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UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL CAMPUS DE CERRO LARGO CURSO DE LETRAS: PORTUGUÊS E ESPANHOL - LICENCIATURA MÁRCIA ANGÉLICA JAROCZEWSKI CONSIDERAÇOES SOBRE O TRABALHO COM CONTOS AFRICANOS NO ENSINO MÉDIO CERRO LARGO 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL

CAMPUS DE CERRO LARGO

CURSO DE LETRAS: PORTUGUÊS E ESPANHOL - LICENCIATURA

MÁRCIA ANGÉLICA JAROCZEWSKI

CONSIDERAÇOES SOBRE O TRABALHO COM CONTOS AFRICANOS NO

ENSINO MÉDIO

CERRO LARGO

2017

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MÁRCIA ANGÉLICA JAROCZEWSKI

CONSIDERAÇOES SOBRE O TRABALHO COM CONTOS AFRICANOS NO

ENSINO MÉDIO

Trabalho de conclusão de curso apresentado no curso Letras Português E Espanhol – Licenciatura da Universidade Federal da Fronteira Sul, como requisito para obtenção do título de graduação em Letras.

Orientador: Prof.Dr.Demétrio Alves Paz

CERRO LARGO

2017

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RESUMO

Este resumo tem por objetivo apresentar duas propostas de sequências básicas com os contos: “Noventa e três” e “O adivinhador das mortes”, de Mia Couto, ambos pertencentes à literatura africana. O trabalho com os contos seria desenvolvido com uma turma do 1º ano do ensino Médio, em uma das escolas da rede estadual do município de Guarani das Missões – RS. A metodologia utilizada para a elaboração das atividades, foi à proposta de Letramento Literário de Rildo Cosson (2009), a qual apresenta quatro etapas: motivação, introdução, leitura e interpretação. O objetivo da pesquisa era trabalhar com contos africanos no Ensino Médio. Quanto à escolha do 1º ano do Ensino Médio, foi porque segundo informações obtidas na escola, essa turma ainda não tinha realizado nenhuma atividade com textos pertencentes à literatura africana. Se o trabalho com os dois contos escolhidos fosse realizado, os resultados seriam positivos, porque os estudantes sentiram-se motivados em conhecer outras obras pertencentes a autores africanos, se estimularia o gosto pela leitura de contos africanos, e ainda se promoveria a reflexão sobre a semelhança entre a cultura brasileira e a africana.

Palavras chaves: Contos africanos. Literatura africana. Ensino Médio.

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RESUMEN

Este resumen tiene por objetivo presentar dos propuestas de secuencias básicas con los cuentos: “Noventa e três” y O adivinhador das mortes”, de Mia Couto, pertenecientes a literatura africana. El trabajo con los cuentos sería desarrollado con un grupo del 1º año del Enseñanza Media, en una de las escuelas del red estadual del municipio de Guarani das Missões – RS. La metodología utilizada para la elaboración de las actividades, fue la propuesta de Letramento Literário de Rildo Cosson (2009), que presenta cuatro etapas: motivación, introducción, lectura e interpretación. El objetivo de la pesquisa era trabajar con los cuentos africanos en la Enseñanza Media. Fue elegido el 1º año de la Enseñanza Media, porque según informaciones obtenidas en la escuela, ese grupo no había realizado ninguna actividad con textos pertenecientes a literatura africana. Si el trabajo con los dos cuentos elegidos fuera realizado, los resultados serían positivos, porque los estudiantes se sentirían motivados en conocer otras libros pertenecientes a autores africanos, estimularía el gusto por la lectura de cuentos africanos y se promovería la reflexión respecto a la semejanza entre la cultura africana y brasileña.

Palabras clave: Cuentos africanos. Literatura africana. Enseñanza Media.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 7

2 O ENSINO DA LITERATURA AFRICANA ......................................................... 8

3 POR QUE O ENSINO MÉDIO? ........................................................................ 11

4 SEQUÊNCIA BÁSICA BASEADA NA TEORIA DE LETRAMENTO LITERÁRIO ....................................................................................................... 13

5 PROPOSTA DE ATIVIDADE COM O CONTO “NOVENTA E TRÊS” ............. 15

6 PROPOSTA DE ATIVIDADE COM O CONTO “O ADIVINHADOR DAS MORTES” ......................................................................................................... 18

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 20

REFERÊNCIAS ................................................................................................. 21

ANEXO A – Plano de aula referente ao conto “Noventa e três”........................ 22

ANEXO B – Plano de aula referente ao conto “O adivinhador das mortes” ...... 29

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1 INTRODUÇÃO

Este trabalho tem por objetivo apresentar duas propostas de sequências

básicas elaboradas com base na teoria de Letramento Literário de Rildo Cosson

(2009), a partir dos contos: “Noventa e três” e “O adivinhador das mortes”, do autor

Moçambicano Mia Couto, ambos pertencentes à literatura africana de língua

portuguesa. As atividades seriam desenvolvidas com a turma do 1º ano do ensino

Médio, em uma escola da rede estadual do munícipio de Guarani das Missões - RS.

A pergunta que envolveu esse trabalho era a seguinte: Qual é a importância

de trabalhar com contos de autores africanos de língua portuguesa no Ensino

Médio? Por meio desse trabalho, proporcionar-se-ia aos estudantes a oportunidade

de conhecer não só contos africanos, como também fariam uma comparação entre a

cultura brasileira e a africana. Através das atividades propostas, os alunos seriam

motivados a desenvolver o gosto pela leitura de obras pertencentes a autores

africanos.

Visto que se desconhece o trabalho com a literatura africana na escola vem

sendo pouco abordado em sala de aula, uma das causas é porque os professores

não tiveram contato durante sua formação. Diante disso, é importante que os novos

profissionais da educação tenham o conhecimento desses textos na formação, para

que mais tarde não tenham problemas em sala de aula.

Ressalta-se a importância de trabalhar com textos, neste caso seriam os

contos, pertencentes à literatura africana na escola, a fim de mostrar aos estudantes

a grande ligação que há da literatura brasileira com a africana.

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2 O ENSINO DA LITERATURA AFRICANA

Na maioria das vezes, o trabalho com a literatura africana na escola é

substituído por outros conteúdos. Uma das causas é porque os professores tiveram

pouco contato com textos da literatura africana durante sua formação. Dessa forma,

sentem-se inseguros para trabalhar em sala de aula. É o que afirma Rolon:

Muitos profissionais sentem dificuldade em abordar os temas relacionados à história e à literatura africana, alegam a falta de uma formação adequada a respeito de como introduzir esses conteúdos e apontam também a falta de capacitação e material didático específico. (ROLON, 2011, p.131).

Neste caso, segundo Guimarães (2010), os cursos de nível superior,

principalmente licenciaturas, devem oferecer aos futuros professores a disciplina de

História e Cultura Afro-Brasileira. Assim, os novos profissionais da educação

sentiram mais segurança quando se depararem com temas pertencentes à História

e Cultura Afro-Brasileira, em sala de aula.

Sabemos que no dia 09 de janeiro de 2003 foi implantada a Lei nº 10.639/03,

a qual tornou obrigatório o ensino da história e cultura africana nas escolas

brasileiras, incluindo o ensino fundamental e médio. De acordo com Leite,

A aplicação dessa lei 10639/03 nas escolas regulares traz à tona a real necessidade de se fazer uma nova abordagem do ensino das Literaturas e culturas Africanas, e poderá dar-se na escola, nova significação ou ressignificação à História Africana, que até então tem sido desconhecida, ignorada, desvalorizada ou tratada, a partir de uma ótica, isto é, a ótica dos dominadores. (LEITE, 2016, p.120).

Sendo assim, já há preocupação na elaboração de materiais didáticos, que

abordem temas pertencentes à literatura africana para os estudantes do ensino

médio. É de suma importância os alunos terem contato com a história e a cultura

africana na escola, porque os africanos também fizeram e fazem parte da

constituição do nosso país. Martin afirma que:

Atualmente, um dos grandes desafios para a elaboração de propostas didáticas para o ensino de literatura no Ensino Médio consiste no cumprimento da Lei nº 10.639/03, que torna obrigatório o estudo da história da África e dos africanos, da luta dos negros no Brasil, da cultura negra brasileira e do negro na formação da sociedade nacional. (MARTIN, 2016, p.126).

Com a implantação da Lei 10.639/03, a iniciativa principal é das escolas

públicas, as quais já vêm planejando atividades referentes à diversidade racial e

cultural é o que comprova Gomes (2011, p.121), [...] “no caso das escolas públicas,

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várias têm sido as práticas pedagógicas voltadas para a diversidade étnico-racial

existentes de norte a sul do país”. Assim, ao desenvolver o trabalho com textos da

literatura africana, os alunos sairão da escola com a opinião formada de que é

importante respeitar a diversidade racial e cultural existente na sociedade.

Outro ponto importante é que, ao levar os contos africanos para o trabalho em

sala de aula, será possível mostrar aos alunos que a cultura brasileira tem muitas

semelhanças com a africana, dessa maneira se ampliará o conhecimento dos

estudantes.

Como futuros docentes, é relevante trabalhar com textos pertencentes a

autores africanos, pois também é uma forma de vencer o preconceito que

atualmente ainda está muito presente na sociedade. Por isso a importância da

escola desenvolver no aprendiz a valorização da diversidade racial e cultural.

Segundo Sarteschi,

Trata-se, como se vê, de formar um indivíduo que seja capaz de compreender a diversidade como tal e não na clave da discriminação racial e, dessa maneira, a escola passaria a trabalhar no sentido de promover a valorização da diferença e da diversidade, afirmando positivamente a pluralidade e a singularidade de cada diferente cultura e a não aceitação das desigualdades. É seu papel ratificar essas diferenças como parte de um

amplo processo social e cultural. (SARTESCHI, 2010, p.135).

Sabemos que a discriminação racial tem aumentado muito nos últimos

tempos, e na escola também nos deparamos com esses problemas que muitas

vezes até geram transtornos na aprendizagem dos estudantes.

Ao desenvolver atividades com textos da literatura africana, os aprendizes

seriam motivados a irem à procura desses livros para fazer leitura. De acordo com

Rolon,

[...] ao promover o contato com autores africanos de expressão portuguesa, a escola irá mediar e estabelecer os diálogos entre a literatura brasileira e outras literaturas, outras culturas, promovendo a quebra de preconceitos e paradigmas. Na leitura desses autores, tem-se então uma literatura que transcende fronteiras geográficas e linguísticas. Evidenciam-se raízes similares e marcas identitárias. Nessa perspectiva percebem-se os enlaçamentos entre Brasil, Angola, Moçambique, Cabo Verde e outros países que sofreram semelhante processo de construção. (ROLON, 2011, p.133).

Com a inserção do ensino da literatura africana de língua portuguesa no

ensino, será possível mostrar que a cultura brasileira também tem uma grande

ligação com a cultura africana. O que para Rolon (2011, p.132) “em meio a todo

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esse processo o que se verifica e o que não se pode esquecer é o fato de que a

cultura brasileira está estreitamente ligada à cultura africana”. Na maioria das vezes,

no entanto, os alunos não sabem dessa ligação porque não tiveram o contato com

textos relacionados à cultura africana.

Guimarães (2010) destaca a importância de formar indivíduos que sejam

capazes de compreender a diversidade. A escola tem o papel de promover a

valorização da diferença e da diversidade, abordando a pluralidade e a singularidade

de cada cultura.

Petronilha (apud Sarteschi, 2010) apresenta a relevância de estudar temas

decorrentes da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Conhecer essa cultura e

essa história não se refere somente à população negra, mas sim a todos os

brasileiros, que devem educar-se enquanto cidadãos de uma sociedade de

indiscutível caráter multiétnico e pluricultural, para que sejam aptos a contribuir na

construção de uma sociedade mais democrática.

Dessa forma, é preciso que os alunos saibam que nós brasileiros temos uma

forte ligação com a África. É o que afirma Teixeira (2012, p.343), “[...] embora

incontestavelmente, as raízes étnicas do Brasil sejam, em larga escala, africanas, o

desconhecimento em relação ao continente faz com que proliferem visões

estereotipadas e preconceituosas sobre ele. [...]”. Por isso, é importante que a

escola seja responsável em oferecer aos estudantes o trabalho com textos

pertencentes às diversas áreas do conhecimento, estimulando assim o diálogo a

reflexão, e também a aprendizagem.

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3 POR QUE O ENSINO MÉDIO?

As atividades com os contos africanos foram planejadas para o 1º ano do

nível médio, partindo de uma conversa com a professora de literatura da escola,

onde a pesquisa seria realizada, que relatou que os estudantes ainda não tinham

tido contato com textos, nem atividades relacionadas a contos pertencentes à

literatura africana, em sala de aula.

Dessa forma, pensando nos alunos, foram elaboradas duas sequências

básicas tendo como base a teoria do Letramento Literário de Rildo Cosson (2009).

Os contos escolhidos para a elaboração das atividades foram: “Noventa e três” e “O

adivinhador das mortes”, do autor Moçambicano Mia Couto, ambos do livro Estórias

abensonhadas.

Quanto à eleição dos contos, “Noventa e três” apresenta a temática

relacionada à exclusão das pessoas idosas. Pensando nisso, seria importante

trabalhar com esse tema a partir de um conto africano, visto que os estudantes

fariam uma reflexão de como são tratadas as pessoas idosas na sociedade atual.

Ainda através dessa narrativa conheceriam um pouco da história do período de pós-

guerra em Moçambique. De acordo com Rolon,

[...] ratifica-se a justificativa para a presença de autores africanos no curriculum escolar brasileiro. Há nessas literaturas certa realidade, tem-se um documento lúdico e crítico, sobretudo original. Os textos conciliam imaginação e vivência, aproximam o leitor, acionam sua fantasia e ao mesmo tempo o faz refletir sobre o seu cotidiano. (ROLON, 2011, p.134).

Já a segunda narrativa escolhida foi “O adivinhador das mortes”,

apresentando a temática referente à morte. A partir desse tema, os estudantes

fariam uma comparação de como a morte é vista na tradição africana e na brasileira.

Escolhemos os contos porque acreditamos que “[...] o trabalho com

africanidade através dos contos [...] será uma oportunidade que a literatura dará aos

alunos brancos e negros da escola pública de adentrarem em histórias contadas por

escritores africanos”. (LEITE, 2016, p.121). Por meio dessas histórias, os estudantes

não só conheceriam os contos africanos, mas também perceberiam o quanto a

cultura brasileira tem semelhanças com a africana.

Também é necessário promover a leitura de textos diversificados, os quais

apresentam temáticas que fazem parte da nossa realidade, e isso pode ser

encontrado nos textos pertencentes à literatura africana. De acordo com Rolon,

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A formação do sujeito leitor é a preocupação de todas as instâncias educacionais. No entanto, a tarefa de formar leitores é árdua. Para se promover o hábito da leitura, em especial da leitura literária, é necessário que a escola tenha e coloque uma diversidade de textos à disposição do aluno, pois assim poderá ampliar seu repertório cultural. Cabe à escola tomar a si o papel de espaço privilegiado para a formação de leitores e a literatura o meio para que essa formação se concretize. (ROLON, 2011, p.133).

Atualmente os professores têm uma grande preocupação em estimular os

alunos a desenvolverem o gosto pela leitura, pois sabemos que os estudantes estão

desmotivados para ler. Realizar qualquer outra atividade é mais fácil, mas fazer

leitura parece ser uma tarefa difícil para os alunos. Segundo Agazzi (2014, p.443),

“os problemas sobre a formação do leitor de textos literários são inúmeros e têm se

adensado nos últimos anos”.

Diante disso, é preciso motivar de alguma forma os estudantes, levar para o

trabalho em sala de aula textos curtos, pois, dessa forma, se promoveria o gosto

pela leitura de obras pertencentes à literatura africana.

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4 SEQUÊNCIA BÁSICA BASEADA NA TEORIA DE LETRAMENTO LITERÁRIO

Como futuros docentes, é importante termos uma metodologia para elaborar

as nossas aulas, com o intuito de que os alunos sejam motivados a aprender o que

desejamos ensinar. Dessa forma, as atividades foram elaboradas tendo por base a

teoria de Letramento Literário de Rildo Cosson (2009), que apresenta quatro etapas:

motivação, introdução, leitura e interpretação.

A partir do trabalho com as quatro etapas, seria possível criar nos alunos o

interesse pela leitura, promover a reflexão das temáticas apresentadas e também

estimular a intepretação de textos literários. Visto que a proposta de Letramento

Literário apresenta relatos de aulas, também oferece aos professores duas

metodologias: a Sequência Básica e a Expandida, as quais ajudam o professor na

elaboração das aulas. De acordo com Cosson (2009),

[...] letramento literário: teoria e prática é uma proposta de ensino da leitura literária na escola básica, [...] não foi escrito para especialistas, mas sim para professores que desejam fazer do ensino da literatura uma prática significativa para si e para os seus alunos”. (COSSON, 2009, p.11).

Diante disso, a teoria de Letramento tem uma grande importância para tornar

as práticas em sala de aula mais significativas. O primeiro passo da sequência

básica, que constitui o letramento literário, é a motivação, que “consiste exatamente

em preparar o aluno para entrar no texto. O sucesso inicial do encontro do leitor com

a obra depende de boa motivação.” (COSSON, 2009, p.54). Assim, após a

motivação os estudantes estariam preparados para receber os textos que seriam

trabalhados.

O segundo passo do letramento é a introdução, “chamamos de introdução à

apresentação do autor da obra” (COSSON, 2009, p.57). Nessa etapa seria

apresentado o autor dos textos que seriam trabalhados, pois é importante que os

alunos saibam um pouco sobre a vida e obras do autor que está sendo trabalhado.

Lembrando de que a apresentação do autor do texto não seja longa, para que não

se torne cansativa.

A etapa seguinte a leitura, é o momento dos alunos entrarem em contato com

o texto, pois, “ler implica troca de sentidos não só entre o escritor e o leitor, mas

também com a sociedade onde ambos estão localizados, pois os sentidos são

resultados de compartilhamento de visões do mundo [...]”. (COSSON, 2009, p. 27).

Com a prática da leitura em sala de aula, os alunos são estimulados a

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desenvolverem mais esse hábito, ou seja, ser um leitor é adquirir conhecimentos

novos todos os dias. Por isso é importante fazer com que os estudantes leiam textos

diversificados.

A última etapa é a interpretação que segundo Cosson (2009,p.41), “por meio

da interpretação, o leitor negocia o sentido do texto, em um diálogo que envolve

autor, leitor e comunidade”. Assim, a interpretação consiste na construção dos

sentidos que o texto apresentou. Dessa forma seriam elaboradas algumas perguntas

referentes ao texto lido para os estudantes responderem.

A interpretação faz com que o aluno volte novamente no texto lido, para reler

alguma parte que passou despercebida no ato da leitura. Como também essa etapa

é uma forma de ajudar os estudantes a desenvolverem mais a escrita e a

compreensão de textos.

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5 PROPOSTA DE ATIVIDADE COM O CONTO “NOVENTA E TRÊS”

O primeiro texto trabalhado seria o conto “Noventa e três”, pertencente ao

livro Estórias abensonhadas (2012), de Mia Couto. Conforme já citado no decorrer

do texto, a metodologia utilizada para a elaboração das atividades foi a proposta de

letramento literário.

Por meio desse conto, os alunos fariam a reflexão sobre o tema referente à

exclusão das pessoas idosas na sociedade. Martin (2016, p.126) ressalta que “de

fato a leitura e a literatura constituem possibilidades de reflexão que apresentam

implicações psicológicas, sociais, culturais, e políticas bastante significativas”. Assim

comprova-se que, com o trabalho com contos africanos, é possível fazer com que os

estudantes reflitam sobre temáticas que não estão presentes somente na sociedade

africana, mas também na sociedade brasileira.

Ao iniciar a pesquisa, primeiramente os alunos seriam questionados com

algumas perguntas orais sobre a temática da narrativa como:

Vocês costumam ou costumavam visitar os avós com frequência?

Para vocês o que é mais importante no dia do aniversário?

E para os avós de vocês, o que é mais importante no dia do aniversário

deles?

Com a realização da motivação, os aprendizes estariam mais preparados

para realizar a leitura do conto, o que para Cosson (2009, p.55) é “[...] a construção

de uma situação em que os alunos devem responder a uma questão ou posicionar-

se diante de um tema é uma das maneiras usuais de construção da motivação”.

Dessa forma seria possível promover uma maior interação entre os alunos, todos

participariam opinando sobre a temática apresentada.

O intuito da motivação não seria de condenar as respostas dos estudantes,

dizendo que estão certas ou erradas, mas sim proporcionar um momento de reflexão

e discussão sobre o tema abordado. Posteriormente, seria distribuído o material

para os alunos, seriam feitas algumas perguntas para a turma como: Se conhecem

ou se já leram alguma obra do escritor Mia Couto.

No material dos estudantes seriam disponibilizadas informações sobre a vida

e obras do autor. Ou seja, isso faz referência à etapa da introdução, a qual consiste

na apresentação do nome completo do autor, local de nascimento, e um breve relato

sobre a sua origem e suas principais obras.

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Além disso, também é importante proporcionar aos estudantes o contato

físico com a obra na qual se encontra o texto que será trabalhado. Segundo Cosson

(2009, p.60), “Independentemente da estratégia usada para introduzir a obra, o

professor não pode deixar de apresentá-la fisicamente aos alunos”. Ao promover

esse contato com a obra, seria despertada no aluno a curiosidade em saber que

outras histórias há naquela obra, também é uma forma de instigar a leitura.

Para ajudar os alunos a compreenderem com mais facilidade o conto Noventa

e três, seria levado um mapa para mostrar onde se localiza Moçambique, local onde

a história se passa.

Por ser uma narrativa que apresenta traços referentes ao final da guerra civil,

que também atingiu Moçambique, seria exibido o documentário “Guerra no

Moçambique terminou há 20 anos”. Dessa forma, os estudantes saberiam um pouco

mais sobre a guerra que aconteceu em Moçambique, e também ajudaria na

compressão de algumas partes do conto. Após a exibição do vídeo, seria realizada a

discussão com o intuito de esclarecer as dúvidas e compartilhar o entendimento.

Prosseguindo, seria realizada a leitura do conto “Noventa e três”, a primeira

leitura seria em silêncio, porque é primeiro contato que o estudante tem com o texto,

e também na maioria das vezes os aprendizes só conseguem entender o texto

fazendo a leitura individual e em silêncio. Após a leitura em silêncio, seria realizada

a leitura oral e alternada pelos estudantes que se disponibilizassem, isso ajudaria

ainda mais na compressão do conto.

Sabemos que a leitura é um momento muito importante, pois através dela

podemos imaginar o texto da nossa forma, viajar para lugares que não conhecemos,

também para nos expressarmos melhor no momento da escrita. De acordo com

Agazzi,

[...] a leitura é um processo cognitivo e perceptivo implica reconhecer que as práticas leitoras interagem com o leitor tanto no que diz respeito ao seu repertório (passado) quanto à sua experiência (presente) e à expectativa de vida que tem (futuro). A confluência dos tempos gera uma ação cujo caráter interacionista da linguagem coloca o leitor e o texto em permanente diálogo com a coletividade. (AGAZZI, 2014, p.449).

Diante disso, é possível afirmar que a leitura é a base para o aluno

desenvolver a escrita, saber usar argumentos para defender as suas ideias, como

futuro cidadão. Assim ao final das leituras, seria realizada a discussão do conto

“Noventa e três” com o intuito de promover o diálogo sobre a temática apresentada

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no conto, também seria o momento dos alunos esclarecerem as dúvidas que teriam.

Visto que, “na ação de compartilhar a interpretações textuais, é possível ganhar

consciência de que a coletividade fortalece a individualidade, exatamente, porque

pode ampliar a visão que uma pessoa tem do mundo [...]”. (AGAZZI, 2014, p.448).

Ressalta-se que a partir do compartilhamento das leituras, os estudantes têm a

oportunidade de expressar o que compreenderam.

Continuando as atividades, os estudantes responderiam algumas questões de

interpretação referentes ao conto lido, que seriam as seguintes:

Qual é a relação entre o título do conto e o personagem principal?

Qual é a temática apresentada? Justifique com uma passagem do texto.

Como era o comportamento do avô durante o seu aniversário? Justifique

sua resposta segundo o texto.

Porque o avô queria fugir da sua própria festa de aniversário?

Quem realmente demonstrava afeto pelo avô?

Por que o menino Ditinho perdeu a moradia?

No final do conto, há uma fala do menino Ditinho: “sua bengala, a partir de

hoje, sou eu”. Comente com suas palavras qual é o significado desse

trecho.

A partir das perguntas de interpretação, os estudantes mostrariam se tiveram

um bom entendimento do conto trabalhado, também se tiveram dificuldade para

compreendê-lo por ser um conto africano.

Para finalizar as atividades com o conto “Noventa e três”, seria apresentada a

proposta de produção textual, última etapa do letramento literário. Na produção, os

estudantes teriam que produzir uma história em forma de texto narrativo de no

mínimo 30 linhas, em que o personagem principal seria uma idosa(o), contando

como atualmente na sociedade brasileira são vistos e tratados os idosos. Quais

vantagens e desvantagens eles têm. De que forma são ou não valorizados?

Por meio da produção textual, os estudantes seriam instigados a refletir sobre

a temática apresentada no conto, pensando na realidade dos dias atuais de como

realmente as pessoas idosas são vistas por eles.

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6 PROPOSTA DE ATIVIDADE COM O CONTO “O ADIVINHADOR DAS MORTES”

O segundo texto trabalhado seria o conto “O adivinhador das mortes”,

também pertencente ao autor Mia Couto, do livro Estórias abensonhadas (2012).

Visto que assim a pesquisa seria mais aprofundada e os estudantes conheceriam

dois contos africanos, mas cada um com a temática diferente.

Estas atividades também foram elaboradas tendo por base a teoria de

letramento literário de Rildo Cosson (2009). Primeiramente seria feita a motivação

envolvendo a temática do conto, pediria que os estudantes escrevessem em um

pequeno papel uma palavra que define a morte para eles, depois de escrita cada um

falaria porque escolheu aquela palavra.

Prosseguindo, a próxima etapa, a introdução, consiste na apresentação do

autor da narrativa, mas como esse conto também é de Mia Couto. Não seria

necessário apresentar o autor novamente porque os alunos já saberiam um pouco

sobre ele através da atividade que envolveu o conto “Noventa e três”, dessa forma

só seriam retomadas algumas informações.

Na etapa que constitui a leitura, seria realizada uma leitura em silêncio,

depois oral e alternada, pelos alunos que se dispusessem a ler. Agazzi afirma que:

“[...] o ato de ler é compreendido dentro do jogo dialético, entre o eu e o outro, entre o horizonte de expetativas estabelecido e o que está por vir, entre o autor e o leitor, entre o estudante e o ambiente escolar, é importante reconhecer que a leitura é uma prática constitutiva da aprendizagem que permeia todas as áreas do conhecimento de forma não segmentada [...].” (AGAZZI, 2014, p.449).

A leitura é o momento muito importante para o estudante, porque é primeiro

contato com o texto, assim poderá interpretá-lo da sua maneira.

Após as leituras, seria realizada a discussão relacionada ao conto lido, pois

esse momento é de relevância para que os alunos façam os seus comentários sobre

o que compreenderam, também se proporcionaria uma maior interação entre a

turma. Agazzi (2014, p.448), afirma que “ao compartilhar a interpretação dos textos

literários no grupo escolar, o aluno pode ampliar os sentidos que construiu

previamente, mobilizando o seu horizonte de expectativas”.

A partir do compartilhamento das leituras, seria possível ajudar os estudantes

a compreenderem melhor o texto. Para melhor ainda compreender o conto “O

adivinhador das mortes”, responderiam algumas perguntas de interpretação

referente à leitura:

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De que maneira a morte aparece no conto de Mia Couto?

Que objeto o adivinheiro utilizava para realizar as consultas? Por que este

objeto é importante?

No início da narrativa Adabo Salange não tinha curiosidade em saber o dia

da sua morte. Por que ele mudou de ideia no decorrer da narrativa?

O que Adabo Salange descobriu no dia em que realizou a consulta com o

adivinheiro?

Ao voltar novamente ao consultório do adivinheiro, o que Adabo ficou

sabendo?

Releia o trecho final do conto: “E os dois pelo caminhinho não deixavam

nenhuma pegada, fossem pisando não a areia, mas o céu”. Quem são os

dois? O que pode ter acontecido com eles?

Para encerrar o trabalho com mais um dos contos pertencentes à literatura

africana, seria apresentada a proposta de produção textual referente à temática do

conto, que consistiria na escrita de um texto narrativo de, no mínimo, 35 linhas,

respondendo a seguinte questão: O que você faria se descobrisse que hoje é o seu

último dia de vida? Conte o seu dia com detalhes, relatando todas as atividades que

gostaria de ter feito, mas não tinha tido oportunidade.

Ao encerrar as atividades com o conto “O adivinhador das mortes”, os

estudantes perceberiam de que por meio da literatura africana também é possível

refletir sobre como o conceito de morte é visto por nós brasileiros.

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7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao final deste trabalho percebemos que a importância de trabalhar com os

contos africanos: “Noventa e três” e “O adivinhador das mortes”, no 1º ano do ensino

médio, se motivaria o gosto pela leitura de contos pertencentes à literatura africana.

Também se promoveria nos estudantes a reflexão de que a cultura brasileira tem

uma grande semelhança com a cultura africana.

Sendo que ambos os contos que seriam trabalhados, proporcionariam aos

alunos momentos de reflexão referente às temáticas que apresentavam. Ainda seria

possível proporcionar o conhecimento dos contos africanos para essa determinada

turma que ainda nunca tinha tido contato com nenhuma atividade envolvendo a

literatura africana.

A partir desse trabalho, contribuiríamos para um ensino mais plural, em que a

diversidade racial e cultural fossem mais valorizadas e respeitadas pela sociedade,

já que atualmente pouco tem se comprometido com esses temas, os quais são

relevantes para formação dos estudantes.

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REFERÊNCIAS

AGAZZI, Giselle Larizzatti. Problemas do Ensino da literatura: Do perigo ao voo possível. Campinas-São Paulo, p.443-458, Jul./Dez.2014.

COSSON, Rildo. Letramento Literário: teoria e prática. 1. ed., 3ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2009.

COUTO, Mia. Estórias abensonhadas. Contos. 1ª. ed. São Paulo: Companhia das letras, 2012.

GUIMARÃES, Percília Antônia Garcia. A necessidade de valorização do ensino de literaturas africanas. Revista África e Africanidades. v.6, n.18, p.1-9, jan. 2015.

LEITE. Douglas Pereira. Ensino de Literaturas africanas de língua portuguesa no Ensino Fundamental. Revista de estudos Linguísticos, Literários, Culturais e da Contemporaneidade - Associada ao programa de mestrado Profletras-UPE-Garanhuns - aos grupos de pesquisa ARGILEA e DISCENS.nº.1,p.118-127,Mar.2016.

MARTIN, Vima Lia de Rossi. Algumas propostas para o ensino das literaturas africanas e afro-brasileiras no Ensino Médio.Revista Abril,v.8,nº.17.Dez.2016.

ROLON, Renata Beatriz Brandespin. O Ensino das Literaturas Africanas de Língua Portuguesa no Curriculum Escolar Brasileiro: Algumas Considerações. Revista ecos Edição. n.11, p.131-139,dezembro 2011.

SARTESCHI, Rosangela. As literaturas de língua portuguesa no ensino básico: breve reflexão. Revista Via Atlântica.n.18,p.133-146,Dez.2010.

TEIXEIRA, Isabel Cristina Santos. A interdisciplinaridade no estudo da Literatura Africana de Língua Portuguesa. Revista Internacional Interdisciplinar INTERtheis. Florianópolis, v.9, n.1, p.334-348, jan./jul.2012.

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ANEXO A – Plano de aula referente ao conto “Noventa e três”

UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL CAMPUS DE CERRO LARGO

MATERIAL DO PESQUISADOR

1 DADOS DE IDENTIFICAÇÃO

1.1 Acadêmica: Márcia Angélica Jaroczewski 1.2 Escola: 1.3 Série: 1º/ Ano: 2017 1.4 Turno: Tarde 1.5 Número de alunos: 20 alunos 1.6 Orientador: Demétrio Alves Paz

2 JUSTIFICATIVA

Atualmente, os professores têm a missão de motivar os estudantes para que

desenvolvam o hábito da leitura, pois estamos em uma época em que o uso de

aparelhos tecnológicos se tornou um hábito, assim a leitura está sendo deixada de

lado.

Dessa forma, ao trabalhar com um dos contos pertencentes à literatura

africana, será possível instigar os alunos a irem em busca da leitura de obras

diferentes das que já estão acostumados.

Também o trabalho com o conto “Noventa e três”, do autor Moçambicano Mia

Couto fará com que os estudantes conheçam um pouco da história de pós-guerra de

Moçambique, como também poderão refletir sobre a exclusão das pessoas idosas

na sociedade.

3 OBJETIVOS

3.1 Objetivo Geral:

Proporcionar por meio de um conto africano a reflexão sobre a exclusão das

pessoas idosas na sociedade.

3.2 Objetivos específico

Conhecer um conto africano;

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Incentivar a leitura de contos pertencentes às literaturas africanas de língua

portuguesa;

Refletir sobre a temática presente no conto;

4 METODOLOGIA

Este plano de aula foi elaborado com base na proposta de Letramento

Literário de Rildo Cosson, composta por quatro etapas: motivação, introdução,

leitura e interpretação.

MOTIVAÇÃO

Primeiramente será realizada a motivação com alguns questionamentos orais

como:

1) Vocês costumam ou costumavam visitar os avós com frequência?

2) Para vocês o que é mais importante no dia do aniversário?

3) E para os avós de vocês o que é mais importante no dia do aniversário

deles?

INTRODUÇÃO

Na etapa da introdução, será apresentado o autor do conto, Mia Couto.

Primeiramente perguntarei se conhecem ou se já leram alguma obra do autor.

Levarei o mapa para mostrar onde se localiza Moçambique. Depois será exibido um

documentário sobre a guerra civil que assolou o país, com o intuito de auxiliar os

estudantes a compreenderem melhor o conto, pois a narrativa apresenta dados

referentes ao final da guerra civil.

LEITURA

Os alunos farão uma leitura silenciosa e outra oral e alternada (cada aluno lê

uma parte ou parágrafo, conforme a disposição em ler).

INTEPRETAÇÃO

Após a leitura, será realizada a discussão sobre o assunto do conto,

estimulando os alunos a mostrarem o que entenderam e a esclarecerem as dúvidas

referentes ao contexto histórico.

Para finalizar será apresentada a proposta de produção textual referente ao

conto trabalhado.

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5 RECURSOS/MATERIAIS QUE SERÃO UTILIZADOS

Folhas impressas, mapa, datashow.

6 BIBLIOGRAFIA:

Biografia do autor Mia Couto: Disponível em: https://pensador.uol.com.br/autor/mia_couto/biografia/. Acesso em: abril de 2017.

COSSON, Rildo. Letramento Literário: teoria e prática. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2011.

COUTO, Mia. Estórias Abensonhadas. 1ª ed. São Paulo:Companhia das letras, 2012.

Documentário sobre Guerra no Moçambique terminou há 20 anos, Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=QrzIsAEFLXQ. Acesso em: Abril de 2017.

7 ANEXOS

Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Cerro Largo- RS

Considerações sobre o trabalho com contos africanos no Ensino Médio

Material para pesquisa

Aluno ( )

Aluna ( )

Sobre o autor do conto:

Mia Couto

Antônio Emílio Leite Couto, mais conhecido por Mia Couto, nasceu em 5 de

Julho de 1955, na cidade da Beira, em Moçambique. Sua paixão por gatos o fez

adotar o pseudônimo de Mia. Filho de imigrantes portugueses, aos 14 anos teve

seus poemas publicados no jornal “Notícias da Beira”. Em 1971 muda-se para a

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capital Lourenço Marques (hoje Maputo), onde estudou Medicina, sem concluir o

curso. Exerceu a função de jornalista na “Tribuna” e no “Jornal de Notícias”. Foi

diretor da Agência de Informações de Moçambique.

Em 1983, Mia Couto publica seu primeiro livro de poesias “Raiz de Orvalho”,

onde aborda as representações dos sonhos para refazer a memória do país e

recuperar a identidade que o processo de colonização desmantelou. Em 1992,

publicou “Terra Sonâmbula”, que foi considerado um dos melhores livros africanos

do século XX. É um romance escrito em prosa poética, que compõe uma bela fábula

que nos ensina a sonhar, mesmo nas condições mais adversas. Nos versos de

“Poema Mestiço”, Mia Couto busca a identidade, além de uma esperança que é

depositada no futuro, expressando o desejo de mudança.

Além de ser considerado um dos mais importantes escritores de Moçambique,

tem seus livros traduzidos em diversos países.

Disponível em: https://pensador.uol.com.br/autor/mia_couto/biografia/. Acesso em:

abril de 2017.

Apresentação do livro em que o conto se encontra

Estás histórias foram escritas depois da guerra. Por incontáveis anos as

armas tinham vertido luto no chão de Moçambique. Estes textos me surgiram entre

as margens da mágoa e da esperança. Depois de quase trinta anos de guerras,

Moçambique por fim entrou em um longo período de paz.

COUTO, Mia. Estórias Abensonhadas. 1ª ed. São Paulo: Companhia das letras,

2012.

Conto para leitura:

Noventa e Três

Mia Couto

Foram entrando um por um. O velho estava na cabeceira, cabeceando. À

medida que entravam alguém anunciava os nomes, descrevendo em alta voz o jeito

dos vestidos. Os netos encheram a sala, os bisnetos sobraram no quintal. O avô

levantava um olhar silencioso, sem luz. Sorria o tempo todo: não queria cometer

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indelicadeza. O avô fingia, aniversariante. Porque em nenhum outro dia os outros

dele se recordavam. Deixavam-no poeirando com os demais objetos da sala.

Esta noite, as prendas se juntam e ele apalpa os embrulhos. O seu gesto não

leva desacerto. Afinal, não há mão mais segura que a do cego. Porque o cego

agarra o que há e o resto não acontece. Lugar de quem não vê está sempre certo:

afinal, só erra quem pode escolher. O velho agradece, vidente invisual. Tudo estando

longe da vista, perto do coração.

Os convidados ficam um tempito junto dele, não sabem o que dizer, não há

quase nada a dizer, o velho ouve só acima das gritarias. Depois, quem sabe olhar

um cego? Vendo-o assim esplendoroso, acreditam, para sossego deles, que o avô já

tenha adormecido. O dia lhe sendo igual à noite, o cego bem deve dormir de ouvido.

Mas o avô apenas se finge dormindo. Naquele enquanto, ele apenas aguarda

uma fresta para poder exercer sua mais secreta malandrice. Todos os dias escapa

do lar. Quando a cidade refreia o pulso, ele sai à rua. Nunca lhe notaram essas

ausências. Nem imaginam que, andando em tropeços tão pequenos que nunca

chega a cair, ele diariamente se evade para o jardim público. Vai encontrar seus dois

vigentes amigos: um gato silvestre e Ditinho,o menino da rua, desses que perderam

morada. O miúdo lhe conversa e o velho lhe oferece uma nenhumita coisa que

roubou de casa.Para ambos o mundo é muito grande. Cansado de puxar estória, o

miúdo adormece. Amolecido o avô também se aplica no banco de jardim. Até que

aparece o gato, mais meloso que remeloso. O gatito se esfrega, seu todo corpo é

uma língua lambendo o velho. O bicho ronrona farfalhante. Gato que ama é sempre

asmático?

Agora, por entre os barulhos que invadiram toda a casa, o avô sente saudade

do jardim. Será que pode sair?

- Sair?

Os familiares se admiram, indignados. Então, no preciso dia de anos? E

aonde? O velho se resigna, desistido. Que ele era de manias já sabiam. Há três

anos atrás ele decidira fazer seu próprio caixão. A família se perguntava: que deu

nele? A filha mais velha estremeceu: seria pressentimento? Os irmãos, contudo,

riram: disparate! O velho, no entanto, prosseguia a construção. Hoje um toque,

amanhã um retoque. Esta é a morada a mais definitiva, obra para nossa eternidade,

não será que vale a pena cuidar dela? Vocês estão a vida inteira trabalhando para e

erguer casa provisória; eu trabalho no definitivo.

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Por isso, os familiares não se perturbam com os desejos do velho. Em plena

comemoração da sua idade ele quer ir passear-se longe e sozinho? Coisa de

menino, delírio infantil. E assim deixam o velho na poltrona da cabeceira , em

aparência de sono. Todos se garantem de que ele não precisa mais cuidado. Mas a

ilusão de estar certo nasce de todos estarem errado no mesmo momento. Pois, o

velho, de repente, proclama a súbita pergunta:

- Me desculpem vocês todos: mas, fim ao cabo, quantos anos eu faço?

Riram-se. O velho malandrava, devia fingir esquecimento. Uma voz se

levanta, lhe anunciando a idade. O velho franze a testa desconfiado:

- Noventa e três?

Parecia atónito. No restante da noite, ele intervalava a cada hora com

repentinos espantos. E voltava:

- Noventa e três?

Mais tarde, já as danças se emparelhavam. O velho tropeçando entre os

casais, aborda um alguém: me desculpa, meu filho, em que ano estamos?

- Noventa e três, pai.

Não, corrige o velho. Pergunto em que ano estamos. Mas já ninguém estava.

A multidão ruidosa, acelera os festejos. Naquela alegria não cabem os avôs. As

bebidas correm, as mentes se vão tornando líquidas.

Finalmente trazem o bolo de aniversário. O velho sopra em todo o lado menos

no bolo. Decidem todos juntos apagar as vela, na vez do festejado. O bolo é cortado

rápido, há que regressar à alegria. O velho deve estar por aí dormindo, dizem, ele

descansa assim no meio de qualquer momento. Mas o avô não dorme. Está quieto

sofrendo de saudade dos seus companheiros da rua, Ditinho mais o gato. Esses,

sim, mereciam pensamento. Só para eles, vadios do jardim, ele se sentia avô.

E sem que ninguém se aperceba, o aniversariante escapa do aniversário. Se

adentra no jardinzito e se estende no banco, suspirando uma leve felicidade. O gato

desce da paisagem e se enrosca docemente no braço. O velho lhe tinha reservado

um doce roubado à festa. Ditinho chega depois, vindo de jantar um lixo.

Diante do banco, o miúdo espreita curioso. Nunca o velho se apresentara tão

tardio. A criança se senta familiar. Coloca a mão no bolso do avô, avalia-lhe o

volume da carteira e pergunta:

- Então, quanto temos aqui?

O velho sorri, leva a mão ao peito e proclama:

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- Noventa e três!

Os olhos do miúdo relampejam:

-Tudo isso? Estás rico, vovô!

O velho concorda acendendo um sorriso. O menino tinha o coração em

trabalho de parto:

- Com esse tanto dinheiro hoje vamos fartar por aí: comer, beber, gargalhotar.

E se levanta puxando o velho por uma escura ruela. O avô ainda se lembra: a minha

bengala! Mas Ditinho responde: sua bengala, a partir de hoje, sou eu. E se afastam

os dois, cada vez mais longe dos ruídos da festa de aniversário. No jardim, o gato

esfrega uma saudade na esquecida bengala. Depois, corre pelo beco escuro,

juntando-se aos dois amigos, que, já longe, festejam o tempo, comemorando o dia

em que todos os homens fazem anos.

COUTO, Mia. Estórias Abensonhadas. 1ªed. São Paulo: Companhia das letras,

2012.

Questões de interpretação referentes à leitura do conto:

1) Qual é a relação entre o título do conto e o personagem principal?

2) Qual é a temática apresentada? Justifique com uma passagem do texto.

3) Como era o comportamento do avô durante o seu aniversário? Justifique sua

resposta segundo o texto.

4) Porque o avô queria fugir da sua própria festa de aniversário?

5) Quem realmente demonstrava afeto pelo avô?

6) No final do conto, há uma fala do menino Ditinho: “sua bengala, a partir de

hoje, sou eu”. Comente com suas palavras qual é o significado desse trecho.

Produção textual

1) Agora que você já conhece o conto “Noventa e três” do autor Mia Couto,

escreva uma história em que a personagem principal é um (a) idoso (a).

Conte como, atualmente na sociedade brasileira, são vistos e tratados os

idosos. Quais são as vantagens e desvantagens que têm? De que forma são

ou não valorizados? Escreva um texto narrativo de, no mínimo, 30 linhas.

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ANEXO B – Plano de aula referente ao conto “O adivinhador das mortes”

UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL CAMPUS DE CERRO LARGO

MATERIAL DO PESQUISADOR

1 DADOS DE IDENTIFICAÇÃO

1.1 Acadêmico: Márcia Angélica Jaroczewski 1.2 Escola: 1.3 Série: 1º/ Ano: 2017 1.4 Turno: Tarde 1.5 Período de realização: Abril de 2017 1.6 Número de alunos: 20 alunos 1.7 Orientador: Demétrio Alves Paz

2 JUSTIFICATIVA

O trabalho com o conto “O adivinhador das mortes” proporcionará aos

estudantes o conhecimento sobre o conceito da morte na sociedade africana. Assim,

os alunos serão instigados a refletir como a morte é vista na nossa sociedade e na

sociedade Moçambicana.

3 OBJETIVOS

3.1 Objetivo Geral:

Proporcionar, por meio de um conto moçambicano, a reflexão sobre o

conceito de morte na tradição africana.

3.2 Objetivos específicos:

Conhecer a visão africana da morte por meio de um conto moçambicano;

Refletir sobre a temática da morte presente no conto;

Perceber as semelhanças ou diferenças sobre o conceito de morte entre a

sociedade moçambicana e a sociedade brasileira.

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4 METODOLOGIA

Este plano de aula foi elaborado com base na proposta de Letramento

Literário de Rildo Cosson, composta por quatro etapas: motivação, introdução,

leitura e interpretação.

MOTIVAÇÃO

Primeiramente será realizada a motivação, falarei a palavra “morte”, em

seguida pedirei que escrevam uma palavra que define a morte para eles. Depois que

acabarem de escrever, cada um poderá falar a palavra que escreveu e o porquê de

tê-la escolhido.

INTRODUÇÃO

A etapa da introdução é o momento da apresentação do autor do conto.

Contudo, os estudantes já tiveram a apresentação de Mia Couto na atividade que

envolveu o trabalho com o conto “Noventa e três”. Portanto, somente retomaremos

alguns dados sobre ele.

LEITURA

Nessa etapa, os alunos farão uma leitura em silenciosa do conto, e

posteriormente, a leitura oral e alternada (para quem se dispuser a ler).

INTERPRETAÇÃO

Após as leituras, será feito um debate referente ao conto com o intuito de

esclarecer as dúvidas e mostrarem o que entenderam. Posteriormente terão que

responder algumas questões de interpretação referentes à leitura do conto.

Para finalizar as atividades, será apresentada a proposta de produção textual,

que consistira em uma atividade que envolve a temática do conto.

5 RECURSOS/MATERIAIS QUE SERÃO UTILIZADOS

Folhas impressas.

6 BIBLIOGRAFIA:

Biografia do autor Mia Couto Disponível em: https://pensador.uol.com.br/autor/mia_couto/biografia/. Acesso em: abril de 20

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COSSON, Rildo. Letramento Literário: teoria e prática. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2011.

COUTO, Mia. Estórias Abensonhadas. 1ªed. São Paulo: Companhia das letras, 2012

7 ANEXO

Universidade Federal da Fronteira Sul

Campus Cerro Largo- RS

Considerações sobre o trabalho com contos africanos no Ensino Médio

Material para pesquisa

Aluno ( )

Aluna ( )

Sobre o autor do conto:

Mia Couto

Antônio Emílio Leite Couto, mais conhecido por Mia Couto, nasceu em 5 de

Julho de 1955, na cidade da Beira, em Moçambique. Sua paixão por gatos o fez

adotar o pseudônimo de Mia. Filho de imigrantes portugueses, aos 14 anos teve

seus poemas publicados no jornal “Notícias da Beira”. Em 1971 muda-se para a

capital Lourenço Marques (hoje Maputo), onde estudou Medicina, sem concluir o

curso. Exerceu a função de jornalista na “Tribuna” e no “Jornal de Notícias”. Foi

diretor da Agência de Informações de Moçambique.

Em 1983, Mia Couto publica seu primeiro livro de poesias “Raiz de Orvalho”,

onde aborda as representações dos sonhos para refazer a memória do país e

recuperar a identidade que o processo de colonização desmantelou. Em 1992,

publicou “Terra Sonâmbula”, que foi considerado um dos melhores livros africanos

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do século XX. É um romance escrito em prosa poética, que compõe uma bela fábula

que nos ensina a sonhar, mesmo nas condições mais adversas. Nos versos de

“Poema Mestiço”, Mia Couto busca a identidade, além de uma esperança que é

depositada no futuro, expressando o desejo de mudança.

Além de ser considerado um dos mais importantes escritores de Moçambique,

tem seus livros traduzidos em diversos países.

Disponível em: https://pensador.uol.com.br/autor/mia_couto/biografia/. Acesso em:

abril de 2017.

Conto para leitura:

O adivinhador das mortes

Mia Couto

No bairrinho de Muitetecate havia um poderoso espiriteiro que adivinhava,

com acerto de álgebra, a data das individuais mortes. Não usava os convencionais

métodos: pedrinhas, conchas e ossinhos. Não. Ele tinha duas pequenas cruzes de

marfim que encostava sobre os olhos dos consultados. O adivinho cerrava os seus

próprios olhos: se concentrava, todo dentro das pálpebras, até abraçar com seu

escuro o escuro do outro. Nesse tocar de penumbras se escrevia o exato da data

dos falecimentos.

Pois, em Muitetecate, todos encorajavam Adabo Salanje a consultar os

serviços do adivinheiro.

-Vai e sabes o fatal dia.

Adabo recusava. Saber seu derradeiro prazo? Para fazer o quê? Certas

felicidades só chegam com o não saber. Aprendemos a viver não é para

terminarmos. A luz não aceita seu futuro: ser poeira. Saboreamos o cristal do riso, a

polpa sumaruda do amor, a doce sombra da amizade, trincamos a eternidade em

breves dentadas não é para depois sermos nada, nenhum, ninguém.

E Adabo Salanje se dava bem era nessa ignorância, ilusão de não ter

contrato com o tempo. Até que uma noite despertou em tremuras e transpiros.

Salanje acordou em pleno escuro, coração a sair-lhe pelos poros. Sonhara que

estava na residência dos mortos e lhe perguntavam:

- Você, Salanje, ainda está morto?

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E lhe empurravam: ele que se servisse de consulta com os aléns para saber a

data da sua revivência. Afinal, quanto mais tarde ele soubesse mais cedo ele

transitaria de estado, no inverso da lógica deste outro lado do mundo.

No dia seguinte, saído à rua, Salanje saboreou a claridade como se fosse a

primeira vez. Será verdade, estou vindo do além? Afinal, o sonho se cumprira?

Fosse ou não, Adabo Salanje se deslumbrava com o azul, trinantes cantos

enfeitando os pássaros. Naquele mesmo momento, ele se decidiu e se encaminhou

para o adivinhista. Pensava o ensinamento do sonho: se soubesse a prévia data da

póstuma morte ele acabaria ludibriando o calendário. A surpresa é a vantagem da

morte. Roube-se-lhe esse proveito e seremos nós, mortais, eternos vencedores e

viventes. E ele lá foi. O adivinho recebeu-lhe torcendo troça nos lábios. Ordenou que

se sentasse na penumbra. O sábio espreitava o tempo através das cruzes colocadas

sobre os cerrados olhos. Requeria-se o total silêncio. De repente, ele confessou

preocupação, em estalo da língua:

- Desconsigo. Sua cabeça está muito barulhosa. Aquiete lá o pensamento!

Adabo se admirou. Ele estava em total imobilidade. Que culpa tinha? O

adivinhador voltou a concentrar-se em seus serviços. Ficou afastando e

aproximando as cruzes, aparentando difícil focagem.

- Sabe, o senhor? Há em si uma situação...

- Situação?

- Nem sei como vou lhe dizer.

Salanje engoliu goelas. Não digam a sua morte estava perto, no calendário da

semana? Contar-se-iam pelos dias os tempos que lhe restavam?

- Vou morrer daqui a nada?

- Não. Não vai morrer.

- Não vou morrer? Como não vou?

- Esse o problema.

- Se me explique, homem!

- É que você, Adabo Salanje, você já morreu.

O cliente se abismalhou. Passadas umas moscas, ele rebentou em

gargalhada. Disparate! De tanto rir, teve que levantar para aliviar as costelas.

Quando gargalhamos nos aumenta a quantidade de costelas. Daí o perigo de rirmos

alto e despregado. Adabo saiu do consultório, respirou uma porção de ar e voltou

para dentro. Já vinha sério:

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- Então me faz favor explicar: que dia eu, afinal, morri?

- Ontem à noite. O senhor, em verdade, é um recém-falecido.

Adabo se embrumou. Fora o sonho? Pode a morte suceder em terras

enevoadas do sonho? Nunca ouvira. Mentira, devia ser mentira do adivinho. O

fulano canganhiçava. A zanga de Adabo não sabia se havia de rir. Acabou por

levedar a maka:

- Está bom. Então se estou morto, como você adianta, não posso pagar

consulta. Vou embora assim mesmo.

E desandou. Nem mais quis saber. Qualquer coisa, porém, mudara em

sua íntima existência. Porque ele passara a ter facilidades com a bondade, paciência

com os meninos, gentileza com os velhos. As mulheres lhe surgiam com nova graça,

pareciam feitas de nenhuma matéria. Já não lhe subiam aqueles calores

desenfreáticos quando deparava com as belezas delas. E sobretudo, havia uma

maior mudança: nunca mais ele teve acesso ao sonho. Ele que era um assíduo

sonhador nunca mais voltaria a ter devaneio. Na seguinte manhã, a mulher lhe

desperta com ternura, beijo na fronte. Nunca antes havia sido dedicado tais ternuras.

E com a meiguice de um

suspiro:

- Tinha tantas saudades suas, Adabo !

Ressurge-lhe, enormecida, a dúvida. Estaria mesmo morto, conforme o

vaticínio do outro? Seu falecimento estaria vigente e em vigor, sem que ele tivesse

sido devidamente notificado? A dúvida lhe escavava fundo.

Não mais esperou. Voltou ao consultório do futurista. Chegado lá, estranhou o

vazio de gente. Só uma velha galinha se passeava no recinto. Bateu licenças na

porta mas ninguém respondeu. Foi entrando na salinha escura. Quando seus olhos

se conformavam com as sombras ele notou, abandonadas, as duas cruzinhas de

marfim. Se baixou para as apanhar e, assim, posto de cócoras, encostou os marfins

sobre as pálpebras. E esperou a chegada de um sinal. Uma voz lhe deu susto:

- O senhor quem é?

- Sou Adabo, venho ver o adivinho.

- Não pode.

- Eu pago, adiantado até. Aliás, o adivinho me deve...

- Não pode. O mestre já deu falecimento.

- Morreu? Quando?

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Morrera no dia anterior. Então, o mestre, como o outro lhe chamara, não fora

capaz de adivinhar sua própria morte? Adabo fazia gozo. Mas o outro lhe respondeu

que os pessoais assuntos escapam aos próprios feiticeiros. Salanje saía, em

gravidade: agora, morto o adivinho, como poderia esclarecer o autêntico de sua

morte?

- Posso levar estas cruzes?

- Leva, fica para acerto de seu dinheiro.

E voltou ao caminho, mãos nos bolsos, confirmando os marfins. O poente já

se afundava, o naufrágio da luz se espalhando pelo bairro. Foi no curvar da esquina,

o susto de um ilegível vulto. Se arrepiou quando reconheceu a voz do adivinhador:

- Venho buscar meus marfins.

Ele desembolsou os inutensílios e os estendeu em concha para as mãos do

outro. Então, inesperadamente, sentiu as mãos presas, cativas do feiticeiro.

Primeiro, resistiu. Depois, experimentando a convicção das outras mãos, foi

esvanecendo. O adivinheiro adocicou a voz, em modos de convite:

- Vem comigo.

E os dois pelo caminhinho não deixavam nenhuma pegada, fossem pisando

não a areia mas o céu.

COUTO, Mia. Estórias Abensonhadas. 1ªed. São Paulo: Companhia das letras, 2012.

Questões de interpretação referentes ao conto:

1) De que maneira a morte aparece no conto de Mia Couto?

2) Que objeto o adivinheiro utilizava para realizar as consultas? Por que este

objeto é importante?

3) No inicio da narrativa Adabo Salange não tinha curiosidade em saber o dia da

sua morte. Por que ele mudou de ideia no decorrer da narrativa?

4) O que Adabo Salange descobriu no dia em que realizou a consulta com o

adivinheiro?

5) Ao voltar novamente ao consultório do adivinheiro, o que Adabo ficou

sabendo?

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6) Releia o trecho final do conto: “E os dois pelo caminhinho não deixavam

nenhuma pegada, fossem pisando não a areia, mas o céu”. Quem são os

dois? O que pode ter acontecido com eles?

Produção textual

1) Agora que você já conhece o conto “O adivinhador das mortes”, de Mia

Couto, escreva um texto narrativo de, no mínimo, 35 linhas, respondendo a

seguinte questão: O que você faria se descobrisse que hoje é o seu último dia

de vida? Conte o seu dia em detalhes, relatando todas as atividades que

gostaria de ter feito, mas não tinha tido oportunidade.