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Universidade do Minho Escola de Direito Inês Catarina Azevedo da Costa Santos A Retribuição e as Prestações Complementares Análise das repercussões na retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal Outubro 2014 Inês Catarina Azevedo da Costa Santos A Retribuição e as Prestações Complementares Análise das repercussões na retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal Minho | 2014 U

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Universidade do MinhoEscola de Direito

Inês Catarina Azevedo da Costa Santos

A Retribuição e as Prestações ComplementaresAnálise das repercussões na retribuição de férias,subsídios de férias e de Natal

Outubro 2014

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Universidade do MinhoEscola de Direito

Inês Catarina Azevedo da Costa Santos

A Retribuição e as Prestações ComplementaresAnálise das repercussões na retribuição de férias,subsídios de férias e de Natal

Tese de MestradoMestrado em Direito dos Contratos e de EmpresaDireito do Trabalho

Trabalho realizado sob a orientação daProfessora Doutora Teresa Alexandra Coelho Moreira

Outubro de 2014

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DECLARAÇÃO

Nome: Inês Catarina Azevedo da Costa Santos Endereço electrónico: [email protected] Telefone: 918026248 Número do Bilhete de Identidade: 13361273 Título tese de Mestrado: “A Retribuição e as Prestações Complementares - Análise das repercussões na retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal”. Orientadora: Exma. Senhora Professora Doutora Teresa Alexandra Coelho Moreira Ano de conclusão: 2014 Designação do Mestrado: Mestrado em Direito dos Contratos e da Empresa É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA TESE/TRABALHO APENAS PARA

EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE. Universidade do Minho, ___/___/______

Assinatura: __________________________________

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"He is well paid that is well satisfied”

WILLIAM SHAKESPEARE – The Merchant of Venice (1596-1598)

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Agradecimentos

Ao longo do tempo de elaboração deste estudo fui acompanhada por algumas pessoas, cuja

imprescindível presença muito contribuiu para o meu crescimento pessoal e profissional, e para

a elaboração desta dissertação, às quais não podia deixar de agradecer:

À minha Ilustre Orientadora, a Professora Doutora Teresa Alexandra Coelho Moreira, pela sua

disponibilidade e por todas as considerações tecidas acerca do presente estudo ao longo deste

percurso, que muito contribuiu para que esta dissertação chegasse a bom porto, constituindo

esta colaboração, um prazer e uma honra.

À minha família, de valor incomensurável a qual amo muito, por todo o amor, paciência, em

especial à minha mãe por sempre me ter incentivado a querer ser melhor, ao meu pai pelo

esforço constante em prol da família e por todos os princípios e ensinamentos transmitidos e ao

meu irmão, pelas contendas, brincadeiras, discussões, e partilhas.

Ao Tiago, fonte de inspiração e confiança pelo apoio constante, pela ternura, compreensão e

todo o carinho despendido.

Aos meus amigos que, direta ou indiretamente, estiveram presentes, sempre dispostos a ajudar

com companheirismo a amizade, sobretudo ao Edgar.

À Dr.ª. Patrícia Vilar Resende, Ilustre Advogada e Colega, a quem agradeço todo o tempo

dispensado com debates sobre várias questões relacionadas com este tema, cujos sábios

contributos e amizade foram fundamentais e tornaram possível o término da Dissertação.

À Dr.ª Susana Pardilhó, Ilustre Advogada e Patrona, pela amizade e por todos os ensinamentos e

conhecimentos que me tem transmitido, de forma incansável e sempre disponível.

A todos muito Obrigada.

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Resumo

A Retribuição e as Prestações Complementares

Análise das repercussões na retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal

O presente estudo tem como principal objetivo, compreender a influência que o conceito

de retribuição pode exercer na vida de um trabalhador, mormente no que concerne à sua

consideração para efeitos de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal,

explorando os aspetos subjacentes ao desenvolvimento do conceito, procurando aprofundar o

papel que as prestações patrimoniais complementares, atribuídas pelo empregador ao

trabalhador, têm na vida deste último.

Para prosseguir com este objetivo procuramos, em primeiro lugar, explanar o regime

jurídico-laboral em vigor, explorando os elementos essenciais do contrato de trabalho, enquanto

principal mecanismo de regulação das relações juslaborais, e por fim indagar sobre o conceito

de retribuição que, em suma, é o que nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos

usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho.

Percebe-se, através de pesquisa doutrinária e sobretudo jurisprudencial que, na prática,

as decisões no âmbito destas matérias não têm sido unânimes no que concerne à avaliação dos

critérios de regularidade e periodicidade para efeitos de integração de certos complementos

salariais no conceito de retribuição, a serem tidos em conta no quantum a pagar pelo

empregador, a título de retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal, tendo havido nos

últimos tempos decisões divergentes que vêm mudando as tendências decisórias dos tribunais

portugueses.

Por outro lado, no que diz respeito ao regime da prescrição dos créditos laborais e

respetivos prazos, o entendimento é também díspar no seio da doutrina, no que concerne à

aplicação das normas respeitantes a prescrição previstas no Código Civil. Por último, discute-se

a natureza civil ou laboral dos juros de mora gerados pela mora derivada do incumprimento no

pagamento da retribuição, ou parte desta.

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Abstract

The Wage and Complementary Benefits

Analyses of the repercussions of holiday pay, holiday allowance and Christmas

allowance

The present study aims to understand the influence that the concept of wage can have in the life

of an employee, mostly regarding to its account for the purpose of holiday pay, holiday allowance

and Christmas allowance, exploring the underlying concept development aspects, seeking to

further the role that complementary patrimonial benefits, provided by the employer to the

employee, have in his life.

To pursue this goal we seek, firstly, to explain the labour law scheme, exploring the essential

elements of the employment contract, as the principal mechanism of regulation of jus-labour

relations, and finally we inquire about the concept of wage that, in short, is what in the terms of

the contract, the rules that govern the contract or customs, an employee is entitled in return for

his work.

It is clear that, through primarily doctrinal and jurisprudential research, in practice, decisions

within these matters have not been unanimous in regard to the evaluation criteria for periodicity

and regularity for integration purposes of certain wage supplements in the concept of wage, to be

taken into account in the quantum to be paid, by the employer, in respect of holiday pay, holiday

allowance and the Christmas allowance, have been divergent decisions in recent times, which

have changed the decision trends of the Portuguese courts.

On the other hand, regarding the system of prescription the labour credits and respective

deadlines, the understanding is also uneven within the doctrine, concerning the application of the

rules relating to the prescription provided by the Civil Code. Finally, we discuss the civil or labour

nature of arrears, generated by default derived of the failure to pay the wage, or part thereof.

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Nota Prévia

As referências bibliográficas são citadas pelo autor, título, editora, local de publicação,

data e página.

A bibliografia final representa as obras consultadas, relacionadas com o tema.

O diploma legal a que recorremos ao longo deste é a Lei

n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterada pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro,

53/2011, de 14 de outubro, 3/2012, de 10 de janeiro e 23/2012, de 25 de junho, doravante

Código do Trabalho.

Sempre que a disposição legal é referida sem indicação da fonte, deve entender-se que

se reporta ao Código do Trabalho.

Se for imperioso citar diplomas precedentes, por necessidade elucidativa a nível de

evolução legislativa, fá-lo-emos identificando o diploma em causa.

A jurisprudência cuja fonte não esteja indicada pode ser encontrada em www.dgsi.pt (Cf.

índice de jurisprudência em anexo).

A escrita respeita o novo acordo ortográfico, sendo que as citações da doutrina e

jurisprudência respeitam o acordo ortográfico utilizado pelos autores originários.

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Índice

Agradecimentos………………………………………………………….…………………………….. iii

Resumo…………………………………………………………………….…………………………….. v

Abstract…………………………………………………………………….……….…….…….……….. vii

Nota Prévia………………………………………………………….……………..……………………. ix

Índice………………………………………………………….………….………………..…………….. xi

Abreviaturas e Siglas Utilizadas……………………………………………………….…………… xiii

Introdução………………………………………………………….…………….……….…………….. Pág. 17

1. O Conceito de Retribuição……………………………………………………………….………. Pág. 19

2. Evolução Histórica - Enquadramento Legislativo………………………………………….. Pág. 21

2.1. Formação das Relações Laborais……………………………………………………….. Pág. 22

2.2. Fontes internas do Direito do Trabalho………………………………………………… Pág. 24

2.3. Proteção Constitucional……………………………………………………………………. Pág. 25

2.4. Fontes Externas do Direito do Trabalho………………………………….……………. Pág. 26

3. O Contrato de trabalho………………………….……………………………………………….. Pág. 27

4. A Tutela da Retribuição…………………………………………………………………….…….. Pág. 33

4.1. Não Discriminação e Igualdade……………………………………………….…………. Pág. 33

4.2. Irredutibilidade Salarial…………………………………………………………………….. Pág. 34

4.3.Proibição da Renúncia, Insusceptibilidade de Cessão e Impenhorabilidade… Pág. 37

4.4. Proibição de Compensação e Descontos……………………………………………… Pág. 38

5. Garantias dos Créditos Laborais……………………………………………………………….. Pág. 41

5.1. Termos Gerais…………………………………………………………………..……………. Pág. 41

5.2. Privilégios Creditórios……………………………………………………….……………… Pág. 42

5.3. Responsabilidade Solidária das Sociedades em Relação de Domínio ou de

Grupo………………………………………………………………………………………………………

Pág. 43

5.4 Responsabilidade de Sócio, Gerente, Administrador ou Diretor…………………. Pág. 44

5.5. Pagamento pelo Fundo de Garantia Salarial…………………………………………. Pág. 45

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6. Retribuição-Noção, Elementos e Modalidades de Retribuição ………………….…….. Pág. 47

6.1. Cálculo do Montante Retributivo ………………………………………….…………….. Pág. 49

6.2. Retribuição em Concreto e Retribuição Modular……………………………………. Pág. 50

6.3. A Retribuição como Elemento Essencial………………………………………………. Pág. 53

6.4. Componentes da Retribuição……………………………………………….……………. Pág. 55

6.5. O Caráter Regular e Periódico das Prestações Retributivas……………………… Pág. 58

6.6. A Presunção Estabelecida…………………………………………………………………. Pág. 62

7. Prestações Complementares – Exclusões Legais…………………………………………. Pág. 69

8. Retribuição de Férias e o Subsídio de Férias……………………………………………….. Pág. 79

9. Subsídio de Natal…………………………………………………………………………….……. Pág. 99

10. O Ónus da Prova – Presunção de Laboralidade…………………………………………. Pág. 105

11. Prescrição – Implicações no Pagamento da Retribuição…………………….……….. Pág. 109

11.1 A Prescrição no Código Civil Vigente - Resenha……………………………………. Pág. 109

11.2. A Prescrição no Código do Trabalho – Evolução Legislativa Nacional………. Pág. 112

11.3. A Prescrição dos Créditos Laborais…………………………………………………… Pág. 115

11.4. A Prescrição dos Juros…………………………………………………………………… Pág. 120

12. Do Exercício Abusivo do Direito por Suppressio……………………………….………... Pág. 125

Conclusões………………………………………………………………………………………………. Pág. 133

Bibliografia………………………………………………………………………………………………. Pág. 137

Índice de jurisprudência……………………………………………………………………………… Pág. 141

Anexo……………………………………………………………………………………………………… Pág. 143

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Abreviaturas e Siglas Utilizadas

Ac. (Acs.) – Acórdão (s)

al. – Alínea

art. (arts.) – Artigo(s)

BMJ – Boletim do Ministério da Justiça

BTE – Boletim do Trabalho e Emprego

CCivil – Código Civil

Cf. – Conferir

Cit. – Citada

CJ – Colectânea de Jurisprudência

Coord. – Coordenador/coordenação/coordenado

CPC – Código de Processo Civil

CPT – Código de Processo do Trabalho, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 489/99, de

09/11, revisto pelo Dec-Lei n.º 295/2009, de 13/10.

CSC – Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 02 de

Setembro

CT/2003 – Código de Trabalho, aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de agosto

CT – Código de Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de fevereiro

CRP – Constituição da República Portuguesa

E. – Editora

Ed. – Edição

IDT – Instituto de Direito do Trabalho

IRCT – Instrumento de Regulamentação Coletiva de Trabalho

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LCCT – Lei da Cessação do Contrato de trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 64A/89, de

27/02

LCT – Lei do Contrato de trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 49.408, de 24/11/1969

n.º(n.os) – Número(s)

ob. – Obra

org. – Organizado/organização

pág. (págs.) – Página(s)

Prof. – Professor

RDES – Revista de Direito e de Estudos Sociais

RJCIT – Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto- Lei n.º 49

408, de 24/11/1969

RJCT – Regime Jurídico do Contrato de trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de

24/11/1969

RLJ – Revista de Legislação e de Jurisprudência

RCT – Regulamentação do Código do Trabalho

TRC – Tribunal da Relação de Coimbra

TRE – Tribunal da Relação de Évora

TRG – Tribunal da Relação de Guimarães

TRL – Tribunal da Relação de Lisboa

TRP – Tribunal da Relação do Porto

segs.– Seguintes

STA – Supremo Tribunal Administrativo

STJ – Supremo Tribunal de Justiça

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TFUE – Tratado de Funcionamento da União Europeia

UE – União Europeia

Vol. – Volume

vd. – Ver

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Introdução

O motivo que nos levou a escolher “A Retribuição e as Prestações Complementares -

Análise das repercussões na retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal” como tema de

dissertação de Mestrado advém das diversas e conflituantes interpretações doutrinárias e

jurisprudenciais levantadas ao longo dos anos sobre tais conceitos, bem como a relevância

prática que o esclarecimento destas questões possa proporcionar na retribuição de férias,

subsídios de férias e de Natal dos trabalhadores, no âmbito quotidiano da relação laboral.

Com o presente estudo propomo-nos tecer algumas considerações acerca de um dos

elementos que caracterizam o contrato de trabalho, ou seja, a retribuição. Nestes termos, vamos

começar por fazer uma pequena resenha histórica do surgimento da legislação laboral,

sobretudo no que concerne ao contrato de trabalho e à sua retribuição como elemento essencial

e caracterizador.

Seguidamente, procederemos à análise e enquadramento jurídico das prestações

complementares, sua eventual integração no conceito de retribuição e suas repercussões,

nomeadamente no que diz respeito à retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal,

dando nota, ao longo de todo o estudo, do entendimento jurisprudencial na interpretação destas

matérias.

Teceremos ainda algumas considerações no que concerne à aplicação do instituto da

prescrição dos créditos laborais, que comporta indagações de proeminente relevância na

demanda judicial das relações juslaborais. Ainda no âmbito do instituto da prescrição, vamos

expor algumas considerações acerca de uma figura criada pela jurisprudência alemã, a chamada

Verwirkung ou Suppressio.

Propusemo-nos analisar este tema porque, para além de ser uma matéria fulcral na

disciplina laboral, que interfere profundamente no quotidiano das empresas e trabalhadores,

alcança consequências bastante gravosas para os sujeitos da relação laboral e por isso fervilha

abundantemente no seio dos tribunais portugueses, originando decisões judiciais bastante

contraditórias em todas as instâncias decisoras, que até aos dias de hoje não encontraram uma

solução consensual e sistemática para estas questões.

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Sendo certo que a retribuição é um conceito jurídico, ele procura regular um modelo

social que tem vindo a conhecer alterações no paradigma de relação entre trabalho e retribuição,

não apenas fruto das transformações económicas e sociais, como no aparecimento de novos

modelos de trabalho, os quais acompanham o progresso.

Reconhecendo que a aplicação do princípio mutatis mutantis poderia conduzir a uma

desregulação da relação de retribuição, do valor do trabalho, por tender a acabar com modelos

sociais baseados em classes ou profissões, a dúvida existente tanto nos tribunais e nas suas

decisões, como na difícil gestão da coisa pública tem levado a um conflito – eventualmente

geracional - onde as necessidades do mercado, a realidade política e social e ainda o

entendimento político traduzido por força de lei, confrontam-se com as necessidades de

retribuição e os seus respetivos direitos adquiridos.

Trata-se assim de estabelecer garantias de direitos sobre o valor do trabalho, a par da

mudança progressiva que o mercado tem vindo a trazer para a realidade laboral e, ainda, a

capacidade do Estado em continuar a corresponder a princípios constitucionais, estabelecidos

há mais de 40 anos, numa realidade presente que coloca em causa direitos estabelecidos.

Deste conflito resulta ainda uma instabilidade entre poderes públicos do Estado, dos

quais deriva uma consequência política que põe em causa sustentabilidade das finanças do

Estado, da relação de confiança que se estabelece com os contribuintes, e ainda das legítimas

expectativas dos trabalhadores.

O conceito de retribuição, no seu princípio jurídico, tem assim sido desafiado e posto em

causa do ponto de vista político, sendo razão das maiores perturbações sociais dos últimos

anos.

Torna-se por tudo isto imperativo atentar nos conceitos jurídicos sobre o tema e de que

forma poderão acompanhar os novos tempos, ou, se for caso disso, garantir justiça e equidade

social e de retribuição em virtude dos normativos legislativos em vigor.

Não será, por certo, ambicioso considerar que a necessária clarificação desta relação e

do conceito de retribuição constitui um importante contributo não apenas jurídico mas social e

político para todos aqueles que, nos tempos de hoje, se confrontam com a decisão pública e a

obrigação de proceder à implementação destes princípios.

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1. O Conceito de Retribuição

Nos termos do n.º 1 do art. 258.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009,

de 12 de fevereiro1, considera-se retribuição “a prestação que, nos termos do contrato, das

normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho”.

O n.º 2 do mesmo artigo vem ainda esclarecer que a retribuição “compreende a retribuição base

e outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em

espécie”.

Dir-se-á em primeira mão que o conceito de retribuição é um dos principais temas do

direito do trabalho, desde logo porque é uma das matérias que, no âmbito do contencioso

laboral, mais ocupa os tribunais portugueses decorrentes de reivindicações inerentes à

integração de certas prestações como sendo retributivas e porque constitui um elemento

essencial da relação laboral, cuja génese é a sua onerosidade e, por outro lado, porque a

obrigação de retribuição é a principal obrigação do empregador. Se assim não fosse, não viria

previsto no próprio conceito de contrato de trabalho nos termos do art. 11.º do CT: “ contrato de

trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga mediante retribuição, a prestar a sua

atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob autoridade destas”

(sublinhado nosso). Ademais, é através da retribuição que se afere a qualidade de vida dos

cidadãos, se avalia o grau de desigualdade social e económica dos mesmos em relação a outros

regimes políticos, económicos e sociais.

A questão que se levanta é a de saber se a retribuição é pura e simplesmente a

contrapartida do trabalho efetuado pelo trabalhador e da sua disponibilidade para o fazer, ou se

a retribuição engloba também a atribuição ao trabalhador de prestações em face de outras

situações que não constituem diretamente contrapartida do seu trabalho. Quanto a este aspeto o

n.º 2 do preceito supra referido esclarece que a retribuição inclui “outras prestações regulares e

periódicas”. E é neste ponto que nos detemos: se devem as prestações complementares ser

consideradas retribuição, para efeitos de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de

Natal e, em caso afirmativo, quais devem ser consideradas retribuição e que requisitos devem

cumprir para integrar tal conceito.

1 Alterado pelas Leis n.os 105/2009, 53/2011, 23/2012, 47/2012 e 65/2013.

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Este estudo tem uma pandórica relevância prática uma vez que influi com matérias

essenciais do regime jurídico-laboral, designadamente porque a qualificação de certa prestação

como retribuição determina a aplicação dos regimes de garantia e de tutela dos créditos

retributivos previstos no CT nos termos do art. 258.º, n.º 4 – a proibição de compensação e

descontos nos termos do art. 279.º, a garantia de proibição de diminuição da retribuição ao

trabalhador nos termos do art. 129.º, al. d), (salvo nos casos previstos no CT e nos IRCT) e a

garantia dos salários intercalares em caso de despedimento ilícito nos termos do art. 390.º.

Comecemos por averiguar a evolução histórica do Direito do Trabalho e o contrato de

trabalho enquanto o principal negócio jurídico do direito laboral, e o corolário da retribuição

como elemento essencial do contrato de trabalho, bem como as variações que o conceito de

retribuição sofreu na ordem jurídica interna.

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2. Evolução Histórica - Enquadramento Legislativo

O contrato de trabalho enquanto negócio jurídico de direito privado está previsto no

Código Civil, no Livro II, intitulado “Direito das Obrigações – Dos Contratos em Especial”. Lê-se

aí, no art. 1152.º do CCivil, que o contrato de trabalho “é aquele pelo qual uma pessoa se

obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob

autoridade e direção desta” e, o artigo 1153.º do mesmo diploma acrescenta que “o contrato de

trabalho está sujeito a legislação especial”, remetendo assim o CCivil esta disciplina para

legislação especial – concretamente, nos dias de hoje, o Código do Trabalho 2 . Dada a

especificidade das características do contrato de trabalho e da dinâmica e complexidade das

relações laborais, justifica-se que esta disciplina seja autonomizada do direito obrigacional puro,

por opção jurídico-política, uma vez que lhe corresponde uma realidade sociológica igualmente

autónoma 3 . Grande parte da doutrina indica que este tipo negocial tem como característica

principal o facto de a força do trabalho ser um elemento indissociável do trabalhador – pessoa

singular – e, citando LEAL AMADO4, “ao alienar a disponibilidade da sua força de trabalho, o

trabalhador aliena-se, de algum modo, a si próprio”. No entanto, entendemos que esta

característica não pode por si só ser fundamento para a autonomia deste ramo do direito, uma

vez que existem outras prestações pessoais, ou infungíveis, consagradas no CCivil.

Esta imprescindibilidade de regular a relação jurídica entre o trabalhador e o empregador

surge pela manifesta assimetria da relação de trabalho, uma vez que na maior parte dos casos,

o trabalhador carece da retribuição, que aufere mediante a prestação de uma atividade, para

fazer face às suas necessidades essenciais, estando numa posição de dependência económica.

Por outro lado, na execução da relação de trabalho tem de se submeter à autoridade e direção

do empregador, havendo assim uma subordinação jurídica do primeiro em relação a este último.

O contrato de trabalho e a obrigação de remuneração da respetiva atividade prestada,

tem as suas raízes no Direito Romano e sofreu algumas alterações decorrentes da evolução

histórica das circunstâncias políticas e sociais daquela sociedade. Inicialmente, numa economia

predominantemente agrícola, estas atividades eram prestadas no âmbito da família, isto é, os

elementos familiares sobreviviam dos proveitos da sua própria agricultara, considerada uma

2 Cf. art. 11.º do Código do Trabalho. 3 Não obstante a aplicação subsidiária do regime jurídico do CCivil

4 Amado, João Leal in “Contrato de trabalho”, 6.ª ed., janeiro 2014, Coimbra Editora, pág. 20.

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atividade digna para qualquer cidadão romano. Com a expansão do Império Romano e o

aumento do número de pessoas em regime de trabalho servil, houve também um acréscimo no

que diz respeito à concorrência do trabalho manual, que começou a perder dignidade sendo

associado a trabalho prestado por escravos, passando assim a ter um sentido pejorativo. No

entanto, além da “elite” de cidadãos romanos que dispunha de escravos para efetuar aqueles

trabalhos manuais pouco dignos, existiam também duas classes de cidadãos romanos: uma

classe de homens livres que, não dispondo de escravos nem de outro meio económico, locavam

os seus serviços (operae) em contrapartida de um salário (merces), que se considera uma

recompensa (pretium). No fundo, eram homens livres sem dignidade social por realizarem

atividades desprezíveis à luz daquela sociedade (mercennarius). Por outro lado, surge a classe

de cidadão que se dedicava ao trabalho intelectual, com elevada estima da sociedade romana

(operae liberales). Eram consideradas atividades insuscetíveis de preço, que o homem intelectual

livre prestava por amizade ou por cumprimento de um officium que não concebe uma

remuneração. Não obstante, surgiu o sentimento de injustiça pois, muito embora não devessem

ser pagas, o tempo e despesas feitas em prol do exercício do trabalho intelectual, de algum

modo deviam ser compensadas, pelo que surgiu a figura do honorarium, que visa compensar as

operae liberales5,6.

2.1. Formação das Relações Laborais

Sem prejuízo das fontes do Direito Romano, como refere MONTEIRO FERNANDES7, “o ponto

de partida do processo de formação do Direito do Trabalho (como ramo autónomo de Direito)

esteve no primado do contrato de trabalho como instrumento de regulação das situações do

empregador e do trabalhador, na linhas das concepções liberal-individualistas que serviram de

suporte à Revolução Industrial”.

Com o regime capitalista derivado da Revolução Industrial, baseado nos princípios da

liberdade de empresa e de concorrência, sendo a propriedade privada altamente tutelada e

5 Justo, António Santos in “O Contrato de trabalho no direito romano (locatio-conduction operarum)”, separata Ars Iudicandi, Estudos em

Homenagem ao Prof. Doutor António Castanheira Neves, Vol. III, Boletim da Faculdade de Direito, Studia Iuridica, n.º 92, Universidade de Coimbra, Coimbra E., pág. 775-800.

6 A este propósito: Ramalho, Maria do Rosário Palma in “Direito do Trabalho Parte I – Dógmática Geral”, 2.ª ed., outubro de 2009, Almedina,

pág. 43 e segs.

7 Fernandes, António Monteiro in “Direito do Trabalho”, 16.ª ed., outubro de 2012, Almedina, pág. 29.

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deixando a classe operária sem qualquer proteção face à superioridade dos patronatos,

irrompeu, assim, o primeiro movimento sindical dos trabalhadores – é a chamada Questão

Social –, que careciam de representantes junto das entidades empregadoras, de forma a

exigirem melhores condições de trabalho e qualidade de vida minimamente aceitável para a

classe trabalhadora, autonomizando assim, pela primeira vez, o Direito do Trabalho, surgindo

este ramo do direito como resultado de uma tensão negocial, antes de ser propriamente uma

opção política.

Até então, os trabalhadores não dispunham de qualquer proteção estadual e modelo

organizativo, o que provocava um ambiente de competição entre si na disposição da sua força

de trabalho, ao contrário dos patronatos que dispunham de uma vasta oferta de pessoas que se

disponibilizavam para trabalhar. Tendo em vista a promoção de melhores condições de trabalho,

houve a aceitação generalizada da direta intervenção estadual, nomeadamente através da

criação de normas laborais e da proteção do legislador constitucional8, nascendo assim este

ramo do Direito com o escopo que se mantem até aos dias de hoje: tutela da relação laboral,

promovendo a proteção da parte mais débil da relação jurídica9.

O Direito do Trabalho português acompanhou o desenrolar dos desenvolvimentos

políticos e sociais europeus, sendo certo que em Portugal a evolução jurídica europeia só

décadas mais tarde é que foi seguida, os problemas sociais não foram sentidos com tanto vigor,

e quem desencadeou as reformas no âmbito da legislação laboral foi o próprio estado, na

sequência do que havia ocorrido em países vizinhos10.

Embora o contrato de trabalho encontre a suas raízes no Direito Romano o processo de

formação desta área do Direito no nosso ordenamento jurídico, é relativamente recente11. Apenas

no século XIX surgiu um conjunto de diplomas no ramo laboral com temas tão relevantes como

a idade mínima de admissão ao trabalho12, o estatuto das associações de classe13, a proteção do

8 O texto do atual do art. 59.º da CRP foi introduzido em 1982 (anterior art. 60.º).

9 A este propósito, vd., LEAL AMADO, “Contrato...”; António Monteiro Fernandes, op. cit.; Bernardo da Gama Lobo Xavier, “Manual de Direito do

Trabalho”, abril de 2011, Verbo; José João Abrantes, “Do Direito Civil ao Direito do Trabalho. Do liberalismo aos nossos dias”, 1978, Coimbra E.

10 Martinez, Pedro Romano in “Direito do Trabalho”, 6.ª ed., maio de 2013, Almedina, pág. 76. 11 Aliás, é igualmente recente a constituição da Organização Internacional do Trabalho, datada de 1919, e na qual participam os representantes

dos Governos, dos trabalhadores e dos empregadores de grande parte dos países do mundo. 12 Decreto de 14/4/1891.

13 Decreto de 9/05/1891.

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trabalho das crianças e das mulheres, o tempo de trabalho, o descanso semanal14, etc. Mas a

sua formação decorreu sobretudo ao longo do século XX, nomeadamente com a consagração do

direito à greve e do lock-out (então lícito) através do Decreto, com força de Lei, de 6 de

dezembro de 191015.

2.2. Fontes internas do Direito do Trabalho

A nível do ordenamento jurídico interno, a questão social suscitada pela industrialização

teve um impacto social tardio, sendo que só em finais do século XIX é que começou a surgir a

legislação de proteção ao trabalho16, provavelmente devido ao clima de instabilidade política e de

guerras civis ocorridas durante os meados desse século.

Até ao CT de 200317, no que respeita ao regime jurídico da retribuição, tinha aplicação

legal a Lei n.º 1952, de 10 de março de 1937, que consagrava no seu art. 1.º a noção de

contrato de trabalho, onde já se previa uma remuneração. Mais tarde entrou em vigor o Decreto-

Lei n.º 47 032, de 27 de maio de 1966, que de seguida sofreu alterações com a entrada em

vigor do Regime Jurídico do Contrato de trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24

de novembro de 196918.

Em 2009, a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, aprovou a revisão do CT de 2003, e

mais tarde a Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, procedeu à alteração do referido diploma.

Finalmente, em 2012, procedeu-se à terceira alteração do CT de 2003, com a

aprovação e publicação da Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, vigente nos dias de hoje.

É também relevante para perceber o enquadramento jurídico-laboral atender à

regulamentação destes diplomas, designadamente, a Regulamentação do Contrato de Trabalho,

aprovado pela Lei n.º 35/2004 de 29 de Julho, que regulamenta a Lei n.º 99/2003, de 27 de

Agosto, que aprovou o Código do Trabalho.

14 Decreto de 3/08/1907.

15 Marcos, Rui Manuel de Figueiredo in “A emergência do contrato de trabalho no direito português”, Revista da Faculdade de Direito da

Universidade do Porto, 2011, pág. 217 e segs. 16 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 44 e segs.

17 Lei n.º 29/2003, de 27 de agosto – que aprovou o Código do Trabalho.

18 De ora em diante designado LCT (Lei do Contrato de trabalho).

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25

2.3. Proteção Constitucional

A tutela da relação laboral encontra-se também salvaguardada constitucionalmente 19 .

Desde logo os princípios basilares que norteiam a relação laboral estão previstos no capítulo dos

Direitos Liberdades e Garantias – segurança no emprego e proibição de despedimento sem justa

causa, criação e atuação de comissão de trabalhadores, liberdade sindical, direito de

contratação coletiva, direito à greve - e no capítulo dos Direitos e Deveres Económicos – direito

ao trabalho e à retribuição, direito à organização do trabalho em condições dignas, direito a

condições de higiene, segurança e saúde no trabalho, direito de repouso, direito a um limite

máximo de jornada de trabalho, direito ao descanso semanal, férias periódicas e pagas, direito a

assistência nos casos de desemprego, direito a assistência e justa reparação em casos de

acidente de trabalho ou doença profissional, etc.

A Constituição da República Portuguesa configura assim uma importante fonte do direito do

trabalho, aliás fonte das fontes, sendo que se impõe fazer uma chamada de atenção para a

reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República em matéria de direitos,

liberdades e garantias, pelo que estas matérias para serem reguladas pelo Governo (decreto-lei

governamental) carecem de prévia autorização (lei de autorização – lei de valor reforçado20) da

Assembleia da República, devendo esta definir o objeto, sentido, extensão e duração da

autorização, nos termos do art. 165.º, n.º 2 da CRP.

Fora do âmbito dos direitos, liberdades e garantias, embora o Governo possa legislar

sem autorização prévia do Parlamento, os trabalhadores sempre podem participar na elaboração

legislativa, através das comissões de trabalhadores e das associações sindicais 21 e a sua

participação é de tal forma importante que a violação deste direito configura uma

inconstitucionalidade22, na medida em que a participação é requisito procedimental essencial.

19 Cf. art. 53.º e seg. da Constituição da República Portuguesa.

20 Cf. art. 112 º, n.º 2 da CRP. 21 Cf. art. 54.º, n.º 5 al. d) e 56.º, n.º 2 al. a), ambos da CRP. 22

Sendo que uma Lei ou Decreto-Lei que não respeite o direito constitucionalmente reconhecido às associações sindicais o de participarem na

elaboração da legislação do trabalho, é formalmente inconstitucional, por violação do preceituado no art. 56.º da CRP.

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2.4. Fontes Externas do Direito do Trabalho

No que concerne a fontes externas do Direito do Trabalho é de referir, em primeiro lugar,

as Convenções Internacionais, entre elas a Declaração Universal dos Direito do Homem 23, o

Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, a Carta Social Europeia e

as Convenções e Recomendações da OIT.

Em segundo lugar, e não menos importante, o Direito da União Europeia através do

Tratado sobre o Funcionamento da UE, Diretivas e Regulamentos, Carta dos Direitos

Fundamentais da UE, e a Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos

Trabalhadores (1989)24.

Assim, o Direito do Trabalho, além de estar sob a alçada das fontes externas que

referimos, a nível do ordenamento jurídico interno, está regulado não só pela Constituição da

República Portuguesa, mas também pela legislação ordinária (leis e decretos-leis), nos termos do

art. 1.º do CT.

Por outro lado, o contrato de trabalho, como mecanismo de regulação das relações

juslaborais, está sujeito, em especial, aos instrumentos de regulamentação coletiva de

trabalho25 , 26 que, nos termos do art. 476.º do CT, só podem ser afastados pelo contrato de

trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis ao trabalhador, e aos usos laborais27

que não contrariem a boa fé28.

23 Cf. art. 16.º, n.º 2 da CRP – “Os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados em

harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem”.

24 No âmbito do direito da União Europeia, o Tribunal de Justiça, questionado prejudicialmente pelos tribunais britânicos e alemães a propósito

da aplicação do Princípio da Igualdade de tratamento entre homens e mulheres no acesso ao emprego à formação e promoção de profissionais, veio finalmente interpretar o significado de remuneração – Cf. Ac. “Defrenne”: acórdão de 25 de maio de 1971, 80/70.

25 Cf. arts. 2.º e 3.º do Código do Trabalho – os IRCT podem ser negociais e não negociais. Os negociais dizem respeito às convenções coletivas

de trabalho nos termos do art. 485.º e segs.

26 Os IRCT negociais dizem respeito às convenções coletivas de trabalho nos termos do art. 485.º e seg. (contrato coletivo, acordo coletivo ou

acordo de empresa), acordo de adesão nos termos do art. 504.º ou decisão de arbitragem voluntária nos termos do art. 506.º todos do Código do Trabalho. Os IRCT não negociais podem consistir em portarias de extensão nos termos do art. 514, portaria de condições de trabalho nos termos do art. 517.º, decisão de arbitragem obrigatória ou necessária nos termos dos arts. 508.º e 510.º, respetivamente, todos do Código do Trabalho.

27 Usos laborais são uma autovinculação do empregador resultante de exigências de coerência e de racionalidade, de acordo com as expetativas

geradas, pela sua prática regular e uniforme, dado a sua posição de autoridade. Podem ser distinguidos entre usos externos/profissionais e usos internos/da empresa. Estes últimos têm carácter reiterado, espontâneo e são generalizados, devendo ainda ser favoráveis aos trabalhadores.

28 O princípio geral da boa-fé vem consagrado no n.º 2 do art. 762.º do CCivil: “No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do

direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé”.

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3. O Contrato de trabalho

Do art. 11.º do CT podemos retirar os elementos essenciais caracterizadores da

existência de um contrato de trabalho.

É consagrada no art. 11.º do CT uma presunção ilidível (iuris tantum) da existência de

um contrato de trabalho, isto é, admite prova em contrário e ocasiona a inversão do ónus da

prova, fazendo recair sobre a outra parte a prova do contrário do facto que serve de base à

presunção. O legislador incluiu no n.º 1 desta norma uma lista de indícios que correspondem,

em grande parte à lista de índices de subordinação utilizada pela jurisprudência e doutrina, há

vários anos, como método de apuração de subordinação jurídica na relação em vigor entre as

partes.

Em primeiro lugar, o contrato de trabalho é um negócio jurídico bilateral, envolvendo

dois polos, com posições jurídicas opostas, na maioria dos casos tendo uma pessoa em cada

pólo, e cujas declarações de vontade são opostas mas harmonizáveis entre si29.

É um contrato nominado e típico, uma vez que este está previsto e é regulado por lei,

cujo conteúdo consagra prestações patrimoniais (atividade prestada pelo trabalhador e a

prestação remuneratória devida pelo trabalhador).

É um contrato oneroso e sinalagmático30, isto é, existe uma relação de reciprocidade e

interdependência de obrigações dele emergentes como explica MARIA DO ROSÁRIO PALMA

RAMALHO31, “a remuneração faz equivaler a posição das partes no contrato do ponto de vista das

vantagens que dele retiram (as utilidades decorrentes da actividade laboral para o empregador e

o enriquecimento patrimonial do trabalhador que decorre da retribuição), ao mesmo tempo que

evidencia a reciprocidade das suas obrigações negociais, uma vez que o dever de pagar a

remuneração se configura tecnicamente como a contraprestação de dever do trabalho.

Todavia o sinalagma do contrato de trabalho é um sinalagma imperfeito32, porque, em

alguns casos, subsiste o dever principal de uma das partes perante a ausência de prestação da

29 Varela, João de Matos Antunes in “Das Obrigações em Geral”, Volume I, 10.ª edição, 2002, Almedina, Pág. 216.

30 Varela, João de Matos Antunes, op. cit., Pág. 405 e seg.

31 Ramalho, Maria do Rosário Palma in “Tratado de Direito do Trabalho Parte II – Situações Laborais Individuais”, 4.ª ed., dezembro de 2012,

Almedina, pág. 85.

32 Paula Quintas e Hélder Quintas referem a “sinalagmaticidade atípica do contrato de trabalho”, in “Manual de Direito do Trabalho e de

Processo do Trabalho”, março de 2010, Almedina, pág. 43.

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28

outra”, nomeadamente, no que diz respeito à remuneração em período de férias. É um contrato

duradouro e de execução continuada, cujas prestações não se esgotam, mas podendo ser

determinada, consoante o contrato seja por tempo indeterminado ou com termo resolutivo e tem

um caráter eminentemente pessoal33.

O contrato de trabalho obedece ao princípio da liberdade de forma, ou seja, é um

contrato consensual, nos termos do art. 110.º do CT 34 , podendo o contrato celebrar-se

verbalmente ou mediante comportamentos concludentes, o que permite uma maior proteção do

trabalhador uma vez que este pode provar a existência de um contrato de trabalho celebrado,

ainda que tacitamente. O silêncio das partes não significa que não exista, de facto, uma relação

juslaboral e para a aferirmos servimo-nos do art. 11.º do CT35, que estabelece uma presunção

judicial36, permitindo assim ao julgador, através de um juízo de normalidade que se traduz na

referida presunção, avaliar os factos e detetar a existência de um contrato de trabalho gerador

de obrigações37.

No entanto, a lei prevê expressamente algumas exceções à liberdade de forma, a saber:

exige-se forma escrita na promessa de contrato de trabalho, nos termos do n.º 1 do art. 103.º;

no contrato de trabalho com pluralidade de empregadores, nos termos do art. 101.º, n.º 2; no

contrato de trabalho a termo, nos termos do art. 141.º, n.º 1; no contrato de trabalho a tempo

parcial, nos termos do art. 153.º, n.º 1, no contrato de trabalho em comissão de serviço nos

termos do art. 162.º, n.º 3; no contrato de prestação subordinada de teletrabalho, nos termos do

art. 166.º, n.º 4; no acordo de cedência ocasional de trabalhadores, nos termos do art. 290.º,

n.º 1 e no acordo de pré-reforma, nos termos do art. 319.º, todos do CT38.

Quanto ao carácter eminentemente pessoal, JÚLIO GOME39 respondendo ao que considera

ser a doutrina dominante, indica que se está a usar expressões não sinónimas para se referir a

esta característica. Este autor explica que, não raras vezes, se diz que o contrato de trabalho é

33 Sobre esta matéria, Amado, João Leal, op. cit., pág. 73 e seg.

34 Cf. art. 219.º do CCivil.

35 A Presunção Judicial prevista no art. 11.º do CT auxilia na diferenciação do contrato de trabalho com outros tipos negociais, nomeadamente

através da aplicação do método indiciário, que se traduz numa avaliação por aproximação da existência dos elementos caracterizadores da relação subordinada: vinculação a um horário de trabalho, a execução da prestação em local pelo empregador, a existência de controlo externo

do modo de prestação, a obediência a ordens, a sujeição à disciplina da empresa, a modalidade da retribuição, a propriedade dos instrumentos de trabalho e a observância dos regimes fiscais e de segurança social próprios do trabalho por conta de outrem, etc.

36 Cf. art. 351.º do CCivil. 37 Fernandes, António Monteiro in “Direito...”, pág.125.

38 Leitão, Luís Manuel Teles de Menezes in “Direito do Trabalho”, 3.ª ed., 2012, Almedina, pág. 98.

39 Gomes, Júlio in “Direito do Trabalho Volume I, As relações individuais de Trabalho”, Coimbra E., pág. 85 e segs.

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um contrato intuitu personae e que a relação que dele resulta é uma relação fiduciária e ainda

se acrescenta que a prestação realizada pelo trabalhador é uma prestação infungível, o que

explica a impossibilidade do trabalhador se fazer substituir na prestação da sua atividade.

Em primeiro lugar cumpre esclarecer o conceito de fungibilidade e para tal efeito,

citamos ANTUNES VARELA 40 , que explica que “a prestação diz-se fungível, quando pode ser

realizada por pessoa diferente do seu devedor, sem prejuízo do interesse do credor […]; será não

fungível no caso de o devedor não poder ser substituído no cumprimento por terceiro […]. São

obrigações em que ao credor não interessa apenas o objecto da obrigação, mas também a

habilidade, o saber, a destreza, a força, o bom nome ou outras qualidades pessoais do

devedor”.

A propósito da crítica apresentada por JÚLIO GOMES, o autor, para assinalar a doutrina

dominante nesta matéria (com a qual não se identifica) cita as palavras de ROMANO MARTINEZ41

que defende que “ainda que a massificação tenha quebrado o lado fiduciário entre o trabalhador

e o empregador, não é aceitável que um trabalhador, certo dia, para a realização da actividade a

que se obrigou, se faça substituir por outrem” e continua, afirmando que “se a relação laboral

não se baseasse na fidúcia, a substituição seria admissível, pois a actividade a desenvolver pelo

trabalhador era fungível”.

Neste seguimento, JÚLIO GOMES começa por referir que há uma imprecisão terminológica

e vem distinguir e esclarecer a aplicação dos conceitos de intuitu personae, o negócio fiduciário

e a infungibilidade na relação laboral.

Em primeiro lugar, esclarece que um negócio intuitu personae é aquele negócio no qual,

para a celebração do mesmo, são levadas em consideração as características e qualidades

pessoais de uma das partes, e que as mesmas são essenciais para a decisão de contratar, e se

estas não existissem o contrato não seria celebrado com aquela pessoa em concreto.

Ora, acompanhamos a visão de JÚLIO GOMES, que hesita em aceitar que todos os

contratos de trabalho celebrados sejam um negócio intuitu personae dando, para o efeito, o

exemplo de um trabalhador contratado para distribuir prospectos no passeio em frente a um

restaurante e acrescentamos nós o exemplo de um trabalhador contratado para verificar se

40 Varela, João de Matos Antunes, op. cit., pág. 97.

41 Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 414.

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30

todos os passageiros de um comboio estão acompanhados do devido bilhete para aquela

viagem. Por outro lado, o mesmo autor refere que nem sempre as qualidades do trabalhador se

possam associar a uma particular relação de fidúcia. Isto é, para JÚLIO GOMES, afirmar que em

todos os contratos de trabalho se estabelece uma relação de especial confiança é um exagero,

pelo menos no que concerne a fidúcia pessoal, no sentido de que, por exemplo, quando se

contrata um manequim, devido à sua excecional beleza ou porque as suas características físicas

se adequam ao perfil escolhido para uma determinada campanha publicitária, isso não significa

que aquele manequim, com o qual se celebrou um contrato de trabalho, estabelece uma relação

de especial confiança com o empregador.

O que acontece é que, em qualquer contrato de trabalho, o empregador acredita que o

trabalhador com quem celebrou o contrato irá cumprir pontualmente o negócio celebrado e agirá

dentro do princípio da boa-fé. Embora se admita que em qualquer relação laboral existe uma

mútua confiança que decorre não só do negócio celebrado mas também dos ditames e das

normas gerais que tutelam o Direito, não se pode afirmar que pela celebração de um qualquer

contrato de trabalho, exista uma relação de fidúcia (pelo menos pessoal) e que o trabalhador

estaria obrigado a uma especial obrigação de lealdade.

Sublinha-se, no entanto, que mesmo que não haja uma especial relação de fidúcia com

o trabalhador, isto não acarreta a possibilidade de o trabalhador se fazer substituir na sua

respetiva prestação, isto porque, ainda que não se ponha em causa a questão da especial

confiança naquele trabalhador, podem existir razões de ordem técnica ou organizativa que leve a

que o empregador não aceite (nem tenha de aceitar) que pessoas estranhas à empresa tenham

acesso ao espaço da mesma.

Além disso, o empregador, ao contratar determinado trabalhador assumiu certos riscos

em relação àquele (e só àquele trabalhador), levando-o por exemplo a celebrar um contrato de

seguro de acidentes de trabalho, em que o segurado é aquele trabalhador em concreto e não

outra pessoa pela qual o trabalhador se faça substituir na execução da sua prestação, bem com

o trabalhador ao celebrar determinado contrato de trabalho assumiu, não só as obrigações

diretamente decorrentes do contrato, mas também obrigações acessórias que dificilmente se

atribuem ao seu substituto.

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31

Relativamente à infungibilidade do contrato de trabalho, JÚLIO GOMES considera que em

alguns cenários se pode admitir a possibilidade de o credor (empregador) consentir que o

devedor (trabalhador) se faça substituir por outra pessoa, considerando que a possibilidade de

inclusão no contrato de trabalho de uma cláusula que permita que o trabalhador se faça

substituir excecionalmente por outrem não descaracteriza este tipo contratual, referenciando, a

título de exemplo, um professor que solicite e obtenha autorização do empregador para se fazer

substituir por um colega, com iguais competências, em certas aulas que terá de faltar, e não é

por isso que o contrato celebrado com o empregador deixa de ser considerado um contrato de

trabalho.

A nosso ver, acompanhando a opinião de LEAL AMADO42, a infungibilidade do contrato de

trabalho é inegável, uma vez que, ainda que se permita a substituição do trabalhador por outrem

para a execução das tarefas a que se vinculou, esta substituição carece sempre de

consentimento (a nosso ver expresso) do empregador.

É de destacar que o contrato de trabalho só pode ser celebrado entre uma pessoa

singular (trabalhador) e outra (s) pessoa (s), ou seja o empregador ou vários empregadores,

sendo que a figura do trabalhador não pode, então, figurar numa pessoa coletiva. Este preceito

previsto no art. 11.º afasta-se da noção consagrada no art. 1152.º do CCivil, que diz que o

“contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a

sua atividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob autoridade e direção desta”,

estabelecendo que a atividade prestada pelo trabalhador pode ser prestada a vários

empregadores, através de um só contrato de trabalho – pluralidade de empregadores – quando

haja uma relação societária de participações recíprocas entre os empregadores, expressamente

prevista no art. 101.º do CT. Pelo contrário não é prática corrente a celebração de um contrato

de trabalho com vários trabalhadores43. Esta perspetiva é alcançada facilmente, uma vez que a

prestação do trabalhador é a sua própria força do trabalho, indissociável da pessoa humana.

Por outro lado, além do requisito da singularidade do trabalhador, o elemento

“subordinação jurídica”, constituiu um segundo requisito para a aferição da existência de um

contrato de trabalho. Esta subordinação jurídica, não corresponde a uma subordinação

económica.

42 Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 75. 43

Cf. art. 2.º do CT relativo à Contratação Coletiva.

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32

Da referida definição legal resulta que o trabalhador presta a sua atividade encontrando-

se sujeito à autoridade do empregador, que recebe a dita prestação. Conforme escreve JÚLIO

GOMES44, a subordinação é “a posição jurídica passiva que corresponde ao poder de direção do

empregador e traduz um modo de ser da realização do trabalho”, ou seja, há dependência da

conduta pessoal do trabalhador na execução do contrato, às ordens, instruções e orientações do

empregador, dentro dos limites e normas do contrato que o regem. Este requisito vem

consagrado não só no art. 11.º do Código do Trabalho, mas também nos arts. 97.º e 128.º, n.º

1 al. e), do mesmo diploma. Este elemento constitutivo do contrato de trabalho permite-nos

distinguir este tipo negocial de outros contratos suscetíveis de confusão, como seja o contrato de

prestação de serviços previsto no art. 1154.º do CCivil, definido como “aquele em que uma das

partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual,

com ou sem retribuição”45.

Além dos elementos supra identificados, é ainda necessário verificar-se a existência do

terceiro elemento essencial para aferir da existência de um contrato de trabalho referimo-nos à

retribuição, conforme consagrado no art. 258.º do CT. Assim, é exigível que a atividade prestada

pelo trabalhador ao empregador seja remunerada, constituindo o contrato de trabalho, um

contrato oneroso.

E este é o item chave do estudo que aqui se apresenta, uma vez que existem outras

prestações (chamadas “complementares”) que podem ser qualificadas como retribuição em

sentido técnico, e cujo alcance não vem definido claramente na lei. Esta matéria tem uma

relevância jurídico-prática bastante ativa, na medida em que tem vindo a ser discutida no seio da

jurisprudência e tem gerado algumas decisões contraditórias, cuja análise é imprescindível para

a compreensão do estudo da retribuição.

Para esse efeito, cumpre em primeiro lugar explicitar o alcance e conceito do elemento

retribuição, passando, em primeiro lugar, pela tutela jurídica que a mesma merece.

44 Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 122.

45 A distinção entre a qualificação de um contrato como sendo de trabalho ou de prestação de serviços, não é uma tarefa fácil, uma vez que nem

sempre é claro se se oferece o trabalho ou o seu resultado, uma vez que o trabalho faz derivar um resultado. Para o efeito, a jurisprudência concebe uma técnica jurídica para distinguir estes tipos negociais: método indiciário, que ajuda o intérprete da lei a aferir, casuisticamente, da existência de um contrato de trabalho (ou pelo contrário da prestação autónoma de um serviço) através de índices de subordinação, no âmbito da relação jurídica existente.

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33

4. A Tutela da Retribuição

Embora para o empregador a retribuição seja sempre um custo de produção, uma vez

encarada como uma diminuição da margem de lucro, a maior parte das vezes, para o

trabalhador, constitui o único meio de subsistência ou fonte prevalecente de rendimento familiar

do mesmo, sendo que qualquer aumento dessa contrapartida significa, consequentemente, um

melhoramento da qualidade de vida, merecendo que o seu regime jurídico tenha uma especial

tutela jurídica, de forma a garantir a subsistência do trabalhador e dos seus familiares.

Nesse sentido, a própria Constituição da República Portuguesa prevê no capítulo relativo

aos direitos e deveres fundamentais, concretamente no art. 59.º, n.º 3 que os salários gozam de

garantias especiais.

4.1. Não Discriminação e Igualdade

Mas, a Constituição não fica por aqui. Na al. a) do art. 59.º é proclamado o princípio da

igualdade do tratamento retributivo, ou o comummente conhecido “trabalho igual, salário igual”.

Este princípio diz que devem ser retribuídos da mesma forma os casos que têm a mesma

quantidade e qualidade de trabalho, da mesma natureza, sem existir qualquer discriminação

entre os trabalhadores que não resulte da sua categoria profissional, tarefas executadas,

rendimento e qualidade de execução, e outros aspetos atendíveis e justificáveis46.

No entanto, não serão consideradas violações ao referido princípio os casos em que o

empregador remunera de forma diferente os trabalhadores que, embora executem tarefas com a

mesma quantidade e qualidade de trabalho, da mesma natureza, têm situações pessoais

diferentes, nomeadamente em função da antiguidade. Isto deve-se à conciliação do princípio da

igualdade, com o princípio (igualmente constitucional) da liberdade da empresa e autonomia

contratual.

Outro caso em que pode suceder diferenças salariais entre trabalhadores que executem

tarefas com a mesma quantidade e qualidade de trabalho, da mesma natureza, deve-se à

possibilidade de, no âmbito da mesma empresa, serem aplicáveis convenções coletivas

46 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 574.

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diferentes 47 , ou pelo menos, só ser aplicada determinada convenção coletiva ao trabalhador

subscritor do sindicato outorgante da mesma.

O enfoque basilar deste princípio é o de proibir as situações de discriminação em função

da idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas

(conforme lista exemplificativa prevista no art. 59.º, n.º 1 da CRP).

No que concerne à discriminação referente à retribuição, o Código do Trabalho, refere-se

expressamente ao princípio da igualdade nos termos dos arts. 23.º e 24.º.

O art. 25.º, n.º 5 do CT, estabelece a regra do ónus da prova respeitante às situações de

discriminação, ou seja, incumbe à parte que alega a situação de discriminação indicar o

trabalhador em relação ao qual é discriminado. Por outro lado, incumbe ao empregador fazer a

prova de que aquela diferença de tratamento alegada não assenta em fatores discriminatórios,

incumbindo ainda a este, manter o registo dos recrutamentos efetuados, durante cinco anos,

nos termos do art. 32.º do referido diploma.

Ainda no âmbito deste diploma legal, o art. 31.º do CT prevê a não discriminação de

retribuição em função do sexo, assegurando a igualdade das condições de trabalho, entre

trabalhadoras e trabalhadores, por execução laboral semelhante prestada ao mesmo

empregador, promovendo no n.º 5, critérios de avaliação com objetividade comum entre

mulheres e homens.

4.2. Irredutibilidade Salarial

Como já se aludiu, o legislador consagrou no art. 129.º, n.º 1 al. d) do CT, o princípio da

irredutibilidade salarial. Este princípio vai no sentido de que não pode ser diminuída a retribuição

do trabalhador, salvo casos previstos no Código do Trabalho e nos instrumentos de

regulamentação coletiva de trabalho.

47 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15 de fevereiro de 2012, Processo n.º 3250/09.0TTLSB.L1-4, disponível no website

www.dgsi.pt . – “A diferenciação salarial assente no princípio da filiação não constitui violação do princípio da igualdade, na vertente de “para trabalho igual salário igual”, salvo se a razão dessa diferenciação residir apenas no facto de os trabalhadores, não beneficiados pelos aumentos em condições idênticas às desfrutadas por outros, não serem associados da organização sindical ou das organizações sindicais que outorgaram o IRCT, ou no facto de eles não serem sindicalizados, cabendo neste caso, a esses trabalhadores que se julgam alvo de discriminação alegar e provar que o trabalho por eles prestado é igual, em natureza, quantidade e qualidade, ao prestado pelos trabalhadores filiados na organização ou organizações que subscreveram a convenção colectiva cujas tabelas salariais pretendem que lhes sejam aplicadas.”

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Quanto às situações previstas no Código do Trabalho, referimo-nos aos casos de

mudança do trabalhador para categoria inferior (art. 119.º), aos casos de mobilidade funcional

(art. 120.º), aos casos de prestação de trabalho em tempo parcial (art. 154.º, n.º 3 al. a)), por

acordo com o trabalhador o mesmo prestar trabalho intermitente durante o período de

inatividade (art. 160.º, n.º 1), aos casos de cessão de comissão de serviços (al. a), n.º 1 do art.

164.º), casos de lay-off, ou seja, durante o período de redução temporária do período normal do

trabalho ou suspensão do contrato por facto imputável ao empregador (art. 305.º, n.º 1).

Além destes casos previstos no Código do Trabalho e dos casos previstos em IRCT, o

empregador não pode diminuir o montante da retribuição do trabalhador, contando para o efeito

a retribuição base e outras prestações complementares, regulares e periódicas, prestadas como

contrapartida do trabalho.

Como explica o autor BERNARDO LOBO XAVIER 48 , deve considerar-se as retribuições

nominais e não salários reais, pelo que se pode “verificar uma diminuição efectiva da retribuição

pelo simples decurso do tempo, desde que a empresa não actualize um salário sujeito a erosão

monetária provocada pela inflação”, isto é, o empregador não está obrigado a atualizar a

retribuição de acordo com a taxa de inflação, a não ser que o contrato de trabalho preveja de

modo diferente.

Tem sido entendimento geral da jurisprudência que nos casos de retribuição parcelar

não é negado ao empregador alterar o quantitativo de algumas das parcelas ou até proceder à

sua eliminação, desde que o quantitativo da retribuição resultante desta alteração ou eliminação

pelo empregador não resulte em valor inferior àquele que o trabalhador auferia resultante do

apurado o total do somatório das parcelas49.

Tal como a Relação de Lisboa explica em sumário: “é entendimento dominante na

doutrina e na jurisprudência que o referido princípio respeita à retribuição em termos globais e

não a cada parcela retributiva de per si, permitindo, por conseguinte, a alteração, ainda que no

sentido da supressão ou da baixa de algumas parcelas retributivas, desde que o valor global não

seja diminuído” 50, ou seja, a proibição fixada nesta norma legal, não significa que o empregador

48 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 577.

49 Marecos, Diogo Vaz, in “Código do Trabalho Anotado”, 2.ª ed., Coimbra Editora – anotação ao art. 129.º.

50 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de fevereiro de 2005, Processo n.º 5655/2004-4, disponível no website www.dgsi.pt.

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não possa unilateralmente alterar o conteúdo de uma retribuição, dita mista, do trabalhador51,

desde que o faça sem reduzir o que o trabalhador efetivamente auferia, ainda que as expetativas

do trabalhador quanto ao aumento retributivo seja frustrado.

Por outro lado, não é vedado ao empregador a cessação de certos complementos

salariais se a situação que serviu de base à sua atribuição também cessar.

Como sabemos, as prestações a título de complementos salariais, são auferidas em

função da natureza da própria prestação ou da especificidade que a sua execução implica.

Referimo-nos aos subsídios de trabalho noturno, compensação por trabalho descontínuo,

trabalho suplementar, subsídio para transporte, etc., que constituem prestações que não são

pagas como contrapartida do trabalho prestado mas sim prestações para fazer face, ou

compensar, a penosidade ou despesas específicas em virtude da natureza da prestação ou da

própria execução do trabalho, que apenas são devidas enquanto as situações que lhes servem

de fundamento persistirem assim o empregador o poder de unilateralmente cessar a atribuição

das mesmas, logo que cessem as situações de natureza especifica que servem de fundamento a

sua atribuição, sem que isso implique a violação do princípio da irredutibilidade salarial52.

Porém, JÚLIO GOMES53 coloca em discussão um problema que não podemos deixar de

abordar. Este autor releva que o contrato de trabalho tem como elemento essencial a

retribuição, mas que a redução da retribuição não é o principal problema a ser discutido, mas

antes o pontual cumprimento do mesmo, isto é, pacta sunt servanda. O autor referiu-se, em

relação a esta questão, à evolução jurisprudencial francesa, mencionando o Acórdão SA Systia

Informatique, de 28 de janeiro de 1998, que versou sobre uma alteração, unilateral, pelo

empregador do modo de cálculo da retribuição, no qual a Court de Cassation “afirmou que o

modo de remuneração de um trabalhador constitui um elemento do seu contrato de trabalho e

não pode ser modificado sem o acordo do trabalhador”54.

Neste caso o Tribunal entendeu que, uma vez que se trata de um elemento essencial do

contrato, e que mudar-se o modo de remuneração é alterar o próprio contrato, esta alteração

51 No mesmo sentido Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal Justiça, de 16 de janeiro de 2008, Processo n.º 07S3786, 26 de março de 2008,

Processo n.º 07S3791 E 4 DE junho de 2008, Processo n.º 08S456, todos disponíveis no website www.dgsi.pt.

52 Cf. Acórdãos do Supremo Tribunal Justiça, de 25 de setembro de 2002, Processo n.º 02S1197, 4 de maio de 2005, Processo n.º 04S779 e

17 de janeiro de 2007, Processo n.º 06S2188, todos disponíveis no website www.dgsi.pt.

53 Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 777. 54 A este propósito Cf. ainda, Gomes, Júlio in “Algumas observações críticas sobre a jurisprudência recente em matéria de retribuição e afins”, IV

Congresso Nacional de Direito do Trabalho, pág. 59.

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exige o acordo do trabalhador. Anuiu-se que se a retribuição é um elemento essencial do

contrato de trabalho, que é caracterizado pelo seu montante, forma de pagamento e de cálculo,

uma vez consentido pelas partes, como integrante do conteúdo do contrato, e neste sentido só

pode ser alterado com consentimento de ambos os contraentes.

Entenda-se que foi em troca da retribuição acordada que o trabalhador consentiu em se

submeter à autoridade e direção do empregador, sendo este um elemento essencial do contrato

que configura a contrapartida da prestação do trabalho. Pelo que aceitar que, unilateralmente, o

empregador o pudesse alterar seria, também, segundo o entendimento da jurisprudência

francesa, por em causa, o princípio basilar do direito dos contratos - pact sunt servada – uma

vez que o contrato de trabalho é um contrato na aceção civilista e, portanto, deve ser

pontualmente cumprido.

4.3. Proibição da Renúncia, Insusceptibilidade de Cessão e

Impenhorabilidade

Ainda a este propósito, é de evidenciar a proibição da renúncia à retribuição.

Não é lícito renunciar à retribuição durante a vigência do contrato de trabalho – referimo-

nos não só à retribuição a título de contrapartida do trabalho prestado, mas também a

retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal.

Após a cessação do contrato de trabalho, a jurisprudência entende que há possibilidade

de renúncia à retribuição, sendo assumida esta posição claramente pelo Supremo Tribunal de

Justiça em sumário: “é entendimento deste Supremo Tribunal que o contrato de “remissão

abdicativa” tem plena aplicação no domínio das relações laborais, designadamente quando as

partes se dispõem a negociar a cessação do vínculo pois, nessa fase, já não colhe o princípio da

indisponibilidade dos créditos laborais, que se circunscreve ao período de vigência do contrato

de trabalho, o que não exclui que tal contrato não possa ser tido como inválido, sempre que

concorra um vício na declaração da vontade, seja ele intrínseco ao agente ou motivado por

terceiros”55.

55 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de novembro de 2009, Processo n.º 274/07.6TTBRR.S1, disponível no website

www.dgsi.pt.

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No entanto, a doutrina vem discordando desta posição, pois entende que se não é

possível ceder o crédito, nos termos do art. 280.º do CT (com a exceção da parte penhorável56),

então também não se pode permitir a renúncia ao crédito retributivo (“se a lei proíbe o mais,

também proíbe o menos”).

4.4. Proibição de Compensação e Descontos

A compensação é um mecanismo que visa a extinção de obrigações, através do qual, no

lugar do cumprimento, o devedor opõe o crédito que tem sobre o credor.

Ao mesmo tempo que a divida se extingue, cobra-se também um crédito a que se tem

direito. Este mecanismo vem previsto no art. 847.º do CCivil, e exige, por um lado, que o crédito

seja exigível judicialmente, não podendo proceder contra ele exceção perentória, ou dilatória, e

por outro lado, exige que as duas obrigações tenham por objeto coisas fungíveis da mesma

espécie ou qualidade57.

O art. 848.º consagra a forma do negócio da compensação e prevê que o mesmo seja

feito por meio de declaração de uma das partes à outra. Este mecanismo diz respeito apenas à

compensação legal, na qual uma das partes, unilateralmente, a impõe à outra, com ou sem a

sua vontade.

No que diz respeito aos créditos retributivos é ainda vedado ao empregador a

possibilidade de descontar ou compensar a retribuição devida por conta da relação laboral, com

crédito que tenha sobre o trabalhador, nos termos do art. 279.º do CT.

A enumeração das exceções previstas no n.º 2 do referido preceito (limite de 1/6

previsto no n.º 3 (salvo al. a)), não é exaustiva na medida em que existem mais casos em que o

empregador pode, legitimamente, descontar ou deduzir no montante retributivo, na vigência do

contrato. Referimo-nos aos casos previstos no art. 247.º, n.º 2, ou seja, quando o trabalhador

em período de férias exerça outra atividade remunerada, sem que a exercesse conjuntamente

com o trabalho que presta ao empregador, ou sem o consentimento do empregador. Nestes 56 Cf. art. 738.º do Código de Processo Civil – em relação à retribuição, apenas é penhorável 1/3 da retribuição, tendo como limite máximo o

montante equivalente a três salários mínimos nacionais à data da apreensão, e como limite mínimo, o montante equivalente a um salário mínimo nacional.

57 Ressalva feita no n.º 2 da admissão de compensação parcial, no caso de as dívidas não serem de igual montante. O n.º 3 do mesmo preceito

legal consagra que a iliquidez da dívida não impede a compensação.

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casos, o empregador tem o direito de readquirir a retribuição de férias e o respetivo subsídio,

sendo que metade destes valores reverte para o órgão de gestão financeira da Segurança Social.

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5. Garantias dos Créditos Laborais

5.1. Termos Gerais

Se o empregador não cumprir voluntária e pontualmente a obrigação emergente do

contrato de trabalho a que está vinculado, sobretudo a essencial obrigação retributiva, o

trabalhador pode lançar mão de mecanismos para a realização coativa da prestação devida,

tendo em vista a satisfação do seu crédito, executando o património do devedor, nos termos

gerais do Código Civil58.

Ainda nos termos gerais do direito civil, pelo cumprimento das obrigações respondem

todos os bens do devedor suscetíveis de penhora (ressalva feita aos regimes previstos em

legislação especial)59.

Não obstante esta garantia geral que, em princípio, abrange todo o património do

empregador indiscriminadamente, situações há em que nem todo o património do devedor é

suscetível de satisfazer os créditos laborais. Como explica ROMANO MARTINEZ60, por um lado pode

ter sido consagrado um acordo de limitação de responsabilidade nos termos do art. 602.º do

CCivil. Ou por outro lado podem existir proibições, convencionais ou legais, quanto à disposição

de certos bens do seu património.

Pode ainda suceder que haja mais do que um credor laboral e o património do

empregador não seja suficiente para satisfazer os créditos em dívida. Assim, o art. 604.º do

CCivil consagrou o princípio par condicio creditorum, procedendo-se assim ao rateio dos

créditos, sendo os trabalhadores pagos de forma proporcional, em função do valor global do

património do empregador e do montante do crédito de cada um dos credores,

independentemente da data da constituição de cada crédito.

Ainda assim, pode o património do empregador ser insuficiente para a satisfação dos

créditos dos credores laborais, pelo que o legislador laboral, com o intuito de assegurar o

pagamento das prestações pecuniárias aos trabalhadores, estabeleceu um regime próprio de

58 Cf. art. 817.º do CCivil.

59 Cf. art. 601.º do CCivil.

60 Martinez, Pedro Romano in “Garantia dos Créditos Laborais. A responsabilidade solidária instituída pelo Código do Trabalho, nos artigos 378.º

e 379.º”, RDES, abril-dezembro de 2005, n.ºs 2, 3 e 4, pág. 222.

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garantias, recorrendo aos privilégios creditórios e ao Fundo de Garantia Salarial, como

analisaremos de seguida.

5.2. Privilégios Creditórios

O Código do Trabalho prevê nos arts. 333.º e segs., formas de garantia dos créditos do

trabalhador em caso de incumprimento contratual por parte do empregador.

O que o legislador pretende é consagrar uma série de recursos (privilégios creditórios)

que permitam ao trabalhador a satisfação de créditos que derivem do “contrato de trabalho, ou

da sua violação ou cessação”. Como se retira da letra da lei, aqui não está só em causa a

recuperação do crédito relativo à retribuição.

Neste sentido, o art. 333.º do CT inclui todos os créditos derivados da celebração e

execução do contrato de trabalho, onde de integram os créditos retributivos, bem como os

créditos resultantes da violação da relação laboral e da própria cessação do contrato.

O não cumprimento, pelo empregador, da obrigação retributiva, traduz-se na mora61, que

pode ser o incumprimento da prestação retributiva, ou o atraso no cumprimento da prestação. A

mora quer diga respeito ao incumprimento definitivo quer ao incumprimento temporário, no que

concerne às obrigações pecuniárias, que normalmente caracterizam a prestação retributiva

devida ao trabalhador, confere ao credor o direito a uma indemnização, correspondente ao juro

legal fixado, nos termos do art. 806.º do CCivil.

Em matéria laboral, o art. 323.º do CT consagra igualmente o direito de o trabalhador

ser indemnizado com os respetivos juros, pelo não cumprimento tempestivo da prestação

retributiva, conferindo-lhe ainda a possibilidade de resolver o contrato com justa causa com

direito a indemnização, nos termos do art. 394.º, n.os 1 e 2, al. a), do referido diploma legal.

Os privilégios creditórios dizem respeito a uma garantia de um credor, ou seja, do

trabalhador, a ser pago com preferência em relação aos demais credores que eventualmente

possam existir.

61 Cf. art. 804.º e segs. do CCivil.

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Os privilégios creditórios previstos no art. 333.º, podem ser divididos em duas

categorias: privilégios mobiliários gerais e privilégios mobiliários especiais.

Os privilégios mobiliários gerais62, dizem respeito ao património do empregador, isto é, os

créditos laborais dos trabalhadores são graduados com preferência63 aos créditos constantes do

art. 747.º, n.º 1 do CCivil64, ou seja, preferem aos demais créditos com privilégio mobiliário geral,

e com privilégio mobiliário especial referidos no art. 747.º do CCivil, sucumbindo apenas aos

privilégios dos créditos constantes de despesas de justiça, nos termos do art. 746.º do CCivil, e

art. 333.º, n.º 1 al. a) e n.º 2 alínea a) do CT.

O regime laboral consagra ainda aos trabalhadores os privilégios mobiliários especiais

sobre “o bem imóvel do empregador no qual o trabalhador presta a sua atividade”, que são

graduados com preferência aos créditos previstos no art. 748.º do CCivil65, e ao crédito relativo à

contribuição para a Segurança Social66. Além disso, ainda prevalece sobre os direitos reais de

gozo, e de garantia de terceiro anteriormente conferida sobre o mesmo bem, nos termos do art.

751.º do CCivil67.

5.3. Responsabilidade Solidária das Sociedades em Relação de Domínio

ou de Grupo

O art. 334.º do CT68 prevê a possibilidade de o trabalhador reclamar a satisfação de

créditos laborais (todos os créditos emergentes da celebração da execução do contrato de

trabalho, da violação e sua cessação, nos quais de incluem os créditos remuneratórios, a

62 Cf. arts. 736.º e 737.º do CCivil.

63 Cf. art. 737.º, n.º 1 al. d) e n.º 2 do CCivil- respetivamente “1. Gozam de privilégio geral sobre os móveis: […] d) Os créditos emergentes do contrato de trabalho, ou da violação ou cessação deste contrato, pertencentes ao trabalhador e relativos aos últimos seis meses.”; 2. – “O prazo de seis meses referido nas alíneas b), c) e d) do número anterior conta-se a partir da morte do devedor ou do pedido de pagamento.”

64 Cf. art. 747.º do CCivil – “a) Os créditos por impostos, pagando-se em primeiro lugar o Estado e só depois as autarquias locais; b) Os créditos por fornecimentos destinados à produção agrícola; c) Os créditos por dívidas de foros; d) Os créditos da vítima de um facto que dê lugar a responsabilidade civil; e) Os créditos do autor de obra intelectual; f) Os créditos com privilégio mobiliário geral, pela ordem segundo a qual são enumerados no artigo 737.º”. 65 Cf. art. 748.º do CCivil – “Os créditos com privilégio imobiliário graduam-se pela ordem seguinte: a) Os créditos do Estado, pela contribuição predial, pela sisa e pelo imposto sobre as sucessões e doações; b) Os créditos das autarquias locais, pela contribuição predial”.

66 Cf. art. 333.º, n.º 1 al. b) e n.º 2 alínea a) do CT.

67 Cf. art. 751.º do CCivil – “Os privilégios imobiliários especiais são oponíveis a terceiros que adquiram o prédio ou um direito real sobre ele e preferem à consignação de rendimentos, à hipoteca ou ao direito de retenção, ainda que estas garantias sejam anteriores”.

68 O art. 334 do CT é um regime especial em relação ao regime supletivo previsto no art. 501.º do CSC.

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qualquer das sociedades a que o empregador, sendo uma sociedade comercial, esteja em

relação de coligação societária69.

Este preceito consagra assim a responsabilidade solidária através da qual a sociedade

ou sociedades com as quais o empregador se encontre em relação de participações recíprocas,

de domínio ou de grupo, são solidariamente responsáveis pelos créditos laborais, devidos ao

empregador, vencidos há mais de três meses 70 . A obrigação é solidária porque o credor

(trabalhador) “pode exigir a prestação integral de qualquer dos devedores e a prestação

efectuada por um deles libera a todos perante o credor comum”71. O dever de prestação integral

recaí assim sobre qualquer um dos devedores e em consequência da prestação dá-se o efeito

extintivo recíproco da satisfação dada por qualquer dos devedores ao direito do credor72, ou seja,

a prestação integral por um dos devedores aos restantes liberta.

No plano das relações internas, a sociedade que satisfaça créditos laborais do

trabalhador, tem o direito de regresso pela totalidade do montante pago, contra o co-devedor73,

não sendo possível ao empregador afastar este regime, nem com o consentimento do

trabalhador.

Uma vez que a função desta previsão normativa é a de garantir o cumprimento do

contrato de trabalho, basta a existência de uma coligação para operar o instituto da

responsabilidade solidária, pelo que se prescinde da alegação e prova por parte do trabalhador,

sendo assim o único requisito procedimental o vencimento do crédito ter mais de três meses74.

5.4 Responsabilidade de Sócio, Gerente, Administrador ou Diretor

Se o empregador for uma sociedade comercial, a legislação laboral, através do art. 335.º

do CT, confere ao trabalhador a possibilidade de demandar quer os sócios75, quer os gerentes,

69 Cf. art. 482.º do CSC.

70 Martinez, Pedro Romano in “Garantia...”, pág. 234.

71 Cf. art. 512.º, n.º 1 do CCivil.

72 Varela, João de Matos Antunes, op. cit., pág. 751.

73 Cf. art. 524.º do CCivil.

74 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 584. 75 A lei limita a responsabilidade aos chamados “sócios-controladores”, nos termos do art. 83.º do CSC.

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quer os administradores ou diretores da respetiva sociedade76, tendo em vista a satisfação dos

créditos laborais vencidos há mais de três meses.

Como explica BERNARDO LOBO XAVIER77, estamos perante uma situação de “responsabilidade civil

extracontratual verdadeira e própria, fundada na actuação ilícita e culposa do sujeito que se

pretende demandar e num dano causado ao trabalhador”. Neste seguimento, cumpre ao

trabalhador alegar e provar os pressupostos da responsabilidade civil, nos termos do art. 483.º

do CCivil isto é, facto ilícito, dano, culpa, nexo de causalidade.

5.5. Pagamento pelo Fundo de Garantia Salarial

O art. 336.º do CT consagra, a favor do trabalhador, uma última garantia do pagamento

dos créditos laborais emergentes de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, que não

possam ser pagos pelo empregador devido a insolvência ou insuficiência económica.

No seguimento da legislação comunitária mormente, Diretiva n.º 80/787/CEE, de 20 de

outubro de 1980, alterada pela atual Diretiva n.º 2008/94/CE, de 22 de outubro de 2008,

surge o Fundo de Garantia Salarial, nos termos do decreto-lei n.º 219/99, de 15 de junho.

A instituição do Fundo de Garantia Salarial visa assegurar o pagamento dos créditos

laborais, em caso de insolvência ou insuficiência económica do empregador e, nas palavras de

LEAL AMADO 78 , acaba por funcionar “como uma espécie de fiador ope legis das obrigações

emergentes do contrato de trabalho”.

Atualmente, o Fundo de Garantia Salarial vem previsto no art. 336.º do CT, e por força

do art. 12.º n.º 6 al. o) da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o novo Código do

Trabalho, enquanto não for publicada a legislação especial sobre o Fundo de Garantia Salarial,

mantêm-se em vigor os artigos 317.º a 326.º da anterior Regulamentação do Código do

Trabalho aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de julho.

O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos emergentes do

contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, que se tenham vencido nos seis meses

76

Cf. art. 78.º e 78.º do CSC.

77 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 594.

78 Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 334.

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anteriores à propositura da ação de declaração de insolvência do empregador ou da

apresentação do requerimento para promover o procedimento de conciliação previstos no

Código da Insolvência (arts. 336.º do CT e 337.º a 319.º da RCT), com o limite de pagamento

até ao valor equivalente a seis meses de retribuição, não podendo cada mês de retribuição

ultrapassar o triplo da remuneração mensal mínima garantida (art. 320.º do RCT)79.

Depois de efetuado o pagamento pelo Fundo de Garantia Salarial este último subroga-se

na posição do trabalhador em relação ao crédito sobre o empregador, podendo exigir o

cumprimento dos direitos do trabalhado nos termos do art. 322.º do RCT.

79 Martinez, Pedro Romano in “Garantia...”, pág. 231.

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6. Retribuição-Noção, Elementos e Modalidades de Retribuição

Juridicamente, a retribuição configura nada mais do que a obrigação nuclear a cargo do

empregador como contraprestação de um trabalho prestado80.

Citando o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 20 de fevereiro de 2008 “A

retribuição abrange assim o conjunto de valores que, nos termos do contrato, das normas que o

regem ou dos usos, a entidade empregadora está obrigada a pagar regular e periodicamente ao

trabalhador em razão da actividade por ele desempenhada, presumindo-se, até prova em

contrário, constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade empregadora ao

trabalhador” 81.

Apesar da aparente simplicidade da definição, é inegável a conflitualidade existente no

que concerne à interpretação do conceito de retribuição82, mais propriamente no que se refere

ao enquadramento jurídico de algumas prestações realizadas pelo empregador e à respetiva

integração ou não das mesmas como prestações retributivas. Bem assim como a terminologia

utilizada para a referência à retribuição nas leis laborais é bastante diversificada83.

Desde logo o termo salário84 é referido pela CRP no art. 59.º, n.º 1 al. a) in fine, sendo

também usual nos instrumentos de regulamentação coletiva e em leis laborais avulsas,

nomeadamente, na Lei dos Salários em Atraso e Lei do Salário Mínimo. Já o termo retribuição é

referido na CRP, na primeira parte do n.º 1 do seu art. 59.º, bem como no CT (nomeadamente

no art. 258.º do CT).

Por último, o termo remuneração, é utilizado no direito originário da União Europeia (art.

157.º do TFUE) e é comummente utilizado em instrumentos de regulamentação coletiva de

trabalho e pela doutrina.

Distingue-se a remuneração em sentido amplo e a remuneração em sentido estrito (ou

retribuição). De acordo com esta diferenciação, a retribuição em sentido estrito corresponde à

80 Xavier, Bernardo in “Introdução ao estudo da retribuição no direito do trabalho português”, Revista de Direito e Estudos Sociais, Ano XXVIII (I

da 2ª série) n.º 1, janeiro-março de 1986, Coimbra 1986, Almedina, pág. 67.

81 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de fevereiro de 2008, Processo n.º 7354/2007-4, disponível no website www.dgsi.pt.

82 Utiliza-se comummente terminologia variada sobre a matéria da “retribuição”, tal como “remuneração”, “salário”, “ordenado”, “vencimento”,

etc.. No entanto aplicaremos indistintamente estes conceitos, como sendo a contrapartida da prestação do trabalho devida pelo empregador.

83 Ramalho, Maria do Rosário Palma in “Tratado...”, pág. 569 e 570.

84 Como explica Sónia Preto, in “Alguns aspectos da retribuição: I A remuneração durante as férias½”, Revista de Direito e Estudos Sociais, n.º

1/3, janeiro-setembro de 2013, Coimbra 2014, Almedina, pág. 244, “Sal é a raiz etimológica da palavra salarium (radical de salário) forma de

pagamento aos soldados romanos.”

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prestação patrimonial, em dinheiro ou em espécie, regular e periódica, que é devida ao

trabalhador, por força do contrato, das normas que o regem e dos usos, como contrapartida do

seu trabalho. Por outro lado, a remuneração em sentido amplo diz respeito ao conjunto de

vantagens patrimoniais de que o trabalhador beneficia em razão do seu contrato de trabalho e

que podem ou não decorrer do trabalho prestado.

Para MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO85 a distinção doutrinal referida deve ser mantida e

a sua utilidade deve-se a dois pontos essenciais. Em primeiro lugar, porque o conceito é

associado ao princípio da irredutibilidade consagrado no art. 129.º, n.º 1 al. d) do CT, permitindo

esta distinção “isolar as prestações remuneratórias que se sujeitam a este princípio, não

podendo, por consequência, ser retiradas ou diminuídas, das restantes prestações patrimoniais,

que, por expressa determinação da lei, não se sujeitam à regra da irredutibilidade”. Em segundo

lugar, diz a autora que é importante levar em consideração a divergência dos conceitos de

retribuição e remuneração para efeitos de interpretação de outras fontes normativas 86 que se

referem ao termo remuneração em sentido amplo.

Do ponto de vista dos trabalhadores o seu salário é considerado um rendimento de

subsistência e de satisfação de necessidades pessoais e familiares, sendo esta uma visão social.

No entanto, a retribuição não é a mera contraprestação do trabalho prestado, uma vez que

aquela tem diversas funcionalidades ou seja, nem tudo o que o trabalhador recebe do

empregador é retribuição em sentido técnico87.

Por conseguinte, para o empregador a retribuição não equivale a todo o custo de

trabalho efetivo, uma vez que este tem outros encargos, tais como os custos previdenciais,

despesas com seguros de trabalho, segurança e higiene no trabalho. E, da mesma forma, o

trabalhador sabe que a retribuição auferida não equivale a todas as suas necessidades pessoais

e familiares, destacando-se a título exemplificativo, os cuidados de saúde familiar e as despesas

inerentes à educação.

E o Direito (laboral) pretende somente conciliar estes interesses divergentes, tendo uma

participação regulativa que visa “garantir uma existência condigna e a prossecução de um bem

85 Ramalho, Maria do Rosário Palma in “Tratado...”, pág. 571.

86 Cf. art. 157.º do TFUE, Diretiva 117/75/CE, de 10 de fevereiro de 1975 e Diretiva n.º 2006/54/CE, de 5 de julho de 2006, sobre o princípio

da igualdade de remuneração entre trabalhadores de sexos diferentes.

87 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 533 e segs.

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comum”, não deixando esta matéria apenas nas mãos dos seus principais atores88, e sobretudo

promovendo a proteção da parte mais débil da relação jurídica laboral, que na maior parte dos

casos se consubstancia no trabalhador. A este propósito convém indicar que o próprio legislador

consagrou na al. d) do n.º 1 do art. 129.º do CT o princípio da irredutibilidade salarial, feitas as

devidas ressalvas aos casos expressamente previstos naquele diploma legal ou em IRCT, a que

mais à frente faremos uma referência mais aprofundada.

6.1. Cálculo do Montante Retributivo

Ao fazer uma análise do sistema retributivo facilmente se conclui que a forma de fixação

do montante da retribuição depende de variadíssimos fatores.

Para aferir do montante retributivo, além da quantificação da prestação fixada em função

do tempo, nos termos do art. 59.º, n.º 1 al. a) da CRP, considera-se ainda a atribuição de

retribuição em função do posto de trabalho ou categoria (isto é, retribuição em função da

natureza), retribuição em função da performance ou mérito no desempenho da função

(qualidade), e retribuição em função da evolução na empresa – aqui referimo-nos à antiguidade.

É ainda de ressalvar quanto à fixação do montante retributivo o limite legalmente

imposto através da chamada “retribuição mínima mensal garantida”, comummente salário

mínimo, previsto nos arts. 273.º a 275.º do CT.

A este propósito deve ser referido que, nos termos do art. 59.º, n.º 2 al. a), compete ao

Estado interferir diretamente no estabelecimento e atualização do salário mínimo, atribuído a

nível nacional, intercategorial e interprofissional, fixado em ordem a satisfazer necessidades de

subsistência dos trabalhadores, e que, configuram geralmente o mínimo, relativamente ao qual

não pode ser estabelecido montante retributivo mais baixo, com exceção dos casos de

trabalhadores em fase formativa, como sejam os aprendizes, praticantes, estagiários, e

trabalhadores com capacidade de desempenho reduzida.

88 Cf. art. 59.º, n.º 1 al. a) e n.º 2 al. a), ambos da CRP.

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O n.º 4 do art. 274.º do CT vem esclarecer que este montante mínimo garantido não

inclui subsídios, prémios, gratificações ou outras prestações a estas equiparadas89.

6.2. Retribuição em Concreto e Retribuição Modular

O problema da aferição do cálculo da prestação retributiva coloca-se em dois patamares:

a) determinação em concreto da retribuição, quando a mesma não se encontra fixada pelo

contrato de trabalho; b) determinação em abstrato da prestação retributiva.

Ou seja, a questão que se levanta é a de saber “quanto recebe um qualquer trabalhador

por mês considerando, em abstrato, determinados pressupostos padronizados”90.

Como explica BERNARDO LOBO XAVIER91, “a retribuição em concreto diz respeito a saber o

quantitativo devido a um trabalhador, que prestou serviços num dado mês, com esta ou aquela

assiduidade e faltas, justificadas ou não, com a produtividade apurada, nestas e naquelas

condições (tantos dias de turno, tantos dias de trabalho nocturno, etc.). A retribuição em

abstrato tem a ver com o montante que o trabalhador ganha num (qualquer) mês e, portanto,

com um apuramento médio, padronizado, que se torna necessário fazer para lhe definir direitos

no plano do contrato de trabalho”.

Normalmente, o montante retributivo em concreto vem expressamente previsto no

contrato de trabalho outorgado, mas pode suceder que as partes não tenham determinado a

prestação retributiva no mesmo. Neste caso, o montante retributivo, direta ou indiretamente,

pode resultar de cláusula prevista em convenção coletiva para a categoria ou função que o

trabalhador exerce no seio da empresa, isto é, as partes podem, aquando da celebração do

contrato de trabalho, não determinarem o quantum retributivo, acordando (ainda que

tacitamente) fazer equivaler a prestação retributiva devida, ao valor que os trabalhadores da

mesma categoria, ou com as mesmas funções, recebem de acordo com convenção coletiva que

fixa a tabela salarial da empresa, mesmo que a eles não lhes seja aplicada tal convenção, por

não serem trabalhadores sindicalizados.

89 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 535 e segs.

90 Preto, Sónia, op. cit., pág. 258.

91 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 566.

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Se não houver fixação expressa do valor da retribuição no contrato de trabalho, nem

resultar de normas aplicáveis ao contrato, pois não vigora qualquer convenção coletiva no seio

da empresa em questão, sempre pode o montante retributivo em concreto ser determinado

judicialmente, nos termos do art. 272.º, n.º 1 do CT.

Por outro lado, além da dificuldade de determinação do quantum retributivo nos casos

que referimos, é também difícil a aferição em concreto do montante retributivo nos casos em

que os critérios consagrados no contrato de trabalho ou na lei, para a determinação da

retribuição não são suficientemente claros. Porquanto, as mais das vezes, a terminologia

utilizada nos mesmos parece afastar-se da retribuição base, cuja principal função é a fixação de

um critério para o cálculo dos complementos remuneratórios, os quais são calculados com

recurso a percentagens do “valor hora”, “valor dia” ou “valor mês”.

Considera BERNARDO LOBO XAVIER92 que a retribuição base e diuturnidades, previstas no

art, 262.º, n.º 1 do CT, deverão ser consideradas como a base de cálculo para a determinação

dos complementos remuneratórios, uma vez que se corre o risco de se utilizar um método que

implique uma “duplicação”, isto é, “não se pode, por exemplo, computar o subsídio de turno (ou

subsídio por trabalho nocturno) com base na «retribuição» e depois dizer-se que esse mesmo

subsídio integra a «retribuição»”. No entanto considera o referido autor que, a título excecional,

existem prestações complementares cujos cálculos serão feitos após a determinação de outros

complementos remuneratórios, dependendo da previsão legal ou convencional aplicável que

estabeleça tais prestações complementares. Em suma, a determinação em concreto do

montante da retribuição, depende da previsão legal ou convencional a determinação da forma de

cálculo dos complementos remuneratórios, uma vez que, em certos casos recorre-se à

“retribuição base” e, noutros casos, à “retribuição base integrada com complementos”.

No entanto, há casos, como o previsto no art. 393.º, n.º 2 al. a), que se refere às

prestações a que o trabalhador tem direito por ilicitude do despedimento, em que surge a

necessidade de determinar o valor da “retribuição”, consagrando a estrutura remuneratória que

integra o “estatuto” do trabalhador93. Essa determinação só pode ser aferida a posteriori, e diz

respeito ao conjunto de atribuições patrimoniais pagas pelo empregador durante um

determinado período de tempo ao longo do contrato de trabalho. Trata-se de determinar a

92 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 568. 93 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.400.

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estrutura retributiva de um trabalhador, de forma a criar critérios de cálculo para aferir o valor

padrão, ou o módulo, do esquema remuneratório do trabalhador, em referência a uma unidade

de tempo. Assim, a legislação laboral refere bastantes vezes, para a determinação do montante

indemnizatório, um período temporal padrão de retribuição, sendo esse montante, portanto,

abstrato (mas determinável), a retribuição modular.

Como explica MONTEIRO FERNANDES94, “o critério legal constitui, assim, o instrumento de

despiste dos valores que, no seu conjunto, têm como nexo de correspectividade com a posição

obrigacional do trabalhador, encarada também na sua globalidade. Ele serve, então, para definir

a posteriori uma base de cálculo para certos valores derivados”.

O art. 258.º do CT considera, assim, que a “retribuição” se reporta a períodos padrão de

duração recorrendo, nomeadamente, a unidades de tempo (hora, dia, mês) cujo valor seja

devido ao trabalhador. Importa, então, não considerar a retribuição devida num certo mês pelo

trabalho prestado naquele período, mas antes considerar um módulo, um valor teórico,

padronizado (abstrato) que se refere a um hipotético período de duração (hora, dia ou mês).

Na opinião de BERNARDO LOBO XAVIER 95 , a legislação laboral concede os elementos

essenciais, no art. 258.º, n.º 2 do CT, para se aferir da retribuição abstrata. O autor diz que a

ideia de regularidade e periodicidade é um “elemento necessário para definir sem distorção o

que é retribuição-tipo ou modular durante um período padrão de tempo (dia ou hora) e que

constitui medida ou base de cálculo de inúmeros direitos consignados nas normas de trabalho”.

Ou seja, são excluídas do cálculo do módulo ou padrão retributivo, isto é, da retribuição abstrata

ou modular, todas as prestações que são esporádicas, extraordinárias ou atípicas, como sejam

as que decorrem de exclusões diretas da lei, as atribuições que não têm caráter temporal,

nomeadamente a atribuição de telemóvel ou uso de carro da empresa e prestações que têm a

sua atribuição dependente de regras próprias.

No que concerne à determinação da retribuição abstrata, ou retribuição modular, o

Supremo Tribunal de Justiça 96 entende que mesmo “o facto das prestações periódica e

regularmente recebidas pelo trabalhador integrarem, em princípio, o conceito de retribuição não

significa que linearmente tenham de ser levadas em conta para efeitos de cálculo das prestações

94 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.401.

95 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 570. 96 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17 de janeiro de 2007, Processo n.º 06S2188, disponível no website www.dgsi.pt.

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cujo montante se encontra indexado ao valor da retribuição, como, por exemplo, acontece com a

retribuição de férias e os subsídios de férias e de Natal. A retribuição a atender para esse efeito

não é a retribuição global, mas sim a chamada retribuição modular ou padrão, da qual devem

ser excluídas aquelas prestações cujo pagamento não é justificado pela prestação de trabalho

em si mesma, mas por outra razão de ser específica”.

Em suma, se se atendesse a um regime “homogéneo” da retribuição para qualquer

circunstância retributiva, sem mais, surgiriam soluções bastante injustas e desajustadas, quanto

ao cálculo da prestação retributiva 97 . Por um lado, as prestações complementares iam ser

calculadas em função da retribuição e, por outro lado, essas mesmas prestações

complementares integravam a atribuição retributiva. Pelo que, a qualificação de certa prestação

como integrante do padrão da prestação retributiva do trabalhador, definido pelo art. 258.º do

CT, “não afasta a possibilidade de se ligar a essa atribuição patrimonial uma cadência própria,

nem a de se lhe reconhecer irrelevância para o cálculo deste ou daquele valor derivado da

«retribuição». O «ciclo vital» de cada elemento da retribuição depende do seu próprio regime

jurídico, cuja interpretação há-de pautar-se pela específica razão de ser ou função desse

elemento na fisiologia da relação de trabalho” 98.

6.3. A Retribuição como Elemento Essencial

Lê-se no art. 258.º do Código do Trabalho que “considera-se retribuição a prestação a

que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito

em contrapartida do seu trabalho”. A retribuição enquanto elemento essencial do contrato de

trabalho, não é mais do que o “preço” da atividade prestada pelo trabalhador, isto é, a sua força

de trabalho. Significa isto que, se excluem do regime jurídico do contrato de trabalho, as formas

de trabalho não remunerado, como sejam as ações de mera cortesia, de boa vizinhança,

voluntariado e qualquer outro género de atividades prestadas de forma gratuita. Como diz

BERNARDO LOBO XAVIER99, “em traços gerais, do ponto de vista jurídico, a retribuição costuma

perfilar-se como a obrigação essencial a prestar no contrato de trabalho pelo empregador,

obrigação de índole patrimonial e marcadamente pecuniária, devida em todos os casos e não 97 “Duplicação” nas palavras de Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 568.

98 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.402.

99 Xavier, Bernardo Lobo in “Introdução...”, 1986.

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tendo carácter meramente eventual, ligada por uma relação de reciprocidade à actividade

prestada, tendo nela a sua causa”.

A previsão legal do conceito de retribuição indica que, a mesma envolve uma prestação

de bens, normalmente sempre em dinheiro, por parte do empregador e específica que, ainda

que possa existir prestações não pecuniárias e na medida em que estas se destinem à

satisfação de necessidades pessoas do trabalhador ou da sua família, o valor destas prestações

não pode exceder o valor da prestação pecuniária100. Ora, quanto a este aspeto o n.º 2 do art.

259.º do CT estabelece que as prestações em espécie não podem exceder a parte em dinheiro,

salvo se o instrumento de regulamentação coletiva o permitir. No entanto, é nosso entendimento

que se aplica a este preceito a limitação do salário mínimo nacional, uma vez que a al. e) do n.º

2 do art. 274.º, prevê o limite de que o total das prestações em espécie não pode exceder 50%

do valor da retribuição mínima mensal. Assim sendo, e porque o art. 274.º, n.º 2 al. e) tem

carácter imperativo, é nossa opinião que quando a retribuição de um trabalhador seja de

montante igual ao salário mínimo nacional, não pode o instrumento de regulamentação coletiva

ultrapassar aquele limite, levando em consideração o art. 3.º, n.º3 al. j) do CT.

O n.º 2 do art. 258.º, na tentativa de especificar os elementos que integram o conceito

de retribuição, vem dizer que a retribuição compreende a retribuição base e outras prestações

regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie. Ora, lido este

n.º 2 concluímos facilmente que a retribuição não se refere exclusivamente a uma prestação

devida ao trabalhador em contrapartida do seu trabalho, uma vez que a obrigação do

empregador ao pagamento da retribuição permanece ainda que não haja uma correspondência

com o trabalho efetivamente prestado. Os casos a que nos referimos, a título exemplificativo, são

o pagamento da retribuição do período de férias prevista no art. 264.º, a retribuição

correspondente a feriado prevista no art. 269.º, o pagamento de retribuição nos casos de faltas

justificadas nos termos do art. 255.º, a retribuição durante o encerramento ou diminuição de

atividade prevista no art. 309, que claramente constituem exceção à típica relação sinalagmática

do contrato de trabalho.

100 Cf. art. 259.º do CT.

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No entanto, o n.º 3 do mesmo preceito vem alagar o conceito de retribuição,

estabelecendo uma presunção ilidível 101 , de que qualquer prestação do empregador ao

trabalhador integra a retribuição deste último.

Em termos gerais, podemos salientar que o conceito de retribuição consagrado no art.

258.º do CT, evidencia quatro características essenciais: a) prestação devida ao trabalhador por

título contratual legal; b) como contrapartida do seu trabalho; c) prestações regulares e

periódicas; e d) em dinheiro ou em espécie.

6.4. Componentes da Retribuição

Ainda na missão de caracterizar a prestação retributiva, a lei (art. 261.º) consagra três

modalidades de retribuição, isto é, a retribuição pode ser certa, variável ou mista. Em primeiro

lugar é de referir que a retribuição é devida pelo empregador ao trabalhador, ainda que ele não

possa efetivamente prestar a sua atividade devido a circunstâncias que lhe são alheias, isto é, na

vida empresarial de uma sociedade e na pendência de um contrato de trabalho, momentos há

em que o volume de produção oscila, ou a procura de certo produto diminui, e portanto, embora

o trabalhador esteja disponível para executar as funções a que foi afeto, o mesmo não as podem

realizar por circunstâncias adversas e que a ele não são imputáveis, o que não significa que o

empregador possa, legitimamente, deixar de cumprir a sua obrigação retributiva, uma vez que a

retribuição deverá ser a contrapartida do trabalho (e portanto a disponibilidade de o prestar) e

não de uma específica prestação de trabalho, neste sentido vem o Tribunal da Relação de

Coimbra sublinhar que “resulta explicitamente da norma cujo conteúdo acaba de transcrever-se

que só deve ter-se por retribuição aquilo a que o trabalhador tem direito como contrapartida da

sua disponibilidade para o trabalho”102.

A retribuição certa é calculada em função do tempo de trabalho e define por exclusão a

parte variável, que é calculado em função de outros fatores. O tempo de trabalho, a que se

refere o n.º 2 do art. 261.º do CT encontra-se definido no art. 197.º, n.º 1 do CT, sendo

“qualquer período durante o qual o trabalhador exerce a atividade ou permanece adstrito à

realização da prestação, bem como as interrupções e os intervalos” previstos do n.º 2 do

101 Cf. arts. 349.º e 350.º, n.º 2 do CCivil – presunção iuris tantum de omnicompreensividade- pode ser afastada mediante prova em contrário. 102 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 3 de maio de 2014, Processo n.º 601/13.7TTVIS.C1, disponível no website www.dgsi.pt.

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mesmo preceito legal. O tempo de trabalho é medido em número de horas por dia e por

semana, ou seja, determinação das horas de início e do termo do período normal de trabalho,

sendo que o período normal de trabalho é o período de tempo que o trabalho se obriga a

prestar, conforme consta no art. 198.º do CT e tem como limite máximo, nos termos do art.

203.º do mesmo diploma legal, as oito horas por dia e quarenta horas por semana. Citando o

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de junho de 2000, “A lei limita-se, assim, a fixar

limites máximos para a duração dos períodos normais de trabalho mas não delimita estes

períodos que, inquestionavelmente, podem ser inferiores a esses máximos”, e esclarece ainda

que “As entidades patronais podem, assim, em princípio, alterar o horário de trabalho do seu

pessoal mas, sendo esse horário a determinação das horas do início e do turno do período

normal de trabalho e sendo este o número de horas que o trabalhador se obrigou a prestar, não

podem alterar o horário de trabalho, unilateralmente, para além da duração do período

normal. O período normal de trabalho, repete-se, sendo "o número de horas de trabalho que o

trabalhador se obrigou a prestar", é acordado pelas partes, que não podem exceder os limites

máximos estabelecidos para a duração do trabalho”103.

A retribuição variável, como referimos supra, não é calculada com base no tempo de

trabalho, mas sim calculada em função do resultado ou rendimento do trabalho prestado 104.

Embora o contrato de trabalho seja um negócio jurídico em que o trabalhador se vincula a

prestar uma atividade sob direção do empregador em contrapartida de uma retribuição, ou seja,

o trabalhador compromete-se a prestar uma atividade e não a obter um certo resultado, isto não

significa que parte da sua retribuição não possa ser variável (contando que não ultrapasse o

limite previsto no art. 273.º, n.º 1 referente à garantia de retribuição mínima mensal). Embora a

obrigação a que o trabalhador se vinculou seja a de prestar uma atividade (e não à obtenção de

um resultado), a verdade é que o cálculo da parte variável passa por apurar o resultado da

atividade gerada pelo trabalhador, de forma a determinar o montante patrimonial devido pelo

empregador e não tanto por apurar se o trabalhador executou ou não as suas obrigações, com o

devido zelo e diligência105. Na verdade, se o trabalhador não atingir certo resultado não está a

incumprir as obrigações decorrente do contrato de trabalho a que se vinculou, mas o fracasso na

103 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 6 de junho de 2000, Processo n.º 99S346, disponível no website www.dgsi.pt. 104 Distingue-se dos lucros na medida em que se trata de uma retribuição de um resultado concreto do trabalhador e não de um resultado global

da empresa.

105 Cf. art. 128.º, n.º 1 al. c) do CT.

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obtenção de certo resultado vai-se repercutir negativamente na parte variável da retribuição a

que tem direito.

A razão de ser da retribuição variável prende-se maioritariamente com motivos de

incentivo à competição entre trabalhadores de modo a aumentar a produtividade da empresa,

podendo no entanto ter impactos negativos na vida pessoal dos trabalhadores uma vez que,

normalmente, gera ritmos de trabalho excessivos, afeta a solidariedade entre colegas de trabalho

tornando o ambiente de trabalho mais hostil. A 2ª parte do n.º 3 do art. 261.º do CT ao

estabelecer que se considera a média dos montantes das prestações correspondentes aos

últimos dozes meses, ou ao tempo de execução de contrato que tenha durado menos tempo

quando não se aplique o respetivo critério, indica que as partes definem o critério para o

apuramento da parte variável da prestação retributiva a priori, sendo que a 2ª parte do n.º 3 do

art. 261 do CT, só se aplica no silêncio das partes quanto ao apuramento deste valor,

configurando assim um regime supletivo.

A retribuição mista, como a própria denominação indica, é constituída por uma parte

certa e outra variável. Para o cálculo da retribuição variável, o legislador nos termos do n.º 3 do

art. 261.º do CT, considera a “média dos montantes das prestações correspondentes aos

últimos dozes meses ou ao tempo da execução do contrato que tenha durando menos tempo”.

Os tribunais portugueses têm entendido que o empregador pode, legitimamente, alterar de modo

unilateral a componente da retribuição mista, por exemplo, subindo a parte fixa e reduzindo a

variável, desde que não haja redução da retribuição que o trabalhador aufere, respeitando a

garantia de irredutibilidade salarial prevista no art. 129.º, al. d) do CT106.

Levando em consideração os dados apresentados, já é possível esboçar o conceito de

retribuição no âmbito laboral. Não obstante, é necessário persistir no estudo desta matéria com

o intuito de auxiliar o intérprete da lei no que concerne à aplicação deste conceito para efeitos de

retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

Assim, numa primeira e breve abordagem podemos desde já afirmar que a retribuição

integra a retribuição base e as prestações complementares e acessórias que sejam regulares e

periódicas e, citando o Supremo Tribunal de Justiça: “o conceito de retribuição tem vários

sentidos, podendo falar-se em remuneração em sentido amplo, que abrange as diversas

106 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de janeiro de 2008, Processo n.º 07S3786, disponível no website www.dgsi.pt.

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prestações remuneratórias de que o trabalhador beneficia, e retribuição em sentido estrito ou

técnico-jurídico. A retribuição em sentido estrito ou técnico-jurídico abrange o conjunto de valores

pecuniários ou não que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o

empregador está obrigado a pagar, regular e periodicamente, ao trabalhador como contrapartida

do seu trabalho”107.

No entanto, cumpre ir mais longe no estudo desta matéria nomeadamente através de

uma análise mais aprofundada do regime jurídico no n.º 3 do art. 258.º.

6.5. O Caráter Regular e Periódico das Prestações Retributivas

Para que uma prestação seja considerada retribuição, o legislador faz depender a sua

qualificação como tal, de um pagamento regular e periódico (n.º 2 do art. 258.º do CT), sendo

que não tem natureza retributiva a prestação extraordinária ou cujo pagamento não esteja

antecipadamente garantido, faltando-lhe assim a estabilidade exigível (art. 260.º, nº 1 al. c) e n.º

3 al. b)). Estas prestações destinam-se a reconhecer as necessidades regulares e periódicas do

trabalhador no âmbito da execução do seu contrato de trabalho e tem a ver com a própria

distribuição no tempo da sua prestação.

Isto é, as características da periodicidade e da regularidade por um lado apoiam a

presunção da existência de uma vinculação prévia (quando não esteja expressamente prevista)

e, por outro, protegem as expectativas de ganho do trabalhador, consagrando assim o nexo

existente entre a retribuição e as suas necessidades pessoais e familiares.

Com a expressão “regular” o legislador quis referir-se a uma prestação não arbitrária,

isto é, a uma prestação que siga uma regra uniforme, sendo assim uma prestação constante.

Já no que concerne à expressão “periódica”, a lei pretende indicar que para uma

prestação ser qualificada como retributiva, a mesma deve ser paga em períodos certos no

tempo, ou com uma frequência aproximada, de modo a integrar-se na ideia típica de

periodicidade do contrato de trabalho e nas necessidades recíprocas das partes outorgantes a

quem diz respeito o contrato.

107 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de dezembro de 2009, Processo n.º 1881/07.9TTLSB.L1-4, disponível no website

www.dgsi.pt.

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De salientar que a regularidade e a periodicidade são dois requisitos cumulativos: uma

prestação variável, cuja regra de cálculo esteja previamente definida no contrato, cumpriria o

requisito da regularidade, mas já não o da periodicidade, visto que o quantum concreto

resultante de tal cálculo não é replicável em todos os períodos.

A regularidade e a periodicidade têm como pressuposto a execução no decurso do

tempo da prestação do trabalhador, sendo que se exige que o seu pagamento seja suscetível de

criar no trabalhador a expectativa do seu recebimento, associada à previsibilidade de

rendimentos.

Para BERNARDO LOBO XAVIER108, a regularidade e periodicidade devem-se à “necessidade

de calcular uma retribuição-tipo, abstrata, padrão, de carácter normal, porque esse cálculo é

indispensável para certas aferições no plano do Direito de trabalho e em que, portanto, deve ser

excluído tudo o que for esporádico ou atípico”.

Para MONTEIRO FERNANDES109, estas características têm um “duplo sentido indiciário”, uma

vez que sugerem a “existência de uma vinculação prévia”, e portanto, uma “prática vinculativa”,

e “assinala a medida das expectativas de ganho do trabalhador”, conferindo assim “relevância

ao nexo existente entre a retribuição e as necessidades pessoais e familiares daquele”.

Uma vez que o legislador não fixou concretamente um critério para a aferição da

“regularidade e periodicidade”, a qualificação das prestações como retributivas, tendo em conta

a sua “regularidade e periodicidade”, não tem sido uniforme no seio da jurisprudência.

Assim, por exemplo, a Relação de Lisboa110, em acórdão datado de 16 de dezembro de

2009, a propósito do subsídio de disponibilidade atribuído pela TAP aos técnicos de manutenção

de aeronaves que estão de prevenção, considerou que não basta que uma prestação seja

regular e periódica para a mesma se integrar na retribuição devida ao trabalhador, não sendo

consideradas parte integrante da retribuição se tiverem uma causa específica e individualizável,

diversa da remuneração do trabalho e afirmando que “não basta a verificação da regularidade e

da periodicidade (ou melhor, o seu não afastamento pelo empregador, por força da presunção

legal) para que as prestações sejam qualificadas como retributivas, para os devidos efeitos

108 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 546. 109 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.397.

110 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de dezembro de 2009, Processo n.º 1881/07.9TTLSB.L1-4, disponível no website

www.dgsi.pt.

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legais. A regularidade e a periodicidade com que são atribuídas as prestações são apenas um

dos vários elementos integradores do conceito de retribuição, não tendo qualquer apoio na lei a

ideia de que tem um valor autónomo e suficiente. As características da regularidade e da

periodicidade devem ser reportadas ao elemento essencial da contrapartida do trabalho (no

sentido em que é, enquanto contrapartida do trabalho, que as prestações remuneratórias devem

ser regulares e periódicas) e devem ser ponderadas em conjunto com os demais elementos do

conceito de retribuição, para se poder concluir pela qualificação de uma determinada prestação

como retributiva”.

Ainda no mesmo acórdão, a Relação de Lisboa pronunciou-se no sentido de que

discorda das decisões judiciais que consideram que a prestação regular e periódica deve ser

integrada no conceito de retribuição nos anos em que a mesma foi auferida em pelo menos seis

meses, indicando que “a regularidade e a periodicidade (…), apontam para a constância, para

um ritmo temporal que se repete ao longo dos anos de vigência da relação laboral e que é

conhecido e esperado pelo trabalhador e, no caso em apreço, não se verificam estes requisitos.

Além disso, a relevar uma unidade tempo para aferir a regularidade e periodicidade de uma

prestação, que o trabalhador alega constituir retribuição variável, essa unidade de tempo terá

que ser, necessariamente, a unidade mensal, uma vez que a retribuição do trabalhador é paga

ao mês, conjugada com o período de um ano, relativamente ao qual são devidos a retribuição de

férias, o subsídio de férias e o subsídio de Natal, cuja “reconstituição” o trabalhador reclama. É

isso que resulta do disposto nos arts. 84º, n.º 2 da LCT e 252º, n.º 2 do Código do Trabalho,

nos quais se estabelece que para determinar o valor da retribuição variável tomar-se-á como tal a

média dos valores que o trabalhador recebeu ou tinha direito a receber nos últimos doze meses

ou no tempo da execução do contrato, se este tiver durado menos tempo”.

Com o mesmo raciocínio mas discordando da dimensão do período, o Supremo Tribunal

de Justiça111 entendeu que “estando em causa determinar o valor de atribuições patrimoniais

devidas anualmente correspondentes a um mês de retribuição, como são a retribuição de férias,

o respectivo subsídio e o subsídio de Natal, afigura-se que o critério seguro para sustentar a

aludida expectativa, baseada na regularidade e periodicidade, há-de ter por referência a cadência

mensal, independentemente da variação dos valores recebidos, o que, de algum modo, tem

correspondência com o critério estabelecido na lei para efeito de cálculo da retribuição variável 111 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de junho de 2010, Processo n.º 607/07.STJLSB.L1.S1, disponível no website

www.dgsi.pt.

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[…], e, assim, considerar-se regular e periódica e, consequentemente, passível de integrar o

conceito de retribuição, para os efeitos em causa, a atribuição patrimonial cujo pagamento

ocorre todos os meses de actividade do ano” (sublinhado nosso). Neste caso os Conselheiros

acolheram o entendimento de que o critério a ter em linha de conta, é a cadência mensal e só

as prestações cujo pagamento ocorreu onze vezes por ano, devem ser tidas como prestações

retributivas.

Com entendimento diverso, defendendo o critério dos seis meses de pagamento de uma

prestação para a mesma se incluir na retribuição, o Tribunal da Relação do Porto considerou que

“tem a jurisprudência das Relações considerado que uma prestação só poderá considerar-se

regular se for prestada com alguma frequência, chamando à colação para aferir de tal frequência

a bitola da metade do ano”. Neste sentido pronunciou-se o Acórdão da Relação do Porto de 21

de fevereiro de 2011112, citando o Acórdão da Relação de Lisboa de 17 de dezembro de 2007,

onde se refere que “qualquer prestação que não tenha uma periodicidade certa e pré-

determinada só poderá considerar-se regular se for prestada com alguma frequência, que terá

de ser, pelo menos, de metade do ano. Menos do que isso não lhe permitirá deixar de ser uma

prestação esporádica e, portanto, sem carácter retributivo”. Tendemos a concordar com este

critério orientador do cariz regular e periódico das atribuições patrimoniais.

Com sapiência sui generis, o Tribunal da Relação de Coimbra113 não concorda com um

mecanismo matemático para a aferição da regularidade e periodicidade da prestação,

concretamente: “não concordamos inteiramente que o critério da regularidade tenha que ser

aferido mecanicamente por um número certo, de mais de metade (seis em onze) ou, muito

menos, da totalidade (onze em onze) de repetições da prestação em cada ano; a questão deve

ser perspectivada de outro modo: só não deve ponderar-se nas férias e subsídios o que se revela

excepcional, ocasional, inesperado”.

Assim, podemos dizer que se determinada prestação configurar uma prática habitual

(e não anómala ou ocasional) do empregador e disser respeito a trabalho prestado nas

condições que pessoal e funcionalmente forem mais onerosas e desgastantes para o

trabalhador, gerando no mesmo uma legítima expectativa de ganho em função da regularidade e

112 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 7 de abril de 2014, Processo n.º 408/12.9TTVLG.P1, disponível no website www.dgsi.pt. 113 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de março de 2011, Processo n.º 1191/09.0TTCBR.C1, disponível no website www.dgsi.pt.

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periodicidade da correspondente prestação de trabalho, é também legítima e justificada a sua

convicção de que tal benefício económico constitui um complemento normal da sua retribuição.

No entanto, e por hipótese meramente académica, se sempre que os trabalhadores de

determinada empresa gozassem férias, o trabalhador A os substituísse voluntariamente no

exercício das respetivas atividades e em função dessa substituição, auferisse pelo menos seis

meses de subsídio por trabalho suplementar, gerava naquele trabalhador a convicção de que

aquelas prestações auferidas através do trabalho suplementar prestado, constituiriam um

complemento normal da sua retribuição? Em nosso entendimento não.

Como se conclui estamos em matéria de proteção de expectativas e citando MONTEIRO

FERNANDES “a repetição (por um número significativo de vezes, que não é possível fixar a priori)

do pagamento de certo valor, com identidade de título e/ou de montante, cria a convicção da

sua continuidade e conduz a que o trabalhador, razoavelmente, paute o seu padrão de consumo

por tal expectativa – uma expectativa que é justamente protegida”114 e, na esteira das decisões

mais recentes do Supremo Tribunal de Justiça, salvo melhor entendimento, supomos que para a

criação de uma razoável e legítima expectativa na esfera jurídica do trabalhador de que certas

prestações se destinam a integrar o orçamento normal do trabalhador, o melhor critério, tendo

em conta a regularidade e periodicidade, para sustentar a expectativa do trabalhador será o da

cadência mensal, uma vez que no caso da aferição de o valor de atribuições patrimoniais

devidas anualmente correspondentes a um mês de retribuição, como são a retribuição de férias,

o respetivo subsídio e o subsídio de Natal. De certa forma coincide com a forma para o cálculo

da retribuição variável (art. 261.º, n.º 2 do CT), devendo, em nosso entendimento, considerar-se

regular e periódica, prestação cujo pagamento ocorre todos os meses de atividade do ano,

constituindo, assim, um complemento normal da retribuição do trabalhador.

6.6. A Presunção Estabelecida

O n.º 3 do art. 258.º consagra a presunção de que constitui retribuição “qualquer

prestação do empregador ao trabalhador”. A razão de ser da presunção prevista no n.º 3 do art.

258.º é a de precaver os casos em que o empregador pretende efetivamente pagar a

114 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág. 458.

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contrapartida do trabalho prestado pelo trabalhador, mas atribui outra nomenclatura à

prestação, não assumindo a mesma como retribuição.

A presunção, prevista no art. 349.º do CCivil, indica que nos termos do sistema

probatório consagrado nesse diploma legal se dá como demonstrado um facto desconhecido, a

partir de um facto conhecido (por exemplo, se sai fumo por uma porta, presume-se que do outro

lado há um incêndio). Na verdade o legislador aplica a técnica da presunção para preencher um

conceito legal, podendo este ser afastado pela parte interessada que não beneficia da mesma.

Assim, por aquele n.º 3 do art. 258.º o legislador faz presumir a natureza retributiva como

consequência da conhecida atribuição de uma prestação patrimonial.

No entanto, o empregador pode ilidir esta presunção, pela demonstração de que certa

prestação não é um complemento retributivo por, por exemplo, faltar o preenchimento dos

requisitos do n.º 1 do art. 258.º, ou estar excluída da qualificação de retribuição nos termos do

art. 260.º, ou seja, o ónus da demonstração de que certa atribuição não é retributiva, é do

empregador, através, nomeadamente, da demonstração da falta de obrigatoriedade ou de outros

elementos essenciais caracterizadores da retribuição.

Convém sublinhar que esta presunção só diz respeito à qualificação de certa atribuição

patrimonial como retribuição para efeitos de aplicação dos princípios de tutela e garantias dos

créditos retributivos. Segundo BERNARDO LOBO XAVIER115, “não pode dizer-se que o reconhecimento

do carácter retributivo de uma dada atribuição envolva fatalmente a produção de todos os efeitos

jurídicos da retribuição, tal como, ao inverso, não pode afirmar-se que as prestações não

retributivas não beneficiam de nenhum dos efeitos associados à retribuição”.

Ou seja, se um trabalhador demonstrar que várias vezes, ao longo de um ano, lhe foram

pagos certos montantes, este beneficia da presunção do caráter retributivo daquelas prestações,

e o empregador terá de ilidir essa presunção, para evitar as consequências legais que daí

advêm, nomeadamente, a aplicação do princípio da irredutibilidade salarial. No entanto, não

basta ao trabalhador alegar o pagamento efetivo desses montantes e que os mesmos têm

caráter retributivo para a aferição dos montantes devidos a título de retribuição e subsídio de

férias, uma vez que isso seria extrapolar o sentido do n.º 3 do art. 258.º e interpretar esta norma

em excesso. Sendo que com esta interpretação, além de uma presunção de caráter retributivo,

115 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 545.

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tínhamos também a atribuição de relevância para efeito da aplicação de determinado regime

jurídico.

Um exemplo bastante discutido na jurisprudência é o caso de atribuição ao trabalhador

de um veículo automóvel (ou de um telemóvel ou computador portátil) para que este o utilize,

não só na prestação da sua atividade mas também na sua vida privada, incluindo fins-de-semana

e férias116.

Esta atribuição por parte do empregador pode ser considerada retribuição em espécie,

uma vez que manifesta uma vantagem de natureza económica para o trabalhador. Conforme diz

o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de setembro de 2012117 “sendo a retribuição a

contrapartida da atividade prestada pelo trabalhador em sede de contrato individual de trabalho,

ela é paga normalmente em numerário. Tal não impede que uma parte da retribuição, pelo

menos, não possa ser paga em espécie, como sucede com a atribuição de alimentos, refeições,

ou o uso de viaturas. Porém, a utilização de um veículo automóvel da empresa, com todos os

custos a cargo desta, tanto pode configurar um mero instrumento de trabalho, porque é usada

durante e por causa da prestação laboral, como pode configurar uma parcela da retribuição do

trabalhador, quando o empregador autoriza o trabalhador a usar o veículo irrestritamente, para

além do horário normal de trabalho, maxime, em fins-de-semana, feriados e férias. Nesta

situação, evitando o trabalhador de adquirir viatura própria para se deslocar de e para o trabalho

e em toda a sua vida pessoal e familiar, o empregador confere-lhe uma vantagem patrimonial,

suscetível de avaliação em numerário, que integra a designada retribuição em espécie, como se

tem entendido”.

No mesmo sentido o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão datado de 30 de abril de

2014118 diz que “perante a matéria de facto provada, impõe-se concluir que a atribuição ao autor

de veículo automóvel assume natureza retributiva, uma vez que a empregadora, ao conferir

àquele o direito de utilização do veículo na sua vida particular, incluindo em fins-de-semana e

férias, e ao suportar os respectivos encargos, designadamente, com a sua manutenção, seguros,

portagens e combustível, ficou vinculada a efectuar, com carácter de obrigatoriedade, essa

116 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág. 397, nota de rodapé n.º 1.

117 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de setembro de 2012, Processo n.º 749/10.0TTPRT.P1, disponível no website

www.dgsi.pt.

118 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de abril de 2014, Processo n.º 714/11.00TTPRT.P1.S1, disponível no website

www.dgsi.pt.

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prestação. Trata-se de uma prestação em espécie com carácter regular e periódico e um

evidente valor patrimonial, que assume natureza de retribuição, nos termos dos artigos 82.º da

LCT, 249.º do Código do Trabalho de 2003 e 258.º do Código do Trabalho de 2009,

beneficiando, por isso, da garantia de irredutibilidade, prevista nos artigos 21.º, n.º 1, alínea c),

da LCT, 122.º, alínea d), do Código do Trabalho de 2003 e 129.º, alínea d), do Código do

Trabalho de 2009”.

Não obstante este entendimento generalizado, se o empregador conseguir ilidir a

presunção de que constitui retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador,

designadamente porque a utilização de veículo automóvel se deve à necessidade das específicas

funções do trabalhador, e a utilização do mesmo veículo de trabalho na vida privada do

trabalhador configura apenas uma liberalidade do empregador, então esse veículo não é parte

integrante da retribuição, conforme é dito no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de

setembro de 2008119: “no que diz respeito ao automóvel, é óbvio que a sua utilização pelo autor

na sua vida particular lhe trazia vantagens económicas, mas essas vantagens também não

constituíam uma contrapartida directa do trabalho, uma vez que resultavam de uma mera

liberalidade da entidade empregadora que, como tal, podia ser por ele retirada a todo o tempo,

não constituindo, por isso, um componente da sua retribuição”.

Discordando do entendimento maioritário da doutrina, MARIA MANUELA MAIA120, entende

que se a atribuição de viatura não for consagrada no contrato, só em casos especiais deve ser

integrada na retribuição, explicando a título de exemplo que nas situações de “mobilidade

funcional, do ius variandi ou em consequência de um processo de restruturação e reorganização

da empresa sem menoscabo da categoria, retribuição e dignidade, o trabalhador se vê privado

da viatura da empresa, não existe ânimo empresarial no sentido de ofender a dignidade do

trabalhador ou retirar-lhe competência ou direito, porque a dignidade humana assenta em

valores e princípios mais elevados e importantes que o mero uso de uma máquina”.

Dúvidas não há quanto à exclusão de consideração de prestação retributiva nos casos

em que o trabalhador de desloca com o seu veículo até as instalações da empresa e apenas aí

inicia a sua utilização diária do telemóvel, computador portátil ou veículo disponibilizados pelo

119 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de setembro de 2008, Processo n.º 08S1031, disponível no website www.dgsi.pt.

120 Maia, Maria Manuela in “O conceito de retribuição e a garantia retributiva”, II Congresso Nacional de Direito do Trabalho, Lisboa, 1999,

Almedina, pág. 267.

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empregador para exercer as suas funções, e ao fim do dia de trabalho devolve esses meios

disponibilizados nas instalações do empregador, não tendo a eles acesso em tempo de férias

e/ou fins-de-semana.

Questão semelhante é a da atribuição de cartão de crédito, seguros de saúde e de vida,

combustível, parqueamento, concessão de stock options, descontos em serviços ou bens da

empresa, etc.

O plano de aquisição de ações, as chamadas stock options, diz respeito a opção de

aquisição de ações da empresa, concedida pelos empregadores aos trabalhadores.

Como explica ROMANO MARTINEZ 121, a “dispersão acionista e o designado «capitalismo

popular», dos anos 50-60 do século passado, deram origem à democracia acionista, com as

«ações do trabalho», tendo em vista transformar os trabalhadores em capitalistas”.

No entanto, apesar desta ideia inicial, as empresas concedem normalmente as stock

options com outros intuitos, como sejam, alinhar os interesses dos gestores com os dos

acionistas, reduzindo os custos de agência; como forma de remuneração que permite minimizar

o reconhecimento de custos com os trabalhadores; como substitutos de remunerações pagas

em caixa e seus equivalentes; para atrair e reter trabalhadores na empresa evitando a

transferência para empresas concorrentes e como instrumento de extração de rendimento dos

acionistas122 e, acima de tudo, tem por base requisitos variados, como a existência de relação de

trabalho, verificação de resultados da empresa e o bom desempenho do trabalhador para o

alcance desses resultados.

Os planos de aquisição de ações podem também ser planos de aquisição de obrigações,

convertíveis em ações. Embora do ponto de vista fiscal, as stock options sejam tributadas como

rendimentos do trabalho, à luz do regime laboral, normalmente não se integram no conceito de

retribuição123.

Em suma, a qualificação destas atribuições como retribuição depende da sua utilização,

e deve ser sempre alvo de avaliação casuística, isto é, se aquela atribuição é uma mera

121 Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 547.

122 Morais, Ana Isabel in “Stock Options: Principais determinantes da atribuição”, in Revista da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, nº 37

abril/junho de 2007, pág. 49-54.

123 Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 548.

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liberalidade ou tolerância do empregador, revogável pelo mesmo a qualquer momento, ou se,

por outro lado, estas atribuições se traduzem numa intenção de atribuição de um benefício

económico ao trabalhador.

Ainda quanto às tipologias de retribuição, recentemente os empregadores começaram a

atribuir a certos trabalhadores algumas prerrogativas. Normalmente estas regalias são

consagradas a trabalhadores que exercem cargos de chefia, dirigentes. São os chamados “fringe

benefits” (ou “atribuição de meios”), ou seja, são prestações que têm como objetivo aumentar a

motivação dos trabalhadores, reduzir o absentismo, o “turn-over”, aumentar a produtividade,

atrair melhores profissionais, melhorar a imagem da empresa dentro do setor ou conexão entre

o trabalhador e os objetivos da empresa e da organização onde esta inserido, etc. Podem

configurar vários privilégios, “como sejam o pagamento de prémios de seguro, complementos à

assistência em caso de doença, pensões complementares de reforma, empréstimos para

aquisição de casa ou automóvel” 124 , bem como prestações de fianças e outras garantias

bancárias aos trabalhadores, a atribuição de um cartão de crédito com um limite de crédito

autorizado, atribuição de cargos e situações de consultoria em sociedades coligadas, etc.

Como explica JÚLIO GOMES125, em termos sociológicos, “trata-se de prémios de fidelidade

que exprimem lealdade recíproca, sendo que o valor simbólico destas atribuições, quando dizem

respeito a produtos e serviços126, são usados para realçar as diferenças hierárquicas e sociais

nos quadros das empresas”.

É discutível se todos os “fringe benefits” deverão ser entendidos como retribuição em

espécie, acompanhando a opinião de DIOGO VAZ MARECOS127, no que diz respeito aos empréstimos

que o empregador realize não devem ser entendidos como retribuição em espécie, em primeiro

lugar porque podem deixar de ser concedidos a qualquer momento (com exceção dos

resultantes de obrigação contratualmente prevista) em segundo lugar, porque normalmente

configuram benefícios sociais atribuídos pelo empregador e que este, a qualquer momento, pode

alterar o montante do empréstimo ou até eliminar a concessão destes empréstimos a futuros

trabalhadores, não podendo estes últimos alegar o direito a estes empréstimos.

124 Gomes, Júlio in “Algumas...”, pág. 57 e 58. 125 Gomes, Júlio in “Algumas...”, pág. 58.

126 Nomeadamente, automóveis, relógios ou outros objetos de usos pessoal, viagens, férias, cartas de crédito, formação, etc.

127 Marecos, Diogo Vaz, op. cit., ponto 6 da anotação ao art. 259.º.

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7. Prestações Complementares – Exclusões Legais

Ao fazer uma análise prática dos conflitos decorrentes do conceito de retribuição, logo se

percebe que a consideração de certa atribuição patrimonial como retribuição é uma das causas

mais discutidas nos tribunais portugueses. Estes conflitos decorrem, sobretudo, do facto de os

empregadores, muitas vezes, quererem facultar atribuições remuneratórias encapotadas com

outro título. Esta necessidade de mascarar uma atribuição remuneratória deve-se, sobretudo, à

vantagem do empregador não se vincular à obrigatoriedade do seu pagamento, bem como à

obrigatoriedade de não diminuição da prestação retributiva (de acordo com o princípio da

irredutibilidade salarial), evitando, por outro lado, todas as despesas inerentes à concessão de

retribuição, como seja o pagamento do valor devido à Segurança Social. Todavia, o inverso

também se discute, tendo em conta o disposto no n.º 3 do art. 258.º do CT, que estabelece a

presunção de que todas as prestações do empregador ao trabalhador configuram retribuição,

quando na verdade nela não se devem integrar.

Pelo supra mencionado, urge a necessidade de expor algumas considerações

concernentes a certas prestações patrimoniais atribuídas pelo empregador que podem ou não

constituir parte integrante da prestação retributiva, recorrendo ao entendimento jurisprudencial

no âmbito destas matérias.

Decorre do n.º 1 do art. 258.º do CT que apenas constituem retribuição as prestações a

que o trabalhador tenha direito, ou seja, ficam desde logo excluídas as gratificações prestadas

pelo empregador “e cuja concessão este não seja obrigado por força do contrato, das normas

que o regem ou dos usos (alínea b) do n.º 1 e alínea a) do n.º 3 do art. 260.º)”128. No fundo, o

art. 258.º não deixa margem para dúvidas quanto ao facto de que apenas se pode considerar

retribuição as prestações que configuram uma contrapartida da atividade do trabalhador,

deixando de parte todas as prestações cuja causa é autónoma e individualizável, nomeadamente

aquelas prestações que visam compensar o trabalhador por despesas feitas durante a execução

da sua prestação.

As prestações complementares estão intimamente ligadas às especiais circunstâncias

em que a prestação do trabalho deve ser efetuada. Queremos com isto referir-nos àquelas

128 Carvalho, António Nunes, in “Notas sobre o Regime de Retribuição no Código do Trabalho”, Revista de Direito e de Estudos Sociais, Ano LI, 2ª

série.

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circunstâncias a que o trabalhador está exposto, tais como elevada penosidade, perigo,

isolamento, toxicidade e que servem de base a que de certa forma deva ser “compensado”, ou

situações ligadas ao mérito e performance ou ainda situações pessoais ligadas aos anos que

aquele “deu à casa”, isto é, antiguidade.

É indiscutível que a obrigação de retribuição não pode ser reduzida à lógica do

sinalagma “prestação-contraprestação”, sendo necessário aceitar a natureza híbrida do próprio

conceito de retribuição. Esta relatividade do conceito decorre, desde logo, do facto de o

trabalhador receber uma prestação em troca do seu trabalho bem como da relação de sujeição a

que está adstrito. Além disso, o legislador, embora estabeleça a regra geral no n.º 1 do art.

258.º, vem abranger através do n.º 2 outras prestações, além da retribuição base129, que sejam

regulares e periódicas e através da presunção do n.º 3 do mesmo preceito uma série de

prestações complementares, invertendo o primeiro raciocínio e concluindo que nem a retribuição

diz apenas respeito à prestação a que o “trabalhador tem direito em contrapartida do seu

trabalho”.

Mas, muito embora o n.º 4 do art. 258.º venha aplicar o regime das garantias previstas

no Código do Trabalho à “prestação qualificada como retribuição”, na ótica de BERNARDO LOBO

XAVIER, “não pode dizer-se que o reconhecimento do caráter retributivo de uma dada atribuição

envolva fatalmente a produção de todos os efeitos jurídicos da retribuição, tal como, ao inverso,

não pode afirmar-se que as prestações não retributivas não beneficiam de nenhum dos efeitos

associados à retribuição” 130 . Na opinião deste autor devem merecer a mesma tutela das

prestações retributivas, o crédito do trabalhador que diga respeito a, por exemplo, ajudas de

custo ou à remuneração por trabalho suplementar, seja ou não considerado como prestação

retributiva.

A verdade é que nem sempre as prestações complementares devem ser integradas na

prestação retributiva, e neste sentido o Código do Trabalho, no seu art. 260.º, consagra

expressamente as prestações que devem ou não ser incluídas na retribuição, e estabelece que

“não se consideram retribuição as importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de

129

Cf. art. 262.º, n.º 2 al. a) - A retribuição base tem carácter obrigatório decorrente do contrato ou IRCT e corresponde à atividade

desempenhada pelo trabalhador em contrapartida do trabalho prestado, de acordo com um período normal de trabalho, que é certo e fixo.

130 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 545.

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viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao

trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador”.

Os casos previstos na al. a) do n.º 1 do art. 260.º do CT são normalmente excluídos do

“conceito de retribuição”, uma vez que as mesmas não são necessariamente contrapartida do

trabalho prestado, mas configuram formas de ressarcimento pelo empregador de despesas

efetuadas com a realização da prestação a que o trabalhador se vinculou, sendo que,

normalmente, essas despesas serão dispersas, não preenchendo assim o requisito da

regularidade e periodicidade para serem tidas em conta enquanto prestações retributivas. Em

suma, não se consideram retribuição as importâncias devidas ao trabalhador por deslocações,

novas instalações, despesas feitas em serviço – ajudas de custo, abonos de viagem, despesas

de transporte ou despesas de instalação.

No entanto, o legislador quis acautelar os casos em que o empregador atribui estas

prestações complementares ao trabalhador, de forma regular e periódica, prevendo que estas

ajudas de custo ou outros subsídios integrem, pelo menos em parte, a retribuição (art. 260.º, n.º

1 in fine). Ou seja, quando as ajudas de custo ou abonos forem “frequentes”, previstos no

contrato ou se devam considerar integrantes da retribuição pelos usos, sendo que, ainda que

estes requisitos estejam previstos, apenas são considerados retribuição na medida em que

excedam os “respetivos montantes normais”. É ainda fixado o mesmo regime para o abono por

falhas e para o subsídio de refeição, nos termos do n.º 2 do mesmo preceito legal.

Na opinião de MARIA MANUELA MAIA131, as prestações complementares que dizem respeito

às compensações por risco, como sejam, por exemplo, os abonos para falhas, trabalho por

turnos, isolamento, trabalho noturno, toxicidade, perigosidade, horas extraordinárias, etc., não

devem integrar o conceito de retribuição pelo seu cariz não ser remuneratório mas antes

compensatório do risco ou especial penosidade a que os trabalhadores estão sujeitos. Entende a

autora que os referidos subsídios só deverão subsistir enquanto a situação que lhes serve de

base perdurar, configurando circunstâncias que por força da lei ou convenção serão transitórias,

“não revestindo carácter de regularidade ou habitualidade”, uma vez que “estes complementos

são parcelas ligadas a «condições extrínsecas» da prestação convencionada, que as partes

interiorizam como suscetíveis de cessar”.

131 Maia, Maria Manuela, op. cit., pág. 268.

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Em conclusão a autora considera que para o reconhecimento de uma prestação

complementar como parte integrante da retribuição do trabalhador, há que verificar duas

condicionantes, a saber: analisar se o complemento foi previsto no contrato, e caso o tenha sido,

presume-se como integrante do montante retributivo; se não tiver sido previsto contratualmente,

o complemento não integra a retribuição, exceto nos casos em que tiver “adquirido uma

regularidade e periodicidade tal, bem como a interiorização das partes que o mesmo tenha

integrado o núcleo do sustento do trabalhador”.

São ainda excluídas da retribuição as importâncias atribuídas pelo empregador a título

de gratificações ou prestações extraordinárias, concedidas como recompensa ou prémio de bons

resultados da empresa, nos termos do n.º 1 al. b). Estas atribuições assumem um caráter

voluntário e extraordinário, uma vez que o empregador pretende recompensar o trabalhador ou

premiá-lo pelos bons serviços, mas não quer a elas vincular-se. Em princípio, estas atribuições

estão conexas aos resultados obtidos pela empresa ou à qualidade do serviço de um dado

trabalhador, mas podem também dizer respeito a outras causas, como sejam a comemoração

de uma data importante para a empresa (aniversário, Natal - atribuição de um “cabaz de

Natal”), homenagear um trabalhador ao fim de certos anos de serviços na empresa, com a

atribuição de objetos valiosos (relógio, medalha, etc..), etc.

Quanto às gratificações, é necessário ressalvar os casos em que as mesmas são devidas

por força do contrato ou das normas que o regem, os casos em que as gratificações, pela sua

importância e caráter regular e permanente, devam considerar-se como parte integrante da

retribuição por força dos usos, ou quando as mesmas tenham caráter estável, ordinário, por

estarem relacionadas com os resultados obtidos pela empresa, quer por força do título atributivo,

quer pelo seu caráter regular e permanente. O legislador previu e visou proteger aqueles casos

em que as atribuições patrimoniais são regulares e permanentes, tendo assim um caráter

estável, e que, por estarem previstas no contrato e nas normas que o regem, criam no

trabalhador uma expectativa legítima do recebimento dessas atribuições, considerando-as assim

com retributivas.

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Como explica ROMANO MARTINEZ132, tendo em conta o art. 260.º do CT, o critério a seguir

é o da “contraposição entre o animus donandi e a obrigatoriedade de efetuar a prestação,

associado à regularidade”.

Se a gratificação for devida por força do contrato ou se pelos usos se integrar na

contraprestação, não deixa de integrar a retribuição. Como explica o autor citado, “são

prestações que, apesar do (aparente) animus donandi, por serem devidas ao trabalhador,

constituem um crédito deste e consideram-se, portanto, retribuição; diferentemente da doação,

que assenta no espírito da liberalidade (art. 940.º, n.º 1 do CCivil), estas prestações são devidas

por força da execução do contrato”.

Se, por outro lado, a gratificação atribuída pelo empregador, for irregular, mas não

garantida, não integra o conceito de retribuição por não corresponde a uma contrapartida do

trabalho prestado, nos termos da al. b) do n.º 1 do art. 260.º.

Muito se discute na doutrina o caso de certas gratificações, atribuídas por terceiros, ou

seja as comummente chamadas “gorjetas”133. Na verdade, numa abordagem leve, sempre se

dirá que o requisito essencial para se considerar que certa atribuição patrimonial integra a

retribuição, não está preenchido. Referimo-nos, naturalmente, à obrigatoriedade jurídica do

empregador, ou seja, as gorjetas não correspondem a uma prestação devida pelo empregador,

mas sim, a uma liberalidade de um terceiro, de natureza eventual e optativa, portanto, logo se

dirá, que a “gorjeta” não configura uma prestação retributiva, este é o nosso entendimento, bem

como da maioria da doutrina, nomeadamente de LEAL AMADO 134 que diz que, a retribuição

configura uma prestação obrigatória a cargo da responsabilidade do empregador, e se a mesma

não for “juridicamente obrigatória” ou não for efetuada pelo empregador, então não será uma

prestação retributiva, reconhecendo no entanto que “ainda que correspondam a uma parcela

não negligenciável do rendimento daquele, não integram a retribuição do trabalhador”.

No entanto, e uma vez que tais gratificações muitas vezes são uma parte significativa do

rendimento do trabalhador (ex. restaurantes, bares, cabeleireiros, etc.) levanta-se a questão de

saber se a gorjeta poderia ser considerada retribuição através de um de dois caminhos: a) ou da

132 Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 545.

133 A este propósito Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual..., pág. 561; Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 302; Gomes, Júlio in

“Direito...”, pág. 769 e Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 550. 134 Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 302.

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renúncia do empregador na cobrança do serviço ao cliente, ou b) na possibilidade de conferir ao

trabalhador o recebimento das gorjetas, assumindo o empregador o dever de não diligenciar de

forma comprometedora do recebimento das referidas gorjetas135.

Por um lado, ainda que acompanhando a teoria de que a gorjeta não é uma prestação

retributiva, sempre se dirá que a sua atribuição, anda par a par com a mesma, tal como

demonstrado por JÚLIO GOMES que cita, em nota de rodapé, o autor GIULIO MUSACCHIA, que deu o

exemplo da possibilidade de um contrato de trabalho, quanto aos croupiers, prever que a

retribuição fosse inteiramente excluída em atenção à frequência e importância das gorjetas136.

Aliás, mesmo que as gorjetas não sejam retribuição, em caso de despedimento ilícito,

devem ser tidas em conta para a determinação do prejuízo sofrido pelo trabalhador pela ilicitude

do despedimento. Este é o entendimento generalizado da jurisprudência, sobretudo no que diz

respeito aos trabalhadores de casino, mormente da Relação do Porto 137, recorrendo à prévia

análise do Supremo Tribunal de Justiça, e citando o douto Tribunal, transcreveu as palavras do

mesmo, que explicavam que, “embora não se possa considerar aquelas gratificações como

retribuição, a verdade é que elas, apesar de donativos de terceiros, estavam dependentes da

prestação de trabalho pelo A. Com o despedimento operado pela R. o A. viu-se privado de as

receber durante o espaço de tempo em que o despedimento prevaleceu”138.

Por força das al. c) e d) do n.º 1 do art. 260.º do CT, respetivamente, as prestações

decorrentes de factos relacionados com o desempenho, o mérito profissional ou a assiduidade,

desde que não estejam antecipadamente garantidas e a participação nos lucros da empresa,

desde que a retribuição certa contratada seja adequada ao trabalho prestado pelo trabalhador,

são igualmente prestações que não se integram na retribuição. Estas são, tal como as

gratificações, prestações que não são obrigatórias. São prestações que configuram liberalidades

que o empregador quer realizar, mas que a ele não estão vinculadas.

135 Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 769.

136 Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 769, em nota de rodapé citando o autor Giulio Musacchia, Mancia, Enciclopédia del Diritto, Giuffrè, vol. XXV,

Milano, 1975, pág. 306: “non poche recipoche interferenze”.

137 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 29 de novembro de 2010, Processo n.º 431/08.8TTBCL.P1, disponível no website

www.dgsi.pt.

138 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de janeiro de 1996, Coletânea de Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de

Justiça, 1996, Vol. I, págs. 249 e segs., e no mesmo sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de novembro de 1996, in Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, Ano XXXVI, 1997, págs. 691 e segs.: “a entidade patronal, casino, na sequência de despedimento ilícito, constitui-se na obrigação de indemnizar o trabalhador por este não ter recebido as gratificações correspondentes a dádivas de clientes”.

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Quanto às prestações conferidas relacionados com o desempenho, o mérito profissional,

normalmente denominadas “prémios”, destinam-se a incentivar os trabalhadores, tendo em

vista o aumento da produtividade da sua prestação, mas em geral não dependem dos resultados

da empresa. Estes prémios muitas vezes estão previstos nos regulamentos internos das

empresas, ou até nos próprios contratos, condicionados ao desempenho do trabalhador, mas

não se consideram retribuição dado o seu caráter de incentivo e encorajamento, exigindo um

esforço complementar.

Conforme explica BERNARDO LOBO XAVIER 139 , o facto de o empregador prever

regulamentação relativa aos incentivos ligados ao desempenho, não significa que esta

regulamentação e não discricionariedade os aproximem do conceito retributivo. Em primeiro

lugar, porque na verdade o prémio nunca é garantido, uma vez que depende sempre de uma

avaliação ao desempenho do trabalhador, que por si só é aleatório, que é uma condição, incerta,

não sendo assim um dado garantido, o que por si só exclui a ideia de garantia. Em segundo

lugar, se a atribuição dos prémios fosse garantida, por um lado o empregador sairia beneficiado

quando decidisse atribuir discricionariamente um dado prémio, e sairia prejudicado quando

regulamentasse a atribuição de prémios, e os mesmos perderiam o seu caráter de incentivo e

toda a sua eficácia prática.

Contudo, o n.º 3 do art. 260.º do CT consagrou expressamente os casos excecionais às

al. b) e c) do n.º 1 do referido preceito legal. Quanto às gratificações, ainda que estas estejam

condicionadas aos bons serviços prestados pelo trabalhador, estas serão obrigatórias e

configuram um direito do trabalhador, se forem devidas por contrato ou das normas que o

regem, ou se considerem retribuição pelos usos. Além disso, se o empregador instituir na

empresa um certo prémio de fim de ano, e o mesmo se repetir, criando assim uma expetativa

de recebimento do mesmo na esfera jurídica do trabalhador, o legislador, criou um mecanismo

de defesa dessa expectativa, através no n.º 3, alínea b), em que a obrigatoriedade do pagamento

decorre do uso e das expectativas por ele causadas, ainda que o seu montante possa variar em

função dos resultados obtidos.

Relativamente às comissões, estas consistem num acréscimo à remuneração,

determinado por percentagem sobre o valor das vendas efetuadas pelo trabalhador, ou seja,

configura a participação no resultado concreto da atividade do trabalhador. São atribuições 139 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 559.

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patrimoniais retributivas que existem não só no trabalho subordinado, mas também nos

contratos comerciais, nomeadamente, no contrato de agência e por se relacionarem com o

desempenho profissional do trabalhador, questiona-se se estas atribuições não se encontram

abrangidas pela al. c) do n.º 1 do art. 260.º do CT, do que resultaria as mesmas não serem

consideradas retribuição. A doutrina e jurisprudência 140 têm considerado que as comissões

integram a retribuição do trabalhador, na modalidade de retribuição variável, sendo certo que o

regime jurídico do Direito do Trabalho, pouco se pronuncia quanto a este tipo de prestações.

Como explica JÚLIO GOMES141, “na prática dos negócios é frequente que estas só sejam

pagas se os contratos promovidos vierem a ser efectivamente cumpridos, mantendo-se o direito

à comissão se o contrato vier a ser resolvido por incumprimento culposo do principal (no

contrato de agência) ou do empregador (no contrato de trabalho)”.

Quanto à remuneração por trabalho suplementar, a prestação deste pretende

compensar as situações de especial penosidade, que resulta da execução do trabalho fora do

horário normal de trabalho. O regime jurídico relativo a esta prestação encontra-se consagrado

nos arts. 226.º e seguintes do CT. O Código do Trabalho não prevê expressamente a exclusão

dessa atribuição da retribuição, ao contrário do art. 86.º da LCT. No entanto, em nosso

entendimento e salvo melhor parecer, parece-nos que a atribuição concedida pelo trabalho

suplementar não deve integrar a retribuição, desde logo porque esta prestação tem, em

princípio, caráter excecional. Pelo que, só se deve considerar que a prestação pelo trabalho

suplementar como parte integrante da retribuição, quando pela sua atribuição regular e

periódica se conclua que o montante auferido a este título influencia consideravelmente o valor

recebido pelo trabalhador, de tal forma a que este legitimamente crie uma expectativa de

recebimento do mesmo. Nesse sentido, escreve ainda MONTEIRO FERNANDES142, “no tocante ao

trabalho suplementar, a remuneração acrescida pode ser ou não computada no salário global

conforme se verifique ou não a regularidade do recurso a horas suplementares de serviço”.

140 Neste sentido Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de janeiro de 2008, Processo n.º 07S3786, e Acórdão do Tribunal da

Relação de Lisboa, de 13 de março de 2009, Processo n.º 2195/05.8TTLSB-4, ambos disponíveis no website www.dgsi.pt. 141 Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 773.

142 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.406.

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Este tem sido também o entendimento unânime no seio da Jurisprudência. Citando a

Relação do Porto 143 “face às considerações que acima se deixaram expostas a propósito da

natureza regular e periódica de uma prestação, a conclusão que se impõe é no sentido da

retribuição do trabalho extraordinário ou suplementar não ser de computar na retribuição global,

excepto se a prestação desse trabalho pelo trabalhador assumir natureza regular”.

No que concerne às diuturnidades, como explica o Supremo Tribunal de Justiça, as

diuturnidades “constituem complementos pecuniários estabelecidos para compensar a

permanência do trabalhador na mesma empresa ou categoria profissional, e têm como razão de

ser a inexistência ou dificuldade de acesso a escalões superiores. Assim, vencidas nos termos

convencionalmente fixadas, o montante das diuturnidades que tem carácter regular e certo,

integra-se no vencimento como parcela a somar ao salário base, gozando, por isso, da protecção

própria inerente à retribuição”144.

Estas prestações têm como característica o facto de serem associadas à pessoa do

trabalhador, isto é, a atribuição patrimonial está ligada à antiguidade do estatuto de cada

trabalhador, e não à qualidade ou natureza da sua prestação. A antiguidade a que se refere a al.

b) do n.º 2 do art. 262.º, diz respeito à antiguidade de um dado trabalhador em certa categoria

ou função, e não à antiguidade na empresa, sendo que, se o trabalhador mudar de categoria ou

função, recomeça a contagem da antiguidade para o cômputo da diuturnidade. O legislador

visou afastar todas as prestações auferidas pelo trabalhador, com exceção da retribuição base e

diuturnidade, para a aferição da prestação complementar ou acessória.

Como consagra o art. 262.º do CT, as diuturnidades fixam um critério para a

determinação da prestação complementar ou acessória devida ao trabalhador. A este propósito

fala-se da não consagração do princípio da omnicompreensibilidade no direito do trabalho

português, como explica DIOGO VAZ MARECOS, no comentário feito ao art. 262.º do CT, “ de

acordo com o princípio da omnicompreensibilidade a retribuição é constituída por todas as

prestações que tenham um nexo de causalidade com o contrato de trabalho, o que se traduz na

143 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24 de março de 2014, Processo n.º 597/13.5TTVNG.P1 e no mesmo sentido Acórdão do

Supremo Tribunal de Justiça de 30 de março de 2006, Processo n.º 08/06, ambos disponíveis no website www.dgsi.pt.

144 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de dezembro de 2010, Processo n.º 285/07.1TTBGC.P1.S1, disponível no website

www.dgsi.pt.

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relevância de toda e qualquer prestação complementar retributiva, independentemente do

instituto retributivo em causa”145.

145 Marecos, Diogo Vaz, op. cit., anotação ao art. 262.º.

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8. Retribuição de Férias e o Subsídio de Férias

“O facto das prestações periódica e regularmente percebidas pelo trabalhador

integrarem, em princípio, o conceito de retribuição não significa que linearmente tenham de ser

levadas em conta para efeitos de cálculo das prestações cujo montante se encontra indexado ao

valor da retribuição, como, por exemplo, acontece com a retribuição de férias e os subsídios de

férias e de Natal”146. Estas questões são com frequência litigadas nos tribunais portugueses, para

que decidam se uma dada prestação deve ou não ser integrada no valor devido ao trabalhador a

título de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

A Constituição da República Portuguesa, consagra no seu art. 59.º, n.º 1 al. d), o direito

ao repouso e aos lazeres, isto é, o direito a férias periódicas pagas. Esta consagração, em

termos sistemáticos, está prevista no âmbito dos direitos económicos, sociais e culturais, muito

embora se entenda este direito com natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias dos

cidadãos, e portanto sujeito ao regime dos arts. 17.º e 18.º do mesmo diploma legal147.

Na verdade o legislador compreende que o trabalhador não se desprende do cidadão-

pessoa, tendo, por isso, necessidades pessoais e que o mesmo carece de recuperação física e

psíquica bem como disponibilidade pessoal e oportunidade para participação no quotidiano

familiar, social e cultural, conforme é reconhecido pelo disposto no art. 237.º, n.º 4 do CT.

Com o intuito de conceder ao trabalhador um período extralaboral para satisfação das

suas necessidades pessoais e recuperação física e psíquica, o legislador fixou uma duração

mínima de vinte e dois dias úteis, por cada ano civil de trabalho prestado148, ou seja, de segunda

a sexta-feira, não incluindo os dias feriados, os sábados e os domingos.

Na verdade, a consagração do direito a férias remuneradas “emana da qualidade de

trabalhador subordinado constituindo um verdadeiro direito subjectivo e traduz-se na pausa ou

pausas na prestação de trabalho, remuneradas, por um período total de dias que deverá ser

gozado seguido até a um limite mínimo, preferencialmente no ano a que reportam, e que se

destinam a proporcionar ao trabalhador um período anual de repouso retribuído para a sua

146 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de maio de 2010, Processo n.º 467/06.3TTCBR.C1.S1, disponível no website

www.dgsi.pt.

147 Canotilho, Gomes e Moreira, Vital in “Constituição da República Portuguesa”, anotação I ao art. 59.º, 4ª ed. Revista, Vol. I, 2007, Coimbra E.,

pág. 770.

148 Cf. art. 238.º, n.º 1 do CT.

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recuperação física e psíquica bem como garantir-lhe temporariamente a auto determinação e

disponibilidade pessoais, integração familiar e participação social e cultural sendo que poderão,

marginalmente, traduzir um prémio nomeadamente pela assiduidade”149.

Percebe-se que, uma vez que o direito a férias se relaciona com a promoção humana,

social e cultural, bem como com a necessidade de descanso anual do trabalhador, sendo que

estimula também a colaboração do empregador com o trabalhador para a obtenção de uma

maior produtividade no seio da empresa, o trabalhador não possa efetuar outras atividades

remuneradas, durante o hiato respeitante ao período de férias, que lhe exijam esforço físico ou

intelectual, privando-o dessa forma da necessidade de descanso que fundamenta o direito às

férias remuneradas, ressalvando as exceções legalmente previstas.

Estas exceções estão previstas na 2ª parte do n.º 1 do art. 247.º do CT, e dizem

respeito às situações em que o trabalhador já exerça cumulativamente outra atividade

remunerada ou nos casos em que o empregador autoriza o trabalhador a exercer atividades

remuneradas em período de férias.

Fora estes casos, e sem prejuízo da responsabilidade disciplinar do trabalhador nos

termos do art. 328.º e segs. do CT, o empregador terá direito a reaver a retribuição de férias e o

respetivo subsídio 150 , sendo que metade desses valores reverte para o serviço de gestão

financeira do orçamento da segurança social (Cf. art. 247.º, n.º 2).

Segundo a CRP, conforme mencionado supra e nos termos do art. 237.º, n.º 1 do CT, o

trabalhador tem direito a “um período de férias retribuídas”. A este propósito o art. 264.º, n.º 1

do CT esclarece que “a retribuição do período de férias corresponde à que o trabalhador

receberia como se estivesse em serviço efetivo” e, o n.º 2 consagra o direito do trabalhador a

um subsídio de férias, diferente do montante da retribuição de férias, que compreende a

retribuição base e “outras prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico

da execução do trabalho”.

O art. 264.º do CT, relativo à retribuição do período de férias e respetivo subsídio,

suscita várias dúvidas no que concerne à própria interpretação do referido preceito. Levando em

consideração os aspetos supra mencionados quanto à dificuldade de balizar o conceito de 149 Sónia Preto, op. cit., pág. 284.

150 Nos termos do n.º 3 do art. 247.º, em cumprimento do n.º 2 do mesmo preceito, pode o empregador fazer descontos na retribuição do

trabalhador, até ao limite de um sexto, em relação a cada uma dos períodos de atribuições patrimoniais posteriores.

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retribuição, à multiplicidade de complementos salariais existente à margem do salário base e

quanto ao caráter misto ou variável da prestação retributiva, a forma de cálculo da retribuição de

férias vai também encarar todas estas dificuldades, acrescidas da circunstância da forma de

cálculo da retribuição de férias não ser coincidente com a forma de cálculo do subsídio referente

ao período de férias.

Porquanto, no que diz respeito à expressão “outras prestações retributivas que sejam

contrapartida do modo específico da execução do trabalho”, de acordo com JOANA

VASCONCELOS151, a “formulação adoptada comporta uma opção, de entre os diferentes nexos de

correspectividade que caracterizam as várias componentes da retribuição, por aqueles que se

referem à própria prestação do trabalho” isto é, a autora indica que são contrapartida do modo

específico do trabalho os “condições extrínsecas” como seja a penosidade, isolamento,

toxicidade, trabalho noturno, turnos rotativos e por isso, incluídas no subsídio de férias. Por outro

lado excluí por não serem contrapartida do modo específico do trabalho, as atribuições

patrimoniais devidas pela efetiva prestação da atividade, ou seja, as “condições intrínsecas” da

prestação do trabalho, que respeitem ao próprio trabalhador e ao seu desempenho (como

prémios de assiduidade, produtividade, gratificações, comissões), “que consistam na assunção

pelo empregador de despesas em que aquele incorreria por causa da prestação do trabalho,

quando devam considerar-se retribuição (subsídios de refeição, de transporte) ”.

O direito a férias é entendido como elemento integrante do próprio contrato de trabalho,

sendo um direito do trabalhador associado à própria personalidade do mesmo. Como explica

SÓNIA PRETO152, “trabalhar não se traduz apenas em entregar força de trabalho de uma forma que

se possa retratar como estanque, independente de todos os demais elementos que constituem o

ontos de uma pessoa. O direito a férias é um desses direitos que reflete a especial relação que

se estabelece no domínio laboral entre o empregador e o trabalhador. E é esta especial relação

(…) que justifica uma regulamentação jurídica que tenha por base e limite a dignidade do

trabalhador pessoa”.

Como referimos supra, esta é uma das causas pelas quais o contrato de trabalho não é

um contrato civil estritamente bilateral, isto é, o sinalagma que assenta na prestação do trabalho

151 Cf. Código do Trabalho Anotado de Pedro Romano Martinez e outros, anotação n.º 3 ao art. 264.º por Joana Vasconcelos, 8ª edição, outubro

de 2009, Almedina, pág. 631, e Manuel Ferreira da Costa in “A Reforma do Código Do Trabalho - A retribuição e outras atribuições patrimoniais”, dezembro de 2004, Coimbra E., pág. 404.

152 Sónia Preto, op. cit., pág. 299.

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versus retribuição, acaba por padecer de um “vício”, uma vez que mesmo durante o período de

férias, ou seja, inatividade do trabalhador, a prestação retributiva continua a ser paga ao

trabalhador, sem qualquer impacto que seja prejudicial ao trabalhador.

O legislador consagra o atual direito à retribuição de férias e explicita que a mesma diz

respeito ao valor que o trabalhador usualmente recebia se estivesse a desempenhar as suas

funções e, já quanto ao subsídio de férias, o conceito legal veio balizar as prestações que podem

ou não integrar o mesmo.

Somos levados a acreditar que, no que concerne à retribuição de férias, o legislador quis

manter a retribuição de férias proporcional à retribuição que o trabalhador aufere em período de

não férias, ou seja em serviço efetivo, excluindo as atribuições patrimoniais pagas ao trabalhador

que têm como escopo compensar as despesas que o mesmo tem a título de alimentação, e pela

deslocação que o trabalhador tem de realizar para executar o contrato.

Exclui-se em nossa opinião, portanto, estas prestações uma vez que estas circunstâncias

não se verificam em período de férias e por não terem sequer natureza retributiva, sem prejuízo

do previsto na parte final da al. a), do n.º 1 do art. 260.º se, porém, estas atribuições relativas a

despesas forem devidas independentemente da sua efetivação ou nos termos em que excedam

os valores normais.

Quanto aos complementos retributivos por trabalho noturno, isenção de horário de

trabalho, trabalho suplementar, por exemplo, deve aferir-se, em primeiro lugar, da sua natureza

retributiva através do critério do pagamento regular e periódico (cremos com base no critério dos

onze meses, conforme referido supra), e em caso oposto não deverão as mesmas assumir

caráter retributivo e, como tal, não devem ser tidas em conta para o cálculo da retribuição de

férias.

Quanto à parte variável da retribuição, referimo-nos nomeadamente ao caso das

comissões, por fazer parte da retribuição do trabalhador deve integrar, igualmente, o montante

pago a título de retribuição de férias; o critério para apurar o montante devido deve ter por

referência os doze meses anteriores, com base no art. 261.º, n.º 3 do CT153.

153 Com efeito, no que concerne às comissões o fundamento mantem-se, isto é, uma vez que as mesmas fazem parte da retribuição variável,

normalmente como complemento à parte fixa da retribuição, devem também integrar a retribuição de férias, atendendo ao valor médio.

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É nosso entendimento que o legislador, na atual consagração legal do subsídio de férias,

pretendeu eleger, entre as várias atribuições patrimoniais, aquelas que, de algum modo, se

prendem com a própria prestação do trabalho, e às específicas circunstâncias que a prestação

acarreta.

Nesta perspetiva, as atribuições a título de trabalho suplementar (porque se destina a

compensar a especial penosidade do modo específico da prestação do trabalho), trabalho

noturno (porque visa compensar a penosidade e incómodo de trabalhar à noite), trabalho por

turnos (visa remunerara a maior penosidade da prestação da atividade por turnos), isolamento

(porque visa compensar o modo específico da prestação de trabalho, pela penosidade da

prestação em isolamento), toxicidade (visa remunerar o risco acrescido derivado da exposição

que o modo especifico da prestação de trabalho implica), etc., devem ser tidos em consideração

para o cômputo do valor a pagar por subsídio de férias, por serem prestações que são

contrapartida do modo específico da execução do trabalho, sendo este o critério eleito pelo

legislador.

Dado o exposto, ficam excluídas do subsídio de férias aqueles complementos

remuneratórios que dizem respeito à pessoa do trabalhador, às despesas que o mesmo tem de

efetuar para a realização da sua prestação de trabalho, bem como ao seu desempenho, por

assim dizer, devem excluir-se do subsídio de férias, as diuturnidades, os prémios de

produtividade e semelhantes, gratificações bem como os subsídios de refeição, transporte,

fardamento, parqueamento, etc.

Ora, a disposição legal relativa à retribuição de férias no atual CT, segue a orientação já

prevista na Lei das Férias, Feriados e Faltas, concretamente o Decreto-Lei n.º 874/76, de 28 de

dezembro, que consagrava o princípio da não penalização remuneratória, e nas palavras de

ANDRADE MESQUITA154, este princípio significa que “em termos de contrapartida do trabalho, tudo

se passa como se não existisse tempo de repouso”. Este entendimento é maximalista, mas

apesar de a lei apontar para a ficção de que a retribuição de férias correspondia ao montante

que o trabalhador recebia se prestasse efetivamente os seus serviços e assentando nessa

pressuposição se determinava o quantum a pagar a título de retribuição de férias, deixava de se

154 Mesquita, José Andrade in “O direito a férias”, Estudos do Instituto do Direito do Trabalho, Vol. III, Almedina, Coimbra, 2002, pág. 106.

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considerar “substancial heterogeneidade dos pressupostos e razão de ser da atribuição de cada

uma das prestações retributivas”155.

Apesar desta visão maximalista do regime relativo à retribuição de férias, a verdade é

que o mesmo levantava algumas questões pertinentes que a doutrina não deixou de criticar.

Desde logo, a ficção não permite contabilizar o montante das prestações desligadas da mera

efetividade do trabalho e dependentes da sua qualidade ou produtividade, assim como a

assiduidade do trabalhador, sobretudo nos casos em que estas características não

determinassem apenas o quantum a pagar, mas a própria existência de determinada prestação.

Por outro lado, levanta-se também a dificuldade derivada do momento em que a retribuição de

férias se vence, isto é, a prestação vence-se e o seu montante tem de ser concretamente

determinado antes do período a que respeita, no entanto, no momento em que a mesma se

torna exigível é impossível tomar em consideração factos que, em abstrato, podiam alterar o

montante retributivo devido (por ex.: acréscimo de trabalho, maior faturação, produtividade da

empresa, etc…)156.

Por outro lado, não seria de todo razoável que o montante retributivo relativo às férias

fosse alterado em função do momento, ou forma (seguidas ou interpoladas) em que as mesmas

fossem gozadas.

Neste sentido, parte da doutrina157, ao longo da vigência da Lei das Férias, Feriados e

Faltas, entendia que a determinação das prestações devidas a título de retribuição de férias,

devia ser feita com base em “pautas de regularidade e normalidade, em função de um padrão

retributivo, em abstrato, que correspondesse a um módulo temporal de duração igual ao período

de férias”, sendo “incontornável” o recurso a um padrão retributivo, e em função desse padrão,

o trabalhador teria direito ao que lhe era devido caso estivesse em serviços efetivo. Ou seja,

como explica ANTÓNIO NUNES CARVALHO158 “teria de lhe ser pago tudo aquilo com que o prestador

de trabalho pudesse antecipadamente contar pela mera permanência em efectividade de

funções durante o período de férias. Porém, decerto que o trabalhador não poderia

legitimamente contar – a menos que outra coisa resultasse do respectivo título atributivo – com

155 Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 92.

156 Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 92 e segs.

157 Assim, Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 94 e no mesmo sentido Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 636;

“Introdução...”, pág. 100. 158 Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 94.

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prestações cuja causa de atribuição desaparecesse durante o período de férias (v.g. subsídio de

transporte) ”.

Com a entrada em vigor do CT/2003 e sucessivas revisões e, apesar da nova

abordagem que o legislador faz quanto a esta matéria, a doutrina e jurisprudência divergem

quanto ao conteúdo do montante retributivo de férias, desde logo porque certo tipo de

atribuições que o empregador concede podem não ser devidas em férias (por ex.: despesas de

transporte), por outro lado, a obrigação de inclusão das parcelas variáveis da retribuição, no

valor devido a título de retribuição de férias, mostram-se também duvidosas, pelo que esta

matéria se revela de extrema importância para as partes do contrato de trabalho e tem sido

ativamente discutida no seio dos tribunais portugueses.

Para a abordagem do tema retribuição de férias e subsídio de férias, é imprescindível

sublinhar que a retribuição, na aceção do art. 258.º do CT, tem como característica basilar ser a

contrapartida da prestação de trabalho, fixada pela vontade das partes, normas que regem o

contrato ou pelos usos. E esta característica permite ao intérprete da lei excluir do âmbito do

conceito de retribuição as prestações que não decorram da prestação do trabalho e que,

portanto, tenham fundamento divergente deste. Assim, há prestações patrimoniais, que, muito

embora possam criar no trabalhador a expectativa de recebimento, não são, rigorosamente,

correspetivas da execução do trabalho, não se podendo incluir na retribuição (nem no subsídio

de férias).

Por outro lado, releva para este matéria, a regularidade e periodicidade com que as

atribuições são conferidas aos trabalhadores, dando materialidade por um lado à presunção de

existência de vinculação prévia do empregador, e criando por outro lado expetativa de

recebimento, e criação de nexo entre a retribuição e as necessidades pessoais e familiares do

trabalhador. Mas as características da regularidade e periodicidade andam de braço dado com o

principal elemento definidor da retribuição, ou seja, o elemento da contrapartida, não têm valor

autónomo suficiente para conferir a uma atribuição patrimonial o cunho retributivo. Ou seja, as

atribuições patrimoniais conferidas de forma regular e periódica, só integrarão a retribuição, se

não tiverem uma causa específica e individualizada diversa da contrapartida159.

159 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de dezembro de 2009, Processo n.º 1881/07.9TTLSB.L1-4, disponível no website

www.dgsi.pt.

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Ora, o art. 264.º n.º 1 parece indiciar que o legislador quis atribuir ao trabalhador, a

título de retribuição de férias, não só as atribuições patrimoniais referidas no art. 258.º do CT,

(que consagra os princípios gerais da retribuição) constituída pela prestação a que nos termos

do contrato o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho (com a ressalva de que,

como mencionado supra, no caso da retribuição de férias, não há concretamente

correspetividade de prestações), compreendendo a retribuição base (Cf. art. 262.º do CT) e

outras prestações regulares e periódicas feitas pelo empregador, incluindo aquelas prestações

pecuniárias devidas pelo específico modo de prestação do trabalho (ex.: subsídio de trabalho

noturno), bem como aquelas atribuições patrimoniais que não revistam, em princípio, o caráter

retributivo, como sejam as despesas de transporte, o subsídio de refeição e outras prestações

equivalentes;

Incluindo ainda as demais prestações retributivas de caráter variável, como as

comissões, sendo que, a parte correspondente ao valor variável é calculado nos termos do art.

261.º, n.º 3, ou seja, recorrendo-se ao critério anual através do cálculo da média dos valores que

o trabalhador recebeu ou tinha direito a receber nos últimos doze meses.

Quanto ao subsídio de férias, ANTÓNIO NUNES CARVALHO160 entende que a determinação se

refere ao cálculo um complemento retributivo, pelo que se deveria aplicar, em princípio, o

regime jurídico previsto no art. 262.º do CT, caso o art. 264.º, n.º 2 não fixasse um critério para

aferir deste valor. O referido autor entende que o n.º 2 do art. 264.º não é uma norma

imperativa, mas antes fixa um regime excecional ao n.º 1 do mesmo preceito, que nem por isso

pode deixar de ser afastado pela vontade das partes, imputando no subsídio de férias os

complementos cuja atribuição tenha lugar por “força da lei e nos seus termos, como sucede

com o subsídio de isenção de horário de trabalho ou o pagamento de períodos de trabalho

nocturno incluídos no trabalho estabelecido”, mas excluí as atribuições patrimoniais que surjam

por vontade das partes, nomeadamente, as que são criadas pela autonomia coletiva e da

convenção resulte que os mesmos complementos não integram a retribuição161.

Defende o referido autor que, quando da convenção coletiva não decorra outra solução,

os complementos devem ser tidos em conta para o cálculo do subsídio de férias. Porém,

160 Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 100.

161 António Nunes Carvalho, na obra citada pág. 101, entende a este respeito que “não está aqui em causa (ao contrário de que acontece quanto

ao nível de rendimentos assegurados durante as férias) um princípio constitucional […]”.

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ressalva que o regime jurídico do subsídio de férias consagra uma “proporção mínima (no

sentido inderrogável), com o normal montante retributivo, vedando a sua distorção por

convenção coletiva”.

Ainda neste âmbito, o autor citado supra entende que, o legislador decidiu integrar as

prestações complementares acessórias, sendo sempre necessário para a sua afetação no

subsídio de férias, distinguir entre elas as que constituem contrapartida da forma de execução

da prestação162, e no que concerne à retribuição variável considera que se o montante variável for

atribuído como “contrapartida da prestação standard”, então a mesma deve ser considerada no

computo do valor do subsídio de férias a atribuir ao trabalhador.

A este respeito, LEAL AMADO 163 chama a atenção para as prestações de caráter não

retributivo, que estão ligadas à específica execução (ou execução de facto, por exemplo: subsídio

de refeição) da prestação do trabalho, e que por isso, em princípio, estas não integram a

retribuição e não serão devidas durante as férias, nos termos do art. 260.º do CT, contando com

a presunção retributiva prevista no art. 258.º, n.º 3 do CT, e diz o autor que “em caso de dúvida,

tais prestações patronais também devem integrar a retribuição em período de férias”.

No que concerne às comissões, entende este autor164, uma vez que as mesmas têm

caráter retributivo (parte variável da retribuição) e o trabalhador a elas terá direito como

contrapartida do seu trabalho, as mesmas não podem deixar de ser tidas em consideração para

efeitos do cálculo de retribuição de férias, devendo ser apurado o valor médio, nos termos do art.

261.º, n.º 3 do CT.

Já no que concerne ao subsídio de férias, LEAL AMADO 165 indica que numa primeira

abordagem as comissões não integram o conceito de “outras prestações retributivas”, a que o

CT alude, admitindo que as mesmas relevem para efeitos de retribuição de férias como

referimos supra, mas já não para o subsídio devido a esse título166. Por outro lado, entende que

162 Incluindo, nestes termos, o subsídio de isenção de horário de trabalho, ou a prestação de trabalho noturno compreendida no horário de

trabalho, bem assim como todas as prestações que decorram a “condições programadas da execução da prestação”.

163 Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 290, em nota n.º 401. 164 Amado, João Leal in “Comissões, subsídio de Natal e férias (breve apontamento à luz do Código do Trabalho) ”, Prontuário de Direito do

Trabalho, n.º 76 a 78, 2008, Coimbra E., pág. 239.

165 Amado, João Leal in “Comissões..”, pág. 241.

166 No mesmo sentido, com a ressalva de que esta matéria é discutível e por isso, admitindo a possibilidade de as comissões poderem integrar o

subsídio de férias, Rouxinol, Milena Silva in “O direito a férias do trabalhador (comentário aos artigos 237.º a 247.º e 264.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009) ”, Cadernos do Instituto de Direito das Empresas e do Trabalho n.º 8, junho de 2014, Almedina, pág. 122.

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as prestações ligadas às circunstâncias da prestação do trabalho, ao seu “condicionalismo

externo”, como sejam as prestações devidas por trabalho noturno, subsídio de risco, isolamento,

toxicidade, trabalho por turnos, penosidade, etc., devem ser tidas em conta para efeitos de

subsídio de férias.

Já MONTEIRO FERNANDES167 esclarece que estão fora do âmbito do montante retributivo

devido em período de férias, as atribuições patrimoniais cuja razão de ser esteja ligada à

prestação de facto, como sejam, nomeadamente o subsídio de refeição, bem como as

atribuições que não sejam atribuídas pelo empregador, mas sim por terceiros, como sejam as

gorjetas e ou gratificação, ainda que estas sejam uma significativa fonte de rendimento para o

trabalhador. Quanto à retribuição variável, mormente as comissões, este autor entende que a

mesmas se integram e o critério para o seu cálculo é o que vem previsto no art. 261.º, n.º 3 do

CT, com referência ao valor médio dos doze meses anteriores.

No que concerne ao subsídio de férias, MONTEIRO FERNANDES, entende que o preceito

legal permite excluir as atribuições que correspondem à antiguidade de serviço, bem como os

subsídios que não se relacionem com o “modo específico da prestação”, como seja o subsídio

de transporte, de refeição, estudos, etc.

Para DIOGO VAZ MARECOS168 a retribuição do período de férias deve incluir as prestações

pecuniárias como o subsídio de refeição e transporte. Recorrendo ao argumento da maioria de

razão, este autor inclui também, para efeitos de retribuição de férias, outras prestações

pecuniárias que se relacionem com o modo específico da prestação do trabalho como sejam,

por exemplo, o subsídio de turnos, bem como as prestações que constituam a retribuição

variável.

No que diz respeito ao subsídio de férias, na opinião deste autor, ao contrário da

retribuição de férias, neste caso não devem ser consideradas as atribuições que pressupõem a

efetiva prestação de trabalho, como o subsídio de refeição e transporte, incluindo-se, por outro

lado, todas as prestações que decorram da contrapartida do modo específico da execução do

contrato, considerando, por exemplo, o subsídio de turnos e de trabalho noturno, bem como

comissões que devem ser calculadas, nos termos do n.º 3 do art. 261.º do CT, explicando a este

167 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.358.

168 Marecos, Diogo Vaz, op. cit., anotação ao art. 264.º.

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propósito que “no subsídio de férias, o que existe é um subvenção criada por lei, não sendo

aplicável o critério para apurar a retribuição variável, hà que recorrer à regra supletiva do n.º 3

do art. 261.º […]”.

A propósito deste assunto, SÓNIA PRETO 169 entende que o legislador se quis referir ao

conceito de retribuição previsto no art. 258.º do CT, “associando-o à ideia de serviço efectivo”. A

autora explica que “apenas as parcelas que estejam ligadas ao serviço efectivo fazem parte da

retribuição devida de férias”, excluindo dessa forma aquelas atribuições que pretendem facilitar

a prestação do trabalho, ou torná-la mais cómoda, pois trata-se de despesas que não configuram

uma “receita efectiva no orçamento familiar do trabalhador”, e conclui dizendo que devem ser

excluídas da retribuição de férias aquelas atribuições patrimoniais não consideradas retribuição,

e dentro das parcelas retributivas, aquelas que não se prendam com o serviço efetivo.

A mesma autora, referindo-se aos casos em que a retribuição do trabalhador é mista,

portanto constituída por uma parte certa e uma parte variável, defende que as parcelas variáveis

devem ser contabilizadas para o cômputo do valor da retribuição de férias, sendo que o critério

supletivo a adotar para o seu cálculo, será o previsto no art. 261.º, n.os 3 e 4, clarificando que o

referido critério não assenta no fundamento de retribuir o trabalhador como se estivesse em

serviço efetivo, pelo facto de a sua referência não ser o trabalho do mês de férias a gozar, mas

antes a referência ao ano anterior, e por isso, “a ideia de retribuição do (presumível) efectivo

serviço” só deve ser aplicada supletivamente, sendo que, como esclarece, “a ideia subjacente a

este cálculo não é a média das retribuições auferidas anteriormente, mas aquela que

razoavelmente, com base na ideia de regularidade e previsibilidade da sua atribuição, lhe seria

necessariamente devido pela prestação do trabalho durante as férias”.

Mas SÓNIA PRETO vai mais longe e revela que a maior dificuldade no que concerne à

retribuição em período de férias diz respeito à impossibilidade do cálculo da retribuição em

concreto, mas da retribuição em abstrato ou modular, uma vez que, durante o gozo das férias,

não há as vicissitudes do quotidiano laboral, como sejam as faltas, os atrasos, as refeições que

devem ser somadas ou deduzidas no montante retributivo a prestar, pelo que, para aferir do

montante retributivo de férias “exige-se um juízo de prognose no sentido de apurar o que será

efectivamente devido”.

169 Sónia Preto, op. cit., pág. 314 e segs.

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A este propósito, ANTÓNIO NUNES CARVALHO170 diz que a retribuição de férias se alcança

pela “definição do padrão retributivo”, dando enfâse à ideia de regularidade, que decorre da

fixação por lei com eventuais adaptações por convenção coletiva, para o fim específico de “uma

regra retributiva, de um padrão, não se inferindo em termos aritméticos”. Para este autor, “deve

ser pago ao trabalhador aquilo que ele receberia pela mera circunstância de se encontrar

efectivamente ao serviço”, e portanto ficariam excluídas as atribuições patrimoniais irregulares,

eventuais ou que não decorressem diretamente da efetiva prestação do serviço. No entanto, na

ótica deste autor, não basta o critério da regularidade para que uma prestação possa ser

integrada na retribuição devida em férias, sendo necessário que o recebimento da mesma seja

legitimamente previsível171.

Relativamente à parte variável da retribuição, o referido autor defende que se as

prestações disserem respeito a atribuições que normal e previsivelmente estão presente na

efetiva realização da atividade a que o trabalhador está afeto, sem consideração de outras

causas específicas que afetem a sua atribuição, então estas deverão ser computadas no valor a

pagar a título de retribuição de férias, recorrendo ao critério do art. 261.º, nos 3 e 4.

JÚLIO GOMES172 destaca que, para efeito de retribuição de férias, e uma vez que o fim

último desta consagração legal é garantir que o “trabalhador não se sinta tentado, por

necessidade económica, a não gozar as férias”, devem ser consideradas “todas as componentes

da retribuição”, desde comissões, ajudas de custo, deslocações, subsídios de refeição, etc.

Com referência ao subsídio de férias, JÚLIO GOMES refere que o problema está na

circunscrição das prestações que dizem, ou não, respeito ao modo específico da execução do

trabalho. Em primeira linha, admite que há casos de fácil consideração de modo específico de

execução do trabalho, como sejam, o subsídio de turno e o pagamento de trabalho noturno. Mas

levanta sérias dúvidas ao subsídio de risco ou de isolamento, admitindo, no entanto, que os

mesmos também devem ser considerados para o subsídio de férias.

170 Carvalho, António Nunes, op. cit., pág. 96. 171 Com efeito, o autor sublinha que a lei não dá relevância aos montantes recebidos pelo trabalhador antes do período de férias para aferir o

montante devido por esse período, nem o legislador prevê os “instrumentos para a tornar operativa”, esclarecendo que não se trata de fazer uma “média a partir do que efetivamente e em concreto se passou, em termos de trabalho prestado, no período de uma ano”, mas antes de “fixar, a partir do critério legal expresso no n.º 1 do art. 264.º, uma regra ou padrão retributivo mensal (padrão este que representa uma remuneração em abstrato, uma unidade de conta)”.

172 Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 780.

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Já no que concerne ao pagamento do trabalho suplementar e às comissões, este autor

tece considerações mais cautelosas. Rigorosamente, o trabalho suplementar é uma

contrapartida cujo fundamento assenta na penosidade agravada de trabalhar fora do horário de

trabalho, e no entendimento deste autor, as prestações conferidas a este título devem ser

abrangidas pelo subsídio de férias. Contrariamente, as comissões, embora só se tornem

realizáveis através do modo específico da execução do trabalho, tendo assim um nexo de

conexão com esse modo específico, no entendimento de JÚLIO GOMES, dúvidas permanecem para

a classificação plena destas atribuições como contrapartida do modo específico da execução do

trabalho, sublinhando por fim que “a fórmula legal é hermética e fonte de alguma ambiguidade”.

Segundo BERNARDO LOBO XAVIER173, para o cálculo da retribuição de férias, deve ser tida

em consideração a retribuição em abstrato, ou modular. No que concerne às atribuições a título

de despesas que, em princípio diziam respeito ao trabalhador, as que visam facilitar o trabalho,

ou que não têm fundamento de contrapartida da prestação, como seja o subsídio de refeição,

transporte, fardamento, parqueamento, etc., entende o autor que não devem ser incluídas na

retribuição de férias bem assim, como não devem ser incluídas no subsídio de férias.

Já no que diz respeito às parcelas variáveis da retribuição, mormente as comissões de

venda e prémios, BERNARDO LOBO XAVIER, destaca, nos casos em que estas sejam consideradas

retribuição174, que a dificuldade se prende com a determinação do valor das referidas parcelas

que devam ser imputadas na retribuição de férias, sendo que, conforme refere, “a questão

estará em conciliar a necessidade de estabilizar a retribuição de modo a que o trabalhador não

esteja a receber menos durante as férias e ao mesmo tempo as expectativas do empregador em

pagar apenas em função de resultados obtidos e não em situações de não-trabalho, como as das

férias”, sugerindo que a concessão de uma única atribuição anual contribuiria para a resolução

desta querela ou a divisão dessas atribuições a obter durante um ano em catorze parcelas

(contando com a retribuição de férias e respetivo subsídio).

173 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 636.

174 Supra, opinião do autor mencionada na página 31.

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No que tange ao subsídio de férias, o autor referido defende que deve operar “um

conceito depurado e próprio da retribuição”, e por isso, o subsídio de férias “é computado como

um minus relativamente à retribuição durante as férias”175.

Quanto à referência legal “outras prestações retributivas que sejam contrapartida do

modo específico de execução do trabalho”, prevista no n.º 2 do art. 264.º, BERNARDO LOBO XAVIER

concebe que se afasta a regra geral prevista no n.º 1 do art. 262.º bem como o critério do art.

264.º, n.º 1 e nesta sequência, afasta da integração no subsídio de férias, aquelas atribuições

“relativas ao próprio trabalhador de performance, mérito ou desempenho e que foram pensadas

fora dos parâmetros directos da execução do trabalho”, e ainda que sejam retribuição não

devem ser computadas no subsídio de férias, por defender que não devem ser pagas as

“atribuições ou o seu valor em que não se verifique a ideia de contrapartida relativamente à

execução do trabalho”.

Ademais, entende que se encontram também excluídas do subsídio de férias, as

diuturnidades ou prémios de antiguidade, pelo seu fundamento ser a evolução do trabalhador na

empresa e não a forma específica de execução do trabalho, bem assim como os prémios ligados

ao trabalhador, consagrados, eventualmente, por via de contrato ou convenção coletiva, como

sejam os prémios de tecnicidade, disponibilidade, conhecimentos de línguas, etc. Além destas

exclusões, BERNARDO LOBO XAVIER, entende que também os subsídios exclusivos que se liguem,

nomeadamente com estudos, formação profissional ou equipamentos, também não devem, ser

considerados para efeitos de subsídios de férias, pois não nexo entre os mesmos e a execução

da prestação de trabalho. Ainda fora do âmbito do subsídio de férias na opinião deste autor,

estão as atribuições patrimoniais permanente e em espécie, desligadas da contrapartida

específica da prestação do trabalho, como sejam o uso de casa, telemóvel e até automóvel,

ainda que as mesmas possam ser correspondidas a título de retribuição de férias176.

Por outro lado, o autor entende que devem ser incluídas no subsídio de férias o

acréscimo de retribuição devido a trabalho noturno, bem como no caso de o “trabalhador

exercer a sua função em regime de turno, o subsídio de turnos que esteja previsto em

convenção coletiva”, por serem prestações retributivas caracterizadas como modo específico da

execução da prestação sendo este também o entendimento quanto à retribuição por isenção de

175 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 637 in fine.

176 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 639.

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horário do trabalho, com a ressalva de que há “situações muito subjetivas que podem ter mais a

ver com a disponibilidade pessoal que com a execução do trabalho”.

JORGE COSTA177 refere que com a nova redação do CT parece haver um “certo grau de

regressão, de natureza material, já que se perdeu a parificação à retribuição por férias”,

indicando que esta nova redação, quanto ao subsídio de férias, veio delimitar o seu âmbito, e

entende que estão excluídas do mesmo, pela sua natureza não corresponder ao modo específico

de execução do contrato, as prestações “facilitadoras da prestação do trabalho”, como o

subsídio de refeição, e os incentivos à produtividade, como os prémios.

Outrossim, MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO178 a propósito do subsídio de férias indica

que para calcular as “demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo

específico da execução do trabalho”, devem ser distinguidas duas categorias de prestações

complementares: as que dizem concretamente respeito às funções ou posto de trabalho daquele

trabalhador, como sejam as prestações de trabalho noturno, turnos, penosidade, risco ou

comissões; e as que digam respeito ao “cumprimento efetivo do dever do trabalho”, tais como,

por exemplo, os subsídios de refeição, transporte, alojamento, prémios de assiduidade e

produtividade e abonos para falhas. Sendo que, na opinião desta autora devem apenas ser

incluídos no subsídio de férias a primeira categoria de prestações complementares e não a

segunda, chamando a atenção que, para efeitos de inclusão no subsídio de férias, sempre será

necessário o cumprimento do requisito geral de qualquer prestação remuneratória, que é o da

natureza retributiva da prestação em causa, nos termos do art. 258.º do CT, exigindo o

cumprimento de três requisitos: periodicidade ou regularidade; contrapartida do trabalho

prestado e constituir um direito do trabalhador, sendo que na dúvida prevalece a presunção

retributiva do n.º 3 do referido preceito legal.

Acresce que a jurisprudência também não abraça um entendimento unânime no que

concerne a esta matéria, sobretudo no que respeita às comissões, sendo certo que é

entendimento generalizado que a retribuição de férias não tem uma cabal correspondência com

a retribuição auferida pelo trabalhador em serviço efetivo e, por conseguinte, o entendimento

tem sido o de excluir as prestações que são conferidas ao trabalhador como forma de

177 Costa, Jorge, in “A retribuição e outras prestações patrimoniais no Código do Trabalho (reflexão e perplexidade à volta de um direito

fundamental) ”, A reforma do Código do Trabalho, Coimbra E., 2004, pág. 387.

178 Ramalho, Maria do Rosário Palma in “Tratado...”, pág. 595.

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compensação das despesas realizadas por este não se encontrar no seu domicílio, ou por

despesas de deslocação no exercício das suas funções de trabalho. Em suma, são excluídas as

atribuições que visam compensar aquelas circunstâncias que não se verificam em tempo de

férias, concretamente, o subsídio de alimentação e transporte.

Assim, por exemplo o Supremo Tribunal de Justiça179 exclui o subsídio de alimentação e

concretiza dizendo que, o referido subsídio “embora assuma, na maior parte dos casos,

natureza regular e periódica, só é considerado retribuição na parte que exceder os montantes

normalmente pagos a esse título. E isto porque, não obstante assumir as apontadas

características, não consubstancia uma contrapartida específica da prestação laboral por banda

do trabalhador (ao contrário das componentes com natureza retributiva), mas antes uma

compensação decorrente do contrato de trabalho. […] dir-se-á, em acréscimo, que o facto das

prestações periódica e regularmente percebidas pelo trabalhador integrarem, em princípio, o

conceito de retribuição não significa que linearmente tenham de ser levadas em conta para

efeitos de cálculo das prestações cujo montante se encontra indexado ao valor da retribuição,

como, por exemplo, acontece com a retribuição de férias e os subsídios de férias e de Natal. A

retribuição a atender, para esse efeito, não é a retribuição global, mas sim a chamada

retribuição modular ou padrão, da qual devem ser excluídas aquelas prestações cujo pagamento

não é justificado pela prestação de trabalho em si mesma, mas por outra específica motivação.

O subsídio de alimentação não integra a dita retribuição modular, pois destina-se a cobrir ou

minorar as despesas que o trabalhador tem de suportar por ter de tomar as suas refeições fora

de casa, não sendo de o computar no cálculo da retribuição de férias e dos subsídios de férias e

de Natal”.

Igualmente, no que ao subsídio de transporte diz respeito, o Supremo Tribunal de

Justiça180, citando acórdão do mesmo Tribunal de 30 de março de 2006 (Revista n.º 8/2006 da

4.ª Secção) explica que devem excluir-se do cômputo da retribuição de férias e subsídio de férias

“as prestações que são atribuídas ao trabalhador, não para retribuir o trabalho no

condicionalismo em que é prestado, mas para o compensar de despesas que se presume que

tenha que realizar por não se encontrar no seu domicílio, ou por ter que se deslocar deste e para

este para executar o contrato de trabalho. É o que sucede com o subsídio de refeição, o subsídio

179 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de maio de 2010, Processo n.º 467/06.3TTCBR. C1.S1, disponível no website

www.dgsi.pt.

180 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de abril de 2007, Processo n.º 06S4557, disponível no website www.dgsi.pt.

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especial de refeição, o subsídio de pequeno-almoço e o subsídio de transporte pessoal, que

estão em correlação estrita com o tempo de trabalho efectivo” […] Estes subsídios visam cobrir

ou minorar as despesas que o trabalhador tem que suportar com a aquisição de almoço e

pequeno-almoço, fora do seu domicílio por virtude da prestação de trabalho e com o transporte

do domicílio de e para o local de trabalho. Destinam-se, pois, a fazer face a despesas concretas

que o trabalhador presumivelmente tem que efectuar para executar o contrato, para “ir

trabalhar”, não constituindo um ganho acrescido para o mesmo, uma mais-valia resultante da

sua prestação laboral, razão pela qual não se justifica a sua inclusão na retribuição de férias e

no respectivo subsídio”.

Todavia, quanto às atribuições de trabalho suplementar e de trabalho noturno, de

subsídio de compensação de horário incómodo, subsídio de abono de viagem, subsídio de

compensação por horário descontínuo, etc., tem-se entendido que se tratam prestações pagas

pela prestação de trabalho, e que, “independentemente de estarem ou não sujeitas ao princípio

da irredutibilidade, ou seja, de ser admissível que o seu pagamento cesse por deixarem de

ocorrer as particulares condições de prestação do trabalho que as justificam, devem ser

consideradas para o efeito de retribuição das férias e do respectivo subsídio, […] enquanto se

mantiver a situação que justifica tais pagamentos, sob pena de violação do princípio da não

penalização remuneratória do trabalhador em virtude do gozo das férias”.

Relativamente às prestações concedidas a título de trabalho noturno, muito

especificamente na circunstância de “trabalho prestado durante a noite excedesse as 30 horas

mensais” (sublinhado nosso) […] trabalho nocturno prestado para além das 30 horas mensais,

desenvolvido pelo trabalhador sujeito ao regime de turnos e que mais não visa senão compensá-

lo pela maior penosidade que representa laborar durante a noite, quando o número de horas por

mês ultrapasse as 30 horas de trabalho entre as 20 horas de um dia e as 7 horas do dia

seguinte”, o Supremo Tribunal de Justiça sustentou em acórdão datado de 24 de outubro de

2012181, que, basta faltar requisito da contrapartida do trabalho que o conceito de retribuição

exige e pressupõe, independentemente da sua regularidade e periodicidade, para que

determinada atribuição patrimonial não seja suscetível de partilhar daquela natureza, in casu, “o

abono em causa tem uma causa determinante diversa da prestação da actividade pelo

trabalhador, ou da sua disponibilidade para o trabalho, não devendo os valores auferidos a esse

181 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de outubro de 2012, Processo n.º 73/08.8TTLSB.S1, disponível no website www.dgsi.pt.

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título integrar o cálculo da retribuição de férias e respectivo subsídio”, dando, assim, este

tribunal relevância ao critério defendido por alguns autores que, para que uma atribuição

patrimonial integre a retribuição para efeitos de retribuição de férias, é necessário que a mesma

seja conferida no âmbito da efetiva prestação do serviço e portanto, só nesses casos seria

legitimamente expectável que as mesmas integrassem a retribuição para efeito de férias.

A propósito das prestações concedidas, por exemplo, a título de subsídio de assiduidade

– mormente prémios, diz o mesmo tribunal, em acórdão datado de 5 de junho de 2012182,

citando acórdão do Supremo Tribunal, de 18 de janeiro de 2012, processo n.º

1947/08.1TTLSB.L1.S1, da 4.ª Secção, adota o entendimento de que “revestindo-se de

natureza notoriamente aleatória e ocasional, não pode, pois, integrar no conceito legal de

retribuição. Porém, mesmo que devesse integrar tal conceito não tinha, sem mais, como

consequência que fosse devido nas férias e nos subsídios de férias e de Natal, já que nem todas

as remunerações acessórias são devidas naquelas situações”.

Outro fator que este tribunal sublinha como sendo determinante para aferir da

integração ou não de certas prestações no conceito de retribuição para efeitos de retribuição de

férias é o critério com fundamento na regularidade e periodicidade durante onze meses do ano,

conforme explica este coletivo, “estando em causa determinar o valor de atribuições patrimoniais

devidas anualmente correspondentes a um mês de retribuição, como são a retribuição de férias,

o respectivo subsídio e o subsídio de Natal, afigura-se que o critério seguro para sustentar a

aludida expectativa, baseada na regularidade e periodicidade, há-de ter por referência a cadência

mensal, independentemente da variação dos valores recebidos, o que, de algum modo, tem

correspondência com o critério estabelecido na lei para efeito de cálculo da retribuição variável

(artigos 84.º, n.º 2, da LCT e 252.º, n.º 2, do Código do Trabalho de 2003), e, assim,

considerar-se regular e periódica e, consequentemente, passível de integrar o conceito de

retribuição, para os efeitos em causa, a atribuição patrimonial cujo pagamento ocorre todos os

meses de actividade do ano”.

No que tange às comissões de vendas a bordo dos trabalhadores na TAP e enquanto

modalidade de retribuição variável, o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão datado de 2 de

182 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05 de junho de 2012, Processo n.º 2131/08.0TTLSB.L1.S1, disponível no website

www.dgsi.pt.

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abril de 2014 183 , entende que as mesmas têm natureza retributiva, configurando-se como

contrapartida do modo específico de execução do trabalho, devendo integrar-se na retribuição de

férias dos anos a que respeitam e dos subsídios de férias e de Natal, e ainda quanto à

regularidade e periodicidade e da repercussão que estas importam na expectativa de ganho do

trabalhador, neste acórdão, à semelhança de outros do mesmo tribunal, entende-se que o

critério seguro para fundamentar a expectativa de ganho do trabalhador, com base na

regularidade e periodicidade, tem por base uma “cadência mensal”, “independentemente da

variação dos valores recebidos”, recorrendo ao critério estabelecido para o cálculo da retribuição

variável, nos termos dos nos. 3 e 4 do art. 261.º do CT, considerando assim como regular e

periódica, integrante do conceito de retribuição para o pagamento de retribuição de férias, as

prestações conferidas durante onze meses do ano.

Em sentido contrário, um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa 184 entende que

“numa primeira aproximação à nova fórmula adoptada pelo CT para o cálculo do subsídio de

férias, parece-nos que ela comporta uma opção, de entre os diferentes nexos de

correspectividade que caracterizam as várias componentes da retribuição, por aqueles que se

referem à própria prestação do trabalho, isto é, às específicas contingências que o rodeiam, ou,

dizendo de outro modo, ao seu condicionalismo externo (penosidade, isolamento, trabalho

nocturno, turnos rotativos), em detrimento daqueles que pressuponham a efectiva prestação da

actividade, quer respeitem ao próprio trabalhador e ao seu desempenho (prémios, gratificações,

comissões), quer consistam na assunção pelo empregador de despesas em que incorreria o

trabalhador por causa da prestação do trabalho (subsídios de refeição e de transporte). Em

relação a certas prestações retributivas, como o subsídio de turno, o acréscimo devido pelo

trabalho nocturno, o subsídio de risco ou de isolamento, podemos afirmar, com alguma

segurança que são contrapartida do modo específico da execução do trabalho. Já o mesmo não

parece suceder com as comissões, os prémios e as gratificações”.

183 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2 de abril de 2014, Processo n.º 2911/08.6TTLSB.L1.S1, disponível no website www.dgsi.pt.

184 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12 de março de 2009, Processo n.º 2195/05.8TTLSB-4, disponível no website www.dgsi.pt.

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9. Subsídio de Natal

O subsídio de Natal vem previsto no art. 263.º do CT. Inicialmente terá sido consagrado,

apenas por via de lei aos trabalhadores da Administração Pública em regime de emprego público

e aos trabalhadores com contrato de serviço doméstico 185 . Para a generalidade dos

trabalhadores, este direito foi instituído através da contratação coletiva e só com o Decreto-Lei

n.º 88/96, de 3 de julho, é que foi instituída para a maioria dos trabalhadores, embora em

regime supletivo, sendo que mediante acordo entre as partes podiam existir disposições diversas

nesta matéria.

O legislador laboral, através do subsídio de Natal, quis conceder ao trabalhador uma

maior disponibilidade financeira na quadra natalícia, através do pagamento de uma prestação

pecuniária, para aquele fazer face ao acréscimo de despesas características desta época do ano.

Conforme descrito no art. 263.º do CT, o subsídio de Natal configura uma prestação

retributiva, que se vence anualmente, e deve ser paga até ao dia 15 do mês de dezembro, e o

montante equivale a um mês de retribuição, mas poderá ser superior se acordado mediante

convenção coletiva ou por contrato individual, nos termos do art. 3.º do CT.

A regra geral é a de que o subsídio de Natal é atribuído por inteiro, mas pode, em

circunstâncias específicas, sofrer de algumas “supressões”. Como explica LEAL AMADO 186 ,

caracteriza-se por ser uma “prestação retributiva de formação progressiva ao longo do ano civil,

num salário diferido que se vai sedimentando gradualmente”. Ou seja, o n.º 2 do art. 263.º

prevê que o subsídio de Natal é pago de forma proporcional aos serviços prestado em cada ano

civil, no ano de admissão do trabalhador, no ano de cessação do contrato e em caso de

suspensão do contrato por facto respeitante ao trabalhador. Nesta última hipótese, o legislador

ressalvou os casos em que a suspensão por facto respeitante ao empregador 187 , em que a

suspensão não altera suprime o direito ao subsídio de Natal por inteiro do trabalhador.

Ora, é a propósito do valor do subsídio de Natal que surgem as dúvidas sobre esta

matéria. Discutia-se se este valor dizia respeito se o valor referido no art. 263.º a título de

subsídio de Natal, será o previsto no art. 258.º do mesmo diploma, incluindo todos os elementos

185 Leite, Jorge in “Observatório Legislativo”, Questões Laborais, Ano III - n.º 8, 1996, Coimbra E., pág. 214.

186 Amado, João Leal in “Comissões...”, pág. 236, nota de rodapé n.º 10; e o mesmo autor in “Contrato...”, pág. 304, em nota n.º 438.

187 Insolvência e Recuperação da empresa, art. 347.º; encerramento temporário do estabelecimento por caso fortuito ou força maior, art. 350.º;

encerramento temporário do estabelecimento por facto imputável ao empregador, art. 351.º, todos do CT.

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descritos nesse preceito ou se diz respeito ao valor que o empregador paga, de forma regular e

periódica, por cada mês de trabalho, é uma questão bastante complexas, sobretudo nos casos

em que a retribuição auferida pelo trabalhador tem uma parte variável.

Na verdade, esta matéria com a entrada em vigor do CT/2003 encontrou um

entendimento maioritário pacífico. Com a consagração do art. 262.º do CT com “um campo de

aplicação potencial bastante dilatado”188, veio dissipar a maior parte das questões levantadas

sobre esta matéria.

Segundo ROMANO MARTINEZ189, o subsídio de Natal configura um “complemento salarial

certo” e deve atender-se à regra contida no art. 262.º do CT, que só abrange a retribuição base

e as diuturnidades 190 para aferir do montante devido a título de subsídio de Natal, ficando,

portanto, excluídos todos os complementos salariais que o trabalhador aufere, nos termos do art.

263.º do CT, ainda que tenham caráter retributivo, ressalvando-se apenas os casos em que as

partes disponham em sentido oposto191.

Com entendimento semelhante, MONTEIRO FERNANDES 192 diz que o “subsídio é uma

prestação complementar porque não tem correspectividade directa com certa quantidade de

trabalho”, pelo que o art. 262.º do CT configura um regime supletivo que deve ser seguido, que

indica que a base de cálculo será composta pela retribuição base e diuturnidades193.

É entendimento de BERNARDO LOBO XAVIER194 que o legislador laboral, com a consagração

legal do subsídio de Natal e embora não o dizendo expressamente, quis referir-se apenas à

obrigatoriedade de pagamento da retribuição certa seguindo, assim, o princípio geral do art.

262.º do CT, que refere que a “base de cálculo para as prestações complementares e

acessórias – entre as quais o subsídio de Natal – é constituída apenas pela retribuição base e

188 Amado, João Leal in “Contrato...”, pág. 304.

189 Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 556 e segs. 190 A maioria da doutrina partilha desta opinião, por exemplo, Joana Vasconcelos, Código do Trabalho Anotado de Pedro Romano Martinez e

outros, anotação ao art. 263.º por, 8ª edição, outubro de 2009, Almedina, pág. 629; Manuel Ferreira da Costa, op. cit., pág. 402 e 403. 191 No mesmo sentido, Maria do Rosário Palma Ramalho in “Tratado...”, pág. 594.

192 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.406.

193 Com o mesmo entendimento, LEAL AMADO in “Comissões...”, pág. 237 e 238.

194 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, “Manual...”, pág. 552.

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diuturnidades”, ressalvando os casos previstos na lei com soluções diversas ou acordados entre

as partes mediante convenção coletiva ou contrato de trabalho195.

Ao contrário da maioria da doutrina, JORGE LEITE196 defendia que o que se entende por

“um mês de retribuição” deve ser “o montante equivalente ao que recebe o trabalhador em

cada um dos 12 meses do ano, tudo se passando como se a 12.º se seguisse um 13.º mês,

recebendo neste o que lhe é pago naquele. Porém, quando tenha havido oscilações ao longo do

mesmo ano civil, o montante do subsídio deve corresponder à média das retribuições dos

diferentes meses”, sendo que para este autor esta configuraria a “solução mais equilibrada e

mais conforme com o princípio da tendencial proporcionalidade que se desprende do disposto

no n.º 2 do art. 2.º” do Decreto-Lei n.º 88/96.

Entendendo-se em discórdia com a maioria da doutrina mas admitindo que contrariar o

entendimento predominante será inócuo, JÚLIO GOMES197 questiona a própria natureza acessória

ou complementar da prestação patrimonial concedida a título de subsídio de Natal, entendendo

que hoje já não deve ser este o entendimento quanto à natureza daquela prestação.

Este autor explica, questionando que, muito embora o subsídio de Natal tenha a fonte na

contratação coletiva e uma vez que esta prestação é hoje obrigatória, por força da lei, se não

será hoje “retribuição normal para todos os efeitos, sucedendo apenas que o montante

retributivo global recebido por um trabalhador já não é hoje dividido por 12 prestações mensais”.

E vai mais longe, dizendo que, apesar de reconhecer a existência de indícios na lei em sentido

oposto, exemplificando com a forma de cálculo da retribuição horária, na qual a retribuição

mensal é multiplicada por 12 (art. 271.º do CT), questiona se não haverá um “anacronismo

resultante de não se ter considerado a obrigatoriedade legal do pagamento do subsídio de

Natal”, continuando a afirmar que, ainda que se considere que o subsídio de Natal é uma

prestação complementar ou acessória, sempre se poderá dizer que o art. 262.º do CT não

estabelece que “onde a lei diz retribuição se deve ler retribuição base e diuturnidades”, e a

interpretação do art. 263.º respeitante ao subsídio de Natal pode ser a de estabelecer o

contrário, “uma vez que diz expressamente que o trabalhador tem direito a um subsídio de Natal

de valor igual a um mês de retribuição".

195 No mesmo sentido, Jorge Costa, op. cit., pág. 402 e 403; António Nunes Carvalho, op. cit., pág. 86.

196 Leite, Jorge in “Observatório...”, pág. 215.

197 Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 779.

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A jurisprudência relativamente ao conteúdo do subsídio de Natal, até à entrada em vigor

do CT/2003, era pacífica e considerava que “ao prever que os trabalhadores têm direito a

subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, pelo seu teor literal e tendo ainda em

consideração a unidade do sistema jurídico, pretendeu assegurar que o subsídio de Natal fosse,

em todos os casos, de valor igual a um mês de retribuição, apontando no sentido de que, para

efeito do pagamento do subsídio de Natal, devia também atender-se a todas as prestações

retributivas que fossem contrapartida da execução do trabalho198. Ou seja, “os subsídios de Natal

vencidos antes da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003 podiam ter um valor distinto

daquele que tiveram, ou deveriam ter, posteriormente à entrada em vigor daquele diploma,

incluindo remuneração base e todos os suplementos ou complementos remuneratórios que

fossem retribuição, os quais eram calculados de acordo com os valores médios recebidos, nos

termos previstos no n.º 1 do art. 2.º do Decreto-Lei n.º 88/96, de 3 de julho, e dos n.os 2 dos

arts. 82.º e 84.º da LCT”199.

Em consequência da entrada em vigor do CT/2003, com as alterações que até hoje

foram feitas, é entendimento generalizado que não devem ser tidas em consideração as

atribuições patrimoniais que pressupõem a efetiva prestação do trabalho e que visam, tão-

somente, compensar o trabalhador das despesas que realiza pela efetiva execução das suas

funções, como sejam o subsídio de refeição e transporte. Por outro lado, não entram também

para o cálculo do quantum devido por subsídio de Natal as prestações que sejam contrapartida

do modo específico da execução do trabalho, como sejam os complementos salariais a título de

subsídio de turnos, trabalho noturno, etc., ainda que estes sejam concedidos de forma regular e

periódica. Desta feita, o valor do subsídio de Natal é balizado pelo legislador, nos termos do art.

262.º do CT, aferindo-se pelo montante da retribuição base e diuturnidades, salvo quando por

disposição legal, cláusula contratual ou mediante instrumentos de regulamentação coletiva

aplicável ao caso em concreto haja disposição em sentido oposto.

É também nosso entendimento que, traduzindo-se o subsídio de Natal numa prestação

complementar, acompanhando o juízo de MONTEIRO FERNANDES referido supra, aplicar-se-á ao

subsídio de Natal o disposto no art. 262.º n.º 1 do CT que diz que “a base de cálculo da

prestação complementar ou acessória é constituída pela retribuição base e diuturnidades”,

198 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de dezembro de 2010, Processo n.º 2065/07.5TTLSB.L1.S1, disponível no website

www.dgsi.pt.

199 Marecos, Diogo Vaz, op. cit., em anotação ao art. 263.º.

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ressalvado os casos de disposição legal, convencional ou contratual que disponham em sentido

oposto, conferindo assim a esta norma uma natureza supletiva.

Em suma, o art. 263.º do CT dispõe que o subsídio de Natal é de “valor igual a um mês

de retribuição”, e em consequência do subsídio de Natal configurar uma prestação

complementar, salvo disposição legal, convencional ou contratual em contrário, o seu quantum

há-de equivaler à soma da retribuição base e das diuturnidades, uma vez que, manifestamente,

na aferição do montante das prestações complementares e acessórios, o legislador quis afastar

expressamente as restantes prestações recebidas pelo trabalhador, independentemente do seu

caráter regular e periódico, afastando nesta norma o princípio da omnicompreensibilidade200, que

diz que a retribuição compreende todas as prestações que tenham nexo de causalidade com o

contrato de trabalho.

200 Marecos, Diogo Vaz, op. cit., em anotação ao art. 262.º.

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10. O Ónus da Prova – Presunção de Laboralidade

De acordo com o art. 342.º, n.º 1 do CCivil, aquele que invoca um direito tem o ónus de

fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado. Esta é a norma civil geral no que

concerne ao ónus da prova. E se se aplicasse esta norma ao regime laboral, em matéria de

retribuição, sempre que o trabalhador alegasse que determinada prestação que lhe foi atribuída

pelo empregador, ser uma prestação retributiva teria de provar que auferiu ou tinha direito a

receber certas prestações do empregador e que as mesmas integravam o conceito de

retribuição, por cumprirem os elementos constitutivos da retribuição.

No entanto, o legislador laboral, ciente da dificuldade agravada de tal prova pelo

trabalhador, estabeleceu no n.º 3 do art. 258.º do CT em matéria de retribuição, uma

presunção, geralmente em benefício do trabalhador, de que se presume retribuição “toda e

qualquer prestação do empregador ao trabalhador”. Como referimos supra aquando das

considerações feitas acerca da referida presunção, esta é uma presunção iuris tantum, ou seja,

ilidível.

Ora, nos termos do art. 350.º, n.º1 do CCivil, “quem tem a seu favor esta presunção

escusa de provar o facto a que ela conduz” o que significa que, a existência da presunção do art.

258.º, n.º 3 do CT leva a uma inversão do ónus da prova 201 . Assim, muito embora os

pressupostos da retribuição constituírem factos constitutivos para a alegação e invocação do

direito do trabalhador, e nos termos gerais do direito civil, o trabalhador dever provar a existência

dos mesmos, este beneficia da presunção consagrada no CT, invertendo assim o ónus da prova,

e fazendo com que seja o empregador que tenha o encargo de demonstrar a existência dos

elementos integrantes do conceito de retribuição, ou seja, o caráter regular e periódico e a

correspetividade da prestação.

Na verdade, não basta ao trabalhador alegar a presunção, o mesmo tem de demonstrar

que recebeu as invocadas prestações pecuniárias, não tendo no entanto de provar que as

mesmas são contrapartida do seu trabalho.

A dificuldade relativa a este regime é a conciliação da presunção do art. 258.º, n.º 3 do

CT com as exclusões legais previstas no art. 260.º, n.º 1 do mesmo diploma legal. Como vimos,

201 Cf. art. 344 do CCivil - Inversão do Ónus da Prova.

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incumbe ao empregador, nos termos dos arts. 344.º, n.º 1 e 350.º, n.º 1 do CCivil, provar que

as prestações atribuídas ao trabalhador revestem a natureza de ajudas de custo, ou abono de

viagem (etc.), que têm causa individualizada e específica, aproveitando assim a consagração

prevista no art. 260.º, n.º 1 do CT, ilidindo dessa forma a presunção de existência de uma

prestação retributiva, muito embora este entendimento seja discutido no seio da jurisprudência

nacional.

Por um lado, o Supremo Tribunal de Justiça, com o entendimento de que é ao autor que

cabe o ónus da prova de que as prestações atribuídas a título de despesas de transporte, ajudas

de custo, etc., não constituem prestações retributivas, dispõe em acórdão datado de 18 de junho

de 2008, o seguinte: “No caso vertente, os termos em que se expressou a decisão da matéria

de facto (e respectiva fundamentação) permitem afirmar, como se afirmou no acórdão

impugnado, que, apesar de não concretizados os custos suportados pelo Autor para a execução

do contrato, a(s) importância(s) que lhe eram pagas “a título de ajudas de custo” tinham

fundamento específico diverso da prestação do trabalho, ou, mais rigorosamente, da

disponibilidade de prestar o trabalho, a que corresponde a retribuição” 202.

Por outro lado, com um entendimento diferente, a Relação do Porto em acórdão de 18

de fevereiro de 2013203, em jeito de resumo, refere que “O “Ab. Kms”, pago de 1995 a 1998, a

que se reporta a clª 155ª do AE aplicável aos C… publicado no BTE nº 24/1081,e o “Abono de

viagem/Mar” a que se reporta, posteriormente, a clª 147.º do AE aplicável aos C… previsto no

BTE 21/1996, bem como nos AE posteriores, ainda que pago regularmente, não constitui

retribuição, competindo ao trabalhador, pelo menos, a alegação de que tais abanos não visam a

compensação a que se reportas as citadas clªs ou outras despesas decorrentes de viagens e/ou,

bem assim, que o pagamento excede o montante das despesas que o pagamento do referido

abono visa compensar”, esclarecendo na fundamentação do referido acórdão que “importa

também referir que, mesmo que se considerasse, por via da presunção legal decorrente dos

arts. 82.º, nº 3, da LCT, 249.º, nº 3, do CT/2003 e 258.º, nº 3, do CT/2009, que caberá ao

empregador o ónus da prova de que determinada prestação paga ao trabalhador não constitui,

face do disposto nos arts. 87.º da LCT e 260.º do CT/2003 e do CT/2009, retribuição, sempre

incumbirá ao Autor/trabalhador, pelo menos, impugnar a natureza compensatória de prestação

202 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de junho de 2008, Processo n.º 07SS4480, disponível no website www.dgsi.pt. 203 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18 de fevereiro de 2013, Processo n.º 573/10.0TTSTS.P1, disponível no website

www.dgsi.pt.

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que lhe haja sido paga a algum dos títulos previstos nestes últimos preceitos, sendo certo que a

ele cabe a definição do objeto e termos do litigio através da formulação do pedido e da indicação

da respetiva causa de pedir. Assim, e tendo presente o caso em apreço, se ao trabalhador é

paga determinada prestação a título de abonos de viagem (suscetível de se enquadrar no

disposto nos citados arts. 87.º da LCT e 260.º do CT de 2003 e de 2009), caber-lhe-á, caso

pretenda discutir a veracidade do título/designação ao abrigo do qual o pagamento foi feito, pelo

menos invocá-lo, delimitando o objeto da causa que pretende ver discutido”(sublinhados

nossos).

Logo se percebe que a questão do ónus da prova não é tão linear quanto a doutrina

parece entender.

Em primeiro lugar, sempre se deverá questionar se a norma legal que estabelece a

presunção de que todas as atribuições patrimoniais feitas pelo empregador ao trabalhador

constituem retribuição, salvo prova em contrário – invertendo assim o ónus da prova (de certa

forma desfavorecendo o empregador), prevalece sobre a norma legal que expressamente

consagra quais as prestações que devem ser excluídas (ou incluídas) na retribuição.

Salvo melhor parecer, e tendo sobretudo em conta a sistematização do CT, é defensável

que o legislador quando consagrou as exclusões legais do conceito de retribuição, em artigo

posterior à previsão da presunção retributiva, fê-lo com a intenção de amenizar a prova a ser

produzida pelo empregador, pelo menos, quanto à não integração daquelas prestações no

montante retributivo.

Ademais, conforme explica o Tribunal da Relação de Lisboa204 a propósito da inversão do

ónus da prova e da presunção de laboralidade, “esta presunção legal em matéria de retribuição

não tem, em si mesma, uma função qualificativa adicional das prestações do empregador ao

trabalhador, nem confere um valor qualificativo autónomo ou superior a nenhum dos elementos

do conceito de retribuição que atrás enunciámos. Assim, por exemplo, não basta a verificação da

regularidade e da periodicidade (ou melhor, o seu não afastamento pelo empregador, por força

da presunção legal) para que as prestações sejam qualificadas como retributivas, para os

devidos efeitos legais. A regularidade e a periodicidade com que são atribuídas as prestações

204 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de dezembro de 2009, Processo n.º 1881/07.9TTLSB.L1-4, disponível no website

www.dgsi.pt.

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são apenas um dos vários elementos integradores do conceito de retribuição, não tendo

qualquer apoio na lei a ideia de que tem um valor autónomo e suficiente”.

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11. Prescrição – Implicações no Pagamento da Retribuição

11.1 A Prescrição no Código Civil Vigente - Resenha

Uma questão de especial relevo, que é comummente discutida dos tribunais

portugueses, é a dúvida se poderão ser exigidos créditos emergentes do contrato de trabalho,

vencidos há mais de vinte anos, ou se pode o trabalhador legitimamente demandar o

empregador para pagamento de uma indemnização, por ilícito laboral sofrido há mais de trinta

anos.

Na verdade, no que à matéria da prescrição dos créditos laborais diz respeito, a doutrina

tem tido um entendimento grosso modo pacífico.

Apesar de para um melhor entendimento acerca deste tópico ser sempre necessário

fazer uma revisão à evolução legislativa, no que concerne ao regime da prescrição dos créditos

laborais, em primeiro lugar cumpre sintetizar o regime geral da prescrição consagrado no Código

Civil.

Por conseguinte, o CCivil vigente, no capítulo III do subtítulo III da Parte Geral, dedica-se

ao “tempo e sua repercussão nas relações jurídicas”, regulando na secção II o instituto da

prescrição.

Como explica CARVALHO FERNANDES 205 , o CCivil de 1867 206 referia que “a prescrição

extintiva referia-se, em termos gerais, o fenómeno de extinção de um direito e,

correspondentemente, de uma obrigação, pelo seu não exercício, durante certo tempo;

reservava-se a expressão prescrição aquisitiva – ou usucapião – para referir o fenómeno de

aquisição de um direito real por efeito da manutenção da respectiva posse, verificados certos

atributos da mesma, durante certo período de tempo”. O referido autor continua dizendo que

nos dias de hoje, “o Código Civil actual reserva a palavras prescrição sem mais qualificativos,

para referir o primeiro instituto (arts. 300.º e 327.º) e recorre, para a chamada prescrição

aquisitiva, ao termo clássico de usucapião”.

205 Fernandes, Carvalho in “Teoria Geral do Direito Civil II”, 5ª edição revista e atualizada, E. Universidade Católica, Lisboa, 2010, pág. 686.

206 O CCivil de 1867, previa no seu art. 505.º o conceito de prescrição, diferenciando entre a prescrição positiva e negativa ou extintiva. No CCivil

em vigor, a chamada “prescrição negativa ou extintiva” diz respeito à prescrição, por outro lado, “a prescrição positiva” diz respeito à figura da usucapião, prevista e regulada no Livro II do CCivil atual.

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Assim, a prescrição é regulada pelos arts. 298.º, n.º 1, 300.º a 327.º do CCivil e, nos

termos do n.º 1 do art. 304.º do referido diploma, “tem o beneficiário a faculdade de recusar o

cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito”,

ou seja, “apenas acontece que o direito de exigir (obrigação civil) fica reduzido a um direito de

pretender (obrigação natural) ”207.

Com respeito à definição do conceito de prescrição, o art. 298.º, n.º 1 do CCivil vem

assinalar os seus fatores distintivos, a saber: o não exercício do direito devido a inércia do seu

título; durante um hiato de tempo considerável; os direitos não sejam indisponíveis ou a lei os

não declare isentos de prescrição. Ora, a legislação não consagra assim uma noção legal desta

figura.

MENEZES LEITÃO208 indica que a prescrição configura uma exceção perentória, sendo que

paralisa em definitivo o direito do credor, que deixa de poder exigir o seu cumprimento, estando

nas mãos do devedor a realização da obrigação de forma voluntária, sendo que a mesma não

pode ser repetida nos termos no n.º 2 do art. 304.º do CCivil. Para este autor, ao contrário da

maioria da doutrina209, a prescrição deve ser incluída nas causas de extinção das obrigações.

O legislador, através do instituto da prescrição permite que o devedor se oponha ao

exercício de um direito, cujo titular não invocou nem dele fez uso durante um lapso temporal

previsto na lei, por razões de segurança e paz social. De certa forma compreende-se que a

inércia do credor crie no devedor uma legítima expectativa do não desejo do exercício do direito,

que deve também ser protegida, por razões de estabilidade e confiança jurídica. Está em causa

o conflito entre a “justiça” e a “certeza ou segurança” das relações jurídicas210.

Para que o devedor possa fazer vale a prescrição, para que esta seja eficaz, precisa de

ser invocada, nos termos do n.º 1 do art. 303.º do CCivil, pelo que o tribunal não a pode

oficiosamente suprir, só a podendo considerar quando a mesma for invocada a título de exceção

perentória211.

207 Hörster, Heinrich Ewald in “A Parte Geral do Código Civil Português – Teoria Geral do Direito Civil”, 4ª reimpressão da ed. De 1992, março de

2007, Almedina, pág. 214.

208 Leitão, Menezes in “Direito das Obrigações”, Vol. II, 2001, 8ª edição, pág. 119.

209 Entre outros, Cf. Fernandes, Carvalho, op. cit., pág. 692.

210 Fernandes, Carvalho, op. cit., pág. 687

211 Cf. n.º 1 e n.º 3 do art. 576.º e art. 579.º do CPC.

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O prazo ordinário da prescrição é de vinte anos (art. 309.º). No entanto, a lei prescreve

prazos inferiores ao prazo ordinário nos arts. 310.º, 316.º e 317.º, todos do CCivil.

Conforme acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 212 de 13 de outubro de 2010, o

fundamento da prescrição é a inércia do respetivo titular, que ou significa a renúncia ao seu

direito ou, de qualquer maneira, o torna indigno de proteção jurídica213.

No que concerne à retribuição, tem aplicação a al. g) do art. 310.º do CCivil, que fica

que as prestações “periodicamente renováveis” prescrevem no prazo de cinco anos.

Nos termos do art. 306.º do CCivil, o prazo de prescrição começa a correr desde a data

em que o direito em causa possa ser exercido, com a ressalva de que, se o beneficiário da

prescrição só se encontrar vinculado ao seu cumprimento depois de decorrido um certo hiato

temporal, só após o termo desse prazo se inicia a contagem da prescrição.

O prazo de prescrição é contínuo, salvo ocorrência de causas de suspensão (arts. 318.º

a 322.º do CCivil) ou interrupção (arts. 323.º a 327.º do CCivil).

A suspensão do prazo de prescrição implica que esta não corra enquanto a causa que a

suspende se mantiver, sendo que quando a causa de suspensão cessar, o prazo retoma a sua

contagem, ou seja, as causas de suspensão da prescrição “adormecem” a prescrição.

Como explica LEAL AMADO214, “fala-se em suspensão do curso quando ela impede o início

ou o curso da prescrição (que a prescrição comece a correr ou que prossiga) e em suspensão do

termo quando ela impede que o tempo da prescrição se complete”.

Por outro lado, a interrupção do prazo de prescrição tem como consequência a

inutilização do prazo já decorrido, ou seja, cessando a causa de interrupção, dá-se início a uma

nova contagem de um prazo integral a partir do ato interruptivo.

Em suma, e nas palavras do Supremo Tribunal de Justiça215, “em regra todos os direitos

estão sujeitos a prescrição, o que vale por dizer que o não exercício do direito por parte do titular

e no prazo fixado pela lei, conduz à prescrição. Excetuam-se os direitos indisponíveis e os

212 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13 de outubro de 2010, Processo n.º 76/10.2YFLSB, disponível no website www.dgsi.pt. 213 Esta posição era bem traduzida no velho adágio “dormientibus non socurrit ius”. 214 Amado, João Leal in “A prescrição dos Créditos Laborais (Nótula sobre o art. 381.º do Código do Trabalho”, Prontuário do Direito do Trabalho

– 71, pág. 68.

215 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13 de outubro de 2010, Processo n.º 76/10.2YFLSB, disponível no website www.dgsi.pt.

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direitos que a lei declare isentos de prescrição (art.º 298.º 1, do CC). A prescrição tem por fonte

um facto, o decurso do tempo. E, verifica-se quando nesse período temporal definido pela lei o

titular do direito não o exerce. A prescrição é determinada no interesse do devedor ou sujeito

passivo da relação jurídica, e supõe a negligência ou inércia do titular do direito, o que inculca a

sua renúncia e o torna por isso, indigno de proteção jurídica”.

11.2. A Prescrição no Código do Trabalho – Evolução Legislativa

Nacional

A Lei n.º 1952, de 10 de março de 1937, previa no seu art. 25.º que “a prescrição dos

ordenados e salários e das remunerações e indemnizações […] devidos a empregados ou

assalariados despedidos, corre desde o dia seguinte ao da rescisão do contrato de trabalho”216,

ou seja, desde o término da relação laboral, indicando assim o início da contagem do prazo de

prescrição. Até então era aplicável o disposto nos arts. 535.º e 536.º do Código de Seabra, que

por sua vez tinham caráter imperativo.

Como explica MONTEIRO FERNANDES217, o legislador para justificar o início da contagem do

prazo de prescrição após a data da cessação do contrato de trabalho, presumiu que o

trabalhador não teria liberdade psicológica para reclamar o que lhe é devido durante a vigência

do contrato.

Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 47 032, de 27 de maio de 1966, deu-se uma

alteração significativa do teor da lei quanto ao instituto da prescrição dos créditos laborais.

Assim, o art. 38.º previa que “todos os créditos resultantes de trabalho e da sua violação ou

cessação, que pertencentes à entidade patronal, quer pertencentes ao trabalhador, extinguem-se

por prescrição, decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de

trabalho, sem prejuízo do disposto na lei geral acerca dos créditos pelos serviços prestados no

exercício de profissões liberais”.

216 Sem prejuízo do disposto no art. 26.º do mesmo diploma legal: “Os preceitos desta lei não prejudicam o que estiver ou vier a ser estabelecido

em contratos ou acordos colectivos de trabalho e são imediatamente aplicáveis aos contratos vigentes”. 217 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.414.

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Note-se que há uma alteração significativa no texto da norma no que concerne aos

sujeitos que podem beneficiar da prescrição, aos créditos que podem ser suprimidos por via da

prescrição e um previsão de um prazo para a extinção de créditos por via da prescrição.

Ora, se no diploma precedente o legislador se referia à prescrição “dos ordenados e

salários e das remunerações e indemnizações […] devidos a empregados ou assalariados

despedidos”, à luz do Decreto-Lei n.º 47 032, de 27 de maio de 1966, vem o legislador prever:

a) créditos resultantes de trabalho e da sua violação ou cessação – já não se referindo apenas

aos créditos relativos à retribuição ou indemnizações devidas; b) pertencentes à entidade

patronal, quer pertencentes ao trabalhador – aditando à lista de sujeitos a “entidade patronal”,

atualmente o empregador; c) extinção no prazo de um ano, a partir do dia seguinte à cessação

do contrato – fixação de um prazo de curta duração para o exercício do direito. Entende-se que o

legislador contemplou os créditos devidos também ao empregador para “salvaguardar uma certa

simetria de posições entre as partes”218 da relação laboral.

Mas cumpre avançar na evolução legislativa no que concerne ao regime jurídico da

prescrição dos créditos laborais.

Com efeito, com a alteração registada pelo Decreto-Lei n.º 49.408, de 24 de novembro

de 1969219, que no seu 38.º artigo estatui: “todos os créditos resultantes do contrato de trabalho

e da sua violação, quer pertencentes à entidade patronal, quer pertencentes ao trabalhador,

extinguem-se por prescrição, decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o

contrato de trabalho, sem prejuízo do disposto na lei geral acerca dos créditos pelos serviços

prestados no exercício de profissões liberais”, o legislador já contemplou os créditos resultantes

do “contrato de trabalho”, diferentemente dos diplomas precedentes que consagravam

“ordenados e salários e das remunerações e indemnizações” e “todos os créditos resultantes de

trabalho e da sua violação ou cessação”. Por outro lado, acolheu a disposição já consagrada na

primeira versão da LCT, incluindo neste preceito os créditos pertencentes ao trabalhador bem

como ao empregador, e a fixação do prazo de um ano para a invocação da prescrição, sob pena

de extinção dos créditos por via da prescrição. Este diploma apenas faz a ressalva, na parte final

218 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág. 414. 219 Comummente designada LCT.

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do n.º 1 do seu art. 38.º, aos créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões

liberais, aos quais manda aplicar a lei geral220.

Com a codificação das leis laborais, surge em 2003 do primeiro CT no regime jurídico

português. Este código manteve no seu art. 381.º, n.º 1, na generalidade, a redação dada pela

LCT, quanto à prescrição dos créditos laborais, apenas afastando a disposição da última parte

do n.º 1 do art. 38.º concernente aos créditos pelos serviços prestados no exercício de

profissões liberais e alterando a terminologia de um dos sujeitos da relação laboral, considerada

mais correta, para a referência “empregador”, anteriormente designado por “entidade patronal”.

Outrossim, com a entrava em vigor do CT/ 2009, registou-se uma alteração significativa

do regime da prescrição dos créditos laborais. Desde logo, no que concerne à sistematização, o

CT de 2009 prevê o regime da prescrição na secção V, concretamente no art. 337.º, n.º 1. No

que respeita ao conteúdo literal da norma, o legislador laboral de 2009 consagrou: “o crédito de

empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação

prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de

trabalho”. Consigna-se, essencialmente, a alteração da referência “todos os créditos” para “o

crédito”.

Como refere BERNARDO LOBO XAVIER221, “é claro que se podem sempre extrair algumas

consequências do desaparecimento de ênfases… A verdade é que podia ser dada algum

significado histórico à expressão «todos» na altura da publicação da LCT, porque se simplificou a

discriminação dos créditos, segundo os seus vários títulos e titulares, que constava dos arts. 23.º

e 24.º da L. n.º 1952, artigos aos quais se somava a norma do C. Civ. de Seabra que

estabelecia a prescrição de 6 meses, e sobretudo pelo caso especial de caducidade anual

quanto ao trabalho extraordinário”.

No que à prescrição dos créditos laborais diz respeito, a doutrina tem sido unânime

quanto ao entendimento de que o início da contagem do prazo de prescrição do direito do

trabalhador só se verifica com o terminus do contrato de trabalho, e justifica esta posição com a

presunção de que o trabalhador não está plenamente livre de exercer os seus direitos durante a

vigência da relação laboral. Por outro lado, e de acordo com a ideia de simetria na relação de

220 Cf. art. 317.º do CCivil, que estabelece um prazo de prescrição de dois anos para os créditos resultantes do exercício de profissões liberais. 221 Xavier, Bernardo da Gama Lobo in “A prescrição nas Relações de Trabalho (Uma Questão Polémica) ”, Revista de direito e de estudos sociais,

2012 (XXVI da 2ª Série), pág. 15, nota de rodapé n.º 15.

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trabalho, o benefício de o início da contagem do prazo prescricional só se iniciar após a

cessação do contrato de trabalho também se aplica ao empregador 222 ; em sentido oposto,

BERNARDO LOBO XAVIER223.

Neste estudo não nos propomos a analisar com pormenor o regime especial de prova de

certos créditos previsto no n.º 2 do referido art. 337.º do CT. Assinalemos, porém, que este

normativo indica que os créditos vencidos há mais de cinco anos resultantes de indemnização

por falta do gozo de férias, ou pela aplicação de sanções abusivas e pela realização de trabalho

suplementar só podem ser provados por documento idóneo, embora este não seja o tema que

pretendemos abordar com mais afinco no presente estudo; para mais desenvolvimentos veja-se

BERNARDO LOBO XAVIER 224 , que indica que se deve considerar “um documento escrito que

demonstre a existência dos factos constitutivos do crédito”.

11.3. A Prescrição dos Créditos Laborais

Na atual regime jurídico o instituto da prescrição dos créditos laborais vem previsto no

art. 337.º, n.º 1 do CT.

Este normativo consagra “uma concepção ampla do conceito de crédito laboral”225, isto

é, são incluídos neste preceito todos os créditos que resultem da celebração, da execução, da

violação e da cessação do contrato de trabalho o que, necessariamente, abarca os créditos

retributivos. O mesmo preceito prevê que o “crédito laboral” prescreve no prazo de um ano a

partir da cessação do seu contrato de trabalho (independentemente do motivo que gerou a

cessação do mesmo226).

A primeira crítica que surge a esta norma jurídica, acompanhando neste ponto LEAL

AMADO227, prende-se com o facto de o legislador laboral dar um tratamento igual, no que concerne

222 Cordeiro, Menezes in “Manual...”, pág. 735. 223 Xavier, Bernardo da Gama Lobo in “A prescrição...”, pág. 26.

224 Xavier, Bernardo Lobo, in Regime Jurídico do Contrato de Trabalho, Anotado, 2.ª ed., Coimbra, Atlântida E., pág. 103 225 Marecos, Diogo Vaz, op. cit., ponto 4 da anotação ao art. 337.º do CT.

226 Como refere Pedro Romano Martinez, in “Direito...”, pág. 573, “a extinção do vínculo deve entender-se em sentido factual, abrangendo a

hipótese de despedimento ílicito”.

227 Amado, João Leal in “A prescrição...”, pág. 69.

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à disciplina da prescrição, a todo e qualquer crédito proveniente da relação laboral,

independentemente do titular do crédito ser o trabalhador ou o empregador.

A segunda crítica ao regime jurídico da prescrição dos créditos laborais relaciona-se com

a falta de clareza no que respeita ao início da contagem do prazo prescricional e à aplicação, ou

não, das regras da prescrição consagradas no CCivil.

Impõe-se assim, na ótica dos créditos retributivos, uma abordagem mais profunda a este

tema, uma vez que esta matéria suscita vastas dúvidas e levanta complexas querelas junto dos

tribunais portugueses.

A doutrina e jurisprudência dominantes têm tido o entendimento de que o trabalhador se

encontra numa posição bastante restritiva, de forma a criar no espírito do trabalhador um certo

sentimento de temor em agir contra o empregador por este se encontrar numa circunstância

social e económica alegadamente mais favorável. Por outro lado, a subordinação jurídica do

trabalhador em relação ao empregador, caracterizadora do contrato de trabalho, pode fomentar

algum embaraço para o trabalhador fazer valer os seus direitos. Assim, recorrendo a estes

argumentos é a maioria da doutrina e jurisprudência têm dado o seu parecer no sentido de que

a prescrição não se inicia, nem corre, na pendência da relação laboral.

Assim, para LEAL AMADO228, na vigência do contrato de trabalho existe uma “verdadeira

suspensão do curso da prescrição”, que se fundamenta na “desigualdade das forças em

presença” na relação laboral. Para este autor, a supremacia económica e social do empregador

aliada à subordinação jurídica que caracteriza as relações laborais origina, no trabalhador, um

sentimento de inibição e receio para este último vir reclamar daquele os seus créditos na

vigência do contrato. No entanto, o referido autor critica a curta durabilidade do prazo de um

ano, por entender que a solução mais adequada aos interesses das partes seria a de aplicar aos

créditos laborais um prazo mais dilatado, de cinco anos, conjugado com a suspensão do termo,

segundo o qual a prescrição só se pudesse completar um ano após a cessação contratual.

Em concordância com esta tese MONTEIRO FERNANDES229 indica que presumivelmente, na

pendência da relação laboral, o trabalhador se encontra numa situação de dependência para

exercer plena e livremente os seus direitos. No entanto, entende que o importa para o início da

228 Amado, João Leal in “A prescrição...”, pág. 69.

229 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.415.

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contagem do prazo de prescrição o “momento da ruptura da relação de dependência, não o

momento da cessação efectiva do vínculo jurídico” mesmo que o ato tenha posto termo à

relação de trabalhão venha mais tarde a ser declarado inválido.

No mesmo sentido ROMANO MARTINEZ230 também defende que na vigência do contrato de

trabalho subsiste uma suspensão da prescrição.

JÚLIO GOMES231, com entendimento semelhante, recorre à teleologia da norma, dizendo

que o que está em questão é que “as partes não se sintam compelidas a recorrer aos tribunais,

durante a vigência do contrato de trabalho sob pena de perderem os seus direitos, já que o

recurso aos tribunais teria frequentemente sequelas sobre a continuação da relação laboral”.

Neste sentido, vai mais longe e alega este autor que “a prescrição dos créditos laborais não

deveria correr (ou deveria interromper-se) sempre que cessado um contrato de trabalho, as

mesmas partes viessem depois a celebrar um novo contrato de trabalho232” e, no mesmo sentido

pronunciou-se a Relação de Lisboa233.

De forma discordante argumenta BERNARDO LOBO XAVIER234 que não se pode retirar da letra

da lei que não se aplica aos créditos laborais, os prazos prescricionais gerais nem mesmo que

durante a relação laboral a mesma não corra ou fique a prescrição suspensa. Diz o autor que se

assim o legislador o quisesse dizer, expressaria que “a prescrição só se inicia e corre finda a

relação do trabalho”, ou diria o preceito legal que o “crédito emergente de contrato de trabalho

(ou da sua violação ou cessação) só prescreve ou apenas prescreve decorrido um ano a partir da

cessação do contrato”.

BERNARDO LOBO XAVIER explica que o que se pretendeu com a consagração do mesmo

regime prescricional de curto prazo para créditos do trabalhador e do empregador, foi suprimir a

“gritante injustiça”, uma vez que até a referida consagração admitia que os créditos dos

empregadores subsistissem por um longo período de tempo após a cessação da relação laboral,

e os créditos dos trabalhadores prescrevessem no prazo de um ano finda a relação de trabalho.

230 Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 572. 231 Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 904 e segs. e o mesmo autor in “Estudos dedicados ao Professor Doutor Luís Alberto Carvalho Fernandes”,

Vol. II, Universidade Católica E., 2011, pág. 353 e segs.

232 Indica que no caso de existência de contratos sucessivos entre as partes, devia produzir o mesmo efeito sobre a prescrição dos créditos

laborais já existentes.

233 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2 de fevereiro de 2014, Processo n.º 4598/12.2TTLSB.L1-4, em citação do Acórdão de 17

de janeiro de 2007, Processo n.º 7258/2006-4 do mesmo tribunal, ambos disponíveis no website www.dgsi.pt.

234 Xavier, Bernardo da Gama Lobo in “A prescrição...”, pág. 16.

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O autor defende que se deve partir do princípio que a letra da lei nada diz diretamente

sobre a suspensão da prescrição no decurso das relações de trabalho e não aceita os

argumentos sustentados pelos maioria dos intérpretes de que essa seria a vontade subjetiva do

legislador laboral, uma vez que é nesse sentido que vai a interpretação tradicional, constante e

unânime da norma, sem nunca ter sido posta em causa pelas várias redações da mesma; então

deve ser essa a sua interpretação.

Assim, entende que objetivamente são abarcados na letra da lei relativa à prescrição dos

créditos laborais as regras gerais do CCivil relativas ao prazo e da sua contagem, podendo

coexistir com a prescrição de curto prazo do CT235, podendo ser aplicadas a ambas as partes da

relação laboral as regras prescricionais previstas no CCivil e as regras previstas no CT. Para o

mencionado autor nada justifica a inércia das partes por um hiato temporal tão prolongado e o

devedor carece de tutela tendo em conta a inércia do credor, sobretudo porque pode gerar uma

convicção de tolerância ou perdão da sua dívida. Ademais, explica que a exigência inesperada de

créditos somados e com juros pode gerar um colapso económico no devedor. Outrossim a

prescrição de curto prazo prevista no CT tem como fundamento a segurança e certeza jurídica

no acerto de contas e a facilitação da aplicação do regime da compensação, o que não se

harmoniza com a paralisação ocasionada pela suspensão.

Resumindo, este autor propõe uma leitura linear da norma que fixa o regime da

prescrição dos créditos laborais no CT, uma vez que na sua opinião na letra da mesma não há

nada que se oponha à aplicação dos prazos gerais de prescrição previstos no CCivil. Esta

perspetiva assenta na ideia de que o que se retira da leitura da norma jurídica relativa à

prescrição dos créditos laborais não é a pretensão de paralisação durante a vigência da relação

laboral, mas antes a consagração de um novo prazo prescricional (curto) que se aplica

suplementarmente e se conta a partir do dia seguinte à cessação da relação de trabalho,

aplicável aos créditos de ambas as partes da relação laboral.

Defendendo a aplicabilidade das normas gerais do CCivil, DIOGO VAZ MARECOS236 diz que

“não pode deixar de causar desconforto que um trabalhador, volvidos 40 anos sobre um

vencimento de um crédito que não lhe foi pago atempadamente, possa vir reclamá-lo, desde que

a relação laboral tenha cessado há menos de um ano”. Assim, este autor perfilha que não há

235 Xavier, Bernardo da Gama Lobo in “A prescrição...”, pág. 35.

236 Marecos, Diogo Vaz, op. cit., ponto 6 da anotação ao art. 337.º.

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motivos para afastar as normas gerais em matéria de prescrição dos créditos laborais pois,

aplicando-se essas normas, “a prescrição inicia-se a partir do momento em que os créditos

laborais são exigíveis, continuando a correr até à verificação da prescrição, ou seja, 5 anos para

as prestações periódicas, cf. artigo 310.º do Código Civil (nestas se incluindo o crédito

retributivo), e 20 anos quanto às demais prestações não periódicas cf. artigo 309.º do Código

Civil”, e continuando afirmando que se o legislador quisesse que a “prescrição dos créditos

laborais não se iniciasse, nem corresse na pendência do contrato de trabalho, tê-lo-ia previsto

expressamente, à semelhança do que sucede a quem presta trabalho doméstico, cf. alínea e) do

artigo 318.º do Código Civil”.

Para este autor, o exercício das relações laborais mudou o seu paradigma, pelo que é

comum nos dias de hoje a observância de alguns comportamentos que durante muitos anos

constituíam exceção, concluindo dizendo que o tráfico jurídico obriga a uma segurança jurídica e

previsibilidade que é posta em casa pelo entendimento generalizado de que a prescrição dos

créditos laborais não se inicia nem corre no decurso da relação laboral.

Em suma, na esteira de BERNARDO LOBO XAVIER e DIOGO VAZ MARECOS, não nos parece de

todo absurdo que se aplique aos créditos laborais as regras gerais do CCivil. Em primeiro lugar

porque, objetivamente, a norma jurídica relativa à prescrição no CT, não exclui liminarmente a

aplicação das regras gerais. Por outro lado, é inquietante, do ponto de vista da paz,

previsibilidade e segurança jurídica, que passados vinte e trinta anos (ou mais), possa vir ser

exigido o pagamento de um crédito que não foi pago tempestivamente, sobretudo nos casos em

que o trabalhador teve um comportamento compactuante com o incumprimento do empregador,

não demonstrando, em qualquer altura da vigência do contrato e sucessivo incumprimento por

parte do empregador, a sua vontade de fazer valer os seus direitos, causando no empregador

um legítimo sentimento de condescendência para com esse incumprimento, decorrente da

passagem de um prazo de longa duração.

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11.4. A Prescrição dos Juros

O principal crédito emergente do contrato de trabalho corresponde à retribuição, que por

sua vez é um dos elementos essenciais do mesmo 237, e que configura o principal tema em

análise.

O conceito de retribuição vem consagrado no art. 258.º CT, complementado pelos

esclarecimentos prestados pelos arts. 259.º e 260.º do mesmo diploma legal, nos termos

expostos nos capítulos precedentes no presente estudo.

Ora, o art. 337.º do CT, na sua atual redação, reporta-se ao “crédito […] de trabalhador

emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação”. Ora, perante o incumprimento

contratual, por parte do empregador, decorrente da falta de pagamento da sua principal

obrigação – retribuição – estamos perante um crédito do trabalhador que deriva do contrato de

trabalho ao qual, portanto, se aplica o regime prescricional consagrado pelo art. 337.º.

Não raras são as vezes em que o trabalhador por via judicial vem demandar o

empregador para o pagamento de juros desde a data de vencimento das prestações retributivas.

Destarte, cumpre fazer um comentário ao regime jurídico da obrigação de juros, previsto

no CCivil.

Com efeito, o art. 561.º do referido diploma legal consagra a “autonomia do crédito de

juros”, e retira-se do citado normativo que “o crédito de juros não fica necessariamente

dependente do crédito principal”. Nestes termos, é fixado o prazo de cinco anos para a

prescrição dos créditos decorrentes dos juros, determinando assim um afastamento claro em

relação ao regime aplicável à obrigação principal.

Salvo melhor parecer, sempre se poderá afirmar que o crédito de juros não decorre

objetivamente do regime laboral, ou seja não decorrem do contrato de trabalho, da sua violação

ou cessação, mas antes das regras consagradas no Direito Civil.

Saliente-se que os créditos de juros têm um regime jurídico fixado por lei que consagra o

princípio da autonomia dos mesmos (Cf. art. 561.º e 310.º d), ambos do CCivil) em relação à

obrigação capital. No caso em concreto, os juros devidos por mora no pagamento da obrigação

237 Cf. a este propósito o art. 1152.º do CCivil.

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retributiva devem seguir o seu regime próprio e não o regime previsto no CT para a prescrição

dos créditos laborais, ou seja, é de qualificar os juros como civis e não de natureza laboral.

Outrossim, tendo em conta aquele princípio previsto no art. 310.º do CCivil, os juros dos

créditos laborais devem obedecer-lhe e, por isso, entende-se que os mesmos prescrevem ao fim

de cinco anos.

Ou seja, não é defensável que a obrigação dos juros assuma a natureza laboral apenas

porque a obrigação principal reveste essa natureza, e assim não nos parece razoável que se lhes

seja aplicável o mesmo regime, tanto mais que o regime da prescrição dos créditos laborais é

um regime especial. Isto é, o regime jurídico da prescrição dos créditos laborais é um regime

excecional e não refere os juros, e nem mesmo pela interpretação da norma se alcança uma

sustentação mínima em sentido contrário (art. 9.°, n.º 2 do CCivil), pelo que nos parece

inequívoco que o regime consagrado pelo art. 337.º do CT não abrange os juros no seu âmbito.

Nesta senda, o Tribunal da Relação de Coimbra238 entende que “atenta a sua autonomia

em relação ao capital, aos juros dos créditos laborais, como aos que decorrem de qualquer outro

tipo contratual, é aplicável o prazo de prescrição previsto no artigo 310.º, alínea d) do Código

Civil, norma específica que abrange expressamente no seu âmbito aplicativo todos e quaisquer

juros”.

Com entendimento semelhante, ROMANO MARTINEZ 239 diz que “não faria sentido que,

concedendo-se uma situação de benefício ao credor, se lhe permitisse ainda «ganhar» com o

valor de prestações acessórias, mormente a dívida de juros”. Este autor reitera dizendo que a

especial tutela da prescrição consagrada para os créditos emergentes do contrato de trabalho,

sua violação ou cessação, prevista no CT pelo art. 337.º, não se aplica à obrigação acessória de

juros, que é autónoma da dívida capital, sendo que aceita a aplicação normativa em sentido

oposto seria estar a “permitir que o credor beneficiasse de um venire contra factum proprium:

não reclama o pagamento da dívida durante um período longo porque a prescrição não corre e

vem depois exigir o pagamento de juros durante esse longo período”.

Tendo em conta os ditames da boa fé da previsibilidade, segurança e certeza jurídica,

não parece que o legislador tenha consagrado um regime prescricional, no âmbito dos créditos 238 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de março de 2011, Processo n.º 1191/09.0TTCBR.C1, disponível no website

www.dgsi.pt.

239 Martinez, Pedro Romano in “Direito...”, pág. 575.

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laborais, mormente da retribuição, que visasse incluir os juros nos sucessivos preceitos da

prescrição dos créditos laborais, sendo certo que configura uma insensatez jurídica que um

trabalhador após vinte e trinta anos, sobre o vencimento de um crédito que não lhe foi pago

atempadamente, possa vir reclamar juros desde o vencimento, o que resultava num descomunal

prejuízo para o empregador.

Paralelamente o art. 337.º do CT fixa, no seu n.º 1, um regime que se refere a

circunstâncias derivadas do contrato de trabalho, sua violação ou cessação. Por outro lado,

relevam para a aplicação do seu n.º 2 créditos equiparados à violação do direito a férias,

indemnização por sanção abusiva ou pagamento de trabalhão suplementar. Diante disto, parece

não estar incluído na letra da lei qualquer referência aos juros.

Através desta solução, alcança-se a pretendida simetria na relação laboral, pois por um

lado o prazo de cinco anos em que assenta o art. 310.º d) do CCivil é francamente mais

vantajoso para o trabalhador do que o curto prazo de um ano previsto na disciplina laboral; por

outro lado, para o empregador este regime é também mais profícuo visto que o prazo passa a

contar desde os juros possam ser exigidos.

Convém ainda, quanto à data do vencimento dos juros respeitante às prestações

retributivas debatidas, nomeadamente se uma dada prestação deve ou não ser integrada no

valor devido ao trabalhador a título de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de

Natal, esclarecer quando os mesmos se vencem.

Resulta do art. 806.º, n.º 1 do CCivil que na obrigação pecuniária vencem juros a contar

do dia da constituição em mora. O momento da constituição em mora, vem previsto no art.

805.º do mesmo diploma legal. De acordo com o art. 805.º do CCivil, o devedor só fica

constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir e,

nos termos do n.º 3 do referido preceito, sendo o crédito ilíquido não há mora enquanto este não

se tornar líquido.

No entanto, o art. 323.º do CT consagra uma regra especial no que concerne à falta de

cumprimento das prestações pecuniárias, não bastando, na moral laboral, o não pagamento,

sendo também necessário um juízo de culpa.

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Não obstante ser consagrado um prazo certo para o pagamento da retribuição de férias,

subsídio de férias e de Natal, se a questão quanto à natureza das prestações patrimoniais

prestadas ao longo da relação laboral for controvertida na medida de saber se as mesmas

integram ou não o conceito de retribuição não se pode considerar a quantia liquidada no

momento do pagamento do seu pagamento.

Pelo que não se mostra razoável exigir do devedor o cumprimento de uma prestação da

qual ele não saiba o montante e o objeto exato da prestação que lhe cumpre realizar – in

illiquidis non fit mora.

Apenas pela avaliação casuística é que se pode afirmar, com clareza, se e quais são as

prestações que o trabalhador aufere ao longo do contrato com o empregador que se podem

considerar retribuição para efeito de pagamento da retribuição de férias, subsídio de férias e de

Natal. Assim, o trabalhador só pode demandar o empregador para o pagamento de juros caso se

verifique que este último não cumpriu a sua prestação no que concerne à inclusão de

determinados montantes no pagamento de retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal,

quando lhe era possível fazê-lo no tempo devido.

Razão pela qual se entende que não havendo culpa do devedor, não é possível imputar

ao empregador a mora geradora de condenação em juros, sendo que estes são devidos tão só a

partir do momento do dia da constituição em mora, nos termos do art. 806.º do CCivil.

Em sentido diverso, o Tribunal da Relação do Porto240 entende que “os juros de mora

relativos a créditos laborais encontram-se submetidos ao regime da prescrição constante do

artigo 38.º, n.º1 da LCT, 381.º, nº 1 do CT de 2003 e 337.º, nº 1 do CT de 2009, que

estabelecem um regime especial e, nessa medida, constituem um desvio ao regime geral

estabelecido no artigo 310.º, al. d) do Código Civil”. Com o mesmo entendimento pronunciou-se

a Relação de Lisboa241, entendendo que “(…) na formulação ampla da norma cabem os juros de

mora, sendo essa a interpretação que melhor corresponde às exigências do art.º 9.º do CC, quer

por atender ao pensamento legislativo quer por ser a mais coerente com a unidade do sistema

jurídico (n.º1), sem que se lhe possa apontar (como defende o entendimento contrário), que

não tenha na lei correspondência verbal (n.º 2), dado que essa abrangência é intencional”. 240 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18 de dezembro de 2013, Processo n.º 1260/12.0TTPRT-A.P1, disponível no website

www.dgsi.pt.

241 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21 de maio de 2014, Processo n.º 1195/13.9TTLSB.L1-4, disponível no website

www.dgsi.pt.

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124

Para MENEZES CORDEIRO 242 o prazo de prescrição previsto no art. 337.º do CT é

igualmente aplicável aos juros moratórios relativos aos créditos laborais, deixando de estar

sujeitos às regras gerais do CCivil243.

A mesma orientação é perfilhada por MILENA SILVA ROUXINOL244. A autora explica que a

decisão de demandar o empregador para o cumprimento das obrigações em falta é sempre

condicionada pelo “típico constrangimento psicológico do trabalhador ante a entidade

empregadora”. E, por outro lado, rejeita igualmente o argumento de que “encontrando-se o

trabalhador protegido pelas normas e princípios laborais, mormente o da segurança no

emprego, pode ignorar-se qualquer inibição para o exercício dos direitos que lhe assistem”.

Assim, entende que “a decisão de reagir contra a entidade empregadora só se afigura, para o

trabalhador, como pensável a partir do momento em que a relação se quebra”, e reitera que se

aplique o mesmo regime aos juros.

242 Cordeiro, Menezes in “Manual...”, pág. 380.

243 No mesmo sentido Gomes, Júlio in “Direito...”, pág. 905.

244 Rouxinol, Milena Silva in “O regime da prescrição dos Juros Laborais – Comentário ao Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de

março de 2011”, disponível no website do Repositório Científico Lusófona - http://recil.grupolusofona.pt/.

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12. Do Exercício Abusivo do Direito por Suppressio

O Capítulo III do Livro I, referente à Parte Geral do CCivil, é consagrado ao tempo e às

suas repercussões nas relações jurídicas. As figuras previstas neste regime, como formas de

repercussão do tempo, são a prescrição, a caducidade e o não uso. No entanto, esta

enumeração parece não ser taxativa, sendo que a doutrina e a jurisprudência têm apontado

outras figuras jurídicas que têm eficácia direta pelo decurso do tempo.

Com efeito MENEZES CORDEIRO 245 propõe a hipótese da suppressio ex bona fide ou

supressão por exigência de boa fé, isto é, o autor explica que as regras previstas no

ordenamento jurídico, atinentes à repercussão do tempo, servem para assegurar a certeza e a

segurança, definido balizas de aplicação generalizada, mas atenta para o facto de o Direito ter

uma preocupação diferenciadora que carece de ser tutelada, pelo que nem o instituto da

prescrição nem a caducidade “têm aptidões para aderir aos meandros das situações

individuais”. Assim, este autor sugere que o corretivo necessário para assegurar tais situações

poderia advir da boa fé, preconizando o instituto supra referido, explicitando que: “perde a sua

posição jurídica a pessoa que não exerça por um período de tempo e em circunstâncias tais que

não mais seja de esperar qualquer exercício”.

Este autor defende que esta figura é uma das diversas modalidades do instituto do

abuso de direito e designa a posição do direito subjetivo que não tendo sido exercido em

determinadas circunstâncias num dado hiato temporal, não mais deverá poder sê-lo, sob pena

de contrariar a boa fé.

Segundo o acórdão da Relação do Porto de 17 de junho de 2013 246 , “a supressio,

enquanto modalidade do abuso do direito, respeita àquelas situações em que uma posição

jurídica que não tenha sido exercida em certas circunstâncias e por certo lapso de tempo, não

mais possa sê-lo por, de outro modo, contraria a boa-fé”.

A suppressio é a expressão latina do termo Verwirkung, originário do direito alemão. A

origem desta figura é jurisprudencial, mas o seu surgimento deu-se no âmbito da “venda de

ofício comercial, a favor do comprador, ficando consignadas em decisões do então

245 Cordeiro, Menezes in “Tratado de Direito Civil” Vol. V, Almedina, Coimbra, 2011, pág. 236.

246 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de junho de 2013, Processo n.º 629/10.9TTBRG.P2, disponível no website www.dgsi.pt.

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Reichsoberhandelsgericht – o Tribunal Superior do Comércio do Império Alemão, antes da

unificação das jurisdições civil e comercial”247.

Como explica a Relação do Porto248, o seu surgimento deu-se “no tempo da I Guerra

Mundial, de grande inflação, em que se verificavam alterações elevadas no valor das

mercadorias, como é típico de tais circunstâncias temporais. Visou obstar aos inconvenientes de

se exercer o direito, em matéria comercial, decorridos longos períodos de tempo, onde não

existiam prazos de prescrição e o cumprimento dos contratos levaria à ruína de uma das partes

pela subida vertiginosa de preços. Daí que o exercício do direito em tais circunstâncias seja

entendido como abuso”.

MENEZES CORDEIRO249 elucida que em consequência das alterações monetárias, o exercício

tardio de alguns direitos conduzia a situações de desequilíbrio inadmissível entre as partes, e a

suppressio iria funcionar como contrapeso, assegurando o efeito do devedor, indicando que a

boa fé requer o equilíbrio da situação das partes. Chama ainda a atenção para um ponto

essencial, referindo que a suppressio surgiu como um instituto autónomo e só mais tarde houve

aproximação ao conceito da boa fé e ao instituto do abuso de direito.

Relativamente ao sucesso e aceitação desta figura MENEZES CORDEIRO250 indica que foi

com a conciliação da suppressio à proibição de venire contra factum proprium com a seguinte

matriz: “o titular do direito, abstendo-se do exercício durante um certo lapso de tempo, criaria,

na contraparte, a representação de que esse direito não mais seria actuado; quando

supervenientemente, viesse agir, entraria em contradição”.

Em consonância com o desenvolvimento independente do conceito e a fixação de um

regime diferenciador, o autor supra referido indica alguns elementos basilares para a aferição da

existência da suppressio nas situações jurídicas. Por um lado, afirma que todos os direitos

subjetivos lhe estão sujeitos, salvo determinadas exceções; é exigido um certo decurso de tempo

sem exercício, tempo esse que é eminentemente variável consoante as circunstâncias. Ademais

requerem-se indícios objetivos de que o direito em causa não irá mais ser exercido251.

247 Cordeiro, Menezes in “Tratado...” Vol. V, pág. 315.

248 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de junho de 2013, Processo n.º 629/10.9TTBRG.P2, disponível no website www.dgsi.pt.

249 Cordeiro, Menezes in “Da Boa-fé no Direito Civil”, Vol. II, Almedina, Coimbra, 1984, pág. 801.

250 Cordeiro, Menezes in “Tratado...” Vol. V, pág. 320.

251 Cordeiro, Menezes in “Da Boa-fé...”, pág. 810 e segs.

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Neste sentido, é coerente afirmar que o hiato de tempo sem exercício para se poder

arguir a suppressio em detrimento do direito do credor sempre terá de ser inferior do que os

prazos de prescrição, sob pena de inutilidade da figura da suppressio; sendo que será

necessário fazer um juízo equilibrado relativamente ao caso em concreto para aferir que já não é

de se esperar o exercício do direito em causa.

Em nota de rodapé252, o mesmo enuncia como exceções, nomeadamente, os direitos que

prescrevem em períodos curtos, por no prazo de prescrição ser sempre de contar com o seu

exercício; os direitos legalmente excluídos da suppressio; os direitos emergentes de contratos

coletivos de trabalho; certos direitos essenciais dos trabalhadores, como o direito ao salário.

Aponta ainda a suppressio como um instituto objetivo, ou seja, independente de culpa

(dolo ou má fé) do titular atingido, requerendo apenas a sua inércia. Sendo que, por um lado, é

afetada por elementos voluntários que interrompam ou suspendam o decurso do prazo de

prescrição ou caducidade, uma vez que tais ocorrências deitam por terra a ideia de que o direito

não mais iria ser exercido. Por outro lado, indica que esta figura é uma “saída extraordinária”,

tendo natureza subsidiária e por isso, só podendo ser aplicada se mais nenhuma solução

prevista no ordenamento jurídico for aplicável ao caso253.

VAZ SERRA254 refere que a Verwirkung é uma figura análoga à prescrição, acolhida pela

jurisprudência alemã, tendente a valorar o não exercício do direito, em certos casos excecionais,

sem que tenha decorrido qualquer prazo de caducidade ou de prescrição.

Por outro lado, PAIS DE VASCONCELOS255 referindo-se a esta figura entende que, tal como a

surrectio (Erwirkung)256, não instituem um novo tipo de abuso de direito. São sim, subtipos do

venire contra factum proprium, e ambas as figuras traduzem o comportamento contraditório do

titular do direito que o vem exercer depois de uma prolongada abstenção e acrescenta que é

essa abstenção prolongada no exercício de um direito que pode, em certas circunstâncias,

suscitar uma expectativa legítima e razoável de que o seu titular o não irá exercer ou que haja

252 Cordeiro, Menezes in “Da Boa-fé...”, pág. 810, nota n.º 603.

253 Cordeiro, Menezes in “Da Boa-fé...”, pág. 812.

254 Serra, Vaz in “Prescrição e Caducidade”, BMJ 105, pág. 5.

255 Vasconcelos, Pedro Pais de in “Teoria Geral do Direito Civil”, Almedina, Coimbra, 2012, pág. 240.

256 Menezes Cordeiro indica que a expressão “Erwirkung” foi proposta por CANARIS para se referir ao “surgimento”, e explica que a língua

portuguesa não comporta a construção de novas palavras, por aditamentos ou partículas, pelo que, para o efeito, propõe a termo “surrectio” para se referir a Erwirkung, Cf. Cordeiro, Menezes in “Tratado...”, Vol. V, Almedina, Coimbra, 2011, pág. 324.

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renunciado ao próprio direito, ao exercício de algum dos poderes que o integram, ou a certo

modo do seu exercício.

Em suma, a suppressio apresenta-se como uma forma de tutela da confiança do seu

beneficiário (devedor), perante a inércia do titular do direito (credor)257. Ora, para cimentar esta

teoria MENEZES CORDEIRO indica que esta figura carece de circunstâncias colaterais que melhor

fundamentem a confiança do beneficiário, a saber: a) um não exercício prolongado; a existência

de uma situação de confiança; uma justificação para essa confiança; um investimento para essa

confiança e a imputação da confiança ao não exercente do direito.

O fundamento para a tutela da confiança do beneficiário assenta, essencialmente, no

não exercício prolongado. Este tem de ser de tal forma relevante que crie no espírito do homem

médio, colocado na posição do beneficiário concreto, a legítima expectativa de que aquele direito

não mais deverá ser exercido. Pelo que, esta confiança e o investimento nela feito deverão ser

protegidos, sob pena de causar danos irreparáveis.

Face ao exposto, o referido autor conclui258 afirmando que “a suppressio manifesta-se

porque, mercê da confiança legítima, uma pessoa adquiriu (por surrectio) uma posição

incompatível com um exercício superveniente, por parte de exercente”. Assim, na ponderação

dos interesses de ambos, vai-se dar preferência ao beneficiário, porque tendo em conta o

investimento de confiança, os danos sofridos com por este último seriam consideravelmente

superiores às vantagens que o titular do direito iria colher e porque, face ao nexo de imputação

de confiança, o titular do direito não exercido se coloca numa situação que faculta julgar social e

eticamente ajustado o seu sacrifício.

Nos termos propugnados pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça259, “como tem

sido assinalado pela doutrina, os casos redutíveis a um exercício abusivo do direito por

suppressio, impõem que, patente ou ostensivamente, se crie, no obrigado, a convicção de que a

prestação já não virá a ser exigida, sob pena de a posterior exigência representar para ele um

incomportável sacrifício”

257 Cordeiro, Menezes in “Tratado...”, Vol. V, pág. 323.

258 Cordeiro, Menezes in “Tratado...” , Vol. V, pág. 324.

259 Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de junho de 2009, Processo n.º 09S0620, disponível no website www.dgsi.pt.

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Transponhamos, então, para o campo do Direito do Trabalho a figura que acabamos de

apresentar, no âmbito do presente estudo quanto à repercussão que o conceito de retribuição

causa na retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, enquadrando a suppressio

nos casos em que o trabalhador vem requerer judicialmente a integração de certos suplementos

salariais no conceito de retribuição para efeitos de retribuição de férias, subsídio de férias e

subsídio de Natal, volvidos, pelo menos, vinte e trinta anos desde o vencimento dos referidos

créditos.

Tem sido entendimento generalizado que “o abuso do direito, na modalidade da

suppressio, não terá aplicação, em princípio, em matéria de direito laboral, nomeadamente, em

matéria de retribuições, onde existe também prazo de prescrição”260.

No entanto, face ao que anteriormente acobertamos no que concerne à integração de

certos complementos no conceito de retribuição, bem como à tese defendida no que diz respeito

aos prazos de prescrição dos créditos laborais e da matéria referente aos juros, entendemos que

um trabalhador que não tenha reclamado da não integração de certos complementos

patrimoniais na retribuição de férias e nos subsídios férias e de Natal, durante um dado hiato

temporal, nomeadamente nos casos em que excede o prazo geral de prescrição previsto no

CCivil, de vinte e trinta anos, poderá gerar na esfera jurídica do empregador, uma legítima e

defensável convicção que o mesmo jamais irá ser demandado.

Sem conceder, a verdade é que o fim social ou económico do direito à retribuição como

contrapartida do trabalho prestado visa, essencialmente, a proteção do trabalhador, para quem,

em regra, o rendimento do trabalho constitui a fonte principal, senão única, de satisfação das

necessidades básicas de subsistência, pelo que se afigura conforme ao fim social e económico

do direito o trabalhador procurar obter do empregador o pagamento das retribuições que a lei

lhe confere, nomeadamente dos juros de mora que acrescem àqueles créditos.

Parece uma conclusão precipitada afirmar categoricamente que um qualquer

trabalhador, que não tenha tido um comportamento expresso durante largos anos quanto à sua

vontade de fazer repercutir na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal aqueles

complementos patrimoniais, cuja natureza não é claramente retributiva (tendo em conta as

260 Cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de junho de 2013, Processo n.º 629/10.9TTBRG.P2, disponível no website www.dgsi.pt.

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considerações já expostas), não ultrapassa os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes

ou pelo fim social e económico do direito.

Com efeito, a renúncia tácita do crédito laboral sempre seria inválida, uma vez que o

direito à retribuição é indisponível durante a vigência da relação laboral, o que se justifica, quer

pela natureza da retribuição, entendida como crédito alimentar, indispensável ao sustento do

trabalhador e da sua família, quer pela situação de subordinação económica e jurídica em que o

trabalhador se encontra face ao empregador, que, segundo o entendimento tradicional, o pode

inibir de tomar decisões verdadeiramente livres, em resultado do temor reverencial em que se

encontra face aos seus superiores ou do medo de represálias ou de algum modo poder vir a ser

prejudicado.

No entanto, não deixa de causar algum desconforto que o exercício tardio do direito do

trabalhador, sendo reclamado apenas vinte anos após a data do vencimento dos complementos

patrimoniais que alegadamente integrariam o conceito de retribuição para efeitos de retribuição

de férias e nos subsídios férias e de Natal, mais do que poder representar, concretamente, um

incomportável sacrifício para o empregador, mormente num contexto de crise socio económica

como o atual, signifique desvalorizar a legítima convicção do empregador de que aquele direito

não mais iria ser exigido, derivada da falta de exigência do cumprimento durante um acentuado

período de tempo, tornando as relações jurídicas laborais bastante incertas.

Reiteramos que em nosso entendimento, salvo melhor parecer, não se patrocina a teoria

de que o trabalhador não é livre de fazer valer os seus direitos, sobretudo no que concerne ao

direito à retribuição e que o facto de ser constitucionalmente protegido, não seja por si só um

forte fundamento para que o trabalhador se sinta desprendido de quaisquer constrangimentos,

especialmente aquele trabalhador em concreto que se encontra sob a alçada de um sindicato,

com robustez suficiente para assegurar o cumprimento pleno dos direitos dos seus

trabalhadores.

Assim, parece-nos legítimo invocar a figura da suppressio nas causas que tenham como

litígio o conceito de retribuição, se as prestações complementares são consideradas para o

referido conceito e em caso afirmativo, quais a que nele devam ser integradas para efeitos de

retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, e que apenas venham a ser exigidas

após uma duração prolongada de tempo, durante o qual o trabalhador (máxime o trabalhador

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sindicalizado) nunca tenha tido um comportamento discordante de tal prática, provocando no

empregador a legítima expectativa de que não se encontra sequer em incumprimento.

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Conclusões

1. O contrato de trabalho, enquanto mecanismo jurídico de regulação das relações laborais, tem

as suas raízes no Direito Romano.

2. A obrigação de remuneração da atividade prestada, já consagrada na era Romana, na

qualidade de elemento essencial do contrato de trabalho, sofreu algumas alterações decorrentes

da evolução histórica das circunstâncias políticas e sociais.

3. Em Portugal, o processo de formação do Direito do Trabalho é relativamente recente, tendo

acompanhado o desenrolar dos desenvolvimentos políticos e socias europeus derivados dos

movimentos sindicais que requeriam melhores condições de trabalho, que se faziam sentir um

pouco por toda a Europa.

4. Os primeiros diplomas legais concernentes às questões laborais em Portugal remontam

apenas ao século XIX, tendo sobretudo a formação do ordenamento jurídico-laboral alcançado

um espaço relevante ao longo do século XX, nomeadamente com a consagração do direito à

greve e do lock-out.

5. A retribuição é um dos elementos essenciais do contrato de trabalho, enquanto mecanismo

máximo das relações juslaborais, consagrada no art. 258.º do CT.

6. Por ser um elemento essencial do contrato de trabalho o legislador estabelece vários

mecanismos de proteção da retribuição, mormente de consagração constitucional, no art. 59.º,

n.º 3 da Lei Fundamental.

7. O cálculo do montante retributivo tem em conta vários fatores, tais como a quantificação da

prestação fixada em função do tempo, o posto de trabalho ou categoria, a performance ou

mérito no desempenho da função e a evolução na empresa, ou seja a antiguidade.

8. Há doutrina que entende que o problema da aferição do cálculo da prestação retributiva

coloca-se em dois patamares, sendo um o da determinação em concreto da retribuição, quando

a mesma não se encontra fixada pelo contrato de trabalho e o segundo o da determinação em

abstrato da prestação retributiva.

9. O n.º 2 do art. 258.º indica que para que uma prestação seja considerada retribuição, o

legislador faz depender a sua qualificação como tal de um pagamento regular e periódico e, uma

vez que o legislador não fixou concretamente um critério para a aferição da “regularidade e

periodicidade”, a qualificação das prestações como retributivas, tendo em conta a sua

“regularidade e periodicidade”, não tem sido uniforme no seio da jurisprudência.

10. Em nosso entendimento, e na senda das mais recentes decisões do Supremo Tribunal de

Justiça, deve considerar-se regular e periódica a prestação cujo pagamento ocorre todos os

meses de atividade do ano, constituindo, assim, um complemento normal da retribuição do

trabalhador.

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11. O legislador consagra no art. 258.º, n.º 3 uma presunção de que constitui retribuição

qualquer prestação do empregador ao trabalhador; no entanto, esta presunção carece sempre,

em nosso entendimento, de uma avaliação casuística, isto é, de aferir se aquela atribuição é

uma mera liberalidade ou tolerância do empregador, ou se se traduz numa intenção de

atribuição de um benefício económico ao trabalhador, digno de tutela.

12. O legislador laboral prevê no art. 264.º do CT o direito a retribuição de férias, sendo que

defendemos que o legislador quis manter a retribuição de férias proporcional à retribuição que o

trabalhador aufere em período de não férias, ou seja em serviço efetivo e, portanto, excluem-se

as prestações que pelas suas circunstâncias não se verifiquem em período de férias por não

terem sequer natureza retributiva, sem prejuízo do previsto na parte final da al. a), do n.º 1 do

art. 260.º.

13. Quanto ao subsídio de férias, é nosso entendimento que devem ficar excluídos aqueles

complementos remuneratórios que dizem respeito às condições que afetam a pessoa do

trabalhador pelo exercício efetivo do trabalho, às despesas que o mesmo tem de efetuar para a

realização da sua prestação de trabalho, bem como ao seu desempenho.

14. Relativamente ao subsídio de Natal, consagrado pelo legislador no art. 263.º, entendemos

que não devem ser tidas em consideração as atribuições patrimoniais que pressupõem a efetiva

prestação do trabalho e que visam, tão-somente, compensar o trabalhador das despesas que

realiza pela efetiva execução das suas funções, nem as prestações que sejam contrapartida do

modo específico da execução do trabalho, e sendo o subsídio de Natal considerada uma

prestação complementar o seu cálculo deverá obedecer ao disposto no art. 262.º n.º 1 do CT.

15. Somos da opinião de que se o legislador consagrou as exclusões legais do conceito de

retribuição em artigo posterior à previsão da presunção retributiva (art. 258.º, n.º 3), fê-lo com a

intenção de amenizar a prova a ser produzida pelo empregador, pelo menos, quanto à não

integração daquelas prestações no montante retributivo.

16. Igualmente consideramos que no que concerne à prescrição de créditos laborais, quer para

o trabalhador quer para o empregador, não é absurdo que se aplique aos créditos laborais as

regras gerais do CCivil. Uma vez que a norma jurídica relativa à prescrição no CT não exclui

liminarmente a aplicação das regras gerais. Além disso, não é razoável, do ponto de vista da

paz, previsibilidade e segurança jurídica, que passados vinte e trinta anos, ou mais, possa vir ser

exigido um crédito que até então nunca havia sido considerado para efeitos de retribuição de

férias, subsídio de férias e Natal.

17. Quanto à obrigação de juros de mora, não nos parece que no âmbito das relações laborais

os juros assumam natureza laboral apenas porque a obrigação principal reveste essa natureza.

Assim deverá, em nosso entendimento, aplicar-se aos juros o regime geral consagrado no CCivil.

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18. A figura da suppressio, quanto a nós, deve ser entendida como proibição de venire contra

factum proprium, e é uma questão sobre a qual os tribunais do trabalho portugueses têm sido

progressiva e recentemente chamados a pronunciarem-se. Entendemos que é um domínio ainda

pouco considerado no âmbito do Direito do Trabalho mas merecedor de atenção, dada a sua

relevância prática.

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Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13 de março de 2009, Processo n.º

2195/05.8TTLSB-4

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de junho de 2009, Processo n.º

09S0620

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de novembro de 2009, Processo n.º

274/07.6TTBRR.S1

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de dezembro de 2009, Processo n.º

1881/07.9TTLSB.L1-4

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de maio de 2010, Processo n.º

467/06.3TTCBR. C1.S1

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142

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de junho de 2010, Processo n.º

607/07.STJLSB.L1.S1

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13 de outubro de 2010, Processo n.º

76/10.2YFLSB

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 29 de novembro de 2010, Processo n.º

431/08.8TTBCL.P1

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de dezembro de 2010, Processo n.º

285/07.1TTBGC.P1.S1

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de dezembro de 2010, Processo n.º

2065/07.5TTLSB.L1.S1

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2 de março de 2011, Processo n.º

1191/09.0TTCBR.C1

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15 de fevereiro de 2012, Processo n.º

3250/09.0TTLSB.L1-4

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05 de junho de 2012, Processo n.º

2131/08.0TTLSB.L1.S1

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de setembro de 2012, Processo n.º

749/10.0TTPRT.P1

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de outubro de 2012, Processo n.º

73/08.8TTLSB.S1

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18 de fevereiro de 2013, Processo n.º

573/10.0TTSTS.P1

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17 de junho de 2013, Processo n.º

629/10.9TTBRG.P2

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18 de dezembro de 2013, Processo n.º

1260/12.0TTPRT-A.P1

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2 de fevereiro de 2014, Processo n.º

4598/12.2TTLSB.L1-4

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24 de março de 2014, Processo n.º

597/13.5TTVNG.P1

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2 de abril de 2014, Processo n.º

2911/08.6TTLSB.L1.S1

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 7 de abril de 2014, Processo n.º

408/12.9TTVLG.P1

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de abril de 2014, Processo n.º

714/11.00TTPRT.P1.S1

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 3 de maio de 2014, Processo n.º

601/13.7TTVIS.C1

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21 de maio de 2014, Processo n.º

1195/13.9TTLSB.L1-4

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143

Anexo

INSTÂNCIA

DATA DO

ACÓRDÃO FONTE PROCESSO N.º CONSIDERAÇÕES RELEVANTES

TRL 27.09.1995

CJ/95, T4 Recurso n.º 9471 Comarca de Lisboa

O subsídio de aniversário integra o conceito de retribuição, porque, sendo pago regularmente, cabia ao empregador afastar a presunção, provando que não era retribuição;

TRL 18.10.1995

DGSI 0001294 O facto de a ré nunca ter considerado o abono de viagem como retribuição, e nunca o ter pago na retribuição de férias e subsídios, nem sobre ele ter feito descontos para a CGA, quer em relação ao autor quer em relação aos restantes trabalhadores nas mesmas condições, não obsta a que o mesmo possa e deva ser considerado, agora, como fazendo parte do conceito de retribuição;

STJ 16.05.200 CJSTJ/00T2

Recurso n.º 343/99 A retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal devem ser calculadas com base em todos os proventos que constituem e se integram na retribuição;

TRC 11.04.2002

CJ/02, T2 Recurso n.º 3124 Comarca de Coimbra

Todos os benefícios pecuniários concedidos ao trabalhador constituem, em princípio, retribuição;

TRL 01.02.2006

DGSI 9563/2005-4 O subsídio de trabalho noturno, o subsídio de divisão do correio e a comparticipação especial, recebidos de forma regular e periódica, integram o conceito de retribuição, sendo, por isso, a respetiva média devida na retribuição de férias, no subsídio de férias e no de Natal;

STJ 24.09.2008

DGSI 08S1031 No que diz respeito ao automóvel, é óbvio que a sua utilização pelo autor na sua vida particular lhe trazia vantagens económicas, mas essas vantagens também não constituíam uma contrapartida direta do trabalho, uma vez que resultavam de uma mera liberalidade da entidade empregadora que, como tal, podia ser por ele retirada a todo o tempo, não constituindo, por isso, um componente da sua retribuição”;

TRL 17.06.2009

DGSI 607/07.5TTLSB.L1-4 As prestações regulares e periódicas pagas pelo empregador ao trabalhador, independentemente da designação que lhes seja atribuída no contrato ou no recibo, em princípio, só não serão consideradas parte integrante da retribuição se tiverem uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho;

STJ 25.06.2009

DGSI 09S0620 Como tem sido assinalado pela doutrina, os casos redutíveis a um exercício abusivo do direito por suppressio, impõem que, patente ou ostensivamente, se crie, no obrigado, a convicção

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de que a prestação já não virá a ser exigida, sob pena de a posterior exigência representar para ele um incomportável sacrifício;

TRL 16.12.2009

DGSI 1881/07.9TTLSB.L1-4 A relevar uma unidade tempo para aferir a regularidade e periodicidade de uma prestação, que o trabalhador alega constituir retribuição variável, essa unidade de tempo terá que ser, necessariamente, a unidade mensal, uma vez que a retribuição do trabalhador é paga ao mês, conjugada com o período de um ano, relativamente ao qual são devidos a retribuição de férias, o subsídio de férias e o subsídio de Natal, cuja “reconstituição” o trabalhador reclama;

TRP 14.06.2010

DGSI 522/08.5TTLMG.P1 Provando-se o carácter regular e periódico dos suplementos pagos ao trabalhador, no período de 1986 a 2003, a título de remuneração de trabalho suplementar, de trabalho noturno, prémio motorista, abono de viagem, prémio de desempenho, os mesmos devem relevar para o cômputo da remuneração de férias e dos subsídios de férias e de Natal;

STJ 23.06.2010

DGSI 607/07.STJLSB.L1.S1 Estando em causa determinar o valor de atribuições patrimoniais devidas anualmente correspondentes a um mês de retribuição, como são a retribuição de férias, o respetivo subsídio e o subsídio de Natal, afigura-se que o critério seguro para sustentar a aludida expectativa, baseada na regularidade e periodicidade, há-de ter por referência a cadência mensal, independentemente da variação dos valores recebidos, o que, de algum modo, tem correspondência com o critério estabelecido na lei para efeito de cálculo da retribuição variável […]. E, assim, considerar-se regular e periódica e, consequentemente, passível de integrar o conceito de retribuição, para os efeitos em causa, a atribuição patrimonial cujo pagamento ocorre todos os meses de atividade do ano;

STJ 03.11.2010

DGSI 425/07.0TTCBR.C1.S1 A remuneração de férias, o seu subsídio e o subsídio de Natal são atribuições patrimoniais de carácter retributivo, mas que, ao contrário do ordenado mensal e respetivos complementos, não têm uma relação de correspetividade direta e concreta com certa prestação de trabalho, realizada em tempo e espaço definidos, representando valores que corrigem ou ajustam a retribuição global do benefício auferido pelo empregador;

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STJ 16.12.2010

DGSI 2065/07.5TTLSB.L1.S1

Deve considerar-se regular e periódica, para efeito de cálculo de férias e de subsídios a atribuição patrimonial cujo pagamento ocorre em todos os meses de atividade do ano;

TRC 02.03.2011

DGSI 1191/09.0TTCBR.C1 Atenta a sua autonomia em relação ao capital, aos juros dos créditos laborais, como aos que decorrem de qualquer outro tipo contratual, é aplicável o prazo de prescrição previsto no artigo 310.º, alínea d) do Código Civil, norma específica que abrange expressamente no seu âmbito aplicativo todos e quaisquer juros;

TRP 17.06.2013

DGSI 629/10.9TTBRG.P2 A suppressio, enquanto modalidade do abuso do direito, respeita àquelas situações em que uma posição jurídica que não tenha sido exercida em certas circunstâncias e por certo lapso de tempo, não mais possa sê-lo por, de outro modo, contraria a boa-fé;

TRP 18.12.2013

DGSI 1260/12.0TTPRT-A.P1 Os juros de mora relativos a créditos laborais encontram-se submetidos ao regime da prescrição constante do artigo 38.º, n.º1 da LCT, 381.º, nº 1 do CT de 2003 e 337.º, nº 1 do CT de 2009, que estabelecem um regime especial e, nessa medida, constituem um desvio ao regime geral estabelecido no artigo 310.º, al. d) do Código Civil;

TRP 07.04.2014

DGSI 408/12.9TTVLG.P1 Tem a jurisprudência das Relações considerado que uma prestação só poderá considerar-se regular se for prestada com alguma frequência, chamando à colação para aferir de tal frequência a bitola da metade do ano;

STJ 30.04.2014

DGSI 714/11.00TTPRT.P1.S1

Perante a matéria de facto provada, impõe-se concluir que a atribuição ao autor de veículo automóvel assume natureza retributiva, uma vez que a empregadora, ao conferir àquele o direito de utilização do veículo na sua vida particular, incluindo em fins-de-semana e férias, e ao suportar os respetivos encargos, designadamente, com a sua manutenção, seguros, portagens e combustível, ficou vinculada a efetuar, com carácter de obrigatoriedade, essa prestação. Trata-se de uma prestação em espécie com carácter regular e periódico e um evidente valor patrimonial, que assume natureza de retribuição, nos termos dos artigos 82.º da LCT, 249.º do Código do Trabalho de 2003 e 258.º do Código do Trabalho de 2009, beneficiando, por isso, da garantia de irredutibilidade;