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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE LETRAS E ARTES INSTITUTO VILLA-LOBOS LICENCIATURA EM MÚSICA UMA REFLEXÃO SOBRE AS METODOLOGIAS DA PERCEPÇÃO MUSICAL E SUAS PRÁTICAS NA UNIRIO MARIANA FOLLADOR GUEDES RIO DE JANEIRO, 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO  CENTRO DE LETRAS E ARTES  

INSTITUTO VILLA-LOBOS  LICENCIATURA EM MÚSICA  

                           

UMA REFLEXÃO SOBRE AS METODOLOGIAS  DA PERCEPÇÃO MUSICAL  

E SUAS PRÁTICAS NA UNIRIO                

MARIANA FOLLADOR GUEDES                                      

 RIO DE JANEIRO, 2014  

 

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UMA REFLEXÃO SOBRE AS METODOLOGIAS  DA PERCEPÇÃO MUSICAL  

E SUAS PRÁTICAS NA UNIRIO                    

   

por                

MARIANA FOLLADOR GUEDES                  

                                   

Rio de Janeiro, 2014  

Monografia apresentada para a conclusão do curso de Licenciatura em Música do Instituto Villa-Lobos, Centro de Letras e Artes da UNIRIO, sob orientação da professora Ms. Cândida Luiza Borges da Silva.

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GUEDES, Mariana Follador. Uma reflexão sobre as metodologias da Percepção Musical e suas práticas na UNIRIO. 2014. Monografia (Licenciatura em Música) - Graduação em Música, Centro de Letras e Artes, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.  

                       

RESUMO  Esta monografia vem trazer um estudo das metodologias aplicadas nas aulas de Percepção Musical dos cursos preparatórios para o vestibular, e nas universidades, especialmente a Universidade Federal do Rio de Janeiro - UNIRIO. Ao analisar as propostas pedagógicas que foram aplicadas nas aulas que tive como aluna de duas universidades de música brasileiras e um programa de mobilidade acadêmica na Suécia, pude perceber a diferença entre as metodologias utilizadas pelos professores. Motivei-me a entender e pesquisar melhor sobre o assunto, comparando métodos brasileiros e estrangeiros aplicados pelos meus professores. Trago, também, nesse trabalho uma reflexão sobre as aulas de Percepção Musical, segundo minhas experiências e as de outros alunos. Essa reflexão foi feita através de entrevistas estruturadas, com 13 alunos e ex-alunos da UNIRIO que já concluíram os quatro períodos obrigatórios de Percepção Musical, e através de análise do referencial teórico. O objetivo é mostrar os problemas recorrentes nas aulas, como se dá a educação de base da percepção musical, quantos utilizam tecnologias como forma metodológica e as vantagens de se ter diferentes metodologias implantadas em uma mesma universidade.                                Palavras chave: Percepção musical. Pedagogia musical. Métodos de percepção musical. Metodologia musical.  

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SUMÁRIO  

 INTRODUÇÃO   5      CAPÍTULO I: A PERCEPÇÃO MUSICAL NAS UNIVERSIDADES   8      

1.1. O desenvolvimento da percepção musical 9  1.2. A Percepção Musical nas Universidades 9  1.3. O estudo da percepção musical antes da Universidade 12  1.4. O instrumento utilizado 13  1.5. Metodologias 14  

   CAPÍTULO II: MÉTODOS BRASILEIROS E ESTRANGEIROS   16       2.1. O uso da tecnologia nas aulas de Percepção Musical   24      CAPÍTULO III: AS PEDAGOGIAS DA PERCEPÇÃO MUSICAL UTILIZADAS NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO  

27  

    3.1. Como os alunos se preparam para o vestibular?   29   3.2. Quais as metodologias utilizadas durante os estudos de percepção musical dos alunos?  

30  

3.2.1. O estudo do solfejo durante as aulas do IVL/UNIRIO   30  

3.2.2. O estudo do ritmo durante as aulas do IVL/UNIRIO   31  

3.2.3. O estudo do ditado durante as aulas do IVL/UNIRIO 31     3.3. A utilização da tecnologia no estudo da percepção musical   32  

3.4. Qual a avaliação dos alunos quanto às práticas utilizadas pelos professores de Percepção Musical no IVL/UNIRIO  

33  

3.5. Como o aluno vê a forma de avaliação da Percepção Musical no IVL/ UNIRIO?  

34  

3.6. Quais metodologias os novos professores de Percepção Musical estão utilizando?  

36  

   CONSIDERAÇÕES FINAIS   37      REFERÊNCIAS   41            

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INTRODUÇÃO  

 

Comecei meus estudos de música muito cedo, com aulas particulares de piano

ainda em Curitiba, porém, o estudo da percepção da forma tradicional só veio quando

decidi fazer faculdade de música. Desde então, a percepção musical sempre me chamou

atenção. Passei por diversos professores, os quais aplicaram diferentes métodos como

Pozzoli, Gramani e O Passo (na parte de percepção rítmica), Bohumil Med e dó móvel

(relacionados ao solfejo, e o segundo aplicado de diferentes formas), e alguns possuíam

os seus próprios, como é o caso do Método Prático de Solfejo, desenvolvido por João

Soares Souza e adotado pelo Conservatório de Música Villa Lobos de Curitiba.  

A maioria dos métodos que já estudei me fizeram pensar em como aquele estudo

estaria me ajudando musicalmente. Eu via alguns exercícios propostos como não

musicais, ou fora da minha realidade musical. Eram melodias eruditas e na maioria das

vezes desconhecidas. Os professores executavam os ditados ao piano, iniciando pelo lá

seguido do acorde que mostraria a tonalidade. Depois, tocavam a melodia inteira, para

que entendêssemos a música com um todo, mas, em seguida, fragmentavam a melodia e

repetiam diversas vezes cada pedaço, para que memorizássemos e então escrevêssemos

na pauta. O solfejo também era com melodias aleatórias, retiradas dos métodos e folhas

de exercícios. O ritmo, apesar de também estar composto no ditado e solfejo, era

estudado separadamente, seguindo os métodos, mas nunca fizeram um real link entre as

três vertentes. Lembro-me ainda que era proibido solfejar o ditado, para não atrapalhar

os colegas ao lado. Oras, para que estudar solfejo, então?  

Iniciei o curso superior de Licenciatura em Música, na Faculdade de Artes do

Paraná (FAP) e as aulas de Percepção Musical era exatamente iguais as que tive

anteriormente. O que mudavam eram os métodos e professores. Resolvi me mudar para

o Rio de Janeiro e ingressei no curso de Licenciatura em Música da UNIRIO em 2008.

Quando entrei na faculdade uma professora me mostrou outro caminho para

desenvolver minha percepção musical, o qual fugia dos métodos tradicionais (apesar de

alguns citados serem contemporâneos), mas que estavam diretamente ligados ao meu

repertório. Os alunos faziam pesquisas de repertório e os ditados e solfejos eram

praticados em cima dessas músicas, o que fez ampliar além da minha visão sobre

percepção, o meu repertório.  

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Participei do programa de mobilidade acadêmica entre a UNIRIO e Örebro

Universitet na Suécia, e lá tive a oportunidade de continuar meus estudos de percepção

com um método bastante interessante para mim. O professor trabalhava em cima do

repertório de jazz. Tínhamos uma semana para desenvolver um estudo em cima daquela

música. O passo a passo era: a) cantar e tocar a melodia; b) cantar a linha do baixo; c)

cantar a melodia, e a cada acorde solfeja-lo em posição cerrada a partir da nota da

melodia, podendo ter a ajuda de um instrumento harmônico (não necessariamente o

piano). Para mim foi muito interessante estudar dessa forma, pois trabalhava todos os

elementos (harmonia, melodia e ritmo) através de um repertório popular. Além disso,

trabalhamos também polirritmia por um método apresentado pelo professor.

Primeiramente aprendíamos o que era proposto através do solfejo, e depois o exercício

deveria ser executado pelos instrumentos de cada aluno (guitarra, violão, piano,

percussão e até mesmo a voz), reproduzindo o exercício e depois os aplicando em uma

improvisação.  

Esse último modelo citado foi, para mim, o que mais se aproximou da percepção

musical aplicada na minha vivência como musico. Os caminhos mostrados pela minha

professora de Percepção Musical na UNIRIO também foram muito interessantes, e

entendi que não precisava ser algo torturante, além de ver tudo aplicado ao meu dia a

dia.  

Foi pensando nas minhas experiências que resolvi verificar quais as diferenças

entre os métodos utilizados pelos professores de percepção musical da Universidade

Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), e entender o que pensam meus colegas

dos cursos de Licenciatura e Bacharelado sobre esses métodos, para avaliar minha

posição sobre o assunto.  

No primeiro capítulo, A Percepção Musical nas Universidades, trago a visão de

outros pesquisadores sobre as aulas de Percepção Musical aplicadas em diferentes

universidades do Brasil. Algumas também falam especificamente da UNIRIO, o que

permite fazer uma comparação da universidade analisada com outras instituições. As

pesquisas trazem problemas apontados pelos pesquisadores e professores e alunos

entrevistados. O referencial teórico traz nomes como Otutumi (2008), Grossi (2001),

Alcantara Neto (2010; 2011; 2012), Goldemberg; Otutumi (2010), retirados de sites,

revistas e Anais de grande avaliação dentro das pesquisas em música e educação

musical como ABEM, AMPPOM, SIMPOM, Além de monografias desenvolvidas na

UNIRIO como Almeida (2006) e Cappelletti (2011).  

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O segundo capítulo, Métodos Brasileiros e Estrangeiros, tem como referencial

maior o livro de Ermelinda Paz (2013), Pedagogia Musical Brasileira no Século XX:

Metodologias e Tendências, onde a autora relata diferentes métodos musicais

brasileiros, sendo alguns de percepção e outros não. Além dela, analisamos alguns

métodos que não continham em seu livro, com a intenção de complementar a pesquisa.

Nesse capítulo exponho os métodos, explicando como cada um funciona e como devem

ser aplicados em sala, mostrando que um dos problemas apontados pelos professores no

capítulo anterior (falta de métodos) não condiz com a realidade. Ainda falo sobre a

utilização da tecnologia no ensino e estudos da percepção musical, citando sites,

aplicativos e softwares que podem ser utilizados nessa prática.  

O terceiro e último capítulo, A Pedagogias da Percepção Musical Utilizadas na

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, traz uma entrevista realizada com

13 alunos da UNIRIO, os quais já terminaram a carga horária obrigatória para a

disciplina de Percepção Musical. Essa entrevista foi realizada através de um

questionário estruturado, onde os alunos puderam explicar e expressar suas opiniões

sobre como iniciaram seus estudos de percepção musical, como avaliam os métodos

aplicados nas aulas de UNIRIO e quais métodos utilizam quando dão aulas de

Percepção Musical.  

Portanto, o objetivo dessa pesquisa é entender como funcionam as aulas de

Percepção Musical dentro da universidade, quais as dificuldades apontadas por

pesquisas, analisar métodos de percepção musical e entender como eles podem ser

aplicados nas aulas, mas, principalmente, avaliar o que cada aluno entrevistado pensa

sobre as aulas de Percepção que teve durante a vida acadêmica, como se deram seus

estudos, os prós e contras encontrados por eles nos métodos utilizados e quais métodos

utilizarão quando se tornarem professores da disciplina.  

Foi escolhida a UNIRIO como campo para o trabalho, por se tratar da instituição

onde estudo atualmente, condizendo com a realidade que me insiro, podendo ter contato

mais direto com os professores e alunos da instituição e suas realidades dentro da

disciplina.  

 

 

 

 

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CAPÍTULO I  

A PERCEPÇÃO MUSICAL NAS UNIVERSIDADES  

 

Para o desenvolvimento teórico desse trabalho, procurei entender como era o

quadro de pesquisas realizadas dentro do tema sobre pedagogias e desenvolvimento de

aulas de Percepção Musical na UNIRIO, analisando as monografias desenvolvidas nos

últimos anos. Almeida (2006) e Cappelletti (2011) trazem argumentos e pontos

interessantes sobre o tema, sendo que a diferença entre os trabalhos está no foco de cada

um. O primeiro trata mais especificamente dos ditados nas aulas de Percepção Musical,

e traz algumas propostas de soluções para os questionamentos da autora. O segundo

aborda a percepção musical de maneira geral, questiona a forma como as aulas são

ministradas, e a heterogeneidade dos alunos que frequentam as aulas de Percepção

Musical. Seu foco foi a UNIRIO, e alguns argumentos foram expostos através de

entrevistas com professores e ex-professores da matéria no ano da pesquisa.  

Através do referencial dos dois trabalhos citados, pude começar a pesquisa em

outros campos, e percebi que Otutumi (2008) aparece em outros artigos e projetos mais

recentes de uma maneira significativa. Sua pesquisa é mais ampla, e procurou investigar

a situação da disciplina de Percepção Musical nos cursos superiores do Brasil, através

de entrevistas realizadas com professores de diferentes universidades brasileiras.  

Busquei também nos sites das revistas mais importantes dentro das pesquisas em

educação musical. Um artigo apresentado por Alcantara Neto (2010) no SIMPOM

(Simpósio Brasileiro de Pós Graduandos em Música) é o início de sua pesquisa, a qual

aparece também nos Anais da ABEM (2011) e da ANPPOM (2012). Alcantara Neto

(2010) faz uma pesquisa dentro do curso de Bacharelado em Música Popular da Escola

de Música da UFMG, procurando entender o perfil dos alunos ingressantes, e como se

deu a formação prévia dos mesmos na percepção musical. Nos Anais da ABEM e da

ANPPON, Alcantara Neto (2011, 2012) já traz algumas das conclusões de sua pesquisa

iniciada em 2010.  

Uma das primeiras pesquisadoras a tratar das dificuldades e problemas

envolvendo as aulas de Percepção Musical é Grossi (2001), em um artigo publicado na

Revista da ABEM. Nesse artigo, a autora trata sobre a maneira não musical em que as

avaliações de percepção musical acontecem tanto nas aulas, quanto nos Testes de

Habilidade Específica realizados nos vestibulares brasileiros.  

 

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1.1. O desenvolvimento da percepção musical

O desenvolvimento da percepção musical é, de fato, uma das principais

prioridades no ensino musical e, sendo assim, possui um espaço de fundamental

importância dentro dos currículos dos cursos de graduação. Sobre isso, Otutumi (2008)

relata:  

 Verificamos que o desenvolvimento do sentido auditivo ou da Percepção Musical é considerado pela grande maioria dos educadores como de fundamental importância, pois se bem encaminhada e aperfeiçoada, oferece significativo suporte para a carreira do músico em suas diversas modalidades, além de anteceder sua formação profissional, participando ativamente no processo de educação musical de base (OTUTUMI, 2008, p.5).  

 

Essa visão também é aprofundada em outros autores, como mostra o trecho a

seguir, no qual a autora descreve sobre algumas áreas que a percepção musical ajuda a

desenvolver:  

 

As sensações e as percepções são fatores fundamentais para a construção de reflexos da realidade e estão, por isso, presentes em todos os processos de aprendizagem. As primeiras representam as formas iniciais e elementares desses processos, limitando-se às captações sensoriais de estímulos. As percepções, por sua vez, permitem o desenvolvimento da aprendizagem que se dá em conjunto com fatores psicológicos como memória, linguagem e pensamento e, assim, compõem os estágios de reconhecimento, armazenagem, codificação e comparação de estímulos. A percepção musical, portanto, se inicia a partir da dimensão sensorial e é desenvolvida com a contribuição de fatores como atenção, processos de codificação, de agrupamentos e de compreensão musical (CAPPELETTI, 2011, p.1).  

 

A autora ainda comenta a construção da linguagem falada, a qual é aprendida

“através da assimilação do sistema fonético (língua)” (CAPPELETTI, 2011, p.1). Esse

processo também ocorre com o ouvido musical, quando o sistema musical passa a ser

incorporado através de suas experiências e educação musical (CAPPELETTI, 2011).  

 

1.2. A Percepção Musical nas Universidades

A cadeira de Percepção musical está presente nos currículos dos cursos de

música, “provavelmente desde os primeiros cursos reconhecidos, como da Faculdade de

Música Santa Marcelina – FASM de São Paulo/SP, em 1938, segundo fonte do

Ministério da Educação – MEC” (OTUTUMI, 2008, p.8). Geralmente é dividida em

três frentes – ritmo, melodia e harmonia – e seus conteúdos são aplicados através de

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solfejos (rítmicos e melódicos), ditados (rítmicos, melódicos e harmônicos) e

reconhecimento de intervalos. Quando destacamos os pontos dessa forma, nada de

novidade é apontado em relação às aulas de Percepção que vemos hoje (OTUTUMI,

2008). Sobre esses pontos da aula e as dificuldades encontradas nesse curso, Almeida

(2006) vai ao encontro de meus argumentos quando diz:

[...] repensando minha vida de estudante de música, percebi que minhas dificuldades nesta disciplina sempre foram as mesmas até porque a aula sempre foi a mesma: ditados melódicos, rítmicos, percepção de intervalos e acordes com algumas pequenas variações (ALMEIDA, 2006, p.1).

Grossi (2001) ainda comenta sobre a maneira como essa fragmentação aparece

nos testes de percepção musical:  

 

Verifica-se que muitos dos testes de percepção musical aplicados no contexto educacional partem da premissa de que a 'base' para a compreensão musical encontra-se na competência dos estudantes em examinar a música (ouvir e pensar sobre) de forma compartimentalizada. Essa e uma forma restritiva de lidar com a música (GROSSI, 2001, p. 51).  

 

Levitin (2012), em seu artigo What does it mean to be musical? (O que significa

ser musical? [tradução minha]), explica que:  

 

[...] a música é processada em nosso cérebro componente por componente, através de manipulações de circuitos neurais específicas do tempo, duração, altura e timbre. Centros cerebrais superiores trazem essas informações juntas, ligando em representações de linha, melodia, ritmo, tempo, métrica, e, finalmente, frases e composições completas (LEVITIN, 2012, p.633) [tradução minha]1  

 

Com essa afirmação, podemos ver que, apesar dos processos serem separados,

nosso cérebro reconhece-os de forma integrada, sendo necessário, então, desenvolver as

partes também de forma conjunta. Foi pensando assim que Grossi (2001) propôs uma

mudança na forma de avaliação do THE (Teste de Habilidade Específica) na Faculdade

Estadual de Londrina (UEL), no qual era professora e fez parte da banca examinadora

                                                                                                                         1 “[...] Music is processed component by component, with specific neural circuits handling pitch, duration, loudness and timbre. Higher brain centers bring this information together, binding in into representations of contour, melody, rhythm, tempo, meter, and, ultimately, phrases and whole compositions.” (LEVITIN, 2012, p.633)

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no ano da conclusão de sua pesquisa. Grossi (2001) verificou que os testes que

aplicados para avaliação da percepção musical, tratavam a competência dos estudantes

em analisar a música de forma fragmentada (GROSSI, 2001, p. 51). Quando teve a

oportunidade de participar da elaboração da prova de THE na UEL, propôs aos

professores que também participavam dessa etapa, que aplicassem o que havia sido

desenvolvido em sua pesquisa. Então, o THE foi reelaborado em 1998, com perguntas e

formato da avaliação muito mais musicais, agrupando todo o conhecimento estudado

em uma aula de Percepção Musical. O teste teve grande aceitação e aprovação dos

alunos e professores participantes da banca (GROSSI, 2001). Se pararmos para pensar,

as aulas de Percepção Musical deveriam ser totalmente reavaliadas para preparar o

aluno para esse tipo de avaliação, pois deixaria de ser um treinamento auditivo, para ser

uma prática e uma análise da escuta musical. Essa prática do treinamento auditivo é

comentado em uma das entrevistas realizadas com professores de Percepção Musical da

Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) na pesquisa de Cappelletti

(2011), quando uma ex-professora da cadeira “explica que o curso de Percepção

Musical oferecido nas graduações da UNIRIO se detém na parte de um adestramento de

acorde, intervalo, solfejo etc., focalizando o que ela chamou de um adestramento de

ouvido” (CAPPELLETTI, 2010, p.15).  

Outro ponto comum analisado em todos os referenciais que tratam sobre as aulas

de Percepção utilizados nessa pesquisa, é a heterogeneidade dentro das turmas de

Percepção Musical. Essa diferença pode acontecer devido diferentes objetivos e perfis

dos alunos, mas também por uma “parte [dos ingressantes que] não estudaram

Percepção Musical anteriormente, ou melhor, não tiveram experiência com esse modelo

de estudo” (OTUTUMI, 2008, p.10). Isso pode comprometer o trabalho do docente,

que, a cada grupo, deve primeiro entender o nível dos alunos ali presentes para então

conseguir, de fato, traçar uma linha pedagógica, visando sempre o equilíbrio da turma.

Porém, dois dos quatro professores entrevistados por Cappelletti (2011) veem a

heterogeneidade como algo normal, pois as pessoas não escutam de forma similar,

contudo, a forma como são preparadas, as avaliações pedem para que se nivele os

alunos. As habilidades de cada um vêm de acordo com sua vivência musical, e até

mesmo o instrumento que toca influencia na hora da escuta, e acreditam que isso deve

ser levado em consideração (CAPPELLETTI, 2011).  

 

 

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1.3. O estudo da percepção musical antes da Universidade

Pouco se fala sobre o estudo da percepção musical antes de ingressar um curso

superior de música. Dentro dessa pesquisa, Alcantara Neto (2011, 2012) tenta entender

como é o aprendizado da percepção para os alunos antes de ingressarem na vida

acadêmica. O intuito de sua pesquisa é “compreender como esses alunos de música

popular construíram suas habilidades e conhecimentos relacionados à percepção

musical anteriormente à faculdade, e quais os significados e valores que atribuem a seus

próprios processos de aprendizagem” (ALCANTARA NETO, 2011, p.1402). Otutumi

(2008) também fala sobre a pré-formação acadêmica, através de uma entrevista com

uma professora de curso de música preparatório, tentando entender quais suas

metodologias, conflitos encontrados dentro de sala de aula, e a relação de suas respostas

e dos professores universitários também entrevistados. Essa professora relata que a

maioria dos seus alunos procura o curso para se preparar para o THE do vestibular de

música. São raros os que procuram como intuito de complementação do estudo. Muitos

deles, ainda, após começarem o curso, entendem que um semestre não é o suficiente

para se ter um nível satisfatório dentro de uma universidade, e decidem adiar o

vestibular para que tenham mais tempo de preparação (OTUTUMI, 2008).  

Otutumi (2008) ainda fala sobre a importância do desenvolvimento da escuta

musical ainda na educação de base, afirmando que essas atividades, quando

desenvolvidas desde a infância, podem ajudar nos estudos futuramente, mas o grande

problema é que nem todos os alunos passam por essa fase da musicalização, e muitas

vezes vão ter o primeiro contato com a percepção no curso de graduação, o que gera

certas dificuldades no seu desempenho, e o distancia daqueles ingressantes que já

estudaram previamente (OTUTUMI, 2008, p.18). Já Alcantara Neto (2011), durante as

entrevistas com os alunos, mostra que a maioria estuda a percepção musical antes da

vida acadêmica, mas de maneira não formal:  

 

Em relação aos processos de aprendizagem, a maior parte dos alunos (10) começou a desenvolver habilidades musicais por meio de práticas informais, especialmente “tocando de ouvido” a música que gostavam, participando de grupos musicais e bandas e, muitos deles, atuando profissionalmente. Doze estudantes afirmaram ainda que tocar de ouvido é uma habilidade extremamente importante em suas práticas musicais. Por outro lado, escrever música (utilizando a notação musical tradicional) foi a atividade menos frequente (indicada por apenas seis alunos) (ALCANTARA NETO, 2011, p. 1404).    

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13    

Um dos professores da UNIRIO entrevistados por Cappelletti (2011) também

acredita no desenvolvimento da percepção musical a partir da prática musical de cada

pessoa, e diz que essa proposta já vem sendo incorporada por alguns professores. Em

suas aulas procura utilizar o instrumento dos alunos para que essa distância com a

prática não ocorra (CAPPELLETTI, 2011, p.20). Outros dois professores entrevistados

na mesma pesquisa, também questionam a educação musical de base, e veem nela a

razão para alguns problemas dentro dos cursos de Percepção Musical na universidade

(CAPPELLETTI, 2011).  

Ainda nos deparamos com alunos que começaram o estudo da percepção

musical apenas para os Testes de Habilidades Específicas (THE) dos vestibulares para

os cursos de música, como relatou a professora do cursinho preparatório em entrevista a

Otutumi (2008), já citado anteriormente. Passam um ou dois anos em cursinhos, sendo

condicionados e treinados para aquela prova, a qual a maioria é aprovado, mas sem ter

estudado e desenvolvido a fundo sua escuta e reprodução. Sobre esse condicionamento,

Almeida (2006) contesta dizendo que “os ditados tradicionais funcionam mais para

adestrar e condicionar os alunos (uma espécie de ginástica auditiva), do que como um

real meio de compreensão musical” (ALMEIDA, 2006, p. 6). Essa afirmação aparece

também nas entrevistas feitas por Otutumi (2008) com professores de Percepção

Musical de cursos de graduação e cursinhos preparatórios para o THE (OTOTUMI,

2008, p.83).  

Esses dois casos citados acima são comuns de encontrar em uma faculdade de

música, e também são responsáveis por gerar a heterogeneidade das turmas, também

comentado anteriormente. Com isso, cabe ao professor analisar e organizar suas aulas

conforme a necessidade de cada uma. Ele também deve tomar cuidado para não tornar

suas aulas uma mera reprodução de métodos e exercícios, deixando de lado a parte

musical.  

 

1.4. O instrumento utilizado

Continuando a análise do formato das aulas de Percepção, o instrumento mais

utilizado pelos professores é o piano. Talvez pela facilidade de, na maioria das vezes, se

ter um piano em uma sala de aula de um curso de música, e pela facilidade de extensão

e reprodução de acordes, melodias e ritmo em diferentes regiões, mas dificilmente vi

algum professor utilizando outro instrumento para fazer um ditado ou até mesmo apoiar

os alunos em um solfejo. Isso condiciona o ouvido do aluno para o reconhecimento

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daquele timbre, e não permite que ele desenvolva sua audição independente do timbre

utilizado. Otutumi (2008) chama a atenção para entender se a utilização do piano é uma

tradição devido à ampla possibilidade que o instrumento proporciona, ou simplesmente

uma comodidade (talvez até pelo fato de tê-lo sempre nas salas) que a referência sonora

do instrumento proporciona, abandonando outros timbres (OTUTUMI, 2008, p.11). Ela

ainda complementa:  

 

É evidente que exemplo de acordes, de mudanças de alturas e registros, acompanhamentos ao piano são facilmente abordados, mas o que nos chama a atenção é a aparente e quase restrição a demais fontes, que podem ser trabalhadas também como conteúdo, não somente como ferramenta (OTUTUMI, 2008, p. 11-12).  

 

1.5. Metodologias

Sobre os métodos brasileiros e estrangeiros, trataremos mais a frente. O que

procuramos esclarecer até aqui, foram as dificuldades encontradas na minha vivência, e

que se correlacionam com o que outras pesquisas vem mostrar e argumentar. Todas as

fontes citadas até agora são de pesquisas relativamente recentes, o que mostra que esse

tema é atual e há uma necessidade de melhora e uma direção nos cursos. Na pesquisa

realizada por Otutumi (2008) sobre obras acadêmicas que tratam sobrea educação

musical no eixo da percepção, nota-se uma crescente significativa de trabalhos que

tratam do assunto. Cappeletti (2011) também afirma que “estudos sobre o tema estão

surgindo na atualidade, pois se torna cada vez mais evidente a necessidade de reflexões

quem levem o desenvolvimento da disciplina, principalmente no Brasil”

(CAPPELETTI, 2011, p.7).  

Na pesquisa feita com professores universitários de 52 Instituições de Ensino

Superior no Brasil, atuantes na área de Percepção Musical, Goldemberg; Otutumi

(2010) chegaram aos seguintes números:

 

Linha metodológica adotada: tradicional ‘contextualizada’ (58,3%), tradicional (20,1%), atuação com material didático próprio e ênfase no potencial criativo dos alunos (11,7%), mescla de duas ou três linhas pedagógicas (9,9%); - piano como instrumento referencial (68,3%); - perfis acadêmicos entre novatos e experientes, distribuídos em 2 a 9 anos (60%), 10 a 15 anos (25%) e 16 a 29 anos (15%); - esforços extraclasse destinados especialmente à preparação das aulas (40%) (GOLDENBERG; OTUTUMI, 2010, p.1785)    

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15    

Sobre as linhas metodológicas apresentadas nas entrevistas feitas em 2011 por

Cappelletti, com os professores de Percepção Musical da UNIRIO, todos afirmam não

haver uma união entre a metodologia entre os docentes. Uma das professoras vê esse

ponto como positivo, pois dá maior possibilidade ao aluno de se enquadrar na

metodologia que mais lhe agrada, e que se sente mais confortável (CAPPELLETTI,

2011, p.24). Apenas uma professora diz utilizar recursos tecnológicos (softwares de

treinamento auditivo) como indicação de estudo para os alunos, disponibilizando-os em

um site que possui para comunicação e troca de informação com os alunos

(CAPPELLETTI, 2011, p.30). Apenas dois dos 4 professores utilizam o repertório dos

alunos em suas aulas e como forma de exercício para aproximá-los de uma forma mais

real da sua percepção musical (CAPPELLETTI, 2011).  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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16    

CAPÍTULO II  

MÉTODOS BRASILEIROS E ESTRANGEIROS  

 

Observei em algumas das pesquisas feitas, que alguns professores contestam o

número de materiais didáticos escritos para a percepção musical. Cappelletti (2011), em

seu primeiro capítulo traz algumas questões negativas e que dizem respeito aos

problemas enfrentados pelos professores dos cursos de Percepção Musical. Dentre eles,

encontra-se a falta de materiais para o professor da disciplina (CAPPELLETTI, 2011,

p.7). Otutumi (2008) também comenta sobre isso, e compara a situação brasileira com a

estrangeira afirmando que “no âmbito internacional, as opções são vastas, diferente da

realidade brasileira. A quantidade de publicações e variedade de abordagem dos

conteúdos são veementemente intensas” (OTUTUMI, 2008, p.43, 44). Ela ainda ressalta

que os métodos norte-americanos são mais completos e sequenciados em uma lógica

cognitiva. Além disso, alguns se preocupam com a tessitura vocal de quem utiliza o

método, e ainda unem os elementos trabalhos de forma a tornar mais musical

(OTUTUMI, 2008, p. 44).  

Dentro da pesquisa de Otutumi (2008), uma nota citada traz a seguinte

afirmação em relação aos materiais didáticos: “[...] o material didático relativo à

Percepção Musical não existe de maneira organizada. O professor acaba utilizando

folhas de exercícios fragmentados, ficando a cargo de cada um produzir o seu próprio

material” (apud BERING, 2003, p.2, em nota de rodapé). Essa afirmação se confirma

nas entrevistas realizadas por Otutumi (2008), onde um dos professores afirma haver

um método comum entre os professores de Percepção Musical na universidade que

leciona, e que as folhas de exercícios ajudam a nortear o trabalho dos docentes, além de

ajudar na elaboração de um material progressivo (OTUTUMI, 2008, p.62). Outro

professor diz utilizar livros e ser a favor do livro didático no Brasil, porém aponta

alguns exercícios como enfadonhos e, por isso, os substitui por outros (OTUTUMI,

2008, p.70).  

Realmente vemos pouquíssimas publicações brasileiras na área de percepção

musical. Até vejo uma grande crescente nos livros de musicalização (como é o caso dos

métodos de Cecília Cavalieri França), e até mesmo de harmonia, mas difícil encontrar

bibliografias novas de percepção. Otutumi (2008) listou 17 livros didáticos editados no

Brasil de 1921 a 2005. Dos 17, 7 são destinados ao estudo rítmico especialmente, sendo

3 deles adotados por diversas universidades como seu material base na Percepção

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Musical: Rítmica de Gramani, Método Prince de Adamo Prince e tradução de Eliana

Ávila e A arte de ouvir, também de Adamo Prince mas com tradução de Cláudia Costa

Gulamães ; 4 enfatizam a parte de desenvolvimento melódico; 2 agrupam ritmo e

melodia; 4 possuem um conteúdo variado entre ritmo, melodia e harmonia (OTUTUMI,

2008, p. 47; 48; 49; 50). Porém, esses número aumentam significativamente quando o

público alvo muda e passa do universitário e curso técnico para o infantil e juvenil

(OTUTUMI, 2008, p.51). Pensando nisso, Paz (2013) lançou o livro (já disponível em

sua segunda edição) Pedagogia Musical Brasileira no Século XX: Metodologias e

Tendências. Na apresentação do livro, a autora traz:  

 

A falta de livros que historiassem o movimento renovador do ensino da música no Brasil, fez com que buscássemos os especialistas da área, em grande parte ex-alunos dos idealizadores do métodos, de modo que fosse viável traçar um perfil vivo de uma realidade que não pode nem deve se extinguir, por falta de continuadores (PAZ, 2013, p.7)  

 

Paz (2013) descreve em seu livro mais de dez métodos brasileiros que tratam

tanto da musicalização quanto da Percepção Musical. Há alguns do início do século XX,

como é o caso de Villa-Lobos, até os mais atuais como O Passo de Lucas Ciavatta, e o

Processo de Criação Ao Vivo (PVC) de Itiberê Zuarg. Em cada um deles, a autora

relata como se dá a pedagogia, como ele deve ser aplicado e é visto dentro da educação

musical. Tendo em vista que o presente trabalho trata apenas da percepção musical,

falarei um pouco apenas dos tratam também do mesmo assunto, ou tragam indagações

já apresentadas na pesquisa.  

Antes de apresentar os autores, vale pontuar o que chamo de método, proposta

pedagógica e livro. Método é o que tenta desenvolver de maneira gradual e lógica os

elementos a serem estudados. Proposta pedagógica, ou pedagogia ou livro, trago como

uma forma de se pensar a educação, e como se deve proceder na aplicação ou até

mesmo criação dos métodos. É uma instrumentação para o professor utilizar em suas

aulas.  

A primeira proposta pedagógica trazida por ela é a de Villa-Lobos, o qual vê a

vivência musical prévia ao ensino, como um fator importante e fundamental para a

assimilação das regras, como já foi citado anteriormente. Paz (2013) vê a falta (ou

pouca falta) de sucesso dessa proposta e da disciplina desenvolvida a partir dela (Teoria

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Aplicada), a má formação musical didática de alguns professores que tentaram utiliza-

lo (PAZ, 2013, p.21).  

Uma pedagogia que me chamou muito a atenção foi a de Sá Pereira (1988-

1966). Apesar de tratar mais sobre a iniciação musical (o que chamamos hoje de

musicalização infantil), ele chama a atenção para a falta de preparo dos professores na

questão didática e até mesmo da psicologia infantil. Sá Pereira acredita que o professor

de Iniciação Musical deveria ser um dos mais preparados, pois trabalha com a base dos

alunos (PAZ, 2013, p. 47). Ele ainda fala muito do primeiro contato com a escuta

musical antes do fazer musical. Devemos primeiro compreender, para depois executar:  

 

Antes de ensinar o nome das notas e os valores de duração e de abordar os intervalos e os compassos, o aluno deve ouvir e sentir a música, vivenciando os fenômenos musicais, procurando discernir atenta e intuitivamente as relações sonoras entre dois sons (mais agudo ou mais grave), assim como a duração maior de determinados sons etc. Os conhecimentos teóricos só terão importância se forem o resultado de uma experiência musical vivenciada (PAZ, 2013, p. 49)  

 

Esse pensamento de Sá Pereira está totalmente relacionado ao que já foi

apontado anteriormente sobre a educação musical de base, quando Otutumi (2008)

afirma que a falta da educação de base pode gerar e heterogeneidade dos alunos dentro

de um curso de Percepção Musical. Esse apontamento de Sá Pereira vai contra ao que

Alcantara Neto (2011) traz em suas entrevistas, também já comentado anteriormente.  

Ainda sobre a pedagogia musical, Paz (2013) traz também o trabalho de Liddy

Chiaffarelli Mignone, que teve sua linha de pesquisa junto a Sá Pereira. O que eu

gostaria de destacar sobre essa pedagogia, é que a autora destaca a valorização da

realidade do aluno, “respeitando e procurando sempre compreender sua bagagem

psicológica e emocional” (PAZ, 2013, p. 64).  

Tanto Sá Pereira quando Liddy Mignone possuem em seus estudos uma forte

influência do método Dalcroze, que tem como proposta a “percepção rítmica através da

sensibilidade, para que se distingam componentes musicais como dinâmica, compasso,

frase, linha melódica, estrutura harmônica, tensão e relaxamento” (PAZ, 2013, p.254).

Durante sua vida docente como professor de Harmonia em Genebra, Dalcroze notou

que seus alunos faziam música de forma mecânica, muitas vezes sem sensibilidade, e

até mesmo sem entender o que estava acontecendo. Em suas observações, pode ver que

as crianças realizavam movimentos naturais durante suas brincadeiras, e seu método da

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Eurritmia, criado em 1903, veio do princípio desse estudo e reflexões. Esse método

estava completamente fora daquilo que se era estudado e aplicado nos cursos de música

da época, pois não se tratava mais de realizações técnicas e virtuosísticas, nem tinha

como foco a leitura e a escrita musical, o que acabava deixando o aluno desprovido da

parte criativa da música, tornando aquele estudo meramente mecânico (PAZ, 2013, p.

254).  

Na tentativa de fugir da mecanicidade, e de trazer a música brasileira para dentro

dos métodos de solfejo, alguns autores aplicaram em seus métodos, exercícios com

melodias e ritmos caracteristicamente brasileiros. É o caso de Cacilda Borges Barbosa

em seu método Estudos Brasileiros de Ritmo e Som, que tentou tirar a quadratura

encontrada nos livros de solfejo e ditado, os quais não traziam muito interesse aos

alunos e ainda não apresentavam nenhuma característica da música brasileira. Foi

querendo suprir essa lacuna no estudo musical brasileiro, que Cacilda Borges escreveu,

em 1980, seu estudo para a percepção musical (PAZ, 2013, p. 96). Outra coisa muito

importante de seu estudo é a união da teoria e da prática. “O aluno descobre e o

professor conceitua. Os exercícios teóricos são realizados somente como fixação” (PAZ,

2013, p. 97).  

Um método contemporâneo que envolve tanto o ritmo quando o solfejo é O

Passo, desenvolvido por Lucas Ciavatta. Um das propostas apresentadas é, assim como

a de Liddy Mignone, proporcionar à todas as pessoas a prática musical, independente

das habilidades musicais que essa pessoa possui (PAZ, 2013, p.334).  

 

Talvez a minha mais importante constatação neste sentido seja a de ninguém está completamente livre, por melhor que se julgue, de receber este infeliz rótulo. A ideia do famoso “dom”, de que se nasceu ou não para a música, é perigosíssima e tem realmente servido apenas como desculpa tanto para aqueles alunos que não têm forças para entrar ou permanecer num processo de ensino-aprendizagem musical quanto para aqueles professores que não sabem como conduzir este processo (CIAVATTA, 2009, p. 17).  

 

O Passo é também um método que traz a cultura popular como referência. Ele

trabalha muito a noção de espaço e movimento corporal, além dos elementos musicais,

e é por esse motivo que o autor define O Passo não apenas como um método de

educação musical, mas “é melhor definido como uma abordagem multissensorial”

(CIAVATTA, 2009, p.13).  

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Uma grande diferença d’O Passo para os outros métodos é a forma de

representação/escrita. Ciavatta (2009) parte da afirmação que todo músico,

independente da forma que faz, escreve. Mesmo não sendo graficamente no papel, o

músico escreve em seu instrumento, através de uma notação corporal (CIAVATTA,

2009, p. 67). Uma coisa que me chamou atenção ao ler esse método é a forma como o

autor fala sobre a notação musical escrita. Ele relata que antigamente apenas os músicos

eruditos frequentavam a Academia e, portanto, somente eles sabiam ler partituras. Hoje,

o músico popular também frequenta o mesmo ambiente, tendo  

 

um grande dilema pela frente: se por um lado a escrita e os procedimentos acadêmicos os ajudam e mesmo possibilitam sua prática, na maioria das vezes, seus ídolos ou referências são todos músicos vindo da tradição oral e que pisaram na academia apenas para receber algum prêmio (CIAVATTA, 2009, p.68).  

 

A escrita musical tradicional possui certas limitações, principalmente para a

música popular. A forma rítmica nem sempre é fiel ao que se é executado e as

dinâmicas, formas, fraseados e articulações nem sempre são possíveis de serem tratadas

em uma partitura tradicional, e a solução dada geralmente dentro da música popular é a

tradição oral, feita pelo professor. Apesar disso, a partitura ainda ajuda em um aspecto

muito importante para o aprendizado, que é a autonomia do aluno (CIAVATTA, 2009,

p.69).  

Sobre essa necessidade da escrita musical, gostaria de retratar um pouco a

pesquisa de Luedy (2009), que fala do tema analfabeto musical. Esse tema surgiu para o

autor devido ao grupo de professores da Faculdade Federal do Acre (UFAC) que se

colocaram contra a eliminação do THE para o vestibular de música, argumenta que um

aluno de graduação deve ter o mínimo de conhecimento básico para ingressar em

qualquer outro curso, e com a música não de ser diferente. Dentre os conhecimentos

básicos da música estão leitura e escrita musical. Ele chama a atenção para o fato de

que, um analfabeto pode muito bem ser um falante competente de sua língua materna

(mesmo sem ter o conhecimento da linha escrita), podendo se comunicar perfeitamente

com outras pessoas que dominam sua linguagem oral (LUEDY, 2009, p. 51). Essa

necessidade de se estudar a teoria e percepção, e de ter como obrigação esses

conhecimentos antes da vida acadêmica, acabam por trazer a seguinte questão ao autor:  

 

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Imagino que o analfabeto musical [...] possa igualmente executar uma melodia e ouvir/compreender uma sequência de acordes. Acredito também que ele possa vir a fazer música com isso, ou encontrar sentido musical em melodias e acordes, ainda que não domine a leitura e notação musical ocidental (LUEDY, 2009, p. 51).  

 

O Passo utiliza também, o que foi citado anteriormente: a notação corporal e a

notação escrita. A corporal se dá com o movimento do corpo e palmas, e a notação

escrita é diferente da partitura tradicional, mas traz basicamente a mesma estrutura. A

diferença é a facilidade da compreensão da partitura d’O Passo, pois expressa

graficamente o que o corpo do aluno está reproduzindo (CIAVATTA, 2009, p.71). Essa

facilidade torna possível pessoas sem o conhecimento formal da música desenvolver sua

musicalidade, e ainda ter a independência durante seus estudos.  

Uma das linhas metodológicas presentes no livro de Ermelinda Paz que mais me

chamou a atenção é O Processo de Criação Ao Vivo (PVC) de Itiberê Zwarg, pois ele

o desenvolveu a partir de uma dificuldade que teve durante seu processo de

musicalização, e condiz com o que meu trabalho vem apresentar. Em uma comunicação

pessoal feita à Ermelinda Paz (2013) em 2011, Itiberê revela:  

 

Tenho uma facilidade muito grande para escuta. Tenho uma memória musical muito boa. Por causa disso eu demorei muito para aprender música. Entre treze e quatorze anos tentaram me ensinar. As pessoas liam ta, ta, ta (sugerindo uma má execução). Eu não entendia por que tinha que ser assim. Eu estou executando uma coisa, mas, na minha cabeça, era outra. Eu já escutava com a interpretação, já escutava com a música bonita. Aquilo era quadrado, feio, era difícil para você aprender divisão assim! Foi difícil aprender por causa disso (PAZ, 2013, p.263 - 264).  

 

A metodologia de Itiberê Zwarg originou-se em uma Oficina de Música2, e seu

principal objetivo é a prática musical do aluno, sem ter qualquer tipo de barreira cultural

e musical. É desenvolvido em dois momentos: a criação e a execução da música que os

integrantes criaram (PAZ, 2013, p. 266). A escuta, a prática musical, repertório variado,

equilíbrio acústico e o conhecimento não polarizado são fatores que fazem parte das

técnicas de ensino desse método. Tudo que é criado durante a oficina, motivos ou

temas, é repassado aos instrumentistas, que ajudam a aprimorar aquela criação (PAZ,

2013, p.268).  

                                                                                                                         2 Oficina de Música realizada na Pro Arte do Rio de Janeiro, no ano de 1999.

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Para ilustrar métodos tradicionais, Osvaldo Lacerda e o Curso Preparatório de

Solfejo e Ditado Musical tem um pensamento mais rígido e bastante segmentado. Logo

no prefácio de seu método, ao explicar como se dará o estudo do solfejo, Lacerda vai de

encontro ao que foi tratado anteriormente sobre a fragmentação do ensino da percepção

musical quando explica: “Como uma das regras básicas da Pedagogia é “apresentar uma

dificuldade de cada vez”, conclui-se que é contraproducente procurar resolver, ao

mesmo tempo, problemas de entonação e ritmo” (LACERDA, 1964, p.6). No primeiro

capítulo foi citado o artigo de Levitin (2012), afirmando como nosso cérebro processa

cada parte da música de forma separada, mas os reconhece de forma integrada,

mostrando divergência com o pensamento trazido no método de Lacerda, pois algumas

vezes resolvemos um problema de ritmo quando aplicamos o mesmo exercício com um

solfejo ou uma música.  

Ao ler o prefácio desse método, observei que a técnica faz muito mais parte dele

do que a música em si. Em seu passo a passo do estudo de solfejo, ele pede para que o

aluno não marque o primeiro tempo com a mão ou marcando com a cabeça ou pé. Pode-

se ver ainda essa mecanicidade quando ele fala: “Procurar conseguir a máxima pureza

rítmica, tanto no que diz respeito à acentuação dos tempos, como no que se refere ao

valor das notas e das pausas. Dar às mesmas o seu valor exato e integral” (LACERDA,

1964, p.8). Ele ainda reforça sempre a utilização do piano para o auxílio nesses

exercícios, mas o solfejo, ao final do estudo, deve ser executado sem o auxílio de

qualquer instrumento.  

Nos ditados, Lacerda separa o rítmico do melódico. Para a parte rítmica ele

peque o professor utilize a sílaba “ta” (ou qualquer outra) para ditar aos alunos o

exercício proposto. Ainda pede que seja ditado de 2 a 4 compassos por vez quantas

vezes forem necessárias, até a perfeita compreensão do aluno (LACERDA, 1964, p. 9).

Já para a parte melódica, é dada a sugestão de se executar o exercício ou no piano, ou

cantando. Trazer sempre a sugestão de executar os exercícios ao piano, remete ao que

Otutumi (2008) fala e nos faz pensar e a utilização do piano como instrumento base é

devido às possibilidades do instrumento, ou simples comodidade, já tratado no primeiro

capítulo.  

Quando saímos dos métodos brasileiros e nos deparamos com os estrangeiros,

há algumas diferenças nos discursos e formas de lidar com a disciplina e a forma de

estudo da percepção musical. Edlund (1963), sueco, traz em seu método Modus Novus,

um estudo da leitura da melodia atonal. Na sua introdução já traz um pensamento

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diferente dos brasileiros vistos até agora. Para Edlund, o objetivo principal da percepção

musical, ou treinamento auditivo, como ele traz, “deveria ser para desenvolver a

sensibilidade musical” (EDLUND, 1963, p.13) [tradução minha]3, e as diferentes áreas

da percepção deveriam ser um caminho para essa sensibilidade.  

Diferentemente do que foi relatado no método anterior, Edlund afirma que um

músico profissional diferencia-se dos ouvintes por ser capaz de explicar os elementos

musicais, mas que o mais importante para os dois casos é ouvir e identificar as nuances

na expressão musical, pois isso é muito mais importante do que o domínio da técnica do

idioma musical (EDLUND, 1963, p.13).  

Em seu passo a passo, antes do aluno ler a melodia que será solfejada, o

professor deve executar a frase a ser estudada, em seguida os alunos devem canta-la

ainda sem ler a partitura, mas com o nome das notas. Em seguida, o professor reproduz

novamente a frase e novamente o aluno irá tocá-la também, mas com a diferença de que

a execução dessa vez será feita em seu instrumento. Para praticar a leitura, os alunos

acompanham a melodia tocada pelo professor, o qual deve mudar uma nota ou outra,

para que eles identifiquem o que foi mudado.  

O ditado se dá a partir da primeira nota que será executada. O professor indica o

nome dessa primeira nota e toca a frase completa quantas vezes forem necessárias. Os

alunos devem cantar a frase e depois escrevê-la. Em seguida cantam ou tocam a frase

novamente, mas em tonalidades diferentes.  

No estudo rítmico, um grande nome dos métodos brasileiros está o Rítmica, de

José Eduardo Gramani. Seu objetivo é trazer o ritmo o mais próximo possível da

realidade, colocando-o como um elemento musical, e não apenas vê-lo de forma

matemática (GRAMANI, s/d, p.11). Gramani enfatiza a questão da sensibilidade

musical, e como o ritmo pode ser trabalhado para chegarmos a essa sensibilidade

(GRAMANI, s/d, p.12).  

Assim como Edlund, Gramani compôs sua série de exercícios pensando neles

como um meio a ser utilizado para se desenvolver “principalmente os aspectos de

disciplina interior e flexibilidade de adaptação da atenção a novos tipos de associações

ou relações” (GRAMANI, s/d, p.12). O desenvolvimento desses processos interiores de

associação e dissociação é o fim que esse meio irá levar (p.12).  

                                                                                                                         3 “The main object of aural training should be to develop musical sensitivity.” (EDLUND, 1963, p.13)

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24    

No capítulo anterior, foi comentado sobre o que disse uma professora de

Percepção Musical da UNIRIO, quando diz que as aulas acabam gerando um tipo de

‘adestramento do ouvido’. Retomo esse pensamento, pois Bona traz no prefácio de seu

Método Completo Para Divisão as seguintes palavras: “Este método tem uma finalidade

específica: foi composto exclusivamente para os alunos se adestrarem com facilidade à

interpretação da leitura das várias formas rítmicas dos agrupamentos construídos da

métrica musical” (BONA, s/d, p.2, grifo meu). O método é constituído de três partes,

que se dividem em uma crescente de dificuldades no que abordam as partes rítmicas

musicais.  

Apesar de se apresentar como um método de estudo rítmico, possui em seus

exercícios a parte melódica junto, e propõe também essa leitura melódica. Na primeira

parte, só trabalha compasso quaternário, mas na parte melódica trabalha a escala em

grau conjunto, os saltos dos intervalos de segunda a maiores do que uma oitava, além da

escala com várias figurações, finalizando com uma revisão apontando tanto a parte

rítmica quanto melódica.  

A segunda parte traz compassos simples e compostos, e o solfejo melódico já é

mais elaborado e realizado em diferentes tonalidades, sempre apresentadas antes da

partitura de forma escrita, além da armadura de clave. A terceira e última parte é uma

recapitulação das duas primeiras, mas acrescenta-se também os ornamentos, sinais de

repetição e alterações consideradas por ele de maior uso.  

O que se vê até aqui é uma série de métodos, estudos e metodologias de

percepção musical, em suas diferentes frentes. Métodos estrangeiros que acabaram

influenciando os brasileiros, brasileiros que surgiram da necessidade de adaptação do

professor, ou até mesmo de suas dúvidas sobre o que ele mesmo utilizava, como é o

caso de Dalcroze e Itiberê Zwarg. Com isso, deve-se pensar se a falta de métodos é

realmente um dos problemas que afetam as aulas de Percepção, se os próprios métodos

causam esse problema, ou se a falta de conhecimento e busca dos professores causa esse

problema.  

 

2.1. O uso da tecnologia nas aulas de Percepção Musical  

Quando falamos em “tecnologia”, podemos envolver questões diferentes em

seus significados. Nevada (2006) não vê a tecnologia apenas como sendo o computador,

nem o ser humano como único ser pensante. Para ele, o conceito de tecnologia engloba

todas as formas diferentes como damos soluções aos problemas propostos por nós, e

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que as máquinas, instituições e até mesmo coisas mais simples podem fazer parte de um

conceito estendido de inteligência, agindo “como agentes, mensageiros e facilitadores

das nossas trocas e comunicações” (NEVADA, 2006, p.70).  

A tecnologia é hoje utilizada na educação de diferentes formas, como por

exemplo, na Educação a Distância, discutida por Krüger (2006), e na utilização de

softwares, aplicativos, mídias etc. Quanto à utilização da “tecnologia informacional”,

Nevada (2006) chama a atenção quando diz que essa tecnologia não pode ser utilizada

apenas com aluno em frente ao computador, mas deve ser pensada de forma mais

criativa e pedagógica, utilizando dessas ferramentas com a mesma facilidade que

utilizamos os instrumentos musicais, vendo-os como possibilidades materiais

(NEVADA, 2006, p.71).  

Mas onde essa tecnologia pode ser empregada no ensino da música? Para

Cunha; Martins (1998), é de fundamental importância que a experiência dos artistas e

arte educadores estejam presentes nas Novas Tecnologias de Informação e

Comunicação (NTIC), a fim de completar as necessidades trazidas na educação musical.

“Estas ferramentas podem auxiliar no desenvolvimento da percepção auditiva,

organização sonora e outras áreas do conhecimento musical” (CUNHA; MARTINS,

1998, p.3). Nevada (2006) ainda complementa:  

 

Onde a tecnologia provavelmente atua com destreza é justamente onde enfadonhamente ainda insistimos em atuar como máquinas pedagógicas, previsíveis e limitados a informações. Nessas tarefas onde o conhecimento está tecnicamente estruturado, redundante, onde permeiam nomes, definições, transmissões de símbolos externos, visuais, sonoros, matemáticos, onde as habilidades motoras ou sensoriais são testadas, onde se acomodam conceitos que todos partilhamos, âmbito da acomodação. Lugares onde encontramos os nomes de notas, controles e possibilidades facilitados sobre os sons, conceitos, treinamentos auditivos, técnicas instrumentais (NEVADA, 2006, p.71).  

 

Os dois autores mencionam a utilização da tecnologia como auxílio nas práticas

e treinamentos auditivos. Hoje, diversos sites, softwares e aplicativos para smartphones

e tablets, foram desenvolvidos com o propósito do estudo da percepção musical.

Citando alguns aplicativos, temos o Perfect Ear, Ear Trainer, goodEar, Perfectone,

Rhythm Sight Reading Trainer dentre milhares de outros em versões gratuitas e pagas.

Cada um com exercícios diferentes para o reconhecimento de escalas, acordes,

intervalos, ditados melódicos, progressões de acordes e leitura rítmica.  

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Dentro os softwares temos o Ear Master, GNU Solfege, e outros com downloads

gratuitos pela internet. No GNU Solfege, o aluno encontrará assuntos relacionados à

percepção musical, como o de reconhecimento de escalas, intervalos, progressões

harmônicas e de cadências, ditados harmônicos, melódicos e rítmicos (CORREIA,

2010).  

Nos sites cito o teoria.com, disponível na url:

<https://www.teoria.com/exercises/> e o good-ear, disponível em: <http://www.good-

ear.com/servlet/EarTrainer>. Todos com exercícios parecidos com os aplicativos e

softwares já citados.  

Com diversas fontes de tecnologias citadas aqui, podemos pensar nesses meios

também como um método de estudo, ou talvez como um meio que o educador pode

utilizar como proposta de estudo diário e contínuo do aluno. Cunha; Martins (1998)

chama a atenção para que se atente de que o indivíduo deve ser exposto e sentir-se

estimulado a utilizar esses recursos (CUNHA; MARTINS 1998, p.3).  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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CAPÍTULO III  

AS PEDAGOGIAS DA PERCEPÇÃO MUSICAL UTILIZADAS NA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO  

 

Como objetivo dessa pesquisa, procurei avaliar com alguns alunos e ex-alunos

da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UNIRIO) como se deu o estudo de

percepção musical de cada um. Primeiramente, a ideia era realizar entrevistas com os

professores de Percepção Musical da mesma instituição, mas, durante a análise do

referencial teórico, pude notar que a pesquisa de Cappelletti (2011) é recente, e consta

essa entrevista com o corpo docente composto pelos professores Cândida Borges,

Adriana Miana e José Wellington dos Santos. Com o intuito de diferenciar, a fim de

acrescentar dados e ideias sobre o assunto, resolvi, então, realizar uma entrevista com

alunos ainda cursando Licenciatura em Música ou Bacharelado em MPB, ou recém-

formados em um dos dois cursos, e que já completaram os 4 períodos obrigatórios de

Percepção Musical. Vale lembrar que a nova ementa do curso de Bacharelado em MPB

da UNIRIO sofreu uma reforma curricular, e hoje os ingressantes não fazem mais

quatro períodos de Percepção Musical, mas sim 2, mas os entrevistados fazem parte da

grade antiga.  

A matéria de Percepção Musical na UNIRIO é divida em 4 períodos: Percepção

Musical (PEM) I, PEM II, Percepção Musical Avançada (PEMA) I e PEMA II. Cada

um contém uma carga horária de 60 horas semestrais, sempre divididas em duas aulas

de duas horas cada, por semana. Segundo a ementa dos cursos disponibilizados no site <

http://www2.unirio.br/unirio/prograd/cursos/projetos-pedagogicos-dos-

cursos/arquivos/PP%20MPB%20Arranjo.pdf>, em cada semestre deve ser trabalhado:  

 

Vivência do tonalismo musical e também dos procedimentos modais das estruturas musicais. Trabalho prático e criativo de leitura, grafia e execução de musicas de raízes populares e eruditas das diversas épocas. Os aspectos teóricos serão enfocados a partir da prática como necessidade de ordenação e racionalização dos mesmos (PROJETO PEDAGÓGICO CURSO DE BACHARELADO EM MPB, REFORMA 2007, p. 272, 273).  

 

A ideia da entrevista realizada com os alunos foi para entender como se deu o

estudo de cada um antes e durante a graduação (e posterior para os que já se formaram),

verificar se alguns dos problemas expostos no primeiro capítulo condizem com a

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realidade do aluno, quais métodos foram estudados por eles, como eles avaliam as aulas

de Percepção que tiveram, as avaliações que foram submetidos durante o curso, e quais

métodos os novos professores de Percepção Musical estão aplicando.  

A escolha de se realizar a pesquisa através de um uma entrevista estruturada foi

com a finalidade de deixar as questões abertas para que os alunos pudessem expressar e

explicar melhor cada item, o que um questionário não permitiria, tendo em vista que o

mesmo traria respostas fixas para cada questão. Segundo Otutumi (2008), a entrevista

estruturada possui questões elaboradas previamente, sem dar a liberdade de que se

inclua ou altere os tópicos expostos (OTUTUMI, 2008, p.58).  

Para Seale (2012), “o objetivo mais importante de um estudo utilizando

[entrevistas estruturadas] é aprender sobre as ideias, conhecimentos, sentimentos,

opiniões/atitudes e comportamentos auto relatados de uma população definida”

(SEALE, 2012, p. 185) [tradução minha]4. Ainda seguindo a opinião de Seale (2012),

para se realizar uma pesquisa, o pesquisador precisa determinar alguns elementos:  

● A informação que está buscando;  

● A população que pretende estudar;  

● Construir o roteiro da entrevista e decidir como isso será administrado;  

● Desenhar uma amostra representativa;  

● Administrar os instrumentos;  

● Analisar e interpretar os dados;  

● Comunicar os resultados.  

(SEALE, 2012, p. 185) [tradução minha]5.  

Pensando nesses dados, estruturei uma entrevista com 9 perguntas, para serem

respondidas por alunos ou ex alunos recém formados pela UNIRIO, que já completaram

a carga horária do curso de Percepção Musical. O roteiro da entrevista foi composto por

questões que visam entender como se deu o estudo de percepção musical de cada aluno,

anterior e dentro da universidade. Os dados foram analisados e serão expostos a seguir.  

A entrevista foi realizada com 13 alunos dos cursos de Licenciatura em Música e

Bacharelado em MPB da UNIRIO, na cidade do Rio de Janeiro, no mesmo ano da                                                                                                                          4 “The most important goal of study using such an instrument is to learn about the ideas, knowledge, feelings, opinions/attitudes and self-reported behaviours of a defined population” (SEALE, 2012, p.185). 5 “determine the information to be sought; define the population to be studied; construct the interview schedule or questionnaire and decide how it is to be administered; draw a representative sample; administer the instrument; analyse and interpret the data; communicate the results” (SEALE, 2012, p.185).  

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pesquisa. As perguntas foram enviadas por e-mail para cada aluno, os quais tiveram as

respostas de forma descritiva. Dos 13 alunos entrevistados, 3 deles se formaram no

período anterior a pesquisa, e um reingressante do curso de Licenciatura, estando no

primeiro período de Bacharelado, sendo suas respostas ainda válidas, pois tiveram seus

estudos de percepção com os mesmos professores avaliados pelos então ainda alunos da

instituição, e praticamente no mesmo período que os mesmos.  

 

3.1. Como os alunos se prepararam para o vestibular?  

Dos 13 alunos entrevistados, 8 começaram seus estudos de percepção musical

para se preparar para o Teste de Habilidade Específica (THE) da UNIRIO e outras

universidades como a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Dos 5 que

começaram antes de pensar no vestibular, o entrevistado 2 começou quando descobriu

que sua percepção melódica era ruim, e depois fez aula de preparatório para o THE na

Pro Arte – Rio de Janeiro, o entrevistado 3 pelo TEPEM (Teoria e Prática da Percepção

Musical – curso de extensão da UNIRIO) em 1999 e depois com aulas particulares em

2007 para se preparar ao vestibular, o entrevistado 11 começou aos 6 anos junto com o

estudo do violino, mas deixou de estudar e retomou com professor particular apenas

para se preparar para o THE, o entrevistado 14 deu início aos seus estudos com 17 anos

com professor particular e depois em conservatório, e o entrevistado 8 fez o curso

básico do Conservatório Villa-Lobos, no Rio de Janeiro, e vale relatar sua resposta:  

 

Entrevistado 8: Eu não sabia o que era percepção musical até encontrar um incrível professor no curso básico do Villa Lobos em 2004 (se não me engano). Aprendi não só a solfejar e fazer ditado como a escutar melhor e antes de julgar. Só mais tarde fui entender que este foi um treino para vestibular e que não compreende todo o universo que é a percepção musical.  

 

O único que citou os métodos utilizados foi o entrevistado 1:  

 

Apesar da vida de músico prático há aproximados 15 anos, passei a estudar percepção em 2008 quando decidi entrar para a faculdade. Fiz o curso do Luiz Carlos Peçanha com metodologia Gazzi de Sá. Já dentro da universidade conheci o método O Passo que continuo praticando e me aprofundando até hoje.  

 

Todos os outros começaram com professores particulares ou em cursos como o

TEPEM.  

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3.2. Quais as metodologias utilizadas durante os estudos de percepção musical dos

alunos?  

Essa parte resolvi dividir em 5 perguntas diferentes, direcionadas às partes

específicas do estudo da percepção (solfejo, ritmo e ditado), utilização de softwares e

aplicativos e qual a avaliação dos alunos quanto aos métodos utilizados por seus

professores. Todas essas questões foram direcionadas aos estudos de percepção musical

nas aulas da UNIRIO.  

 

3.2.1. O estudo do solfejo durante as aulas do IVL/UNIRIO  

Poucos alunos citaram os nomes dos métodos utilizados pelos professores, mas

os comentados foram: Bohumil Med, Ermelinda Paz, Dragomirov, apostila da Berklee e

Robert Ottman. 7 dos entrevistados afirmam que utilizavam materiais (partituras e

coletâneas de vários materiais) escolhidos e propostos pelo professor, sendo que um

deles diz lembrar que um dos métodos era estrangeiro, e outro brasileiro.  

O que chama a atenção, são alguns dos entrevistados enfatizarem a metodologia

de um dos professores pela utilização do repertório de cada aluno, e até mesmo das

práticas de canto coral:  

 

Entrevistado 1: [estudei] através de partituras proposta pelos professores e mesmo das aulas de canto coral que “forçavam” uma leitura a primeira vista. As aulas de percepção também induziram a uma aproximação do conteúdo ao conteúdo do meu dia-a-dia e passei a usar os Songbooks como apoio.  

 

Entrevistado 10: [iniciou a UNIRIO com um estudo tradicional, depois de finalizar seus estudos, retornou à UNIRIO e, enquanto aguardava o resultado do aproveitamento de matérias, cursou PEMA I novamente e teve a seguinte avaliação sobre essa segunda experiência:] Quando retornei à universidade estudei com outra professora que adotou um método mais livre, sugerindo que os alunos buscassem em seus próprios repertórios os assuntos das aulas como acordes com nona, escala de tons inteiros. A partir do repertório dos alunos foram feitos ditados e solfejos. Foram feitos ditados com acordes de nona e foi pedido aos alunos para formarem “coros” de cinco alunos para cantar as notas dos acordes. Os alunos também eram responsáveis por fazer uma apresentação com trechos musicais que continham o assunto da aula e preparar um resumo para a turma explicando o

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assunto e apresentando os trechos musicais com partitura e áudio.  

 

Quatro alunos ainda estudam o solfejo pelas práticas do dia a dia de músico,

como cantar uma melodia de seu repertório, através do canto e com aplicativos e sites

de percepção musical.  

 

3.2.2. O estudo do ritmo durante as aulas do IVL/UNIRIO  

O método mais citado entre os alunos (6) foi o método Gramani. Alguns citam

materiais disponibilizados pelos professores, como folhas de exercício, estudos

dirigidos ao instrumento e apenas um aluno cita o método d’O Passo, o qual estuda por

sua escolha, e não por ter sido apresentado pelos professores de Percepção Musical.  

Dois dos entrevistados me chamam a atenção quando alegam a falta de

importância estabelecida pelos professores, e a falta de interesse do próprio aluno pelo

desenvolvimento:  

 

Entrevistado 5: Acho particularmente muito chato. O que é um problema pra mim até hoje, pra ler partitura eu sempre peco numa síncope ou coisas difíceis de ler ritmicamente.  

 

Entrevistado 6: Os estudos de ritmo seguiram da mesma forma que os de solfejo, porém com uma importância bem menor. Foram feitos bem menos exercícios ao longo do período e em alguns momentos o estudo parecia esquecido. Em alguns momentos o professor retomava as tarefas e exercícios rítmicos e voltávamos a estudar.  

 

3.2.3. O estudo do ditado durante as aulas do IVL/UNIRIO  

Nenhum aluno citou algum método específico utilizado. Três alunos apontam

que os ditados era propostos pelos professores, um apontou o auxílio do estudo com

monitoria, 5 apontam estudar fora de sala através da transcrição de músicas, o que

alguns chamam de “tirar a música de ouvido”, algumas vezes devido o trabalho, outras

para a prática, utilizando músicas de seu repertório na maioria das vezes.  

O entrevistado 13 relatou um tipo de aula mais formal, como as expostas no

primeiro capítulo, e o 2 critica a forma como são trabalhados os ditados nas aulas:  

 

Entrevistado 2: sempre achei [chato], acho que é quase inútil a forma como é feito esse tipo de estudo na academia, então

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também nunca recorri a livros nem nada. Ia empurrando essa parte para poder me formar. Mas acho que é importante saber ouvir uma melodia e poder organiza-la conscientemente, mas acho que esse tipo de ouvido deve estar ligado a estilos (variados) e não a abstrações atonais ou apenas melodias de uma Europa extinta.  

 

Entrevistado 13: A professora Adriana tocava os ditados no piano, diversas vezes para que nós escrevêssemos. Eram melodias clássicas ou cantigas brasileiras, na imensa maioria das vezes desconhecidas para mim. Não sei de onde ela tirava as melodias, se ela usava algum livro ou não, pois ela nunca chegou a falar. Por minha conta, às vezes eu estudava ouvindo músicas que eu conhecia e tentando identificar os graus.  

 

3.3. A utilização da tecnologia no estudo da percepção musical  

Como exposto no capítulo anterior, para que as tecnologias sejam utilizadas de

maneira eficaz e correta, é necessário que as mesmas sejam apresentadas aos alunos e

que os mesmos sejam estimulados a utilizar. Um dos entrevistados afirma que nunca foi

apresentado a softwares, aplicativos e sites durante as aulas de Percepção Musical, mas

que descobriu posteriormente, e passou a utiliza-los para estudar ditados.  

Um aluno não se adaptou, um nunca utilizou mas acredita que seria lúdico, um

nunca utilizou mas acha importante e está desenvolvendo sua pesquisa de conclusão de

curso sobre o assunto, e cinco nunca utilizaram nem comentaram os motivos por não

recorrerem à essa ferramenta.  

Entre alunos que utilizam da tecnologia para o estudo da percepção musical (4),

os aplicativos, sites e softwares citados por eles são: Transcribe (para reduzir o

andamento de algumas músicas e entender com clareza as melodias), teoria.com,

Perfect Piano, Chordbot e Ear Trainging. Todos consideram uma boa forma de estudo

fora de sala, atendendo as dificuldades de cada um. Apenas um dos entrevistados disse

não se adaptar a um desses programas citados:  

 

Entrevistado 7: [utilizo o] site teoria.com e alguns aplicativos como perfect piano e chordbot. Acredito que estes podem ser utilizados como complementos, mas não substituem os exercícios realizados em sala de aula, a prática musical e a escuta dos diversos instrumentos musicais. Também acho que o aplicativo perfect piano me atrapalha em alguns momentos, como por exemplo, em um ditado, quando perco mais tempo tentando tocar a melodia no aplicativo ao invés de ouvir o ditado e escrever suas partes (tom, ritmo, melodia) separadamente.  

 

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3.4. Qual a avaliação dos alunos quanto às práticas utilizadas pelos professores de

Percepção Musical no IVL/UNIRIO  

A maioria dos alunos entrevistados reclamam da forma como as aulas de

Percepção Musical acontecem. Muitos reclamam da falta de musicalidades e ligação

com o repertório popular referente a cada aluno, outros reclamam do conservadorismo e

sistematização, ou até mesmo avaliam como “nada inovador”. Ainda assim, há alunos

que se adaptam e preferem esses métodos, como é o caso do entrevistado 13:  

 

[Tive aulas com] uma professora de métodos bem clássicos, em minha opinião. Ela sempre utilizou material musical advindo da tradição popular brasileira (na linha da Ermelinda Paz, acredito) ou de música clássica. Os ditados eram sempre feitos no piano e dificilmente recorríamos a outros instrumentos ou outros repertórios. Como eu entrei na faculdade bastante “crua” em termos de treino auditivo, foi importante para eu passar por essa etapa. [Ela] foi uma professora muito adequada para mim, inclusive do ponto de vista psicológico, pois muitas vezes me sentia constrangida ou inferiorizada por não ter a facilidade que alguns colegas tinham, e ela sempre me mostrou que o importante era progredir em relação a mim mesma, e nunca usar os colegas como parâmetro de competência e evolução.  

 

Já outros preferem propostas pedagógicas que lhes permitam estudar o que está

mais ligado às vivências e práticas musicais, e teve até quem desistiu da matéria por não

se adaptar à metodologia, tentando retomar com outro professor em outro período:  

 

Entrevistado 1: A aproximação do conteúdo ao meu cotidiano musical foi o mais eficaz no meu aprendizado! Quando o conteúdo não estava no meu contexto se tornava muito mais difícil compreender. Com a Cândida Borges, desde o primeiro semestre de PEM foi assim e a princípio os alunos não entenderam bem a proposta – pelo fato do costume daquela aula mais tradicional bem marcada de solfejo e ditado baseado na metodologia tradicional europeia ou mesmo nas músicas folclóricas que no meu ponto de vista hoje não fazem mais parte da música popular que pode permear a maioria dos alunos.  

 

Entrevistado 2: o primeiro período eu fiz com [um professor que], para mim foi impossível acompanhar e eu abandonei a matéria, achei que a aula era muito boa, mas eu não era bom o suficiente para acompanhar. Depois fiz os outros quatro períodos com [outra professora e não me adaptei ao método]. Isso até me criou um bloqueio, não tinha um dia que eu chegava lá querendo que a aula não acabasse logo, acho que era teórico demais, com pouca assimilação

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com o mundo lá fora. Acho que percepção na faculdade deveria ser reinventado, acho muito importante o estudo e o desenvolvimento do ouvido e da percepção, mas como professor iria por caminhos bem diferentes. Mas não posso dizer que não aprendi nada, realmente meu ouvido evoluiu muito nos anos de faculdade, mas acho que essa evolução se deve mais ao estudo fora da faculdade.  

 

Entrevistado 5: Nada muito inovador. Ou você acerta ou ta errado e isso é ruim, mais ou menos uma sensação assim. Sistema de notas não é muito legal, não concordo muito. Nem sistema de cobração de faltas. Se a pessoa estudar em casa, ela tem direito de tentar fazer a prova e passar pelos próprios métodos.  

 

Entrevistado 10: A primeira professora deu continuidade à forma que era ensinada percepção no TEPEM. Com os ditados e solfejos retirados dos livros. A segunda professora adotou o repertório dos alunos, sugeriu sites e aplicativos de percepção, pediu aos alunos para pesquisarem determinado assunto e apresentar à turma, explicando e dando exemplos com partituras e áudio. Era possível ouvir heavy metal, música erudita, jazz e MPB no mesmo curso, dependendo das práticas dos alunos.  

 

Entrevistado 12: Não sei se o problema é comigo, mas as práticas usadas pela maioria dos professores de percepção não é usual no meu cotidiano, não consegui, até hoje, torná-los parte integrante da minha prática musical, infelizmente!    

3.5. Como o aluno vê a forma de avaliação da Percepção Musical no IVL/

UNIRIO?  

Apesar de muitas críticas relacionadas à forma como as avaliações são aplicadas,

7 alunos acreditam que as avaliação são válidas, mas apenas um não possui oposição

alguma sobre as formas das avaliações. Os outros alunos podem até concordar que as

avaliações são válidas e estão de acordo com a proposta do professor, mas tem algum

argumento contra, ou para a complementação dessa avaliação.  

Os outros 6 alunos são completamente contra as formas de avaliações que foram

submetidos. Uns dizem não se aproximar com o ritmo das aulas, outros acreditam que

quando o aluno é exposto à uma avaliação que não é gradual, os aspectos externos como

nervosismo não são levados em consideração, o que pode gerar desconforto e até

mesmo prejudicar o resultado final da avaliação.  

Alguns citaram como proposta de avaliação aquela gradual, que mede o

desempenho do aluno a cada aula, a cada exercício executado, a cada trabalho realizado.

Mesmo que não seja possível trabalhar apenas com esse tipo de resultado, eles podem

ajudar a uma real indicação de avanço do aluno.  

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Selecionei algumas respostas que melhor exemplificam os exemplos dados:  

 

Entrevistado 1: Acredito que em todas as formas de avaliação sejam falhas. Penso que a avaliação a longo prazo é a mais interessante por não envolver aspectos como o nervosismo de um aluno durante uma prova! Os trabalhos também são importantes! Mas não acho que qualquer avaliação possa medir o conhecimento e habilidade de um músico. Isso no meu ponto de vista só é visto durante sua performance!  

 

Entrevistado 3: A avaliação não mede perfeitamente o conhecimento da matéria pois não consegue contemplar alguns aspectos extramusicais importantes, como o nervosismo gerado pela avaliação, estado anímico, etc.; mas acho que é um indicativo aproximado do progresso do aluno.  

 

Entrevistado 4: Não tenho oposição aos métodos de avaliação pelos quais eu fui submetido.  

 

Entrevistado 6: As avaliações eram feitas da forma tradicional, primeiro os ditados e depois prova oral individual ou em duplas com os solfejos e ritmos. Acredito que esse método de longe mede o meu conhecimento sobre percepção. Uma prova com ditados de melodias que quase nunca vemos no dia a dia, ritmos nem um pouco usuais e meia dúzia de acordes pra distinguirmos as funções, não pode medir o conhecimento efetivo de um aluno. A percepção auditiva vai muito além disso. Percepções de timbres, alturas e efeitos por exemplo, é fundamental em um trabalho de mixagem e masterização. Trabalho este muito comum entre os músicos de hoje. Porque não atualizar os alunos sobre a contemporaneidade deles próprios? Porque não trabalhar um conteúdo que eles vivem diariamente (as vezes sem perceber)?  

 

Entrevistado 9: [as avaliações] eram similares as aulas. [...] Considero que mediam sim nossos conhecimentos de percepção, pois só era capaz de realizar com certa destreza quem estivesse com os "sons" na cabeça e na minha concepção percepção musical é a capacidade de reconhecer o que está acontecendo na música através de um conhecimento prévio já armazenado em seu cérebro.  

 

Entrevistado 13: As avaliações eram feitas da seguinte forma: apresentação de solfejos estudados em casa (toda semana); prova escrita de ditados melódicos e harmônicos (3x por semestre). Acredito que essas provas mediam meu conhecimento da matéria, apesar de algumas vezes me sentir um pouco ansiosa ou preocupada com elas, o que pode ter prejudicado um pouco meu desempenho. Gostaria, no entanto, de que o desempenho em aulas também contasse na avaliação, pois o envolvimento do aluno, além da sua evolução em aula, é muito importante. A prova, no fundo, é uma situação artificial em que se mede o conhecimento do aluno de uma maneira estanque, pouco dinâmica.  

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3.6. Quais metodologias os novos professores de Percepção Musical estão

utilizando?  

Mesmo os alunos que não são do curso de Licenciatura em Música podem acabar

precisando exercer a função de professor alguma vez. Os que não são licenciados

acabam ficando apenas com o ensino de instrumentos, mas algumas vezes são

submetidos a dar aulas de Percepção Musical nas escolas que trabalham.  

A última questão da entrevista visou entender quais dos alunos já lecionam

percepção musical e qual o método adotado por cada um, se seguem os métodos

utilizados por seus professores ou não. Dos 13 entrevistados, 6 nunca deram aulas de

percepção, mas o entrevistado 10 afirma que se algum dia der aulas, utilizará a

metodologia desenvolvida pela sua professora do curso preparatório.  

Dos métodos apontados por aqueles que trabalham na área se destacam O Passo,

Dalcroze, Dó Móvel, Gazzi de Sá, Ottman e Gramani. Alguns ainda misturam os

diferentes métodos que foram submetidos e aprenderam durante a graduação, e outros

aplicam a Percepção Musical durante as aulas particulares de instrumentos.  

 

Entrevistado 1: Utilizo para ritmo “O Passo”. Para parte melódica utilizo dó móvel e muita coisa que aprendi quando estudei o Método Gazzi, com uso de partituras dos songbooks. Geralmente meus alunos estão vivendo no meio da música popular brasileira e busco uma aproximação do que eles já sabem com o que querem compreender! Na verdade vejo que todos nós vivemos imersos em muitas músicas e ao estudarmos percepção estamos decodificando e racionalizando aquilo que já conhecemos mas não sabemos nomear. Tento sempre partir do que o aluno já tem conhecimento para puxar assuntos e acrescentar ao conhecimento deles.  

 

Entrevistado 13: Sou professora particular de violão, e frequentemente trabalho teoria e percepção musical com meus alunos. Cada aluno tem uma demanda, um perfil e um objetivo diferentes, portanto não uso um método único. De maneira geral gosto de trabalhar percepção por graus da escala e usando músicas conhecidas do repertório do aluno, para familiarizá-lo e não assustá-lo. Muitas vezes alunos iniciantes têm medo da palavra “percepção” e se julgam incapazes, então meu objetivo é tirar o estudo de percepção do pedestal e trazer para perto da realidade do aluno. Como o instrumento é o violão, procuro sempre aliar os estudos de percepção com o instrumento, para que o conhecimento do aluno seja completo e global. Para crianças, gosto bastante do método “O equilibrista das seis cordas”, da Silvana Mariani, que não é exatamente um método de percepção, mas sim de violão, porém que aborda de maneira bastante musical e completa os primeiros passos no instrumento e na música.  

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CONSIDERAÇÕES FINAIS  

 

Durante a fase de pesquisa teórica desse trabalho, pude verificar que os meus

questionamentos sobre a forma como as aulas de Percepção Musical são aplicadas e

vistas por professores e alunos hoje em dia, vão ao encontro aos de outras pesquisas e

dissertações. É evidente que a cadeira de Percepção Musical é uma das mais

importantes dentro da graduação em Música, estando presente em todos os cursos

(bacharéis e licenciatura) e auxiliando tanto em outras matérias (harmonia, contraponto,

prática do instrumento etc.) quanto na vida profissional do músico.  

Ao longo do trabalho, foram citados alguns problemas expostos por pesquisas

anteriores e que fazem parte das aulas de percepção musical. Um dos mais comentados

e apontado em quase todas as pesquisas utilizadas é a heterogeneidade dentro das

turmas de Percepção Musical nas universidades. Um dos motivos apresentados por

professores entrevistados e até mesmo pelos pesquisadores é a falta de uma educação

musical de base entre os alunos. Pelas entrevistas podemos constatar que a maioria dos

alunos procura o estudo formal da percepção musical apenas quando decidem ingressar

na faculdade de música, e precisam se preparar para o THE. Dos 13 alunos

entrevistados, apenas 4 tiveram aulas de percepção antes mesmo de pensar em fazer o

vestibular de música, e, ainda assim, um parou durante muito tempo e só retomou os

estudos para a preparação ao THE, e o outro já tarde, com 17 anos.  

Com as aulas em formatos estruturados e bem estabelecidos com solfejo, ritmo e

ditado, o que os alunos precisam entender é que a prática musical diária é também uma

forma de estudo da nossa percepção. Um dos professores entrevistados por Cappelletti

(2011) acredita no desenvolvimento da percepção musical a partir da prática de cada

aluno. Pelas respostas de alguns entrevistados podemos ver que a forma como os alunos

veem essa prática está mudando, muito provavelmente por terem contato com métodos

que melhor se aproximam do seu dia a dia. Quando um dos alunos responde que a

forma como se estuda era também durante as aulas de canto coral, que se “forçava” a

fazer uma leitura a primeira vista, ele já incorporou que essa prática também auxilia em

sua evolução e estudos. O entrevistado 8 ainda diz que esse tipo de treinamento com

solfejo e ditado não compreende todo o universo que é a percepção, mas que ele mesmo

só foi entender isso depois de ingressar na faculdade.  

Dos diversos métodos utilizados em sala e citados pelos alunos entrevistados, o

Gramani é o mais utilizado nas aulas da UNIRIO como apoio para desenvolvimento do

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ritmo, porém a maioria dos professores opta não apenas por um método, mas por

escolher o que eles consideram melhor de métodos diferentes, e disponibilizam apenas

partes fragmentadas para os alunos. Com a lista de metodologias e métodos expostos no

trabalho, podemos ver que a falta de material publicado no Brasil, é um problema dentro

da percepção musical, mas ainda há a possibilidade de adaptações e utilização dos

estrangeiros para complementar o que temos de carência. Talvez o problema esteja na

falta de busca e renovação de cada professor.  

Inicialmente pensava que a falta de união entre as metodologias dos professores

da universidade fosse uma característica ruim, mas, ao concluir esse trabalho, vejo a

vantagem que graduandos têm ao poder optar pelos métodos e metodologias que mais

lhe agradam e melhor funcionam para eles. Alguns alunos são a favor das metodologias

que utilizam seus repertórios, alegando que isso os traz mais para a realidade de músico

prático e até mesmo professor, outros preferem os métodos tradicionais e julgam

importante passar também por esse tipo de treinamento. Portanto, ter diferentes

professores que disponibilizam essas diferentes formas de aula é favorável aos alunos,

para que eles possam escolher e até mesmo experimentar diferentes formas de se

estudar percepção musical.  

Num período em que a tecnologia está presente no dia a dia de todos, muito se

fala sobre as formas como se pode inserir as plataformas na educação. Internet, tablets,

smartphones, softwares, hoje já não são tecnologias ao alcance apenas daqueles que

possuem uma melhor condição financeira. Nos últimos anos, muitos aplicativos foram

desenvolvidos para auxiliar no ensino de línguas, matemática e até mesmo de música.

Sobre essas plataformas, Nevada (2006) comenta:  

 

As possibilidades hoje dispostas em plataformas amplamente acessíveis (tanto software quanto hardware) já representam passos consistentes tanto para o apoio em nossas atividades pedagógicas quanto para o estabelecimento de novas formas de lidar com a música, e com o que não seja música (NEVADA, 2006, p.71)  

 

Foram citados alguns aplicativos, sites e softwares utilizados pelos alunos para

auxiliar nos estudos da percepção musical. Alguns tiveram contato com essas

plataformas depois de apresentados pelos professores, e outros pela própria busca de

alternativas de estudo. Há ainda aqueles alunos que nunca utilizaram essas ferramentas

e os que não se adaptaram.  

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Sobre as avaliações dos alunos em relação às aulas que tiveram durante o curso

da UNIRIO, observa-se diferentes respostas e observações. Como já dito antes, há os

que gostam dos métodos mais conservadores, e por isso se adaptaram aos métodos

aplicados, mas também alguns alunos que estudaram pelos mesmos métodos, os

avaliam de forma negativa, tendo desistido do curso algumas vezes, e até mesmo

criando certo trauma com a disciplina. Há também os que foram submetidos à

metodologias mais contemporâneas e com repertório apresentado pelos próprios alunos,

auxiliados por pesquisas e até mesmo apresentações durante o curso. Sobre isso, não foi

registrado nenhum aluno que se opôs a ele.  

Sobre as avaliações realizadas durante o curso para verificar o conhecimento do

aluno dentro da matéria estudada no semestre, e entender se o mesmo é apto para a

mudança de nível, também encontramos diferentes respostas dos alunos entrevistados.

Há os que são a favor dos métodos tradicionais, e acreditam que a forma como são

aplicados avaliam sim seus conhecimentos de percepção musical, os que consideram

uma forma não eficaz, mas que condiz com o que era aplicado em aulas, e os que são

totalmente contra e por diferentes motivos. Ou por apresentarem melodias não

palpáveis, ou por acreditarem que as avaliações a longo prazo são mais válidas, ou até

mesmo por acharem falho as avaliações não levarem em consideração as aulas durante

todo o período, pois em dia específicos acabam não levando em consideração o que um

entrevistado chama de “aspectos extramusicais” como o nervosismo.  

Com o intuito de entender quais métodos os novos professores de Percepção

Musical estão utilizando, a última pergunta da entrevista mostrou que, dos alunos que já

são professores de percepção ou aplicam a percepção musical nas aulas de instrumento,

a maioria reproduz os métodos que melhor se adaptou. A resposta que mais me chamou

a atenção foi do entrevistado 13, quando diz mudar a metodologia conforme o perfil e

objetivos do aluno. Ele também utiliza o próprio instrumento (violão) para essa parte da

aula, não o abandonando e indo ao piano, como a maioria das aulas tradicionais de

percepção, com o professor tocando ao piano uma melodia e/ou harmonia, e os alunos

tendo que escrever corretamente na pauta o que foi executado (incluindo a parte

rítmica). Muitas vezes esses exercícios são extraídos de métodos, e não condizem com a

realidade musical do aluno (como é o caso dos alunos do entrevistado 13, que estudam

violão). Esse modelo de aula é o que estamos chamando de modelo tradicional para as

aulas de Percepção Musical. Almeida (2006) também vê dessa forma:  

 

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O que normalmente ou tradicionalmente acontece nessa disciplina, é que o professor executa, geralmente ao piano, melodias tonais e atonais a uma, duas, três ou quatro vozes, intervalos melódicos e/ou harmônicos, acordes isolados ou encadeados. Muitas vezes os ritmos e as alturas são separados, e em geral os ditados são fragmentados, interrompidos, sendo executados de compasso em compasso (ou de dois em dois compassos). Devem ser memorizados (e para isso são inúmeras vezes repetidos) e escritos pelos alunos com precisão; o erro remete a defeitos no âmbito da notação musical (ALMEIDA, 2006, p.3).  

 

Quando iniciei a pesquisa, meu intuito era entender o porquê alguns professores

ainda aplicam as formas tradicionais no ensino da percepção musical, pois para mim

não condiziam com a minha realidade nem de repertório, nem de experiência musical.

Ao analisar outras pesquisas, livros com métodos de percepção, e as respostas dos 13

entrevistados, pude perceber que estava equivocada ao pensar que essa forma de aula

não deveria mais ser trabalhada. Cada um possui uma vivência diferente dentro do

ensino e experiência musical, e isso deve ser levado em consideração em qualquer aula.  

Há alunos que tiveram suas formações de maneira mais erudita e conservadora,

e por isso se adaptam facilmente a esses métodos e avaliações. Há outros que, assim

como eu, tiveram suas formações mais abertas, nada eruditas e, com isso, precisam

trabalhar com métodos que tragam também essa vivência mais para perto de seus

estudos e realidade. Portanto, hoje vejo e considero os valores de todos os métodos

apresentados, e reforço a vantagem de se ter em uma universidade professores com

diferentes perfis, para que o aluno tenha autonomia de escolha com aquele que mais se

adapta.  

 

                               

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