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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas Departamento de Geografia Trabalho de Graduação Individual I LUIS GUSTAVO MOLINI RAZERA Os caminhos da urbanização: Passado, presente e futuro do Campo de Marte, em Santana São Paulo 2011

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas

Departamento de Geografia

Trabalho de Graduação Individual I

LUIS GUSTAVO MOLINI RAZERA

Os caminhos da urbanização: Passado, presente e futuro do Campo de Marte, em Santana

São Paulo

2011

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas

Departamento de Geografia

LUIS GUSTAVO MOLINI RAZERA

Os caminhos da urbanização: Passado, presente e futuro do Campo de Marte, em Santana

Orientador: Prof. Dr. Ricardo Mendes Junior

São Paulo

2011

Monografia apresentada ao Curso de Geografia do

Departamento de Geografia da Faculdade de

Filosofia, Letras e Ciências Humanas, da

Universidade de São Paulo, para obtenção do título

de Bacharel em Geografia.

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AGRADECIMENTOS

Aos amigos do passado, cada vez mais presentes que, bem ou mal,

sempre colocaram meus pés no chão e me ajudaram a crescer de uma

maneira positiva e realista. Pessoas que não enxergam o mundo como eu,

não torcem pelo meu time, não gostam das minhas músicas e não têm

nenhuma afinidade de gostos comigo. Minha família de sintonia. Um salve

especial para esses dez anos de percurso!

Aos amigos da Geografia, pelos inúmeros momentos de abstração,

discussão, devaneios e crescimento que tivemos nessa graduação. As

marcas deixadas por tantas viagens, festas, bares e situações são

gigantescas, impossíveis de não serem notadas. Um abraço especial aos

companheiros das situações difíceis, do choro e da cumplicidade. Àqueles

que estão presentes nos momentos certos, compartilhando histórias e

sentimentos.

Por fim, agradeço aos professores, ao meu orientador e aos

familiares que de alguma maneira contribuíram e influenciaram minha

pessoa ao longo de todos esses anos.

Obrigado.

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RESUMO: O principal objetivo deste trabalho foi identificar e analisar os

fatores que contribuíram para a atual formação do espaço urbano do distrito

de Santana, zona norte da cidade de São Paulo, tendo como recorte

específico o aeroporto do Campo de Marte e seu entorno, assim como,

dentro da perspectiva crítica, estudar futuros projetos estatais e privados

que transformarão essa porção da metrópole paulistana. Palavras-chave: São Paulo, Zona Norte, Metropolização, Intervenção

Urbana, Fixo Geográfico

RESUMEN: El principal objetivo de este trabajo fue identificar y analizar los

factores que contribuyeron para la actual formación del espacio urbano del

distrito de Santana, zona norte de la ciudad de Sao Paulo, teniendo como

recorte específico el aeropuerto Campo de Marte y sus alrededores, tal como,

dentro de la perspectiva crítica, estudiar los futuros proyectos estatales y

privados que va a transformar esa parte de la metrópolis paulistana. Palabras llave: São Paulo, Zona Norte, Metropolización, Intervención

Urbana, Fijo Geográfico

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Lista de mapas

Mapa 1 – Localização de Santana no Município de São Paulo 11

Mapa 2 – Localização do Campo de Marte. 13

Mapa 3 – Localização das colônias oficiais em São Paulo 18

Mapa 4 – Planta Geral da Capital de São Paulo 20

Mapa 5 – Planta Geral da Capital de São Paulo, detalhamento no povoado de Santana 21

Mapa 6 – Geologia do relevo do Município de São Paulo, detalhamento na localização

do Aeroporto

24

Mapa 7 – Projeto de retificação do rio Tietê em 1930 26

Lista de imagens Imagem 1 – Sede da Fazenda Santana, construída em 1734 16

Imagem 2 – As Várzeas do Rio Tietê, janeiro de 1938 25

Imagem 3 – Campo de Marte em 1933 29

Imagem 4 – Divisão da área da União Federal no Aeroporto Campo de Marte 31

Imagem 5 – Operações urbanas existentes e em estudo em São Paulo 44

Imagem 6 – Área da intervenção da Operação Urbana Carandiru – Vila Maria 45

Imagem 7 – Fachada do Campo de Marte 47

Imagem 8 – Área interna do Campo de Marte 47

Imagem 9 – Representação esquemática do traçado referencial e estações do TAV 49

Imagem 10 – Construção de edifícios de alto padrão junto à cabeceira do aeroporto 50

Imagem 11 – Futuro lançamento de alto padrão, Avenida Braz leme 50

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Lista de abreviaturas e siglas TAV Trem de Alta Velocidade EMPLASA Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano UITs Unidades de Informação Territorializadas VASP Viação Aérea São Paulo ACECAM Associação dos Concessionários, Empresas Aeronáuticas

Intervenientes e Usuários do Aeroporto Campo de Marte OU Operação Urbana INFRAERO Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária CURA Comunidades Urbanas para a Recuperação Acelerada SEMPLA Secretaria Municipal do Planejamento, Orçamento e

Gestão

PDE Plano Diretor Estratégico

EMURB Empresa Municipal de Urbanização

ABVG Associação Brasileira de Aviação Geral

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Sumário

Introdução......................................................................................... 9

Área de Pesquisa............................................................... 11

CAPÍTULO 1.......................................................................................

Primeiros relatos

14

CAPÍTULO 2......................................................................................

O século XX

A retificação dos rios e a ocupação das várzeas..............

22

23 CAPÍTULO 3.......................................................................................

Origens do Campo de Marte

27

CAPÍTULO 4.......................................................................................

Os reflexos das transformações socioeconômicas no espaço

urbano de Santana

32

CAPÍTULO 5.....................................................................................

O futuro do Campo de Marte.

41

Considerações finais........................................................................ 52

Referências bibliográficas e sites consultados............................. 55

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INTRODUÇÃO

O fenômeno urbano brasileiro, em especial a sua manifestação na

cidade de São Paulo, possui características particulares e significativas.

Através do enfoque dialético percebemos problematicamente que a realidade

urbana atual está intimamente ligada à uma mercantilização do espaço

geográfico, que mediatizada pelo trabalho e pelas técnicas, reproduz antigas

lógicas de desigualdade sócio-espacial, como também cria novas formas à

medida que o modo de produção se transforma ao longo da história.

Tendo esse pressuposto, o presente trabalho busca fazer uma

caracterização da produção e evolução do espaço urbano, tomando como

foco o bairro de Santana, zona norte da cidade de São Paulo, e tendo como

recorte específico o aeroporto do Campo de Marte e seu entorno.

Essa região, ao longo da acelerada expansão do espaço urbano do

município de São Paulo, foi ocupada de maneira heterogênea, existindo,

especialmente nas últimas décadas, uma grande demanda imobiliária gerada

pelo processo especulativo sobre áreas ociosas do ponto de vista da

ocupação produtiva ou rentista.

A porção norte da capital paulista é uma região em constante

transformação e que, hoje em dia, passa por um processo intenso de

valorização do espaço (COSTA & MORAES, 1996), sendo objeto de uma

nova linha de Metrô, da estação central do Trem de Alta Velocidade (TAV) e

de uma operação urbana. Essa grande quantidade de investimentos nos

chamou a atenção, pois até meados do século XX, a zona norte era tida

como algo muito longínquo, praticamente isolado de São Paulo pelo rio Tietê

(e pelas suas várzeas). A súbita seletividade do capital, representando a

lógica contraditória e perversa da expansão capitalista, como nos mostra

Harvey (2005), deve ser desvendada, superando as aparências desses

projetos.

Exatamente por essa escolha de localização da estação do TAV, a

pesquisa utilizará o recorte espacial específico do Campo de Marte como

base para compreender essa formação de uma nova centralidade no distrito

de Santana e todo o processo histórico que desencadeou as transformações

do espaço urbano no entorno do aeroporto.

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Além disso, consideramos nessa monografia a cidade enquanto uma

construção humana, produto das relações históricas da sociedade que por

meio do trabalho e da técnica apropria-se dos recursos naturais, produzindo

o espaço geográfico. Ou seja, esse último seria como um conjunto de formas

que trazem as relações sociais do pretérito e do presente, e pela estrutura

das relações sociais que ocorre atualmente e que se manifesta por funções e

refuncionalizações espaciais. (SANTOS, 1978).

Em síntese, o processo de urbanização ocorrido na porção norte do

município de São Paulo é diretamente derivado do processo de produção da

Metrópole paulistana, e essa surge diretamente ligada ao processo de

industrialização, desde o período do capital cafeeiro e as primeiras

manufaturas e operariado de origem imigrante, quando Santana ainda era

uma área de colonização oficial do império concebida para dar conta do

abastecimento da “cidade” com gêneros alimentícios e materiais de

construção (LANGENBUCH, 1971), até a formação dos grandes

conglomerados estatais e multinacionais com operariado formado por

brasileiros de todas as regiões do país. Como é sabido, essa expansão da

indústria paulistana gerou uma intensa urbanização, que hoje se pauta

sobretudo no capital financeiro, nos serviços e atividade comercial.

Entender o funcionamento e os meandros da produção do espaço

geográfico, seus caminhos e sua fundamentação entre o Estado e o capital

podem trazer à questão urbana um novo olhar, não que esse não seja um

tema recorrente entre os geógrafos, mas é que na análise de novos

materiais, inéditos a cada período, é que a construção de novas perspectivas

emergem nas pesquisas, força do próprio posicionamento histórico do

pesquisador.

Para melhor compreensão de cada momento histórico vivido pelo

bairro, e especialmente o aeroporto, dividiremos a pesquisa por períodos,

desde o primeiro relato colonial em 1560, até os dias atuais e perspectivas

futuras, sempre utilizando o Campo de Marte como um forte elemento

modificador do espaço urbano e seu entorno.

Dessa forma, a monografia se divide em cinco capítulos demonstrando

como o espaço da cidade se expandiu e desenvolveu sobre a égide dos

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diversos momentos produtivos vigentes e o uso que foi feito do aeroporto

nessas épocas.

ÁREA DE PESQUISA: SANTANA E CAMPO DE MARTE

Segundo a Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano

(EMPLASA), no espaço jurídico do distrito de Santana existem seis Unidades

de Informação Territorializadas1 (UITs): Santana (onde está contido o bairro

de mesmo nome), Tietê, Jardim São Paulo, Alfredo Pujol, Anhembi e Santa

Terezinha. Cada uma dessas unidades possui características funcionais e

urbanas similares, tais como ocupação do solo, aspectos construtivos das

edificações, pólos geradores de tráfego etc. Contudo, para os objetivos dessa

monografia não faremos diferença entre o bairro, a UITs ou o distrito, já que a

gênese e as relações atuais dessas três formas de unidade ocorrem de

maneira muito semelhante.

1 Com metodologia desenvolvida pela EMPLASA, as Unidades de Informações Territorializadas (UITs) correspondem a polígonos territoriais delimitados com base nas características funcionais e urbanas predominantes em cada município.

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Inaugurado em 1920, o Aeroporto do Campo de Marte foi o primeiro

campo de aviação da capital paulista, instalado junto às atuais pontes da

Casa Verde e das Bandeiras, no bairro de Santana. O complexo tem sua

entrada principal pela Avenida Santos Dumont, no bairro do Anhembi e uma

entrada auxiliar localizada na Avenida Braz Leme, no bairro de Vila Bianca.

Segundo dados de 2009 do Ministério da Defesa, o Campo de Marte é

o quinto maior movimento operacional do país2, seus pousos e decolagens,

especialmente de helicópteros (abrigando a maior frota do país3), jatos

privados e escolas de pilotagem, superam pistas relevantes como o Santos

Dumont no Rio de Janeiro e o Salgado Filho no Rio Grande do Sul.

Durante seus 90 anos de existência, o Campo de Marte incorporou

uma série de mudanças relevantes, firmando-se na operação de vôos da

chamada aviação geral. Categoria essa que, segundo a Associação

Brasileira de Aviação Geral (ABAG), engloba todos os setores da aviação

civil que não possuem vôos regulares (oriundos de linhas aéreas) e

aeronaves militares. Exemplificando, compõem esse ramo desde pequenos

aviões de propriedade particular, até modernos jatos

executivos, helicópteros, vôos de treinamento e outras atividades aéreas não

regulares.

Operando 24 horas por dia no transito de helicópteros e das 6 ás 23

para aviões, o aeroporto desafoga grande parte do que anteriormente

utilizavam os outros dois principais aeroportos da região metropolitana,

Congonhas e Guarulhos. Nesses últimos, o número de pousos e decolagens

por hora foi limitado por questões de segurança, ocorrendo à aterrissagem de

jatos executivos somente se alguma companhia aérea cancelar sua operação

padrão. Além desses motivos, conforme o mapa seguinte, Marte está

localizado em uma região com vasta infra estrutura viária, próximo a dois

terminais de ônibus (Santana e Tietê) e a linha azul do metrô, garantindo uma

boa acessibilidade para o local.

Além disso, consideramos nosso objeto como um grande fixo

geográfico (SANTOS e SILVEIRA, 2001), ou seja, imóvel, gerador de uma 2 Em 2009 foram 104.502 pousos e decolagens e um total de 312.460 passageiros 3 De acordo com a Agência Nacional de Aviação do Brasil, o número de helicópteros civis no Estado de São Paulo em 2008 era de 469 aeronaves, desses, cerca de 420 estão na capital paulista. Somente em Marte são contabilizados cerca de 240 pousos e decolagens por dia.

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tipologia nova de fluxos materiais e imateriais. “Fixos criam fluxos” nos

lembra Milton Santos (2001). Ambos interagem e se alteram mutuamente.

Mapa 2 - Localização do Campo de Marte. Fonte:VPC/Brasil, 2008.

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CAPÍTULO 1 PRIMEIROS RELATOS O ponto de partida desse trabalho é a discussão sobre as

transformações de um local da capital paulista, conhecido por Santana, ao

norte do rio Tietê e Tamanduateí. Começaremos essa monografia

procurando, primeiramente, fazer uma breve reconstituição histórica do local

e assim tentarmos mostrar toda a relação da técnica, do espaço e do tempo

na construção das características e da história dessa porção do município.

O regime de Capitanias Hereditárias é tido como o primeiro propulsor

da criação de cidades no Brasil, instituído em 1534, dava aos donatários

(conforme as cartas – régias) o direito de fazer todas e quaisquer povoações

que se chamarão de Vilas, segundo a forma e o costume do reino de

Portugal4. Nesse contexto, é fundada em 1554 no planalto e feita Vila de São

Paulo de Piratininga (1558) a atual cidade de São Paulo. O núcleo desse

povoamento de origem jesuíta é o Pátio do Colégio, tendo ao seu redor os

aldeamentos para confinamentos de índios cujo objetivo principal seria o uso

dessa força de trabalho. Como abordaremos a seguir, nosso objeto de estudo

se encontra distante cerca de quatro kilômetros dessa localização.

Inicialmente conhecida como a Fazenda de Sant’ana, o atual distrito

de Santana, que manteve suas características rurais até o princípio do século

XX, tem sua primeira citação feita pelo padre José de Anchieta em 1560,

durante os primeiros anos do período colonial português. Popularmente

conhecida como Fazenda Tietê ou Guaré, a região é considerada o mais

antigo núcleo de povoamento da cidade do Além Tietê – nome dado a zona

norte – e era considerada uma terra de passagem, especialmente para os

viajantes (bandeirantes e tropeiros) que seguiam para algumas cidades

mineiras e para o interior paulista.5

Em 1673, a localidade passa a ter uma maior relevância quando os

herdeiros das terras doam uma sesmaria ao Colégio Companhia de Jesus,

fato que traria, além de muitos jesuítas e indígenas, grandes doações de

terras (seus limites chegavam até Guarulhos e Jundiaí), que acabaram 4 AZEVEDO, 1956 5 VOLTOLINI, 1996, p. 18.

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transformando a Fazenda no principal núcleo Além Tietê6. Os padres, além

das atividades de catequese, iniciaram um vasto plantio de hortaliças e

leguminosas, que eram levadas até a região central da cidade por canoas

(via rio Tamanduateí) ou por um aterro até o Convento da Luz.

Esse aterro não agradava muito a população e em 1700 foi construída

uma ponte de madeira, popularmente conhecida como Ponte Grande, ligando

a Rua Voluntários da Pátria à Avenida Tiradentes, no centro. Segundo a

historiadora Maria Celestina Teixeira Mendes Torres (1969), a ponte era algo

inseguro, “simples tabulões serrados, da grossura de quatro dedos”. Esse

caminho era utilizado para quem se deslocava para Atibaia, Bragança

Paulista e a parte do sul de Minas.

Com as reformas religiosas propostas pelo Marques de Pombal, que

acreditava que a Companhia de Jesus atuava como um poder autônomo ao

governo português, os jesuítas são expulsos de todos os territórios lusitanos

e em 1760 a administração da fazenda é concedida diretamente para a

Coroa (e conseqüentemente para o Governo da Capitania de São Paulo)7.

Mesmo com seus territórios confiscados, a capela (futura Paróquia de

Sant’ana) é preservada. Devido às inúmeras inundações na área de várzea

dos rios que cortavam a região, a expansão da fazenda foi lenta, com

algumas divisões, existindo habitações no entorno das construções católicas.

Para ilustrar esse momento vivido pela cidade tomamos as palavras

de Odette Seabra (2004). De acordo com a autora:

São Paulo vista de longe, (possivelmente do Jaraguá) era como uma cidade circundada por outras “pequenas vilas” na expressão do viajante que por aqui passou. Referia-se, obviamente, aos núcleos de povoamento antigo que dariam origem aos velhos bairros de São Paulo: Penha, Santana, Nossa Senhora do Ó, Pinheiros, Santo Amaro. Estes bairros foram centros de alguma atividade ainda na colônia. Alguns, simples paragem de tropas com uma ermida, outros chegaram ser núcleos coloniais. (SEABRA, 2004, p.289)

Durante os três primeiros séculos de ocupação portuguesa, o principal

agente modelador das cidades e vilas, e portanto da zona norte de São 6 Santana chega aos 227 anos como a locomotiva da Zona Norte. Jornal Semanário da Zona Norte (24/07/2009). Página visitada em 22 de janeiro de 2011. 7 VOLTOLINI, 1996, p.19.

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Paulo, era a Igreja, como a criada na Fazenda Santana no final do século

XIX. Era ela que organizava toda a vida social das cidades, sendo o principal

local de sociabilidade/regulação. O reconhecimento da Igreja era o

reconhecimento (e presença) do Estado (ABREU, 1996).

Imagem 1 – Sede da Fazenda Santana, construída em 1734. Fonte: CPOR/SP, 2011.

Com a mineração (e com o então único caminho para a região), as

primeiras décadas do século XVIII transformam a economia de subsistência

paulista, funcionando como um importante centro de abastecimento das

Gerais seja com gado ou em menor proporção leguminosas (SINGER, 1968).

Como decorrência disso, os primeiros aparatos burocráticos da Coroa

chegam ao núcleo de Santana, constituindo um novo tipo de residente. Agora

além dos inúmeros agricultores, uma série de funcionários públicos e

empresários habita as terras. Para elucidar essa passagem, e já

incorporando as modificações oficiais trazidas pela Independência, contamos

com as palavras do economista Paul Singer (1968):

A partir de 1822, São Paulo, torna-se Capital da província e, portanto, centro administrativo de certo destaque. Hospedando o governador e demais membros do governo, São Paulo torna-se também sede da burocracia provincial, embora o caráter de subsistência da economia, que parcela a província em numerosas unidades praticamente autônomas, restrinja fortemente o âmbito das atividades da administração pública. (SINGER, 1968, p.27)

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O século XIX traz algumas mudanças relevantes para a história do

nosso local de pesquisa. A antiga sede da fazenda é transformada em quartel

do exército brasileiro e as primeiras levas de imigrantes começam a chegar

especialmente portugueses, italianos e espanhóis.

Cabe aqui uma ressalva: enquanto a grande maioria dos europeus

aqui recebidos se dirigia para as colheitas de café do Vale do Paraíba (e

posteriormente para o Oeste paulista), substituindo a mão de obra escrava,

em Santana, eles constituíram uma colônia oficial de povoamento8,

mantendo sua função histórica colonial, ou seja, continuava a fornecer

alimentos (e em menor importância tijolos) para o incipiente mercado urbano

paulistano (TORRES, 1969 e LANGENBUCH, 1971). A cafeicultura traz um

novo momento para a região por meio do desenvolvimento das ferrovias,

forte aumento populacional, melhorias urbanas, urbanização, serviços

públicos, constituição de mercados e acúmulos de capitais são apenas

alguns exemplos diretos que a agricultura trouxe.

8 Além de Santana, outros três núcleos próximos a cidade de São Paulo foram criados, são eles: Glória, São Bernardo e São Caetano. Segundo Languenbuch (1971) eles serviram para atender ao serviço da colonização, abrigando colonos imigrantes. Poucos meses após sua fundação, com crescentes problemas de abastecimento e organizacionais, a idéia é abandonada, emancipando o antigo núcleo oficial para parte integrante da cidade.

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Mapa 3 - Localização das colônias oficiais em São Paulo. Fonte: LANGENBUCH, 1971.

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Algumas décadas após esse momento surgem os primeiros bairros

industriais e operários na cidade9, como por exemplo, Brás, Barra Funda e

Bom Retiro. As fábricas desse tempo eram primordialmente da indústria têxtil,

oriundas de famílias tradicionais, que habitavam o centro expandido como

Higienópolis, Campos Elíseos e Jardins.10 Odette Seabra (2004) retrata os

diferentes tempos de ingresso desse novo meio de produção, na zona norte e

no restante da capital:

Os velhos núcleos de população antiga foram redefinidos nos seus conteúdos socioculturais com a presença dos imigrantes e da indústria em São Paulo, desde o final do século XIX. Mas não o foram da mesma forma nem com a mesma intensidade. Os núcleos da zona norte, Santana e Nossa Senhora do Ó, experimentariam mais lentamente os efeitos da modernização de São Paulo. Ernani da Silva Bruno, historiador de São Paulo, refere-se ao velho caipira de Nossa Senhora do Ó que, ainda em 1910, seguia semanalmente com sua carrocinha até a cidade para vender a caninha do Ó. Em verdade, era uma vasta região, entre Guarulhos e Perús que ficara à margem dos fatores de localização definidos pela implantação das ferrovias que cortaram São Paulo (1867), como mostrou Juergen Langenbuch. Nesta região estes efeitos de modernização que a industrialização implicava parecem ter sido menos impactantes tanto que o caipira demorou um pouco mais para desaparecer; muitos deles ainda ao final dos anos quarenta pescavam nas lagoas e riachos e vendiam o peixe na cidade e em outros bairros. (SEABRA, 2004, p.292)

Os efeitos dessa urbanização foram fortíssimos para São Paulo,

somente durante o último decênio do século XIX, a população passou de

quase 65.000 habitantes para 240.00011. Como podemos observar na planta

abaixo, em 1897, muitos bairros já estavam constituídos, inclusive algumas

núcleos, antes distantes, passavam a ser incorporados e tidos como sendo

realmente pertencentes a uma realidade paulistana. Entretanto, dos bairros

ao norte do Tietê, apenas Santana se destaca, com a presença de algumas

residências e muitas chácaras, que se ligavam ao resto do município pela

ponte Grande. Como curiosidade, a primeira linha de trens que circulou na

região foi a Tramway da Cantareira, um ramal da Estrada de Ferro

9 Ver ANDRADE, Margarida M., Industrialização, Urbanização e Vida de Bairro, 2004 10 GONÇALVES, 2006 11 Histórico demográfico do Município de São Paulo. Prefeitura de São Paulo.

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Sorocabana, que transportava materiais que foram utilizados em uma

adutora. As estações de metrô da zona norte (Tucuruvi, Parada Inglesa,

Jardim São Paulo, Santana, Carandiru e Tietê) construídas a partir da década

de 70, seguiram, em alguns casos, as mesmas paradas desse trem, como

por exemplo, a ramal de Guarulhos, que continha as estações Parada

Inglesa, Jardim São Paulo e Tucuruvi, com posições muito semelhantes às

metroviárias atuais. Os bondes de passageiros da Light só chegariam em

1908, mais de 30 anos depois que o resto da cidade.

Mapa 4. Planta Geral da Capital de São Paulo, 1897. Fonte: Arquivo Histórico Municipal.

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Mapa 5. Planta Geral da Capital de São Paulo – Detalhamento no povoado de Santana,

1897. Fonte: Arquivo Histórico Municipal.

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CAPÍTULO 2 O SÉCULO XX Trataremos especificamente do século XX, pois é nessa passagem

que Santana assume qualidades específicas de um subcentro (VILLAÇA,

2001). Por ser um local de transição entre as terras ao norte e o centro

paulistano, o fluxo de pessoas e transportes, acaba por atrair um

considerável número de atividades terciárias e comerciais, caracterizando

nosso objeto de estudo como um forte pólo de influência para toda a área

norte de São Paulo.

Nesse mesmo século se consolida uma vocação industrial do território

brasileiro, vinculada diretamente à concentração populacional. A partir desse

momento, com a modernização dessas novas relações capitalistas ligadas a

sociedade cafeeira, ocorrem profundas modificações sócio espaciais,

marcadas pelo paradigma da velocidade (SCARLATO, 2004). Para retratar a

importância dessa cultura desse novo momento paulista, utilizamos as

palavras de Paul Singer (1968):

Que o processo de industrialização se tenha localizado em São Paulo, deve-se às conseqüências indiretas do surto cafeeiro. Graças a ele constituíram-se mercados de fatores (de capital e de trabalho), construíram-se um amplo sistema de transportes terrestres (ferroviário) e marítimo e se formaram aglomerações urbanas, que foram constituir o mercado interno indispensável ao desenvolvimento industrial. (SINGER, 1968, p.50)

Temos então, durante o período que se estende do final do século XIX

aos anos 30, uma crescente industrialização do país (especialmente

concentrado nas grandes cidades brasileiras – São Paulo e Rio de Janeiro),

decorrente da liberação do capital utilizado na escravidão para a mão de obra

assalariada, na modernização das técnicas e serviços da época e na

constituição de um forte mercado de consumo urbano, que

conseqüentemente, estimulou o crescimento de um parque industrial de

consumo de bens duráveis (SCARLARTO, 2004). Esse aprofundamento da

divisão internacional do trabalho no território brasileiro foi de grande

importância para uma nova configuração de Santana, que passou a ser

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incorporada como sendo parte integrante da cidade de São Paulo.

Analisaremos adiante os propulsores locais desse fato, como a retificação do

rio Tietê, a conseqüente ocupação das várzeas, a melhora dos sistemas de

transportes e a fundação do nosso principal objeto de estudos, o Campo de

Marte.

A RETIFICAÇÃO DO RIO E A OCUPAÇÃO DAS VÁRZEAS

Como visto no capítulo anterior, a ocupação de Santana (e de toda

zona norte), ocorreu de forma mais devagar do que o restante da capital.

Parte considerável disso deve-se ao rio Tietê e suas imensas áreas de

várzeas, que descolaram esse bairro do restante da cidade (AB’SABER,

1958), ocupando residencialmente uma parcela mais setentrional e nobre,

longe das áreas de cheias, que eram reservadas para atividades como

pastagem, pequenos sítios, campos de futebol e atividades militares. Existia

a extração de areia e cascalho das margens, bem como pequenas olarias,

que contribuíram com matérias para a construção da cidade12.

Vê-se, abaixo no mapa geológico, a localização do Campo de Marte

em relação à geomorfologia do sítio urbano de São Paulo, para usar a

expressão de Ab’Saber. Situado entre os Rios Tietê e Tamanduateí,

apresenta baixa declividade, com terrenos de cobertura aluvial junto ao curso

d’água, ou seja, é uma área de várzea, com perfil topográfico plano, como foi

dito.

12 AB’SABER, 1958, p. 218

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Mapa 6: Geologia do relevo do município de São Paulo, detalhamento na localização do

Aeroporto13

Na metade do século XIX, surgiram as primeiras intenções de

retificação do Tietê, norteadas pela visão higienista, que visava conter os

surtos de doenças e trazer um novo aspecto urbanístico para as cidades 13 Disponível em http://atlasambiental.prefeitura.sp.gov.br/mapas/118.jpg, acessado em 11 de junho de 2011.

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brasileiras, mas por falta de recursos, o projeto foi adiado. Quando foi

retomado, em 1924, uma comissão formada principalmente por engenheiros

liderou os estudos, iniciando a obra somente na década de 30 no governo de

Prestes Maia. Além dessa grande obra fluvial, essa gestão é responsável

pelo Plano de Avenidas (1930), um ambicioso projeto (de inspiração norte-

americana) de reestruturação viária, que incluía elaboração das marginais

Tietê e Pinheiros e a destruição da Ponte Grande, dando lugar a Ponte das

Bandeiras e a Ponte Cruzeiro do Sul.

Imagem 2 – Reportagem de Janeiro de 1938. Fonte: jornal O Estado de São Paulo.

Temos nessa obra, uma das primeiras parcerias do Estado brasileiro

com uma empresa privada, a canadense Light. Conforme a geógrafa Odette

Seabra mostra em sua tese de doutorado (1987), a empresa obteve o direito

de retificar o rio para regularizar o fluxo de águas para beneficiar a sua

hidrelétrica rio abaixo (reservatório de Guarapiranga e barragem de

Parnaíba), gerando energia para boa parte da capital paulista. Em

contrapartida, recebeu o direito às terras que não eram de particulares e que

ficaram em condições de uso, sem os constantes alagamentos anteriores.

Terras antigamente tidas como comunais e reservadas ao bem público, agora

passariam ao domínio de especuladores, tornando-se reservas de valor e

gerando uma valorização diferencial. O sociólogo francês Henri Lefebvre

(1969), chama a atenção para a construção dessa natureza segunda,

produzida e intimamente ligada ao que é o urbano e a cidade. Santos (1980),

semelhantemente, classifica essa natureza fisicamente modificada pela ação

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do trabalho vivo sobre o morto, como natureza artificial, onde a natureza

natural não contém trabalho humano.

Essa gigantesca intervenção geraria uma explosão imobiliária nas

décadas seguintes e não resolveria os problemas das enchentes na região.

Mapa 7. Projeto de retificação do rio Tiete em 1930. Fonte: Acervo Família Julio Prestes.

Ao contrário do que aconteceu com a várzea do Pinheiros, que foi

ocupada em sua grande parte por loteamentos residenciais, no Tietê, ela foi

preenchida praticamente em toda a sua extensão por galpões industriais ou

galpões que prestavam auxílio a indústria, sobretudo no setor de estocagem,

transporte e distribuição. Eram cerca de 25 km² de área de várzea,

transformados para a ocupação, que acarretariam em uma nova

configuração e costumes para toda a cidade.

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CAPÍTULO 3

ORIGENS DO CAMPO DE MARTE

Antes mesmo da retificação do rio Tietê, em 1920, era inaugurado o

Campo de Marte 14, junto às áreas de várzea, entre a Ponte das Bandeiras e

a Ponte da Casa Verde. Naquele momento, São Paulo tinha um papel

secundário frente às tomadas de decisões brasileiras, seu papel era

ascendente, mas ainda menor do que o Rio de Janeiro. Esse quadro

começou a mudar justamente com a cafeicultura, que como dito

anteriormente, iniciou, pelos grupos econômicos mais abastados, uma nova

fase econômica, onde, foi substituída a pequena produção artesanal e

doméstica ou a produção em pequena escala, por um significativo número de

estabelecimentos, especialmente na capital. Assim, José de Souza Martins

manifesta o seu entendimento para a origem da indústria brasileira:

“Nasceram, portanto, para substituir a pequena produção intersticial e não

para substituir as importações.” (MARTINS, 1981, p.106)

As ferrovias, que cortavam o Estado nesse momento (e foram

indutores do crescimento de uma série de cidades) já não eram suficientes

para atender o fluxo de pessoas que demandava a capital e o ritmo das

locomotivas não acompanhava mais o ritmo de seu crescimento. A elite

paulistana cafeeira (como a família de Santos Dumont), juntamente com

militares, manifestou e concretizou o desejo de ter um aeroporto que

facilitasse suas viagens, fato ocorrido no governo de Álvaro Gomes Azevedo

com a criação da VASP – Viação Aérea São Paulo e seus aviões ingleses.

O terreno escolhido para essa grande obra de engenharia foi descrito

recentemente por AB’SABER (2007) como de natureza plana, com solos

varzeanos – turfosos, fofos e encharcados – ao lado das extensivas e

intensas inundações periódicas. Por tais motivos, existia ali uma gama alta de

terrenos baldios, grandes e baratos, características que iriam dificultar as

atividades aeronáuticas na época da sua fundação. Um desses acidentes

naturais foi a grande enchente de 1929, que inundou as regiões próximas aos 14 Esse nome é uma homenagem a uma Praça em Paris, localizada próxima a Torre Eiffel, onde Santos Dumont fez vôos de balão em 1899. A área do aeroporto, no início do século XX já era utilizada para exercícios de cavalaria da Força Pública do Estado de São Paulo.

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rios Tamanduateí, Anhangabaú, Tietê e Pinheiros, causando enormes

estragos em plantações, casas e comércios da região15. Esse fato histórico

coloca em relevo a interpretação de Odette Seabra onde “as cheias são um

fenômeno do rio, as inundações um fenômeno social.” (SEABRA, 1987).

O papel histórico do nosso objeto de estudo também é muito

relevante. Segundo a ACECAM (Associação dos Concessionários, Empresas

Aeronáuticas Intervenientes e Usuários do Aeroporto Campo de Marte16) a

Escola de Pilotos da Força Pública de São Paulo, que foi o primeiro órgão

militar a ocupar o local, teve papel preponderante no combate a Coluna

Prestes, movimento militar de insatisfação com a República Velha. A

esquadrilha da Força Pública inaugurou uma série de rotas aeronáuticas no

interior do país e novas pistas de pouso, perseguindo esse numeroso grupo.

Tal fato criou empatia entre os mais abastados paulistas, que logo se

interessaram pela aviação. Nos anos seguintes foi criada a Escola de

Aviação do Ypiranga, que além de atender a esse público seleto, contribuiu

para o nascimento da Companhia de Transporte Aéreo, que era responsável

pelo transporte de cargas, especialmente para o Rio de Janeiro, Uberaba e

Ribeirão Preto.

15 Para maiores informações sobre a enchente consultar o site do Clube Pinheiros: http://www.ecp.org.br/pdf/revista/130/revista_130_pg54_memoria.pdf. 16 Disponível em http://acecam.blogspot.com/2009/09/historia-do-campo-de-marte.html, acessado em 11 de junho de 2011.

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Imagem 3 – Campo de Marte em 1933. Fonte: Santos, R. R., 1985.

Outro marco importante foi durante o início da década de 30. Durante

o governo provisório de Getúlio Vargas, a Força Pública foi extinta e todos os

hangares, aeronaves e equipamentos passaram para o domínio do Exército

brasileiro. Poucos anos depois, nos anos de 1932 e 1933, no auge da

Revolução Constitucionalista, o Campo de Marte foi retomado por tropas

paulistas e tornou-se quartel general e palco da aviação de guerra. Com a

superioridade das tropas federais e os grandes abalos causados pelo

combate, Marte foi interditado durante o ano de 1934, fato que culminou com

o grande crescimento das atividades de aviação civil e transporte de

passageiros nos anos posteriores. Nas palavras do historiador José Alfredo

Vidigal Pontes (2004), temos a dimensão desse choque:

O bombardeio mais forte ocorreu em Campinas, onde civis ficaram feridos e um garoto de 10 anos foi morto. Já o Campo de Marte foi alvo de um pesado ataque aéreo porque seus pilotos haviam sido convocados para integrar o Movimento Constitucionalista, juntamente com outros aviadores militares que aderiram à causa. Além da destruição provocada ao Campo de Marte pelos bombardeios, derrotado o levante, todos os aviões do Campo de Marte foram levados para o Campo dos Afonsos, no Rio de Janeiro. Além disso, a instalação do Parque da Aeronáutica, em 1934, ocupou boa parcela da área do Campo de Marte. (PONTES, 2004, p. 169)

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Passado para o domínio federal, os anos seguintes trouxeram um

novo aeroporto para São Paulo, Congonhas, localizado no distrito do Campo

Belo, que absorveu grande parte dos vôos domésticos que se dirigiam para a

zona norte e não estava sujeito as sazonalidades do período das chuvas e as

inundações das áreas de várzea do Tietê.

Mais recentemente, nas últimas décadas do século XX e começo do

XXI, as pistas do aeroporto foram tomadas por pequenos monomotores das

escolas de aviação, aviões de aluguel, aviões ambulância, jatos particulares

de transporte, helicópteros, todos englobados na Aviação Geral17. Além

desses, passou a abrigar os equipamentos e helicópteros das policias civil e

militar e órgãos da Força Aérea Brasileira. Tudo isso garantiu um movimento

muito expressivo, no ano de 2009, foram mais de 312 mil passageiros

transportados e cerca de 100 mil pousos e decolagens de aeronaves.

Atualmente é um aeroporto compartilhado, com parte da área física

sob administração do Comando da Aeronáutica (área militar) e outra sob o

controle da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (INFRAERO,

área civil), ambos ligados ao Ministério da Defesa e, conseqüentemente, a

União.

Nos domínios da INFRAERO, além dos cerca de mil funcionários,

temos 21 hangares de empresas de taxi aéreo (Ocean Air, Reali, North Wind,

Fretax, LRC e Helimarte), a Escola de Aviação, empresas especializadas na

manutenção de peças, dois bancos (Santander e Bradesco) e uma filial do

Bar Brahma.

Na área militar destacam-se o Hospital Militar, o Parque de Material da

Aeronáutica e a sede do IV Comando Aéreo Regional, todos subordinados a

Força Aérea Brasileira. Existem ainda nessa porção, três pequenas vilas

militares que são utilizadas de moradia pelos oficiais (com uma arborizada

entrada pela Avenida Braz leme) e o Clube da Aeronáutica. Locais que não

eram utilizados pelos militares como os seis campos de futebol (conhecidos

popularmente como SADE) e um enorme terreno junto a Avenida Olavo

17 Disponível em http://www.infraero.gov.br/index.php/br/aeroportos/sao-paulo/aeroporto-campo-de-marte.html, acessado em 15 de junho de 2011.

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Fontora foram emprestados para a Prefeitura de São Paulo, que os utiliza

para eventos esportivos e como depósito de carros alegóricos antigos.

Imagem 4: Divisão da área da União Federal no Campo de Marte. Fonte: INFRAERO, 2004.

Outros eventos marcantes, nesses 90 anos de existência, foram a

visita (e missa campal) do Papa João Paulo II, no ano de 1980, o tradicional

Domingo Aéreo, evento realizado pela Aeronáutica que traz uma série de

aeronaves antigas e novas para shows de acrobacias sob a região do

aeródromo, além de alguns acidentes a que está submetida à prática da

aviação18.

18 Cerca de 29 pessoas já faleceram em acidentes com helicópteros e aviões que partiram ou estavam a caminho do Campo de Marte. O mais grave foi em 2007, quando dez pessoas se vitimaram quando um jato caiu sobre o bairro da Casa Verde.

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CAPÍTULO 4 OS REFLEXOS DAS TRANSFORMAÇÕES SOCIOECONÔMICAS NO ESPAÇO URBANO DE SANTANA

Como visto no início do segundo capítulo, a zona norte do começo do

século XX ainda era marcada por seu aspecto rural, com chácaras e

povoamentos dispersos e somente com a Ponte Grande como forma de

ligação com o Centro. Segundo VOLTOLINI (1996) a partir dos anos 40, com

a retificação do Tietê, bondes, novas pontes, chegada de imigrantes e

incipientes traços industriais, o aspecto interiorano começa a desaparecer,

dando lugar a uma série de equipamentos urbanos básicos e sendo

realmente vista como um território paulistano, não mais como terras do “Além

Tietê”.

Nesse momento, a capital de São Paulo já é uma cidade industrial,

inserida dentro da lógica fordista, com grande especialização do trabalho,

forte presença estatal e inúmeros produtos e serviços oferecidos a fim de

gerar o consumo. Odette Seabra destaca a importância dessa indústria:

A Cidade de São Paulo ficou no centro de um processo de divisão territorial do trabalho depois de 1930, processo que teve por fundamento a industrialização brasileira. A partir de então, São Paulo e sua região formaram o hardcore da acumulação e da reprodução capitalista com características endógenas, centralizando por mais de quatro décadas, os investimentos produtivos e gerando economias de aglomeração. (SEABRA, 2004, p.274)

O termo Metrópole começa a ser empregado justamente nas primeiras

décadas do século XX. Segundo DAMIANI (2000), as presenças do mercado,

da indústria e do forte aumento populacional causaram uma grande

metamorfose social, com uma nítida mudança quantitativa e espacial da

experiência urbana e das relações entre os munícipes.

Os baixos preços dos terrenos na zona norte, a ausência de diretrizes

frente aos inúmeros terrenos irregulares e as facilidades que os loteadores

ofereciam, atraíram a população para essa parte da cidade. Tanto os bairros

industriais, como Brás, Barra Funda, Lapa, quanto os bairros jardins de elite,

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como Higienópolis, Pacaembu e Jardim Paulistano, eram muito custosos

para a recém chegada massa trabalhadora e já estavam consolidados como

principais pontos de serviço e comércio. A tese de Mônica Brito (2000), já

explora o fato de que ainda nos primeiros momentos do século passado, uma

série de empresas, voltadas para atividades urbanizadoras, se dedicavam às

atividades imobiliárias e de infraestrutura, de modo a controlar o montante de

investimentos feitos na cidade e trabalhar com a valorização fundiária. São

empresários com fortes laços estatais e políticos, que conseguem, de

maneira obscura, privilégios, autorizações especiais da administração pública

e a exclusividade na execução de obras de grande porte para os

melhoramentos urbanos. É um fato anterior ao caso da retificação dos rios

Tietê e Pinheiros, onde, como visto anteriormente, a Light ganhou o direito de

desapropriar imóveis de quase toda a várzea dos rios e utilizou a maioria das

terras para sacramentar seu interesse privado e empresarial.

Mais um indício da união dos interesses do Estado com os interesses

privados, foi o que a arquiteta Raquel Rolnik19 (2001) definiu como “surto

rodoviarista”, quando, ainda seguindo as diretrizes do Plano de Avenidas, são

inauguradas uma série de viadutos, rodovias e avenidas, privilegiando o

transporte e a indústria automotiva.

Com a chegada dos anos 50 e o pós II Guerra Mundial, a indústria

nacional passa por um novo momento, especialmente impulsionada pelo

momento histórico internacional, o governo incentiva a produção de artigos

importados e com a ajuda do capital internacional incrementa o setor

secundário de base. Novas ondas de migrantes chegam a São Paulo,

distribuindo-se por toda Região Metropolitana, aumentando

consideravelmente a população paulistana e a extensão real da cidade.

Milton Santos (1990) retrata essa mobilidade do trabalho e o crescimento

como uma expansão desmedida. O geógrafo cita que o raio que continha a

área construída da cidade até 1897 era de 1 km e pouco mais de 50 anos

depois, esse raio era de 15 km, além disso, as taxas de crescimento eram

19 Disponível em http://raquelrolnik.wordpress.com, acessado em 12 de junho de 2011.

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muito elevadas20. A industrialização se tornava cada vez mais presente e a

urbanização modificava consistentemente as antigas paisagens. Na

interpretação de Seabra:

A incorporação de novas frentes de expansão do espaço urbano em decorrência da concentração industrial e da conseqüente formação e diversificação dos mercados de bens, de produtos e de trabalho, além de tornar muito denso o espaço urbano, discriminavam modalidades de uso, segundo as determinações do valor econômico da terra, à medida que o urbano se configurava como quadro de vida. As demandas crescentes de áreas de uso público (a infra-estrutura material do urbano) e de uso privado (conjuntos residências, condomínios verticais, cortiços, favelas) implicavam, sempre, em novos conteúdos da urbanização, à medida que se configurava a metrópole. Foram, sobretudo, o Estado e os empreendedores privados os agentes interessados nesse processo. (SEABRA, 2001, p.272)

Os veículos automotores têm papel importante nessa trama. Não é

difícil concordar com Lefebvre (1991): concebe-se o espaço de acordo com

as pressões do automóvel. O Estado, comprometido com os interesses da

indústria automobilística, utiliza-se do planejamento territorial, entre outros

instrumentos, para reproduzir e ampliar interesses privados. Percebemos

mudanças constantes, como a criação e adaptação de ruas e avenidas para

a melhor circulação de veículos motorizados, como foi o caso da Marginal

Tietê e Pinheiros, finalizadas na década de 60. As forças produtivas na

cidade agradecem essa ação estatal, eliminando as possíveis barreiras que

impediam e dificultavam a circulação de mercadorias e retardavam a

reprodução do capital.

Toda essa brusca mudança no espaço urbano paulistano em um

período de tempo pequeno pode ser entendida nas palavras de Milton

Santos: O movimento dialético entre forma e conteúdo, a que o espaço, soma dos dois, preside, é, igualmente, o movimento dialético do todo social, apreendido na e através da realidade geográfica. (...) Por isso mesmo, cada lugar está sempre mudando de significação, graças ao movimento social: a cada instante as frações da sociedade que lhe

20 Segundo o Histórico Demográfico do Município de São Paulo, entre 1950 e 1960 a população da Capital cresceu 5,6% ao ano e da Região Metropolitana 6,1%, praticamente dobrando sua população em uma década.

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cabem não são as mesmas. (...) Cada lugar, ademais, tem, a cada momento, um papel próprio no processo produtivo. Este, como se sabe, é formado de produção propriamente dita, circulação, distribuição e consumo. (SANTOS, 1985, p.13)

O Estado atuou de forma mais explicita na região de Santana nas

décadas de 60 e 70. Esse período foi marcado por, além das obras viárias, o

início das operações do Metrô. Tais fatos causaram um salto nos índices de

densidade demográfica, superando os valores médios da cidade. Fica claro

que a falta de acesso à porção norte foi um fator essencial para dificultar o

seu incremento populacional nos séculos passados.

Durante o período militar (1964-1985), aumentam os estudos sobre o

planejamento urbano das cidades, com destaque para o Plano Urbanístico

Básico (1968) e o Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado21 (1971), que

trazem diagnósticos sobre a evolução urbana de São Paulo e da zona norte.

Os relatórios apontam para uma pequena quantidade de famílias de alta

renda e zonas majoritariamente de classe média, além de uma boa

concentração de atividades de comércio, serviços, educação, lazer e saúde.

Santana firma-se como um subcentro municipal, com equipamentos

notáveis22 e um fluxo de pessoas não encontrado em nenhum outro distrito

da região. Poucos anos depois, foi anunciado o Plano CURA (Comunidades

Urbanas para a Recuperação Acelerada) Piloto de Santana, que

efetivamente interveio na paisagem visando a recuperação de loteamentos e

bairros. Entretanto, como abordaremos no capítulo a seguir, essa intervenção

urbana gerou muita polêmica e foi descartada nos anos seguintes.

Nos anos 70, nas principais economias do mundo, o modelo fordista

de produção entra em colapso (especialmente na crise do petróleo de 1973).

Movimentos de descontentamento e insatisfação por aqueles que não eram

contemplados pelos benefícios estatais, geram uma série de tensões e fortes

movimentos sociais. Harvey elucida esse contexto: De modo mais geral, o período de 1965 a 1973 tornou cada vez mais evidente a incapacidade do Fordismo e do Keynesianismo de conter

21 Disponível em http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/07.082/259, acessado em 12 de junho de 2011. 22 Além da Casa de Detenção de São Paulo (Carandiru), do Clube de Regatas Tietê e do Clube Espéria, em 1972 é inaugurado o Centro de Convenções Anhembi.

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as contradições inerentes ao capitalismo. Na superfície, essas dificuldades podem ser melhor apreendidas por uma palavra: rigidez. Havia problemas com a rigidez dos investimentos de capital fixo de larga escala e de longo prazo em sistemas de produção em massa que impediam muita flexibilidade de planejamento e presumiam crescimento estável em mercados de consumo invariantes. Havia problemas de rigidez nos mercados, na alocação e nos contratos de trabalho (especialmente no chamado setor “monopolista”). (HARVEY, 1992, p. 135)

A economia brasileira, no final dos anos da década de 1970 e

especialmente nos anos 1980, foi marcada pela alta inflacionária e o rápido

crescimento da dívida externa, além do aumento do desemprego e da

diminuição de salário da classe trabalhadora. Esse modelo de produção era

inadequado quando se necessitava respostas rápidas para superar

obstáculos inesperados. Nosso país enfrentou problemas para superar essa

condição durante quase toda a década de oitenta e noventa, quando

ocorreram mudanças produtivas de tendência neoliberal. Harvey assim

classifica essa nova estrutura:

A acumulação flexível, como vou chamá-la, é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo. Ela se apóia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimentos de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. (Idem, p.140).

Segundo a dissertação de André Gonçalves (2006), essas mudanças

ocorridas na economia mundial colocam em crise a centralidade econômica

das metrópoles. As novas tecnologias de transportes, comunicação,

produção, além das cargas tributárias, pressão dos sindicatos trabalhadores

dão as empresas maior flexibilidade e alternativas na escolha dos lugares

para se estabelecerem suas sedes. Observa-se em São Paulo, e em outras

cidades, uma mudança no perfil das atividades econômicas. As plantas

industriais deslocam-se para lugares mais rentáveis e a metrópole passa a

abrigar com mais ênfase, ramos especializados do setor terciário, ligados ao

setor financeiro e de informação mundiais. A partir desse momento, a capital

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paulista é classificada como cidade mundial23 (CARLOS, 2004), e

pertencente ao período técnico científico informacional (SANTOS, 1994). A

cidade está inserida em um mercado global, disputando recursos e

investimentos disponibilizados pelo mercado mundial.

Santos (1978) não é avesso a globalização em si, é contrário ao

acirramento da competitividade e do fim da solidariedade entre as nações.

Além disso, questiona a atuação das multinacionais e transnacionais, que

ocupam territórios oportunos em determinados momentos estratégicos,

geram lucros para seus países de origem e deixam as nações exploradas

quando lhes convém, sem nenhum comprometimento com o território.

Enquanto a Avenida Paulista se consolida com as atividades

administrativas e financeiras e a zona sudoeste com empresas multinacionais

ligadas às telecomunicações e à informática, em Santana, cresce o mercado

informal (circuito inferior da economia), especialmente na Avenida Cruzeiro

do Sul e rua Voluntários da Pátria.

A descentralização industrial e conseqüente mudança no processo

produtivo (que era marcado pelo capital industrial) para uma economia

financeira geram novos usos para o espaço paulistano, facilitando e

impulsionando a expansão do mercado imobiliário em São Paulo (CARLOS,

2004). Além disso, a rentabilidade dos investimentos imobiliários como fonte

segura de aplicação, apesar da inflação, facilitam essa expansão.

Ana Fani Carlos (2004) mostra que o capital imobiliário, dado a falta de

terrenos desocupados, atua junto ao poder público, criando novos

instrumentos legais que permitem a mudança do uso e o reparcelamento do

solo urbano, aumentando a rentabilidade dos imóveis em áreas já

urbanizadas. Outra forma de atuação desse capital é a criação de

centralidades em áreas antes desprezadas. A centralidade tem origem por

meio de “novas” atividades do setor terciário que se desenvolvem de acordo

com as funções e características de cada parte da cidade.

O espaço, produto da ação humana, ao se organizar reproduzindo as

características do modo de produção que lhe originou, acaba por ser 23 A socióloga Saskia Sassen (2008) classifica São Paulo como cidade global, ainda que de 56ª grandeza. Disponível em http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq103/arq103_00.asp, acessado em 19 de junho de 2011.

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deficitário com grande parte dos interesses dos habitantes (e suas

reivindicações de consumo coletivo), beneficiando e sendo produzido,

majoritariamente, em função dos objetivos do capital. A estrutura do poder

está com quem detém os recursos econômicos (imobiliárias e construtoras),

afetando diretamente o legislativo e executivo em detrimento da população,

que se distancia cada vez mais do poder. Nas palavras de Carlos: “Hoje o

Estado tende a representar, de forma mais ampla, os interesses da

reprodução ampliada do capital”. (CARLOS, 1994, p. 182)

Santana, nesse contexto, inaugurou grandes obras, como a Avenida

Luiz Dummond Villares (1980) e o gigantesco shopping Center Norte24

(1984), do mesmo grupo que inauguraria o Lar Center (1984), o Expo Center

Norte (1990) e os hoteis Novotel (1999) e Parthernon (2002). Entre os outros

grandes equipamentos surgidos, temos o Terminal Rodoviário do Tietê

(1982), o Sambódromo (1991) e a desativação da Casa de Detenção do

Carandiru (2002), dando lugar ao Parque da Juventude (2007). Fica claro

que o setor imobiliário atuou para o desenvolvimento de diversas atividades

terciárias geradoras de alto fluxo, principalmente próximo a Marginal Tietê e

arredores, áreas com terrenos baratos, que antigamente eram as

indesejáveis várzeas.

Concluindo, os anos 80 marcaram uma nova fase de transformações

do espaço em São Paulo, gerada principalmente pelo crescimento do terceiro

setor (especialmente serviços em Santana) e sua participação na economia.

Com o comando do capital financeiro no sistema produtivo da cidade, o

mercado imobiliário alia-se ao poder público, que por sua vez, libera áreas

subutilizadas nas regiões de interesse para novos investimentos mais

rentáveis e também cria atributos para o desenvolvimento de novas áreas de

centralidade, que se tornam novas opções de investimento.

Segundo a SEMPLA (2002), no final dos anos noventa, Santana era

uma centralidade consolidada, especialmente nas áreas no entorno das

Avenidas Cruzeiro do Sul, Alfredo Pujol e Voluntários da Pátria, oferecendo

grande quantidade de serviços e comércio, um considerável fluxo de pessoas

e condições de acessibilidade (seja por ônibus ou metrô) muito significativas.

24 Disponível em www.centernorte.com.br, acessado em 19 de junho de 2011.

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Indiscutivelmente o aeroporto, enquanto objeto técnico fixo carrega

consigo uma estrutura complexa. São armazéns, hangares, vias de acesso,

sistemas de transporte público, entre outros. O caso do Campo de Marte é

ainda mais especial, pois presenciou, no passar das décadas, mudanças não

só de seu entorno, como de seu uso. Analisando a divisão territorial e social

do trabalho ao longo do tempo, Milton Santos destaca como esses objetos

podem nos auxiliar na leitura do urbano:

Pela forma como o capital fixo novo é distribuído no espaço, é possível discernir as articulações que se criam ou se podem criar, nesse ou naquele momento, tanto a articulação interna a cada subespaço como também aquelas entre subespaços. São ambas essas articulações que nos vão explicar o movimento da urbanização e sua repartição no território” (SANTOS, 1997, p.81 a 82)

Frente ao nosso atual período, onde ciência, técnica e informação

definem a constituição e o refazimento dos lugares de forma seletiva

(SANTOS, 1997), elementos como grandes meios de transporte e meios

modernos de comunicação ganham destaque no espaço. Objetos esses

adaptados ao novo frenesi da velocidade e circulação, corroborando para

uma divisão da cidade em subespaços especializados, com distintas funções

e tempos. Podemos visualizar essa velocidade e seletividade:

Despontam paralelamente nas grandes cidades as empresas destinadas ao transporte de passageiros mediante helicópteros. Assim, São Paulo e Rio de Janeiro vêem seus centros financeiros e empresariais e, também, certos hotéis de luxo e bairros de alta renda povoar-se de helicópteros. Em 1997 a frota brasileira alcançava 560, dos quais cerca de duzentos operavam no Campo de Marte e em mais 60 heliportos da capital paulista. São sobretudo as grandes corporações, as empresas de taxi aéreo (...) que se utilizam desses aparelhos. Dentro da mesma aglomeração, cria-se um circuito de transporte privilegiado e o tempo social conhece uma nova escala, superposta às já existentes. (SANTOS e SILVEIRA, 2001. p. 58, grifo nosso)

Conforme visto na passagem acima, o aeroporto, um bem público

pertencente ao Ministério da Defesa, cede sua área para grandes empresas

privadas a fim de incrementar a integração territorial e melhorar as condições

de fluidez. Embora existam interesses públicos e privados quanto ao uso do

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fixo, o Estado trabalha como agente regulador, fazendo sua mediação de

forma a tentar harmonizar os desejos ou, como no caso do nosso objeto,

privilegiando uma das partes.

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CAPÍTULO 5

O FUTURO DO CAMPO DE MARTE

Em meados de 2002, a Secretaria Municipal de Planejamento

(SEMPLA), anunciou uma série de estudos visando o consorciamento da

Operação Urbana Vila Maria/Carandiru25. Desde então, vários projetos

surgem na região de Santana, incidindo diretamente no Campo de Marte e

sua gigantesca extensão (2.113.667,00 de m²). A seguir, um breve resgate

da legislação urbana que trata desse tipo de operação.

O primeiro arcabouço legal que trata da propriedade urbana e sua

ordenação quanto aos Planos Diretores municipais, data da Constituição de

1988, nos artigos 182 e 183, onde está expresso:

§ 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. § 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, artigos 182 e 183, 1988)

O Estatuto da Cidade (2001), criado na esfera federal, embasa de

forma jurídica e institucional a operacionalidade desses artigos, tratando

diretamente do instrumento das Operações Urbanas:

§1º Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental. (Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257 de 10/07/2001)

Assim, no ano de 2002, São Paulo publica seu novo Plano Diretor

Estratégico (PDE), com sua respectiva lei de zoneamento. Poucos meses

25 Disponível em http://ww2.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/desenvolvimentourbano/plano_diretor_estrategico/quadros/0001/quadro13.pdf, acessado em 25 de junho de 2011.

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depois, aprova a criação de nove áreas de Operação Urbana Consorciada26,

entre elas a Vila Maria – Carandiru. A lei que institui esse PDE é muito clara

em sua definição sobre as Operações Urbanas (OU), caracterizadas como o

conjunto de medidas coordenadas pelo Município com a participação dos

proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com

o objetivo de alcançar transformações urbanísticas estruturais, melhorias

sociais e a valorização ambiental, notadamente ampliando os espaços

públicos, organizando o transporte coletivo, implantando programas

habitacionais de interesse social e de melhorias de infra-estrutura e sistema

viário, num determinado perímetro (Lei 13.430/02).

Ainda antes da impressão da Constituição atual, já existiam prefeituras

efetivamente imprimindo algumas mudanças sobre suas jurisdições. São

Paulo, baseado em seu Plano Diretor de 1971, já era um exemplo

significativo da incapacidade do setor público de propor projetos urbanos

para a cidade, recorrendo às parcerias privadas. Nessa ótica, surgiu em

1973, o Plano CURA27 de Santana, onde os três níveis de governo e

construtoras, com o discurso de uma melhor integração do transporte

rodoviário com o metroviário propunham a intervenção em uma área

gigantesca com cerca de 714 hectares.

Segundo o arquiteto Renato Luiz Anelli28, enquanto a burocracia

avançava, a população se organizou, protestando contra os desalojados da

obra e a possível super valorização do bairro, que tornaria insustentável a

permanência dos moradores menos abastados. Após uma série de

passeatas e mandados contra a prefeitura, o programa foi paralisado, com

algumas obras públicas viárias (privilegiando o automóvel) e uma intervenção

em uma quadra entre as ruas Ezequiel Freire e Daizan Magalhães que

passou a ter um lote maior e um acesso mais fácil dos veículos. (ANELLI,

2008)

26 O Plano Diretor Estratégico de São Paulo adequou o instrumento das operações urbanas às exigências do Estatuto da Cidade. As nove operações urbanas propostas no documento foram: Diagonal Sul, Diagonal Norte, Carandiru-Vila Maria, Vila Leopoldina, Vila Sônia, Celso Garcia, Santo Amaro, Pólo de Desenvolvimento Sul e Amador Bueno. 27 Santana, Jabaquara, Itaquera e Vila das Mercês foram as áreas com intervenções propostas. 28 Disponível em http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.088/204, acessado em 22 de junho de 2011.

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Milton Santos (1994) destaca pontos contraditórios do projeto,

especificamente na fragmentação seletiva do programa, já que ele não

levava em conta o planejamento urbano geral do município:

Os Projetos CURA e programas de viabilização de transportes, que desvalorizam prematuramente certos terrenos, enquanto revalorizam outros. Os projetos Cura fizeram parte de um projeto mundial de revitalização urbana, que acaba por levar à expulsão dos pobres dos centros das cidades, em benefícios de camadas restritas da sociedade. Mais uma vez o capital social da cidade é usado diferentemente pelos diversos capitais particulares. O problema da habitação também se inclui nessa ótica (...) o comando fica com o mercado especulativo e não com a problemática da habitação. (SANTOS, 1994, p. 137)

Com a não implantação definitiva desse projeto, a zona norte

enfrentou algumas décadas sem a intervenção estatal e privada em grandes

empreendimentos. No fim do século passado, com a emergência de novos

modos de relacionamento da esfera pública com o setor privado, cresce a

ênfase desse tipo de parcerias e, seguindo exemplos americanos e

europeus, novas29 OUs são efetivadas. Como podemos observar na imagem

a seguir:

29 A primeira operação urbana paulistana iniciou-se na década de 1990, no governo de Luísa Erundina (PT), chamada Operação Urbana Anhangabaú (Lei Nº 11.090/91). A partir de então, já foram aprovadas em São Paulo as operações urbanas Faria Lima (Lei Nº 11.732/95), Água Branca (Lei Nº 11.774/95) e Centro (Lei Nº 12.349/97)30. Mais recentemente foram aprovadas as operações urbanas Água Espraiada (Lei Nº 13.260/01) e Rio Verde – Jacu (Lei Nº 13.872/04).

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Imagem 5: Operações urbanas existente e em estudo na Região Metropolitana de São Paulo. Fonte: SEMPLA. 2002.

Esse novo momento pode ser entendido pela crise financeira,

especialmente local, que o estado atravessa. Além disso, temos no início da

década de 90, um avanço do pensamento neoliberal no país, que garantia

maior autonomia e força ao mercado e a intencionalidade das cidades em se

tornar atraentes ao capital global, mostrando, em larga escala, uma maior

inclinação da política com a causa econômica, em detrimento da social.

A atual fase, de internacionalização do capital, fez com que a dinâmica

sócio-espacial das cidades sofresse grandes alterações. As reestruturações

urbanas, que produzem um novo ordenamento territorial, mostram-se como

um processo global, que segundo HARVEY (1996), traduz, além do

esgotamento do modelo de produção fordista, a perda de capacidade de

regulação da economia pelo poder público, da financeirização e a

desterritorização30 do capital, bem como sua maior concentração, afetando

de maneira particular todas as grandes cidades do mundo.

Nessa conjuntura, em 2005, é elaborado o projeto urbanístico da OU

Carandiru – Vila Maria, coordenado pelo arquiteto José Geraldo Martins de

Oliveira. Um plano gigantesco, que inclui diversos distritos paulistanos, como 30 O termo “desterritorialização” é utilizado aqui para se referir a lógica do capital financeiro, onde o capital se desloca para formas de produção mais rentáveis, em outras partes geográficas da Terra, buscando sua maximização em espaços não produtivos, como o mercado imobiliário e a especulação.

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Casa Verde, Santana, Vila Guilherme, Vila Maria, Bom Retiro, Pari e

especialmente a totalidade da área do Campo de Marte.

Imagem 6: Área da intervenção da Operação Urbana Consorciada Carandiru – Vila Maria. Fonte: Website: Vitruvius, 2005.

Segundo as proposições dessa intervenção recolhidas no próprio site

do coordenador31, temos um arcabouço de medidas públicas e privadas que

estimulariam esta fração do solo urbano, de cerca de 1752 hectares, com

limites muito próximos aos do projeto CURA, visando especialmente,

modificações na rede de transportes e na habitação. Literalmente temos:

O Projeto Urbanístico Carandiru – Vila Maria, por sua vez, foi desenvolvido com enfoque em três principais temas, assim definidos: 1 Alcançar maior adensamento da ocupação territorial e promover a atração da mais ampla diversidade de usos, que proporcionem a utilização intensa da infra-estrutura instalada e a obtenção das condições para o emprego pleno daquela que virá a ser instalada, sobretudo a Linha 8 do Metrô, cuja construção está prevista para o local. Também, com a ocupação diversificada e de elevada densidade, busca-se gerar condições para que a dinâmica econômica e a afluência de público, dos equipamentos de serviços e

31 Disponível em http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/06.065/415, acessado em 01 de julho de 2011.

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de comércio de grande porte da área, repercutam, em parte, nas suas proximidades, por meio das atividades que lhes sejam complementares ou lhes dêem suporte, que estejam ou venham a se instalar na região; 2 Regenerar o ambiente e a paisagem, de modo a obter condições adequadas de habitabilidade, melhorando os padrões de moradia da população residente e dos usuários permanentes ou temporários e, ainda, de maneira a ampliar o universo da habitação no local. Nesse sentido, a oferta de áreas públicas na região é fator preponderante para atingir as condições estabelecidas no projeto; 3 Adquirir mobilidade no interior da região da Operação Urbana, em que é precário o deslocamento entre pontos próximos, enquanto são fartos os meios de acesso ao seu território. A articulação dos equipamentos mencionados mostra-se possível no Projeto Urbanístico Carandiru – Vila Maria, por meio do alinhamento dos maiores deles, com vias em parte existentes e algumas ligações a serem construídas entre essas. Da conquista por mover-se com facilidade e rapidez e ainda estimular a circulação, por vários meios, depende a intensificação do uso dos equipamentos instalados e a atração de novas atividades para a região, conforme se propõe. (OLIVEIRA, 2005)

Essa remodelação da paisagem, tida como subaproveitada, tem como

ação central a área do aeroporto. O fixo público aparece como uma

gigantesca reserva de valor, passível de uma grande valorização fundiária.

Não fica claro se as atividades de aviação civil irão ser mantidas como

atualmente ou se iriam ser extintas, privilegiando a execução de parques e

praças no seu espaço. Segundo o site:

Dentre esses terrenos de domínio público o Campo de Marte é, certamente, um dos maiores enclaves, como até recentemente fora o presídio do Carandiru. É também, contudo, imensa área de extraordinário potencial. A utilização das suas instalações, complementadas com outras próprias da atividade aeroportuária voltadas para uso menos restrito do que o atual viria ao encontro das propostas que o Projeto Urbanístico formula. (OLIVEIRA, 2005)

Pode se concordar com uma certa ociosidade e baixa utilização da

totalidade da área do aeroporto, especialmente na área destinada aos

militares, conforme as imagens a seguir, porém, segundo a crítica de André

Gonçalves (2006), devemos conhecer com clareza qual é a real

intencionalidade dessa ação de capitais mistos.

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Imagem 7: Fachada do Campo de Marte, avenida Braz leme. Fonte: Luis Gustavo Razera

Imagem 8: Área interna do Campo de Marte. Fonte: Luis Gustavo Razera

Em seu trabalho, o geógrafo alenta sobre a roupagem positiva que a

OU traz, promovendo a melhoria do ambiente local e por conseqüente um

incremento na qualidade de vida dos moradores da região. Entretanto, em

uma análise mais profunda do que essa monografia se propõe, temos certos

pontos discutíveis no discurso oficial. A valorização fundiária “planejada”

proposta serviria a quais atores? As populações socioeconomicamente

desfavorecidas seriam expulsas, produzindo espaços segregados na cidade?

Segundo a tese:

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Os motivos reais da OU, está naquilo que o autor denomina de motores da Operação Urbana. Não é a história de ocupação da região, sua paisagem inóspita (sic) ou sua baixa densidade demográfica que justificam a OU, mas sim, a necessidade imposta pela lógica da economia mundial na Metrópole de São Paulo, de ter um espaço específico, voltado no caso aqui, a constituição de um pólo hoteleiro intercalado com um pólo de feiras, eventos e negócios. (GONÇALVES, 2006, p. 141)

Ainda que possua especificidades próprias ligadas à manifestação da

sociedade local, o espaço urbano da zona norte - e de toda metrópole

paulista – busca, majoritariamente, através de vários atores e de receituários

internacionais, facilitar a reprodução do capital. Seja pela fluidez de pessoas,

objetos, desejos, dinheiro ou informação, ou ainda pelo espaço, que na

sociedade global contemporânea é tido como ferramenta e produto dessa

condição.

Nos últimos três anos, as discussões e embates da OU Vila Maria –

Carandiru foram minimizadas. Outro gigantesco projeto ganhou as

manchetes da imprensa e mobilizou os diversos atores do país. Trata-se do

Trem de Alta Velocidade32 (TAV), uma linha que ligaria Campinas – São

Paulo e Rio de Janeiro pela matriz ferroviária. A implantação desse estudo,

com um custo de cerca de 34 bilhões de reais (valor de 2009) e 510

quilômetros de extensão, certamente provocará impactos de grande

magnitude em diferentes setores, tanto econômicos quanto sociais e incidirá

diretamente sobre a totalidade do Campo de Marte, que seria usado como

uma estação central na capital paulista33. Conforme a imagem seguinte:

32 Disponível em http://www.tavbrasil.gov.br, acessado em 01 de julho de 2011. 33 Campo de Marte receberá TAV (11/08/2009), Jornal o Estado de São Paulo. Disponível em http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20090811/not_imp416787,0.php, acessado em 01 de julho de 2011.

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Imagem 9: Representação esquemática do traçado referencial e estações do TAV. Fonte: Relatório Halcrow/Sinergia

Mais uma vez, motivadas pela fluidez exigida pela nova divisão

territorial do trabalho, temos uma intervenção proposta para uma

determinada fatia do solo urbano. E novamente em um misto de capitais

públicos (federais) e privados, esses últimos, especialmente internacionais.

Algumas informações oficiais foram divulgadas sobre o uso do terreno

do aeroporto34. Segundo o então ministro da defesa Nelson Jobim, em

matéria publicada no jornal Folha de São Paulo (2009), o "Campo de Marte

vai ser um dos pontos da passagem do trem de alta velocidade. Então, terá

que mudar a natureza do Campo de Marte" e "É uma destinação claramente

de heliponto. O futuro de Marte será heliponto". Assim, as atividades de

aviação executiva e civil seriam deslocadas para alguma cidade próxima a

São Paulo e na zona norte seria mantido apenas as atividades com

helicópteros. Dessa maneira, toda a pista pouso poderia ser destinada a

estação do trem.

Dada a fartura de terrenos ociosos de grande porte nessa região, não

é de se espantar que, paulatinamente, novos lançamentos comerciais e

residenciais surjam, modificando a paisagem para algo inusual, como

34 Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u630208.shtml, acessado em 01 de julho de 2011.

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condomínios e empresas de altíssimo padrão, que citam35 o TAV como um

incremento a valorização dos imóveis, exemplificados nas imagens a seguir:

Imagem 10: Construção de edifícios de alto padrão junto à cabeceira do aeroporto, bairro da Casa Verde. Fonte: Luis Gustavo Razera

Imagem 11: Futuro lançamento de alto padrão, Avenida Braz leme, bairro da Casa Verde. Fonte: Luis Gustavo Razera

Não podemos afirmar definitivamente qual será o destino do Campo

de Marte, ainda mais quando as esferas públicas do poder parecem discordar

quanto ao seu uso36. Até a finalização dessa monografia a execução do TAV

35 Jornal Kallas News, edição 747 de maio de 2011. Disponível em www.kallasnet.com.br, acessado em 01 de julho de 2011. 36 Estava prevista para o ano de 2011 a inauguração de uma nova torre de controle, orçada em 16 milhões de reais, além do alargamento e pavimentação da pista de pousos. Nenhuma obra foi iniciada pela INFRAERO.

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parece ser mais provável, transformando o aeroporto em uma estação de

manutenção e embarque de trens.

É notável que a sociedade e a população estão cada vez mais

distanciadas da tomada de decisão sobre o espaço que habitam. Aqueles

que detêm os recursos econômicos, principalmente as imobiliárias,

construtoras, transnacionais e multinacionais, interferem diretamente no

legislativo e no executivo, em todas as suas esferas. Fato que, com o passar

dos anos e dos sucessivos ciclos econômicos, proporciona uma visível e

impactante estratificação social, tornando a segregação espacial um novo e

constante produto do processo de produção da cidade. (VILLAÇA, 1997).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao fazer o resgate histórico da região estudada, ficou claro que o

desenvolvimento urbano de Santana e de toda a zona norte foi prejudicado

pelas constantes cheias das várzeas do Rio Tietê, gerando um acesso

deficitário ao local. Sua evolução urbana ganhou um forte impulso quando

características de acessibilidade foram melhoradas, seja por meio de novas

pontes, avenidas e a controversa retificação fluvial, seja pela chegada de

energia elétrica e a consequente expansão do sistema de transporte entre os

bairros.

No momento da fundação do Campo de Marte, em 1920, seu entorno

ainda era pouco habitado, com muitas chácaras, que tinham a função de

abastecer o restante da cidade, especialmente com alimentos e serviços

manuais, garantidos e impulsionados pela proximidade ao centro.

Nas décadas seguintes, com o café, a industrialização e os primeiros

passos metropolitanos, os núcleos de povoamento antigo perderam seus

traços de origem. O aeroporto, por sua vez, foi transformado em um

importante centro da aviação geral, executiva e de táxi-aéreo, concentrando a

maior frota de helicópteros do país. Aqui está a sua principal função como um

capital fixo: auxiliar na circulação de mercadorias, pessoas, informações e

integrar o território. Deve-se ter claro que seu uso correspondeu diretamente,

sob a ótica da reprodução capitalista, às estratégias utilizadas em cada

momento histórico. Estudando sua distribuição e função no espaço, podemos

perceber quais articulações (presentes ou futuras) o fixo pode criar e

conjugar, auxiliando na explicação dos movimentos urbanos a cada recorte

temporal.

Com a internacionalização de fluxos e bens, informações e serviços,

São Paulo foi transformada em um espaço estratégico de articulação junto

aos circuitos internacionais, sendo considerada por diversos atores como

uma cidade “nó”, com considerável importância nas decisões dos mais

diversos segmentos no continente. Cresceu também, no entanto, a presença

das grandes corporações, que são usualmente mais poderosas que certos

níveis de Estado, especialmente na sua esfera municipal e alguns entes

federados, para o caso brasileiro. Conforme mais se aprofunda a divisão

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territorial do trabalho, mais o país tenta viabilizar-se aos grandes capitais, e

faz isso adequando seus mecanismos de regulação econômica e territorial às

exigências das mega empresas globalizadas.

Por isso, as reestruturações urbanas, envolvendo investimentos e

ações políticas vistosas, buscam em longo prazo um novo patamar de

valorização financeira e espacial, convertidas em rentabilidade econômica.

Novos modelos de urbanização são criados pela indústria imobiliária,

especialmente com a execução de edifícios de apartamentos e sua vindoura

especulação.

Como visto com suas adjacências, o aeroporto tem grandes chances

de ser refuncionalizado em um futuro próximo, ou mesmo extinto, por ser

considerado um entrave à acumulação mais vertical de riquezas.

Nas últimas décadas o modelo aeroviário de transporte evoluiu

consideravelmente em aspectos como rapidez, segurança e popularização

das tarifas. O fluxo material transportado em Marte (nesse caso, os

passageiros) corresponde a uma gama ainda elitizada, usualmente

empresários e executivos, tradicionais usuários dos táxis-aéreos e dos jatos

executivos. Mesmo com consumidores endinheirados e regionalmente

importantes, nos parece que o atual momento mundial impõe uma menor

influência a essas pessoas. Corporações transnacionais dos mais diversos

ramos fogem ao controle estatal, reorganizam os espaços e não se

comprometem com a realidade social dos países (SANTOS, 1997). Fazem

isso com a intencionalidade de satisfazer suas necessidades de investimento

e retorno, enquanto atores econômicos poderosíssimos.

Tanto seu porvir como estação de trens de alta velocidade quanto

como gigantesca área de lazer em meio a uma Operação Urbana conferem

ao Aeroporto e seu entorno certo grau de perversidade. Trata-se de mais um

pedaço da cidade que tenta mostrar-se moderna e tecnológica, capaz de

suprir qualquer padrão internacional de exigência e competitividade.

É um movimento contraditório, dinâmico e confuso, no qual se busca

persistentemente figurar São Paulo em uma rede de cidades, mas exclui-se,

pouco a pouco, a população que não é interessante a esses olhos. As

transformações nos lugares, que constantemente estão mudando de

significação, acabam por esvaziar o sentido da cidadania, forçando e forjando

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um novo tipo de comportamento e consumo. Trata-se, infelizmente, de mais

um capítulo da ação do homem sobre a natureza e das relações geradas por

nós através do processo de trabalho ao longo do tempo. Resta-nos

questionar e trabalhar, solidariamente, por uma nova ruptura.

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