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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ ADRIANA COUTINHO REFLEXÕES SOBRE A PEDAGOGIA EMPREENDEDORA NA EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL MARINGÁ 2011

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ

ADRIANA COUTINHO

REFLEXÕES SOBRE A PEDAGOGIA EMPREENDEDORA NA EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL

MARINGÁ

2011

ADRIANA COUTINHO

REFLEXÕES SOBRE A PEDAGOGIA EMPREENDEDORA NA EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL

Trabalho de conclusão de curso apresentado, em forma de artigo, como parte dos requisitos para a conclusão da graduação do curso de pedagogia. Orientador (a): Profª: Dra. Elma Júlia Gonçalves de Carvalho

MARINGÁ 2011

Dedico este trabalho em especial a minha querida mãe dona Valdirene, meus filhos João Víctor e Lethícia e a Profª Elma Júlia, pelo apoio, dedicação e paciência. Agradeço a Profª Rosiane Cardoso, pelo exemplo e pelo incentivo, e a todos, que de alguma forma contribuíram, direta ou indiretamente para que esta graduação não fosse apenas um sonho, mas uma conquista.

SUMÁRIO

1 Introdução...................................................................................................

2 A reestruração produtiva e as mudanças nas relações no mundo do

trabalho.....................................................................................................

3 A origem do empreendedorismo..................................................................

4 O sonho estruturante e as estratégias didáticas para a formação do sujeito

empreendedor...........................................................................................

5 A repercussão da Pedagogia Empreendedora na educação básica...............

6 Considerações finais........................................................................................

7 Referências......................................................................................................

9 Anexo........................................................................................................

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Reflexões sobre a Pedagogia Empreendedora na educação Básica no Brasil

Acadêmica Adriana Coutinho Orientadora Profª Drª Elma Júlia Gonçalves de Carvalho Resumo: Este trabalho de Conclusão de Curso (TCC) será organizado na forma

de um artigo científico, cujo tema principal é o empreendedorismo na educação

básica no Brasil. Temos observado que no atual contexto muito se tem debatido a

temática do empreendedorismo, bem como a contribuição do processo educativo

no desenvolvimento da capacidade empreendedora a partir da educação infantil,

redefinindo os papéis e funções do trabalho educativo. Para conhecer melhor a

nova proposta pedagógica estudaremos os documentos de políticas educacionais

internacionais e nacionais e as fontes bibliográficas, ou seja, o que os autores

brasileiros vêm discutindo sobre o assunto. O objetivo é investigar o que é a

pedagogia empreendedora e por que se faz necessário educar para o

empreendedorismo no atual contexto.

Palavras chaves: reestruturação produtiva, desemprego estrutural, Pedagogia

Empreendedora.

Introdução

Atualmente, a temática do empreendedorismo vem se manifestando para

além dos muros empresariais, se fazendo presente também no cenário da

educação escolar, desde as séries iniciais da educação básica.

Esse aspecto nos chamou a atenção, nos levando a refletir sobre a

temática da pedagogia empreendedora na educação básica, a fim de contribuir

para o debate de um tema ainda bastante recente no Brasil, mas que vem

apontando novos rumos para a educação.

Nosso objetivo é analisar os principais aspectos sócio-econômicos que

deram suporte para a implantação da Pedagogia Empreendedora na educação

09

básica, investigar quais políticas públicas tem impulsionado a expansão desta

proposta pedagógica, apresentar os pressupostos teórico-metodológicos em que

se baseiam esta pedagogia, bem como, o que os autores têm discutido sobre o

assunto.

Nossa pretensão não se refere apenas à abordagem da temática da

Pedagogia Empreendedora no cenário da educação escolar, mas, sobretudo, no

interesse de apreender os atuais acontecimentos econômicos e sociais que

tornam necessária a formação de indivíduos empreendedores a partir das séries

iniciais da educação escolar.

Consideramos que compreender as políticas públicas para a educação,

bem como, os principais fatores sócio-econômicos que norteiam a criação de

novas propostas pedagógicas é fundamental para a atuação nossa atuação

enquanto pedagogo. Nesse sentido, ao nos interarmos das atuais discussões

sobre a educação, particularmente sobre a pedagogia empreendedora, temos a

possibilidade de refletir sobre a especificidade da educação no atual contexto

sócio-econômico, como também, de adotar uma postura crítica frente aos novos

modelos educacionais que vêm sendo inseridos na instituição escolar.

Para isso, em nosso trabalho, num primeiro momento, abordaremos as

mudanças no mundo do trabalho a partir dos anos de 1990, apresentando o

cenário que favorece a origem da pedagogia empreendedora. Em seguida,

descreveremos as principais estratégias didático-pedagógicas para a formação do

sujeito empreeendedor. E, por fim, analisaremos as repercussões da pedagogia

empreendedora na educação, a partir das quais teceremos algumas

considerações finais.

A reestruturação produtiva e as mudanças nas relações no mundo do trabalho

A nova grande crise do sistema capitalista, ocorrida a partir de meados da

década de 1970, promoveu a necessidade de buscar novos mecanismos de

09

acumulação produtiva. Nesse sentido, houve o declínio do chamado modelo

fordista de produção, baseado no processo de produção em massa e a sua

substituição pelo modelo flexível, cujas bases são a segmentação e a

especialização flexível do processo de produção. Também fez parte desse

momento de reestruturação do capital, a introdução de novas tecnologias, a

abertura das economias aos mercados internacionais e o processo de

globalização1.

Essas mudanças trouxeram novos desafios, pois se antes o modelo

taylorista/fordista dava conta das demandas de mercado, tendo como

característica a produção em massa, a partir da reestruturação do sistema e do

incremento dos modos de produção, a lógica do capital passou a considerar as

habilidades humanas como parte das relações de mercado, uma vez que o foco

da produção não se concentra mais na produção em larga escala, mas sim na

especialização flexível (ANTUNES, 2007, p. 24).

Conforme Antunes (2007) o novo modelo de produção – também

denominado de toyotista – associa, por um lado, o avanço significativo da

tecnologia e, por outro, a desconcentração da produção dando origem para o

surgimento de médias e pequenas empresas, cuja característica é a produção

regional, em um sistema artesanal, rompendo com o modelo taylorista/fordista de

produção em série.

Com a introdução desse novo modelo produtivo, a segmentação foi o

caminho encontrado pelo sistema, para diminuir gastos e aumentar a acumulação

de capital. Isso permitiu que os postos de trabalho mais estáveis e

1 A globalização é a síntese de transformações radicais pelas quais vem passando a

economia mundial desde o início dos anos de 1980, resultando, segundo Fonseca,

da junção de três forças poderosas: 1) a terceira revolução tecnológica (tecnologias

ligadas a busca, processamento, difusão e transmissão de informações; inteligência

artificial; engenharia genética); 2) a formação da área de livre comércio e blocos

econômicos interligados [...]; 3) a crescente interligação patrimonial e a interdependência

dos mercados industriais e financeiros, em escala planetária, ou seja, não apenas entre as

principais economias capitalistas, mas com participação também dos países socialistas

(FONSECA, 1997, p. 2).

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regulamentados na forma da lei, fossem substituídos por empregos terceirizados,

em pontos isolados, praticamente sem vínculos empregatícios. Conforme Alves

(2007, p. 140)

A crise do emprego clássico devido a corrosão do estatuto salarial tradicional do mundo do trabalho, expele um imerso contingente de subempregados que buscam nas atividades de venda ou de prestação de serviços dos mais diversos tipos, alguma estratégia de sobrevivência pessoal.

Se por um lado, os empregos no setor industrial sofreram drásticas

reduções nas últimas décadas, por outro, cresceu de forma surpreendente a

abertura de pequenas e micro-empresas no setor de prestação de serviços e de

vendas, dos mais diversos tipos de produtos (POCHAMANN, 2001).

Nesse contexto, as indústrias multinacionais passaram a delegar a

produção de seus produtos para pequenas empresas ou mesmo para

trabalhadores domiciliares, situados em diferentes países do mundo. A vantagem

econômica é que além de seus produtos poderem ser confeccionados em

qualquer parte, onde a mão de obra é mais barata, também é possível a redução

gigantesca dos encargos sociais, à medida que os trabalhadores passam a atuar

de forma terceirizada ou independente da empresa, criando para estas empresas

condições de acumulação elevada de capital.

Esse processo de reestruturação produtiva foi acompanhado pelo avanço

das políticas neoliberais. Essas políticas provocaram mudanças, não apenas nas

relações de trabalho, mas sobre tudo, nas relações das condições de vida dos

trabalhadores e que tornaram-se evidentes, a partir da flexibilização dos contratos

de trabalho.

No momento em que os processos de flexibilização, terceirização,

cooperativização e informalização foram sendo intensamente incorporados no

processo produtivo, a legislação trabalhista passou por modificações, têm origem,

assim, leis mais flexíveis, de modo a regulamentar as mutações do mundo do

trabalho e a criar condições para a maior acumulação de capital (RAMOS, 2011).

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Neste sentido, houve o que alguns autores denominam de

“desregulamentação dos direitos do trabalho”. As leis, que antes representavam

lutas e conquistas históricas por parte dos trabalhadores, foram sendo revisadas,

sob o discurso político de medidas para aumentar a oferta de emprego no

mercado. Na verdade tratava-se de um processo legislativo de legalização dos

contratos flexíveis, para atender as necessidades temporárias e instáveis do

mercado, ao mesmo tempo, representava a perda dos direitos trabalhistas. As

alterações na legislação favoreceram a redução de gastos, por parte dos

empregadores, e que as empresas se tornassem mais competitivas num mercado

globalizado.

No Brasil, algumas das conquistas regulamentadas pela Consolidação das

Leis do Trabalho – CLT foram sendo revogadas, após a Constituição de 19882,

mediante uma série de medidas provisórias. Com exemplo podemos citar os

contratos por tempo indeterminado, os chamados empregos temporários (Lei nº

6.019/74) e o banco de horas (MP nº 10709-3/98), a partir da qual o empregador

fica desobrigado de pagar horas extras, ao limite de tempo que o trabalhador

exceder no exercício de suas funções, podendo então ser compensadas as horas

no prazo de até um ano.

Acompanhando o processo de reestruturação do sistema econômico

vigente, ocorre a reforma do Estado. Se antes, o Estado do bem-estar social

buscava promover uma política de pleno emprego e ofertar serviços como:

educação, segurança, habitação, saúde e seguridade social, a partir da adoção

das políticas neoliberais, especialmente a partir dos anos de 1990, há um recuo na

ação do Estado na área social. Assim, com a política do Estado-mínimo, o Estado

redefine seu papel e área de atuação, reduzindo significativamente os gastos com

2 Podemos dizer que essa tendência de flexibilização das leis que regem as relações de trabalho,

já se manifestava na década de 60, como exemplo podemos citar a lei que criou o FGTS (Lei nº 5.107/66). Essa Lei conferiu ao empregador ampla liberdade para despedir trabalhadores regidos pelo FGTS. Além disso, a Lei 4.923/65 dá para o empregador a possibilidade de reduzir os salários em até 25%, mediante acordo sindical, para o caso de a empresa ter sido afetada por fortuito ou motivos de força maior (CARVALHO, 2010). Porém, no contexto atual, essa tendência se intensificou.

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investimento em setores sociais, privatizando as empresas estatais, reduzindo os

empregos públicos e transferindo responsabilidades para o poder local, para a

sociedade e para o próprio indivíduo.

Diante desse cenário, a classe trabalhadora passou a vivenciar a perda de

seus direitos, acompanhada pela precarização das condições de trabalho e

redução dos níveis de emprego, cabendo-lhe submeter-se ou readequar-se às

novas condições de vida.

O aumento do desemprego estrutural e a precarização das condições de

trabalho originaram, por um lado, a expansão significativa do trabalho informal

(part time, terceirizado), por outro lado, a expansão significativa de pequenas

empresas, as chamadas empresas de “fundo de quintal,” fazendo crescer o

trabalho domiciliar. Nesse sentido, Pochmann (2001) afirma que no Brasil:

Em 24 anos, a taxa de desemprego aberto do conjunto de 141 países pesquisados aumentou 53%. Já nas nações não-desenvolvidas, a taxa de desemprego aberto subiu 200%, passando de 1,79%, em 1975, para 5,35%, em 1999. No mesmo período o Brasil destacou-se por ter a sua taxa de desemprego aberto aumentada em 369,4%, alterando-se de 1,73%, em 1975 para 9,85%, em 1999 (POCHMANN, 2001, p. 86).

O aumento significativo do desemprego e a expansão de empregos

temporários e terceirizados produziram um grande impacto na sociedade global,

por um lado, resultando na marginalização do indivíduo, o que propiciou o

aumento da pobreza e dos altos índices de violência e de situações de conflitos

em todo mundo, por outro, exigiu que os sujeitos procurassem formas alternativas

individuais para tornar possível a sua própria subsistência, fazendo crescer a

busca do auto-emprego.

As alterações nas condições de vida trouxeram novas exigências para a

educação. Em busca de responder as demandas da sociedade globalizada, no

ano de 1996, a UNESCO publicou um Relatório elaborado pela comissão

internacional para a educação, conhecido como Relatório Delors. Este documento

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tem por objetivo estabelecer diretrizes para a educação a fim de preparar o

indivíduo para o século XXI.

Ao sugerir os princípios para a educação do século XXI, o Relatório aponta

que um dos principais papéis reservados à educação consiste em “fazer com que

cada um tome seu destino nas mãos e contribua para o progresso da sociedade

em que vive” (DELORS, 2001, p. 82). Para isso, a comissão sugere quatro pilares

para a educação (aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e

aprender a conviver com os outros) que devem fazer parte da educação ao longo

de toda a vida. Na perspectiva da Comissão esses pilares representam “Um

conjunto de conhecimentos e competências indispensáveis na perspectiva do

desenvolvimento humano” (DELORS, 2001, p. 89).

Assim, a educação básica ou “educação fundamental”, na perspectiva da

educação permanente, deve “dar a todos meios para modelar, livremente, a sua

vida”. Isso incluiria “um conjunto de conhecimentos e competências indispensáveis

na perspectiva do desenvolvimento humano” (Ibid., p. 83).

Portanto, diante deste cenário econômico e social de instabilidades, é

preciso ensinar o homem, a partir de sua capacidade de criação, reinvenção e

iniciativa própria, criar recursos próprios de sobrevivência e de auto-emprego. Nos

termos do documento:

O princípio geral de ação que deve presidir a esta perspectiva de um desenvolvimento baseado na participação responsável de todos os membros da sociedade é o do incitamento à iniciativa, ao trabalho em equipe, as sinergias, mas também ao auto-emprego e ao espírito empreendedor: é preciso ativar os recursos de cada país, mobilizar os saberes e os agentes locais, com vista à criação de novas atividades que afastem os malefícios do desemprego tecnológico. Nos países em desenvolvimento esta é a melhor via de conseguir e alimentar processos de desenvolvimento endógeno (Ibid., p. 83).

Conforme o Relatório, o chamado espírito empreendedor é uma capacidade

que deve ser desenvolvida a partir da educação escolar a fim de preparar o

indivíduo para superar sua condição social através da iniciativa própria. O

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indivíduo torna-se, assim, o único responsável pelo seu fracasso ou pelo sucesso,

o que implica em desconsiderar a pobreza e a marginalização como fatores que

fazem parte da lógica do capital e que permeiam as relações sociais.

Nessa mesma perspectiva, podemos citar outros documentos internacionais

orientadores da s reformas educacionais nacionais. Dentre as recomendações do

Fórum Mundial sobre Educação, ocorrido em Dakar em 2002, está “estimular o

desenvolvimento da criatividade e das capacidades de empreendimento

endógenas”. (DELORS, 2001, p.84).

O Projeto Regional de Educação para a América Latina e Caribe3

(PRELAC), em 2002, acresce a estes quatro pilares, um quinto, o “aprender a

empreender”:

A estes [quatro pilares], há que se reunir “Aprender a empreender”, fazendo propostas e tomando iniciativas. As aprendizagens indicadas têm de capacitar cada pessoa a construir seu projeto de vida e orientar a ação das instituições educativas para que isto seja possível (UNESCO, 2002, p. 14).

Segundo Rodrigues (2008), ancorado no discurso e defesa de uma

educação norteadora da promoção e do desenvolvimento humano ao longo de

toda a vida:

[...] o PLELAC apresenta como quinto pilar da educação o “aprender a empreender”, reafirmando a necessidade de formação de um novo modelo educacional, capaz de preparar o indivíduo, para lidar, de forma ativa, com o cenário de incertezas e instabilidades econômicas produzidas pelo capitalismo nas últimas décadas, propondo ainda uma revisão dos currículos e dos conteúdos escolares, a fim de que o educando possa manifestar sua capacidade de aprendizagem por meio da iniciativa própria, de modo que o educador assume a postura de facilitador do processo aprendizagem (RODRIGUES, 2008, p.90).

3 O que é o PRELAC. O Projeto Regiona

l de Educação para a América Latina e Caribe, proposto para a vigência de 2002-2017. Sua finalidade declarada é “propor mudanças substantivas nas políticas públicas para tornar efetiva a proposta de Educação para Todos e atender, assim, as demandas de desenvolvimento humano da região no século XXI.” (UNESCO, 2002, p. 3). Vai o projeto em anexo acrescentar mais coisas

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Importa-nos ressaltar que em 1999 a expressão aprender a empreender já

havia sido mencionada no Boletín Proyecto Principal de Educación4, identificada

como eixo de aprendizagem no âmbito da educação de jovens e adultos e sua

vinculação ao mundo do trabalho. Nos termos do documento:

A oferta de programas de capacitação nos setores de pobreza deve ocorrer no marco de um “aprender a empreender”. Sob esta lógica, a estratégia aponta para a potencialização das pequenas atividades econômicas, os pequenos empreendimentos das pessoas, em muitos casos as estratégias de sobrevivência. [...] O “aprender a empreender” refere-se justamente a possibilitar que as pessoas desenvolvam competências que lhes permitam iniciar, potencializar e desenvolver atividades econômico-produtivas, quaisquer que seja o porte e o tipo destas. A ênfase não é, sem dúvida, sobre a necessidade de desenvolver empresas-negócios [...] mas sobre a necessidade de que as pessoas desenvolvam a capacidade de tomar iniciativas pessoais orientadas à criatividade e à potencialização de seus recursos frente a um contexto econômico em constante transformação (UNESCO/OREALC, 1999, p. 18, grifo nosso).

As políticas educacionais elaboradas a partir dos documentos aqui citados

apontam para a criação de novas concepções de educação e novos métodos

pedagógicos. O objetivo é viabilizar a formação de um sujeito, capaz de se

sobressair, ao enfrentar o atual cenário social e econômico, ou seja, que possa

criar diferentes formas de garantir sua subsistência, a partir de capacidades que

serão desenvolvidas desde a educação básica. Tais mudanças no âmbito da

educação vêm responsabilizar os sujeitos não apenas pela condição social a qual

4 O Boletim é o órgão de divulgação do Projeto Principal para a Educação – PPE. O “Projeto

Principal de Educação para América Latina e Caribe (PPE), proposto para vigência no período de (1980-1999), conforme Rodrigues (2008, p. 12), “é apresentado como resultado de consenso entre os representantes governamentais dos países da região, cujos objetivos tinham como horizonte, até o ano 2000, atender carências, necessidades educativas fundamentais, enfatizando-se, para isso, a cooperação horizontal, sub-regional, regional e internacional. Compunham as finalidades do Projeto a promoção da formação integral e permanente do homem, o amparo à organização de uma sociedade justa, participativa e auto-determinante. Para tal, são elencados entre os objetivos específicos a escolarização antes de 1999 de todas as crianças em idade escolar, a ampliação dos serviços educativos para os adultos e a melhoria da qualidade e eficiência dos sistemas educativos por meio da realização das reformas necessárias”.

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estão submetidos, mas também pela capacidade de aprendizagem voluntária, de

construir os saberes, capaz de resultar em auto-emprego e sucesso profissional

(RODRIGUES, 2008).

A propagação desse discurso em grande parte do mundo impulsionou a

defesa da formação de um sujeito com espírito empreendedor. Esta corrente de

pensamento tem ganhado força no contexto atual, fazendo com que o

empreendedorismo seja um dos principais temas no campo da economia e da

educação. O “aprender a empreender”, significa uma nova articulação entre

educação e economia na tentativa de promover o desenvolvimento econômico e

social sustentável, para atenuar as desigualdades e suas consequências.

Para compreendermos melhor os princípios desta ideologia, abordaremos a

seguir a origem do empreendedorismo e seus elementos conceituais para que

estes novos aportes, possam ampliar nossos conhecimentos na relação desta

temática com a educação.

A origem do empreendedorismo

O termo empreendedorismo surgiu com o desenvolvimento do capitalismo.

Ou seja, com o surgimento das máquinas, o avanço das grandes navegações, o

aumento significativo da capacidade de produção, esse termo passou a ser

empregado para definir as pessoas que apresentavam como características a

ousadia e a capacidade de estimular o progresso econômico.

Foi na França por volta dos séculos XVII e XVIII que o termo surgiu pela

primeira vez. No século XIX o economista francês Jean Baptiste Say conceituou o

empreendedor como o indivíduo capaz de movimentar recursos de uma área de

baixa produtividade para outra com maior retorno. Um século mais tarde o

austríaco Joseph Schumpeter, considerado um dos maiores economistas da

época, definiu o empreendedorismo como a capacidade de inovar por meio do

desenvolvimento da tecnologia, atuando como agentes de promoção da

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economia. Atualmente, Peter Ferdinand Drucker, considerado o pai do

empreendedorismo moderno, considera que o termo está ligado à capacidade de

superação, de aproveitar oportunidades para inovar e provocar mudanças (LUZ,

2007, p. 9).

Alguns autores definem que o empreendedorismo não é apenas uma

habilidade a ser desenvolvida, mas refere-se também a um traço relacionado à

personalidade, o sujeito empreendedor possui um atributo fundamental para a

organização social no atual momento histórico, a capacidade de lidar e resolver

situações problemas e criar recursos próprios que lhe garantam não apenas a

subsistência, mas também o sucesso profissional (Ibid., p. 9). Neste sentido, o

espírito empreendedor está ligado a capacidade de reinvenção e a de conhecer,

enfrentar e assumir riscos.

Observa-se que o termo vem ganhando força a partir da reestruturação do

capitalismo e das mutações do trabalho, vivenciadas especialmente a partir dos

anos 90, tornando-se tanto objeto de estudo quanto de ensino a ser ministrado em

cursos de graduação e pós-graduação, especialmente na área empresarial

comercial e industrial. As universidades americanas foram pioneiras a introduzir

essa temática na área da educação. Esse ensino, porém, não têm se restringido

apenas às universidades, mas tem ganhado ênfase, cada vez maior também na

educação básica.

No Brasil, o tema vem ganhando cada vez mais espaço e adesão,

chegando a fundamentar projetos pedagógicos de diversas escolas, por

orientação das próprias Secretarias de Educação. Na literatura educacional se

multiplica as publicações voltadas para a disseminação de uma suposta

superioridade do empreendedorismo na educação frente a outras proposições

pedagógicas, revelando uma “nova” forma de articulação entre economia e

educação, proposta pelos ideólogos do capital, sob o nome de “Pedagogia

Empreendedora”.

Considerando a necessidade do sistema vigente, de os indivíduos buscar

garantir a sua própria sobrevivência, a Pedagogia Empreendedora surge com a

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proposta de, a partir de habilidades e competências desenvolvidas através da

educação escolar, transformar sonhos em possibilidades, indivíduos que, apesar

da condição social, possam superar as dificuldades desta mesma condição, para

construir, através de recursos próprios, (iniciativa, ousadia, planejamento de

ações, capacidade de enfrentar e superar situações problemas e criatividade)

métodos eficazes de auto emprego e sustentabilidade.

O autor que mais se destaca no debate e na defesa desta proposta no

Brasil, é Fernando Dolabela5. Em seu livro “Pedagogia Empreendedora – O

Ensino do Empreendedorismo na Educação Básica, voltado para o

Desenvolvimento Sustentável”, conforme as palavras Gilberto Dimenstein no

Prefácio do livro, Dolabela pretende levar para o ensino básico uma proposta que

se diz inovadora e capaz de “semear o empreendedorismo, o espírito de aprender

a empreender, de tomar o destino nas próprias mãos” (DIMENSTEIN, apud,

DOLABELA, 2003, p. 13).

A tarefa da educação empreendedora já é anunciada pelo autor na contra

capa do livro. De acordo com suas palavras:

A tarefa da educação empreendedora é principalmente fortalecer os valores empreendedores na sociedade.É dar sinalização positiva para a capacidade individual e coletiva de gerar valores para toda comunidade, a capacidade de inovar, de ser autonômo, de buscar a sustentabilidade, de ser protagonista.Ela deve dar novos conteúdos aos antigos conceitos de estabilidade e segurança impregnados na nossa cultura, mas referentes à contextos hoje inexistentes. Atualmente, estabilidade e segurança envolvem a capacidade da pessoa em correr riscos limitados e de se adaptar e se antecipar às mudanças, mudando a si mesma

permanentemente (DOLABELA, 2003).

5 O professor Fernando Dolabela, de Minas Gerais, é o criador dos maiores programas de ensino de

empreendedorismo do Brasil na educação básica e universitária; consultor e professor da Fundação Dom

Cabral, ex-professor da UFMG, consultor da CNI-IEL Nacional, do CNPq e de dezenas de universidades.

Autor de nove livros, entre eles: “Pedagogia Empreendedora” e dois softwares, com publicações nos maiores

congressos nacionais e internacionais.

09

A Pedagogia Empreendedora foi elaborada por ele para atender jovens e

crianças, sendo fundamentada na chamada Teoria Empreendedora dos Sonhos.

Para Dorabela (2003, p. 38), “É empreendedor em qualquer área, alguém que

sonha e busca transformar seu sonho em realidade”.

Segundo o autor, o conceito de sujeito empreendedor deve ser também

empregado na esfera educacional, uma vez que este, não se limita as relações

empresariais, mas abrange também todos os setores. Esse sujeito é alguém que,

a partir de um sonho, concentra-se todos seus esforços para realizá-lo,

independente das circuntâncias e do contexto em que o indivíduo esteja inserido.

O sonho e a busca pela sua realização é, portanto, o “combustível” para que o

indivíduo construa conhecimentos e a partir deles se desenvolva.

A seguir apresentaremos as estratégias didáticas, por meio dos quais,

serão construídas as habilidades e competências para a formação do espírito

empreendedor, a sua consolidação enquanto sujeito e sua promoção profissional.

O sonho estruturante e as estratégias didático-pedagógicas para a formação do sujeito empreeendedor

Conforme já citamos anteriormente o sonho é a base desta proposta

pedagógica. De acordo com Dolabela, o sonho é o combustível que irá mobilizar

as capacidades, competências, habilidades e conhecimentos necessários para

que o indivíduo possa transformá-lo em realidade.

Segundo o autor, o processo de construção do sonho, e do sujeito

empreendedor, deve ser acompanhado e estimulado pelo professor. O sonho

deve estar de acordo com a faixa etária e o aluno possui liberdade para escolher

e difinir seu próprio sonho, exceto em casos em que o sonho inflinja questões

relaciondas a ética o respeito e a democracia. O sonho escolhido pode ser coletivo

ou individual.

O primeiro passo nesta proposta é realizar o mapeamento do sonho, ou

seja, um roteiro que deverá auxiliar o aluno na busca pela identificação e

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realização do mesmo. Este roteiro perpassa pelo auto-conhecimento, ou seja, o

aluno realizará o conceito sobre si mesmo, na busca de identificar quem é, o que o

emociona e o que o atrái. Esta proposta se organiza a partir de cinco momentos

denominados por Dolabela como: momentos estruturantes:

O primeiro desses momentos é voltado para a concepção do sonho; O segundo, para a análise do sonho; O terceiro para o planejamento da busca de realização do sonho;

O quarto para o levantamento de recursos necessários à realização do sonho; O último será um balanço do que foi realizado durante o ano

(DOLABELA, 2003, p. 96).

A partir disto,o professor deverá iniciar a aula com a seguinte questão: qual

é o seu sonho? A partir desta temática o professor pode levantar

problematizações como: o que gosta? Ou, o quê produz o sentimento de auto

realização? E o quê necessita para ser feliz.

Tendo cumprido esta etapa, o próximo passo será pedir aos alunos que

façam relatos orais, por escrito ou mesmo em forma de desenhos, sobre seus

sonhos. O professor também pode utilizar como recurso didático o depoimento de

pessoas da comunidade ou de profissionais de setores diferenciados como, por

exemplo, médicos, jornalistas e empresários, a fim de contribuir para o processo

de construção do sonho estruturante. O sonho recebe este nome, justamente por

estruturar o processo de construção dos saberes inerentes ao sujeito

empreendedor. Neste sentido, o autor destaca que o “conteúdo a ser aprendido

será defenido pela natureza do sonho – o que for necessário para concretizá-lo”

(DOLABELA, 2003, p. 67).

Uma vez que o aluno identificou o sonho, a próxima etapa consiste em

conhecer a área ou setor em que este sonho se concentra. Através de atividades

de busca de informações, pesquisa em livros ou a campo, o aluno tem

oportunidade de conhecer profundamente o ambiente do sonho. De posse destes

09

conhecimentos o aluno possa a realizar uma análise das relações entre si e o

sonho, buscando identificar o que este sonho pode lhe oferecer. Quais as

oportunidades que tem para realizar o mesmo e quais sensações irá ter a partir da

realização do mesmo e por quanto tempo.

Conforme Dolabela, conhecer a si mesmo é um dos fatores fundamentais

para a construção do sujeito empreendedor, pois o conhecimento de si mesmo

permite ao sujeito lidar com as próprias emoções, especialmente se

conisderarmos que vivenciamos um contexto marcado por instabilidades

econômicas e sociais, como também de criar recursos para se sobressair em meio

as adversidades. Neste sentido, o autor enfatiza a necessidade eminente de se

trabalhar com o domínio emocional e com a aquisição de característas emocionais

que contribuam para a consolidação do sujeito empreendedor.

Perseverança, iniciativa, criatividade, comprometimento, orientação para o futuro, liderança, imaginação, proatividade, tolerância a riscos moderados, alta tolerância a ambigüidades e incertezas, capacidade incomum para o trabalho, protagonismo e energia (DOLABELA, 2003, p. 58).

Tendo o aluno avançado neste processo de auto-conhecimento e de

relações entre o sonho e a auto satisfação, a próxima etapa é a análise das

relações entre o sonho e as outras pessoas, ou seja: o seu sonho é útil para a

comunidade? (DOLABELA, 2003, p.95)

Cabe resslatar que, para essa perspectiva pedagógica, o indivíduo assume

toda responsabilidade por sua condição social, uma vez que, através da iniciativa

própria e dos conhecimentos adquiridos no seu processo de formação enquanto

sujeito empreendedor, ele assume a condição de “senhor do seu próprio destino”.

Em útlima instância o sujeito é responsabilizado pelas “dores e delícias” de ser o

que é, por suas conquistas e seus fracassos.

Dessa forma, ao atribuir ao sujeito, de forma isolada e individual, a

responsabilidade por sua própria realidade, o capitalismo deixa ser visto em última

instância como responsável por sua exploração e a marginalização.

09

Cabe dizer que a proposta pedagógica, defendida por Dolabela, não está

centrada na transmissão/aquisição de saberes sistematizados, função

tradicionalmente desempenada pela instituição escolar, mas corresponde

inteiramente às exgências da economia globalizada, cujas bases cada vez mais

competitiva e excludente, exigem o desenvolvimento de um conjunto de

habilidades e compentências que permitam ao indivíduo lidar tanto com as

mudanças no processo produtivo, quanto com desemprego, a fim de criar

estratégias de auto-emprego para a garantia da própria sobrevivência.

O educador, atua como estimulador e orientador do desenvolvimento do

aluno na busca pelo realização do sonho. Para isso, ele deve apontar para o

universo de possibilidades, ou seja, para os caminhos pelos quais os sonhos

podem ser construídos e realizados. Neste sentido, Dolabela (2003, p. 97) destaca

que:

[...] O foco do aprendizado são as relações que o indivíduo estabelece consigo mesmo e com o munndo, havendo portanto mudanças contínua dos conteúdos e também, e principalmente do próprio ser do aluno no processo de construção do auto conhecimento. Assim, o auto-aprendizado é permanente e acompanha o fato de que os sonhos se alteram com o passar do tempo.

Segundo o autor, a produção de conhecimento e o desenvolvimento do

educando de se dá a partir do empenho e da atuação do próprio aluno. Neste

sentido, o professor deve atuar com estratégias e didáticas que estimulem e

orientem o aluno na busca da construção e da realização do sonho, fazendo com

que o próprio aluno se descubra enquanto autor e protagonista de sua própria

história.

Nesta proposta de ensino, a avaliação se dá por meio da análise de avanço

no processo de incorporação do sujeito empreendedor, ou seja,à medida que o

aluno, respondendo as idéias nortedoras da construção do sujeito empreendedor,

elabora conceitos sobre si mesmo, sobre sua atuação na comunidade, planeja o

09

roteiro do sonho e busca elementos para realizá-lo. Enfim, se constitui um sujeito

empreendedor. Para essa concepção de avaliação, o foco da análise dos

conhecimentos adquiridos pelo aluno não concentra-se na realização do sonho,

mas nas etapas de desenvolvimento em que o aluno avança para sua realização.

A partir desta breve exposição das bases teórico-metodológico da

Pedagogia Empreendedora, nossa próxima questão consiste na investigação de

como esta proposta pedagógica tem se efetivado na educação e quais discussões

autores tem feito sobre esta temática no campo da educação.

As repercussões da Pedagogia Empreendedora na educação

Atualmente a temática do empreendedorismo vem ganhado um grande

número de adeptos no campo educaiconal. Na expectativa de formar o sujeito

empreendedor, diversas Secretarias de Educação em diferentes estados e

municípios têm adotado a Pedagogia Empreendedora, como forma de amenizar

as desigualdades sociais e apresentar possíveis soluções para a problemática do

desemprego estrutural, de buscar estimular indivíduos a investir no auto-emprego

como forma de amenizar o aumento da pobreza, e de diminuir as desigualdades

sociais e as suas consequências.

É importante destacar que, segundo Dolabela (2003), o termo

empreendedor, não refere-se apenas aos indíviduos que se destacam pelo

sucesso ou pela ascensão social, mas trata-se de todo e qualquer indivíduo que a

partir de um sonho e da busca por sua realização cria e descobre estratégias de

sobrevivência, adquirindo aí o caráter de agente construtor de seu próprio destino.

Em síntese, alguém que convive em um cenário econômico de instabilidades e

incertezas, de desigualdades sociais e auto índices de desemprego e pobreza,

mas que, apesar disso, é capaz de criar estratégias de sobrevivência e de auto-

emprego.

09

Em nossa pesquisa constatamos que as Secretarias Municipais de

Educação de diversos municípios6, algumas associadas a outras instituições como

o SEBRAE, tem optado cada vez mais pela implatação desta proposta

pedagógica. O objetivo geralmente tem sido o de formar indivíduos que se auto-

promovam enquanto sujeitos sociais e profissionais, que busquem novos modos

de subsistência e de realização pessoal.

De acordo com o site da Fedaração de Entidades de Micro e Pequenas

Empresas (FEMICRO) do Espírito Santo, em artigo publicado em 28 de outubro de

2010, foi implantado na cidade de Londrina no Estado do Paraná o programa

“Pedagogia Empreendedora”7, desenvolvido por Fernando Dolabela. A finalidade é

do programa é capacitar professores da rede municipal de ensino, mediante

palestras e grupos de estudos, para que estes possam, a partir de estratégias

didáticas, desenvolver nos alunos o espírito empreendedor. Conforme as

informações do site os alunos vão aprender conceitos de matemática

empreendedora e noções de administração.

Conforme nos informa o site da Acil Notícias, a Secretaria Municipal de

Educação da cidade de Londrina iniciou a implantação do projeto “Saber

Empreender”, que se apresenta como metodologia de ensino sob o nome de

“empreendedorismo para a vida”. O referido projeto será desenvolvido nas 82

escolas da rede municipal de ensino. Para isso, serão atendidas cerca de 30 mil

alunos de primeira a quarta série, este projeto será dividido em duas etapas, no

primeiro semestre do corrente ano, o projeto se concentrará em oferecer

capacitação aos professores da rede, a partir do segundo, o projeto deve ser

implantado nas salas de aulas de toda rede de escolas municipal de Londrina.

6 Conforme Luz (2007, p. 11), “Várias secretarias municipais de Educação, localizadas em

diferentes estados (Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo), serviram de espaço para a experiência-piloto da proposta da Pedagogia Empreendedora”. 7 A principal meta da iniciativa é vincular as tecnologias de desenvolvimento locais às escolas e

comunidade, formando os estudantes não só para a abertura de uma empresa, mas explorando,

também, o potencial de serem empreendedores em qualquer atividade. O público que o programa

abrange são alunos da Educação Infantil até o Ensino Médio, ou seja, de 4 a 17 anos.

09

Além do município de Londrina, mais outros 126 municípios vem adotando

esse novo projeto pedagógico, com a pespectiva de aumentar o produto interno

bruto do município e promover o desenvolvimento sustentável dos muncípios.

A partir deste novo papel que passa a ser desempenhado pela educação, a

escola pública vai adquirindo um outro caráter institucional, o que nos remete a

uma profunda reflexão sobre sua especificidade. A educação assume o papel de

formar habilidades e competências que qualifique o indivíduo a sobreviver frente

as novas exigências impostas pela nova lógica do capital. Isto é, de uma lógica em

que o inidivíduo que “por não se conseguir o pleno emprego, se comece a

caminhar para uma multiplicidade de estatutos e de contratos de trabalho: trabalho

com tempo parcial, trabalho com duração limitada ou precária, trabalho com

duração indeterminada, desenvolvimento do auto-emprego” (DELORS, 2001, p.

110).

Verifica-se que este modelo educacional, voltado para a formação do

sujeito empreeendedor não apenas coloca em cheque o papel desempenhado

pela educação escolar, até então, mas promove a alienação do indivíduo, uma vez

que sua formação escolar está centrada, sobretudo, na relação sonho-realização,

como se isso independesse das condições materiais de vida, revelando uma

concepção idealizada da educação.

Embora haja uma adesão significativa da pedagogia empreendedora por

diversas Secretarias de Educação em todo país (conforme tabela em anexo),

constatamos que esta vem sendo altamente criticada por diversos autores, ao

apontar suas contradições, seus prejuízos para a formação do indivíduo, sua

ineficácia na aplicabilidade e na própria base teórico-metodológico.

Luz (2007), ao refletir sobre a implantação desta pedagogia em sua

pesquisa, intitulada “Empreendedorismo na educação: reflexões sobre a

experiência educacional do município de Guarapuava com a pedagogia

empreendedora”, investigou os resultados da relação entre educação e economia

na perspectiva do empreendedorismo. A pesquisa tomou como base de

investigação o resultado da aplicação da Pedagogia Empreendedora nas séries

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iniciais no município de Guarapuava. Para isso, foram entrevistados professores

da educação infantil a quarta série do ensino fundmental - alunos de 4 à 17anos.

O pesquisador observou que, em geral as crianças possuiam sonhos em comuns

como ter uma mochila de rodinha, transformar-se em heróis de desenhos

animados, ser rico, ter um cavalo, uma boneca, pisar na lua, dentre outros. No

entanto, algumas crianças apresentaram sonhos pouco convencionais como ser

“garota de programa” e “motorista de caminhão de maconha”. Neste caso, os

professores tiveram que criar novas estratégias a fim de que os alunos pudessem

refletir e adequar seus sonhos dentro aos padrões de ética e moral previstos pela

sociedade.

Ao analisar esses aspectos o pesquisador considera que esta pedagogia

apresenta diversas lacunas que resultam no fracasso de sua implementação. A

criança, em seu processo de formação físico, emocional e intelectual, não realiza

sonhos a longo prazo. Portanto, não possuem maturidade para concentrar

esforços para realizar sonhos como o quê gostariam ser quando crescerem. O

pesquisador destaca, ainda, que enfatizar na criança a construção do sonho e a

busca pela realização do mesmo pode acarretar sérias consequências para seu

desenvolvimento, uma vez que a criança é “retirada de sua infância” para projeta-

se para o futuro, como sujeito autor e protagonista de sua própria história.

Além disso, o sonho da criança, geralmente astá atrelado as experiências

adquiridas no convívio familiar. Uma criança filha de mecânico tende a se espelhar

na profissão do pai, já que este representa ser um importante referencial na

construção de sua identidade. Isto retira-lhe a possibilidade de possuir sonhos que

estão para além de sua realidade, como ser piloto de avião, policial, dentre outros.

Para Luz (2008), nessa perspectiva pedagógica, o indivíduo é concebido

como um ser multifuncional e polivalente, o qual toda sua existência está voltada

apenas para atender as necessidades do mercado.

Outra questão apontada por ele é que a pedagogia empreendedora não

preconiza o fracasso, este só se efetiva por meio da desistência do sonho, e que a

impossibilidade de realização do sonho é vencida por outro sonho. Cabe

09

ressalatar que, em geral, a não realização do sonho está ligada a incapacidade do

aluno em planejar-se, enfrentar e solucionar situações problemas,

desconsiderando os fatores externos como implicadores no processo de formação

do indivíduo enquanto ser social. Nesse caso, é transferido ao sujeito a

responsabilidade pela sua condição social, de modo que o sujeito assumiria o que

a Rodrigues (2008) chama de culpabilidade por suas escolhas mau-sucedidas.

Considerações finais

As reflexões aqui apresentadas sobre a adoção da pedagogia

emprendedora na educação básica, cujo o objetivo é formar sujeitos

empreendedores desde a mais tenrra idade, nos permite afirmar que sua principal

finalidade é manter as relações sociais vigentes. Em outros termos, considerando

o atual cenário, cujas características são: a instabilidade econômica dos mercados

internacionais, a ruptura do mercado de trabalho formal, os avanços tecnológicos,

a desqualificação da mão de obra e a precarização dos postos de trabalho,

transformar a educação em um instrumento de formação de indivíduos que

possam, a partir de características desenvolvidas através da educação escolar,

formentar capacidades próprias de auto-emprego como forma de sobrevivência,

se apresenta como sendo mais uma estratégia do capital para sua reprodução.

Nesse sentido, as políticas educacionais, que vem sendo fomentadas

atualmente, pelas agências internacionais, sob diversas pedagogias (pedagogia

das competências, pedagogia do aprender a aprender, pedagogia empreendedora

dentre outras), visam a manutenção do sistema econômico, como forma de

inevitabilidade do processo das relações capitalistas. Nesse sentido, o indivíduo

deve estar continuamente se adequando as mudanças e alterações incessantes

do mercado. Em última instância essas pedagogias acabam por promover sua

alienação e desumanização desde a mais tenrra idade

Embora nosso objeto central de estudo seja a análise e a reflexão sobre a

pedagogia empreendedora como uma proposta educacional, ao analisá-la, somos

09

levados a uma profunda reflexão sobre a natureza e a especificidade da educação

escolar no atual cenário econômico, político e social.

De nossa perspectiva a ênfase na defesa e disseminação destas novas

concepções educacionais, reduzem a vida humana a objeto das relações de

mercado, pois estas pedagogias minimizam significadamente o papel da

educação, uma vez que toda sua concepção de formação humana, está reduzida

a preparar o indivíduo para competir e para atuar num mundo de incertezas,

especialmente no que diz respeito à sua própria subsistência. Contudo, a

educação escolar possui outras especificidades, ou seja, ela é parte do processo

de humanização do homem (SAVIANI, 1991). A educação é antes de tudo

desenvolvimento de potencialidades e apropriação dos saberes historicamente

acumulados e socialmente produzidos, objetivando a formação integral do homem.

Tal discussão implica em compreender que a educação deve ser muito

mais do que simplesmente ensinar sujeitos a tomar para si, as “rédias” da própria

vida. Portanto, se consideramos que é a partir da educação escolar e das

instituições de ensino que os homens se apropriam dos conhecimentos

historicamente produzidos e dos bens culturais (SAVIANI, 1991, p.19), quando

transferimos este “olhar” para a pedagogia empreendedora, objeto de nossa

discussão, é possível identificarmos uma negação da função da instituição escolar

como o lócus fundamental de transmissão dos conhecimentos científicos.

Desse modo, adotar uma pedagogia cujo o objetivo único é formar sujeitos

capazes de sobreviver em meio as crises econômicas e sociais de um sistema

econômico instável e inconstante, é reduzir a educação a uma lógica

economicista, individualista, imediatista e pragmatista. É, sobretudo, negar a

educação como processo de desenvolvimento pleno dos sujeitos, é privar-lhes da

socialização do saberes sistematizados e historicamente construídos.

Apesar da atual adoção significativa, por parte da Secretarias Municipais de

Educação, de projetos pedagógicos empreendedores, desejamos que as

discussões aqui apresentadas demonstrem a fragilidade deste proposta

pedagógica no processo de formação do indivíduo.

09

Na realização do trabalho observamos que, embora veham sendo

produzidas novas tentativas de conciliar educação e economia é fundamental que

tenhamos como base para a prática pedagógica as seguintes reflexões: Quem são

os sujeitos que se pretende formar? Para qual sociedade?

Para finalizar gostaríamos de destacar que refletir sobre as políticas

educacionais é, sobretudo, um exercício que deve acompamhar o pedagogo

durante toda sua caminhada pelo campo da educação. Isso porque, entendemos

que sua compreensão nos oferece possibilidades para atuarmos de forma

consciente, a fim de que a nossa ação pedagógica possa, de fato, contribuir para

a formação de sujeitos capazes de lutar para romper com as relações que nos

degradam e marginalizam.

De nossa perspectiva, ao lançarmos esses questionamentos, desejamos

levantar novos pontos para reflexão e compreensão dessa questão, para que

possamos refletir criticamente sobre nossas práticas e agir de forma consciente

diante das situações que nos deparamos cotidianamente na escola.

Referências

ALVES, Giovanni. Dimensões da reestruturação produtiva: Ensaios de sociologia do trabalho. 2ª ed., Bauru, Editora Práxis, 2007. ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. 9ª ed, São Paulo: Boitempo, 2007. ANTUNES, Ricardo. Adeus ao Trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a Centralidade do Mundo do Trabalho. 8 ed. São Paulo: Cortez, 2002. DELORS, Jacques (org.). Educação: Um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da comissão internacional sobre educação para o século XXI. São Paulo, Cortez, 2001. DOLABELA, Fernando. Pedagogia Empreendedora: Editora de Cultura, São Paulo, 2003.

09

FONSECA, E. G. Globalização diminui as distâncias e lança o mundo na era das incertezas. Folha de São Paulo, São Paulo, 2 nov. 1997. Caderno Especial. LUZ, Antonio Santos Da. Empreendedorismo na educação: reflexões sobre a experiência educacional do município de Guarapuava com a pedagogia empreendedora. Monografia apresentada como requisito obrigatório para obtenção do título de Especialista em História da Educação Brasileira na Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Unioeste, Cascavel, 2007. POCHMANN, Márcio. O Emprego na Globalização. São Paulo, Boitempo Editorial, 2001. RAMOS, Alexandre Luiz. Acumulação flexível, Toyotismo e Desregulamentação do direito do trabalho. Disponível (http://www.ccj.ufsc.br/~alramos/trabalho.html) RODRIGUES, M. Marilda. Educação ao Longo da Vida: A eterna obsolescência Humana. 2008. Tese de Doutorado – Programa de Pós Graduação em Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2008. SAVIANI, Dermeval. Pedagogia histórico-crítica primeiras aproximações. 5ª ed., Campinas: Autores Associados, 1991. UNESCO. OREALC. Proyecto Principal de Educación en América Latina y El Caribe. Sus Objetivos, características y modalidades de acción. OREALC/UNESCO, s/d. Disponível em: <HTTP//: www.unesco.org>. Acesso em 16 de setembro de 2011. UNESCO. PREAL. Proyeto Regional de Educación para América Latina y El Caribe. Cuba, 2002. Disponível em: <http://www.unesco.cl/port/prelac/focoest/2. act>. Acesso em: 16 de setembro de 2011. UNESCO. OREALC. Proyecto Principal de Educación en América Latina y El Caribe. Boletín 50. OREALC/UNESCO: Santiago, Chile, 1999. Disponível Em: <HTTP//: www.unesco.org>. Acesso em 20 de junho de 2004.

09

ANEXO

09

LISTA DOS MUNICÍPIOS QUE ADOTARAM A PEDAGOGIA

EMPPREENDEDORA NA EDUCAÇÃO BÁSICA

MUNICÍPIO ANO ESTADO

Abatiá 2004 PR

Alto Piquiri 2003 PR

Altônia 2003 PR

Andirá 2004 PR

Ângulo 2003 PR

Apucarana 2003 PR

Arapoti 2003 PR

Ariranha do Ivaí 2003 PR

Astorga 2003 PR

Barracão 2003 PR

Belo Horizonte 2004 MG

Bituruna 2003 PR

Boa Esperança do Iguaçu 2002 PR

Boa Ventura de São Roque 2003 PR

Bom Sucesso 2004 PR

Borrazópolis 2003 PR

Cambira 2004 PR

Campina do Simão 2003 PR

Cândido de Abreu 2003 PR

Cartópolis 2004 PR

Cascavel 2003 PR

Chopinzinho 2003 PR

Cidade Gaúcha 2003 PR

Clevelândia 2003 PR

Colorado 2003 PR

Congonhinhas 2004 PR

Conselheiro Mairinck 2004 PR

Cruzeiro do Iguaçu 2003 PR

Curiúva 2004 PR

Douradina 2003 PR

Doutor Camargo 2003 PR

Nova Esperança 2003 PR

Faxinal 2003 PR

Figueira 2004 PR

Flor da Serra do Sul 2003 PR

Flórida 2003 PR

Francisco Alves 2003 PR

Francisco Beltrão 2004 PR

Francisco de Sá 2004 MG

09

Godoy Moreira 2004 PR

Grandes Rios 2004 PR

Guapirama 2003 PR

Guarapuava 2002 PR

Ibaiti 2003 PR

MUNICÍPIO ANO ESTADO

Icaraíma 2003 PR

Iporã 2003 PR

Iracema do Oete 2003 PR

Itabirito 2004 MG

Itambaracá 2004 PR

Itambé 2004 PR

Itinga 2003 PR

Ivaí 2003 PR

Ivaíporã 2004 PR

Ivatuba 2003 PR

Jacarezinho 2004 MG

Japonvar 2003 PR

Joaquim Távora 2002 PR

Jundiaí do Sul 2003 PR

Kaloré 2004 PR

Laranjeiras do Sul 2003 PR

Lidianópolis 2004 PR

Lontra 2003 PR

Lunardelli 2003 PR

Mallet 2004 PR

Mandaguari 2003 PR

Marialva 2003 PR

Marilândia do Sul 2003 PR

Marilena 2003 PR

Mariópolis 2003 PR

Marmeleiro 2004 PR

Matelândia 2004 PR

Medianeira 2003 PR

Missal (A confirmar) 2004 PR

Montes Claros 2003 MG

Munhoz de Melo 2003 PR

Nossa Senhora das Graças 2003 PR

Nova Contagem 2003 PR

Nova Esperança 2004 PR

Nova Olímpia 2003 PR

09

Nova Prata do Iguaçu 2003 PR

Nova Tebas 2003 PR

Ortigueira 2004 PR

Paiçandu 2004 PR

Palmas 2004 PR

Palmeiras 2004 PR

Palotina 2003 PR

Paranavaí 2002 PR

Pato Bragado 2003 PR

MUNICÍPIO ANO ESTADO

Pérola 2003 PR

Pérola do Oeste 2003 PR

Pitanga 2003 PR

Planalto 2004 MG

Ponta Grossa 2004 PR

Porto Amazonas 2004 PR

Presidente Castelo Branco 2003 PR

Quinta do Sol 2003 PR

Realeza 2004 PR

Renascença 2003 PR

Ribeirão Claro 2004 PR

Ribeirão do pinhal 2003 PR

Rio Branco do Ivaí 2002 PR

Rio Negro 2003 PR

Rondon 2004 PR

Salto do Itararé 2003 PR

Salto da Lontra 2004 PR

Santa fé 2003 PR

Santa Inês 2003 PR

Santa Rita da Sapucaí 2004 MG

Santo Antônio da Platina 2003 PR

Santo Antônio do Jacinto 2003 PR

Santo Antônio do Sudoeste 2003 PR

Santo Inácio 2003 PR

São João do Ivaí 2003 PR

São João do Oeste 2004 PR

São Jorge do Oeste 2004 PR

São Jorge do Patrocínio 2003 PR

São José dos Campos 2003 SP

09

São Miguel do Iguaçu 2003 PR

São Pedro do Ivaí 2003 PR

Serranópolis do Iguaçu 2003 PR

Siqueira Campos 2003 PR

Tomazina 2004 PR

Três Passos 2002 RS

Umuarama 2003 PR

Verê 2003 PR

Wenceslau Braz 2004 PR

Xambrê 2003 PR

Sesi Espírito Santo 2005 ES

Disponível a partir do site: WWW.dolabela.com.br [email protected]