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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE ADMINISTRAO DA UFBA
NCLEO DE PS-GRADUAO EM ADMINISTRAO NPGA/UFBA MESTRADO EM ADMINISTRAO
LALA RODRIGUES SOARES RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL:
Uma Anlise de Modelos Terico-Conceituais
SALVADOR 2008
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LALA RODRIGUES SOARES
RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL: Uma Anlise de Modelos Terico-Conceituais
Dissertao apresentada ao Curso de Mestrado em Administrao da Escola de Administrao da UFBA como requisito parcial para a obteno do grau de Mestre em Administrao.
Orientador: Prof. Dr. Jos Clio Silveira Andrade
Salvador 2008
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Aos meus pais, com todo amor que houver nessa vida.
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AGRADECIMENTOS
Foram muitos os que de alguma forma contriburam para que, mais do que uma dissertao, um ciclo se completasse.
Ao orientador Clio, pela imensa ateno e disponibilidade com que sempre me recebeu quando o procurei.
Ao professor Nelson Oliveira, pela referncia na vida acadmica e na estrada da vida.
A Dacy e Analia, pelo apoio e ateno.
Agradeo imensamente, como sempre, aos meus pais, pelo apoio incondicional nas minhas escolhas, o respeito a minha individualidade, a compreenso, o carinho e o interesse pelas minhas coisas. Pelo exemplo paterno de autenticidade, respeito ao outro e dedicao ao que se cr ser o certo. Pelo exemplo materno de mulher forte e doce, guerreira e singela, determinada e sensvel, subversiva em tudo o que faz.
Ao irmo e amigo Gabriel, pelas idas EAUFBA atrs de livro, xerox, professor, colega e tudo mais quanto eu precisei nesses dois anos. Mas, em especial, por se fazer sempre presente, pelo cuidado sua maneira, pelo silncio que no constrange, pelas impagveis noites de conversa fiada, pela sensao eterna de que pra nada na vida estarei s.
Ao companheiro de tantas jornadas Joo Gabriel, sempre presente, sempre cuidando, sempre abrigo; pelo apoio e ateno desde o dia da deciso de tentar o mestrado at hoje (e sempre). Por saber to direitinho do que h por aqui alm do que se v.
Aos queridos colegas e agregados do BanSol e DAADM, pela construo da viso de mundo que tanto influencia esse trabalho.
s queridas do Clube da Luluzinha, pelas conversas infindveis e pela renovao do nimo sempre.
Aos amigos PCN, contra-administradores, sonhadores, revolucionrios e, cada um sua maneira, esperana de um mundo melhor.
Aos amigos Gabriel Campos, Rafael Guma e Ceclia Sarno, pela compreenso independente de qualquer entendimento; pelo apoio no que no concordam; por serem to incondicionalmente amigos.
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Aos colegas mais que queridos da Colivre, por me apresentarem um
mundo to novo e mostrarem como no dia-a-dia que se faz a diferena. Pela muita crena, poucos discursos, coerncia e tanta ao.
amiga Neide, com seu cafezinho certeiro, e a disponibilidade de sempre para se perder no Vale do Canela levando um trabalho e pra revirar o mundo atrs daquele texto que eu esqueci em algum lugar...
Ao mais que amigo Tiago-da-casa-azul, pela companhia constante nos ltimos anos, pelo sarcasmo que no me deixa parar de sorrir, pelo carinho e ateno de sempre, pelo ombro amigo, por saber consolar sem choror, pelos comentrios mais inconvenientes, as tiradas mais inteligentes, os escaldes mais pertinentes, o abrao apertado, as bebidinhas ruins e eficientes, as verdades que no devem ser ditas, as conversas nos momentos de ansiedade e tanto, tanto mais companheirismo que o fez to importante no encarar a vida ultimamente.
A todos que mandaram e-mail com alguma coisa que pode servir pra sua dissertao, que procuraram saber dela, que revisaram meus trabalhos... ou que de alguma forma se interessaram pelo meu Mestrado nesses dois anos.
E, em especial, queles que acreditam que eu ainda viro hippie, mega-executiva, atriz, me de famlia... ou que de alguma forma se interessam pelo que h de vir por a.
Obrigada!
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E eu pergunto aos economistas polticos, aos moralistas, se j calcularam o
nmero de indivduos que foroso condenar a misria, ao trabalho
desproporcionado, desmoralizao, infmia, ignorncia crapulosa,
desgraa invencvel, penria absoluta, para produzir um rico?
Almeida Garrett
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RESUMO
Com base na questo em que medida os modelos conceituais de Responsabilidade Social Empresarial refletem as prticas empresariais identificadas na pesquisa do Instituto Akatu? desenvolveu-se este trabalho, cujo objetivo principal analisar a relao entre os principais esquemas conceituais de Responsabilidade Social Empresarial e as prticas empresariais encontradas na pesquisa do Instituto Akatu. Alguns so os modelos que se propem a definir essa responsabilidade social empresarial, contudo, esses modelos no derivam de prticas de responsabilidade social adotas pelas empresas no contexto brasileiro, derivam, sobretudo, da observao desse movimento por uma responsabilidade social empresarial e a reao das firmas a este movimento em contextos internacionais. Aps ampla reviso da literatura sobre o tema, foram escolhidos sete modelos terico-conceituais de anlise do fenmeno da responsabilidade social que por sua vez foram confrontados com dados fornecidos por pesquisa do Instituto Akatu junto s empresas sobre suas aes de Responsabilidade Social Empresarial. Assim, puderam-se identificar a adequao de cada um deles, com suas dimenses de anlises, pressupostos ideolgicos e categorizaes para o entendimento do movimento de responsabilidade social no Brasil. A pesquisa, de carter exploratrio, identificou que as categorizaes pertinentes a esta realidade no se encontram em extremos de adoo ou no de uma Responsabilidade Social Empresarial, e que os modelos que mais se aproximam desta realidade do conta de que a responsabilidade social das empresas pesquisadas no significa comprometimento social, nem tampouco se restringe ao cumprimento de leis, mas se pauta numa busca por um bom relacionamento com as foras de mercado para a manuteno e potencializao da finalidade da empresa.
Palavras-chave: Responsabilidade Social Empresarial, Responsabilidade Social no Brasil.
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ABSTRACT
From the central question How much the conceptuals models of social responsibility of the firms reflect the firms practices showed by Akatu Institutes research? this work was developed, and the purpose of which is to analyze the relationship between the main conceptuals schemes of social responsibility of the firms and the firms practices showed by Akatu Institutes research. There are some models that try to define this social responsibility of the firms, however these models are not based on Brazilians firms practices, but on the observation of the movement for a social responsibility of the firms and its reactions to this into international contexts. After a large literature review, seven theoretical models developed to analyze the social responsibility phenomena were chosen to be confronted by some data brought by the Akatu Institutes research with the Brazilians firms about its practices in the social responsibility ways. So, the pertinence of each conceptual model could be analyzed, with each ones dimensions of analyzes, ideological purposes and classifications adequate for the understanding of the social responsibility movement in Brazil. This work, an exploratory research, identified that the classifications pertinent to this reality arent in extremes of being or not socially responsibly, and that the models that get close to this reality explain that de social responsibility of the researched firms do not mean social engagement, or even represents only the fallowing formal obligations as laws, but are pointed by a search for a good relationship with the market agents to maintenance and maximization of the firms objectives.
Key words: Social Responsibility of the Firms, Social Responsibility in Brazil.
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1- Lista de vises de RSE x Autores
22
Quadro 2 - Princpios de RSE
24
Quadro 3 - Aes tidas como foco de responsabilidade social pelas empresas
45
Quadro 4 - Aes no tidas como foco de responsabilidade social pelas
empresas...............................................................................................................
..49
Quadro 5 - Anlise comparativa entre os modelos conceituais
68
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1-
Modelo analtico de Quazi e OBrien
27
Figura 2-
Modelo de sntese da atuao social das empresas
29
Figura 3-
Modelo analtico de Melo Neto e Froes
30
Figura 4: Motivaes e conseqncias das aes de Responsabilidade Social
com enfoque instrumental
35
Figura 5 - Motivaes e conseqncias das aes de Responsabilidade Social
com enfoque tico
36
Figura 6 Distribuio da amostra de pequenas e mdias empresas
pesquisadas, por setor de atuao
56
Figura 7 Distribuio da amostra de pequenas e mdias empresas
pesquisadas, por localizao geogrfica
57
Figura 8 - Aes desenvolvidas por grupo
62
Figura 9 -
Aes no discutidas por grupos
66
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ADCE Brasil - Associao de Dirigentes Cristos de Empresas do Brasil
ANPAD - Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em
Administrao
BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social
ENANPAD - Encontro Nacional da Associao Nacional de Ps-Graduao e
Pesquisa em Administrao
ONG - Organizao No-Governamental
PIB - Produto Interno Bruto
RSE - Responsabilidade Social Empresarial
SEBRAE - Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas
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SUMRIO
1 INTRODUO 14
2 REVISO DE LITERATURA 21
2.1 EVOLUO DA IDIA DE RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL
21
2.2 RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS: DELINEANDO UM
CONCEITO 26
2.3 MODELOS DE ANLISE DA RESPONSABILIDADE SOCIAL
EMPRESARIAL (RSE)
32
2.3.1 O Modelo de Sethi 32
2.3.2 O modelo de Carroll 34
2.3.3 O modelo de Wood 36
2.3.4 O modelo de Quazi e OBrien 38
2.3.5 O modelo de Curado 40
2.3.6 O modelo de melo Neto e Fres 42
2.3.7 Os esquemas crticos 44
3 CONSIDERAES METODOLGICAS 51
4. ANLISE DOS DADOS 55
4.1 AES DE RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS
58
4.2 AES DAS EMPRESAS E OS MODELOS DE ANLISE DA
RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL 69
4.2.1 O modelo de Sethi 70
4.2.2 O modelo de Carroll 71
4.2.3 O modelo de Wood 73
4.2.4 O modelo de Quazi e OBrien 74
4.2.5 O modelo de Curado 76
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4.2.6 O modelo de Melo Neto e Froes 78
4.2.7 Os esquemas crticos 79
4.3 ANLISE COMPARATIVA 81
5 CONCLUSES 87
REFERNCIAS 94
ANEXO QUESTIONRIO APLICADO PELO INSTITUTO AKATU (2004) 98
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1 INTRODUO
A Responsabilidade Social Empresarial sempre me causou alguma
inquietao. Se a empresa existe para gerar lucros aos seus acionistas, pode
existir tambm para promover o bem-estar social? Se o lucro aumenta quando
os gastos diminuem, os acionistas estariam dispostos a ser socialmente
responsveis? Se a regulao do mercado consumidor tem o poder de impor
s empresas a adoo de uma responsabilidade social, porque no o teria para
reivindicar outras questes de interesse mais direto? Se a responsabilidade
social serve apenas como mais um instrumento para o aumento de lucros, essa
responsabilidade para com o social? E se instrumento para algo, a quem
ele serve prioritariamente? E muitas, muitas outras questes despertaram meu
interesse para o tema.
O fato que, h um movimento das empresas no sentido de assumir
uma responsabilidade social, o que quer que isso signifique. E justo a
inquietao sobre o que isso significa, o que as motiva, como isso determina as
aes desenvolvidas, quais so as aes desenvolvidas, os impactos delas na
forma de atuao da firma; que culmina com a questo que guia este trabalho,
com a busca por um entendimento conceitual do que vem a ser esse
fenmeno.
Aps a Revoluo Industrial inglesa (sculo XVIII), o mundo viu
consolidar-se, de forma to rpida quanto intensa, o que chamamos de modo
de produo capitalista. De forma bastante sucinta, o capitalismo caracteriza-
se, essencialmente, pela acumulao e riqueza gerada pela diferena entre o
capital investido na produo e o valor da negociao do produto ou servio no
mercado. Mais fundo, o capitalismo caracteriza-se ento pela compra, pelo
capitalista, da fora de trabalho do operrio e a venda do produto desta, por
valor superior, aos consumidores.
Essa caracterstica traz consigo uma tenso entre interesses de
trabalhadores e capitalistas, aqueles desejando ser melhor recompensados
pela venda de sua fora de trabalho, estes almejando o inverso, medida que
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quanto menor a remunerao dos fatores produtivos, maior seu ganho.
Tal caracterstica marca ainda o sistema capitalista como um sistema de
desigualdades, dada que a riqueza produzida por todos no assim
distribuda: quanto menos ao exrcito de operrios, mais ao seleto clube dos
investidores. Para que um possa ter mais, outro ter que necessariamente ter
menos. E este o cerne das transformaes da ordem social desde a tal
Revoluo.
A explorao da classe trabalhadora, as desigualdades de toda ordem
geradas pelo sistema capitalista (para alm da esfera econmica, e
determinadas por esta), dentre outras externalidades negativas deste modo de
produo, geraram movimentos de protesto. Alguns, pela sua superao,
outros, por sua reforma.
Os movimentos por uma reforma do sistema capitalista no demonstram
interesse em substituir o sistema por um outro mais justo ou igualitrio, mas
torn-lo mais humano, alm de diminuir incmodos decorrentes deste:
desequilbrio ambiental, violncia urbana exacerbada pelo consumismo e
desigualdades sociais, guerras motivadas por interesses econmicos,
marginalizao dos no aptos a inserir-se no sistema, dentre outros.
Alguns destes movimentos passam por um fortalecimento do poder do
Estado frente aos interesses capitalistas, equacionando-os com os interesses
de trabalhadores e cidados de maneira geral. Tal via passa pela elaborao
de legislao de proteo ao trabalho e meio ambiente, fiscalizao de seus
cumprimento, criao de regras e instituies que garantam o desenvolvimento
das atividades de acumulao dentro de determinados parmetros de
desigualdade e excluso aceitos pela sociedade: a chamada regulao.
Tais movimentos parecem considerar o Estado um ente neutro,
ignorando o papel estatal ao longo da histria do sculo XX como fiador e
parceiro institucional do processo de desenvolvimento do sistema capitalista.
Outro movimento surge no sentido de apaziguar as relaes entre
capitalistas e o todo social, atravs de uma maior participao deste na riqueza
gerada: o da Responsabilidade Social Empresarial. A idia que a empresa
retribua a sociedade pelo uso de seus recursos (humanos, ambientais,
institucionais, etc.) e colaborao no desenvolvimento de suas atividades. Aqui,
o cumprimento de exigncias bsicas, em forma de lei, para o funcionamento
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da firma condio para a observncia de uma responsabilidade da empresa
com o todo social, embora no contemple a idia de responsabilidade social
empresarial. Tal idia se afirma na medida que a empresa, para alm do
exigido pela coero do Poder Pblico, assuma formas de conduo do seu
negcio aceitas e at mesmo exigidas na relao com a sociedade como um
todo. Assim, alm da imposio regulamentar de limites atuao, h a
possibilidade de a sociedade civil, atravs do poder do consumo, regular a
conduta empresarial.
Trs premissas parecem nortear a idia de uma responsabilidade social
empresarial:
1 A de que as empresas, enquanto parte do todo social, devem
assumir a responsabilidade pelo seu desenvolvimento e bem-estar;
2 A de que essa responsabilidade ultrapassa seu bom desempenho
econmico e a gerao de postos de trabalho,e;
3 A sociedade regular o comportamento das empresas atravs de
hbitos de consumo, legislao, movimentos sindicais, etc.
Alguns so os modelos que se propem a definir essa responsabilidade
social empresarial, seu grau de abrangncia, possibilidades de atuao,
motivaes para adoo, dentre outras variveis. Contudo, esses modelos no
derivam de prticas de responsabilidade social adotas pelas empresas no
contexto brasileiro, tampouco da percepo da sociedade/consumidores acerca
destas prticas. Eles derivam, sobretudo, da observao desse movimento por
uma responsabilidade social empresarial, representado, em especial, pela
atuao de ONGs e algumas Fundaes beneficentes ligadas a grandes
empresrios ou grupos empresariais; e a reao das firmas a este movimento,
mas em contextos internacionais.
O Instituto Akatu - voltado para a conscientizao do consumidor
brasileiro do seu protagonismo na construo de uma sustentabilidade scio-
ambiental - realizou em 2004 uma pesquisa junto s empresas brasileiras para
conhecer suas prticas de responsabilidade social empresarial e o seu grau de
comprometimento com esse movimento. A pesquisa foi realizada em parceria
com o Instituto Ethos, e sua amostra contemplou empresas de diferentes
portes, ramos de atuao e localizao geogrfica.
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Enquanto mapeamento do que vem a ser a responsabilidade social
empresarial na realidade brasileira, a pesquisa bastante rica. Alm de elencar
as aes desenvolvidas pelas empresas enquanto prticas de RSE, traz dados
interessantes como temas no discutidos pelas empresas para
desenvolvimento de aes de RSE, diferenas de comportamento de acordo
com o porte das empresas, portas de entrada das empresas no compromisso
com a responsabilidade social, dentre outros. Tais dados permitem, alm de
uma viso geral do que est dado como RSE no meio empresarial, algumas
anlises e reflexes sobre a natureza dessas aes, contradies entre a
proposta de RSE e as aes desenvolvidas, grau de comprometimento social
das empresas, e com os modelos analticos de RSE apresentados na produo
acadmica sobre o tema, por exemplo.
vasta a literatura, inclusive nacional, acerca da responsabilidade social
da empresa. A maior parte dos trabalhos versa sobre os retornos desta para a
empresa; a elaborao do balano social; avaliao e implantao de
programas de RSE. Ainda, poucos trabalhos apresentam uma viso generalista
da manifestao dessa responsabilidade social das empresas brasileiras, mas
centram sua anlise em estudos de caso ou estudos comparativos com
empresas de determinados setores, o que pode ser observado nos anais de
encontros de pesquisa em Administrao, bem como no acervo da produo
da ps-graduao na rea no Brasil.
Contudo, alguns trabalhos, em especial artigos e ensaios apresentados
em encontros de Administrao, trazem interessantes reflexes e inquietaes
para anlise da natureza do fenmeno no contexto de uma economia de
mercado de forma mais ampla e suas possibilidades de reflexo na prtica
empresarial nacional.
O tema da Responsabilidade Social Empresarial comea a aparecer nos
encontros da ANPAD Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa
em Administrao - no ano de 1998, com apenas um artigo, contudo o assunto
principal ainda no era a responsabilidade social das empresas, mas o
instrumento do balano social. (ENANPAD, 1998) O mesmo ocorre no ano de
1999. (ENANPAD, 1999)
no ano de 2000 que o termo responsabilidade social aparece como
tema exclusivo de um artigo no evento, dividindo espao com artigos ainda
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versando sobre o balano social e o investimento social. (ENANPAD, 2000)
Mas j em 2002 o tema ganha relevncia no universo dos temas tratados por
artigos do encontro com mais de 10 trabalhos apresentados. (ENANPAD,
2002)
A partir de 2002 o nmero de trabalhos apresentados sobre o tema
tornou-se a cada ano mais significativo, indicando um interesse dos estudiosos
da Administrao pelo fenmeno. (ENANPAD, 2002; 2004; 2006) Tal interesse
parece se justificar pelo aumento das aes desenvolvidas pelas empresas
brasileiras sob o rtulo da responsabilidade social empresarial.
Vlido observar ainda que um bom nmero destes trabalhos trata da
responsabilidade social em relao com outros temas, como o marketing e a
satisfao dos funcionrios; mas que tambm aparecem nesse meio alguns
(poucos) trabalhos que prope alguma reflexo sobre o que vem de fato a ser
essa responsabilidade que a empresa assume, e as possibilidades e
limitaes que a prpria organizao poltica, ideolgica e, especialmente,
econmica da sociedade impem a um compromisso social por parte da
empresa.
Contudo, persiste a ausncia de trabalhos que relacionem o que as
empresas praticam enquanto responsabilidade social empresarial e os modelos
conceituais apresentados pela literatura acadmica. H sim, interessantes
contribuies para um debate acerca da possibilidade de uma RSE no sistema
de produo capitalista, mas no alguma anlise sobre as construes terico-
conceituais que reflitam as prticas de responsabilidade social no Brasil.
Com base nessa observao, este trabalho se prope a analisar em
que medida os modelos conceituais de Responsabilidade Social Empresarial
refletem as prticas empresariais identificadas na pesquisa do Instituto Akatu?
Assim, tem-se como objetivo geral analisar a relao entre os principais
esquemas conceituais de Responsabilidade Social Empresarial e as prticas
das empresas brasileiras encontradas na pesquisa do Instituto Akatu; e como
especficos:
1 analisar os modelos conceituais de RSE;
2 - identificar divergncias e similaridades entre os modelos e conceitos
propostos para o tema;
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3 - identificar a compatibilidade entre os modelos e a prtica de RSE
trazida pela pesquisa;
4 - identificar modelos mais adequados para a anlise emprica de
Responsabilidade Social.
Finalmente, para alm de trazer concluses sobre a questo que o guia
e os objetivos relacionados a ela, este trabalho busca tambm reforar a
ateno para o debate acerca da ideologia por trs de todas as aes
organizacionais, fugindo do que parece ser a tendncia de considerar as
prticas empresariais como neutras e puramente instrumentais; e analis-las
em termos de efetividade e resultado apenas, ignorando os seus impactos para
os arranjos nas relaes de trabalho, com consumidores e poder pbico, os
arranjos scio-econmicos que determinam em funo do peso e do papel da
empresa no contexto institucional e econmico atual.
O trabalho encontra-se dividido em cinco sees. Aps breve introduo,
segue-se o captulo de reviso bibliogrfica em Responsabilidade Social
Empresarial, bem como resgate do contexto histrico de seu surgimento e das
tentativas de construo deste conceito. Neste captulo feito um esforo de
sistematizao e caracterizao dos modelos tericos e conceituais de RSE
consolidados na literatura, pesquisa e trabalhos acadmicos sobre o tema.
Em seguida, tm-se as consideraes metodolgicas do trabalho, que
se desenvolve com base em dados secundrios. Trata-se de uma pesquisa
exploratria a partir de observaes desses dados e confrotamentos com os
modelos analticos revisados no captulo anterior.
A pesquisa no pde ser muito aprofundada por conta das limitaes de
informaes decorrentes do uso de uma fonte de dados no produzidos de
acordo com os objetivos deste trabalho. Alm disso, s se teve acesso aos
dados j agregados, o que impossibilitou a realizao de cruzamentos que
permitissem maior aprofundamento do nvel de anlise. Assim, o trabalho
caracteriza-se por uma anlise de um perfil mais generalista das aes
desenvolvidas, tendo como principal contribuio a explorao de caminhos e
possibilidades no desenvolvimento de anlises sobre o tema, dado o ineditismo
do estudo de modelos de anlise essencialmente para entendimento do
contexto nacional.
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Contudo, o trabalho traz subsdios relevantes para a reflexo proposta,
abrindo um caminho promissor para o surgimento de pesquisas mais
aprofundadas sobre a temtica da natureza do fenmeno da responsabilidade
social empresarial no Brasil, suas variveis, dimenses de anlise e modelos
conceituais adequados para sua compreenso. Ainda, traz como subproduto a
identificao de pontos relevantes para pesquisas futuras sobre o tema, como
recortes possveis para amostras, informaes determinantes do processo a
serem levantadas, possibilidades de anlises mais qualitativas com base em
informaes acerca das motivaes das empresas, dentre outros.
O captulo seguinte dedicado anlise dos dados oriundos da
pesquisa do Instituto Akatu realizada junto s empresas em 2004 acerca de
suas prticas de Responsabilidade Social. Essa anlise feita luz dos
esquemas conceituais de RSE, numa busca por conexes e dissonncias entre
as prticas empresariais e os conceitos at ento desenvolvidos.
Por fim, so trazidas algumas consideraes finais sobre os resultados
encontrados, o desenvolvimento do trabalho, suas limitaes e alguns
questionamentos decorrentes de sua execuo.
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2 REVISO DE LITERATURA
2.1 Evoluo da Idia de Responsabilidade Social Empresarial
As primeiras idias de uma Responsabilidade Social das empresas
datam do sculo XX (DUARTE e DIAS, 1996), no perodo de lucros crescentes
que seguiu da chamada Segunda Revoluo Industrial at o incio da Primeira
Guerra Mundial. A aplicao da energia eltrica na produo, o mtodo de
produo em massa proposto por Henry Ford e a administrao cientfica de
Taylor, acarretaram uma mudana de paradigmas na produo industrial
mundial com conseqncias extremamente positivas do ponto de vista do lucro
das corporaes. (MARTINS, 2006)
Neste perodo, empresrios e proprietrios de grandes corporaes
comearam a demonstrar interesse na distribuio dos lucros da organizao
no apenas para seus acionistas, mas para trabalhadores e outros grupos que
julgavam merecedores da ateno das empresas.
Assim, em 1916, Henry Ford resolve investir parte dos lucros em aes
de cunho social, sob a justificativa de justamente remunerar os trabalhadores
que possibilitaram tal retorno, motivando-os para o trabalho; e de estar
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investindo na imagem da organizao ao desenvolver atividades filantrpicas.
Em 1919 Ford acionado judicialmente por um grupo de acionistas que se
sentiu prejudicado pelo investimento, ao invs da distribuio dos dividendos.
(ASHLEY, 2002)
Em 1936, Edsel Ford e outros dois executivos da Ford Motors criam a
Fundao Ford, com o intuito de arrecadar e administrar recursos para fins
cientficos, educacionais e de caridade, visando o bem-estar coletivo.
(FUNDAO FORD, 2007). A iniciativa segue o modelo filantrpico das j
existentes Fundao Rockefeller (fundada em 1913 por Jonh Rockefeller,
proprietrio a Standard Oil) e a Fundao Carnegie (fundada em 1905 pelo
tambm empresrio Andrew Carnegie). (FUNDAO CARNEGIE, 2007;
FUNDAO ROCKEFELLER, 2007).
Se tais Fundaes demonstram alguma conscincia dos homens de
negcios com a sua responsabilidade social, no chegam ainda a representar
aes de Responsabilidade Social das empresas. Contudo, so as aes
filantrpicas e as primeiras preocupaes ticas dos homens de negcios os
primeiros passos para o comprometimento das organizaes com o seu
entorno scio-ambiental, aumentando a aceitao do tema nos meios
acadmico e empresarial.
Assim, em 1942, 120 empresrios ingleses assinam um manifesto
afirmando a responsabilidade da empresa para com o bem-estar de seus
funcionrios e da sociedade em geral. Tal documento considerado o primeiro
apoio significativo do meio empresarial idia de Responsabilidade Social da
empresa. (TORRES, 2002, p.132)
Nas palavras de Duarte e Dias (1986, apud TORRES, 2002, p.132):
Em 1942, a idia aparecia num manifesto subscrito por 120 industriais ingleses, onde se afirmava sem rodeios: A responsabilidade dos que dirigem a indstria manter um equilbrio justo entre os vrios interesses do pblico como consumidor, dos funcionrios e operrios como empregados e dos acionistas como investidores. Alm disso, dar a maior contribuio possvel ao bem-estar da nao como um todo. (DUARTE & DIAS, 1986, apud TORRES, 2002, p.132).
A difuso do tema no meio acadmico marcada pela publicao de
Social Responsabilities of the Businessman, de Howard Bowen, em 1953. O
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livro considerado a primeira tentativa de discusso acadmica e
sistematizao acerca da responsabilidade social das corporaes,
repercutindo nos meios universitrio e empresarial. A partir de ento a dcada
de 50 marcada por uma profuso de debates, seminrios, pesquisas e
trabalhos sobre o tema. (MACEDO, 200, p.32)
Outro marco no desenvolvimento e consolidao da idia de uma
responsabilidade social corporativa foi a atuao a sociedade civil organizada.
Movimentos sociais, em especial o sindicalista, feminista e em defesa das
minorias tnicas passaram a pressionar os mais diversos setores e
principalmente as corporaes a posicionarem-se de forma tica quanto aos
seus funcionrios, consumidores e a sociedade em geral, combatendo
preconceitos, discriminao e a super explorao do trabalho.
O espao alcanado por estes movimentos junto sociedade e seu
trabalho de conscientizao comearam a surtir efeitos mais efetivamente
durante a dcada de 60, quando consumidores e sociedade em geral passam a
cobrar das corporaes posturas ticas nas suas relaes seja com seus
funcionrios, consumidores, polticos e a comunidade. O papel da empresa na
estrutura da sociedade industrial capitalista e os impactos de suas atividades
na comunidade em que se insere passam a ser mais claramente percebidos
pela sociedade civil, que exige ento deste ente atitudes comprometidas com o
bem-estar comum.
Os maiores opositores, no meio acadmico, da idia de uma
responsabilidade social das empresas, so os pensadores neoliberais, dentre
os quais o maior expoente Milton Friedman. Na discusso acerca da funo
da empresa na sociedade, Friedman afirma que o verdadeiro papel da empresa
o de atingir lucros crescentes e bem remunerar seus proprietrios, e qualquer
bem-estar que possa oferecer ao todo social decorre das atividades na busca
por estes objetivos. Para Friedman, qualquer destinao do lucro da empresa
que no investimento em aumento de capacidade ou distribuio de dividendos
aos seus acionistas significa apropriao indbita do capital dos investidores.
(ASLHEY, 2002, p.10)
Mas, a no aceitao da Guerra do Vietn, com queda nas aes e
boicote aos produtos de empresas de alguma forma envolvidas com o conflito,
contribuiu para que as organizaes assumissem posturas socialmente
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responsveis, tratando melhor seus funcionrios, negociando de forma mais
justa com seus fornecedores, atentando para o contedo das mensagens de
seus anncios publicitrios, desenvolvendo aes filantrpicas, evitando poluir
o meio ambiente, dentre outros. (TORRES, 2002, p.133).
Assim, nos meados da dcada de 70, a idia de uma responsabilidade
social das empresas j estava bastante difundida e aceita nos meios
acadmicos e sociedade civil, embora as suas prticas ainda no fossem
predominantes no meio empresarial.
No Brasil, o marco da difuso da idia de uma responsabilidade social
das empresas d-se em 1965, quando a Associao de Dirigentes Cristos de
Empresas do Brasil (ADCE Brasil) divulgou uma Carta de Princpios do
Dirigente Cristo de Empresas, em que trata, dentre outros temas, da
responsabilidade social das corporaes. No mesmo ano criada a Fundao
Odebrecht, mantida pelo grupo Odebrecht, se destacando como marco do
incio do movimento de prticas de responsabilidade social pelas empresas
brasileiras. Contudo, esta ainda uma ao isolada.
no final dos anos 80 que as empresas brasileiras de um modo geral
passam a praticar a idia da responsabilidade social e se preocupar com
comportamentos ticos. Alguns fatores influenciaram decisivamente a adoo
desta postura por parte das organizaes, como a promulgao da
Constituio de 1988 e o despertar da cidadania no pas; atuao das ONGs
na defesa do meio ambiente e dos direitos sociais dos indivduos, bem como
sua colaborao para a difuso destes temas.
Nas palavras de Torres (2002, p. 145),
todo esse processo se deu por uma conjuno de interesses pessoais de alguns empresrios; cobrana por parte da sociedade organizada; disputas de poder; e da necessidade do meio empresarial de adaptar-se s transformaes nacionais e globais (TORRES, 2002, p.145)
O mais recente marco no tocante responsabilidade social das
empresas no Brasil foi a fundao, em 1998, do Instituo Ethos de Empresas e
Responsabilidade Social. Criado por empresrios, o instituto tem a misso de
mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a gerir seus negcios de forma
socialmente responsvel, tornando-as parceiras na construo de uma
sociedade sustentvel e justa. A organizao contava, em julho de 2008, com
-
1.346 empresas filiadas, de diferentes tamanhos e setores. Juntas, tm
faturamento anual correspondente a aproximadamente 35% do PIB (Produto
Interno Bruto) brasileiro e empregam cerca de dois milhes de pessoas.
(ETHOS, 2008) O Ethos atua em cinco linhas: ampliao do movimento de
responsabilidade social empresarial;
aprofundamento de prticas em RSE;
influncia sobre mercados e seus atores mais importantes, no sentido de criar
um ambiente favorvel prtica da RSE;
articulao do movimento de RSE com polticas pblicas; produo de
informao. O grande nmero de filiados da organizao alcanado em poucos
anos aponta para a consolidao da idia de uma responsabilidade social das
empresas no cenrio brasileiro.
Outro indicador deste fato o crescente nmero de empresas que
publicam periodicamente o seu Balano Social, uma espcie de relatrio
contendo informaes diversas acerca do tratamento que a empresa dispensa
aos seus funcionrios, aes sociais realizadas, relao com o meio ambiente,
etc. Segundo relatrio institucional do BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econmico e Social), o Balano Social,
o nome dado publicao de um conjunto de informaes e de indicadores dos investimentos e das aes realizadas pelas empresas no cumprimento de sua funo social junto aos seus funcionrios, ao governo e s comunidades com que interagem, direta e indiretamente. (BNDES, 2000, p.6)
Esse tipo de balano tornou-se obrigatrio inicialmente na Frana,
quando em 1977, lei estabeleceu a publicao compulsria para empresas com
mais de 750 funcionrios. Em 1982 a lei foi estendida a todas as empresas
com mais de 300 funcionrios, j tendo se tornado um hbito das empresas
daquele pas (BNDES, 2000, p.7).
No Brasil, em 1997, as ento deputadas federais Marta Suplicy, Maria da
Conceio Tavares e Sandra Starling apresentaram projeto de lei (ainda em
tramitao) versando acerca da obrigatoriedade de publicao de Balano
Social para as empresas privadas com mais de 100 funcionrios e para todas
as empresas pblicas ou prestadores de servios pblicos. Apesar da no
obrigatoriedade, parte das grandes e mdias empresas situadas no Brasil
publicam balano social periodicamente, de maneira estratgica, j que este
-
motiva funcionrios, traz ganhos de imagem, atrai investidores e contribui para
a valorizao de suas aes negociadas em bolsas de valores. (BNDES, 2000,
p.7-8)
A sociedade organizada, que to importante foi na consolidao de
posturas socialmente responsveis das empresas, tem ratificado esta postura
em alguns momentos atravs de suas escolhas na hora do consumo. Casos de
protestos e boicotes a produtos so cada vez mais comuns. Um dos mais
conhecidos e emblemticos o caso da Nike, fabricante de materiais
esportivos que foi denunciada por organizaes internacionais de defesa dos
direitos humanos por utilizar mo-de-obra infantil nas suas fbricas na sia,
bem como de manter trabalhadores em regime de trabalho semi-escravo no
mesmo continente. Por conta do boicote dos consumidores aos seus produtos
a empresa chegou a acumular US$ 1,4 bilho de produtos em estoque e teve
que vender mais barato para poder escoar sua produo; alm de demitir
funcionrios da alta gerncia. (TORRES, 2002, p.138)
Outro indicador importante da consolidao da idia de uma
responsabilidade social empresarial foi a crescente valorizao das aes das
empresas socialmente responsveis nas principais bolsas de valores. A Dow
Jones, uma das maiores bolsas de negociao de aes do mundo, criou, em
1999, ndice de avaliao de aes baseado na sustentabilidade das
organizaes, abrangendo suas aes sociais. Tal ndice apresenta, na mdia,
valorizao superior aos outros criados pela mesma bolsa. (MACEDO, 2000,
p.45-46)
Segundo SOARES, G. (2006),
j existem investidores que consideram que a prtica da responsabilidade social uma forte evidncia da sua provvel perpetuao, pois esta prtica melhora a imagem da empresa perante seus consumidores e a mantm frente de seus concorrentes na adaptao a regulamentaes cada vez mais restritivas a atividades ambientalmente degradantes ou socialmente indesejveis, fazendo com que a empresa que controla satisfatoriamente estes riscos, tenha maiores possibilidades de se perenizar, correspondendo a um investimento menos arriscado no longo prazo. (SOARES, G., 2006, p.48)
-
Embora no seja unnime entre acadmicos e empresrios, a idia de
uma responsabilidade social das empresas est consolidada nestes meios, se
tornando recorrente enquanto prtica.
2.2 Responsabilidade Social das Empresas: delineando um conceito
O conceito de Responsabilidade Social melhor se delineia com o
entendimento das idias de filantropia corporativa e tica empresarial. A
filantropia corporativa se refere basicamente a aes voluntrias e doaes
realizadas pelos executivos das empresas, no representando uma poltica
institucionalizada de ao social da organizao. Para o Instituto Ethos,
a filantropia basicamente uma ao social externa da empresa, que tem como beneficirio principal a comunidade em suas diversas formas (conselhos comunitrios, organizaes no-governamentais, associaes comunitrias, etc.) e organizaes. (ETHOS, 2007)
J a tica corporativa refere-se aos meios utilizados pela organizao no
decorrer de suas atividades, os caminhos escolhidos para realizar seus fins e
as conseqncias dessas escolhas (SOARES, B., 2005, p.78). Assim, a tica
nos negcios est ligada ao relacionamento da empresa com seus
funcionrios, fornecedores, parceiros, meio ambiente, consumidores e outros
grupos de uma forma transparente, correta, honesta e justa. Respeitar as leis,
no agredir o meio ambiente, remunerar de forma justa seus funcionrios, no
produzir bens que possam causar algum dano aos seus consumidores;
independentemente de prescries legais, so aes relacionadas tica
corporativa.
Pode-se encarar a tica corporativa ainda em termos de escolha por
uma racionalidade substantiva em lugar instrumental. A racionalidade
instrumental assemelha-se lgica de que os fins justificam os meios, a busca
por objetivos e finalidade suprema quanto aos caminhos percorridos para
tanto, a lgica da eficincia. J a racionalidade substantiva guia o agente de
forma a atentar para todo o caminho, e no s o fim. (RAMOS, 1989). Esta a
idia da tica nos negcios.
-
A adoo de posturas ticas pelas organizaes no parece mais do
que a obrigaes destas, em se tratando de respeito ao meio ambiente, s
pessoas e outras organizaes. Contudo, a posio em favor da tica nos
negcios no unanimidade no meio empresarial, onde muitos gestores
acreditam ser a empresa um ente desprovido de moral, parte do todo em que
se insere, e, assim, desprovido de conscincia ou questionamentos ticos. A
tica uma questo de carter da pessoa, no se estendendo empresa.
(NASH, 2001)
De toda forma, a tica nos negcios no representa um compromisso
com a transformao social ou com outros objetivos que no o lucro, mas um
primeiro passo para a compreenso de um outro papel da empresa, diferente
da idia de um ser desarticulado do todo social. Se o lucro aqui ainda no
meio para promoo do bem-estar social (e no apenas dos acionistas), j no
visto como nico elemento relevante no mundo empresarial (SOLOMON,
1997).
Esta parece ser a idia de uma Responsabilidade Social das Empresas.
O termo responsabilidade, segundo o dicionrio Houaiss (2005), definido
como: 1 obrigao de responder pelas aes prprias ou dos outros; 2 carter
ou estado do que responsvel. (HOUAISS, 2005)
Da possvel apreender a idia de responsabilidade social como a
tomada para si da responsabilidade, das obrigaes, compromisso para com o
social. Contudo, no meio acadmico, a conceituao do termo no to
simples, nem tampouco una. Votaw (1973 apud MACEDO, 2000, p.49-50),
afirma que:
o termo responsabilidade social um termo brilhante. Ele significa algo, mas nem sempre a mesma coisa, para todos. Para alguns, ele representa a idia de responsabilidade ou obrigao legal; para outros, significa um comportamento responsvel no sentido tico; para outros ainda, o significado transmitido o de responsvel por, num modo casual. Muitos simplesmente comparam-no a uma contribuio caridosa; outros tomam-no pelo sentido de socialmente consciente; muitos daqueles que o defendem mais fervorosamente vem-no como um simples sinnimo de legitimidade (...); uns poucos vem-no como uma espcie de dever fiducirio, impondo aos administradores de empresa padres mais altos de comportamento que aqueles impostos aos cidados em geral. (VOTAW, 1973 apud MACEDO, 2000, p.49-50).
-
Assim, faz-se necessria a apreciao de conceitos diversos de
autores/pesquisas do campo para apresentao das dimenses que do
unidade ao conceito e refletem sua essncia.
Para MACEDO (2000), o termo responsabilidade social sinnimo de
cidadania empresarial, que define:
a prtica da cidadania empresarial reforada quando a empresa se engaja na luta pela criao de uma sociedade melhor, em busca de uma distribuio de renda mais justa e de uma melhor qualidade de vida para todos, tornando os processos empresariais coerentes com os princpios de justia e desenvolvimento sustentvel. (MACEDO, 2000, p.47-48)
E ressalta que a cidadania da empresa s se completa quando se
completa a cidadania dos indivduos. O mesmo autor afirma que
A responsabilidade social fundamenta-se num novo tipo de relao entre os fatores de produo capital e trabalho, trazendo consigo uma nova concepo do papel social a ser representado pela empresa e a oportunidade para humanizao da economia (MACEDO, 2000, p.47-48).
Melo Neto e Fres (2001) encaram a Responsabilidade Social em
termos de aes orientadas para a comunidade como uma deciso gerencial
estratgica da organizao. Os autores citam a filantropia (deciso individual
do empresrio, empenhando seu tempo e seus recursos) como origem dessas
aes, que assumem novas caractersticas com a conscientizao empresarial.
A responsabilidade social seria ento um novo estgio destas aes
filantrpicas, caracterizado pelo desenvolvimento de programas e projetos
voltados para uma postura tica da organizao nas suas relaes com
clientes, fornecedores, funcionrios, governos; bem como para a promoo dos
direitos dos cidados. Nas palavras dos autores:
a Responsabilidade Social busca estimular o desenvolvimento do cidado e fomentar a cidadania individual e coletiva. Sua tica social centrada no dever cvico (...). As aes de responsabilidade Social so extensivas a todos os que participam da vida em sociedade indivduos, governo, empresas, grupos sociais, movimentos sociais, igreja, partidos polticos e outras instituies. (MELO NETO e FROES, 2001, p.26-27).
-
SOARES, G. (2006), acrescenta mais um nvel ao esquema de MELO
NETO e FROES (2001), que considera representar mais fielmente a idia de
Responsabilidade Social: o do compromisso social enquanto deciso
empresarial. Segundo ele,
nesse nvel, o objetivo principal das organizaes combinaria a busca do lucro com um grau diferenciado de priorizao do interesse social, como resultado de uma maior regulao, presso da sociedade civil e uma maior conscientizao dos prprios acionistas. (SOARES, G. 2006, p.45)
O Instituto Ethos tambm segue a tendncia da Responsabilidade Social
enquanto compromisso social, ao encar-la alm dos programas e projetos
sociais, mas como uma forma de gesto, voltada para a consecuo de metas
relacionadas com a justia social e a sustentabilidade scio-ambiental:
responsabilidade social empresarial a forma de gesto que se define pela relao tica e transparente da empresa com todos os pblicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais compatveis com o desenvolvimento sustentvel da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para as geraes futuras, respeitando a diversidade e promovendo a reduo das desigualdades sociais. (ETHOS, 2007)
Ainda nesse sentido, Jaramillo e Angel (1996, apud ASHLEY, 2002, p.7)
definem: responsabilidade social pode ser tambm o compromisso que a
empresa tem com o desenvolvimento, bem-estar e melhoramento da qualidade
de vida dos empregados, suas famlia e comunidade em geral..
Definio parecida trazida pelo Banco Mundial, que afirma;
RSE o compromisso empresarial de contribuir para o desenvolvimento econmico sustentvel, trabalhando em conjunto com os empregados, suas famlias, a comunidade local e a sociedade em geral para melhorar sua qualidade de vida, de maneira que sejam boas tanto para as empresas como para o desenvolvimento (BANCO MUNDIAL, 2002).
Para ASLHEY (2002, p.6), a responsabilidade social leva, no mbito
interno da empresa, constituio de uma cidadania organizacional e, no
mbito externo, implementao de direitos sociais.
A autora sugere ainda duas linhas na conceituao do termo: a tica e a
instrumental. A primeira deriva de princpios religiosos e normas sociais
-
vigentes, implicando que a empresa, como membro do todo social, comporte-
se de acordo com estes valores e normas, de maneira socialmente
responsvel por ser a ao moralmente correta, mesmo que envolva despesas
improdutivas para a companhia (ASHLEY, 2002). J a linha instrumental
considera a relao positiva entre investimento social e desempenho financeiro
da empresa como motivao principal para as prticas de responsabilidade
Social Empresarial.
BNDES (2000), apresenta viso tendendo linha instrumental ao afirmar
que,
o exerccio da responsabilidade social corporativa est associado noo de sustentabilidade, que visa conciliar as esferas econmica, ambiental e social na gerao de um cenrio compatvel continuidade e expanso das atividades das empresas, no presente e no futuro. (BNDES, 2000, p.4)
Assim tambm sugere BORGER (2001), apresentando a
responsabilidade social como uma estratgia baseada nos anseios da
sociedade para garantir a sobrevivncia da empresa. MOLLICONI (2003)
sugere que
o que se prope que as empresas atuem com Responsabilidade Social (...), com fim nos lucros futuros, sem comprometer em muito os lucros presentes, de uma forma compromissada, tica e humana, de modo a garantir a sustentabilidade da sociedade onde est inserida (MOLLICONI, 2003, p.46).
Kreitlon (2004) sugere trs abordagens para o conceito de
Responsabilidade Social Empresarial, a saber;
tica ou normativa: a empresa no vista com um ente
despersonalizado, mas como provida de valores e princpios morais,
assim como os indivduos. Por isso, a empresa deve agir de forma
correta, com base nos princpios ticos, assumindo o que a autora
chama de responsabilidade moral.
Social ou contratual: a empresa e a sociedade so vistas como
interdependentes na tentativa de equalizar suas demandas e recursos.
Com isso, ambas assumem uma espcie de contrato social, em que
estipulam o que desejam, o que podem oferecer e o que esperam da
outra parte. Aes de Responsabilidade Social das empresas so
-
compreendidas neste mbito como demanda social em contrapartida
pelo uso de seus recursos humanos e naturais pelas empresas para
consecuo de suas atividades.
Gerencial ou estratgica: esta abordagem sugere o desenvolvimento de
prticas e ferramentas de gesto social para otimizar as aes
necessrias para o cumprimento do contrato social trazido pela
abordagem contratual. As aes de responsabilidade social so
encaradas como estratgias de relacionamento com os stakeholders em
geral, devendo ento ser o mais eficientes possvel para reverter seus
custos em benefcios para as empresas, sejam lucros, melhora de
imagem, vantagem competitiva, novas oportunidades.
As trs abordagens propostas por Kreitlon (2004) no so excludentes, mas
complementares para a compreenso e anlise do conceito e prticas de
responsabilidade social empresarial. A abordagem tica ou normativa se
confunde com a idia de tica empresarial j apresentada nesta seo, sendo
considerada, na perspectiva deste trabalho, a base da responsabilidade social,
as primeiras aes no sentido da promoo do bem-estar geral, mas
representando a postura de agir com correo nas suas atividades uma
obrigao da empresa, assim como dos indivduos.
Ackerman e Bauer (1976 apud DUARTE e DIAS, 1986), apresentam trs
fases do comprometimento das empresas com aes de Responsabilidade
Social:
1 Fase Poltica: representa o despertar da conscincia da alta gerncia para
o tema. Contribuies da empresa se resumem a eventuais apoios a atividades
sociais desenvolvidas pelos executivos;
2 Fase Tcnica: a empresa define-se pela ao social, com temas prioritrios
e programas e projetos regulares;
3 Fase de Institucionalizao: a empresa assume um compromisso de
atuao socialmente responsvel, incluindo o tema no seu planejamento, bem
como cria na sua estrutura rgos exclusivamente responsveis pelas aes
de responsabilidade social, com recursos humanos e financeiros alocados para
este fim.
-
Estas fases propostas por Ackerman e Bauer coincidem com a prpria
evoluo histrica da idia de responsabilidade social das empresas,
caminhando da filantropia ao compromisso social.
Os modelos analticos de RSE trazidos neste trabalho so sete, e foram
escolhidos por se prestarem a refletir sobre este fenmeno, indo alm de
anlises sobre sua operacionalidade e gesto (avaliao de programas e
projetos, impactos sociais, mensurao de ganhos de imagem e retorno
financeiro, etc.); perpassando pelas motivaes das organizaes, a ideologia
relacionada ao fenmeno, o papel da empresa no sistema social e outros
determinantes de sua atuao socialmente responsvel ou no.
Os modelos em questo so o de Sethi (1975), Carroll (1979), Wood
(1991), Quazi e OBrien (2000), Curado (2003), Melo Neto e Froes (2001) e o
esquema crtico capitaneado pelas idias de Jones (1996).
So estes os modelos que sero utilizados para a anlise das aes de
Responsabilidade Social das Empresas declaradas na pesquisa do Instituto
Akatu.
2.3 Modelos de anlise da responsabilidade Social Empresarial (RSE)
usual encontrar na produo bibliogrfica acerca de RSE esforos de
autores para sugerir ferramentas de gesto da Responsabilidade Social
Empresarial, no tocante ao planejamento, conduo, explorao mercadolgica
e avaliao das aes. Mesmo na produo cientfica grande parte dos estudos
ainda est associada avaliao das aes empresariais e seus impactos.
Contudo, alguns trabalhos concentram esforos no sentido de refletir
acerca do discurso da RSE. Tais trabalhos dispensam especial ateno para
suas motivaes e implicaes, no somente para a firma e seus stakeholders,
mas para o modelo scio-econmico vigente (em termos de relaes de poder,
sociedade civil, e do prprio papel da corporao na sociedade) ganharam
notoriedade no meio acadmico pelo impacto trazido para a anlise do
fenmeno da Responsabilidade Social Empresarial. a partir da reviso dos
modelos tericos de alguns destes autores que se dar a anlise das prticas
de RSE proposta neste trabalho.
-
2.3.1 O Modelo de Sethi
Sethi (1975) um dos primeiros autores a propor um modelo terico-
conceitual consistente para anlise do fenmeno da Responsabilidade Social
Empresarial. Para ele, o desenho de um quadro analtico da RSE deveria
contemplar duas propriedades:
- estabilidade na classificao das atividades corporativas, para que, mesmo
com as mudanas que as aes sofram, as categorias propostas possam ainda
dar conta de sua natureza, possibilitando uma comparao histrica entre
estas categorias;
- significados estveis, de forma que as categorias contemplem a natureza das
aes mesmo em diferentes tipos de empresas, contextos culturais e sistemas
sociais, possibilitando anlises comparativas entre modelos econmicos e
setores industriais.
Nas consideraes que precedem a proposta do modelo, Sethi (1975)
afirma que o comportamento social das corporaes culturalmente e
temporalmente determinado. Em suas palavras, a specific action is more or
less socially responsible only within the framework of time, environment, and
the nature of the parties involved (Sethi, 1975, p.59). Como exemplo, ele cita a
diferenciao no tratamento dispensado pelas firmas japonesas aos seus
funcionrios no Japo ou em filiais em outros pases. Frisa que, embora o
tratamento dispensado aos trabalhadores nas suas fbricas fora do Japo seja
menos favorvel do que nas fbricas japonesas, estas empresas no so
consideradas socialmente irresponsveis nos pases em questo, por estarem
atendendo s suas demandas scio-culturais, no tocante s relaes de
trabalho (Sethi, 1975).
Na viso do autor, a empresa, como todas as instituies sociais, uma
parte da sociedade, e dela depende sua existncia, continuidade e
crescimento. Assim, devem estar sempre atentas quanto ao uso de recursos,
suas atividades, resultados produzidos e a distribuio destes entre a
sociedade em busca de uma legitimidade para que sua existncia continue a
ser aceita e corroborada pelo todo social. Para ele,
letimization involves not only the type of corporate activities, but also the process of internal decision making: the perception of external environment; the manipulation of external environment physical, social, and political to make it more receptive to corporate activities;
-
and the nature of accountability to other social institutions in the system (Sethi, 1975, p.60)
Percebe-se ento que para Sethi o fenmeno da Responsabilidade
Social Empresarial se refere a um comportamento das corporaes no sentido
de legitimar suas atividades dentro de um sistema socioeconmico qualquer
que as envolva, garantir uma no-repulsa sua lgica de operao e suas
atividades. Pode-se interpretar ento que para Sethi (1975) a RSE se refere,
num campo ideolgico, idia de legitimao, e no de transformao.
O autor classifica em trs os possveis comportamentos empresariais
nessa busca pela legitimao:
A obrigao social, quando a empresa apenas cumpre prescries legais,
seja por presses mercadolgicas ou imposies do Poder Pblico.
Contudo, embora indispensvel, esta dimenso no suficiente para
garantir a sobrevivncia da empresa: the corporations that flouts them will
not survive. However, the mere satisfaction of these criteria does not insure
the continued existence of a corporation (Sethi, 1975, p.62);
A responsabilidade social, caracterizada pela adoo de posturas que
no choquem com os valores morais da comunidade, evitando prejuzos
financeiros e de imagem. Aqui, a empresa adere a prticas filantrpicas,
mas procura manter-se distante de posicionamentos, evitando
controvrsias. While the concept of social obligation is proscriptive in
nature, the concept of social responsibility is prescriptive in nature (Sethi,
1975, p.62);
A responsividade social, quando a empresa adota comportamento
proativo frente a questes scio-ambientais, integrando estas dimenses ao
seu planejamento com mesmo destaque da dimenso econmica,
privilegiando posies favorveis sustentabilidade empresarial e social e
atuando nas reas relacionadas e/ou impactadas pelas atividades da
empresa. While the social responsibility relates activities are prescriptive in
nature, activities related to social responsiveness are anticipatory and
preventive in nature (Sethi, 1975, p.64).
Para Sethi, o comportamento empresarial prximo da responsividade social
evita que outras foras, insatisfeitas com as atitudes corporativas, unam seu
-
poder para contestar o imenso poder da corporao de decidir sobre o uso de
recursos, relevncia da produo de determinados bens ou servios em
detrimento de outros e distribuio de riquezas; colocando em risco assim a
sobrevivncia da corporao e do prprio modo de produo em que se insere.
2.3.2 O modelo de Carroll
Carroll (1979) traz um esforo para definio da Responsabilidade Social
das corporaes a partir da categorizao das dimenses trazidas por outros
autores. O modelo proposto se traduz na tentativa de sintetizar estes aspectos
levantados por outros pesquisadores em macro-dimenses representativas do
comportamento da empresa na busca do cumprimento da RSE.
As contribuies categorizadas por Carroll (1979) so representadas no
Quadro 1 abaixo:
VISO DE RSE AUTOR
Gerao de lucro apenas Friedman
Ir alm da gerao de lucro Davis, Backman
Ir alm das exigncias econmicas e
legais
McGuire
Atividades voluntrias Manne
Aspectos legais, econmicos e
atividades voluntrias
Steiner
Crculos concntricos de dimenses
diversas
CED, Davis e Blomstrom
Preocupao com uma expanso e
controle do sistema social
Eells e Walton
Responsabilidade com algumas
questes sociais problemticas
Hay, Gray e Gates
Comprometimento com a
responsividade social
Ackerman e Bauer, Sethi
Quadro 1- Lista de vises de RSE x Autores Fonte: Adaptado de Carroll (1979)
-
Com base nos aspectos levantados, Carroll sugere ento que as
responsabilidades sociais das empresas podem ser categorizadas em quatro
grupos: responsabilidades econmicas, legais, ticas e discricionrias.
Estas dimenses no se excluem, mas, do contrrio, juntas completam aquelas
que o autor julga serem as responsabilidades da empresa para com a
sociedade, as responsabilidades sociais empresariais (Carroll, 1979).
Para Carroll, as responsabilidades econmicas so as primordiais, por
serem a razo da existncia das corporaes. Produzir bens e servios, gerar
riqueza e empregos so a principal responsabilidade da empresa para com a
sociedade. Do caminho percorrido para atingir esses objetivos, decorrem as
outras responsabilidades.
As responsabilidades legais esto baseadas no que Carroll chama de
contrato social entre empresa e sociedade; ou seja, para que aquela possa
existir, utilizar-se de recursos e realizar suas atividades, deve seguir
determinadas normas consensuadas na sociedade.
As responsabilidades ticas se referem s normas sociais impostas
pelo comportamento cultural e opinio pblica no necessariamente
convertidas em lei, at mesmo pelas diferentes dinmicas do processo formal
de mudanas legislativas x mudanas sociais.
Por fim, as responsabilidades discricionrias so aquelas no
claramente demandadas pela sociedade, representando um engajamento
voluntrio da organizao com a resoluo de problemas sociais. O autor
chega a afirmar que esta no propriamente uma responsabilidade da
empresa, mas que dado o papel ocupado na sociedade e o poder concentrado
pelas corporaes esta dimenso deve ser considerada. Carroll deixa assim
em aberto o debate acerca do papel e das funes da empresa no sistema
social em que se insere.
Carroll (1979) inclui ainda a questo temporal em sua anlise, ao afirmar
que the social responsibility of business encompasses the economic, legal,
ethical and discretionary expectations that society has of organizations at a
given point of time (Carroll, 1979, p.500).
Shermerhorn (1999) aplica a proposta de Carroll (1979) ao planejamento
empresarial, apresentando uma tipificao de estratgias relacionadas aos
-
quatro grupos de responsabilidades sociais das empresas propostos por Carroll
(1979). Ele sugere quatro tipos de estratgia:
Pro ativa, quando a organizao assume iniciativas sociais abrangendo
tanto a responsabilidade econmica quanto a legal, tica e discricionria;
Acomodativa, quando a organizao, alm das preocupaes econmicas
e legais se dispe a fazer o mnimo exigido pela tica, evitando assim
sanes mercadolgicas;
Defensiva, faz-se o mnimo exigido em lei, evitando assim sanes
regulatrias;
Obstrucionista, quando a organizao atende apenas as
responsabilidades econmicas e combate s demandas sociais para que
estas no atrapalhem o negcio.
Assim, Shermerhorn (1999) valida o modelo de Carroll (1979) ao
demonstrar sua aplicabilidade tanto para a interpretao como para nortear as
aes corporativas.
2.3.3 O modelo de Wood
Wood (1991) prope um modelo analtico de RSE a partir de trs
dimenses: princpios, processos e resultados. Segundo a autora, tais
dimenses permitem uma anlise completa do fenmeno, por se referir tanto
s suas motivaes quanto s questes gerenciais e impactos das aes
(Wood, 1991).
Com relao ao debate do papel da empresa no sistema social em que
se insere, logo de suas responsabilidades para com ele, Wood (1991) avana
menos que Sethi (1975) e Carroll (1979). A autora cita Eberstadt (1977): at the
present, business has seldom enjoyed so much power with so little
responsibility (Eberstadt, 1977 apud Wood, 1991). Wood (1991) afirma que
Responsabilidade Social traz consigo a idia de que a empresa, para alm de
seus objetivos econmicos, tem a obrigao de trabalhar para a melhoria
social, no apresentando, contudo, seus fundamentos tericos ou ideolgicos
para tal firmao.
Os princpios da RSE propostos por Wood (1991) podem ser observados
em trs nveis: institucional (relativo a todo o mundo dos negcios),
-
organizacional (referindo-se a determinadas organizaes
individualmente) e individual (relacionado com os gestores tomadores de
deciso). Nas palavras da autora,
[there are] expectations placed on all business because of their roles as economic institutions, expectations placed on particular firms because of the way they are and what they do, and expectations placed on managers (and others) as moral actors within the firm. (Wood, 1991, p.695)
Os princpios se referem aos valores que motivam os atores destes
nveis a agir de forma socialmente responsvel. O Quadro 2 abaixo ilustra os
princpios de RSE propostos por Wood (1991).
PRINCPIO FOCO
INSTITUCIONAL Legitimidade Obrigaes,
expectativas e possveis
sanes
ORGANIZACIONAL Responsabilidade
Pblica
Relaes ambientais de
responsabilidade sobre
seus outcomes
INDIVIDUAL Discricionariedade
Gerencial
Escolhas, possibilidades
e responsabilidade
individual
Quadro 2 - Princpios de RSE Fonte: Adaptado de Wood (1991)
J os processos das empresas na adoo de uma RSE podem ser
categorizados em avaliao ambiental, gesto dos stakeholders e gesto
das questes sociais.
O processo de avaliao ambiental se refere escolha da firma por
estudar o ambiente externo, suas demandadas e presses, para que possa
respond-las ou mesmo modifica-las. A gesto de stakeholders j se refere
ao mapeamento das relaes da empresa com seus diversos grupos de
interesses e escolha da melhor forma de relacionamento com cada um deles.
Por fim, a gesto das questes sociais est associada identificao e
-
estudo destas para desenvolvimento de respostas adequadas por parte da
corporao.
Como outcomes, Wood (1991) percebe os impactos sociais e
programas e polticas de RSE; vistos como aes propostas enquanto
respostas s questes identificadas nos processos de RSE.
Percebe-se que os processos propostos por Wood (e seus outcomes,
enquanto conseqncias destes) esto intimamente ligados aos princpios e
motivaes que prope, pela busca de legitimidade por parte das corporaes
enquanto instituies, da adaptao pelas organizaes ao procurar responder
s demandas mapeadas, e a criao de uma cultura de escolhas ticas com a
considerao de interesses diversos aos da organizao no processo
decisrio.
2.3.4 O modelo de Quazi e OBrien
Os autores Quazi e OBrien (2000) propem um modelo bidimensional
para o entendimento do fenmeno da Responsabilidade Social Empresarial.
Num plano do esquema, os autores percebem a RSE enquanto variante das
duas vises ideolgicas mais fortes acerca do papel da empresa na sociedade:
ofertar bens e servios, criar empregos e gerar riqueza, trazendo assim bem-
estar; engajar-se na soluo dos problemas sociais e promoo ativa de uma
sociedade melhor, como qualquer outra parte integrante da sociedade (Quazi e
OBrien, 2000).
A outra dimenso se refere relao custo x benefcio da adoo de
uma responsabilidade social por parte das empresas, tambm apresentando
duas grandes correntes como extremos: a de que a empresa deve assumir as
responsabilidades sociais independentemente de uma relao positiva entre
investimento financeiro x retorno financeiro e de imagem; e a de que a empresa
deve pautar sua deciso acerca de RSE nesta relao (Quazi e OBrien, 2000).
Pelo cruzamento destas duas dimenses, Quazi e OBrien (2000),
chegam a dois tipos de responsabilidade social das corporaes, situados nos
quadrantes extremos: a responsabilidade ampla e a responsabilidade
estreita.
-
O esquema proposto pelos autores claramente visualizado na Figura 1
abaixo. Cada quadrante apresenta uma possibilidade de anlise de RSE
atravs do cruzamento dos extremos das duas dimenses propostas:
A viso clssica, segundo a qual a nica responsabilidade da empresa
gerar lucros, e que as aes de RSE s devem ser tomadas se seus custos
puderem ser traduzidos em retorno financeiro considervel para a
corporao;
A viso scio-econmica, segundo a qual a empresa pode desempenhar
os dois papis, assumindo que a empresa tem uma responsabilidade mais
ampla para com a sociedade, e que o investimento em aes nesse sentido
traz benefcios para a empresa, ainda que no de ordem financeira e numa
perspectiva imediata;
A viso moderna, para a qual a adoo da responsabilidade social
empresarial significa a manuteno de uma boa relao com o tecido social,
o que traz vantagens para a organizao tanto no curto quanto no longo
prazo. Tal viso se aproxima da idia de gesto dos stakeholders proposta
por Wood;
A viso filantrpica, segundo a qual a empresa deve comprometer-se com
a soluo de questes sociais independentemente da relao custo x
benefcio, por ser este o comportamento correto das partes integrantes da
sociedade, como a corporao.
Quazi e OBrien, (2000) apresentam valiosa contribuio para o
entendimento do fenmeno da Responsabilidade Social Empresarial,
englobando a dimenso da viso de mundo, a ideologia por trs de possveis
aes de RSE de forma determinante e clara.
No tocante aos autores anteriormente apresentados, nota-se que o modelo
de Quazi e OBrien (2000) se aproxima em alguns aspectos do de Wood
(1991), podendo se traar um paralelo entre a viso moderna e a gesto dos
stakeholders.
Benefcios das aes de RSE
-
Figura 1- Modelo analtico de Quazi e OBrien Fonte: Adaptado de Quazi e OBrien (2000)
Ainda, pode-se perceber uma relao entre a viso scio-econmica e a
avaliao ambiental; mas sem deixar de notar o avano do esquema de Quazi
e OBrien (2000) em relao aos autores anteriores, seja em termos de clareza
ou de pertinncia na categorizao das dimenses.
2.3.5 O modelo de Curado
A autora brasileira Isabela Curado (2003) inova ao trazer trs correntes
de percepo da empresa na sociedade, com base em contribuio de
Guimares (1984). Segundo ela, as responsabilidades sociais das corporaes
podem ser:
1. Produzir bens e servios e gerar riqueza;
Viso Filantrpica
Viso Moderna
Viso scio-econmica
Viso Clssica
Custos das aes de RSE
Respon-
sabi- lidade Ampla
Responsa-bilidade Estreita
-
2. Gerar tambm um benefcio social, atravs da distribuio da riqueza pelo
uso dos recursos coletivos (baseada numa viso marxista);
3. Retornar para a sociedade que a sustenta alguma parte dos lucros obtidos,
sem assumir uma forte funo redistributiva.
A partir destas abordagens, Curado (2003) sugere um esquema de RSE
enquadrando-a como uma atitude entre os extremos da Responsabilidade
Legal (onde a empresa apenas cumpre as leis, no assumindo
responsabilidade outra que no a gerao de lucro); e o Compromisso Social
(onde a empresa se compromete ideologicamente com a distribuio dos seus
resultados e a transformao social).
Com base neste modelo analtico, a empresa pode assim assumir a RSE de
trs formas: como imagem, como negcio e como cidadania.
Enquanto imagem, o foco da RSE o pblico externo, e a preocupao
do gestor com o Marketing Social. O marketing para causas sociais pode ser
definido como uma ferramenta estratgica de marketing e posicionamento, que
associa uma empresa (ou marca) a uma questo ou causa social relevante, em
benefcio mtuo (Curado, 2003, p.10). Ou seja: a Responsabilidade Social
Empresarial seria uma chave para gesto da imagem da corporao.
Enquanto negcio, a RSE foca tanto o pblico interno quanto o externo,
e a preocupao do gestor transformar a atuao social em fonte de
vantagem competitiva, seja pelo ganho de imagem ou de motivao/inovao
entre os funcionrios. Esta vertente preocupa-se ento com a gesto dos
stakeholders da corporao, com intuito de obter facilidades para o negcio.
Finalmente, enquanto cidadania, a RSE foca a sociedade em geral, e a
preocupao do gestor com o desenvolvimento de atividades que tragam
lucros para a empresa e desenvolvimento social.
Neste caso, a atuao envolve uma nova postura empresarial, onde a empresa investe recursos financeiros, tecnolgico, humanos, conhecimentos, etc., em projetos de interesse pblico, visando melhorar a sociedade como um todo (Curado, 2000, p.11).
O esquema proposto por Curado (2003) melhor visualizado na Figura
2 abaixo:
-
Figura 2- Modelo de sntese da atuao social das empresas Fonte: Curado (2003)
Contudo, a idia de RSE enquanto cidadania no se confunde com o
conceito de compromisso social, que engloba o sentido de parceria entre
empresa e sociedade para a transformao desta com base em princpios de
cooperao e coletividade substituindo os de competio e individualismo.
Curado (2003) traz significativa contribuio para a anlise da
Responsabilidade Social Empresarial ao perceber RSE como meio termo,
como adequao s presses sociais (indo alm da responsabilidade legal)
sem um comprometimento ideolgico da base do capitalismo (busca nica pela
acumulao do capital).
2.3.6 O modelo de melo Neto e Fres
Melo Neto e Froes (2001) tambm incorporam uma inovao ao seu
modelo de anlise da Responsabilidade Social Empresarial ao focar sua
anlise somente na dimenso das responsabilidades da empresa para com
seus pblicos internos e externos. A relao com o pblico interno, tratada com
pouco destaque nos modelos anteriores, crucial na anlise proposta pelos
autores.
-
Contudo, os autores no pautam a discusso acerca do papel da
corporao na sociedade, e, as funes e responsabilidades derivadas desse
papel, baseando sua anlise puramente no conceito de RSE enquanto deciso
gerencial para um relacionamento tico com os seus stakeholders. Assim,
ignoram as motivaes da organizao (comprometimento, busca por
legitimidade, etc.) e os impactos da idia de uma Responsabilidade Social
Empresarial no sistema produtivo.
A partir do cruzamento das dimenses pblico interno x externo, Melo
Neto e Froes (2001) derivam os possveis comportamentos das empresas
quanto RSE. Os quadrantes referem-se ao exposto na Figura 3 seguinte.
No quadrante 1 encontram-se empresas com baixo grau de RSE; no
atentando para o atendimento das demandas sociais, nem para o bem-estar de
seus funcionrios. Pode-se inferir que neste grau a empresa ainda no assume
suas responsabilidades sociais, limitando-se a seguir normatizaes legais e
evitar sanes.
No quadrante 2 encontram-se as empresas que apresentam baixo grau
de comprometimento com o bem-estar do pblico interno, evidenciando
ausncia de interesse para com o desenvolvimento social e cidado. Nesta
categoria a RSE vista como necessria para que a corporao atinja suas
finalidades lucrativas, assim, aes de responsabilidade social so planejadas
de forma a dar visibilidade organizao, consolidar posicionamento junto a
determinado pblico e obter retorno financeiro a partir dessas aes.
No quadrante 3 esto as empresas que realmente demonstram
conscincia cidad, que alm de atuar de forma tica junto ao seu pblico
externo, tambm dispensa este tratamento ao seu pblico interno, concedendo
benefcios que aumentam o bem-estar de funcionrios e dependentes.
Pela anlise dos autores no possvel afirmar que empresas inseridas
no quadrante 3 percebam a RSE enquanto compromisso social. Mas, pode-se
dizer que assumem a idia de que a empresa, enquanto membro da
sociedade, deve se comportar de acordo com os princpios e valores morais
comuns ao tecido social em que se insere como a tica, a transparncia e a
justia.
No quadrante 4 esto as organizaes em estgio inicial de ateno
para com a responsabilidade social empresarial, preocupando-se primeiro em
-
estabelecer relaes transparentes e ticas com seus funcionrios para ento
expandir este padro de relacionamento para seus outros pblicos.
Figura 3- Modelo analtico de Melo Neto e Froes Fonte: Melo Neto e Froes (2001)
2.3.7 Os esquemas crticos
Jones (1996) traz uma grande contribuio para a anlise do fenmeno
da Responsabilidade Social das Empresas ao incorporar fundamentos tericos
marxistas para uma apreciao crtica da prpria possibilidade da existncia de
uma responsabilidade empresarial para com as questes sociais.
Para Jones (1996) as externalidades negativas geradas pela natureza
do sistema capitalista (concentrao de riqueza, desigualdade de
oportunidades, alienao do trabalho) trazem para o sistema a necessidade de
QUADRANTE 2 Alto grau de RSE externa e baixo grau de RSE interna
QUADRANTE 1 Baixo grau de RSE
externa e baixo grau de RSE interna
QUADRANTE 3 Alto grau de RSE externa e
alto grau de RSE interna
QUADRANTE 4 Baixo grau de RSE externa e
alto grau de RSE interna
Grau de RSE externa
Grau de RSE interna
-
convencer a sociedade de que as corporaes so necessrias para ela, que
tm uma funcionalidade indispensvel, e que por isso aquela (a sociedade)
deve contribuir para a continuidade e crescimento das empresas. Ou seja:
atravs de estratgias diversas, as corporaes buscam legitimidade para suas
aes e sua existncia perante a sociedade. A RSE, segundo o autor, pode ser
vista como uma destas estratgias de legitimidade, como um Band-Aid over
deep capitalist scars (Jones, 1996, p.8).
Assim, Jones (1996) centra sua anlise na relao do fenmeno da
Responsabilidade Social Empresarial com o escopo de economia poltica do
sistema capitalista. Para ele, os princpios citados por Wood (1991) no se
referem apenas a princpios de RSE, mas de toda ao da firma capitalista. A
legitimidade corresponderia ao princpio da economia poltica capitalista (nvel
institucional). A responsabilidade pblica ao princpio da organizao
burocrtica capitalista (nvel organizacional) e a discricionariedade gerencial ao
princpio de uma moral, ou conscincia capitalista (nvel individual) (Jones,
1996, p.9).
O autor foca o entendimento da legitimidade como fundamental para a
percepo do fenmeno da RSE. Segundo ele, a legitimao fator crucial
para as corporaes atuantes em sistemas democrticos, onde as pessoas
devem participar das decises que a afetam. Contudo, este princpio parece
ser contraditrio, j que, ao mesmo tempo em que a corporao precisa se
legitimar, a distoro entre seu poderio econmico e o poder de cada cidado,
a habilita como determinante na deciso das questes determinantes para a
vida do cidado (mercado de trabalho, de produtos, e at mesmo,
indiretamente, taxas de cmbio, nveis de poluio, dentre outros). A questo
da legitimidade assume ento uma outra face, no a de conseguir aceitao da
sociedade para existncia e continuidade das organizaes, mas para sua
crescente (e determinante) concentrao de poder. (Jones, 1996).
Jones (1996) prope a reflexo que, antes de tentativas de
categorizao e sistematizao de possveis responsabilidade sociais das
empresas, deve-se pensar o poder ideolgico do discurso da RSE; j que boa
parte da produo literria atribui RSE uma atitude de mudana de postura
por parte das corporaes, enquanto esta se apresenta justo como estratgia
de continuidade e legitimao de sua lgica funcionalista e utilitarista.
-
O fenmeno da RSE seria ento um dos fatores de manuteno da
possibilidade de reproduo das j existentes instituies e relaes sociais
capitalistas (Jones, 1996, p.21). Por isso, para o autor, o discurso da
Responsabilidade Social Empresarial, para ser entendido na sua essncia,
deve ser analisado sob as dimenses ideolgica e material.
Use of the phrase social responsibility discourse thus signifies both the ideological core of the social responsibility concept (including its principles and outcomes) and the material sites in which this concept is produced, disseminates, and practiced. (Jones, 1996, p.24)
Como exemplo de dimenso material da RSE, Jones (1996) cita as
escolas de Administrao, where the discourse is produced as well as
disseminated through teaching, researching, and consulting activities (Jones,
1996, p.25).
Ventura (2003) tambm prope uma anlise da RSE a partir de sua
correlao com a estrutura do sistema capitalista de forma mais enftica; j que
as aes de RSE no tm conseqncias somente para a prpria empresa ou
para seus beneficirios diretos, mas para a sociedade como um todo, pois
podem influir na distribuio de poder poltico na prpria sociedade
(VENTURA, 2003, p.3).
Com base em obra de Boltanski e Chiapello (1999), a autora argumenta
que o capitalismo precisa de um esprito que torne possvel o engajamento
das pessoas na produo e desenvolvimento dos negcios sem o uso da fora,
o que corresponde, em parte, ao conceito de legitimidade trabalhado pelos
autores aqui visitados.
Contudo, crticas ao sistema continuam a existir, levando a uma
constante transformao deste esprito. Assim, as crticas s externalidades
negativas do modo de produo capitalista levam o sistema a procurar um
novo esprito do capitalismo, j que a simples gerao de empregos e riquezas
j no garante o engajamento da sociedade para com ele.
O esprito, ento, a ideologia que justifica o compromisso com o
capitalismo (VENTURA, 2003, p.9). Assim, a RSE vista nessa leitura como
resultado de uma crtica s externalidades negativas do sistema, como
ideologia que desmantela tal crtica ao colocar a firma enquanto, para alm de
-
provedora de empregos, bens e servios, promotora do bem-estar social
(Ventura, 2003).
Aps considerar as questes de legitimidade, distribuio do poder e
democracia e a lgica do sistema capitalista (maximizao da acumulao de
capital), Jones (1996) conclui que no sistema capitalista no possvel a
existncia de uma Responsabilidade Social Empresarial enquanto forma de
gesto orientada para objetivos econmicos e sociais.
Para ele, o que pode haver so benefcios sociais promovidos pelas
corporaes tanto como forma de aumentar seus lucros como de legitimao
social. Em suas palavras: in any organization, particulary a for-profit one, all
resource allocation decisions must be justified in terms of some kind of positive
return to the organizations (Jones, 1996, p.28).
A partir desta anlise, que fundamenta o seu posicionamento, Jones
(1996) divide em duas correntes os esforos analticos de uma possvel RSE
feitos at ento: a tica e a instrumental. As correntes pospostas por Jones
(1996) servem de inspirao para a construo de um conceito de RSE feita
por Ashley (2002), j citada neste captulo.
Para Jones (1996), a corrente instrumental se baseia na idia de que a
empresa s deve assumir responsabilidades sociais se estas puderem ser
traduzidas em retorno para a corporao; ou seja, se contribuem para o seu
objetivo de maximizao dos lucros. Esta viso se afina com a do prprio autor,
que descarta a possibilidade de adoo de atividades pelas corporaes com
finalidade diferente do acmulo de capital. The instrumentalist position is base
don the notion that acting in a socially responsible manner accrues benefits to
the firm as well as the society (Jones, 1996, p.28).
Jones afirma ainda que:
In many cases, it simply makes good economic sense for large corporations to spend money on socially responsible activities because it represents a good inve