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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO – UPE CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS - CFCH PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA POLÍTICA - PPGCP SOBRE OS POSTULADOS DA ANÁLISE INSTITUCIONAL: AS TEORIAS POSITIVAS DA ORGANIZAÇÃO LEGISLATIVA NA CIÊNCIA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA Emerson Oliveira do Nascimento RECIFE - PE 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO – UPE CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS - CFCH

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA POLÍTICA - PPGCP

SOBRE OS POSTULADOS DA ANÁLISE INSTITUCIONAL: AS TEORIAS POSITIVAS DA ORGANIZAÇÃO LEGISLATIVA NA

CIÊNCIA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA

Emerson Oliveira do Nascimento

RECIFE - PE 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO – UPE CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS – CFCH

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA POLÍTICA - PPGCP

SOBRE OS POSTULADOS DA ANÁLISE INSTITUCIONAL: AS TEORIAS POSITIVAS DA ORGANIZAÇÃO LEGISLATIVA NA

CIÊNCIA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA

Emerson Oliveira do Nascimento

RECIFE – PE 2007

Dissertação apresentada como requisito indispensável à obtenção do título de Mestre em Ciência Política pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), sob orientação do Prof. PhD. Flávio da Cunha Rezende.

Nascimento, Emerson Oliveira do Sobre os postulados da análise institucional: as teorias positivistas da Organização Legislativa na Ciência Política contemporânea. – Recife: O Autor, 2007. 163 folhas : il., gráf., tab., fig. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Pernambuco. CFCH. Ciência Política. Recife, 2007.

Inclui: bibliografia e anexos

1.Ciência Política – Instituições políticas. 2. Teoria da escolha racional. 3. Novo institucionalismo. 4. Modelos especiais. 5. Teorias positivistas – Organização Legislativa. I Título.

32 320

CDU (2. ed.) CDD (22. ed.)

UFPE BCFCH2007/81

3

4

DEDICATÓRIA

Para meus pais, Edson e Elione, pelos estímulos de toda uma vida.

5

AGRADECIMENTOS

Durante a elaboração desta dissertação contei com vários tipos de apoio,

sem os quais a tarefa seria bem árdua e praticamente impossível de se consumar.

Gostaria de prestar meus agradecimentos, em primeiro lugar e de maneira

bastante especial, ao professor Flávio da Cunha Rezende, orientador atento e

cuidadoso, a quem devo não só meu ingresso no campo dos estudos institucionais e

a apresentação das teorias positivas da organização congressional, mas também

meu reconhecimento explícito por grandes parcelas de sua contribuição sobre

minha formação acadêmica.

Devo mencionar aqui também dois outros professores que acompanharam

ainda a gestação deste trabalho, quando o mesmo era ainda um projeto e puderam

contribuir com insights muito interessantes que, acredito, só vieram a enriquecer a

pesquisa – Ernani Carvalho (UFPE) e Cátia Lubambo (FUNDAJ). Não poderia deixar

de mencionar ainda o nome de algumas pessoas especiais com as quais, nos

últimos, anos pude não só partilhar literaturas e seminários na pós-graduação, mas

principalmente, pude usufruir da oportunidade de discutir com eles meu trabalho e

desfrutar de suas críticas e sugestões. Falo dos amigos que fiz durante o mestrado:

Rodrigo Albuquerque, Priscila Maria Lapa, Júlio César Gaudêncio, Fábio Machado,

Manoel Leonardo Santos e Juliana Salazar.

Não poderia deixar de agradecer também aqui ainda aos incentivos

institucionais sobre esta pesquisa na pessoa do professor Enivaldo Rocha

(Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFPE) e ao

CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) que me

concedeu junto a UFPE uma bolsa de pesquisa durante os anos de 2006 e 2007.

6

Devo registrar novamente um agradecimento especial aos meus pais, seja

pelo conforto do carinho e pelo estímulo nas horas mais duras desse processo de

produção, seja pelo modo sempre generoso e compreensivo com me apoiaram

desde os tempos mais remotos de minha formação humanística.

Todavia, desnecessário se torna dizer que somente a mim cabe a

responsabilidade por eventuais erros e omissões.

Emerson O. do Nascimento

7

“(...) nenhuma observação real, de qualquer tipo de fenômeno, é possível a menos que seja de início dirigida e por fim interpretada por alguma teoria.”

(A. Comte. System of Positive Philosophy. Paris: Bachelier, 1830-1842: 242)

8

SUMÁRIO

RESUMO 10 ABSTRACT 11 LISTA DE TABELAS E ILUSTRAÇÕES 12 APRESENTAÇÃO 13 Os Postulados da Análise Institucional 18 Instituição: Entre a Ação e a Estrutura 21 Os Modelos Espaciais da Escolha Legislativa 24 O Problema de Investigação 29 O Arranjo Expositivo da Pesquisa 31 CAPÍTULO 1 OS NOVOS INSTITUCIONALISMOS NA CIÊNCIA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA E O PROBLEMA DA INTEGRAÇÃO TEÓRICA 33

Sobre o Conceito de Instituição 38 Sobre Instituições e Ação Social 41 Sobre a Mudança Institucional 46 Questões Metodológicas e Epistemológicas 49 Sobre os Vários Institucionalismos e o Problema da Integração Teórica 51 CAPÍTULO 2 PRINCIPAIS, PREFERÊNCIAS E DIMENSIONALIDADE: A LÓGICA ANALÍTICA DA DELEGAÇÃO 60 A Estrutura da Delegação de Poderes 62 Por que Delegar Poderes? 65 Delegação e Organização do Congresso 66 A Delegação para as Comissões 67 A Delegação para o Executivo 68 A Delegação para a Burocracia 69 A Ação Coletiva e os Limites da Delegação 70 Ação e Informação Ocultas 73 Dilema Madsoniano 74 Como Evitar que a Delegação Degenere em Abdicação? 74 Desenho do Contrato 74 Mecanismos de Seleção 75 Monitoramento e Exigência de Relatórios 76 Controles Institucionais 79 CAPÍTULO 3 AS TEORIAS POSITIVAS DA ORGANIZAÇÃO LEGISLATIVA EM PERSPECTIVA COMPARADA 81 Demand Side: Alocação de Recursos e Racionalidade Distributiva 84 Supply Side: Especialização e Racionalidade Informacional 90

9

Supply Side: Tradição Partidária e Racionalidade Cooperativa 95 CAPÍTULO 4 O BALANÇO DA PRODUÇÃO NORTE-AMERICANA RECENTE SOBRE AS INSTITUIÇÕES LEGISLATIVAS 103 Os Estudos Legislativos Enquanto Campo Experimental 103 Os Passos da Pesquisa 106 Agrupando os Trabalhos Analisados 108 O Jogo de Combinações Teóricas Possíveis e Alguns Exemplos Concretos Revisitados 108 Caso 1: O Problema da Assimetria Informacional e as Regras Legislativas 111 Caso 2: A Relação entre o Pivotal Politics e o Partisan Politics 114 Caso 3: A Relação entre a Autoridade do Executivo, Voto Personalista e Disciplina Orçamentária 116 Caso 4: O Problema dos Lobbies e dos Subsídios Legislativos 118 Limites da Explicação Institucional ou Como e Porque as Instituições Devem Importar? 120 CONCLUSÃO 125 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 136 ANEXOS Anexos I: Levantamento da Literatura (2002-2006) 146 Anexos II: Modelo de Ficha de Leitura 151 Anexos III: Quadro de Classificação dos Artigos Analisados 152

10

RESUMO

SOBRE OS POSTULADOS DA ANÁLISE INSTITUCIONAL: AS TEORIAS POSITIVAS DA ORGANIZAÇÃO LEGISLATIVA

NA CIÊNCIA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA

O novo paradigma institucional afasta-se tanto das explicações deterministas, como dos modelos behavioristas, para fixar-se no estudo das mediações entre as estruturas sociais e os comportamentos individuais, digo as instituições. Uma investigação mais cuidadosa deste paradigma revela que, embora possamos isolar um compromisso específico com aplicações conceituais e metodológicas padronizadas, o novo institucionalismo está longe de representar uma escola unificada. É nesse sentido que podemos falar em três novos institucionalismos: o sociológico, o histórico e o da escolha racional. Este último, particularmente influenciado pelo estudo das instituições congressionais norte-americanas, produziu nas últimas décadas um alto grau de perícia teórica e metodológica que desembocou em três teorias fundamentais: distributiva, informacional e partidária. O presente estudo tem por finalidade apresentar o terreno comum de onde partiram estas teorias, sintetizando suas respectivas contribuições e enfatizando o modo como elas constroem a relação entre as instituições políticas e os atores individuais para finalmente – a partir de um survey da produção recente sobre as instituições legislativas norte-americanas –, pensar as possibilidades de combinação e confluência entre elas.

PALAVRAS-CHAVES

Novo Institucionalismo; Teoria da Escolha Racional; Modelos Espaciais; Teorias Positivas da Organização Legislativa.

11

ABSTRACT

ON THE POSTULATES OF THE INSTITUTIONAL ANALISYS: THE POSITIVE OF THEORIES OF THE LEGISLATIVE ORGANIZATION IN THE

CONTEMPORARY POLITICAL SCIENCE

The new institutional paradigm deviates as much of the determinists explications as of the behaviorists models for establishes in the study of the mediations between the social structure and the behaviors individuals in such case, the institutions. Investigations more careful from this paradigm reveal that however might to isolate some applications conceptual and methodological standardizes, it’s distant to represent a school united. This sense we might to speak in three new institutionalisms: the sociological, the historical and of the rational choice. This latter peculiarly influenced by scholarship of the American congressional institutions produced in the finishing decades an elevated degree of theoretical and methodological ability that discharged in three fundamental theories: distributive, informational and partisan. The present study have per purpose to present the common soil wherein breaks up these theories, summary its respective contributions and emphasizing by what means its builds the relations between the political institutions and the individual actors for finally – breaks up of the a survey from recent production on American legislative institutions – to think the possibilities of the combination and confluence between this theories.

WORDS-KEYS New Institutionalism; Theory of Rational Choice; Spatial Models; Positive Theories

of Legislative Organization.

12

LISTA DE TABELAS E ILUSTRAÇÕES

TABELA 1 – Premissas e Características Fundacionais dos Modelos Espaciais da Escolha Legislativa 26 TABELA 2 – Quadro Comparativo dos Paradigmas da Organização Legislativa 34 TABELA 3 – Enfoque Analítico dos Institucionalismos 51 TABELA 4 – Quadro de Classificação das Teorias 83 TABELA 5 – Freqüência da Publicação dos Artigos por Ano 107 TABELA 6 – Número de Artigos Encontrados por Periódico Analisado 107 TABELA 7 – Relação dos Artigos Encontrados para o Caso de Modelos Puristas 108 TABELA 8 – Relação dos Artigos Encontrados para o Caso de Modelos Híbridos 109 TABELA 9 – Disposição dos Artigos Encontrados Segundo os Grupos de Análise 110 TABELA 10 – Disposição das Variáveis Explicativas dos Artigos Analisados 110 TABELA 11 – O argumento central das Teorias Positivas da Organização Legislativa 127 FIGURA 1 – Mapeando as Tradições Teóricas da Organização Legislativa 57 FIGURA 2 – O Problema da Combinação Teórica 105

13

APRESENTAÇÃO

Antes de falar qualquer coisa sobre os paradigmas da organização

legislativa, convém falar antes o que entendo aqui por paradigma. O conceito de

paradigma que adoto é o mesmo elaborado por Kuhn (1998): (...) paradigmas

seriam realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante, algum

tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de

praticantes de uma ciência1.

Cada paradigma vê e interpreta o mundo a partir de diferentes ontologias e

epistemologias. É neste sentido que podemos afirmar que cada paradigma abriga

uma concepção própria de mundo, com problematizações, métodos e

procedimentos próprios.

Pontuamos os excessos de uma conceituação tão generalista, adiciono a

esta idéia a estrutura funcional de um programa de pesquisa, tal como descrito por

Lakatos (1974): [pode-se compreender um programa de pesquisa enquanto] uma

estrutura que fornece orientação para pesquisas futuras a partir de um núcleo

irredutível que assume a forma de uma hipótese teórica muito geral, tornada

infalsificável por decisão metodológica dos cientistas. Estes conceitos serão úteis

para compreender operacionalmente algumas tradições2.

Por conseguinte, trilhando o argumento lakatosiano, quem quer que venha

tentar descrever ou analisar a evolução de uma tradição teórica deve procurar,

antes de qualquer coisa, as regras e os princípios comumente aceitos pela

comunidade de cientistas.

Pelo menos três tradições principais no interior das ciências políticas,

reivindicam para si a melhor explicação ou a melhor solução possível para o

problema da agregação das preferências individuais dentro da organização

legislativa, estamos falando do determinismo social, do behaviorismo e do novo

1 Para uma maior discussão sobre o significado de paradigmas científicos e seus usos pela ciência moderna Cf. Thomas Kuhn. 1998. A Estrutura das Revoluções Científicas. São Paulo: Editora Perspectiva; idem. 1959. The Copernican Revolution. New York: Random House; idem. 1969. Second Thoughts on Paradigms. The Strucuture of Scientific Theories, ed. F. Suppe. Urbana: University of Illinois Press, 1973, pp. 459-82; A. F. Chalmers. 2000 [1976]. O que é ciência, afinal? São Paulo: Editora Brasiliense. 2 Sobre a definição lakatosiana para programa de pesquisa Cf. Imre Lakatos, 1974. Criticism and the Growth of Knowledge. Cambridge: Cambridge University Press; idem. Proofs and Refutations. British Journal for the Philosophy of Science 14 (1963-64): 1-25, 120-39, 221-43, 296-342.

14

institucionalismo3. Ao seu modo, cada um destes paradigmas explica os fenômenos

políticos, ora a partir das micro-fundações do comportamento individual, ora a

partir de variáveis estruturais ou macro-sociais. Com exceção das situações de

coerção total (se é que elas existem), todo fenômeno social abriga algum grau,

maior ou menor, de liberdade individual reproduzido pelas situações de escolha dos

indivíduos. Em se tratando das instituições políticas, essas noções de escolha

tornam-se ainda mais caras ao cientista político. É desse ângulo que examinaremos

cada um desses paradigmas.

Para o determinismo social, instituições e comportamentos individuais são

explicados a partir do conceito de função latente, típico do funcionalismo

mertoniano, o qual tem muito pouco a nos dizer, seja sobre o funcionamento

propriamente dito das instituições, seja sobre a estruturação do sistema de

preferências dos atores e suas opções4. Em geral, as instituições são tomadas aqui

como uma variante pouco vantajosa para explicação. De maneira análoga, há

também pouco espaço para atores individuais, os quais são sucumbidos, assim

como as instituições, dentro de explicações de natureza teleológica ou funcionalista,

onde os processos são entendidos a partir de uma finalidade sem sujeitos

intencionais5.

É típico dos paradigmas deterministas relacionarem a explicação dos

fenômenos políticos e sociais a elementos anteriores ao próprio fenômeno, através

de modelos do tipo estímulo-resposta ou causa-ação onde A (anterior a B) causa

3 Para uma análise sumária e pontual dos principais paradigmas da organização legislativa nas últimas décadas Cf. Kenneth A. Shepsle and Barry R. Weingast.1994. Positive Theories of Congressional Institutions. Legislative Studies Quartely, XIX, pp. 149-179. Para uma boa interpretação ainda sobre os postulados teóricos e metodológicos da análise behavioral e neo-institucional Cf. George C. Homans. 1999. Behaviorismo e pós-behaviorismo. In: Anthonny Giddens e Jonathan Turner. 1999. Teoria Social Hoje. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, pp. 91-126; Ellen Immergut. 1998. The Theoretical Core of the New Institutionalism. Politics and Society, vol. 26, março, pp. 5-34. 4 Embora sejam já bem conhecidos os limites que a idéia de função traz ao campo das ciências sociais, tais limites tornam-se ainda mais evidentes quando sugerem que a esfera legislativa pode ser compreendida como um mundo onde as preferências dos atores são consideradas como dadas e inteligíveis e a interação ocorre sob um cenário estável e contratual, digo, um mundo em que os atos dos agentes sociais são tomados evidências do comportamento e podem ser explicados a partir dos elementos anteriores a esses atos (exigências estruturais, processos de socialização, etc.). Para uma maior discussão sobre o funcionalismo nas estruturas sociais Cf. Robert Merton. 1968 [1949]. Social Theory and Social Theory. New York: Free Press. Para uma discussão sobre os limites do paradigma funcional nas ciências políticas e sociais Cf. Raymond Boudon (1979). Efeitos Perversos e Ordem Social. São Paulo: Zahar Editores; Anthony Giddens (1997). Política, Sociologia e Teoria Social Hoje. Encontros com o Pensamento Social Clássico e Contemporâneo. São Paulo: Unesp. 5 Sobre a crítica aos pressupostos das explicações de tipo teleológicas Cf. Jon Elster. 1989. Marxismo, Funcionalismo e teoria dos Jogos. Lua Nova, n. 17, junho (89).

15

B6. Dessa maneira, instituições são associadas aqui à mera reprodução de variáveis

previamente determinadas, tais como status ou classe social. De maneira afim,

preferências individuais são tomadas como objetivas e equivalentes aos interesses

sociais ou do grupo. O modelo despreza, portanto, qualquer tentativa de explicar a

formação das preferências individuais, assim como o problema da sua agregação.

De pronto, o conceito de democracia que emerge daí é essencialista, apoiada sobre

a idéia de solidariedade social, como o fim da exploração de classe, tão almejado

pelo marxismo7.

De maneira oposta aos modelos deterministas, o paradigma behaviorista

acredita que as instituições importam e não podem ser desprezadas na análise

política. Por conseguinte, consideram que as instituições podem ser explicadas

mediante a análise do comportamento individual agregado. É neste sentido que,

para o behaviorismo, instituições políticas são compreendidas como o resultado da

composição das preferências individuais. A propósito, instituições existiriam, tão

somente, para acomodar preferências individuais, já que a heterogeneidade de

preferências não representaria nenhum problema maior para sua acomodação.

Para o behaviorismo, a organização legislativa poderia ser explicada, tão

somente, a partir do comportamento observável e observado dos legisladores. Fica

evidente desde então, o compromisso epistemológico e metodológico desta tradição

com o empirismo e a lógica indutiva. Num plano prático, o behaviorismo apoiar-se-

ia no tripé: observação, generalização e dedução. Ou seja, a partir de um número

razoável de observações, estes teóricos acreditavam ser possível generalizar

afirmações que formassem uma base consistente para predições futuras. Isto só

seria possível porque, segundo o behaviorismo, o comportamento, por si, revelaria

as preferências dos indivíduos, já que as verdadeiras preferências, estas, nunca

poderiam ser determinadas. Para qualquer fim, eles partiam do pressuposto de que

as preferências expressadas são as verdadeiras preferências de qualquer indivíduo.

6 Cf. Raymond Boudon. 1979. Efeitos Perversos... citado. 7 A tradição sociológica que remete a centralidade do conflito na vida social concentra-se nas estruturas grandes, digo, macrossociais, tais como as relações de classe, os padrões de dominação que mostrariam como a desigualdade dentro da sociedade se produziria e reproduziria. Marx, por exemplo, acreditava que em última instância, os trabalhadores tornar-se-iam conscientes que pertenciam por antecipação (ex ante) a uma mesma classe de explorados e em algum momento na história procurariam pôr fim à propriedade privada (o pecado inicial da sociedade) e substituindo-a por um sistema onde propriedade e riqueza seriam divididas: o comunismo. Cf. Karl Marx. 2000. Para a Crítica da Economia Política do Capital. In: Karl Marx: Os Pensadores. São Paulo: Editora Nova Cultural Ltda.

16

A maior limitação do behaviorismo compreende os limites do uso

epistemológico e metodológico do indutivismo. Ainda que apoiado sobre premissas

observáveis, o indutivismo pode levar a conclusões falsas, já que nada pode

garantir que, quanto mais freqüentes forem as observações, maiores serão as

probabilidades de que as generalizações sejam verdadeiras8. Além do que, não há

critérios racionais que determinem a porção exata de vezes que devemos observar

como os representantes votam o orçamento legislativo, por exemplo, para que

possamos, finalmente, generalizar afirmações singulares e elaborar predições

seguras sobre suas preferências. Na verdade, não há, necessariamente, nenhuma

relação análoga entre as preferências potenciais e aquelas expressas no

comportamento político, pois se assim o fosse, teríamos que tomar os bens

públicos como o produto final da agregação perfeita de todas as preferências

individuais, e não, o resultado de embates institucionais entre os atores e entre os

atores e as regras.

Tomando para si três axiomas, os quais julga irrefutáveis em sentido

lakatosiano, o novo paradigma institucional executa um salto qualitativo em relação

aos demais, sobretudo no que diz respeito à compreensão da relação entre as

instituições e o comportamento individual. Assim, o novo institucionalismo, ao

contrário do behaviorismo, acredita que as preferências expressas nem sempre

revelam as preferências reais, da mesma maneira, reconhece que a agregação de

preferências é sempre problemática e, finalmente, compreende que instituições

podem privilegiar grupos particulares em detrimento dos demais. Instituições são

compreendidas pela nova análise institucional, portanto, não como um produto

residual de estruturas sociais ou o resultado de uma combinação de preferências,

mas sim como mecanismos fixados para a resolução de problemas de ação coletiva.

Isso acontece porque, para o novo institucionalismo, acredita-se ser perfeitamente

8 De acordo com a probabilidade lógica do indutivismo, uma hipótese pode ser considerada provável, caso ela seja elemento de uma seqüência de ocorrências e apresente certa probabilidade de se manifestar, ou seja, apresente uma definida freqüência-verdade. Popper considera que esta tentativa indutivista é falha, pois não poderíamos falar de uma freqüência-verdade, simplesmente porque jamais podemos saber se uma hipótese é verdadeira. Se pudéssemos sabê-lo, pouca necessidade teríamos do conceito de probabilidade de uma hipótese. Todavia, se tentamos definir a probabilidade de uma hipótese recorrendo ao quociente da divisão do número de hipóteses não falseadas pelo número de hipóteses falseadas, também, para o autor, não avançamos muito, pois a probabilidade de toda hipótese, em toda seqüência-referência infinita, será sempre igual a um. Assim, Popper afirma que estão esgotadas todas as possibilidades de fundamentar o conceito de probabilidade de uma hipótese no da freqüência da probabilidade de eventos, ou seja, jamais a probabilidade de uma hipótese poderá ser reduzida à probabilidade de um evento. Cf. Karl Popper. 2003 [1968]. A Lógica da Pesquisa Científica. São Paulo: Editora Brasiliense.

17

possível conhecermos as preferências potenciais do sujeito, ainda que a relação

entre preferências potenciais e preferências reveladas seja quase sempre

intransitiva.

No que compreende ainda à metodologia empregada, o novo paradigma

institucional rejeita o comportamento observado enquanto referência única para a

análise das instituições e acredita que comportamentos ocorrem somente sob

situações de restrição, e só podem ser compreendidos assim. Consequentemente

pode-se afirmar que o novo institucionalismo está interessado em pintar uma

imagem mais totalizante da relação entre as esferas macro e micro. Para isso,

tenta superar o simplismo com que os demais paradigmas trataram as instituições

políticas, ora tomando-as como uma variante determinante dos comportamentos

individuais, ora apresentando-as como um resultado da agregação de preferências,

tal como numa espécie de transposição perfeita das partes para o todo, do micro

para o macro.

No entanto, ainda que coerente a um conjunto de ilustrações e aplicações

conceituais e instrumentais aceitas consensualmente, o novo institucionalismo está

longe de representar um todo unificado. Alguns trabalhos pioneiros, tentando dar

ordem ao caos teórico das últimas décadas, apontam para a existência de pelo

menos três vertentes diferentes reivindicando para si a designação do título neo-

institucional: a sociológica, a histórica e a da escolha racional9. Todavia, embora

possamos identificar com relativa facilidade o núcleo comum dos problemas

trazidos por este paradigma – o papel desempenhado pelas instituições na

determinação de resultados sociais e políticos. O compartilhamento de princípios e

técnicas pela nova tradição institucional não excluiu a possibilidade de subdivisão

dentro do mesmo paradigma. O que também não impediu que teorias pudessem

discordar a respeito das possíveis soluções para o mesmo problema. Em virtude

disso, é perfeitamente plausível afirmarmos que os diferentes institucionalismo

identificam-se a um mesmo paradigma, mas não entram em acordo quanto a sua

interpretação ou racionalização.

9 Sobre as várias vertentes do novo institucionalismo Cf. Peter Hall e Rosemary C. Taylor. 2003. As Três Versões do Neo-Institucionalismo. Lua Nova, n. 58, pp. 193-223; Ellen Immergut. 1998. The Theoretical Core of the New Institutionalism. Politics and Society, vol. 26, março, pp. 5-34; Bruno Théret. 2003. As Instituições entre as Estruturas e as Ações. Lua Nova, n. 58, pp. 193-223.

18

A falta de uma interpretação padronizada ou de uma redução às regras que

goze de uma unanimidade, no entanto, não impede que um paradigma oriente

futuras pesquisas. Na verdade, a existência de um paradigma, segundo Kuhn, nem

mesmo precisa implicar a existência de qualquer conjunto completo de regras.

Como era de se esperar, os institucionalismos tomam por base matrizes teóricas

diferentes e consequentemente, suscitam imagens não menos diferentes do mundo

político, visto que, pensam de diferentes formas o conceito de instituição, o

comportamento dos atores individuais e sua causalidade, a natureza e a gênese das

instituições, assim como o jogo de interação entre as instituições e os atores

individuais. Não entrarei no mérito de comparar as peculiaridades ou similaridades

de cada uma destas escolas, já que não é esse meu nosso propósito aqui, contudo

dedicarei atenção especial ao novo institucionalismo da escolha racional que traz

implicações diretas às minhas investigações.

OS POSTULADOS DA ANÁLISE INSTITUCIONAL

Qualquer relação política, em certa medida, refere-se à capacidade de atingir

objetivos frente a uma oposição. Neste sentido, nos referimos à capacidade de um

determinado ator A agir e controlar as ações de um outro ator B. A capacidade de A

depende não só de seus esforços pessoais, mas também, e principalmente, dos

recursos que dispõe10. Estes recursos podem ser dos mais variados tipos, desde o

acesso diferenciado a recursos financeiros, como vantagens de ordem

constitucional ou eleitoral, por exemplo. O impacto da observação dessas operações

por vários autores ao longo do século XX (Schumpeter, 1961 [1942]; Arrow, 1951;

Downs, 1999 [1957]; Olson, 1999 [1965] e Dahl, 2005 [1971]) nos mostrou que

aquilo que balizava todo o pensamento político clássico, e parecia a característica

mais óbvia dos regimes democráticos – a idéia de maioria, assim como, o ideal de

bem comum –, não são tão óbvios assim, não passando, talvez, de expressões

vazias, pouco úteis para explicar o funcionamento dos regimes democráticos. Ou

seja, entre A e B haveria mais do que preferências ou ideais normativos, haveria

instituições, que coordenariam os elementos determinantes das decisões de

governo: as regras do jogo.

10 R. Dahl. 1989. Um Prefácio à Teoria Democrática. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.

19

Embora relutemos hoje em classificar o elitismo competitivo schumpeteriano

como democrático, e poucos cientistas políticos e sociais aceitem aderir à teoria

poliárquica sem modificações; não podemos negar que ambas as tradições tiveram

uma influência penetrante para a análise institucional em ciência política11. Depois

de Schumpeter e Dahl, quase todos os teóricos empíricos da democracia defendem

uma interpretação desta como um conjunto de regras artificiais – estruturas

institucionais – que criam uma rica trama de políticas de interesses grupais e

permitem a competição para influenciar e selecionar líderes políticos12. Tal definição

de democracia acabou por lançar luzes e dúvidas sobre o funcionamento dos

regimes ditos democráticos e sobre as decisões coletivas, antes, aceitas como

transmutações puras e simples das preferências individuais, hoje, um problema

novo e de primeira grandeza para as ciências políticas e sociais.

Como se dá a agregação política de interesses? Em que condições um grupo

latente13 é capaz de empreender uma ação visando promover o interesse comum

de seus membros? Por meio de que processos um grupo latente pode transformar-

se em um grupo semi-organizado ou organizado (grupo latente representado por

organizações) dotados de mecanismos de decisão coletiva? São algumas das

principais questões que ocupam a agenda contemporânea dos analistas14.

Primeiro a abordar o problema da agregação de preferências de um prisma

menos filosófico e mais positivo foi, Kenneth Arrow (1951). Ele submeteu a crítica

schumpeteriana à idéia de bem comum aos limites do empirismo, e mostrou que o

paradoxo de Condorcet15 é um problema para qualquer método razoável de

agregação individual de preferências dentro de um grupo. Ele afirmou ainda que

não existe nenhum mecanismo para a tradução das preferências de indivíduos

11 Para uma análise dos pressupostos e limites do elitismo schumeperiano Cf. David Held. 1993. Modelos de Democracia. São Paulo: Editora Paidéia, pp. 131-167. 12 Cf. J. Schumpeter. Capitalismo, Socialismo e Democracia. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura Econômica, p. 297; Robert Dahl. 1989. Um Prefácio à... citado, p. 175. 13 Por grupo latente entendam-se aqui grupos de indivíduos com interesses comuns. Cf. Raymond Boudon e François Bourricaud. 1993. Dicionário Crítico de Sociologia. São Paulo: Ática (verbetes: Ação, Causalidade). 14 Para uma análise da agenda dos problemas relacionados à ação coletiva Cf. William Outhwaite e Tom Bottomore. 1996. Dicionário do Pensamento Social do Século XXI. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. (verbetes Ação e mediação, Explicação, Causalidade); Robert J. Brym (et. alli.). 2006. Sociologia – Sua Bússola para um Novo Mundo. São Paulo: Thomson Learning, pp. 498-521. 15 As escolhas de indivíduos racionais não traduzem necessariamente o voto da maioria dentro de um grupo de preferências bem definido. Cf. Condorcet. 1986 [1785]. Essai sur l’application de l’analyse le probabilité des decisions rendues à la pluralité des vost’. In: Olivier de Bernon, (ed.). Sur lês élections et autres textes. Paris: Fayard.

20

racionais dentro de um grupo coerente de preferências que satisfaça as condições

por ele previamente estabelecidas16.

A partir do dito Teorema da Impossibilidade de Kenneth J. Arrow, podemos

concluir que atribuir características individuais de intencionalidade ou racionalidade

a grupos é por natureza, um oxímoro – indivíduos são racionais, grupos não.

Contudo, será com Anthony Downs (1957), que a análise institucional se firmará

mais fortemente na moderna ciência política. Utilizando-se de paradigmas da

microeconomia e da Teoria da Escolha Racional (TER), Downs ilumina a explicação

da democracia e dos processos políticos específicos que nela se dão, analisando o

processo político eleitoral em termos análogos aos que eram utilizados, até então,

para avaliar o jogo do mercado na ciência econômica, salientando o cálculo racional

realizado por partidos e eleitores sob várias circunstâncias decisórias17.

Mas será com Mancur Olson (1965), que o problema da agregação de

preferências voltará ainda com mais força. Olson emprega o dilema do prisioneiro

para analisar a natureza da ação coletiva, e conclui que os indivíduos só cooperarão

em direção à ação coletiva se os interesses e benefícios coletivos forem maiores do

que os interesses e benefícios não-coletivos18. É nesse ínterim que Olson elabora

16 (i) Admissibilidade universal, todos os indivíduos podem ordenar e escolher preferências; (ii) Pareto Ótimo ou Unanimidade. Se todos os membros do grupo preferem j a k (ou é indiferente entre eles), então o grupo deve refletir uma preferência para j sobre k (ou uma indiferença entre eles); (iii) independência de alternativas irrelevantes. Se todo o grupo mantém uma relação de afinidade que não varia, diga-se, ninguém prefere as alternativas j e k, então alternativas irrelevantes (j e k), devem ser desprezadas; (iv) não-ditadura, não há nenhum indivíduo distinto e que pertença ao grupo, que possa ditar preferências ao grupo, independente dos outros membros. Cf. Kenneth Arrow. 1951. Social Choice and Individual Values. New York: John Wiley & Sons. 17 O modelo analítico proposto por Downs baseia-se no pressuposto de que todo governo procura maximizar o apoio político, e que este governo existe numa sociedade democrática em que se fazem eleições periódicas, sendo o principal objetivo dos partidos já alijados no poder – a reeleição. A cada eleição um partido recebe o maior número de votos (embora não necessariamente a maioria), o que lhe garante o controle do governo até às próximas eleições, sem quaisquer votações intermediárias, seja pelo povo como um todo, seja pelo parlamento. O partido governante, então, tem liberdade ilimitada de ação, dentro dos limites da constituição. Segundo Downs, embora estes governos não enfrentem limites econômicos ao seu poder, o mesmo não se pode dizer acerca de alguns limites políticos. Por exemplo, o partido governante não pode impedir as operações de outros partidos na sociedade. Não pode restringir sua liberdade de expressão, sua capacidade de empreender campanhas, nem alterar o pleito eleitoral ou mesmo cercear a liberdade de qualquer cidadão de falar abertamente contra qualquer partido. Tal modelo, não preenche os detalhes das relações no interior de um Estado, é verdade, mas atribui um objetivo ao governo (a reeleição), a partir do qual podemos produzir uma regra satisfatória para o comportamento dos governos – a maximização de seus objetivos. E assim, levando em conta os problemas da ação coletiva, elaborar um modelo com razoável poder para prognosticar o comportamento político racional, tanto de governos, como de cidadãos num plano micro, e sua transmutação para um plano coletivo ou agregado. Cf. Anthony Downs. 1999 [1957]. Uma Teoria Econômica da Democracia. São Paulo: Edusp. 18 Mancur Olson. 1971. [1965]. The Logic of Collective Action. London: Harvard University Press, pp. 56-57.

21

ainda o conceito do “carona” (free rider), ou seja, os indivíduos querem sempre

colher as benesses da ação coletiva ao menor custo possível. Nesse sentido, o autor

denuncia que a existência de interesses comuns, ou a consciência desses interesses

são condições necessárias, mas não suficientes para a ação coletiva, seria preciso

que outras condições fossem satisfeitas19.

A formulação do paradoxo da articulação entre os planos individual e

agregado, mostrou que a ação racional dos atores individuais no plano micro (ou

atores coletivos em escala menor), às vezes, pode resultar em irracionalidade num

plano macro, com a frustração dos objetivos e interesses de todos os envolvidos.

Cabe notar, portanto, que não há nenhuma relação que converta perfeitamente as

preferências do plano individual para um nível agregado, ou seja, não existe

nenhuma correspondência natural entre os desígnios dos atores isoladamente e os

resultados da agregação de preferências. É, portanto, sobre esse longo caminho

que permeia e a relação entre as ações individuais e as suas conseqüências

coletivas, que tratarei agora: a mediação entre a ação racional e as estruturas

institucionais, a qual é profundamente importante para os resultados que emergem

dos processos políticos e para os problemas de que se ocupam as páginas

seguintes20.

INSTITUIÇÕES: ENTRE A AÇÃO E A ESTRUTURA

Segundo Jon Elster (2000), não basta conhecer as causas dos fenômenos, é

preciso entender como as causas operam e se organizam de maneira a produzir

determinados efeitos21. É neste sentido que o autor sugere que existem duas

formas principais de explicar as ações humanas que são as causas dos fenômenos

sociais: as normas sociais e a escolha racional. A primeira, de abordagem

sociológica, privilegia o comportamento social padronizado e os processos de

19 A consecução da ação coletiva deve acompanhar a satisfação de algumas condições, a saber: (i) que o grupo seja restrito; (ii) que disponha de mecanismos coercitivos que garantam a coesão do grupo (bens individuais paralelos); (iii) assimetria entre os interesses e os recursos dos participantes; (iv) fragmentação (estruturas federativas); (v) organização exógena (mecanismos que combatam a atomização do grupo); (vi) membros ligados por algum forma de lealdade; (vii) custos nulos ou negativos de participação individual na ação coletiva. Cf. Mancur Olson. 1971. The Logic of Collective… citado. 20 Kenneth A. Shepsle & M. S. Boncheck. 1997. Analizyng Politics: Rationality, Behavior and Institutions. New York: W. W. Norton & Company, pp. 135-137. 21 Cf. Jon Elster. 2000. Peças e Engrenagens das Ciências Sociais. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, pp. 38-76.

22

socialização como variáveis para a explicação dos fenômenos políticos e sociais22. E

a escolha racional que, fazendo uso da abordagem econômica, trata as relações

políticas e sociais a partir da microscópica configuração das escolhas disponíveis

aos sujeitos individuais23.

A Teoria da Escolha Racional (TER) não procura retratar indivíduos como

átomos egoístas e isolados, para ela, sejam os objetivos altruístas ou egoístas,

ambos podem ser admitidos dentro de um cálculo racional. Trata-se de um modelo

tripartite de ação apoiado sobre os conceitos de racionalidade instrumental, auto-

interesse e maximização de preferências24. Neste sentido, a TER não deve ser

compreendida como a redução da realidade social a um conjunto de leis

deterministas, mas como um conceito limite, puramente ideal (em sentido

weberiano)25, sobre o qual construímos explicações por meio da utilização da

categoria da possibilidade objetiva, que a nossa imaginação formada e orientada

segundo a realidade, julga adequada. De acordo com a TER, a ordem social seria o

resultado das diferentes formas de interação entre os homens, conforme os

diversos modos que inventam para obter o que desejam. Assim, ao estudar a

ordem social, os teóricos da TER estão estudando os princípios do comportamento

22 Estou falando aqui dos fenômenos em que as liberdades de escolha do indivíduo são cerceadas por restrições externas ou pela internalização de normas e valores societais que podem limitar suas opções de escolha e ação. Cf. Max Weber. 1987. Conceitos Básicos de Sociologia. São Paulo: Moraes, 1987. 23 O ponto de partida da teoria da escolha racional é a proposição de que o comportamento coletivo pode ser entendido em termos de atores que procuram atingir seus objetivos. Estes podem ser desde indivíduos isolados ou mesmo grupos, o que importa é que tenham objetivos a atingir, e que o façam racionalmente, ou seja, mediante a escolha de meios adequados à consecução dos seus fins Para uma análise pontual dos postulados e limites da Teoria da Escolha Racional Cf. Maria das Graças Rua. 1990. Escolha Racional e Novo Institucionalismo: Notas Introdutórias. In: Maria das Graças Rua e Maria Isabel Valadão Carvalho (orgs.). O estudo da política: tópicos selecionados. Brasília. Editora Paralelo 15; George Tsebelis. 1998. Jogos Ocultos. São Paulo: Edusp. 24 A despeito das principais críticas que podem ser feitas à teoria da escolha racional, há de se enfatizar seu elevado valor heurístico para a investigação científica, visto que pode ser utilizada, principalmente por cientistas políticos como meio conceitual para captar a realidade através de constructos teóricos formulados a partir de uma elaboração lógica que permitem uma apreensão consciente do acontecimento estudado. Cf. Teresa M. Frota Haguette. 2003. Metodologias Qualitativas na Sociologia. Petrópolis: Ed. Vozes. (capítulo: O Individualismo Metodológico na Confluência da Estrutura e da Ação Individual). 25 Segundo Weber, o tipo-ideal “(...) trata-se de um quadro do pensamento, e não da realidade histórica, e muito menos da realidade ‘autêntica’, e não serve de esquema no qual se pudesse incluir a realidade à maneira de exemplar. Tem antes o significado de um conceito limite puramente ideal, em relação ao qual se mede a realidade a fim de esclarecer o conteúdo empírico de alguns dos seus elementos importantes, e com o qual esta é comparada. Tais conceitos são imagens sobre as quais construímos relações, pela utilização da categoria da possibilidade objetiva, que a nossa imaginação formada e orientada segundo a realidade, julga adequadas.” Cf. Max Weber. 2003. Ensaios sobre a Teoria das Ciências Sociais. São Paulo: Centauro, pp. 105.

23

individual no contexto da vida coletiva ou ainda os mecanismos26 que explicam as

variações deste comportamento.

O foco da idéia de comportamento racional é o indivíduo (individualismo

metodológico), no entanto, o destaque metodológico que a TER dá aos indivíduos e

às suas escolhas, não deixa de pontuar que as preferências dos atores estão

imersas em situações de interação e, portanto também afetadas por estruturas e

restrições externas que podem influenciar suas escolhas. Segundo o individualismo

metodológico, atores individuais são os únicos agentes capazes de desejar e agir,

sendo a ação coletiva compreendida como a ação agregada destes atores27.

O novo institucionalismo da escolha racional rejeita o ecletismo

metodológico a favor de um modelo hierárquico de ciência política, tal como se

movendo em direção a um grupo de teorias matemáticas formais, parcimoniosas e

logicamente consistentes, prestigiando o exame das utilidades individuais como um

método para a avaliação das instituições28. Prontamente, podemos enumerar

quatro características peculiares ao novo institucionalismo da escolha racional em

se tratando da forma com a qual este pensa a articulação entre atores individuais e

instituições políticas:

� As preferências dos atores são tidas como fixas e transitivas e a

maximização dos interesses pessoais é tomada como responsável

pela modelagem dos comportamentos individuais.

26 O conceito de explicação por mecanismos é um empréstimo da sociologia de Jon Elster (2000). Mecanismos podem ser entendidos aqui como as formulações mínimas enunciadas por uma teoria sobre a composição dos desejos e as crenças dos atores a partir das quais podemos deduzir como os indivíduos interagem entre si e como respondem as questões externas. Cf. Jon Elster. 2000. Peças e Engrenagens... citado; José Luís Ratton e Jorge Ventura Morais. 2003. Para Ler Jon Elster: Limites e Possibilidades da Explicação por Mecanismos nas Ciências Sociais. Dados, Rio de Janeiro, vol. 46, n.º 2, pp. 385-410. 27 A soma do individualismo metodológico à teoria da escolha racional é uma forma de proporcionar explicações micro para fenômenos até então, viciosamente, explicados por razões teleológicas. Assim, a teoria da escolha racional tem conseguido minar os alicerces das explicações holistas e vem tentando fazer a aponte entre a estrutura e a ação individual sob o argumento de que, sem o domínio dos microfundamentos, a referência à estrutura se torna inócua. Cf. Rajeev Bhargava. 1992. Individualism in Social Science. Forms and Limits of a Methodology. New York: Oxford University Press; James S. Coleman. 1998. Foundations of Social Theory. Combridge; London: Harvard University Press. 28 A TER não teria popularizado-se tanto entre os cientistas e analistas políticos não fosse a publicação de alguns trabalhos pioneiros já mencionados na seção anterior [Arrow (1951); Downs (1957); Black (1958); Olson (1965)]. Ainda que outros autores pudessem ser mencionados aqui, o que se quer realçar é que, em sua grande maioria, estes trabalhos não apenas divulgaram o potencial da TER, mas também responsabilizaram-se por apresentá-la como uma hipótese conceitual perfeitamente adequada quando estamos tratando de situações onde a identidade e os objetivos dos atores estão estabelecidos e as regras de interação são precisas e conhecidas por todos.

24

� A política é vista como uma série de dilemas de ação coletiva.

� As instituições são compreendidas ao mesmo tempo como um espaço

para o embate entre os atores e como um produto das

intencionalidades individuais29.

OS MODELOS ESPACIAIS DA ESCOLHA LEGISLATIVA

Uma das maiores limitações da TER é o fato de que ela não pode dar conta

de atos dinâmicos, ou seja, ela não pode descrever quais os caminhos que os

atores irão seguir para chegar aos equilíbrios prescritos30. Para transpor estes

limites, a TER usa o conceito de equilíbrio. Por equilíbrio podemos entender aquele

estado em que nenhum ator tem incentivos para desviar-se dele, quando os planos

das pessoas são consistentes entre si e há um mínimo de previsibilidade da ação

humana31. A ênfase da TER sobre o conceito de equilíbrio explica-se pela crença de

que, em equilíbrio, as estratégias dos atores seriam mutuamente ótimas e os

indivíduos obedeceriam à prescrição da teoria dos jogos. O que garantiria aos

analistas que as probabilidades subjetivas de cada ator estariam mais próximas de

sua freqüência objetiva e, portanto suas crenças mais próximas da realidade. O uso

do conceito de equilíbrio para pensar a interação estratégica entre os atores pode

ser entendido, dessa maneira, como um modelo32 preestabelecido que a TER usa

29 Segundo o novo institucionalismo somado a TER, cabem às instituições não apenas afetar a gama e a seqüência das alternativas de escolha, provendo informação ou criando mecanismos reduzam a incerteza, no caso das legislaturas. Elas também podem ser compreendidas como mecanismos de cooperação, os quais evitam que a maximização dos interesses pessoais provoque efeitos deletérios sobre os demais. 30 Sobre os limites da TER Cf. Raymond Boudon. 1998. Limitations of Rational Choice Theory. The American Journal of Socioloy, vol. 104, n. 03, pp. 817-828; Bruno Sciberras de Carvalho. A Escolha Racional como Teoria Social e Política: Uma Interpretação Crítica. Tese de doutorado em ciências humanas (ciência política), Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ). 31 Sobre o conceito de Equilíbrio Cf. Jon Elster. 2000. Peças e Engrenagens... citado. 32 O uso de modelos é altamente ambíguo nas ciências sociais. Em ciências naturais, um modelo é uma forma de representar visualmente determinado fenômeno, de sorte a expor suas propriedades inerentes e suas interconexões. Em teoria social, o uso de modelos restringe-se à teorização em que conceitos e suas relações são apresentados como um quadro que mapeia propriedades e inter-relação do universo social. Na teoria sociológica, são geralmente construídos dois tipos de modelos: modelos analítico-abstratos e modelos empírico-causais. Para este último tipo, que nos interessa aqui, podemos compreendê-los como uma tentativa de construir assertivas de correlação entre variáveis mensuráveis, dispostas numa seqüência linear ou temporal. A finalidade é “explicar a variação” numa variável dependente em termos de uma série de variáveis independentes e intervenientes. Cf. Jonathan Turner. Teorização Analítica. In: Anthony Giddens e Jonathan Turner. 1999. Teoria Social Hoje. São Paulo: Unesp. Para Bahskar (1998) modelos podem ser compreendidos ainda como exposições possíveis ou hipotéticas de uma realidade desconhecida, porém passível de ser conhecida. Cf. R. Bhaskar. 1998. Philosophy and Scientific Realism. In: M. Archer et. al. Critical Realism. London: Routledge, pp. 16-48.

25

para aproximar as crenças e preferências internas dos atores das possibilidades e

restrições do mundo real.

Em se tratando da organização legislativa, a emergência do equilíbrio entre

os atores pode tanto ser induzida por estruturas (structure-induced equilibrium

models ou apenas SIE)33, como produzida a partir de ações descentralizadas, não-

compulsórias (game-theoretic models)34. Tratam-se dos dois principais modelos

espaciais da escolha legislativa, os quais têm desempenhado um papel crescente na

ciência política contemporânea e procuram descrever ou predizer como os

legisladores fazem suas escolhas. Na verdade, modelos são simplificações do

comportamento individual de legisladores e do método de tomada de decisão

dentro da legislatura, e por isso mesmo, muitas vezes têm sido considerados

33 Kenneth A. Shepsle em seu trabalho pioneiro, Institutional Arrangements and Equilibrium in Multidimensional Voting Models (1979), foi o primeiro a introduzir o conceito de SIE e a provar a existência de cenários institucionais estáveis dentro da legislatura. O ponto de partida para o novo conceito elaborado pelo autor foi a compreensão das instituições enquanto regras formais que dividem trabalho e responsabilidade dentro do congresso. Neste sentido, ele elege o sistema de comissões como um consistente sistema jurisdicional de subgrupos dentro da legislatura, o qual seria responsável não apenas por escalar os vários legisladores para as diversas comissões, mas também por enumerar os respectivos domínios políticos de cada comissão (admite-se que comissões possuem poderes de gate-keeping e proposal power). Modelos desta natureza são razoavelmente apropriados para a compreensão das conseqüências distributivas de arranjos institucionais exógenos e, portanto mais adequados à percepção das possíveis implicações de regras (previamente estabelecidas) sobre o comportamento de legisladores e sobre a estabilidade de suas decisões. Por isso mesmo, estes modelos combinam pressupostos de informação perfeita (com raras exceções) a protótipos de arranjos institucionais simples (SIA), por conseguinte, desprezam a incerteza (também salvo algumas exceções) e compreendem o equilíbrio institucional como um ponto dentro de um espaço de escolha que, se escolhido, é estável. A hipótese comportamental oculta por trás desse modelo é a crença de que o comportamento legislativo é sincero nos vários estágios do processo de decisão política. Isto acaba criando um modelo contra-intuitivo onde os legisladores são considerados racionais com respeito às preferências e comportamentos individuais, mas não-racionais com respeito aos arranjos institucionais endógenos. Em vista disso, podemos afirmar que a maior limitação dos modelos de tipo SIE é o não tratamento dos processos endógenos. Cf. Keith Krehbiel. 1988. Spatial Models of Legislative Choice. Legislative Studies Quarterly, XIX, pp. 149-179. 34 Os modelos oriundos da teoria dos jogos diferenciam-se dos modelos de tipo SIE a partir do conceito de equilíbrio. Para a teoria dos jogos, o equilíbrio é definido explicitamente em termos do comportamento dos atores durante as seqüências do processo de tomada de decisão. Podendo ainda ser subdividido em termos de duas hipóteses principais: os modelos de informação perfeita e os de informação imperfeita. O primeiro pressupõe uma simetria informacional entre os atores e concentra seu foco analítico sobre as propriedades distributivas do processo de decisão e sobre suas regras. O segundo toma a informação como uma propriedade assimétrica entre os legisladores, a qual pode ser usada de maneira estratégica para alcançar benefícios distributivos desproporcionais. Isso explica a necessidade do modelo expandir sua lógica analítica sobre as propriedades informacionais das regras, já que estas também são consideradas igualmente passíveis de escolha pela legislatura. Dessa maneira, o modelo da teoria dos jogos acomoda informação incompleta de uma maneira que caracteriza não somente a incerteza, mas também o uso estratégico da informação por parte dos jogadores. A hipótese comportamental do modelo pressupõe que indivíduos aderem, freqüentemente, a estratégias não-cooperativas e possuem iguais chances de colher benefícios distributivos, estando cada um à mercê da sua própria performance e da capacidade individual de demover restrições institucionais através das regras formais que especificam quem pode fazer propostas e como elas serão decididas (barganha). Cf. David P. Baron e J. A. Ferejohn. 1989. Bargaining in Legislatures. American Political Science Review, vol. 83, n. 04, pp. 1181-1206.

26

simples demais para tratar do processo que desejam explicar. De maneira não

intencional, estas críticas têm estimulado os modelos a tornarem-se mais e mais

realistas a partir da endogeneização de novas hipóteses comportamentais e

institucionais, como a natureza das preferências e das escolhas legislativas, se mais

ou menos homogêneas, se uni ou multidimensionais, se incluem informação

perfeita ou incerteza, etc.

Tabela 1 – Premissas e Características Fundacionais dos Modelos Espaciais da Escolha Legislativa

Espaço de Escolhas Espaço Multidimensional Euclidiano.

Mais usual: Espaço Bidimensional, onde cada ponto (x¹, x²) representam uma escolha legislativa.

Preferências Heterogeneidade.

Escolhas associadas a utilidades.

Existência de um bliss point que maximiza a utilidade individual do legislador num espaço de políticas.

Representação das preferências por curvas de indiferença.

Curvas Euclidianas: utilidade diminui monotonicamente com a distância do ponto de máxima utilidade.

Comportamento Modelos podem se diferenciar de acordo com as premissas comportamentais que assumem para os legisladores: comportamento estratégico, sincero, miópico e outros.

Instituições As regras oferecem restrições (constraints) para a escolha individual e coletiva ds legisladores no processo decisório.

Grande parte dos modelos assume que os arranjos institucionais são externos ao modelo – nesses casos, o objeto das escolhas legislativas são as políticas públicas e não os arranjos institucionais.

Se o modelo assume que o arranjo institucional é também interno, por conseguinte, não só políticas públicas são objetos da escolha legislativa, mas instituições também.

Informação Informação Perfeita

Incerteza

Equilíbrio Structure Induced Equilibrium (SIE) – as instituições produzem o equilíbrio.

Game Theoretical Models (GTM) – as escolhas legislativas produzem o equilíbrio.

Fonte: Elaborado a partir de Ktehbiel (1988).

27

Essas várias dimensões sem dúvida enriquecem a análise legislativa, visto

que, hoje, quase todas as variáveis, exceto a escolha legislativa propriamente dita,

são tomadas como dados exógenos. É neste sentido, que convém discorrer um

pouco acerca de alguns ingredientes genéricos:

� Espaço de escolha. Os objetivos da escolha legislativa são representados nos modelos espaciais através de pontos em um multidimensional espaço geométrico e distinguem-se entre espaços unidimensionais e multidimensionais. Os espaços unidimensionais caracterizam-se pela existência de poucos legisladores e pela possibilidade de obter um resultado estável através do voto da maioria (majority rule) e do Black’s Single-Peakedness Theorem (1958), o qual mostra a importância das preferências pontuadas (single-peaked of preferences) na produção de resultados estáveis em espaços de escolha unidimensionais. Já os chamados espaços multidimensionais, onde a existência de muitos legisladores pode levar a desequilíbrios profundos, estes, só podem ser superados através de maiorias cíclicas, onde o legislador que possui o controle da agenda (agenda setting) pode fornecer a seqüência de propostas preferida pela maioria (McKelvey, 1976).

� Preferências. Escolhas coletivas só serão consideradas atraentes quando as preferências individuais não são perfeitamente homogêneas, isto é, quando legisladores têm diferentes opiniões sobre quais políticas deveriam ser adotadas. O conflito é representado, portanto, situando as diferentes preferências dos legisladores como alternativas dentro de um espaço de escolha, ou seja, partimos do pressuposto que cada legislador tem um ponto ideal (x), que maximiza sua utilidade, sabendo que esta utilidade decresce à mesma proporção que o legislador afasta-se do ponto ideal para qualquer direção.

� Comportamento. Os modelos espaciais adotam hipóteses diferentes quanto ao comportamento estratégico dos legisladores. Assim, em modelos simples, onde os legisladores são confrontados apenas a um par de alternativas, tendo que optar pela alternativa preferida, considera-se seu comportamento como verdadeiro. Já onde legisladores são confrontados a várias alternativas e podem fazer uso de variantes institucionais em benefício próprio, estamos tratando de formas mais sofisticadas de comportamento (estratégico, miópico, convexo, etc.).

28

� Instituições. Variáveis institucionais entram na análise legislativa ou como restrições ao comportamento e às decisões dos legisladores (constraint), ou como fatores de influência. Neste sentido, quanto mais o modelo enfatiza a solidez e a estabilidade dos arranjos institucionais, diz-se que as instituições são variáveis exógenas ao modelo e, portanto, os objetos da escolha legislativa só podem ser políticas, e não instituições. Se o contrário, ou seja, os arranjos institucionais são considerados mais flexíveis e menos duráveis, e consequentemente, menos determinantes sobre as decisões legislativas, diz-se que as instituições são endógenas ao modelo e, por isso, passíveis de escolha. É neste sentido que podemos falar nas propriedades distributiva e informacional das instituições legislativas. A primeira trata do que um legislador pode ganhar ou perder a partir de uma determinada decisão sob um definido arranjo institucional. Por isso mesmo, este critério pode ser proveitoso para modelos de informação perfeita, onde os resultados do processo, por definição, não estão sujeitos à incerteza, mas antes, são determinados pelo comportamento do legislador e pelas regras que definem o que é permissível. Já a propriedade informacional refere-se à redução da incerteza durante os processos de escolha e enfatiza o uso de modelos espaciais de informação incompleta.

� Informação. A maioria dos modelos espaciais de escolha legislativa adota a hipótese simplificada de que os legisladores são perfeitamente informados sobre as preferências dos outros ou seus pontos ideais. Mais recentemente, esta hipótese tem sido abandonada a favor de modelos mais complexos, os quais partem do pressuposto de que os pontos ideais não são perfeitamente conhecidos pelos jogadores, logo, o legislador bem informado aumenta a estimativa subjetiva da probabilidade de locação do seu ponto ideal e dos demais legisladores. Tratam-se dos modelos que levam em conta a existência da incerteza durante os processos de escolha. Por exemplo, um legislador que está mais informado do que os outros sobre como uma determinada proposta legislativa pode impactar suas utilidades pessoais e as dos demais, pode tanto ser encorajado a divulgar suas informações privadas, como omiti-las em benefício próprio.

� Equilíbrio. O equilíbrio induzido por estruturas (SIE) e a teoria dos jogos usam tipos diferentes de equilíbrio. A forma de equilíbrio do SIE é equivalente à produção de resultados estáveis, neste sentido, ele é incerto quantos aos comportamentos individuais e enfatiza as características institucionais que produziram os resultados. Já a teoria dos jogos, ao contrário do SIE, enfatiza variáveis comportamentais elaboradas a partir de variações do equilíbrio de Nash (cada legislador deveria comportar-se de um modo que, dada a maneira como todos os outros se comportaram, ele não poderia ter feito melhor agindo de outra forma).

29

O PROBLEMA DE INVESTIGAÇÃO

Feito esse breve review sobre os principais paradigmas, postulados e

modelos mais gerais do estudo da organização legislativa, parto agora para uma

concisa apresentação do problema de investigação desta dissertação, a saber: a

possibilidade de construção e combinação de teorias realisticamente complexas. De

acordo com Lakatos35, a gênese e o desenvolvimento de teorias realisticamente

complexas devem ser apresentados como todos estruturados. É neste sentido que

os paradigmas da organização legislativa devem ser compreendidos como

estruturas abertas que oferecem a possibilidade de desenvolvimento de um

programa de pesquisa. Este, devendo ser compreendido como uma matriz teórica

que fornece orientação para as pesquisas futuras.

Por conseguinte, um programa deve se desenvolver a partir de um núcleo

irredutível, o qual compreende uma hipótese teórica muito geral tornada

infalsificável pelos cientistas, e por uma heurística negativa e uma heurística

positiva. A heurística negativa é formada por um cinturão de hipóteses auxiliares

que não devem rejeitar ou modificar o núcleo irredutível. Já a heurística positiva,

compreende as tentativas de desenvolver suposições adicionais que suplementem o

núcleo irredutível, numa tentativa de explicar fenômenos conhecidos ou prever

novos. É dessa maneira que podemos compreender o desenvolvimento das

principais teorias da organização legislativa36.

Um dos propósitos essenciais desta pesquisa é não somente discutir os

principais postulados da nova análise institucional em ciência política e apresentar e

enfatizar as peculiaridades e as problematizações que originaram cada um das três

tradições que orientam hoje a discussão nacional e internacional sobre os princípios

35 Cf. Imre Lakatos, 1974. Criticism and the Growth of Knowledge. Cambridge: Cambridge University Press. 36 Sabendo-se que (P) reuni os principais paradigmas utilizados pelos estudos legislativos: Determinismo (Pdt), Behaviorismo (Pbh) e o Novo Institucionalismo (Pni). Podendo este último ainda ser dividido em três subparadigmas: Novo Institucionalismo Histórico (NIh), Sociológico (NIs) e da Escolha Racional (NIer). Os quais, se comparados à idéia lakatosiana de um núcleo duro (heurística negativa), não estão vedados ao desenvolvimento de hipóteses auxiliares (heurística positiva). É nesse ínterim que se pode compreender o desenvolvimento das principais teorias da organização legislativa, a saber: Distributiva (Tdt), Informacional (Tif) e Partidária (Tpt), que separadamente, oferecem modelos distintos para explicar a ação e o funcionamento das instituições congressionais, mas em conjunto, não rejeitam o núcleo irredutível da TER.

30

da organização legislativa (distributiva, informacional e partidária)37, mas também,

discutir os limites e possibilidades de um caminho integrativo entre estas tradições

a partir de uma análise da produção mais recente sobre as instituições legislativas

via os principais periódicos da ciência política internacional38.

Ao seu modo, cada uma destas teorias reserva um lugar especial para os

atores individuais dentro da elucidação do processo legislativo (se mais ou menos

autônomos), dependendo da relação que estabelecem entre instituições políticas e

atores individuais, e a influência que um dos modelos espaciais de escolha

legislativa exercerá sobre a explicação (se o SIE ou a teoria dos jogos). Tais

configurações refletem-se não só em idéias distintas de equilíbrio, mas também na

construção de formas próprias de interação entre variáveis dependentes e

independentes e na relação previamente estabelecida entre preferências,

comportamentos, informação e instituições. Não obstante, assim como os

institucionalismo encontram-se hoje envoltos no problema da integração teórica,

assim também, a questão da insurgência de modelos híbridos a partir das teorias

positivas da organização legislativa mostra-se para a maioria dos analistas e

cientistas políticos, ora como uma necessidade premente de construção de novos

modelos (sobretudo quando essa realidade parece pouco ajustável a um conjunto

de pressupostos viciosamente estilizados39), ora como resultado de uma demanda

natural da evolução destas tradições (de modelos mais simples para arranjos

analíticos mais sofisticados).

Minha decisão de ocupar-me aqui exclusivamente com evidências teóricas já

disponíveis é baseada na intenção de aumentar a coerência teórica do campo em

questão e quiçá instar uma mudança na percepção de dados já familiares. Partindo

do pressuposto que é papel primordial do cientista político e social estudar tanto

37 Sobre a influência das tradições norte-americana sobre a ciência política brasileira Cf. Manoel Leonardo W. D. Santos. 2006. As Teorias Positivas sobre a Organização do Legislativo e as Explicações sobre o Congresso Nacional. Tese de mestrado em Ciência Política, Recife, Universidade Federal de Pernambuco (CFCH); Fernando Limongi. 1994. O Novo Institucionalismo e os Estudos Legislativos: a Literatura Americana Recente. BIB – Boletim Informativo e Bibliográfico de Ciências Sociais, n.º 37, pp. 1-100. 38 A pesquisa incluiu o período dos últimos cinco anos, levando em conta a investigação de periódicos críveis ou especializados na área de estudos legislativos. Grande parte do acesso a estas fontes primárias deu-se via Periódicos Capes (http: //www.periodicos.capes.gov.br). 39 Para uma discussão sobre os limites da adesão indiscriminada de pressupostos típicos e naturais da arena político norte-americana sobre a análise institucional de outros países, por exemplo, Cf. Luis F. Fraga (et al.). 2006. Su Casa Es Nuestra Casa: Latino Politics and the Development of American Political Science. American Political Science Review. Vol. 100, n.º 4, November.

31

seus objetos de conhecimento (a política ou o social) como as condições de

conhecimento destes objetos (os conceitos e as teorias), a concepção de ciência

desenvolvida aqui acredita na fecundidade potencial da pesquisa qualitativa dentro

das ciências políticas e sociais. Dessa maneira, a ausência de grandes revisões

críticas de literatura na academia brasileira já justificaria por si a exeqüibilidade

deste trabalho40. Contudo, a crescente institucionalização da ciência política no

Brasil somada à solidificação de vários grupos de estudo e discussão sobre o Poder

Legislativo entre nós representam uma justificativa ainda mais especial. Uma vez

que boas fatias da produção nacional estão orientadas por uma das tradições aqui a

serem apresentadas, a carência de maiores discussões teóricas sobre os princípios

e postulados que guiam esta produção científica apresenta-se como uma tarefa

primordial para o aperfeiçoamento da produção local e dos próprios cientistas.

O ARRANJO EXPOSITIVO DA PESQUISA

O novo institucionalismo constitui hoje o mainstream dos estudos sobre as

instituições. Por conseguinte, o primeiro capítulo é dedicado exclusivamente à

análise que este paradigma procura estabelecer a partir da concepção de ação

racional e dos contextos de incerteza, sob os quais assume que os indivíduos

estariam frequentemente inscritos. Neste sentido, analiso a expansão deste

paradigma, bem como sua divisão em três outros subparadigmas: os

institucionalismos histórico, sociológico e da escolha racional. Para apresentar o

desenvolvimento do paradigma neo-institucional, destaquei suas respostas aos

conceitos de instituição, ação social, mudança institucional e integração teórica,

sem perder de vista, naturalmente, as questões metodológicas e epistemológicas

trazidas por esta nova tradição.

Tendo em vista aproximar o leitor dos mecanismos inerentes às tradições

positivas da organização legislativa, procurei, no capítulo seguinte, analisar os

elementos constitutivos e decompor os pressupostos analíticos dos modelos

40 Com exceção de um único artigo produzido no Brasil sobre os princípios teóricos norteadores da produção internacional sobre o Poder Legislativo (Fernando Limongi. 1999. O Novo Institucionalismo e os Estudos Legislativos... citado) e da dissertação de mestrado de Manoel Leonardo W. Santos (As Teorias Positivas da Organização Legislativa e as Explicações... citado), que corrobora a hipótese da influência da produção teórica norte-americana sobre as explicações do Congresso Nacional, nenhum outro trabalho dessa natureza foi encontrado entre as principais revistas científicas de circulação nacional.

32

delegatórios. Levando em conta que cada uma das teorias positivas da organização

legislativa apóia-se sobre modelos diferentes de delegação, versar sobre a lógica

analítica destes modelos faz-se parte imprescindível para a compreensão dos

mecanismos de explicação e das articulações causais que analisarei no próximo

capítulo.

Inicio o capítulo três tratando exatamente do problema central da

instabilidade dos contratos dentro da arena legislativa e as soluções oferecidas por

cada destas teorias (distributiva, informacional e partidária) para a superação deste

aparente caos. Levando em conta as afinidades analíticas destas tradições, optei

por tratá-las juntas em um mesmo capítulo e a partir de um prisma comparativo.

No geral, dediquei seções individuais a cada uma destas gerações teóricas,

priorizando, consequentemente, a análise de seus pressupostos, seus modelos de

causalidade, principais variáveis explicativas, bem como de suas maiores limitações

analíticas.

Em um momento posterior, já delineada a matriz teórica das principais

teorias legislativas, bem como as particularidades e as problematizações que lhes

diferenciam; investigarei, no capítulo seguinte, a possibilidade de confluência entre

estas teorias a partir da análise criteriosa de alguns artigos modelares, todos,

selecionados a partir do survey da produção norte-americana mais recente sobre as

instituições congressionais.

Por fim, tendo em vistas as possibilidades críticas expostas, procurei

argumentar que a construção de modelos híbridos para a análise das instituições

congressionais vem inquietando e atraindo de maneira insurgente analistas e

cientistas políticos. Visto que toda observação é inescapavelmente carregada de

teoria, a objetivação resultante desta pesquisa é pôr à mostra as hipóteses teóricas

e interpretações que subjazem estas e outras pesquisas empíricas e assim,

possivelmente, iluminar as nossas próprias agendas de pesquisa.

33

CAPÍTULO 1

OS NOVOS INSTITUCIONALISMOS NA CIÊNCIA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA E O PROBLEMA DA INTEGRAÇÃO TEÓRICA

The central theoretical argument of new institutionalism is that institutions shape action. New institutionalists argue that theorizing in political science must take into account that action does not occur in an institutional vacuum.

(André Lecours, 2005)

Institutions are the rules of the game in a society or, more formally, are the humanly divised constraints that shape human interaction. In consequence they structure incentives in human interaction, whether political, social, or economic.

(Douglass North, 1990)

Nos últimos cinqüenta anos, uma renovada atenção tem sido direcionada às

instituições por parte da ciência política. Este esforço em enfatizar a importância

das instituições, sucintamente expressada no slogan “as instituições importam”,

está associada a uma escola conhecida como novo institucionalismo41. O novo

institucionalismo tem dado primazia analítica às instituições, todavia, a nova

tradição institucional está longe de representar um todo unificado, e substanciais

discordâncias têm surgido acerca dos rumos que a análise institucional deve tomar.

Não obstante, o novo institucionalismo também tem seus críticos. Alguns autores

sugerem que esta relativa confusão teórica e conceitual origina-se da possível falta

de poder exploratório desta tradição ou simplesmente porque o estudo das

instituições não representa nada de novo para a ciência política42. Este debate tem

41 O primeiro uso do termo institucionalismo atribui-se a Walton H. Hamilton, quando em 1918 apresentou ao Meeting Anual da American Economic Association o artigo “The Institutional Approach to Economic Theory”. Tratou-se de um momento em que a Associação queria, através de um comitê criado para o efeito, propor uma discussão sobre a economia e a profissão de economia, tendo em vista uma maior aproximação aos problemas e desafios correntes. Cf. Ph. Klein. 1993. The Institutionalist Challenge: Beyond Dissente. In: Marc Tool (ed.). Institutional Economics; Theory, Methods, Policy. Boston e Londres, Kluwer Academic. 42 Não há nada de novo em prestigiar as instituições como variável explicativa para os fenômenos políticos. Neste sentido, a fim de distinguir os novos estudos institucionais de outros trabalhos mais tradicionais, Shepsle e Boncheck (1997) consideram quatro variáveis explicativas como indispensáveis para a caracterização da nova análise institucional: (1) A divisão do trabalho e os procedimentos regulares. Instituições são formadas por regularidades, permanências e atribuições de poder, logo, conhecer uma instituição pressupõe conhecer a divisão do trabalho e os procedimentos que dão maior eficiência ao trabalho e diminuem os custos da transação; (2) A especialização. A divisão do trabalho e os procedimentos não são suficientes se as instituições não perseguem a especialização, ou seja, o bom aproveitamento do capital humano. Dessa maneira, quanto mais especializados, mais os indivíduos estão capacitados a obter maior quantidade de informação sobre os objetos de seu interesse e produzir

34

envolvido, prioritariamente, estudiosos americanos. Isto não é surpreendente

porque desde a sua gênese, o desenvolvimento do novo paradigma institucional

esteve de par à trajetória particular da ciência política nos Estados Unidos.

TABELA 2 – Quadro Comparativo dos Paradigmas da Organização Legislativa

Variável Institucionalismo Behaviorismo Determinismo Interesses Origens diversas dos

indivíduos e dos interesses coletivos; instituições influenciam sua articulação e expressão nas políticas.

Subjetivo: preferências reveladas pelo comportamento; cada indivíduo julga como lhe convém seus interesses.

Objetivo: interesses e preferências são determinados a priori segundo grupo/classe social.

Processo Político Problema de agregação: as formas do processo afetam a qualidade e os resultados da participação.

Agregação utilitária das preferências a partir de uma agregação perfeitamente eficiente.

Corresponde à posição ocupada pelo grupo/classe social dentro das macroestruturas.

Pressuposto Normativo

Democracia Procedural: justiça substantiva sem procedimentos formais.

Democracia formal: a imparcialidade do processo garante a justiça dos resultados: abertura política e competição protegida por regras.

Democracia Substantiva: harmonia social igual a solidariedade orgânica/ fim da exploração de classes.

Níveis de Análise Micro-Macro Macro-Micro Macro-Macro Natureza da Explicação

Complexidade causal e elementos interacionistas.

Função da ação e conceito de papel social.

Efeito de composição das ações individuais (efeitos como resultados de ações não vinculadas/dialética).

Exemplos Rousseau, Kant, Montesquieu, Tocqueville, Weber, Rawls, Lowi, Habermas.

Bentham, James Mill, Milton Friedman, David Truman, Robert Dahl.

Durkheim, Marx.

Fonte: Elaborado a partir de Immergut (1998).

os resultados que desejam; (3) A jurisdição. Refere-se ao espaço de atuação das instituições, ou seja, os limites de sua ação. O bom funcionamento de uma instituição pressupõe que suas jurisdições devam ser bem delineadas, o que também se torna um incentivo a mais à especialização, e à autonomização decisória da própria instituição; (4) A delegação e o monitoramento. Compreende as relações do tipo Principal-Agente, onde o Principal é o titular da relação, é quem delega as atividades, e o Agente, o ator que está encarregado de defender os interesses do Principal. A lógica inerente destas relações está em evitar que a delegação degenere em abdicação, o que só pode ser possível superando do oportunismo gerado pela sonegação de informações e pela ação oculta, que dificultam o controle do Agente pelo Principal e por isso mesmo, podem ser usadas estrategicamente pelo Agente a favor da consecução dos seus interesses particulares e em detrimento dos interesses do principal. Tendo em vista a influência analítica destes modelos sobre as teorias positivas da organização legislativa, optei um reservar um capítulo à parte para tratar destas questões (Cf. capítulo 2 desta dissertação).

35

Durante as décadas de 1960 e 1970, a variável instituição foi marginalizada

na ciência política americana em função da sua trivial associação ao conhecimento

jurídico-formal, retrospectivamente, batizado de velho institucionalismo (ou

behaviorismo), o qual fora duramente criticado posteriormente em virtude do seu

caráter meramente descritivo, a-teórico e paroquial43. Análises orientadas por

variáveis sociológicas conquistavam mais estudiosos na medida em que ampliavam

as possibilidades de generalização, dedução e comparação. Especificamente, e no

contexto do movimento behaviorista, instituições eram vistas como uma anátema

para a lógica indutiva, para a quantificação e finalmente, teorização44. Então, o foco

sobre as instituições foi criticado como contrário à boa ciência política, e até

mesmo, contrário ao estudo científico da política.

Ellen M. Immergut (1998) observa que a abordagem neo-institucional surgiu

como uma crítica ao behaviorismo, que aceita a idéia de que a soma das

preferências individuais explicariam o comportamento coletivo. Contra essa

concepção, os institucionalistas afirmam que a ação social é determinada por

instituições, e não meramente pelo somatório das preferências. Mas, por outro

lado, os institucionalistas também rejeitam o estruturalismo, o qual atribui a uma

determinada estrutura social a força causal de todas as situações sociais. Segundo

ela,

“Institutionalists criticize the behavioralists for accepting the expression of preferences and the aggregation of interests in politics at face value. But they are not willing to adopt the objective standards of the social determinants or Marxists – or for that matter, any single a priori principle – as a basis for critiquing and improving current social and political arrangements. Instead, they attempt to ‘square the circle’ between a priori and a posteriori standards by recommending formal procedures that can be used to define substantive justice”.45

43 A concepção fundamental do behaviorismo era estratégica: ao invés de analisar consciência e estados mentais, os estudiosos faziam mais progressos em psicologia concentrando-se mos atos de homens e mulheres, bem como nos estados observáveis dos indivíduos e seus ambientes, aos quais os atos podiam ser legitimamente relacionados. Cf. Matthew Wilson. 2005. Institutionalism, Critical Realism, and the Critique of Mainstream Economics. Journal of Intitutional Economics. 1:2, 217-231; George C. Homans. 1999. Behaviorismo e Pós-behaviorismo… citado. 44 A concepção central do behaviorismo radical foi a importância de eliminar quaisquer alusões a assuntos como crença, conhecimento, objetivo e significação, justamente porque eles não se enquadram no tipo de descrição exigido pelas ciências naturais e pelas quais os behavioristas se orientavam. Cf. Thomas P. Wilson. Sociologia e Método Matemático. In: Anthony Giddens e Jonathan Turner. 1999. Teoria Social Hoje. São Paulo: Unesp, p. 568. 45 Cf. Ellen M. Immergut. 1998. The Theoretical Core of the New Institutionalism. Politics & Society, vol. 26, n.º 1, pp. 5-34.

36

Teoricamente, o novo institucionalismo deve situar-se como uma reação

tanto às perspectivas voluntaristas, quanto às perspectivas estruturalistas dentro

das ciências sociais46. De acordo com estes desdobramentos teóricos, os resultados

sociais são, por conseguinte, tanto o produto dos resultados das condutas

individuais, bem como o reflexo de determinadas estruturas. Em outras palavras, o

novo institucionalismo representa uma reação em considerar o sujeito social como

um ator autônomo e todo poderoso ou como um elemento passivo, absolutamente

sujeitado pelas estruturas sociais que delimitam suas possibilidades de ação47. É

neste sentido, que a perspectiva neo-institucionalista tenta demonstrar a

necessidade de combinar a agência (a capacidade dos indivíduos de transformar a

alterar a estrutura) e a estrutura como forma de explicar os fenômenos e

resultados sociais (aqui, naturalmente, incluem-se além das dimensões

estritamente sociais; a política e a economia).

Segundo Goodin (1996) podemos considerar como denominar comum da

perspectiva neo-institucional os seguintes pontos48:

� Os agentes individuais e os grupos perseguem seus projetos em um contexto coletivamente constrangido (constraints).

� Estas restrições tomam a de instituições, padrões organizados de normas e papéis socialmente construídos, e condutas socialmente prescritas, os quais são criados e recriados continuamente.

� Tais restrições são em algum aspecto vantajoso para os indivíduos e grupos para a persecução de seus projetos particulares.

� Os mesmos fatores contextuais que constrangem as ações dos indivíduos e dos grupos também moldam seus motivos, desejos preferências.

� Estas restrições podem ser o produto de raízes históricas, resíduos de ações e decisões pensadas.

46 Cf. W. Powell e P. DiMaggio. 1991. The New Institutionalism in Organizacional Análisis. Chicago: University of Chicago Press. 47 Sobre a análise institucional e o problema agência-estrutura Cf. James Mahoney e Richard Snyder. 1999. Rethinking Agency and Structure in the Study of Regime Change. Studies in Comparative International Development. Summer, vol. 43 (2); Gabriel P. Pérez e Laura Valencia E. 2004. El Neoinstitucionalismo como Unidad de Análisis Multidisciplinario. Actualidad Contable FACES, n.º 8, Enero-Junio. Mérida. Venezuela, pp. 85-95. 48 Cf. R. Goodin. 1996. The Theory of Institutional Design. Cambridge: Cambridge University Press.

37

� As restrições preservam, representam e distribuem diferentes recursos de poder a diferentes grupos e indivíduos.

� As ações individuais e coletivas, contextualmente constrangidas e socialmente modeladas são o motor que conduz a vida social.

Quanto as suas origens, o movimento neo-institucionalista emergiu, em

particular, no seio da própria academia norte-americana. Não obstante,

naturalmente, o novo institucionalismo também tem tomado espaço entre outras

academias. Os europeus, por exemplo, têm feito significantes contribuições para

esta literatura. Neste caso, a ciência política européia tem empregado continuidade

antes do que ruptura ao novo paradigma, ainda que a variável instituição nunca

tenha sido totalmente abandonada por estes scholars, nem a tradição behavioral

tomada ao pé da letra.

Vários estudiosos, independentemente das perspectivas particulares que

norteiam seus interesses individuais, têm oferecido infinitas contribuições para a

literatura institucional no campo da ciência política. Isto não significa dizer que haja

uma versão distinta do novo institucionalismo que possa diferenciar tão nitidamente

a escola francesa da norte-americana, por exemplo. Todavia não se pode deixar de

observar que o que chamamos de novo paradigma institucional está longe de

representar um todo unificado. Neste sentido, estudiosos têm destacado pelo

menos três ramificações desta tradição – os novos institucionalismos histórico,

sociológico e da escolha racional. Assim, enquanto a ciência política européia tem,

em suas aplicações, enfatizado os novos institucionalismos histórico e sociológico,

nos Estados Unidos, os estudiosos têm se dividido, principalmente, entre a tradição

histórica e a da escolha racional, esta última com prioridade especial49.

Embora hoje possamos falar em uma presença do novo institucionalismo em

virtualmente todos os principais campos da ciência política, inicialmente, esta

presença foi sentida na área da análise de políticas públicas e, no caso do

institucionalismo da escolha racional, no estudo do legislativo norte-americano. E

uma de suas principais contribuições interdisciplinares para o campo da teorização

política e social é o debate sobre o lugar que devemos reservar para as instituições

na análise política. Neste sentido, o novo institucionalismo tem incitado algumas

49 Sobre as respectivas contribuições das escolas americana e européia para o paradigma neo-institucional Cf. André Lecours. 2005. New Institutionalism: Issues and Questions. In: André Lecours (org.). New Institutionalism – Theory and Analysis. London: University of Toronto Press.

38

“grandes questões” que acompanham hoje a agenda da ciência política

contemporânea. Estas questões, naturalmente, não são novas, pelo contrário, elas

envolvem debates clássicos: O que são instituições? Qual o real impacto das

instituições sobre a ação humana? Como as instituições são formadas e

transformadas? Como explicar a mudança institucional? Que posições

metodológicas e epistemológicas melhor se ajustam à análise institucional? Os neo-

institucionalistas não são os primeiros a formular estas questões, mas eles trazem

um novo olhar ou mesmo uma renovada atenção sobre elas, revestindo-as de

importância. Em geral, neo-institucionalistas oferecem algumas respostas originais

a estas questões ou, ao menos, as vêem de um jeito novo ou diferente. Por outro

lado, estas respostas também estão longe de representar uma perspectiva única e

coerente, ante a diversidade interna e a dimensão atual dos debates dentro do

mesmo paradigma.

SOBRE O CONCEITO DE INSTITUIÇÃO

O problema da definição conceitual de instituição tomou novo fôlego a partir

da nova tradição institucional50. Estudiosos guiados segundo categorias

sociologicamente orientadas, estão menos pré-dispostos a serem confrontados por

este problema, afinal suas ferramentas analíticas repousam sobre o conceito de

indivíduo, grupos, classes, gênero, movimentos sociais, ou mesmo qualquer outra

estrutura da sociedade civil. O neo-institucionalismo argumenta que a análise

política é mais bem conduzida quando o foco analítico são as instituições ou, mais

especificamente, quando parte das instituições. O programa teórico dessa

perspectiva foi muito bem formulado por North (1997): Para dar inteligibilidade às

evidências históricas e contemporâneas, precisamos repensar todo o processo de

crescimento econômico [...]. A fonte principal do crescimento econômico é a

estrutura institucional/organizacional de uma economia51.

50 A preocupação com as instituições dentro da teoria social contemporânea nos últimos anos tem ressurgido, principalmente, com a obra de James March e Johan P. Olsen. 1989. Rediscovering Institutions – The Organizational Basis of Politics. New York: Free Press. 51 Cf. Douglass North. 1997. Some fundamental puzzles in economic history/development. In: W. Brian Arthur, Steven Durlauf e David A. Lane (orgs.). The economy as an evolving complex system II. Reading, MA: Addison-Wesley, p. 224.

39

Neste contexto, torna-se primordial conhecer o que são exatamente

instituições52. Isto nunca foi um problema para o velho institucionalismo, até

mesmo por que a idéia de instituição nunca foi problematizada por esta tradição.

Para o velho institucionalismo, instituições representavam apenas estruturas

materiais. Estas poderiam ser constituições, gabinetes ministeriais ou presidenciais,

parlamentos, burocracias, cortes, organizações militares, arranjos federais e, em

algumas instâncias, sistemas partidários. Em outras palavras, instituições referir-

se-iam somente a órgãos do Estado ou, mais precisamente, ao governo.

Em geral, a reflexão sobre instituições é usualmente conceituada, mais

implicitamente do que explicitamente. Esta definição materialista é a mais aceita

pela maioria dos autores neo-institucionalistas. Steinmo et al. (1992) referem-se a

regras eleitorais, sistemas partidários, a estrutura da relação entre os ramos do

governo e os sindicatos53. Tal posição concorda com a definição estritamente

materialista articulada pelo velho institucionalismo. Mas esta posição não é

compartilhada por todos os novos institucionalistas. Institucionalistas da escolha

racional afastam-se um pouco desta definição focando sua atenção mais

precisamente sobre as regras do jogo político, as quais tendem a ser associadas à

estrutura material dos cenários e aos interesses dos autores, independentemente

se, no mundo real, afastam-se dos parâmetros tangíveis. Para muitos

institucionalistas da escolha racional, a questão mais importante não é o que as

instituições são, mas o que elas representam: um equilíbrio54.

A mais significante característica da definição materialista consiste em

conceitualizar instituições em termos de normas e valores. Este foi o caminho

tomado por March e Olsen (1989), onde eles definiram instituições como um

conjunto de regras e rotinas correlacionadas. O significado de instituição foi, por

isso, contestado por muitos autores desde o princípio do movimento neo-

institucional. Seguindo os passos trilhados por March e Olsen, institucionalistas

52 Na terminologia de Douglass North, instituições são compreendidas como as regras do jogo numa sociedade ou, em termos mais formais as restrições inventadas pelo homem para modelar a interação humana. D. North. 1990. Structure, Institutional Change and Economic Performance. Cambridge: Cambridge University Press. 53 Cf. Sven Steinmo et al. 1992. Structuring Politics: Historical Institutionalism in Comparative Perspective. Cambridge: Cambridge University Press. 54 Sobre o institucionalismo da escolha racional Cf. Kenneth A. Shepsle. 1989. Institutional Equilibrium and Equilibrium Institutions. In: H. Weisberg (ed.). Political Science: The Science of Politics. New York: The Agathon Press; Barry Weingast. 1996. Political Institutions: Rational Choice Perspectives. In: New Handbook of Political Science. Oxford: Oxford University Press. Pp. 167-190; A. Przeworsky. 1995. Democracy and Market. Cambridge: Cambridge University Press.

40

sociológicos têm definido instituições de uma maneira não-materialista, ao tratarem

de crenças, valores e modelos cognitivos. Para esta perspectiva, instituições podem

ser vistas como um arquétipo, no sentido de que elas internalizam elementos da

cultura e princípios normativos. Institucionalistas históricos, de outra forma, estão

preocupados em ver as instituições como estruturas formais, conquanto alguns têm

atraído o trajeto das idéias para a análise destas estruturas, o que os têm afastado

dos modelos estruturalistas tradicionais. Tipicamente, institucionalistas históricos55

tendem a ver as idéias enquanto normas e valores cuja importância é uma função

das instituições materiais das quais elas emergiram, enquanto os institucionalistas

sociológicos as conceitualizam como estruturas cognitivas separadas das estruturas

formais.

A questão da definição é crucial aqui. Kathleen Thelen (1999) está certo ao

dizer que a contenda dentro do novo paradigma institucional caracteriza-se pelo

embate entre as visões materialista e normativa ou ideal de instituições56. Neste

sentido, há muito a ser dito por ambas as visões. A visão ideal ou normativa

corresponde a uma rejeição ao neo-institucionalismo: a idéia de que o foco sobre as

estruturas formais conduz a uma perspectiva simplista da política. Dessa maneira,

podemos argumentar que esta visão está mais predisposta a oferecer um

tratamento multidimensional da política, ao contrário da versão materialista. Então,

a visão ideal ou normativa contém, ao menos parcialmente, objeções relativas ao

que o novo institucionalismo ignora. A visão materialista traz a vantagem da

clareza analítica por que envolve uma ontologia onde instituições e sociedade são

mais claramente distintas. Isto não significa dizer que estes autores ignoram a

importância que as instituições ou outras estruturas materiais exercem sobre a

sociedade, mas sim que, em nome da parcimônia teórica, tais autores consideram

que a existência da variável instituição, não está associada ou subordinada a

qualquer mecanismo de reprodução social – elas tão somente são tomadas como

dado.

Na verdade, a visão normativa ou ideal pinta um cenário onde o Estado e a

sociedade são realmente uníssonos, até mesmo indistinguíveis, o que oblitera uma

55 Para uma análise dos principais aspectos do institucionalismo histórico Cf. Daniel Béland. 2005. Ideas, Interests, and Institutions: Historical Institutionalism Revisited. In: André Lecours. New Institutionalism – Theory and... citado. 56 Cf. Katheleen Thelen. 1999. Historical Institutionalism in Comparative Politics. Annual Review of Political Science, 380n12.

41

posição analítica central para o novo institucionalismo: as linhas que demarcam

nitidamente os limites entre o Estado e a sociedade. Isto é problemático para os

autores neo-institucionalistas por que dilui a lógica subjacente às estruturas formais

– e aqui o debate dentro do paradigma neo-institucional torna-se significante para

a ciência política como um todo – pois uma breve análise do estado da obra pode

nos mostrar que o grande desafio para nossa disciplina hoje é a construção da

ponte entre os ramos institucionalista (em sentido materialista tradicional) e as

tradições que enfatizam normas, valores, cultura e idéias57.

SOBRE INSTITUIÇÕES E AÇÃO SOCIAL

O argumento central dos neo-institucionalistas é que as instituições moldam

a ação. Os novos institucionalistas argumentam que a teorização dentro da ciência

política deve levar em conta o fato de que a ação jamais ocorre no vácuo

institucional. Enfatizando a importância teórica das instituições, os neo-

institucionalistas rejeitam duas perspectivas principais sobre a relação entre

instituições e ação. A primeira toma as instituições como o reflexo de forças sociais,

quaisquer que sejam suas naturezas (sóciopolítica, econômica, cultural e assim por

diante). Esta visão é controvertida por que descreve instituições como elementos

neutros, adaptáveis mecanicamente, seja às mudanças sociais, seja à continuidade

ou à preservação do equilíbrio da balança de poderes. A segunda perspectiva que é

criticada pelos novos institucionalistas considera as instituições como meros

instrumentos que podem ser manipulados pelos autores. Esta posição é

considerada inadequada por que exagera a extensão com que os atores podem

usar as instituições para servir aos seus objetivos políticos ou, mais

frequentemente, para a resolução dos seus problemas. Os autores neo-

institucionalistas consideram que esta visão despreza o impacto que as restrições

institucionais (constraints) exercem sobre a ação humana. Por conseguinte, os neo-

institucionalistas consideram que ambas as visões – instituições enquanto reflexo

de forças sociais ou instituições compreendidas enquanto instrumentos neutros –

ignoram o simples fato de que instituições podem, elas mesmas, afetar os

resultados políticos, ou seja, instituições possuem vida própria. O novo

57 No entender de uma das mais conhecidas institucionalistas históricas, Ellen Immergut, o problema do novo institucionalismo seria justamente o de não permitir uma orientação normativa. Sobre a crítica de Immergut aos limites do novo institucionalismo Cf. Ellen M. Immergut. 1998. The Theoretical Core of... citado.

42

institucionalismo caminha em direção à idéia de que as instituições representam

uma força autônoma dentro da política, e que seu peso pode ser sentido tanto

sobre a ação quanto sobre os resultados. Isto sugere que a análise política está

mais bem apoiada se as instituições são nosso ponto de partida. Ou,

metodologicamente falando, autores neo-institucionalistas advogam o uso das

instituições não apenas enquanto variáveis intervenientes, mas também,

principalmente, enquanto variáveis independentes58.

Adotando esta posição, os autores neo-institucionalistas reelaboram o

problema agência-estrutura. O novo institucionalismo pinta para si cenários teóricos

muito bem representados pelo dilema e, neste contexto, tem importância especial o

modo com que este debate tem sido reestruturado e rearticulado na ciência

política. Em alguma medida, o novo institucionalismo representa para a ciência

política um retorno estruturalista na medida em que ele redireciona seu foco para o

impacto das instituições sobre a ação humana. Todavia, a nova tradição

institucional levanta três novas questões no que diz respeito ao problema agência-

estrutura, desprezadas, ou antes, insignificantes para o velho institucionalismo e

outras tradições estruturalistas. São estas: Quais são os mecanismos com os quais

as instituições moldam a ação humana? Qual o verdadeiro peso das instituições

sobre os agentes? Qual a posição que um analista deve resguardar para as

instituições no estudo dos processos políticos, ou em outras palavras, o peso das

instituições recai somente sobre as estratégias dos atores ou também sobre suas

preferências?

Estas questões não são respondidas do mesmo modo por todos os neo-

institucionalistas. A questão de como as instituições afetam a agência é abordada

de dois modos diferentes. A primeira aposta nos modelos de tipo path dependency,

os quais se referem à relevância causal de estágios precedentes a partir de uma

seqüência temporal, ou seja, a idéia de que as instituições são formadas, tomam

vida própria e conduzem o processo político. Esta perspectiva particular é

frequentemente associada ao institucionalismo histórico. O conceito de path

dependency, mais precisamente, envolve a idéia de que um país ou região fazem

escolhas institucionais e iniciam movimentos quase autônomos, cujos custos de

58 Cf. Peter Hall e Rosemary C. R. Taylor. 2003. As Três Versões do Neo-Institucionalismo. Lua Nova, vol. 58; P. DiMaggio e E. Powell. 1991. The New Institutionalism in organizational Analysis. Chicago: University of Chicago Press; Bruno Théret. 2003. As Instituições entre as Estruturas e as Ações. Lua Nova, vol. 58.

43

reversão são muito altos, pois quase sempre, os rumos tomados pelos arranjos

institucionais obstruem reversões à escolha inicial59. Path dependency então,

envolve não somente um foco analítico sobre as instituições, mas também sobre a

contingência e a imprevisibilidade. Na verdade, instituições possuem mesmo uma

lógica própria, e por isso, sua criação e desenvolvimento resulta em conseqüências

não-planejadas ou imprevistas para os atores políticos.

Um outro modo de como os autores neo-institucionalistas tratam a questão

de como as instituições afetam a ação, diz respeito, à perspectiva de que as

instituições moldam a ação porque elas oferecem oportunidades e impõem

restrições. Esta perspectiva foi enfatizada primeiramente pelos institucionalistas da

escolha racional (embora não ignorada pelos institucionalistas históricos), e sugere

que o peso das instituições é sentido sobre os resultados na medida em que afeta

os indivíduos e as decisões coletivas. Neste contexto, a importância teórica das

instituições origina-se de seu efeito mediador sobre os cálculos dos atores, podendo

a base analítica do novo institucionalismo ser compreendida como a idéia de

escolha sob regras60.

Uma interessante estrutura inspirada pelo institucionalismo da escolha

racional é a idéia de actor-centred institutionalism, de Fritz Scharpf (1997)61. Para o

autor, o exame analítico das instituições serve para reduzir a dependência sobre

outras hipóteses por parte do pesquisador. O modelo caracteriza uma constelação

de atores, os quais se assemelham a jogadores de capacidades, percepções e

preferências, cujas interações podem seguir diferentes caminhos a depender do

arranjo institucional. Institucionalistas da escolha racional são também inspirados

sobre outras estruturas analíticas, por exemplo, o conceito de veto points e veto

59 Cf. P. Evans, D. Rueschemeyer e T. Sckoopol. 1979. Bringing the State Back in. Cambridge: Cambridge University Press. 60 O novo institucionalismo da escolha racional afirma que a criação de uma instituição é um processo estritamente intencional (contractual). Por conseguinte, institucionalistas da escolha racional estão mais predispostos a interessar-se pelas funções que estas instituições cumprem e pelas vantagens que propiciam, visto que essa permanência depende das vantagens que a instituição oferece (analiticamente, institucionalistas da escolha racional fazem o caminho inverso a o que é praticado pelos institucionalistas sociológicos, a saber: eles partem das conseqüências às origens. Sobre o conceito de instituição trazida pelo institucionalismo da escolha racional Cf. P. Hall e Rosemary C. R. Taylor. 2003. As Três Versões... citado; Paul K. MacDonald. 2003. Useful Fiction or Miracle Maker: The Competing Epistemological Foundations of Rational Choice Theory. American Political Science Review. Vol. 97, n.º 4, November. 61 Fritz w. Scharpf. 1997. Games Real Actors Play: Actor-Centered Institutionalism in Policy Research. Boulder: Westview Press.

44

players62. Veto players são atores cuja aprovação, em virtude de alguma

configuração institucional particular, possuem influência sobre a mudança, digo, a

quebra do status quo. Sua existência é reconhecida por todos os jogadores

envolvidos, o que significa que os veto points ou veto players moldam as

estratégias dos demais atores.

A segunda questão diz respeito ao peso das instituições sobre a agência

humana – ou o nível de estruturalismo envolvido na análise institucional –, o qual

também é abordado de duas maneiras. Neo-institucionalistas mais racionalistas no

que diz respeito à natureza das relações entre agentes e instituições argumentam

que o processo político é realmente conduzido pelos atores. Eles afirmam que

instituições representam um contexto para a ação antes do que uma força

autônoma. Os adeptos aos modelos de path dependency sugerem que instituições

possuem uma influência quase irresistível sobre a ação humana e por isso, a

autonomia dos atores seria severamente limitada em nome do desenvolvimento e

da reprodução institucional.

O estruturalismo aparece com mais força quando instituições são

conceituadas em termos de idéias, cultura, e normas, como no caso do

institucionalismo sociológico e algumas versões de institucionalismo histórico, pois

idéias, cultura e normas são internalizadas pelos atores. James March e Johan

Olsen (1989) têm desenvolvido poderosos argumentos sobre o dilema agência-

estrutura, em que eles têm afirmado que o comportamento é acionado por

elementos outros para além dos cálculos utilitários, os quais incluem princípios,

valores, normas, identidades e hábitos internalizados. A lógica das conseqüências,

onde os atores comportam-se de acordo com os resultados esperados, rivaliza com

a lógica das convenções, onde os atores comportam-se segundo suas regras e

valores. Até mesmo a própria idéia de racionalidade é vista para esta última como

um constructo cultural. A idéia subjacente a este argumento é que a ação humana

não é apenas moldada pelo contexto institucional, mas que também se justapõe a

ele. Por conseguinte, atores podem nem mesmo serem capazes de conceber

alternativas ao seu comportamento usual. O institucionalismo sociológico situa a

ação dentro de um vasto contexto sociológico, o que têm levado alguns autores a

62 George Tsebelis. 1995. Decision Making in Political Systems: Veto Palyers in Presidentialism, Parliamentarism, Multicameralism, and Multipartidarism. British Journal of Political Science, 25, 289-315.

45

argumentar estar se tratando esta tradição, mais precisamente, de uma teoria

cultural63.

A discussão sobre o lugar que se deve reservar às instituições dentro da

análise institucional liga-se ainda a primeira e a segunda questão. Para os

institucionalistas mais racionalistas, o impacto das instituições é sentido mais

estritamente sobre as estratégias. Os interesses e as preferências dos atores

seriam formados independentemente do ambiente institucional e seguiriam uma

chamada lógica da maximização. Em outras palavras, a formação das preferências

e a definição dos objetivos ocorrem, em termos analíticos, fora de qualquer

influência institucional64. A questão da formação das preferências, por isso,

permanece sem resposta. Para os institucionalistas sociológicos, bem como para os

institucionalistas históricos, instituições afetam não somente as estratégias e os

interesses, mas também os modelos de relação entre atores, preferências,

objetivos e identidades. Deste ângulo, instituições não somente representam

restrições ou incorporam oportunidades para a ação – instituições são variáveis

indispensáveis para a compreensão do processo de formação de preferências. Aqui

instituições estão envolvidas em várias dimensões da política e elas modelam o

processo político ao seu modo65.

Autores neo-institucionalistas estão longe de conceituar a interação entre

agência e estrutura de uma mesma maneira. Entretanto, estes autores parecem

concordar sobre um aspecto comum da relação entre instituições e ação – a ênfase

dos seus trabalhos recai, em sua grande maioria, mais sobre a dinâmica da

continuidade do que sobre a mudança institucional. Autores neo-institucionalistas

sugerem que atores adaptam seu comportamento à estruturas institucionais

63 Para um intercurso sobre os principais fundamentos do novo institucionalismo sociológico Cf. Robert Putnam. 1993. Making Democracy Work: Civic Traditions in Modern Italy. Princenton: Princenton University Press; M. Granovetter. 1985. Economic Action and Social Structure: The Problem of the Embeddedness. American Journal of Sociology, 91, Chicago, University of Chicago Press, pp. 481-510. 64 Como notam Hall e Taylor (2003), para o institucionalismo da escolha racional, “as instituições estruturariam as interações, influenciando a abrangência e a seqüência das alternativas na agenda de escolhas ou fornecendo informações e mecanismos de fiscalização que reduzam a incerteza sobre o comportamento correspondente dos outros e permitindo ‘ganhos na troca’, e assim levando os atores na direção de cálculos específicos e a resultados sociais potencialmente melhores”. Cf. Hall e Taylor. 2003. As Três Versões... citado. 65 Como também apontam Hall e Taylor (2003), o institucionalismo sociológico “(...) enfatiza a maneira pela qual as instituições influenciam o comportamento fornecendo scripts cognitivos, categorias e modelos que são indispensáveis para a ação, principalmente porque sem eles o mundo e o comportamento dos outros não poderiam ser interpretados. [...] Em muitos casos, as instituições estariam fornecendo os próprios termos por meio dos quais o sentido é atribuído à vida social”. Cf. (idem: 2003).

46

previamente existentes, por isso mesmo, tais autores estão mais predispostos a

legitimar arranjos institucionais e acreditar na continuidade institucional. Uma

conseqüência imediata destes pressupostos é que as possibilidades da mudança

institucional são sempre vistas de maneira limitada em favor da longevidade dos

arranjos, capaz de produzir um comportamento repetitivo por parte dos atores.

Desta perspectiva, a mudança institucional, pré-condição para a mudança política,

deixa de ser uma possibilidade digna de apreciação.

SOBRE A MUDANÇA INSTITUCIONAL

O novo institucionalismo encontra-se mais à vontade para explicar a

continuidade, antes do que a mudança institucional, porque sua lógica analítica foca

mais sobre a reprodução institucional do que sobre a sua transformação66. Neo-

institucionalistas argumentam que suas análises incorporam os cenários e situações

sociais correntes ao nascimento das instituições, as quais, uma vez criadas,

acreditam os autores, seriam autônomas em relação à sociedade e seu

desenvolvimento seguiria um caminho independente. Além do mais, argumentam

estes autores, instituições tenderiam a gerar incentivos positivos no sentido de fixar

de maneira crescente os mecanismos de reprodução do comportamento. Como

resultado, instituições adaptariam imperfeitamente e com muita demora qualquer

transformação na sociedade, e por isso resistiriam mais à mudança. Desta maneira,

a lógica inerente aos modelos de tipo path dependency serve mais ao reforço dos

mecanismos da permanência, do que às forças que levam à mudança, as quais, se

quer, são incorporadas a sua perspectiva teórica. A ênfase sobre a natureza

endógena das preferências explica, ao menos em parte, a pouca habilidades dos

autores neo-institucionalistas em lidar com o problema da mudança institucional.

Resta a estes pensadores argumentarem que as mudanças domésticas sempre

ocorrem em função de variáveis externas.

Alguns neo-institucionalistas, principalmente os da escolha racional, têm

adotado uma visão mais utilitária da mudança institucional. Eles sugerem que

instituições são necessárias porque elas aumentam o bem-estar dos atores

66 Faz-se necessário ressaltar aqui que a expressão “mudança institucional” pode servir a propósitos diferentes. Às vezes, é empregada em sentido mais estrito por institucionalistas da escolha racional, ao referir-se a alterações na estrutura das próprias instituições (o equilíbrio entre diferentes atores, por exemplo); em outras ocasiões, institucionalistas históricos e sociológicos podem aplicá-la em um sentido consideravelmente mais amplo, compreendendo além da organização política, as esferas social, econômica e cultural.

47

racionais e só são transformadas, quando elas tornam-se disfuncionais ou passam a

produzir resultados sub-ótimos. Neste sentido, instituições são criadas para o

propósito de assegurar contratos (commitments) entre os atores ou reforçar as

regras (rules). Racionalistas dizem que a fonte da mudança institucional é

encontrada nas próprias instituições, mais precisamente, no seu caráter

disfuncional ou subótimo; ou seja, de qualquer modo, a mudança é sempre

principiada pelos atores67.

Outros neo-institucionalistas, principalmente institucionalistas sociológicos,

tendem a ver a mudança institucional em termos de uma relação de convergência

entre as instituições e o cenário histórico-social. A idéia central aqui é isomorfismo,

e significa a coexistência entre as instituições e seus domínios e o ambiente onde

estas surgiram ou foram transplantadas. DiMaggio e Powell (1991) identificam três

mecanismos que levam ao isomorfismo: (i) a coerção, que envolve explicitamente a

pressão de outras instituições, assim como o ambiente cultural onde elas se

desenvolveram; (ii) o mimetismo, digo, a capacidade que estas instituições têm de

adaptar-se aos mais variados cenários; e (iii) as normas, as quais legitimam sua

autonomia. A idéia de isomorfismo institucional é coerente à ênfase sobre a

importância teórica das instituições porque situam os mecanismos da mudança

institucional dentro das próprias instituições. O isomorfismo envolve um limitado,

na verdade, unidimensional, perspectiva sobre a mudança porque ele não se

coaduna à idéia de uma mudança orientada. Da perspectiva do institucionalismo

sociológico, este tipo de transformação institucional é mais bem compreendida a

partir do conceito de legitimidade: instituições não são necessariamente

desagregadas quando perdem sua eficiência, tal como dizem os institucionalistas da

escolha racional, mas antes, quando elas não estão mais em sintonia com a

sociedade ou com os códigos culturais.

Uma interessante teoria da mudança política tem recentemente sido

proposta por Robert C. Lieberman68, o qual argumenta que nenhum

67 Analistas como Hall e Taylor (2003), Immergut (1998) e Therét (2003) a firmarem que o institucionalismo da escolha racional oferece boas explicações para a gênese e a permanência das instituições, mas oferecem poucos subsídios analíticos quando a questão é explicar sua modificação. Autores como Shepsle, por exemplo, tomam as regras como dadas em suas análises (variável independente) por acreditar que os atores têm mais incentivos para preservá-las do que para alterá-las. Cf. K. Shepsle. 1989. Studing Institutions. Some Lessons from the Rational Choice Approach. Journal of Theoretical Politics. 1, 2, pp. 131-147. 68 Robert C. Lieberman. 2002. Ideas, Institutions, and Political Order: Explaining Political Change. American Political Science Review, 96, 697-712.

48

institucionalista, nem nenhuma perspectiva institucional podem dar conta da

mudança institucional em virtude da sua inclinação à estabilidade, às regularidades

e à repetição. Lieberman sugere que a política pode ser conceitualizada como um

conjunto de regras, antes do que uma única e coerente ordem política. A mudança

política pode então ser vista como emergindo da fricção entre estas ordens. De

acordo com o que Lieberman propõe, nós podemos conjeturar que a ordem

institucional pode ser teorizada enquanto um mecanismo de ajustes e reajustes

entre instituições e idéias.

Neste sentido, de acordo com Lieberman (2002), um caminho para a

mudança institucional pode ser o foco sobre a discrepância entre uma situação

sociopolítica existente e aquela incorporada pelo contexto institucional; quando esta

discrepância torna-se gritante, instituições são submetidas à transformação, de

modo a incorporar a nova realidade social. Esta explicação assenta-se sobre um

cenário institucional, com alguma ênfase sobre o histórico particular destas

instituições; por conseguinte, esta explicação sobre a mudança afasta-se da idéia

de que as instituições são autônomas em relação à sociedade.

Alguns institucionalistas históricos têm formulado uma alternativa

intermediária para explicar a mudança institucional que envolve um foco sobre as

tensões inerentes às próprias instituições. Estes institucionalistas históricos

postulam que esta tensão existe porque instituições são criadas em diferentes

períodos históricos e tendem a incorporar o panorama sociopolítico do seu tempo.

Esta tensão deriva da justaposição de várias instituições as quais têm distintos, ou

mesmo contraditórios modelos de desenvolvimento e reprodução. Em outras

palavras, instituições se assentam sobre diferentes períodos históricos e carregam

consigo diferentes interesses e identidades. Assim, um mecanismo de ajustamento

é acionado quando a tensão torna-se insuperável. Deste ângulo, a tensão existe

dentro de um cenário institucional antes do que entre as instituições e a sociedade,

e os ajustes emanam das próprias instituições e não da sociedade69.

Os institucionalistas históricos, igualmente aos da escolha racional e sua

contraparte sociológica, têm uma predisposição a priorizarem a ordem e a

estabilidade. Todavia, a ênfase destes primeiros sobre a variante tempo e sobre as

69 Para uma maior discussão sobre as possibilidades analíticas do institucionalismo histórico Cf. Paul Pierson e Theda Skocpol. 2002. Historical Institutionalism in Comtemporary Political Science. In: Ira Katznelson and Helen V. Milner (eds.). Political Science: State of the Discipline. New York: Norton, pp. 693-721.

49

seqüências lhes oferece um potencial para explicar a mudança sem recorrer a

elementos exógenos, como fatores externos ou mesmo a agência humana. Logo,

esta tradição possui algum potencial para explicar a mudança sem libertar-se da

lógica que enfoca a tensão entre o conjunto de instituições ou entre a ordem

institucional e os vários processos sociopolíticos.

QUESTÕES METODOLÓGICAS E EPISTEMOLÓGICAS

Quais são as conseqüências metodológicas e epistemológicas da análise

política que se centra sobre as instituições? O novo institucionalismo é um projeto

teórico, seu objetivo não é descrever as instituições e como elas funcionam, mas

antes, explicar a produção dos resultados políticos, na tentativa de produzir

generalizações. O novo institucionalismo é fundamentalmente diferente das formas

precedentes de análise institucional, chamadas de velho institucionalismo, o qual

estava primariamente preocupado em compreender o funcionamento das

instituições70. Apesar do objetivo comum de gerar explicações e produzir teorias,

neo-institucionalistas não são unidos sobre a forma como deve proceder a análise

institucional e sobre a extensão com a qual a formulação de proposições gerais é

possível e desejável.

Autores neo-institucionalistas que conceitualizam o impacto das instituições

sobre o processo político em termos de path dependency, principalmente

institucionalistas históricos, tipicamente, iniciam suas investigações com questões

de pesquisa empiricamente direcionadas relatando resultados diferentes através do

tempo e do espaço. Para estes autores, a idéia é explicar porque eventos comuns,

processos ou situações socioeconômicas levam a diferentes resultados através dos

diferentes países ou regiões. Por exemplo, porque políticas similares cruzam

Estados e criam resultados controversos em ambos os casos? De um ângulo

temporal, o objetivo destes autores é explicar porque os processos desdobram-se

em certos resultados em pontos particulares no tempo. Para explicar estes quebra-

cabeças, institucionalistas históricos olham para as diferentes estruturas

institucionais apoiadas sobre a história específica de nações, regiões e até

70 Desde suas origens, a velha tradição comportamentalista assumiu os compromissos epistemológicos e metodológicos próprios da tradição estrutural-funcionalista. Cf. José A. R. Leone. 2002. El Neoinstitucionalismo y la Revalorización de las Instituiciones. Panorama, FCE, pp. 36-46.

50

continentes. Neste contexto, as generalizações produzidas por esta tradição são

formuladas a partir de parâmetros espaciais e temporais.

Em matéria de generalização, os institucionalistas históricos empregam

técnicas de periodização, isto é, eles dividem a história em frações. Lieberman

(2002) tem, proveitosamente, distinguido entre quatro estágios principais. Para as

origens institucionais, estes autores comparam períodos anteriores e posteriores à

criação de uma instituição. Para a mudança institucional, a estratégia é focalizar os

momentos que correspondem a substancial transformação das instituições. A

estratégia consiste em comparar os períodos antes e depois da mudança

institucional. A chamada estratégia das causas rivais caracteriza-se pelo exame da

continuidade quando a mudança não corre.

Para alguns institucionalistas que vêm de uma perspectiva mais racional, o

processo metodológico é dedutivo. Os resultados são considerados embaraçosos

quando eles não parecem seguir a lógica do comportamento racional ou, em outras

palavras, quando eles não corroboram as expectativas especificadas pela teoria.

Instituições são vistas aqui como um link entre a racionalidade e os resultados. O

argumento subjacente a este raciocínio é que as os resultados podem ser

explicados em termos do comportamento racional; se podemos reconhecer que as

instituições afetam o cálculo estratégico dos atores. Isto não implica dizer que a

análise política compreenda as instituições como estruturas históricas. Pelo

contrário, instituições são conceituadas aqui como restrições estratégicas.

Metodologicamente, institucionalistas da escolha racional utilizam modelos que

priorizam as micro-estratégias do comportamento individual. Usando este método,

estes autores podem olhar para os cenários, como uma legislatura, por exemplo, e

conseguem identificar um conjunto coerente de estratégias por parte dos autores

operando dentro de um bem definido contexto onde as escolhas são claramente

identificáveis e payoffs relativamente transparentes71.

Posições diferentes dentro do novo institucionalismo, naturalmente, refletem

este amplo debate dentro da ciência política. Não é surpresa que institucionalistas

da escolha racional argumentem que os institucionalistas mais predispostos à

71 Um conjunto ilustrativo desta safra são os trabalhos de Kenneth A. Shepsle. 1978. The Giant Jigsaw Puzzle. Chicago: Chicago University Press; K. Krehbiel. 1997. The Information in Legislative Organization. Ann Arbor: The University of Michigan Press; Gary Cox e Mathew D. McCubbins. 1993. Legislative Leviathan: Party Government in the House. Berkeley: University of Califórnia. (No capítulo 3 tratarei mais especificamente destas teorias que surgem no bojo no novo institucionalismo da escolha racional).

51

história estão mais propensos a desenvolverem estudos mais configurativos, visto

que se apóiam sobre uma grande quantidade de detalhes empíricos (históricos).

Institucionalistas da escolha racional, por outro lado, são criticados por sacrificar

nuances na construção de teorias que compreendem um nível muito alto de

abstração. Alguns autores têm sugerido que estas dicotomias são falsas e que, ao

contrário, autores neo-institucionais têm construído, cada vez mais, pontes

metodológicas e epistemológicas entre estes ramos. A verdade é que estas duas

posições têm levado a literatura neo-institucionalista à divisão. É importante

salientar ainda que, não são os autores neo-institucionalistas que decidem sobre os

diferentes caminhos metodológicos e epistemológicos, mas antes, são os variados

interesses teóricos que têm estimulado o desenvolvimento de caminhos

alternativos. Em outras palavras, a metodologia e a epistemologia servem para

iluminar a diversidade dentro do movimento neo-institucional e sinalizam as

conseqüências desta natureza multifacetada.

SOBRE OS VÁRIOS INSTITUCIONALISMOS E O PROBLEMA DA INTEGRAÇÃO TEÓRICA

É freqüente dizer que o novo institucionalismo não é uma escola teórica

coerente e unificada, e que esta inclui vários ramos que vêm desenvolvendo uma

relativa autonomia metodológica e epistemológica entre si. Tipicamente, três ramos

são identificados: o histórico, o sociológico e o da escolha racional72.

TABELA 3 – Enfoque Analítico dos Institucionalismos

Tipo de Institucionalismo Discussão Velho Institucionalismo: a história das instituições sociais, políticas e econômicas.

Histórico

Novo Institucionalismo: crítica aos usos do estrutural-funcionalismo na história. Combina um enfoque amplo com um estreito, ou seja, a análise das grandes instituições sociais (família, igreja, empresa, sindicato, etc.) com a análise das agências estatais de forma mais estreita. Instituições são compreendidas aqui como procedimentos, normas e convenções editadas por organizações formais da comunidade política ou da economia política.

72 Esta classificação tem ficado especialmente popular depois do trabalho inaugural de Peter Hall e Rosemary C. R. Taylor (2003), sendo preservada pelos demais analistas. Cf. André Lecours. 2005. New Institutionalism... citado.

52

Base Teórica: Estruturalismo, Funcionalismo, Teoria dos Conflitos, Neo-marxismo.

Comportamento e Causalidade: estratégico (guiado por objetivos); identidade do ator é exógena e endógena; forças ativas são modificadas pelas propriedades de cada contexto local, propriedades essas herdadas do passado (path dependency).

Referências: Evans, Rueschemeyer e Sckocpol (1979); Steinmo et. al. (1999); Pierson e Sckocpol (2002) são alguns trabalhos ilustrativos.

Característica Distintiva: a questão distintiva desta perspectiva está na tentativa de agregar a análise uma dimensão temporal, interpretando como o passado incide sobre o presente e o futuro, sem perder de vista que indivíduos são dotados de escolhas. Ao invés de basear seus cenários sobre a liberdade dos indivíduos, o institucionalismo histórico prefere modelar um mundo onde as instituições conferem a certos grupos um acesso desproporcional sobre o processo de decisão.

Abordagem: sua principal preocupação é a história de instituições particulares sob uma conjuntura histórica particular. Todavia, institucionalistas históricos não consideram que as instituições sejam os únicos fatores que influenciam na vida política. Esta abordagem procura situar as instituições dentro de uma cadeia causal que deixe também espaço para outros fatores, em particular, os desenvolvimentos sócio-econômicos e a difusão de idéias.

Velho Institucionalismo: as principais e mais tradicionais correntes teóricas da sociologia têm como objeto principal o estudo das isntituições. Não obstante, sobre todas as versões de natureza marxista ou durkheiminiana, se observa uma preponderância das estruturas sobre a configuração das condutas individuais.

Novo Institucionalismo: retoma a preocupação clássica com as instituições, todavia, rompe com a posição conservadora de que a estabilidade social é uma função das estruturas sociais. O novo institucionalismo sociológico reconhece a autonomia dos indivíduos e assume que as ações e relações sociais dão-se numa dimensão intermediária entre os atores e as macroestruturas.

Base Teórica: Teoria das Organizações Comportamento e Causalidade: sociologizado (indivíduos e organizações estão em busca de definir ou de exprimir identidades, conforme os modelos socialmente aceitos); identidade do ator é exógena e a racionalidade dos indivíduos é socialmente construída.

Sociológico

Referências: Giddens (1997); Archer (1998); Granovetter

53

(1985); Putnam (2005) são alguns bons exemplos desta.

Característica Distintiva: sua característica principal é a preocupação com o coletivo. O velho institucionalismo sociológico se preocupava em ver como as entidades coletivas criavam as instituições que modelavam as condutas, o novo institucionalismo sociológico se preocupa em compreender e explicar a forma como atores enraizados dentro de estruturas sociais moldam suas crenças e preferências.

Abordagem: instituições são criadas e adotadas em um mundo que já as tem em abundância. Nesse sentido, esta tradição procura explicar a dimensão interativa e criativa do processo pelo qual as instituições são socialmente construídas e o que confere a legitimidade dos arranjos institucionais.

Velho Institucionalismo: está baseado, principalmente, no paradigma econômico neoclássico, na economia de atores egoístas, racionais e em síntese, maximizadores. Os principais antecedentes deste tipo de institucionalismo procuravam dar conta da maneira com que as instituições, enquanto direitos de propriedade, modelavam a vida econômica. E dessa maneira, derrubavam por terra os ideais de mercados livres, mostrando que a realidade é dominada por grupos que têm o poder de modelar os resultados do mercado.

Novo Institucionalismo: representam um ressurgimento do interesse pelas instuições políticas e econômicas. Preocupam-se ainda em enfatizar que as decisões individuais (a partir de uma conduta de rational choice) não podem ser explicadas sem referência ao marco institucional mais amplo sob o qual elas estão inseridas. As instituições são vistas aqui como reduzindo os custos de transação por que faz previsível a conduta dos demais atores envolvidos.

Base Teórica: Economia das Organizações, Teoria da Escolha Racional, Teoria da Firma, Teoria da Ação (modelos do tipo Principal-Agente).

Comportamento e Causalidade: Estratégico (indivíduos querem maximizar seu bem-estar individual) e a identidade do ator é exógena.

Escolha Racional

Referências: Shepsle (1978, 1989a, 1989b, 1987); Weingast (1996, 2002); Shepsle e Weingast (1981); Shepsle e Boncheck (1997); Weingast e Marshall (1988); Przeworski (1995, 2003); Elster (2000, 1989); Ferejohn e Pasquino (2001); Downs (1999); Olson (1971); Arrow (1951); Krehbiel (1997); Cox e McCubbins (1993); Kiewiet e McCubbins (1991) compõem uma safra representativa desta tradição.

54

Característica Distintiva: sua preocupação com o poder, ou seja, a capacidade de uma pessoa ou grupo de controlar as ações de outros. As instituições cumprem um papel determinante nesta área – elas tornam as coisas mais fáceis para uns e mais difícieis para outros.

Abordagem: oferece uma explicação elegante das instituições, na medida em que se interessam pelas funções que estas cumprem e pelas vantagens que elas propiciam aos atores. Essa abordagem é ideal para explicar a permanência das instituições, visto que sua durabilidade depende das próprias vantagens que ela oferece.

Fonte: Elaborado a partir de DiMaggio e Powell (1991); Hall e Taylor (2003); Lecours (2005) e Therét (2003).

O institucionalismo histórico emergiu como uma reação ao behaviorismo e

pode ser associado à idéia de path dependency, o qual vê o impacto das

instituições sobre a ação mais em termos de conseqüências não-intencionais do que

sob restrições estratégicas. O institucionalismo histórico, geralmente, usa as noções

de choques externos ou tensão institucional para explicar a transformação e a

criação institucional. Institucionalistas da escolha racional, diferentemente,

enfatizam a importância das instituições no cálculo estratégico dos atores73. Aqui,

as instituições são vistas em termos materialistas como as regras que governam o

jogo político, sendo capazes tanto de oferecer oportunidades, como impor

restrições aos agentes74. A mudança institucional, para os autores mais

racionalistas, ocorre quando as instituições tornam-se disfuncionais ou capazes de

produzir apenas resultados sub-ótimos, quando os autores tomam a decisão

consciente de remodelá-las. O institucionalismo sociológico surge a partir da teoria

das organizações. Instituições para estes autores, são definidas em termos de

normas, valores, cultura e idéias. A tradição sociológica foca sobre uma dimensão

cognitiva de instituições, a qual se acredita internalizada pelos atores. As relações

de poder aqui estão intricadas dentro de uma complexa rede institucional cognitiva.

Em outras palavras, instituições moldam a percepção dos atores e, através deste

mecanismo, condicionam o comportamento a favor da reprodução das instituições.

Esta heterogeneidade é não só percebida por muitos estudiosos que vêem o

novo institucionalismo de “fora”, mas também por integrantes do próprio

movimento. A reflexão sobre o novo institucionalismo envolve algumas

73 Cf. George Tsebelis. 1998. Jogos Ocultos. São Paulo: Edusp. 74 Cf. Barry R. Weingast. 2002. Rational-Choice Institutionalism. In: Ira Katznelson e Helen V. Milner (eds.). Political Science: State of the Discipline. New York: Norton ,pp. 660-692.

55

considerações sobre isto, pois duas questões emergem com especial importância

aqui. Primeiro, a questão do núcleo teórico. Podemos dizer que os diferentes ramos

do novo institucionalismo compartilham o mesmo núcleo teórico? Há realmente um

único institucionalismo, ou vários? Segundo, há possibilidades destes diferentes

ramos teóricos caminharem juntos? Isto quer dizer, é possível uma síntese entre

estas várias tradições? Em outras palavras, estes ramos têm suficientes elementos

em comum que nos possibilite pensarmos a emergência de um único caminho?

Muitos autores argumentam que, na verdade, o novo institucionalismo tem

um núcleo teórico comum. Seu argumento é simples. Todos os três ramos vêem a

instituição como a única e mais importante variável para a explicação da política. O

fato é que os institucionalismos histórico, sociológico e da escolha racional dão

grande importância teórica às instituições e assumem a posição de que a análise

política é mais bem conduzida quando parte das instituições. O compartilhamento

desta posição seria suficiente para constituir um núcleo teórico, apesar do fato

destes ramos terem diferentes e muitas vezes divergentes visões sobre a natureza

das instituições, assim como sobre seu impacto sobre a ação e sobre os processos

que levam a sua criação, transformação e reprodução? Todavia, o

compartilhamento de um mesmo núcleo teórico não significa que haja um único

institucionalismo. É mais apropriado dizer que existem muitos neo-

institucionalismos, locados a partir de tradições intelectuais distintas: ciência

política histórica tradicional, teoria da escolha racional e sociologia. Representando

as instituições, um ponto de convergência na evolução destas tradições. Desta

perspectiva, instituições podem ser vista não como um ponto de partida, mas como

um ponto de aproximação entre estas tradições.

Outros autores têm sugerido que as diferenças entre os ramos do novo

institucionalismo, mais particularmente o histórico e o da escolha racional, não são

realmente importantes75. Estes autores advogam na verdade, de maneira

subliminar, um grande diálogo, ou mesmo uma síntese entre estes diferentes

ramos. Estas tradições incorporam diferentes posições metodológicas e

epistemológicas, como nós já discutimos, mas também distintas ontologias e

hipóteses sobre a arena política76. O institucionalismo da escolha racional é uma

75 Cf. Katheleen Thelen. 1999. Historical Institutionalism... citado. 76 Colin Hay e Daniel Wincott. 1998. Structure, Agency and Historical Institutionalism. Political Studies, 46, pp. 951-957.

56

extensão da teoria da escolha racional. Ele não pode, por isso mesmo, negar o

racionalismo e uma ontologia do conflito entre os atores77. Para os institucionalistas

da escolha racional, uma instituição é simplesmente um equilíbrio, isto é, um

modelo regular de comportamento com expectativas mútuas sobre os cursos de

ação que os atores irão tomar. O argumento principal para estes autores é que os

atores perseguem interesses fazendo escolhas sob restrições. Não obstante, o

institucionalismo surge como uma reação à popularidade e aos excessos do

behaviorismo. O institucionalismo histórico representa uma rejeição à noção da

política entendida como o resultado último de processos estratégicos de tomada de

decisão. Na verdade, os institucionalistas históricos preferem ver a política como

uma complexa rede de relações entre atores e instituições orientadas pela

contingência e a ausência de qualquer forma de planejamento previamente

definida. O institucionalismo sociológico origina-se da teoria da organização e

consequentemente, tem muito pouco de racionalismo e voluntarismo. O foco é

sobre a rotinização de efeitos psicológicos das estruturas culturais.

Institucionalistas sociológicos argumentam que o que você sustenta (preferências,

interesses, posições e finalmente, a ação) usualmente, depende do ambiente

normativo e dos modelos cognitivos prevalecentes naquela sociedade. Neste

sentido, o institucionalismo sociológico está longe de ser compatível com as

hipóteses da escolha racional.

Este debate entre os vários ramos do novo institucionalismo é importante

porque vai de encontro ao problema fundacional da teoria social: como explicar a

ação humana? Qual o peso que podemos reservar aos indivíduos e que lugar ocupa

o contexto institucional dentro das decisões tomadas, bem como a importância de

outros fatores como cultura, normas sociais e convenções? Embora não possamos

falar em uma unidade dentro do novo institucionalismo, e haja obstáculos que

dificultam os esforços em direção a uma síntese, esta hipótese não pode ser

totalmente desprezada78.

De acordo com Hirsch e Lounsbury (1997),

“Abordagens que estudam instituições não devem estar limitadas arbitrariamente a um determinado paradigma estruturalista ou restrito ao

77 John Ferejohn e Pasquale Pasquino. 2001. A Teoria da Escolha Racional na Ciência Política: Conceitos de Racionalidade em Teoria Política. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 16, nº 45, pp. 5-24. 78 Keith Dowding. 1994. The Compatibility of Behaviouralism, Rational Choice and New Institutionalism. American Political Science Review, 85, pp. 237-243.

57

estudo da ação. O que é necessário é uma atenção ao debate sociológico sobre a construção de formas de explicação mais complexas e completas que forneçam a ligação dos enfoques micro e macro de maneira a possuir diferentes níveis de análise interconectados” 79.

A análise das diferenças e similaridades institucionais por um único nível de

análise não é suficiente; ao contrário, existe a necessidade de examinar diversos

fatores em diferentes níveis para compreender tanto a variação quanto a

similaridade. Este estudo adota esta perspectiva e transpõe este debate do nível

dos paradigmas mais gerais da ciência política contemporânea para o subcampo

dos estudos legislativos, discutindo as possibilidades analíticas de um modelo de

explicação híbrido.

FIGURA 1 – Mapeando as Tradições Teóricas da Organização Legislativa

A principal diferença entre as três grandes correntes que analisam hoje o

Poder Legislativo diz respeito aos motivos pelos quais as instituições de organização

do processo decisório são criadas80. No organograma acima, pode-se vizualizar,

graficamente, a disposição dos principais pardigmas da organização legislativas e

as três principais teorias em que veio desembocar o novo institucionalismo da

teoria da escolha racional (teorias distributiva, informacional e partidária).

79 P. Hirsch e M. Lounsbury. 1997. Ending the Family Quarrel: Toward a Reconciliation of “Old” and “New” Institutionalisms. The American Behavioral Scientists, vol. 40, n.° 4. 80 São elas: a distributiva, a informacional e a partidária. Na verdade, estas últimas são dissensões da visão distributiva, que é a perspectiva dominante. Cf. F. Limongi. 1994. O Novo Institucionalismo e os Estudos Legislativos... citado.

Paradigmas da Organização Legislativa

Behaviorismo Novo Institucionalismo Determinismo

Novo Institucionalismo Histórico

Novo Institucionalismo da Escolha Racional

Novo Institucionalismo Sociológico

Teoria Distributiva

Teoria Informacional

Teoria Partidária

58

Na teoria distributiva, a ênfase recai sobre as motivações resultantes da

natureza do sistema eleitoral81. Para os autores identificados com esta corrente, os

congressistas são guiados pela lógica eleitoral e estarão interessados, quase que

exclusivamente, em aprovar intervenções de cunho clientelista.

Para a versão informacional, as instituições devem atender à necessidade do

Poder Legislativo de decidir com base no maior volume de informação disponível. O

Congresso, portanto, deve ser capaz de motivar os congressistas para que se

tornem especialistas em certas áreas e usem as informações de que dispõem para

o bem de todos. O foco é transferido para a tentativa de promover políticas

públicas bem informadas por meio da redução da incerteza82.

A perspectiva partidária questiona as premissas anteriores de que os

partidos não contam e que os interesses individuais dos congressistas é que são

relevantes, chamando a atenção para a importância dos partidos como elementos

estruturadores da atividade legislativa83. A necessidade de reforçar sua imagem

junto ao eleitorado torna-se um fator explicativo importante e a organização

legislativa é entendida como expressão e forma de controle dos partidos sobre a

ação parlamentar84.

Há tantos modos diferentes de conduzir a análise institucional quanto há

formas de ver a política. Na verdade, esta diversidade do novo institucionalismo

oferece um enorme escopo e capacidade para compreender os mais variados

processos políticos. O fato é que o as teorias positivas das instituições legislativas,

caracterizam-se hoje por este mesmo movimento plural, heterogêneo e,

indiscutivelmente, diferenciado, capaz de demonstrar uma profunda versatilidade

teórica e analítica comprovada por uma literatura crescente e carregada de

interesse para a ciência política. É neste sentido que Richard L. Hall (2002)85,

avaliando a progressiva corrosão da aparente uniformidade analítica dentro do

subcampo dos estudos legislativos nos últimos anos, pode afirmar:

81 Cf. Kenneth A. Shepsle e Barry R. Weingast (eds.). 2002. Positive Theories of Congressional Institutions. Ann Arbor: The University of Michigan Press, pp. 10-14. 82 Cf. Ibidem, pp. 14-17. 83 Cf. Ibidem, pp. 17-21. 84 Cf. Inês Santos e Fabiano Guilherme Santos. 1996. Um Modelo de Produção Legislativa em Diferentes Contexto Institucionais. Caxambu (Trabalho Apresentado no XX Encontro Anual da ANPOCS). 85 Cf. Richard L. Hall (2002). Empiricism and Progress in Positive Theories of Legislative Institutions. In: Kenneth A. Shepsle e Barry R. Weingast. Positive Theories of… citado.

59

“The analytical unity that characterized the field in the 1980s is now being contested. The standard wisdom that constituted a consensus five years ago is now undergoing revision. What are we make of the field?” “(…) theses approaches have more in common than a casual reading of them suggest. All draw in various ways on the logic of the new economics of organization in which institutions represent solutions to particular forms of transactions problems, solutions that allow members to capture the gains from cooperation. Furthermore, all the approaches not only focus on committees but also assume that institutionalization is in part an exchange of rights”86.

86 Cf. Kenneth A. Shepsle e Barry R. Weingast (eds.). 2002. Positive Theories of Congressional... citado.

60

CAPÍTULO 2

PRINCIPAIS, PREFERÊNCIAS E DIMENSIONALIDADE: A LÓGICA ANALÍTICA DA DELEGAÇÃO87

In framing a government which is to be administered by men over men, the great difficulty lies in this: you must first enable the government to control the governed and in the next place oblige it to control itself.

(James Madison, Federalist, n. 51)

Legislators who, from afar, appear as docile as sheep may in fact be the shepherds who guide the activities in the policy-making paddock.

(Lupia and McCubbins, 1999)

Uma importante contribuição da teoria política positiva88 aplicada aos

estudos das instituições congressionais é ilustrar como a realidade pode ser

enganosa. Cada teoria positiva busca ser uma tentativa de analisar a agregação de

preferências individuais, examinando as propriedades das regras (f) e mapeando o

contorno destas preferências (p) dentro de um dado cenário (x). Assim, qualquer

que seja a configuração de preferências (p), a imagem de (f) será sempre uma

relação designada por f(p). Esta relação pode exibir ainda resultados máximos ou

inesperados a depender do cenário (x)89.

Convencionalmente, a teoria positiva incorpora a idéia de comportamento

estratégico para a análise do comportamento individual. Cada teoria projeta uma

representação estratégica do comportamento (c) dentro de cada cenário (x). Neste

contexto, tal representação estratégica do comportamento será induzida, pelas

teorias da racionalidade, pela natureza do cenário estratégico (x) e pelas regras do

jogo (f). Ou seja, acredita-se que atores têm objetivos definidos a serem atingidos,

87 Versão preliminar deste capítulo foi apresentada ainda durante II Seminário de Ciência Política patrocinado pelo Programa de Doutorado em Ciência Política da Universidade Federal de Pernambuco. Agradeço a leitura prévia do mesmo e os comentários preliminares sugeridos pelos professores Simone Diniz (USP) e Ernani Carvalho (UFPE) quando o texto ainda era uma versão preliminar. 88 Por teorias positivas entendo aqui o conjunto de teorias sobre o Congresso norte-americano desenvolvidas com base em pressupostos comportamentalistas ou neo-institucionais, mas que possuem em comum a prescrição de postulados empiricamente motivados e acompanhados de suas respectivas corroborações e refutações. Cf. Kenneth Shepsle e Barry Weingast. 1994. Positive Theory of Congressional Institutions. Legislative Studies Quarterly, XIX, May, pp. 149-179; Milton Friedman. 1953. The Methodology of Positive Economics. In: Milton Friedman (ed.). Essays on Positive Economics. Chicago: The University of Chicago Press. 89 Sobre as propriedades da agregação direta de preferência sob regras ver David Austen-Smith e Jeffrey S. Banks. Positive Political Theory I: Collective Preference. Ann Arbor: University of Michigan Press, 1999.

61

e o fazem racionalmente90, digo, mediante a escolha dos meios adequados à

consecução dos fins.

O comportamento racional implica em fazer escolhas, isso nos faz supor que

cada escolha (e) também representa uma renúncia (r). Sempre que escolhemos

uma alternativa, renunciamos à outra, por isso, diz-se que toda escolha tem seus

custos. Ou seja, acredita-se que um ator não rejeitará o status quo (sq) inicial por

uma situação incerta ou que o ponha em uma situação inferior a que ele se achava

anteriormente. Desse modo, podemos afirmar que para a maioria dos atores deve

prevalecer a seguinte relação de preferências: sq>e>r, onde > significa preferível

à, se r<e, digo, se os custos da escolha forem maiores do que os da renúncia. Ou

seja, se as escolhas têm custos, espera-se que os legisladores escolham as

alternativas cujos benefícios excedam os custos. Sendo assim, parece incongruente

que determinados atores, sob certas condições, deleguem autoridade política a

favor de outros, ou pelo menos é isto que alguns analistas salientam quando tratam

da relação e distribuição de poderes dentro dos mais variados cenários

institucionais.

No que toca aos estudos das instituições congressionais, a lógica analítica da

delegação política cumpre um papel essencial na compreensão dos princípios e

postulados referentes a cada uma das três tradições que concorrem hoje pela

melhor explicação acerca da natureza e do funcionamento da esfera legislativa. Ao

seu modo, cada uma destas tradições (distributivista, informacional e partidária),

compreende uma cadeia distinta de delegação de poderes91. No caso da teoria

distributivista, a delegação dá-se dos distritos eleitorais para seus representantes e

destes para as comissões legislativas. Já para o caso da tradição informacional, a

transmissão dá-se do Congresso como um todo para as comissões, e destas para

os legisladores. E finalmente, no caso dos modelos partidários, as relações de

90 Os pressupostos comportamentais da Teoria da Escolha Racional já são amplamente reconhecidos pela literatura especializada: (i) um ator racional não pode sustentar crenças e preferências contraditórias entre si; (ii) estas preferências devem ser transitivas; (iii) suas decisões racionais devem estar em conformidade como o axioma do cálculo de probabilidades; (iv) sob equilíbrio, os atores agem em conformidade com as prescrições da teoria dos jogos; (v) as probabilidades subjetivas dos atores devem também aproximar-se de sua freqüência objetiva em equilíbrio; e (vi) sob equilíbrio, as crenças dos atores devem aproximar-se da realidade. Cf. George Tsebelis. Jogos Ocultos. São Paulo, Edusp, 1998. 91 Para uma análise das relações de delegação e dimensionalidade nas teorias positivas da organização legislativa Cf. Forrest Maltzman e Steven S. Smith. 2002. Principals, Goals, Dimensionality, and Congressional Committees. In: Kenneth A. Shepsle e Barry R. Weingast. Positive Theories of Congressional... citado.

62

delegação estabelecem-se a partir do partido majoritário na Assembléia e deste,

sequencialmente, para os legisladores e para as comissões legislativas.

Resta-nos saber quais razões levam estes atores a cederem tais

prerrogativas a outrens e, se assim o fazem, questionar até onde podemos

considerar tais atores como racionais ou passíveis de cálculo estratégico. O objetivo

deste capítulo é apresentar os elementos e pressupostos constitutivos da lógica

analítica da delegação política, realçando que os cientistas políticos têm se

preocupado mais com o quanto de autoridade é delegada pelos mais variados

atores políticos entre si, do que como e sob quais circunstâncias essa autoridade é

delegada. É neste sentido que os principais problemas levantados aqui serão: por

que os indivíduos delegam? Quais os limites da delegação? Digo, até onde a

delegação implica em abdicação de funções ou poderes? Quais são os problemas

mais freqüentes na delegação política e quais as possibilidades de atenuá-los? O

argumento principal que se desenvolve aqui é que a expansão da delegação nos

sistemas políticos não deve ser vista como um sinal de fraqueza ou sinônimo de

abdicação, mas como uma das possibilidades da governabilidade democrática ou

até mesmo sua principal característica.

A ESTRUTURA DA DELEGAÇÃO DE PODERES

Relações de delegação são, por definição, relações hierárquicas. Diz-se

mesmo que a delegação é o princípio da representatividade política moderna92.

Toda relação de delegação é moldada a partir de um ator o qual chamamos de

Principal (aquele que delega a autoridade) e um outro, o Agente (que recebe a

autoridade em nome de um Principal)93. Oriundo da teoria das organizações

industriais, mas hoje, amplamente utilizado pela ciência política, o modelo

Principal-Agente é uma ferramenta analítica apropriada para o estudo de processos

92 James Madison é uma das principais figuras históricas que articula o conceito de representação entendida como uma relação de delegação de poderes. Cf. Madison, James, Alexander Hamilton e John Jay. The Federalist Papers. Ed. Isaac Kramnick. Harmondsworth: Penguin. Ainda sobre a democracia entendida sob o prisma das relações de delegação de poderes, podemos citar Robert Dahl: “por ‘poder’ queremos descrever uma relação realista, tal como a capacidade de A de agir de tal maneira a controlar as reações de B” Cf. Robert Dah. 1989. Um Prefácio à Teoria Democrática. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. 93 As principais referências sobre o assunto ainda são as obras de Roderick Kiewiet e Mathew McCubbins. 1991. The Logic of Delegation. Congressional Parties and the Appropriations Process. London: The University of Chicago Press e Arthur Lupia e Mathew McCuubbins. 2000. Representation or Abdication? How Citizens Use Institutions to Help Delegation Suceed. European Journal of Political Research 37 (3): 291-307.

63

delegatórios na política, pois visa justamente esclarecer questões de controle em

contextos de assimetria de informação e conflito de interesses94.

Não surpreendentemente, a literatura especializada no estudo das

instituições políticas tem desprezado a eficiência das relações de delegação. E

dentre estas novas interpretações institucionais, talvez nenhuma instituição tenha

recebido tantos comentários desacreditados da comunidade de cientistas políticos

do que as organizações partidárias, sempre vistas como uma aglomeração amorfa

de indivíduos permanentemente dispostos a sacrificar os interesses partidários

(supra-individuais) em nome da consecução de suas preferências geograficamente

localizadas (princípio da maximização/reeleição). De acordo com os pressupostos

desta literatura, os partidos seriam incapazes de exercer qualquer tipo de controle

sobre seus membros ou manter blocos de votos que garantissem a aprovação das

políticas vendidas na eleição anterior, no máximo, limitar-se-iam à construção de

coalizões instáveis e ad hoc. Em geral, por que tais maiorias para aprovar uma

emenda na legislação ou uma política específica não passariam de logrolls

passageiros, estes autores afirmam explicitamente que o papel dos partidos

políticos, nas democracias contemporâneas, restringe-se a não constranger o

comportamento dos parlamentares individuais95.

Por conseguinte, aqueles que procuram medir a influência dos partidos

políticos têm, quase sempre, priorizados em suas investigações o partido

majoritário e não a distribuição e o equilíbrio de poderes entre os partidos dentro

do Congresso. Muito dessa análise desacreditada, entretanto, é apoiada sobre o

argumento de que a fraqueza e as limitações do partido majoritário são de natureza

auto-impositiva, digo, macro-estruturais96. Nesse sentido, algumas variáveis têm

sido escalonadas como contribuindo – se presentes – ainda mais para a fraqueza

dos partidos políticos, a saber: o federalismo, o bicameralismo, o single-member

districts e a separação de poderes. Grande parte dessa interpretação pessimista

94 Cf. Adam Przeworski. 1998. Sobre o Desenho do Estado: Uma perspectiva Agent x Principal. In: Luís Carlos Bresser Pereira e Peter Spink (orgs.). Reforma do Estado e Administração Pública Gerencial. Rio de Janeiro: FGV. 95 Algumas das análises mais formais e influentes da organização legislativa subtraem qualquer papel para os partidos na elaboração de políticas. Weingast e Marshall no modelo de organização industrial do Congresso norte-americano, por exemplo, explicitamente assumem a premissa de que partidos não devem constranger o comportamento de seus membros. Cf. Barry Weingast e William Marshall. 1988. The Industrial Organization of Congress. Journal of PoliticalEconomy 96: 132-163. 96 Cf. J. Cauby Monteiro, M. C. Mira Cavalero Monteiro e Tatiana L. de Lima. 2001. O Neo-institucionalismo e o Viés Antipartidário nos Estudos Legislativos. Adcontar, Belém, vol. 2, n.º 1, pp. 7-10, maio.

64

sobre os partidos políticos considera que, se o partido majoritário realmente

exercesse algum papel chave dentro do processo legislativo, este deveria ser uma

força efetiva na elaboração de políticas e agir como uma maioria. O que não ocorre

na prática, já que o papel dominante na elaboração de políticas é rotineiramente

transferido para outros – internamente, para as comissões permanentes e as

subcomissões; externamente, para o presidente e a burocracia. O pessimismo de

tal posição é ampliado ainda mais pelo que Kiewiet e McCubbins (1991) chamam de

hipótese da abdicação, ou seja, a suposição de que os partidos têm transgredido

seu papel político central quando desviam tarefas excedentes ou específicas para

outros atores. Nesta visão, a delegação de poderes conduz inevitavelmente à

abdicação, usualmente pouco a pouco, algumas vezes subitamente, mas em

qualquer caso completamente97.

Não obstante, nem sempre a delegação é compreendida como uma das

características principais das modernas poliarquias. Pelo contrário, aquilo que

parece coerente à luz da delegação política, frequentemente, é visto com

desaprovação por grande parte da maioria dos estudiosos98. Para os mais céticos, a

delegação de autoridade macula o princípio da representatividade democrática, na

medida em que os atores trocam responsabilidade (responsibility) pela criação de

políticas (policy-making), criando um intervalo quase intransponível entre os

legisladores (Agents) e aqueles que sentem a incidência da ação legislativa

(Principals). Neste sentido, diz-se que a delegação facilitaria a anulação de

responsabilidades por parte do Legislativo, sobretudo sob situações em que os

custos da escolha excedem o impacto da decisão sobre a sobrevivência do Agente.

A tese inicial desenvolvida por Kiewiet e McCubbins (1991) não contraria a

hipótese que toda relação de delegação impõe custos, todavia, eles não concordam

que relações de delegação, necessariamente, degenerem em abdicação. A hipótese

97 Roderick D. Kiewiet e Mathew D. McCubbins. 1991. The Logic of Delegation. Congressional Parties and the Appropriations Process. Chicago: Chicago University Press. 98 Para Hanna Pitkin, por exemplo, “(…) el representante moderno actúa dentro de una elaborada red de presiones, demandas y obligaciones; y existe una discrepancia considerable entre los legisladores en lo concerniente al modo apropiado de desempeñar su papel. En primer lugar, el representante político tiene un electorado y unos electores, no un principal. Es elegido por un gran número de personas; y, si bien puede ser difícil determinar los intereses o los deseos de un solo individuo, es infinitamente más difícil determinar los de un distrito electoral de miles de individuos. […] En segundo lugar, es un político profesional en un marco de referencia de instituciones políticas, un miembro de un partido político que quiere conseguir ser reelegido, y un miembro de un legislativo junto con otros representantes. Debe ser sensible a su partido político (tanto local como nacional) y ante diversos grupos e intereses públicos y privados”. Cf; Hanna Fenichel Pitkin. 1985. El Concepto de Representation.Madrid: Centro de Estúdios Constitucionales.

65

concorrente dos autores é que é possível delegar autoridade para outros e ainda

sim, continuar a perseguir suas preferências políticas. Na verdade, às vezes,

apostam os autores, o resultado desejado só pode ser alcançado delegando

autoridade a outrem. Dessa maneira, eles inovam o estudo da organização

legislativa e forçam a intelligentsia a repensar questões clássicas anteriormente

irrefutáveis da política norte-americana: a propalada autonomia das comissões

legislativas e a suposta (in)governabilidade do orçamento federal99, e a crença na

dominância do presidente nas relações Executivo-Legislativo100.

POR QUE DELEGAR PODERES?

Os adeptos da hipótese da abdicação afirmam que a disposição para delegar

apóia-se sobre algumas proposições principais, a saber:

� Considerações eleitorais (legisladores procuram maximizar suas perspectivas de reeleição demandando transferência de autoridade para as comissões cujas jurisdições coincidem com os interesses dos grupos de seus distritos eleitorais, logo, quão mais influente a comissão, maiores suas vantagens de perseguir e garantir a consecução das preferências legislativas).

� Anulação de responsabilidades (tendo em vista os custos da escolha, torna-se mais atrativa a opção de nomear um Agente que empreenda a ação do que arcar com os custos individuais da ação e assim, otimizar sua sobrevivência política. Trocando responsabilidade por policy-making, a delegação de poderes aqui, cria um intervalo político entre os legisladores e aqueles que

99 Para uma análise da hipótese da pretensa autonomia das comissões legislativas norte-americanas Cf. Kenneth A. Shepsle. 1987. The Institutional Foundations of Committee Power. American Political Science Review, vol. 81, n.º 01. 100 Interpretações estilizadas da dominância do Poder Executivo sobre o Legislativo apóiam-se sobre o pressuposto que sistemas presidencialistas estão fadados a um empate institucional forçado entre os ramos de Poder. Isto se explicaria primeiro, porque a conexão eleitoral entre Executivo e eleitores seria direta, e não, via Legislativo, tal como nos sistemas parlamentaristas. Segundo, por que democracias presidencialistas incorporariam um grande número de atores em qualquer decisão política, o que criaria problemas de ação coletiva e levaria presidentes a adotarem mecanismos unilaterais (decretos autoritários, por exemplo) como forma de impor suas preferências. Embora seja particularmente tentador pensar que presidentes dotados de mecanismos unilaterais devem usá-los para compensar o comportamento particularistas de legisladores, de forma a direcioná-los às questões programáticas da agenda política nacional, isto nem sempre é verdade. A idéia de que presidentes governam de maneira unilateral é uma daquelas afirmativas muito difundidas, mas pouco verificadas. Decretos autoritários, por exemplo, provavelmente, compreendem somente um campo limitado de circunstâncias – aquele onde as preferências entre Executivo e Legislativo não divergem tanto assim. O que implica em afirmarmos que, a má reputação dos poderes presidenciais pode seguir-se de uma falta de clareza sobre suas as cadeias de delegação entre os Poderes. Cf. John M. Carey e Matthew Soberg Shugart (eds.). 1998. Executive Decree Authority. Cambridge: Cambridge University Press; Idem. 2003. Presidents and Assemblies. Constitutional Design and Electoral Dynamics. Cambridge: Cambridge University Press.

66

sentem mais diretamente a incidência da ação legislativa, o que não só dificulta a percepção de responsabilidades como ainda, incita a desconfiança).

� Falta de especialização política (as assembléias representativas seriam incapazes de formular, satisfatoriamente, políticas sobre os mais variados e complexos assuntos do mundo moderno, restando apenas a opção de delegar a um Agente especializado, digo, que detenha expertise política, a tarefa de elaborar ou até mesmo aplicar políticas específicas).

� Evitar paralisia institucional (a ação sobre projetos de lei pode ser bloqueada em vários momentos do processo legislativo por pequenos grupos de oponentes estrategicamente identificados e posicionados, a fim de evitar a paralisação completa, restaria a opção de delegar a alguém (Agente/externo) com poder de decisão, a consecução dos objetivos).

DELEGAÇÃO E ORGANIZAÇÃO DO CONGRESSO

Indivíduos delegam autoridade política a cada pleito eleitoral ao escolherem

os representantes que julgam mais aptos à consecução de suas preferências. Estes,

uma vez eleitos – seja para maximizar suas preferências, seja por falta de

familiaridade com a complexidade da arena legislativa ou mesmo, no pior dos

casos, para anular possíveis responsabilidades políticas –, delegam autoridade a

outros atores. Dentro da organização legislativa, as três formas mais convencionais

de delegação política dão-se, primeiro, dos partidos políticos para subgrupos de

membros dentro de comissões permanentes, depois, do Legislativo para o

Executivo e finalmente, do Legislativo para os quadros de funcionários não-eleitos

da burocracia federal101.

Cada uma destas formas de delegação levanta diferentes séries de

considerações e implica cada qual, numa relação diferente entre Principal e Agente.

Por conseguinte, cada uma destas relações implica num conjunto também diferente

de problemas a serem superados. De nenhum modo, entretanto, as decisões de

delegação têm sido estabelecidas constitucionalmente ou derivam dos princípios do

governo. Ao contrário, uma característica comum de toda delegação congressional

101 Cf. Roderick D. Kiewiet e Mathew D. McCubbins. 1991. The Logic of Delegation. Congressional Parties and the Appropriations… citado.

67

é que elas ocorrem diretamente contra os ideais e expectativas daqueles que

organizaram o Congresso nos anos formativos da instituição.

A DELEGAÇÃO PARA AS COMISSÕES

Uma das primeiras desventuras da nascente república norte-americana foi a

interpretação Jeffersoniana do Congresso como um fórum onde todo membro seria

um nobre e nenhum homem conduziria. Embora estes ideais não sejam rejeitáveis

em sua base filosófica, na prática este ideal foi dissipado por uma série de

imperativos políticos e organizacionais. Para a posição Jeffersoniana, qualquer ação

empreendida por um legislador fora dos princípios gerais da legislação sobre o floor

seria considerada um modo inexeqüível de proceder.

Como acreditar que estes legisladores devam gastar grande parte do seu

tempo deliberando sobre matérias que eles nada conhecem, ou ainda, pouco lhes

interessa? Os Federalistas encontraram a solução para este problema na prática,

desenvolvendo no Congresso norte-americano a delegação da autoridade legislativa

às comissões parlamentares102. A nova divisão de trabalho dentro do Congresso

não somente apressou a fluidez da legislação, mas também, encorajou o

desenvolvimento de expertise política, memória institucional e maior estabilidade

na elaboração de políticas.

Não obstante, a conquista de expertise e eficiência organizacional resultou

também numa grande desigualdade de influência através dos domínios políticos.

Comissões agora poderiam explorar informação superior e outras vantagens

estratégicas e usa-las para benefício próprio dentro de suas respectivas jurisdições.

Desde então, é de esperar que legisladores só venham a investir seu tempo em

comissões que tratem de temas que sejam condescendentes aos seus interesses

parlamentares ou aos interesses do seu distrito eleitoral103.

Aos olhos das tradições distributivista e informacional, a delegação de

autoridade legislativa para as comissões seria necessariamente corrosiva para os

partidos do governo, visto que a ascendência de um dito – governo das comissões

– dissiparia e difundiria a autoridade antes depositada sobre os partidos políticos,

102 Cf. Cf. Madison, James, Alexander Hamilton e John Jay. The Federalist Papers... citado. 103 Na verdade, como Gilligan e Krehbiel reconhecem, membros do Congresso não investem seu tempo, nem sua energia em comissões cujas jurisdições fogem ou extrapolam seus interesses pessoais e eleitorais. Cf. Thomas Gilligan e Keith Krehbiel. 1987. Collective Decision-Making and Standing Committees: An Informational Rationale for Restrictive Amendments Procedures. Journal of Law, Economics, and Organization, 3: 287-335.

68

que agora só podem contribuir para a elaboração de políticas de forma fragmentada

e desarticulada. Na visão de muitos autores, a controvérsia sobre a pretensa

autonomia das comissões e sua relação com o partido do governo ainda é uma

questão pendular. Embora para um conjunto coerente de estudiosos o pêndulo

tenha balançado um pouco nos últimos anos para várias democracias. De acordo

com estes autores, os partidos vêm tornando-se mais ativos e impositivos, para

evidenciar isso, estes autores verificam as prerrogativas dos Presidentes do

Congresso e dos Líderes dos Partidos em algumas democracias, de modo a pôr à

vista a influência da estrutura partidária sobre os destinos dos parlamentares ou

mesmo sobre o processo de indicação e nomeação para as mais variadas comissões

legislativas104.

A DELEGAÇÃO PARA O EXECUTIVO

Um outro elemento central do pensamento Jeffersoniano era a compreensão

do Congresso como um braço supremo do governo, o qual deveria ser totalmente

livre e independente da influência do ramo Executivo. Para os Federalistas, só seria

permitido ao Executivo prover o Congresso com informações, não podendo emitir

opinião ou oferecer recomendação sobre propostas de legislação. Contudo, levando

em conta os caminhos trilhados pelas modernas poliarquias no último século e a

complexidade da política contemporânea (a divisão de tarefas dentro do Congresso,

os poderes de veto outorgado ao Executivo e o papel crescente assumido pelos

partidos e líderes partidários nas últimas décadas), não seria ingenuidade acreditar

numa doutrina da supremacia legislativa? A realidade institucional mostra que o

intrincado jogo legislativo apresenta insuperáveis problemas para qualquer doutrina

da preponderância legislativa. Alguns autores identificam pelo menos duas

fraquezas endêmicas do legislativo, a saber: a inabilidade para agir rapidamente e

a inabilidade para desenvolver e coordenar políticas abrangentes. Nesta visão, a

conjuntura institucional tem levado os membros do Congresso a confessarem suas

deficiências e delegarem ao Executivo as tarefas legislativas, seja por que a

legislatura não pode cumprir, seja por que pode ser mais vantajoso delegar tarefas

a um Agente que pode ser claramente responsabilizado pelo eleitorado, neste caso,

104 Sobre a hipótese partidária e a extensão do uso da teoria do cartel legislativo para explicar a organização de outras instituições legislativas além das norte-americanas Cf. Mark P. Jones e Wonjae Hwang. 2005. Party Government in Presidential Democracies: Extending Cartel Theory Beyond the U.S. Congress. American Journal of Political Science. Vol. 49, n.º 2, April, pp. 267-282.

69

a persona do presidente, um primeiro-ministro ou qualquer outro funcionário do

Executivo.

Enquanto, historicamente, o século XIX parece ter pertencido aos

Congressos, o século XX, de maneira geral, parece ter pertencido ao Executivo.

Para os defensores desta posição, a expansão do governo federal sobre os negócios

domésticos e a dotação de poderes legislativos aos Executivos reflete a inaptidão

das assembléias representativas para manusear legislações complexas. Outros

cientistas políticos, mais preocupados com o papel que as comissões e

subcomissões exercem no Congresso, apontam para os efeitos deletérios deste

novo arranjo de poder sobre a qualidade da democracia105. Para estes autores, um

modelo mais harmonioso e integrativo entre os poderes só pode ser conquistado

delegando maior autoridade legislativa para as comissões permanentes do

Congresso. Nesse sentido, alguns autores apontam para o crescente processo de

especialização interna das comissões legislativas como um movimento no sentido

de frear o controle do ramo Executivo sobre o processo legislativo. Contudo, é

necessário ressaltar que, a despeito do efeito que a delegação de autoridade para o

Executivo pode impor à habilidade legislativa para perseguir uma agenda política ou

fiscalizar as ações executivas, o enaltecimento do Executivo em algumas das

principais poliarquias modernas deu-se mais por escolha dos próprios legisladores

do que pela ambição usurpadora dos Executivos Federais106. As redes de delegação

construídas entre os ramos Executivo e Legislativo tornam-se ainda mais

complexas quando pensamos que, apesar das particularidades históricas de cada

poliarquia, a situação torna-se ainda mais complexa quando podemos pensar que

esta transferência de poder, freqüentemente, fora iniciada pelo próprio ramo

Legislativo.

A DELEGAÇÃO PARA A BUROCRACIA

É consenso dos autores que a delegação da iniciativa legislativa para o

Executivo é largamente, matéria de escolha. Entretanto, é inevitável que o

Congresso tenha que delegar a tarefa de programar políticas públicas aos

funcionários não-eleitos da burocracia federal. De acordo com os preceitos

105 Para uma crítica aos usos das prerrogativas legislativas por parte do Executivo Cf. Guillermo O’Donnell. (1991). Democracia Delegativa? In: Novos Estudos Cebrap, n.º 31, outubro, p. 25-40. 106 Cf. John M. Carey e Matthew Soberg Shugart (eds.). 1998. Executive Decree Authority... citado.

70

Jeffersonianos, caberia aos burocratas um pequeno espaço de ação ou

interpretação para a execução das leis aprovadas pela legislatura. Para este fim,

seria imperativo que o Congresso elaborasse legislação concreta e específica para

dominar e controlar este ramo. Esta doutrina opõe-se frontalmente ao princípio da

delegação e apóia-se sobre os pressupostos da teoria contratualista que defende

que o consentimento do governado – manifestado nos pleitos eleitorais – é a única

base legítima para o exercício do poder coercitivo do governo.

De acordo com muitos observadores críticos, a franca e vasta delegação da

autoridade de elaboração e aplicação de políticas por parte dos funcionários não-

eleitos da burocracia federal foi produto de uma característica vital do nervo

institucional. Enfrentando o clamor público de fazer alguma coisa sobre problemas

urgentes, e incapaz de concordar sobre o que fazer, o Congresso passou a sua luta

por estabilidade para outros Agentes e instituiu-os para resolver tais problemas. Em

vez de se antecipar, o Congresso evadiu-se de suas responsabilidades reforçando o

princípio da delegação. Na teoria, o Congresso deveria sempre reivindicar uma

porção do seu mandato legislativo exigindo o controle da atividade burocrática,

todavia, não é isso que se vê. De acordo com Morris Fiorina (1981), porque os

benefícios derivados da supervisão da atividade burocrática são bens públicos

(digo, não individuais), faltam aos membros do Congresso os incentivos suficientes

para que se empenhem nestas tarefas107.

A AÇÃO COLETIVA E OS LIMITES DA DELEGAÇÃO

Como o Congresso produz políticas públicas sobre um crescente número de

questões e domínios, um dos seus maiores problemas são as dificuldades da

realização da ação coletiva (collective action). O ponto central deste dilema é que

indivíduos, procurando maximizar seu auto-interesse, têm incentivos para

comportar-se de modo desfavorável aos interesses da comunidade como um todo.

A lógica subjacente a este raciocínio é que as escolhas racionais individuais

produzem resultados coletivos irracionais108.

107 Dessa maneira, a tensão central das teorias contemporâneas sobre a delegação legislativa para a burocracia repousa exatamente no conflito potencial entre a expertise burocrática e o desejo legislativo de controlá-la Cf. Morris P. Fiorina. 1981. Congressional Control of the Bureaucracy: A Mismatch of Incentives and Capabilities. In: Lawrence Dodd e Bruce Oppenheimer (eds.). Congress Reconsidered. Washington: Congressional Quarterly Press, pp. 332-348. 108 O melhor exemplo deste dilema foi oferecido por Mancur Olson (1966) e o problema do carona (free rider).

71

Outra barreira para que os indivíduos entrem em ação coletiva pode ser

ainda a falta de coordenação. Em contraste ao dilema do prisioneiro, onde

estratégias dominantes produzem um equilíbrio ineficiente, o espaço legislativo é

freqüentemente caracterizado pela possibilidade de múltiplos equilíbrios eficientes.

Os membros do Congresso estão, em geral, incertos quanto às estratégias que

outros membros desejam perseguir, por conseguinte, a coordenação pode não ser

nunca alcançada.

Outro obstáculo ainda à consecução da ação coletiva diz respeito à

instabilidade da escolha social109. A decisão de uma comunidade de empenhar-se

em ação coletiva pode levá-la a uma alternância cíclica de escolhas, por exemplo, a

comunidade pode escolher construir uma escola, um parque, um parque ou

novamente uma escola. A comunidade pode unir-se para devotar recursos a uma

alternativa ou à outra, mas nunca poderá executar qualquer uma dessas

alternativas aleatoriamente. Uma implicação importante da instabilidade da escolha

social é que um ou mais membros da comunidade podem, estrategicamente,

manipular o processo de tomada de decisão para vantagem própria. A manipulação

da agenda pode produzir escolhas vantajosas para um número restrito de membros

à custa da maioria110.

De acordo com a maioria dos teóricos, a melhor resposta para o problema

da ação coletiva é minimizar sua ocorrência, seja restringindo sensivelmente o

número de atores envolvidos no processo, seja derivando os benefícios coletivos de

arranjos simples de reciprocidade111. Esta última compreende o contexto das

organizações (firmas, burocracias, associações, comissões legislativas, assembléias

representativas, etc.) em que a ação coletiva é efetivamente coordenada, onde os

dilemas do prisioneiro são mais facilmente superados e as decisões sociais estáveis

são mais prováveis de serem alcançadas. O que estas formas de organização têm

em comum, no entanto, é a delegação de autoridade do Principal para um ou mais

Agentes. Tais organizações podem ser definidas como uma rede de sobreposição de

funções e autoridades, capazes de ampliar a totalidade dos ganhos de troca (gains-

109 Cf. Kenneth J. Arrow. 1951. Social Choice and Individual Values. New York, John Wiley & Sons, Inc. 110 A principal referência ao problema das maiorias cíclicas ainda é Richard D. McKelvey. 1976. Intransitive in Multidimensional Voting Models and Some Implications for Agenda Control. Journal of Economic Theory 12. 111 Adam Smith já argumentou no passado que o bem estar de uma comunidade é mais bem realizado dentro de um mercado individual de transações (mão invisível) do que dentro de um esquema de planejamento benevolente.

72

from-trade) se as tarefas são delegadas para Agentes com talento, treino e

inclinação para fazê-las. A delegação do Principal para o(s) Agente(s) aqui é a

chave para a divisão do trabalho e o desenvolvimento da especialização.

Os subordinados em uma organização são, naturalmente, Agentes de seus

superiores, estes, podem ainda ser Agentes de um outro Principal. Neste sentido, a

delegação de autoridade é um artifício das organizações para driblar os problemas

da ação coletiva. Por conseguinte, Agentes devem ser dotados dos recursos que

eles precisam para executar efetivamente as tarefas que lhe são delegadas. No

caso dos partidos no Congresso, Líderes podem utilizar a proeminência de sua

posição para induzir o processo legislativo para um ponto do seu interesse ou de

interesse do partido, seja restringindo o leque de escolhas disponíveis, seja

reunindo maiorias sobre uma alternativa preferível. Através de sua habilidade para

estruturar a agenda política, os Líderes podem não só resolver velhos problemas de

coordenação, mas também, superar a instabilidade da escolha social. Não obstante,

qualquer influência ou poder que um Líder partidário tem sobre o processo

legislativo é uma conseqüência da delegação dos membros do partido112.

Em qualquer relação de delegação, um Agente procura maximizar sua

retribuição sujeita às restrições oferecidas pelo Principal. O Principal, de maneira

oposta, procura estruturar o relacionamento com o Agente de modo que os

resultados produzidos através dos esforços do Agente sejam o melhor que o

Principal poderia realizar dada a escolha inicial por delegar esta tarefa. Há então

um conflito natural de interesses entre o Agente e o Principal, conflito esse oriundo

da assimetria de informação que persevera entre eles. É da natureza de qualquer

relação de delegação, que o Principal sempre experimente alguma redução do seu

bem-estar. Tratam-se dos riscos que um Principal corre delegando autoridade a um

Agente, que por sua vez, pode perseguir outros objetivos que não os do Principal.

Neste sentido, dizemos que estas relações geram perdas de delegação (agency

loss) quando o Agente realiza ações que o Principal não teria realizado em seu

lugar113. O objetivo primordial de qualquer relação de delegação entre dois ou mais

atores é, portanto, reduzir as possibilidades de comportamento oportunista por

112 Cf.Gary Cox e Mathew D. McCubbins. 1993. Legislative Leviathan: Party Government in the House. Berkeley: University of California Press. 113 Sobre os riscos envolvidos em qualquer relação de delegação Cf. Kaare Strom. 2003. Parliamentary Democracy and Delegation. In: Kaare Strom, Wolfgang Müller e Torbjörn Bergman. (eds.). Delegation and Accountability in Parliamentary Democracies. London: Oxford University Press.

73

parte do Agente, ou seja, trata-se de restringir os incentivos que criam um

ambiente particularmente adequado às atitudes pouco nobres de um Agente. E a

melhor forma de fazer isso, é buscando reduzir a assimetria de informações que

existe entre os atores, digo, combatendo os problemas de informação oculta

(hidden information), ação oculta (hidden action), e o dilema Madisoniano

(Madison’s dilemma)114.

AÇÃO E INFORMAÇÃO OCULTAS

Por informação oculta entendem-se as vantagens que um Agente tem em

relação a um Principal de possuir ou utilizar, ou tão somente ocultar, informação

para benefício próprio. Em toda relação de delegação, um Agente possui e adquire

informação que é indisponível para o Principal ou muito cara para este obtê-la. Da

incompatibilidade de incentivos que permanece entre ambos, surge o problema da

revelação sincera de informações e os incentivos que o Agente possui para utilizar

estas informações de maneira estratégica. Aqui podemos incluir ainda os riscos de

seleção adversa (um Principal delega autoridade a um Agente, mas não conhece as

características desse Agente, se talentoso, preguiçoso, aplicado, competente ou

não, etc.).

O segundo problema – a ação oculta –, diz respeito à impossibilidade do

Principal mapear, permanentemente, os passos do seu Agente, e assim, garantir

que este se comportará de acordo com o seu melhor interesse. Por exemplo,

acionistas não podem observar se as ações que os Agentes das firmas tomam estão

de acordo com o seu melhor interesse, eleitores não podem observar se as ações

dos seus representantes eleitos – seus Agentes – estão orientadas segundo suas

preferências. A ação oculta pode ser especialmente problemática quando as ações

dos Agentes, somente parcialmente, determinam os resultados, como no caso da

produção de políticas públicas. Nesse caso, o Principal será sempre incapaz de

inferir a conveniência das ações dos seus Agentes a partir dos resultados

meramente observáveis.

114 Cf. Kaare Strom. 2003. Parliamentary Democracy and Delegation… citado; Roderick Kiewiet e Mathew D. McCubbins. 1991. The Logic of Delegation... citado.

74

O DILEMA MADISONIANO

Finalmente, o dilema Madisoniano (melhor representado na epígrafe que

abre este capítulo), junto aos problemas da informação e ação ocultas, representa

a armadilha potencial para todas as instituições que se pautam em relações de

delegação. A essência do problema é que os recursos ou a autoridade delegados a

um Agente sob o propósito de promover o melhor interesse do Principal, pode

voltar-se contra o próprio Principal. Embora o problema seja recorrente nas

relações de delegação, ele tem sido amplamente reconhecido pela teoria política

liberal, principalmente em contextos onde Agentes envolvidos encontram-se em

posição de liderança. O dilema Madisoniano, por conseguinte, não é uma

conseqüência dos problemas de ação ou informação oculta – que podem até piorar

a situação, mas antes, é levantado por agentes que exploram a posição estratégica

que lhes foi outorgada115.

COMO EVITAR QUE A DELEGAÇÃO DEGENERE EM ABDICAÇÃO?

Embora algum prejuízo seja significante em qualquer relação de delegação,

isso não quer dizer que toda relação de delegação deva degenerar em uma espécie

de política sem lei. É nesse sentido que algumas medidas podem ser

experimentadas a fim de controlar ou ao menos reduzir as perdas de delegação

(agency loss), o que também não quer dizer que estas medidas possam vir a ser

pouco custosas (agency costs)116:

DESENHO DO CONTRATO

A especificação de tarefas e responsabilidades de um Agente por um

Principal deve satisfazer o princípio da restrição de participação, ou seja, a

retribuição de um Agente deve ser pelo menos tão vasta quanto os custos de sua

oportunidade, mas menos do que o benefício marginal que o Principal pode obter

das ações do Agente. Trata-se de criar um esquema de incentivos para que o

Agente comporte-se segundo os planos do Principal. Assumindo que a restrição de

participação seja satisfeita, o objetivo do Principal é delegar tarefas e

responsabilidades, e especificar uma correspondente escalação de compensações

115 Cf. Roderick Kiewiet e Mathew D. McCubbins. 1991. The Logic of Delegation... citado. p. 26. 116 Ibidem, pp. 27-34.

75

(retribuições), de modo que o Agente seja motivado a melhor servir aos interesses

do Principal. Cada contrato pode especificar recompensas negativas ou sanções,

particularmente quando o Agente é capaz de tomar ações que podem ser muito

prejudiciais ao Principal. Em algumas situações, precisamente quando é difícil

detectar o não-cumprimento das diretivas de um Principal por parte de um Agente,

as sanções estipuladas para garantir a execução de uma tarefa podem ser muito

mais distantes do que os benefícios que o Agente obtém do não-cumprimento da

tarefa.

Sob as condições que usualmente imperam em uma relação Principal-Agente

(informação e ação ocultas), designar retribuições escaladas pode nem sempre ser

um negócio profícuo. A teoria das organizações oferece abundantes exemplos de

esquemas de compensação que criam incentivos para os Agentes comportarem-se

de outro modo do que o planejado pelo Principal. Na prática, embora esses arranjos

(esquemas de compensação) possam contribuir para mitigar as perdas de

delegação, elas podem ainda ser muito caras para o Principal e não,

necessariamente, remover todos os incentivos inapropriados. Dadas as dificuldades

envolvidas no desenho de contratos ótimos, uma estratégia alternativa aos

Principais, além dos esquemas de compensação, pode ser analisar, dentro de um

período de tempo restrito, o desempenho de um Agente na consecução de um

modesto grupo de tarefas e responsabilidades, sob um nível também modesto de

compensações. Partindo do pressuposto que Agentes que executam pobremente as

tarefas não desejam ser elevados ou podem ainda ser rebaixados e demitidos, o

Principal pode minimizar os riscos associados à estratégia de contratação do

Agente. Tal estratégia pode funcionar ainda melhor quando os Agentes podem ser

induzidos a competir um com o outro – a lógica subjacente aqui é que numa

organização hierárquica, há mais indivíduos procurando promoção para um nível

superior do que há oportunidades disponíveis.

MECANISMOS DE SELEÇÃO

Uma política que primeiro contrata e depois ajusta a compensação

(retribuição) não trata o problema da seleção adversa mencionado anteriormente,

visto que a oferta de um determinado nível de compensação atrai somente aqueles

candidatos cujos custos de oportunidade são menores do que os da oferta. Isto

acontece por que há pouco a ser feito sobre seleção adversa alterando as

76

compensações de um contrato. O maior problema é que a informação revelada por

um Agente durante a realização de uma tarefa (desempenho), pode ser custosa

para o Principal ou as reais capacidades de um Agente podem levar muito tempo

para tornarem-se aparentes. Além disso, Agentes podem deturpar suas habilidades

e preferências num momento t¹ para revelá-las somente mais tarde num momento

t², o que não pode ser evitado ou minorado pelos contratos.

A fim de reduzir prejuízos provenientes do desconhecimento do trabalho e

do desempenho dos Agentes, os Principais podem optar por utilizar-se de

mecanismos de seleção que podem anteceder o estabelecimento de um contrato ou

nem mesmo chegar a cogitá-lo. Através de mecanismos de seleção, as capacidades

e qualidades de interesse fundamental do Agente tornam-se aparentes, o que pode

representar sinais confiáveis para um Principal. Entre estes sinais, alguns podem

ser controlados totalmente, outros apenas parcialmente. No mundo político, os

sinais compreendem um fenômeno importante. Candidatos ao Congresso que já

exerceram algum cargo eletivo, por exemplo, têm mais chances de serem reeleitos

do que aqueles que nunca serviram em qualquer cargo desta espécie. Uma razão

possível para isso é o sucesso prévio e os sinais emitidos pelo candidato para o seu

eleitorado durante o exercício do mandato. Outro exemplo é o caso dos partidos

que não nomeiam calouros para as comissões de amplo impacto externo porque

estes ainda não tiveram tempo suficiente para demonstrar suas qualidades – se

compatíveis ou não com as qualidades tradicionalmente exigidas pelo partido para

ocupar estes postos117.

MONITORAMENTO E EXIGÊNCIA DE RELATÓRIOS

Uma vez que um Principal e um Agente tenham entrado em uma relação de

delegação, a melhor forma de driblar os problemas de ação e informação ocultas é

instituir procedimentos, exigindo dos Agentes que relatem qualquer informação

relevante que eles tenham obtido, e qualquer ação que eles tenham tomado. Feito

isso, a informação oculta não será tão oculta assim se o Agente for de alguma

maneira, obrigado a revelá-la. Sobre as bases de informação produzidas pelo

Agente, o Principal pode, presumivelmente, fundamentar as compensações do

Agente de modo a aproximar seu comportamento da conduta ideal. No entanto, o

117 Sobre os mecanismos institucionais dos partidos políticos para controlar seus membros Cf. Gary Cox e Mathew D. McCubbins. 1993. Legislative Leviathan... citado.

77

estabelecimento destes procedimentos para a provisão e consumo de informações

pelo Principal pode refletir dois tradeoffs não muito positivos. Primeiro, a

transferência de informação pode ser não só custosa e demorada para o Principal,

como contribuir para que o Agente desvie-se da execução de suas tarefas.

Segundo, de tanto desejar ardentemente informação, às vezes, o excesso de

informação, não só mergulha o Principal num emaranhado de informações inúteis,

como também não garante que o que esteja sendo revelado tenha realmente

importância.

A mais séria desvantagem da exigência de relatórios, já mencionada

anteriormente, é o problema da revelação verdadeira de preferências ou da

incompatibilidade de incentivos. O Agente tem incentivos para ocultar informação e

ações e elaborar relatórios favoráveis a ele mesmo ou que desvie a atenção do

Principal. Agentes podem perceber que empregar energia, habilidade e criatividade

na elaboração de relatórios periódicos pode ser mais vantajoso do que ocupar-se de

suas tarefas. Da mesma maneira, ainda que Agentes sejam constrangidos a agir de

maneira sincera em seus relatos, mesmo assim, Principais permanecerão ainda sem

conhecer aquilo que escapou aos relatos. Por essa razão, Principais complementam

a solicitação de relatórios com o que Schwartz e McCubbins (1984) têm intitulado

patrulhas de polícia (police patrol) – auditorias, investigações e outros métodos

diretos de monitoramento. Para serem efetivos, patrulhas policiais devem ser

aplicadas de modo a preservar o elemento surpresa. Monitoramentos deste tipo

podem representar para o Principal um grande gasto de tempo e esforço, além do

que, a supervisão constante pode ser ainda moralmente corrosiva tanto para o

Agente, quanto para o Principal118.

Quase sempre, as ações de um Agente afetam indivíduos que não têm parte

alguma no contrato original. Frequentemente, estes indivíduos são os beneficiários

mais diretos das ações dos Agentes, como quando um funcionário fornece um

serviço para um cliente em nome do proprietário de uma empresa ou quando um

burocrata libera benefícios para eleitores em nome de um parlamentar ou do ramo

Executivo. Por que as terceiras partes afetadas têm incentivos para observar e

fiscalizar as ações do Agente, as oportunidades de supervisão podem ser

118 Sobre as patrulhas de polícia Cf. Mathew D. McCubbins e T. Schwartz. 1984. Congressional oversight overlooked: police patrol versus fire alarm. In: American Journal of Political Science, 28: 165-79.

78

potencialmente menos custosas e mais confiáveis do que as oportunidades

oferecidas pelas patrulhas de polícia. Ao invés de examinar o conjunto das

atividades dos Agentes procurando por ações inapropriadas ou pelo uso impróprio

da informação – a exemplo do que as patrulhas de polícia fazem a partir da

exigência de relatórios –, Principais obtém aqui informação através das terceiras

partes afetadas. Isso acontece por que terceiras partes têm incentivos que estão de

acordo com os interesses do Principal e não, como no caso dos Agentes, em conflito

com eles. A este mecanismo de supervisão, Shwartz e McCubbins têm chamado

alarmes de incêndio (fire alarm)119.

De acordo com os autores, alarmes de incêndio oferecem várias vantagens,

em detrimento das patrulhas de polícia. Primeiro, permitem ao Principal reunir

informação ao menor custo se comparados aos cultos originários das patrulhas.

Como os alarmes são em geral produzidos por terceiras partes, Principais são, com

freqüência, desonerando de maiores gastos. Segundo, alarmes de incêndio podem

permitir também uma melhor provisão de informação. Na medida em que as

patrulhas se prestam ao escrutínio de uma amostra temporalmente limitada de

ações de um Agente, alarmes estão usualmente relacionados à denúncia de

infrações específicas, o que não só pode mitigar, sensivelmente, o tempo gasto em

uma investigação, como possibilitar uma análise mais plena das ações do Agente e,

por conseguinte, identificar mais facilmente comportamentos ímprobos ou violações

de conduta. Finalmente, alarmes de incêndio podem ser preferíveis às patrulhas por

que é usualmente difícil especificar um contrato prévio com um Agente que venha a

cobrir, sem ambigüidades, todas as contingências que possibilitam identificar

quando o Agente violou o contrato. Neste sentido, alarmes de incêndio, à sombra

das queixas que podem ser emitidas por terceiras partes, oferecem ao Principal a

oportunidade de que os Agentes possam explicar em detalhes seus objetivos mais

claramente.

119 McCubbins e Schwartz (1984) diferenciam as patrulhas de polícia (police patrol) e os alarmes de incêndio (fire alarm), enquanto mecanismos de controle, respectivamente, formal e informal que buscam suprir as limitações de monitoramento convencional, com ênfase para o funcionamento e a eficiência dos alarmes de incêndio. Cf. Mathew D. McCubbins e T. Schwartz. 1984. Congressional oversight overlooked: police patrol versus fire alarm... citado.

79

CONTROLES INSTITUCIONAIS

A maior parte dos modelos do tipo Principal-Agente caracteriza o problema

central de qualquer delegação de poderes – como um Principal pode induzir um

Agente a despender mais esforço do que o que ele pretende na consecução de suas

tarefas? A hipótese subjacente aqui é que, quanto mais os Agentes trabalham, mais

eles devem produzir e mais devem se aproximar das preferências do Principal.

Todavia, Agentes encontram-se, mais frequentemente, em uma posição mais

propícia a ferir e prejudicar os interesses do Principal do que simplesmente sonegar

esforço. Fraudes, corrupção e abuso de autoridade são apenas alguns exemplos do

mau comportamento de Agentes pouco nobres. A questão é: Principais precisam

frustrar as habilidades dos Agentes para perseguir cursos de ação unilateral e

garantir, se não a conduta ideal dos Agentes, pelo menos, a mais decorosa

possível. De todas as medidas defensivas relatadas até aqui, o uso de controles

institucionais (checks) compreende o posicionamento de Agentes, um contra o

outro, tal como já fora pensado por Madison – ambição freando ambição.

Uma vez que a autoridade tenha sido delegada a um Agente, o

estabelecimento de controles institucionais requer que seja outorgada pelo menos a

um outro Agente, autoridade suficiente para vetar ou bloquear as ações do

primeiro. Trata-se do estabelecimento de controles interligados que possam frear o

comportamento arbitrário de um Agente, inibindo suas habilidades para

empreender ações que o Principal considere indesejáveis. Controles institucionais

são equivalentes ao que os teóricos da escolha racional referem-se como a

presença de subgrupos de veto120. Os resultados relativos aos efeitos práticos dos

subgrupos de veto, que são, geralmente, intuitivos. Primeiro, quanto mais há

grupos com poderes de veto, diz-se que mais difícil é para alterar o status quo. Não

por acaso, o status quo torna-se também mais difícil de ser alterado quando as

preferências dentro dos subgrupos tornam-se homogêneas e as preferências entre

os subgrupos são heterogêneas. Nesse sentido, controles institucionais inibem a

habilidade dos Agentes para tomar ações que um Principal considera indesejáveis,

mas também atrasam ou até mesmo atrapalham os Agentes na hora de

120 Para uma análise dos usos do conceito de veto points e veto players pelos teóricos da escolha racional Cf. George Tsebelis. 1995. Decision Making in Political Systems: Veto Players in Presidentialism, Parliamentarism, Multicameralism, and Multipartidarism. British Journal of Political Science, 25, 289-315; David P. Baron e John A. Ferejohn. 1989. Bargaing in Legislatures. American Political Science Review, vol. 83(4), pp. 1181-1206.

80

empreender as ações ditas desejáveis. Por conseguinte, pode-se dizer que o desejo

de impor controles sobre a autoridade delegada aumenta com a utilidade que o

Principal obtém do status quo e com a soma dos perigos atribuídos às ações

inapropriadas de um Agente.

A partir de uma cadeia de delegação política, cidadãos (Principais) delegam

poder a um representante (Agente), que está autorizado a tomar decisões políticas

e, incondicionalmente, delega poder a outros Agentes em nome do mesmo

Principal. Enquanto muitos estudiosos têm afirmado que, membros dos

Parlamentos e membros dos Congressos, ao delegarem suas tarefas, têm feito

pouco mais do que seguir de maneira inquestionável as propostas e os sinais

daqueles que fixam a agenda legislativa, os modelos analíticos da delegação têm

argumentado que a dita fraqueza dos órgãos legislativos, necessariamente, não

significa que legisladores tenham abdicado de suas funções, pelo contrário. A

despeito da assimetria de informações que existe em qualquer delegação de

poderes, acredita-se que seja perfeitamente possível delegar tarefas sem a perda

total do controle sobre o processo legislativo.

81

CAPÍTULO 3

AS TEORIAS POSITIVAS DA ORGANIZAÇÃO LEGISLATIVA EM PERSPECTIVA COMPARADA

These scholars view the committee system as the formal expression of a comprehensive logrolling arrangement. In large, diverse republic political interests will be heterogeneous – things dear to one set of representatives will be of little value to others, and vice versa. Thus, logrolling can produce gains from trade…

(Fiorina, 1987) Distributive theories paint an individualistic, conflictive, and demand-side picture of legislative politics. Informational theories extend beyond these three features. They explicitly characterize collective objectives alongside individually rational behavior. They allow for informed decision making alongside distributional conflict. And they accommodate the supply side as well as the demand side when analyzing the choice of organizational forms

(Krehbiel, 1991) Why do political parties exist and persist in democratic societies? The existence question would seem to belong to a more general class that also includes the questions why business firms exist, why public bureaucracies exist, and why armies exist. One general answer is that all these organizations help solve collective dilemmas: they overcome bad incentives and strategic uncertainty.

(Gary W. Cox and Mathew D. McCubbins, 1994)

As tentativas de explicar o princípio da ordem e a superação do caos dentro

da arena legislativa partem pela busca de um elemento aglutinador capaz de trazer

equilíbrio121 e estabilidade a um terreno aparentemente transitório e movediço. No

geral, as teorias positivas da organização legislativa primam por tentar explicar

como indivíduos presumivelmente individualistas e clientelistas podem estabelecer

contratos (logrolls) suficientemente estáveis e capazes de superar a

121 O significado de equilíbrio aqui é o mesmo já elaborador por Jon Elster (2000) para as ciências sociais, a saber – equilíbrio é o estado no qual os planos das pessoas são consistentes entre si e há um mínimo de previsibilidade da ação humana, ou seja, espera-se que, ao interagirmos com alguém, conseqüências não-intensionais não ocorram. Com isso, Elster não pretende defender que as ciências sociais sejam uma ciência preditiva, mas antes, constatar que o convívio social exige, por parte dos indivíduos, um juízo, ainda que incerto, sobre o que vai acontecer ao interagirmos com alguém, por exemplo. Cf. Elster. 2000.Peças e Engrenagens das Ciências Sociais. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, p. 124.

82

heterogeneidade de suas preferência em direção à consecução de um bem comum

ou da ação coletiva.

A teoria distributiva ou hipótese dos ganhos de troca (gains from exchange)

sugere que o equilíbrio da organização legislativa está apoiado sobre a alocação da

influência legislativa de acordo com a extremidade e intensidade das preferências

dos legisladores122. De acordo com esta tradição, adotando este princípio de

organização, uma legislatura pode não só invalidar a imprevisibilidade da regra da

maioria, mas também alocar recursos clientelistas para os distritos eleitorais

preferenciais dos legisladores que aderem a este acordo tácito. Partindo do

pressuposto que as chances de reeleição são sensivelmente minoradas para

aqueles que não conseguem granjear tais benefícios distributivos para seus distritos

eleitorais (constituents), a adesão ao acordo é quase prescrita ao legislador.

Todavia, a quase incontestável hipótese dos ganhos de troca tem sofrido

consideráveis transmutações que burlam o pretenso caráter indisputável de seus

pressupostos. Para os falsificacionistas da tradição distributiva, a chamada hipótese

dos ganhos de troca não explica as condições sob as quais os tais contratos

legislativos são estabelecidos ou se mantêm, ou seja, para estes autores, a

hipótese alocativa não compreende um conjunto muito sólido de pressupostos, mas

antes, afirmações imprecisas sobre pressupostos pouco verificados123. É neste

sentido, que estas pesquisas arrebatem o argumento distributivo e focam suas

análise menos sobre as preferências individuais dos legisladores e dos seus distritos

(demand side) e mais no problema da incerteza dos contratos e nas possibilidades

oferecidas pelo desenho institucional dos parlamentos aos legisladores (supply

side)124.

122 Thomas W. Gilligan and Keith Krehbiel. 1994. The Gains from Exchange Hypothesis of Legislative Organization. Legislative Studies Quarterly 19, n.º 2 (May), pp. 181-214. 123 Para uma crítica aos pressupostos da teoria distributiva Cf. Keith Krehbiel. 2004. Legislative Organization. Journal of Economics Perspectives, vol. 18, n.º 1, pp. 113-128; David W. Rode. 1994. Parties and Committees in the House: Member Motivations, Issues, and Institutional Arrangements. Legislative Studies Quarterly 19, n.º 3 (August), pp. 341-359. 124 A tipologia aqui adotada demand side e supply side foi elaborada inicialmente por Shepsle e Weingast. Do lado da procura (demand side), os autores identificam a teoria distributivista, do lado da procura (supply side), as teorias informacional e partidária Cf. Kenneth A. Shepsle and Barry R. Weingast. 2002. Positive Theories Congressional Institutions. Ann Arbor: The University of Michigan Press.

83

TABELA 4 – Quadro de Classificação das Teorias

Demand Side Supply Side Postulados

Teóricos Teoria Distributiva Teoria Informacional Teoria Partidária Idéia Central O legislativo é

compreendido como um mercado de trocas sob restrições (exchange and cooperation).

O processo legislativo vai além do individualismo e do conflito e incorpora objetivos coletivos que perpassam o comportamento individual racional.

Partidos políticos funcionam como mecanismos capazes de promover a solução de problemas de ação coletiva.

Foco Analítico Políticas (policies). Escolhas sobre instituições.

Escolhas sobre instituições.

Natureza dos Bens Particularistas Coletivos Coletivos Variável Explicativa Sistema eleitoral. Distribuição de

recursos dentro da arena legislativa.

Distribuição de recursos dentro da arena legislativa.

Comissões Legislativas

Poderosas (autonomia decisória).

Relativamente poderosas (submetidas ao legislador mediano).

Fracas (submetidas ao poder do partido majoritário).

Composição das Preferências Legislativas

Preferências outliers (self-selection).

Preferências nonoutliers.

Preferências nonoutliers.

Referências The Giant Jigsaw Puzzle (Shepsle: 1978).

Information and Legislative Organization (Krehbiel: 1991).

Legislative Leviathan: Party Government in the House (Cox e McCubbins: 1993).

Fonte: Elaborado a partir de Shepsle (1979); Shepsle e Weingast (1987); Weingast e Marshall (1988); Krehbiel (1991); Cox e McCubbins (1993).

O problema central da instabilidade dos contratos, presente, seja na tradição

distributiva, assim como na informacional ou na partidária, levou-me a optar aqui

por uma abordagem, comparativa entre estas ramificações teóricas. A despeito de

suas diferenças, estas teorias são similares em alguns aspectos principais: todas

assumem que os conflitos são resolvidos por atores orientados segundo objetivos

racionais125, e todas caracterizam a arena política como um jogo de conflito entre

125 O ponto de partida aqui é a teoria da escolha racional e a proposição de que o comportamento coletivo pode ser entendido em termos de atores que procuram atingir seus objetivos. Estes podem ser desde indivíduos isolados ou mesmo grupos, o que importa é que tenham objetivos a atingir, e que o

84

quem ganha e quem perde. Num plano analítico podemos dizer que estas teorias

convergem quanto ao problema da instabilidade da escolha social e seus limites à

consecução do bem comum, mas divergem quanto à natureza do bem em questão

– se mais particularista ou mais coletivo, digo, se mais pork barrel126 ou mais

informação. Nas próximas seções, tratarei mais detalhadamente destas gerações

teóricas, partindo, inicialmente, dos pressupostos basilares da tradição

distributivista para finalmente, interpelar suas refutações, discutindo os problemas

e modelos alternativos de racionalidade oferecidos pelas tradições informacional e

partidária.

DEMAND SIDE: ALOCAÇÃO DE RECURSOS E RACIONALIDADE DISTRIBUTIVA

Já foi dito que as teorias positivas da organização legislativa estão

interessadas em explicar por que legisladores presumivelmente racionais, ao

agirem assim, conseguem agregar suas racionalidades individuais e divergentes

para um nível coletivo. O modelo distributivo que se alude nesta seção começa com

a observação de que os políticos chegam à legislatura com uma variedade de

propósitos, dentre estes, um principal – a busca pela reeleição. A partir deste

propósito específico, a teoria origina o chamado princípio da conexão eleitoral, do

qual, derivam-se os demais elementos constitutivos da teoria, digo, os conceitos de

bem público, heterogeneidade de preferências e reciprocidade entre os legisladores.

Uma lógica aparente da troca e da cooperação (exchange and cooperation)

impera para estes modelos distributivos. Ou seja, é por que os legisladores têm um

objetivo principal em comum (a reeleição no próximo pleito eleitoral) que estes são

incitados a compartilhar de suas autoridades legislativas, de modo que sob

quaisquer circunstâncias de decisão (decision-making), a heterogeneidade das

inclinações legislativas seja atendida da melhor maneira possível. Nos modelos de

tipo distributivo, qualquer legislador é orientado pelo problema da execução de

suas plataformas particularistas dentro de um ambiente altamente competitivo. Ao

façam racionalmente, ou seja, mediante a escolha de meios adequados à consecução dos seus fins. Desta perspectiva, a teoria da escolha racional não procura retratar indivíduos como átomos egoístas e isolados, para ela, sejam os objetivos altruístas ou egoístas, ambos podem ser admitidos dentro de um cálculo racional. Trata-se de um modelo tripartite de ação apoiado sobre os conceitos de racionalidade instrumental, auto-interesse e maximização de preferências Cf. Coleman, James (1999). Foundations of Social Theory. London: Harvard University Press 126 Por falta de melhor tradução para o termo em português, optei por adotar a grafia da palavra em língua inglesa. A melhor correspondência lingüística para o termo pork barrel seria verbas governamentais para melhoramentos locais, com fins políticos (eleitorais).

85

extremo, cada legislador representa a ínfima porção de 1/n, sabendo-se que n

representa o conjunto heterogêneo das preferências de uma dada legislatura (onde

legisladores propõem gastos específicos para seus distritos à custa de muitos

outros distritos) 127.

A troca e a cooperação aparecem aqui não como um arranjo imposto aos

atores, mas como uma solução espontânea e auto-induzida pelo impasse. Os

legisladores sabem que sendo a arena legislativa, em geral, conduzida pelo

princípio da maioria, se todos os legisladores fizerem opções intransigentes quanto

à consecução de suas prerrogativas, todos perdem e ninguém ganha. Logo, deve

imperar entre os legisladores um modelo de racionalidade quase contratual – se eu

ajudo (x) com seus objetivos, em troca (x) me ajuda com os meus, esta lógica

cooperativa não excede as expectativas de retribuição e aumenta as perspectivas

de realização dos meus objetivos, e todos ganham128. Em resumo, há sempre

possibilidades de ganho e troca para os atores envolvidos.

Por conseguinte, o desafio primordial dos modelos distributivos é explicar

como a cooperação social entre legisladores ditos racionais pode ser possível. A

idéia de um legislativo que funciona à semelhança de um mercado de trocas

smithiano pode ser tentadora, mas na verdade, tal como já fora elaborado por

Weingast e Marshall (1988), o problema é mais complicado do que parece. A

heterogeneidade das inclinações legislativas torna o suporte de trocas necessário e

atrativo, todavia o peso das escolhas legislativas sobre seus projetos individuais

jamais devem exceder a carga que os projetos legislativos individuais podem

suportar, sob pena de – para garantir a consecução dos projetos de outros,

legisladores venham a perder seu assento. Estamos tratando aqui, especificamente,

dos riscos e custos morais a que estão submetidas as escolhas dos legisladores, e

seus limites129. Por exemplo, a troca legislativa nem sempre é simultânea.

Dificilmente, um legislador poderá aprovar o projeto de um outro concorrente seu

127 A melhor representação modelar deste problema é o clássico Dilema do Prisioneiro, onde todos os jogadores têm uma estratégia dominante, isto é, uma estratégia que é sempre a melhor resposta a todo e qualquer movimento dos oponentes. Cf. Jon Elster. 2000. Peças e Engrenagens das Ciências Sociais... citado, pp. 45-6. 128 Cf. Kenneth A. Shepsle and Barry R. Weingast. 2002. Positive Theories of Congressional... citado, p. 154; Barry Weingast e William Marshall. 1988. The Industrial Organization of Congress. Journal of Political Economy 96: 132-163. 129 Para maiores considerações sobre a relação entre heterogeneidade das preferências legislativas e os riscos imputados pelas escolhas individuais Cf. Weingast, Barry e William Marshall. 1988. The Industrial Organization... citado.

86

cujas idéias ameacem seus interesses particularistas ou vá à contramão de sua

plataforma eleitoral.

A necessidade de estender a sobrevida dos acordos (agreements) e garantir

a sua robustez, de modo que sejam capazes de resistir a eventos imprevistos,

aparece para os modelos distributivistas como um outro problema premente. Para o

novo institucionalismo da teoria da escolha racional, a esfera legislativa

compreende um mundo em que os acordos são forjados entre agentes

autônomos130. Instituições são consideradas aqui como mecanismos imprescindíveis

que diminuem os custos de transação ligados à conclusão dos acordos, de modo a

propiciar aos atores os benefícios da troca (deference and reciprocity) sob a adoção

de regras estáveis (arrangements) e a resolução de problemas de ação coletiva.

Quando um arranjo institucional persiste por um longo período de tempo – longo o

suficiente para permitir que os estudiosos possam observá-lo com relativa

regularidade e robustez empírica – então, diz-se que esse arranjo, na linguagem

institucional, se impõe per si (self-enforcing) e é ainda à prova de fraudes (cheat-

proof). Em outras palavras, diz-se que ninguém tem qualquer incentivo para deixar

o contrato ou existe ainda algum mecanismo de coerção endogenous

(enforcement).

Modelos distributivistas apóiam-se ainda sobre a hipótese da divisão do

trabalho (division of labor), a qual se assenta sobre a idéia de um jogo de

descentralizados e fracionados domínios políticos (policy domain) onde, legisladores

alocados sob domínios específicos com autoridade também específica, são

obrigados a compartilhar de alguma autoridade política junto aos demais

legisladores e vice-versa, sempre que a troca de apoio seja necessária, digo,

sempre que políticas (policy) precisem ser apreciadas e votadas pelo grupo131. O

130 Para uma revisão pontual dos principais postulados do novo institucionalismo da teoria da escolha racional Cf. Douglass C. North. 1990. Institutions, Institutional Change and Economic Performance. Cambridge: Cambridge University Press; Hudson Meadwell. 2005. Institutions and Political Rationality. In: André Lecours (ed.). 2005. New Institutionalism. Theory and Analysis. Toronto: University of Toronto Press; Maria das Graças Rua. 2000. Escolha Racional e Novo Institucionalismo: Notas Introdutórias. In Maria das Graças Rua e Maria Izabel Valadão (orgs.). O Estudo da Política: Tópicos Selecionados. Brasília: Editora Paralelo 15. 131 É importante enfatizar aqui que esta “troca” nem sempre se realiza de imediato ou de maneira simultânea entre os atores e, muitas vezes, nem sempre é evidente. Isto acontece por que a idéia de ganhos de troca (gains from trade), necessariamente, não deve estar associada apenas à idéia de benefícios particularistas (pork barrell). Muitas vezes, ganhos de troca, podem estar associados à troca de influência jurisdicional, oportunidades institucionais, credibilidade política ou até mesmo, possibilidades de implementar e até mesmo, formular políticas (policy). Para uma maior discussão sobre

87

sistema de comissões legislativas é, para os teóricos distributivos, a expressão

formal deste tipo de arranjo político (logrolling). Ele é o mecanismo capaz de

acomodar a heterogeneidade de preferência que chegam ao Congresso e pode criar

as oportunidades de ganhos de troca entre os legisladores, reduzindo maiores

custos de transação e institucionalizando regras (rules).

“(...) each actor in the committee assignment process entertains interests, possesses behavior alternatives, chooses from among the latter with an eye to the former, and is constrained in his choices by the interests and choices of others and by formal institutional rules. Behavior in this context is instrumental; it may be characterized as “constrained maximization in an institutional setting.”132

Deste modo, legislaturas estabelecem comissões com jurisdição

especializada, permitem aos seus membros auto-selecionarem suas respectivas

posições segundo suas preferências (committee assignment process) e adotam

normas que servem para atenuar os atritos entre os legisladores. Na sua essência,

este sistema permite aos seus membros exercerem influência desproporcional

sobre a formulação e administração de políticas importantes para seus interesses

eleitorais. Todavia, os resultados que surgem deste sistema nunca estão em

perfeito equilíbrio e a curto-prazo, legisladores têm sempre incentivos para desviar-

se dos demais membros e perseguir interesses localizados. Por conseguinte, a

necessidade premente de imputar algum mecanismo de constrangimento

(enforcement) que induza os legisladores à cooperação surge aqui da necessidade

de oferecer algum mecanismo supra-individual capaz de agregar as preferências

particulares num plano coletivo.

A solução dada ao problema é a criação de um arranjo decisório onde as

influências de cada legislador precisam ser levadas em conta, tendo em vista que

suas inclinações individuais podem cruzar todos os domínios políticos, inclusive

aqueles sobre os quais ele não possui autoridade específica. Em outras palavras –

ainda que legisladores só possuam autoridade política dentro de suas respectivas

jurisdições, autores como Shepsle e Weingast (1987) e Weingast e Marshall (1988)

têm priorizado em suas análises os poderes de gatekeeping (autoridade para

decidir se uma policy será oferecida à apreciação de todos ou revertida ao seu

o conceito de ganhos de troca Cf. Thomas W. Gilligan and Keith Krehbiel. 1994. The Gains frm Exchange Hypothesis of Legislative Organization… citado. 132 Cf. Kenneth A. Shepsle. 1978. The Giant Jigsaw Puzzle. Chicago: University of Chicago Press, p. 232.

88

emissor) e ex post veto133 (autoridade para preservar o status quo inicial frustrando

qualquer proposta, mesmo depois dela ter sido apreciada e mudada pelo plenário)

que, embora estejam legitimamente circunspetos aos seus domínios políticos,

podem ampliar seu raio de influência para além das suas respectivas jurisdições

afetando todo o jogo legislativo e criando as engrenagens que explicam o sistema

autônomo de cooperação e barganha entre os legisladores134.

“(...) the committee system must solve several subsidiary problems. First, there must be a mechanism enabling individual legislators to flow to committees whose jurisdictions they care most about (the honoring of preferences in the committee assignment process must be given some priority). Second, committees must retain extraordinary influence in their respective policy areas (some combination of gatekeeping and proposal power, relatively restrictive amendment rules, control over conference committee proceeding, and oversight authority). Third, the system of jurisdictions must accommodate the rise of new issues and change in legislative interests and emphases so that members do not feel short-changed; that is, there must be mechanisms by which to adjust jurisdiction from time to time so that the jurisdictions of committees do not get too unequal in importance.”135

Embora alguns autores prefiram enfatizar a idéia de um Congresso

assemelhado à imagem de um mercado de trocas livres (spot-market) ou mesmo

um grande quebra-cabeça (giant jigsaw puzzle136), teorias distributivas retratam o

Congresso, mais apropriadamente, como um sistema de trocas de suporte sob

alguma forma institucionalizada de economia contratual associada aos custos de

transação entre as partes. Em sua grande maioria, estes modelos focam sua

atenção sobre o modo como o Congresso enfrenta o problema da oportunidade de

distribuição de recursos limitados dentro de uma imensidão de preferências

infindas. A variável chave que oferece sustentação à teoria é o sistema de

comissões legislativas, segundo os autores, capaz de criar a conveniência das

133 No sistema de comissões parlamentares norte-americano, o Conference Committee (CC), responsável por compatibilizar as propostas do Senado e da Câmara, é capaz de vetar uma nova proposta mesmo após ela ter sido analisada pelo plenário e, por isso, pode funcionar como um mecanismo capaz de dissuadir as modificações pretendidas pelo plenário, garantindo que a proposta original não mude para nenhum ponto que seja pior para a comissão do que o status quo, sob pena de vetar a proposta na próxima instância do jogo. Cf. David Baron and J. A. Ferejohn (1989). Bargaining in Legislatures. American Political Science Review, vol. 83, n. 04, pp. 1181-1206. 134 Para uma enunciação dos vários poderes institucionais das comissões legislativas Cf. Kenneth A. Shepsle and Barry R. Weingast (1987). The Institutional Foundations of Committee Power. American Political Science Review, vol. 81, n.º 01. 135 Cf. Kenneth A. Shepsle e Barry R. Weingast. 1994. Positive Theories of Congressional Institutions. Legislative Studies Quarterly, 19, n.º 2, May, p. 156. 136 Tal comparação foi inicialmente sugerida por Shepsle Cf. Kenneth A. Shepsle. 1978. The Giant Jigsaw Puzzle... citado.

89

barganhas e garantir a credibilidade e durabilidade dos acordos legislativos

(logrolling).

Como já dito anteriormente, os modelos distributivas focam sua atenção

sobre o modo como o Congresso enfrenta o problema da distribuição e das

oportunidades dentro dos cenários institucionais. Por conseguinte, estes modelos

detêm-se sobre o bom funcionamento do sistema de comissões, atentando para os

mecanismos que possibilitam a barganha legislativa e dão credibilidade e

durabilidade ao sistema. Todavia, duas características desta literatura apontam as

bases para a elaboração de perspectivas alternativas137:

� Primeiro, a idéia dos ganhos e da cooperação assenta-se sobre a

hipótese de que as preferências legislativas estão apoiadas sobre

uma espécie de racionalidade da procura do bem-estar individual.

Mas e se as comissões forem concebidas menos como agentes de

distribuição, economizando os custos de transação, e mais como

agentes especializados dentro do processo legislativo? Comissões,

neste caso, perseguem o bem-estar dos seus membros

aumentando a produtividade para o lado da oferta. Em uma

linguagem normativa, a qualidade da deliberação, dos debates e

das decisões legislativas é ampliada pelas comissões

congressionais que podem servir como corpos especializados de

experts que coletam, selecionam e revelam informação sobre a

relação entre as políticas públicas e os resultados sociais138.

� Segundo, os modelos distributivos consideram que os direitos

alocados dentro da legislatura são gratuitamente exercidos. Isto

ignora que os custos envolvidos na transação e execução destes

direitos, assim como as instituições que originam e sobrescrevem

estes direitos representam por si, uma variável à parte para a

137 Cf. Thomas W. Gilligan e Keith Krehbiel. 1991. The Gains from Exchange Hypotjesis of Legislative Organization… citado. 138 Comissões, nesta perspectiva, não são agentes de alocação; eles são agentes de produção. Por conseguinte, arranjos institucionais são concebidos não pelo desejo da demanda de oportunidades, mas antes, pela necessidade da oferta da produção de políticas públicas. Esta perspectiva que oferece uma racionalidade informacional para a organização legislativa, é o assunto da próxima seção. Cf. Keith Krehbiel. 1997. Information and Legislative Organization. Ann Arbor: The University of Michigan Press.

90

compreensão da cooperação legislativa139. A política de

distribuição, nesta perspectiva, ocorre em um contexto de

marcado imperfeito. Este problema estimularia o desenvolvimento

de instituições que reduziriam tais imperfeições e expandiriam

oportunidades de cooperação. Estas considerações foram notadas

inicialmente por Weingast e Marshall (1988) e foram reelaboradas

pelos autores da geração seguinte. É sobre este e outros temas

que trata a seção seguinte.

SUPPLY SIDE:

ESPECIALIZAÇÃO E RACIONALIDADE INFORMACIONAL

A segunda epígrafe que inaugura este capítulo, extraída do livro “Information

and Legislative Organization” (Krehbiel, 1991) sumariza bem a contribuição da

tradição informacional para o estudo das instituições legislativas. Para os modelos

da racionalidade informacional, a descrição distributiva da arena legislativa é

insuficiente. Para os teóricos informacionais, a escolha legislativa é mais complicada

do que parece. É neste sentido que a teoria informacional elabora e relaciona novos

problemas teóricos e epistemológicos, sequer mencionados anteriormente pelos

estudos da primeira geração.

As premissas centrais da teoria informacional são elaboradas inicialmente

por Keith Krehbiel no trabalho já citado acima. O autor, em sua investigação sobre

o Congresso norte-americano, lança dúvidas sobre a visão convencional desta

instituição por parte de muitos acadêmicos, jornalistas e cidadãos comuns. Ele

desconfia da interpretação tradicional que diz que o Congresso está organizado de

modo a facilitar os ganhos de troca entre os legisladores (gains from trade). É

neste sentido que Krehbiel aponta para uma teoria alternativa das instituições

legislativas (a teoria informacional), a qual tenta lançar novas luzes sobre a análise

139 Para os modelos distributivos, legisladores descobrem-se presos a uma espécie de dilema do prisioneiro onde cada um procura benefícios particularistas para seus distritos, mas reconhecem que estes ganhos também podem aplicar-se ao direito de produzir algum tipo específico de legislação (iniciativas orçamentárias, por exemplo, representam apenas uma destas possibilidades) ou ainda, o poder ainda de calcular o impacto e as conseqüências da legislação produzida (por exemplo, de que maneira determinadas políticas podem afetar seus distritos eleitorais e, consequentemente, o impacto de algumas decisões sobre sua carreira política). Estamos falando especificamente das possibilidades que um legislador pode dispor sobre o desenho das instituições para superar problemas de má coordenação ou de origem externa, ou mesmo os limites da ação coletiva dentro do Congresso. Cf. Bárbara Sinclair. 1994. House Special Rules and the Institutional Design Controversy. Legislative Syudies Quarterly 19, n.º 4, pp. 477-494.

91

da organização legislativa. Primeiro, o pressuposto de que instituições criam

incentivos sobre indivíduos para que estes se especializem e, segundo, a hipótese

de que os legisladores que acumulam maior expertise política estão mais próximos

de garantir a consecução dos seus interesses dentro da arena legislativa.

Pode-se sintetizar a contribuição de Krehbiel destacando as premissas

inaugurais do seu trabalho, a saber: primeiro, o postulado majoritário – o

pressuposto de que todas as escolhas legislativas sejam elas organizacionais,

processuais ou substantivas, são feitas a partir de maiorias. E, finalmente, o

postulado da incerteza – a premissa de que para os legisladores há sempre uma

incógnita entre os instrumentos políticos por eles selecionados e suas reais

conseqüências140.

O postulado majoritário afirma que instituições são endógenas. Os modelos

de segunda geração, de tipo gains from trade, incorporam as práticas institucionais

tal como que derivadas de uma espécie de equilíbrio institucional, onde as políticas

resultam, em última instância, das preferências individuais e dos meios

institucionais com os quais as coisas são feitas. Krehbiel faz-nos lembrar que

instituições, elas mesmas, constituem escolhas. Consequentemente, instituições

que frustram a vontade de uma maioria não se espera que sobrevivam por muito

tempo, ou seja, instituições também reproduzem as escolhas feitas por uma

maioria. A noção de endogeneidade das escolhas institucionais desenvolvida pelo

postulado majoritário da teoria informacional não compreende, necessariamente,

uma ruptura com os modelos de primeira geração, mas antes uma ênfase diferente

sobre o problema da escolha legislativa141.

A segunda premissa da racionalidade informacional, entretanto, compreende

uma característica particular e constitui um novo e importante ponto de partida

para os modelos de segunda geração. O postulado da incerteza faz a distinção

entre os instrumentos políticos e os resultados políticos, per si. A partir dele,

140 Para uma análise dos postulados da teoria informacional Cf. Keith Krehbiel. 1988. Spatial Models of Legislative Choice. Legislative Studies Quarterly, XIX, pp. 149-179; Idem. 1991. Information and Legislative... citado. 141 Embora autores como Shepsle e Weingast (1994) dêem destaque às diferenças entre os modelos de primeira e segunda geração, neste caso, às teorias distributivista e informacional. Outros autores como Fernando Limongi (1994), por exemplo, chega a falar em certo “exagero” ao tratarmos de maneira distanciada tais modelos, uma vez que para ele, estas teorias estariam envoltas com um mesmo problema analítico, apenas assumindo algumas refinações teórico-metodológicas, se comparada os modelos de primeira geração. Cf. Kenneth A. Shepsle e Barry Weingast (1994). Positive Theories of Congressional Institutions... citado; Fernando Limongi (1994). O Novo Institucionalismo e os Estudos Legislativos... citado.

92

podemos deduzir que legisladores não conhecem a relação precisa entre os

instrumentos que eles selecionam e os resultados subsequentemente produzidos.

Este postulado vai além da banal noção de risco presente no ato de legislar

(lawmaking) e traz maiores ramificações para como podemos pensar a organização

legislativa e seus procedimentos institucionais internos.

Especificamente, Krehbiel e outros autores sugerem que a relação entre um

conjunto selecionado de políticas preferidas por um grupo de legisladores e os

resultados por eles alcançados podem ser dispostos entre os componentes

sistemáticos que regulam os procedimentos institucionais do Congresso e um novo

componente analítico: o acaso. Ainda que possamos assumir que todos os

legisladores conhecem tais procedimentos institucionais, ou seja, seriam cônscios

das regras que regem os procedimentos internos, ainda assim, os resultados

esperados para qualquer política perseguida estariam sempre a um passo do ideal,

pois a maior perturbação ou mesmo limitação de qualquer legislador seria,

exatamente, o fato deste não poder conhecer, ao tempo da formação de suas

escolhas individuais, todas as faces e peculiaridades da aplicação de uma política.

Os modelos de tipo informacional assumem que não só instituições, mas

crenças também são endogeneizadas142. O reconhecimento destas limitações

legislativas acaba por agregar maiores refinamentos analíticos a estes modelos. É

neste sentido que os modelos de tipo informacional assumem como princípio

fundamental os usos e efeitos da informação sobre as escolhas políticas. Aqui

legisladores são visto como colecionadores de informação (expertise), partindo-se

do pressuposto que o legislador, quanto mais e melhor informado, mais próximo

estará de fazer escolhas diferentes daqueles que não a fazem pela falta ou ausência

de informação, e por isso, estariam mais capazes de reduzir os riscos provenientes

da incerteza143.

Combinando estes dois princípios, Keith Krehbiel observa que maiorias

particulares podem, a partir de escolhas organizacionais, estabelecerem incentivos

institucionais para perseguir, disseminar ou mesmo ocultar informação, isto é, elas

podem fornecer incentivos e transmitir recursos para que comissões especializem-

142 Sobre o problema da endogeneização das preferências na vertente informacional Cf. David W. Rohde. 1994. Parties and Committees in the House: Member Motivations, Issues, and Institutional Arrangements. Legislative Studies Quarterly 19, n.° 03 (August), pp. 341-359. 143 Cf. Max F. Cohen. 2002. Alguns Aspectos do Uso da informação na Economia das Organizações. Ci. Inf., Brasília, vol. 31, set/dez, n.º 3, pp. 26-36.

93

se e invistam-se afim de tornarem-se experts . Este talvez seja o principal insight

da teoria informacional – a idéia de que arranjos institucionais podem refletir a

necessidade de adquirir, disseminar ou ocultar informação além do que, tão

somente, resolver problemas de ordem distributiva. Por conseguinte, comissões

podem ser elementos poderosos dentro de uma legislatura não somente por que

eles monopolizam poderes de agenda (agenda power), mas também por que eles

monopolizam informações e expertise.

É neste sentido ainda que os teóricos da vertente informacional sugerem

formas alternativas de pensar outros aspectos da vida legislativa. Debate e

deliberação, por exemplo, podem ser vistos sob esta ótica como um método

através do qual a informação, inicialmente um produto privado, pode ser agregada

e disseminada pela comunidade legislativa. Ou, se sobre outra perspectiva,

levamos em conta as regras que regem os procedimentos internos de uma

Assembléia, como o tratamento reservado a um projeto de lei, por exemplo,

podemos deduzir que o conjunto de restrições auto-impostas sobre as habilidades

de uma comissão – sob a ótica da teoria informacional –, pode refletir as tentativas

subseqüentes de alterar o produto final destas comissões, seja induzindo-as a

desenvolver expertise, seja obrigando-as a revelar suas verdadeiras preferências

veladas.

Um conjunto de implicações segue destes dois postulados (um número de

hipóteses adicionais são cogitadas) e elas são elaboradas por Krehbiel em seu livro

inaugural (1991) e em uma outra série de artigos junto a Thomas Gilligan144. Por

exemplo, pode-se deduzir desta tradição que comissões, em geral, não desejam ser

compostos por preferências outliers, mas em seu lugar, refletem uma posição

mediana, mais centrista no que diz respeito ao grau de homogeneidade de suas

preferências. Processualmente, Gilligan e Krehbiel sugerem que comissões refletem

pontos de vista majoritários, e que estas maiorias, frequentemente, ligam-se entre

si de modo a manipular comissões com seus produtos e assim, criar redes de

incentivos que estimulem comissões a tornarem-se experts. Tais restrições tornam

as comissões Agentes, não de sujeitos individuais, mas sim, corpos representativos

144 Cf. Thomas Gilligan e Keith Krehbiel. 1989. Asymmetric Information and Legislative Rules with a Heterogeneous Committee. American Journal of Political Science 33: pp. 459-490; Idem. 1987. Collective Decision-Making and Standing Committees: An Informational Rationale for Restrictive Amendments Procedures. Journal of Law Economics and Organization, 3:2, pp. 287-335; Idem. 1989. Collective Choice without Procedural Commitment, in Models of Strategic Choice in Politics. Peter C. Ordeshook, ed. Ann Arbor: University of Michigan Press, pp. 295-314.

94

das Assembléias como um todo. Esta breve sumarização tem apenas sugerido

algumas implicações que seguem da racionalidade informacional. A ênfase sobre o

postulado da incerteza e sobre a endogeneização das práticas institucionais,

constitui um esforço de produzir uma racionalidade positiva para muitas das

práticas legislativas, e é o que a distingue dos modelos de primeira geração (gains

from exchange).

Uma outra questão, de igual importância para a vertente informacional da

organização legislativa compreende a caracterização das preferências legislativas.

Para Krehbiel (1991), as preferências são exógenas, e são induzidas pelos valores,

necessidades e carências do próprio eleitorado. Legisladores, aparentemente,

precisam ser reeleitos, e este desejo induziria suas preferências sobre as escolhas

legislativas. Não obstante, como legisladores só podem nutrir preferências sobre

resultados políticos (outcomes), legisladores só podem derivar sua utilidade a partir

destes resultados. É esta diversidade no eleitorado que produz a diversidade de

preferências dentro da legislatura.

Naturalmente, é difícil acreditar que as preferências dos legisladores sejam

completamente induzidas por fatores exógenos, mesmo que o objetivo da reeleição

seja essencialmente exógeno. É certo que as preferências do eleitorado exercem

uma poderosa influência sobre os resultados políticos, todavia, mesmo que

assumíssemos que a única motivação de um membro fosse a reeleição, não

poderíamos esquecer que muitas pessoas e instituições dentro da própria

legislatura poderiam influenciar sua probabilidade de reeleição. É neste sentido que

Krehbiel pode estender seu modelo de classificação das possíveis motivações dos

membros dentro do Congresso: a reeleição, a persecução de políticas públicas

apropriadas aos seus distritos eleitorais ou até mesmo o uso e a aquisição de

poderes institucionais dentro da legislatura.

A citação extraída do livro de Krehbiel que abre este capítulo sugere a visão

de que as racionalidades informacional e distributiva são complementares, mas o

vigor e a força de afirmações deste tipo são solapadas por outras passagens do seu

próprio livro. Concluo essa seção com mais uma passagem de Krehbiel (1991), a

qual reflete seu profundo cepticismo sobre a racionalidade dos ganhos de troca:

“As a former subscriber to the orthodox distributive view of legislatures but an increasing skeptic regarding its fit with a similarly impressive body of empirical research, I regard it as important in this book to confront

95

distributive-theoretic predictions pertaining to legislative organization head-on. Intuitiveness may be a nice property to theories, and surely it deters challenges from skeptics. However, positive social science is not primarily about the intuitiveness of theoretical arguments; it is about the derivation and assessment of refutable hypotheses. The appropriate standards in this context are standards of evidence rather than intuitiveness, and while distributive theories are strong on intuitiveness, they have proven here to be rather weak in terms of evidence. Theory says: committees are composed of homogeneous high-demanders. Evidence says: probably not true. Theory says: special rules are adopted mainly to facilitate gains from trade. Evidence says: false. Theory says: legislatures commit to restrictive postfloor procedures to enhance distributive committee power and cross-committee logrolling. Evidence says: false again.”145

SUPPLY SIDE: TRADIÇÃO PARTIDÁRIA E RACIONALIDADE COOPERATIVA

Uma importante característica da literatura recente sobre o Congresso

norte-americano é o retorno à questão central dos estudos behavioristas. Este

movimento de retorno ao problema behaviorista não implica numa tentativa de

restauração desta velha tradição behavioral, mas numa volta ao retorno do

problema instituições vs. comportamento. É neste sentido que o papel dos Líderes e

dos partidos políticos, que tiveram pouca proporção nas últimas décadas sobre os

modelos da escolha racional para as teorias distributiva e informacional, passaram

a tornar-se o ponto de partida de trabalhos fundacionais como o de Mathew

McCubbins e Gary Cox (1993)146. Numa tentativa de mostrar que a transformação

do cenário institucional norte-americano trouxera nas últimas décadas profundas

alterações, seja sobre o processo legislativo, seja mesmo sobre a formação e

configuração das preferências individuais; os autores concentram seus esforços

analíticos sobre o novo papel que o partido majoritário assume dentro da

legislatura a partir do século XX. Junto com a noção de que os partidos exercem um

papel central dentro do processo legislativo, emergem outros tantos fenômenos de

semelhante importância. Aqui incluímos o poder e a importância crescente que os

presidentes do Congresso (speakers) passam a exercer sobre a tramitação interna

da Assembléia a partir dos poderes institucionais que lhe são delegados pós-

reforma; o novo e crítico papel exercidos pelas comissões que regulam tais regras e

poderes (Rules Committee); a ascensão cada vez maior de regras restritivas e o

145 Cf. Keith Krehbiel. 1991. Information and Legislative Organization... citado. Pp. 247-248. 146 Cf. Gary Cox e Mathew D. McCubbins. 1993. Legislative Leviathan: Party Government in the House. Berkeley: University of California Press.

96

declínio dos jogos de tipo open rule147 tão comuns anteriormente, conjugam-se

para dar formas a um novo cenário institucional onde o partido majoritário e não

mais as comissões, reservam-se ao papel de variável explicativa principal.

“Influential researchers... have argued that structure – in particular the committee system – is key to understanding why decisions in Congress are not forever overturned by shifting majorities. We share this emphasis on structure but view as the key actors not the committees, but the parties. In ours view, congressional parties are a species of legislative cartel. These cartels usurp the rule-making power of the House in order to endow theirs members with differential powers… Most of the cartel’s efforts are centered on securing control of the legislative agenda for its members.”148

Para a teoria partidária, a chave para a compreensão das decisões dentro do

legislativo não se encontra nas comissões, mas sim nos partidos. Estes formariam o

que Cox e McCubbins (1993), chamam de uma espécie de cartel legislativo,

usurpando o pode de fazer leis do Congresso (rule-making power) para oferecer

aos seus diferentes membros. A força destes cartéis estaria apoiada,

principalmente, no controle, por parte dos seus membros, da agenda legislativa149.

Enfim, a vertente partidária busca explicar como um partido majoritário pode

influenciar a organização da legislatura, ou seja, como funcionam os sistemas de

delegação entre o partido, a burocracia e o executivo, como eles interagem com a

estrutura das comissões e como podem influenciar o processo legislativo e a

produção de políticas públicas.150

Por que os partidos políticos são a base da organização legislativa e de que

modo eles influenciam tal organização? Como eles interagem com a estrutura das

147 Nos jogos de tipo open rule, um número ilimitado de propostas podem ser consideradas. Um jogador reconhecido (empowered), um outro jogador também reconhecido propõe uma emenda ou move a questão para a votação. Se a proposta passa, o jogo acaba, se não, a proposta recua e o jogo começa na próxima sessão. Já nos jogos de closed rule, um jogador reconhecido oferece uma proposta que é prontamente votada (up ou down) pela legislatura. Se a maioria vota sim, o jogo acaba, se não, a proposta recua e a próxima sessão começa. Isso pode se repetir indefinidamente. Cf. David P. Baron e J. A. Ferejohn. 1989. Bargaining in Legislatures. American Political Science Review, vol. 83, n. 04, pp. 1181-1206. 148 Cf. Gary Cox e Mathew D. McCubbins. 1993. Legislative Leviathan... citado. P. 278. 149 “Under Cartel Theory, U.S. House members are considered to be independent entrepreneurs, exercising a great deal of control over their political careers. Cox e McCubbins (1993) highlight the manner in which individual representatives delegate power to the House party leadership to further their own reelection efforts both generally (party reputation) and specifically (perks of office, pork) as well as to influence public policy. This delegation to the party leadership helps the representatives achieve their collective goals” p. 273. Cf. Mark P. Jones e Wonjae Hwang. 2005. Party Government in Presidential Democracies: Extending Cartel Theory Beyond the U.S. Congress. American Journal of Political Science, vol. 49, n.º 2, April, pp. 267-282. 150 Roderick Kiewiet e Mathew D. McCubbins. 1991. The Logic of Delegation: Congressional Parties and the Appropriations Process… citado.

97

comissões? Enfim, como os partidos afetam a produção de políticas públicas? Estas

são pelo menos algumas das questões sobre as quais estes autores debruçam-se e

a partir das quais, eles não só buscam revisar os modelos distributivo e

informacional, mas também, transcendê-los. Para Cox e McCubbins (1993), o

partido majoritário, enquanto suficientemente homogêneo acerca dos seus

propósitos políticos, encontra-se em uma posição capaz de confiscar autoridade

legislativa e redesenhar as instituições legislativas e suas práticas (como o sistema

de comissões), de modo a dar seguimento à agenda política sobre a qual seus

membros estão de acordo.

Os autores começam sua análise com uma série de dilemas de ação coletiva,

problemas enfrentados por legisladores individuais que, agindo sozinho, não podem

capturar os ganhos da legislatura para seus distritos eleitorais (mantêm-se o

postulado da reeleição). Os problemas já são bem familiares: bens públicos,

externalidades, coordenação. De acordo com a tradição da nova economia das

organizações, os autores argumentam que os membros, uma vez afrontados por

estes problemas de coordenação, criarão mecanismos que lhes ofereça

oportunidades de capturar ganhos potenciais. Esta lógica sobre as instituições já é

bem familiar, o que é novo aqui é o foco analítico sobre o partido e as instituições

partidárias como um meio de aperfeiçoar o bem-estar dos legisladores.

A tradição partidária sugere que em qualquer organização, há um número de

dilemas de ação coletiva, externalidades e bens públicos, sobre os quais soluções

institucionais são sempre concebidas. Para os autores, estes vários problemas

frustram as causas e os propósitos de legisladores individuais, para além dos seus

possíveis interesses mútuos ou mesmo carreiras comuns – o que de antemão,

rompe com os modelos de tipo distributivo e informacional. A ampliação de ganhos

pode ser materializada através da criação de instituições, principalmente a partir de

lideranças institucionais que sejam capazes de reformar ou incrementar ao seu

favor, circunstâncias não regulamentadas ou não institucionalizadas. Desta

perspectiva, partidos políticos servem como mecanismos institucionais para

perseguir os objetivos dos legisladores. Neste contexto, onde múltiplos problemas

frustrariam a cooperação descentralizada e espontânea entre os legisladores, os

partido surgem como os meios necessários para a cooperação e através dos quais,

98

os ganhos podem ser garantidos. Partidos cumprem este papel de dois modos, seja

assumindo a forma de coalizões processuais, seja atuando como agenda setters.

O primeiro problema de ação coletiva que Cox e McCubbins (1993)

enfatizam diz respeito aos efeitos da reputação. Consideremos um indivíduo

membro de um Congresso. Levando em conta que, a despeito das características

que lhe são específicas – posições políticas, histórias individuais e características

pessoais –, cada membro de um partido traz uma reputação coletiva construída

junto ao partido e aos Líderes nacionais deste mesmo partido. Esta reputação, à

semelhança de um bem público, deve ser desenvolvida, mantida e protegida. Isto

acontece por que todos os membros de um partido têm algum interesse pela

preservação de sua reputação partidária, seja junto ao seu eleitorado, seja junto às

instituições partidárias.

Partindo do pressuposto que os membros mais “fiéis” ao partido estão mais

próximos de garantir a consecução de seus ganhos. Podemos sumarizar aquele que

é o segundo problema de ação coletiva identificado pelos autores – poucas chances

um legislador tem de obter ganhos da legislação para os seus distritos agindo

sozinho. Assim, a fim de garantir a troca de ganhos, legisladores devem cooperar, e

os partidos, criar os meios necessários, de modo a confeccionar preferências afins

entre os legisladores ou ao menos, coibir a busca de bens exclusivamente

particularistas por parte de seus membros através de restrições institucionais. Na

visão de Cox e McCubbins (1993), os Líderes de partido usam as ferramentas da

organização congressional para estes fins. A autoridade das comissões, o processo

de indicação para uma comissão, a produção e o planejamento dos produtos finais

de uma comissão, o controle das deliberações sob o floor, etc., comporiam apenas

uma amostra razoável dos mecanismos através dos quais o partido majoritário

poderia exercer controle sobre a organização legislativa151.

Regras, procedimentos e legislação, parecem, aos olhos das tradições

anteriores, um produto de comissões poderosas, mas são vistas por Cox e

McCubbins (1993) como um produto ultimamente ligado à coordenação partidária.

151 Para uma análise da influência do partido majoritário sobre a organização interna das instituições legislativas Cf. John H. Aldrich e David W. Rohde. 2000. The Consequences of Party Organization in the House: The Role of Majority and Minority Parties in Conditional Party Government. In: Jon Bond e Richard Fleisher (eds.). Polarized politics: Congress and the President in a Partisan Era. Washington: Congressional Quarterly Press, pp. 31-72.

99

Comissões podem ser os agentes da produção legislativa, mas destacam os

autores, sua influência existe somente quando esta serve aos fins do partido

majoritário. Em síntese, os autores oferecem a perspectiva de um modelo baseado

no partido, sendo este parâmetro partidário dependente do grau com o qual o

partido majoritário pode agir em conjunto enquanto uma coalizão processual.

Esta descrição revela a tradição inaugurada por Cox e McCubbins enquanto

uma terceira geração de estudos legislativos152. Elementos tomados como exógenos

nos modelos de segunda geração – mais notavelmente, a composição das

comissões e o poder dos Líderes – são endógenos nesta perspectiva. O processo de

indicação para as comissões, por exemplo, extensivamente analisado pelos autores,

parte da premissa de que o partido enquanto um cartel internaliza externalidades.

Em síntese, eles argumentam que as políticas de algumas comissões impõem

externalidades que podem afetar, potencialmente, as perspectivas de reeleição de

muitos partidários. Outras comissões, ao contrário, teriam efeitos externos muito

mais limitados. Por conseguinte, um cartel seleciona administradores (Líderes

partidários) que, apropriadamente, possam balancear seu próprio auto-interesse

(seja sua conexão distrital/eleitoral, seja sua busca por reeleição) e a defesa dos

interesses do cartel como um todo, no sentido de manter e aumentar o status

majoritário do partido.

Cox e McCubbins (1993) ampliam a plausibilidade de seus impressivos

argumentos formais providenciando um largo corpo de evidências empíricas que

possam corroborar esta interpretação. A questão central passa a ser para esses

autores, o grau de representatividade das comissões frente às preferências do

partido majoritário. Definindo os interesses do partido em termos de sua

representatividade a partir do membro mediano, os autores investigam o grau com

o qual os membros de uma comissão com alta externalidades refletem os

interesses do partido153.

Tomando-o como um todo, o trabalho inaugural de Cox e McCubbins chama

a atenção dos estudiosos para uma nova dimensão dos modelos da organização

152 Cf. Howard L. Reiter. 2006. The Study of Political Parties, 1906-2005: The View from the Journals. American Political Science, vol. 100, n.º 4, November, pp. 613-618. 153 Sobre a relação entre comissões com altas e baixas externalidades e seu controle por parte do partido majoritário Cf. Cox, Gary e Mathew McCubbins. 1993. Party Loyalty and Committee Assignment. In: Idem. Legislative Leviathan… citado, pp. 163-187.

100

legislativa (a dimensão partidária), enriquecendo, consideravelmente, os modelos

anteriores. Os autores têm buscado nas gerações precedentes de estudos sobre a

organização congressional (behavioral tradition) a ênfase sobre os partidos como

uma solução para vários dilemas coletivos, retificando a visão estilizada das

tradições contemporâneas que resistem em representar os legisladores como

atores narcisistas, atomistas e irrestritos na busca pela maximização de suas

preferências; todavia, sem perder de vista as contribuições teórico-metodológicas

das últimas gerações: a preocupação com o problema das preferências cíclicas, a

noção de caos e o problema da realização do equilíbrio (se induzido por regras ou

de tipo não-cooperativo).

Para Cox e McCubbins (1993), os estudos das últimas décadas têm

corroborado que os partidos políticos estão em claro declínio, seja na arena

eleitoral, seja na legislativa. Autores como Shepsle (1978) Shepsle e Weingast

(1987), ou até mesmo Krehbiel (1991), têm defendido que a onda de reformas

institucionais pelas quais passou o legislativo norte-americano, a partir da primeira

década do século passado, acabou levando a um modelo de descentralização

administrativa a favor das comissões e subcomissões que, desde então, passaram a

corroer o poder anteriormente homogêneo dos líderes partidários. Entretanto, para

os autores da vertente partidária, dizer que os partidos têm declinado em

importância, não é o mesmo que dizer que eles, a partir de agora, devam ser

ignorados. É neste sentido que estes autores criticarão a ênfase excessiva dos

teóricos anteriores sobre a autonomia das comissões e a dita inviolabilidade de

suas decisões (decision-making power of committes), que para Cox e McCubbins

não passariam de uma espécie de produto da própria lógica da reciprocidade

desenvolvida por estes autores (exchange and cooperation), sustentada, ora pela

possibilidade de veto (ex post veto), ora pela necessidade de troca de informação

(expertise).

Tanto as teorias neo-institucionais, como as que se filiam à escolha racional

desacreditam na importância dos partidos políticos. Assim, a maioria dos trabalhos

sob esta orientação focaliza seu eixo analítico sobre as comissões, e desprezam os

partidos. Krehbiel (1991) constrói uma série de modelos em que o Congresso e as

comissões exercem um papel, mas em que os partidos não aparecem. Shepsle

(1978), igualmente, analisa o funcionamento do sistema de comissões e do

101

Congresso, mas não o dos partidos. Na verdade, para as estas teorias, os partidos

não só seriam pouco úteis para analisar o comportamento individual e o processo

legislativo, como até dificultariam sua explicação.

O grande empecilho destas teorias ao tratar do papel dos partidos dentro da

legislatura parece provir de sua base fundacional (o problema do caos) e dos

modelos espaciais que elas desenvolvem, eminentemente instáveis. Para os

adeptos das teorias distributiva e informacional, governar sob coalizões em uma

instituição de regras da maioria é algo quase impossível ou ilusório, logo, tomar os

partidos como um ator unitário dentro da estrutura legislativa é de imediato,

injustificado. Isto, no entanto, se contradiz com o fato de que as legislaturas, de

acordo com as votações na tribuna (floor), apresentam certa estabilidade,

coordenada por coalizões móveis com limitado espaço de interesse próprio para os

legisladores.

No entanto, o que Cox e McCubbins (1993) defendem não é um retorno à

velha tradição partidário-institucional, a qual não estava nenhum pouco preocupada

com a instabilidade espacial ou não viam nenhum impedimento em tomar os

partidos como unidades analíticas. Da mesma forma, também não se dão por

satisfeitos com as restrições típicas da teoria da escolha racional, seja sua grande

dificuldade em ver os partidos como atores políticos, seja seu descrédito quanto à

possibilidade de coalizões processuais garantirem a reunião de legisladores

individuais dentro de uma coletividade estável. O que Cox e McCubbins tentam

fazer é conciliar estes extremos: a vertente partidária tradicional e a Teoria da

Escolha Racional. Tal como os teóricos tradicionais, eles pensam os partidos

enquanto coalizões processuais, os quais, em certas circunstâncias, agem como um

ator unitário. Com destaque que quanto mais homogêneo o partido, mais ativo ele

será. Da TER, eles colhem os limites da proposição anterior, ou seja, os autores não

aderem a qualquer tipo de estrutural-funcionalismo, sua ênfase analítica sobre os

partidos não negligencia as racionalidades individuais e nem os limites da ação

coletiva154.

154 Segundo Boudon (1998) e Baert (1997), a Teoria da Escolha Racional (TER), se não quiser ser aplicada apenas a um número reduzido de contextos institucionais, deve estar pronta para alargar suas hipóteses e dar mais espaço às dimensões herdadas e aos aspectos cognitivos das instituições. No plano dos estudos legislativos, esta limitação da TER reflete-se na ausência da idéia de mudança institucional. Isto acontece porque falta a esta escola, mais precisamente, a noção de estrutura social. É esta lacuna

102

Neste capítulo, procurei apresentar um panorama das mais importantes

características teóricas das tradições que constituem hoje o mainstream no campo

dos estudos legislativos. Sobre os modelos de tipo demand side enfatizei a hipótese

dos ganhos de troca da organização legislativa – o problema dos dividendos e os

limites da cooperação entre os atores. Sobre os modelos de tipo supply side

enfatizei os mecanismos alternativos – comissões e floors enquanto espaço de

criação e difusão de informações dentro da legislatura, bem como o impacto dos

poderes institucionais dos líderes partidários e do presidente do Congresso sobre a

formação das preferências legislativas e sobre a produção de políticas públicas.

Cada uma destas tradições tem suas próprias pretensões teóricas, hipóteses,

modelos e apresentam evidências empíricas diferentes para as mais variadas

épocas históricas do Congresso norte-americano. Todavia, o mais importante a se

destacar aqui não são as limitações de cada uma destas tradições teóricas, mas

sim, as conexões possíveis entre elas. É sobre isso que tratarei no próximo capítulo

– as possibilidades de integração teórica entre estas tradições a partir de um

survey da produção norte-americana recente sobre as instituições legislativas.

que Cox e McCubbins tentam suprir combinando aos postulados da TER alguns princípios estruturadores da velha tradição partidária. É neste sentido, que não acredito que qualquer uma destas teorias seja superior às demais, todavia, defendo que o pivô da evolução convergente das três teorias pode ser a vertente partidária, na medida em que muito dos seus pressupostos podem ser traduzidos tanto para a perspectiva da escolha racional, quanto para a tradição institucionalista. Cf. Raymond Boudon. 1998. Limitations of Rational Choice. The American Journal of Sociology, vol. 104 (3); Patrick Baert. 1997. Algumas Limitações das Explicações da Teoria da Escolha Racional em Ciência Política e na Sociologia. Revista Brasileira de Ciências Sócias, vol. 12, n.º 35.

103

CAPÍTULO 4

O BALANÇO DA PRODUÇÃO NORTE-AMERICANA RECENTE SOBRE AS INSTITUIÇÕES LEGISLATIVAS

For the bulk of political scientists today, the study of legislatures is the study of the U.S. Congress. Other legislatures do exist, of course. The U.S. states have legislatures. The U.S. cities have legislatures. National, provincial, and local governments the world have parliaments, representative assemblies, and legislatures. Even Europe – and, on rare occasions, the world assembled as the United Nations – has a legislature. But the scholarly world of legislative studies is, overwhelmingly, a world that studies the U.S. Congress.

(Gerald Gamm and John Huber, 2002)

OS ESTUDOS LEGISLATIVOS ENQUANTO CAMPO EXPERIMENTAL

No último século, o número e a influência dos estudos experimentais na

ciência política tem aumentado consideravelmente155. Neste terreno, tem se

destacado o subcampo dos estudos legislativos enquanto um domínio frutificante

para a descoberta e o uso de técnicas experimentais que iluminem a organização

das instituições congressionais. A força destes experimentos no subcampo dos

estudos legislativos reflete a própria canonização da disciplina nas últimas décadas

e a busca epistemológica por inferências causais e argumentos teóricos

empiricamente motivados156.

“Experiments in political science have progressed from a method used in the occasional anomalous study to a generally accepted and influential approach. This evolution was driven by the maturation of research literatures that demand acute tests of causal claims, and by innovations in the implementation of experiments that expand their reach. Political science experiments can transform – have transformed – thinking on a topic when carried out in relevant contexts – and to be relevant, the situation need not be isomorphic with a naturally occurring (i.e. ‘real world’) referent. Rather, the evaluation of an experiment’s power depends on the precise claim under study, the general usage (e.g. searching for facts, speaking to theoretical, or whispering to princes), and the specific goal of the study, including its connection to related work that often uses alternatives methodologies. Political science might not be an experimental

155 Cf. James N. Druckman, Donald P. Green, James H. Kuklinski e Arthur Lupia. 2006. The Growth and Development of Experimental Research in Political Science. American Political Science, vol. 100, n.º 4, November, pp. 1-9. 156 Cf. Richard L. Hall. 2002. Empirism and Progress in Positive Theories of Legislative Institutions. In: Kenneth A. Shepsle e Barry Weingast. Positive Theories of Congressional Institutions. Ann Arbor: The University of Michigan Press, pp. 273-302.

104

discipline, but with creativity it can become a discipline whose contributions are deepened and strengthened by experimental research.”157

Experimentos facilitam inferências causais a partir da transparência e da

capacidade dos procedimentos experimentais, mais notavelmente o uso da

observação e da corroboração ou falsificação para a análise dos fenômenos. Para

isso, cientistas políticos se guiam por teorias que pré-estabelecem formas de

inferência e variáveis explicativas como os efeitos de regras institucionais, as

configurações de preferências ou outros fatores contextuais cujo impacto pode ser

importante para a explicação dos fenômenos legislativos.

Embora estas experimentações de campo tenham se desenvolvido

rapidamente nas últimas décadas, e alcançado um notável rigor epistemológico e

metodológico, qualquer analista da ciência política experimental deve atentar para

suas limitações. Nesse sentido, uma importante questão é menos a extensão com

que com que estes experimentos podem ser compartilhados dentro de um mesmo

subcampo, e mais, as possibilidades de combinação teórica e epistemológica entre

tradições diferentes.

Como podemos perceber até aqui, a ciência política norte-americana das

últimas décadas conseguiu gerar um conjunto sofisticado de explicações sobre o

funcionamento e a organização do Poder Legislativo. Em linhas gerais, estas teorias

oscilam entre o grau de liberdade que atribuem à ação humana e o peso das

estruturas sobre os resultados produzidos (de um lado os autores que defendem a

hipótese de que os equilíbrios são induzidos pelas preferências dos congressistas e

do outro, os que acreditam que estes equilíbrios são induzidos pelas estruturas

institucionais do Congresso). Apesar disso, como já vimos, as teorias apresentadas

anteriormente, ainda que difiram em essência no que diz respeito à natureza do

problema e à solução que oferecem, não são absolutamente antitéticas. Pois

convém lembrarmos mais uma vez que elas compreendem, do ponto de vista

teórico, isomorfismos de um mesmo subparadigma: o novo institucionalismo da

escolha racional.

A decomposição teórica das tradições que orientam hoje a análise das

instituições legislativas na seção anterior me possibilitou concentrar-me agora no

problema da combinação e integração de teorias. Meu propósito maior aqui é

157 Cf. James N. Druckman, D. P. Green, James H. Kuklinski e Arthur Lupia. 2006. The Growth and Development of Experimental Research in Political Science… citado, p.8.

105

investigar as possibilidades possíveis de combinações teóricas entre as tradições

que orientam hoje a pesquisa empírica experimental no campo dos estudos

legislativos (ver figura 2). Para isso, eu priorizei em minha análise métodos

qualitativos para a investigação da produção acadêmica recente sobre as

instituições congressionais, traçando finalmente um mapa destas possíveis

combinações, bem como de suas limitações analíticas158.

FIGURA 2 – O Problema da Combinação Teórica

Partindo do pressuposto que nenhuma teoria é capaz de explicar tudo e que

a substituição de um paradigma tradicional por um novo paradigma traz ganhos em

relação ao anterior, mas também traz perdas159, pode-se deduzir que, em se

tratando do subcampo dos estudos legislativos, se por um lado o novo paradigma

institucional representou um progresso substancial em relação aos demais

paradigmas da organização legislativa, por outro, este mesmo paradigma deve

trazer um conjunto novo de problemas ainda não solucionados ou questões ainda

não tratadas. É neste sentido que procurarei concluir ainda este estudo,

questionando as principais limitações trazidas pelo paradigma neo-institucional para

a interpretação e explicação do funcionamento das instituições legislativas. Em

158 A opção aqui por dedicar-me exclusivamente à literatura norte-americana e não há literatura nacional, reflete o fato de que, em sua quase totalidade, a produção nacional está já orientada pelos paradigmas internacionais da pesquisa sobre as instituições legislativas. 159 Kuhn, em seu livro As Estruturas das Revoluções Científicas, São Paulo, Ed. Perspectiva, 1975, afirma que em cada momento do desenvolvimento das ciências há um conjunto de pressupostos e crenças que são compartilhadas pelos cientistas na definição dos problemas da investigação e na elaboração das teorias propostas para solucioná-los. Este quadro mental é provisório, no sentido de que quando os problemas internos a um paradigma são excessivos, coloca-se em dúvida a própria validade do paradigma adotado, implicando em sua substituição por outro.

1

3 2

1 – Teoria Distributiva 2 – Teoria Informacional 3 – Teoria Partidária

106

outras palavras, de que maneira o novo paradigma institucional (somado à teoria

da escolha racional) conseguiu oferecer possibilidades para a articulação de

explicações mais convincentes acerca do funcionamento dos órgãos legislativos e

quais são as questões sobre as quais este conjunto de teorias ainda não se

debruçou ou quais são suas maiores limitações?

OS PASSOS DA PESQUISA

A presente seção presta-se à apresentação dos critérios utilizados para a

seleção e agrupamento dos artigos examinados. Sendo esta pesquisa de natureza

eminentemente qualitativa e bibliográfica, foram tomadas aqui como fontes

primárias além dos trabalhos referenciais de cada tradição (a literatura

especializada, compreendida aqui enquanto artigos em revistas científicas; teses e

livros160). O objetivo de explorar as possibilidades de adaptação crítica entre as

principais teorias positivas da organização legislativa e os rumos desta produção

mais recente, no entanto, obrigou-me a expandir minhas fontes primárias para

além da bibliografia especializada já clássica e somar a ela uma revisão de pelo

menos 05 (cinco) anos161 aos principais periódicos da ciência política internacional

(via Periódicos Capes)162. O processo de identificação e seleção dos artigos resultou

em uma relação de 41 artigos para a análise163. A tabela seguinte apresenta a

freqüência de artigos analisados por ano de publicação:

160 Este conjunto de referências mais gerais encontra-se devidamente agrupados segundo as normas oficiais da ABNT na seção de referências bibliográficas. 161 A escolha por este corte temporal teve por objetivo cumprir o objetivo de explorar uma literatura recente, abrangendo os últimos anos anteriores ao desenvolvimento desta pesquisa. Ademais, o período em análise configura-se como importante para o trabalho ao atender a um dos seus objetivos que é analisar, dentre as produções contemporâneas sobre as instituições legislativas, as possibilidades de desenvolvimento de modelos teóricos híbridos. Tendo em vista que a última destas tradições teórica constitui-se, pelo menos, a partir de 1993 (Cox e McCubbins), julgo o limite temporal aqui estipulado suficiente. 162 Acesso através do endereço eletrônico http://www.periodicos.capes.gov.br. Quanto ao levantamento geral desta bibliografia a partir do Periódicos Capes Cf. Anexos desta dissertação. Também devidamente catalogado segundo as normas oficiais da ABNT. 163 A quantidade de estudos encontrados sobre as instituições legislativas nestas revistas especializadas poderia ser ainda maior, não fosse o corte analítico estipulado neste trabalho. Assim, tendo em vista uma maior objetividade com meu propósito de pesquisa, a saber: as possibilidades de combinação e integração entre as principais vertentes teóricas da organização legislativa; foram excluídos deste conjunto de artigos, aqueles relacionados aos seguintes temas: Senado Federal e federalismo (impactos do bicameralismo sobre a legislatura), participação política (representatividade), accountability (responsabilização política), campanhas e sistemas eleitorais, delegação para o Judiciário, polarização ideológica dentro do Congresso e ainda, artigos de natureza metodológica sobre o estudo de votações no Congresso. Tais temas correlacionados foram excluídos por que, em geral, tendem a analisar a prática da legislativa somente enquanto um produto residual, funcional ou condicional destas variantes. Por conseguinte, foram priorizados neste grupo de artigos aqueles que versavam, mais precisamente, sobre a lógica e os mecanismos internos das assembléias legislativas.

107

TABELA 5 – Freqüência da publicação dos artigos por ano.

Corte temporal da pesquisa 2002 2003 2004 2005 2006 Freqüência das publicações 07 07 04 12 11 Total de artigos agrupados 41 artigos

Fonte: Banco de dados do autor.

Levando em conta a credibilidade internacional do periódico e sua

especialização ou familiaridade à área de estudos legislativos, apresento a seguinte

relação de dados, tomando como referência o número de artigos encontrados por

publicação pesquisada:

TABELA 6 – Número de artigos encontrados por periódico pesquisado.

Periódicos Pesquisados Artigos Encontrados Journal of Political Economy 03 artigos American Journal of Political Science 08 artigos Legislative Studies Quarterly 18 artigos American Politics Research 02 artigos American Political Science Review 10 artigos Total 41 artigos

Fonte: Banco de dados do autor.

Os critérios para a seleção dos trabalhos foram primeiro, a orientação

teórica do artigo, isto é, só foram relacionados e analisados artigos que se

prestavam à compreensão do funcionamento das instituições congressionais,

segundo, priorizaram-se trabalhos orientados segundo os pressupostos do novo

institucionalismo da teoria da escolha racional, e finalmente, foi priorizada ainda

sua relevância para a área, seja por apresentar novas conjecturas ou inovações de

cunho teórico ou epistemológico, seja por contrariar outras teorias através de

novos dados empíricos.

A análise desta produção acompanhou uma lógica da desagregação de

teorias, ou seja, priorizei em seu curso a análise distinta dos aspectos teóricos,

empíricos e metodológicos de cada teoria. A idéia subjacente foi não apenas pôr em

perspectiva comparada estas tradições, o que acredito já ter sido executado com

alguma razoabilidade no capítulo anterior, mas sim, discutir e, sobretudo,

apresentar as possibilidades de combinação teórica a partir dos artigos

pesquisados.

108

AGRUPANDO OS TRABALHOS ANALISADOS

Priorizando a exploração das possibilidades de adaptação crítica entre as

teorias da organização legislativa, o estudo foi organizado seguindo uma

sistematização dos trabalhos analisados, onde os artigos pesquisados foram

agrupados e classificados segundo (i) identificação; (ii) título e ano de publicação;

(iii) periódico; (iv) filiação teórica (sob qual das tradições teóricas o artigo filia-se –

se distributivista, informacional ou partidária ou modelos híbridos, no caso deste

último, especificar qual forma de hibridismo predomina no estudo); (v) variável

explicativa principal (nome da variável ou conjunto de variáveis utilizada pelo(s)

autor(es) para explicar o fenômeno); (vi) natureza da explicação (se endógena ou

exógena); (vii) metodologia empregada e (viii) foco analítico (o problema sobre o

qual o artigo debruça-se e o argumento central). O agrupamento164 possibilitou

uma visão mais panorâmica desta produção e uma identificação menos equivocada

dos modelos exeqüíveis de hibridismo teórico entre os artigos científicos

analisados165.

O JOGO DE COMBINAÇÕES TEÓRICAS POSSÍVEIS E ALGUNS EXEMPLOS CONCRETOS REVISITADOS

Separei os artigos coletados em dois grandes grupos. O primeiro referente

aos artigos sem maiores pretensões integrativas e que tão somente filiam-se a uma

das três principais tradições teóricas já conhecidas (distributiva, informacional ou

partidária). A este conjunto de artigos, chamarei de puristas. E o segundo grande

grupo, formado por artigos de pretensões híbridas, ou seja, que primam por

alguma espécie de integração entre estas tradições teóricas.

TABELA 7 – Relação dos artigos encontrados para o caso de modelos puristas.

Modelos Puristas Artigos Encontrados

Distributiva166 05 artigos

164 Cf. Anexos III (Quadro de Classificação dos Artigos Analisados). 165 Sobre os modelos possíveis de combinações teóricas cf. mais uma vez Anexos III (distributiva-informacional, partidário-informacional, partidário-distributiva e distributiva- informacional-partidária). 166 Sobre os modelos puristas da teoria distributivistas Cf. Nathan J Kelly (2005); Guillaumer R. Fréchette, John H. Kegel e Steven F. Lehrer (2003); Michael S. Rocca (2003); Nathan F. Batto (2005); Michael C. Herron e Kenneth W. Shotts (2006).

109

Partidária167 14 artigos

Informacional168 05 artigos

Total 24 artigos

Fonte: Banco de dados do autor.

TABELA 8 – Relação dos artigos encontrados para o caso de modelos híbridos.

Modelos Híbridos Artigos Encontrados

Distributiva-Informacional 01 artigo

Partidário-Distributiva 06 artigos

Partidário-Informacional 06 artigos

Distibutiva-Partidário-Informacional 04 artigos

Total 17 artigos

Fonte: Banco de dados do autor.

Este segundo grande grupo pode ser subdividido ainda em três outros

grupos menores. O primeiro deles (caso 1169), trata das combinações possíveis

entre as teorias distributiva e informacional170. O segundo grupo (caso 2171) é

formado a partir da combinação entre as teorias partidária e informacional. O

terceiro grupo (caso 3172) compreende o conjunto de artigos que versam sobre as

167 Para uma análise da amostra referente às interpretações puramente partidárias Cf. Gary Cox e Jonathan N. Katz (2006); Lanny W. Martin e George Vanberg (2005); Gerald C. Wright e Brian F. Schaffner (2002); Erik J. Engstrom (2006); Mark P. Jones e Wonjae Hwang (2005); William R. Lawry e Charles R. Shipan (2002); Brian W. Marshall (2002); David C. King e Richard J. Zeckhauser (2003); Charie D. Maestas, L. Sandy Maisel e Walter J. Stone (2005); Jeffery A. Jenkins, Michael H. Crespin e Jamie L. Carson (2005); Antonie Yoshinaka (2005); Keith Krehbiel e Alan E. Wiseman (2005); Eric D. Lawrence (2006); Sarah A. Binder (2006). 168 Para conferir a amostra de trabalhos de orientação unicamente informacional, ver Keith Krehbiel (2002); David Austen-Smith e Tomithy J. Feddersen (2006); Holly Brasher (2006); Keith Krehbiel e Adam Meirowitz (2002); Nancy Martorano (2006). 169 Para este caso de combinações só foi encontrado um único artigo dentre as revistas científicas consultadas. Cf. Vijay Krishna e John Morgan (2002). 170 A despeito do que já fora previsto por teóricos políticos acerca das similaridades entre os modelos distributivista e informacional (Cf. Shepsle e Weingast, 1994; Limongi, 1999), os resultados da pesquisa são bem tímidos quanto aos usos deste tipo de combinação teórica por parte dos estudos contemporâneos. Acredito que a falta de maior integração teórica destas perspectivas explica-se em função das dificuldades em combinar o tratamento que cada uma destas tradições oferece à análise das instituições. Enquanto para a tradição distributivista as instituições aparecem como restrições exógenas moldando as preferências legislativas, a tradição informacional toma as instituições como produto das escolhas legislativas, logo, instituições são vistas aqui como variáveis endógenas. 171 Para o conjunto de artigos do caso tipo 2 Cf. Fang-Yi Chiou e Lawrence S. Rothenberg (2003); Glen S. Krutz (2005); Vicky M. Wilkins e Garry Young (2002); Richard Forgette (2004); Jason M. Roberts (2005); Graig Volden e Elizabeth Bergman (2006). 172 Para os artigos do caso 3 Cf. Mark Hallerberg e Patrik Marier (2004); Philip Keefer e David Stasavage (2003); John D. Huber e Nolan McCarty (2004); Scott Desposato (2006); Marian L. Currinder (2003); H. W. Jerome Maddox (2004).

110

possibilidades de integração entre os modelos partidário e distributivo. Finalmente,

o quarto grupo (caso 4173) compreende o conjunto de modelos híbridos por

excelência, ou seja, trata-se do conjunto de trabalhos que visam chegar ao

desenvolvimento de um modelo absolutamente integrativo a partir das três

tradições.

Os artigos selecionados, por periódico, encontram a seguinte disposição nos

grupos de análise:

TABELA 9 – Disposição dos artigos encontrados segundo os grupos de análise Periódicos Caso 1 Caso 2 Caso 3 Caso 4 Journal of Political Economy 01 American Journal of Political Science 02 02 01 Legislative Studies Quarterly 03 02 01 American Politics Research 01 American Political Science Review 01 01 02 Total 01 06 06 04

Fonte: Banco de dados do autor.

Quanto à disposição sobre as principais variáveis explicativas escalonadas

pelos artigos analisados, segundo o critério de grupos de classificação que venho

propondo aqui, pode-se visualizar a seguinte configuração:

TABELA 10 – Disposição das Variáveis Explicativas dos Artigos Analisados

Variável Explicativa Distrib. Partid. Inform. Caso 1 Caso 2 Caso 3 Caso 4 Resultados de votações nas comissões

01 02

Poderes institucionais das comissões

01 02 01

Poderes institucionais do partido majoritário e preferências legislativas

07 02 02 01

Carreiras legislativas 01 Distribuição de recursos legislativos

03 02 01

Processo de tomada de decisão (decision-meking)

01 01

173 Sobre os modelos híbridos do caso 4 Cf. Nils Ringe (2005); Richard L. Hall e Alan V. Deardorff (2006); William T. Bianco e Itai Sened (2005); James S. Coleman Battista (2003).

111

Veto players e controles de agenda

01 01 01 01

Policies e sistema eleitoral

04

Grupos de pressão e burocracias

01 02

Sistema partidário 02 Total 05 14 05 01 06 06 04 Fonte: Banco de Dados do Autor.

Na próxima seção, farei uma apresentação e uma descrição sumária de

alguns exemplos concretos de hibridismo teórico a partir da amostra selecionada. É

neste sentido que, em virtude dos limites espaciais impostos a uma dissertação de

mestrado, optei aqui por apresentar apenas um artigo ilustrativo para cada tipo de

combinação teórica possível. Para a surpresa do que podem esperar analistas mais

pessimistas, o hibridismo apresenta-se hoje como uma forte aposta por parte dos

cientistas políticos.

CASO 1: O PROBLEMA DA ASSIMETRIA

INFORMACIONAL E AS REGRAS LEGISLATIVAS174

Neste artigo, os autores analisam os principais fundamentos das teorias

informacional e distributiva da organização legislativa, focando, respectivamente,

sobre a eficiência distributiva e informacional das regras sob os mais variados graus

de restrição. Por exemplo, os autores postulam que, quando as comissões são

heterogêneas, toda a eficiência informacional é atingível sob open rule. Em

contraste, quando as regras são do tipo closed rule sempre impera a ineficiência

informacional. Isto quando as preferências internas da comissão são heterogêneas.

Mas quando as comissões são homogêneas, a situação é diferente. Todo e qualquer

equilíbrio é ineficiente, não obstante as regras legislativas, ainda que os autores

pontuem que o closed rule pode levar a uma maior eficiência informacional do que

o open rule. Ademais, afirmam os autores, os ganhos de eficiência sob o closed rule

são maiores do que a compensação das perdas distributivas, indiferente ao grau

das preferências divergentes. Nesse sentido os autores examinam os incentivos

174 Para maiores informações Cf. Krishna, Vijay and Morgan, John. 2002. Asymetric Information and Legislative Rules: Some Amendments. American Political Science Review. Vol. 95, N° 2, June, pp. 435-452.

112

produzidos pelas diferentes regras para a aquisição e informação, distribuição de

ganhos e especialização das comissões175.

Por que o Congresso adota regras restritivas para emendas e assim, cede

autoridade substancial às comissões legislativas? Para responder a esta questão, os

autores enveredarão sobre as principais tradições teóricas que explicam a adoção e

o uso de tais regras – as teorias distributiva e informacional. Os autores analisam

que a ênfase sobre o argumento distributivo ou informacional recai sobre as

controvérsias do desenho institucional e seu impacto sobre as instituições

legislativas. Por exemplo, teorias distributivas postulam que o processo legislativo é

organizado de modo a facilitar a extração de ganhos clientelistas (eleitorais) por

parte dos legisladores. Nesse sentido, uma comissão representa um conjunto

razoavelmente homogêneo de preferências ligadas por uma conexão eleitoral que,

geralmente, sob regras restritivas, permite aos seus membros apropriar-se de

ganhos materiais importantes para sua reeleição.

Aonde as teorias distributivas vêem o sistema de comissões como um meio

de apropriação de rendas e troca (exchange), as teorias informacionais postulam

que o papel das comissões é adquirir e disseminar informação relevante para a

legislatura. O processo legislativo é visto aqui como um mecanismo de difusão de

informação das comissões para o Congresso. A composição das comissões refletiria

esta diferença teórica. Em particular, teorias distributivas predizem que comissões

tendem a ser, provavelmente, compostas de preferências outliers e por isso

precisam ser recebidas sob regras restritivas. A análise dos autores indica que

preferências divergentes, por si, não são prejudiciais para a eficiência

informacional. Em comissões heterogêneas, toda a eficiência pode ser alcançada

sob open rule ou regras modificadas (modified rules) a despeito de preferências

divergentes. Então, divergências significantes de preferências, como predito pelas

175 É universalmente reconhecido pela literatura especializada, que o processo legislativo tem efeitos expressivos sobre a arena política. As regras legislativas determinam como propostas podem ser introduzidas, emendadas e votadas. Nesse sentido, tem merecido destaque especial o sistema de comissões legislativas, visto que é lá que tais propostas são esboçadas e encaminhadas às votações no floor. Estas comissões têm atravessado um processo de especialização através do tempo, levando-as a especializarem-se nas mais variadas áreas ou questões. O conjunto de regras sob as quais cada proposta é considerada determina se e como uma proposta pode ser emendada. O closed rule é um procedimento restritivo que não permite oferecer emendas sobre o floor, enquanto o open rule permite que emendas sejam livremente oferecidas. O efeito prático destas limitações de emendas é dar às comissões, considerável poder de guiar a forma final de um projeto de lei.

113

teorias distributivas, não precisam ter efeitos tão prejudiciais sobre a eficiência

informacional.

Teorias distributivas predizem ainda que comissões tendem a ser compostas

de membros com preferências similares (homogêneas). A teoria informacional

prediz que comissões homogêneas estariam associadas a perdas informacionais.

Logo, haveria um trade-off entre uma comissão idealmente composta por

propósitos distributivos e uma composta por propósitos informacionais. Em

algumas instâncias, dirão os autores, a legislatura pode ser capaz de superar as

comissões. Por exemplo, duas comissões homogêneas com preferências opostas

têm jurisdição sobre uma proposta. Neste caso, um sistema de múltiplas

atribuições para duas comissões homogêneas é, estrategicamente, equivalente a

um sistema de uma única atribuição para uma comissão heterogênea. Como as

regras permitiriam à legislatura escolher entre as propostas lançadas pelas duas

comissões, o peso da regra instituída pode ser maquiada pelo grau de

heterogeneidade das preferências internas, a despeito das regras decisórias, e a

eficiência informacional pode ser preservada.

A maior contribuição dos autores para a discussão entre as teorias

distributiva e informacional é assegurar que, apesar do que é predito pela primeira

teoria, ou seja, que comissões tendem a ser formadas por membros com razoável

homogeneidade de preferências, tendo em vista o sistema de divisão de trabalho

quem imperaria no Congresso. Tal homogeneidade não implica em perdas

informacionais, assim como também postula a teoria informacional. Os autores

mostram que eficiência informacional pode ser alcançada na ausência de ganhos

distributivos. Em outras palavras, para além do que é previamente dito pelas

teorias, isoladamente, os autores contra-argumentam que, independente da

comissão ser formada por preferências razoavelmente homogêneas, isto não

significa que a eficiência informacional esteja ameaçada. Do mesmo jeito, a

presença de preferências divergentes, ainda que positiva para a criação e produção

de especialização e expertise política, não implica que provoque efeitos deletérios

sobre os ganhos distributivos dos membros de uma comissão.

114

CASO 2: A RELAÇÃO ENTRE O PIVOTAL POLITICS E O PARTISAN POLITICS176

Nos últimos anos, podem se assistir inúmeros esforços no sentido de

compreender a produtividade legislativa e seus riscos de paralisia. Não obstante,

apesar das contribuições teóricas e empíricas que os últimos anos trouxeram sobre

como as preferências legislativas e as instituições podem influir sobre a paralisia

decisória, falta uma compreensão mais fina da relação entre preferências

legislativas, instituições e o peso da variável partido sobre este fenômeno. Chiou e

Rothenberg (2003) tentam suplantar esta lacuna teórica e empírica combinando

pressupostos típicos às teorias distributiva e partidária, e modelando as condições

de paralisia decisória como uma função das preferências legislativas, das

instituições e dos partidos políticos – incorporando aí o bicameralismo e a influência

das prerrogativas do poder Executivo.

Políticos e analistas concordam que a insurgência de governos divididos nas

últimas décadas tem levado legislaturas à paralisia institucional. Na contramão

destas interpretações, Keith Krehbiel (1998), tem advogado que a provocativa

teoria do governo dividido tem, atualmente, pouca influência sobre a produtividade

legislativa. Para Krehbiel, a paralisia é um problema da ordem do dias nas

democracias contemporâneas, mas ela pode ocorrer mesmo quando um mesmo

partido controla os ramos do Executivo e do Legislativo. Meticulosamente apoiado

sobre fortes dados empíricos, Krehbiel argumenta que o voto

fundamental/essencial (pivotal) dentro do Congresso, não é do ator que pode

oferecer a um projeto uma maioria simples, mas o voto daquele que permite a este

projeto superar um possível veto presidencial ou firmar-se sobre qualquer tipo de

obstrução aos trabalhos legislativos. Esta teoria dos pivots desenvolvida por

Krehbiel177 explica porque, quando uma proposta é aprovada, as coalizões

vitoriosas são usualmente bipartidárias e as maiorias estendias. Oferecendo uma

incisiva explicação de como a paralisia pode ser superada, Krehbiel detêm-se pouco

sobre a importância dos partidos políticos, pois acredita que seu peso é menos

importante dentro da relação Executivo-Legislativo. Não obstante, as principais

variáveis tomadas por Krehbiel são: a natureza das preferências entre os atores,

176 Para maiores detalhes Cf. Chiou, Fang-Yi and Rothenberg, Laurence S. (2003). When Pivotal Politics Meets Partisan Politics. American Journal of Political Science. Vol. 37, Nº 3, July (Pp. 503-522). 177 Cf. Keith Krehbiel. 1998. Pivotal Politics: A Theory of U.S. Lawmaking. Chicago: University of Chicago Press.

115

bem como seu grau de homogeneidade e os poderes institucionais de atores

estratégicos dentro da arena legislativa (policy makings).

O argumento central da interpretação partidária é a idéia de que os partidos

servem, essencialmente, para resolver problemas de ação coletiva e coordenar a

maximização dos interesses legislativos. E nos últimos anos, várias análises

teóricas e empíricas têm focado sua atenção sobre os mecanismos com os quais se

opera este processo. Entretanto, pouca atenção tem sido dada por estas pesquisas

ao impacto do partido sobre a paralisia decisória. A fim de analisar esta possível

influência do partido, Chiou e Rothenberg (2003), elaboram um modelo básico

incorporando à análise dos determinantes da produtividade legislativa, a variável

unidade partidária (os autores se detêm ao papel que os partidos políticos podem

exercer na arena legislativa, mais precisamente, o papel que os líderes partidários

podem exercer, o que, para os autores, é fundamental para explicar as escolhas

legislativas em jogo). Nesse sentido, os autores esperam poder desenvolver uma

melhor perspectiva compreensiva da relação entre preferências, instituições e

partidos. Pois assim, acreditam estar preenchendo uma importante lacuna teórica e

empírica, visto que as teorias da paralisia decisória têm relegado pouca importância

aos partidos políticos, e os estudantes empíricos dos partidos não têm também

integrado aos seus trabalhos tais teorias, de modo a capturar estas relações

potencialmente complicadas e dinâmicas.

Com seu artigo, Chiou e Rothenberg (2003), apontam dados sugestivos e

encorajam a extensão de suas hipóteses sobre outros regimes democráticos. Por

exemplo, teoricamente, ao endogeneizarem o papel dos partidos, os autores podem

capturar a possibilidade de que alguns fatores – como a disciplina partidária –

podem vir a ser mais importantes sob algumas condições do que sob outras (talvez

quando correlacionada a fatores de interesse). E assim, lançam luzes sobre a

correlação de variáveis ainda intocadas. Ainda no que diz respeito à literatura

empírica, seja sobre partidos políticos, seja sobre o problema da paralisia decisória,

os autores podem oferecer dados fortes e robustos mostrando que, a partir da

endogeneização do problema da disciplina partidária, pode-se identificar que,

mesmo a uniformemente difundida hipótese da unidade partidária também pode

ser desfeita, se levarmos em conta momentos e situações específicas sobre as

quais os legisladores não votam com seus companheiros de partido ou têm poucos

incentivos para isso. Finalmente, as possibilidades de combinação teórica trazidas

116

pelos autores vêem ainda a acrescentar na medida em que implementam a

discussão a partir definições alternativas de paralisia institucional, e sugerem novos

desenhos de pesquisa, seja desagregando unidades tradicionais de análise, seja

explorando a combinação de predições teóricas largamente conhecidas.

CASO 3: A RELAÇÃO ENTRE A AUTORIDADE DO EXECUTIVO, VOTO PERSONALISTA E DISCIPLINA ORÇAMENTÁRIA178

O conhecimento recente sobre a formação e elaboração do orçamento nos

países latino-americanos e caribenhos indica que as instituições políticas têm um

impacto importante sobre a disciplina orçamentária. Partindo deste pressuposto

analítico, os autores aqui (Hallenberg e Marier, 2004) argumentam que o principal

problema a ser tratado no que diz respeito a assegurar a força da disciplina fiscal

pelo governo e pela legislatura é o ajuste de recursos comuns. Ao nível dos

ministérios, dizem os autores, o problema se levanta por que ministros consideram

as implicações das decisões unicamente sobre seus ministérios. Ao nível da esfera

legislativa, o problema repousa sobre a rede de incentivos e restrições criada pelo

sistema eleitoral. Usando dados de países latino-americanos e caribenhos para o

período de 1988-1997, os autores concluem que o poder executivo sobre o

processo orçamentário é mais eficiente em reduzir os déficits orçamentários quando

os incentivos para o voto personalista são altos na legislatura, enquanto

presidentes ou primeiros-ministros se fortalecem em países onde o voto

personalista é baixo ou não tem nenhum efeito dentro da legislatura.

Analiticamente, os autores observam a existência de duas fortes tradições

na explicação sobre o déficit orçamentário na América Latina. Para a primeira

tradição, de orientação distributiva, os déficits orçamentários são explicados em

função da forma como o governo cria seu orçamento a cada ano. Para a segunda

tradição, a natureza do processo orçamentário latino-americano é explicada em

função dos mecanismos eleitorais e seu impacto sobre o orçamento. Os autores

agregam maior complexidade a esta discussão tomando uma via explicativa

alternativa. Somando para si pressupostos partidários como a influência do

Executivo ou do partido majoritário sobre a legislatura, por exemplo, os autores

178 Para maiores informações Cf. Mark Hallenberg e Patrik Marier. 2004. Executive Authority, the Personal Vote, and Budget Discipline in Latin American and Caribbean Countries. American Journal of Political Science. Vol. 48, Nº3, Jully (Pp.571-587).

117

podem apresentar, baseados sobre análises de regressão para o caso dos países

latino-americanos, que, a depender da posição/poder que este ator (partido

majoritário) pode exercer sobre as partes, a disciplina orçamentária pode tornar-se

fato, a despeito da influência dos mecanismos eleitorais e de seu estímulo, seja ao

voto personalista, seja à fragmentação.

A pesquisa destes autores acaba tendo implicações especiais para a

discussão sobre o design institucional das novas poliarquias, e o debate sobre a

posição e o papel ocupado pelo Executivo e pelo partido majoritário nestas recentes

democracias. Os autores concluem que, na maioria dos países onde cresce o déficit

fiscal, legisladores estão dispostos a fortalecer a autoridade do Executivo, todavia

as recentes experiências da América Latina com ditaduras têm causado certo temor

sobre esta hipótese de fortalecimento das prioridades do poder Executivo. Não

obstante, os autores, munindo-se de pressupostos comuns às teorias distributiva e

partidária concluem que o fortalecimento das prerrogativas do Executivo dentro do

Congresso pode resolver o problema ao nível do processo decisório, mas

naturalmente, isto implicaria em alguns riscos, como o de delegar autoridade em

excesso a um único ator central. Uma segunda possibilidade, esta reservada pelos

autores aos países ditos de coalizão como o Brasil, é adotar uma espécie de

contrato fiscal negociado entre os partidos da coalizão, tomando como pressuposto

que estas partes estão menos predispostas a delegar tanto poder a um ator

unitário, já que estariam, de antemão, predispostas a concorrer uma contra a outra

durante o próximo pleito eleitoral. Finalmente, a alternativa mais adequada,

segundo os autores para a resolução do problema do déficit orçamentário pode ser

a reforma no sistema eleitoral.

A importância teórica da discussão travada pelos autores reside no fato de

que eles, mesmo apelando a variáveis exógenas como o sistema eleitoral; não

deixam perder de vista as relações distributivas entre os atores, mas também o

papel do Executivo ou do partido majoritário sobre todo esse processo. Os autores

enriquecem a discussão no momento em que combinam teria distributiva e

partidária e introduzem ainda aí a análise do sistema eleitoral como algo não

determinista para o processo, mas uma variável passível de influência a depender

da própria relação entre o Congresso, o Executivo e o partido majoritário.

118

CASO 4: O PROBLEMA DOS LOBBIES E DOS SUBSÍDIOS LEGISLATIVOS179

Lobistas profissionais são hoje, talvez, os mais experientes e reconhecidos

atores estratégicos que podem ser reconhecidos dentro da arena política,

especialmente em se falando da política norte-americana. Todavia, seu modelo de

comportamento, freqüentemente, é visto como anômalo à luz das três principais

teorias existentes sobre a organização legislativa (distributiva, informacional e

partidária). Hall e Deardorff (2006) revisitam estas anomalias entre teoria e empiria

na tentativa de lapidar uma teoria alternativa que dê conta das relações entre a

legislatura e os grupos de interesse. Os autores criam e compreendem seu modelo

de lobby para além das interpretações tradicionais que os vêm, seja como um mero

mecanismo de troca (gains from exchange), seja como um mecanismo unicamente

persuasivo (informative signals), seja mesmo enquanto partes capazes de

influenciar o processo legislativo a partir de compromissos negociados através da

elaboração de propostas e emendas (shape the agenda).

Os autores elaboram que o objetivo político aproximado da estratégia dos

grupos de interesse não é mudar a mente dos legisladores, mas sim montar redes

de aliança possíveis a partir de objetivos coincidentes. A teoria sugerida pelos

autores é simples na forma, realística em suas hipóteses principais e contra-

intuitiva em muitas de suas principais implicações. Empiricamente, ela resolve

várias e significantes anomalias que aparecem quando os grupos de lobby são

vistos somente a partir de suas preferências (preference-centered). Neste sentido,

a teoria sugerida pelos autores está menos apoiado na relação de coincidência

entre as preferências dos grupos de interesse e dos legisladores, e mais assentada

sobre as possibilidades reais de ganhos destes atores (budget-centered), todavia

sem perder de vista o valioso jogo de informações entre as partes, nem a

inteligência política que envolve a relação entre os lobistas e os legisladores

estrategicamente selecionados.

Focando sua atenção sobre o problema das anomalias teóricas, os autores

sugerem que os modelos do tipo preference-centered são na verdade vazios de

significado. Para os autores, parte desta literatura tem prestado mais atenção sobre

o papel dos lobistas como uma espécie de fornecedores de informação. Para os

179 Para maiores referências CF. Hall, Richard L. and Deardorff, Alan V. (2006). Lobbying as Legislative Subsidy. American Political Science Review. Vol. 100, Nº1, Frebruary (Pp. 69-84).

119

autores, os grupos de lobby não representam uma estratégia na tentativa de

alterar (transformar) as preferências dos legisladores sobre políticas. Na verdade,

eles cumpririam tentativas de subsidiar os recursos legislativos dos membros que já

defendem as causas do grupo. Ou seja, grupos de lobby operariam sobre a

fronteira do orçamento legislativo, não sobre suas funções de utilidade. Por

conseguinte, as relações entre lobistas e legisladores são retratas pela teoria dos

autores mais enquanto uma rede de doações (gifts) do que enquanto um comércio

de trocas (trade).

Visto que a literatura sobre grupos de interesse é ampla, mas

frequentemente contraditória, a teoria apresentada pelos autores apóia-se sobre

uma tentativa de combinar ao máximo, interpretações e pressupostos oferecidos

pelas teorias positivas da organização legislativa acerca das relações possíveis

entre o processo legislativo e a influência dos grupos de pressão. A justaposição

elaborada pelos autores entre empiria e teoria, acabou por transformar-se numa

alternativa teoria proveitosa, na medida em que tentou revisitar algumas hipóteses

básicas e repensar alguns conceitos.

A teoria por eles apresentada sugere que devemos repensar o conceito de

lobby de maneira simples, mas de forma diferente ao que vinha sendo pensado

segundo essas teorias até então. Para os autores, os grupos de lobby devem ser

vistos menos como uma forma de troca, controle ou persuasão, e mais enquanto

formas de subsídio. Isto acaba por gerar novas e promissoras hipóteses para o

campo de pesquisa. Além das novas luzes que a teoria pode lançar sobre a

alocação de estratégias divergentes entre as partes ou sobre a própria tramitação

do processo legislativo, merece destaque especial a conexão que estes autores são

capazes de elaborar a partir da discussão sobre as implicações normativas da ação

destes grupos de interesse para a teoria democrática contemporânea, sobretudo

para a representatividade dentro das poliarquias modernas.

Enfim, a teoria dos subsídios lobistas apresentada por Hall e Deardorff

(2006) caminha numa tentativa bem sucedida de combinação teórica, não partindo

da mera agregação de pressupostos, mas partindo da discussão entre empiria e

teoria e dos problemas e anomalias apresentados pelo paradigma. Em geral,

problemas desse nível têm surgido menos de dentro da própria arena legislativa e

mais a partir de terceiras partes, ou melhor, das partes que parecem não se

ajustarem à teoria. É neste sentido que podemos afirmar que, as possibilidades

120

mais bem sucedidas de combinação teórica e desenvolvimento de modelos híbridos

desta espécie, parte hoje de terrenos ainda desconhecidos pelos cientistas políticos,

ou seja, problemas ainda movediços e pouco sedimentados, para os quais estes

cientistas têm buscado munir-se das melhores ferramentas analíticas possíveis. E

se para isso for necessário condensar e combinar teorias, os analistas já mostram

que não ousarão em resistir ou defender qualquer purismo analítico.

LIMITES E POSSIBILIDADES DA EXPLICAÇÃO INSTITUCIONAL OU COMO E PORQUE AS INSTITUIÇÕES DEVEM IMPORTAR?

O que são teorias? De onde elas surgem? Como se configuram? Teorias são

conjecturas, elas nos dizem como e por que determinados fatos se relacionam. Para

os realistas críticos, a construção de uma teoria é um processo diacrônico, ou seja,

é uma via de mão dupla entre a atividade conceitual e a investigação empírica180.

De acordo com Van Evera (1997)181, não há receitas prontas para construir teorias,

em geral, os estudiosos usam a dedução, inferindo explicações mais gerais e leis

causais estabelecidas com a maximização da utilidade, examinando casos pouco

estudados, minando hipóteses já estabelecidas através de novos dados empíricos

ou mesmo, importando teorias de outros domínios e adotando-as para explicar

outros fenômenos. Todas estas tentativas, podemos enumerar como possibilidades

indutivas de construir ou moldar teorias, só esta última alternativa pode ser

considera dedutiva. E foi isso que a ciência política de maneira geral, e o subcampo

dos estudos legislativos, de maneira crescente, tem feito nas duas últimas décadas,

adotado de modo progressivo métodos e pressupostos naturais das ciências

econômicas (homo economicus).

Não obstante, os estudos sobre o Congresso norte-americano, a partir de tal

multidisciplinaridade, passaram a compor, indiscutivelmente, o mais teoricamente e

metodologicamente avançado subcampo da ciência política contemporânea.

Todavia, enquanto este subcampo tem de modo convincente, aperfeiçoado sua

compreensão das instituições congressionais, sua contribuição para o

180 Cf. Cynthia Lins Hamlin. Realismo Crítico: Um Programa de Pesquisa para as Ciências Sociais. Dados, vol. 43, n.º 2. 181 Cf. Stephen Van Evera. 1997. Guide to Methods for students of Political Science. Ithaca, London: Cornell University Press.

121

desenvolvimento de uma teoria geral do legislativo tem sido mais limitada182. As

teorias norte-americanas baseadas sobre pressupostos comportamentalistas, foram

desenvolvidas dentro de um contexto institucional que difere dramaticamente

daquele encontrado em virtualmente todas as outras democracias presidenciais, o

que implica que a pressuposta universalidade da sua aplicação venha sendo

questionada183. Nesse ínterim, a discussão sobre a natureza e o funcionamento das

instituições legislativas foi, a princípio, transladada para o contexto das nossas

instituições nos moldes das três principais tradições (distributiva, informacional e

partidária) sem maiores preocupações adaptativas, a despeito das grandes

dessemelhanças entre o desenho das nossas instituições legislativas e as

instituições norte-americanas184.

Considerando que entre o desenho institucional norte-americano e o das

demais democracias presidenciais há dessemelhanças quase intransponíveis, alguns

estudiosos argumentam que as teorias desenvolvidas para o estudo do Congresso

americano, são pouco úteis para explicar o funcionamento das legislaturas sob

outros contextos institucionais185. Mas afinal, o que faz uma teoria ser considerada

boa? Ainda segundo Van Evera (1997), boas teorias são aquelas que possuem

amplo poder de explicação, ampla extensão de aplicação, estruturas claramente

articuladas, simplicidade (usa poucas e simples variáveis para explicar o

fenômeno), riqueza prescritiva e um princípio razoável de falseabilidade186. O

argumento desenvolvido é menos pessimista do que parece, pois acredito que,

embora as fundações epistemológicas das teorias positivas da organização

legislativa norte-americana não sejam universalmente traduzíveis para qualquer

contexto institucional, considero-as suficientemente robustas e flexíveis para serem

182 Gerald Gamm e John Huber (2002). Legislatures as Political Institutions: Beyond the Contemporary Congress. In Political Science: The Estate of Discipline, ed. Ira Katznelson e Helen V. Milner. New York: W. W. Norton, pp. 313-341. 183 Limongi já realçou os limites dessa adesão indiscriminada a muitos pressupostos da agenda norte-americana no contexto dos estudos da política comparada. Cf. Fernando Limongi (2003). Formas de Governo, Leis Partidárias e Processo Decisório. BIB – Boletim Informativo e Bibliográfico de Ciências Sociais. São Paulo, n.º 55, pp. 07-39. 184 Mais uma vez, para uma breve análise da influência das tradições norte-americana sobre a ciência política brasileira Cf. Manoel Leonardo W. D. Santos (2006). As Teorias Positivas sobre a Organização do Legislativo e as Explicações sobre o Congresso Nacional. Tese de mestrado em Ciência Política, Recife, Universidade Federal de Pernambuco (CFCH); Fernando Limongi (1994). O Novo Institucionalismo e os Estudos Legislativos: a Literatura Americana Recente. BIB – Boletim Informativo e Bibliográfico de Ciências Sociais, n.º 37, pp. 1-100. 185 Cf. Kurt Weyland (2002). Limitations of Rational-Choice Institutionalism for the Study of Latin American Politics. Studies in Comparative International Development (spring): 57-85. 186 Cf. Stephan Van Evera. 1997. Guide to Methods… citado.

122

adaptadas sob alguma parcimônia a outros cenários institucionais além do

americano. É neste sentido que o hibridismo teórico e as possibilidades de

combinação teórica têm encontrado solo fértil, principalmente, fora do cenário

acadêmico norte-americano, onde a canonização destas tradições implicou na

consolidação de redes de pesquisa e incentivos a muito já consolidadas.

Dando continuidade ainda a um exame previdente da literatura internacional

sobre os problemas da organização legislativa e de suas instituições, pode-se

apontar que o novo paradigma institucional da escolha racional foi ademais, talvez,

o principal responsável pelo salto qualitativo dentro do subcampo dos estudos

legislativos. Isto se levamos em conta o avanço que este paradigma trouxe para o

estudo da mediação entre as instituições e o comportamento individual. Não

obstante, a análise dessa literatura aponta ainda para a hipótese da existência,

entre estes trabalhos, de uma possível tendência predominante por não enfatizar

ou até mesmo desprezar o fato simples e fundamental de ser o Legislativo, antes

de tudo, um corpo representativo. Com isso, e esta talvez seja a principal

contribuição desta pesquisa, espero chamar a atenção dos estudiosos brasileiros

para os caminhos tomados pela produção contemporânea sobre o Poder Legislativo,

seu real alcance heurístico, bem como suas limitadas possibilidades de análise

normativa187. Assim, acredito que os estudos legislativos podem e devem ir além

de, simplesmente, repetir que a adoção de diferentes instituições possivelmente

está associada a resultados políticos distintos. Devem, em suma, poder extrair da

análise, conseqüências para a qualidade da democracia, uma vez que investigar a

organização legislativa deve denotar mais do que o registro de preferências

reveladas em votações nominais e indicações para as diversas comissões.

Para Ellen M. Immergut (1998), o problema do novo institucionalismo seria

justamente não permitir uma orientação normativa. Ao comentar uma das questões

mais importantes dessa linha teórica, ou seja, as assimetrias de poder geradas

187 De maneira bastante pertinente, Ian Shapiro (2002) já apontou para os limites de uma ciência política dividida. De um lado, aqueles que se apóiam sobre teorias empírica e metodologicamente dirigidas, separada das grandes questões teóricas e focada apenas sobre o que lhe parece metodologicamente tratável. E do outro, aqueles orientados apenas por teorias normativas, desconectadas de problemas políticos concretos. Shapiro afirma que a ciência política deve ser dirigida menos por questões exclusivamente empíricas ou teóricas e mais por problemas de pesquisa (problem-driven). Visto que a observação é inescapavelmente carregada de teoria, Shapiro sugere que é papel do cientista político identificar e por à mostra as hipóteses teóricas e interpretações políticas que subjazem as pesquisas empíricas e dessa maneira, sugerir alternativas plausíveis que possam iluminar novas e promissoras agendas de pesquisa. Ian Shapiro. Problems, Methods, and Theories in the Study of Politics, or What’s Wrong with Political Science and What to do about it, Political Theory 30 (Agosto de 2002).

123

como efeitos secundários pelas instituições, a autora afirma que cabe aos

institucionalistas sugerir maneiras para que as instituições forneçam resultados

justos. No entanto, isso seria muito difícil de obter devido aos próprios

pressupostos do novo institucionalismo. Diz-se que o novo paradigma institucional

baseia-se sobre duas proposições: instituições importam e são endógenas188. Seu

argumento central é que as instituições são a causa profunda ou primordial do

desenvolvimento político e econômico189. Mas isso ainda não responde como e

porque elas devem importar.

Estudar instituições só faz sentido se partimos da idéia de que, se assim o

fazemos, podemos melhorá-las, ou seja, espera-se que o estudo e a compreensão

sobre as instituições possam vir a trazer um benefício implícito. Przeworski (2003),

bastante pessimista sobre a agenda neo-institucional, em um draft apresentado no

CEBRAP, em março de 2003, apresenta algumas inquietantes provocações sobre

essa questão: 1) pode-se dizer que instituições importam apenas se elas podem ser

mudadas e se tais mudanças conduzem a diferentes resultados; 2) para concluir

que instituições importam, nós precisamos descobrir que instituições importam

para quê. Até aqui, nós ainda não sabemos190.

A reflexão proposta por Przeworski é instigante porque tem potencial para

colocar em xeque todo um conjunto de pressupostos analíticos que vêm sendo

extensivamente utilizados pela literatura de ciência política contemporânea,

especialmente no subcampo dos estudos legislativos, dentro e fora do Brasil. Nesse

sentido, pode-se propor uma pergunta teórica definitiva: é possível melhorar a

democracia mudando as instituições? A questão pode ser transladada para o estudo

das instituições legislativas: se as teorias positivas da organização legislativa

excluem a questão da representatividade (pedra fundacional dos órgãos

legislativos), como se pode deduzir que o estudo das instituições implique num

aperfeiçoamento da democracia? Ou o estudo destas instituições significa a

possibilidade de vir a aperfeiçoá-las ou não significa mais nada191.

188 Como já observaram North e Thomas (1973), “novos arranjos institucionais não se estabelecerão a menos que os benefícios privados de sua criação prometam exceder os custos”. Cf. Douglass C. North e Robert P. Thomas. 1973. The Rise of The Western World: a New Economic History. Cambridge: Cambridge University Press. 189 Cf. Adam Przeworski. 2005. A ùltima Instância: As Instituições são a causa primordial do desenvolvimento econômico? Novos Estudos CEBRAP, n.º 72, São Paulo, Julho. 190 Cf. Adam Przeworski. 2003. Institutions Matter. Mimeo. 191 Para Rothstein (1996), a preocupação da ciência política com as instituições é tão antiga quanto o começo da reflexão clássica acerca de qual é o melhor governo para dar lugar a uma boa sociedade.

124

O modelo neo-institucional é hoje, indiscutivelmente, uma referência

fundamental para o estudo das instituições congressionais. Por conseguinte, o

problema da transformação institucional é, provavelmente, um dos seus maiores

desafios. A discussão sobre quais são os arranjos institucionais mais adequados

para assegurar a qualidade da democracia e como estes afetam a qualidade das

decisões aprovadas no interior dos órgãos legislativos vem sendo uma das questões

mais debatidas na literatura especializada192 o que, em última instância, remete à

discussão sobre os critérios normativos que devem guiar o desenho das

instituições193.

Nesse sentido, Platão e Aristóteles seriam institucionalistas. Por outra parte, quando a ciência política se constitui em uma disciplina, a denominada engenharia institucional, é uma de suas principais manifestações. Também a teoria da justiça de Rawls (2000) inahugura uma nova era de interesses sobre estas questões, afirmando que só instituições políticas justas darão lugar a uma sociedade justa. Cf. B. Rothstein. 1996. Political Institutions: an Overwiew. In: New handbook of Political Science. Oxford: Oxford University Press, pp. 133-166; J. Rawls (2000). Teoria de la Justicia. México: Fondo de Cultura Económica. 192 Ver, por exemplo, Arend Lijphart (2003). Modelos de Democracia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; G. Bingham Powell Jr., Elections as Instruments of Democracy: Majoritarian and Proportional Visions (New Haven & London: Yale University Press, 2000); George Tsebelis, Veto Players: How Political Institutions Work (New York: Russell Sage Foundation, 2002); idem, Decision Making in Political System: Veto Players in Presidentialism, Parlamentarism, Multicameralism, Multipartidarism, British Journal of Political Science (1995); Mathew Soberg Shugart and John M. Carey, Presidents and Assemblies: Constitutional Design and Electoral Dynamics (New York: Cambridge University Press, 1992); John Huber, Rationalizing Parliament: Legislative Institutions and Party Politics in France (New York: Cambridge University Press, 1996); Kaare Strom, Wolfgang C. Müller e Torbjörn Bergman eds., Delegation and Accountability in Parliamentary Democracies (New York: Oxford University Press, 2003); e Stephan Haggard e Mathew D. McCubbins eds., Presidents, Parliaments, and Policy (New York: Cambridge University Press, 2001). 193 Marcus André Melo. 2002. Institutional Design, Normative Political Theory and Accountability. Mimeo.

125

CONCLUSÃO

A literatura especializada tem apresentado pelo menos três tradições

principais para a explicação da organização interna das instituições legislativas. A

primeira enfatiza o papel das comissões como agenda-setters jurisdicionais capazes

de garantir os ganhos de troca dentro das legislaturas (Shepsle e Weingast, 1987;

Weingast e Marshall, 1988). A segunda, aposta no papel das comissões enquanto

repositórios de informação e expertise (Gilligan e Krehbiel, 1989; Krehbiel, 1991,

2004). E a terceira e última, volta-se para a análise dos partidos políticos enquanto

mecanismos capazes de resolver problemas de ação coletiva dentro do Congresso

(Rohde, 1991; Cox e McCubbins, 1993). Todas essas abordagens nos mostram que

as variáveis organizacionais específicas à organização dos trabalhos legislativos

podem e devem ser tomadas como variáveis independentes com grande poder

explicativo.

O presente estudo inicia com a observação de que estas tradições têm mais

em comum do que uma leitura casual destes trabalhos pode sugerir. Ao seu modo,

cada uma destas tradições evoca a lógica da nova economia das organizações,

onde instituições representam soluções para problemas particulares de transação e

permitem aos membros ganhos a partir da cooperação. Ainda que estas tradições

escolham variáveis explicativas diferentes – ora o sistema de comissões (em suas

vertentes alocativa e informacional), ora o partido majoritário dentro do Congresso

(para a vertente partidária) – todas elas assumem que a institucionalização é parte

importante e imprescindível das relações intra-legislativas.

Em comum, as três perspectivas possuem a referência ao indivíduo

legislador como unidade de análise, e a preocupação em comprovar a veracidade

de seus modelos por intermédio do exame da gênese e dinâmica de funcionamento

das comissões permanentes do Congresso. Nesse sentido, parlamentares possuem

preferências que são primariamente a reeleição e, secundariamente o aumento de

seu prestígio e patrimônio (à medida que o primeiro determinaria este último). A

busca da reeleição leva o parlamentar médio a favorecer projetos que tragam

benefícios concentrados (espacialmente) para seus distritos e/ou para os grupos de

interesse que o apóiam (setorialmente). Os projetos cujos benefícios são difusos

tendem a ser subproduzidos. Os parlamentares interagem numa arena sujeita à

regra majoritária, ou seja, os projetos devem contar com a aprovação da maioria

126

dos seus membros. Assim, teoricamente, os membros do Congresso se engajariam

em um processo de trocas mutuamente vantajosas até que nenhum apoio recíproco

fosse possível. No entanto, cada parlamentar teria que trocar a aprovação de seu

projeto individual pelo seu apoio a projetos de, pelo menos, metade dos membros

do Legislativo, já que cada parlamentar representa um voto. Os legisladores,

portanto, se deparam recorrentemente com a possibilidade de seus pares não

honrarem os compromissos de apoio recíproco (logrolling), o que levaria o

Congresso à paralisia decisória, pois não seria possível a formação de coalizões

vencedoras para cada projeto.

A solução histórica para esse tipo de problema de ação coletiva foi a

formação de comissões e subcomissões especializadas que detêm “direitos de

propriedade” sobre o tratamento exclusivo das questões acerca de seus distritos

eleitorais (constituencies). Os membros dessas comissões tipicamente

representariam de forma mais intensa os interesses setoriais e localistas, e

tomariam decisões, superando assim um problema de ação coletiva. Os membros

de uma comissão especializada, por se auto-selecionarem, são os representantes

mais identificados com interesses setoriais relativos a esta comissão. Em suma, o

sistema de comissões e subcomissões representa um arranjo específico que

permite a mediação entre interesses sociais e decisões legislativas. Os partidos

disciplinados também são citados como formas de superação do chamado dilema

do “segredo eficiente”: a superação de interesses localistas por interesses

universalistas programáticos. A direção dos partidos responde a uma estrutura de

incentivos distinta daquela com que se depara o parlamentar médio. Tal estrutura

associada à disciplina partidária permite que um espectro mais amplo de interesses

seja contemplado194.

Estas tradições diferem quanto à natureza e a origem do problema a ser

resolvido e quanto à solução institucional proposta. Em geral, tais teorias apostam

na hipótese de que estes problemas podem ser mais facilmente superados se os

membros cooperarem. É neste sentido que se pode afirmar que em virtude de sua

lógica interna, as tradições não são absolutamente antitéticas. Por conseguinte,

aceitar uma destas tradições para a compreensão da organização congressional não

requer que precisemos rejeitar outra. De um ponto de vista teórico, elas não são

194 Cf. Kenneth A. Shepsle e Barry R. Weingast. 1981. Political Preferences for the Pork Barrel: A Generalization. American Journal of Political Science, n.º 25.

127

mutuamente exclusivas e podem mesmo representar diferentes e importantes

partes de um mesmo complexo quebra-cabeça: o Congresso. O surgimento de

hipóteses concorrentes que são testadas contra novas evidências e novamente

corroboradas ou contestadas reflete a própria natureza do Congresso enquanto um

objeto de estudo observável sob vários pontos de vista, ou seja, uma organização

multifacetada e, provavelmente, impensável de ser compreendida sob um único

prisma. Para uma última apreensão disto, sintetizo abaixo a essência de cada uma

destas tradições:

TABELA 11 – O Argumento Central das Teorias Positivas da Organização Legislativa

Vertente Teórica Argumento Central Teoria Distributiva A existência do argumento distributivo é que os ganhos

de troca só são possíveis mediante um sistema autônomo de comissões, partindo-se do pressuposto que as preferências legislativas são heterogêneas e as escolhas políticas multidimensionais. A idéia de troca só se faz possível se acreditamos na heterogeneidade das preferências legislativas e das prioridades individuais.

Teoria Informacional A exigência fundamental da vertente informacional é o princípio da informação imperfeita, tal como capturado pelo postulado da incerteza de Krehbiel (1991). Para esta tradição, devem existir oportunidades para os membros de ganhar, adquirir e disseminar informação sobre a relação entre os instrumentos políticos alternativos e os resultados.

Teoria Partidária A essência do modelo partidário são os problemas de coordenação do Congresso. Comissões, enquanto elementos organizacionais descentralizados de produção de políticas, são vistos aqui como instrumentos potenciais de manobra por parte do partido majoritário. Na medida em que podem exercer efeitos politicamente relevantes sobre os processos internos e sobre os demais não-membros, comissões podem revelar-se importantes agentes do partido.

Fonte: Elaborado a partir de Shepsle (1979); Shepsle e Weingast (1987); Weingast e Marshall (1988); Krehbiel (1991); Cox e McCubbins (1993).

Preferências heterogêneas, resultados multidimensionais, informação

imperfeita sobre os instrumentos políticos, efeitos externos da elaboração de

políticas, custos de agência e seus benefícios são os componentes das teorias

positivas da organização legislativa. Uma síntese delas, portanto, deverá conter

todos eles, considerando-se, naturalmente, que sob circunstâncias especiais, um ou

128

outro destes componentes deverá destacar-se. Nesta seção conclusiva, procurarei

examinar com brevidade alguns aspectos controversos sobre os limites e

possibilidades destas combinações teóricas.

A tradição inaugurada por Keith Krehbiel repousa, explicitamente, sobre a

idéia de uma única dimensão política195. Tal hipótese reflete seus limites sobre o

grau de sofisticação dos modelos informacionais. Por conseguinte, isto afeta o tipo

de conclusões derivadas por estes modelos. O princípio do postulado majoritário,

por exemplo, pressupõe esta restrição unidimensional. Quando somente uma única

dimensão política é levada em conta, uma legislatura cuja organização apóia-se

sobre uma regra majoritária é improvável afastar-se dos interesses do legislador

mediano. Todavia, por que o legislador mediano é aquele que decide sob estas

circunstâncias, deveríamos perguntar: por que estes legisladores se absteriam de

sua posição num espaço de informação assimétrica? Esta característica envolve

muita das substantivas conclusões a que chegou o autor. Em um espaço político

multidimensional, um legislador mediano (median voter) é sempre pouco provável

ou ineficiente. Por conseguinte, isto permanece um problema para o postulado

majoritário de Krehbiel.

Como Riker196 (1980) tem argumentado, o problema da escolha sobre as

instituições reflete a incoerência das preferências políticas coletivas. A lógica é bem

forte ao modelo. Se instituições têm um previsível efeito sobre a escolha política,

então ciclos subjacentes aos espaços políticos manifestam-se como ciclos sobre

estas instituições. Em outras palavras, para qualquer arranjo institucional haverá

sempre uma maioria que preferiria outro. Por isso, o postulado majoritário pode

mostrar-se incompleto quando pensamos que ele oferece uma única predição sobre

um mundo eivado de múltiplas questões.

Além do mais, embora Krehbiel discuta as tradições distributiva e

informacional, seu foco unidimensional da esfera legislativa contradiz o próprio

pressuposto da possibilidade de trocas transversais (exchange). O princípio da

troca requer mais do que a existência de um confortável espaço unidimensional.

Sob um espaço unidimensional, indivíduos só podem trocar maças por maças, uma

pela outra. Somente sob um espaço multidimensional indivíduos com diferentes

195 Cf. Keith Krehbiel. 1991. Information and Legislative Organization. Ann Arbor: The University of Michigan Press, pp. 260-261. 196 William Riker. 1980. Implications from the Disequilibrium of Majority Rule for the Study of Institutions. American Political Science Review 73:85-102.

129

preferências podem estabelecer, de fato, uma lógica cooperativa da troca. Digo:

somente sob uma arena multidimensional, indivíduos podem trocar maças por

laranjas, pêras, etc. Um sistema de comissões envolveria a troca de prioridades por

autoridade jurisdicional e para isso, requer um espaço de múltiplas jurisdições. Se,

de acordo com Krehbiel, só haveria espaços unidimensionais, como poderia um

legislador estabelecer qualquer tipo de logrolling de modo a trocar poderes com

outrem? A troca legislativa requer que haja, ao menos, duas dimensões para que

legisladores tenham preferências heterogêneas. Nesta esfera, legisladores oferecem

poder sobre uma área para ganhar poder sobre outra. Quando ganhos marginais

sobre a questão a qual eles ganham poder afetam eles, mais do que os ganhos

marginais sobre a questão a qual eles perderam poder, diz-se que estes

legisladores encontram-se em melhor posição.

Suponhamos duas questões caracterizadas pela incerteza sobre a relação

entre instrumentos políticos e resultados. Suponhamos ainda que legisladores

tenham preferências diferentes sobre estas questões – por exemplo, a perspectiva

de reeleição de cada legislador é maior afetada por uma questão do que pela outra.

Neste cenário, é possível acreditarmos que legisladores estarão em melhor posição

se alocados em comissões com poderes restritivos. De acordo com o pressuposto

da troca (exchange), o bem-estar de um membro aumenta a medida que eles

ganham influência sobre as questões que mais afetam sua reeleição. Ainda, de

acordo com o argumento pela redução da incerteza, o bem-estar legislativo

aumenta quando as comissões adquirem e produzem informação. Sob estas

condições, estes dois efeitos – ganhos de troca e informação – são distintos, mas

complementares. É neste sentido que se pode afirmar que modelos do tipo

demand-side e supply-side interagem e se combinam, produzindo uma imagem

mais rica das permutas legislativas quando acrescidas uma da outra. Está certo que

a ênfase do modelo de tipo supply-side de Krehbiel alerta-nos para o problema da

incerteza e nos obriga a pensar para além do que pressupõem os modelos de tipo

demand-side, agregando uma espécie de racionalidade informacional ao cenário

legislativo. Todavia, racionalidades do tipo supply-side ou demand-side não são

substitutas, mas antes, complementares.

Se virmos a esfera legislativa a partir de uma perspectiva unidimensional,

então tudo sugere que pesquisadores devem escolher entre as tradições

informacional ou distributiva. Não obstante, se pesquisadores abrem este leque e

130

vêem que a esfera legislativa caracteriza-se por uma multiplicidade de questões,

então estas tradições se reforçam mutuamente. Seguramente, os trabalhos de

Krehbiel representaram um avanço sobre os modelos de primeira geração no que

diz respeito à troca cooperativa dentro da legislatura a partir do princípio da

aquisição e da troca de informações. Contudo, mesmo os ganhos pela adoção de tal

pressuposto podem ser ameaçados pela unicidade dos modelos espaciais, típicos a

esta tradição. Por exemplo, Krehbiel sugere que a hipótese dos ganhos de troca

tem trazido uma visão errônea do poder das comissões197. Comissões são

diferencialmente poderosas dentro de suas respectivas jurisdições (Shepsle e

Weingast, 1987), mas a explicação para o seu poder, de acordo com a teoria

informacional, encontra-se no caráter eloqüente e persuasivo que estes

instrumentos podem ter dentro do Congresso198.

Já os trabalhos de Cox e McCubbins, na medida em que focam sobre os

problemas da ação coletiva dentro do Congresso, eles podem iluminar o papel dos

partidos dentro da organização legislativa e construir um impressivo conjunto de

hipóteses e dados sobre o modus operandi das instituições congressionais. Todavia,

o foco analítico destes autores pode nos levar ainda a uma visão no mínimo

diminuta da importância e do papel das comissões legislativas.

Por exemplo, imaginemos um espaço multidimensional, onde legisladores,

membros de um partido majoritário, possuem pontos ideais e preferências bem

definidas. Imaginemos ainda que os membros deste partido difiram quanto à média

de suas preferências sobre a dos membros de um segundo partido minoritário. De

acordo com Cox e McCubbins, os membros do primeiro partido (por que

majoritários dentro da legislatura), tendem a defender ganhos maiores sobre os

197 Nos últimos anos, a teoria distributiva da organização legislativa vem sendo contestada fundamentalmente porque, ao enfatizar o sistema de comissões, prescinde do papel dos partidos, dos ganhos coletivos produzidos pelo sistema de comissões especializadas – redução dos custos de obtenção de informação por não-especialistas -, do aprendizado social resultante, ou ainda por não considerar os ganhos de eficiência (pela diminuição dos custos da relação Agente-Principal) gerados pela delegação de atribuições a comissões (Krehbiel, 1991; Kiewiet e McCubbins, 1991; Cox e McCubbins, 1993). Nesse sentido, a teoria distributiva tem sido o ponto de partida das demais tradições, seja na tentativa de incrementar e sofisticar estes modelos ditos de primeira geração, seja mesmo para criticá-la e sugerir outras variáveis explicativas que não somente o sistema de comissões e sua pretensa autonomia. 198 Nas palavras de Krehbiel: “committees earn the compliance of their parent chamber by convincing the chamber that what the committee wants is in the chamber’s interest. In this respect, committee power is not inherently informational but also inherently majoritarian.” (Krehbiel, 1991: 256). Este argumento repousa sobre um raciocínio unidimensional. Primeiro, a referência de Krehbiel aos “interesses da Câmara” só faz sentido dentro de um universo unidimensional. Segundo, mesmo que haja alguma expressão multidimensional dos interesses da Câmara, o argumento de Krehbiel presume que as comissões devem persuadir a Câmara de que estas agem segundo as preferências da Câmara e dentro de suas respectivas jurisdições.

131

membros minoritários e para isso, estão dispostos a moldar instituições que os

ajudem a perseguir seus objetivos. Não obstante, se um partido majoritário, de

acordo com a lógica da racionalidade partidária, tende a executar políticas próximas

somente às suas preferências, como é possível defender qualquer descrição

particular de representatividade dentro da legislatura? Depois, levando em conta a

heterogeneidade de cada partido, que não é menor do que toda a legislatura

(sobretudo se pensamos num espaço multidimensional) é difícil predizer que usos o

partido majoritário fará do sistema de comissões, por exemplo.

É preciso enfatizar aqui que, se os membros de um dado partido possuem

preferências diferenciadas sobre questões, eles devem estar dispostos a trocar suas

diferenças pelo aumento do seu bem-estar individual. Para a teoria partidária, não

cabem preferências diferentes entre os membros de um mesmo partido. É neste

sentido que Cox e McCubbins têm destacado de maneira incontestável o papel do

partido como um veículo para a organização das comissões, para a delegação e

manutenção destes poderes e para o policiamento de comportamentos não

condizentes às preferências e prioridades do partido199.

O argumento elaborado por Cox e McCubbins acrescenta uma importante

consideração sobre o papel dos partidos políticos na divisão de trabalho dentro do

sistema de comissões e na alocação e acomodação de seus membros. Além do

mais, os autores nos alertam para os prejuízos materiais e os riscos morais

oriundos para os membros se estes maculam a sigla partidária pela otimização

desenfreada de ganhos individuais. Não obstante, apesar dos avanços que a

tradição partidária sugere sobre os modelos de primeira e segunda geração, a

relação que a teoria partidária elabora entre os planos micro e macro do

comportamento legislativo não é de todo satisfatória, pois o tratamento e o modo

com o qual as preferências dos membros individuais são agregadas em torno de

uma coletividade maior (o partido) são ainda pouco claros.

Isto é importante porque afeta diretamente a forma como analistas e

cientistas políticos avaliam o papel das comissões. Em um extremo, os modelos de

primeira e segunda geração vêem as comissões como tendo efetivos direitos sobre

questões e então, capazes de dominar a elaboração de políticas públicas a partir de

199 Sobre o papel reservado às comissões legislativas pela tradição partidária Cf. Forrest Maltzman and Steven S. Smith. Principals, Goals, Dimensionality, and Congressional Committees. Legislative Studies Quarterly 19, n.° 4 (November 1994): 457-76.

132

seus poderes jurisdicionais. Em um outro extremo, para os modelos partidários

puros, os membros individuais das comissões são simplesmente agentes do seu

partido e não têm nenhuma capacidade de decisão (decision-making)

independente. Para o cenário criado pela teoria partidária, se qualquer poder é

delegado a uma comissão em especial, o raio de influência do partido majoritário

sobre a comissão é de tal forma suficientemente robusto que tal comissão não fará

escolhas ou produzirá legislação outra além daquela desejada pelo partido

majoritário. No primeiro caso, comissões expressam e sinalizam sua independência

sobre a produção de políticas, no segundo caso, acredita-se que elas não podem

fazer isso.

Todavia, não é absolutamente difícil imaginar um mundo entre estes dois

extremos. O trabalho de Cox e McCubbins (1993) que vê o partido como capaz de

coordenar, segundo suas preferências, a organização interna das instituições

congressionais, não é inteiramente incompatível com a hipótese das comissões

fortes. Em um mundo onde as preferências legislativas diferem substancialmente,

partidos podem não somente organizar e manipular comissões com fortes poderes,

mas também ajudam a moldar coalizões, patrocinar legislação e manter intactos os

objetivos do partido sob o floor. Se os membros de uma legislatura preferem

comissões com força e poderes independentes, então partidos, como agentes de

seus membros, devem manufaturar este tipo de comissão para seus membros200.

200 Os resultados empíricos apresentados por Cox e McCubbins enfatizam e corroboram a hipótese dos partidos como um veículo de coordenação interna da legislatura. E neste sentido, parecem falsear a perspectiva dos ganhos de troca. Cox e McCubbins usam o NOMINATE SCORE em seus testes empíricos. Ironicamente, sugerem Shepsle e Weingast, este tipo de recorte produz uma base inapropriada para testar a hipótese da diferenciação de preferências. Os percentuais apresentados pelos autores da tradição partidária são baseados sobre votos e não sobre a extensão das preferências, e por isso, são endógenos ao contexto legislativo. Membros decidem como votar não somente sobre as bases de suas preferências, mas também a partir da influência das instituições legislativas e das expectativas do membro sobre o comportamento dos demais. Para Cox e McCubbins, o papel central dos partidos é coordenar o comportamento dos membros e influenciar a sanção de legislação. Esta ênfase sobre a coordenação implica uma maior homogeneidade sobre a votação dos membros do partido do que sobre suas preferências individuais. É neste sentido que Shepsle e Weingast afirmam que o mecanismo identificado por Cox e McCubbins (NOMINATE SCORE) pode ser pode ser proveitoso ao nível das votações no floor, mas é menos hábil quando a questão é testar as diferenças de preferências entre os membros. Ou seja, os críticos sugerem que o NOMINATE SCORE menospreza a diferença entre um contingente partidário e um contingente não-partidário dentro de uma comissão. Shepsle e Weingast sugerem o uso do POOLE e do ROSENTHAL DATA como meios alternativos para o teste da hipótese sobre as diferenças entre os membros do Congresso. Cf. Kenneth A. Shepsle and Barry R. Weingast. Positive Theories of Congressional Institutions. Legislative Studies Quarterly 19, n.º 2 (May 1994): 149-79; Richard Hall and Bernard Grofman. The Committee Assignment Process and the Conditional Nature of Committee Bias. American Political Science Review (July 1990) 84: 1149-66; John Londregan and James M. Snyder Jr. Comparing Committee and Floor Preferences. Legislative Studies Quarterly 19, n.º 2 (May 1994): 233-66.

133

Partindo do pressuposto de que nenhuma dessas tradições (distributiva,

informacional e partidária) é capaz de capturar em sua totalidade a natureza

recíproca da influência entre os atores individuais e as instituições legislativas, o

objetivo desta pesquisa não é elaborar uma defesa de uma ou outra tradição, nem

mesmo argumentar a predominância ou superioridade de uma teoria sobre a outra,

mas, em se tratando da área de estudos legislativos, discutir as possibilidades de

um modelo que integre abordagens (macro) que acentuem a influência do

ambiente institucional sobre a organização interna do Legislativo e abordagens

(micro) que acentuem a riqueza das ações legislativas ao responder ao ambiente.

A hipótese dos ganhos de troca (demand side) não pode ser sumariamente

rejeitada a despeito de suas limitadas aplicações, nem julgada como absolutamente

incompatível aos modelos informacionais e partidários de segunda geração (supply

side). Os argumentos elaborados por Shepsle (1979), Shepsle e Weingast (1987),

Cox e McCubbins (1993) e Krehbiel (1991) são mutuamente enriquecidos pela

especificação de suas hipóteses, coleção de dados e pela sua intrincada série de

dados empíricos. Entretanto, como já enfatizado, a diferença entre os testes

aplicados por estes autores não constituem uma evidência definitiva a favor de uma

ou outra tradição. Pelo contrário, ela sugere mais uma vez a multiplicidade de

possibilidades para o campo dos estudos legislativos.

Em se tratando mais uma vez da agenda neo-institucional, este pluralismo

analítico dentro do subcampo dos estudos legislativos reflete a própria ambigüidade

do tratamento da agência humana por parte deste paradigma. A relativa falta de

atenção que a agência humana tem recebido do novo institucionalismo tem sido

amplamente criticada. Por exemplo, Barley e Tolbert (1997)201 escreveram que “os

institucionalismos têm se concentrado mais na capacidade das instituições em

constranger as ações e os atores”. Hirsh (1997)202 argumenta que “os

institucionalistas, com seu foco nas regras e idéias, se preocupam pouco com a

capacidade de atores individuais ou coletivos de agir e perseguir objetivos

201 Cf. S. Barley e P. Tolbert. 1997. Institutionalization and Structuration: Studying the links Between Action and Institution. Organization Studies, v. 18, n.º 1, p. 95. 202 Cf. P. Hirsh. 1997. Sociology without Social Structure; Neoinstitutional Theory Meets Brave New World. American Journal of Sociology, v. 102, n.º 6, p. 174.

134

independentes”. Finalmente, Oliver (1991)203 aponta “a falta de atenção ao papel

dos interesses organizacionais e da agência.”

Como argumentam DiMaggio e Powell (1991)204, “algo se perdeu na

mudança do velho para o novo institucionalismo (...) e o objetivo de ser uma teoria

multidimensional mais robusta ao contrário de uma teoria unilateral com foco

puramente cognitivo, parece ter se perdido”. Uma das maiores críticas feitas ao

neo-institucionalismo é o seu foco nas causas e conseqüências da persistência e

continuidade organizacional. Para superar estas dificuldades e incorporar a

mudança e a agência humana, estudos recentes têm buscado apoio em

perspectivas diferentes, tais como a teoria da estruturação205.

A noção de morfogênese defendida por Archer (1982) apresenta-se como

uma tentativa de superar a complexidade da interação entre estes níveis micro e

macro de análise206. Seguindo os princípios do realismo crítico de Bhaskar

(1998)207, esta proposição, ao invés de evitar o dualismo entre ação e estrutura,

assume um dualismo analítico, considerando que a ação ocorre em uma seqüência

de interações, nas quais a situação presente é diferente da situação anterior, pois

foi condicionada por ela. Por esta razão, a separação analítica entre a estrutura e a

interação social no tempo permite elaborar proposições conceituais sobre a

estruturação e re-estruturação do campo com maior precisão analítica.

No caso dos estudos legislativos, ainda que as legislaturas sejam afetadas

pelo ambiente institucional, pode-se afirmar que elas raramente serão sempre

cativas deste ambiente; ao contrário, elas lutam para se adaptar por meio de

interpretações e processos de atribuição de significados e, eventualmente, se

engajam ativamente em ações que modificam este ambiente. Nesse sentido, a

discussão proposta por Archer (1982) e Bhaskar (1998) pode contribuir para os

contínuos esforços em reconciliar o determinismo e o voluntarismo e, também, o

velho e o novo institucionalismo no estudo das instituições congressionais.

203 Cf. C. Oliver. 1991. Strategic Responses to Institutional Process. Academy of Management Review, v. 16, n.º 1, p. 45. 204 P. DiMaggio e W. Powell. 1991. The New Institutionalismo in Organizational Analysis. Chicago: University of Chicago Press, p. 30. 205 Cf. S. Barley e P. Tolbert. 1997. Institutionalization and Structuration… citado. 206 Para uma maior discussão sobre o conceito de morfogênese Cf. M. Archer. 1998. Morphogenesis versus Structuration: On Combining Structure and Action. The British Journal of Sociology, v. 33, n.º 4, pp. 455-483 (December). 207 Sobre os postulados do realismo crítico Cf. R. Bhaskar. 1998. Philosophy and Scientific Realism. In: M. Archer et. al. Critical Realism. London: Routledge, pp. 16-48.

135

Neste sentido, para poder consolidar-se com unidade de estudo, o neo-

institucionalismo precisa avançar com relação aos seus níveis de análise e

fortalecer seus conceitos. Por exemplo, ainda hoje, mesmo entre institucionalistas

da escolha racional, encontramos problemas para definir a relação existente entre

os indivíduos e as instituições. Esta questão nos remete ao problema original deste

mesmo paradigma, ou seja, se as instituições moldam as condutas individuais ou

se estas condutas é que moldam as instituições. Em outras palavras, se as

instituições são variáveis dependentes ou independentes, ou se em algumas

ocasiões elas se apresentam como ambas.

Essencialmente, minha visão é que as relevantes diferenças entre estas

tradições teóricas permitem-nos explicar processos, decisões e resultados em casos

particulares. Antes do que procurar um único e universal modelo para as

instituições congressionais (se distributiva, informacional ou partidária), devemos

reconhecer que todas estas especificidades operam em vários graus e que estas

variações são sistemáticas e previsíveis. A influência da tradição partidária será

superior em certas circunstâncias e ausente em outras. Para algumas políticas, a

teoria informacional será fortemente ajustável para a análise de alguns processos

de tomada de decisão (decision-making); para outras, os mecanismos da

racionalidade informacional pouco de aplicam, pois podem ser mais bem

interpretadas a partir dos pressupostos distributivos. Isso acontece por que as

motivações dos diferentes membros vão interagir com diferentes questões de modo

a criar uma variedade de contextos que não podem ser adequadamente capturados

por uma única motivação ou uma perspectiva analítica universal. Por conseguinte, o

desafio dos estudiosos das instituições legislativas não é promover uma destas

visões teóricas como superior sobre as demais, mas nada verdade, especificar as

circunstâncias sob as quais cada uma destas visões pode ser aplicada, sem perder

de vista que, sob determinadas condições, uma composição destas perspectivas

pode ser mais apropriada.

136

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ANEXOS II – MODELO DE FICHA DE LEITURA

CLASSIFICAÇÃO:

Autor (es):

Periódico: � American Journal of Political Science � Legislative Studies Quarterly � American Political Science Review � American Politics Research � Journal of Political Economy Ano:

Título:

Filiação Teórica: � Distributiva � Informacional � Partidária � Mix

Tipo de Hibridismo: � Distributiva-Informacional � Distributiva-Partidária � Partidário-Informacional � Distributiva-Partidária-Informacional Questão de Pesquisa (Qual):

Variável Explicativa Principal (Qual):

Modelo de Pesquisa: � Sim � Não

Tipo de Estudo: � Longitudinal � Transversal

Mix de Métodos: � Sim � Não

Objeto de Investigação (Qual):

Sujeito de Investigação (Qual):

Operacionalização das Variáveis: � Sim � Não

Desenho de Pesquisa:

Descrição dos Procedimentos Metodológicos:

� Sim � Não

Natureza da Explicação: � Endógena (variáveis que dizem respeito tanto à organização). interna do Poder Legislativo, quanto do Executivo) � Exógena (demais variáveis) � Ambos

Nível de Análise: � Macro (Estrutura) � Micro (Agência) � Níveis Intermediários � Todos

Dados Utilizados: � Resultados das Votações Nominais � Resultados das Votações nas Comissões � Poderes Institucionais das Comissões Legislativas � Poderes Institucionais do Partido Majoritário � Carreiras Legislativas � Distribuição de Emendas � Distribuição de Recursos Legislativos � Processo de Tomada de Decisões (Decision-Making) � Veto Players e Controles de Agenda � Outros (Qual?)

Instrumentos de Medida e Coleta de Dados:

Tipo de Dados: � Primários � Secundários � Ambos

Análise dos Dados: � Freqüência � Média � Média � Mediana � Moda � Desvio Padrão � Regressão (Correl.) � Regressão (Múltipla) � Teoria dos Jogos � Modelos Espaciais � Outro

Foco Analítico:

152

ANEXOS III – QUADRO DE CLASSIFICAÇÃO DOS ARTIGOS ANALISADOS

A tabela 1 traz a classificação das principais variáveis utilizadas nos artigos analisados. (i) identificação do artigo; (ii) título do artigo e ano de publicação do mesmo; (iii) nome do periódico onde o artigo foi inicialmente publicado (American Journal of Political Science - AJPS; Legislative Studies Quarterly - LSQ; American Political Science Review - APSR; American Politics Research - APR e Journal of Political Economy - JPE); (iv) a filiação teórica do artigo (se unicamente distributivista, informacional ou partidária ou ainda se híbrida, neste caso, classificar o tipo de hibridismo em questão, digo, o tipo de combinação teórica – distributivista-informacional, partidário-informacional, distributivista-partidária ou distributiva-informacional-partidária); (v) variável explicativa (nome da variável ou conjunto de variáveis utilizadas pelo(s) autor(es) para explicação do fenômeno); (vi) natureza da explicação (se endógena ou exógena – por variável endógena entendo aqui aquelas que dizem respeito tanto à organização interna do Poder Legislativo, quanto do Executivo – as demais variáveis considerei exógenas); (vii) metodologia (teoria dos jogos, métodos quantitativos, métodos qualitativos, cortes longitudinais ou modelos espaciais); (viii) foco analítico (qual o problema sobre o qual o artigo debruça-se e o argumento do defendido pelo autor).

IDENTIFICAÇÃO TÍTULO E ANO PERIÓDICO FILIAÇÃO VARIÁVEL NATUREZA METODOLOGIA FOCO ANALÍTICO

Gary W. Cox e Jonathan N. Katz

Gerrymandering Roll-Calls in Congress, 1879-2000 (2006)

AJPS

Partidária

Poderes institucionais do partido majoritário

Endógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Autores apostam na possibilidade de usar as mesmas ferramentas analíticas dos estudos eleitorais para avaliar propensões e responsividades do sistema legislativo, partindo do pressuposto que podemos avaliar e julgar as ações do partido majoritário como um ator unitário.

Nathan J. Kelly

Political Choice, Public Policy, and Distributional Outcomes (2005)

AJPS

Distributiva

A “natureza” das políticas públicas

Exógena

Métodos quantitativos

O autor questiona em que medida as políticas públicas influenciam ou podem influenciar os resultados distributivos dentro da legislatura.

Fang-Yi Chiou e Lawrence S. Rothenberg

When Pivotal Politics Metts Partisan Politics (2003)

AJPS

Híbrido Partidário-Informacional

Instituições, preferências legislativas e partidos políticos

Exógena e endógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Autores questionam os limites das explicações que atribuem somente às variáveis exógenas o problema da paralisia institucional, e tentam oferecer uma interpretação mais holística do fenômeno incluindo varáveis endógenas (preferências legislativas e partidos políticos).

Nils Ringe

Policy Preference Formation in Legislative Politics: Structure,

AJPS

Híbrido Distributiva-Informacional-Partidária

Processo de tomada de decisões (decision-

Exógena e endógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

O autor tenta articular um modelo analítico para a esfera legislativa que enfatize uma interpretação mais integrativa entre agência e estrutura, ampliando os horizontes da escolha legislativa a partir da inclusão

153

Actors, and Focal Points (2005)

making) de outros fatores (normatividade, ideologia, interação estratégica e fatores estruturais).

Mark Hallerberg e Patrik Marier

Executive Authority, the Personal Vote, and Budget Discipline in Latin American and Caribbean Countries (2004)

AJPS

Híbrido Distributiva-Partidária

Poderes do Executivo e do partido majoritário sobre o processo orçamentário

Exógena e Endógena

Métodos quantitativos

Autores argumentam que, dependendo da posição que venha a ocupar o partido majoritário dentro do Congresso e do poder que ele possa exercer sobre as partes, a disciplina orçamentária pode tornar-se fato, a despeito da influência dos mecanismos eleitorais e seu estímulo ao voto personalista e à fragmentação.

Richard L. Hall e Alan V. Deardorff

Lobbying as Legislative Subsidy (2006)

APSR

Híbrido Distributiva-Informacional-Partidária

Comportamento dos grupos de lobby

Exógena e endógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Autores exploram as anomalias das teorias dominantes sobre a organização legislativa ao tratar da relação entre grupos de lobby e as instituições legislativas. Eles criam um modelo onde os lobbies são vistos, ao mesmo tempo, como formas de barganha (distributiva), persuasão (informacional) e troca de subsídios (partidária).

Guillaumer R. Fréchette, John H. Kagel e Steven F. Lehrer

Bargaining in Legislatures : An Experimental Investigation of Open Closed Amendment Rules (2003)

APSR

Distributiva

Poderes institucionais das comissões

Exógena

Métodos quantitativos e teoria dos jogos

Os autores analisam os efeitos diferenciais que o open rule e o closed rule sobre a estrutura dos modelos distributivistas da barganha legislativa. Autores argumentam que sob open rule, legislaturas estão mais predispostas a apresentarem uma distribuição mais igualitária de benefícios entre os legisladores.

Philip Keefer e David Stasavage

The Limits of Delegation: Veto Players, Central Bank Independence, and Credibility of Monetary Policy (2003)

APSR

Híbrido Partidário-Distributiva

Veto players e controle de agenda

Exógena

Métodos quantitativos

Autores investigam sob que condições a delegação de autoridade às agências independentes pode aumentar a credibilidade, antes do que a estabilidade, apenas. Eles concluem que o aumento da credibilidade repousa sobre o alcance da incerteza sobre a posição do status quo e sobre como o poder de agenda é alocado entre os veto players.

154

Keith Krehbiel

Plausibility of Signals by a Heterogeneous Committee (2002)

APSR

Informacional

Regras restritivas das comissões

Edógena

Métodos quantitativos e teoria dos jogos

Krehbiel responde a crítica de Krishna e Morgan (2001)208 ao trabalho de Gilligan Krehbiel (1988)209 sobre assimetria de informações e regras legislativas em comissões heterogêneas. Krehbiel responde a crítica dos autores argumentando que a relação positiva entre regras restritivas e heterogeneidade das comissões é inconsistente com o modelo de Krishna e Morgan.

Glen S. Krutz

Issues and Institutions: “Winnowing” in the U.S. Congress (2005)

AJPS

Híbrido Partidário-Informacional

Instituições e atores individuais

Exógena e endógena

Métodos quantitativos

O autor analisa o processo de winnowing (processo pelo qual o Congresso americano determina quais os projetos que receberão atenção das comissões). Ele examina a questão desenvolvendo e testando uma estrutura teórica construída sobre os pressupostos da racionalidade e do ambiente institucional (partidária), incluindo ainda o papel da informação nestes processos (informacional).

Lanny W. Martin e George Vanberg

Coalition Policymaking and Legislative Review (2005)

APSR

Partidária

Multipartidarismo

Exógena

Métodos quantitativos

Cientistas políticos conhecem pouco ainda sobre como legislaturas podem influenciar a produção de políticas em democracias parlamentaristas. É neste sentido que os autores focam sobre a influência das instituições em períodos de governos de coalizão. Eles argumentam que governos multipartidaristas estão mais predispostos a criarem problemas de delegação originados pela delegação de autoridade a gabinetes ministeriais que ampliam as questões que dividem o governo. Eles apresentam ainda o legislative review como um mecanismo capaz de superar estas tensões.

William T. Bianco e Itai Sened

Uncovering Evidence of Conditional Party

APSR

Híbrido Distributiva-Informacional-

Procedimentos e preferências legislativas

Exógena e endógena

Métodos quantitativos e modelos

Os autores criam um modelo alternativo para mensurar a influência do partido majoritário dentro do Congresso, e acabam por enriquecer o debate

208 Conferir classificação deste artigo neste mesmo quadro analítico. Cf. Vijay Krishna e John Morgan. 2002. Asymmetric Information and Legislative Rules: Some Amendments. American Political Science Review 95 (June): 435-452. 209 Cf. Thomas W. Gilligan e Keith Krehbiel. 1988. Asymmetric Information and Legislative Rules with a Heterogeneous Committee. American Journal of Political Science 33 (2): 459-490.

155

Government: Reassessing Majority Party Influence in Congress and State Legislatures (2005)

Partidária espaciais entre as tradições teóricas a partir do desenvolvimento de um modelo espacial mais sofisticado (bidimensional). Embora eles priorizem as hipóteses partidárias da organização legislativa, seu estudo traz implicações analíticas para as ouras tradições também.

John D. Huber e Nolan McCarty

Bureaucratic Capacity, Delegation, and Political Reform (2004)

JPE

Híbrido Partidário-Distributiva

Capacidade burocrática

Exógena

Métodos quantitativos

Os autores criam um modelo de delegação e policymaking onde a capacidade burocrática é a chave para explicação do comportamento dos legisladores em delegar ou não funções à burocracia federal. Eles argumentam que quando a capacidade burocrática é baixa, legisladores têm menos incentivos para delegar funções, pois acreditam que nestas condições, burocratas têm poucos incentivos para comportar-se segundo suas preferências.

Scott W. Desposato

Parties for Rent? Ambition, Ideology, and Party Switching in Brazil’s Chamber of Deputies (2006)

AJPS

Híbrido Partidário-Distributiva

Partidos politicos, sistema eleitoral e líderes de partido

Exógena e endógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Enquanto a troca de partidos é vista pela maioria dos analistas como um sinal de fraqueza dos partidos, Desposato afirma o contrário. Ele desenvolve um modelo onde a decisão de troca ou permanecer na legenda é vista como uma função da interação estratégica e endógena entre os legisladores e os líderes de partido. O autor argumenta que legisladores (no caso do Brasil), usam os partidos para maximizar pork, consistência ideológica e sucesso eleitoral em curto prazo.

David Austen-Smith e Timothy J. Feddersen

Deliberation, Preference Uncertainty, and Voting Rules (2006)

APSR

Informacional

Grau de homogeneidade das preferências legislativas

Endógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os autores argumentam que a incerteza sobre as preferências individuais é indispensável para o compartilhamento de toda a informação e demonstram que um cenário em que os membros da comissão compartilhem, invariavelmente, de preferências idênticas sobre as mesmas alternativas está mais predisposto à revelação de toda a informação em jogo. Todavia, o resultado não será o mesmo se há incerteza sobre as preferências individuais.

156

Gerald C. Wright e Brian F. Schaffner

The Influence of Party: Evidence from the State Legislatures (2002)

APSR

Partidária

Poderes institucionais do partido majoritário

Endógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os autores analisam o grau com que os partidos majoritários afetam o comportamento político de legisladores eleitos. Para isso eles aplicam os pressupostos da teoria partidária em nas legislaturas estaduais do Kansas e de Nebraska. Os resultados apresentados pelos autores tão somente corroboram a nível estadual as hipóteses da tradição partidária sobre o Congresso.

Erik J. Engstrom

Stacking the States, Stacking the House: The Partisan Consequences of Congressional Redistricting in the 19th Century (2006)

APSR

Partidária

Poderes institucionais do partido majoritário

Endógena

Métodos quantitativos, modelos espaciais e cortes longitudinais

O autor visa ampliar os limites da teoria partidária da organização legislativa, debruçando-se sobre um corte temporal longitudinal pouco analisado pela maioria dos cientistas políticos – o século XIX no Congresso norte-americano. Usando dados eleitorais de 1870 a 1900, o autor mostra que quando um único partido controlava o districting process, eles, sistematicamente, usam deste mecanismo a favor das preferências do partido majoritário. No geral, os autores tentam chamar a atenção para a influência do partido majoritário dentro do Congresso para além do período que já fora extensivamente analisado – o século XX.

Mark P. Jones e Wonjae Hwang

Party Government in Presidential Democracies: Extending Cartel Theory Beyond the U.S. Congress (2005)

AJPS

Partidária

Poderes institucionais do partido majoritário (poderes de agenda)

Endógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os autores alertam para os limites do uso da teoria do cartel para explicar o funcionamento e a natureza de outras legislaturas que não a norte-americana. Eles argumentam que as sensíveis diferenças entre a democracia americana e as demais democracias (democracias intermediárias) devem ser levadas em conta por parte de cientistas e analistas políticos. Todavia, os autores não são pessimistas no uso da teoria do cartel para explicar também o funcionamento das legislaturas nestes países, eles tão somente apontam para a necessidade de adaptações.

Holly Brasher

Listening to Hearings: Legislative Hearings and

APR

Informacional

Audiências legislativas

Endógena

Métodos quantitativos

O autor considera aqui o papel a ser exercido pelas audiências legislativas. Ele afirma que a maioria dos estudos despreza a discussão de audiência sobre as propostas (bills) enviadas a uma comissão e, por isso,

157

Legislative Outcomes (2006)

não incorporam sua análise de modo sistemático. O autor afirma que estas audiências podem servir para produzir informação e expertise necessária para resolver problemas acerca da legislação em pauta e assim, adquirir informação necessária para que a bill seja aprovada.

Vijay Krishna e John Morgan

Asymetric Information and Legislative Rules: Some Amendments (2002)

APSR

Distributiva-Informacional

Regras restritivas das comissões

Endógena

Métodos quantitativos e teoria dos jogos

Os autores elaboram uma avaliação da teoria informacional das regras legislativas, focando sobre a eficiência informacional das regras sob vários graus de restritividade. Os autores argumentam que quando as comissões são heterogêneas, toda a eficiência é exeqüível se o jogo for sob open rule, mas se as regras são do tipo closed rule, então o jogo resulta em ineficiência. Não obstante, os autores argumentam ainda que, se as comissões são homogêneas, todos os equilíbrios são ineficientes, a despeito das regras legislativas, ainda que o closed rule levasse sempre a uma maior eficiência informacional do que o open rule.

William R. Lowry e Charles R. Shipan

Party Differentiation in Congress (2002)

LSQ

Partidária

Condições institucionais

Exógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os autores analisam as causas primordiais das diferenciações políticas e ideológicas entre os partidos dentro da legislatura. Eles argumentam que esta troca de posições é natural e reflete não só uma racionalidade por parte de uma coletividade unida (partido), mas também respostas as mais variadas mudanças institucionais a que estão, permanentemente, expostas as legislaturas.

Brian W. Marshall

Explaining the Role of Restrictive Rules in the Postreform House (2002)

LSQ

Partidária

Regras restritivas na legislatura

Exógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

O autor analisa as três principais interpretações sobre a organização legislativa e suas predições acerca da aplicação de regras restritivas dentro da legislatura. O autor conclui que estas interpretações não dão conta de modo satisfatório para a análise dos 97º, 98º, 104º e 105º Congressos através do tempo. O autor demonstra que poucos dados há para afirmar que estas regras servem para reforçar a barganha legislativa ou a influência das comissões sobre políticas. Todavia, afirma o autor, a hipótese partidária deve sustentar-se com maior plausibilidade

158

(regras usadas para ampliar a influência do partido majoritário sobre seus membros e sobre a produção de políticas públicas).

Keith Krehbiel e Adam Meirowitz

Minority Rights and Majority Power: Theoretical Consequences of the Motion to Recommit (2002)

LSQ

Informacional

Poderes institucionais de agenda e preferências legislativas

Endógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os autores analisam as motivações em jogo de um legislador quando este recebe instruções para reencaminhar uma proposta a uma comissão. Os autores analisam estas situações a partir de um modelo espacial simples, onde eles tentam lançar luz sobre o momento anterior ao encaminhamento da proposta (early-stage agenda-setting) e o estágio posterior. A fim de enriquecer suas análises, os autores modelam a situação, seja para comissões com poder de agenda ou partidos majoritários, seja para minorias partidárias e membros sem-comissão (noncommittee member).

Vicky M. Wilkins e Garry Young

The Influence of Governors on Veto Override Attempts: A Test of Pivotal Politics (2002)

LSQ

Híbrido Partidário-Informacional

Poderes institucionais do ramo Executivo

Endógena e exógena

Métodos quantitativos

Os autores analisam a habilidade dos governadores de Missouri para controlar legisladores cancelando as tentativas de veto por parte da legislatura. Os autores argumentam que o sucesso do chefe do Executivo conseguido enquanto veto pivot, amplia-se se levamos em conta as prerrogativas institucionais do partido majoritário dentro do Congresso. Finalmente, os autores contribuem para produzir uma rara e sistemática análise da influência dos governadores dentro da arena legislativa e contribuem ainda para o debate corrente entre as tradições partidária e informacional.

James S. Coleman Battista

Na Ambitions-Theoretic Approach to Legislative Organizational Choice (2003)

LSQ

Híbrido Distributiva-Informacional-Partidária

Instituições legislativas internas e preferências individuais

Endógena e exógena

Métodos quantitativos e modelos espaciais

O autor argumenta que o estudo da organização legislativa requer uma melhor compreensão das escolhas institucionais internas, ou seja, segundo o autor, devemos ser capazes de descrever e predizer variações nas estruturas internas das legislaturas e não somente explicar uma dada estrutura. Por conseguinte, o autor busca desenvolver um modelo homogêneo, combinando a análise da estrutura institucional (normas e regras) com a formação e acomodação das preferências individuais.

159

David C. King e Richard J. Zeckhauser

Congressional Vote Options (2003)

LSQ

Partidária

Poderes institucionais dos líderes partidários

Endógeno

Métodos quantitativos

Os autores destacam a importância dos poderes institucionais à disposição dos líderes partidários e seu impacto sobre o comportamento dos legisladores. Segundo a interpretação dos autores, os poderes dos líderes permitem a estes converter a possibilidade de recompensar legisladores individuais em votos favoráveis quando necessário. A fim de corroborar as evidências desta hipótese, os autores usam os dados do 106º Congresso.

Michael S. Rocca

Military Base Closures and the 1996 Congressional Elections (2003)

JPE

Distributiva

Distritos eleitorais e alocação de benefícios distributivos

Exógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os autores examinam a extensão com que a mudança na distribuição de benefícios clientelistas influencia os resultados congressionais nas eleições. Os autores preservam o postulado distributivista, mas relativizam a hipótese de que haja um link direto e necessário entre a distribuição de benefícios e os resultados eleitorais. Segundo os autores, esta relação existe somente sob condições específicas.

Marian L. Currinder

Leadership PAC Contribution Strategies and House Member Ambitions (2003)

LSQ

Híbrido Partidário-Distributiva

Liderança dentro de comissões especiais

Exógeno e endógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

As PACs (political action committees) são comissões que têm encabeçado políticas federais, mas separadas das campanhas de comissões de políticas pessoais. Os líderes das PACs recebem donativos de indivíduos e grupos, que fazem contribuições para os candidatos políticos que eles suportam. Os autores argumentam que a contribuição estratégica dos membros reflete tanto o peso da estrutura partidária, quanto dos objetivos pessoais. Ou seja, os autores acreditam que um legislador pode agir sob as restrições de uma estrutura partidária e mesmo assim, perseguir a consecução de objetivos pessoais.

Richard Forgette

Party Caucus and Coordination: Assessing Caucus Activity and Party Effects (2004)

LSQ

Híbrido Partidário-Informacioal

Convenções políticas

Endógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

As convenções partidárias são reuniões de líderes políticos, a portas fechadas, para a escolha de candidatos a postos políticos. O autor argumenta que estas convenções têm afetado as relações políticas e a informação política de modo crescente. A crescente capacidade de coordenação do partido majoritário, segundo o autor, têm resultado da capacidade de compartilhamento de informação estratégica entre os

160

membros e a capacidade de moldar, previamente, as preferências legislativas.

H. W. Jerome Maddox

Opportunity Costs and Outside Careers in U.S. State Legislatures (2004)

LSQ Híbrido Partidário-Distributiva

Carreiras legislativas e informação sobre ganhos legislativos

Exógeno e endógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Modelos do tipo custo-benefício para a análise das carreiras legislativas predizem que legisladores escolhem suas carreiras sob a expectativa da utilidade dos préstimos oferecidos pela legislatura. A utilidade destes préstimos inclui os custos monetários de escolherem uma carreira outsider. A hipótese do autor é que os legisladores, provavelmente, tendem a escolher carreiras outsider quando a informação sobre os custos de oportunidade são altos ou quando eles sabem que não obterão retorno financeiros dos préstimos legislativos.

Nathan F. Batto

Electoral Strategy, Committee Membership, and Rent Seeking in the Taiwanese Legislature, 1992-2001 (2005)

LSQ

Distributiva

Sistemas eleitorais

Exógeno

Métodos quantitativos, espaciais e cortes longitudinais

A principal hipótese da vertente distributivista é a da conexão eleitoral, ou seja, legisladores entram na arena política tendo em vista a preservação do seu link eleitoral. O autor tenta relativizar o peso desta hipótese argumentando que a influência do sistema eleitoral sobre o comportamento legislativo não tem, necessariamente, um efeito uniforme sobre toda a legislatura. Ele afirma que as diferentes estratégias que os legisladores optam na busca de por barrel refletem os diferentes incentivos das eleições sobre os candidatos eleitos.

Jason M. Roberts

Minority Rights and Majority Power: Conditional Party Government and the Motion to Recommit in the House (2005)

APR

Híbrido Partidário-Informacional

Vantagens processuais do partido majoritário

Endógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os estudiosos das instituições legislativas têm se esforçado para explicar e medir a influência do partido majoritário a partir das votações e dos resultados no Congresso. Em geral, tal argumento apóia-se sobre a hipótese de que as vantagens do partido majoritário encontram-se nas suas vantagens processuais. O autor testa mais uma vez esta hipótese, analisando uma regra em especial, a saber: a garantia concedida ao partido minoritário de reencaminhar uma proposta quando, efetivamente informado das preferências do partido majoritário.

Cherie D. Maestas, L.

National Party Efforts to Recruit

LSQ

Partidária

Líderes partidários e

Endógeno

Métodos quantitativos e

Os autores exploram os possíveis fatores que influenciam as chances de um legislador vir a ser o

161

Sandy Maisel e Walter J. Stone

State Legislators to Run for the U.S. House (2005)

carreiras legislativas

modelos espaciais

alvo do recrutamento nacional do seu partido na corrida por uma cadeira no Congresso. Usando dados de 200 distritos eleitorais americanos, os autores argumentam que as carreiras individuais dos legisladores e a influência dos líderes nacionais do partido são os principais fatores para explicar estas escolhas.

Jeffery A. Jenkins, Michael H. Crespin e Jamie L. Carson

Parties as Procedural Coalitions in Congress: An Examination of Differing Career Tracks (2005)

LSQ

Partidária

Poderes institucionais do partido majoritário

Endógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os autores examinam o grau com que os partidos agem como coalizões processuais dentro do Congresso testando as predições da teoria do cartel de Cox e McCubbins (1993). Para isso, os autores focam sobre a influência do partido majoritário em três aspectos principais do processo político: a busca de reeleição por parte dos membros, a nomeação de altos-funcionários e a retirada ou exclusão de membros.

Antonie Yoshinaka

House Party Switchers and Committee Assignments: Who Gets “What, When, How?” (2005)

LSQ

Partidária

Troca de legendas e líderes partidários

Exógeno e endógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

O autor questiona quais são as conseqüências dos membros do Congresso que trocam de legenda partidária? Já é bem conhecida da literatura especializada suas conseqüências eleitorais, todavia, suas implicações partidárias têm sido pouco exploradas. O autor examina a troca de legendas aqui e argumenta que os líderes partidários procuram recompensar membros da oposição que se juntam ao seu rank, e que a permanência faz-se mais provável quando os membros são beneficiados por não violarem as normas.

Keith Krehbiel e Alan E. Wiseman

Joe Cannon and the Minority Party: Tyranny or Bipartisan? (2005)

LSQ

Partidária

Bipartidarismo e partidos minoritários

Exógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os autores argumentam que os partidos minoritários são raramente considerados nas pesquisas empíricas, e recentes teorias sobre o comportamento dos partidos nas legislaturas reservam um espaço quase neutro para o tratamento destas minorias. Os autores identificam quatro características do bipartidarismo e avaliam seus méritos e testam suas hipóteses para o mandato do presidente Joseph G. Cannon no Congresso. Os autores concluem apontando para a necessidade de maiores pesquisas futuras sobre estes partidos na legislatura.

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Eric D. Lawrence, Forrest Maltzman e Steven S. Smith

Who Wins? Party Effects in Legislative Voting (2006)

JPE

Partidária

Poderes institucionais do partido majoritário

Endógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os autores testam a teoria partidária, tentando mensurar e descrever como e por que o partido majoritário pode influenciar o comportamento dos membros do Congresso. A principal questão a ser tratada pelos autores diz respeito às possibilidades do partido majoritário ter ou não força suficiente para mover os resultados políticos em direção a uma posição mediana (median position).

Graig Volden e Elizabeth Bergman

How Strong Should Our Party Be? Party Member Preferences Over Party Cohesion (2006)

LSQ

Híbrido Partidário-Informacional

Poderes institucionais do partido majoritário e preferências legislativas

Exógeno e endógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

Os autores procuram explicar quando e por que partidos políticos perseguem seus membros para que votem junto com o partido. Eles desenvolvem um modelo para analisar a coesão partidária onde as escolhas legislativas são endogeneizadas e alinhadas pelo partido majoritário. Para isso, os autores utilizam-se ainda modelo de pivotal politics desenvolvido, inicialmente, por Krehbiel (1998)210.

Nancy Martorano

Balancing Power: Committee System Autonomy and Legislative Organization (2006)

LSQ

Informacional

Organização interna das comissões legislativas

Endógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais

A autora explora as três principais interpretações concorrentes sobre o sistema de comissões, a saber: (1) as comissões como agentes de membros individuais (distributivista); (2) as comissões como agentes do toda a Assembléia (informacional) e (3) as comissões como agentes do partido majoritário. Operacionalizando o conceito de autonomia das comissões, a autora testa as principais hipóteses de cada tradição e defende os pressupostos da teoria informacional sobre as demais.

Michael C. Herron e Kenneth W. Shotts

Term Limits and Pork (2006)

LSQ

Distributiva

Sistemas eleitorais e escolhas políticas legislativas

Exógeno

Métodos quantitativos

Os autores elaboram um modelo de seleção eleitoral e escolhas legislativas sobre políticas que explora os efeitos dos term limits sobre os gastos legislativos. No modelo dos autores, eleitores auto-interessados preferem representantes que liberam pork à representantes que somente maximizam bem-estar social agregado. A hipótese dos autores é que, em determinadas circunstâncias, os term limits podem

210 Cf. Keith Krehbiel. 1998. Pivotal Politics: A Theory of U.S. Lawmaking. Chicago: University of Chicago Press.

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inibir eleitores de procurar representantes que transfiram benefícios particularistas e, nestes casos, os term limits podem vir a reduzir os gastos com pork.

Sarah A. Binder

Parties and Institutional Choice Revisited (2006)

LSQ

Partidária

Poderes processuais do partido majoritário e eleitor mediano

Exógeno e endógeno

Métodos quantitativos e modelos espaciais e cortes longitudinais

A autora afirma que os estudiosos da mudança institucional no Congresso têm oferecido interpretações diferentes sobre a adição de poderes processuais por parte do partido majoritário dentro do Congresso. Uma destas interpretações, afirma que os interesses e capacidades do partido majoritário conduziram a mudança institucional que acabou por afetar o controle da agenda. Uma outra alternativa aponta para uma interpretação não-partidária destas mudanças. A autora explora estas duas hipóteses empiricamente e testa-as a partir de cortes analíticos na história do Congresso norte-americano.

Fonte: Banco de Dados do Autor.