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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE LINGUAGENS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE CULTURA CONTEMPORÂNEA ALIANA FRANÇA CAMARGO Documentário e Cibercultura: conjunção contemporânea CUIABÁ-MT 2012

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE LINGUAGENS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE CULTURA

CONTEMPORÂNEA

ALIANA FRANÇA CAMARGO

Documentário e Cibercultura: conjunção contemporânea

CUIABÁ-MT 2012

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ALIANA FRANÇA CAMARGO

Documentário e Cibercultura: conjunção contemporânea

CUIABÁ-MT

2012

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ALIANA FRANÇA CAMARGO

Documentário e Cibercultura: conjunção contemporânea

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea da Universidade Federal de Mato Grosso, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Comunicação e Mediações Culturais.

Orientadora: Prof ª Dra. Lúcia Helena Vendrúsculo Possari.

CUIABÁ-MT 2012

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Para os amores

Maria Júlia,

Cristiano e

Lucida.

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AGRADECIMENTOS

Na elaboração dessa dissertação, alguns obstáculos foram superados. Mas

esta superação não seria possível sem que ao meu redor estivessem pessoas que

me encorajaram e me deram força para continuar. Por isso, agradeço à minha

família, em especial, à minha mãe Lucida, que apesar das dificuldades sempre foi

um incentivo para os meus estudos. O meu amado companheiro Cristiano por

sempre estar ao meu lado quando tudo parece ficar muito difícil. Ao mais novo amor

da minha vida, minha princesa Maria Júlia, que chegou durante o percurso desta

dissertação para dar mais emoção à minha existência. Aos meus irmãos

Josémarcio, Márcio, Ítrio, Sandra e Lú, porque sempre estiveram comigo.

Agradeço imensamente à minha orientadora, Lúcia Helena Vendrúsculo

Possari, por acreditar em mim e aceitar, no meio do caminho, pesquisar o tema

documentário, sempre apaziguando, com sutileza e equilíbrio, os momentos mais

complicados na construção das ideias. Ao professor Yuji Gushiken, por contribuir

com sua refinada arguição no momento da qualificação deste trabalho. À professora

Maria Cristina de Aguiar Campos por aceitar o convite para compor a banca.

Aos amigos de jornada que fiz no ECCO, Marília Cortez, Karine Krewer, Alan

Mantilha, Albília Almeida, Daniel Guazina, Thais Castro, Jan Moura, Mayra

Jeannyse, Luzo Reis, Alexandro Romão, Fernando Birello e tantos outros.

Aos professores do programa, em especial, Ludmila Brandão e Maria Thereza

de Oliveira. Aos funcionários do ECCO, representados pelo sempre paciente Diego.

A Kleber Lima, que me possibilitou pesquisar e trabalhar ao mesmo tempo; sem o

incentivo, o caminho seria mais difícil. Aos companheiros do Hipernotícias.

Aos amigos que fazem parte da minha vida, Diego Baraldi, Fernando

Augusto, Gilvan Rodrigues e Camila Caetano. Esta foi apenas uma etapa, na qual

despertei a consciência para o ser/estar pesquisadora. Estou certa de que o

caminho teórico por onde passa a pesquisa sobre documentários será cada vez

mais aprofundado em minha vida, com o passar dos anos. E que venha a prática!

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“O cinema não vem apenas registrar a vida reclusa,

seus dramas e ameaças, mas também se somar ao

que ajuda a inventar o cotidiano, estabelecer uma

rotina de práticas variadas.”

Ismail Xavier

“Se a tecnocultura moderna foi o paraíso de Apolo,

a cibercultura pós-moderna é o teatro digital de

Dionísio.”

André Lemos

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RESUMO

Alguns aspectos da contemporaneidade ofereceram variações aos segmentos das

artes, e é pensando nestas transformações que este trabalho tem a pretensão de

construir um diálogo sobre o audiovisual, especificamente o documentário, em

relação à nova forma de cultura – chamada Cibercultura. Através da simulação,

existente em outros tempos, mas que tem sua particularidade na esfera virtual,

compreendem-se algumas questões sobre as linguagens expandidas do

documentário para a Web nesta segunda década do século XXI. A diversificação de

público, de formato e mudança na base cultural do documentário (produção,

distribuição e exibição) faz com que um novo olhar seja lançado para a criação do

gênero para a internet. A base teórica passa pela cultura, Cibercultura, pelos

conceitos de interação e de socialidade, e pelas concepções de documentário, a fim

de embasar minhas descrições. A metodologia é de abordagem qualitativa, pois

busco a construção de sentidos desses documentários: O Som do Tempo, Cidades

Visíveis, Restos e Webdoc Verdade. Assim, a descrição visa à constituição deles,

inseridos na Cibercultura.

Palavras-chave: Webdocumentário; Cibercultura; interação.

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ABSTRACT

Some aspects of contemporaneity have allowed art segments to vary. This work

intends to build a dialog on the audiovisual – especially the documentary – by

thinking of these transformations in relation to a new type of culture – which is called

Cyberculture. Through simulation, which exists in other times – though its particularity

is in the virtual sphere, we can understand some issues on the languages that

expanded from the documentary to the web (internet) in the second decade of the

21st century. The diversity of public and format as well as the change of the cultural

basis of the documentary (exhibition, distribution and production) caused us to have

a new perspective on the creation of the genre on the internet. The

theoretical basis ranges from culture, cyberculture, concepts of interaction and

sociality, to the conceptions of the documentary in order to support my

descriptions. The methodology is of a qualitative approach, because I am interested

in the sense production in the following documentaries: O som do tempo (The sound

of time), Cidades Visíveis (Visible Cities), Restos e Webdoc Verdade (Remains and

Webdoc Truth). Thus, the descriptions aim at their formation inserted in the

Cyberculture.

Key-words: webdocumentary; cyberculture; interaction.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Título: Dona Fátima em sua casa...............................................................66

Figura 2. Título: Casa de Dona Fátima......................................................................67

Figura 3. Título: Primeira imagem da obra Restos.....................................................69

Figura 4. Título: Garis em avenida de Belo Horizonte...............................................70

Figura 5. Título: Oficina sobre webdoc......................................................................73

Figura 6. Título: Imagem do vídeo Webdoc verdade................................................74

Figura 7. Título: webdocumentário Cidades Visíveis.................................................78

Figura 8. Título: webdocumentário Cidades Visíveis.................................................80

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 13

CAPÍTULO 1 – O Gênero, a representação e a realidade.................................... 17

1.1. O outro no documentário........................................................................... 26

1.2. Documentário no mundo............................................................................ 29

1.3. Documentário no Brasil.............................................................................. 33

1.4. O documentário na cultura contemporânea............................................... 37

CAPÍTULO 2 – Ambiente comunicacional na Cibercultura................................. 40

2.1. Rumos do gênero documental frente à dinâmica da cibercultura.............. 47

2.2. A representação através da mediação digital: mudanças evidentes......... 49

2.3. Documentário na rede: construção de conteúdo na internet..................... 51

CAPÍTULO 3 – Documentário e a condição da simulação na era cibernética... 54

3.1. Compreensão da obra digital na esfera virtual.......................................... 64

3.2. O Som do Tempo na Cibercultura............................................................. 65

3.3. Canais de compartilhamento e as indagações sobre o webdoc................ 68

3.4. Reflexão sobre Webdoc no festival é tudo verdade.................................. 72

3.5 Cidades Visíveis e a utilização de novas possibilidades através do sistema digital................................................................................................................. 77

CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................... 83

REFERÊNCIAS......................................................................................................... 87

ANEXO...................................................................................................................... 91

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INTRODUÇÃO

A partir da década de 2000, o fenômeno audiovisual ganhou projeção com a

internet, fazendo do cotidiano uma janela aberta de imagens que circulam em nível

mundial. Essa realidade é cada vez maior quando canais de exibição na rede

telemática são criados, possibilitando muitas trocas de informações por meio de

cabos de fibra ótica.

Este estudo inicia a partir do anseio em observar qual é o lugar do

documentário quando inserido na rede telemática. Estudar o gênero parte de uma

busca pessoal. Em meu percurso profissional, coloquei em prática o projeto

Cinemagora, fruto da conclusão de graduação em Comunicação Social pela

Universidade Federal de Mato Grosso. O projeto foi aplicado em algumas escolas da

periferia de Cuiabá, a partir de 2005, e no decorrer dos anos foi inserido também em

alguns eventos no Estado. O trabalho, direcionado para crianças e adolescentes,

tem como papel fundamental inserir a prática do audiovisual no universo de vários

estudantes.

O aprendizado através da prática pedagógica sempre esteve aliado ao meu

trabalho como documentarista, sendo alguns apresentados no Festival de Cinema e

Vídeo de Cuiabá.

A popularização de canais de exibição de vídeos, como o Youtube , o

crescimento de documentários apresentados na internet e a prática cada vez mais

aliada a novas tecnologias como celulares, câmeras fotográficas e Webcams, fez

com que a investigação teórica tivesse início neste Programa de Mestrado em

Estudos de Cultura Contemporânea.

Diante do exposto, esse trabalho tem a pretensão de fortalecer, através de

um aporte teórico, a prática adquirida ao longo dos anos. Quero propor a reflexão da

produção do documentário na era da informática e das novas tecnologias.

Apresento o recorte de algumas produções documentais inseridas na World

Wide Web para descrever as narrativas propostas pelos seus autores.

Produzir, exibir e distribuir fazem parte de outra esfera diferente das décadas

de 1980 e 1990. Agora, com a comunicação todos-todos, compartilhar, interagir e

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manipular imagens integram as rotinas de vários realizadores existentes na

cibercultura. Em linhas gerais, como é concebido o documentário quando

influenciado pelo digital? Como se apresentam e se caracterizam os documentários

na web?

Busco respostas a essas questões através da contribuição de pesquisadores

como André Lemos e Pierre Lévy: observo a cibercultura se desenhando na esfera

do social na forma da cibersocialidade, resultado da socialidade aliada à tecnologia

telemática. Essa paisagem sociocultural reverbera em vários campos do

conhecimento, e, neste trabalho, compartilho os conceitos dos autores citados, para

compreender a posição do documentário na esfera virtual. Bill Nichols, Jean-Louis

Weissberg, Arlindo Machado e outros teóricos também contribuem

significativamente.

Se, antes, eram feitas reflexões sobre se o que estava sendo exposto se

tratava de um documentário, na Cibercultura, observa-se que este tema está cada

vez mais em discussão, já que as linguagens estão cada vez mais em expansão.

O trabalho foi dividido em três capítulos. No primeiro, com o objetivo de dar a

ver inúmeros olhares sobre o gênero documentário, faço recuo histórico, a partir dos

anos 1960, em que as críticas e os estudos acadêmicos se voltaram intensamente

para o campo do cinema. As reflexões, a partir daquela época, apresentam pontos

importantes como representação, realidade, a voz do outro no documentário, assim

como o lugar do gênero na cultura da sociedade.

O segundo capítulo, alinhando-se à proposta do documentário e sua inserção

na Cibercultura, tem como objetivo abordar o gênero na contemporaneidade, em

que há um novo curso na produção, informação e trocas entre indivíduos comuns e

interessados pela área: a desterritorialização, traçando as informações em tempo

real; o vitalismo de André Lemos; a inteligência coletiva de Pierre Lévy

proporcionada pela Cibercultura.

Para além de uma visão positiva da tecnologia e sua contribuição para a

formação de um conhecimento comum entre os usuários, também considerei

interessante colocar outro lado da visão, incrementando o trabalho com as críticas

de Jean Braudrillard, Paul Virilio e Lorenzo Vilches, que vão traçar particularmente

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suas ideias de que a comunicação vive um grande colapso com o bombardeio de

informações existente na Web, causando, entre vários aspectos, uma dependência

do homem contemporâneo em relação ao pensar.

No terceiro e último capítulo, apresento quatro documentários inseridos na

Internet. As obras foram escolhidas dentre centenas de outros documentários

investigados que também poderiam contribuir para a descrição pretendida. A meu

ver esses quatro representam a reflexão teórico-metodológica objetivada.

Nas considerações finais, sob a forma de linhas de fuga – pois é impossível

concluir sobre o tema –, busco apontar a relação entre documentário, Cibercultura e

ciberespaço.

Dois documentários foram retirados do projeto Rumos Itaú Cultural que

lançou, em 2009, um edital com a temática Documentário para internet. Outros dois

foram retirados dos canais de compartilhamento e exibição Youtube e Vimeo.

Eles enfocam mundos particulares que só podem ser apresentados no

documentário, paisagens sociais que esboçam a representação do cotidiano,

personagens singulares e ao mesmo tempo comuns, que fazem com que a vida seja

vista de um ângulo muito diferente de outras lentes do mundo, mas que, agora, é

observada em escala mundial, em espaço e tempo comprimidos.

Considero importante a observação do pesquisador Arlindo Machado (2006),

que afirma que cada vez mais estamos vivendo uma escrita audiovisual, por causa

das inúmeras trocas e interações, onde a fala perde força, confrontado-se com a

tela.Todavia, o argumento continua inserido na questão de trocas e na expansão

cada vez maior das linguagens.

Já estamos na realidade em que as reservas de imagens, as questões de

simulações interativas fazem parte da construção da inteligência coletiva. O

documentário é, sem dúvida, uma importante ferramenta de exploração do

conhecimento.

A partir do momento em que a tecnologia reinstala um novo universo de

significações em conteúdos produzidos pela cultura social é importante ter

consciência sobre o seu processo.

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A metodologia do trabalho segue o aporte teórico da pesquisa qualitativa

sobre a imagem e som, organizado pelos autores Martin Bauer e George Gaskell

(2002) e da pesquisa na internet analisado professoras Raquel Recuero, Suely

Fragoso e Adriana Amaral (2011).

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CAPÍTULO 1

1.0. O gênero, a representação e a realidade

Este capítulo busca compreender o documentário e os inúmeros olhares

sobre gênero, entender as concepções de alguns pesquisadores e cineastas com a

finalidade de conhecê-las num espaço-tempo-tecnologia diferente do que será

apresentado nos próximos capítulos, sem que, para isso, eu opte por uma ou outra

concepção.

Busquei informações sobre as teorias que analisam o documentário e como o

gênero se estabeleceu tanto no mundo como no Brasil. Minha investigação

colaborou para tornar a visão muito mais nítida do meu trabalho como

documentarista.

Compreendi que, no Brasil, a maioria dos teóricos sobre o assunto se

posiciona vinculada aos pós-estruturalistas (Nichols, Renov), mas também temos

outras linhas de pensamento que abordam este campo de estudo.

De acordo com a corrente de pensamento pós-estruturalista, existe uma linha

tênue que separa a nãoficção da ficção e, em certos momentos, as duas vias se

unem. Por isso, nelas, o documentário é encarado como não tendo uma

especificidade, já que muitas obras tratam de estabelecer uma conexão própria com

o mundo, seja pelos movimentos da década de 1930, seja pelo cinema direto

americano, ou pelo cinema verdade da Kino Pravda de Dziga Vertov. Assim, o

cinema vem experimentando, especialmente no campo documental, vários métodos

para se utilizar a imagem-câmera como um instrumento para observar o mundo.

Na tentativa de entender o que é um documentário, refleti, juntamente com

Bill Nichols (2005), que se trata de um gênero que registra fatos e acontecimentos

de determinada época, com personagens que fazem parte da vida real. Na verdade,

o documentário tem a pretensão de tocar a realidade de alguma forma, mesmo que

para isso tenha que usar de artifícios ficcionais ou dispositivos de realização. Ao

mesmo tempo em que, como sugere Nichols, todo filme é um documentário.

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Partindo da ideia de que qualquer filme, mostra a cultura de uma época e os

indivíduos que fazem parte dela.

O documentário insinua a crença em algum fato e pede que aceitemos o

universo do filme como real.

João Moreira Salles1 (2004) diz que “o documentário não é o tema, o

documentário é a maneira de documentar o tema” e, a cada obra realizada, há

indagações do por quê se está narrando desta maneira e não de outra. Documentar

é experimentar linguagens.

Em sua teoria sobre a representação e realidade no documentário, Bill

Nichols (2005) observa e analisa a problemática, baseando-se especialmente nas

teorias de Michel Foucault. O autor trata da fronteira que separa nãoficção e ficção.

A primeira sugere tratar de questões sobre a representação social; em se tratando

da segunda, os desejos, as imaginações ganham proporções mais amplas e

também fazem parte das representações. A primeira se constitui na história do

mundo; a segunda, na história criada e criativa de um mundo imaginado.

O autor afirma que “os documentários não diferem das ficções por serem

textos construídos, mas pelas representações que fazem” (NICHOLS, 1997, p. 153).

No geral, tanto as obras de ficção como os documentários têm a pretensão de que

acreditemos em sua narrativa como parte integrante da realidade.

A partir da década de 1950, muitos teóricos acadêmicos se voltaram para

uma ampla descoberta do cinema. O tema sobre a representação da realidade foi e

ainda perdura como um dos grandes objetos desses estudos. Como já citei

anteriormente, existem posições argumentativas e conceituais contrárias.

O documentário procura traçar um retrato que anseia aproximar-se de alguma

realidade. Em suma, a ideia de realidade almejada pelo cinema e, principalmente,

pelo gênero documental foi amplamente criticada por pesquisadores franceses no

final da década de 1960 e início da década de 1970. A época, havia uma

efervescência de informações sobre o cinema e seus significados na França.

Pesquisadores da área publicavam nas revistas Cahiers Du Cinémà e Cinèthique, e

1 Entrevista concedida ao programa ‘Olhares’, da TV Câmara de Brasília, sob a direção de

Getsemane Silva, em 2004.

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outra que influenciou as duas, Tel Quel. O aporte teórico que estruturava as críticas

destes pesquisadores estava apoiada no Cinema (Eiseinstein e Dziga Vertov), na

Semiologia (Saussure e Metz); na Economia (Marx) e na Psicologia (Freud e Lacan).

Na análise do pesquisador Godoy de Souza (2001, p.68) as influências do

movimento representaram uma ruptura no pensar cinematográfico:

O cinema para os críticos de Cinèthique definitivamente não é

o espaço de uma possível descoberta ou revelação da

realidade. Esse ponto de vista desferiu contra o documentário

um golpe mortal, que o invalidou como instrumento de

investigação do mundo, apoiado por uma semiologia que se

ajustava a essa crítica (Metz). Isso é visível nas posições

sobre o Direct Cinema2; embora esse gênero de documentário,

típico dos anos 70, seja até certo ponto elogiado, o elogio dá

outro sentido.

As ideias das críticas produzidas na França (revistas Cinèthique e Cahiers)

acerca do universo cinematográfico influenciaram nas análises da função da

linguagem e na arte audiovisual de vanguarda. “Infelizmente em função disso o

documentário parece continuar a viver uma certa orfandade teórica, fato que não

seja justificado pelo próprio desenvolvimento histórico”3 (GODOY DE SOUZA, 2001,

p. 69).

Através da pesquisa de Godoy de Souza, observa-se que, em contraposição

a essa ideia, Jean Mitry, estudioso acadêmico francês da década de 50 e que

baseou seus estudos nas teorias de Sergei Eisenstein e André Bazin, afirma que é a

relação com a realidade que define a principal característica do cinema. A busca

pelo real é o objetivo do movimento chamado Cinema Veritè. O cinema verdade foi

desenvolvido entre os documentaristas e os objetos participantes, que eram pessoas

vivendo situações críticas que são coautores do produto final. O principal objetivo

desse movimento é não interferir na fotografia do filme. Para Mitry e Bazin, quando o

2 O Direct Cinema é um gênero de documentário que se contrapõe o movimento Veritè, que é mais

preocupado com uma narrativa desprendida de interferências do produtor. Manipula, através de cena de ficção, a narrativa do documentário. Este gênero ainda é muito utilizado, principalmente quando produzido para televisão.

3 O pesquisador americano Bill Nichols (2005) salienta que o documentário não se desenvolveu

paralelamente ao filme de ficção. Sua trajetória alcança reconhecimento apenas no fim da década de 1920 e no começo da década de 1930.

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estético predomina, há perda da principal especialidade do cinema – a busca pela

realidade.

Fernão Pessoa Ramos4 propõe a reflexão lógico-analítica que define o

significado no campo do documentário, abrindo o caminho para dois conceitos

centrais, que são a proposição assertiva e a indexação. O primeiro considera que o

discurso fílmico apresenta afirmações verdadeiras, afirma a existência da realidade

na obra. O documentário Estamira (2005), de Marcos Prado, apresenta asserções

sobre a vida de uma catadora de lixo. A pessoa é para o que nasce (1998), de

Roberto Berlinos, oferece asserções sobre irmãs cegas que cantam no nordeste do

país.

O documentário tomaria, então, sua singularidade da ficção, ao possuir uma forma específica de representação, composta por enunciados sobre o mundo, caracterizados como asserções. Estas asserções, por sua vez, podem ser analisadas como proposições, a partir de procedimentos que possuem a estrutura da lógica formal, no horizonte (RAMOS, 2001, p. 05)

As asserções que compõem o discurso do documentário designam, de forma

estreita, uma relação com a realidade considerada. A rigor, para os cognitivistas, a

análise deve ser definida e trabalhada por um olhar com proposições lógicas, “que

fecham o campo para definição de seu conteúdo de verdade” (RAMOS, 2001, p.6).

A indexação estabelece as dimensões pragmáticas e receptivas do

documentário. O princípio da indexação é a de que o sujeito assiste à obra com

conhecimento social prévio e está esclarecido que o que está vendo é ficção ou

documentário. Embora isso não se constitua como regra, as exceções são evidentes

quando à introdução da pragmática da indexação, mais se baseia na relação entre

quem está realizando o filme dentro do contexto social e para o destinatário do

discurso que reside nesta narrativa.

Outro estudioso que contribuiu com teorias acadêmicas na década de 1970

foi Christian Metz. Para ele, a possibilidade de acesso à realidade ou a impressão

dela é provocada pela interação que existe entre as atividades mentais

4 RAMOS, Fernão Pessoa. O que é documentário? Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/pessoa-fernao-ramos-

o-que-documentario.pdf. Acesso em: 12 de mar. 2011.

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desenvolvidas pelo espectador e as propriedades físicas da imagem

cinematográfica. A mente do espectador seria a matéria-prima do cinema.

Metz consagra a ideia de que se todo filme, seja ele documental ou ficcional,

está na ordem da representação, logo ele também está na esfera da ficção, da

imaginação. Toda obra fílmica tem um início e um fim, é a materialização da

irrealidade. Metz separa, descola a obra do mundo, para ele é uma representação

do social.

Alinhando a Andre Bazin, Rezende Filho (2005, p.21) afirma que o estudioso

apresenta em seu raciocínio a noção de que o cinema faz uma representação

privilegiada do mundo. Nas imagens em movimento, encontra-se a existência efetiva

das coisas, a forma como ela se apresenta é como uma “transferência da realidade

do objeto” para a tela como retrato fiel da realidade.

De acordo com Rezende Filho, há certa crítica ao realismo de Bazin, porque

ele não leva em consideração que a projeção do objeto filmado já está em

transformação com a presença da câmera, levando em consideração que há fatores

externos que podem modificar toda a mis-en-scène da narrativa, como as escolhas

do diretor, a modificação da própria imagem na montagem, a ideologia e a própria

noção de representação.

Bill Nichols, segundo a pesquisa de Rezende Filho (2005, p.24), ataca a

formatação realista quando afirma que os “documentários sempre foram formas de

representação, nunca janelas transparentes da realidade”. As concepções de

representação e realidade, entre vários teóricos, apontam para formas distintas de

se elaborar um material documental.

Bill Nichols (2005) divide a representação em três conceitos: o primeiro está

relacionado com a reprodução, a cópia, o modelo – no geral, a “representação em

si”, o termo mais usado nas críticas cinematográficas; O segundo conceito tem a ver

com o verbo “representar”; entende-se, neste caso, a representação de uma classe,

por exemplo, sou representada enquanto documentarista pela Associação dos

Produtores do Audiovisual – é a representação política de um grupo. O último

exemplo se refere à construção discursiva, “uma declaração ou narração que

procura transmitir uma ideia ou impressão de forma concreta [...] com o objetivo de

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influir na ação ou na opinião” (NICHOLS, 1997, p. 154). O autor sugere que o

documentário realiza representações ou cópias fotográficas do mundo, assim como

os sons captados.

Dizer que o gênero é uma representação significa corroborar que ele é uma

construção discursiva e subjetiva a partir de um modelo que está na composição do

real, como uma produção paralela da realidade.

No campo discursivo documental está a reflexividade. Ao supor o caráter

ideológico (discurso e representação) de uma obra, a reflexividade que compõe

formulações realizadas pelos sujeitos e por quem realiza a obra sugere que as

suposições e análises não podem ser feitas de forma inocente e totalizadora.

O documentário, enquanto representação do real, apresenta personagens

reais, mas que, diante de uma câmera, falam o que gostariam de ser ou o que

gostariam que os outros enxergassem nelas enquanto pessoa, fazendo uma

projeção do próprio perfil – transformando-se em uma representação, um modelo

ficcional do eu. Pode-se considerar que muitos personagens presentes em

documentários estão encenando um papel, como um modelo de suas próprias vidas,

atores de si mesmos. No livro de Consuelo Lins (2007), observa-se que esta é uma

consideração que Eduardo Coutinho apoia em suas obras. O cineasta não busca

exatamente as pessoas num formato real, avesso às imaginações, mas sujeitos que

estão à procura de uma dimensão ficcional. Quando há o encontro entre

personagem e câmera, tudo se transforma.

O cineasta João Moreira Salles (2004) segue nesta mesma direção e afirma:

“Eu não sei se nenhum personagem que é filmado existe em estado puro ou em

estado natural. Você sempre, numa câmera, apresenta alguma coisa que deseja

apresentar de si mesmo. A inconsciência (diante da câmera) quase não existe”.5

O documentário quer alcançar o mais fiel quadro da realidade, mas isso não

quer dizer que o objetivo é tangível.

Santiago - uma reflexão sobre o material bruto (2007) foi um projeto de Salles

desde 1992. O mordomo faleceu um pouco depois da captação das imagens e o

5 Entrevista de João Moreira Salles concedida ao programa ‘Olhares’, da TV Câmara de Brasília, sob

a direção de Getsemane Silva, em 2004.

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diretor deixou o material guardado até 2005, ano em que decidiu avaliar e retomar

as imagens que revelavam que, mais que contar a história do mordomo, a narrativa

também era sobre a história familiar do cineasta.

Ao fazer um filme sobre o mordomo Santiago, Salles mostrou claramente as

suas opções, fez escolhas, recortou, tirou imagens; no percurso, viu que outra

história poderia aparecer, mas, ao se deparar com ela, preferiu fazer as suas

próprias eleições dos objetos. O filme apresenta com um tom de raridade um

metadocumentário, no qual existe a exposição de segredos na elaboração do

trabalho, e que na maioria das vezes ficam escondidos ou perdidos no processo de

finalização.

O filme apresenta ao público a eleição dos seus caminhos, revela que a

relação entre o diretor e o personagem foi muito distante, jamais deixou de ser entre

patrão e empregado. Mesmo no momento de documentar um pouco história familiar

do cineasta, o filme nos faz refletir que o documentário não pode ser a realidade em

si, mas tão somente uma representação, o cineasta manipula e transfere para a sua

narrativa as suas preferências. Neste sentido, Luiz Augusto Rezende Filho (2005, p.

35) explica a manipulação no documentário:

À pergunta, totalmente retórica por sinal, “o cinema manipula a realidade?”, então, é praticamente impossível não responder “sim”, por, pelo menos, duas razões. Primeiro, porque, quando se faz tal pergunta, se supõe implicitamente que a “realidade” é o “objeto” do cinema. E como objeto, a realidade não pode ser “representada” sem que haja artifícios, arbitrariedades, manipulações. Segundo, porque não há como estabelecer “o que é a realidade” a partir de um critério de julgamento único e segundo o qual se ateste, definitivamente, a adequação ou a inadequação da sua “representação”. Assim, sempre haverá algum critério externo, um momento histórico, uma ideologia segundo os quais a representação é inadequada, manipulada, deixando como conclusão que toda representação empreende, de alguma forma, uma “manipulação da realidade”, uma manipulação de seu objeto.

Consuelo Lins (2007) observa que a realidade no cinema é construída a partir

da experiência entre assunto histórico, os personagens e o cineasta. A câmera não

está passiva, ela provoca alterações na realidade. Lins alinha-se ao pensamento de

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Eduardo Coutinho, o qual afirma que, se não houvesse essas alterações, não teria

como filmar o objeto. A grande experiência do documentário é saber negociar com o

real; esta negociação implica ter ambiguidades que o próprio mundo apresenta.

A sensação de realidade vem do conhecimento das leis que regem o universo

mágico produzido pelo cinema. São histórias reais de encontros e desencontros.

Como o pioneiro Ao Redor do Brasil (1932), de Thomaz Reis; da mulher que almeja

ter uma terra em Terra para Rose (1987), de Tetê Moraes; a biografia de um

presidente em Jango (1984), de Silvio Tendler ou a loucura de um centro psiquiátrico

em Imagens do Inconsciente (1984), de Leon Hirszman. Todos transportam o

espectador ao quadro real tal qual ele foi apresentado pelas imagens; isso que dizer

um modelo do real produzido pela câmera.

O cinema, como lembra Ismail Xavier (1984), além de reproduzir propriedades

do mundo visível, segue para essências da sua natureza, a propriedade de registrar

imagens em movimento. Então, a junção de vários planos e ângulos diferentes é o

que provoca a sensação de realidade na obra fílmica.

A sensação da realidade na imagem projeta a virtualidade do objeto. A

virtualidade não se opõe ao que é real. Isso quer dizer que a virtualidade de um

corpo na tela é de fato o corpo real na tela. Mas o pensamento é que o cinema em

todo o seu processo possibilita que o tal corpo possa ser distorcido, através do olhar

artístico, da subjetivação existente na interferência da câmera sobre o objeto – o

corpo. Por isso ser difícil designar o que é o documentário, pois ao mesmo tempo

em que ele quer tocar a realidade ele também interfere, muda, transforma o objeto,

mudanças que, se não existissem, deixariam de estar no plano da arte.

A tela do cinema é centrífuga, portanto nos projeta para a realidade que está

para além do quadro da tela, a nossa mente formula questões que estão além do

que é percebível. O cinema reforça a tendência à expansão.

A proximidade entre as imagens e o que se vê produz a sensação de ilusão

de estar no interior do filme, fazendo parte da narrativa. Os recursos consistem não

somente dos planos de gravação do cineasta, mas, sobretudo, da grande

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expressividade que a câmera produz e também da montagem tão estudada por

Eisenstein6.

A justaposição das imagens, no momento da montagem, apresenta a

intervenção humana no que foi registrado. A partir daí, distanciamos-nos da ideia de

semelhança do mundo visível. Empresto a explicação de Ismail Xavier (1984, p.17)

quando diz que “a montagem será o lugar por excelência da perda de inocência”. É

na articulação enunciativa das imagens que os cineastas procuram sintetizar o

trabalho, dando destaque para a montagem.

Para Pudovkin a arte será realista mais pelo significado produzido do que pela

naturalidade de seus meios. Ao construir o olhar sobre a realidade, o documentário

apresenta todos os “elementos discursivos que tornam possível aquilo que não é

imediatamente visível na nossa experiência direta do mundo” (XAVIER, 1984, p. 44).

Bela Balazs vai mais a fundo em sua concepção sobre representação e

realidade. Para ele, há um antropomorfismo7 inerente ao ato de representação. Isso

quer dizer que a realidade tende à figura do homem. O contundente na ideia de

Balazs é que à medida que as formas humanas são apresentadas, redefine-se o

tempo todo, a interação entre realidade e representação.

Em geral, a arte de fazer cinema quer se aproximar constantemente da

realidade. Por isso, o cinema torna possível captar pequenos gestos, o silêncio de

um rosto, e subjetivamente a experiência interior sem que, necessariamente, precise

da mediação do falar. A objetividade visual é que produz a impressão da realidade,

que, por conseguinte, é uma representação cultural do outro dentro de uma

sociedade.

6 Sobre a montagem no cinema, ver a obra A forma do filme, de Sergei Eisenstein.

7 Antropomorfisar o objeto visado não significa, para Balazs, doar-lhe uma vida que se define nele e por ele

isoladamente, mas integrá-lo numa cadeia que o liga ao destino humano. Colocando-se contra o que chama de

“poesia das coisas”, Balazs dirá que o objeto pelo objeto é mero espetáculo, sem sentido.

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1.1. O outro no documentário

A busca pela impressão da realidade, utilizando-se de realismos como

método, dá voz ao documentário. Bill Nichols esclarece que a voz do documentário

transmite qual é o ponto de vista social do cineasta e como se manifesta esse ponto

de vista no ato de criar o filme. Neste ponto, o autor permite entender que o estilo

assume uma dimensão ética:

A voz do documentário atesta seu engajamento numa ordem

social e sua avaliação dos valores subjacentes a essa ordem.

É a orientação para o mundo histórico que dá ao documentário

sua voz própria (NICHOLS, 2005, p. 92).

A voz do documentário apresenta, de maneira especial, as particularidades de

uma sociedade, através de um ponto de vista ou uma perspectiva do

comportamento social que começa a ser conhecido.

Consuelo Lins (2007) afirma que o documentário não pode fazer dos

entrevistados o objeto do filme, mas o sujeito que necessita ser ouvido. A obra se

torna um instrumento de propagação desse discurso, um meio de dar ouvidos a

quem precisa ser ouvido. Há uma tradição que caminha para o plano ético e estético

no qual dialogar com o outro é ter um discurso formulado a partir do outro.

O documentário é um ato no mínimo bilateral, em que a palavra é determinada por quem a emite, mas também por aquele a quem é destinada, ou seja, o cineasta, sua equipe, quem estiver em cena, é sempre um “território compartilhado” tanto pelo locutor quanto por seu destinatário. Falar e ouvir não são atividades independentes e integrais. Fazemos as duas coisas ao mesmo tempo, e isso não acontece apenas no cinema documental. Integra a vida, o mundo, as relações entre as pessoas segundo a bela visão da linguagem de Mikhail Bakhtin – e que Coutinho, por conta própria e a seu modo, no faz ver (LINS, 2007, p. 108).

A premissa de que o documentário não deixa de ser ficção consta nas obras

de Coutinho, principalmente em seus trabalhos realizados a partir do filme Boca de

lixo (1992). O cineasta participa do enredo, faz-se presente diante da câmera,

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constrói junto com os catadores de lixo de São Gonçalo, em Niterói, Estado do Rio

de Janeiro, fazendo um jogo entre “filmar e ser filmado, a imagem de si e a imagem

do outro” (LINS, 2007, p. 89). A partir desse experimento, o cineasta produz uma

representação do tempo vivido.

Dar voz a esse “outro” desconhecido torna-se questão importante para os cineastas, e a entrevista – possibilitada pelo advento das técnicas de gravação do som direto – torna-se um procedimento privilegiado. A “voz do povo” faz-se portanto presente, mas ela não é ainda o elemento central, sendo mobilizada sobretudo na obtenção de informações que apóiam os documentaristas na estruturação de um argumento sobre a situação real focalizada (LINS, 2008, p. 21).

Em Prisioneiro da Grade de Ferro – Auto Retrato (2003), de Paulo

Sacramento, o cineasta deixa com os detentos uma câmera filmadora. Essa

experiência única faz com que os sujeitos não somente sejam ativos em seus

discursos, mas também ofereçam o retrato, o olhar do filme. Essa abertura de dar

voz e a câmera ao outro no Brasil teve seu inicio na década de 1960. Essa

perspectiva almeja estar mais intimamente ligada ao cotidiano dos que estão dentro

da realidade de uma cela. A liberdade de fazer planos com a câmera na mão e filmar

o que poderia ser deixado de lado transitam em todo o processo do filme. Nenhum

cineasta faria o mesmo, ou conseguiria o mesmo detalhe de uma parcela da

realidade. Quando um detento está dentro da cela filmando o lado de fora, ele fala

de seus desejos, o quanto gostaria de deixar a prisão e voltar novamente para o

mundo que eles observam através das grades. É um momento de abertura da fala,

exposição do traço psicológico. Há uma intimidade em relação à câmera, a

experiência de se abrir junto com outros detentos não seria a mesma com a

presença de uma equipe de filmagem.

Obras como Santo Forte (1999), de Eduardo Coutinho, e Janela da Alma

(2000), de João Jardim, dão ênfase à palavra falada, construção ativa da relação

entre diretor e personagem. O privilégio da entrevista, portanto do ouvir, observado

pela câmera, é uma grande fábrica de interpretações. O diretor, ao se dispor a ouvir

o outro, deve ter em mente que as contradições e ambiguidades surgirão no

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processo, pois estão no patamar em que o filme, por si só, projeta seu próprio

conteúdo. De certa forma, o cineasta tem que estar aberto às fissuras e tensões que

surgem no processo do filme e não querer ir contra elas.

O cineasta deve estar imune a pré-concepções, evitar cortar algo que o

sujeito queria falar, que queria abrir para o mundo. Entender que filme não é

propriedade de um único sujeito que o produz, mas que o filme, tal qual ele é, ganha

corpo e está nascendo para o mundo, para outras milhares de interpretações.

Estamira (2005) celebra o ouvir o outro de maneira excelente. A história de

uma catadora de lixo (tema abordado principalmente no movimento da estética do

lixo) rompe com o convencional para mostrar a normalidade e, ao mesmo tempo, a

loucura cotidiana da personagem. Estamira representa o real que se aproxima de

uma loucura hipnotizante. É filósofa da vida, brinca com as palavras, a fotografia

enobrece o discurso da personagem. Ouvir as palavras, exaltar a fala são pontos-

chave do filme. Essa experiência de dar voz a sujeitos está presente desde o

Cinema Novo, mas ganha força em filmes, na década de 2000. Pro dia nascer feliz

(2007), de João Jardim, e Em trânsito (2006), de Henri Gervaisau reforça a presença

do ouvir o sujeito.

A opção em fazer um filme que dá voz ao outro é muito mais do que

apresentá-los como sujeitos da fala. É saber que esses sujeitos donos do discurso

podem conduzir a expressão cinematográfica com grande subjetividade e muita

identidade. O filme nasce dessa intervenção construída pela interferência da câmera

no universo dos personagens.

João Moreira Salles, um dos poucos cineastas que privilegia a câmera de

observação, não considera que os personagens têm que necessariamente ser bons

contadores. A visão do diretor é que o outro pode ser retratado de maneira diferente,

sem que a palavra esteja presente. Vias de regra, para se ter um bom personagem é

preciso ter um bom foco. Em Nelson Freire (2003), dirigido por Salles, a câmera está

sempre a observar pequenos gestos; no silêncio, estão presentes algumas sutilezas.

Em Santiago (2007), Salles evidencia que a observação é realmente a sua grande

influência, evidenciada no cinema direto americano. A forma com que o diretor

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trabalha com as imagens, por certo, não privilegia com mais entusiasmo o som da

palavra, mas a ausência do som

Com a intensificação do uso das câmeras, o audiovisual se torna instrumento

de luta. Os grupos, associações e representantes de classe se elevam no debate da

identidade social e tornam o outro das produções uma forma de se

autorrepresentarem, são de fato os sujeitos do discurso e utilizam de suas próprias

visões e logística para difundir o pensamento. Experiências praticadas pelos

integrantes da Central Única das Favelas – (CUFA), pelo projeto Vídeo nas Aldeias,

e milhares de outros projetos de grupos minoritários espalhados pelo país, que

almejam expor sua visão de mundo.

A possibilidade de fazer o filme com o outro, dividir a coautoria, é chamada

pelo teórico Robert Stam de “autor híbrido”. O sujeito sociológico deixa de ser o

objeto do filme para dar as suas interpretações e se meter na criação. Ouvir o outro

é fazer com que o personagem dê um depoimento aberto. A entrevista pode ser

considerada mecânica, mas o depoimento tem fluxo. No momento do depoimento

aberto e fluido, a câmera abandona a sua autonomia para ouvir a voz de quem

testemunha um fato; é um instante de entrega e fascínio pela história que está

sendo contada. Em certo sentido, o cineasta se abdica de cortes para deixar que o

outro fale.

É claro que deixar o outro falar não significa se ausentar de conhecimentos

técnicos e linguísticos por parte do cineasta. Grandes obras são construídas e

permanecem como tal porque sabem aliar o conhecimento, a subjetividade e o saber

ouvir, ou melhor, dar voz ao sujeito.

1.2. Documentário no mundo

A história do documentário mundial passa por algumas tendências, mas o seu

desenvolvimento mais extraordinário se deu, sem dúvida, durante e pós a Segunda

Guerra Mundial.

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Destaque para o movimento neorealista que surgiu na Itália com os filmes

Roma Cidade Aberta (Roma, Città Aperta, 1945), sob a direção de Roberto

Rosselini, e Sciuscià (1946), de Vittorio de Sica’s. Estas duas produções foram a

grande escola, na qual documentaristas foram influenciados pela utilização de uma

linguagem mais despretensiosa e, ao mesmo tempo, compromissada em refletir a

realidade da época.

O neorealismo, que misturou imagens reais, ou que podemos chamar de

documentais com a ficção, apresentava a experiência da câmera compromissada

em denunciar os horrores da guerra e da devastação que o povo estava vivendo.

Neste movimento, tanto a ficção que entrava no documentário (imagens com

apelo da realidade) como o documental que se preenchia com a ficção se tornaram

uma referência para produções e experimentações de muitos outros cineastas para

a chamada poesia do documentário. Esta denominação, citada por Erick Barnouw,

em seu livro Documentary: a history of the non-fiction film (1993), denomina alguns

realizadores como poetas, por terem um papel importante na construção da história

do documentário e também por saberem utilizar com maestria a linguagem

documental durante e pós a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), fato histórico que

envolveu mais de 100 milhões de militares.

De acordo com Barnouw (1993), durante décadas, a máquina magnética de

gravação de som foi ignorada. O aparelho, inventado na Dinamarca de 1989 por

Valdemar Poulsen, trouxe evolução às gravações, proporcionando alto nível de

perfeição durante a guerra na Alemanha.

Para Barnouw, o trabalho dos poetas documentaristas foi construir uma linha

persistente de formas e montagens que atravessou décadas depois da guerra e

influenciou o modo de fazer documentários no mundo inteiro. Eles produziam com

percepção individual e com espírito de inovação, e deixavam transparecer que a

busca pela arte do fazer era superior ao simples fato de terem que realizar filmes

para o mercado, sejam eles instituições ou governos.

O desenvolvimento rápido da televisão depois da guerra foi um dos fatores

predominantes para o declínio dos chamados poetas documentaristas. A TV oferecia

espaços limitados para o que era considerado experimento de vanguarda. Alguns

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tradicionais sofreram com a situação e começaram a viver à margem, outros

fecharam alguns centros de produção.

Por muito tempo, a guerra permaneceu como área principal de interesse,

especialmente, quando nas imagens não se encontrava um refúgio de luz sobre a

vida. Entretanto, alguns conseguiam enxergar além da guerra. Em Paris 1900

(1947), Nicole Védrès retratou a cultura e a vida parisiense anos antes da Primeira

Guerra Mundial.

Filmes feitos por antropólogos cresceram intensamente depois da guerra,

estimulados, em parte, pela experiência dos conflitos. A esse subgênero, foi

atribuído o nome de Etnoficção ou Documentários Etnográficos. Um dos destaques

desta corrente foi o cineasta Jean Rouch. Nascido em Paris, trabalhou como

engenheiro durante a guerra, em construções de pontes na Nigéria, na época,

colônia francesa.

Rouch se interessou rapidamente pelo estilo de vida africano, deixou a

construção civil e passou a se dedicar à direção de filmes etnográficos. Para

Barnouw (1993), Rouch expressa, em seus filmes, a vida do homem na África de

forma magistral, sem ser autoral, compartilhando o filme com os nativos.

Entre suas obras, estão: Hippopotamus Hunt (1946) e The Rain Makers

(1951). Seus filmes foram se tornando uma influência inovadora no campo do

documentário.

Na contramão do filmes de guerra, um jovem documentarista de apenas 24

anos de idade chamado Arne Sucksdorff começou a despontar e se tornar tendência

no cinema. Seus filmes de estréia, August Rhapsody (1940) e This Land is Full of

Life (1941) (este último uma adaptação do texto feito pelo poeta sueco Harry

Martinson), foram considerados produções que se deslocam dos temas produzidos

por outros filmes da época, por se tratarem de contextos neutros em relação à

guerra.

Com a sua experiência no desenvolvimento de uma câmera mais tranquila e

contemplativa, Arne Sucksdorf se tornou a maior figura do cinema sueco, inclusive

seus filmes se tornaram referência mundial.

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Na infância, Sucksdorff passou períodos longos a explorar solitariamente o

mundo dos animais. Ganhou a simpatia das raposas, lontras e outros seres da vida

selvagem. Sua família vivia em um lugar rodeado de bosques e criou, em sua

propriedade, um pequeno zoológico no qual o pequeno Arne dedicava horas a

brincar com os amigos selvagens.

Considerado um estudioso nato das ciências naturais e seguindo na direção

da arte, uniu as duas paixões e começou a fazer filmes sobre a vida na floresta.

O documentário poético de Sucksdorff, lançado em tempos de guerra, provocou

ecos em outras nações, incluindo as terras ocupadas pelo Nazismo, e a excelência

de suas obras se tornou tendência entre os documentaristas.

Seu primeiro filme realizado para a Indústria Cinematográfica8 foi um enorme

sucesso popular. A narrativa de A Summer’s Tale (1941) seguia uma raposa em sua

aventura na selva. Sucksdorff apresentava suas produções com um raro senso de

ritmo e estética. Momentos de encantamentos em seus filmes eram comuns, assim

como a crueldade, retratada abertamente, sem comentários ou julgamentos. A

fotografia era preenchida pela textura das gramas, folhas, samambaias; seus planos

em close-up mostravam os olhos e os pêlos dos animais.

Curiosamente, Arne Sucksdorff foi acusado de crueldade e sadismo por

causa da performance apresentada pelos animais em seus filmes. Alguns

consideraram que o diretor havia utilizado o mesmo método de gravação de Robert

Flaherty em Nanook of the North, no qual a morsa sofre uma terrível truculência para

a sequência de gravação.

Sucksdorf se defendeu das acusações dizendo que as ações eram naturais e

que não havia controlado absolutamente nada em seu set de filmagem.

Anos mais tarde, já com fama em toda a Europa, o diretor ganhou o mundo.

Por um longo período, foi diretor de escola de cinema no Brasil, dando aula para

muitos jovens que se tornariam grandes documentaristas no país. Depois da

docência, Arne se encantou com o Pantanal mato-grossense e se instalou nessa

região por muitos anos.

8 Para Svensk Filmindustri.

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1.3. Documentário no Brasil

Este tópico não tem a pretensão de fazer um panorama detalhado da história

do documentário no Brasil. Por certo, um relato histórico do documentário brasileiro

ainda está por ser escrito. Cabe aqui não uma compilação exaustiva do gênero, mas

fazer uma base para a construção teórica que será apresentada nas outras partes

deste trabalho.

Apresento algo particular de como o universo da nãoficção está delineado no

país, principalmente a partir da retomada do cinema após o desgoverno de

Fernando Collor de Mello que, ao tomar posse, encerrou as atividades da Empresa

Brasileira de Filmes (Embrafilme) e do Conselho nacional do cinema (Concine),

abrindo um vazio na produção de filmes tanto de ficção como de nãoficção no país.

Para se ter uma ideia dos problemas enfrentados por produtores e cineastas,

Amir Labaki (2006) apresenta, através de sua pesquisa, a evolução lenta do gênero

depois da crise provocada pelo governo de Fernando Collor. Em 1998, dois

documentários haviam estreado em salas de cinema no país; em 1999, foram

quatro; em 2000, foram seis; oito, em 2001; onze, em 2002; caiu para cinco, em

2003; em 2004, foram exibidas dezessete produções; e, em 2005, treze

documentários.

Anterior a essa crise a história do gênero no Brasil se cruza com a história de

Humberto Mauro, um grande incentivador do cinema a partir de 1932, no governo de

Getúlio Vargas. Mauro criou o Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE), em

que o lema era o cinema como o livro das imagens luminosas.

Consuelo Lins (2008) observa, com Jean-Claude Bernardet, que a produção

cinematográfica no Brasil está muito ancorada em leis de incentivo, o que acaba

enfraquecendo qualquer possibilidade de um movimento mais intenso, justamente

porque esbarra na burocracia. Não existe um mercado formado, um filme que

banque bilheteria do cinema brasileiro; em se tratando de produções documentais,

essa realidade é ainda mais cruel. Mecanismos de circulação e produção, que

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poderiam mudar essa realidade, na qual se inclui a televisão, quase não têm

participação nas produções ou estímulo para produtores independentes.

O documentário no Brasil tem grande participação na formação de muitos

cineastas. A maioria deles teve, na experiência com o gênero, a base para a

realização de seus filmes ficcionais. Sendo assim, a nãoficção funciona, para muitos

cineastas, como laboratório. Eles experimentam um universo rico de linguagens e é

na montagem que o documentário ganha corpo, amplitude. Não existiria Tropa de

Elite (2007), de Eduardo Padilha sem Ônibus 174 (2002); assim como não existiria

Central do Brasil (1998), de Walter Salles sem que antes houvesse Socorro Nobre

(1995); Cidade de Deus (2002), de Fernando Meirelles, também veio de Notícias de

uma Guerra Particular (1999), de João Moreira Salles e Kátia Lund. São obras

ficcionais que tiveram grande projeção no cenário nacional e que beberam da fonte

da produção de um documentário, que se utiliza de linguagens mais flexíveis e está

totalmente aberto para o improviso.

Na década de 1990, João Moreira Salles e Marcelo Masagão despontam

como revelações na carreira nãoficcional no cenário nacional, o primeiro com

Notícias de uma Guerra Particular (1999) e Nós que aqui estamos por vós

esperamos (1999) de Masagão, respectivamente.

O crescimento da produção de documentários no Brasil, especialmente a

partir da década de 2000, não coloca o gênero no patamar de grande produtor de

narrativas. Consuelo Lins (2008, p. 31) destaca a posição de Jean-Claude

Bernardet, o qual adverte que “o crescimento da produção do gênero não se trata do

enriquecimento da dramaturgia e das estratégias narrativas”. As produções,

segundo ele, estariam contaminadas com a banalização do jornalismo praticado pela

televisão, algo como “eu pergunto, você responde”, num instinto robótico do fazer

documentário.

Cabra Marcado para Morrer9 (1964/1984), do diretor Eduardo Coutinho, é

considerado o grande divisor de águas na produção de documentários brasileiros,

revolucionando o modo de fazer audiovisual no Brasil. Jean-Claude Bernardet afirma

9 Entre muitos prêmios que recebeu, o filme foi destaque nos Festivais: Cinema Du Réel de Paris e

em Havana, Cuba, além de ter uma grande projeção no mundo do cinema, dentro e fora do país.

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que a obra de Coutinho representa o modo de fazer documentários. Com grande

maestria ele, rompe com o cinema moderno dos anos 1960 e 1970 e influencia as

produções realizadas a partir dos anos 1980 e 1990.

Em Cabra Marcado, Coutinho está presente nas imagens, junto com a sua

equipe de gravação. Seu objetivo é contar a história do líder camponês João Pedro

Teixeira, assassinado por latifundiários. Na versão inacabada de 1964, o diretor

mistura ficção e cenas reais para estruturar a narrativa. A esposa do camponês,

Elizabeth Teixeira, desempenha o seu próprio papel. Mas o filme não pôde

prosseguir, por conta da ditadura militar. Passaram-se 17 anos até que o diretor

retomou o projeto do filme, e buscou reencontrar os personagens que encenavam a

história. Coutinho encontrou algumas resistências, mas, ao se deparar com

Elizabeth anos depois, entendeu que a busca naquele momento era contar a história

interrompida, mas que, agora, eram histórias individuais dos camponeses que

conseguiram sair daquele drama social.

Cabra Marcado, de 1984, gera um filme aberto para as reflexões do sujeito,

muitas vezes contraditórias, mas que queria apresentar as complexidades das

representações dos personagens. Coutinho inaugura, no Brasil, uma estética

singular porque faz com que pessoas reais estejam à vontade ao se deparar com a

câmera. O diretor, em muitos momentos, opta por não cortar as falas, expondo

abertamente a visão política daqueles camponeses anônimos. No livro de Consuelo

Lins (2007), Ismail Xavier diz que o filme encerra o período “estético e

intelectualmente mais denso do cinema brasileiro”.

O filme influenciou muitos documentaristas, foi considerado por uma

pesquisa10 realizada no ano 2000 como o melhor filme de nãoficção rodado no

Brasil, premiado em vários festivais no mundo.

No filme, Eduardo Coutinho filia-se ao cinema verdade francês ao colocar

sequências abertas entre os personagens e a equipe – o fotógrafo, o técnico de

som, o diretor. Disposto à improvisação, Coutinho alia a linguagem clássica com

experiência de televisão, imagens em movimento chegando ao local de gravação.

10

Essa pesquisa foi realizada pelo Festival É tudo verdade, dirigido por Amir Labaki.

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Ele hibridiza os recursos de linguagem, obtendo um excelente resultado em seus

trabalhos.

Na década de 2000, há um esforço por parte de produtores independentes,

Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura e outras Instituições11 em busca

do desenvolvimento do gênero no país, principalmente quando é lançado o

programa DOCTV, que vai ao encontro do fomento da produção e teledifusão do

documentário brasileiro.

Lançado em 2003, o programa ofereceu maior visibilidade ao documentário

na televisão, representando um grande momento na relação entre produtores

independentes e a TV Aberta, feito inédito na história do cinema nacional. O DOCTV

é o maior programa do país em matéria de produção documentária. Antes de sua

criação, o Ministério da Cultura recebeu, em 2001, o total de 201 inscrições: nas três

primeiras edições do programa, foram totalizadas 2.310 inscrições12, um salto

significativo na busca da realização de filmes de não-ficção no país.

Atualmente, a projeção de imagens reais ganhou status na televisão, na

internet, nas exposições de arte, e circulam com maior frequência. Consuelo Lins

(2008) indaga se essa nova situação do documentário brasileiro, a popularização de

imagens reais (sejam violentas, banais, ou infinidade de outros temas encontrados

no cotidiano), será essa realidade o propósito para romper com a indiferença? Seja

qual for a resposta, o fato maior é que mais programas estão sendo lançados

apontando a expectativa da realização de obras no Brasil que se destinem à

autorrepresentação, identidade, produção de linguagens e à diversidade de trocas

culturais.

Diante da crescente produção de documentários almejados por cineastas e

jovens aspirantes pela busca do real ou de imagens que sugerem a realidade, o

documentário se torna um instrumento de variadas práticas culturais.

11

Junto com a Secretaria do Audiovisual estão a fundação Padre Anchieta/TV Cultura e a Associação Brasileira

das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec). 12

Fonte: A produção de documentários através do DOCTV, de Verena Carla Pereira. Disponível em: http://www.revistas.univerciencia.org/index.php/rumores/article/viewFile/6542/5949

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1.4. O documentário em terreno desterritorializado

A partir do momento em que as tecnologias passam a ser exploradas por um

grande números de pessoas cada vez mais interessadas na cultura da imagem, o

documentário ganha projeção na tela do computador, um terreno desterritorializado.

Essa cultura da imagem no contemporâneo será compreendida agora por um

recorte que considero muito interessante. A visão do antropólogo indiano Arjun

Appadurai (2002) vai priorizar, esquematicamente, as paisagens para dispor as

nuances no mundo global, suas relações de poder, a vida cotidiana e as paisagens

que interferem diretamente no Estado.

É através deste estudo da cultura que Appadurai apresenta algumas

particularidades para descrever a desterritorialização em que vivemos e revelar a

localidade nesta conjuntura.

Para antecipar o que virá nos próximos capítulos e sugerir uma visão do

quadro experienciado pelo documentário atual, apresento esse recorte da visão de

Appadurai. Embora seja uma contextualização breve e pontual, vai nortear as

dinâmicas sociais que serão observadas no Capítulo 2.

Para explicar sobre as paisagens do mundo atual, que são interativas,

Appadurai vai compor cinco dimensões de fluxos culturais globais, são elas:

etnopaisagem (etnoscape) mediapaisagem (midiascape), tecnopaisagem

(tecnoscape), financiopaisagem (financialscape) e ideopaisagem (ideoscape).

Apesar de todas as dimensões serem importantes, não teria condições, em

apenas uma parte deste capítulo, fazer um tratado sobre o relevante trabalho de

Appadurai. Desta forma, considero, para o tema sugerido, refletir sobre a

mediapaisagem de forma sucinta, sem deixar de lado a influência, por exemplo, da

tecnopaisagem e da etnopaisagem.

Agregam-se ao sufixo ‘paisagem’ as perspectivas moduladas pela localização

histórica, linguística e política de diferentes tipos de atores. Esses atores são

empresas multinacionais, comunidades da diáspora, grupos e movimentos

populares, aldeias, bairros, famílias e os Estados-nação.

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O entendimento de mediapaisagem neste conjunto de atores revela a

produção e a disseminação de informação. Com os fluxos de informação dado de

forma todos-todos, proporcionada pela internet, há muitos interesses privados e

públicos em imagens do mundo, criados não somente pelos meios de comunicação,

mas por sujeitos ativos que agora se apropriam das ferramentas tecnológicas para

compartilhar ideias.

Para Appadurai, o aspecto mais importante da mediapaisagem é o vasto e

completo repertório de imagens, narrativas e etnopaisagens a espectadores de todo

o mundo.

Esse repertório, até bem pouco tempo atrás, era explorado por poucos

indivíduos pertencentes à classe média e média alta, que se permitiam “as fantasias

e imaginações em práticas restringidas a momentos e lugares especiais”.

Com a tecnologia e a mídia, isso vai se modificar radicalmente. O pesquisador

indiano vai contextualizar, através do papel da imaginação em uma sociedade, toda

a sua importância para a modificação do que conhecemos hoje por mundo global e

seus efeitos para esboçar a produção e distribuição da cultura do século XXI.

A imaginação, dentro da localidade (experiências vividas por bairros,

famílias, de forma micro), tem adquirido uma força nova e singular na vida social que

a projeta para este mundo globalizado e cada vez mais desterritorializado.

A imaginação – expressa em sonhos, canções, fantasias, mitos e

contos – sempre constou do repertório de qualquer sociedade que

esteja de algum modo organizada culturalmente. Mas na vida social

de hoje a imaginação tem uma força nova e singular. Mais pessoas

em mais partes do mundo consideram possível um conjunto de vidas

mais vasto do que nunca. Uma fonte importante para esta mudança

está na comunicação de massas, que apresenta um sortido rico e

sempre variado de vidas possíveis (APPADURAI, 2002, p. 77).

Esse terreno de desterritorialização cria novos mercados para agências de

viagens, empresários das artes e para as produtoras de filmes. A grande intenção

destes segmentos (finaciopaisagens) é proporcionar para as pessoas que estão

desterritorializadas com o país de origem que entrem em contato com a sua cultura,

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em contrapartida, mostra para outras pessoas os costumes de uma localidade

diferente.

Exemplo desta potência para a mediapaisagem é o documentário Passaporte

Húngaro (2002), da cineasta brasileira Sandra Kogut, no qual ela vai buscar na

Hungria, local de suas raízes familiares, as respostas que precisava para entender,

entre outros fatos, o sentido de nacionalidade.

É na questão da tecnopaisagem que as mudanças são diretamente

observadas, quando esta estimula alterações da ordem cultural global,

impulsionando a produção do cinema, da televisão e do vídeo com o efeito do papel

da imaginação na vida pessoal.

Arjun Appadurai afirma ser impossível estudar novos cosmopolitismos sem

analisar fluxos culturais transnacionais em que, por excelência, estão imbricadas as

relações entre espaço, estabilidade e reprodução cultural.

Essa dinâmica cultural em forma de imagens na web encerram muitas

inflexões definidas pelo autor como complexas, já que estão pautados conforme o

seu gênero (documentário ou ficção), as suas ferramentas (eletrônicas ou pré-

eletrônicas), os seus públicos (local, nacional, transnacional) e os interesses

daqueles que os detêm e controlam. Até esta parte do trabalho, relatei o

desenvolvimento do gênero documentário. No próximo capítulo, abordo a

cibercultura como fato importante na vida social e como isso vai transformar e

influenciar o documentário.

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CAPÍTULO 2

2.0. Ambiente comunicacional na Cibercultura

Neste capítulo, proponho a reflexão sobre a Cibercultura para compreender o

documentário na contemporaneidade. Para isso, o autor André Lemos tem papel

importante para fundamentar teoricamente o entendimento da sociedade em

constante busca pela imagem.

A pós-modernidade é o terreno fértil para o desenvolvimento da Cibercultura,

fruto da simbiose entre tecnicidade e socialidade.

As várias formas de produção de conteúdo produzido para a internet se

moldam conforme o terreno o possibilita. Consequentemente, os webdocumentários

são apresentados para diferentes olhares, diferentes leitores, o que demonstra a

diferença de muitos trabalhos na Cibercultura com a origem no gênero

documentário.

A técnica aplicada à rede, em tempo real, permite uma comunicação

individual, personalizada e bidirecional. Isso causa mudanças na produção e

distribuição do conteúdo, afetando diretamente no modo de se fazer documentário,

televisão, jornal, revistas e rádios. De acordo com André Lemos (2008, p. 79), “a

tecnologia digital proporciona, assim, uma dupla ruptura: no modo de difundir as

informações (modelo Todos-Todos). Alguns autores chegam mesmo a falar de um

domínio dos meios de produção pelo público”.

André Lemos vai buscar na sociologia de Michel Maffesoli a explicação para a

atual paisagem social diante das novas tecnologias e sua influência no cotidiano da

sociedade. Para Maffesoli, a pós-modernidade é formada por várias tribos13, o que

se opõe à ideia do individualismo marcado na modernidade. Entendo como pós-

13 A utilização do termo tribo está ancorada na explicação de Michel Maffesoli no qual “O trabalismo refere-se, (...), à vontade de estar-junto (être-ensemble), onde o que importa é o compartilhamento de emoções em comum. (LEMOS, 2008, p.85)

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modernismo uma ruptura cultural, iniciada no modernismo, e que rompe com as

tradições. Apesar de haver uma tensão sobre o termo pós-moderno entre vários

autores, neste trabalho, utilizo a compreensão de Jean-Francois Lyotard (1979), na

qual as comunicações linguísticas farão com que a conexão entre sociedades seja

instaurada e não mais como um campo de conflito. Contribui também para o

entendimento do termo as mudanças de fluxos, observadas através das dimensões

de Arjun Appadurai (1996), como principais pontos de ruptura do mundo pós-

moderno, sendo os meios de comunicação eletrônicos e a migração a principal

interferência na imaginação e na subjetividade do homem contemporâneo.

A Cibercultura é resultado da fusão das novas tecnologias de base

microeletrônica e da socialidade contemporânea, onde está presente o tribalismo,

presenteísmo, erotismo e a violência.

De forma vitalista, Lemos (2008) interpreta que este desenvolvimento

tecnológico vivido atualmente não pode ser apenas um agente de separação,

esgotamento de vínculos sociais e alienação, mas também pode ser uma força

capaz de formar relações de cooperação e de solidariedade entre os indivíduos.

A Cibercultura, como proposta de uma nova forma de viver a cultura, é uma

janela aberta, onde o documentário está inserido. Entendê-la em uma visão social é

importante pelo seu atual estágio de total conexão entre as pessoas.

Na pós-modernidade, existe uma desterritorialização da cultura proporcionado

pelo tempo real imediato (que esculpe o espaço) e pelas redes telemáticas, que

também suprimem o espaço. Essa desespacialização atinge diretamente as

estruturas econômicas, sociais, políticas e culturais.

A dinâmica social vivida atualmente traduz o desejo de as pessoas se

conectarem através do ciberespaço, comunicando-se de uma maneira direta, eficaz

e imediata.

De acordo com Pierre Lévy (1999), essa comunicação através do ciberespaço

se dá de forma universal sem ser totalitária, porque incide sobre trocas de

informação bidirecionais sem que haja uma homogeneização de sentidos, havendo

multiplicação de muitas vozes e pensamentos diferentes.

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Enquanto Lemos (2008) fala de tribalização dos meios, Jean Baudrillard

(1993) e Paul Virilio (1993) entendem que o ciberespaço permite apenas uma

simulação de interação e não verdadeiras interações entre os internautas.

Para Baudrillard (1993) o excesso de informações faz com que haja um

distanciamento cada vez maior de uma comunicação de fato. Seria uma imersão em

um espaço altamente destrutivo, no qual o internauta se torna passivo e responde

apenas a alguns estímulos imediatos.

Como define Lemos, “a cibercultura é uma configuração sociotécnica de

produção de pequenas catástrofes que se alimentam das fusões, impulsões e

simbioses contemporâneas: o usuário interativo da Cibercultura nasce do

desaparecimento do social (Baudrillard) e da implosão do individualismo moderno”.

Lemos usa a referência de Baudrillard, que projeta de forma pessimista os

sentidos da atual utilização dos meios tecnológicos, mas, ao mesmo tempo, vê uma

luz de equilíbrio, no qual todos poderão se expressar e caminhar para um

conhecimento em comum, o que Pierre Lévy vai chamar de inteligência coletiva. “A

ideia de uma comunicação racional, instituindo uma sociedade iluminada e sem

ambiguidades é, no fundo, um sonho totalitário” (LEMOS, 2008, p. 76).

A nova conjuntura sociocultural é denominada por Gilles Deleuze e Félix

Guatarri como um modo esquizofrênico do capitalismo, herança do homem

consumidor da modernidade e que se emoldurou ainda mais na vida pós-moderna.

Diante deste fato cada vez mais crescente do consumismo, a técnica ganha força

simbólica e, ao mesmo tempo, mítica na sociedade.

A máquina (técnica) se enquadra no cotidiano pós-moderno como um objeto

de extrema importância para as relações pessoais, e claramente nas paisagens

econômica, política e midiática.

Lemos (2008) apresenta as ideias do filósofo Gilbert Simondon, que oferece

uma contribuição importante do papel da máquina e sua relação com o indivíduo,

que ainda estabelece uma distância de seu objeto principal.

Para Simondon, ainda não nos conectamos de forma equilibrada com a

técnica; há sempre um momento de tensão e ruptura, como ao considerar que a

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máquina não faz parte da cultura em seu aspecto mais natural do desenvolvimento

de um trabalho.

A técnica, que sempre esteve presente na vida social do homem, agora se

torna um personagem principal incompreendido, como apresentado pelo filósofo.

Lemos (2008, p.30) cita um pensamento de Simondon para tratar da relação

com a máquina: “A mais forte causa de alienação no mundo contemporâneo reside

nesse desconhecimento da máquina, que não é uma alienação causada pela

máquina, mais pelo não conhecimento de sua natureza e de sua essência, pela sua

ausência do mundo das significações, e pela sua omissão na tabela de valores e

dos conceitos que fazem parte da cultura.”

Para o autor, a sociedade vive um momento sui generis, já que é neste

começo de século XXI que a humanidade reconhece o valor da técnica e esta se

impõe como força simbólica e mítica. A máquina se torna um grande símbolo.

A propósito dessa relação homem e máquina no universo das artes,

especificamente o documentário passa a ter os movimentos de metamorfoses,

mudanças que envolvem estímulos para a informação e a comunicação imediatas.

Em toda a sua explicação, Lemos instiga a fazer uma leitura do objeto técnico

na sua história e trazê-la para a sociedade contemporânea. Das atualizações14 nos

vaudevilles15 aos documentários didáticos, de Grierson16; dos documentários de

conversa, de Eduardo Coutinho17 exibidos em salas espalhadas pelo Brasil aos

documentários hospedados na internet, a circulação toma projeção antes

inimaginável, tornando o cotidiano social suporte de experiências estéticas, tanto no

sentido da arte, e do belo, como no sentido de comunhão, e de emoções

14

Entre 1895 a 1906, os simples registros eram chamados de atualizações, porque apenas apresentavam o quotidiano social sem nenhum tipo de montagem.

15 Os vaudevilles eram lugares na França (presentes na época dos irmãos Augusto e Louis Lumière),

onde se passava os filmes em vários atos, às vezes durando de 10 a 20 minutos. Junto com os filmes, havia atrações como comédia pastelão, declamação de poesia, apresentação musical, entre outros.

16 John Grierson é um cineasta escocês, que, a partir de 1933, lidera um movimento em favor do

documentário de cunho didático na Inglaterra.

17 No livro Introdução ao documentário brasileiro de Amir Labaki, Eduardo Coutinho figura como um

dos mais importantes documentaristas brasileiros.

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compartilhadas. Agora, “trata-se de uma sociedade que aproxima a técnica (o saber

fazer) do prazer estético e comunitário” (LEMOS, 2008, p. 17).

Em um artigo publicado pela Universidade Federal Fluminense, a

pesquisadora Andréa França18 (2004) discorre, de forma pertinente, sobre o cinema

contemporâneo, a partir do pensamento de Foucault.

Na ótica da desterritorialização proporcionada pelas redes telemáticas,

Andréa França observa que as “imagens do mundo inteiro que estão ali para

informar, explicar, integrar tudo e todos numa espécie de consensualismo”.

Esse consensualismo vem imbuído de uma carga de interrogações, visto que

a sociedade, segundo Jean Baudrillard, é fruto de sua própria ignorância e ao

mesmo tempo de suas ações. Nessa comunicação consensual transborda questões

sobre o que produzimos, veiculamos e consumimos como arte, e como analisar as

imagens de um documentário em um mundo que é constituído por vários tipos de

imagens.

Se, antes, a vida social era limitada a algumas aventuras através de técnicas

que estivessem ao alcance de alguns poucos letrados pertencentes a uma camada

que tinha condições de adquiri-las, com a civilização contemporânea, imersa na

modernidade líquida de que trata Zygmund Baumman (2001), temos um universo

técnico que é independente da vida social.

O panorama social no qual se insere a sociedade de hoje, baseado na

energia nuclear, na engenharia genética, na informática como pano de fundo da

cibercultura, apreende, cada vez mais, uma dimensão intangível, já que lhe permite

escapar do tempo linear e do espaço geográfico, o que a direciona para

questionamentos sobre os rumos dessa civilização. Não diferente, o documentário,

inserido neste sistema técnico tem seu papel como formulador de propósitos

subjetivados pelas tribos.

E é nessa realidade social, fruto da desmaterialização de muitos processos e

de simulação do mundo potencializados pelos computadores que, enquanto

18

O artigo “Foucault e o cinema contemporâneo” foi originalmente apresentado sob a forma de comunicação no evento Foucault Hoje?, realizado de 23 a 26 de novembro de 2004, na Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF).

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pesquisadora, me esforço para compreender o documentário quando inserido em

um ambiente comunicacional rizomático.

Este cenário de nova ordem cultural, com a junção das novas tecnologias do

ciberespaço e a socialidade contemporânea, é o que Lemos vai propor em seu livro

como a cibersocialidade, que vai mostrar o extrato das práticas sociais no cotidiano

da sociedade ocidental como uma ressacralização, um reencantamento do mundo

através de cabos de fibra ótica, que cria um elo entre o eu e o mundo.

Na cibersocialidade, as dimensões lúdica, erótica, hedonista e espiritual são

potencializadas. No movimento diacrônico, os atores sociais atualizam essas

dimensões através da tela do computador, que é a fronteira entre o individual e o

coletivo, produzindo a construção cultural na contemporaneidade.

A cibercultura é resultado dessa força que corrobora com a realidade

aumentada proporcionada pelo ciberespaço.

A tela é a fronteira entre o individuo e o coletivo, entre o orgânico e o artificial, entre o corpo e o espírito. O ciberespaço é o espaço simbólico onde se realizam, todos os dias, ritos de passagem do espaço físico e analógico ao espaço digital sem fronteiras (LEMOS, 2008, p.132).

Para Lemos (2008), a cibercultura é uma verdadeira infognose, que seria a

comunicação na qual as pessoas podem chegar a um conhecimento superior, um

saber epistemológico. É como um rito de passagem em direção à desmaterialização

da sociedade pós-industrial. Sendo o documentário uma forma de comunicação,

observar como esta linguagem está inserida no universo da internet se torna

importante para a leitura do objeto comunicacional.

Lemos vai colocar que, no instante em que o sujeito se conecta com este

outro mundo, abre-se para uma realidade aumentada, que rompe com o sagrado em

plena luz do dia, um lugar de hierofania, onde é revelada a experiência de outro

mundo e está diretamente ligada ao tempo Kairós, quando o internauta perde a

noção do tempo por estar muito envolvido em determinada ação, passando para o

tempo das conexões.

Este mundo mágico possibilita que o tempo (junto com o espaço) não seja

mais o mesmo tempo progressivo da história. A projeção agora é do tempo

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presente, o presenteísmo, que envolve a socialidade contemporânea e as máquinas

do ciberespaço.

A socialidade se converte em uma multiplicidade de experiências coletivas,

que se ancora no universo imaginário, passional, erótico e violento do dia a dia.

Lemos pensa, junto com Maffesoli, que “todos os micro-rituais parecem ter esse

papel de desvio da técnica de sua função meramente utilitária, de agrupamento de

indivíduos em torno de uma atividade comum, de uma paixão compartilhada.

Poderíamos então falar que o destino da técnica moderna reside também na sua

apropriação dionisíaca e, assim, numa ressacralização, um reencantamento do

mundo”. Desta forma, Lemos une a socialidade de que trata Maffesoli com a

virtualidade do ciberespaço, demonstrando que a realidade virtual proporciona a

entrada para uma nova era, na qual todos estão inseridos. Novas práticas culturais

surgem a todo momento.

É na manifestação contemporânea da cibercultura que o documentário vai

ganhar nova projeção, se a circulação é crescente, logo podemos dizer que o vídeo

de representação social não está tão distante como antes, como nos tempos em que

o gênero tinha pouco espaço para exibição, distribuição e produção.

Com a telemática, qualquer lugar pode ser um espaço para se exibir, assistir

e interpretar um documentário.

Na tribalização dos costumes, em que as comunidades se agregam, e na

ênfase no tempo vivido como do agora, do tempo sempre presente, o documentário

se torna um poderoso instrumento da cibercultura em direção a convivência,

potencializando um dos modos de fazer cultura na cibersocialidade.

De acordo com A Galáxia Internet (2001) de Manuel Castells, o novo espaço

urbano criado é um grande ambiente de mobilidade ilimitada, um espaço feito de

intensos fluxos de informação e comunicação, o que podemos chamar de

hipermobilidade.

A hipermobilidade a qual Castells se refere é a possibilidade de configuração

múltipla dos espaços de trabalho, permitindo espaços de mobilidade ilimitada. Como

exemplo, podemos ver nos cibercafés, no carro, no aeroporto, no sítio, nas férias,

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nos hotéis, no lar, todos potencialmente se convertem em espaços de trabalho,

tornando-se ambientes inteligentes, nos transportando para uma televida.

Esta hipermobilidade se converte numa força produtiva, onde as grandes

cidades tendem a aproveitar o momento em que a criatividade cultural se torna

vantagem competitiva e fonte de riqueza.

2.1. Rumos do gênero documental frente a dinâmica da cibercultura

Se, durante a Segunda Guerra Mundial, o gênero documental alcançou um

número fantástico em produções, com a internet esse esgarçamento de obras é

impressionante. É por essa dinâmica crescente que envolve o documentário diante

da plataforma telemática que algumas indagações surgem no que se refere: qual é a

direção do documentário na era digital? Qual o futuro do gênero como meio

particular de comunicação? Quais os novos tipos de produção do documentário com

a internet? Terá algum modelo com a utilização da web? Como fica a questão da

representação tão estudada em documentários tradicionais?

Um ponto levantado por David Hogarth (2006), pesquisador de estudos de

comunicação da Universidade de Toronto, no Canadá, insere a seguinte questão: a

existência dos documentários em novas plataformas de distribuição passa a permitir

formas mais ou menos imediatas de comunicação global?

O pesquisador lança três perspectivas que fizeram o documentário mudar ao

longo dos anos. Nos primeiros tempos, o gênero documental era basicamente feito

por estados-nação, como visto na parte anterior; os patrocinadores eram

compromissados em apresentar para a população o que estava acontecendo na

guerra, em uma perspectiva muito particular de nação, até mesmo como uma forma

de moldar, de maneira expressiva, a opinião pública.

Para Hogarth (2006, p.122), essa já não é a realidade no século XXI, assim

como as representações e o sentido de verdade em filmes documentários:

O documentário não é mais uma forma cinematográfica nacional, produzido em primeiro lugar pelo estado-nação e suas instituições

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culturais. Segundo, o documentário não é mais um gênero a serviço público dedicado à representação de lugares e assuntos públicos, para públicos mais ou menos cativos. E finalmente, o documentário não é mais um projeto epistemologicamente seguro, no qual a verdade e o significado dependem de um índice determinado para o mundo.

Pensando nessa posição de Hogarth, observo que a representação do mundo

através das imagens documentais é alterada, quando pensamos na sua lógica

espacial/virtual da internet, traduzida por uma máquina binária. Há um deslocamento

do mundo nessa perspectiva. Por outro lado, fica a questão se realmente os

documentários realizados a partir da década de 1920 tinham um compromisso com

a verdade, ou com situações que expunham o real. Basta pensarmos no primeiro

longa-metragem do gênero realizado por Robert Flahert em Nanok of the North

(1922). Já sabemos que Flahert manipulou várias cenas, fazendo com que os

personagens encenassem o que estava sendo apresentado.

As imagens projetadas pela máquina são expressas por algoritmos, que é um

procedimento lógico. Essa lógica conduz à solução dos problemas através de uma

lógica de cálculo. Somente esta explicação da forma como as máquinas traduzem

as imagens já condiciona uma mudança das formas tradicionais com as quais eram

feitos os documentários, com a utilização de película, com grandes câmeras ou em

processos analógicos, através de fitas eletromagnéticas.

Lemos (2008) observa com relação às imagens, que passam pelo processo

numérico ou digital, “não se trata mais de representar o mundo, mas de simulá-lo”.

Dominique Wolton (2003) classifica como “doces utopias” o espaço transparente na

internet; com o documentário na web, a questão é sempre essa, de realidade

produzida e simulação latente.

Lemos (2008) defende que o modelo de uma realidade é simulado pela

imagem na contemporaneidade porque a potência de ter a realidade da natureza é

deixada de lado por conta da digitalização do mundo, no qual o mais importante é a

construção do conhecimento.

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A partir da última fase da cibercultura, o tecnorealismo19 que tem início em

1998, a utilização da internet propõe ações imaginativas que se ligam diretamente

ao realismo. Nesta esfera, a sociedade da informação se torna berço da cibercultura,

uma cultura muito mais propícia ao simulacro, a uma representação falsificada da

realidade.

Esta ordem comunicacional possibilitada pelo advento da internet não traz

tanto entusiasmo para muitos teóricos. Lorenzo Vilches (2003) faz uma análise

crítica em relação ao pensamento vitalista da internet.

Com o documentário se multiplicando na rede, o autor diz que o internauta

tem mais liberdade para interpretar mensagens, mas tem menor autonomia em

relação aos valores dominantes.

Os usuários da nova comunicação são menos dependentes da

cultura tradicional, mas mais dependentes das relações

interpessoais geradas na rede. [...] Mudança de conduta dos

usuários, ou se trata de uma ruptura cultural do conhecimento?

(VILCHES, 2003, p. 20).

2.2. A representação através da mediação digital: mudanças evidentes

Esse estar conectado com os mais diferentes dispositivos que nos ligam em

rede em qualquer circunstância, hora ou local do mundo faz com que a imagem

esteja presente no cotidiano.

19

De acordo com a pesquisa de André Lemos (2008), a cibercultura se divide em quatro fases. A primeira está vinculada ao chamado “nerdismo puro” e compreende os anos de 1976 a 1988. Esta fase é a subcultura da informática, os chamados hippies da informática que acreditam que o ciberespaço é de todos e querem que os computadores sejam um aparelho acessível e de fácil utilização. A segunda fase é chamada de tecnoanarquismo (entre 1989 e 1992), no qual há o amadurecimento da informática e as características rizomáticas e posturas anárquicas da rede são evidentes. O tecnoliberalismo (1992 a 1998) constitui a terceira fase, no qual a internet se expande para o comércio (e-commerce, e-business, e-money). A última fase tem início em 1998, e é denominada tecnorealismo, no qual o escritor R. U. Sirius diz que o realismo sem imaginação é mero reducionismo (nasce e logo morre).

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Esta é a era em que a tecnologia, ou a téchnè de que tratou Aristóteles,

condiciona a produção de muitas cópias de produções esta existentes há décadas,

mas que agora ganham projeção imensurável com o fenômeno técnico.

Há sempre uma imagem para revelar, uma determinada realidade a observar,

uma atualização do mundo que se apresenta.

Diante da possibilidade de fazer vídeos com qualquer aparelho de gravação,

seja ele um celular, webcam ou câmera de qualquer qualidade, é necessário traçar

um cenário do gênero documentário.

Para Lorenzo Vilches (2003), os computadores podem representar a

realidade, mas ao mesmo tempo podem alterá-la, direcionando-nos para um plano

real alternativo. O autor se ancora no legado de Marshal McLuhan que, em suas

teorias sobre as tecnologias, afirmava que a maior preocupação é o discurso sobre a

realidade.

Para McLuhan, o critério epistemológico do real é irrelevante. A

constituição da realidade não passa pelos pares binários:

linguagem/meios e realidade/imagem; e a constituição social da

realidade tampouco passa pelos meios (ibid., p. 67).

A perspectiva de que trata esse teórico ressalta que não é preciso julgar o

que é mais real ou menos real, já que as tecnologias de base eletrônica nos

reinstalam em um novo universo de significações.

Na linha de raciocínio de Lorenzo Vilches, o que tem de importante na

questão do documentário quando se trata das mudanças da representação da

realidade em seu valor teórico e, por conseguinte, as imagens realizadas através de

uma lógica é que as mudanças no mundo estão acontecendo e que o relevante são

os conteúdos culturais produzidos na migração simbólica entre espaço e tempo.

A representação da realidade é repensada com as tecnologias da imagem

porque esta é fundamental para a formação da percepção e da compreensão da

realidade no contemporâneo. Como se percebe, a imagem está em toda parte e

supõe um dos objetos para a tecnologia do conhecimento. Com o desenvolvimento

das tecnologias digitais da imagem, Vilches (2003, p. 201) identifica uma percepção

diferente das relações com os objetos, o tempo e o espaço: “A internet e as

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51

teletecnologias levam os sujeitos a desenvolver uma compreensão técnica da

realidade”.

Sendo a realidade uma mediação de processos, Lorenzo Vilches (op. cit., p.

254) observa, com Gilles Deleuze, que “o que se decompõe e recompõe é o próprio

movimento, não a realidade”.

A partir das ideias apresentadas, não há dúvida de que a informática alterou

os conceitos tradicionais de representação visual. Existe, no documentário feito para

a internet ou que está na internet, uma relação de hiper-realidade, que é

caracterizada por permitir a visualização de objetos inexistentes na natureza, mas

que podem alcançar níveis de simulação altíssimos, muitas vezes, maior do que a

semelhança, nos casos de reprodução dos objetos reais. Isso se deve ao poder que

o computador permite, através de suas fórmulas digitais. Com isso, documentários

foram realizados por meio de técnicas que implicam necessariamente na utilização

da informática.

A criação de imagens por meio da informática e das aplicações

virtuais da Inteligência Virtual a todas as formas de produção

humana conhecidas até agora não afeta só os objetos do mundo,

mas afeta também nossa própria situação espaço-temporal

(VILCHES, 2003, p. 201).

A noção de espaço passa a ser estreitada, proporcionando relações

interculturais mais expressivas, enquanto que a noção de tempo na pós-

modernidade é fundamental e passa a ser vivenciada como uma experiência do

próprio eu.

2.3. Documentário na rede: construção de conteúdo na internet

Os sujeitos que fazem seu cotidiano ser algo explorado pela câmera, seja do

celular, da máquina fotográfica ou de vídeo pensando em jogar essas cenas para a

rede, compartilha-o com qualquer indivíduo que não conhece, mas que pode, em

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algum lugar do globo, estar descolado do tempo e espaço real proporcionado pela

tecnologia.

Com câmeras baratas e dispositivos acessíveis, cineastas e pessoas comuns

produzem uma infinidade de vídeos que não constituem obras de arte, pois não

acompanham um rigor estético almejado pelos amantes da arte, mas não deixam de

ser documentos realizados por pessoas no cotidiano.

O documentário na web coloca grandes diretores e produtores anônimos em

um plano horizontal de divulgação. A voz do outro surge como estado de

contemplação. Você assiste, enxerga a posição do outro, esse atravessamento

cultural preenche-lhe em certa medida. Não há julgamento melhor que o público,

fora dos pequenos ou grandes circuitos. A internet se torna a grande expositora da

voz do outro.

O sociólogo francês Domique Wolton (2003), que tece uma teoria crítica das

novas mídias, explica, primeiramente, para amputar os que entendem que internet é

mídia, de que para a web ser classificada desta forma, deveria ter em sua

comunicação uma única direção. Por não ter essa característica, a informação

dentro da internet está em várias direções, com muitas interações, sendo dominada

por vários tipos de expressões. Por isso, não há mídia sem uma representação, o

que permite entender porque um grande número de atividades da internet não

depende de uma lógica das mídias.

A construção de conteúdos na internet é classificada pelo autor em:

informação-serviço, informação-lazer, informação-notícia ou imprensa e informação-

conhecimento.

Superando a questão da internet como mídia, Wolton dispõe de três pontos

para o sucesso das novas tecnologias e isso implica em sua existência nas

chamadas redes tribais.

Três palavras são essenciais para compreender o sucesso das

novas tecnologias: autonomia, domínio e velocidade. Cada um pode

agir, sem intermediário, quando bem quiser, sem filtro nem hierarquia

e, ainda mais, em tempo real. Eu não espero, eu ajo, e o resultado é

imediato. Isto gera um sentimento de liberdade absoluta, até mesmo

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de poder, de onde se justifica muito bem a expressão ‘surfar na

Internet’ (WOLTON, 2003. p. 85).

Demonstrando o sucesso das novas tecnologias, Wolton (op. cit.) traz à luz a

questão de Hogarth quando questiona sobre formas imediatas na comunicação

global proporcionadas pelas novas plataformas.

O autor enfatiza que as novas tecnologias encorajam a capacidade de

criação. Contudo, o desafio maior não consiste na comunicação a qualquer preço,

mas na gestão da maioria e na coesão das comunidades em um contexto aberto e

democrático.

De acordo com a nova forma de pensar a cultura, as possibilidades são

grandes e, agora, fazer um pequeno documentário para a internet é se lançar para o

mundo da rede.

O documentário se adaptou de forma dinâmica às possibilidades oferecidas

pelas novas tecnologias. Uma nova geração de documentaristas, assim como um

público antenado na prática audiovisual, utiliza câmeras portáteis e de fácil

manuseio para capturar o mundo histórico-social através de abordagens inovadoras.

Isso está transformando aspectos da cultura do documentário, a ponto de se

indagar: o que pode ser classificado como filme documentário? Essa reflexão será

feita a partir do próximo capítulo.

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CAPÍTULO 3

3.0. Documentário e a condição da simulação na era cibernética

A realidade condicionada pela era da informática aplica ao universo

documental várias nuances próprias de um espaço-tempo que já não é o mesmo

vivido, por exemplo, por produtores e cineastas das décadas de 1980 e 1990.

Pensando nesta mudança da base do documentário procuro, neste capítulo,

descrever quatro obras inseridas na internet. A pesquisa elencou centenas de

documentários, que certamente enriqueceriam o trabalho. Mas, para a reflexão

teórico-metodológica as escolhas se deram através do edital do Rumos Itaú Cultural

e pelos canais Youtube e Vimeo.

O Rumos Itaú Cultural, um importante canal de fomento de trabalhos de

artistas de vários segmentos, lançou, em 2009, um edital para que realizadores do

Brasil enviassem documentários realizados exclusivamente para a web. Com a

proposta de pensar o documentário na era da cibercultura, centenas de realizadores

foram estimulados a refletirem sobre a proposta. Foram escolhidas 12 produções,

dentre as quais duas foram selecionadas para este trabalho.

O primeiro documentário, O som do tempo20 (2010), do cineasta cearense

Petrus Cariry, propõe esta obra pensando na internet, dentro do edital do Rumos

Itaú Cultural. A obra narra a vida de uma senhora simples do nordeste. O segundo

trabalho, intitulado Restos21 (2003), escolhido através do canal Vimeo, é uma obra

do grupo Teia, coletivo de Belo Horizonte-MG que trabalha com documentários e

tem reconhecimento no país pelas obras que desenvolve no campo do audiovisual.

O documentário, dirigido por Cristina Maure e Pablo Lobato, trata sobre a questão

20

O documentário pode ser encontrado no site Youtube (extrato de 2 minutos) e na página do Rumos

Itaú Cultural, sessão documentários para web.

Youtube:http://www.youtube.com/watch?v=0n7SKRp9YcA. Rumos:

http://www.itaucultural.org.br/index.cfm?cd_pagina=2787&id=001768&titulo=O%20Som%20do%20Te

mpo&auto=undefined

21 Disponível em:http://vimeo.com/12005874. Acesso em: março 2012.

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do lixo em várias partes do mundo. A escolha consiste em observar como os

realizadores articulam um trabalho na web.

Webdoc Verdade22 (2011), o terceiro trabalho, através da metalinguagem, é

um documentário feito para pensar o gênero na internet. Foi extraído do Youtube e é

resultado de uma oficina do cineasta Jorge Bodansky realizada durante o Festival É

tudo Verdade, do ano de 2011. O evento promove a exibição de documentários

realizados no país e no mundo. Webdoc Verdade apresenta várias opiniões de

pessoas ligadas à oficina sobre o que seria um documentário para a web e se

realmente existe alguma diferença com relação ao tradicional.

O quarto e último trabalho é Cidades Visíveis23 (2011), realizado pelo grupo

Lat23. Os pesquisadores/realizadores propõem, com diversas câmeras de

segurança instaladas em várias partes do mundo, um documentário que não tem

definida uma única montagem. O espectador vê um vídeo a cada clique no link

Iniciar.

O que pretendo é caracterizar os documentários eleitos para descrevê-los.

Cada obra tem sua peculiaridade, ocupando um espaço único, no qual estão sendo

diferenciados não só pela forma, mas pela atual facilidade de acesso num universo

configurado como cibercultura, lugar onde o webdocumentário ganha projeção.

Em seu livro sobre o gênero, Bill Nichols (2005) insere o documentário em

três possibilidades: a que envolve uma comunidade com um determinado contexto

institucional, formas de representação da realidade e um conjunto de fatores e de

suposições por parte do público que fazem crer que o que se vê seja um

documentário. Essas três definições do teórico americano, quando permeadas pela

força do fenômeno digital, sugerem uma mudança radical na base da cultura do

documentário.

A noção da comunidade, através dos estudos de André Lemos (2008), leva a

entender que existe uma nova forma de se comunicar através da rede. O gregarismo

proveniente das tecnologias mais portáteis permite um alto grau de

22

Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=Bu7gIxBQD2I. Encontra-se também a

videorreportagem sobre a oficina: http://www.youtube.com/watch?v=5eA8nDwCv1k&feature=related

23 Ver Cidades Visíveis em: http://lat-23.net/cidades_visiveis/ ou http://vimeo.com/16435792

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comunicabilidade, na qual as leituras de linguagens na contemporaneidade

perpassam, num maior grau, pela questão audiovisual. Na cibercultura, as pessoas

querem se olhar e transmitir pensamentos, por um viés político ou pelo

entretenimento.

A segunda classificação feita por Nichols coloca em questão como fica a

representação da realidade, quando, na verdade, com a alta tecnologia, as imagens

podem ser facilmente trabalhadas, até mesmo pela questão da reprodução e pelo

hibridismo nelas inseridos.

A terceira e última questão é do observador – o que é e o que não é

documentário? A categorização ou mesmo o gênero na web deve ser redefinido?

Pontuar as definições de Bill Nichols é se lançar ao desafio de conceituar e

esclarecer vários pontos que se apresentam com a tecnologia. Neste desafio,

encontramos a própria definição do termo “documentário” nesta era real/virtual,

como pontuou Arlindo Machado em entrevista ao justo.aqui24. Para o pesquisador,

quando a ideia de um documentário é feita para a web, a produção ganha uma nova

nomenclatura que ainda está para ser definida.

A produção se realoca porque novos processos se instauram para elaborar e

instalar um documentário na rede. Deve-se pensar na forma dinâmica com que o

filme deve ser feito, observar continuidades nos discursos culturais para não se

restringir apenas a tecnologia e divergências entre plataformas, considerando que

este último termo se refere à maneira como é assistida a obra.

Para utilizar o documentário como forma de se comunicar, as pessoas se

apoderam da linguagem para representar o mundo. Este universo hiper-real da

virtualidade é, por assim dizer, duas faces de uma mesma questão (real/virtual).

Essa forma de representar o mundo abastece o conhecimento e o

autoconhecimento da maioria das pessoas que se interessam pelo gênero.

Utilizando a experiência da internet, cadastrei-me em um dispositivo do

Google que envia para o meu correio eletrônico vários e-mails sobre a tag

“documentário”. Nos primeiros dias, interessava-me muito pelo que estava sendo

24

Revista eletrônica – www.justoaqui.com.br

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enviado e me interava dos documentários que estavam sendo produzidos no Brasil,

na América Latina e em menor número, de outros países.

A finalidade de acumular tantas mensagens com o tema pretendido era

organizar um material de pesquisa que pudesse ser explorado futuramente. O

exemplo do que foi exposto delineia o mundo de agora, cada vez mais influenciado

pelos meios de comunicação, e mais intensamente por elementos visuais, que

desempenham um papel de suma importância na vida social, política e econômica.

O trabalho com a imagem se torna um fator social potente que não pode ser

ignorado.

Craig Hight (2008), pesquisador da Universidade de Waikato, na Nova

Zelândia, diz ser visível que o documentário, quando foi atravessado pela

digitalização, sofreu mudanças radicais na base de sua cultura, no modo de sua

distribuição, exibição e principalmente de sua produção.

Um dos pontos da cibercultura, diante dessa digitalização do mundo, é a

simulação como um dos fatores dessa mudança na base da realização do

documentário quando atravessado pelas redes telemáticas.

Para Jean-Loius Weissberg (1993), o que se ganha com a simulação

informática não é exatamente a substituição da realidade pela simulação. Para ele,

isso é possível e numerosos projetos científicos têm esse alcance. “Essa situação é,

ela própria, portadora de subversões, em particular no campo do saber. Mas então,

podemos dizer, em terreno conhecido: de um lado o referente e de outro o seu

substituto”. (ibid., p. 118)

De uma maneira geral, a simulação informática liga-se a esse estado de

nãoseparação entre imagem e objeto. Retomo à questão de que o virtual e o real

são duas faces de uma mesma moeda, na qual o real não é substituído pelo virtual,

mas este ajuda a dar sentido ao real. Através de Weissberg, compreende-se que o

virtual propõe essa simulação latente que muda as noções de utilização das

imagens.

Pierre Lévy (1999, p. 165) traz à luz a discussão sobre a simulação que ocupa

um lugar central nos novos modos de conhecimento oferecidos pela Cibercultura.

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A simulação, para o pesquisador, é uma tecnologia intelectual que amplifica a

imaginação individual (aumento de inteligência) e permite aos grupos que

compartilhem, negociem e refinem modelos mentais comuns, qualquer que seja a

complexidade deles (aumento da inteligência coletiva).

Com a simulação, segundo o autor, a capacidade de imaginação e de

pensamentos se prolonga. Para Levy (1999, p. 150), “Na cibercultura qualquer

imagem é potencialmente matéria-prima de outra imagem, todo texto pode constituir

o fragmento de um texto ainda maior, composto por agente de software durante uma

determinada pesquisa”.

A simulação, como se percebe, é uma forma de conhecimento, muito própria

da Cibercultura e não somente está ligada à interferência da imagem, mas também

reflete nas operações cognitivas de contar, medir e comparar experiências no

espaço-tempo.

A interação e a imersão, características da realidade virtual, fazem com que

cada vez mais o receptor participe, transforme, e quem sabe faça parte da autoria de

um trabalho, como a autoria híbrida proposta por Robert Stam25, mas agora em

plataformas digitais.

A dinâmica da Cibercultura pode ser observada com o fenômeno Kony 2012

(2012), um documentário realizado por Jason Russel, e também membro da Invisible

Children, uma organização nãogovernamental norte-americana que atua pelas

causas de crianças em situação de risco. O ativista propõe, com o vídeo

documentário, a procura de Joseph Kony, que alicia e maltrata crianças na

República do Congo, um país da África Central.

O documentário postado no dia 5 de março de 2012 tinha, em seis dias, mais

de 10 milhões de visualizações. No dia 02 de abril do mesmo ano, quase um mês

depois de sua postagem, tinha exatamente 86.617.926 (oitenta e seis milhões,

seiscentos e dezessete mil e novecentos e vinte e seis) visualizações, um número

impressionante mesmo para exibição na rede e que, neste momento em que

escrevo estas linhas, tende a subir.

25

Fala de Robert Stam em aula inaugural no Programa em Estudos de Cultura Contemporânea (ECCO/UFMT), em 2010.

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Tanto sucesso é devido ao atrelamento de várias celebridades internacionais,

principalmente do cinema, com a proposta do vídeo, que era dar publicidade a um

ditador que já tinha aliciado mais de 30 mil crianças em 26 anos. O objetivo do vídeo

era que forças militares pegassem Kony e o prendessem.

Mas outro rumo começou a ser desenhado sobre Kony 2012. Informações

apontam que o conteúdo do documentário não conta inteiramente com a verdade, e

passou a ser contestado pela sua representação, que não era tão real assim. Russel

quis demonstrar que a realidade apresentada no vídeo de quase meia hora de

duração era atual, mas especialistas que estudam a realidade política do Congo

afirmam que Kony já não tem tanto poder como apresentado pelo documentário e já

deixou o país. Outra versão aponta que a realidade apresentada no vídeo era de

mais de 10 anos atrás.

Com tantas especulações e um processo de imaginação evidente, fica a

dúvida se o argumento apresentado no vídeo trata ou não de uma história

verdadeira, já que, no final do vídeo, um dos propósitos é angariar dinheiro para a

Invisible Children. A ONG está sendo investigada nos Estados Unidos após a

projeção mundial do documentário. Nem Titanic - sucesso de público e bilheteria há

15 anos, quando foi lançado, teve tantas visualizações em tão pouco tempo.

Pensando na repercussão de Kony 2012, voltamos à pesquisa de Craig Hight

(2008) que diz que o fenômeno técnico, a revolução digital que se apresenta, produz

um colapso na produção dos documentários de representação. Contudo, a

abordagem vitalista de uma expressiva cadeia de produção mundial é que, na

mesma medida que não se pode deixar de considerar o impacto digital e as formas

tradicionais de produção, também se devem observar as possibilidades agregadas

pelo novo.

Ao introduzir o pensamento filosófico da nova polis, de uma nova sociedade

que se associa cada vez mais com a técnica, o sujeito que se lança para a arte do

fazer, de produzir, “é para Platão um demiurgo, um imitador, produtor de cópias e de

simulacros” (LEMOS, 2008, p. 27).

Cada era ressurge de seus simulacros. Neste tempo, a dinâmica

comunicacional dada pelas imagens em movimento envolve a transformação da

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materialidade dos textos, com elementos constitutivos, hiperlinks, dados que são

transportados para o computador capazes de serem facilmente acessados,

distribuídos, combinados com vários arquivos e manipulados para muitos fins.

De acordo com Craig Hight (2008), os documentários que eram intitulados

como convencionais, são agora obras abertas para o experimentalismo, indícios do

filme-ensaio de Arlindo Machado, possibilitado pelos meios digitais, baseados em

uma nova paleta, na captura de imagens, em uma pós-produção com muitos

recursos técnicos, resultando em outra direção para o documentário.

Para o estudioso, a partir do momento em que as formas convencionais ou

tradicionais são atravessadas pela alta tecnologia, deve-se pensar numa mudança

na teoria do documentário, ainda a ser construída, ou até mesmo difícil em ter um

desfecho certo, dada a efemeridade da tecnologia.

O fato é que não dá para traduzir no documentário para a web os mesmos

cânones do cinema de 40 anos atrás. Até mesmo as formas de se comunicar em

rede interpelam os modos de se fazer o documentário. Pela ótica da cibercultura de

André Lemos, há uma forma muito mais gregária e grupal que conduz a

comunicação atual,

Hight (2008, p. 4) aponta, com muita pertinência, ser necessário conceituar

velhos e novos meios de comunicação, observar que há a tendência de dois

padrões, onde um não anula o outro, mas complementam-se.

Nesta fase inicial, é possível delinear duas dinâmicas que estão em jogo, dentro deste campo emergente do documentário digital. Estas sobreposições transformam mútua e coletivamente a base tecnológica das práticas documentais ao mesmo tempo em que reforçam e ampliam o significado do documentário como uma forma cultural.

Os primeiros passos dessa dinâmica foram dados no fim da década de 1990,

quando a integração digital começava a ser inserida nas produtoras com poder

aquisitivo no Brasil. Após a facilitação de se comprar um computador, as formas

digitais ganharam um caminho sem volta. De certa maneira, foram impulsionadas

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por produtores independentes, como forma de resistência em um meio voltado para

a ficção.

A digitalização alavancou produções de documentários no país. Existe uma

diversidade muito grande de equipamentos que captam e armazenam imagens

digitais, mas inúmeros fatores contribuíram para que essa realidade fosse possível.

A necessidade de registrar e guardar imagens sempre acompanhou a

sociedade moderna. Com a popularização do cinema através da Indústria Cultural, a

tecnologia evoluiu e surgiram novas formas de interagir com imagens em movimento

e novas mídias audiovisuais, como a televisão, que surgiu nos anos 1930. Anos

mais tarde, foi desenvolvido o sistema digital, que proporcionou um impulso em

velocidade, aumento de qualidade, de capacidade de armazenamento, além de

iniciar uma verdadeira batalha entre os fabricantes para desenvolver novas

tecnologias e conquistar o mercado. A tecnologia sempre esteve aliada ao mundo do

vídeo e das imagens, principalmente no universo contemporâneo/moderno, em que

a chegada do computador, em 1946, foi revolucionária (outro marco foi o lançamento

do Apple I em 1976, que é considerado o primeiro computador pessoal) e as

possibilidades aumentaram ainda mais com todo o potencial da internet, que permite

uma expansão surpreendente para o compartilhamento e a divulgação das

imagens/vídeos em todo o globo.

Com o avanço e desenvolvimento de novas tecnologias, os equipamentos

digitais estão mais acessíveis, popularizaram-se e nem sempre exigem pessoas

qualificadas para manuseá-las, tamanha a facilidade operacional. Como exemplo,

podemos citar os telefones móveis (aparelhos com acesso à internet, câmera de

vídeo e foto, entre outras funções); os aparelhos reprodutores de DVD (criados em

1995) e Blu-ray Disc (BD, para vídeo e áudio de alta definição e armazenamento de

dados de alta densidade); câmeras dos computadores chamadas de webcam; e até

as máquinas fotográficas profissionais incorporaram o vídeo, como o exemplo do

modelo EOS 5D Mark II da Canon, que grava imagens em 1.080 linhas de resolução

máxima (HD – Alta Definição). Tanto o segmento profissional quanto as linhas

amadoras, todos investem na tecnologia 3D (televisor, cinema, computador,

câmeras de vídeo, etc.). E com a concorrência entre as empresas de tecnologia da

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imagem sempre haverá a evolução de equipamentos, o que permitirá novas formas

de se trabalhar com o audiovisual.

A técnica digital invadiu todos os procedimentos na realização de um

documentário. Criou-se um processo para remodelar a produção, pós-produção dos

documentários convencionais e, mais à frente, a maneira como se passou a

distribuir os trabalhos. A partir de então, a prática encontra mecanismos de

realização bem mais acessíveis que antes. Os dispositivos tecnológicos (câmeras de

vídeo amador, filmadoras profissionais, webcams, celulares, sistema de edição não

linear portátil e vários outros meios móveis) desenham o documentário

contemporâneo.

Atualmente, existem vários editais do governo e da iniciativa privada

destinados aos projetos feitos exclusivamente para a internet, como o concurso do

site Terra, que em 2006, lançou o concurso “Vc Diretor”; o canal Vimeo de exibição

também lançou, em 2011, o Vimeo Festival +Awards, no qual foram escolhidos

vídeos criativos e originais para a web. Outros editais lançados, por exemplo pela

operadora de telefonia móvel TIM são para vídeo realizado por meio de um celular.

Existem outros concursos que estão cada vez mais se adequando aos novos

aspectos da realidade tecnológica audiovisual.

A apropriação por plataformas digitais gerou uma grande participação online

na constituição de trabalhos feitos de forma caseira e profissional.

Até mesmo a convergência da TV (meio analógico) para a web (digital) deve

considerar a plataforma e se adequar à sua linguagem em expansão.

No contexto do discurso e da estética, as direções são diversas, já que na

pós-modernidade tudo é possível e pertinente, remodelando mais uma vez a cultura

na web, cabe a cada um julgar o gosto. Segundo Patrícia Moran26 “ainda não

podemos afirmar onde chegaremos em termos poéticos. Enquanto isso, a rede

matemática é visível e exige seu tempo”.

A Cibercultura, cada vez mais presente no cotidiano, faz com que o pensador

de agora deixe a escrivaninha para uma relação direta com a máquina para dar

26

CRUZ, Roberto (org.). Rumos cinema e vídeo: linguagens expandidas. São Paulo: Itaú Cultural, 2011.

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forma ao seu pensamento. Arlindo Machado acredita que a construção das ideias

através de instrumentos como câmeras portáteis, ilhas de edição, e uma infinidade

de aparatos tecnológicos trará uma realidade para onde todos caminham: a escrita

audiovisual.

Mas a compreensão deste trabalho perpassa pelas seguintes questões – no

que a realidade virtual influenciou os documentários e em que sentido? Qual o ponto

central para a comunicação quando se pretende fazer um documentário para a

internet?

Para essas questões, lanço a hipotética afirmação de que o documentário

contemporâneo possui novidades na enunciação, através da tecnologia digital, e de

linguagens variadas fruto do experimentalismo de seus realizadores. Essas são as

diferenças da comunicação através do documentário: muitas pessoas se lançando

ao que Fernão Pessoa Ramos (2008, p. 70) vai denominar “experimentalismo formal

distendido”.

Muito do texto audiovisual foi atravessado por esta nova realidade

tecnológica, que impulsiona para a hiper-realidade projetada na tela do computador

e é compartilhada por milhares de pessoas do mundo inteiro. No geral, os

internautas precisam de um referencial que é a conexão e a dinâmica que isso

proporciona para as relações interpessoais.

O trabalho não é exatamente sobre técnica documental, mas quer entender

aspectos sociológicos e observar, nos elementos da informática, os caminhos que o

gênero está agregando.

Ao ler sobre a análise argumentativa, o autor Miltos Liakopoulos (2010)

ofereceu significativa contribuição para o entendimento da importância da cultura da

imagem neste século.

O fato de grande quantidade de pessoas estarem tomando parte dos debates sociais possui uma consequência importante: a forma preferida de fala está se tornando menos formal, isso porque dizer que com a era da informação, o advento da cibercultura, as pessoas deixam a fala (forma), mas não abrem mão do argumento.

Uma dessas formas de poder argumentativo utilizado na contemporaneidade

é o audiovisual, que intensifica as trocas e relações pessoais.

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3.1. Compreensão da obra digital na esfera virtual

A proposta deste item é fazer a descrição de quatro documentários que estão

na internet e que, por assim dizer, se propõem obras realizadas pensando na

internet. O esforço é compreender a obra digital na esfera virtual, aliando-a às

abordagens teórico-metodológicas e buscando respostas a partir de vários

documentários hospedados na web.

Para definição de conteúdo, pensei em categorias que pudessem me fornecer

uma amostragem e assim que contemplassem o que o trabalho propõe. Durante

mais de seis meses, foram vistos muitos documentários, primeiramente no Festival

de Cinema na internet chamado Fluxus, patrocinado pela Estatal Petrobrás, mas me

deparei com a falta de diálogo dos realizadores, que nunca responderam a qualquer

mensagem enviada. O projeto Fluxus existe há mais de 10 anos e abre uma janela

para produções do mundo inteiro.

Depois de algumas pesquisas, cheguei à proposta do Rumos Itaú Cultural,

que foi mencionado anteriormente, o qual lançou, em 2009, um edital intitulado

Linguagens Expandidas, com a proposta para que realizadores enviassem

documentários pensados para a web.

A classificação do material escolhido para a descrição é uma tarefa de

construção, portanto é um recorte teórico e demonstra a pesquisa pretendida.

Cada amostra que incorpora o objetivo da pesquisa, para ser escolhida,

deveria ser enquadrada em um dos seguintes códigos formulados previamente: ser

um documentário, ter entre 5 e 15 minutos de duração, com proposta de linguagens

variadas, o tema não ser restrito e ter como proposta a exibição na internet para a

ampliação de comunicação da obra.

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3.2. O Som do Tempo na Cibercultura

O som do tempo é um documentário de 8 minutos, que retrata um dia na vida

de uma senhora chamada Fátima, mulher do sertão que mora em meio a muitos

prédios da cidade grande.

A ideia central é a abordagem baseada nos temas ruído e velocidade. Estes

temas foram incluídos no Projeto Rumos Itaú Cultural, o qual contempla projetos

direcionados para questões da realidade contemporânea brasileira e invoca o que

pode ser discutido como linguagem audiovisual produzida para a web.

Ao longo da estrutura narrativa do documentário existe a relação de silêncio

da personagem principal em sua simples casa contrastando com os ruídos de

cidade predominantemente vertical e movimentada.

A forma como as imagens estão organizadas na obra demonstra o cinema de

observação. O cineasta aborda a questão social pelo viés poético, deixando a

câmera olhar para a vida simples de Fátima, buscando ressaltar o som e o espaço.

O primeiro plano, a imagem do sertão como moldura-retrato, já induz uma

atuação autorreflexiva, como uma realidade a observar. A ressonância pessoal da

personagem contrapõe a forma de viver numa cidade tecnológica. Vidas do sertão e

da metrópole se cruzam.

Na sequência, o diretor apresenta a sua personagem principal através da

simplicidade dos pés, das mãos, sempre com planos longos e o som ambiente com

uma música instrumental de fundo.

Gestos, olhares, a face cansada da personagem, a maneira de viver o dia, a

casa pequena e a existência de uma mise-en-scène tecem o trajeto narrativo que

busca a simplicidade em paralelo a uma complexa existência no meio urbano.

Esta obra aponta para uma questão apresentada pelo estudioso Arlindo

Machado (2011), no qual a internet permite, em decorrência das dimensões por ela

possibilitadas, proporcionar a utilização do documentário como uma manifestação de

práticas antropológicas através de ensaios visuais ou audiovisuais.

Pensar no que a pragmática da comunicação fílmica propõe nesta obra é

entender que um filme não tem sentido em si. É nessa perspectiva que o artigo do

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americano Sal Worth, citado por Roger Odin (2005, p. 29), em The Development of a

Semiotic of film irá pontuar – que o filme apenas adquire sentido na relação

intrínseca com o sujeito que assiste à obra.

Figura 1. Título: Dona Fátima em sua casa.

Fonte: Petrus Cariry, 2010.

A forma privilegiada através da observação direta produzida pelo

documentário ao mostrar dona Fátima realizando suas tarefas do cotidiano como

lavar a roupa e comer no silêncio de seu lar apresenta uma formação social e um

hiato na questão lingüística da personagem que, em momento algum, oferece um

depoimento.

O tema de reflexão é o mundo caótico urbano sob a égide de um contraste

entre o capitalismo e a vida singular. As imagens servem de fundo para uma

interpretação sobre o que se passa com as cidades modernas e suas diversidades.

A voz, de certa forma não convencional, discorre o que, para Arlindo Machado seria

a voz sussurrada, “em tom baixíssimo, como que falando para dentro, uma imagem

sonora admirável da linguagem interior: o pensamento”.

O que ganha destaque em O som do tempo é essa ausência da voz presente,

indo na contramão de vários documentários tradicionais. A contraposição entre cena

e som, ora buscada pela exaltação de sons caóticos da cidade ao mesmo tempo em

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que leva para o silêncio da vida singela de uma senhora do sertão, mostra o mapa

da iconografia cultural.

Muitas obras audiovisuais inseridas na web estão cada vez mais direcionadas

a um curto tempo, o qual permite maior fluxo de hipertextos. A duração de cada obra

audiovisual é que estabelece a dinâmica e assim multiplica a possibilidade de

assistir a vários trabalhos e fazer diversas leituras sobre a forma de representação

de cada documentário, conforme já observado.

É na reflexão de Bill Nichols (2005, p. 63) que o vídeo se apresenta como um

simulacro, um traço externo da produção de significado a que nos propomos a cada

dia, a cada momento.

Figura 2. Título: Casa de Dona Fátima.

Fonte: Petrus Cariry, 2010.

O Som do tempo não apresenta nada de novo por estar sendo exibido na tela

de um computador, mas a obra, quando num espaço de desterritorialização como a

internet, se abre para o campo do possível, no qual o filme documentário, como

apresenta André Lemos (2008), “se expandiu para incluir estratégias de reflexividade

que podem posteriormente servir como objetos políticos e científicos”.

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Traduzindo aspectos da teatralidade social de O som do tempo até mesmo

com nuances de ficção, entende-se a transferência da interface audiovisual à vida

cotidiana, como simbiose paradoxal entre tecnicidade e socialidade.

A obra em sua forma primitiva, quando apresenta dona Fátima e seus signos

de vivência, é o próprio mundo, estabelece uma relação direta entre o homem e o

mundo, e entre várias esferas culturais.

Ao utilizar o elemento técnico em forma de câmera gravadora e registrar essa

determinada realidade, quando projetada para a web, as dimensões imaginativas na

cibercultura se esgarçam, ampliando-se para múltiplas interpretações da teatralidade

dramática do social.

3.3. Canais de compartilhamento e as indagações sobre o webdoc

O terreno internet é tão vasto que angular o trabalho foi tarefa árdua, e em

busca de uma variante para ele busquei, no canal Vimeo, um vídeo que tivesse

várias conexões para além da internet, como a atribuição de ter sido produzido em

vários lugares. Esse perfil foi encontrado na obra Restos, produzida pelo grupo

Teia27 de Minas Gerais e dirigido por Cristina Maure e Pablo Lobato.

O trabalho versa sobre o lixo em vários países do mundo – Brasil, França,

Cuba, Estados Unidos e Inglaterra. É feito em imagem de 35 milímetros, película

para cinema, produzido em 2003 e postado no Vimeo em 2010. A produção

brasileira participou de, pelo menos, 20 festivais e mostras, algumas em nível

internacional.

Embora o tempo do trabalho seja de 11 minutos, o internauta poderá ver

apenas um extrato de 2 minutos disponível no canal. Somente a parte do Brasil

aparece no extrato. Quando o internauta/espectador espera ver o trabalho dos garis

em outras cidades, o vídeo é cortado.

27

Disponível em: http://teia.art.br/

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Entre os sons da madrugada e a agilidade dos garis, os restos de lixo

produzidos por uma cidade como Belo Horizonte vai ganhando os seus contornos.

Cinco câmeras mostram o que é descartado em Havana, Londres, Nova Iorque,

Paris e Belo Horizonte.

Figura 3. Título: Primeira imagem da obra Restos.

Fonte: Cristiane Maure e Pablo Lobato, 2003.

A primeira imagem revela a mão de um trabalhador recolhendo o lixo. No

outro plano, imagens de uma cidade movimentada com a inscrição – Belo

Horizonte/Brasil – demonstra a agitação dos seus moradores e a produção de muito

material, agora descartado.

Na tela, são meia-noite e quarenta e sete da madrugada e o serviço está a

todo vapor. O caminhão de coleta de lixo se movimenta, para em vários pontos. A

câmera está no alto de uma passarela de pedestres, como a observar a coleta do

que foi jogado fora pelos seus habitantes.

Outro plano evidencia que o serviço é denso; garis levantam as pesadas

sacolas de lixo. Os personagens do vídeo não têm tempo de encarar a câmera; ele é

escasso, é preciso prestar atenção no serviço para se coletar muito material pela

cidade de Belo Horizonte.

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A câmera segue os trabalhadores, observa o tamanho do esforço desses

profissionais da madrugada, que estão sempre se movimentando. Os diretores

captam um plano interessante: no reflexo no espelho do retrovisor do veículo, dois

garis se arriscam em subir e descer do caminhão. A agilidade impera no trabalho

dos personagens como um traço a esboçar a complexa vida na metrópole.

A trinta segundos de acabar o vídeo, o caminhão vai para uma espécie de

local que recicla os materiais; entram duas imagens, uma ao lado da outra: enquanto

a cidade está acordada, movimentando-se em bicicletas e carros velozes, a

inscrição aparece – “e os restos continuam” - e o vídeo termina.

Figura 4. Título: Garis em avenida de Belo Horizonte.

Fonte: Cristiane Maure e Pablo Lobato, 2003.

Por ser um extrato de apenas dois minutos (o vídeo tem o total de 11

minutos), entrei em contato com os produtores para saber como poderia ver o vídeo

completo. Dias depois, um e-mail retornava com a resposta da diretora Cristina

Maure dizendo que, a princípio, todos os trabalhos publicados são em forma de

extrato dos filmes realizados. O interesse por parte do internauta/espectador em ver

todo o filme é realizado através do envio de um DVD com os custos da cópia e mais

o correio incluídos no valor de R$ 50,00. Essa é uma prática do grupo com o público

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que se interessa pelas suas produções. De acordo com a diretora, essa dinâmica

ajuda a pagar os custos com a produção dos trabalhos realizados pelo coletivo.

Percebi que esta era uma das vias da descrição do meu trabalho. No

momento em que entro em contato com a diretora e vejo que a obra tem um custo

para ser liberada para quem quer vê-la completa, percebo que a internet também faz

com que os produtores independentes encontrem uma maneira de viabilizar o

investimento do trabalho através de um canal como o Vimeo.

O Vimeo, diferente do Youtube, pode ser considerado um canal onde se

encontram trabalhos mais elaborados, com imagens bem mais definidas, e por isso

é utilizado por muitos profissionais que vivem e compreendem o audiovisual, como o

coletivo Teia, de Belo Horizonte.

Por ser um site de compartilhamento de vídeo, os usuários do Vimeo, criado

em 2004, podem fazer upload dos trabalhos realizados. Há restrições para vídeos

comerciais ou com temas pornográficos. O canal não tem a mesma quantidade de

acesso que o Youtube, considerado mais popular.

A forma como os produtores de Restos compartilham os trabalhos é uma

maneira de se reinventar e nos leva a entender algumas questões vinculadas ao

comportamento dentro da web. A criatividade e a inventividade são ingredientes das

trocas estabelecidas no cenário atual.

Penso, com Manuel Castells (2003), que enxergar a internet como uma

ferramenta importante e estabelecer a criatividade como norte é um dos grandes

destaques para as grandes metrópoles, para as cidades conectadas, para tribos que

se organizam para pulverizar o trabalho e receber reconhecimento sem que, para

isso, seja preciso recorrer às grandes empresas de comunicação.

A era da internet chegou para que a arte possa construir grandes narrativas

ao mesmo tempo em que se recolhe aos temas locais. Expandir visões e políticas

através do que podemos chamar de Antropologia Visual.

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3.4. Reflexão sobre Webdoc no Festival É Tudo Verdade

Outro trabalho que chamou a atenção está no Youtube, Webdoc Verdade,

que considero ser um metawebdocumentário, resultado de uma oficina ministrada

pelo cineasta Jorge Bodanzky no 16º Festival de Documentário É Tudo Verdade,

em 2011, no qual se discute o que é documentário para a internet. O vídeo

demonstra que ainda há muitas reflexões e nenhum apontamento para o que de fato

se enquadra como um documentário produzido para a web.

A proposta surgiu do coordenador do festival, Amir Labaki, que, a partir de

vários trabalhos apresentados para serem exibidos durante o evento com a temática

Novas Mídias e Tecnologia, convidou o cineasta Bodanzky para realizar a oficina.

Da oficina ministrada em abril de 2011, pelo menos 15 vídeos foram feitos

pelos participantes e todos estão inseridos no canal Youtube28, para dialogar sobre –

o que é webdoc? E se existe um formato de filmes documentários para a internet.

O vídeo Webdoc Verdade busca metalinguagem com a proposta de ir para a

rua, a fim de captar depoimentos que ajudem a refletir sobre o conceito de webdoc.

Em alguns planos, a edição do documentário é apresentada por duas telas

paralelas, mostrando cenas da oficina e dos alunos. Em uma das imagens,

Bodanzky diz que a oficina será de um diálogo aberto entre os participantes, já que

ainda não sabe se realmente existe um formato de vídeo feito para a web.

Apesar de ter vários entrevistados, não há no vídeo legenda com nomes de

quem oferece o depoimento. Após as observações do palestrante, uma das alunas

da oficina diz que as mudanças de tecnologias são muito rápidas, fator

preponderante para iniciar o diálogo sobre o documentário e a web. Logo em

seguida, outro depoente diz que não havia pensado em fazer um vídeo

especificamente para a internet. Na sequência, outro aluno diz que o “futuro a gente

está buscando, tem que tentar entender o que está acontecendo e o que vai

acontecer”.

28

Vídeos disponíveis em: www.youtube.com/webdocverdade.

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Planos abertos da oficina e a legenda “Depois de uma tarde cheia de conceitos, o

grande desafio: pegar uma câmera e sair por aí...objetivo: captar depoimentos que

ajudem a refletir o conceito de Webdoc”. No pano de fundo desta legenda, estão os

participantes utilizando câmeras portáteis como fotográficas e de celulares,

computadores e a legenda “Veja o resultado...”.

Figura 5. Título: Oficina sobre webdoc.

Fonte: Antenor Thomé, 2011.

Aos dois minutos de vídeo, aparece: “Webdoc é”. Na sequencia o primeiro

entrevistado diz: “Acho que não existe webdoc, acho que não existe documentário

para internet, feito para internet”. Para esse entrevistado, o documentário na web se

diferencia, por exemplo, da televisão, pela vivência do internauta em poder buscar

informações mais detalhadas sobre uma obra ou até mesmo construir o próprio

documentário.

Em seguida, aparece o primeiro plano de pessoas falando várias palavras

entre elas informação, cultura, internet, conhecimento, e encerra com “é tudo

mentira”. Outras imagens surgem, sem muita conexão com o tema.

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Vários dispositivos tecnológicos como celulares, câmeras fotográficas e vídeo

surgem na tela com a voz off: “com um custo muito baixo, eu consigo produzir meu

conteúdo”.

O documentário tem três minutos e quarenta e oito segundos. Mostra vários

planos da oficina, e observa-se que muitos deles foram realizados com a tecnologia

de celular, adaptados, inclusive com microfone para melhor captação de áudio dos

entrevistados.

Figura 6. Título: Imagem do vídeo Webdoc verdade

Fonte: Antenor Thomé, 2011.

Webdoc Verdade não conclui o tema. Muitos entrevistados ainda estão em

dúvida sobre o que realmente é webdoc, outros afirmam que a internet é apenas um

terreno fértil no qual a possibilidade se expande muito mais do que em festivais ou

mostras.

O entendimento é que o gênero incorpora a tecnologia e isso transforma a

edição, a captação, a produção e amplia o campo de experimentação.

Para Jorge Bodanzky cada participante que realizou um vídeo na oficina

enxergou “o documentário de forma pertinente, de forma particular”, cada um

utilizando as suas ferramentas para captar asserções sobre o mundo. Através de um

celular ou de uma câmera fotográfica, a tecnologia portátil e de fácil manuseio

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permitiu alto grau de comunicabilidade e interação na web através de cada

documentário. O vídeo encerra com imagens de todos os participantes da oficina.

É interessante pontuar através deste documentário descrito que o

crescimento de trabalhos documentais na web pode ser traduzido pela pesquisa

realizada pela Interactive Advertising Bureau29, a IAB Brasil. O resultado demonstra

que, no primeiro trimestre de 2012, a internet se consolidou como a segunda fonte

de informação buscada pelos brasileiros, perdendo apenas para a TV aberta. Com a

convergência e o acesso da população, em pouco tempo, esse cenário vai se

modificar, tornando a internet o grande terreno da busca de informação e

compartilhamento do saber.

A internet corresponde a 11,98% do mercado. Sua penetração no Brasil, no

primeiro trimestre de 2012, é de 82,4 milhões de usuários, segundo a empresa que

realizou a pesquisa. A internet é o grande espaço de faturamento. Somente nos

primeiros meses do ano, foram R$ 840 milhões, entre sites de busca e publicidades

através de banners.

Essa consolidação da internet faz com que o Youtube cresça em

popularidade no mundo inteiro. O canal YouTube é um site em formato Adobe

Flash30, um software de gráfico vetorial – apesar de suportar imagens bitmap e

vídeos, utilizado geralmente para a criação de animações interativas que funcionam

embutidas num navegador web. Fundado em fevereiro de 2005, por Chad Hurley,

Steve Chen e Jawed Karim, o Youtube alcançou expressivo reconhecimento em

apenas um ano após o seu lançamento, sendo considerado um fenômeno e se

tornando popular em mais de 50% do mercado mundial com mais de 100 milhões de

vídeos postados por dia31. Tamanha popularidade é dada à facilidade de hospedar

qualquer vídeo, basta o usuário ter um mínimo de conhecimento de internet para

manusear o site e hospedar filmes, videoclipes e vídeos caseiros. Através do

29

Disponível em: http://www.iabbrasil.org.br/indicadores/Indicadores-de-Mercado-IAB-Brasil.pdf.

30 Com a inovação tecnológica, o Adobe Flash vai sendo desenvolvido, possibilitando que vídeos com

maior definição sejam hospedados no site.

31 Fonte: 7 THINGS YOU SHOULD KNOW ABOUT YOUTUBE.

Disponível em: http://net.educause.edu/ir/library/pdf/ELI7018.pdf acesso em: 21 de Jun. 2010.

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sistema de Interface de Programação de Aplicativos (APIs), o usuário pode

disponibilizar seu vídeo em blogs e sites pessoais.

O canal foi eleito em 2006 pela revista Time como uma das melhores

invenções dos últimos tempos; o Youtube mudou o conceito de participação de

cidadãos com o audiovisual.

O canal se tornou popular e estimula o jargão “faça você mesmo”, quando o

usuário pode utilizar as ferramentas muito acessíveis e compartilhar as ideias ou

puramente entreter.

Até mesmo a televisão aberta, para não ficar fora da experiência vivida por

milhares de pessoas todos os dias, também utiliza vídeos de internautas para se

pautar no dia a dia. A internet fez com que imagens e, principalmente, as que estão

em movimento sejam observadas e vivenciadas no cotidiano das pessoas.

No mundo contemporâneo, a grande força de trabalho não depende somente

do esforço físico, mas da força de invenção, o centro do valor agora é imaterial. O

Youtube é prova disso: quanto mais acesso uma obra de arte tem, quanto mais

compartilhamento entre os usuários, mais valor ela produz.

Outro ponto é que a questão da autoria é sempre levantada como uma

incógnita. O internauta/espectador pode ser o produtor e controla seu próprio texto

a partir das imagens disponíveis na web. A diversidade do público, em termos

étnicos, sexuais, geográficos, culturais e sociais, enfim, pode manipular a

informação, explorando de forma ativa páginas de hiperlink e executando outros

atos, como se apropriar do que o ‘outro’ realizou para transformar em proposta

diferente da anterior.

A atuação da World Wide Web na contemporaneidade é de criar

oportunidades para a produção, distribuição e exibição de documentários

independentes. Pressuponho que a noção de webdoc justamente fomenta novas

formas criativas digitais que incorporam e transformam elementos da estética do

documentário.

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3.5. Cidades Visíveis e a utilização de novas possibilidades através do

sistema digital

Antes de optar pelo trabalho Cidades Visíveis, houve o questionamento se

realmente a escolha se tratava de um documentário. O interessante é que o projeto

foi inserido no Programa Rumos Itaú Cultural e qualificado por três examinadores,

Consuelo Lins, Joel Pizzini e Beto Magalhães, que compunham a banca de

avaliação e julgavam se as produções enviadas pelos realizadores se tratavam de

uma obra documental para a internet.

Cidades Visíveis tem uma proposta tão diferente que me fez enviar vários e-

mails para todos os examinadores do projeto, a fim de que eles pudessem me

fornecer dados e perspectivas do porquê entraram em consenso de que a obra se

tratava de um documentário e não de uma instalação na web ou um videoarte.

Porém não obtive sucesso, já que os examinadores não abriram o diálogo sobre o

documentário realizado para a web.

A espera de meses por uma resposta e a falta de uma posição mais

conceituada por parte dos examinadores sobre o que estava sendo questionado me

fez entender que a estrutura da base do documentário, quando se alia à internet,

está ainda sendo desenhada, com suas nuances e formas que talvez jamais se

esgotem pelas novas possibilidades digitais que sempre surgem.

Outro meio de buscar informações sobre o trabalho foi entrar em contato com

os realizadores da obra, a fim de obter respostas de como foi pensado o trabalho.

Quem é responsável pelo resultado da obra é o grupo Lat-23, formado pelos

brasileiros Cláudio Bueno, mestre em Artes Visuais pela Universidade de São Paulo

(Usp); Denise Agasse, doutoranda em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP;

Marcus Bastos, doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, e pelo espanhol

Nacho Durán, que desenvolve projetos em várias linguagens digitais, como o

conceito de microcinema. Porém não houve retorno por parte de um dos integrantes

do qual foi localizado o e-mail.

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Mesmo sem informações por parte dos realizadores, a análise do trabalho

pareceu pertinente, já que há que considerar que tem uma linha diferente do que foi

observado nos trabalhos anteriores.

Figura 7. Título: webdocumentário Cidades Visíveis

Fonte: Grupo Lat23, 2010.

Cidades Visíveis tem duas vias de ser observada: a primeira pelo seu site32

que, até o final de 2011, mostrava as imagens. Porém, desde o início de 2012, o site

com a proposta do documentário não apresenta mais o projeto. Mesmo tendo o

contato do grupo e enviado o questionamento da razão de não aparecerem as

imagens, não obtive resposta em seis meses de tentativa.

O entendimento é que o projeto foi apresentado apenas para o Rumos Itaú

Cultural, no qual o webdocumentário se apresenta como obra efêmera. Há também

uma instalação como desdobramento do trabalho realizado pelo grupo Lat-23. Existe

um vídeo no canal Vimeo33 sobre o webdocumentário e a instalação Cidades

Visíveis.

32

Disponível em: http://lat-23.net/cidades_visiveis/.

33 Disponível em: http://vimeo.com/16435792

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Descrever a obra é, sem dúvida, um desafio, já que a edição é via tags e cada

vez que começa o documentário, outra lógica de imagens aparece, desfazendo a

sequência anterior.

O que pode ser observado são imagens de vários lugares do mundo inteiro.

Ora podemos ver um grupo tomando banho em uma piscina. Depois, surgem

imagens de carros em uma avenida movimentada. Um céu nublado. Barcos em um

porto. Imagens de uma praia. Uma rua sem movimento, com grandes casas. Uma

oficina mecânica. Câmeras em muitos lugares e o internauta observa tudo através

de uma tela.

O documentário explora procedimentos possíveis apenas quando inserido na

internet, porque são utilizados dispositivos, como tags e cruzamento de dados para

deixar em sequências as imagens.

O trabalho procura subverter a lógica da filmagem e edição do cinema

convencional. Quando o internauta entra para ver Cidades Visíveis, é possível ver

várias sequências do mesmo filme a cada 8 minutos, tempo de duração da obra.

Cada vez que o espectador/internauta clica no play, uma nova lógica da formação

de imagens aparece. Pelo que se pode perceber, há tantas combinações de tags e

cruzamentos de dados que permitem a formação de centenas de combinações

possíveis de um mesmo trabalho audiovisual.

O webdocumentário é formado por várias imagens de webcams ou câmeras

de segurança espalhadas pelo mundo inteiro. Em alguns momentos, mosaicos de

imagens de vários lugares aparecem em tempos diferentes do dia, contrariando a

lógica da edição temporal.

A explicação prévia sobre o trabalho indica que as imagens de webcams que

formam vários vídeos foram distribuídas em categorias e mapeadas por palavras-

chave ou tags.

Quando o internauta aciona o play, o sistema do site escolhe os vídeos de

forma aleatória. Isso é permitido porque a tecnologia digital oferece esse dispositivo

de reformular o que vai ser assistido.

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As combinações feitas por múltiplos tags e várias palavras-chave, que não

são visíveis para o usuário, faz com que se criem diferentes sentidos para a obra

que está sendo exibida.

Para o pesquisador Phillippe Quéau (1999), do Instituto Nacional do

Audiovisual na França, “a imagem digital graças à sua natureza numérica e

simbólica (no sentido matemático do termo) torna possível todos os tipos de

mediação entre linguagens formais e representações sensíveis”.

Figura 8. Título: webdocumentário Cidades Visíveis

Fonte: Grupo Lat23, 2010.

O estudioso indica que, ao entrarmos para a lógico do 0 e 1 dos computadores,

amplia-se o leque de imaginações utilizáveis no ciberespaço. As representações

começam a fazer parte de um texto completamente dirigível, como uma hiper-

realidade do mundo.

O computador como importante ferramenta para explorar esses universos de

imagens “não é uma simples ferramenta, mas uma metamáquina, que representa

mundos virtuais em direção da perspectiva da interação dramática” (LEMOS, 2008,

p. 112). Nesse ponto, Cidades Visíveis apresenta as perspectivas de vários mundos

inseridos na virtualidade da imagem.

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A importância cultural da imagem como forma funcional e sua relação com a

representação no campo da virtualidade ganha destaque com o estudioso Jean-

Louis Weissberg (1999, p. 118)

Falta-nos palavras para designar essa situação em que a imagem não é mais representação, mas presentação, simplesmente, em que a imagem não é mais figurativa, mas também funcional, em que ela tem como lastro um coeficiente de realidade reencontrando por novos caminhos sua eficácia primeira.

Ainda sobre a representação, os realizadores sugerem que o documentário

Cidades Visíveis evidencia um campo interessante da internet: “a incapacidade de

enxergar as coisas de modo completo”. Para os produtores, a web se caracteriza por

ser um lugar de presença remota, de várias fraturas e interrupções.

De acordo com Edmund Couchot (1999), ao utilizar a codificação numérica,

como é o caso de projetos documentais realizados para a internet, elas controlam

todas as imagens de forma automática porque, ao se transformarem em operação

numérica, as possibilidades de serem tratadas, difundidas, conservadas,

manipuladas e registradas são grandes.

Ao utilizar vários mecanismos para montar o documentário, o grupo Lat-23 faz

a hibridação e insere instalação, documentário, e imagens de webcams para chegar

ao resultado pretendido. Além disso, redefine a edição, já que o internauta sempre

tem uma nova perspectiva sobre as imagens que estão sendo expostas.

Sobre como os produtores-artistas introduzem o trabalho na hibridação do

universo simbólico do audiovisual, utilizo uma observação de Edmund Couchot

(1999, p. 47):

Hibridação enfim entre o pensamento tecnocientífico, formalizável, e o pensamento figurativo criador, cujo imaginário nutre-se num universo simbólico da natureza diversa, que os modelos nunca poderão anexar. Desta forma, a ordem numérica torna possível uma hibridação quase orgânica das formas visuais e sonoras, do texto e da imagem, das artes, das linguagens, dos saberes instrumentais, dos modos de pensamento e de percepção. Esse possível não forçosamente provável: tudo depende da maneira pela qual especialmente os artistas farão com que as tais tecnologias se curvem a seus sonhos.

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Os simulacros estão presentes em várias épocas e gerações, mas para Jean-

Louis Weissberg (1999) o tempo de agora é caracterizado pelo efeito particular de

entidades híbridas nascerem, situadas entre o que é real (segundo o modo do

objeto) e o que não é (segundo o modo de representação).

Por esta razão, Cidades Visíveis levanta o fato de como encarar o fenômeno

de novas linguagens derivadas do uso da informática no campo da arte.

A aparição de um espaço ficcional autônomo com o surgimento do cinema e de seus derivados óticos eletrônicos certamente reforçou esse movimento (de naturalização tecnológica da imagem) constituindo, com a tela, um universo independente no qual se encarna o imaginário visual (WEISSBERG, 1999, p. 117).

Com o documentário inserido nesse mecanismo, a informática apodera-se de

funções de visualização que subverte as regras mais comuns. Segundo Weissberg

(1999), isso acontece porque a tecnologia telemática consegue trabalhar “o elo que

liga a imagem ao objeto pelos dois lados”.

Confirma-se mais uma vez que, a tecnologia e as ferramentas da internet no

documentário propõem a redefinição, por meio da engenharia informática da

simulação, das noções de imagens, objeto e espaço perceptivo.

Cidades Visíveis mostra a trama organizada via dispositivos digitais em que

várias possibilidades estão surgindo; quando a Cibercultura apresenta essas várias

formas de se comunicar e fazer a comunicação impulsionar nos cabos de fibra ótica.

André Lemos (2008) observa que a cultura e o saber vão passar por um

processo de negociação e distorção que impulsiona para outras apropriações de

ideias e posições, de reformulação da informação planetária.

O trabalho do grupo Lat-23 demonstra que o documentário se adaptou de

forma dinâmica às possibilidades oferecidas pelas novas tecnologias. Uma nova

geração de documentaristas, assim como um público antenado na prática

audiovisual, utilizam câmeras portáteis e de fácil manuseio para capturar o mundo

histórico-social através de abordagens inovadoras. Isso está transformando

aspectos da cultura do documentário, evidenciado não apenas por Cidades Visíveis,

mas por milhares de documentários que estão inseridos na internet.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelas observações realizadas através da pesquisa sobre o documentário na

contemporaneidade, é importante reconhecer que se torna impossível tecer

conclusões sobre o objeto estudado. Todavia, pensar o documentário e suas

particularidades, mesmo que ainda seja um estudo incipiente, faz-me refletir que o

gênero possibilita, a partir da disseminação das novas tecnologias, que as

linguagens sejam um campo em expansão.

A incompletude do trabalho reforça o entendimento que ainda há

transformações ocorrendo e que essas não irão cessar. Nesta perspectiva, concordo

com o pesquisador Arlindo Machado (2011) quando afirma que, no momento em que

o documentário tradicional incorpora a alta tecnologia, deve-se pensar numa

mudança da teoria do gênero que ainda está sendo construída. Dada a efemeridade

dessa tecnologia, dificilmente haverá desfecho para esse aporte teórico do

documentário na internet.

Como o campo ainda está aberto, traço algumas linhas de fuga sobre as

observações através dos conceitos apresentados e das descrições dos trabalhos.

Como observado no documentário Webdoc Verdade, existe muitas dúvidas

sobre o documentário na web e seu conceito. Alguns afirmam que a internet é

apenas um terreno fértil no qual a possibilidade se expande muito mais do que em

festivais ou mostras, mas que não há diferenças a ser apontadas do documentário

tradicional; outros vão tratar o documentário contemporâneo como um campo aberto

de experimentalismo distendido.

A proliferação de aparelhos de tecnologia que permitiram um alto grau de

trocas de imagens e exposições produzidas através de celulares, câmeras

fotográficas, webcams e o acesso a equipamentos profissionais foram fatores

primordiais para a mudança na base cultural do documentário. A produção passou a

ter níveis altíssimos de trocas e interações através da web.

Outro fator é a expansão das linguagens no gênero documentário. O

experimentalismo sempre esteve presente na produção de documentários, mas,

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com as novas tecnologias, percebo que as interconexões se fazem com muito mais

facilidade, como é o caso do vídeo Cidade Visíveis.

Cidades Visíveis mostra a trama organizada via dispositivos digitais em que

várias possibilidades estão surgindo, quando a Cibercultura apresenta essas várias

formas de se comunicar e fazer a comunicação impulsionar nos cabos de fibra ótica.

Neste sentido, é importante a posição de Phillippe Quéau (1999) do Instituto

Nacional do Audiovisual na França, quando diz que “a imagem digital graças à sua

natureza numérica e simbólica (no sentido matemático do termo), torna possível

todos os tipos de mediação entre linguagens formais e representações sensíveis”.

A nova base dessa cultura, proporcionada pela Cibercultura, é ampliar as

plataformas digitais que promovam a participação, colaboração, interação textual e,

de certa forma, rever o conceito da democracia quando se tem acesso às redes, e

está diretamente ligada à organização de grupos que saem da passividade para a

produção de conteúdos expressivos e que pretendem atingir uma finalidade.

Entre todos os documentários apresentados, certamente Cidades Visíveis se

descola do tradicionalismo dos três primeiros documentários. É um trabalho que

utiliza o viés plástico-imagético das artes, e o construtivismo na forma da sua edição.

Já os outros documentários são mais tradicionais. O Som do Tempo tem a

tonalidade lírica dos documentários poéticos, há uma sensibilidade do sujeito-da-

câmera que provoca um despertar para as mudanças da relação entre o homem e

seu o habitat. O documentário Restos também está na mesma tradição dos

observados anteriormente. O que vai mudar é a interação na distribuição da obra

que é apresentada apenas como um extrato para o internauta assistir.

A tecnologia condiciona a produção de muitas cópias, produção esta existente

há décadas, mas que agora ganha projeção imensurável através do fenômeno

técnico. Há sempre uma imagem para revelar uma determinada visão sobre o

mundo, uma determinada atualização que se apresenta.

A tecnologia digital, por assim dizer, permite que a teatralidade social, os

dramas do cotidiano, seja amplamente explorada. Com a utilização vertiginosa dos

aparatos tecnológicos, o alto grau de comunicação, sem dúvida, passa pelo

audiovisual. As possibilidades de denominação do documentário é revista com o

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meio digital. Arlindo machado (2011) sugere a mudança da nomenclatura, já que

uma nova maneira de se produzir, distribuir e exibir está posto.

Com o esgarçamento das produções, a base da cultura do documentário se

renova. Contudo, esse cenário está sendo construído a partir de antigos conceitos

que ainda direcionam o fazer documental, um fazer cada vez mais presente no

cotidiano, na socialidade humana.

Na cidade polifônica, a criatividade cultural é o grande produtor do imaginário;

os documentários estão inseridos nesta grande fábrica de produção. Para Pierre

Lévy (1996), as mídias audiovisuais do século XX (rádio, TV, filmes) participaram da

emergência de uma sociedade do espetáculo que subverteu as regras do jogo tanto

na vida política quanto no mercado, economia da informação e da comunicação.

Agora, passamos para a sociedade da simulação.

De acordo com a pesquisadora portuguesa Manuela Penafria (1999) a

evolução digital trouxe aos documentaristas um esforço para compreender e

acompanhar as capacidades técnicas disponíveis. Isso os obriga a ficar atentos com

novos suportes para sempre recriar o gênero documentário.

O que estamos vivendo com a digitalização e novos formatos do

documentário, como bem avalia o pesquisador Arlindo Machado em recente artigo

publicado no final de 2011, é que, atualmente, existe uma expansão do conceito de

documentário.

Para Machado (2011), o cenário é complexo: “levantamos alguns dos mais

proeminentes desvios que esse formato audiovisual experimentou nos últimos anos:

o documentário híbrido, o falso documentário, o metadocumentário, o documentário

sonoro, a animação documental e o documentário machinima”.

Com tantas influências, hibridismo e interconexões de mídias, o gênero

amplia a sua função em retratar uma determinada história do mundo. Não há pureza

em nenhum documentário, muito pelo contrário, há sempre um meio termo entre o

que é um documento e o que faz parte de uma imaginação.

Na verdade, o documentário puro nem é desejável, pois seria algo insípido, incolor e inodoro, além de inútil, e [...], a própria noção de documento depende de um engajamento da parte de quem lida com ele. (MACHADO, 2011, p. 10).

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Na esteira da cibercultura, onde o pós-moderno se desenvolve cada vez mais,

os documentários estão cada vez mais se intitulando como experimentais. Não por

acaso, o tema ‘linguagens expandidas’ do Rumos Itaú Cultural propõe a criação de

documentários sem amarras.

Mas, para Arlindo Machado, a questão dos “documentários experimentais”

requer pensar uma dupla negação: a negação do próprio documentário e a negação

da ficção, para dizer que no conceito do documentário atual, existe uma ampliação

do olhar, talvez ocasionado por uma desordem da interconexão mundial, onde a

comunicação todos-todos causa outro efeito na dinâmica do documentário e

principalmente no saber.

Porém, na veia da pós-modernidade, concordo com Fernão Pessoa Ramos

(2008) ao afirmar que muitos documentários contemporâneos são obras “limítrofes

em sua órbita”, nas quais todas as possibilidades devem ser acolhidas e olhadas

com atenção, sempre observando o gênero como um campo em expansão.

Realizadores se lançam para o fazer documental e transformam a realidade

do que antes era considerado um gênero marginal. Agora, o documentário ganha

um espaço maior dentro do cotidiano dos internautas. Além disso, fazer uma obra é

ter exposto um pensamento; é também utilizar o espaço da web para trocas; é

informar através da escrita audiovisual.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS:

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COSTA, Flávia Cesarino. O primeiro cinema. São Paulo: Saritta, 1995.

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tecnologias do virtual. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993. p. 37-48.

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Paulo: Francis, 2005.

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Imagem máquina: a era das tecnologias do virtual. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993. p.

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WEISSBERG, Jean-Louis. Real e virtual. In: PARENTE, André (Org.). Imagem

máquina: a era das tecnologias do virtual. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993. p. 117-126.

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LEMOS, André. Ciberespaço e Tecnologias Móveis: Processos de Territorialização e

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COMPÓS - Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em

Comunicação. UNESP-Bauru, 2006. Disponível em:

http://www.compos.org.br/data/biblioteca_762.pdf. Acesso em: 13 jun. 2010

REZENDE FILHO, Luiz Augusto Coimbra de. Documentário e Virtualização:

propostas para uma microfísica da prática documentária. Tese de doutorado da

Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro. 2005. Disponível em:

http://www.pos.eco.ufrj.br/. Acesso em: 18 nov. de 2010.

HIGHT, Craig. The field of digital documentary: a challenge to documentary

theorists. Studies in Documentary Film. Vol 2 Number 1. 2008. Disponível em:

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http://vnweb.hwwilsonweb.com.ez52.periodicos.capes.gov.br/hww/results/external_li

nk_maincontentframe.jhtml?_DARGS=/hww/results/results_common.jhtml.44.

Acesso em: 29 de abr. de 2011

MACHADO, Arlindo. Filme-Ensaio. Revista Intermídias, ano 2, n. 5, 2006.

Disponível em: http://www.intermidias.com/txt/ed56/Cinema_O%20filme-

ensaio_Arlindo%20Machado2.pdf. Acesso em: 03 de jun. 2011

PENAFRIA, Manuela; MADAÍL, Gonçalo. O Filme documentário em suporte digital.

Universidade da Beira Interior, 1999. Disponível em:

http://www.bocc.ubi.pt/pag/madail-penafria-digital.pdf. Acesso em: 16 de mar. 2012.

REFERÊNCIAS AUDIOVISUAIS

O Som do tempo. Direção: Petrus Cariri. Ceará: Rumos Itaú Cultural, 2010. (8min.),

Digital, son., color. Disponível em:

http://www.itaucultural.org.br/index.cfm?cd_pagina=2787&id=001768&titulo=O%20S

om%20do%20Tempo&auto=undefined

Restos (Remains). Direção: Cristina Maure e Pablo Lobato. Brasil, Cuba, EUA,

Inglaterra e França. 2003. (11min.), Dolby Digital 5.1, 35mm, son., color. Disponível

em: http://vimeo.com/12005874?ab

Webdoc Verdade. Direção: Paulo Castilho. São Paulo: Festival É Tudo Verdade,

2011. (aprox. 4min), Digital, son., color. Disponível em:

http://www.youtube.com/watch?v=Bu7gIxBQD2I

Cidades Visíveis. Direção: Cláudio Bueno, Denise Agassi, Marcus Bastos e Nacho

Durán. São Paulo, 2010. (4min), Digital, son., color. Disponível em:

http://vimeo.com/16435792

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ANEXO

Destaques da pesquisa webdoc realizada em 2011/2012 – Vimeo | Youtube |

Rumos Itaú Cultural

http://vimeo.com/20288667 - Negra Jhô

http://vimeo.com/22052448 - Dança Burlesca // Burlesque Dance

http://vimeo.com/22920228 - Barbearia 9 de Julho

http://vimeo.com/22927400 - Haters and skills

http://vimeo.com/22783584 - Loja Amores

http://vimeo.com/2544740 - Feature Doc - Caminhoneiros

Documentário Seleção Oficial da 31ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo

Co-Direção de Patrícia Oriollo, Juarez Malavazzi e Rodrigo Meirelles.

http://vimeo.com/6613278 - FEATURE DOCUMENTARY

by juarez malavazzi jr.

sao paulo - brazil

juarezmalavazzi.com

photographer, filmaker, storyteller

http://vimeo.com/13681132 - Webdoc Das Kapital Parte 1

Captação e montagem no primeiro episódio do webdoc Das Kapital, onde a banda Capital

Inicial conta detalhes do processo de produção do disco homônimo, entremeados por cenas

de turnê e estúdio dos últimos 6 meses.

http://vimeo.com/11001192 - CUCETA - A Cultura Queer de Solange Tô Aberta

Um documentário de Cláudio Manoel

sinopse:

Webdocumentário focando os bastidores do show, idéias e a filosofia queer do duo Solange

tô Aberta. Seriedade, sarcasmo, ironia, anarquia e cultura gay. A defesa do corpo livre, sem

formato social. O webdoc intercala entrevistas com trechos do shows.

ficha técnica:

Depoimentos de Paulo Belzebitchy e Pedro Costa; Direção e Fotografia de Cláudio Manoel

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Participações dos djs Môpa (estúdio) e Adriana Prates (live); Montagem de Wallace

Nogueira; Finalização da Vogal Imagem; Apoio de Necas Produções; Gravado com

handycam.

Duração: 13 minutos

claudiomanoel.wordpress.com

http://vimeo.com/11001015 - Johnny Star, performer

Miniwebdoc com o performer Johnny Star. Camera, edicao de Claudio Manoel. Gravado em

handycam.

http://vimeo.com/11295664 - Carlos Moliterno (depoimentos) - poeta alagoano

As idéias de um dos mais consagrados poetas alagoanos Carlos Moliterno (em memória)

sobre arte, amor, poesia...Vídeo produzido por Arla Coqueiro e Cláudio Manoel, em Maceió -

Alagoas, gravado em dezembro de 1996 (editado 1999). Autor da letra do Hino de Maceió,

foi o criador da grande obra A Ilha, composto de 59 sonetos em versos brancos. Alem de

poeta, era jornalista, crítico literário e foi, por seis mandatos, presidente da Academia

Alagoana de Letras.

http://vimeo.com/13257824 - Caretas de Saubara

Manifestação popular nos domingos de julho na cidade de Saubara, no Reconcâvo Baiano,

Bahia, Brasil. Garotos usam máscaras, roupas em trapos e folha de bananeira, como saia.

Saem nas ruas em grupos em algazarra. Essa manisfetação tem inspiração nas Caretas do

Mingau, que reune nas ruas (na madrugada do 1º para o dia 2 de julho) mulheres , "vestidas

de branco e com os rostos cobertos, se reúnem para percorrer as ruas da cidade

distribuindo mingau, bebendo licores e fazendo a maior algazarra do mundo. Dona Maria da

Cruz Santos, de 84 anos, lidera a brincadeira que relembra o papel importante das mulheres

do então distrito da Freguesia de São Domingos de Saubar".

(fonte: reconcavo.wordpress.com/2010/06/13/3-caretas-do-mingau/)

http://vimeo.com/12005874?ab - extrato do filme 'restos' doc 35mm

Vaca Amarela - sitiodavaca.com

A Vaca Amarela é uma produtora multimídia que realiza e produz projetos independentes e

autorais e presta serviços na realização de filmes e vídeos documentários, experimentais,

ficções e institucionais, música, animação, ilustração, website, design gráfico, autoração de

DVD e fotografia.

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composta por: bruno crepaldi _ designer gráfico e DJ nas horas vagas, desenvolve projetos

de webdesign e gráfico há 11 anos e faz alguns experimentos na área audiovisual. Formado

pela Escola de Design - UEMG, em Belo Horizonte.

cristina maure _ Artista plástica e realizadora. Estudou na Escola Guignard_UEMG, onde se

especializou em fotografia. Há 11 anos pesquisa e realiza trabalhos audiovisuais.Seus

trabalhos já foram exibidos em festivais e mostras, nacionais e internacionais.

robert frank _ Cantor e guitarrista da banda Pelos de Cachorro, ilustrador, animador e

finalizador. Realiza e contribui com trabalhos audiovisuais há 7 anos. Mora em Belo

Horizonte mas é apaixonado pelo mar.

http://www.sitiodavaca.com/documentario.php

outros documentários do sitio da vaca

Rio de Mulheres 20'47" | 35mm| cor | 2009 | Brasil

Direção | Produção: Cristina Maure e Joana Oliveira

Produtora: Vaca Amarela

Sinopse: Em uma região muito seca, onde a água é escassa, mulheres vivem somente entre

crianças e outras mulheres.

Restos

11'| 35mm| cor | 2003 | Brasil Direção | Produção: Cristina Maure e Pablo Lobato Produtora: TEIA Sinopse: Cinco câmeras, cinco cidades, uma noite e seus restos.

Testemunhos Sobre o Silêncio

Direção | Produção: Cristina Maure, Henrique Rocha e Inácio Neves Produtora: Cinear Sinopse: Depoimentos de comerciantes do Mercado em Turmalina no Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais, sobre o silêncio.

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http://vimeo.com/19489427 - São Roque de Minas_Serra da Canastra / by Vaca Amarela

Video realizado para o Projeto Cinema no Rio em 2009. O Cinema no Rio é um projeto que

exibe filmes nacionais em comunidades ribeirinhas do rio São Francisco, desde 2004.

Nesses quatro anos de existência, já levou o cinema a municipios dos estados de Minas

Gerais, Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe. Projeto idealizado e com a coordenação de

Inácio Neves.

http://vimeo.com/17095404?ab - DOC. AVA Marandu / by pontãodeculturabrasilplural

ste documentário vai muito além do registro do projeto Ava Marandu-Os Guarani Convidam,

realizado de Janeiro de 2010 em Mato Grosso do Sul, traz os Guaranis falando da realidade

em que vivem e expressando sentimentos diante do contato com as possibilidades do

audiovisual e da fotografia no contexto da memória, da luta e da resistência à tentativa de

entinção. 4MIN.

10 maio de 2011

http://www.fluxusonline.com/2010/film.php?cod=37

Paulo Menten – Wagner Munhê – pelo Vimeo, mas não está disponível

http://vimeo.com/7554529 - Imagens Inscritas - Bruno Jorge

http://vimeo.com/9337908 - Vidas Amostras - documentary – Bruno Jorge

2012

http://vimeo.com/2545922 - institucional com características de doc na web

http://vimeo.com/25166875 - webdoc gentediferenciada : webdoc

http://vimeo.com/38664536 - o que é webdoc? vídeo feito entre o 1o e o 2o dia da

oficina de Web Doc realizada com Jorge Bodanzky, dentro do 16o Festival É Tudo

Verdade - Festival Internacional de Documentários de São Paulo (abril / 2011).

direção e montagem: Cristina Müller

http://vimeo.com/25687916 - La commune de Paris: bilan d'un webdoc

http://vimeo.com/8550542 - L'essor du Webdocumentaire (France 24)

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http://vimeo.com/35763309 - Will Ryman WebDoc Ch6 - Final Night and a Look

Forward

http://vimeo.com/35891149 - Will Ryman WebDoc Ch2 - Martin and Past Works

http://vimeo.com/14212375 - la cité de verre

http://vimeo.com/38720032 - Mostra Ecofalante - Ativismo

http://vimeo.com/13915927 - Afonso Luz - Ativismo / Participante fala durante o

encontro Cultura e Pensamento: Juventude e Ativismo realizado em Belo Horizonte

entre os dias 1° e 7 de Agosto de 2010.

http://vimeo.com/13914199 - Poética

http://vimeo.com/36315174 - Teatro de Operações / O Coletivo Teatro de

Operações surge em 2009, a partir do interesse de jovens artistas recém desligados

do programa de extensão Teatro na Prisão (vinculado à UNIRIO), em investigar

formas de conjugar arte e ativismo micropolítico, usando o corpo como campo da

manifestação e a rua como território de intervenção. [email protected]

Metalinguagem – sobre documentário

http://vimeo.com/10636530 - Como fazer um argumento?

http://www.youtube.com/watch?v=Bu7gIxBQD2I - WEBDOC VERDADE YouTube

Oficina no Festival É tudo Verdade com Jorge Bodanzky

Youtube

http://www.youtube.com/watch?v=2lppbvRh_-Y - Tudo o que você sempre quis

saber sobre a Web 3 0 documentário ViuIsso Por Michel Lent (inglês)

http://www.youtube.com/watch?v=ImhK1QhmiOw&feature=fvsr - O Céu Nos

Observa / De: DanielLimaBR1 | Criado em: 07/12/2010

A proposta do documentário para web O CÉU NOS OBSERVA foi criar interferências

numa imagem da cidade de São Paulo captada por satélite. Através de ações

criadas por pessoas mobilizadas por uma chamada pública, o documentário propõs

uma discussão sobre a capacidade de interferir coletivamente nas estruturas de

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controle e vigilância de escala global. Um processo poético de criação de "ruídos" na

representação da metrópole. Daniel Lima é bacharel em Artes Plásticas pela Escola

de Comunicação e Artes da SP (ECA/USP); desde 2001, desenvolve intervenções

e interferências no espaço urbano. Próximo de trabalhos coletivos, desenvolve

também pesquisas relacionadas a mídia, questões raciais e processos educacionais

em dois diferentes grupos: Frente 3 de Fevereiro (www.frente3defevereiro.com.br)

e olítica do mpossível (www.politicadoimpossivel.org).

http://www.youtube.com/watch?v=0n7SKRp9YcA – Petrus Cariry – Documentário

para Web.

Somente uma parte. Documentário sobre um dia na vida de dona Fátima, mulher do

sertão, e sua relação com os ruídos da cidade e de sua casa. Sua humilde

residência fica no meio da cidade grande, cercada de avenidas e grandes prédios. O

som e o espaço são os objetos temáticos deste filme que aborda uma questão social

pelo aspecto poético. Petrus Cariry é cineasta, nascido em Fortaleza. Dirigiu, entre

outros, os curtas A Velha e o Mar, Dos Restos e das Solidões e A Montanha Mágica,

premiados em festivais nacionais e internacionais. Em 2007, lançou seu primeiro

longa, O Grão. O filme recebeu 28 prêmios, aqui e no exterior. Atualmente, prepara

o longaClarisse ou alguma coisa sobre nós dois

Rumos Itaú cultural

http://lat23.net/cidades_visiveis/

Explorando procedimentos possíveis apenas na internet, esse webdocumentário procura subverter a lógica de filmagem e edição típicas do cinema mainstream. Cidades Visíveis propõe filmes potenciais, montados cada vez que o usuário clica no play. As imagens de webcams ao vivo e as de um conjunto de vídeos gravados são exibidas ao mesmo tempo. Esses vídeos são distribuídos em categorias, mapeados por palavras-chave, ou tags. No momento de exibição, o sistema do site escolhe os vídeos aleatoriamente. As combinações criam diferentes sentidos e aproximam lugares remotos. Os critérios de reunião permanecem invisíveis para o usuário. Segundo os produtores, "a web é um lugar de presença remota, espaços outros, fratura, interrupções. Não faz sentido um webdocumentário manter a lógica de embate direto com os objetos filmados. No nosso projeto, as sequências disparadas não se repetem nem podem ser previstas. É tudo um comentário sobre algo que a internet torna evidente: a incapacidade de enxergar as coisas de modo completo".O grupo LAT-23 desvela as camadas de vivência que ficam escondidas no cotidiano das cidades. Com o retrabalho de mapas, por exemplo, demonstra histórias, curiosidades e personalidades que transitam pelas

Page 97: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE ... · despertei a consciência para o ser/estar pesquisadora. Estou certa de que o caminho teórico por onde passa a pesquisa sobre

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ruas sem deixar vestígio. Fazendo uso de mídias gráficas ou digitais, o LAT-23 fala da impossibilidade de se apreender a vida que nos circula em sua totalidade.

- visite o site oficial do coletivo Integrantes: Cláudio Bueno (site) é mestrando em Artes Visuais na Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP). Seu trabalho investiga as questões do espaço no mundo contemporâneo, trabalhando com mídias móveis e locativas, net art, vídeo, entre outros materiais. Denise Agassi (blog / site) atua no campo da fotografia, videoarte e net art. É doutoranda em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP e mestre em Artes Visuais pela Faculdade Santa Marcelina (FASM) (2007-2009). Em 2010, foi selecionada como artista residente do Museu de Imagem e do Som (MIS). Marcus Bastos é doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP e atua como professor nesta faculdade. Produziu de curtas-metragens a vídeos interativos, individual ou colaborativamente. Trabalhou como curador e tem textos críticos publicados em revistas e livros. Nacho Durán (site / oficinas) é espanhol e reside em São Paulo desde 2001. Desenvolveu projetos em várias linguagens, como VJing, design, programação, microcinema, net.art, entre outros. É fundador da empresa de produção multimídia Feitoamouse, e ministra oficinas e palestras no Brasil e exterior.

http://www.youtube.com/watch?v=veDZfejpbs8 – Satélite Bolinha

Bruno Vianna é mestre pelo ITP, programa de graduação da Tisch School, em Nova

York. Trabalha com cinema, instalações e meios portáteis. Dirigiu quatro curtas,

entre 1994 e 2003, e lançou seu primeiro longa, Cafuné, em 2006. Para suportes

portáteis, produziuPalm Poetry e Invisíveis. Satélite bolinha é o nome dado a um

grupo de satélites militares norte-americanos que, por ter acesso simplificado, foram

usados durante anos, ilegalmente, por brasileiros. Em março de 2009, o exagero na

comemoração de um gol de Ronaldo provocou um pedido americano à polícia

federal brasileira, que terminou na prisão temporária de 20 desses usuários [saiba

mais]. Com base no fato, o documentário cria uma estética audiovisual do ruído para

discutir tecnologia e liberdade de comunicação.