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UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA – UNOESC ÁREA DAS CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS PROGRAMA PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO (PPGEd) – MESTRADO MICHELLE SPEROTTO BORTONCELLO BULLYING NA INSTITUIÇÃO EDUCATIVA AUTOR, ALVO, ESPECTADOR: “DE QUE” E “DE QUEM” ESTAMOS FALANDO? Joaçaba / SC 2014

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UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA – UNOESC

ÁREA DAS CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

PROGRAMA PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO (PPGEd) – MESTRADO

MICHELLE SPEROTTO BORTONCELLO

BULLYING NA INSTITUIÇÃO EDUCATIVA –

AUTOR, ALVO, ESPECTADOR:

“DE QUE” E “DE QUEM” ESTAMOS FALANDO?

Joaçaba / SC

2014

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MICHELLE SPEROTTO BORTONCELLO

BULLYING NA INSTITUIÇÃO EDUCATIVA –

AUTOR, ALVO, ESPECTADOR:

“DE QUE” E “DE QUEM” ESTAMOS FALANDO?

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

graduação em Educação (PPGEd) - Mestrado

em Educação, da Universidade do Oeste de

Santa Catarina – Unoesc, Campus de Joaçaba,

como requisito parcial à obtenção do grau de

Mestre em Educação, sob a orientação da Profa.

Dra. Maria Teresa Ceron Trevisol.

Joaçaba/ SC

2014

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MICHELLE SPEROTTO BORTONCELLO

BULLYING NA INSTITUIÇÃO EDUCATIVA –

AUTOR, ALVO, ESPECTADOR:

“DE QUE” E “DE QUEM” ESTAMOS FALANDO?

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

graduação em Educação (PPGEd) - Mestrado

em Educação, da Universidade do Oeste de

Santa Catarina – Unoesc, Campus de Joaçaba,

como requisito parcial à obtenção do grau de

Mestre em Educação.

Aprovada em ............ de .................................. 2014.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________

Profª. Dra. Maria Teresa Ceron Trevisol

Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC

________________________________________

Profª. Dra. Luciene Regina Paulino Tognetta

Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara – UNESP

________________________________________

Profª. Dra. Ortenila Sopelsa

Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC

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B739b Bortoncello, Michelle Sperotto

Bullying na instituição educativa – autor, alvo, espectador:

“de que” e “de quem” estamos falando?. / Michelle Sperotto

Bortoncello. UNOESC, 2014.

213 f.; 30 cm.

Dissertação (Mestrado) – Universidade do Oeste de

Santa Catarina. Programa de Mestrado em Educação,

Joaçaba,SC,2014.

Bibliografia: f. 206 – 213.

1. Adolescentes – Conflitos Interpessoais. I. Título

CDD- 371.78

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Dedico, em especial,

A Eloi Junior, meu esposo, companheiro e

amigo de todos os momentos, que sempre

esteve ao meu lado, entendendo as dificuldades

e desafios enfrentados, dando-me forças para

continuar, incentivando e apoiando minhas

decisões. Meu eterno Amor!

A Augusto, meu pequeno filho, por todos os

momentos que tirava minha atenção do trabalho

e procurava, do seu jeito, me mostrar o que

realmente é importante na vida. O verdadeiro

sentido da minha existência!

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus, por permitir-me chegar até aqui.

Agradeço em especial:

Ao meu esposo Eloi Junior, companheiro em todos os momentos, grande incentivador, por

seu zelo e dedicação.

Ao meu pequeno filho Augusto, que com sua alegria de viver soube enfrentar a minha falta

de companhia e falta de paciência, e que com seu doce sorriso me incentiva a cada dia

buscar o melhor.

Aos meus pais, pelo amor, dedicação e incentivo.

Aos meus colegas da turma de mestrado, em especial às minhas amigas: Ana Maria e

Luciane, com as quais troquei ideias, aprendi, ri, desabafei e compartilhei muitos momentos

ao longo destes dois anos.

À querida amiga e professora Dra. Maria Teresa Ceron Trevisol, que aceitou ser a

orientadora deste trabalho e com sua calma sempre me incentivou a seguir adiante.

Aos demais professores do Programa de Pós-graduação – Mestrado em Educação, pelos

ensinamentos compartilhados.

Às professoras Dra. Luciene Tognetta e Dra. Ortenila Sopelsa, pela leitura criteriosa e

contribuições valiosas, que em muito enriqueceram este trabalho.

Aos adolescentes participantes desta pesquisa, sem eles este trabalho não seria possível.

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Nós vos pedimos com insistência: não digam nunca “isso é

natural” diante dos acontecimentos de cada dia.

(...) não digam nunca: isso é natural. A fim de que nada

passe por imutável.

Sob o familiar descubram o insólito.

Sobre o cotidiano, desvelem o inexplicável.

Que tudo que seja dito ser habitual, cause inquietação.

Na regra é preciso descobrir o abuso.

E sempre que o abuso for encontrado,

é preciso encontrar o remédio.

Bertolt Brecht

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RESUMO

Esta dissertação apresenta como objeto de estudo o bullying escolar e busca analisar um

contexto particular de relações interpessoais conflituosas, que ocorrem no IFC – Instituto

Federal Catarinense - Campus Concórdia. Enquanto profissional que atua no IFC observei e

inquietou-me o fato de tantos alunos apresentarem mal-estar, ansiedade, medo, sérias

dificuldades na relação pessoal com os colegas, falta de motivação para estudar, entre

outros. Nesse sentido, a pesquisa teve como objetivo investigar a concepção de alunos do

IFC – Campus Concórdia a respeito do fenômeno bullying, suas diferentes manifestações,

causas e consequências. A pesquisa realizada se caracteriza como descritiva, de cunho

exploratório e de natureza quanti-qualitativa. A amostra foi constituída por 209 alunos, com

idade entre 14 e 18 anos, pertencentes aos cursos de Ensino Técnico integrado ao Ensino

Médio (Agropecuária e Alimentos), abrangendo as turmas de 1º, 2º e 3º anos. Como

procedimento de coleta de dados foi utilizado o questionário e a entrevista. A coleta dos

dados se deu em duas etapas, inicialmente houve a aplicação de um questionário abrangendo

os 209 alunos, com a finalidade de diagnóstico. Posteriormente foi realizada uma entrevista

(tendo como base de coleta e análise dos dados o método clínico piagetiano combinado ao

uso situações problema), aplicada a 5% dos alunos que participaram da primeira etapa,

envolvendo 10 alunos. Para a análise dos dados, buscou-se aporte teórico, principalmente

nos estudos de: Fante (2005); Lopes Neto (2005, 2011); Tognetta (2005, 2010, 2011);

Tognetta e Vinha (2008, 2010); Gomes e Sanzovo (2013); Maldonado (2011); Goffman

(1987); Eyng (2011); Campos (2010). Os resultados obtidos indicaram que a escola convive

com situações e práticas violentas, que são facilmente identificadas pelos alunos. A cultura

escolar atua como fonte de violência, o que faz com que muitos alunos entendam como

“normal” atitudes deste tipo na escola e ajam com indiferença, ou seja, confundir fatos do

tipo bullying com brincadeiras é muito habitual na instituição pesquisada. Os dados

revelaram que a violência psicológica é a que mais acontece na escola, e que o bullying é

caracterizado, principalmente, por meio de atos de violência verbal (xingamentos, apelidos

maldosos, difamação, ofensas) realizados diariamente, os quais geram sentimentos negativos

e de mal estar, principalmente nos alvos. Além disso, tais atos resultam em prejuízos

imediatos aos escolares, como falta de motivação, dificuldades de concentração,

comunicação e queda no rendimento escolar. Na instituição pesquisada, as ações de bullying

acontecem principalmente longe dos responsáveis pela escola, sendo o alojamento indicado

como o local mais vulnerável para a sua ocorrência. Dentre os participantes da pesquisa,

41,15% já maltrataram colegas de escola, enquanto 63,6% já foram alvos de maus tratos por

parte dos colegas e 80% já presenciaram cenas de bullying na escola, ou seja, já foram

espectadores. Com relação às razões promotoras do bullying, destaca-se que o poder e

hierarquia estão envolvidos com as agressões praticadas. Além disso, o fato de já ter sofrido

bullying antes, faz com que muitos repitam às mesmas ações e/ou comportamentos sofridos

em outros colegas, indicando a presença do círculo vicioso alvo-autor. A pesquisa forneceu

ainda dados acerca da gravidade da problemática existente dentro do ambiente escolar

pesquisado. Pode-se concluir que o bullying é um problema complexo e de causas múltiplas,

cabendo à escola pesquisada, diante dos dados analisados, organizar e desenvolver

estratégias próprias para reduzi-lo e preveni-lo. Ressalta-se a urgência de se combater o

bullying, e isto só será possível por meio de reflexões coletivas em que se oportunize a

efetiva participação de todos no processo: professores, funcionários, alunos e pais.

Palavras-chave: Bullying escolar. Conflitos Interpessoais. Adolescentes. Escola internato.

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ABSTRACT

The following paper was aimed at studying school bullying and analyzing a particular

context of conflict-ridden interpersonal relations, which happened at IFC – Instituto Federal

Catarinense – Campus Concórdia. As a professional from IFC, one fact that made me uneasy

while observing some students was that a great number of them display anxiety, fear,

difficulties in interpersonal relations with their classmates, lack of motivation to study, and

so on. Being so, the research investigated the students’ assessment of the phenomenon

known as bullying, its different forms, causes and consequences. The research is

characterized as descriptive, exploratory, quantitative and qualitative. 209 students were

sampled, ages between 14 to 18, who study technical courses integrated to high school (in

the areas of Agricultural Science and Food) of the freshmen, sophomore and junior years.

Data collection was carried out in two steps; first, a diagnostic questionnaire for the 209

students was applied; then, an interview, based on the piagetian clinical method for data

collection and analysis together with the use of practical situations, was made to 5% of the

students who were involved the first step. For the data analysis, theoretical support, as the

one found in the studies of Fante (2005), Lopes Neto (2005, 2011), Tognetta (2005, 2010,

2011), Tognetta and Vinha (2008, 2010), Gomes and Sanzovo (2013), Maldonado (2011),

Goffman (1987), Eying (2011), and Campos (2010), was used. Results have shown that

violent situations happen at the school on a daily basis, and are easily identified by the

students. In this context, school culture acts as a source of violence, which makes a lot of

students see such attitudes as being normal, leading to indifference. That is, confusing

bullying with innocent joy is rather normal in the institution. Data also revealed that

psychological violence is of the most common kind in the school, and bullying is

characterized, mainly, by daily verbal violence (cursing, mean nicknames, defamation,

offense), which lead to negative feelings and reduced welfare, especially on the students

who suffer from such violence. Besides, such course of action reflect as direct loss to the

school, such as lack of motivation, capacity of focus and communication, and decay in the

process of learning. Bullying actions normally happen away from the school staff,

happening with a higher frequency at the dormitories. Among the participants, 41,15% have

already maltreated classmates, while 63,6% have already been maltreated and 80% have

witnessed bullying. As for the reasons why bullying happens, power control and hierarchy

stand out. Moreover, it was also found that a students who has suffered from bullying before

has a higher tendency of repeating those actions to other students in the future, which

indicates the presence of the target-author vicious circle. The research has also provided

enough information about the gravity of the problem inside the school. It is possible to

conclude that bullying is a complex problem caused by numerous reasons, and that the

responsibility to organize and develop strategies to reduce and prevent it belongs to the

school. It is also important to emphasize the urgency of fighting bullying, and that can only

be made possible through collective thinking which allows for the participation of every part

involved in the process: teachers, staff, students and parents.

Keywords: School bullying. Interpersonal Conflicts. Adolescents. Boarding school

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Principais formas de violência existentes na escola .................................... 101

Tabela 2 – Locais onde ocorre a prática de bullying na escola ...................................... 109

Tabela 3 – Autores de bullying ...................................................................................... 127

Tabela 4 – Série/turma dos autores ................................................................................ 128

Tabela 5 – Alvos de bullying ......................................................................................... 131

Tabela 6 – Contou para alguém ..................................................................................... 134

Tabela 7 – Para quem contou?........................................................................................ 134

Tabela 8 – Reações frente ao bullying .......................................................................... 138

Tabela 9 – Sentimentos ocasionados ao presenciar cenas de bullying .......................... 140

Tabela 10 – Motivos para a prática de bullying na escola ............................................. 142

Tabela 11 – Como os alunos consideram o ambiente escolar ....................................... 157

Tabela 12 – Como os alunos se sentem estudando na escola ........................................ 158

Tabela 13 – O que os alunos mais gostam na escola ..................................................... 158

Tabela 14 – O que os alunos não gostam na escola ....................................................... 159

Tabela 15 – Quantos bons amigos você tem na escola................................................... 181

Tabela 16 – Opinião dos alunos a respeito de como a escola lida com os casos de

violência, desrespeito e agressão repetitiva................................................ 187

Tabela 17 – Qual deve ser o encaminhamento da escola diante de situações de

Bullying...................................................................................................... 189

Tabela 18 – Sugestões de melhoria.................................................................................. 192

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Gênero e número de participantes por série .............................................. 91

Gráfico 2 – Idade dos participantes .............................................................................. 92

Gráfico 3 – Conflitos e violência na escola .................................................................. 94

Gráfico 4 – Já presenciaram colegas praticando bullying ............................................. 97

Gráfico 5 – Principais tipos de violência que ocorrem na escola ................................... 103

Gráfico 6 – Locais onde mais ocorre o bullying ........................................................... 110

Gráfico 7 – Tipos de violência enfrentados ................................................................... 132

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LISTA DE FIGURAS

Fotografia 1 – IFC - Campus Concórdia ...................................................................... 32

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CGAE – Coordenação Geral de Assistência ao Educando

CGE – Coordenação Geral de Ensino

CGRH – Coordenação Geral de Recursos Humanos

IFC – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Catarinense

MEC – Ministério da Educação

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 16

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS................................................... 27

2.1 TIPO DE PESQUISA......................................................................................... 27

2.2 LOCAL/ESCOLA A SER PESQUISADA........................................................ 29

2.2.1 Caracterização geral do Instituto Federal Catarinense – IFC.............................. 29

2.2.2 O Campus Concórdia.......................................................................................... 30

2.3 AMOSTRA......................................................................................................... 32

2.4 PROCEDIMENTOS PARA COLETA DE DADOS......................................... 33

2.5 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DE DADOS............................................. 36

3 BULLYING ESCOLAR: DE QUE ESTAMOS FALANDO? ...................... 38

3.1 ESTUDOS SOBRE BULLYING NAS ESCOLAS: ALGUMAS

CONSIDERAÇÕES.......................................................................................... 38

3.2 CONCEITO: DE QUE ESTAMOS FALANDO?............................................. 44

3.3 CARACTERÍSTICAS: COMO DIFERENCIAR O BULLYING DE ATOS

SIMPLES DE VIOLÊNCIA?............................................................................. 46

3.4 FORMAS DE BULLYING: TIPOS DE MAUS TRATOS................................ 48

3.5 PROTAGONISTAS: DE QUEM ESTAMOS FALANDO?.............................. 51

3.6 CAUSAS: MOTIVADORES E REFORÇADORES......................................... 60

3.7 CONSEQUÊNCIAS: QUAIS OS DANOS SOBRE OS ESTUDANTES?....... 71

3.8 BULLYING E INTERNATO............................................................................. 77

3.9 A ADOLESCÊNCIA, O GRUPO DE PARES E O BULLYING...................... 81

4 A DINÂMICA DO FENÔMENO BULLYING NO IFC - CAMPUS

CONCÓRDIA: A PARTIR DA COMPREENSÃO DOS ALUNOS........... 89

4.1 CARACTERIZANDO O BULLYING NO IFC – CAMPUS CONCÓRDIA... 93

4.1.1 Identificação da Violência na escola ................................................................. 93

4.1.2 Formas de violência existentes na escola............................................................ 99

4.1.3 Espaços onde o bullying se manifesta................................................................. 109

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4.1.4 Os sujeitos envolvidos......................................................................................... 125

4.1.5 Aspectos motivadores......................................................................................... 142

4.2 A PERCEPÇÃO DOS ALUNOS SOBRE A VIOLÊNCIA E O DESRESPEITO

NA INSTITUIÇÃO DE ENSINO: SENTIDOS ATRIBUÍDOS AOS

EPISÓDIOS DE BULLYING........................................................................... 157

4.2.1 O Ambiente e a convivência escolar..................................................................... 157

4.2.2 Prejuízos causados pelo bullying.......................................................................... 163

4.2.2.1 Influência do bullying sobre o rendimento escolar............................................... 165

4.2.2.2 Os sentimentos despertados.................................................................................. 172

4.2.3 Como os alunos percebem os maus tratos entre os pares e suas consequências... 175

4.2.4 A importância do grupo de amigos........................................................................ 178

4.2.5 Quanto à intervenção dos pais nos casos de bullying............................................ 182

4.2.6 Quanto à atuação da escola frente ao bullying...................................................... 185

4.2.6.1 Atuação da escola – Algumas considerações....................................................... 194

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 202

REFERÊNCIAS............................................................................................................ 208

APÊNDICES ................................................................................................................ 215

ANEXOS........................................................................................................................ 224

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1 INTRODUÇÃO

Todos os dias, alunos no mundo todo sofrem com algum tipo de violência que vem

mascarada na forma de “brincadeira”. Estudos revelam que esse comportamento, que até

pouco tempo atrás era considerado inofensivo e que recebe o nome de bullying, pode

acarretar diversas consequências ao desenvolvimento psíquico dos alunos.

O fenômeno bullying é um assunto recente em termos de investigações acadêmicas.

Contudo, não se pode desconsiderar sua presença nos ambientes escolares há muito tempo,

antes mesmo que os resultados das primeiras pesquisas constatassem sua manifestação. No

entanto, o tema só passou a ser objeto de estudo científico no início dos anos 70.” As

primeiras pesquisas sobre o termo bullying foram realizadas na Noruega, sendo o

pesquisador Dan Olweus considerado o precursor dos estudos sobre tal temática. Com

relação à realidade brasileira, os estudos são mais contemporâneos (a partir de 2000), e

necessitam de maiores aprofundamentos, a fim de que respostas sejam oferecidas ao

contexto no qual estamos inseridos. Vale apontar autores e pesquisadores brasileiros no

assunto: Fante, Tognetta, Vinha, Lopes Neto, Maldonado, entre outros.

De acordo com Gomes e Sanzovo (2013, p. 17) e Lopes Neto (2011, p.21) o

bullying é derivado do verbo inglês to bully, que significa: ameaçar, amedrontar, intimidar,

maltratar, tiranizar, oprimir. Já bully pode ser traduzido como valentão, brigão, tirano. O

termo inglês bullying, popularizado no Brasil, possui amplo significado e aplica-se a todo

tipo de tortura física e psicológica repetitiva de que são vítimas as crianças e adolescentes

que têm como algozes seus próprios colegas.1

Conforme Tognetta (2005) o bullying pode ser definido como:2

[...] bullying é um termo em inglês utilizado para designar a prática de atos

agressivos entre estudantes [...] uma intimidação, um assédio cotidiano [...] uma

intimidação caracterizada por algumas peculiaridades muito interessantes: diz

respeito às ações agressivas intencionais e repetidas, praticadas por um ou mais

alunos contra outro. [...] segundo, as características principais do bullying que o

distinguem de outros acontecimentos cotidianos é que seu caráter é intencional.

Não se trata de uma simples brincadeira que acontece de vez em quando [...] aos

casos de bullying atribui-se o critério da intenção, ou seja, são atos pensados,

1 No Brasil e na maioria dos países adota-se a terminologia inglesa bullying, justamente por não se encontrar

outra denominação que contenha o mesmo alcance da palavra inglesa para descrever um tipo de violência tão

grave que ocorre nas escolas. (GOMES E SANZOVO, 2013, p. 17). 2 Este conceito foi adotado para fins de análise dos dados por entendermos que abarca as características

principais para distinguirmos o bullying de outros tipos de violência que também ocorrem nas escolas.

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calculados e praticados repetidas vezes com um mesmo alvo. [...] Outra

particularidade observada é que essa agressão se repete constantemente a uma

única vítima.

Pode-se dizer então, que o bullying é uma prática de atos agressivos entre pares,

realizados de maneira recorrente e intencional por parte dos agressores, sempre contra o

mesmo alvo, sem motivos aparentes, ocorrendo sempre na presença de um público.3

Para se caracterizar um comportamento como bullying, é necessário distinguir os

“conflitos normais”, ocasionais e não graves dos “maus tratos” habituais e graves, como

destacam as autoras Fante (2005) e Tognetta (2011). As autoras apontam que o diferencial

entre o bullying e os “maus tratos” ocasionais é a intencionalidade e a repetição das

agressões sempre com o mesmo alvo.

Conforme Fante, os atos de bullying entre os alunos apresentam determinadas

características comuns:

[...] são comportamentos produzidos de forma repetitiva num período prolongado

de tempo contra uma mesma vítima; apresentam uma relação de desequilíbrio de

poder, o que dificulta a defesa da vítima; ocorrem sem motivações evidentes; são

comportamentos deliberados e danosos. (FANTE, 2005, p. 49)

A cena do bullying envolve papéis diferenciados4 que, segundo estudiosos do tema

(SILVA, 2010; FANTE, 2005; FANTE e PEDRA, 2008; TEIXEIRA, 2011, TOGNETTA,

2011; MALDONADO, 2011), podem ser descritos como o autor ou agressor; a vítima ou

alvo e os espectadores ou testemunhas.

Conforme encontramos em Tognetta e Vinha (2008, p. 03; 2011, p. 141), a atual

literatura aconselha que se utilize as expressões “alvos de bullying” e “autor de bullying”,

para designar a vítima e o agressor, respectivamente, na tentativa de evitar preconceitos por

parte das pessoas que trabalham com situações em que haja essa forma de violência.5

O autor de bullying (ou agressor) é aquele que, sem motivo aparente, intimida,

humilha e agride o colega que considera mais fraco. Comumente são indivíduos que tem

pouca empatia e falta de sensibilidade moral. Segundo Silva (2010, p. 43) podem ser de

ambos os sexos, possuem em sua personalidade traços de desrespeito e maldade e, na

3 (TOGNETTA E VINHA, 2010a, p. 452).

4 Todos os componentes da comunidade escolar são protagonistas efetivos, diretos ou indiretos, das ações de

bullying. (LOPES NETO, 2011, p. 36) 5 No entanto, se em algum momento neste texto nos referirmos aos termos “vítima” e “agressor”, será pela

importância de manter a escrita original dos autores citados.

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maioria das vezes, essas características estão associadas a um perigoso poder de liderança

que, em geral, é obtido ou legitimado através da força física ou de intenso assédio

psicológico. Os autores apresentam aversão às normas, não aceitam serem contrariados e

geralmente estão envolvidos em atos de pequenos delitos (furtos, roubos, vandalismo,

destruição do patrimônio público, etc.). Conforme Teixeira (2011, p. 32) “os agressores

mantêm seu status à custa da violência e da opressão de suas vítimas e se sentem mais

poderosos cada vez que agridem e maltratam outros estudantes”. A covardia é outra marca

dos bullies, que não costumam agir sozinhos, sempre estão acompanhados de mais alunos,

utilizando-se disso para impor medo e insegurança aos alvos.

Em relação às pessoas que são alvo do bullying (ou vítimas), autores como; Silva

(2010) e Fante (2005) convergem no sentido de caracterizá-las como frágeis, que se sentem

desiguais e prejudicadas (sentimento de menos valia), mas dificilmente pedem ajuda. Sem

esperanças de adaptação no grupo, geralmente, tem dificuldades ou quase impossibilidade

de reagir aos ataques, ou mesmo de conversar com alguém sobre o problema. Conforme

Tognetta (2005) “quem sofre bullying tem uma grave alteração na estima que tem de si

mesmo, ou do valor que se atribui tanto para baixa-estima como para alta, como a não

reconhecer em si um valor ou que os outros também precisam ser valorizados.”

Quanto ao nível de sociabilidade pode-se dizer que o alvo de bullying é pouco

sociável. Fante e Pedra (2008) colocam que a maioria dos alvos no bullying são aqueles

alunos considerados pela turma como diferentes ou “esquisitos”. Dentro desse perfil

podemos incluir os alunos que se destacam em notas (os CDFs) e os alunos transferidos de

outras escolas e/ou cidades (os novatos).

Com relação ao perfil dos alvos de bullying, Fante (2005, p. 48) sinaliza que:

Se há na classe um aluno que apresenta características psicológicas como

ansiedade, insegurança, passividade, timidez, dificuldade de impor-se, e de ser

agressivo e com frequência se mostra fisicamente indefeso, do tipo bode

expiatório... ele logo será descoberto pelo agressor. Esse tipo de aluno representa o

elo frágil da cadeia, uma vez que o agressor sabe que ele não vai revidar se

atacado, que se atemorizará, vindo talvez a chorar, não se defenderá e ninguém o

protegerá dos ataques que receber.

Conforme Middelton-Moz e Zawadski (2007) os alvos são escolhidos pelos

agressores em face de várias características, como: ser gorda ou magra demais, usar óculos,

trabalhar bem, andar de cadeira de rodas, usar a roupa inadequada, ser passiva ou

independente demais, ter a cor, a origem étnica, o sexo, a religião, a origem socioeconômica

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ou a orientação diferente, ser simpático, ser quieto, etc. Vale destacar, porém, que nem todos

os que apresentam essas características serão alvos de bullying, pois é a fragilidade e a

incapacidade de se defender que desperta o interesse do autor.

A respeito das vítimas Tognetta (2005) apresenta:

Elas geralmente tímidas, e as diferenças, muitas vezes de raça, religião, peso e

estatura são tomadas pelos agressores como os grandes sinais pelos quais eles

podem se aproveitar pra desafiá-las, pra atacá-las. De um modo geral, essas

crianças e adolescentes que se personificam como vítimas, são ansiosas, inseguras

de sua autoimagem e de seus gostos e assim, podem ser muitas vezes, sensíveis e

caladas porque não têm como revidar, por medo, ou por não terem forças

suficientes para isso. Não denunciam por vergonha ou medo das represarias e essa

é sua grande dificuldade. Na verdade, muitas vezes ela não denuncia, não contra-

ataca influenciada pela insegurança.

O espectador ou testemunha é o terceiro grupo – aquele que presencia, observa as

situações de violência e não intervém a favor dos alvos, ou porque tem medo de também ser

atingido (ser a próxima vítima)6, ou porque sente prazer com o sofrimento do alvo, dando

“apoio moral” ao agressor, com risadas e palavras de incentivo. O medo de reagir, aliado à

dúvida sobre o que fazer, cria um clima de silêncio, no qual tudo parece estar bem. Fante

(2005, p. 73) afirma que a maioria dos estudantes não se envolve diretamente em atos de

bullying; são testemunhas ou espectadores que presenciam e interferem em graus variados

de participação sem, no entanto, se tornarem os autores de bullying ou agressores principais

e tampouco saírem em defesa da vítima.

O bullying pode se manifestar das mais variadas formas: bater, chutar, empurrar,

ferir, roubar, furtar ou destruir os pertences da vítima, insultar, ofender, xingar, fazer

gozações, colocar apelidos pejorativos, fazer piadas ofensivas, “zoar”, irritar, humilhar,

ridicularizar, excluir, isolar, desprezar ou fazer pouco caso, discriminar, ameaçar, chantagear

e intimidar, perseguir, difamar. Existe ainda o bullying virtual, mais conhecido como

ciberbullying (utilização de aparelhos e equipamentos de comunicação – celular e internet –

para difundir calúnias, seja por mensagens no MSN, YouTube, Twitter, Facebook, etc).

De acordo com Middelton-Moz e Zawadski:

6 A grande maioria não concorda com as agressões, mas prefere ficar em silêncio, pois tem medo que os

agressores, em caso de saída em defesa das vítimas, as “eleja” também para esses ataques. (CALHAU, 2011, p.

10).

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O bullying envolve atos, palavras ou comportamentos prejudiciais, intencionais e

repetidos. Os comportamentos incluídos no bullying são variados: palavras

ofensivas, humilhação, difusão de boatos, fofoca, exposição ao ridículo,

transformação em bode expiatório e acusações, isolamento, [...], socos, agressões,

chutes, ameaças, insultos, ostracismo, sexualização, ofensas raciais, étnicas ou de

gênero. (MIDDELTON-MOZ e ZAWADSKI, 2007, p. 21).

Embora se caracterize principalmente por formas não físicas de manifestação – de

modo que muito se identifique com a violência moral – o bullying também se expressa ou

resulta em formas físicas de agressão. No interior das escolas, ele é observado, sobretudo,

nos momentos de maior socialização, como os recreios e a saída para casa, porém, Cubas

(2006) aponta que os casos de bullying podem ocorrer nas salas de aula, nos corredores, nas

quadras, nos banheiros ou no pátio.

“A existência de violência nas escolas é inegável [...]” afirma Eyng (2011, p. 103)

em seus estudos. O bullying, uma faceta da violência, tem se mostrado um problema

universal, envolvendo estudantes, sejam eles de grandes metrópoles ou de pequenas e

remotas comunidades7 “Por certo, podem ser encontrados casos de bullying em diferentes

ambientes, sejam eles pobres ou ricos, cultos ou incultos.” (TOGNETTA e VINHA, 2008, p.

09). Maldonado (2011, p. 114) complementa: “O bullying é um fenômeno amplo e

complexo: ocorre em várias faixas etárias, em escolas públicas e particulares.”

Cabe destacar, porém, que nem tudo o que ocorre na escola pode ser considerado

violência ou bullying, já que lá ocorrem inúmeros problemas de convivência que não são

essencialmente violências. É necessário estar atento às características do fenômeno para não

confundir, por exemplo, incivilidades e indisciplina com o bullying. É verdade que a

existência de tal fenômeno é, às vezes, negada por uns ou supervalorizada por outros, isto é,

alguns acreditam que tudo não passe de brincadeira de criança e adolescente não tendo

nenhum efeito danoso, já outros, a todo tipo de conflito, dizem configurar bullying. É

imprescindível entendermos que brincadeiras normais e sadias são aquelas nas quais todos

os envolvidos se divertem. Quando apenas alguns se divertem à custa de outros que sofrem,

isso ganha outra conotação, bem diversa de um simples divertimento. Nessa situação

específica, ocorre bullying escolar, ou seja, atos de violência intencionais e repetidos contra

um ou mais alunos, impossibilitados de fazer frente às agressões sofridas.

7 “[...] as manifestações de bullying estão ocorrendo em todas as escolas e em todos os níveis, da educação

infantil à pós-graduação. [...] O bullying ocorre em todos os estabelecimentos educacionais que não têm

programas eficazes para enfrentar o problema: escolas privadas, públicas, religiosas, internatos, escolas

técnicas, faculdades, universidades.” (EYNG, 2011, p. 104).

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As brincadeiras acontecem de forma natural e espontânea entre os alunos. Eles

brincam, “zoam”, colocam apelidos uns nos outros, tiram “sarros” dos demais e de

si mesmos, dão muitas risadas e se divertem. No entanto, quando as “brincadeiras”

são realizadas repletas de “segundas intenções” e de perversidade, elas se tornam

verdadeiros atos de violência que ultrapassam os limites suportáveis de qualquer

um. (SILVA, 2010, p. 13).

Estudos e pesquisas estão sendo desenvolvidos na tentativa de compreender esse

fenômeno, sob os mais diversos aspectos, como familiar, social, cultural, afetivo e

emocional. Inúmeros fatores podem influenciar e/ou contribuir no aparecimento do bullying,

dentre eles: carência afetiva, ausência de limites, afirmação dos pais sobre os filhos através

de maus-tratos e explosões emocionais violentas, excessiva permissividade, exposição

prolongada às inúmeras cenas de violência exibidas pela mídia, facilidade de acesso às

ferramentas oferecidas pelos modernos meios de comunicação e informação, a alta

competitividade, o individualismo, a dificuldade de empatia, a crise ou ausência de modelos

educativos baseados em valores humanos, capazes de alicerçar a vida do indivíduo.

(FANTE E PEDRA, 2008, p. 100).

Em se tratando da instituição escola, temos que considerar que crianças e

adolescentes não vão à escola apenas para assistir as aulas. A escola é um ambiente social

onde eles se sentem na obrigação de se inserir, de criar uma personalidade própria. O

ambiente escolar, depois do espaço familiar, é o local onde ocorrem os fatos mais

expressivos da vida de crianças e adolescentes, tais como a experiência coletiva, amizades,

descoberta da vida em sociedade, da subjetividade e intersubjetividade, a formação de

identidade pessoal e social.

A escola é de grande significância para crianças e adolescentes, e os que nela não se

sentem acolhidos8

têm maior probabilidade de apresentar desempenhos insatisfatórios,

comprometimentos físicos e emocionais à sua saúde9ou sentimentos de insatisfação com a

vida. Os relacionamentos interpessoais positivos e o desenvolvimento acadêmico

estabelecem uma relação direta, onde os estudantes que percebem esse apoio terão maiores

possibilidades de alcançar um melhor nível de aprendizado. Portanto, a aceitação pelos

companheiros é fundamental para o desenvolvimento da saúde física e psicológica de

8 Neste caso falamos em não se sentir acolhido (seja pelo sistema educacional – que não media o conhecimento

e sim “despeja-o” sobre o aluno –, seja pela dificuldade de relacionamento com os iguais – a importância das

relações interpessoais neste espaço e neste momento da vida das crianças e adolescentes). 9 “Algumas situações mais extremas são passíveis de ocorrer, como a fobia escolar, em que o medo, a

ansiedade e as manifestações depressivas incapacitem crianças e adolescentes a frequentar a escola. A adesão

ao consumo de álcool e drogas também pode estar presente [...].” (LOPES NETO, 2011, p. 103).

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crianças e adolescentes, aprimorando suas habilidades sociais e fortalecendo a capacidade de

reação diante de situações de tensão.

Segundo Oliveira (2010) um dos motivos para instalação do bullying pode ser a

carência de modelos educativos, o que faz com que a criança e o adolescente fiquem sem

referencial que favoreça a formação de valores e minimize a intolerância. O que é apontado

também por Middelton-Moz e Zawadski (2007, p. 137), quando colocam: “As crianças estão

nos dizendo, com suas palavras e ações, que estão se sentindo sós, com medo, desprotegidas

e necessitando de modelos de referência que lhes ensinem valores saudáveis e

responsabilização por suas ações, em lugar de violência”. Segundo estas autoras, a maioria

de nossos comportamentos é guiado pelos padrões e pelas visões que temos como exemplos

em nossas famílias e comunidades. As normas (ou seja, as regras não ditas) de nossas

comunidades influenciam as nossas ações e a forma como criamos nossos filhos, e muitas

vezes, é difícil encarar o fato de que as nossas crianças e adolescentes estão refletindo o que

lhes foi ensinado. Os valores baseados em “eu” e não em “nós”; “ignorar ou punir”; “não

delatar”; “você não é responsável se não for pego”; “é problema dele, e não meu”, são

alguns exemplos que podemos citar. As crianças estão em busca de pertencimento, apoio e

valores. Quando estes requisitos não são construídos/cultivados no dia-a-dia da família e nas

comunidades, as crianças frequentemente formam suas próprias comunidades e operam a

partir de seus próprios valores, como exemplo a agressividade. Os valores morais não são

transmitidos, são construídos, são vivenciados.

Outro enfoque é proporcionado por Tognetta (2011), que apresenta a contribuição

da Psicologia Moral nos estudos sobre o bullying. Esta entende que o bullying é um

problema moral10

, em que meninos e meninas precisam sentir por si um autorespeito que os

levem a respeitar o outro. “Alvos de bullying assim o são até que não consigam enfrentar

seus próprios medos e desafios por se sentirem desrespeitados.” (TOGNETTA, 2011, p.

142). Conforme a autora, estamos acostumados a agir pautados na perspectiva de que as

regras existem em função da obediência à autoridade e para dar conta disso, comumente

usamos formas de punições, que também são tão violentas quanto às formas de violência

que assistimos nas cenas de bullying. “Superar formas de violência significa dar a essas

crianças espaços para que elas possam compreender que existem outras maneiras de se

resolver um conflito”. (ibid, p. 149). Esta forma de entendimento do fenômeno bullying

10

Conforme Tognetta: “O bullying é um problema moral já que se remete às relações entre as pessoas e

sacrifica aquilo a que mais se busca – a sua dignidade”. (TOGNETTA, 2011, p. 150).

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defende que as crianças e adolescentes que desrespeitam os outros ou se deixam desrespeitar

não construíram por si um autorespeito (não tem consciência de seu valor e do outro).

Buscando-se justificar a escolha desta temática para a realização da pesquisa de

mestrado, pode-se dizer que de alguma forma, todo tema de pesquisa tem que fazer parte da

nossa vida, de desejos, de vontades, de dúvidas, de curiosidades.

O interesse pelo tema bullying e o despertar pela pesquisa surgiu de minha prática

profissional diária. Como psicóloga – trabalhando em escola com adolescentes – percebo

que muitos alunos apresentam mal-estar, medo e sérias dificuldades na relação pessoal com

seus colegas. Sentem-se humilhados, vítimas de apelidos maldosos, zombarias,

intimidações, dentre outras hostilidades, que provocam necessidade de ajuda. Em muitos

casos apresentam vontade de desistir do curso, da escola, fugir do meio que se mostra tão

ameaçador. E como o bullying geralmente não deixa marcas físicas visíveis que denunciam

a agressão, ele vem se mostrando como comprometedor das relações entre estudantes, pois

normalmente, passa despercebido aos educadores. Sendo o bullying praticado pelos pares –

ou seja, pelo próprio grupo ao qual o adolescente precisa pertencer e no qual deve se sentir

“um igual” como parte de um processo saudável de amadurecimento psicológico e de

preparo para a vida adulta – sentir-se preterido nesse momento da vida pode ser uma

punição cujas marcas podem ser abrandadas, mas dificilmente esquecidas.

Por estas razões decidiu-se investigar o fenômeno bullying, pois somente

ampliando os conhecimentos sobre a temática é que se poderá propor alternativas de

intervenção (teoricamente embasadas) que inspirem mudanças significativas nas práticas

educativas, prevenindo as manifestações do bullying e buscando favorecer um educar

transformador de uma sociedade agressiva e violenta em uma sociedade mais justa, solidária

e feliz.

Sem que haja um profundo estudo da realidade concreta da escola – campo de

intervenção – não faz sentido delinearem-se objetivos, planificarem-se estratégias ou

acordarem-se as técnicas e recursos a utilizar. “O fenômeno bullying é contextual e suas

manifestações estão vinculadas à especificidade de cada instituição. Portanto, uma

abordagem que o dissocie dessa condição está previamente fadada ao insucesso.”

(PEREIRA et al., 2011, p. 145).

Conforme Stival et al. (2011, p.184), uma das primeiras ações quando se visa

implantar propostas para se lidar com o problema do bullying nas escolas, é fazer um estudo,

um inventário, um mapeamento do fenômeno, buscando o entendimento de quando e como

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essas ações são realizadas. “Torna-se necessário conhecer como os integrantes se articulam e

o que pensam, como vivem e quais as suas expectativas, [...]”.

Para realizar este estudo escolheu-se como lócus o Instituto Federal Catarinense –

Campus Concórdia, principalmente pela facilidade de acesso e pelo grande interesse e

abertura ao diálogo demonstrado pela equipe da escola. Cabe justificar a originalidade de

estudos sobre o bullying nesta realidade escolar, já que a escola possui internato, aulas em

período integral, cursos técnicos integrados ao médio, entre outros diferenciais.11

Dada a diversidade de relações sociais que interagem, pode-se dizer que a escola é

uma organização complexa, onde se inter-relacionam alunos, pessoal docente, pessoal não

docente, pais, comunidade em geral – “todos” contribuindo para uma mesma finalidade. A

escola, de fato, tem de atender a uma gama muito grande de necessidades, seja de instrução,

educação, socialização e desenvolvimento dos alunos etc.

No decorrer da vida escolar, é comum estudantes presenciarem ou participarem de

desentendimentos, fofocas, intrigas, zombarias, brigas, entre outros. O que não dá para

admitir, entretanto, é que o ambiente escolar – que deveria ser um espaço de construção de

aprendizagem, conhecimento, socialização e cidadania – se apresente, para alguns alunos,

como um lugar de sofrimento, maus tratos, falta de compreensão, podendo, contribuir para a

evasão escolar, baixo rendimento, baixa auto-estima, entre outros.

Diante disso, evidencia-se a necessidade de compreender como os alunos12

do

Instituto Federal Catarinense – Campus Concórdia percebem a crescente violência e

desrespeito com as diferenças entre os pares e ao mesmo tempo dar voz a estes adolescentes

(alunos), para que, enquanto sujeitos pertencentes a um determinado processo histórico,

percebam-se como integrantes deste.

Surgiu então o principal problema de pesquisa: Qual é o entendimento dos alunos

que frequentam o Instituto Federal Catarinense – Campus Concórdia a respeito do

fenômeno bullying?

A pesquisa teve como objetivo principal, investigar a dinâmica do fenômeno

bullying, dos sujeitos envolvidos e dos aspectos motivadores implicados na incidência de

episódios de desrespeito e violência no Instituto Federal Catarinense – Campus Concórdia.

11

Contribuição da pesquisa sobre bullying e internato: uma discussão nova no Brasil. 12

O recorte dado ao estudo do fenômeno bullying, nesta pesquisa, irá se basear no fato de como ele é

representado pelos adolescentes (alunos), que constituirão a população de pesquisa.

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Como objetivos específicos da pesquisa elenca-se: (i) Verificar as diferentes

manifestações, causas e consequências do fenômeno bullying na escola; (ii) Realizar

inventário e diagnóstico das formas e espaços em que se manifesta o bullying na escola; (iii)

Avaliar como os alunos estão percebendo a violência e o desrespeito entre os pares e as

consequências destes atos e (iv) Entender a dinâmica do fenômeno bullying, considerando

os sentidos atribuídos pelos alunos envolvidos nos episódios deste fenômeno, dentro da

especificidade da instituição.

As questões e inquietações sobre o tema buscam entender a dinâmica do fenômeno

bullying no Instituto Federal Catarinense – Campus Concórdia e são: Qual o entendimento

dos alunos sobre o fenômeno bullying, suas diferentes manifestações, causas e

consequências? Quais são as principais formas de intimidações e em que espaços ela se

manifesta na escola? Como os alunos estão percebendo a violência e o desrespeito entre os

pares e as consequências destes atos? Quais os significados e sentidos atribuídos pelos

alunos envolvidos nos episódios do fenômeno bullying?

As hipóteses iniciais para responder ao problema de pesquisa são: de que os alunos

identificam a presença de violência e bullying na escola; de que a violência entre pares

ocorre, mas é tratada como brincadeira; de que o bullying é um comprometedor das relações

entre os alunos; que o desrespeito generalizado, a indiferença em relação aos outros e o

poder (hierarquia) produzem as violências e entre elas o bullying, e que este está

profundamente enraizado na cultura escolar.

Para atender aos objetivos propostos e para organizar este estudo, o primeiro

capítulo traz a Introdução – que inicia a exposição do estudo, apresentando o tema, o

problema, os objetivos e os questionamentos que nortearam esta investigação.

O segundo capítulo apresenta os Procedimentos Metodológicos da Pesquisa –

caracterizando a escola e os participantes da pesquisa, descrevendo os procedimentos e

instrumentos utilizados na coleta e análise dos dados.

No terceiro capítulo encontra-se a revisão de literatura, com o título: Bullying

escolar – de que estamos falando? Neste expõe-se uma contextualização do fenômeno

bullying – definição do termo; estudos sobre o bullying nas escolas; suas características;

caracterização dos protagonistas; manifestações; causas; consequências; bullying no

internato; bullying na adolescência, entre outros.

O quarto capítulo traz a Apresentação e Discussão dos resultados obtidos à luz dos

fundamentos teóricos bases deste estudo. Neste apresenta-se a dinâmica do fenômeno

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bullying no IFC- Concórdia, a partir da compreensão dos alunos. Para melhor organização

dividiu-se o capítulo em dois blocos: (i) Caracterizando o bullying no IFC-Campus

Concórdia; (ii) A percepção dos alunos sobre a violência e o desrespeito na instituição de

ensino: sentidos atribuídos aos episódios de bullying.

No último capítulo, nas Considerações Finais foi apresentada, ao mesmo tempo,

uma síntese e uma análise das principais reflexões abordadas nas sessões anteriores. Foram

apontadas, também, algumas questões, ainda em aberto, referentes ao objetivo central desta

dissertação.

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2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

2.1 – TIPO DE PESQUISA

De acordo com Gil (2007, p. 17), podemos definir pesquisa como “o procedimento

racional e sistemático que tem como objetivo proporcionar respostas aos problemas que são

propostos.” Ainda segundo o autor, a pesquisa é desenvolvida mediante os conhecimentos

disponíveis e a utilização de métodos, técnicas e outros procedimentos científicos, e

acontece ao longo de um processo que envolve inúmeras fases, desde a formulação do

problema até a apresentação dos resultados. Trata-se de um empenho do pesquisador para

que o conhecimento obtido pelos resultados da pesquisa possa, efetivamente, vir a responder

as questões que se propôs a investigar.

A presente proposta investigativa, articulada à Linha de pesquisa “Processos

Educativos”, do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEd) da Universidade do

Oeste de Santa Catarina – Unoesc, foi desenvolvida através de uma pesquisa descritiva, de

cunho exploratório e de natureza quanti-qualitativa.

Segundo Oliveira (2010, p.68) a pesquisa descritiva “[...] procura analisar fatos

e/ou fenômenos, fazendo uma descrição detalhada da forma como se apresentam esses fatos

e fenômenos, ou, mais precisamente, é uma análise em profundidade da realidade

pesquisada.” A pesquisa descritiva exige um planejamento rigoroso quanto à definição de

métodos e técnicas para coleta e análise de dados, pois visa não só explicar a relação entre

variáveis, como também procura determinar a natureza dessa relação, ou seja, é um estudo

bastante amplo e que permite o desenvolvimento de uma análise para a identificação de

fenômenos e a explicação da causa e efeito destes fenômenos. “É recomendável que nesse

tipo de pesquisa se utilizem informações obtidas através de estudos exploratórios”. (ibid.).

Utilizou-se, portanto, o estudo exploratório, visto que este objetiva “[...]

proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a

constituir hipóteses”. (GIL, 2007, p. 41), o que possibilitará uma visão geral do fenômeno

estudado facilitando a delimitação do tema de pesquisa.

A abordagem metodológica empregada nessa pesquisa foi a abordagem quanti-

qualitativa. O método quantitativo permite a mensuração de opiniões, reações, hábitos e

atitudes em um universo, por meio de uma amostra que o represente estatisticamente. Já o

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método qualitativo é útil e necessário para identificar e explorar os significados dos

fenômenos estudados e as interações que estabelecem, assim possibilitando estimular o

desenvolvimento de novas compreensões sobre a variedade e a profundidade dos fenômenos

sociais.

A pesquisa quantitativa é apropriada para medir opiniões, atitudes e preferências.

Ela é especialmente projetada para gerar dados precisos que permitam uma análise

estatística. São mais adequadas quando se deseja apurar opiniões e atitudes explícitas e

conscientes dos entrevistados, pois utilizam instrumentos estruturados (questionários).

Devem ser representativas de um determinado universo de modo que seus dados possam ser

generalizados e projetados para aquele universo. Seu objetivo é mensurar e permitir o teste

de hipóteses, já que os resultados são mais concretos e geram índices que podem ser

comparados ao longo do tempo, permitindo traçar um histórico da informação.

Já conforme Richardson (2008, p. 90) “a pesquisa qualitativa pode ser caracterizada

como a tentativa de uma compreensão detalhada dos significados e características

situacionais apresentadas pelos entrevistados [...]”.

Os estudos que empregam uma metodologia qualitativa podem descrever a

complexidade de determinado problema, analisar a interação de certas variáveis,

compreender e classificar processos dinâmicos vividos por grupos sociais,

contribuir no processo de mudança de determinado grupo e possibilitar, em maior

nível de profundidade, o entendimento das particularidades do comportamento dos

indivíduos. (RICHARDSON, 2008, p. 80).

Em síntese, pode-se dizer que a investigação quantitativa atua em níveis de

realidade e tem como objetivo trazer à luz dados, indicadores e tendências observáveis. Já a

investigação qualitativa, ao contrário trabalha com valores, crenças, representações, hábitos,

atitudes e opiniões (MINAYO & SANCHES, 1993, p. 247).

Os métodos quantitativos são precários em termos de validade interna, entretanto

são fortes em termos de validade externa: os resultados adquiridos são generalizáveis para o

conjunto da comunidade. Ao contrário, os métodos qualitativos têm muita validade interna

(focalizam as particularidades e as especificidades dos grupos sociais estudados), mas são

precários em termos de sua possibilidade de generalizar os resultados para toda a

comunidade. Diante disso, opta-se por contar com dados obtidos pelos métodos

quantitativos e qualitativos, que permitem garantir um razoável grau de validez externa e

interna, ou seja, os dados numéricos (gerais, representativos, frequência) serão

complementados pelos dados qualitativos (particulares, subjetivos, individuais) e vice-

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versa. “O estudo quantitativo pode gerar questões para serem aprofundadas

qualitativamente, e vice-versa.” (ibid).

Conforme Minayo (2003, p. 22) os dados qualitativos e quantitativos “se

complementam, pois a realidade abrangida por eles interage dinamicamente, excluindo

qualquer dicotomia.”

Em razão da natureza complexa do ambiente educacional, que envolve variáveis

múltiplas, parece inadequado o uso de metodologias que se baseiam, tão somente, em um

paradigma metodológico. É preciso reconhecer que o objeto de estudo em questão é de

difícil entendimento, e, por isso, opta-se por uma metodologia que englobe os mais variados

aspectos.

2.2 – LOCAL/ESCOLA A SER PESQUISADA

O presente estudo foi realizado no IFC – Instituto Federal Catarinense – Campus

Concórdia, escola pública federal localizada na microrregião do Alto Uruguai Catarinense,

na cidade de Concórdia/SC. A escolha desta instituição para a realização da pesquisa deve-

se a facilidade de acesso e ao grande interesse e abertura ao diálogo demonstrado pela

equipe da escola.

2.2.1 – Caracterização geral do Instituto Federal Catarinense - IFC

Os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, criados por meio da Lei

nº 11.892/08, constituem um novo modelo de instituição de educação profissional e

tecnológica. Este modelo propõe-se a responder eficazmente às demandas crescentes por

formação profissional, por difusão de conhecimentos científicos e tecnológicos e de suporte

aos arranjos produtivos locais.

Presentes em todos os estados e consoante a reorganização da rede federal de

educação profissional, os institutos federais oferecem formação inicial e continuada, ensino

médio integrado, cursos superiores de tecnologia, bacharelado em engenharias, licenciaturas

e pós-graduação.

Atualmente, o IFC é composto pelos campi Araquari, Blumenau, Camboriú,

Concórdia, Rio do Sul, Sombrio e Videira e pelos campi avançados de Ibirama, Luzerna e

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São Francisco do Sul. A sede da reitoria está instalada na cidade de Blumenau, sendo uma

autarquia federal vinculada ao MEC, gozando das seguintes prerrogativas: autonomia

administrativa, patrimonial, financeira, didático-científica e disciplinar.

Assim, por sua formação inicial e inserção regional, o IFC abrange todo o território

catarinense, desde Araquari, que contempla o norte/nordeste catarinense; Camboriú,

contemplando o litoral centro e baixo Vale do Itajaí; Concórdia, que atende a grande região

oeste; Rio do Sul, atendendo o médio e alto Vale do Itajaí e parte do planalto serrano;

Sombrio, que atende a região Sul e, por fim, o campus de Videira, contemplando o meio

oeste catarinense e, mais especificamente, o Vale do Rio do Peixe.

O IFC atua no ensino médio, técnico e superior, sendo ofertados cursos em sintonia

com a consolidação e o fortalecimento dos arranjos produtivos locais. Estimula a pesquisa

aplicada, a produção cultural, o empreendedorismo e o cooperativismo, além de apoiar

processos educativos que levem à geração de trabalho e renda, especialmente a partir de

processos de autogestão. Sua missão é: “Contribuir para o desenvolvimento socioambiental,

econômico e cultural, ofertando uma educação de excelência, pública e gratuita, com ações

de ensino, pesquisa e extensão”.

2.2.2 – O Campus Concórdia

O IFC – Concórdia está localizado na microrregião do Alto Uruguai Catarinense,

na cidade de Concórdia. Nesta microrregião, a base do crescimento econômico regional se

apoia na agroindústria com uma produção diversificada baseada na estrutura familiar.

A Instituição iniciou suas atividades pedagógicas em março de 1965, como Ginásio

Agrícola, tendo seu funcionamento autorizado pelo Decreto nº 60.731, de 19 de maio de

1967, tendo formado a primeira turma em 1968. Elevou-se de Ginásio Agrícola para a

categoria de Colégio Agrícola, em 12 de maio de 1972, através do Decreto nº 70.513.

Posteriormente, pelo Decreto nº 83.935, de 4 de outubro de 1979, passou a denominar-se

Escola Agrotécnica Federal de Concórdia (EAFC). Foi transformado em Autarquia Federal

pela Lei nº 8.731, de 16 de novembro de 1993, vinculada ao MEC, nos termos do artigo 2º

do anexo I, Decreto nº 2.147, de 14 de fevereiro de 1997, adquirindo autonomia didática,

disciplinar, administrativa, patrimonial e financeira. Por fim, através da Lei nº 11.892/2008,

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a Escola Agrotécnica Federal de Concórdia passou a integrar o IFC, denominando-se

campus Concórdia.

A área total do IFC – Concórdia é de 253 hectares 26.065 m2 de área construída.

Sua estrutura física é composta por: Laboratórios de Informática, Biologia, Solos, Química,

Física, Análises Sensoriais, Bromatologia, Microbiologia, Biotecnologia; Mini-usina de

beneficiamento em Panificação, Laticínio, Produtos Cárneos e Vegetais; Ginásio de

Esportes, Campo de Futebol com Pista de Atletismo, Refeitório, Biblioteca, quatro

Alojamentos de Estudantes (masculino e feminino), Centro Cultural, Centro Administrativo,

Centro Pedagógico, Centro de Educação Tecnológica, Auditório, Parque Tecnológico e

Equoterapia, Unidades Educativas de Produção Agrícola e Zootécnica.

O campus ministra cursos técnicos de nível médio, voltados à Agricultura,

Zootecnia e Agroindústria, integrados com o Ensino Médio (Curso Técnico em

Agropecuária e Curso Técnico em Alimentos). Oferece também os cursos: Técnico em

Informática; Bacharelado em Medicina Veterinária; Licenciatura em Matemática;

Licenciatura em Física; Engenharia de Alimentos; de Pós-graduação em Desenvolvimento

Territorial e Pós-graduação em Gestão de Tecnologia da Informação.

O quadro de Servidores do IFC/Concórdia é composto por docentes efetivos e

substitutos, técnicos-administrativos e servidores terceirizados. Em relação número de

servidores que compõem o Campus Concórdia, o quadro de pessoal é composto por 75

professores (61 efetivos e 09 substitutos e 05 temporários), 82 técnicos administrativos, 52

pessoas prestadoras de serviços e 12 estagiários, perfazendo um total de 221 profissionais.13

Com relação aos alunos matriculados, o Campus Concórdia possui 989 alunos

matriculados, sendo 65 alunos matriculados nos cursos de Pós Graduação, 349 alunos

matriculados nos cursos superiores, 106 alunos matriculados nos cursos subsequentes e 469

alunos matriculados nos cursos de Ensino Médio integrado ao técnico.14

Durante toda sua existência, o IFC – Concórdia tem buscado atualização constante,

modernizando o ensino, além de ter alcançado e beneficiado grande parte da população da

região oeste do estado, através de atividades de extensão, como programas técnicos em

13

Dados fornecidos pela CGRH do IFC – Campus Concórdia, referentes ao mês de março/2012. Os dados

foram obtidos pessoalmente no setor. 14

Dados fornecidos pela Secretaria de Registros Escolares do IFC – Campus Concórdia, referentes ao mês de

março/2012. Os dados foram obtidos pessoalmente no setor.

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rádios, jornais e televisão, exposições, feiras, dias de campo, visitas técnicas, seminários e

palestras.

Um dos diferenciais do IFC – Campus Concórdia é que a instituição oferece

internato (moradia estudantil) aos alunos. A escola possui quatro Alojamentos Masculinos e

um Alojamento Feminino. No total são beneficiados com moradia 216 alunos (sexo

masculino) e 21 alunas (sexo feminino). Os demais alunos moram em Concórdia, em

cidades vizinhas, em pensões ou em repúblicas situadas no entorno do Campus. Percebe-se

desta forma, um diferencial para o estudo neste espaço, ou seja, onde a grande maioria dos

alunos ao final das aulas não retorna para a casa de suas famílias e sim residem na escola

(internato) ou em repúblicas, passando a maior parte do tempo em interação com os colegas

(contexto particular de relações interpessoais conflituosas).

Fotografia 1 – IFC – Campus Concórdia

Fonte: Instituto Federal Catarinense Concórdia - Coordenadoria Especial de Comunicação.

2.3 – AMOSTRA

A população objeto da pesquisa foi constituída por um grupo de alunos, de ambos

os sexos, composto por 209 alunos (com idade entre 14 e 18 anos) do Instituto Federal

Catarinense – Campus Concórdia, pertencentes aos cursos de Ensino Técnico integrado ao

Ensino Médio (Agropecuária e Alimentos), pertencentes às Turmas de 1º, 2º e 3º anos.

No total, participaram da pesquisa alunos de nove turmas diferentes, assim

distribuídos: 106 alunos eram da 1ª série; 32 alunos eram da 2ª série e 71 alunos eram da 3ª

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série. Quanto ao gênero 129 participantes eram do sexo masculino, enquanto 80 eram do

sexo feminino. Houve um predomínio do sexo masculino (61,7%) sobre o sexo feminino

(38,3%). Essa diferença entre gêneros se justifica pelo fato de que na escola também há um

predomínio de alunos do sexo masculino, principalmente os do Curso de Técnico em

Agropecuária integrado ao Ensino Médio.

A escolha dos alunos para participar do estudo foi aleatória, levando-se em

consideração apenas a representatividade de no mínimo 10% do contingente de alunos das

diferentes turmas e séries e envolvendo diferentes faixas etárias e de gênero.

Segundo Richardson (2008, p.161) numa amostra probabilística ou aleatória, em

princípio todos os sujeitos têm a mesma probabilidade de ser selecionados para formar parte

da amostra. “A representatividade da população nessas amostras é guiada pelas leis da

probabilidade. Isso quer dizer que, de acordo com o modo como se seleciona a amostra em

relação à população, ela terá uma probabilidade adequada de ser representativa da

população.” (ibid, p.162).

2.4 – PROCEDIMENTOS PARA COLETA DE DADOS

A presente pesquisa foi realizada em duas etapas e utilizou-se como procedimentos

de coleta de dados:

1ª etapa: Aplicação de um questionário (com perguntas abertas e fechadas) a 209

alunos – com a finalidade de diagnóstico, visando identificar e descrever o nível de

conhecimento e a relação dos adolescentes com o bullying (dentre o coletivo dos alunos o

que conhecem sobre o bullying; se estiveram envolvidos em situações desta natureza; quais

situações envolvendo este problema mais ocorrem no contexto escolar e locais onde

ocorrem). Além de mapear o grupo de adolescentes e conhecer a cultura de pares.

Conforme Oliveira (2010, p. 83) “o questionário pode ser definido como uma

técnica para obtenção de informações sobre sentimentos, crenças, expectativas, situações

vivenciadas e sobre todo e qualquer dado que o pesquisador(a) deseja registrar para atender

os objetivos de seu estudo”.

Quanto à finalidade de uso do questionário, Oliveira (2010, p. 83) e Richardson

(2008, p. 190) concordam que o questionário tem como principal função descrever as

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características, fazer a medição de variáveis de uma pessoa ou de determinados grupos

sociais.

Com relação ao tipo de perguntas que foram utilizadas para compor o questionário,

optou-se pelas abertas e fechadas, pois segundo Richardson (2008, p. 193) “frequentemente,

os pesquisadores elaboram os questionários com ambos os tipos de perguntas”. Com as

perguntas abertas buscou-se aprofundar as opiniões dos participantes, já com as perguntas

fechadas objetivou-se obter informações do participante e respostas de identificação de

opiniões.

2ª etapa: Foram utilizadas Entrevistas tendo como base de coleta e análise dos

dados o método clínico piagetiano combinado ao uso de situações-problemas – com a

finalidade de criar situações hipotéticas alusivas ao assunto estudado, que ofereçam aos

sujeitos participantes um cenário para instigar a conversa, de maneira que eles tenham que

explicitar seus pensamentos, descentrar-se, colocar-se no lugar da cena, do cenário e do ato

em ação. Isto no sentido de ir além do óbvio, da resposta estereotipada, buscando

compreender o ponto de vista da análise do sujeito. As características gerais das explicações,

a maneira como o indivíduo fala a respeito das situações hipóteses apresentadas, como chega

às suas explicações, buscando também perceber se guarda coerência, se manifesta

contradições.

O método clínico piagetiano, conforme Delval (2002, p. 35) “consiste em uma

forma de obter dados em interação direta com o sujeito.” Pode-se, neste caso, adotar

procedimentos muito distintos, desde uma entrevista verbal, desenhos, objetos, histórias,

entre outros. Por ser um método muito flexível permite ao pesquisador intervir a qualquer

momento da experiência para tornar mais claro o que está ocorrendo. (DELVAL, 2002, p.

79).

Para Queiroz e Lima (2010, p. 128) o método clínico piagetiano é um procedimento

de entrevistas, com coleta e análise de dados, onde se acompanha o pensamento do sujeito,

com intervenção sistemática, elaborando sempre novas perguntas a partir das respostas

dadas, e avaliando a qualidade e abrangência destas. Também se avalia a segurança e clareza

que o sujeito tem sobre as suas respostas diante das contra-argumentações.

Sobre a entrevista clínica os autores trazem:

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A entrevista clínica consiste em uma conversa aberta com o sujeito, na qual se

procuram seguir suas ideias e explicações sobre um determinado tema. Pesquisas

sobre moralidade podem valer-se desse tipo de metodologia. O entrevistador

intervém sistematicamente e conduz suas perguntas de modo a tentar esclarecer o

que o sujeito diz. Nesse tipo de entrevista existem perguntas básicas que são

comuns a todos os sujeitos envolvidos na pesquisa, mas essas perguntas vão sendo

ampliadas e complementadas de acordo com as respostas dos sujeitos. As

respostas orientam o curso do interrogatório, mas se retorna aos temas essenciais

estabelecidos inicialmente. (QUEIROZ e LIMA, 2010, p. 113)

Com relação às situações problemas, estas são breves narrações que apresentam

casos baseados na vida real, seguidas de um inquérito (entrevista), que buscam levantar as

compreensões, o entendimento dos participantes com relação à situação exposta. Trata-se de

situações que levam o sujeito a refletir, argumentar e expor sua opinião sobre os fatos e

histórias levantadas.

Através deste instrumento, procurou-se acompanhar o pensamento dos sujeitos da

pesquisa com intervenções sistemáticas, elaborando novas perguntas a partir das respostas

obtidas. Buscou-se também, identificar percepções, sentimentos, atitudes e ideais dos

participantes, a respeito do tema bullying, sua ocorrência e suas possíveis causas no

ambiente escolar.

Entende-se que as situações problemas podem se constituir em um interessante

recurso quando se deseja que os participantes se descentrem, analisem a situação em foco, se

coloquem no lugar do outro, entre outros aspectos, pois nem sempre é fácil identificar os

alvos, os espectadores e os autores de bullying, quase todos se recusam a falar a respeito do

assunto.

Este procedimento foi aplicado, individualmente, a 5% dos participantes da

primeira etapa (questionário), num total de 10 alunos. O enredo de cada uma das situações

problemas foi formulado a partir dos dados coletados por meio da aplicação do questionário,

com a finalidade de diagnóstico. A escolha dos alunos para participar desta segunda etapa

também foi aleatória e por disponibilidade, independente das respostas fornecidas na 1ª

etapa, buscando-se respeitar apenas a representatividade de alunos de todas as séries.

Vale destacar que o presente projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética

em Pesquisa CEP/UNOESC, com parecer consubstanciado de número: 160.785 de

28/11/2012. (cf. anexo C).

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2.5 – PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DE DADOS

Segundo Lakatos e Marconi (1991, p. 167) “uma vez manipulados os dados e

obtidos os resultados, o passo seguinte é a análise e interpretação dos mesmos, constituindo-

se ambas no núcleo central da pesquisa”.

A tarefa de análise de dados implica primeiramente na organização de todo o

material, dividindo-o em partes, buscando relacionar e identificar nestas, tendências e

padrões relevantes. (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 45).

Os dados foram analisados de forma qualitativa, contemplando todo o material

coletado através dos questionários e das entrevistas (considerados complementares),

resultando em uma análise de conteúdo. Para a análise de dados foram utilizadas as

respostas dos alunos ao questionário – 1ª etapa da pesquisa, de forma articulada com as

respostas obtidas na entrevista – 2ª etapa da pesquisa.

A abordagem metodológica utilizada para a análise dos dados coletados foi a

análise de conteúdo das respostas dos sujeitos participantes, pois levou-se em conta não

apenas a semântica da língua, mas também a interpretação do sentido que os indivíduos

participantes da pesquisa atribuíram às mensagens.

Este método constitui-se em um conjunto de técnicas utilizadas na análise de dados,

cujo objetivo é a busca do sentido ou dos sentidos de um documento. Através deste buscou-

se “[...] compreender melhor um discurso, de aprofundar suas características (gramaticais,

fonológicas, cognitivas, ideológicas, etc) e extrair os momentos mais importantes.”

(RICHARDSON, 2008, p. 224).

Bardin (1979, p. 31) configura a análise de conteúdo como um conjunto de técnicas

de análise das comunicações, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de

descrição do conteúdo das mensagens. Já Minayo (2003, p. 74) enfatiza que a análise de

conteúdo visa verificar hipóteses e ou descobrir o que está por trás de cada conteúdo

manifesto.

Conforme Franco (2005, p. 24) “o que está escrito, falado, mapeado,

figurativamente desenhado e/ou simbolicamente explicitado sempre será o ponto de partida

para a identificação do conteúdo manifesto (seja ele explícito e/ou latente).” A

contextualização deve ser considerada como um dos principais requisitos, e, mesmo, “o

pano de fundo” no sentido de garantir a relevância dos resultados a serem divulgados e

socializados.

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A abordagem dos conteúdos está em como visualizá-lo no campo objetivo, a

princípio mais palpável; e no campo simbólico, ou seja, naquilo que não está aparente na

mensagem. Isto nos remete aos “conteúdos manifestos” e aos “conteúdos latentes” de uma

mensagem. Desta forma, a técnica de análise de conteúdo refere-se ao estudo tanto dos

conteúdos nas figuras de linguagem, reticências, entrelinhas, quanto dos conteúdos

manifestos.

Cabe ressaltar que esse método exige uma grande dedicação do pesquisador, para

que uma leitura detalhada dos dados seja apresentada sem interferência, abstração ou

acréscimo de dados que não foram expressos pelo sujeito pesquisado.

Buscou-se, para a análise dos dados extrair a essência das respostas apresentadas, a

fim de conhecer a compreensão/o entendimento dos sujeitos a respeito da dinâmica do

fenômeno bullying na instituição de ensino.

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3 BULLYING ESCOLAR: DE QUE ESTAMOS FALANDO?

3.1 – ESTUDOS SOBRE BULLYING NAS ESCOLAS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

A prática de bullying na escola já é antiga, porém só há pouco tempo vem sendo

objeto de estudo. As pesquisas e iniciativas de intervenção e prevenção do bullying e violên-

cia na escola podem ser consideradas recentes, somente nas duas últimas décadas é que vem

tendo maior atenção, a partir de estudos que evidenciam sua prevalência e, principalmente,

os riscos para o desenvolvimento pessoal e social de jovens em instituições escolares como

um todo.

No Brasil, o tema só começou a ser abordado junto à sociedade a partir de 2000,

através de pesquisas realizadas por Cleo Fante. Esse trabalho pioneiro resultou em um

programa de combate ao bullying denominado "Educar para a Paz", colocado em prática no

interior paulista. A partir de então, a atenção e as pesquisas voltadas ao tema vem crescendo

a cada ano. Além destes pesquisadores podemos citar também Lopes Neto que juntamente

com a Associação Brasileira de Proteção à Infância e à Adolescência (ABRAPIA)

desenvolveram o Programa de Redução do Comportamento Agressivo entre Estudantes, na

cidade do Rio de Janeiro-RJ. Cabe também destacar os trabalhos desenvolvidos por

Tognetta que, ao fazer uma revisão de literatura, apontou para as especificidades do bullying

e o olhar necessário às questões ligadas aos sentimentos de todos os envolvidos em situações

marcadas por esse tipo de violência escolar. Além destes, vários outros pesquisadores estão

poderiam ser destacados, pois com suas pesquisas e estudos estão contribuindo em muito

para a conscientização de profissionais, pais, alunos e interessados sobre o tema.

Antigamente gestores, professores e outros profissionais, assim como os pais e

comunidade em geral, atribuíam o bullying a processos naturais, normais que ocorriam nas

escolas; pouco se falava ou se noticiava sobre episódios e manifestações graves de

comportamento agressivo dentro das escolas. Fante (2005, p. 51) relata o que ouviu de

educadores enquanto pesquisava o fenômeno bullying:

[...] esse tipo de relação baseada na submissão sempre existiu, sendo “normal”

encontrar nas escolas os grupos que dominam e os que deixam dominar, e que isso

faz parte da vida, devendo os alunos aprender sozinhos a conviver e a lidar com

essas situações impostas por seus agressores, pois, afinal, experiências assim os

tornarão fortes para enfrentar os desafios futuros.

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Percebe-se, diante deste relato, que infelizmente muitas escolas observam as

atitudes de violência e as consideram normais, não admitindo a existência do bullying.

Algumas insistem em afirmar que tais práticas não ocorrem em suas dependências, na

maioria das vezes, por questão de marketing e medo de perder alunos. Entretanto, Fante e

Pedra (2008, p. 53) colocam que a omissão em nada contribui para a redução desse tipo de

comportamento; ao contrário, dificulta as possibilidades de ação.

Pesquisas transculturais mostram que o fenômeno bullying sempre existiu e é

identificado em diversos países do mundo. (FANTE E PEDRA, 2008; LISBOA; BRAGA;

EBERT, 2009; LOPES NETO, 2011). Há aspectos comuns nessas manifestações, os quais

sugerem um caráter universal no fenômeno. Pode-se supor que houve uma mudança na

maneira de analisar as atitudes agressivas – que sempre existiram, mas que até então eram

ignoradas e/ou negligenciadas – e pesquisadores passaram a encará-las não mais como um

fenômeno corriqueiro, normal e inofensivo, mas como um processo que merece ser

cuidadosamente observado e investigado, pois implica graves consequências (emocionais e

cognitivas) para os envolvidos.

Muito do que se tem encontrado nas pesquisas atuais sobre o fenômeno bullying

correspondem aos dados elucidados em outras pesquisas mundialmente reconhecidas, entre

elas podemos citar as de Olweus, Almeida et al. 2003; Avilés e Casares 2005; Fante 2005;

Tognetta et al. 2005.

Foi o professor e pesquisador Dan Olweus, da Universidade de Bergen, que iniciou

as pesquisas sobre bullying, na década de 1970, na Noruega, embora na época, ainda, não se

identificasse um interesse das instituições sobre o assunto. Olweus realizou uma grande

pesquisa com o objetivo de avaliar as taxas de ocorrência e as formas pelas quais o bullying

se apresentava na vida escolar de crianças e adolescentes. Através destes dados seria

possível criar critérios para diferenciar o bullying de outros episódios característicos das

brincadeiras próprias da idade. Seu estudo reuniu aproximadamente 84 mil estudantes de

todas as séries, 300 a 400 professores e cerca de mil pais de alunos. Os resultados apontaram

que um em cada sete alunos já havia se envolvido em casos de bullying, seja como vítima ou

como agressor. Os espectadores não foram incluídos nos índices, o que faz imaginar que a

população envolvida no bullying é bem mais expressiva. Os estudos de Olweus deram

origem a um programa antibullying, visando aumentar a conscientização sobre o problema e

promover apoio e proteção às vítimas.

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Aqui no Brasil, a ABRAPIA (Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à

Infância e Adolescência) se dedicou durante muito tempo em estudar, pesquisar e divulgar o

fenômeno bullying. Criou o Programa de Redução do Comportamento Agressivo entre

Estudantes, com a Coordenação de Aramis Antonio Lopes Neto, Lauro Monteiro Filho e

Lucia Helena Saavedra. Este programa realizou uma pesquisa que visava diagnosticar e

implementar ações efetivas para a redução do comportamento agressivo entre estudantes de

11 escolas localizadas no Município do Rio de Janeiro, com objetivo de sensibilizar

educadores, famílias e sociedade para a existência do problema e suas consequências. Dos

5875 alunos de 5ª a 8ª séries, a pesquisa revelou que 40,5% desses alunos admitiram ter

estado diretamente envolvidos em atos de Bullying, naquele ano, sendo 16,9% alvos, 10,9%

alvos/autores e 12,7% autores de Bullying. Os meninos, com uma frequência maior (50,5%),

estão mais envolvidos com o Bullying, tanto como autores quanto como alvos. Já entre as

meninas (49,5%), o bullying também ocorre e se caracteriza, principalmente, como prática

de exclusão ou difamação. Outro dado importante da pesquisa foi que 50% alvos admitem

não relatar a ninguém sobre os maus-tratos sofridos (silêncio). As agressões ocorrem

principalmente na própria sala de aula (60,2%), no recreio (16,1%) e portão das escolas

(15,9%).

Já os estudos de Fante (2005) trouxeram reflexões sobre o bullying e suas

consequências. Como instrumento de coleta e análise a pesquisadora utilizou um

questionário composto de itens que visavam detectar os tipos de violência, os locais mais

comuns onde ocorriam as condutas de bullying e quais os fatores determinantes destas

condutas. Os dados foram obtidos através de quatro estudos, em cidades diferentes do

interior do Estado de São Paulo. O primeiro estudo, realizado no ano de 2000 com 430

alunos de 5ª a 8ª série do Ensino Fundamental e de 1ª e 2ª série do Ensino Médio de uma

escola da rede particular de ensino, da cidade de Barretos/SP. Este estudo apresentou os

seguintes resultados: o fenômeno bullying ocorre: 81% dos alunos teriam se envolvido em

situações de violência, no decorrer do ano letivo, sendo que, desses, 41% foram

considerados casos de bullying (18% vítimas, 14% agressores e 9% vítimas agressoras). O

local de maior ocorrência foi a sala de aula e os corredores da escola. 64% das condutas

violentas eram praticadas por meninos. As condutas mais utilizadas eram os maus-tratos

verbais e psicológicos (gozações, ameaças, intimidações) e os maus-tratos físicos. Quanto as

causas do fenômeno, o fator familiar foi o preponderante, com 73%. O segundo estudo, em

2001, com 431 alunos, de 7 a 16 anos, de cinco escolas da rede de ensino particular e

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pública, demonstrou que 87% dos participantes estariam envolvidos em atos violentos,

durante o respectivo ano letivo, sendo que, desses, 47% foram classificados como casos de

bullying (21,38% vítimas, 15,61% agressores e 10,1% vítimas agressoras). O local mais

apontado para a ocorrência foi a sala de aula, seguida pelo exterior da escola e o pátio do

recreio. Quanto ao gênero, a maioria dos agressores eram meninos (66%). As condutas mais

apontadas pelo grupo estudado foram: maus-tratos verbais e agressões morais, ataques à

propriedade (furtos) e os maus-tratos físicos. Com relação aos aspectos motivadores, os

participantes apontaram para a violência doméstica, reproduzida na escola, sendo que 82%

disseram reproduzir a violência sofrida contra outros colegas. O terceiro estudo, em 2002,

foi mais abrangente e envolveu além dos alunos, professores e funcionários da escola. Os

resultados apresentados não foram menos preocupantes que os obtidos nos estudos

anteriores: dos 450 alunos participantes de uma escola pública da rede municipal de ensino,

66,92% estariam envolvidos em atos de bullying, somente no primeiro semestre do ano

letivo, sendo considerados 25,56% vítimas, 22,04% agressores e 19,32% vítimas agressoras.

E, por fim, o quarto estudo, feito em 2003 com 450 alunos de 5ª a 8ª séries de uma escola

pública da rede estadual de ensino, evidenciou que 45% dos alunos estavam envolvidos em

atos de bullying, sendo 24% como vítimas, 8% como agressores e 13% vítimas agressoras.

Tognetta et al. desenvolveram várias pesquisas a respeito do assunto. Na sequência

apresenta-se brevemente algumas delas. Numa investigação com 150 adolescentes do nono

ano do Ensino Fundamental e primeiro ano do Ensino Médio de escolas públicas de

Campinas, encontraram números que descrevem o bullying: 16% foram considerados

autores, cujas ações são frequentes e contínuas; 29,3% foram considerados autores

eventuais, que possuem ações semelhantes ao bullying; 60% dos alunos participantes

afirmaram já terem passado por processo de vitimização; e 92% disseram já terem assistido

a alguma situação de bullying na escola. Em outro estudo realizado também na região de

Campinas, Tognetta et al. puderam constatar novamente o bullying. Participaram da

pesquisa cerca de 800 alunos de escolas públicas e particulares. Parte desta investigação

visava implantar um programa antibullying nas escolas particulares participantes (projeto

piloto). Esta pesquisa além de fornecer dados sobre a violência entre pares (bullying)

apontou um problema relacionado ao fato de crianças e adolescentes terem sido humilhados,

desprezados, zoados, diminuídos pelos próprios professores/autoridades da escola.15

Das

15

Conforme Tognetta e Vinha (2011, p. 145) “as formas de atuação de um professor também podem levar

crianças e adolescentes a serem alvos e autores de bullying, ainda que indiretamente.”

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turmas participantes a do 8º ano foi a que mais indicou esse tipo de problemas, com 17,36%.

Já em outra pesquisa Tognetta et al. buscaram identificar a presença do bullying entre alunos

do quinto ano no Ensino Fundamental de escolas da rede pública e particular. Utilizaram um

questionário adaptado de Olweus (1998) e Fante (2005), com questões relativas à existência

de bullying, suas formas de ação, locais mais comuns e frequência desses atos. Participaram

210 alunos (105 advindos de escolas particulares e 105 de escolas públicas da região). Os

resultados mostraram que 27% dos alunos das escolas particulares e 21% dos alunos das

escolas públicas dizem já ter agredido alguém na escola, enquanto 67% dos alunos das

escolas públicas e 53% dos alunos das escolas particulares declararam já terem sido alvos de

algum tipo de violência na escola, o que comprova maior índice de violência nas escolas

públicas participantes da pesquisa. Verificando-se a frequência dos atos, os resultados

ressaltam que 8% dos alunos das escolas particulares e 14% das públicas dizem sofrer

intimidações e maus tratos todos os dias, e 2% dos alunos das escolas públicas e 3% das

particulares afirmam que agridem os colegas todos os dias.

Fisher, Lorenzi, Bose, Fante et al (2010) realizaram uma pesquisa com 5.168

alunos de escolas de diferentes regiões do país. Nesta, 28% dos estudantes disseram ser

vítimas de maus tratos ao menos uma vez ao ano e, aproximadamente, 10% da amostra, três

ou mais vezes ao ano. A região sudeste aparece como a campeã de incidência de bullying no

país, com um total de 15,5%, seguido do Centro-Oeste com 11,7%, do Sul com 8,4%, do

Norte com 6,2% e, finalmente, o Nordeste com 5,4% de pessoas que sofreram bullying na

escola.

Pesquisa desenvolvida pelo IBGE em 2009, em escolas brasileiras, apontou que

25% dos alunos disseram sofrer bullying. O Distrito Federal foi o local que mais teve casos

de bullying, com 35,6% dos participantes indicando serem vítimas de bullying e seguido de

Curitiba com 35,2%. A maior parte dos envolvidos eram jovens do sexo masculino (32,6%).

Escolas privadas tiveram um índice maior de prática de bullying (35,9%) se comparadas as

escola públicas (29,5%).

O bullying está amplamente disseminado no Brasil: foi o que revelou outra

pesquisa nacional, da ONG PLAN, de 2009. De acordo com a pesquisa, o bullying atinge

10% das crianças e adolescentes em todo o país, o que significa dizer que apenas no ano de

2012, por exemplo, 5.097.261 crianças e adolescentes podem ter sofrido com o processo do

bullying, tendo em vista que o número de crianças e adolescentes devidamente matriculados

tanto em escola pública, como privada, foi de 50.972.619 alunos. A mesma pesquisa

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apontou que aproximadamente 70% dos alunos entrevistados informaram ter assistido, ao

menos uma vez no ano de 2009, a um colega sendo agredido, e cerca de 20% afirmaram ter

testemunhado atos de maus-tratos desferidos contra a mesma vítima, mais de três vezes

durante o mesmo período.

Além destas pesquisas comentadas, destacamos outro fator a ser considerado nos

estudos sobre bullying nas escolas brasileiras, que é a produção que alguns cursos de Pós

Graduação estão fazendo por meio de Dissertações e Teses sobre o tema nas mais diversas

regiões do país, e que começaram a dar visibilidade ao assunto de forma mais ampla. Vale

apontar os estudos realizados por Bandeira (2009) Bullying: auto-estima e diferenças de

gênero; Francisco (2010) Percepções e formas de enfrentamento de adolescentes frente ao

bullying; Munarin (2007) A escola como espaço de convivência: a prevenção e a redução

do bulismo escolar; Oliboni (2008) O bullying como violência velada: a percepção e ação

dos professores; Pingoello (2009) Descrição comportamental e percepção dos professores

sobre o aluno vítima do bullying em sala de aula; Vieira (2009) Bullying: estudo de caso em

escola particular; Frick (2011) As relações entre os conflitos interpessoais e o bullying: um

estudo nos anos iniciais do Ensino Fundamental de duas escolas públicas; Mendes (2010)

Fenômeno bullying: um estudo de caso sobre a violência simbólica no Colégio de Aplicação

de Sergipe; Rolim (2008) Bullying: o pesadelo da escola; Pupo (2007) Violência Moral no

interior da escola: um estudo exploratório das representações do fenômeno sob a

perspectiva de gênero; Nogueira (2007) Violência nas escolas e juventude: um estudo sobre

o bullying escolar; Oliveira (2010) Bullying Escolar: discutindo a percepção de professores

no município de Juiz de Fora – MG; Silva (2010) Bullying e depressão no contexto escolar:

um estudo psicossociológico; Catini (2004) Problematizando o “bullying” para a realidade

brasileira; entre muitos outros trabalhos.

A análise que se pode efetuar destes estudos confirma a ocorrência do bullying nas

nossas escolas e indica um grande número de alunos envolvidos nesse tipo de conduta, seja

como alvo, seja como autor ou espectador. É possível perceber que o bullying ocorre em

vários locais da escola, como na sala de aula, o pátio do recreio, porém, longe dos olhares

dos adultos. As formas mais frequentes são as agressões verbais, seguidas das físicas e da

exclusão social. Os fatores promotores das práticas de bullying normalmente estão

associadas à carência afetiva, à ausência de limites, à reprodução dos maus-tratos sofridos, a

ausência de modelos educativos, o desejo de dominar os outros, o preconceito, entre outros.

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As pesquisas indicam também, que o bullying traz muitos prejuízos aos envolvidos e

atestam a urgência das intervenções e principalmente da prevenção.

3.2 – CONCEITO: DE QUE ESTAMOS FALANDO?

As situações de violência que atingem os pares nas escolas necessitam de uma

melhor compreensão de suas características para que se possam apontar possibilidades de

soluções que ajudem crianças e adolescentes a superar um problema em suas relações

interpessoais. Quando nos referimos à violência e seu combate, normalmente nos

empenhamos em combater a violência explícita, a exemplo nas escolas: brigas e discussões

entre alunos, gangues, acertos de contas entre grupos rivais, depredações ao patrimônio, uso

de drogas e armas, entre outros.

Porém aliada à violência explícita, uma outra forma de violência deve despertar a

atenção dos profissionais de educação: aquela que se apresenta de forma velada,

por meio de um conjunto de comportamentos cruéis, intimidadores e repetitivos,

prolongadamente contra uma mesma vítima, e cujo poder destrutivo é perigoso à

comunidade escolar e à sociedade como um todo, pelos danos causados ao

psiquismo dos envolvidos. Referimo-nos à fenomenologia bullying, aquela que

gera e alimenta a violência explícita e que vem se disseminando nos últimos anos

[...]. (FANTE, 2005, p. 21).

“O bullying na escola é considerado a forma mais frequente de violência contra

crianças e adolescentes.” (LOPES NETO, 2011, p. 37). A presença desse tipo de

comportamento deriva ou gera uma grande variedade de problemas de ordem

comportamental, emocional e social.

Ainda segundo o autor (ibid, p. 16) o bullying é “um fenômeno antigo, frequente e

universal, normalmente entendido como natural, inócuo e, até mesmo, como necessário ao

amadurecimento de crianças e adolescentes.” Porém, podemos supor que houve uma

mudança na maneira de analisar as atitudes agressivas – que sempre existiram, mas que até

então eram ignoradas e/ou negligenciadas – e pesquisadores passaram a encará-las não mais

como um fenômeno corriqueiro, normal e inofensivo, mas como um processo que merece

ser cuidadosamente observado e investigado, pois implica graves consequências (emocionais

e cognitivas) para os envolvidos.

Conforme Fante (2005, p. 27) bullying é uma palavra de origem inglesa, adotada

para definir o “desejo consciente e deliberado de maltratar uma pessoa e colocá-la sob

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tensão”. É o termo que conceitua os comportamentos agressivos e anti-sociais nos estudos

sobre a violência escolar. No Brasil, adotou-se o termo, visto que o mesmo é empregado na

maioria dos países. “Bully, enquanto nome, é traduzido como ‘valentão’, ‘tirano’, e como

verbo, ‘brutalizar’, ‘tiranizar’, ‘amedrontar’.” (ibid, p. 28).

Mesmo sendo um fenômeno antigo, o bullying mantém, ainda hoje, um caráter

oculto, pelo fato das vítimas não terem coragem suficiente para uma possível denúncia. Isso

contribui com o desconhecimento e a indiferença sobre o assunto por parte dos profissionais

ligados à educação. Conforme Fante (2005, p. 29) o bullying pode ser considerado um

fenômeno novo, visto que as investigações sobre o tema são fruto de estudos recentes

(últimas décadas), porém podemos considerá-lo um fenômeno antigo, pois se trata de uma

forma de violência que sempre existiu nas escolas.

O bullying pode ser manifestado em qualquer lugar onde existam relações

interpessoais. “O bullying é um fenômeno que ocorre, principalmente, em espaços coletivos

e se configura como um processo que tem diferentes causas associadas, mas que pode ser

considerado uma manifestação do processo de interação entre pares.” (GISI, 2011, p. 39).

Este tipo de comportamento agressivo não se dá isoladamente em escolas de

periferia – como muitos imaginam – e sim está presente em todas as escolas, sejam públicas

municipais, estaduais e federais, sejam particulares, ricas ou pobres. “O bullying é um

fenômeno amplo e complexo: ocorre em várias faixas etárias, em escolas públicas e

particulares. [...] Não é um comportamento normal, nem ‘uma brincadeira de crianças que

passa com o tempo’.” (MALDONADO, 2011, p. 14).

Pedra16

acrescenta que o bullying é uma:

[...] manifestação que é inocentemente considerada como “brincadeiras da idade”,

tem um poder destrutivo capaz de promover danos psicológicos incalculáveis e

irreparáveis às suas vítimas, atingindo milhares de alunos-clientes e usuários de

nossas redes de ensino, devendo ser considerado tema de grande relevância na

atualidade e de máxima preocupação por parte das autoridades competentes.

(FANTE, 2005, p. 10).

É possível perceber que a definição de bullying se reveste de grande complexidade.

Para se compreender realmente o que é o bullying é importante conhecer suas

características. Para Fante (2005, p. 28) o bullying é compreendido como um subconjunto de

16

Pedra, José Augusto. Em prefácio da obra de Cleo Fante (2005), p. 10.

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comportamentos agressivos, sendo caracterizado por sua natureza repetitiva17

e por

desequilíbrio de poder.18

3.3 – CARACTERÍSTICAS: COMO DIFERENCIAR O BULLYING DE ATOS

SIMPLES DE VIOLÊNCIA?

Para agirmos contra as práticas de bullying e violência precisamos primeiro

identificar o problema e compreender suas características. Conforme Gisi (2011, p. 46) é

imprescindível distinguir o bullying de qualquer outro tipo de agressão pontual ou

momentânea. O que para muitos pode aparentemente parecer uma brincadeira pode ser

bullying – uma agressão física ou não com intencionalidade de magoar.

Outro aspecto levantado por Calhau (2011, p. 07) e que também pressupõe a

importância de se conhecer as características do bullying é a questão do “modismo”. Os

descrentes da existência do bullying questionam o suposto “modismo” da mídia, dos

professores, dos psicólogos – que segundo eles, apontam o bullying em todas as situações de

conflito de grupos. Para se evitar esse tipo de situação, a fim de não banalizar o problema, é

necessário conhecimento das características e cautela quando de sua identificação.

A existência do fenômeno bullying é, às vezes, negada por uns ou supervalorizada

por outros, isto é, alguns acreditam que tudo não passa de brincadeira de criança e

adolescente não tendo nenhum efeito danoso, já outros, a todo tipo de conflito, dizem

configurar bullying. É necessário entendermos que brincadeiras normais e sadias são aquelas

nas quais todos os envolvidos se divertem. Quando apenas alguns se divertem à custa de

outros que sofrem, isso ganha outra conotação, bem diversa de um simples divertimento.19

O bullying é diferente de uma brincadeira inocente, sem intenção de ferir. Não é

uma simples troca de ofensas em uma discussão, nem um ato simples de violência. A grande

17

Alguns pesquisadores consideram ser necessários no mínimo três ataques contra a mesma vítima durante o

ano para classificar a agressão como bullying (FANTE, 2005, p. 28). 18

“O desequilíbrio de poder caracteriza-se pelo fato de que a vítima não consegue se defender com facilidade,

devido a inúmeros fatores: por ser de menor estatura ou força física; por estar em minoria; por apresentar pouca

habilidade de defesa; pela falta de assertividade e pouca flexibilidade psicológica perante o autor ou autores

dos ataques.” (FANTE, 2005, p. 28). 19

“Muitos pais e profissionais que lidam com a clientela escolar podem considerar bullying algo que não o é,

em decorrência de sua complexidade. Por isso, é necessário conhecer e reconhecer o fenômeno, a fim de

diferenciá-lo das brincadeiras ou atitudes inconsequentes próprias da idade, além das demais formas de

violência. Portanto, é imprescindível, ao analisar uma conduta agressiva, verificar se esta preenche os critérios

estabelecidos para a identificação do fenômeno [...]” (FANTE E PEDRA, 2008, p. 42).

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maioria dos autores (FANTE, 2005; FANTE E PEDRA, 2008; MIDDELTON-MOZ E

ZAWADSKI, 2007; SILVA, 2010; LOPES NETO, 2005, 2011; TEIXEIRA, 2011;

CALHAU, 2011, GISI, 2011) convergem para um conceito de bullying como prática que

compreende atitudes agressivas, intencionais e repetidas, que ocorrem sem motivação

evidente, adotadas por um ou mais estudantes contra outro(s), causando dor e angústia,

sendo executadas dentro de uma relação desigual de poder (força física ou condições

emocionais).

Tognetta e Vinha (2010a, p. 452) apresentam as principais características do

fenômeno bullying:

é uma forma de violência entre pares;

é marcado pela repetição, ou seja não são brincadeiras ao acaso e sim atos

direcionados a um mesmo alvo por repetidas vezes20

;

há a intenção de ferir, de prejudicar ou magoar alguém (falta de sensibilidade

moral);

há uma situação de vulnerabilidade da vítima (alvo frágil, que se vê com menos

valor) e a ausência de motivos que justifiquem os atos;

público – não há bullying sem que haja espectadores a corresponder com os atos

de violência.

Cabe destacar também e ainda segundo as autoras que “Somente aqueles cujas

imagens de si empobrecidas revigoram as características postas em evidência pelos autores

de bullying são tomados como vítima.” (TOGNETTA E VINHA, 2010a, p. 452).

Diante das características específicas destacadas, ou seja, a repetição, a

intencionalidade, o fato de ser uma violência entre iguais (sem poder instituído), a ausência

de motivos que justifiquem os atos, é que, assim como Avilés (2002, 2004, 2006) e Tognetta

e Vinha (2010a), fala-se em bullying e não apenas em maus-tratos ou

vitimização/intimidação entre pares. O bullying não consiste apenas de violência isolada,

mas de ações repetidas e intencionais, o que, segundo Tognetta (2010, p. 5), “[...] o torna de

fato, fenômeno ‟que merece destaque nos estudos sobre violência na escola.”

20

“[...] considera-se que as ações são repetitivas quando os ataques são desferidos contra a mesma vítima num

período de tempo, podendo variar de duas ou mais vezes no ano letivo.” (FANTE E PEDRA, 2008, p. 40).

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3.4 – FORMAS DE BULLYING: TIPOS DE MAUS TRATOS

O bullying pode se manifestar através de diversas atitudes e comportamentos, de

forma direta ou indireta.21

Consideram-se bullying direto as agressões físicas e as verbais. Já

o bullying indireto envolve uma forma mais sutil de vitimização, pois engloba atitudes como

indiferença, isolamento, exclusão, difamação, provocações de ordem racista e sexual – que,

em geral, podem ser muito dolorosas para a vítima, afetando-a indiretamente. Conforme

Lopes Neto (2011, p. 23) “Em um ataque direto, a vítima vê o seu agressor; em um ataque

indireto, a vítima é ferida, mas nem sempre sabe a quem culpar.” Já Silva (2010, p. 22) faz

referência ao fato de que dificilmente o alvo de bullying recebe apenas um tipo de maus-

tratos, pois normalmente, os “comportamentos dos bullies costumam vir em ‘bando’.”

A maioria dos autores e pesquisadores do bullying apresentam consenso quanto as

formas de manifestação do bullying. Os principais tipos de maus tratos encontrados são:

físico, material, verbal, moral, sexual, psicológico e virtual (FANTE, 2005; FANTE E

PEDRA, 2008; TEIXEIRA, 2011; SILVA, 2010; LOPES NETO, 2011; ROLIM, 2010).

As principais formas e atitudes de bullying são: insultar, ofender, xingar, fazer

gozações, colocar apelidos pejorativos, fazer piadas ofensivas, “zoar”, bater, chutar,

espancar, empurrar, ferir, beliscar, roubar, furtar ou destruir os pertences da vítima, atirar

objetos contra as vítimas, irritar, humilhar e ridicularizar, excluir, isolar, ignorar, desprezar

ou fazer pouco caso, discriminar, aterrorizar e ameaçar, chantagear e intimidar, tiranizar,

dominar, perseguir, difamar, passar bilhetes e desenhos entre colegas de caráter ofensivo,

fazer intrigas, fofocas ou mexericos, abusar, violentar, assediar, insinuar. Além destes, pode-

se apontar ainda o Bullying virtual, mais conhecido como ciberbullying (utilização de

aparelhos e equipamentos de comunicação – celular e internet – para difundir calúnias, seja

por mensagens no MSN, Skipe, YouTube, Twitter, Facebook, etc).22

21

Segundo Guareschi (2008), o comportamento do bullying pode ser classificado como direto ou indireto,

sendo que ambos são prejudiciais à vítima.

Direto – Ocorre quando as vítimas são atacadas diretamente, por práticas imediatas, através de apelidos,

agressões físicas, ameaças, roubos, ofensas verbais ou expressões e gestos que geral mal-estar às vítimas.

Indireto – A forma indireta de bullying ocorre quando as vítimas estão ausentes e os autores criam situações de

divisão, discórdia, indiferença, agindo através da fofoca, manipulação de amigos, mentiras, isolamento de

alguns difamadores e discriminação, com o propósito de excluir a vítima de seu grupo social, sendo mais

praticado pelas meninas. 22

Willard (2006, apud LIMA, 2011, p. 69, grifo do autor) fala sobre o bullying virtual como sendo “o ato de

mandar ou postar material danoso ou outras formas de engajar em agressão social usando a internet ou outros

tipos de tecnologias digitais, tais como os celulares de terceira geração. Estas comunicações online podem ser

viciantes e o ciberbullying pode acontecer a qualquer momento nas 24 horas do dia e nos sete dias da semana.

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Pesquisas recentes tem revelado que os tipos de bullying praticados variam

conforme o sexo dos envolvidos23

. Estes estudos apontam para uma associação entre os

meninos e o bullying do tipo direto, enquanto as meninas apresentam maior propensão a

assumir atitudes de bullying indireto. Conforme estudos (LISBOA, 2001; LOPES NETO,

2011; CALHAU, 2011; MALDONADO, 2011; TEIXEIRA, 2011; ROLIM, 2010;

MIDDELTON-MOZ E ZAWADSKI, 2007), observou-se que as meninas adotam mais a

prática do bullying indireto, ou seja, empregam mais agressões verbais (ataques morais) para

lidar com um problema com seus colegas, enquanto os meninos usam preponderantemente

agressões físicas.

A maior incidência do bullying é observada em meninos no papel de agressores e

vítimas (LOPES NETO, 2005, 2011; FANTE E PEDRA, 2008). Entretanto, cabe dizer que a

forma indireta de bullying, tipicamente praticada pelas meninas, dificulta a identificação da

agressão, por não ser uma agressão explícita. Raquel Simmons classifica este modo de

agressão das meninas como “agressões alternativas.” Para a autora,

[...] algumas agressões alternativas são invisíveis aos olhos dos adultos. Para

fugirem da desaprovação social, as meninas se escondem sob a fachada de doçura

para, em segredo, se magoarem mutuamente. A intenção é evitar serem

desmascaradas e punidas. As agressões das meninas são mais bem trabalhadas

(racionalizadas) e, embora não sejam praticadas com força física, tem requinte de

sutileza e crueldade, visando atingir de forma devastadora as suas vítimas.

(SIMMONS, 2004, p. 11-12).

Para Maldonado (2011, p. 27) o bullying praticado pelas meninas costuma ser mais

insidioso, mas não por isso menos cruel. Rolim (2010, p. 49) traz que o mais comum é que

as meninas atinjam suas vítimas espalhando boatos, passando bilhetinhos, conspirando,

jogando as colegas umas contra as outras. “Práticas que, assinale-se, podem ser tão

destrutivas quanto as formas mais explícitas de agressão física, pois a autoestima da vítima é

aniquilada sem que o problema seja discutido na escola, [...]”.

Middelton-Moz e Zawadski (2007, p. 22) apontam que as meninas “tendem a usar a

exclusão social como principal arma, em lugar de agressão emocional ou física direta,

Texto ou imagens comprometedoras podem ser disseminados de forma ampla, sendo impossível retirar o

conteúdo da internet.” 23

Uma pesquisa realizada por Lopes Neto (2005) constatou que o bullying direto era utilizado pelos meninos

com uma frequência quatro vezes maior do que pelas meninas. Isso não significa que os meninos são mais

agressivos do que as meninas – ao contrário do que poderia supor o senso comum – mas que as meninas se

utilizam de formas mais sutis de agressão.

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embora estudos indiquem que também elas têm se tornado cada vez mais agressivas

fisicamente na última década.”

Conforme Calhau:

Existe uma cultura oculta de agressividade nas meninas na qual o bullying é

epidêmico, característico e destrutivo. Não é marcado pelo comportamento físico e

verbal direto, que é basicamente domínio dos meninos. A nossa cultura nega às

meninas o acesso ao conflito aberto e impõe à agressividade delas formas não

físicas, indiretas, dissimuladas. As meninas usam a maledicência, a exclusão, a

fofoca, apelidos maldosos e a manipulação para infligir sofrimento psicológico nas

vítimas. Diferentemente dos meninos, que tendem a provocar e a praticar o

bullying com conhecidos e estranhos, as meninas, com frequência, atacam dentro

de um círculo bem fechado de amizades, tornando a agressão mais difícil de

identificar e reforçando o dano causado às vítimas. (CALHAU, 2011, p. 51-52).

Algumas características da prática de bullying modificam-se conforme a idade dos

protagonistas24

. A presença do bullying já é percebido na educação infantil (a partir dos 3

anos), atinge sua maior incidências na pré-puberdade e puberdade quando a aceitação pelos

pares passa a ser fundamental (na faixa etária dos 11 aos 13 anos). Após essa fase, o

bullying tende a diminuir. (LOPES NETO, 2011, p. 24).

Ressalta-se também que os “autores de bullying de ambos os sexos são mais cruéis

com os alvos do mesmo sexo do que com os do sexo oposto.” (ibid, p. 25).

Outro fator evidenciado é que, gradativamente, a intencionalidade e o grau de

perversidade no bullying vão aumentando, sendo reforçados pelo ambiente escolar e social,

quando estes não desenvolvem estratégias adequadas para identificá-lo e combatê-lo, assim

como aponta Lopes Neto, “é consenso que os atos de violência, sejam eles quais forem, se

praticados com frequência, apresentam uma característica evolutiva, em que os níveis de

agressividade e gravidade são crescentes e persistentes.” (ibid)

Considerando-se estes conhecimentos seguidamente apresentar-se-ão os

protagonistas deste fenômeno.

24

Quanto mais jovens forem as crianças frequentemente agressivas, maiores serão os riscos de apresentarem

comportamentos antissociais mais tarde. (LOPES NETO, 2011, p. 24).

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3.5 – PROTAGONISTAS: DE QUEM ESTAMOS FALANDO?

São vários os personagens envolvidos em bullying. Identificá-los é fundamental,

porém, deve-se tomar o cuidado para não rotular os alunos, evitando que sejam

estigmatizados pela comunidade escolar, o que também seria uma violência.

Os estudos sobre o fenômeno bullying permitem identificar os perfis psicológicos

de cada protagonista envolvido nesta história. E como ressalta Eyng (2011, p.106) ninguém

pratica bullying sozinho, todos os atores, embora tenham papéis diferentes, são responsáveis

pela ocorrência e repetição dos episódios de bullying.

Embora os estudiosos que tratam do tema não classifiquem exatamente da mesma

forma, podemos dizer que são três os principais grupos participantes do bullying: o autor ou

agressor; a vítima ou alvo e os espectadores ou testemunhas. (SILVA, 2010; FANTE, 2005;

FANTE E PEDRA, 2008; TEIXEIRA, 2011, TOGNETTA, 2011; MALDONADO, 2011;

CALHAU, 2011; LOPES NETO, 2011).

Os autores (agressores, bullies) são os que praticam as agressões físicas e/ou

morais; os alvos (vítimas) são as pessoas a quem são direcionados os ataques e os

espectadores são as testemunhas, geralmente silenciosas desses episódios e que estão

sempre no ambiente, mantendo alguma relação com os autores e os alvos.

Maldonado (2011, p. 15) e Lopes Neto (2011, p. 37) enfatizam que não se trata de

três grupos estanques, pois muitos autores são ou já foram vítimas; há vítimas que também

atacam e atiçam a raiva dos agressores, e, os autores e vítimas também podem ser

espectadores de episódios de bullying.

Não há consenso na literatura quanto a nomenclatura a ser utilizada para designar

os protagonistas, até mesmo porque, alguns autores como Lopes Neto (2005), Oliboni

(2008) e Tognetta (2011) preferem utilizar as nomenclaturas alvos para as vítimas e autores

ao invés de agressores. As medidas de adaptação da nomenclatura25

, conforme os autores,

visam a não rotulação dos estudantes perante a comunidade escolar.

Conforme encontra-se em Tognetta e Vinha (2008), a atual literatura aconselha que

se utilize as expressões “alvos de bullying” e “autor de bullying”, para designar a vítima e o

agressor, respectivamente, na tentativa de evitar preconceitos por parte dos agentes que

25

Cabe ressaltar novamente que será adotada a nomenclatura “Alvos” e “Autores”, porém poderão aparecer no

decorrer deste texto as nomenclaturas “vítimas” e “agressores”, pois será mantido os termos utilizados pelos

autores que serão utilizados como fonte.

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trabalham com situações em que haja essa forma de violência. Sobre a questão da

nomenclatura Tognetta explica:

A atribuição dessas nomenclaturas permite-nos superar um estereótipo que tem

sido constante nos estudos de bullying e nas propostas que se tem, principalmente

em termos de políticas de intervenção: chamávamos os protagonistas desse

fenômeno como agressores e vítimas; quando falamos em “agressor” pensamos em

um sujeito “mau”, e quando falamos em “vítima” atribuímos a ela um sentimento

de piedade que parece por si só resolver a situação – agimos por ela e não

suscitamos no alvo de bullying, ao sentir pena, a necessidade de se defender.

Portanto, a alteração dos nomes não é somente uma mudança de linguagem, mas

de significação. (TOGNETTA, 2011, p. 141).

Independente da nomenclatura utilizada buscar-se-á descrever as características

comuns aos personagens do bullying. Cabe ressaltar, conforme assinalam Fante e Pedra

(2008, p. 61), que o fato de determinados alunos apresentarem algumas características

comuns aos protagonistas, não significa que estarão envolvidos no fenômeno.

Quem são os autores (ou agressores)? Também chamados de bullies, são aqueles

que vitimizam os mais fracos. Apresentam características peculiares de comportamento,

como agressividade e impulsividade mais exacerbada, além de um desejo por dominar,

humilhar e subjugar os demais. Tentam conseguir o que querem a qualquer preço. Não

conseguem ter flexibilidade para fazer acordos. Comumente são indivíduos que tem pouca

empatia e falta afeto pelos outros (SILVA, 2010; ROLIM, 2010; TEIXEIRA, 2011;

MALDONADO, 2011; LOPES NETO, 2011). O desempenho escolar destes jovens costuma

ser regular ou deficitário. Para os autores de bullying, valores como respeito, generosidade,

solidariedade não são centrais, pois são sujeitos que carecem de “sensibilidade moral”, ou

seja, não enxergam no outro um sujeito digno de respeito e por isso não conseguem

sensibilizar-se com a dor alheia (colocar-se no lugar do outro).

Normalmente são fisicamente mais fortes, se julgam superiores e podem ser

considerados populares por muitos estudantes. Segundo Teixeira (2011, p. 32) possuem

habilidades sociais, ou seja, são normalmente comunicativos, mais falantes e mais

extrovertidos, possuem um poder de liderança e são mais aptos para realizar a manipulação

de alguns colegas contra outro. “Apesar de alguns autores de bullying serem rejeitados, em

geral eles são populares, respeitados, temidos e até admirados. Eles apreciam seus status

social elevado, fortalecido pelas atitudes dos colegas, seja apenas como observadores ou

como incentivadores ativos e passivos.” (LOPES NETO, 2011, p. 50). Silva (2010, p. 43)

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acrescenta: “Quando ele está acompanhado de seus ‘seguidores’, seu poder de ‘destruição’

ganha reforço exponencial, o que amplia seu território de ação e sua capacidade de produzir

mais e novas vítimas.”

Para compreendermos o perfil dos autores de bullying, analisaremos definições

trazidas por alguns autores. Sobre eles Maldonado (2011, p. 30) apresenta:

Há agressores que constroem argumentos para justificar seus atos, sem manifestar

remorsos ou arrependimento. Consideram que as vítimas são pessoas fracas e que,

mesmo assim, os provocam e merecem ser atacadas por apresentarem

características que se encaixam nos preconceitos que motivam as práticas

discriminatórias (“Quem mandou nascer preto?”; “Com orelhas desse tamanho tem

mais é que ser zoado!”; “O cara é gago, merece ser vaiado cada vez que se atreve a

dizer alguma coisa!”) Compaixão, paciência, colaboração e solidariedade estão

atrofiadas: os autores de bullying com esse perfil conseguem até mesmo

arregimentar colegas para fazer coro e intensificar as ações de humilhação e de

exclusão.

Lopes Neto (2005, p. S167) traz em sua definição sobre os autores de bullying:

[...] é tipicamente popular; tende a envolver-se em uma variedade de

comportamentos antissociais; pode mostrar-se agressivo inclusive com os adultos;

é impulsivo; vê sua agressividade como qualidade; tem opiniões positivas sobre si

mesmo; é geralmente mais forte que seu alvo; sente prazer e satisfação em

dominar, controlar e causar danos e sofrimentos a outros. Além disso, pode existir

um “componente benefício” em sua conduta, como ganhos sociais e materiais. São

menos satisfeitos com a escola e a família, mais propensos ao absenteísmo e à

evasão escolar e têm uma tendência maior para apresentarem comportamentos de

risco (consumir tabaco, álcool ou outras drogas, portar armas, brigar, etc). As

possibilidades são maiores em crianças ou adolescentes que adotam atitudes anti-

sociais antes da puberdade e por longo tempo.

O estudo sobre o comportamento dos autores de bullying nos permite sintetizar

algumas características: agressividade, impulsividade, desejo de dominar, intolerância,

controle sobre o outro (manipulador), necessidade de chamar a atenção para si, falta de

empatia e perfil opositor e desafiador. Outra característica, que ajuda a manter esse

problema, é que os autores (bullies) conhecem as regras, mas não têm medo da punição.

Conforme Fante e Pedra (2008, p. 40) os bullies são muito habilidosos em sair-se de

situações difíceis, principalmente quando são indagados sobre seus atos.

Rolim (2010, p.38) aponta que as práticas de bullying constituem um estágio inicial

de um percurso que tende a se desdobrar em práticas delituosas anos mais tarde. Isto é

trazido também por outros autores como Middelton-Moz e Zawadski (2007), Eyng (2011) e

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Lopes Neto (2011)26

. Conforme Eyng (2011, p. 109) “é possível constatar que a identidade

do bullie se estrutura e se consolida ao longo da vida em virtude das interações e das reações

que causa nos outros, tanto nas vítimas quanto nos expectadores.” Ainda segundo a autora,

os bullies se formam a partir da infância, em contextos familiares e escolares nos quais não

tenha intervenção (ou a intervenção não seja adequada) diante das atitudes agressivas e de

desrespeito, estabelecendo limites, valores e regras. Desse modo, os contextos atuam

fortalecendo e enraizando os comportamentos desajustados que podem permanecer (e se

fortalecer) na idade adulta.

Tognetta e Vinha destacam que há outra característica subjetiva, e talvez menos

considerada quando se fala em bullying, trata-se da falta de sensibilidade moral por parte do

autor. Segundo Tognetta (2010a, p. 05):

Esse “senso moral” se refere a um conjunto de capacidades necessárias a uma ação

moral: uma primeira capacidade diz respeito a distinguir o certo e o errado a partir

de uma hierarquia de valores que são agregados à personalidade da pessoa. Essa

primeira capacidade é somada a outra também importante – a capacidade de

atribuir valor a outrem como alguém que ‘merece’ ser tratado com determinado

valor moral. Seria, portanto, uma espécie de sensibilidade capaz de fazer o sujeito

olhar para o outro com olhos de quem se sensibiliza, se simpatiza com esse outro e

o vê digno de receber uma ação justa, tolerante, generosa, honesta ou respeitosa.

Ao considerar a falta de sensibilidade moral o autor passa a ser compreendido mais

adequadamente como parte, também sofredora do bullying, à medida que age de

determinada forma por não ter subsídios para agir adequado à moral. Por isso, ele não deve

ser chamado de agressor, com denotação de culpado, mas de autor – como a parte

responsável por maus comportamentos e plausível de intervenção pedagógica, social e

especialmente, afetiva.

Como identificar os alvos (ou vítimas)? São aqueles estudantes que sofrem as

agressões repetitivas. A incapacidade de se defender e a negação em solicitar ajuda são

características dos alvos de bullying. Os autores Teixeira (2011), Rolim (2010), Fante

(2005), Silva (2010), Fante e Pedra (2008), Calhau (2011), Lopes Neto (2011) apontam as

principais características dos alvos de bullying27

: elas são normalmente são pessoas tímidas,

retraídas, introspectivas, passivas, submissas, temerosas, menos confiantes, fisicamente mais

26

Conforme Lopes Neto (2011, p. 49-50) a prática de bullying na escola “pode ser um indício importante de

que os estudantes autores tendem a adotar comportamentos antissociais e violentos, imediatos e tardios.” 27

Conforme Fante e Pedra (2008, p. 59) e Teixeira (2011, p. 34) é preciso destacar, que o simples fato de

algum estudante apresentar essas características não significa que ele seja ou venha a ser alvo de bullying.

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fracas, menores e mais jovens que os autores. Possuem menores habilidades de

relacionamento (poucos amigos e parecem solitários), permanecendo a maior parte do tempo

sozinhos e isolados na escola (ex. no recreio). Dificilmente participam de brincadeiras e

esportes coletivos, por medo da rejeição ou por isolamento. Podem evitar a escola e o

convívio social.28

Os alvos são escolhidos normalmente em razão de diferenças. Como o bullie está

sempre em busca de algo “diferente” na vítima, algo que sirva de motivo para agredi-la,

entram na lista além dos acima descritos, os alunos novos na escola (vindos de outras

regiões, com sotaques, cultura, religião e costumes diferentes), e também pessoas com

algum traço diferenciador em termos de estatura, peso, aparência física, sexo, sexualidade,

raça, etnia, situação sócio-econômica, religião, ou mesmo pelo seu perfil emocional mais

sensível.

Conforme Eyng (2011, p. 109) “A padronização, os rótulos, a desigualdade, o

desconhecimento da diversidade, a intolerância com os diferentes pode gerar preconceitos,

discriminação, exclusão, vitimando os sujeitos percebidos como diversos [...].”

Cabe destacar também os estudantes que se sobressaem no meio escolar (boas

notas, elogios dos professores, etc). Estes são normalmente escolhidos para serem alvos de

bullying.

Tognetta e Vinha (2010a) trazem algo importante a respeito das características dos

alvos – a sua fragilidade – o fato destes se verem e se sentirem com menos valor. Isto

explica o fato de porque nem todos que os que apresentam um perfil para ser alvo, se tornam

alvos de bullying.

Autores de bullying escolhem intencionalmente seus alvos, e estes são exatamente

aqueles que por razões psicológicas parecem concordar com a imagem que seus

algozes querem fazer dele: as vítimas sentem-se diferentes pela roupa que vestem,

maneiras como se relacionam, pelas diferenças físicas ou psicológicas, trejeitos e,

principalmente, por sentirem-se pouco seguros com relação ao respeito que nutrem

por si mesmos [...].

A literatura apresenta uma classificação para os alvos (vítimas). Segundo os autores

Fante (2005), Fante e Pedra (2008), Lopes Neto (2005), Silva (2005) os alvos (vítimas)

podem ser classificadas em: vítima típica, vítima provocadora e vítima agressora.

28

“Algumas situações mais extremas são passíveis de ocorrer, como a fobia escolar, em que o medo, a

ansiedade e as manifestações depressivas incapacitam crianças e adolescentes para frequentar a escola.”

(LOPES NETO, 2011, p. 44).

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A vítima típica, segundo os autores é aquela que serve de “bode expiatório” para o

autor (agressor). Elas não têm habilidades para reagir às provocações e sofrem

repetitivamente as consequências dos comportamentos agressivos de outros. Tem conduta

habitual não-agressiva, motivo pelo qual mostra ao agressor que não irá revidar e denunciar

(“presa fácil” para os abusos).

Conforme Silva (2010, p. 38):

Normalmente, essas crianças ou adolescentes “estampam” facilmente as suas

inseguranças na forma de extrema sensibilidade, passividade, submissão, falta de

coordenação motora, baixa autoestima, ansiedade excessiva, dificuldades de se

expressar. Por apresentarem dificuldades significativas de se impor ao grupo, tanto

física quanto verbalmente, tornam-se alvos fáceis e comuns dos ofensores.

A vítima provocadora é aquela que deliberadamente provoca e irrita os colegas,

despertando o desejo de ataque dos bullies. Possuem um perfil mais ansioso e explosivo. É

geniosa, briga e responde quando é atacada, mas geralmente de maneira ineficaz. Conforme

Teixeira (2011, p. 37) “eles apresentam uma reação agressiva diante dos assédios de seus

agressores e a irritabilidade é encarada como um convite a esses agressores para continuar

com o bullying”.

Sobre este tipo de vítima, Fante (2005, p. 72) completa: “[...] pode ser hiperativa,

inquieta, dispersiva e ofensora; é, de modo geral, tola, imatura, de costumes irritantes, e

quase sempre é responsável por causar tensões no ambiente em que se encontra”. Motivo

pelos quais acabam vitimizadas.

A vítima agressora pode ser caracterizada como aquela que “Bateu, levou!” ou

“Tudo que vem tem volta”29

. Ela reproduz os maus tratos sofridos buscando uma

compensação. Adotam as atitudes de intimidação das quais foram vítimas ou apoiam os que

assim agem. Conforme Silva (2010, p. 42) e Fante (2005, p. 72) a vítima agressora tende a

buscar indivíduos mais frágeis para transformá-los em “bodes expiatórios”, na tentativa de

transferir os maus-tratos sofridos. Isso gera o “efeito cascata” ou círculo vicioso, que

transforma o bullying em um problema de grandes proporções e difícil controle.

Para Lopes Neto (2005, p. S167) existem alguns fatores que podem ser facilitadores

para que alguém se torne alvo de bullying. Esses fatores estão ligados aos métodos

educativos familiares, como proteção excessiva (gerando dificuldades para enfrentar os

desafios e para se defender), tratamento infantilizado (gerando desenvolvimento psíquico e

29

Silva (2010, p. 42).

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emocional aquém do aceito) e o papel de “bode expiatório” da família (quando é alvo de

críticas sistemáticas).

Ainda segundo o autor, “é pouco comum que a vítima revele espontaneamente o

bullying sofrido, seja por vergonha, por temer retaliações, por descrer nas atitudes

favoráveis da escola ou por recear possíveis críticas.” (ibid). O alvo de bullying sente-se

impotente diante da descrença do adulto, quando tenta denunciar os atos de agressão e ouve

que aquilo foi apenas uma “brincadeira de mau gosto”. Além disso, muitas vezes, sente

medo de que o agressor fique sabendo da denúncia e queira se vingar. Lopes Neto (2005)

complementa: “O silêncio só é rompido quando os alvos sentem que serão ouvidos,

respeitados e valorizados.” (ibid).

Quem são os espectadores (ou testemunhas)? São a grande maioria dos alunos30

,

aqueles que não se envolvem diretamente nos atos de bullying, presenciam as agressões,

mas se calam por medo de ser “a próxima vítima”, por não saberem como agir ou por

descrerem nas atitudes da escola.

Sobre esta “lei do silêncio”, Lopes Neto (2005, p. S167) traz: “Esse clima de

silêncio pode ser interpretado pelos autores como afirmação de seu poder, o que ajuda a

acobertar a prevalência desses atos, transmitindo uma falsa tranquilidade aos adultos.” Ou

seja, passa a falsa imagem de que o bullying não ocorre na escola, ou de que se trate de um

problema menor, que não interfere na dinâmica escolar.

Contudo, o fato de não contarem para suas autoridades, propositalmente, fortalece

outro fato interessante: autores de bullying precisam fazer com que seu público os

venere sabendo de suas proezas. Dão um jeito: ou mandam recado, ou contam

sobre suas ações... E o público, por sua vez, quase que em sua totalidade,

amedrontado com a possibilidade de se tornar “a próxima vítima”, parece

concordar com as ações dos autores, mesmo que seja pela indiferença ou pura

aceitação. (TOGNETTA E VINHA, 2010a, p. 452).

Fante (2005, p. 74) e Teixeira (2011, p. 38) trazem que estes alunos (espectadores)

mesmo não sofrendo as agressões diretamente, podem se sentir inseguros e incomodados

com a situação. Isto pode prejudicar sua capacidade e progresso acadêmico e social, visto

que a escola deixa de ser um ambiente acolhedor e seguro e passa a ser um local hostil,

30

Conforme Fante (2005), Fante e Pedra (2008), Lopes Neto (2005, 2011), Silva (2010), Calhau (2011),

Teixeira (2011).

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perigoso e violento. Além de ansiedade, preocupações e angústia, os alunos podem sentir

vergonha de fazer perguntas e esclarecer dúvidas com os professores por medo de serem

alvos de bullying. Até mesmo a participação em eventos, festas, reuniões, jogos esportivos

pode ser comprometida.

A grande maioria dos espectadores não concorda com as agressões e apresentam

sentimentos negativos com relação ao bullying, sentem simpatia pelos alvos e

condenam/desaprovam o comportamento agressivo dos autores, conforme apresentam Lopes

Neto (2005; 2011) e Calhau (2011).

No entanto, as reações positivas ou negativas diante dos atos de bullying podem

ser influenciadas pelos grupos nos quais crianças e adolescentes interagem,

suplantando, inclusive, os seus próprios princípios. Pertencer a um contexto social

outorga a seus membros uma identidade social que não só os identificam, como

estabelece regras de comportamento, que pode torna-los relutantes e inseguros em

intervir diretamente ou para informar aos adultos sobre os casos observados, ou

mais suscetíveis à adoção de atitudes discriminatórias e de práticas de bullying.

(LOPES NETO, 2011, p. 55).

Estes preferem ficar em silêncio, pois temem que os autores de bullying – caso

saiam em defesa dos alvos – os escolham também para os ataques. Em geral, não denunciam

os fatos aos pais e professores, pois a fama de “dedo duro” é terrível, sabem que poderão

sofrer represálias dos autores – então por medo, não entregam os colegas, mesmo não

concordando com o bullying.

Tognetta e Vinha (2008, p. 13) colocam que:

[...] o espectador assume uma posição de “fora de jogo”, como se nada tivesse a

ver com o problema pelo medo de uma punição da autoridade, mas, ao mesmo

tempo, ainda que de maneira controlada, também zomba ou ri da crueldade feita a

alguém, não porque concorda com ela, mas pelo temor de se tornar a próxima

vítima e por perceber que para manter uma boa imagem diante do grupo é melhor

“ficar do lado” dos mais fortes. [...] O que está em jogo é necessariamente a

ausência de um sentimento de indignação que permita a esse espectador assumir

um posicionamento contrário às ações injustas. Por sua vez, essa indignação é

proveniente de um “estar sensível” ao sentimento do outro, de uma espécie de

comover-se ao outro.

Sobre os espectadores Maldonado (2011, p. 32) traz:

Na “plateia silenciosa”, as testemunhas ou espectadores se omitem, observando o

desenrolar das agressões sem nada dizer, sem tomar providências no sentido de

denunciar ou desmascarar os agressores, que se tornam ainda mais audaciosos por

acreditarem que não haverá consequências para suas ações. Os espectadores se

omitem por medo de serem escolhidos como alvos, por indiferença ou pela recusa

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de perceber a realidade: “O problema não é meu, então não sou eu quem vai

resolver”; “Se fosse comigo, eu reagiria de outro modo, essa bobinha que aprenda

a se defender”; “Nunca vi essas coisas acontecendo na minha escola”.

De acordo com a forma como reagem aos episódios de bullying podemos

classificar31

os espectadores como: passivos ou observadores (são aqueles que só observam

e se afastam, por medo); auxiliares (neste grupo encontram-se aqueles que participam da

agressão, normalmente planejando e articulando os ataques – camuflados de “bons moços”);

incentivadores (são aqueles que apesar de não participarem ativamente dos ataques contra os

alvos, manifestam “apoio moral”, com risadas e palavras de incentivo – que estimulam e

incitam o autor); neutros (são aqueles que não demonstram nenhuma sensibilidade pelas

situações de bullying que presenciam – percebem as cenas como algo normal, muitas vezes

até condenando o alvo); defensores (este grupo inclui os espectadores que buscam proteger o

alvo ou buscar ajuda para interromper as agressões).

Percebe-se que durante os episódios de bullying os estudantes espectadores podem

assumir diversos papéis, e que este grupo pode influenciar diretamente na ocorrência de

bullying, seja intervindo e ajudando os alvos, seja apoiando e incentivando os autores.

A postura assumida pelos espectadores pode ser determinada por diversos fatores

pessoais, sociais e circunstanciais: como medo, sentir “pena” do alvo, entendimento de que o

problema não seja seu, de não se sentir capaz ou não saber como agir, de estarem

“acostumados” com a violência (quando esta faz parte de seu cotidiano) tornando-se

invisíveis a seus efeitos, descrença na capacidade e interesse da escola em intervir na

situação.

Diversos estudos procuram correlacionar o protagonismo desses estudantes com

aspectos psicológicos, traços de personalidade, habilidades sociais, motivação

moral, empatia e autossuficiência, buscando explicar o porquê de alguns deles

assumirem atitudes proativas, como defensores dos colegas, outros se mostrarem

totalmente alheios aos atos de violência ou incentivarem e participarem da prática

de bullying. Entre os fatores mais importantes, favoráveis às intervenções das

testemunhas em favor dos alvos, destacam-se as manifestações agressivas mais

amenas, as atitudes positivas de proteção às vítimas e o entendimento de que seus

pais e amigos, mas não os professores, esperam que eles prestem apoio aos alvos.

(LOPES NETO, 2011, p. 56).

Diante disso, percebe-se que este terceiro grupo “os espectadores” possui um

grande poder diante dos episódios de bullying, por isso “os que não praticam ou sofrem

31

Não há um acordo dos autores, quanto a nomenclatura na classificação dos espectadores, mas baseados em

Silva (2010), Lopes Neto (2005; 2011) e Maldonado (2011) destacamos as principais.

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bullying devem ser entendidos como parte do problema e parte da solução.” (ibid, p. 57).

Eles detêm a capacidade de poder reduzir os números do bullying, sendo assim a abordagem

do bullying, visando à sua redução, deve envolver toda a comunidade escolar e incentivar o

conhecimento e percepção do bullying por todos os estudantes.

Eyng (2011, p. 111) traz que a identidade e o comportamento dos bullies dependem

tanto das reações dos alvos quanto da falta de ação dos espectadores, e esses, segundo a

autora, são os maiores responsáveis pelo fato de o bullying continuar a ocorrer.

Sobre isto Middelton-Moz e Zawadski complementam:

Os bullies são ao mesmo tempo, temporariamente fortalecidos e prejudicados por

nossa impotência, nossa apatia e nosso silêncio. Precisamos criar comunidades em

que a agressão contra os outros seja totalmente inaceitável, não em função de leis

rígidas e punições severas, mas porque nos importamos com os outros.

(MIDDELTON-MOZ E ZAWADSKI, 2007, p. 146, grifo do autor).

Os alunos considerados espectadores, que por medo ou outra razões não adotam um

papel ativo e fundamental em defesa dos alvos de bullying, acabam aprendendo a aceitar e

até a legitimar o errado e o injusto, desde que isso não os atinja, contribuindo assim para a

perpetuação do bullying na escola.

3.6 – CAUSAS: MOTIVADORES E REFORÇADORES

Quando nos deparamos com cenas de violência e desrespeito entre escolares

passamos a nos questionar: por que ocorre o bullying? O que leva um aluno ou grupo de

alunos a humilhar, perseguir, intimidar, apelidar de forma pejorativa um colega mais

indefeso? Será intolerância? Maldade? Satisfação em provocar sofrimento ao outro? Será

por diversão? Por não aceitar as diferenças? Ou talvez seja uma maneira de denunciar que

algo não anda bem? Haveria um incentivo involuntário aos problemas do desrespeito? Qual

o “combustível” para que essas condutas aconteçam em nossa sociedade? E, ainda, por que

algumas pessoas não conseguem se defendem e tornam-se “alvos fáceis” para outros colegas

de escola? 32

32

Fante (2005).

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Conforme Tognetta e Vinha (2008, p. 08) o “bullying é um fenômeno

‘multicausado’. São muitos âmbitos implicados para a formação de um alvo ou autor de

bullying.”

Estudos estão sendo desenvolvidos na tentativa de compreender esse fenômeno, sob

os mais diversos aspectos, como familiar, social, cultural, afetivo e emocional. Uma

evidente crise nos valores morais, a grande quantidade de informações transmitidas pela

mídia, a desestruturação da família, a falta de respeito ao próximo, a má qualidade das

relações com o grupo, influência das normas sociais (espaço onde o indivíduo está inserido)

são alguns dos fatores pesquisados, uma vez que interferem e influenciam na qualidade das

relações humanas, e a escola é um dos espaços em que isso é refletido.

Pesquisadores e autores têm destacado inúmeros fatores que influenciam e/ou

contribuem no aparecimento do bullying, mas é bem provável que não se consiga dar conta

de listar todos, uma vez que sempre haverá possibilidade de surgir uma razão ainda não

identificada para tal comportamento.

Fante e Pedra indicam alguns desses fatores:

[...] carência afetiva, ausência de limites, afirmação dos pais sobre os filhos através

de maus-tratos e explosões emocionais violentas, excessiva permissividade,

exposição prolongada às inúmeras cenas de violência exibidas pela mídia e pelos

games, facilidade de acesso às ferramentas oferecidas pelos modernos meios de

comunicação e informação. Além desses, existe a alta competitividade, que acaba

gerando o individualismo e a dificuldade de empatia, a crise ou ausência de

modelos educativos baseados em valores humanos, capazes de alicerçar a vida do

indivíduo. (FANTE E PEDRA, 2008, p. 100).

Já Frick (2011, p. 75) aponta para as seguintes variáveis: culturais (meios de

comunicação social e modelos que reproduzem e incentivam a violência); sociais (violência

estrutural, valores socialmente aceitos, crenças e costumes sociais face ao bullying,

machismo, exclusão de determinados grupos); familiares (padrões educativos autoritários,

permissivos ou negligentes, métodos coercitivos e violentos, qualidade nas relações);

escolares (metodologias não cooperativas, disciplinas autoritárias, punitivas e

inconsistentes, falta de normas estabelecidas de forma democrática, falta de comunicação);

grupais (popularidade dos grupos, busca por status/posição/reconhecimento no grupo) e

pessoais (temperamento, aprendizagem de condutas submissas ou violentas, experiências

prévias de maus-tratos, falta de autocontrole, incapacidade social).

Uma questão muito importante para entender o fenômeno bullying (agressão –

vitimização – impotência – indiferença) é compreender, além das características, formas de

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atuação e protagonistas, a dinâmica que produz esses personagens, levando em conta os

contextos socioculturais nos quais os motivadores e reforçadores do bullying se constituem.

Sobre isto Beaudoin e Taylor (2006) assinalam o fato de vivermos em uma

sociedade que funciona segundo os princípios e valores do capitalismo, do individualismo,

do patriarcado e do racismo – buscando as implicações associadas a essas práticas e que

afetam o clima educacional da sala de aula e a experiência das pessoas com as escolas. Com

base nisto trazem que:

Embora a maioria das pessoas esteja ciente de que vivemos em cultura capitalista,

individualista, patriarcal, que frequentemente é intolerante em relação às

diferenças (padrões restritos de normalidade, pouca aceitação das diferenças de

raça, de orientação sexual, etc.), muitos não percebem a implicação desses

discursos amplos em seu cotidiano. Em geral, nessas culturas, as instituições

passam a estruturar-se por temas como a competição, as regras, as conquistas, a

avaliação, a recompensa e a punição e as hierarquias de poder. (BEAUDOIN E

TAYLOR, 2006, p. 29).

Destaca-se a importância de ser um vencedor, de ter a razão e de estar no topo da

hierarquia (competitividade); o fato dos meninos terem que ser durões e demonstrar a força

física, valorizado os traços considerados de natureza masculina; o individualismo – foco

sobre as próprias necessidades do indivíduo, seus desejos e seus direitos, muitas vezes às

custas dos outros.

As autoras assinalam que, em geral, as instituições (incluindo a escola) também se

estruturam com base em temas como a competição, as regras, as conquistas, a recompensa, a

punição e as hierarquias de poder. Cabe ressaltar, porém, que o problema não está nas

culturas que funcionam sob essas estruturas, mas é a sua aplicação exagerada, constante e

rígida que pode levar aos efeitos negativos.33

Conforme Eyng (2011, p. 117) é inegável que os discursos culturais atuem sobre o

indivíduo e produzam respostas e ou bloqueios diante de suas atuações. O que é

complementado por Beaudoin e Taylor (2006, p. 29) “alguns desses bloqueios, em especial a

competição, as regras, ênfase exagerada na conquista a todo custo e a avalição, podem

acabar contribuindo para o desrespeito e o bullying,” já que os alunos que lutam contra esses

problemas geralmente recebem uma dose extra destas práticas de ensino. As autoras

destacam:

33

(ibid)

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[...] a cultura em um sentido mais amplo limita a quantidade de opções que os

alunos conhecem na vida, e certos aspectos estruturais da escola – como a

avaliação, as regras, a competição e uma ênfase exagerada sobre as conquistas –

podem involuntariamente exacerbar os problemas. (BEAUDOIN E TAYLOR,

2006, p. 39).

Ainda que os princípios, valores e regras em vigor nessas estruturas afetem de

modo diferente os sujeitos, todos são, de algum modo, influenciados. Lopes Neto (2011, p.

84) aponta que pesquisas e estudos comparativos sugerem que o bullying varia de lugar para

lugar e que sofre influências culturais, dos próprios ambientes escolares e de fatores

socioeconômicos.

Calhau (2011) também contribui neste sentindo, colocando que vivemos em uma

sociedade extremamente individualista, onde o capitalismo acaba por transformar as pessoas

em objetos que querem cada vez mais possuir bens. Os valores ficam em segundo plano na

vida das pessoas, a figura do próximo fica de lado e muitos não pensam duas vezes em

passar por cima de qualquer um para atingir seus objetivos. Isto é visto em muitos lares, nas

novelas, no futebol, no trabalho, etc., cada um buscando apenas os seus interesses. E nesse

contexto social individualista, ganha destaque o bullying – pessoas são perseguidas no

ambiente escolar, no trabalho, pela internet.34

Não é preciso ir fundo na análise de tais condutas serem reproduzidas numa

sociedade capitalista como a nossa, onde o sucesso, a competição e o lucro são

fontes de desejos e obsessões de um número cada vez maior de pessoas. É comum

a expressão “o mundo é dos espertos”, que reflete um terreno propício para a

reprodução do bullying. (CALHAU, 2011, p. 49).

O autor explica, que na sociedade, lamentavelmente ser honesto, para alguns, é

sinônimo de fraqueza, porque o “mundo é dos espertos”, numa total deterioração dos

fundamentos éticos e morais que devem dirigir as ações das pessoas.35

O modismo impõe

que todos consumam cada vez mais, sem limites. As crianças e adolescentes, por exemplo,

precisam comprar objetos semelhantes e se vestir de forma similar e com produtos caros (de

marcas famosas) para se sentirem aceitos pelo grupo.36

34

“O bullying, nesse contexto, é um problema que, em não sendo controlado, propicia a ocorrência de

situações-problema e a sua posterior reprodução no meio social, de forma que a tolerância e o respeito sejam

abandonados em detrimento de uma linha de relação interpessoal, em que seja aplicada a exploração do mais

fraco pelo mais forte.” (CALHAU, 2011, p. 05). 35

“Os preconceitos e as práticas discriminatórias são as raízes mais comuns do bullying e do ciberbullying”.

(MALDONADO, 2011, p. 08). 36

“É um mundo de consumista, onde o ‘ter’ acaba para muitos sendo preponderante sobre o ‘ser’. Nesse

mundo capitalista e volátil, o jovem quer tudo e para ontem.” (ibid, p. 26).

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Tognetta (2005, p. 10) coloca que:

Sabemos que a boa imagem valorizada socialmente não é a da humildade, da

tolerância e sim aquela de coragem, virilidade, força, valentia. É de fato, a imagem

que os meios de comunicação sugerem e do herói que infelizmente, nossos

meninos e meninas podem hoje tomar para si.

Já segundo Oliveira (2010) um dos motivos para instalação do comportamento de

bullying pode ser a carência de modelos educativos, o que faz com que a criança e o

adolescente fiquem sem referencial que favoreça a formação de valores e minimize a

intolerância.

A ausência de modelos educativos humanistas, capazes de estimular e orientar o

comportamento da criança para a convivência social pacífica e para o seu

crescimento moral e espiritual, fatores indispensáveis ao bom processo

socioeducacional, que se torna promotor de auto superação na vida. A ausência

desses valores humanistas tem induzido o educando ao caminho da intolerância,

que se expressa pela não-aceitação das diferenças pessoais inerente a todos os

seres humanos. Dessa forma, o bullying começa frequentemente pela recusa de

aceitação de uma diferença, seja ela qual for, mas sempre notória e abrangente [...].

A constatação dessas diferenças faz surgir conflitos interpessoais de convivência, e

os métodos utilizados para solucioná-los são aqueles aprendidos nas vivências

experienciais no modelo educativo a que foi submetido, que é expresso pela

imposição de autoridade e pelo emprego de vários tipos de atitudes e linguagem

violenta para fazê-lo obedecer. (FANTE, 2005, p. 62-63).

O que é apontado também por Middelton-Moz e Zawadski (2007, p. 137), quando

colocam: “As crianças estão nos dizendo, com suas palavras e ações, que estão se sentindo

sós, com medo, desprotegidas e necessitando de modelos de referência que lhes ensinem

valores saudáveis e responsabilização por suas ações, em lugar de violência”. Segundo estas

autoras, a maioria de nossos comportamentos é guiado pelos padrões e pelas visões que

temos como exemplos em nossas famílias e comunidades. As normas (ou seja, as regras não

ditas) de nossas comunidades influenciam nossas ações e a forma como criamos nossos

filhos, e muitas vezes, é difícil encarar o fato de que as nossas crianças e adolescentes estão

refletindo o que lhes foi ensinado. Os valores baseados em “eu” e não em “nós”; “ignorar ou

punir”; “não delatar”; “você não é responsável se não for pego”; “é problema dele, e não

meu”, são alguns exemplos que podemos citar.

A respeito disso, Calhau complementa:

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65

Os adolescentes procuram captar nos adultos, nas entrelinhas da comunicação

cotidiana, os sinais que refletem o modo como são vistos e julgados, o que pode

ajudá-los a perceber e definir sua identidade em formação. (CALHAU, 2011, p.

05).

Segundo Piaget (1954) os valores referem-se a uma troca afetiva do sujeito com os

objetos, entendendo objeto como as coisas e as pessoas do mundo exterior. Sendo assim,

valores são construídos com base nas interações que o sujeito faz com a realidade. Eles não

são pré-determinados, nem simplesmente internalizados, mas são fruto das ações do sujeito

sobre o mundo em que ele vive. “[...] os valores e a moral são aprendidos e se internalizam

por meio de sua vivência aprendida” (TARDELI, 2009, p. 86). As crianças não nascem com

empatia, com capacidade de regular as emoções ou com limites carinhosos e claros a seu

comportamento. Elas aprendem essas lições por meio do “reflexo em espelhos” e da

internalização as emoções e dos comportamentos de seus cuidadores adultos.

A Psicologia Moral, conforme reflete La Taille (2002, p. 23) também defende que a

ausência de valores e a falta de regras pode ser a responsável pelas atitudes praticadas pelos

autores de bullying.

De fato, pode perfeitamente acontecer de uma pessoa ter orgulho de ser violenta

porque, entre os valores que fazem parte de suas representações de si, o ser

dominante, o ser fisicamente forte, o ser destemido são valores centrais. Também

pode acontecer de pessoas serem violentas porque, para elas, fazer uso

instrumental dos outros é condição para realizarem e manterem representações de

si como ser bem-sucedido, ser famoso, ter glória, etc. Nos dois casos, agir de

forma violenta não traz vergonha; pelo contrário, como dissemos, traz orgulho.

Vê-se que, nessa abordagem, a violência não é decorrência de falta de regras ou

ausência de projetos de vida: ela é decorrência dos valores presentes na construção

da identidade. (LA TAILLE, 2002, p. 23).

Estudos realizados por Fante e colaboradores também apontam que o bullying –

desrespeito entre os colegas – está diretamente relacionado aos modelos educativos a que as

crianças estão submetidas, principalmente na primeira infância (baseados na rejeição e em

castigos físicos – “práticas educativas” que incluem maus-tratos físicos e explosões

emocionais violentas) e, a ausência de valores humanistas norteadores de suas condutas

contribuem decisivamente para a irrupção do comportamento bullying na escola. A autora,

em suas pesquisas realizadas37

, encontrou como uma das respostas para a violência – o fator

familiar. A violência doméstica foi relatada por mais de 70% dos alunos entrevistados como

37

Fante (2005).

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66

fator decisivo para a reprodução da violência nas escolas, confirmando, assim, o papel

fundamental da família na formação das bases da personalidade das crianças.

Conforme Fante e Pedra:

O modelo educativo predominantemente introjetado pela criança na primeira

infância é determinante, tanto para a manifestação do comportamento agressivo

quanto para a produção de “perfis psicológicos” que favoreçam a sua expressão. A

história intrapsíquica de cada um, armazenada nos arquivos de memória, oriunda

das primeiras interações emocionais na psicodinâmica familiar, ao longo do seu

desenvolvimento, será decisiva na construção dos seus pensamentos, suas emoções

e seus comportamentos. (FANTE E PEDRA, 2008, p. 102-103).

Desta forma, pode-se dizer então, que uma criança (ou adolescente) exposto

constantemente a situações de maus-tratos e humilhações tem a tendência inconsciente de

reproduzir o modelo introjetado contra outras crianças ou adolescentes, ou seja, repetir o que

aprendem com seus familiares.

Middelton-Moz e Zawadski (2007, p. 58) trazem que as crianças e adolescentes se

tornam bullies como proteção contra a dor de traumas sofridos durante o desenvolvimento.

Sentem raiva e mágoa e frequentemente praticam o bullying da mesma forma com que o

sofreram. Fante e Pedra complementam:

[...] o praticante de bullying, em algum momento de sua vida, foi alvo de um

tirano, de um bully – talvez, de algum adulto, como pais, parentes, vizinhos,

professor ou algum colega de escola, que se aproveitou de sua fragilidade e

dificuldade de defesa para imputar-lhe sofrimentos. Portanto, o bullying acontece

dentro de um ciclo repetitivo de abusos e maus-tratos, duas faces da mesma moeda

em que o indivíduo aparece como vítima e agressor ao mesmo tempo. As crianças

não nascem praticando bullying. Algum fator no transcurso de seu

desenvolvimento colaborou para o surgimento desse tipo de comportamento.

(FANTE E PEDRA, 2008, p. 101).

Outro problema apontado por Calhau (2011), Silva (2010) e Fante e Pedra (2008) e

quem relação direta com o bullying escolar é o problema dos limites.38

A questão dos limites

é muito conhecida dentro das escolas. Falta de educação e respeito entre colegas e

professores tem se tornado cada vez mais comuns no sistema escolar.

Uma grande parcela de pais vem agindo de forma excessivamente tolerante com

seus filhos. Segundo Silva (2010, p. 61) são os pais do “deixa pra lá” ou que costumam

passar a mão na cabeça de seus filhos rebentos, diante de comportamentos transgressores.

38

“A falta de limites é uma das grandes causas de ocorrência do bullying.” (CALHAU, 2011, p. 28).

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67

São permissivos em excesso, cedem a praticamente a todas as vontades deles e toleram

quase tudo, o que faz com que as crianças e adolescentes não obedeçam suas orientações e

reprimendas. Esses pais, normalmente agem desta forma, sob a alegação de que não querem

ferir a autoestima dos filhos, para evitar desavenças e confusões familiares ou como forma

de compensar o período que estão distantes dos filhos por motivos profissionais. O resultado

disso, é que crianças e adolescentes se habituam a fazer tudo o que querem e impõem-se de

forma autoritária e opressora perante os pais.

Sobre os limites Calhau expõe:

É fundamental acreditar que dar limites aos filhos é iniciar o processo de

compreensão e apreensão do outro (atualmente, muitas pessoas acreditam que o

limite provoca necessariamente um trauma psicológico e em consequência,

acabam abrindo mão desse elemento fundamental na educação). Ninguém pode

respeitar seus semelhantes se não aprende quais são os seus limites – e isso inclui

compreender que nem sempre se pode fazer tudo que se deseja na vida. É

necessário que a criança interiorize a ideia de que poderá fazer muitas, milhares,

ou a maioria das coisas que deseja – mas nem tudo, nem sempre. Essa diferença

pode parecer sutil, mas é fundamental. (CALHAU, 2011, p. 26).

A ação educativa muito branda e permissiva está na essência dos problemas dos

jovens, conforme apontam muitos autores. Isso resulta diretamente na falta de respeito às

regras e no aumento do nível de transgressões. Segundo Fante e Pedra (2008, p. 102) assim

como a ausência de modelos positivos a educação permissiva colabora para que os jovens

“não aprendam a noção de limites de suas ações, que vivam de maneira irresponsável, que

sintam dificuldade em conter seus impulsos, negociar os conflitos, responsabilizar-se pelas

suas próprias ações, refletir sobre as consequências de seus próprios atos, respeitar o outro e

saber se colocar no lugar dele.”

A respeito disso Silva complementa:

Esses jovens habituam-se, desde muito cedo, a ser o centro das atenções em suas

casas, onde as regras foram inexistentes, ignoradas ou flexibilizadas em excesso.

De forma quase natural, eles se comportam em sociedade de acordo com esse

modelo doméstico. Muitos deles não se preocupam com as regras sociais, não

refletem sobre a necessidade delas no convívio coletivo e sequer se preocupam

com as consequências que seus atos transgressores podem ocasionar aos outros

[...]. (SILVA, 2010, p. 63).

Percebe-se que a renúncia dos pais aos seus papéis de educadores, delimitando de

forma clara as fronteiras entre o que se pode e o que não se pode fazer, traz consequências

sérias ao desenvolvimento dos filhos. “Resultam em filhos egocêntricos, sem qualquer

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noção de limites, totalmente despreparados para enfrentar os desafios e obstáculos inerentes

à própria vida” (ibid, p. 62).

Tognetta (2005, p. 13) fala que adultos que tudo permitem às crianças também são

causadores de graves problemas.

Impedem que estas experimentem as perdas necessárias, o luto por não terem tudo

o que querem, o sofrimento por uma consequência natural de seus atos. Quem

nunca sofreu uma perda, uma necessidade de esperar por algo que muito deseja,

também pode precisar fazer com que o outro experimente seu sofrimento,

causando-lhe bullying.

Conforme apresenta Calhau (2011, p. 27) os próprios alunos tem dificuldade de

diferenciar os limites entre brincadeiras e agressões verbais inocentes e os maus-tratos

violentos. Também não conseguem perceber uma escala de crescimento exponencial dessas

situações. Isso é facilmente percebido, quando em muitos casos, esses jovens se utilizam de

versões “sem coerência” para justificarem seus atos.

Avilés (2006) e Fante e Pedra (2008) apontam que fatores escolares e a forma como

os educadores lidam com os alunos também podem contribuir para o aparecimento do

bullying. Dentre os fatores destaca-se: metodologias não cooperativas, disciplinas

autoritárias, punitivas e inconsistentes, falta de normas estabelecidas de forma democrática,

falta de comunicação, clima de sala de aula perturbador ou caótico, falta de respeito e

confiança nas relações entre professores e alunos, se há ou não programas antibullying,

presença ou não de adultos acompanhando os recreios, entre outros.

Fante e Pedra apontam em que medida os educadores contribuem para o bullying:

A ausência de modelos positivos também é uma questão a ser considerada. Muitos

educadores ou cuidadores apresentam dificuldade em manter relações construtivas,

de comunicar-se de maneira assertiva e apropriada, de resolver seus conflitos com

paciência e bom-humor, respeitando o ambiente e as pessoas envolvidas. Alguns

oferecem modelos educativos inadequados, principalmente aqueles em que

imperam a violência, o autoritarismo, os maus exemplos, a excessiva proteção, a

permissividade, além de omissão, negligência e abandono. (FANTE E PEDRA,

2008, p. 102).

Já Lopes Neto (2011, p. 49) acrescenta outro fator: as “influências comunitárias,

como o alto índice de criminalidade e a banalização da violência pela mídia, filmes,

videogames etc., também podem influir sobre o comportamento dos escolares” incentivando

a prática de bullying.

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Minayo (1999, p. 142) chega à conclusão de que a “influência maior da mídia sobre

a violência social é no sentido de sua banalização." Ainda segundo a autora, os jovens de

todos os estratos consideram que a televisão e os jornais influenciam no aumento dos

conflitos da sociedade, na medida em que os veiculam de forma exagerada e incentivam os

comportamentos violentos. (ibid, p. 139).

Levando em conta a grande carga emocional dos personagens e tramas (filmes,

telenovelas, noticiários), estes podem acarretar forte impacto emocional em toda a

coletividade, influenciando comportamentos e o relacionamento das pessoas. Isto ainda se

mostra mais devastador nas crianças, que ainda não dispõem de parâmetros emocionais para

distinguir o real do fictício e acabam validando esses modelos como forma de identificação.

Para Fante e Pedra (2008, p. 104) a mídia pode influenciar negativamente o

comportamento de muitas pessoas, o que colabora com o surgimento do bullying. Um

exemplo disto é a estética estabelecida pela mídia, que cria um padrão de beleza excludente,

fazendo com os que não se adequam no padrão de beleza, como os que estão acima do peso,

sejam vistos como esquisitos e sejam excluídos pelos colegas.

Tognetta e Vinha (2008, p. 211) procurando aprofundar as reflexões sobre as causas

do bullying questionaram: por que mesmo tendo todas essas condições favoráveis a serem

personagens dessa problemática, por que nem todos os que são submetidos a essas

condições se tornam alvos ou autores de bullying?”

As autoras defendem que:

[...] não é o contexto que determina tais condutas agressivas, assim como não é a

genética a grande vilã dessa história, e sim como esses meninos e meninas se vêem

diante desse meio e constroem suas personalidades integrando tudo aquilo que

foram valorizando durante suas vidas, podendo, assim, tornarem-se resilientes.

Como se vêem e querem ser vistos, portanto, pode nos levar a explicar o porquê de

se comportarem como vítimas e agressores. (TONETTA e VINHA, 2008, p. 10).

Cabe destacar que a cultura, a sociedade, a família, a mídia, entre outros são fatores

que influenciam e potencializam o bullying, porém não explicam o fato de se destituir a

imagem positiva “de si” de quem não apresenta, por exemplo, o padrão de beleza ditado

(alto, magro, esbelto). As autoras colocam que o que pode configurar um alvo ou mesmo um

autor de bullying é se “ver com menos valor”. Ou seja, nem todos que não apresentam este

padrão ditado pela mídia serão alvos, e sim aqueles que não construíram por si um auto

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70

respeito39

(não tem consciência de seu valor) e se deixam desrespeitar pelos outros. Estas

pessoas carecem, conforme Tognetta e Vinha (2008) de “estima de si que os fortaleça o

bastante para não se tornarem alvos de provocações.”

Ainda conforme as autoras: “Somente aqueles cujas imagens de si empobrecidas

revigoram as características postas em evidência pelos autores de bullying são tomados

como vítimas.” (TOGNETTA E VINHA, 2010a). Ou seja, quem se torna alvo de bullying

concorda com aquela imagem que os outros fazem dele (essa é a imagem que têm de si) se

sentindo por isso menosprezado e sem forças para reagir aos escárnios a que são submetidos.

(TOGNETTA, 2010). Isto sim pode ser considerado um fator preponderante para o

surgimento do bullying, que nesta perspectiva pode ser considerado um problema moral.

Tognetta (2005, p. 09) coloca que o bullying é um problema anterior às relações

interpessoais:

[...] um problema ligado à constituição de “quem eu sou”, ou até mesmo de “quem

eu desejo ser”. Estamos nos referindo às representações de nós mesmos, ou das

imagens que se tem de si. Por certo, os estudos na Sociologia, na Antropologia, na

Psicologia Moral, e em todas as ciências que podem estudar o homem vão

assegurar fatores de ordem externa ao sujeito, como a sociedade em que vive e o

contexto cultural em que está inserido. A cultura em que se vive, os ídolos que se

tem são influências a serem consideradas. Por sua vez, onde serão equacionadas?

Exatamente na constituição da identidade do sujeito ou no que chamamos de

representações de si. [...] As imagens ou representações que o sujeito tem de si

mesmo podem leva-lo a dar-se menor ou maior valor; podem levar ao

conformismo, assim como fazer com que esse mesmo sujeito imponha sua força

para tornar o outro tão pequeno como vê a si mesmo.

Outra possível causa dos comportamentos agressivos, além das questões afetivas,

está ligada a razão, ou da tomada de consciência necessária a qualquer ação moral. De

acordo Tognetta (2005, p. 12), os autores de bullying não conseguem ter um “pensamento

reversível”, ou seja, eles não conseguem ir e vir no plano mental, se colocar no lugar do

outro, não têm consciência do resultado de suas ações e dos sentimentos do outro. Já o alvo

de bullying não prevê outra forma de resolver o problema, senão com o silêncio e a reclusão.

A falta de indignação40

contra injustiças cometidas a outrem também é tida como

uma das causas do bullying. A ausência de um sentimento de indignação que permita, por

39

Sobre o auto respeito Tognetta e Vinha (2009, p. 18) colocam: “Para se tornar auto respeito é preciso que a

autoestima ou a valorização de si próprio incida sobre os valores morais. Assim, pode-se afirmar que o auto

respeito é um caso particular de autoestima, visto que esta é regida pela moral: quando a pessoa vê valor em

suas ações generosas, justas, honestas (agir moralmente com o outro) e isso lhe causa um efeito positivo, ou

uma espécie de ‘ficar bem consigo mesma’ por ter agido bem.”

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exemplo, ao espectador das cenas de bullying assumir uma posição contrária às ações

injustas. Essa indignação é proveniente de um sensibilização ao outro, um preocupar-se com

o outro, com seus sentimentos. Tognetta e Vinha (2010a, p. 497colocam que “[...] onde há

pessoas que não se indignam com situações de injustiça vivenciadas por outrem, há uma

enorme propensão de se prosperarem problemas como o bullying.”

É possível perceber que uma gama muito grande de fatores – sejam eles afetivos,

culturais, sociais, familiares, escolares, grupais, sociais – podem influenciar o aparecimento

e a perpetuação de práticas de bullying. Porém, cabe ressaltar ainda, que mesmo que se

tenham todos esses fatores apontados acima, nem todos os que são submetidos a essas

condições (tanto na escola como na família) se tornarão alvos ou autores de bullying.

3.7 – CONSEQUÊNCIAS: QUAIS OS DANOS SOBRE OS ESTUDANTES?

O bullying traz consequências para os alvos, mas traz também para os autores e

espectadores. Suas implicações nos envolvidos, podem ser extremamente danosas a curto e a

longo prazo, sendo mais severas para os alvos. Conforme Maldonado (2011, p. 16) “em

inúmeros casos, o sofrimento provocado pelo bullying se prolonga por muitos anos após os

ataques, atingindo a autoestima, formando a raiz de sintomas e influenciando decisões nem

sempre saudáveis.” Fante acrescenta que o bullying pode causar “danos psicológicos

irreparáveis ao psiquismo (se não identificados e tratados), à personalidade, ao caráter e à

autoestima de suas vítimas, manifestando suas sequelas ao longo de toda a vida.” (FANTE,

2005, p. 15).

Avilés (2006) afirma que sofrer bullying de modo sistemático, exercê-lo

habitualmente ou observá-lo e acostumar-se com a sua ocorrência produz consequências

negativas para os sujeitos envolvidos no fenômeno. Nessa perspectiva, o bullying tem

consequências como a rejeição social, as perturbações psicológicas, a depressão e as ideais

de suicídio entre as vítimas, para os agressores a delinquência social e para as testemunhas

ou observadores a deformação moral.

Tognetta (2005) fala a respeito das consequências do bullying:

40

“A indignação refere-se essencialmente a um conteúdo moral que estaria em jogo: a justiça.” (TOGNETTA e

VINHA, 2009, p. 19).

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[...] para a vítima serão a falta de amigos, conceito de si deficiente, insegurança e

infelicidade. Quanto ao agressor, esses legitimam a violência como forma de obter

uma boa imagem de si e é assim que vão agir sempre, com violência. Permanecem

egocêntricos, não conseguem sair do seu próprio ponto de vista e são incapazes de

se colocar no ponto de vista do outro.

Pedra41

também fala sobre os prejuízos que o bullying pode acarretar:

O fenômeno bullying estimula a delinquência e induz a outras formas de violência

explícita, produzindo, em larga escala, cidadãos estressados, deprimidos, com

baixa autoestima, capacidade de auto aceitação e resistência à frustração, reduzida

capacidade de autoafirmação e de auto expressão, além de propiciar o

desenvolvimento de sintomatologias de estresse, de doenças psicossomáticas, de

transtornos mentais e de psicopatologias graves. Tem como agravante,

interferência drástica no processo de aprendizagem e de socialização, que estende

suas consequências para o resto da vida, podendo chegar a um desfecho trágico.

(FANTE, 2005, p. 09-10).

Os envolvidos em práticas de bullying sejam como autores, sejam como alvos ou

como espectadores, na maioria das vezes acabam por vir a ter problemas de aprendizagem e

de rendimento escolar.42

As consequências para os “alvos” são o desinteresse pela escola, o

déficit de concentração e aprendizagem, a queda do rendimento, a mudanças sucessivas de

escola, o absentismo e a evasão escolar. Para os “autores”, ocorre o distanciamento e a falta

de adaptação aos objetivos escolares, uma maior probabilidade de dificuldades nas relações

com os professores, suspensão, reprovação e abandono escolar. Já os “espectadores” – que

são a maioria dos alunos – podem sentir insegurança, ansiedade, medo e estresse,

comprometendo o seu processo socioeducacional.43

A respeito dos problemas acadêmicos apresentados como consequência das práticas

de bullying, segue a contribuição de alguns autores:

O bullying exerce impacto sobre a experiência escolar de crianças e adolescentes

em vários níveis: cria problemas com a adaptação e o vínculo com a escola,

prejudica a capacidade e o interesse de aprender e de cumprir tarefas, compromete

o processo de socialização, gera sentimento de medo, aumenta o absenteísmo e

pode favorecer a evasão escolar. (LOPES NETO, 2011, p. 83).

41

Pedra, José Augusto. Em prefácio da obra de Cleo Fante (2005), p. 9-10. 42

“Todas as crianças, sem exceção, são afetadas negativamente, passando a experimentar sentimentos de

ansiedade e medo.” (LOPES NETO, 2011, p. 83).

“Em todo o mundo milhões de estudantes deixam de comparecer às aulas por medo de sofrer bullying”.

(FANTE e PEDRA, 2008, p. 09). 43

“A maneira pela qual os estudantes se relacionam entre si e com seus professores é decisiva para o

desenvolvimento do processo sócio educacional.” (ibid.).

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O bullying interfere no processo de aprendizagem e no desenvolvimento cognitivo,

sensorial e emocional. Favorece o surgimento de um clima escolar de medo e

insegurança, tanto para aqueles que são alvos como para os que assistem calados

às mais variadas formas de ataques. O baixo nível de aproveitamento, a

dificuldade de integração social, o desenvolvimento ou agravamento das

síndromes de aprendizagem, os altos índices de reprovação e evasão escolar têm o

bullying como uma das suas causas. (FANTE e PEDRA, 2008, p. 10).

Sentimentos de descontentamento por estar na escola e queda do rendimento

escolar são os sinais mais precocemente percebidos. [...] Esse clima escolar

negativo para todos gera custos adicionais, decorrentes dos altos índices de

reprovação, do absenteísmo e do aumento de demanda para turmas especiais.

(LOPES NETO, 2011, p. 103).

O bullying traz uma série de prejuízos, que se refletem não apenas no processo de

aprendizagem e socialização, mas sobretudo, na saúde do indivíduo. Conforme Fante e

Pedra (2008, p.10) diariamente, milhares de estudantes em nosso país procuram atendimento

médico apresentando sintomas psicossomáticos – dores de cabeça e de estômago, febre,

diarreia, vômitos, alergias, taquicardia – transtornos do sono e do apetite, estresse,

depressão, além de inúmeras doenças, inclusive de ordem psiquiátrica. Ainda segundo os

autores, o bullying é responsável pelos altos índices de estresse e pelo rebaixamento da

resistência imunológica.

Com relação às diferentes e variadas consequências do bullying, Fante e Pedra

destacam:

[...] que o estresse é responsável por cerca de 80% das doenças da atualidade, pelo

rebaixamento da resistência imunológica e sintomas psicossomáticos

diversificados, principalmente próximos ao horário de ir à escola, como dores de

cabeça, tonturas, náuseas, ânsia de vômito, dor no estômago, diarreia, enurese,

sudorese, febre, taquicardia, tensão, dores musculares, excesso de sono ou insônia,

pesadelos, perda ou aumento do apetite, dores generalizadas, dentre outras. Podem

surgir doenças de causas psicossomáticas, como gastrite, úlcera, colite, bulimia,

anorexia, herpes, rinite, alergias, problemas respiratórios, obesidade e

comprometimento de órgãos e sistemas. (FANTE E PEDRA, 2008, p. 83).

Fante (2005, p. 81) destaca ainda, que o fenômeno bullying devido à quantidade e

intensidade de reações que vem causando aos envolvidos (danos físicos e emocionais),

passou a ser considerado como um problema de saúde pública, devendo ser reconhecido

pelos profissionais da saúde. “O bullying escolar é um importante problema de saúde

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pública, que atinge de 20% a 40% de estudantes e exige demandas crescentes de atenção e

intervenção.” (LOPES NETO, 2011, p. 25).44

Para os autores de bullying, as consequências mais prováveis apontadas são: crença

na força para solução dos problemas (a supervalorização da violência como forma de

obtenção de poder), o desenvolvimento de habilidades para futuras condutas delituosas

(caminho que pode conduzi-lo ao mundo do crime), dificuldades em respeitar a lei,

dificuldades na inserção social, dificuldades de autocontrole, comportamentos antissociais,

além da projeção de condutas violentas na vida adulta (no trabalho, no trânsito, na vida

familiar).45

Fante e Pedra (2008), Rolim (2010, p.38), Silva (2010), Lopes Neto (2011)

apontam que as práticas de bullying constituem um estágio inicial de um percurso que tende

a se desdobrar em práticas delituosas anos mais tarde. Isto é trazido também por outros

autores como Middelton-Moz e Zawadski (2007), Eyng (2011) e Teixeira (2011).

As consequências para os que praticam o bullying na escola são graves:

[...] os estudantes autores tendem a adotar comportamentos antissociais e

violentos, imediatos e tardios. Crianças e adolescentes autores frequentes de

bullying são mais propensos que outras à: aderirem ao consumo de álcool e

drogas; faltarem às aulas; evadirem-se da escola; apresentarem pouca empatia

(pouca preocupação com os sentimentos alheios); serem agressivos ou

manipuladores com irmãos, pais e outros, inclusive animais; envolvem-se em

brigas; danificarem ou roubarem bens de terceiros; aparecerem com dinheiro extra

ou com objetos de origem não revelada; apresentarem pensamentos suicidas ou

tentarem suicídio; portarem armas na escola; praticarem violência doméstica;

envolverem-se em atos criminosos. (LOPES NETO, 2011, p. 49-50)

Um dado importante levantado por Teixeira (2011, p. 57) é que o padrão agressivo

de comportamento demonstrado na escola tende a se repetir na faculdade, no ambiente de

trabalho, na família e na vida adulta de forma geral.

Já como consequência para os alvos de bullying destaca-se – além dos prejuízos

acadêmicos já citados – problemas no âmbito da saúde física e emocional, a baixa na

resistência imunológica e na autoestima, o stress, os sintomas psicossomáticos, transtornos

psicológicos, a depressão e o suicídio (sendo esta a consequência mais severa).

44

“Sofrer bullying pode ser um fator predisponente importante para a instalação e manutenção de diversos

sinais e sintomas clínicos. A identificação de algumas dessas queixas pode ser fator indicativo de maus-tratos

perpetrados por colegas, demonstrando a necessária atenção dos profissionais da saúde.” (LOPES NETO,

2011, p. 107). 45

“O praticante de bullying apresenta maior suscetibilidade ao envolvimento em gangues, brigas, tráfico, porte

ilegal de armas, abuso de álcool e de drogas. Tende a praticar a violência doméstica e o assédio moral em seu

local de trabalho, além de apresentar baixa resistência à frustração.” (FANTE E PEDRA, 2008, p.91).

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Conforme Fante e Pedra (2008, p. 10) muitas das vítimas de bullying podem

manifestar tendências suicidas ou mesmo dar cabo da própria vida. Outras tantas

reproduzem a vitimização contra terceiros ou integram-se às gangues com o intuito de

revide. Alguns, após não aguentarem mais tanto sofrimento e humilhações já

protagonizaram tragédias, com consequências lamentáveis.

Fante enfatiza que dependendo da intensidade do sofrimento vivido em

consequência do bullying, o alvo poderá desenvolver:

[...] reações intrapsíquicas, com sintomatologias de natureza psicossomática:

enurese, taquicardia, sudorese, insônia, cefaleia, dor epigástrica, bloqueio de

pensamentos e do raciocínio, ansiedade, estresse e depressão, pensamentos de

vingança e de suicídio, bem como reações extra psíquicas, expressas por

agressividade, impulsividade, hiperatividade e abuso de substâncias químicas.

(FANTE, 2005, p. 80).

A respeito da influência do bullying sobre a autoestima dos alvos, Maldonado

(2011, p. 37) expõe que: a autoestima – ou seja, a visão positiva de nós mesmos – é

construída no decorrer da vida, em grande parte pelo olhar de apreciação das pessoas

significativas para nós. Em períodos de grandes mudanças, em que aspectos novos de nós

mesmos se desenvolvem, nossa autoestima fica mais vulnerável. Como exemplos: o ingresso

na escola, quando crianças; e os primeiros “amores”, na adolescência.

A autora destaca:

As experiências bem-sucedidas e o reconhecimento do nosso valor ajudam a

construir uma boa autoestima; fracassos sucessivos, olhares críticos e impiedosos,

a perseguição implacável do bullying com mensagens que humilham,

ridicularizam, depreciam e com ações que excluem do convívio social podem

deixar marcas profundas em algumas pessoas, especialmente quando estão em

períodos de mudanças marcantes [...]. (MALDONADO, 2011, p. 37).

O bullying compromete também a socialização dos alvos (vítimas), que tendem a se

recolher e se isolar dos demais. A vitimização compromete sua autoestima e, desta forma,

elas acabam se fechando para novos relacionamentos, o que dificulta a integração social.

Tendem a apresentar dificuldades na vida sentimental, por não confiarem nos parceiros. No

trabalho podem apresentar dificuldades para falar em público, liderar, trabalhar em equipe,

insegurança, dificuldade na resolução de conflitos, tomada de decisões e iniciativas.

O bullying é marcado por atitudes hostis, que violam o direito à integridade física e

psicológica e à dignidade humana. Conforme resumem Fante e Pedra (2008, p. 09) “Ameaça

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o direito à educação, ao desenvolvimento, à saúde e à sobrevivência de muitas vítimas. As

vítimas se sentem indefesas, vulneráveis, com medo e vergonha, o que favorece o

rebaixamento de sua autoestima e a vitimização continuada e crônica.”

As consequências que atos de bullying geram nos espectadores ou testemunhas,

não são menos preocupantes que aos alvos e aos autores. Os espectadores se sentem

prejudicados nesse ambiente, temerosos de se tornarem as próximas vítimas; alguns acabam

se tornando agressores ou participando do grupo agressor.

A respeito das consequências para os espectadores Fante e Pedra trazem que:

Mesmo não sofrendo diretamente as agressões, muitos deles podem se sentir

inseguros, incomodados e mesmo traumatizados pelo sofrimento do outro. Alguns

espectadores reagem negativamente, uma vez que seu direito de aprender em um

ambiente seguro e solidário foi violado, o que pode influenciar seu progresso

acadêmico e social, além de prejudicar sua saúde física e emocional. (FANTE E

PEDRA, 2008, p. 94).

Avilés (2006) apresenta como possíveis implicações para os que convivem

habitualmente com situações de bullying: i) a crescente falta de sensibilidade frente ao

sofrimento dos outros – à medida que vão presenciando ações repetidas de maus-tratos entre

iguais, passando a considera-las como normais; ii) a incompreensão e certo sofrimento, em

função da gratuidade dos atos e por falta de justificativa de tais ações; iii) o sentimento de

indefesa diante dos ataques dos agressores, o que faz muitos alunos sentirem medo de se

tornarem os próximos alvos; iv) a ansiedade, tensão e sofrimento frente à crueldade das

agressões; v) o sentimento de culpa, por perceberem que tais ações são injustas e, no

entanto, não serem capazes de tomar alguma atitude para acabar com o problema.

Para muitos alunos, o ato de presenciar o bullying pode causar tensão, medo,

revolta. Porém, com o passar do tempo, as atitudes de intimidação e agressão adotadas pelos

autores de bullying, passam a fazer parte do cotidiano da escola, gerando certa acomodação

e psicoadaptação – os alunos acabam agindo como se isto fosse normal. Existem também os

espectadores, que se incomodam com a situação, porém sentem-se impotentes em ajudar os

alvos, já que temem se transformar na próxima vítima. 46

Os prejuízos na socialização também são evidenciados para os espectadores. O

medo de vir a ser um alvo de bullying faz com que muitos espectadores se inibam, se

46

“Muito delicada é a situação dos espectadores, pois estes também são tomados por sensações de

constrangimento e por emoções desagradáveis. Pior é quando desenvolvem a insensibilidade frente ao

sofrimento alheio, o que é muito comum.” (FANTE E PEDRA, 2008, p. 95).

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retraiam, para não serem notados, prejudicando sua participação nas aulas e atividades – o

que repercute no desenvolvimento de suas habilidades relacionais de fazer amigos e se

integrar aos grupos. Quando adultos podem apresentar retraimento, timidez, dificuldade para

falar em público e fazer amizades.

3.8 – BULLYING E INTERNATO

Não nos propomos aqui a aprofundar esse tema, mas sim oportunizar algumas

considerações sobre o assunto que possam auxiliar e contribuir para o desenvolvimento da

pesquisa, trazendo de forma sintetizada autores importantes que tratam do assunto internato

como instituições totais, buscando informações sobre o funcionamento destas instituições e

sua relação com a ocorrência de bullying.

O internato pode ser considerado uma instituição total, que conforme Goffman

(1987) é um local que concentra moradia, lazer, e a realização de algum tipo de atividade

formativa, educativa, correcional ou terapêutica, onde um grupo relativamente numeroso de

internados estão submetidos a uma equipe dirigente que gerencia a vida institucional.

Entender o termo “instituição total” é essencial para compreendermos o que ocorre nos

internatos, já que segundo o autor este regime de moradia escolar apresenta as características

deste tipo de instituição.

As instituições totais47

, “fechadas”, “muradas”, têm como característica o fato de

que “parte das obrigações do indivíduo é participar visivelmente, nos momentos adequados,

da atividade da organização, o que exige uma mobilização da atenção e de esforço muscular,

certa submissão do eu à atividade considerada”. (GOFFMAN, 1987, p. 150).

Ainda segundo o autor, uma disposição básica da sociedade moderna é que o

indivíduo tende a dormir, brincar e trabalhar em diferentes lugares, com diferentes

coparticipantes, sob diferentes autoridades e sem um plano racional geral. O aspecto central

das instituições totais pode ser descrito com a ruptura das barreiras que comumente separam

essas três esferas da vida. No internato todos os aspectos da vida são realizados no mesmo

local e sob uma única autoridade. Todas as atividades diárias do participante são realizadas

na companhia imediata de um grupo relativamente grande de outras pessoas, sendo que

47

Para Goffman, seu “fechamento”, o caráter total é simbolizado pela barreira à relação social com o mundo

externo e por proibições à saída que muitas vezes estão incluídas no esquema físico – por exemplo, portas

fechadas, paredes altas, arrame farpado, fossos, água, florestas ou pântanos. (GOFFMAN, 1987, p. 16).

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todos são tratados da mesma forma e obrigados a fazer as mesmas coisas em conjunto. Além

disso, todas as atividades são rigorosamente estabelecidas em horários e toda a sequência é

imposta de cima, por um sistema de regras formais explícitas e um grupo de funcionários,

sendo que as várias atividades obrigatórias são reunidas num plano racional único,

supostamente planejado para atender aos objetivos oficiais da instituição. (GOFFMAN,

1987).

O controle das necessidades humanas pela organização burocrática de grupos

completos de pessoas é o fato básico das instituições totais. Disso decorrem algumas

consequências importantes. Quando as pessoas se movimentam em conjuntos, podem ser

supervisionadas por um pessoal, cuja atividade principal não é orientação ou inspeção

periódica, mas sim de vigilância — fazer com que todos façam o que foi indicado como

exigido, sob condições em que a infração de uma pessoa tende a salientar-se diante da

obediência visível e constantemente examinada dos outros. Nas instituições totais, existe

uma divisão básica entre um grande grupo controlado, que podemos denominar o grupo dos

internados, e uma pequena equipe de supervisão.48

Estas instituições costumam ser geridas por uma enormidade de regulamentos,

regimentos ou normas e seus efeitos disciplinares. E as relações sociais autoritárias e

violentas que ocorrem nestes espaços podem ser promotoras de uma cultura instável,

conflitiva e explosiva.

Como membro da comunidade escolar, o estudante depende em grande medida do

que o colégio lhe proporcione quanto ao seu bem estar, alojamento, recreação,

saúde, etc. Ele também está bastante sujeito ao sistema de autoridade e controle

institucional (normas sobre a admissão, expulsão, regulamentos, aproveitamento

acadêmico e comunitário e condições de graduação). (BENELLI, 2002, p. 27).

Existe ainda outra situação bem importante a ser considerada. A ideia de entrar para

um colégio interno pode ser não apenas uma oportunidade ou escolha do aluno, mas ter sido

motivada pela pressão dos pais, professores, pares e outros. Os aspectos coercitivos da vida

no internato escolar, também podem ser mais massificantes e difíceis de enfrentar, gerando

revolta e insatisfação, conflitos e agressividade. As funções de reclusão podem não ser tão

48

Conforme Goffman (1987) a equipe dirigente muitas vezes vê os internados como amargos, reservados e não

merecedores de confiança; os internados muitas vezes veem os dirigentes como condescendentes, arbitrários e

mesquinhos. Os participantes da equipe dirigente tendem a sentir-se superiores e correios; os internados

tendem, pelo menos sob alguns aspectos, a sentir-se inferiores, fracos, censuráveis e culpados.

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proeminentes, mas mesmo assim alguns alunos podem sentir o colégio como um ambiente

carcerário e restritivo, ao qual foram entregues por seus pais. (BENELLI, 2002).

Diante de tudo isso, a vida no contexto institucional de uma instituição total tende a

se caracterizar por um alto grau de agressividade e inclusive, de violência (GOFFMAN,

1987). A violência pode ser representada por ações realizadas por indivíduos ou grupos, que

ocasionam danos físicos ou morais a si próprios ou a outros e que visam prejudicar o outro,

destruí-lo, constrangê-lo, humilhá-lo.

Para Goffman (1987, p. 148) sujeitos e instituições se produzem mutuamente,

numa completa implicação: as práticas institucionais produzem sujeitos como efeito dessas

práticas, que por sua vez são tomados como alvos de manutenção delas ou se organizam

como focos de resistência à ordem institucional. Sendo assim, os alunos reproduzem entre si

as mesmas relações de dominação e modelagem às quais estão submetidos pela equipe

dirigente. A proposição é de que se eles se tornam opressores, é porque são também

oprimidos, reproduzindo as relações sociais de dominação e submissão.

Ainda segundo o autor, os internados criam ajustamentos secundários, práticas que

não desafiam diretamente a equipe dirigente, mas lhes permitem obter satisfações proibidas

ou conseguir, por meios proibidos, as satisfações permitidas. Os internos “conhecem as

manhas” para usufruir de uma certa autonomia pessoal, reagindo às pressões ostensivas da

equipe dirigente. Poderíamos dizer que os internos criam controles sociais informais

utilizando a cooptação ou a coerção pela força e violência para evitar que delatores os

entreguem à equipe dirigente.

No internato escolar pode-se dizer que encontramos uma sociedade em miniatura.

Conforme Benelli (2002, p. 28) muitos fenômenos sociais podem ser ali apreciados: a

circulação da informação, o exercício da autoridade e seus efeitos disciplinares, as pressões,

os mecanismos adaptativos dos indivíduos, a tensão entre interesse geral e satisfação de

necessidades individuais; o conflito entre as necessidades do estabelecimento e a

preservação dos particularismos individuais e da espontaneidade criadora, as normas, os

códigos, as crenças, a linguagem comum, a hesitação entre a tolerância e o ostracismo em

relação aos desviantes (sobretudo sexuais) e às “panelinhas” que enfraquecem a unidade

coletiva, o antagonismo das personalidades dominantes, geralmente reforçados pelos grupos

correspondentes, as relações de forças oscilando nos eixos maioria-minoria-unanimidade, os

bodes expiatórios, os suspeitos, os heróis, os braços fortes, os subalternos, os delatores,

perseguidos e algozes.

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Percebe-se diante disso, que o internato – sendo uma instituição onde o

questionamento às normas nunca é bem-vindo por força da natureza de sua estrutura – é um

terreno fértil para as práticas de bullying. Além disso, muitas situações, comuns neste tipo

de ambiente, costumam gerar algum tipo de violência, como exemplo Benelli (2002, p. 28)

aponta questões relativas ao desempenho acadêmico, rivalidades, inveja, temores, medo do

fracasso, disputas, competição por reconhecimento, etc. E o autor coloca que quando

acontece algo que ataca a imagem do sujeito, a agressividade tende a surgir como uma

reação natural, sempre na tentativa de reconstruir essa autoimagem. (ibid, p. 20).

Do ponto de vista psicológico, a comunidade do internato escolar pode ser

estudada como um laboratório para outras experimentações: além da perspectiva

institucional, dos objetivos confessos, das tarefas cumpridas em comum, podemos

ver como o grupo, no contexto institucional, se configura no encontro de pessoas,

de sujeitos, como um local de confronto e de laços afetivos. As oposições e as a

afinidades de caráter florescem na comunidade. Os desejos individuais, sempre

presentes na surdina, esperam passivamente ou reclamam com violência sua

realização: apelo à ajuda, proteção, vontade de poder, exibicionismo, ataque que

denigre, curiosidade, rivalidade, admiração, idolatria. O narcisismo de cada um

nela experimenta doces vitórias e também feridas amargas: os outros são reduzidos

a objetos do meu desejo ou os narcisismos alheios me infligem feridas sem querer

(e às vezes, propositalmente), apenas por sua própria existência. (BENELLI, 2002,

p. 28-29).

O internato ainda produz e reproduz com muita frequência a prática de bullying

contra os alunos novos ou “novatos”49

, o que muito se identifica ao bullying militar (talvez a

mais fechada de todas as instituições totais).

Um tipo de bullying muito comum nos internatos (assim como no meio militar) é o

trote dados aos alunos “novos”, que ao chegarem a sua nova escola (sem conhecimento da

realidade), são surpreendidos por alunos mais “antigos”, com batismos (padrinhos),

colocação de apelidos, rituais muitas vezes violentos, que visam preparar o novato para ser

doutrinado pelos valores da instituição ou do grupo que já reside no internato.50

Na chegada,

o aluno novato é “batizado”, recebendo dos outros internos nomes com conotação negativa,

49

O novato chega ao estabelecimento com uma concepção de si mesmo que se tornou possível por algumas

disposições sociais estáveis no seu mundo doméstico. Ao entrar, é imediatamente despido do apoio dado por

tais disposições. Na linguagem exata de algumas de nossas mais antigas instituições totais, começa uma série

de rebaixamentos, degradações, humilhações e profanações do eu. O seu eu é sistematicamente, embora muitas

vezes não intencionalmente, mortificado. Começa a passar por algumas mudanças radicais em sua carreira

moral, uma carreira composta pelas progressivas mudanças que ocorrem nas crenças que têm a seu respeito e a

respeito dos outros que são significativos para ele. (GOFFMAN, 1987). 50

Conforme Calhau, “O meio militar ainda reproduz práticas de bullying com muita frequência, notadamente,

contra ‘novatos’, recrutas, conscritos, alunos de cursos especiais, cadetes, entre outros. São práticas muito

antigas, talvez seculares e não apenas brasileiras.” (CALHAU, 2011, p. 111).

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obscenos ou que apontem características físicas negativas, sendo que passam a ser alvos de

insultos e chacota por parte dos colegas.

Nas instituições com internato há costumeiramente a presença de “vítimas-

agressoras”, ou seja, alunos que sofreram bullying quando novatos e que, mais tarde, se

acham no “direito” de reproduzir as agressões contra os que estão chegando.

As vítimas-agressoras, ao sofrerem perseguições de seus colegas, acabam

posteriormente revidando os maus tratos sofridos em outros colegas considerados mais

frágeis que eles (círculo vicioso). Sendo assim, há um grande problema nessas situações,

pois elas contribuem para uma maior ocorrência de situações de bullying nas instituições.

3.9 – A ADOLESCÊNCIA, O GRUPO DE PARES E O BULLYING

A adolescência é o período compreendido entre a infância e a vida adulta. Seu

início é marcado pela puberdade – período de rápido crescimento físico e mudanças

fisiológicas que levam à maturidade sexual e se “finda” com a independência, realização

social do adulto.51

Segundo Pereira (2005, p. 01) a palavra adolescência deriva do

substantivo latino adollacentia, que significa crescer ou crescer em direção à maturidade.

A adolescência pode ser considerada então uma fase da vida compreendida entre a

dependência da infância e as responsabilidades da vida adulta. Sabe-se, porém, que se deve

levar em consideração a individualidade de cada ser, uma vez que estes possuem reações

diferentes, diante do mesmo estímulo.52

E que os critérios que poderiam definir a

adolescência são construídos pela cultura. Campos, (2005, p. 31) traz que para caracterizar a

adolescência somam-se os fatores biológicos específicos na faixa etária com as

determinantes socioculturais, advindas do ambiente onde o fenômeno da adolescência

ocorre. Jeammet; Corcos (2005, p. 34) complementam que a adolescência é um fenômeno

51

“Na sociedade moderna não há um critério único pelo qual o jovem possa saber que foi reconhecido como

adulto. Vários aspectos que caracterizam esse status como independência financeira dos pais, término dos

estudos e casamento, vêm sendo adiados para idades mais avançadas, alongando o período da adolescência.”

(PEREIRA, 2005, p. 07, grifo do autor).

Campos (2005, p. 15) aponta que segundo Erikson o processo adolescente está completo “somente quando o

indivíduo subordinou suas identificações infantis a uma nova espécie de identificação, conseguida na

socialização e na aprendizagem competitiva e entre seus pares.” 52

Conforme Campos (2010, p. 15-16) “A grande variação individual dificulta os esforços para a definição das

idades-limite.” E apesar da “atrativa simplicidade em definir o começo da adolescência como maturação

biológica sexual, tanto o critério de estabelecer-lhe um começo como um final é difícil de ser identificado.” A

autora porém estabelece que “para a maioria das pessoas jovens, estes eventos ocorrerão principalmente entre

as idades de 11 e 21 anos, que limitam a fase da adolescência.”

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natural e individual, mas cuja forma e resultado são sempre muito amplamente

condicionados pela cultura a que cada indivíduo pertence. Bock; Furtado; Teixeira (2002, p.

292) complementam colocando que os critérios que podem definir essa fase da adolescência

não fazem parte da constituição do indivíduo, mas são construídos pela cultura. Sobre a

construção cultural da adolescência Pereira (2005, p. 02) apresenta:

[...] conforme se tornaram mais complexas, as sociedades modernas

industrializadas foram criando um intervalo de aprendizagem entre a maturidade

biológica e a maturidade social, com um consequente retardamento na tomada das

responsabilidades adultas, intervalo que veio a constituir a adolescência tal como a

conhecemos. Neste sentido, os acontecimentos psicológicos da adolescência não

são necessariamente, em nossa sociedade, apenas um correlato natural das

mudanças físicas da puberdade, mas também uma construção cultural, produto da

complexidade das mudanças sociais.

Diante disso, pode-se dizer que a adolescência “é a fase caracterizada pela

aquisição de conhecimentos necessários para o ingresso do jovem no mundo do trabalho e

de conhecimentos e valores para que ele constitua sua própria família.” (BOCK;

FURTADO; TEIXEIRA, 2002, p. 294).

A adolescência pode ser caracterizada como uma fase especial no desenvolvimento

do ser humano, com dificuldades no estabelecimento de uma identidade – padrão de

comportamento e uma personalidade própria – de indefinições de papéis entre a infância e a

fase adulta. Eles não são mais crianças, mas ainda não são adultos. Bock; Furtado; Teixeira

(2002, p 291) colocam que a inquietação dos adolescentes gira em torno de “loucura e

liberdade ao lado de controle e responsabilidade. Uma vontade de ser criança e adulto ao

mesmo tempo.”

As transformações (principalmente físicas) são muito grandes num breve período

de tempo (o indivíduo entra na adolescência com a aparência física de uma criança e em

pouco tempo sua aparência é a de um adulto) e tais transformações implicam na cobrança e

na necessidade dos jovens assumirem um papel social diferente e saberem se comportar

como pessoas mais maduras (mudam os padrões para desempenho de tarefas e as normas de

comportamento). Por isso, conforme aponta Pereira (2005, p. 08) o tema central da

adolescência é a descoberta de si. “Os adolescentes devem aprender a conhecer um corpo

novo, com seus potenciais de emoções e de comportamentos, ajustando-os à sua

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autoimagem”. Esse é um período em que os adolescentes flutuam entre uma dependência e

uma independência extremas.53

Esses conflitos entre necessidades de autonomia e dependência podem acarretar

oscilações súbitas e imprevisíveis nas atitudes e nos comportamentos. O

adolescente pode ser surpreendentemente maduro, independente e responsável

num momento, e infantil e pouco confiável em outro. (PEREIRA, 2005, p. 97-98).

A adolescência propicia uma crise psicológica ou de identidade, ou seja, os jovens

não sabem o que são e o que querem ser e é aí que entram as relações interpessoais que o

ajudarão a decidir, pois é no grupo de amigos que ele vê a sua identidade.

O desenvolvimento de um senso da própria identidade é uma tarefa indispensável

na adolescência. Para que possa abandonar com êxito a segurança da dependência infantil, o

adolescente deve ter alguma noção de quem é, para onde está indo e quais são as

possibilidades de chegar lá.

Segundo Erikson (1968, apud PEREIRA, 2005, p. 09):

Os jovens devem tornar-se pessoas totais por seu próprio esforço, e isto durante

um estágio de desenvolvimento caracterizado por uma diversidade de mudanças

no crescimento físico, maturação genital e consciência social. Eu denominei

sentido de identidade interior à totalidade a ser alcançada neste estágio. A fim de

experimentar a totalidade, o jovem deve sentir uma continuidade progressiva entre

aquilo que ele vem sendo durante os longos anos da infância e o que percebe que

os outros veem nele e esperam dele. Individualmente falando, a identidade inclui a

soma de todas as identificações daqueles primeiros anos quando a criança queria

ser, e frequentemente era forçada a tornar-se aquilo que as pessoas de quem

dependia queriam que ela fosse. A identidade é um produto único, que encontra

agora uma crise a ser resolvida apenas através de novas identificações com os

companheiros de mesma idade e com figuras líderes, fora da família.

Por isso, a formação de grupos na adolescência tem funções primordiais para o

desenvolvimento de seus membros. A convivência no grupo de iguais é extremamente

importante para o desenvolvimento psicológico dos adolescentes, já que os iguais

desempenham papel relevante no desenvolvimento da sua identidade.

Segundo Santrock (2003), na fase da adolescência, o fator mais importante é a

forma como são percebidos pelos pares. A aparência passa a ser muito valorizada na

adolescência, uma vez que a opinião do outro torna-se elemento fundamental para a

53

“Durante a adolescência, a dependência continua a existir, quase sempre numa relação assimétrica, difícil e

frágil com a necessidade de independência. O adolescente necessita de uma base de segurança e estabilidade

no lar e nos pais, enquanto se dedica a interesses mais prementes.” (PEREIRA, 2005, p. 96).

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interação. Por isso, muitas vezes, as mudanças físicas que ocorrem na adolescência servem

como alvo para o bullying.

O grupo tem um papel regulador que funciona como um espelho refletindo as

características comuns e aumentando a segurança. Ao mesmo tempo, evidencia as

diferenças e particularidades que contribuirão para o autoconhecimento e para a

formação da identidade. (PEREIRA, 2005, p. 42).

Diversos adolescentes submetem-se a diferentes situações para serem aceitos em

um determinado grupo, pois não participar de um grupo nesta fase da vida significa viver

fora do universo. Segundo Zagury (2000, p. 25) os adolescentes “[...] Temem não serem

aceitos e valorizados pelos amigos e, portanto, procuram agir de acordo com o que faz a

maioria.” Um relacionamento positivo com pares tende a favorecer um ajustamento social

positivo, evidenciando o companheirismo, a estimulação, a comparação social e

intimidade/afeição. Já a não aceitação pelo grupo, a insatisfação e a formação da

autoimagem negativa geram dificuldades relacionais e problemas emocionais para o

adolescente. Por isso, ser alvo de bullying nesta fase em que as relações interpessoais são tão

importantes para seu crescimento pessoal e entrada no mundo adulto, pode trazer graves

consequências ao adolescente.

Devido ao fato de os companheiros exercerem papel tão importante na vida da

maioria dos adolescentes, a aceitação social é provavelmente um dos maiores

problemas para a maioria dos jovens. Poucos adolescentes – ou adultos – são

imunes aos efeitos da indiferença ou da rejeição social. [...] Os jovens na sua

maioria, avaliam o próprio valor baseados na forma como os outros reagem a eles

e permanecem, assim, dependentes da aprovação e do reconhecimento dos

companheiros. (PEREIRA, 2005, p. 104).

Os adolescentes esperam com sua participação em um grupo uma experiência que

promova bem estar e emoções, satisfação de pertença e companheirismo, esperam também

recompensas materiais ou psicológicas. Há uma constante troca de informações, onde os

grupos satisfazem as necessidades pessoais dos adolescentes, proporcionam informações,

elevam a autoestima e conferem uma identidade em resposta à questionamentos dos

adolescentes referentes a questões vivenciais tais como, relacionamento, sexualidade,

namoro e outros. O fato de pertencerem a um grupo concede-lhes uma referência de

identidade, como por exemplo: os inteligentes, os bagunceiros, os descolados, os rebeldes ou

bad boys, os atletas, as patricinhas. Em síntese o adolescente está à procura do “eu” nos

outros, na expectativa de obter uma identidade para si.

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[...] Há um processo de superidentificação em massa, onde todos se identificam

com cada um. Ás vezes, o processo é tão intenso que a separação do grupo parece

quase impossível e o indivíduo pertence mais ao grupo que de coetâneos do que do

que ao grupo familiar. Não se pode separar da turma nem de seus caprichos ou

modas. Por isso, inclina-se às regras do grupo, em relação a modas, vestimentas,

costumes, preferências de todos os tipos, etc. (ABERASTURY; KNOBEL, 1992,

p. 36).

Pode-se dizer que conjuntamente ao desenvolvimento físico do adolescente

ocorrem modificações também a nível social. O grupo de amigos aumenta muito em

importância e a tendência a imitação acentua-se, seja na forma de agir, de vestir, de falar,

tudo tende a ser muito influenciado pelo grupo. “A grande importância do grupo de

companheiros durante a adolescência manifesta-se no fenômeno da conformidade ao

grupo, a necessidade de se adequar aos padrões, comportamentos, manias e modismos do

grupo.” (PEREIRA, 2005, p. 101, grifo do autor).

A conformidade ao grupo é uma característica comum dos adolescentes e pode ser

considerada negativa ou positiva. É positiva quando através da convivência com os pares é

acordado um relacionamento saudável, desenvolvendo hábitos e práticas de atividades

altruístas. É negativa quando, por exemplo, adotam comportamentos de desrespeito aos

professores e pais, maus-tratos com os colegas (bullying), roubam, adotam práticas de

vandalismo, etc. Ou seja, todas as relações estabelecidas pelos adolescentes, sejam elas no

contexto familiar, escolar ou social, estão implicados na construção de sua identidade,

fazendo com que esta seja afetada de forma positiva ou negativa diante das convivências que

os jovens têm com seu circuito de relações.

Se na infância os modelos identificatórios são a família, na adolescência estes

passam a ser os amigos, o grupos de iguais, os colegas de escola, os ídolos. Pereira (2005, p.

96) coloca que na medida em que vai atingindo a maturidade emocional, social e sexual, o

jovem passa, gradualmente, a “transferir para os colegas, para os ‘melhores amigos’, para os

namorados e namoradas vínculos mais afetivos que eram anteriormente reservados quase

que exclusivamente aos próprios pais.”

Diante disso, alguns pais podem até ficar magoados e desnorteados ao verificarem

que o filho prefere ficar na casa de um amigo e que idealiza o convívio daquela família; ou

muitas vezes prefere permanecer junto de amigos ao invés de sair em um passeio na

companhia deles. O adolescente com frequência verbaliza suas preferências em desacordo

com os hábitos e costumes dos pais. E nesse ensaio de separação dos pais volta-se para os

companheiros.

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[...] a adolescência é um tempo de grandes transformações, tanto fisiológicas,

quanto psicológicas. Em função disso, é um período de dificuldades e conflitos

familiares. Os pais, muitas vezes, se mostram confusos e irritados com a conduta

de seus filhos nessa fase de transição. Aquelas crianças que antes acatavam suas

opiniões e diretrizes passam a questionar e, frequentemente, a se rebelar contra os

valores paternos. [...] Nesse processo, o idealismo infantil dirigido aos pais vai se

diluindo e estes deixam de ser pessoas perfeitas para serem aceitos como seres

humanos com defeitos e qualidades. (PEREIRA, 2005, p. 95).

Com certeza, é bastante difícil para os pais a troca do papel de proteção e defesa

pelo de orientação e confiança, estimulando responsabilidades crescentes, na medida em que

o amadurecimento se processa, mas essa é uma das suas grandes tarefas nessa fase da

adolescência dos filhos.

O adolescer promove mudanças no relacionamento familiar e é nesse momento de

distanciamento da família e aproximação do grupo social, que o adolescente fica mais

suscetível a prática do bullying, pois está depositando seu interesse e atenção

preferencialmente em seus amigos e colegas. Sendo um momento crítico na formação da

identidade do indivíduo, a ocorrência deste tipo de violência pode influenciar profundamente

na estruturação desta.

Campos (2010, p. 65, grifo do autor) coloca:

[...] é fácil supor os problemas emocionais enfrentados pelo adolescente para

desempenhar seu papel de cidadão, pai, profissional, filho maduro e independente.

Libertar-se dos laços afetivos e de dependência da família, para ingressar em

outros grupos, constitui fonte de grandes apreensões, por que a certeza da

segurança e apoio encontrados no lar vai ser abalada pela insegurança da

integração em outros grupos, onde ele precisa conquistar seu status.

Outra questão a destacar é a escola. Ela tem um significado primordial para o

adolescente. Conforme o ambiente que ele vivencia, terá um aprendizado mais prazeroso ou

mais propício ou distúrbios de conduta e/ou aprendizagem.

[...] é no ambiente escolar, onde passa a maior parte de seu tempo, que o

adolescente está à caça de um ‘grupo de iguais’ para se auto afirmar como

indivíduo e tornar-se mais independente da família, mesmo que ainda precise

muito dela. Por isso há grande frustração quando é rejeitado por grupos ou pessoas

específicas (OLIVEIRA; ANTONIO, 2006, p. 4).

Geralmente quando os jovens são mais suscetíveis ou vulneráveis às agressões

verbais ou morais que lhes causam angústia e dor, principalmente quando ocorrido em

ambiente escolar, essas se traduzem como uma forma de exclusão social (OLIVEIRA;

ANTONIO, 2006).

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87

Excluir as pessoas por suas características estarem em desarmonia com o aceitável

pela maioria (pode ser objeto de chacota pelos colegas, por exemplo) ou o simples uso do

poder com essa finalidade leva-nos a fazer uma ponte com a marca da sociedade

contemporânea que é o individualismo. A prática do bullying, reforçando a exclusão, reforça

também um pensamento no qual a convivência em grupos de iguais já não mais atende a um

sentido primeiro.

O bullying faz com que as pessoas se concentrem apenas em satisfazer as

necessidades pessoais. Um jovem que pratica o bullying usa dessa forma de intimidação

para adquirir uma identidade diante dos demais, enquanto o que é alvo adquire uma

identidade rotulada. Entretanto, em ambos os casos, a construção dessa identidade é afetada

de maneira negativa num momento em que o adolescente passa por uma crise. O bullying

não afeta apenas o alvo, mas sim todos os envolvidos, sejam eles autores, alvos ou

espectadores.

E o pior é que tais traumas não cessarão ao término da escolaridade e poderão se

estender pela vida inteira, podendo gerar sentimentos e atitudes como: vingança,

agressividade, impulsividade, hiperatividade, inadequação, exclusão, ansiedade, depressão,

estresse, vergonha, medo, timidez, confusão, vulnerabilidade, além do que podem haver

bloqueios do pensamento e raciocínio.

Quando o adolescente passa por essa etapa de desenvolvimento sendo alvo de

bullying ele poderá levar à vida adulta alguns afetos relacionados ao período que irão refletir

em sua vida social.

Ao se tornar adulto, o alvo de bullying poderá ter dificuldades de relacionamento,

depressão, comportamento agressivo e abuso de substâncias químicas. Muitas vezes

reproduzirá os comportamentos que aprendeu na escola. Trazendo consequências também

para sua carreira profissional, sofrendo ou praticando o bullying no trabalho (mobbing),

tendo dificuldade de se expressar em público ou assumir cargos de liderança. Poderão

também apresentar dificuldades em constituir uma família e ter uma vida social, pois

buscarão o isolamento. (FANTE, 2005).

Os demais envolvidos – autor e espectador – também poderão apresentar

dificuldades nos relacionamentos na vida adulta. O autor carregará em sua identidade vários

traços adquiridos devido à sua prática. Ele internaliza a supervalorização da violência como

forma de obter poder e controle, o que no futuro, poderá conduzi-lo a condutas delituosas,

uso de drogas, porte ilegal de armas, tendo a crença de que deve sempre levar vantagem em

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tudo. Ele pode também se tornar agressivo na vida doméstica e no trabalho, tendo

dificuldades com as relações interpessoais. Já os espectadores poderão sofrer de

insegurança, ansiedade e medo nas relações que irão estabelecer.

Diante de todo o exposto, podemos entender então como a adolescência é uma

época da vida campeã em fragilidade de autoestima. As possíveis consequências do

bullying, em especial nessa fase, precisam ser consideradas de modo a evitar que os

adolescentes que praticam e sofrem com ele entrem no mundo adulto comprometidos com

vestígios do período no qual se deparam com esse tipo de violência.

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4 A DINÂMICA DO FENÔMENO BULLYING NO IFC – CAMPUS CONCÓRDIA:

A PARTIR DA COMPREENSÃO DOS ALUNOS.

Este capítulo apresenta a descrição e a análise dos dados obtidos a partir das

respostas dos sujeitos pesquisados em relação às questões que compuseram os instrumentos

de coleta de dados, a fim de compreender-se a dinâmica do fenômeno bullying no IFC-

Campus Concórdia.

Com a presente pesquisa buscou-se investigar a dinâmica do fenômeno bullying,

dos sujeitos envolvidos e dos aspectos motivadores implicados na incidência de episódios de

desrespeito e violência no Instituto Federal Catarinense – Campus Concórdia. Sendo assim,

procurou-se identificar o entendimento dos alunos que estudam na instituição a respeito do

fenômeno bullying, dos sujeitos envolvidos, suas diferentes manifestações, causas,

consequências e espaços em que se manifesta com maior frequência. Buscou-se também

entender como os alunos estão percebendo a violência e o desrespeito entre os pares e os

sentidos atribuídos por estes aos episódios deste fenômeno.

Para coletar as informações necessárias a este estudo utilizou-se duas etapas

complementares. Na primeira etapa aplicou-se um questionário para os alunos e para a

segunda etapa utilizou-se entrevistas, visando à obtenção de dados a partir da manifestação

dos sujeitos. Vale destacar, que para a análise dos dados utilizou-se as respostas do

questionário (1ª etapa) de forma articulada com as respostas obtidas na entrevista (2ª etapa).

O Questionário, contendo 25 questões (sendo uma das questões abertas), tinha a

finalidade de diagnóstico. Através deste buscou-se desvelar os entendimento dos alunos

sobre o bullying. Foi realizada inicialmente a aplicação do questionário piloto a uma turma

de 30 alunos – que se mostraram favoráveis a contribuir para a pesquisa. Após isto, poucos

ajustes foram feitos, apenas com relação a alguns termos utilizados. (cf. Apêndice A).

Após a fase de aplicação do questionário piloto e de sua revisão iniciou-se o difícil

processo de recolhimento dos TCLE (cf. Anexo A), buscando-se um número significativo de

alunos interessados em participar da pesquisa. Todos os pesquisados foram consultados e

receberam um Termo de Consentimento Livre Esclarecido detalhando os objetivos da

pesquisa, os procedimentos utilizados para a coleta dos dados e solicitando a autorização dos

pais e/ou responsáveis. Após várias e incansáveis tentativas na escola, esquecimentos e

perda dos termos por parte dos alunos, conseguiu-se compor a amostra. Além do TCLE

todos os participantes receberam e assinaram o Termo de Assentimento. (cf. Anexo B). O

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projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa CEP/UNOESC, com

parecer consubstanciado de número: 160.785 de 28/11/2012. (cf. Anexo C).

Cabe ressaltar, que a recepção e a aceitação dos alunos ao trabalho de pesquisa foi

positivo, não houve dificuldade em nenhuma fase da coleta de dados, todos os participantes

aceitaram prontamente responder ao questionário e também a entrevista. Inclusive muitos

alunos comentaram sobre a importância de se abordar um assunto tão importante dentro da

escola. Um exemplo disso foi o comentário de uma aluna participante: “Eu estava

esperando alguma coisa, alguma oportunidade prá eu poder falar sobre isso... falar sobre o

que aconteceu comigo...” (Aluno 2).

Diante disso, percebe-se a grande necessidade de ouvir os alunos, dar espaço para

que eles possam expressar seus sentimentos, suas angústias. Enquanto pesquisador conhecer

as concepções dos alunos sobre os episódios de violência e maus-tratos entre pares foi muito

valioso e resultou numa fonte muito rica de dados para análise, principalmente quando

sabemos o quanto é difícil para os envolvidos em casos de bullying falar sobre o que lhes

está acontecendo.54

Os Questionários foram aplicados coletivamente nas turmas, aos alunos que

devolveram os TCLEs com a autorização dos pais e/ou responsáveis, no período de

25/03/2013 a 05/04/2013. Os participantes após serem informados dos objetivos da pesquisa

responderam voluntariamente e anonimamente o questionário, em horário de aula, com

prévia autorização dos professores. Após a tabulação dos dados obtidos nos questionários e a

confecção das situações-problemas, procedeu-se à seleção dos alunos para a segunda etapa

da coleta de dados. Estes foram selecionados aleatoriamente e por disponibilidade

(independente das respostas obtidas na primeira etapa), sendo que buscou-se manter a

representatividades de alunos de todas as séries, de ambos os cursos, de sexos e idades

diferentes (dentre os que haviam respondido o questionário). As entrevistas foram realizadas

no período de 22/04/2013 a 08/05/2013, sendo que todas foram gravadas e posteriormente

transcritas pelo pesquisador.

As Entrevistas tendo como base o método clínico piagetiano combinado ao uso de

situações-problemas – tinha a finalidade de coletar dados significativos e complementares a

pesquisa e que pudessem ajudar a responder como os alunos estão percebendo o bullying e

quais os significados e sentidos eles atribuem aos episódios deste fenômeno. As discussões

54

Fante (2005, p. 51) disse: “[...] valorizem os sentimentos que as vítimas expressam e entendam que para elas

é muito difícil falar sobre o que lhes está ocorrendo!”

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feitas se referem aos dados encontrados a partir da exposição aos participantes da pesquisa

de quatro situações-problemas (baseadas na vida real) que foram desenvolvidos para essa

análise. Foram apresentadas as situações problema aos alunos entrevistados e após cada

uma, foi efetuada uma sequência de perguntas aos mesmos. (cf. Apêndice B). Desta segunda

etapa (entrevistas) participaram 5% dos alunos que responderam ao questionário, num total

de 10 alunos.

Através das reações dos entrevistados, percebeu-se vários tipos de posturas diante

das perguntas. Quase todos, de certa maneira, vivenciaram ou conheciam indivíduos

envolvidos com a problemática do bullying. Como já ressaltado, muitos encararam a

entrevista como uma forma de desabafo. Grande parte dos participantes se mostraram

ansiosos, com algum tique nervoso, gagueira, choro e até mesmo silenciando-se quando a

pergunta o deixava reflexivo, conforme seu envolvimento na ocorrência dos eventos de

bullying.

Com relação à composição da amostra, o gráfico 1 apresenta o número de alunos

que responderam ao questionário de pesquisa, distribuídos por série, assim como, a

quantidade por gênero. No total, participaram da pesquisa 209 alunos, de nove turmas

diferentes, assim distribuídos: 106 alunos eram da 1ª série; 32 alunos eram da 2ª série e 71

alunos eram da 3ª série. Quanto ao gênero 129 participantes eram do sexo masculino,

enquanto 80 eram do sexo feminino. Houve um predomínio do sexo masculino (61,7%)

sobre o sexo feminino (38,3%). Essa diferença entre gêneros se justifica pelo fato de que na

escola também há um predomínio de alunos do sexo masculino, principalmente os do Curso

de Técnico em Agropecuária integrado ao Ensino Médio.

Gráfico 1 – Gênero e número de participantes por série

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

0

20

40

60

80

100

120

Total Masculino Feminino

106

69

37 32 25

7

71

35 36

1ª série

2ª série

3ª série

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Com relação à faixa etária, os participantes da pesquisa possuíam de 14 a 18 anos,

sendo que a idade média da população avaliada foi de 15,3 anos, conforme aponta o gráfico

a seguir:

Gráfico 2 – Idade dos participantes

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Para apresentação dos resultados desta pesquisa, os dados coletados por meio dos

questionários foram organizados em gráficos e tabelas e as entrevistas foram transcritas

literalmente em algumas de suas partes.

A fim de preservar a identidade dos sujeitos da pesquisa, sempre que necessário,

quando reportado às suas falas, os mesmos serão identificados da seguinte forma: Aluno 1,

Aluno 2 e assim consecutivamente.

A descrição e a análise dos dados foi organizada em dois blocos: o primeiro refere-

se à caracterização do bullying no IFC- Campus Concórdia; o segundo versa sobre a

percepção dos alunos sobre a violência e o desrespeito na instituição de ensino: sentidos

atribuídos por estes aos episódios de bullying.

Na sequência apresenta-se a exposição e análise dos dados obtidos com os sujeitos

da pesquisa.

76; 37%

40; 19%

52; 25%

34; 16%

7; 3%

14 anos

15 anos

16 anos

17 anos

18 anos

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4.1 – CARACTERIZANDO O BULLYING NO IFC-CAMPUS CONCÓRDIA

Neste capítulo analisaremos as respostas dos alunos ao questionário aplicado na

primeira etapa da pesquisa, de forma articulada com as respostas obtidas na entrevista –

segunda etapa da pesquisa – e a literatura sobre o tema Bullying. Assim, priorizaremos para

a análise os seguintes temas:

- a identificação da violência na escola;

- as formas de violência existentes na escola;

- os espaços onde o bullying se manifesta;

- os sujeitos envolvidos;

- os aspectos motivadores.

4.1.1 – Identificação da Violência na escola

Quando se deseja realizar uma análise da violência dentro da escola é necessário

direcionar um olhar para além de manifestações individuais, compreendendo-a como a

expressão de um coletivo situado em um determinado contexto histórico e social. Sendo

assim, a violência é tida como uma relação, e como tal, não pode ser analisada fora do

ambiente no qual ocorre.

A violência escolar foi definida por Abramovay e Rua (2004, p. 29) como

abrangendo todos os atos praticados no interior da escola que atingem o indivíduo em suas

diversas dimensões – física, moral e pública. Ela pode se configurar como indisciplina,

delinquência, problemas na relação professor-aluno ou mesmo aluno-aluno, entre outros.

Nota-se, a partir desta denominação, que quando se faz referência a violência escolar, não se

está falando apenas de violência física, mas todo tipo de violência: seja ela física, simbólica,

incivilidades, todas com consequências muito graves.

Pode-se dizer que, na grande maioria das vezes, a violência que envolve crianças e

adolescentes, não é denunciada. A violência pode ser velada, sutil, mas não menos

traumática aos envolvidos. Brigas, ofensas, intimidações, chantagens, comentários

maldosos, apelidos, repressão, agressões físicas e psicológicas, são tipos de violência

associados à infância e adolescência, e normalmente considerados como “brincadeiras”.

Porém, estudos indicam que “brincadeiras de mau gosto” podem gerar consequências sérias,

incluindo-se casos de suicídio, baixa autoestima e novas fontes de violência.

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Visando compreender se os alunos percebem situações de conflitos e violência na

sua escola, perguntamos: Você identifica conflitos/violência na sua escola? O gráfico 3,

indica as respostas dos alunos participantes com relação a existência de conflitos/violência

na escola.

Gráfico 3 – Conflitos e violência na escola

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Ao analisar os resultados, percebe-se que 67% dos alunos dizem identificar

situações de conflitos e violência na escola, enquanto 33% dizem não identificar.

Conforme Abramovay (2009, p. 99), a escola é:

[...] um espaço onde as pessoas se encontram em busca de objetivos comuns como

conhecimento e novas amizades. É também um local onde indivíduos são

obrigados a conviver todos os dias, obedecendo a horários e normas. Essa

convivência diária é, também, responsável por indisposições e conflitos.

Cabe mencionar a hipótese, de que a não indicação ou a negação da presença de

conflitos ou violência no ambiente escolar – por parte deste grupo dos 33% – pode revelar o

desconhecimento, um possível silenciamento ou mesmo, uma indiferença diante das

manifestações de desrespeito, violência e bullying na escola. Cabe destacar também, que o

que o é caracterizado como um ato violento para uma pessoa, pode ser observado por outra

como natural, pois as interações sociais auxiliam na construção de diferentes subjetividades

e representações sobre os acontecimentos do cotidiano, que correspondem, também, a

determinado tempo. Por outro lado, a confirmação da existência de violência por 67% dos

participantes é bastante expressivo.

A violência se exerce no marco da organização social, em suas instituições e

agrupamentos. Nesse sentido, há violência na instituição escolar quando, em seu

interior, algumas pessoas são acossadas, maltratadas ou socialmente excluída,

física, psicologicamente ou moralmente (ORTEGA, 2003, p.83).

139; 67%

70; 33%

Sim

Não

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Para muitos alunos, o ato de presenciar conflitos e violência na escola pode causar,

a princípio, tensão, medo, revolta e inconformismo. Porém, com o passar do tempo, as

atitudes de violência (intimidação, agressão e opressão), passam a fazer parte do cotidiano

da escola, gerando certa acomodação e psicoadaptação – os alunos acabam agindo como se

isto fosse normal.

Sobre o fato de considerar atos de violência como normais dentro da escola um

aluno manifesta:

Porque se você é criado de um jeito e você sofre ou fica muito feliz, essas coisas te

marcam, é como a convivência em casa: por exemplo, se você for criado desde

pequeno aprendendo que é certo bater em mulher, você vai acabar achando isso

certo, mesmo alguém te dizendo que não. Aqui, tipo os formados, eles fazem com

nós como era no 1º ano deles, aqui eles foram “criados”, criados desse jeito. Ai,

eles foram criados assim, na ideologia deles (dos formandos deles), eles mandam

em nós, oprimem a gente, porque os formandos mandavam neles, faziam assim

com eles. E assim vai indo... todo mundo vai aceitando, vendo como normal.

Como eles dizem: é tradição! (Aluno 08).

Muitas vezes a cultura escolar atua como fonte de violência – ou como os alunos

dizem: a “tradição de colégio agrícola” (onde os alunos novatos são submetidos a

humilhações constantes, apelidos pejorativos, sujeição aos padrinhos) – faz com que muitos

alunos entendam como normal esse tipo de situação violenta na escola e ajam com

indiferença (“Todo mundo passa por isso!” – Aluno 03).

Já outros se conformam e acabam considerando as agressões como brincadeiras ou

algo normal entre os colegas:

Quando a gente vem estudar aqui sabe que vai ganhar apelidos. Quem vem estudar

aqui já sabe a rotina de um colégio agrícola. Já sabe como vai ser, que vai sofrer.

(Aluno 01).

Você é do 1º ano vai sofrer, porque os do 3º tá, tá, tá...” (Aluno 08).

É tradição de colégio agrícola, não vejo isso como violência, isso é brincadeira e

diversão, são todos um bando de piazada. (Aluno 09).

Todos no 1º ano irão sofrer; Minha irmã estudou aqui e me avisou que o 1º ano

sofre. (Aluno 10).

Isso representa a banalização da violência na escola. As agressões não são vistas

pelos alunos como violência e em geral, os professores também costumam abordar os

episódios violentos com descaso ou como “brincadeiras”. Conforme Ens (2011, p. 82) as

manifestações de violência e bullying “nem sempre são percebidas pelos professores que, de

uma forma equivocada, o associam a brincadeiras.”

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Na sociedade de forma geral isso também acontece. A incivilidade, o desrespeito

são cenas cotidianas em quase todos os lugares. A violência também passou a ser vista como

algo normal e aceitável, principalmente na mídia. No cinema e na televisão, as cenas de

violência são cada vez mais explícitas. Convivemos tanto com estas imagens que acabamos

nos tornamos, aos poucos, indiferentes. Não ficamos mais chocados com tanta violência, nos

acostumamos com ela. É a naturalização, a banalização da violência. Até os desenhos

animados e os jogos eletrônicos trazem uma carga elevada de violência e nossas crianças e

jovens brincam de matar, de fazer guerra como se isso fosse normal. “A naturalização de

comportamentos violentos pela cultura de massa é, sem dúvida, outro fator que reforça a

banalização da violência.” (CANDAU; LUCINDA; NASCIMENTO, 2001, p. 25).

A respeito da violência Camacho (2001, p. 133) expõe que: “De tanto acontecer, ela

passa a ser banalizada e termina por ser considerada ‘naturalizada’, como se fosse algo

‘normal’, próprio da adolescência. A banalização da violência provoca a insensibilidade ao

sofrimento, o desrespeito e a invasão do campo do outro.”

Bullying: uma violência velada

Sabe-se que diversas formas de violência podem ocorrer no ambiente escolar.

Entretanto, uma delas vem ganhando destaque nos últimos anos: o bullying. E é a respeito

desta forma de violência que pretende-se abordar com mais ênfase neste trabalho.

Cabe esclarecer e reforçar que essa forma de violência (bullying) possui algumas

características que o diferenciam das demais formas de violência. O bullying ocorre por

meio da perseguição e intimidação de um aluno por um ou vários colegas de escola. As

situações são marcadas pela intencionalidade de causar danos e sofrimentos e pela

repetitividade das ocorrências de violência. Cabe apontar que, além destas características,

sempre existe um público a presenciar e apoiar moralmente o praticante da violência.

Objetivando investigar a possível incidência de violência velada (silenciosa,

opressora, cruel) entre pares na escola – o bullying, seguimos a investigação perguntando

aos sujeitos da pesquisa: Você já presenciou algum colega praticando bullying (maltratando

repetidas vezes um mesmo colega)?

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Gráfico 4 – Já presenciaram colegas praticando bullying

Fonte: Pesquisa de Campo (2013).

Através das respostas – expostas no gráfico 4 – percebe-se que os alunos

identificam casos de bullying na escola, sendo que 135 alunos responderam que sim, várias

vezes presenciaram colegas praticando bullying; 32 alunos responderam que sim, já

presenciaram pelo menos uma vez casos de colegas praticando bullying e apenas 42 alunos

disseram que não, nunca presenciaram colegas praticando bullying na escola.

Diante dos dados é possível perceber que 64,6% dos alunos já presenciaram alguma

situação de bullying na escola, ou seja, alguém maltratando repetidas vezes um mesmo

colega. Trata-se de um dado muito significativo, que expressa que ocorrem situações

repetitivas de violência entre pares na escola. No total 80% dos participantes dizem já ter

assistido, no mínimo uma vez, cenas desse tipo de violência na escola, ou seja, já foram

espectadores.

Quando questionado a respeito de ter presenciado situações de bullying na escola

um aluno respondeu:

Já! Horrores! Gente isso é o que mais acontece aqui, é só sair ali fora prá ver.

Sempre com as mesmas pessoas. Com os que se acham mais e os que são... são

diferentes, no caso as pessoas que são diferentes... “Ah, porque ela é gorda, ou

porque ele é pequeno, ou porque pinta o cabelo” ... estes são os que mais sofrem.

(Aluno 01).

A fala do aluno confirma a ocorrência de episódios de violência contra os mesmos

colegas, repetidas vezes. Ainda percebe-se, pela fala expressiva (Já! horrores!), que isto

ocorre com frequência na escola.

0

20

40

60

80

100

120

140

Sim, várias vezes Sim, apenas uma vez Não, nuncapresenciei

135

32 42

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Visando confirmar estes dados, também perguntamos aos alunos: Você conhece um

ou mais colegas que tenham sido agredidos, ameaçados, isolados, humilhados

propositalmente (“por gosto”) por outros colegas? As respostas a esta questão indicaram

novamente um grande número de alunos que identificam colegas que são ou foram expostos

a situações de agressão, ameaça, isolamento ou humilhação, ou seja, que sofrem ou sofreram

bullying. Dos pesquisados, 155 (74%) responderam que sim, conhecem pessoas que sofrem

bullying na escola; contra apenas 54 (26%) que disseram não conhecer ninguém que sofra

ou já tenha sofrido bullying.

Diante dos resultados apontados percebe-se inicialmente, Conforme Eyng (2011, p.

103) “a existência de violências nas escolas é inegável” e esta constatação é feita pelos

alunos participantes da pesquisa. Nota-se também que a percepção sobre violência e

bullying por parte dos alunos é bem clara e os índices apontados são altos, o que indica que

as situações de desrespeito e bullying são corriqueiras e frequentes na instituição. Isso ficou

evidente também nas falas dos alunos, quando estes se referem a frequência dos atos:

Acontece bastante! [...] Já vi várias vezes também! (Aluno 02).

Isso acontece sempre! ... (Aluno 05).

Acontece muito! Bastante! É o que mais acontece aqui... ter conflitos entre os

alunos dentro da sala de aula e no colégio. (Aluno 06).

Acontece, acontece muito! Isso nunca vai parar! (Aluno 10).

Não se pode ignorar o que está acontecendo na escola e na sociedade de uma

maneira em geral, pois o bullying é um problema sério que requer especial atenção por parte

de dirigentes da escola, professores, pais e responsáveis. Eyng (2011, p. 104) aponta que o

bullying ocorre em todos os estabelecimentos educacionais que não têm programas eficazes

para enfrentar o problema, sejam escolas privadas, públicas, religiosas, internatos, escolas

técnicas, faculdades, universidades. Ainda conforme a autora, o bullying não pode ser

naturalizado ou ignorado, é preciso cuidado para não agir de forma a naturalizar os

acontecimentos, pois percebe-se na escola pesquisada, que para “muitos”, o bullying tornou-

se tão normal na vida cotidiana, que as pessoas se acostumaram com ele ou fingem não o

ver, tornando-se insensíveis a seus efeitos devastadores.

Assim como ocorre com outros tipos de violência, confundir fatos do tipo bullying

com brincadeiras é muito habitual nas escolas. Comportamentos de ordem moral, como

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agressões físicas, verbais e psicológicas entre pares são, na maioria das vezes, menos

preocupantes para os professores, do que, por exemplo, conversas paralelas enquanto o

professor explica a matéria, o uso do boné, chegar atrasado à escola, ou não realizar tarefas

solicitas (TOGNETTA et al., 2010).

Tanto as escolas como as famílias têm dificuldades em identificar a incidência de

bullying entre seus jovens. Falta um olhar mais atento para perceber os conflitos. Aquilo que

é tratado como “brincadeira” na maioria das vezes possui uma conotação agressiva por parte

de quem a faz. Isso dificulta a intervenção da escola e da família e acaba por agravar as

marcas do fenômeno.

Roubos, insultos, brigas, exploração dos mais novos pelos mais velhos são atos

que, de tão frequentes no cotidiano escolar, acabam por serem banalizados e/ou

tidos como manifestações “normais” da idade e/ou da condição sociocultural e

econômica do jovem. (CANDAU; LUCINDA; NASCIMENTO, 2001, p. 32).

Enquanto muitos alunos são intimidados, ameaçados, humilhados, excluídos, por

seus pares, as escolas acabam por não perceber que de fato há um problema, ou mesmo

desconhecem ao certo como identificar e trabalhar com a situação da intimidação entre

pares; ou ainda acreditam ser brincadeiras de infância e de adolescência, praticamente que

naturalizando tais práticas (TOGNETTA; VINHA, 2010a).

A escola é um contexto que propicia o desenvolvimento de habilidades,

competências, saberes e opiniões, cabendo, portanto, a ela o papel fundamental de buscar

alternativas para o enfrentamento e prevenção do bullying – ações concretas, esforços

coletivos, baseadas no estudo da sua realidade, que possam transformar tais relações

conflituosas entre os alunos em um local de convivência mais cooperativo, permeado por

relações de respeito mútuo.

4.1.2 – Formas de violência existentes na escola

É preciso saber distinguir as “brincadeiras saudáveis” daquelas “falsas

brincadeiras”, que camuflam sentimentos pouco nobres, de intolerância, de preconceito, de

ignorância e de maldade. Conforme Silva (2010, p. 13), quando alguns se divertem às custas

do sofrimento dos outros, intencionalmente e de forma repetitiva ocorre o fenômeno

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bullying. Este se manifesta através de diversos comportamentos: insultos, intimidações,

ameaças, apelidos cruéis, gozações que magoam profundamente, perseguições, acusações

injustas, difusão de fofocas, isolamento, tomar ou destruir pertences, meter medo, atuação de

grupos que hostilizam, ridicularizam e infernizam a vida de outros alunos, levando-os à

exclusão, além de danos físicos (socos, agressões, chutes), morais e materiais. (FANTE,

2005; MIDDELTON-MOZ; ZAWADSKI, 2007; SILVA, 2010).

Conforme Abramovay (2009, p. 103):

O clima entre alunos muitas vezes está permeado por relações conflituosas dos

mais diversos tipos, envolvendo agressões verbais, físicas, humilhações e falta de

respeito. São maneiras de se relacionar, muitas vezes tidas como típicas da

adolescência/ juventude, que não podem ser vistas a priori como não civilizadas,

mas que podem chegar a minar uma boa convivência entre escolares, tornando o

ambiente mais propício a conflitos e resoluções violentas.

Buscando identificar as formas de manifestação da violência no IFC – Campus

Concórdia, perguntamos aos alunos: Quais as principais formas de violência existentes na

sua escola? Para fins deste estudo, indicamos que a violência física se manifesta através de

maus-tratos físicos – brigas, socos, pontapés, empurrões. Já a violência psicológica utiliza

maus-tratos como humilhações, ameaças, intimidações, constrangimento, perseguições,

chantagens, fofocas. A violência ao patrimônio, como indica o próprio nome, refere-se a

atos como danificar/quebrar cadeiras, carteiras, vidros, lâmpadas, cortinas, livros e outros

materiais didáticos. A discriminação na escola, por sua vez, é uma das ações praticadas

contra as vítimas e envolve os maus-tratos referentes a exclusão/isolamento, seja por cor,

sexo, raça, idade, e como exemplo podemos citar, o bullying homofóbico55

.

A tabela 1 apresenta as principais formas de violência indicadas pelos participantes.

Podemos identificar que a alternativa mais citada foi a violência psicológica (82,3%). As

demais formas de violência parecem ter menos visibilidade por parte dos sujeitos

pesquisados, o que não quer dizer que elas não aconteçam na escola.

55

“É a prática das diversas formas de ataque bullying contra homossexuais. É o ato de submeter homossexuais

a chacotas, humilhações, ameaças, perseguições e exclusões sociais, dentro ou fora das escolas. [...] muitos

alunos que assumem sua opção sexual, ou aqueles que parecem assumi-la, sofrem terrivelmente o rechaço e a

resistência frente a diversidade afetivo-sexual. Essa prática infelicita ainda mais o jovem, que está num

momento de descoberta e de autoafirmação.” (FANTE E PEDRA, 2008, p. 42).

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101

Tabela 1 – Principais formas de violência existentes na escola

FORMAS DE VIOLÊNCIA RESPOSTAS %

Violência Física 45 21,5%

Violência Psicológica 172 82,3%

Violência ao patrimônio 45 21,5%

Discriminação na escola 41 19,6%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Se 82,3% dos pesquisados apontaram a violência psicológica como a que mais

acontece na escola, isto significa que para os alunos existe mais agressão verbal,

humilhações, ameaças, constrangimento, fofocas, do que outras formas de violência, como a

física, apontada por 21,5% dos pesquisados, ou a violência ao patrimônio, citada também

por 21,5% dos participantes. A discriminação na escola, seja por cor, sexo, raça, idade foi

indicado nas respostas de 19,6% dos pesquisados.

A respeito da violência um aluno comenta:

Violência psicológica, pressão psicológica é o que mais acontece aqui dentro do

colégio. [...]. É difícil ficar firme e não se deixar abalar tão fácil. (Aluno 06).

Percebe-se que a violência na escola pesquisada ocorre de maneira mais sutil,

velada, dissimulada, através do desrespeito ao outro, à sua individualidade (humilhações,

ameaças, fofocas), e menos através de ações violentas mais explícitas e radicais, como

brigas e surras.

Camacho (2001, p. 133) expõe a respeito da violência explícita e implícita:

Por ser visível, a violência explícita é, na maioria das vezes, assumida, combatida,

punida e evitada, [...]. A violência mascarada, por outro lado, passa, quase sempre,

a ser confundida com indisciplina ou com brincadeira. É considerada menos grave,

por que não traz consequências visíveis ou de efeito imediato, por que não

machuca o corpo, não faz verter o sangue. Os danos, muitas vezes indeléveis, são,

geralmente, de ordem psicológica e/ou moral. Essa violência pode se tonar

perigosa porque não é controlada por ninguém, não possui regras ou freios e

porque passa a ocorrer constantemente no cotidiano escolar.

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Talvez esse resultado possa ser explicado partindo do fato de que, por um lado,

professores e demais servidores da instituição percebem e respondem mais facilmente às

vitimizações físicas, enquanto a vitimização verbal e psicológica, na forma de zoar, implicar,

rejeitar e humilhar, frequentemente não são vistos e se vistos, às vezes são tolerados. É como

complementa Camacho (2001, p. 133), a violência, na sua forma explícita de manifestação

nas escolas, é combatida, criticada e controlada por meio de punições. Entretanto, a

violência mascarada (psicológica, moral) passa impune, ou porque não é percebida como tal

e é confundida com a indisciplina, ou por que é considerada pouco grave, isenta de

consequências relevantes, ou, finalmente, por que não é vista.

No que se refere à discriminação, a intolerância às diferenças, pode-se dizer que: de

um lado, há as razões sociais da diferença, que geram intolerância, preconceito,

discriminação, racismo e violência, porque, nesse caso, a diferença é avaliada como

desigualdade e não diversidade. De outro lado, há a dificuldade típica do momento da idade

(adolescência) de se lidar com as diferenças. Esses alunos, por estarem num processo de

busca de afirmação da identidade, tendem a rejeitar aqueles que não pertencem ao seu grupo

e que apresentam características diferentes das suas.

O bullying é uma manifestação dessa rejeição de ordem social que priva o

indivíduo, considerado diferente, de seu direito de participar e de existir nos grupos, nega-se

a essas pessoas seu desejo de fazer parte, de ser importante e valioso ao grupo.

Na sequência, perguntamos também aos alunos: Quais os principais tipos de

violência que ocorrem na sua escola? Esta questão permitia aos participantes assinalar mais

de uma alternativa, visto que dificilmente se é acometido de apenas um tipo de violência. É

como apontam Silva (2010, p. 22) e Fante e Pedra (2008, p.63) dificilmente a vítima recebe

apenas um tipo de maus-tratos, pois normalmente eles vêm associados.

O Gráfico 5 traz os principais tipos de violência assinaladas pelos alunos: o

destaque está para a agressão verbal (xingamentos) apontado por 59,3% dos participantes; os

apelidos maldosos, por 55,5% e as fofocas e mentiras, por 55%. Também é válido destacar

as humilhações e ameaças, o fato de esconder, estragar e furtar objetos pessoais e as brigas

físicas entre alunos (socos, pontapés, empurrões).

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Gráfico 5 – Principais tipos de violência que ocorrem na escola

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Percebe-se através da análise das respostas, que as ações de violência praticadas

variam. Na escola pesquisada, as ações de violência mais frequentes são as diretas e verbais.

Os xingamentos foram apontados por 59,3% (124 alunos) e receber apelidos maldosos foi

apontado por 55,5% (116 alunos). Porém, merece destaque a ocorrência de violência

psicológica/moral, sendo que 55% participantes apontaram as fofocas e mentiras

(difamação); 42% indicaram humilhações; 42% ameaças; 31% constrangimentos. Também

ocorre na escola e foi apontado por 40,2% dos participantes, o fato de esconderem,

estragarem e furtarem objetos pessoais. A violência física como brigas, socos, chutes, foi

assinalada por 33,5% dos pesquisados.

Conforme Debarbieux e Blaya (2002. p.72) “os xingamentos são a forma mais

comum desse tipo de intimidação, [...], bem como a disseminação de boatos.” Já para Avilés

(2006) as formas mais frequentes de intimidação são a verbal, a psicológica, a física e a

social, segundo o autor conforme a idade aumenta, os atos de agressão física diminuem e

aumentam os modos mais elaborados, como a exclusão social e a ridicularização grupal, fato

este identificado na instituição pesquisada.

Agressão verbal – As palavras podem ser usadas e atingir profundamente a

autoestima das pessoas. Não faz diferença se a gozação ou os comentários têm ou não um

fundo de verdade. É sempre muito doloroso para os alvos ouvir alguém falar mal deles. Uma

0 20 40 60 80 100 120 140

Isolamento de colegas

Esconder, estragar ou furtar objetos

Fofocas e mentiras

Constrangimento

Perseguições

Ameaças

Humilhações

Agressão verbal

Trotes

Apelidos maldosos

Brigas entre alunos

57

84

115

65

27

88

88

124

62

116

70

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frase antiga, muito utilizada principalmente pelas crianças e adolescentes: “palavras não me

atingem”, pode até ser utilizadas como meio de defesa pelos alvos, mas na realidade isso não

é real.

A respeito das formas de violência que ocorrem na escola um aluno traz:

A principal forma de violência usada, e a pior que tem aqui na escola, é a verbal.

Porque só se ouve: “Você é uma bicha louca! Vadia! Puta! etc.” Desculpa falar

estes palavrões, mas é o que acontece direto na escola. Desentendimentos... é só

xingamentos e ofensas. De dia quase não se vê, mas a noite, essas crias de 14, 15,

16 anos, todas soltas no alojamento. Ninguém dá valor prá nada, prá ninguém.

(Aluno 01).

A agressão verbal (xingamentos) foi apontada por 59,3% dos participantes como a

forma de agressão que mais ocorre entre os alunos na instituição pesquisa. Conforme aponta

o aluno 01, muitos palavrões são usados cotidianamente nas discussões entre os alunos no

sentido de ofender a moral dos colegas.

Tognetta (2005, p. 6) destaca que: “entre adolescentes, como o pensamento é

formal, um pensamento que opera, que organiza suas reflexões mentais de forma abstrata,

hipotética, é possível que agridam mais pela violência verbal, pelas ameaças.”

Nota-se que as agressões verbais no ambiente escolar remetem à dimensão da

convivência e dos relacionamentos sociais, por isso é fundamental que a escola desenvolva

ações que promovam o diálogo enquanto mecanismo de resolução pacífica de conflitos, a

fim de se constituir um ambiente de convivência harmônica e de tolerância entre alunos,

bem como entre alunos e servidores da escola.

Agir no plano dos relacionamentos interpessoais também se mostra importante

dentro da escola para evitar a gravidade dos conflitos, que podem iniciar com uma agressão

verbal, mas tendem a evoluir e a dar origem a episódios de violência com maior potencial de

dano (agressões físicas, por exemplo) e consequências aos envolvidos.

Fofocas e mentiras – Da mesma forma que as ofensas verbais, as fofocas e as

mentiras têm um alto poder de devastar uma relação. Quase sempre vem de pessoas ligadas

aos envolvidos, são formuladas com desonestidade e covardia e sem chances de defesa aos

alvos. Conforme Gomes e Sanzovo (2013, p. 49) “trata-se das situações em que há a

disseminação de histórias difamadoras e pejorativas sobre a vítima, acarretando em sua

rejeição diante dos demais colegas.”

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Apontadas por 55% dos participantes da pesquisa, pode-se dizer que estas formas

de violência acontecem com muita frequência na escola. Fato este confirmado pelos alunos:

Situações de boatos e fofocas na escola é muito frequente, imagine o muito! É o

que mais tem. Adoram inventar coisas para acabar com a moral dos outros.

Fofocas e boatos é o que mais tem na escola, eu sofro muito quando acontece essas

situações. (Aluno 01).

Acontece muito! Bastante! É o que mais acontece de ter conflitos na escola.

Porque geralmente quando tem uma pessoa que eles não gostam, eles unem a

turma deles e resolvem acabar com a moral da pessoa, então eles pegam e

começam a inventar histórias mesmo, prá todo mundo, prá ninguém mais gostar

daquela pessoa. [...] A pessoa acaba sendo muito prejudicada por isso. É muito

comum acontecer isso aqui e já aconteceu comigo. (Aluno 06).

Isso acontece muito aqui... e é bem tenso ouvir todo mundo falando de ti uma

coisa que você não fez. Muito do que eles fazem aqui no colégio é colocar fama

principalmente de “galinha” nos meninos e de “putinha” nas meninas. É muito

comum aqui de se fazer isso. É muita coisa que inventam. A poucos dias

inventaram que eu estava ficando com um colega meu, teve uma foto que eles

bateram da gente sentado, assim só conversando e já falaram por ai que tinham

visto a gente se beijando. É tudo fofoca, mentira... e esses boatos correm que nossa

aqui no colégio. E você fica sabendo de coisas que você nem sabia que tinha feito.

Isso acontece muito... bastante mesmo! (Aluno 10).

É possível perceber através das colocações destes alunos, que as fofocas acontecem

com tanta frequência que todos em um dado momento já foram vítimas, ou pior, já foram

cúmplices desse mal.

Os autores das intrigas nunca se importam com o estrago que farão na vida

daqueles que são alvos de suas fofocas, seu prazer único é espalhar aos quatro cantos aquilo

que pensam saber. É simples para alguns sujeitos falar da vida dos outros e é fácil e

prazeroso apontar defeitos e criar histórias (mentiras), principalmente quando o objetivo é

atingir e maltratar o alvo, fazendo com que este fique mal visto diante dos colegas

(conforme colocou o aluno 06).

Se existem pessoas que fazem fofocas e inventam mentiras, é porque existem outras

pessoas que estão dispostas a ouvir. É como um ciclo-vicioso; um fala e o outro ouve, este

que ouve passa a falar para um terceiro... e esse ciclo-vicioso permanece.

Pode-se dizer que boatos espalhados tem o mesmo efeito de plumas lançadas do

topo da montanha no momento do vendaval, você pode descer e tentar recuperá-las, mas

nunca conseguirá reaver todas as que lançou. Diante disso, percebe-se o efeito danoso na

vida dos alvos que sem chances de defesa se veem expostos aos mais diversos tipos de

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humilhações e infâmias devido a comentários que se espalham rapidamente por toda a

escola.

Novamente ressalta-se a importância da escola agir no plano dos relacionamentos

interpessoais para evitar a gravidade deste tipo de conflito, que pode levar ao aumento do

nível das agressões, já as fofocas normalmente estão relacionadas a moral, a honra da

pessoa.

Apelidos pejorativos – Percebe-se através da análise dos questionários e das

entrevistas, que os apelidos e rótulos são comuns na escola. Alguns alunos aparentemente

não se importam com eles, porém, segundo os participantes da pesquisa, em grande parte

dos casos, os apelidos causam constrangimento em quem os recebe. As sensações de mal-

estar ocorrem quando o apelido vem carregado de sentido pejorativo, torpe, depreciativo,

discriminatório, com a intenção de desvalorizar, menosprezar, ridicularizar, zombar,

rebaixar o apelidado. As razões para apelidar são muitas, podem ser por causa da estatura,

por estar acima do peso, por causa dos óculos, cor da pele, da opção sexual ou alguma outra

característica que faça com que o outro ou o seu grupo seja considerado diferente.

Conforme Tognetta (2005, p. 6) o agressor reconhece, pela esperteza, quais são as

maiores dificuldades do ponto de vista afetivo, e do ponto de vista físico de suas vítimas.

Eles conseguem identificar quais são os maiores problemas que essa pessoa sofre, e são

geralmente sarcásticos. De outro lado, temos a vítima geralmente mais apática, mais

fragilizada, com menos força e poder de persuasão que o agressor. Isso pode explicar

facilmente a questão dos apelidos.

Com relação aos apelidos, nas entrevistas os alunos trouxeram:

Desde o primeiro ano eles me chamam de orelhuda, porque ninguém é perfeito... e

eu tenho uma orelha maior que a outra. Ai ficam me chamando de um monte de

besteiras, ficam querendo se achar por causa disso. Falam assim: “Ah! a orelhuda

lá, não sei o que... ao invés de colar!” Acho que é só por causa do meu físico. Daí

eles tem motivo prá ficar tirando com a minha cara. Eu sofro bullying desde o

primeiro ano por causa disso. (Aluno 02).

Eu acho terríveis os apelidos... porque o pai e a mãe deram um nome prá você e

vem outro e te chama de apelido. Tipo... eu não digo o meu apelido prá ninguém...

porque eu não gosto do meu apelido. Acho que ninguém no fundo gosta do

apelido, porque eu preferia ser chamada pelo nome. Geralmente a maioria dos

apelidos são maldosos... são referente a questão física da pessoa. (Aluno 05).

Olha tem muito! Quanto aos apelidos tem... todo mundo tem apelidos. Por minha

sorte eu adoro meu apelido... é o apelido de casa. [...] Só que tem vários apelidos

que, por exemplo, um dos meus melhores amigos... chamam ele de “bunda”, eu

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não gosto do apelido dele, nem ele, por isso eu não chamo ele assim. Mas as

pessoas chamam. Só que enquanto alguns trocam o nome pelo apelido com boa

aceitação, alguns se sentem inferiorizados e maltratados, se sentem mal por causa

dos apelidos. (Aluno 08).

A principal questão que me fez sofrer na escola foi em cima do apelido. Era quase

um deboche. Era muito estranho, era feio... (Aluno 10).

Muitas vezes os apelidos e gozações têm sido tratados como brincadeiras naturais

da adolescência e, por isso, recebem pouca ou nenhuma interferência dos educadores.

Podem até ter a intenção de brincadeiras, porém quando ultrapassam o limite do outro e lhe

causam sofrimento, como nos casos apresentados acima, tornam-se violência.

Por conta de seus valores culturais e de uma insensibilidade compartilhada

institucionalmente, professores e membros das direções das escolas têm como

“inofensivas” muitas das brincadeiras organizadas pelos alunos, entre elas a de

atribuir aos outros apelidos estigmatizantes. Os apelidos, como se sabe,

estabelecem uma nova identidade às pessoas, destacando alguma característica

tomada como particularmente significativa. Muito raramente, entretanto, tal

escolha seleciona uma virtude. [...] Quase sempre, há algo que se projeta como

ridículo ou humilhante na identidade atribuída ao apelidado. Assim, se faz “graça”

ao se promover um rótulo pelo qual se deprecia o outro. (ROLIM, 2010, p. 53).

Percebe-se que os apelidos, na maioria das vezes estão ligados a alguma

característica do alvo, normalmente uma característica física da pessoa, conforme apontam

em suas falas os alunos 02 e 05. Por exemplo, apelidam de “baleia”, evocando uma

característica física da pessoa de ser gorda. E ser gorda, na nossa sociedade, é sinônimo de

estar fora do perfil de beleza indicado pela moda – modismo este que aniquila o ser em

função do ser, onde prevalece a aparência em detrimento da essência. Ou então estão

associados a “palavrões” ou palavras depreciativas, a exemplo: “bunda”, como referência o

aluno 08.

Os apelidos nestes casos soam como uma agressão e desempenham um efeito

extremamente prejudicial ao processo de desenvolvimento das pessoas, principalmente de

adolescentes, na formação de seu autoconceito e de sua autoimagem. Conforme Campos

(2010, p.27), “O corpo e os traços físicos do adolescente apresentam importante relação com

a imagem que ele tem de si e com a ideia que faz de como é, aos olhos dos outros.” Ou seja,

para os adolescentes, a aparência física influência muito, pois ele sempre está à procura de

respostas para as mudanças no seu corpo e o turbilhão de sentimentos surgidos por estas

mudanças. A maneira como o adolescente vê a sua imagem é causa de intensas inquietações

neste estágio, e apelidos pejorativos, que exaltam traços não desejados podem deixar o

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adolescente muito mais inseguro, desorientado, inquieto e insatisfeito consigo mesmo. Fato

denunciado pelo aluno 02, que demonstra o sofrimento que vem passando desde o 1º ano na

escola devido ao apelido que exalta um traço físico por ele não desejado

Os apelidos ofensivos deixam marcas na vida de quem os recebe, como registro de

desmoralização, principalmente aqueles inventados cruelmente com a intenção de humilhar

e ridicularizar os outros.

Quando o apelido “pega”, ele passa a fazer parte do indivíduo como um rótulo

colocado de fora para dentro. É visto de forma natural pelo grupo, pelo fato de ser repetido

por todos, sem a reflexão sobre as consequências do mesmo para a pessoa apelidada, como

se o apelido fosse o próprio nome da pessoa.

O fato do apelido “pegar ou não” revela, segundo Rolim (2010, p. 54), as diferenças

de poder nas relações construídas entre os alunos, posto que os mais fortes ou “populares”

jamais irão permitir que alguém lhes conceda uma identidade indesejável. Porém, os que

desfrutam de menor poder pouco podem fazer diante da nova denominação, mesmo que esta

lhes seja intolerável. Com relação a estes, os apelidos, com certeza, se perpetuam.

Essa questão evidenciada por Rolim (2010) é facilmente identificada na Instituição

pesquisada, onde os alunos do 1º ano, considerados mais “fracos”, acabam sendo alvo de

apelidos. Isso explica também porque em alguns alunos do 1º ano os apelidos não “pegam”,

pois estes desde de cedo acabam se destacando também pelo poder sobre os demais colegas

e jamais permitiriam receber um apelido não desejado.

Para alguns, inventar apelidos é apenas uma brincadeira banal. Para quem está de

fora os apelidos soam engraçado. Porém, são raros os adultos que percebem as

consequências e a gravidade dos apelidos maldosos na vida de quem, constrangido pela

chateação e pela humilhação, não sabe o que fazer para resolver o problema ou em quem

buscar ajuda.

Como destacado pelo aluno 5, todos nós recebemos um nome e sobrenome e isto

nos confere uma identidade, uma individualidade. O nome é uma denominação que

identifica, distingue, individualiza e, portanto, carrega uma história de vida, que é particular

e nos faz únicos e especiais. Sendo o nome um símbolo de identificação, ninguém tem o

direito de desqualifica-lo, de despersonalizar o outro (colega) impondo-lhe um apelido. O

valor do nome está na capacidade que tem de conferir ao portador indivíduo uma existência

única, reconhecimento e identidade e por isso, é pelo nome que a pessoa deve ser chamada,

salvo casos onde ela autorizar que seja diferente.

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Perceber os apelidos pejorativos como uma forma de violência é o primeiro passo

para a conscientização e para a compreensão dos danos causados nos alunos atingidos, pois

as fronteiras entre o que é brincadeira e o que é violência, nestes casos são tênues e a

passagem de uma para a outra nem sempre é percebida pelos educadores.

4.1.3 – Espaços onde o bullying se manifesta

Quais são os locais onde comumente ocorrem os ataques de bullying na escola?

Conforme Fante e Pedra (2008, p. 53) os locais onde ocorrem os ataques de bullying são

diversos: pátio de recreio, playgrounds, banheiros, corredores, salas de aula, bibliotecas,

quadras esportivas, laboratórios de informática. Ocorre dentro da escola e nas suas

imediações, mas também em outros locais fora dela, mas de convivência comum aos alunos

– locais onde eles costumam frequentar e se reunir.

Com a questão nº 10, buscamos identificar quais os locais da escola onde com mais

frequência ocorrem as manifestações de violência e bullying. Esta questão permitia aos

participantes assinalar mais de uma alternativa. Na tabela 2, listamos todos os locais onde

ocorrem atos de bullying na escola, conforme citados pelos participantes da pesquisa.

Tabela 2 – Locais onde ocorre a prática de bullying na escola

LOCAIS FREQUÊNCIA TOTAL (%)

Na entrada da escola (portão) 5 2,4%

Na saída da escola 19 9%

Na rua, durante deslocamento de ida e volta para a escola 25 12%

No transporte escolar 10 4,8%

Na sala de aula, quando o professor não está presente 42 20%

Na sala de aula, com a presença do professor (durante a aula) 7 3,3%

Nos alojamentos 142 68%

Durante o recreio/intervalo, no pátio da escola 100 48%

Nos banheiros da escola 27 13%

No ginásio da escola 25 12%

No bar/cantina da escola 49 23,5%

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Na fila do refeitório 100 48%

Pelo celular 8 3,8%

Pela internet (Skype, msn, facebook, e-mail...) 48 23%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

A forma como o bullying se manifesta em cada espaço escolar assume

características diferentes em razão do tipo de atividade e do controle que existe ou não sobre

os alunos. Na instituição pesquisada, percebe-se que as ações de bullying acontecem

principalmente longe dos adultos/ responsáveis pela escola, e mais dentro do que fora do

ambiente escolar.

Os lugares apontados como de maior ocorrência de bullying no IFC – Campus

Concórdia foram: os alojamentos (68%), seguido do pátio da escola, durante o recreio/

intervalo (48%) e a fila do refeitório (48%). Cabe destacar também, outros locais bastante

utilizados para a prática da violência entre os pares, que é a cantina da escola (23,5%), a

internet (23%) e a sala de aula, na ausência do professor (20%).

Como o bullying pode ocorrer nos mais diversos locais da escola, fez-se questão de

apontar na tabela 2, todos os locais e a frequência das respostas dos alunos, para que se

pudesse ter um panorama abrangente da situação. Porém, para fins de análise, o gráfico 6

aponta com clareza os locais onde é mais comum a ocorrência de bullying.

Gráfico 6 – Locais em que mais ocorre o bullying

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

68,00%

48,00% 48,00%

23,50% 23,00% 20,00%

0,0%

10,0%

20,0%

30,0%

40,0%

50,0%

60,0%

70,0%

80,0%

Nos alojamentos Durante orecreio/intervalo

Na fila dorefeitório

No bar/cantina daescola

Pela internet Na sala de aula,quando o

professor nãoestá presente

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Conforme expõe Fante (2005, p. 106) “o maior índice de violência, ao contrário do

que se pensa, ocorre dentro da escola, principalmente nos locais onde a supervisão é

deficitária ou inexistente.” Lopes Neto (2005), também aponta que o bullying acontece

principalmente onde não há supervisão de adultos.

Um aluno comenta a respeito dos locais propícios para a prática de bullying na

escola:

O lugar onde mais ocorre o bullying seria nos alojamentos e nos corredores, nos

lugares mais públicos e longe da secretaria e da direção ou outros setores. Eles não

fazem isso onde tem servidores. Nos corredores dá para encarar, bater de lado, dar

cotoveladas, empurrões, tapas, e ninguém vê, ninguém fica sabendo. (Aluno 01).

Os alunos participantes da pesquisa acreditam que melhorar a supervisão nos

espaços coletivos é uma medida que pode trazer maior segurança aos alunos alvos de

bullying (FANTE, 2005, p. 106). Essa medida, porém, não visa superar o bullying, mas

dificultar a ação do agressor e proporcionar mais segurança aos alvos, pela facilidade de

aproximação e de intimidade. Uma melhor supervisão, não numa perspectiva de

policiamento, mas de apoio aos alunos, pessoas em que se possa confiar e que sejam

mediadoras diante das práticas abusivas.

Destaca-se que, nestes casos, a existência de um acompanhamento mais

sistemático e mais próximo por parte da equipe de assistentes e coordenadores seria muito

importante, principalmente no sentido de estar atento às situações e exercer um papel de

mediador diante dos conflitos e violência existentes. Isso porque, o simples aumento da

vigilância não irá resolver o problema da ocorrência de bullying, para isto acontecer é

necessário envolver toda a comunidade escolar e estabelecer um programa antibullying.

Alojamentos - O Alojamento é tido pelos alunos como o local mais vulnerável para

a ocorrência do bullying, onde sem a vigilância dos adultos/pessoas responsáveis da escola,

as cobranças, as humilhações, os “acertos de conta” podem ser feitos pelos alunos com

maior facilidade. Conforme Benelli (2002, p. 28) “A comunidade do internato escolar se

configura no encontro de pessoas, de sujeitos, como um local de confronto e de laços

afetivos.”

Entende-se que nos alojamentos/internato a ocorrência de atos de violência acentua-

se mediante o viver coletivo e integral dos sujeitos, por serem adolescentes e estarem

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vivendo um período de reafirmação, busca e reconhecimento, e também porque as relações

interpessoais dos internos são, em sua grande maioria, hierárquicas e escalonadas entre as

diferentes séries, marcadas por atitudes repressivas que visam à obediência.

É um local onde os alunos passam grande parte do tempo, é sua residência

provisória no período em que estão estudando. Pela distância das suas residências familiares

(muitos moram longe e até em outros estados) os alunos permanecem nos alojamentos

inclusive durante os finais de semana, durante meses seguidos, pois não possuem condições,

transporte, ou mesmo tempo suficiente para o deslocamento até suas casas.

Os relacionamentos, as amizades e a formação de grupos distintos são perceptíveis

nesses ambientes (internato), originando em alguns momentos conflitos, desordens,

organização, confraternizações. Por esse motivo é possível e muito comum nos depararmos,

no internato (alojamentos), com situações que geram algum tipo de violência. Benelli (2002,

p. 20) assinala que: “quando acontece alguma coisa interna ou externa que ataca a imagem

do sujeito, a agressividade surge como uma reação natural, numa tentativa de reconstruir

esta autoimagem”. O fato de ser aluno interno e permanecer por muito tempo dentro da

escola acaba impedindo, muitas vezes, que o aluno extravase ou desabafe sobre seus

problemas e angustias com alguém de fora da escola, o que pode gerar um acúmulo de

agressividade na relação com os colegas.

Benelli (2002, p. 28) acrescenta a respeito dos internatos:

A vida pessoal do estudante dentro do estabelecimento, tanto no dormitório quanto

e em outras partes, tem um grande significado para seu desenvolvimento, além de

sua importância para atingir os fins educativos mais concretos. [...] O estudante

responde muito à cultura geral de seus pares e às alianças e rupturas transitórias

que se produzem dentro do corpo estudantil, com os professores e com a

administração. A relação entre os estudantes, [...], costuma ter aspectos

problemáticos que causam ansiedade [...]. Surgem questões relativas ao

desempenho acadêmico, rivalidades, inveja, temores, medo do fracasso, disputas,

competição por reconhecimento, etc.

A respeito disso um aluno comenta:

A gente fica muito estressado aqui dentro, qualquer coisa é motivo para partir para

a briga. É muita cobrança e preocupação, melhor para quem pode ir para casa e

esfriar a cabeça, não ter que ver sempre as mesmas pessoas, mesmos problemas

todo o momento. Muitas vezes os problemas que acontecem no alojamento

acabam aparecendo na sala de aula e muitas vezes volta a ser resolvido no

alojamento, no fim do dia. (Aluno 06).

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O alojamento é um tipo de ambiente frequentemente associado com encontros não

desejados e não previstos, ou seja, com a perda do sentimento de privacidade, que diz

respeito à capacidade do indivíduo de controlar o seu contato social com o grupo e outros

residentes. Lá ele não pode controlar com quem irá encontrar, e pelo contrário, sabe que terá

que se relacionar com os mesmos colegas, aqueles com quem tem afinidades e outros com

quem não tem, e isso diariamente. Goffman (1987, p. 32) destaca que, “de modo geral,

evidentemente, o internado nunca está sozinho, está sempre em posição em que possa ser

visto e muitas vezes ouvido por alguém, ainda que apenas pelos colegas de internamento”.

Os efeitos sociais e psicológicos disso sobre os residentes no internato são

comprovadamente negativos. Tais efeitos são expressos pelo prejuízo na produção de tarefas

e no rendimento (inclusive escolar), pelo aumento de reações de agressividade, hostilidade e

mal-estar e pela diminuição nas condutas de afeto entre os sujeitos. Outras possíveis

consequências são o incremento da possibilidade de transmissão de enfermidades (sobretudo

as produzidas por contágio) e da vulnerabilidade ao estresse (MORAIS et al, 2004, p. 381).

Ao mesmo tempo em que a possibilidade de conviver com amigos por um maior

período de tempo é visto pelos adolescentes como um aspecto positivo e desejado, verifica-

se que aspectos negativos ligados a ocorrência de violência podem estar estreitamente

relacionados com as particularidades da convivência em grupo. Dessa forma, brigas,

desentendimentos, rivalidades, intrigas, jogos de interesse e incompreensão estão

diretamente ligados ao tempo de permanência que passam juntos, conforme apontados pelos

participantes da pesquisa.

A respeito da ocorrência do fenômeno bullying na escola, os alunos são

praticamente unânimes em afirmar que o fato da escola ter internato (alojamentos) facilita e

promove este tipo de situações bem mais do que em escolas “normais/tradicionais”, pelo

fato do maior tempo de convivência (estarem 24h juntos), do maior contato entre os alunos,

da ausência dos familiares. Conforme os alunos, quanto maior o tempo de contato/de

convivência, maior o índice de desentendimentos e conflitos entre eles. Isso é confirmado

por Gomes e Sanzovo (2013, p. 68) quando estes colocam que quanto mais tempo os alunos

passam na escola, maior a probabilidade da ocorrência de bullying.

Esses foram alguns comentários feitos pelos alunos a respeito:

Aqui na escola são mais comuns estes casos. Eu acho que é mais fácil, porque vai

ter o internato, os alojamentos. As pessoas vão estar aqui dentro 24 horas. E se

fosse um colégio fora teria só o tempo integral de aula e depois ir embora.

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Ninguém ia ficar dentro do colégio... alunos dormindo e tal... convivendo. Acho

que aqui o risco de acontecer isso, aqui dentro do colégio é bem maior, bem maior!

(Aluno 02).

Quem mais sofre bullying são os alunos que ficam internos, eles são os que mais

sofrem com as intimidações, com as cobranças, pois os semi-internos vão para

casa e a gente fica aqui o tempo todo. Sempre estamos mais expostos. (Aluno 04).

Os internos... a gente sofre bem mais aqui dentro, com certeza! Os semi-internos

passam nove, dez horas aqui... e nós ficamos direto. (Aluno 08).

Com o semi-interno não acontece quase, porque a gente vem cá vai direto prá sala,

fica livre das 11:30h as 13:30h, e as 17h30 já pega o ônibus e vai embora, então

não tem esse tempo maior para eles cobrar, é mais com os internos, que ficam mais

tempo e mais em contato no colégio. (Aluno 10).

Catini (2004) afirma que não podemos esquecer que os comportamentos

relacionados ao bullying, refletem ambientes específicos, envolvidos por um contexto social

e histórico. O ambiente e a dita “cultura escolar” de um colégio interno com raízes agrícolas,

pode influenciar muito na prática de bullying, pois reforça-se ano a ano comportamentos

ditos “culturais” dos alunos mais antigos sobre os mais novos, no sentido de manter uma

hierarquia de poder, típicas destes ambientes, o que nos leva muitas vezes a supor que um

adolescente inserido neste contexto pode estar agressivo, e não, necessariamente, ser

agressivo. Esta seria uma visão que compreende o fenômeno bullying como um processo

decorrente da interação entre a pessoa e o seu ambiente físico, social e cultural. Valoriza-se

muito o ambiente físico, onde estão inseridos os adolescentes e deixa-se um pouco de lado

os fatores sociais e culturais por eles interiorizados. (GOMES; SANZOVO, 2013, p. 47-48).

Nesse sentido, a escola (seu ambiente) e os alojamentos representariam um fator

determinante para a ocorrência de bullying.

Não se pode desconsiderar que estes comportamentos agressivos podem também

ser o reflexo da insatisfação dos alunos com o cotidiano e com o ambiente escolar

(alojamentos) – talvez as instalações não sejam tão adequadas às necessidades, o ambiente

não propício ao estudo, falta de limpeza e higiene adequadas, etc. Além da falta de um

projeto de vida, da falta de significado, da falta de alegria em viver e conviver, pois seres

humanos satisfeitos tem menor probabilidade de agredir fisicamente e moralmente os outros.

Cabe destacar, que se o objetivo da instituição em oferecer moradia aos alunos é

para facilitar o acesso destes aos estudos, torna-se, então, tarefa obrigatória da escola

oferecer um espaço mais agradável, com infraestrutura e recursos humanos suficientes para

atender as necessidades destes alunos em formação, principalmente porque o alojamento foi

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apontado como o local onde os alunos mais se sentem desprotegidos e consequentemente

mais vitimados pelo bullying na instituição. Os alojamentos constituem-se num amplo

ambiente de aprendizagens para esses alunos e o bem-estar deles, tanto físico como

psicológico, incide diretamente nos resultados acadêmicos e de convivência.

Recreio/intervalo – O pátio da escola durante o recreio/intervalo foi outro

ambiente escolar apontado pelos participantes (48% destes) como muito favorável a

ocorrência de bullying, pois também possui pouca ou nenhuma supervisão. É no

intervalo/recreio que os alunos se encontram e convivem juntos, sem a intervenção de

professores e funcionários da escola. O bullying ocorre mais facilmente nestas ocasiões,

porque os recreios/intervalos são normalmente vistos pelos agressores como locais para

medir forças e estabelecer relações de poder e onde é mais difícil para a escola detectar e

intervir.

A maioria dos alunos gosta do recreio/intervalo, pois este é um período destinado

ao descanso e a descontração, mas para alguns alunos ele pode se transformar num

verdadeiro “inferno”, uma vez que é nestes momentos que mais estão expostos aos bullies.

Em decorrência disso, muitas vezes acabam se isolando e preferem nem sair da sala de aula.

Comportamento este que, na maioria das vezes, passa despercebido dos professores.

Insultar, ignorar, humilhar, empurrar, tirar dinheiro ou o lanche, ameaçar, falar mal,

etc., são comportamentos que se intensificam no recreio/intervalo, que é considerado e

deveria ser um momento de lazer, de encontros, de brincadeiras, mas que pode assumir outra

característica e se constituir em um momento de grande estresse para alguns alunos.

Conforme apontam Abramovay e Rua (2004, p. 236) dentre os fatores que

desencadeiam violências como ameaças e brigas entre os alunos nos pátios escolares,

durante o intervalo, destacam-se o “encarar” e o “esbarrar”. O olhar direto e inconsciente

(encarar) é assumido como desrespeitoso e desafiador e leva a confrontos. Também o

esbarrar no outro, mesmo sem querer, pode ser interpretado como atitude de provocação,

possibilitando inclusive brigas.

Na Instituição pesquisada a ação dos agressores no horário do recreio/intervalo

acaba sendo acentuada, devido a grande extensão física da escola, da distância entre os

prédios onde estão localizados as salas de aula, dos prédios onde se encontram a biblioteca,

a cantina, os laboratórios de informática, os alojamentos, e é neste caminho, neste

deslocamento, que muitos se aproveitam para praticar bullying contra outros colegas. A

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dificuldade de defesa do alvo se intensifica quando não existe um adulto, um supervisor

observando, o que deixa o caminho livre aos agressores e o que gera grande tensão às

vítimas.

Fila do refeitório – Assim como o pátio da escola nos momentos de

recreio/intervalo, a fila de espera para o refeitório também foi apontada pelos participantes

(48% destes) como um local de constante desrespeito, maus tratos e humilhações entre os

alunos.

Segundo relatos dos participantes não existe respeito pelos colegas que já estão

aguardando na fila, e muitos acabam sendo intimidados, humilhados e ameaçados

diariamente, tendo que deixar outros passarem em sua frente, demorando muito tempo para

conseguir almoçar e/ou jantar.

Esse tipo de situação acontece diariamente na instituição, sendo a fila do refeitório

outro local de pouca supervisão por parte dos responsáveis pela escola.

Os alunos expressaram a respeito dos abusos que ocorrem na fila do refeitório:

Ah! Acontece muito isso, dos outros passarem na tua frente, principalmente no 1º

ano. Bastante porque o 3º ano vem e passa outros na frente. No caso, são os

afilhados deles, prá eles entrarem antes. (Aluno 01).

Acontece muito! Acontece por causa dos formandos e dos 1ºs anos. Isso vem

desde uma época em que o padrinho e a madrinha podem passar seus afilhados na

frente na fila do refeitório. Isso acontece até agora... tipo... vem um padrinho ou

madrinha e diz conta cinco e entra na fila. Todos os que estão para trás são

prejudicados, pois não é um caso que acontece, mas vários. Além disso, o primeiro

ano sofre na fila, pois são obrigados a ficar retos na parede, se sair são intimidados

ou se não deixarem passar na frente também são humilhados e ameaçados. (Aluno

02).

Ocorre bastante! Você está na fila por mais que tenha bastante tempo quando está

esperando, não importa quem seja, nem tipo quanto tempo você está lá, eles pegam

gente e passam na tua frente, não importa se você está morrendo, se está com

fome, se você está em baixo de chuva, de sol quente, eles pegam e colocam... a

maioria tipo tem afilhado... eles pegam o afilhado deles e passam prá frente. [...]

além disso, se reclamar as pessoas são tiradas lá da frente prá ser colocada lá no

fim da fila. (Aluno 05).

Hoje entraram mais de sete pessoas na minha frente de uma vez. E, digamos, não é

uma questão que eles mandem você deixar ou não deixar passar, eles agem como

se você não tivesse ali, ou não tivesse opção. Tipo assim.. digamos que você tá na

fila esperando a 10 min e tem duas gurias bem mais atrás de você. Passa um

formando, que por motivos óbvios, querem ganhar fama, fazer média e eles

simplesmente chegam e passam elas na tua frente. Chegam e dizem: “Entrem na

frente daquele piá ali”. Elas vão e entram... e você não pode falar nada. (Aluno

08).

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Principalmente nas primeiras semanas de aula, porém ainda continua bastante, os

do 3º ano estavam ameaçando nós na questão da fila do refeitório e também lá

dentro. Na fila, o que nós tínhamos que fazer: eles diziam que nós não podia se

encostar na parede, tinha que ficar assim... em pé, reto, perto da parede... nós não

podia se virar, não podia falar com quem estava atrás ou na frente, nada! Nós

tínhamos que ficar na fila assim... que nem um soldado, assim... Ainda chegava

um piá do 3º e dizia: “Oh, afilhado, conta cinco pessoas e passa na frente da fila.”

Poh! o cara tá ali faz bastante tempo... chega um ai que apenas chegou e vai lá na

frente, não dá! E ainda tem dentro do refeitório, se você for almoçar vai ver... a

separação das mesas, tem mesas só do 3º ano, só do 2º ano e as do 1º ano. [...] Nós

somos do 1º não podemos sentar nas outras mesas para não se complicar, para não

arrumar encrenca, ai o que acontece... [...] Nós temos que esperar vagar as nossas

mesas muitas vezes com o prato cheio na mão, sendo que tem mesas vazias deles.

Principalmente nós que somos internos se chegar sentar na mesa deles, de noite os

do 3º vem chamar nós para xingar, humilhar, etc. (Aluno 09).

Acontece muito comigo! Às vezes, o formando que é padrinho do bixo que entrou,

eles chegam e dizem: “Conta cinco prá trás de quem vai entrar na porta e pode

entrar na fila.” A gente que está na fila tem que deixar, né, porque não tem o que

fazer,,, é deixar e deu. Só que a gente acha injusto, porque as vezes a gente fica

meia hora parado esperando abrir e até começar a ir a fila e daí outras pessoas

chegam lá e vão entrando por primeiro, passando na frente. É muita falta de

respeito. Mas se não deixar é pior, ninguém quer briga. (Aluno 10).

Os alunos foram praticamente unânimes quanto ao desrespeito que ocorre na fila do

refeitório e também dentro dele. Estes foram alguns dos comentários feitos durante as

entrevistas, onde é possível perceber que este local da escola é utilizado pelos alunos mais

antigos para impor seu poder, cometer humilhações e maus tratos contra os mais fracos, no

caso, os alunos novatos. Até mesmo no momento das refeições, o qual deveria ser um tempo

de descanso, pausa, tranquilidade, reposição de energias, os alvos acabam passando por

momentos difíceis e de angustia, e isto faz, inclusive, com que muitos acabem desistindo de

almoçar ou jantar (saem da fila) ou mesmo nem frequentem mais o refeitório, ficando sem

comer. Fato este expressado por alguns alunos:

[...] A tua vida vira um inferno! É a convivência, as horas de sono perdidas, o

estresse, a má alimentação... Isso porque tem pessoas que não vão no refeitório por

causa disso. Ficam sem se alimentar mesmo! (Aluno 08).

Eu sou um cara que estou parando... Deixando de ir almoçar por causa disso. Hoje

eu não fui almoçar por causa dessa questão que ocorre na fila. [...] Você está na

fila, passa um grande tempo na fila, é um estresse, quando você está quase

chegando, chegava um louco, lá e te pulava na frente. Ai o que acontece: você fica

nervoso, se você fala alguma coisa é pior, pois você é ameaçado, então você nem

almoça direito, você se estressa na fila, se atrasa, se estressa para conseguir sentar,

você não come direito, volta mais cansado, a comida não faz bem... (Aluno 09).

Já aconteceu comigo... Ah eu não consegui continuar mais na fila, eu peguei e sai

chorando. E tem um monte de colegas que, às vezes, a gente vê o formando

ameaçando, indo lá “conversar”, parece que tá conversando... Eles exigem as

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coisas, ai a pessoa não aguenta, daí sai da fila, porque perde a fome, perde a

vontade de comer, perde a vontade de ficar no meio dos outros colegas, dá

vergonha, é humilhante! (Aluno 10).

Esta situação revelada por vários participantes é muito grave, pois aponta que os

alunos alvos de ameaças e humilhações na fila do refeitório e mesmo dentro dele, chegam ao

ponto de não se alimentar para não ter que enfrentar esse tipo de situação. Acredita-se que

esta condição é acentuada para os alunos internos que necessitam fazer suas refeições neste

local, já que residem na escola. Se a maioria destes alunos não está se alimentando na escola

e também não tem condições financeiras para buscar outra fonte de alimentação, como será

que eles estão se mantendo? O que estão comendo? Deixando de fazer refeições mais

completas – necessárias ao desenvolvimento físico e intelectual saudável, principalmente

nesta fase de crescimento e rápidas transformações físicas – poderão acarretar consequências

mais sérias, para a sua saúde e também comprometimento nos estudos.

Compreende-se que estes relatos merecem atenção por parte da instituição, pois é

necessário que os direitos dos alunos sejam assegurados, e eles têm o direito à alimentação.

A escola sempre preocupada em oferecer uma alimentação saudável e equilibrada (conta

inclusive com nutricionista), buscando melhores condições de instalações físicas e de

atendimento no refeitório, talvez não está identificando as dificuldades enfrentadas por seus

alunos. É fato que muitos não estão podendo usufruir dos benefícios oferecidos pelo

refeitório escolar.

Sobre a supervisão no refeitório os alunos argumentam:

Toda vez que tem professor na fila eles... eles... eles não colocam na frente, não se

metem. Se não, sempre tem aqueles engraçadinhos que se metem na frente dos

outros. Não adianta falar... eles não fazem nada! De vez em quando tem um ou

outro professor na fila, isso acaba inibindo um pouco, mas na maioria das vezes

não tem ninguém, então eles pegam e se metem lá, não adianta falar, se revoltar,

acham que tem direito mais que os outros, então... (Aluno 05).

Isso só iria se resolver se quem sabe o CGAE ficasse mais de olho, se ele ficasse

em cima deles (dos que fazem isso) na fila. (Aluno 08).

Novamente, os alunos manifestam que se houvesse mais supervisão neste local, os

alvos de bullying se sentiriam mais seguros e menos temerosos de frequentar diariamente o

refeitório. Não que isto resolverá o problema da violência na fila do refeitório, apenas trará

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mais segurança aos alvos das ameaças e humilhações, assegurando o direito dos alunos a

frequentar o espaço e poder se alimentar com mais tranquilidade.

Bar/cantina – A cantina da escola foi apontada por 23,5% dos respondentes do

questionário, como um local propício a ocorrência de bullying na escola. É lá que os bullies

agem no sentido de extorquir dinheiro e lanche das vítimas. É fato comprovado, pelas falas

dos alunos durante as entrevistas, que existe a requisição de dinheiro – a conhecida

capelinha – ou a cobrança de coca-cola dentro da escola, principalmente na cantina. Os

bullies se utilizam de várias estratégias para atingir o objetivo, seja tirando dinheiro das

vítimas para comprar, seja fazendo elas pagarem a conta. Utilizam-se para isso de ameaças,

perseguições e pressão psicológica.

Os alunos falaram a respeito da cobrança de capelinha e Coca-Cola na escola:

Tem uns piás que vão todos os dias pedir dinheiro, no alojamento ou no bar,

principalmente para os dos 1º ano. Isso pode ser considerado bullying! Tem alunos

que sofrem muito com isso. Teve um colega da minha sala que desistiu na 2ª ou 3ª

semana, pois iam cobrar 2, 5 reais dele todo dia. Não aguentou e foi embora...

Desistiu. (Aluno 01).

Alguns alunos, principalmente os do 3º ano, chegam falando: “Vamos lá tomar

uma coca, bixo? Bixo queremos tomar uma coca... vamos lá?” Ai a gente

pergunta: Sim e você vai ajudar com quanto?” Eles respondem: “Não é você que

vai pagar!” Esse é o palavreado que tem na escola, né. [...] Alguns alunos chegam

a desistir por causa disso... por causa da pressão colocada em cima deles. (Aluno

02).

Acontece que o 3º ano persegue o 1º fazendo os guris pagar capelinha. Ameaçam e

batem se eles não fazem o que eles querem e perseguem até a pessoa não aguentar

mais e querer desistir. Aconteceu comigo. Eu fiz relatório para o CGAE e o aluno

ameaçou de me bater, ele disse que era para mim me cuidar lá fora, que lá a gente

se acertava. (Aluno 04).

[...] todo mundo que paga coca sofre pelo menos uma pressão, assim para pagar:

“paga coca! paga coca!... Você tem que me pagar coca, você é meu afilhado.”

Todo mundo já pagou coca para os padrinhos que pediram. Já vi muita gente que é

obrigada também a dar dinheiro. (Aluno 05).

Eles acharam outra forma diferente de cobrar, tirar dinheiro... 90% dos alunos do

3º cobram coca. Tens uns que são mais espertos, eles falam que é prá gente ir

todos juntos, “convidam” sabe, só que não pagam nada, vão junto com nós no bar,

tomam e não pagam. Então é a mesma coisa que cobrar capelinha, só vão tomar,

mas quem tem que arcar com a conta é o 1º ano, eles não dão um centavo. (Aluno

06).

A poucos dias aconteceu que cinco alunos foram cobrar capelinha de um amigo

meu, lá no bar. Aí ele não pagou. Daí, no outro dia, eles voltaram em mais e

fizeram ele pagar. E por causa disso, pressionaram ele e fizeram ele pagar todo dia.

O cara... acho que deu prá eles uns cinquenta reais. Ai, um dia ele chegou

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chorando, me contou a história dizendo que ia desistir da escola por isso. (Aluno

08).

[...] um aluno me disse: “Ou tu me arruma sete pila hoje ou tu vai apanhar”. Ele

queria dinheiro prá comprar coca-cola. Eles fazem muitas ameaças... (Aluno 09).

Eu sei que alguns alunos cobram bastante, estão sempre em cima pedindo

dinheiro, ou então cobram coca. Eles dizem: “Vamos lá tomar uma coca?”. O

certo seria fazer uma vaquinha e todos pagar um pouco, mas eles sempre tomam e

nunca pagam, são sempre os mesmos que tem que pagar. Prá mim nunca

aconteceu, mas eu presenciei uma cena, do meu colega sendo ameaçado para pagar

coca. O piá falou prá este meu colega: “Ou tu paga agora ou a gente vai se

entender aqui!” Ele foi lá e pagou. Ele nem toma coca e teve que ir lá e pagar,

porque dá medo... é ameaçador. (Aluno 10).

Os relatos dos alunos trazem exemplos de como o bullying ocorre na cantina e em

outros locais da escola, ou seja, apontam como os bullies (normalmente alunos mais antigos

na escola) agem para extorquir dinheiro dos seus alvos. A cobrança de dinheiro (capelinha

ou Coca-Cola) acontece com bastante frequência na escola e assusta muitas vítimas, que de

tantas pressões e ameaças acabam chegando no limite da tolerância e optam por desistir da

escola, entendendo que esta seja a única opção para se livrar das intimidações. Estes dados

são muito significativos e preocupantes. Esse tipo de situação pode estar contribuindo para

aumentar os índices de desistência de alunos, conforme apontado pelas falas dos alunos 01 e

08.

Percebe-se que os bullies são hábeis e isso dificulta a visualização por parte da

escola deste tipo de situação. Além do mais, estes ameaçam as vítimas que tomadas pelo

medo não encontram coragem para denunciar a violência. Conforme aponta o aluno 10:

“[...] dá medo... é ameaçador.”

Internet – Apontada por 23% dos participantes a internet ou ambiente digital se

destacou como um local utilizado para a prática de bullying na escola pesquisada. Conforme

Lopes Neto (2011, p. 24) o bullying virtual (ou ciberbullying) é uma modalidade de bullying

indireto e utiliza as novas tecnologias de informação e da comunicação para a execução de

comportamentos deliberados, repetitivos e hostis. Apesar das recentes preocupações com o

crescimento da vertente virtual do fenômeno bullying, de acordo com as análises, o

ciberbullying ainda ocorre em menores proporções se comparado às agressões verbais e

físicas na instituição, porém merece atenção já que o grande desafio diante do ciberbullying

é a identificação das facilidades, causas e circunstâncias para que ocorram, além das

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possíveis implicações aos participantes e das soluções eficientes para preveni-lo e

interrompê-lo.

Gomes e Sanzovo (2013, p. 126) destacam que o incremento da tecnologia trouxe

muitas coisas positivas, porém em se tratando de bullying ela potencializou e aperfeiçoou o

tradicional fenômeno. O aumento dos ataques, da humilhação e da violência através de

celulares e internet foi notório. “O que antes ocorria fundamentalmente nas escolas ou nas

suas imediações agora se tornou ubíquo (todos os lugares) e ininterrupto (todo dia, toda

hora).”

As tradicionais relações interpessoais cederam lugar para usuários que interagem

entre si por um ilimitado rol de ferramentas, seja através de redes sociais, sites, blogs de

relacionamento, mensagens simultâneas, e-mail, etc. Na internet não há fronteiras nem

restrições. Ela pode ser usada para o bem ou para o mal. Ao mesmo tempo em que se

apresenta como um maravilhoso provedor de informações e instruções, pode apresentar

riscos, como a vulnerabilidade e exposição do usuário frente à dimensão da rede virtual,

principalmente quando se tratam de usuários adolescentes.

Conforme Lopes Neto:

A internet é parte integrante da adolescência, a adaptação à rede digital não é um

ato de imposição, porque os adolescentes cresceram com a internet representando

algo muito próximo do cotidiano, como um ingrediente a mais em suas vidas.

Nesta nova geração, que detém um alto domínio da moderna tecnologia, se

encontram os autores de bullying, que se utilizam desses recursos como mais uma

via para a prática de atos violentos. (LOPES NETO, 2001, p. 31)

De acordo com pesquisas, os atos de ciberbullying são mais frequentes fora do

ambiente escolar, mas a maioria dos autores estudam na mesma escola de seus alvos.

Portanto, o bullying pode começar no meio digital e, posteriormente, estender-se para o

meio escolar, ou vice-versa.56

Isto pode ser facilmente identificado na fala dos participantes da pesquisa:

Teve uma menina que sempre ficava me chamando de viadinho, gayzinho,... aqui

na escola. Daí ontem no facebook, ela ficou falando um monte de coisas da gente,

bem ofensivas, chamando de viadinho, gayzinho, postando e comentando fotos,

coisas sobre a gente, muitas ofensas pela internet, prá todo mundo. (Aluno 01).

Prá mim foi um pouco difícil porque antes de mesmo de eu entrar na escola, já

teve algumas meninas que conversavam comigo pelo facebook. Uma delas me

56

LOPES NETO (2008, p. 33).

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pediu se eu tinha madrinha e apelido... e eu respondi... Ai ela me disse que ia ser

minha madrinha e que estava me dando “tal” apelido. Só que eu não gostei! Ai eu

respondi prá ela: “Olha, eu já tenho madrinha e eu não gostei, eu não quero que me

dê apelidos.” [...] E ai, a menina implicou comigo. [...] nos primeiros dias de aula

eu estava na fila do refeitório, ela me fez encostar na parede, e então a gente

discutiu porque eu não quis encostar. [...] Ai, a menina disse que eu ia sofrer as

consequências. (Aluno 10).

Quanto às redes de relacionamento social (MSN, Facebook) as agressões são

espalhadas maciçamente e acabam identificando aquele que está sendo alvo das humilhações

e ameaças e essas conversações virtuais acabam sendo temas de comentários dentro do

ambiente escolar. Por isso, muitas dessas mensagens têm efeitos mais danosos do que se

fossem ditas pessoalmente.

Quando te agridem pela Internet, tudo fica mais difícil, porque não se sabe quem

fez, todo mundo fica sabendo e até quem você nem conhece faz comentários. É

muito, muito chato e humilhante. (Aluno 04).

Os ataques deliberados aos colegas, provenientes do exercício descometido da

liberdade na internet, conferem o poder de dispor da vida privada e informações pessoais

destes na rede. Os links em sites de relacionamentos, com perfis falsos, montagens e

ridicularizações diretas sobre determinadas pessoas, escondidas sob o anonimato, permitem

a exposição da imagem, da honra, e demais direitos de pessoas. Percebe-se na fala do Aluno

04, que quando se descobre que se é vítima deste tipo de ataque é muito humilhante,

principalmente pelo alcance e pela dificuldade de descobrir quem o está causando.

Conforme Tognetta (2013)57

“[...] para a vítima, o prejuízo no cyberbullying também é

maior: com muito mais pessoas contemplando o que sofre e por muito mais tempo, seu

sofrimento e dano são prolongados e agravados.

Compreender-se diante de todo o exposto que o alcance da internet é muito grande

e as consequências para os envolvidos em casos de ciberbullying também. É importante que

a escola assuma que o problema do cyberbullying também é de sua competência e que os

educadores estejam atentos e em conjunto encontrem formas de prevenir este mal que está se

disseminando cada vez mais entre os estudantes, principalmente entre os adolescentes. É

necessário um trabalho sobre o uso ético e seguro da internet, sempre ressaltando que a

internet possui uma série de potenciais interessantes e úteis, porém apresenta muitos riscos.

57

Tognetta, Luciene R. P. Em prefácio da obra de José Avilés (201305), p. 11.

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123

Sala de aula, quando o professor não está presente - O bullying está presente na

maioria das salas de aula e casos de agressões físicas e verbais, como já mencionado,

ocorrem nas salas de aula, inclusive na presença dos professores. Isso porque o fenômeno

bullying possui como uma das suas características a agressão psicológica, e esta se manifesta

de forma velada, silenciosa, através de um olhar, um sorriso irônico, gestos, bilhetinhos,

entre outros.

No caso da instituição pesquisada, 20% dos participantes apontaram nos

questionários, que o bullying ocorre dentro da sala de aula, principalmente na ausência do

professor, ou seja, nos momentos de troca de aulas ou quando o professor se ausenta da sala

por algum motivo. Conforme os alunos, a presença do professor inibe um pouco os ataques,

que são mais frequentes quando eles estão na sala de aula sem supervisão.

Na entrevista as falas dos alunos apontam que os atos acontecem com mais

frequência quando o professor não está na sala, porém durante as aulas ele também ocorre:

Na sala de aula, quando o professor está, eles quase não fazem isso, mas quando

ele sai ou tá ocupado, eu percebo, a exclusão, que eles não querem ficar perto de

mim ou então tiram com a cara, ou excluem, ou fazem piadinhas, ficam enchendo

o saco, rindo, atirando papel. (Aluno 01).

Quando o professor está na sala, eles não fazem para o professor escutar, mas às

vezes, eles fazem alguma coisa quando o professor está distraído ou está

explicando a matéria ou quando ele dá um tempo para a gente fazer o exercício ou

alguma coisa assim. Eles fazem alguma coisa para “tirar com a cara”, sempre,

sempre... não tem uma aula que eles não achem alguma coisa prá fazer com a

gente. Mas fora do horário, no intervalo das aulas, ali é pior, eles vão “tirar saro”

das outras pessoas. E fora da sala, nos corredores quando a gente passa na frente

eles também maltratam bastante, é bem chato! Quando vai no bar, encontra eles

prá lá e prá cá no caminho, é costumeiro ver eles falando ou fazendo alguma coisa

que ofenda, que acabe ofendendo a pessoa. (Aluno 02).

Quando acontecem casos de bullying ou maus tratos na sala de aula, o professor

muitas vezes acaba não percebendo ou se percebe simplesmente não interfere, ou ainda, sua

atitude perante a sala não basta para que os alunos entendam que deve prevalecer o respeito

em um ambiente escolar.

Muitas atitudes tomadas pelo professor podem influenciar negativamente na prática

de bullying. O professor que critica constantemente o seu aluno, o compara com outros, o

ignora, está expondo esse aluno a ser mais um alvo do bullying e de certa forma também

está agindo com desrespeito ao espaço pedagógico.

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[...] Na sala os professores deixam acontecer as coisas, eles acabam só se

preocupando com a matéria, passar os conteúdos. Tudo que fica acontecendo ao

redor parece que não importa, eles não se importam com as coisas que os alunos

fazem uns para os outros. Na minha sala é muito complicado. Mas o pior ainda, o

pior... são professores que reforçam e parecem que concordam com as atitudes de

bullying que acontecem, porque também chamam os alunos de apelidos, fazem

zoação, dão risada quando alguns são humilhados... (Aluno 03).

O aluno 03 traz à tona uma situação que retrata a forma como alguns professores

lidam com as ocorrências de bullying durante as aulas: não percebem ou ignoram, reforçam,

participam e expõem os alunos, entre outros. O professor deve cultivar na sala de aula a

ética, a importância do respeito mútuo, do diálogo, da justiça e da solidariedade. Ele não

deve admitir de forma alguma que situações de maus tratos entre alunos ocorram dentro da

sala de aula, e não se trata de punir os alunos e sim de trabalhar essas questões com eles, de

forma a debater, esclarecer, conscientizar, levar a reflexão. Isso inclusive está previsto nos

Parâmetros Curriculares Nacionais: na Apresentação dos Temas Transversais e Ética, o

professor deverá trabalhar em seu cotidiano pedagógico os conteúdos de ética, onde se

prioriza o convívio escolar.58

Trabalhar temas como respeito mútuo, respeito às diferenças, o

diálogo, a solidariedade, a justiça, é abordar valores necessários em qualquer relação.

Fazendo isso, estarão contribuindo para a formação ética dos alunos e para a prevenção do

bullying na sala de aula.

Se o professor trabalhar com os alunos a importância do respeito ele pode ser o

mediador de um ambiente de amizade e companheirismo, interferir de maneira coesa nas

chamadas brincadeiras de mau gosto, casos de bullying poderão não acontecer no interior ou

ao menos diminuir na sala de aula.

Mas, para que isto ocorra é necessário chamar a atenção dos profissionais da

educação para o bullying, que tem sido mascarado como brincadeira própria da idade

escolar, mas que tem como finalidade a intimidação, humilhação e exclusão. E está é uma

função da Instituição, proporcionar estudos e debates sobre o tema com todos os

profissionais e em especial, os professores, pois eles estarão em contato próximo e diário

com os alunos, tendo grandes oportunidades de não só intervir, como prevenir o fenômeno.

Para finalizar a exposição a respeito dos locais onde ocorrem situações de bullying

na escola, não podemos deixar de considerar e analisar outros dados significativos: se

58

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. PARÂMETROS

CURRICULARES NACIONAIS. Brasília: MEC/SEF, 1998. v.8.

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somarmos os valores obtidos com as alternativas: “Na rua, durante deslocamento de ida e

volta para a escola”, “Na entrada da escola (portão)”, “Na saída da escola” e no “No

transporte escolar”, obteremos um total de 28,2%, o que nos aponta para uma dinâmica de

violência/bullying que pode surgir muitas vezes dentro da escola, mas que vai se concretizar

fora dela, pela facilidade de ação dos bullies. Estes casos podem envolver alunos não-

internos, na ida ou volta da escola, mas também pode atingir alunos internos, nos momentos

em que eles precisam sair da escola.

Os alunos manifestaram na entrevista:

O que acontece... eles vem lá ou acabam batendo aqui dentro do colégio [...] ou

eles te chamam e dizem assim: “Vou te pegar depois, quando você estiver fora do

colégio”. [...] Qualquer cantinho que tu ir descuidado ou que tu estiver sozinho e

que não tiver câmeras, se eles te pegam... e depois que apanhou... (Aluno 09).

Lá fora do colégio dois formandos internos perseguiram e bateram em dois

calouros semi-internos, lá eles acertam as contas. (Aluno 08).

Fica evidenciada a facilidade encontrada pelos autores de bullying de atingir seus

alvos fora da escola, até porque lá não existe o controle e a supervisão desta. Pelo que é

possível identificar, é muito comum que situações ocorridas dentro da escola acabem sendo

“resolvidas” lá fora. Isso aumenta a angustia e o sofrimento dos alvos, que manifestam o

sentimento de falta de segurança e medo quando necessitam sair da escola ou mesmo

durante a ida e volta da escola. Se dentro da escola, muitas vezes se sentem inseguros, como

será na rua? Com certeza, fora da escola a exposição fica muito maior, principalmente se o

alvo se cala diante das ações agressivas e não busca apoio de familiares ou da escola.

4.1.4 – Os sujeitos envolvidos

Por mais que os sujeitos ocupem papéis diferentes nas ocorrências de bullying, seja

como alvos, autores ou espectadores, eles fazem parte de um círculo de relações sociais que

contribuem para multiplicar e propagar a violência. Conforme Eyng (2011, p. 106, grifo do

autor) “Todos esses atores, embora tenham papéis diferentes, são responsáveis, não tanto em

relação à ocorrência, mas sim em relação à repetição dos episódios, que passam a

caracterizar o comportamento de bullying.”

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Pode-se dizer também, que os papéis ocupados pelos sujeitos não são estanques,

uma vez que tanto os alvos quanto os autores também podem desempenhar o papel de

espectadores, assim como as vítimas também podem passar a ser autoras, dependendo da

situação em que se encontram.

Dos 209 alunos participantes da pesquisa, 41,15% (86) admitiram já ter maltratado

colegas de escola, enquanto 63,63% (133) admitiram já terem sido vítimas de maus tratos

por parte dos colegas. Assim como 80% dos alunos informaram já ter assistido, no mínimo

uma vez, cenas de bullying na escola, ou seja, já foram espectadores.

Percebe-se, através destes dados, que os alunos reconheceram seu envolvimento em

cenas de violência que ocorrem escola. Admitem ter tido envolvimento direto na prática do

bullying no IFC – Campus Concórdia, seja como alvos e/ou como autores de bullying, assim

como o envolvimento indireto, como espectadores. Destaca-se que este índice é alto e

preocupante, principalmente se comparado ao encontrado por outras pesquisas nacionais,

por exemplo, o obtido pela pesquisa da ONG Plan, onde 29,1% dos alunos se consideraram

praticantes de maus tratos, 27,8% confirmaram terem sido vítimas de maus tratos no

ambiente escolar e 70% dos alunos informaram já ter assistido a colegas sendo agredidos no

ambiente escolar ao menos uma vez. (PLAN, 2010).

Autores – De maneira resumida podemos definir o autor como aquele que age de

forma agressiva contra um colega que é supostamente mais fraco, com a intenção de

machucar, prejudicar, sem ter havido provocação por parte da vítima. O autor, comumente,

vê sua agressividade como qualidade, tem opiniões positivas sobre si mesmo e é bem aceito

por grande parte dos colegas. Sente prazer e satisfação em dominar, controlar e causar danos

nos outros.

Conforme Tognetta (2005, p. 06) os autores de bullying “buscam uma vítima que

lhes pareça vulnerável aos seus ataques, exatamente porque se referem a seu ‘ponto fraco’,

suas dificuldades. Os agressores sempre impõem sua autoridade, seja através do medo, pelas

ameaças morais ou da força física.”

O autor utiliza a insegurança de seus colegas para torná-los alvos de seu desejo de

se auto afirmar. Ele fala de características que a pessoa realmente tem, e que ninguém

negaria, conforme aponta Tognetta (2011), mas dá a essas características um sentido

pejorativo e maldoso. O autor detecta a vulnerabilidade e a diferença no outro, aliando a isso

sua força física e/ou habilidade cômica de fazer “piadinhas”.

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Para o autor, os atos de bullying são divertidos porque humilham a pessoa vitimada.

Quando esta aceita as agressões de forma pacífica torna-se alvo de chacota também para

outros alunos. O autor de bullying se sente bem, diante da sua turma ele é “o poderoso”, ele

se satisfaz ao ver o riso dos colegas ou muitas vezes se sente vingado pelas agressões ou

humilhações que sofre ou já sofreu em outros ambientes, entre eles, na própria escola.

Buscando-se os indicadores sobre os autores de bullying na escola pesquisada,

perguntamos aos alunos: “Você já maltratou (xingou, bateu, humilhou, ameaçou, etc)

repetidas vezes algum colega de escola?”

A tabela 3 indica as respostas obtidas à questão:

Tabela 3 – Autores de bullying

RESPOSTAS %

Sim, desde o ano passado maltrato alguns colegas 8 3.82%

Sim, comecei a maltratar colegas este ano 7 3,35%

Sim, já maltratei alguns colegas, porém não faço mais 36 17,22%

Sim, maltrato, pois já fui maltratado 35 16,75%

Não, nunca maltratei nenhum colega de escola 123 58.85%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Percebe-se através das respostas que 41,15% dos participantes admitiram serem

autores de maus-tratos contra os colegas. Destes, cabe destacar, que 17,22% afirmaram que

já maltrataram colegas, porém não fazem mais isto. Enquanto que 16,75% disseram que

maltratam outros colegas, pois já foram maltratados, ou seja, podem ser considerados

vítimas-agressoras, que cometem uma espécie de vingança, aumentando os índices de

violência na instituição pesquisada. Evidencia-se aqui, o fato de que as vítimas de bullying

tendem a replicar às agressões sofridas em outros colegas, transformando-se também em

autoras de bullying.

Visando identificar em que série/turma estão os alunos que costumam praticar

bullying, perguntamos aos alunos: “Em que (série/turma) estão os alunos que costumam

maltratar/praticar bullying com os colegas da escola?” Os alunos poderiam optar por mais

de uma resposta. Os resultados foram os seguintes: 72,25% dos participantes apontaram que

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os autores de bullying são de uma série/turma diferente da série/turma dos alvos; enquanto

27,75% afirmaram que os autores dos maus tratos são colegas que estudam na mesma turma.

A tabela 4 indica em que séries/turmas estão localizados os autores:

Tabela 4 – Série/turma dos autores

SÉRIE/TURMA RESPOSTAS %

1ª série 29 13,88%

2ª série 53 25,36%

3ª série 139 65,51%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Percebe-se através da análise da tabela, que a grande maioria dos autores são alunos

da 3ª série, ou seja, os formandos, que foram apontados por 65,51% dos pesquisados. Eles

representam a maioria dos autores de bullying, porém alunos das outras turmas também

praticam agressões contra os pares (colegas da mesma turma e/ou de outras turmas).

Destaca-se, no caso da instituição pesquisada, o fato de que os autores de bullying dirigem

suas ações contra alguém notoriamente mais vulnerável (neste caso, contra os alunos

novatos), caracterizando um desequilíbrio de força, de poder, de dominação. Isto não tem

apenas uma relação lógica baseada na idade dos bullies, ou seja, isso não ocorre

essencialmente por eles (formandos) serem mais velhos e os alvos (novatos) mais jovens, e

sim, pela relação desigual de poder que se estabelece entre os protagonistas (para os alunos

os “formandos mandam e novatos obedecem”). Conforme Gomes e Sanzovo (2013, p. 73)

“o bullying é derivado da relação desigual de poder entre os envolvidos.”

Em diversos comentários, durante a entrevista, os alunos expõem a questão de

dominação e do desequilíbrio de poder, exercida pelos formandos sobre os novatos, fato

muito claro dentro da instituição e que é responsável por muitos dos casos de bullying ali

existentes:

[...] Sempre vai ter essa divisão 1º, 2º e 3º ano escola. 1º ano tem que obedecer, 3º

ano mandar e 2º ano ficar na deles. (Aluno 01).

Principalmente o 1º ano é pressionado pelo 3º ano. Eles querem mandar, dominar a

escola e por isso colocam tanta pressão em cima dos novos que alguns não

aguentam... e, no caso, chegam até a desistir. (Aluno 02).

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Muitos dos que sofrem humilhação, cobrança, pressão são do 1º ano. Quem faz

isso é o pessoal da 3ª e alguns da 2º série, mas os formandos são os que mais

botam pressão. [...] Muitos estão no 3º ano e querem mostrar força, poder, eles

sabem fazer isso, sabem fazer aquilo. Então impõem bastante medo nos do 1º ano.

E é por causa desse medo que eles nunca falam nada... denunciam no caso...

(Aluno 04).

[...] Alguns dos alunos dos 3ºs anos querem comandar o colégio, eles querem ter

uma elite dos formandos, que mandam, que tem respeito dos outros, que na

verdade mesmo, impõem medo nos outros, nas pessoas. Então uma forma de

conseguir isto é mostrando autoridade e com eles ninguém se passa. [...] Pela

força, pela humilhação dos outros, eles querem conseguir respeito. (Aluno 06).

O que me irrita na escola é que todo mundo acha que os calouros são seres

inferiores, chamados de “bixos” e os formandos são os chefões, os superiores.

(Aluno 08).

A maioria do 3º ano não se integra com a gente. A maioria nem olha para a tua

cara, porque acham que a gente é “bixo”, o simples fato de você olhar para a cara

deles já os incomoda. Isso é uma falta de respeito, eles querem saber de mandar

em nós. (Aluno 09).

[...] formando sempre vai querer mostrar força. Eles sempre são os melhores, eles

que vão querer mandar no colégio enquanto você for 1º ano e eles fazem isso para

mostrar força[...] Formando manda e “bixo” obedece. (Aluno 10).

Fica explícita, por meio dos relatos, a presença da violência, da pressão, do uso do

poder pelos alunos formandos (3º ano) contra os do 1º ano (novatos), com objetivo de impor

respeito e dominar o meio do qual fazem parte. Conforme Calhau (2011, p. 09, grifo do

autor) “Os bullies são pessoas que gostam de poder e de controle.” O autor ainda destaca

(ibid, p.10) que os novatos, pela própria situação de ser novo no ambiente, ficam

fragilizados e expostos a situações de bullying. Destaca-se, neste caso, o fato do alvo ser

mais vulnerável e derrotável, estabelecendo-se uma completa relação desigual de poder entre

alvo e autor.

Alvos – Fazer uma análise a respeito dos alvos de bullying é essencial para

compreender a violência escolar, já que estes fazem parte do fenômeno, assim como os

autores e espectadores.

Conforme expõem Fante e Pedra (2008, p. 59) os alvos de bullying são

normalmente aqueles alunos que apresentam pouca habilidade de socialização, insegurança,

sensibilidade, fragilidade, timidez, medo, baixa auto-estima, passividade e submissão.

Debarbieux e Blaya (2002, p. 74) complementam, que alguns deles têm uma aparência física

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diferente dos demais ou apresentam uma fragilidade ou deficiência que se torna alvo de

zombaria por parte dos colegas.

A respeito dos alvos de bullying os alunos expressaram na entrevista:

Normalmente a maioria que passa por isso é mais pequeno. Não por judiar deles,

seria assim, como eles são pequeninhos eles não vão fazer nada, entende. Acho

que se sentem mais inferiores, frágil, humilhados. Não vão reagir... (Aluno 01).

Aquele que se destaca na sala de aula é muitas vezes discriminado e deixado de

lado. Na minha sala tem uma menina que é super inteligente, sabe tudo, estuda

horrores. Todo mundo se aproveita dela quando precisam, porém em outros

momentos ela é excluída, inventam histórias, fofocas, tudo para tentar acabar com

ela. É bullying com os nerds! (Aluno 01).

Na minha sala tem uma colega que é a mais inteligente, uma das mais inteligentes.

Todo mundo cai em cima dela para fazer trabalhos... e se aproveitam dela por ela

sabe bastante, quando querem tema trabalho, etc, mas em outras situações ela é

excluída e tem poucos amigos. (Aluno 02).

Pelo menino ser muito certo, muito inteligente, ele é excluído da turma, porque só

atrapalhava, só pensava em estudar, não era de muitos amigos, não se misturava

muito. (Aluno 05).

Eles acabam perseguindo quem digamos: não tem chance contra eles, quem tem

chance eles têm medo, eles fazem isso com quem não tem capacidade, tipo não

reage, não briga, não denuncia, não faz nada. O tímido, o quieto, o fraco. Tem

pessoas que eles sabem que não vão poder fazer nada. Os agressores só vão

perseguir aqueles que são fracos e não vão conseguir se defender ou os que batem

de frente com eles também. (Aluno 08).

É possível perceber através das falas dos alunos, que os alvos de bullying são

normalmente pessoas com incapacidade de se defender e solicitar ajuda, são tímidas,

introspectivas, física e psicologicamente mais fracas e também aquelas que possuem poucos

amigos e parecem mais solitárias.

A fala do aluno 01, quando aponta as características dos alvos: “[...] Acho que se

sentem mais inferiores, frágil, humilhados. Não vão reagir...” pode ser relacionada ao que

dizem Tognetta e Vinha (2008, p. 07) “Meninos e meninas que se fazem vítimas sentem-se

constantemente ameaçados, não somente por um algoz, mas por uma constatação implacável

no interior de si mesmas: ‘eu sou assim como ele diz’, ‘eu mereço ser chamada de ...’ ‘eu

não tenho como me libertar deles’.” Os alvos normalmente tem dificuldade de indicar o

motivo dos maus tratos e violência que ocorrem com eles. E não conseguindo encontrar

motivos concretos e externos, eles acabam se voltando para as características pessoais e se

culpando.

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Tognetta (2005, p. 07) traz que pessoas que se personificam como vítimas são:

[...] ansiosas, inseguras de sua autoimagem e de seus gostos e assim, podem ser

muitas vezes, sensíveis e caladas porque não têm como revidar, por medo, ou por

não terem forças suficientes para isso. Não denunciam por vergonha ou medo das

represarias e essa é sua grande dificuldade. Na verdade, muitas vezes ela não

denuncia, não contra-ataca influenciada pela insegurança: “puxa vida, eu sou

assim mesmo, é assim que eles me veem, eu não me vejo de forma diferente” o

que poderíamos também chamar de conformismo: “eu sou assim mesmo, não dá

pra mudar, não tem como ser diferente”.

Outra característica observada nas falas é que os alunos que apresentam um

excelente rendimento acadêmico também são alvos de bullying. De uma forma geral, pode-

se afirmar que o bullie está à procura de algo diferente na vítima, qualquer vulnerabilidade é

motivo para uma possível agressão. Aqui podemos incluir também os alunos novos na

escola, que também são comumente vítimas de bullying. (Teixeira, 2011, p. 35; Calhau,

2011, p. 10).

Visando conhecer a presença de alvos de bullying na instituição pesquisada,

perguntamos aos alunos: “Você já foi maltratado por seus colegas de escola?”

A tabela 5 indica as respostas obtidas à questão:

Tabela 5 – Alvos de bullying

RESPOSTAS %

Sim, desde o ano passado meus colegas me maltratam 27 12,92%

Sim, meus colegas começaram a me maltratar este ano 22 10,53%

Sim, já fui maltratado por colegas, porém não sou mais 82 39,23%

Não, nunca fui maltratado por colegas de escola 78 37,32%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Analisando-se os dados da tabela, observa-se que 63,63% dos alunos já foram alvos

de maus tratos por parte dos colegas, sendo que 12,92% afirmam ser vítimas desde o ano

passado; 10,53% dizem ter se tornado alvo no decorrer deste ano e 39,23% asseguram terem

sido alvos de maus tratos, porém não são mais. 37,32% expõem que nunca sofreram maus

tratos por parte dos colegas.

Vale destacar o fato de 39,23% dos alunos mencionarem já terem sido alvos de

bullying e agora não serem mais, o que reforça a ideia de que muitos alunos podem ter sido

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vítimas quando estavam no 1º ano e depois nos anos seguintes deixaram de ser vítimas,

podendo ter se transformado em autores de bullying.

Buscando saber quais os principais tipos de vitimizações a que os alvos da amostra

são submetidos, perguntamos aos alunos: Você é ou já foi vítima de algum desses

problemas? Foram possibilitadas alternativas de respostas e os participantes podiam

assinalar mais de uma resposta.

Os resultados estão expostos no gráfico7:

Gráfico 7 – Tipos de violência enfrentados

Fonte: Pesquisa de Campo (2013).

Pelas respostas obtidas à questão podemos constatar que a realidade dos alvos é

marcada por múltiplas vitimizações. O xingamento foi apontado por 113 vítimas ou 54%. A

experiência de humilhação (ser motivo de piada, rirem de você) vem logo a seguir,

respondendo por 48,3% dos casos ou 101 vítimas. Receber apelidos pejorativos foi apontado

por 90 vítimas, o que representa 43% dos participantes da pesquisa.

Interessante destacar também a alta ocorrência de violência “psicológica/moral”.

44,5% ou 93 participantes apontaram que foram ou são alvos de fofocas ou mentiras a seu

respeito (difamação). 38,8% já se sentiram ou se sentem intimidados ou ameaçados pelos

pares e 6,2% dos participantes já foram ou são discriminados por conta de sua cor, raça ou

opção sexual.

0 20 40 60 80 100 120

Ser discriminado por conta de sua cor,…

Ser vítima de ciberbullying

Ser intimidado, ameaçado

Ser agredido fisicamente

Ser furtado ou danificarem suas coisas

Ser alvo de fofocas ou mentiras a seu…

Ser motivo de piada

Ser xingado

Receber apelidos pejorativos

13

38

81

39

67

93

101

113

90

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Percebe-se claramente, na fala dos alunos, que a violência aparece na intolerância

ao outro (diferenças), na exclusão nos trabalhos em grupo, nos apelidos maldosos e no

preconceito à opção sexual do(a) colega, entre outros.

[...] eu acabei sendo excluída do grupo em si, da turma, da turma inteira. Daí,

quando tinha que fazer trabalhos ou alguma coisa em grupo, em cinco, em quatro,

em três, em dupla até, eu era a que sempre ficava por último. “Alguém ficou

sozinho?” – o professor perguntava. Eu levantava a mão: “Sim, eu fiquei sozinha!”

Daí eu sempre acabava fazendo individual, sempre sozinha. [...] Eu nunca cheguei

a perguntar... nunca tive coragem de chegar e perguntar por que ninguém queria

fazer grupo comigo. (Aluno 02).

Por ele ser diferente... por ser de uma classe inferior... por ser diferente de todas as

outras pessoas é deixado de lado, excluído, humilhado... (Aluno 05).

Eu acho terrível os apelidos... [...] Geralmente a maioria são maldosos... são

referente a questão física da pessoa. (Aluno 05).

Ainda chama a atenção, os casos de vitimização física ou material. 32% dos

participantes indicaram que já foram furtados ou tiveram suas coisas danificadas e 18,7%

foram ou são agredidos fisicamente, com empurrões, chutes, socos, pontapés, por seus pares.

Conforme Tognetta e Vinha (2008) os alvos de bullying geralmente são

intimidados com ameaças a questões psicológicas, costumam servir de “chacota” para os

outros e mesmo têm seus pertences destruídos.

Ainda entre os vitimizados da amostra, 18,2% dos participantes apontaram ser ou

ter sido vítima de ataques virtuais, ou seja, foram humilhados, ameaçados, constrangidos,

vítimas de fofoca através da internet (via e-mail, facebook, Skype, MSN).

Cabe destacar, que para que o fenômeno bullying seja apropriadamente

caracterizado é preciso que tenhamos a repetição das condutas violentas59

, por isso

investigamos, além dos tipos de violência sofridas, há quanto tempo os alvos estão se

sentindo incomodados pela maneira como são tratados pelos seus colegas.

Sendo assim perguntamos aos participantes que se pronunciaram como alvos da

violência na escola: “Há quanto tempo você está se sentindo incomodado (a) com a maneira

como é tratado pelos seus colegas?”

Em resposta, 43% dos alvos informaram que sofrem violência por parte dos colegas

desde que entram na escola (no 1º ano) e 11% responderam que passaram a ser alvos desde

59

A frequência da vitimização (quantas vezes as agressões têm ocorrido dentro de um determinado espaço de

tempo).

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o início do ano. Os demais não se manifestaram sobre o tempo em que estão expostos às

vitimizações ou responderam que não estão incomodados.

Ainda com relação ao tempo e a frequência dos acontecimentos violentos,

investigamos também quantas vezes os alvos se sentiram incomodados na última semana

(questão nº 15). Dos pesquisados, 120 ou 57,4% apontaram que sofreram maus tratos na

última semana. Destes, 19% informaram ter sofrido pelo menos duas vezes na semana;

15,8% sofreram ataques uma vez na semana; 13% sofreram três vezes na semana e 9.6%

sofreram maus tratos todos os dias da semana.

Sabendo-se da dificuldade dos alvos em relatar seu envolvimento no bullying para

alguém responsável pela escola ou mesmo para os familiares, o presente estudo investigou

se os alvos após sofrerem violência buscaram ajuda para poder sanar e superar o que vem

ocorrendo em suas vidas. Questionamos os alunos alvos se eles já haviam contado para

alguém o que estava acontecendo com eles no ambiente escolar (questão nº 16).

As tabelas 6 e 7 indicam os resultados:

Tabela 6 – Contou para alguém?

RESPOSTAS %

Sim 80 38,27%

Não 70 33,49%

Isso nunca aconteceu comigo 59 28,22%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013).

Conforme aponta a tabela, 38,27% dos alvos contaram para alguém sobre o que

vem acontecendo com eles na escola, porém 33,49% não revelaram a ninguém sobre as

situações de violência que vem sofrendo na escola.

Tabela 7 – Para quem contou?

RESPOSTAS %

Pais 35 43.75%

Professores 05 6,25%

CGAE/ Direção 16 20,00%

Colegas/Amigos 56 70,00%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013).

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Entre os escolhidos para os alvos contarem e pedirem ajuda a respeito deste

problema, aparecem em primeiro lugar os colegas/amigos de escola com 70%, e em segundo

lugar os pais com 43,75%, em detrimento do quadro funcional da escola. A respeito de

confiar em alguém para contar sobre o bullying, o Aluno 09 comenta: “Eu iria contar

primeiro para os meus amigos. Depois, dependendo da gravidade eu falaria com os meus

pais e em último caso eu comunicaria o colégio, caso viesse a sofrer agressão de alguém.”

Ocorre que, geralmente, os envolvidos tentam camuflar os atos de violência – os

alvos omitindo os fatos e os autores ameaçando o outro para não os revelar, sob pena de

punição. O silêncio dos alvos se torna aliado poderoso dos autores, garantido por medo,

vergonha e intimidações.

[...] são inúmeras as formas de violência velada que enfrentam muitos de nossos

alunos, dentre elas humilhações, gozações, ameaças, imputação de apelidos

constrangedores, chantagens, intimidações. Na maioria das vezes as vítimas

sofrem caladas por vergonha de se exporem ou por medo de represálias dos seus

agressores, tornando-se reféns de emoções traumáticas destrutivas, como medo,

insegurança, raiva, pensamentos de vingança e de suicídio, além de fobias sociais e

outras reações que impedem seu bom desenvolvimento escolar. (FANTE, 2005, p.

16).

Sobre o silêncio dos alvos diante das situações de agressão, humilhação e

desrespeito os alunos comentaram:

Eles não denunciam por medo. A maioria sente medo e não vai falar nunca, de

forma alguma, só com os conhecidos deles, e principalmente com as pessoas que

eles deveriam comentar (que é os pais), eles não contam, aí é que está o problema,

se eles falassem para os pais ou talvez fizessem uma reclamação para a APP da

escola, isso poderia mudar. (Aluno 04).

[...] o cara não vai entregar quem está ameaçando ele de medo, porque depois as

consequências podem ser piores, eles ameaçam bater, de acertar as contas fora do

colégio. Ai o que acontece: o cara não entrega de medo. Então entregar o cara,

contar para alguém não é.. talvez não sei se vai resolver. (Aluno 09).

Percebe-se que na escola, mesmo tendo um grande número de alvos que consegue

delatar seu agressor, entre muitos ainda impera o silêncio. Conforme Stival et al (2011, p.

191) “O medo de retaliação e as ameaças são considerados como argumentos para manter

oculta a situação.” Faz parte do bullying impor à vítima o silêncio, isto é, ela não pode

denunciar à direção da escola, nem aos pais, sob pena de piorar sua condição de

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discriminada. Normalmente pais e professores só ficam sabendo do problema através dos

efeitos e danos causados, como a resistência em ir à escola, queda de rendimento escolar,

retraimento, depressão, distúrbios psicossomáticos, fobias, etc.

São circunstâncias como estas, aliás, que sugerem ser o fenômeno, em larga

medida, invisível nas escolas; o que, por sua vez, autoriza a hipótese de uma

determinada aceitação do bullying, tanto pelos professores e dirigentes das

instituições escolares, quanto pelos pais dos alunos. Uma omissão que funcionará

sempre como estímulo. (ROLIM, 2010, p. 51).

Cabe enfatizar ainda, a condição de descrença dos alvos com relação às situações

de vitimização, o que ocasiona uma “sensação” de falta de perspectiva sobre a possibilidade

de que estas venham a cessar (conforme exposto pelo aluno 09). Por vez, isso poderá

contribuir com outro problema, cria-se a ilusão de que se deve conviver com essas situações

(se acostumar).

Rolim ainda acrescenta que o silêncio costuma ser regra também entre os

espectadores. (ibid, p. 52) Estes podem se isentar de responsabilidade diante dos fatos

presenciados ou temer que os agressores, após serem informados sobre quem comunicou o

fato, passem a maltratá-los e assediá-los também.

Espectadores – A maioria dos alunos podem ser considerados espectadores numa

situação de bullying. (SILVA, 2010; FANTE, 2005; GOMES e SANZOVO, 2013;

TOGNETTA, 2010). São aqueles que testemunham, assistem as ações dos agressores contra

os alvos e que podem ter variadas reações diante dos fatos: ficar passivo (não tomar

nenhuma atitude); ficar com medo de ser a próxima vítima; juntar-se ao agressor e reforçar o

bullying (manifestar apoio “moral”, com risadas e palavras de incentivo), sair em defesa dos

colegas alvos (defender); não demonstrar nenhuma sensibilidade diante das situações

presenciadas.

Embora não pratiquem nem sofram as humilhações e agressões, os espectadores

também acabam sendo alvos das consequências do bullying. Conforme Teixeira (2011, p.

38) os espectadores normalmente apresentam ansiedade, preocupações e angústias e podem

sentir vergonha de fazer perguntas e esclarecer dúvidas com os professores por medo de se

tornarem alvos de chacotas.

Conforme citado, a pesquisa revelou que 80% dos alunos participantes já

assistiram, no mínimo uma vez, cenas desse tipo de violência na escola, ou seja, já foram

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espectadores e que 74% conhecem colegas que sofrem bullying na escola – isto representa

que a maioria dos alunos convive como espectadores na escola. Estes números são maiores

do que os encontrados na pesquisa da ONG Plan, onde aproximadamente 70% dos alunos

informaram já ter assistido a colegas sendo agredidos no ambiente escolar ao menos uma

vez. (Plan, 2010).

A respeito dos espectadores os alunos trazem:

A maioria vai na onda dos outros, segue o que eles querem para não ser a próxima

vítima, fazem o que a maioria vai fazer de medo. “Se fazem isso prá ele, o que

poderão fazer comigo?” Ou então fazem de conta que não viram prá não chamar a

atenção. (Aluno 02).

O comportamento deles (dos alunos que cometem bullying) é muito diferente

quando está um deles só, do que quando está no grupo. Onde está só um (uma

pessoa só), eles se sentem vulneráveis, então prá eles agir tem que ter o grupo

inteiro apoiando, prá dar aquela força. Agora se tem apenas um deles, ele fica

quieto, no canto dele. Mas quando está presente o grupo eles se sentem os

machões, sempre precisam dos outros prá dar apoio, quem faz as agressões sempre

precisa dos apoiadores. (Aluno 06).

A fala do aluno 06 demonstra o papel desempenhado pelos espectadores – o de

plateia apoiadora – a necessidade do autor de estar com o grupo que lhe apoia e ri de suas

maldades. Já o aluno 02 relata um pouco da angustia e medo que os espectadores enfrentam

diante das situações de bullying e que, muitas vezes, o impedem de tomar qualquer atitude,

seja esta de defesa do alvo e/ou de denunciar o autor dos maus tratos.

Para Gomes e Sanzovo (2013, p. 99, grifo do autor):

Espectadores assíduos da violência funcionam como espécie de plateia (ou

termômetro) para os atos de bullying dos agressores. Se forem favoráveis às

ofensas (físicas e morais) testemunhadas, os autores identificarão as atitudes como

apoio e incentivo, fortalecendo seus impulsos hostis. Do mesmo modo, se optarem

pelo silêncio, não interferindo nas agressões presenciadas, tampouco delatando os

responsáveis pelo fenômeno, estimularão igualmente os bullies (já que estes

entendem o silêncio como aprovação de suas condutas), e a impunidade restará

garantida.

Eyng (2011, p. 107) também aponta que o fato dos espectadores não se

posicionarem diante dos eventos de violência, reforça o comportamento dos autores e

consequentemente amplia o sofrimento e constrangimento das vítimas.

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Buscando compreender o papel assumido pelos espectadores, ou seja, quais reações

os alunos costumam ter diante do bullying, perguntamos aos participantes: Como você

costuma reagir quando vê algum colega sofrendo bullying?

A tabela 8 expõe as reações apontadas e a respectiva porcentagem:

Tabela 8 – Reações frente ao bullying

REAÇÕES RESPOSTAS TOTAL (%)

Quando vejo cenas assim, procuro sair de perto e faço de conta

que nem vi

67 32%

Fico parado assistindo a cena 33 15,8%

Procuro ajudar quem está sendo agredido (“saio em defesa do

agredido”)

34 16,3%

Normalmente dou risada em casos assim 17 8%

Peço aos agressores que “parem” com a violência 40 19%

Não faço nada porque isso é normal entre os colegas 28 13,4%

Conto para um responsável pela escola (professor, direção,

coordenação)

26 12,4%

Conto para os colegas 22 10,5%

Eu nunca vi uma situação deste tipo 27 12,9%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013).

Diante das respostas, percebe-se que os alunos possuem reações variadas diante do

bullying e são de omissos a incentivadores, de temerosos a solidários. Dos 209 alunos

participantes da pesquisa, quando colocados na condição de espectadores do bullying, 47,8%

admitiram sentimentos de solidariedade e ajuda aos alvos, seja defendendo o agredido ou

contando para alguém responsável o fato acontecido; 32% demonstraram temor quanto a sua

própria integridade, saindo de perto sem se envolver na situação; 29,2% demonstraram

indiferença pelas situações de bullying presenciadas e 8% admitiram que atuam como

incentivadores, dando “apoio moral” aos agressores, com risadas e palavras de incentivo.

Verifica-se que na instituição, embora muitos alunos espectadores demonstrem

solidariedade e ajuda aos alvos, é muito comum terem dificuldades de se posicionar e

defender um colega que esteja sendo alvo de agressões e humilhações. A indiferença e o

silêncio dos espectadores acabam ajudando na manutenção do fenômeno bullying, pois a

passividade destes pode representar uma legitimação às agressões, quando nada fazem para

impedi-las.

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Eyng (2011, p. 106) fala que ninguém pratica o bullying sozinho e que todos são

responsáveis com relação à repetição dos episódios. A respeito dos espectadores ela coloca:

O silenciamento, a indiferença, o despreparo ou o medo dos expectadores, cuja

falta de posicionamento, apoiando, defendendo, acolhendo a vítima e/ou

conscientizando o agressor sobre a inadequação do comportamento pode fazer

com que os resultados da ação dos bullies sejam reforçados. (ibid, p. 107, grifo do

autor).

Os espectadores tem um papel muito importante no estabelecimento e na

manutenção do bullying, ao encorajar e reforçar o papel do autor, que está buscando ganhar

o “respeito” dos pares ou como os próprios adolescentes costumam dizer “ganhar moral”

diante dos colegas. Normalmente seu papel acaba dando suporte ao autor, pois “se não há

plateia não há espetáculo.” (Gomes e Sanzovo, 2013, p. 99). Já Tognetta (2011, p. 144)

coloca que a maior recompensa de um autor é ver seu sucesso diante dos outros. Daí a

importância dos espectadores na manutenção do bullying.

A respeito das atitudes dos espectadores um aluno comentou:

Sempre tem os que se acham e provavelmente sempre tem os que vão na onda.

Tem um que se acha e provavelmente tem um companheiro que vai na onda.

Quando acontece uma situação de violência, discussão, a maioria (a turma) grita,

berra, dá risada, a turma mesmo age incentivando, ficam colocando fogo, prá

poder dar risada. A turma fica de platéia. São apenas 1 ou 2 que tentam evitar,

defender quem está sendo vítima. (Aluno 04).

A fala acima retrata exatamente o que a teoria traz a respeito do papel

desempenhado pelos espectadores nas cenas de bullying. Gomes e Sanzovo (2013, p. 83)

constataram que:

[...] é muito raro que os atos de bullying sejam praticados sem testemunhas, sem

espectadores (os agressores necessitam de testemunhas para a demonstração do

seu ato de poder). Geralmente, os espectadores apoiam tais condutas e o fazem

com risos, com outros comportamentos ou, até mesmo, com o próprio silêncio.

Tognetta e Vinha (2010, p. 452, grifo do autor) por sua vez complementam: “[...]

não há bullying sem que haja um público a corresponder com as apelações de quem ironiza,

age com sarcasmo e parece liderar aqueles que são espectadores”. As autoras descrevem que

é o público que assiste aos atos de bullying que alimenta a continuidade destes.

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Porém, os espectadores podem assumir outra atitude e se posicionar em defesa dos

alvos, especialmente quando mantem laços de amizade, fato este expressado por 48,7% dos

pesquisados. Ens (2011, p. 54, grifo do autor) destaca que “os observadores são uma peça-

chave no combate do bullying e podem contribuir para diminuir a sua ocorrência.” A

respeito disso Gomes e Sanzovo (2013, p. 99) complementam: “é incomensurável a

importância da atuação dos estudantes na prevenção e no combate ao bullying, seja

reprovando as ações ofensivas e, por conseguinte, inibindo a prática, seja delatando os

autores, coibindo, assim, futuras agressões.”

Todo o exposto a respeito dos espectadores ou testemunhas do bullying levam a

crer que a escola deve investir em ações de prevenção e combate ao bullying voltadas

principalmente para este grupo, para que tomando consciência do seu poder, se indignem

com as injustiças que ocorrem na escola e não permitam mais ser usados pelos agressores

como grupo de apoio. É fazer, como expõe Tognetta (2010) “que esses meninos e meninas

se indignem com situações de injustiça.”

Perguntamos também aos alunos: Como você se sente ao presenciar cenas de

bullying? A tabela 9 apresenta os resultados

Tabela 9 – Sentimentos ocasionados ao presenciar cenas de bullying

SENTIMENTOS RESPOSTAS TOTAL (%)

Fico com medo que possa acontecer comigo também 106 50,7%

Fico chateado/triste, pois já fizeram isto comigo também 49 23,4%

Fico preocupado com os colegas agredidos 74 35,4%

Acho engraçado 20 9,6%

Não sinto nada, são brincadeiras 35 16,7%

Eu nunca vi situações deste tipo 10 4.8%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013).

A apreciação da tabela acima mostra que 50,7 % dos espectadores se mostram

amedrontados com a possibilidade de se tornar “a próxima vítima”, fato este que os leva

silenciar e a concordar com as ações dos autores, mesmo que seja pela indiferença ou pura

aceitação. Apesar de não sofrerem as agressões diretamente, muitos deles podem se sentir

incomodados com o que veem e inseguros sobre o que fazer.

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Conforme Lopes Neto (2005); Fante (2005); Fante e Pedra (2008), as testemunhas

também se veem afetadas por esse ambiente de tensão, tornando-se inseguras e temerosas de

que possam vir a se tornar as próximas vítimas.

Observa-se também que 35,4% ficam preocupados com os colegas agredidos e

tendem a demonstrar solidariedade a estes. Lopes Neto (2005, 2011) aponta que grande

parte dos espectadores sente simpatia pelos alvos, tende a não culpá-los pelo ocorrido,

condena o comportamento dos autores e deseja que a escola intervenha mais efetivamente

nos casos.

Boa parte dos espectadores (23,4%) também apontaram que se sentem chateados

com a situação, visto que já passaram por isso e sabem o quanto é sofrido ser alvo de maus

tratos pelos colegas.

Infelizmente, cabe registrar, que na instituição pesquisada, 26,3% dos espectadores

se posicionaram como apoiadores do bullying, sendo que consideram como brincadeiras as

ocorrências de maus tratos e violências contra os colegas, achando isso normal e engraçado.

Conforme apontamentos feitos por Tognetta e Vinha (2010a); Fante (2005), Lopes

Neto (2011), entre outros autores: os espectadores têm papel específico nas condutas de

bullying. Se o autor de bullying tem uma plateia que aprova suas atitudes é bem provável

que ele persistirá agindo desta maneira. Diante disto, percebe-se que as ações contra o

bullying precisam focar nos espectadores, esta “maioria” não violenta que, por consentir,

apoiar, incentivar ou ignorar, fomenta tais práticas.

Lopes Neto (2005, p. S168) fala que quando as testemunhas interferem e tentam

cessar o bullying, essas ações são efetivas na maioria dos casos. O mesmo autor (2011, p.

57) coloca que “Os que não praticam ou sofrem bullying devem ser entendidos como parte

do problema e parte da solução”. Deste modo, é importante incentivar o uso desse poder

advindo do grupo, fazendo com que os autores se sintam sem o apoio social necessário.

Catini (2004, p. 168) reforça dizendo que “quando os espectadores enxergarem atitudes que

vão além de interesses individualistas para vislumbrarem a grandeza das ações cooperativas,

seu papel não será mais o de compactuar em silêncio.”

A escola precisa em sua abordagem do bullying, visando sua redução, envolver

toda a comunidade escolar e seus objetivos devem estar voltados a essa maioria silenciosa,

para que também se sintam responsáveis pela prática de bullying e se sensibilizem para agir

cada vez mais em defesa dos colegas vitimizados. Assim como colocam Gomes e Sanzovo

(2013, p. 84) “se os espectadores atuam em grupo em favor da vítima e contra a vitimização,

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desfazem o poder/fortalecimento/status do agressor e, de acordo com os autores, esta

solução é muito mais efetiva que um eventual castigo ao bully.”

4.1.5 – Aspectos motivadores

As agressões do bullying são consideradas gratuitas por que a pessoa vitimada,

geralmente, não cometeu nenhum ato que motivasse as agressões. Geralmente acontece por

motivos discriminatórios ou preconceituosos, racismo, classe social, biótipo e estereótipos

que fogem do padrão imposto pela sociedade, por exemplo, ser de etnia diferente, ser um

bom aluno e tirar boas notas, ser frágil ou muito pequeno, usar óculos, estar acima do peso,

possuir atitudes afeminadas para os homens ou masculinizadas para as mulheres, ou seja,

por seu porte físico, suas atitudes e valores, entre muitos outros (FANTE, 2008).

Para algumas pessoas, e em especial na adolescência, a agressividade pode ser uma

estratégia adotada para promover a autovalorização uma vez que se acredita que alguém que

“vence” em disputas entre pares é alguém melhor. Verifica-se que o desencadeamento dos

maus tratos é, muitas das vezes, para obtenção de poder e respeito diante do grupo.

Com o propósito de conhecer os motivos ou aparentes causas que levam os alunos

da escola a praticarem maus tratos contra os outros colegas, indagamos os participantes da

pesquisa sobre o que leva um estudante a praticar bullying contra o colega. Esta questão

proporcionava escolher mais de uma opção. A tabela 10 apresenta os motivos apontados e

suas respectivas porcentagens.

Tabela 10 – Motivos para a prática de bullying na escola

MOTIVOS RESPOSTAS TOTAL (%)

Ele faz isto porque quer ser mais popular, sentir-se poderoso. 137 65,55%

Ele faz isto porque é mais forte. 51 24,40%

Ele faz isto porque se “acha melhor” que os outros. 135 64,60%

Ele faz isto por diversão. 76 36,36%

Ele faz isto porque é uma pessoa que não se preocupa com os

sentimentos do outro.

65 31,10%

Ele faz isto porque deve ter uma relação familiar na qual tudo

se resolve pela violência verbal ou física e ele reproduz isso no

ambiente escolar.

29 13,87%

Ele faz isto porque fizeram isto com ele (já sofreu bullying). 133 63,64%

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Ele faz isto por não aceitar que as pessoas são diferentes. 34 16,27%

Ele faz isto porque não é punido. 52 24,88%

Ele faz isto porque as vítimas merecem, elas provocam. 35 16,75%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Popularidade, o bullying como um fenômeno grupal – A relação desigual de

poder entre os protagonistas do bullying pode ser evidenciada quando observamos a razão

mais citada pelos participantes da pesquisa para a ocorrência de bullying: “querer ser mais

popular, sentir-se poderoso”. Isto significa que grande parcela dos alunos (65,55%) tem

plena consciência de que poder e hierarquia estão envolvidos com as agressões praticadas

entre os alunos. Eles querem dizer, que os bullies praticam barbaridades com o intuito de

alcançar destaque no grupo escolar, a chamada “aceitação escolar”.

Conforme colocam Gomes e Sanzovo (2013, p.64, grifo do autor) “Entendem que

as práticas agressivas lhes garantem status e popularidade escolar.” Muitos alunos acabam

acreditando que o uso de comportamentos agressivos contra os colegas é o melhor caminho

para alcançarem a popularidade e o poder e, por isso, tornam-se autores de bullying. O que

os satisfaz é a sensação de poder, que é também afirmado e reforçado por aqueles que estão

à sua volta e que ajudam ou mesmo pactuam com suas ações.

Para os alunos as agressões contra os colegas podem ser motivadas pelo objetivo de

se sobressair diante do grupo, de conseguir um papel de destaque. Nesses casos prevalece a

satisfação pelo estabelecimento e manutenção de uma posição de destaque e comando no

grupo e a total insensibilidade aos sentimentos dos alvos.

Conforme os alunos, muitos fazem isso porque querem ser mais populares,

sentirem-se poderosos. “O bullying é um fator de risco para a violência institucional e social,

bem como para comportamentos antissociais individuais e pode significar uma forma de

afirmação de poder interpessoal por meio da agressão.” (LISBOA; BRAGA; EBERT, 2009,

p. 61).

Sobre os motivos que levam à prática de bullying os alunos comentam:

Muitas vezes isso acontece porque muitos querem ter mais condições, mais

prestígio que os outros, então eles se acham, e eles tentam rebaixar os outros

porque eles se acham os “tal” da escola, então como eles pensam que mandam,

comandam a escola, eles rebaixam os outros, não conhecendo as pessoas, e não

tendo esse tipo de percepção de que a pessoa pode ser gente boa, pode ser uma

pessoa legal, eles querem conseguir ser os melhores, acabando com os outros.

(Aluno 04).

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A vontade de chamar a atenção, digamos que querem comandar o colégio, eles

querem ter uma elite, que mandam, que tem respeito dos outros, que na verdade

impõem medo nos outros, nas pessoas. Então uma forma de conseguir isso é

mostrando superioridade, autoridade e com eles ninguém se passa. Prá eles terem

poder é mais fácil falar mal de alguém, humilhar do que conseguir o respeito pela

educação, pelo que ele é ou pode ser, mas sim pela força que eles querem

conseguir respeito. (Aluno 06).

Os formandos, por motivos óbvios, querem ganhar, fazer média, ganhar uma

moral, na escola e com as meninas, por isso fazem isso com os outros. (Aluno 08).

Pode-se estabelecer uma relação entre a fala do aluno 04: “[...] querem conseguir

ser os melhores, acabando com os outros.” e o que diz Tognetta (2005, p. 09): “Existem

muitas pessoas que se veem como melhores e não são morais, portanto, suas respostas às

relações são sempre no sentido de menosprezar o outro, para comprovar a si mesmas que são

melhores. Necessitam continuar sendo maiores e melhores que o outro e fazer com que este

se sinta ‘pequeno’.” É o individualismo que prospera mediante a ótica da realização pessoal,

ou seja, eu tenho que me dar bem não importa por cima de quem terei que passar. Ou então,

a total negligência às diferenças individuais.

Geralmente se tem uma pessoa que eles não gostam ou que atrapalha eles (sabe...

se destaca), então eles unem a turma deles e resolvem acabar com a moral dessa

pessoa, então eles pegam e começam a inventar histórias mesmo, prá todo mundo

do colégio, prá ninguém gostar daquela pessoa. (Aluno 06).

Conforme Tognetta e Vinha (2008, p. 03) o autor de bullying é “ágil em manobras de

articulação da turma para se voltarem contra um alvo e é um provocador permanente.” Fato

este expressado pelo aluno 06, quando fala que para conseguirem destaque como os

melhores, os autores reúnem/articulam os demais colegas para atingir a vítima.

Quando consideramos o bullying como um problema moral, podemos dizer que

nestes casos o autor (agressor) não se vê com valor e por isso precisa mostrar a todos que é

melhor. Ele também carece de sensibilidade moral, ou seja, não vê o outro como digno de

respeito e por isso não se sensibiliza com a sua dor.

A teoria de Adler (1935, apud TOGNETTA, 2009) considera que o “sentir-se

inferior” é parte do ser humano, ele deseja sempre a superação e pode buscar seu objetivo

diminuindo os outros, inclusive com agressividade. Em contrapartida, quem sofre o bullying

pode apresentar uma tendência conformista deste “ser inferior”, aceitando a imposição dos

outros sobre si.

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Conforme Tognetta (2011, p. 139) há no homem um sentimento de inferioridade

(que pode explicar condutas mais agressivas) que o conduz sempre a buscar a superação de

si, ou melhor, ele precisa se sentir bem e importante entre aqueles com os quais convive.

Neste sentido TOGNETTA (2009, p. 5) diria que a eterna busca do homem é uma “uma

superação de si”. O homem almeja, dia após dia, uma imagem positiva que o represente.

Porém, destaca-se segundo Tognetta (2011, p. 139) que o problema está nas “formas

pelas quais esses sujeitos tratam uns aos outros para dar conta dessa necessidade de

atribuição de valor, ora menosprezando o outro, ora validando a posição de menosprezo em

que são colocados.” Ou seja, o ser humano nas relações com o outro se utiliza da

intimidação, da violência e do menosprezo, para diminuir o outro e se sobressair, constituir

uma imagem de valor diante dos outros. Muitas vezes, mesmo não tendo suas ações

comumente pautadas na violência, pode passar a tê-las quando na presença de outros, na

busca de uma boa imagem ou de “pertencer” ao grupo de iguais.

Isso pode ser identificado na fala deste participante, quando indagado a respeito do

que leva um colega a cometer atos de violência/bullying contra outro colega:

Querer se achar um mais do que outro... Porque se um deles está sozinho, está

tranquilo, dá para conversar, dá para brincar, dá para fazer qualquer coisa. Aí,

quando outro ou os outros aparecem, o mesmo guri quer se achar mais, e muda de

comportamento. “Ah, porque eu sou mais que você então eu tenho que aparecer

mais, eu tenho que ter mais fama aqui dentro, então você não pode aparecer mais

que eu.” Daí eles disputam... um tenta bater o outro assim... nas palavras. Um

querendo aparecer mais que o outro. O motivo é de se achar mesmo aqui no

colégio. (Aluno 02).

Percebe-se na fala do aluno que quando na presença do grupo o colega muda de

atitude, sempre com o intuito de ser melhor, de ser mais importante, de chamar a atenção. E

para que isso aconteça não importa quem ele terá que atingir, ele buscará de todas as formas

ser o melhor. Nestes casos, se utiliza da ridicularização de colegas, do menosprezo, da

violência verbal, entre outros. Krynski (2000, p.44) coloca que “Aí entra o problema do

grupo adolescente. O indivíduo sozinho não é assassino, mas o grupo é, e como o grupo

domina o adolescente, ele se torna um assassino em potencial.” Assassino no sentido das

relações humanas, do respeito com o outro. O grupo legitima as ações individuais. Ou como

apontam Gomes e Sanzovo (2103, p. 59) “O bullying é um fenômeno necessariamente

grupal.”

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Percebe-se que o bullying na instituição pesquisada aparece como uma forma de

exaltação do poder no grupo em que se está inserido, levando em consideração que o poder

passa a existir entre as pessoas quando elas agem juntas e desaparece no instante em que eles

se dispersam (conforme a fala do aluno 02), ou seja, quando estamos em grupo somos

capazes de revelar e exercer atitudes que isoladamente não faríamos, como praticar a

violência. Identificamo-nos com situações familiares, da sociedade, ou de um líder negativo,

e atuamos coletivamente, sem pensar muito, imitando comportamentos inadequados. O

grupo de pares exerce um papel essencial na adolescência, caso esse grupo seja hostil,

agressivo, violento, o jovem tenderá a acompanhar este tipo de comportamento. Do

contrário, também, na vontade de fazer parte do grupo, poderá ainda aceitar situações de

humilhação em virtude do receio do isolamento.

Neste caso é extremamente importante que os adultos (responsáveis pela escola,

professores, pais) intervenham colocando limites, forma de proteção aos adolescentes

envolvidos, antes que os fatos se tornem mais graves e, por consequência, mais difíceis de

resolver.

Tognetta (2009, p. 5-6) contribui quando destaca que o que pode explicar a violência

é, na verdade, um certo “ethos de hipermasculinidade”. É a busca de um valor positivo de si,

de um “ser melhor” diante dos outros e de si mesmo.

Gomes e Sanzovo (2013, p. 83) falam sobre o bullying como um fenômeno grupal,

onde o agressor deseja receber destaque dentro do grupo (visto que o domínio é valorizado

positivamente, principalmente entre os adolescentes), e atua em busca de prestígio social,

para ser respeitado, admirado e se tornar popular e poderoso. Ele precisa do grupo de

apoiadores para demonstrar seu poder, pessoas que com o riso, o silêncio, o estímulo ou

outros comportamentos acabam legitimando e reforçando suas ações.

Tognetta (2011, p. 142) argumenta que os adolescentes que desrespeitam os outros

ou se deixam desrespeitar não construíram por si um auto respeito (não tem consciência de

seu valor e do outro). Os adolescentes precisam sentir por si um auto respeito que os levem a

respeitar o outro, ou seja, para respeitar o outro, é preciso primeiro um respeito a si próprio.

Neste sentido, os autores de bullying não conseguem se ver como valor, são muitas vezes

incapazes de reconhecer seus próprios sentimentos e consequentemente os sentimentos dos

outros. Já os alvos de bullying assim o serão até que consigam enfrentar seus próprios

medos e desafios por se sentirem desrespeitados.

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Há algo anterior à busca do respeito ao outro: “há de se convir que pelo auto respeito

ou capacidade, em termos morais, de atribuir-se valor e satisfazer-se, que se pode respeitar

ou atribuir valor a outros.” (TOGNETTA, 2009, p. 6). Deste modo, deduz-se que “as ações

desrespeitosas ou violentas que nossos adolescentes podem cometer são movidas pela

ausência de um valor de si ou de auto respeito.” (ibid).

O agressor tem a intenção de ferir, ele precisa menosprezar o outro para se sentir

melhor, mas nem sempre ele é uma ex-vítima. Ele pode ser um adolescente que carece de

sensibilidade moral, a ponto de não conseguir se colocar no lugar do outro. Mas pode ser

que tenha se sentido vitimado em alguma circunstância, por seus pais, por seus iguais e

tenha aprendido que a única forma de se destacar, seja também provocando os outros. O

valor que ele vê em si mesmo pode ser tão pequeno que, para se sentir melhor, ele invista

sobre os outros.

Pode-se dizer que os adolescentes que estão violentos precisam de um novo sentido

para suas vidas que inclua o outro, e também a si. São individualismos imperantes que

utilizam formas violentas. É como se esses adolescentes não se vissem, e não se veem, neste

domínio do que é público, do que é coletivo, e, portanto, não veem nem a si como

pertencentes, nem aos outros.

Calhau (2011, p. 5) contribui neste sentindo sobre o não se preocupar com o outro,

colocando que vivemos em uma sociedade extremamente individualista, onde os valores

ficam em segundo plano na vida das pessoas, a figura do próximo fica de lado e muitos não

pensam duas vezes em passar por cima de qualquer um para atingir seus objetivos. Isto é

visto em muitos lares, nas novelas, no futebol, no trabalho, etc., cada um buscando apenas os

seus interesses. E nesse contexto social individualista, ganha destaque o bullying – pessoas

são perseguidas no ambiente escolar, no trabalho, pela internet. A tolerância e o respeito são

abandonados em detrimento de uma linha de relação interpessoal onde o mais forte explora

o mais fraco.

Círculo-vicioso alvo - autor – As pessoas que agridem a outra, normalmente já

foram agredidas um dia e se revoltam acreditando que não são respeitadas, compreendidas e

amadas e decidem revidar em alguém. Segundo Tognetta (2010) precisamos resgatar a ideia

de que meninos e meninas que desrespeitam os outros também se sentem desrespeitados

primeiro.

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Encontramos na literatura diversos autores que apresentam contribuições a respeito

do círculo vicioso alvo-autor. Fante (2005, p. 72) fala em reproduzir os maus tratos sofridos.

Fante e Pedra (2008, p. 101) apontam para um círculo vicioso de abusos e maus-tratos –

onde o praticante de bullying, em algum momento de sua vida, já foi alvo de um bullie –

talvez dos pais, vizinhos ou colegas de escola. Rolim (2010, p. 99) fala que a agressividade

produz agressividade, como um ciclo vicioso. Lopes Neto (2005, p. S168) fala a respeito da

reprodução do bullying por antigas vítimas. Gomes e Sanzovo (2013, p. 73) citam a inversão

de papéis, onde o bullinado (agredido) passa a ser o próprio bully (autor). Silva (2010, p. 42)

menciona o efeito cascata – a vítima que se torna agressora – reproduz os maus-tratos

sofridos como forma de compensação, ou seja, ela procura outras vítimas mais vulneráveis e

comete contra estas as agressões sofridas. Maldonado (2011, p. 23) aponta que muitos

autores são ou já foram vítimas e querem se vingar, escolhendo alvos mais frágeis. Beane

(2010, p. 49) também faz referência ao sentimento de vingança, ou seja, àqueles que

agridem e ferem o outro por terem sido maltratado, seja por pais, irmãos, colegas de escola,

acreditando que tal atitude irá compensar a dor.

Calhau (2011, p. 11) também menciona o fato de pessoas que “foram vitimizadas

pelo bullying e passaram a ser agressoras de outras pessoas, ou seja, aprenderam o

comportamento bullying e, por algum motivo (ex: deixaram de ser alvos) passaram a

reproduzir o comportamento e atacar outras pessoas.” Nesse contexto, podemos encaixar

perfeitamente o trote, em que alunos do 3º ano agridem os “calouros ou novatos” de forma

sistemática ao longo dos anos – um caso típico de bullying muito comum no IFC – Campus

Concórdia. Isso ocorre muito em instituições com internato, do tipo instituições totais.

Isso fica explícito na fala de vários alunos:

A maioria das coisas que eles fazem com nós, eles fazem porque já aconteceu com

eles. (Aluno 09).

A maioria acha que é assim... porque sofreu no 1º ano tem que fazer sofrer quando

for formando, para se vingar, sabe! E geralmente é isso que acontece. A maior

parte age assim, é porque sofreu que vai fazer os outros sofrer. (Aluno 10).

O formando sempre vai querer mostrar força. Eles sempre são os melhores, eles

vão querer mandar no colégio enquanto você for 1º ano. Eles fazem isso prá

mostrar força e porquê, que nem eu te falei, eles sofreram e acham que os outros

devem sofrer também. (Aluno 10).

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Percebe-se nas falas dos alunos, que os novatos são os alunos que mais sofrem

agressões e estas são desferidas por parte dos colegas mais antigos de escola.

Quanto à relação entre os alunos mais velhos e os novatos, Camacho (2001, p. 135)

coloca que os grupos formados na escola mostram-se tendentes a rejeitar os novatos

movidos pelo pensamento de que “eu e meu grupo nos identificamos entre nós, mas o novo

é diferente de mim e de nós”. A presença do novato pode, ainda, fazer aflorar aquilo que se

assemelha à defesa do território, ou seja, como se os já sediados desejassem mostrar quem

são os “donos do pedaço”. Há que se reconhecer que a defesa do território é inerente à

sociabilidade dos adolescentes. Entretanto, as condutas que ultrapassam a normalidade

ganham gravidade quando a isso se juntam situações amplas de preconceito, discriminação e

recusa do novo e diferente.

Nas instituições com internato há costumeiramente a presença de “vítimas-

agressoras”, ou seja, alunos que sofreram bullying quando novatos e que, mais tarde, se

acham no “direito” de reproduzir as agressões contra os que estão chegando. Isto simboliza

uma das graves consequências do fenômeno bullying: “a reprodução da violência, o

agredido transformando-se em agressor.” (GOMES e SANZOVO, 2013, p. 73). De acordo

com dados obtidos 16,75% da amostra é, ao mesmo tempo, alvo e autor de maus-tratos no

ambiente escolar, ou seja, afirmaram que maltratam outros colegas, pois já foram

maltratados, aumentando os índices de violência na instituição pesquisada.

A respeito disso um aluno manifesta:

A gente sofre mais depois se vinga. A gente tenta mostrar prá eles o que eles terão

que fazer quando estiverem no 3º ano, tipo manter os apelidos, cobrar capelinha,

[...] isso precisa se manter... (Aluno 01).

Na questão aberta (nº 25) também apareceram comentários a esse respeito:

Acho que os alunos que estão mais anos aqui na escola devem poder impor um

pouco de respeito nos primeiros anos. Foi assim com a gente... Agora fazemos

assim também... é tradição. (Aluno 26).

Desde sempre existe uma tradição! Formando manda em bixo e é assim que tem

que ser. Se a gente sofreu, os outros também tem que sofrer. No final é muito

gratificante, porque é assim que seremos lembrados como verdadeiros

“agricolinos”. (Aluno 129).

Os novatos tem que se acostumar a respeitar as regras dos alunos existente na

escola e respeitar quem manda. (Aluno 137).

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Fica muito evidente nas falas, que as vítimas-agressoras, ao sofrerem perseguições

de seus colegas, acabam posteriormente revidando os maus tratos sofridos em outros colegas

considerados mais frágeis que eles (círculo vicioso). Sendo assim, há um grande problema

nessas situações, pois elas contribuem para uma maior ocorrência de situações de bullying

na instituição.

Percebe-se na instituição pesquisada que essa é uma dinâmica escolar cada vez

mais frequente, porque o aluno que é vítima se transforma em agressor e reproduz a

violência sofrida. Conforme Catini (2004, p. 15, grifo nosso) as consequências a curto e

longo prazo para as vítimas é tornarem-se tristes e isoladas, ficarem acostumadas a

vitimização e adotarem o papel de agressores contra outras pessoas.

Maldonado (2011, p. 24) complementa a respeito da vítima que se torna agressor: o

medo que esta pessoa sentia na pele de vítima é transformado em “desejo de ter uma vítima”

para poder provar aos outros que se fortaleceu e que agora tem poder. É o raciocínio de que

“o ataque é a melhor defesa” (agora sou agressor, ninguém vai me agredir).

Muitos também acabam escolhendo a violência para se sobressair, para tentar

resolver seus conflitos e superar ações que estavam lhe oprimindo. É como diz o ditado:

“Violência gera violência!”

Gomes e Sanzovo (2013, p. 74, grifo do autor) contribuem:

Seja nos casos de maus-tratos ou de bullying, a constatação é numérica: a

violência, também no contexto escolar, gera, dentre outras sequelas, mais

violência, caracterizando um ciclo vicioso, ou seja, fomentando, e não diminuindo

o bullying.

Lopes Neto (2011, p. 41) também destaca que em grupos sociais onde haja

agressores, “o comportamento agressivo pode se tornar uma regra, e os atos de bullying

acabam se tornando um meio para a manutenção do poder.”

Os alunos relatam que existe uma repetição de comportamentos e que isso é visto

como uma tradição dentro das escolas com perfil agrícola:

Não tem como resolver o problema da violência e do bullying. Sempre vai ter,

sempre! Daqui a cinquenta anos, vai ter essa mesma coisa, vai ter essas atitudes de

3º ano maltratar e humilhar 1º ano. Pode ser que mude o nome, mas as atitudes

não. 1º ano tem que obedecer, 3º ano mandar e 2º ano ficar na deles. O 1º ano são

os bobinhos que tão entrando agora e os do 3º são os “bem bons.” (Aluno 01).

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Eles foram criados assim, na ideologia do 3º anos deles, eles mandam em nós

porque os formandos mandavam neles, eles humilham e maltratam nós porque os

formandos faziam isso com eles, eles apelidam nós porque fizeram isso com eles

também. E assim vai indo, ano após ano... tipo uma corrente, se este círculo não

quebrar, nunca vai parar.. É tipo um círculo... vicioso. Como eles dizem: “É a

tradição!” (Aluno 08).

Percebe-se que este tipo de comportamento é comum neste tipo de instituição e que

a violência é construída ao longo de uma história e não apenas em casos isolados. A

violência é vista tanto como uma questão de opressão diária, quanto de atos mais graves e

faz parte da história destas Instituições, tem raízes profundas. Muitos indivíduos convivem

sistematicamente com a violência da dominação e acabam por interiorizá-la como atitude

natural, pois é um processo de imposição da situação no contexto social.

É o que acontece na escola segundo os participantes da pesquisa. Ficou claro que

quando entram na escola e começam a enfrentar as situações de humilhação, perseguição,

apelidos, cobranças indevidas, ninguém gosta e concorda, dizendo que nunca farão isto,

porém os anos vão passando, e como eles mesmos afirmaram, a concepção dos alunos vai

mudando e eles acabam aceitando isso como normal e até como uma “cultura” da escola,

passando a agir da mesma forma que agiam com eles (ou seja, com violência) com os alunos

mais novos ou mais fracos. Que cultura da escola seria essa? A cultura da violência? Onde

passa a se acreditar que adotar a violência seja o melhor caminho para se alcançar a

popularidade ou poder (no caso dos alunos que estão no 3º ano?) De alvos passam a ser

autores de bullying como forma de compensação ao que sofreram ou será que se acostumam

com a violência a ponto de não se importar com a convivência onde as vitimizações são

diárias?

Outro fator importante percebido na análise das falas dos alunos, diz respeito a

mudança de opinião sobre a violência cometida contra os colegas. Os que estão no 1º ano

não concordam com essa postura assumida pelos alunos dos 3º anos e afirmam que nunca

farão isso quando forem formandos, porém com o passar do tempo, segundo os relatos, os

alunos vão mudando de opinião e passam a agir conforme agiram com eles:

Os próprios alunos afirmam que:

No 1º ano você pensava assim (como bixo)... Não vou fazer isso, não vou agir

assim... conforme vai passando os anos a gente vai mudando. Vai vendo que os

formandos queriam mostrar como era prá gente ser quando tivesse no 3º ano. Se

maltrataram a gente é prá gente maltratar. (Aluno 01).

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Se nós sobrevivemos a isso, eles também passarão e quando forem formandos vão

mudar de opinião e achar que esta é a melhor forma de educar os novos, os bixos.

(Aluno 06).

Eu falei prá um formando: “Eu não vou fazer isso com os alunos do 1º.” Ai ele

respondeu prá mim: “Você diz isso agora porque você está sofrendo, mas quando

você estiver por cima você não lembra dos menores. Você vai ficar aqui três anos

e a tua opinião vai mudar. Eu também pensava assim...” (Aluno 08).

Alguns alunos me falam: “Você questiona agora, mas quando você estiver na 3ª

vai saber como é... quando você está na 3ª você vai fazer essas coisas (cobrar,

mandar, )... não sei... porque está na 3ª um faz e o outro começa a ir entrando na

onda.” Eu acho que a maioria das coisas que eles fazem com nós é porque

aconteceu com eles. Eu penso assim... eu penso prá mim assim... tá... se na época

que eles estavam aqui eles sofreram com isso, de capelinha, humilhações,

zombarias, de proibir pisar ali, passar aqui... por que eles estão fazendo isso? Se

eles não gostaram prá eles, por que fazer prá nós? É um pensamento que eu tenho

e que acham que eles não se tocaram ainda. Se o cara não gosta, por que fazer para

o outro? (Aluno 09).

[...] Eles dizem prá gente: “Quando você chegar no 3º ano você vai fazer a mesma

coisa com os bixos do 1º.” Daí eu fiquei pensando... a gente é muito bem criada e

tal, eu não vou conseguir fazer isso com alguém sabendo que eu passei por isso,

que a gente sabe o quanto é ruim. Só que tem gente que pensa assim... como sofreu

não vai querer fazer outra pessoa sofrer, mas também tem aqueles que acham, a

maioria acha assim, que porque sofreu no 1º ano tem que fazer quem for do 1º

sofrer quando for formando. E geralmente é isso que acontece. Tem as pessoas que

não conseguem fazer porque sabem o quanto é ruim, mas a maior parte é porque

sofreu que vai fazer sofrer... eu acho que é isso! (Aluno 10).

Os alunos 08, 09 e 10, expressam muito bem a situação vivenciada e o fato de não

entenderem como que alguém pode repetir para outra pessoa um mal que sofreu. ([...] Se o

cara não gosta, por que fazer para o outro? - Aluno 09; [...] a gente é muito bem criada e

tal, eu não vou conseguir fazer isso com alguém sabendo que eu passei por isso, que a gente

sabe o quanto é ruim. Aluno 10). Percebe-se que a maioria dos alunos entra na instituição

com esta consciência e no decorrer dos anos acabam se acostumando com as cenas de

violência, passam a considera-la normal, reproduzem contra outros colegas e o pior, passam

a ser a favor da sua manutenção. ([...] Você vai ficar aqui três anos e a tua opinião vai

mudar. Eu também pensava assim...” - Aluno 08).

Para encerrar este tópico não poderia deixar de destacar a sugestão de um aluno

participante da pesquisa para que a escola se torne menos violenta: o fato de que os

agredidos procurem ajuda e denunciem as agressões para que não busquem reparar a

agressão que sofreram futuramente contra outras pessoas/alunos.

Assim escreveu o aluno:

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Proponho que os colegas agredidos conversem, contem aos professores as

agressões que estão sofrendo e que mais tarde não repassem a agressão sofrida a

outros, só porque já foram agredidos. (Aluno 97).

Considera-se muito pertinente a colocação deste aluno, que consegue ter a clareza

dos reais motivos que levam a maioria dos alunos a agredirem os colegas, a vingança. Ouvir

os alunos, dar voz aos participantes é de suma importância, pois nos revela muito de sua

vivência, dos relacionamentos, dos modos como lidam com as situações, e isso é

fundamental para entendermos a dinâmica do fenômeno bullying. A escola de posse destes

dados, precisa buscar alternativas para quebrar este círculo vicioso que gera violência e que

vem mantendo as relações de poder – dominadores e dominados dentro da instituição.

Conforme Rolim (2010, p. 100) após a identificação deste ciclo a escola assinala um desafio

que a impedirá de tratar do problema como se ele estivesse estruturado em dois grupos

isolados: autores de um lado e vítimas de outro, pois estes papéis se invertem e os atores

assumem diferentes posições no decorrer de sua permanência dentro da escola. Esse modelo

de instituição e de relações trazem enraizadas atitudes que são repetidas ano após ano pelos

seus membros, quase que inconscientemente, que precisam ser colocadas em destaque, ser

debatidas com a comunidade. Para isso é necessário traçar metas de combate e prevenção

que devem abarcar conscientizações e atividades educacionais voltadas a superação de um

contexto escolar violento.

A diversão e a não preocupação com os sentimentos dos outros – a crise de

valores – Percebe-se que os alunos participantes da pesquisa entendem que a estrutura e a

organização do grupo são o motor dos maus-tratos entre iguais, elucidando fatores como o

hedonismo60

coletivo, o exercício de poder ou o domínio sobre os outros. Em busca de

diversão e prazer o grupo pratica atos de gozação, humilhação, sem se preocupar com os

sentimentos dos colegas atingidos. Muitos se utilizam, por exemplo, de colocar apelidos,

para se divertir, dar risada, zoar do outro, e nem se preocupam com o sentimento que isso

possa provocar nos alvos. Por outro lado, outros tantos podem também se utilizar de

apelidos para diminuir outros colegas e desta forma, ganhar destaque no grupo como os

“bons”, os “populares”. Tognetta e Vinha (2008, p. 07) colocam que o autor de bullying é

alguém que “aprendeu a resolver seus problemas de falta de valor a si mesmo buscando

rebaixar os outros. Esconde também outra dificuldade: acha que todos devem atender a seus

60

É a doutrina geral do prazer. É a busca sem limites pelo que proporciona prazer.

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desejos de imediato e não consegue, do ponto de vista psicológico, sair de si e colocar-se no

lugar do outro.”

De acordo com Maldonado (2011, p. 29, grifo do autor) “a dificuldade de empatia é

outra raiz que alimenta muitas ações de bullying.” Centrado em seu próprio prazer ou na

necessidade de conquistar mais poder, o autor das agressões simplesmente não desenvolve

uma relação de respeito e de consideração pelos outros e nem sequer percebe a extensão e a

profundidade dos danos que causa em suas vítimas; eles também não conseguem delimitar

uma linha divisória entre o que é brincadeira e o que é agressão.

Tognetta (2010) fala que os autores dos maus tratos carecem de sensibilidade

moral, uma espécie de capacidade de sair de si, do ponto de vista cognitivo e afetivo para

ver o outro como um sujeito digno de respeito. Eles são muitas vezes incapazes de

reconhecer seus próprios sentimentos e consequentemente os sentimentos dos outros. É a

falta de sentimento de empatia que impede o interessar-se em compreender os sentimentos

dos outros. Pode-se dizer que o autor de bullying não é empático com o sofrimento e a dor

do outro. Falta-lhes, sensibilidade moral, um conjunto de capacidades necessárias a uma

ação moral: uma, do ponto de vista cognitivo, diz respeito à distinção entre o certo e errado

partindo de uma hierarquia de valores que a pessoa tem. Outra, é a capacidade de atribuir

valor a outra pessoa como alguém que merece ser tratado bem.

Podemos destacar também a “crise de valores” que enfrentamos atualmente na

sociedade em geral. Com destaque para o individualismo, o egoísmo, a busca do prazer a

qualquer custo, a impunidade. Situações onde o bem e o mal aparecem muito próximos,

como se fazer o bem ou o mal tivesse o mesmo significado. Na sociedade as grandes

desigualdades sociais, a valorização do ter ao invés do ser, o consumismo exacerbado e os

padrões de beleza valorizados pela mídia e pelo mercado econômico, acabam influenciando,

muitas vezes, às pessoas a buscarem e satisfazerem seus desejos a qualquer custo, o que

acaba degradando-as, influenciando também negativamente as crianças e adolescentes, o que

pode ser percebido em muitas atitudes e formas de expressão dos alunos no cotidiano

escolar. Maldonado (2011, p. 25) destaca justamente essa característica dos agressores: eles

“querem obter o que desejam a qualquer preço e afirmam que ‘os fins justificam os meios’.”

Estes exemplos nos mostram que a crise de valores geralmente vem associada à

crise das instituições, como por exemplo, a família e a escola.

A sociedade, hoje, é marcada por uma “anorexia moral”, que se reflete no

descompromisso causado pelo sentimento individual de apatia em relação à vida

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social, na ausência de utopias, na perda do sentido de viver, na falta de

solidariedade, na ausência de parâmetros definidos sobre o que é certo e errado

(CANDAU; LUCINDA; NASCIMENTO, 2001, p. 38).

No contexto atual, percebemos que os problemas relacionados à violência e ao

desrespeito ao próximo estão diretamente interligados à crise de valores presente na

sociedade e consequentemente entre as pessoas. Diante de tantas mudanças sociais e

tecnológicas, as pessoas passaram a dar menos importância a valores, como a solidariedade,

o respeito, a cooperação, o amor ao próximo.

Precisamos dentro do processo educacional, estimular o respeito mútuo, a justiça, o

diálogo, a autoestima, levando os alunos a refletirem e a fazerem opções positivas frente à

realidade. A escola é um espaço formal de educação, um tempo e um contexto de

aprendizagem e desenvolvimento, é nela que os alunos ampliam suas relações sociais,

formam grupos com pares, convivem com a diversidade, conhecem regras e normas num

contexto social maior do que aquele vivido no ambiente familiar. “Colocar abertamente

valores a serem conjuntamente vividos é uma tarefa iniludível de todo o processo

educativo.” (CANDAU; LUCINDA; NASCIMENTO, 2001, p.94). A escola deve, portanto,

ser o local onde o aluno poderá ter sua formação e educação melhorada. Nesse espaço

educacional deve-se abordar temas como: paz, respeito, responsabilidade, valorização do

“eu”, amor e felicidade, possibilitando situações pedagógicas que levem os alunos à reflexão

sobre o seu papel na sociedade.

Destaca-se a importância do diálogo como forma de enfrentamento da questão da

violência na escola. O diálogo pode ser considerado como instrumento

privilegiado para alcançar tal objetivo. Dar voz aos estudantes, discutir com eles

sobre suas próprias expectativas, desvendar os ingredientes ideológicos da tarefa

educacional, desenvolver formas participativas de construção de normas são

fatores que podem contribuir significativamente para a construção de um ser social

capaz de falar, de respeitar, de lutar pela transformação da sociedade. (CANDAU;

LUCINDA; NASCIMENTO, 2001, p. 51).

Não podemos deixar de destacar a importância destes direcionamentos para estes

alunos, adolescentes em formação, fase essa de definição da identidade e de escolhas

importantes para a vida toda. É muito importante que a escola esteja mais atenta a qualidade

das assimilações provenientes do cotidiano escolar e dos grupos ali formados, observando e

acompanhando o convívio diário dos alunos (principalmente os alunos internos), observando

como se relacionam, para poder identificar os problemas existentes na instituição e mais que

isto, trabalhar no sentido de superação, de mudanças no espaço e nas concepções.

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156

Valorizar os anseios e ações de justiça, despertar os valores morais e sociais

existentes nestes adolescentes, através de ações claras e debatidas com toda a comunidade

escolar, se apresenta como um caminho promissor que a instituição pode seguir para a

concretização de seu papel no desenvolvimento e formação destes adolescentes. A escola

precisa estar atenta aos modelos educativos utilizados e dar voz e vez aos alunos, que devem

ser os protagonistas das mudanças. Os alunos não podem ser meros espectadores a espera de

ações milagrosas que venham a melhorar o ambiente e as relações na escola, até porque, se o

problema é a relação entre pares, é no grupo e com o grupo que se devem buscar e debater as

possíveis soluções. Conforme Tognetta61

“nossos alunos não são espectadores que aguardam

pelas nossas ações. Devem ser atuantes porque podem decidir, podem escolher, podem

restaurar a paz mediados por professores que entendem do desenvolvimento humano e

permitem a expressão do que sentem e o que pensam.”

Diante de todo o exposto, encerramos este capítulo reiterando que a violência e o

bullying possuem múltiplas causas. Na escola pesquisada não é diferente. Os alunos sofrem

muita influência da cultura escolar e do contexto histórico da instituição. Destaca-se que o

poder e hierarquia estão envolvidos com as agressões praticadas. Além disso, o fato de já ter

sofrido bullying antes, faz com que muitos repitam às mesmas ações e/ou comportamentos

sofridos em outros colegas, indicando a presença do círculo vicioso alvo-autor.

No próximo capítulo, dar-se sequência a descrição e análise dos dados, dando

ênfase às percepções e sentidos atribuídos pelos alunos aos episódios de bullying,

abrangendo como eles percebem o ambiente e a convivência escolar, as influências e os

prejuízos causados pelo bullying, os sentimentos despertados, a importância do grupo de

amigos, o papel dos pais e da escola diante do bullying.

61

Tognetta, Luciene R. P. Em prefácio da obra de José Avilés (2013, p. 12).

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4.2 – A PERCEPÇÃO DOS ALUNOS SOBRE A VIOLÊNCIA E O DESRESPEITO

NA INSTITUIÇÃO DE ENSINO: SENTIDOS ATRIBUÍDOS AOS EPISÓDIOS

DE BULLYING.

4.2.1 – O Ambiente e a convivência escolar

Visando conhecer a opinião dos alunos a respeito da temática ambiente escolar

foram abordadas questões sobre como estes percebem a escola, seu ambiente, as

características que mais apreciam e aquelas que não gostam na escola e como se sentem

estudando neste ambiente.

Nas tabelas apresentadas a seguir apontam-se as respostas assinaladas pelos alunos

e sua referida frequência para as questões nº 1, 2, 3, 4 do questionário que serão expostas e

depois comentadas (estas questões não indicavam a possibilidade de escolha de mais de uma

resposta, porém a maioria dos alunos optou por assinalar múltiplas respostas).

Perguntamos aos alunos: Como você considera o ambiente escolar? As respostas

estão

Tabela 11 – Como os alunos consideram o ambiente escolar

OPÇÕES RESPOSTAS TOTAL (%)

Agradável 142 67%

Desagradável 18 8,61%

Seguro 31 14,83%

Inseguro 19 9,1%

Indiferente 31 14,83%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Observa-se na tabela acima, que a maioria dos alunos (67%) consideram o

ambiente escolar agradável e 14,83% se sentem seguros na escola.

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Tabela 12 – Como os alunos se sentem estudando na escola

OPÇÕES RESPOSTAS TOTAL (%)

Sozinho (a) e sem amigos (as) 03 1,43%

Feliz e enturmado (a) 107 51,2%

Não gosto, quero mudar de escola 09 4,3%

Triste, por causa dos apelidos e

brincadeiras de mau gosto

08 3,8%

Satisfeito 106 50,71%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Um fator positivo encontrado na pesquisa, que pode ser visualizado nas tabelas 11

e 12 e que também foi percebido nos relatos dos alunos, durante as entrevistas, consiste na

satisfação destes com a escola, sendo que 67% dos alunos consideram o ambiente escolar

agradável e 50,71% se sentem satisfeitos com a escola. Além disso, 51,2% se consideram

felizes e enturmados na escola, 47,37% disseram gostar das aulas e oportunidades de

aprendizagem que a escola proporciona e 49,85% apontam que o que mais gostam na escola

são os colegas. Isto é importante, pois estes fatores atraem o adolescente, motivando-o à

frequência escolar e favorecendo seu rendimento enquanto se encontra na posição de

educando.

Tabela 13 – O que os alunos mais gostam na escola

OPÇÕES RESPOSTAS TOTAL (%)

Colegas 103 49,28%

Espaço Físico 36 17,22%

Professores 27 12,92%

Outros funcionários 10 4,78%

Aulas/Oportunidades de aprendizagem 99 47,37%

Lazer/esporte 65 31,10%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

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Os indicativos expostos nas tabelas 12 e 13 são muito positivos dentro da

pesquisa, aspectos estes também primordiais a uma boa passagem pelo período da

adolescência. A satisfação dos alunos com a escola e com boa parte dos professores

demonstra uma interação positiva entre os mesmos, fator indispensável para o crescimento

físico, social e psicológico do adolescente. Ainda apontamos outro aspecto de caráter

positivo dentro da pesquisa, o lazer/esporte, citado por 31,10% dos sujeitos, e que é

indispensável para uma boa manutenção da saúde física e mental do adolescente,

principalmente dos alunos internos – que residem na escola.

Porém, outros indicativos também chamaram a atenção. Aqui não se trata de

gostar ou não da escola ou de estudar, visto que a maioria dos alunos considera o ambiente

escolar agradável, mas de sentir-se bem neste ambiente, dos tipos de relações que se

estabelecem neste espaço. Parece contraditório, mas 58,85% dos alunos relataram que o

menos gostam na escola são os colegas, conforme dados apontados na tabela 14. Por que

será? Isto pode estar indicando que algo não está bem nas relações.

Em se tratando de amigos, a quantidade de amigos indicadas pelos pesquisados

foi em média de dois ou três por aluno (39,7%). Enquanto 8,13% afirmaram não ter nenhum

bom amigo dentro da escola, número este bastante significativo, se considerarmos que os

alunos são adolescentes.

Tabela 14 – O que os alunos não gostam na escola

OPÇÕES RESPOSTAS TOTAL (%)

Colegas 123 58,85%

Espaço Físico 32 15,31%

Professores 34 16,27%

Outros funcionários 36 17,22%

Aulas/Oportunidades de

aprendizagem

12 5,74%

Lazer/esporte 11 5,26%

Outros 4 1,91%

Não responderam 11 5,26%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

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Este é um aspecto negativo apontado pela pesquisa, sendo que nesta fase da vida

destes alunos – a adolescência – o grupo, os amigos significam muito. Nesta fase a relação

com a família passa a não ser o suficiente e o grupo de amigos se torna muito importante,

por isso o adolescente sente a necessidade de estar em sua companhia. A vivência com a

família proporcionou ao adolescente a base para a formação de sua identidade que poderá

agora se enriquecer com os novos relacionamentos grupais que propiciarão crescimento,

integração e sociabilidade. Por isso, o adolescente sem turma, com dificuldade de firmar

relações encontrará mais dificuldade para elaborar suas crises vitais e pode sofrer por não ter

com quem dividir suas incertezas, dúvidas e desejos, próprios desta fase.

Pertencer a um grupo social e manter boas relações é uma questão fundamental no

processo de construção de identidade pelo qual os adolescentes passam.

[...] é no ambiente escolar, onde passa a maior parte de seu tempo, que o

adolescente está à caça de um “grupo de iguais” para se autoafirmar como

indivíduo e tornar-se mais independente da família, mesmo que ainda precise

muito dela. Por isso há grande frustração quando é rejeitado por grupos ou pessoas

específicas. (OLIVEIRA; ANTONIO, 2006, p. 4).

Conforme Abramovay (2009, p. 107) as amizades são:

[...] responsáveis por transformar o ambiente escolar em um local de interações

agradáveis e divertidas, onde vínculos afetivos fortes se constroem e muitas vezes

permanecem durantes anos. É principalmente nesta fase da vida de adolescência e

juventude que a sociabilidade entre pares adquire um valor fundamental. [...] os

sentimentos de amizade produzem satisfação, alimentam a autoestima e ampliam o

capital social e cultural.

Lopes Neto (2005, p. S165) aponta que, em virtude do grande valor que a escola

tem para os adolescentes, os alunos que não gostam dela podem acabar tendo um

desempenho insatisfatório, comprometimentos físicos e emocionais à sua saúde ou

sentimentos de insatisfação com a vida. Sendo assim, pode-se dizer que se o bullying estiver

presente na escola, este irá afetar o rendimento escolar e também as relações sociais

estabelecidas na instituição de ensino.

Pazio (2010, p. 97), ao analisar a ocorrência do bullying na sala de aula como um

entrave não percebido no processo ensino-aprendizagem, também é enfática ao expor que as

relações sociais na escola constituem-se como pano de fundo para a ocorrência de atos

violentos.

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Abramovay (2009, p. 107) complementa dizendo:

A construção de amizades interfere na afinidade que se tem com a escola. Um

ambiente agradável é responsável por maior interesse no que se está fazendo,

inclusive nas questões relacionadas ao estudo e à aprendizagem. As relações

positivas são, inclusive, responsáveis pela diminuição de comportamentos

violentos e perturbadores.

Os relatos dos alunos expressam o gostar da escola, porém evidenciam que algo nas

relações não está bem:

A escola é boa, se comparada as outras de Concórdia, ela é melhor, é federal. Pena

que os alunos, não todos, não mereçam estar aqui dentro. Muitos não dão valor

para o que tem aqui dentro. Só pensam: “Ah, vamos quebrar tudo, vamos fazer

bagunça!” Não estudam e não deixam os outros que querem estudar. São muitos

conflitos que acontecem e isso tira a atenção principal que é estudar. (Aluno 01).

A escola nos oferece uma estrutura bem boa, com condições de nos formarmos e

nos darmos muito bem lá fora, só que os alunos estragam; então, eu não me sinto

bem aqui dentro. E isso me prejudica. (Aluno 02).

[...] não adianta a escola ter boa fama, ter bons professores (cheio de mestre,

doutor), ter os melhores laboratórios, se os alunos que vem estudar ali não são bem

selecionados. Eu acho que a escola é ótima, mas é difícil viver aqui dentro. Só os

muito fortes conseguem não se desligar do seu objetivo. É bem difícil aguentar

tudo que a gente aguenta de maldades aqui dentro, a aflição, o medo, as

perseguições, não dá para confiar em ninguém. (Aluno 06).

Era o meu sonho estudar aqui no colégio, pois ele é muito bom. Mas fiquei

decepcionada depois que entrei, pois a gente se depara com cada coisa aqui, é

muita pressão, muito medo, muita maldade das pessoas. É muita fofoca, intrigas, o

relacionamento não é bom aqui... eu preferia muito mais a minha escola de antes.

Não por causa do estudo... porque aqui ele é muito bom. Eu não tenho as melhores

notas, mas todas estão na média. E as aulas, assim, são muito boas aqui, muito

melhores do que as da escola que eu vim. Lá a escola era boa, mas aqui o estudo é

mais forte do que lá. E, assim, com relação as aulas e a escola não tem porque

querer sair daqui, é pesado, mas a gente enfrenta. Mas em relação as coisas que

acontecem com a gente aqui da sim... (Aluno 10).

Estes são alguns relatos selecionados, em que os alunos fazem referência ao gostar

da escola, o fato dela ser uma escola com bom conceito na sociedade, porém também é

evidenciado que algo nas relações interpessoais não está bom e isto está prejudicando os

alunos que têm vontade de estudar. É como o aluno 06 manifestou, não adianta a escola só

se preocupar em ter bons profissionais, professores bem qualificados, uma ótima biblioteca,

bons laboratórios, se esta não estiver atenta ao tipo de relações que estão se estabelecendo lá

dentro. O fato da maioria dos participantes (58,85%) terem declarado que o que menos

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gostam na escola são os colegas, estes estavam se referindo ao tipo de relações que estão

sendo estabelecidas e das dificuldades encontradas nestas relações, ou seja, estavam se

referindo a convivência escolar com os colegas. Conforme Frick (2011, p.163) existe uma

forte influência das relações interpessoais estabelecidas sobre o modo como os alunos

interagem e resolvem conflitos entre pares, bem como sobre a prática do bullying. O que

reforça o fato de que a escola precisa estar atenta à qualidade das relações que está

promovendo.

Se partirmos do pressuposto de que a aprendizagem e o desenvolvimento são

facilitados pelo envolvimento das pessoas em uma interação, com certeza em um local em

que há problemas nos relacionamentos, onde o bullying e outras formas de violência

imperam, o desempenho e a aprendizagem serão afetados. Também cabe ressaltar que a

ausência de um bom clima de convivência é o primeiro sinal de que as coisas não vão bem

numa instituição, e isso vale tanto para o relacionamento de alunos com alunos, alunos com

funcionários, funcionários com funcionários.

Para Abramovay (2009, p. 106): “Um clima de desrespeito, intimidação e ataques

pessoais é responsável por causar instabilidade emocional, além de servir como obstáculo

para o processo de aprendizagem e para a missão educativa da escola.”

Sabemos que o convívio na escola, que deveria ser uma relação de parceria e

respeito mútuo entre os alunos, nem sempre se configura dessa forma. Sabemos que a escola

é um microcosmo62

social e numa sociedade composta por tantas diferenças, exclusões,

injustiças, violências, intolerâncias, preconceitos e racismos, as relações de colaboração

necessárias para a construção coletiva do conhecimento são, muitas vezes, marcadas por

contradições, levando-nos a questionar se a escola que temos é compatível com as

necessidades sociais vigentes e mesmo com o projeto de homem e de sociedade desejados.

Conforme aponta Francisco (2010, p. 19) “a escola não deve centrar-se somente em

saberes concretos, mas necessita estar atenta a elementos pertinentes ao convívio social de

seus protagonistas e agentes. Entendê-la diante desse prisma, possibilita um olhar mais

articulado.”

Se a escola pesquisada está se configurando num local propício para que atos de

violência ocorram, esta precisa despertar para isso e buscar alternativas eficazes para a

solução dos problemas, pois uma escola não é formada apenas de prédios, livros,

laboratórios, ela é formada por seres humanos em interação. Conforme Frick (2001, p. 163)

62

Microcosmo, neste caso, usado no sentido de “miniatura da sociedade”.

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é necessário que a escola retome o papel da educação, destacando a formação integral do

indivíduo para a ética e para a autonomia. “A escola precisa se dar conta e assumir seu

percentual de responsabilidade sobre a educação moral dos alunos, percebendo essa

educação como processo integrante e intrínseco do ato de educar.” (ibid).

Sendo assim, os dados apresentados por esta pesquisa podem constituir-se

indicadores de como as relações estão se configurando dentro da escola e podem servir de

base para os primeiros passos na direção de possíveis ações para prevenção e combate dos

conflitos e da violência entre alunos.

4.2.2 – Prejuízos causados pelo bullying

Uma das melhores formas de demonstrar a gravidade do fenômeno bullying é

apresentando o quanto prejudiciais podem ser as suas consequências, seja para os

protagonistas, seja para a escola, seja para a sociedade em geral.

As consequências do bullying comprometem muito a vida dos indivíduos

envolvidos, prejudica o convívio social, a aprendizagem, a saúde física e emocional,

principalmente das vítimas, que se sentem excluídas, sozinhas e humilhadas,

comprometendo o processo de formação de sua identidade, baixando sua autoestima,

causando medo de voltar à escola, sentindo-se inseguras e desprotegidas (FANTE, 2005, p.

78-79). Portanto, pode-se dizer que este fenômeno coletivo acarreta, sobretudo, implicações

psicossociais aos sujeitos envolvidos, no caso desta pesquisa – adolescentes –

comprometendo sua saúde, influenciando negativamente na sua qualidade de vida e

condições de aprendizagem.

Embora seus efeitos mais visíveis sejam contra as vítimas, o bullying atinge tanto

os alvos, quanto os autores ou os espectadores, podendo prejudicar o rendimento escolar,

trazendo dificuldades sociais e emocionais para todos os envolvidos.

Gomes e Sanzovo (2103, p. 137) concordam que não apenas as vítimas, mas sim

toda a comunidade escolar (protagonistas, testemunhas, demais alunos do colégio,

professores, funcionários, pais) acabam sofrendo ou tendo prejuízos com o bullying.

Como já apontado, na Instituição pesquisada, os efeitos das ações agressivas entre

os pares gera a represália, ou seja, a reprodução da violência, onde na maioria dos casos, os

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alvos (vítimas) do bullying, com o tempo, passam à condição de autores de bullying com o

intuito de vingança.

Lopes Neto (2011, p. 107) aponta que adolescentes envolvidos em situações de

bullying podem apresentar sintomas físicos e alterações de ordem psicológica, psíquica e

distúrbios sociais. O autor também assinala que o estresse causado pela vitimização pode

levar ao surgimento de patologias. (ibid, p. 108).

Com relação às consequências do bullying sobre a saúde, o relato de um aluno

(alvo de bullying) aponta várias implicações e sintomas:

[...] Por exemplo, está acontecendo umas coisas comigo... eu me sinto mal, eu não

consigo dormir, eu estou tenso, meus ombros estão doendo, tá tudo doendo em

mim, meu corpo está pedindo socorro, sabe... (o aluno se emociona e chora). [...]

O meu dente também dói... bastante! Isso que eu já tentei até trocar de escova. Eu

estou falando contigo aqui, mas essa parte dos meus dentes está doendo. O meu

ombro aqui está doendo muito, muito. O meu peito dói. A minha cabeça então...

dói que não adianta nem remédio. Eu não consigo mais dormir, eu estou dormindo

na sala de aula, mas no quarto eu não consigo mais dormir. Eu me sinto cansado,

estressado demais, demais. Eu já tive vários resfriados, dores de estômago e até

diarreia... do nada... parece que não melhoro nunca. (Aluno 08).

Podemos identificar que as queixas apontadas pelo aluno (dores de cabeça, dor no

estômago, diarreia, dores musculares, insônia, problemas respiratórios, cansaço, estresse,

dores generalizadas – dentes, peito, corpo, ombros) coincidem com as descritas pelos

autores e podem ser fator indicativo de maus-tratos praticados por colegas.

[...] o estresse é responsável por cerca de 80% das doenças da atualidade, pelo

rebaixamento da resistência imunológica e sintomas psicossomáticos

diversificados, principalmente próximos ao horário de ir à escola, como dores de

cabeça, tonturas, náuseas, ânsia de vômito, dor no estômago, diarreia, enurese,

sudorese, febre, taquicardia, tensão, dores musculares, excesso de sono ou insônia,

pesadelos, perda ou aumento do apetite, dores generalizadas, dentre outras. Podem

surgir doenças de causas psicossomáticas, como gastrite, úlcera, colite, bulimia,

anorexia, herpes, rinite, alergias, problemas respiratórios, obesidade e

comprometimento de órgãos e sistemas. (FANTE E PEDRA, 2008, p. 83).

Na fala de outro aluno também foi possível identificar indícios dos males do

bullying sobre a saúde:

Quando eu vou para casa no final de semana, chega domingo de tarde na hora de

aprontar as coisas para pegar o ônibus, já começa a me doer a cabeça, doer de dar

ânsia de vômito. Está tudo bem e de repente vem aquela dor, acho que eu fico

nervoso, agitado. Me bate uma sensação ruim, de angústia, sei lá. [...] Aqui no

colégio, não consigo dormir e fico cansado demais, mas em casa não, lá eu durmo

bem. (Aluno 05).

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No relato do aluno 05 é possível identificar sintomas que podem estar ligados

diretamente a resistência em ir para a escola. As dores de cabeça, ânsia de vômito,

nervosismo, angustia são as consequências prejudiciais à saúde do aluno, que surgem

próximas ao horário de ir para a escola. A insônia e o cansaço, também apontados, podem

estar relacionados à insegurança por estar na escola, já que o mesmo coloca não sofrer com

insônia quando está em casa.

Tognetta (2005, p. 7) aponta com relação às vítimas que com frequência “têm dores

de cabeça, pouco apetite, dores de estômago, tonturas sempre próximo aos horários de ir

para a escola ou a um grupo social ao qual pertencem e mantém uma convivência com

outros pares.”

Rolim (2010, p. 56) traz em seu estudo que “vítimas de ‘bullying’ possuem até três

vezes mais chances de sofrer com dores de cabeça e com dores abdominais, até 5 vezes mais

chances de ter insônia [...] “isto quando comparadas a não-vítimas.

Diante do exposto, constata-se que as consequências do bullying são muito sérias e

merecem atenção por parte da escola e dos profissionais de saúde que lá trabalham e que

atendem estes adolescentes. Ser alvo de maus-tratos por um período longo de tempo pode,

além de afetar a saúde – como apontado pelos alunos – contribuir no rebaixamento da

autoestima e criar sentimentos de medo, depressão e falta de confiança nos alunos. É ainda

mais preocupante se considerarmos que os pares podem evitar o contato com colegas

vitimizados, aumentando seus problemas de autoimagem e ajustamento emocional. É como

traz Eyng (2011, p. 107), “os agredidos podem se sentir ainda mais vitimizados pelo grupo

que também não o respeita.”

4.2.2.1 - Influência do bullying sobre o rendimento escolar

O bullying afeta sobremaneira as práticas pedagógicas e o convívio em sala de aula.

Dentre as implicações desse fenômeno, podem ser provocadas: a exclusão, o fracasso

escolar, a evasão, a angústia, a ansiedade e consequências a longo prazo na adolescência e

na vida adulta.

Ele gera ainda, no espaço escolar, sentimentos de medo, em variados graus de

intensidade, bem como produz um impacto negativo sobre os estudos, prejudicando à

aprendizagem. Mostra-se, portanto, um obstáculo à educação de qualidade.

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Visando conhecer o que os alunos pensam a respeito das consequências do bullying

sobre o rendimento escolar, questionamos os alunos participantes da pesquisa e estes foram

unânimes em relação à influência negativa do bullying sobre os estudos:

É pior coisa que tem aqui dentro, atrapalha muito, muito os estudos. Essa rotina,

essa pressão não deixam a gente estudar, e não é por falta de tempo como muitos

dizem, é porque você não consegue se concentrar. É muita coisa acontecendo ao

mesmo tempo e você não consegue desligar, sentar para estudar, fazer um

tema...(silêncio)... está sempre ligado no que te aconteceu, remoendo o assunto.

Você não sabe o que fazer para resolver a situação, fica tenso, nervoso. (Choro)

(Aluno 01).

As situações de bullying aqui no colégio são bem complicadas. Quanto tu vê já

está envolvida nas coisas sem saber. Mesmo você não sendo a vítima primeira das

fofocas e das maldades, você precisa ficar longe, pois se tentar fazer alguma coisa,

logo é você que estará envolvido. Eu sempre fico com medo que aconteça comigo,

quero ficar longe de confusão, tenho medo até que me contem as barbaridades que

fazem com uns coitados aqui dentro. Às vezes, eu nem consigo dormir, pois a

gente vive sobre pressão, isso te deixa nervoso, sem concentração na aula, parece

até um pesadelo. (Aluno 02).

Pode influenciar nos estudos sim, já aconteceu e vai acontecer mais uma vez.

Como aconteceu com dois amigos meus que já desistiram, não aguentaram mais as

ameaças. E tem mais dois ou três querendo desistir, pois eles ficam cobrando coca,

pressionando, perseguindo e está atrapalhando os estudos deles, e eles estão com

notas baixas, pois se preocupam mais com essas coisas do que estudar. Isso

atrapalha sim nos estudos, porque a pessoa pode ir muito bem na aula, mas quando

acontece situações assim, ela pode começar a pensar no que aconteceu e não mais

nos estudos, não se concentra, pensa mais nisso do que no estudo, por motivo de

tristeza. Nossa, como atrapalha! (Aluno 04).

Imagine nas últimas aulas, você dentro da sala pensando assim: “meu, daqui a

pouco tenho que sair de dentro da sala e ir lá para o quarto”, já começa bater

aquele medo, pânico de ser ameaçado, o que será que vai me acontecer hoje? Terei

que dar dinheiro para os do 3º, será que vão me ameaçar, será que poderei ir jantar,

será que alguém poderá ir junto comigo na biblioteca (porque você não pode andar

sozinho aqui dentro), Meu Deus! Tenho que estudar, ... não dá para se concentrar...

é horrível... só quem passa para saber. Os estudos são muito prejudicados nesses

casos. (Aluno 05).

Eu acho que influencia quase que diretamente nos estudos e na autoestima da

pessoa que é afetada. Se você sofre na turma é o mais complicado, pois serão três

anos na mesma turma, com os mesmos colegas. Então se no 1º ano você começa a

se incomodar com eles, pode saber que terá mais dois anos para sofrer. Dá aquela

vontade de ir embora, desistir da escola mesmo! Já aconteceu comigo, isso de

ficarem me maltratando muito, de dar vontade de desistir da escola... isso interfere

nos estudos sim, você fica mais reservado, isolado, você não consegue se soltar.

Até mesmo na apresentação de trabalhos, você sabe que tem pessoas que te

perseguem ou não gostam de você ali assistindo, você fica nervoso, inquieto, com

vergonha, com medo de ser debochado, ai não fala tudo que sabe, não consegue

desempenhar seu potencial. Até para tirar uma dúvida na sala você não faz, porque

será zoado com certeza, e estas dúvidas podem te fazer não entender todo um

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conteúdo passado. Até o lugar onde sentar na sala faz a pessoa sofrer, pois a

tendência é ir sentar mais no fundo ou nos lados para ficar mais isolado, com medo

de ficar na frente deles (de eles ficarem jogando bolinhas, fazendo coisas pelas

tuas costas), a pessoa precisa estar cuidando o que eles estão fazendo, sempre com

medo das próximas coisas. (Aluno 06).

Isso atrapalha muito! Muito! Muito! Muito! Você pode imaginar o quanto

atrapalha, mas não vai saber com certeza o quanto isso atrapalha, o quanto me

atrapalhou, o quanto atrapalha outras pessoas que sofrem com bullying. Cara é de

120%! Atrapalha muito! Você nunca sofreu uma aflição de estar na sala de aula

fazendo uma prova... e lembrar que quando o sinal bater... quando você sair...

quando não tiver nenhum professor por perto... tua vida vira um inferno! Você tem

que pagar coca prá formando e provavelmente apanhar (silêncio e choro). Com

que cabeça você vai estudar (silêncio e choro). Tirando a convivência, as horas de

sono perdidas, o estresse, a má alimentação (porque tem pessoas que não vão no

refeitório por causa disso). Tem pessoas que não convivem que se isolam. E neste

isolamento que entra de novo o estresse, a má alimentação, eles não querem mais

estudar, não tão nem ai prá eles nem para os estudos. Simplesmente perdem o

amor pelas coisas. (Aluno 08).

Ah! Atrapalha! Atrapalha e muito! Porque o que acontece: o cara se estressa, sofre

um monte diante de situações constrangedoras e humilhantes diante de vários

colegas, daí ele tem que fazer um tema, fazer um trabalho, fazer um texto. O cara

estressado não vai fazer com a mesma qualidade que ele iria fazer se ele estivesse

tranquilo, porque ele não vai conseguir se concentrar, não vai conseguir fazer coisa

muito boa. Na cabeça dele ao invés de vim aquele conteúdo bom, vai começar a

vim besteiras. Ele não vai conseguir se desligar, vai continuar pensando no que

aconteceu, vai ter dor de cabeça, não vai conseguir se concentrar... Atrapalha em

muito nos estudos! Imagine estudar para uma prova difícil... nem pensar... não dá.

A pessoa precisa estar bem senão os estudos não vão bem também. (Aluno 09).

Sofrer qualquer tipo de humilhação e bullying influência muito nos estudos e na

autoestima da gente, porque incomoda, se você estiver bem você tem ânimo para ir

prá sala de aula, prá estudar,... se estiver mal, você se fecha, se isola por causa do

que aconteceu e por causa disso você não consegue prestar atenção na aula, porque

você fica martirizado, fica só pensando no que aconteceu, porque é como se você

fosse humilhado, daí parece que todo mundo, toda vez que te ver, vão dar risada

daquele fato que aconteceu, então isso influência muito, porque quando você passa

no meio dos outros, por mais que eles não estejam falando disso, parece que sim...

é o psicológico da pessoa que fica abalado. Eu acho que influência muito sim,,,

(Aluno 10).

Percebe-se através destes relatos que os alunos focaram-se em descrever como e o

quanto o bullying pode ser prejudicial, principalmente aos estudos. É possível destacar que

todos se referem aos prejuízos a que são acometidos os alvos – aqueles que sofrem com os

maus tratos. Evidencia-se também, que os relatos foram marcados por sentimentos fortes,

silêncios, lágrimas, queixas, isto porque, ser acometido pelo bullying traz muitos prejuízos

aos que sofrem (alvos), mas também para os que estão próximos destes, no caso colegas e

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amigos. Além destes, os agressores e os espectadores, como já comentado anteriormente,

também sofrem consequências no rendimento escolar.

Conforme Lopes Neto (2011, p. 42):

Todos os estudantes perdem com a prática do bullying e com a falta de programas

voltados à sua prevenção e redução. Sentimentos de descontentamento por estar na

escola e queda do rendimento escolar são os sinais mais precoces percebidos.

(LOPES NETO, 2011, p. 42).

Através dos relatos evidencia-se que os alunos conseguem apontar muitas das

implicações do bullying: a pessoa busca o isolamento, fica deprimida, com vergonha,

preocupada, quer abandonar os estudos/desistir da escola, apresenta queda no rendimento

escolar (notas baixas, dificuldade de concentração, dificuldade de aprendizagem, falta de

motivação para estudar). Os alunos apontaram que a vitimização na escola impede a plena

realização do potencial dos adolescentes, que acabam perdendo a concentração nos estudos e

o entusiasmo pela escola, levando muitas vezes a desistência ou troca de escola.

De acordo com Fante (2005) muitas vítimas passam a ter baixo desempenho

escolar, apresentam queda no rendimento, déficit de concentração, prejuízos no processo de

aprendizagem, resistência ou recusa a ir para a escola, trocam de colégios com frequência ou

abandonam os estudos.

Francisco (2010, p. 21) acrescenta que a violência escolar está relacionada com

repercussões negativas nos processos de ensino aprendizagem. “O aluno, diante de um

ambiente no qual não se sente protegido, acaba adquirindo aversão à escola, bem como os

conteúdos escolares tornam-se menos interessantes diante de um espaço no qual não há um

bom convívio social.” Além disso, os casos de evasão podem ser reflexo da violência

escolar.

Tognetta (2005, p. 8) coloca que os alvos de bullying “apresentam baixo

rendimento escolar, o que consequentemente, acaba interferindo na estima de si baixa

demais que não lhe permite nem aprender, nem crescer em seus estudos.”

A dificuldade de concentração e motivação para o estudo foi evidenciado nas falas

dos alunos: Aluno 01: ([...] essa pressão não deixa a gente estudar, e não é por falta de

tempo como muitos dizem, é porque você não consegue se concentrar. É muita coisa

acontecendo ao mesmo tempo e você não consegue desligar, sentar para estudar); Aluno

02: ([...] Às vezes eu nem consigo dormir, pois a gente vive sobre pressão, isso te deixa

nervoso, sem concentração na aula, parece até um pesadelo.) Aluno 04: ([...] ela pode

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começar a pensar no que aconteceu e não mais nos estudos, não se concentra, pensa mais

nisso do que no estudo); Aluno 05: ([...] não dá para se concentrar... é horrível... só quem

passa para saber. Os estudos são muito prejudicados nesses casos.) Aluno 09: ([...] O cara

estressado não vai fazer com a mesma qualidade que ele iria fazer se ele estivesse tranquilo,

porque ele não vai conseguir se concentrar, não vai conseguir fazer coisa muito boa);

Aluno 08: ([...] eles não querem mais estudar, não tão nem ai prá eles nem para os estudos.

Simplesmente perdem o amor pelas coisas.) Aluno 10: ([...] se você estiver bem você tem

ânimo para ir prá sala de aula, prá estudar... se estiver mal, você se fecha por causa do que

aconteceu e por causa disso você não consegue prestar atenção na aula, porque você fica

martirizado, fica só pensando no que aconteceu).

O fator desistência ou troca de escola pode ser observado nos relatos dos alunos:

Aluno 06: ([...] Dá aquela vontade de ir embora, desistir da escola mesmo!); Aluno 04:

([...] Como aconteceu com dois amigos meus que já desistiram, não aguentaram mais as

ameaças. E tem mais dois ou três querendo desistir, ...).

O aluno 05 também se refere a desistência quando comenta:

A preocupação é muito grande... Sim!... Um monte de gente já quis desistir da

escola porquê... ou não fez amizade direito ou... todo mundo... ninguém gostou

dela ou... falam mal ou... porque fez alguma coisa e todo mundo fica comentando.

(Aluno 05).

Ainda a respeito da evasão escolar outro aluno manifesta:

O que leva o aluno a desistir da escola é a carga de pressão que ele recebe, as

humilhações, as cobranças, porque não tem um motivo sincero, um motivo claro.

É difícil aguentar tantas coisas que acontecem aqui. É mais fácil desistir, ir

embora, do que denunciar, falar, eles preferem desistir do que contar a verdade.

Por mais que os pais queiram que eles fiquem aqui, se formem, eles não

conseguem obrigar o filho a ficar. Muitos pais não acreditam no que acontece aqui,

e querem obrigar o filho a ficar, dizem para eles não se importarem, para não

ligarem que é só brincadeira, mas não é fácil. (Aluno 04).

Lopes Neto (2005) considera que a evasão escolar pode ser tanto da parte das

vítimas quanto das testemunhas, que se sentem exaustos pelas agressões que sofrem ou

veem seus colegas sofrer no dia-a-dia no ambiente escolar. Assim a saída de escape é

geralmente a troca de escola, no entanto, porém o problema em si não foi resolvido, pois os

agressores continuarão como agressores e outras vítimas continuarão a existir.

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Conforme Maldonado (2011, p. 89) muitos alunos sofrem em silêncio, por

vergonha de relatar o que está acontecendo, sentem-se incompetentes para resolver o

problema por conta própria ou temem ser criticados por não conseguir enfrentar o agressor.

Outros se calam para evitar que a situação fique ainda pior. Muitos preferem não contar o

que está acontecendo por temer ser desacreditado ou ver seu problema minimizado (“Que

bobagem ficar perturbado desse jeito, é só uma brincadeira!”). Nesses casos, a desistência da

escola aparece como uma solução aos alvos para tentar se livrar das agressões, já que muitas

vezes não encontram amparo na escola e na família.

Outra consequência do processo de vitimização destacado das falas dos alunos foi a

questão do isolamento do convívio com os colegas. Isso pode ser identificado nas falas dos

alunos: Aluno 10: [...] você se fecha, se isola por causa do que aconteceu [...] daí parece

que todo mundo, toda vez que te ver, vão dar risada daquele fato que aconteceu [...]; Aluno

06: ([...] isso interfere nos estudos sim, você fica mais reservado, isolado, você não

consegue se soltar. Até mesmo na apresentação de trabalhos, você sabe que tem pessoas

que te perseguem ou não gostam de você ali assistindo, você fica nervoso, inquieto, com

vergonha, com medo de ser debochado, ai não fala tudo que sabe, não consegue

desempenhar seu potencial.); Aluno 08: [...] Tem pessoas que não convivem que se isolam.

E neste isolamento que entra de novo o estresse, a má alimentação, eles não querem mais

estudar, não tão nem ai prá eles nem para os estudos[...].

Percebe-se, através dos relatos, que o isolamento dos alvos dos demais colegas

ocorre por diferentes razões, sendo gerado principalmente por vergonha dos colegas, por

medo e receio de novas humilhações.

O evento do bullying simboliza efetivo impacto e metamorfose na vida destas

vítimas. A transformação atinge tamanha proporção que interfere no próprio

comportamento destes alvos. Reprimidos, abalados e, mais, amedrontados, podem

isolar-se do convívio escolar, segregando-se dos demais alunos (tanto dos

agressores como dos espectadores) pelo receio de nova “avalanche” de deboches e

humilhações. (GOMES e SANZOVO, 2013, p. 139, grifo do autor).

É comum, diante de acontecimentos vexatórios e humilhantes, que os atingidos se

sintam envergonhados e tendam a se afastar dos demais, por receio de serem, a qualquer

momento, atacados novamente. Vale apontar, inclusive, que estes acabam, conforme já

apontado pela pesquisa, evitando de frequentar alguns ambientes, como por exemplo, o

refeitório da escola. Até mesmo, em sala de aula, como comenta o aluno 06, os alvos se

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isolam e em caso de dúvidas a respeito do conteúdo, temem saná-las por saber que serão

zoados e debochados.

Também foi possível identificar nos relatos dos alunos, outro fator gerado pelo

bullying: a ansiedade antecipatória ou sofrimento por antecipação (BEANE, 2010, p. 188).

Isto ocorre quando o alvo já sabe a violência que o espera, pois como o bullying caracteriza-

se pela ação repetida dos agressores, este já prevê a agressão futura. Isto pode ser

identificado nas falas dos alunos: Aluno 05: [...] Imagine nas últimas aulas, você dentro da

sala pensando assim: “meu, daqui a pouco tenho que sair de dentro da sala e ir lá para o

quarto”, já começa bater aquele medo, pânico de ser ameaçado, o que será que vai me

acontecer hoje? Terei que dar dinheiro para os do 3º, será que vão me ameaçar, será que

poderei ir jantar, será que alguém poderá ir junto comigo na biblioteca [...]; Aluno 06: [...]

Até para tirar uma dúvida na sala você não faz, porque será zoado com certeza, e estas

dúvidas podem te fazer não entender todo um conteúdo passado. [...] a pessoa precisa estar

cuidando o que eles estão fazendo, sempre com medo das próximas coisas); Aluno 08: [...]

Você nunca sofreu uma aflição de estar na sala de aula fazendo uma prova... e lembrar que

quando o sinal bater... quando você sair... quando não tiver nenhum professor por perto...

tua vida vira um inferno! Você tem que pagar coca prá formando e provavelmente apanhar

[...].

Conforme Gomes e Sanzovo (2013, p. 139, grifo do autor):

[...] o bullying representa um processo nefasto, devastador e cruel de vitimização.

Muitas vezes, ininterrupto e destrutivo, acarretando, além dos prejuízos físicos e

mentais, o próprio abalo no desempenho educacional do aluno.

É possível concluir, após a análise dos relatos, que os alunos da Instituição

pesquisada estão sofrendo as consequências do bullying, que vão desde o medo e

preocupação, passando pelos problemas gerados à saúde e atingindo diretamente o interesse

pelo estudo e o rendimento escolar, levando muitas vezes a reprovação e a evasão escolar.

Conforme a opinião dos alunos, o maior impacto da violência repetitiva entre os pares dá-se

justamente no processo de ensino e aprendizagem dos alvos (vítimas).

Cabe destacar, que embora os problemas relacionados ao rendimento escolar sejam

os mais visíveis e precocemente percebidos, estes não são os efeitos mais danosos do

bullying. Conforme Beane (2010, p. 195) a vergonha tóxica pode ser uma consequência

ainda mais severa e nociva aos alvos do bullying. Conforme o autor, essa vergonha não é

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uma simples timidez, inibição ou constrangimento natural diante de acontecimentos

corriqueiros. A vergonha tóxica é mais devastadora e perigosa, pois gera sensação de

fracasso e inferioridade extremos na pessoa, que passa a se sentir inútil, impotente. É essa

vergonha que gera a descrença na vítima de que o fenômeno bullying possa ser interrompido

4.2.2.2 – Os sentimentos despertados

Ainda abordando a problemática do bullying e suas consequências, buscou-se

investigar os sentimentos provocados pelos maus-tratos oriundos de episódios de bullying na

escola pesquisada.

A descrição do bullying para os alvos pode ser expresso pelos sentimentos, ao invés

de palavras. Todas as pessoas são diferentes e também são diferentes as reações que cada

uma vai ter diante do bullying. As dores, as emoções de quem sofre os maus tratos pode

envolver: sofrimento, tristeza, depressão, mágoa, lágrimas, medo, exclusão, raiva, vergonha,

entre tantos outros.

O que os autores do assunto trazem é que dependendo da estrutura psicológica de

cada vítima, diversos sentimentos e patologias poderão surgir, tais como ansiedade, medo,

raiva, tensão, tristeza, angústia, desgosto, sensação de abandono, impotência e rejeição,

mágoa, retraimento, desejo de vingança, depressão, fobias, hiperatividade, entre outros.

(FANTE e PEDRA, 2008; GOMES e SANZOVO, 2013, p. 138)

Fante e Pedra (2008, p. 85) enfatizam ainda que:

No caso dos envolvidos em bullying, principalmente os que foram vitimizados,

sendo expostos a situações intimatórias e constrangedoras, pode ocorrer a

formação de uma estrutura psicológica caracterizada por autoestima rebaixada e

inabilidades relacionais. Eles poderão ter suas mentes dominadas por pensamentos

e emoções marcadas por excessiva insegurança, ansiedade, angústia, medo,

vergonha, etc., prejudicando sua capacidade de raciocínio e aprendizado, [...].

Nesse caso, o indivíduo poderá ter comprometimentos no desenvolvimento da

inteligência, da capacidade de criatividade e liderança, bem como sérios problemas

no desenvolvimento afetivo, familiar, social e laboral.

Estas foram alguns relatos dos alunos participantes a respeito dos sentimentos

despertados durante e após os eventos de bullying:

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Eu me sinto muito mal! Horrível! É muito difícil ver todo mundo se divertindo as

tuas custas, olhando você, assim... é... bate um sentimento, uma vontade de sumir,

de não ver ninguém, de querer ficar sozinho... pensar. (Aluno 01).

Quando a gente está se sentindo humilhada, a gente não enxerga mais nada, só

consegue ouvir vozes e risos, você quer sair dali, fugir, mas não tem pra onde

fugir. A gente fica com vergonha no início, até que chega uma hora que a gente

não sente mais nada, pois dói tanto as humilhações, saber que eles fazem isso em

qualquer lugar, até na frente dos professores, não importa o lugar onde você está e

com quem está, a única coisa que você quer fazer é chorar. Eu corro lá para o

bloco e choro muito, muito. (Aluno 02).

A vítima da perseguição se sente humilhada, porque ela está ali, quer se misturar

junto com os outros, ela está querendo entrar no grupo, mas não consegue, porque

o grupo humilha, espalha boatos, fala besteiras dela por ai, ela vai ficar muito mal,

magoada. (Aluno 04).

Eu já passei por isso e... (silêncio) posso dizer que não é nada bom!...Você se sente

um lixo! Primeiro as pessoas precisam te conhecer..., por certo motivo acham que

você é anormal. Você se sente muito rebaixada! (Choro...) Muito... muito mal!

(Aluno 05).

Tem pessoas que ficam tristes, que choram, que tem vontade de ir embora do

colégio e nunca mais voltar. Eu já cheguei a ficar muito chateado com algumas

histórias por ai, daí tu fica com vergonha de sair, não sabe o que os outros estão

pensando de você. É ruim chegar num lugar e ser isolado, ninguém falar com

você, você se sente um nada. (Aluno 06).

Olha sinceramente, eu tento não dar bola, porque se eu parar para pensar, vai

muito fundo. Mas a maioria das pessoas se sente repudiadas pelo resto da

sociedade, constrangidas, se sentem enganadas, desprotegidas. [...] Se sentem

muito mal, sem saber o que fazer.. (Aluno 08).

Na hora te dá vontade de pegar os cara e encher de lixo, [...] Dá raiva! Bastante

raiva! Dá vontade de sair batendo nos cara, só que não tem o que fazer, porque são

todos da 3ª. Eu me sinto mal numa hora dessas. [...] (Aluno 09).

Ah! A gente fica com vergonha, fica meio deprimida, não tem vontade de ir ali no

meio dos outros, a gente fica mais num canto, recolhida (silêncio e choro), porque

se sente mal é muito dolorido tentar chegar próximo de alguém pra conversar e

eles saírem de perto ou senão ter a sensação que estão comentando e rindo de

você. (Aluno 10).

Independente da forma como a violência tenha sido vivenciada pelos alvos,

observou-se nas falas, nas expressões e no conteúdo subjetivo das mesmas que as agressões

geram sentimentos diversos, mas essencialmente de cunho negativo.

Através da análise das unidades textuais, evidencia-se, de forma geral, que os

alunos se sentem incomodados com as atitudes dos colegas. Eles apontaram ser acometidos

por sentimentos diversos: tristeza, mágoa, revolta, vergonha, constrangimento, isolamento,

raiva, vontade de fazer a mesma coisa com os agressores, vontade de desistir/mudar de

escola, entre outros. Deste modo, é possível interpretar que os sentimentos vivenciados pelos

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alunos vitimizados estão relacionados com sentimentos de menos valia, isolamento social, e

de medo ou raiva reprimida, causando mal-estar psicológico entre as vítimas.

A citação de sentimentos ruins e incoerentes com boa saúde mental foi fortemente

evidenciada nos relatos. Humilhação, tristeza e sofrimento devido a rejeição, ao isolamento

pela aparência física, devido aos apelidos pejorativos, foram marcantes dentro da pesquisa.

Estes relatos confirmaram o que antes já havíamos considerado, que as marcas

deixadas pelo bullying no adolescente são profundas, magoando-o no íntimo de seu ser,

desestruturando áreas de sua vida, principalmente relacionadas à autoestima e socialização.

É possível perceber porque o bullying predispõe os alvos a uma ampla gama de

problemas psicológicos, e está associada à maior número de encaminhamentos para os

serviços de saúde mental, na escola pesquisada inclusive.

Percebemos em alguns alunos relatos de indignação diante da disseminação do

bullying no ambiente escolar.

Eu sofri no 1º ano, não irei fazer outros sofrer, mas geralmente é isso que

acontece... tem pessoas que não conseguem fazer porque sabem o quanto é ruim,

mas outros já pensam em se vingar. (Aluno 02).

Eu fico indignado com essa história de que todo o 1º ano deve sofrer e o 3º ano

mandar. Se acabasse com isso, tudo ficaria melhor na escola, as relações seriam

mais amigas e menos interesseiras. Isso precisa acabar, os alunos não podem mais

seguir pensando assim, ensinados pelos outros mais antigos a terem que agir

assim. Eu não posso falar pelos outros meus colegas do 1º, mas eu não vou agir

assim e não vou querer deixar amigo meu fazer isso. (Aluno 04).

Eu fico indignado, cara! Eu não vou fazer com os meus calouros o que estão

fazendo comigo. Eu digo: Não vou fazer com eles o que fazem comigo!” (Aluno

08).

Outra questão já evidenciada, e contrária também acontece. Em consequência dos

sentimentos negativos despertados pelas diferentes formas de bullying observou-se, pela

análise dos conteúdos das verbalizações dos entrevistados, que muitos dos envolvidos com o

bullying desenvolvem um verdadeiro sentimento de vingança e, em determinado momento,

passam de vítimas a agressores, passando a repetir com outros colegas os mesmos maus

tratos a que era submetida. Esses comportamentos decorrem de um processo complexo que

envolve a dinâmica do bullying evidenciada na escola (círculo-vicioso).

É fato que todas as pessoas em um contexto geral querem ser reconhecidas e

respeitadas pelos outros, pelo grupo ao qual pertence. Com o adolescente isso não poderia

ser diferente. Dentro da pesquisa, os sofrimentos diante dos maus tratos, constrangimentos e

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gozações aos alvos de bullying, forneceram dados de alerta acerca do problema. Por mais

que os entrevistados tentassem disfarçar e calar os sentimentos, era visível a tristeza e o

descontentamento dos indivíduos afetados.

A escola pesquisada de posse de dados tão significativos precisa com urgência

pensar em práticas preventivas e de combate ao bullying, pois não é mais possível que

jovens que procuram a escola pensando em ter futuro melhor, acabem sendo afetados de

maneira tão severa pela prática de bullying.

4.2.3 – Como os alunos percebem os maus tratos entre os pares e suas consequências

Além dos prejuízos acadêmicos e dos problemas no âmbito da saúde física e

emocional, outra consequência do bullying que merece destaque, pois ocorre na instituição

pesquisada, é o fato da reprodução e da naturalização da violência. Com o passar do tempo,

as atitudes de intimidação e agressão adotadas pelos autores de bullying, passaram a fazer

parte do cotidiano da escola, gerando certa acomodação e psicoadaptação – os alunos

acabam agindo como se isto fosse normal. É como apontam Gomes e Sanzovo (2013, p.

143, grifo do autor) “[...] seja nos casos de maus-tratos ou agressões meramente pontuais,

seja nos casos de bullying, a conclusão é certeira: a violência acarreta, dentre outras mazelas

e sequelas, mais violência, incitando, ao invés de minimizar, a prática do bullying.”

O fato é que na medida em que a escola não consegue intervir nessas situações, ou

não dá a devida importância, acaba legitimando e contribuindo com o modelo de relações de

convívio que vai se estabelecendo entre os alunos, constituindo-se em um saber difundido

como “certo, justo e normal” dentro da escola.

Constata-se que, no geral, que os comportamentos agressivos que ocorrem na

escola passam a ser admitidos como naturais, sendo habitualmente ignorados ou não

valorizados, tanto por alunos, como por professores, quanto pelos pais. Na própria fala dos

alunos, os mesmos não reconhecem muitas vezes, como expressões que agrediam os demais:

A gente coloca apelido, mas todo mundo gosta e também coloca nos outros.

(Aluno 01).

Aqui no colégio, desde sempre, por exemplo, formando dá as regras, manda e

“bixo” obedece. Foi assim com o meu pai, quando ele estudou aqui e continua

comigo. Não se pode acabar com a tradição, isso de sofrer você se acostuma,

fizeram para você e depois você faz para os outros... é assim que deve ser. (Aluno

10).

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Os relatos evidenciam a naturalização da violência existente no âmbito escolar, tal

como se observa no trecho do aluno 10: “[...] você se acostuma, fizeram para você e depois

você faz para os outros.” Os alunos convivem neste ambiente e acabam considerando

situações de violência como normais, algo inerente a própria condição da instituição. “Isso

faz parte da cultura da escola, é algo inquestionável, todos terão a oportunidade de passar

por todas as séries e aproveitar. Agora é a nossa vez.” Este foi o relato de um aluno

participante da pesquisa que se encontrava no 3º ano.

Nas exposições dos alunos isso fica bem evidente e percebe-se o conformismo e o

fato não se importar com os sentimentos do outro.

Aqui no colégio agrícola não é lugar de criancinhas, que não suportam

brincadeiras, esses devem ficar em casa, pois são um empecilho na vida dos outros

estudantes, que muitas vezes recebem punições desnecessárias, por coisas tipo

apelidos, cobrança de coca... isso é coisa normal de acontecer. (Aluno 01).

Discussões são normais aqui, alguns mandam e os outros tem que baixar a orelha,

sabe, isso é cultura da escola (Aluno 03).

Você brigar, xingar, implicar, debochar com os outros é normal com essa piazada

aqui, não é real, é aquelas “briga de brincadeira”, “é normal entre nós”, só se

estressa quem quer ser diferente... tem que entrar nessa onda... apelidar, zoar,

detonar os outros também. (Aluno 09).

São poucos os alunos que observam a violência e os conflitos como uma prática

não admissível e que deve ser abolida da escola, porque todos os alunos têm os mesmos

direitos (e estes, normalmente são alunos do 1º ano), que são os que mais sofrem com os

maus tratos.

Ressalta-se que afirmações do tipo: é cultural, é tradição, sempre foi assim, é

normal entre nós (presentes nos relatos dos alunos), precisam ser avaliadas pela instituição

pesquisada, pois já se demonstrou os problemas decorrentes desse modelo de relações de

convivência presentes no cotidiano escolar. Se essa linguagem faz parte do dia-a-dia da

escola, há indícios de que isso não está sendo considerado ou não se dá a devida atenção.

Diante disso, a violência passa a ser normal no ambiente, não apenas para os alunos, mas

para toda a comunidade escolar. Diante desse contexto é importante analisar também, em

que grau a instituição pode estar reforçando tais pensamentos por meio de seu fazer

pedagógico, pois tudo que se vive lá dentro resulta em aprendizagens que se estendem para

toda a vida, principalmente para quem está em um período de reafirmação e ressignificação

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de valores, que busca apoio nas relações de amizades, e, nesse contexto, as relações

interpessoais são fundamentais.

Percebe-se também através dos relatos, que os alunos, a partir de seu ingresso na

instituição, sofrem influências que os conduzem ao modelo culturalmente instituído naquele

ambiente. Esses ensinamentos aos novatos ocorrem a partir das relações interpessoais, no

repasse das experiências pelos alunos mais velhos e isto se acentua quando se trata dos

alunos internos. O relato do aluno 01 vem ao encontro do exposto:

Conforme vão passando os anos a gente vai mudando a nossa concepção aqui

dentro. Vai vendo que o que nós achávamos ruim no 1º ano, o que faziam com a

gente não era para maltratar e sim ensinar como nós deveríamos ser quando

estivéssemos no 3º ano, a fim de manter a ordem das coisas. (Aluno 01).

Esse modelo de relacionamento está tão enraizado na instituição que até mesmo os

alunos mais inconformados acabam se moldando, muitas vezes por medo, outras vezes por

indiferença. É interessante destacar nas falas dos adolescentes, o medo que alguns possuem

em sofrer represálias, em razão dos conflitos que ocorrem na escola devido a essa “cultura”

institucionalizada, tais como se relata:

Tem uns que dizem não e não acontece nada, já teve outros que disseram não ou

questionaram algumas atitudes e que apanharam. Eu tenho certeza que isso não foi

para a diretoria, pois ninguém tem coragem de ir contra ao que eles estabelecem.

(Aluno 04).

A indiferença também é usada por muitos alunos como estratégia de defesa frente

aos conflitos.

A indiferença para mim é a melhor coisa nessas horas. Quanto mais mostrar que tu

se incomoda, mais eles vão fazer. E não adiante nem bater! (Aluno 02).

É melhor ficar na sua. Bater de frente é pior. (Aluno 09).

Sei lá, a gente acaba se acostumando a ter que levar na esportiva, porque é melhor

fazer isso do que bater de frente, ir denunciar e tal... E se você se incomodar, daí é

que eles fazem... porque se eles percebem que você se incomoda, fica chateado, se

deixa atingir, daí que eles aprontam mesmo. (Aluno 10).

A sociedade e a cultura contribuem para o estabelecimento de códigos da

sociabilidade adolescente que produzem práticas de aceitação ou intimidação entre os jovens

no contexto escolar. Nesse sentido, tais práticas podem incorrer em situações de difícil

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intervenção e compreensão, pois tendem a ser legitimadas (ensinadas e aprendidas) como

fatos banais, levando a violência ao processo de naturalização pela própria comunidade

escolar – fato este evidenciado nos relatos dos alunos. E a triste consequência é que:

violência gera mais violência.

Constata-se, diante do exposto, a urgência de se refletir, enquanto escola, com

relação aos modelos de relações instituídos. Conforme alerta Eyng (2011, p. 112, grifo do

autor) “O bullying não pode ser naturalizado ou ignorado.” É necessário verificar se o

projeto educativo institucional oferece o suporte necessário para quebrar esse ciclo vicioso

violento estabelecido nas formas de relacionamento entre alunos, que a muito tempo vem

sendo aceito praticamente sem questionamentos.

Toda a comunidade escolar precisa estar disposta a conhecer o que se passa com os

alunos, pois é necessário o envolvimento de todos no processo educativo da Instituição,

visando a resolução dos problemas identificados.

4.2.4 – A importância do grupo de amigos

Os adolescentes vão se desvinculando de seus pais e as relações com os

colegas/grupo de amigos ganham em importância, em intensidade e em estabilidade,

passando a ser o contexto de socialização mais influente. Dessa forma, os valores do grupo

de semelhantes são muito importantes para o adolescente. E sendo assim, os conflitos que

envolvem grupos de adolescentes e a desvalorização do sujeito perante os colegas

contribuem muito para a expressão de sentimentos negativos.

Conforme Silva (2010, p. 67, grifo nosso):

A adolescência pressupõe riscos, aventuras, inquietações, angústias, descobertas,

irresponsabilidades pontuais, insensatez, paixões, emoções exacerbadas etc. [...]

Elas são, na maioria absoluta dos casos, manifestações exasperadas, ainda que

disfuncionais e socialmente inaceitáveis, de jovens se lançando na busca de sua

própria identidade. [...] Nesse contexto de dúvidas, incertezas e agressividade, o

grupo vem a ser o lugar privilegiado do reconhecimento individual e, por isso,

objeto afetivo de enorme relevância. É no grupo que o sentimento de vínculo do

adolescente encontra canal para se expressar na forma de linguagem verbal, física

e comportamental.

O ser humano sente a necessidade de se adequar ao grupo ao qual pertence, e com

os adolescentes não é diferente. Segundo Campos (2010, p. 102) “Os companheiros de

idade, a roda de amigos e a turma ajudam o adolescente a encontrar sua própria identidade,

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em um contexto social.” E é por isso que, muitas vezes, as pessoas aceitam os maus tratos,

sem se impor. A insegurança, o receio da rejeição, o desejo de ter valor e de ser reconhecido,

de ser parte de um grupo é comum aos seres humanos, especialmente àqueles que estão se

desenvolvendo. Conforme Tognetta (2010) “é desconcertante ir contra um grupo em que se

está inserido, ser diferente” No caso particular do adolescente, a necessidade de pertencer ao

grupo é um fator preponderante nessa faixa etária. A tendência dos adolescentes é unirem-se

ao grupo de iguais e neles buscar apoio para os desafios que vão se apresentando. Conforme

indica Campos (2010, p. 40) quando surge um dilema, em resposta a ele os jovens procuram

apoio em seus companheiros de idade. Eles vão preferir pedir ajuda e conselhos aos pares do

que procurar os pais ou os professores. Isso fica muito evidente nas falas dos alunos

participantes da pesquisa, quando discorrem a respeito do significado dos amigos para eles

dentro da escola:

Eles significam bastante coisa! Aqui dentro eles são que nem irmão, que nem uma

irmã, irmão... pai, as vezes pai e mãe. Que todo mundo tem mais liberdade com o

pai ou a mãe, ou nem sempre com eles... então eles significam bastante aqui

dentro... ficar sem um, oh! Ficar sem um amigo é bem difícil. (Aluno 02).

Eles representam uma segunda família aqui, né, porque você não tá em casa. A

gente se vê bastante, eles te acolhem quando você tá mal, que nem, tipo... uma

segunda mãe... assim... uma segunda família, eles ajudam a entender os problemas,

você pode contar com eles sempre. Sem eles você se sente sem nada... você se

sente desnorteada. (Aluno 05).

Ah! Os meus amigos são um motivo prá mim estar aqui dentro ainda. Prá mim

descansar, prá mim relaxar, prá mim tá ligado, prá tirar a cabeça dos estudos, prá

mim conseguir descansar. E se eu não tivesse eles, se por acaso fosse excluído... aí

eu... num caso desses não aguentaria ficar aqui dentro do colégio. Eu acho que não

estaria mais aqui. Sem meus amigos, com certeza, eu não estaria mais aqui.

(Aluno 09).

As relações com os pares desempenham um papel central na vida dos adolescentes.

É com os colegas que eles contam intensamente durante a adolescência para suporte

emocional e amizades. Então ter uma participação no grupo de pares é vital para o indivíduo

nesta fase do desenvolvimento humano. A turma ou grupo são uma base segura, da qual ele

se apropria e movimenta-se em direção a uma solução singular do processo de identidade.

Observando-se os relatos dos alunos compreende-se ainda mais a necessidade destes laços

no decorrer da adolescência. Trata-se de um mecanismo efetivo no qual as interações

funcionam como um elemento de autoafirmação e fornecedora de segurança emocional. Em

alguns dos relatos os alunos declararam que se porventura não tivessem amigos dentro da

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180

escola, esse seria um motivo para abandoná-la. Em outros relatos, percebe-se claramente

que, muitas vezes, os adolescentes relacionam a figura do amigo com familiares ou parentes

próximos (atribuem o mesmo significado). Pode-se sintetizar, por meio da análise dos

relatos, que a definição de “amigo” para sujeitos da pesquisa é a de alguém com quem “se

pode contar” e o fato de cultivar amigos e ser aceitos por estes é visto como necessário para

todos os entrevistados.

Um fator bastante relevante na ocorrência de bullying diz respeito às relações

estabelecidas com os pares. Para os adolescentes a posição que ocupam entre seus pares é

muito importante, por isso, não ser aceito pelos pares ou não ser estimado por eles, oferece

menos oportunidades dele desenvolver suas habilidades sociais.

A existência de vínculos afetivos significativos entre os alunos, sejam eles das

relações estabelecidas de amizade ou de namoro, são importantes tanto pelo seu papel

socializador e de formação de identidade, como também por permitirem que os adolescentes

partilhem o conhecimento, já que eles podem constantemente estudar juntos.

O relato de um aluno exemplifica a importância do grupo de colegas no momento

dos trabalhos de aula em grupo:

[...] Às vezes, quando eu não tinha grupo, ficava sozinha, daí eu via os outros

grupos fazendo o trabalho e ficava pensando: “Ah, bem que a gente podia estar

fazendo juntos, a gente poderia estar estudando e brincando ao mesmo tempo. Daí

eu ficava assim... com preguiça.... ficava meio triste e sem vontade de fazer o

trabalho. Ficava isolada, sem fazer nada. (Aluno 02).

Ver-se isolado, excluído perante um grupo de colegas evoca sentimentos negativos

nos alunos participantes do estudo e fica explícito no relato do aluno 02. Ser preterido pelos

colegas numa atividade coletiva é muito frustrante e dolorido para as vítimas, que além do

isolamento, apresentam sentimentos de tristeza, desânimo, falta de vontade de estudar.

A importância dada à existência dos vínculos de amizade confirma a noção de que,

na adolescência, os relacionamentos com outros indivíduos e com grupos diversos,

diferentes da família, são priorizados. (PEREIRA, 2005; CAMPOS, 2010).

Buscando compreender o grau de entrosamento dos alunos com os amigos,

perguntamos: “Quantos bons amigos (amigos de verdade) você tem na escola?”

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Tabela 15 – Quantos bons amigos você tem na escola

OPÇÕES RESPOSTAS TOTAL (%)

Apenas um 15 7,18%

Dois ou três 51 24,40%

Quatro ou cinco 83 39,71%

Mais de seis 43 20,57%

Não tenho nenhum bom amigo 17 8,13%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

A análise dos resultados dos questionários mostra que a maioria dos alunos indicou

possuir amigos dentro da escola. Percebe-se que 4 ou 5 amigos é a quantidade apontada por

39,71% dos respondentes do questionário. Com as entrevistas foi possível compreender que

as amizades são muito valorizadas e os vínculos de confiança que se estabelecem entre os

alunos são extremamente importantes para “aguentar” (termo utilizado pelos alunos) ficar na

escola, morar no internato, longe da família. Nota-se que se as relações de amizade que até

então costumavam ser orientadas pelas atividades (brincar, estudar, etc.), na adolescência

tornam-se mais autoconscientes e mais analíticas, sendo construídas a partir do

estabelecimento de vínculos afetivo.

Outro fator que merece destaque é o número significativo de alunos que apontaram

não possuir nenhum bom amigo dentro da escola (8,13%). Estes alunos enfrentam uma

situação muito difícil, pois já destacamos a importância do grupo de iguais na adolescência.

Isto ficou evidente na fala do aluno 05:

É muito difícil viver aqui sem ninguém com quem contar, sem ninguém

para desabafar, conversar, ou mesmo dar umas risadas. Eu já sofri muito

com o isolamento aqui. Hoje, Agora vou na Psicóloga e tomo remédio para

depressão. (Aluno 05).

Percebe-se que a escola é um espaço conveniente e fundamental ao estabelecimento

de relações, que podem marcar de forma decisiva a vida dos adolescentes. Apesar das

relações próximas serem extremamente importantes para pessoas de todas as idades, é na

adolescência que emergem as primeiras relações verdadeiramente íntimas.

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4.2.5 – Quanto à intervenção dos pais nos casos de bullying

O bullying é uma violência velada, silenciosa, e os alvos nem sempre tem

condições e habilidades pessoais para livrar-se das agressões sozinhos ou nem sempre

encontram espaço na família para compartilhar a aflição pela qual estão passando.63

Porém,

os filhos sinalizam de alguma forma seus problemas e os pais precisam estar atentos a estes

indicadores, que muitas vezes são desesperados pedidos de ajuda. Pode-se destacar: o

desinteresse pela escola, a vontade de abandonar os estudos/trocar de escola, medo da

escola, marcas de intimidação, sinais de isolamento, mudanças de comportamento, entre

outros.

Segundo os alunos, as atitudes individuais dos alvos de bullying na tentativa de

interromper as agressões não surtem muito efeito. Isso gera ainda mais sentimentos de

impotência e vergonha aos alvos.

Não adianta eu já fiz de tudo, quanto mais fala, mais eles tentam me atingir. É

pior, a gente fica cada vez mais exposto, mais gente fica sabendo. Quando eu

mandei relatório para o CGAE, daí que eles ficaram espalhando boatos para todo

mundo de coisas que nem existiam. (Aluno 02).

Não adianta falar. Melhora por uns dias depois voltar a acontecer e até pior.

(Aluno 05).

Na maioria das vezes, os alvos não buscam ajuda e acabam sofrendo em silêncio.

Porém, quando já tentaram resolver os problemas e conflitos sozinhos e não obtiveram êxito,

uma saída é recorrer aos pais. O relato abaixo evidencia que a possibilidade de intervenção

dos pais, nos casos de violência e maus tratos entre colegas, pode gerar resultados positivos:

É bem difícil... Eu liguei prá mãe: “Eu quero ir prá casa! Não quero mais ficar

aqui... Tá terrível!” A gente chora no telefone. Daí a minha mãe veio aqui,

conversou com a direção, daí me convenceu a ficar. Prá mim resolveu, valeu a

pena. Eu falei e foi resolvido. E se eu não tivesse falado para minha mãe, ia

continuar acontecendo e ninguém ia saber, só eu ia ficar lá sofrendo, sozinha.

Porque se ninguém souber não tem como te ajudar. Acho que tem que falar para os

pais e denunciar os colegas que agridem. (Aluno 10).

63

É comum que a vítima mantenha a lei do silêncio, pois, na maioria das vezes, as agressões são apenas morais

e não deixam vestígios. Ela tem medo e vergonha de falar sobre as humilhações e, em muitos casos, teme que o

problema se agrave se for tornado público. Outras vítimas temem, inclusive, a reação desproporcional ou

escandalosa dos pais e preferem ficar em silêncio. Por último, muitas vítimas temem que a escola não possa

fazer nada para ajuda-las. (CALHAU, 2011, p. 43).

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Já em outros casos parece ocorrer o contrário:

Eu comentava a situação com os meus pais. Só que eles iam conversar no colégio.

Conversavam, daí um dia resolvia e depois voltava tudo a mesma coisa. Daí não

adiantava nada. (Aluno 02).

Eu estava muito triste pelas coisas que vinham acontecendo no colégio, daí

conversei com a minha mãe, e ela veio aqui. Isso só piorou a situação, porque daí

eles tinham mais um motivo para tirar com a minha cara. Tipo: “Vai chorar...

chama a mamãe!” (Aluno 05).

Embora os alunos tenham relatado situações de êxito e também de não resolução

dos problemas de maus tratos após a intervenção da família, acredita-se que o papel dos

pais, diante de situações que envolvam violência na escola, seja o de acompanhar o caso

com os gestores da escola, estando sempre atentos às providências que foram adotadas para

que a segurança dos filhos seja assegurada. Os pais não devem ter receio de procurar a

escola e de reclamar, sugerir, exigir que esta tome providências no sentido de prevenção e

combate a violência.

Com relação a intervenção dos pais, Silva (2010, p. 69) traz:

As “ferramentas” que os adultos devem utilizar para intervir, evitando as

consequências mais dramáticas nessa difícil fase de transição para a vida adulta,

são: o estímulo ao diálogo, a escuta atenta e empática, a construção de vínculos

afetivos fortes, o desenvolvimento de uma reflexão crítica, o incentivo à

participação familiar e escolar, a orientação para a responsabilização por si

mesmos e pelos outros, a criação e a implementação de regras e o estabelecimento

precoce (desde os primeiros anos de vida) de limites bem definidos.

Com relação ao papel da família diante do bullying, Pereira et al (2011, p. 147)

coloca que este é decisivo no desenrolar das práticas agressivas estabelecidas no contexto da

escola. A participação da família na dinâmica da escola é necessária e insubstituível. A

participação da família na vida escolar dos filhos vai além de simplesmente conhecer

professores e diretores.64

O acompanhamento da trajetória escolar dos filhos, por meio do

diálogo constante, é determinante ao perfil comportamental do estudante. Os autores trazem

64

Existe um distanciamento das famílias com as escolas, motivado pelo entendimento de que a relação das

crianças e adolescentes com seus colégios seja restrito ao ensino e ao aprendizado. Portanto, os meios pelos

quais os pais avaliam o desempenho escolar de seus filhos são a verificação de notas nos boletins, a frequência

e os cadernos de anotações. Raramente existe a preocupação sobre o que sentem ao estar na escola, as

amizades, o ambiente, o comportamento de seu filho e dos colegas, etc. (LOPES NETO, 2011, p. 86).

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ainda que “há evidências de que o estilo parental se relaciona às condutas manifestadas pelos

alunos nos contextos escolares.” (ibid).

A dinâmica familiar pode reforçar a violência, principalmente quando faltam regras

claras, quando falta coerência entre valores proclamados e vivenciados e, sobretudo, quando

falta afetividade nas relações familiares. Nesse sentido, “a aproximação família e escola é

um desafio à espera de respostas e que está diretamente relacionado à origem e aos

desdobramentos das práticas de bullying.” (PEREIRA, et al, 2011, p. 147).

A linguagem da violência está, infelizmente, muito enraizada na sociedade e nos

meios de comunicação e é amplamente utilizada em algumas famílias: as crianças

absorvem e reproduzem, desde cedo, os padrões de relacionamento com os quais

convivem. [...] Será que é em casa que seu filho está aprendendo que a agressão é

uma ferramenta básica para se relacionar com os outros? (MALDONADO, 2011,

p. 136).

A autora levanta por meio desta pergunta um chamado a muitos pais para que

observem os padrões de relacionamento em suas famílias. Será que dentro de casa não

ocorrem situações de maus tratos, humilhações, agressões, xingamentos, insultos, colocação

de apelidos, rótulos (burro, desligado, imprestável)? Nem sempre os pais se dão conta de

que certos comportamentos que o filho manifesta são aprendidos em casa, como resultado da

interação entre os familiares. (FANTE, 2005, p. 76). Além disso, como é o tempo de

convívio das famílias? Atualmente, percebe-se, cada vez mais, pais trabalhando muito para

proporcionar o “melhor” aos filhos; filhos cheios de atividades (inglês, natação, futebol,

judô); e cada qual mergulhado em seus próprios interesses, sem tempo para encontros e

atividades conjuntas.

Diante do exposto, podemos afirmar que a base familiar revela-se como um apoio,

um abrigo para os filhos, principalmente para os adolescentes. Os pais devem favorecer em

casa um ambiente participativo, aberto ao diálogo, buscar entender e ajudar este jovem nas

situações de dificuldades com o grupo de iguais, e nunca favorecer a baixa autoestima e

carência afetiva, devendo fornecer sustentação emocional nesse período do desenvolvimento

humano, marcado por tantas incertezas e dificuldades. Os pais necessitam preocupar-se com

as atitudes e os exemplos e participar da vida social e escolar dos filhos, pois é numa

estrutura familiar sólida que o adolescente vai suprir suas necessidades de valorização,

limites, amor. Valores estes que contribuem para o desenvolvimento de autodefesa e

autoafirmação.

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Fante (2005, p. 76) acrescenta que é necessário que os pais acompanhem dia a dia o

andamento escolar do filho, sendo esta tarefa obrigatória de ambos (pai e mãe), procurando

incentivá-lo com entusiasmo e corrigi-lo com brandura. Somente assim, observando e

acompanhando o filho com atenção é que os pais poderão detectar sinais de vitimização e/ou

indícios de agressividade.

Quando os pais suspeitarem ou perceberem algum comportamento diferente ou

estranho do filho, estes devem estabelecer uma conexão direta com ele, buscando

informações, detalhes do que está ocorrendo. Fante (2005, p. 75-76) diz que em casos de

vitimização “os pais devem procurar elevar a autoestima dos seus filhos, ressaltar sempre

suas qualidades e capacidades, procurar não culpá-los pelo que lhes está ocorrendo nem

incentivá-los a revidar os ataques, pois isso somente aumentaria a violência.”

Infelizmente, temos assistido ainda, principalmente entre as famílias cujas crianças

são vítimas de qualquer violência, pais que incentivam seus filhos a baterem de

volta, a também utilizarem violência física ou verbal para com seus agressores. É

compreensível que em sua indignação esses pais se revoltem e atuem junto a seus

filhos, julgando melhores a coragem, a força e a virilidade para a autodefesa. No

entanto, é preciso que levemos em conta a nossa condição enquanto adultos: nós

temos a possibilidade de pensar sob mais de uma possibilidade para resolver os

problemas, principalmente de forma mais evoluída que supere as tendências de

uma justiça retributiva que se traduza em revide da violência sofrida. É possível,

no entanto, que auxiliemos as vítimas dando a elas a possibilidade de se indignar.

Quando questionamos, por exemplo: “Por que você deixou que ele te batesse? O

que você pode fazer para que isso não aconteça novamente?” Estamos

contribuindo para que a criança tome consciência de sua importância e que ela

pode se defender. (TOGNETTA, 2005, p. 16).

4.2.6 – Quanto à atuação da escola frente ao bullying.

O bullying ocorre em todas as escolas e se manifesta diariamente, em maior ou

menor grau. Conforme Fante e Pedra (2008, p. 52) o bullying sempre existiu no ambiente

escolar, porém, muitas escolas ainda não admitem a existência do fenômeno, ou seja, não

percebem, não aceitam ou não dão a devida importância às dificuldades de relacionamento

entre os alunos dentro de seus muros. Contudo, o despreparo e o desconhecimento dos

profissionais da educação diante do fenômeno bullying não são justificativas para a falta de

posicionamento adequado da escola frente às situações de bullying.

Sabe-se que o papel da escola sofreu mudanças drásticas, e atualmente vai além da

função de formação acadêmica, agregando também funções como a socialização, formação

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de caráter e a cidadania. Seus objetivos vão além de ensinar conteúdo. A escola é um espaço

de interação entre seus participantes, é também um lugar onde os adolescentes aprendem a

se relacionar, adquirem valores e crenças, desenvolvem senso crítico, autoestima e a

segurança.

Minayo (1999, p. 114) traz que uma escola ideal é aquela que favorece um

ambiente saudável:

[...] é aquela que respeita e estimula os alunos a pensar. São escolas em que, além

de o aluno aprender as matérias, se permite que ele cresça como pessoa e cidadão.

Ou seja, ela é a instituição que realiza, ao mesmo tempo, sua função de construir

conhecimentos, convivências, experiências e crítica social e, assim, cumpre

importante papel socializador.

Entende-se que o papel da escola diante do bullying deve ser, primeiro, o de

reconhecer a existência da problemática, para depois poder traçar estratégias para preveni-lo

e extingui-lo. Acredita-se, que a prevenção começa pelo conhecimento. Conforme Tognetta

2005, p.14) em primeiro lugar, é preciso se faça um diagnóstico da situação escolar que

comprove que na instituição se encontram vítimas e agressores de bullying. É preciso que as

escolas pesquisem a sua realidade e reconheçam a existência do bullying e, sobretudo,

estejam conscientes de seus prejuízos para a personalidade e o desenvolvimento

socioeducacional dos alunos.

Rolim (2008) destaca, que a preocupação de prevenir o bullying e a violência em

geral devem ser pensadas desde os primeiros anos de vida do indivíduo, dessa forma a

família deveria ser a primeira a se preocupar em transmitir uma cultura de paz, porém a

escola, a sociedade e o Estado não estão eximidos dessa responsabilização, pelo contrário,

possuem um papel de extrema importância na continuidade da formação das crianças e

adolescentes.

Faz parte, então, do papel da escola a construção de habilidades sociais, incluindo a

comunicação, o ato de fazer amigos e a resolução de conflitos.

Visando conhecer a opinião dos alunos sobre a forma como a escola lida com os

casos de violência, perguntamos a eles: “Como você acha que o CGAE/direção da escola

lidam com os casos de violência, preconceito, desrespeito e agressão repetitiva entre

colegas?

As respostas a esta questão estão apresentadas na tabela a seguir:

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Tabela 16 – Opinião dos alunos a respeito de como a escola lida com os casos de violência,

desrespeito e agressão repetitiva.

OPÇÕES RESPOSTAS TOTAL (%)

Normalmente eles nem ficam sabendo 79 37,80%

Normalmente quando sabem não tomam nenhuma

providência

32 15,31%

Normalmente quando sabem buscam punir os culpados 65 31,10%

Normalmente quando sabem buscam resolver o problema,

orientar os culpados, mas sem puni-los

33 15,78%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013)

Diante dos dados da tabela acima, percebe-se que a maioria dos alunos (53,11%)

demonstrou descrença na atuação da escola frente aos casos de bullying, sendo que 37,80%

afirmaram que, normalmente, os responsáveis nem ficam sabendo do que ocorre entre os

alunos, e somam-se a estes 15,31% dos alunos que apontaram que, normalmente, quando a

escola sabe não toma nenhuma providência.

Tem muitas coisas que acontecem e a maioria dessas coisas o CGAE não vê,

porque os alunos são espertos. Mas tem outras que acontecem que o CGAE não vê

não porque não consegue, a maioria dessas coisas o CGAE não vê porque não

quer. (Aluno 08).

Evidencia-se então, a questão velada da violência entre pares, já que “a escola”, na

maioria das vezes, nem fica sabendo da ocorrência de bullying entre os alunos, mas ele

ocorre em grande percentual.

O fato de 15,31% dos pesquisados terem apontado que diante dos casos de bullying

a escola não toma providências, pode segundo Lopes Neto (2011, p. 105), contribuir para o

aumento dos índices de agressividade entre os alunos. “Ao perceber que o bullying é

tolerado pelas escolas e que seus autores não sofrem punições e gozam de popularidade,

destaque social e poder, muitos estudantes podem aderir a esse tipo de comportamento

também, aumentando os índices de agressividade entre os escolares. (ibid).

Outra questão a ser discutida, são as providências tomadas pela escola em caso de

identificação de situações de bullying. Segundo os alunos, normalmente, quando os

responsáveis ficam sabendo de situações envolvendo bullying, eles buscam punir os

culpados – isto foi apontado por 31,10% dos pesquisados.

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Stival et al (2011, p. 195) baseados em Fante (2005) trazem algumas orientações

imediatas que devem sem seguidas pela escola no caso de observância de casos de bullying:

[...] intervir imediatamente e tomar consciência imediata quando for percebida

uma situação de bullying; falar com os envolvidos separadamente (no caso de

professores) e encaminhar a mesma conversa para os pais dos mesmos para que a

continuidade dessa conversa seja apreciada no contexto familiar; Se houver mais

de um participante direto da situação, quer seja agressor, observador ou vítima, ser

cuidadoso com a abordagem para não expor ainda mais a vítima (que deve ser

observada em sigilo); No caso da vítima, pedir que os pais lhe deem proteção e

sempre mostrem interesse sobre o assunto já que ela estará sentindo medo e a

intimidação de uma futura retaliação; Consultar outros professores e funcionários,

pais e demais familiares e fazer uma maior leitura sobre o problema, alertando-os

na colaboração. (STIVAL et al, 2011, p. 195, grifo do autor).

A escola não pode jamais fechar os olhos diante de casos de maus-tratos entre

estudantes, sob pena de incitar este tipo de comportamento. Percebe-se que a intervenção

precisa ser imediata e que os cuidados no trato com os envolvidos é de extrema importância,

sempre visando a não exposição dos alunos, que normalmente possuem idade inferior a 18

anos – nesses casos a família deve ser sempre solicitada a acompanhar o caso.

Tognetta (2005, p. 15) fala que a escola tem que agir com cautela, “para que as

vítimas não sejam colocadas mais em exposição do que já estão e mesmo aos agressores,

porque tais ações nada mais acarretarão do que a ampliação do problema.”

Porém, vale destacar que estas medidas – embora necessárias – são o “remédio”,

servem para lidar com as situações de bullying que já ocorreram. Mas, a escola precisa ir

além, ela deve pensar em estratégias de intervenção e prevenção (“vacina” antibullying).

Somente um trabalho efetivo e diferenciado, com toda a comunidade escolar será capaz de

reduzir as ocorrências de bullying. É necessário se pensar na formação dos profissionais que

lidam com os alunos, para que estes estejam aptos a lidar com as situações que ocorrem no

dia-a-dia. Com os alunos é importante pensar em projetos de convivência, onde seja

garantida a participação de todos.

Os relatos dos participantes demostraram o desejo pela intervenção por parte da

escola nos casos de bullying e também indicaram que esperam punições mais rigorosas para

os que praticam atos de violência contra os colegas:

Nos casos de bullying, tem que por os culpados para fora da escola, expulsar, seria

a melhor coisa do mundo. Senão, acontece o que está acontecendo, o caso vai para

a direção, lá se conversa, os culpados prometem, juram para todos os santos que

não vão mais fazer. É mentira! Saem de lá e no corredor continuam provocando,

não resolve nada!. (Aluno 01).

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Teria como se resolver a situação se a direção tomasse uma atitude de colocar mais

monitores alguma coisa assim e começar a fazer cumprir as regras, fazer valer o

que está escrito nas regras, pode ser que mude. Porque a maioria das coisas que

estão escritas nas regras eles não estão fazendo valer, nesses casos. (Aluno 04).

Se eles aplicassem punições mais severas para essa prática de quem não tem o que

fazer, iria diminuir o número de brigas aqui no colégio. (Aluno 05).

Aqui na escola é necessário mais atenção por parte do CGAE, porque é preciso se

cumprir as regras. Não adianta passar a mão na cabeça, dar chance, dar horas, é

preciso punir os culpados, senão não vai impor respeito. Quanto mais chance dá,

mais eles enfrentam. Como não acontece nada, todo mundo se acha no direito de

humilhar, de expor os outros. Eles dizem: “Ah, não dá nada!”. (Aluno 10).

As falas acima evidenciam o desejo dos alunos pelo cumprimento das regras

(Regimento) – isso é expressado pelos alunos 04 e 10 – e pela punição dos agressores. Nota-

se no relato do aluno 10, justamente o que coloca Lopes Neto (2011, p. 105), se a escola

tolerar casos de bullying e não tomar providências, outros alunos se sentirão no direito de

fazer a mesma coisa. O aluno 01, por sua vez, manifesta o desejo de punições mais severas,

como a expulsão/troca de escola, talvez por entender que esta seja a única forma de uma

vítima se sentir segura – ou seja, com o agressor não estando mais no ambiente da escola. A

ideia de punições mais severas é expressada também pelo auno 05.

Seguindo-se a investigação e buscando-se saber mais a respeito do que os alunos

pensam sobre os encaminhamentos que devem ser dados diante dos casos de bullying,

perguntamos aos alunos: “Na sua opinião, qual deve ser o encaminhamento da escola

diante de situações de violência entre pares?

Tabela 17 – Qual deve ser o encaminhamento da escola diante de situações de bullying

OPÇÕES RESPOSTAS TOTAL (%)

Expulsão / transferência dos alunos envolvidos 80 38,28%

Conversa de orientação entre equipe da escola, os

responsáveis e os envolvidos na situação.

86 41,15%

Se for aluno interno, deve perder o internato 45 21,53%

Outros 18 8,61%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013).

Comprova-se diante dos resultados, que todos os participantes da pesquisa indicam

que os autores de bullying devem sofrer alguma pena. Desses, 41,15% querem punições

mais educativas, como por exemplo: conversas de orientação entre equipe da escola, os

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responsáveis e os envolvidos na situação. Porém, 38,28% são mais severos: acreditam que

os alunos que maltratam os colegas devem ser expulsos da instituição. Ainda, 21,53%

colocam que os autores de bullying devem perder o direito ao internato (casa do estudante).

As punições podem até evitar que as brincadeiras que oprimem e maltratam

aumentem, mas não são suficientes quando se pensa em prevenir novos eventos. O problema

do bullying e da violência velada é muito mais sério do que parece, quem causa o bullying

não precisa apenas de punição rigorosa, precisa também de acompanhamento da escola, da

participação dos pais, da ajuda de todos que estão à sua volta.

Conforme Tognetta (2010) “comumente usamos formas de punições, que são

também tão violentas quanto às formas de violência que assistimos em nossas escolas.”

Os recursos para reduzir o bullying, conforme os pesquisadores do assunto, não

estão em ações rígidas e punições rigorosas aos autores da violência, e sim num trabalho de

resgate de valores e de conscientização sobre o que é certo e o que é errado, que deve ser

desenvolvido com os alunos.

Lopes Neto (2011, p. 70) fala a respeito das punições:

[...] a suspensão ou exclusão de estudantes autores de bullying podem ser vistas

como atitudes graves e inadequadas à uma criança ou adolescente que,

supostamente, necessite ser tão apoiado quanto o colega que sofre suas agressões.

Mas podem ser medidas que fortalecem a sensação de segurança para as

testemunhas e alvos.

Com base nesta colocação de Lopes Neto, percebe-se que os alunos, principalmente

os que são vítimas do bullying querem se livrar do agressor e por isso são favoráveis a

expulsão e a perda do internato como medida punitiva. Porém, sabe-se que estarão se

livrando deste agressor, mas logo outro poderá ocupar o seu lugar, já que esta medida

punitiva em nada contribui para evitar novos casos de violência.

O questionário proporcionava a opção Outros, deixando espaço aberto a diferentes

entendimentos sobre os encaminhamentos que poderiam ser adotados pela escola em casos

de bullying. Nesta opção surgiram as seguintes propostas de encaminhamentos, na opinião

dos alunos:

Fazer os alunos pagar horas de trabalho na escola. (4,3%)

Encaminhar o caso para a polícia/promotor de justiça. (2,87%)

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Chamar/falar com os pais dos envolvidos. (1,91%)

A escola deve dar advertência verbal, pois punições geram mais raiva aos

agressores. (0,96%)

A escola deve motivar o aluno a mudar de atitude e ver as coisas de outra forma

(0,48%)

Vigiar e punir mais. (0,48%)

A escola deve deixar os alunos seguir a tradição. (0,96%)

A escola deve deixar acontecer, pois no próximo ano o aluno afetado se vinga.

(0,48%)

Não adianta nenhuma medida por parte da escola, pois qualquer coisa só faz

aumentar as agressões. (0,48%)

Embora poucos alunos tenham manifestado encaminhamentos diferentes dos já

propostos no questionário, as propostas nos trouxeram algumas possibilidades de análise. A

proposta de pagamento de horas de trabalho, sugerida por 4,3% dos participantes, já é uma

alternativa adotada pela Instituição em estudo, e isso mostra que alguns alunos

compreendem que ela seja eficaz.

Já outros 2,87% dos participantes sugerem encaminhar o caso para a

polícia/promotor de justiça. Esta é uma medida cabível, principalmente em casos mais

graves, já que as condutas do bullying encontram perfeita correspondência com os crimes

previstos no código penal (xingamentos – injúria; fofocas – difamação; agressão física –

lesão corporal; entre outras manifestações), porém isso não exime a escola de se posicionar

sobre o caso. Os principais estudiosos do assunto costumam ser contrários a

neocriminalização do bullying, pois esta apenas atingirá as consequências e não as causas

desencadeadoras dos eventos agressivos. (GOMES e SANZOVO, 2013, p. 55). O

enfrentamento e o combate ao fenômeno bullying demandam ações e programas

preventivos, desenvolvidos pela e na escola e direcionados a especificidade desta. Ainda

segundo os autores, a melhor política a ser adotada pela escola é a prevenção. (ibid).

Outra proposta, marcada por 1,91% dos participantes, foi chamar/falar com os pais

dos envolvidos, visto que os envolvidos são menores e precisam ser representados pelos

pais, que mais do que isso, precisam acompanhar a vida escolar dos filhos e são

imprescindíveis, nesta atuação conjunta com a escola, visando o enfrentamento do bullying.

Outras opções aparecem com menor representatividade, porém duas delas merecem

ser comentadas: “A escola deve deixar os alunos seguir a tradição”, apontada por 0,96%

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dos participantes e “A escola deve deixar acontecer, pois no próximo ano o aluno afetado se

vinga”, opção de 0,48% dos participantes. Embora os índices não sejam tão significativos,

destaca-se nestas opções a questão da naturalização da violência, tema já abordado neste

trabalho. Alguns alunos acreditam que a escola não deve tomar providências em casos de

bullying, pois os alunos que sofrem terão a oportunidade de “vingar-se”, das agressões

sofridas em outros colegas, e assim o círculo-vicioso da violência (ou “tradição” como

preferem dizer os alunos), continua.

Para concluir, na questão nº 25 do questionário, fechamos com uma questão aberta

buscando sugestões dos alunos para que a escola se torne um local menos agressivo e mais

agradável de conviver.

A tabela 17 apresenta algumas sugestões de melhoria fornecidas pelos alunos na

questão e podem servir como parâmetros para possíveis estratégias da escola no combate ao

bullying65

:

Tabela 18 – Sugestões de melhoria

SUGESTÔES FREQUÊNCIA TOTAL (%)

Mais vistorias e acompanhamento dos alunos 04 1,91%

Trabalhos de orientação/conscientização, sobre respeito às

diferenças, convívio, desigualdades, preconceito, etc.

32 15,31%

Mais funcionários para cuidar e acompanhar os alunos 18 8,61%

Punições justas / mais severas / cumprimento das regras 42 20,10%

Proporcionar mais atividades grupais, como gincanas,

passeios, lazer, atividades esportivas e de integração

08 3,83%

Melhores condições de convívio, infraestrutura,

principalmente nos alojamentos e áreas comuns (refeitório,

locais de estudo, lazer)

12 5,74%

Colocar mais segurança, mais câmeras de monitoramento 16 7,65%

Fonte: Pesquisa de Campo (2013).

As sugestões apontadas pelos participantes demonstram o envolvimento dos alunos

com a causa em questão e a vontade dos mesmos de poder conviver em um ambiente mais

65

Para fins de explanação neste item foram consideradas apenas as respostas que traziam sugestões de

melhorias, outros comentários surgidos nesta questão aberta serão, quando pertinentes ao estudo, serão trazidos

durante o trabalho.

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agradável e fraterno. Todas as sugestões deveriam ser analisadas e poderão ser aproveitadas

pela escola, pois representam as reais necessidades dos alunos.

Na opinião dos alunos algumas medidas por parte da escola poderiam contribuir

para minimizar a existência de conflitos, principalmente nos alojamentos (local apontado

como o mais propício a ocorrência de bullying na escola). Entre outros, destaca-se: i) a

existência de um acompanhamento mais sistemático e mais próximo por parte da equipe de

assistentes e coordenadores (alguém que possa exercer um papel de mediador nas situações

de conflito e violência); ii) a realização de trabalhos em grupo que possibilitassem a reflexão

constante dos alunos e de toda a comunidade escolar acerca de aspectos como comunicação,

liderança, conflitos, violência, bullying, cooperação, os quais fazem parte da vida em

ambiente coletivo; iii) proporcionar mais atividades integrativas entre os alunos; iv)

proporcionar melhorias na infraestrutura do internato e nos locais de convívio (menor

número de alojados por quarto, existência de banheiros privativos e de local adequado ao

estudo, melhor limpeza dos alojamentos, etc).

20,10% dos alunos esperam que a escola, em casos de bullying, cumpra com as

regras, seja mais severa, porém ofereça punições justas aos envolvidos. 15,31% acreditam

que são imprescindíveis os trabalhos de orientação/conscientização de toda comunidade

escolar, sendo sugeridos inclusive temas a serem abordados: respeito às diferenças,

convívio, desigualdades, preconceito, entre outros. Através deste trabalho de informação e

conscientização os índices de desrespeito podem ser diminuídos e o convívio se tornará

menos agressivo e mais cordial entre colegas.

Foram apontadas também, necessidade de mais profissionais para acompanhar os

alunos e melhorias nas condições de convívio, infraestrutura, principalmente nos

alojamentos e áreas comuns (refeitório, locais de estudo, lazer). Estas melhorias

representam, principalmente, a necessidade de uma alteração na estrutura e funcionamento

do internato, por exemplo, redução do número de alunos por quarto, banheiros privativos,

melhorias que poderiam diminuir as situações de enfrentamento e consequentemente reduzir

os casos de bullying.

Proporcionar mais atividades grupais, como gincanas, passeios, lazer, atividades

esportivas e de integração, também, na visão dos alunos isto facilita o entrosamento e torna

o convívio melhor.

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4.2.6.1 – Atuação da escola – algumas considerações

Diante de todo o exposto, percebe-se que a escola não está totalmente passiva

diante dos problemas de violência entre os pares. Pode-se mencionar a sua posição de tentar

evitar as situações de violência e também as de tentar descobrir quem são os envolvidos

(alvos e autores), quando estes colocam câmeras de vigilância nos ambientes mais propícios

aos acontecimentos de bullying, a exemplo, nos alojamentos. Porém, diante dos

acontecimentos e dos dados da pesquisa evidencia-se que tais iniciativas não têm conseguido

evitar e muito menos empreender uma visível transformação ou prevenção do bullying e

outros tipos de violência dentro da instituição, pelo menos, não aos olhos dos alunos

participantes da pesquisa.

Conforme expõem Tognetta e Vinha, é necessário:

[...] olhar para as intervenções que a escola tem realizado, posto que, apesar de

bem intencionadas, não raro têm gerado aumento da violência e da manutenção da

heteronomia, tornando mais desgostosos e desmotivados alunos e professores.

Consideremos que talvez o perigo esteja na acomodação e na manutenção de um

sistema escolar falido que não dá mais conta de educar para a complexidade de

nossa sociedade contemporânea e que a oportunidade pode estar na possibilidade

de transformação, de reestruturação desse sistema, adaptando-o às novas

necessidades e circunstâncias. (TOGNETTA E VINHA, 2011, p.14, grifo do

autor).

Nota-se que as ações da escola diante dos casos de violência entre pares são

apoiadas em instrumentos corretivos. Conforme Tognetta (2010) “a escola se preocupa

demasiadamente com os problemas de indisciplina e se esquece de um problema que é

frequente entre meninos e meninas – o bullying” e na escola pesquisada não é diferente. E

ao considerar e tratar tudo que ocorre envolvendo os alunos na escola como indisciplina,

quando estes acontecimentos chegam ao conhecimento dos responsáveis, são aplicadas

sanções punitivas, de acordo com o regimento disciplinar dos alunos.

Tognetta e Vinha (2008, p. 04) complementam dizendo que “Infelizmente, as

atenções dos adultos que educam estão voltadas às formas de indisciplina, ou mesmo aos

constantes desinteresses dos educandos às matérias escolares.” E que de maneira geral,

professores e educadores não estão atentos aos casos de bullying.

Observa-se na Instituição pesquisada que a intervenção dos responsáveis, na

maioria das vezes efetuada por meio de ações corretivas e punitivas, não tem conferido aos

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alvos o resultado que eles desejam, ou seja, o cessar da vitimização. Também não tem

contribuído em nada para a prevenção do fenômeno.

Aprender a identificar potenciais situações de risco é o grande desafio da instituição

pesquisada. Isso se faz com programas de prevenção – e não por atividades pontuais, como

chamar um especialista para dar uma palestra sobre o tema na escola e depois nunca mais

falar do assunto. É muito importante entendermos que apenas as punições aos autores de

bullying não resolverão os casos. O autor precisa da atenção responsável de toda a

comunidade escolar (pais, professores, gestores), para que estes, conjuntamente, possam

auxiliá-lo numa mudança de atitudes e de comportamento.

Conforme Tognetta (2010) embora os autores de bullying “sintam prazer em

provocar os outros, precisam ser vistos como também necessitando de ajuda, pois carecem

de um ‘mal’ cujo remédio também é de responsabilidade da escola: carecem de sensibilidade

moral [...] espécie de capacidade de sair de si, do ponto de vista cognitivo e afetivo para ver

o outro como um sujeito digno de respeito.” Ou seja, os autores de bullying, embora tenham

a intenção de maltratar o alvo, também precisam de apoio porque não conseguem se ver

como valor e são normalmente incapazes de reconhecer seus próprios sentimentos e

consequentemente os sentimentos dos outros.

Conforme Tognetta (2010) “as ações iniciais para vencer o bullying precisam ser da

escola.” A autora traz ainda, que normalmente, o que ocorre hoje nas escolas é querer

terceirizar o trabalho de ação contra o bullying, já que se acredita que chamando por

exemplo, o Conselho Tutelar, a Polícia, discando 0800... se resolverá o problema do

bullying. Mas, é “dentro da escola que as ações para ajudar esses adolescentes a superarem

esses atos violentos, a falta de valor, a ausência de reconhecimento de sentimentos deve

começar.” (ibid). Lopes Neto (2011, p. 16) também defende que a solução para o problema

da violência escolar e do bullying “está dentro das estruturas e redes da própria escola.”

Um espaço comprometido com a formação e com o educar – seja na escola, na

família ou em qualquer ambiente de convivência – precisa estar preparado para acolher

autores, alvos e espectadores, caso contrário será reprodutor da intolerância. Pereira et al,

(2011, p. 141) complementa dizendo que “introduzir na escola processos formativos

voltados à educação emocional, com práticas cotidianas de convívio respeitoso, nas diversas

interações, pode contribuir para a melhoria do convívio e prevenção da violência.”

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E mais, todos na escola devem estar informados e empenhados nesse combate, não

somente o Orientador, o Psicólogo ou o Diretor da escola. Esse é um trabalho conjunto e que

necessita do comprometimento e do empenho de todos.

Tognetta e Vinha (2008, p. 222) ressaltam que:

[...] a implantação de um projeto anti-bullying requer uma reflexão da

comunidade educativa em relação às próprias condutas. Sim, pois o compromisso

de um projeto como esse engloba orientadores, professores, diretores, alunos, pais,

enfim, todos que integram o que chamamos de comunidade educativa.

Nesse sentido, a Instituição precisa se empenhar na identificação das causas desses

conflitos e violências e trabalha-las em conjunto. Fica evidente que não basta atacar os

sintomas por meio das punições e da vigilância, é necessário desenvolver por meio da

prática diária atitudes de respeito no convívio com o outro. Fante (2005, p. 90, grifo do

autor) traz que justamente “a única forma de obtenção de sucesso na redução do bullying é a

cooperação de todos os envolvidos: alunos, professores, gestores e pais.” E Lopes Neto

(2011, p. 63) reforça: “Não há projetos antibullying bem-sucedidos sem o envolvimento de

toda a comunidade escolar, professores, funcionários, pais e estudantes.”

Para combater o bullying as escolas necessitam compartilhar e unificar os esforços

de todos os seus membros. Ideias claras e compartilhadas sobre como abordar a

criação de um projeto de atuação comum contra o maltrato são necessárias. A

soma das decisões, estratégias e esforços de todos finalmente conformarão um

instrumento (o Projeto Antibullying) que deverá servir para diminuir os níveis de

bullying proporcionar ambientes de convivência mais sadios e mais estáveis.

(AVILÉS, 2013, p. 14, grifo do autor.)

A respeito da forma como alguns professores lidam com o problema do bullying

um aluno manifestou na entrevista:

Eu te digo, você que está trabalhando com o problema do bullying, o problema do

bullying aqui na escola não vai melhorar, porque na sala os professores deixam

acontecer as coisas, eles acabam só se preocupando com a matéria, passar os

conteúdos. Tudo que fica acontecendo ao redor parece que não importa, eles não

se importam com as coisas que os alunos fazem uns para os outros. Na minha sala

é muito complicado. Mas o pior ainda, o pior... são professores que reforçam e

parecem que concordam com as atitudes de bullying que acontecem, porque

também chamam os alunos de apelidos, fazem zoação, dão risada quando alguns

são humilhados... Só tem uma professora que é firme e não permite que essas

coisas ocorram na aula dela. Então não adianta nada você aqui, se preocupando

com tudo isso, se lá na nossa sala acontece essas coisas. (Aluno 03).

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A fala do aluno 03 retrata muito bem a forma como alguns professores lidam com

as situações de mal tratos entre alunos na escola pesquisada. Percebe-se que muitos parecem

não dar importância, outros não tomam providências e permitem que isto ocorra durante as

suas aulas, outros ainda, reforçam e participam das situações. Cabe destacar, que estar atento

às atitudes, comportamentos dos alunos e poder intervir no momento exato, é essencial no

combate ao bullying, e é tarefa de todos. Estando o professor em contato direto e mais

próximo dos alunos, eles possuem um papel primordial na tarefa de prevenção e

intervenção.

Quanto ao papel e participação de professores na resolução e prevenção do

bullying, Pereira et al (2011, p. 146) traz que estes:

[...] sentiam que alguém, não eles próprios, deveria lidar com a situação: o diretor

da escola, o coordenador pedagógico, o orientador ou o psicólogo escolar, mas não

o professor da turma. [...] parece claro que muitos professores têm receio pessoal

de intervir e o desejo de evitar a responsabilidade de agir diretamente.

Consideramos que as possíveis incertezas dos professores nesta área disciplinar

podem encorajar os agressores. Além de contribuir para o sentimento de falta de

confiança e de segurança na escola, por parte das vítimas, esse dado ajuda a

explicar a alta incidência de alunos que não informam aos professores, mesmo

quando estão a ser seriamente vitimados por um colega ou grupo de colegas.

Gomes e Sanzovo (2013, p. 94) também concordam que a omissão dos professores

frente a violência escolar propicia um ambiente favorável para a ocorrência do bullying.

“[...] quando professores ignoram a prática agressiva, conferem condições necessárias para

que a impunidade impere e a violência se perpetue.” (ibid).

Lopes Neto (2011, p. 45) complementa colocando que a omissão dos professores

diante da violência e do bullying é decorrente do próprio desconhecimento do fenômeno.66

“[...] eles não sabem o que fazer...”. (ibid). Não sabem como lidar diante de acontecimentos

agressivos e entendem que os alunos devem encontrar as soluções para seus problemas.

“Conhecer uma determinada realidade não significa saber lidar com essa realidade”

(PEREIRA et al, 2011, p. 152).

Fante (2005, p. 68) também contribui colocando que o:

66

Conforme Gisi (2011, p. 50) Em relação ao bullying, as dificuldades sentidas, por parte dos professores, têm

relação direta com a formação recebida, que não dá conta de lidar com a diversidade social e cultural hoje

existente nas escolas. A autora complementa: “É fundamental que os professores tenham formação adequada

para lidar com as situações de bullying em todos os momentos em que se manifesta na escola, em especial para

atuar na sua prevenção.” (ibid, p. 63, grifo do autor).

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[...] despreparo dos professores ocorre porque, tradicionalmente, nos cursos de

formação acadêmica e nos cursos de capacitação, são treinados com técnicas que

unicamente os habilitam para o ensino de suas disciplinas, não sendo valorizada e

necessidade de lidarem com o afeto e muito menos com os conflitos e com os

sentimentos dos alunos.

Tognetta (2010) aponta que está na “formação dos professores um canal para a

compreensão desse fenômeno humano e a possibilidade de intervenção.” A autora também

concorda que a formação dos professores é falha neste sentido, e por isto eles tendem a olhar

para o bullying como brincadeira, perdendo uma grande oportunidade de, a partir de um

conflito, trabalhar o conviver, criar espaços para que os alunos possam compreender que

existem outras formas de se resolver um conflito.

Isso acaba sendo um reforço à tolerância a violência, onde a maioria dos casos de

bullying é ignorada, fazendo com que muitos alunos não contem nada aos professores sobre

seus sofrimentos, pois sabem que nada ou muito pouco será feito para defendê-los, e que, ao

se expor, a situação pode se agravar ainda mais. Diante disso, percebe-se que os professores

têm um papel importante e decisivo na prevenção e no combate ao bullying.

A escola tem em suas mãos o compromisso em educar não somente para os testes,

para o vestibular, para uma profissão, mas para a vida. Conforme Gomes e Sanzovo (2013,

p.58) “[...] a escola desempenha uma função social indiscutivelmente fundamental na vida

do aluno. Mediante a transmissão de conceitos, valores e ensinamentos, objetiva não apenas

a formação profissional do indivíduo, mas, sobretudo, sua própria socialização. E, ai se pode

pensar nos conflitos vividos pelos seus alunos como oportunidade de promover

aprendizagem, reflexão e internalização de valores (TOGNETTA; VINHA, 2010). “Se a

formação ética é, portanto, tarefa da escola, superar a violência o é por extensão”

(TOGNETTA, 2009, p. 8), entretanto, a ação de transformar conflitos em formação moral

desafia as escolas que ainda priorizam a educação formal e o conhecimento unicamente

científico.

Avaliar o bom desempenho dos estudantes pelas notas dos testes e cumprimento

das tarefas não é suficiente. Perceber e monitorar as habilidades ou possíveis

dificuldades que possam ter os jovens em seu convívio social com os colegas passa

a ser atitude obrigatória daqueles que assumiram a responsabilidade pela educação,

saúde e segurança de seus alunos, pacientes e filhos. (LOPES NETO, 2005, p.

S169)

Através da pesquisa e da fala dos sujeitos foi possível identificar que no cotidiano

da escola há algo a ser modificado em sua estrutura que opta por conteúdos que excluem

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uma necessidade notadamente humana – a de se aprender a resolver conflitos. Normalmente

quando o professor identifica um conflito ou a situação chega até ele de outro modo, sua

preocupação é em resolver o mais breve possível para que possa retomar sua “tarefa

principal”, a de ensinar o conteúdo programático. Sua intervenção tende a ser pontual

demais, sem avaliar o que houve por trás deste conflito ou simplesmente (e normalmente é o

que mais ocorre) encaminhar o caso para a Coordenação responsável.

Talvez seja esse contexto um fator permissivo para que o bullying aconteça. Afinal,

e segundo Tognetta (2010), a escola está mais preocupada com a indisciplina de seus alunos

e em criar novas regras para que eles se comportem dentro dos padrões, em vez de voltar seu

olhar para as relações.

Reforça-se o desenvolvimento cognitivo e intelectual e, não se deixa espaço para

desenvolver habilidades pessoais e grupais para solucionar os conflitos. Neste ambiente

orientado à supervalorização da cognição questões fundamentais ficam sem resposta, como

exemplo: Como evitar a violência? Como enfrentar as agressões e as humilhações? Em

quem confiar? A quem pedir ajuda? Como enfrentar os conflitos interpessoais?” Nota-se que

a questão da solução para os casos de bullying está muito mais implícita e é mais intensa do

que puramente defender o “alvo” e condenar o “autor”.

Conforme nos traz Lopes Neto (2011, p. 52) atitudes puramente punitivas ou

excludentes, que se “baseiam na lógica de expurgar o mau, sem se preocupar em criar um

ambiente seguro, saudável e prazeroso, não são estratégias efetivas no controle e redução do

bullying.”

Gomes e Sanzovo (2013, p. 53) complementam dizendo que, pela

multidisciplinaridade que envolve o bullying, também não é eficiente o seu combate através

da ferramenta penal, mas, sim, com medidas, ações e planos preventivos. “A intervenção do

direito penal só tem sentido em último caso, para situações muito graves, que mereçam

algum tipo de sanção e eventual reparação de danos” (ibid, p. 56). O sistema penal é a última

ratio, segundo os autores. Não se previne e combate o fenômeno bullying através da

tipificação penal e sim com programas antibullying aplicados de acordo com a realidade e o

contexto de cada estabelecimento de ensino, com a participação de todos os envolvidos.

É necessário, nas escolas, acabar com a ideia ilusória de que respostas oriundas de

organismos policiais e judiciais serão suficientes para reduzir condutas agressivas entre os

estudantes. “É preciso ficar atento a essa tendência, que fragiliza a escola em sua natureza

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educativa e a supõe como uma réplica de uma instituição policial, cujos métodos de

excelência são a repressão e a punição” (PEREIRA et al, 2011, p. 149).

Somente um trabalho conjunto e cooperativo poderá sustentar um modelo de

intervenção que responda de forma eficaz às necessidades e demandas da escola. Somente

uma educação voltada à moral será capaz de dar espaço para que crianças e adolescentes não

somente compreendam como lidar com situações de violência, mas também tenham a

oportunidade de contribuir para uma discussão construtiva sobre o porquê essas situações

ocorrem, como o alvo, o autor e a testemunha se sentem respectivamente em seus papéis.

Não há outra forma mais eficiente de aprender valores, senão pela prática, pela confrontação

direta entre “o que acontece” e o “o que eu posso fazer”. Em outras palavras, dar voz aos

alunos. Eles precisam e querem espaço para participar, para poder falar sobre suas vivências,

suas dificuldades e serem ouvidos, poderem opinar. Isso ficou muito claro nos discursos dos

participantes da pesquisa.

Tognetta (2010, p. 10) traz uma contribuição valiosa no combate a violência entre

pares:

[...] superar formas de violência significa dar a essas crianças espaços para que

elas possam compreender que existem outras maneiras de se resolver um conflito.

Pouco adianta punir o autor de bullying e afirmar que ele é mau já que é preciso

ajudá-lo a perceber a perspectiva do outro. E como fazemos isso? Primeiro este

outro terá que falar como se sente e não o professor, porque quando falamos, o

valor está em nos obedecer e não respeitar àquele que sofreu as ofensas. Por essa

razão crianças e adolescentes precisam ser acostumadas a dizer como se sentem.

Esses alunos, autores ou alvos, infelizmente, não têm espaço para dizer como se

sentem, se chateados ou revoltados, porque quando se sentem revoltados agem da

mesma maneira, causando revolta nos outros.

O diálogo aberto e a reflexão devem ser estratégias básicas no trabalho educativo

com os adolescentes. Segundo o educador Paulo Freire, o diálogo é uma exigência em

qualquer relacionamento e consiste em uma relação horizontal e não vertical entre as

pessoas implicadas, principalmente entre sujeitos em processo de formação. Esta

compreensão é o que dá sentido a esta frase célebre de Paulo Freire: “Ninguém educa

ninguém. Ninguém se educa sozinho. Os homens se educam juntos na transformação do

mundo.” (FREIRE, 1987, p. 52). É no diálogo coletivo – sustentado pelo respeito, pelo

amor, pela humildade, pela confiança, pela esperança – que se aprecia o saber de todos.

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Tognetta (2005, p. 15) acrescenta a respeito do diálogo:

É através do diálogo que conseguimos a tomada de consciência do problema. No

entanto, o diálogo às vezes é confundido por pais ou professores com extensos

sermões. Passam horas a fio fazendo um sermão e depois não sabem porque, na

manhã seguinte, o interlocutor está se comportando do mesmo jeito. Exatamente

porque para a tomada de consciência, é preciso que quem antecipe as

consequências de suas ações, quem reconstitua mentalmente os fatos acontecidos,

quem compare as possibilidades de resolução do problema, seja o próprio sujeito

envolvido.

É importante ainda dar suporte a todos os envolvidos nos casos de bullying de

forma individual, pensando na preservação de cada sujeito. Mas é importante também, que

se aborde o tema com o coletivo, com a finalidade especial de prevenir episódios futuros, de

explanar as consequências dos maus tratos e a importância em lidar adequadamente com

eles quando ocorrerem. Isso diz respeito inclusive, e talvez, principalmente, aos

espectadores, no sentido de que percebam-se como sujeitos ativos, responsáveis pelo bem

estar do outro a medida em que denunciam a violência, que desprezam os maus tratos e que

deixam de ser o público que incentiva o autor e intimida o alvo.

Tognetta (2010) apresenta que “boas soluções para combater o bullying na escola,

implicariam então, formas de ajudar os nossos meninos e meninas que são em número muito

maior – o público, a se indignarem contra as injustiças que veem dia-a-dia.”

É pensando na educação moral que, a escola apresenta-se como referência para que

se lide com a problemática do bullying. A escola, conforme coloca Pereira et al (2011, p.

144) é uma das principais agências educadoras, tendo força e legitimidade para se consolidar

como gestora de processos de formação humana, voltados a prevenir e reduzir os

comportamentos de bullying.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A intolerância, a ausência de parâmetros que orientem a

convivência pacífica e a falta de habilidade para resolver os

conflitos são algumas das principais dificuldades detectadas

no ambiente escolar. Atualmente, a matéria mais difícil da

escola não é a matemática ou a biologia; a convivência, para

muitos alunos e de todas as séries, talvez seja a matéria mais

difícil de ser aprendida. (FANTE, 2005, p.91).

Embora a expressão e o adequado conceito de bullying ainda sejam novos para

muitas pessoas, vale ressaltar que este fenômeno é antigo, sendo mais uma faceta da

violência que impregna as relações humanas em todas as sociedades, estando

intrinsecamente relacionado à intolerância e ao desrespeito. As estereotipias associadas ao

tema também conservam a compreensão dicotômica e simplista do problema, como ainda é

comum observar-se nas nossas escolas. Isso apenas contribui para a cultura da naturalização

do bullying e de outras atitudes agressivas, principalmente quando o problema é ignorado e

concebido como “brincadeiras típicas da idade”.

Diante de tal realidade e de tantos casos de alunos que apresentam mal-estar e

dificuldades de relacionamento na escola, surgiu o interesse em pesquisar o assunto –

bullying escolar. Ciente das consequências negativas que o bullying pode trazer a vida dos

envolvidos, associado à ausência de dados de pesquisas em escolas com internato

(alojamento) no Brasil, ressalta-se a relevância do estudo da temática neste ambiente

especifico, visando contribuir para um diagnóstico da realidade da escola e futuras

intervenções.

O presente estudo teve como objetivo principal investigar a dinâmica do fenômeno

bullying, dos sujeitos envolvidos e dos aspectos motivadores implicados na incidência de

episódios de desrespeito e violência no Instituto Federal Catarinense – Campus Concórdia.

Para sua realização, foi utilizada uma pesquisa descritiva, de cunho exploratório e de

natureza quanti-qualitativa. Participaram do estudo 209 alunos dos cursos Técnico Integrado

ao Ensino Médio (Agropecuária e Alimentos). Os dados foram coletados através de um

questionário, envolvendo 209 alunos de diversas turmas e séries; e de uma entrevista,

abrangendo 5% dos alunos que responderam ao questionário, identificando saberes e

concepções dos sujeitos da pesquisa a respeito da violência e bullying escolar.

Inicialmente aplicou-se o questionário aos alunos – com a finalidade de

diagnóstico, através do qual foi possível identificar e descrever o nível de conhecimento e a

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relação dos adolescentes com o bullying (dentre o coletivo dos alunos o que conhecem sobre

o bullying; se estiveram envolvidos em situações desta natureza; quais formas de violência

mais ocorrem no contexto escolar, locais onde ocorrem, entre outros). Na sequência, foram

utilizadas entrevistas (tendo como base de coleta e análise dos dados o método clínico

piagetiano combinado ao uso de situações-problemas) com a finalidade de criar situações

hipotéticas alusivas ao assunto estudado, que oferecessem aos sujeitos participantes um

cenário para instigar a conversa, de maneira que eles pudessem explicitar seus pensamentos,

colocar-se no lugar da cena. Através desta, foi possível dar voz aos alunos, esclarecer e

compreender o ponto de vista deles sobre a temática em questão, aprofundando assuntos já

presentes no questionário.

De acordo com os dados da pesquisa, a maioria dos alunos identifica situações de

conflitos e violência na escola. Cabe destacar, porém, que para que os episódios de violência

sejam considerados bullying é necessário considerar algumas características básicas: ocorre

entre pares; existe a intencionalidade do dano por parte do autor das agressões; a

periodicidade dos atos violentos; a produção de um efeito negativo para os alvos; o fato do

autor receber apoio de um grupo (espectadores); a falta de motivos para a conduta agressiva

e a fragilidade do alvo. Como pode ser observado nas características citadas, além dos alvos,

o fenômeno bullying envolve outros personagens, como: os autores do bullying e os

espectadores.

O estudo realizado no IFC – Campus Concórdia confirmou o que outras pesquisas

realizadas no país já evidenciaram: que o fenômeno bullying está presente no âmbito

escolar, consistindo-se em um dos principais fatores intervenientes para a violência na

escola. A pesquisa forneceu ainda, dados importantes acerca da gravidade da problemática

existente dentro do ambiente escolar pesquisado. Os resultados encontrados permitem

afirmar conforme Tognetta e Vinha (2010a) que existe no cotidiano da escola uma violência

silenciosa que acomete os alunos (alvos de bullying), e que aponta o fato de outros tantos

alunos (autores de bullying) também precisarem de ajuda para inverter uma hierarquia de

valores que coloca a força, o poder, a virilidade, a intolerância à diferença como

privilegiados.

As formas de violência mais percebidas no cotidiano da escola pesquisada não são

em sua maioria materialmente explícitas: são formas sutis de violência. Conforme

apontaram os participantes da pesquisa, a violência psicológica é a que mais ocorre na

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escola, e é manifestada através de agressão verbal, apelidos, humilhações, ameaças,

constrangimento, fofocas.

A violência velada está presente no cotidiano dos alunos e foi demonstrada na

análise qualitativa da pesquisa. As falas dos alunos, durante as entrevistas, evidenciaram que

os mesmos sentem-se incomodados quando recebem apelidos pejorativos, quando são

rejeitados por seus pares na hora das tarefas em grupo; quando sofrem algum tipo de

intimidação, a exemplo, na fila do refeitório, no intervalo, na cantina, nos alojamentos ou

quando são alvos de mentiras, chacotas e fofocas por parte dos colegas. Os dados apurados

apontaram que um número expressivo de alunos (63,63%) se identificaram como alvos de

mal tratos repetitivos por parte dos colegas.

Outro elemento significativo apontado pelo estudo, é que na Instituição, a presença

da violência é tão comum no cotidiano dos indivíduos, que tende a ser interiorizada como

natural. As agressões e conflitos, normalmente, não são observados pelos alunos como

violência, e em geral, os professores também costumam abordar os episódios violentos com

descaso ou como “brincadeiras”. A naturalização/banalização do bullying, bem como de

outras formas de conflitos, apenas camufla situações de violência a que são submetidos os

alunos, e por consequência, dificultam a identificação e a intervenção por parte da escola.

Os dados coletados evidenciaram um processo complexo que envolve a dinâmica

do bullying na escola – que tende a provocar um círculo-vicioso – no qual muitas vítimas

acabam se tornando os agressores de novos sujeitos em outras oportunidades, ou seja,

passam a repetir com outros colegas os mesmos maus tratos a que foram submetidos,

provocando um crescimento dos índices de violência no IFC – Concórdia.

Com relação às consequências e implicações do bullying, os alunos revelaram que é

comum os alvos buscarem o isolamento, ficarem deprimidos, com vergonha e preocupados.

Além disso, os reflexos nos estudos são evidentes – apresentam queda no rendimento

escolar (notas baixas, dificuldade de concentração, dificuldade de aprendizagem, falta de

motivação para estudar). Apontaram também que a vitimização na escola impede a plena

realização do potencial dos adolescentes, que acabam perdendo a concentração nos estudos e

o entusiasmo pela escola, o que leva na maioria das vezes à desistência do curso ou troca de

escola. Porém, as consequências do bullying incidem não somente nos alvos e autores, mas

em toda a rede social constituída na escola, incluindo colegas, professores e profissionais.

Essa compreensão sistêmica é de suma importância quando se pensa em intervenções que

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objetivem minimizar a violência e o bullying na escola, bem como, quando se pondera o

alcance e eficácia dessas medidas.

Chegando-se ao final deste trabalho, temos a consciência de que a violência escolar,

e em especial o fenômeno bullying, não é um problema fácil de ser resolvido e que não

existem soluções simples e prontas para se combater e prevenir o bullying. Trata-se de um

problema complexo e de causas múltiplas. Portanto, cada escola, diante da sua realidade

precisa desenvolver estratégias próprias para reduzi-lo e preveni-lo.

Concorda-se com Catini (2004, p. 168) quando esta diz que “uma transformação é

um processo de mudança, exige tempo, exige mudança na postura de todos os profissionais

da escola.” Se estes não estiverem convencidos e conscientes da necessidade de construir

uma ética de relacionamento baseada na cooperação, na igualdade de direitos, no respeito às

diferenças individuais, não poderão mediar esta transformação.

Torna-se necessário que todos os que trabalham no ambiente escolar estejam

capacitados, não só para perceber os atos de bullying que ocorrem no cotidiano escolar, mas

também, para agir de forma eficaz, transformando momentos de conflitos em oportunidades

de aprendizagem. Para isso, faz-se indispensável, profissionais preocupados e

comprometidos com uma educação mais humana e igualitária.

Os recursos propostos para o combate e prevenção do bullying são, na grande

maioria das vezes, voltados a melhorar a supervisão dos alunos, penalidades/punições,

denúncia ao conselho tutelar, palestras isoladas, cartilhas e leis antibullying. Entretanto,

assinala-se a insuficiência destes métodos interventivos pontuais – que até colaboram para a

informação e para “remediar” casos de bullying já ocorridos – mas não são eficientes

quando o objetivo é melhorar a qualidade das relações interpessoais dos alunos e realmente

prevenir o bullying. Sendo assim, considera-se que os processos de prevenção e intervenção

contra o bullying precisam ser da escola, baseados na sua realidade e devem recair sobre as

relações interpessoais, não só de alunos, mas de toda a comunidade escolar. Além disso, as

propostas de intervenção precisam operar sobre alvos, autores e espectadores de bullying,

desmistificando a idéia de que precisamos, apenas, prestar ajuda aos alvos de bullying e punir os

agressores. Ressalta-se, ainda, que os espectadores possuem um papel importante no

fenômeno, eles influenciam diretamente no estímulo ou na inibição aos autores de bullying.

E, nesse sentido, é importante que as propostas de prevenção e intervenção ao bullying

tenham esse grupo como um dos principais públicos-alvo.

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É fundamental que o bullying não seja visto como um problema pessoal de um

aluno específico, e sim, que a violência que ocorre entre pares é um problema de toda a

comunidade escolar, uma vez que as consequências são danosas para todos os seus

integrantes. Ressalta-se que as estratégias de prevenção e intervenção só serão eficazes se

houver o empenho e a cooperação de todos os envolvidos: professores, funcionários, alunos

e pais. É necessário que se estabeleçam reflexões coletivas e se oportunize a afetiva

participação de todos nesse processo.

Embora este trabalho não objetivasse levantar dados ou fazer um estudo mais

aprofundado sobre as possibilidades de intervenção, destaca-se algumas alternativas que a

escola poderá utilizar, considerando um trabalho antibullying na Instituição. O primeiro

passo seria tomar conhecimento da realidade escolar (para conscientização e compromisso)

e o segundo passo seria a adoção de estratégias de intervenção, prevenção e modificação da

realidade escolar.

Um trabalho antibullying necessita: priorizar a capacitação (sensibilização,

formação e atuação) de todos os profissionais da escola; propiciar a toda comunidade escolar

a reflexão sobre sua própria realidade, buscando coletivamente a solução dos problemas

apresentados; envolver os pais dos alunos, procurando informá-los, conscientizá-los e tê-los

como aliados no processo; realizar reflexões sobre as diversas formas de violência, buscando

conscientizar os alunos através da análise das próprias experiências vivenciadas no

cotidiano; que os alunos através da interiorização de valores humanos, possam desenvolver a

capacidade de empatia; realizar ações que trabalhem a autoestima dos alunos (gostar-se,

estimar-se, respeitar-se); estabelecer e aplicar as regras contra o bullying; trabalhar temas

relacionados a cidadania, convivência na diversidade, valores sociais, tolerância,

relacionamento interpessoal, entre outros, mas não em blocos independentes e indissociados,

mas integrados aos componentes curriculares (abordagem de modo transversal e vivencial);

formar grupos de apoio (que auxiliam na reflexão e solução de casos de bullying); entre

outras.

Para finalizar, destaca-se que os apontamentos e as análises exibidos neste estudo,

representam verdades temporárias, relativas ao contexto e ao momento histórico pesquisado

e que não esgotam as possibilidades de compreensão do fenômeno bullying. Registra-se

também, que alguns tópicos não puderam ser analisados mais profundamente, considerando

que os procedimentos de coleta de dados não deram conta de levantar todas as informações

necessárias. Porém, a riqueza de dados apresentados pode contribuir, em muito, com a

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equipe gestora e com a equipe de assessoria pedagógica, como diagnóstico da realidade e

poderá ser utilizado para reflexões sobre o assunto. Um estudo mais concreto a respeito da

prevenção e da intervenção ao bullying na instituição pesquisada é de suma importância para

se estabeleçam objetivos, se tracem caminhos a percorrer, visando a solução dos problemas

apontados pela pesquisa. Indica-se também que este estudo pode se constituir em objeto de

futuras investigações e estudos.

De maneira geral, aponta-se também a necessidade de que mais pesquisas tratem a

respeito das estratégias de intervenção ao bullying, sua aplicabilidade, resultados positivos,

facilidades ou dificuldades na implantação, entre outros. Outra questão importante, diz

respeito a projetos que possam contemplar a capacitação dos profissionais que atuam nas

escolas, a fim de trabalhar com o fenômeno bullying.

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APÊNDICES

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APÊNDICE A – Instrumento de Coleta de dados 01 – Questionário

PESQUISA: BULLYING NA INSTITUIÇÃO EDUCATIVA – AUTOR, ALVO,

ESPECTADOR: “DE QUE” E “DE QUEM” ESTAMOS FALANDO?

QUESTIONÁRIO PARA OS ALUNOS 67

Prezado (a) estudante:

Esta pesquisa tem por objetivo investigar o fenômeno bullying no IFC – Campus Concórdia.

Gostaríamos de saber o que, de fato, acontece nas relações entre os estudantes desta escola. Se eles

se respeitam, se todos estão se sentindo bem no ambiente escolar, ou se há problemas que podem ser

identificados, enfrentados e resolvidos para que o ambiente realmente favoreça o aprendizado e o

crescimento pessoal dos estudantes.

Você NÃO deve escrever seu nome neste questionário, porque nossa intenção não é conhecer o autor

das respostas, porém solicitamos que todos sejam sinceros e contem o que realmente ocorre na

escola.

Agradecemos a participação de todos!

01 - Como você considera o ambiente da sua escola?

( ) Agradável.

( ) Desagradável.

( ) Seguro.

( ) Inseguro.

( ) Indiferente.

02 - Como você se sente estudando no IFC- Campus Concórdia?

( ) Sozinho(a) e sem amigos(as).

( ) Feliz e enturmado(a).

( ) Não gosto, quero mudar de escola.

( ) Triste, por causa dos apelidos e brincadeiras de mau gosto.

( ) Satisfeito.

03 - O que você mais GOSTA na escola?

( ) Colegas.

( ) Espaço Físico.

( ) Professores.

( ) Outros funcionários.

( ) Aulas/Oportunidades de aprendizagem.

( ) Lazer/esporte.

04 - O que você NÃO gosta na escola?

( ) Colegas

( ) Espaço Físico.

( ) Professores.

67

Questionário adaptado em Fante e Pedra (2008) e Rolim (1995).

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( ) Outros funcionários.

( ) Aulas/Oportunidades de aprendizagem.

( ) Lazer/esporte.

05 - Quantos “bons amigos” (amigos de verdade) você tem na escola? ( ) Apenas um.

( ) Dois ou três.

( ) Quatro ou cinco.

( ) Mais de seis.

( ) Não tenho nenhum bom amigo.

06 - Você identifica conflitos/violência na sua escola?

( ) Sim.

( ) Não.

07 - Você se sente seguro dentro da escola?

( ) Sim.

( ) Não.

08 - Quais as principais formas de violência existentes na sua escola?

( ) Violência física (brigas, socos, pontapés, empurrões, etc).

( ) Violência psicológica (humilhações, ameaças, constrangimento, fofocas, etc).

( ) Violência ao patrimônio (quebrar cadeiras, carteiras, vidros, lâmpadas, etc).

( ) Discriminação na escola (seja por cor, sexo, raça, idade, entre outros).

09 - Quais os principais tipos de violência que ocorrem na sua escola? (você pode

assinalar mais de uma alternativa):

( ) Briga entre alunos (socos, pontapés, empurrões).

( ) Apelidos maldosos.

( ) Trotes.

( ) Agressão verbal (xingamento).

( ) Humilhações.

( ) Ameaças.

( ) Perseguições.

( ) Constrangimento.

( ) Fazem fofocas e espalham mentiras.

( ) Escondem, estragam ou furtam objetos pessoais.

( ) Isolamento de colegas (não deixam fazer parte do grupo).

10 - O lugar mais comum onde o bullying ocorre na escola é: (você pode assinalar mais

de uma alternativa):

( ) Na entrada da escola (portão).

( ) Na saída da escola.

( ) Na rua, durante deslocamento de ida e volta para a escola.

( ) No transporte escolar.

( ) Na sala de aula, quando o professor não está presente.

( ) Na sala de aula, com a presença do professor (durante a aula).

( ) Nos alojamentos.

( ) Durante o recreio/intervalo, no pátio da escola.

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( ) Nos banheiros da escola.

( ) No ginásio da escola.

( ) No bar/cantina da escola.

( ) Na fila do refeitório.

( ) Pelo celular.

( ) Pela internet (Skype, msn, facebook, e-mail...).

11 - Você já maltratou (xingou, bateu, humilhou, ameaçou, etc) algum colega de escola?

( ) Sim, desde o ano passado maltrato alguns colegas.

( ) Sim, comecei a maltratar alguns colegas este ano.

( ) Sim, já maltratei alguns colegas, porém não faço mais isso.

( ) Sim, maltrato alguns colegas, pois já fui maltratado.

( ) Não, nunca maltratei nenhum colega de escola.

12 - Você já foi maltratado por seus colegas de escola?

( ) Sim, desde o ano passado meus colegas me maltratam.

( ) Sim, meus colegas começaram a me maltratar este ano.

( ) Sim, já fui maltratado por colegas, porém não sou mais.

( ) Não, nunca fui maltratado por colegas de escola.

13 - Você é ou já foi vítima de algum desses problemas (você pode assinalar mais de

uma alternativa):

( ) Receber apelidos pejorativos.

( ) Ser xingado.

( ) Ser motivo de piada (riram de você, humilharam).

( ) Ser alvo de fofocas ou mentiras a seu respeito.

( ) Ser furtado ou danificarem as suas coisas ou dinheiro.

( ) Ser agredido fisicamente – empurrado , puxado ou chutado.

( ) Ser intimidado, ameaçado.

( ) Ser vítima de ciberbullying – ser humilhado, ameaçado, constrangido, vítima de fofoca

através da internet (via e-mail, facebook, Orkut, MSN, blogs) e celular (torpedos).

( ) Ser discriminado por conta de sua cor, raça, opção sexual.

14 - Se sim, há quanto tempo você está se sentindo incomodado(a) com a maneira como

é tratado pelos seus colegas:

( ) Desde o início deste ano.

( ) Desde que entrei na escola.

( ) Não me sinto incomodado.

15 - Quantas vezes você sentiu-se incomodado (a) com brincadeiras de mau gosto na

última semana:

( ) Nenhuma.

( ) Uma vez.

( ) Duas vezes.

( ) Três vezes.

( ) Todos os dias da semana.

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16 - Se você já sofreu algum tipo de violência na escola, você contou para alguém?

( ) Sim. Para quem? ( ) pais / ( ) professor (a) / ( ) cgae/direção ( ) colega/amigo.

( ) Não. Não contei para ninguém.

( ) Isso nunca aconteceu comigo.

17 - Você já presenciou algum colega praticando bullying (maltratando repetidas vezes

um mesmo colega)?

( ) Sim, várias vezes.

( ) Sim, apenas uma vez.

( ) Não, nunca presenciei colega (s) praticando bullying.

18 - Você conhece um ou mais colegas que tenham sido agredidos, ameaçados, isolados

ou humilhados propositalmente (“por gosto”) por outros colegas?

( ) Sim.

( ) Não.

19 - Como você costuma reagir quando vê algum colega sofrendo bullying (ex.: sendo

ameaçado, desrespeitado, humilhado, agredido) por um ou mais estudantes?

( ) Quando vejo cenas assim, procuro sair de perto e faço de conta que nem vi.

( ) Fico parado assistindo a cena.

( ) Procuro ajudar quem está sendo agredido (“saio em defesa do agredido”).

( ) Normalmente dou risada em casos assim.

( ) Peço aos agressores que “parem” com a violência.

( ) Não faço nada porque isso é normal entre os colegas.

( ) Conto para um responsável pela escola (professor, direção, coordenação).

( ) Conto para os colegas.

( ) Eu nunca vi uma situação deste tipo.

20 - Como você se sente ao presenciar cenas deste tipo (bullying)?

( ) Fico com medo que possa acontecer comigo também.

( ) Fico chateado/triste, pois já fizeram isto comigo também.

( ) Fico preocupado com os colegas agredidos.

( ) Acho engraçado.

( ) Não sinto nada, são brincadeiras.

( ) Eu nunca vi situações deste tipo.

21 - Em que (série/turma) estão os alunos que costumam maltratar/praticar bullying

com os colegas da escola? (pode marcar mais de uma resposta)

( ) Estudam na mesma série.

( ) Estudam em outra série. Qual? ( ) 1ª série / ( ) 2ª série / ( ) 3ª série

22 - Na sua opinião, o que leva um estudante a praticar bullying contra o colega?

(Você pode assinalar mais de uma opção).

( ) Ele faz isto porque quer ser mais popular, sentir-se poderoso.

( ) Ele faz isto porque é mais forte.

( ) Ele faz isto porque se “acha melhor” que os outros.

( ) Ele faz isto por diversão.

( ) Ele faz isto porque é uma pessoa que não se preocupa com os sentimentos do outro.

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( ) Porque ele deve ter uma relação familiar na qual tudo se resolve pela violência

verbal ou física e ele reproduz isso no ambiente escolar.

( ) Ele faz isto, porque fizeram isto com ele (já sofreu com o bullying).

( ) Ele faz isto por não aceitar que as pessoas são diferentes.

( ) Ele faz isto porque não é punido.

( ) Ele faz isto porque as vítimas merecem, elas provocam.

23 - Na sua opinião, qual deve ser o encaminhamento da escola diante de situações de

violência?

( ) Expulsão / transferências dos alunos envolvidos.

( ) Conversa de orientação entre equipe da escola, os responsáveis e os envolvidos na

situação.

( ) Se for aluno interno, deve perder o internato.

( ) Outros. Qual: _____________________________________________________

24 - Como você acha que o CGAE/direção da escola lidam com casos de violência,

preconceito, desrespeito e agressão repetitiva entre os colegas?

( ) Normalmente, eles nem ficam sabendo.

( ) Normalmente quando sabem, não tomam nenhuma providência.

( ) Normalmente quando sabem, buscam punir os culpados.

( ) Normalmente quando sabem, buscam resolver o problema, orientar os culpados, mas

sem puní-los.

25 - O que você propõe para melhorar a sua escola – para que ela se torne um lugar

menos agressivo e violento e se torne uma escola mais justa, solidária e feliz?

________________________________________________________________________

________________________________________________________________________

________________________________________________________________________

________________________________________________________________________

________________________________________________________________________

________________________________________________________________________

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APÊNDICE B – Instrumento 02: Entrevista baseada em histórias de conflitos na escola

PESQUISA: BULLYING NA INSTITUIÇÃO EDUCATIVA – AUTOR, ALVO,

ESPECTADOR: “DE QUE” E “DE QUEM” ESTAMOS FALANDO?

HISTÓRIAS DE CONFLITOS NA ESCOLA (DILEMAS MORAIS)68

1 - Você está na fila do refeitório a mais de 30 min aguardando para almoçar. Vem um

colega e empurra você para fora da fila, exigindo, sob ameaça, que você deixe outros alunos

passarem na sua frente.

Esta é uma situação que ocorre na sua escola?

Com que frequência?

Alunos de que turma sofrem com esta situação?

Como você se sentiria diante desta situação? Tente descrever detalhadamente os

sentimentos de quem vivencia esta situação.

Se fosse você como resolveria/o que faria nesta situação? Por quê?

Ele deve contar para a sua família? Deve procurar os responsáveis pela sua escola e

entregar os colegas?

Você conhece algum caso semelhante a este que ocorreu na sua escola.

Enfrentar uma situação desta com o grupo de colegas pode influenciar na auto-estima

deste aluno a ponto de atrapalhar nos seus estudos?

2 - Vamos supor que alguém da sua classe, por algum motivo, não vai com a cara de um

colega. Ao invés de tentar um diálogo para mudar a situação, essa pessoa começa a fazer

intrigas, influenciar um grupo de pessoas que passam a evitar sua presença (isolam o dito

colega, não querem aceitá-lo nos grupos de trabalhos escolares, excluem-no de

eventos/festas/encontros) e passam a espalhar mentiras (boatos) a respeito deste colega. Sem

contar as gozações e piadinhas que ouvia diariamente.

Esta é uma situação que ocorre na sua escola?

O que leva os alunos a agirem desta forma com o colega?

68

Inspirados em Fante (2005).

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Como você se sentiria diante desta situação? Tente descrever detalhadamente os

sentimentos de quem vivencia esta situação.

O que você faria neste caso?

Aceitaria não se relacionar com este colega, mesmo não tendo nada contra ele? Faria

isto somente para não ser a próxima vítima (vai que resolvam te isolar também)? Ou

Desafiaria a ordem de não se relacionar com ele e o convidaria para fazer um

trabalho em dupla?

Enfrentar uma situação desta com o grupo de colegas pode atrapalhar a auto-estima

deste aluno a ponto de influenciar negativamente nos seus estudos?

Você conhece algum caso semelhante a este que ocorreu na sua escola.

3 - Maria Sempre foi uma daquelas alunas que tirava notas altas, caprichava nos trabalhos,

estudava bastante para as provas, frequentava a biblioteca da escola, e por isso era vista

como CDF. Seus colegas a criticavam, por isso não tinha amigos, sofria preconceito e era

ridicularizada. Maria entendia que estava fazendo as coisas de forma correta, já que estava

na escola para estudar e se formar, porém isto estava lhe custando um preço muito alto. Seus

colegas sentiam inveja dos elogios e comparações feitas pelos professores e passaram a

excluí-la.

Esta é uma situação que ocorre na sua escola?

Conte algum caso semelhante a este que ocorreu na sua escola.

O que leva os colegas a agirem assim com Maria?

O que você acha que Maria deve fazer?

Será que se ela for diferente será aceita pelo grupo? Abrir mão do seu sonho e

fazer como seus colega – levar “tudo” na brincadeira?

Enfrentar uma situação desta com o grupo de colegas pode influenciar na auto-estima

deste aluno a ponto de atrapalhar nos seus estudos?

4 - João era um garoto muito tímido. Logo que entrou na escola para cursar o Ensino Médio

passou a ser infernizado por um colega que cismou em desafiá-lo... Provocava, armava

situações, e colocava-o em situações difíceis… Durante o “trote” foi forçado a fazer

atividades constrangedoras, levou muitos empurrões, tapas, socos na cabeça. Devido a isto

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ficou com o braço machucado e hematomas pelo corpo. Se isto não bastasse estava sendo

alvo de apelidos maldosos. Ele não poderia frequentar alguns locais da escola e teria que dar

suas roupas e dar dinheiro para outro aluno (que passava cobrando a “capelinha” todo santo

dia), caso contrário apanharia. O aluno não possuía mais camisetas do uniforme, pois foi

obrigado a dar todas. Isso ofendia-o de sobremaneira, levando-o a pensar em desistir da

escola e inclusive parar de estudar. Porém, o aluno não queria decepcionar seus pais que

com tanto esforço investiram todo o dinheiro que tinham para que ele pudesse seguir nos

estudos em uma boa escola.

Você já presenciou uma situação como esta na sua escola?

Conte algum caso semelhante a este que ocorreu na sua escola.

Ele deve procurar os responsáveis pela sua escola e entregar os agressores ou

isto pode ser considerado “brincadeira entre alunos”, por isso ele não deve falar nada

para ninguém.

Quando ele for “formando” terá sua oportunidade de passar trotes nos “bixos” e se

cobrar.

Enfrentar uma situação desta com o grupo de colegas pode influenciar na auto-

estima deste aluno a ponto de atrapalhar nos seus estudos?

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ANEXOS

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ANEXO A –

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)

DESTINADO AOS PAIS OU RESPONSÁVEIS

Título da pesquisa:

BULLYING NA INSTITUIÇÃO EDUCATIVA – AUTOR, ALVO, ESPECTADOR:

“DE QUE” E “DE QUEM” ESTAMOS FALANDO?

Eu, Michelle Sperotto Bortoncello, aluna do Programa de Pós-graduação em

Educação - Mestrado em Educação da Universidade do Oeste de Santa Catarina, residente

em Concórdia/SC, telefone para contato (49) 9964-1025, estou desenvolvendo uma

atividade de pesquisa sobre o tema Bullying Escolar.

Seu filho ________________________________ está sendo convidado (a) a

participar desta pesquisa. O objetivo da pesquisa é investigar a dinâmica do fenômeno

bullying (maus tratos entre escolares), dos sujeitos envolvidos e dos aspectos motivadores

implicados na incidência de episódios de desrespeito e violência no Instituto Federal

Catarinense – Campus Concórdia.

Pretende-se investigar o fenômeno bullying, pois somente ampliando os

conhecimentos sobre a temática é que poderemos propor alternativas de intervenção

(teoricamente embasadas) que inspirem mudanças significativas nas práticas educativas,

prevenindo as manifestações do bullying e buscando favorecer um educar transformador de

uma sociedade agressiva e violenta em uma sociedade mais justa, solidária e feliz. Sem que

haja um profundo estudo da realidade concreta da escola – campo de intervenção – não faz

sentido delinearem-se objetivos, estratégias ou acordarem-se as técnicas e recursos a utilizar,

pois o bullying é contextual e suas manifestações estão vinculadas à especificidade de cada

instituição. Desta forma, percebe-se a necessidade de compreender como os alunos do

Instituto Federal Catarinense – Campus Concórdia percebem a crescente violência e

desrespeito com as diferenças entre os pares e ao mesmo tempo dar voz a estes adolescentes

(alunos), para que, enquanto sujeitos pertencentes a um determinado processo histórico,

percebam-se como integrantes deste.

A pesquisa terá como participantes alunos do ensino técnico integrado ao médio do

IFC – Campus Concórdia, de todas as séries. Ao autorizar a participação de seu filho (a)

nesse estudo você permitirá que o pesquisador inicialmente aplique um questionário de

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pesquisa (com a finalidade de diagnóstico, visando identificar e descrever o nível de

conhecimento e a relação dos adolescentes com o bullying). Num segundo momento alguns

alunos serão selecionados para uma entrevista individual com o pesquisador (nesta fase o

pesquisador utilizará dilemas morais – pois estes apresentam situações de vida real –

seguido de um inquérito/entrevista). Por fim, haverá a seleção de alguns alunos para a

participação em um grupo focal (grupo de discussão que irá dialogar sobre o tema em

questão – visando identificar percepções, sentimentos, atitudes e idéias dos participantes, a

respeito do tema bullying e suas possíveis causas no ambiente escolar).

Os encontros (entrevista e grupo focal) serão gravados em áudio e serão feitas

anotações acerca do ambiente e do assunto em questão. Nos questionários não haverá espaço

para identificação dos sujeitos. Todos os materiais, depois de transcritos e analisados,

ficarão sob a responsabilidade do pesquisador e serão utilizados apenas para fins científicos

vinculados ao presente projeto de pesquisa. Ninguém terá acesso às respostas do

questionário, dados da entrevista e grupo focal, nem mesmo a família, amigos, professores e

a direção da escola.

Os possíveis benefícios desta pesquisa serão o de apresentar um estudo, um inventário

do fenômeno bullying na instituição. Esperamos que este estudo traga informações

importantes, de forma que o conhecimento construído possa subsidiar propostas para o

enfrentamento do problema, minimizando os efeitos negativos do bullying sobre

adolescentes que se encontram vitimizados (as) por esta forma de violência escolar;

A participação nesta pesquisa não traz complicações legais, podendo talvez mobilizar

alguns sentimentos desagradáveis, devido a temática tratada. Nenhum dos

procedimentos usados oferece riscos à sua dignidade e não acarretará nenhum

preconceito, discriminação ou desigualdade social;

Haverá garantia de acompanhamento e assistência em todas as fases da pesquisa

prestando informações e primando pela transparência, ética e compromisso com o rigor

científico durante a pesquisa;

Os resultados deste estudo podem ser publicados, mas o nome ou identificação de seu

filho não serão revelados (garantia de sigilo aos dados confidenciais envolvidos na

pesquisa);

Seu filho (a) não terá nenhum tipo de despesa para participar desta pesquisa, bem como

não haverá remuneração ou ajuda de custo (ressarcimento) pela participação dele nesta

pesquisa.

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227

Quaisquer dúvidas que você tiver em relação à pesquisa ou à participação de seu filho,

antes ou depois do consentimento, poderão ser esclarecidas e respondidas pela pesquisadora

Michelle Sperotto Bortoncello, telefone: (49) 9964-1025, e-mail: michelle.sperotto@ifc-

concordia.edu.br; ou ainda pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da

Unoesc/Hust, telefone: (49) 3551-2012.

Assim, este termo está de acordo com a Resolução 196 do Conselho Nacional de Saúde,

de 10 de outubro de 1996, para proteger os direitos dos seres humanos em pesquisas.

Qualquer dúvida quanto aos direitos de seu filho como sujeito participante em pesquisas, ou

se sentir que seu filho foi colocado em riscos não previstos, você poderá contatar o Comitê

de Ética em Pesquisa para esclarecimentos.

Li as informações acima, recebi explicações sobre a natureza, riscos e benefícios do

projeto. Assumo a participação de meu filho e compreendo que posso retirar meu

consentimento e interrompê-lo a qualquer momento, sem penalidade ou perda de benefício.

Ficaremos muito gratos em poder contar com participação e colaboração de seu filho.

Por favor, preencha os dados abaixo e após rubrique/assine todas as folhas deste

documento.

Assinatura do pai ou responsável ou impressão dactiloscópica

.

Assinatura: _________________________________________

Nome legível:________________________________________

Endereço: __________________________________________

RG.: _______________________________________________

Fone: ______________________________________________

Data ______/______/______

_______________________________________

Michelle Sperotto Bortoncello

Pesquisadora Responsável

I m p r e s s ã o

d a c t i l o s c ó p i c a

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228

ANEXO B

Termo de Assentimento (TA) para adolescentes participantes da Pesquisa

Você está sendo convidado(a) como voluntário(a) a participar da pesquisa “BULLYING NA INSTITUIÇÃO

EDUCATIVA – AUTOR, ALVO, ESPECTADOR: “DE QUE” E “DE QUEM” ESTAMOS FALANDO?”. Neste

estudo pretendemos conhecer um pouco do que você pensa sobre o bullying (maus tratos entre escolares), suas causas,

consequências, bem como, o que seria necessário para podermos enfrentá-lo, com o propósito de prevenir e diminuir sua

incidência no meio escolar. Somente ampliando os conhecimentos sobre a temática é que poderemos propor alternativas de

intervenção que inspirem mudanças significativas nas práticas educativas.

O motivo que nos leva a estudar esse assunto é perceber que a cada dia, mais crianças e adolescentes são

vitimizados pela violência nas escolas. Percebemos que muitos alunos apresentam mal-estar, medo e sérias dificuldades na

relação pessoal com seus colegas. Sentem-se humilhados, vítimas de apelidos maldosos, zombarias, intimidações, dentre

outras hostilidades, que provocam necessidade de ajuda.

Para este estudo adotaremos o(s) seguinte(s) procedimento(s): inicialmente aplicaremos um questionário de

pesquisa (com a finalidade de diagnóstico). Num segundo momento alguns alunos serão selecionados para uma entrevista

individual com o pesquisador (nesta fase o pesquisador utilizará dilemas morais – pois estes apresentam situações de vida

real – seguido de um inquérito/entrevista). Por fim, haverá a seleção de alguns alunos para a participação em um grupo

focal (grupo de discussão que irá dialogar sobre o tema em questão – visando identificar percepções, sentimentos, atitudes e

ideais dos participantes, a respeito do tema bullying e suas possíveis causas no ambiente escolar).

Para participar deste estudo, o responsável por você deverá autorizar e assinar um termo de consentimento. Você

não terá nenhum custo, nem receberá qualquer vantagem financeira. Você será esclarecido(a) em qualquer aspecto que

desejar e estará livre para participar ou recusar-se. O responsável por você poderá retirar o consentimento ou interromper a

sua participação a qualquer momento. A sua participação é voluntária e a recusa em participar não acarretará qualquer

penalidade ou modificação na forma em que é atendido(a) pelo pesquisador que irá tratar a sua identidade com padrões

profissionais de sigilo. Você não será identificado em nenhuma publicação. Este estudo apresenta risco mínimo, isto é, o

mesmo risco existente em atividades rotineiras como conversar, tomar banho, ler etc. Apesar disso, você tem assegurado o

direito a ressarcimento ou indenização no caso de quaisquer danos eventualmente produzidos pela pesquisa.

Os resultados estarão à sua disposição quando finalizada a pesquisa. Seu nome ou o material que indique sua

participação não será liberado sem a permissão do responsável por você. Os dados e instrumentos utilizados na pesquisa

ficarão arquivados com o pesquisador responsável por um período de 5 anos, e após esse tempo serão destruídos. Este

termo de consentimento encontra-se impresso em duas vias, sendo que uma cópia será arquivada pelo pesquisador

responsável, e a outra será fornecida a você.

A sua opinião é fundamental para enriquecer nosso estudo e para que os adultos entendam que os

adolescentes têm muito a dizer sobre o bullying.

Eu, __________________________________________________, portador(a) do documento de Identidade nº

____________________ fui informado(a) dos objetivos do presente estudo de maneira clara. Sei que a qualquer momento

poderei solicitar novas informações junto ao pesquisador responsável listado abaixo ou ainda com o Comitê de Ética em

Pesquisa em Seres Humanos da Unoesc e Hust, telefone (49) 3551-2012. Estou ciente que o meu responsável poderá

modificar a decisão da minha participação na pesquisa, se assim desejar. Tendo o consentimento do meu responsável já

assinado, declaro que concordo em participar desse estudo. Recebi uma cópia deste termo assentimento e me foi dada a

oportunidade de ler e esclarecer as minhas dúvidas.

______________, ____ de ______________ de 20____ .

Assinatura do(a) menor.

Assinatura: ______________________________________

Nome legível :____________________________________

Endereço: _______________________________________

RG. ____________________________________________

Fone: __________________________________________

Data _______/______/______

__________________________________

Michelle Sperotto Bortoncello

Pesquisadora Responsável

Fone: (49) 99641025

Data ____/____/____

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ANEXO C – Parecer Consubstanciado do CEP

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