universidade estadual de campinas...aos meus alunos, que me ensinam e impulsionam na minha busca À...

158
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ARTES ANA PAULA LIMA DE ALBUQUERQUE O ENSINO DO CANTO POPULAR EM DUAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS BRASILEIRAS: UM ESTUDO SOBRE AS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DA UnB E DA UFMG CAMPINAS 2017

Upload: others

Post on 01-Feb-2021

1 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  •    

    UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ARTES

    ANA PAULA LIMA DE ALBUQUERQUE

    O ENSINO DO CANTO POPULAR EM DUAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS BRASILEIRAS: UM ESTUDO SOBRE AS

    PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DA UnB E DA UFMG

    CAMPINAS 2017

  • ANA PAULA LIMA DE ALBUQUERQUE

    O ENSINO DO CANTO POPULAR EM DUAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS BRASILEIRAS: UM ESTUDO SOBRE AS

    PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DA UnB E DA UFMG

    Dissertação apresentada ao Instituto de Artes, da Universidade Estadual de Campinas, como um requisito para obtenção do título de Mestra em Música. Área de Concentração: Música: Teoria, Criação e Prática.

    Orientadora: Profa. Dra. Regina Machado

    ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA ANA PAULA LIMA DE ALBUQUERQUE, E ORIENTADA PELA Profa. Dra. REGINA MACHADO.

    CAMPINAS

    2017

  • A

    Maria, minha filha amada, minha estrela-guia.

    A Aldeniza, minha mãe amada, por ter me ensinado a valorizar

    todas as oportunidades que ela não teve.

  • AGRADECIMENTOS

    À Profa. Dra. Regina Machado, minha grande inspiração para trilhar o caminho acadêmico, pelos ensinamentos valiosos, pela paciência e sensibilidade com que me acolheu e me direcionou. Ao programa de Pós-Graduação do IA – Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), professores e funcionários. À Universidade Federal da Bahia (UFBA), pelo apoio. À CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pelo apoio parcial nesta pesquisa. Aos professores Alexei Queiroz e Clara Sandroni, por toda generosidade com que me acolheram em suas aulas e pelas preciosas informações para a realização desta pesquisa. Aos professores Daniella Gramani, Valéria Leite e Luciano Simões pelas informações e atenção. A Sandra Loureiro, pela inestimável ajuda, carinho na revisão e formatação do trabalho e por suas contribuições valiosas. A Paula Dellazzana, pela amizade e ajuda nos momentos de dificuldade, além das valiosas discussões que enriqueceram este trabalho e a pesquisadora. Aos meus colegas pesquisadores do grupo VOX MUNDI. Aos meus alunos, que me ensinam e impulsionam na minha busca À minha irmã Ana Lúcia Albuquerque, pelo apoio incondicional. À minha filha, Maria, pelo amor, companheirismo e alegria que acalmam a minha alma.

  • RESUMO

    A presente investigação versa sobre o currículo de canto popular, a partir da análise da inserção do ensino da música popular nas universidades públicas brasileiras. Busca apresentar um estudo acerca da forma como o ensino do canto popular vem sendo sistematizado, além de discorrer sobre a concepção didático-pedagógica do canto popular, apresentando um histórico da inserção dessa modalidade de ensino, suas propostas curriculares e como os professores desenvolvem suas metodologias e elegem seus conteúdos. Como ponto de partida, é exposta uma breve descrição do primeiro curso de música popular a oferecer o ensino do canto popular na universidade pública, a Unicamp. Para delinear um contexto mais amplo, são citados os cursos ofertados nas demais universidades, porém com diferentes graus de aprofundamento quanto à sua estrutura e a seu funcionamento, detendo-se particularmente na análise de como ocorre na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e na Universidade de Brasília (UnB). Para tanto, por meio de entrevistas com os professores das duas universidades, foi descrita a organização de cada curso, no que concerne aos currículos articulados às práticas desenvolvidas por cada professor entrevistado para, assim, chegar a algumas conclusões significativas, como o reconhecimento da importância da diversidade cultural nos currículos e da valorização da nossa cultura. Palavras-chave: Universidade de Brasília. Universidade Federal de Minas Gerais. Música - Currículo. Canto popular. Música Popular – Brasil – Instrução e estudo. Universidades e faculdades públicas - Brasil.

  • ABSTRACT

    The present research deals with how the popular singing curriculum is organized, based on the analysis of the insertion of popular music education in Brazilian public universities, and seeks to present a study about how popular singing has been taught and systematized. It also discusses the didactic-pedagogical concepts of popular singing education, presenting a history of the insertion of this teaching modality, its curricular proposals, and how professors develop their methodologies and choose their contents. As a starting point, there is a brief description of the first undergraduate course in Popular Music that introduced popular singing in a Public University, the one offered at Unicamp. To include a broader context, the courses offered in the other universities are mentioned, but with different degrees of deepening regarding their structures and functioning focusing particularly on the analysis of how it occurs in the Federal University of Minas Gerais (UFMG) and the University of Brasília (UnB). In order to do so, through interviews with two professors of these two universities, the organization of each course was described, presenting the curricula linked to the practices developed by each professor interviewed. Finally, significant conclusions emerged from this analysis, such as the recognition of the importance of cultural diversity in curricula and the appreciation of our national culture. . Keywords: Universidade de Brasília. Universidade Federal de Minas Gerais. Music - Curricula. Popular singing. Popular music – Brazil – Instruction and study. Public universities and colleges - Brazil.

  • Lista de Ilustrações

    Gráfico 1 - Evolução da oferta de ensino do canto popular.......................... 36

    Figura 1 - Quadro comparativo dos cursos de música popular que oferecem

    canto popular ................................................................................................ 37 Gráfico 2 – Localização e distribuição regional das instituições onde o canto

    popular vem sendo ensinado no Brasil.......................................................... 37 Quadro 1 - Ementa da disciplina “Instrumento Suplementar Canto Popular

    1”.................................................................................................................... 67

    Quadro 2 - Ementa da disciplina “Instrumento Suplementar Canto Popular

    2”.................................................................................................................... 67

    Quadro 3 - Ementa da disciplina “Instrumento Principal Canto Popular 1”... 70

    Quadro 4 - Ementa da disciplina “Instrumento Principal Canto Popular 2”... 71

    Quadro 5 - Ementa da disciplina “Instrumento Principal Canto Popular 3”... 71

    Quadro 6 - Ementa da disciplina “Instrumento Principal Canto Popular 4”... 71

    Quadro 7 - Ementa da disciplina “Instrumento Principal Canto Popular 5”... 72

    Quadro 8 - Ementa da disciplina “Instrumento Principal Canto Popular 6”... 72

    Quadro 9 - Ementa da disciplina “Performance de Instrumento ou Canto

    A”.................................................................................................................... 74

    Quadro 10 - Ementa da disciplina “Performance de Instrumento ou Canto

    B”.................................................................................................................... 75

    Quadro 11 - Ementa da disciplina “Performance de Instrumento ou Canto

    C”.................................................................................................................... 75

    Quadro 12 - Ementa da disciplina “Performance de Instrumento ou Canto

    D”.................................................................................................................... 76

  • Lista de Abreviaturas CEFET Centro Federal de Educação Tecnológica

    CONSEPE Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão

    EAD Educação a distância

    IA Instituto de Artes

    IFPE Instituto Federal de Pernambuco

    ENEM Exame Nacional do Ensino Médio

    FAP Faculdade de Artes do Paraná

    GEV-RJ Grupo de Estudos da Voz do Rio de Janeiro

    IFPE Instituto Federal de Pernambuco

    LEM Linguagem e Estruturação Musical

    MEC Ministério da Educação

    MPB Música Popular Brasileira

    Reuni Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão

    das Universidades Federais UAB Universidade Aberta do Brasil

    UFC Universidade Federal do Ceará

    UFMG Universidade Federal de Minas Gerais

    UFPB Universidade Federal da Paraíba

    UFPEL Universidade Federal de Pelotas

    UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul

    UFSCar Universidade Federal de São Carlos

    UFSJ Universidade Federal de São João del-Rei

    UnB Universidade de Brasília

    Unespar Universidade Estadual do Paraná

    Unicamp Universidade Estadual de Campinas

    UNILA Universidade Federal da Integração Latino-Americana

    UNIRIO Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

    TCC Trabalho de Conclusão de Curso

  • Sumário

    Introdução .................................................................................................... 13  Delimitação do problema e objetivos ..................................................................... 16  

    1. A música popular no cenário musical acadêmico ............................... 17  1.1 O canto popular nas universidades públicas brasileiras ................................. 19  1.3. Abordagem das teorias do currículo ............................................................... 23  1.4. A metodologia e os métodos de coleta de dados ........................................... 26  

    1.4.1 Sujeitos ............................................................................................................................ 31  2. Panorama atual do ensino do canto popular ........................................ 35  

    2.1 O canto popular como habilitação específica na Unicamp .............................. 39  2.2 O canto popular como “Instrumento”: uma habilitação em execução nos cursos de Bacharelado em Música Popular .......................................................... 42  2.2.1 Universidade Estadual do Paraná (Unespar) ............................................... 42  2.2.2 Universidade Federal da Bahia (UFBA) ....................................................... 43  2.2.3 Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) .......................................... 45  2.3 O canto popular como “disciplina” e “habilitação” nos cursos de Licenciatura em Música ............................................................................................................. 46  2.3.1 Universidade Federal da Paraíba (UFPB) .................................................... 47  2.3.2 Universidade de Brasília (UnB) .................................................................... 50  2.3.3 Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ) ..................................... 51  2.3.4 Instituto Federal de Pernambuco - campus Belo Jardim (IFPE) .................. 53  2.3.5 Universidade Federal do Ceará (UFC) ......................................................... 55  2.4 O Canto Popular a Distância na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) ............................................................................................................... 56  2.5 Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) .................... 57  

    3. Análise das entrevistas ........................................................................... 59  3.1 O que se entende como canto popular: opiniões docentes ............................ 60  3.2 Concepção dos professores sobre o currículo de canto popular .................... 62  

    3.2.1 Fundamentos dos conteúdos no currículo: discussão a partir das ementas e conteúdos programáticos ........................................................................................................................... 66  

    3.2.1.1 As disciplinas do curso de Licenciatura em Música da UnB .......................... 68  3.2.1.2 As disciplinas do curso de Bacharelado em Música Popular da UFMG ......... 75  

    3.2.2 Áreas de conhecimento envolvidas ................................................................................. 78  3.2.3 Critérios para estruturação, seleção e organização dos conteúdos ................................ 80  

    3.3 Concepção didático-pedagógica dos docentes ............................................... 83  3.3.1 Como desenvolvem suas metodologias .......................................................................... 85  3.3.2 Como o professor avalia .................................................................................................. 92  

    4. Conclusão ................................................................................................ 95  REFERÊNCIAS ........................................................................................... 100  APÊNDICES ................................................................................................ 105  ANEXOS ...................................................................................................... 142  

  • Nas experiências cotidianas miúdas, nas brechas, nas frestas e fissuras, nas reexistências afirmativas, nas transgressões, nas rasuras,

    nas rebeldias e nas traições cotidianas, nas opacidades, na clandestinidade, nas diversas micro-ousadias,

    nas epifanias que irrompem, acontecem ações instituintes. Plurais, muitas vezes não normatizadas,

    podemos falar mais uma vez de experiências curriculares que se instituem como temporalidades outras,

    realizações curriculares outras, bricolagem outras. Fachos de luz caminhando e iluminando situações curriculares,

    fundando uma heterogeneidade que queremos cada vez mais ampliada, cada vez mais irredutível, cada vez mais socialmente referenciada e que

    pode nascer de con-versações socialmente engendradas. " (Roberto Sidnei Macedo, 2013)

  •   13  

    Introdução

    A música popular brasileira é reconhecida internacionalmente por

    sua qualidade e diversidade, tendo se tornado uma das mais relevantes

    manifestações culturais do país. No entanto, há cerca de 30 anos, a

    universidade pública brasileira oferecia somente o ensino da música erudita1,

    de origem europeia, mais precisamente a música de concerto e de câmara.

    Nas universidades, o que mais se aproximava do Brasil, no ensino da música,

    eram as obras dos compositores do período nacionalista, a exemplo de Heitor

    Villa-Lobos. Ao focalizarmos a história da produção e ensino de música no

    Brasil, encontramos algumas concepções musicais oriundas das vanguardas

    europeias, introduzidas nas universidades brasileiras, como, por exemplo, o

    dodecafonismo2 e o serialismo3.4 A partir do final dos anos 1930, com a

    chegada do compositor, musicólogo e professor alemão, posteriormente

    naturalizado brasileiro, Hans Joachim Koellreuter, em 1937, somaram-se

    àquelas propostas musicais a ideia de uma música que considerasse

    elementos diatônicos e populares. Na Universidade Federal da Bahia (UFBA),

    no final dos anos 60, um grupo se organizou em torno dessas ideias,

    fundando o Grupo de Compositores da Bahia5. Nessa mesma época, em

                                                                                                                   1O primeiro curso de música popular do Brasil surgiu em 1989, na Unicamp. 2 Dodecafonismo é uma técnica de estruturação musical que utiliza uma série de doze sons de alturas diferentes, ou seja, uma permutação da escala cromática, como principal elemento unificador (BRITO, 2001, p. 141). 3 Serialismo é uma técnica de estruturação musical. Maneira de estruturar a composição baseando-se na ordenação serial de vários ou todos os parâmetros musicais utilizados na obra (BRITO, 2001, p. 140). 4  "O movimento Música Viva foi criado no Brasil, em 1938, por obra de H. J. Koellreutter, sendo suas primeiras realizações e atividades efetivamente concretizadas no ano seguinte. Assim, desde 1939 e ao longo de toda a década de 40, vemos desenvolver-se um movimento pioneiro de renovação, tendo por meta instaurar uma nova ordem no meio musical, inicialmente no Rio de Janeiro e após em São Paulo. Suas principais características definem-se pelo ineditismo de propostas na área cultural, atualidade do pensamento musical, convergência com tendências estéticas, filosóficas e políticas da vanguarda internacional e assim gerador de dinamismo junto ao ambiente da época". KATER, Carlos. Música Viva. Disponível em: http://dc.itamaraty.gov.br/imagens-e-textos/revista-textos-do-brasil/portugues/revista12-mat13.pdf. Acesso em: 08 fev. 2017. 5 O Grupo de Compositores da Bahia foi criado por Ernst Widmer, na Universidade Federal da Bahia, na época, Universidade da Bahia, inspirado nas concepções e no pensamento educacional e musical de Koellreutter, que criou os Seminários Livres de Música, entre 1954 e 1962, espaço de fomento do pensamento de vanguarda da música erudita na Bahia. Após a saída de Koellreuter da Bahia, em 1963, Widmer assumiu o ensino de composição e o cargo de diretor substituto dos Seminários. "A respeito do ensino de composição, ele assim

  •   14  

    1963, surgia, na cidade de Santos, em São Paulo, o movimento “Música

    Nova”, cujos compositores propunham pesquisas sobre microtonalidade,

    música concreta e música eletroacústica6.

    Dessa forma, percebemos que as universidades brasileiras, ao

    longo de sua trajetória, dialogaram, timidamente, em alguns momentos, com

    elementos musicais populares, embora não tenham estabelecido a

    possibilidade efetiva do ensino de música popular. Somente em 1989, com a

    criação do curso de Música Popular na Universidade Estadual de Campinas

    (Unicamp), surgiu o primeiro curso voltado para o canto popular no âmbito da

    universidade pública no Brasil.

    Desde então, entre outros fatores, que serão detalhados adiante, o

    ensino formal do canto popular vem se consolidando, impulsionado por um

    grande interesse pela temática da canção nos últimos anos e pela crescente

    demanda pelo ensino formal dessa modalidade.

    Assim, a presente investigação versa sobre o currículo de canto

    popular a partir da análise da inserção do ensino da música popular nas

    universidades públicas. Como ponto de partida, apresentaremos uma breve

    descrição do primeiro curso de música popular a oferecer o ensino do canto

    popular na universidade pública, a Unicamp. Posteriormente, apresentaremos

    as demais universidades públicas que oferecem essa formação, seja como

    “habilidade específica”, nos cursos de bacharelado em música popular, ou

    como disciplina, nos cursos de licenciatura em música. São também citados

    os cursos ofertados nas demais universidades, porém com diferentes graus

    de aprofundamento quanto à sua estrutura e a seu funcionamento.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                 se expressou já no final de sua vida: essa postura que, de certa forma, reflete as ideias assentadas por Koellreutter, já se encontra na 'Declaração de Princípios do Grupo de Compositores da Bahia', um documento datado de 30 de novembro de 1966, elaborado por Jamary Oliveira e Milton Gomes para ser inserido no programa de um concerto do Grupo. Em seu famoso Parágrafo único – 'Estamos contra todo e qualquer princípio declarado' –, a atitude rebelde, iconoclasta, tanto se justifica na ideologia de ensino plantada por Koellreutter e Widmer nos Seminários Livres de Música, quanto no palco dos acontecimentos políticos e sociais da época." NOGUEIRA, Ilza. A criação musical em diálogo com o contexto político-cultural: o caso do Grupo de Compositores da Bahia. Disponivel em: < http://rbm.musica.ufrj.br/edicoes/rbm24-2/rbm24-2-06.pdf>. Acesso em: 8 fev. 2017. 6 “No final dos anos cinquenta, um grupo de jovens compositores e músicos de Santos começou a trabalhar com essa orientação, à luz de diretrizes europeias, e em 1963 lançou um manifesto que marcou época. Era o grupo Música Nova, integrado por Gilberto Mendes, Willy Correia de Oliveira, Damiano Cozzela, Rogério Duprat e Júlio Medaglia”. (MARIZ, 2005, p. 331).

  •   15  

    Justifica-se esta pesquisa por considerarmos que se trata de uma área recente no âmbito da universidade pública brasileira, que demanda

    investigações. Acreditamos ser relevante descrever e investigar como está

    ocorrendo essa inserção nos principais cursos de graduação em música que

    oferecem a disciplina de canto popular, seja nos cursos de Bacharelado ou

    de Licenciatura. A discussão proposta neste trabalho é fruto da inquietação

    sobre o ensino do canto popular pautado nas experiências vivenciadas pela

    autora em sala de aula, como professora de canto popular no curso de

    Bacharelado em Música Popular da UFBA. Assim, esta investigação também

    justifica-se pela crescente demanda dos professores de canto popular, que

    mais do que nunca percebem a importância de aprofundar esse estudo como

    forma de ampliar os horizontes e possibilidades dos sujeitos, enquanto

    intérpretes e artistas, bem como na formação de novos professores de canto

    popular. Portanto, são emergentes essas reflexões e discussões sobre a

    efetividade das formações e sobre as contribuições para o desenvolvimento

    desses sujeitos implicados no contexto de formação do canto popular.

    Acreditamos na relevância deste trabalho no atual contexto, na medida em

    que observamos uma ampliação dos conceitos referentes ao estudo da

    música popular, o que reflete na criação e abertura das universidades para

    essa modalidade de ensino. Apesar da discussão sobre o tema já existir há

    algum tempo, Green (apud COUTO, 2006) afirma que apenas recentemente

    as estratégias de ensino da música popular estão efetivamente mudando.

    Nesse sentido, afirma que:

    Compreender os contextos nos quais a música popular acontece, bem como suas formas de transmissão de conhecimentos, práticas, valores, filosofia e conceitos, torna-se de suma importância para que o trabalho do professor e o uso dessa música sejam significativos. Nesse sentido, o que passa a ter maior importância não é apenas o “ produto” em si, ou seja, o conteúdo; o que realmente importa é o “ processo”, ou seja a “ autenticidade da aprendizagem musical”. (p. 90).

    De forma geral, a concepção por trás desse movimento de inserção da

    música popular nos cursos de música está relacionada à crescente demanda

    por um ensino de música mais alinhado com a realidade nacional.

  •   16  

    Delimitação do problema e objetivos  

    Conforme o ensino do canto popular vem crescendo no âmbito

    acadêmico brasileiro, algumas inquietações se colocam diante da

    estruturação dos currículos e formação dos futuros cantores e professores de

    canto popular. Dentre elas, enfatizamos a forma como os currículos vêm

    sendo construídos, e como os professores têm desenvolvido suas

    metodologias.

    Desse modo, o objetivo da presente dissertação é traçar um

    panorama sobre o ensino do canto popular na universidade pública, detendo-

    se particularmente na análise de como ele ocorre na Universidade Federal de

    Minas Gerais (UFMG) e na Universidade de Brasília (UnB). Para tanto, por

    meio de entrevistas com os professores das duas universidades, buscamos

    descrever como se organiza o curso, no que concerne aos currículos

    articulados às praticas desenvolvidas por cada um.   Como objetivos

    específicos, a presente dissertação investiga como o canto popular vem

    sendo ensinado e sistematizado na universidade pública brasileira; discorre

    ainda sobre a concepção didático-pedagógica do ensino do canto popular,

    apresentando um histórico da inserção dessa modalidade de ensino, suas

    propostas curriculares e como os professores desenvolvem suas

    metodologias e elegem seus conteúdos.

  •   17  

    1. A música popular no cenário musical acadêmico

    No Brasil o ensino da música popular chega à universidade pública no final da década de 1980, na Unicamp, iniciativa pioneira que vem

    impulsionada por um momento de interesse e valorização mundial sobre o

    assunto. Em sua pesquisa sobre os procedimentos do ensino do canto

    popular na Unicamp, Queiroz (2009) apresenta um histórico sobre o

    surgimento desse primeiro curso de música popular no Brasil, através de

    entrevistas com alguns dos professores fundadores do curso. Nesse sentido,

    Queiroz (2009) verificou que a ideia de criar um curso de música popular

    surgiu em 1987, nos encontros do “Grupo de Estudos da Música Popular”, do

    qual faziam parte os professores Ney Carrasco, Eduardo Andrade, Valter

    Krausher, Paulo Pugliese, Ricardo Goldemberg e Rafael dos Santos, os

    quais mantinham encontros semanais para pensar e estruturar as ideias do

    curso, que teve seu início em 1989. A música popular, segundo Egg (2013), apesar de ser a que

    mais circula, conquista público e constrói significado para as pessoas nos

    espaços comerciais (fonográficos, rádio, cinema), vinha sendo

    historicamente ignorada pelo ambiente acadêmico. No século XX, a

    academia se dedicou a consolidar e ampliar o modelo clássico de ensino da

    música europeia, mesmo com o desenvolvimento de novas modalidades de

    produção, circulação e os novos modelos de criação que surgiram ao longo

    do tempo:

    O mais cotidiano dos objetos de consumo da sociedade moderna não figurava de modo relevante, nem mesmo como objeto de pesquisa de determinadas áreas do conhecimento, como as ciências sociais, comunicação ou estudos da linguagem. (Jornal da Unicamp, 2006, p. 23)7.

                                                                                                                   7 Considerações de Edgar Morin, Jornal da Unicamp, 2006, p. 23. Disponível em: http://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/jornalPDF/ju339pg23.pdf . Acesso em: 15 jun. 2016

  •   18  

    A esse respeito, Barbosa (1998) afirma:

    A educação poderia ser o mais eficiente caminho para estimular a consciência cultural do indivíduo, começando pelo reconhecimento e apreciação da cultura local. Contudo, a educação formal no Terceiro Mundo Ocidental foi completamente dominada pelos códigos culturais europeus e, mais recentemente, pelo código cultural norte-americano branco. A cultura indígena só é tolerada na escola sob a forma de folclore, de curiosidade e esoterismo; sempre como uma cultura de segunda categoria [...] Somente no século vinte, os movimentos de descolonização e de liberação criaram a possibilidade política para que os povos que tinham sido dominados reconhecessem sua própria cultura e seus próprios valores. (p. 13).

    Mesmo que todas as concepções de música possam ser

    consideradas culturalmente equivalentes, percebe-se no senso comum essa

    dicotomia entre o erudito e o popular, que tem uma tradição histórica, a

    hierarquia entre alta cultura – ou erudita - e a cultura popular. Para Marín

    (2009, p.128), “assumir a interculturalidade como perspectiva possibilita-nos

    o reconhecimento e a valorização de outros sistemas culturais, para além de

    toda a hierarquização, em um contexto de complementaridade”. Não se trata

    de anular ou excluir a tradição europeia, mas reconhecer, valorizar e

    fortalecer as tradições locais, considerando a questão da hibridação entre

    culturas.

    Afinal, estamos tratando de música popular, que nasceu e

    floresceu a partir de um ambiente próprio, formado por muitas referências, de

    diversas origens. Essa discussão passa pela questão de que não se defende

    nenhum suposto “purismo” cultural, artístico, estético e educativo, mas um

    equilíbrio de forças, em relação à produção artística e cultural local, no

    sentido de abrir espaço para uma reflexão que seja de inclusão e não de

    exclusão. Marín (2009) relaciona a proposição da interculturalidade com a

    descolonização do poder e do saber, fundamental para reconhecer que

    existem outras visões de mundo e múltiplos conhecimentos que também são

    válidos.

    Nesse sentido, surge a necessidade de se compreender as

    experimentações no campo de ensino do canto popular e as tendências que

    apontam para a criação e desenvolvimento de metodologias e formas de

  •   19  

    ensino-aprendizagem mais adequadas à nossa realidade cultural. Nesse

    contexto, insere-se esta reflexão sobre o ensino da música popular na

    academia, com base no reconhecimento das diversas identidades envolvidas

    no processo formativo, na consciência cultural e na apreciação do saber

    local. Quijano (2005) esclarece sobre essa busca nas ciências sociais latino-

    americanas:

    A elaboração intelectual do processo de modernidade produziu uma perspectiva de conhecimento e um modo de produzir conhecimento que demonstram o caráter do padrão mundial de poder: colonial/moderno, capitalista e eurocentrado. Essa perspectiva e modo concreto de produzir conhecimento se reconhecem como eurocentrismo8. Sua constituição ocorreu associada à específica secularização burguesa do pensamento europeu e à experiência e às necessidades do padrão mundial de poder capitalista, colonial/moderno, eurocentrado, estabelecido a partir da América. (p. 115).

    Especificamente no Brasil, podemos destacar referências a

    estudos sobre cultura e dominação em obras de Darcy Ribeiro e Milton

    Santos, por exemplo, embora o conceito de descolonização tenha sido visto

    como uma especificidade do debate latino-americano nas ciências sociais,

    que compreende o questionamento à matriz colonial do poder/ser/saber. Para

    Marín (2009), uma primeira condição para elaborar a análise da

    descolonização do saber é através do conceito de interculturalidade9, onde

    não haja diferenciação entre cultura “alta” e “baixa”, com base na

    revalorização das línguas e culturas locais e sua inserção no contexto global.

    1.1 O canto popular nas universidades públicas brasileiras

    Na universidade pública brasileira o ensino do canto popular vem

    sendo praticado há 27 anos, a partir da criação do primeiro curso de música

    popular em 1989, na Unicamp. No entanto, somente nos últimos anos essa

                                                                                                                   8Eurocentrismo é, aqui, o nome de uma perspectiva de conhecimento cuja elaboração sistemática começou na Europa Ocidental antes de meados do século XVII, ainda que algumas de suas raízes são sem dúvida mais velhas, ou mesmo antigas, e que nos séculos seguintes se tornou mundialmente hegemônica percorrendo o mesmo fluxo do domínio da Europa burguesa. (Quijano, 2005). 9 Interculturalidade - "Intercultural significa a interação entre as diferentes culturas” (Barbosa, 2003).

  •   20  

    modalidade de ensino passou a integrar os programas de outras

    universidades públicas do país.

    Vários fatores contribuíram para a inclusão do canto popular

    como objeto de ensino nos meios acadêmicos. Dentre eles, podemos citar

    o momento de efervescência das pesquisas acadêmicas em torno da

    canção em diversas áreas do conhecimento, o que levou à consolidação da

    temática da canção nos meios acadêmicos, com a publicação de diversas

    pesquisas e eventos, tais como a elaboração da Teoria Semiótica da

    Canção de Luiz Tatit, e eventos como o “Encontro da Palavra Cantada”.

    A “Semiótica da Canção”, foi criada em 1994 por Luiz Tatit e, de

    acordo com Machado (2012), essa é, até agora, a mais expressiva

    comprovação do reconhecimento nos meios acadêmicos da importância da

    canção. Essa teoria tem servido de base para diversos estudos

    desenvolvidos por pesquisadores como Dietrich (2003), Coelho (2007) e

    Segretto (2015), que têm trabalhado a partir da “Semiótica da Canção”

    abordando, além da própria canção, elementos de arranjo, por exemplo.

    Nesse contexto, destacamos os que foram desenvolvidos por Machado

    (2007 e 2012), tratando da gestualidade da voz na canção popular, em

    seus trabalhos de mestrado e tese de doutoramento, nos quais, aplicando a

    semiótica da canção, inicia uma estruturação analítica e acrescenta

    terminologia descritiva do comportamento vocal, analisando algumas das

    principais vozes do Brasil com base na escuta de fonogramas.

    Já o “Encontro da Palavra Cantada”10, com edições em 2000, 2006

    e 2011, no Rio de Janeiro, foi organizado objetivando a criação de um espaço

    no qual especialistas11 das diferentes áreas de conhecimento pudessem

    dialogar sobre suas pesquisas em torno da palavra cantada. Com o despertar

    desse interesse pelo objeto da canção, o canto popular ganha voz como

    tema acadêmico, através de um processo que foi, pouco a pouco, dando

    visibilidade ao estudo da música popular como elemento importante da

    História, como resume Egg (2013):

                                                                                                                   10 O Encontro da Palavra Cantada deu origem a publicações, com artigos dos pesquisadores participantes, em cada uma das edições. 11 Semiologistas, sociólogos, filósofos, antropólogos, cantores, etnomusicologos, professores de canto, historiadores, músicos, pedagogos, por exemplo.

  •   21  

    O ensino da música popular chegou à academia através das ciências sociais, dentro de um processo de renovação metodológica no campo da história. O surgimento de revistas especializadas, departamentos de estudos e cursos acadêmicos voltados para a música popular, bem como uma ciência que vai desenvolvendo metodologia própria, derivada das combinações de história, sociologia e antropologia, demonstra essa nova tendência. (EGG, 2013).

    Outro fator que possivelmente contribuiu para a inclusão da

    música popular, e consequentemente do canto popular, na universidade, foi a

    criação do Programa do Governo Federal de Apoio a Planos de

    Reestruturação e Expansão das Universidades Federais Brasileiras (Reuni)12 . Nesse clima de restruturação, percebeu-se a necessidade da

    criação e desenvolvimento de metodologias e formas de ensino-

    aprendizagem mais coerentes com nossa realidade cultural, musical,

    artística, mesmo sem deixar de levar em conta outras referências mais

    consolidadas enquanto estudo sistematizado, como aquelas relacionadas à

    cultura europeia ou mesmo estadunidense.

    De acordo com Queiroz (2009), fatores como a importância da

    canção para a música popular garantem a presença do canto popular nos

    currículos dos novos cursos quase que automaticamente. Nesse sentido,

    Queiroz (2009) entrevistou diversas pessoas questionando se era possível

    pensar o curso de música popular sem canto popular, e, nos depoimentos

    colhidos por ele, constatou que há uma crença de que o canto é

                                                                                                                   12 “O Reuni faz parte do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e foi instituído em 6 de abril de 2007, pelo Decreto Presidencial n. 6.096, sob o pressuposto do importante papel das universidades federais no desenvolvimento econômico e social do país. Sua principal finalidade é reduzir as desigualdades sociais com relação ao acesso e à permanência no ensino superior. Para tanto, conforme consta nesse Decreto, o Governo Federal cogitou alcançar, em cinco anos, a meta de 30% de jovens, entre 18 e 24 anos, matriculados no ensino superior. Em 2007, esse percentual se encontrava na casa dos 13,1%, ou seja, 86,9% dos brasileiros, entre 18 e 24 anos, não cursavam esse nível de ensino. O Reuni estabeleceu também a meta de elevar a taxa de conclusão média em cursos de graduação para 90% e a relação de um professor para dezoito alunos de graduação em cursos presenciais. Ainda de acordo com o Decreto Presidencial n. 6.096, de 24 de abril de 2007, foram traçados objetivos de ampliação do acesso à educação superior por meio de promoção do aumento das vagas em cursos de graduação, de oferta de cursos noturnos e de ocupação de vagas ociosas. Propôs o incentivo às inovações pedagógicas e o combate à evasão como estratégias de elevação das condições de permanência e sucesso dos alunos nesse nível de ensino”. LIMA, Edileusa Esteves e MACHADO, Lucília Regina de Souza. Reuni e Expansão Universitária na UFMG de 2008 a 2012. Educ. Real. [online]. 2016, vol.41, n.2, pp.383-406. ISSN 0100-3143. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/2175-623654765. Acesso em: 02 fev. 2017.

  •   22  

    imprescindível, pois “a expressão central da música popular é a canção13”, o

    que demonstra que o conhecimento da música para muitas pessoas ocorre

    através da música cantada.

    A efetiva criação de novos cursos e a abertura das universidades

    federais para a inclusão do Bacharelado em Música Popular, como ocorreu

    na UFBA e na UFMG, só se concretizaram em 2009, dentro do processo do

    Reuni. Esse processo também beneficiou a Universidade Federal da Paraíba

    (UFPB), com o curso de música popular oferecido no formato de curso

    sequencial14, no qual a disciplina canto popular passa a integrar o currículo

    do curso de Licenciatura em Música, fato que também ocorre na UnB, onde a

    tramitação para implementação do curso de música popular está em

    andamento e a disciplina vem sendo ofertada desde 2010, no curso de

    Licenciatura em Música.

    Podemos verificar que depois do surgimento do primeiro curso de

    música popular na universidade pública brasileira, em 1989, na Unicamp,

    passaram-se nove anos para que surgisse o Bacharelado em Música

    Popular, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO),

    seguido pelo curso da Faculdade de Artes do Paraná (FAP), em 2003, que

    em 2013 passa a fazer parte da Universidade Estadual do Paraná (Unespar).

    Após a inciativa da Unicamp e dos cursos da UNIRIO e FAP, em

    pesquisa recente no site do Ministério da Educação (MEC),15 encontramos a

    oferta do ensino da música popular nas seguintes universidades públicas do

    país: UFMG, UFBA, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e

    Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Dessas instituições listadas,

    apenas três universidades não contemplam o ensino especifico do canto

    popular, embora ofereçam o curso de música popular: UNIRIO, UFPEL e

    UFRGS.

    Um terceiro fator que podemos mencionar e que contribuiu para a

    oferta do canto popular na universidade foi a crescente demanda pelo ensino

    formal dessa modalidade. Podemos verificar que uma grande parcela dos

    profissionais que atua hoje nas universidades como professores de canto                                                                                                                13 CARRASCO (Informação verbal) apud QUEIROZ (2009). 14 Os cursos sequenciais são cursos de nível superior, em uma formação específica numa dada "área de saber" e não numa "área de conhecimento e nas suas habilitações". 15 http://emec.mec.gov.br

  •   23  

    popular, se constitui de um grupo de pessoas que buscaram a universidade e

    tiveram que estudar o canto erudito por não encontrarem alternativa.

    Podemos exemplificar essa tendência na fala do diretor da Escola

    de Música da UFBA, Heinz Karl Schwebel, que, em entrevista ao Impressão

    Digital16 , afirmou que a criação do Curso de Música Popular na Bahia

    atendeu a uma demanda histórica da classe musical de Salvador, por um

    acesso formal ao ensino da música popular. Schwebel observou ainda que a

    demanda reprimida por tantos anos resultou numa procura muito superior, se

    relacionada aos índices padrões de outros cursos de música.

    Como participante ativa da iniciativa de inclusão da música popular

    na UFBA, enquanto docente dessa instituição verificamos, nesse processo, a

    grande demanda pelo ensino do canto popular. Podemos destacar dois

    fatores relevantes nessa tendência: a crescente competitividade no mercado

    de trabalho e a busca por aprimoramento técnico musical e vocal.

    1.3. Abordagem das teorias do currículo  

    Buscamos o estudo da teoria crítica do currículo para ampliar a

    compreensão sobre currículo e as suas relações entre conhecimento, poder

    e identidade social. Segundo Silva (2011), mesmo com as contribuições

    dessa teoria ainda existem questionamentos, através da teorização social

    cultural pós-estruturalista, às concepções entre saber e poder, onde o

    poder ainda se sobrepõe à organização do conhecimento. O autor

    relaciona a teorização social e o campo do currículo com o aporte do pós-

    estruturalismo e dos estudos culturais.

    As teorias da reprodução social, por exemplo, mostraram-nos como a distribuição desigual do conhecimento, através do currículo e da escola, constituem mecanismos centrais do processo de produção e reprodução de desigualdade social. Perspectivas mais culturalistas, como a de Bourdieu, por exemplo, contribuíram para nos fazer compreender como as desigualdades escolares escondem fundamentais relações entre cultura e poder. (SILVA, 2011, p. 185).

                                                                                                                   16 Entrevista realizada por alunos de Jornalismo da Faculdade de Comunicação da UFBA (FACOM), com o Diretor da Escola de Música da UFBA. Disponivel em: < http://impressaodigital126.com.br/?p=890 >. Acesso em: 30 jun. 2015.

  •   24  

    Nesse sentido, Cunha (2006) também aponta para a falta de

    questionamentos ao currículo. As formas e os métodos de ensinar eram o

    foco, mas o que ensinar não estava em questão, até as teorias da

    reprodução, desenvolvidas no campo da sociologia da educação,

    contribuírem para essa mudança de paradigma.

    Silva (2011, p. 189) define o currículo como uma atividade

    produtiva em dois sentidos: construímos e somos construídos por ele, ou

    seja: “o que nós, professores e estudantes, fazemos com as coisas e

    também aquilo que as coisas que fazemos, fazem a nós [...] o currículo é a

    construção de nós mesmos como sujeitos”, e complementa:

    [...] o currículo nos constrói como sujeitos particulares, específicos [...] não é, assim, uma operação meramente cognitiva [...] pode ser visto como um discurso que, ao corporificar narrativas particulares sobre o indivíduo e a sociedade, constitui-nos como sujeitos – e sujeitos também muito particulares [...] não está envolvido num processo de transmissão ou de revelação, mas num processo de constituição e de posicionamento: de constituição do indivíduo como um sujeito de um determinado tipo e de seu múltiplo posicionamento no interior das diversas divisões sociais. (p. 189-190).

    As narrativas do currículo legitimam os conhecimentos,

    representam e também excluem, valorizam e desvalorizam, instituem os

    cânones. O saber e o poder correspondem, segundo Silva (2011, p. 189),

    dentro da visão foucaultiana, ao conhecimento e dominação,

    respectivamente. “Currículo e poder estão mutuamente implicados”:

    O poder está inscrito no currículo através das divisões entre saberes e narrativas inerentes ao processo de seleção do conhecimento e das resultantes divisões entre os diferentes grupos sociais. Aquilo que divide e, portanto, aquilo que inclui/exclui, isso é o poder. Aquilo que divide o currículo – que diz o que é conhecimento e o que não é – e aquilo que essa divisão divide – que estabelece desigualdades entre indivíduos e grupos sociais – isso é precisamente poder. (SILVA, 2011, p. 191).

    Refletir sobre os atos de currículo pode nos responder acerca de

    como a sistematização se organiza no currículo e se traduz no ato curricular,

    no sentido de método. No campo do ensino do canto popular, temos um

    conjunto de professores que estão sistematizando de forma diferente o

    ensino do canto popular na universidade:

  •   25  

    Atos de currículos nos possibilitam compreender como os currículos e os atores curriculantes mudam, como mudam seus significantes, ou como conservam, de alguma maneira, suas concepções e práticas, como definem as situações curriculares e têm pontos de vista sobre as suas questões, como entram em contradição, produzem ambivalências, paradoxos e derivas [...] atos de currículo como conceito-acontecimento, como conceito-dispositivo, radicaliza o entendimento e apresenta dispositivos conceituais para aprofundarmos nossos convencimentos da emergência do currículo como uma construção social incessante e interessada. Orienta nossa práticas para percebê-las como instituintes, passíveis de crítica, compreensão cultural e histórica. (MACEDO, 2013, p. 24).

    Segundo Macedo (2013), os atos de currículo carregam e criam os

    etnométodos 17 para interpretar e agir com o conteúdo do currículo; se

    renovam no campo curricular como instituintes culturais e servem tanto para

    a compreensão das práticas quanto para a análise curricular. Os atos de

    currículo e seus etnométodos criam as condições fundantes para intervenção

    dos processos, compreensão das concepções e construções curriculares.

    Referem-se à capacidade de descrever, entender e analisar como se

    instituem os currículos.

    Para Macedo (2013), a ideia emergente de etnocurrículos tem

    como propostas: a desconstrução colonizadora com que os currículos são

    feitos e o processo de inclusão de atores sociais importantes nessa

    construção. Os alunos deixam de ser apenas portadores de sentido e

    passam a ser também criadores de sentido, na construção curricular, através

    de seus processos de aprendizagem, dando-lhes possibilidade

    emancipacionista.

    Nesse sentido, Macedo (2013) acredita que a página da tradição

    de se pensarfazer-currículo-para-o-outro-sem-o-outro possa ser transformada

    pelos processos formativos etnoimplicados em pensarfazer-currículo-com-o-

    outro, intercriticamente.

                                                                                                                   

    17 Conceito forjado pela etnometodologia, os etnométodos são compreendidos como métodos que os atores sociais produzem ao compreender e interferir com suas ações nas realidades que habitam, para todos os fins práticos. Neles estão presentes capacidades de descritibilidade, inteligibilidade e analisibilidade com as quais esses atores instituem as ordens sociais nas quais estão envolvidos. (MACEDO, 2013, p. 431).

  •   26  

    1.4. A metodologia e os métodos de coleta de dados    

    Como fonte de dados foram acessados os currículos dos cursos

    onde a disciplina está inserida, os planos de curso das disciplinas voltadas

    para essa formação e entrevistas com os professores dos cursos escolhidos.

    Outro recurso utilizado foi a observação de um ciclo de aulas, nas quais

    buscou-se compreender como cada professor desenvolve sua metodologia.

    Foram analisados os currículos das disciplinas de canto popular em duas

    universidades de dois estados do Brasil, para que assim pudéssemos, de

    alguma maneira, dimensionar a forma como a disciplina vem sendo

    organizada, pensada e desenvolvida pelos professores.

    Portanto, trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa, por

    meio da qual foi possível fazer entrevistas semiestruturadas (APÊNDICE A)

    com os professores dos cursos pesquisados, e uma análise documental das

    propostas curriculares dos respectivos cursos. Visto que ainda são poucas as

    publicações e referências nesse campo de ensino, o presente estudo possui

    caráter exploratório. Através do levantamento bibliográfico, da análise

    documental dos currículos e dos planos de aula atuais e das entrevistas

    (APÊNDICE B) com os professores, pretendemos compreender de que forma

    está ocorrendo essa formação.

    A abordagem qualitativa para o presente estudo se justifica pela

    característica do objeto, sua complexidade e, sobretudo, pelo aspecto

    subjetivo que lhe é subjacente. Portanto, nossa escolha recaiu sobre o

    método de pesquisa exploratória, visando problematizar mais do que

    encontrar respostas, incluindo como instrumentos de coleta de dados as

    entrevistas semiestruturadas, gravadas em áudio, com docentes que atuam

    no campo de ensino do canto popular, e a observação direta da prática

    pedagógica em um ciclo de aulas. Com base nos dados coletados, buscamos

    discutir a metodologia de ensino-aprendizagem, buscando contribuir para um

    pensamento reflexivo sobre a prática pedagógica do canto popular. Também

    procuramos verificar como esses experimentos estão acontecendo, como se

    organizam os conteúdos e como as experiências dos professores estão

  •   27  

    articuladas aos conteúdos programáticos, em termos não apenas dos itens

    dos currículos, mas também dos planejamentos de suas aulas.

    Assim, registramos o processo de cada professor, suas

    experiências, verificando como esses docentes sistematizam as técnicas de

    ensino de canto popular, descrevendo as metodologias desenvolvidas,

    observando de que forma cada um trabalha aspectos como a materialidade

    da voz, a performance, a gestualidade e o corpo. Dessa forma, descrevemos

    como cada professor realiza esse ofício, com o objetivo de incluir diferentes

    perspectivas e traçar um mapeamento dessa diversidade.

    É importante perceber que o aluno já vem com uma formação

    prévia, preconceitos, predisposições em aprender e não aprender, em ser

    seletivo e direcionar seus interesses. Nessa interação é que acontece a

    materialização do currículo. Nesse sentido:

    Arroyo (2011) fala-nos da experiência social como produtora de conhecimento, de como a tradição curricular separou de forma hierárquica e antinômica conhecimentos e experiências, valorizando o primeiro a partir de sua identificação vinculada às cosmovisões que se hegemonizaram em nossa sociedade, a exemplo do conhecimento livresco cientificamente legitimado. (Arroyo apud MACEDO, 2013, p. 23-24).

    A escolha pela pesquisa exploratória como método desta pesquisa

    deveu-se à prerrogativa de poder ampliar a visão sobre o problema que

    necessitamos investigar, focalizando a realidade de modo complexo e

    contextualizado. Assim, concluímos que uma investigação acerca das

    práticas pedagógicas de professores não pode ser abordada apenas numa

    perspectiva quantitativa de pesquisa, buscando correlações entre causa e

    efeito, como afirma Gil (2008): As pesquisas exploratórias têm como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores. De todos os tipos de pesquisa, estas são as que apresentam menor rigidez no planejamento. [...] Pesquisas exploratórias são desenvolvidas com o objetivo de proporcionar visão geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado fato. (p. 27).

  •   28  

    Para a análise do ensino do canto popular na universidade pública,

    é importante considerar que existem particularidades em cada caso

    estudado, visto que o canto popular está inserido em um curso de

    Licenciatura em Música, na UnB, e em um curso de Bacharelado em Música

    Popular, na UFMG. A UnB, por exemplo, oferta uma disciplina de canto

    popular no curso de Licenciatura, apresentando necessidades e público

    diverso daquele encontrado na UFMG, que oferta o curso específico de

    música popular. Além disso, trata-se de uma área recentemente inserida na

    academia e, portanto, ainda em fase de experimentações. Assim, isso reflete

    no modo como optamos por conduzir a presente pesquisa. A abordagem

    qualitativa tem sido frequentemente utilizada em estudos voltados para a

    compreensão da vida humana, sobretudo nas ciências sociais. Essa

    abordagem tem tido diferentes interpretações ao longo da história do

    pensamento científico, mas pode-se dizer que constitui estudos descritivos

    que buscam mais compreender e descrever do que trazer respostas aos

    problemas de pesquisa.

    A pesquisa documental utiliza fontes que ainda não tiveram um

    tratamento analítico contido nelas mesmas. Para Gil (2008), “os documentos

    podem ser reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa e as fontes

    são muito mais diversificadas e dispersas”. Nesta pesquisa, acessamos os

    currículos e projetos pedagógicos dos cursos investigados com o intuito de

    utilizá-los como base para os demais conteúdos analisados.

    Para uma análise dos planos de curso e o estabelecimento de uma

    relação com as observações em sala de aula, trabalhamos com o conceito-

    dispositivo de ato de currículo18, ou seja, o currículo que não está expresso

    nos programas, nos planos de aula, mas no que se realiza em sala de aula:

    É assim que a ideia de ato de currículo realça a processualidade criativa do currículo, sua instituinte materialidade, mais ainda de tudo, a responsabilização/particividade como concebeu, há mais de um século, Mikhail Bakhtin na sua filosofia do ato. Ato de currículo, como um conceito-dispositivo, levando em conta a práxis curricular, é um conceito-chave, um gesto ético-politico, um potente analisador da práxis curricular. (MACEDO, 2013, p. 19)

                                                                                                                   18 Conceito-dispositivo de ato de currículo significa pensar no currículo como um dispositivo educacional, resultante da multicriação implicada de atores sociais, via seus pertencimentos e suas afirmações socialmente referenciadas. (MACEDO, 2013).

  •   29  

    O currículo escrito é o roteiro onde temos um conjunto de disciplinas

    que são distribuídas numa certa sequência, as disciplinas precedendo uma a

    outra, sendo, dessa forma, o currículo é considerado como uma maneira de

    organizar um conjunto de disciplinas, com uma configuração mais identificada

    com uma matriz curricular. Contudo, ele é de fato o que vai acontecer entre o

    script escrito e a sala de aula, e se realiza no embate da relação do professor

    com o aluno, no ambiente da escola.

    Assim, analisamos currículos de diferentes universidades e

    diferentes cursos com o objetivo principal de compreender como os

    curriculantes 19 atuam no processo de ensino-aprendizagem, que está

    propenso a alterações nas interações e nas experimentações que podem

    apontar um novo direcionamento pedagógico: Estabelece-se aqui o aprender com a diferença enquanto ela quer se afirmar diferente e alterar como diferença, mesmo que o bem comum social e culturalmente referenciado seja algo a ser conquistado como processo emancipacionista, sem, entretanto, aceitarmos neste movimento qualquer conclusão integrativa, qualquer pretenso amálgama curricular sem face. Falar de bem comum socialmente referenciado não significa aceitarmos voltar ao forjado homogêneo, à desejada unicidade educacional que pauta a ideia de uma pretensa e impensável sociedade sem diferença, e uma educação para todos organizada por uma burocracia homogeneizante. (MACEDO, 2013, p.17).

    Para efeito desta pesquisa, procuramos entender como se

    apresenta a proposta didática de cada professor, a forma como ele planeja,

    avalia e medeia os conteúdos. Também como esses professores interagem

    com os alunos e se utilizam uma concepção e ação mais tecnicista ou

    conteudista, por exemplo.

    As entrevistas foram analisadas à luz do método da análise de

    conteúdo de Laurence Bardin (2011), com base em uma concepção de

    entrevista não diretiva ou centrada na pessoa, em que algumas condições

    são estabelecidas. Bardin entende que o entrevistador deve ter uma atitude

    de consideração positiva e incondicional, na qual deve tentar colocar-se a

                                                                                                                   19 Criadores de atos de currículos.

  •   30  

    partir do ponto de vista do entrevistado e no seu quadro de referência,

    buscando não aplicar juízo de valor ou desvalorização, em uma atitude de

    empatia. Ainda segundo a autora, a entrevista deve desenvolver-se segundo

    a lógica própria do entrevistado, sendo as únicas limitações as instruções em

    relação ao tema que interessa ao entrevistador, e a presença deste como

    interlocutor. Deve haver uma pré-formação mínima, ou seja, não utilizando

    questionários pré-formados, e deve apresentar um caráter de improvisação

    devido a uma relativa autonomia, certa unidade e coerência, ou seja, cada

    entrevista deve formar um todo original e singular, porém comparável às

    outras, devido à padronização da questão inicial, uma focalização do

    conteúdo na relação (subjetiva) do locutor com o “objeto” do discurso

    (representação, atitude etc.), uma elaboração do pensamento aqui e agora,

    ligada à elaboração da palavra (BARDIN, 2011, p. 220-221).

    Bardin (2011) afirma também que devemos selecionar as unidades

    de significação, que são as respostas que têm sentido para a pesquisa. As

    categorias são elencadas através das falas dos entrevistados, que vão

    compor o corpus para o processo geral de análise, em suas diferentes

    etapas, que são a análise temática e a análise da enunciação. A análise

    temática precede a análise da enunciação e a complementa. A análise da

    enunciação é desenvolvida em vários níveis: nível das sequências, das

    proposições e dos elementos atípicos. A interpretação vai ocorrer

    confrontando-se os diferentes indicadores propostos pela pesquisa e

    refletidos nas questões propostas pela entrevista:

    A análise temática: é transversal, isto é, recorta o conjunto das entrevistas por meio de uma grade de categorias projetada sobre os conteúdos. Não se têm em conta a dinâmica e a organização, mas a frequência dos temas extraídos do conjunto dos discursos, considerados dados segmentáveis e comparáveis. A análise da enunciação: cada entrevista é estudada em si mesma com uma totalidade organizada e singular. Trata-se do estudo dos casos. A dinâmica própria de cada produção é analisada e os diferentes indicadores adaptam-se à irredutibilidade de cada locutor. (BARDIN, 2011, p. 222-223).

    Nesse sentido, o discurso vai ser analisado com base em uma

    perspectiva em construção, através da qual são confrontados os elementos

    constitutivos do pensamento, da ação, das motivações e desejos dos

  •   31  

    entrevistados, transversalizados pelo que é proposto como contextualização

    e provocação do entrevistador:

    Ora, uma produção de palavra é um processo. A análise da enunciação considera que na altura da produção da palavra é feito um trabalho, é elaborado um sentido e são operadas transformações. O discurso não é transposição cristalina de opiniões, de atitudes e de representações que existam de modo cabal antes da passagem à forma linguageira. O discurso não é um produto acabado mas um momento num processo de elaboração, com tudo o que isso comporta de contradições, de incoerências, de imperfeições. Isto é particularmente evidente nas entrevistas em que a produção é ao mesmo tempo espontânea e constrangida pela situação. (BARDIN, 2011, p. 218).

    De acordo com Bardin (2011), a análise de conteúdo pode ser

    considerada como “um conjunto de técnicas de análise das comunicações” e

    não apenas um instrumento. Na verdade, trata-se de um conjunto de

    possibilidades e técnicas de análise que vão assumir diferentes

    configurações e que podem ser adaptadas às mais diversas propostas

    investigativas no campo do discurso e das comunicações. “Enquanto esforço

    de interpretação, a análise de conteúdo oscila entre os dois polos do rigor da

    objetividade e da fecundidade da subjetividade.” (p.15).

    1.4.1 Sujeitos

    Para representar os dois tipos de cursos e modalidades de ensino

    em que a disciplina canto popular está inserida, através das opiniões

    docentes, selecionamos a UnB e a UFMG. Tal escolha deveu-se ao fato de

    cada uma dessas universidades representar um tipo de curso: uma

    oferece um bacharelado, a outra, uma licenciatura. Em relação às demais

    universidades que oferecem formação em canto popular, consideramos

    não ser adequado escolher a Unicamp, por ter como professora de canto

    popular a Dra. Regina Machado, orientadora desta pesquisa. Dos três

    cursos de bacharelado em música popular que oferecem essa formação,

    na UFBA temos a questão desta pesquisadora atuar como a professora

  •   32  

    de canto popular. Na Unespar, vimos que os trabalhos acadêmicos

    desenvolvidos no campo do ensino pela professora da instituição, Liane

    Guariente, tem um direcionamento para o canto coral, pois configura outro

    campo de atuação diferente daquele que buscamos enfocar no presente

    trabalho.

    Dos cinco cursos de licenciatura em música que oferecem a

    formação em canto popular, também não escolhemos a UFPB, já que a

    professora Daniella Gramani, que seria o sujeito pesquisado, embora

    tenha vasta experiência como cantora de música popular, centra o seu

    interesse sobre temas muito específicos: sua monografia de

    especialização traz reflexões sobre o Fandango do Paraná e em seu

    mestrado disserta sobre o aprendizado da rabeca. A UFSJ também não

    entrou na pesquisa no campo das opiniões docentes, ao levamos em

    consideração o fato da professora do curso, Valéria Braga, não possuir

    mestrado ou pesquisa na área do canto ou canto popular. Na IFPE, as

    duas professoras de canto popular, Katarina Menezes de Lourenço e

    Maria Rejane Campelo Silva, não possuem mestrado nem trabalhos

    acadêmicos publicados na área do canto popular. Na UFC, a inclusão do

    canto popular foi implantada muito recentemente.

    Na UFSCar, o canto popular é oferecido apenas na modalidade

    de educação a distância, portanto, diferenciando-se do modelo presencial

    que procuramos observar.20 Ressaltamos que a modalidade EAD, para o

    ensino do canto, traz outras implicações, que levariam a muitas outras

    questões para estudo e poderiam desviar a pesquisa para outro lugar de

    investigação que, neste momento, não seria do nosso interesse.

    A Universidade Federal de Integração Latino-Americana

    (UNILA) apresenta uma particularidade que dificultaria o tipo de análise

    que estamos fazendo, requerendo um trabalho bem mais extenso, pois a

    formação compreende paralelamente duas vertentes de estilo do canto: o

    lírico e o popular.

                                                                                                                   20 Esse curso da UFSCar foi o primeiro curso de graduação a distância em canto popular a ser criado em uma universidade pública brasileira.

  •   33  

    Na UnB, o canto popular é uma disciplina inserida no curso de

    Licenciatura em Música, nas modalidades EAD e presencial, com o objetivo

    principal de formar professores de canto popular. Já na UFMG, o canto

    popular é uma opção de formação no curso de Bacharelado em Música

    Popular. Assim, com essa escolha, acreditamos que contemplamos duas

    leituras diferentes dessa inserção, que são suficientes para nos permitir

    refletir sobre a situação do ensino do canto popular nas universidades

    públicas brasileiras, a partir do recorte realizado.

    Os sujeitos que compõem nossa pesquisa são dois professores de

    canto popular em duas universidades públicas do país: UnB e UFMG, como

    dito anteriormente. Como critérios de seleção, além dos diferentes campos

    de atuação de cada um, tivemos a representatividade e a atuação dos

    referidos professores no cenário educacional brasileiro e em modalidades

    diferentes de curso, sendo um do curso de Bacharelado em Música Popular e

    o outro do curso de Licenciatura em Música. Concorreu para essa escolha, o

    fato dos dois professores possuírem trabalhos acadêmicos sobre o ensino do

    canto popular. A professora Clara Sandroni desenvolveu a dissertação

    “Práticas de ensino de canto popular urbano brasileiro no Grupo de Estudos

    da Voz (GEV- RJ) e seus desdobramentos”, em 201321, orientada pelo

    professor Dr. José Alberto Salgado Filho. O professor Alexei Queiroz

    desenvolveu a dissertação “Canto Popular; pensamentos e procedimentos de

    ensino na Unicamp”, em 200922, sob orientação da professora Dra. Aci

    Taveira Meyer.

    Alexei Queiroz é professor do curso de Licenciatura em Música, na

    UnB, desde 2010. Relata que fez o concurso uma semana após sua defesa

    de mestrado na Unicamp. Sua experiência na docência foi como monitor de

    algumas disciplinas. Enquanto fazia a graduação, ministrou aulas em escolas

    particulares e também oficinas livres. Na UnB, vem trabalhando com as

    disciplinas Canto Instrumento Principal, Canto Suplementar, História da MPB

                                                                                                                   21  SANDRONI, Clara. Práticas de ensino de canto popular urbano brasileiro no grupo de estudos da voz (GEV-RJ) e seus desdobramentos. Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro, 2013. 22 QUEIROZ, Alexei Alves de. Canto popular e procedimentos de ensino na UNICAMP. Dissertação de mestrado. Campinas, 2009.

  •   34  

    e Linguagem e Estruturação Musical (LEM). Como cantor, Alexei Queiroz

    possui dois discos gravados, todos com canções compostas por ele.

    Começou cantando música popular brasileira com os amigos, trabalhando

    composições próprias. Em sua trajetória artística, passeou por diversos

    gêneros e estilos musicais, como rock, reggae, samba, música latino-

    americana, música caribenha. Declara que nos últimos anos deixou um

    pouco os palcos e tem se dedicado exclusivamente às aulas. Atualmente seu

    foco artístico tem se direcionado ao trabalho como escritor. Possui graduação

    em Música Popular e mestrado em música pela Unicamp. Antes da formação

    em música, graduou-se em Ciências da Computação.

    Clara Sandroni, professora da UFMG desde 2015, leciona as

    disciplinas Performance, Prática de Conjunto, Improvisação Vocal, Grupo

    Vocal, Produção Musical e Grandes Grupos Instrumentais. Possui graduação

    em Música Popular e mestrado em Etnomusicologia pela UNIRIO.

    Atualmente é doutoranda em Etnomusicologia na UNIRIO. Sua vida

    profissional como professora de canto popular iniciou-se em 1991, mesmo

    ano em que começou a integrar o GEV-RJ, grupo existente há mais de 25

    anos. Sandroni afirma que o grupo foi responsável pelo desenvolvimento de

    sua formação docente e por ter lhe proporcionado o estudo de tudo

    relacionado à didática e pedagogia vocal. Além de atuar como professora

    particular, também atuou como professora convidada, por alguns anos

    seguidos, em festivais de música de Curitiba, Itajaí e Londrina. Na UFMG,

    vem ministrando as disciplinas Performance em Canto Popular - que é a

    matéria obrigatória para os alunos que fazem vestibular para Canto Popular -,

    Prática de Conjunto para Cantor e Banda, Grupo Vocal para Canto Popular,

    Grandes Grupos Instrumentais - Canto Popular, Produção Musical e

    Improvisação Vocal. Clara Sandroni tem uma sólida carreira como cantora

    profissional iniciada em 1981, com 11 discos gravados, entre esses consta

    sua experiência com o grupo de samba “Lira Carioca”, com o qual gravou

    quatro discos. Destaca como um momento marcante em sua carreira a

    participação no disco de Milton Nascimento, Encontro e Despedidas, gravado

    em 1985. Mais tarde, teve Milton Nascimento como convidado em seu disco

    de 1990, cantando “Um Índio”. Gravou com outros grandes nomes da música

    popular brasileira, como Zé Renato, Paulo Baiano, Maurício Carrilho e

  •   35  

    Marcos Sacramento e com o guitarrista americano Al Di Meola. Sua carreira

    sempre foi muito centrada no Rio de Janeiro, mas viajou pelo Brasil como

    participante do projeto Pixinguinha, em 1987. Em 1991, participou do projeto

    Basf Chrome Music, com Milton Nascimento e Paulo Moura. Seu trabalho

    também é reconhecido internacionalmente, principalmente na França, país

    onde fez várias turnês. Tem como instrumento principal o violão, e em seu

    álbum Cassiopéia, gravou violão em cinco canções. Paralelamente, estudou

    por 17 anos com a professora de canto Clarisse Szajnbrum. Evidencia que

    com essa professora não se falava ou se dividia esteticamente o tipo de

    canto. A referida professora era especialista no estilo Barroco, mas dava aula

    de canto popular. Durante o trabalho com a professora Clarisse Szajnbrum,

    Clara afirma que nunca trabalhou nada além do repertório da música popular.    

  •   36  

    2. Panorama atual do ensino do canto popular

    Como dito anteriormente, o ensino do canto popular no Brasil vem

    sendo ofertado em nove universidades públicas sendo elas: a Unicamp, a

    Unespar, a UFBA, a UFMG, a UnB, a UFPB, a UFSJ, o IFPE - campus Belo

    Jardim -, a UFC, a UFSCar e a UNILA. Vem sendo oferecida, como

    disciplina, em modalidades diferenciadas de ensino e formação, para o cantor

    e para o professor de canto, nos currículos dos cursos de Bacharelado em

    Música Popular; como “instrumento” e como uma habilitação, nos cursos de

    Licenciatura em Música. Apenas na Unicamp o canto popular se configura

    enquanto habilidade específica nessa formação, no contexto da universidade

    pública, no país.

    O ensino do canto popular é oferecido, no quadro geral, em quatro

    diferentes modalidades de cursos, sendo elas: Bacharelado em Música Voz –

    Música Popular (Habilitação), Bacharelado em Música Popular (Execução),

    Licenciatura em Música (como disciplina), além da modalidade experimental

    de ensino de canto, integrando o popular e o erudito, o Bacharelado em

    Práticas Interpretativas em Canto. Dentre essas modalidades, destacamos

    duas propostas de ensino por sua originalidade no contexto dos cursos que

    oferecem o canto popular: a UNILA, que propõe em seu currículo a

    integração das formações em canto lírico e canto popular; e o formato de

    aulas de educação a distância, na UFSCAR e UnB.

    O canto popular era inicialmente oferecido pela Unicamp como

    uma disciplina que integrava a grade do curso de Bacharelado em Música

    Popular. Contudo, após uma reformulação curricular em 2009, o canto

    popular passou a ser uma das habilitações do currículo único do curso de

    música do Instituto de Artes (IA).

    O canto popular como uma opção de “instrumento”, no currículo

    dos cursos de Bacharelado em Música Popular, vem sendo oferecido na

    Unespar, desde 2003, na UFMG, desde 2009, e na UFBA, desde 2010.

    No currículo dos cursos de Licenciatura em Música, o canto

    popular figura como “disciplina” na UFSJ, desde 2008; UFPB, desde 2009;

    UNB, desde 2010, em formato presencial e EAD; no IFPE (campus Belo

  •   37  

    Jardim), desde 2013; na UFC, desde 2016; e na UFSCar, desde 2007 na

    modalidade de educação a distância; além do curso de Bacharelado em

    Práticas Interpretativas em Canto, UNILA, desde 2012.

    Gráfico 1 – Evolução da oferta de ensino do canto popular

    Como podemos observar no Gráfico 1, o ensino do canto popular,

    após a criação do primeiro curso na Unicamp, tem se expandido para outras

    universidades lentamente, e se intensifica no ano de 2010 com a abertura de

    quatro novos cursos, todos beneficiados pelo projeto de reestruturação das

    universidades, o Reuni, que abre suas portas para o ensino da música

    popular. Outro aspecto importante que destacamos é que de um total de

    nove cursos de bacharelado em música popular existentes no Brasil, apenas

    cinco oferecem o canto popular como opção de formação.

    1989  

    1994  

    1999  

    2004  

    2009  

    2014  

  •   38  

    Figura 1 - Quadro comparativo dos cursos de música popular que oferecem

    canto popular

    Música Popular Canto Popular

    Unicamp Unicamp

    UNIRIO -

    Unespar Unespar

    UFBA UFBA

    UFMG UFMG

    UFCE – SAXOFONE -

    UFGRS -

    UFPEL -

    UFPB – SEQUENCIAL UFPB

    O quadro anterior não representa a oferta geral do ensino de

    canto popular, visto que muitas das universidades que oferecem essa

    disciplina o fazem através dos cursos de licenciatura.

    Gráfico 2 – Localização e distribuição regional das instituições onde o canto

    popular vem sendo ensinado no Brasil

    Centro-‐Oeste  

    Nordeste  

    Norte  

    Sudeste  

    Sul  

  •   39  

    Como ainda são poucos os cursos que oferecem a formação em

    canto popular, ainda não é possível fazer uma observação crítica sobre a

    distribuição regional das instituições na quais o canto popular vem sendo

    ensinado no Brasil.

    Note-se no Gráfico 2, que na Região Norte não existe ainda

    representação na universidade pública para o canto popular. Nas outras

    regiões temos uma representação ainda pequena e concentrada nas capitais,

    mas já significativa.

    2.1 O canto popular como habilitação específica na Unicamp

    O curso de música oferecido pela Unicamp possui currículo único

    com quatro habilitações de bacharelado, sendo elas: Composição,

    Instrumento, Música Popular, Regência Plena e Regência Coral.

    Recentemente, no ano de 2015, o curso de Licenciatura em Música, que

    também integrava esse currículo foi desmembrado por uma demanda do

    CEE/SP.

    A reformulação que unificou o curso de música na Unicamp foi

    implementada no ano de 2008, pois, até então, todos os estudantes

    cumpriam um único currículo para cada modalidade. Uma das grandes

    preocupações declaradas do curso é oferecer ao aluno as ferramentas

    necessárias para a sua atuação profissional, em todas as especialidades

    possíveis da música popular, seja como instrumentista, cantor, arranjador ou

    produtor musical.

    A forma de ingresso regular no curso é através de vestibular

    nacional, onde anualmente são ofertadas duas vagas para os estudantes de

    canto popular. As outras formas de ingresso podem ocorrer através das

    vagas remanescentes disponibilizadas a partir do segundo semestre, por

    meio do reingresso de alunos graduados em outros cursos do IA. Existe

    também um processo seletivo para vagas adicionais para estudantes

    conveniados pelo MEC e para vaga de cortesia ofertada a estudantes

    estrangeiros, refugiados ou asilados.

  •   40  

    O canto popular, que antes figurava como uma das disciplinas ou

    instrumento do curso de Bacharelado em Música Popular, passa a ser uma

    habilitação, Voz – Música Popular, após uma reformulação curricular

    proporcionada pela reforma curricular implantada em 2012.

    O canto popular começou sob o comando da professora Luciana

    Souza e, após sua saída, permaneceu um período sem professor, como

    relata, em entrevista, o professor José Roberto Zan: “Por algum tempo, o

    ensino do canto popular na Unicamp ficou meio experimental com a

    professora Adriana e outros do canto erudito. [...] Regina Machado, foi quem

    mais sistematizou, até agora, o ensino do canto popular.” 23 (Informação

    verbal).

    Sobre os procedimentos pedagógicos que Regina Machado

    efetivou na cátedra de canto popular, Mariz (2013) afirma que:

    No inicio dos anos 2000, assumiu a cadeira de canto popular na mesma Unicamp, onde se graduara, e se dedicou a estruturar um curso específico para este tipo de canto, que comanda até hoje. O método de ensino criado e adotado por Regina Machado já formou inúmeros cantores importantes do cenário de música popular brasileira. (MARIZ, 2013, p.134).

    A Habilitação Voz - Música Popular, da Unicamp, ainda é o único

    curso especifico de canto popular, no contexto da universidade pública no

    Brasil, tendo como professora Regina Machado, desde 2002. Uma das 22

    habilitações oferecidas aos estudantes vinculados à matriz curricular do curso

    de música da Unicamp, reconhecido pela portaria MEC n° 911 de 31/07/1995

    e renovado pela Portaria CEE/GP n° 18 de 14/01/2014. Para graduar-se

    nesse curso, o aluno deverá obter o total de 174 créditos, correspondentes a

    2.610 horas de atividades supervisionadas, que poderão ser integralizadas

    em oito semestres, conforme proposta oferecida pela unidade para o

    cumprimento do currículo pleno, sendo o prazo máximo de integralização de

    12 semestres, de acordo com as Grades Curriculares do Núcleo Comum do

    Curso de Música/Voz – Música Popular (ANEXOS A e B).

    Além das disciplinas comuns a todos os estudantes, o estudante

                                                                                                                   23 Professor José Roberto Zan, em entrevista concedida em 23 de junho de 2015.

  •   41  

    de Voz - Música Popular deverá cumprir as disciplinas específicas de voz e

    música popular e cumprir 24 créditos com disciplinas que, além de música,

    podem ser dos currículos de artes cênicas, dança, artes plásticas, pedagogia,

    cinema, ou qualquer outra oferecida pela Unicamp.

    As principais disciplinas para a formação em Voz – Música Popular

    são: Voz I a Voz VIII; Canto na Música Popular - I ao VII; e Tópicos Especiais

    em Música Popular - I ao IV. As ementas das disciplinas Voz I a VIII incluem

    o estudo ordenado e progressivo do instrumento. Nas disciplinas Canto na

    Música Popular de I ao VII é traçado um estudo histórico e técnico do

    desenvolvimento da voz na canção popular brasileira, realizado a partir da

    escuta de fonogramas desde o início do século XX até a metade dos anos

    1940, passando pela chamada Época de Ouro da música popular brasileira;

    dos anos 1946 a 1962, período reconhecido como sendo de renovação do

    samba-canção e surgimento da bossa nova; fonogramas produzidos e

    veiculados nos anos 1960, período reconhecido pela realização dos Festivais

    da Canção, da Jovem Guarda e do Tropicalismo; dos conteúdos cancionais

    na obra do chamado Clube da Esquina; estudo progressivo e sistemático do

    repertório referente à musica caipira e ao samba paulista; e do repertório que

    caracteriza a vanguarda paulista, bem como a produção alternativa de

    música na cidade de São Paulo, nos anos 1980; canção popular produzida

    nos países da América Latina, com enfoque especial para Argentina, Chile,

    Cuba, Peru e México. Nas disciplinas de tópicos especiais, que traz como

    ementa geral o estudo programado de assunto relevante em área específica

    da música, os objetivos gerais de preparar os alunos para o trabalho artístico

    coletivo, considerando a formação de uma consciência crítica e da

    necessidade de compartilhamento de forças criativas, são trabalhados: a

    ocupação cênica a partir da aplicação da Teoria dos Six Viewpoints,

    desenvolvida pela coreógrafa Mary Overlie; a capacidade de improvisação

    livre, partindo das Sequências Minimais; e a capacidade crítica, a partir da

    leitura de textos relativos ao fazer artístico. Todas as disciplinas específicas

  •   42  

    para a formação do cantor popular são ministradas pela professora Dra.

    Regina Machado24.

    A Unicamp atualmente mantém grupos de pesquisa, cujos

    objetivos incluem assuntos relacionados à música popular: a) Música

    Popular: história, produção e linguagem; b) Vox Mundi – grupo de estudos da

    voz popular midiatizada, erudita e dos povos tradicionais; c) Musilinc – grupo

    de pesquisas sobre música, linguagem e cultura25.

    2.2 O canto popular como “Instrumento”: uma habilitação em execução nos cursos de Bacharelado em Música Popular

    O canto popular é oferecido nos cursos de Bacharelado em Música

    na FAP, da Unespar, na UFBA e na UFMG. Nessas três instituições a

    disciplina é oferecida na grade curricular como uma opção de instrumento

    para habilitação em execução.

    2.2.1 Universidade Estadual do Paraná (Unespar)

    O curso de Bacharelado em Música Popular da Unespar teve seu

    início no ano de 2003. Sua proposta pedagógica é fundamentada nas

    dimensões reflexiva e técnica dos conhecimentos musicais, buscando

    capacitar instrumentista, compositor de trilhas musicais, arranjador, produtor

    musical, crítico, pesquisador, diretor de conjuntos instrumentais e vocais.

    A forma de ingresso anual no curso é através de vestibular

    nacional, onde são ofertadas vinte vagas para os estudantes de música

    popular. Com objetivo principal voltado para o mercado de trabalho, o curso

    procura habilitar seus alunos ao desenvolvimento de uma atividade

    profissional de nível superior.

                                                                                                                   24 Disponível em: http://www.dac.unicamp.br/sistemas/catalogos/grad/catalogo2017/cursos/cur22.html. Acesso em: 31 jan. 2017. 25 Disponível em:https://www.iar.unicamp.br/pesquisa/grupos-de-pesquisa. Acesso em: 31 jan. 2017.

  •   43  

    Em artigo, Egg (2013), docente dessa instituição, conclui que a

    institucionalização da música popular na academia ainda precisa avançar,

    enfatizando a falta de estruturação. Declara que, “dentro dos departamentos

    de música, a música popular ainda é um patinho feio”.

    Entretanto, as cunhas estão inseridas, e cabe a cada um de nós trabalhar para aumentar as “rachaduras” nesse edifício que se construiu em torno da música como expressão da cultura aristocrática europeia. Para isso podemos nos inspirar nos historiadores, sociólogos e antropólogos, que já vêm há mais tempo se dedicando a pensar que o que aconteceu no mundo real merece atenção, tanto mais quanto maior circulação tenha tido. Ou seja, não dá mais para deixar a música popular de fora como assunto de pesquisa e de ensino de música. (EGG, 2013).

    Para graduar-se nesse curso o aluno deverá obter o total de 3.232

    horas, divididas em prática, teoria e atividades complementares, que poderão

    ser cursadas em no mínimo oito e no máximo 12 semestres. Entre as

    disciplinas ofertadas nesse curso, identificamos: Expressão Vocal, Canto

    Solista I, Canto Solista II, Canto Solista III e Canto Solista IV, como sendo