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  • UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJA

    SILVANA KALFF

    A CONSTITUIO DO(A) PROFESSOR(A) DE MSICA: ENTRELAAMENTO DO SENSVEL E DO INTELIGVEL NA EXPERINCIA

    COM O ESTGIO SUPERVISIONADO

    Itaja (SC)

    2018

  • 1

    UNIVALI UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJA

    Vice-Reitoria de Ps-Graduao, Pesquisa, Extenso e Cultura Programa de Ps-Graduao em Educao - PPGE

    Curso de Mestrado Acadmico em Educao

    SILVANA KALFF

    A CONSTITUIO DO(A) PROFESSOR(A) DE MSICA: ENTRELAAMENTO DO SENSVEL E DO INTELIGVEL NA EXPERINCIA COM O

    ESTGIO SUPERVISIONADO

    Dissertao apresentada ao colegiado do PPGE como requisito parcial obteno do grau de Mestre em Educao rea de concentrao: Educao (Linha de Pesquisa - Cultura, Tecnologia e Processos de Aprendizagem).

    Orientadora: Prof. Dr. Mnica Zewe Uriarte.

    Itaja (SC)

    2018

  • 2

    SILVANA KALFF

    Dissertao avaliada e aprovada pela Comisso Examinadora e referendada pelo Colegiado do PPGE como requisito parcial obteno do grau de Mestre em Educao.

    ______________________________ DRA. VALRIA SILVA FERREIRA

    COORDENADORA

    Apresentada perante a Banca Examinadora composta pelos Professores:

    _________________________________________________ DRA. MNICA ZEWE URIARTE (UNIVALI)

    PRESIDENTE E ORIENTADORA

    _________________________________________________ DRA. REGINA CLIA LINHARES HOSTINS (UNIVALI)

    MEMBRO

    _______________________________________________________ DRA. CARLA CARVALHO (FURB)

    MEMBRO EXTERNO

    Itaja-SC, 19 de fevereiro de 2018.

  • 3

    Dedico esta pesquisa minha famlia,

    em especial aos meus amores: Raphael, companheiro de todas as horas, que me faz sentir o que amar ao outro;

    Sissa, pet alegria da casa, que nos ensina todos os dias sobre a leveza e o companheirismo; e

    Pedro, vida que est ganhando corpo e que logo nascer entre ns.

  • 4

    AGRADECIMENTOS

    Agradeo,

    Aos meus pais, por me receberem nesta vida;

    Ao meu marido, pela pacincia, pelo incentivo nas descobertas do Mestrado, por dedicar a nossa caminhada o seu amor;

    minha orientadora, Prof. Dr. Mnica Zewe Uriarte, pela dedicao e carinho,

    por caminhar sempre junto...;

    Aos professores do Mestrado, que muito contriburam, no s para a pesquisa mas para um refinamento pessoal;

    s professoras convidadas para a banca, Prof. Dr. Carla Carvalho e Prof. Dr.

    Regina Clia Linhares Hostins, por dedicarem seu tempo com contribuies valiosssimas para a construo desta dissertao;

    Ao grupo de pesquisa Cultura, escola e educao criadora, pelos bons momentos,

    pela Arte, pelas leituras, pelos amigos e pelas trocas riqussimas;

    Aos amigos que fiz nesta caminhada...;

    Ao curso de Licenciatura em Msica da UNIVALI, que me acolheu, e, principalmente professora Cris e aos participantes da pesquisa,

    meu muito obrigada!

    OBRIGADA A TODOS, OBRIGADA VIDA!

  • 5

    Espao mgico presidido pelo fogo, o corpo livre do controle do espelho, ali aflorava uma outra verdade, pela seduo dos gostos e

    dos cheiros. O silncio no incomodava, porque na cozinha havia um estar juntos que permitia a solido, na encantada

    contemplao dos paus de lenha que gemiam e desprendiam os seus sucos ferventes pelas frestas de suas fibras. Os corpos

    experimentavam sua solidariedade com a comida, e os pensamentos ficavam diferentes. Os pensamentos que nascem do

    fogo, no so os mesmos que vivem no espelho. Rubem Alves (Se eu pudesse viver minha vida novamente...).

  • 6

    RESUMO

    A Licenciatura no seria somente uma preparao para o futuro ou para a formao de um(a) futuro(a) professor(a), mas um momento vivido e significado - parte de um todo - na trajetria de vida do(a) licenciado(a). Assim sendo, a presente pesquisa, realizada junto linha de pesquisa Cultura, Tecnologia e Processos de Aprendizagem, do Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade do Vale do Itaja e do Grupo de Pesquisa Cultura, escola e educao criadora, estudou a constituio do(a) professor(a) de Msica por meio de significaes e de sentidos que discentes de um curso de Licenciatura em Msica atribuem s suas experincias no processo docente de Estgio Supervisionado. Para discutir a constituio docente do professor de Msica, a pesquisa dialoga com autores como John Dewey (1976) e Antnio Nvoa (1995, 2017), e, tambm, com a experincia apresentada por Jorge Larrosa (2004, 2016) e com a interinfluncia do sensvel e do inteligvel, discutida por Duarte Jr. (2000, 2012), entre outros autores. Neste estudo, pergunta-se: Como ocorre o entrelaamento do sensvel e do inteligvel na constituio do ser professor(a) de Msica na experincia com o Estgio Supervisionado? O objetivo geral, assim, tratou de analisar como ocorre o entrelaamento do sensvel e do inteligvel na constituio do ser professor(a) de Msica na experincia com o Estgio Supervisionado. Para isso, os seguintes objetivos especficos foram delineados: mapear como se d a constituio do(a) professor(a) de Msica no Estgio Supervisionado; descrever como os(as) participantes da pesquisa concebem a experincia no Estgio Supervisionado na sua constituio docente em msica; identificar como ocorre o entrelaamento do sensvel e do inteligvel nos desafios, nas conquistas e nas transformaes significados no estgio Supervisionado pelos(as) participantes da pesquisa. A abordagem metodolgica qualitativa e baseou-se em autores como Bogdan e Biklen (1994), Lakatos e Marconi (1991), Bauer e Gaskell (2013) e Penna (2015), tendo como instrumentos de produo de dados: a observao in loco, a entrevista aberta e a anlise dos documentos produzidos pelos(as) participantes da pesquisa sobre a experincia no Estgio Supervisionado em dois semestres. Como resultados, apresenta-se uma discusso referente aos dados produzidos e fundamentao terica utilizada, que aponta o Estgio Supervisionado do curso de Licenciatura em Msica estudado como um componente curricular importante e essencial na constituio do(a) professor(a) de Msica, possibilitando uma aproximao do(a) licenciando(a) com o universo docente de escolas pblicas, despertando nesse sujeito reflexes sobre a suas aes e nas suas aes, assim como o senso crtico sobre o lugar institucional que o(a) recebe no perodo de formao docente. Conclui-se que a experincia com o Estgio Supervisionado possibilita uma conscientizao das foras do entrelaamento do sensvel e do inteligvel na constituio do ser professor(a) de msica, por meio das interdependncias do sentir e do pensar, presentes nos processos de constituio da autonomia docente, da comunicao entre professor(a) e aluno(a), na produo de sentidos e significaes no ser professor(a) de msica. Espera-se que as discusses e as anlises apresentadas contribuam para a Educao musical e para os cursos de Licenciatura em Msica, assim como para o campo educacional em geral, visto que o objeto de pesquisa permeia a constituio do ser professor(a) com foco no entrelaamento da sensibilidade e da razo humana. Olhar para o entrelaamento das instncias sensveis e inteligveis permite olhar para o ser humano como um todo integrado, que interage e se relaciona em uma rede de complexidades subjetivas e sociais.

    Palavras-chave: Constituio do(a) professor(a) de Msica. Estgio Supervisionado. Entrelaamento do sensvel e do inteligvel.

  • 7

    ABSTRACT The Teaching degree not only prepares the student for the future, or for the formation of a future teacher, but is a moment experienced with meaning - part of a whole in the students life trajectory. This research, carried out within the line of research Culture, Technology and Learning Processes of the Postgraduate Program in Education of the University of the Vale do Itaja, and the Research Group Culture, school and creative education, studies the constitution of the Music teacher through meanings and senses that students of a Music Teaching course attribute to their experiences in the teaching process of Supervised Internship. In order to discuss the constitution of the music teacher, the research dialogues with authors such as John Dewey (1976) and Antnio Nvoa (1995, 2017), and also with the experience presented by Jorge Larrosa (2004, 2016) and the interinfluence of the sensitive and the intelligible, discussed by Duarte Jr. (2000, 2012), among other authors. In this study, we ask: How does the intertwining of the sensible and the intelligible in the constitution of being a Music teacher in the experience with the Supervised Internship occur? The general objective, therefore, was to analyze how the intertwining of the sensible and the intelligible in the constitution of being a Music teacher in the experience with the Supervised Internship occur? For this the following specific objectives were outlined: to map how the constitution of the Music teacher is constructed in the Supervised Internship; to describe how the research participants view their experience in the Supervised Internship, in their constitution as music teachers; to identify how the sensitive and the intelligible are intertwined in the challenges, achievements and transformations signified in the Supervised Internship by the research participants. The methodological approach is qualitative, and is based on authors such as Bogdan and Biklen (1994), Lakatos and Marconi (1991), Bauer and Gaskell (2013) and Penna (2015), having as instruments of data production: on-site observation, open interviews, and analysis of the documents produced by the research participants about the experience in the Supervised Internship over two semesters. As results, a discussion is presented regarding the data produced and the theoretical basis used, indicating that the Supervised Internship of the Music Teaching course studied is an important and essential curricular component in the constitution of the Music teacher, enabling an approximation of the student with the teaching universe of public schools, awakening in this subject reflections about and on his/her actions, as well as encouraging a critical sense about the institutional place that receives him/her during the period of teacher education. We conclude that the experience of the Supervised Internship allows an awareness of the forces by which the sensitive and the intelligible are intertwined in the constitution of being a Music teacher, through the interdependencies of feeling and thinking, present in the processes of constitution of teacher autonomy, communication between the teacher and the student, and the production of senses and meanings in being a Music teacher. We hope that the discussions and analyses presented will contribute to Music Education and Music Teaching courses, as well as to the educational field in general, as the object of research permeates the constitution of being a teacher with a focus on the intertwining of sensitivity and intelligible. Looking at this interwinement allows us to look at the human being as an integrated whole, who interacts and relates in a network of subjective and social complexities. Keywords: Constitution of the Music teacher. Supervised Internship. Intertwinement of the sensitive and the intelligible.

  • 8

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1: Interinfluncia entre sensvel e inteligvel, saber e conhecimento 15

    Figura 2: Rede de sentidos sobre a Msica 19

    Figura 3: Problema de pesquisa 22

    Figura 4: Objetivos da pesquisa 23

    Figura 5: Palavras chaves que permeiam os objetivos da investigao 24

    Figura 6: Entrelaamento do sensvel e do inteligvel 26

    Figura 7: Mapeamento da pesquisa 34

    Figura 8: Participantes (p) da pesquisa emprica 37

    Figura 9: Pseudnimos dos participantes e organizao das duplas no ES-I e ES-II 39

    Figura 10: Proposta de Antnio Nvoa para pensar os desafios da formao docente 50

    Figura 11: Rede de constituio docente e o Estgio Supervisionado em Msica 57

    Figura 12: Desafios no ES-II 97

    Figura 13: Conquistas no ES-II 107

    Figura 14: Transformaes na atuao docente do ES-I ao ES-II 110

    Figura 15: Rede de entrelaamento do sensvel e do inteligvel na constituio do ser professor(a) de Msica, na experincia com o Estgio Supervisionado 115

  • 9

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1: Organizao do componente curricular ES na Licenciatura em Msica-UNIVALI 35

    Quadro 2: Participantes da pesquisa e a produo de documentos na atuao no ES-I e ES-II 38

    Quadro 3: Instrumentos de produo de dados: caractersticas e objetivos 40

    Quadro 4: cones de apresentao de fontes dos dados 48

    Quadro 5: Projetos de Estgio para o ES-II 60

    Quadro 6: Projetos de Estgio para o ES-I 64

    Quadro 7: Categorias criadas a posteriori: reviso de teses e dissertaes que relacionam msica, esttica e/ou cognio 93

  • 10

    SUMRIO

    1 INTRODUO 11

    1.1 O SENTIDO DAS PALAVRAS 24

    2 CAMINHOS METODOLGICOS 31

    2.1 MAPEAMENTO DA PESQUISA 32

    2.2 O ESPAO DA PESQUISA EMPRICA 34

    2.3 OS PARTICIPANTES DA PESQUISA 37

    2.4 INSTRUMENTOS DE PRODUO DE DADOS 40

    2.5 DO DILOGO COM OS DADOS 47

    3 A CONSTITUIO DO(A) PROFESSOR(A) DE MSICA E O ESTGIO SUPERVISIONADO 49

    3.1 O PROCESSO DO ESTGIO SUPERVISIONADO NO CURSO DE LICENCIATURA EM MSICA DA UNIVALI 57

    4 OS(AS) PARTICIPANTES DA PESQUISA E O VALOR DO ESTGIO SUPERVISIONADO NA SUA CONSTITUIO DOCENTE EM MSICA 77

    4.1 EXPRESSES RELATIVAS AO ES-I 77

    4.2 EXPRESSES RELATIVAS AO ES-II 81

    5 O ENTRELAAMENTO DO SENSVEL E DO INTELIGVEL NA EXPERINCIA DO SER PROFESSOR(A) DE MSICA NO ESTGIO SUPERVISIONADO: DESAFIOS, CONQUISTAS E TRANSFORMAES 90

    6 CONSIDERAES FINAIS 117

    REFERNCIAS 123

    APNDICES 132

    ANEXO 137

  • 11

    1 INTRODUO

    A presente pesquisa tece caminhos para o estudo da constituio do(a) professor(a) de

    Msica, por meio de significaes e de sentidos que discentes de um curso de Licenciatura em

    Msica atribuem s suas experincias no processo docente de Estgio Supervisionado. Para

    pensar sobre a constituio docente, esses caminhos dialogam com autores como John Dewey

    (1976) e Antnio Nvoa (1995, 2017), quando percebo a universidade no como uma

    preparao para o futuro, mas, sim, como a prpria vida daquele sujeito que ali est, buscando

    conhecer-se, refinar-se e constituir-se profissionalmente em suas escolhas. Nesse sentido, a

    Licenciatura no seria somente uma preparao para o futuro, ou a formao de um(a) futuro(a)

    professor(a), mas um momento vivido e significado - parte de um todo - na trajetria de vida

    do(a) licenciado(a). Esta investigao dialoga tambm com a experincia apresentada por Jorge

    Larrosa (2004, 2016) e com a interinfluncia do sensvel e do inteligvel, discutida por Duarte

    Jr. (2000, 2012), como focos de estudo junto constituio docente. Essas e outras referncias

    se entrelaam no caminho desta pesquisa formando uma rede aberta de conexes que

    contribuem no estudo da constituio do(a) professor(a) de Msica.

    Este estudo foi desenvolvido junto ao Programa de Ps-Graduao em Educao da

    Universidade do Vale do Itaja, sendo vinculado linha de pesquisa Cultura, Tecnologia e

    processos de Aprendizagem e ao grupo de pesquisa Cultura, Escola e Educao Criadora. A

    investigao sofre influncia dos movimentos e das referncias desse grupo, que se prope,

    principalmente, a discutir e a estudar: a educao e a experincia esttica, a relao sensvel e

    inteligvel, a mediao cultural, as artes, a formao de leitores(as) e de professores(as), o

    refinamento dos sentidos e a importncia da sensibilidade na constituio humana.

    Um dos motivos de meu interesse por esse tema e a forma como os caminhos de pesquisa

    foram engendrados podem ser atribudos ao fato de eu ser licenciada em Msica e apresentar,

    como marcas na minha constituio docente, questes que comearam a surgir nos anos iniciais

    da Graduao. Durante a Licenciatura, essas questes tambm eram compartilhadas com

    colegas de curso e expressas durante conversas ou dilogos em aulas. Perguntvamos: Como

    dar aula de Msica? Para que dar aula de Msica? E ento: O que ser um(a) professor(a) de

    Msica?

    Quando ingressei no curso de Licenciatura em Msica, tinha como objetivo principal

    aprender e fazer msica, j que era violoncelista e j tinha uma vivncia musical intensa antes

    da universidade. Contudo, logo no primeiro ano, fui percebendo que poderia ir mais alm. Esse

  • 12

    mais alm ia ao encontro da proposta de formao docente discutida na Licenciatura, surgindo,

    a partir desse momento, as dvidas e, a partir delas, preocupaes, inquietaes e reflexes.

    Cheguei universidade acreditando que os(as) professores(as) iriam me entregar a

    frmula para ser uma professora de Msica, me dizendo o que e como - exatamente - ensinar

    para os meus alunos. No entanto, o que me chegava da sala de aula muitas vezes no me parecia

    suficiente. Filha de uma gerao que, em seu contexto1, buscava agarrar-se a certezas, a um

    futuro estvel, a respostas prontas, a padres e modelos pr-determinados, acabei por ficar com

    marcas dessas heranas. A arte como eu a recebia de certa forma me libertava desses padres

    e me anunciava transformaes, as quais levei um tempo para perceber que no eram somente

    individuais, mas vinham ao encontro de um movimento social2 que vem se constituindo rumo

    s incertezas, valorizao das diferenas, exploso de troca de informaes alimentada pela

    internet, pelo avano da tecnologia, pela criao de novas ferramentas de comunicao, entre

    muitas outras velozes transformaes que experimentamos no mundo contemporneo. Ao

    colocar-me em movimento em busca por um aperfeioamento por meio da Universidade,

    emerge, ento, a conscincia de que a informao e os modelos dados por si ss no servem

    mais como conhecimento e muito menos como saber3 e a sensao de no ser suficiente, a

    vontade de aprender de outras formas e em outros lugares.

    Esse movimento inicial acabou gerando uma ansiedade e uma necessidade de vivenciar

    dar aula de Msica, resultando na minha participao como professora bolsista em um projeto

    da Universidade, no qual ministrei aulas de musicalizao para crianas da comunidade, j no

    incio da Licenciatura. Entretanto, agora que estava em sala de aula, mesmo no estando sozinha

    - pois as aulas eram realizadas em dupla de bolsistas a pergunta era: O que fazer? Nessa poca,

    mesmo recebendo orientaes e com as vivncias do curso, optei tambm em procurar por

    chaves em mim mesma, apoiando-me nas minhas experincias como aluna - um tempo muito

    mais longo e intenso do que aquele em que vinha sendo professora, para compor meus

    propsitos de atuao docente. Para Dewey:

    A formao de propsitos , portanto, operao intelectual bem mais complexa do que poderia parecer. Envolve: 1) observao das condies e circunstncias ambientes; 2) conhecimento do que aconteceu em situaes similares no passado, conhecimento

    1 Modernidade ocidental. 2 Esses movimentos ou transformaes percebidas, principalmente no mundo ocidental, vem ao encontro de teorias ps-modernas, ps-crticas e ps-estruturalistas. 3 Em momentos neste texto, saber e conhecimento aparecem destacados, baseado em Duarte Jr. (2000), quando o autor teoriza que o saber se constitui pelas coisas que nos chegam ao corpo pelos rgos dos sentidos, pelas sensaes, pela intuio; e o conhecimento est relacionado ao intelecto, ao racional e ao abstrato. Ambos, conhecimento e saber, neste caso, interinfluenciam-se, estando, assim, conectados na forma como o sujeito aprende, percebe, intui e sente as coisas do mundo e a si mesmo.

  • 13

    obtido, em parte, pela lembrana e, em parte, pela informao, conselho [...]; e 3) julgamento ou juzo, ou seja, a operao pela qual juntamos o que observamos e o que recordamos e conclumos sobre o que significa toda a situao, para podermos tomar, ento, o propsito de ao. (DEWEY, 1976, p. 67-68).

    Essa opo de resgatar as significaes de quando aluna serviu de base, principalmente,

    para eu pensar e sentir a relao professora e aluno(a) que estava sendo construda, a

    comunicao com os(as) alunos(as), a relao sujeito e msica, a reflexo sobre as aes, assim

    como a organizao do tempo e do espao das aulas. Junto a todo esse conjunto de vivncias,

    encontravam-se os contedos, os planejamentos, os registros e as questes tcnicas e musicais,

    que tambm estavam sendo alimentadas pelo curso e pelas orientaes, pelas leituras e pelas

    experincias como musicista, mas no deixando de sofrer influncias das memrias significadas

    de aluna.

    No entanto, como as marcas da experincia nos anos como aluna repercutiam na

    reflexo sobre o que ser uma professora? Acredito que esse foi um artifcio utilizado por mim

    como uma forma de imaginar-me no lugar do outro do(a) aluno(a). Imaginar talvez seja uma

    boa palavra, pois fui percebendo que esses resgates de sensaes e de sentimentos auxiliavam

    no momento do planejamento das aulas, das estratgias, dos critrios de avaliao, do fazer, da

    comunicao. Entretanto, no momento real, em que a aula acontecia, quem estava ali

    vivenciando a msica junto a mim era um outro diferente daquilo que eu pretendia prever,

    anteceder, prescrever (LARROSA, 2004). Estar aberta para a novidade e ao mesmo tempo

    trazer reflexo minhas marcas de vida possibilitou-me um caminhar ao autoconhecimento que

    repercute continuamente na minha constituio como professora de Msica. E a pergunta ento

    se transforma: Quem sou Eu quando professora?

    Nesse processo de autoconhecimento, percebo que a minha relao com a arte vinha,

    h muito tempo, afetando a minha relao com o mundo, com o outro e com as escolhas

    profissionais que eu venho construindo. At hoje trago vivo em minha memria o dia em que

    descobri a importncia de um desenho. Sempre desenhava em casa e na escola, e, um dia, em

    uma aula na pr-escola4, pela qualidade do meu desenho, acabei sendo convidada para

    participar de um grupo de amigos, visto que foi importante porque era nova na escola e na

    cidade. Nesse dia, comecei a pensar sobre o que era ter um amigo. Foi uma experincia que

    marcou, pois, depois desse episdio, outros desenhos foram criados e as outras crianas

    4 Equivalente atualmente ao primeiro ano do Ensino Fundamental da Educao Bsica.

  • 14

    queriam que eu lhes contasse qual era o segredo do meu desenho; como desenhar daquele jeito?

    E nesse dia descobri, tambm, que tinha um segredo! Ser que isso seria arte?5

    Esse episdio aparentemente banal acabou demonstrando um enorme nmero de coisas

    significativas para mim quando criana e depois como professora. Quando criana, percebi que

    podia agradar com meu desenho; que era possvel fazer novas amizades; que certamente eu

    tinha valor como pessoa; que desenhos podem ser considerados arte e que esta contribua

    sensivelmente na minha relao com o mundo. Como professora, o mesmo episdio alerta-me

    para uma permanente reflexo sobre minhas prprias atitudes como docente: sobre como os

    processos de construo de saber e de conhecimento repercutem nos sujeitos; sobre o que est

    alm dos contedos na relao professor e aluno; sobre como o sensvel e o inteligvel podem

    estar entrelaados nos sujeitos que vivenciam arte.

    Nesta investigao, o sensvel est relacionado aos sentidos, s sensaes, ao saber que

    nos chega pelo corpo; e o inteligvel est relacionado ao intelecto, percepo, s coisas da

    mente, ao conhecimento construdo pelo pensar. Nessa perspectiva, sensvel e inteligvel so

    duas instncias com caractersticas prprias, mas que se interinfluenciam tornando-se

    dependentes uma da outra na forma como o sujeito aprende, percebe, contempla, intui e

    sente as coisas do mundo e a si mesmo (DUARTE JR., 2000). O autor apresenta essas duas

    instncias da seguinte maneira:

    Prefiro ento chamar o produto de nossa inteligncia simblica de conhecimento inteligvel, e a nossa capacidade de sentir, de perceber e nos movermos fisicamente, de saber sensvel, na medida em que o verbo saber tem a ver etimologicamente com saborear por meio dos sentidos o mundo saboreado, seus sons, cores, odores, texturas e sabores. [...]. Nesse processo humano o nosso lastro animal, corporal, vale dizer, sensvel, tambm tornado signo, ganha significao, e esse processo constitui uma via de mo dupla, pois as significaes, de volta, nos ajudam a entender, elaborar e desenvolver a nossa sensibilidade corporal. Portanto so essas as duas instncias entre as quais nos movemos na construo do sentido da vida, do conhecimento do mundo [...]. Ambas se interinfluenciam. (DUARTE JR., 2012, p. 362-363, grifos do autor).

    Dialogando com Duarte Jr. (2000), sensvel e inteligvel entrelaam-se na constituio

    do saber e do conhecimento (Figura 1). Para o autor, o saber est mais relacionado ao sensvel,

    ao sabor, sensibilidade, ao saborear as coisas do mundo por via corporal; e o conhecimento

    5 Todo esse movimento e marcas, por meio das aulas de artes, hoje por mim significadas, vem ao encontro das tendncias pedaggicas discutidas por Schramm (2012). Em seu artigo As tendncias pedaggicas e o ensino-aprendizagem da arte - publicado tambm em PILLOTTO, Silvia Sell Duarte; SCHRAMM, Marilene de Lima Krting (Org.). Reflexes sobre o ensino das artes. Joinville: Univille, 2001. v. 1, p. 20-35 -, Schramm (2012), alm de debater como essas tendncias em educao influenciam o ensino das artes nas escola desde o sculo XX - destacando o ensino das artes em Santa Catarina -, reflete sobre o quanto os professores de escolas pblicas assumiam ou no essas tendncias como aes.

  • 15

    est relacionado ao de conhecer o mundo por meio da abstrao intelectual, mental,

    inteligvel. Saber e conhecimento ento so instncias correlacionadas, que podem ser

    interpretadas como funes semelhantes ou at mesmo iguais no movimento de conhecer, mas

    que o autor diferencia em palavras com o intuito de evidenciar as diferentes vias de acesso e de

    compreenso das coisas da vida.

    Figura 1 Interinfluncia entre sensvel e inteligvel, saber e conhecimento

    Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

    Dessa forma, a Figura 1 expressa uma harmonia entre as instncias apresentadas, que

    relaciono s experincias no fazer artstico presentes em minha vida e em especial na trajetria

    como aluna de escola pblica, desde a Educao Bsica at a Graduao. A arte, ao provocar o

    dilogo entre a sensibilidade e o racional, foi me possibilitando aprender sobre a vida de uma

    forma mais livre. Contudo, livre do que ou para qu? Talvez livre de algumas amarras

    invisveis, como padres e modelos que, na infncia, no saberia expressar, mas que, de alguma

    forma, sentia que, por meio da arte na escola, o aprender poderia ser diferente (SCHRAMM,

    2012). Ou, ainda, por sentir que, por meio da expresso e do fazer artstico, a sensibilidade

    caminhava junto ao racional, podendo me proporcionar relaes mais ativas com o outro e as

    coisas do mundo.

    Aqui abro um parntese para refletir sobre esse sentimento referente minha formao

    escolar, que mistura amarras e liberdade, relacionando-o aos modos de pensar a educao

  • 16

    do humano engendrados nas tendncias pedaggicas vivenciadas nas escolas brasileiras.

    Segundo Schramm (2012), o surgimento de uma nova tendncia no anula as outras e nem

    substitui por imediato a ao pedaggica dos(as) professores(as), resultando em uma mescla de

    atitudes que podem apresentar distines para diferentes espaos ou diferentes professores(as)

    neste caso, at mesmo os que atuam em um lugar comum. Para Schramm (2012), [...] temos

    duas derivantes principais na educao brasileira: a conservadora e a progressista, classificadas

    em liberais e progressistas mediante os critrios que adotam em relao s funes sociais e

    polticas da escola; sendo as tendncias6 resultantes dessas derivantes - as que mais percebo

    influenciar em minhas expectativas, marcas, intuies e desejos de mudana -, a mescla entre a

    pedagogia tradicional e a pedagogia liberal renovada ou escola nova, na qual:

    A pedagogia tradicional preocupa-se com a universalizao do conhecimento. O treino intensivo, a repetio e a memorizao so as formas pelas quais o professor, elemento principal desse processo, transmite o acervo de informaes aos seus alunos. Estes so agentes passivos aos quais no permitida nenhuma forma de manifestao. Os contedos so verdades absolutas, dissociadas da vivncia dos alunos e de sua realidade social. Os mtodos baseiam-se tanto na exposio verbal como na demonstrao dos contedos, que so apresentados de forma linear e numa progresso lgica, sem levar em considerao as caractersticas prprias dos alunos, muitas vezes encarados como adultos em miniatura. O professor detentor do saber e deve avaliar o seu aluno atravs de provas escritas, orais, exerccios e trabalhos de casa. [...]. [J na pedagogia liberal renovada:] No tocante s teorias e prticas estticas, a pedagogia escolanovista rompe com as cpias de modelos, e parte para a criatividade e a livre-expresso. A esttica moderna [dessa tendncia] privilegia a inspirao e a sensibilidade, acentuando o respeito individualidade do aluno. Se por um lado esses aspectos foram importantes para o rompimento com os padres estticos e metodolgicos tradicionais, por outro, criou-se uma postura no-diretiva, onde tudo em arte era permitido em nome da livre-expresso. A preocupao em Artes Visuais passa a ser como o desenho livre e o conhecimento deixado de lado, caindo no espontanesmo. Seu objetivo principal o desenvolvimento da criatividade. (SCHRAMM, 2012, n.p.).

    Apesar de Schramm (2012) alertar para os problemas de interpretao, por parte dos(as)

    professores(as), de certas tendncias; pela arte na escola eu sentia que podia criar e compartilhar

    das sensaes que meus desenhos, coreografias e msicas causavam nas pessoas, sentindo-me,

    assim, livre para a autoexpresso e a criatividade. Em minha infncia, as disciplinas de Artes

    eram as nicas que no cobravam resultados homognios e fixos, e os(as) professores(as)

    pareciam estar mais abertos. Nessas aulas, ouvia-se alunos(as) dizendo: eu no tenho este

    dom, eu no consigo, mas isso no era obstculo e no se deixava de trabalhar o desenho,

    6 Schramm (2012) discute algumas tendncias pedaggicas que vem influenciando a educao nas escolas brasileiras, entre elas: A Pedagogia Liberal, A Pedagogia Liberal Tradicional, A Pedagogia Liberal Renovada, A Pedagogia Liberal Tecnicista, A Pedagogia Progressista, A Tendncia Progressista Libertadora, A Pedagogia Progressista Libertria, A Pedagogia Progressista Crtico-Social dos Contedos.

  • 17

    as artes visuais, a msica, a dana e o teatro7. Na minha percepo, as crianas eram valorizadas

    pelo seu interesse e pela sua criatividade, que eram considerados e incentivados. No havia uma

    cobrana por resultados finais iguais, como nas outras disciplinas, e nenhum(a) aluno(a)

    precisava memorizar um contedo para depois fazer uma prova. O(A) aluno(a) era

    convidado(a) a ser ativo(a) e realizar as atividades artsticas corporalmente, colocando sua

    expresso e sua criatividade nas propostas. Nesse caso, o corporal e o sensvel eram to

    valorizados quanto o intelectual.

    Diante desse cenrio de relaes sensveis/inteligveis aqui discutidas e expressas por

    meio das minhas memrias relacionadas arte, destaco consideraes sobre um elemento

    essencial conectado a essa investigao: a Msica. No saberia dizer quando iniciei minha

    relao com a msica, pois ela sempre pareceu fazer parte da minha vida. Tenho lembranas de

    me emocionar ao ouvir Romaria8, cantada na voz de Elis Regina, quando ainda era bem beb.

    Meus pais at hoje comentam no compreender porque meus olhos se enchiam de lgrimas

    quando eu ouvia a cano. Lembro-me da sensao de estar emocionada, de sentir uma beleza

    contagiante como se o mundo inteiro coubesse naquela msica. At hoje essa msica me coloca

    em um estado de contemplao; ela me conta um pouco sobre a esperana, a simplicidade, a

    ingenuidade, a intimidade e a f. Soa-me como uma tristeza bonita!

    A msica pode despertar diversas sensaes e sentimentos9, assim como desempenhar

    diferentes funes na vida das pessoas10. Ela nos chega pelo corpo com seus sons, suas

    harmonias, suas melodias, seus ritmos entre outros elementos, formando um conjunto que nos

    toca os sentidos, provocando sensaes e, instantaneamente, sentimentos, emoes, imagens e

    pensamentos. Segundo Sloboda (2008):

    7 Muitas das atividades artsticas desenvolvidas durante a minha Educao Bsica eram iniciadas nas aulas de Artes ou Educao Fsica no caso da dana; e acabavam por envolver toda a escola, professores e outras disciplinas. Algumas tinham como finalidade apresentar ou organizar um evento para a comunidade, quando se tratavam de datas comemorativas como a Festa Junina, ou o dia das mes, ou dos pais, mas outras tinham somente o objetivo de criar uma interao entre todos os alunos na escola. 8 Msica composta por Renato Texeira e gravada por Elis Regina em 1977. Letra: de sonho e de p/o destino de um s/Feito eu perdido em pensamentos/Sobre o meu cavalo;/ de lao e de n/ de gibeira o jil/dessa vida/ cumprida a s; / Sou caipira Pirapora Nossa/Senhora de Aparecida/Ilumina a mina escura e funda/O trem da minha vida (Refro); O meu pai foi peo/minha me solido/Meus irmos perderam-se na vida/Em busca de aventuras;/ Descasei e joguei/ investi, desisti/Se h sorte eu no sei/ nunca vi/ Refro.../ Me disseram porm/Que eu viesse aqui/Pra pedir em romaria e preces/Paz nos desaventos;/ Como no sei rezar/S queria mostrar/Meu olhar, Meu olhar/Meu olhar 9 Ver Sloboda (2008). Professor de psicologia que pesquisa sobre a psicologia cognitiva da msica focando em estudos sobre os efeitos da msica no crebro humano. 10 Ver Hummes (2004). Em sua dissertao, a autora discute as funes sociais da msica, baseada nos estudos de Allan P. Merriam (1923-1980).

  • 18

    A razo pela qual muitos de ns nos envolvemos em atividades musicais, de composio, execuo ou escuta, que a msica consegue despertar emoes profundas e significativas. Essas emoes podem variar desde o simples deleite esttico diante de uma construo sonora e desde emoes como a alegria ou tristeza que a msica s vezes evoca ou reala, at um simples alvio da monotonia, tdio ou depresso que pode ser proporcionado pelas experincias musicais cotidianas. [...]. Considerando que muitas atividades musicais so tambm atividades sociais, a msica pode ter muitos significados sociais, proporcionando uma srie de retornos sociais para aqueles que dela participam. (SLOBODA, 2008, p. 3).

    Segundo pesquisas e evidncias arqueolgicas, a msica est presente na humanidade

    desde a antiguidade. Encontram-se registros de atividades musicais das antigas civilizaes, por

    meio de pinturas, de esculturas e de afrescos. Para Levitin (2006, p. 43), [...] a msica tem

    estado com a nossa espcie por muito tempo tanto tempo quanto qualquer outra coisa para

    qual temos alguma evidncia. Sua ubiquidade e antiguidade demonstram sua importncia para

    ns. Devido a tantas evidncias encontradas sobre a presena da msica na humanidade at os

    dias atuais, quase possvel especular que a msica nasceu com o ser humano.

    A palavra Msica tem origem no Latim: musica; e no Grego: mousike tekhne, Arte

    das Musas, e vem sendo definida de variadas formas por diversas reas de estudo, alm dos

    discursos, dos textos e dos livros de teoria musical. Entre essas definies ou sentidos, encontra-

    se a msica como sendo uma organizao entre som e silncio; uma expresso sensvel da

    matemtica (Pitgoras); a arte de combinar os sons; um fenmeno intencional criado e

    produzido pelo ser humano. Levitin (2006) ainda levanta a possibilidade da existncia da

    msica no som dos pssaros, no mar, no vento, no corpo humano, e questiona que [...] at

    mesmo dizer que a msica uma inveno exclusivamente humana um tanto controverso,

    embora o peso das evidncias sugira que seja esta a verdade (LEVITIN, 2006, p. 43). Para

    Ilari, por exemplo:

    A msica, por sua vez, definida como um fenmeno esttico que envolve os sentidos (aisthesis, termo grego que originalmente significa sentir). Entretanto, conforme Marothy, o sentir e o pensar no so exatamente processos opostos, mas inter-relacionados, integrando igualmente as experincias musicais. (ILARI, 2010, p. 11).

    Os sentidos e os significados da msica vo se contrapondo e/ou dialogando11 em

    pesquisas na rea da Msica, da Educao musical, da Musicologia, da Psicologia, da

    Musicoterapia, da Antropologia, da Sociologia, entre outras reas que estudam a relao msica

    e sujeito. Esses dilogos e sentidos sobre msica aqui expressados, mais os elementos fsicos

    que a compem como: som, silncio, altura, etc., relacionados aos sentidos do entrelaamento

    11 Um dos exemplos desse dilogo, pode ser observado em Ilari e Arajo (2010). As organizadoras focam em estudos da cognio musical, trazendo-nos textos que evidenciam como diferentes reas pesquisam e dialogam sobre msica.

  • 19

    do sensvel e do inteligvel aqui discutidos, foram transformados nesta investigao, em pontos

    de conexo em uma rede (Figura 2) que pode levar a variados significados ou sentidos sobre

    msica, no sendo necessrio eleger apenas um como verdadeiro. Por se tratar de um fenmeno

    que envolve diferentes culturas e funes sociais, assim como diferentes sentidos e

    significaes, no cabe defini-la como um conceito nico e fechado. Nessa rede, engendro

    caminhos em busca de um sentido aberto que represente possibilidades de encontro com a

    msica.

    Figura 2 Rede de sentidos sobre a Msica

    Fonte: Elaborada pela autora para fins da pesquisa.

    Neste estudo, as entradas por meio dos pontos de conexo dessa rede (Figura 2), resultaram

    no seguinte sentido sobre a msica:

    v Msica: fenmeno intencional sonoro/temporal, criado, percebido, significado e

    expressado por meio do entrelaamento do sensvel e do inteligvel humano.

    Dentro desse contexto, a msica repercute no ser humano por meio do entrelaamento

    do sensvel e do inteligvel, e essa relao torna-se cclica. Esse ciclo acontece, pois, por meio

    do entrelaamento dessas instncias, criamos, percebemos, significamos e expressamos msica;

  • 20

    do mesmo modo que a msica como fenmeno vivo afeta o modo sensvel/inteligvel humano

    de estar no mundo. Recebemos a msica pelo corpo - com seus sons, harmonias e ritmos - e

    expressamos a msica corporalmente. Todo esse movimento remete-nos a pensamentos, a

    sensaes, a emoes e a percepes que tambm envolvem o cognitivo e podem envolver a

    experincia esttica.

    Envolvi-me com a aprendizagem musical ainda criana, por meio de instrumentos

    musicais. Alm de ouvir, cantar e danar com a msica, aprendi a tocar flauta doce como

    autodidata e iniciei os estudos no teclado em aulas particulares, fora da escola convencional12.

    Na adolescncia, iniciei no violo, na percusso e cheguei ao violoncelo, onde realizei vrios

    trabalhos junto a orquestras, grupos de diversas formaes musicais, culminando na Graduao

    em Msica e, logo em seguida, na docncia em Msica. Ministrei aulas de musicalizao e

    violoncelo, sendo esta segunda em escolas particulares ou projetos de msica externos escola

    regular. Com o passar do tempo, trabalhei tambm com cursos de capacitao para

    professores(as) de Msica; gesto e coordenao pedaggica de projetos e oficinas artsticas.

    Enfim, minha vivncia com a msica extensa, levando-me a sentir o entrelaamento do

    sensvel e do inteligvel aqui discutido, na prtica musical e nas experincias que nela se

    constituem.

    Posso dizer que as vivncias aqui relatadas marcaram-me positivamente, constituindo,

    assim, parte do meu imaginrio sobre ser um(a) professor(a) de Msica. Alm do que foi

    positivo, tambm houve, em minha trajetria como aluna, outras experincias que me marcaram

    negativamente, ao ponto de certa vez desejar nunca ser uma professora, devido a certos

    exemplos autoritrios de controle, advindo de alguns gestores(as) e professores(as). Sem ter

    conscincia, nesses momentos, eu j estava fazendo algumas escolhas e reflexes que, mais

    tarde, repercutiriam na minha atuao como docente.

    Quando iniciei na docncia como profissional13, perguntava-me a todo instante sobre

    quais marcas estavam refletidas em minhas aes e representaes docentes: A criana livre

    ou a necessidade de controle14? E a pergunta Quem sou Eu quando professora? continua

    ecoando. Aqui, ento, aproximo, em parte, a constituio docente formao docente no olhar

    12 recente a tentativa de retomada do ensino da Msica como componente curricular na Educao Bsica de escolas brasileiras, que, por sinal, ainda est em processo de incluso. Em Fonterrada (2008), em especial no capitulo 3, p. 207, encontra-se uma discusso sobre o ensino de Msica no Brasil, incluindo uma reflexo sobre a histria do ensino e aprendizagem instrumental e musical, em escolas especficas de Msica ou com professores particulares (professores de Msica autnomos). 13 Profissional no sentido de estar dando aula como professora de Msica contratada em uma escola. As atuaes docentes em msica anteriores deram-se dentro da Universidade em projetos de extenso. 14 No sentido do controle idealizado na pedagogia tradicional e pela cincia moderna.

  • 21

    de Nvoa (1995, p. 25), quando este discute que a [...] formao no se constri por

    acumulao (de cursos, de conhecimento ou de tcnicas), mas sim atravs de um trabalho de

    reflexibilidade crtica sobre as prticas e de (re)construo permanente de uma identidade

    pessoal.

    Nesse sentido, posso dizer que, quando estudamos a constituio de professores(as) de

    Msica, estamos estudando a constituio de seres humanos, e esta pode ser investigada por

    diversos mbitos: sociais e subjetivos, intelectuais e sensveis, espirituais, psicolgico,

    pedaggico, filosfico, entre outras possibilidades, complexidades e desdobramentos. Todas

    essas variveis, juntamente s marcas e a outras problemticas aqui apresentadas, podem

    apontar para a construo de uma rede de complexidades no processo de constituio docente.

    A complexidade parte da constituio humana e j vem sendo, de alguma forma, discutida

    por estudiosos. Neste estudo, esse termo permeia momentos da anlise e da reflexo, mesmo

    que no seja o foco de discusso. De acordo com Morin:

    Num sentido, o pensamento complexo tenta dar conta daquilo que os tipos de pensamento mutilante se desfaz, excluindo o que eu chamo de simplificadores e por isso ele luta, no contra a incompletude, mas contra a mutilao. Por exemplo, se tentamos pensar no fato de que somos seres ao mesmo tempo fsicos, biolgicos, sociais, culturais, psquicos e espirituais, evidente que a complexidade aquilo que tenta conceber a articulao, a identidade e a diferena de todos esses aspectos, enquanto o pensamento simplificante separa esses diferentes aspectos, ou unifica-os por uma reduo mutilante. Portanto, nesse sentido, evidente que a ambio da complexidade prestar contas das articulaes despedaadas pelos cortes para o pensamento complexo entre disciplinas, entre categorias cognitivas e entre tipos de conhecimento. (MORIN, 2005, p. 175-177).

    Nesse processo de vir a ser uma professora, foi necessrio criar links de reflexo sobre

    a complexidade humana e cultural, buscando compreender ou apreender como uma profissional

    docente em Msica - com suas responsabilidades e buscas permanentes de renovao

    relaciona sua subjetividade com esse coletivo social e global. Agora, na Ps-Graduao, o

    propsito (re)organizar e/ou (re)significar todas essas experincias dessa vivncia. As

    questes continuam ecoando: O que ser um(a) professor(a)? Quem sou Eu quando

    professor(a)? Como se constitui um(a) professor(a)? No entanto, nesse momento, elas esto

    carregadas de outras imagens e abertas para o outro, para a busca do que me diferente, para

    uma discusso maior que compreende o espao escolar e a constituio de outros(as)

    professores(as), para um dilogo filosfico, epistemolgico, esttico e artstico. Nesse percurso,

    portanto, motivada pelo modo que venho me envolvendo na profisso docente, direciono a

    investigao para a anlise do entrelaamento do sensvel e do inteligvel na constituio

    docente em Msica.

  • 22

    Dessa forma, o delineamento desta pesquisa compreende olhar para o entrelaamento

    do sensvel e do inteligvel na constituio de professores(as) de Msica, no espao do Ensino

    Superior. O espao escolhido para esta investigao foi a Licenciatura em Msica, com foco no

    componente curricular Estgio Supervisionado.

    Diante desse cenrio, foram percorridos caminhos para delimitar o problema de

    pesquisa. O ponto de partida foi uma questo motivacional: Como se constitui um(a)

    professor(a) de Msica? Que se desdobrou em outras questes correlacionadas: Como o

    sensvel e o inteligvel esto entrelaados no processo de constituio do(a) professor(a) de

    Msica? Como a experincia no Estgio Supervisionado do curso de Licenciatura em Msica

    vem contribuindo para esse processo de constituio? Com essas questes, construmos o

    problema que pretendemos estudar expresso na Figura 3 a seguir.

    Figura 3 - Problema de pesquisa

    Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

    A partir do problema de pesquisa apresentado (Figura 3), foram delimitados os objetivos

    desta investigao, apresentados na Figura 4.

  • 23

    Figura 4 - Objetivos da pesquisa

    Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

    Trata-se de uma pesquisa qualitativa com variadas ferramentas de produo de dados,

    em que pretendemos provocar dilogos entre a teoria e os dados empricos e documentais.

    Apontamos como objeto de investigao: a constituio do(a) professor(a) de Msica; como

    espao para o estudo emprico: o componente curricular de Estgio Supervisionado: Pesquisa

    da Prtica Pedaggica, do curso de Licenciatura em Msica da Universidade do Vale do Itaja

    (UNIVALI); e como participantes da pesquisa: doze discentes matriculados e cursando esse

    componente curricular no perodo investigado.

    A palavra entrelaamento foi escolhida para permear toda a pesquisa, por acreditarmos

    que as relaes aqui apontadas fazem parte da constituio do ser humano como redes de

    conexes interligadas, no cabendo discuti-las de forma fragmentada ou dicotmica. Neste

    estudo, essas redes possibilitam diferentes caminhos para pensar-se a constituio do saber e

    do conhecimento tanto docente como integral no sujeito. Essa proposta vai ao encontro de

    autores como Burke e Ornstein (2010, p. 300), quando tratam que o [...] conhecimento no

    constitudo de fatos isolados, desconectados, mas um conjunto dinmico. Os autores

    chamam de teia esse processo em rede, no qual no h um caminho de entrada correto para se

    chegar aos alvos designados, pois a teia oferece [...] ao usurio um meio de aprender a

    informaoalvo chegando a ela por seu prprio caminho (BURKE; ORNSTEIN, 2010, p.

  • 24

    299). Diante disso, esta pesquisa passa a caminhar por essa lgica, enfatizando nas redes

    engendradas as palavras em destaque na Figura 5 que segue.

    Figura 5 - Palavras chaves que permeiam os objetivos da investigao

    Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

    1.1 O SENTIDO DAS PALAVRAS

    Antes de apresentarmos os caminhos metodolgicos desta investigao, pretendemos

    expressar o sentido de palavras-chave conectadas a este estudo, assim como problematizar os

    entrelaamentos realizados na pesquisa. Afinal, no so as palavras que expressam os sentidos

    e/ou significaes (LARROSA, 2004, 2016; DUARTE JR., 2000), que descobrimos nesse

    movimento vivo de pesquisa e pesquisador(a)? Para Larrosa (2004), a palavra ou a linguagem

    mais do que uma ferramenta ou uma faculdade humana. Nesse sentido, todo ser humano d-

    se em palavras, orientando o modo de viver, pois:

    Quando fazemos coisas com as palavras, do que se trata de como damos sentido ao que somos e ao que nos acontece, de como juntamos as palavras e as coisas, de como nomeamos o que vemos ou o que sentimos e de como vemos ou sentimos o que nomeamos. (LARROSA, 2004, p. 153).

    Ainda segundo o autor, conceitos fechados podem limitar o sentido das coisas ou

    palavras, preferindo apresentar o contexto em que so pensadas ou atribudas. Ao

    aproximarmo-nos de Larrosa (2016), apresentamos o sentido e o contexto de palavras-chave

    desta investigao.

    Retomamos aqui a palavra entrelaamento para aprofundar a expresso de como ela

    est sendo encadeada nesta pesquisa. A palavra entrelaamento pode ser definida como: efeito

  • 25

    de juntar-se a algo enlaando; conjunto de coisas ligadas ou muito prximas entre si, de modo

    que se misturem, embaralhem; acontecimentos relacionados, vinculados, conexos; motivos que

    se misturam passando uns por dentro do outro (FERREIRA, A. B. de H., 1986).

    Como exemplo do entrelaamento que pretendemos propor, aproximamos essa palavra

    ideia da sua utilizao na fsica como: entrelaamento quntico15. Nesse caso, o

    entrelaamento permite que duas ou mais partculas estejam fortemente ligadas, representando

    fortes correlaes entre propriedades ou partculas fsicas observveis, no qual as medidas

    realizadas em uma delas paream influenciar instantaneamente a outra, com a qual ficou

    entrelaada16. Em torno da aproximao dessa ideia de influncia instantnea entre duas

    partculas, ou, em nosso caso, entre duas instncias, que o termo entrelaamento foi escolhido

    neste estudo para analisar a interinfluncia entre sensvel e inteligvel na constituio do ser

    professor(a) de msica.

    Nessa linha de raciocnio, o entrelaamento do sensvel e do inteligvel d-se,

    principalmente, por uma instncia depender da outra para completar o ciclo de apreenso das

    coisas da vida ou de relaes com o mundo, com o outro e consigo mesmo, apresentando entre

    si uma interinfluncia instantnea nesse processo17. Mesmo que as coisas nos cheguem pelo

    corpo, pelos rgos dos sentidos, pelas sensaes; no intelecto que as organizamos em emoes,

    em sentimentos, em percepes e sentidos, em significaes que nos voltam ao corpo

    transformando nosso modo de sentir. Na Figura 6 a seguir, representamos esse entrelaamento

    em imagem.

    15 Tambm conhecido como emaranhamento quntico. Detalhes tcnicos sobre o entrelaamento ou emaranhamento quntico podem ser encontrados em: PINTO, E. M. A. et al. Sobre os estados emaranhados. Physicae Organum, Braslia, v. 1, n. 1, p. 1-10, 2015. Disponvel em: . Acesso em: 31 dez. 2017. Ou: RIGOLIN, Gustavo. Emaranhamento Quntico. Physicae [online], ano 7, n. p. 1-7, jul. 2008. Disponvel em: . Acesso em: 31 dez. 2017. Doi: https://doi.org/10.5196/physicae.7.1. 16 [...] coube prpria fsica a ruptura com os padres cientficos vigentes ao longo da modernidade. A ela cumpriu enfrentar uma crise particular, a partir do final do sculo XIX, que redundou no abandono de velhas convices e procedimentos tidos como definitivamente estabelecidos, em favor da construo de novas maneiras de se pensar a obteno do conhecimento em seus domnios (DUARTE JR., 2000, p. 206). 17 Para discutir o entrelaamento entre sensvel e inteligvel, como uma interinfluencia instantnea entre estas duas instncias, utilizamos como base a aproximao entre a razo e a sensibilidade discutida por Alexander Gottlieb Baumgarten (1714-1762) e analisada ou expressa nas Teses de Tolle (2007) e Duarte Jr. (2000).

  • 26

    Figura 6 Entrelaamento do sensvel e do inteligvel

    Fonte: Elaborada pela autora com base em Duarte Jr. (2000).

    Nessa ptica, apresentada na Figura 6, no existe uma hierarquia e nem um ponto de

    partida, mas, sim, um contnuo ciclo de interinfluncia que se transforma ininterruptamente na

    construo de saber e de conhecimento. De acordo com Tolle (2007), quando este analisa a

    aproximao da razo e da sensibilidade por Alexander G. Baumgarten, o que pode determinar

    a prevalncia do que ser significado como saber ou conhecimento, por meio da ligao das

    instncias sensvel e inteligvel, so os focos de ateno que o sujeito direciona na experincia,

    ou seja, a forma como direcionamos os rgos dos sentidos ao que nos externo e a forma

    como damos sentidos e significamos as coisas:

    Por um lado a ateno ajusta o teu foco a um certo detalhe, por outro, procura abranger um conjunto ou uma totalidade. Ambos os focos so determinados pelo significado, e como um detalhe ou um conjunto no so grandezas mensurveis, mas sempre um recorte diante de todo um universo contido numa s percepo, a dissoluo entre o distinto e o confuso se torna iminente. [...]. Ora, no que aqui a opo pelo dualismo alma e corpo redunde no carter representativo do referente sensorial, o que poderia conduzir novamente a uma polarizao sujeito e objeto, a qual justamente a tese da harmonia preestabelecida tinha por fim dissolver. No se trata da separao de duas realidades isoladas cada uma em seu mbito, como no cartesianismo, mas a simultaneidade de dois indicadores existenciais completamente heterogneos. (TOLLE, 2007, p. 48-49).

    Nessa direo, o sensvel teoricamente possui caractersticas diferentes do inteligvel,

    mas um no atua sem o outro em nossa relao com a vida, formando, assim, um conjunto de

    sobreposies instantneas na construo de sentidos e de significao. Esse entrelaamento do

    sensvel e do inteligvel no ser humano constitui as vias de saber e de conhecimento em um

    todo interligado e, podemos dizer, na experincia com a msica.

    No trajeto da pesquisa, analisamos, ento, o entrelaamento do sensvel e do inteligvel

    na constituio do ser professor(a) de Msica, na experincia com o Estgio Supervisionado,

    pela ptica do que fazemos com o que nos acontece, nos toca, nos transforma (LARROSA,

    2004, 2016). A palavra experincia vem sendo discutida em diferentes concepes: como

    experimento cientfico, como acmulo de tempo de trabalho ou atividades, como algo possvel

    de ser reproduzido, entre outras tentativas de conceitu-la como coisa ou fato. Para atribuir

  • 27

    sentido a essa palavra, Jorge Larrosa opta pela ptica de que a experincia [...] no pode ser

    objetivada, no pode ser reproduzida. E tampouco um conceito, uma ideia clara e distinta

    (LARROSA, 2016, p. 10). O autor expressa que:

    Poderamos dizer, de incio, que a experincia , em espanhol, o que nos passa. Em portugus se diria que a experincia o que nos acontece; em francs a experincia seria ce que nos arrive; em italiano quello che nos succedeou quello che nos accade; em ingls seria that what is happening to us; em alemo seria was mir passiert. [...]. A experincia o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. No o que se passa, no o que acontece ou o que toca. A cada dia se passam muitas coisas, porm, ao mesmo tempo, quase nada nos acontece. (LARROSA, 2004, p. 153-154).

    O sujeito da experincia assim como a experincia esto aqui relacionados aos

    acontecimentos que nele acontece, a exposio. Para Larrosa (2016, p. 30), algo visto [...]

    sob o ponto de vista da travessia e do perigo, da abertura e da exposio, da receptividade e da

    transformao, da paixo. O autor ressalta que o sujeito da experincia, mesmo em estado de

    exposio e de receptividade, tambm tem sua prpria fora que [...] se expressa

    produtivamente em forma de saber e em forma de prxis (LARROSA, 2016, p. 30). Esse saber

    e prxis da experincia

    [...] se trata de um saber distinto do saber cientfico e do saber da informao, e de uma prxis distinta daquela da tcnica e do trabalho. O saber da experincia se d na relao entre o conhecimento e a vida humana. De fato, a experincia uma mediao entre ambos. importante, porm, ter presente que do ponto de vista da experincia, nem conhecimento, nem vida significam o que significam habitualmente. (LARROSA, 2016, p. 30-31).

    No decorrer da obra, Larrosa (2016) traz-nos diferentes contextos18 para

    conhecimento e vida. O conhecimento do ponto de vista da experincia diferente do

    conhecimento da cincia e da tecnologia quando o apresenta como universal, objetivo,

    impessoal de alguma forma, fora do sujeito como algo que se pode utilizar, como uma

    mercadoria. A vida do ponto de vista da experincia diferente da vida reduzida sua

    dimenso biolgica, ao consumo, sobrevivncia da sociedade. Para o autor, a relao entre

    conhecimento e vida como saber da experincia

    [...] o modo como algum vai respondendo ao que lhe vai acontecendo ao longo da vida e no modo como vamos dando sentido ao acontecer do que nos acontece. [...] no se trata da verdade do que so as coisas, mas do sentido ou do sem-sentido do que nos acontece. [...]. Por isso, o saber da experincia um saber particular, subjetivo, relativo, contingente, pessoal. Se a experincia no o que acontece, mas o que nos acontece, duas pessoas, ainda que enfrentem o mesmo acontecimento, no fazem a

    18 Larrosa (2016) utiliza contextos para expressar o sentido dos termos ou das palavras, pois ele alega que o conceito limita o sentido e as coisas.

  • 28

    mesma experincia. [...]. O saber da experincia um saber que no pode separar-se do indivduo concreto em quem encarna. [...]. A experincia e o saber que dela deriva so o que nos permite apropriar-nos da nossa prpria vida. (LARROSA, 2016, p. 32-33).

    Diante disso, o autor prefere tratar da experincia e do saber da experincia no

    como conceito, mas como palavra, aproximando-a da vida e do sentido. O saber da

    experincia est no modo como o sujeito d sentido e significado ao que lhe acontece, sendo

    esse modo subjetivo, portanto a experincia intransfervel e incapaz de ser reproduzida. Nesse

    caso, o saber engloba o conhecimento como um todo inseparvel, expressando-se no sentido

    que damos s coisas e s relaes com a vida. O autor contextualiza, ento, essa palavra sob o

    par: experincia e sentido.

    O sentido uma palavra que Larrosa (2016) traz colada ao saber da experincia,

    subjetividade, vida. J Duarte Jr. (2000) discute a palavra sentido relacionando-a ao saber

    sensvel, ao sentido dos sentidos (rgos dos sentidos, o que nos chega corporalmente), em

    dilogo com o inteligvel. Dessa maneira, o sentido remete [...] a nossa percepo do mundo,

    uma referncia aos rgos dos sentidos e tambm quela faculdade que, supe-se, possumos

    e os transcenda: nosso sexto sentido, que aponta uma intuitiva capacidade de conhecer

    (DUARTE JR., 2000, p. 13). Continuando com Duarte Jr. (2000), o sentido seria um [...]

    nmero de referncias capacidade humana de apreender a realidade de modo consciente,

    sensvel, organizado e direcionado (ou intencionado, como diriam os fenomenolgicos)

    (DUARTE JR., 2000, p. 13). Nesse cenrio, podemos, assim como Larrosa (2016), pensar a

    palavra sentido junto vida, subjetividade, experincia, significao.

    Fazemos aqui enlaamentos, aproximando a significao ao sentido e a experincia aos

    objetivos deste estudo: analisar o entrelaamento do sensvel e do inteligvel na constituio do

    ser professor(a) de msica, por meio da narrao e da expresso dos sentidos e das significaes

    que os(as) participantes da pesquisa atribuem na experincia com o Estgio Supervisionado. De

    acordo com o Glossrio Ceale19, pelo autor Luiz Francisco Dias [200-], uma mesma palavra

    pode representar diferentes significaes, dependendo do contexto ou frase que ela se encontra.

    O autor discute duas vises da significao. Nesse sentido, alm do significado dicionarizado

    de uma palavra ou grupo de palavras, necessrio compreender os sentidos e o contexto que

    ela se expressa.

    As palavras tornam-se complexas para a interpretao, visto que sua expresso pode

    soar limitada quando buscamos uma definio apenas pela combinao de alguns significados

    19 Glossrio disponvel em: . Acesso em: 28 out. 2017

  • 29

    que a elas so atribudos, portanto a necessidade de expressar os sentidos, o contexto do que se

    quer comunicar, por meio dessas palavras. A significao de uma palavra ou de acontecimentos

    d-se, portanto, dentro de um contexto e no de forma isolada.

    A significao na experincia, na constituio do saber e do conhecimento , portanto,

    subjetiva, mas no individualista ou isolada. Podemos dizer que a subjetividade plural,

    constituda por meio das relaes que o sujeito vai construindo com o outro, com o meio social,

    com a cultura, com os sentidos, com a vida vivida. Diante disso, por meio da experincia, como

    algo que nos toca, nos acontece, podemos criar redes de sentidos e de significaes, que

    repercutem na nossa relao com a vida, na nossa constituio humana e na transformao do

    que somos.

    Essa discusso que relaciona experincia, sentido e significao vem ao encontro dos

    caminhos desta pesquisa, quando pretendemos analisar o entrelaamento do sensvel e do

    inteligvel na constituio do ser professor(a) de Msica, por meio da narrao e da expresso

    dos sentidos e das significaes que os(as) participantes da pesquisa atribuem na experincia

    com o Estgio Supervisionado, no perodo de formao investigado. Alm disso, foram aqui

    introduzidos o problema e os objetivos da pesquisa, assim como uma discusso sobre os

    principais termos ou palavras que permeiam o caminho desta investigao.

    Dando seguimento, partimos para apresentao dos prximos captulos. No segundo

    captulo, apresentamos os caminhos metodolgicos da investigao, detalhando o mapeamento

    da pesquisa, os espaos e os participantes da investigao emprica, os instrumentos de

    produo de dados e os detalhes de como foi organizada a anlise e a apresentao dos dados.

    Os captulos seguintes esto relacionados aos objetivos especficos. O terceiro captulo

    refere-se ao objetivo de mapear como se d a constituio do(a) professor(a) de Msica no

    Estgio Supervisionado. Aqui, alm de discutirmos a constituio do(a) professor(a) de Msica

    por meio de alguns autores e revises realizadas em teses e dissertaes de pesquisas que se

    referem constituio e formao docente em Msica, com foco no Estgio Supervisionado,

    dialogamos com os dados empricos, apresentando o processo do Estgio Supervisionado no

    curso de Licenciatura em Msica investigado, por meio dos objetivos do curso e das narrativas

    dos(as) participantes da pesquisa sobre os seus projetos de estgio.

    O quarto captulo refere-se ao objetivo de descrever como os(as) participantes da

    pesquisa concebem a experincia no Estgio Supervisionado na sua constituio docente em

    msica. Descrevemos, por meio das narrativas dos(as) participantes, como eles significam a

    experincia do Estgio Supervisionado na sua constituio docente, dialogando com diferentes

    autores e com as pesquisas em Msica revisadas. O que diferencia esse captulo do anterior

  • 30

    que, no terceiro captulo, focamos na discusso sobre a constituio docente e nas expectativas

    do curso para a formao docente em Msica, dialogando com as narrativas dos(as)

    participantes sobre os planejamentos dos seus projetos de estgio e suas expectativas

    relacionadas a eles, antes de realizarem a atuao docente na escola. J, no quarto captulo,

    apresentamos os sentidos que os(as) participantes atribuem s experincias no Estgio

    Supervisionado, para a sua constituio docente, aps vivenciarem, na escola de Educao

    Bsica, seus projetos de estgio.

    O captulo 5 refere-se ao objetivo de identificar como ocorre o entrelaamento do

    sensvel e do inteligvel nos desafios, nas conquistas e nas transformaes significados no

    Estgio Supervisionado pelos(as) participantes da pesquisa. Este um captulo importante

    nesta investigao, pois discutimos como vem sendo pensado o entrelaamento do sensvel e

    do inteligvel em pesquisas em Msica, por meio de uma reviso em teses e dissertaes

    brasileiras, evidenciando lacunas e aproximaes com o problema deste estudo. Por meio dos

    sentidos e das significaes expressos ou narrados pelos(as) participantes da pesquisa,

    analisamos como ocorre os entrelaamentos aqui propostos como objetivo especfico.

    Finalizamos com as consideraes sobre a anlise das narrativas dos(as) participantes e

    o conjunto da pesquisa, e disponibilizamos as referncias, os apndices e os anexos dos

    materiais aqui indicados.

  • 31

    2 CAMINHOS METODOLGICOS

    O sujeito da experincia um sujeito ex-posto. Do ponto de vista

    da experincia, o importante no nem a posio[...], nem a o-posio[...], nem a imposio[...], nem a pro-posio [...], mas a exposio, nossa maneira de ex-por-nos, com tudo o que isso tem

    de vulnerabilidade e de risco. Jorge Larrosa

    Este estudo constitui-se por uma pesquisa qualitativa, em um processo que concebe a

    pesquisadora como sujeito exposta, como sujeito da experincia. Nesse sentido, estar exposta

    partir para a investigao em um estado de abertura, de receptividade diante dos encontros na

    pesquisa. ir ao encontro do ponto vista de Jorge Larrosa (2004, p. 161), a partir de uma

    exposio que concebe a subjetividade da pesquisadora, como sujeito da experincia, presente

    durante todo o processo de pesquisa, mas sem buscar prever, se opor ou propor resultados.

    Segundo Larrosa (2004), o sujeito da experincia seria

    [...] algo como um territrio de passagem, algo como uma superfcie de sensibilidade na qual aquilo que passa afeta de algum modo, produz alguns afetos, inscreve algumas marcas, [...] o sujeito da experincia um ponto de chegada, um lugar ao que chegam as coisas, como um lugar que recebe o que lhe chega e que, ao receber, lhe d lugar. (LARROSA, 2004, p. 160).

    Nessa perspectiva, fundamentamos este estudo na abordagem qualitativa. A abordagem

    qualitativa vem sendo utilizada quando se pretende compreender algo em profundidade,

    considerando-se, nesse processo, tanto a subjetividade do pesquisador quanto as dos sujeitos de

    pesquisa. Para Bogdan e Biklen (1994), na abordagem qualitativa, o(a) pesquisador(a) faz-se

    presente no local investigado em contato direto com os sujeitos da pesquisa, e sua preocupao

    gira em torno do contexto, do processo de investigao e significaes atribudas pelos sujeitos

    ao objeto de pesquisa. Nessa abordagem, nada trivial, e os dados no buscam provas para

    confirmar hipteses pr-estabelecidas. Entendemos, portanto, que a subjetividade, tanto do

    pesquisador quanto dos investigados, constituda por um coletivo, um contexto social

    significado que se expressa por meio dos sentidos atribudos pelos indivduos.

    Os(as) investigadores(as) que se utilizam dessa abordagem, segundo Bogdan e Biklen

    (1994), esto interessados no modo como as pessoas do sentido s suas vidas, nas perspectivas

    dos(as) participantes. Um exemplo disso quando Uriarte (2017) utiliza dessa abordagem em

    pesquisas relacionadas educao musical, escola e formao de professores(as) de Msica.

    Para Uriarte (2017, p. 33): A abordagem qualitativa o meio mais apropriado para estudar

    percepes, necessidades [...], assim como nos permite acessar o que as pessoas pensam e como

    reagem em diferentes situaes a que so expostas. Se a experincia na docncia musical pode

  • 32

    repercutir nos sujeitos a ponto de atriburem sentidos a ela expressos corporalmente ou em

    palavras, ento possvel que esses sentidos se manifestem por meio das expresses provocadas

    pelos instrumentos desta pesquisa, construdos com base na investigao qualitativa.

    Nesta investigao, a produo de dados aconteceu a partir das interaes dos(as) e com

    os(as) licenciandos(as)20 participantes da pesquisa, por meio da investigao emprica. Os

    instrumentos ou tcnicas de pesquisas neste estudo esto concentrados em produzir dados para

    a anlise do entrelaamento do sensvel e do inteligvel na constituio do ser professor(a) de

    Msica, na experincia com o Estgio Supervisionado. No intuito de apresentarmos esses

    instrumentos e os procedimentos de investigao, seguimos, neste captulo, com o mapeamento

    da pesquisa, assim como a apresentao do espao, dos participantes e dos instrumentos de

    produo de dados da pesquisa.

    2.1 MAPEAMENTO DA PESQUISA

    A presente investigao foi sendo construda desde o ano de 2016, com o ingresso da

    pesquisadora no Mestrado em Educao. Os primeiros passos referentes a essa investigao

    foram a delimitao do objeto de estudo, que ficou concentrado na constituio de

    professores(as) de Msica; e o tipo de pesquisa a ser realizada, no qual a produo de dados se

    daria de forma emprica em uma abordagem qualitativa.

    Aps essa delimitao, foi realizada a escolha do espao ou local e o tempo de pesquisa,

    assim como um primeiro convite aos possveis participantes da investigao emprica, para o

    detalhamento do projeto de pesquisa. Como espao/local de pesquisa, escolhemos a UNIVALI,

    no curso de Licenciatura em Msica, e seu componente curricular: Estgio Supervisionado:

    Pesquisa da Prtica Pedaggica (neste estudo indicado por ES). O tempo de pesquisa seria

    inicialmente equivalente a um semestre dessa disciplina - sendo posteriormente produzidos

    dados referentes a dois semestres. Os(as) participantes da pesquisa compreenderam doze

    discentes matriculados e atuantes nesse componente curricular durante os semestres

    investigados. Um convite de participao foi realizado professora de ES e aos(s) discentes

    matriculados, sendo aceito por todos(as) os(as) convidados(as).

    Aps a aceitao e o consentimento para a realizao da pesquisa pela coordenao do

    curso e o prvio interesse de participao dos sujeitos convidados, o projeto de pesquisa foi

    20 Alunos do curso de Licenciatura em Msica da UNIVALI. O detalhamento dos participantes encontra-se no item 2.3 deste captulo.

  • 33

    submetido ao comit de tica21, sendo realizadas, paralelamente a esses primeiros passos,

    revises bibliogrficas e leituras referentes ao tema de pesquisa. Os resultados dessas revises

    auxiliaram na compreenso de como o objeto deste estudo vem sendo discutido no campo

    cientfico de ps-graduaes brasileiras, nas escolhas das tcnicas de produo de dados e na

    discusso terica desta pesquisa.

    Depois da aprovao do projeto no comit de tica, o convite aos participantes da

    pesquisa foi reforado. Nesse momento, as intenes e os procedimentos da pesquisa foram

    novamente explicados, assim como esclarecidos os Termos de Consentimento e Assentimento

    Livre Esclarecido (TCLE) (Apndice A), deixando os sujeitos livres para escolherem participar

    ou no da investigao proposta. Os doze licenciandos convidados estavam cursando o

    componente curricular Estgio Supervisionado: Pesquisa da Prtica Pedaggica (ES) e

    confirmaram sua participao como sujeitos deste estudo. A solicitao de assinatura do TCLE

    aos(s) discentes participantes foi realizada e, junto professora de classe, foi combinado um

    cronograma para dar incio aos procedimentos de produo de dados.

    Os instrumentos de produo de dados foram engendrados mediante as necessidades da

    pesquisa, da abordagem qualitativa e dos acordos e das sugestes discutidos entre a

    pesquisadora, orientadora e a professora da disciplina de ES. Elas acabaram consistindo em: a)

    observao in loco e gravao da atividade curricular de socializao22 (narrativas da

    experincia no ES-II); b) entrevista com questes abertas, gravadas em vdeo com udio

    transcrito; e c) anlise dos documentos produzidos pelos(as) participantes da pesquisa para o

    ES-I e ES-II. O detalhamento de cada instrumento e da produo dos dados ser apresentado

    neste captulo no tpico: instrumentos de produo de dados.

    Os prximos passos consistiram na produo e nos registros dos dados pelos

    instrumentos aqui elencados, na transcrio dos dados em udio e na composio do texto para

    a qualificao e a dissertao de Mestrado; alm da anlise e da discusso terica dos dados

    produzidos. A produo dos dados teve incio pelas observaes in loco - que permeou todo o

    perodo de pesquisa emprica; seguido das gravaes em udio e vdeo da narrativa dos(as)

    21 Plataforma Brasil - Instituio proponente: Universidade do Vale do Itaja. Disponvel em: . Acesso em: 9 set. 2017. Projeto aprovado sob o Certificado de Apresentao para Apreciao tica (CAAE): 68358017.2.0000.0120. 22 Essa atividade aconteceu durante a ltima aula de cada semestre de ES -I e ES -II e teve como estratgia

    curricular socializar, por meio da narrativa oral com todos os discentes da disciplina e mais um professor convidado, as experincias vividas por cada dupla de licenciando(as) nas escolas onde foram realizadas as intervenes de estgio. A atividade de socializao ser detalhada no tpico instrumentos de produo de dados neste captulo.

  • 34

    participantes da pesquisa, durante a atividade curricular de socializao das experincias de ES-

    II23; das entrevistas que foram transcritas e tratadas posteriormente; e do acesso e da anlise

    dos documentos produzidos pelos discentes sobre e durante a experincia de Estgio

    Supervisionado em dois semestres ES- I e ES- II24.

    Diante do mapeamento exposto, apresentamos sua sntese na Figura 7 a seguir, cujo

    caminho indicado inicia-se pelo tema objeto da pesquisa e alcana as publicaes. O ponto

    indicado como Leitura permeia todo o perodo de pesquisa, assim como outros pontos esto

    interligados a diferentes momentos da construo da investigao.

    Figura 7 Mapeamento da pesquisa

    Fonte: Elaborada pela autora para fins de pesquisa.

    2.2 O ESPAO DA PESQUISA EMPRICA

    O espao ou local selecionado para a realizao da investigao emprica consiste na

    Universidade do Vale do Itaja, no curso de Licenciatura em Msica, no componente curricular

    23 Essa nomenclatura ES-II foi criada pela pesquisadora, a qual equivale ao segundo semestre de ES do curso. Os participantes j haviam cursado no semestre anterior a disciplina ES-I. 24 Com o objetivo de ampliar as possibilidades de anlise, foram acessados e analisados tambm os documentos produzidos pelos participantes no ES-I, ampliando a anlise documental de um para dois semestres. O ES-I equivale primeira experincia de ES desse grupo com durao de um semestre, e o ES-II, a segunda experincia de ES desse mesmo grupo, tambm com durao de um semestre. Os documentos foram analisados com base na anlise de contedo e equivalem: aos planos de ensino, aos planos de aula, aos relatrios de aula, ao PowerPoint da socializao, ao portflio produzido no ES-I e ao artigo cientfico produzido no ES-II.

  • 35

    Estgio Supervisionado: Pesquisa da Prtica Pedaggica25. O curso era composto, no decorrer

    da investigao, por sete perodos, sendo quatro perodos com ES, entre outras disciplinas. O

    perodo estudado refere-se primeira experincia de ES dos(as) participantes - a qual ser

    chamada neste estudo de Estgio Supervisionado I (ES-I); e a segunda experincia de ES

    dos(as) participantes - a qual ser chamada neste estudo de Estgio Supervisionado II (ES-II).

    No Quadro 1 a seguir, esto expostos detalhes desse componente curricular.

    Quadro 1 Organizao do componente curricular ES na Licenciatura em Msica-UNIVALI

    Disciplina Perodo Carga

    horria Crditos Objetivo/Ementa Investigao

    1. ES IV:

    Pesquisa da Prtica

    Pedaggica

    IV 60 h 4

    A investigao-ao na prtica pedaggica: procedimento de coleta e anlise de dados. Planejamento do estgio. Interveno. Documentao, anlise e registro: portflio ou artigo cientfico. Socializao.

    (X) Estgio

    Supervisionado-I (ES-I)

    2. ES V:

    Pesquisa da Prtica

    Pedaggica

    V 90 h 6

    A investigao-ao na prtica pedaggica. Estrutura do planejamento do estgio. Planejamento do estgio: interveno. Sistematizao, registro e socializao.

    (X) Estgio

    Supervisionado-II

    (ES-II)

    3. ES VI:

    Pesquisa da Prtica

    Pedaggica

    VI 120 h 8

    Prtica pedaggica. Materiais didticos: anlise e produo. Documentao e registro da prtica pedaggica.

    -

    4. ES VII:

    Pesquisa da Prtica

    Pedaggica.

    VII 135 h 9

    Interdisciplinaridade na prtica pedaggica. Planejamento integrado. Planejamento do estgio. Interveno pedaggica e anlise de dados. Sistematizao, registro e socializao.

    -

    Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados disponveis no site do curso.26

    O Estgio Supervisionado: Pesquisa da Prtica Pedaggica desenvolve-se do 4 ao 7

    perodo, com a carga horria e a distribuio na matriz curricular j apresentada no Quadro 1.

    A carga horria em cada perodo do Curso de Msica diferenciada, e o campo de investigao

    25 O Estgio Supervisionado investigado um componente curricular obrigatrio para a obteno do diploma, estando seu regulamento disposto na Resoluo N 058/CONSUN-Caen (ver Anexo A), em acordo com as Leis N 11.788/08, de 25 de setembro de 2008, e N 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996; as Resolues CNE/CP N 1, de 18 de fevereiro de 2002 (BRASIL, 2002a) (DCN para Formao de Professores da Educao Bsica, em nvel superior, curso de licenciaturas, de graduao plena) e CNE/CP N 2, de 19 de fevereiro de 2002 (BRASIL, 2002b). 26 Disponvel em: . Acesso em 28 nov. 2017.

  • 36

    e interveno dos estagirios compreendem os ambientes escolares e outros contextos

    educacionais, formais e no formais, da Rede de Educao Bsica, pblica ou privada,

    conveniados com a UNIVALI. As atividades no Estgio Curricular e a orientao so de

    competncia do professor orientador e do supervisor de campo (externo). Os(As)

    acadmicos(as) fazem, ao fim do processo de cada semestre de estgio, a socializao oral da

    experincia e a registram tambm em relatrio ou artigo cientfico. Essas informaes esto

    baseadas no regulamento do curso vigente no perodo de investigao.

    De acordo com a Resoluo N 058/CONSUN-Caen 2015 (ver Anexo A), o estgio

    como forma de integrao entre aprendizagem e prtica proporciona [...] contrapartidas

    indispensveis formao docente e [representa] valiosa oportunidade de aproximao do

    acadmico ao mercado de trabalho. Mais detalhes sobre essa Resoluo e o planejamento do

    estgio investigado encontram-se no Anexo A.

    Diante do exposto, podemos perguntar: Por que estudar o entrelaamento do sensvel e

    do inteligvel na constituio de professores(as) de Msica, por meio da experincia com o

    Estgio Supervisionado em um curso de Licenciatura em Msica? Os fatores de escolha do

    espao ou local de pesquisa esto relacionados aos seguintes critrios:

    a) por ser considerado o curso de Licenciatura em Msica um espao formal, definido

    culturalmente e por Lei no Brasil, como formador de profissionais habilitados para

    atuarem como educadores(as) musicais em escolas regulares e outros espaos;

    b) pela Licenciatura em Msica ter a pretenso de contribuir efetivamente na constituio

    do ser professor(a) de Msica;

    c) por ser o Estgio Supervisionado considerado em pesquisas27 um expressivo

    componente curricular dos cursos de Licenciatura a antecipar ou possibilitar ao()

    licenciando(a) contato e experincias no campo de atuao profissional, para o qual o

    curso almeja formar.

    d) pelo fato de a Licenciatura em Msica no ES estudado proporcionar aos(as)

    licenciandos(as) um contato direto com a escola, onde estes(as) atuam como

    professores(as) planejando, criando, dando aulas e avaliando;

    e) pelo fato de o ES estudado articular atividades ao(as) licenciandos(as), que provocam a

    reflexo sobre e na prtica docente; instigar a socializao escrita e oral sobre a

    27 Ver, por exemplo: Benvenuto (2012), Buchmann (2008), Campos (2016), Fernandes (2017), Parente (2015), Werle (2010) e Azevedo (2007).

  • 37

    experincia na atuao docente; e fomentar a criao de significaes e de sentidos na

    constituio docente;

    f) pelo fato de o curso de Licenciatura em Msica investigado fomentar a pesquisa e a

    troca de conhecimento entre Graduao, Educao Bsica e Ps-Graduao.

    2.3 OS PARTICIPANTES DA PESQUISA

    A investigao emprica contou com a participao de discentes (Figura 8)

    matriculados(as) e atuantes no componente curricular de ES-II, do curso de Licenciatura em

    Msica da UNIVALI, durante o perodo de produo dos dados. O nmero de participantes da

    pesquisa totalizou 12 (doze) licenciandos(as), todos maiores de dezoito anos, sendo 7 (sete) do

    sexo masculino e 5 (cinco) do sexo feminino. Esses(as) participantes so os(as) mesmos(as)

    licenciandos(as) que concluram o ES-I, tendo a mesma professora orientadora de estgio nos

    ES-I e ES-II.

    Figura 8 Participantes (p) da pesquisa emprica

    Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados da pesquisa.

    A atuao dos(as) discentes participantes deste estudo nas escolas, nos planejamentos,

    assim como na produo dos documentos referentes ao ES foi realizada em duplas. A

    composio desses(as) discentes em duplas gerou um total de cinco duplas mais duas atuaes

    individuais no ES-I e seis duplas no ES-II, como mostra o detalhamento apresentado no Quadro

    2.

  • 38

    Quadro 2 Participantes da pesquisa e a produo de documentos na atuao no ES-I e ES-II

    Disciplina Total de participantes

    Organizao das duplas Documentos produzidos

    Estgio

    Supervisionado I-

    IV perodo

    12 Cinco duplas e mais duas atuaes

    individuais*.

    Planos de aula, Planos de ensino, portflio, relatrios, PowerPoint de apresentao da atuao no ES-I.

    Estgio

    Supervisionado II-

    V perodo

    12 Seis Duplas.**

    Planos de aula, planos de ensino, artigo cientfico,

    relatrios, PowerPoint de apresentao da atuao

    no ES-II. *Nesse primeiro perodo, inicialmente eram 15 discentes, mas houve a desistncia de trs discentes. Dois deles desistiram da disciplina antes de iniciarem os planejamentos, a atuao nas escolas e os registros; e o segundo discente desistiu logo aps a atuao na escola, no participando dos registros, totalizando assim 12 participantes na pesquisa. Desse perodo foram analisados apenas os documentos produzidos e parte da entrevista onde este perodo foi mencionado. **Foram analisados os documentos produzidos e as narrativas (relatos e entrevista) dos(as) discentes sobre a experincia no ES- II.

    Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados da pesquisa.

    Para a produo de dados desta investigao foi solicitado aos(s) participantes que

    elegessem nomes fictcios para si prprios(as), como uma forma de preservar o anonimato. De

    acordo com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e as questes ticas da pesquisa, o

    anonimato dos(as) participantes ser preservado. Assim sendo, na Figura 9, est exposto o

    pseudnimo escolhido por cada um(a), relacionado organizao das duplas de cada semestre

    de ES estudado.

  • 39

    Figura 9 Pseudnimos dos participantes e organizao das duplas no ES-I e ES-II

    Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados da pesquisa.

    A organizao das duplas ficou diferente nos dois semestres, com exceo da dupla

    Luiza e Patrcia, que permaneceram a mesma, devido a uma solicitao justificada pela

    pretenso da realizao de um projeto de estgio comum entre as licenciandas. Como relatado

    anteriormente, no ES-I, a princpio, seriam sete duplas, mas devido desistncia da disciplina

    por trs discentes, a organizao foi alterada para cinco duplas e mais duas atuaes individuais,

    totalizando 12 (doze) participantes no estudo. No ES-I, foram analisados apenas os documentos

    e parte da entrevista que menciona a relao que os licenciandos fazem entre o ES-I e ES-II. O

    ES-II contou com seis duplas, sendo analisados todos os dados referentes a esse perodo,

    construdos pelas tcnicas de investigao. O fato de os(as) licenciandos(as) serem os(as)

    mesmos(as) nos ES-I e ES-II contribuiu para a anlise da experincia nos dois semestres.

  • 40

    2.4 INSTRUMENTOS DE PRODUO DE DADOS

    Os instrumentos de produo de dados deste estudo foram organizados em diferentes

    etapas. As caractersticas de cada instrumento e etapa assim como seus objetivos esto

    apresentados no Quadro3.

    Quadro 3 Instrumentos de produo de dados: caractersticas e objetivos

    Instrumento Caractersticas Objetivos

    Observao in loco

    Aconteceu durante todo o perodo da pesquisa emprica, totalizando cinco encontros com os(as) participantes.

    O espao de observao considerado na pesquisa limitou-se sala de aula dos(das) licenciandos(as), e aos espaos do curso de Licenciatura em Msica na universidade estudada.

    Aproximar a pesquisadora da rotina dos(as) participantes da pesquisa, na disciplina de ES estudada, assim como criar dilogos referentes pesquisa.

    Observao e gravao em vdeo28 das narrativas das experincias no ES-II

    A gravao aconteceu em um nico dia, registrando-se em vdeo com udio o momento de socializao29 da experincia no ES-II vivida pelos(as) participantes da pesquisa.

    Os udios desses registros foram transcritos e tratados posteriormente, transformando-se em dados para a pesquisa.

    Registrar a narrativa oral dos(as) licenciandos(as), sobre as experincias no ES-II.

    Produzir dados para a pesquisa por meio do registro e de transcrio de udio.

    Entrevista com questes abertas (ver Apndice B)

    Trata-se de uma entrevista com questes abertas.

    Foi realizada em um nico dia. A entrevista aconteceu logo aps

    cada dupla de licenciandos(as) narrarem suas experincias de estgio, na atividade de socializao, sendo as respostas dadas individualmente e compartilhadas com o grupo.

    O roteiro de questes foi o mesmo para todos(as) os(as) participantes, totalizando 12(doze) respostas.

    As entrevistas foram gravadas em udio e vdeo, e