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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO ACONTECEU EM 2015 E EN 2015 IL EST ARRIVÉ: ORDENAÇÃO DOS CIRCUNSTANCIAIS TEMPORAIS E ASPECTUAIS NO PORTUGUÊS E NO FRANCÊS Érika Cristine Ilogti de Sá 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

ACONTECEU EM 2015 E EN 2015 IL EST ARRIVÉ: ORDENAÇÃO DOS

CIRCUNSTANCIAIS TEMPORAIS E ASPECTUAIS NO PORTUGUÊS E NO FRANCÊS

Érika Cristine Ilogti de Sá

2015

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ACONTECEU EM 2015 E EN 2015 IL EST ARRIVÉ: ORDENAÇÃO DOS

CIRCUNSTANCIAIS TEMPORAIS E ASPECTUAIS NO PORTUGUÊS E NO FRANCÊS

Érika Cristine Ilogti de Sá

Tese de Doutorado apresentada ao Programa

de Pós-Graduação em Linguística da

Universidade Federal do Rio de Janeiro como

quesito para a obtenção do Título de Doutor

em Letras (Linguística).

Orientadora: Profa. Dra Maria Maura da

Conceição Cezario

Co-orientadora: Profa. Dra Maria da

Conceição de Paiva

Rio de Janeiro

Setembro de 2015

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ACONTECEU EM 2015 E EN 2015 IL EST ARRIVÉ: ORDENAÇÃO DOS

CIRCUNSTANCIAIS TEMPORAIS E ASPECTUAIS NO PORTUGUÊS E NO FRANCÊS

Érika Cristine Ilogti de Sá

Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario

Co-orientadora: Professora Doutora Maria da Conceição Auxiliadora de Paiva

Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-graduação em Linguística, Faculdade de

Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos

necessários à obtenção do título de Doutor em Linguística (Letras)

Aprovada por:

________________________________________________________________

Profa. Dra. Maria Maura da Conceição Cezario - UFRJ

________________________________________________________________

Profa. Dra. Maria da Conceição Auxiliadora de Paiva - UFRJ

________________________________________________________________

Profa. Dra. Maria Luiza Braga – UFRJ

________________________________________________________________

Profa. Dra. Priscilla Mouta Marques - UFRJ

________________________________________________________________

Profa. Dra. Márcia dos Santos Machado Vieira – Vernáculas – UFRJ

________________________________________________________________

Profa. Dra. Maria Jussara Abraçado de Almeida - UFF

________________________________________________________________

Prof. Dr. Roberto de Freitas Junior – UFRJ, suplente

________________________________________________________________

Prof. Dr. Vinicius Maciel de Oliveira – UERJ, suplente

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Ilogti de Sá, Érika Cristine.

Aconteceu em 2015 e En 2015 il est arrivé: Ordenação dos Circunstanciais

Temporais e Aspectuais no Português e no Francês / Érika Cristine Ilogti de Sá.

– Rio de Janeiro: UFRJ/ Faculdade de Letras, 2015.

xvi, 222 fl.: il.; 34 cm.

Orientador(a): Maria Maura da Conceição Cezario

Tese (doutorado) – UFRJ/ Faculdade de Letras/ Programa de PósGraduação

em Linguística, 2015.

Referências Bibliográficas: f. 218-222.

1. Análise Comparativa de duas línguas. 2. Circunstancial temporal e

aspectual. 3. Português e Francês. 4. Ordenação de palavras. 5. Funcionalismo

Norte-Americano. I. Cezario, Maria Maura da Conceição. II. Universidade

Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras, Programa de Pós-graduação em

Linguística. III. Título.

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Ao meu melhor amigo, ao meu amor, Fernando

Henriques, por me ajudar em cada passo, ser

meu caminho, minha vida.

Aos meus pais, por tudo o que fizeram e fazem

por mim, por serem a minha essência.

.

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AGRADECIMENTOS

O que pode acontecer na nossa vida em quatro anos? Uma certa pessoa, no início do

meu doutorado, me disse: “Pode esperar, muita coisa muda em quatro anos” E isso parecia

profecia. Pessoas entraram na minha vida. Pessoas saíram. Perdi entes queridos. Ganhei

entes queridos. Conheci a Europa. Conheci um marido. Fui substituta. Casei. Escrevi uma

tese. Agora, no fim, é difícil conseguir agradecer a tudo o que passei para chegar aqui. E,

sim, agradecer a tudo! Até o que de ruim passou, pois isso me transformou. Hoje, quatro

anos depois, outra pessoa encerra essa jornada.

Quero começar os agradecimentos pela pessoa que “tentou” me avisar que “em

quatro anos muita coisa muda”: minha mãe acadêmica, a Maura. São exatos 13 anos juntas.

Desde o meu primeiro período nesse mundo que era tão afastado de toda a realidade que até

então eu vivia. Obrigada por fazer me apaixonar por linguística desde a minha primeira

aula na Faculdade de Letras, em setembro de 2002. Obrigada ainda por ter sido tão

compreensiva nesse último ano, quando parecia que nada mais daria certo. Obrigada por ter

me levado para a família D&G. Isso transformou minha.

Continuando com as mães acadêmicas, agradeço a uma que me adotou, minha co-

orientadora: Conceição. Nesse doutorado e, principalmente nesses últimos tempos, você foi

muito mais que uma co-orientadora: atenciosa, participativa, carinhosa. Obrigada pelos

conselhos, por estar sempre tão disponível, por me fazer querer entender cada vez mais.

Desculpe não ter sido a melhor, mas foi o melhor que consegui agora.

Ainda no ramo acadêmico, não tenho como não falar da minha marida, Julieta.

Obrigada pelas viagens, pelas broncas, pelos vinhos. Você é o meu par, independentemente

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de pesquisa e do rumo que a nossa vida tome. Você é minha madrinha ausente-presente,

sem vestido rosa. Amo lembrar de tudo o que passamos lá em 2011, numa Europa com

moedinhas, com euros sumindo, com sorvetes, escadas, com italianos sendo colocados na

mala pela Natália, com sonhos compartilhados. Aliás, tenho muito orgulho de vocês duas

terem conseguido fazer aquilo que sonhamos lá naqueles cafés. Nat, obrigada simplesmente

por ter me deixado conhecer a pessoa que você é. Simplesmente não trocaria vocês duas,

minhas companheiras preferidas de viagem, por ninguém.

Essa família ainda trouxe mais presentes. Roberto, obrigada por sempre tentar me

animar com o “Vamos à Mocidade?”. Agora eu te pergunto: “Me leva à Mocidade?”.

Karen, minha gema, obrigada por ter sido tão especial comigo. Por sua culpa, hoje, quero

logo voltar a dar aula de Filologia só para poder dividir turmas com você. Deise, admiro

sua competência e sua determinação. Você me ensinou a não desistir. Obrigada!

Aqui, duas pessoas ainda merecem destaque: Dennis e Priscilla. Dennis, você é

aquele tipo de pessoa que acredita na gente mais que nós mesmos. Obrigada por ser esse

entusiasta, por revisar meus textos, pelo “estamos juntos”, “não sofra sozinha”. Às vezes,

de fato, é só isso que precisamos ouvir. Pri, já falei isso antes para você, mas hoje mais do

que nunca repito: quero ser você quando crescer. Você foi minha inspiração, admiro você

hoje muito mais! Obrigada!

A todos os outros amigos do D&G, acreditem, compartilhar essa história com vocês

é muito prazeroso. A cada vez que vejo um aluno de IC entrando, estou revivendo minha

história. Aliás, Matheus, obrigada por me fazer reviver minha animação do início de vida

acadêmica e por me fazer sentir tão especial. Nesses 13 anos de convivência, cada um me

ajudou de alguma forma, e, claro, nunca poderia me esquecer do Mario, não só do Mario

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funcionalista, mas daquele que dizia para eu trocar de time, aquele que dizia para eu

comprar um all star, aquele que fazia a gente se sentir importante. A toda família D&G,

meu muito obrigada!

Além dos amigos do D&G, gostaria de agradecer àqueles que fazem parte da

família a qual escolhi, os amigos, Débora e Luciano, Aline e Sérgio, Clara e Renê, Natália

Lemelle, Juju Bessa. Dividir com vocês, nesse período, as angústias, os choros, o

desespero, a ausência, as rezas, foi de uma importância singular. Agora, eu espero poder

retribuir todo o carinho e amor que tiveram.

Esses últimos quatro anos não foram nada fáceis, e agradecer à família que Deus me

deu é pouco. Agradeço aos meus pais, por serem quem são. Ao meu pai, o que mais tem

orgulho de mim, obrigada pelas conversas, por ir me buscar no fundão e até mesmo por

ficar perguntando todo domingo “você não vem almoçar?”, “quer um churrasquinho, aí?”.

Acredite, poder ir comer seu churrasquinho num domingo foi um grande incentivo para

terminar a tese. À minha mãe, por tudo o que passou, que tem passado, e nunca ter

esmorecido. Por receber alta do hospital e na semana seguinte cozinhar feijão para levar

comida para mim. Obrigada por ser a mulher mais forte que conheço no universo, por não

me deixar sozinha nesse barco. Amo vocês demais!

À minha tia Lica, minha madrinha, que, mesmo não entendendo nada que eu faço, é

sempre tão carinhosa e gentil. À minha irmã, aquela que começou a mudar a minha vida no

início do meu doutorado, há pouco mais de quatro anos, me dando o maior presente das

nossas vidas: o Bernardo. Bianca, saber que você se orgulha de mim me faz ter forças para

continuar. Terminar a tese e saber que terei mais tempo para vocês foi um dos meus

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maiores incentivos. Bernardo, sua prima-irmã, a tese, chegou! À minha família, o meu mais

profundo agradecimento. Amo vocês!

Há quatro anos, mais uma parte de mim se foi. Minha tia, mãe de criação, nos

deixou, sem avisos. Durante essa tese, sua falta e sua presença foram sentidas a cada

momento. Ser mimada pelas suas comidinhas, ao longo de todo o processo, só me fizeram

ter mais a certeza do quanto havia um espaço vazio em mim. Essa tese é sua, tia Boinha.

Você e minha vó serão para sempre minhas inspirações. Todo o esforço de vocês para que

eu estudasse valeu a pena. Obrigada.

Acreditamos nas razões de Deus, e ele não nos desampara. Há quatro anos, conhecia

o homem da minha vida, em um período conturbado, ele veio como um alento, um amparo,

um presente. Casamos e nada até agora foi fácil. Fernando, saiba que não te decepcionar foi

o maior motivo para eu não desistir. Parece clichê, mas você foi meu cérebro quando eu

não conseguia raciocinar, quando eu queria desistir, quando fiquei sem rumo. Essa tese é

tão sua quanto minha, porque sem você literalmente nada teria acontecido. Obrigada por

viver a tese comigo nos últimos meses, por me ensinar um pouquinho da sua teoria durante

os nossos cafés. Obrigada por ser meu revisor oficial. Obrigada por você ter segurado tudo

isso comigo, para mim. Sem você, eu não conseguiria. Obrigada por ter sido para mim

aquilo que ninguém poderia. Te amo hoje muito mais que antes, se é que é possível. Agora,

podemos viver o casamento, ou, pensar em um pós-doutorado juntos.rs.

Finalmente, agradeço a Deus! Não somente por ter colocado essas pessoas

maravilhosas na minha vida, mas por ter feito com que tudo, no final, desse certo.

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Dentre os grandes és o primeiro!

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RESUMO

ACONTECEU EM 2015 E EN 2015 IL EST ARRIVÉ: ORDENAÇÃO DOS

CIRCUNSTANCIAIS TEMPORAIS E ASPECTUAIS NO PORTUGUÊS E NO

FRANCÊS

Érika Cristine Ilogti de Sá

Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario

Co-Orientadora: Professsora Doutora Maria da Conceição Auxiliadora de Paiva

Resumo da Tese de Doutorado submetida ao programa de Pós-Graduação em Linguística,

Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos

requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em Linguística.

À luz dos pressupostos do funcionalismo norte-americano, este trabalho tem como

principal objetivo fazer uma análise comparativa entre os diferentes usos dos

circunstanciais temporais e aspectuais na escrita do português e do francês. Para isso,

utilizamos um corpus de notícias e editoriais dos jornais O Globo, Folha de São Paulo, Le

Monde e Le Figaro.

Diversos são os fatores que podem motivar a ordenação dos circunstanciais – entre

eles, o tipo de verbo, a representação e a posição do sujeito, o peso do circunstancial, seu

papel semântico, sua função discursiva –, por isso, partimos de uma análise estrutural da

sentença, investigando também a semântica do circunstancial até chegar ao seu papel

discursivo. Dessa forma, pretendemos provar a hipótese de que a ordenação do

circunstancial em início de orações é determinada em primazia por motivações discursivas

e pragmáticas – e não necessariamente por questões mais sintáticas, como o preenchimento

da posição vazia deixada pelo sujeito. Nossa hipótese ganha força ao compararmos as

tendências do português com o francês, já que este possui uma estrutura em que o

preenchimento do sujeito é obrigatório.

Palavras-Chave: análise comparativa de duas línguas, circunstancial temporal e aspectual,

português e francês, ordenação de palavras, Funcionalismo norte-americano.

Rio de Janeiro

Setembro de 2015

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ABSTRACT

ACONTECEU EM 2015 E EN 2015 IL EST ARRIVÉ: ORDENAÇÃO DOS

CIRCUNSTANCIAIS TEMPORAIS E ASPECTUAIS NO PORTUGUÊS E NO

FRANCÊS

Érika Cristine Ilogti de Sá

Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario

Co-Orientadora: Professsora Doutora Maria da Conceição Auxiliadora de Paiva

Abstract da Tese de Doutorado submetida ao programa de Pós-Graduação em Linguística,

Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos

requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em Linguística.

This thesis aims at making a comparative analysis of the different uses of time and

aspectual adverbs in Portuguese and French writing, in the light of North American

functional linguistics. Thus, we used a corpus of news articles and editorials from O

Globo, Folha de São Paulo, Le Monde and Le Figaro.

There are several factors that can motivate the adverbial position: the verb type, the

representation and position of the subject, besides the weight, semantic role and discourse

function of the adverbial. For that reason, we investigated the structure of the sentence, the

semantics of the adverbs and their discourse role. Based on this, we intended to prove the

hypothesis that the position of adverbs in the beginning of clauses is mainly determined by

discourse and pragmatic reasons and not necessarily due to syntactic issues, such as the

filling of the empty position resulting from the absence of the subject in it. Our hypothesis

seems to be plausible when we compare Portuguese to French, since the latter has a

structure in which the subject occurrence is mandatory.

Keywords: Comparative analysis of two languages, Time and aspectual adverbials,

Portuguese and French, Word Order, North American functionalism.

Rio de Janeiro

September, 2015

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RÉSUMÉ

ACONTECEU EM 2015 E EN 2015 IL EST ARRIVÉ: ORDENAÇÃO DOS

CIRCUNSTANCIAIS TEMPORAIS E ASPECTUAIS NO PORTUGUÊS E NO

FRANCÊS

Érika Cristine Ilogti de Sá

Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario

Co-Orientadora: Professsora Doutora Maria da Conceição Auxiliadora de Paiva

Résumé da Tese de Doutorado submetida ao programa de Pós-Graduação em Linguística,

Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos

requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em Linguística.

À la lumière des présupposés du fonctionnalisme nord-américain, ce travail a

comme but principal de faire une analyse comparative entre les différents usages des

circonstanciels temporels et aspectuels dans l’écriture du portugais et du français. Pour cela,

nous utilisons un corpus de nouvelles et d’éditoriaux des journaux O Globo, Folha de São

Paulo, Le Monde et Le Figaro.

Il y a plusieurs facteurs qui peuvent motiver l’ordre des circonstanciels – parmi

lesquels le type de verbe, la représentation et la position du sujet, l’importance du

circonstanciel, son rôle sémantique, sa fonction discursive – c’est pourquoi nous partons

d'une analyse structurelle de la proposition, en investiguant aussi la sémantique du

circonstanciel jusqu’au moment d’atteindre son rôle discursif. Nous avons ainsi l'intention

de prouver l'hypothèse que l'ordre du circonstanciel au début de clauses est déterminée en

primauté par des raisons discursives et pragmatique – et pas nécessairement par des

questions plus syntaxiques comme le remplissage de la position vidée par le sujet. Notre

hypothèse se révèle plausible lorsque l'on compare les tendances du portugais avec le

français, puisque celui-ci a une structure dans laquelle le remplissage du sujet est

obligatoire.

Mots-clés: analyse comparative de deux langues, circonstanciel temporel et aspectuel,

portugais et français, ordination de , Fonctionnalisme nord-américain.

Rio de Janeiro

Septembre 2015

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 17

1. OBJETO DE ESTUDO: O PONTO DE PARTIDA ........................................................ 25 1.1 As locuções adverbiais ............................................................................................... 25 1.2. Les Compléments circonstanciels – complementos circunstanciais em francês ....... 30 1.3. Os circunstanciais de tempo e aspecto ...................................................................... 33

2. ESTUDOS LINGUÍSTICOS ............................................................................................ 38

2.1. A ordenação dos circunstanciais................................................................................ 38 2.1.1. O Papel Semântico ............................................................................................. 38 2.1.2. A função discursiva e as demais motivações para ordenação dos circunstanciais

...................................................................................................................................... 44

2.2. Sobre o Sujeito .......................................................................................................... 54 2.3. Considerações sobre o francês ................................................................................... 58

3. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS ........................................................................................ 63 3.1. Conceitos básicos do funcionalismo norte-americano .............................................. 63

3.2. Gênero Textual e tipo de texto .................................................................................. 71

4. AMOSTRA E METODOLOGIA ..................................................................................... 76

4.1. Amostra ..................................................................................................................... 77

4.2. Metodologia ............................................................................................................... 82

5. ANÁLISE DOS DADOS ................................................................................................. 93 5.1. Ordem da Locução em Relação ao verbo .................................................................. 94

5.1.2. Margens da oração ............................................................................................ 123

5.2. Parâmetros Analisados ............................................................................................ 127 5.2.1. Propriedades estruturais .................................................................................... 128 5.2.2. Propriedades semânticas ................................................................................... 167 5.2.3. Propriedades Discursivo-Pragmáticas .............................................................. 177

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 204

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 214

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LISTA DE TABELAS

Tabela 4.1 – Quantidade de dados em cada gênero...................................................83

Tabela 5.1 – Ordenação das locuções......................................................................102

Tabela 5.2 – Ordens com apenas um X no português.............................................107

Tabela 5.3 – Ordens com apenas um X no francês..................................................112

Tabela 5.4 – Ordenações com dois X......................................................................120

Tabela 5.5 – Tipo de verbo X ordem no português.................................................131

Tabela 5.6 – Tipo de verbo X ordem no francês.....................................................133

Tabela 5.7 – Representação do sujeito X ordem no português................................140

Tabela 5.8 – Representação do sujeito X ordem no francês....................................146

Tabela 5.9 – Posição do sujeito X ordem no português ..........................................151

Tabela 5.10 – Posição do sujeito X ordem no francês.............................................154

Tabela 5.11 – Estrutura da locução X ordem no português.....................................159

Tabela 5.12 – Estrutura da locução X ordem no francês.........................................160

Tabela 5.13 – Tamanho da locução X ordem no português....................................163

Tabela 5.14 – Tamanho da locução X ordem no francês.........................................165

Tabela 5.15 – Semântica da locução X ordem no português...................................171

Tabela 5.16 – Semântica da locução X ordem no francês.......................................174

Tabela 5.17 – Papel discursivo da locução X ordem no português.........................188

Tabela 5.18 – Papel discursivo da locução X ordem no francês.............................192

Tabela 5.19 – Gênero Textual X ordem no português.............................................199

Tabela 5.20 – Gênero Textual X ordem no francês.................................................201

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LISTA DE QUADROS, GRÁFICOS E ESQUEMA

Esquema 1 – Noções semânticas dos adverbiais.............................................................36

Quadro 4.1 – Distribuição da Amostra............................................................................78

Gráfico 5.1 – Margens e posições mediais das locuções no português.........................124

Gráfico 2 – Margens e posições mediais das locuções no francês................................125

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INTRODUÇÃO

O mundo românico atual reconhece seis línguas nacionais1 com uma mesma

origem. Para esta pesquisa, duas delas são comparadas – a língua portuguesa e a língua

francesa. Suas diferenças, segundo Ilari (2008), são oriundas do processo de queda do

Império Romano e da consequente dialetação do latim vulgar – o francês, inclusive,

desde o século XIII, era a língua que mais se distanciava dessa variedade do latim.

Ainda que, do ponto de vista estrutural, aspectos divergentes entre o português e o

francês sejam evidentes, comparar duas línguas de mesma origem nos possibilita buscar

também pontos de convergência.

Comparamos nessas duas línguas as diferentes possibilidades de ordenação dos

circunstanciais de tempo e aspecto, seguindo uma visão funcionalista. Para nossa

análise, consideramos como circunstanciais de tempo e aspecto válidos apenas as

locuções adverbiais que traziam em si essa noção semântica, conforme Givón (2001)2.

Como veremos no capítulo 1, o termo circunstancial adotado em nossa análise remete

ao fato de o objeto de estudo indicar uma circunstância temporal que, segundo Neves

(2011), pode acoplar o valor aspectual3.

Há muitos estudos sobre a ordenação dos adverbiais em português, sobretudo a

partir da última década do século XX, tais como Ilari et alii (1990); Martelotta (1994);

Castilho (1999); Andrade (2005); Brasil (2005); Paiva (2007, 2008, 2011, 2012); Ilogti

de Sá (2009), que se dedicaram à análise e compreensão dos adverbiais e mostraram a

relevância do aprofundamento do estudo desses elementos, posto que são construções

1 Ilari (2008:213) considera seis línguas românicas nacionais, são elas: o português, o espanhol, o catalão,

o francês, o italiano, o romeno. 2 Os termos locução adverbial temporal / aspectual e circunstancial temporal / aspectual são utilizados ao

longo do trabalho para designar nosso objeto de estudo e a justificativa para o seu emprego se encontra no

capítulo 1. 3 No capítulo 1, veremos que há uma grande dificuldade em se estabelecer a separação entre as noções de

tempo e aspecto.

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de natureza diversificada, de difícil classificação e que apresentam funções variadas na

língua.

Dando continuidade à pesquisa iniciada por Ilogti de Sá (2009) no Mestrado,

nosso trabalho tem como objetivo investigar os possíveis fatores responsáveis pelas

diferentes posições dos circunstanciais de tempo/aspecto na oração. Procuramos fazer

um estudo dos usos das locuções adverbiais, com o intuito de verificar se as tendências

de ordenação seriam semelhantes e se as estratégias de uso estariam ligadas a possíveis

princípios comunicativos e de organização textuais universais. Além disso, tentamos dar

conta de dois gêneros textuais escritos, utilizando notícias e editoriais de diferentes

jornais, a saber: Folha de São Paulo e O Globo – jornais brasileiros – e Le Fígaro e Le

Monde – jornais franceses.

Ao assumirmos a perspectiva de que o circunstancial temporal e aspectual possui

mobilidade na oração, buscamos ao longo da tese delimitar os possíveis fatores que

motivem as diferentes ordens. Sendo assim, estruturas como as que observamos em (1),

(2), (3) e (4) serviram de base para nossa análise:

(1) Lors de son interrogatoire, le commandant Schettino s’est pourtant targué

d’être un “bon commandant”4. [notícia 4 – Le Monde]

(2) Les deux amant se sont rencontrés em 1996.5 [notícia 11 – Le Figaro]

(3) A Associação de Jornais dos EUA lançará em abril uma campanha

publicitária. [editorial 1 – O Globo]

(4) Ele já conseguiu adiar essa decisão mais uma vez, contando com uma

Suprema Corte outrora manipulável. [notícia 16 – Folha de São Paulo]

4 Durante o seu interrogatório, o comandante Schettino ainda se gabou de ser um "bom comandante". 5 Os dois amantes se reencontraram em 1996.

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Utilizamos os pressupostos teóricos da corrente funcionalista por julgarmos que

o posicionamento dos circunstanciais possui motivação muito mais discursiva do que

propriamente sintática, distanciando-se das abordagens mais formalistas. Esse

distanciamento ocorre pelo fato de o funcionalismo considerar a linguagem como um

instrumento de interação social e por conceber que a gramática emerge do uso e é

moldada por fatores comunicativos e cognitivos.

Comparamos nossos resultados com as tendências estabelecidas nos estudos

realizados anteriormente, no que diz respeito à função discursiva da locução e com sua

função na sintaxe da oração. Assim, um dos objetivos principais desta tese é contribuir

para o estudo da ordenação de locuções adverbiais e verificar as semelhanças e

diferenças entre as duas línguas românicas com relação ao uso das locuções adverbiais.

No estudo dos circunstanciais temporais, é possível perceber que a referência

temporal não é sua única função, porque eles participam da coesão entre os termos do

discurso, introduzem novos eventos e fazem referências a situações já descritas (cf.

Paiva 2007, 2008; Ilogti de Sá 2009). De acordo com várias pesquisas, sobretudo de

linha formalista, como Duarte (1993, 1995), o português está se tornando uma língua de

sujeito obrigatório. Assim, se deixada vazia, a posição deste sujeito tenderia a ser

ocupada por algum elemento, como, por exemplo, as locuções adverbiais (cf. Kato e

Duarte 2003), para evitar que o verbo inicie a oração. No entanto, alguns trabalhos já

mostraram que, como a posição prototípica das locuções são as margens da oração, a

margem esquerda pode ser preenchida independentemente da presença ou ausência do

sujeito ( Brasil, 2005, Ilogti de Sá, 2009, Paiva 2011, Lessa 2012). Assim, não seria a

ausência formal do sujeito que facilitaria a ocorrência da locução circunstancial na

margem esquerda da oração, mas sim fatores discursivos.

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Com a comparação entre o português e o francês, buscamos evidências para

discutir que a posição da locução está mais relacionada à sua função discursiva do que à

sintaxe da oração, visto que o francês é uma língua de sujeito obrigatório e, mesmo

assim, a posição da locução adverbial varia de acordo com o contexto (como vimos nos

exemplos (1) e (2)). Portanto, analisar uma língua que já tenha passado pelo processo de

mudança no parâmetro do sujeito nulo, como o francês, nos fornece subsídios para

entender o comportamento estrutural dos circunstanciais no português.

Com base nas características observadas em estudos anteriores e em expectativas

apresentadas, pretendemos responder aos seguintes questionamentos:

1) As tendências de ordenação das locuções são iguais no português e no francês? Se

não, por que há as diferenças?

2) Qual o posicionamento da locução adverbial na oração, em cada língua?

3) Quais locuções seriam mais presas ao verbo? Isso é motivado por sua extensão? Ou

pelo tipo de sintagma?

4) As locuções adverbiais preenchem a posição deixada vazia pelo sujeito?

5) Existem posições mais fixas para as locuções adverbiais em função de seu papel

semântico na oração? Se sim, que valores seriam esses?

6) Até que ponto as funções discursivas da locução são importantes no seu

posicionamento na oração? E quais são as funções desempenhadas por elas?

Tais questionamentos nos trouxeram os seguintes objetivos para o estudo

comparativo entre o português e o francês:

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(a) caracterizar as posições assumidas pelas locuções adverbiais de tempo e aspecto,

apresentando a frequência de ocorrência de cada ordenação;

(b) verificar a relação entre o papel semântico-pragmático das locuções adverbiais e a

posição das mesmas na oração;

(c) investigar a relação entre tamanho e posição da locução;

(d) analisar a relação entre o papel de cada locução no discurso e a sua posição;

(e) observar as locuções na margem esquerda da oração, estabelecendo a relação com a

presença ou ausência de sujeito antes do verbo;

(f) verificar as diferenças e semelhanças de uso de locuções adverbiais temporais e

aspectuais em português e em francês;

(g) investigar o tipo sintático do verbo (transitivo, intransitivo, de ligação) e sua relação

com a posição das locuções;

(h) identificar a influência do gênero e da tipologia textual na ordenação da locução;

(i) identificar as possíveis diferenças na ordenação das locuções iniciadas por

preposição (como “naquela manhã”, “de vez em quando” ou “depuis plus de trente

ans”, por exemplo) e aquelas compostas apenas por sintagma nominal (como “le 3

juillet” ou “muitas vezes”).

Para guiar nossa análise, levantamos as seguintes hipóteses:

(1) as locuções adverbiais temporais e aspectuais devem ter uma posição prototípica na

oração; as locuções tendem a ocupar as margens da oração, pois são estruturas mais

livres, possuem uma função discursiva e podem possuir escopo maior;

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(2) o valor semântico exercido pela locução deve influenciar na posição que ela ocupa

na frase; por exemplo, esperamos que as locuções com valor dêitico ou localizador

apareçam predominantemente na margem esquerda pelo fato de que podem possuir

alcance de modificação maior, localizando vários estados de coisas;; já aquelas com

valor aspectual tenderiam a ocorrer nas adjacências do verbo, pelo fato de que a própria

categoria de aspecto é mais inerente à predicação;

(3) locuções maiores devem ocorrer na margem direita, no final da oração, já que a

literatura linguística demonstra que essas estruturas seriam mais pesadas e devem

aparecer ao final da sentença para não interromper o fluxo de informações essenciais

(codificadas através do sujeito, do verbo e do complemento ou predicativo), ou seja,

para não quebrar a coesão textual;

(4) as locuções com uma função na macroestrutura do texto, ou seja, com um escopo

maior que a oração, devem aparecer predominantemente na margem esquerda da

oração, estabelecendo ligações entre partes do texto; ao passo que aquelas com uma

função mais restrita à oração, apenas se referindo ao tempo do evento, não devem

aparecer na margem esquerda da oração, ocupando posições mais ligadas ao verbo;

(5) as locuções tendem a aparecer na margem esquerda das orações independentemente

do preenchimento da posição do sujeito ou não; assim, a posição das locuções é

determinada principalmente por sua função discursiva e não por fatores sintáticos;

(6) a posição das locuções adverbiais em francês na margem esquerda da oração deve

ser explicada sobretudo por fatores de ordem discursiva e não por fatores ordem

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sintática, já que a posição do sujeito estará necessariamente preenchida, exceto quando

está posposto;

(7) a locução adverbial tende a aparecer na margem esquerda da oração,

independentemente da posição do sujeito em orações intransitivas; e tende a aparecer

nas margens com verbos transitivos para não interferir na integração entre o verbo e os

complementos.

(8) em textos mais narrativos, como as notícias, as locuções, principalmente as

localizadoras, apareceriam mais à direita do verbo para verbo para não quebrar o fluxo

narrativo; já os textos mais argumentativos, como os editoriais, tenderiam mais a

posições iniciais para demarcar oposições de ideias;

(9) em francês, as locuções mais presas ao verbo seriam aquelas que aparecem com a

preposição, como, por exemplo, à quatre ans; entre 2000 et 2006.

Procuraremos ainda refutar a hipótese de que a locução tende a se posicionar na

margem esquerda da oração quando o sujeito não estiver presente para ocupar seu

espaço deixado vazio. Para nós, a posição da locução adverbial seria a margem esquerda

sobretudo por fatores discursivos, como a retomada anafórica ou mudança de assunto, e

não por uma questão de mudança do parâmetro do sujeito nulo. Essa nossa hipótese

ganha força ao analisarmos a língua francesa, que já possui em sua estrutura a

obrigatoriedade do sujeito. Neste caso, tentaremos comprovar que, nas duas línguas, a

posição da locução é motivada principalmente pela sua função no discurso. Não

estamos dizendo com isso que fatores estruturais não são relevantes, como, por

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exemplo, o tamanho da locução. São importantes, mas sozinhos não explicam a

ordenação dessas construções em estudo.

Para tanto, nosso primeiro capítulo trará uma explanação sobre nosso objeto de

estudo; justificaremos o uso do termo circunstancial e ainda discutiremos a noção de

tempo e aspecto. No capítulo seguinte, retomaremos de forma sucinta alguns estudos

linguísticos sobre os circunstanciais temporais e aspectuais. Abordaremos, ainda, a

forma como a noção semântica dos adverbiais temporais e aspectuais é tratada, além de

apresentarmos uma breve explanação de trabalhos sobre a questão do sujeito no

português brasileiro. No terceiro capítulo, apresentaremos os pressupostos teóricos que

norteiam nossa pesquisa. No capítulo 4, detalhamos a metodologia utilizada e alguns

parâmetros empregados em nossa análise. Finalmente, no capítulo 5, apresentaremos as

análises realizadas e, em sequência, as tendências observadas nas locuções.

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1. OBJETO DE ESTUDO: O PONTO DE PARTIDA

No intuito de apresentar o objeto de análise de nosso trabalho – ordenação de

circunstanciais de tempo e de aspecto no português e no francês escrito – faremos, neste

capítulo, uma breve explanação sobre as suas características estruturais, semânticas e de

ordenação. Para isso, partimos das observações de algumas gramáticas tradicionais

brasileiras e francesas sobre as locuções adverbiais, bem como de algumas discussões

teóricas sobre as noções de tempo e aspecto.

1.1 As locuções adverbiais

A tradição gramatical brasileira atribui às locuções adverbiais o status de

subcategoria dos advérbios simples. Como veremos mais adiante, em função de tal

perspectiva, as gramáticas tradicionais acabam destacando somente dois aspectos dessas

locuções: (a) a sua constituição estrutural, com ênfase na sua realização sob a forma de

SPrep (preposição + elemento nominal), e (b) o seu valor semântico, geralmente, com

base numa listagem dos tipos de adverbiais, exemplificados de forma

descontextualizada.

Cunha (1990) distingue os advérbios a partir do termo ao qual eles se

relacionam. Para o autor, advérbios são palavras que se juntam a verbos – para exprimir

a circunstância em que se desenvolve o processo verbal – e a adjetivos e a outros

advérbios, para intensificar uma qualidade. Rocha Lima (2003) segue o mesmo padrão

de definição, referindo-se aos advérbios como modificadores do verbo, limitando a

apenas os advérbios de intensidade a modificação de adjetivos e outros advérbios.

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Para ambos os autores, a estrutura da locução adverbial consiste num conjunto

de duas ou mais palavras com valor de advérbio. Segundo Cunha (op.cit.), a regra para a

formação das locuções adverbiais é a associação de uma preposição a um substantivo, a

um adjetivo ou mesmo a um advérbio. Nos exemplos dados pelo autor, a locução

adverbial aparece em estruturas com preposição (em silêncio; de vez em quando) e sem

a preposição (frente a frente; ombro a ombro)6.

O papel da preposição como formador da locução adverbial é apresentado por

Bechara (2009), já que ela seria o elemento responsável por preparar o substantivo para

exercer uma função primariamente diferente da sua: a função de advérbio. Entretanto, o

autor aponta que essa preposição pode não integrar a estrutura da locução adverbial de

tempo e de modo. Um dos exemplos apresentados pelo autor, retomado (1) a seguir,

mostra que a locução esta semana (um SN) é usada, ao invés de nesta semana, na

margem esquerda da sentença:

(1) Esta semana teremos prova. (Bechara 2009:290)

Para nós, uma definição mais abrangente sobre a distinção estrutural entre

advérbio e locução adverbial está em Martelotta (2012:26):

“Há dois aspectos da estrutura dos advérbios que devem ser aqui mencionados. Um

deles diz respeito à distinção entre a noção de advérbio, que focaliza a natureza do

termo como um único vocábulo (hoje, bem, aqui, rapidamente etc.) e o conceito de

sintagma ou locução adverbial, caracterizado pela estrutura sintagmática de algum tipo

(de manhã, na noite passada, todo dia, muitas vezes etc).

Nesse sentido, teríamos, por um lado, aquelas estruturas sintagmáticas, consequentes

da possibilidade de se formar, sobretudo pela junção de preposições com substantivos,

construções de valor adverbial. (...)”

6 Cunha (1990:501).

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Tendo em vista a questão estrutural, Neves (2011) elenca algumas construções

possíveis para as locuções adverbiais:

(a) preposição + substantivo/adjetivo/advérbio – Ex.: de repente; às vezes; por miúdo.

(b) substantivo quantificado – Ex.: algumas vezes; muitas vezes.

(c) preposição + substantivo quantificado – Ex.: de forma alguma; de modo nenhum.

(d) substantivo + preposição + substantivo – Ex.: via de regra.

(e) substantivo/pronome quantificador + preposição + mesmo substantivo/pronome –

Ex.: passo a passo; pouco a pouco.

(f) preposição + sintagma nominal/pronominal + preposição + sintagma

nominal/pronominal – Ex.: de uma vez por todas; de vez em quando.

(g) preposição + nome/pronome + preposição + mesmo nome/pronome – Ex.: de tempo

em tempo; de quando em quando.

(h) as formas verbais HÁ/FAZ, HAVIA/FAZIA + substantivo quantificado – Ex.: fazia

alguns meses; há dois anos.

Das diferentes possibilidades estruturais listadas pela autora para as locuções

adverbiais, a única que não faz parte de nossa investigação é a (h), pois consideramos

que, por ser uma construção verbal, ela precisaria de uma análise diferenciada das

demais (cf. capítulo 4).

Como vimos, um conjunto de palavras não precisa necessariamente de uma

preposição inicial para funcionar como advérbio. Castilho et alii (2014) afirma que há

uma área cinzenta entre os advérbios propriamente ditos e os adverbiais (sintagmas

nominais e sintagmas preposicionais que assumem funções de advérbios). Os autores

indicam que, no estudo sobre adverbiais, é importante distinguir o que eles chamam de

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advérbios de constituintes de advérbios de sentença. Os primeiros seriam aqueles que

tomam como escopo um constituinte da sentença; os segundos seriam os que tomam

toda a sentença como escopo7. Os autores confirmaram, a partir de uma série de testes, a

distinção entre esses dois tipos de advérbios: se, por um lado, apenas os advérbios de

constituinte aceitam normalmente operações de focalização, interrogação e clivagem,

por outro, os advérbios “de discurso” – associados à modalidade oral pelos autores.

No que diz respeito à ordenação dos adverbiais, Castilho (op.cit.) resume as

possibilidades em quatro8:

P1: antes da sentença

P2: depois da sentença

P3: entre o sujeito e o verbo da sentença

P4: entre o verbo e o argumento que vem imediatamente depois do verbo.9

Os autores afirmam que, geralmente, o advérbio estará próximo à frase sobre a

qual opera, ou seja, a ordenação do adverbial estará diretamente relacionada ao seu

escopo. No entanto, os próprios autores consideram este apenas um princípio geral, cuja

aplicação gera várias alternativas.

Castilho (2012) faz uma distinção entre os adjuntos adverbiais a partir de seu

escopo. O autor nomeia como adjunto adverbial aqueles que tomam como escopo o

verbo, o adjetivo ou outro advérbio. Já os adjuntos que possuem como um escopo toda a

sentença, predicando-a, são chamados de adjuntos adsentenciais.

7 Escopo aqui é considerado como o alcance de modificação em que um determinado elemento tem na

sentença. 8Castilho et alii (2014:271). 9 A proposta de amálgama das posições (conforme veremos no capítulo 5) dá conta dessas ordens

indicadas por Castilho (2014).

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A questão da função e da posição dos adverbiais10 pouco é descrita nas

gramáticas tradicionais, que se limitam, na maioria das vezes, a indicar que os advérbios

e as locuções adverbiais têm a função de adjuntos adverbiais e que sua posição

prototípica é a final – embora eles tenham mobilidade sintática. Além disso, a tradição

gramatical brasileira acaba não contemplando de forma satisfatória as funções

discursivas desses termos e as suas diferentes ordenações na oração.

É importante destacar que Rocha Lima (2003) não limita a função do adverbial à

de adjunto. Para ele, o advérbio pode ser considerado um complemento circunstancial

dependendo da oração, ou seja, ele pode fazer parte da estrutura argumental do verbo.

Contudo, os complementos circunstanciais ocorreriam em orações nas quais o verbo é,

tradicionalmente, classificado como intransitivo, como vemos em (2) e (3)11:

(2) Morar em Paquetá.

(3) A guerra durou cem anos.

Para o autor, o verbo intransitivo prototípico encerra em si “a noção predicativa,

dispensando quaisquer complementos” (p.340), ou seja, ele recorta apenas um papel

participante, que se funde com o argumento que desempenha o papel sintático de

sujeito. Conforme observamos em (2) e (3), as locuções em Paquetá e cem anos não

podem ser consideradas apenas termos acessórios nas suas orações, pois se mostram tão

indispensáveis “à construção do verbo quanto, em outros casos, os demais

complementos verbais” (pág. 252). Para o autor, a ocorrência do complemento

circunstancial é possível em virtude da semântica de verbos como morar, ir, durar e

viver, que não recortam participantes tradicionais como o objeto direto e o indireto, mas

10 Adotamos a nomenclatura “adverbiais” em alguns pontos para designar advérbios e locuções adverbiais

como um todo. 11 Cf. Rocha Lima (2003:252).

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sim circunstâncias necessárias12 à coerência externa do evento. Em outras palavras, os

termos que expressam a noção circunstancial podem se apresentar como um papel

participante do verbo, ou seja, como um de seus complementos.

A flexibilidade de ordenação das locuções adverbiais, podendo ser colocadas no

predicado e ainda nos domínios do sujeito, é justificada por Bechara (op.cit.) devido ao

seu papel na oração. Segundo o autor, como a locução não se prende apenas ao núcleo

verbal, mas também a toda a extensão do conteúdo do predicado, isso lhe permite

mobilidade.

A classificação semântica dos adverbiais está diretamente relacionada à sua

ordenação nas sentenças. Na visão de Cunha (op.cit.), a colocação dos advérbios segue

uma regra básica: os que modificam um adjetivo, um particípio isolado ou outro

advérbio (intensidade) colocam-se antes dele; os que modificam o verbo (modo), depois

dele; e os de tempo e os de lugar podem vir antes ou depois do verbo. Castilho (2012)

sinaliza que Braga e Botelho (1981) já mostraram que os adjuntos adverbiais de tempo e

de frequência se topicalizam mais que os de lugar, modo, quantidade e companhia.

1.2. Les Compléments circonstanciels – complementos circunstanciais em francês

Grevisse (2011) considera que, em francês, o advérbio é uma palavra invariável

a qual pode servir de complemento a um verbo, a um adjetivo e a outro advérbio. O

autor afirma que o advérbio pode ser formado de várias palavras (bientôt; toujours), mas

que, se elas tiverem a escrita separada, são chamadas de locution adverbiale (d’ores et

déjà; en vain; tout à fait).

12 Essas circunstâncias, segundo ao autor, podem vir expressas por: (a) um nome regido por a ou para,

indicando direção (Ir a Roma); (b) um nome com ou sem preposição, exprimindo tempo, ocasião (Viver

muitos anos; E meu suplício durará por meses); ou (c) por nome sem preposição que indique peso, preço,

distância no espaço, no tempo (Envelhecer vinte anos). (pág.252-253)

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Do ponto de vista semântico, Grevisse (op.cit.) distingue os advérbios em três

grupos principais:

(a) os advérbios de modo (adverbes de manière) - aos quais se somam os advérbios de

intensidade (adverbes de degré) e os advérbios de negação (adverbes de négation);

(b) os advérbios de tempo e lugar (adverbes de temps et lieu);

(c) e os advérbios que marcam uma relação lógica (adverbes marquant une relation

logique).

Os advérbios de aspecto (adverbes d’aspect) são considerados, por ele, muitas

vezes próximos dos adverbes de manière e dos adverbes de temps. Segundo o autor:

“Les adverbes de temps situent les faits dans la durée par rapport au moment de la

parole ou à un autre repère. — Les adverbes d’aspect concernent à la fois le temps et la

manière : ils font intervenir des nuances de soudaineté, de répétition, etc”13 (p. 1004)

Como podemos notar, assim como em português, a noção aspectual do adverbial

na língua francesa se confunde com a noção de tempo, tornando difícil a separação.

Uma clara distinção na definição da categoria adverbial pelo autor é a associação

do item à função de complemento de um verbo. Grevisse (op.cit.) separa o

complemento verbal em três tipos: les compléments d’objet (complementos de objeto);

les compléments adverbiaux (complementos adverbiais); et le complément d’agent du

verbe passif (agente da passiva). Esses complementos verbais são o que,

tradicionalmente, a gramática francesa considera como compléments circonstanciels

13 Os advérbios de tempo situam os fatos ao longo do tempo em relação ao momento de discurso ou outro

marco. – Os advérbios de aspecto concernem tanto o tempo quanto a maneira: eles envolvem a

quantidade de nuances, de repetição, etc.

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(complementos circunstanciais), ou seja, é a função exercida pela classe dos advérbios

(adverbes) na sentença.

Estruturalmente, esses complementos circunstanciais possuem o mesmo

comportamento das locuções adverbiais no português. Em francês, les locutions

adverbiales (locuções adverbiais)14 são extremamente numerosas e são formadas a

partir das seguintes estruturas: Préposition + nom; Préposition + infinitif; Préposition +

adjectif; Préposition + forme verbale + objet; Préposition et adverbe; Syntagmes divers.

Delatour et alii (2004) expõe que a expressão de tempo, em francês, pode ser

assinalada de várias maneiras: por um advérbio, por uma oração subordinada e por

um grupo com preposição + nome. Segundo os autores, advérbios e expressões

diversas exprimem a localização, a duração, a repetição, a sucessão, o hábito, além de

indicarem data, hora, medidas de tempos e periodicidade. Nos exemplos, percebemos o

uso tanto de locuções tipicamente temporais como também aspectuais15:

(a) En ce moment, mes parentes sont em Suisse. (localização no tempo)

(b) Il nous racontait tout le temps les mêmes histoires. (hábito)

(c) Il est né le 5 mai 1985. (data)

Após a explanação a respeito da forma como as locuções adverbiais são tratadas

em português e em francês, trataremos brevemente da noção semântica das locuções de

tempo e de aspecto para delimitarmos o que de fato constituirá como objeto de nosso

estudo: os circunstanciais temporais e aspectuais.

14 O autor salienta que há diferença entre locuções adverbiais e advérbios formados por mais de uma

palavra (adverbes composés). Na realidade, o que ele considera como advérbios de mais de uma palavra

são as que locuções que “resultam de alterações que encontraremos mais ou menos na etimologia” (pág.

965), ou seja, são expressões que já se gramaticalizaram e se tornaram um só elemento, como o

aujourd’hui (= au jour d’hui) ou autrefois (autre + fois). 15 Exemplos de Delatour et alii (2004:261-262).

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1.3. Os circunstanciais de tempo e aspecto

Nosso objeto de estudo são as ordenações das locuções adverbiais de tempo e de

aspecto. As noções de tempo e de aspecto, segundo Rocha e Lopes (2009), são

dimensões que se entrecruzam, mas que transmitem informações distintas. Tempo trata-

se de uma categoria dêitica, já que sua interpretação se ancora no momento da

enunciação; aspecto indica as fases de constituição do evento, sua duração, seu começo,

seu desenvolvimento e seu fim.

Para Travaglia (1994: 42), o aspecto é uma categoria verbal relacionada ao

TEMPO. O autor esclarece o que, para ele, seria esse “TEMPO”:

(1º) Tempo 1 tempo = é a categoria verbal, relacionada ao presente, ao passado e ao

futuro;

(2º) Tempo 2 tempos flexionais = é a flexão verbal, ou seja, os agrupamentos de

flexões da conjugação verbal;

(3º) Tempo 3 TEMPO = é a ideia geral, abstrata de tempo, sem levar em

consideração sua indicação pelo verbo.

Segundo o autor, a confusão entre as noções de tempo e aspecto ocorre pelo fato

de que ambas vêm da mesma categoria: o TEMPO. Para ele, as duas não se confundem,

pois16:

(a) o tempo situa o momento de ocorrência da situação a que nos referimos em

relação ao momento da fala como anterior (passado), simultâneo (presente)

16 Ver Travaglia (1994:43).

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ou posterior (futuro) a esse mesmo momento. É uma categoria dêitica, uma

vez que indica o momento da situação relativamente à enunciação. Aqui

temos uma datação;

(b) o aspecto não é uma categoria dêitica, porque se refere à situação em si. São

as diferentes maneiras de ver a constituição interna da situação, sua duração.

Podemos resumir as noções de tempo e aspecto, apresentadas por Travaglia

(1994:43), afirmando que o tempo é “um TEMPO externo à situação” e o aspecto é

“um TEMPO interno à situação”. O autor retoma Verkuyl (1972: 8) e afirma que o

aspecto não pode ser ignorado em nenhuma sentença que contenha advérbios de tempo

(pág. 272). Para ele, o adjunto adverbial pode ser o responsável por toda a noção

aspectual presente na frase. De forma semelhante, Castilho (1967) afirma que os

adjuntos adverbiais envolvidos na noção de aspecto são sempre temporais.

Para nós, a noção temporal e a aspectual das locuções adverbiais não são

excludentes, seguindo a posição de Travaglia. Além disso, assumimos, seguindo

Martelotta (2012: 72), que “as locuções adverbiais são mais ricas na expressão do

aspecto do que os advérbios simples”. As locuções adverbiais, segundo o autor, podem

ser agrupadas em conjuntos que envolvem noções aspectuais: (a) indeterminadas; (b)

iterativas; (c) durativas; (d) delimitativas. No entanto, devido à dificuldade de se

distinguir na prática um advérbio de tempo de um aspectual, alguns autores, como

Givón (2001), preferem tratar ambos como um único grupo: advérbios de tempo e

aspecto.

Neves (2011:256) atenta para a noção de aspecto dentro da categoria de

circunstanciais temporais. A autora afirma que o subgrupamento básico dos advérbios

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circunstanciais contempla os advérbios de tempo e de lugar, por serem categorias “que

fazem orientação por referência ao falante e ao aqui-agora, que constituem o complexo

modo-temporal que fixa o ponto de referência do evento de fala”.

A autora salienta que, dentro da semântica de tempo, há inegavelmente a noção

aspectual, mesmo com uma oposição entre elas (o tempo possui natureza dêitica e o

aspecto, natureza não dêitica). Para a autora, a circunstância de tempo é a característica

semântica geral dos advérbios de tempo, mas há traços semânticos e aspectuais

vinculados a essa noção de circunstância temporal. As circunstâncias de tempo são:

(a) situação – responde à pergunta “quando?”. Pode ser absoluta ou relativa;

(b) duração – período visto na sua duração. Pode ser fórico ou não fórico17;

(c) frequência – repetição / não repetição de momentos ou períodos. Tais elementos

exprimem aspecto, vinculado a tempo.

No presente trabalho, consideramos circunstanciais temporais e aspectuais as

locuções adverbiais que indicam a noção de tempo ou de aspecto, como nos exemplos18:

(4) No dia 31 de julho , a menina queria estocar chocolate.

(5) Eu precisei de chocolate durante aqueles dias.

(6) A vida mais uma vez será doce com chocolate.

(7) Pendant ses études, elle a mangé beaucoup de chocolat.

(8) Nous serons libres le 18 de septembre.

17 A autora define como fórico o período referido a um momento da enunciação e o não fórico o período

não referido a um momento determinado da enunciação ou do enunciado. (pág.269) 18 As frases simples foram criadas a título de exemplificação.

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No exemplo (4), temos a locução prototípica – no dia 31de julho –, iniciada por

preposição e com um constituinte calêndrico, tipicamente temporal; em (5), temos uma

locução iniciada por preposição, com valor durativo, ou seja, mais aspectual; e

finalmente, vemos, no exemplo (6), a locução constituída de um SN prototípico da

noção aspectual de reiteração. Os dois exemplos em francês possuem estruturas

diferentes, em (7) o circunstancial pendant ses études é iniciado por uma preposição

tipicamente durativa; já em (8) o circunstancial é um SN (le 18 de septembre) com

noção temporal. Destaque-se o fato de que, nos exemplos citados, os termos destacados

aparecem em diferentes posições (antes e depois do verbo), evidenciando a mobilidade

sintática das locuções adverbiais.

Portanto, as ocorrências de locuções adverbiais como as observadas em (4), (5),

(6) (7) e (8) constituem objetos de análise da nossa pesquisa, pois, baseando-nos em

Neves (op.cit.), consideramos que tempo e aspecto são diferenças semânticas dentro de

um grupo maior chamado Advérbios de tempo, que, por sua vez, são circunstanciais.

Poderíamos esquematizar essa semântica da seguinte forma:

Semântica dos adverbiais

Circunstanciais

Tempo Lugar

Tempo

Aspecto

Outras noções semânticas

Esquema 1: Noções semânticas dos adverbiais

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Após definirmos, semântica e estruturalmente, nosso objeto de estudo, com base

em diferentes considerações acerca da literatura sobre adverbiais, passaremos para o

capítulo seguinte, que apresenta uma breve (porém necessária) revisão sobre estudos

referentes aos circunstanciais temporais e aspectuais no português e no francês.

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2. ESTUDOS LINGUÍSTICOS

Inúmeros são os estudos sobre os adverbiais na literatura atual. Daremos aqui

maior destaque àqueles que tratam dos circunstanciais, em particular àqueles que nos

trazem maiores contribuições para a análise das posições das locuções adverbiais de

tempo e de aspecto. Primeiramente, faremos um apanhado geral sobre trabalhos que

focam a questão da semântica e a ordenação dos circunstanciais, em especial aqueles

que dão destaque à sua função discursiva. Após a discussão dos estudos empíricos

acerca da posição dos circunstanciais na oração, abordaremos alguns pontos importantes

sobre a questão do sujeito, que, embora, não seja nosso objeto de análise, possui papel

importante para algumas de nossas hipóteses.

2.1. A ordenação dos circunstanciais

2.1.1. O Papel Semântico

Sob a perspectiva funcional, a ordenação dos circunstanciadores temporais foi o

objeto de estudo de Martelotta (1994), em um corpus constituído de entrevistas19. O

autor considerou como circunstanciadores temporais os advérbios simples, adjuntos

adverbiais, orações adverbiais e operadores argumentativos que expressavam a noção de

tempo.

Como seu objetivo era buscar os diversos fatores discursivos que pudessem

motivar a distribuição desses elementos temporais na sentença, o autor, adaptando uma

19Corpus constituído de entrevistas elaboradas pelo Projeto Projeto do Censo de Variação Linguística,

Competências Básicas do Português e pelo Projeto NURC-RJ (Projeto da Norma Urbana Oral Culta do

Rio de Janeiro).

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proposta de classificação já utilizada em Martelotta (1986), apresentou cinco tipos de

circunstanciadores, listados a seguir:

(a) Circunstanciadores de tempo determinado – indicam o momento em que ocorre o

evento de forma precisa (como hoje, ontem, semana passada);

(b) circunstanciadores de tempo indeterminado – expressam a noção de que os eventos e

situações perduram no tempo e não em um momento específico (como sempre,

geralmente, nunca);

(c) circunstanciadores iterativos – denotam a frequência com que os eventos não-

específicos ocorrem ao longo do tempo (como às vezes, duas vezes por semana, de vez

em quando);

(d) circunstanciadores de simultaneidade – indicam eventos que ocorrem

concomitantemente (como enquanto isso, ao mesmo tempo);

(e) circunstanciadores delimitativos – delimitam os eventos e as situações, indicando o

início e/ou fim de sua permanência no tempo (como há três anos, até hoje, durante três

meses).

Compartilhamos a opinião de Martelotta (1994), segundo o qual há dentro da

semântica dos circunstanciadores temporais aqueles que indicam a frequência com que

eventos ocorrem ao longo de um tempo, ou seja, os aspectuais. Além disso, o autor

relaciona o tipo de circunstancial ao tipo de discurso no qual o constituinte está inserido

(figura ou fundo em textos narrativos e não-narrativos) e às posições20.

20 Martelotta (op. cit.) organiza os circunstanciadores em seis possibilidades de ordenação, são elas: (i)

antes do verbo, sem a ocorrência de sujeito; (ii) antes do sujeito; (iii) entre o sujeito e o verbo; (iv) após o

verbo, sem a ocorrência de complemento ou predicativo; (v) entre o verbo e o complemento ou

predicativo; e (vi) após o complemento ou predicativo.

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Os resultados dessa investigação indicam que há uma tendência específica para a

colocação dos circunstanciadores temporais na sentença – tal tendência, segundo os

resultados encontrados, depende da força que a informação expressa pelo circunstancial

assume dentro da estrutura do discurso em que ele ocorre. O circunstanciador tende a

aparecer em posições pré-verbais quando traz informações temporais análogas aos

traços semântico-gramaticais do discurso no qual ocorre21. No entanto, se não há essa

relação semântica, o circunstanciador tende a aparecer nas posições pós-verbais.

Assim, os circunstanciadores de tempo determinado tendem a ocupar posições

pré-verbais em figura narrativa e não-narrativa, uma vez que a força informativa que

assumem nestes contextos os leva a ser topicalizados ou enfatizados. Por sua vez, os

circunstanciadores de tempo indeterminado e os circunstanciadores de simultaneidade

tendem à posição pré-verbal em fundo narrativo e não-narrativo, devido também à força

informativa assumida, que os leva à topicalização ou à ênfase.

Em relação aos circunstanciadores iterativos, há a maior ocorrência nas posições

pré-verbais em fundo narrativo e não-narrativo e em figura não-narrativa, já que esses

tipos de discursos são marcados pelo traço [-específico], estimulando a iteratividade.

Em contraste, os circunstanciadores delimitativos possuem uma mobilidade maior na

oração, visto que apresentam duas características distintas: por um lado, funcionam

como um circunstanciador de tempo determinado (indica o momento específico no qual

se inicia e/ou termina o evento), por outro, apresentam características semântico-

gramaticais típicas de fundo.

A noção semântica da temporalidade também é observada em Ilari (2001), em

seu estudo sobre a expressão linguística de tempo. Nele, o autor aborda, dentre outras

questões, a indicação de tempo expressa pelos adjuntos adverbiais com valor de

21 Martelotta (1994), pág. 201.

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localização de eventos, de duração interna dos eventos, ou até mesmo para expressar

uma reiteração.

O autor descreve os adjuntos adverbiais que localizam os eventos no tempo

como aqueles que se relacionam aos valores não durativos e não iterativos. Esses

adjuntos respondem à questão “quando?” e podem indicar uma localização mais ou

menos específica de acordo com os momentos apontados. Ilari (op. cit.) explica que o

uso desses adjuntos remete a uma necessidade de ancoragem real, em um tempo

disponível ou não no texto no qual estão inseridos. Ou seja, existem aqueles adjuntos

que possuem uma ancoragem textual endofórica ou exofórica, dependendo da situação à

qual se referem.

A duração interna dos eventos, segundo o autor, pode ser expressa de diversas

maneiras, distintas em três processos: os pontuais, os duráveis com a ideia de “tempo

gasto” ou “tempo empregado” e os duráveis com a ideia de “tempo escoado”. Em

alguns casos, os adjuntos adverbiais associados a essas noções temporais responderiam

à pergunta “em quanto tempo?” ou mesmo “quanto tempo... levou para...?”.

Por último, o autor afirma que a escolha de uma determinada estrutura sintática

resulta numa interpretação reiterativa ou não da sentença, combinada sempre a alguns

outros fatores. Um desses fatores é a presença de certos adjuntos, principalmente

aqueles que se utilizam da noção de “vez”, referindo-se sempre a uma repetição de

eventos de um mesmo tipo (pág. 57). Assim, a ideia de reiteração pode ser percebida

quando se responde à pergunta “Quantas vezes?” e pode vir caracterizada

numericamente ou mesmo através de termos indefinidos.

As definições semânticas apresentadas por Martelotta (1994) e por Ilari (2001)

para as noções temporais dos circunstanciadores e adjuntos servirão de base para

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classificarmos semanticamente os circunstanciais temporais e aspectuais neste trabalho

e para darmos conta das possíveis ordenações motivadas por suas distinções semânticas.

Outras pesquisas de cunho funcionalista também abordam a questão semântica

das locuções adverbiais temporais e aspectuais. Entre elas, temos Andrade (2005), que

analisou tais locuções em editoriais do Jornal do Brasil, coletados nos anos de 1999,

2003 e 2004, com o objetivo de identificar os possíveis fatores que motivariam a sua

ocorrência em posição pré-verbal ou pós-verbal.

A autora tomou por base os estudos de Martelotta e desenvolveu sua análise de

acordo com a semântica das locuções adverbiais temporais encontradas: localizadoras

(as que localizam o evento no tempo), durativas (expressam a duração de uma situação),

reiterativas (apontam uma repetição de um evento) e simultâneas (indicam dois eventos

que ocorrem concomitantemente). Seus resultados revelaram que as locuções

apresentavam 53% de posições pré-verbais e 47% de posições pós-verbais. O equilíbrio

na distribuição de ambas as ordenações se verificou a princípio pela questão semântica

das locuções.

As locuções com valor localizador e durativo não tiveram preferência por uma

certa posição, pois a diferença percentual entre as duas não se mostrou significativa. As

locuções reiterativas apresentaram-se em maior número na posição pós-verbal (71%) e

as simultâneas mostraram-se mais produtivas na posição pré-verbal (80%).

Em Ilogti de Sá (2009), as locuções adverbiais temporais e aspectuais foram

estudadas sob a ótica do funcionalismo norte-americano em um corpus jornalístico

contemporâneo, buscando as motivações para o seu posicionamento na oração. A

classificação semântica adotada pela autora, baseada em Martelotta (1994) e Ilari

(2001), distinguiu entre locuções que expressam noções dêiticas, durativas, reiterativas,

delimitativas e simultâneas para as locuções adverbiais.

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No corpus em análise, a autora verificou uma grande quantidade de locuções

com valor dêitico. Ao cruzar esse fator com as posições assumidas pelos circunstanciais,

ela esperava encontrar uma influência do papel semântico da locução com a sua

ordenação. Viu, então, que as dêiticas se posicionaram nas margens das orações. O

mesmo foi observado com relação às delimitativas, ao contrário do esperado, já que a

autora previa o aparecimento das locuções com valor delimitativo mais na margem

esquerda das orações. Já as durativas e as reiterativas ocuparam principalmente a

margem direita da oração, porque são locuções mais aspectuais e normalmente não

possuem a função de retomar informações no discurso anterior.

Ainda com relação à semântica, Ilogti de Sá (op. cit.) conclui que as locuções

reiterativas, por estarem mais próximas cognitivamente ao verbo, ocupam posições

mediais da oração. Quanto às locuções com valor simultâneo, embora poucos dados

tenham sido encontrados, observou-se uma forte tendência a um posicionamento mais

fixo, na margem esquerda da oração.

Uma proposta de um contínuo entre essas classificações semânticas das locuções

listadas em Ilogti de Sá (2009) é apresentada em Machado (2012). A autora, assumindo

que o grupo semântico dessas locuções distingue duas noções (tempo e aspecto)

pertencentes a um valor semântico equivalente (temporais), propõe um contínuo de

modo que, de um lado, estejam as locuções [+temporais; -aspectuais] e, do outro,

locuções [temporais; +aspectuais]. A autora apresenta o seguinte esquema:

Dêiticas > Localizadoras > Simultâneas > Delimitativas > Durativas > Reiterativas

+temporal +aspectual

Em sua análise das locuções adverbiais temporais e aspectuais no português dos

séculos XVIII e XIV, a autora acredita que as locuções mais temporais tendem a ocupar

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posições à esquerda do verbo, enquanto as locuções mais aspectuais, posições à direita

do verbo. Machado (op. cit.) constata que as ocorrências das locuções à esquerda

parecem ser motivadas mais pela sua deiticidade do que pela sua semântica.

Utilizamos em nossa análise semântica dos circunstanciais temporais e

aspectuais a proposta de contínuo apresentada pela autora, para justificarmos as noções

semânticas de tempo e aspecto dos circunstancias aqui adotadas (cf. capítulo 1).

2.1.2. A função discursiva e as demais motivações para ordenação dos

circunstanciais

Sob uma perspectiva variacionista, Brasil (2005) realizou um estudo

comparativo entre o português do Brasil (PB) e o português de Portugal (PE) sobre a

ordenação de circunstanciais temporais e locativos. Seus resultados trazem importantes

considerações acerca da preferência de ordenação dos constituintes analisados.

A autora utiliza um corpus de língua escrita constituído de 330 textos de jornais

e revistas do português brasileiro e europeu de diferentes gêneros22. Ela pressupõe que

exista uma ordenação preferencial para cada uma das duas classes semânticas analisadas

(ordem não-marcada) e que, por algumas condições divergentes, ou até mesmo por

imposições comunicativas, tal posicionamento é modificado.

Brasil (op. cit.) define, com base em estudos anteriores, que o circunstancial

temporal admite uma variação de ordenação maior que os locativos. Tal diferenciação

ocorreria porque, segundo Paiva (2002), há a possibilidade de o locativo ser um

argumento verbal, o que o fixaria em posição pós-verbal. Os circunstanciais com valor

temporal se dividiriam especialmente nas margens da oração, sendo a margem esquerda

22 Os gêneros considerados por ela foram anúncios, entrevistas, notícias/reportagens e matéria

assinada/artigo de opinião, todos coletados no período de 1999 a 2002.

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a predominante daqueles com uma função coesiva maior. Com relação à ordenação dos

circunstanciais temporais, Brasil define como posição não-marcada a margem esquerda

e discute os fatores que influenciam o uso numa posição diferente, tais como os de

natureza sintática, semântica e discursiva.

A construção da coesão e coerência textuais foi forte influência para o

posicionamento dos circunstanciais. A posição inicial é ocupada pelo circunstancial

quando ele está relacionado à continuidade ou à retomada de pontos específicos de

informação, assim como quando estabelece uma relação entre determinados pontos do

texto ou mesmo quando indica um foco de contraste. Já a margem direita é ocupada

pelo circunstancial, quando ocorre um acréscimo de informação nova, pois, nesse caso,

o circunstancial aparece apenas para contribuir no desenvolvimento do discurso. Dessa

forma, a autora afirma que os circunstanciais constituem um elemento importante na

articulação tema-rema, tendo em vista que o produtor do texto os utiliza para introduzir

novos referentes ou para se referir a algum referente já mencionado no discurso.

Percebendo a importância dos circunstanciais na organização do discurso, Brasil

(op.cit.) conclui que “as variações posicionais dos circunstanciais, em especial dos

temporais, refletem pressões impostas pela organização linear do texto e pelas

exigências de garantir sua coerência e coesão”. No entanto, tal funcionalidade não

exclui os fatores semântico-lexicais como motivadores para a ruptura da ordem

preferencial do circunstancial. Assim, a autora constatou que os temporais que possuem

uma noção mais relacionada especificamente à constituição interna da predicação do

que com a noção aspectual tendem a ocupar posições adjacentes ao verbo e não as

margens, sendo estes os circunstanciais que menos se apresentam na posição não-

marcada.

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A respeito do escopo do circunstancial e sua ordenação, ela conclui que, tanto os

locativos quanto os temporais, quando estão associados a todo o discurso, se

posicionam à margem esquerda da oração. Já sua ordenação posposta ao verbo pode ser

verificada quando seu poder de atuação é mais restrito, posicionando-se, nesses casos,

principalmente na margem direita.

Uma de suas hipóteses iniciais era que o circunstancial ocuparia a posição do

sujeito quando este não estivesse presente. No entanto, isso só foi observado no PE e

nas orações em que o sujeito estava ausente. Brasil afirma que a diferença entre as duas

variedades (PB e PE) pode ser explicada por fatores discursivos e sintáticos, mais

especificamente como um reflexo de opções estruturais diferentes no que se refere ao

sujeito nulo. A autora ressalta que nos contextos nos quais o sujeito estava oculto, a

anteposição do circunstancial poderia prejudicar a relação anafórica com o antecedente

do sujeito e talvez a não antecipação do adverbial ocorra para dar prioridade a essa

informação.

O peso do circunstancial foi outro fator relevante na ordenação dos

circunstanciais e, ao verificar a relação entre quantidade de material fonológico e

posição dos circunstanciais o resultado foi o esperado. As posições pós-verbais foram

ocupadas principalmente por circunstanciais maiores, e as pré-verbais pelos de menor

quantidade fônica. Observou-se ainda que as posições mediais eram quase que

exclusivas daqueles que possuem pouco material fonológico, ou até mesmo para os

monossílabos.

Paiva (2007), no seu artigo sobre regularidades e divergências sobre o papel dos

circunstanciais temporais, incluindo as locuções e os adverbiais, nos padrões de

organização do discurso, confronta fala e escrita. A autora se vale do conceito de

marcação, mas mostra que a oposição marcado X não-marcado não seria absoluta, já

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que a função da modalidade, o tipo de texto e de gênero discursivo podem influenciar na

posição. Portanto, Paiva procura mostrar que podemos traçar paralelos entre as duas

modalidades, mas que, ao nos referirmos à ordem não-marcada e ao contexto de uso,

outros fatores intervêm na ordenação.

A autora define as seguintes possibilidades de posicionamento para os

circunstanciais temporais: margem esquerda da oração (ME), entre o sujeito e o verbo

(PM1), entre o verbo e o objeto (PM2) e margem direita da oração (MD). Após sua

análise comparativa, a autora conclui que a ordem mais frequente, nas duas

modalidades, era a posição à margem esquerda. Essa tendência foi observada tanto na

variação dos advérbios quanto na dos sintagmas preposicionais, o que a levou a afirmar

que essa era a posição não-marcada dos circunstanciais temporais. Ainda no que diz

respeito a um primeiro resultado, outra semelhança encontrada foi a escassez de

circunstanciais ocupando a margem direita da oração.

A autora salienta que os temporais, assim como outros circunstanciais,

desempenham funções no discurso, principalmente a partir de seu escopo de atuação.

Essa função23 poderia ser:

1) Retomada anafórica: o circunstancial retoma informações apresentadas anteriormente

no discurso;

2) Especificação de predicação: o circunstancial atua apenas para situar o evento num

determinado tempo, atuando apenas como circunstanciador;

3) Segmentação tópica: o circunstancial anuncia o início de um novo evento, atuando

em uma transição entre tópicos do discurso;

23 Destaque-se que, em nossa análise da função discursiva do circunstancial temporal e aspectual, nós nos

baseamos nessas funções delimitadas por Paiva (2007).

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4) Mudança de plano discursivo: o circunstancial estabelece o início de uma nova

unidade discursiva, em uma descontinuidade da temática do evento e sendo uma espécie

de fronteira para o ouvinte;

5) Demarcação de pontos: o circunstancial demarca pontos ou períodos de tempo em

que o evento ocorre;

6) Focalização: o circunstancial introduz uma informação em forma de tópico, ou seja,

uma informação destacada;

7) Contraste: o circunstancial estabelece uma oposição entre duas informações, a

mencionada anteriormente e a nova.

A análise da posição desses circunstanciais e sua função discursiva permite

depreender alguns padrões. No que se refere aos sintagmas preposicionais, a margem

esquerda (não-marcada) é a preferência, nas duas modalidades estudadas, daqueles

circunstanciais que possuem papel anafórico, dos que marcam a descontinuidade

discursiva e dos que indicam um contraste.

As funções discursivas que apresentaram diferentes tendências na fala e na

escrita foram as de especificação de predicação, as que focalizam eventos e as que

demarcam pontos de uma sequência. Naquela, pode-se observar uma oscilação entre as

posições pospostas, sendo que, na fala, houve uma tendência maior ao posicionamento

na margem e, na escrita, a preferência foi pela PM2. Os sintagmas preposicionais que

indicam focalização mostraram uma predominância nas posições pós-verbais, sendo os

dois casos encontrados apenas na escrita: um caso entre o verbo e o objeto e outro na

margem da oração. Por sua vez, no caso dos SPreps temporais que demarcam pontos

diferentes do discurso, observou-se a tendência geral na modalidade oral de

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circunstanciais aparecerem na posição inicial; na escrita, eles apresentaram uma maior

flexibilidade, já que se ordenaram tanto na margem esquerda quanto na PM2.

Brasil (2005) e Paiva (2007), embora tenham objetos de estudo diferentes24 do

dessa pesquisa, nos fornecem importantes subsídios de comparação, principalmente no

que diz respeito à função discursiva dos sintagmas preposicionais temporais.

Em Ilogti de Sá (2009), as locuções adverbiais temporais e aspectuais foram

analisadas a partir de um corpus de textos jornalísticos de grandes veículos nacionais do

Brasil, considerando a questão da intertextualidade de gêneros proposta por Marcuschi

(2005), ou seja, a ideia de que um gênero pode ser apresentado com função de outro.

A análise desenvolvida permitiu afirmar que as locuções adverbiais tendem a

ocupar as margens da oração, o que estava de acordo com as expectativas iniciais. As

locuções, sobretudo as que expressam tempo, por normalmente situarem um estado de

coisas seja com ancoragem dêitica ou discursiva, poderiam ocupar posições mais

afastadas – de acordo com o Subprincípio Icônico da Integração (cf. Givón 1990),

quanto mais próximos cognitivamente os conteúdos estiverem, mais próximos

sintaticamente eles se posicionarão. No entanto, não foi possível identificar a posição

não-marcada da locução adverbial, pois a diferença entre as margens não foi

significativa, conclusão a que também chegou Brasil (2005), em seu estudo.

A partir da análise dos gêneros textuais, a autora verificou tendências opostas de

ordenação das locuções nas notícias e nos editoriais. Naquelas, a locução ocupou

preferencialmente a margem direita da oração, conforme o previsto em sua hipótese. Na

notícia, o foco não é o tempo e sim o fato narrado, pois há o pressuposto de que ela se

refere a algo que aconteceu naquele dia, ou num tempo próximo, sobretudo por se tratar

de textos on-line, destacando aquilo que está acontecendo no momento. Além disso,

24 Brasil (2005) trabalha com advérbios e SPreps temporais e locativos e, Paiva (2007), com advérbios e

SPreps temporais.

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nesse gênero, há trechos com cadeias tópicas de orações, o que desfavorece o uso de

locuções em início de oração (margem esquerda). Já nos editoriais, a tendência foi a

ocupação da margem esquerda da oração, sendo o tempo uma informação colocada em

foco, muitas das vezes em partes em que há contrastes de ideias entre frases e

parágrafos.

A análise do papel discursivo da locução foi de significativa importância, pois

explicou que grande parte das posições é motivada pelo papel das locuções na

macroestrutura textual. A partir de uma adaptação das funções propostas por Paiva et

alii (2007, 2008ª, 2008b), Ilogti de Sá (2009) determinou cinco funções (especificação

de coordenadas temporais, anafórica, introdução de subtópico, sequência temporal e

mista) e verificou a sua influência na ordenação das locuções.

Sua expectativa inicial era que as locuções com uma função anafórica, aquelas

que introduziam um subtópico e as que marcavam uma sequência temporal ocupariam

as posições pré-verbais e principalmente a margem esquerda da oração, por terem uma

relação direta com o discurso antecedente. No corpus analisado, tal hipótese foi

comprovada, pois todas ocuparam preferencialmente a margem esquerda da oração.

Aquelas locuções com uma função de circunstanciador, ou seja, as que apenas

indicavam o tempo do evento, ocorreram na margem direita da oração. Esse resultado

deixava claro que essas locuções, por não terem uma relação com o evento descrito

anteriormente, ocupam posições finais, isto é, sem foco e com escopo mais local. Ainda

com relação a essa função, observou-se que elas ocuparam as posições mediais da

oração, ou seja, as posições entre os verbos e seus argumentos foram preenchidas por

locuções que também tinham um escopo mais reduzido.

A autora cruzou ainda o papel discursivo da locução com os gêneros textuais

para saber se havia alguma relevância nesse resultado. Observou que, nos editoriais, as

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locuções se apresentam apenas com a função de circunstanciador e de introdutor de

subtópico. Nos artigos e nas notícias, a mesma tendência foi verificada, pois a locução

exercia um papel de circunstanciador (predominante em todo o corpus), seguida

daquelas que estavam em orações que introduziam um novo evento.

O tamanho da locução ainda foi verificado com a expectativa de que, quanto

maior o tamanho da locução, maior a tendência de estas aparecerem em posições

marginais, já que assim não interromperiam a coesão entre os constituintes básicos da

oração, evidenciando possíveis restrições dadas pelo princípio da iconicidade.

Lessa (2012) e Soares (2012) apresentam alguns resultados convergentes a essa

pesquisa. A primeira, ao focalizar nos SPreps temporais e locativos em textos

jornalísticos, encontra como padrão de ordenação para os temporais as margens direita e

esquerda em detrimento das posições mediais. Mesma tendência mostrada em Soares

(op.cit.) para as locuções adverbiais temporais estruturadas em em+calêndrico.

Os resultados para a análise da função discursiva exercida pela locução, em

Soares, constataram que as diferentes ordenações se dão devido ao papel das locuções

na macroestrutura. Foi confirmada a hipótese inicial de que as locuções com função de

especificadores temporais tenderiam a ocupar a MD da oração, à medida que essas

locuções apenas situavam o tempo do evento, sem fazer referências às orações

anteriores. Já a ME da sentença, conforme o esperado, foi ocupada por locuções que

desempenhavam funções mais específicas no discurso, como as que introduziam um

novo assunto, faziam contraste com outra referência e demarcavam pontos numa

sequência temporal, ou ainda as que apresentavam mais funções. Machado (2012)

mostra a mesma tendência para os séculos XVIII e XIX.

Os resultados de Lessa (op.cit.) para os SPreps temporais trazem uma

comparação com os locativos. A conclusão da autora foi que estas funções discursivas

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são inerentes aos temporais e que sua ordenação é definida por tais funções. Em seus

resultados, a ME foi ocupada por SPreps em contextos discursivos mais específicos, ou

seja, quando possuem funções como contraste, focalização ou de segmentação tópica.

Esses dois trabalhos nos dão contribuições importantes acerca da ordenação dos

temporais em detrimento do tipo e da posição do sujeito da sentença. Lessa (op.cit.)

analisa, separadamente, sujeitos nulos de 1ª e 2ª pessoa em relação aos de 3ª pessoa e,

apesar de os resultados mostrarem menos ocorrências de SPreps temporais em ME, em

ambos os casos, os sujeitos nulos de 3ª pessoa são os que mais desfavorecem SPreps

circunstanciais nessa posição.

A autora, explica que os SPreps de tempo e lugar ocupam preferencialmente a

MD em orações com sujeito nulo de 3ª pessoa por tentarem manter a continuidade

referencial entre o sujeito anafórico e o seu antecedente. A MD, nesse caso, garante a

recuperabilidade do referente do sujeito. Seus resultados contradizem a hipótese mais

geral de não deixar a periferia esquerda da oração vazia, evitando o verbo em posição

inicial, mesmo resultado encontrado em Brasil (2005). Essa hipótese só se confirma nas

orações em que o sujeito está posposto. Para a autora, a posição do sujeito parece ser

mais relevante do que a variação entre seu preenchimento ou não preenchimento.

Em Soares (op.cit.), a posposição do sujeito também se mostrou mais relevante

para o preenchimento da ME pela locução do que a elipse do argumento externo –

nesses casos, houve um equilíbrio entre as duas margens. Devido à grande quantidade

de dados encontrados de locuções em ME em estruturas SV, a autora passou a uma

análise mais discursiva e verificou se o sujeito estava em continuidade tópica.

Conforme o esperado, para não quebrar a cadeia tópica, as locuções ocuparam

posições pós-verbais, quando o referente-sujeito estava em continuidade tópica, já que

nesse caso, o tópico da oração era o sujeito. A autora afirmou que outros fatores – como

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o tamanho pequeno da locução – explicariam a inserção de locuções na ME, nos casos

em que o sujeito estava em uma cadeia tópica, e que, mesmo assim, elas ocuparam essa

posição. Nessa pesquisa, considerou-se que o sujeito não era tópico, quando não havia

sido mencionado em até 2 orações anteriores. Nestes casos, a tendência à ordenação das

locuções na ME foi confirmada, sendo a locução o tópico, pois não havia a quebra da

coesão ou da atenção em relação ao sujeito.

A relação entre a locução temporal e a anteposição e posposição do sujeito

indica, em dados do século XVIII e XIX, uma tendência diferenciada, no que concerne

à posição da locução em orações SV. Machado (2012), em sua investigação sobre as

motivações para ordenação das locuções adverbiais temporais e aspectuais em cartas

pessoais desses séculos, verificou que a posição do sujeito contribui para a ordem das

locuções uma vez que, em estruturas SV e V, as locuções adverbiais temporais e

aspectuais tendem a ocorrer antepostos ao verbo. Nas sentenças em que o sujeito está

em sua posição prototípica (SV), a locução ocorre em MD em 59,6% dos dados,

resultado diferenciado dos estudos com corpus contemporâneo de Brasil (2005), Lessa

(2012) e Soares (2012), nos quais se verificou um equilibro em MD e ME para as

locuções. Já a posposição da locução ocorre principalmente em estruturas VS, por ser

uma estrutura em que o sujeito não é tópico e essa função passa a ser desempenhada

pela locução.

Os resultados dos trabalhos empíricos destacados nessa seção nos fornecem

elementos importantes para nossa análise, no que concerne à verificação da função

discursiva do circunstancial temporal e aspectual – fator essencial na nossa pesquisa – e

à motivação da realização e posição do sujeito na ordem do circunstancial temporal.

Sobre esse último aspecto, veremos na seção a seguir, algumas considerações relevantes

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para compreendermos nossa hipótese acerca da influência do sujeito na posposição ou

anteposição do circunstancial temporal/aspectual.

2.2. Sobre o Sujeito

Uma de nossas hipóteses envolve a correlação entre o posicionamento da

locução adverbial temporal e aspectual e a forma de realização do sujeito, assim como

sua posição na oração, uma questão já levantada em vários estudos, principalmente

sobre o português brasileiro (PB).

Votre e Naro (1986), em um estudo sobre a ordenação do sujeito, analisaram 400

ocorrências de estruturas VS e a mesma quantidade de orações SV, aproximadamente,

retiradas de dados de fala do português contemporâneo25. O objetivo da análise era

identificar as estratégias discursivas na estruturação linguística dessas orações.

Os pesquisadores apontam para o Princípio de Preservação, relacionado à

estrutura sintática das sentenças. Este princípio prevê que o sujeito ocorre à direita do

verbo se outro elemento, como um objeto ou um adverbial, estiver à esquerda, no intuito

de preservar a estrutura sintagmática.

Entretanto, os próprios autores remetem a questão da topicidade no discurso

como causa verdadeira para as diferenças distribucionais. Para eles, embora a

preservação do peso sintagmático exista, a ocupação de posições à esquerda do verbo se

daria pelo grau maior de tópico, ou seja, o que tivesse traços de menos tópico ocorreria

mais na posição pós-verbal.

25 Compõem o corpus 20 entrevistas do projeto Censo da Variação Linguística no Estado do Rio de

Janeiro.

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Os estudos de Duarte (199326, 199527) sobre a representação do sujeito

referencial no PB revelaram evidências de que a variedade brasileira estaria se tornando

uma língua de sujeito foneticamente preenchido. Dessa forma, PB estaria passando por

um processo de mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo (Chomsky 1981).

Outros trabalhos empíricos baseados no casamento teórico entre o modelo de estudo da

mudança proposto por Weinreich, Labov e Herzog (2006) e a Teoria Gerativa foram

empreendidos28, no intuito de investigar se os diferentes contextos do sujeito não

referencial (classificados como oração sem sujeito pela tradição gramatical) sofreriam

alterações em função da mudança paramétrica em curso atestada por Duarte (op. cit.).

Em linhas gerais, esses trabalhos mostraram que a representação do sujeito não

referencial apresenta efeitos colaterais devido à mudança em curso no PB.

Partindo da ideia de que o PB prefere a forma preenchida do sujeito à forma

nula, Kato e Duarte (2003) defendem que, como no português não há sujeito expletivo

(a exemplo do il do francês e do it do inglês), outros elementos, como os adverbiais por

exemplo, seriam posicionados para a esquerda do verbo, para não permitirem que V

ocupe a posição inicial na oração. Nesses casos, o elemento à esquerda estaria nessa

posição apenas por uma questão sintática.

Spanó (2008), em seu estudo sobre VS no PB e no PE, baseando-se em Spanó

(2002), Coelho (2000), Santos e Duarte (2006), relaciona a presença de elementos à

esquerda do verbo à ordem VS, principalmente com verbos inacusativos. A autora atesta

26 Neste seu estudo diacrônico, Duarte utilizou uma amostra de peças teatrais para verificar a relação entre

a preferência pela forma preenchida do sujeito, crescente principalmente no século XX, e a redução do

paradigma pronominal/flexional verbal no PB. Para a autora, o aumento nos índices de preenchimento do

sujeito à proporção que o paradigma flexional se reduzia ao longo do tempo indica que o PB estaria

deixando de ser uma língua prototipicamente de sujeito nulo para se tornar uma língua de sujeito

preenchido. 27 A amostra utilizada – composta de 12 inquéritos – faz parte do acervo do Projeto NURC – RJ e tem

como base falantes com ensino superior. 28 Sobre as sentenças existenciais com ter e haver, temos Callou e Duarte (2005) e Marins (2013), entre

outros. Sobre a ordem SV/VS, encontramos Spanó (2002, 2008), Santos (2008) e Santos e Soares da Silva

(2012). Sobre os verbos de alçamento, temos Henriques (2008, 2012, 2013).

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o uso frequente de sintagmas adverbiais e preposicionais de tempo e de lugar na posição

pré-verbal, que seria do sujeito. Segundo Coelho (2000), a posição à esquerda do verbo

inacusativo funcionaria como mais um argumento, tornando esta construção uma ordem

fixa (XVS). A autora exemplifica um caso de elemento à esquerda sendo um sintagma

preposicional com valor temporal, como ilustrado em (a):

(a) “Nestes três anos aconteceu o chamado ‘caso Maddie’. Descobriu-se que a

investigação criminal é fraca.” (PE, edit, 291) (Spanó, 2008:116)

O exemplo dado por Spanó poderia pertencer ao corpus de nossa pesquisa, já

que se trata de uma locução adverbial temporal/aspectual. Para ela, este sintagma estaria

nessa posição principalmente para ocupar o lugar do sujeito, que se encontra posposto

ao verbo. Para nós, essa posição não poderia ser explicada apenas por sua questão

sintática (de argumento externo do verbo)29, como a autora sugere.

Após analisar a estrutura VS, o tipo de verbo da oração e os elementos à

esquerda do verbo, os resultados apontados por Spanó (2008) levam-na a concluir que o

PB escrito evitaria o uso do verbo em posição inicial, preferindo utilizar outros

elementos nessa posição, conforme já havia sido apontado na fala por Kato & Duarte

(2003). Ela depreende desse grupo de fatores que a ordem VS estaria relacionada

predominantemente à presença de um elemento à esquerda do verbo, seja ele

monoargumental ou transitivo.

Em um estudo diacrônico de cunho funcionalista sobre a ordem SV e VS em

português, Marques (2012) também verificou a presença do advérbio ou da locução

adverbial na margem esquerda. Em sua análise, poucos foram os casos de adverbial na

29 Segundo a própria Spanó (2008), Fuchs & Fournier (2005), em uma perspectiva funcionalista, creditam

aos elementos locativos e temporais que iniciam as ordens SV e VS no francês uma relação não só

sintática, mas também discursiva e semântica. Este trabalho será visto mais à frente.

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margem esquerda em sentenças VS e a autora afirma que o sujeito se posiciona mais

frequentemente após o verbo, em orações com item adverbial, do português arcaico ao

século XVIII.

Em sua amostra do século XX, a hipótese de preenchimento da margem

esquerda pelo advérbio em estruturas VS não se confirmou. Para a autora, a presença do

elemento adverbial não influencia de modo determinante a ordenação do sujeito,

diferentemente do que é defendido por outros autores. Marques (op.cit.) postula que os

“sintagmas adverbiais podem ser favorecedores da posposição, mas não os seus

determinadores” (pág. 134), já que, dentre outras justificativas, ela verificou uma

quantidade considerável de sujeitos em posição pós-verbal e adverbial na primeira

posição com papel temático de [+Tópico] e [+Foco], respectivamente.

Dessa forma a autora associa a relação pré ou pós-verbal do sujeito não à

presença de outro termo (como o advérbio ou a locução adverbial), mas sim ao valor

discursivo que o elemento apresenta, que, para ela, pode ser representado pelo alto grau

de informatividade ou por ser um elemento central ou periférico em termos

comunicativos.

Uma de nossas hipóteses relaciona a posição do circunstancial

temporal/aspectual com a presença ou a ausência de sujeito e sua ordem na oração.

Segundo os trabalhos citados nessa seção, o adverbial seria um dos elementos a

preencher a posição do sujeito, quando esse não estivesse em posição prototípica na

oração. No entanto, para nós, a explicação para a posição do circunstancial à margem

esquerda não é motivada por fatores estritamente sintáticas.

Outras evidências contrárias à explicação meramente sintática podes ser vistas

pelo estudo do francês (língua de sujeito obrigatório), que possui geralmente a estrutura

sujeito + verbo. Dessa forma, se, em francês, a posição da locução for

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predominantemente à margem esquerda (como pretendemos discutir através da análise

de diferentes gêneros do domínio jornalístico), essa seria uma evidência de que o

circunstancial não iniciaria a oração apenas para ocupar a posição vazia do sujeito e sim

por outras razões (como pretendemos discutir nesta tese).

2.3. Considerações sobre o francês

A posição canônica do sujeito no francês, fixada entre os séculos XV e XVII30, é

SV. No entanto, de acordo com Fouchs e Fournier (2003), essa ordem ainda goza de

certa liberdade, pois o sujeito pode aparecer antes ou após o verbo em algumas

configurações, principalmente quando ele ocorre com um constituinte X inicial. Muller

(2007) afirma que um elemento circunstancial, principalmente localizador de espaço-

tempo, no início de uma sentença, pode gerar uma construção inversa do sujeito. Para

Fouchs e Fournier (op.cit.), a estrutura XSV é muito mais recorrente na língua do que a

ordem XVS, portanto, essa posposição aparece como um caso marcado.

As autoras defendem que quatro estruturas sintáticas podem determinar a

posposição do sujeito em francês. Dentre as quatro, uma nos é de especial interesse,

pois traz considerações respeito do circunstancial – objeto de estudo do presente

trabalho –, ao considerá-lo como um dos termos independentes na sentença, ocupando a

posição de X em XSV e XVS.

A partir principalmente de extratos retirados do jornal Le Monde, o artigo

assume quatro parâmetros31 co-textuais para a anteposição e posposição do sujeito. O

primeiro diz respeito à relação sintática entre o elemento X e o verbo. Nesse caso, o X

30 Marchello-Nízia, 1995, p. 104, apud Fouchs e Fournier, 2003. 31 Limitaremos a nossa exposição àqueles parâmetros que nos trarão considerações importantes para os

circunstanciais, nosso objeto de investigação.

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pode ser um elemento regido pelo verbo (como um objeto) ou um circunstancial

endofrásico ou exofrásico32.

O circunstancial endofrásico é, na verdade, um constituinte satélite do verbo, um

pouco mais integrado ao predicado. Nesses casos, o sujeito pode variar de posição,

dependendo da atuação de outros fatores. O exemplo dado pelas autoras para esse tipo

de construção (cf. pág. 82) é um caso de circunstancial temporal (À neuf heures

arrivèrent les premiers invités. / À neuf heures, les premiers invités arrivèrent33).

Em contrapartida, o circunstancial exofrásico é um constituinte periférico, que

traz de fora sua relação com o predicado34. A presença desse circunstancial iniciando a

oração, segundo Fouchs e Fournier (op.cit.), leva à anteposição do sujeito, ou seja, à

construção XSV (muito recorrente no nosso corpus da língua francesa). Para elas, nesse

caso, a posposição do sujeito é notadamente incompatível com um circunstancial

metadiscursivo, que focaliza uma fonte enunciativa na declaração.

As autoras sinalizam que, quando a sentença é iniciada por um complemento

circunstancial – separado, muitas vezes até por vírgula, e referencialmente autônomo –,

o sujeito não se pospõe ao verbo. Elas consideram, nesses casos, o circunstancial como

uma espécie de enquadramento circunstancial (circonstanciel cadratif), na sequência do

enunciado seguinte, ou seja, ele enquadra uma cena prototipicamente dinâmica. No

interior deste enquadre aberto por X, a relação entre sujeito e o verbo pode ser

construída, seja como uma relação entre tema (S) e rema (V) ou como uma relação

global (S-V).

A ordem XVS ocorre quando o complemento circunstancial é mais integrado ao

predicado. Nesse caso, o termo X, introdutor, tem um papel adicional ao verbo, que não

32 Circonstant endophrastique ou exophrastique. 33 Tradução, na ordem em que aparecem: Às nove horas, chegaram os primeiros convidados. / Às nove

horas, os primeiros convidados chegaram. 34 Charolles (2003) considera esse tipo de circunstancial como um advérbio extrapredicativo, o qual

normalmente funciona como tema ou tópico da sentença

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lhe confere autonomia referencial, e, portanto, papel de enquadramento. Essa construção

tem X em posição temática, S em posição remática e o verbo aparece como um simples

relator. Já a configuração XSV corresponde a uma autonomização enunciativa

(referencial) do termo introdutor X, a partir da relação predicativa que segue, de modo

que X não participa desta relação (construída como tema-rema entre o sujeito e o verbo

da oração).

A função discursiva do circunstancial em posição inicial tem grande destaque

em pesquisas sobre a anteposição/posposição do sujeito e a posição dos circunstanciais

na senteça. Segundo Charolles (2003), expressões pouco integradas sintaticamente,

figurando na zona pré-verbal, são predestinadas a funcionar como temas ou tópicos.

Nesses casos, quando a expressão adverbial é anteposta, ela funciona como um

extrapredicado (extraprédicatif). Para Fouchs e Fournier (2003), o aparecimento de

localizador espacial ou temporal no início de uma declaração XSV marca a abertura de

um "enquadre discursivo" .(cadre de discours, pág. 96). Em alguns casos, esta abertura

pode corresponder ao encerramento de um quadro anterior (do mesmo nível) ou

constituir a abertura de um sub-quadro mais amplo dentro de uma configuração

precedente. Vejamos os exemplos dados pelas autoras:

(a) En 1960, Paul partit s’installer en Amérique. En 1980, il revint en Europe.

(b) En 1960, Paul partit s’installer en Amérique. Au printemps de cette même année,

ce grand voyageur parcourut les USA. (2003:96)35

Em (a), temos um exemplo de abertura de um novo quadro e o fechamento do

quadro anterior. Por outro lado, em (b), o escopo do circunstancial é maior, pois é um

35 Tradução: (a) Em 1960, Paul foi se instalar nos Estados Unidos. Em 1980 ele voltou para a Europa. (b)

Em 1960, Paul foi se instalar nos Estados Unidos. Na primavera do mesmo ano, este grande viajante

percorreu os EUA

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exemplo de abertura de um sub-quadro, ou de um novo assunto, subtópico, dentro de

um quadro mais amplo.

Fouchs e Fournier (op.cit.) afirmam que o estudo de corpus atesta esse

enquadramento de X no início dos enunciados com o sujeito anteposto e revela a

complexidade de encadeamento. Elas afirmam que o caso mais simples é o de abertura e

fechamento de quadros, mas há ainda o introdutor de subquadro temporal e múltiplos

outros casos de figurações possíveis. Aqui, o importante é que, nesses casos de

circunstancial extrapredicativo (extrapredicatif), na posição XSV, o adverbial terá

sempre o papel de introdutor de enquadramento discursivo; já o X intrapredicativo

(intrapredicatif), inicial, jamais terá esse papel. Em outras palavras:

quando o X tem função extrapredicativa, ou seja, quando ele possui função além

do predicado, o sujeito obrigatoriamente está anteposto ao verbo, pois ele

funciona como tema;

quando o X tem função intrapredicativa, ou seja, quando ele se relaciona com o

predicado, o sujeito está posposto ao verbo, pois o circunstancial toma o lugar de

tema e transfere a configuração remática para o sujeito.

Dessa forma, os parâmetros co-textuais diferentes, no plano da sintaxe e da

semântica, permitem compreender, no plano discursivo, o enquadramento do termo

inicial X dos enunciados com sujeito anteposto, e ainda a ausência deste papel de

enquadramento funcional dentro dos enunciados XVS. Para Charolles (2003),

contrariamente ao adverbial posposto, que tem tendência de anexação à predicação, os

advérbios antepostos definem um padrão com relação àquela informação vinculada pela

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parte superior. Esse critério pode ser motivado pelo contexto precedente, que justifica a

dimensão do estado de coisas colocado em cena.

Neste capítulo, retomamos brevemente diferentes estudos, tanto no português

quanto no francês, sobre os circunstanciais temporais e aspectuais. As contribuições

desses trabalhos fornecem evidências que sustentam muitas das hipóteses que buscamos

verificar na nossa análise.

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3. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

Para esta pesquisa adotamos os pressupostos teóricos do funcionalismo norte-

americano, pois acreditamos que a gramática de uma língua se constitui a partir de seus

usos. A seguir, faremos uma breve explanação sobre os conceitos básicos da corrente

teórica que guia nosso trabalho, além de noções sobre gêneros textuais e tipos de textos,

já que constituem nossa amostra.

3.1. Conceitos básicos do funcionalismo norte-americano

Defendemos a ideia de que as línguas apresentam uma inerente maleabilidade

em seu sistema, em função dos propósitos comunicativos envolvidos em dado espaço

discursivo. Em outras palavras, à semelhança do que afirma Du Bois (1993),

acreditamos que “(...) a gramática é feita à imagem do discurso” (p. 11). Tendo em vista

essa perspectiva, nossa pesquisa é pautada na corrente funcionalista norte-americana, a

qual pressupõe que o conhecimento de mundo e o linguístico estão intimamente

interligados.

A abordagem funcionalista adotada neste trabalho se refere à iniciada na década

de 70 e conta como principais representantes Talmy Givón, Sandra Thompson, Paul

Hopper, Wallace Chafe, dentre outros. A partir de seus estudos, acreditamos não ser

possível compreender o funcionamento da língua sem levar em conta o comportamento

comunicativo dos falantes. Ou seja, não é possível analisar a língua de maneira isolada,

nem a associar apenas a fatores cognitivos, posto que a gramática é resultado de

estratégias desenvolvidas no discurso e a linguagem é uma atividade sociocultural, que

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reflete as necessidades comunicativas do falante. De acordo com Martelotta et alii

(2011, p.164):

Considerar a gramática como um organismo maleável, que se adapta às

necessidades comunicativas e cognitivas dos falantes, implica reconhecer que a

gramática de qualquer língua exibe padrões morfossintáticos estáveis,

sistematizados pelo uso, ao lado de mecanismos de codificação emergentes.

Em outras palavras, as regras da gramática são modificadas pelo uso (isto é, as

línguas variam e mudam), e, portanto, é necessário observar a língua como ela

é falada. [...]

Ao assumirmos que a língua reflete as necessidades comunicativas, nossa

investigação não considera a diversidade posicional de cada elemento como um fator

arbitrário, como vemos em estudos mais formalistas, mas sim como icônica, ou seja,

motivada por tais questões discursivas. Resumindo: para nós, funcionalistas, a

linguagem tem uma estrutura não-rígida, maleável e sujeita a mudanças, pois essa

estrutura está ligada ao discurso. Este, por sua vez, estaria relacionado às situações reais

de comunicação, já que é através do discurso que as estruturas vão se adaptando e se

modificando para se adequarem ao contexto de uso. Dentre os princípios e as categorias

centrais dessa corrente, dois são essenciais para nossa pesquisa: a iconicidade e a

marcação.

A iconicidade, termo oposto à arbitrariedade, é definida, a princípio, como a

correlação entre a forma – o código linguístico, a expressão – e seu designatum – seu

conteúdo, aquilo que o falante pretende expressar. Dessa forma, partindo de uma visão

original, mais radical, o Princípio de Iconicidade postularia que, para uma forma na

língua, teríamos uma função. Entretanto, estudos sobre variação e mudança linguísticas

constataram a existência de mais de uma forma para uma mesma função, principalmente

por causa de pressões diacrônicas corrosivas (cf. Martelotta, 2011, p. 167), o que gerou

uma reformulação desse princípio.

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Em sua versão menos radical, o Princípio de Iconicidade, segundo Givón

(1990), relaciona-se a três subprincípios: subprincípio da quantidade, da integração e da

ordenação linear.

O subprincípio da quantidade postula que uma maior quantidade de elementos

linguísticos (morfemas, palavras, sintagmas ou frases) será utilizada se a informação a

ser dada for de grande importância e pouco previsível. Por outro lado, se a informação

for óbvia, haverá uma menor quantidade de elementos linguísticos. Podemos observar,

no exemplo do extrato, a clara aplicação do subprincípio da quantidade:

George Orwell, autor do romance "1984", que retratava a vida

em um Estado totalitário governado por um ditador onisciente,

foi alvo da vigilância dos serviços de segurança britânicos, que

suspeitavam que ele fosse comunista.

O serviço secreto do Reino Unido, o MI5, e a Seção Especial da

Polícia Metropolitana de Londres, encarregada da vigilância

política, mantiveram Orwell sob observação intermitente por 21

anos, segundo um arquivo sigiloso do MI5 sobre o escritor

divulgado ontem pelo Arquivo Nacional britânico.

"Este homem tem opiniões comunistas bem enraizadas", diz um

relatório de 20 de janeiro de 1942. "Ele se veste à maneira

boêmia, tanto no escritório quanto nas horas de lazer."

Orwell atraiu a atenção das autoridades britânicas pela primeira

vez em 1929, segundo seu arquivo no MI5. Ele estava vivendo em

Paris, pesquisando para o livro "Na Pior em Paris e Londres", e

recebeu oferta de trabalho como correspondente do "Workers"

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Life", um jornal britânico de esquerda. (Folha de São Paulo,

notícias, 05/09/2007)

O sujeito pronominal de 3ª pessoa – contexto de maior resistência ao

preenchimento no português brasileiro (cf., entre outros, Duarte 1993,1995) –, quando é

introduzido pela primeira vez no discurso, precisa ser apresentado através de um SN

pleno. No exemplo anterior, podemos verificar que a primeira menção ao escritor

George Orwell foi codificada por um sintagma nominal grande, inclusive com uma

relativa para apresentar ao leitor sobre quem se tratava a notícia: George Orwell, autor

do romance "1984", que retratava a vida em um Estado totalitário governado por um

ditador onisciente. Este sujeito, explícito na primeira sentença, é retomado algumas

vezes no discurso por estruturas menores – Este homem e depois por seu nome Orwell.

No último parágrafo, o destaque está para a gradação de referencialidade expressa pelo

elemento sujeito em três momentos: primeiro o SN sujeito apresenta o nome do autor,

Orwell, em seguida o retoma com o pronome anafórico – ele – e, na sequência, o sujeito

da forma verbal conseguiu fica elíptico, visto que a informação já é previsível no

discurso.

No que diz respeito ao processo de ordenação das estruturas na cadeia sintática,

temos dois subprincípios relativos à ordenação sequencial: o subprincípio da

integração – ou da relação entre ordem sequencial e topicalidade – e o subprincípio da

ordenação linear.

O subprincípio da integração prevê que, quanto mais próximo cognitivamente o

elemento estiver, mais próximo ele estará na estrutura linguística (e o contrário também

se verifica). Por exemplo, advérbios que modificam intrinsecamente o verbo, como os

de modo, costumam se apresentar bem próximos a ele; em contrapartida, os advérbios

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de tempo, por serem apenas dêiticos temporais, podem vir mais distantes do verbo.

Observemos o parágrafo a seguir, que ilustra esses comportamentos dos adverbiais:

Até agora, a combinação do policiamento dos usuários e da

visualização dos dados trabalhou bem ao tornar as trapaças

relativamente mínimas. Aqueles que são suspeitos de utilizar suas

contas para tentar enganar o sistema recebem um e-mail de

aviso. O usuário é banido após a segunda violação. (O Globo,

editoriais, 24/01/2007)

No exemplo, temos uma locução adverbial de tempo/aspecto, até agora,

iniciando o período e afastada do verbo da oração. Já o advérbio bem, que indica o

modo como a ação de trabalhar ocorreu, se ordenou imediatamente após a forma verbal

– trabalhou.

O subprincípio da ordenação linear pressupõe que (a) a ordem de um enunciado

demonstra a ordem de importância dada aos fatos pelo falante, pois a informação mais

importante tende a ocupar o primeiro lugar da cadeia sintática ou (b) as informações

tenderiam a aparecer nas orações na ordem que ocorrem no mundo real. Um exemplo

prototípico é a coordenação, que expressa o número e a ordem dos eventos de acordo

com o que é percebido pelo falante ou com o que ele quer expressar. Vejamos um

exemplo de enumeração de ações:

Scarlet Johansson colaborava com a Oxfam desde 2005 e em

2007 se converteu em embaixadora mundial de sua causa. (O

Globo, notícias, 30/01/2014)

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No exemplo, visualizamos duas orações coordenadas entre si numa sequência de

eventos percebidos pelo emissor. A ordem em que esses eventos são mostrados indica a

sequência na qual eles ocorreram: primeiro, a atriz Scarlet Johansson colaborava com a

instituição beneficente Oxfam, em 2005; depois, com a marcação do tempo enfatizada

pelo posicionamento do circunstancial, em 2007, para o início da oração coordenada, a

atriz se converteu em embaixadora.

Testaremos esses subprincípios ao procurarmos as motivações para as tendências

de ordenação das locuções adverbiais temporais no português e no francês, observando

topicalização (ordenação linear), relação entre tamanho da locução e posição na oração

(quantidade) e proximidade ao verbo (integração).

O Princípio da Marcação, originado em construções binárias na Escola de

Praga, é o outro princípio funcionalista relevante para a pesquisa. Tal princípio prevê

que em determinadas formas binárias a marcação ocorre na estrutura que exibe uma

propriedade ausente na outra, considerada menos marcada na língua. As formas não-

marcadas seriam mais automatizadas pelos usuários, sendo, dessa forma, estruturas mais

corriqueiras e usuais. Givón (1990), para distinguir categorias marcadas e não-

marcadas, propõe um conjunto de critérios, apresentados a seguir:

(1) Complexidade estrutural: a estrutura marcada tende a ser mais complexa e, por

vezes, até maior que a sua correspondente não-marcada;

(2) Distribuição de frequência: a categoria marcada tende a ser menos frequente do

que a não-marcada;

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(3) Complexidade cognitiva: a categoria marcada requer mais atenção, um esforço

mental maior e o tempo de processamento é mais estendido, o que a faz ser uma

estrutura cognitivamente mais complexa.

Desse modo, uma estrutura não-marcada seria aquela comum ao usuário,

sendo frequentemente empregada no seu dia a dia, o que acarreta um menor esforço

para a sua compreensão. Por outro lado, as estruturas mais marcadas estão diretamente

relacionadas à sua baixa frequência na língua, o que consequentemente leva o usuário a

um esforço mental maior para a assimilação do conteúdo.

Segundo Givón (op. cit.), a iconicidade maior na gramática teria seu reflexo

mais geral quando esses três critérios coincidissem. O autor afirma ainda, levando em

consideração que a marcação é um fenômeno relacionado ao contexto de uso, que uma

determinada estrutura pode ser marcada em um contexto e não em outro. Para ele, é de

extrema importância a questão da frequência de uso de uma dada estrutura, pois é ela

que determina a relação entre a complexidade estrutural e a complexidade cognitiva.

No que diz respeito à complexidade cognitiva, Dryer (1995) defende que a

marcação estaria ligada ao falante e não ao ouvinte, como sugere Givón. A marcação,

para aquele, é uma propriedade de princípios e regras que seriam relevantes para

explicar a escolha de uma estrutura, ao invés de outra, pelo falante. Assim, o autor

propõe o critério do pragmaticamente marcado ou não marcado, inserido em questões

discursivas, independentemente da recorrência daquela construção. Para o autor, uma

ordem é pragmaticamente não marcada quando é utilizada em contextos em que são

anuladas as condições discursivas que exigem ocorrência da ordem marcada, ou seja,

em contextos de neutralização. (cf. Brasil 2005)

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Outra discussão acerca da marcação é encontrada em Croft (1990), o qual

defende que o conceito de marcação presume uma assimetria relacionada a protótipos, a

hierarquias gramaticais e a universais implicacionais. O autor exemplifica tal conceito

com base na marcação de estruturas no singular e no plural, em que elementos distintos

funcionam como uma mesma forma gramatical: o número.

No entanto, o próprio autor salienta o fato de que a construção mais ou menos

marcada pode ser relativa de acordo com a quantidade de elementos presentes naquele

paradigma. Furtado da Cunha (2003, p. 35) ilustra três estruturas negativas que não se

opõem binariamente na fala, porém constituem um continuum, exibindo graus

diferentes de marcação. A autora aponta, ainda, para a necessidade de adoção de

parâmetros de gradualidade ao se analisar a marcação, uma vez que a língua é fluida.

Em nossa análise sobre os circunstanciais temporais e aspectuais, procuramos

identificar a posição não-marcada do nosso objeto de estudo, tomando como base não

um critério binário, dicotômico, mas, sim, o que seria mais prototípico em termos,

principalmente, de frequência. Além disso, a partir dos nossos resultados, tentamos

compreender as motivações a ocupar uma posição mais marcada na oração.

Nas duas últimas décadas, sobretudo, o funcionalismo foi enriquecido com as

contribuições da Linguística cognitiva. Os pesquisadores têm demonstrado que fatores

cognitivos – como a capacidade humana de categorizar, de fazer analogia, de

compreender intenções nas ações e falas dos outros humanos – são importantes tanto

para explicar as variações de uso da gramática, como a sua mudança. Vêm

demonstrando que a gramática de uma língua é baseada no uso, ganhando forma a partir

do modo como a mente opera e de acordo questões ligadas à frequência de uso. Essa

abordagem – que junta os conhecimentos do funcionalismo clássico com contribuições

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da Linguística cognitiva – é denominada Usage-Based Linguistics. No Brasil, é

conhecida como Linguística Funcional Centrada no Uso.

Nesta tese, vamos nos basear no Funcionalismo clássico, porque seus conceitos

são suficientes para dar conta dos objetivos aqui propostos. Além disso, a abordagem

mais recente volta-se sobretudo para explicar mudança linguística, que não é foco da

presente tese.

3.2. Gênero Textual e tipo de texto

Bakhtin (1985 apud Hammes 2004) defende que a comunicação verbal só pode

se realizar por meio de algum gênero textual – pressuposto fundamental para a maioria

dos autores que estudam a língua através de seus aspectos enunciativos e discursivos. O

autor define os gêneros como tipos de enunciados, relativamente estáveis, normativos e

necessariamente vinculados a situações típicas da comunicação social – cada gênero,

pois, apresenta necessariamente natureza sócio-ideológica e discursiva diferente. Essa

relação dos gêneros com os enunciados – e não com uma dimensão linguística

desvinculada da atividade social – caracteriza a natureza verbal proposta pelo autor.

Bakhtin enfatiza, ainda, a relação entre a estabilização dos gêneros e a sua

ligação com a atividade humana, já que, para ele, os gêneros são frutos da situação

social de interação típica dentro de uma esfera social. Desse modo, os gêneros seriam

constituídos ao longo da história por novas situações de interação verbal e as mudanças

nos gêneros estariam associadas às mudanças nessas relações sociais.

Porém, para Bakhtin, os gêneros também seriam formas de ação, pois exercem, a

partir do momento em que se estabelecem, um efeito normativo sobre as interações

verbais ou não verbais. Desse modo, para a interação, é necessário tanto o domínio das

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formas da língua quanto o das formas do discurso, isto é, o domínio dos gêneros do

discurso. Assim, no momento da interação, os gêneros auxiliam o interlocutor no modo

como interpreta e compreende o enunciado e ainda exercem a função de índices de

referência para que o enunciado seja construído, delimitando o autor no processo

discursivo.

Ao adotar as ideias de Bakhtin, Marcuschi (2005) afirma que os gêneros textuais

são uma espécie de ação sócio-discursiva para agir no mundo e que contribuem, para

estabilizar e coordenar a comunicação diária. Para o autor, os gêneros são entidades

comunicativas em que aspectos relativos a funções, ações, propósitos e conteúdos são

predominantes, não sendo, portanto, entidades formais. Os gêneros, para ele, são

fenômenos históricos, relacionados à vida social e cultural, sendo por essa razão eventos

textuais maleáveis e dinâmicos que surgem e se modificam a partir das necessidades e

atividades sócio-culturais. Eles não são caracterizados por questões linguísticas e

estruturais, mas por suas funções comunicativas, cognitivas e institucionais.

As inovações tecnológicas, principalmente na área de comunicação, propiciaram

o aparecimento de um grande número de gêneros textuais no século XX. Dessa forma,

os novos gêneros, com formas discursivas cada vez mais diferenciadas, surgem a partir

dos novos suportes36 tecnológicos para atender às interferências nas atividades

comunicativas do indivíduo. Assim são criados os editoriais, os artigos, as notícias, as

telemensagens, os telefonemas, etc.

A partir da perspectiva de que não existe comunicação verbal que não seja feita

por meio de um gênero, é impossível que tal comunicação ocorra verbalmente sem um

texto. A interação verbal, por essa razão, só existe a partir de algum gênero textual, que,

embora seja constituído a partir de aspectos sócio-comunicativos e funcionais, não tem

36 Locus físico ou virtual onde o texto se apresenta materializado, como o rádio, a televisão, o jornal, a

revista, a internet, etc.

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a sua forma desprezada, pois, em certos casos, a forma, a função ou até mesmo o

suporte podem determinar o gênero presente.

Algumas distinções entre o tipo de texto e os gêneros textuais se fazem

necessárias, bem como, ainda, algumas características do domínio discursivo, são elas:

1) O tipo textual caracteriza-se mais como sequência linguística do que como a

materialização do texto. Designa a construção teórica definida pela natureza linguística

de sua composição. Temos poucos tipos de texto, pois o conjunto de categorias é

limitado, são eles: a narração, a argumentação, a exposição, a descrição e a injunção.

2) Os gêneros textuais apresentam padrões sócio-comunicativos definidos por

composições objetivos enunciativos, funcionais e estilos concretamente realizados na

integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas. Eles são a

materialização dos textos que encontramos no nosso dia a dia e entidades empíricas em

situações comunicativas que se expressam em designações diversas, constituindo, em

princípio, listagens abertas. Os gêneros podem ser representados na fala e na escrita de

forma bastante estável, situadas histórica e socialmente. São infinitos os gêneros

existentes, temos como exemple o email, o bilhete, a notícia jornalística, o editorial, a

crônica, a carta etc.

3) O domínio discursivo são as práticas discursivas nas quais identificamos um conjunto

de gêneros textuais, ou seja, são as grandes esferas da atividade humana em que os

textos circulam. São exemplos de domínio discursivo, discurso jornalístico, o discurso

político e o discurso religioso.

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Para não confundirmos a noção de texto e discurso, cabe ressaltar que o discurso

corresponde àquilo que é produzido pelo texto ao se manifestar e por outro lado, o texto

corresponde aos acontecimentos discursivos para os quais as ações linguísticas, sociais

e cognitivas convergem. Sendo assim, em situações institucionais, sociais, ideológicas e

históricas, o discurso se realiza nos textos.

Um texto normalmente é tipologicamente variado, ou seja, em um único texto,

podemos encontrar um tipo apenas ou até mais. Os tipos de textos têm como principal

característica o fato de se definirem por traços linguísticos predominantes, por uma

sequência, e não por um texto por completo. Um gênero textual é denominado por sua

realização linguística em situações sociais em particular e, não, por sua forma, já que

não podemos defini-lo por propriedades essenciais. Dentro de um gênero há grande

heterogeneidade tipológica. Dessa forma, um gênero pode não ter determinada

característica e, mesmo assim, continuar pertencendo àquele gênero.

Ainda há casos, em que um texto possui uma configuração híbrida, ou seja, se

configura com a presença de dois gêneros textuais. A relação intertextual de

intergêneros caracteriza-se por uma mescla de formas e funções de diferentes gêneros

em um específico. Um convite de casamento escrito como uma história em quadrinhos,

ou uma notícia em formato de poema seriam exemplos da intertextualidade

intergêneros.

Marcuschi indica as seguintes relações entre os gêneros:

Intertextualidade intergêneros = um gênero com a função de outro;

Heterogeneidade tipológica = um gênero com a presença de vários tipos textuais

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Organizamos nosso corpus a partir da nomenclatura clássica dos gêneros,

designada pelos próprios suportes. Consideramos que os textos possuem a

intertextualidade de intergêneros e principalmente a heterogeneidade tipológica e que

todos fazem parte de um mesmo domínio discursivo: o discurso jornalístico.

Veremos, nos próximos capítulos, se há relação entre os gêneros textuais e a

ordenação do circunstancial na oração.

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4. AMOSTRA E METODOLOGIA

Com o objetivo principal de comparar as possibilidades de ordenação de

circunstanciais temporais e aspectuais em duas línguas românicas – o português e o

francês –, coletamos e analisamos todas as suas ocorrências em jornais de grande

circulação no Brasil e na França, como O Globo, Folha de São Paulo, Le Monde e Le

Figaro, no período de 2007 a 2015.

Consideramos circunstanciais válidos para nossa pesquisa apenas locuções

adverbiais com valor de tempo e de aspecto, com estrutura de SN ou de SPrep (com ou

sem cabeça. Seguimos a nomenclatura de Neves (2011), que considera dentro da

categoria de circunstanciais temporais também a noção aspectual (cf. capítulo 1).

Assim, dados como os exemplificados de (1) a (4) foram considerados na análise:

(1) Os protestos retornaram já na sexta-feira. [notícia 31 – O Globo]

(2) Vinte minutos depois, a explosão de uma motocicleta a menos de dois quilômetros

dali destruiu carros e matou sete pessoas. [notícia 3 – Folha de São Paulo]

(3) En 2014, Vladimir Poutine a gagné 7,6 millions de roubles, soit 149.000 euros37.

[notícia 12 – Le Figaro]

(4) Tel est le sens des propos que le pape a tenus, lundi 29 juillet, sur les homossexuels

dans l’avion qui le ramenait du Brèsil.38 [editorial 3 – Le Monde]

37 Em 2014, Vladimir Putin ganhou 7,6 milhões de rublos, ou 149.000 euros.

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Nestes exemplos, as locuções adverbiais podem aparecer em diferentes posições,

ou seja, apresentam mobilidade sintática. Em (1), a locução posiciona-se logo após

outro adverbial – já – e está na margem direita da oração; em (2), o circunstancial está

na margem esquerda, iniciando a sentença, assim como no exemplo (3), em francês. Por

fim, no exemplo (4), o adverbial aparece imediatamente após a forma verbal.

4.1. Amostra

Nossa amostra foi composta por dois gêneros textuais diferentes, de dois jornais

de cada língua: para o português, O Globo e Folha de São Paulo, com circulação no

Brasil, e, para o francês, o Le Monde e o Le Figaro, com circulação na França.

Os jornais O Globo e Folha de São Paulo são veículos de comunicação

nacional. Ambos possuem sua versão digital e a equivalente impressa com circulação no

Brasil. Os jornais franceses Le Monde e Le Figaro também são de circulação nacional,

na França, e são disponibilizados on-line. Todos os jornais são considerados imparciais

pelo próprio veículo, à exceção dos editoriais, que privilegiam as opiniões do próprio

veículo. O público alvo dos jornais é o mesmo, embora o Le Monde, na França, e a

Folha de São Paulo, no Brasil, sejam voltados para um público teoricamente mais

escolarizado. A princípio, esperávamos encontrar diferença no nível de formalidade dos

jornais, mas essa modalidade discursiva se mostrou irrelevante, pois os veículos pouco

variavam.

Os gêneros selecionados foram as notícias e os editoriais, com o objetivo de

verificar se a distinção de tipologia textual prototipicamente associada a esses dois

38 Este é o significado das palavras que o papa realizou proferiu segunda-feira 29 de julho, sobre os

homossexuais no voo que o levava de volta do Brasil.

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gêneros – a notícia é um gênero narrativo, e o editorial, argumentativo – acarretaria

mudança significativa na ordenação do circunstancial. Os textos foram recolhidos no

período de 2007 a 2015, no próprio site dos veículos de informação e na sua versão

impressa, no caso de alguns jornais brasileiros. O quadro (4.1) indica o número de

textos recolhidos em cada um dos jornais:

Editorial Notícia Total

Francês Le Monde 20 20 40

Le Figaro 20 20 40

Português O Globo 20 20 40

Folha de SP 20 20 40

Quadro 4.1: Distribuição da Amostra

Todas as notícias que compõem nossa amostra foram recolhidas da versão

digital do jornal e possuem uma estrutura próxima ao que de fato conhecemos pelo

gênero notícia (linguagem mais direta, mais objetiva e mais narrativa). Além disso,

todas, tanto as brasileiras quanto as francesas, pertenciam à seção que os veículos

chamam de “Notícias do Mundo”, para manter a mesma temática desenvolvida no texto.

O gênero textual no qual o circunstancial se encontra tem importante relevância

em sua ordenação. Como já exposto no capítulo 3, um consenso sobre a distinção entre

os gêneros está nos objetivos sócio-comunicativos de cada um. Para Marchuschi (2008,

p.156), os gêneros textuais apresentam padrões sócio-comunicativos, mas devemos ter

cuidados para que “não concebamos os gêneros como modelos estanques, nem como

estruturas rígidas, mas como formas culturais e cognitivas de ação social [...]”. O autor

diferencia gênero de tipo textual, indicando a noção de tipo como a sequência

linguística na qual o texto vai se materializar e o gênero como o texto em si, já

materializado no processo comunicativo.

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Partindo da afirmação de que o gênero textual apresenta as intenções

comunicativas, esperamos que a ordenação do circunstancial seja motivada por esse

objetivo. Sendo assim, partimos de dois gêneros compostos principalmente por tipos de

texto distintos: o gênero notícia, composto basicamente por narração, e o gênero

editorial, composto, em sua maioria, por argumentação e exposição. Em sequência,

alguns exemplos dos dois gêneros, retirados de nossa amostra:

Notícia

A característica principal da notícia é ser um gênero jornalístico em que o

repórter narra fatos que ocorreram há pouco tempo ou naquele mesmo dia. A notícia é

um gênero pretensamente objetivo, marcado por um certo afastamento do locutor e que

privilegia as ações, os eventos e os participantes. Na tradição jornalística, a notícia

responde às perguntas “quem?”, “como?”, “por quê?”, “onde?” e “quando?” logo no

início do texto, no parágrafo chamado lead (ou lide).

(5) O líder supremo iraniano, o aiatolá Ali Khamenei, advertiu nesta quinta-feira que

seu país atingirá os interesses americanos no mundo se for atacado.

Em discurso perante comandantes da Força Aérea iraniana divulgado pela televisão,

Khamenei lembrou que "é impossível deixar sem resposta a invasão da nação

iraniana".[...]

A Casa Branca repudiou nesta quinta-feira as ameaças do aiatolá Ali Khamenei, e

afirmou que os Estados Unidos não têm a intenção de entrar em guerra com o Irã.

Khamenei se referiu aos "rumores" de um possível ataque americano contra o Iraque, e

acrescentou que estas questões "não assustam" o Irã, pois não é a primeira vez que o

país é atacado pelos EUA.

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O líder se mostrou convencido de que "os inimigos não cometerão tal erro, já que

sabem muito bem que desta forma poriam em perigo seus próprios interesses".

No mesmo dia do duro discurso de Khamenei contra os EUA, o Irã testou com sucesso

um míssil terra-mar de alcance de 350 km. O teste foi realizado durante o segundo dia

de manobras aeronavais na região do Golfo, informou a TV estatal. [notícia 1 – o

Globo]

Editorial

O editorial é um gênero textual que tem como objetivo mostrar a opinião do

jornal sobre determinado assunto em pauta no momento, sendo, portanto, um tipo de

texto argumentativo. Geralmente, os editoriais, por representarem a voz do jornal, não

são assinados. Entretanto, tal prática não é realizada pelos jornais franceses. Neles, os

editoriais normalmente possuem uma assinatura, mas se assemelham estruturalmente ao

que no Brasil é reconhecido como este gênero.

(6) Não se pode acusar o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de falta

de tenacidade. Ele se agarra ao cargo com rara contumácia.

As desditas do senador tiveram início no final de maio, quando a revista "Veja" afirmou

que ele teve despesas pessoais pagas pelo lobista Cláudio Gontijo, da empreiteira

Mendes Júnior. O dinheiro bancaria pensão de Mônica Veloso, com quem o senador

tem uma filha.

De lá para cá, a situação do presidente do Senado deteriorou-se. Recorreu à pecuária

para justificar a origem do dinheiro -Gontijo seria só um amigo que repassava o

dinheiro do próprio Renan Calheiros à mãe de sua filha.

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Os primeiros problemas a respeito dessa versão surgiram quando se verificou que,

para chegar a seu patrimônio declarado, Renan teria de conseguir com seu rebanho

alagoano uma lucratividade bem superior à registrada em regiões mais tradicionais,

como São Paulo e Rio Grande do Sul. Para piorar as coisas para o senador, soube-se

logo a seguir que as notas apresentadas por Renan para sustentar suas afirmações

incluíam recibos com irregularidades e emitidos por empresas de fachada.

Elementos já surrealistas surgiram quando um dos frigoríficos para os quais o senador

teria vendido gado foi assaltado na véspera do dia em que entregaria documentos para

serem periciados pela Polícia Federal. Papéis que interessavam à apuração foram

levados pelos bandidos.

Em paralelo às batalhas em torno da contabilidade rural, surgiram outras denúncias,

também negadas pelo senador. Teria favorecido a cervejaria Schincariol, que comprou

uma fábrica de Olavo Calheiros, irmão de Renan. Teria adquirido, com recurso a

testas-de-ferro, uma rádio e um jornal em Alagoas, no valor de R$ 2,5 milhões. A

história foi confirmada pelo usineiro João Lyra, atual desafeto do presidente do

Senado, que seria sócio do senador na empreitada.

Finalmente, veio a público nesta semana o resultado da perícia da PF. A polícia diz

que os documentos apresentados pelo senador não são suficientes para sustentar a sua

história. Afirma que a papelada apresenta lacunas graves, como a ausência de registro

de despesas de custeio na atividade pecuária. O pagamento de mão-de-obra, por

exemplo, só aparece na movimentação de 2006 e não na dos anos anteriores.

Outros problemas incluem a multiplicação do gado. Em 2004 surgiram cem reses na

criação, sem que haja registro de compra ou de nascimentos. Como os peritos

apontaram um déficit nas contas de 2005, Renan Calheiros aparece agora com um

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empréstimo de R$ 178 mil tomado à empresa Costa Dourada Veículos. [editorial 11-

Folha de São Paulo]

Nossa intenção em trabalhar com diferentes jornais era buscar distinções no

nível da formalidade, verificando se havia ou não diferença significativa no que diz

respeito ao uso dos circunstanciais em cada um deles. No entanto, uma análise

preliminar sobre o fator nível de formalidade não se mostrou relevante. Embora

tenhamos algumas diferenças estruturais nos gêneros (por exemplo, os editoriais do Le

Monde são assinados e os do O Globo não) e na linguagem utilizada (mesmo com os

quatro jornais possuindo praticamente um mesmo público-alvo), as mesmas tendências

de uso para os circunstanciais temporais e aspectuais foram verificadas.

4.2. Metodologia

Coletamos e codificamos todas as orações em que a locução adverbial de tempo

e aspecto ocorriam, com o objetivo de analisar suas distintas formas de ordenações

destes circunstanciais. Para nós, cada posição assumida pela locução adverbial deve ter

uma função diferente no discurso, o que buscamos identificar. O programa SPSS

(Statistical Package for the Social Sciences), um pacote estatístico desenvolvido para as

ciências sociais, foi utilizado como ferramenta para nos auxiliar na frequência e

cruzamento de fatores.

O total de dados recolhidos em cada um dos jornais é mostrado na tabela (4.1):

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Tabela (4.1): Quantidade de dados em cada gênero

Jornal notícias editoriais língua total

O Globo 155 135 574 290

Folha de São Paulo 169 115 284

Le Figaro 196 103 669 299

Le Monde 183 187 370

Total 703 540 1243 1243

Selecionamos um total de 1243 dados válidos para análise – 574 para o

português e 669 para o francês. Nesse conjunto de ocorrências, consideramos apenas

aquelas que apresentam valor temporal ou aspectual, descartando os casos em que se

superpunham outros valores, como lugar, modo ou intensidade.

Dessa forma, excluímos dados como os ilustrados a seguir:

Tempo + Lugar

(7) “Este homem tem opiniões comunistas bem enraizadas”, diz um relatório de 20 de

janeiro de 1942. “Ele se veste à maneira boêmia, tanto no escritório quanto nas

horas de lazer.” [notícia – Folha de São Paulo, 05/10/2007]

(8) Voilà ce que nous enseignent les révélations faites par le sonneur d’alarme

américain Edward Snowden et par l’enquête qu’a publiée Le Monde dans son

édition datée du 5 juillet.39 [editorial 13 – Le Monde]

Tempo + Modo

(9) Les Algériens n’ont pas le dorit de savoir quel traitement a subi leur président, s’il

va reprendre son travail à plein temps, brf quel est l’état de santé d’un homme

39 Isto é o que nos ensinam as revelações feitas pelo tocador de alarme americano Edward Snowden e pela

investigação que o Le Monde publicou na sua edição datada de 05 de julho.

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dont le mandat – le troisième consécutif depois 1999 – s’achève em avril 2014.40

[editorial 7 – Le Monde]

Tempo + Intensidade

(10) Sem dinheiro, o time foi armado às pressas com a competição em andamento.

[notícia. Folha de São Paulo, 05/10/2007]

(11) Plus que jamais, l’imigration est um motif d’anxiété dans les sociétés

européennes.41 [editorial 19 – Le Figaro]

Como nosso objetivo é comparar as possibilidades de ordenação dos

circunstanciais temporais / aspectuais no português e no francês, uma característica

essencial para os dados é sua mobilidade sintática dentro da oração. Dessa forma, casos

que não admitiam outro posicionamento, que pertenciam a frases nominais ou que

constituem estruturas fixas foram descartados da análise. Tais ocorrências aparecem

ilustradas, respectivamente, em (12), (13), (14) e (15):

Oração comparativa

(12) As festividades, que incluíram fogos de artifício e salvas de canhão em diferentes

cidades, foram no entanto mais modestas do que em anos passados. [notícia 16

– Folha de São Paulo]

40 Os argelinos não têm o direito de saber qual o tratamento que sofreu seu presidente, se ele vai retomar

seu trabalho a tempo, em suma qual é o estado de saúde de um homem cujo mandato - o terceiro

consecutivo desde 1999 - termina em abril de 2014. 41 Mais do que nunca, a imigração é um motivo de ansiedade nas sociedades europeias.

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Construção com verbo haver existencial

(13) O dia mais violento na Ucrânia desde que militares pró-russos ocuparam cidades

no leste, há mais de três semanas, terminou com pelo menos 35 mortos em

Odessa e 9 mortos em Slaviansk. [notícia 7 – Folha de São Paulo]

Frase nominal

(14) Et non pas à mi-mandat, après deux années et demie de gâchis, et par um exécutif

exsangue.42 [editorial 24 – Le Figaro]

Estruturas sem mobilidade sintática

(15) La politique étrangère n'a été abordée qu'après 1h30 d'émission.43 [notícia 23 –

Le Figaro]

Também não consideramos dados em que o circunstancial se encontra em uma

oração reduzida. Para nós, esses casos necessitam de uma análise diferenciada. Seguem

alguns exemplos:

Reduzida de particípio

(16) Or, ceux-cil’avaient principalement quitté au profit de François Hollande, a

notamment montré le dernier baromètre Ipsos-Logica Business Consulting por

Le Monde, France Télévisions et Radio France, réalisé le 13 et 14 janvier.44

[notícia 2 – Le Monde]

42 E não a em médio prazo, depois de dois anos e meio de desordem, e por um executivo apático. 43 A política estrangeira só foi abordada após 1h30 de emissão. 44 Ora, estes o tinham deixado, principalmente em favor de François Hollande, mostrou, notadamente, o

último barômetro Ipsos-Logica Business Consulting para o Le Monde, France Télévisions e Radio

France, realizado em 13 e 14 de janeiro.

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Reduzida de infinitivo

(17) Correm soltas as especulações de que Rowling, que se tornou bilionária com o

sucesso dos livros e filmes de Harry Potter, pode fazer Harry morrer no final do

sétimo livro. (O Globo, editorial, 01/02/2007)

Reduzida de gerúndio

(18) Além disso, o jornal ganhou um “editor de inovação”, responsável por “nada

menos que fazer a redação trabalhar 24 horas por dia, publicando material

exclusivo o tempo todo através da internet”, segundo o editor David Hiller.

[editorial 3 - O Globo]

Os dados com circunstanciais em construções com voz passiva foram

considerados e codificados normalmente. Nos casos de passiva analítica, o

circunstancial foi relacionado à locução verbal e o agente da passiva, quando presente,

foi analisado como um elemento X, conforme o exemplo:

(19) Autor de “1984” e “Revolução dos Bichos”, que cunhou o termo “Big Brother”,

foi espionado [pelo MI5] por 21 anos. [notícia 4 – O Globo]

O circunstancial, em algumas ocorrências no nosso corpus, modificava um

núcleo nominal, sem fazer referência ao verbo da oração. Nesses casos, a mobilidade

sintática ficava comprometida, como no exemplo (20):

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(20) Frankie Laine, um dos cantores de maior popularidade nos Estados Unidos na

década de 1950, morreu terça aos 93 anos em San Diego (Califórnia), Segundo

informações oficiais. [notícia 10 – O Globo]

No exemplo (20), o circunstancial temporal/aspectual, na década de 1950,

modifica o elemento anterior – maior popularidade –, pertencente ao aposto e não à

estrutura verbal morreu. Nesse caso, o escopo do SPrep fica restrito à nominalização, o

que impede alterar sua posição sintagmática. Qualquer movimento da locução adverbial

implica, necessariamente, um movimento do SN no qual ela está encaixada (Um dos

cantores de maior popularidade nos Estados Unidos na década de 1950, Frankie

Laine, morreu terça aos 93 anos em San Diego (Califórnia), segundo informações

oficiais).

Em alguns casos, ainda, a mudança de posição do circunstancial acarretava uma

mudança no escopo de atuação do mesmo. Vejamos o exemplo:

(21) A última entrada do arquivo, uma anotação anônima, registra sua morte, por

tuberculose, aos 46 anos, em 21 de janeiro de 1950 – um ano após a publicação

de 1984. [notícia 4 – Folha de São Paulo]

Analisando o circunstancial em 21 de janeiro de 1950, percebemos uma

ambiguidade em seu escopo. Na posição em que se encontra, após o outro circunstancial

– aos 46 anos –, não temos plena convicção se essa data se refere à data da morte ou à

de registro dessa morte. Se o circunstancial estivesse adjacente ao verbo, anteposto ou

posposto a ele, não haveria dúvida: a locução estaria ligada ao ato de registrar a morte.

Como um de nossos objetivos é identificar as ordenações prototípicas dos

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circunstanciais, casos desse tipo também foram descartados, pois a sua mudança de

posição alteraria o termo ao qual o circunstancial estaria vinculado.

Além dos casos já listados, não incluímos os dados presentes nos títulos dos

textos (exemplo (22), por apresentarem sempre uma estrutura fixa para chamar a

atenção do público leitor, e aqueles dados que pertenciam a falas e entrevistas, exemplo

(23). Portanto, só foi considerado o discurso do autor do texto.

(22) Crescimento tende a perdurar este ano [notícia 5 – O Globo]

(23) Achim Steiner, diretor executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio

Ambiente (Unep), disse que os políticos de cada país tinham de tomar a

dianteira do processo. "Se não houver uma vontade política nas discussões deste

ano, então acho que vamos nos deparar com uma situação de avanços muito

lentos, ou até impossíveis." [notícia 7 – O Globo]

Além disso, cabe ressaltar que não faziam parte de nosso objeto de estudo

estruturas já cristalizadas em francês como um vocábulo apenas, mesmo que sua

tradução equivalesse a uma locução em português (como “quelquefois”, que significa

“algumas vezes”) e orações temporais (como “Quando cheguei, me assustei” ou “Me

assustei ao chegar”). Nosso circunstancial temporal/aspectual corresponde apenas às

locuções adverbiais de tempo e aspecto, com ou sem preposição explícita.

A partir de uma análise empírica, levantamos as seguintes possibilidades de

ordenação para dar conta das diversas posições dos circunstanciais nas duas línguas:

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Ordenação da locução em relação ao verbo:

Locução adverbial + Verbo (AdvV)

X + Locução adverbial + Verbo (XAdvV)

Locução adverbial + X + Verbo (AdvXV)

X + Locução adverbial + X + Verbo (XAdvXV)

Verbo + X + Locução adverbial (VXAdv)

Verbo + Locução adverbial + X (VAdvX)

Verbo + Locução adverbial (VAdv)

Verbo + X + Locução adverbial + X (VXAdvX)

Verbo auxiliar + Locução adverbial + Verbo Principal (AuxAdvV)

Em alguns momentos da análise, foi necessário fazer um amálgama dessas

posições da seguinte forma:

Margem esquerda (ME)

Margem direita (MD)

Pré-verbais mediais (juntando as posições XAdvV, XAdvXV e AuxAdvV)

Pós-verbais mediais (juntando as posições VAdvX, VXAdvX)

Analisamos o uso destas diferentes possibilidades de ordenação na escrita

jornalística das duas línguas de acordo com diversas propriedades45 estruturais,

semânticas e discursivo-funcionais, listadas:

1- Valor do elemento X

45 Cada um será analisado, explicado e exemplificado no capítulo de análise (capítulo 5)

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Posições pré-verbais:

Com apenas um X: sujeito; outro adverbial; outra função

Com dois X: sujeito + outro adverbial; outro adverbial + sujeito

Posições pós-verbais:

Com apenas um X: sujeito; complemento verbal; agente da passiva; outra

função; sujeito com complemento verbal

Com dois X: sujeito + agente; agente + sujeito; sujeito + complemento;

complemento + sujeito; sujeito + outras funções; outras

funções + sujeito; complemento + outras funções; outras

funções + complemento; sujeito e complemento + outras

funções; outras funções + sujeito e complemento; outras

funções + outras funções; complemento + complemento.

2- Tipo de verbo

Verbo de Ligação

Verbo Transitivo

Verbo Intransitivo

3- Representação do sujeito

Sujeito expresso, representado por um sintagma

Sujeito oculto

Sujeito representado pelo pronome relativo

Sujeito indeterminado

Sujeito oracional

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Oração sem sujeito

4- Posição do Sujeito

Sujeito + Verbo (SV)

Verbo + Sujeito (VS)

5- Estrutura da Locução

Sintagma nominal (SN)

Sintagma preposicional (SPrep)

6- Tamanho da Locução

Pequeno – 2 e 3 palavras

Médio – 4 e 5 palavras

Grande – 6 palavras em diante.

7- Semântica da Locução

Localizadora

Delimitativa

Durativa

Reiterativa

Simultânea

8- Função Discursiva

Circunstanciador temporal

Anafórica

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Introdução de Subtópico

Sequência Temporal

Mista

9- Gênero Textual

Notícia

Editorial

No capítulo a seguir, veremos a análise e os resultados obtidos. Primeiramente,

organizamos as possíveis ordenações do circunstancial (fator 1), fizemos uma descrição

de elementos intervenientes entre ele, o verbo e as margens da oração (fator 2) e depois

um amálgama de posições para visualizarmos a questão das margens (fator 3). Em uma

nova seção, fizemos um cruzamento dessas ordens com fatores estruturais (fatores 4, 5,

6, 7 e 8), semânticos (fator 9) e discursivo-pragmáticos (fatores 10 e 11).

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5. ANÁLISE DOS DADOS

Este capítulo apresenta a análise dos circunstanciais46 temporais e aspectuais do

português e do francês, encontrados nos 160 textos jornalísticos que compõem a

amostra (conforme exposto no capítulo 3). Analisaremos todos os 1243 dados – 574 do

português e 669 do francês – quantitativa e qualitativamente, à luz dos pressupostos do

funcionalismo norte-americano.

Na primeira seção, apresentaremos (a) uma descrição das posições que os

circunstanciais podem assumir nas orações, com exemplos em cada uma das línguas; (b)

um detalhamento dos elementos que, em algumas posições, são intervenientes ao

circunstancial e ao verbo; e, posteriormente, (c) um amálgama dessas ordenações para

examinarmos com maior precisão47, as margens da oração em que o circunstancial se

encontra.

Na seção seguinte, apresentaremos e cruzaremos com a posição os fatores

discursivos e sintáticos considerados relevantes para a motivação das posições

assumidas pelos circunstanciais na sentença, para que tenhamos uma análise mais

completa dos seus usos.

Ressalto que a seção 5.1 é mais descritiva, para darmos detalhamente as

possibilidades de ordenação das locuções; e a seção 5.2 é mais explicativa, no sentido

de apresentar uma série de parâmetros que precisam ser levados em consideração para

compreensão das escolhas feitas pelos escritos em ambas as línguas com relação à

posição das locuções adverbiais temporais.

46 Estamos utilizando os termos “circunstanciais temporais e aspectuais” e “locuções adverbiais

temporais e aspectuais” para designar a classe de locuções adverbiais de tempo (como estrutura de

sintagma preposicional ou nominal) que funciona como os circunstanciais temporais e aspectuais de mais

de uma palavra. 47 Em alguns casos na seção posterior

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5.1. Ordem da Locução em Relação ao verbo

Analisamos todos os dados, tanto do francês quanto do português, segundo a

posição do circunstancial em relação ao verbo da oração na qual a locução adverbial se

localizava. Como já exposto, encontramos 574 dados válidos para a análise do

português e 669 para a do francês. A princípio, estabelecemos as seguintes

possibilidades para o posicionamento desses 1243 circunstanciais:

a- Locução adverbial + Verbo (AdvV) 48

(1) [Nesta campanha, tem ficado translúcida a tendência visceral do PT à hegemonia

política] [editorial 05 – O Globo novo]

(2) S'il a rappelé l'opposition de l'Eglise au mariage gay, en prenant soin de ne pas y

insister, il n'a porté aucune condamnation morale des homosexuels, se distinguant de

Benoît XVI, |qui, en 2005, verrouillait les portes des séminaires aux hommes présentant

des "tendances homosexuelles"|. [editorial 03 – Le Monde]

Nesta primeira possibilidade de posição da locução na margem esquerda da

oração, encontramos 29 dados no português (5% do total de 574) e apenas 6 dados no

francês (1% do total de 669 ).

48Cabe aqui ressaltar que a posição do circunstancial foi considerada sempre apenas em relação ao verbo

e à oração à qual ele pertencia. Dessa forma, o circunstancial está na posição inicial (posteriormente essa

posição será uma das incluídas no que chamaremos Margem Esquerda), quando estiver iniciando uma

oração e não apenas o período. Por esse motivo e por uma questão metodológica, nas sentenças em que o

circunstancial está iniciando a oração, mas vem precedido por uma conjunção, pronome relativo ou

qualquer outro elemento conector – como o pronome relativo qui do exemplo (02), – consideramos este

circunstancial na posição inicial da oração, já que ele não poderia vir antes de tal elemento.

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b- X + Locução adverbial + Verbo (XAdvV)

(3) |A Constituição brasileira, depois das reformas estruturais aprovadas pelo

Congresso no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, passou a permitir |

que qualquer empresa, independentemente da origem de capital, explore a cabotagem,

desde que se instale no país e utilize navios de bandeira nacional. [editorial 12 – O

Globo novo]

(4) L'équipée sauvage de Mohamed Merah, en 2012, aurait dû être le signal d'un

nouveau et durable danger.49 [editorial 07 - Le Figaro]

Nos exemplos (3) e (4), o circunstancial aparece em posição pré-verbal, mas não

está na margem, pois há um elemento X iniciando a oração. No corpus analisado, 9

locuções no português preencheram essa posição (1,5%) e, no francês, 11 locuções (os

mesmos 1,5% do total).

O elemento X50, nessas possibilidades de ordenações, se mostra importante para

conseguirmos observar a posição do circunstancial apenas em relação ao verbo.

Sabemos que é importante descrever qual elemento se coloca ao circunstancial e ao

verbo, no entanto, esse detalhamento do valor do X será visto apenas posteriormente,

nesta seção. Aqui, o importante é destacar que o circunstancial temporal está em

posição medial e pré-verbal na oração.

49 A equipe selvagem de Mohamed Merah, em 2012, deveria ter sido um sinal de nova e duradoura.

ameaça.| 50 Consideramos como X qualquer elemento que não seja o circunstancial em análise ou o verbo da

oração. Nesse momento da análise, desconsideramos se nessa posição haveria mais de uma função como

um X. Dessa forma, o X pode equivaler a um único sintagma ou a mais de um.

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c- Locução adverbial + X + Verbo (AdvXV)

(5) No passado, já culpou a “elite colombiana” pelo conflito armado. [notícia 05 –

Folha de São Paulo nova]

(6) |Jusqu’à présent, le FMI n’était pas concerné par le deuxième plan d’aide de 130

milliards d’euros| décidé dans la nuit du 26 au 27 octobre par La seule zone euro lors

d’um sommet extraordinaire à Bruxelles.51 [notícia 03 – Le Monde]

A posição AdvXV é outra possibilidade de preenchimento da margem esquerda

pelo circunstancial analisado. Nesse caso, a locução adverbial inicia a oração, mas não

está imediatamente antes do verbo, já que há um elemento X entre a locução e a forma

verbal. No exemplo (5), um advérbio simples – já – é o elemento X inserido entre a

locução e o verbo, por outro lado, em (6), o elemento interveniente é o sujeito da oração

– le FMI52 – e o advérbio de negação – n’. Essa segunda forma de preenchimento da

margem esquerda pela locução foi mais produtiva que a anterior, pois, dos 574 dados do

português, 110 apareceram nessa posição (19%) e, em francês, 187 dos 669 dados

(28%) preencheram a margem esquerda e tiveram um elemento X antes da forma

verbal. Em francês, essa foi a ordenação com a maior quantidade de dados.

51 Até agora, o FMI não tinha sido afetado pelo segundo plano de ajuda de 130 bilhões de euros |

decidido na noite de 26 a 27 de Outubro pela única zona euro por ocasião de uma cimeira extraordinária

em Bruxelas. 52 Cabe ressaltar que a análise da natureza do elemento X será vista mais adiante, nesta seção.

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d- X + Locução adverbial + X + Verbo (XAdvXV)

(7) Nunca se poderia profetizar, em sã consciência, |que, em um comício da CUT,

braço sindical do partido, no Dia do Trabalho, lideranças petistas seriam variadas| e

impedidas de falar. [editorial 13 – O Globo novo].

(8) Dès 2009, juste après son élection, le président démocrate avait érigé la lutte contre

le réchauffement au premier rang de ses priorités.53 [editorial 19 – Le Monde]

Nesta última posição pré-verbal, verificamos o circunstancial temporal entre

dois elementos X antes da forma verbal. Em francês, a sua produtividade foi um pouco

maior em relação ao português: tivemos 24 locuções em francês (4% de 669 dados) e 11

em português (2% dos 574 dados). Nos dois exemplos (7) e (8), os elementos

intervenientes foram um circunstancial e o sujeito.

e- Verbo + X + Locução adverbial (VXAdv)

(9) “Estamos diante de um problema moral”, disse o número dois da Casa Branca

durante a Presidência de Bill Clinton (1992-2000) [mundo 14 – O Globo]

(10) Les Frères musulmans, |qui avaient récupéré la révolution après la chute du

président Moubarak| et, seule force politique organisée, gagné les premières élections

démocratiques, ont fait, en un an, la preuve de leur incapacité à gouverner. [editorial

14 – Le Monde]

53 A partir de 2009, logo após a sua eleição, o presidente democrata tinha erguido a luta contra o

aquecimento global na vanguarda das suas prioridades.

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Aqui, a locução adverbial aparece na margem direita da oração, ou seja, no final

da oração, com um elemento X entre ela e a forma verbal. Na tabela (5.1), percebemos

que, no português, essa foi a ordenação predominante pelas locuções, com 184 dados

(32%). Já em francês, essa foi a segunda ordem mais produtiva, com 142 locuções do

total de 669 dados (21%). No exemplo (9), a locução está posicionado após o sujeito

posposto, em uma estrutura muito comum nos textos jornalísticos, a com verbos dicendi

(de elocução). Em tais construções, o complemento do verbo vem em posição inicial,

seguido do verbo, do sujeito posposto e só depois aparece a locução adverbial. Já no

exemplo (10), a estruturação sintática da oração foi a mais prototípica, com o

complemento verbal – la révolution – vindo após o verbo, seguidos da locução

adverbial temporal analisada.

f- Verbo + Locução adverbial + X (VAdvX)54

(11) os executivos |que se reunirão na próxima semana na estação de esqui suíça de

Davos para o encontro do Fórum Econômico Mundial| se beneficiaram de uma

"bonança no estilo (David) Beckham". [editorial 11 – O Globo]

(12) [...]le président du MoDem a reconquis, en un peu plus d’un mois, une partie de

ses électeurs de 2007.55 [notícia 2 – Le Monde]

Nessa posição, o circunstancial ocorre imediatamente após o verbo, mas não está

na margem direita, já que há um elemento X finalizando a oração. Em português, 91

54 Cabe ressaltar que esse elemento X pode conter mais de uma função. 55 [...] presidente do MoDem reconquistou, em pouco mais de um mês, parte de seus eleitores de 2007.

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dados (16%) apareceram nessa posição, sendo, portanto, a segunda na preferência de

ordenação das locuções. Como podemos observar no exemplo (11), logo após a locução

temporal analisada, há um circunstancial locativo como elemento X. Em francês, 125

locuções (18,5%) apresentaram-se logo após o verbo com um elemento X

posteriormente. Em (12), vemos a presença do circunstancial temporal quebrando a

integração esperada entre a forma verbal – a reconquis – e seu complemento verbal -

une partie de ses électeurs de 2007.

g- Verbo + Locução adverbial (VAdv)

(13) As eleições indiretas,| que devem ocorrer entre 15 de setembro e 15 de outubro,|

significam um dilema. (notícia 16 – Folha de São Paulo)

(14) Depuis son entrée en campagne le 7 décembre, sa progression l’a meme fait

atteindre un niveau d’intentions de vote légèrement supérieur à celui |qu’il avait en

2007|.56 [notícia 2 – Le Monde]

Esta é a segunda possibilidade de ocorrência da locução adverbial na margem

direita da oração. Aqui, ela se posiciona imediatamente após o verbo e finaliza a oração.

No português, 89 locuções apareceram nessa posição (11,7% do total de 574

ocorrências); em francês, 103 dados (5,9% de 669) ordenaram-se logo após o verbo e

finalizaram a oração. Cabe relembrar que consideramos o final da oração em que a

locução se encontra e não o período inteiro. Por essa razão, o exemplo (13) seria um

56 Desde sua entrada na campanha em 7 de dezembro, seu progresso o fez até atingir um nível de

intenções de voto ligeiramente superior ao que | ele tinha em 2007. |

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caso de margem direita da oração na qual se localiza, mesmo ocorrendo entre uma outra

oração.

h- Verbo + X + Locução adverbial + X (VXAdvX)

(15) |Scorsese|, que nunca ganhou um Oscar, apesar de ter sido indicado cinco vezes, |é

o favorito nesta temporada de prêmios em Hollywood| [editorial 13 – O Globo]

(16) Une réputation qui avait fini d’être entamée par la collision de deux TGV |qui

avait fait 40 morts le 23 juillet 2011 près de Wenzhou, dans l’est du pays, quelques

mois à peine après le limogeage de Liu Zhijun.|57 [notícia 01 – Le Figaro]

Em posição pós-verbal, o circunstancial temporal ainda pode vir entre dois

elementos X, um entre o verbo e a locução e o outro finalizando a oração. Nessa

ordenação, foram encontrados 50 dados em português (8,5%) e 61 em francês (9%). O

circunstancial analisado apareceu, no exemplo em (15), entre o predicativo do sujeito –

o favorito – e uma locução adverbial de lugar – em Hollywood. Entretanto, no exemplo

da língua francesa, em (16), a locução temporal surge após o complemento verbal – 40

morts – e o circunstancial locativo – près de Wenzhou.

i- Verbo auxiliar + Locução adverbial + Verbo Principal (AuxAdvV)

(17) Embora |a política de segurança| para combater a influência do crime organizado

em comunidades conflagradas no Rio |tenha, de imediato, logrado | reduzir a níveis

57 Uma reputação que tinha acabado de ser iniciada pela colisão de dois TGVs | que tinha causado 40

mortes em 23 julho de 2011 perto de Wenzhou, no leste do país, apenas alguns meses após a demissão de

Liu Zhijun.

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palatáveis os indicadores de criminalidade nas localidades retomadas pelo Estado,

seria ingenuidade atribuir às UPPs os poderes de uma panaceia. [editorial 11 – O

Globo novo]

(18) Ceux-ci ont, entre 2010 et 2011, augmenté de 12,3% (+10,0% entre 2009 et

2010).58 [notícia 5]

Em 11 casos, o circunstancial apareceu inserido em uma locução verbal. Em

francês, houve 10 ocorrências (1,5 % do total) dessa estrutura. Por outro lado, no

português, foi encontrado apenas um dado (0,5% do total) em todo o corpus analisado.

Isso se explica pelo fato de que, para alguns advérbios, esta é uma posição obrigatória,

no caso de perífrase verbal. Posteriormente, ao apresentarmos o amálgama das

ordenações para algumas análises, esta posição será considerada como uma pré-verbal,

já que a locução adverbial aparece imediatamente antes do verbo predicador da locução

verbal.

A tabela (5.1), a seguir, mostra a quantidade de dados de cada uma das posições

em um comparativo das duas línguas em estudo. :

58 Estes, entre 2010 e 2011, aumentaram em 12,3% (+ 10,0% entre 2009 e 2010)

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Tabela (5.1): Ordenações das locuções

Português Francês

nº % nº %

Pré

-Ver

ba

is AdvV 29 5 6 1

XAdvV 9 1,5 11 1,5

AdvXV 110 19 187 28

XAdvXV 11 2 24 4 P

ós-

ver

ba

is

VXAdv 184 32 142 21

VAdvX 91 16 125 18,5

VAdv 89 15,5 103 15,5

VXAdvX 50 8,5 61 9

AuxAdvV 1 0,5 10 1,5

Total 574 100 669 100

Uma diferença já pode ser notada a partir desta tabela 5.1 no que diz respeito aos

dados das posições dos circunstanciais no português e no francês. No português,

verificamos que a maior quantidade de circunstanciais temporais foi usada na margem

direita da oração com um elemento X entre ela e a forma verbal – 184 locuções, num

total de 574, o que equivale a 32%. Observamos, ainda, que houve uma diferença de 13

pontos percentuais entre essa posição e a segunda ordenação com maior quantidade de

dados no português, a posição pré-verbal AdvXV (19% do total). Tal ordenação foi a

predominante nos textos jornalísticos franceses, ocorrendo em 28% dos dados (187

casos do total de 669).

Em linhas gerais, a tabela mostra uma inversão entre a primeira e a segunda

posição entre o português e o francês, já que 142 locuções francesas (21%) se

posicionaram na margem direita e afastadas do verbo (ordenação VXAdv, a

predominante nos textos brasileiros). Embora a diferença em francês não tenha sido na

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mesma proporção que a observada em português, percebe-se uma tendência da língua

francesa ao posicionamento do circunstancial temporal para a margem da oração.

Nas demais posições, não houve uma diferença muito significativa entre as duas

línguas analisadas. A posição medial e pós-verbal imediatamente após o verbo

(VAdvX) apareceu em terceiro na preferência das locuções tanto em português, com 91

dados (16%), quanto em francês, com 125 ocorrências (18,5%). Esse elemento X se

apresentou, em muitos casos, como um complemento verbal, o que nos traz um

resultado interessante, que abordaremos posteriormente.

Em seguida, obtivemos, com exatamente a mesma porcentagem no português e

no francês, 15,5% dos circunstanciais em margem direita colados ao verbo (VAdv).

Imediatamente após, com apenas 5 pontos percentuais de diferença entre as duas

línguas, surgem os dados na posição VXAdvX – 8,5% em português (50 dados) e 9%

em francês (61 dados).

As quatro posições menos produtivas nas duas línguas foram pré-verbais –

AdvV, XAdvXV, XAdvV, AuxAdvV. A posição do circunstancial na margem esquerda

imediatamente antes do verbo (AdvV), em português, representa 5% dos dados (29 do

total de 574) e, em francês, essa mesma posição apareceu como a de menor

produtividade, com apenas 1% (6 ocorrências no total de 669). Esses resultados

aparecem em função da restrição sintática do francês a essa ordenação (AdvV) – a

obrigatoriedade de argumento externo explícito nessa língua – além de, em português,

ainda mantermos uma considerável frequência de sujeitos nulos (cf., entre outros,

Duarte 1993, 1995).

Ao compararmos os resultados obtidos nas duas línguas, verificamos, no

português, uma tendência das locuções, a princípio, à posposição em relação ao verbo.

Contudo, em francês, esse circunstancial se mostra mais produtivo antepondo-se a ele,

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em posição de margem esquerda com um elemento X entre a locução adverbial e o

verbo (AdvXV). Poderíamos, com isso, já sinalizar a relação desse resultado com nossa

hipótese de que a recorrência de Spreps adverbiais na margem esquerda da oração não

pode ser explicada unicamente em termos sintáticos (preenchimento de uma posição

vazia), pois, no francês, o preenchimento do sujeito é obrigatório e, mesmo assim, o

circunstancial tende a aparecer no início.

Para darmos conta desse elemento X interveniente entre o circunstancial e o

verbo ou presente nas margens esquerda e direita da oração, identificamos as seguintes

situações:

Posições com apenas um X

Em posições pré-verbais XAdvV e AdvXV

o sujeito

(19) Em outubro de 2002, [Berlusconi] cometeu uma gafe com Cacciari. [editorial 2 –

O Globo]

o outro adverbial

(20) No passado, [já] culpou a elite colombiana pelo conflito armado [notícia 5 – Folha

de São Paulo]

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o outra função59

(21) Lors du renversement du régime Moubarak, ["nous avions dit que le changement

ne serait ni facile ni rapide, et qu'il devait s'accompagner d'une série de principes : la

non-violence, le respect des droits universels et la poursuite d'un processus

démocratique de transition"], a rappelé le président américain.60 [notícia 7 – Le

Monde]

(22) Desde 2003, [porém], existe a pressão para contar com os membros da seita.

[notícia 15 – Folha de São Paulo]

Em posições pós-verbais VXAdv e VAdvX

o sujeito

(23) De acordo com a boliviana Felcn (Força Especial de Luta Contra o Narcotráfico),

foram apreendidas no primeiro semestre [382 toneladas de droga -a maior parte

maconha] [notícia 14 – Folha de São Paulo]

(24) Âgé de 73 ans, Ezzat Ibrahim al-Douri, numéro deux sous la dictature bassiste, a

été tué lors d'une opération militaire d'envergure, a annoncé ce vendredi [le

59 Consideramos aqui como outra função qualquer elemento que não fosse o sujeito ou outro adverbial,

como uma outra oração, um aposto, uma conjunção deslocada. Cabe destacar que não foram encontrados

dados, no português brasileiro, em que esse elemento X em posição pré-verbal fosse um complemento do

verbo e, em francês, o único caso foi o do exemplo (21). Nosso objetivo com essa análise era destacar,

principalmente, a relação do sujeito com o circunstancial destacado. 60 No momento da queda do regime de Mubarak, ["nós tínhamos dito que a mudança não seria nem

fácil nem rápida, e que ela devia ser acompanhada por uma série de princípios: a não-violência, o respeito

pelos direitos universais e a busca por um processo democrático de transição "], lembrou o presidente dos

EUA.

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gouverneur de la province de Salaheddine] à la chaîne de télévision Al Arabya, qui a

diffusé la photo d'un corps ressemblant à celui d'Al-Douri.61 [notícia 26 – Le Fígaro]

o complemento verbal

(25) A Casa Branca repudiou nesta quinta-feira [as ameaças do aiatolá Ali Khamenei.]

[notícia 1 – O Globo]

(26) La BCE tient [sa réunion mensuelle] jeudi 3 avril62. [editorial 24- Le Monde]

o agente da passiva

(27) Shetty é famosa na Índia, especialmente por suas danças sensuais, mas sua

carreira vem sendo ofuscada desde o ano passado [por uma nova geração de estrelas.]

[editorial 10 – O Globo]

(28) Surtout quand une longue habitude du fait du prince a été complétée, depuis plus

d'un siècle, [par un solide usage des privilèges républicains.]63 [editorial 20 – Le

Monde]

61 Com 73 anos, Ezzat Ibrahim al-Douri, número dois sob a ditadura bassista, foi morto durante uma

grande operação militar, anunciou nesta sexta-feira [o governador da província de Salaheddin] no canal

de televisão Al Arabya, que transmitiu uma foto de um corpo semelhante ao de al-Douri. 62 O BCE realiza [sua reunião mensal] quinta - feira, 3 de abril. 63 Especialmente quando um longo costume do ato do príncipe foi concluído, há mais de um século, [por

um forte uso dos privilégios republicanos.]

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o sujeito / complemento verbal em um mesmo constituinte X

(29) Ele encarna perfeitamente bem este machismo italiano insuportável", declarou

nesta quinta-feira [à AFP] [Valeria Ajovalasit, presidente da Arcidonna, principal

associação de defesa dos direitos das mulheres.] [editorial 2 – O Globo]

o outra função64

(30) Cerca de R$ 250 milhões caíram [nesse sorvedouro só] nos três primeiros meses

do ano. [editorial 8 novo – Folha de São Paulo]

(31) L'épave est «étonnamment intacte» pour un bâtiment ayant passé plus de 60 ans

[sous l'eau.].65 [notícia 25 – Le Figaro]

As tabelas (5.2), do português, e (5.3), do francês, elencam todas as

possibilidades, juntamente com o número de ocorrências para cada valor de X:

64 Consideramos aqui como outra função elementos como outra oração, um aposto, um predicativo, ou

ainda outro adverbial, pois consideramos essencial para nossa análise principalmente a relação entre o

verbo, seu complemento interno, o sujeito e o agente da passiva (para dar conta das orações passivas). As

demais funções foram reunidas para sintetizarmos mais a visualização. 65 O destroço está "surpreendentemente intacto" para uma construção tendo passado mais de 60 anos [sob

a água]

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Tabela (5.2)66: Ordenações com apenas um X no português

Posições pré-verbais Posições pós-verbais

XAdvV AdvXV VXAdv VAdvX Total P

ré Sujeito N 7 97 - - 104

Adverbial N 1 7 - - 8

Outra função N 1 6 - - 7

Pós

Sujeito N - - 6 10 16

Complemento verbal N - - 99 44 143

Agente da passiva N - - 4 4 8

Outra função N - - 74 31 105

Sujeito + C.Verbal N - - 1 2 3

Total N 9 110 184 91 394

A tabela 5.2 permite verificar que em 97 dos casos, é o sujeito que se mostra

mais produtivo como X, na estrutura AdvV. Além disto, X corresponde a um

constituinte sujeito em 7 casos em que X inicia a oração (XAdvV). Ou seja, nas 119

ocorrências das locuções adverbiais temporais em posição pré-verbal com algum X

(XAdvV e AdvXV), o sujeito aparece em 104 casos (87,5% do total).

Esta tabela fornece outras evidências de que a ordenação da locução adverbial na

margem esquerda da oração não ocorre por questões sintáticas, conforme proposto por

alguns trabalhos. (Kato & Duarte 2003, Spanó, 2008, Henriques, 2013). Segundo

hipótese Kato e Duarte (2003), o adverbial se colocaria na posição inicial quando o

sujeito estivesse oculto, ou fora de sua posição, para que tal espaço não fosse deixado

vazio. Os resultados mostram que, quase na sua totalidade (97 casos), o constituinte (X)

que aparece em AdvXV é um constituinte sujeito, ou seja, o circunstancial está na

posição inicial da oração mesmo com a presença do sujeito antes do verbo (tal

constatação ficará mais claramente exposta através dos fatores analisados na seção

5.2.1.3.

Nas posições pós-verbais (VXAdv e VAdvX), em 16 casos o elemento X

corresponde a um constituinte sujeito. Em português, verificamos que, desses 16 casos,

66 Nesta tabela e na subsequente, preferimos deixar apenas o quantitativo de dados em X, sem o

percentual, para facilitar a percepção das tendências, já que essas tabelas constituem muitas

possibilidades.

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exatamente metade era constituída de estruturas na voz passiva (7 na voz passiva

analítica e 1 na voz passiva sintética) e a outra metade era de estruturas com verbos de

elocução, presentes maciçamente no gênero notícia, como nos exemplos:

(32) É nesse cenário distante da Primavera Árabe de 2011 que será realizada no fim

deste mês [nova eleição presidencial] [editorial 6 novo – Folha de São Paulo]

(33) O volume de negócios aumentou levemente em 0,6%, a 56,594 bilhões de euros em

2006, contra 56,267 bilhões no ano anterior, informou [um comunicado do grupo]

nesta quarta-feira [notícia 13 – O Globo]

Em (32), temos um exemplo de um circunstancial posicionado logo após a forma

verbal na voz passiva analítica. O elemento X, sujeito, realiza-se na margem direita –

nova eleição presidencial – na posição VAdvX. Desses casos, em apenas um a locução

é posicionada no final da oração, com o sujeito (X) posposto ao verbo (VXAdv).

Já em (33), verificamos uma estrutura que nos parece cristalizada para esse tipo

de construção: a com verbos de elocução. Nessas orações, o complemento do verbo

aparece no início da oração, constituindo a informação dada pelo verbo dicendi no caso

do exemplo (33), O volume de negócios aumentou levemente em 0,6%, a 56,594 bilhões

de euros em 2006, contra 56,267 bilhões no ano anterior. O sujeito – um comunicado

do grupo –, então, pospõe-se ao verbo, seguido do circunstancial temporal analisado.

Cabe destacar que, em português, os dados não nos mostraram uma forte tendência com

relação à possibilidade de o sujeito vir colocado após o verbo (VXAdv) ou vir na

margem direita da oração (VAdvX) – como o elemento X –, pois, dos nossos 8 casos

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desse tipo, 4 tiveram a locução colada ao verbo e, em 4, a locução veio na margem

direita.

No que concerne aos complementos verbais, confirmaram-se as nossas

expectativas: dos 143 casos em que eles se apresentaram como elemento X, 99 se

mantêm adjacentes ao verbo e a locução adverbial se situa na margem direita da oração.

Confirma-se, assim, o Subprincípio da Integração, proposto por Givón (1990), que

prevê a proximidade entre o verbo e seus argumentos. Observemos o exemplo (34):

(34) Essa conta apresentou [déficit de US$ 717 milhões] no mês de julho. [editorial 9 –

Folha de São Paulo]

No entanto, dados como os do exemplo (35) em seguida em que a locução se fica

adjacente ao verbo são possíveis, embora quebrem a integração entre o verbo e o seu

complemento.

(35) O ministro da saúde, José Gomes Temporão, anunciou na semana passada [uma

verba suplementar de R$ 2 bilhões] para o setor. [editorial 2 – Folha de São Paulo]

No exemplo, o circunstancial temporal na semana passada aparece

imediatamente após a forma verbal – anunciou –, seguidos, só então, pelo objeto direto

uma verba suplementar de R$ 2 bilhões para o setor. No entanto, casos deste tipo são

bem mais raros, com um total de 44 ocorrências.

Ainda com relação às posições pós-verbais, juntamos em “outras funções”

elementos como um predicativo, outro adverbial, ou qualquer outro elemento que não

fosse sujeito, complemento verbal e agente da passiva. Nesse conjunto, há maior

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recorrência de dados em que X é outro circunstancial, como no exemplo (36), em que a

locução adverbial analisada (nesta semana) ocorre logo após um X com valor de

circunstancial locativo (ao Brasil).

(36) O medicamento chegou [ao Brasil] nesta semana. [notícia 13 nova – Folha de São

Paulo]

Um dos 17 casos particulares em que o X não era um adverbial aparece no

exemplo (37):

(37) Pelas normas vigentes, o mandato de Musharraf é [válido] até o final deste ano.

[notícia 8 – Folha de São Paulo]

Em (37), o circunstancial temporal até o final deste ano aparece na margem

direita, seguindo um predicativo do sujeito - válido. É importante destacar que todos os

casos, nos jornais brasileiros, em que X corresponde a um predicativo do sujeito a

locução adverbial temporal se pospõe a ele.67

Por fim, os 3 dados em que X corresponde a dois constituintes (um constituinte

sujeito e um complemento) são de frases com verbo dicendi, como no exemplo (38):

(38) "Uma oferta de 40 Rafales será apresentada ao governo indiano nos próximos

dias", declarou nesta quarta-feira [à AFP] [Yves Robins, diretor de comunicação do

construtor aeronáutico francês]. [notícia 6 – O Globo]

67 Essa configuração será melhor explorada na página 127.

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Em seguida, na tabela (5.3), a distribuição para os valores dos elementos

intervenientes entre o circunstancial temporal e aspectual e o verbo nos dados do

francês:

Tabela (5.3)68: Ordenações com apenas um X no francês

Posições pré-verbais Posições pós-verbais

XAdvV AdvXV VXAdv VAdvX

Total

Pré

Sujeito N 11 186 - - 197

Adverbial N 0 0 - -

Outra função N 0 1 - - 1

Pós

Sujeito N - - 11 12 23

Complemento verbal N - - 93 60 153

Agente da passiva N - - 0 2 2

Outra função N - - 37 51 88

Sujeito + C.V. N - - 1 0 1

Total N 11 187 142 125 465

Em francês, encontramos uma grande quantidade de ocorrências em posição

inicial antecedendo o sujeito expresso. Dos 187 dados em posição AdvXV, o elemento

X era o sujeito da oração em 186 casos. Além disso, dos 11 dados em posição pré-

verbal e não inicial, imediatamente antes do verbo (XAdvV), em todos o circunstancial

temporal estava entre o sujeito e a forma verbal, ou seja, o elemento X era o sujeito da

oração. Vejamos os exemplos (39) e (40):

(39) Avant même les morts de lundi, [l’armée] a entrepris d’emprisonner les

dirigeants des Frères.69 [editorial 11 – Le Monde]

68 Nesta tabela, assim como a anterior, preferimos deixar apenas o quantitativo de dados em X, sem o

percentual, para facilitar a percepção das tendências, já que essas tabelas constituem muitas

possibilidades. 69 Antes mesmo das mortes de segunda-feira, [as forças armadas] começou a prender os líderes da

irmandade.

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(40) [La précédente expérience du pouvoir des généraux égyptien], après la chute de

Moubarak jusqu’à l’investiture de M. Morsi, avait été calamiteuse.70 [editorial 14 – Le

Monde]

No exemplo (39), a locução adverbial Avant même les morts de lundi posiciona-

se no início absoluto da oração, mesmo com o sujeito – l’armée – estando presente em

sua posição prototípica, ou seja, antes da forma verbal – a entrepris. Voltaremos a tratar

da questão do uso de locuções e a presença ou ausência de sujeito na seção 5.2.

Em (40), percebemos uma construção pouco esperada, já que o circunstancial

temporal – après la chute de Moubarak jusqu’à l’investiture de M. Morsi – aparece

entre a forma verbal - avait été – e o sujeito – La precedente expérience du pouvoir des

généraux égyptien.

Ainda com relação às posições pré-verbais em francês, não foram encontrados

dados de outros adverbiais como um elemento X e em apenas um caso (exemplo 41) o

complemento verbal foi o termo interveniente entre o circunstancial e o verbo.

(41) Lors du renversement du régime Moubarak, ["nous avions dit que le changement

ne serait ni facile ni rapide, et qu'il devait s'accompagner d'une série de principes : la

non-violence, le respect des droits universels et la poursuite d'un processus

70 [A experiência anterior do poder dos generais egípcios], após a queda de Mubarak até a posse do Sr.

Morsi, tinha sido calamitosa.

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démocratique de transition"], a rappelé le président américain..71 [notícia 7 – Le

Monde]

No exemplo (4), o circunstancial temporal ocorre na margem esquerda da

oração, posição predominante das locuções em francês, no entanto, o elemento

interveniente entre ele e o verbo não é o sujeito, como na maior parte dos casos e, sim, o

complemento verbal. Cabe perceber que a estrutura em que isso ocorre é a com verbo

dicendi, ou seja, com o verbo de elocução, que nos traz uma estrutura quase

cristalizada, com o objeto em posição pré-verbal e o sujeito transferido para a pós-

verbal. Veremos mais adiante que tal construção ocorre de forma maciça em francês,

assim como foi produtiva em português, e que ela ocasionou o posicionamento da

locução adverbial em posição pós-verbal, juntamente com o sujeito. A exceção está no

exemplo (41), em que o objeto direto era de uma grande extensão, assim como o

circunstancial.

Com relação às posições pós-verbais, praticamente as mesmas tendências do

português foram observadas. Nas ordenações VXAdv e VAdvX, o elemento X

corresponde a um constituinte com função de sujeito em 23 casos, divididos nas duas

posições. Vejamos os exemplos:

(42) La société Canadian Pacific Railway (CP) va faire appel de la mise en demeure du

gouvernement du Québec de payer pour le nettoyage et la décontamination du site de

71 Durante a queda do regime de Mubarak, ["nós tínhamos dito que a mudança não seria nem fácil

nem rápida, e que deveria ser acompanhada por uma série de princípios: a não violência, o respeito pelos

direitos universais e a busca de um processo democrático de transição"], lembrou o presidente americano.

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Lac Megantic, a indiqué jeudi 15 août [un porte-parole du transporteur ferroviaire].72

[notícia 14 – Le Monde]

(43) Il a appelé le ministère polonais des Affaires étrangères à accorder des visas

gratuits aux Loups de la Nuit, |comme l'avait fait [l'ambassade russe] pour son groupe

pendant 10 ans.73 [notícia 9 – Le Figaro]

Muitos casos de sujeito posposto ao verbo no francês ocorrem devido ao fato de

as construções com verbos dicendi serem praticamente cristalizadas na língua, conforme

ilustrado no exemplo (42). Nesse caso, o sujeito – un porte-parole du transporteur

ferroviaire – aparece como o valor de X em posição pós-verbal, já que o complemento

da forma verbal – a indiqué – se manifesta na forma oracional e é deslocado para o

início da oração – La société Canadian Pacific Railway (CP) va faire appel de la mise

en demeure du gouvernement du Québec de payer pour le nettoyage et la

décontamination du site de Lac Megantic.

Dos 23 dados em francês de X com valor de sujeito na posição pós-verbal,

apenas 5 não possuíam essa estrutura com verbos de elocução. Em português, vimos,

com o exemplo (32), que o valor de X pós-verbal poderia ser de sujeito quando a oração

estivesse na voz passiva. Em francês, o sujeito nessa posição pode encontrar-se na

forma pronominal e imediatamente após o verbo, em alguns casos, devido à construção

prevista nesta língua para uma das possibilidades de interrogativas diretas, tornando-se

um clítico (como estruturas do tipo Que fait-[on] après 2020 ?); ou em outros poucos

72 A Companhia Ferroviária Canadian Pacific (CP) vai recorrer da notificação do Governo do Quebec

para pagar a limpeza e descontaminação do local de Lac Mégantic, indicou quinta-feira 15 de agosto

[um porta-voz da transportadora ferroviária]. 73 Ele chamou o Ministério polonês das Relações Exteriores para conceder vistos gratuitos para aos Lobos

da Noite, | como fizera [a Embaixada da Rússia] para seu grupo por 10 anos.

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casos como o do exemplo (43), em que o sujeito (l'ambassade russe) apresenta-se após

a forma verbal (avait fait) na oração comparativa.

Encontramos, nas orações em que o circunstancial estava após o verbo, 153

casos nos quais o constituinte X era um complemento verbal. Desses, 93 estavam

imediatamente após o verbo, com a locução adverbial finalizando a oração (VXAdv), e

60 com a locução adverbial entre o verbo e seu complemento (VAdvX). Vejamos os

exemplos:

(44) Ce musulman d'origine tchétchène risque la peine capitale pour les attentats |qui

ont fait [3 morts et 264 blessés] le 15 avril 2013,| lorsque deux bombes ont explosé près

de la ligne d'arrivée du marathon de la ville.74 [notícia 28 – Le Figaro]

(45) Le PS va nous offrir pendant quelques semaines [une de ces petites comédies dont

il a le secret].75 [editorial 3 – Le Figaro]

Assim como ocorreu no português, em francês, nos casos em que o

complemento verbal (seja objeto direto ou indireto) estava presente, o circunstancial

temporal ordenou-se preponderantemente após o argumento verbal, como podemos

visualizar em (44).

No entanto, dos 153 casos em que o valor de X era o complemento do verbo na

posição pós-verbal do circunstancial temporal, 60 estavam na posição VAdvX,

conforme observado no exemplo (45). Não esperávamos tal resultado pois em geral há

uma forte ligação entre o verbo e o complemento. Mas podemos ver que o uso

74 Este muçulmano de origem tchetchena corre o risco de ser condenado à pena de morte pelos atentados |

que fizeram [3 mortos e 264 feridos]em 15 de abril de 2013, | quando duas bombas explodiram perto da

linha de chegada da maratona da cidade. 75 O PS vai nos oferecer por algumas semanas [uma destas pequenas comédias de que ele tem o

segredo].

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preponderante é VXAdv, sobretudo quando X é objeto (conferir os resultados da tabela

5.3)

Ainda com relação à função do elemento X nas posições pós-verbais, tivemos,

em francês, apenas 2 casos nos quais o circunstancial temporal estava entre a forma

verbal e um agente da passiva e somente 1 dado em que o elemento X corresponde a

dois constituintes, um na função de sujeiro e outro de complemento verbal. Tais casos

podem ser vistos nos exemplos (46) e (47):

(46) En ce 7 décembre 1941, le cuirasser fut touché au petit matin [par quatre torpilles

japonaises] avant de chavirer et de couler avec son équipage.76 [notícia 16 – Le Figaro]

(47) Vous avez l'obligation de réussir", n'a cessé de répéter [François Hollande] [à ses

interlocuteurs tunisiens] tout au long de sa visite d'Etat, jeudi 4 et vendredi 5 juillet.77

[editorial 12 – Le Monde]

Em português, como vimos na tabela (5.2), em 8 casos de X como agente da

passiva, 4 se apresentaram na posição VAdvX e 4 em VXAdv, ou seja, não houve uma

tendência nítida para a posição do circunstancial nessas construções. Já em francês,

poucos foram os casos com o agente da passiva – apenas 2 dados foram encontrados.

No entanto, em ambos, a locução adverbial se colocou entre a perífrase verbal e o

agente da passiva, contrariando a expectativa, já que a integração entre o verbo e seu

agente deveria ser forte. No exemplo (46), vemos a locução adverbial au petit matin

entre a forma verbal – fut touché – e o agente – par quatre torpilles japonaises.

76 Neste 07 de dezembro de 1941, a blindagem foi atingida no início da manhã [por quatro torpedos

japoneses] antes de virar e afundar com sua tripulação. 77 “Vocês tem a obrigação de conseguir”, não parou de repetir [François Hollande] [a seus interlocutores

tunisianos] ao longo de sua visita de Estado, na quinta-feira e sexta-feira 4, 5 de julho.

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No exemplo em (47), percebemos mais uma vez a estrutura com verbos de

elocução, bastante frequente nos textos jornalísticos. Nesse caso, além do objeto direto

oracional posicionado na margem esquerda da oração, um objeto indireto – à ses

interlocuteurs tunisiens – se apresentou após o sujeito posposto – François Hollande. O

circunstancial, nesse caso, não interrompeu a relação entre o verbo e seus argumentos,

ordenando-se, portanto, na margem direita da oração.

Por fim, o que chamamos, na tabela (5.3), de outras funções resumiu-se a outros

circunstanciais (36 ocorrências) e ao predicativo do sujeito (1 ocorrência). Já na posição

VAdvX, tivemos predicativo em 7 dos 51 dados e 44 de outros adverbiais. Observemos

os exemplos (48) e (49):

(48) Qualifié de « journaliste exceptionnel » par Arthur Sulzberger, Dean Baquet est,

au départ, [un reporter autodidacte].78 [notícia 26 – Le Monde]

(49) La 100e édition du Tour de France s’élance [de Corse], samedi 29 juin.79 [editorial

17 – Le Monde]

O exemplo (48) configura o único caso em que o circunstancial temporal se

posiciona entre a forma verbal – est – e o predicativo do sujeito –

un reporter autodidacte. Nessa construção, percebemos uma tentativa de enfatizar o

circunstancial au depart, deslocando-o para uma posição próxima ao verbo. Em todos

os outros dados em que X, em posições pós-verbais, é um predicativo o circunstancial

temporal segue o predicativo, ou seja, na posição final da oração.

78 Qualificado como "excelente jornalista" por Arthur Sulzberger, Dean Baquet é, de início, [um repórter

autodidata]. 79 A 100ª edição do Tour de France é lançada [da Córsega], sábado 29 de junho.

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Os demais 81 dados de constituinte X, incluídos em outras funções,

correspondem a outros adverbiais. No exemplo (49), o circunstancial temporal– samedi

29 juin – segue outro circunstancial – de Corse –, no caso, locativo. Esse resultado foi o

único que difere da tendência do português, mostrada na tabela (5.2). Vimos que, em

português, as outras funções se mostravam mais produtivas na posição mais próxima ao

verbo, com a locução adverbial na margem direita, contudo, em francês, essa ordenação

(VXAdv) teve 37 dados, enquanto a posição medial para a locução (VAdvX) se

mostrou mais produtiva com 51 dados.

Há indicações de que, no francês, no caso de outro circunstancial na mesma

oração, o circunstancial temporal tende a se aproximar do verbo, deslocando esse outro

adverbial para a margem direita 80. É provável que essa tendência tenha relação com a

semântica dos circunstanciais analisados, conforme veremos posteriormente (seção

5.2.2.1). O que aqui cabe ressaltar é que, tanto em português quanto em francês, a

presença maciça de circunstanciais de outras noções semânticas (além dos temporais e

aspectuais analisados), pode motivar a ordenação dos circunstanciais temporais.

Em seguida, podemos verificar de uma forma mais breve a posição do

circunstancial temporal ou aspectual em orações onde ocorrem dois constituintes X.

Posições com mais de um X

Nas tabelas, visualizamos quais elementos intervenientes se tornaram

importantes na construção pré-verbal e pós-verbal do circunstancial temporal nas duas

línguas em análise, quando havia a ocorrência de dois elementos X, ou seja, na posição

XAdvXV (pré-verbal) e VXAdvX (pós-verbal):

80 Cf. Paiva (2007, 2008) e Lessa, 2012, sobre sequenciação de diversos circunstanciais.

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Tabela (5.4)81: Ordenações com dois X Posição pré-verbal Posição pós-verbal

XAdvXV VXAdvX

Português Francês Português Francês

pré

Sujeito + adverbial N 4 9 - -

Adverbial + sujeito N 7 15 - -

pós

Sujeito + outras N - - 2 2

C.V. + outras N - - 19 31

Outras + C.V N - - 2 5

Outras + outras N - - 25 18

CV + CV N - - 2 -

Sujeito/CV + outras N - - - 4

Outras + sujeito/CV N - - - 1

Total N 11 24 50 61

Na análise das orações com dois constituintes X, demos prioridade ao controle

da posição do circunstancial temporal em relação ao sujeito e ao complemento verbal,

ou seja, à questão da quebra, ou não, do fluxo de informação entre o verbo e seus

argumentos interno e externo. Apenas para as posições pré-verbais, consideramos

relevante o outro adverbial por ele estar deslocado de sua posição.

Para as posições pré-verbais, as mesmas tendências de uso foram observadas

para o português e o francês, embora a ordenação (XAdvXV) tenha sido mais produtiva

para o francês (24 dados contra apenas 11 em português). Nessa ordenação, a

configuração que se apresentou na maior parte dos dados, em ambas as línguas, foi a de

primeiro X como locução adverbial e o segundo X como sujeito. O que significa que

dois circunstanciais ficam na margem esquerda da oração.

(50) [Segundo o relatório], entre abril de 2006 e março de 2007, [nenhum crimoso

nazista] foi condenado | e nem mesmo muitas investigações foram iniciadas. [notícia 3

– Folha de São Paulo]

81 Idem à nota 4.

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(51) [De fait], moins de deux jours après sa nomination à Matignon, [son

gouvernement] a été constitué en temps et en heure.82 [editorial 23 – Le Monde]

Em português, dos 11 dados com dois elementos X, 7 foram de outro adverbial

na posição do primeiro X e o sujeito adjacente ao verbo, como no exemplo (50). Nele, o

circunstancial temporal – entre abril de 2006 e março de 2007 – aparece entre um

circunstancial com valor conformativo (segundo o relatório) e o sujeito da oração

(nenhum criminoso nazista).

Essa mesma configuração ocorre no exemplo (51) do francês. Nele, e em 15

dados dos 24 na posição XAdvXV, o circunstancial temporal (no caso, moins de deux

jours après sa nomination à Matignon) se posiciona entre um adverbial de enunciação

– de fait – e o sujeito – son gouvernement.

A segunda possibilidade para a posição pré-verbal foi aquela em que o

circunstancial temporal se situa entre o sujeito que inicia a oração e é seguido por outro

circunstancial. Essa ordenação, em ambas as línguas, foi menos produtiva do que a

anterior, já que os circunstanciais estariam inseridos entre o sujeito e o verbo,

quebrando, assim, o fluxo de informação – o que não seria previsto no Subprincípio da

Integração (cf. cap 3). Vejamos os exemplos em que isso ocorre:

(52) Seriam decisões obviamente impopulares, e [as primeiras movimentações pela

sucessão presidencial], no ano que vem, [só] agravam o dissenso quanto ao que seria

82 [Na verdade], menos de dois dias após a sua nomeação para Matignon, [seu governo] foi constituído

a tempo e na hora.

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preciso fazer para resgatar o país de seus graves desequilíbrios. [editorial 13 – Folha

de São Paulo]

(53) Autant [la répression sanglante des partisans de Morsi], lundi matin [devant le

quartier général de la Garde républicaine], doit donner lieu à une enquete, |autant les

appels islamistes à l’insurrection doivent être condamnés.83 [editorial 25 – Le Monde]

Nos jornais brasileiros, essa estruturação da oração ocorreu com advérbios

pequenos, do tipo só, não e já, na segunda posição para o elemento X. Isso pode ser

visto no exemplo (52), em que o circunstancial analisado (no ano que vem) está entre o

sujeito e o advérbio só. Apenas 4 dados apareceram nessa posição, inseridos entre o

verbo e o sujeito, e com mais um adverbial. No entanto, o segundo elemento X possui

uma massa fônica reduzida, o que não dificulta o fluxo de informação entre o sujeito e o

verbo.

Já em francês, essa configuração se apresentou em 9 casos dos 24 nessa posição.

Destes 9 dados, apenas 2 deles foram encontrados no jornal Le Figaro, essas

construções, com mais inserções, nos parecem mais produtivas em uma linguagem mais

rebuscada, menos direta. No exemplo (53), o circunstancial analisado – lundi matin –

aparece entre o sujeito – la répression sanglante des partisans de Morsi – e outro

circunstancial – devant le quartier général de la Garde républicaine. Cabe perceber,

aqui, que tanto o sujeito quanto o adverbial são elementos X de grande extensão e que o

circunstancial lundi matin é um constutuinte pequeno.

83 Tanto [a repressão sangrenta dos partidários de Morsi] na segunda de manhã [na frente da sede da

Guarda Republicana], deve resultar em uma investigação, | como os apelos islâmicos à insurreição devem

ser condenados.

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Comparando as tabelas (5.3) e (5.4), verificamos que o circunstancial

temporal/aspectual só aparece nessas posições pré-verbais em francês quando um dos

elementos X é o sujeito, já que, na tabela (5.3), foi encontrado somente um dado em que

o elemento X antes de V tem outra função sintática. Dos 197 dados visualizados na

tabela (5.3) em posição pré-verbal com elemento X, 196 tinham o valor de sujeito. Já na

tabela (5.4), 24 dados apresentam o argumento externo do verbo como um dos valores

do X.

5.1.2. Margens da oração

Do que pudemos verificar até o momento, fica clara a predominância das

locuções temporais/aspectuais nas margens da oração em detrimento das posições

internas. Para observamos as margens esquerda e direita, fizemos um reagrupamento

das posições apresentadas e consideramos 4 posições84.

o Margem Esquerda = AdvV ; AdvXV

o Margem Direita = VXAdv ; VAdv

o Posições pré-verbais mediais = XAdvV; XAdvXV; AuxAdvV85

o Posições pós-verbais mediais= VAdvX, VXAdvX

O gráfico (5.1) mostra a distribuição obtida para este reagrupamento:

84 Essa nova organização será utilizada em cruzamentos com alguns fatores que consideramos essenciais

para visualizarmos a questão das margens 85 Considerei aqui a locução inserida entre o auxiliar e o verbo principal como “outras pré-verbais”, pois

levei em consideração o verbo predicador.

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Gráfico (5.1): Margens e posições mediais das locuções no português

No gráfico (5.1), vemos o resultado do amálgama realizado para verificarmos as

tendências gerais da locução adverbial no que diz respeito às margens da oração.

Conforme o já exposto, juntamos as posições AdvV e AdvXV em margem esquerda

(ME) e as posições VXAdv e VAdv em margem direita (MD). As demais posições

foram divididas em posições pré-verbais mediais (XAdvV, XAdvXV e AuxAdvV) e

posições pós-verbais mediais (VAdvX e VXAdvX).

Como podemos observar a partir do gráfico, há um número maior de ocorrências

de locução adverbial de tempo/aspecto na margem direita, correspondendo a 47% dos

dados considerados para análise. Ainda no gráfico, percebemos que, no português, as

locuções adverbiais ocupam de forma significativamente mais frequente posições pós-

verbais, mas, preferencialmente a margem direita da oração, uma vez que temos 72%

dos casos ocorrendo depois do verbo (somatório da posição MD, com 47%, e da

amálgama das demais posições pós-verbais, com 25%).

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Vejamos, no exemplo (54), uma locução temporal na posição que, até o

momento, foi a prototípica no português, VXAdv:

(54) Outros dados, como os cortes de pessoal na imprensa, que| aumentaram 88% em

2006,| também são reveladores [editorial 1 – O Globo]

No que diz respeito à posição das locuções adverbiais temporais e aspectuais,

observamos uma distribuição um pouco diferenciada da do português, como mostra o

gráfico (5.2):

Gráfico (5.2): Margens e posições mediais das locuções no francês

Assim como no português, os circunstanciais no francês apareceram

predominantemente nas margens da oração: 65% das locuções iniciam ou finalizam a

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oração – 29% na margem esquerda e 36% na margem direita. No entanto,

diferentemente do português, em que a tendência de uso das locuções foi

indiscutivelmente a margem direita, em francês, observamos menor intervalo entre as

frequências para cada uma das margens. Embora, nos jornais franceses, a posição

predominante dos circunstanciais tenha sido a posição inicial AdvXV (conferir tabela

5.1), com 28% dos dados, ao amalgamarmos as outras posições, a margem direita obtém

maior índice de ocorrência, de forma semelhante ao constatado para o português. O

trecho (55) exemplifica bastante claramente esta tendência.

(55) Une réputation qui avait fini d’être entamée par la collision de deux TGV |qui

avait fait 40 morts le 23 juillet 2011 près de Wenzhou, dans l’est du pays, quelques

mois à peine après le limogeage de Liu Zhijun.|86 [notícia 1 – Le Figaro]

Em (55), o circunstancial temporal – quelques mois à peine après le limogeage

de Liu Zhijun – finaliza a oração em que se encontra. Essa ordenação específica

(VXAdv) foi a segunda de maior produtividade em francês, com 21% dos 669 dados

válidos. Como veremos na seção 5.2, esta tendência está correlacionada a fatores, como

por exemplo, a extensão da locução.

As posições mediais, tanto em português quanto em francês, foram as menos

produtivasfrequentes, já que nelas os circunstanciais se inserem entre os argumentos do

verbo e quebram a integração entre os elementos. Em linhas gerais, podemos afirmar

que, em ambas as línguas, houve uma preferência pelo posicionamento das locuções em

posições pós-verbais, destacando-se a margem direita da oração, em especial no

português. Mais especificamente, no português, obtivemos 72% (47% MD e 25% de

86 Uma reputação que tinha acabado de ser iniciada pela colisão de dois TGVs | que tinha causado 40

mortes em 23 julho de 2011 perto de Wenzhou, no leste do país, apenas alguns meses após a demissão de

Liu Zhijun.

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pós-verbais mediais) de circunstanciais pós-verbais do total de 577 dados, contra 64%

(36% MD e 28% de pós-verbais mediais) de circunstanciais pós-verbais do total de 669

dados considerados para a análise.

O resultado mais significativo que esses gráficos nos mostram é que os

circunstanciais temporais, nas duas línguas românicas analisadas, seguem um mesmo

padrão de ordenação, tendo em vista que as mesmas tendências foram encontradas.

Na seção seguinte, verificaremos quais fatores, sintáticos, semânticos e / ou

discursivos, motivam a preferência pelas ordenações. Nossa hipótese é que, quanto

maior o papel discursivo dos circunstanciais, mais o deslocamento ocorrerá.

5.2. Parâmetros Analisados

Nesta seção, apresentamos os resultados dos parâmetros que consideramos

relevantes para explicar as razões pelas quais escritores usam diversas posições em

textos escritos em língua portuguesa e em língua francesa.

Iniciamos nossa discussão pelos parâmetros mais estruturais e concluímos com

fatores discursivo-pragmáticos. Focalizamos primeiro o tipo de verbo da oração, em

sequência, o tipo de sujeito, sua posição, a estrutura do circunstancial, seu tamanho,

e, por fim, a semântica da locução adverbial, seu papel discursivo e o gênero textual

em que ocorre.

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5.2.1. Propriedades estruturais

5.2.1.1. Tipo de Verbo

Consideramos aqui o tipo sintático do verbo de acordo com a nomenclatura

tradicional da NGB (Norma Gramatical Brasileira) – verbo de ligação, transitivo,

intransitivo –, sempre levando em consideração o contexto em que o circunstancial

temporal está inserido, como mostramos a seguir:

a- verbo de ligação

Em (56), temos a forma verbal seria e em (57) a forma est (v. ser). Nos dois

exemplos, o circunstancial temporal se desloca para a posição pré-verbal.

(56) Mas antes do primeiro protesto, [tudo] era mais fácil, segundo Dhundup . [notícia

7 – Folha de São Paulo]

(57) Officiellement, le bilan après deux jours d'affrontements est d'au moins 623 morts

mais il pourrait encore s'alourdir.87 [notícia 09 – Le Monde]

Em (56), o circunstancial temporal aparece na margem esquerda da oração, não

interferindo na relação entre o sujeito (tudo) e seu elemento caracterizador (fácil),

colocado após o verbo de ligação (era). Já em (57), o circunstancial analisado – après

deux jours d'affrontements – posiciona-se entre o sujeito (le bilan) e a forma verbal

(est). No entanto, neste caso específico, a margem esquerda já está ocupada por outro

87 Oficialmente, o saldo após dois dias de confrontos é de pelo menos 623 mortos, mas ainda poderia

aumentar.

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adverbial – officiellement – o que pode ter motivado o posicionamento do temporal

mais próximo ao verbo.

b- verbo transitivo

Os verbos transitivos foram os mais frequentes em todo o corpus analisado,

como nos exemplos a seguir:

(58) Na quinta-feira passada, o segundo maior grupo mundial do setor, o Rio Tinto,

divulgou também seus recordes, com lucro líquido de US$ 7,4 bilhões [notícia 5 – O

Globo]

(59) Le ministre de l'Intérieur italien a envoyé lundi une directive aux préfets les

appelant à trouver d'urgence 6.500 places d'hébergement, en particulier dans le nord et

le centre du pays.88 [notícia 13 – Le Figaro]

A expectativa com relação a esses verbos era que o circunstancial temporal não

aparecesse ao lado da forma verbal, pois essa posição é prototipicamente ocupada por

seu(s) complemento(s). Dessa forma, a locução tenderia às margens. Isso ocorre no

exemplo (58), em que o circunstancial analisado - Na quinta-feira passada – aparece na

margem esquerda da oração, deixando a forma verbal (divulgou), transitiva, próxima ao

seu objeto direto (seus recordes). O mesmo não acontece em (59), em que o

circunstancial lundi se posiciona imediatamente após a forma verbal bitransitiva (a

envoyé) e seus complementos (une directive – direto – e aux préfets – indireto).

88 O ministro do interior italiano enviou na segunda-feira, uma diretriz aos governadores os convocando,

urgentemente, a encontrar 6.500 lugares de alojamento, especialmente no norte e no centro do país.

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c- verbo intransitivo89

Em (60) e (61) a seguir vemos dois exemplos de verbos intransitivos na amostra.

(60) O exército americano afirmou suspeitar |que os atentados aumentariam pouco

antes de setembro. [notícia 15 – Folha de São Paulo]

(61) La veille, une soixantaine avaient défilé au Puy-en-Velay devant la permanence

dum aire Laurent Wauquiez, également ministre de l’enseignement supérieur.90 [notícia

01 – Le Monde]

Em (60), o circunstancial temporal (pouco antes de setembro) posicionou-se

logo após a forma verbal intransitiva – aumentariam –, finalizando a oração. Por outro

lado, em (61), a locução adverbial La veille inicia a oração, mesmo com a forma verbal

intransitiva (défilé) intransitivo. Nesse caso, logo após a forma verbal, aparece outro

adverbial, locativo, au Puy-en-Velay devant la permanence dum aire Laurent Wauquiez.

Segundo Rocha Lima (2003)91, alguns verbos ditos intransitivos pela NGB, em

determinados contextos, selecionam um circunstancial com a mesma importância que

um argumento. O autor considera tais adverbiais, nesses contextos, como complementos

circunstanciais. Nosso objetivo aqui é o de verificar qual a posição prototípica do

89 Segundo Cyrino, Nunes e Pagotto (2009), os inacusativos também podem ser considerados intransitivos

por não apresentarem complemento verbal. No entanto, tais verbos selecionam o seu sujeito como

argumento interno, ocupando uma posição mais comum aos complementos verbais, diferenciando-se dos

intransitivos prototípicos. Sabemos que a observação atenta dos inacusativos costuma ser importante em

análises como a empreendida neste trabalho. Entretanto, dados com esse tipo de verbo intransitivo foram

pouco produtivos no corpus analisado e mantiveram a mesma tendência de uso dos intransitivos padrão.

Diante disso, para efeitos da análise aqui realizada, os verbos intransitivos e os inacusativos são

considerados pertencentes ao mesmo grupo. 90 Na véspera, sessenta tinham desfilado em Puy-en-Velay diante da permanência do prefeito Laurent

Wauquiez, também ministro do ensino superior.

91 Cf. capítulo 1.1

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circunstancial com verbos intransitivos, se ele se colocaria em posição mais próxima a

ele, ou se deslocaria para a margem esquerda da sentença, por exemplo.

Nas tabelas (5.5) e (5.6), mostramos a distribuição das formas de ordenação

do circunstancial de acordo com cada tipo de verbo, em português e em francês,

respectivamente:

Tabela (5.5): Tipo de verbo X Ordem – no Português

Transitivo Intransitivo Ligação

N % N % N %

Pré

-Ver

ba

is AdvV 7 2 18 8 4 11

XAdvV 5 1,5 3 1,5 1 2,5

AdvXV 75 24 25 11,5 10 27

XAdvXV 6 2 5 2 0 0

Pós-

ver

bais

VXAdv 111 35 56 25,5 17 46

VAdvX 53 17 38 17 0 0

VAdv 28 9 60 27 1 2,5

VXAdvX 29 9 17 7,5 4 11

AuxAdvV 1 0,5 0 0 0 0

Total 315 100 222 100 37 100

Nos 574 dados válidos para a análise, 315 se referem a orações com verbos

transitivos; 222 vinculavam-se a verbos intransitivos; e 37 estavam em orações com

cópula. Desses 315 dados com verbos transitivos, 35% (111 dados) localizaram-se na

margem direita da oração, após o verbo e o elemento X, como no exemplo (62):

(62) As forças de segurança ucranianas estão sob certa confusão desde que

|manifestantes depuseram o presidente pró-russo Viktor Yanukovich, em fevereiro.

[notícia 3 – O Globo]

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Em (62), vemos o circunstancial temporal, em fevereiro, na margem direita da

oração, após a forma verbal transitiva depuseram e o elemento X, no caso, o objeto

direto (o presidente pró-russo Viktor Yanukovich). Ao recuperarmos a descrição do

valor de X da tabela (5.2), nessa posição VXAdv, percebemos que, dos 184 dados nessa

ordenação, 99 tinham como elemento X o complemento do verbo. Portanto, em 99 dos

111 dados com verbos transitivos na ordenação VXAdv, os circunstanciais temporais

estão finalizando orações após o complemento verbal, ou seja, o elemento interveniente.

Confirma-se, portanto, que o circunstancial temporal tende a não se posicionar entre o

verbo transitivo e o seu complemento.

A segunda posição preferencial da locução quando o verbo é transitivo é a da

margem esquerda com um elemento X entre ela e o verbo. Em 24% dos casos (75

dados), o circunstancial ordenou-se em AdvXV com verbos transitivos. Ou seja, com

verbos transitivos, a locução tende a se posicionar nas margens das orações.

No entanto, logo em seguida, tivemos a posição medial VAdvX, com os verbos

transitivos. Esta ordenação do circunstancial aconteceu em 53 dos 315 dados (17%) de

circunstancial em orações com o tipo de verbo transitivo. Quanto ao valor de X valor de

X, cerca da metade dos dados são de complemento verbal (cf. tabela 5.2). Nesses casos,

o circunstancial está quase sempre inserido entre o verbo e seu complemento verbal.

Esse resultado é inesperado tendo em vista que, nas línguas, em geral o complemento é

muito integrado ao verbo. Acreditando que a ocorrência relativamente alta de

circunstanciais temporais entre o verbo e o complemento deva-se ao fato de estarmos

lidando com um corpus escrito.

Com relação às orações com verbos intransitivos, esperávamos que os

circunstanciais se posicionassem imediatamente após o verbo, o que ocorreu em apenas

27% dos casos (60 das 222 ocorrências). Em 25,5% dos dados (56 ocorrências), as

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locuções ordenaram-se na margem direita, com um elemento X interveniente (VXAdv)

– posição favorita dos circunstanciais no português, conforme o exemplo.

No que concerne ao verbo de ligação, percebemos uma tendência de os

circunstanciais se posicionarem nas margens, primeiramente a direita (46% em VXAdv)

e depois a esquerda (27% em AdvXV). Esses resultados confirmam nossas expectativas

de que as locuções não tenderiam a posições mais próximas ao verbo, já que, nessas

estruturas, o elemento posterior ao verbo – geralmente o predicativo do sujeito – está

diretamente relacionado ao sujeito da oração. Sendo assim, o circunstancial não

quebraria a integração entre os termos para que não houvesse prejuízo nesta conexão.

Na tabela (5.6), encontramos as tendências de colocação dos circunstanciais

quanto à tipologia verbal, no francês:

Tabela (5.6): Tipo de verbo X Ordem – no Francês

Transitivo Intransitivo Ligação

N % N % N %

Pré

-Ver

bais

AdvV 4 1 1 0,5 1 3

XAdvV 7 1,5 1 0,5 3 8

AdvXV 125 28 48 26 14 39

XAdvXV 19 4 4 2 1 3

s-v

erb

ais

VXAdv 111 24,5 21 12 10 28

VAdvX 92 20 30 16,5 3 8

VAdv 40 9 62 34 1 3

VXAdvX 44 10 14 8 3 8

AuxAdvV 9 2 1 0,5 0 0

Total 451 100 182 100 36 100

Mais uma vez, a inversão na preferência das locuções em português e em francês

se torna visível. Na tabela (5.6), observamos que, no que tange à construção com o

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verbo transitivo, 28% dos dados estão relacionados à ordenação AdvXV (estrutura

predominante das locuções temporais/aspectuais do corpus no francês). Observamos um

exemplo dessa construção:

(63) Par le passé, l’Union européenne a sanctionné d’autres massacres, d’autres

dérives autoritaires, | que ce soit au Sri Lanka, au Zimbabwe, em Birmanie ou em

Biélorussie.92 [editorial 1 – Le Monde]

No exemplo (63), o circunstancial (par le passé) inicia a oração com a forma

verbal transitiva a sanctionné (verbo sanctionner no passé composé). Entre a locução e

o verbo, o sujeito (l’Union européenne) é o elemento interveniente, assim como em

todos os outros casos, pois, como já mostramos na tabela (5.3), em ordenações, pré-

verbais no francês, praticamente todos os X que seguem o circunstancial correspondem

à função sujeito.

A preferência pela ordenação pré-verbal, AdvXV, pode apontar uma tendência

de uso, mas que não pode ser tomada como decisiva, já que a diferença para a segunda

configuração estrutural (VXAdv) – que corresponde a 24,4% dos dados – é de 3,5

pontos percentuais. Essa ordenação não inviabiliza nossa hipótese de que se evita inserir

a locução entre o verbo e seus complementos, uma vez que, dos 142 casos dos nossos

circunstanciais temporais/aspectuais nessa posição, o valor de X é complemento verbal

em 93 (cf. tabela 5.3).

Ainda com relação aos verbos transitivos, assim como em português,

encontramos no francês 92 dados (20%) em posição medial e adjacente ao verbo

(VAdvX). Como já exposto em 5.1, na tabela 5.3, dos 125 dados nessa posição, o valor

92 No passado, a União Europeia sancionou outros massacres, outros desvios autoritários, | seja no Sri

Lanka, Zimbábue, na Birmânia ou em Bielorrússia.

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do elemento X, em 60 casos93, é de complemento verbal e, em 51, tem outra função

(predominantemente adverbial). Da mesma forma que o resultado obtido em português,

essas ocorrências de circunstanciais temporais entre o verbo e o complemento são mais

escassas. Pretendemos, em uma análise futura, comparar a modalidade oral com a

escrita para verificar se essa ordem é ou não característica do tipo de corpus estudado.

Alguns trabalhos, para o português, já mostraram claramente que esta configuração é

mais típica da escrita (Cf. Paiva et alii, 2007)

No que diz respeito às formas intransitivas, o padrão foi o esperado. Dos 182

dados de construções intransitivas, 34% (62 dados) estavam na posição VAdv, 26% (48

dados) na posição AdvXV e 16,5% (30 dados) em VAdvX. Nestes casos, embora o

francês não tenha mantido o padrão do português, tivemos um resultado interessante, já

que as expectativas eram de que a locução aparecesse imediatamente após o verbo, o

que ocorreu em 50,5% dos casos (34% VAdv + 16,5% VAdvX). No entanto, o

deslocamento do circunstancial para a margem esquerda da oração, antecedendo o

sujeito pré-verbal, mesmo com o verbo intransitivo, nos demonstra que tal ordenação da

locução não é motivada pela necessidade de preencher espaços vazios na oração e, sim,

por razões discursivas que discutiremos mais a frente (seção 5.2.3.1) .

Por fim, os circunstanciais das orações com verbos de ligação, em francês,

apresentaram resultados semelhantes aos do português, mas com inversão entre as duas

posições de preferência: 39% das locuções temporais se situam na margem esquerda da

oração (14 dados em AdvXV) e 28% na margem direita (10 ocorrências em VXAdv).

Em português, a posição preferencial foi a VXAdv e a segunda, AdvXV. Entretanto,

confirma-se a predisposição dos temporais nas margens em ambas as línguas, visto que,

dessa forma, o circunstancial não interfere na ligação entre o sujeito e seu predicativo.

93 Esses 60 dados de complemento verbal não coincidem com a quantidade de verbos transitivos, pois

muitos complementos em francês manifestaram-se de forma pronominal e anterior ao verbo.

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5.2.1.2 Representação do Sujeito

Nosso objetivo com esse parâmetro de análise foi observar o comportamento do

circunstancial temporal e aspectual, principalmente quando o sujeito da oração não

estivesse preenchido. Postulamos algumas possibilidades para o preenchimento ou não

desse sujeito, tanto em português como em francês. Não pudemos determinar os

mesmos tipos de sujeito para as duas línguas, devido às restrições sintáticas do francês.

Para as ocorrências em português, consideramos as seguintes possibilidades:

a) Sujeito expresso, representado por um sintagma nominal94

Dentre os dados analisados, encontramos 422 com o sujeito preenchido por um

sintagma nominal – 73,5% do total de 574 ocorrências, vf, tabela (5.7), a seguir –,

conforme ilustrado nos exemplos a seguir:

(64) [O fabricante automobilístico alemão BMW] aumentou em janeiro as vendas

mundiais das marcas BMW, Mini e Rolls-Royce para 94.276 veículos, 0,5% a mais |

que no mesmo mês do ano anterior. [notícia 8 – O Globo]

(65) Erdogan voltou a apresentar a candidatura de Gül e,| desta vez, [ele] foi eleito.

[editorial 6 – Folha de São Paulo]

Nos dois exemplos, o sujeito aparece preenchido, em sua posição prototípica95,

por sintagmas nominais de naturezas distintas. Em (64), encontramos um sintagma

94 A principio, separamos o sujeito cujo núcleo era um substantivo daquele em que o núcleo era

pronominal. No entanto, por não apresentarem tendências distintas, resolvemos juntá-los.

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nominal pleno – o fabricante automobilístico alemão BMW –, já em (65), o sujeito é

representado por uma forma pronominal – ele –, retomando a referência

anaforicamente.

Marques (2012), em seu estudo diacrônico sobre a ordenação do sujeito no

português, distinguiu a representação do sujeito com sintagma pleno ou um elemento

pronominal. Em sua análise, a autora verificou que o primeiro apresentava uma

mobilidade sintática maior do que os pronomes. Por outro lado, os elementos

pronominais se concentravam nas posições pré-verbais. Entretanto, sua conclusão foi

que a necessidade de uso do pronome ou de uma massa fônica maior para codificar um

referente estaria relacionada à Informatividade e ao Subprincípio da Quantidade (cf.

capítulo 2), já mencionado anteriormente. Como o foco de nossa pesquisa não é o

sujeito e, sim, em como seu preenchimento pode ou não motivar o posicionamento do

circunstancial temporal, não julgamos necessária essa distinção.

b) sujeito oculto

A forma determinada do sujeito – porém oculta, não expressos na sentença e

retomados seja anaforicamente, seja pela flexão verbal96 – contabilizaram 73 dados do

total de 574 (12,5%). A seguir, em (66), encontramos um exemplo dessa possibilidade

de representação do sujeito:

(66) O grupo que detém o controle do PT parece mesmo decidido a lutar pela

hegemonia, |e, já trabalha para isso desde já. [editorial 5 – O Globo]

95 Analisaremos a posição desse elemento sujeito a seguir, em 4.2.3. 96 A distinção entre o sujeito oculto anafórico e o desinencial foi analisada, mas não se mostrou

significante no nosso corpus, pois as mesmas tendências foram observadas. Por esse motivo, resolvemos

juntá-los em uma única categoria.

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Em (66), o sujeito da oração em que o circunstancial temporal (desde já) está

inserido é recuperado pelo contexto anterior, mas não é expresso na oração – no

exemplo, o sujeito é O grupo, localizado numa oração anterior. Alguns autores como

Kato e Duarte (2003) e Spanó (2002 e 2008) levantam a hipótese de que, no caso de

sujeito nulo, locuções adverbiais se deslocam para a margem esquerda para evitar que o

verbo ocupe a posição inicial. Neste estudo, acreditamos, no entanto, que esse adverbial

só se deslocará para a margem esquerda por questões discursivas.

c) pronome relativo

O sujeito em forma de pronome relativo se apresentou em 65 dos dados

analisados (11,5% do total). Observemos o exemplo a seguir:

(67) Foram encontrados 123kg de cocaína dentro da aeronave, |[que] havia partido no

dia 18 de Assunção. [notícia 14 – Folha de São Paulo]

Nesses casos, o sujeito está preso sintaticamente por iniciar uma oração relativa,

funcionando, inclusive, como um conector. No exemplo (67), a locução

temporal/aspectual, no dia 18 de Assunção, finaliza a oração em que se encontra.

d) sujeito indeterminado

A indeterminação do sujeito se mostrou pouco produtiva no corpus de jornais

brasileiros, com apenas 3 ocorrências (0,5% do total de dados encontrados).

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(68) Também há mais notícias em Hong Kong,| onde em 4 de janeiro informou-se sobre

o surgimento do primeiro caso de vírus de gripe aviária em três anos. [ editorial 15 – O

Globo]

Em (68), o circunstancial temporal – em 4 de janeiro – desloca-se à margem

esquerda, em estratégia de indeterminar o sujeito a partir da presença do elemento SE

índice de indeterminação do sujeito.

e) oração sem sujeito

Foram apenas 7 (1% dos dados) os casos em que a oração é considerada

tradicionalmente sem sujeito. A seguir, temos um exemplo dessa possibilidade:

(69) No novo estágio de confiança, houve concessões dos dois lados. [notícia 5 – Folha

de São Paulo]

No exemplo (69), o circunstancial – No novo estágio de confiança – aparece em

margem esquerda na estrutura com a forma verbal impessoal – houve. Esses casos, para

nós, teriam as mesmas tendências das já expostas para o sujeito oculto. Consideramos

os 7 dados separadamente, para comparar essa construção impessoal com a estrutura

expletiva do francês, utilizada nesses casos.

f) sujeito oracional

Destacamos essa representação do sujeito por ser uma estrutura diferenciada das

demais possibilidades. Foram encontrados apenas 4 dados com esse tipo de sujeito no

corpus. A seguir, encontramos um exemplo dessa possibilidade estrutural:

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(70) [Embarcar na espiral de represálias] é, obviamente, o caminho mais fácil e, neste

caso, até conveniente]. [editorial 10 – O Globo]

No corpus analisado, em todos os casos com esse tipo de sujeito, a oração

encontrava-se posposta ao verbo, como no exemplo (70), em que o sujeito – Embarcar

na espiral de represálias – se posiciona na margem esquerda, seguido imediatamente

pela forma verbal (é). O circunstancial em análise (neste caso) ordena-se após o verbo.

Na tabela (5.7), observamos as tendências de ordenação dos circunstanciais

temporais e aspectuais de acordo com o tipo de sujeito de cada oração, no português:

Tabela (5.7): Representação do sujeito X Ordem – no Português

Sintagma Oculto Pronome

Relativo

Sujeito

Indeterm.

Or. sem

sujeito

Sujeito

oracional

N % N % N % N % N % N %

Pré

-Ver

ba

is

AdvV 13 3 6 8 5 7,5 1 33,5 1 14,5 3 75

XAdvV 9 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

AdvXV 103 24,5 5 7 0 0 0 0 2 28,5 0 0

XAdvXV 11 2,5 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

s-v

erb

ais

VXAdv 115 27 30 41 35 54 2 66,5 2 28,5 0 0

VAdvX 75 18 9 12,5 7 11 0 0 0 0 0 0

VAdv 57 13,5 18 24,5 12 18,5 0 0 2 28,5 0 0

VXAdvX 38 9 5 7 6 9 0 0 0 0 1 25

AuxAdvV 1 0,5 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0

Total 422 100 73 100 65 100 3 100 7 100 4 100

A ordenação do circunstancial temporal/aspectual nas orações com sujeito

representado por um sintagma pleno (422 ocorrências – 73,5%) seguiu categoricamente

as mesmas tendências encontradas nos dados gerais da língua expostos na tabela (5.1)

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97. A posição preferencial dos circunstanciais foi a margem direita, VXAdv, com 27%

dos dados (115 do total de 422), seguida da posição na margem esquerda, AdvXV, em

24,5% das ocorrências (103 dados). Como vemos, a diferença entre as duas margens foi

de apenas 12 dados, o que não nos permite afirmar se, no português, o circunstancial

tende a posição pré ou pós-verbal quando aparece numa oração com o sujeito

representado por um sintagma pleno. A posição medial com maior produtividade com

esse tipo de sujeito foi a pós-verbal VAdvX, com 75 ocorrências, ou 18% dos dados

totais. Em sequência, vêm a margem direita, sem elemento X, VAdv, com 57 casos

(13,5%), e a ordenação VXAdvX, com 9% dos dados (38 casos).

Esse resultado, devido à grande quantidade de dados com sujeitos preenchidos,

mantiveram os padrões vistos na distribuição das diversas possibilidades de ordenação.

Entretanto era esperada maior recorrência de circunstanciais pospostos, o que não se

confirmou, favorecendo nossa hipótese.

Os resultados relativos às orações com sujeito oculto indicam novamente que a

ordenação do circunstancial temporal/aspectual não pode ser relacionada ao

preenchimento do sujeito. Em nossa amostra, dos 73 casos de sujeito oculto, em 30

(41%) os circunstanciais se situam na margem direita com um X (VXAdv), em 18

(24,5%) na margem direita e adjacentes ao verbo (VAdv) e em apenas 11 dados eles se

deslocaram para a esquerda, posição prototípica do sujeito (6 dados em AdvV e 5 em

AdvXV).

Segundo o Princípio da continuidade tópica ou referencial (Givón 1983. 1995),

quanto maior a previsibilidade de uma informação, menor a necessidade de material

linguístico. Assim, em construções nas quais o sujeito elíptico estiver afastado

significativamente de seu referente, o circunstancial não tenderia a ser anteposto para

97 Cf. seção 5.1.

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não quebrar a referencialidade entre a forma verbal e a estrutura anterior, já que, para

que esta referência seja retomada corretamente, o referente precisa estar claro no

discurso. Vejamos o exemplo (71):

(71) Bhutto, que vive em Londres desde que foi condenada por corrupção em

1999 [...], disse que irá disputar as eleições parlamentares e que, pelo acordo, o

ditador deixará o comando das Forças Armadas -ela não informou quando. [notícia 8

– Folha de São Paulo]

Observamos que o circunstancial destacado em 1999 se encontra em uma oração

passiva, com o sujeito oculto. Seu referente – Bhutto – está expresso no início da

sentença. Dificilmente, na escrita, o período apareceria como “Bhutto, que vive em

Londres desde que em 1999 foi condenada por corrupção [...]”, com o circunstancial

deslocado para a posposição da forma verbal, pois deixaria a referência do sujeito ainda

mais distante, na cadeia tópica.

O mesmo ocorre nas orações, em que o sujeito se manifesta como um pronome

relativo. Nesses casos, os circunstanciais tendem às posições pós-verbais,

principalmente à margem direita: 35 (54%) dos 65 dados em VXAdv e 12 (18,5%) em

VAdv.

A pouca ocorrência do sujeito indeterminado e da oração sem sujeito na amostra

não nos permite fazer afirmações categóricas sobre as tendências dos circunstanciais

nesses casos. A oração sem sujeito, ou aquela constituída por verbo impessoal,

apresentou-se por 7 vezes e os circunstanciais se distribuíram quase igualitariamente nas

posições predominantes das locuções no português: 2 em VXAdv, 2 em AdvXV, 2 em

VAdv e 1 em AdvV. Já nas orações com sujeito indeterminado, o circunstancial só se

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deslocou para a margem esquerda em 1 caso de 3 (as outras 2 ocorrências mantiveram-

se na posição não-marcada do circunstancial do português)

Subsequentemente, discutimos a posição do circunstancial de acordo com o

sujeito da oração no francês.

a) sujeito expresso, representado por um sintagma

Encontramos, na amostra analisada, 587 casos em que o circunstancial pertencia

a uma oração com o sujeito representado por um sintagma pleno ou pronominal, o que

equivale a 87,5% do total de 669 dados de francês, como no exemplo a seguir:

(72) Jeudi matin, [les salariés d'Yssingeaux] envisageaient d'occuper l'usine et une

dizaine d'ouvrières parlaient d'une grève de la faim.98 [ notícia 1 – Le Monde]

Assim como em português, nesse caso preferimos juntar as ocorrências de

sujeito com sintagma pleno e pronome, pois verificamos que as tendências de uso dos

circunstanciais seguiam o mesmo padrão nos dois casos. No exemplo (72), o

circunstancial – Jeudi matin – apresenta-se na margem esquerda da oração,

antecedendo o sujeito expresso por um sintagma nominal - les salariés d'Yssingeaux.

b) pronome relativo

O sujeito expresso em forma de pronome relativo foi encontrado em 60 dados

(9% do total).

98 Quinta-feira de manhã, [os funcionários da Yssingeaux] planejavam ocupar a fábrica e uma dezena

de operários falavam de uma greve de fome.

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(73) La fronde sociale |qui secoue le Brésil depuis trois semaines |continue de laisser

perplexes analystes et hommes politiques.99 [notícia 2 – Le Figaro]

Em (73), a relativa iniciada pelo pronome qui tem em sua sequência a presença

da forma verbal secoue, do objeto direto (le Brésil) e, posteriormente a todos os

elementos envolvidos na construção, o circunstancial fecha a oração – depuis trois

semaines.

c) sujeito expletivo

A obrigatoriedade de preenchimento da função de sujeito no francês requer o

uso do pronome de 3ª pessoa do singular – il – esvaziado semanticamente. Essas

estruturas são equivalentes as nossas orações sem sujeito, em que o verbo é flexionado

na 3ª pessoa do singular, mas sem a presença de um elemento com a função de sujeito.

Essas construções apareceram 10 vezes na amostra, contabilizando apenas 1,5% do total

de dados e são ilustradas a seguir:

(74) [Il] y aurait eu environ 900 morts en mediterranée depuis le début de l'année,

contre moins de 50 pendant la même période en 2014.100 [notícia 13 – Le Monde]

No caso (74), o sujeito expletivo é o pronome il, sem conteúdo semântico. Em

(74), o circunstancial temporal - depuis le début de l'année - surge após elemento X

pós-verbais.

99 A agitação social | que agita o Brasil há três semanas | ainda deixa perplexos analistas e políticos. 100 Teria sido cerca de 900 mortes no Mediterrâneo desde o início do ano, contra menos de 50 durante o

mesmo período em 2014.

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d) sujeito oculto

Em francês, devido à obrigatoriedade do preenchimento do sujeito, poucos são

os casos em que ele pode vir implícito. Na amostra, encontramos 12 ocorrências (2% do

total) com esse tipo de sujeito – em todos esses dados os circunstanciais se encontravam

em orações coordenadas, conforme vemos em (75):

(75) Elles ont habituellement lieu tous les deux ans |et avaient déjà été annulées en

2011 au moment du renversement de Moubarak.101 [notícia 17 – Le Monde]

Nossa expectativa, nesses casos, era que o circunstancial evitasse a posição

inicial para que, assim, a referencialidade do sujeito não se perdesse. No exemplo (75),

a locução verbal (avaient été annulées) posiciona-se logo após a conjunção aditiva et. A

referência desse sujeito é retomada na oração anterior (elles) e a locução adverbial

temporal em negrito aparece logo após a forma verbal.

Na tabela (5.8), são apresentados os resultados obtidos com o cruzamento desses

tipos de sujeito supracitados e a ordenação dos circunstanciais no francês:

101 Eles ocorrem geralmente a cada dois anos | e já tinham sido canceladas em 2011 no momento da

derrubada de Mubarak.

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Tabela (5.8): Representação do sujeito X Ordem – no Francês

Sintagma Pronome

Relativo

Expletivo Oculto

N % N % N % N % P

ré-V

erb

ais

AdvV 1 0,5 5 8,5 0 0 0 0

XAdvV 11 2 0 0 0 0 0 0

AdvXV 186 32 0 0 1 10 0 0

XAdvXV 24 4 0 0 0 0 0 0

s-v

erb

ais

VXAdv 109 19 24 40 3 30 6 50

VAdvX 105 18 17 28 0 0 3 25

VAdv 90 15 8 13 2 20 3 25

VXAdvX 52 8 5 8,5 4 40 0 0

AuxAdvV 9 1,5 1 2 0 0 0 0

Total 587 100 60 100 10 100 12 100

Assim como ocorreu em português, em francês, a grande quantidade de sujeito

representado por um sintagma seguiu a tendência geral de ordenação dos circunstanciais

na língua. A posição predominante foi a AdvXV, com 186 dados do 587 desse tipo de

sujeito (32%), seguida das posições pós-verbais VXAdv, com 109 ocorrências (19%), e

a VAdvX, com 105 (18%). A ordenação da locução na adjacência direita do verbo,

VAdv, ainda contou com 90 dados (15% do total).

Em geral, sujeitos expressos por SN são novos ou disponíveis. Eles não estão em

cadeia tópica. Assim a ocorrência de um circunstanciador numa posição inicial –

ordem predominante em francês – não quebra a sequência tópica a qual o sujeito está

inserido.

O sujeito expresso com um pronome relativo, em francês, contabilizou 9% dos

dados, com 60 ocorrências. Dessas, 40% (24 dados) colocaram-se à margem direita da

oração, na segunda posição mais recorrente em frances, VXAdv. O interessante no que

diz respeito às construções com pronomes relativos na função de sujeito foi que, à

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exceção de 5 dados na posição inicial (AdvV), todos os outros mantiveram-se à direita

da oração. Conforme já exposto anteriormente e tomando como referência conclusões

de Lessa (2012) em sua análise, tal ordenação assegura a correferencialidade do

pronome relativo, evitando que a locução adverbial interfira na coesão entre o pronome,

o verbo e ainda a referência anterior.

Encontramos no nosso corpus poucas ocorrências de construções com sujeito

expletivo, provavelmente por causa do Domínio Discursivo a que pertencem os textos,

ou seja, textos jornalísticos, com teor informativo mais direto e objetivo. Nossa

expectativa quanto a esses casos era que o circunstancial viesse apenas após o verbo

para não interferir na relação entre esse sujeito sem valor semântico e a forma verbal.

Embora tenhamos poucos dados (tabela 5.8) podemos dizer que hipótese foi

confirmada, pois, dos 10 dados encontrados, 9 se mantiveram pospostos ao verbo.

Por fim, os raros, porém existentes, casos de sujeito oculto em uma língua em

que o preenchimento é obrigatório. Como já citado, a posição de sujeito, em francês,

pode ficar vazia em casos específicos, como em orações coordenadas simétricas. Nesses

casos, seria praticamente impossível, segundo a nossa hipótese, o circunstancial

temporal/aspectual vir em margem esquerda da oração, visto que nessa ordenação ele

poderia interferir na referencialidade entre o sujeito elíptico e seu antecedente. Nos

textos, encontramos 12 dados com esse tipo de sujeito, todos posicionados após o verbo

– 6 em VXAdv, 3 em VAdvX, 3 em VAdv.

Lessa (2012)102, após uma análise minuciosa da relação entre a representação do

sujeito e a ordem do SPrep temporal no português, concluiu que a elipse não favorecia o

aparecimento do circunstancial temporal na ME, contrariando as suas expectativas. A

autora salienta que os sujeitos nulos em 3ª pessoa são os mais desfavorecedores e

102 Cf. capítulo 2

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148

justifica tal fato com a questão da coesão entre o termo ocultado e sua referência

anterior. Em seus resultados, consta ainda que, em casos de sujeito indeterminado e

oração sem sujeito, o SPrep temporal se desloca para a margem esquerda quase

categoricamente.

Paredes Silva (1988, 2003) constata que a previsibilidade do referente sujeito se

associa à sua realização. Segundo a autora, quanto maior a relação entre o sujeito e seu

referente, maior a possibilidade de ele ser nulo. Nesses casos, o circunstancial não

tenderia a quebrar essa referencialidade, a cadeia tópica.

Em nossa amostra, o mesmo resultado de Lessa (2012) foi encontrado quanto ao

sujeito nulo e ao posicionamento do circunstancial após o verbo. Nos jornais franceses e

brasileiros, a tendência de colocação da locução na ausência do sujeito é pós-verbal.

Além disto, nos poucos casos em que, no português, a oração era sem sujeito ou

apresentava sujeito indeterminado, o circunstancial também se situou,

predominantemente, à direita do verbo.

Esses resultados, juntamente com os resultados obtidos para posição dos

circunstanciais em orações com o pronome relativo (mais uma vez em ambas as

línguas), demonstram que a questão da correferencialidade entre os termos se mostra

mais eficaz no processo de motivação da ordem do circunstancial do que as questões

sintáticas. Tais resultados corroboram os obtidos por Brasil (2005), quando ela atesta

que a supracitada hipótese de preenchimento do sujeito nulo só se confirma no

Português Europeu e não no PB.

Em seguida, analisamos a correlação entre a ordem do sujeito em relação ao

verbo e o posicionamento do circunstancial temporal/aspectual.

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5.2.1.3. Posição do Sujeito

No intuito de aprofundar a análise da relação entre a ordem do circunstancial

temporal/aspectual e o elemento sujeito, observamos sua posição em relação ao verbo.

Votre e Naro (1986), em uma visão funcionalista, acreditam que elementos deslocados

para a margem esquerda de uma oração com sujeito posposto acarretam uma

compensação sintagmática. Para verificarmos se tal compensação motiva o

posicionamento do circunstancial temporal/aspectual, estabelecemos as seguintes

estruturas, excluindo aqui, os casos de sujeito como pronome relativo e os casos de

sujeito não preenchido:

a) sujeito-verbo (SV)103

(76) [Os advogados do presidente] afirmaram na terça-feira| que Katsan está decidido

a continuar lutando para demonstrar sua inocência. [editorial 7 – O Globo]

(77) En septembre 2013, [Vladimir Poutine] résumait la position officielle.104 [notícia

30 – Le Monde]

b) verbo-sujeito (VS)

(78) O aquecimento global exigirá um monitoramento mais rigoroso de furacões, tufões

e outros desastres, refletindo nos sistemas instalados para alertar o perigo de tsunamis,

103 Para o português, considerei os casos de sujeito representado por sintagma nominal e os sujeitos

oracionais. Para o francês, considerei os casos de sujeito representado por um sintagma nominal e por

expletivos. 104 Em setembro de 2013, [Vladimir Putin] resumia a posição oficial.

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|disse na quarta-feira [uma autoridade graduada da Organização das Nações Unidas]

[notícia 3 – O Globo]

(79) Il a appelé le ministère polonais des Affaires étrangères à accorder des visas

gratuits aux Loups de la Nuit, |comme l'avait fait [l'ambassade russe] pour son groupe

pendant 10 ans.105 [notícia 9 – Le Figaro]

Diversos estudos de cunho funcionalista sobre ordem de adverbiais ou ordem do

sujeito já verificaram a relação entre a posição do circunstancial e o ocorrência de

circunstanciais na margem esquerda da oração. (cf. Naro e Votre 1986; Pádua, 1960;

Matos e Silva, 1989) e da atuação de circunstanciais na marcação da ordem VS (cf.

Spanó, 2002, 2008; Santos e Duarte, 2006; Brasil, 2005; Paiva, 2007; Lessa, 2012,

dentre outros)

Em uma análise diacrônica sobre a ordem SV/VS no português, Marques (2012)

constatou que, do Português Arcaico até o século XVIII, havia uma tendência maior de

o sujeito ocupar posições pós-verbais, em construções com itens adverbiais na margem

esquerda. A autora completa, afirmando que tais resultados justificariam a hipótese já

mencionada. Entretanto, a partir do século XIX, a quantidade de orações com sujeito

posposto e item adverbial na margem esquerda diminui, culminando em um resultado,

para o século XX, com pouquíssimos casos como os já citados. Com base nos séculos

XVIII e XIX – momento em que parece ter começado a mudança –, o estudo de

Machado (2012) também mostra uma diferença de poucos pontos percentuais (apenas 2)

do circunstancial temporal analisado por ela na margem esquerda em orações VS.

105 Ele chamou o Ministério polonês das Relações Exteriores para conceder vistos gratuitos para aos

Lobos da Noite, | como fizera [a Embaixada da Rússia] para seu grupo por 10 anos.

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151

Entretanto, Lessa (2012) afirma que em sua amostra a variação da posição do

sujeito foi mais importante para a ordenação do circunstancial temporal na margem

esquerda do que o sujeito nulo o que também foi confirmado em Soares (2012) para

SPreps calêndricos dos jornais brasileiros atuais.

Nossa hipótese é que a ordenação do circunstancial temporal não se explica

unicamente por questões sintáticas e, sim, por questões discursivas, correlações do texto

e do contexto em que está inserido.

As tabelas a seguir indicam os resultados do cruzamento entre ordem

amalgamada e a posição do sujeito para o português:

Tabela (5.9): Posição do sujeito X Ordem – no Português

SV VS

N % N %

Pré

-

Ver

bais

ME 99 26 20 44,5

Pré-verbais

mediais 18 5

2 4,5

Pós-

ver

bais

MD 165 43 8 18

Pós-verbais

mediais 99 26

15 33

Total 381 100 45 100

A diferença quantitativa entre as ocorrências de orações SV e VS já era prevista

devido às mudanças que têm ocorrido no português brasileiro quanto à nova marcação

da representação da posição do sujeito106, exposta no capítulo 2. Na amostra analisada,

encontramos 381 dados em orações SV, 45 em VS.

106 Cf. Duarte (1993, 1995, 2007), Kato e Duarte (2003), dentre outros.

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Para as construções SV, observamos que a margem direita se mostra a mais

recorrente, representando 43% dos casos (165 dos 381 dados). Essa posição, no entanto,

não foi a absoluta, uma vez que houve uma concorrência entre a margem esquerda e as

outras posições pós-verbais, com 26% dos casos em cada ordenação (99 dados em ME e

99 em outras posições pós-verbais mediais).

Esse resultado torna-se interessante, pois, com a presença do sujeito em sua

posição prototípica, o circunstancial deveria tender à posposição, para manter o

equilíbrio sintagmático, segundo o Princípio da Preservação (Votre e Naro 1986). Tal

deslocamento para a posição inicial favorece nossa hipótese de que a margem esquerda

da oração será preenchida pelo circunstancial por questões discursivas, sem relação com

o sujeito, como no exemplo (80):

(80) De lá para cá, [apenas 15 mil vagas] foram criadas, mesmo depois de suspensa a

exigência de interromper demissões. [editorial 3 – Folha de São Paulo]

Os 99 casos (26% das ocorrências) de ME em estrutura SV, ilustrados pelo

exemplo (80), indicam que a hipótese do Equilíbrio sintático (Votre e Naro, 1986) não

pode ser confirmada em todo o corpus, visto que uma quantidade relevante de dados se

deslocou para a esquerda, mesmo com o sujeito em posição prototípica.

Ainda no que tange à ordenação dos circunstanciais em orações SV, a

posposição do circunstancial se destaca, ao somarmos todas as ocorrências em posições

pré e pós-verbais. Nesse caso, teríamos 117 casos pré-verbais (99 + 18), ou seja 31%, e

264 de circunstanciais temporais em posições pós-verbais (165 + 99), contabilizando

69% do total.

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Nas construções VS, percebemos um equilíbrio maior (dessa vez tanto na

posição predominante quanto no somatório de ordens pré e pós-verbais). Das 45

ocorrências da estrutura VS, o circunstancial se ordenou em posição inicial, margem

esquerda (ME), em 20 casos (44,5%); se manteve em outras posições pós-verbais

mediais por 15 vezes (33%); e ainda se posicionou na margem direita (MD) em 8

orações (18%).

A expectativa, de acordo com a literatura acerca da influência da posição do

sujeito na ordenação do circunstancial, era que ele se deslocasse para a margem

esquerda quando o sujeito não estivesse presente em sua posição inicial. Embora a

diferença percentual tenha sido significativa (11,5 pontos percentuais entre a ME e as

posições pós-verbais mediais), a diferença entre a posição ME e as posições pós-verbais

mediais foi de apenas 5 dados. Tal resultado não nos permite afirmar que a tendência à

anteposição da locução em estruturas VS é categórica, no nosso corpus. Além disso, se

somarmos as posições antepostas e as pospostas, constatamos um equilíbrio total de

ocorrências antes e após o verbo – 22 casos pré-verbais (20 de ME + 2 de posições pré-

verbais mediais) e 23 de pós-verbais (8 de MD + 15 de posições pós-verbais mediais).

Tais resultados quanto à ordenação dos circunstanciais no VS são contrários aos

encontrados tanto em Lessa (2012) quanto em Soares (2012).

Alguns trabalhos na linha funcionalista (como Votre e Naro (1986) e Marques

(2012)) demonstram que há fatores de ordem discursiva que motivam ainda o uso de

VS. Orações desse tipo tendem a ter sujeito com informação nova e verbos

apresentativos e tendem a ser usadas em orações de fundo. Assim, a locução adverbial

fica na posição inicial, numa posição de tópico, servindo muitas vezes para fazer um

contraste com alguma informação já apresentada (cf. seção 5.2.3.1)

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Em seu artigo sobre a presença de circunstanciais na margem esquerda com

sujeitos antepostos e pospostos, Paiva (2011) afirma que os objetivos discursivos das

configurações XVS e XSV se diferem, pois, na primeira, o circunstancial (X) se

restringe a estabelecer relações com o contexto discursivo anterior (backward tie),

enquanto a segunda possui um escopo mais amplo (forward tie)107, podendo enquadrar

estados de coisas apresentados no discurso anterior ou no discurso subsequente.

Esses resultados evidenciam que a hipótese de deslocamento do circunstancial

para não permitir verbo em posição inicial e a hipótese do equilíbrio sintagmático não

são confirmadas. Embora haja uma tendência de o circunstancial temporal aparecer na

posição inicial (ME – 44,5%), os dados na ordem SV também se deslocam para a

margem esquerda (ME) em 26% dos casos), indicando sentenças com grande peso antes

do verbo. Por essa razão, para nós, os fatores discursivo-pragmáticos e semânticos são

essenciais para entendermos a motivação do preenchimento à esquerda da forma verbal.

Em seguida, são apresentados os resultados da ordenação do circunstancial no

francês em relação à posição do sujeito:

Tabela (5.10): Posição do sujeito X Ordem – no Francês

SV VS

N % N %

Pré

-

Ver

ba

is ME 186 33 2 7

Pré-verbais

mediais 44 7,5

0 0

s-

ver

ba

is MD 193 34 11 36,5

Pós-verbais

mediais 144 25,5

17 56,5

Total 567 100 30 100

107 Termos retomados de Charolles (2003, 2005) e utilizados por Paiva (2011).

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A diferença de tendências de ordenação do português para o francês já se

mostrou produtiva na primeira construção observada – a SV. Nela, houve um grande

equilíbrio entre o posicionamento dos circunstanciais em margem esquerda e em

margem direita – 33% (186 ocorrências em ME) e 34% (193 em MD). Conforme já

exposto na seção 5.1 esta distribuição corresponde às nossas expectativas de que o

posicionamento do circunstancial temporal não é resultado da necessidade de preencher

uma posição vazia deixada pelo sujeito (conforme também já exposto por Fuchs e

Fournier (2005). Ver seção 2.3).

Do mesmo modo que fizemos com os dados em português, ao somarmos as

ocorrências em posições pré-verbais e pós-verbais, percebemos a tendência à

posposição da locução, visto que em 230 (40,5%) casos os circunstanciais se

antepunham ao verbo – 186 (33%) dados em ME e 44 (7,5%) em posições pré-verbais

mediais – e em 337 (59,5%) ordenavam-se após a forma verbal – 193 (34%) em MD e

144 (25,5%) em posições pós-verbais mediais.

Se analisarmos segundo a ótica do Princípio de Preservação, a posposição do

circunstancial mantém o equilíbrio dentro da construção. No entanto, em francês, a

margem esquerda da oração, mesmo com o sujeito presente, tem grande produtividade,

o que nos indica resultados próximos aos encontrados por Fouchs e Fournier (2003) e

Charolles (2003), já destacados na seção 2.3. Para nós, essa margem esquerda é ocupada

pelo circunstancial quando este possui um escopo maior de atuação, conforme veremos

em 5.2.3.1.

Dos 30 dados encontrados na construção VS, 17 estiveram em posições pós-

verbais à direita do verbo (56,5%), 11 em margem direita (36,5%) e apenas 2 dados na

margem esquerda (7%). À primeira vista, esse resultado contradiz a hipótese de

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equilíbrio sintático. Contudo, conforme já exposto na seção 5.1, os casos de sujeito

posposto ao verbo são de estruturas com verbos dicendi ou estruturas fixas de

interrogação, como nos exemplos (81) e (82):

(81) Qu’attendait- [on] en effet après la mise en garde de la Commission européenne

sur le budget 2015 de la France?108 [editorial 6 – Le Figaro]

(82) “Les femmes doivent jouir d’opportunités, de protection et de droits sociaux

égaux”, déclarait [Hassan Rohani] le 8 mars, journée internacionale de la femme, sur

son compte Twitter.109 [notícia 14 – Le Figaro]

Em francês, há diferentes formas de se construir uma frase interrogativa, que

variam de acordo com o registro da língua. Em registros mais formais, ocorre a inversão

do sujeito, que praticamente se cliticiza ao verbo110. Geralmente, tais estruturas são

iniciadas ou pelo próprio verbo ou por um pronome interrogativo. No exemplo (81), a

construção é iniciada por um pronome interrogativo – que – seguido imediatamente pela

forma verbal – attendait – e pelo pronome sujeito – on. Essa estruturação não permite a

inserção do circunstancial e dificulta sua anteposição, pois o foco, nesses casos, é na

inversão V-S para indicar a interrogação.

As outras ocorrências de VS, em francês, em estrutura cristalizada, se deram nas

construções com verbo dicendi, ou verbos de elocução. Segundo Marques (2012:142),

108 O que se esperava, de fato, após a advertência da Comissão Europeia sobre o orçamento de 2015,

da França? 109 "As mulheres devem gozar de oportunidades, proteção e igualdade de direitos sociais", declarou

[Hassan Rohani] 08 de março, dia internacional da Mulher, em sua conta no Twitter. 110 Conferir Nouvelle Grammaire du Français: Cours de Civilisation Française de la Sorbonne (2004).

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“as cláusulas com verbos dicendi, especificamente, apresentam estruturas que são

cristalizações de estratégias discursivas, sedimentadas em função de sua frequência de

uso em experiências comunicativas prévias, estando, portanto, relacionadas à tradição

discursiva. Tais construções refletem uma estratégia de distanciamento do

falante/escritor em relação ao que está sendo citado, ponto em que reside o foco

sentencial.”.

Sendo assim, o papel informacional do sujeito se torna menos relevante e as

estruturas se fixam, cristalizando-se. Neste caso, a única posição disponível para o

circunstancial temporal/aspectual é a pós-verbal.

A partir dessas duas tabelas, (5.7) e (5.8), temos evidências de que a recorrência

de circunstanciais na margem esquerda da oração não se explica, pelo menos

inteiramente, por razões sintáticas. O efeito mais relevente dos fatores discursivos na

ordenação dos circunstanciais só será visto na seção 5.2.3.1.

Uma indicação de tal conclusão é a anteposição de grande número de dados,

mesmo com a posição do sujeito preenchida pelo próprio, além de, em orações VS, em

português e em francês, a locução se manter posposta ao verbo. Tal tendência também

foi constatada em Brasil (2008) e Marques (2012), mas não corrobora todos os

resultados de Soares (2012) e Lessa (2012), para o grupo de fatores tipo e realização do

sujeito.

A seguir, discutiremos a estrutura da locução adverbial e sua extensão.

5.2.1.4. Estrutura da Locução

Como já exposto nos capítulos 1 e 3 , nosso objeto de estudo são as locuções

com noção de tempo ou tempo/aspecto. Consideramos para análise tanto as prototípicas,

iniciadas por preposição (sintagma preposicional – SPrep), quanto aquelas locuções em

que a preposição não ocorre (sintagma nominal – SN). Além de identificar a estrutura

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mais recorrente nos jornais brasileiros e franceses, objetivamos verificar se a presença

da preposição favorece maior proximidade do circunstancial em relação ao verbo.

a- sintagma preposicional (Sprep)

(83) As eleições indiretas, |que devem ocorrer entre 15 de setembro e 15 de outubro, |

significam um dilema. [ notícia 16 – Folha de São Paulo]

(84) En une dizaine d'années, c'est la cinquième fois | que la France ne tient pas ses

promesses en matière de discipline budgétaire .111 [editorial 29 – Le Monde]

Como podemos observar, em (83), a preposição entre inicia o circunstancial –

entre 15 de setembro e 15 de outubro –, colocado logo após a forma verbal (devem

ocorrer). No exemplo (84), o circunstancial na margem esquerda da sentença – En une

dizaine d'années – é iniciado pela preposição en.

b- sintagma nominal (SN)112

(85) Poucos anos atrás, uma melhora de classificação de risco do país num contexto de

grande incerteza no mundo das finanças internacionais seria impensável. [editorial 9 –

Folha de São Paulo]

111 Em dez anos, esta é a quinta vez | que a França não cumpre as suas promessas em matéria de

disciplina orçamental.

112 Consideramos como SN tanto os casos em que observamos um Sprep sem cabeça quanto os casos em

que tínhamos um SN propriamente dito.

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(86) L'assaut donné par les forces de l'ordre, le 14 août, contre les campements de

manifestants pro-Morsi au Caire a déclenché un bain de sang.113 [editorial 01 – Le

Monde]

Em alguns casos, a preposição da locução adverbial temporal/aspectual pode ser

omitida, em (85), a locução adverbial ocorre sem preposição, no entanto, a noção de

circunstância em poucos anos atrás permance. Em francês, os dias semana

normalmente não são preposicionados, como o exemplo no do exemplo (86) – le 14

août – iniciado pelo artigo le.

Na tabela (5.11), verificamos a distribuição na posição dessas duas estruturas de

circunstanciais temporais e aspectuais em português e em francês:

Tabela (5.11): Estrutura da locução X Ordem – no Português

Nominal Preposicional

N % N %

Pré

-Ver

bais

AdvV 3 8 26 5

XAdvV 0 0 9 1,5

AdvXV 9 23 101 19

XAdvXV 1 2,5 10 2

s-v

erb

ais

VXAdv 5 13 179 33

VAdvX 10 25,5 81 15

VAdv 8 20,5 81 15

VXAdvX 3 7,5 47 9

AuxAdvV 0 0 1 0,5

Total 39 100 535 100

113 O ataque dado pelas forças de ordem, 14 de agosto, contra os acampamentos de manifestantes pró-

Morsi no Cairo desencadeou um banho de sangue.

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Em português, dos 574 dados, 93% (535) eram constituídos por preposição e

apenas 7% (39) eram sintagmas nominais funcionando como circunstanciais

temporais/aspectuais. Esperávamos, nesse caso, que houvesse mais dados de sintagmas

nominais na margem esquerda e que os sintagmas preposicionais ficassem mais

próximos ao verbo.

Quanto às estruturas nominais, das 39 ocorrências, apenas 12 se posicionaram na

margem esquerda (9 AdvXV e 3 AdvV). Os demais casos seguiram as tendências de

uso dos circunstanciais temporais/aspectuais do português – 10 dados ilustrativos de

VAdvX, 8 de VAdv, 5 de VXAdv, 3 de VXAdvX e somente 1 de XAdvXV.

Diante dos resultados encontrados, mostramos que esse fator estrutural, pelo

menos no português, não se mostrou relevante, principalmente devido ao reduzido

número de ocorrências de circunstancias representados por um SN.

Em francês, a discrepância entre a quantidade de SNs e SPreps encontrada no

corpus não ocorreu no mesmo nível do observado no português, conforme indica a

tabela (5.12):

Tabela (5.12): Estrutura da locução X Ordem – no Francês

Nominal Preposicional

N % N %

Pré

-Ver

ba

is AdvV 3 1 3 1

XAdvV 3 1 8 2

AdvXV 58 25 129 30

XAdvXV 9 4 15 3

s-v

erb

ais

VXAdv 42 18 100 23

VAdvX 60 26 65 15

VAdv 33 14 70 16

VXAdvX 24 10 37 8,5

AuxAdvV 3 1 7 1,5

Total 235 100 434 100

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Na tabela (5.12), verificamos que, dos 669 dados recolhidos, em 434 a estrutura

do circunstancial era o sintagma preposicional (65%) e, em 235 ocorrências, uma

estrutura nominal (35%). Nos jornais franceses, o SN com papel circunstanciador se

mostrou mais produtivo do que na outra língua em análise, aparecendo principalmente

em exemplos como o (86), que fazem referências a dias da semana ou do mês (no

exemplo, le 14 août).

A hipótese de que a falta da preposição ocorreria em posição inicial não se

comprovou na língua francesa, pois, dos 235 dados de SN, apenas 58 se deslocaram

para a margem esquerda da oração. Todas as demais ocorrências do circunstancial

temporal se mantiveram em posições à direita do verbo (60 dados em VAdvX, 42 em

VXAdv, 33 em VAdv e 24 em VXAdvX).

A seguir, analisaremos na seção 5.2.1.5 a extensão do circunstancial e sua

influencia na ordenação.

5.2.1.5. Tamanho da Locução

A partir dos subprincípios da ordenação linear – uma informação mais previsível

deve ser colocada em primeiro lugar na oração – e da integração – uma informação não

quebra a integração existente entre elementos cognitivamente relacionados (Givón

1995, 2001), nossa hipótese era de que os circunstanciais maiores se mantivessem nas

margens, principalmente a direita, e de que as posições mediais fossem ocupadas pelos

adverbiais de peso fonético menor. Para verificar a hipótese, consideramos as seguintes

possibilidades para os circunstanciais de tempo/aspecto:

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a) pequeno 1114, 2 ou 3 palavras

(87) Em abril, terminou frustrada a primeira tentativa do premiê Recep Erdogan de

emplacar Gül – no sistema turco. [editorial 6 – Folha de São Paulo]

(88) C’est dans ce climat de tension que |les Tatars de Crimée commémorent dimanche

les soixante dix ans de leur déportation par Staline, une tragédie| dont la mémpore a

été ravivée après le rattachement em mars de la péninsule ukrainienne à la Russie.115

[notícia 27 – Le Monde]

b) médio 4 ou 5 palavras

(89) Eles praticam diversos exercícios de tempos em tempos no Golfo Pérsico. [notícia

1 – O Globo]

(90) A la suite des violences, l’etat d’urgence a été décrété pour un mois et le couvre-

feu imposé dans la moitié du pays de 19 heures à 6 heures.116 [notícia 19 – Le Monde]

c) grande 6 palavras ou mais

114 Esse circunstancial com apenas uma palavra não consiste em um advérbio simples e, sim, o que a

literatura chama de sintagma preposicional sem cabeça (Ex.: Aconteceu sexta-feira, ao invés de na

sexta-feira). 115 É neste clima de tensão que | os Tatars da Criméia comemoram domingo os setenta anos de sua

deportação por Stalin, uma tragédia | que foi reavivada na memória após a ligação em março da península

ucraniana à Rússia. 116 Após as violências, o estado de emergência foi decretado por um mês e um toque de recolher imposto

em metade do país de 19:00 - 06:00.

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(91) O mais alto número de vítimas de ataques terroristas em um único dia no Iraque

desde 2003 é o saldo de 202 mortos em 23 de novembro de 2006. [notícia 15 – Folha de

São Paulo]

(92) Depuis plus d’une vingtaine d’années, en effect, c’était la règle, presque le

reflexe.117 [editorial 21 – Le Monde]

Alguns estudos sobre ordem de circunstanciais no português brasileiro já

comprovaram a motivação exercida pelo peso do circunstancial em sua ordenação (cf.

Andrade, 2005; Brasil, 2005; Ilogti de Sá, 2009; Soares, 2012; Lessa, 2012; dentre

outros). Nosso objetivo, como já destacado, era verificar se o tamanho do circunstancial

motivaria sua ordenação mais marginal ou medial. A seguir, veremos as tendências de

ordenação dos circunstanciais de acordo com os fatores discriminados anteriormente:

Tabela (5.13): Tamanho da locução X Ordem – no Português

Pequena Média Grande

N % N % N %

Pré

-Ver

bais

AdvV 23 6 4 3 2 2,5

XAdvV 4 1 3 2 2 2,5

AdvXV 65 18,5 28 19 17 22,5

XAdvXV 3 1 5 3 3 4

s-v

erb

ais

VXAdv 101 29 54 36 29 38

VAdvX 70 20 13 9 8 10,5

VAdv 52 15 28 19 9 12

VXAdvX 31 9 13 9 6 8

AuxAdvV 1 0,5 0 0 0 0

Total 350 100 148 100 76 100

117 Por mais de vinte anos, com efeito, era a regra, quase o reflexo.

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A tabela (5.13) demonstra que os circunstanciais com até três palavras são os

mais produtivos, correspondendo a 61% das ocorrências (350 dados) nos jornais

brasileiros analisados.

Correspondendo às nossas expectativas, as posições mediais, principalmente à

direita do verbo, foram preenchidas em grande parte por circunstanciais de menor

extensão. Das 350 locuções adverbiais temporais pequenas, 70 (ou seja, 20% desses

casos) posicionaram-se logo após o verbo em VAdvX e 31 (9%), em VXAdvX.

Entretanto, constatamos, maior percentual desses circunstanciais principalmente na

margem direita da oração – 101 dados (29% do total de 350 para VXAdv) e, a seguir, na

margem esquerda, com 65 (18,5%) em AdvXV. Um resultado interessante, no que

concerne às locuções menos extensas, foi a quantidade de dados em posição inicial, sem

nenhum elemento interveniente, ou seja, a ordem AdvV (ilustrada no exemplo 87). A

propósito, tal ordenação, como podemos observar na tabela (5.12), parece mais

receptiva às locuções pequenas do que aos circunstanciais de tamanhos médio e grande

(com 4 e 2 dados apenas, respectivamente).

As locuções médias mantiveram a tendência geral de se situarem nas margens da

oração. Das 148 ocorrências, 36% (54 dados) posicionaram-se na margem direita, após

um elemento X (VXAdv); 19% (28%) ainda na margem direita, mas imediatamente

após o verbo (VAdv); e os mesmos 19% (28) deslocados para a margem esquerda, antes

de um elemento X (AdvXV). Em posições mediais, os circunstanciais de 4 ou 5

palavras não se mostraram produtivos: dos 148 dados, 3 ocorreram em XAdvV, 5 em

XAdvXV, 13 em VAdvX e 13 em VXAdvX).

Com relação aos circunstanciais considerados grandes, esperávamos que os

mesmos não aparecessem em posições mediais e se mantivessem às margens da oração

para não interferir na relação entre sujeito-verbo ou verbo e complemento (Givón, 1995,

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2001). O resultado corroborou nossa expectativa, visto que, das 76 ocorrências de

circunstanciais com mais de 6 palavras, 69 permaneceram na posição final ou inicial da

oração – 29 casos (38%) em VXAdv, 19 (17%) em VAdv, 19 (17%) em AdvXV e 2

(2,5%) em AdvV.

Em português, percebemos que o peso dos circunstanciais não possui influência

predominante nas ordenações. Embora percebamos as locuções grandes tendendo a

posições marginais, conforme previsto, estas posições podem ser ocupadas também por

locuções menores. Sendo assim, percebemos que as margens da oração são as mais

recorrentes, independentemente do tamanho do circunstancial, resultado também

encontrado por Soares (2012) em sua análise sobre as locuções adverbiais inicadas pela

preposição em.118

Na tabela (5.14), vemos as tendências de usos dos circunstanciais em francês:

Tabela (5.14): Tamanho da locução X Ordem – no Francês

Pequena Média Grande

N % N % N %

Pré

-Ver

bais

AdvV 6 1,5 0 0 0 0

XAdvV 5 1 3 2 3 2,5

AdvXV 93 23 40 29 54 43,5

XAdvXV 13 3 5 3,5 6 5

s-v

erb

ais

VXAdv 81 20 33 24 28 22,5

VAdvX 99 24 21 15 5 4

VAdv 64 16 21 15 18 14,5

VXAdvX 38 9,5 13 9,5 10 8

AuxAdvV 7 2 3 2 0 0

Total 406 100 139 100 124 100

118 Ver também Paiva, 2012, sobre questão do peso dos circunstanciais.

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166

Em francês, a grande maior dos dados tem até 3 palavras (61% dos dados).

Diferentemente do observado em português, os circunstanciais pequenos, na língua

francesa, apareceram 99 vezes em posição medial logo após o verbo (24% do total de

406), VAdvX, e 93 vezes em posição AdvXV (com 23%), não havendo diferença

significativa entre essas duas posições. Essa competição entre VAdvX e AdvXV ainda

foi seguida da posição VXAdv com 20% do total.

As locuções médias mantiveram a tendência de ordenação padrão descrita na

seção 5.1 para o francês. Das 139 locuções com 4 ou 5 palavras, 29% (40 dados) se

posicionaram na margem esquerda antecedendo um X (posição AdvXV) 24%, (com 33

dados) na margem direita, após um X, em VXAdv; e 15% em cada posição pós verbal,

VAdvX (21 dados) e VAdv (21 dados). Nas posições internas pré-verbais, encontramos

poucas ocorrências, apenas 3 em XAdvV e 5 em XAdvXV.

Quanto aos circunstanciais considerados grandes, assim como em português, a

hipótese é comprovada, já que, dos 129 dados, em 100 os circunstanciais se colocaram

às margens da oração – 54 casos (43,5%) em AdvXV, 28 (22,5%) em VXAdv e 18

(14,5%) em VAdv – evitando-se, dessa forma, a infração do princípio de integração.

Entretanto, à semelhança do que encontramos para o português, não podemos

afirmar que a extensão do circunstancial o motive às margens, pois, independentemente

de seu tamanho (pequeno, médio ou grande), a ordenação com a maior quantidade de

dados foi a margem (apenas as locuções pequenas possuem ampla concorrência a

posições mediais). Em francês, a diferença mais significativa foi a leve tendência à

margem esquerda, como já verificado em outras seções, o que reforça a nossa hipótese

de que o posicionamento do circunstancial na margem esquerda da oração é motivada

por aspectos semântico-discursivos. A seguir, passamos à análise destes aspectos.

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167

5.2.2. Propriedades semânticas

A semântica da locução adverbial já se mostrou importante em diversos

trabalhos anteriores, entre eles Martelotta (1994), Ilari (2001), Andrade (2005), Ilogti de

Sá (2009), Soares (2012), Machado (2012). Na próxima subseção, apresentamos os

valores semânticos dos circunstanciais encontrados nos jornais brasileiros e franceses.

5.2.2.1. Semântica da Locução

Nesta pesquisa, consideramos os tipos semânticos já estudados em Ilogti de Sá

(2009), baseados em Martelotta (1994) e em Ilari (2001), por darem conta de algumas

noções aspectuais para as quais esperamos motivações específicas de ordenação. Os

valores considerados formam um continuum semântico que parte do mais temporal

(localizador) para o mais aspectual (reiterativo)119. Os grupos semânticos analisados

foram:

a) Localizador é aquele que situa um evento em um ponto preciso do tempo, atribuindo

maior valor temporal ao circunstancial. Em outras palavras, esse tipo de locução

determina o momento exato do evento descrito.

(93) Em outubro de 2002, Berlusconi cometeu uma gafe com Cacciari, o colega

dinamarquês Anders Rasmussen e Veronica. [O Globo, editorial, 01/02/2007]

119 Cf. capítulo 2, Machado (2012)

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168

(94) Or, ce record devrait être battu cette année.120 [editorial 25 – Le Monde]

No exemplo (93), a locução em outubro de 2002 mostra a data precisa em que

Berlusconi cometeu a gafe, e, em (94), o circunstancial temporal cette année (neste ano)

indica quando o recorde deverá ser batido (ce record devrait être battu). Este valor

temporal é o de maior produtividade tanto no português quanto no francês, em todo o

corpus analisado.

b) Reiterativo: expressa uma ação que se repete no tempo, iterativa, corresponde ao

valor aspectual.

(95) No momento, a inércia parece não cobrar preço. No futuro, ele poderá revelar-se,

mais uma vez, muito elevado. [editorial 9 – Folha de São Paulo]

(96) L’armée qui a une longue tradition d’intervention dans la vie publique en Egypte,

se retrouve donc de nouveau au pouvoir au Caire.121 [ editorial 14 – Le Monde]

No exemplo (95), vemos que o circunstancial aspectual mais uma vez indica que

o preço – retomado pelo pronome ele na oração – será revelado novamente em

determinado período de tempo. Em (96), a locução adverbial de nouveau (de novo)

indica que as forças armadas (L’armée) se encontra (se retrouve), mais ume vez, no

poder do Cairo, ou seja, é um evento que ocorreu algumas vezes durante um período de

tempo.

120 Ora, este recorde deveria ser batido este ano.

121 As forças armadas, que têm uma longa tradição de intervenção na vida pública no Egito, encontra-se,

então, de novo no poder no Cairo.

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169

c) Durativo: representa o valor aspectual que expressa uma ação duradoura no tempo.

(97) Durante o trimestre, mais 29 mil pessoas assinaram o serviço básico de televisão

a cabo (editorial, O Globo 31/01/2007)

(98) En particulier la France, l’Espagne et l’Italie, |qui n’ont eu de cesse de soutenir

Ben Ali pendant ses vingt-trois ans de règne.122 [editorial 2 – Le Monde]

Nos exemplos (97) e (98), o circunstancial expressa, respectivamente, a duração

do tempo em que houve um grande número de assinaturas de televisão a cabo – durante

o trimestre – e em que o apoio foi dado por França, Espanha e Itália – pendant ses

vingt-trois ans de règne (durante seus vinte e três anos de reinado).

d) Delimitativo: corresponde ao circunstancial que delimita o tempo da ação, seja no

início, no meio ou no fim.

(99) Embora constituam de 60% a 65% da população nacional e hoje detenham o

governo, os xiitas foram reprimidos durante o regime do ditador sunita Saddam

Hussein,| que comandou o país no período de 1979 a 2003. [editorial 11 novo – Folha

de São Paulo]

122 Em especial a França, Espanha e Itália, | que não têm deixado de apoiar Ben Ali durante seus vinte e

três anos de reinado.

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(100) Depuis son entrée em campagne le 7 décembre, sa progression l’a même fait

atteindre um niveau d’intentions de vote légérement supérieur à celui qu’il avait en

2007.123 [notícia 2 – Le Monde]

No exemplo (99), o circunstancial no período de 1979 a 2003 determina o início

e o fim do evento assinalado anteriormente. Em (100), a locução Depuis son entrée en

campagne le 7 décembre (desde sua entrada na campanha em 7 dezembro), demarca o

início do progresso de aumento nas intenções de voto.

e) Simultâneo: corresponde ao valor em que eventos ocorrem ao mesmo momento. Em

função de seu importante papel coesivo – ligar dois ou mais eventos ocorrendo

simultaneamente – é esperado que as locuções com este valor semântico apresentem

uma posição mais fixa na oração.

(101) Em paralelo, o STF também sancionou medida a respeito dos chamados

embargos declaratórios. [editorial 5 novo – Folha de São Paulo]

(102) Plusieurs personnes hurlent en même temps.124 [notícia 30 – Le Figaro]

Nos dois exemplos apresentados, as locuções em paralelo e en même temps

indicam, respectivamente, que a sanção realizada pelo STF ocorreu de maneira

simultânea ao evento descrito anteriormente e que muitas pessoas efetuavam uma ação

(hurlent) ao mesmo tempo.

123 Desde sua entrada na campanha em 7 de dezembro, seu progresso o fez até atingir um nível de

intenções de voto ligeiramente maior do que era em 2007. 124 Muitas pessoas berram ao mesmo tempo.

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Nossas expectativas iniciais eram, em relação às duas línguas, (a) que os

circunstanciais com valor temporal (localizadoras) ocupassem mais a margem esquerda

da oração, e (b) que, por outro lado, aqueles com valor mais aspectual (em particular as

locuções reiterativas) estivessem mais presos ao verbo, ocupando, por isso, posições

mediais.

Tabela (5.15): Semântica locução X Ordem – no Português

Reiterativa Durativa Delimitativa Simultânea Localizadora

N % N % N % N % N %

Pré

-Ver

ba

is

AdvV 4 14 2 3 7 5 0 0 16 5

XAdvV 1 3 1 2 3 2 0 0 4 1

AdvXV 2 7 12 20 32 22 3 60 61 18

XAdvXV 0 0 0 0 2 1 0 0 9 3

s-v

erb

ais

VXAdv 8 27,5 17 29 59 40 1 20 99 29,5

VAdvX 6 20,5 8 13,5 16 11 0 0 61 18

VAdv 4 14 11 19 17 11,5 1 20 56 17

VXAdvX 4 14 8 13,5 11 7,5 0 0 27 8

AuxAdvV 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0,5

Total 29 100 59 100 147 100 5 100 334 100

Nos jornais brasileiros analisados, encontramos 334 ocorrências de

circunstanciais com valor localizador temporal, ou seja, 58% dos 574 dados. Os

circunstanciais com valor delimitativo apresentaram-se como o segundo mais produtivo,

com 26% do total (147 ocorrências). Em sequência, tivemos as locuções durativas,

representando 10% do corpus (59 dados), e as reiterativas, com 5% dos dados (29

dados). O valor simultâneo apareceu em apenas 5 casos, contabilizando apenas 1% do

total.

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172

A grande quantidade de dados com valor de localizador nos mostrou como

tendência de ordenação as mesmas posições predominantes em todo o corpus da língua.

Dos 334 dados, 99 (29,5%) se posicionaram na margem direita da oração, após um

elemento X interveniente. Para a margem esquerda, na posição AdvXV, obtivemos

exatamente a mesma quantidade de casos que na posição medial à direita do verbo,

VAdvX. Em ambas as posições, 18% dos circunstanciais eram localizadores (61 dados).

Em seguida, com apenas 5 dados de diferença, aparece a posição ainda pós-verbal

VAdv, com 17% dos casos (56 ocorrências).

Nossa hipótese era que o valor semântico localizador da locução propiciasse o

uso nas margens, em particular na margem esquerda, por localizar imediatamente o

evento descrito. Entretanto, verificamos que a posição prototípica do circunstancial

localizador em português é a margem direita. Ao amalgamarmos algumas ordenações,

percebemos que, dos 334 dados de circunstanciais localizadores, 155 permaneceram na

margem direita do verbo (99 casos em VXAdv e 56 em VAdv) e apenas 77 se situaram

na margem esquerda da oração (61 dados em AdvXV e 16 em AdvV). Esta distribuição

corrobora a já constatada em Ilogti de Sá (2009).

Os circunstanciais delimitativos apareceram em 26% do corpus e sinalizaram

para as mesmas tendências de uso das localizadoras. Do total de 147 dados, 59 (40%)

ordenaram-se à direita do verbo com um elemento X interveniente, VXAdv; 32 (22%)

deslocaram-se à esquerda da oração, em posição AdvXV; 17 (11,5%) na margem direita

imediatamente após o verbo, VAdv; 16 (11%) em posição VAdvX.

Ao amalgamarmos as ordenações com os circunstanciais delimitativos,

percebemos a mesma predileção pela margem direita. Em 147 dados com tais

circunstanciais, 76 estavam na margem direita (59 em VXAdv e 17 em VAdv) – 52%

desse total – e apenas 39 na margem esquerda (32 em AdvXV e 7 em AdvV),

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173

representando 26,5%. Verificamos que as locuções delimitativas possuem a mesma

ordenação das localizadoras, portanto, essa distinção semântica não se mostra relevante

para a ordenação dessas locuções.

As locuções adverbiais com valor durativo apresentaram uma produtividade

menor, com 59 ocorrências de 574 dados – 10% do total do português. Entretanto, a

diferença numérica não trouxe alterações nas tendências de uso desses circunstanciais.

Dos 59 casos, 17 (29%) correspondem à margem direita com o X entre os elementos,

VXAdv, e 12 (20%), à posição AdvXV. As demais ordenações pospostas ainda se

mostraram produtivas: em 19% (11 dados) os circunstanciais aparecem na posição

VAdv; em 13,5% (8 dados), na posição VAdvX; e, com a mesma quantidade,

encontramos a ordem VXAdvX.

As locuções adverbiais reiterativas são aquelas consideradas mais aspectuais

dentre todas as semânticas estabelecidas para as locuções. Por ser o aspecto uma

categoria mais inerente ao verbo, esperávamos que esses circunstanciais fossem os mais

propícios a posições mediais. Em todo o corpus, encontramos 29 locuções adverbiais

com esse valor semântico, dentre as quais, ainda mantendo a tendência geral de

ordenação para o português, observamos 8 (27,5%) em posição VXAdv, ou seja, na

margem direita da oração. Nossa expectativa só foi confirmada ao somarmos os casos

de circunstanciais em posições próximas ao verbo. Dessa forma, verificamos a

ocorrência de 15 dados – 6 (20,5%) VAdvX, 4 (14%) AdvV, 4 (14%) VAdv, 1 (3%)

XAdvV.

Com relação aos circunstanciais indicativos de simultaneidade, esperávamos que

aparecessem preferencialmente na margem esquerda da oração, pois possuem um valor

coesivo importante com o discurso antecedente. Em português, dos 5 que possuíam tal

valor semântico (no total de 574 dados gerais), 3 deslocaram-se à esquerda, conforme o

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174

previsto. No entanto, pouco podemos afirmar em função da quantidade muito reduzida

de ocorrências.

A análise da semântica dos circunstanciais em português mostra que os padrões

de ordenação destes constituintes são independentes, como já indicado em Ilogti de Sá

(2009). Com uma amostra de dados ampliada/reformulada, percebemos que o papel

semântico dos circunstanciais temporais e aspectuais pouco influencia o deslocamento

dos adverbiais para posições diferentes da margem direita. Apenas os de valor

claramente aspecutal, como os reiterativos, apresentam uma tendência mais nítica de se

posicionarem mais próximos ao verbo.

Veremos em (5.16) que os circunstanciais, em francês, apresentam tendências

diferentes das encontradas no português.

Tabela (5.16): Semântica locução X Ordem – no Francês

Reiterativa Durativa Delimitativa Simultânea Localizadora

N % N % N % N % N %

Pré

-Ver

ba

is

AdvV 0 0 3 2,5 1 0,5 0 0 3 1

XAdvV 0 0 2 1,5 5 2,5 0 0 4 1

AdvXV 7 23 30 26 70 36,5 0 0 80 24

XAdvXV 0 0 1 1 10 5 0 0 13 4

s-v

erb

ais

VXAdv 4 13 26 23 39 20,5 0 0 73 22

VAdvX 8 27 21 18 19 10 0 0 77 23

VAdv 8 27 20 17,5 26 14 1 0 48 14,5

VXAdvX 2 7 10 9 18 9,5 0 0 31 9,5

AuxAdvV 1 3 2 1,5 3 1,5 0 0 4 1

Total 30 100 114 100 191 100 1 0 333 100

Em francês, assim como em português, o valor semântico mais produtivo foi o

localizador, com 333 dados (50% do total de 669 encontrados no corpus). Em linhas

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175

gerais, encontramos na língua francesa uma maior quantidade de locuções com valores

delimitativo e durativo: as primeiras apareceram em 28,5% dos dados (191 casos) e a

segunda, em 17% (114 dados). Locuções de valor aspectual, reiterativo, são

representadas por apenas 30 casos, contabilizando apenas 4% do total. Por fim, só

houve 1 caso de circunstancial simultâneo no corpus, identificado no exemplo (102),

retomado em sequência.

(102) Plusieurs personnes hurlent en même temps.125 [notícia 30 – Le Figaro]

Nossa expectativa inicial era que os circunstanciais localizadores

predominassem na margem esquerda da oração – hipótese não comprovada em

português. Dos 333 dados com esse valor semântico, 80 (24%) deslocaram-se para a

posição AdvXV. Em seguida, destacam-se duas ordens pós-verbais com número

significativo de ocorrências: 77 dados (23%) aparecem em VAdvX e 73 (22%) em

VXAdv.

Estes primeiros resultados apontam uma diferença significativa no que concerne

à comparação entre as duas línguas. Conforme exposto na seção 5.1, esperávamos que,

em francês, língua em que o sujeito é obrigatoriamente preenchido, a quantidade de

circunstanciais em margem esquerda não fosse a preponderante, para não comprometer

o equilíbrio sintagmático em função do peso maior à esquerda do verbo (cf. Votre e

Naro 1986). Entretanto, verificamos que a posição geral predominante do circunstancial

no francês é uma das predominantes para o a locução localizadora, a ordenação AdvXV.

Mesmo que a diferença para a segunda ordenação não tenha sido significativa,

125 Muitas pessoas berram ao mesmo tempo.

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176

percebemos que a tendência, nessa língua, ao contrário do português, é a colocação do

temporal no início da oração.

Para os circunstanciais delimitativos, verificamos a mesma tendência à margem

esquerda, e, dessa vez, com uma variação considerável em relação à segunda posição.

Dos 191 dados de locuções adverbiais com valor delimitativo, em 70 (36,5%) elas se

deslocaram para a margem esquerda da oração, posição AdvXV, a preferida pelos

circunstanciais franceses no geral. A diferença para a segunda ordem ocupada pela

locução adverbial foi de 16 pontos percentuais – atestamos 20,5% dos dados (39 casos)

em posição VXAdv. Com relação às delimitativas, a margem direita da oração não é a

preferencial nem quando amalgamamos os dados, pois a margem esquerda aparece 71

vezes (70 AdvXV e 1 AdvV) e a margem direita, 65 (39 VXAdv e 26 VAdv).

Os resultados para os circunstanciais durativos no francês foram mais próximos

às tendências encontradas em português, embora ainda com a preponderância da

margem esquerda da oração. Nas 114 ocorrências de adverbiais com esse valor

semântico, observamos 30 (26%) na ordem AdvXV, seguida da ordem VXAdv, com 26

dados (23%). Outras duas posições pós-verbais ainda sobressaem: VAdvX, com 18%

(21 casos), e VAdv, com 17,5% (20 dados).

Para o circunstancial reiterativo, entretanto, a proximidade em relação ao verbo

aparece mais claramente. Das 30 ocorrências de circunstanciais reiterativos, 16

posicionaram-se imediatamente após o verbo (8 em cada posição VAdvX e VAdv,

contabilizando 27% para cada uma) e 1 apresentou-se entre o auxiliar e o verbo

principal da locução verbal. Não fica excluída, no entanto, uma certa recorrência da

ordem mais produtiva do francês que ocorreu em 7 dados (23% em AdvXV).

O valor semântico da locução mostrou-se de extrema relevância para a

comparação entre as duas línguas. A partir desse fator, percebemos que há uma

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177

diferença entre a preferência de ordem no francês e no português. Embora as posições

pós-verbais sejam as mais produtivas, a ordenação predominante da locução adverbial

em francês é a sua anteposição ao sujeito da oração, ou seja, AdvXV, distinguindo-se do

português, no qual verificamos a posição final como prototípica (MD).

Na seção subsequente, discutiremos sobre os fatores discursivos, a partir dos

quais esperamos obter respostas sobre a função dos circunstanciais situados na margem

esquerda da oração.

5.2.3. Propriedades Discursivo-Pragmáticas

Nessa subseção, apresentaremos os fatores de natureza discursiva que

consideramos para a análise da ordenação dos circunstanciais no português e no francês.

Verificamos o papel discursivo desempenhado pela locução adverbial de tempo/aspecto

e o gênero textual no qual os circunstanciais estão inseridos. A partir desses fatores,

concluiremos nossa análise perpassando desde critérios mais sintáticos e semânticos, até

os discursivos, apontados nesta seção.

5.2.3.1. Papel Discursivo

Conforme Paiva (2008), os circunstanciais temporais e aspectuais não têm como

função apenas indicar coordenadas temporais dos eventos descritos. Tais adjuntos

“podem desempenhar diferentes funções na organização do discurso e constituem

instrumentos imprescindíveis no gerenciamento da interação”126 . Para tanto, sua função

na macroestrutura do texto no qual está inserido deve ser analisada, ou seja, devemos

126 Cf. também Van Dijk, 1982; Givón, 1983; Chafe, 1984

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178

levar em consideração não só a oração em que o circunstancial se posiciona e, sim, um

contexto maior.

Ilogti de Sá (2009) baseou-se nas funções exercidas pelos circunstanciais,

apresentadas em Paiva (2008) e Brasil (2005)127, para sua na análise no corpus

jornalístico estudado. Na presente pesquisa, retomamos essa reorganização, baseada nos

autores supracitados, para a comparação dos dados em português e francês. As funções

discursivas consideradas foram:

a) Especificação de coordenadas temporais – o circunstancial informa sobre o tempo ou

o aspecto do evento, indicando apenas uma coordenada temporal, sem que se faça

referência a eventos anteriores descritos, ou seja, possui um escopo reduzido.

(103) Decisão recente da Suprema Corte americana validou o referendo |no qual os

eleitores de Michigan baniram, em 2006, o critério racial na admissão às

universidades públicas daquele Estado [editorial novo 3 – Folha de São Paulo]

(104) Les malversations financières reprochées à Liu Zhijun avaient profondément terni

l’image du réseau ferroviaire chinois, dont l’édification rapide forçait jusque-là

l’admiration, bien au-delà des frontières de l’empire du Milieu. Une réputation qui

avait fini d’être entamée par la collision de deux TGV |qui avait fait 40 morts le 23

juillet 2011 près de Wenzhou, dans l’est du pays, quelques mois à peine après le

limogeage de Liu Zhijun.128 [notícia 1 – Le Figaro]

127 A proposta de Paiva, 2007, e Brasil, 2005, estão expostas no capítulo 2. Na nossa pesquisa, nós nos

baseamos nas funções propostas pelas autoras e fizemos algumas adaptações em função dos tipos de

dados que encontramos e quantidade de dados. 128 Os desfalques financeiros alegados à Liu Zhijun tinham danificado, profundamente, a imagem da rede

ferroviária chinesa, cuja construção rápida forçava até então, a admiração muito além das fronteiras do

Império do Meio. Uma reputação que tinha acabado de ser iniciada pela colisão de dois TGVs | que tinha

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179

Nos exemplos, os circunstanciais temporais determinam o momento em que o

evento ocorre. Em (103), o circunstancial em 2006 localiza no tempo a ação de banir,

realizada pelos eleitores de Michigan. Em (103), o circunstancial le 23 juillet 2011

indica quando ocorreu o fato de 40 pessoas morrerem após uma colisão. Esses dois

circunstanciais representam uma informação nova no discurso, referente apenas à

oração em que estão inseridos, ou seja, seu escopo é restrito, já que não faz referência

anafórica ou indica uma sequência temporal, por exemplo.

É importante destacar que todas as outras funções se relacionam a essa, uma vez

que todas possuem o papel de circunstanciador temporal. A diferença é que seu segundo

papel vai além de indicar o tempo, devido à sua função coesiva dentro do discurso no

qual está inserido.

b) Retomada anafórica – o circunstancial retoma uma referência temporal já apresentada

no discurso, possuindo um papel coesivo importante.

(105) A expectativa era investir R$ 188 milhões em 2004 e criar 260 mil vagas por ano.

Lula anunciou que seria possível chegar a 500 mil postos.

Oito meses depois, o Primeiro Emprego só tinha levado à contratação de um copeiro

em Salvador. De lá para cá, apenas 15 mil vagas foram criadas, mesmo depois de

suspensa a exigência de interromper demissões. [editorial 3 – Folha de São Paulo]

No exemplo (105), os dois circunstanciais destacados – Oito meses depois e De

lá para cá – estabelecem uma relação anafórica com outros elementos presentes no

feito 40 mortos, em 23 de julho de 2011, perto de Wenzhou, no leste do país, apenas alguns meses após a

demissão de Liu Zhijun.

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discurso precedente elementos do discurso. No primeiro caso, o sintagma nominal com

função de circunstancial indica o momento em que o primeiro emprego havia levado à

contratação de apenas um copeiro, retomando a informação anterior de que isso ocorreu

oito meses após o anúncio feito por Lula. No segundo caso, além de delimitar o

momento em que as vagas foram criadas, o sintagma preposicional refere-se à situação

descrita antes. Na verdade, nesses dois casos, o circunstancial toma como ponto de

ancoragem o discurso pronunciado por Lula, anteriormente citado. Dessa forma, só

podemos compreender as coordenadas temporais introduzidas pelos circunstanciais a

partir do conhecimento do discurso anterior.

No exemplo (106), verificamos como isso ocorre em francês:

(106) Dimanche, le ton est monté d'un cran entre les deux pays, Riyad accusant

ouvertement Téhéran d'ingérence en exhortant l'Iran à «ne pas aider les activités

criminelles des houthistes contre le régime légitime du Yémen» et à «stopper la

livraison d'armes». Trois jours plus tôt, le chef de la diplomatie américaine avait lui

aussi pointé un doigt accusateur en direction de l'Iran.129 [notícia 6 – Le Figaro]

O circunstancial Trois jours plus tôt (três dias mais tarde) refere-se ao momento

em que o chefe norte-americano acusou o Irã, tomando como ponto de referência

temporal (dimanche) já introduzida no discurso anterior

Não encontramos essa relação coesiva apenas nas funções anafóricas. Ao

introduzirmos um assunto novo, ou quando criamos um subtópico, também percebemos

129 Domingo, o tom subiu de nível entre os dois países, Riyadh acusando abertamente Teerã de

interferência, incitando o Irã a “não ajudar as atividades criminosas de Houthi contra o regime legítimo do

Iêmen” e a “parar a entrega de armas”. Três dias antes, o chefe da diplomacia norte-americana também

tinha apontado um dedo acusador para o Irã.

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uma ampliação funcional do circunstancial temporal/aspectual, como veremos na

terceira função em seguida.

c) Introdução de subtópico (assunto) – o circunstancial inicia um novo evento, um novo

episódio, um novo assunto, ou um subtópico dentro de um assunto mais geral (cf. Van

Dick, 1982).

(107) Não deixa de ser incômoda a proximidade entre o episódio da semana passada

em que servidores do IBGE ameaçaram entregar os cargos em reação à suspensão da

Pnad Contínua, dando margem a suspeitas de manipulação por parte do governo, e

outra mudança metodológica em preparo pelo respeitado instituto estatístico.

No início de maio o IBGE reformulará a coleta de dados de produção da indústria

para aumentar a quantidade de produtos considerados e empresas entrevistadas. Longe

de sugerir interferência ou partidarização do órgão, desta vez a mudança é bem-vinda

e resultará em mapeamento melhor do setor, que representa quase 15% do PIB.

[editorial 16 – Folha de São Paulo]

No parágrafo inicial, somos apresentados à opinião do editorial sobre o assunto

em pauta – as suspeitas de manipulação do governo. O circunstancial No início de

maio aparece iniciando o parágrafo seguinte, ao termos uma mudança no foco na

argumentação. A partir daí o editor expõe a atitude do órgão IBGE, apresentando a

solução do problema e a opinião do jornal sobre tal atitude. Nesse caso, ocorre um

subtópico, relacionado ao fato anterior, mas com mudança de perspectiva e de

participantes.

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(108) Les dépouilles appartiennent à des marins et Marines tous embarqués, le jour de

l'attaque, à bord l'USS Oklahoma. En ce 7 décembre 1941, le cuirasser fut touché au

petit matin par quatre torpilles japonaises avant de chavirer et de couler avec son

équipage. Dans les jours suivants, 32 hommes piégés à l'intérieur de l'épave purent être

sauvés. Au total, 429 Américains périrent dans le naufrage. De 1942 à 1944, tous les

corps des victimes furent évacués de l'épave. Mais seules 35 d'entre elles purent être

identifiées. Une fois la guerre terminée, plusieurs tentatives furent lancées pour

identifier les disparus. Mais il a fallu attendre 2003 et la persévérance d'un vétéran,

scandalisé de voir toutes ces tombes anonymes, pour voir l'identification de six

nouveaux corps.

À présent, le Pentagone a décidé de mettre les moyens. Des techniques modernes

d'identification, notamment des tests ADN, seront employées. Une fois identifiés, les

corps seront retournés à leurs proches avant d'être à nouveau inhumés avec les

honneurs militaires. Pour l'heure, le ministère de la Défense reste prudent même si une

grande partie des disparus de l'USS Oklahoma devraient pouvoir être identifiés. Toutes

les familles des victimes ne pourront pas retrouver leur proche, prévient ainsi Robert

Work.130 [notícia 16 – Le Figaro]

130 Os restos pertencem aos marinheiros e fuzileiros navais todos embarcados, no dia do ataque, a bordo

do USS Oklahoma. Neste 07 de dezembro de 1941, a blindagem foi atingida no início da manhã por

quatro torpedos japoneses antes de virar e afundar com sua tripulação. Nos dias seguintes, 32 homens

presos nos destroços foram salvos. No total, 429 americanos morreram no naufrágio. De 1942 a 1944,

todos os corpos das vítimas foram retirados dos destroços. Mas apenas 35 delas puderam ser

identificadas. Uma vez terminada a guerra, várias tentativas foram lançados para identificar os

desaparecidos. Mas foi preciso esperar 2003 e a perseverança de um veterano, chocado ao ver todas essas

sepulturas anônimas, para ver a identificação de seis novos corpos.

Agora, o Pentágono decidiu usar seus meios. Serão utilizadas técnicas modernas de identificação,

incluindo o teste de DNA. Uma vez identificados, os corpos serão devolvidos aos seus entes queridos

antes de serem enterrados com honras militares. Por agora, o Ministério da Defesa é cauteloso, embora

grande parte dos desaparecidos de USS Oklahoma devam ser identificados. Todas as famílias das vítimas

poderão encontrar seu ente querido, e prevê Robert Work.

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A notícia do exemplo (108) relata o fato de os EUA, 73 anos depois, resolver

sustentar financeiramente a identificação dos mortos do ataque a Pearl Harbor. No

parágrafo anterior ao do circunstancial À présent, há uma breve narrativa do

acontecimento do ataque a um navio de guerra americano e das tentativas subsequentes

de identificação dos soldados mortos. O foco narrativo então muda, quando, o sintagma

preposicional aparece indicando que agora o Pentágono agirá de forma diferente, com

técnicas modernas para a identificação. O circunstancial temporal nesse caso teve o

papel de estabelecer uma fronteira discursiva entre as duas situações narradas – o que

aconteceu no passado e o que será feito a partir de agora –, indicando o início de um

novo episódio e uma quebra da continuidade temática.

A quarta função sinalizada para o circunstancial é comum em textos narrativos,

pois demarca uma sequência temporal, como veremos a seguir:

d) Sequência temporal – o circunstancial demarca pontos de uma sequência temporal,

que se sucedem ao longo de um evento; são marcas linguísticas específicas para

demarcar uma sucessão de acontecimentos dentro de um evento.

(109) Mesmo com a proibição, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)

prevê a importação de substâncias ilegais para fins terapêuticos.

A agência se reuniu com a família no dia 15 de abril para orientar sobre a importação,

que deverá ser feita com um formulário detalhando a natureza da substância, um laudo

e uma prescrição médica. O remédio chegou à casa de Fischer no dia 30. [notícia 13

nova – Folha de São Paulo]

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No exemplo (109), percebemos nitidamente a sequência de ações estabelecidas

na notícia. Primeiramente, houve uma demarcação temporal de quando a agência se

reuniu com a família – no dia 15 de abril. Após essa reunião e a explicação do que

deveria ser feito, a conclusão do evento é apresentada, com a chegada do remédio à

residência, em outra data – no dia 30. Nesse caso, a demarcação de pontos sucessivos

do evento não ocorreu no início da oração, como o esperado, já que há uma relação com

o discurso anterior. No entanto, não podemos descartar os eventos enumerados a partir

de sua localização temporal. O exemplo (110), exemplifica essa função do

circunstancial em francês:

(110) Il s'agit pour le président de la République d'assumer fermement, même aux yeux

d'une majorité qui ne le partage pas, son réformisme. Jusqu'à présent, il ne l'a exprimé

que dans des cercles restreints. Le 23 mai, à Leipzig, devant le SPD, il a salué les

"réformes courageuses" de Gerhard Schröder, soulignant que "le réformisme n'est pas

l'acceptation d'une fatalité mais l'affirmation d'une volonté". Le 11 juin, il a rendu

hommage au "choix du réformisme" de Pierre Mauroy, affirmant que "réformer, ce

n'était pas céder à la réalité, c'était la saisir à la gorge pour la transformer", et aussi

"inscrire la gauche dans la durée".131 [editorial 8 – Le Monde]

No trecho do exemplo (110), observamos uma sequência de ações associadas ao

presidente. A sucessão se inicia com o circunstancial Jusqu'à présent (Até o presente),

indicando que até agora o presidente só exprimiu seu reformismo em círculos restritos.

131 Trata-se, para o Presidente da república, assumir firmemente seu reformismo, mesmo aos olhos de

uma maioria que não concorde com ele. Até agora, ele o manifestou/expressou apenas em círculos

restritos. Em 23 de maio, em Leipzig, diante do SPD, ele cumprimentou pelas "reformas corajosas" de

Gerhard Schröder, enfatizando que "o reformismo não é a aceitação do destino, mas a afirmação de uma

vontade." Em 11 de junho, ele prestou homenagem à "escolha de reformismo" de Pierre Mauroy,

afirmando que "reformar, não era ceder à realidade, mas ???? para transformá-la", e também "inscrever a

esquerda ao longo do tempo. "

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A partir dessa afirmativa, duas sequências de datas – Le 23 mai e Le 11 juin – são

colocadas para apontar os momentos em que ele fez declarações públicas. Nesse caso,

tivemos uma enumeração, uma marcação de pontos distintos relacionados entre si,

descrevendo ações do sujeito (um evento no dia 23 de maio, outro no dia 11 de junho).

A distinção entre cada uma das funções discursivas dos circunstanciais não é

categórica, pois as fronteiras entre elas não são totalmente excludentes e, em alguns

casos, algumas dessas funções se sobrepõem. A quinta função discursiva, observada,

tenta dar conta dessas ocorrências.

e) mista – o circunstancial retoma uma referência anterior e ao mesmo tempo marca um

novo episódio, associando duas funções: a anafórica e a mudança de assunto.

(111) A Casa Branca repudiou nesta quinta-feira as ameaças do aiatolá Ali Khamenei,

e afirmou que os Estados Unidos não têm a intenção de entrar em guerra com o Irã.

Khamenei se referiu aos "rumores" de um possível ataque americano contra o Iraque, e

acrescentou que estas questões "não assustam" o Irã, pois não é a primeira vez que o

país é atacado pelos EUA.

O líder se mostrou convencido de que "os inimigos não cometerão tal erro, já que

sabem muito bem que desta forma poriam em perigo seus próprios interesses".

No mesmo dia do duro discurso de Khamenei contra os EUA, o Irã testou com sucesso

um míssil terra-mar de alcance de 350 km. O teste foi realizado durante o segundo dia

de manobras aeronavais na região do Golfo, informou a TV estatal. [notícia 1 – O

Globo]

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No exemplo (111), o circunstancial destacado estabelece clara relação anafórica

com o evento anterior (o duro discurso do líder, apresentado no parágrafo antecedente).

Além dessa função, percebemos a mudança no foco narrativo e a introdução de um

assunto, já que agora a informação em destaque é o teste ocorrido no Irã, até então não

mencionado no discurso.

Em (112), temos um exemplo dessa interseção de funções discursivas em

francês:

(112) Si je reçois le mandat du pays d'être le prochain président, je ne veux être jugé

que sur un seul objectif : (...) est-ce que les jeunes vivront mieux en 2017 qu'en 2012 ?

Je demande à être évalué sur ce seul engagement, sur cette seule vérité, sur cette seule

promesse ! (...) Ce n'est pas un engagement à la légère que je prends. C'est pour

mobiliser toute la nation par rapport à cet enjeu." C'était le 22 janvier 2012 au

Bourget, le candidat François Hollande s'adressait à une jeunesse "trahie", "sacrifiée,

abandonnée, reléguée" et proclamait : "C'est pour la jeunesse de notre pays que je veux

présider la France."

Un mois avant son élection, le 4 avril 2012 à Rennes, M. Hollande avait confirmé cette

"seule priorité " en annonçant qu'"un grand ministère d'Etat consacrera cette

ambition". Mais en lieu et place du "ministère de l'éducation, de la jeunesse, de

l'avenir" promis, le gouvernement s'est retrouvé classiquement et banalement doté, avec

Valérie Fourneyron, d'une ministre des sports... et de la jeunesse. Aujourd'hui, un jeune

de moins de 25 ans sur quatre est au chômage et, selon une étude du cabinet Deloitte,

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27 % des jeunes diplômés veulent travailler hors de France, contre 15 % en 2012. La

jeunesse reste "sacrifiée, abandonnée, reléguée".132 [editorial 4 – Le Monde]

O editorial do Le Monde tem início com a reprodução de falas do até então

candidato a presidente da República, com uma certa ironia, e finaliza o primeiro

parágrafo nomeando o autor do discurso, relatando um último discurso direto. O

circunstancial temporal Un mois avant son élection, le 4 avril 2012 introduz o

parágrafo em sequência, retomando, através do pronome possessivo son, o termo já

mencionado anteriormente - le candidat François Hollande. Além dessa relação

anafórica do circunstancial, percebemos uma mudança de foco e de plano discursivo:

agora, o editor disserta sobre os eventos, retirando o tom irônico presente no primeiro

parágrafo do editorial.

Nossa expectativa é a de que os circunstanciais com função na macroestrutura

do texto – as locuções anafóricas, as introdutoras de assunto, as indicadoras de

sequência temporal e as mistas – aparecessem predominantemente na margem esquerda

da oração, estabelecendo ligações entre partes do texto. Por outro lado, aquelas com

uma função mais restrita à oração, apenas se referindo ao tempo do evento, tenderiam a

posições pós-verbais, ocupando seja posições mais ligadas ao verbo, seja a margem

direita da oração.

132 Se eu conseguir o mandato do país para ser o próximo presidente, eu só quero ser julgado em um único

objetivo (...) os jovens viverão melhor em 2017 do que em 2012? Desejo ser avaliado exclusivamente

sbre este compromisso, esta única verdade, sobre esta única promessa! (...) Não é um compromisso de

ânimo leve que tomo. É para mobilizar toda a nação em relação a esta questão". Era 22 de janeiro de 2012

em Paris, François Hollande se dirigia a uma juventude "traída", "sacrificada, abandonada, relegada” e

proclamava: "É para a juventude de nosso país que eu quero presidir a França."

Um mês antes de sua eleição, em 4 de abril de 2012 em Rennes, Hollande tinha confirmado esta "única

prioridade", anunciando que "um grande ministério de estado se dedicará a esta ambição”. Mas no lugar

do "Ministério da Educação, da Juventude, do futuro", prometido, o governo encontrou-se clássica e

banalmente dotado, com Valérie Fourneyron, de uma ministra do desporto e ... da juventude. Hoje, um

jovem com menos de 25 em cada quatro está desempregado e, de acordo com um estudo realizado pela

Deloitte, 27% dos diplomados querem trabalhar fora da França, contra 15% em 2012. O jovem

permanece "sacrificado, abandonado, relegado ".

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Verificaremos a seguir as tendências encontradas nas duas línguas:

Tabela (5.17): Papel discursivo da locução X Ordem – no Português

especificação

de coord.

temp.

anafórica

introdução

de assunto

sequência

temporal

mista

N % N % N % N % N %

Pré

-Ver

ba

is

AdvV 10 2,5 3 5 10 18,5 5 8 1 0

XAdvV 7 2 0 0 0 0 2 3 0 14

AdvXV 31 8 18 33 37 68,5 18 29,5 6 86

XAdvXV 9 2 1 2 0 0 1 1,5 0 0

s-v

erb

ais

VXAdv 156 39 11 20 3 5,5 14 23 0 0

VAdvX 77 19,5 5 9 3 5,5 6 10 0 0

VAdv 70 17,5 12 22 1 2 6 10 0 0

VXAdvX 36 9 5 9 0 0 9 15 0 0

AuxAdvV 1 0,5 0 0 0 0 0 0 0 0

Total 397 100 55 100 54 100 61 100 7 100

A partir dessa tabela, notamos a grande quantidade de dados com função de

circunstanciador, ou seja indicando uma coordenada temporal. Dos 574 dados em

português, 397 (69%) funcionaram apenas como indicativos de tempo do evento

descrito como um todo (exemplo 103). Dados como os do exemplo (109) foram aqueles

com a segunda maior produtividade nos textos jornalísticos analisados - encontramos 61

ocorrências (11%) de circunstanciais com função de sequência temporal. Com 55 e 54

dados, respectivamente, as locuções com função anafórica (exemplo 105) e de

introdução de assunto (exemplo 107) aparecem em seguida. Por fim, as locuções com

função mista foram as de menor produtividade, com apenas 7 dados no total.

Nossa hipótese era que os circunstanciais com o escopo mais restrito à

predicação se mantivessem em posições à direita do verbo em posições mediais. Os

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resultados da tabela 16 confirmam essa expectativa, pois, dos 397 dados com função de

circunstanciador temporal, em 156 (39%) as locuções se posicionaram no final da

oração, em posição VXAdv. Ainda à direita, mas adjacente ao verbo, o circunstanciador

temporal apareceu 77 vezes (19,5%) na posição VAdvX e 70 (17,5%) na posição VAdv.

Esta distribuição corrobora resultados já obtidos em Brasil (2005), Paiva (2008), Ilogti

de Sá (2009) e Soares (2012), para o português.

Confirmando nossa hipótese, locuções com a função de indicar coordenadas

temporais muito raramente se posicionaram na margem esquerda da sentença: no total

de 41 casos – 31 vezes (8%) na posição AdvXV e 10 (2,5%) na posição AdvV.

A segunda função mais recorrente na amostra é a de sinalização de uma

sequência temporal. Nossa hipótese (cf. Brasil 2005 e Paiva 2008) era que, por ter uma

relação maior com o contexto anterior, este tipo de locução se posicionasse mais

frequentemente na margem esquerda. A expectativa foi confirmada: em 23 das 61

ocorrências com função de sequência temporal – 18 (29,5%) correspondem à

configuração AdvXV, sendo esta a posição predominante para locuções com essa

função, e 5 (8%) em AdvV. Logo, a função analisada é a motivação para o

posicionamento de 37,5% dos dados para a margem esquerda. A margem direita ainda

foi preenchida por essa locução em 20 orações (14 VXAdv e 6 VAdv), o que não

inviabiliza a hipótese inicial, visto que a margem direita, conforme exposto na seção

5.1, é a posição não marcada para o circunstancial temporal no português,

A função anafórica também possui uma função na macroestrutura textual e seu

papel no discurso de retomar algo já mencionado anteriormente vai além de apenas

indicar o tempo e o aspecto do evento. Os circunstanciais anafóricos tenderam a ocupar

a posição AdvXV – dos 55 dados com essa função, em 18 (33%) as locuções

apareceram em margem esquerda com um elemento X interveniente. Embora esta

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ordem tenha sido a configuração preferencial das locuções temporais anafóricas,

posições à direita do verbo corresponderam a 60% dos dados encontrados para esse

papel discursivo – 22% (12 casos) VAdv, 20% (11) VXAdv, 9% (5) VXAdv e 9% (5)

VXAdvX. Observemos o exemplo (113) para entendermos esses casos:

(113) O petista acabou renunciando à vice-presidência da Câmara e afirmou que

renunciaria ao mandato, mas recuou logo em seguida [notícia 6 nova – Folha de São

Paulo]

Ao longo da análise dos dados, percebemos que algumas ocorrências de

circunstanciais com função anafórica pertenciam a períodos compostos com orações

coordenadas entre si e elipse do sujeito. Assim como já exposto em 5.2.1.2, em uma

cadeia tópica, o circunstancial raramente quebraria a sequência devido à necessidade de

garantir a recuperabilidade do sujeito, como em (113). No exemplo, o circunstancial,

ainda que mantenha a relação anafórica com o discurso anterior (logo em seguida à

afirmação de renúncia, exposta na oração precedente), pertence a uma oração com

sujeito elíptico, cuja referência se encontra na primeira oração do período. Tal cadeia

tópica reduz a possibilidade de inserção de circunstanciais para manter a referência do

sujeito. (cf. Marques, 2012).

Por outro lado, a função de introdução de assunto ou de contrastes temporais foi

uma das mais produtivas na margem esquerda da oração. De 54 ocorrências de

circunstanciais com essa função, em 37 (68,5%) situam-se na margem esquerda com um

elemento interveniente (AdvXV) e em 10 (18,5%) posicionaram-se na adjacência direita

do verbo (AdvV). Na análise, apenas 6 dados (3 em VXAdv e 3 em VAdvX) se

mantiveram em posições à direita, ou seja, fora da margem esquerda. A nossa hipótese

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de que o circunstancial com um escopo maior no discurso se desloca para posições

iniciais, mais uma vez, é comprovada com os resultados para queles que introduzem

assuntos.

Por fim, os circunstanciais com mais de um papel discursivo, conforme o

exemplo (111), mantiveram um padrão de ordenação. Em todas as 7 ocorrências dessa

função, o circunstancial se posicionou na margem esquerda - 6 com um elemento X

(AdvXV) e 1 imediatamente antes do verbo (AdvV). Tal resultado nos mostra que,

quanto maior a função discursiva do circunstancial, maior a motivação do

preenchimento da margem esquerda da oração, corroborando nossa hipótese inicial.

Tais resultados para a função discursiva do circunstancial temporal confirmam

tendências já apresentadas em outras pesquisas (cf. Brasil 2005, Paiva 2015, Ilogti de Sá

2009, Lessa 2012, Soares 2012, dentre outras).

A importância das funções discursivas na posição do circunstancial pode ser

atestada igualmente em francês. Fuchs & Fournier (2005), na análise do francês,

atribuem aos circunstanciais em posição inicial, tanto locativos quanto temporais,

função discursiva e semântica específicas. (cf. seção 2.3). Na tabela a seguir,

mostramos a distribuição dos temporais coletados nos jornais franceses de acordo com

as funções já descritas:

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Tabela (5.18): Papel discursivo da locução X Ordem – no Francês

especificação

de coord.

temp.

anafórica

introdução

de assunto

sequência

temporal

mista

N % N % N % N % N %

Pré

-Ver

ba

is

AdvV 5 1 0 0 1 1 0 0 0 0

XAdvV 8 1,5 3 4 0 0 0 0 0 0

AdvXV 50 10,5 35 50 72 94 17 57 13 100

XAdvXV 18 4 1 1,5 2 3 3 10 0 0

s-v

erb

ais

VXAdv 125 26 12 17 0 0 5 17 0 0

VAdvX 116 24 8 11,5 1 1 0 0 0 0

VAdv 91 19 7 10 1 1 4 13 0 0

VXAdvX 56 12 4 6 0 0 1 3 0 0

AuxAdvV 10 2 0 0 0 0 0 0 0 0

Total 478 100 70 100 77 100 30 100 13 100

A tabela (5.18) evidencia, assim como a tabela (5.17) para o português, a

predominância de circunstanciais com função de apenas especificar coordenadas

temporais. Dos 669 dados de francês no corpus, 479 (71,5% do total) são de locuções

adverbiais com função de circunstanciadores. A segunda função discursiva que se

mostra produtiva na análise é a de introdução de assuntos, presente em 77 (11,5% do

total) das ocorrências de circunstanciais temporais analisados. Em seguida, encontramos

a anafórica, função discursiva que representa 10,5% dos dados, com 70 ocorrências. A

função indicativa de uma sequência temporal corresponde a 4,5% dos casos de

circunstanciais temporais, com apenas 30 dados. Por último, a função mista apareceu

em 13 dados, contabilizando apenas 2% dos casos.

Já percebemos uma diferença entre o português e o francês nesses primeiros

percentuais de distribuições das funções discursivas. Se, por um lado, o circunstancial

com função de introduzir assunto, em francês, correspondeu a 11,5% do total de dados,

ou seja, é a segunda função mais produtiva na amostra, por outro, em português, essa

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função foi apenas a quarta mais produtiva, representando somente 9,5% das ocorrências.

Essa distinção pode ser explicada com base na pouca variação quantitativa de dados de

português entre as funções de sequência de temporais (61 dados), anafórica (55) e

introdução de assunto (54). Em francês, de fato, a maior variação se deu na pouca

ocorrência de casos com sequência de temporais, com apenas 30 dados.

A função do circunstancial de apenas dar as coordenadas temporais no discurso

foi a predominante, com 479 ocorrências. Destas, 26%, ou 125 dados, posicionaram-se

na margem direita da sentença com um elemento X (VXAdv). A segunda ordem

ocupada por esse circunstancial foi a colada ao verbo VAdvX, representando 24% desse

total (116 casos). Ainda em posições à direita, a ordem VAdv contabilizou 19% dos

dados, com 91 ocorrências. A posição predominante no quadro geral do francês (cf.

tabela 5.1), AdvXV, foi apenas a 5ª possibilidade de ordenação para a função de

circunstanciador, com 50 dados (10,5%).

A distribuição de dados com essa função, corrobora a nossa hipótese de que este

papel discursivo tenderia a posições mais à direita ou mais próximas ao verbo. Vejamos

o exemplo (114):

(114) La 100e édition du Tour de France s’élance de Corse, samedi 29 juin.133

[editorial 17 – Le Monde]

O circunstancial com função de especificação de coordenadas temporais,

indicativo apenas da data em que o Tour de France partiu, samedi 29 juin (sábado 29

de junho), finaliza a oração, ou seja, na posição preferida pelos circunstanciais que

exercem esse papel no discurso (VXAdv). Tal resultado reforça ainda nossa expectativa

133 A 100ª edição do Tour de France começa na Córsega, sábado 29 de junho.

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inicial de que a posição à esquerda da oração é ocupada pelo circunstancial devido ao

seu papel discursivo e semântico na sentença. A função na qual o circunstancial possui

um escopo mais reduzido é a única em que a posição inicial, precedendo o sujeito da

oração, não é a principal. A margem esquerda só foi ocupada por essa função discursiva

em 11,5% dos casos (10,5% AdvXV e 1% AdvV), o que não é atestado nas demais

funções.

O circunstancial com a função de introduzir assunto ou contrastar elementos

temporais, a segunda mais produtiva em francês, obteve 94% (72 dados) das suas 77

ocorrências, na posição principal dos circunstanciais do francês, a posição anterior ao

elemento X (sujeito na maioria dos casos), AdvXV, como vemos a seguir:

(115) A force, l'exercice pourrait bientôt procéder de la routine. Mardi, des chasseurs

britanniques ont décollé d'une base écossaise afin intercepter un bombardier russe qui

volait tout près de l'espace aérien britannique. Ce dernier s‘est vu escorter par la Royal

Air Force. Cet épisode est intervenu le même jour que le passage de trois navires de

guerre russes dans la Manche. Une présence certes fréquente depuis ces derniers mois,

mais que le ministère britannique de la Défense a annoncé surveiller étroitement.

Depuis le début de la crise ukrainienne, ces opérations assimilées à des provocations

par les Occidentaux, et dignes de la Guerre froide, se multiplient à proximité de

l'espace aérien communautaire.

En 2014, plus de 400 interceptions de ce type, soit 50 % de plus que l'année précédente,

ont été réalisées par les chasseurs de l'OTAN.134 [notícia 10 – Le Figaro]

134 Com o tempo, o exercício poderia logo provir da rotina. Na terça-feira, caças britânicos decolaram de

uma base escocesa para interceptar um bombardeiro russo que voava perto do espaço aéreo britânico.

Este último foi visto sendo escoltado pela Força Aérea Real. Este episódio ocorreu no mesmo dia que a

passagem de três navios de guerra russos no Canal da Mancha. Uma presença, provavelmente, frequente

nos últimos meses, mas que o Ministério da Defesa britânico anunciou acompanhar de perto.

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No exemplo (115), o circunstancial en 2014 (em 2014) introduz um assunto em

relação ao que já havia sido descrito. Nos parágrafos anteriores, havia uma espécie de

introdução e explicação sobre o assunto – a guerra fria que ocorre no espaço aéreo. O

circunstancial aparece no parágrafo precedente, indicando um subtópico, na verdade,

dados estatísticos do que havia sido mencionado anteriormente.

A ordenação do circunstancial com valor anafórico também confirma nossas

expectativas. Das 70 ocorrências de locuções temporais e aspectuais com essa função

discursiva, 50%, ou seja, 35 dados, mantiveram-se na posição de preferência do

circunstancial no francês, a ordem AdvXV. Nessa função, outros 44,5% dos dados

distribuíram-se nas demais posições pós-verbais (12 casos em VXAdv, 8 em VAdvX, 7

em VAdv, 4 em VXAdvX), o que sugere a influência de outros elementos discursivos

e/ou sintáticos nessa preferência pela posposição, como no exemplo (116):

(116) Nous sommes en 1997, à Seattle, au nord-ouest des Etats-Unis et Mary Kay

Letourneau est mariée et mère de quatre enfants. Aujourd'hui, tous deux sont mariés

depuis dix ans, ont deux filles et viennent de donner une interview exclusive à la chaîne

ABC.

Les deux amants se sont rencontrés en 1996. Dans l'interview, Mary Kay Letourneau

raconte comment elle s'est rapprochée, à l'époque, de son élève.135 [notícia 11 – Le

Figaro]

Desde o início da crise ucraniana, estas operações tratadas como provocações pelos Ocidentais, e dignas

da Guerra Fria, se multiplicam perto do espaço aéreo comunitário.

Em 2014, mais de 400 interceptações desse tipo, 50% a mais do que no ano anterior, foram realizadas

pelos caças da OTAN. 135 Estamos em 1997, em Seattle, noroeste dos EUA e Mary Kay Letourneau é casada e tem quatro filhos.

Hoje, ambos estão casados há dez anos, têm duas filhas e acabam de dar uma entrevista exclusiva ao

ABC.

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Em (116), o circunstancial à l'époque (na época) faz clara menção ao discurso

precedente, o momento do reencontro. Entretanto, tal relação anafórica não é suficiente

para situar a locução temporal no início da oração, pois o circunstancial pertence a um

período composto, já iniciado por outro circunstancial – Dans l'interview (durante a

entrevista) –, e finaliza uma oração em que o sujeito pronominal (elle) faz referência ao

sintagma nominal que funciona como sujeito da oração anterior (Mary Kay

Letourneau). Dessa forma, o circunstancial anafórico dificilmente se colocaria em

posição inicial, pois quebraria a cadeia tópica do sujeito (motivação sintática) e tiraria o

foco do circunstancial inicial que delimita a coordenada temporal do fato ocorrido

(motivação discursiva).

As locuções com função de indicar uma sucessão temporal posicionaram-se em

57% do total de 30 ocorrências (17 dados) em posição AdvXV. Por estarem inseridos

em uma sequência de eventos, demarcados por pontos temporais distintos, algumas

vezes em cadeias tópicas, alguns circunstanciais não podem ser deslocados para a

esquerda, pelos mesmos motivos já descritos anteriormente, o que explica a quantidade

de dados relevante em posições à direita do verbo. Vejamos o exemplo (117):

(117) La fronde sociale qui secoue le Brésil depuis trois semaines continue de laisser

perplexes analystes et hommes politiques. Après avoir surpris par sa jeunesse, sa force

et son expansion à tout le pays, c’est désormais la rapidité avec laquelle elle affecte les

opinions politiques qui intrigue.

Début juin, le gouvernement de la présidente Dilma Rousseff était jugé « bon » ou

« excellent » par 57 % de la population, selon l’institut de sondages Datafolha. Cette

Os dois amantes se encontraram em 1996. Na entrevista, Mary Kay Letourneau conta como ela se

aproximou, na época, de seu pupilo.

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proportion est tombée à 30 % à la fin du mois, soit une chute de 27 points en trois

semaines. Il faut remonter à mars 1990, quand le président Fernando Collor mit en

place un plan congelant tous les avoirs bancaires, pour retrouver un effondrement

similaire.136 [notícia 2 – Le Figaro]

Em (117), o segundo parágrafo tem início com um circunstancial – Début juin

(início de junho) –, que introduz um assunto dentro do assunto geral: apresentar os dados

de pesquisas sobre o governo brasileiro. Os circunstanciais sinalizados a seguir indicam

uma sequência temporal de eventos: à la fin du mois (no final do mês) e en trois

semaines (em três semanas). Todavia, tais sequenciadores não se situam na margem

esquerda da oração, já que o sujeito da oração em que se encontram faz referência ao

discurso anterior (Cette proportion – esta proporção).

Para finalizar, os circunstancias que reúnem duas funções discursivas, os mistos,

assim como em português, apresentaram ordenação categórica na margem esquerda da

oração, com um elemento X entre ele e a forma verbal. Dos 13 dados encontrados,

100% estavam em posição AdvXV, conforme o exemplo (118):

(118) Quand on superpose ces deux images, l'effet est on ne peut plus choquant. Les

salariés de Gad se sont mis en grève dès que le couperet des licenciements est tombé.

Ils ont brûlé des pneus, occupé l'aéroport de Brest, bloqué un pont à Rennes. Ceux de

Lampaul se sont heurtés physiquement à ceux de Josselin (Morbihan), la fermeture du

136 A agitação social que agitou o Brasil por três semanas ainda deixa perplexos analistas e políticos.

Depois de surpreender pela sua juventude, sua força e sua expansão em todo o país, agora é a velocidade

com que ela afeta os pontos de vista políticos que intriga.

No início de junho, o governo da presidente Dilma Rousseff foi julgado "bom" ou "excelente" por 57%

da população, de acordo com o instituto de pesquisas Datafolha. Esta proporção caiu para 30% no final

do mês, ou seja, uma queda de 27 pontos em três semanas. É preciso voltar à março de 1990, quando o

presidente Fernando Collor colocou em prática um plano de congelamento de todas as contas bancárias,

para recuperar um colapso similar.

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premier site ayant provoqué une surcharge de travail sur le second, sans que la

pérennité de celui-ci soit assurée. Terrible guerre des pauvres.

Au final, un accord est intervenu entre la direction et les syndicats. Il prévoit le

doublement des primes de licenciement, soit 400 euros par année d'ancienneté, c'est-à-

dire cent fois moins que ce que gagne, en moyenne, un joueur professionnel de Ligue 1

en un mois...137 [editorial 34 – Le Monde]

O circunstancial Au final (no final) faz uma retomada do discurso anterior para

introduzir um novo evento: um acordo entre as partes, após a guerra descrita

previamente. O papel discursivo misto, por apresentar duas funções dentro do contexto

de uso e deslocar-se categoricamente para a posição inicial, vem para confirmar nossa

hipótese de que a ordenação do circunstancial temporal na margem esquerda da

sentença é motivada pelo seu papel discursivo.

O papel discursivo em francês se mostrou como o fator de maior relevância para

explicar os deslocamentos à esquerda e preferência pela posição AdvXV da língua,

descritos na seção 5.1 desta análise. Conforme já assinalado principalmente em estudos

de Fuchs e Fournier (2005) e Charolles (2003), dentre outros, a posição à esquerda do

circunstancial em francês, tanto em ordem SV quanto em VS, é motivada por suas

funções discursivas e semânticas.

137 Quando se sobrepõe estas duas imagens, o efeito não poderia ser mais chocante. Funcionários de Gad

entraram em greve desde que o corte nas demissões diminuiu. Eles queimaram pneus, ocuparam o

aeroporto de Brest, bloquearam uma ponte em Rennes. Os de Lampaul se enfrentaram fisicamente com os

de Josselin (Morbihan), tendo o fechamento do primeiro lugar provocado uma sobrecarga de trabalho

sobre o segundo, sem que a durabilidade fosse garantida. Terrível guerra dos pobres.

No final, foi alcançado um acordo entre a administração e os sindicatos. Ele prevê a duplicação das

indenizações por demissões, ou 400 euros por ano de serviço, isto é, cem vezes menos do que o que

ganha, em média, um jogador profissional na Ligue 1 em um mês ...

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5.2.3.2. Gênero Textual

Nossa hipótese (baseada em resultados já sinalizados em Ilogti de Sá 2009) é

que, no gênero notícia, o circunstancial temporal e aspectual se posicione à direita do

verbo, para não quebrar a sequência de acontecimentos narrados; ao passo que, no

editorial, o cunho mais argumentativo seja favorável a que o circunstancial se situe na

margem esquerda da oração.

Na tabela (5.19), temos os resultados para o português das ocorrências dos

circunstanciais em cada gênero analisado:

Tabela (5.19): Gênero Textual X Ordem – no Português

Notícias Editoriais

N % N %

Pré

-Ver

bais

AdvV 14 4,5 15 6

XAdvV 4 1 5 2

AdvXV 54 17 56 22,5

XAdvXV 4 1 7 3

Pós-

ver

bais

VXAdv 101 31 83 33

VAdvX 62 19 29 11,5

VAdv 54 17 35 14

VXAdvX 31 9,5 19 7,5

AuxAdvV 0 0 1 0,5

Total 324 100 250 100

No total de 574 dados encontrados em português, 324 (56%) são de notícias e

250 (44%), de editoriais. Ainda que haja equivalência no total de textos analisados para

os dois gêneros (60 para cada), as notícias se mostraram como o gênero mais propício

ao aparecimento do circunstancial temporal, talvez por seu cunho narrativo.

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Nossa expectativa era que o circunstancial temporal não se deslocasse para a

margem esquerda da oração nas notícias a fim de não provocar rupturas do fluxo

narrativo. Dos 324 dados pertencentes a esse gênero, em 101 (31% desse total) as

locuções apareceram na ordenação VXAdv. Outras duas posições pós-verbais foram as

preferencialmente ocupadas pelos circunstanciais: na ordenação VAdvX apareceram 62

dados (19%) e, na VAdv, 54 (17%). A margem esquerda, na posição AdvXV,

corresponde a apenas 17% dos dados (54 ocorrências). Se somarmos as ocorrências em

posições na margem esquerda da oração, contabilizaremos somente 68 casos (54

AdvXV e 14 AdvV) de circunstanciais iniciando a sentença no gênero em questão, ou

seja, apenas 21% desses 324 dados. Tais resultados comprovam nossa hipótese inicial

de que a locução temporal não apareceria à esquerda do verbo no gênero notícia,

corroborando resultados de Paiva (2007), Ilogti de Sá (2009) e Lessa (2012).

Não obtivemos a mesma comprovação no que diz respeito aos editoriais. Para

nós, esse gênero favoreceria o aparecimento dos circunstanciais no início da sentença, já

que o editor faria mais referências a sua argumentação anterior, por exemplo, e o escopo

do circunstancial não se restringiria à predicação verbal. No entanto, dos 250 dados

neste gênero, em 83 (33% desse total) as locuções se mantiveram na margem direita da

oração, na posição prototípica do circunstancial temporal/aspectual no português

(VXAdv). Nossa expectativa era que as locuções temporais predominassem na

ordenação AdvXV, posição predominante por 56 (22,5%) das locuções adverbiais

temporais/aspectuais. Em português, a margem esquerda da oração permaneceu sendo a

segunda opção de ordenação para o circunstancial, indo de encontro às nossas

expectativas e aos resultados obtidos em Ilogti de Sá (2009) e Lessa (2012).

Na amostra de dados de português, os resultados demonstram que a ordem não

marcada do português – a margem direita – só não é a preferencial do circunstancial nos

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casos em ele possui uma função discursiva mais específica além de coordenar

temporais. O fator gênero textual, apesar de revelar uma quantidade relevante de

locuções adverbiais na margem esquerda nos editoriais, não se mostrou relevante para

explicar o deslocamento do circunstancial temporal/aspectual para o início das

sentenças.

Os resultados para o francês se distinguem dos observados para o português,

como mostra a tabela (5.20):

Tabela (5.20): Gênero Textual X Ordem – no Francês

Notícias Editoriais

N % N %

Pré

-Ver

bais

AdvV 1 0,5 5 2

XAdvV 3 1 8 2,5

AdvXV 97 25,5 90 31

XAdvXV 7 2 17 6

Pós-

ver

bais

VXAdv 88 23 54 18,5

VAdvX 82 21,5 43 15

VAdv 54 14 49 17

VXAdvX 40 10,5 21 7

AuxAdvV 7 2 3 1

Total 379 100 290 100

A partir da tabela (5.19), percebemos que, da mesma forma que em português, a

notícia é o gênero mais propício ao uso do circunstancial temporal. Dos 669 dados de

francês, 379 (57%) são notícias e 290 (43%), editoriais. Cabe relembrar138 que ambos os

gêneros foram recolhidos de duas fontes jornalísticas distintas, mas que aqui foram

reunidas, pois não mostraram diferenças significativas na análise dos dados das duas

línguas.

138 Já exposto no capítulo 4

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A tabela (5.20) revela um resultado interessante. Ainda que a posição AdvXV

tenha aparecido em maior quantidade no gênero notícia (97 dos 379 dados – 25,5%

desse total), obervamos o predomínio geral das ordenações em que o circunstancial se

encontra à direita do verbo. Em sequência, obtivemos 88 ocorrências (23%) de VXAdv,

82 (21,5%) de VAdvX, 54 (14%) de VAdv e 40 (10,5%) de VXAdvX. Portanto, ao

amalgamarmos as posições na margem direita e as próximas ao verbo, verificamos que,

de fato, os circuntanciais aparecem preferencialmente em posições pós-verbais nas

notícias dos jornais franceses. Os resultados, dessa forma, comprovam nossas

expectativas iniciais.

No entanto, vemos que os casos nos quais o circunstancial se encontra em

posições pré-verbais no gênero notícia representam 31% dos dados. Isso ocorre porque

o francês apresenta uma forte tendência de anteposição do circunstancial ao sujeito, isto

é, margem esquerda da oração principalmente quando o mesmo possui funções dentro

do discurso (cf. Charolles 2003). Nas notícias, a recorrência do circunstancial para a

esquerda pode ser motivada pela necessidade de focalizar imediatamente para o leitor as

coordenadas temporais do evento narrado.

Os dados presentes nos editoriais mostraram uma tendência similar à

apresentada nas notícias. Dos 290 casos de circunstanciais temporais e aspectuais neste

gênero, em 90 (31%) as locuções se deslocaram para a margem esquerda da oração,

corroborando nossa hipótese de que o gênero editorial propiciava o aparecimento de

locuções adverbiais na ME. As posições pospostas ao verbo ainda se mostraram

produtivas, mas a diferença da posiçao principal do circunstancial (AdvXV) para a

segunda posição (VXAdv) foi de mais de 12 pontos percentuais: na ordem VXAdv,

encontramos 54 dados (18,5%) contra 90 (31%) em AdvXV.

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Esse resultado demonstra a tendência diferenciada do português e do francês no

que concerne ao uso da margem esquerda na escrita jornalística. Em português, essa

posição é preenchida pelo circunstancial em casos muito específicos, ao passo que, em

francês, essa parece ser a posição predominante do circunstancial temporal/aspectual.

Ainda que os resultados apontem para o predomínio dos circunstanciais

temporais e aspectuais à margem direita da oração no português e no francês, quando

amalgamamos todas as posições, encontramos diferenças quanto à ordenação mais

recorrente em cada uma das línguas. Se, por um lado, no português, observamos a

preferência pela ordenação VXAdv (posição pós-verbal), por outro, no francês, a

ordenação preferencial é AdvXV (posição pré-verbal). Conforme demonstram nossos

resultados, esta ordenação na margem esquerda da oração está diretamente relacionada

aos fatores discursivo-pragmático, pois o circunstancial aparece no início da sentença

quando seu escopo é maior que a coordenada temporal. A semântica da locução trouxe

diferenças significativas na comparação entre as duas línguas, pois apenas as locuções

com valor durativo e reiterativo mostraram tendências de uso mais próximas. No

francês, ao contrário do português, observamos nítida inclinação à posição AdvXV,

antecedendo o sujeito. Os fatores mais estruturais, como o tipo de verbo, a realização e a

posição sujeito, a estrutura e a extensão da locução, mostraram-se importantes, mas não

decisivos na ordenação dos circunstanciais, o que corroborou com nossas expectativas

de que o grupo de fatores semântico e discursivo-pragmático são os mais relevantes na

motivação pela margem esquerda pela locução adverbial temporal/aspectual.

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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

No presente trabalho, observamos e analisamos em duas línguas românicas – o

português e o francês – a ordenação dos circunstanciais de tempo e aspecto nas orações,

com base em uma amostra de notícias e editoriais. Alguns pressupostos do

funcionalismo norte-americano, prevê diferentes funções para as diversas possibilidades

de uso das formas linguísticas, serviram como ponto de partida para a nossa análise.

Inicialmente, no capítulo 1, apresentamos nosso objeto de estudo: os

circunstanciais temporais e aspectuais. Ao assumirmos a visão de Givón (2001) e Neves

(2011), defendemos que o termo circunstancial temporal/aspectual refere-se tanto às

locuções adverbiais (preposicionadas ou não) que apresentam a noção semântica de

tempo quanto às que apresentam a noção semântica de aspecto. Diante dessa

perspectiva, encontramos em nossa amostra 1243 dados.

Nesta conclusão da análise realizada, tentaremos responder às questões

propostas anteriormente, na introdução, as quais repetimos aqui:

1) As tendências de ordenação das locuções são iguais no português e no francês? Se

não, por que há as diferenças?

2) Qual o posicionamento da locução adverbial na oração, em cada língua?

3) Quais locuções seriam mais presas ao verbo? Isso é motivado pelo seu tamanho? Ou

por sua estrutura?

4) As locuções adverbiais preenchem a posição deixada vazia pelo sujeito?

5) Existem posições mais fixas para as locuções adverbiais em função de seu papel

semântico na oração? Se sim, que valores seriam esses?

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6) Até que ponto as funções discursivas da locução são importantes no seu

posicionamento na oração? E quais são as funções desempenhadas por elas?

Como vimos no decorrer da análise, a resposta à nossa primeira questão

implica considerar a importância de diferentes aspectos. O primeiro aspecto associado a

algumas distinções as na ordenação de circunstanciais nas duas línguas envolve

diferenças estruturais no que diz respeito à obrigatoriedade de sujeitos explícitos no

francês. A análise permitiu depreender, no entanto, que fatores semânticos e discursivo-

funcionais influenciam opõem preferenciais de ordenação em uma e outra língua.

As perguntas 2 e 3 relacionam-se à posição prototípica dos circunstanciais na

oração. Para o português, mostramos que a posição predominante foi a VXAdv, com

32% dos casos, seguida da ordem AdvXV, com 19%. Por outro lado, em francês, nos

669 dados, percebemos um equilíbrio maior entre essas duas posições marginais,

tendendo de forma pouco destacada para a esquerda do verbo: 28% estavam em AdvXV

e 21%, em VXAdv. Embora, em francês, essa posição AdvXV tenha mais ocorrência de

dados, no amálgama das ordenações mediais e marginais possíveis, a margem direita se

destaca da margem esquerda (36%MD e 29% ME). As posições mediais de um modo

geral, em ambas as línguas, se mostraram equivalentes nas tendências de uso.

Partindo da noção de marcação proposta por Givón (1990) – para o qual a

estrutura não-marcada seria aquela mais frequente na língua (e, por isso, se mostra ao

interlocutor de maneira mais natural) –, assumimos a perspectiva de que, em ambas as

línguas, a ordem não marcada seria a margem direita, respondendo, assim, à nossa

segunda questão. Em francês, embora tenhamos uma quantidade maior de ocorrências

em posição AdvXV, a predominância, no total de dados, assim como em português, é a

posposição ao verbo – em português, encontramos 72% dos dados pós-verbais; e em

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francês, 64%. Ao longo dos demais parâmetros analisados, verificamos que a margem

esquerda da sentença, na posição AdvXV, é ocupada pelo circunstancial quando este é

motivado por outros fatores, principalmente de cunho discursivo, tornando-se em

determinados contextos a ordem marcada.

Detalhamos, ao longo da seção 5.1, os constituintes que poderiam aparecer antes

do circunstancial, entre ele e o verbo, ou, ainda, em posições pós-verbais, entre o verbo

e o circunstancial, ou ocupando a margem direita. Verificamos, nesse detalhamento de

elementos intervenientes, que o circunstancial temporal e aspectual poucas vezes

interfere na integração entre o verbo e seus argumentos externo ou interno, não

infringindo o Subprincípio da Integração (cf. Givón 1990), confirmando, assim, o que já

foi mostrado por outros estudos tanto do português como do francês. Constatamos, em

nossa análise, que as posições predominantes para o circunstancial eram as margens da

sentença.

Um fator estrutural relevante para a ordenação das locuções

temporais/aspectuais nas duas línguas é o tipo de verbo. Nossa hipótese era que, em

orações intransitivas, o circunstancial tendesse a aparecer após o verbo, o que foi

confirmado em francês, com a maioria dos dados em posição VAdv, mas,

aparentemente, não se confirma no português, em que se observou concorrências entre

as ordens VXAdv e VAdv. Neste, a ordem VAdv também foi a mais produtiva, mas em

concorrência com a posição VXAdv – constatamos, entretanto, que outro elemento

adverbial assumia o valor de X, nesses casos, o que não inviabiliza nossa hipótese. Por

sua vez, os verbos transitivos nos trouxeram como resultados as tendências gerais das

duas línguas: as margens da oração – em português, a margem direita, na ordem

VXAdv, seguida da margem esquerda, AdvXV; e em francês, a margem esquerda, na

ordem AdvXV, seguida da margem direita VXAdv.

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Contrariando resultados de estudos anteriores, peso do circunstancial temporal

não se mostrou um fator determinante, nem mesmo para as margens da oração. Os

circunstancias mais extensos (acima de 6 palavras) e os médios (de 4 e 5 palavras)

mantiveram-se na margem da oração, tanto em francês quanto em português. No

português, as locuções adverbiais mantiveram a tendência geral na língua ao final da

clausula, e, em francês, tanto as locuções menores como as mais extensas ocuparam

preferencialmente a posição inicial da oração, em ordem AdvXV. Nossa expectativa era

que os circunstanciais menores (de 2 e 3 palavras) se ordenassem mais em posições

mediais, as quais de fato são ocupadas predominante por eles. Entretanto, esses

circunstanciais com peso menor também ocorreram de forma equivalente nas margens

da sentença.

Nossa hipótese quanto à estrutura da locução adverbial, se SN ou SPrep, também

não encontra confirmação na análise. Esperávamos encontrar locuções com estrutura de

SN mais à margem esquerda e os SPreps, mais ligados ao verbo. O resultado, nas duas

línguas, não foi conclusivo quanto a este fator, visto que encontramos poucos dados

com estrutura nominal e, destes, poucos se deslocaram para a margem esquerda. Dessa

forma, respondendo à terceira questão, a posição da locução em relação ao verbo não

parece ser motivada pelo peso ou pela estrutura da locução, já que o peso se mostra

mais relevante apenas na pouca possibilidade de inserção de grandes circunstanciais em

posições mediais.

Devido à extensa literatura sobre a relação entre a forma de realização do sujeito

e a posição do circunstancial, principalmente na margem esquerda, investigamos se essa

questão estrutural seria determinante para a ordenação do circunstancial

temporal/aspectual. Votre e Naro (1986), a partir da proposta do Princípio de

Preservação, acreditam que haja uma compensação sintagmática com o deslocamento

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de elementos à esquerda da sentença; Kato e Duarte (2003), por sua vez, acreditam que,

devido à ausência de um pronome expletivo no português, um item adverbial pode se

deslocar para a margem inicial da oração para ocupar a posição vazia deixada pelo

sujeito, não permitindo, dessa forma, que o verbo inicie a sentença.

A análise que fizemos da forma de representação do sujeito assim como da sua

posição em relação ao verbo leva a conclusões interessantes no que se refere ao quarto

questionamento, tanto em português (73,5% do total de dados) quanto em francês

(87,5%), o sujeito representado por um sintagma nominal foi predominante na amostra

e permitiu observarmos nas duas línguas a mesma distribuição dos circunstanciais nas

posições previstas da tabela 5.1. No português, constatamos o predomínio de margem

direita (VXAdv), seguida de margem esquerda (AdvXV); e em francês, o contrário,

primeiro a margem esquerda (AdvXV), seguida muito próxima da margem direita

(VXAdv).

Em oração com sujeito não explícito, ou sujeito oculto, o circunstancial se

manteve em posição pós-verbal em praticamente todas as ocorrências no português e em

todos os poucos casos de sujeito elíptico no francês. De acordo com o Princípio da

continuidade tópica ou referencial (Givón 1983, 1995), quanto maior a previsibilidade

de uma informação, menor a necessidade de material linguístico. Assim, em orações

com sujeito vazio a anteposição do circunstancial pode comprometer a recuperabilidade

do referente sujeito zero, já que, para esta referência ser retomada corretamente, o

referente precisa estar claro no discurso, mantendo sua continuidade referencial.

Em francês, ainda verificamos as poucas ocorrências em que o sujeito era

expletivo, construção pertinente a uma língua em que o preenchimento do sujeito é

obrigatório. Nossa expectativa era que, nesses casos, o circunstancial tendesse à

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posposição, para não interferir na relação entre o sujeito expletivo e o verbo, o que foi

verificado.

Os resultados para a forma de representação do sujeito foram de extrema

relevância no que diz respeito à ordenação do circunstancial, tendo em vista a grande

ocorrência de dados em margem esquerda, em francês, com a posição do sujeito

preenchida, e a tendência nas duas línguas à posposição da locução em orações com

sujeito oculto. Tais resultados se tornam ainda mais expressivos, principalmente quando

também verificamos a posição do circunstancial temporal/aspectual com as estruturas

SV e VS.

Verificamos que o comportamento do circunstancial temporal/aspectual em

português, em construções SV, mantém seu padrão no geral: o circunstancial tende à

margem direita (43%), seguido pelas ordens pós-verbais mediais e margem esquerda,

com 26% cada. Embora haja uma clara tendência à posposição dos circunstanciais

quando o sujeito inicia a sentença (o que era esperado), uma quantidade não

negligenciável (26%) se posiciona antes do mesmo, na margem esquerda da oração,

indicando a influência de fatores discursivos.

Em francês, a relação entre o circunstancial e a estrutura SV nos trouxe

evidências adicionais claras de que o posicionamento de circunstanciais na margem

esquerda da oração não é regida por fatores sintáticos relacionados ao preenchimento do

sujeito, e sim por aspectos discursivos. Em nossa análise, a locução adverbial apareceu

de forma equivalente na margem esquerda (33%) e na margem direita (34%) em

construções SV, o que nos indica que a posição do circunstancial, em nossos dados, é

inteiramente independente da posição do sujeito.

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Em português, a princípio a hipótese de preenchimento da posição vazia inicial

em orações com sujeito posposto parece se confirmar, pois 44,5% das locuções

temporais/aspectuais ocuparam a ME da sentença. No entanto, ao somarmos as

ocorrências de circunstanciais antepostos e pospostos ao verbo, verificamos 22 casos de

circunstanciais pré-verbais e 23 de circunstanciais pós-verbais, ou seja, o equilíbrio

sintagmático não é comprovado. Em francês, também não observamos tal equilíbrio,

pois, à exceção de 2 ocorrências em ME, todo os outros casos de circunstanciais em

estruturas VS ocuparam posições pospostas ao verbo.

O valor semântico do circunstancial – foco do nosso quinto questionamento –

se mostrou essencial na comparação entre o português e o francês, pois os resultados

indicaram, com poucas exceções, tendências distintas nas duas línguas. Com base na

proposta de classificação de Martelotta (1994) e Ilari (2001) e do contínuo semântico

apresentando em Machado (2012), verificamos uma sequência semântica que partia de

um valor mais dêitico até o mais aspectual, empregando-a em nossa análise.

O valor mais aspectual do circunstancial, o reiterativo, por ter uma noção

semântica mais intrínseca ao verbo, foi o que, nas duas línguas, mais frequentemente se

situou em posições adjacentes à forma verbal, confirmando tendências já atestadas em

trabalhos anteriores (cf., dentre outros, Martelotta (1994), Ilogti de Sá (2009)).

As locuções com valor localizador em português, corroborando os resultados de

Ilogti de Sá (2009), se posicionam na margem direita. Em francês, verificamos um

equilíbrio entre a margem esquerda (24%), as posições mediais pós-verbais (23%) e a

margem direita (22%). No entanto, se somarmos todas as ocorrências de anteposição e

posposição, verificamos que a posposição é a mais frequente também para o francês. A

distinção entre as duas línguas é que, em francês, o circunstancial, motivado por outros

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parâmetros, se posiciona mais frequentemente na margem esquerda do que em

português.

As locuções delimitativas, em português, também são mais frequentemente

pospostas ao verbo, situando-se predominantemente na margem direita. Já em francês,

essas mesmas locuções mostraram clara predominância pela margem esquerda.

Além dos reiterativos, outro tipo de locução que apresentou maior similaridade

nas duas línguas foi o durativo. Essas locuções de acordo com a escala semântica, são

mais próximos dos valores aspectuais, motivo pelo qual talvez tragam tendências

similares. Em português, seguindo a tendência geral, a locução durativa predominou na

posição VXAdv (29%), e, em sequência, na margem esquerda AdvXV (20%) e na

margem direita na adjacência do verbo, VAdv (19%), mostrando, mais uma vez, o

predomínio das posições pós-verbais. Em francês, a posposição e a adjacência do verbo

também foram ocupadas pelo circunstancial, mas ainda com quantidade significativa de

locuções na ordem AdvXV (26%) – seguida de 23% em VXAdv, 18% em VXAdvX e

17,5% em VAdv.

Por fim, as locuções com valor de simultaneidade aparentam ser mais rígidas em

seu comportamento, situando-se quase sempre na margem esquerda da sentença.

Andrade (2005) sinalizou para um possível processo de gramaticalização desses

circunstanciais – eles estariam, segundo a autora, se tornando elementos conectores. No

entanto, não conseguimos tirar conclusões sobre tais circunstanciais, pois, em

português, encontramos apenas 5 dados e, em francês, 1.

As tendências destacadas para o valor semântico do circunstancial

temporal/aspectual permitem responder à terceira e quinta questões: quanto mais

aspectual é o circunstancial, maior é a tendência de ele se aproximar do verbo, visto que

o aspecto é uma categoria semântica mais inerente ao verbo.

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No intuito de buscar subsídios para comprovar a hipótese de que a ordenação do

circunstancial é motivada por seu papel no discurso e não apenas por questões sintáticas

– respondendo, consequentemente, à nossa sexta questão –, analisamos a sua função

discursiva. Baseando-nos em Brasil (2005) e em Paiva (2007, 2008), consideramos que

o circunstancial temporal/aspectual pudesse exercer as seguintes funções: especificação

de coordenadas temporais, retomada anafórica, introdução de assunto, sequência

temporal e mista.

Nossa expectativa maior, dado o referencial teórico adotado, mais forte envolvia

a correlação entre posição das locuções temporais/aspectuais e a função discursiva

destes constituintes. Nossa hipótese era a de que o circunstancial ocuparia a margem

esquerda da sentença quando sua função discursiva tivesse um escopo maior de atuação

do que a própria oração a qual ele iniciava se confirmou em ambas as línguas. A partir

do cruzamento entre as funções desempenhadas pelos circunstanciais e as possíveis

ordens, atestamos uma tendência crosslinguistic, ou seja, inteiramente independente das

diferenças estruturais entre as duas línguas consideradas.

Em português e em francês, circunstanciais com escopo de atuação reduzido, ou

seja, que apenas especificam uma coordenada temporal, tendem à posposição. Em

contrapartida, circunstanciais que desempenham outras funções – seja retomando um

elemento anterior, introduzindo um novo assunto, indicando uma sequência temporal ou

contrastando coordenadas temporais – levam à predominância de ordenação AdvXV ou

AdvV, corroborando o que já foi atestado em outros estudos.

De todos os aspectos que verificamos na nossa análise, a função discursiva se

destaca como a motivação mais regular para as duas línguas, principalmente no que se

refere à margem esquerda da sentença. A locução temporal/aspectual se posiciona à

esquerda do sujeito, iniciando a oração, quando possui escopo mais amplo. Nos casos

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em que apenas situa temporalmente o predicado verbal, sua posição passa a ser

motivada por outros parâmetros, de ordem semântica ou sintática.

Diante de todos os resultados apresentados, encontramos subsídios para,

finalmente, retornarmos ao primeiro questionamento: As tendências de ordenação das

locuções são iguais no português e no francês? Se não, por que há as diferenças?.

Vimos que, em ambas as línguas, a tendência geral de ordenação do circunstancial é às

margens, principalmente a direita, em detrimento das posições mediais. Contudo, cabe

ressaltar que, em francês, embora no geral a posposição seja predominante, a ordem

AdvXV – com o circunstancial inicial e anterior ao sujeito – é bastante marcada.

Embora as tendências para ambas as línguas tenham mais semelhanças que diferenças,

essas distinções decorrem, em grande parte, de diferenças estruturais que envolvem o

parâmetro do sujeito nulo.

Assim, com essa tese, buscamos contribuir para o estudo contrastivo de duas

línguas românicas tendo em vista os pressupostos teóricos da linha funcionalista, com

análise detalhada da ordenação de locuções adverbiais temporais e aspectuais em textos

escritos contemporâneos. Tratamos da análise de propriedades formais, semânticas e

discursivas para explicar as motivações das diferentes ordenações nas duas línguas e

retomamos uma discussão importante em diferentes linhas da Linguística a respeito da

relação entre presença ou sujeito antes do verbo e posição de adjuntos adverbiais.

Esperamos que a análise contrastiva entre o português e o francês estimule futuros

trabalhos comparativos, no sentido de se verificar o peso de fatores estruturais e

funcionais para a motivação de diferentes ordenações de constituintes da oração.

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