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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO DANIELE SILVA ROCHA EDUCADORES SURDOS: REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A PRÁTICA DOCENTE CAMPINAS 2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

DANIELE SILVA ROCHA

EDUCADORES SURDOS:

REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A

PRÁTICA DOCENTE

CAMPINAS

2017

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DANIELE SILVA ROCHA

EDUCADORES SURDOS:

REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A

PRÁTICA DOCENTE

Dissertação de Mestrado

apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Educação da

Faculdade de Educação da

Universidade Estadual de Campinas

para obtenção do título de Mestra

em Educação, na área de

concentração de Educação.

Orientadora: Prof.ª Dra. Lilian Cristine Ribeiro Nascimento

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO

FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA

ALUNA DANIELE SILVA ROCHA, E ORIENTADA

PELA Prof.ª DRA. LILIAN CRISTINE RIBEIRO

NASCIMENTO.

CAMPINAS

2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

EDUCADORES SURDOS:

REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A

PRÁTICA DOCENTE

Autora: Daniele Silva Rocha

COMISSÃO JULGADORA:

Orientadora Prof.ª Dr.ª Lilian Cristine Ribeiro

Nascimento.

Prof.ª Dr.ª Aryane Santos Nogueira.

Prof.ª Dr.ª Terezinha de Jesus Machado Maher.

A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

2017

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à pessoa eu que amo muito e sempre está presente em todos

os momentos de minha vida. Minha avó Mafalda Beraldi da Rocha, pessoa que

sempre acreditou e acredita em mim, que me enche de conforto de muito amor. Minha

eterna gratidão à pessoa maravilhosa.

Aos meus pais, Célia Silva e Márcio Rocha, pela educação que me deram para

minha vida e apoio nos meus estudos, sempre me apoiaram e confiaram no meu

potencial. Nunca permitiram que eu me acomodasse.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pela sua presença constante na minha vida, por sempre me amparar nas

dificuldades e por todas graças concedidas.

À querida Prof.ª Dra. Lilian Nascimento, por ter me acolhido, por sua confiança em

meu trabalho, pelas necessárias e valiosas contribuições para a pesquisa e por ampliar e

enriquecer o meu olhar sobre o mundo.

Ao meu irmão, Pedro Rocha, pela inspiração.

Ao meu avô paterno, Boris Rocha, pelo seu exemplo de honestidade e caráter, uma

pessoa integra a qual admiro muito.

À família paterna e materna, pelo acolhimento e carinho de sempre: Andressa, Camila,

Cecília, Celise, Késsia, Kellen, Leda, Lucia, Luís, Jaime, José, Rafael, Jorge

Matheos, Selma (in memória), Telma e Yara.

Ao meu amado, Leonardo Volf, que entrou há pouco tempo em minha vida, mas me

preenche de alegria e orgulho. Obrigada pela compreensão, pelas trocas de sexta para

sábado, por ser a minha paz nas horas de desespero e cansaço, por ser quem faz meu

sorriso mais aberto, meus dias mais coloridos, minha vida mais feliz!

À Carmem Zulueta, que faz parte da família Rocha, pela ajuda e acolhimento.

À Prof.ª Dra. Aryane Santos Nogueira, pela amizade, pelas risadas garantidas, estudos,

reflexões e conversas de sempre.

À Prof.ª Dra. Heloísa Lins, pelas contribuições na participação da banca de

qualificação.

Às Prof.ª Dra. Teca Maher, Prof.ª Dra. Aryane Nogueira, por aceitarem em participar

da banca de qualificação e da defesa.

À Prof.ª Dra. Regina Souza, pelas conversas filosóficas que contribuiu para a reflexão

da minha pesquisa.

À Jaqueline Araújo, pela revisão do abstract graças à ajuda da Prof.ª Dra. Lilian.

Obrigada.

Aos intérpretes Lilian Ferreira e Diego Assis por emprestar as suas vozes, pela

paciência e acompanhar sempre nas interpretações durante o tempo do mestrado.

Às fonoaudiólogas, Prof.ª Dra. Tereza Rossi e Prof.ª Dra. Priscila Amorim, pela

amizade e carinho de sempre.

Aos profissionais do CEPRE, em especialmente, Prof. Dra. Ivani Silva e Prof. Dra.

Zilda Gesueli pelo aprendizado e conhecimento.

À Luciana Rosa, amiga querida de longa data, pela amizade sincera.

Ao Guilherme Nichols, além de amigo querido, um modelo de referência acadêmica e

que me “empurrou” para o mestrado. Gratidão.

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À Olívia Rall, por acolher-me de forma tão amiga, pela convivência afável comigo nos

tempos da UNESP, de quem guardo amizade e respeito.

Aos amigos da UNESP, Bárbara Melo, Clarisse Zan, Elaine Rezende, Glauciele

Edygio, Jaquelini Santos, Priscila Caetano, Roberta Amaral, Victor Hugo

Cassetari, pelas ótimas histórias vividas, pela convivência e risadas garantidas ao longo

da graduação.

Às companheiras de estudo do mestrado e do grupo GES (Grupo de Estudos Surdos),

Daniela Cury, Geilda Fonseca, Mirian Santos, Elaine Fernandes e Ellen Oliveira.

À Thais Marin, funcionária da Faculdade de Educação (FE), pela ajuda com a

Plataforma Brasil. Sem você, não teria conseguido.

Ao Departamento de Informática da FE pela elaboração do questionário online para a

realização da minha pesquisa.

Às escolas Cravo, Girassol e Tulipa, pela disponibilidade para a realização da

pesquisa.

Aos participantes que responderam o questionário para o andamento da pesquisa e aos

profissionais que permitiram que eu observasse seu trabalho.

A todas as pessoas que direta ou indiretamente, contribuíram para o andamento e a

realização deste estudo.

À Capes, pela bolsa concedida e pelo financiamento deste estudo.

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RESUMO

EDUCADORES SURDOS: REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO E A

PRÁTICA DOCENTE

Esta pesquisa teve como objetivo compreender o perfil do profissional educador surdo e

sua função no ambiente educacional, destacando sua formação técnica pedagógica, e

refletir sobre sua atuação na formação dos alunos surdos. Essa pesquisa foi realizado

com método de cunho qualitativo e quantitativo que teve como objeto de análise um

questionário on line realizado com educadores surdos e também observações em sala de

aula. Os dados das respostas aos questionários foram quantificados e, posteriormente,

discutidos e analisados. Para descrever e refletir sobre observações em sala de aula em

que atuam educadores surdos, realizou-se uma análise interpretativista baseada nos

seguintes critérios: metodologia utilizada; didática; comprometimento com o ensino;

uso de materiais adaptados e conhecimento. As análises tiveram como embasamento as

perspectivas histórico-cultural (Vygotsky) e a teoria enunciativo-discursiva (Bakhtin).

Os resultados encontraram uma consonância entre as respostas dos questionários e as

observações em sala de aula. Pode-se concluir que, ainda hoje, ocorre uma

desvalorização do profissional surdo no ambiente educacional, sendo que este, na

maioria das vezes, é contratado na educação básica como instrutor, mesmo tendo

formação superior, o que lhes cerceia a autonomia como docente.

Palavras-chaves: Professores surdos; formação docente; prática docente;

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ABSTRACT

DEAF EDUCATORS: REFLECTIONS ABOUT FORMATION AND

TEACHING PRACTICES

The present research aims at understanding the profile of the deaf educator as well as

his role in the educational environment highlighting his technical academic formation,

not to mention dwelling on how his job reflects on the formation of the deaf students.

The objects of analysis of such research, being qualitative as it is, were classroom

observations and an online questionnaire for which the respondents were the

aforementioned deaf educators. The data produced by the answers to the questionnaire

were quantified and, later on, discussed and analyzed. To describe and reflect upon the

classroom observations in which deaf educators work, an interpretative analysis was

made based on the following criteria: methodology applied; teaching practice;

commitment to teaching; use of adapted materials and knowledge. The analyses were

based on the historical-cultural perspective (Vygotsky) and on the enunciative-

discursive perspective (Bakhtin). The answers to the questionnaires and the classroom

observations proved to be in harmony. Thus, we may conclude that, still today, the deaf

professional is devalued in the educational environment and in most cases is hired for

the primary education level of schooling as an instructor even having superior formation

which, by the way, curbs his authority as an educator.

Keywords: Deaf teachers; educator formation; educator teaching.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 01 – Tirinha de Carlos Ruas 66

LISTA DE TABELAS

Tabela 01 - Formação de instrutor de trânsito 29

Tabela 02 - Curso de instrutor de armamento e tiro 30

Tabela 03 - Instrutor de mergulho livre 30

Tabela 04 - Instrutor de voo 31

Tabela 05 - Mapeamento de levantamento de produções técnicas 50

Tabela 06 – Editais 58

Tabela 07 - Descrição dos locais da pesquisa de observação 72

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01 - Idade dos participantes

74

Gráfico 02 - Alunos matriculados na educação superior com surdez,

deficiência auditiva, pessoas com deficiências no Brasil.

75

Gráfico 03 – Estados de residência

76

Gráfico 04 – Idade em que aprendeu Libras

76

Gráfico 05 – Local em que aprendeu Libras

78

Gráfico 06 – Local em que aprendeu Libras (< 9 anos) 79

Gráfico 07 – Local em que aprendeu Libras (> 9 anos)

79

Gráfico 08 – Tipo de escola em que estudou na educação básica

80

Gráfico 09 – Formação em nível superior

82

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Gráfico 10 – Cargo 82

Gráfico 11 – Cargo de professor 83

Gráfico 12 – Cargo de instrutor

84

Gráfico 13 – Cargo de professor e instrutor

84

Gráfico 14 – Curso de formação em nível superior 85

Gráfico 15 – Escolha da profissão

Gráfico 16 - Facilidade de vaga no mercado de trabalho

Gráfico 17 – Valorização da profissão

87

90

91

Gráfico 18 – Melhoria na educação de surdos

93

Gráfico 19 – Diferença de professor e instrutor

95

Gráfico 20 – Contratado como instrutor 97

LISTA DE QUADROS

Quadro 01 – Prefeitura Municipal de Barueri/SP

55

Quadro 02 – Prefeitura Municipal de Petrópolis/RJ

56

Quadro 03 – Prefeitura Municipal de Santo Ângelo/RS 56

Quadro 04 – Prefeitura Municipal de São Caetano do Sul/SP

Quadro 05 – Prefeitura Municipal de São Paulo/SP

Quadro 06 – Prefeitura Municipal de Vitória/ES

56

57

57

Quadro 07 – Perguntas relevantes para a análise do questionário

71

Quadro 08 – Sujeitos da pesquisa de observação em sala de aula 102

Quadro 09 – Trecho de diálogo entre professor e aluno 104

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ....................................................................................................

13

CAPÍTULO I – O papel e a formação do professor e instrutor surdo .................

23

CAPÍTULO II – Professor e instrutor surdo: revendo os conceitos.....................

36

2.1 Compreendendo a formação docente do sujeito surdo.............................. 37

CAPÍTULO III – Contribuições teóricas para a reflexão sobre profissão

do educador surdo .................................................................................................

52

CAPÍTULO IV – Método de pesquisa .................................................................

68

CAPÍTULO V – Análise dos questionários: o que dizem os educadores surdos

sobre sua formação e atuação ................................................................................

73

CAPÍTULO VI – Análise das observações: o que é possível afirmar sobre as

práticas dos educadores surdos em sala de aula ....................................................

99

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................

117

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................

123

ANEXOS .............................................................................................................

133

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INTRODUÇÃO

Pensar na formação do profissional surdo, objeto de estudo da pesquisa, é pensar

também na minha própria história de vida e relatar um pouco das minhas vivências com

esse profissional. Lembro-me dos tempos em que eu ia ao Centro de Estudos e

Pesquisas em Reabilitação (CEPRE)1, pertencente à Universidade Estadual de

Campinas (UNICAMP), o qual frequentei por dez anos (dos dois aos doze anos de

idade). No CEPRE, eu sempre procurava pela instrutora surda. O que esta figura

representava em minha vida?

Minha mãe participou do curso de Língua Brasileira de Sinais (Libras) nessa

instituição (CEPRE) com o intuito de aprender essa língua, uma das partes do programa

que os pais deveriam participar, enquanto os filhos eram atendidos na instituição, que

naquela época adotava a abordagem comunicação total2. Quando eu tinha dúvidas,

além da minha mãe, eu sempre procurava a instrutora surda3, pois com ela minha

compreensão se realizava qualitativamente. Vygotsky (1998) define que a relação entre

sujeitos é de suma importância, já que a aprendizagem ocorre na mediação do sujeito

com o outro. Para que o sujeito tenha o desenvolvimento do pensamento, é necessária

sua inserção na cultura, através dos grupos sociais e da linguagem. Portanto, o

desenvolvimento da linguagem ocorre no meio social e o significado das palavras é que

permite uma representação da realidade no pensamento. Cito um exemplo: quando

pedia à minha mãe para explicar porque a palavra manga estava escrita numa parte de

um casaco, porque ela escreveu errado? Ela afirmou que manga tinha dois significados

parte de uma peça de vestuário, como casaco, blusa; mas, também significava fruta.

Fiquei confusa, era tamanha a minha incompreensão, eu olhava: “MANGA” – As

mesmas letras e com significados tão diferentes? Minhas indagações e insatisfação

continuavam, principalmente porque minha mãe me explicava com os recursos que ela

tinha: o bimodalismo, usando a fala e os sinais ao mesmo tempo. Era essa a forma

defendida pela abordagem da Comunicação Total, na época.

1 O Centro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação (CEPRE) também atende às pessoas com deficiência

visual. Para mais informações: http://www.fcm.unicamp.br/fcm/centro-de-estudos-e-pesquisas-em-

reabilitacao-cepre. 2 Comunicação Total, método adotado após o fracasso de oralismo, começou a ser desenvolvido em

meados de 1960. A abordagem consistia no uso de sinais, fala, leitura labial, apontamento, uso de figuras,

ou seja, uso simultâneo de fala com os sinais (LACERDA, 1998). 3 Denomino a profissional surda que trabalhava no CEPRE de instrutora, porque, na época ela não tinha

formação acadêmica em nível de graduação e até hoje a nomenclatura é adotada nesta instituição.

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Quando a instrutora surda me explicou sobre os dois significados da palavra, a

real comunicação se fez, pude compreender claramente. Hoje reflito sobre a importância

da língua de sinais como compreensão e inserção no mundo em que vivemos.

Com a minha mãe algo que eu não compreendia ou não conhecia, ela fazia à

maneira dela, usando seu próprio discurso de ouvinte; por outro lado, quando eu

perguntava algo à instrutora surda, ela citava vários exemplos e ainda acrescentava

outros, próprios da comunidade surda4. A identificação pessoal vai além da língua de

sinais, é a essência e a sutileza da comunicação, assim como define Vygotsky (1998), é

a inclusão das relações entre as pessoas que garante a aprendizagem, ou seja, a

construção da linguagem ocorre quando a criança tiver exposição a uma língua natural,

o que permitirá a realização de trocas comunicativas, vivenciando situações do seu meio

(GOLDFELD, 1997; GESUELI, 2003).

Parece-me que o CEPRE, além de uma escola de vida, era meu palco de

comunicação, pois parte das pessoas conversavam (e conversam) por meio de Libras e

havia respeito às singularidades das pessoas surdas. Na escola, não havia professor

surdo e nem professora ouvinte que soubesse a língua de sinais e, por isso, eu sempre

recorria à minha mãe e aos profissionais do CEPRE. Nesse período, fui aprendendo com

várias pessoas e me apropriando, porque ali havia um ambiente bilíngue, inclusive as

fonoaudiólogas com quem eu fazia as sessões eram bilíngues, utilizavam a fala e a

língua de sinais simultaneamente, o que facilitava a comunicação e o entendimento. O

ambiente rico que eu vivenciei naqueles tempos era um ambiente de interação com

todos no CEPRE. Não foi na escola que essa interação aconteceu.

Tenho memória fotográfica de certas situações, por exemplo, conversas em

Libras. Lembro-me dos amigos conversando em Libras, lembro-me de certos discursos.

A presença do instrutor faz diferença na vida da criança surda. O papel do professor

surdo fazia falta em minha vida escolar, pois o CEPRE não era uma escola e sim uma

instituição clínica, mas que, a partir do conhecimento que tenho hoje do que é uma

escola bilíngue, esse ambiente me parecia muito com o que hoje entendo como uma

escola bilíngue. Eu podia conversar com qualquer profissional que sabia a língua de

sinais e com as crianças surdas. É através desta interação com outros que a criança

4 Entende-se que se refere ao grupo de pessoas ouvintes e surdos, sejam elas, intérprete de Libras,

professores, pesquisadores, pais de filhos surdos, entre outros que participam à militância em favor da

cultura surda. Segundo Padden (2000), "uma comunidade surda pode incluir pessoas que não são próprias

surdas, mas que apoiam ativamente os objetivos da comunidade e trabalham em conjunto com as pessoas

surdas para os alcançar" PADDEN (2000, p. 5).

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constrói significados e valores. Além desses ambientes “bilíngues”, lembro-me também

das broncas dos tios ou das tias, nesses momentos eles sempre chamavam minha prima

para dar explicações, porque esta sabia a língua de sinais, nossa comunicação era

baseada em gestos caseiros (a maioria dos sinais inventados por nós), o que tornava uma

comunicação parcialmente interativa. Mesmo o CEPRE não sendo uma instituição de

ensino escolar, as experiências que vivenciei lá me fazem compreender a falta que faz o

professor surdo em sala de aula nas escolas brasileiras.

No CEPRE, eu aprendi a língua de sinais, descobri a minha língua, comuniquei-

me com amigos surdos na nossa língua, construí minha história e fiz diferença em

minha vida e de minha mãe. A ideia do projeto de mestrado se deu devido a essa

experiência que relatei, ou seja, minha vivência com o instrutor surdo na época em que

eu frequentava o CEPRE. Já como adulta, pude refletir sobre essa experiência da

infância e adolescência e compreender a importância do contato da criança surda com o

adulto surdo. Essas lembranças também se entrelaçaram à minha própria experiência

profissional como instrutora da Agência para a formação profissional da Unicamp,

antiga AFPU e atualmente Educorp5, durante quatro anos ensinando Libras aos

funcionários públicos da Unicamp e, atualmente, ensinando Libras e Língua Portuguesa

para crianças e adolescentes surdos em uma instituição. Tanto minha experiência no

CEPRE quando criança como minha experiência profissional me levaram a

compreender, principalmente, a importância da presença e da ação do professor surdo

em determinadas situações voltadas ao desenvolvimento da criança e a relação com ela.

Estas questões são perpassadas por elementos nem sempre facilmente percebidos e

compreendidos pelas escolas inclusivas e ainda mais por famílias ouvintes com filhos

surdos. Assim, é importante sistematizar esses elementos e analisar a relação e os

modos de interação professor-aluno. Uma convicção ratificada por essa experiência de

pesquisa foi reconhecer a importância da presença do profissional surdo na vida da

criança surda tomando como referência a criança e os elementos significativos de seus

ambientes.

Vygotsky (1998) afirma que a formação ocorre numa relação dialética entre o

sujeito e a sociedade a seu redor, ou seja, o homem modifica o ambiente e o ambiente

modifica o homem, é essa interação que cada pessoa estabelece com determinado

ambiente que promove seu desenvolvimento e sua inserção na cultura. Posso afirmar,

5 Link do Educorp: http://www.educorp.unicamp.br/

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então, que constitui a minha identidade, adquiri a minha língua, minha história no

CEPRE.

Apesar de algumas condições desfavoráveis na minha vida escolar, considero-

me privilegiada por ter oportunidade de ter contato com uma instrutora surda. Ao sair

do CEPRE, eu me recordo muito bem, senti um vazio, porque a partir daquele momento

comecei a conviver, quase que exclusivamente, com pessoas ouvintes. Todos da minha

família são ouvintes, estudei a vida toda em escola com ouvintes. Eu sentia que algo

faltava, uma “estranha no ninho”. Era um desconforto, percebia que eu estava

decorando tudo o que os professores diziam, mas como poderia me comunicar

oralmente? Não compreendia os conceitos. Minha situação era de uma aluna que

copiava da lousa sem entender. Essa atitude não foi ou é exclusividade minha,

Fernandes (2006) comenta:

Com muita clareza e propriedade, Góes e Tartuci (2002, p.114) nos

revelam em suas pesquisas acerca da inclusão na escola regular, as

situações excludentes a que são submetidas crianças e adolescentes

surdos, simulando o papel de aprendiz e reproduzindo os rituais

escolares para ocupar o lugar de aluno em sala de aula: “copiar da

lousa, copiar do colega, copiar de seu próprio caderno – o aluno surdo

aprende e acaba por fortalecer este tipo de estratégia: copiar para se

manter vivo no ambiente” (FERNANDES, 2006, p. 3).

Inevitavelmente, eu comparava minha experiência na escola com as vivenciadas

no CEPRE. O CEPRE, embora fosse um programa de reabilitação e de apoio à

escolaridade, era um espaço para aprender, refletir, pensar, questionar e interagir com os

colegas. Meu histórico na escola regular, em que predominavam a oralização e a cultura

ouvinte, suscitou em mim o desejo para desenvolver essa pesquisa com o intuito de

realizar uma reflexão sobre a importância de se ter um profissional surdo nas escolas

onde há alunos surdos. Quem explicava e repassava as disciplinas da escola era minha

mãe e o meu irmão, eles sabiam a língua de sinais, eles eram, para mim, a imagem de

um professor “surdo”. A experiência no CEPRE e o auxílio que eu tinha de minha mãe

e meu irmão que usavam comigo a língua de sinais foram confirmando a importância de

um professor surdo e da Libras para uma educação de qualidade e o desenvolvimento da

identidade.

Durante o período de convivência com diversas pessoas, algumas inquietações

foram geradas: que aspectos de minhas experiências de vida influenciaram e

influenciam essas relações e também a escolha do tema da dissertação do mestrado?

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Quais minhas percepções sobre as diferenças de significação do discurso na minha

relação com minha mãe e na minha relação com a professora surda? Como se dá e como

deveria ser a formação do instrutor e do professor surdo? Qual a importância do papel

do professor surdo na sala de aula no processo educacional de crianças e jovens surdos?

Junto a essas inquietações e da minha formação como pedagoga, constatei que a

maioria dos professores surdos formados no ensino superior continua sendo contratada

como instrutor nas escolas brasileiras, o que me mobilizou para algumas questões que

direcionaram os caminhos percorridos para geração dos registros e a análise

empreendida na pesquisa: Quais são as práticas que constituem a atuação

profissional dos profissionais surdos nos contextos escolares? São práticas

constituídas de elementos próprios de uma prática de docência? Quais as

percepções que os próprios profissionais surdos têm de sua formação e de sua

atuação no contexto educacional? O que faz com que as instituições educacionais

continuem a contratar o educador surdo com o título de instrutor?

A relação da formação do professor surdo e o mercado de trabalho foram se

constituindo como objeto de pesquisa. A base teórica que utilizo nessa pesquisa foi a

sócio histórico cultural, com destaque a Vygotsky (1998) e a teoria da enunciação de

Bakhtin (1999). Segundo os autores, a criança precisa construir o seu conhecimento na

inter-relação com os outros e com o meio em que está inserida. Vygotsky enfatiza o

quanto a experiência sociocultural influencia a criança e afirma que a construção do

conhecimento ocorre a partir de um grande e importante processo de interação. Ele frisa

que além da importância da socialização no processo de construção do conhecimento, o

professor como mediador tem um importante papel na construção do próprio sujeito e

em suas ações. Essa mediação passa necessariamente pela língua.

No estudo de Vygotsky apresento dois aspectos sobre o desenvolvimento:

cultural e natural. Segundo o autor, “o crescimento intelectual da criança depende de

seu domínio dos meios sociais do pensamento, isto é, da linguagem” (VYGOTSKY,

1998, p. 63). O ser humano tem sua capacidade de expressar-se por meio da linguagem,

e principalmente por uma língua, que tem sua relação com as gerações repassadas

construindo assim sua cultura, os valores, sua história. Seguindo a mesma lógica de

Vygotsky (1998), para Bakhtin (1999), outro pesquisador russo, a relação do ser

humano se dá com a influência da linguagem na constituição da subjetividade. Segundo

o autor, o ser humano não nasce pronto para desenvolver a sua linguagem, ele passa a

fazer parte de um contexto social, como ele afirma: “não se nasce organismo biológico

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abstrato, mas se nasce camponês ou aristocrata, proletário ou burguês”. (BAKHTIN,

1988, p. 36). Poderíamos ampliar essa expressão: “não se nasce organismo biológico,

mas se nasce brasileiro, americano ou japonês; surdo ou ouvinte; homem ou mulher;

branco, negro ou indígena...”; e tantas outras possibilidades culturais quanto o número

de grupos humanos existentes no mundo. Esses dois pensadores deram a importância ao

estudo da linguagem e no estudo das realidades (relações) humanas, motivo pelo qual

são tão adequados à fundamentação teórica de uma pesquisa que pretende analisar as

relações educacionais com a presença do educador surdo.

No século XXI, houve grandes avanços na política educacional para surdos, no

Brasil, isso se deu graças ao reconhecimento da Lei Federal n° 10.436 de 2002 e do

Decreto n° 5.626 de 2005 que regulamenta esta lei. Com isso, a política tem se

preocupado com a formação de profissionais que trabalham com o ensino de Libras

como primeira língua e português como segunda língua para surdos. Isso porque o

surdo precisa apropriar-se da Libras, que se baseia na pista visual e espacial e é

considerada sua língua natural6. De acordo com Gesser (2006), a Libras é a língua

natural dos surdos brasileiros e, como tal, poderá ser aprendida pelo surdo nas

interações que estabelece com a comunidade surda e por qualquer pessoa ouvinte

interessada através de cursos específicos.

A Libras possui todos os elementos classificatórios identificáveis e componentes

gramaticais de uma língua e demanda de prática para seu aprendizado como qualquer

outra língua. Foi na década de 60 que a Língua de Sinais foi estudada e analisada por

linguistas de forma sistemática, passando então a ocupar um status de língua, como

afirma o autor “a língua de sinais dos surdos têm estrutura e função semelhante às

demais línguas” (STOKOE, 1960, p. 3). Os estudos constataram que a Língua de Sinais

é uma língua viva e autônoma. Como já mencionado, foi ela, então, reconhecida pelo

Governo Federal Brasileiro que, em 2002, assinou uma lei que definiu a Libras como

meio legal de comunicação e expressão da comunidade surda.

O reconhecimento da Libras como língua pela comunidade surda relaciona-se

diretamente com a questão da educação inclusiva bilíngue do aluno com surdez. Isto

porque os sistemas educacionais têm por base a política educacional inclusiva

6 Sobre a língua natural, segundo Caporali (2005), “quando a criança ouvinte desde seu nascimento é

exposta à língua oral, dessa forma é fornecida para ela a oportunidade de adquirir uma língua natural, a

qual irá permitir realizar trocas comunicativas, vivenciar situações do seu meio e, assim, possuir uma

língua efetiva e constituir sua linguagem. Para a criança surda deveria ser dada a mesma oportunidade, de

adquirir uma língua própria para constituir sua linguagem”. (CAPORALI et al, 2005, p. 587)

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implementada no país a partir de 1990, segundo a qual as escolas devem se organizar de

forma a garantir condições de acessibilidade curricular para todos os alunos, oferecendo

uma educação de qualidade, inclusive para os que apresentam necessidades

educacionais especiais, entre eles os alunos com surdez. Especificamente no caso do

aluno surdo, Fernandes (2006) relata que a educação escolar bilíngue propicia o ensino

e/ou ampliação da Libras como primeira língua e o português escrito, como segunda

língua. Porém, sabe-se que ainda se faz necessário a efetivação de uma educação

bilíngue de qualidade no território brasileiro. Há, ainda, a necessidade de mais pesquisas

sobre esse tema a fim de que lancemos luz a esse modelo educacional com o intuito de

consolidá-lo no Brasil.

A educação bilíngue almejada para grupos minoritários (alunos índios,

imigrantes, de fronteira) nos últimos anos ressalta a importância de propiciar a esses

grupos de alunos uma escolarização que lhes permita ter acesso dentro do ambiente

escolar à sua primeira língua (MAHER, 2007). Como parte também de um grupo

minoritário, para o aluno surdo é importante o acesso à Libras ao mesmo tempo que ele

aprende o português, sua segunda língua. Uma das maneiras para que isso se efetive é a

condição de que o profissional que lida com esse grupo de pessoas seja o profissional

surdo.

A importância da figura do professor devido ao seu papel mediador com o como

defende Martins (2010)

[...] O professor surdo é alguém que transforma os alunos surdos e que

também é transformado pela L2, porque se o professor surdo contribui

para o desenvolvimento e a transformação da criança surda, ele

também é o mediador da bagagem cultural e conhecimentos de sua

formação que estão presentes na sua segunda língua, por isso [...]

também é transformado ou influenciado pelas marcas da língua

portuguesa durante a sua formação e história. (MARTINS, 2010, p.

67).

Além de contribuir para o desenvolvimento linguístico da criança surda, o

professor surdo tem um importante papel no seu desenvolvimento psíquico, através da

afetividade constituída nessa relação.

O Decreto n° 5.262 de 2005, que regulamenta a Lei Federal nº 10.436/2002 e o

art. 18º da Lei nº 10.098/2000, institui que a formação do professor deve ser oferecida,

preferencialmente, ao profissional surdo, como explicitado nos artigos 4º, 5º e 6º

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Art. 4º: A formação de docentes para o ensino de Libras nas séries

finais do ensino fundamental, no ensino médio e na educação superior

deve ser realizada em nível superior, em curso de graduação de

licenciatura plena em Letras: Libras ou em Letras: Libras/Língua

Portuguesa como segunda língua.

Art. 5º: A formação de docentes para o ensino de Libras na educação

infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental deve ser realizada

em curso de Pedagogia ou curso normal superior, em que Libras e

Língua Portuguesa escrita tenham constituído línguas de instrução,

viabilizando a formação bilíngue.

Art. 6º: A formação de instrutor de Libras, em nível médio, deve ser

realizada por meio de: I - cursos de educação profissional; II - cursos

de formação continuada promovidos por instituições de ensino

superior; e III - cursos de formação continuada promovidos por

instituições credenciadas por secretarias de educação. (BRASIL, 2005,

p. 12)

Com este ecreto a contratação de professores surdos deve ser priorizada, o que

significa oferecer oportunidades no mercado de trabalho a esse profissional levando em

consideração a situação de desvantagem social, política e econômica, em relação aos

ouvintes. Como o campo de trabalho para professor surdo ainda é restrito, faz-se

importante a conscientização da prioridade para o profissional surdo já prevista em lei

para que a sociedade possa, inclusive, vê-lo com outros olhos.

O argumento sobre a necessidade de inserção do professor surdo na escola é

destacado nas palavras de Lunardi (1998):

A presença do professor surdo na escola representa muito mais que

modelo de linguagem e identidade: ele é um articulador do senso de

cidadania que se estabelece num processo de relação social. Essa

relação acontece entre professores surdos e alunos surdos, porque essa

troca social de conhecimentos se reproduz através da língua de sinais

(LUNARDI, 1998, p.85).

Assim, surgem algumas questões: qual é o espaço para professor surdo dentro da

carreira reservado pelo Decreto n° 5.626 de 2005 que define o profissional

preferencialmente surdo? Porque ainda não se vê o respeito ao decreto e, por

consequência, ao profissional surdo?

É muito comum que as diretrizes operacionais das redes públicas de ensino

confundam e tratem do assunto indiscriminadamente, deixando de fora os profissionais

surdos dos dois papéis que a ele são possíveis: Instrutor ou Professor. Silveira e

Rezende (2008) questionam sobre a função do profissional surdo

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Quão inferior o surdo se apresenta no contexto profissional, já que

no ambiente educacional foram observadas várias distorções, na

nossa avaliação. Historicamente, fomos chamados para sermos o

"dicionário ambulante" (de Libras) de muitos professores na escola

e, na maior parte, os ditos "professores especialistas” [...] apenas

orientavam os alunos a trabalharem com o sinal dado pelos surdos.

Por que o surdo não pode desempenhar este importante papel de

professor e não de mero instrutor - palavra com menor status

profissional? Por que ele não pode explicar os conteúdos

curriculares, como já acontece em várias escolas? Nesse último

caso, os surdos já trabalharam com informações importantes

apresentadas pela disciplina e mesmo assim não foram

considerados, agraciados com o título de "professores" pelos

docentes. Sempre os surdos foram considerados tecnicamente como

instrutores, mas na verdade, atuavam como professores, apesar de

poucos possuírem licenciatura. (SILVEIRA e REZENDE, 2008, p.

66).

Segundo Faria (2011), é necessário olhar atentamente a relação discriminatória

do uso do termo Instrutor de Libras, comumente utilizado para o profissional surdo que

atua nas escolas de educação básica, mesmo quando este tem formação pedagógica e

funções similares às de um docente.

A principal base para formação do profissional da educação é a docência, com

ela se envolve o processo de ensino-aprendizagem. Sobre isso, Farias (2011) descreve

que a presença de um professor surdo dará ao processo de aquisição da linguagem da

criança surda, em essência, um processo ensino-aprendizagem da Libras em contexto,

imbuído de uma cultura linguística, de uma gramática própria e uma estrutura de

construção de conhecimento peculiar.

Diante da realidade acima exposta, o objetivo geral dessa pesquisa é

compreender o perfil do profissional educador surdo e a sua função no ambiente

educacional, destacando sua formação técnica pedagógica e refletir sobre os reflexos de

sua atuação na formação dos alunos surdos.

A estrutura da dissertação traz uma organização do trabalho em cinco capítulos.

No primeiro capítulo, foi discutido sobre a formação do professor e instrutor

surdo e relacionado com outras áreas.

O levantamento bibliográfico sobre os conceitos de instrutor e professor surdo

para a análise e discussão dos termos encontrados em artigos, teses, dissertações e entre

outros será discutido no segundo capítulo.

Para o terceiro capitulo, foi feita a discussão teórica referente à formação

docente do profissional surdo.

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O capítulo quatro descreve o método da pesquisa.

Os capítulos seguintes, cinco e seis, trazem os resultados e as análises da

pesquisa de campo, realizadas, uma a partir de um questionário e outra, a partir da

observação em sala de aula. Esses resultados são discutidos nas considerações finais.

Esta pesquisa se propõe a dar visibilidade à atuação de profissionais surdos, à

sua formação e à relevância da presença desse profissional para os alunos surdos,

compreendendo sua inserção em diferentes espaços educacionais.

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CAPÍTULO I

O PAPEL E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR E INSTRUTOR

SURDO

O propósito do capítulo é apresentar concepções sobre a formação do professor e

instrutor surdo ancorado na legislação vigente. A retomada da legislação é de suma

importância, uma vez que existem tendências de diferentes épocas que se mantém na

perspectiva atual, principalmente em relação ao vínculo empregatício, visto que muitos

profissionais surdos, mesmo sendo docentes formados e qualificados, são contratados

como instrutores.

Pretende-se percorrer, primeiramente, as legislações da esfera educacional,

relacionando-as com a formação do profissional surdo. Irei analisar também o

“Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue – Língua Brasileira de

Sinais e Língua Portuguesa”7 do Ministério da Educação (MEC), elaborada por um GT

(Grupo de Trabalho) composto por pesquisadores surdos e ouvintes.

A legislação educacional, com suas diretrizes e normas, direciona a organização

e o funcionamento de vários órgãos e instituições responsáveis pela educação. Em 2005,

entrou em vigência o Decreto nº 5.626 de 2005, que regulamenta a Lei nº 10.436 de

2002 dispondo sobre a Libras e o artigo 18º da Lei nº 10.098 de 2000. Este decreto é

composto por nove capítulos, sendo que um deles tem uma parte específica sobre a

formação do professor e instrutor de Libras. Este decreto aborda, ainda, a formação do

docente de Libras, principalmente sobre a formação docente para o ensino de língua,

diferenciando as funções dos profissionais formados em Pedagogia e dos formados em

Letras Libras.

A língua de sinais, como qualquer outra língua, possui estrutura gramatical

própria com níveis linguísticos como fonológico, morfológico, sintático, semântico e

pragmático (FERREIRA BRITO, 1995). A Libras é utilizada pela comunidade surda,

que se comunicam por meio desta língua. Há outros surdos que usam exclusivamente a

língua oral ou as duas línguas, dependendo da situação comunicacional.

Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma de

comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza

visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um

7 Relatório disponível no link: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=56513

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sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de

comunidades de pessoas surdas do Brasil. (BRASIL, 2002).

A oficialização da Libras na Lei n° 10.436 de 2002 tem sua regulamentação no

Decreto n° 5.626 de 2005, o qual define diretrizes para a divulgação e propagação desse

sistema linguístico. Para tal, define-se que os sistemas educacionais federal, estadual e

municipal devem incluir o ensino de Libras, sob garantia da lei, nos cursos de formação

de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério nos níveis médio e superior,

prevista no artigo 4º

O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais,

municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos

de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de

Magistério, em seus níveis médio e superior, do ensino da Língua

Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante dos Parâmetros

Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vigente

(BRASIL, 2002).

Por conta da legislação vigente do ensino de Libras, o Decreto nº 5.626 de 2005

a Libras deve ser incluída nos sistemas de ensino para dar identidade, excelência e

legitimidade aos cursos que se propõem a formar docentes na área da educação de

surdos.

A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos

cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em

nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições

de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos

sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios

(BRASIL, 2005).

Há orientação de que o ensino de Libras deva ser incluído nos sistemas de

ensino, com prazo e percentuais mínimos para inclusão da Libras na grade curricular

dos cursos. O decreto estabeleceu o prazo limite em 22 de dezembro de 2015, após a

criação deste decreto de dez anos. Como prevê no artigo nono, que diz os prazos e

percentuais mínimos para cumprir:

A partir da publicação deste Decreto, as instituições de ensino médio

que oferecem cursos de formação para o magistério na modalidade

normal e as instituições de educação superior que oferecem cursos de

Fonoaudiologia ou de formação de professores devem incluir Libras

como disciplina curricular, nos seguintes prazos e percentuais

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mínimos: I - até três anos, em vinte por cento dos cursos da

instituição; II - até cinco anos, em sessenta por cento dos cursos da

instituição; III - até sete anos, em oitenta por cento dos cursos da

instituição; e IV - dez anos, em cem por cento dos cursos da

instituição (BRASIL, 2005).

Sendo que o processo de inclusão do ensino de Libras na disciplina curricular

deve ser, segundo o parágrafo único do artigo nono:

O processo de inclusão da Libras como disciplina curricular deve

iniciar-se nos cursos de Educação Especial, Fonoaudiologia,

Pedagogia e Letras, ampliando-se progressivamente para as demais

licenciaturas (BRASIL, 2005).

Desde a promulgação daquele decreto, as discussões sobre a inclusão de ensino

de Libras como disciplina curricular se intensificaram, as instituições de Ensino

Superior tiveram que se adequar à legislação federal, porém a discussão da questão do

perfil do profissional de Libras para o ensino dessa disciplina não está esclarecida e

muito menos a formação do profissional habilitado para os diferentes níveis de ensino.

Uma reflexão se faz necessária: a inserção da disciplina de Libras nos cursos de

Pedagogia e outras licenciaturas poderiam ser compreendidas como uma forma de

suprir a necessidade do profissional surdo na educação de crianças e jovens surdos? Em

uma pesquisa de Nascimento e Sofiato (2016), os graduados de pedagogia que tiveram a

disciplina de Libras em sua formação disseram não se sentirem capazes de ministrar

aulas para surdos. As autoras afirmam

Cumprir a legislação, agregando ao currículo uma disciplina de um

semestre não é suficiente para atender às necessidades de formação de

professores que poderão lecionar em uma sala de aula que inclua o

aluno surdo. Por outro lado, garante-se, ao menos, que a questão se

coloque em discussão entre os futuros professores (NASCIMENTO;

SOFIATO, 2016, p. 13).

De acordo com a Lei de Diretriz e Bases da Educação Nacional (LDB), os

profissionais da educação precisam atender às especificidades do exercício de suas

atividades, e para tanto é necessário que tenham uma formação sólida, ou seja, esses

profissionais devem ter conhecimento dos fundamentos científicos e sociais para o

exercício da docência. Segundo o parágrafo único do artigo 1° da LBD:

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A formação dos profissionais da educação, de modo a atender às

especificidades do exercício de suas atividades, bem como aos

objetivos das diferentes etapas e modalidades da educação básica, terá

como fundamentos: a presença de sólida formação básica, que

propicie o conhecimento dos fundamentos científicos e sociais de suas

competências de trabalho (BRASIL, 1996).

Quanto à formação específica para a habilitação da docência, as Diretrizes

Curriculares Nacionais (DCN) determinam que a formação de profissionais da

Educação Básica se dará em nível superior em cursos de licenciaturas de graduação

plena, como define o artigo 62º da DCN:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em

nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em

universidades e institutos superiores de educação, admitida, como

formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil

e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em

nível médio, na modalidade Normal (BRASIL, 1996).

Uma análise do Decreto nº 5.626 de 2005, que menciona a formação do

professor e do instrutor de Libras, encontra-se no terceiro capítulo, intitulado como “da

formação do professor de Libras e do Instrutor de Libras”. Este se inicia com uma

descrição sobre a formação de profissionais de Letras Libras ou Letras Libras/Língua

Portuguesa para atuar no ensino fundamental das séries finais

Mais uma vez questionamos a formação desses profissionais surdos nos cursos

que os habilita a ensinar Libras em todos os níveis educacionais. Estariam os

professores surdos preparados para ensinar Libras? Albres (2014), em sua pesquisa de

doutorado analisou essa questão. Como um dos resultados da pesquisa, Albres (2014)

afirmou

Constatamos que os institutos de formação provêm de um

conhecimento científico e de um conhecimento técnico (como fazer),

mas sua fraca articulação com a experiência docente e com os

problemas reais de sala de aula desfavoreceram uma formação mais

consolidada dos professores evidenciado nos discursos dos

professores de Libras (ALBRES, 2014, p. 247).

A formação de docentes para atuar no ensino infantil e nas séries iniciais do

ensino fundamental encontra-se no artigo 5º do Decreto n° 5.626 de 2005.

Observa-se, portanto, que o curso Letras Libras, sendo uma licenciatura, não

habilita os graduados para atuar na educação infantil ou ensino fundamental.

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O sexto artigo daquele decreto aborda a formação do instrutor de Libras, que,

diferente do professor de Libras, deve ter formação em nível médio, em instituições que

podem ser realizadas tal formação: “I - cursos de educação profissional; II - cursos de

formação continuada promovidos por instituições de ensino superior; e III - cursos de

formação continuada promovidos por instituições credenciadas por secretárias de

educação” (BRASIL, 2005). Neste artigo, o primeiro parágrafo menciona a formação do

instrutor de Libras deve ser realizada por organizações da sociedade civil representativa

da comunidade surda, como por exemplo, Federação Nacional de Educação e

Integração de Surdos (FENEIS)8, Centro de Atendimento ao Surdo (CAS)

9 ou

Associação de Surdos, desde que o certificado seja convalidado por pelo menos uma

das instituições referidas nos incisos II e III. De acordo com esse artigo do decreto, se o

curso de formação for realizado em uma associação de Surdos, o instrutor só poderá

ministrar aulas de Libras em instituição de ensino escolar, se esse curso for reconhecido

por um curso de educação profissional ou instituição de ensino superior.

O decreto determina que nos dez anos seguintes à sua promulgação, caso não

haja docente com título de pós-graduação ou de graduação em Libras para o ensino

dessa disciplina em cursos de educação superior, poderá ser ministrada por profissionais

que apresentem pelo menos um dos seguintes perfis, conforme no sétimo artigo:

I - professor de Libras, usuário dessa língua com curso de pós-

graduação ou com formação superior e certificado de proficiência em

Libras, obtido por meio de exame promovido pelo Ministério da

Educação;

II - instrutor de Libras, usuário dessa língua com formação de nível

médio e com certificado obtido por meio de exame de proficiência em

Libras, promovido pelo Ministério da Educação;

III - professor ouvinte bilíngue: Libras - Língua Portuguesa, com pós-

graduação ou formação superior e com certificado obtido por meio de

exame de proficiência em Libras, promovido pelo Ministério da

Educação (BRASIL, 2005).

Estes perfis trazem uma incoerência. Quando se menciona no item III, o

professor ouvinte bilíngue está em evidência, sendo que o professor de Libras e o

8 Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (FENEIS) é uma entidade filantrópica, sem

fins lucrativos, que tem por finalidade a defesa de políticas linguísticas, educação, cultura, saúde e

assistência social, em favor da comunidade surda brasileira, bem como a defesa de seus direitos. Link

disponível: http://feneis.org.br/ 9 Link do Centro de Atendimento às Pessoas com Surdez (CAS) de Ribeirão Preto na página do

Facebook: https://pt-br.facebook.com/CAS-Centro-de-Apoio-ao-SurdoRibeirão-Preto-

694409923935096/.

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instrutor de Libras descritos nos itens I e II não são mencionados como sendo “surdo”,

só como “usuário dessa língua”. Essa definição entre aspas poderia referir-se a um

ouvinte que possui família surda e utiliza a Libras como língua para se comunicar. A

palavra “surdo” é omitida ou esquecida? Não há perspectiva à priorização da pessoa

surda, uma vez que o termo “surdo” não foi utilizado e sim “usuários dessa língua”?

Segundo Bakhtin, nenhuma palavra é utilizada por uma escolha aleatória ou

deixa de ser utilizada por um simples esquecimento. “A palavra é o fenômeno

ideológico por excelência” (BAKHTIN, 1999, p. 36). Há, portanto, uma significação

ideológica no fato de se omitir a palavra “surdo” nos itens I e II e inserir a palavra

ouvinte no item III. Como ele mesmo afirma

Um signo não existe apenas como parte de uma realidade; ele também

reflete e refrata uma outra. Ele pode distorcer essa realidade, ser-lhe

fiel, ou apreendê-la de um ponto de vista específico, etc. Todo signo

está sujeito aos critérios de avaliação ideológica (isto é: se é

verdadeiro, falso, correto, justificado, bom, etc.). O domínio do

ideológico coincide com o domínio dos signos: são mutuamente

correspondentes. Ali onde o signo se encontra, encontra-se também o

ideológico. Tudo que é ideológico possui um valor semiótico

(BAKHTIN, 1999, p. 32).

Continuando com a análise do texto do decreto, verificamos que também por

meio de aprovação no exame de Proficiência em Libras (Prolibras)10

proposto pelo

Ministério da Educação (MEC), os profissionais poderão atuar na docência do ensino de

disciplina de Libras, e o artigo 8º do primeiro parágrafo define que o exame deve ser

promovido anualmente pelo MEC e instituições de educação superior para tal

finalidade. No entanto, desde a promulgação do decreto até no dia de hoje, foram

realizados apenas sete Prolibras11

, ou seja, os exames não foram realizados anualmente

como orienta o decreto.

Ainda segue a polêmica de que esse certificado do Prolibras é aceito para atuar

como instrutor ou professor para a função docente. A polêmica vem à tona quando o

decreto diz que esse exame pode habilitar profissionais graduados ou pós-graduados em

10

Segundo o site do Prolibras (http://www.prolibras.ufsc.br/) “O exame Prolibras é uma combinação de

um exame de proficiência propriamente dito e uma certificação profissional proposto pelo Ministério da

Educação como uma ação concreta prevista no Decreto n. 5.626/2005, decreto que regulamenta a Lei n.

10.436/2002, chamada “Lei de Libras”. Basicamente, esse exame objetiva avaliar a compreensão e

produção na língua brasileira de sinais – Libras. O exame Prolibras não substitui a formação em todos os

níveis educacionais”. 11

Segundo o link do Prolibras, o último exame de proficiência realizado no Brasil foi o sétimo Prolibras

no ano de 2015, conforme no link: http://www.prolibras.ufsc.br/edicoes-anteriores/

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qualquer área, que serão considerados professores de Libras, podendo lecionar tanto nas

séries iniciais do ensino fundamental quanto no médio sem ter nenhuma formação na

área educacional. Também podemos questionar como uma pessoa com formação em

ensino médio pode ser instrutor de Libras, ou seja, ter a função de ensinar Libras, sem

ter nunca tido qualquer formação em docência. Essa situação se deu pela urgência de

profissionais para atuar no ensino de Libras, o que deveria, segundo o decreto, ocorrer

pelo período de 10 anos, ou seja, até 2015. A partir daí, estariam, a partir de 2016, as

instituições de ensino superior preparadas para formar docentes para o ensino de Libras?

Para problematizar a questão da nomenclatura ‘Instrutor de Libras’ atribuída aos

surdos que ensinam Libras e que possuem nível educacional em ensino médio e ainda,

aqueles que mesmo tendo concluído a graduação são contratados com a denominação de

Instrutor, trago a comparação com outras profissões que também utilizam essa

nomenclatura.

Diante do exposto acima, os quadros abaixo apresentam outras formações de

instrutores de cursos existentes nos sites online, com formação em diversas áreas com

formação mínima, pré-requisito, objetivo, documento necessário para se inscrever e a

fonte do site online.

Levando em conta estes aspectos, percebe-se que os requisitos que caracterizam

o profissional instrutor se prendem a uma formação técnica e prática.

FORMAÇÃO DE INSTRUTOR DE TRÂNSITO

Objetivo Qualificar recursos humanos para atuarem como Instrutores de Centro de Formação de

Condutores, na formação de condutores de veículos automotores, com ênfase no valor

segurança.

Público-alvo Comunidade em geral.

Pré-requisitos Ser maior de 21 anos; Comprovar escolaridade de conclusão de Ensino Médio, através da

apresentação de cópia do Certificado de Conclusão do Ensino Médio;

Possuir carteira de habilitação no mínimo há dois anos; Ser aprovado em avaliação

psicológica para fins pedagógicos (em data a ser agendada).

Documento necessário para

inscrição

Cópia do RG, CPF, CNH e Comprovante de Residência; Cópia do Certificado de

Conclusão do Ensino Médio

Fonte http://www.feevale.br/ensino/cursos-e-eventos/formacao-de-instrutor-de-transito-37-

edicao

Tabela 01: Formação de instrutor de trânsito

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CURSO DE INSTRUTOR DE ARMAMENTO E TIRO

Objetivo Nosso método visa formar instrutores de armamento tiro nos padrões de qualidade

internacional além de prepará-los para que tenham excelentes chances no teste de

Credenciamento feito pela Polícia Federal.

Público-alvo Todos aqueles que buscam tal formação que tenham um mínimo conhecimento no

assunto, Instrutores de Armamento e Tiro credenciados pelo Departamento de Policia

Federal cujos querem se enquadrar na nova normatização de formação, Instrutores de

Armamento e Tiro de Escolas de Formação, aos candidatos ao credenciamento de

instrutor de armamento e tiro pelo DPF e também atiradores desportistas em busca de

conhecimento, bem como candidatos ao Porte de Arma de Fogo.

Pré-requisitos Ter mais de 21 anos; Não possuir antecedentes criminais; Envio de demais

documentações pessoais que serão solicitados após reserva de matrícula.

Documento necessário para

inscrição

Para reserva de matrícula, o interessado deverá primeiramente entrar em contato via e-

mail para verificar a disponibilidade de vagas para a data desejada, onde receberá todas as

informações pertinentes à matrícula.

Fonte http://propoint.com.br/?curso=curso-de-instrutor-de-armamento-e-tiro

Tabela 02: Curso de instrutor de armamento de tiro

INSTRUTOR DE MERGULHO LIVRE

Objetivo Qualificar o mergulhador para: prestar assistência a um Instrutor durante os cursos de

mergulho Scuba e ministrar aulas práticas e teóricas de mergulho livre.

Público-alvo O programa é designado para treinar mergulhadores experientes e com um bom nível de

conhecimentos a se tornarem instrutores da primeira modalidade de mergulho; o mergulho

em apneia ou livre

Pré-requisitos Idade mínima: 18 anos para a certificação; Certificação de Mergulhador Livre ou Básico

Scuba; Avaliação de conhecimentos e habilidades para o curso; 32 mergulhos logados.

Documento necessário para

inscrição

Não mencionado

Fonte http://hidrofobia.com.br/cursos-de-mergulho/profissionalizante/instrutor-de-mergulho-

livre/

Tabela 03: Instrutor de mergulho livre

INSTRUTOR DE VOO

Objetivo O curso de Instrutor de Voo requer formação prévia como Piloto Comercial.

Público-alvo Para se tornar um Instrutor de Voo, você deve ter concluído o curso de Piloto

Comercial prático.

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31

Pré-requisitos Possuir 18 anos de idade, 2º grau completo e ser portador da licença de Piloto Comercial

Documento necessário para

inscrição

Não mencionado

Fonte http://www.ej.com.br/cursos-para-piloto/curso-de-instrutor-de-voo

Tabela 04: Instrutor de voo

Vale ressaltar que os conceitos que se encontram nas fontes quando se fala do

"instrutor" são voltados para a formação técnica, na qual a formação mínima para

exercer o trabalho de instrutor é de ensino médio sem nenhuma formação específica

para tal curso. Todos os pré-requisitos nos cursos de instrutores solicitam a mínima

formação de ensino médio e outros não são mencionados, o que significa que qualquer

pessoa pode se formar como instrutor e exercer essa função apenas com esse curso.

Vale lembrar que esses tipos de cursos para formação de instrutor encontram-se

inexistentes nos catálogos de cursos técnicos no site do portal do Ministério da

Educação (MEC)12

. Segundo o portal

Como política de desenvolvimento e valorização da educação

profissional e tecnológica de nível médio, o MEC iniciou, em 2007, a

elaboração do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, um dos marcos

do centenário da educação profissional no Brasil. O documento é

elaborado de forma clara e objetiva para facilitar a consulta dos

estudantes diante da quantidade de cursos ofertados. O catálogo

agrupa os cursos em formato e linguagem simples, de acordo com as

características científicas e tecnológicas de cada um. Para cada perfil

de formação, sintonizado com o mundo do trabalho, o catálogo

apresenta uma descrição do curso. As informações englobam

atividades do perfil profissional, possibilidades de atuação e estrutura

mínima recomendada (MEC, s/d).

No entanto, cabem aqui as indagações em relação ao conceito de instrutor ao

pensar que "todo instrutor é professor?" ou vice-versa. Como fica a posição do instrutor

surdo mesmo com sua formação acadêmica? Porque a denominação de instrutor de

Libras necessita de formação em nível médio para lecionar nas instituições? Os

instrutores de outras áreas podem ser docentes?

12

Segue o link do portal de catálogo de cursos técnicos no portal do MEC:

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=41271-cnct-3-edicao-

pdf&category_slug=maio-2016-pdf&Itemid=30192

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32

Segundo Guerra (2015), o manual de curso Instrutor de Voo – Avião – INVA -

MMA 58-16, de julho 1992, em seu anexo 16, utiliza para fazer referência ao professor

como: “profissional credenciado na forma da lei, com preparação pedagógica,

responsável pelo ensino de matérias teóricas ou práticas dos diversos cursos”, e ao

instrutor como: “elemento que possui experiência ou especialidade decorrente do

exercício de atividade técnica, responsável pela instrução de matérias teóricas ou

práticas dos diversos cursos” (BRASIL, 1992).

O manual de curso citado mostra claramente o quanto há distinção entre duas

denominações que refere o professor como profissional e o instrutor como exercício de

atividade técnica responsável pela instrução de matérias teóricas ou práticas.

Podemos constatar que todos os quadros se enquadram como cursos técnicos,

algo manual que é ensinado por um instrutor de formação adquirida. Em cima disso, as

questões a serem pensadas são “Quem são os profissionais qualificados que ensinam

para o curso técnico?”, “Qual a formação adquirida por eles?”, “Por acaso, o instrutor

surdo é formado por curso técnico?” e “Em qual categoria ele se encaixa

profissionalmente?”.

Figueredo (2014) afirma em seu artigo intitulado “O enquadramento e

representação sindical do instrutor técnico do Serviço Social de Aprendizagem

Industrial - SENAI”, que discute sobre o enquadramento sindical em relação com a

diferenciação da categoria professor com a da do instrutor. Ela salienta que a formação

do instrutor é diferente a do professor, como diz em seu artigo

O instrutor, diferentemente do professor, detém seu ensino voltado

somente aos aspectos de conhecimento técnico. O professor dá sua

aula para alunos e o instrutor dá treinamento para aprendizes

(FIGUEREDO, 2014, p. 4).

Segundo a citação, o instrutor é voltado para conhecimento técnico, enquanto o

professor é responsável pelo conhecimento teórico. A autora ressalta que o curso de

profissionalização é voltado para prática técnica, que é ministrado pelo instrutor.

No caso do ensino de Libras, ao utilizar como docentes a figura dos instrutores,

estaria o decreto promovendo a ideia de que saber Libras é uma atividade técnica? Uma

língua pode ser considerada uma técnica? Essa prerrogativa coloca em grau de

inferioridade a Libras, como uma habilidade técnica e não como uma língua.

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Para compreender sobre as etapas da formação escolar, deve-se observar que a

educação básica é composta por três níveis: educação infantil, ensino fundamental e o

ensino médio. No último nível do ensino educacional tem a educação profissional.

Neste sentido, Figueredo (2014) esclarece a educação profissional dentro do ensino

médio

[...] A atividade preponderante exercida pelo profissional dentro dos

cursos ministrados pelo SENAI é efetivamente realizada no âmbito da

aprendizagem industrial, de formação e orientação profissional.

Assim, não se pode considerar como professor de educação regular o

instrutor do ensino profissionalizante, cuja atividade enfatiza a prática

profissional, de modo que os cursos de aprendizagem não têm relação

com o exercício do magistério (FIGUEREDO, p. 7, 2014).

Diante dessa situação, acaba tornando-se uma entidade de educação, que o

diferencia das demais instituições de ensino, seja de ensino fundamental, médio ou

superior, justamente pela natureza de seu ensino, que é a profissionalização do aluno

dentro de determinada área específica e técnica.

Há uma contradição: um sistema de ensino deveria priorizar o profissional

professor, que conhece o pedagógico, a língua em toda a sua estrutura, que trabalha com

os conhecimentos científico e cultural e não o instrutor, que domina a parte técnica,

prática?

Como o instrutor surdo dentro de uma escola e sala bilíngue ou classe inclusiva

pode ministrar aula, se a instituição é de ensino regular sem possuir certificação para

ministrar a tal aula? Como entrelinhar a profissão do instrutor dentro de uma instituição

que é de ensino regular? Eis a questão a ser pensada e analisada. Onde o professor surdo

fica incluído, se há o instrutor?

Recentemente, foi lançado o Relatório de Grupo de Trabalho designado pelo

MEC pelas portarias nº 1.060 de 2013 e nº 91 de 2013. Esse grupo de trabalho teve

como, objetivo trocar e atualizar informações, conhecimentos sobre temas e aspectos

específicos sobre a educação dos surdos, a fim de elaborar políticas públicas nessa área.

Neste relatório não há denominação de conceito “instrutor” como mostra a seguinte

citação retirada do relatório

A formação de professores de Libras, de Língua Portuguesa como L2,

de tradutores e intérpretes é fundamental para formar profissionais

para atuarem na educação básica. Essas formações devem ser

garantidas em nível superior (licenciatura e bacharelado) e enquanto

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formação continuada para os professores que já estejam atuando na

educação básica e superior. Os cursos de graduação envolvem a

Pedagogia Bilíngue (que forma o professor bilíngue de atuar na

educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental), os cursos de

Letras Libras licenciatura (que forma professores de Libras para atuar

no ensino da Libras na educação básica e nível médio) e bacharelado

(que forma tradutores e intérpretes de Libras e Língua Portuguesa). O

Curso de Língua Portuguesa como L2 deve ser oferecido para formar

os professores que atuarão, tanto na educação básica, como no nível

superior. 19) Fomentar a formação inicial e continuada de professores

surdos, professores bilíngues, professores de Língua Portuguesa como

L2, professores de Libras e tradutores e intérpretes de Libras

(BRASIL/MEC/SECADI, p.14, 2014).

Quando comparado ao Decreto n° 5.626 de 2005, o Relatório acima citado

representa um avanço, uma vez que não utiliza a terminologia “Instrutor”, porém o

mesmo não tem força de lei. Para efeitos de implantação das políticas educacionais

ainda é o decreto que deve ser seguido.

Vale a reflexão: se um instrutor formado em uma escola de idioma ou numa

associação que oferece curso de idioma para comunidade do bairro, este aluno poderá

ministrar a aula numa instituição educacional onde a lei prevista para docência é de

formação em ensino superior? Por que a lei permite o instrutor nessas instituições e qual

seriam os espaços de atuação profissional de um instrutor de Libras? O que o aluno

surdo fará com o certificado da Feneis, por exemplo, para trabalhar em um lugar onde a

escola não exige a formação específica?

Nestas circunstâncias, a reflexão da descrição do profissional habilitado para o

ensino de Libras sob a base do Decreto nº 5.626 de 2005 e da legislação educacional

brasileira, prevê a necessidade de alguns pressupostos e possibilidades para reflexão.

Tais questões que necessitam de discussão para a solução dos problemas em que se

encontra no cenário do ambiente educacional no ensino e Libras: os professores de

qualquer licenciatura podem se formar em curso de pós-graduação em Libras e atuar

como professor dessa disciplina na educação superior mesmo que sua licenciatura não

seja em Letras ou Pedagogia. A carga horária dos cursos de especialização é bem

inferior a de um curso de graduação, no entanto, possibilita esse profissional formar

outros profissionais para o ensino de Libras? Como o Prolibras pode habilitar um

profissional com certificado em proficiência num mercado de trabalho que não

privilegia a docência? Será que esses problemas serão resolvidos até a adequação da lei?

Onde estão os profissionais surdos que se encontram nessa posição? No entanto, como

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afirma Faria (2011), o primeiro passo é superar a nomenclatura de instrutor de Libras

para que haja reconhecimento e valorização do sujeito surdo licenciado.

Diferenciar instrutor de Libras e professor é extremamente necessário, para dar

qualidade ao trabalho de docência no ensino de Libras, sobretudo, dar visibilidade,

espaço e “mãos e olhos” ao professor surdo.

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CAPÍTULO II

PROFESSOR E INSTRUTOR SURDO: REVENDO OS CONCEITOS

Este capítulo traz um panorama das pesquisas que focalizam a formação do

professor e do instrutor surdo dentro da educação básica, a discussão destes conceitos,

possíveis enfoques, áreas de investigação e a articulação teórica com o tema. A partir de

dados de extensiva revisão de literatura, tendo como base o resultado do levantamento

realizado e a análise sobre o tema, foi conduzida uma revisão e discussão dos conceitos

de professor, de instrutor surdo e de algumas das principais questões relacionadas à

pesquisa sobre estes conceitos.

Acredita-se que um levantamento pode ser produzido em relação às

denominações professor e instrutor surdo, além de questões sobre a formação de cada

um, com o objetivo de compreender a especificidade de cada profissional e como ela é

descrita. Nesse capítulo, portanto, pretendo identificar as diferenças atribuídas às

denominações professor surdo e instrutor surdo a partir de busca realizada em pesquisas

e publicações relacionadas ao tema em bases de dados eletrônicos nacionais e livros. Tal

levantamento possibilitou o acesso a informações relevantes para a reflexão sobre os

conceitos que diferenciam ou não nas denominações instrutor e professor. O trabalho

ampliou e diversificou os conceitos estudados, ancorados pelo olhar científico e

acadêmico.

A busca foi realizada em bases científicas gerais como Scielo, SBU, bases de

dados específicas sobre o assunto, bancos de dissertações e teses, além de livros

publicados. Para a realização da busca, foi utilizada a pesquisa em bases de dados por

assuntos, foram utilizadas as palavras-chaves: "instrutor surdo" e "professor surdo",

porém não foram encontrados com exatidão e diferenciação as palavras-chave. Na busca

realizada no site de Scielo, tomou-se como referência algumas palavras-chave, tais

como: professor surdo, instrutor surdo, docente surdo, surdo. Também foram realizados

cruzamentos de palavras: professor e instrutor surdo, docente surdo e professor, entre

outros. No total foram localizados três artigos para esta pesquisa. Diante desse reduzido

número de material, foi utilizado como site de busca o Google Acadêmico. Assim,

foram localizadas mais publicações relacionadas à temática pesquisada. Ao todo, foram

localizadas 17 publicações sobre a temática, datadas de 1999 a 2014.

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Após o levantamento bibliográfico, os dados foram analisados por meio de

realização de fichamentos, que buscaram abranger todas as informações relevantes para

o estudo dos conceitos atribuídos às denominações professor e instrutor e sua relação

com o campo de trabalho, bem como análises das principais ideias de cada artigo, teses

e revistas pesquisadas. Por fim, o resultado apresentado por cada estudo possibilitou

uma perspectiva sobre os caminhos que as pesquisas sobre o tema vêm seguindo.

Nos últimos anos, a proposta da formação do profissional surdo tem sido objeto

de inúmeras reflexões e polêmicas. É fato que essa formação no ensino de língua de

sinais no Brasil começou a ser disseminada nos estudos da área política linguística e

educacional após uma notória atenção no documento elaborado pela comunidade surda

a partir do Pré-congresso ao V Congresso Latino Americano de Educação Bilíngue para

Surdos, realizado em Porto Alegre no salão de atos da reitoria da Universidade Federal

de Rio Grande do Sul nos dias 20 a 24 de abril de 1999, no qual foi discutida uma

proposta intitulada “A educação que nós surdos queremos” com objetivo de colocar em

prática a educação dos Surdos. Este documento foi redigido pela comunidade surda,

sendo dividido em três tópicos: a) política e práticas educacionais para surdos; b)

comunidade, cultura e identidade; c) formação do profissional surdo. O evento foi um

marco para as discussões mais amplas e profundas do profissionalismo no ensino de

língua de sinais e outros assuntos referentes à educação de surdos. Houve um maior

incentivo à formação do profissional surdo e sua inserção na sala de aula, com

consequentes reflexos nas produções científicas e publicações sobre o documento. A

investigação da formação do profissional surdo se faz necessária na medida em que

propõe um mapeamento do percurso das pesquisas, da construção teórica real efetivação

da proposta e compreensões diversas dos termos professor e instrutor surdo.

Neste sentido, o presente texto discute os resultados de uma pesquisa sobre os

termos empregados e suas significações no contexto acadêmico. A pesquisa objetivou

realizar um estudo da produção teórico-bibliográfica a fim de conhecer e estudar os

textos teóricos publicados e produções científicas sobre a formação do surdo a partir

daquele documento proposto pela comunidade surda. Os resultados dessa pesquisa

poderão fornecer importantes elementos à compreensão do processo educacional e da

formação destes sujeitos que atualmente se desenvolve nas escolas.

2.1 Compreendendo a formação docente do sujeito surdo

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Dentro da proposta de educação bilíngue, vários autores têm apontado a

importância do docente surdo na escolarização das crianças surdas. Martins, Albres e

Sousa afirmam que:

Mais importante que ter a circulação da Libras na escola é, de fato,

possibilitar que essa língua seja empoderada nos usos cotidianos, nas

avaliações, nas salas de aulas, na relação com alunos ouvintes, tendo

espaço de poder nas negociações escolares como a língua portuguesa.

É ter a presença de educadores surdos que tragam para a cultura

escolar aspectos culturais das pessoas surdas (MARTINS, ALBRES e

SOUSA, 2015, p. 105. Grifos meus).

A postura profissional do professor de Libras diante da sua formação é destacada

por Albres (2014), que produziu sua tese de doutorado utilizando como metodologia

grupo focal com professores de formação em Letras Libras. Essa pesquisa teve como

objetivo analisar as condições da formação e atuação dos professores em sala de aula,

mais especificamente a natureza dos saberes13

, como afirma a própria autora.

Para a análise e a avaliação dos participantes da pesquisa, a autora utilizou três

categorias: a primeira especificou sobre a significação e sentido do trabalho docente, a

teoria e a prática no processo de ensino-aprendizagem de língua são a segunda categoria

da análise e a terceira, a ideologia e a consciência política. Juntando estas três

categorias, a autora buscou entender e investigar sobre o curso de Letras Libras como

uma formação adequada do saber para o desenvolvimento da competência profissional

para atuar na docência. Além desta investigação, a autora buscou também analisar os

discursos dos sujeitos da pesquisa, o conhecimento e os saberes dos mesmos.

Com a análise do resultado da pesquisa, a autora vê a necessidade de

transposição didática, termo utilizado por ela como referente à formação do profissional

surdo na docência ressaltando como primordial e fundamental para a profissão do

docente, afirma que o curso de Letras Libras tem uma carência em termos de conteúdo

didático e metodologia na grade curricular. Destaca-se que os achados da pesquisa de

Albres (2014) refletem uma realidade também de outros cursos de licenciatura, que

apresentam uma carência em termos de metodologia de ensino. Mas isso não ocorre

somente na formação em Letras Libras. Segundo um estudo realizado pela Fundação

13

O termo “saber” empregado no texto de Albres (2014) refere-se ao sujeito surdo diante da sua

experiência em várias hierarquias: “da família, da escola que o formou, da cultura pessoal, dos seus

pares” (ALBRES, 2014, p 30). O conceito utilizado por Tardif define: “O saber é sempre o” saber de

alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo qualquer (...) o saber dos professores

é o saber deles, está relacionado com a pessoa e a identidade, com a sua experiência de vida e com a

história profissional (TARDIF, 2010, p. 11 apud ALBRES, 2014, p. 30).

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Carlos Chagas, os cursos de licenciaturas têm carência e apontam falhas na formação

inicial dos professores, como mostra a situação segundo a reportagem

Assim como nos cursos de pedagogia, os de licenciatura também

enfrentam dificuldades em balancear as disciplinas. O principal

problema, segundo a professora é que as licenciaturas ainda hoje não

estão voltadas para a formação de professores, "elas priorizam a

formação disciplinar, em detrimento da pedagógica". (TODOS PELA

EDUCAÇÃO, 2008, s/p).

Albres (2014) recorre a Tardif (2010) para repensar a questão da formação de

professores de línguas, que envolve certa complexidade quando se trata de uma língua

minoritária

A política nacional de formação de professores tem indicado uma

preocupação com este aspecto, tanto que produz diretrizes para

articulação da teoria e da prática e para desenvolver nos futuros

professores a competência de trabalhar com a transposição didática

(ALBRES, 2014, p. 49).

Para garantir uma formação de qualidade na profissionalização do educador

surdo (professor e instrutor), necessita-se de uma “transposição” do conhecimento

científico do profissional para o conteúdo escolar destinado ao ensino para alunos,

utilizando as características do discente como: idade, maturidade, conhecimento prévio.

A autora analisa a falta de estrutura dos cursos voltados para o ensino de Libras e

enfatiza a importância de um planejamento de curso com uso de materiais didáticos e

pedagógicos.

Gianini (2012) apresenta, em sua tese de doutorado intitulada “Professores

surdos de Libras: a centralidade de ambientes bilíngues em sua formação”, reflexões e

análises sobre a evolução histórica e trajetória da educação dos surdos através da

formação docente destacando as três figuras de professor. A primeira figura é

denominada de “professor improvisado”, a qual se refere ao docente da primeira

geração que atuava sem ter formação especifica. Nesse sentido, Gianini (2012, p.189)

destaca que os professores improvisados eram “[...] aqueles primeiros professores na

história da educação, que atuavam quando ainda não havia formalização do ensino, e

por essa razão, qualquer pessoa que possuísse alguns conhecimentos poderia ensinar”.

O professor artesão é designado como a segunda figura de professor, aquele que

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assumia a função docente através da troca de saberes entre os pares. De acordo com a

autora:

A partir do século XVII, e presente até o século XX, com a

formalização do ensino e o surgimento das escolas, encontramos o

modelo do professor artesão, que tinha possibilidade de construir

saberes docente na troca com vários professores, o que vai permitir

impulsionar e partilhar a criação de procedimentos de ensino e de

comportamentos em sala de aula, que a deviam ser cumpridos de

forma precisa. Para ensinar era necessário, então, dominar o conteúdo,

um método e estratégias para desenvolvê-lo. Começa, então, a ser

necessária a formação do professor, ainda não concebido como um

profissional do ensino, mas como um repetidor de regras ritualizadas e

não questionadas (GIANINI, 2012, p. 141).

O uso do termo “professor artesão” é relacionado com o instrutor, pois segundo

a autora, ele assume a função docente sem ter o domínio do conteúdo especifico e de

aspectos didáticos. Nesse sentido há uma dificuldade do profissional em atuar na

docência, por falta de informação específica.

A última figura é a de professor de verdade, denominação dada pelos

participantes da pesquisa, que eram, naquele momento, graduandos no curso Letras

Libras.

Ser um "professor de verdade" é o desejo expresso por todos os

participantes da pesquisa. Apesar de que já exercerem a profissão, de

nos revelarem todo um processo de formação docente ao longo de

suas narrativas autobiográficas, não se sentem autorizados a serem

tratados como professor. O entendimento de nossos participantes é o

de que se tornarão professores de verdade quando concluírem a

formação com a licenciatura para o ensino de Libras (GIANINI, 2012,

p. 183).

Pelo contexto profissional, os participantes da pesquisa perceberam a falta da

prática didática e conhecimento científico para atuar na docência, o que os levou a

buscar uma alternativa melhor para seu trabalho docente, quando manifestaram o desejo

de ingressar no ensino superior. A entrada para o ensino universitário é definida pela

autora como a passagem para o professor de verdade, quando serão formados na área

especifica para docência.

A identidade em construção é utilizada por Martins (2010) em sua dissertação de

mestrado quando se refere à utilização do conceito “professor surdo”. De ponto de vista

da autora, a posição do profissional surdo ainda não é reconhecida no espaço

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educacional. Portanto, refere-se que ainda não existe uma identidade docente surda

sólida. Mesmo com a política de intervenção pedagógica e a formação acadêmica de

professores surdos esses profissionais não são reconhecidos. Além da falta de

reconhecimento e da desvalorização da profissão, a autora ressalta que a percepção

sobre a importância da atuação do professor surdo ainda está em processo. Nesse

sentido, Martins (2010, p.99) salienta que “vale lembrar que também existem

profissionais surdos (professores, instrutores, assistentes educacionais14

), que utilizam a

metodologia tradicional”. A preocupação não é focalizada apenas em construção de uma

identidade docente, há outros problemas que precisam ser resolvidos no ambiente

educacional, como por exemplo, o uso de práticas pedagógicas inadequadas,

observando que a presença do professor surdo é de suma importância para a construção

de conceitos e identidades para crianças surdas. Portanto, segundo a autora, o processo

de construção para uma nova identidade docente surda implica na construção de uma

pedagogia surda, centrada nas práticas linguísticas.

Santos (2007) coloca a reflexão sobre o papel do instrutor que se ocupa como

professor ou educador. Em sua análise de pesquisa de campo, o instrutor surdo no

ensino de Libras para crianças surdas nas escolas e instituições configura-se como

professor, que entrelaça a posição de educador de língua. Este conceito é desenvolvido

em seu trabalho de mestrado intitulado “Instrutor surdo em uma escola inclusiva

bilíngue: sua formação junto aos alunos surdos no espaço da oficina de língua brasileira

de sinais”. A autora enfatiza a preocupação de que bastaria o instrutor possuir fluência

em Libras e ter concluído o ensino médio para assumir o cargo de docente, como mostra

o Decreto n° 5.626 de 2005. Muitas instituições e escolas desistem de contratá-los e

acabam optando pelo profissional ouvinte para atuar na área educacional visto que os

surdos não tinham formação (SANTOS 2007). Em sua pesquisa sobre o espaço de

oficina ministrado por instrutores surdos, a autora destaca a importância da formação

continuada desse profissional, e aponta que havia necessidade de profissionalização dos

instrutores que atuavam no espaço por ela pesquisado.

A formação continuada e em serviço mostra-se um caminho

promissor, já que temos a necessidade urgente de instrutores surdos e

14

Segundo Martins (2010, p. 69), o termo assistente educacional é “denominação da profissão do surdo

que atua no INES (Instituto Nacional de Educação de Surdos) que substituiu a nomenclatura de monitor.

Esta profissão de assistente Educacional não é semelhante à do professor ou do intérprete. Atua em todas

as séries do Ensino Infantil, Médio e Fundamental esclarecendo conceitos e conteúdos dados pelo

professor”.

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não dispomos de tempo para aguardar esta formação pela academia.

Sendo assim, este pode ser um caminho possível, conforme os

apontamentos do estudo aqui apresentado, para enfrentarmos os

desafios que se colocam perante o processo de ensino-aprendizagem

da criança surda, já que este profissional, o instrutor surdo, mostra-se

fundamental para as propostas de educação de alunos surdos,

quaisquer que sejam elas (SANTOS, 2007, p. 74).

O conceito de instrutor de Libras é destacado na pesquisa de dissertação

produzida por Gurgel (2004). De acordo com a pesquisa, o surgimento do conceito

instrutor de Libras teve origem nas associações de surdos, onde o ensino de Libras para

pessoas surdas e ouvintes fluía naturalmente pela língua em comum e por necessidade,

como verdadeiro espaço destinado aos surdos, filhos de pais ouvintes, com pouca ou

nenhuma fluência na língua.

Há pessoas que fazem parte de associações de surdos e atuam como

instrutor em diferentes espaços, para o ensino da língua de sinais. Nas

escolas, as iniciativas que envolvem instrutores ainda são poucas, de

âmbito local e com periocidade irregular, quase sempre sem garantias

de uma continua vinculação institucional (GURGEL, 2004, p. 31).

Lembremos que as pesquisas de Gurgel e Santos datam respectivamente de 2004

e 2007, sendo que, naquele momento, poucos profissionais surdos tinham uma

formação acadêmica específica. Em 2010, formaram-se pelo curso Letras Libras da

UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) cerca de 389 surdos, na modalidade à

distância e em 2012, no segundo oferecimento do curso, cerca de 378 profissionais,

segundo os dados no livro digital do Letras Libras15

(2014). Atualmente a UFSC

continua oferecendo o curso na modalidade presencial e à distância e outras

universidades também têm cursos de formação em Letras Libras e pedagogia bilíngue.

A FENEIS (Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos) procurou

intensificar a formação do instrutor e sua profissionalização nas associações, o resultado

não foi atingido dentro do esperado devido à falta de reconhecimento da profissão, pelos

que deliberam na educação de surdos.

15

Dados obtidos em QUADROS, R. (org). Letras Libras ontem, hoje e amanhã. Florianópolis: UFSC,

2014. Disponível em http://www.institutosantateresinha.org.br/images/pdf/letras-libras.pdf. Acesso em 13

de novembro de 2016

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Ao utilizar o termo professor e o termo instrutor, a cartilha de curso de

aperfeiçoamento16

de professores para Atendimento Educacional Especializado (AEE)

faz uso de barra entre as conjunções “E” e “OU”, em diferentes excertos do texto. Tal

curso foi promovido pelo Ministério da Educação (MEC) com parceira da Secretária da

Educação Especial (SEE) e Secretaria de Educação a Distância (SEED) realizada em

uma ação conjunta da Universidade Federal do Ceará (UFC). Nela há um projeto de

formação continuada de professores por meio do programa Educação Inclusiva: direito

à diversidade (MEC, 2007), que é dividido por modalidade em áreas de deficiência

física, sensorial e mental com objetivo de “introduzir conhecimentos que possam

fundamentar os professores na reorientação das suas práticas de Atendimento

Educacional Especializado” (MEC, 2007, p. 5). Diante dos conceitos encontrados nesta

cartilha, é possível constar que há a utilização da barra entre as conjunções “E” e “OU”,

entre as palavras professor e instrutor.

Este trabalhado é realizado pelo professor e/ou instrutor de Libras

(preferencialmente surdo), de acordo com o estágio de

desenvolvimento da Língua de Sinais em que o aluno se encontra. O

atendimento deve ser planejado a partir do diagnóstico do

conhecimento que o aluno tem a respeito da Língua de Sinais (MEC,

2007, p. 19, grifos meus).

O uso de barra entre “E” e “OU” mostra claramente que não há um

posicionamento da secretaria sobre a necessidade de profissionalização do professor

como mostra a anterior citação. No entanto, de forma contraditória, em outro trecho do

documento, a secretaria afirma a necessidade de formação:

Na escola comum, é ideal que haja professores que realizem esse

atendimento, sendo que os mesmos precisam ser formados para ser

professor e ter pleno domínio da Língua de Sinais. O Professor em

Língua de Sinais ministra aula utilizando a Língua de Sinais nas

diferentes modalidades, etapas e níveis de ensino como meio de

comunicação e interlocução (MEC, 2007, p. 20, grifos meus).

Percebe-se que o MEC aponta para a necessidade da formação profissional e da

fluência em Língua de Sinais. Há o uso do termo “preferencialmente” na cartilha o qual

16

Curso de aperfeiçoamento produzido pela Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação

(SEE/MEC) em 2007. Serve para ampliar o projeto de formação continuada de professores por meio do

programa Educação Inclusiva: direito à diversidade.

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mostra a preferência de pessoa surda para atuar na docência, entretanto não está claro

qual a posição adequada para o profissional surdo, no que se refere à necessidade de

formação, já que não diferencia o professor de instrutor.

Por muitos anos, a prática da educação dos surdos era pautada em “pedagogia

ortopédica”, ao qual o profissional procura curar o “ouvido deficiente”, definição usada

no tempo do oralismo. Os conceitos contidos entre aspas são utilizados no artigo

publicado por Machado (2010). A autora percorre os caminhos educacionais do sujeito

surdo desde a hegemonia do oralismo até o surgimento da educação bilíngue,

procurando entender e contextualizar os processos de abordagem educacional. Na

mudança de paradigma, os profissionais que atuam na educação dos surdos também se

modificam, conforme afirma

A figura do professor especialista em deficiência auditiva passa a ser

substituída pelo professor de Libras e pelo professor bilíngue, que

aparecem no cenário tendo inclusive um curso superior para essa

formação especifica. Os surdos passam a fazer parte desse processo

como construtores teóricos e práticos dessas formações e novas

oportunidades de inserção tanto no mercado de trabalho quanto na

academia (MACHADO, 2010, p. 62).

A autora afirma que, ainda hoje, existe a exclusão de alunos surdos nas escolas

devido à política do AEE e pela pouca formação de professores qualificados para

atender à demanda dos alunos surdos na sala de aula. Mesmo com a inserção da

educação bilíngue, no sistema educacional ainda persiste a exclusão dos surdos, pois o

AEE cria um não funcionamento na sala de aula regular e deixa a Libras como uma

língua utilizada somente no contraturno. Então, vê-se a necessidade de uma busca de

novos saberes e novas experiências para a educação dos surdos.

O espaço para educação dos surdos foi fruto de muitas lutas por parte de

movimentos sociais de pessoas surdas em busca de educação de qualidade e pelo

respeito à diferença linguística. Segundo Machado (2010), desde os tempos da

Salamanca17

começou o travestismo linguístico, ou seja, a língua de sinais não é de fato

a língua de instrução, mas assume um papel instrumental, usada apenas no espaço do

AEE. Isso ocorre com a ”reorganização” pedagógica para a educação dos Surdos, o qual

17

A Declaração de Salamanca é considerada um dos principais documentos mundiais que visam a

inclusão social, ao lado da Convenção de Direitos da Criança (1988) e da Declaração sobre Educação

para Todos de 1990.

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prevê a necessidade de repensar as práticas e saberes dos professores especialistas. A

formação deste profissional passou a ser confundida com a do generalista em educação

especial.

Com o emergir da política de educação para todos desde 1994 em

Salamanca, a Língua de Sinais, outrora “demonizada”, agora passa a

fazer parte dessas discussões, e os surdos passam a ter seus saberes

valorizados por meio de suas narrativas denunciativas. O saber clínico

aos poucos, com o discurso da inclusão, foi sendo substituído por um

espaço vazio de práticas bilíngues que o discurso da educação especial

criou com a nova racionalidade instituída quando corrobora a figura

do surdo no espaço discursivo das deficiências. Quando se pensou que

mudanças seriam prerrogativas fundamentais, foi-se percebendo que o

discurso não muda tanto. O que ocorre é um travestismo linguístico

(MACHADO, 2010, p. 9).

Para “encerrar” a confusão, a Lei da Libras foi imprescindível, porém a autora

questiona com algumas reflexões como colocar a lei em prática, como repensar a

formação do professor de surdos.

Com a regulamentação do decreto, surgem duas novidades: professor bilíngue e

professor de português para surdos. Com isso, passa a ser substituída a figura do

professor especialista em deficiência auditiva para professor de Libras e pelo professor

bilíngue, uma transcrição poética educacional (MACHADO, 2010), e que passa a ter

uma transgressão pedagógica como um intuito de tornar a educação mais

pedagogicamente “bilíngue”. Porém, Quadros (2005) aponta que a formação do

professor de surdos está em falta mesmo com o surgimento do curso de graduação para

formação especifica. Diante da preocupação da falta de formação de profissional surdo,

a autora destaca o projeto de criação do curso de graduação voltada para área de Libras

Esse processo torna-se possível se as universidades criam condições

para o ingresso e permanência dos surdos na universidade. A

Universidade Federal de Santa Catarina está desenvolvendo um

projeto, com apoio da CAPES, que visa formar professores e

pesquisadores da educação de surdos, da língua de sinais e da

interpretação da língua de sinais para garantir a implementação do

ensino da Libras, em atendimento ao artigo 4o. da Lei 10.436, de 24

de abril de 2002. A proposta é de propiciar uma formação teórico-

prática, em nível stricto sensu, que permita aos professores bilíngues

(língua de sinais e português), aos professores de língua de sinais e

aos intérpretes de língua de sinais atuar no ensino como pesquisadores

e multiplicadores da educação de surdos e da língua brasileira de

sinais, tendo em vista a promoção da inclusão de todos os alunos.

Também visa qualificar, em nível stricto sensu, os profissionais que

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estão atuando direta ou indiretamente na educação de alunos surdos.

Dessa forma, essa Universidade passou a criar as condições para que

isso se tornasse uma realidade (QUADROS, 2005, p. 45).

Após a regulamentação daquele decreto, Faria (2011) analisou a nomenclatura

de instrutor de Libras e averiguou como essa denominação está explicada neste decreto.

A autora usa a profissão do professor sob perspectiva da LDB (Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional)18

de 1996 como base para explicar e fazer comparação com a

profissão de professor surdo, sendo que a LDB propõe a profissão “valorizada” e

reconhecida como profissional da área educacional determinando a obrigatoriedade de

formação do professor em nível de graduação. A LDB intensificou nas últimas décadas

a política da formação de professores, o que exige a valorização e reconhecimento da

profissão. Nesta diretriz, a formação do magistério, como é chamada de cursos normais

de nível médio, é aceita como formação mínima apenas em período transitório. Faria

(2011, p.89) destaca a LDB como um modelo de formação de professores como

essencial para atuar na docência, portanto “[...] é consenso entre os educadores que a

formação dos profissionais da educação em nível superior em cursos de licenciatura é

essencial tanto para a qualidade da educação, quanto para a profissionalização docente”.

Enquanto isso, o Decreto n° 5.626 de 2005 mostra o avanço significativo da formação

do profissional surdo na educação, porém a autora questiona quais as diferenças entre

dois profissionais: o professor e o instrutor e qual o papel de cada um na docência de

Libras, os usuários de Libras e sua expansão.

A autora critica o decreto quando afirma que a educação formal19

para o

instrutor é a formação para atuar no ensino, mas questiona como uma escola de curso

livre é considerado não-formal20

:

Já se identificou que o Instrutor de Libras, de acordo com o Decreto

5.626/2005 não está apto para o magistério da Educação Básica.

Portanto, esse profissional, denominado de Instrutor de Libras é todo

aquele que possui formação profissional e que poderá, portanto, atuar

no ensino da Libras em cursos livres a ser oferecidos em empresas,

instituições públicas, organizações e outros espaços, que não a

educação formal (FARIA, 2011, p.97).

18

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) regulamentada na Lei n° 9.394/96, é a mais

importante Lei do sistema educacional, que traz as diretrizes gerais da educação brasileira, seja ela

pública ou privada. 19

Educação formal refere-se a curso de graduação formado em instituição de ensino superior. 20

Instituições de cursos livres são consideradas como não formais.

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A pesquisadora questiona a educação formal: por que o instrutor está apto para

assumir a docência e mesmo assim é tratado como instrutor? Por que não tratá-lo como

professor de Libras? Para a autora, o termo professor deveria ser usado em respeito à

profissão e ao docente surdo, e consequentemente, ao reconhecimento, na perspectiva

da igualdade de condição para interferir no processo educativo (FARIA 2011).

A pesquisadora afirma que existem profissionais formados para a docência, eles

são os professores. Além deles, existem os “trabalhadores em educação” como o

instrutor de Libras que não é habilitado para a docência, mas atua com alunos de

educação básica.

Outro aspecto relevante apontado pela autora, ao analisar o decreto, diz a

respeito à conjunção disjuntiva “OU” que mostra claramente a forma indiscriminada

quando se refere aos dois profissionais dentro da mesma função profissional como

mostra a reflexão da autora

Percebe-se que a presença do Instrutor de Libras na escola de

Educação Básica é citada no artigo 14 de forma indiscriminatória ao

Professor de Libras, usando a conjunção disjuntiva “ou” para elencar

esses dois profissionais dentro de uma mesma função profissional.

Significa que o Decreto indica que o Professor de Libras pode exercer

a função de Instrutor, porém, o Instrutor não está apto a atuar em

espaços profissionais que exigem formação pedagógica. Ou seja, a

interpretação que se faz é que o Instrutor de Libras pode apoiar a

escola, mas não é um professor. Ora, essa perspectiva diferencial de

nomenclatura não faz sentido se o lócus de atuação é a escola de

Educação Básica e se a atividade exercida tem como essência o

processo ensino-aprendizagem da Libras para os educandos surdos. É

tratar o Instrutor com certo desprestígio, mesmo se a função

desempenhada possui relevância, por se tratar de uma prática docente.

O que tem acontecido comumente é que tanto os profissionais surdos

com licenciatura, quanto os profissionais surdos sem habilitação para

o magistério, estão sendo alocados nas redes de ensino como

Instrutores de Libras (FARIA, 2011, p. 93).

Segundo Faria (2011), atualmente, ainda há um desprestigio da prática docente

dos profissionais surdos com licenciatura tanto quanto profissionais surdos sem

habilitação para o magistério, pois mesmo os graduados são contratados como

instrutores.

Além do ensino de Libras, o profissional surdo com ou sem formação acadêmica

não deve só executar o ensino de Libras, mas participar também das atividades da

gestão escolar como construção do Projeto Político Pedagógico (PPP), discussão

pedagógica, conselho escolar, entre outros. Inclusive, o profissional deve garantir o

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exercício de sua profissão com a formação inicial e continuada (FARIA, 2011). Assim,

o profissional tem seus deveres, responsabilidade específica da docência, atitudes éticas

e políticas. Portanto, a base de formação é a essência da docência voltada para ensino-

aprendizagem. Então, fica a pergunta: o trabalho do instrutor poderá ser semelhante à

função do professor? Se sim, qual o seu papel na educação básica?

Ao analisar a reportagem publicada na revista Nova Escola21

sobre a educação

de surdos e a formação do profissional surdo, Silveira e Rezende (2008) demonstram a

desvalorização do professor surdo no contexto escolar, muitas vezes alcunhados de

“Dicionário ambulante”, pelos ditos “professores especialistas”. Segundo as autoras, em

muitos casos, ele é considerado ajudante do professor. As autoras debatem a crítica aos

termos utilizados pelos professores mostrando a falta de reconhecimento e a

profissionalização do profissional surdo.

[...] a reportagem nos mostra o quão inferior o surdo se apresenta no

contexto profissional, já que no ambiente educacional foram

observadas várias distorções, na nossa avaliação. Historicamente,

fomos chamados para sermos o “dicionário ambulante” (de Libras) de

muitos professores na escola e, maior parte, os ditos “professores

especialistas”, como é o caso dos personagens consultados na

reportagem, apenas orientavam os alunos a trabalharem com o sinal

dado pelos surdos. Por que o surdo não pode desempenhar este

importante papel de professor e não de mero instrutor – palavra com

menor status profissional? Por que ele não pode explicar os conteúdos

curriculares, como já acontece em várias escolas? Nesse último caso,

os surdos já trabalharam com informações importantes apresentadas

pela disciplina e mesmo assim não foram considerados, agraciados

com o título de “professores” pelos docentes. Sempre os surdos foram

considerados tecnicamente como instrutores, mas na verdade, atuavam

como professores, apesar de poucos possuírem licenciatura

(SILVEIRA; REZENDE, 2008, p. 66-67).

Silveira (2008) utiliza a expressão "professor secundário" ao referir os

professores surdos, pois é essa sua posição, muitas vezes, dentro da escola. Na análise, a

pesquisadora vê a importância da adaptação do currículo dentro do ensino, que

necessariamente deve ser mudado, pois o currículo atual é pensado na lógica ouvinte. A

autora faz também reflexões sobre a importância das associações, dos surdos adultos

como modelos para os surdos alunos, da necessidade de aumentar o número de

professores surdos na escola para que não tenham o posicionamento como

“secundários”.

21

Revista Nova Escola é uma revista destinada a professores e voltada para área da educação.

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Sintetizando os trabalhos analisados, destacamos algumas reflexões sobre a

formação e atuação do profissional surdo no contexto educacional: a) falta de

articulação teoria e prática educacional (ALBRES, 2014); b) fragilidade nas formações

gerais e formação pedagógica (MARTINS, 2010); c) falta de valorização do saber

docente em detrimento do saber científico (SILVEIRA E REZENDE, 2008); d) falta de

especificidade na formação do professor surdo como responsável pela aquisição e

desenvolvimento da língua de sinais pelos alunos (MACHADO, 2010); e) necessidade

de formação continuada e em serviço do docente surdo (SANTOS, 2007); f) escassez de

profissionais surdos para atuarem nas escolas (GURGEL, 2004); g) não valorização do

profissional surdo (FARIA, 2011).

Para o mapeamento de produções técnicas encontradas neste capítulo sobre a

temática do professor e instrutor surdo, esquematiza uma tabela resumida com os

levantamentos bibliográficos encontrados a seguir

ANO DE

PUBLICAÇÃO

AUTORES LOCAL

DE

PUBLICA

ÇÃO

ASSUNTO

ESPECÍFICO

MOMENTO

CRONOLÓGICO

1 1999 Comunidade

surda

Porto

Alegre (RS)

Proposta para

educação de

surdos

Documento

proposto pela

comunidade surda

no V Congresso

Latino Americano

de Educação

Bilíngue para

Surdos

2 2004 GURGEL, T. Piracicaba

(SP)

Papel do

instrutor surdo

Dissertação de

mestrado

3 2005 QUADROS,

R.M.

Rio de

Janeiro (RJ)

Formações

profissionais

no campo da

surdez

Anais publicado no

Congresso do INES

4 2007 SANTOS,

L.F.

Piracicaba

(SP)

Instrutor surdo

em uma escola

inclusiva

bilíngue

Dissertação de

mestrado

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5 2007 MEC Brasília

(DF)

Formação

continuada

para

professores de

AEE

Cartilha

6 2008 SILVEIRA,

C.H;

REZENDE,

P.L.F.

Petrópolis

(RJ)

Educação de

Surdos

Livro publicado

pela Editora Arara

Azul

7 2008 SILVEIRA,

C.H.

Santa Cruz

do Sul (RS)

Visão sobre a

atuação do

professor

surdo

Artigo publicado

pela Revista do

Departamento de

Educação e do

Programa de Pós-

Graduação em

Educação da

UNISC

8 2010 MACHADO,

L.M.C.V.

Pelotas

(RS)

Formação de

professores

surdos

Artigo publicado

em revista

“Caderno da

Educação”

9 2010 MARTINS,

M.A.L.

Piracicaba

(SP)

Relação do

professor e

aluno surdo em

sala de aula

Dissertação de

mestrado

10 2011 FARIA, J. G. Marília (SP) Formação do

professor

surdo

Artigo publicado

pela Revista

Brasileira de

Educação Especial

11 2012 GIANINI, E. Natal (RN) Formação de

professores

surdos

Tese de doutorado

12 2014 ALBRES,

N.A.

São Carlos

(SP)

Formação de

professores

surdos

Tese de doutorado

Tabela 05 – Mapeamento de levantamento de produções técnicas

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Esse levantamento bibliográfico demonstra que a profissionalização do docente

surdo constitui-se num fenômeno bastante recente, presente na última década.

Embora os dados analisados apresentem algumas limitações em relação aos

conceitos, como mostrado na descrição, quanto ao acesso aos mesmos, colocam-se

como uma importante fonte de dados a respeito do movimento histórico da formação do

docente surdo, na medida em que mapeiam a produção teórica sobre a temática. As

produções cientificas e publicações também revelam o investimento em direção a um

amadurecimento no campo teórico da constituição e formação do educador surdo.

Investigar esse movimento a fim de percebê-lo e compreendê-lo coloca-se como uma

nova necessidade no processo de construção de identidade docente, buscando uma

visibilidade e reconhecimento da profissão do docente surdo. O mapeamento e

sistematização das produções que marcam este caminho de construção do conhecimento

sobre a temática, também possibilitam conhecer o teor das produções já construídas e

abrir possibilidades para avançar em novas construções.

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CAPÍTULO III

CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS PARA A REFLEXÃO SOBRE A

PROFISSÃO DO EDUCADOR SURDO

Nesse capítulo, busco traçar uma fundamentação teórica que dê sustentação para

as reflexões e análises do objeto dessa pesquisa. Dois autores são basilares nesse

trabalho: Vygotsky e Bakhtin, visto que a pesquisa aborda o profissional educador

surdo, cuja função primordial na escola é possibilitar a aquisição plena da língua pelos

alunos surdos.

Elenco as contribuições importantes de alguns autores sobre a importância do

profissional surdo em sala de aula: a) mediação entre professor e aluno surdo

(GESUELI, 2006); b) modelo bilíngue (SKLIAR, 1997); c) identidade (PERLIN, 1998);

d) cultura surda (STROBEL, 2008); e) relação dialógica (BAKHTIN, 1999); f)

identidade do professor surdo (REIS, 2007); g) semiótica imagética (CAMPELLO,

2007); h) experiências visuais (PERLIN; MIRANDA, 2003); i) subjetividade (LODI,

2005); j) interação e convivência entre crianças surdas e ouvintes (LACERDA, 2006).

Todos esses autores serão utilizados como pressupostos teóricos e também nas reflexões

sobre as observações realizadas em sala de aula com educadores surdos no capítulo seis.

Quando as crianças surdas são inseridas em um ambiente que não há interações

linguísticas em uma língua que lhes seja acessível (a língua de sinais) e ainda mais na

escola, onde a língua majoritariamente é língua portuguesa, como elas irão desenvolver

uma língua? Onde irão ocorrer as relações interativas? Em que meio social ocorrerá a

aquisição de conhecimentos? Estas questões são pertinentes, uma vez que “o

crescimento intelectual da criança depende de seu domínio dos meios sociais do

pensamento, isto é, da linguagem” (VYGOTSKY, 1998, p. 44). Qual a linguagem que

irá constituir o pensamento da criança se não há ambiente linguístico bilíngue ao seu

redor? Quais práticas dos educadores surdos permitem que a língua de sinais se

desenvolva nessas crianças? São questões que essa pesquisa busca responder ao analisar

a formação e as práticas dos docentes surdos.

Para o embasamento teórico sobre a formação docente, utilizei autores da área

da educação, tais como: Tardif (2010), Libâneo (2008), Saviani (1996), Perrenoud

(1997), Veiga Neto (2004) e outros autores que focalizam a importância do professor e

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a formação do saber. Primeiramente, o processo da educação é de suma importância

para o desenvolvimento da criança para sua formação como cidadão.

Libâneo (2008) analisa que o perfil do profissional educador é daquele voltado

para a formação cultural

O trabalho docente constitui o exercício profissional do professor e

este é o primeiro compromisso com a sociedade. Sua responsabilidade

é preparar os alunos para se tornarem cidadãos ativos e participantes

na família, no trabalho, nas associações de classe, na vida cultural e

política. É uma atividade fundamentalmente social, porque contribui

para a formação cultural e científica do povo, tarefa indispensável

para outras conquistas democráticas. (LIBÂNEO, 2008, p. 47)

Em outras palavras, a formação do docente consiste no papel do professor

especialista em conhecimento cientifico, segundo Jalbut (2011), “O professor é

entendido como um especialista que aplica as regras do conhecimento científico às

situações idealizadas para a sala de aula” (JALBUT, 2011, p. 3).

No entanto, a formação vai além do conhecimento cientifico, como afirma o

autor Alves apud Veiga Neto (2005)

A formação do profissional da Educação é um processo denso e que

comporta diversos aspectos importantes, devendo ser fornecida ao

futuro professor uma sólida bagagem nos âmbitos científico, cultural,

social e pedagógico para sua atuação profissional (VEIGA-NETO,

2002 apud ALVES, 2005, p. 05).

Todavia, alguns autores utilizam, em outras palavras, o conceito de “saber”, que

define um profissional cuja função principal é educar crianças, jovens e adultos com

seus “saberes”. Cunha (2007) define que o saber é aquilo

Que orienta a atividade do professor insere-se na multiplicidade

própria do trabalho dos profissionais que atuam em diferentes

situações e que, portanto, precisam agir de forma diferenciada,

mobilizando diferentes teorias, metodologias, habilidades. (CUNHA,

2007, p. 1).

De acordo com Saviani (1996), o professor é aquele que educa, o qual precisa

também aprender, ser formado para ser educador, e usar os saberes implicados na ação

de educar. Seguindo a mesma lógica, o autor afirma que se invertem os termos da

questão: “em lugar de os saberes determinarem a formação do educador, é a educação

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que determina os saberes que entram na formação do educador” (SAVIANI, 1996,

p.145). Isso contribui para que o professor precise estar sempre em reflexão, em

situação em sala de aula e fora dela, para que os tipos de saberes determinem uma visão

de mundo, uma concepção de educação, de ensino. Enquanto na sala de aula como

prática do docente, o professor é visto como "espaço de produção da competência

profissional pelos próprios professores" (TARDIF, 2002, p. 291). O trabalho de cada

professor, quanto coletivamente tanto individualmente, é o lugar em que se produzem

saberes adquiridos pela reflexão prática por meio das atividades cotidianas de ensino do

professor na escola. Continuando com as palavras daquele pesquisador, o trabalho dos

professores é "um espaço específico de produção, de transformação e de mobilização de

saberes, e, portanto, de teorias, de conhecimentos e de saber-fazer específicos ao ofício

de professor" (TARDID, 2002, p. 234).

Para compreender esse postulado, faz-se necessário esclarecer a formação do

profissional surdo, como deve ser o “saber” cientifico e qual o conhecimento especifico

da sua formação.

Na educação de crianças e jovens surdos, é de suma importância a presença

física do professor surdo em sala de aula. Com ele o aluno surdo não aprende só a

língua de sinais, mas também tem sua formação e subjetividade.

Além desse aspecto, o professor surdo tem domínio de metodologias a serem

utilizadas e adaptadas, o que impulsiona o interesse dos alunos quando o conteúdo

acadêmico é trabalhado por meio de estímulo visual. Na presença do professor surdo, o

ambiente linguístico se torna rico, o que permite que ele tenha melhor aproveitamento

no processo de ensino e aprendizagem. Portanto, o trabalho bilíngue deve ter qualidade,

o que produz a partir de uma formação adequada do professor. “A formação do

professor é um processo pedagógico, intencional e organizado de forma preparado

teórico cientifico e técnica do professor para dirigir a competência do seu processo de

ensino” (LIBÂNEO, 2008, p.27). Quanto às formas de educar o aluno surdo, é

necessário que o professor realize um conjunto de operações didáticas como

planejamento, direção de ensino, aprendizagem e a avaliação.

As crianças surdas que têm oportunidade de ter contatos com os profissionais

surdos em sala de aula, tem uma otimização na construção de conhecimento, uma vez

que a interação linguística favorece seu desenvolvimento, como afirma Vygotsky

(1998). Este profissional surdo faz a função de mediador, favorecendo a construção de

palavra, ou seja, o signo, que é o elemento mais importante do pensamento e da cultura

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humana. Embora profissionais ouvintes fluentes em Libras possam também serem

medidores na aprendizagem e desenvolvimento das crianças surdas, a maioria desses

não tem a língua de sinais como sua língua natural, como é o caso de algumas pessoas

surdas.

Entrelaçando a formação do docente com a do profissional surdo, apresento a

seguir seis quadros com os dados de editais de concursos públicos e credenciamento

para o preenchimento de cargos para instrutor ou professor surdo. A análise desse

material se faz útil para a reflexão e discussão a respeito do cargo em que o profissional

surdo está inserido no mercado de trabalho. Nesse material, analiso também a relação

entre docência e a formação do profissional surdo.

Quadro 1 – Prefeitura Municipal de Barueri/SP

Fonte: Edital n. PMB 02/20, de 07 de outubro de 201122

.

22

Disponível: https://www.pciconcursos.com.br/concurso/prefeitura-de-barueri-sp-40-vagas

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Quadro 2 – Prefeitura Municipal de Petrópolis/RJ

Fonte: Edital n. 001/2014, de 19 de dezembro de 201423

.

Quadro 3 – Prefeitura Municipal de Santo Ângelo/RS

Fonte: Edital n. 58/2010, de 07 de janeiro de 201024

.

Quadro 4 – Prefeitura Municipal de São Caetano do Sul/SP.

23

Disponível em: https://www.pciconcursos.com.br/noticias/prefeitura-de-petropolis-rj-retifica-concurso-

publico-para-a-area-da-educacao 24

Disponível em: https://www.pciconcursos.com.br/concurso/prefeitura-de-santo-angelo-rs-75-vagas

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57

Fonte: Edital n. 001/2015, de 04 de março de 201625

.

Quadro 5 – Prefeitura Municipal de São Paulo/SP

Fonte: Edital de Credenciamento SME/Divisão de Educação Especial – DIEE n. 01/201626

.

Quadro 6 – Prefeitura Municipal de Vitória/ES.

25

Disponível em: https://arquivo.pciconcursos.com.br/prefeitura-de-sao-caetano-do-sul-sp-altera-edital-

do-concurso-com-mais-de-880 vagas/1341939/64a280e421/edital_de_abertura_n_001_2015.pdf

26

Disponível em:

https://www.imprensaoficial.com.br/DO/BuscaDO2001Documento_11_4.aspx?link=/2016/diario%2520o

ficial%2520cidade%2520de%2520sao%2520paulo/abril/27/pag_0076_894MDRIMLIU3GeDODVTENK

OG5CK.pdf&pagina=76&data=27/04/2016&caderno=Di%C3%A1rio%20Oficial%20Cidade%20de%20

S%C3%A3o%20Paulo&paginaordenacao=100076

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Fonte: Edital n. 010/2016, de 06 de maio de 201627

.

Para uma comparação, apresentamos uma tabela resumida com os seis editais,

relacionando com o cargo e o requisito para a melhor leitura, e, em seguida, uma breve

discussão sobre estes dados:

Tabela 06: Editais

EDITAIS CARGO REQUISITO

Quadro 1 – Barueri/SP Instrutor

Ensino Médio com

magistério + curso de

formação de instrutor de

Libras ou Ensino Médio +

curso de formação na área

ou Ensino Superior com

graduação de Pedagogia ou

licenciatura;

Quadro 2 – Petrópolis/RJ Instrutor

Ensino Superior +

Prolibras + Curso de

formação de instrutor de

Libras ou assistente

27

Disponível em: https://arquivo.pciconcursos.com.br/prefeitura-de-vitoria-es-anuncia-tres-processos-

seletivos/1355924/1157023f00/edital_de_abertura_n_10_2016.pdf

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educacional de Libras;

Quadro 3 – Santo Ângelo/RS Instrutor

Ensino Superior na área

da educação + Prolibras;

Quadro 4 – São Caetano do Sul/SP Instrutor

Ensino Superior + Curso

específico na área;

Quadro 5 – São Paulo/SP Instrutor (prioritariamente

surdo)

Ensino Médio ou Ensino

Superior + Prolibras ou

Curso de pós-graduação em

Libras

Quadro 6 – Vitória/ES Instrutor e Professor

(comprovadamente surdo);

Instrutor: Ensino Médio +

Prolibras ou curso de

formação de instrutores

surdos;

Professor:Ensino Superior

+ Prolibras ou curso de

formação de instrutores de

Libras

Fonte: Elaborada pela pesquisadora

Em relação aos dados apresentados, percebe-se que os editais revelam um

problema na definição do profissional. Esse problema revela-se pela ambiguidade na

linguagem, o que tem uma relevância considerável. Os editais 1, 2, 3, 4 e 5 discriminam

as vagas para “instrutor”. Observando os requisitos verificamos que os editais 1 e 5

exigem a formação em ensino médio e/ou superior. Os editais 2, 3 e 4 definem como

requisito apenas o ensino superior. A questão

de requisito dos editais gera certa polêmica. Como podem definir que a vaga é

para instrutor e exigem ensino superior? Além disso, podemos também fazer uma

discussão sobre “não definição” da condição auditiva do candidato. Observa-se que os

editais de Barueri/SP, de Petrópolis/RJ, de Santo Ângelo/RS e de São Caetano do

Sul/SP não oferecem a vaga para o candidato surdo. Isso significa que uma pessoa

ouvinte pode concorrer à vaga de instrutor juntamente com os surdos. Esses editais não

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dão prioridade às pessoas surdas como previsto no Decreto n° 5.626 de 2005, como já

explicado no capítulo anterior. Observa-se que deste decreto estabelece a prioridade de

formação para pessoas surdas, porém dos seis editais, quatro deles não mencionam a

prioridade à pessoa surda para a contratação no mercado de trabalho, mesmo que o

surdo tenha formação na área específica.

Enquanto esses editais não destinam a vaga para pessoas surdas, o edital de São

Paulo/SP e de Vitória/ES definem que a vaga é prioritariamente para candidatos surdos

no cargo de instrutor e professor respeitando o espaço de mercado de trabalho para estes

sujeitos. A diferença é que o de São Paulo destina o cargo de instrutor e o de Vitória são

cargos diferentes e separados para a formação especifica. Chamo a atenção que apenas o

edital de Vitória define o cargo de professor surdo, embora outros editais exijam o curso

superior. Sobre essa desqualificação do profissional surdo, Fernandes (2006) comenta

Ironicamente, alguns dos objetivos e pressupostos de “Milão”

sobrevivem no espaço escolar, travestidos em uma nova “roupagem”:

[...] os surdos adultos são convocados a colaborar no processo

educacional, desde que sejam apenas instrutores de Libras, ainda que

tenham formação para atuar como professores (FERNANDES, 2006,

p. 4).

Comparando os seis editais, é visível a violação ao decreto, com exceção de São

Paulo e Vitória, quando a formação mínima exigida para instrutor é a de ensino médio.

Se a formação mínima exigida é a de nível superior para o cargo de professor surdo, por

que não respeitá-la? Qual a intenção dos editais que colocam o requisito de formação

em nível superior para o cargo de instrutor? Não há perspectiva do mercado e mesmo

das instituições de ensino de haver profissionais surdos com ensino superior? Há uma

questão ideológica em relação aos surdos no contexto ouvinte? Nessa perspectiva,

trabalharei com o conceito de ideologia na concepção bakhtiniana, sobretudo a

ideologia do cotidiano. A ideologia é caracterizada como a expressão, a organização e a

regulação das relações histórico-materiais dos homens, portanto, pode ser vista como

uma representação, assim como ele afirma que “tudo que é ideológico possui um

significado e remete a algo situado fora de si mesmo” (BAKHTIN, 1999, p 31). O autor

finaliza com a explicação de que a ideologia ocorre por um grupo organizado, assim “a

ideologia não pode derivar da consciência, como pretendem o idealismo e o positivismo

psicologista, pois a consciência adquire forma e existência nos signos criados por um

grupo organizado no curso de suas relações sociais (BAKHTIN, 1999, p.35)”.

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Como afirma Bakhtin (1999), a ideologia tem “dupla face”, que reflete uma

coisa, mas refrata outra por meio de signo, que é visto como um todo produto

ideológico, ele não existe como uma parte da realidade.

De acordo com esse autor, todo signo é ideológico. Ele apresenta exemplo: o pão

é um produto de consumo, mas pode também ser transformado em um signo ideológico

quando ele é usado para representar o corpo de Cristo em cerimônias religiosas, por

exemplo. Outro exemplo também é enfatizado por Miotello (2008) descrevendo o

casamento.

Como exemplo do que aqui se está discutindo, penso na luta

ideológica que vem se dando na sociedade brasileira para estabilizar o

sentindo de “casamento”. Basta olhar para as múltiplas composições

familiares, para os vários tipos possíveis de casamentos, para as

discussões sem fim em torno do “casamento de pessoas do mesmo

sexo” para entender que estamos diante de uma luta declarada de

sentidos; a ideologia oficial buscando construir um sentido

relativamente estável para “casamento” (união entre duas pessoas de

sexo diferente), enquanto os estratos inferiores da ideologia produzem

uma multidão de sentidos e de realidade (MIOTELLO, 2008, p. 174).

No entanto, pode-se dizer que, no caso dos editais, está por detrás uma ideologia

oralista e ouvinte quando se abre a possibilidade e, de certa forma, se protagoniza para o

ensino de Libras um candidato ouvinte e transparece a rara presença de um candidato

surdo.

Nesse caso, o edital com suas especificidades define que o candidato somente

poderá assumir o posto se for aprovado no concurso público (ou na seleção, no caso do

credenciamento) se ele atender a todos os requisitos estabelecidos no documento. No

entanto, não se respeita as vagas para candidatos surdos, sendo que de seis quadros,

apenas dois preveem a prioridade para candidato surdo, como determina o Decreto n°.

5.626 de 2005. O quadro 6 - edital de Vitória/ES - segue as normas do decreto dentro do

quadro exigido pelo edital, assim cumprindo legalmente a formação própria e específica

para a docência, o que caracteriza um aspecto positivo em questão de respeito e

legalidade para o espaço da pessoa surda, o que é valorizado e reforçado pela demanda

de atuação dos docentes na educação básica.

Outro aspecto relevante para a discussão é a respeito da docência da disciplina

de Libras em ensino superior. O sétimo artigo do Decreto n° 5.626 de 2005 estabelece

três perfis de profissionais para ministrar a disciplina de Libras nos dez anos seguintes à

sua promulgação.

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Art. 7o Nos próximos dez anos, a partir da publicação deste Decreto,

caso não haja docente com título de pós-graduação ou de graduação

em Libras para o ensino dessa disciplina em cursos de educação

superior, ela poderá ser ministrada por profissionais que apresentem

pelo menos um dos seguintes perfis: I - professor de Libras, usuário

dessa língua com curso de pós-graduação ou com formação superior e

certificado de proficiência em Libras, obtido por meio de exame

promovido pelo Ministério da Educação; II - instrutor de Libras,

usuário dessa língua com formação de nível médio e com certificado

obtido por meio de exame de proficiência em Libras, promovido pelo

Ministério da Educação; III - professor ouvinte bilíngue: Libras -

Língua Portuguesa, com pós-graduação ou formação superior e com

certificado obtido por meio de exame de proficiência em Libras,

promovido pelo Ministério da Educação. § 1o Nos casos previstos nos

incisos I e II, as pessoas surdas terão prioridade para ministrar a

disciplina de Libras (BRASIL, 2005).

Este artigo menciona os três profissionais que podem ministrar o ensino de

Libras em cursos de educação superior durante dez anos após a publicação. Neste

decreto, há esclarecimento de que a formação de instrutor e de professor tem diferença

em relação ao nível de ensino, sendo médio para o instrutor e superior para o professor.

Outra observação importante que chama atenção é um dos perfis profissionais para

ministrar a disciplina de Libras no ensino superior: a de instrutor surdo com formação

em nível médio. O decreto não descreve os perfis profissionais para a educação básica,

sendo que só tem o artigo sobre a formação para ministrar a Libras e não o perfil como

deveria ser colocado neste decreto, assim como o perfil para ensino superior. O instrutor

que for contratado para dar aula em ensino superior será nomeado como instrutor? Isso

parece muito incoerente, uma vez que no ensino superior, os docentes são denominados

de professores.

Contextualizando o cenário atual da educação de surdos com os editais e o

decreto, destaco nas palavras de Maher (2007), pesquisadora da área de línguas

minoritárias como língua indígena, língua de fronteira, de imigrantes, língua de sinais e

outros. A autora ressalta a importância do planejamento de programas voltados para as

especificidades linguístico-culturais de grupos minoritários:

[...] não basta as minorias brasileiras [...] terem consciência de seus

direitos para que o cenário de opressão linguístico-cultural em que

vivem seja, na prática, no varejo, no cotidiano, modificado. Daí o meu

desconforto com o modo como o termo empoderamento vem sendo,

em muitas situações, utilizado. Creio que os termos politização ou

fortalecimento político dos grupos sociais destituídos de poder

traduzem melhor o que buscamos com nossas pesquisas e ações

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educativas. Porque o empoderamento de grupos minoritários é,

parece-me, decorrência de três cursos de ação: (1) de sua politização;

(2) do estabelecimento de legislações a eles favoráveis; e (3) da

educação do seu entorno para o respeito à diferença. A politização é

apenas um dos alicerces – um alicerce absolutamente necessário, mas

não suficiente –, quando se pensa a arquitetura de projetos

emancipatórios para eles voltados. Sem que o entorno aprenda a

respeitar e a conviver com diferentes manifestações linguísticas e

culturais, mesmo que fortalecidos politicamente e amparados

legalmente, estou convencida de que os grupos que estão à margem do

mainstream não conseguirão exercer, de forma plena, sua cidadania

(MAHER, 2007, p. 257).

A autora destaca as três principais ações necessárias que ocorrem em certos

grupos minoritários que necessitam de ação coletiva para a restauração do problema

educacional brasileiro: I – Politização: necessita de grupos de debates, movimentos

políticos e sociais, associações de surdos, entre outros, que possam discutir a

importância do professor surdo escolas de surdos enfatizando o processo de ensino e

aprendizagem do aluno surdo de forma e ter a comunicação “plena” entre docente e

estudantes; II – Estabelecimento de legislações: necessita urgentemente de

reestruturação do Decreto n° 5.626 de 2005, visto que sua criação, que se deu há mais

de dez anos, se deu em um momento em que ainda havia poucos surdos formados. Essa

reestruturação deveria rever principalmente os aspectos referentes à formação e à

docência. Em outras palavras, se na atualidade existem vários surdos formados em

cursos de graduação e pós-graduação na área de Libras, por que as mudanças nas

formas de contratação dos surdos caminham vagarosamente? Ou seja, o que justifica a

permanência do cargo de “instrutor” para ministrar a disciplina de Libras no ensino

superior?; III – Educação do entorno: trata-se da necessidade de uma efetiva mudança

no ensino para surdos, o respeito à profissão do professor surdo e a inclusão da

disciplina de Libras na grade curricular para garantir o “fortalecimento”,

reconhecimento e respeito às pessoas surdas.

O sétimo artigo daquele decreto enfatiza o perfil de profissional para ministrar o

ensino superior. Há uma contradição quando este artigo diz que o instrutor pode

ministrar a aula no ensino superior mesmo tendo a formação em nível médio com o

certificado obtido por meio de exame de proficiência em Libras, o Prolibras. O instrutor

surdo tem competência para ministrar o curso de Libras nas instituições de ensino

superior? Teria um profissional de ensino médio, o conhecimento básico e didático para

ministrar aulas em cursos de graduação ou pós-graduação? Enquanto isso, as crianças

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surdas nas escolas de surdos sofrem com a ausência do profissional surdo, sendo que a

maioria são professores ouvintes. É importante que a criança surda tenha contato com o

professor surdo. É preocupante a situação de uma criança surda inserida em uma escola

onde não há professor bilíngue, professor surdo, intérprete de Libras e não tem sua

língua compartilhada com seus colegas e professores (BOTELHO, 1998; LACERDA,

1999). Nesse ambiente a língua dominante é o português. As crianças ouvintes se

comunicam espontaneamente, a criança não aprende a sua língua. Além disso, as

“crianças surdas, de pais ouvintes, chegam à escola sem uma língua, cabe aos

profissionais lhes propiciar a aquisição da língua brasileira de sinais” (PEREIRA, 2011,

p.2). Como esses sujeitos podem se constituir enquanto sujeito, ou seja, desenvolver sua

subjetividade no período de aquisição da linguagem sem ter uma interação em uma

língua compreensível?

Bakhtin (1999) ressalta que o dialogismo está na relação entre os sujeitos, pois o

sujeito se constrói com os outros, então o dialogismo é um conceito relacional que

pressupõe que a linguagem sempre coloca sujeitos e sentidos em relação, não havendo,

portanto, linguagem sem interação. De acordo com ele, a linguagem é dialógica, sendo a

teoria da linguagem a base de sua concepção humana, portanto a linguagem sempre é

social.

Reis (2007) descreve os conceitos de identificação e modelo na questão do

professor surdo na sala de aula, no qual enfatiza a importância desse profissional surdo

em contato com o aluno surdo. A autora também destaca o papel do professor ouvinte

no processo educacional do aluno surdo, mas alerta para a necessidade da presença

física do professor surdo para que o aluno surdo construa os seus valores como sujeito

surdo.

Remete à importância de que os alunos surdos devam ser vistos não

como tradicionais e dependentes dos outros professores ouvintes, se

bem que estes professores ouvintes também são agentes do processo,

tendo em vista o processo de interação. Mas é importante na formação

dos professores surdos que busquem as inovações e possibilitem

efetivar uma transgressão pedagógica, para que atinjam o seu desejo e

a sua singularidade de ensinar. O seu próprio pensamento deve ser

manifestado, para professores surdos ocorrer uma auto identificação

como professor surdo, valorizando a sua construção histórica dos

valores culturais. É necessário esclarecer a importância da prática dos

professores surdos vivenciada e surgida dentro do povo surdo. Ser

diferente significa produzir a partir da história, do conhecimento

próprio, e compartilhado uns com os outros com o objetivo de ter mais

experiência dessa prática pedagógica. Nesse processo identificatório

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cultural prosseguem as inovações, as transgressões vão ocorrendo,

buscando, fazendo acontecer as múltiplas experiências de que é o seu

próprio fazer pedagógico. (REIS, 2007, p. 96).

A construção da imagem do professor surdo e ouvinte na relação com o aluno

surdo constitui uma condição de sentido como um todo. A dialogia é o princípio

constitutivo da linguagem.

Vale ressaltar que o Decreto n° 5.626 de 2005 também dispõe sobre a formação

do tradutor e intérprete de Libras/língua portuguesa; e o direito dos surdos de ter acesso

às informações em Libras e à educação bilíngue” (LACERDA; ALBRES; DRAGO,

2013, p. 03). Enquanto a política educacional insiste na educação inclusiva, muitas

crianças estão sem direito de ter acesso à sua língua, o direito linguístico. Muitas

escolas ainda não têm uma estrutura de ensino bilíngue. Muitos professores ouvintes

não sabem Libras, ainda não há intérpretes e muito menos a presença do professor surdo

na sala de aula. Se há intérpretes inseridos em sala de aula, a criança está inserida em

um ambiente em que não há trocas entre seus pares, com pouco acesso à língua que

possibilite uma real aquisição da linguagem.

Nascimento e Souza (2016), a partir dos estudos vygotskyiano, ressaltam e

indicam a necessidade da educação bilíngue de surdos

Se levarmos à radicalidade as ideias de Vygotsky sobre a íntima

implicação entre língua e comunidade, entre sociedade, cultura e

existência humana, certamente, a demanda dos surdos receberia do

psicólogo russo completo apoio e ele seria, quem sabe, um dos

fervorosos defensores da principal demanda dos surdos: a expansão e

a consolidação da Educação Bilíngue de/para Surdos. Talvez por isto,

Vygotsky inspire pesquisadores que, apoiando-se nele, produzem

pesquisas e participam de ações para que a educação bilíngue saia do

reino das leis e se consolide, materialmente, em escolas públicas e de

qualidade em todo o território brasileiro (NASCIMENTO; SOUZA,

2016, p. 119).

Finalizo este capítulo com uma apresentação de uma tirinha para suscitar a

reflexão e discussão acerca da formação do profissional surdo. Até este momento,

descrevi a trajetória de minha vivência com a instrutora surda, a base de formação

docente, a falta de profissionais de Libras (professor bilíngue, intérprete, professor

surdo), a análise e discussão dos editais de concurso para cargo de professor e instrutor.

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Figura 01: Tirinha de Carlos Ruas

Esta tirinha foi elaborada pelo ilustrador Carlos Ruas28

em homenagem ao dia do

professor. Pode se observar que a criança recebe um balãozinho colorido de cada

professor.

No entanto, podemos fazer uma reflexão sobre os conceitos de dialogismo e de

polifonia utilizados por Bakhtin (1981). A dialogia é entendida como um todo discurso

que ocorre na interação entre os sujeitos. Já a polifonia remete aos muitos sons, as

diferentes vozes que formam o discurso de cada ser humano.

Segundo a teoria do dialogismo bakhtiniano, todo discurso é constitutivamente

polifônico e se caracteriza por um jogo de vozes, de discursos, num permanente diálogo.

Bakhtin considera o dialogismo o princípio constitutivo da linguagem que é, para ele,

por constituição, dialógica, num cruzamento constante de discursos.

Enquanto as escolas brasileiras falham na educação dos alunos surdos, há

pesquisadores e profissionais que precisam ser vistos e ouvidos (polifonia), o que

28

Fonte: http://www.umsabadoqualquer.com/obrigado-professor/

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contribuem com suas produções na qualidade de Educação Bilíngue, nos Estudos

Surdos e na questão da identidade.

A política educacional voltada para a área de educação de surdo deve levar em

consideração a formação do profissional surdo, pois esta permite a interação ativa entre

professor e alunos surdos, o que abre horizontes para novos conhecimentos, habilidades,

atitudes, convicções, a pesquisa, a vida acadêmica e as lutas pela cidadania dos surdos

na sociedade.

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CAPÍTULO IV

MÉTODO DE PESQUISA

Minayo (1994) define que a pesquisa é de suma importância como uma

ferramenta fundamental no sentido de pensar a realidade. O debate em torno da pesquisa

está longe de ser homogêneo, pois envolve realidades sociais, circunstâncias cotidianas

e ideologias distintas. No entanto, segundo a autora, a pesquisa

[...] é a atividade básica da Ciência na sua indagação e construção da

realidade. É a pesquisa que alimenta a atividade de ensino e a atualiza

frente à realidade do mundo. Portanto, embora seja uma prática

teórica, a pesquisa vincula pensamento e ação. Ou seja, nada pode ser

intelectualmente um problema, se não tiver sido, em primeiro lugar,

um problema da vida prática. (MINAYO, 1994, p. 17).

O objetivo geral dessa pesquisa é compreender o perfil do profissional surdo e a

sua função no ambiente educacional, observando sua formação técnica pedagógica e

refletir sobre sua atuação na formação dos alunos surdos.

A partir desse objetivo geral, delinearam os objetivos específicos, a saber:

Descrever o perfil de profissionais surdos que atuam ou atuaram na

esfera educacional, buscando compreender suas percepções sobre suas próprias

práticas pedagógicas;

Identificar a função do profissional surdo;

Verificar como se inserem os profissionais surdos no sistema educacional

a partir das denominações instrutor e professor;

Descrever a metodologia utilizada, a didática, o comprometimento com o

ensino, uso de materiais adaptados e o conhecimento do docente surdo em

situações de ensino;

Analisar como a formação dos sujeitos participantes interfere na sua

prática docente.

A fim de atender a esses objetivos, foram definidos dois corpora de pesquisa, na

busca de se caracterizar os modos de compreensão da função do professor surdo dentro

da educação bilíngue. O primeiro corpus foi constituído por um questionário com 26

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perguntas. O segundo corpus foi obtido a partir de uma pesquisa de cunho descritivo

com método observação interpretativista dos profissionais em sala de aula. Minayo e

Sanches (1993) descrevem sobre o método quali-quantitativo:

A relação entre quantitativo e qualitativo (...) não pode ser pensada

como oposição contraditória (...) é de se desejar que as relações

sociais possam ser analisadas em seus aspectos mais "concretos" e

aprofundadas em seus significados mais essenciais. Assim, o estudo

quantitativo pode gerar questões para serem aprofundadas

qualitativamente e vice-versa (MINAYO; SANCHES, 1993, p. 247).

Para a construção do questionário, de acordo com Aaker (2001), não existe

procedimentos exatos que garantam que seus objetivos de mediação sejam alcançados

com bons resultados. Conforme experiência de cada participante, podem ocorrer

respostas ambíguas. No entanto, o trabalho do pesquisador para desenvolver o

questionário passa por algumas etapas: a) planejar e formular as perguntas para obter as

informações necessárias; b) definir a quantidade das perguntas; c) testar o questionário;

d) corrigir o problema e fazer o pré-teste. Essas etapas compuseram uma parte do

trabalho dessa pesquisa.

A escolha do formato das respostas foi feita com perguntas abertas em que os

participantes puderam responder de forma livre com suas próprias palavras sem ter um

limite de escolha entre um rol de alternativas e também perguntas fechadas, ou seja, de

múltipla escolha em que os participantes optavam por uma das alternativas ou por

determinado número permitido de opções. A questão da amostragem das respostas do

questionário é importante para obter conjunto de respostas com amostra válida para

atingir o objetivo.

Com o caráter quantitativo da pesquisa, temos as traduções em números dos

resultados das opiniões dos participantes. O questionário viabiliza a exatidão no

conhecimento do perfil e o papel do profissional surdo entre os participantes. Já o

método qualitativo foi útil e necessário para identificar e descrever os perfis e papel dos

profissionais surdos no ambiente educacional em quatro escolas do Estado de São Paulo

de diferentes tipos de ensino (público, privado). Essas observações possibilitaram

verificar as interações que se estabelecem no ambiente escolar, permitindo compreender

as funções dos profissionais e as formas de atuação. Ou seja, a pesquisa qualitativa

interpretativista permitiu compreender de maneira mais aprofundada como as

estratégias e condições pedagógicas destes profissionais interferem em seu cotidiano e

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em sua percepção no ato de ensinar. Por isso, foi também importante refletir sobre as

diferenças nas formas de atuação desses profissionais em cada instituição de ensino.

O questionário foi desenvolvido no programa Lime Survey29

por meio da

internet, com temáticas sobre a atuação do educador surdo. O sistema on-line foi

desenvolvido junto com o Departamento de Informática da Faculdade de Educação da

UNICAMP. Os participantes foram convidados por meio de redes sociais, WhatsApp, e-

mail e a partir de contatos da própria pesquisadora. Os sujeitos que responderam ao

questionário foram trinta participantes, todos são surdos, com idade entre 25 e 58 anos e

são residentes nos diversos Estados do Brasil. O critério de participação do questionário

foi: a) ser surdo; b) atuar ou já ter atuado como docente no ensino de Libras e/ou outras

disciplinas.

Para a realização da pesquisa do questionário, foram formuladas vinte e seis

perguntas dividindo em quatro blocos para a categorização das perguntas: 1) Perfil do

participante; 2) Formação escolar e acadêmica; 3) Experiência profissional; 4) Visão

sobre atuação profissional. O último bloco consiste em perguntas abertas com objetivo

de cada participante relatar suas opiniões e experiências profissionais. O questionário

contém 16 questões fechadas para posterior análise quantitativa e 10 abertas para

posterior análise qualitativa e quantitativa. Uma vez que o participante aceitasse

participar da pesquisa, deveria assentir sua participação entrando em acordo por um

termo de consentimento feito pelo próprio link. Assim que ele concordava em

responder, seguiam as perguntas. Com vinte e seis perguntas, para a análise e discussão

do questionário, foram selecionadas as catorze seguintes perguntas mais relevantes,

sendo nove perguntas fechadas e seis abertas:

29

Segue o link do programa Lime Survey: https://www.limesurvey.org/

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1) Idade; 2) Em que Estado do Brasil você mora; 3) Com quantos anos começou

aprender a Libras; 4) Onde aprendeu a Libras; 5) Onde estudou na educação básica; 6)

Tem formação de graduação; 7) Nas instituições em que você trabalha ou trabalhou,

você era contratado como; 8) Qual a sua formação em nível superior; 9) Porque você

escolheu a profissão; 10) Pelo fato de você ser surdo, a escolha da sua profissão foi por

causa da facilidade da vaga no mercado de trabalho; 11) Você acredita que a profissão

de professor é a que mais “valoriza” e respeita para pessoa surda no mercado de

trabalho; 12) Ao longo da experiência profissional, o que você sente falta e precisa para

melhorar a proposta educativa bilíngue dentro da escola; 13) Para você, qual a

diferença entre professor e instrutor; 14) Você já foi contratado como instrutor, mesmo

depois de ter concluído sua formação como professor? Como você se sentiu?

Quadro 07: Perguntas relevantes para análise do questionário

As respostas foram armazenadas em Excel, procedimento orientado pelo técnico

de informática da Faculdade da Educação (FE), o que deu formato para a análise e

discussão referente às questões.

Os sujeitos participantes da pesquisa da observação em sala de aula foram

escolhidos de acordo com os seguintes critérios: a) atuar em sala de aula na educação

básica; b) atuar com alunos surdos, podendo também atuar com alunos ouvintes c) ser

docente da disciplina de Libras ou outras do currículo escolar. São oitos sujeitos

participantes em três escolas no Estado de São Paulo.

Todos os participantes tanto do questionário quanto da observação assinaram o

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) solicitado pelo Comitê de Ética

em Pesquisa em Seres Humanos, aprovado com o CAAE: 57649416.1.0000.5404

Com o intuito de não identificar os sujeitos da pesquisa, os nomes são fictícios,

assim como os nomes das escolas.

Para a investigação da pesquisa em observação, foram selecionadas três escolas

que foram visitadas e observadas pela pesquisadora em local previamente agendado. A

observação em sala de aula foi realizada por dois dias em cada escola, a fim de observar

os participantes durante diferentes atividades escolares. A seguir, apresento um quadro

com descrição dos locais da pesquisa de observação:

Escola Local Tipo de instituição Quantidade e cargo

de profissionais

Disciplina que o

profissional

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surdos ministra

Cravo São Paulo/SP Escola Bilíngue

Municipal

Um instrutor e um

professor

Libras e

Matemática.

Tulipa São Paulo/SP Escola Polo

Municipal

Dois instrutores Suporte do

professor bilíngue

em todas as

disciplinas

curriculares e

ensino de Libras

Girassol São Paulo/SP Particular Cinco professores Libras, Artes,

Contação de

história, Jardim I.

Tabela 07: Descrição dos locais da pesquisa de observação

O propósito da pesquisa em sala de aula era observar o profissional surdo,

analisando aspectos da metodologia utilizada por ele e sua didática, o comprometimento

com o ensino, o uso de materiais adaptados, o conhecimento, a interação e relação com

os envolvidos no ambiente escolar.

Quanto ao procedimento desta pesquisa para o registro dos dados foi utilizado

anotações no diário de campo, o que possibilitou a análise do processo da observação.

Para o questionário, foi feito pelo programa Lime Survey disponibilizado de forma

direta, sem interferência da pesquisadora. Os dados quantitativos foram analisados

estatisticamente e apresentados em gráficos e posteriormente análise e discussão.

A análise e discussão do questionário e da observação encontram-se nos

próximos capítulos, respectivamente, cinco e seis. A análise do questionário foi feita a

partir da quantificação de respostas dos participantes, sendo que alguns cruzamentos de

dados foram realizados para produzir uma discussão sobre os mesmos. Para melhor

visibilidade dos achados as respostas foram apresentadas em gráficos. Já os dados das

observações foram analisados seguindo os critérios citados anteriormente.

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CAPÍTULO V

ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS:

O QUE DIZEM OS EDUCADORES SURDOS SOBRE SUA

FORMAÇÃO E ATUAÇÃO

Este capítulo traz os resultados e as discussões a partir das respostas dos trinta

sujeitos que participaram do questionário no modelo Survey. Como descrito no capítulo

anterior, participaram dessa etapa da pesquisa educadores surdos convidados pela

pesquisadora pessoalmente e por meio de redes sociais, e-mail ou WhatsApp. De acordo

com Gil (1999), Survey pode ser entendido como uma pesquisa que tem o objetivo de

investigar a

Interrogação direta das pessoas, cujo comportamento se deseja

conhecer. Solicita-se informações a um grupo significativo de

pessoas acerca do problema estudado para, em seguida,

mediante análise quantitativa, obter as conclusões

correspondentes dos dados coletados (GIL, 1999, p.70).

A nomenclatura Survey vem da palavra inglesa traduzida como levantamento de

dados, e também pode ser considerada como um "método para coletar informação de

pessoas acerca de suas ideias, sentimentos, planos, crenças, bem como origem social,

educacional e financeira" (FINK e KOSECOFF, 1985, p. 13).

As principais características da pesquisa Survey de acordo com Pinsonneault e

Kraemer (1993) são:

a) descrição quantitativa de aspectos da população e informações padronizadas

sobre os objetos de estudo, sejam eles indivíduos, grupos, organizações, comunidades,

projetos, aplicações ou sistemas;

b) coleta de informações por meio de perguntas estruturadas e pré-definidas;

c) a informação é normalmente coletada sobre uma amostra da população;

As respostas foram registradas pelo sistema informatizado e depois analisadas

para essa pesquisa. As perguntas fechadas e algumas das abertas foram apresentadas em

forma de gráfico, a fim de proporcionar uma melhor visualização dos dados. As duas

últimas questões não são apresentadas em gráfico, uma vez que trazem respostas

subjetivas, com grande diversidade de opiniões, o que impossibilitou a categorização

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das mesmas. Estas são discutidas a partir dos próprios enunciados. Iniciamos o primeiro

bloco de respostas analisando o perfil dos participantes:

Gráfico 01: Idade dos participantes

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

A maioria dos respondentes é jovem, com menos de 40 anos, perfazendo

86,6% do total. Esse fato reflete a inserção recente desse profissional – o educador

surdo – no mercado de trabalho da área educacional. Se levarmos em conta o tempo de

promulgação do Decreto n° 5.626 de 2005, que ocorreu há dez anos, percebe-se que

houve um significativo aumento de pessoas surdas que se interessaram pela formação na

área educacional desde então.

Segundo dados do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

Anísio Teixeira) de 2013, o número de surdos que se matricularam no ensino superior

nos últimos 10 anos vem aumentando consideravelmente, como é possível visualizar no

gráfico a seguir:

25 a 30 31 a 35 36 a 40 41 a 45 46 a 50 51 a 55 56 a 60

7

10

9

2

1

0

1

Idade dos participantes - Total: 30

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Gráfico 02. Alunos matriculados na Educação Superior com surdez, deficiência

auditiva e pessoas com deficiência no Brasil (2003-2013)

Fonte: MEC/INEP (2013).

O dado acima do INEP não se restringe a estudantes matriculados na área

educacional (Pedagogia e Licenciaturas), mas ao ensino superior de modo geral (todos

os cursos de graduação). O aumento geral de matrículas também é um reflexo do

Decreto n° 5.626 de 2005, uma vez que este obriga a presença de intérpretes no

processo educacional de alunos surdos, o que tem possibilitado seu acesso e

permanência no ensino superior.

Diante dos números apresentados pelo Censo de Educação Superior

de 2003 a 2013, é possível notar que houve um expressivo

crescimento do acesso da população com deficiência a esse nível de

ensino (século XX), porém, ainda é incipiente quando comparado com

o total de matrículas existentes. A matrícula de surdos e deficientes

auditivos também trilhou nessa linha de crescimento exponencial, e,

apesar de timidamente, avançou percentualmente mais que o total

geral de matrículas e de pessoas com outras deficiências (ROCHA,

2015, p. 29).

Outra inferência que podemos fazer sobre a faixa etária preponderante entre os

participantes é de que por terem sido convidados pela pesquisadora, a maioria deles faz

parte do grupo de contato ou convivência da mesma, tendo, portanto, uma idade

semelhante. O mesmo fato pode explicar a predominância de sujeitos residentes no

Estado de São Paulo (43%), local onde reside a pesquisadora. Esse dado pode ser

visualizado no gráfico a seguir:

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Gráfico 03: Estado em que residem os participantes

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Ainda no bloco de questões sobre o perfil, foi questionado aos participantes, em

que idade aprenderam Libras.

Gráfico 04: Idade em que aprendeu Libras

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

O gráfico revela um importante dado: dos participantes da pesquisa, 63%

aprenderam Libras na infância, até os 9 anos. Diversos pesquisadores (SACKS, 2010;

MG PE PR RJ RS SC SP

6

1 3

1

4 2

13

Estado de residência Total: 30

1 a 3 4 a 6 7 a 9 10 a 12 13 a 15 16 a 18 Acima de19

8

6

5

0

3 3

5

Idade em que aprendeu Libras - Total: 30

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SKLIAR, 1997; MOURA, 2000; LODI e LACERDA, 2009; SOUZA, 1998;

QUADROS, 1997; entre outros) têm apontado a importância da aquisição da Libras o

mais cedo possível pela criança surda, uma vez que é a língua que pode possibilitar o

desenvolvimento social e cognitivo da criança.

Num contexto de interlocução favorável, a criança descobre a palavra

e vai percebendo a linguagem como um processo dinâmico, pleno de

múltiplos sentidos e significados. Assim, muito nova a criança ouvinte

é colocada na “ordem do discurso”. O interlocutor adulto colabora

para que a linguagem da criança flua e lhe permita atitudes discursivas

que a levem a aprender a identificar aspectos importantes da língua

que ela irá se apropriar. Contudo, os surdos, em geral, têm pouca

oportunidade para este aprendizado, já que, na maioria das vezes, não

têm acesso à língua utilizada por seus pais (ouvintes), e têm seu

contato com a língua de sinais, em geral, bastante postergado. Assim

sendo, a criança surda vai interagindo, no decorrer de sua infância,

com inúmeras pessoas, buscando diferentes modos de comunicação.

Ela se comunica basicamente com ouvintes, porém, mais cedo ou mais

tarde, acaba surgindo uma possibilidade de interação com um surdo

que utiliza a língua de sinais e a criança surda, então, entra em contato

com essa língua. A língua de sinais permite a ela significar o mundo e

a si própria, já que essa tem papel constitutivo na subjetividade. Nesse

sentido, quanto mais tardia a aquisição, mais comprometido pode ficar

o desenvolvimento do sujeito (LACERDA, 2004, p 67).

Chama a atenção o fato de se ter nesse grupo um predomínio de sujeitos que

adquiriam a Língua de Sinais na infância, pois muitos estudos apontam que a aquisição

da Libras ocorre em idade tardia no Brasil (LACERDA, 1998; QUADROS, 2005;

NADER e NOVAES-PINTO, 2011). O que, então, ocorre de singular nesse grupo de

sujeitos? Teria a experiência de aquisição da Libras na infância mobilizado esses

sujeitos a escolher a profissão de educadores? Podemos inferir que a incorporação da

Língua de sinais ainda quando criança fez com que realmente essa fosse sua língua

natural na qual as significações sobre o mundo foram tecidas e, portanto, suas relações

afetivas se desenvolveram a partir dessa língua visual, direcionando seu desejo para a

escolha profissional.

Já o outro bloco de sujeitos que diz ter aprendido a língua tardiamente, são 11

sujeitos. Desses, 6 disseram que aprenderam Libras na adolescência, entre 13 e 18 anos.

A adolescência é o momento em que os indivíduos adquirem autonomia e passam a

buscar outras figuras identitárias fora do espaço familiar. É muito comum que os jovens

surdos encontrem grupos de surdos sinalizantes, mesmo quando a família escolheu o

modelo de educação oralista, e nunca tivessem tido contato antes com outros surdos. A

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pesquisa de Dalcin (2006) mostra que as pessoas surdas que aprenderam a Libras

tardiamente encontram nessa língua, por meio de grupo de surdos, uma sensação de

libertação da mente que estava aprisionada. A autora relata:

A vida mudou para Pedro, Maria e Janice depois que eles iniciaram o

contato com a comunidade surda e com a língua de sinais. Relataram

que ficaram muito “emocionados” ao descobrir que havia outros

surdos além deles, pois acreditavam que eram os únicos no mundo.

Afirmaram que, antes de adquirir a Libras, não sabiam de nada, não

compreendiam nada, eram “zero” como expressam através da Libras.

Após a entrada na comunidade surda, o mundo se abriu, eles

começaram a interagir com a sociedade através da escola, do trabalho

e dos contatos sociais. Passaram a ter acesso às notícias do mundo,

bem como a conhecê-lo (DALCIN, 2006, p. 205).

Essa história é muito comum na vida dos surdos devido à falta de escola bilíngue

ou família que escolhe a abordagem oralista.

Quando questionados sobre o lugar onde aprenderam Libras, obtiveram-se as

seguintes respostas:

Gráfico 05: Local em que aprendeu Libras

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Alguns participantes responderam a essa questão com mais de uma resposta,

como por exemplo: “família e escola” ou “escola e família”, e por essa razão o número

de respostas excede o número de participantes. Entre aqueles que responderam “outros”

Amigos Família Escola Igreja Outros

9

6

13

1

6

Local onde aprendeu Libras

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encontramos as seguintes respostas: fonoaudióloga (2 respostas), cursos (2), televisão -

janela de Libras (1) e centro de reabilitação (1).

Fazendo um refinamento dos dados, separamos em dois grupos:

a. Aqueles que adquiriram a Libras até os 9 anos

b. Aqueles que adquiriam a Libras após os 9 anos

Nesses dois subgrupos, cruzamos os dados da questão sobre a idade de aquisição

linguística com o dado sobre o local em que aprendeu (família, escola, amigos, igreja e

outros). O resultado desse cruzamento apontou que aqueles que aprenderam Libras em

idade inferior a nove anos tiveram essa aquisição, em sua maioria, dentro da família e

da escola. Por outro lado, aqueles que adquiram Libras em idade posterior aos nove

anos, o processo ocorreu com amigos, em sua maioria, devido ao encontro e contato

com os outros surdos, que se identifica e tem afinidade pelo sentimento e pela sensação

de pertencimento. Como define Strobel (2007), o encontro entre surdos é como se fosse

um “jogo de espelhos”. Esses dados podem ser visualizados nos gráficos a seguir:

Gráfico 06 – Local de aquisição da Libras Gráfico 07 – Local de aquisição de Libras

(< 9 anos) (> 9 anos)

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Muitos surdos relatam que quando descobrem a Libras, começam a

aproximação de contato com os amigos e se “afastam” da família. Na pesquisa de

Dalcin (2006), já citada anteriormente, a pesquisadora afirma

Escola 52%

Família 22%

Outros 13%

Amigos 9%

Igreja 4%

LOCAL DE AQUISIÇÃO DA

LIBRAS (< 9 ANOS) Escola

8% Família

8%

Outros 25%

Amigos 59%

LOCAL DE AQUISIÇÃO DA

LIBRAS (> 9 ANOS)

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Além de exaltarem a língua de sinais, os sujeitos pesquisados

relataram a importância da comunidade surda em suas vidas. Todos

preferem estar entre os surdos a estar com os ouvintes (mesmo os

familiares), pois dizem que surdo com surdo “combina mais”. As

horas de lazer e as festas comemorativas são vivenciadas em geral,

com os amigos surdos. Embora se sintam dessa maneira, há o

reconhecimento da importância da família quando relatam que passam

a festividade do Natal com ela por acharem que essa comemoração é

familiar. Entretanto, passam o Ano Novo e outras festividades com os

amigos surdos. As festas dos ouvintes são descritas como “chatas”,

pois não conseguem participar das conversas (DALCIN, 2006, p.

209).

Passemos, agora, ao processo de formação educacional desses sujeitos.

Gráfico 08: Local em que estudou na educação básica

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

O gráfico 8 teve mais de trinta respostas porque os participantes estudaram em

diversos tipos de escolas, sendo que 21 participantes estudaram em escola regular na

maior parte do tempo de sua vida acadêmica. Dos participantes, oito responderam que

estudaram em escola inclusiva, e que tinham intérpretes de Libras em sala de aula.

Somando os participantes que responderam que estudaram em escola especial e

bilíngue, temos 20 respostas. Muitas escolas que eram denominadas de escola

“especial” tiveram suas nomenclaturas modificadas a partir da década de 90 para escola

bilíngue porque a abordagem bilíngue começou a ganhar força no Brasil. Exemplos

dessas mudanças ocorreram em escolas como Hellen Keller, DERDIC, Santa Teresinha

Regular Inclusiva Especial Bilingue

21

8

11 9

Tipo de escola em que estudou na educação básica

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e outras. Essas mudanças, por exemplo, foram oficializadas no município de São Paulo

com o Decreto n° 52.785 de 201130

.

Art. 1º. Ficam criadas as Escolas Municipais de Educação Bilíngue

para Surdos – EMEBS na Rede Municipal de Ensino, vinculadas à

Secretaria Municipal de Educação, destinadas acrianças, jovens e

adultos com surdez, com surdez associada a outras deficiências,

limitações, condições ou disfunções, e surdo-cegueira, cujos pais do

aluno, se menor, ou o próprio aluno, se maior, optarem por esse

serviço (SÃO PAULO, 2001, s/p).

Este decreto também criou duas escolas pólos no município de São Paulo.

Art. 11. Além das escolas existentes, a Secretaria Municipal de

Educação poderá instituir Escolas Municipais de Educação Bilíngue

para Surdos em Unidades-Polo, de acordo com as demandas regionais.

Parágrafo único. A organização das Unidades-Polo observará as

normas estabelecidas pela Secretaria Municipal de Educação (SÃO

PAULO, 2011, s/p).

Assim, muitas pessoas que responderam podem ter se referido a escolas

especiais que se transformaram em bilíngues na atualidade. Embora tenham aqui sido

apresentadas as legislações da cidade de São Paulo, muitas mudanças também

ocorreram em outros Estados do Brasil como Rio Grande do Sul, Minas Gerais,

Pernambuco e outros.

As questões seguintes são direcionadas à formação profissional. Sobre a

formação em nível superior, obtivemos as seguintes respostas:

30

Disponível no link: https://servidoresjt.wordpress.com/2011/11/11/decreto-n%C2%BA-52-785-de-10-

de-novembro-de-2011/

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Gráfico 09: Formação em nível superior

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

O gráfico 9 sobre a formação aponta que 90% dos participantes possuem

formação em nível superior, ou seja, apenas um participante tem formação até o ensino

médio. Este participante fez também um curso de formação para instrutor de Libras.

Quando questionados sobre qual cargo ocupam nas instituições de ensino que

trabalham, os participantes apresentaram as seguintes respostas:

Gráfico 10: Cargo

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Não Sim Não respondeu

1

27

2

Formação em nível superior - Total: 30

Professor Instrutor Outros

19

12

2

Cargo

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83

Os dois gráficos acima apontam para uma contradição: Se 90% tem formação

superior, o que justificaria serem contratados como instrutores?

Cruzamos estes dados do cargo de professor com o nível escolar de atuação

dos educadores e chegamos à seguinte constatação: Dos 14 participantes que

responderam que foram contratados como “professores”, 11 deles atuam no ensino

superior (exclusivamente ou em dois empregos, sendo no ensino superior e também na

educação básica). Apenas 3 participantes que trabalham exclusivamente na educação

básica foram contratados com a nomenclatura de professores.

Gráfico 11: Cargo de professor

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Já aqueles que foram contratados como instrutores, a maioria (5 entre os 7 que

apresentaram essa resposta) atua na educação básica, como podemos verificar no

gráfico abaixo:

Educação Básica +Superior

Educação Superior Educação Básica

4

7

3

Cargo de professor

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Gráfico 12: Cargo de instrutor

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Há ainda aqueles que responderam que são contratados nos dois cargos

(professor e instrutor), como se pode visualizar no gráfico abaixo. Nessa resposta é

possível inferir para a maioria dos respondentes que o cargo de professor se dá no

ensino superior e de instrutor na educação básica.

Gráfico 13: Cargo de professor + instrutor

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Educação Básica +Superior

Educação Superior Educação Básica

1 1

5

Cargo de instrutor

Educação Básica +Superior

Educação Superior Educação Básica

3

1 1

Cargo de professor + instrutor

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A que conclusões chegamos na análise dos três gráficos anteriores. Ainda é

frequente a contratação na educação básica de profissionais surdos graduados na função

de “instrutores”. Essa situação é muito grave e revela uma desqualificação do

profissional surdo em relação aos colegas ouvintes. Assim como já discutido no capítulo

3, há uma descaracterização da figura do docente surdo. Embora as instituições de

ensino contratem esse profissional, por determinação do Decreto n° 5.626 de 2005 ou

por considerar que esse facilita o trabalho com as crianças surdas, o nome que lhe é

atribuído o coloca sempre em uma situação de subalternidade em relação ao ouvinte.

Ressaltamos que a nomenclatura ‘instrutor’ raramente é utilizada na contratação do

profissional surdo no Ensino superior (1 caso entre os participantes), provavelmente

porque esse cargo não exista entre o corpo docente de uma faculdade ou universidade.

Sobre a formação em nível superior obtivemos as seguintes respostas:

Gráfico 14: Curso de formação em nível superior

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Observamos que 10 participantes responderam que se formaram em Letras

Libras, o que representou um empate com as respostas dos participantes que formaram

em outras áreas, como matemática, serviço social, psicologia, ciências biológicas.

Observamos também que 26% dos participantes responderam que se formaram em

pedagogia e dois participantes não responderam por não possuir graduação. O que se

destaca é que há um número significativo de profissionais que não tem formação

Pedagogia Letras Libras Outros Não respondeu

8

10 10

2

Curso de formação em nível superior Total: 30

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86

específica para ministrar a disciplina de Libras e nem para atuar no ensino na educação

básica. Cruzando os dados da resposta sobre o curso em que se formou com o de nível

em que os participantes lecionam, observa-se que 18 participantes responderam que dão

aula em ensino superior. Isso significa que não apenas aqueles que formaram em Letras

Libras (que totalizam 10 sujeitos) lecionam no ensino superior, mas graduados em

outros cursos também. Quando dizem que formaram em Letras Libras, estes estudaram

em pólo com parceira da UFSC, já que o Estado de São Paulo não possui universidade

de graduação própria. Cruzamos com o gráfico de Estados dos participantes, observa-se

que a maioria dos participantes que não são do Estado de São Paulo responderam que

formaram em Letras Libras devido à localização de polo com a parceira da UFSC. Já no

Estado de São Paulo, pode-se também observar que os cursos de Letras e Pedagogia são

da área de licenciatura, que são perfis dos profissionais formados para a docência, como

definem Dall’Alba e Sarturi (2014):

O Curso de Letras/Libras foi o pioneiro, que se expandiu desde 2006

nas regiões brasileiras, sendo um destaque da comunidade surda

brasileira em suas bravas lutas histórica, políticas e culturais. Portanto,

o movimento surdo alcançou inúmeras conquistas importantes após a

Lei nº 10.436/2002, como a aprovação da Graduação em

Letras/Libras, implementada pela UFSC. Outro fator relevante que

ainda requer novos movimentos é a ampliação de vagas nas

Universidades Federais para o cargo de professor da disciplina de

Libras, sendo a exigência mínima a formação na Licenciatura em

Letras/Libras, os quais habilitam o profissional na Língua de Sinais e

seus elementos constitutivos de gramática (DALL’ALBA, SARTURI,

2014, p. 11).

Percebe-se, então, o crescimento gradativo do número de surdos formados em

nível superior, o que traz aspectos positivos para a comunidade surda e para a sociedade

brasileira. De acordo com Albres (2014), no início da década de 90, a ampliação das

instituições de ensino que começaram a adotar a educação bilíngue impulsionou a

necessidade de formação de profissionais para ensinar Libras. No entanto, essa

formação só se consolidou com a promulgação da Lei n° 10.436 de 2002 e do Decreto

n° 5.626 de 2005

Então, ser surdo e fluente era o requisito indispensável, mas a

ampliação dos interessados e a percepção de que a Libras merecia ser

ensinada de maneira mais adequada fez emergir o PNAES do MEC

em 2001, visando formar um grupo com preparo mais específico.

Estas experiências ajudam os surdos a terem mais clara a necessidade

de formação e fomentam a inserção deste tema no Decreto no

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5.626/2005 (sobre a formação em nível superior e que aponta para a

obrigação do estado em fomentar isso) resultando em curso de

formação superior (Letras Libras). O que antes era falado,

reivindicado, se torna real. As novas experiências geram o aumento

das exigências. Assim, um movimento político e ideológico vai

compondo suas marcas na história pela participação social e pela

expressão na vida real (ALBRES, 2014, p. 54).

A partir disso, cresce de forma gradativa o número de surdos que tem acesso ao

ensino superior, trazendo aspectos positivos. Desse fato decorrem fatores como o

reconhecimento do status de língua para a língua de sinais, o desenvolvimento de

propostas de educação bilíngue de qualidade para surdos e "um momento histórico no

qual políticas públicas de inclusão vêm aos poucos aumentando o acesso e a

participação ativa de pessoas com necessidades especiais em diferentes contextos

sociais" (BISOL et al., 2010, p.2).

Com base no gráfico a seguir analisamos as respostas as perguntas abertas.

Nessas questões os participantes foram perguntados sobre suas experiências

profissionais. Para a análise das questões abertas, criamos uma categorização das

respostas, a partir de temáticas comuns. Cada participante foi designado com uma letra

maiúscula. Nem todos responderam a todas as perguntas. Sobre o motivo da escolha da

profissão de educador, obtivemos as seguintes respostas:

Gráfico 15: Escolha da profissão

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Por que gosto

Por que sou surdo

Vocação e oportunidade

Ajuda e preocupação com pessoas surdas

Sem resposta

10

3

6

8

3

Escolha da profissão - Total: 30

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De forma geral, os participantes responderam que gostam da profissão devido à

sua formação. Algumas das respostas foram selecionadas para mostrar a explicação do

motivo da escolha da profissão:

Participante A: “Porque é uma profissão no qual me identifiquei, trabalhar

com arte e cultura, além de instrutor de Libras. No qual eu valorizo muito a Libras

em todos lugares e luto para comunidade surda”.

Participante B: “Sempre gostei da área educacional e pelo fato de ser surda

filha e sobrinha de surdos me motivou aprofundar os conhecimentos sobre a

surdez, a libras e o universo psicossocial da pessoa surda, com isso veio o meu

desejo de pesquisa, divulgação e apoio no entendimento da sociedade em relação à

pessoa surda e sua língua”.

A categoria de “ajuda e preocupação com pessoas surdas” tiveram oito respostas

pelos participantes surdos, o que caracteriza o altruísmo, isso explica a vontade de

ajudar as pessoas e que não tiveram acesso à língua de sinais quando eram crianças na

educação escolar. Goés (1999) enfatiza a importância da construção de subjetividade na

criança surda quando esta tem contato com a língua de sinais. Essa interação é

importante para a sua aquisição da língua que ocorre no processo dialógico, trocando

ideias, sentimentos, compreendendo o que se passa ao seu redor.

Participante C: “Pela falta professora usuária de Libras e tive dificuldade nas

aulas com ouvintes então decidi ser professora e motivadora para crianças surdas

que precisam muito de professores surdos”.

Esse sujeito relata sua história de sofrimento da educação, por isso ele quer

passar o seu modelo para as outras crianças surdas. Muitas pessoas surdas passaram por

experiências de sofrimento no seu processo educacional, como relata Strobel (2008):

[...] Uma criança surda sentada de frente para o professor com os

olhos atentos a qualquer movimento dos lábios, ansiosa e preocupada

sem entender o professor, que muitas vezes fazia exercícios

fonoarticulatórios exaustivos na tentativa ansiosa de realizar de uso da

língua de sinais, ela era como uma marionete do professor, um

verdadeiro estresse e perda de motivação para a aprendizagem real e

participação ativa (STROBEL, 2008, p.53)

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A preocupação e cuidado com a nova geração de surdos é um sentimento

comum entre surdos adultos, que buscam evitar que essas crianças vivenciam as

angústias, medos e sofrimentos pelos quais passaram. Quadros (2006) diz

Desse modo, só surdos sonham com espaços em que a língua de sinais

seja a língua de instrução, em um ambiente cultural e social que

favoreça o fortalecimento das heranças surdas para a consolidação de

um grupo que se diferencia a partir da experiência visual

(QUADROS, s/d, p. 4).

Esse fator leva a consideração de que muitos adultos surdos que não tiveram

acesso à língua de sinais salientarem a importância da presença do professor surdo em

sala de aula, como afirma Quadros (1997)

A presença de surdos adultos apresenta grandes vantagens dentro de

uma proposta bilíngue. Primeiro, a criança, tão logo tenha entrado na

escola, é recebida por um membro que pertence à sua comunidade

cultura, social e linguística; assim, ela começa a ter oportunidade de

criar a sua identidade. Segundo, essa criança começa a adquirir a sua

língua natural. Tais vantagens são imprescindíveis para o sucesso da

proposta bilíngue. Assim, tornar-se-á possível o ensino de uma

segunda língua, caso contrário, a criança não terá chances de

apresentar um domínio razoável da língua portuguesa (QUADROS,

1997, p.30).

Participante D: “Eu ensinei Libras no ensino fundamental e eu adoraria ver os

alunos surdos e ouvintes Libras aprendizagem. Eu também gosto de influenciá-

los a compreender a cultura surda e história. Quero mostrar-lhes que os surdos

é capaz de qualquer coisa, exceto ouvir. Uma vez que, eu sou Surdo e eu quero

ser os seus modelos”.

A categoria de “ser surdo” nos incita algumas reflexões. O fato de ser surdo não

significa ser da mesma “cultura surda”, já que há diferentes experiências de ser surdo.

Segundo Bastos (2013, p. 43): “[...] não existe surdez, mas surdezes; não há um surdo

universal, mas pessoas surdas com suas experiências e subjetividades forjadas a partir

de diferentes processos de interiorização” A resposta do participante pode ser entendida

como um espaço de movimentos e lutas entre diferentes grupos sociais. Embora haja

diferentes vivências de ser surdo, algo os une: a experiência visual. Quadros (2003)

esclarece a questão da cultura surda quando diz que:

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Essa cultura é multifacetada, mas apresenta características que são

especificas, ela é visual, ela traduz-se de forma visual. As formas de

organizar pensamento e a linguagem transcendem as formas ouvintes.

Elas são de outra ordem, uma ordem com base visual e por isso tem

características que podem ser ininteligíveis aos ouvintes. Ela se

manifesta mediante a coletividade que se constitui a partir dos

próprios surdos (QUADROS, 2003, p.6).

Portanto, a resposta do participante pode ser relacionada à afinidade que tem

com a experiência visual e da própria vida do sujeito surdo.

Uma das questões abertas perguntou se o participante escolheu a profissão de

educador devido à facilidade de encontrar vagas no mercado de trabalho. Vejamos as

respostas:

Gráfico 16: Facilidade de vaga no mercado de trabalho

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

As respostas para “sim” e “não” encontram-se empatadas em relação à facilidade

de vaga no mercado de trabalho. Alguns participantes manifestaram suas impressões de

que a educação de surdos teve uma “melhora” após a criação da Lei Federal n° 10.436

de 2002 e do Decreto n° 5.626 de 2005 quando expandiu a oferta de curso de graduação

de Letras Libras, Pedagogia Bilíngue, aumentando de forma gradativa o mercado de

trabalho para surdos, como afirma o participante E:

Sim Não Depende Sem resposta

12 12

2

4

Facilidade de vaga no mercado de trabalho - Total: 30

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Participante E: “Para mim foi tranquilo, mas hoje em dia melhorou muito o

mercado de trabalho para os surdos porque na época era muito difícil para os

surdos”.

Os participantes que responderam “não”, disseram que não houve melhora no

mercado de trabalho, mesmo com as legislações vigentes. Outros relatos também

mostram que há “ocupação” dos ouvintes no espaço de mercado de trabalho de ensino

de Libras.

A seguir, algumas das respostas dos participantes que responderam “não”:

Participante B: “Não, não acredito na facilidade pois a sociedade

prefere o ouvinte intérprete ao professor/surdo devido a comunicação”.

Participante F: “O mercado de trabalho é ainda muito pequeno,

insignificante e não valoriza o profissional surdo”.

Participante D: “Sim, mas grande problema com as ouvintes fará de

tudo para levar a nossa profissão de distância. Se as ouvintes respeitar profissões

surdos no mercado de trabalho, então as pessoas surdas podem ver a sua melhor

oportunidade e seu futuro também”.

Participante G: “Eu acho que não, não vejo nenhuma vaga no mercado

de trabalho. Muito pouco que tem vaga”.

Participante H: “Depende, tem vagar ou não... pois aumento surdos quer

ser professores e o problema os ouvintes entrar do nosso lugar dos surdos”

Na pergunta a seguir, os participantes responderam se percebem uma maior

valorização profissional do surdo na atualidade:

Gráfico 17: Valorização da profissão

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Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Os participantes revelaram que perceberam uma melhoria significativa na

valorização profissional devido à expansão do curso de graduação de Libras e ao

reconhecimento da profissão, o que passou a ser um marco histórico para a comunidade

surda, porém ainda há obstáculo. As pessoas que responderam sim acreditam na

valorização do trabalho do surdo. Mesmo com a expansão de cursos de graduação e pós

em Libras, ainda se encontram falhas e barreiras na profissão da pessoa surda.

Participante A: “Acredito que sim. Penso que qualquer surdo que tenha

pelo menos um título de graduação seja contratado como professor em

qualquer instituição e não como instrutor ou monitor como acontece em

alguns casos que presenciei”.

Uma participante alerta que a visibilidade ainda é pouca e que até para ouvinte a

valorização também é pouca.

Participante C: “No papel sim, porém as pessoas não levam a sério”.

Participante B: “Em parte sim, porém é recente a visibilidade do professor

surdo, há obstáculos a serem enfrentados, o primeiro dele é desmitificar as

ideias que os ouvintes ainda têm em relação ao professor surdo e o segundo

a barreira comunicacional no quesito adaptação a qual a maioria das

escolas/instituições preferem surdo oralizados e não sinalizante”.

Sim Não Nem sempre Sem resposta

16

7

4 3

Valorização da profissão - Total: 30

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Participante J: “Depende local, pois tem um monte ouvinte esta usando

profissional dos surdos”.

Participante K: “Está sendo difícil ultimamente, pois até para ouvintes,

este cargo de professor não está sendo muito valorizada socialmente,

imagine então para pessoa surda no mercado? É triste ver que ainda

estamos sendo vista como "incapacidade" para dar aula. Devemos ser

tratadas iguais na sociedade, tanto para ouvinte quanto para surdo. Além

disso, é através da educação que nós aprendemos, assim devemos valorizar

a profissão de professor mesmo que o professor seja surdo, ou seja,

igualdade”.

Quando questionados sobre quais as melhorias que almejam para a educação

dos surdos, os participantes responderam:

Gráfico 18: Melhoria na educação de surdos

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

Pelo gráfico podemos perceber que as categorias “estrutura curricular,

metodologia e formação” e a de “falta de escola bilíngue” estão próximas em número de

respostas, o que significa há falta de estrutura para atender a demanda dos alunos. Há

crítica sobre a escassez de formação, inclusive para ouvinte, pois muitos não sabem

Libras. Se estes profissionais não sabem, que falta fazem os professores surdos? Quanto

Estruturacurricular,

metodologia,formação

Falta de escolabilíngue

Política Sem resposta

12 10

5 3

Melhoria na educação de surdos - Total: 30

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a categoria de “política”, há forte tendência à educação inclusiva, o que leva à evasão e

ao fracasso escolar por parte de alunos que não conseguem acompanhar as aulas,

mesmo tendo intérprete de Libras na sala de aula. Fernandes (2006) denuncia essa

situação:

O que temos observado é que a proposta de educação bilíngue em

curso é desenvolvida apenas no contexto das escolas especiais, pois as

escolas regulares sequer cogitam a diferença linguística dos surdos e,

quando o fazem, a única preocupação efetiva que se manifesta é a

ausência de intérpretes, já que acreditam ser delas a responsabilidade

da educação dos alunos surdos (FERNANDES, 2006, p. 4).

Participante B: “Estrutura curricular, metodologia adequada e regulamentada,

pois não basta ser bilíngue a proposta, é preciso reformular o pensamento

educacional como todo e estar bom senso com a política da inclusão e assim

ambas caminhem juntas: escola bilíngue para surdos e escola inclusiva.

Qualificar o professor ou instrutor surdo reconhecendo que parte dele a

premissa da qualidade do ensino-aprendizagem do alunado surdo”.

Participante L: “Principalmente aos professores ouvintes que dominam pouco

ou mal na instrução em libras para surdos”.

Participante K: “Abrir mais escolas bilíngues para surdos, está na lei, por

tanto ainda é fraca e é por isso estamos lutando. Sinto falta também de por mais

professores SURDOS nas escolas bilíngues”.

Participante M: “Sim experiência profissional, 3 anos atrás proposta educativa

bilíngue de Escola Municipal Osvaldo Veloso, responsabilidade CAEE (Centro

atendimento Educacional de Especializado) de Sul orientam todos profissionais

(servidor, professores, orientadores e diretores. Mas SEE muito difícil, é

política. A favor inclusão. Tenta negociar proposta bilíngue”.

Participante N: “Primeiramente falta muita coisa para melhorar, não só com a

educação, também com a comunicação e interação com os alunos surdos. E

essa comunicação e interação não é somente com os alunos ouvintes, mas

também com os professores que leciona a cada disciplina com os seus alunos.

Melhorar também a metodologia de aula para alunos surdos, porque o ensino é

completamente diferente a dos alunos ouvintes”.

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Participante O: “Precisa melhorar muito, adaptar os materiais pedagógicos e

os professores ouvintes fazerem mais cursos para aprofundar mais sobre libras

e como ensinar os surdos”.

Participante F: “Precisa melhorar a proposta educativa bilíngue, a

qualificação dos profissionais para sejam fluentes em Libras e ausência de

materiais didáticos”.

Participante P: “Eu trabalho dentro na escola, quase 4 anos, eu sinto falta que

preciso aumentar professores surdos trabalhar juntos. Acredito os alunos

surdos são fortes e aprenderam rápido”.

Uma vez que muitos dos participantes são contratados como instrutores, apesar

de serem graduados, questionamos qual seria, para eles, a diferença entre instrutor e

professor, ao que responderam:

Gráfico 19: Diferença de professor e instrutor

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

A categoria “formação” foi a mais citada em termos diferença da profissão de

professor e instrutor. Isso pode se referir ao acesso à informação que se obtém nas

formações seja em pedagogia ou licenciaturas. A categoria “didática” foi citada, talvez

por perceberem a diferença de conhecimento didático que tinham antes de se graduar e a

que adquiram depois de se graduar. Os participantes que responderam à essa pergunta

com a resposta “é mesma coisa” são os não possuem graduação, por isso desconhecem

Formação Didática emetodologia de

ensino

Mesma coisa Sem resposta

19

5 2 4

Diferença de professor e instrutor - Total: 30

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os benefícios e conhecimentos significativos que uma graduação pode oferecer. Veja as

respostas semelhantes:

Participante Q: “Professor é para ser formado em ensino superior. Instrutor é

para ser formado em ensino médio”.

Participante R: “SIM, É DIFERENÇA. O professor possui o diploma

universitário, e o instrutor não”.

Participante I: “Para mim, a função de professor é mais valorizada que a de

instrutor, pois geralmente professor possui graduação e às vezes pode ter mais

preparo e segurança no ensino em relação ao instrutor. Além disso, parece que

instrutor é contratado a qualquer momento sem maior preocupação com a sua

formação e experiência (apenas verificar se é surdo e sabe Libras com

fluência), enquanto as do professor são analisadas e avaliadas para posterior

ser aprovado a dar aulas”.

Participante B: “Nada mais do que status, já que a definição professor é para

os graduados e para o instrutor até ensino médio, porém ressalto na

importância da experiência teórica e prática independe do termo assim como é

para o intérprete cuja lei define livre atuação a partir do ensino médio e o que

vale é a fluência na Libras. Portanto digo que o Surdo para dar aula de libras

deve ter qualificações, conhecimentos da área em que atua ou vai atuar.”

Participante K: “Professor é aquele que já pode dar aula em todos os níveis de

educação, possui diploma de graduação e instrutor não pode dar aula em todos

os níveis, apenas cursos livres, empresas e entre outras instituições, possui

certificado de instrutor”.

Participante S: “Diferença Professor já estudou pedadogia. Instrutor ja

estudou proprio libras, curso, prova de Libras e estudar simples”.

Participante T: “Instrutor é para ajudar os alunos entender o significado dos

sinais, coisa básica. Professor é para explicar melhor, mais experiencia das

disciplinas e ajudar a desenvolver o aprendizado dos alunos”.

Participante H: “Eu era instrutor para ensinar crianças surdas porque eu não

aprendi ser profissional como eu sei como ensinar melhor para eles porque é

minha experiencia! depois eu me formei letras libras é mais experiencia

significa é já sou professor!”.

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Participante D: “Professor ensinar todos os cursos e instrutor ajudou o

professor. Instrutor também se concentrar em uma área. Os instrutores também

não foram autorizados como professores têm”.

A última questão que analisamos refere-se ao sentimento dos participantes em

relação ao fato de terem sido contratados como instrutores, mesmo após terem se

formado no nível superior. O gráfico mostra a resposta se sentiram inferiorizados.

Vejamos as respostas:

Gráfico 20: Contratado como instrutor

Fonte: Dados coletados pela pesquisadora

A maioria respondeu que se sentiu inferiorizada quando foi contratada como

instrutor, isso mostra a desvalorização da profissão. Percebem a diferença no ambiente

do trabalho, principalmente quando se relaciona com os outros profissionais.

Participante Q: “Sim, trabalhei no CAS e depois passei no concurso federal, é

muito diferente porque dei aulas para surdos na escola e dou aulas para

ouvintes no ensino superior. Agora tem uma aluna surda que estuda no curso de

Letras-Libras onde trabalho”.

Sim Não Nunca fuicontratado

Depende Sem resposta

16

5

1 3

5

Contratado como instrutor - Total: 30

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Participante V: “Após formação de Letras-Libras, sou professora e me sinto

mais preparada para dar respostas correta aos alunos e ministrar aula bem

estrutura. Como instrutor, me sinto mais despreparada”.

Participante T: “Sim, isso foi umas 2 vezes, me senti como se nao fosse feito a

faculdade. Tem as pessoas acham que a profissão instrutor é como professor,

infelizmente! Eles precisam entender que são 2 coisas diferentes”.

Participante F: “Sim, me senti sem valorização. Tanto esforço para me

preparar profissionalmente e depois não ter a oportunidade adequada de

trabalho”.

Participante H: “sim foi, e depois fiquei feliz e senti bem palavra ser

professora”.

As respostas dos participantes vão ao encontro do que vem sendo discutido nos

capítulos anteriores dessa pesquisa. Embora haja um aumento de possibilidades de

trabalho na esfera educacional para profissionais surdos, isso não revela uma real

mudança de paradigma. O período de hegemonia da abordagem oralista ficou para trás e

os atuais modelos preconizam o uso da língua de sinais na educação das crianças surdas.

Essas mudanças se constituem rupturas com um modelo educacional que gerou tanto

sofrimento ao povo surdo, e só foram possíveis devido às lutas dos próprios surdos.

Porém o que se vislumbra na atualidade é uma mudança de formato das propostas

educacionais sem uma valorização do surdo como educador. A manutenção do

qualificativo instrutor na contratação de profissionais graduados e pós-graduados revela

essa desqualificação.

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CAPÍTULO VI

ANÁLISE DAS OBSERVAÇÕES:

O QUE É POSSÍVEL AFIRMAR SOBRE AS PRÁTICAS DOS

EDUCADORES SURDOS EM SALA DE AULA

Para a pesquisa de observação em sala de aula, foi utilizado o método qualitativo

de cunho interprepretativista a fim de entender, descrever e explicar, a partir dos

fenômenos sociais e culturais, o processo de formação do profissional surdo. Segundo

Spradley (1980), esse método se baseia na análise de grupos e/ou indivíduos e contribui

para o aperfeiçoamento das teorias que buscam compreender os fenômenos sociais. Para

a realização do método, a observação tem um papel fundamental no processo de registro

dos dados. Ela pode ser feita por meio de diário de campo na forma de relato, que

favorece a base para uma descrição e interpretação daquele contexto em que está

inserido. O pesquisador pode, ainda, utilizar outros instrumentos de pesquisa como

entrevista, questionário, gravação em vídeo e áudio, documentos e relatos para a

interpretação da observação em diversos ângulos. No caso dessa pesquisa, o

instrumento utilizado foi a observação e registro em diário de campo, seguindo os

princípios definidos por Trivinõs (2008), a saber: o ambiente natural como fonte direta

de dados e o caráter descritivo.

Moita Lopes (1996), explica que o interesse pela pesquisa interpretativista tem

sido cada vez maior, não só por representar um foco de investigação, mas por avançar

no tipo de método de pesquisa que pode ser mais apropriado à natureza subjetiva do

objeto das ciências humanas.

Logo, podemos considerar a necessidade de valermo-nos dos paradigmas

interpretativistas ao nos propormos focar a formação do profissional surdo no contexto

da sala de aula, ação que implica a pesquisa qualitativa.

Nesse sentido, Bortoni-Ricardo (2013 p. 34) expõe que:

Na pesquisa qualitativa trabalha-se com variáveis procurando

estabelecer uma relação entre elas. A variável dependente é a que é

explicada; a independente é a explicação. O pesquisador está

interessado em um processo que ocorre em determinado ambiente e

quer saber como os atores sociais envolvidos nesse processo o

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percebem, ou seja, como o interpretam (BORTONI-RICARDO, 2013,

p. 34).

Ancorado na citação da página anterior, Trivinõs (2008) define que os elementos

principais a serem considerados na pesquisa de cunho qualitativo-interpretativista são o

ambiente natural como no caso, a sala de aula, uma forma direta de coleta de dados e o

pesquisador como instrumento fundamental no processo de análise e reflexão. Desse

modo, a análise buscou interpretar os dados colhidos nas aulas de diversas disciplinas

que tinham a presença do profissional surdo (FLICK, 2009).

O relato e a análise da observação em sala de aula têm como objetivo analisar o

perfil do profissional surdo atuante em sala de aula, sua relação com os alunos e outros

profissionais e quais as estratégias utilizadas pelo mesmo. Pretendeu-se também refletir

sobre os reflexos de sua atuação na formação dos alunos surdos e ouvintes. Foram

considerados como critério de análise para a descrição: a) metodologia utilizada; b)

didática; c) comprometimento com o ensino; d) uso de materiais adaptados; e)

conhecimento.

Como se trata de pesquisa qualitativa, procurei estar em contato direto e

prolongado com o ambiente e a situação a ser investigada, realizando um delicado

trabalho de campo que totalizou 12 horas aproximadamente em cada escola presenciada.

Cada aula durava em média duas horas (das 8h às 10h).

Para seguir a esses pressupostos, procurando entender o contexto sócio histórico,

de abordagem interpretativista. Busquei interpretar os significados que os atores sociais

envolvidos no processo de formação, professor e alunos, conferem às suas ações.

A análise buscou interpretar os dados colhidos nas aulas de diversas disciplinas

que tinham a presença do profissional surdo: instrutor ou professor. As observações

foram realizadas no segundo semestre de 2016, quando assisti às aulas, anotando os

detalhes de cada uma e considerando as ações desenvolvidas pelos profissionais, pelos

alunos em cada contexto: espaço da sala de aula, participação de todos os alunos, ações

desenvolvidas pelos sujeitos participantes do processo e colaborações do ambiente

físico, humano, material.

Nesta etapa, procurei interpretar as ações ocorridas em sala de aula, levando em

conta o que presenciei, senti e compreendi nos contextos educacionais observados.

Os sujeitos participantes diretamente da pesquisa são os profissionais surdos na

área de diversas disciplinas de Libras, artes, contação de histórias e brincar de aprender.

Essa última disciplina é uma orientação de estudo dirigida por um professor surdo.

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Outros sujeitos, porém, foram analisados indiretamente, uma vez que a prática educativa

só pode ser observada na relação entre os atores educacionais. Portanto, são também

sujeitos indiretos da pesquisa: a) os alunos surdos do Ensino Fundamental I das escolas

privadas e públicas; b) os alunos ouvintes do Ensino Fundamental I; c) os profissionais

ouvintes que entram em cena para a docência no ensino bilíngue em algumas disciplinas

presenciadas pela pesquisadora.

Para a realização da observação, realizei dois encontros em cada escola,

previamente agendado com a coordenação da escola.

O principal material de análise desta pesquisa constituiu-se do conjunto de

anotação no campo de diário, das enunciações produzidas em sala de aula. Nesse

sentido, esse "olhar" investigativo atentou-se para os processos e as dinâmicas de

interações ocorridas na sala de aula.

A pesquisa de observação foi feita em três escolas, sendo duas públicas e uma

privada no Estado de São Paulo, em que estão inseridos os profissionais surdos.

Abaixo, segue o quadro descritivo dos sujeitos da pesquisa, sendo seis homens e duas

mulheres com nomes fictícios.

Sujeitos Função Formação Escola Disciplinas

João Instrutor Design e Pedagogia Tulipa Libras, suporte do professor

bilíngue;

Pedro Instrutor Letras Libras Tulipa Libras, suporte do professor

bilíngue;

Maria Professora Artes Visuais Girassol Artes;

José Professor Letras Libras Girassol Libras;

Francisco Professor Pedagogia Girassol Contação de história;

Ana Professora

auxiliar

Pedagogia Girassol Informática e Jardim I e II;

Joaquim Professor Desenho Industrial e

Pedagogia

Girassol Brincar de aprender;

Paulo Instrutor Letras Libras Cravo Libras, suporte do professor

bilíngue;

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Quadro 08 – Sujeitos da pesquisa de observação em sala de aula

A descrição e o perfil de formadores de profissionais surdos encontram-se

abaixo com as caracterizações de cada instituição e de cada profissional.

1) Caracterização das instituições:

a) Escola Cravo;

Escola Municipal de Educação Bilíngue para Surdos. Essa escola oferece

Ensino Fundamental I e II e conta com dois profissionais surdos e os demais

são profissionais ouvintes bilíngues. Um dos profissionais surdos é professor

de matemática e o outro é contratado com instrutor. O professor de

matemática não foi observado, pois no período da pesquisa estava de licença

médica. O outro profissional surdo participou como sujeito dessa pesquisa.

b) Escola Tulipa;

Escola Municipal de Educação Infantil, Ensino Fundamental I e II,

considerada escola polo. Atende a alunos ouvintes e também a alunos

surdos. Nessa escola, os alunos surdos da Educação Infantil e Fundamental I

estudam em salas distintas às dos ouvintes, com dois docentes: um professor

bilíngue ouvinte e um instrutor surdo. Apenas as aulas de artes, educação

física e informática e atividades comemorativas e de passeio são realizadas

em conjunto entre alunos surdos e ouvintes.

c) Escola Girassol;

Escola bilíngue privada que possui professores surdos e ouvintes bilíngues

na Educação Infantil e no Ensino Fundamental I e atende apenas a alunos

surdos. No ensino fundamental II, esses alunos são inseridos em sala de aula

com ouvintes e com a presença de intérprete de Libras.

2) Sujeitos da pesquisa: formação dos profissionais surdos

a) O instrutor João é formado em desenho industrial e pedagogia. Exerce a

docência no ensino de Libras há mais de quinze anos, já trabalhou em diversas

escolas de surdos incluindo que já foi professor da escola Girassol e da Cravo.

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b) Pedro formou-se como professor de Libras no curso de Letras Libras pela

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) no polo de Vitória/ES. Está na

escola Tulipa há dois anos;

c) Maria cursou graduação em Artes e leciona essa disciplina há mais de dezesseis

anos na instituição Girassol. Seu primeiro emprego foi no banco, e insatisfeita com

o emprego, abandonou-o quando estava no último ano de graduação para trabalhar

na escola Girassol, mas naquela época era estagiária e depois foi promovida a

professora;

d) José tem formação em Letras Libras, possui pós na área de psicopedagogia.

Trabalha na instituição Girassol há quatro anos. Também ministra aula de Libras em

outras instituições;

e) Francisco trabalha na instituição Girassol há mais de dezoito anos. É formado

em pedagogia e tem pós-graduação em nível de especialização;

f) Ana é professora auxiliar da escola Girassol. Sua função é dar suporte aos

professores. É novata, está na instituição há quatro meses, pois se formou há pouco

tempo no curso de Pedagogia;

g) Joaquim possui graduação de desenho industrial e pedagogia. É professor há

mais de nove anos na escola Girassol. Na época da graduação era contratado como

instrutor e depois que se formou passou a ser professor. Ministra Libras em outras

instituições.

h) Paulo é formado em licenciatura de Letras Libras. É contratado como instrutor

há dez meses pela prefeitura de São Paulo. Antes de ingressar na escola Cravo,

trabalhou em outras escolas polos no Estado de São Paulo;

3) Observação em sala de aula:

a) Prof. João. Escola Tulipa.

A relação do profissional surdo com os alunos e a professora bilíngue foram

fontes de dados utilizados. Nesta escola, há três salas com alunos surdos do primeiro,

segundo, quarto e quinto ano, sendo que os dois primeiros anos do ensino fundamental

são inseridos na mesma sala (turma multisseriada).

Ao chegar à escola Tulipa, fui apresentada à coordenadora pedagógica, que me

explicou um pouco sobre o trabalho desta escola. Foi esclarecido para a coordenadora

pedagógica e aos professores o que seria a pesquisa, o que seria observado e as

anotações que seriam feitas no caderno de campo como observadora sem nenhuma

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intervenção nas aulas. A pesquisa iniciou-se no segundo semestre de 2016. Iniciei a

observação na aula de Libras para alunos ouvintes, pois havia a presença do instrutor

naquele momento. Além dessa, os instrutores surdos também exercem atividade de

apoio docente ao professor bilíngue nas salas de aula do Ensino Fundamental I e dão

aula de Libras para a comunidade (profissionais da escola, família e outros

interessados). Vale relembrar que o foco da escolha foram os profissionais surdos.

Neste dia, a pesquisadora se apresentou e explicou aos alunos que estava fazendo uma

pesquisa, que iria observar nas aulas e que iria sempre anotar as observações em um

caderno.

A observação iniciou às 07h30min na sala de alunos ouvintes em que o instrutor

João dá aula de Libras. O objetivo da aula é que os ouvintes aprendam a se comunicar

com os alunos surdos. Ele apresentou um desenho da Discovery sobre Olimpíadas,

sinalizou alguns vocábulos e utilizou classificador de Libras para encenar algumas

partes do desenho. O uso da imagem é essencial para crianças ouvintes para incentivá-

las no aprendizado da língua de sinais. Essa estratégia é essencial para ensinar aos

alunos ouvintes. Ao término do desenho, os alunos fizeram o uso de palmas em Libras.

O professor começou a fazer algumas perguntas sobre o desenho, e sinaliza para um

aluno:

Quadro 09 – Trecho de diálogo entre professor e aluno

A análise desse momento discursivo permite identificar alguns pontos de

enunciação surgidos na aula de Libras que transparecem no discurso mantido entre o

professor (P) e o aluno (A), possibilitando a visibilidade de algumas questões

importantes para a compreensão das relações dialógicas. Na concepção de Bakhtin, a

enunciação não pode ser entendida como expressão da consciência individual interior,

mas sim como produto da interação entre indivíduos socialmente organizados. Desse

modo, foi possível perceber nesta aula que o ensino de Libras está ocorrendo em

contexto dialógico e não por uma lista de vocábulos descontextualizados, como é

- P: Você gosta de futebol?

- A: Gosto sim.

E seguida, o professor pergunta novamente.

- P: Qual o time que torce.

- A: Corinthians.

O aluno pergunta para o instrutor o time que ele torce.

- P: Também;

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comum ocorrer. O professor atesta sua capacidade de ensinar uma língua em situação

real de comunicação, enfatizando o diálogo como material de aprendizagem, além de

utilizar recursos visuais de temática de interesse dos alunos da faixa etária trabalhada. A

apresentação de alguns sinais combinada à expressão corporal, facial e uso de

classificadores permitiu que se estabelecesse uma comunicação real entre os

interlocutores durante a aula. O episódio reforça a ideia de que para ensinar Libras, ou

qualquer língua, não basta ser falante dessa, “é necessário ao professor um amplo

conhecimento de diversos aspectos: da língua e suas características (linguísticas e

gramaticais), de metodologias de ensino e, principalmente, das práticas pedagógicas a

serem desenvolvidas” (SANTOS, LOPES, LACERDA e OLIVEIRA, 2016, p. 128).

Logo após o termino da aula do segundo ano, o instrutor pega seus materiais e

segue para outra sala, onde ficaria com alunos surdos no trabalho de suporte à

professora bilíngue.

A professora bilíngue passa a tarefa na lousa e pede para os alunos responderem

o que anotaram no caderno. Alguns alunos não entenderam e confundem “gostar” e

“não gostar” e o instrutor imediatamente ajuda a professora a explicar aos alunos.

Observa-se nesse momento que, mesmo a professora sendo fluente em Libras, a

explicação do instrutor foi fundamental. Nesse sentido, verifica-se que “a presença do

instrutor surdo no contexto educacional é de suma importância, assim como o

desenvolvimento de práticas que favoreçam o desenvolvimento de linguagem, sua

constituição e identidade, além do aprendizado da LIBRAS” (SANTOS, LOPES,

LACERDA e OLIVEIRA, 2016, p. 129).

Logo em seguida uma aluna respondeu “não gosto de demorar”, a professora

pede para a aluna completar a palavra que ela havia dito da frase na lousa e ela tira suas

dúvidas com o instrutor e pergunta se deve escrever em português da norma culta para

que os alunos aprendam da forma que o professor ensina. O instrutor afirma que é

melhor primeiro escrever o português com marcas de Libras e depois a norma culta para

que os alunos perceberem a diferença entre essas línguas. Percebe-se que há interação e

parceria entre esses profissionais, o que favorece a cooperação e parceira de trabalho

com qualidade com afirma a citação de Bakhtin (1999) a seguir

A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema

abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica

isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo

fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação

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ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade

fundamental da língua (BAKHTIN, 1999, p. 123).

Em uma conversa informal com o instrutor, ele relata que a relação com a

professora bilíngue é recíproca, porém não são todos os professores que o procuram

para tirar dúvidas, fazer perguntas para o maior aproveitamento e acompanhamento das

aulas. Quando ocorre essa troca, o trabalho se torna mais produtivo, também no ensino

da Língua Portuguesa. “El trabajo colaborativo entre un adulto sordo y un profesor

oyente tiene el potencial de enriquecer el proceso de aprendizaje de la segunda lengua

para los estudiantes sordos” (LISSI, SVARTHOLM, GONZÁLEZ, 2012, p. 317)31.

Na minha observação, pude perceber que esse instrutor traz em sua atuação

docente o diálogo e o comprometimento. Diálogo que permite a oposição de ideias e a

comunicação efetiva. Apresenta comprometimento com sua responsabilidade de

educador e de formador, da qual não se exime.

Uma das observações relevantes na sala de aula foi o modo como os alunos

surdos fazem uso do celular e do tablet. Para o instrutor surdo, essas tecnologias digitais

são ferramentas importantes tanto como instrumento para os alunos aprenderem a usá-

las de modo independente, quanto para o auxílio na compreensão dos conceitos. O

instrutor João me informou que quando desconhecem a palavra, os alunos passaram a

ter o hábito de usar essas ferramentas, consultando aplicativos de dicionários Português

- Libras.

Outra estratégia que os alunos surdos utilizam, segundo o instrutor, é a busca no

site do Google Imagens ou de vídeos. Essas pesquisas permitem que o aluno faça uma

associação das imagens e dos vídeos com os conceitos. O instrutor complementa a

explicação dos conceitos realizando, também, a instrução em Libras. De fato, a

tecnologia digital tem sido um importante recurso na vida dos surdos:

Através da internet os surdos vêm se apropriando da escrita da Língua

Portuguesa e desenvolvendo com sucesso o papel que até agora foi delegado

à escola. O que se tem hoje, em termos tecnológicos, é algo que possibilita

aos surdos uma independência quase que total em relação ao ouvinte. Esta é

uma característica extremamente positiva para os surdos, uma vez que

diminui a sua dependência em relação ao ouvinte, começando a desenvolver

de forma determinada, os ditames de sua própria consciência. (COSTA,

2011, p.110)

31

Tradução livre da autora: “O trabalho colaborativo entre um adulto e um professor surdo ouvinte tem o

potencial para enriquecer o processo de aprendizagem da segunda língua para alunos surdos”.

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Os recursos visuais para os alunos surdos, elaborados como uma metodologia

reflexiva para a construção de seus conhecimentos, contextualizada no ensino de

português, é essencial para a apropriação e entendimento dos conceitos e conteúdos

presentes durante as aulas. Campelo (2007) define a importância do recurso visual em

sala de aula.

A pedagogia visual direciona práticas docentes para uso das imagens

que visem às experiências adaptadas a quem não dispõe da audição.

Possui uma forma estratégica de transmitir a representação de objetos,

de imagem e de língua, cuja natureza e aspecto são precisamente de

aparato visual (CAMPELLO, 2007, p.113).

Destacamos que os alunos não possuem tablet para a consulta de dicionários,

como a Libras é uma língua visual, o que necessita de recursos para o uso em sala de

aula. O instrutor explica que quando quer trabalhar com o dicionário online, os alunos

utilizam os aplicativos ProDeaf32

e Hand Talk33

no tablet do próprio instrutor.

É importante ressaltar a presença da professora bilíngue que faz mediação com o

instrutor, assim dando um trabalho bilíngue. Isso favorece uma valorização da

concepção de mundo constituído por meio da subjetividade e da objetividade com as

experiências visuais (PERLIN, 2000) dos alunos surdos.

b) Prof.ª Maria. Escola Girassol

A professora Maria foi receptiva, me explicou sobre o Programa de Estimulação

Dinâmica (PED)34

, que trabalha com a estimulação da linguagem da criança a partir de

sete e oito meses até três anos de idade. O programa consiste em atividades

desenvolvidas com as crianças surdas por profissionais com a presença dos pais. O tema

da aula foi sobre o desenvolvimento da lagarta. Os pais participam das atividades

simultaneamente com os profissionais e as crianças. A professora cola purpurina na

folha dos alunos para representar a comida da lagarta. Ela usa várias cores para

estimular a criatividade dos alunos.

32

O ProDeaf é um software de tradução de texto e voz na língua portuguesa para Libras - a língua

brasileira de sinais (www.prodeaf.net). 33

O aplicativo Hand Talk é uma ferramenta gratuita, para Android e iOS, desenvolvida para conversão de

áudios e textos fotografados para a língua de sinais (https://handtalk.me/app). 34

O PED viabiliza-se o contato da criança com adultos usuários da Libras, motivando a comunicação,

propiciando o desenvolvimento da linguagem compatível com a faixa etária e favorecendo a futura

escolarização.

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Nessa aula, foi interessante ver como a professora surda estimula a interação

entre os pais e as crianças em Libras. A interação entre pais e filhos possibilita o uso da

linguagem na produção dos sentidos - as trocas de forças entre os interlocutores.

Bakhtin (1999) define uma concepção de interação verbal através das relações que se

estabelecem entre o eu e o outro nos processos discursivos instaurados historicamente

pelos sujeitos. Segundo o autor, as interações se instauram pelo discurso, ou seja, o uso

da linguagem em qualquer contexto social manifesta-se através da interação verbal entre

os sujeitos.

Após o PED, a professora se dirige à sala de artes onde trabalharia com os

alunos do quarto ano. O tema abordado nessa turma foi a pintura de Van Gogh. Cada

aluno fez suas atividades e as realizou sem dificuldades. A professora ensina as cores,

temperatura (quente e frio). A professora faz diversas observações sobre arte, explica

cada detalhe e afirma que cada aluno deve fazer de seu jeito. A professora Maria sentou-

se à mesa, dando liberdade para que cada aluno mostrasse em exposição para classe o

que havia feito a partir do desenho de Van Gogh. A partir da exposição, a professora

pediu que cada um avaliasse e desse sua opinião sobre os demais trabalhos.

Posteriormente, um aluno questionou sobre as cores fortes do desenho e sobre as

possíveis escolhas de cores. Os colegas participaram da atividade em sala aula, em uma

atividade coletiva e prazerosa pautada em uma relação dialógica. Essa interação

comunicativa só é possível porque a Libras flui espontaneamente entre todos os

interlocutores na sala de aula. As discussões sobre o tema arte, cores, Van Gogh são

construídas em uma rede discursiva, em consonância com o que propõem Bakhtin

(1999):

Toda enunciação é uma resposta a alguma coisa e é construída como

tal. Não passa de um elo da cadeia dos atos de fala. Toda inscrição

prolonga aquelas que a precederam, trava uma polêmica com elas,

conta as reações ativas da compreensão, antecipa-as (BAKHTIN,

2006, p. 98).

Bakhtin (2009) afirma que “a língua se apresenta como uma corrente evolutiva,

ininterrupta”, ou seja, ela é viva e se modifica de acordo com os falantes, tempo e

discursos. O enunciador, ao constituir um discurso, contempla “o discurso do outro” que

está presente no seu discurso. O dialogismo constitui-se nas relações de sentido que se

estabelecem entre dois enunciados, contraditórios, divergentes ou convergentes.

Segundo aquele autor que o dialogismo acontece quando

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(...) existem as trocas harmônicas entre sujeitos comunicantes, pondo

em foco os processos de negociação de significados, de cruzamento de

referentes culturais e de reinvenção da linguagem que atravessam

todos os atos linguísticos (BAKHTIN, 2003, p. 270).

A observação nessa aula de artes permitiu visualizar a importância fundamental

do profissional surdo como um interlocutor em Libras, na construção de conhecimentos

dos alunos, não só sobre o conteúdo da aula, mas, principalmente, como construtor ativo

da língua de sinais para aqueles alunos e ponte para a inserção nas culturas surdas em

que o sujeito está inserido, como afirma Reis (2007):

Minha reflexão sobre a realidade do acontecimento da existência da

identificação que se dá na relação entre os alunos e professores, quer

acreditar que a postura do professor surdo permite a identificação à

cultura surda. A cultura surda permite fazer emergir a identidade;

permite vincular valores para se construir, ou seja, adquirir língua de

sinais; permite identificar os valores surdos. A importância da

identificação é que ela nos faz entender as diversas posições

assumidas pelo sujeito para se identificar aos outros para valorizar o

seu ser. A partir daí o sujeito surdo inicia a produção cultural. (REIS,

2007, p. 91)

c) Prof. José. Escola Girassol

Na aula de teatro, o professor chega na sala para o ensaio sobre 30 de

setembro35

. Ao chegar na sala, o professor observou que alguns alunos não tinham

realizado a atividade solicitada anteriormente. Ele questiona o aluno e o aconselha.

Explica a importância de ter responsabilidade e compromisso, de se lembrar das tarefas.

O professor seleciona os alunos para escolher os personagens. Ele relata uma história

em que os personagens foram criados por ele. O aluno grita pelo nome do professor e

ele “ignora”. Ele adverte que é surdo, e que, portanto, “não precisa gritar”: “Para que

gritar?”. O professor explica as regras do teatro: pergunta para os alunos se podem

sinalizar de costas para o público e fala sobre o momento de apresentação dos

personagens.

Nessa observação, pude verificar a habilidade do professor de dirigir o processo

discursivo em sala de aula, o que tem grande influência no ato de aprender do aluno e

repercute no processo de ensino-aprendizagem.

35

Nessa data é comemorada o Dia Internacional do Surdo.

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Na sala do quinto ano, o professor chega na sala e pergunta para os alunos se

lembram do vídeo “Slam36

”. Um aluno perguntou se o vídeo seria para ensaiar, o

professor responde “não, espera, quando acabar”. Após o fim da apresentação, ele

pergunta aos alunos o que perceberam no vídeo. O professor destaca que a “rima” em

Língua de Sinais é realizada com a realização de sinais com uma mesma configuração

de mãos37

. O professor pede para que os alunos criem duplas e façam a atividade de

modo semelhante à do vídeo, ou seja, que eles produzam uma poesia com sinais que

tenham a mesma configuração de mão. O professor explica novamente para que os

alunos possam entendem melhor. A contextualização, conforme Almeida (2007), é o

que “estabelece a margem e delimita os caminhos a serem percorridos” no trabalho do

professor. Nesse sentido, logo que deu início à aula, o professor fez uma

contextualização do trabalho desenvolvido na disciplina, discutindo com os alunos

sobre as atividades que haviam sido desenvolvidas até aquele momento e sobre os

trabalhados que seriam realizados “garantindo o comprometimento do aluno com o

futuro dele em relação ao conteúdo e, portanto, em relação à aprendizagem”

(ALMEIDA, 2007, p, 39).

O professor utilizou outro vídeo “Le Sign et le crocodil”38

na aula, para

exemplificar como a poesia em Língua de Sinais faz uso de repetição de uma mesma

configuração de mãos.

No dia seguinte, continuei a observação do professor José. Às oito horas da

manhã, teve início a aula de Libras para famílias. O professor deu boas-vindas aos

familiares. Pergunta a eles se trouxeram fotos da família para a aula. Com a ajuda dessa

foto, cada pai ou mãe apresentou sua família, utilizando os sinais em Libras. Quando

eles não se lembravam de determinado sinal, o professor pedia para imaginarem e

fazerem como pensarem. Ao final das apresentações, o professor explica a atividade que

deveriam realizar em casa sobre a cultura de um estado brasileiro (comidas típicas,

danças, costumes, clima, etc.) Ele pede que cada participante do curso traga uma

atividade de um estado do Brasil para exposição. Cada família deve tirar fotos e colocar

no cartaz para seus filhos verem.

Após a aula de Libras para as famílias, o professor se dirige para o segundo ano.

Na sala do segundo ano, o professor José ministra disciplina de Libras. Ele prepara as

36

Slam é uma batalha de poesia em Libras, semelhante ao “repente” em Línguas Orais. 37

Configuração de mãos é um dos parâmetros da língua de sinais, a qual compõe a estrutura do sinal. São

as diversas formas que uma ou as duas mãos tomam na realização do sinal. 38

https://www.youtube.com/watch?v=CMw_dAaID_g

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atividades para os alunos surdos. A proposta dessa aula é que os alunos busquem sinais

que usem a configuração da mão correspondente à letra inicial do próprio nome ou sua

idade. Cita um exemplo: como a configuração de mão em F, que é a letra inicial do de

Felipe há os sinais de: feliz, férias, futuro, família, faculdade. Outro exemplo: com a

configuração de mão do numeral “5” há os sinais de: cobra, vampiro, inteligente,

perceber.

Desse modo, percebe-se que o professor busca ensinar a Língua de Sinais

enfatizando seus aspectos gramaticais e não somente oferecendo uma lista de vocábulos.

Na observação do professor José, pude verificar em dois momentos o ensino de

Libras: para os familiares e para a crianças surdas. Cabe destacar que essa é uma das

mais significativas funções do profissional surdo, embora não a única, como já apontada

nesse capítulo.

“O instrutor surdo é um educador que deve trazer para o espaço

escolar os valores, aspectos culturais, emoções e percepções da ótica

da pessoa surda; além de disso, ele é o representante da língua, da

cultura e da identidade surda no espaço escolar” [...] (SANTOS,

LOPES, LACERDA e OLIVEIRA, 2016, p. 129).

d) Prof. Francisco. Escola Girassol

O professor explica um pouco sobre a disciplina de contação de história. Nessa

disciplina, o professor realiza quatro etapas: primeiro o professor conta a história em

Libras. Em segundo momento, os alunos veem os livros e usam a imaginação para

inventar, complementar a história. Na terceira etapa é o próprio aluno que conta a

história em Libras. Essa contação realizada pelos alunos é registrada em vídeo. Por

último, o professor apresenta o vídeo para toda a classe. Nesse momento, cada um faz

sua crítica, dá sua opinião. O professor comenta o que precisa ser melhorado e

posteriormente ele faz um vídeo mais “formal” para os alunos aprenderem e entenderem

melhor a história. Depois de discussão, os alunos desenham sobre a história. O

professor explica para os alunos que eles têm meia hora para desenhar e depois iria

mostrar o vídeo dos alunos contando a história. Em seguida, após os alunos concluírem

os desenhos, formam uma rodinha e, com o tablet, o professor mostra para os alunos o

vídeo produzido por eles. Durante a discussão entre alunos e professor, ele ensina que

deve evitar a repetição do sinal “depois”. Os alunos avaliam e percebem que precisam

melhorar. Eles riem por repetir os sinais “depois”. Segundo o professor, um aluno fez

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certo, e o restante repetiu. Eles pedem para filmar de novo, porém ele disse que

precisariam treinar primeiro e depois filmar.

Esse trabalho, segundo a perspectiva do professor, permitiria atitudes

responsivas ativas e contribuiria para a ampliação do repertório de informações

necessárias à compreensão da turma do segundo ano, prezando assim as relações

dialógicas em que devem se efetivar as práticas de linguagem em sala de aula,

ampliando o repertório, o que se preserva a linguagem, sua função de despertar a

imaginação e sentimentos, bem como sua possibilidade na construção de significados,

da forma que alia ao contexto da história, além de enriquecer o vocabulário.

Na perspectiva histórico-cultural, segundo Vygotsky (1998), a educação tem

como princípio a valorização o contexto histórico social do aluno. Evidencia-se a

necessidade de adaptar os métodos educacionais à realidade do aluno, uma vez que,

quando desvinculadas de seu contexto, as palavras tornam-se ocas, vazias de

significado, alienantes. Daí a necessidade de presença do profissional surdo na sala de

aula considerando as experiências concretas do cotidiano do aluno.

Nesse sentido, de acordo com a concepção de linguagem bakhtiniana, o sujeito

não se expressa apenas, ele age, atua com seu interlocutor, esperando deste uma

resposta. Assim, cada ato enunciativo, integra diversas vozes, ou seja, a presença do

profissional surdo acontece quando há interação com outros sujeitos, levando em

consideração o fato de que a língua é dialógica.

e) Prof.ª Ana. Escola Girassol

A professora Ana é auxiliar e fica na sala do Jardim I com outra professora

bilíngue ouvinte. Há cinco alunos de idade entre quatro e cinco anos na sala de aula. No

momento da observação, a atividade da professora foi a organização da rotina do dia. A

Professora Ana utilizou plaquinhas que continham gravuras das diversas atividades

daquele dia: chegada, banheiro, brincar, aula do Prof. Francisco (conto de história),

lanche, educação física, escova de dente, registro (desenho), hora do filme e saída.

Nessa atividade de organização da rotina, a professora ouvinte bilíngue ajudou a

executar a tarefa dos alunos, organizando as plaquinhas.

Como são bem pequenos, a presença da professora surda nessa sala possibilita a

aquisição da Libras em momento oportuno, sem que haja atrasos na aquisição

linguística, como define a proposta de educação bilíngue para surdos. Segundo Santos,

Lopes, Lacerda e Oliveira (2016)

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[...] este tipo de educação visa oferecer as condições de aprendizado

necessárias ao alunado surdo por meio da língua de sinais – língua

esta que deve ser oferecida desde a mais tenra idade por meio do

contato com interlocutores surdos e usuários desta. Esta proposta

contempla o direito linguístico da pessoa surda e possibilita o acesso

ao conhecimento, à cultura e às relações sociais por meio de sua

língua de domínio, respeitando ainda suas condições diferenciadas de

aprendizado (metodologia própria) e os aspectos culturais e sociais

inerentes à surdez. (SANTOS; LOPES; LACERDA; OLIVEIRA,

p.128 – grifos meus, 2016).

f) Prof. Joaquim. Escola Girassol

O professor Joaquim ministra uma disciplina denominada “Brincar de

Aprender”. Essa é uma disciplina complementar desenvolvida para o Ensino

Fundamental em que os alunos desenvolvem atividades multidisciplinares com o

objetivo de retomar os conteúdos das aulas de modo lúdico. A disciplina ocorre em uma

sala multisseriada com alunos do quarto e quinto ano. O professor utilizou o aplicativo

“Edmondo” 39

como atividade no dia da aula. Ele pede aos alunos para pegarem o iPad

para utilizar na aula. Os alunos interagiram e ajudaram um ao outro, tiraram dúvidas

com o professor. Nesse aplicativo, os alunos registravam as atividades que tinham

realizado no dia da escola, como um diário. O objetivo dessa atividade é estimular a

escrita do português. Os alunos devem desenvolver suas atividades autonomamente com

a orientação do professor. Como cada aluno escrevia suas vivências diárias, ficava fácil

lembrar o que deveriam registrar, porém a escrita do português é sempre um processo

difícil para alunos surdos. Com a interação com o professor e os colegas iam tirando as

dúvidas e construindo seus registros. A interação e diálogo entre os alunos e o professor

surdo é uma valiosa oportunidade de aprendizagem das formas e modos de escrever em

português.

La actividad de producción de textos escritos se ve enriquecida

cuando existe la oportunidad de que el profesor y los alumnos

conversen acerca de lo que posteriormente van a escribir. La LS se

utiliza así para hablar antes de escribir, compartir ideas y crear

estímulos para el texto. A partir de una comunicación fluida en LS, el

profesor puede saber con detalle qué es lo que los niños desean

escribir. Esto ayuda a entender y corregir el texto producido por el

alumno, de manera que lo que el profesor sugiere refleje lo que los

39

Link do aplicativo Edmondo: https://www.edmodo.com/?language=pt-br

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114

niños realmente quieren decir (LISSI, SVARTHOLM, GONZÁLEZ,

2012, p. 315)40

g) Instrutor Paulo. Escola Cravo

No curso de Libras para a comunidade externa, pessoas interessadas em

aprender Libras, mas sem nenhum vínculo com a escola. O professor inicia a aula

avisando que se esqueceu de trazer material para aula. Ele usaria um DVD, mas o iPad

estava sem bateria. O instrutor pergunta aos alunos o que fizeram no final de semana.

Pede que sinalizem o mês que nasceram e o dia também. No papel que ele distribuiu aos

alunos tinha em datilologia o sinal do numeral “um” com configuração de mão usando o

polegar, mas o professor avisa e diz que a configuração correta é com o dedo indicador

para utilizar a referência de quantidades. Ele alerta que o uso de ano por extenso tem

que ser soletrado com os números completos (exemplo 1986) e não os dois últimos

números. Faz jogo de pergunta: semana, cada aluno sinaliza a mesma coisa que o outro

sinalizou. O professor fez uma atividade para explicar o uso dos numerais em Libras.

i) Instrutor Pedro, instrutor da escola Tulipa.

O instrutor Pedro ministra aula de Libras para funcionários e comunidade

externa. O tema da aula foi sobre expressão facial, o instrutor utilizou a lousa como

recurso para ministrar a aula e ele próprio fez desenhos. Estes alunos que acompanham

não conseguem entender as palavras que o aluno sinaliza. Um aluno surdo oralizado

tentou explicar para os alunos, mas o professor interviu e alertou a não traduzir para os

alunos para que eles não ficassem dependentes do português e esquecessem a Libras. O

instrutor pediu para sinalizar novamente para cada aluno. Observei que esse profissional

surdo compreende que o educador precisa contextualizar a sua prática docente,

considerando o aluno como um sujeito integral e concreto. Segundo Vygotsky (1998),

cada indivíduo é historicamente situado, isto é, a partir da sua história de vida, tem um

capital cultural construído na interação com o meio em que está inserido. Os seres

humanos têm uma identidade que vai além de individual, é também coletiva e que o liga

40

Tradução livre da autora: A atividade de produção de textos escritos é enriquecida quando há a

oportunidade para o professor e os alunos conversarem sobre o que vão escrever posteriormente. As LS

(Língua de sinais) é, assim, usada para falar antes de escrever idéias compartilhar e criar incentivos para o

texto. A partir de uma comunicação fluida em LS, o professor pode conhecer em detalhe o que as crianças

querem escrever. Isso ajuda a entender e corrigir o texto produzido pelo estudante, de modo que o

professor sugere e reflete sobre o que as crianças realmente querem dizer.

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aos grupos sociais com os quais convive. Para que haja a compreensão deste processo, é

necessário que o professor crie vínculos afetivos com seus alunos. Ele precisa ter em

mente que o seu aluno é um ser cheio de ideias, experiências próprias que precisa ser

escutado para a construção de seu conhecimento.

No processo de observação e intervenção em sala de aula, percebemos que um

dos fatores que interferem na produção de uma atitude responsiva ativa (BAKHTIN,

1999) não é apenas a limitação de conhecimentos anteriormente adquiridos, é também a

capacidade de identificação de informações implícitas, que, em alguns casos, fica a

depender de experiências de leitura e do uso corrente da língua. Nesse sentido, o

professor exerce um significativo papel.

4) Reflexões sobre as observações:

Nesse capítulo, busquei refletir sobre as práticas de educadores surdos a partir da

observação de suas atuações em quatros escolas diferentes. Os critérios utilizados para

essa análise foram: a) metodologia utilizada; b) didática; c) comprometimento com o

ensino; d) uso de materiais adaptados; e) conhecimento.

Entre as escolas observadas, a que tinha uma metodologia mais adequada ao

alunado surdo foi a Girassol. Nessa escola havia professores surdos que utilizavam

materiais adaptados para o ensino, tais como uso de tablet, exposição de vídeos, aulas

com muitas imagens com auxílio de datashow. Também nessa escola, os educadores

surdos tinham mais autonomia em preparar suas aulas, utilizando uma metodologia

própria e atividades com recursos preparados por eles. Também posso afirmar que a

didática, na escola Girassol, era mais adequada às especificidades das crianças surdas,

dentro de uma proposta bilíngue, em relação às outras escolas. Na escola Tulipa, o

profissional surdo tinha uma didática adequada para ensinar, mas em nenhum momento

pude observar que havia um planejamento prévio de atividades das aulas com o

professor ouvinte bilíngue. Embora houvesse uma boa parceria, me pareceu que o

educador surdo era mais um coadjuvante, ou seja, não tinha uma participação efetiva no

planejamento das aulas. O professor da escola Cravo não tinha nenhum

comprometimento com o ensino. Isso se deve de ele não se sentia convidado a participar

das reuniões escolares, como HTPC, conselho de classe, ou mesmo de colaborar com o

planejamento das aulas. É nítida a postura dele quando relata que os profissionais

ouvintes só o procuram para tirar dúvidas ou perguntar de um determinado sinal, o que

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ele sentia como um “dicionário ambulante”. Em relação às escolas Girassol e Tulipa,

pude observar que muitos professores têm comprometimento com o ensino, não pela

questão de autonomia de dar aula, mas pelo fato de ter consciência plena de ensinar aos

alunos. Quanto ao uso de materiais adaptados observados em sala de aula, a escola

Girassol possui uma estrutura com recursos acessíveis para alunos surdos tais como

filmes, desenho, livros, tablet, entre outros. Já nas escolas Cravo e Tulipa, alguns

instrutores carregam seus tablets oferecidos pela secretária da educação e também

faziam desenhos na lousa como recurso para um entendimento maior. Quando

questionados sobre o conhecimento, pude observar que a formação não interfere o

conhecimento, já que todos possuem um conhecimento amplo na sua área de formação,

mas a atuação enquanto docentes difere de um para o outro. Pude constatar que há

diferença em relação com o cargo que o profissional surdo exerce nas escolas. Não há

diferença em relação ao conhecimento entre os educadores surdos observados. Mesmo

com o cargo de instrutor nas escolas Cravo e Tulipa, o conhecimento é o mesmo dos

professores da escola Girassol. No entanto, autonomia dos profissionais na docência,

planejamento e execução de atividades mostra-se distinta nas diferentes escolas, o que

determina o modo como o profissional se coloca em relação ao aluno surdo e ouvinte, o

que se faz notar na dinâmica de sala de aula. O posicionamento dos docentes permite

estabelecerem relações concretas de interação com os alunos que facilitem os processos

de aprendizagem.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa aqui descrita teve como objetivo compreender o perfil do

profissional surdo e sua função no ambiente educacional, destacando sua formação

técnica pedagógica e refletir sobre os reflexos de sua atuação na formação dos alunos

surdos. Para tal, utilizamos dois corpora de pesquisa: questionário online e observação

em sala de aula.

Com base nas análises dos questionários associadas às observações em sala de

aula, pode-se constatar que há diferenças na função do profissional surdo em diferentes

contextos educacionais.

Nos questionários, 19 respondentes disseram que são contratados como

professores e 12 como instrutores, sendo que há sujeitos que são contratados com as

duas denominações, pois trabalham em mais de um local. Dos respondentes, 90% tem

formação em nível superior, o que se configura como uma contradição, pois, mesmo

sendo graduados, são ainda contratados como instrutores.

Observa-se que dos que são contratados como professores, a maioria está em

instituições de Ensino Superior. Na educação básica, os surdos são, em sua maioria,

contratados na função de instrutores. Somente 3 profissionais surdos que responderam

ao questionário disseram que são contratados como professores na educação básica.

Essa realidade revela uma subordinação do profissional surdo em relação ao

profissional ouvinte dentro das escolas, ou seja, ainda se mantém uma lógica ouvintista

na educação dos surdos. Mesmo que haja profissionais surdos dentro dos espaços

escolares, o saber legítimo é o do profissional ouvinte. Esse sim é denominado

“professor”.

O problema é que ainda não estamos conseguindo considerar o Outro

através de sua alteridade. Não nos preocupamos em escutar o que nos

dizem. Tratamos suas falas como produções marginais e

desarticuladas. (No caso dos surdos, essa desarticulação é entendida

literalmente.) Silenciamos a eles para que possamos continuar a falar

por eles (SKLIAR e SOUZA, 2004, p.16).

Seria importante que os professores bilíngues ouvintes realizassem o

planejamento das aulas com o professor surdo de forma que o currículo fosse

organizado partindo de uma perspectiva visual e espacial para que o processo

educacional ocorra mediante a interação linguística, tendo a Libras como língua de

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instrução. O professor surdo é peça fundamental na organização e planejamento

curricular, ou seja, ele não deve ser o profissional de apoio, ou aquele que tira dúvidas

do professor ouvinte sobre algum sinal ou sobre o melhor procedimento para ensinar

algum conteúdo, mas ao contrário, ele deve ser parceiro na elaboração das atividades

acadêmicas, pensando junto com o professor ouvinte e toda a equipe docente o trabalho

pedagógico.

Da mesma forma quando comparadas as diferentes escolas onde se realizaram as

observações, percebe-se diferentes funções atribuídas aos profissionais surdos.

Enquanto a escola Girassol possui professores que exercem a docência com autonomia,

ou seja, os próprios professores são responsáveis pelas disciplinas da grade curricular do

Ensino Fundamental, nas escolas Cravo e Tulipa, o profissional surdo acompanha o

professor ouvinte bilíngue nas disciplinas da grade curricular. Apenas o curso de Libras

para a comunidade é exercido pelo instrutor surdo de modo autônomo, sem a parceria

do professor ouvinte. É notável o cenário que vem acentuando as ambiguidades, uma

vez que, nos espaços escolares em que os profissionais surdos não têm autonomia como

docentes junto aos alunos surdos, sua denominação é de “instrutor”. Já em uma escola

(Girassol) em que os profissionais surdos trabalham autonomamente com os alunos

surdos, sua denominação é “professor”. Cabe destacar que os instrutores e os

professores têm os mesmos conhecimentos embora o regime de trabalho e as condições

salariais sejam bastante diferentes.

Ser denominado “professor” como o docente ouvinte estabelece uma igualdade

desde o modo como são designados até as funções e responsabilidades pelo processo

pedagógico e pela aprendizagem do aluno. Terem a mesma designação os coloca em pé

de igualdade.

No processo de observação em sala de aula, pude perceber que um dos fatores

que interferem na produção de uma atitude responsiva ativa não é apenas a limitação de

conhecimentos anteriormente adquiridos, é também a capacidade de identificação de

informações implícitas, que, em alguns casos, fica a depender de experiências do

indivíduo e do uso corrente da língua.

A interação dialógica dos alunos surdos com o professor surdo permite atitudes

responsivas ativas e contribuiria para a ampliação do repertório de informações

necessárias à compreensão da turma do ensino fundamental I em que atua como docente

Além disso, na relação com o professor, a compreensão ativa pode ser efetivada nas

aulas, e as reflexões sobre os fenômenos linguístico-discursivos, utilizadas como

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recurso para a promoção da interação, logo, da dialogicidade, ou seja, a própria língua

de sinais pode ser refletida e analisada pelos processos metalinguísticos como

observados na aula dos professores José e Francisco. Essas produções representam

manifestações de compreensão ativa que integram o ato comunicativo como ordem

natural do diálogo e se estabelece nas relações sociais. Entretanto, sob nossa

perspectiva, ela constitui-se como posições dialógicas e responsivas ativas que são

elaboradas. Essas experiências de interação do profissional surdo confirmam o papel

decisivo dos profissionais surdos nas orientações das atividades no ensino para que os

alunos desenvolvam uma posição de dialogicidade nos diferentes contextos

interlocutivos de que participam, seja na escola ou em outros de seu cotidiano. Nesse

sentido, o professor exerce significativo papel como interlocutor na aquisição e

desenvolvimento da língua de sinais, bem como na consolidação de conceitos pelos

alunos surdos. A importância do professor surdo na educação pode ser corroborada pela

citação de Bakhtin: “O homem é ser essencialmente social e histórico que, na sua

relação com outros, em uma atividade prática comum, intermediado pela linguagem, se

constitui e se desenvolve enquanto sujeito” (BAKHTIN, 1999).

Bakhtin (1999) redefine o papel dos principais componentes da interação verbal.

Para ele, não existe o ouvinte e o entendedor, porém existe o falante e o ouvinte, e este

último, ao perceber o significado do discurso, ocupa uma ativa posição responsiva. Isso

ocorre a partir da mobilização de uma atividade mental com os signos envolvidos na

interação verbal que, em diálogos com outros anteriores, promovem outros discursos.

Nessa pesquisa, a prática de observação foi de fundamental importância para

compreender a realidade da formação do profissional surdo e, principalmente, os

aspectos que o professor encontra ao ministrar as aulas, considerando que a formação e

o cargo possuem diferentes realidades tipo de contratação e da instituição. O instrutor

não é enquadrado como professor, mas deveria ser, uma vez que sua prática é de

docente.

O que pôde ser percebido nos dados coletados com a pesquisa é que há

profissionais surdos de diversos perfis atuando nas escolas, e que adotam, modos de

atuação distintos na sua prática docente, tentando de alguma maneira solucionar os

problemas. Os alunos apresentam necessidades em comum, porém, os professores

divergem em algumas questões, mas parecem buscar por um mesmo objetivo: aulas

produtivas.

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No processo de observação em sala de aula, percebe-se que um dos fatores que

interferem na produção pedagógica não é apenas a limitação de conhecimentos

anteriormente adquiridos, metodologia, didática, é também a limitação da autonomia em

exercer a docência que, em alguns casos, fica dependente dos professores ouvintes

bilíngue. Os dados da análise apontam que a função do profissional surdo dentro da

escola interfere de uma forma diferente no trabalho pedagógico. Essa diferença se

expressa na autonomia ou não para a docência, sejam nos conteúdos ensinados, nos

acontecimentos em sala de aula, na aprendizagem dos alunos e também com o modo

como o professor lida com as situações que ali encontra. Sob essa ótica, essa

organização não se reduz à aplicação de métodos e à realização de prescrições e, nem

tão pouco, se esgota no desenvolvimento de habilidades para o desempenho de seu

trabalho.

Neste sentido, a pesquisa realizada permite identificar três momentos claramente

definidos e datados que passamos a aprofundar.

O primeiro momento foi a fase de lutas, dúvidas, incertezas e confusões. Em

1999, após o congresso, a formação do professor surdo começou a ganhar força. A

FENEIS passou a se posicionar e questionar sobre a formação do professor surdo,

ganhando destaque o início do curso de formação organizado pela instituição. O curso

de formação de instrutores em parceira com o MEC e o CORDE41

tem grande

divulgação com matérias no portal da FENEIS nas quais se destacam os surdos

formadores.

Consta-se que a análise dos materiais coletados revela que a formação se

encontrava de forma tímida, uma vez que não existia formação específica no ensino

superior que possibilitasse um modelo referencial que apontasse definitivamente para a

formação profissional qualificada. Por outro lado, começa a reivindicação e o

posicionamento de novas profissões na época do congresso, como mostra a revista

FENEIS com uma matéria intitulada "as comunidades surdas reivindicam por novas

profissionais: instrutor de Libras e intérprete de Libras” posicionado pelos membros do

Grupo de Pesquisa de Língua Brasileira de Sinais e de Cultura Surda Brasileira, que

pedem o reconhecimento dessas duas novas profissões (FENEIS, 1999). O segundo

momento inicia a construção da visibilidade na formação do docente surdo, após o

Decreto n° 5.626 de 2005. A problemática da formação por meio de decreto ganha

41

CORDE (Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa com Deficiência).

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projeção nacional ao ser objeto de respeito à formação docente. Por sua vez, o Letras

Libras ganha destaque na formação do profissional surdo. O curso de graduação foi o

fato principal que viabilizou a atuação do docente dando maior reconhecimento à

profissão do ensino da língua de sinais e, consequentemente, a visibilidade de uma

pedagogia construída por e pelos surdos. O terceiro momento é o de valorização,

visibilidade e reconhecimento da profissão a serem enfrentados como desafio em busca

de questões centrais da política educacional brasileira, evidenciando uma ruptura e

distinção entre professor surdo e instrutor surdo. Constata-se o consenso existente no

cenário educacional em torno da legibilidade da formação do docente, uma vez que as

instituições adotam esse sistema para manter o empoderamento da formação. A

formação docente será o objeto mais específico dos estudos e de pesquisa no próximo

capítulo. Requer, assim, que se encontre um sentido e uma forma de organização social

que, assegurando o respeito à profissão do docente surdo, solucione divergências,

viabilize um fim comum: uma educação de qualidade e de identidade para os surdos.

A proposta da formação do profissional surdo se configura ainda como uma

nova concepção da docência. A construção da concepção de profissional surdo

certamente se apresenta em sua constituição histórico-social como processo advindo do

desenvolvimento das diversas abordagens na área da surdez, tendo se iniciado no

movimento da comunidade surda desde o pré-congresso em Porto Alegre (RS)42

e que

repercutiu sobre a realidade brasileira. No Brasil, a formação do professor surdo é algo

que está ainda longe de ser considerada ideal, portanto muito ainda deve ser estudado,

discutido e construído. Como diz Martins (2010), a identidade do docente surdo ainda

está constantemente em construção em busca de uma formação sólida, uma vez que as

produções teóricas mostram o quanto as temáticas vão demarcando alguns avanços no

campo linguístico e educacional.

A cada passo conquistado pela proposta da formação do docente surdo como

uma garantia de direito de uma carreira digna, observou-se a incidência dos reflexos

dessas medidas sobre as produções teóricas, assim como, o desenvolvimento teórico a

partir das pesquisas realizadas sobre a formação do profissional surdo pode ter

subsidiado a elaboração de documentos que mostram cada vez mais fundamentos mais

aprofundados e comprometidos, ao menos em seu texto teórico, com o rompimento de

paradigmas, de concepções e de práticas que revelam a discriminação na formação do

42

V Congresso Latino Americano de Educação Bilíngue para Surdos, realizado em Porto Alegre no salão

de atos da reitoria da Universidade Federal de Rio Grande do Sul nos dias 20 a 24 de abril de 1999.

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docente surdo. Isso indica que a formação do profissional educador surdo necessita de

uma identidade sólida. Aponta-se a relevância de iniciativas no sentido de compreender

a formação do profissional surdo como uma característica de marca histórica, como diz

Machado (2010), de educação especial para inclusiva e de inclusiva para a bilíngue.

Esse “mergulho na docência” permitiu que se identificasse a ampliação de

sentidos e significados da prática docente dos profissionais surdos. A partir da reflexão

mediada e compartilhada sobre a prática docente e o que pensamos sobre o papel desses

profissionais e sobre as concepções de conhecimento, aprendizagem, ensino,

metodologia evidenciadas nas interações discursivas expressas nos episódios é que

notamos como eles foram ampliando os sentidos e os significados da prática docente.

A mediação, além de pedagógica, pode ser concebida como facilitadora das

trocas dialógicas entre os professores que se materializam nos modos de elaboração de

conhecimento pelo sujeito.

Essa pesquisa dá visibilidade a algumas necessidades prementes:

- Abertura de novas escolas bilíngues ou classes bilíngues que contratem

profissionais surdos em seu quadro docente como professores, gestores e monitores;

- Revisão dos contratos de profissionais surdos nos serviços públicos com

concursos que tenham em seu edital a nomenclatura “professor de Libras” com

prioridade para pessoas surdas;

- Promoção de autonomia para os professores surdos nos espaços escolares, de

modo que possam assumir a docência sem a tutela dos profissionais ouvintes.

- Revisão e reestruturação do Decreto n° 5.626 de 2005, modificando os termos

que indicam o termo “instrutor”, para “professor”, no caso de profissionais graduados.

Faz-se cada vez mais evidente pensarmos sobre as necessidades de se construir

uma prática educativa inovadora, pautada na construção e reflexão da formação do

profissional surdo, que possibilite agir, transformar e refletir na prática educativa dos

docentes. É preciso pouco a pouco, através dos desafios do contexto em que se vive

olhar e perceber os obstáculos como possibilidades de construção do novo. Para que

essas mudanças aconteçam e a escola consiga exercer seu papel, é necessário que todos

caminhem juntos, surdos e ouvintes, para a construção de uma educação de qualidade

para crianças, jovens e adultos surdos com professores, diretores, pesquisadores surdos.

É necessário criar condições e visibilidade para o profissional educador surdo.

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ANEXOS

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COMPROVAÇÃO DO TERMO DE CONSENTIMENTO PARA PESQUISA DO

QUESTIONÁRIO E DA OBSERVAÇÃO

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TERMO DE CONSENTIMENTO ON-LINE DO QUESTIONÁRIO

Pesquisadora responsável: Daniele Silva Rocha.

Orientadora: Prof.ª. Dra. Lilian Cristine Ribeiro Nascimento.

“A inserção do profissional surdo na docência do ensino fundamental dentro da proposta educativa

bilíngue termo de consentimento livre e esclarecido a inserção do profissional surdo na docência do

ensino fundamental dentro da proposta educativa bilíngue”.

Você está sendo convidado (a) a participar como voluntário (a) de um estudo. Este

documento, chamado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, visa assegurar seus direitos

como participante. Se quiser, pode imprimir uma via. Esta via impressa deverá ficar com você e

outra online ficará com a pesquisadora.

Por favor, leia com atenção e com calma, aproveitando para esclarecer suas dúvidas. Se

houver perguntas antes ou mesmo depois de assiná-lo, você poderá esclarecê-las com a

pesquisadora. Se preferir, consulte seus familiares ou outras pessoas antes de decidir participar. Se

você não quiser participar ou retirar sua autorização, a qualquer momento, não haverá nenhum tipo

de penalização ou prejuízo.

Justificativa e objetivos: A pesquisa “A inserção do profissional surdo na docência do ensino

fundamental dentro da proposta educativa bilíngue” tem por objetivo compreender a presença do

profissional surdo na sala de aula de escolas públicas e privadas no Estado de São Paulo, observando

a formação técnica-pedagógica desse educador e com vistas a refletir sobre os reflexos de sua

atuação na formação dos alunos surdos. Também irá refletir sobre o diferencial de um professor

surdo em sala de aula e no sistema de ensino que atua em relação aos sistemas que não incluem esse

educador e elencar estratégias de ensino utilizadas (e que vierem a se mostrar válidas) pelo professor

surdo com os seus alunos surdos. Assim, acreditamos o que o projeto se propõe a dar visibilidade à

atuação de professores surdos, à sua formação e à relevância da presença desse profissional para os

alunos surdos, prevista em lei e não cumprida pelos sistemas escolares, pois existem poucos

professores surdos nas instituições de ensino.

Procedimentos: Participando do estudo você está sendo convidado (a) a responder a um

questionário com perguntas abertas e fechadas. O tempo necessário para se responder a essas

questões pode ser de quinze a trinta minutos. Os dados obtidos no questionário serão analisados

constituindo parte dos resultados dessa pesquisa

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Desconfortos e riscos: A participação na pesquisa não trará nenhum risco para o participante e nem

prejudicará quaisquer atividades que você já realize na instituição.

Benefícios: A participação na pesquisa não trará benefícios diretos para o participante. No entanto,

você poderá ser beneficiado de maneira indireta, uma vez que as reflexões que serão feitas na

pesquisa contribuirão para o aprofundamento das discussões já existentes sobre a formação de

professor surdo.

Sigilo e privacidade: Você tem a garantia de que sua identidade será mantida em sigilo e nenhuma

informação será dada a outras pessoas que não façam parte da equipe de pesquisadores. Na

divulgação dos resultados desse estudo, seu nome não será citado.

Ressarcimento: Não haverá ressarcimento de despesas (por exemplo, transporte, alimentação), pois

o estudo será feito durante sua rotina habitual de participação das atividades desenvolvidas na

instituição que você já frequenta.

Contato: Em caso de dúvidas sobre o estudo, você poderá entrar em contato com a Daniele Silva

Rocha por e-mail [email protected], da Faculdade da Educação – Departamento de

Psicologia Educacional/ FE - UNICAMP – Rua Bertrand Russell, 801. Cidade Universitária

Zeferino Vaz, Campinas-SP, CEP: 13083-865. Em caso de denúncias ou reclamações sobre sua

participação e sobre questões éticas do estudo, você pode entrar em contato com a secretaria do

Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UNICAMP: Rua: Tessália Vieira de Camargo, 126; CEP

13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19) 3521-7187; e-mail:

[email protected] (mailto:[email protected]).

Consentimento livre e esclarecido: Após ter sido esclarecimento sobre a natureza da pesquisa, seus

objetivos, métodos, benefícios previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar,

aceito participar.

Responsabilidade do Pesquisador: Asseguro ter cumprido as exigências da resolução 466/2012

CNS/MS e complementares na elaboração do protocolo e na obtenção deste Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido. Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma cópia deste

documento ao participante. Informo que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi

apresentado. Comprometo-me a utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa exclusivamente

para as finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento dado pelo participante.

Há 26 perguntas no questionário.

Uma observação sobre privacidade: O questionário é anônimo. O registro de suas respostas não

contém nenhuma informação de identificação sobre você, a não ser que uma pergunta específica da

pesquisa explicitamente solicitou. Se você usou um código de identificação para acessar esta

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pesquisa, por favor, tenha a certeza de que esse código não será armazenado junto com suas

respostas. Ele é armazenado em uma base de dados separada e será atualizado apenas para indicar se

você completou (ou não) a pesquisa e não há nenhuma maneira de relacionar os códigos de

identificação com suas respostas.

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QUESTIONÁRIO ON-LINE

1) PERFIL DO PROFISSIONAL SURDO

1) Idade?

A sua resposta deve ser entre 15 e 99

Somente um valor inteiro pode ser informado neste campo.

2) Em que Estado do Brasil você mora?

Escolha uma das seguintes respostas:

Por favor, selecione...

3) Com quantos anos começou a aprender a Libras?

A sua resposta deve ser entre 1 e 99

4) Onde aprendeu a Libras?

Escolha a(s) que mais se adeque(m)

Amigos

Família

Escola

Igreja

Outro

Outros:

2) FORMAÇÃO ESCOLAR E ACADÊMICA

5) Onde estudou na educação básica (fundamental e médio)?

Escolha a(s) que mais se adeque(m)

Comentar apenas quando você selecionar uma resposta.

Regular (sem intérprete). Quantos anos?

Inclusiva (com intérprete). Quantos anos?

Especial. Quantos anos?

Bilíngue. Quantos anos?

6) Tem formação de graduação?

Sim

Não

Sem resposta

7) Se responder sim, qual a sua formação?

Escolha uma das seguintes respostas:

Pedagogia

Letras Libras

Outros:

8) Sua graduação foi em universidade / faculdade:

Escolha uma das seguintes respostas:

Pública

Particular

Sem resposta

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9) Durante sua graduação, você teve intérprete?

Escolha uma das seguintes respostas:

Sim

Não

Só em parte do tempo

Sem resposta

10) Informe os cursos complementares que você fez.

11) Informe os seus cursos de pós-graduação.

3) EXPERIÊNCIA PROFISSIONAL

12) Em quantas instituições já deu aula?

Somente um valor inteiro pode ser informado neste campo.

13) Quais disciplinas?

Escolha a(s) que mais se adeque(m)

Libras na educação básica

Ensino fundamental I (1º ao 5º ano)

Ensino fundamental II (6º ao 9º ano)

Ensino médio

Libras no ensino superior

Outros:

14) Duração de experiência em docência?

Escolha uma das seguintes respostas:

1 a 3 anos

4 a 7 anos

Mais de 8 anos

Sem resposta

15) Nas instituições em que você trabalha (ou trabalhou), você (era) contratado

como?

Escolha a(s) que mais se adeque(m)

Professor

Instrutor

Outros:

16) No seu emprego atual, qual o tipo de contrato?

Por favor, selecione uma resposta

Celetista

Temporário

Contrato

Efetivo

Outros:

4) VISÃO SOBRE ATUAÇÃO PROFISSIONAL

17) Por que você escolheu a profissão?

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18) Por que trabalha em uma escola para surdos?

19) O que levou a escolher essa profissão? Justifique.

20) Pelo fato de ser surdo, a escolha da sua pro�são foi por causa da facilidade

da vaga no mercado de trabalho?

21) Você acredita que a profissão de professor é a que mais "valoriza" e respeita para

pessoa surda no mercado de trabalho?

22) Ao longo da experiência profissional, o que você sente falta e precisa para melhorar a

proposta educativa bilíngue dentro da escola?

23) Qual sua função na escola? Que atividades você realiza?

24) Como é sua relação com a equipe docente e gestora da escola?

25) Para você, qual a diferença entre professor e instrutor?

26) Você já foi contratado como instrutor, mesmo depois de ter concluído suaformação

como professor? Como você se sentiu?