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Universidade Federal de Mato Grosso Instituto de Saúde Coletiva
Graduação em Saúde Coletiva
Marenilza Silvia Vieira Pinheiro da Silva Gomes
Estrutura e funcionamento da unidade de saúde do Centro Socioeducativo de Cuiabá/MT em 2014
Cuiabá/MT 2015
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Marenilza Silvia Vieira Pinheiro da Silva Gomes
Estrutura e funcionamento da unidade de saúde do Centro Socioeducativo de Cuiabá/MT em 2014
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Mato Grosso, para obtenção do título em Bacharel em Saúde Coletiva. Orientadora: Prof. Dra. Reni A. Barsaglini.
Cuiabá/MT 2015
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Catalogação
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Dedico este trabalho a minha família:
Marlene, Cecília, Claudiny, Henrique e
Wilson.
E aos adolescentes sem nome que
inspiraram essa pesquisa.
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Agradecimentos
Meu primeiro agradecimento é a Deus, porque d’Ele por Ele e para Ele
são todas as coisas! A Ele toda Glória!
Agradeço ao meu esposo, Wilson, que sempre está ao meu lado, me
apoiando, auxiliando e incentivando. Assim como minha mãe, minhas irmãs e
meu sobrinho.
Agradeço aos meus amigos e companheiros de caminhada acadêmica:
Camila, Erica, Klisman, Luiz Fernando, Marcelo e Regiane, que fizeram muito
por mim nesses quatro anos.
À professora Reni Barsaglini, minha orientadora, por me auxiliar na
construção deste trabalho; bem como aos demais professores do Instituto de
Saúde Coletiva que participaram de minha formação.
E a todos que de alguma forma ajudaram, contribuíram e torceram por
mim.
Muito Obrigada!
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SILVA, Marenilza S. V. P. da. Estrutura e funcionamento da unidade de saúde do Centro Socioeducativo de Cuiabá/MT em 2014 62 p. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Saúde Coletiva) - Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2015.
RESUMO A Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente garantem para crianças e adolescentes o direito a vida e à saúde, mesmo quando esse menor encontra-se em conflito com a lei. Os adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de privação de liberdade de Cuiabá e região são encaminhados ao Centro Socioeducativo de Cuiabá. Nesta instituição de abrigamento, o adolescente deve cumprir a medida estabelecida pelas autoridades judiciais, sem que os seus direitos legais sejam comprometidos. Nesta perspectiva, buscou-se caracterizar os serviços de saúde oferecidos a esses adolescentes durante o período de internação no Centro Socioeducativo de Cuiabá, verificando o cumprimento das legislações vigentes, que garantem a esse menor, toda a assistência de que ele necessite para se desenvolver. Palavras chaves: Adolescentes, Medida Socioeducativa, Serviços de Saúde.
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SILVA, Marenilza S. V. P. da. Estrutura e funcionamento da unidade de saúde do Centro Socioeducativo de Cuiabá/MT em 2014 . 62 p. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Saúde Coletiva) - Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2015.
ABSTRACT The Brazilian Federal Constitution (BFC) and the Child and Adolescent Statuteensure the rights to life and health to children and teenagers, despite this under age is in confrontation with the law. The teenagers under social educative measure of deprivation of freedom in Cuiabá and region are forwarded to Social Educative Center. In this shelter institution, the teenager must carry out the measure established by judicial authority, with no injury of their legal rights. In this view, the aim is character the health services offered to the teenagers in the time of reclusion in the Social Educative Center in Cuiabá, verifying the fulfillment of the law, that assure to the under age, all the assistance needed to their development.
Key-words: adolescents, social educative measure, Health Services.
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SUMÁRIO
Lista de Quadros e Tabelas .................................................................................................. 9
Lista de Siglas ....................................................................................................................... 10
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 12
2. OBJETIVOS ........................................................................................................................... 16
2.1. Objetivo Geral: .......................................................................................................... 16
2.2. Objetivos Específicos:.............................................................................................. 16
3. REVISÃO DE LITERATURA .................................................................................................... 17
3.1. Marcos da assistência ao adolescente em conflito com a lei ............................ 17
3.2. Assistência à saúde aos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa ...................................................................................................................... 21
3.3. “Pomeri” – Instituição Total ..................................................................................... 24
4. METODOLOGIA .................................................................................................................... 28
5. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS ........................................................................ 30
5.1. A Unidade de Saúde ................................................................................................ 30
5.2. A estrutura física ....................................................................................................... 32
5.3. Recursos Humanos e atendimentos na unidade de saúde ............................... 35
5.4. Organização dos atendimentos e funcionamento da unidade de saúde ......... 40
6. CONSIDERAÇÕES ................................................................................................................. 49
7. REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 52
ANEXOS ....................................................................................................................................... 58
Anexo 1 – Autorização do CEP HUJM .............................................................................. 58
APÊNDICE .................................................................................................................................... 60
Apêndice 1 – Entrevista Semiestruturada com profissional atuante no Ambulatório de Saúde do Centro Socioeducativo de Cuiabá. ............................................................ 60
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Lista de Quadros e Tabelas
Tabela 1: Distribuição dos funcionários do Ambulatório de Saúde do Centro Socioeducativo de Cuiabá por categoria profissional........................................35
Quadro 1: Escala de atendimento dos médicos no Centro Socioeducativo de Cuiabá, MT........................................................................................................37
Tabela 2: Consultas Médicas Especializadas na Rede Pública de Saúde no período de janeiro a agosto de 2014.................................................................43
Tabela 3: Principais procedimentos odontológicos realizados no Ambulatório de Saúde do Pomeri nos meses de janeiro a agosto de 2014...............................45
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Lista de Siglas
C.A. – Centro Acautelatório
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CCJ – Comissão de Constituição e Justiça
CEP – Comitê de Ética em Pesquisa
CISC – Centro Integrado de Segurança e Cidadania
CF – Constituição Federal
CNES – Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde
CPF – Cadastro de Pessoas Físicas
DEA – Delegacia Especializada do Adolescente
DEDICA – Delegacia Especializada dos Direitos da Criança e do Adolescente
DST – Doenças Sexualmente Transmissíveis
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
FEBEMAT – Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor de Mato Grosso
FUNABEM – Fundação Nacional de Bem-Estar do Menor
HUJM – Hospital Universitário Julio Muller
ISC – Instituto de Saúde Coletiva
OAB – Ordem dos Advogados do Brasil
OMS – Organização Mundial de Saúde
ONG – Organização Não-Governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
PEC – Proposta de Emenda Constitucional
PIA – Plano Individual de Atendimento
Pnaisari – Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes em Conflito com a Lei, em Regime de Internação e Internação Provisória
PNS – Profissional de Nível Superior
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POE – Plano Operacional Estadual
POLITEC – Perícia Oficial de Identificação Técnica
Propeq – Pró Reitoria de Pesquisa
PSF – Programa Saúde da Família
RG – Registro Geral
SAM – Serviço de Assistência ao Menor
SEDUC – Secretaria Estadual de Educação
SEJUDH – Secretaria de Justiça e Direitos Humanos
SEJUSP – Secretaria de Justiça e Segurança Pública
SINAJUVE – Sistema Nacional de Juventudade
SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo
SIPIA – Sstema de Informações para Crianças e Adolescentes
SUS – Sistema Único de Saúde
THD – Técnico em Higiene Dental
UFMT – Universidade Federal de Mato Grosso
UPA – Unidade de Pronto Atendimento
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1. INTRODUÇÃO
Há várias definições para os limites cronológicos da adolescência. Um
exemplo disso é que a Organização Mundial de Saúde (OMS) define a
adolescência como o período compreendido dos 10 aos 19 anos de idade, e a
Organização das Nações Unidas (ONU) considerada como adolescentes, os
indivíduos entre 15 e 24 anos. No Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA
Lei 8.069/90 (BRASIL, 1990), adolescente é a pessoa entre 12 e 18 anos de
idade (EISENSTEIN, 2005).
Nessa pesquisa, será focada a definição do ECA, por ser este o
documento que rege como deve ser feito o atendimento aos adolescentes
autores de ato infracional.
A adolescência é uma fase de várias mudanças, sejam elas biológicas,
cognitivas, emocionais e sociais. É nessa fase em que o adolescente
experimenta novas práticas e busca maior autonomia. Sendo desafio a
sociedade organizada formular/implementar políticas públicas para a juventude
com respostas efetivas e eficazes sobre o problema da violência e
criminalidade crescentes nesta fase da vida (ESTEVAM, COUTINHO e
ARAUJO, 2009).
Para o adolescente autor de ato infracional, há um tratamento diferente
do que é destinado aos adultos, pois nesse período ele ainda encontra-se em
processo de desenvolvimento. O ECA o considera penalmente inimputável
(BRASIL, 1990, artigo104), mas prevê a aplicação de medidas socioeducativas,
após a verificação da prática do ato infracional.
As medidas socioeducativas são: I – advertência; II – obrigação de
reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV – liberdade
assistida; V – inserção em regimento de semiliberdade; VI – internação em
estabelecimento educacional. Nota-se que a internação em estabelecimento
educacional, ou medida socioeducativa de privação de liberdade, é a última
medida a ser tomada. E para a aplicação de qualquer uma dessas medidas,
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deve-se levar em conta a capacidade do adolescente em cumpri-la, bem como
as circunstâncias e a gravidade da infração (BRASIL, 1990, artigo 112).
O ECA garantiu direitos às crianças e adolescentes, e através do
Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) foram criados
parâmetros de atendimento aos menores em situação de conflito com a lei,
diferentes das ações punitivas aos quais eram submetidos antes da aprovação
do ECA. O SINASE exige a comprovação da existência de estabelecimento
educacional com instalações e estruturas adequadas (BRASIL, 2002).
Antes da aprovação do ECA, o adolescente era alvo de medidas
punitivas e repressoras estabelecidas através do Código de Menores. Esse
código, sancionado em 1927, foi o primeiro voltado ao tratamento de crianças e
adolescentes e, situação irregular.
Hoje, o adolescente é visto como sujeito de direitos e reconhecido como
pessoa em desenvolvimento, o que faz com que seja tratado de forma
diferenciada a fim de garantir as condições para o seu desenvolvimento
(VOLPI, 1997, apud, ESTEVAM, COUTINHO e ARAUJO, 2009).
Durante o período de cumprimento de medida socioeducativa de
internação, deve-se assegurar ao adolescente os seus direitos sociais, tais
como o direito a proteção à vida e à saúde. Dessa forma, os adolescentes em
medida socioeducativa de privação de liberdade recebem entre outras coisas,
atendimento de saúde dentro e fora da unidade de internação em que se
encontram (BRASIL, 1990, artigos 121 e 126).
Em Cuiabá, MT, os adolescentes submetidos à medida privativa da
liberdade são encaminhados para o Complexo Pomeri, localizado no bairro
Planalto, onde há o Centro Socioeducativo de Cuiabá (popularmente conhecido
por “Pomeri”) que oferece a assistência assegurada pelo ECA. O Complexo
Pomeri é um local onde estão vários órgãos ligados à infância e adolescência,
um desses órgãos é o Centro Socioeducativo, local onde se abrigam
provisoriamente ou não, adolescentes que tenham cometido algum ato
infracional.
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Atualmente há menos de cem adolescentes abrigados na instituição.
Segundo o relatório da instituição, no dia 11/12/2014 haviam 75 adolescentes
internados, sendo 45 na internação masculina, 24 na internação masculina
provisória e 6 na internação feminina (internação e internação provisória).
Como garantia do direito à saúde desses adolescentes, foi construído
em 2007, dentro da unidade de internação masculina, um ambulatório de
saúde, e contratados vários profissionais, como médicos, enfermeiros, cirurgião
dentista e farmacêutico, para atendimento desses adolescentes.
Durante um ano, tive a oportunidade de atuar como docente na escola
estadual que fica dentro do Centro Socioeducativo, e atende os menores que lá
se encontram. Após o contato direto com os adolescentes, vivenciando um
pouco do cotidiano da instituição, e a apropriação dos conteúdos debatidos em
sala de aula, questionei-me sobre os serviços e ações em saúde oferecidos
aos adolescentes em privação de liberdade.
A pergunta que norteou a presente pesquisa foi: como é o serviço de
saúde existente no Centro Socioeducativo de Cuiabá/Pomeri quanto à sua
estrutura e funcionamento e quais procedimentos se destacam no atendimento
aos adolescentes?
Diante disto, o objetivo da pesquisa foi descrever a estrutura e o
funcionamento do serviço de saúde oferecido aos adolescentes em
cumprimento de medida socioeducativa de privação de liberdade no Centro
Socioeducativo de Cuiabá, MT
Este estudo se insere no subprojeto “Saúde penitenciária: experiência de
profissionais atuantes na atenção em unidades prisionais de Cuiabá/MT e na
gestão das ações no nível central1" o qual, por sua vez, integra projeto mais
amplo intitulado “Fortalecimento da linha de pesquisa: Diversidade
sociocultural, ambiente e trabalho”, do Mestrado em Saúde Coletiva/ISC/UFMT,
financiado pelo edital Programa Nacional de Pós-doutorado da CAPES –
1 O centro socioeducativo não se caracteriza formalmente como unidade prisional, porém a ela
se assemelha no que tange à privação de liberdade.
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PNPD/2011 Processo nº 23038.007708/2011 Concessão Institucional, vigência
2012-2014 e prorrogado para mais 24 meses, com Cadastro Propeq/UFMT –
nº 173/CAP/2012; desenvolvido junto a este Instituto, sob a coordenação da
Prof.ª Dr.ª Reni Aparecida Barsaglini.
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2. OBJETIVOS
2.1. Objetivo Geral:
Descrever a estrutura e o funcionamento do serviço de saúde oferecido
aos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de privação de
liberdade no Centro Socioeducativo de Cuiabá, MT (Complexo Pomeri).
2.2. Objetivos Específicos:
- Conhecer o serviço de saúde e os procedimentos realizados na
unidade;
- Identificar quais os procedimentos realizados e sua freqüência;
- Verificar a conformidade do atendimento à saúde do adolescente com
as diretrizes estipuladas pelo SINASE e pelas portarias 1.082/2014, e
647/2008.
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3. REVISÃO DE LITERATURA
3.1. Marcos da assistência ao adolescente em conflito com a lei
Não se tem dados de uma política pública voltada para crianças e
adolescentes no Brasil antes do início do século XX. Eles eram vistos como
pequenos adultos e tratados sem nenhum diferencial, o que lhes causava
muitos sofrimentos como, por exemplo, a excessiva jornada de trabalho,
conforme assinalam Lopes & Ferreira (2010).
Havia casas destinadas ao cuidado de crianças e adolescentes em
situação de abandono físico e moral, como o Juizado Privativo de Menores da
Capital Federal, inaugurada em 1923, e a Casa Maternal Mello Mattos (Rio de
Janeiro), que abrigava mais de 200 crianças de 2 a 14 anos de idade
(AZEVEDO, 2007).
O Código de Menores de 1927 (Decreto 17.943-A) é o primeiro
documento legal para a população menor de 18 anos, mas que se destinava
apenas aos que estavam em situação irregular (abandonado ou delinquente). É
a partir desse código que o Estado começa a intervir na situação das crianças
e adolescentes (AZEVEDO, 2007).
Tal código ficou conhecido como Código Mello Matos, em referência ao
primeiro Juiz de Menores da América latina, José Candido de Albuquerque
Mello Mattos (LORENZI, s/d). De acordo com o artigo 56 do referido código, o
menor fugitivo ou perdido, que não fosse reclamado no prazo de 30 dias seria
considerado abandonado e destinado à internação (SILVA, 1997)
Em 1942, o Decreto-lei 3.799 criou o Serviço de Assistência ao Menor
(SAM), vinculado ao Ministério da Justiça. Esse serviço era equivalente ao
sistema penitenciário para a população menor de idade. Posteriormente o SAM
ficou conhecido como “universidade do crime” e rechaçado pela opinião pública
mais politizada (LOPES e FERREIRA, 2010), tendo em vista que neste serviço
não havia separação dos adolescentes por idade e/ou por ato infracional
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cometido, além de vários problemas como estrutura física e atuação dos
profissionais (MONTE e SAMPAIO, Et AL, 2011).
Em 1964, foi criada a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor
(FUNABEM), através da Lei 4.413 de 1/12/1964. A FUNABEM herdou o
prédio, os funcionários e toda a cultura organizacional do SAM. O objetivo da
FUNABEM era prestar assistência à infância, tendo como foco a internação
para os casos de carência, abandono ou infração.
Mesmo com a criação de uma nova instituição (FUNABEM), não houve
transformação na forma de lidar com o adolescente. Agrupar situações distintas
(carência, abandono e infração) e destinar a elas a internação, como medida
resolutiva, é negar o atendimento especializado de que o adolescente
necessita para o seu pleno desenvolvimento, ou seja, o adolescente não
dispunha de condições de saúde física e psicológica, acesso a educação,
esporte e lazer, entre outros fatores que contribuem para um desenvolvimento
saudável.
Outro marco das políticas públicas para adolescentes foi a reformulação
do Código de Menores, em 1979 (Lei 6.697 de 10 de outubro de 1979).
Segundo o artigo 2º desta Lei, ela destinava-se apenas a crianças e
adolescentes em situação irregular, ou seja, privados de condições essências à
subsistência, vítimas de maus tratos, em perigo moral, privados de assistência
legal, com desvio de conduta, ou autores de ato infracional, ou seja, constitui-
se apenas de uma revisão ao primeiro Código de Menores, mantendo a linha
de repressão (BRASIL, 1979).
Esse código não estipulava período máximo de internação, previa
revisão da pena a cada dois anos e permitia que adolescentes fossem
internados em penitenciárias, caso não houvesse vaga nas instituições
destinadas a menores (BRASIL, 1979, artigo 41).
A década de 1980 deixou um grande legado para as conquistas dos
movimentos sociais pela infância brasileira. Essas conquistas se concretizaram
em 1988, com a promulgação da Constituição Federal (CF), conhecida como a
Constituição Cidadã. O artigo 227 da CF assegura à criança e ao adolescente:
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“o direito à vida, à saúde, à alimentação à educação, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de
colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão”. (BRASIL, 1988,
Artigo 227).
A partir da aprovação da Lei 8.069 (ECA) em 13 de julho de 1990, a
criança e o adolescente passaram a ser concebidos como pessoa em
desenvolvimento, sujeitos de direitos e destinatários de proteção integral, o que
significou avanços na forma com que se lida com essa população (BRASIL,
1990).
O ECA garantiu o direito a educação através da aplicação de medidas
socioeducativas, ao invés das punições previstas pelo Código de Menores. Um
exemplo disso é o fato do foco do Código de Menores ser a internação,
enquanto que o ECA propõe a internação como último recurso, sendo aplicada
apenas nos casos em que o menor é apreendido em flagrante delito de
infração ou por ordem expressa do juiz (BRASIL, 1990, art. 106). A internação
pode ter também caráter protetivo, a fim de resguardar algum adolescente em
caso de violação de seus direitos.
Estevam, Coutinho e Araújo (2009) apontam que o ECA é uma das
legislações mais modernas do mundo quanto aos objetivos da ressocialização
e educação dos adolescentes em conflito com a lei.
Em 2012, a Lei 12.594 institui o Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo (SINASE), constituindo-se dos princípios, regras e critérios que
envolvem a execução de medidas socioeducativas. Esse documento prevê
ações articuladas nas áreas de educação, saúde, assistência social, cultura,
capacitação para o trabalho e esporte, para os adolescentes atendidos
(BRASIL, 2012).
Existem portarias sancionadas a fim de oferecer diretrizes e normativas
para o atendimento aos adolescentes em cumprimento de medida
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socioeducativa de privação de liberdade, entre elas estão a portaria
1.426/2004, a portaria 647/2008 e a portaria 1.082/2014.
A portaria Interministerial 1.426, de 14 de julho de 2004, Aprova as
diretrizes para a implantação e implementação da atenção à saúde dos
adolescentes em conflito com a lei, em regime de internação e internação
provisória, com finalidade de promover a saúde a esses adolescentes. Essa
portaria institui a formulação do Plano Operativo Estadual (POE), que deve ser
realizado em conjunto pelas secretarias envolvidas no atendimento a esses
menores (BRASIL, 2004).
A portaria 647, de 11 de novembro de 2008, as normas para a
Implantação e Implementação da Política de Atenção Integral à Saúde dos
Adolescentes em Conflito com a Lei, em Regime de Internação e Internação
Provisória - PNAISARI, em unidades masculinas e femininas. Garantindo, entre
outras coisas, atendimento realizado por equipe multidisciplinar em saúde, e
acesso a todos os níveis de atenção em saúde aos adolescentes privados de
liberdade (BRASIL, 2008).
A portaria 1.082, de 23 de maio de 2014, redefine as diretrizes da
Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes em Conflito
com a Lei, em Regime de Internação e Internação Provisória (PNAISARI),
incluindo-se o cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto e
fechado. Essa política tem como objetivo geral garantir e ampliar o acesso aos
cuidados em saúde dos adolescentes em conflito com a lei em cumprimento de
medidas socioeducativas em meio aberto, fechado e semiliberdade (BRASIL,
2014).
Há também o Estatuto da Juventude, sancionado através da Lei
12.852/2013 que dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes
das políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude -
SINAJUVE. Para fins deste estatuto, considera-se jovem a pessoa com idade
entre 15 e 29 anos de idade. Sendo que aos adolescentes de 15 a 18 anos,
cabe a aplicação deste estatuto quando não conflitar com as normas
estabelecidas pelo ECA.
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O adolescente é inimputável (CF/88 art. 228), mas não fica impune,
sendo submetido à responsabilização do seu ato, segundo as normativas da
legislação especifica – ECA, que podem ser prestação de serviços à
comunidade, reparação de danos, liberdade assistida e em último caso, a
privação da liberdade, por meio da internação.
O ECA só é lembrado nos casos de infração, mas esquecido nos casos
em que crianças e adolescentes são vítimas de violência e quando faltam
vagas nas creches. Alves (2013) afirma que se o ECA fosse cumprido não
teríamos adolescentes infratores.
Hage e Araújo (2013) apontam que ao invés da sociedade brasileira se
esforçar para a garantia dos direitos humanos e sociais, insiste em tratar a
violência social focalizando casos individuais e culpabilizando os adolescentes
pelas precariedades existenciais que são impostas à grande maioria da
população brasileira.
De acordo com os autores acima citados, para que haja um atendimento
efetivo ao adolescente, alguns marcos legais necessitam ser consolidados
como a Constituição Federal, o ECA e o SINASE. Essas leis fundamentam aos
adolescentes o direito à vida, coloca-os à salvo de qualquer violência,
reconhece-os como sujeitos de direito e garantem as condições para seu
desenvolvimento, estabelecendo os princípios das medidas socioeducativas
aplicadas aos autores de ato infracional.
3.2. Assistência à saúde aos adolescentes em cumprimento de
medida socioeducativa
A Declaração dos Direitos da Criança de 1959 traz em seu princípio 4º
que “a criança terá direito a crescer e a criar-se com saúde”. Esse direito foi
garantido no Brasil, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, com
a seguinte redação:
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A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução
do risco de doenças e agravos e ao acesso universal e
igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação (BRASIL, 1988, art. 196).
Esse direito só foi efetivado em 1990, com a criação da Lei 8.080 que
cria o Sistema Único de Saúde (SUS) que garante universalidade de acesso
aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência. O SUS deve
assegurar atendimento integral à saúde da criança e do adolescente (BRASIL,
1990, art. 11).
Em relação ao adolescente em cumprimento de medida socioeducativa
também há legislações que regulamentam e garantem o direito à saúde. Em 14
de julho de 2004, foi instituída a Portaria Interministerial nº. 1.426/GM (BRASIL,
2004), que aprova as diretrizes para a implantação e implementação da
atenção à saúde dos adolescentes em conflito com a lei, em regime de
internação e internação provisória, tendo por finalidade a promoção à saúde
desses adolescentes oferecendo uma abordagem educativa, integral,
humanizada e de qualidade.
Para alcançar a finalidade pretendida, foram estabelecidas as seguintes
prioridades: a implantação de estratégias de promoção da saúde, de ações de
prevenção e cuidados específicos, e medidas de proteção específica; a
garantia de acesso dos adolescentes em todos os níveis de atenção à saúde,
por meio de referência e contrarreferência; a educação permanente dos
profissionais de saúde; garantia da inclusão dos dados desses adolescentes
nos Sistemas de Informações de Saúde do SUS; e a reforma e aquisição de
equipamentos para essas unidades de saúde (Brasil, 2004).
O capítulo V da Lei 12.594/2012 (SINASE) também trata sobre a
atenção integral à saúde do adolescente em cumprimento de medida
socioeducativa incluindo, entre outras coisas, ações e serviços para a
promoção, proteção, prevenção de agravos e doenças e recuperação da
saúde.
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Essa lei define que a equipe técnica destinada ao atendimento do
adolescente deve compreender, no mínimo, profissionais das áreas de saúde,
educação e assistência social, podendo ser acrescidos outros profissionais de
acordo com as necessidades do programa (Brasil, 2012).
A saúde aos adolescentes nas unidades de internação é fornecida
através do Sistema Único de Saúde, por recursos próprios da unidade, e por
parcerias com ONG’s, com a rede privada ou com universidades (SILVA e
GUERESI, 2003).
Os referidos autores apontam que as principais dificuldades para
oferecimento de serviços de saúde aos adolescentes são: Insuficiência de
material, insuficiência de pessoal para atendimento e controle de medicamento,
inadequação do espaço físico, falta de equipamentos, insuficiência de
capacitação dos profissionais, ausência de tratamento para dependentes
químicos, insuficiência de vagas para internação na rede pública, preconceito
dos profissionais da rede pública, demora na marcação de consultas,
dificuldade em realizar parcerias, e dificuldades para a realização de
atendimento/exames especializados na rede pública.
Aos agentes envolvidos na operacionalização das medidas
socioeducativas é dada a missão de proteger o adolescente, no sentido de
garantir-lhe os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana (VOLPI, 2001
apud ESTEVAM, COUTINHO, ARAUJO, 2009), tais como direito à vida e à
saúde; à liberdade, ao respeito e à dignidade; direito ao convívio familiar e com
a comunidade; direito á educação, à cultura, ao esporte e ao lazer; e do direito
à profissionalização e à proteção no trabalho, dispostos no título II da referida
Lei 8.069 (BRASIL, 1990).
A esta equipe multidisciplinar cabe o diagnóstico social, pedagógico,
psicológico, médico, cognitivo, judicial da medida socioeducativa imposta ao
adolescente e as medidas de intervenção, caso a caso, considerando cada
indivíduo como único, cada história como única e, portanto, cada intervenção
individualizada.
24
Dada a importância do local em que o adolescente deve cumprir a
medida socioeducativa, e a garantia dos direitos assegurados pela Constituição
Federal de 1988 e reafirmados pela Lei 8.069/90, buscou-se caracterizar o
serviço e os procedimentos de saúde oferecidos aos adolescentes internos da
Unidade Socioeducativa de Cuiabá, e verificar se o atendimento realizado tem
sido de acordo com o previsto em Lei.
3.3. “Pomeri” – Instituição Total
Erving Goffman define instituição total como:
“local de residência e trabalho onde um grande número de
indivíduos com situações semelhante, separados da sociedade
mais ampla por considerável período de tempo, levam uma
vida fechada e totalmente administrada”. (GOFFMAN, 1961, p.
6)
Dessa forma, podemos considerar o Centro Socioeducativo de Cuiabá -
Pomeri, como uma instituição total, pois abriga adolescentes em situação de
infração, separando-os da sociedade durante o tempo decidido pelo Juiz, e
realizando quase a totalidade de suas atividades no mesmo local, com um
grupo de pessoas com a mesma roupa, e com horários estabelecidos.
A identidade é deixada de lado, pois os internos são despidos de suas
roupas e objetos pessoais, têm seus cabelos cortados, e passam a viver sob
comando em uma cultura organizacional diferente da qual estavam habituados.
A negação do sujeito e a perda da autonomia reforçam o caráter de instituição
total, conceituado por Goffman (1961).
A situação discutida por Goffman “levam uma vida fechada”, é
caracterizada pelos portões fechados, muros altos, arame farpado, grades e
cadeados, que criam uma barreira entre o adolescente e o mundo externo. O
autor divide as instituições em cinco agrupamentos, e o Pomeri pode ser
25
alocado no terceiro grupo, no qual a instituição é organizada para proteger a
sociedade contra perigos intencionais. O que reforça o preconceito da
sociedade e dos próprios adolescentes em relação à forma como se veem e
como são vistos.
Nas instituições destinadas ao cumprimento de medida socioeducativa,
não há uma linha pedagógica única para lidar com os adolescentes. Os
profissionais podem ter entendimentos distintos sobre quais atividades são
adequadas para integrá‑los na sociedade, desde que estas estejam dentro dos
princípios do ECA e do SINASE (MENICUCCI e CARNEIRO, 2011).
Em Mato Grosso, o histórico de unidades de internação próprias para
adolescentes inicia em 1971, com a criação da Fundação Estadual do Bem-
Estar do Menor de Mato Grosso (FEBEMAT), através da lei 3.137. Esta
fundação estava vinculada à extinta Secretaria do Interior e Justiça e tinha por
competência não apenas o atendimento aos adolescentes em conflito com a
Lei, mas era o órgão responsável por toda a política de assistência social
destinada a crianças e adolescentes em situação de risco no Estado (XAVIER,
2007).
Em 1989, foi criado o Lar do Adolescente, mais conhecido como
“Fazendinha”, no mesmo local onde hoje estão abrigados os adolescente em
privação de liberdade. O Lar do adolescente era um órgão vinculado à
Secretaria de Estado e Segurança, e atendia apenas adolescentes do sexo
masculino, as meninas eram encaminhadas ao Lar Menina Moça. (PORRUA,
2005; XAVIER, 2007).
Após algumas mudanças na estrutura e na nomenclatura, a FEBEMAT é
extinta e inaugura-se em 2004 o complexo Pomeri, sob a responsabilidade da
antiga Secretaria de Estado e Justiça e Segurança Pública (SEJUSP), hoje
Secretária de Justiça e direitos Humanos (SEJUDH); com a finalidade de
atender aos princípios dispostos pelo ECA (MATO GROSSO, 2011)
A palavra Pomeri é de origem indígena e se refere a um ritual de
algumas etnias de Mato Grosso, como a Ikpeng (Kabibe). Nessa cerimônia, os
26
jovens passam por um processo de reclusão, em torno de 18 meses, onde são
preparados para o exercício da cidadania junto às suas respectivas
comunidades (TOMAZ DA SILVA, 2012).
Complexo Pomeri é o Centro de Integração dos Órgãos e Poderes do
Atendimento à Criança e ao Adolescente, principalmente os em situação de
conflito com a lei da capital e do Estado, desde o encaminhamento inicial na
Delegacia Especializada do Adolescente (DEA), à execução das Medidas,
atendimento a Egressos da Internação à Municipalização das Medidas em
Meio Aberto.
O Centro Socioeducativo de Cuiabá está localizado no Complexo
Pomeri, na Avenida Dante Martins de Oliveira (antiga Avenida dos
Trabalhadores), s/nº, no bairro Planalto. O Complexo é formado por diferentes
órgãos, de responsabilidade de diferentes setores. Os órgãos jurídicos são:
Juizado da Infância e da Juventude; Ministério Público; Defensoria Pública,
cada uma destas três instituições conta com duas varas.
A Secretaria Estadual de Educação de Mato Grosso (SEDUC/MT) é
responsável pelo funcionamento da Escola Estadual “Meninos do Futuro”, com
sede no Complexo e salas de aula em funcionamento dentro das Unidades de
Internação masculina e feminina. A escola atende os alunos dividindo-os em
três estágios: Básico, Intermediário e Avançado, correspondendo
respectivamente ao Ensino Fundamental I (Alfabetização ao 5º ano), Ensino
Fundamental II (do 6º ao 9º ano) e Ensino Médio.
A SEJUDH está presente através da Superintendência do Sistema
Socioeducativo; Centro Socioeducativo (Unidades de Internação, Egressos e
Municipalização); Delegacia Especializada do Adolescente (DEA); e da
Delegacia Especializada de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
(DEDICA). Sendo de responsabilidade desta secretaria, gerenciar as
atividades das unidades de internação localizadas nas cidades de Cuiabá,
Rondonópolis, Cáceres e Barra do Garças.
27
Também há parceria com a Polícia Militar através do
Projeto Rede de Cidadã, Batalhão da Guarda e do Centro Integrado de
Segurança e Cidadania – CISC.
O Pomeri abriga, em prédios distintos, meninos e meninas em conflito
com a Lei. Após a apreensão, os adolescentes são encaminhados para a
Delegacia Especializada do Adolescente (DEA), e posteriormente
encaminhados ao Centro Acautelatório (C.A.), chamada também de Internação
Provisória.
Segundo o Artigo 183 do ECA, os adolescentes podem permanecer no
C.A. por no máximo 45 dias, enquanto aguardam decisão judicial. Nos casos
em que o adolescente é encaminhado para a Internação, a pena deve ser
revista, no máximo, a cada seis meses, não podendo exceder o período de três
anos (BRASIL, 1990, artigo 121).
Segundo dados encontrados no sitio da SEJUDH, o Centro
Socioeducativo de Cuiabá tem capacidade de atender cento e trinta e quatro
adolescentes (134), entre meninos e meninas. Mas esses dados encontram-se
desatualizados, pois no início de 2014 foi realizada a demolição de um antigo
bloco da unidade, por ordem da Juíza da 1ª Vara Especializada da Infância e
Juventude, Drª Gleide dos Santos Bispo. A ordem se deu por conta das
condições insalubres do local, e a mão-de-obra utilizada foi a dos próprios
adolescentes internos (JusBrasil, 2014).
28
4. METODOLOGIA
Essa pesquisa é um estudo descritivo e exploratório. As pesquisas
descritivas têm por objetivo a descrição das características de uma população,
fenômeno ou de uma experiência. E a pesquisa exploratória objetiva-se pela
familiarização com um assunto ainda pouco estudado (Gil, 2002).
O Centro Socioeducativo está localizado na região leste da cidade de
Cuiabá, cidade que conta com uma população de 551.098 habitantes, de
acordo com Censo IBGE 2010. Desta população, 66.710 tem entre 12 e 18
anos, segundo dados do DataSus, ou seja, 12,1% da população residente no
município.
Mas o Centro Socioeducativo de Cuiabá atende não apenas o município
de Cuiabá, mas vários outros municípios do Estado, pois em Mato Grosso só
há quatro unidades de internação localizadas em Cuiabá, Rondonópolis,
Cáceres e Barra do Garças.
O Centro de Socioeducativo está passando por reformas em sua
estrutura física, a fim de dar melhores condições de ressocialização para esses
adolescentes.
Para a realização desta pesquisa realizou-se levantamento de dados a
partir de consulta aos documentos internos da unidade que contenham
informações sobre a estrutura e o funcionamento do ambulatório de saúde,
bem como sobre os procedimentos realizados pela equipe de saúde. A
gerência da unidade disponibilizou relatório de produção dos meses de janeiro
a agosto de 2014, os quais foram utilizados para identificar os procedimentos
realizados e a freqüência deles, esses dados foram analisados e alguns
serviram de base para a construção de tabelas. Tivemos acesso também ao
modelo de prontuário utilizado na unidade, e a lista produzida pela instituição
com o nome dos internos. Tais dados foram complementados através de visitas
à unidade, conversas com a equipe de saúde e questionário realizado com o
gerente de saúde da unidade.
29
Nos documentos foram coletados dados sobre:
- a estrutura física instalada e os recursos humanos atuantes;
- informações sobre o fluxo de atendimento;
- classificação a frequência dos procedimentos realizados no primeiro
semestre deste ano (relatório de produção).
A coleta dos dados foi complementada por questionário (Apêndice 1)
com o responsável pela unidade. Os dados foram registrados em planilhas
específicas elaboradas pela pesquisadora.
A realização desta pesquisa foi autorizada pela Superintendência do
Centro Socioeducativo de Cuiabá, MT, e o respectivo projeto foi submetido ao
Comitê de Ética em Pesquisas do Hospital Universitário Júlio Müller (CEP
HUJM), e aprovado conforme protocolo nº 829.740 de 08/10/2014. (Anexo 1)
A coleta de dados iniciou-se após autorização pelo CEP HUJM. Após a
conclusão da pesquisa, os resultados serão divulgados junto à gerência de
saúde, à Superintendência do Centro Socioeducativo e à comunidade
acadêmica.
30
5. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS
Os dados da pesquisa foram organizados e serão apresentados em
tópicos: caracterização da unidade de saúde; estrutura física; recursos
humanos e atendimentos na unidade de saúde; organização dos atendimentos
e funcionamento da unidade de saúde.
A fim de evitar confusões, esclarecemos que será empregado
“instituição” para se referir ao Centro Socioeducativo de Cuiabá e “unidade” no
caso do ambulatório de saúde.
No relatório do dia 11/12/2014, havia 45 adolescentes na internação
masculina, 24 na internação provisória, e 6 meninas no Lar Menina Moça, entre
internação e internação provisória, totalizando 75 adolescentes em
cumprimento de medida socioeducativa de privação de liberdade no Centro
Socioeducativo de Cuiabá.
5.1. A Unidade de Saúde
O ambulatório de saúde do Pomeri foi inaugurado em dezembro de 2007
e, desde então, presta assistência à saúde dos adolescentes daquela
instituição, que são meninos e meninas entre 12 e 18 anos em regime de
internação ou internação provisória2.
A placa de inauguração da unidade, a caracteriza como ambulatório de
saúde, mas ao questionarmos alguns funcionários sobre o serviço oferecido, a
resposta obtida foi que a unidade funciona como um Programa de Saúde da
Família (PSF). Dessa forma, buscamos algumas definições dos serviços de
saúde.
2 Assim que o adolescente é encaminhado ao Centro Socioeducativo, cumpre internação provisória no Centro Acautelatório. Neste local, o adolescente deve permanecer por no máximo 45 dias (Art.108, Lei8.069/1990) até que as autoridades judiciais decidam se ele deve continuar em privação de liberdade, ou deve cumprir outra medida socioeducativa.
31
Segundo o Ministério da Saúde, entende-se como ambulatório:
“... toda unidade de saúde destinada a prestar assistência a
pacientes em regime de não internação ou com internação por
período de até 24 horas. Uma unidade ambulatorial pode
atender aos três níveis de atenção à saúde: o primário, o
secundário e o terciário. No nível primário encontra-se os
Postos e Centros de Saúde, onde se desenvolvem atividades
de prevenção, saneamento e diagnóstico simplificado, com
ações de promoção, proteção e recuperação da atenção
básica”. (BRASIL, 2011).
Nas legislações citadas neste trabalho, é utilizada a denominação de
“estabelecimento de saúde”. No caso, a unidade de saúde do Pomeri se
caracteriza como de nível primário, ou seja, como um Centro de Saúde. No
sitio eletrônico do Datasus, um Centro de Saúde ou Unidade Básica de Saúde
é o local para:
“... realização de atendimentos de atenção básica e integral a
uma população, de forma programada ou não, nas
especialidades básicas, podendo oferecer assistência
odontológica e de outros profissionais de nível superior. A
assistência deve ser permanente e prestada por médico
generalista ou especialista nestas áreas. Podendo ou não
oferecer: Serviço de Apoio Diagnóstico e Terapêutico (SADT) e
Pronto atendimento 24 Horas”. (DATASUS, 2006).
A unidade de saúde localiza-se dentro do Centro Socioeducativo de
Cuiabá. Assim, como é praxe neste tipo de instituição (fechada) após entrar
pelo portão de ferro, deve ser feita a identificação junto à guarita policial. Logo
na entrada do Centro, já é possível visualizar o prédio da unidade de saúde.
32
5.2. A estrutura física
Baseado em observações e informações junto aos funcionários, pode-se
caracterizar a unidade de saúde quanto à estrutura física pelas suas salas
distribuídas da seguinte forma:
- um consultório médico: ocupado para atendimento de clínica geral e
psiquiatria. Nos dias em que há mais de um médico na unidade, outras salas
são utilizadas para consultas (sala de enfermagem, sala de curativos);
- um consultório odontológico: utilizado para realização dos procedimentos
odontológicos. Conta com apenas uma cadeira odontológica, cadeira do
dentista e armário para armazenar os utensílios utilizados;
- uma sala da enfermagem: local onde os profissionais de enfermagem
realizam vários tipos de atendimentos aos adolescentes (consulta de
enfermagem, pré e pós consulta, preenchimento do Plano Individual de
Acolhimento – PIA3);
- uma sala da psicóloga/assistente social: sala com mesa e cadeira, para a
utilização dos profissionais deste setor. Uma das profissionais trabalha no
período matutino e a outra no período vespertino, o que permite que as duas
consigam ocupar apenas um espaço no atendimento do adolescente e de seus
familiares;
- uma sala de escovação odontológica: contém um balcão com três pias e
espelho grande. Local onde são realizadas orientações sobre escovação aos
adolescentes;
- uma sala de acolhimento: serve para realização dos primeiros contatos com
os adolescentes recém chegados, podendo também ser usada para ações de
educação em saúde e reuniões de equipe;
3 PIA – Plano Individual de Acolhimento. Documento utilizado para crianças e adolescentes
institucionalizados, em que constam diversas informações sobre a situação do menor (situação familiar, saúde, educação). Constituindo-se de uma ferramenta no acompanhamento e evolução pessoal e social do adolescente.
33
- uma sala de curativos: sala com balança, pia e maca, onde são realizados
pequenos curativos;
-uma sala de esterilização; destina-se a esterilização dos materiais
odontológicos utilizados na unidade, tendo em vista que os materiais utilizados
nos pequenos curativos são todos descartáveis;
- uma sala de observação: conta com banheiro e é destinada a alojar internos
que necessitem de um acompanhamento mais próximo da equipe de saúde.
No período de um ano em que trabalhei na instituição, a sala foi utilizada
apenas por adolescentes após alta hospitalar;
- uma sala de medicação: local com mesa, cadeiras, pia, e armários com os
materiais utilizados na preparação das medicações que serão administradas
aos adolescentes em seus alojamentos;
- uma farmácia: local com armários para armazenamento das medicações, e
mesa e cadeira utilizada pelos profissionais farmacêuticos da unidade;
- uma sala de utilidades: local destinado a armazenar documentos e
prontuários antigos;
- uma sala da gerência: segundo informações locais, este espaço será
transformado em consultório odontológico. A sala do gestor foi realocada na
superintendência do socioeducativo;
- uma sala da administração: sala com armários, computador, máquina
fotocopiadora, mesas, cadeiras e telefone, onde trabalham os cinco
funcionários do setor administrativo;
- uma copa, onde os funcionários preparam e realizam suas refeições (café,
lanches e almoço). Há pia, fogão, geladeira, mesa e filtro d’agua;
- dois banheiros: sendo um na entrada e outro no interior da unidade, mas sem
placas para distingui-los como feminino/masculino.
- dois vestiários, um feminino e outro masculino.
34
Quanto a vestimentas, é válido destacar que os funcionários da unidade
de saúde trabalham de uniforme (Camiseta branca com símbolo da SEJUDH).
O jaleco é utilizado preferencialmente nas visitas da equipe de saúde aos
alojamentos dos adolescentes.
O uniforme dos agentes orientadores é calça e camiseta preta, por isso,
recomenda-se que outras pessoas que circulem na instituição não utilizem
roupas dessa cor.
Os professores junto com a equipe de gestão escolar têm autonomia
para escolher o uniforme utilizado (desde que não seja preto). Já se utilizaram
de cores como azul, vermelho e lilás. Evita-se o amarelo, por ser a cor utilizada
pelos “amarelinhos” (detentos que fazem serviços de manutenção nas
unidades penitenciárias e socioeducativas).
Já os adolescentes têm como uniforme short bege e camiseta azul clara,
roupa utilizada por eles dentro e fora da instituição (audiências e consultas
médicas externas, por exemplo).
A estrutura física mínima recomendada para o serviço de saúde da
unidade socioeducativa disposta no anexo II da Portaria SAS/MS nº 647, de 11
de novembro de 2008, é: Consultório médico, consultório de odontologia, posto
de enfermagem, dispensário de medicamentos, sala de utilidades, sala de
esterilização, rouparia, depósito de material de limpeza, sanitários para equipe
de Saúde (BRASIL, 2008).
A unidade de saúde do Pomeri não conta com rouparia e depósito de
material de limpeza. Os materiais de limpeza são armazenados fora da unidade
de saúde, pois a empresa terceirizada responsável pela limpeza da unidade de
saúde é a mesma que realizada a limpeza da instituição em geral.
Diante disto, pode-se afirmar que, ao menos quantitativamente, a
unidade de saúde atende quase totalmente ao que é preconizado.
35
5.3. Recursos Humanos e atendimentos na unidade de saúde
A unidade conta com cinqüenta e dois funcionários, sendo que deste
total, sete são contratados (dois técnicos de higiene bucal, três enfermeiros, e
dois médicos psiquiatras).
Segundo informações locais, parte do efetivo atual da unidade de saúde
foi nomeada para atender ao Centro Socioeducativo de Várzea Grande, mas
enquanto este não é inaugurado, os profissionais cumprem sua jornada de
trabalho na unidade de Cuiabá, havendo ajustes internos no cumprimento de
carga horária.
Como parte do efetivo será alocada em outra unidade, após a
inauguração, temos um excedente no número de profissionais na unidade, mas
não encontramos nas portarias referenciadas, uma padronização no número
dos profissionais que compõem a equipe multiprofissional.
A distribuição destes funcionários, por categoria profissional é
apresentada na Tabela 1, a seguir:
Tabela 1: Distribuição dos funcionários do Ambulatório de Saúde do Centro Socioeducativo de Cuiabá por categoria profissional.
Categoria Profissional Quantidade Médico 04
Enfermeiro 03 Psicólogo 02
Farmac êutico 03 Cirurgião Dentista 06 Assistente Social 01
Técnico de Enfermagem
13
Auxiliar de Enfermagem
03
Técnico de higiene dental
04
Agente Orientador 08 Assistente
Administrativo 05
Total 52 Fonte: Construção da pesquisadora
36
Dos 52 funcionários da unidade, 28 são de nível médio, sendo os 05
assistentes administrativos, as 08 agentes orientadoras, os 04 técnicos de
higiene dental (THD), os 13 técnicos e os 03 auxiliares de enfermagem.
Os outros 24 funcionários são profissionais de nível superior (PNS),
havendo os seguintes perfis: 04 médicos, 03 enfermeiros, 06 cirurgiões
dentista, 02 psicólogos, 01 assistente social e 03 farmacêuticos.
O setor administrativo da unidade informou que há 52 funcionários na
unidade, mas em busca no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde
(CNES), o “Centro Socioeducativo Pomeri” conta com 14 profissionais
registrados, sendo um gerente em serviços de saúde, dois médicos clínicos,
dois cirurgiões dentista, um psicólogo, uma assistente social, uma enfermeira,
cinco técnicos de enfermagem e um auxiliar de enfermagem.
Pela quantidade de profissionais e pelos nomes que estão cadastrados
no sitio do CNES, percebemos que essa é uma informação que está
desatualizada.
A portaria Interministerial 1.426 de 2004 e a Portaria 647 de 2008
formalizam a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes
em Conflito com a Lei, em Regime de Internação e Internação Provisória
(Pnaisari). Estabelecendo que a atenção à saúde do adolescente em regime de
internação deve ser realizada por equipe multidisciplinar e oferecida,
prioritariamente pela rede local de saúde (BRASIL,2008)
A equipe encarregada de atender esse adolescente deve ser composta
minimamente de médico, dentista, enfermeiro, psicólogo e assistente social;
podendo ser a equipe do Programa de Saúde da Família (PSF) da área
adstrita, ou equipe própria. Como vimos na Tabela 1, a equipe de saúde do
Socioeducativo é composta por médicos, dentista enfermeiros, assistente
social, psicólogo, farmacêutico, técnicos e auxiliares de enfermagem; ou seja,
atende ao disposto na Pnaisari, quanto aos profissionais do estabelecimento de
saúde.
37
Na unidade há quatro médicos, sendo dois da especialidade de clínica
médica, e dois de psiquiatra. De segunda à sexta-feira há atendimento médico
na unidade, havendo maior concentração destes profissionais nas quintas-
feiras pela manhã, talvez pelo fato deste ser o dia destinado ao atendimento
aos adolescentes da Internação Provisória.
A internação provisória, ou Centro Acautelatório (C.A.) é o local onde há
maior rotatividade. É o local de entrada dos adolescentes na unidade, o que
demanda maiores cuidados, pois além de realizar acolhimento e
preenchimento de PIA, a equipe de saúde deve estar atenta a qualquer
problema de saúde que esses adolescentes possam apresentar.
Esses quatro profissionais atendem os adolescentes seguindo a escala
apresentada abaixo no Quadro 1:
Quadro 1: Escala de atendimento dos médicos no Centro Socioeducativo de Cuiabá,
MT, segundo dia da semana, ala atendida e especialidade.
Dia da Semana Ala atendida Médico escalado Médico e scalado
Período Matutino Período
Vespertino
segunda-feira Ala 6 Cl. Geral1 Cl. Geral 2
terça-feira Ala 3 M. Psiquiatra1 M Psiquiatra 2
Cl. Geral 2
quarta-feira Bloco I
Internação
Feminina (Cl
Geral 2
M.Psiquiatra2
Cl. Geral 2
M.Psiquiatra2
Cl Geral 1
Cl. Geral 2
(feminino)
quinta-feira Internação
Provisória A/B
M.Psiquiatra 2
Cl Geral 1
Cl. Geral 2
M.Psiquiatra2
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sexta-feira Demanda
Espontânea/
Reunião de
Equipe
Cl Geral 1 -----------
sábado
Domingo
Fonte: Construção da pesquisadora
Cada dia da semana é destinado ao atendimento de uma ala/bloco,
como são identificados os locais onde os adolescentes estão alojados.
Atualmente existem a Ala 3 e 6, o Bloco I (ou apenas bloco), o C.A. (internação
provisória), e o alojamento feminino4.
O local onde eram as alas 1, 2 e 5 foi interditado e posteriormente
demolido por ordem judicial, devido as condições insalubres do local. A ala 4 foi
apenas renomeada como Ala 6. O Bloco recebeu nomeação diferente, pois é
uma construção mais nova, e que se distingue visualmente das alas.
Os atendimentos médicos são realizados dentro do ambulatório de
saúde, com exceção daqueles feitos pelo médico Clínico Geral 1 às quartas-
feiras em que ele atende na unidade feminina da instituição.
Na unidade há três profissionais de enfermagem de nível superior,
sendo dois do sexo masculino. As adolescentes do sexo feminino são
preferencialmente atendidas pela enfermeira mulher, por questões de afinidade
e para evitar situações constrangedoras.
De forma resumida, as atividades do farmacêutico da unidade são:
realização de pedidos mensais e semanais de medicamentos, recebimento e
controle de estoque, descartar medicamentos vencidos e fornecer orientações
para a equipe de enfermagem sobre administração e manuseio de medicações,
e para os adolescentes sobre o correto destes.
4 No local onde as meninas estão internadas não há separação física entre internação e internação
provisória.
39
A administração da medicação é de responsabilidade dos técnicos de
enfermagem, que as realizam conforme prescrição médica e orientação do
farmacêutico. Os técnicos de enfermagem juntamente com os agentes
orientadores da saúde dirigem-se até as Alas, onde os menores estão alojados,
e através das grades entregam a medicação a ser tomada naquela hora.
Atualmente há oito agentes orientadores na equipe de saúde. Essas
agentes (são todas mulheres) são profissionais de nível médio que
trabalhavam na instituição, cuidando dos adolescentes em suas alas. Após
solicitação da Gerência de Saúde, elas passaram a integrar a equipe do
ambulatório de saúde.
O gestor da unidade justificou essa solicitação devido à ocorrência de
situações em que os agentes orientadores responsáveis pelas alas não tiravam
os adolescentes de seus alojamentos para os atendimentos em saúde, mesmo
sendo passado um cronograma diário para a equipe de plantão.
A função das agentes orientadoras na equipe de saúde é buscar os
adolescentes em suas alas, acompanhá-los a unidade de saúde, bem como
acompanhar as técnicas de enfermagem na distribuição da medicação. Elas
permanecem todo o plantão junto à unidade de saúde, e acompanham os
adolescentes quando há necessidade de saídas para consultas e exames
externos.
A unidade funciona de segunda à sexta-feira das 07h às 19h, com toda a
equipe; aos sábados há uma escala diferenciada de trabalho. Há três equipes
na unidade, uma atende no período matutino, outra no período vespertino, e a
terceira atende no período vespertino e sábados.
Após as 19h apenas as agentes orientadoras de plantão permanecem
no ambulatório de saúde para acompanhar os adolescentes, caso haja alguma
emergência e eles necessitem ser encaminhados a algum serviço de saúde; e
supervisionar o adolescente que estiver na sala de observação.
40
5.4. Organização dos atendimentos e funcionamento da unidade de
saúde
De acordo com um dos funcionários da unidade, até o primeiro semestre
de 2014, o atendimento médico era feito por demanda espontânea, o que
gerava muitas consultas desnecessárias, pois os adolescentes reclamavam de
alguma dor, e eram levados ao ambulatório de saúde muitas vezes sem real
necessidade de atendimento.
Atualmente as consultas são realizadas por Alas (como foi mostrado no
quadro 1), mas antes de colocar essa proposta em prática, foi necessário
atender todos os adolescentes, para garantir que nenhuma queixa ficasse
despercebida.
Cada dia da semana é destinado ao atendimento de uma das alas da
instituição, o que gera organização e segurança para o serviço, tendo em vista
que alguns adolescentes de alas diferentes não podem se encontrar devido a
rixas ocorridas fora da unidade.
Os medicamentos e insumos disponíveis na unidade são os que
integram o Componente Básico para a Assistência Farmacêutica, o
Componente Estratégico da Assistência Farmacêutica e o Componente de
Medicamentos de Dispensação Excepcional. Dessa forma, o tratamento de
doenças prevalente é feito com medicações padronizadas definidas pelo
Ministério da Saúde.
As medicações são administradas às 07h, às 14h e às 18h e anotadas
em um caderno destinado a essa finalidade. Em consulta ao relatório de
produção do período de janeiro a agosto de 2014, há o registro de 16.007
administrações de medicamentos de rotina e conforme prescrição médica.
Os medicamentos psicoativos são distribuídos às 18h, haja vista que a
maioria deles causarem sonolência. Há uma atenção especial na administração
desses medicamentos, pois alguns adolescentes os usavam de forma indevida.
Ou seja, há desvio na função desses medicamentos, que podem atuar como
drogas terapêuticas, mas também como droga, pois são consumidos
41
esperando as possíveis reações adversas que esse medicamento pode trazer.
(LOPES, 2014 apud APPADURAI, 2008).
Os funcionários relatam situações em que os adolescentes juntavam
dois ou mais comprimidos e tomavam de uma vez só; esfarelam os
comprimidos e os consumiam como se fossem entorpecentes, e até
vendiam/trocavam os comprimidos com outros internos.
A entrega das medicações é diária, e o medicamento deve ser tomado
na hora em que é entregue pelas técnicas de enfermagem, mas a equipe de
saúde não pode obrigar o adolescente a tomar a medicação. Após o
recebimento da medicação o adolescente pode simplesmente se recusar a
tomar, ou fingir que tomou a dose recebida. Para diminuir essa problemática,
as técnicas estão dissolvendo os comprimidos das medicações psicotrópicas e
dando preferência para medicações líquidas quando possível.
No momento em que os técnicos de enfermagem realizam a distribuição
da medicação, os adolescentes aproveitam para fazer relatos sobre sua
situação de saúde, solicitar atendimento, relatar sintomas, reclamar de dores,
etc. Algumas vezes, a equipe sai com papel e caneta, para anotar o nome e as
queixas dos adolescentes e encaminhar aos demais membros da equipe de
saúde.
O adolescente internado no Centro Socioeducativo de Cuiabá, é
acolhido pela equipe técnica e pela equipe de saúde, os quais são
responsáveis pela construção do PIA. Nesse documento deve estar o registro
das condições clínicas e de saúde dos adolescentes, que devem ser avaliados
periodicamente pela equipe multidisciplinar. O PIA servirá de base para os
relatórios enviados ao juiz e subsidiarão as decisões judiciais.
Quando o adolescente chega à unidade, agenda-se o acolhido pela
equipe de saúde. Os profissionais: médico Clínico, Médico psiquiatra, Cirurgião
Dentista, enfermeiro, farmacêutico, psicólogo e assistente social devem
atender os adolescentes e preencher, além do PIA, o prontuário de saúde do
adolescente. Não há um protocolo a ser seguido nesse acolhimento, mas no
prontuário há espaço para anotações das avaliações dos vários profissionais
42
da equipe, abordando vida pessoal, vida familiar, doenças anteriores, alergias,
saúde bucal, vida sexual, etc.
De acordo com o anexo I da Portaria SAS/MS nº 647 de 2008, o
acolhimento deve contemplar imunização, desenvolvimento físico e
psicossocial, DST/HIV/Aids, doenças bucais e utilização de preservativos
(BRASIL, 2008).
O setor administrativo solicita documentação do adolescente para a
instituição e/ou para os responsáveis pelo menor, e confecciona cartão SUS
para os que ainda não possuem. Vale citar, que a unidade socioeducativa
encaminha os menores para a POLITEC, onde é realizada emissão de RG.
Na consulta inicial, o médico solicita os exames de acordo com a
necessidade do adolescente avaliado. A realização de teste rápido de HIV,
sífilis, hepatite A e B é feito com os adolescentes que desejarem fazê-lo.
Conforme conta no relatório de produção do ambulatório, foram realizados seis
testes rápidos nos meses de janeiro a agosto de 2014.
Quando há necessidade de exames laboratoriais e consultas em
especialidades médicas, o adolescente é encaminhado para unidades de
saúde fora do Complexo Pomeri. No período estudado houve 106 consultas
externas na Rede Pública de Saúde.
Para essas saídas, a equipe de saúde solicita o carro da unidade
socioeducativa e a escolta da Polícia Militar. O adolescente sob
responsabilidade da instituição socioeducativa não pode ser transportado em
viaturas policiais, e nem pode ser sair da instituição sem a escolta da PM, por
questões de segurança, a fim de evitar possíveis tentativas de resgate, além de
trocas de tiros entre rivais. Situação semelhante a que ocorre nas unidades
penitenciárias, conforme traz Lopes (2014).
Além do adolescente, se deslocam um profissional da equipe de saúde,
agentes orientadores e policiais militares. Esse deslocamento é uma das
dificuldades apontadas pelo gestor local, tendo em vista que se houver
audiências ou outras saídas, não haverá condições de deslocar o adolescente
para o atendimento externo de que ele necessita. Evidenciando que a saúde
não é prioridade dentro da instituição.
43
A Tabela 2 apresenta o quantitativo de consultas médicas
especializadas ocorridas nos primeiros oito meses de 2014.
Tabela 2: Consultas Médicas Especializadas na Rede Pública de Saúde no período de
janeiro a agosto de 2014.
Especialidades Total
Ortopedia 24
Clínica Cirúrgica 11
Infectologista 7
Dermatologia 9
Clínica Médica 6
Oftalmologia 6
Cardiologia 6
Odontologia 2
Otorrinolaringologia 2
Urologia 1
Gastroenterologia 1
Bucomaxilo Traumatologia 1
Neurologia 1
Fonte: Relatório Ambulatório de Saúde do CSE, 2014
O maior número de encaminhamentos é para a ortopedia, tendo em
vista que muitos adolescentes chegam à instituição com fraturas. O
atendimento de ortopedia, muitas vezes demanda sessões de fisioterapia;
sendo assim, há 21 encaminhamentos para fisioterapia durante o período de
janeiro a agosto de 2014.
44
Outra situação recorrente na unidade é a necessidade de cirurgias para
retirada de balas, e/ou correções de lesões decorrentes dessas perfurações
com arma de fogo. Desta forma, o relatório da unidade apresenta 11
encaminhamentos para clínica cirúrgica.
Pela tabela percebe-se que não foram realizados encaminhamentos
para médicos ginecologistas, mesmo havendo uma média de dez meninas
internadas na unidade. O mês de março foi o que mais houve
encaminhamentos, totalizando 25 consultas externas.
A maior parte dos atendimentos externos é feito na Policlínica do
Planalto, até mesmo pela questão da proximidade. Como a Policlínica só
funciona no período diurno, no caso de alguma emergência no período noturno
os adolescentes são encaminhados para a Unidade de Pronto Atendimento da
Morada do Ouro (UPA). Mas dependendo da especialidade e da urgência da
consulta, os adolescentes podem ser encaminhados a outros serviços de
saúde.
A Portaria 647 de 11 de novembro de 2008 define que o adolescente
sob o regime de internação terá garantia de acesso à assistência de média e
alta complexidade na rede SUS (BRASIL, 2008). Esse acesso é regulado
através da Central de Regulação do Município, mas em casos de urgência, a
vaga é garantida via deliberações do Juizado da Infância, segundo nos
informou o gerente da unidade.
Essa portaria afirma que as ações destinadas aos adolescentes em
privação de liberdade devem priorizar a promoção e a proteção da saúde;
práticas educativas e a prevenção de agravos; e ações de assistência à saúde,
tendo como prioridades: a) Acompanhamento do desenvolvimento físico e
psicossocial; b) Saúde sexual e saúde reprodutiva; c) Imunização; d) Saúde
bucal; e) Saúde mental; f) Controle de agravos; e g) Assistência à vítima de
violência (BRASIL, 2011).
Nas ações de promoção e proteção da saúde estão inseridas o
acolhimento, a construção do Plano Individual de Acolhimento (PIA), ações
45
intersetoriais que proporcionem o bem estar físico, mental e social do
adolescente, ações em educação em saúde, entre outras.
Percebe-se que as ações clínicas têm sido realizadas de forma eficaz,
mas há falhas em questões como a saúde reprodutiva, tendo em vista que não
há distribuição de anticoncepcionais e/ou preservativos, mesmo essa ação
sendo estabelecida pela portaria 647 de 2008, e sendo uma das questões
abordadas no acolhimento através do prontuário destinada para tal.
O acesso a imunização é garantido a esses menores, de acordo com o
calendário de vacinação anual, estabelecido pela Portaria MS/GM nº1.602, de
17 de julho de 2006, ou de acordo com a necessidade (BRASIL, 2006). De
janeiro a agosto de 2014, 119 adolescentes e 30 servidores foram imunizados
na unidade de saúde do Pomeri. Foram distribuídas as primeiras e as
segundas doses de vacinas contra febre amarela, hepatite B, e tétano.
Há casos de adolescentes que chegam à unidade sem nunca terem
passado por uma consulta odontológica. Pode-se inferir que isso ocorre pelo
fato da maior parte desses adolescentes fazerem parte das classes mais
baixas da população; conforme perfil traçado por Silva e Gueresi (2003).
Dessa forma, a tabela 3 mostra que no período estudado, foram
realizados 2.001 atendimentos odontológicos, com realização de
procedimentos como restauração, exodontia, profilaxia, técnicas de escovação,
entre outros, além de 2 encaminhamentos externos trazidos na Tabela 2.
Tabela 3: Principais procedimentos odontológicos realizados no Ambulatório de Saúde
do Pomeri nos meses de janeiro a agosto de 2014.
Atividades Odontológicas Número de Atendimentos
Restauração 239
Exames Clínicos 196
Orientações 129
Técnica de Escovação 116
46
Profilaxia 103
Aplicação de Flúor 100
Bochechos de Higiene 95
Abertura Coronária 82
Medicação 74
Curativos 70
Raspagem Periodontal 48
Exodontia 44
Sutura 44
Remoção de Sutura 35
Radiografia 33
Pulpotomia 2
Fonte: Relatório Mensal ambulatório de Saúde – Centro Socioeducativo de
Cuiabá, 2014.
Ao observarmos essa tabela, percebemos que a saúde bucal oferecida
aos adolescentes internos está de acordo com o instituído na Portaria SAS/MS
nº 647, de 11 de novembro de 2008 (BRASIL, 2008).
Outra perspectiva relevante é a saúde mental destes adolescentes.
Carrara (1998) aponta que segundo o ângulo da psiquiatria, o crime é visto
como sintoma de uma doença mental, “comportamento referido a uma
situação excepcional por que passariam certos indivíduos durante certos
períodos de suas vidas” (p. 68 grifo do autor).
Nesse mesmo trabalho, Carrara fala também sobre os condenados
alienados, que seriam os presos que enlouqueciam dentro das prisões. Dessa
forma, não há estranhamento para o fato de Goffman (1961) colocar
instituições como prisões, conventos e manicômios, dentro de uma mesma
classificação.
47
Nas portarias sobre a saúde dos adolescentes em cumprimento de
medida socioeducativa, há uma atenção dispensada à saúde mental. A equipe
de saúde deve promover ações de prevenção e redução dos agravos
psicossociais decorrentes da privação de liberdade; atenção psicossocial aos
adolescentes que necessitem de cuidados em Saúde Mental, incluindo os
relacionados ao uso de álcool e outras drogas, preferencialmente na rede
extra-hospitalar do SUS (BRASIL, 2008).
Os dois médicos psiquiatras da unidade começaram os atendimentos
em março de 2014, e nesses seis meses realizaram 348 consultas. Antes da
contratação destes médicos, os adolescentes eram atendidos externamente
por médicos psiquiatras do SUS.
Através dos dados do relatório não é possível saber quantos
adolescentes fazem uso de medicação, e nem quantos foram atendidos após a
inserção dos médicos psiquiatras na equipe de saúde da unidade, mas sabe-se
que em oito meses, foram administrados 5.326 medicamentos psicotrópicos,
entre eles carbamazepina, diazepan, carbonato de lítio e clonazepan. O que
daria cerca de 21 comprimidos distribuídos ao dia.
Um dos funcionários da equipe de saúde disse não considerar
necessário o atendimento em psiquiatria dentro da unidade. Segundo ele, está
havendo uma banalização do uso de medicamentos psicoativos, pois se o
adolescente reclama de insônia, já recebe uma medicação para que possa
dormir; não levando em conta os fatores que causam a insônia (estresse,
culpa, reclusão), que poderiam ser tratados de outras formas.
Em relação à Educação em Saúde, no mês de outubro deste ano foi
realizada uma ação sobre a temática do Outubro Rosa para as adolescentes
internas e para as servidoras do Socioeducativo. Além da decoração do painel
da unidade, foram realizadas palestras sobre câncer de mama, sorteio de
brindes e marcação de exames para as servidoras em parceria com a
Secretária Municipal de Saúde de Cuiabá (SMS).
48
Para o mês de novembro estavam sendo programadas atividades sobre
o Novembro Azul; e também haverá uma programação em parceria com a
UFMT sobre o uso de drogas.
Os profissionais da unidade realizam ações de orientações aos menores
institucionalizados, sobre saúde, uso de medicação, higiene bucal, entre
outros. No relatório constam seis ações de educação em saúde desenvolvidas
pela enfermagem, cinco desenvolvidas pela farmácia e cento e vinte e nove
feitas pela odontologia. No período em que realizamos as visitas na unidade de
saúde, não acompanhamos nenhuma ação de educação em saúde, para poder
melhor explicitá-las.
A Portaria 647 de 2008 estabelece a criação do Plano Operativo
Estadual (POE) para as unidades socioeducativas. Sendo este de
responsabilidade das secretárias estaduais envolvidas no atendimento a esses
adolescentes.
Em busca realizada no sítio da SEJUDH, encontramos o Plano
Operativo Estadual (POE) das unidades penitenciárias do Estado, mas não
encontramos o POE para as unidades socioeducativas. Segundo o gerente de
saúde da unidade, o Plano Operativo para o socioeducativo está em processo
de construção.
49
6. CONSIDERAÇÕES
Uma das primeiras coisas que aprendi no curso de graduação de saúde
coletiva, é que o SUS é um sistema universal e igualitário (BRASIL, 1990). Mas
em meu pequeno universo, não havia pensado em como se garante a saúde às
populações excluídas e marginalizadas, assim como os privados de liberdade.
Em março de 2013, quando fui chamada para lecionar na escola que fica
dentro do Centro Socioeducativo de Cuiabá, tive a oportunidade de ampliar um
pouco mais, esse meu pequeno universo. Nessa nova realidade vivida, muita
coisa me chamou atenção, entre elas o atendimento de saúde realizado aos
adolescentes internados na instituição.
Muitas vezes estive presente na administração dos medicamentos (às
vezes realizada em sala de aula), autorizei a retirada dos meus alunos da sala
de aula para atendimentos em saúde, vi adolescentes sendo encaminhados
para procedimentos cirúrgicos, enfim, situações como essas foram aguçando
minha curiosidade em pesquisar o tema; curiosidade essa que resultou no
presente trabalho de conclusão de curso.
A estrutura e o funcionamento do ambulatório de saúde do Centro
Socioeducativo de Cuiabá se assemelham às unidades de saúde existentes
fora do Complexo Pomeri. Mas o contexto em que essa unidade se insere, faz
com que o trabalho dos funcionários e a forma de atendimento sejam
diferentes.
Esse fator faz com que existam portarias específicas para o atendimento
a esses adolescentes, levando em consideração um dos princípios do SUS, a
equidade. Não basta apenas oferecer o serviço, é necessário dar reais
condições para que o cidadão consiga chegar a esse serviço, e que quando ele
chegar, possa ter suas reais necessidades atendidas.
O fato de a unidade possuir estrutura física e equipe de saúde composta
de acordo com o estabelecido pela política nacional de atenção integral à
50
saúde dos adolescentes em conflito com a lei, não garante a integralidade do
atendimento a esse adolescente, tendo em vista que eles enfrentam as
mesmas dificuldades que grande parte da população enfrenta ao utilizar a
saúde pública.
Em levantamento feito nas unidades socioeducativas brasileiras, Silva e
Gueresi (2003) apontaram as principais dificuldades para o oferecimento de
serviço de saúde aos adolescentes, já citadas neste trabalho. Das quais
destaco para a unidade estudada: ausência de tratamento para dependentes
químicos, demora na marcação de consultas, dificuldade em realizar parcerias,
insuficiência de vagas para internação na rede pública, dificuldades para a
realização de atendimento/exames especializados na rede pública, e
preconceito dos profissionais da rede pública.
Considero o preconceito um fator bastante relevante, e ser uma
dificuldade que diferencia os adolescentes em conflito com a lei dos demais
usuários da saúde pública. Esse preconceito pode partir da sociedade, da
mídia, dos profissionais de outras unidades de saúde, dos agentes
orientadores, dos policiais, e dos próprios adolescentes, que após tantas
exclusões, não vêem nenhuma perspectiva para si, e nem motivos para cuidar
da saúde.
Vivenciei essa falta de perspectiva de vida através da fala de um dos
adolescentes da instituição. A unidade de saúde imunizou os adolescentes e os
servidores, e uma das vacinas oferecidas era a antitetânica. Comentei com ele
que daqui a 10 anos, ele teria que repetir a vacina, e obtive a seguinte
resposta: “Isso se eu tiver vivo até lá”.
Mesmo com as dificuldades, sejam elas iguais as de qualquer serviço de
saúde, ou peculiares ao sistema socioeducativo, vejo que há um esforço por
parte dos profissionais da equipe em proporcionar atendimento de saúde digno
a esses menores. Um dos funcionários com que conversei disse que
constantemente recorre à literatura para nortear suas ações na unidade, tendo
em vista que após sua contratação não houve nenhum curso de capacitação
específico para o trabalho nas unidades socioeducativas.
51
Os adolescentes com os quais pude conversar informalmente sobre o
atendimento em saúde dentro da unidade não apresentaram críticas. Um
desses adolescentes teve parte do corpo queimado após queimar um colchão,
em tentativa de rebelião. Ficou internado, recebeu alta hospitalar, voltou à
instituição, e pouco tempo depois recebeu alvará de soltura.
Este menor ainda necessitava de cuidados, como uso de medicação e
aplicação de pomadas nas queimaduras, mas que poderiam ser feitos em casa
e acompanhados pela equipe de saúde da região em que ele reside. Cerca de
dois meses depois, esse adolescente estava de volta à instituição pela prática
de outro ato infracional, e me relatou que dentro do Pomeri ele recebia melhor
atendimento de saúde do que “na rua”.
As ações a serem desenvolvidas para melhorar o atendimento de saúde
aos adolescentes devem ser planejadas por todos os setores envolvidos na
aplicação das medidas socioeducativas, afinal, a saúde é a parte de um todo, e
vai muito além de médicos e remédios. É preciso garantir ao adolescente,
dentro e fora de instituições de abrigamento, alimentação, moradia, renda,
educação, lazer, entre outros fatores, que como sabemos, são determinantes e
condicionantes para a saúde.
A população de adolescentes privados de liberdade é pouco estudada
pela saúde coletiva. Nas buscas realizadas, encontraram-se vários trabalhos
na área de psicologia, mas poucos estudos em saúde. Assim, não há como
concluir o objetivo desta pesquisa, mas deseja-se chamar a atenção para essa
população que necessita de atendimento especializado, como já discutido aqui.
52
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53
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58
ANEXOS
Anexo 1 – Autorização do CEP HUJM
59
60
APÊNDICE
Apêndice 1 – Entrevista Semiestruturada com profissional atuante no Ambulatório de Saúde do Centro Socioeducativo de Cuiabá.
• Nome:
• Formação:
• Especialização:
• Função no Ambulatório:
• Cargo:
• Tempo de serviço na instituição:
• Tipo de vínculo:
• Atividades desenvolvidas:
• Como é a escala de trabalho dos profissionais da unidade?
• Quais os cuidados em saúde realizados em um adolescente recém-chegado na unidade?
• Como é feita a marcação das consultas? Como é conhecida a necessidade dos adolescentes pelo atendimento?
• Como são realizadas as imunizações?
• Em que situações é necessário encaminhar o adolescente às unidades de saúde fora do complexo?
• Como é realizado este deslocamento? Há dificuldade de transporte?
• Existe um acordo de encaminhamento com alguma unidade? (Referência)
• Você percebe preconceito nos atendimentos externos realizados ao adolescente?
• Quem prove os materiais e insumos da unidade? Há falta?
• Quem busca os exames dos adolescentes?
• Qual a maior dificuldade que você enfrenta no desenvolvimento de suas atividades?
• Que ações são realizadas a fim de orientar os adolescentes quanto à saúde?
61
• Há distribuição de preservativos/anticoncepcionais aos adolescentes internos?
• Há Plano Operativo Estadual para as unidades socioeducativas?
• O SIPIA II está implantado em Mato Grosso? Quem é responsável por se preenchimento?
• Qual a maior necessidade do setor saúde dentro do sistema socioeducativo?
• O Estado oferece algum tipo de capacitação para os funcionários desta unidade?