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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAR
INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAO
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LETRAS
EDITOR: UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAR
ORGANIZADORES
Dra. Tnia Maria Pereira Sarmento-Pantoja
Presidente da comisso organizadora
Docente do Programa de Ps-Graduao em Letras
Coordenadora do Programa de Ps-Graduao em Letras
Dr. Sidney da Silva Facundes
Docente do Programa de Ps-Graduao em Letras
Vice-Coordenador do Programa de Ps-Graduao em Letras
Ma. Mrcia do Socorro Pinheiro
Discente do Programa de Ps-Graduao em Letras (Estudos Literrios)
Jeniffer Yara Jesus da Silva
Graduada em Letras Universidade Federal do Par
Belm
2015
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAR
Prof. Dr. Emmanuel Zagury Tourinho
Reitor
Prof. Dr. Gilmar Pereira da Silva
Vice-Reitor
Prof. Dr. Edmar Tavares da Costa
Pr-Reitoria de Ensino e Graduao
Prof. Dr. Rmulo Simes Anglica
Pr-Reitoria de Pesquisa e Ps-Graduao
Prof. Dr. Nelson Jos de Souza Jnior
Pr-Reitoria de Extenso
Joo Cauby de Almeida Jnior
Pr-Reitoria de Administrao
Karla Andreza Duarte Pinheiro de Miranda
Pr-Reitoria de Desenvolvimento e Gesto de Pessoal
Raquel Trindade Borges
Pr-Reitoria de Planejamento
INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAO
Dr. Otaclio Amaral Filho Diretor Geral
Dra. Ftima Cristina da Costa Pessoa
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM LETRAS
Dra. Tnia Maria Pereira Sarmento-Pantoja
Coordenadora do Programa de Ps-Graduao em Letras
Dr. Sidney da Silva Facundes
Vice-Coordenador do Programa de Ps-Graduao em Letras
Dados Internacionais de Catalogao-na-Publicao (CIP)
Biblioteca do ILC/ UFPA-Belm-PA
____________________________________________________________
Seminrio de Pesquisas em Andamento (12: 2015: Belm, PA)
E-book do Seminrio de Pesquisa em Andamento / Organizao,
Tnia Sarmento Pantoja, et al. - Belm: Programa de Ps-Graduao em
Letras. UFPA, 2015.
393 p. : il.
Evento realizado pelo Programa de Ps-Graduao em Letras da UFPA.
Inclui bibliografias.
ISBN: 978-85-67747-08-8
Disponvel em: http://ppgl.propesp.ufpa.br/index.php/br/
1. Educao superior - Congressos. 2. Lingustica - Congressos. 3. Literatura
- Congressos. 4. Lngua portuguesa Congressos. I. Pantoja, Tnia Sarmento et
al, org. II. Ttulo.
CDD-22. ed. 378.177
___________________________________________________________________
Apresentao
O XII Seminrio de Pesquisas em Andamento (XII SEPA), atividade anual que
rene a apresentao de projetos de pesquisas de docentes e de discentes do vinculados
ao Programa de Ps-graduao em Letras (PPGL) da Universidade Federal do Par
(UFPA), em 2015, teve como tema Ps-Graduao e Graduao: a leitura do
contexto.
O evento ocorrido nos dias 22 e 23 de outubro de 2015 teve como
conferencista em sua abertura, o Prof. Dr. Joshua Birchall (Museu Paraense Emlio
Goeldi) que intitulou sua fala como "Estudos tipolgico-comparativos em lnguas
indgenas da Amrica do Sul". Em seu encerramento, o evento contou com a presena
da Profa. Dra. Marisa Martins Gama Khalil (UFU) com a conferncia "Infncia e
exceo: representaes da morte em narrativas com protagonismo infantil.
Das apresentaes de docentes e de discentes feitas no XII SEPA, 36 esto
reunidas nos presentes Anais, como trabalhos completos, os quais versam sobre
pesquisas realizadas nos campos de Estudos Lingusticos e Estudos Literrios, a quais
esto diretamente vinculadas aos projetos de pesquisa dos docentes do Programa de
Ps-graduao em Letras (PPGL) da Universidade Federal do Par (UFPA), em suas
linhas de pesquisa.
Nos ltimos quatro anos o Programa de Ps-Graduao em Letras (PPGL)
obteve respostas positivas quanto ao crescimento da ps-graduao. No trinio que se
concluiu, referente aos anos 2012, 2013 e 2014, o PPGL teve seu doutorado aprovado,
com nota 4, em 25/10/2012, na 65 Reunio do CTC/CAPES. Alm disso, a nota do
Curso de Mestrado igualou-se nota do Doutorado tambm. Desta forma, o desejo da
Coordenao do PPGL que, ao ler os trabalhos presentes nos Anais, se possa
vislumbrar o que tem sido feito de pesquisas na rea de Letras & Lingustica, na Regio
Norte do Brasil, com especial ateno Universidade Federal do Par (UFPA).
Profa. Dra. Tnia Maria Pereira Sarmento-Pantoja & Prof. Dr. Sidney da Silva
Facundes
Sumrio
ESTUDOS LINGUSTICOS
O ALTEAMENTO DAS VOGAIS MDIAS PRETNICAS NO
PORTUGUS FALADO PELOS MARANHENSES RESIDENTES
NO MUNICPIO DE TUCURU: UMA ANLISE
VARIACIONISTA
Benedita do Socorro Pinto Borges
Regina Clia Fernandes Cruz
10
O DUPLO VOCABULRIO: UM ESTUDO SOBRE VARIAO
LEXICAL NA LNGUA APURIN (ARUK)
Bruna Lima-Padovani
Sidney da Silva Facundes
42
A CONSTRUO DE UMA UNIDADE DE ANLISE
DISCURSIVA EM TORNO DA PRTICA PROPAGANDISTA DO
GOVERNO DO PAR: CONSIDERAES TERICO-
METODOLGICAS NA DELIMITAO DE CORPUS EM AD.
Diego Bezerra
Ftima Pessoa
54
VOGAIS MDIAS PRETNICAS NO PORTUGUS DA
AMAZNIA PARAENSE: O DESVOZEAMENTO COMO
QUARTA VARIANTE
Giselda da Rocha Fagundes
Regina Clia Fernandes Cruz
65
AUTORIA NA ESCRITA SOBRE AS PRTICAS DE ENSINO DE
LNGUA PORTUGUESA: REGISTRO E PRODUO DA AULA
EM RELATRIOS DE ESTGIO
Herodoto Ezequiel Fonseca da Silva
Thomas Massao Fairchild
77
A GRAMTICA E DISCURSO DA LNGUA APURIN (ARUK):
O ESTUDO DO MORFEMA =NHI
Lase Maciel Barros
Sidney Facundes
88
A EXPRESSO DA TERCEIRA PESSOA NO PARKATJ
Nandra Ribeiro Silva
Ana Vilacy Galucio
98
LNGUA E IDENTIDADE: A RELAO ENTRE OS USOS DA
LNGUA APURIN (ARUK) E A CULTURA DO POVO
Patricia do Nascimento da Costa
Sidney da Silva Facundes
113
ESTUDOS LITERRIOS
DILOGO DOS ESPELHOS: A PERDA DO REFLEXO EM TRS
CONTOS DE E.T.A. HOFFMANN, GUIMARES ROSA E
MACHADO DE ASSIS
Alan Ferreira Costa
Antnio Mximo Ferraz
121
CHOVE NOS CAMPOS DE CACHOEIRA E LINHA DO PARQUE:
UMA LEITURA DOS EXTREMOS EM DALCDIO JURANDIR
Alcir de Vasconcelos Alvarez Rodrigues
Marl Tereza Furtado
A MULHER DA AMAZNIA EM ROMANCES DE DALCDIO
JURANDIR: D. AMLIA E D. INCIA
Alinnie Oliveira Andrade Santos
Marl Tereza Furtado
132
149
BRUNO DE MENEZES: BREVE PANORAMA CRTICO-
BIOGRFICO
Carolina Menezes de Brito Reis
Lilia Silvestre Chaves
156
OS ROMANCES-FOLHETINS MISTRIOS DE LISBOA E
COISAS ESPANTOSAS: ESTRATGIA NECESSRIA
Cludia Gizelle Teles Paiva
Germana Maria Arajo Sales
166
EDIES DE ROCAMBOLE NO GRMIO LITERRIO
PORTUGUS DO PAR: UM ESTUDO DAS EDIES DA SRIE
E DA PERSONAGEM ROCAMBOLE DE PONSON DU TERRAIL
Dbora de Castro Borges
Valria Augusti
182
A TRAMA DO BORDADO: UMA LEITURA DOS TEXTOS
ALMEIDIANOS VEICULADOS NO DIRIO DE NOTCIAS E NA
PROVNCIA DO PAR
Denise Arajo Lobato
Germana Maria Arajo Sales
190
DA GRAVURA PINTURA: O VISUALISMO NA ESCRITA DE
CLARICE LISPECTOR Elisama Fernandes Araujo
Mayara Guimares
204
O VELHO TEMPO NOS PERSEGUE:
DESDOBRAMENTOS DO BREVE SCULO EM GUIMARES
ROSA E EM HOBSBAWM
Everton Luis Teixeira
212
Silvio Augusto de Oliveira Holanda
O PROBLEMA DA PERSONAGEM LUCIANA NA OBRA DE
DALCDIO JURANDIR
Flvia Roberta Menezes de Souza
Gunter Karl Pressler
225
MANIFESTO DA DISCRDIA: A ARTE MODERNA DE
JOAQUIM INOJOSA E SUA RECEPO NO MEIO
JORNALSTICO BELENENSE
Jos Francisco da Silva Queiroz
Gunter Karl Pressler
261
REGISTROS DA ESCRITA BRASILEIRA NO JORNAL DO
PAR: CNEGO FRANCISCO BERNARDINO DE SOUZA
Juliana Yeska Torres Mendes
Germana Maria Arajo Sales
274
RASTROS DA GUERRA NA NARRATIVA DE LYGIA
FAGUNDES TELLES
Kamila Rodrigues Lima
Tnia Maria Pereira Sarmento-Pantoja
284
RESISTNCIA E UTOPIA NO CONTO MALANDRAGENS DE
UM URUBU
Ladyana dos Santos Lobato
Tnia Maria Pereira Sarmento-Pantoja
291
O DESAMPARO EM MILTON HATOUM E JOO DE JESUS
PAES LOUREIRO
Lourdes Ferreira
Tnia Sarmento-Pantoja
298
CORPO FRAGMENTADO NA COLAGEM DE MAX MARTINS
Mrcia de Souza Pinheiro
Tnia Sarmento-Pantoja
309
A PROVOCAO DO MITO NO LABIRINTO DA HISTRIA: O
JOGO ENTRE A REALIDADE E A FICO NAS NARRATIVAS
CERVANTINA E ROSIANA
Mrcia Denise Assuno da Rocha
Slvio Augusto De Oliveira Holanda
316
AS REPRESENTAES DE LEITURA NO ROMANCE
FABIOLA, DE NICHOLAS WISEMAN
Mrcia do Socorro da Silva Pinheiro
Germana Maria Arajo Sales
330
CONCEPES E SISTEMATIZAO DO ELEMENTO
ESPACIAL NA LITERATURA
Samantha Costa de Sousa
339
Gunter karl Pressler
FRADIQUE MENDES: DO JORNAL AO LIVRO
Sara Vasconcelos Ferreira
Germana Maria Arajo Sales
360
REPRESENTAOES DE LEITURA DE JORNAL NOS
ROMANCES MACHADIANOS
Valdiney Valente Lobato de Castro
Germana Maria Arajo Sales
373
AS INTERPRETAES DO ESPAO: AS VISES
GEOGRFICA E ALEGRICA EM O RECADO DO MORRO
Wellington Diogo Leite Rocha
Slvio Augusto de Oliveira Holanda
391
10
O ALTEAMENTO DAS VOGAIS MDIAS PRETNICAS NO PORTUGUS
FALADO PELOS MARANHENSES RESIDENTES NO MUNICPIO DE
TUCURU: UMA ANLISE VARIACIONISTA1
Autora: Benedita do Socorro Pinto Borges2
Orientadora: Regina Clia Fernandes Cruz
RESUMO: O presente estudo um recorte da pesquisa de mestrado que tem o objetivo
principal caracterizar a variao dialetal em especfico o alteamento das vogais mdias
pr-tnicas /e/ e /o/ do portugus falado pelos maranhenses residentes no municpio
de Tucuru (PA). No estudo nos valemos dos da sociolingustica quantitativa de Labov
(1972), como base das investigaes sobre variaes dialetais de uma comunidade
lingustica, alm das discusses de Mattoso (1991) sobre caracterizao das vogais
mdias pr-tnicas do Portugus Brasileiro (PB) e sobre rima luz da
Sociolingustica (2008). Para a composio da amostra, utilizamos os procedimentos
adotados por Bortoni-Ricardo (1985) em que para explicar o comportamento lingustico
dos migrantes tomou por base o conceito de grupo de referncia. Com base neste
conceito para efeito de qualificao formamos o corpus a partir de entrevistas com 10
informantes, divididos em dois grupos: o de ancoragem e de controle. O primeiro,
composto por 8 informantes, dos quais 4 (quatro) so do sexo masculino e 4 (quatro)
so do sexo feminino, distribudos em duas faixas etrias: de 30 a 46 anos e acima de 50
anos serviu de base para a pesquisa. O grupo de controle, foi composto por 2 (doze)
informantes, nascidos em Tucuru/PA, sendo 1 (um) so do sexo masculino e 1 (um) do
sexo feminino, descendentes do grupo de ancoragem . Os dados coletados foram
tratados no programa PRAAT e no GOLDVARB X. Os procedimentos metodolgicos
so os mesmos adotados pelo Vozes da Amaznia, linha de investigao ao qual essa
pesquisa se vincula sob orientao de Cruz (2012). Os resultados encontrados foram:
40% de ocorrncia de /e/ e 64% de probabilidade de /o/ para manuteno, 31% em /e/ e
14% em /o/ para alteamento e 28% para /e/ e 21% para /o/ de abaixamento. A leve
diferena de predomnio de alteamento de /e/ aliada ao fato de o alteamento ser o foco
1 Recorte da verso para qualificao da Dissertao que ser defendida como requisito parcial para
obteno do ttulo de mestre orientado por Regina Cruz, coordenadora do projeto Vozes da Amaznia da
UFPA 2015. 2 Aluna do Curso de Mestrado em Estudos Lingusticos pela Universidade Federal do Par.
11
dos Vozes nos instigou a analisar o alamento das variveis /e/ e /o/ em posio
pretnica.
Palavras-chave: variacionista, alteamento, pr-tnica, Tucuru.
ABSTRACT: This study is part of the master's research that has the main objective to
characterize the dialectal variation in particular the increasing height of the middle
unstressed vowels / e / and / o / the Portuguese spoken by Maranho residents in the
municipality of Tucuru (PA). In the study we make use of the quantitative
sociolinguistics of Labov (1972) as the basis of investigations into dialectal variations
of a language community, beyond the discussions of Mattoso (1991) on characterization
of the middle unstressed vowels of Brazilian Portuguese (BP) and rhyming to Light
Sociolinguistics (2008). For the sample, use the procedures adopted by Bortoni-Ricardo
(1985) in which to explain linguistic behavior of migrants was based on the concept of
the reference group. Based on this concept for qualification effect form the corpus from
interviews with 10 informants, divided into two groups: the anchor and control. The
first, consisting of 8 informants, of which four (4) were male and four (4) are female,
distributed in two age groups: 30-46 years and over 50 years served as the basis for
research . The control group consisted of 2 (twelve) informants, born in Tucuru / PA, 1
(one) are male and one (1) female, descendants of the anchor group. The data collected
were treated at PRAAT program and GOLDVARB X. The methodological procedures
are the same as those used by the Amazon Voices, line of research to which this
research is linked under the guidance of the Cross (2012). The results were: 40%
occurrence of / e / and 64% probability of w / o / maintenance, 31% / and / e 14% / o /
to heightening and 28% to / e / and 21% for / o / lowering. A slight lift of predominance
difference / and / together with the fact that the heightening be the focus of the voices
prompted us to analyze the uprising of the variables / and / and / o / in pr-tnica
position.
Keywords: variationist, increasing height, pre-tnica, Tucuru
INTRODUO
12
A anlise fontico-fonolgica das vogais do PB tem recebido forte ateno por
parte de pesquisadores linguistas do Brasil. Porm Callou et. al (2013) reclama que
ainda h uma lacuna no que diz respeito aos estudos sobre segmentos voclicos e
numera os dois tipos existentes no pas: um que se realiza por meio de anlises
espectrogrficos e outro que se limita a estuda-las considerando suas posies na slaba
ou a estudar uma lngua.
Mesmo assim, Nascente (1953) apud Fagundes (2015) defende que o estudos
das vogais um dos mais frteis atualmente dada a possibilidade que oferecem de
fornecer dados para mapear o dialeto.
Na Regio Amaznica, o mapeamento dialetal fontico-fonolgico das vogais
realizado por meio do Projeto Vozes da Amaznia, vinculado ao Projeto PROBRAVO3,
de responsabilidade de Cruz (2012) a quem o estudo em tela se subordina incidindo
sobre o Alteamento das vogais mdias pretnicas do portugus falado pelos
maranhenses residentes em Tucuru.
Por meio da referida investigao pretende-se responder a questes bem
especficas do tipo: (i) Como se manifestam as vogais mdias pr-tnicas no dialeto dos
maranhenses residentes em Tucuru em relao aos outros dialetos paraenses estudados
pelo projeto Vozes da Amaznia? (ii) Os migrantes mantm a marca dialetal ou
mudaram a partir do contato com dialeto da localidade pesquisada? (iii) Qual regra seria
mais produtiva do dialeto investigado: a aplicao ou no aplicao da regra de
alteamento? (iv) Que fatores lingusticos e/ou extralingusticos condicionam o
alteamento ou o no alteamento das mdias pr-tnicas no dialeto em estudo? (v) O
dialeto dos mais jovens tende a manter a marca dialetal dos migrantes? (vi) O princpio
da harmonia voclica contribui para o alteamento ou no alteamento das mdias pr-
tnicas?
Considerando as localidades pesquisadas pelo Vozes da Amaznia, dentre as
quais Pereira (2013) em Aurora do Par e Fagundes (2015) na Zona metropolitana de
Belm encontraram como produtivos o abaixamento da vogal mdia pr-tnica ,
apostamos que diferentemente dos dois pesquisadores que devido ao tempo de
residncia h mais de vinte e dois anos em Tucuru, esses falantes migrantes
maranhenses tendem a perder a marca dialetal o abaixamento e a realizar o
3 HTTP:/relin.letras.ufmg.br/probravo/projetos.phd
13
alteamento, caso faam parte da rede uniplex ou ainda mantenham a marca dialetal
caso faam parte da redes de relaes multiplex. Outra hiptese sobre a questo que os
descendentes desses migrantes nascidos em Tucuru ou que tenham migrado com
aproximadamente dois anos para a cidade, no apresentem a marca dialetal dos pais.
Sendo assim a presente investigao teve como objetivo primordial caracterizar
a vogal medial pr-tnica /e/ e /o/ do portugus falado pelos maranhenses e
descendentes residentes em Tucuru. Esse estudo foi motivado pela necessidade de se
fazer um mapeamento sociolingustico do portugus falado no referido municpio e
contribuir para o projeto de pesquisa institucional Vozes da Amaznia (Portaria N
037/2013 ILC) ao mesmo tempo que ajuda a interpretao e diviso dialetal brasileira
no que diz respeito forte variao das vogais mdias pr-tnicas do portugus do
Brasil. Nesse caso, considerar-se-o fatores lingusticos e extralingusticos que
influenciam e condicionam o fenmeno pesquisado na fala dos maranhenses residentes
em Tucuru luz dos conceitos da Sociolingustica Quantitativa Laboviana (1972),
abordagens estruturalistas de Mattoso (1995) sobre vogais pr-tnica e conceito de
rimas (2008) e procedimentos metodolgicos de Bortoni-Ricardo (2010, 2011) adotados
em suas discusses sobre migrao e redes sociais.
Este estudo de natureza fontico-fonolgico coordenado por Cruz (2007) que
investiga as variantes de e em na fala dos Amaznidas domiciliados em
localidades onde houve intenso fluxo migratrio em decorrncia dos projetos
governamentais como o caso da Estrada de Ferro Tucuru e da Construo da Usina
Hidroeltrica de Tucuru.
1. UM BREVE EXCURSO SOBRE OS ESTUDOS DAS VOGAIS MDIAS
PRETNICAS DO PORTUGUS FALADO NO BRASIL
As descries lingusticas a cerca do Portugus Brasileiro (PB) so recentes e
datam aproximadamente a dcada de 60. Dentre os estudos fluentes esto os que
analisam o sistema voclico brasileiro considerando seu posicionamento na slaba. O
teorista Cmara Jr (1970, 1977) interpreta a variao fontico-fonolgica das vogais
mdias nas posies pr-tnicas, como complexo, flutuante, produtivo e produtor de
neutralidade entre as vogais, j que a regra de alteamento dessas vogais, segundo o
linguista, reduz os contrastes entre elas. Nesses casos, o autor defende que ao invs de
neutralizao, os alofones do fonema /i/ e dos submembros do fonema /e/ se desdobram.
14
Esse fenmeno o que o estudioso conceitua como Harmonia Voclica, segundo o qual
existe uma vogal de timbre intermedirio entre /i/ e /e/ e entre /u/ e /o/, ou seja, uma
vogal alta no-subjacente estrutura fnica da palavra (Cmara Junior -1970). Ao
descrever as vogais do portugus brasileiro com base no dialeto falado no Rio de
Janeiro, esse estudioso apresenta um trapzio de sete vogais em posio tnica, que se
reduzem a cinco em posio pr-tnica, em consequncia de uma neutralizao das
mdias altas e baixas nesta posio, conforme quadro 1.
Quadro1. Classificao das vogais tnicas e pretnicas considerando o fenmeno da Neutralizao de
acordo com Cmara Jr. (1975:33-34)
Elaborado pela autora
Na mesma assertiva, Silva (2014, p. 82-84) generaliza a existncia de
cinco vogais pr-tnicas em todos os dialetos brasileiros. Porm, defini algumas
condies especficas nas quais pode ocorrer a pronncia [, ]. Nesse caso, a autora
defende tratar-se de uma variao dialetal geogrfica ou at mesmo idioletal. A autora
lista a ocorrncia pr-tnica das referidas variantes nas cinco observaes seguintes:
Observao 1: ocorrncia pr-tnica de [, ] em palavras derivadas com sufixo em
que o radical do nome tenha as mdias baixas [, ] como em s[]riamente e
m[]lssimo, derivadas respectivamente de (s[]ri)a e (m[]l)e que marcam a variao
dialetal geral do Brasil.
Observao 2: ocorrncia pr-tnica de [, ] quando a vogal tnica for uma vogal
mdia baixa embora uma seja arredonda e a outra no como em [pk] e [pk]
ou em [pksI] e [klg] consecutivamente. Tambm pode ocorrer para alguns
falantes de a vogal mdia pr-tnica ter de ser igual em arredondamento tal qual em
[pk] e [pk] mas que no ocorre em p[]k[]se e k[]l[]g. Por fim a autora
observa que um grupo de falantes sempre ter a forma pr-tnica /o/ e /e/ como em
[peek] e [pook], [peksI] e [kolg].
Observao 3: ocorrncia pr-tnica de [, ] sem que haja vogal baixa na palavra
como em [bleza] e [gstoso].
Altas i
u
Mdias altas e e o o 2 grau
Mdias baixas 1 grau
Baixas
A
Anteriores
Central
Posteriores
15
Observao 4: ocorrncia pr-tnica de [, ] quando a tnica for nasal tipo [ste~bru]
e [klo~bu]
Observao 5: ocorrncia pr-tnica de [, ] quando for seguidas das consoantes s:
[dstinu], de r [vrdadeiro], de l [slvagem].
A autora reconhece a necessidade de mais pesquisas detalhadas sobre o sistema
voclico embora liste Castro (1990), Oliveira (1991) Yaconvenco (1993); Callou et. al
(1996) como estudiosos que dispensaram ateno ao tema.
Callou et al. (2013: 77) classifica tambm as vogais em tnicas, pr-tnicas e
postnica conforme quadro 2:
Tnica I e A O u Sete vogais
Pretnica tona I E A O u Cinco Vogais
Postnica tona I A U Trs Vogais
Quadro 2: Classificao das vogais segundo Callou et al (2013, 77-78)
Elaborado pela autora
A observao da tabela 2 permite concluir que a classificao de Callou et al.
(2013: 77) baseia-se na anlise voclica de Cmara Jr. (1975:33-34) na qual o autor
encontra sete vogais em posio tnica e em posio tona discute o princpio da
neutralizao fnica entre /e/ e // que consiste na eliminao de // em detrimento de /e/
e entre // e /o/ em que h eliminao de // em favor de /o/, reduzindo portanto para
cinco vogais em posio pretnica. Calou et. al informa que:
A realizao do arquifonema /E/ e /O/ como vogal mdia alta e /e/ e /o/ ou
media baixa // e // varia de acordo com as regies geogrficas: As regies
Norte/Nordeste privilegiam a realizao aberta [ e ], enquanto a regio
Sul/Sudeste, a realizao fechada [e e o].
Porm a autora adverte que essa descrio geogrfica no categrica j que
no Nordeste nem todas as vogais so pronunciadas como baixas como o caso de em
v//c e no Sudeste a regra de harmonizao voclica tanto pode produzir pronncia
aberta em algumas palavras como em P//l// como alteamento em outras que o caso
de m/i/nino.
Nascente (1953)4 apud Razki et.al (2012, p. 296) a partir de uma observao
pessoal (sem dados empricos) e baseando-se em caractersticas fonticas e prosdicas
(cadncia) prope um mapeamento dialetal de ocorrncia de vogal pr-tnica /e/ e /o/
4 NASCENTES, A. O linguajar carioca. Rio de Janeiro: Simes, 1953.
16
no PB para classificar os subfalares do pas em dois grupos: o do Norte no qual esto
inclusos os subfares Amaznicos (Par, Acre, Amazonas e parte de Gois) e
Nordestinos ( Maranho, Piau Rio grande do Norte, Paraba, Alagoas e parte de Gois)
; o do Sul que engloba os subfalares Baiano (falar de Sergipe, Bahia, parte de Minas
Gerais -regio norte, nordeste e noroeste), parte de Gois e Tocantins; Fluminense
(falares de Rio de Janeiro, Esprito Santos e parte de Minas -zona da mata e regio
leste); Mineiro (regio leste e centro-oeste e Sulista (Mato Grosso do Sul e parte de
Gois.
Segundo o autor, os subfalares do Norte apresentam pronncia da vogal media
pr-tnica aberta, portanto [, ], e cadncia cantada, e os do Sul se caracterizam por
apresentarem pronncia fechada e cadncia descansada. Essa descrio resultou na
diviso dialetal representada no mapa 1:
Mapa 1 Diviso dialetal do Brasil por Antenor Nascentes:
Fonte: Razki et. al (2012, p. 296)
Razki et. al. (2012, p. 297 analisa os estudos de Leite e Callou (2002, p. 40)5 em
Recife, Salvador, Rio de Janeiro, So Paulo e Porto Alegre, com base em dados do
projeto NURC (Norma Lingustica Urbana Culta) sobre a pronncia das mdias pr-
tnicas e verifica que as abertas tem alta frequncia nas duas cidades do Nordeste e
frequncia baixssima no Rio de Janeiro, como tambm no registra a ocorrncia de
abaixamento em So Paulo e Porto Alegre.
Por isso, vale a pena rever alguns estudos realizados no grupo Norte,
considerando um subfalar Nordestino, como o caso do falado no Maranho, e um
subfalar Amaznico, como o que ocorre no Par, para verificarmos se a realizao das
5 CALLOU, Dinah et alli. As vogais pretnicas no falar carioca. Estudos lingusticos e literrios. Salvador: v. n.5, p. , dez, 1986.
17
mdias abertas // e // em posio pr-tnicas condizente com o postulado por
Nascente (1953) quando as considera como variveis de prestgio nessas do autor.
1.1. As Vogais Pretnicas no Maranho
O registro a cerca dos estudos fonticos variacionistas realizados no Estado do
Maranho so escassos. Entretanto, Castro e Aguiar (2007) tratam do alamento e
abaixamento das vogais pr-tnicas /e/ e /o/. Trata-se de um recorte sincrnico do
estudo dissertativo de Castro, (2008) do qual a partir de lxicos selecionados das
entrevistas dos informantes, as autoras buscam mapear fontico-fonologicamente as
vogais pr-tnicas /e/ e /o/ na fala dos sertanejos da regio de Balsas.
As estudiosas reconhecem as muitas literaturas que falam fertilidade de
ocorrncia da vogal mdia fechada e da baixa produtividade das vogais mdias baixas
// e // na maioria dialetos brasileiros como o caso de Callou e Leite (2001) e de
Ferreira Neto (2010). No entanto, dizem categoricamente que a regra no se aplica ao
Nordeste, onde em posio pr-tnica o /o/ por exemplo, inexistente tanto que no
conseguiram registrar nenhuma ocorrncia da referida variante ao contrrio do que
ocorre com // e //.
Castro e Aguiar (2007) discutiram os fenmenos de Alamento e Abaixamento
na fala dos Sertanejos das regies de Balsa luz das anlises sobre Harmonia Voclica
e de Assimilao Voclica de Bisol (1992) e de Crowley (2003).
As pesquisadoras estabelecem como fatores lingusticos a ser controlados nos
substantivos e adjetivos o seguinte: o tipo de vogal em anlise e a vogal seguinte,
consoantes adjacentes considerando o ponto de articulao, grau de nasalidade da vogal
tnica, onset e coda da slaba pr-tnica e tipo de rima: aberta (VC), fechada (travada
por consoante - CVC)
Sobre os resultados, as estudiosas afirmam que os processos de alteamento e
abaixamento de /e/ se apresentam de forma similar na regio de Balsa do Maranho
tanto nos substantivos quanto nos adjetivos. Porm com relao ao /o/, os fatores que
condicionam a variao do alofone diferem-se dos substantivos para os adjetivos.
No caso de alteamento das vogais, as autoras retomam o conceito de assimilao
de Bisol (1992) e Crowley (2003), segundo quem a vogal mdia pr-tnica assume
traos de alturas de /i/ e /u/ da vogal seguinte. Tambm explicam a possibilidade de
algumas vogais pretnicas tenderem a uma harmonizao com a vogal baixa tnica.
18
Para Razki et. al. (2012) a anlise de Nascente (1953) de modo geral se atualiza,
mas o autor em conformidade com as investigaes de Silva (1989) e Nina (1991) alerta
que h localidades que se configuram com uma ilha quanto pronncia da vogal
mdia pretnica.
Por isso, vale ento retomar os estudos fonticos desenvolvidos no Par para
observarmos se a regra de produtividade da vogal aberta se aplica no subfalar
amaznida conforme mapeado por Nascente (1953).
1.2. As Vogais Pretnicas no Par
Na regio norte, especificamente no Par, as pesquisas de Nina (1991)
inauguram as investigaes de cunho variacionistas em torno das vogais mdias /e/ e /o/
entre consoantes e em posio pr-tnica. Considerando os fenmenos de abaixamento
e alteamento, a autora, por meio das entrevistas livres, desenvolvidas em oito bairros de
Belm nos quais encontrou 4.492 ocorrncias, posteriormente submetidas ao programa
de anlise Varbrul, encontra a manuteno de /e/ e /o/ como resultado.
No mesmo percurso Razky et. al (2012) a partir da criao do Projeto ALIPA
(Atlas Geossociolingustico do Par) em 1996, passou a verificar a variao dos
fonemas /e/ e /o/ em contexto pr-tnico no falar das cidades de Abaetetuba, Altamira,
Belm, Bragana, Breves, Camet, Conceio do Araguaia, Itaituba, Marab e Santarm
, um dos pontos de inquritos: o urbanos proposta do projeto ALIPA, conforme
mapa 2.
Mapa 2: As dez cidades paraenses estudadas por Razki no projeto ALIPA
Fonte: Razki (2012, p. 298)
Os resultados consolidados por Razki et. al (2012) de modo geral apontam para
o predomnio das vogais mdias fechadas /e/ e /o/ na amaznia paraense o que
19
contrariam a diviso dialetal proposta por Nascente (1995). Alm disso, os referidos
resultados evidenciaram a necessidade de um novo mapeamento porque mesmo nas
cidades onde o fluxo migratrio nordestino intenso, como o caso de Itaituba,
Santarm e Conceio do Araguaia nas quais h influencia das medias abertas // e //, o
predomnio das variantes mdias abertas no categrico para todas as cidades,
conforme afirmam os pesquisadores.
Ainda Rodrigues (2005) no municpio de Camet; tal qual Dias et. al (2007) em
Breves; Marques (2008), Campelo (2008), Coelho (2008) em Breu Branco; Campos
(2008) em Mocajuba; Cruz et. al. (2008) em Belm, Cassique et. al (2009) em Breves,
Souza (2010) em Belm apud Cruz (2012) computaram como resultado de seus
inquritos o princpio da Harmonia Voclica, razo pela qual a equipe do PROBRAVO
decide aprofundar os estudos no Par a cerca das vogais em posio pretnica.
Nessa Perspectiva, e a partir das abordagens de Silva Neto (1957) Cassique
(2006) defende uma nova diviso dialetal conforme o mapa 3.
Mapa 3 Mapa Dialetal das localidades Alvo do Projeto Norte Vogais
Adaptado de Cruz (2012)
O mapeamento lingustico proposto por Cassique (2009) compreende trs zonas
dialetais de inquisies no mbito das pesquisas paraenses sobre vogal pretnica: a
Zona 1 onde localizam-se os falares de Belm e Breves, a Zona 2 onde inserem-se os
falares bragantinos e a Zona 3 que compreende a regio onde atestam-se contatos
interdialetais consequncia do fluxo migratrio, como o caso do municpio de Tucuru
onde essa pesquisa se desenvolveu.
Essa configurao norteia os estudos sociofonticos empreendidos por Cruz
(2012) no seio do Projeto Vozes da Amaznia. A partir de Cruz (2012) a metodologia
do projeto se torna mais abrangente e minuciosa porque alm de ampliar o nmero de
informantes, considera fatores lingusticos como o tipo de vogal pr-tnica, a distncia
da vogal tnica em relao tnica, o grau de recuo e de nasalidade da tnica, a
consoante precedente e conseguinte quanto articulao e tipo de rima, bem como
20
fatores extralingusticos (sociais) como: sexo, idade e escolaridade, dentre outros. Os
dados coletados por meio de entrevista semiestrutura so segmentados no PRAAT onde
se procedem as anlises acsticas em pelo menos seis nveis de segmentao para se
localizar a variao da vogal media /e/ e /o/ no vocbulo. Depois esse vocbulo alvo
codificado para finalmente ser submetido ao programa Goldvarb X do qual se extraem
os resultados estatsticos sobre a variante em estudo.
Os resultados investigativos localizados no mbito do Vozes, de modo geral
apontam para preservao da mdia /e/ e /o/ em posio pr-tnica. Alm disso, nos
casos em que ocorre a variao dessas variveis para alteamento ou abaixamento, no
geral so favorecidos por fatores lingusticos, como por exemplo: a influncia da vogal
contgua, e extralingustico como o grupo de referncia, conforme atestaram Ferreira
(2013) e Fagundes (2015).
Por tudo isso, Cruz (2012) defende a tese de que importante considerar a
origem dos informantes em conjunto com os fatores lingusticos e extralingusticos que
j faziam parte da metodologia do Vozes. Assim, com base na metodologia de Bortoni-
Ricardo (1985) Cruz (2012) estabelece uma nova metodologia para vigorar no Vozes na
qual deve-se controlar na pesquisa da vogal mdia em posio pr-tnica no contexto
Amaznico paraense: o grupo de referncia na relao com o grupo de descendestes.
Segundo Bortoni-Ricardo (1985) o grupo de referncia o que serve de alavanca
para construo da identidade do indivduo, ou seja, o grupo com base no qual o falante
modela seu discurso e com o qual ele busca identificar-se. Em outras palavras, o grupo
que atende s expectativas psicossociais e culturais do falante. A autora tambm
escreveu que a rede social o conjunto de ligaes que se estabelecem entre indivduos.
Cruz (2012) tambm defende o uso de conceito de rede de relaes entre os
informantes nas anlises sociofonticas, pois corroborando com ideia de Bortoni-
Ricardo (1985) entende serem as redes de relaes o melhor instrumento para se lidar
simultaneamente com as diferenas individuais e com a identificao da variao sutil
dos padres sistemticos.
O conceito de redes sociais utilizado em investigaes sociolingusticas
quando h interesse em registrar o envolvimento de comunidades lingusticas de
migrantes. Estudos pautados nesse vis no tem interesse apenas em verificar atributos
lingusticos dos indivduos, mas tambm em caracterizar as relaes de um com outro,
como o caso dessa pesquisa.
21
A coordenadora do Vozes ainda acredita numa descrio com base nos
pressupostos terico-metodolgicos da Sociolingustica Variacionista de Labov [1972]
porque esse linguista ofereceu um novo olhar para a lingustica ao empreender estudos
empricos considerando as comunidades de fala. A Sociolingustica que Labov defende
aquela que tem o propsito de estudar a lngua no seio social da comunidade, como
expectativa do Vozes.
Enfim, todos os conceitos aqui descritos foram basilares na investigao dos
fenmenos postos em pauta no estudo realizado no municpio de Tucuru pelo projeto
Vozes da Amaznia a partir de 2014 conforme mapa:
Mapa 4 Mapa Dialetal das localidades Alvo do Projeto Norte Vogais incluindo Tucuru
Adaptado de Cruz (2012)
2. O PROCESSO MIGRATRIO EM TUCURU
Situada na Regio Sudeste do Par, margem do rio Tocantins a cidade de
Tucuru tem mais de 50 anos de emancipao poltica e uma populao de
aproximadamente105. 431 habitantes.
22
Mapa 5 Mapa da Localizao de Tucuru
Fonte: Elaborado
A histria de Tucuru remonta o sculo XVII, quando Frei Cristovo de Lisboa
em 1625 veio regio com o objetivo de fazer contato com os ndios Assurinis (do
troco lingustico tupi, que ainda vivem no municpio) e os Parakans (tambm do troco
lingustico tupi e os Gavies - do troco lingustico j, com hbitos e cultura,
provavelmente nmades)
O povoamento de Tucuru se intensificou por causa dos grandes projetos como
o caso da Estrada de Ferro (construda em 1895 e desativada em meados dos anos 70) e
da Hidroeltrica de Tucuru (iniciada aproximadamente em 1972). Essa usina se tornou
o maior polo gerador de energia de todo pas e um forte atrativo migratrio. Dentre as
motivaes que oportunizaram a escolha de Tucuru para a construo da usina esto o
fato de ser um polo agropecurio do Programa Grande Carajs; gozar de financiamentos
para a indstria madeireira e para a criao de gado e dispor de uma das mais modernas
fbricas de silcio metlico do mundo; a DOW CORNING.
Esses investimentos tambm atraram para o municpio muitos migrantes
visando possibilidade de uma melhor qualidade de vida conforme tabela e grfico 1.
Tabela 1: Dinmica Migratria da rea do Entorno da Usina no
perodo entre 1970 e 1991.
Populao 1970 1980 1991
Nativo 5.447 13.839 55.218
No Nativo 4.474 47.284 26.405
Total 9.921 61.123 81.623
Elaborada pela autora com base IBGE 1970 , 1980 e 1991
Grfico 1 Relao entre populao nativa e no nativa no municpio de Tucuru (PA)
23
no perodo de 1970 e 1991, destacando-se o ano de 1980, quando houve maior dinmica
migratria do municpio no Entorno da Usina de Tucuru.
Elaborada pela autora
As tabelas e os grficos 1 apresentam o crescimento populacional de quase
100% em aproximadamente 40 anos. Esse aumento populacional se deve ao fluxo
migratrio que ocorreu por causa da construo da hidroeltrica.
Para BECKER (1998), o fenmeno da migrao na Amaznia ocorre porque os
centros de migrao passam a ser: a) fator de atrao de migrantes, b) base
organizacional do mercado de trabalho e c) local da ao poltico-ideolgica do
Estado.
Para o autor:
a juno desses papis configura o espao urbano como primordial no
sentido de promover uma rpida mobilidade na Amaznia e direcionar o
fluxo migratrio para a regio. A partir desses dois preceitos, verificaremos
que o processo migratrio ocorrido no espao regional amaznico tem como
fundamento intensa flexibilizao da mo-de-obra
O crescimento populacional de Tucuru em dados numricos pode ser
visualizado no grfico 2 no qual se pode perceber que o maior nmero de migrantes so
oriundos do estado do Maranho.
69 41355144
1113
192
132016735
75
742279
97
5041
6721102
Fluxo Migratrio de Tucuru
RndoniaAmazonasRoraimaAmapTocantinsMaranhoPiauiCearRio Grande do NorteParaibaPernambucoSergipeBahiaMinas Gerais
24
Grfico 2 crescimento populacional de Tucuru nas dcadas de 70 e 80 considerando a migrao por
estado
Elaborada pela autora
2. METODOLOGIA
Para alcanar os objetivos propostos nessa pesquisa seguimos os mesmos
procedimentos metodolgicos orientados pelas diretrizes do Vozes da Amaznia como
fez Ferreira (2013) e Fagundes (2015) em suas pesquisas de mestrado.
Portanto o corpus dessa anlise a priori corresponde a 564 ocorrncias das
quais 418 representam a varivel /e/ e 146 a varivel /o/. Nesse caso, os cento e seis
minutos e nove segundos totais de gravaes que oscilaram em mdia de sete a quinze
minutos por informante representam dados extrados da gravao da fala de 10
entrevistados da amostra, divididos em dois grupos: a) o grupo de ancoragem, com 8
informantes migrantes sendo 4 (quatro) do sexo masculino e 4(quatro) do sexo
feminino, distribudos em duas faixas etrias de 30 a 46 anos e acima de 50 anos; b) o
outro grupo de controle, formado por 2 (dois) informantes sendo 1 (um) do sexo
masculino e 1 (um) do sexo feminino, descendentes do grupo de ancoragem, nascido em
Tucuru ou que tenham migrado para a cidade com pelo menos dois anos de idade.
Para a composio da amostra, utilizamos os mesmos procedimentos adotados
por Bortoni-Ricardo (1985) em que para explicar o comportamento lingustico dos
migrantes lanou mo do conceito de redes sociais, tomando por base o conceito de
grupo de referncia. Realizamos a entrevista a utilizando um questionrio
semiestruturado e depois codificamos o informante para estabelecermos a rede de
relao usando o software Yed Graph Editor.
Fazer um estudo sociofontico considerando o contorno de rede de relaes
considerar a possibilidade de predizer e explicar o comportamento dos indivduos,
inclusive o lingustico que por sinal tem muito a dizer sobre a identidade de um
indivduo.
A rede de relaes sociais traada nessa pesquisa est pautada nos pressupostos
metodolgicos das pesquisas empreendidas por Bortoni-Ricardo (2011, p. 84) para
quem:
A anlise de redes, em sentido amplo, um estudo das relaes
existentes num sistema de processo de mudana. Quando aplicada a sistemas
25
sociais, a anlise de redes uma estratgia social primeiramente voltada para
as relaes entre os indivduos em um grupo.
A autora defende a anlise lingustica funcional em harmonia com
coexistncia da temtica dos relacionamentos humanos em detrimento dos estudos
meramente formalistas. Essa orientao basilar no nosso construto de redes, pois essa
investigao relaciona-se com a abordagem lingustica variacionista que reconhece os
padres de densidade da comunicao humana numa varivel intermediaria entre a
lngua e as caractersticas socioecolgicos da comunidade de fala (BORTONI-
RICARDO, 2011, p. 85)
Na sequncia fizemos a segmentao da entrevista no SOFTWARE PRAAT nos
nveis fontico, silbico, item lexical, do vocbulo alvo e grupo de fora, conforme
figura 1:
Figura 1: Imagem espectrogrfica da segmentao da fala do informante BE01MXA3
Fonte: Elaborado pela autora
Aps localizarmos o vocbulo alvo passamos para a etapa de codificao das
palavras conforme o arquivo de especificao do projeto Vozes considerando os trs
fatores das variveis dependentes: alteamento, manuteno e abaixamento e os 12
fatores de variveis independente dos quais 9 so lingusticos e 3 so os
extralingusticos.
Porm o foco de nosso estudo foi o alteamento, razo porque agrupamos a
manuteno e abaixamento na variao no-alteamento, alm de optarmos pela rodada
binria dos dados codificados no programa goldvarb X.
Para cada varivel realizamos duas rodadas, controlando a aplicao e no
aplicao do alteamento para analisarmos em separado o comportamento de cada uma
delas no dialeto.
26
O programa selecionou como grupos de fatores lingusticos significantes para as
variantes de : o grau de nasalidade da tnica em que a nasalizvel favorece o
alteamento com o peso relativo de .82, seguida da oral com .51; segmento precedente
em que o onset vazio favoreceu a aplicao da regra com um peso relativo de .89; o
segmento seguinte em que a vogal favoreceu com um peso relativo .94, seguido da
dorsal com .75 e da coronal com .52. Os fatores extralingusticos triados pelo programa
como favorecedores de /e/ foi a maior idade com o peso relativo de .54 e o grupo de
referncia com .55.
J para variantes de os fatores lingusticos triados como influentes foram:
a vogal contgua imediata com .75, o segmento seguinte: vogal com .87 e dorsal com
.68, tipo de rima: fator sem rima com 0.75 de peso relativo. O fator social influenciador
da referida variao foi o grupo de ancoragem com .60 de probabilidade, conforme
quadro 3:
Fatores/Variantes /e/ /o/
Alteamento Alteamento
Altura da vogal tnica
Grau de recuo da tnica
Grau de nasalidade da tnica
Posio da pretnica no vocbulo
Vogal contgua
Distncia relativa silaba tnica
Segmento precedente
Segmento seguinte
Tipo de rima
Sexo do informante
Faixa etria
Grupo de Amostra
Quadro 3: Fatores selecionados e excludos pelo programa Goldvarb X nas rodadas de aplicao do
alteamento e do no alteamento das mdias pretnicas e Fonte: Elaborado pela autora.
27
Os resultados dessas rodadas foram expostos no captulo 4, porm nos detemos
nesse estudo a uma anlise parcial considerando os grupos selecionados em comum
como significantes aplicao das variantes de alteamento e no alteamento de e
.
4. APRESENTAO E DISCUSSO DOS RESULTADOS
Tendo em vista a apresentao no captulo 3, dos passos seguidos para pesquisar
o fenmeno de alteamento na fala dos maranhenses residentes h mais de 22 anos em
Tucuru, chegou a hora de discutir os resultados quantitativos em percentuais e pesos
relativos de 564 ocorrncias das vogais alvos gerados pelo o Goldvarb X, dos quais 418
representam a variao de /e/ e 146 dizem respeito variao flutuao de /o/.
A tabela 2 um demonstrativo da ocorrncia de alteamento, manuteno e
abaixamento no municpio de Tucuru:
Tabela 2 Percentuais das variantes de e no subfalar do Maranhense em Tucuru/PA.
Elaborado pela autora
A tabela 2 ilustra a variao de prestigio em Tucuru tais quais os resultados
registrados pelo Projeto Vozes da Amaznia, em que nos dialetos estudados at o
momento predominam a variante de manuteno. Os dados de Tucuru tambm refutam
os postulados de Nascente (1953) que defendeu o abaixamento como variante
predominante no grupo norte. A referida tabela ainda demonstra que em /o/ a
manuteno mais fluente do que em /e/.
Entretanto vale lembrar que o parmetro variacionista focalizado nessa anlise
a aplicao ou no do processo de alteamento, j que pressupomos que o tempo de
residncia dos migrantes maranhenses h mais de vinte e dois anos em Tucuru
influenciou para que perdessem a marca dialetal o abaixamento em detrimento do
alteamento, caso faam parte da rede uniplex ou ainda que mantenham a marca dialetal
caso faam parte da rede de relaes multiplex. Tambm apostamos que os
Variante /e/ /o/
Alteamento 31,1 14,3
Manuteno 40,0 64,6
Abaixamento 28,9 21,2
28
31,1
40
28,9
14,3
64,6
21,2
0
10
20
30
40
50
60
70
alteamento manuteno abaixamento
Grfico comparativo da flutuao de /e/ e /o/
/e/
/o/
descendentes desses migrantes nascidos em Tucuru ou que tenham migrado com
aproximadamente dois anos para a cidade no se identificam com a marca dialetal dos
pais. As tabelas 3 e 4 representam respectivamente os percentuais e os pesos relativos
de /e/ e /o/ no subfalar tucuruiense:
Tabela 3 Aplicao, percentuais e pesos relativos das variantes de .
Fonte: Elaborado pela autora
Tabela 4 Aplicao, percentuais e pesos relativos das variantes de .
Fonte: Elaborado pela autora
Como bem visualizado nas tabelas 3 e 4, os dados em percentuais de 40% para a
e 64,6% para e em pesos relativos .40 para e .65 para apontam
que a manuteno se sobressai nas duas variveis do dialeto tucuruiense. Os nmeros
registram 31,1 de alteamento e 28,9 de abaixamento de /e/. Para as variantes de o
registro foi 21,2 para abaixamento14, 3%, para alteamento. Tais resultados so tambm
evidentes no grfico 3:
Grfico 3: Grfico comparativo da variao de /e/ e /o/ em Tucuru
Fonte: Elaborado pela autora
De acordo o grfico 4, a variao de /e/ para alteamento e abaixamento em dados
estatsticos se apresentam levemente similares, mas os nmeros da manuteno se
Variante Aplicao/Total %
Alteamento: fal[i]sida], s[i]gura~sa 130/418 31,1
Manuteno: n[e]sesidai, [e]kipame~tus 167/418 40,0
Abaixamento: [E]l[E]trnikus, v[E]xdai 121/418 28,9
Variante Aplicao/Total %
Alteamento: k[u]mida, k[um]unidade 27/172 14,3
Manuteno: k[o]~pletu, pr[o]fisu 122/172 64,6
Abaixamento: vi[]le~sia, d[]mEstika 40/172 21,2
29
diferem das duas outras variaes. Ou seja, a manuteno se apresenta se sobrepe s
outras variaes.
Tambm os resultados de /o/ so similares nos fenmenos de alteamento e
abaixamento, mas os nmeros da manuteno registram um alto grau de variao dessa
varivel. Confrontando os resultados das duas variveis, percebemos que h uma
tendncia maior de ocorrncia de manuteno de do que de . Porm, em
alteamento e abaixamento se mostra percentualmente mais produtiva do que .
Os dados dispostos no grfico 3 s refirmam a supremacia da variante mdia
fechada sobre o alteamento e abaixamento na fala de Tucuru. Esse mesmo resultado foi
atestado por Fagundes (2015), Ferreira (2013), Cruz et. al. (2012) Razky et al (2012)
sobre o subfalar amaznico, conforme tabela 5:
Variantes de
/e/ e /o/
BORGES
(2016)
FAGUNDES
(2015)
FERREIRA
(2013)
CRUZ et. al
(2012)
RAZKY
(2012)
/i/ 31 23 28 36 23
/u/ 14 16 21 37 23
/e/ 40 40 43 47 42
/o/ 64 43 52 44 51
// 28 35 28 17 35
/ / 21 40 26 19 26 Tabaela 5: Tabela dos resultados em percentual encontrados por Borges (2016) Fagundes (2015), Ferreira
(2013), Cruz et. al. (2012) Razky et al (2012) no subfalar amaznico
A representao desse resultado melhor pode ser visual no grfico 5.
Grfico 4: Grfico comparativo dos resultados da flutuao de /e/ e /o/ obtidos por
Borges (2016), Fagundes (2015), Ferreira (2013), Cruz et. al. (2012) e Razky et.
al. (2012).
Fonte: Elaborado pela autora.
0
10
20
30
40
50
60
70
/i/ /u/ /e/ /o/ // / /
Grfico comparativo de estudos realizados sobre a flutuao de /e/ e /o/ no Par
BORGES (2016)
FAGUNDES (2015)
FERREIRA (2013)
CRUZ et. al (2012)
RAZKY et. al. (2012)
30
Visualizando o grfico 4, perceptvel que assim como outros resultados
encontrados no Par, os computados em Tucuru refutam os de Nascentes (1953)
quando caracteriza como predominante a vogais mdias abertas em posio pretnica
nos dialetos amaznicos.
Alm disso, a variao das mdias pretnicas em Tucuru se desenha diferente
dos estudados por Fagundes (2015), Razky et. al. (2012) que encontraram como a
segunda flutuao mais produtiva o abaixamento, mas se aproxima dos encontrados por
Ferreira (2013) e Cruz et. al. (2012) quando localizaram em especial o alteamento de /e/
o segundo mais produtivo. Entretanto, lembramos que os valores quantitativos
fornecidos pelo programa GoldvarbX ressaltam o predomnio da manuteno tanto em
/e/ quanto em /o/. Esse resultado responde a nossa questo norteadora quando
pressupomos que os migrantes poderiam ter perdido sua marca dialetal, no caso o
abaixamento, como consequncia do contato interdialetal, de sua rede social ser uniplex,
morarem h mais de 22 anos em Tucuru. Tambm hipotetizamos que seus
descendentes tambm no preservavam a identidade lingustica dos pais: os migrantes
maranhenses tal como confirmamos.
Relembrando que o foco de nossa anlise o alteamento que est representado
em percentual e peso relativo fornecido pelas rodadas binrias do Goldvarb X, na tabela
6:
Tabela 6 Resultado da aplicao e no aplicao do alteamento das mdias pretnicas em Tucuru.
Fonte: Elaborado pela autora.
Esse mesmo resultado pode melhor ser visualizado no grfico 6 no qual o peso
relativo representa a aplicao e no aplicao da regra.
Regra
% %
Alteamento 31.1 18.5
No alteamento 68.9 81.5
31
.31
.18
.69
.82
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Peso Relativo de Alteamento e No alteamento de /e/ e /o/
alteamneto
no alteamento
Grfico 5- aplicao e no aplicao do alteamento das mdias pretnicas
Fonte: Elaborado pela autora.
Como visto, a evidncia de no alteamento das mdias pr-tnicas e
no dialeto tucuruiense aparece como a marca lingustica predominante desse subfalar.
Esses resultados se afunilam tambm aos de Fagundes (2015) 43%, Ferreira (2015)
74%, Oliveira (2007) - 91%, Rodrigues e Arajo (2007) 53%, Campos (2008) 51%,
Cruz et. al 37%, dentre outros. Os resultados vigorados na fala de Tucuru encontram
respaldo no construto de redes de Bortoni-Ricardo (2011), pois ambos os informantes
maranhenses e descendentes pertencem a rede uniplex, como vimos no sociograma 1
(capitulo 3), j que se relacionam mais com outros falantes nativos de Tucuru, em cuja
fala a manuteno predomina como marca dialetal do grupo, do que com os pessoas que
possuem o mesmo vernculo como smbolo de identidade lingustica. A seguir o
diagrama 2 representa a definio de redes, segundo Bortoni-Ricardo (2011, 113)
Diagrama 2 Relao entre padres de redes e preservao do vernculo.
Fonte: Bortoni-Ricardo (2011, p. 113)
Para Bortoni-Ricardo (2011, p. 113):
32
Ao se propor tais relaes que levam em conta o conflito entre orientao
para o prestgio e para a identidade, o papel da mobilidade social
considerado crucial. Como Milroy (1980: 196) aponta, a generalizao
correta parece ser a de que pessoas com redes esparsas e uniplex esto
relativamente mais expostas a mudar seus hbitos de fala na direo do
cdigo padro.
Como influentes nos resultados das duas variveis em estudo e o
programa estatstico GoldVarb X, dos 12 fatores elencados para a anlise, triou 5
grupos fatores como determinantes de 4 grupos como influentes . Porm
nos atemos nesse recorte da Dissertao a analise somente dos grupos comuns s duas
variveis descritos 4.1 onde apresentamos os resultados para o grupo de segmento
seguinte de /e/ e /o/, 4.2 onde registraremos os grupos de fatores determinante do
alteamento /e/ e /o/ de acordo com o grupo de amostra e no item 4.3 faremos uma breve
discusso sobre os resultados obtidos
4.1. SEGMENTO SEGUINTE
O grupo de fatores comuns selecionados tanto para a aplicao do alteamento
como de /o/ em Tucuru o segmento seguinte.
No caso de /e/, os dados revelam que as vogais com o peso .94, seguidas das
consoantes dorsais .75 e depois das coronais com .52 favorecem o processo de
alteamento de da referida varivel, verificvel na tabela 7. J as consoantes bilabiais
desfavorecem o processo de alteamento.
Fatores Segmento seguinte Aplicao % P.R
(Q) labial imine~sia, subrivive~du) 5/54 9.3 .08
(D) coronal (istuda~tzi) 93/248 32.7 .52
(G) dorsal (pike~nu, sigu~du) 29/75 38.7 .75
(V) vogal (pasiax, siare~su, 3/5 60 . 94
Total 130/418 31.1 Tabela 7 - Segmento seguinte na aplicao do alteamento de .
Fonte: Elaborado pela autora
O grfico 6 um demonstrativo de que com exceo das consoantes bilabiais todos
os seguimentos seguintes contribuem para o processo de alteamento em maior grau
33
.8
.52
.76
.94
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
Labial Coronal Dorsal Vogal
Segmento Seguinte
como o caso das vogais, em grau razovel como o caso das dorsais ou um leve
favorecimento como a influncia das coronais.
Grfico 6 Segmento seguinte na aplicao do alteamento de .
Fonte: Elaborado pela autora.
Os ndices probabilsticos do fator vogais seguintes corroboram com resultados
de Oliveira (2007) em especial ao que contraria a previso de Cmara Jnior (1969) que
o afirmou que altas so as que mais favorecem a elevao das vogais mdias pretnicas,
principalmente quando esta posterior fechada ambiente. Tanto quanto Oliveira (2007)
no estudo em tela o contexto favorecedor do alteamento da vogal mdia pretnica so as
vogais tnicas mdias fechadas e abertas e no altas, conforme mostramos no grfico 6
acima.
Em se tratando da varivel /o/ tal qual na triagem de , o segmento seguinte
tambm foi selecionado para aplicao de alteamento de , conforme tabela 8:
Fatores Segmento Seguinte Aplicao % P.R
(Q) labial [ kumex] 7/32 21.9 .45
(D) coronal [apuse~tadu] 11/89 12.4 .43
(G) dorsal [bukadu] 4/17 23.5 .68
(V) vogal [due~ti] 5/8 62.5 . 87
Total 27/146 18.5 Tabela 8 - aplicao do fator seguimento seguinte para o alteamento de /o/ em Tucuru
Fonte: Elaborado pela autora
Assim como na variao de /e/, so as vogais seguintes com peso relativo de .87,
34
.45.43
.68
.87
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
labial coronal dorsal vogal seguinte
Segmento seguinte
seguidas das consoantes coronais com peso .68 que tem significativa influncia sobre o
processo de alteamento de no dialeto tucuruiense. J as labiais e as coronais
desfavorecem o referido alamento. Os mesmos resultados ainda podem ser
visualizados no grfico 7.
Grfico 7 influncia do segmento seguinte no processo de alteamento de em Tucuru
Fonte: Elaborado pela autora
Similar ao resultado da variao de /e/ os ndices quantitativos do fator vogais
seguintes apontam os mesmo resultados de Oliveira (2007) quando afirmou diferente de
Cmara Jnior (1969) que so as vogais tnicas mdias fechadas e abertas e no altas
que favorecem o processo de alteamento, conforme mostramos no grfico 7 acima. O
imput para o favorecimento das referidas vogais de .87 peso relativo, seguido do
significativo .68 da consoante dorsal para o referido alamento de /o/. Entretanto vale
registrar tambm semelhante inibio da labial e coronal para o processo alteamento.
Fagundes (2015) em estudo sobre o abaixamento na fala dos maranhenses residentes h
mais de vinte cinco anos em Belm encontrou um substantivo favorecimento da dorsal
com .80 de peso relativo, e desfavorecimento da vogal com .20 de peso relativo. Pelos
resultados parece possvel afirmar que a dorsal tanto favorece o alteamento como o
abaixamento em contexto seguinte.
4.1.2. GRUPO DE AMOSTRA
35
O grupo de amostra foi a varivel extralingustica triada como importante para
analisar o alteamento de /e/ e /o/no vernculo dos migrantes e de seus descendentes. Em se
tratando de /e/ analisemos os resultados dispostos tabela 9:
Tabela 9 Resultados do Grupo de amostra na aplicao d alteamento de .
Os resultados apresentados na tabela 9 uma amostra quantitativa desse fator na
aplicao da regra de alteamento de /e/. Os valores evidenciam o grupo de Ancoragem,
ou seja, os migrantes maranhenses, como o grupo que se sobressai na aplicao do
alteamento de , com peso relativo .55. Por outro lado, o grupo de controle, os
descendentes maranhenses, nascidos em Tucuru obteve .36 de peso relativo assinalando
desfavorecimento do alteamento. Os mesmos resultados so bem visveis no grfico 8.
Grfico 8 Grupo de amostra na aplicao do abaixamento de . Fonte: Elaborado pela autora.
A imagem e os dados visualizveis no grfico 8 mostram o leve favorecimento
do Grupo de Amostra composto pelos migrantes maranhenses residentes em Tucuru
para o processo de alteamento. Na mesma medida tambm informa o desfavorecimento
da aplicao da varivel na fala dos descendentes desses migrantes. Essa baixa
produtividade da varivel no Par, segundo Nina (1991), Cassique et. al. (2009) Sousa
.36
.55
0
10
20
30
40
50
60
Controle Ancoragem
Grupo de Amostra
Controle
Ancoragem
Fatores Grupo de Amostra Aplicao/Total % P.R.
(A) Ancoragem 100/196 33.8 .55
(C) Controle 30/92 24.6 .36
Total 130/418 31.1
36
(2010), Cruz (2008), Cruz e Sousa (2012), Pereira (2013) Fagundes (2015) ocorre em
desfavor da manuteno que bem expressiva no subfalar amaznico.
Esse mesmo grupo foi selecionado pelo programa goldvarb X, como influente na
flutuao . Tal qual ocorreu na triagem dos fatores influentes no alamento de
a varivel grupo de amostra foi a nica das variveis sociais selecionadas como
relevantes para explicar a aplicao de alteamento de no dialeto dos migrantes
maranhenses residentes em Tucuru e dos paraenses - seus descendentes. Os resultados
do imput de /o/ para esse fator podem ser confirmados na tabela 10.
Fatores Grupo de Amostra Aplicao % P.R
Ancoragem (migrantes) 23/96 24.0 .64
Controle (descendentes) 4/5 8.0 .30
Total Tabela 10 Grupo de amostra na aplicao de alteamento de na fala dos migrantes maranhense
Fonte: Elaborado pela autora
Pelos nmeros considerados na tabela 10 convm afirmar que o resultado para
segue cannico ao encontrado para quanto ao grupo de amostra. Ou seja,
visvel o processo de alteamento na fala dos migrantes maranhense com o peso relativo
de .64 da mesma forma que evidente o desfavorecimento da regra na fala de seus
descendentes com peso de .34, conforme tambm percebe-se no grfico 9:
Grfico 9: Grupo de amostra na aplicao de alteamento de
Fonte: Elaborado pela autora
A imagem dos dados visualizveis no grfico 9 mostra um distinto
favorecimento do Grupo de Amostra na figura dos migrantes maranhenses residentes
em Tucuru para o processo de alteamento inversamente proporcional ao
0
20
40
60
80
AncoragemControle
.64
.30
Grupo de Amostra
Ancoragem
Controle
37
desfavorecimento da mesma varivel na fala dos descendentes desses migrantes. Sobre
a questo como j citamos, Nina (1991), Cassique et. al. (2009) Sousa (2010), Cruz
(2008), Cruz e Sousa (2012), Pereira (2013) Fagundes (2015) dizem que a falta de
produtividade na fala dos migrantes em funo da produtiva manuteno localizado na
fala dos paraenses.
4.3 DISCUSSES DOS RESULTADOS
Enfim, considerando 564 ocorrncias triadas pelo programa Goldvarb X da fala da
quantidade 10 informantes que corresponde a um recorte do corpus de 36 pessoas que
constituem o grupo de Ancoragen migrantes maranhenses e grupo de controle
descendentes dos migrantes desta pesquisa, encontramos que o alteamento das vogais
mdias pretnicas favorecido pelos migrantes maranhenses.
Esse resultado aliado ao predomnio da manuteno a evidncia de perda da marca
idenitria lingustica dos migrantes em decorrncia do confronto com falantes das referidas
variveis lingusticas. O fato pode encontrar explicao no conceito de rede de BORTONI-
RICARDO (2011, p. 113) segundo quem os migrantes quando fazem parte da rede uniplex
ou esparsa como o caso dos informantes de Tucuru, tendem a absorver a variao da
classe dominante em detrimento da sua de origem.
Por isso, considerar o construto de grupo de referncia conforme a pesquisadora faz
todo sentido em pesquisa no qual se atestam o contato interdialetal como foi a realizada em
Tucuru. Ento se atesta a perda da marca dialetal dos migrantes em favor do alteamento,
mas sobretudo em funo da manuteno que recorrente no Par conforme atestaram
Rodrigues (2005) no municpio de Camet; qual Dias et. al (2007) em Breves; Marques
(2008), Campelo (2008), Coelho (2008) em Breu Branco; Campos (2008) em
Mocajuba; Cruz et. al. (2008) em Belm, Cassique et. al (2009) em Breves, Souza
(2010) e Cruz (2012)em Belm.
Fagundes (2015) que estudou o abaixamento em Belm do Par verificou que a
preferncia pela manuteno pelo grupo de controle decorre em geral pelo preconceito
contra o dialeto dos pais ou avs ou por questo de funcionalidade. No registramos o
fenmeno da hipercorreo em nossa pesquisa, portanto por hora apenas afirmamos que
na fala dos descendentes dos maranhenses o processo de alamento improdutivo em
favor do fenmeno da manuteno.
5. CONSIDERAES FINAIS
38
Na pesquisa em tela, procurou-se descrever o fenmeno de alteamento das
vogais mdias pr-tnicas na fala dos maranhenses residentes em Tucuru luz dos
parmetros sociolingusticos da teoria quantitativa Laboviana (1972) alm de considerar
ainda como aporte terico os conceitos de Bortoni-Ricardo (1985) sobre o conceito de
redes e de grupo de referncia. A escolha do municpio inquirido se resume ao fato de
fazer parte da zona 3 mapeado por Cassique (2009) onde o fluxo migratrio foi intenso
nas dcadas de 70 a 90. J a escolha do grupo alvo, no caso os maranhense encontra
respaldo na quantidade majoritariamente registrada pelo IBGE (2010) de todos os
migrantes que foram para Tucuru.
A escolha do fenmeno foi por pressupormos que os migrantes devido o tempo
de residncia e o contato com falantes de outras variedades dialetais teriam perdido sua
marca identitria lingustica no caso o abaixamento de [E] e [O], em favor do
alteamento, j que foi a segunda variante encontrada como a mais produtiva
considerando o resultado de /e/. Assim tambm apostamos que os descendentes no
apresentariam em sua variedade lingustica como significativa a mesma marca dos pais
e avs, tal qual constatado.
Sendo assim os dados encontrados em Tucuru na fala de 10 informantes, de um
total 36 informantes, apontaram que o percentual 40,% de ocorrncia de [e] das 418 e
64,6% de [o] das 146 representam a supremacia das variantes de manuteno sobre as
demais variveis, mas sobretudo sobre o alteamento de /o/ tal qual vem ocorrendo como
regra na maioria dos dialetos paraenses estudados. O resultado responde a questo
norteadora desta pesquisa sobre qual seria a variante de maior prestgio no dialeto de
Tucuru resultante do contato interdialetal entre migrantes maranhenses e falantes nativos
do municpio.
As 564 ocorrncias estudadas luz dos procedimentos metodolgicos do Vozes da
Amaznia demonstraram que a presena da regra [i]
39
Os outros 4 dizem respeito a variao de /o/ dos quais 3 so lingusticos: Vogal
contgua, segmento seguinte, tipo de rima e 1 social: grupo de amostra.
Considerando os resultados fornecidos pelo programa quantitativo goldvarb X
chegamos s seguintes concluses:
De acordo com os dados probabilsticos est confirmada a hiptese de perda da
marca dialetal dos migrantes maranhense o abaixamento das mdias como tambm se
confirma o no uso da marca dialetal dos migrantes pelos descendentes. Alm disso,
est refutada a hiptese de alteamento na fala dos migrantes j que a varivel
predominante no dialeto a manuteno no vernculo tucuruiense. Atribumos tal
variao ao tempo de residncia dos migrantes maranhenses na localidade, h mais de
vinte e dois anos, e a rede de relaes porque tanto os migrantes quanto os descendentes
fazem parte da rede uniplex que segundo Bortoni-Ricardo (2011, p. 113): ...pessoas
com redes esparsas e uniplex esto relativamente mais expostas influncia das normas
de prestgio e, consequentemente, mais propensas a mudar seus hbitos de fala na
direo do cdigo padro.
Considerando as duas variveis verificamos que:
A varivel social de grupo de amostra foi triada para e , entretanto, o
alteamento presente na fala do grupo de ancoragem e no do grupo de controle que por
sinal faz uso da manuteno.
O grupo segmentos seguintes atuam tanto em /e/ como em /o/ da seguinte forma:
a) Ambas as mdias so influenciadas em ordem de importncia pelas vogais e
depois glotais.
b) As dorsais influenciam a variao apenas de /e/, portanto elas desfavorecem a
regra em /o/.
c) As labiais desfavorecem a aplicao da regra tanto em /e/ como em /e
Por fim, a anlise das demais variveis aqui no contempladas encontra-se na verso
qualificao dessa dissertao.
6. REFERNCIA BIBLIOGRFICA
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42
O DUPLO VOCABULRIO: UM ESTUDO SOBRE VARIAO LEXICAL
NA LNGUA APURIN (ARUK)
Autora: Bruna Lima-Padovani
Orientador: Sidney da Silva Facundes
RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo apresentar o andamento da pesquisa
que vem sendo realizada em mbito de mestrado, na qual me proponho a fazer um
levantamento sociolingustico do lxico da lngua Apurin (Aruk) buscando descrever
e analisar os processos envolvidos na formao das variantes e seu papel na formao
das variedades dessa lngua. Apurin uma etnia indgena e uma lngua minoritria,
falada em comunidades que se localizam s margens de vrios afluentes do rio Purus,
no Sudoeste do Estado do Amazonas. Os dados utilizados neste trabalho foram
coletados in loco entre os anos de 2013 e 2015, junto a vrias comunidades Apurin, e
complementam dados de pesquisas anteriores (FACUNDES 2000, BARRETO 2007 e
BRANDO 2006). O estudo se articula no quadro terico-metodolgico da
sociolingustica variacionista (LABOV, 2008 [1972]), da lingustica de corpus (BIBER,
CONRAD e REPPEN, 1988) e da lingustica histrica (CAMPBELL, 1999), alm de
conceitos da semntica lexical (CRUSE, 2000), e especialmente aqueles advindos da
Semntica Cognitiva (LAKOFF e JOHNSON, 1980). Os casos de variao lexical
tratados aqui envolvem principalmente a nomenclatura de fauna e flora que constituem
o fenmeno do duplo vocabulrio (uso extensivo de duas ou mais formas para
designar um mesmo referente em um domnio especfico do lxico) presente na lngua.
Palavras-Chave: Variao; Duplo Vocabulrio; Apurin
ABSTRASCT
This study aims to present the progress of the research being carried out in the context
of a Masters of Arts degree, in which I propose to make a sociolinguistic survey of the
vocabulary of the Apurin language (Arawak), trying to describe and analyze the
processes involved in the formation of the variants and their role in the formation of
varieties of that language. Apurin is an indigenous ethnic and a minority group, whose
language is spoken in communities that are located on the shores of several tributaries
of the Purus River in the Southwest part of the state of Amazonas. The data used in this
study were collected in situ between the years 2013 and 2015, with a number Apurin
communities, and complement previous research data (FACUNDES 2000, BARRETO
2007 and BRANDO 2006). The study follows the theoretical and methodological
framework of variationist sociolinguistics (Labov, 2008 [1972]), corpus linguistics
(BIBER, CONRAD and REPPEN, 1988) and historical linguistics (CAMPBELL,
1999), as well as important concepts of the fields pf lexical semantics (CRUSE, 2000),
especially those with a special role within Cognitive Semantics (LAKOFF and
JOHNSON, 1980). Cases of lexical variation treated here mainly involve the naming of
the flora and fauna terms that make up the "dual vocabulary" phenomenon (extensive
use of two or more ways to designate a same referent in a specific area of the lexicon) in
this language.
Key-Words: Variation; Double Vocabulary; Apurin
43
INTRODUO
O presente trabalho compreende um recorte da dissertao de mestrado (em
andamento) intitulado Levantamento sociolingustico do lxico Apurin e sua
contribuio para o conhecimento da cultura e histria Apurin (Aruk) , vinculado ao
projeto: Passado e presente de povos Aruk: O poder dos Apurin e Manchineri na
Amaznia Ocidental e Paresi na Amaznia Central.
A pesquisa em questo objetiva fazer um levantamento sociolingustico do
lxico da lngua Apurin (Aruk) buscando descrever e analisar os processos envolvidos
na formao das variantes e seu papel na formao das variedades dessa lngua. De
maneira geral, pretendemos investigar os processos envolvidos na variao associada ao
uso de uma ou mais formas lexicais para designar o mesmo referente - fenmeno
rotulado de "duplo vocabulrio". Objetivando determinar como est se dando tal
fenmeno na lngua, que envolve principalmente a nomenclatura de fauna e flora.
O artigo est organizado em cinco sees, alm da introduo. Na primeira
apresentaremos os subsdios teoricos necessrios ao desenvolvimento deste trabalho; na
segunda, os objetivos e hipteses da pesquisa; na terceira, encontra-se a metodologia
empregada; na quarta, so apresentados alguns resultados preliminares; na quinta,
tecemos uma breve concluso acerca do trabalho exposto.
RECORTE TERICO
Nesta seo apresento de forma breve os trs construtos tericos que balizam
esta pesquisa, so eles: a Sociolingustica Variacionista; a Semntica Lexical; e a
Semntica Cognitiva.
Considerando que a atividade humana da linguagem se caracteriza pela
constante variao e pela mudana lingustica, podemos considerar que vrios so os
fatores que influenciam no uso de variantes distintas dentro de uma comunidade de fala.
Em geral, sempre h algum elemento, se no lingustico, sociocultural que determina a
escolha que os falantes fazem de uma forma ou estrutura. A conjugao entre esses dois
aspectos tem sido foco de interesse da Sociolingustica Variacionista, que tem como um
dos seus princpios o pressuposto de que a variao lingustica constitui fenmeno
universal e presume a existncia de padres de uso das formas lingusticas alternativas
denominadas variantes.
A abordagem variacionista firmou-se nos Estados Unidos em meados do sculo
XX com a liderana de William Labov (1966, 1972b). A perspectiva variacionista
44
procura, basicamente, verificar de que modo fatores de natureza lingustica e
extralingustica esto correlacionados ao uso de variantes nos diferentes nveis da
gramtica de uma lngua, assim como compreender de que modo a variao regulada.
A abordagem variacionista baseia-se em pressupostos tericos que permitem observar
as regularidades e a sistematicidade por trs do aparente caos da comunicao.
Segundo Meyerhoff (2006) o interesse principal da Sociolingustica
Variacionista desvendar como a heterogeneidade, ou seja, a variao lingustica, se
organiza, se localiza, alm de descrever, regional e socialmente, as variedades de uma
lngua. Alm disso, ela procura demonstrar como uma variante se implementa ou
desaparece da lngua.
Segundo Mollica (2013), podemos descrever as variedades lingusticas a partir
de dois parmetros bsicos: a variao geogrfica e a variao social. A primeira est
relacionada s diferenas lingusticas distribudas no espao fsico. A segunda, por sua
vez, est ligada a um conjunto de fatores de natureza extralingustica relacionados
identidade dos falantes e organizao sociocultural da comunidade de fala, por
exemplo, classe social, idade, sexo, situao ou contexto social e etc. Assim,
tradicionalmente, concebe-se uma ecologia lingustica do ponto de vista horizontal, com
a formao de comunidades geogrficas com base em marcadores regionais; e, do
ponto de vista vertical, com geraes de padres por meio de indicadores sociais.
Alkmim (2007) comenta que podemos observar a coexistncia de um conjunto
de variedades lingusticas; entretanto, essa coexistncia no se d no vazio, mas no
contexto das relaes sociais organizadas e fortemente marcadas por motivaes
emanadas da prpria estrutura sociocultural de cada comunidade.
Fasold (1996) julga tambm importante observarmos que as variantes no esto
associadas exclusivamente a um grupo ou outro. Um determinado grupo pode usar uma
variante com relativa frequncia, podendo reconhecer uma outra forma. O contato entre
falantes de comunidades distintas favorece a entrada de uma nova forma lingustica
dentro de uma comunidade de fala. Trudgill (1980, apud FASOLD, 1996) exemplifica
isso citando jovens que deixam a comunidade onde nasceram para viverem, por um ou
dois anos, em uma cidade diferente e, depois de algum tempo, voltam para o lugar de
origem. Segundo esse autor, a introduo de uma inovao lingustica em um ponto
central por falantes jovens que se movem geograficamente uma das questes na
anlise da variao.
45
Em Apurin comum membros de uma comunidade migrarem para outras
comunidades. Nesses casos, eles levam as variantes de uma comunidade para outra,
fazendo com que diversas variantes que, supostamente, tiveram origem em uma
comunidade especfica, possam co-ocorrer em vrias outras comunidades.
Consideramos importante descobrir a origem de cada uma dessas variantes, procurando
verificar, nos dados, informaes que possam indicar nas comunidades as variantes das
quais o falante tem domnio ativo, ou seja, aquelas que ele utiliza no dia-a-dia e aquelas
que so apenas conhecidas, mas no usadas, ou seja, pertencentes ao domnio passivo.
Ao examinarmos detalhes da variao dialetal devemos dar ateno especial s
unidades lexicais, pois, so nas informaes lexicais, mais do que em qualquer outro
domnio da gramtica de uma lngua que est parte do conhecimento da realidade e da
categorizao das experincias dos indivduos. Diante disso, buscamos tambm na
Semntica Lexical base para explicarmos os fenmenos que envolvem a formao do
lxico e a diversidade dialetal da lngua Apurin.
A Semntica Lexical consiste em um estudo do significado sistemtico, das
conexes entre lexemas, e da estrutura relacionada ao significado interno de lexemas
individuais. Segundo Fromkim e Rodman (1993), unidades bsicas de significao
constituem o vocabulrio, ou o lxico de uma lngua. A criao do lxico envolve
processos de cognio da realidade e categorizao das experincias que circundam o
falante. Desse modo, a informao lexical parte do conhecimento da realidade que
ocasiona a criao de novas palavras a todo momento, que por sua vez gera a
diversidade nas lnguas naturais.
O lxico afigura-se como uma fonte onde vamos buscar meios para nomeao
dos inventos surgidos em consequncia do avano tecnolgico, do progresso material e
sociocultural. Biderman (2001) define o lxico como uma parte da lngua que configura
a realidade extralingustica e conserva o saber lingustico da humanidade. Isto , o
lxico a janela atravs da qual um povo v o mundo. Ou seja, o lxico envolve o saber
interiorizado, por parte dos falantes de uma comunidade lingustica, acerca das
propriedades lexicais das palavras e o seu poder de representao da cultura.
O lxico possibilita recriar formas que vo denominar objetos, animais, plantas e
as coisas que compem o quadro cultural de um povo. Estamos, frequentemente,
criando novas palavras, ampliando ou restringindo os referentes de uma dada palavra
para expressar novas ideias. As palavras so definidas umas em relao s outras. Por
isso, na prpria estruturao do sistema lexical, elas estabelecem diversos tipos de
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relaes entre si. Estas relaes lexicais, em geral, so conduzidas pelas figuras de
linguagem, tais como: sinonmia, hiponmia/hiperonmia, polissemia, metfora,
metonmia entre outras. As duas ltimas so instrumentos essenciais para
compreendermos os fenmenos que subjazem a variao lexical da lngua Apurin.
Em funo disso, como proposta de anlise, inscreve-se tambm a Semntica
Cognitiva. Um dos traos que diferencia a Semntica Cognitiva diz respeito a
importncia atribuda aos processos de metfora e metonmia. Este campo de pesquisa
recebeu um enorme impulso com o surgimento da teoria de mapeamentos conceituais
(LAKOFF E JOHNSON 1980, LAKOFF 1987, LAKOFF E TURNER 1989).
A tese bsica de Lakoff e Johnson (1980) sobre metfora que a sua funo nos
permite interpretar conceitos abstratos em termos de conceitos familiares e de
experincias cognitivas cotidianas; ou seja, a metfora est presente em toda parte e
essencial na linguagem e no pensamento. Nesse sentido, a compreenso de mundo passa
a ser vinculada concepo da metfora, uma vez que grande parte dos conceitos
bsicos, como tempo, quantidade, estado e ao, alm dos conceitos emocionais, como
raiva e amor, so compreendidos metaforicamente. Isso evidencia o importante papel da
metfora na compreenso do mundo e da cultura.
Segundo Lakoff e Johnson (1980), a metfora , essencialmente, um mecanismo
que envolve a conceptualizao de um domnio de experincia em termos de outro. O
entendimento da metfora se daria por meio de buscas de similaridades entre termos
comparados. Para cada metfora, possvel identificar um domnio-fonte (aquele a
partir do qual conceitualizamos alguma coisa metaforicamente) e um domnio-alvo
(aquele que desejamos conceitualizar). Para os autores, o domnio-fonte implica
propriedades fsicas e reas relativamente concretas da experincia; por sua vez, o
domnio-alvo tende a ser mais abstrato ou mais especifico, dependendo da situao.
Segundo Lakoff e Johnson (1980), as relaes feitas entre os domnios (fonte e
alvo) so conduzidas por um mapeamento metafrico em que o domnio-fonte
estruturado por um modelo proposicional ou uma imagem esquemtica. O mapeamento
tipicamente parcial; mapeia a estrutura do domnio-fonte para uma estrutura
correspondente no domnio-alvo. Os domnios fonte e alvo so representados
estruturalmente por esquemas de contentores, e o mapeamento representado por um
esquema de fonte-caminho-meta
Por sua vez a metonmia definida como deslocamento de significado, no qual