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Reitor

Paulino Lima Fortes

Vice-Reitora para Pós-Graduações e Investigação

Maria Adriana Sousa Carvalho

Vice-Reitor para Extensão Académica e Desenvolvimento Institucional

Manuel Brito-Semedo

Pró-Reitor para a Graduação, Desenvolvimento Curricular e Qualidade Académica

Bartolomeu Lopes Varela

Administradora-Geral

Elizabeth Coutinho

UNIVERSIDADE DE CABO VERDE

Universidade em Rede

www.unicv.edu.cv

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I COLÓQUIO CABO-VERDIANO DE EDUCAÇÃO

“Nas pegadas das reformas educativas”

Praia, 3 e 4 de Julho, 2013

Coordenação institucional

Arlindo Mendes - Presidente do Conselho Diretivo do Departamento de Ciências Sociais e Humanas, Universidade de Cabo Verde

Comissão organizadora

Adriana Mendonça dos Santos

Ana Cristina Pires Ferreira

Ana Domingos

Ana Reis Teixeira

Antonieta Ortet

Eurídice Amarante

João Paulo Madeira

Maria dos Reis

Odete Carvalho

Sílvia Cardoso

Participação especial na concepção gráfica de materiais de divulgação e do site

Bruno Ambrioso

Jorge Brandão

Comissão Científica

Adriana Carvalho (Universidade de Cabo Verde)

Alcides Ramos (Universidade de Cabo Verde)

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Amália Lopes (Universidade de Cabo Verde)

Ana Cristina Pires Ferreira (Universidade de Cabo Verde)

Bartolomeu Varela (Universidade de Cabo Verde)

Bento Duarte Silva (Universidade do Minho)

Carlos Bellino Sacadura (Universidade de Cabo Verde)

Carlos Spínola (Universidade de Cabo Verde)

Fernando Serra (Universidade Técnica de Lisboa)

Filomena Fortes (Ministério da Educação e Desporto de Cabo Verde)

João Rosa (Universidade de Massachusets Darmouth)

José Augusto Pacheco (Universidade do Minho)

José Carlos Anjos (Universidade de Cabo Verde)

Júlio Santos (Instituto Politécnico de Viana de Castelo / Universidade do Porto)

Licínio Lima (Universidade do Minho)

Laurence Garcia (Universidade de Cabo Verde)

Lourenço Gomes (Universidade de Cabo Verde)

Maria Luisa Inocêncio (Universidade de Cabo Verde)

Maria André Trindade (Universidade de Santiago)

Maria João Gomes (Universidade do Minho)

Sílvia Cardoso (Universidade Católica de Portugal - Braga)

Sónia Cruz (Universidade Católica de Portugal - Braga)

Teresa Leite (Escola Superior de Educação de Lisboa)

Victor Fortes (Universidade de Cabo Verde)

Thierry Berthet (Instituto de Estudos Políticos de Bordéus)

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NAs PEGADAs DAs REfORmAs EDUCAtIVAs

ATAS Do I CoLóqUIo CABo-VErDIAno rEALIzADo Do DEPArTAMEnTo DE CIêNCIAS SOCIAIS E HUMANAS DA UNIVERSIDADE DE CABO VERDE

Organizadores

Ana Cristina Pires Ferreira

Ana Maria Domingos

Carlos Spínola

Praia, Cabo Verde - 2013

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fIChA téCNICA

título

nas Pegadas das reformas Educativas: Atas do I Colóquio cabo-verdiano realizado do Departamento de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Cabo Verde

Organizadores

Ana Cristina Pires Ferreira

Ana Maria Domingos

Carlos Spínola

Copyright©

Organizadores, autores e Universidade de Cabo Verde

IsBN

978-989-97833-9-3

Revisão

Cheila Delgado

Elizandra Sabrina Semedo Fernandes

Jair Martins

Odete Carvalho

Coordenação Editorial

Márcia Souto

Capa, Layout e Paginação

Edson Carvalho

Ricardo Mendes

Edições Uni-CV

Praça Dr. António Lereno, s/n - Caixa Postal 379-C

Praia, Santiago, Cabo Verde

Tel (+238) 260 3851 - Fax (+238) 261 2660

Email: [email protected]

Praia, Novembro de 2013

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ÍNDICE

APRESENTAÇÃO....................................................................................................12

AVALIAÇÃO DAs APRENDIzAGENs .............................................................. 13

AVALIAÇÃo EDUCACIonAL: qUE LóGICAS E qUE TEnDÊnCIAS? ALGUnS PROCESSOS E DESAFIOS NO CONTEXTO DAS REFORMAS CURRICULARES NA ÁFRICA SUBSARIANA

Arlindo Vieira; José A. Pacheco ............................................................................ 14

AVALIAÇÃo DAS APrEnDIzAGEnS ESCoLArES: o ELo MAIS FrACo

Victor Manuel Fortes ............................................................................................ 25

CURRÍCULO E REfORmAs CURRICULAREs .................................................. 35

rEForMA CUrrICULAr E ABorDAGEM Por CoMPETÊnCIAS EM CABo VErDE: PERCEÇÕES E QUESTIONAMENTOS

Ana Cristina Pires Ferreira .................................................................................... 36

orIEnTAÇÕES CUrrICULArES: A MÃo qUE EMBALA A EDUCAÇÃo DE INFÂNCIA

Guida Mendes; José Augusto Pacheco ................................................................. 48

FUnDAMEnToS PArA UMA VISÃo HoLÍSTICA Do CUrrÍCULo - TEorIA CUrrICULAr E PrÁXIS PEDAGóGICA, no DLBSE-CV/2010

Sílvia Maria Castro Fortes Cardoso; José Augusto Brito de Pacheco ....................61

CUrrÍCULo-SEM-TEMPo: A (rE)ConSTrUÇÃo DA EDUCAÇÃo DE InFÂnCIA

Tânia Pestana; José A. Pacheco..... ....................................................................... 75

CUrrÍCULo, PLAnIFICAÇÃo E AVALIAÇÃo: UM oLHAr SoBrE A OPERACIONALIDADE DA REFORMA EDUCATIVA E CURRICULAR EM CURSO

Sílvia Maria Castro Fortes Cardoso; Joana Sofia Sousa Figueiredo....... ................86

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DEsAfIOs DA GLOBALIzAÇÃO ..................................................................... 98

FILoSoFIA DA EDUCAÇÃo, PrÁTICAS PEDAGóGICAS E PoLÍTICAS DE EnSIno – UMA RELAÇÃO COMPLEMENTAR E HEURTíSTICA

Carlos Bellino Sacadura ........................................................................................ 99

DESIGUALDADE SoCIAL no ACESSo Ao EnSIno EM CABo VErDE: rELEnDo TrAJECTórIAS DE ESCoLArIzAÇÃo DE ESTUDAnTES DE MEIoS SoCIAIS DESFAVORECIDOS

Crisanto Barros ..................................................................................................... 109

EDUCAr PArA qUÊ? rEFLEXÕES SoBrE A PrÁTICA PEDAGóGICA orIEnTADA PARA O DESENVOLVIMENTO HUMANO

Dulciene Anjos de Andrade e Silva ...................................................................... 127

A ESCoLA CoMo LoCUS MILEnAr DE InSTrUÇÃo E ForMAÇÃo – MUDAnÇAS CUrrICULArES nA PASSAGEM Do MILÉnIo: FInDo o EnSIno nAPoLEónICo qUE PArADIGMA SE AVIzInHA?

José Esteves Rei .................................................................................................... 140

EDUCAÇÃO INCLUsIVA ................................................................................. 151

EDUCAÇÃo InCLUSIVA: UMA InTEGrAÇÃo DE ABorDAGEnS EnTrE PorTUGAL E CABo-VErDE

Joana Sofia Sousa Figueiredo; Sílvia Maria Castro Fortes Cardoso .......................152

HÁ ESCoLA no HoSPITAL: ConTrIBUToS PArA UM noVo MoDELo DE INTERVENÇÃO EDUCATIVA

Joana Sofia Sousa Figueiredo; Sílvia Maria Castro Fortes Cardoso .......................165

RECETIVIDADE DOS PROFESSORES à INCLUSÃO DE ALUNOS COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS NO ENSINO SECUNDÁRIO

Maria José Alfama ................................................................................................ 177

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fORmAÇÃO E AVALIAÇÃO DE DOCENtEs ................................................... 189

(DES)EnCAnToS DA InAUGUrAÇÃo ProFISSIonAL DoS DoCEnTES

Cândida Mota-Teixeira; Elisabete Ferreira ............................................................ 190

ProFESSIonAL DEVELoPMEnT In CAPE VErDE: A SAMPLE oF PrIMAry AnD SEConDAry SCHooL TEACHErS

Courtney Creamer ................................................................................................ 202

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOS PROFESSORES DO ENSINO SECUNDÁRIO EM CABo VErDE: AMBIÇÕES E LIMITES

José rito Baptista Teixeira .................................................................................... 213

PERFIL PROFISSIONAL DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO SUPERIOR COMO ELEMENTO CONSTITUTIVO DE IDENTIDADE DOCENTE ..................................226

Maria da Conceição Valença da Silva ; Maria da Conceição Carrilho de Aguiar; Natércia Alves Pacheco

rUMoS InDAGADorES Con(SEn)TIDoS nA ForMAÇÃo InICIAL DE PROFESSORES

Susana Cristina Pinto; Cândida Mota-Teixeira ...................................................... 236

ORGANIzAÇÃO EsCOLAR E AVALIAÇÃO INstItUCIONAL ......................... 248

AVALIAÇÃo EXTErnA DE ESCoLAS EM PorTUGAL: IMPACTo no ProCESSo DE AUTOAVALIAÇÃO DAS ESCOLAS

Maria da Graça Bidarra; Carlos Barreira; Manuela Soares ...................................249

AVALIAÇÃO EXTERNA DAS ESCOLAS EM PORTUGAL. QUE IMPACTO E EFEITOS nA ESCoLA E nA SALA DE AULA?

Isabel Fialho; José Saragoça; Maria José Silvestre; Sónia Gomes .........................263

ProJETo TUrMAMAIS: A CAMInHAr PArA o SUCESSo ESCoLAr

Ana Maria Cristóvão; Isabel Fialho; Hélio Salgueiro; Marília Cid ..........................274

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DIRETOR DE TURMA NO QUOTIDIANO DA ESCOLA

Lionilda Mágueda Évora de Sá Nogueira .............................................................. 288

PROCEssOs E REALIDADEs EDUCAtIVAs .................................................... 303

TrABALHo DE ProJETo: EXPErIÊnCIAS VIVIDAS E SEnTIDAS EM ConTEXTo DE EDUCAÇÃO DE INFÂNCIA

Cândida Mota-Teixeira; Beatriz Silva .................................................................... 304

A ABORDAGEM DE PROJETO COMO AUTONOMIA E AGêNCIA RELACIONAL NO ENSINO SUPERIOR

Elisabete Ferreira; Cândida Mota-Teixeira ............................................................ 316

A SUrVEy oF rEADInG InSTrUCTIon AnD rEADInG ATTITUDES In THE REPUBLIC OF CAPE VERDE

David A. Almeida .................................................................................................. 328

EU E ELES: A ConSTrUÇÃo DA IDEnTIDADE EM ALUnoS Do EnSIno BÁSICo

Dulce Martins; Carolina Carvalho; Ana Paula Gama; Cristina Carvalho; David Tavares; Edite Fiúzae; Jesuína Fonseca; Joseph Conboy; Maria Helena Salema; Maria Odete Valente... .............................................................................................................. 335

ESTRATÉGIAS PEDAGóGICAS PARA O DESENVOLVIMENTO DE UMA COMPETêNCIA COMUNICATIVA BILINGUE

Elvira Reis ............................................................................................................. 350

CoMPETÊnCIAS rEEDIFICADAS nA/CoM A ESTrATÉGIA METoDoLóGICA DE PROJETO

Cândida Mota-Teixeira; Susana Cristina Pinto ...................................................... 362

sUPERVIsÃO PEDAGÓGICA .......................................................................... 375

PRÁTICAS DE APOIO à SUPERVISÃO PEDAGóGICA COM RECURSO A UM AMBIENTE VIRTUAL NA UNIVERSIDADE DE CABO VERDE

Adriana Mendonça; Maria João Gomes ............................................................... 376

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PRÁTICAS DE SUPERVISÃO DE ESTÁGIO, NA PERSPETIVA DE EDUCAÇÃO CoMPArADA: DUAS EXPErIÊnCIAS EnVoLVEnDo A UnI-CV E A UCP

Adriana Mendonça ; Sílvia Maria Castro Fortes Cardoso .....................................386

o ACoMPAnHAMEnTo CIEnTÍFICo E TÉCnICo-PEDAGóGICo Do ProJETo TURMAMAIS. IMPACTO NAS ESCOLAS

Isabel Fialho; Ana Maria Cristóvão; Hélio Salgueiro; Marília Cid ..........................397

SUPERVISÃO DO ESTÁGIO NA FORMAÇÃO DE FUTUROS PROFESSORES NO EnSIno SECUnDÁrIo CABo-VErDIAno

Isabel Salomé de Lima; Ana Isabel Andrade; Nilza Costa .....................................410

tIC NA EDUCAÇÃO ....................................................................................... 423

“InTErAÇÃo” EM AMBIEnTES VIrTUAIS DE EnSIno E APrEnDIzAGEM: qUE MoDELo DE InTErAÇÃo SErVE MELHor A ForMAÇÃo A DISTÂnCIA?

Maria da Luz Correia; Maria Luísa Inocêncio........................................................ 424

nATIVoS DIGITAIS: ATrEVE-TE A EMPrEEnDEr

Karine P. de Souza; Bento Silva ............................................................................ 435

A WEBqUEST no EnSIno DA InForMÁTICA: APrEnDIzAGEnS E rEAÇÕES DoS ALUNOS

Sónia Catarina Cruz; Maria João Gomes Pires ...................................................... 448

E-MAIL: A FErrAMEnTA ESqUECIDA PELoS ProFESSorES nA CoMUnICAÇÃo COM ALUNOS E PAIS

Sónia Cruz; Vítor Machado ................................................................................... 459

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APREsENtAÇÃO

Este livro das Atas do Primeiro Colóquio Cabo-verdiano de Educação Nas pegadas das reformas educativas, realizado no Departamento de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Cabo Verde, na Praia, a 3 e 4 de Julho, engloba os textos das comunicações apresentadas pela quase totalidade dos participantes e recolhidos após o evento.

Em Cabo Verde, assim como em vários outros países, vive-se atualmente processos de renovação, de mudança global ou parcial, do setor educativo que decorrem de políticas educativas transnacionais e nacionais fortemente influenciadas pelas primeiras. Importa, analisar, explicar e compreender as dinâmicas de reformas educativas em diferentes contextos, bem como produzir e difundir conhecimento sobre elas. Tal foi o objetivo do Colóquio que pretende constituir-se num fórum colaborativo de discussão, a cada dois anos, sobre a educação que se vive, que se constrói e que se projeta no interior dos espaços nacionais e internacionais, num mundo globalizado de conhecimentos e experiências.

Para atender aos objetivos acima referidos, o Colóquio foi organizado em torno de quatro painéis temáticos: Desafios da globalização e reformas educativas; Processos, realidades educativas e inovações curriculares; Formação de professores: políticas, inovações e desafios; Educação e desenvolvimento sustentável.

No entanto, os textos recolhidos apresentam-se agrupados em subtemas mais específicos para maior clareza e estímulo à sua leitura por todos quantos se interessam pelas questões da Educação. os subtemas são: Avaliação das aprendizagens, Currículo e reformas curriculares, Desafios da globalização, Educação Inclusiva, Formação e avaliação de docentes, Organização escolar e avaliação institucional, Processos e realidades educativas, Supervisão pedagógica e TIC na Educação.

A realização deste Colóquio foi possível graças aos patrocínios e apoios concedidos pela reitoria da Universidade de Cabo Verde e seu Departamento de Ciências Sociais e Humanas, Universidade do Minho, Universidade Católica de Portugal, Instituto Camões, Empresa de Segurança Aérea de Cabo Verde, BORNEfonden (Cabo Verde), Porto Editora, UnITEL/T Mais e CAVIBEL Lda, a quem os organizadores agradecem.

A Organização.

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AvAliAção dAs AprendizAgens

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AVALIAÇÃO EDUCACIONAL: QUE LÓGICAs E QUE tENDÊNCIAs?

ALGUNs PROCEssOs E DEsAfIOs NO CONtEXtO DAs REfORmAs CURRICULAREs NA ÁfRICA sUBsARIANA

Arlindo Vieira; José A. Pacheco

Universidade de Cabo Verde; Universidade do Minho

[email protected]; [email protected]

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Avaliação das Aprendizagens

REsUmO

neste artigo, propomos analisar alguns processos e desafios nas reformas curriculares nos sistemas de avaliação educacional. Situamo-lo no atual contexto mundial e percorremos, de forma sucinta e crítica, as influências dos organismos internacionais nas tomadas das decisões nos Estados-nação, questionando as suas tendências e as suas lógicas. Assume-se, aqui, a avaliação educacional como um campo abrangente que comporta subáreas, com características diferentes, por exemplo, avaliação curricular, avaliação de desempenho escolar a nível de sala de aula e avaliação institucional, procurando dar enfoque aos países africanos, especificamente à região da África Subsariana (ASS), de que Cabo Verde faz parte em termos geográficos e de agendas geopolíticas.

Palavras-chave: reformas curriculares; avaliação educacional; políticas educativas; África Subsaariana.

ABstRACt

In this paper, we propose to analyze some processes and challenges at curriculum reforms in the systems of educational assessment. We situates it in the current global context, and we travel, succinctly and critically influences of international organizations in the decisions taken by nation-states, questioning their trends and their logics. It is assumed here, the educational evaluation as a comprehensive field that holds subareas with different characteristics, eg, curriculum evaluation, performance evaluation, school-level classroom and institutional assessment, trying to focus on African countries, specifically in Sub-Saharan Africa (SSA), that Cape Verde is part geographically and geopolitical agendas.

Keywords: curriculum reform; educational assessment; educational policies; sub-Saharan Africa.

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CEDU 2013 - Nas Pegadas das Reformas Educativas

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1. REfORmAs NOs sIstEmAs DE AVALIAÇÃO EDUCACIONAL

nas últimas décadas do Século XX, a política educacional voltou a centrar-se nos princípios democráticos da qualidade, equidade e acesso. Na avaliação educacional, permaneceram fortes as orientações anteriores, ou seja, a obrigação de a educação agir em termos das metas económicas, da formação profissional, segundo as exigências do mercado e da competitividade internacional (Pacheco, 2011). Continuam a ser aplicados os testes ao nível nacional, tal como são seguidos os indicadores internacionais (OCDE, 2005). Das reformas educacionais, iniciadas na década de 1980, constam palavras de ordem como gestão eficiente, privatização, excelência, produtividade, selectividade, interesses e a satisfação do consumidor, enfim, um conjunto de expressões que identificam a educação com a cultura de empresa (Estêvão, 1998; Pacheco, 2000b). Essas tendências para a promoção da eficácia da escola requerem, desse modo, a avaliação externa do desempenho do conjunto das escolas dos sistemas de ensino não apenas como fonte de informação para o planeamento da provisão de recursos financeiros e assistência técnica, mas também como estratégia para induzir, em cada estabelecimento escolar, a responsabilidade pelos resultados (accountability) (Fernandes, 2006; Afonso, 2009; Pacheco, 2011).

os processos de transnacionalização das políticas educativas nacionais, dos quais brotam novos modos de governação, reforçam, por isso, a lógica tecnocrática da educação (Pacheco, 2009) que sonegam actores e interesses, em presença, nos contextos educativos, quer do processo de concepção, quer do processo de avaliação das políticas (Morrow & Torres, 2004; Pacheco, 2000b). Assim, os complexos e sofisticados sistemas de avaliação desenvolvidos, nesta última do século XXI, por organizações transnacionais, como a OCDE, a União Europeia, o Banco Mundial ou a UnESCo, têm sido associados às estratégias de padronização e regulação transnacional dos sistemas educativos, impondo, globalmente, uma agenda educativa tecnocrática e neoliberal (Afonso, 1998; 2009; Teodoro, 2003;

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Avaliação das Aprendizagens

Dale, 2004; Pacheco, 2011). Pois, para além de fornecerem informação comparativa relevante para os países, contribuem para traçar as prioridades futuras s, dado constituírem uma verdadeira agenda global (Dale, 2001; Teodoro, 2010) para as próximas reformas ou revisões curriculares em curso nos sistemas de educação dos diferentes países, como é o caso de Cabo Verde.

2. DEsAfIOs AtUAIs DA AVALIAÇÃO CURRICULAR NO CONtEXtO AfRICANO

Em muitos países africanos, particularmente na sub-região Subsaariana, a recolha de informação tem sido negligenciada (ottevanger, 2004). As estatísticas nacionais devem fornecer informação sobre a disponibilidade das entradas (Banco Mundial, 2002a). Na África do Sul, por exemplo, o National Education Policy Act, de 1996, estipula a monitorização e avaliação do sistema de ensino e, em 2001, aplicou-se a uma amostra de alunos uma prova que testa as capacidades quanto à numeracia, literacia e aptidões de vida; e em 2004, a Matemática, Ciências e literacia. os «Relatórios Fundamentais de Qualidade no Estado» de Kano, na Nigéria, fornecem informação sobre entradas e processos e comparações com outras escolas. O sistema de auto-avaliação das escolas na Namíbia salienta nas entradas, processos e resultados e inclui elementos de comparação com outras escolas. No Gana, as reuniões de Avaliação de Desempenho das Escolas usam dados de avaliação nacionais em Matemática e Inglês para identificar estratégias e definir alvos para melhorar o desempenho da escola. Na Guiné, as folhas de avaliação escolar fornecem uma base para reuniões de avaliação do desempenho da escola por professores, directores e pais. Em Cabo Verde começou-se o processo de avaliação aferida no subsistema do ensino básico, visando a recolha de informações para retroalimentar a política educativa.

os desafios persistem. A capacidade de recolher dados aumentou

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CEDU 2013 - Nas Pegadas das Reformas Educativas

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drasticamente, mas a capacidade de analisar estes dados falha muitas vezes, tal como acontece no caso de Cabo Verde. Mesmo quando a informação esteja disponível, muitas vezes não é usada no processo político, especialmente quando as conclusões são inconvenientes ou contradizem a sabedoria convencional (Greany & Kellaghan, 2006; Bregman & Simonnet, 2004). Países como a África do Sul, que monitorizaram, de perto, a implementação de programas de reforma, empreenderam acções correctivas quando os resultados não eram os previstos, tendo beneficiado muito destes processos.

Em alguns países da sub-região Subsaarian afirma-se que é utilizada uma vasta gama de técnicas de avaliação para avaliar diferentes conhecimentos, competências e atributos dos estudantes. no entanto, a realidade é vincadamente diferente. Em muitos desses países, se não mesmo em todos, as actuais práticas de avaliação limitam-se à recapitulação de factos memorizados (Lewin, 2005; Fernandes, 2006; SEIA, 2007). Predomina uma aprendizagem maquinal, concedendo-se pouca atenção ao desenvolvimento das capacidades de análise, de resolução de problemas ou de comunicação e de trabalho em equipa (Pacheco, 1998; 2002), ao invés de desenvolver competências e capacidades de nível mais elevado de inferência, e exigir, por sua vez, um afastamento das actuais práticas de avaliação. Os sistemas de ensino dos países da África Subsaariana estão assombrados pela elevada exigência nos exames. o seu principal objetivo é selecionar estudantes para o nível seguinte. Muitos ainda recorrem a padrões prevalecentes nos países industrializados, geralmente a antiga potência colonial. Muitas práticas de avaliação apelam a factos memorizados em vez de apelar à compreensão e demonstração de saberes mais complexos (rogiers & De Ketele, 1994). As relações com os objectivos curriculares cruciais são muitas vezes débeis. Raras vezes se tem recorrido ao potencial que os exames têm para melhorar a instrução, através da análise sistemática dos itens e do fornecimento às escolas e aos alunos de feedback sobre os resultados (Pacheco, 1998; Fernandes, 2006; 2009).

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Avaliação das Aprendizagens

Constituem um exemplo bastante extremo, referindo-se, comummente, em toda a ASS, experiências de conhecimento prévio e generalizado do conteúdo dos exames e outras fraudes (Greaney & Kellaghan, 2006). Por conseguinte, embora um melhor alinhamento entre o currículo e a avaliação seja importante para uma melhor aprendizagem (Perrenoud, 1994; Ribeiro, 1998; Gaspar & roldão, 2007), as exigências de exames administrados com honestidade, fiáveis e válidos requerem soluções que incluem um sistema educacional e um contexto mais vastos.

3. CONsIDERAÇÕEs fINAIs

os desafios são, particularmente, difíceis, uma vez que o crescimento económico permanece frágil, as taxas de crescimento da população serão altas num futuro previsível e o ensino primário ainda requer recursos adicionais se se pretende atingir os objectivos do Milénio, Educação para Todos (DoE, 2005). A África, particularmente, a África Subsaariana, enfrenta desafios de seguir uma estratégia para um sistema de ensino que se ajuste às condições particulares do seu atual contexto de desenvolvimento. Vários outros desafios se tornam aparentes (Boubacar, 2006; Benno & o’Connell, 1999; 2006): em primeiro lugar, os sistemas escolares estão cada vez mais a transformar-se num sistema de escolas em que, apenas só a nível do discurso, se verifica a passagem da responsabilidade de melhoria do desempenho dos gestores de nível central para os de nível local. Não faz muito sentido pedir às escolas que implementem reformas, cada vez mais complexas, quando a capacidade de mudança ao nível da escola é limitada e os professores não estão familiarizados com os novos métodos de ensino que se pede que sejam implementados, como sucedeu em Cabo Verde. não existem soluções rápidas para os problemas das escolas; em segundo lugar, as reformas, que procuram mudar a prática do ensino e melhorar o sucesso escolar, têm que ser concebidas como processos e não como eventos. não

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são operações que possam ser mandatadas a partir dos serviços centrais (CrSE, 1986); em terceiro lugar, a discussão pública de opções políticas e a transparência na tomada de decisões bem como a ampla comunicação de desafios e realizações são ingredientes chave de estratégias de implementação eficazes (Greaney & Kellaghan; 2006; Afonso, 2009). Muitas das reformas no sistema de ensino foram controversas e muitas vezes ameaçaram interesses velados ou desafiaram formas estabelecidas de prestação de serviço e prática de ensino. A participação dos atores e a informação aberta e honesta ao público podem ajudar a construir aceitação e apoio público para as mudanças pretendidas.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

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Bregman, J. & Simonnet, G. (2004). What’s next? Coping with Successful Primary Education for All, Secondary Education in Africa (SEIA): Engine for Economic and Social Growth In P. Govender, & S.Gruzd (Eds), Back to the Blackboard: Looking Beyond Universal Primary Education in Africa. The South African Institute of International Affairs. nEPAD Policy Focus.

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Avaliação das Aprendizagens

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Avaliação das Aprendizagens

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AVALIAÇÃO DAs APRENDIzAGENs EsCOLAREs

O ELO mAIs fRACO

Victor Manuel Fortes

Universidade de Cabo Verde

[email protected]

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Avaliação das Aprendizagens

REsUmO

A avaliação das aprendizagens escolares, no Ensino Secundário público, tem sido um dos elos mais fracos de todo o processo de ensino-aprendizagem. O nosso sistema de avaliação, da forma como vem sendo implementado, é excludente, pois encara o aluno como o único responsável pelo seu insucesso e, consequentemente, a única vítima. Isso se deve, na nossa perspectiva, à fraca formação com que saem muitos professores das instituições formadoras, baseando suas práticas preponderantemente numa pedagogia tradicional, em que os métodos se resumem à exposição, à memorização e a avaliação assemelha-se a um juízo de valor, contabilizando os erros e acertos, numa cultura, ainda, enraizada nas escolas, das duas provas escritas com “função classificatória”, e não numa aprendizagem significativa. objetivos: Apelar aos professores tanto do nível superior como do secundário a considerarem que “a avaliação é um processo contínuo e sistemático. Faz parte de um sistema mais amplo, que é o processo ensino-aprendizagem, nele se integrando. Por isso, ela não tem um fim em si mesma, é sempre um meio, um recurso, e como tal deve ser usada. Não pode ser esporádica ou improvisada. Deve ser constante e planeada, ocorrendo normalmente ao longo de todo o processo, para reorientá-lo e aperfeiçoá-lo” (Haidt, 2002). resultados esperados: esperamos que a comunicação ative a compreensão do processo de avaliação em toda sua complexidade e estimule os professores a pesquisas empíricas e teóricas, tornando a avaliação um processo inclusivo, em suas múltiplas dimensões.

Palavras-chave: avaliação; aprendizagem significativa; cultura de testes.

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ABstRACt

The evaluation of school learning in secondary education has been one of the weakest links in the whole process of teaching and learning. ourevaluation system, the way itis being implemented, is exclusionarybecausethe studentseesassolely responsible for thefailure and, consequently, the only victim. This is due, in our view, with a weak training with teachers leave the educational institutions in this context, basing their practices solely on the culture of the two written tests and not on the meaningful learning. objectives: Advocate teachers, both top level and secondary level, to consider that evaluation is a continuous and systematic process. It is partof alarger system, which is theteaching-learning process, itisintegrating. Therefore, it is not an endin itself, it is always a means, a resource, and as such shouldbe used. It can’t be sporadic or improvised. Should be constant and planned, usually occurring throughout the process, to redirect it and perfects it” (Haidt, 2002). Expected results: It is expected that communication enable understanding of the assessment process in all its complexity and encourage teachers to theoretical and empirical research, making evaluation an inclusive process, in its multipledimensions.

Keywords: evaluation; meaningful learning; testing culture.

Vimos constatando, ao longo do tempo, quer por intermédio de estudos mais cuidados quer empiricamente, que a avaliação das aprendizagens no ensino secundário em Cabo Verde constitui um dos elos mais fracos de todo o processo de ensino-aprendizagem. Vejamos.

1. nas aulas da disciplina de Teorias e Práticas da Avaliação que administramos na UniCV, na formação de professores, os alunos professores do Ensino Básico Integrado e do Ensino Secundário reconhecem o seu despreparo em lidar com a avaliação das aprendizagens, concordam com as posições que defendemos discussões que realizamos na sala, mas não

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Avaliação das Aprendizagens

conseguem implementá-las nas suas atividades pedagógicas, alegando que a cultura pedagógica das escolas em que trabalham está tão enraizada na consciência dos professores que trabalham há bastante tempo, o que dificulta muito as tentativas de inovação nesse quesito.

2. nas visitas que efetuamos às escolas e no acompanhamento dos nossos filhos, estudantes do ensino secundário, temos constatado que o que prevalece, de facto, na prática pedagógica de muitos professores, não é a avaliação como um processo para identificar os avanços e as dificuldades dos alunos para uma tomada de decisão, mas uma classificação das reproduções baseada na cultura de teste sumativo. Talvez o professor se sinta pressionado por um ano letivo dividido em três trimestres e pelo normativo de ter que avaliar a partir de um sistema de avaliação que atribui 80% de peso aos dois testes e somente 20% a outros elementos da avaliação. Muitos professores não têm clareza do que possam consistir esses outros elementos da avaliação. As provas têm meramente uma função sumativa e classificatória. Basta saber que, na maioria das disciplinas, os professores só devolvem as provas aos alunos após 2-3 semanas.

Se partirmos do princípio de que uma planificação bem feita pressupõe que unidades menos complexas constituem pré-requisitos para a apropriação de unidades posteriores, mais complexas, ao devolver as provas com um atraso de 2-3 semanas, praticamente sem possibilidades efetivas de um feedback, o professor demonstra que o que ele quer é, de facto, selecionar aqueles que, de uma forma ou de outra, conseguiram memorizar o suficiente para reproduzir os conteúdos (já que as aulas são preponderantemente expositivas) e excluir aqueles que não o fizeram. Pois, o aluno cujas provas demonstraram não ter apropriado/assimilado/memorizado o conhecimento que supostamente deveria ter até então, nessas condições, não terá mais oportunidades de o fazer, ficando praticamente arredado do sucesso nas provas subsequentes.

3. Algumas escolas convidam-nos para proferir palestras sobre

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avaliação das aprendizagens no ensino secundário. Outras solicitam-nos para mostrar aos seus professores como elaborar provas escritas e, outras, ainda, só nos solicitam o modelo de validação das provas.

quando chegamos às escolas, normalmente começamos logo com uma afirmação provocatória: Muitos professores ainda não diferenciam classificação de avaliação.

No princípio, os professores sentem-se ofendidos, mas depois compreendem e aceitam a nossa provocação, ao introduzirmos a nossa comunicação com uma série de perguntas que os ajudam a elucidar essa situação, quais sejam: qual de vocês, logo no início do ano ou de cada trimestre, na preparação metodológica, mesmo sem saber qual o nível do desempenho da turma, o ritmo que consigam implementar, as dificuldades e as facilidades encontradas, já não tenham marcado antecipadamente a data para a realização de duas provas escritas? Com que objetivo? qual de vocês não elabora provas com questões cujas respostas, de antemão, sabem que todos os alunos têm prontas? Com que objetivo? qual de vocês não elabora provas com questões cujas respostas sabem, de antemão, que nenhum aluno possa dar? Com que objetivo? Após quanto tempo devolvem, fazem a correção e análise crítica dos resultados das provas? que decisão tomam perante o resultado das provas? que oportunidade disponibilizam aos alunos para, após uma melhor preparação, refazer uma prova em que não tenham alcançado os objetivos desejados? Como têm realizado e apropriado das “avaliações diagnósticas”?

Ao discutirmos essas questões, todos acabam compreendendo a nossa provocação inicial, reconhecem a dificuldade em trabalhar para mudanças profundas.

Quando nos pedem para lhes mostrar como elaborar uma prova escrita ou lhes apresentar um modelo de validação da prova escrita, começamos por explicar o seguinte:

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Avaliação das Aprendizagens

A prova escrita não existe em si mesma, não é avaliação, mas um dos instrumentos da avaliação. A avaliação é um processo que não existe em si mesmo, faz parte de um processo mais amplo que é o processo de ensino-aprendizagem. Esse processo de ensino-aprendizagem, por sua vez, só ganha sentido em uma ou outra abordagem educativa como sistematização de teorias e práticas pedagógicas. Ao dizer isso, muitos professores ficam quase perdidos porque não têm o domínio de nenhuma teoria pedagógica. Aliás, por isso, replicam com certa ingenuidade: na universidade nos dão muitas teorias, mas essas, na prática, não funcionam.

normalmente perguntamos:

“Vos dão teorias”? “E vocês as recebem”? Me digam qual delas vocês dominam e ajudo-vos a perceber que, na prática, funcionam. A resposta é óbvia!...

Não há, na nossa concepção, nenhum modelo de prova escrita nem modelo de validação da prova escrita. As disciplinas são diversas e diversificadas. Uma prova de língua não obedece aos mesmos objetivos nem aos mesmos critérios de uma prova de matemática, por exemplo. o que nós podemos apontar são alguns critérios gerais a considerar na elaboração de uma prova escrita, sabendo que cada disciplina, cada nível de ensino, cada turma terá sua especificidade a ser observada. Assim, consideramos que só o próprio professor pode reunir tudo o que precisa para a realização da prova. os critérios que nós podemos avançar são os seguintes:

qual o objetivo dessa prova escrita? Avaliar ou classificar?

que conteúdos devem fazer parte dessa avaliação? Por que esses e não outros conteúdos?

Terão que ser avaliados por intermédio de uma prova escrita? Por que não utilizar um outro instrumento de avaliação? Por que, nessas condições, a prova escrita se revela como instrumento mais fidedigno?

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que tipo de prova elaborar? Prova dissertativa? Prova com questões de múltipla escolha? Prova com questões “verdadeira ou falsa”? Emparelhamento? outro? quantas perguntas devem constar da prova? Grau de dificuldade? quanto tempo disponibilizar para o aluno resolver a prova?

o que fazer com os resultados da prova?

Dentre esses critérios, é fundamental o último apresentado. A tomada de decisão no processo de avaliação pode coroar ou desmanchar todo o esforço do aluno e do professor. Uma prova de exame tem caráter diferente (o de classificar) de uma prova que se realiza com o objetivo de uma avaliação formativa. Toda e qualquer prova realizada durante o percurso do processo de ensino-aprendizagem deve assumir, no mínimo, as funções diagnóstica e formativa.

Ora, a debilidade em como o nosso sistema de avaliação é apropriado e implementado nas escolas secundárias torna-o excludente. Excludente, no sentido de que não há uma preocupação com a aprendizagem significativa, mas com a reprodução de conteúdos, muitas vezes anónimos, memorizados, pela via de aplicação/realização de provas. Excludente, porque, dessa forma, o aluno fica excluído da participação do processo da construção do próprio conhecimento. Excludente, porque, com a avaliação por essa via, com devolução tardia dos resultados das provas e praticamente sem feedback necessário, todavia insuficiente, fica-se sem saber quando, onde, por que e como se perdeu o aluno. Excludente, porque, ao ter duas reprovações no ciclo, o aluno vê-se impedido de prosseguir os seus estudos em escolas públicas, alegadamente por ter “perdido o direito”. Mas, o aluno “perdeu o direito” ou lhe “roubaram” o direito? E o que fazer desse aluno excluído de um espaço vocacionado para promover aprendizagem e educação?

Preferimos tecer algumas considerações sobre isso.

Enquanto não houver mecanismos que avaliem essa situação da

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“perda de direito”, ela não deveria efetivar-se. Pois, da forma como as coisas estão, não dá para saber se aluno foi reprovado somente por “(ir)responsabilidade própria” ou por falta de qualidade e empenho dos professores na condução do processo de ensino-aprendizagem. E se se comprovar que o professor é mais responsável pela reprovação do aluno do que o próprio aluno, ele perderia o direito de trabalhar na escola?

E se o aluno tem, de facto, dificuldades de aprendizagem, é menor, a família com parcos recursos para mandá-lo para uma escola privada, o que fazer dele, se nem tem idade para “trabalhar” (caso houvesse trabalho)? não será mais oneroso à sociedade vir resgatá-lo da rua do que deixá-lo na escola?

o que seria de nós se os hospitais, ao diagnosticarem alguém com doença contagiosa, em vez de retê-lo para o tratamento, o liberar para não contagiar os agentes hospitalares?

São apenas questões para reflexão!

queremos alertar, no entanto, que não estamos a tratar aqui da avaliação das aprendizagens nas escolas secundárias privadas. Pois, lá, miraculosamente, todos os alunos conseguem passar de ano independentemente dos níveis de ensino. Poderemos falar disso posteriormente, mas é bom que se faça uma inspeção rigorosa da forma como se faz a avaliação nas escolas secundárias privadas. Há quem já as apelida de escolas PP (pagou, passou).

Aproveitamos para fazer uma pequena análise de alguns dos preceitos adjacentes ao sistema de avaliação das aprendizagens no ensino secundário, de acordo com o Decreto-Lei no 42/03/2003, de 20 de outubro de 2003.

“Arto 5o (Função formativa da avaliação)

1. A função formativa é prosseguida através de uma avaliação siste-

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mática e contínua e consiste na recolha e tratamento das informa-ções relativas aos vários domínios de aprendizagem, que revelem os conhecimentos, as habilidades, as capacidades e as atitudes de-senvolvidas pelos alunos.

2. As informações recolhidas permitem caracterizar os pontos fortes e fracos, avaliar os êxitos e os fracassos dos alunos, as necessidades, ritmos e oportunidades de melhoria da aprendizagem e, em função destes elementos, aplicar medidas educativas de reorientação e de superação das dificuldades sentidas pelos alunos.”

Podemos ver que esses preceitos são ideais, geniais e inerentes a uma abordagem de aprendizagem significativa. Mas, na nossa perspectiva, não são interpretados fielmente pela maioria dos professores, talvez por falta de um domínio consistente do que é, de facto, uma avaliação formativa, mas também, porque se sentem presos aos preceitos seguintes:

“Arto 21o (Critérios de classificação)

1. Em cada trimestre devem ser aplicados dois testes sumativos, no mínimo, e recolhidos outros elementos de avaliação sumativa, que devem ser classificados na escala de 0 a 20 valores.

2. Para efeitos deste diploma, entende-se por outros elementos de avaliação sumativa quaisquer meios que permitam ao professor aferir competências cognitivas, afectivas e activas dos alunos, no-meadamente perguntas orais e escritas, trabalhos individuais e de grupo, pesquisas e trabalhos práticos ou estágios em empresas.”

“Arto 22o (Classificação trimestral)

A classificação trimestral (CT) resulta da soma de oitenta por cento da média aritmética dos testes sumativos (TS) e de vinte por cento de outros elementos de avaliação (oEA) e expressa-se pela fórmula:

CT = 0,2 x OEA + 0,8 x TS.”

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Avaliação das Aprendizagens

Disso resulta:

1. não há uma compreensão generalizada do que é aplicar dois testes sumativos, no mínimo. Cada professor normalmente aplica dois testes sumativos, em qualquer circunstância, a todas as suas turmas, muitas vezes, na mesma semana, no mesmo dia e horário. Devolvem esses testes aos alunos, quase sempre, sem feedback, após 2-3 semanas ou mais.

não compreendemos por que um teste sumativo, no decurso do ano lectivo, não possa ter simultaneamente um caráter diagnóstico e formativo.

numa das escolas em que proferimos uma palestra, um professor achava impossível fazer a devolução da prova nas duas próximas aulas seguintes, dado ao número elevado de turmas em que lecionava (6 turmas, a disciplina de Filosofia). Aí perguntamos: Mas quem o obriga a aplicar a prova a todas as turmas, no mesmo dia ou na mesma semana? o professor retrucou: Mesmo que seja uma turma, mas, na prova de Filosofia, com 8-9 questões dissertativas!”... nós respondemos: Mas, por que você não elabora prova com 4 ou mesmo 3 questões? Por que, em vez de elaborar 2 provas por trimestre, com mais tempo para cada prova, não elabora 3 ou 4, com menos tempo para cada?

A esse respeito pensamos que os professores, talvez pressionados pelo tempo (trimestre e aulas de 50 minutos), se sentem inseguros.

2. Ao atribuir aos outros elementos de avaliação (OEA) um peso somente de vinte por cento, “com a obrigatoriedade dos dois testes” e a limitação do tempo, o professor e o aluno não “dão bola” a esse quesito de avaliação.

Muitos professores, além de limitados, para a conquista da sua autonomia pedagógica, não estão preparados para a mudança, para fazer diferente e melhor. Pois, a mudança e o fazer diferente implicam riscos e isso pode pôr em causa a estabilidade do professor, a sua sobrevivência. Mesmo dentre aqueles que se “formaram recentemente”, a maioria dos

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professores do ensino secundário continua trabalhando com os seus alunos como os seus ex-professores trabalharam com eles quando eram estudantes do ensino secundário: com métodos baseados num ensino tradicional, em aulas expositivas e cobranças de reprodução nas duas provas sumativas. ora, isso faz com que os alunos que sobrevivam a esse processo nos cheguem às universidades com crenças enraizadas e resistência mental à uma nova metodologia. Conscientemente consideram a metodologia tradicional inadequada, mas de forma não consciente não se mobilizam para uma metodologia mais progressista, continuam esperando por aulas expositivas e reprodução nas provas, sem capacidade para se apropriarem de uma nova metodologia e participarem de forma ativa na construção do próprio conhecimento. o pior é que encontram guarida em muitos professores do ensino superior que, por razões várias, continuam trabalhando à moda antiga.

À guisa de conclusão, queremos deixar bem claro que não visamos atingir ninguém maleficamente com as nossas considerações. Elas espelham momentos inconclusivos de reflexão nas nossas atividades e esperamos que sejam um impulso para reflexões mais profundas na formação de professores, nas escolas secundárias e outras instituições formadoras e educativas. Estamos, desde há muito, engajados em colaborar para a melhoria dos aspetos apontados em várias frentes, pois consideramos isso o ponto fulcral da nossa missão como professor-formador.

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CurríCulo e reformAs CurriCulAres

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REfORmA CURRICULAR E ABORDAGEm POR COmPEtÊNCIAs Em CABO VERDE: PERCEÇÕEs E QUEstIONAmENtOs

Ana Cristina Pires Ferreira

Universidade de Cabo Verde

[email protected]

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Currículo e reformas curriculares

REsUmO

A evolução da Educação e os desafios de desenvolvimento económico e social em Cabo Verde trazem, com cada vez mais acuidade, a questão da qualidade da Educação. Esta é um desígnio nacional que apela a mudanças num contexto em que o país procura uma melhor inserção no grupo de países de desenvolvimento médio e no mundo global e está fortemente influenciado pelas agendas transnacionais para a Educação e para a Economia. neste artigo, analiso como o modelo de Abordagem por Competências, difundido pelas organizações internacionais de Educação, ganha sentido em Cabo Verde e é inserido na agenda institucional e política, enquanto solução privilegiada para a melhoria da qualidade das aprendizagens. Analiso, ainda, a dinâmica da sua implementação e os jogos de interesse no quadro da reforma curricular preparada e operacionalizada de 2002 a 2012. A abordagem é sociopolítica e de análise da política educativa subjacente à reforma, enquanto política pública. Ela apoia-se na literatura sobre o tema, nos documentos oficiais concernentes à política educativa, em entrevistas aos actores da reforma curricular a diversos níveis e na minha experiência profissional na Educação em Cabo Verde. Da análise decorre que o Estado procura, sobretudo, reforçar a sua legitimidade, não sem dificuldade, existindo um desfasamento entre os discursos e as práticas, o que coloca em questão a política de qualidade da Educação.

Palavras-chave: política educativa; reforma; abordagem por competências; Cabo Verde.

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RésUmé

Les défis du développement économique et social au Cap Vert amènent avec d’avantage d’acuité la question de la qualité de l’éducation. Celle-ci se pose en tant que dessein national et appellent à des changements dans un contexte où le pays cherche une meilleure insertion dans le groupe des pays à revenu moyen et dans le monde. Le Cap Vert est fortement influencé par les agendas transnationaux pour l’Économie et pour l’Éducation. Dans ce papier, j’analyse comment le modèle d’Approche par Compétences, diffusé par les organisations éducatives internationales prend sens au Cap Vert et comment il est intégré à l’agenda institutionnel et politique en tant qu’option privilégiée pour améliorer la qualité des apprentissages. J’analyse également la dynamique de sa mise en œuvre et de ses enjeux dans le cadre de la réforme curriculaire mise en place de 2002 à 2012. Ma démarche s’appuie sur une approche sociopolitique et d’analyse de la politique sous-jacente à la réforme en tant que politique publique. Elle s’appuie aussi sur des écrits en rapport avec ce thème, les documents officiels concernant la politique éducative, des entretiens avec des acteurs de la réforme à plusieurs échelles et sur mon expérience professionnelle de l’éducation au Cap Vert. Il en résulte que l’État s’essaye à renforcer sa légitimité, non sans difficulté, ceci dû à l’existence d’une discordance entre les discours et les pratiques, ce qui met en question la politique de qualité de l’éducation.

mots-clés : politique éducative; réforme ; approche par compétences; Cap Vert.

1. PONtO DE PARtIDA

A evolução da Educação e os desafios de desenvolvimento económico e social em Cabo Verde trazem, com cada vez maior acuidade, a questão da qualidade da Educação. Esta é um desígnio nacional que apela a mudanças num contexto em que o país procura uma melhor inserção no

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Currículo e reformas curriculares

grupo de países de rendimento médio e no mundo global e está fortemente influenciado pelas agendas transnacionais para a Educação e para a Economia. neste artigo, analiso, através de uma abordagem sociopolítica, como o modelo de Abordagem por Competências (APC), difundido pelas organizações internacionais, é inserido na agenda institucional, na política educativa e ganha sentido em Cabo Verde enquanto solução privilegiada para a melhoria da qualidade das aprendizagens. Para tal, apoio-me em literatura sobre o tema, nos documentos oficiais concernentes à política educativa, em entrevistas aos atores da reforma curricular e na observação em algumas escolas.

2. APC NO CONtEXtO CABO-VERDIANO

A avaliação da reforma educativa da década de 90, realizada entre 2000 e 2002, no âmbito do Projeto de Modernização da Educação e Formação, colocou o acento “nas práticas pedagógicas monótonas, repetitivas, centradas no professor” (Ministério da Educação de Cabo Verde, 2002, p. 161), assim como na dificuldade deste em gerir turmas compostas. No ensino secundário, a rigidez e o desfasamento do currículo da realidade cabo-verdiana e das exigências de desenvolvimento social e económico eram particularmente significativos. As soluções recomendadas foram a revisão do curriculum, a formação dos professores e a promoção da autonomia das escolas secundárias.

Estes são aspetos traduzidos no Plano Estratégico de Educação (PEE) para 2003-13 e na sequência do qual várias iniciativas de inovação curricular vão ser desenvolvidas até à decisão da revisão do currículo e introdução da APC, em 2005. Cabo Verde era, pois, um laboratório de experiências curriculares, introduzidas por diferentes organizações internacionais. Essa tendência foi reconhecida pelos entrevistados que evocaram o curriculum

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como sendo o campo aonde houve mais iniciativas de mudança na última década. Este fenómeno remete para uma dinâmica de “empréstimo de políticas” entre os países em que alguns deles têm papel de “laboratório de política” (van zaten, 2011). Cabo Verde é um deles.

De entre as inovações curriculares figura a APC. Como foi inserida na agenda institucional e política, enquanto solução privilegiada para a melhoria da qualidade das aprendizagens? qual foi a dinâmica da sua implementação no quadro da reforma curricular preparada e operacionalizada de 2006 a 2012?

Da análise de documentos de projetos, cruzada com entrevistas, constata-se que a APC apareceu no discurso educativo cabo-verdiano pelo projeto de Educação em matéria de população e para a vida familiar (1991-2005), sob a forma de lifeskills. no entanto, o défice de recursos e as dificuldades em traduzir a inovação no contexto cabo-verdiano levaram à sua marginalização e abandono. nesta última década, outros projetos retomaram os princípios da APC sem a nomearem o que me leva a considerar as instituições educativas cabo-verdianas não só como lugares de experimentação de inovações curriculares mas de jogos de interesse pela difusão de uma certa visão do mundo, de normas e modelos de soluções aos problemas, pelas organizações internacionais.

A APC está presente não só no PEE, com o sentido de “aprender a aprender” como também político, associada à área económica como “competências pré-profissionais” (Programa do Governo 2011-16).

A noção de competências é polissémica e relativamente controversa. No entanto, conserva ainda as marcas da sua origem no mundo do trabalho e nas empresas e que se revelam através de duas dimensões importantes: a funcional (tornar capaz de realizar um certo número de tarefas) e a utilitária

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Currículo e reformas curriculares

(Tilman, 2008). Estas dimensões aparecem no contexto africano como sendo ideias naturais, visto a escola ser criticada por transmitir somente saberes académicos e distante do ambiente/contexto do aluno (Delorme, 2008).

A APC veiculada pelas agendas institucionais e políticas transnacionais distancia-se do sentido de origem e apresenta um carater abstrato que se reflete numa série de características, de entre as quais destaco: ter um caracter geral, persistir no tempo, estar associado a imagens valorizadas socialmente (por exemplo, prosperidade, empregabilidade).

na realidade, para os países africanos e Cabo Verde em particular, a adoção da APC, significa exprimir-se numa “linguagem de poder” para ter um reconhecimento internacional. Assim, a noção de competências em Cabo Verde significa permitir a adaptação do sujeito ao mundo (social e económico). o programa do Governo (2011) refere-se a “adequação de conteúdo do ensino aos novos tempos, destacando as disciplinas-chave e a informática, dotando os alunos de competências essenciais ao mercado de trabalho” (p. 40). Além disso, as informações recolhidas das entrevistas permitem enriquecer o significado das competências, juntando-lhe um carácter funcional: “saber-agir, mobilizando recursos, numa situação-problema” (GND01).

No entanto, a adoção desse discurso de APC não está isento de controversas sobretudo em termos ideológicos. Primeiramente, a transferência do modelo “managerial” e de produtividade associado à APC e que é redutor, quando o contexto educativo é bastante complexo e sofre a influência de todo um projeto de sociedade.

De acordo com Perrenoud (1999), trata-se de um debate com foco nas contradições da escola: ensinar conhecimentos ou desenvolver competências e que se traduz na tentativa de uns (organizações internacionais) e de outros (governos centrais) de apresentar a ou as perspetivas que se tornariam dominantes. o que está em questão é poder dar sentido à APC e influenciar

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o sistema educativo. Com efeito, as implicações dessa abordagem sobre todo o funcionamento pedagógico e didático são também controversas, por ela demandar não somente mudanças metodológicas em sala de aula mas também uma nova organização escolar, um sistema de avaliação das aprendizagens e de pilotagem, instrumentos pedagógicos disponíveis e inteligíveis, bem como condições materiais. São questões que se colocam com bastante acuidade no contexto africano (C.f Cros e al. 2009, Roegiers, 2008, Sylla 2004) e em Cabo Verde. Para analisar as implicações importa perceber porquê e como Cabo Verde adotou a APC.

3. DO AGENDAmENtO à PRODUÇÃO DA POLÍtICA

A análise realizada a partir de documentos oficiais, nomeadamente o “Documento de Orientação da Revisão Curricular” (2006) e das entrevistas realizadas, deixa entender que a APC entrou na agenda institucional cabo-verdiana através de uma janela de oportunidade definida como um processo em que se conjugam três fluxos: fluxo de problemas, fluxo de soluções e fluxo político (Kingdon citado por Hassenteufel, 2011, p. 59. De forma específica: « un problème est reconnu, une solution est développée et disponible au sein de la communauté des politiques publiques, un changement politique en fait le moment adéquat pour un changement de politique et les contraintes potentielles ne sont pas fortes » (op. cit, p. 60).

no caso cabo-verdiano, o fluxo de problemas esteve associado ao défice de qualidade do sistema educativo propalado em diferentes discursos políticos, técnicos, institucionais e da sociedade. o fluxo de soluções provém das organizações internacionais que transmitiam e difundiam soluções construídas e testadas fora do país colocando o aluno no centro e a resolução de problemas. o fluxo político não foi marcado por um debate público, mediatizado, mas sim pela « abertura da agenda a atores

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que na conjuntura habitual são colocados à parte”1. (Hassenteufel, 2011, p. 61). Esses atores foram quadros técnicos do Ministério da Educação e especialistas da educação da Organização Internacional da Francofonia, que se posicionou como novo ator institucional no mercado concorrente de cooperação para o desenvolvimento da Educação. Este fenómeno foi coroado pelo anúncio, pelo Ministro da Educação, em 2005, da adoção da APC, no quadro de um jogo político (procura de legitimidade política).

o processo de decisão da fase de produção da política educativa que desemboca na revisão curricular não foi linear e nem ordenado. Com efeito, na sequência da abertura da janela de oportunidade, os dirigentes da Administração da Educação estabeleceram a política a seguir, em temos de programa de ação, com objetivos concretos, instrumentos (DorC, cronograma) para a revisão do curriculum do ensino básico e secundário e que inclui a APC. no entanto, essa fase foi eivada de questionamentos e de hesitações de dirigentes e técnicos dos serviços centrais do Ministério da Educação, bem como de não decisões resultantes da busca de legitimidade para a introdução da inovação, que acabam por ter reflexos nas escolas que experimentaram a APC, a partir de 2009. Além disso, constatou-se um desfasamento temporal entre as ações e os processos, entre o planificado e o executado, que revelam resistências no processo de tradução da introdução do modelo APC em Cabo Verde. Importa, pois, interrogar como a APC foi implementada.

4. DA ImPLEmENtAÇÃO

Para compreender as atitudes e práticas recorro ao modelo utilizado por Depover & Strebelle (2010) que apresentam o processo de inovação curricular em três fases sequenciais, embora sabendo que elas são raramente lineares. De acordo com os mesmos, o processo de inovação

1 Tradução livre

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integra uma primeira fase de apropriação do novo curriculum, segunda fase de estabilização das práticas e terceira fase de integração nas práticas rotineiras. Para perceber essas fases é necessário relacionar os objetivos e as práticas.

os objetivos de reforma inseridos no Programa do Governo visam “melhorar a qualidade do ensino e a eficácia do sistema educativo através relevância das aprendizagens, da pertinência social e económica da educação e da eficácia e eficiência do sistema educativo; (…) diversificação das ofertas do ensino (…)” (Programa de Governo 2006-11 e 2011-16). A finalidade é a construção de um novo perfil do cabo-verdiano através do desenvolvimento de competências escolares e sociais no ensino básico e secundário.

A análise dos relatórios de formação de docentes, das orientações curriculares e das entrevistas realizadas revela que Cabo Verde, iniciou, em 2012, a generalização de programas e manuais no 1º ano, do ensino básico, quando ainda está a experimentar os materiais do 2º ao 4º ano e os do 5º e 6º anos estão a ser finalizados. Também está a experimentar novos programas do 7º ao 10º ano. Todavia, o sistema de avaliação revisto em função da nova abordagem não estava sendo experimentado.

Considerando os objetivos e os dados empíricos, concluo que a reforma curricular que procura introduzir a APC está em fase de apropriação. Com efeito, constatei a convivência de dois currículos (revisto e não revisto) nas escolas, pois os programas e materiais eram novos ou revistos e o sistema de avaliação das aprendizagens não. Como os professores entrevistados referiram, alguns estavam a testar os programas, sem os dominar por completo e sentiam necessidade de um apoio e acompanhamento externo, o que, aliás, foi tido como um dos pontos fracos do processo. Uma outra característica desta fase é que os professores tinham tendência a se fixar nas orientações, as mais detalhadas possíveis, revelando autonomia reduzida. Para além disso, a disponibilidade de material de suporte à inovação era

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limitada, sendo esta o primeiro ponto fraco apontado.

As atitudes de entusiasmo foram reveladas sobretudo por professores iniciantes na inovação curricular não tanto em relação à APC mas sim em relação ao novo método de alfabetização em língua portuguesa no 1º ano do ensino básico associado à APC. no entanto, notei nos mais antigos na experiência da APC alguma resistência que derivava da escassez de materiais de apoio, irregularidade do fluxo de informações e de acompanhamento, bem como de incertezas técnicas e pedagógicas em relação à nova abordagem e aos instrumentos associados. Com efeito, não raras vezes os professores afirmaram não saber elaborar situações de integração e, sobretudo, como avaliar as produções dos alunos nessas situações. Além disso, a informação técnica e analítica imanada da investigação ou das estruturas internas do Ministério da Educação era praticamente inexistente o que reforçou a incerteza e as dificuldades em perceber o “espírito” da reforma.

Acrescento que os demais atores (pais, sindicatos, comunicação social…) constituíam um público geral, com alguma informação mas não interessado e distante.

5. CONsIDERAÇÕEs fINAIs

Em síntese, apesar dos discursos políticos, dos atores diversos no terreno, em prol da qualidade, assim como a adoção dos princípios e modelos internacionais de busca da qualidade, como a APC, na prática, a reforma não foi formulada com clareza e suficientemente defendida para suscitar a adesão da sociedade cabo-verdiana. O envolvimento desta, para além de encontros de informação é, pois, necessária, para criar sinergia necessária ao sucesso da reforma, isto é, para provocar a mudança desejada, fazendo jus ao leitmotiv do Ministério da Educação desde há dois anos: “juntos por

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uma Educação e Desporto de qualidade”.

As mudanças em busca da qualidade devem ser entendidas na sua complexidade, dialética e de forma mais ampla, analisando não só o processo nacional mas também a relação entre este e o transnacional, bem como a dinâmica dessa relação (Arnove, 1999).

Enfim, percebi a adoção da APC como uma estratégia de reforço da legitimidade do Estado no campo educativo e de credibilização do sistema educativo face aos desafios da globalização.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Arnove, r. (1999). Introduction. reframing Comparative Education: the dialectic of the Global and the Local. In r. A. (Eds), Comparative Ed-ucation. The Dialectic of the Global and the local (pp. 1-23). oxford: ro-man&Little Publishers, Inc.

Delorme, C. (2008). L’approche par les compétences: entre pro-messes, des déclarations et réalités du terrain, reconnaissance ou négation de la compléxité. In Logiques de Compétences et développement curricu-laire. Paris: L’Harmattan.

Develay, M. (2009). Réforme curriculaire et statut du savoir. Actes du séminaire final de Politiques Publiques en Éducation: l’exemple des ré-formes curriculaires. Paris: CIEP, AFD, organisation Internationale de la Fran-cophonie.

Depover, C.; Strebelle, A. (2010). Aléas de réformes curriculaires, les chemins difficiles par lesqueles s’élaboreront les changements en édu-cation.

Garraud, P. (1990). Politiques nationales: élaboration de l’agenda.

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Hassenteufel, P. (2011). Sociologie Politique: l’Action Publique (2ème ed.). Paris: Armand Colin.

Ministério da Educação de Cabo Verde. (2006). Documento de Orientação da Revisão Curricular. Praia.

Ministério da Educação de Cabo Verde. (2002). Pesquisa Qualitativa sobre a Educação em Cabo Verde. Praia.

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Roegiers, X. (2008). L’approche par compétences en Afrique franco-phone: quelques tendances. Genève: Bureau International d’éducation de l’UnESCo.

Tehio, V., & Cros, F. (. (2009). Politiques publiques en Education: l’exemple des réformes curriculaires. Actes du Séminaire final sur l’Étude les Réformes Curriculaires par l’Approche par Compétence en Afrique. Paris: CIEP/oIF/AFD/BAD/MInistère des Affaires Etrangères et Européennes.

Tilman, F. (2008). Les compétences à l’école Secondaire, les tur-bulences d’une réforme. InDirect- Les clés de la gestion scolaire, 5 Mars , pp. 7-29.

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ORIENtAÇÕEs CURRICULAREs: A mÃO QUE EmBALA A EDUCAÇÃO DE INfÂNCIA

Guida Mendes; José Augusto Pacheco

Universidade da Madeira; Universidade do Minho

[email protected]; [email protected]

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REsUmO

A Educação de Infância, em Portugal, não possui um currículo oficial que refira os métodos, as técnicas ou, até mesmo, os conteúdos a serem abordados. É a partir de documentos normativos oficiais de intencionalidade educativa que os educadores de infância se regem para a construção da sua identidade profissional, dos currículos e das opções metodológicas a adotar. Embora não determinem a natureza das aprendizagens que as crianças devem adquirir, nesta que é considerada a primeira etapa da educação básica, a verdade é que os eixos orientadores da organização e gestão das linhas curriculares dos educadores tendem a seguir o disposto nestes “manuais”. A procura de legitimação normativa no campo do currículo veio dar um rosto às suas práticas, validando as opções metodológicas de aprendizagem, i.e., a intervenção pedagógica do educador. Assim, a mão que embala a infância, i.e., a práxis que move o quotidiano das crianças, tem uma intencionalidade de escolarização que marca o ritmo da sua vida. Com efeito, as crianças estão atulhadas com propostas curriculares fragmentárias da infância. Perante tal cenário é premente desescolarizá-la, pois brincar é a palavra central do currículo da educação de infância. O nosso estudo tem como finalidade entender o mundo da educação de infância através da voz das crianças. Para tal, pretendemos realizar um estudo de abordagem etnográfica cuja pergunta de partida é: o que dizem as crianças acerca do seu quotidiano na educação de infância?

Palavras-chave: orientações curriculares; aprendizagem; educação de infância; investigação etnográfica com crianças.

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ABstRACt

In Portugal, Child Education does not have an official curriculum referring which methods, techniques and contents should be approached. The educators guide themselves through official documents on education, for the construction of their own professional identity, as well as of the curriculum and of the methodological choices to adopt. Although does not determine the nature of learning that children should attain at this stage considered the basic education’s first step, the truth is that the organization and management of the curriculum guidelines chosen by the educators tend to follow the provisions of this “manual”. This looking for normative legitimacy in the curriculum field contributed to give a countenance to the educator’s practices, validating the methodological options of learning, i.e. the educator’s pedagogical intervention. As such, the hand that hug the childhood, i.e. the praxis that conducts the children’s daily lives, intends to teach, thus delimiting the rhythm in childhood’s life. Children are increasingly overloaded by curriculum proposals. Given such a scenario it is crucial do not instruct children, because to play is the key word in the childhood education’s curriculum. our study aims to understand the childhood education’s world through children. We will follow a qualitative methodology research by an ethnographic approach. Thus, it’s important to reflect: What’s children’s opinion about their everyday lives in childhood education?

Keywords: curriculum guidelines; learning; childhood education; ethnographic research with children.

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INtRODUÇÃO

É a partir de documentos oficiais de referência – Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (OCEPE)1 e Metas de Aprendizagem para a Educação Pré-Escolar (MAEPE)2 - que os educadores de infância em Portugal se orientam para a construção da sua identidade profissional, dos currículos e das opções metodológicas a adotar (Vasconcelos, 2008; 2012).

Embora não determinem obrigatoriamente as aprendizagens que as crianças devem adquirir, a verdade é que a organização e gestão curricular na EI tende a seguir o disposto nestes “manuais”. Esta legitimação curricular dá visibilidade às práticas do educador, validando (mais do que as opções curriculares de conteúdo) as opções metodológicas de aprendizagem, i.e. a ação pedagógica3. Assim, a mão que embala a infância, i.e. a práxis que move o quotidiano das crianças, tem uma intencionalidade educativa que marca o ritmo da vida na infância.

o compromisso ético na EI deve refletir-se na humildade discursiva e também na ação onde o respeito pelo outro, a honestidade pela identidade das crianças deverá residir. Porém, a realidade empurra a prática dos educa-dores para a disciplinarização da EI com atividades que ocupam grande par-te do tempo passado nas instituições de educação. Com efeito, as crianças estão cada vez mais atulhadas com propostas curriculares fragmentárias da infância. Perante isto é premente desescolarizá-la, pois brincar é a palavra central da EI.

Neste trabalho, propomo-nos entender a EI através das crianças

1 Ver “Orientações Curriculares para a Educação Pré-escolar”, disponível em http://educacao.te.pt/images/downloads/documentos/orientacoes_curriculares_pre_escolar.pdf 2 Ver “Metas de Aprendizagem para a Educação Pré-escolar”, disponível em http://metasdeaprendizagem.dge.mec.pt/educacao-pre-escolar/apresentacao/Ver também “Gestão do Currículo na Educação Pré-Escolar - Contributos para a sua Operacionalização”. Disponível em http://www.dge.mec.pt/educacaoinfancia/index.php?s=directorio&pid=1 3 A ação pedagógica é aqui entendida, na aceção de Dahlberg, Moss e Pence (2003), como um modo de se relacionar através de valores com o outro e com o mundo, sendo o conhecimento o resultado de um processo de construção conjunta.

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(Graue & Walsh, 2003; oliveira-Formosinho, 2008), partindo da seguinte questão que nos inspira: o que dizem as crianças acerca do seu quotidiano na EI?

Utilizaremos a abordagem de investigação interpretativa, suportada por uma orientação etnográfica, pelo que serão utilizadas várias fontes de recolha de dados junto das crianças (Fino, 2011; Graue & Walsh, 2003). Su-blinhe-se que, tratando-se de um projeto em construção, não se apresen-tam dados empíricos, mas sim dimensões de análise exploratória que são pertinentes para a discussão curricular da educação básica.

O AzImUtE tRANsNACIONAL DA EDUCAÇÃO DE INfÂNCIA

A abordagem das linhas curriculares na EI é complexa e reveste-se de desafios e incertezas, razão pela qual assistimos a regulares orientações nas políticas de educação, alinhadas com processos de regulação transnacionais, de partilha de conhecimento (Steiner-Khamaso, 2012) e mudanças de governos.

As oCEPE e as MAEPE são textos (Gímeno, 1998) representativos de uma visão do que é (ou deve ser) a educação. Como códigos de significado em ressemantização constante, representam seleção, estruturação e modificação do conhecimento a diversos níveis: político, administrativo, de gestão e de práticas. Concordemos ou não “o currículo é algo que transportamos sobre o nosso dorso, desde que iniciámos a escolarização e nos tornámos cidadãos de uma cultura tão intersectada pela instrução” (Pacheco, 2005, p.7).

A globalização veio reforçar a centralidade do currículo como motor de conhecimento, pois a educação é o património das comunidades que serve. Assim, a EI é vista, a nível mundial, como uma alavanca para o sucesso escolar no ensino básico. Dito de outro modo: a educação básica

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tem sido o alvo prioritário das políticas de educação, cuja visibilidade reside nas sucessivas indicações de áreas curriculares a privilegiar e de metas a atingir, quer a nível nacional, quer internacional.

A “curricularização” (Pacheco, 2009) das reformas educativas resulta em alterações que não interferem com mudanças estratégicas e inovadoras e tende a ganhar peso com as diretivas e regulamentos europeus de caráter vinculativo ou prescritivo para os Estados-Membro, eivadas por forças com epicentro nos países mais influentes, cultural e economicamente (Azevedo, 2009).

Lyotard (2006) critica a narrativa funcional centrada nos resultados e admite mudanças pouco expressivas nas aprendizagens. Se por um lado, as atividades de enriquecimento curricular (AEC) promovem o contato das crianças com diversas áreas de conteúdo, por outro acionam políticas curriculares homogéneas no que toca à sua organização, aos conteúdos e à expetativa de resultados.

na União Europeia (UE), nos anos 80 do séc. XX, assistiu-se a um entendimento comum sobre a educação entre os Estados-Membro com a assinatura de Tratados4, marcos importantes na convergência de políticas que visavam a qualidade daquela, ressalvando-se a autonomia relativa no que concerne aos conteúdos, à organização do sistema educativo e à diversidade cultural e linguística.

Assiste-se à consciência da importância da EI para o sucesso escolar e à mudança de práticas, construindo-se pontes entre os diferentes espaços de aprendizagem na assunção de uma função catalisadora da EI no sistema educativo, tanto no que tange à expansão, como à sua frequência5 de modo a aumentar o número de crianças neste nível para valores aproximados da OCDE (Vasconcelos, 2008).

4 Os Tratados de Maastricht (1992), de Amesterdão (1997), a declaração de Bolonha (1999) Tratado de Lisboa (2007), são exemplo disso.5 Preconiza-se a frequência de todas as crianças de pelo menos um ano letivo antes do ingresso na escolaridade obrigatória.

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o primado desta medida consistiu na criação de equidade nas condições de aprendizagem, desenvolvimento e bem estar. Trata-se de concretizar um projeto de cidadania ativa numa sociedade eticamente comprometida (Dahlberg, Moss & Pence, 2003).

neste cenário de expansão ofereceu-se um leque de AEC clonadas do programa pedagógico dos educadores6. A Secretaria Regional de Educação e dos Recursos Humanos (SRERH) da Região Autónoma da Madeira (RAM) congratula-se com o desafio lançado pelas AEC. no seu entender, permitiu um aumento diversificado de aprendizagens, elevando a qualidade na EI, porquanto estão envolvidos técnicos especializados. Interpelamo-nos criticamente: até que ponto esta fragmentação disciplinar que norteia o “espaço das crianças” (Dahlberg, Moss & Pence, 2003) e o aumento da frequência na EI nestes moldes é positiva para elas?

Em Portugal temos vindo a evoluir ao nível da oferta de instituições de EI que acolhem as crianças e promovem o seu desenvolvimento, antes do ingresso na escolaridade obrigatória (Vasconcelos, 2008; 2012; Vilarinho, 2000).

Vilarinho (2000) identificou, no discurso oficial produzido até os anos 90, três fases na legislação fulcrais para o desenvolvimento da EI: Criação, normalização e Expansão (1977/1986); retração (1986/1995); e revitalização (1995/1997). A estas junta-se a Expansão (1996/2002), sinalizada por Vasconcelos (2008) e a Universalização como7 objeto das políticas de educação para este setor, não sendo no entanto obrigatória a sua frequência (Ministério da Educação e Ciência, 2013).

Com a adesão de Portugal à EU, relatórios da situação e tendências, bem como a avaliação dos indicadores de qualidade, surgiram no nosso país.

6 na área da Expressão e Comunicação as crianças têm um professor especialista que desenvolve atividades em horários pré-determinados a par das realizadas pelo educador responsável por esse grupo.7 A Universalização da EI para as crianças dos 3 aos 5 anos, tem marcado, a partir de 2009, as narrativas governamentais sobre esta matéria. Este objetivo é entendido como o limiar mínimo exigido numa sociedade do conhecimento.

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Deste modo, a Expansão e Desenvolvimento da EI esteve ligada ao Relatório da OCDE8 (Ministério da Educação, 2000). neste, a questão da qualidade é premente, assim como a inspeção, a investigação e a criação de creches.

Na RAM9, a organização, estruturas e equipamentos revestem-se de significativas diferenças em relação ao restante território português. A rede regional de EI, abrange creches, infantários, jardins de infância e pré-escolas com tutela pedagógica e administrativa única da competência da SrErH. Com exceção das pré-escolas que são gratuitas o financiamento é feito com base numa comparticipação mensal definida por despacho da SrErH, tendo por base o rendimento dos pais.

Os EsPAÇOs DA EDUCAÇÃO DE INfÂNCIA

A autonomia das instituições mantém-se balizada pelas questões ligadas à organização da aprendizagem, pelo que a autonomia curricular permanece dependente da administração central, pois os normativos oficiais orientam os planos curriculares, os horários, as regras de avaliação e as opções metodológicas. Implícita ou explicitamente, perfilha-se um currículo central, consubstanciado num conjunto de competências essenciais a desenvolver pelas crianças. Mas, um currículo emergente, aberto às mudanças, deve ser planeado localmente, exigindo a redefinição da policentralidade pedagógica (Vasconcelos, 2012) mediante a coconstrução contextualizada.

o “vetor principal da descentralização educativa é o da territorialização da decisão” (Pacheco, 2000, p. 143), o que pressupõe que o educador assuma autonomia profissional e dependa menos de orientações

8 Ver: Exame Temático da Educação Pré-Escolar e dos Cuidados para a Infância em Portugal Disponível em http://www.dgidc.min-edu.pt/educacaoinfancia/data/educacaoinfancia/Documentos/early_childhood_education_and_care_policy_in_portugal_report_pt01.pdf9 na rAM a EI rege-se pelo Decreto Legislativo regional n.º 25/94/M, o que lhe confere algumas especificidades.

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exteriores e mais dos contextos onde trabalha.

Infere-se daqui que as linhas curriculares que embalam a práxis na EI deverão ser cocontruídas com os atores envolvidos, incluindo as crianças, num fórum pedagógico distanciado do modelo dominante (Dahlberg, Moss & Pence, 2003). Para estes autores a EI tem-se voltado para a promoção do desenvolvimento da criança e para o sucesso escolar, atentando menos à infância e mais à prevenção de problemas sociais futuros. Em detrimento da dimensão ética, a EI apresenta uma preocupação técnico-gerencial centrada na previsibilidade e padronização dos resultados desejáveis.

Hargreaves afirma “ninguém é uma ilha” (1998, p.71), logo, seguir esta convicção em parcerias será uma das condições essenciais para o desenvolvimento da EI.

A VOz DAs CRIANÇAs

“Enquanto não nos empenharmos a sério no estudo das crianças em contexto, o nosso conhecimento das crianças continuará a ser gravemente limitado” (Graue & Walsh, 2003, p. 21). Efetivamente a assunção da criança como objeto de estudo tem resultado na convicção de que ela deve ter voz na construção do conhecimento acerca da infância (Oliveira-Formosinho, 2008).

A abordagem etnográfica com crianças apela a um ambiente cuidadoso de intervenção num processo que reforce o conhecimento in loco da problemática em estudo. Investigadores e investigados são parceiros na procura de um entendimento da infância (Graue & Walsh, 2003).

nos contextos terão primazia as instituições de EI públicas, pois são espaços de observação das crianças por excelência. nas saídas de campo, encorajaremos ações de comunicação das crianças, o que requer um conhecimento delas muito particular, logo, as caraterísticas pessoais do

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investigador que se ajustem à prolongada convivência adulto/criança serão exigidas nesta investigação (Graue & Walsh, 2003; Máximo-Esteves, 2008; Oliveira-Formosinho, 2008).

A nossa abordagem metodológica apela ao recurso de entrevistas conversa, observação participante, registos de imagem e artefactos, como instrumentos privilegiados para dar voz às crianças (Graue & Walsh, 2003; Máximo-Esteves, 2008; Oliveira-Formosinho, 2008).

o procedimento nas entrevistas reveste-se de cuidados acrescidos: deverão ocorrer na presença de pares; utilizar objetos de apoio (brinquedos, imagens) e perguntas hipotéticas (imagina que); colocar questões na terceira pessoa; utilizar imagens vídeo como mote para as conversas; utilizar conversas como entrevista; escolher momentos oportunos (Graue & Walsh, 2003, Oliveira-Formosinho, 2008).

O registo dos dados áudio e de imagem serão em suporte digital para facilitar a transcrição e posterior trabalho de análise (Mendes & Sousa, 2011). Serão ainda organizados sistemática e atempadamente para não se perder a sua essência, pois “sem um registo robusto com pormenores concretos, não se está a descobrir nada, está-se a inventar” (Graue & Walsh, 2003, p. 160).

A experiência educacional (Pinar, 2007) das crianças na EI, pelas suas vozes, será a nossa dimensão de análise de referência que versará sobre os seguintes tópicos: Aprendizagem (Coisas que aprendi? Coisas que gostaria de aprender? Coisas em que sou boa/bom); Planeamento (quem decide o que faço? onde e quando e com quem realizo as atividades?); relações e interações (Com quem gosto/não gosto de brincar?)10.

Estas são questões de partida, não se esgotando aqui outras que possam surgir no decorrer do estudo situado num paradigma de incerteza de que Edgar Morin fala e Sousa (1997) refere como uma caraterística da 10 Questões baseadas no Sistema de Avaliação de Crianças (SAC) de Gabriela Portugal e Ferre Laevers (2010).

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investigação interpretativa: “à ordem absoluta, eterna e incondicional contrapõem-se um novo conceito de ordem que contempla a desordem” (Sousa, 1997, p. 6) da complexidade dos espaços das crianças.

CONCLUsÃO

O conhecimento e o currículo são faces de uma educação vista como um construto politico, económico, cultural mas também pedagógico, pessoal e social (young, 2010).

A globalização veio adensar a dimensão europeia das orientações para a EI através da implementação de medidas convergentes e da definição de metas comuns aos sistemas educativos dos Estados-Membro de modo a tornar possível a comparabilidade de dados. Com a adesão de Portugal à UE emergiram objetivos como a expansão e a qualidade da EI, razão pela qual temos vindo a assistir ao qualitativo deste nível como preditor de sucesso escolar e de uma cidadania eticamente comprometida. o apelo à frequência da EI e a atenção de que é alvo através de medidas que visam introduzir valor acrescentado ao alargamento de horários e enriquecimento curricular é facto, sendo objetivo de referência a universalização da EI.

Embora estejamos numa crise, de natureza financeira e política, as pessoas são recursos valiosos, por isso a educação deve assumir-se como o caminho decisivo para o desenvolvimento social. Assim, é imenso o caminho que há a percorrer sobretudo na EI pois trata-se de um setor especialmente vulnerável, merecedor do nosso dever. Importa pois saber: Como experienciam as crianças a educação que lhes oferecemos? Procuraremos responder a esta questão de partida, através de uma investigação qualitativa, numa abordagem etnográfica com crianças. Esperamos com este trabalho fornecer elementos para futuros estudos e trazer mais conhecimento sobre a EI através da voz das crianças.

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Currículo e reformas curriculares

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11 Centro de Investigação em Educação da Universidade do Minho.

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fUNDAmENtOs PARA UmA VIsÃO hOLÍstICA DO CURRÍCULO - tEORIA CURRICULAR E PRÁXIs PEDAGÓGICA, NO DLBsE-

CV/2010

Sílvia Maria Castro Fortes Cardoso; José Augusto Brito de Pacheco

Universidade Católica Portuguesa; Universidade do Minho

[email protected]; [email protected]

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REsUmO

De um território emergente de práticas educativas e pedagógicas, o currículo afirmou-se como espaço de trabalho, de realização e de debate educacional, pondo em evidência diferentes modos de assegurar o direito à educação escolar, de crianças e jovens nos seus contextos físicos e culturais. Sendo uma realidade dinâmica, a ecologia do território curricular reage integrando desafios e inovações proporcionadas na sociedade global, seja para a promoção socioeducativa local, seja para a integração transnacional dos cidadãos. Este processo, que entendemos complexo e comprometido ideologicamente, integra uma multiplicidade de referências e contextos decisionais, alimentando-se de práticas de ensino e de formação que contribuem tanto para a sua realização como para motivar novas performances em consequência do desenvolvimento social, científico e tecnológico, entre outros. nesta comunicação pretendemos partilhar uma visão holística do currículo, pondo em evidências marcos teóricos e práticos para fomentar uma discussão em torno das atuais decisões educativas e do seu eventual impacto na (re)construção do currículo do ensino regular , no âmbito da reforma educativa em curso. Para o efeito, consideramos a observação e análise de práticas ditadas pela revisão curricular, em curso, em harmonia com os textos legais.

Palavras-chave: políticas educativas e curriculares; reforma e inovação curriculares; revisão curricular; práticas educativas.

ABstRACt

From a territory emerging from educational and pedagogical practices, the curriculum became a place of work, of achievement and educational debate, highlighting different ways to ensure the right to school education for children and youths in their physical and cultural

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Currículo e reformas curriculares

contexts. As a dynamic reality, the ecology of the curricular territory reacts by integrating challenges and innovations given by the global society, both for the local social-educational promotion and for the transnational integration of citizens. This process, which one considers to be complex and ideologically compromised, integrates a multitude of references and decision-making contexts, feeding of teaching and training practices that greatly contribute to its realization and to motivate new performances as a result of social, scientific and technological developments, among others. In this communication, one wants to share a holistic vision of the curriculum, emphasizing theoretical and practical milestones to foster a discussion regarding the current educational decision and their possible impact on the (re)construction of the curriculum of the Cape Verdean regular education, within the on-going educational reform. For such, one considered the observation and analysis of practices dictated by the on-going curricular revision, together with legal texts.

Keywords: educational and curricular policies; reform and curricular innovation; curricular revision; educational practices.

ENQUADRAmENtO

Em Cabo Verde, as políticas curriculares instituídas refletem a atenção e o acompanhamento pelas/das tendências desafios e expetativas mundializadas, num percurso de construção e melhoria permanente, permeável a estas mudanças, desde a construção do sistema educativo nacional. É nesse sentido que o Decreto legislativo das Bases do Sistema Educativo (DLBSE), de 07 de maio de 2010, reafirma as decisões curriculares introduzidas pela anterior Lei de Bases do Sistema Educativo, de 29 de dezembro de 1990, no que se refere às orientações das políticas educativas e curriculares, pretendendo operacionalizar um sistema capaz de atender diversos públicos escolares, em processos pedagógicos reconfigurados face

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às condições e necessidades contextuais, como sejam sociais, culturais, pedagógicas e ritmos de aprendizagem dos alunos.

Coloca-se a ênfase num modelo de desenvolvimento curricular dinâmico, com a intenção de promover os diferentes tipos e níveis de competências discentes, a que se associam competências profissionais docentes e competências institucionais, através de processos de empoderamento dos agentes educativos, processos estes, promotores da mudança e da inovação, nos meso e micro contextos de decisão curricular.

Este é um processo complexo e formatado numa linha ideológica reveladora dos modelos de Educação e de Sociedade pretendidos. Integra uma multiplicidade de referências e contextos decisionais, alimentando-se de práticas de ensino e de formação que contribuem, tanto para a sua realização, como para motivar novas performances em consequência do desenvolvimento social, científico e tecnológico, entre outros. no que se refere ao modelo pedagógico, reforça-se nas políticas educativas e curriculares anteriores, ao implementar uma perspetiva de desenvolvimento curricular baseado no modelo por competências, de âmbito da perspetiva crítica do currículoem negação ao modelo por objetivos que reflete a perspetiva técnica (Pacheco, 2001; Kemmis, 1988) prevalecente no sistema de ensino caboverdeano, e não só.

A REfORmA CURRICULAR (DLBsE, 2010)

A palavra currículo invoca uma diversidade de definições associadas aos contextos,às situações e aos âmbitos da sua intervenção (Cardoso, 2007). O campo de estudos curriculares tem-se desenvolvido com base numa intensa atividade científica cuja produção tem vindo a desocultar os sentidos e significados, atribuídos aos diversos entendimentos sobre o termo, numa associação forte com contextos históricos e sociais (Kemmis, 1988; Goodson, 1991), em que emergiram os referenciais teóricos do

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Currículo e reformas curriculares

campo curricular envolvendo uma polissemia (Pacheco 2001) que torna a sua definição complexa, contudo explicativa (Cardoso, 2007).

Para esta comunicação, interessa discutir o sentido e o significado do currículo nacional que, nos termos do DLBSE, de 2010, remetem para a análise da perspetiva formal do termo e no seu entendimento como um conjunto de conhecimentos e experiências de aprendizagem (Pacheco, 2001) que se pretendem desenvolvidas pelo aluno e proporcionadas pela Escola, em ambientes formais, não formais e informais (ibidem), tendo em conta a perspetiva e as orientações do normativo matriz do sistema educativo.

Este normativo institui uma reforma do sistema educativo, através de uma mudança estrutural profunda, ao oficializar o Ensino Básico de 10 anos de escolaridade, impondo um processo de ajuste da educação escolar, com o sentido de provocar mudanças e inovações.

Do ponto de vista jurídico, a reforma educativa implica alterações das políticas educativas, com um padrão ideológico, social e cultural (Kemmis, 1988), sendo necessário adaptar a estrutura do sistema, para integrar as alterações que se propõem acontecer e que se alinham num processo de regulação social (Cardoso, 2003). quanto à inovação, carateriza-se por “mudanças que contribuam para a transformação e melhoria dos processos e práticas de ensino-aprendizagem e consequentemente, para a confirmação do sucesso educativo dos alunos”Pacheco (2001, p.151). Em conjunto e no sentido integrado destes termos, trata-se de mudanças que englobam os processos educativo e pedagógico e culminam na reestruturação global do Currículo (Ribeiro, 1992).

Pacheco (1996) procura sintetizar os dois conceitos para afirmar o lado jurídico/normativo da reforma, na dimensão concetual e o lado operativo centrado na escola e nos professores, ou seja, nas práticas escolares e pedagógicas. Deste modo, no sentido global, a reforma atinge inovações se provocar mudanças na escola (Canário, 1994), se for capaz de mudar

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as práticas escolares e as dos professores, no seu projeto pedagógico. Essa conclusão permite-nos olhar para o DLBSE/2010 e entender a vontade política atual de provocar uma reforma educativa e curricular, envolvendo alterações estruturais e a proposição de um paradigma curricular assente na abordagem do currículo por competências defendida por Perrenoud (1999).

Sobre a conceção de desenvolvimento curricular representada neste paradigma, no pensamento deste autor, enfatiza-se a proposta de redução de conteúdos curriculares e a centração do ensino em conteúdos capazes de proporcionar conhecimento mobilizável face aos contextos dos alunos, sendo relevante o saber fazer, não diminuindo, com isso, a importância do conhecimento. o que propõe Perrenoud (1999) é que o conhecimento seja selecionado com base nos alunos e nas experiências de aprendizagem significativas (Ausubel, 1968), que se deseja facilitar-lhes.

no sistema educativo caboverdeano, a pedagogia por competências é designada por pedagogia da integração (roegiers, 2004),por influência da perspetiva francófona, que lhe é dominante. Carece neste sistema uma clara diferenciação destes dois conceitos. Entende-se que a pedagogia de integração, assim como é defendida por este autor, refere-se ao método pedagógico e à abordagem por competência, que deve ser interpretado como sendo o seu referencial teórico.

O novo ordenamento concetual da educação integra as tecnologias educativas, prevendo-se uma utilização exponencial no ensino, na formação e na gestão educativa. A isso junta-se a determinação pelo alinhamento da formação de professores, num processo que também altera a orgânica e a identidade das próprias instituições formadoras.

Se no idealizado existe clareza nos objetivos de mudança e de inovação, o mesmo não se pode dizer em relação aos percursos práticos da construção do novo conceito nos projetos socioeducativo e pedagógico. Aqui residem as maiores das dificuldades do sistema educativo, atualmente. Assim, o processo de desenvolvimento curricular (enquanto elemento

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Currículo e reformas curriculares

nevrálgico nesta construção e referencial diretor da gestão curricular e da ação pedagógica), só pode ser implementado, de forma criteriosa, se se perceber bem como se prevêem e como se relacionam os diferentes contextos de decisão curricular, que papéis para os agentes educativos e como integrar sua participação à Luz do DLBSE, de 2010.

Neste âmbito, no macro contexto de decisão curricular, ou contexto político-administrativo (Pacheco, 2001), discutem-se e decidem-se os fundamentos orientadores do currículo a partir das diretrizes políticas para a educação e formação, onde a ideologia ocupa certa centralidade, por refletir a conceção de educação de um determinado poder político, em função da conceção filosófica, das crenças e das dinâmicas que sustenta. Aqui, estamos na presença do currículo prescrito (Gimeno, 1988), formal (Perrenoud, 1995), ou seja, do currículo oficial (Goodlad, 1979).

na caminhada em direção à sala de aula, o currículo chega ao meso contexto ou contexto de gestão, à Escola e estruturas locais de administração educativa (Pacheco, 2001). na escola, o currículo é programado (ibidem) pelos grugos disciplinares, de modo a facilitar a sua gestão, tendo em conta a sua realização anual, trimestral, de unidade e semanal (Pacheco, 1990) e a necessidade de harmonização de procedimentos didáticos e pedagógicos, gerais.

no fim da cadeia decisional, encontra-se a ação do professor, o ato pedagógico que coloca o currículo em ação (Gimeno, 1988). É neste micro contexto, ou contexto de realização (Pacheco, 2001), que o currículo se efetiva em experiênciasde ensino e de aprendizagem (Goodlad, 1979).Daqui resultam duas conceções de currículo: o formal, já explicitado, e o oculto(Torres, 1995), este último constituindo-se em experiências de aprendizagem não programadas, mas que ocorrem da realização do currículo escolar (Pacheco, 2001), dependendo da forma como os alunos se apropriam do conhecimento, induzida pelas experiências prévias responsáveis pela diferenciação da aprendizagem.

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neste processo, os decisores curriculares concebem, planificam e realizam o “currículo nacional ou core curriculum (Kirk, 1986), concebido como um conjunto de conteúdos e atividades comuns, de implementação de uma cultura geral para todos, como propósito de uma educação para todos. Aqui entra a democratização do sistema educativo, sob os princípios de igualdade de oportunidades e de acesso e de sucesso educativo(Cardoso, 2007), também refletido no DLBSE, de 2010.

Momentos de avaliação consequentes e processuais integram o processo de desenvolvimento curricular e projetam novas expetativas e interesses curriculares quanto ao currículo e quanto às aprendizagens escolares. O currículo avaliado tanto pode insidir sobre as os resultados das aprendizagens dos alunos, como pode recair sobre si mesmo através da avaliação dos planos de estudos e programas de ensino e formação, os materiais escolares, os modelos de desenvolvimento curricular (Gimeno, 1988).

As decisões que envolvem a escolha de uma determinada orientação curricular desenham-se num processo de partilha de poder e de responsabilidades, desde a conceção à avaliação curricular. Como facilitador da intervenção educativa articulada e baseada numa cultura colaborativa entre os agentes,o sistema instituido pelo DLBSE, de 2010, reafirma o conceito de autonomia, permitindo-se contextualizar o currículo, para aproximar a oferta educativa das realidades comunitárias dos alunos.

Sem querer questionar a base da tomada de decisões no sistema educativo caboverdeano, pois o tempo de que dispomos não nos permite abrir a discussão para esse lado da questão, achamos interessante lembrar Kirk (1986) referido porPacheco (2001) que defende a construção do currículo nacional a partir de uma consulta democrática e formulado de modo a ser de carácter geral e não detalhado em conteúdos específicos, permitindo a (re)constextualização, para atingir as necessidades educativas dos alunos (incluir as suas escolhas e maximizar as oportunidades de auto

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aprendizagem e atender às suas variações de ritmo de aprendizagem); deve centrar-se em objetivos educacionais gerais que incluam todos os níveis do saber; estar de acordo com as necessidades de organização dos conhecimentos e das disciplinas; atender ao sistema nacional de valorização e de certificação;ter mecanismos processuais específicos nacionais, locais e de diferenciação entre os níveis de ensino.

A existência do currículo nacional pretende efetivar a aspiração de conferir oportunidades de formação comuns e fundamentais a todas as crianças, especialmente, na escolaridade obrigatória. No entanto, é importante perceber a complexidade deste intento na prescrição curricular, de modo a que se traduza num “conjunto de normas estipuladas em relação às disciplinas e/ou áreas curriculares, aos conteúdos programáticos às orientações metodológicas, aos materiais curriculares e à avaliação” (Pacheco, 2001, p. 74), suscetíveis de apropriação e integração nos interesses localizados. Estes são efetivamente desafios para a escola cuja autonomia e flexibilização curriculares apresentam-se como elementos incontornáveis no desenvolvimento de um novo conceito de escola e de processo educativo.

EsCOLA E PROCEssO EDUCAtIVO, NO DLBsE (2010)

na atualidade educativa caboverdeana reforça-se a importância da escola no processo educativo, enquanto palco de realizações educativas e curriculares. Podemos exemplificar com a implementação de sistemas de gestão assentes em tecnologias, com vista a desenvolver um modelo de sistematização de dados que se pretende eficaz, monitorado e capaz de proporcionar o acompanhamento do cidadão/ aluno, da entrada à saída do sistema. Isso no âmbito de um projeto tecnológico nacional designado de “Programa Mundu Novu”1.

1 http://www.mundunovu.gov.cv/

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Assiste-se a uma crescente mobilização de recursos teóricos e soluções práticas, envolvendo especialistas nacionais e não nacionais no sentido de integrar a escola neste movimento reformista global.Pretende-se voltar a escola para a comunidade onde se insere, de modo a envolver as instituições locais no processo educativo, bem na continuidade do disposto na LBSE, de 1990, que introduziu a descentralização e a autonomia no sistema, visando a sua democratização. Em termos práticos, importa definir o grau de participação que se pretende dos agentes educativos locais na eventual partilha de poderes. Entende-se que a descentralização“permite ter mais em consideração as condições locais e reagir mais rapidamente às suas eventuais modificações. Mesmo que eles [os argumentos] inspirem concepções educacionais que prevalecem em todo o pais, os currículos podem ser recontextualizados nos seus aspectos principais” (De Landsheere 1992, p. 30). Desta forma facilitará a eficiência na resolução de problemas contextuais.

A participação na educação, a escola integrada na comunidade é uma das preocupações refletidas no DLBSE, de 2010, e nas perspetivas ministeriais, que aspira a uma participação mais ampla e envolvente a nível local/comunitário. Esta questão tem sido muita discutida desde a publicação da LBSE, em 1991, mas ainda está por conseguir. Naturalmente, torne-se necessário desenvolver uma metodologia de intervenção mais complexa e fundamentada que permita a cultura colaborativa, e uma arena política de debate e concertação de interesses educativos entre os agentes, direta ou indiretamente, envolvidos na Educação. Trata-se de uma questão que não se esgota aqui…

De volta à Escola, os agentes educativos neste contextos, particulamente os professores, são os responsavéis primordiais pelas mudanças educativas e inovação, pelo que o seu papel na recontextualização do currículo deve ser objetivo e decisivo, pois para haver mudanças significativas na escola no sentido da inovação, torna-se indispensável

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estimula -la e provoca-la a partir de estratégias e garantia de condições na escola, na comunidade educativa e, nos professores em particular, de modo a desenvolver e a aplicar a sua capacidade (re)criadora.

COmO fICA O PROfEssOR NEstE PROCEssO? (DLBsE, 2010)

Pelo exposto se percebe a importância central do professor na implementação do currículo, embora o seu estatuto e papel como decisor curricular não esteja verdadeiramente assumido, nem pelo sistema nem pelo próprio. na prática o sistema mantem este papel na esfera das decisões político-administrativas, sendo o professor entendido como ensinante, reprodutor do conhecimento, pelo que as competências que mais evidencia no ato pedagógico são aquelas que transmitem uma imagem de um bom detentor do conhecimento, sendo um executor do currículo que reage, quase exclusivamente, em função das decisões administrativas e pedagógicas globais.

A mudança de paradigma educacional impõe um movimento de discussão amplo, para a clarificação dos sentidos e significados teórico práticos atribuidos ao professor no sistema, para a compreender e integrar nas práticas. Pelo disposto no DLBSE, de 2010, deseja-se que o professor seja um mediador curricular, permitindo-se recontextualizar o currículo nacional de modo a integrar os interesses locais e dos alunos na planificação e gestão do ato pedagógico. Como gestor dos processos de ensino, o Decreto suscita uma postura de negociação de facilitador da intervenção do aluno no processo formativo e na gestão das aprendizagens. Implicitamente, institui-se o perfil de professor prático reflexivo (Schön,1987 )para se atingir a transformação, o qual envolve mudanças significativas de postura e de ação, projetando uma nova identidade profissional.

Na ação, o professor deve delinear a sua formação e desenvolvimento

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profissional na perspetiva de formação ao longo da vida, integrando iniciativas de formação formal e não formal, para acompanhar o conhecimento científico e profissional da especialidade e para alimentar a intervenção educativa. na postura, a transformação significa definir-se como investigador, na procura de melhoria permanente do seu serviço educativo junto dos alunos, investigando para intervir sobre os obstáculos ao ensino e à aprendizagem,na busca da qualidade educativa. Para isso, é preciso (des)construir as rotinas fundadas no paradigma técnico ou conceção técnica do currículo (Kemmis, 1988), para estimular a mudança de paradigma, integrando uma perspetiva crítica, proativa, dialogante e reconstrutiva face aos contextos e atores na escola/sala de aula.

A não concretização deste perfil, até então, é uma limitação do processo de implementação da LBSE, de 1990, que persiste e que se pretende resolvido com o DLBSE, de 2010, embora haja a considerar o envolvimento tardio e recente dos professores (e educadores fisicamente exteriores ao Ministério da Educação) na discussão das linhas reorientadoras da reforma, que apesar de estarem associadas ao DLBSE, de 2010, estão em curso desde 2006; e osistema de formação contínua e consequente requalificação em função da revisão do sistema de ensino e formação, entre outros. O sistema carece, neste momento, de uma metodologia global de intervenção facilitador da disseminação dos preceitos da reforma, da capacitação científica, técnica e metodológica, particularmente dos professores,para efetivar, na escola e no projeto pedagógico, as mudanças e inovações instituidas.

A CONCLUIR…

Tudo isso requer uma linha estratégia bem definida e monitorizada, pois difícil se torna mudar rotinas sacramentadas, “seguras”, para num modelo paradigmatico que impõe novas rotinas no quadro de uma

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intervenção onde prevalece o desconhecido, a impreparação,um sentimento de insegurança e de frustração. Este novo modo de agir profissionalmente, envolve, acima de tudo motivação, adesão e desejo pessoal de ultrapassar as barreiras das rotinas e a coragem de reinventar a profissão tendo por base um novo paradigma educacional. Tal só será possivel se se perceber o sentido e o significado das mudanças e inovações que se pretendem, sendo sujeito e ator da própria mudança.

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REsUmO

O currículo é, indubitavelmente, o mentor da aprendizagem. Produzido pelos educadores de infância, é importante que, ao contextualizá-lo, reflitam, de forma crítica e construtiva, sobre que conhecimentos, importantes ou válidos, merecem fazer parte do currículo, e se é importante dar tempo às crianças para interiorizarem as aprendizagens. Assim, o trabalho começa por apresentar uma revisão literária sobre a essência dos conceitos aludidos, passando, de seguida, para uma reflexão sobre a (re)construção do currículo ancorado na proposta de um currículo-sem-tempo, por forma a dar tempo às crianças para construírem a sua identidade, subjetividade, interesses e aprendizagens.

Palavras-chave: currículo; conhecimento; matética; aprendizagem; educação de infância.

ABstRACt

The curriculum is definitely the learning mentor and is entirely of the responsibility of the early childhood educators. Doing its contextualizing, they should critically and constructively reflect about what knowledge, important or valid, should be in the curriculum, and if it’s important to give children time to fully understand what they learn. Therefore, this article initially presents a literary review on the essence of the concepts referred above, and then a reflexion on the (re) construction of the curriculum anchored in the proposed curriculum-without-time in order to give children enough time to built their identity, subjectivity, interests and learning.

Keywords: curriculum; knowledge; mathetics; learning; childhood education.

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Currículo e reformas curriculares

INtRODUÇÃO

Por mais definições que possam ser apresentadas, o currículo é conhecimento (young, 2010), cursor dinâmico da aprendizagem. no quadro de um sistema educativo, bem como da sua organização curricular (Pacheco, 2008), a escola desempenha finalidades diversas, tornando-se evidente não ignorar a seguinte questão: o que é ensinado e aprendido nas escolas? (young, 2013). Existem inúmeras interrogações sobre a função da escola, para que serve social e culturalmente, e de que modo as crianças e jovens interagem com processos e práticas de aprendizagem.

A partir da leitura de Papert (2008), discutimos, nesta comunicação, o espaço da aprendizagem na educação de infância, entendida como etapa decisiva para o percurso de escolarização (CNE, 2010). Assim, abordamos a noção de tempo no processo de aprendizagem na educação de infância, comparativamente ao processo formal de escolarização, que regista uma aprendizagem apressada (Hargreaves & Fink, 2007), considerando as seguintes interrogações: o que é importante que as crianças aprendam? É importante dar-lhes tempo? É importante educá-las para a imaginação, reflexão e pensamento crítico e autêntico? Como devem os educadores abordar a educação de infância em termos de conhecimento?

na procura de respostas para estas questões, exploramos a contextualização do currículo à luz de teorias (pós) críticas (Pacheco, 2013), sobretudo na ênfase que é atribuída à identidade, subjetividade e interesses das crianças. De seguida, abordamos a proposta da aprendizagem significativa de Ausubel (2003) e a proposta construcionista de Papert (2008). Por último, exploramos a incorporação do currículo-sem-tempo na (re)construção da educação de infância, i.e., um currículo que não aprisiona o tempo, o movimento, a voz, a criatividade e a subjetividade das crianças, perante discursos culturalmente padronizados, propiciando, pelo contrário, multiculturalismo, atividades de projeto e práticas pedagógicas centradas em diálogos entre educadores, crianças e respetivas famílias, de modo

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a permitir desbravar e compreender novos saberes e realidades. Como se trata de um projeto de investigação em curso, em que é seguida uma metodologia qualitativa, com recurso à análise documental e ao inquérito por entrevista (Bogdan & Bikle, 1992), não apresentamos dados empíricos, mas apenas uma exploração teórica em torno da educação de infância a partir do conceito de currículo-sem-tempo.

O CURRÍCULO NA EDUCAÇÃO DE INfÂNCIA

o lexema currículo deriva etimologicamente do vocábulo latino curriculum, significando pista de corrida que, segundo Silva (2000), corresponde à pista que conduz ao que cada um de nós é. nesta ordem de ideias, o currículo, entendido como uma questão de problematização do conhecimento, da identidade e da subjetividade, modifica as pessoas que o percorrem (young, 2010).

Uma vez que a escola, através do currículo, molda as práticas culturais, os modos de pensamento predominantes e constrói a sociedade, é importante, segundo young (2013), que esta se debruce, inevitavelmente, sobre a seguinte questão: qual o conhecimento que é considerado importante ou válido para merecer fazer parte do currículo?

Consequentemente, young (2010) defende que, na seleção do tipo de conhecimento, é por demais importante ter em atenção uma segunda questão: Em que é que o ser humano se deve tornar?

Segundo o autor, o conhecimento inerente ao currículo deve centrar-se nos tipos de habilidade, conhecimento e atitudes, que serão necessários para construir e sustentar a sociedade e, ainda, responder às exigências sociais do mundo contemporâneo.

nesta perspetiva da educação direcionada para a cidadania, o sistema educativo português definiu a organização curricular como sendo um dos

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pilares da Lei de Bases1, e a educação de infância2, designada pela Lei-Quadro da Educação Pré-escolar3 de educação pré-escolar, como o primeiro degrau do edifício curricular, ainda que situado fora da educação formal (Pacheco, 2008).

Importa, aqui, abrir um parêntesis para salientar que as decisões curriculares não são da competência exclusiva da Administração Central, existe, também, nas salas um espaço para estas decisões curriculares. Salientamos, ainda, que, à semelhança dos níveis de ensino formal, a educação de infância em Portugal consagra o princípio da tutela pedagógica única assegurada pelo Ministério da Educação (ME), todavia apresenta particularidades que a caraterizam e a diferenciam destes níveis de ensino. Apesar do ME4 produzir copiosos documentos de orientação, estes não têm por missão definir conteúdos programáticos, mas sim servir de orientação para a construção quotidiana do currículo em termos de um conhecimento válido e de aprendizagens significativas (Ausubel, 2003; Vasconcelos, 2012).

Com efeito, tendo como linhas orientadoras os documentos oficiais, o educador constrói o currículo com largas margens de liberdade de ação na sua contextualização, apresentando-se como a figura de intelectual-de-currículo, tecendo o currículo ao sabor da escuta das necessidades mais profundas das crianças e respetivas famílias (Vasconcelos, 2012), pois não está vinculado a um currículo formal, ainda que a introdução das metas curriculares na educação de infância contribua para a sua prescrição. Na realidade portuguesa, as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar5 correspondem ao quadro de referência comum a todos os 1 Lei n.º 46/ 86, de 14 de outubro – Lei de Bases do Sistema Educativo, com alterações pela Lei n.º 115/ 97, de 19 de Setembro, e pela Lei n.º 49/ 2005, de 30 de Agosto – normativos-jurídicos do Ministério da Educação que regulamentam a estrutura da organização dos percursos escolares e, ainda, os objetivos de cada nível de ensino. 2 nível de educação facultativo na maioria dos países da Europa e África.3 Lei n.º 5/97, de 1 de Fevereiro – Lei-quadro da Educação Pré-escolar – normativo-jurídico que regulamenta o sistema público de educação pré-escolar.4 Através da Direção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular em parceria com o Gabinete de Avaliação Educacional.5 Aprovadas pelo Despacho n.º 5220/97 (2.ª Série), de 10 de Julho, publicado no D. R. n.º 178, II série

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educadores, apoiando-os nas decisões sobre as suas práticas educativas (Vasconcelos, 2008).

Dada a existência desta margem de autonomia dos educadores, as salas de educação de infância são diversas, e incorporam metodologias próprias, traduzindo ideias de inúmeros modelos6 (Hohmann & Weikart, 2011; Folque, 2012). Estas metodologias assentam num plano flexível, em que toda a aprendizagem é construída pela própria criança, sendo, esta, participante ativa no seu processo de aprendizagem a partir dos seus interesses e saberes (Vasconcelos, 2012), na consagração do princípio da aprendizagem significativa (Ausubel, 2003).

A APRENDIzAGEm NA INfÂNCIA

No Relatório Educação dos 0 aos 12 anos (CNE, 2010), Gabriela Portugal escreveu que as experiências precoces da criança são cruciais para o seu desenvolvimento cerebral, pelo que muito do que somos está relacionado com o que aprendemos durante a nossa infância.

A aprendizagem de crianças de tenra idade apresenta particularidades específicas, baseiam-se em princípios educativos que enfatizam a natureza holística da aprendizagem e excluem as linhas pedagógicas escolarizantes e estandardizadas (CnE, 2010). neste contexto, cabe perguntar: Como deve ser organizada a educação pré-escolar? o que significa uma aprendizagem significativa?

numa perspetiva psicológica, a educação deve assentar numa aprendizagem significativa que Ausubel (2003) intitula de aprendizagem por receção. Esta aprendizagem esconjura a transmissão de informação e a instrução propriamente dita, processando-se através de um método ativo,

de 4 de Agosto (ME, 1997).6 Destacando-se: o Modelo High/Scope; o Movimento da Escola Moderna; a Pedagogia de Situação; e, o Modelo Reggio Emília.

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Currículo e reformas curriculares

onde a criança aprende a pensar e assume o comando da construção do seu conhecimento, facilitada pela organização cuidadosa das experiências.

nesta perspetiva, as crianças aprendem muito mais “pescando” por si próprias o conhecimento específico de que necessitam, pelo que, quanto mais adequados forem os nutrientes cognitivos, mais probabilidades têm as crianças de constituir e reconstruir o seu conhecimento. Porém, para a criança “pescar”, precisa, para além do acesso aos melhores instrumentos, de adquirir conhecimentos sobre a arte de “pescar” (Papert, 2008).

De forma correlata, mas referindo-se à aprendizagem, Ausubel (2003) defende que a aprendizagem não tem lugar no vácuo social, o espaço da escola deve ajudar as crianças a clarificar ideias através de pesquisas em grupo e promover práticas centradas em diálogos.

Papert defende que, na abordagem curricular contemporânea, “a meta é ensinar de forma a produzir a maior aprendizagem a partir do mínimo de ensino” (2008, p.134).

nesta linha pedagógica, as atividades devem estar entretecidas com as mundividências das crianças e as regiões mentais “quentes”, uma vez que, segundo Papert (2008), estas só são capazes de adquirir conhecimentos quando as suas regiões mentais “frias” são aquecidas pelo contato com as suas regiões mentais “quentes”. Este autor reforça, ainda, que o aquecimento das áreas “frias” implica um paradigma alicerçado na matética7, que concede tempo à criança para fazer conexões a partir de conhecimentos já adquiridos.

CURRÍCULO-sEm-tEmPO: UmA PALAVRA PELA ARtE DE APRENDER sEm PREssAs

Vive-se uma época marcada por uma aceleração vertiginosa e

7 Significa, segundo Papert (2008), a arte de aprender.

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assustadora ao nível do conhecimento, com a existência de escolas apressadas, com currículos altamente técnicos, estruturados segundo uma meta narrativa e abarrotados de conteúdos, pelo que, não é dado às crianças tempo para refletirem sobre esses mesmos conteúdos, limitando-as do enriquecimento de conhecimentos e atitudes exploratórias, essenciais à emancipação e à autenticidade na interação a estabelecer com o mundo.

Se a noção de currículo como conversação complexa for considerada na escola (Pinar, 2007), esta não deveria ser o espaço para o currículo-como-plano (Sousa, 2012), concetualizado como uma conversa decidida, fechada e desligada da vida das crianças, pelo que é importante debruçarmo-nos sobre qual a finalidade do currículo, focando-nos, nomeadamente, nas seguintes questões: Será que a escola i) integra conteúdos relevantes para as crianças?; ii) propicia o multiculturalismo, atividades de projeto e práticas pedagógicas centradas em diálogos entre educadores, crianças e respetivas famílias?; iii) confere tempo para permitir que as crianças maturem novos saberes e apreendam-nos de forma significativa?;

Atualmente, a escola precisa de uma abordagem curricular inovadora que consiga acompanhar as crianças desta nova Era8 adicionando, às suas competências básicas mais antigas, novas competências básicas que, segundo os decisores políticos de queensland, citados em Hargreaves e Fink (2007), são essenciais para que as crianças atuem com responsabilidade e criatividade, de modo a serem capazes de superar os desafios do mundo atual.

Por conseguinte, o currículo-sem-tempo pressupõe uma aprendizagem significativa, profunda e ampla, abordada por Hargreaves e Fink (2007), através de um processo de conhecimento lento que se difunda e perdure pela vida, tornando-se oportuno referir a analogia, feita pelos autores, como as águas fundas são mais calmas a aprendizagem profunda raramente é apressada, residindo a tónica desta abordagem no tempo que deve ser

8 Era da sociedade do conhecimento.

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propiciado às crianças para conhecerem, compreenderem e conseguirem comunicar9.

A UNESCO10 apoiou o texto intemporal e visionário Educação: um tesouro a descobrir, onde os autores11, segundo Hargreaves e Fink (2007), defendem que a educação deve preparar as crianças para agarrarem oportunidades de aprendizagem que se mantenham ao longo das suas vidas.

De acordo com o relatório da UnESCo, os quatro tipos de aprendizagens, que alicerçam o conhecimento ao longo da vida, incluem aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver. Hargreaves e Fink (2007) acrescentam a estes quatro pilares, mais um tipo de aprendizagem, aprender a viver de modo sustentável, que consiste em aprender a respeitar e a preservar a terra que nos dá a vida, e a trabalhar com as pessoas de diferentes comunidades para que todos usufruam dos benefícios da vida económica e ecológica a longo prazo.

Assim, a noção de currículo-sem-tempo, alicerçado no conhecer lento e profundo de Hargreaves e Fink (2007), assenta numa forma de conhecer para proporcionar uma aprendizagem para a vida, uma vez que confere profundidade à nossa existência e instiga melhorias sobre a compreensão humana e, ainda, demonstra tolerância face ao marginal e ambíguo, dá maior importância a detalhes que, de forma imediata, não fazem sentido, explora situações sem saber o que procura, olha a ignorância como um campo de onde pode brotar a compreensão, é recetiva, abdica do controlo sobre os caminhos que a mente decide tomar, e examina com seriedade as ideias que surgem a partir do nada (CnE, 2010; Hargreaves & Fink, 2007).

9 Segundo Hargreaves e Fink (2007), esta aprendizagem orientada para o significado das coisas e para a vida envolve o intelectual, o social, o emocional e o espiritual de cada criança. Para alcançar esta aprendizagem, é imperativo dar tempo aos educadores para recuarem no tempo, refletirem na forma como as crianças estão a aprender, para, então, reagirem à mesma. 10 United nations Educational, Scientific and Cultural organization.11 Mais conhecido pelo relatório Jacques Delors. relatório para a UnESCo da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI.

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CONCLUsÃO

Concluímos, segundo a bibliografia analisada, que as aprendizagens só são significativas se for dado tempo à criança para interiorizar essas aprendizagens, mediante um pensar lento, crítico e autêntico. Porém, por vezes, as escolas não oferecem nem um pensar rápido nem um pensar lento, disponibilizam doses de conteúdos para memorizar, o que significa que, ao contrário de uma aquisição de conhecimentos para a vida, as crianças memorizam conhecimentos que se perdem a curto prazo.

Perante tal cenário educacional, é importante que se reflita sobre a seguinte questão: que modelo de educação é facultado às crianças na educação pré-escolar?

É premente que os educadores descartem as abordagens behavioristas, caraterizadas por um ensino altamente estruturado, e deem uma resposta adequada ao grande desafio que se coloca atualmente, (re)construir propostas curriculares únicas e adequadas a cada grupo de crianças e não um único tipo adequado a todas as crianças. É, igualmente, importante que incorporem uma proposta pedagógica de aprendizagem enraizada no construcionismo e na aprendizagem significativa, onde as crianças assumem um papel ativo, e lhes seja dado tempo para (re)construírem o seu conhecimento, num ambiente rico em nutrientes cognitivos, tornando-as, desta forma, construtoras do seu próprio processo de aprendizagem.

Em suma, é fundamental salientar que os educadores, ao adotarem um currículo-sem-tempo, estão a promover um conhecimento contextualizado, uma aprendizagem significativa, conferindo espaços para a imaginação e reflexão. Serve de frase concludente deste texto as palavras de Confúcio, citado por Hargreaves e Fink (2007, p. 51):

“A aprendizagem sem pensamento é um labor perdido; o pensamento sem aprendizagem é um perigo”.

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Currículo e reformas curriculares

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Ausubel, P. (2003). Aquisição e retenção de conhecimentos: uma perspetiva cognitiva. Lisboa: Plátano.

CNE (2010). Educação dos 0 aos 12 anos. Relatório. Lisboa: CnE.Folque, A. (2012). O aprender a aprender no pré-escolar: o modelo

pedagógico da escola moderna. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.Hargreaves, A., & Fink, D. (2007). Liderança sustentável. Porto: Porto

Editora.Hohmann, M., & Weikart, D. (2011). Educar a criança (6ª ed.). Lisboa:

Fundação Calouste Gulbenkian.Pacheco, A. (2013). Teoria (pós) crítica: passado, presente e futuro a

partir de uma análise dos estudos curriculares. Revista e-Curriculum, 11 (1), 6-22.

Pacheco, A. (Org.). (2008). Organização curricular portuguesa. Porto: Porto editora.

Papert, S. (2008). A máquina das crianças: repensando a escola na era da informática. (Sandra Costa, Trad.). Porto Alegre: Artmed.

Pinar, W. (2007). O que é a teoria do currículo? Porto: Porto Editora.Sousa, M. (2012). Currículo-como-vida. Recuperado em 14 de junho,

de http://www3.uma.pt/jesussousa/publica.htmVasconcelos, T. (2012). A casa [que] se procura: percursos curriculares

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knowledge-based approach. Journal of Curriculum Studies, 45, 2, 101-118.

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CURRÍCULO, PLANIfICAÇÃO E AVALIAÇÃO: Um OLhAR sOBRE A OPERACIONALIDADE DA REfORmA EDUCAtIVA E

CURRICULAR Em CURsO

Sílvia Maria Castro Fortes Cardoso; Joana Sofia Sousa Figueiredo

Universidade Católica Portuguesa; Universidade Portucalense Infante D. Henrique

[email protected]; [email protected]

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REsUmO

nesta comunicação defendemos a noção de que “Currículo, Planificação e Avaliação” resultam numa trilogia indissociável em qualquer processo ou percurso educativo. qualquer intenção prescritiva de reforma ou inovação curricular, parte do equacionamento destes pilares da ação educativa para promover uma compreensão sobre os modos como devem ser interpretados e realizados os pressupostos, a tomada de decisões e as formas de efetivação, visando um processo de desenvolvimento curricular renovado e inovador, capaz de proporcionar uma atualização eficaz do sistema de educativo e de formação, face aos desafios e expetativas da sociedade local e global, num determinado momento. Com efeito, nesta discussão, partilhamos um trabalho de observação e análise sobre estes domínios no âmbito da atual reforma educativa, nas vertentes enunciadas, como contributo para a formulação de um debate entre educadores, passível de permitir a reunião de contributos importantes que possam apoiar os decisores nesta matéria.

Palavras-chave: currículo; planificação; avaliação; design e gestão do currículo; decisores curriculares.

ABstRACt

In this paper, one will defend the notion that “Curriculum, Planning and Evaluation” are the result from an indivisible trilogy in any given educational process or path. Any prescriptive intention of curricular reform or innovation stems from equating these pillars of educational actions to promote an understanding on the ways the assumptions, the decision-making process and the realization forms need to be interpreted and executed, trying to

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achieve a renewed and innovating curricular development process, able to provide an effective actualization of the educational and training system, considering the challenges and expectations of local and global societies in a given moment. In fact, during this discussion, one will share an observation and analysis work on these domains under the current educational reform, across the abovementioned areas, as a contribution for triggering a debate among educators, able to gather important inputs that may support decision-makers in this matter.

Keywords: curriculum; planning; evaluation; curriculum design and management; curricular decision-makers.

ENQUADRAmENtO

A educação caboverdeana acompanha a dinâmica de outras épocas, encontrando-se em permanente mudança com o sentido de acompanhar a evolução da sociedade e, com isso, procurar corresponder às necessidades de mudança e de desenvolvimento científico, técnico e humano, que apesar de estarem em harmonia global, suscitam especificidades e especialidades contextualizadas.

Cabo Verde, enquanto país passou já por aquilo que se pode designar de três reformas educativas. A primeira marca a transformação da educação com a criação de um sistema educativo caboverdeano; a segunda, introduzida pela primeira Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) formaliza o sistema com base numa matriz concetual e estabelece a noção de escolaridade básica obrigatória atribuindo-lhe seis anos de escolaridade; a terceira, com base nesta matriz, altera o número de anos da escolaridade obrigatória de seis para oito anos e reforça as diretrizes no sentido da implementação do potencial político educativo do sistema.

o que têm estas alterações de comum que faz delas reformas

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educativas? A introdução de mudanças profundas no sistema, das quais resultaram uma nova orientação das políticas educativas cuja profundidade e abrangência determinaram mudanças na estrutura. Cardoso (2007, p.7) refere ribeiro (1990) para afirmar que se trata de “mudanças que englobam os processos educativo e pedagógico e que culminam na reestruturação global do Currículo”. Assim, para Popkewitz (1994) referido por Pacheco (1996),

“no quadro jurídico, a reforma educativa caracteriza-se pela introdução de alterações de natureza política, ideológica, social e cultural, o que implica uma adaptação estrutural do sistema em função das mudanças que se quer introduzir revelando-se, desta forma, parte de um processo de regulação social. Estas alterações resultam de novas propostas que se projectam nos objectivos, nas estratégias, na prossecução de prioridades, em função dos pressupostos de inovação, renovação, mudança e melhoria, com o fim de introduzir algo novo” (Cardoso, 2007, p. 7).

Assim sendo, o que particulariza as três reformas verificadas?

A primeira decorre das condições do País pós independência, em que se assumiu

“como uma das prioridades o incremento do sistema educativo, da capacidade de acolhimento e da sua a qualidade identificados como um dos pilares de suma importância para a viabilização do país, enquanto estado independente, onde era urgente a formação e o desenvolvimento de competências nos indivíduos tornando-os capa-citados para o governar e contribuir para o seu integral desenvolvi-mento” (Cardoso, 2003, p.55).

Partindo destes pressupostos cria-se o sistema educativo que, até

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à formulação da LBSE/1990, partiu da estrutura e funcionamento, vinda do regime colonial, e foi sendo reforçada com mudanças concetuais e na orientação educativa visando prioritariamente a formação e a satisfação interna de quadros para sustentar o sistema de ensino e formação, com como a satisfação de outros setores de atividade económica, política e so-cial.

A segunda, por seu lado incorpora já com sentido e significado de estruturação do percurso, da absorção e adaptação às tendências globalizadas da educação. nesta perspetiva,

“A reforma do ensino dos finais do séc. XX teorizou e absorveu as alterações ditadas pela evolução do sistema educativo e introduziu propostas de adequação profundas, de modo a dar respostas às novas exigências decorrentes das transformações políticas, sociais e económicas que se verificaram no país. Assim, novos figurinos surgiram para legitimar a organização e a fundamentação dos ensinos escolar e de adultos” (Cardoso, 2003, p.1).

Em termos estruturais, nos termos da LBSE/1990, estes figurinos ditam a institucionalização da escolaridade básica obrigatória em seis anos de escolaridade, reinterpreta todo o sistema educativo absorvendo mudanças emergentes e integrando legalmente tendências com forte aproximação ao sistema educativo português. Simultaneamente projeta a autonomização do Ensino Superior.

Além disso,

“reafirma o papel do Estado na elaboração, coordenação, execução e a avaliação das políticas educativas em harmonia com o Decreto-Lei nº 116/87 que consta da Lei Orgânica1 do Ministério da Educação Ciência

1 Lei orgânica do Ministério da Educação e cultura, Decreto-Lei nº 116/87, publicada in Boletim oficial, nº44 de 6 de novembro de 1987. Com as últimas eleições os Desportos passa para a tutela do MEC, passando a ser designado por Ministério da Educação Cultura e Desportos. Além dos ajustamento que

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e Cultura que, no seu Capítulo I, artigo 1º, preceitua que “o Ministério da Educação Ciência e Cultura é o departamento governamental encarregado de propor, coordenar e executar as políticas em matéria de ensino pré-escolar, básico, secundário e superior, de qualificação de quadros, de ciência, investigação e tecnologia” (Cardoso,2007, p. 64).

A terceira, que se vive no País atualmente, a decorrer da publicação do DLBSE/2010,que veio introduzir uma nova dinâmica, não só porque alarga a escolaridade obrigatória para oito anos, mas porque tem a pretensão de implementar diretrizes curriculares herdadas da Lei anterior e que, não foram objeto de atenção até ao momento: o ensino técnico profissional, a educação especial e a mudança da abordagem curricular no processo pedagógico. Apesar de serem conquistas da Lei anterior, achamos que não foram percecionadas com tanta lucidez como se quer, hoje, e que fez dessas mudanças cernes da inovação no currículo e na sua gestão, no sistema educativo caboverdeano.

CURRÍCULO, PLANIfICAÇÃO E AVALIAÇÃO

Criado o contexto, detenhamo-nos sobre as diretrizes curriculares, mais particularmente a ação do professor, ou seja, a gestão do currículo em contexto pedagógico. O professor é um agente programador do currículo e seu gestor pedagógico, sendo privilegiado, na cadeia educativa, por ser quem efetivamente faz o currículo acontecer, hoje discute-se no sistema educativo caboverdeano a orientação do processo curricular com enfase na mudança de paradigma.

quando referimos as reformas, assinalamos a questão estrutural. Aqui, importa discutir as conceções curriculares que circundam estas está condição implica não há alterações substanciais a registar.Em execução da Lei orgânica de 1987 aprova-se a nova Lei orgânica de 1990 (em anexo III) e a 1997 com vista à sua adequação às novas orientações do sistema educativo.

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reformas, para se perceber a ação desejada do professor no processo pedagógico, sendo que, basicamente existem dois paradigmas dominantes para a definição do currículo escolar: o modelo tradicional que tem as suas raízes, no modelo Tyleriano de pedagogia por objetivos e o modelo da pedagogia por competência, derivado da evolução do primeiro no sentido da integração, no ato pedagógico, das experiências prévias de alunos e professores, bem como a determinação para a autonomização do aluno e a redefinição de papéis curriculares de aluno e professor.

A primeira aceção “ absorve e defende três campos fundamentais para a selecção dos objectivos curriculares: o aluno, a sociedade e o conteúdo que deve ser ensinado (…) rege-se por objectivos e finalidades, predefinidos e concretos (…) através da prescrição curricular normativa de experiências educativas (…) em particular, por experiências de aprendizagens (Cardoso, 2003, p.12).

A segunda baseia-se no modelo pedagógico por competências (Pacheco, 1996/2001; Cardoso, 2007), na conceção anglo-saxónica e pedagogia da integração (Roegiers, 2004), na conceção francófona. Este modelo reflete o currículo como “um discurso dialético, por uma organização participativa, democrática e comunitária e uma ação emancipatória” (Kemmis, 1986 p.144), resultante dos interesses e das experiências desejadas por todos quantos participam nas atividades escolares e de acordo com os seus interesses, grau de intervenção e poder de decisão. Neste, a ação do professor, como propõe Tardif (2002) citado por Gomes et al (2006, p. 231) deve ser marcada por uma pedagogia que

“priorize a «tecnologia da interação humana, colocando em evidência, ao mesmo tempo, a questão das dimensões epistemológicas e éticas», apoiada necessariamente em uma visão de mundo, de homem e sociedade. neste sentido, uma prática pedagógica precisa ter dinâmica própria, que lhe permita o exercício do pensamento reflexivo, conduza a uma visão política de cidadania e que seja capaz

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de integrar a arte, a cultura, os valores e a interação, propiciando, assim, a recuperação da autonomia dos sujeitos e de sua ocupação no mundo, de forma significativa”.

na expetativa de descolar do modelo por objetivos para o modelo curricular por competências, por forma a corresponder às orientações das políticas curriculares, o professor deverá desenhar a sua ação articulando currículo, planificação e avaliação, num sistema interativo, onde é fundamental a perceção dos papéis curriculares na gestão curricular, no ato pedagógico e nas intervenções complementares da ação educativa.

Invariavelmente, a educação formal apresenta um programa de trabalho ao professor e é na abordagem deste programa que reside o cerne da transformação desejada pelas orientações curriculares integradas nas duas últimas reformas educativas, pretendendo o afastamento da pedagogia por objetivos e a adesão docente à pedagogia por competências, ou da pedagogia da integração conforme designação assumida pela Unidade de desenvolvimento Curricular do Ministério da Educação, a laborar sobre o assunto desde 2006.

Partindo do pressuposto de que estes paradigmas coexistem neste e noutros sistemas de ensino, como se organiza o professor para integrar a pedagogia por competência nas suas práticas curriculares e de avaliação? A questão remete-nos para os modelos de planificação, gestão, avaliação assumidos pelo professor e a revisão dos papéis no espaço pedagógico.

A planificação consiste no desenvolvimento de uma estrutura física ou mental de organização do conteúdo a ser gerido em sala de aula com vista a atingir objetivos curriculares. Segundo zabalza (1997) trata-se de uma forma de organizar o conhecimento necessário para alcançar os objetivos curriculares e pedagógicos. Ou seja, “consiste em ordenar o curso da acção que se pretende seguir, dando-se-lhe um sentido prático e orientado para as direções desejáveis” (Pacheco, 2001, p. 105).

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A realização da atividade pedagógica, tendo por base a pedagogia por competências, deve primar pela realização do modelo de planificação que permita fazer uma previsão dinâmica e flexível (Leite,1999) do conteúdo a ser trabalhado, integrando a noção da interação pedagógica e das experiências prévias dos alunos, bem como a avaliação com caráter contínuo e formativo.

o modelo de planificação que dá essa possibilidade é o proposto por yinger (1977), geralmente designado por modelo aberto, que pretende a planificação concebida entre o que deve ser com o que pode ser (Pacheco, 2001). Admite a centralidade do aluno nos processos de ensino e de aprendizagem e defende uma atuação processual do professor, para promover um percurso de apropriação de conhecimentos gradual e acompanhado pelo aluno. Neste processo o aluno é visto como sujeito singular, com identidade e percurso de formação próprio.

Para este modelo, o plano de aula é um guião da ação do professor, que deve ser flexível atendendo à reação do aluno. Além disso, o professor faz a gestão do currículo assumindo-se como mediador entre o aluno e o conhecimento, passando de executor a decisor e gestor curricular, no exercício de “ fazer aprender” (Roldão, 1999). Mais ainda, deve entender a relatividade do conhecimento e predispor-se a aprender enquanto ensina, explorando, pela investigação e pela relação pedagógica, novos domínios ou novos conhecimentos, tornando-se num prático reflexivo, num investigador da sua prática docente, com vista à superação científica técnica e metodológica.

O aluno assume um papel determinante na recontextualização do currículo, permitindo-se-lhe ter atitude critica, interventiva e proativa em relação ao conhecimento, percebendo-se assim o peso da individualidade e da identidade no desenvolvimento do currículo. o currículo molda-se em função do aluno na sua pluralidade.

A gestão do currículo integra a avaliação quanto ao modelo e quanto aos instrumentos de recolha de evidências sobre o desenvolvimento das

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competências cognitivas, físicomotoras e relacionais do aluno. A dimensão relacional ganha maior expressividade em relação ao modelo pedagógico por objetivos, sem que seja entendido como uma desvalorização, por exemplo, das competências de foro cognitivo.

A avaliação pedagógica, enquanto a formulação de um juízo de valor sobre o desempenho do aluno (Pacheco, 2001; Alves, 2004), acompanha esta visão de gestão do currículo da alçada do professor, afirmando a sua vertente formativa (Pacheco, 2001). A avaliação formativa como modelo, tem caráter contínuo e sistemático (Alves, 2004), sustenta-se de uma panóplia de instrumentos de recolha de evidencias associadas a portefólio, fichas de trabalho, testes sumativos, projetos, trabalho de grupo, entre outros, ajustadas à diversidade de ritmos de aprendizagem e perfis dos alunos e às circunstâncias em que ocorrem, permitindo ao professor, ao aluno, ao encarregado de educação demais interessados legais obter informação sobre o desenvolvimento do processo de formação do aluno e, com isso, organizar a sua ação educativa no apoio ao aluno.

A CONCLUIR…

Conhecedores das dificuldades que alguns professores e inspetores da educação têm manifestado no acompanhamento da atual reforma educativa no que se refere ao seu contributo como professores, avaliadores e educadores, cuja dificuldade de entendimento reside em perceber no que consiste esta mudança paradigmática, do ponto de vista teórico e concetual e como a podem implementar, do ponto de vista da prática pedagógica, convidamos à reflexão sobre estas notas que aqui deixamos, que embora incompletas face ao tempo de oração e quanto ao número de carateres disponibilizados para a sua textualização, podem servir de motivação para o debate em torno da problemática.

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Currículo e reformas curriculares

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Decreto-Legislativo nº2/2010, de 7 de maio – revê a Lei de Bases do Sistema Educativo de Cabo Verde.

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desAfios dA globAlizAção

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fILOsOfIA DA EDUCAÇÃO, PRÁtICAs PEDAGÓGICAs E POLÍtICAs DE ENsINO – UmA RELAÇÃO COmPLEmENtAR E

hEURÍstICA

Carlos Bellino Sacadura

Universidade de Cabo Verde

[email protected]

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REsUmO

Este artigo incide sobre os fundamentos epistemológicos da educação, abordando a sua perspetiva no âmbito da chamada “ciência normal” Khuniana, segundo a qual esta se limita a aplicar modelos, métodos e valores estabelecidos no âmbito de um paradigma ou matriz disciplinar. A docência e educação são vistas como tarefas meramente funcionais e de cumprimento de objetivos delineados exteriormente aos docentes. Inversamente, a ciência é concebida em termos de invenção, criatividade e crítica, na nova epistemologia pós-positivista. Aplicando esta visão à problemática educacional, aborda-se a função do professor como profissional reflexivo, que deverá implicar novos modelos de formação de docentes, e a importância da investigação em Filosofia da Educação para repensar a teoria e prática pedagógica, assim como as políticas de educação em Cabo Verde.

Palavras-chave: epistemologia; paradigma; matriz disciplinar; pedagogia; Filosofia da Educação.

ABstRACt

This paper deals with the epistemological grounds of education, viewed through the Khunian perspective of the “normal science”, which implies the mere application of models methods and values developed within a paradigm or disciplinary matrix. Teaching and education are viewed as simple application of objectives exterior to their intervention. In the new post-positivist epistemology, science is conceived as invention, creativity and critics. Applying this view to education, emerges the function of the teacher as a reflexive professional, which implies new models of teachers formation, and the importance of Philosophy of Education to rethink

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pedagogical theory and practice, as well as the politics of education in Cape Verde.

Keywords: epistemology paradigm; disciplinary matrix; pedagogy; Philosophy of Education.

INtRODUÇÃO

Esta comunicação visa compreender a problemática atual das teorias e práticas da educação nos seus fundamentos metodológicos, epistemológicos, estéticos, éticos e axiológicos, recorrendo aos instrumentos conceituais da ciência, da filosofia e da sociologia contemporânea. num tempo de crise dos paradigmas e fundamentos clássicos de educação, ciência e sociedade, como se pode caracterizar o presente, para pensar a teoria e praxis educacional não basta recorrer a teorias ou práticas institucionalizadas, sendo preciso reequacionar as próprias estruturas conceituais em que assenta a reflexão e ação educativa, os seus métodos, objetivos e políticas.

A abordagem da problemática educacional que se pretende desenvolver neste estudo é de tipo sistémico, incidindo nas interações entre filosofia, ciência, pedagogia e sociedade, encaradas como se fossem círculos concêntricos, na sua implicação mútua. Procura-se assim afastar uma visão unidimensional da educação, que tende a perspetivá-la apenas como uma técnica de ensino-aprendizagem, visando a aquisição de competências de tipo informacional e funcional – ou seja, desenvolver a capacidade para resolução de problemas e desempenho de funções no âmbito da sociedade da informação e da economia do conhecimento. Os fundamentos epistemológicos desta visão centrada na vertente tecnocientífica da educação remontam ao positivismo, por isso importa começar por fazer uma incursão na génese histórica e nos conceitos estruturantes desta corrente de pensamento, cuja atualidade assenta tanto na retomada dos seus pressupostos por algumas tendências pedagógicas e sociais hodiernas,

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como na crítica efetuada a esses pressupostos por autores e correntes centrais do pensamento pedagógico e sociológico contemporâneo. Desta crítica resultam as novas epistemologias ou nova filosofia da ciência e o pensamento pós-moderno, em rotura com o racionalismo, iluminismo e positivismo moderno, tendo as ideias da pós-modernidade influenciado o pensamento e a prática educacional na contemporaneidade.

O PARADIGmA EDUCACIONAL POsItIVIstA E O sEU ImPACtO CONtEmPORÂNEO

o paradigma subjacente a esta conceção é o da ciência moderna, resultante da revolução científica dos séculos XVI-XVII. Tendo como protagonistas filósofos como Francis Bacon e Descartes, ou cientistas como Copérnico, Galileu ou Kepler, desta revolução resultou uma matematização do real, um conhecimento de tipo quantitativo, mensurável ou experimental, e uma ciência orientada para o domínio da natureza, através da técnica. Também se foram constituindo as disciplinas/ciências, com o seu objeto próprio e domínio conceitual específico, conduzindo a uma crescente especialização, que condicionaria os tipos de formação a desenvolver nos sistemas de ensino (HEnry, 2002).

num contexto atual, o paradigma positivista teve de sofrer alterações visando a sua adaptação à era da globalização e da economia do conhecimento, diferente da economia industrial do século XIX, na qual viveu Auguste Comte, e ao serviço da qual pretendeu colocar a educação. A economia já não é baseada na produção industrial, mas assente no conhecimento imaterial, informacional, e a sociedade tornou-se no meio onde esse conhecimento circula, enquanto sociedade da informação. Mas mantêm-se os seus vetores principais: a razão instrumental, visando o domínio da natureza, segundo a fórmula baconiana de que conhecimento é poder, a perspetiva do conhecimento e da educação tecnocientífica, a

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separação entre ética, conhecimento e educação. Toda esta visão constitui um paradigma, termo que na sua origem grega significa modelo ou padrão, e que o historiador e filósofo da ciência Thomas Khun definiu como “(…) a constelação de crenças, valores e técnicas partilhadas pelos membros de uma comunidade científica.” (KHUn, 1996, p. 225). Embora limitada ao campo da comunidade científica, esta definição pode aplicar-se ao conjunto das ideias e valores partilhados por uma sociedade, dado que há uma permeabilidade entre esta comunidade específica e o todo social, sendo as técnicas e as ciências parte importante da utensilagem mental – termo usado pelo historiador Marc Bloch – de uma sociedade. o físico e filósofo da ciência Fritjof Capra emprega o termo paradigma neste último sentido, como pensamentos, perceções e valores que constituem uma visão da realidade. (CAPrA, 2008) Pode-se assim afirmar que este conceito de paradigma tem valor operatório para além da sua matriz originária no campo das ciências experimentais, podendo abarcar a própria visão do real e aplicar-se às teorias e práticas educacionais.

É através da educação que aqueles que são ainda cientistas ou educadores em formação tomam contacto com uma teoria, metodologia, um conjunto de conceitos e valores – ou seja, um paradigma - no qual se inicia e treina, para se tornar num profissional competente. Esta iniciação conceptual, metodológica e axiológica compete aos docentes ou formadores, mas também é veiculada pelos livros didáticos, que espelham o “estado da arte” em cada domínio científico, visando a transmissão dos conhecimentos disponíveis.

Em contraste com este conceito “Khuniano” de ciência, investigação e prática científica, a epistemologia de Karl Popper assenta no pensamento crítico – nos antípodas do dogmático -, na revolução permanente e na divergência – em vez do consenso -, como caraterísticas do pensamento científico. Ao invés da ciência normal, praticada por cientistas formados para aplicarem um método e pesquisarem de acordo com problemas ou

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questões que devem ser resolvidas de acordo com regras estabelecidas – à semelhança de um jogo de xadrez -, a ciência seria sobretudo uma atividade “extraordinária” e revolucionária, não marcada pelo hábito, uniformidade ou dado, mas pela imaginação, invenção, inovação ou criatividade, e o questionamento ou problematização não se efetuam num quadro pré-estabelecido, paradigmático, uniforme, ou “normal”, mas no âmbito de uma crítica dos quadros de pensamento, métodos ou conceitos estabelecidos e colocação de novos questionamentos, fora do enquadramento conceptual no qual o investigador foi formado – aquilo que Khun designa como ciência extraordinária.

Também a epistemologia popperiana se pode aplicar ao campo da educação e das ciências humanas, porque incide sobre a própria estrutura da racionalidade, e não apenas o conhecimento disciplinar. Os processos de ensino e aprendizagem, vistos à luz desta perspetiva epistemológica, passam a ser vistos, não como uma atividade normalizada ou uniformizada, mas como uma prática crítica, criativa, imaginativa ou inovadora. Aplicando à educação o conceito de paradigma, teríamos assim uma polarização entre dois paradigmas de ensino-aprendizagem opostos, assentes em dois conceitos antinómicos de ciência e educação, aos quais corresponderiam duas interpretações sobre o que é ser professor e estudante. A primeira perspetiva é a da ciência normal, intra- paradigmática, descrita por Popper como produto e produtora de um ensino e aprendizagem deficiente:

“Acredito (…) que todo o ensino universitário (e, se possível, de nível inferior) devia consistir em educar e estimular o aluno a usar o pensamento crítico. o cientista normal, descrito por Khun, foi mal ensinado. Foi ensinado com espírito dogmático; é uma vítima da doutrinação. Aprendeu uma técnica que se pode aplicar sem perguntar a razão (…), não é realmente um problema fundamental que está preparado para enfrentar; é antes um problema de rotina, um problema de aplicação do que se aprendeu(PoPPEr, Karl, 1992,

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in LAKATOS e MUSGRAVE (org.), 1992, pp.52-53)”.

Tanto a docência e os modelos pedagógicos, como a estrutura organizacional, a definição dos fins ou missão das instituições de ensino, e as políticas de educação – os níveis “micro”, “meso” e “macro” da educação, se desenvolvem no âmbito desta tensão essencial entre as teorias e práticas educacionais intra-paradigmáticas ou normais, inseridas numa certa tradição ou em modelos estabelecidos, mantendo-se uma certa continuidade na ciência e praxis educativa, e a inovação na reflexão e ação pedagógica, ou nas políticas de educação, em rutura com a tradição e em descontinuidade com os modelos vigentes.

CONstRUtIVIsmO EDUCACIONAL, AUtONOmIA E PEDAGOGIA REfLEXIVA

No campo da educação, o docente tem sempre uma adesão a teorias e métodos que adota consciente ou inconscientemente. Mas o professor dotado de capacidade crítica, autónoma e reflexiva, em vez de se limitar a aplicar essas teorias ou métodos e manter inalterável a sua prática, consegue reestruturá-la, criticá-la ou até reinventá-la, tanto em fases pontuais da sua ação ou do seu percurso formativo, como na sua prática quotidiana. Face aos novos saberes, novas tecnologias, valores e estruturas sociais, económicas e políticas, o docente não pode limitar-se à funcionalidade “normal” de transmissão e aplicação de modelos de educação pré-concebidos, nem o aluno ser um mero recetor de informações. Ambos terão de aprender a construir o conhecimento e a tornarem-se sujeitos autónomos, críticos e reflexivos, tanto no plano académico como no campo sociopolítico e ético.

Conceber a docência como uma tarefa intelectual – crítica e reflexiva – poderia parecer uma redundância ou tautologia, porque o docente seria por definição, e “a priori”, um intelectual, distinto do funcionário ligado ao Estado ou ao ensino privado, para o qual se exigiriam sobretudo

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competências técnicas. no entanto, a massificação e burocratização do ensino tornou-o cada vez mais numa tarefa com objetivos funcionais, uma educação para o saber-fazer, e uma aprendizagem das competências técnico-profissionais exigidas pelo mercado e pela economia do conhecimento, avaliada sobretudo em termos quantitativos e pragmáticos. Um novo paradigma de ensino-aprendizagem implica a transformação deste modelo de “funcionarização” ou “normalização” da docência, ligado à massificação do ensino e da cultura, em direção a um modelo reflexivo, personalizado, crítico, e autónomo de ensino. Sem uma mudança das teorias-filosofias subjacentes às políticas de educação e às práticas pedagógicas, não poderá haver qualquer alteração nos projetos educacionais, tanto ao nível “macro” das estratégias internacionais – veja-se o caso da UNESCO, organismo das nações Unidas para a ciência e cultura – de educação, como ao nível “meso” das políticas nacionais de ensino concebidas ao nível governamental, ou ainda ao nível “micro-educacional”, dos projetos concebidos no âmbito das instituições de ensino, equipas de docentes/investigadores ou individualmente.

As reformas da educação, que constituem um dos principais instrumentos para reestruturar o ensino e já ocorreram em diversos momentos em Cabo Verde, têm permanecido aquém dos objetivos propostos, mantendo-se a continuidade das teorias e práticas educacionais, ou até conduzindo a impasses e bloqueios, tanto devido à sua conceção em gabinetes governamentais, longe da experiência adquirida pelos docentes ou gestores inseridos no espaço académico, como por se ter pensado a reforma sem reformar o pensamento – ou seja, pretendido implementar uma nova estrutura educacional pensando-a a partir de conceitos que continuam inalterados (MorIn, 1999).

A desvalorização da componente filosófica, cultural, social, ética, estética ou axiológica, da educação, e das competências que lhes correspondem, a favor da mera competência técnica, tornou os docentes

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meros executores passivos de políticas, métodos, currículos e objetivos concebidos sem a sua participação:

“A tecnologização do ensino significou precisamente este processo de separação das fases de conceção das de execução, segundo o qual os docentes foram relegados da sua missão de intervenção na decisão e na planificação do ensino (…) acabando a sua função por ficar reduzida à de meros executores de programas e pacotes curriculares (…), ao mero cumprimento das prescrições externamente determinadas, perdendo de vista o conjunto e o controlo sobre a sua tarefa”. (DOMINGO, 2003, pp.18-19)

RECOmENDAÇÕEs E sUGEstÕEs PRÁtICAs

Desta situação resulta a importância de desenvolver a investigação em educação – tanto nas Ciências da Educação como na Filosofia da Educação – em Cabo Verde, sendo as Universidades espaços privilegiados para esse fim, através da implementação de linhas de pesquisa, núcleos ou centros de pesquisa multidisciplinar em educação, e pós-graduações – mestrados e doutoramentos, assim como a realização de conferências nacionais ou internacionais. Também no âmbito da formação de professores, esta pesquisa poderia ser fundamental para formar os docentes cabo-verdianos como profissionais reflexivos – um perfil que pode existir em casos particulares, individualmente, mas ainda sem dimensão institucional. os saberes e experiências adquiridos nestas atividades e instâncias devem poder servir para orientar as práticas pedagógicas e as estratégias de educação em Cabo Verde, no horizonte do século XXI.

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DEsIGUALDADE sOCIAL NO ACEssO AO ENsINO Em CABO VERDE: RELENDO tRAJECtÓRIAs DE EsCOLARIzAÇÃO DE

EstUDANtEs DE mEIOs sOCIAIs DEsfAVORECIDOs

Crisanto Barros

Universidade de Cabo Verde

[email protected]

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REsUmO

no decurso das últimas duas décadas, em Cabo Verde têm surgido diversos estudos sobre o processo de evolução e expansão do sistema de ensino formal (Afonso, 2002; Moniz, 2009; Pereira, 2010; Carvalho, 2011). Todavia, poucos têm sido os estudos que examinam, de forma crítica e mais incisiva, por exemplo as relações entre a desigualdade social e o processo de escolarização de estudantes provenientes dos estratos sociais mais desfavorecidos. Excepção seja feita ao trabalho de Manuela Afonso (2001) que, com base nos indicadores socioprofissionais, procura relacionar sobretudo as desigualdades sociais e as oportunidades de escolarização. Este artigo pretende indagar até que ponto a teoria de reprodução social - assente na posição social e no capital cultural - consegue dar conta das dinâmicas de escolarização de crianças de meios desfavorecidos em Cabo Verde. Em termos teórico-metodológicos, baseamos na teoria da experiência de Dubet (1995) e nas contribuições de Charlot (2005) a respeito da construção da relação com o saber.

Palavras-chave: desigualdade social; desigualdade escolar; estratégias familiares; escolarização.

RésUmé

Au cours des deux dernières décennies, diverses études ont été menées au Cap-Vert à propos de l’évolution et de l’expansion du système éducatif formel (Afonso, 2000 ; Moniz, 2009 ; Pereira, 2010 ; Carvalho, 2011). Toutefois, peu d’études ont porté un regard critique et détaillé sur la question des inégalités sociales et le processus de scolarisation des élèves issus des basses classes sociales. Un des travaux qui fait l’exception est celui de Manuela Afonso (2001) qui, à partir d’indicateurs socioprofessionnels,

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cherche surtout à faire le lien entre les inégalités sociales et les opportunités de scolarisation. Cet article cherche à démontrer jusqu’à quel point la théorie de reproduction sociale, sur la base de la position sociale et du capital cultural, permet de rendre compte des dynamiques de scolarisation au Cap-Vert d’enfants issus des milieux pauvres. Sur le plan théorique et méthodologique, nous nous basons sur la théorie de l’expérience de Dubet (1995) et les contributions de Charlot (2005) à propos de la construction de la relation avec le savoir.

mots clés : inégalité sociale; inégalité scolaire; stratégies familiales; scolarisation.

INtRODUÇÃO

Este artigo constitui uma reflexão crítica a respeito da utilização da teoria de reprodução social cuja tónica assenta na posição social e no repertório cultural familiar, para dar conta das dinâmicas de escolarização de crianças de meios desfavorecidos. Para tal, em termos teórico-metodológicos, socorremo-nos das contribuições da teoria da experiência (Dubet:1995) e da construção da relação com o saber (Charlot: 2005.). neste ensaio, procuramos evidenciar, com recurso a recuperação das narrativas dos nossos entrevistados, as inúmeras estratégias individuais e familiares postas em marcha para a invenção de possibilidades de escolarização.

De modo particular, o ensino secundário em Cabo Verde nasce sob o signo da selectividade e da disparidade regional, excluindo a maioria da população em idade escolar residente longe das sedes dos liceus, primeiramente em São Nicolau, depois na cidade do Mindelo em São Vicente e, posteriormente, na capital do país, Praia (ilha de Santiago). Numa primeira fase até os anos 60, o universo dos diplomados do ensino

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secundário (1º, 2º e 3º ciclos) compunha-se de estudantes originários de famílias possidentes dos meios urbano e rural, que tinham condições de suportar os elevados custos de acesso e permanência nesse que era à época o único liceu nacional, encurtando as distâncias físicas através dos recursos económicos. As famílias mais abastadas residentes nas ilhas periféricas ao liceu adoptavam estratégias tendentes a minorar os custos com a deslocação, inscrevendo os seus filhos nas escolas particulares (explicação) locais e, posteriormente, enviando-os, no final do ano lectivo, para as escolas centrais onde realizavam exames como alunos externos.

Manuela Afonso, ao comparar a estrutura de classes com a origem social dos alunos, constata que a pequena burguesia dirigente e técnica e a pequena burguesia executante detêm uma representação muito acima do seu peso sociodemográfico. Entretanto, essa autora atenta para uma presença não desprezível de estudantes descendentes do operariado (15%) e do campesinato (5%), o que indicia que na escola secundária passam algumas trajectórias de mobilidade social ascendente (Afonso, 2002: 194).

Se é verdade que as posições sociais das famílias condicionam as oportunidades de escolarização, como sugerem os trabalhos consistentes realizados por Bourdieu (1989) e sua equipa de pesquisa, é preciso não obliterar que no interior de uma posição social muitas famílias conseguem resultados escolares diferenciados. Outras vezes indivíduos oriundos de famílias em posições sociais inferiores alcançam melhores resultados que aqueles que teoricamente estão numa posição social superior. Como adverte Charlot, não se deve “ter em conta apenas as posições familiares, mas interessar-se pelas práticas educativas familiares, ou seja, as atitudes em relação à escola mais do que a própria posição de classe” (Charlot,1997; Ogbuapud Charlot, 1992).

Em Cabo Verde, a presença,nos liceus, de estudantes originários dos estratos sociais mais desfavorecidos era pouco frequente e resumia-se, até à primeira metade do século XX, aos residentes nos centros urbanos

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onde se localizavam as escolas secundárias. Todavia, convém precisar que nem a proximidade nem a isenção das taxas escolares garantiam automaticamente a frequência dos pobres aos liceus, pois outros requisitos como a indumentária escolar - vestuário e calçado – e os materiais didácticos importavam custos aquém de suas reias possibilidades económicas. na verdade, a escolarização dos mesmos dependia de acções de solidariedade por parte de famílias, prelado, professores, instituições caritativas, etc.

Antes de nos debruçarmos sobre algumas trajectórias de escolarização dos jovens de famílias populares, convém pontuar algumas balizas teóricas a partir das quais lançaremos um olhar sobre esse processo.

BREVE EXCURsO tEÓRICO sOBRE A DEsIGUALDADE sOCIAL E DEsIGUALDADE EsCOLAR

Bourdieu e Passeron, na obra Les Héritiers, postulam que as camadas mais favorecidas são aquelas que logram melhor desempenho no decurso de sua trajectória escolar. Asseveram, referindo-se às evidências estatísticas, que “le système scolaire opère, objectivement, une élimination d’autant plus totale que l’on va vers les classes les plus défavorisées”, sendo a origem social de entre outras determinantes aquela com maior influência em todos os níveis de experiência social” (1985: 11 a 23).

Num outro estudo conjunto sobre o sistema escolar, Bourdieu e Passeron pretendem explicitar, de um lado, como o sistema de ensino constitui, do ponto de vista institucional, um aparelho de imposição simbólica da cultura burguesa legitimando a reprodução das desigualdades sociais. Do outro, numa perspectiva individual, como o habitus de classe incorporado no decurso do processo de socialização assegura a reprodução legítima das posições de origem (Dubar, 2000).

Os aportes teóricos de Bourdieu e Passeron a respeito do processo

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de reprodução social através da educação conheceram uma larga utilização na Europa e nos países subdesenvolvidos onde as desigualdades sociais, em razão das fragilidades de Estado social, ganharam enormes proporções.

Suas contribuições, ainda que tenham revelado profundas desigualdades de oportunidades de aquisição de capital escolar no sistema educativo francês, são insatisfatórias para explicar como os próprios agentes, no decurso da sua trajectória social, conseguem romper com as amarras vinculadas à sua posição no espaço social.

Conforme afirma Dubar (2000: 80), a abordagem de Bourdieu dá conta “de uma forma de socialização que permanece sem dúvida maioritária – a de reprodução de posições relativas e as disposições ligadas a essas posições. Ela privilegia a continuidade em relação às rupturas, a coerência em relação às contradições, permitindo explicar a reprodução da ordem social, mas responde mal à produção de mudanças.

Para Charlot, Bourdieu, sob certos aspectos, filia-se à mesma tradição que Durkheim ao construir uma sociologia assente num sujeito aprisionado. na verdade, esse autor ao criticar o sujeito da filosofia clássica, livre e racional, envolve-se na redoma de apresentar uma saída epistemológica que implica uma quase anulação do sujeito. Eis por que o sujeito bourdieusiano é um ser social, entretanto, refém dos mecanismos de socialização a que está submetido (Charlot, 1992: 37).

nesse sentido, Bourdieu ao introduzir na sua teoria um lugar para o psiquismo, este não é pensado em referência a um sujeito, mas a um psiquismo de posição, negligenciando, como adverte Charlot, o facto de que o indivíduo não interioriza o mundo, ele se apropria dele na lógica do sujeito – o que é totalmente diferente.Todavia, as teorias de reprodução de que Bourdieu é um dos melhores expoentes não conseguem explicar os casos marginais. Por exemplo, como é que uma parcela das crianças de famílias desfavorecidas alcança sucesso nas escolas e uma fracção de camadas favorecidas não o obtém (Charlot, 1992: 20).

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Para Charlot, a força da sociologia de Bourdieu é de “relembrar incansavelmente contra a filosofia de consciência que o sujeito é social, mesmo que pareça ser o mais íntimo. Entretanto, esta sociologia exclui o sujeito da psicologia”. Se é verdade que todo o sujeito pertence a um grupo social, ele não se reduz a essa pertença. Ele interpreta essa posição, faz o juízo do mundo, age sobre ele, e é confrontado com a necessidade de aprender diversas formas de saber – e sua relação com o saber é o efeito desses múltiplos processos (Charlot, 2005: 39 a 41).

na perspectiva de Charlot, a abordagem de Bourdieu comporta em si várias limitações. Primeiro, o facto de decalcar a posição social das famílias das categorias socioprofissionais gera alguma imprecisão. Como demonstra Laurens (1992), “la position sociale des grands-parents pouvait avoir un effet sur la position scolaire des enfants, notamment en cas de contre-mobilité (le fils rejoint une position qui était celle du grand-père et avait été perdue par le père” (Laurensapud Charlot, 2005).

A segunda limitação prende-se com o facto de a homologia ser uma relação matemática e não um princípio de efectividade. o problema reside em como se processa a reprodução, pois a posição de uma criança não é uma herança que passaria de uma geração à outra pela vontade testamentária, ela se produz por um conjunto de práticas familiares. o sucesso escolar não é apenas uma questão de capital, mas de trabalho, mais precisamente de actividades, de práticas. Por exemplo, a prática religiosa e o militantismo podem, em contextos específicos, ter um efeito sobre o desempenho escolar das crianças (ibidem: 22 a 23).

numa perspectiva crítica em relação aos aportes de Bourdieu, a abordagem de François Dubet pretende escapar ao determinismo social inerente a uma abordagem sistémica da sociedade na qual o indivíduo se subsume, através da socialização, aos imperativos do mundo social. Ele funda a sua teoria sobre a experiência social a partir da reconstrução da sociologia compreensiva de Max Weber, que assenta no sentido que os

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indivíduos imputam às suas acções (Dubet, 1995; Weber, 1991: 3 a 35).

Para Dubet, cada experiência social resulta da articulação de três lógicas de acção: a integração, a estratégia e a subjectivação. Assim, na lógica de integração, o actor se define pelo seu pertencimento, tendo em vista manter ou reforçar no seio de uma sociedade considerada enquanto um sistema de integração. Na lógica de estratégia, o actor busca realizar a concepção que ele faz dos seus interesses numa sociedade concebida como mercado. no registo de subjectivação social, o actor se representa como um sujeito crítico confrontado a uma sociedade definida como um sistema de produção e de dominação” (1995: 111;Cf.Duru-Bellat, 2002).

Na concepção desse autor, “o indivíduo torna-se um sujeito autónomo na dissidência e no conflito, na distância através da crítica, da capacidade de análise e de explicação mobilizado pelos actores que recusam ser reduzidos às categorias de integração” (Dubet, 1995: 255).

Em suma, a escolarização é resultado de um complexo processo de interacção social em que o indivíduo, portador de múltiplas significações, aprende e se apropria do mundo, construindo-se nessa dinâmica.

Antes de explicitarmos as diversas carreiras de escolarização de estudantes de meios populares, afigura-se-nos importante caracterizar as suas diversas situações de pertença familiar, enquanto factor essencial que permite situar os contextos a partir dos quais definem suas estratégias individuais e colectivas.

RELENDO tRAJECtÓRIAs DE EsCOLARIzAÇÃO DE EstUDANtEs DE ORIGEm sOCIAL POBRE

Para a compreensão da trajectória de escolarização, recorremos ao conceito de carreira proposto por Becker cuja perspectiva teórica articula várias dimensões de análise no processo da construção da carreira individual

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(Martinielo et al., 2010: 9). Segundo Becker a carreira constitui um processo de mudança de status ou posição que deve ser analisada não como uma sucessão lógica de etapas mas, antes pelo contrário, como um processo de mudanças possíveis condicionadas por uma série de factoresa diferentes níveis, a saber: macro, micro e intermédio (Beckerapud Martiniello, 2010: 12 a 13).

Para quem pertencia a segmentos das camadas populares, o acesso e a permanência no ensino elementar, na década de 60 do século XX, implicava um intrincado processo de escolarização, como nos relata os nossos entrevistados:

“(…) Eu morava em Achada Funda. Fui a escola em Achada Galego, fui ao Engenhos, depois fui ao Gil Bispo. Tudo a pé. Estudar não era coisa fácil, era preciso ter muita vontade, muita gana para andar meio mundo para chegar a escola e voltar a casa e fazer os trabalhos domésticos. (…) Entrei na escola oficial com 9 anos por que o meu pai não encontrara vaga para me acolher em Assomada, pois as pessoas que residiam na vila tinham mais chances de matricularem os seus filhos. Iniciei as primeiras letras na escola dos padres, mas não me serviu de muita coisa porque reprovei-me logo na 1ª classe na escola oficial (…) (Entrevistado 1).

Um outro entrevistado, conta-nos os seus primeiros passos de escolarização nestes termos:

“ (…) Fiz o primário no ensino particular. o meu professor, chamo-lhe com muito carinho, era senhor José Alves, foi morar nos órgãos neste tempo. Foi a pessoa que me marcou de forma decisiva. quando fui à escola aprender o A B C, tinha 10 anos. Ele tinha uma oficina de carpintaria, uma sala de aula ao lado mercearia. Marcou-me porque ele era uma pessoa muito atenta aos alunos. Na mesma sala conviviam crianças de diferentes níveis (turma composta). (…) Fiz a cartilha e

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depois passei para a 1ª classe. Ele dava castigos horríveis! no ano seguinte, fui matriculado na escola oficial em 1960. Poucas crianças iam à escola nessa época, pois a maioria dos pais era analfabeta e às vezes não via na escola muita utilidade. A vida era trabalhar para sobreviver e por isso os filhos ajudavam nos trabalhos agrícolas (…)” (Entrevistado 2).

Ambas as situações revelam que para uma franja da população rural o acesso ao ensino primário não se inicia pela via tradicional de escolarização através das instituições oficiais – as antigas escolas centrais ou do rei - cravadas nos centros urbanos das vilas e cidades. As escolas paroquiais e particulares formavam vias de acesso privilegiadas para este universo populacional, cujas famílias tinham de conciliar os afazeres domésticos para garantir a sobrevivência e, ao mesmo tempo, entrever na escolarização outras oportunidades. O ingresso tardio no ensino primário resulta da incipiente cobertura da rede escolar no meio rural, da situação económica precária em que vivem as famílias colocadas sob os imperativos da luta pela subsistência e do baixo capital cultural, tornando a escolarização mais distante dos seus horizontes.

Assim, nos concelhos do interior de Santiago, as iniciativas importantes de escolarização e consciencialização das famílias das localidades encravadas devem-se às acções de importantes figuras religiosas. Em Santa Catarina foi a acção do padre Louis Allaz1 nos finais da década de 50, que impulsionou uma grande vaga de escolarização.

De acordo com o nosso informante, as estratégias adoptadas pelo referido vigário para alargar o processo de escolarização à população campesina eram diversas. Desde a sensibilização das famílias mais pobres para inscrição das crianças nas escolas, especialmente das meninas até então excluídas do sistema, até à mobilização das mesmas para a co-participação no processo de financiamento da expansão do ensino. nessa 1 Louis Allaz, afecto à Congregação dos Espiritanos, é originário da Suíça. Chegou a Cabo Verde, em 1947, tendo sido vigário da paróquia de Santa Catarina.

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missão, ele contava com o apoio dos serviços da educação no pagamento do salário dos professores.

O processo de alargamento da escolarização primária através da criação das escolas paroquiais requeria, entretanto, uma participação das famílias nos custos do seu funcionamento. Essa prática informal, amiúde obliterada nos registos oficiais, revela que o sistema de ensino não era de todo gratuito para alguns nichos do meio rural cujos primeiros contactos com a escolarização se estabelece um século após a sua regularização no arquipélago a partir de segundo quartel do século XIX.

Um dos nossos entrevistados, actualmente docente do ensino superior e antigo aluno da escola paroquial no concelho de São Miguel (ilha de Santiago) conta-nos que durante o seu processo de escolarização primária, em 1959, as famílias comparticipavam com o que apelidavam de “real de sabro” (real de sábado). não descortinamos o significado preciso dessa expressão, mas indicia que a palavra real simbolize, provavelmente, um valor com que as pessoas contribuíam aos sábados.

na realidade, tratava-se de uma contribuição em géneros que cada família atribuía ao professor em compensação pelo ensino ministrado. Cada professor acordava com os familiares a contribuição a ser feita, sendo que aqueles que não dispunham de condições não o faziam, o que, entretanto, não era habitual. Praticamente todos procuravam co-participar com uma oferenda ao professor, nomeadamente em géneros alimentícios, desde ovos, milho, feijão, papaia, banana e até feixe de lenha e o apoio no cultivo.

normalmente, quando se retrata o processo de escolarização tende-se a homogeneizar as oportunidades de acesso, em geral, mais facilitado no espaço urbano, onde se localizava a maioria das escolas, apesar de albergar uma menor demografia, quando, na verdade, existiam disparidades acentuadas e estratégias familiares distintas para a viabilização do ensino. nesta perspectiva, quando se refere ao processo de escolarização no campo torna-se também importante considerar outros aspectos, cuja memória não

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é de todo traduzida nos boletins oficiais ou nos documentos de divulgação do Estado.

Para largas franjas da população rural cabo-verdiana, a escola primária era nos finais dos anos 60 ainda um espaço distante do seu habitat. A frequência à escola primária exigia um enorme esforço familiar e individual a quem era oriundo do interior de Santiago, Santo Antão, Fogo. Mesmo num espaço urbano como a cidade a Praia até os derradeiros anos da década de 40, existia, apenas uma escola central localizada no Plateau. Em suma, o acesso e a conclusão dos estudos primários mantiveram-se até aos anos 60 extremamente selectivos, beneficiando especialmente os estratos médio e alto dos centros urbanos, onde existia, na sede dos concelhos, pelo menos uma escola central e, em alguns casos, postos escolares nos bairros periféricos. o alargamento das oportunidades de acesso à escolarização primária no meio rural a partir dos anos 50 deve-se, numa primeira fase, às acções de padres e congregações religiosas, em maior expressão católicas, que pretendiam elevar o nível educacional e cultural das populações no quadro da renovação das acções da diocese de Cabo Verde.

No tangente ao ensino secundário, até a década de 60, poucos estudantes das famílias muito pobres das outras ilhas acediam ao liceu em São Vicente. O alargamento das oportunidades ocorre em resultado dos efeitos das políticas sociais das congregações religiosas, do Estado tardo-colonial, com a institucionalização do ciclo preparatório e com a abolição dos exames de admissão ao liceu (Afonso, 2002; Moniz, 2009; Carvalho, 2011), e das remessas dos emigrantes que tornam o rendimento familiar mais estável e seguro, capaz de propiciar alguma mobilidade espacial. Vejamos o que nos diz um entrevistado que percorre o processo de escolarização nos finais dos anos 70:

Para as famílias pobres do interior de Santo Antão, a continuidade do ciclo de escolarização em São Vicente dependia essencialmente da existência de redes familiares e de parentesco capazes de proporcionar-lhes a estadia

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e alimentação, ainda que esta seja feita de forma compartilhada através do envio de géneros alimentícios e outros bens. o facto de ser oriundo de uma família humilde, cujos irmãos não ultrapassaram as barreiras do primário, o futuro se lhe apresenta não como uma repetição do passado, mas como algo a ser construído e redireccionado. Diz ele:

“(…) no liceu Ludgero Lima era um aluno mui empenhado, pois sabia o que os meus pais esperavam de mim. Eles faziam muito esforço para me manter em São Vicente. Eu guardava a imagem dos meus irmãos que haviam concluído apenas o primário. (…). Após a conclusão do liceu, ganhei do Governo uma bolsa e fiz a minha formação superior (…)”(Entrevistado 4).

Para as camadas sociais mais desfavorecidas do interior de Santiago, o acesso ao ensino secundário torna-se possível e de algum modo previsível, com a instalação de uma secção do liceu Gil Eanes na Praia, em 1956, no antigo edifício da Serbam, no Plateau, e com criação do liceu Adriano Moreira em 1960.As vias de acesso à escolarização dependiam de dois factores importantes: as redes de afinidades familiares e as infra-estruturas religiosas de educação e formação que, à época, se resumiam à Congregação dos Espiritanos e ao Seminário de São José. A vinda ao seminário2 de muitos estudantes do interior de Santiago, em alguns casos da Praia e das outras ilhas do sul do arquipélago não se devia necessariamente à suposta vocação dos mesmos para a vida religiosa, antes pelo contrário revelava-se como única oportunidade de essas famílias desprovidas de redes familiares de apoio na Praia acederem à escolarização secundária. Afirma o nosso entrevistado o seguinte:

“ (…) Meus pais fazem parte de uma família religiosa. Fiz o primário na escola paroquial e depois consegui entrar no seminário para estudar.

2 o Seminário São José, sito na Ponta Temerosa, cidade da Praia, integra inicialmente, alguns edifícios cedidos pelo Governador de Cabo Verde, foi inaugurado em 1957. Conta o padre Caetano Pimenta Pereira que nesse primeiro ano a instituição funcionou com apenas 9 alunos (Cf- ArTILETrA nº72, nov-2005).

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(…) Era a única hipótese que eu tinha, pois sendo do Tarrafal e vir ao liceu Domingos ramos colocava o problema de onde ficar? As outras opções eram muito caras (…)” (Entrevistado 5).

Para os estudantes oriundos das famílias mais desfavorecidas, os seus recursos esgotavam-se na escolarização primária, requerendo o acesso ao ensino secundário a mobilização de novos recursos e de adopção de estratégias múltiplas. As suas redes sociais reduziam-se, por um lado, aos seus familiares e parentes (tios, primos, padrinhos, etc) que, residindo nos espaços urbanos, minoravam os custos de acesso à escolarização secundária. Por outro, à inserção em redes religiosas às quais acediam através do contacto privilegiado com o pároco local e com as congregações religiosas.

PIstAs CONCLUsIVAs

Com o advento do Estado pós-independência, no quadro de um projecto político ambicioso de transformação social, edifica-se um amplo programa de alargamento dos ensinos secundário e superior, que alteraram completamente o perfil social dos estudantes. Assim, com a implementação da reforma do ensino, consolida-se as oportunidades de formação secundária e superior dos estratos altos, amplia as dos estratos médios, outrora, obrigados a cadenciar as suas pretensões relativas ao processo formativo prenhe de incertezas. De igual modo, inclui a maioria dos estudantes originária dos estratos sociais baixos, outrora, excluída do ensino superior.

Importa realçar que se a existência, durante largas décadas, de apenas duas escolas secundárias nos dois maiores centros urbanos (Mindelo e Praia) constituía um factor de exclusão social, não é menos verdade que o acesso a essas escolas permitia um contacto de estudantes provenientes dos mais diversos estratos sociais. Assim, o sistema de ensino excludente em termos

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de acesso incluía, paradoxalmente, os estudantes mais desfavorecidos em novas redes de sociabilidade3, a que estavam desconectadas nos seus locais de origem. neste sentido, o acesso à escola secundária por ser um espaço de interacção interclassista propiciava a inserção em novas redes sociais, com implicação no acesso a recursos pedagógicos (livros, dicionários) e no processo de aprendizagem. Ademais, favorecia a aquisição de um capital social com efeitos importantes no acesso a oportunidades de emprego.

quando nos referimos à reprodução escolar das posições sociais dos estudantes, estamos a aludir a quê propriamente? Um dos aspectos evidentes no processo da reprodução escolar é que ela resulta da repartição histórica desigual das oportunidades de acesso à escolarização dos diferentes estratos sociais, que se estrutura com a edificação do sistema de ensino primário e secundário desde o segundo quartel do século XIX. Assim, a maioria da população estava ausente do espaço escolar em razão da deficiente rede de ensino e dos parcos recursos económicos e culturais de que dispunha para superar as barreiras que a fixação na periferia impunha.

Entretanto, na perspectiva de Bourdieu (2008), o acesso desigual à escolarização é a dimensão menos relevante no processo da reprodução escolar, pois esta decorre essencialmente da reprodução de um arbitrário cultural a que os grupos sociais mais favorecidos se apropriam de forma mais vantajosa. nesta perspectiva, a vivência escolar é, do ponto de vista cultural, uma extensão do habitus incorporado no seio da família, sedimentado ao longo de várias gerações.

No caso cabo-verdiano, todavia, as desigualdades sociais entre os estudantes descendentes de famílias mais favorecidas (médios e grandes comerciantes, proprietários de terra e de funcionários intermédios) e os originários dos estratos desfavorecidos (filhos de pedreiro, carpinteiro,

3 Em França, onde o acesso à escola pública obrigatória é um direito que remonta ao século XIX a segregação espacial das classes sociais impede que a escola seja um espaço de interacção interclassista, com consequências evidentes na inserção dos pobres nas redes sociais mais favorecidas e, portanto, na apropriação do capital social (Cf.Pinçonet Pinçon-Charlot, 2002: 12).

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doméstica, pescador) não implicavam, necessariamente, numa enorme desigualdade em termos de repertório cultural.

De referir que parte importante dessas famílias mais favorecidas não procedia à reconversão do seu capital económico num activo cultural valorizado pela escola (hábitos de leitura adquirida no espaço doméstico, visitas a museus, centros de cultura especializada), uma vez que esses recursos não abundavam no mercado cultural nacional e, outras vezes, nem sequer eram percepcionados como necessários para a sua auto-afirmação.

Com efeito, a relação com o saber não resulta de uma vivência cultural específica anterior, mas é adquirida na própria experiência que cada indivíduo estabelece no espaço escolar com novos colegas, professores e em alguns casos com os próprios funcionários. Eis por que uma proporção importante de estudantes de meios sociais desfavorecidos obtém sucesso escolar, mau grado as suas condições sociais adversas. o escopo desta investigação não aborda de forma sistematizada e aprofundada a experiência escolar dos estudantes a ponto de testar o alcance dessa hipótese.

De todo modo, afigura-se-nos que a transposição do modelo explicativo proposto por Bourdieu a respeito do processo de reprodução social escolar decorrente da posição social e do habitus cultural a ela associada sem se acautelar qual a natureza da desigualdade que está em causa na construção da trajectória escolar pode não ter o potencial explicativo que geralmente se supõe.

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EDUCAR PARA QUÊ?

REfLEXÕEs sOBRE A PRÁtICA PEDAGÓGICA ORIENtADA PARA O DEsENVOLVImENtO hUmANO

Dulciene Anjos de Andrade e Silva

Universidade do Estado da Bahia (UNEB) - Brasil

[email protected]

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REsUmO

o movimento científico do século XX, alterando radicalmente a visão da modernidade ao compreender os fenômenos a partir de um olhar sistêmico e complexo, empreendeu avanços significativos em vários campos do saber, inclusive no âmbito das disciplinas que fundamentam a educação, trazendo importantes implicações para a compreensão do processo de ensino-aprendizagem. Estudos passaram a apontar a necessidade de que a educação, superando o enfoque estritamente racionalista característico da modernidade, pudesse se comprometer com a formação integral do educando, orientando-se para o desenvolvimento humano em sua multidimensionalidade. Entretanto, apesar de fundamentar a formação docente e referenciar documentos oficiais responsáveis pelas diretrizes do ensino, tais proposições não têm sido in-corpo-radas à efetiva ação pedagógica docente - nem consideradas por programas e leis educativos atuais que, orientados para a crescente vocação do aceleramento escolar, ou da intelectualização precoce, têm-se distanciado do ideal da promoção do desenvolvimento humano. Ao transcender a concepção reducionista e instrumental do processo de aprendizagem integrando o pensar, o sentir e o fazer no processo formativo do educando, a Pedagogia Waldorf se apresenta como uma alternativa educacional consoante com os princípios da educação para o século XXI, indicando caminhos possíveis em direção a um fazer docente efetivamente orientado para o binômio educação e desenvolvimento humano.

Palavras-chave: educação; desenvolvimento humano; Pedagogia Waldorf.

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REsUmEN

El movimiento científico del siglo XX alteró radicalmente la visión de la modernidad al buscar una comprensión de los fenómenos a partir de una mirada sistémica y compleja. Proporcionando avances significativos en diversos campos del saber, incluso en el ámbito de las disciplinas que fundamentan la educación, trajo importantes implicaciones para la comprensión del proceso de enseñanza-aprendizaje. Estudios empezaron a enfatizar la necesidad de que la educación, superando el enfoque estrictamente racionalista característico de la modernidad, pudiera comprometerse con la formación integral del educando, orientándose para el desarrollo humano en su multidimensionalidad. Sin embargo, a pesar de fundamentar la formación docente y referenciar documentos oficiales responsables por las directrices de la enseñanza, tales proposiciones no han sido in-corpo-radas a la efectiva acción pedagógica docente - ni tampoco consideradas por programas y leyes educativos actuales que, orientados para la creciente vocación del aceleramiento escolar, o de la intelectualización precoz, se ha distanciado del ideal de la promoción del desarrollo humano. Al transcender la concepción reduccionista e instrumental del proceso de aprendizaje integrando el pensar, el sentir y el hacer en el proceso formativo del educando, la Pedagogía Waldorf se presenta como una alternativa educacional que se adecua a los principios de la educación para el siglo XXI, indicando caminos posibles en dirección a una práctica docente efectivamente orientada para el binomio educación y desarrollo humano.

Palabras-clave: educación; desarrollo humano; Pedagogía Waldorf.

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1. PARA COmEÇO DE CONVERsA...

A educação moderna, herdeira da tradição epistemológica racionalista e mecanicista, destacou-se por reproduzir a fragmentação entre as instâncias da experiência humana, instituindo um ensino orientado para a aprendizagem conceitual e promovendo a dissociação entre o pensar, o sentir e o fazer do educando. nesse contexto, o processo de ensino-aprendizagem voltou-se para o desenvolvimento do pensar, eximindo-se de integrar no currículo habilidades que, ligadas aos domínios do fazer e do sentir, pudessem tornar a educação uma experiência mais significativa para os estudantes (Andrade e Silva, 2004).

Ao hipertrofiar a razão, porém, este modelo tem gerado um profundo irracionalismo, constatado tanto na crise da educação quanto em outros problemas que afligem a humanidade. Ao centrar-se na transmissão de conteúdos, a educação racionalista pôde, na melhor das hipóteses, mostrar-se eficaz na produção de mais conhecimentos teóricos. Mas, por nem sempre promover aprendizagens significativas, não contribui para que conceitos sejam revertidos em condutas. Ademais, a civilização erguida sob o signo do saber objetivo tem gerado um grande impacto quanto à transformação da natureza, sem ocupar-se das consequências dessa ação: um enorme desequilíbrio no meio ambiente. Uma vez que os saberes adquiridos através da educação referem-se tão somente a aspectos conceituais, sendo carentes de significação e de valor, é natural que as ações dos indivíduos se mostrem apartadas da responsabilidade social.

no início do século XX, descobertas realizadas no campo da física deram impulso ao desenvolvimento de um novo modo de compreender a realidade, caracterizado por buscar a inter-relação entre os fenômenos complexos dissociados pelo olhar moderno, como corpo-mente, espírito-matéria, inteligência-afetividade, sentir-pensar-fazer... (Capra, 1982). Essa tendência tem também se expressado no pensamento educacional: vários são os estudos que têm buscado reintegrar o que fora descartado na

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educação em função da ênfase ao racionalismo estrito.

Tais estudos têm sinalizado a necessidade de se promover uma educação que, superando a abordagem conteudista e instrumental, não esteja focada apenas no desenvolvimento cognitivo dos educandos, mas que também possa considerar suas demandas emocionais e afetivas, cultivando sua sensibilidade e suas habilidades sociais, em prol do seu desenvolvimento global. Uma educação que, buscando promover aprendizagens significativas, contribua para o “apoio, estímulo e facilitação do crescimento do aluno como um ser humano, incluindo seu desdobramento cognitivo, emocional, ético, criativo e espiritual” (Armstrong, 2008, p. 48).

Embora esse movimento tenha ressignificado o conceito de educação, a prática cotidiana das nossas escolas não se tem mostrado coerente com seus fundamentos, refletindo, ainda, a concepção abstrata e mecânica do processo de aprendizagem e espelhando o enorme abismo entre o pensar, o sentir e o fazer.

Após observar que leis, programas e práticas educativas têm se mantido distantes do que sinalizam as pesquisas que refletem o novo paradigma educacional, este artigo destaca a Pedagogia Waldorf como uma alternativa que, ao voltar-se para a multidimensionalidade do processo educativo, tem se caracterizado por buscar o desenvolvimento do educando enquanto ser humano global.

2. O PARADIGmA EDUCACIONAL EmERGENtE: A tEORIA, NA PRÁtICA, é OUtRA...

os estudos de epistemologia genética realizados por Jean Piaget na primeira metade do século XX, e difundidos nas faculdades de formação de professores, nem sempre se apresentam refletidos no cenário educacional - o que revela uma das limitações geradas pelo modelo de

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educação da modernidade: a dificuldade de in-corpo-rar à prática os princípios “aprendidos” teoricamente. Em que pese o fato de as pesquisas piagetianas anunciarem que o desenvolvimento da inteligência da criança obedece a etapas caracterizadas por formas distintas e progressivamente mais complexas de organização mental (o que justifica a importância de os objetivos escolares serem estabelecidos a partir das características específicas de cada estágio de maturidade cognitiva da criança), um fenômeno muito comum demonstra o grande fosso que tem separado as contribuições dos estudos piagetianos das efetivas práticas e modelos educativos: a multiplicação de leis, documentos e programas voltados para a aceleração da escolarização das crianças.

Sob o argumento de que quanto mais cedo as crianças sejam iniciadas na alfabetização linguística e matemática melhor desempenho terão na vida acadêmica e no mercado de trabalho, tais iniciativas têm buscado uma “conexão entre a pré-escola e o ensino fundamental” e a “criação de transição suave entre ambos”, escondendo que, na maioria das vezes, “o objetivo é organizar a educação infantil do modo mais parecido possível com a educação no ensino fundamental, e não o contrário” (Armstrong, 2008, p. 78). As crianças estão começando a lidar com números e letras cada vez mais precocemente, sem ainda manifestarem a maturidade intelectual necessária para a manipulação de símbolos.

Conforme Piaget (1967), a maioria das crianças atinge essa capacidade aos aproximados sete anos, quando conseguem operar os símbolos mentalmente, demonstrando habilidade de solucionar problemas concretos. As atuais pesquisas da neurociência (Corso, 2009) também elucidam que, antes dos seis/sete anos, os prolongamentos dos neurônios da criança ainda não completaram o processo de mielinização, ou seja, os axônios ainda não foram suficientemente revestidos para permitir a passagem eficiente de impulsos elétricos - o que caracteriza a maturidade e a solidez estrutural do cérebro para atividades mais abstratas, como a

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manipulação de símbolos requerida pela alfabetização.

As consequências negativas de se desconsiderar as alterações biológicas e neurológicas de cada estágio de desenvolvimento da criança em seu processo de educação em prol de uma intelectualização precoce são preocupantes. Sintomas como angústia, dificuldade de concentração, perda de motivação têm conduzido muitas crianças e adolescentes a consultórios médicos e psicoterápicos. Por outro lado, crianças iniciadas na leitura e escrita precocemente são identificadas, em geral, por alcançarem os índices mais altos de repetência nas séries mais avançadas - além de manifestarem menos espontaneidade para a leitura do que as que foram alfabetizadas mais tarde (Currie; Thomas,1995).

o estímulo à racionalização precoce não está restrito à pré-escola ou às classes iniciais. A tendência hegemônica do ensino é antecipar a iniciação acadêmica dos estudantes, roubando-lhes a oportunidade de experienciar uma educação que contemple as suas múltiplas demandas enquanto ser humano em formação - mesmo se multiplicando estudos que, como o documento elaborado para a UnESCo, anunciam que “a educação deve contribuir para o desenvolvimento total da pessoa - espírito e corpo, inteligência, sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoal, espiritualidade” (Delors, 2001, p.99).

Em minha pesquisa de doutoramento (Andrade e Silva, 2010), me deparei com um modelo que, na contramão da vocação hegemônica, tem avançado quanto à concepção e ao método de educação, caracterizando-se por superar o viés instrumental e estritamente racionalista da educação moderna e por voltar-se para a multidimensionalidade do processo educativo. Trata-se da Pedagogia Waldorf, iniciativa idealizada por rudolf Steiner em 1919, na Alemanha, e hoje praticada em mais de 800 escolas no mundo.

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3. POR UmA EDUCAÇÃO VOLtADA PARA O DEsENVOLVImENtO hUmANO: DIALOGANDO COm A PEDAGOGIA WALDORf

Para elaborar o currículo e as orientações de sua pedagogia, Steiner buscou conhecer quem é o homem. Todo o currículo Waldorf, desde as estratégias didáticas até o conteúdo das disciplinas, mostra-se, pois, profundamente articulado com as necessidades que o educando apresenta em cada fase de seu desenvolvimento.

Na Pedagogia Waldorf, o estudante é considerado uma individualidade que apresenta um corpo físico, uma alma e um espírito. o amadurecimento de cada um desses componentes segue uma progressão baseada em ciclos de sete anos, denominados “setênios”. Steiner (2003) explica que, em cada um desses períodos, o indivíduo passa por modificações biológicas, fisiológicas e cognitivas específicas que vão exigir do ensino atitudes, orientações e métodos de aprendizagem diferenciados.

no primeiro setênio (0-7 anos), quando se desenvolve a corporalidade física da criança, o sistema metabólico-motor (base do “fazer” adulto) está em pleno funcionamento e em progressiva organização. O movimento é a linguagem por excelência da criança e, através dele, os pequenos não apenas se deslocam no espaço, mas agem sobre o meio, comunicando-se e se expressando mais do que conseguem fazê-lo com a palavra. A experiência motora é o alicerce não apenas do seu desenvolvimento físico e motor, mas de todo seu desenvolvimento emocional, neurológico e até mesmo cognitivo, desempenhando um papel bastante ativo nas estruturas neurológicas que serão requeridas em seu futuro processo de aprendizagem.

Para atender a tais peculiaridades, as escolas Waldorf priorizam a livre movimentação da criança e o brincar. Enquanto na educação infantil convencional é comum que se exponham as crianças a períodos de imobilidade mais longos do que o seu sistema metabólico motor pode suportar (para que realizem atividades preparatórias para a leitura e escrita ou ao domínio matemático), no Jardim Waldorf as crianças brincam - e

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muito! Cuida-se para que esse brincar seja movido a partir da demanda da criança: o mais importante é que ela possa permanecer ao máximo no estado de fantasia proporcionado pela brincadeira, para que a sua imaginação seja exercitada - e é este também o motivo pelo qual também todos os dias os professores recorrem a um recurso fundamental, que é a contação de histórias.

Segundo Steiner (e pesquisas sobre desenvolvimento infantil), o jogo simbólico (como o faz de conta) e a criação de imagens internas (vivenciada pela criança ao lhe narrarmos uma história, por exemplo) são a base do futuro pensamento do adolescente e do adulto. As imagens construídas mentalmente pela criança requerem interações entre muitos campos neurais: quanto mais duradouras forem tais interações, mais fortes se tornarão a sua atenção e conceituação (Pearce, 2002). Assim, funcionam como uma ginástica mental, preparando as estruturas cerebrais para o futuro pensamento simbólico e metafórico que o indivíduo desenvolverá tanto nos estágios que Piaget (1967, 1975) denominou de operatório concreto (ou que Steiner denomina segundo setênio), quanto de operatório formal (ou terceiro setênio).

Portanto, embora as práticas de aceleramento escolar busquem estimular o quanto antes as habilidades cognitivas da criança, essa estimulação precoce será muito mais danosa ao desenvolvimento cognitivo do que salutar. Ao contrário, o brincar, o movimento, o ouvir histórias são atividades que ajudarão a criança no desenvolvimento de suas capacidades para o futuro exercício de raciocínio e de abstração.

Através da narração de histórias, os estudantes Waldorf são iniciados no aprendizado de muitos conteúdos formais, como os números e as letras do alfabeto - mas isso só ocorre a partir do primeiro ano, pois, na Pedagogia Waldorf, diferente do que tem sido estimulado inclusive por leis e programas oficiais, as crianças são iniciadas na leitura e escrita aproximadamente aos seis anos e meio, quando, como atestam Steiner (2003) e também Piaget

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(1967, 1975), elas dispõem de recursos cognitivos e/ou neurológicos para operações objetivas exigidas pela alfabetização.

É no segundo setênio (7-14 anos), na fase “do sentir”, quando o processo de maturação orgânica, já concluído, cede espaço para o desenvolvimento anímico (ou psico-emocional), que a criança, em intensa vivência emocional (favorecida pelo desenvolvimento das suas emoções, dos seus sentimentos), é ao mesmo tempo mobilizada pelo desabrochar de suas faculdades psíquicas (progressivamente utilizadas a serviço do pensamento e da aprendizagem). Buscando respeitar o desenvolvimento da criança, o ensino fundamental elege a arte como grande aliada: todo conteúdo é vivenciado em diversas modalidades artísticas, sendo acompanhado de emoção e de estética, para que, envolvida sentimentalmente, a criança possa vivenciá-lo de forma significativa.

Como, nesta fase, o mundo é compreendido pelo estudante pelo seu aspecto e pela configuração dos seus fenômenos, tal ensino busca conduzir toda aprendizagem a partir da vivência, da observação e da descrição dos fenômenos - e não de forma teórica (Lanz, 2003). Só a partir do terceiro setênio (14-21anos), na “fase do pensar”, quando é concluído o processo de desenvolvimento anímico e iniciado o desenvolvimento espiritual do adolescente (ou da sua individualidade), despertando-se progressivamente as forças do pensar lógico e analítico, os adolescentes são iniciados no cultivo do pensar abstrato e conceitual, base para a formação do julgamento pessoal.

Enquanto no ensino fundamental os conteúdos giravam em torno da realidade (e não da abstração), de modo que os estudantes eram conduzidos à observação e à descrição dos fenômenos (mas nunca à sua compreensão abstrata), no ensino médio o currículo volta-se para a abordagem das teorias conceituais. Essa indicação de Steiner encontra ressonância em Piaget: ambos afirmam que, somente quando apresenta estruturas mentais que possibilitam realizar operações baseadas num

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raciocínio abstrato (período das operações formais ou abstratas, para Piaget e terceiro setênio, para Steiner) é que o adolescente estará apto ao estudo da realidade fundamentado no exercício científico e intelectual.

Mas, quais os efeitos dessa Pedagogia na vida de seus egressos?

Pesquisas (Barz; randoll, 2007, Gerwin; Mitchell, 2007) apontam que os ex-estudantes Waldorf apresentam um perfil diferenciado com relação aos egressos do ensino convencional. Tanto no cenário estudantil quanto no profissional, destacam-se por atuar cooperativamente e buscar soluções criativas para os problemas, demonstrando ter pensamento autônomo e inclinação para por em prática suas ideias. Imprimindo um teor ético às suas condutas na vida profissional e privada, valorizam as relações humanas e buscam formas de participação ativa no meio em que vivem.

4. PARA CONCLUIR EssA CONVERsA...

Assim, uma educação que, como a Pedagogia Waldorf, busca atender às múltiplas demandas do educando, respeitando o seu processo de maturação orgânica e orientando-se para o seu pensar-sentir-fazer, mostra-se não apenas consoante com os princípios da educação para o século XXI, mas, sobretudo, comprometida com uma formação que possibilite a seus educandos um desenvolvimento mais efetivo enquanto ser humano integral, atendendo, pois, a função primeva da educação: a realização da pessoa que, em sua totalidade, aprende a SEr.

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REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

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Andrade e Silva, D. (2010). Por uma Educação Voltada para o Desenvolvimento da Expressão Oral dos Educandos: um estudo sobre a Pedagogia Waldorf. Universidade Federal da Bahia, Salvador, Brasil.

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Barz, H. & randoll, D. (Hrsg.). (2007). Absolventen von Waldorfschulen: eine empirische Studie zu Bildung und ebensgestaltung. Wiesbaden: VS Verlag für Sozialwissenschaften.

Capra, F. (1982). O Ponto de Mutação. A Ciência, a Sociedade e a Cultura Emergente. São Paulo: Cultrix.

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A EsCOLA COmO LOCUs mILENAR DE INstRUÇÃO E fORmAÇÃO – mUDANÇAs CURRICULAREs NA PAssAGEm DO mILéNIO: fINDO O ENsINO NAPOLEÓNICO QUE PARADIGmA

sE AVIzINhA?

José Esteves Rei

Universidade de Cabo Verde

[email protected]

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REsUmO

o objetivo deste artigo é questionar o papel da escola hoje, nomeadamente, se mudou a sua natureza ou essência milenar. A metodologia seguirá um percurso, próximo da “análise de conteúdo”, apontando os resultados para uma mudança funcional da escola, a concretizar a partir da relativização dos “curricula” em mudança desde a segunda metade do século XX. Tentaremos caraterizar o sentido dessa mudança. A origem funcional da escola – lugar físico, prática social e identidade formativa comunitária - esculpiu-lhe o rosto durante dois mil e quatrocentos anos. nela acedia-se a um conhecimento prático, que preenchia um vazio cognitivo-operativo pessoal. O liceu napoleónico oferecia um ensino enciclopedista, organizado em “matérias”, mais tarde denominadas de “disciplinas” pela função que lhes era atribuída de disciplinar a mente. Tudo isto desaparece na passagem do milénio, mesmo não tendo entrado nos grandes temas dos cataclismos milenares. As âncoras disciplinares ou disciplinadoras da mente, o Português e a Matemática, perdem o seu estatuto de saberes sustentáculos de outros saberes, para as áreas, respetivamente, das Letras e das Ciências. os alunos podem avançar no seu (per)curso educativo, sem atingir os objetivos mínimos em cada uma delas. Este facto representa metonimicamente a relativização da escola, seu currículo e sua função hoje.

Palavras-chave: escola; instrução; formação; mudança.

RésUmé

Le but de cet article est de remettre en question le rôle de l’école aujourd’hui, en particulier, sa nature, son essence millénaire. La méthodologie suivra un itinéraire proche de l’ analyse de contenu, en

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soulignant les résultats pour une modification fonctionnelle de l’école à partir de la relativisation des “programmes” en cours de changement depuis la seconde moitié du XXè siècle. nous essairons de caractériser le sens de ce changement. L’origine fonctionnelle de l’école – lieu, pratique sociale et entité de formation de la communauté – lui a sculpté son visage pendant deux mille quatre cents ans. Elle offrait une connaissance pratique, qui remplissait un vide cognitvo-operationnel personnel. Le lycée napoléonien offrait un enseignement encyclopédiste, organisé en “matières”, appellees plus tard de “disciplines” à cause de la fonction qui leur a été attribuée de discipliner l’esprit. Tout cela disparaît au tournant du Millénaire, bien qu’il ne soit pas entré dans les grands thèmes des cataclysmes anciens. Les ancrages disciplinaires qui devaient discipliner l’esprit, le Portugais et la Mathématique, perdent leur statut de connaissances-pilier d’autres connaissances en faveur de domaines respectivement, des Lettres et des Sciences. Les étudiants peuvent progresser dans leurs parcours éducatifs, sans toutefois atteindre les objectifs minimums en Portugais ou Mathématique. Cela représente métonymiquement la relativisation de l’école, de ses programmes et de ses fonctions aujourd’hui.

mots-clés: école; enseignement; formation; changement.

- Cícero e a reunião na clareira, momento instaurador da comunicação oral, das axiologias e da função da educação, para, sob “uma eloquência, profunda e sedutora, sem violência, dobrar a força ao jugo das leis” (Cicéron, 1848: 89).

- Roland Barthes e o nascimento da escola formal, a partir da aprendizagem da retórica para satisfação de necessidades pessoais e sociais (Barthes, 1987ª: 23).

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- Plutarco e a leitura dos poetas pelos jovens, ou o primeiro programa educativo cujo título era (na edição francesa de 1870) «Comment il faut que le jeune homme écoute la lecture des poètes» (Plutarque,1870).

Esses são os pilares da educação clássica. Teremos de esperar pela revolução francesa, para vermos alterados os conteúdos, os métodos e as atividades, ou seja, essa Filosofia da Educação. Todavia, tal alteração não atingiu o essencial de um edifício construído sobre os ângulos do triângulo seguinte:

A sua leitura é esta: a Sociedade tem necessidade de determinados Saberes que são sistematizados e didatizados em tratados e a Escola coloca perante os jovens, de modo a prepararem-se para a vida.

Assim funcionou a escola da Grécia ao século XVIII, designando o termo, i) um locus formativo, ii) um modo de fazer e, ainda, iii) uma forma de estar em sociedade. Deste modo, Isócrates, Platão e Aristóteles na Grécia, quintiliano em roma e Santo Agostinho em Cartago, tiveram as suas escolas. o liceu napoleónico relativamente ao liceu aristotélico traz a dimensão institucional ou estatal: da escola, dos conteúdos e dos professores, deixando a estes os métodos e as atividades.

ora os pressupostos deste milenar edifício educativo parecem ter sido postos em causa, pela Sociedade, a partir da segunda metade do século XX.

Primeiro, ela apresentou necessidades para as quais parecia não

Escola

Saberes

Sociedade

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haver tratados disponíveis – veja-se os casos das novas tecnologias e da comunicação, transversal ao espaço público e privado, que convocam todos dos cidadãos.

Segundo, o Saber perde o estatuto de sagrado que adquirira, substituído pelo conhecimento – um uma espécie de saber precário, fugaz, por oposição ao caráter duradouro do(s) saber(es) que habitava(m) as enciclopédias dos homens das Luzes.

Terceiro, a Escola perdeu a sua finalidade milenar, que era a aprendizagem necessária e ambicionada por quem a frequentava. Mais, tornada obrigatória, a escola transforma-se num lugar de estar ou de bem estar. Todavia, ao privilegiar-se a dimensão lúdica e aprazível da escola, desvaloriza-se nela o esforço de aproximação ao saber, de imitação dos modelos ético-morais, de domínio e controlo do ideal distintivo do homem.

A questão fundamental é a seguinte: o que resta dessa Escola milenar? A escola atual ainda mantém a sua essência ou estaremos perante outra realidade, apelando a outra denominação, outra filosofia, outros conteúdos e, supostamente, outros métodos e outras atividades?

Observados os programas e os conteúdos, eles não andam longe dos tradicionais, quer na sua organização em matérias ou disciplinas quer no desenvolvimento de cada uma destas. A diferença, porém, surge naquilo que se faz com eles, ou seja, na função estruturante do aluno que antes tinham e hoje perderam. Assim, desapareceu o perfil social do aluno à saída, antes, tão laboriosamente trabalhado. E ficou-se com quê? Com algo, ainda, incaraterístico.

1. INDÍCIOs DE mUDANÇAs NA sOCIEDADE: A EXIstÊNCIA DE DUAs CULtURAs? QUE REfLEXOs NA EsCOLA?

registemos três constatações: A Escola definida por Louis Altusser

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como aparelho ideológico do Estado, ao lado da do Exército, parece ter desaparecido com o surgimento de novas organizações político-administrativas regionais e superestados como a EU ou o Mercossul. Vivemos um tempo de sínteses ligeiras, não de análises profundas como até há poucas décadas, para o que se exigiam longas e aturadas leituras. Por último, o “homem vulgar” de Unamuno parece ter vindo para ficar, na sua autossuficiência cognitiva, intelectual, analítica e crítica…

1.1. UmA INCERtEzA: QUE CULtURA(s) DA sOCIEDADE DEsDE A sEGUNDA mEtADE DO séCULO XX?

A noção de cultura remete hoje para o modo como as pessoas pensam, comunicam e vivem, falam, gastam o tempo e o dinheiro (Salinas e Tena, 1992: 25). Esse fazer cultural conduz a duas culturas: a cultura culta e a cultura de massas. A primeira seria a das elites, a dos letrados, a dos escolarizados. A segunda, estaria na posse do “cidadão vulgar”, disperso por personagens planas ou tipos sociais. o objeto da primeira passaria pelos clássicos: saberes, personagens, ideais e valores; o objeto da segunda seriam mitos e imagens vulgares, ideias feitas e banais, histórias e faits divers, que visualizam, em mundos fictícios, as ideias ou as paixões: amor e ódio, felicidade e infelicidade, prémio e castigo.

Aquela teria na sua origem a escola, a universidade, a leitura e os museus; esta, o cinema, a rádio, a televisão, a publicidade, a banda desenhada, os jornais e revistas de grande tiragem e os discos populares, embora estes meios também possam receber os conteúdos da primeira.

Onde vai a cultura de massas buscar a capacidade de agarrar um público tão alargado: crianças e idosos, jovens e adultos, donas de casa e mulheres nas mais elevadas posições sociais, distintos executivos e simples empregado da sua empresa? Para Pierre Babin a resposta passa por três constatações: 1) ”o público reflete, mas não de maneira discursiva.” 2) “A sua

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reflexão elabora-se a partir de considerações morais, referidas à orientação pessoal da vida de cada um, e sociais, considerações relacionadas com o reconhecimento individual por outro e com o estatuto na sociedade.” 3) “A reação de adesão ou de recusa provém de uma espécie de orientação interna, como se as pessoas possuíssem, no fundo de si próprias, uma faculdade de discernimento que funciona com[o] o gosto em relação aos alimentos.” (Babin, 1991: 164-165)

Que relação estabelecer entre a lógica dos media e a cultura de massas? Essa lógica desenvolve virtualidades humanas, desprezadas pela lógica discursiva, segundo Babin. Enquanto ao raciocínio intelectual compete conduzir à verdade, sendo a sua ordem a do conhecimento, à lógica dos media está atribuída a tarefa de mostrar e levar ao bem e ao bom, sendo a sua ordem a do comportamento. Deste modo, o que recebemos dos media não é tanto uma formação do pensamento, mas uma transformação das atitudes, das crenças e dos costumes (Babin, 1991: 166-168).

1.2. DA CULtURA CLÁssICA à NOVA CULtURA

Observemos a estruturação e o desenvolvimento de cada uma delas segundo Jean Pierre Boutinet.

Cultura milenar clássica Nova culturaCultura dos clássicos greco-

romanos:

Coletivismo

Mudanças duradoiras

Assunção do passado

Cultura do imediato:

Individualismo

Mudanças transitórias

Rutura com o passado

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Cultura do presente:

valorização do duradoiro

jogo de compromissos realizações resultados e possessão

Cultura do projeto:

predomínio do transitório e efémero

mundo das intenções, finalidades, planos, programas e

previsõesTempo circular:

da existência individual

do sonho de uma vida

da realização pessoal

de conceção mítica de origens e de fins

Tempo linear:

de períodos curtos

febril e de intensa actividade

de realizações incessantes

de renovação ilimitada

Existência retrospectiva:

conformação ao ideal no presente

imitação de modelos do passado

Existência prospectiva:

remissão para o futuro da esperança

ausência de modelos: autossuficiência

Centração no passado

sob uma conceção circular do tempo

Sobrevalorização do futuro

sob uma conceção linear do tempo

(Jean Pierre Boutinet, 1990, p. 18, adaptado)

2. QUE CONtORNOs DA NOVA REALIDADE EsCOLAR? EVOLUÇÃO OU sUBstItUIÇÃO DA EsCOLA?

Um pressuposto: a mudança não é endógena à escola, antes, a mudança escolar segue, com atraso, a mudança social. Se a escola está a mudar é porque a Sociedade mudou primeiro. Deste modo, a dificuldade começa pela compreensão das mudanças sociais.

A grande questão do século XIX sobre a escola era saber se ela deveria ser de elites ou de massas. Perante a indefinição da resposta a esta questão,

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surgiu uma dupla escola, o “liceu napoleónico” das elites burguesas e a “escola comercial e industrial” das classes populares, operárias ou trabalhadoras. A primeira Guerra Mundial, em França, e o 25 de Abril, em Portugal, proporcionaram a junção de ambas naquilo que foi chamado, a Escola Única. Para além de Única, esta escola tornou-se de massas. Mais tarde, ao lado dessa escola única e de massas, vemos surgir, alguns dizem regressar, um ensino profissionalizante, mas cuja identidade ainda se não constituiu.

o regresso ao futuro? Como observamos, a escola do século XIX e XX aconteceu. Decorreu de vicissitudes sociais ou da incapacidade de a Sociedade abraçar para si uma Escola voluntarista, pensada e implementada. Iremos nós ficar reféns, uma vez mais, de outras vicissitudes que nos dominam em vez de nos plantarmos acima delas?

Dados adquiridos: i) A Sociedade mudou nos últimos cinquenta anos. ora este tempo é suficiente, para identificar os eixos da mudança e caraterizar as novas estruturas e valências pretendidas. ii) A etapa seguinte será localizar as novas necessidades sociais educativas a partir das quais haverá que constatar se existe(m) saber(es) disponíveis para serem curricularizados de modo a refazer-se o triângulo de partida Sociedade – Saber(es) - Escola. iii) Por último, ou fazer o “aggiornamento” da Escola ou substituí-la por outra instituição capaz de servir as novas necessidades identificadas na Sociedade.

Em todo o processo requer-se grande abertura de análise, desprendimento de interesses corporativos e grande vontade de servir a comunidade na busca do melhor caminho.

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Desafios da Globalização

3. UmA EsCOLA DE ELItEs PARA UmA DEmOCRACIA DIfERENCIADORA COmO NA GRéCIA?

Pressuposto: uma democracia com novos suportes conceptuais? na verdade, nós vemos surgir, frequentemente, novos controlos por parte de indivíduos e instituições não legitimados…

Então, por que não legitimarem-se novos controlos aceitáveis e a descoberto, embora atentando contra factos de manifestações de alheamento das práticas democráticas como absentismos a 40, 50 ou mais por cento?

Uma escola nova para todos, fundindo nela as duas culturas, seus pressupostos e suas filosofias? Distinguindo os melhores, de facto? Criando novos patamares de transparência, de exigência?

Verbalizamos a incerteza na busca de uma solução, que gostaria de “ver fazer” e não, a posteriori, “ver acontecer”.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

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eduCAção inClusivA

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EDUCAÇÃO INCLUsIVA: UmA INtEGRAÇÃO DE ABORDAGENs ENtRE PORtUGAL E CABO-VERDE

Joana Sofia Sousa Figueiredo; Sílvia Maria Castro Fortes Cardoso

Universidade Portucalense Infante D. Henrique; Universidade Católica Portuguesa

[email protected]; [email protected]

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Educação Inclusiva

REsUmO

Vivemos num Mundo complexo, marcado por aceleradas transformações às quais estão associadas uma série de incertezas e paradoxos, quer no plano dos discursos, quer ao nível das práticas, e que trazem à Escola, que educa cidadãos para o Mundo, um novo desafio de responder à diversidade da sua população. neste artigo, procuramos fazer uma análise de realidades educativas sobre os processos de inclusão de alunos, com diferentes tipos de necessidades educativas especiais, nas escolas regulares, com referencial teórico nos quadros reguladores da ação educativa em Portugal e em Cabo Verde. Equacionamos as orientações das políticas educativas destes países no sentido da regulação e dos mecanismos de efetivação da escolaridade obrigatória, garantindo direitos e deveres de cidadania a todos os indivíduos em idade escolar. Da análise realizada percebemos que os preceitos da educação inclusiva encontram-se regulamentados nas respetivas Leis de bases dos Sistemas Educativos. Mas, em Cabo Verde ainda não existem normativos que definam os apoios especializados a prestar aos alunos com limitações significativas ou permanentes, decorrentes de alterações funcionais e estruturais, como já acontece em Portugal. Mas, em Portugal apesar do quadro regulador, colocam-se limitações à sua interpretação pela escola, motivadas por outras formas de carências. Assim, nos dois espaços identificam-se limitações à educação inclusiva de natureza e expressividade específicos.

Palavras-chave: inclusão; educação inclusiva; necessidades educativas especiais; educação para a diversidade.

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ABstRACt

We live in a complex world, which is set by rapid changes. These changes brought doubts and paradoxes both in speech and practice, which mean a new challenge to the cultural diversity of Schools, who educate the citizens to the World reality. This article aims to analyse compared educative realities, concerning inclusion processes of students with different special educational needs, in regular schools and is based on the legal framework of education action in Portugal and Cape Verde. The educational policy orientation of these two countries is considered in order to regulate and succeed on the mechanisms of compulsory education. These mechanisms must guarantee the rights and duties of citizenship of all individuals in school age. Drawing on the analysis, the inclusive education is revealed to be regulated in the Portuguese Fundamental Laws of Education Systems. nonetheless, unlike the Portuguese reality, in Cape Verde the settings that define the special support of students, who have significant or permanent limitations, resulting from functional and structural changes, do not exist, yet. Portugal, on the other hand, despite the expressive regulatory framework and its consummation, has certain restrictions on the application of these settings in schools, caused by other kinds of needs. Therefore, there are specific kinds of restrictions to inclusive education in both realities.

Keywords: inclusion; inclusive education; special educational needs; education for diversity.

INtRODUÇÃO

Vivemos num Mundo complexo, marcado por aceleradas transformações às quais estão associadas uma série de incertezas e paradoxos, quer no plano dos discursos, quer ao nível das práticas, e que trazem à Escola, que educa cidadãos para o Mundo (sejam elas crianças

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Educação Inclusiva

com deficiência ou superdotadas, crianças de origem estrangeira ou vítimas de trabalho infantil, crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais e crianças de outros grupos desfavorecidos ou marginalizados), um novo desafio de responder à diversidade da sua população.

o reconhecimento e a valorização da diversidade social, educativa e cultural nos processos de ensino-aprendizagem e na adoção de estratégias educativas e pedagógicas diferenciadas, faz da escola uma escola inclusiva que investe numa educação para o sucesso de todos e de cada um.

no presente artigo, fazemos uma análise comparativa das duas realidades educativas sobre os processos de inclusão de alunos com diferentes tipos de necessidades educativas especiais, na escola do ensino regular, tendo como referencial os quadros legais reguladores da ação educativa em Portugal e em Cabo Verde. Trata-se de equacionar as orientações das políticas educativas destes no domínio supracitado.

A sOCIEDADE INCLUsIVA: Um OLhAR sOBRE O CONtEXtO INtERNACIONAL

Apontadas como seres possuídos pelo demónio, na Idade Média, como mortificação fruto de castigo e transgressões morais, ou ainda como loucas, sendo internadas em hospitais e hospícios nos séculos XVIII e XIX, as pessoas com deficiência foram objeto, desde a Antiguidade, de um tra-tamento especial.

Do ponto de vista científico, a partir de meados do século XX, a filoso-fia da educação especial começa a sofrer mudanças passando a ser contes-tado o papel exclusivo dos diagnósticos médico e psicológico para o ensino e recuperação dos deficientes, valorizando-se a educação como forma de mudança. Surge assim, na década de 70 o movimento da Integração, com o conceito de normalização, expressando que à pessoa com deficiência de-

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vem ser dadas condições as mais semelhantes possível às oferecidas pela sociedade ao cidadão comum enfatizando-se a dignidade da pessoa como direito fundamental, do qual derivam todos os outros direitos.

É ainda nesta década, com a aprovação da Declaração sobre os Direi-tos das Pessoas com Atraso Mental (1971) e da Declaração sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (1975) que se verifica uma crescente conscien-cialização de que a segregação nos aspetos educativo e social era antina-tural e indesejável bem como dos seus efeitos nefastos e estigmatizantes – potenciando o desenvolvimento de movimentos pró-direitos sociais – que contribuíram para a (re)concetualização da Educação Especial e subsequen-te alteração do quadro legal e das modalidades educativas de caráter segre-gativo (Stainback & Stainback, 1996; CnE, 1999).

É neste processo gradual de conscientização mundial que se dá a aprovação da Public Law 94/142 (1975), nos Estados Unidos da América e com ela os primeiros passos efetivos para a educação inclusiva. Seguiu-se-lhes o relatório Warnock, em 1978, que define pela primeira vez um modelo de atendimento centrado nas dificuldades do aluno e em serviços especialmente criados para ele, com novas abordagens curriculares. Intro-duziu-se a abordagem de integração (mais tarde, da inclusão), baseada em objetivos educacionais comuns para todas as crianças, independentemente das suas capacidades ou incapacidades, concretamente a independência, a diversão e a compreensão.

Várias conferências mundiais se seguiram, nas décadas de 80 e 90, que reafirmaram o direito à educação para todos. no entanto, foi a Decla-ração de Salamanca (UnESCo, 1994) que a educação inclusiva recebeu um impulso decisivo. A sua conceção foi orientada pelo princípio da inclusão e pelo reconhecimento da necessidade de construir uma “Escola para Todos”, reforçando o direito de aprender juntos, sempre que possível, independen-temente das dificuldades e das diferenças que apresentam. Concretiza-se, o

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Educação Inclusiva

desafio educativo (de todas as crianças e jovens) da tarefa não ser exclusiva da escola e professores, acima de tudo, é uma responsabilidade de todos. Aliás, a educação para a inclusão não começa nem acaba na escola, passa pela escola como por muitos outros lugares ao longo da vida.

Um OLhAR sOBRE O CONtEXtO PORtUGUÊs

Em Portugal, remonta a 1822 o que podemos designar como os primórdios da Educação Especial, altura em que D. João VI aceitou que fossem educados os cegos e os surdos. Na década de 1960, os serviços e estabelecimentos de educação especial existentes eram escassos, sendo o Ministério dos Assuntos Sociais que superintendia a maior parte dessas estruturas. Na década de 1970, já pelo Ministério da Educação, é criado o Secretariado do Ensino Especial com o objetivo de proceder a uma reestruturação do ensino especial, inserido numa política geral de educação. Este organismo tinha como atribuições, entre outras, contribuir para a definição de uma política global e unitária no domínio da educação do ensino especial, velar pela integração social da criança deficiente e acompanhar a preparação de pessoal técnico. Marcava o início do reconhecimento da responsabilidade do Estado em assegurar a todas as crianças o direito à educação; o início da integração das crianças e jovens com deficiência no sistema educativo público.

Vários diplomas legais foram publicados definindo o regime escolar com algumas especificidades relativamente a matrículas, tipo de frequência e avaliação de conhecimentos. De realçar o contributo da Lei n.º 66/79, de 4 de outubro, sobre a natureza, o âmbito e os objetivos da educação especial e que consagrava expressamente, como finalidade, “a preparação para uma adequada formação profissional e integração na vida activa por parte de jovens deficientes...” entre outras.

As profundas transformações no sistema educativo – decorrentes da

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publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86, de 14 de outubro), as recomendações emanadas de organismos internacionais e a consequente evolução dos conceitos relacionados com a educação espe-cial, os diplomas vigentes no nosso país tornaram-se obsoletos. Foi, então, que a legislação conheceu um grande impulso. Assim, no desenvolvimento do regime jurídico estabelecido na Lei de Bases do Sistema Educativo, em que se consagrou a gratuitidade da escolaridade obrigatória e os apoios e complementos educativos, surge o Decreto-Lei n.º 35/90, de 25 de janeiro, que realça a preocupação com o baixo índice de escolaridade dos alunos com nEE e determina, no n.º 2 do art.º 2.º, que os mesmos alunos não se encontram isentos da frequência da escolaridade obrigatória, devendo ser integrados em estabelecimentos do ensino regular e/ou instituições de educação especial.

o Decreto-Lei n.º 319/91, de 23 de agosto, apresenta, no seu articu-lado, princípios inovadores no âmbito da integração escolar das crianças com necessidades educativas especiais, enfatizando o modelo pedagógico, o conceito de necessidades educativas especiais e a crescente responsabi-lização da escola regular perante a educação das crianças com este tipo de necessidades. o Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de janeiro, sobre a reorgani-zação curricular do ensino básico, distingue, nos arts. 10.º- 11.º, os alunos com necessidades educativas de caráter permanente e a diversificação das ofertas educativas, abrindo, assim, o caminho à gestão flexível do currículo e à sua adequação à especificidade dos alunos.

o Decreto-lei n.º 3/2008, ao contrário do que sucedia no diploma anterior, estabelece o processo de referenciação bem estruturado, o qual deverá ocorrer o mais precocemente possível e por qualquer interveniente que estabeleça uma relação com a criança. Assume uma perspetiva de inclusão, numa lógica de adequação de respostas educativas, de modo a criar condições especializadas, além de definir a possibilidade de se estabelecerem parcerias com instituições públicas, instituições particulares

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Educação Inclusiva

de solidariedade social e centros de recursos especializados. Define, acima de tudo, os apoios especializados para alunos com necessidades educativas especiais de carácter prolongado.

Entre as alterações mais significativas, sublinhamos a possibilidade de criação de escolas de referência para a educação bilingue de alunos surdos e escolas para a educação de alunos cegos e com baixa visão, assim como unidades de ensino estruturadas para a educação de alunos com perturbações do especto do autismo e unidades para a educação de alunos com multideficiência e surdo cegueira congénita (Art. 4.º, p. 2-3). outra alteração substantiva está relacionada com a avaliação das crianças, a qual deve ter como referência a Classificação Internacional da Funcionalidade e Incapacidade (CIF, organização Mundial de Saúde), servindo de base à elaboração dos programas educativos individuais. Possibilita, ainda, um papel mais ativo dos pais, na medida em que define o papel destes nos serviços prestados aos pais/encarregados de educação, os deveres e direitos, e estipula procedimentos precisos em caso de incumprimento.

Um OLhAR sOBRE O CONtEXtO CABO-VERDIANO

Em Cabo Verde, a partir de 1990, com as diretrizes traçadas na Conferência Mundial sobre a “Educação para Todos”, importantes medidas foram tomadas com o intuito de incorporar as orientações sobre a abordagem da Educação Inclusiva e criar condições no sistema educativo para que todas as crianças possam ser escolarizadas no sistema regular de ensino. Aliás, a Constituição da república, no art. 49.º – o qual reporta à liberdade de aprender, de educar e de ensinar –, sublinha no ponto 2 que “a liberdade de aprender, de educar e de ensinar compreende: a) o direito de frequentar estabelecimentos de ensino e de educação e de neles ensinar sem qualquer descriminação, nos termos da lei”.

Esta preocupação esteve presente, na Lei de Base do Sistema

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Educativo (1990), no art. 6.º, o qual defende o livre acesso ao sistema educativo, assegurando o direito de todos à educação, independentemente das suas condições físicas, intelectuais, sociais e emocionais.

Em 1999, os direitos dos portadores de deficiência são integrados na Constituição da república (art. 75.º da versão revista). Em 2000, é criada a Lei 122/V/2000 que estabelece as bases gerais da prevenção, reabilitação e integração das pessoas deficientes. Três anos mais tarde, o Plano nacional de Educação para Todos e o Plano Estratégico para a Educação, efetivam medidas de política, para a formação de professores na abordagem das nEE. A estes documentos, que afirmam os direitos de todas as crianças a uma educação equitativa, sem descriminação, dentro do sistema regular de ensino juntou-se a nova Lei de Base do Sistema Educativo (2010) que definiu pela primeira vez, os princípios reguladores da educação para crianças e jovens com necessidades educativas especiais. não se conhecem documentos operacionalizadores destas medidas, ou iniciativas da formação de professores na atualidade.

A CONCLUIR: REALIDADEs COmPARADAs

Constatamos uma evolução significativa dos quadros concetuais e dos dispositivos legislativos que têm marcado o contexto, quer de Portugal quer de Cabo Verde. Percebe-se que a educação e o ensino são direitos fundamentais consagrados nas Constituições da república Portuguesa e Cabo-verdiana as quais determinam a incumbência ao Estado da realização da política de ensino ao que acresce o facto de os preceitos da educação inclusiva, também, se encontrarem regulamentados nas respetivas Leis de Bases dos Sistemas Educativos.

Em Portugal, o Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, foi fundamental para a afirmação da Educação Especial, permitindo que se alinhassem as políticas educativas com os princípios e recomendações de diversos

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Educação Inclusiva

tratados e declarações de direito internacional em matéria de necessidades educativas especiais e de não discriminação em razão de deficiência e saúde. Afigura-se interessante a preocupação em propor uma linguagem e terminologia unificadoras para este domínio. Embora a classificação escolhida – CIF – oMS, tem sido objeto de algumas críticas, especialmente pela inexistência de investigação consolidada sobre a adequação da CIF ao domínio educativo (Correia, 2008). o País tem um quadro regulador expressivo e da Educação Especial, mas que por déficit de cidadania ou tradição curricular centralizadora, tem dificuldade em funcionar “no terreno”.

Já em Cabo Verde, a educação inclusiva, enquanto desafio para o país, carece de uma maior clarificação e divulgação, bem como de normativas que definam os apoios especializados a prestar aos alunos com limitações significativas ou permanentes – decorrentes de alterações funcionais e estruturais –, visando a sua efetiva implementação em moldes que correspondam às especificidades do país.

Torna-se necessário clarificar o processo de referenciação, no sentido de providenciar o despiste das crianças e jovens que dela carecem, detetando os fatores de risco associados às limitações ou incapacidades; de construir e implementar os programas educativos individuais; e analisar os princípios que norteiam o processo de avaliação dos alunos com necessidades educativas especiais.

A escola inclusiva é uma inevitabilidade e não se vislumbra outra alternativa perante a crescente diversidade. Há ainda caminhos a percorrer e trilhos a desbravar, sendo necessário, em ambos os países, repensar a formação dos professores, adequar práticas educativas, envolver toda a comunidade educativa e desenvolver projetos de investigação nos contextos educativos, com o intento de monitorizar e otimizar o sistema e as suas estruturas, propondo as mudanças necessárias à inclusão.

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Educação Inclusiva

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hÁ EsCOLA NO hOsPItAL: CONtRIBUtOs PARA Um NOVO mODELO DE INtERVENÇÃO EDUCAtIVA

Joana Sofia Sousa Figueiredo; Sílvia Maria Castro Fortes Cardoso

Universidade Portucalense Infante D. Henrique; Universidade Católica Portuguesa

[email protected]; [email protected]

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REsUmO

o presente artigo enquadra-se num projeto de investigação, de âmbito da escolaridade obrigatória, tendo como premissa equacionar em que medida a concretização de uma resposta educativa dirigida a crianças e jovens hospitalizados, por um tempo prolongado, pode contribuir para um maior índice de sucesso educativo, do processo de aprendizagem dos jovens, bem como do quadro clínico (físico e emocional) dos mesmos, quando se encontram em situação impeditiva de frequentar a sua escola por tempo prolongado. Do ponto de vista metodológico, o estudo inscreve-se numa abordagem qualitativa do tipo multicasos e está a ser implementado em seis instituições do Sistema nacional de Saúde Português (os casos), com base em testemunhos de médicos e enfermeiros, professores e educadores de infância; de crianças e jovens em idade escolar alvo de internamento; e de seus familiares diretos, pais e/ou encarregados de educação.

As análises parciais projetam duas realidades: uma, a ausência de intervenções organizadas para dar resposta à necessidade de se evitar a interrupção das atividades escolares comprometendo, desse modo, o sucesso educativo destes jovens; outra, a uma tentativa de resposta por parte de algumas unidades hospitalares que, para contrariar a dificuldade de desenvolvimento da dimensão educativa, promovem atividades educativas de caráter lúdico com soluções que apenas satisfazem a educação pré-escolar, ficando de fora iniciativas adequadas a outros níveis do ensino escolar.

Palavras-chave: criança hospitalizada; intervenção educativa; inclusão; educação em contextos diversificados.

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Educação Inclusiva

ABstRACt

This article can be framed in a research project and is connected to compulsory education, under the premise of weighting the accomplishment of an education response, towards long term hospitalized children and adolescents. The response shall contribute to a higher level of success in the educational and learning process of the teenagers. Their clinical picture (physical and emotional) during the time of absence from school would also be positively influenced.

From a methodological point of view, the study is inscribed by a qualitative multiple case approach, which is under implement in six institutions of the Portuguese national Health Service (the cases). This approach is based on doctors’, nurses’, teachers’, nursery school teachers’ testimonials; and also on hospitalized children and adolescents in school age; their close relatives, parents and/or guardians. The partial analysis present two distinct realities: one, the absence of organized interventions in order to avoid the scholar activities interruptions, would endanger the educational success of these teenagers; Two, an attempt of some hospital units to respond, would mean an attempt to thwart the development of educational difficulties. These hospital units promote educational, ludic activities that only benefit the pre-school education and exclude the adaptation of measures to other school levels.

Keywords: hospitalised child; educational intervention; inclusion; education in several contexts.

ENQUADRAmENtO DA INVEstIGAÇÃO

A educação do Homem é uma tarefa de vital importância e a universalização do direito à educação constitui uma das conquistas mais significativas resultantes da modernização das sociedades, sendo, hoje,

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a liberdade para aprender - enquanto expressão do desejo de elevação pessoal - sendo um elemento crucial na concretização dos direitos cívicos e políticos. Acreditamos na educação com sentido amplo: pessoal, social e profissional (saber, saber-fazer, saber-ser e saber-estar), significando que já não basta o sucesso escolar, é imprescindível garantir igualmente o sucesso educativo.

Assim, a presente comunicação enquadra-se num projeto de doutoramento, que tem como premissa equacionar no âmbito da escolaridade obrigatória em que medida, a resposta educativa existente dirigida a crianças e jovens hospitalizados por tempo prolongado, efetiva o seu direito à continuidade da ação educativa com vista à sua reintegração social e escolar.

Do ponto de vista metodológico, o estudo inscreve-se numa abordagem qualitativa do tipo multicasos e está a ser implementado em seis instituições do Sistema nacional de Saúde Português (os casos). A sua base firma-se em testemunhos de profissionais de saúde (médicos e enfermeiros), professores e educadores de infância (que atuam em contexto hospitalar), crianças e jovens em idade escolar alvo de internamento e dos seus familiares diretos, pais e/ou encarregados de educação.

A CRIANÇA hOsPItALIzADA: A CONQUIstA DE Um DIREItO

A educação é o mais importante foco de uma sociedade. Por meio dela desenvolvemo-nos e crescemos enquanto nação e como cidadãos, aspirando à formação individual de seres virtuosos e comprometidos. Hoje, são vários os documentos de caráter internacional, assinados por países pertencentes à organização das nações Unidas (onU), que reconhecem e garantem esse acesso a todos os cidadãos. É o caso da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, enquanto carta edificadora do humanismo das sociedades democráticas, na qual se destaca, entre tantos outros, o

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Educação Inclusiva

direito à educação como uma das prioridades do desenvolvimento humano. Assim, no seu art. 26.º, proclama-se que,

“toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. o ensino elementar é obrigatório. os ensinos técnico e profissional devem ser generalizados; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função das aptidões individuais”. (Organização das Nações Unidas, 1948)

o direito à educação é, ainda, anunciado em diversas recomendações e diretivas internacionais como a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (1950); a Declaração dos Direitos da Criança (1959); a Convenção contra a Discriminação no Domínio da Educação (1960); o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais (1966); a Convenção sobre os Direitos da Criança (1989); e a Conferência Mundial sobre Educação para Todos (1990). nestes documentos oficiais alargam-se e aprofundam-se as obrigações dos Estados relativamente à educação e impõem-se condições para que a educação para os direitos humanos possa ser uma preocupação inscrita nas políticas educativas nacionais.

Em 1994, Portugal foi um dos subscritores da política de educação inclusiva, tendo como pilar a Declaração de Salamanca, que vinca a necessidade de uma educação para todos, independentemente das condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais e linguísticas de cada um. Além disso, em 2000, é instituída a Carta da Criança Hospitalizada, inspirada nos princípios da Carta Europeia da Criança Hospitalizada (1986), que reflete preocupações com a humanização dos hospitais e com a qualidade de vida das crianças hospitalizadas. Este documento sintetiza os direitos da criança hospitalizada com particular destaque para o 7.º direito, o qual evidencia que o hospital deve oferecer às crianças um ambiente que corresponda às suas necessidades físicas, afetivas e educativas, quer no domínio do equipamento, quer no pessoal e de segurança. (Mota, 2000).

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Apesar da importância de que se reveste o tema, em Portugal, não existe qualquer documento legislativo específico relativo à educação em contexto hospitalar. Contudo, a Lei de Bases do Sistema Educativo, no art. 2.º, ressalva o direito de igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolar, observando que este direito não cessa quando há interferências, como é o caso da hospitalização.

O PAPEL DO EDUCADOR NO hOsPItAL

As primeiras tentativas de intervenção pedagógica em contexto hospitalar cabem a Henri Sellier, em Paris, em 1935, com a inauguração da primeira escola para crianças inadaptadas (Vasconcelos, 2003). Esta experiência serviu de exemplo em muitos países da Europa e nos Estados Unidos da América, que introduziram o mesmo sistema com o objetivo de complementar as dificuldades escolares de crianças. Países como Espanha, Inglaterra e Brasil são, nos dias de hoje, impulsionadores deste tipo de medida de intervenção educativa. Ainda, não podemos deixar de considerar a Segunda Guerra Mundial como um marco decisivo na implementação deste espaço pedagógico neste tipo de ambiente devido ao grande número de crianças e adolescentes atingidos e mutilados, que ficaram impossibilitados de se deslocar à escola (Gomes e rubio, 2012).

Entre os investigadores, formulam-se duas linhas de pensamento principais: uma delas defende o atendimento dentro do contexto de humanização das práticas hospitalares e, nesse sentido, deve prestar um serviço de auxílio à promoção da saúde da criança e adolescente hospitalizado, priorizando na sua prática as atividades lúdicas e recreativas (Taam, 1997); a segunda linha de pesquisa defende que o acompanhamento educativo esteja direcionado para o cumprimento do currículo escolar e seja materializado em parceria com a instituição de ensino onde a criança esteja matriculada (Fonseca, 2001) e Ceccim (1997 e 1999).

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Educação Inclusiva

Independentemente destas duas orientações reflexivas, todos os autores são unanimes em afirmar que cabe ao professor/educador que atua em contexto hospitalar fazer o elo entre a educação e saúde, e mediar a relação entre os novos conhecimentos que o ambiente hospitalar produz e a aquisição de novos saberes escolares (Fontes, 2006). Dessa forma, o professor exerce o importante papel de ajudar a criança a compreender e ressignificar esses conhecimentos, num processo de construção e apropriação de novas aprendizagens significativas.

É impossível, porém, ignorar que este processo se afigura um processo educativo singular uma vez que as crianças e jovens hospitalizados pertencem a diferentes faixas etárias e apresentam um quadro clínico diferenciado e reações distintas ao processo de hospitalização, entre outros aspetos. A atenção pedagógica nestas situações requer um atendimento específico e direcionado, que seja coadjuvante do tratamento e abrevie a permanência hospitalar. Ainda que não se verifiquem as caraterísticas da escola regular, a intervenção educativa em contexto hospitalar procurará resgatar a dinâmica escolar apoiando-se em atividades lúdicas e em conteúdos programáticos, para assim promover um espaço de interação, desafiando a criança a solucionar problemas, desenvolver o raciocínio e pensar criticamente.

CONfIGURANDO Os RUmOs DA INVEstIGAÇÃO EmPÍRICA

Clarificada a natureza da investigação e a intenção de aprofundar o objeto de estudo, a nossa opção metodológica passa por uma abordagem qualitativa, cujo método de investigação se configurou num estudo multicasos, procurando descobrir pontos de convergência entre vários casos. Trata-se de um estudo de caráter descritivo analítico que incide sobre um fenómeno atual muito pouco estudado em Portugal. Esta investigação permite-nos a compreensão dos comportamentos a partir da perspetiva

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dos sujeitos de investigação, apreender a riqueza e especificidade de cada situação e compreender as ocorrências, induzindo novas formas de estar (Almeida e Freire, 2000).

Sabemos que a realização bem sucedida de um estudo de caso, seja ele de que natureza for, só é possível mediante uma seleção criteriosa de técnicas de recolha de dados e tratamento meticuloso da informação, devendo ser processual e faseado. Assim, no que se refere ao processo de investigação, guiámo-nos por yin (2001) e por Bodgan & Biklen (1994). Para a recolha de dados fizemos a análise documental e a entrevista semiestruturada. Para a análise de dados, recorremos à análise de conteúdo (Cardoso, 2007).

os respondentes para cada caso/hospital, foram: profissionais de saúde (enfermeiros e médicos), que exercem funções nos serviços pediatria dos seis hospitais referidos, as crianças e jovens com pelo menos quinze dias de internamento, os pais e/ou encarregados de educação dessas crianças e jovens e os professores e educadoras de infância que atuam em contexto hospitalar. A escolha destes informantes teve como critérios: hospitais que pertençam a regiões diferentes, de modo a podermos ter uma maior representatividade da realidade nacional; hospitais públicos, pertencentes ao sistema nacional de saúde e que efetivam o direito de acesso de toda a população a cuidados básicos de saúde; hospitais centrais ou hospitais distritais (no caso de não existir nenhum hospital central) de modo a conseguirmos abordar um maior número de sujeitos; hospitais que apresentam simultaneamente serviço de pediatria e de internamento e dos quais surgiram as seis instituições que se pretendem estudar, num total de sete casos, cinco no continente e um por cada região autónoma.

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Educação Inclusiva

REsULtADOs CONCLUsIVOs PARCIAIs

na perspetiva da educação inclusiva, atendendo à diversidade dos alunos, o acompanhamento educativo em contexto hospitalar é fruto do reconhecimento formal de que, independentemente do tipo e período de internamento, cidadão tem direito à educação. As análises parciais do estudo apontam, já, alguns aspetos relevantes: a) somos confrontados com a ausência de intervenções organizadas para dar resposta à necessidade de evitar a interrupção das atividades escolares, comprometendo, desse modo, o sucesso educativo destes jovens; b), verifica-se uma tentativa de resposta por parte de algumas unidades hospitalares que, contrariando a dificuldade de desenvolvimento da dimensão educativa, promovem atividades educativas de caráter lúdico com soluções que apenas satisfazem a educação pré-escolar, sendo excluídas iniciativas adequadas a outros níveis do ensino escolar. Mas toda a criança/jovem hospitalizado necessita de manter-se vinculado ao quotidiano escolar anterior ao período de hospitalização, pelo que nos parece fundamental que se estabeleçam propostas de trabalho articuladas, entre as escolas de origem, o sujeito hospitalizado e a equipe do hospital, para que a reinserção na sua rotina habitual seja facilitada após a hospitalização.

Acreditamos que a disponibilização de uma modalidade de acompanhamento educativo no hospital, mesmo que por um período limitado, representa uma medida interventiva fundamental para as crianças e jovens hospitalizados, uma vez que este tipo de atendimento propicia sentimentos de integração e de pertença relativamente a um sistema e promove a igualdade de condições para o acesso ao conhecimento, mantendo o vínculo com a sua realidade fora do hospital e assegurando a continuidade do desenvolvimento intelectual crianças e jovens doentes e da ação educativa, com vista ao acesso e também ao sucesso educativo, bem assim a manutenção do direito e do dever à educação.

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Educação Inclusiva

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RECEtIVIDADE DOs PROfEssOREs à INCLUsÃO DE ALUNOs COm NECEssIDADEs EDUCAtIVAs EsPECIAIs NO ENsINO

sECUNDÁRIO

Maria José Alfama

Universidade de Cabo Verde

[email protected]

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REsUmO

Uma das exigências mais prementes para implementação da Escola Inclusiva é a aposta na formação dos agentes educativos, mormente dos professores. quais as necessidades de formação contínua percecionadas pelos professores do Ensino Secundário e por responsáveis da educação e formação, para dar resposta aos alunos com NEE nas Escolas Inclusivas em Cabo Verde? A recolha de dados foi feita através de entrevistas semidiretas e o tratamento dos mesmos com base na técnica da análise de conteúdo (Bardin, 2008). Genericamente concluiu-se que os entrevistados concordam com a inclusão de alunos com NEE nas turmas regulares, com a formação de todos os agentes educativos e revelam que a atual não dá resposta às reais necessidades da escola inclusiva. Foi reconhecida que adesão à formação está condicionada por fatores intrínsecos e extrínsecos e por aspetos de ordem pessoal (personalidade do professor), relacional (estratégias de comunicação da entidade formadora e ME com o professor) e profissional (resolução dos problemas existentes na classe).

Palavras-chave: formação de professores; necessidades de formação; inclusão; alunos com NEE.

ABstRACt

one of the most pressing requirements for implementation of the inclusive school is the training of educational staff, particularly teachers. What are the ongoing training needs perceived by Secondary school teachers and those responsible for education and training, to respond to students Student with Especial Need (SEN) at Inclusive Schools in Cape Verde? The data collection was done by applying semi-direct interviews and analyzing the latter based on the technique of content analysis. Generally

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Educação Inclusiva

is was found that respondents agree with the inclusion of SEN students in regular classes, with the formation of all the educational agents and reveal that the current classes do not respond to the real needs of the inclusive school. It was recognized that participating in training is conditioned by intrinsic and extrinsic factors, personal (the teacher’s personality) relational (communication strategies of trainer and ME with the teacher) and professional aspects (resolution of existing problems in the class).

Keywords: teacher training; training needs; inclusion; educational special needs.

INtRODUÇÃO

Em Cabo Verde é notável a crescente sensibilidade da Comunidade Educativa e da Sociedade em geral no que concerne ao direito de todos à educação. A Educação promove sem dúvidas a melhoria da qualidade de vida de qualquer indivíduo, permitindo-lhe não só ter ferramentas para aceder à informação como também desenvolver diversas competências e ter uma maior compreensão do mundo que o rodeia.

Apesar de reconhecidos alguns avanços neste domínio, os constrangimentos são imensos. No Relatório preparado pelo GEP do Ministério da Educação para a Conferência Internacional de Educação, realizado em 2004, reconhecia-se que, apesar do quadro jurídico contemplar medidas legislativas apropriadas, a concretização e materialização das práticas inclusivas continuavam a ser deficitárias, por razões de vária ordem, nomeadamente a carência de recursos materiais, financeiros e humanos.

fORmAÇÃO DE PROfEssOREs E INOVAÇÃO

A Formação pode ser entendida como o desenvolvimento do

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sujeito de forma integral (implica a maturação interna e a possibilidade de aprendizagem decorrente das experiências vividas pelo sujeito) ou, num sentido mais restrito, “aquisição e/ou aperfeiçoamento de conhecimentos, atitudes, competências, visando o desenvolvimento profissional do individuo” (Marcelo-Garcia, 1999, p.19).

Segundo Estrela et al, (1999), a identificação das necessidades de formação é um procedimento que não pode ser descurar pois,

“A análise de necessidades, no âmbito das actividades de formação, permite conhecer as necessidades dos indivíduos a formar, visando ajustá-los à organização/sistema, dando-lhes a ilusão de participar responsavelmente nas decisões e diminuindo, por isso, a resistência à formação (e à mudança) e/ou satisfazer as suas lacunas, tornando o formando e os seus problemas e dificuldades no verdadeiro centro do processo formativo” (rodrigues e Esteves, 199,3 p.23).

Cardoso (2002, p. 22) considera prioritária a formação de professores, especificamente para a mudança. Mas para que a mudança ocorra é preciso que a classe esteja recetiva. A autora entende a recetividade como “atitude, diferentes maneiras como reagem as pessoas perante a mudança ou a inovação”. As propostas de inovação são, por vezes, acolhidas com indiferença ou mesmo com receio e hostilidades porque a maioria delas, centralmente decididas, surge devido a mudanças sociais, culturais e políticas numa dada sociedade.

Se recorrermos à Declaração de Salamanca (UnESCo, 1994) encontraremos definidas como escolas inclusivas as que “devem acomodar todas as crianças independentemente de suas condições físicas, intelectuais, emocionais, linguísticas ou outras”. Segundo González (2002), responder à diversidade ao nível das escolas tem um conjunto de implicações para

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Educação Inclusiva

os professores e para as próprias escolas. Os esforços devem centrar-se na busca de estratégias de ajuda para todos os alunos, a fim de que estes possam desenvolver ao máximo suas possibilidades.

A formação de professores para a inclusão implica o desenvolvimento dos conhecimentos, de atitudes inclusivas, através da aceitação da diferença e de capacidades do saber-fazer, através de um conjunto de práticas, nomeadamente, observação e avaliação de necessidades educativas dos alunos, questionamento da prática à luz da teoria (e vice-versa) e resolução de incidentes críticos, de situações problemáticas e de dilemas éticos (Madureira e Leite, 2007).

CABO VERDE E A fORmAÇÃO DE PROfEssOREs PARA UmA EsCOLA INCLUsIVA

nos Estatutos do Pessoal Docente (EPD), Decreto Legislativo nº 2 de 2004, a formação é referenciada em dois capítulos, III e VII, sendo este último dedicado exclusivamente ao desenvolvimento profissional. Acrescente-se que o Decreto-legislativo nº 2/2010, de 7 de maio, revê as Leis de Base do Sistema Educativo do Sistema Educativo Cabo-Verdiano como forma do Governo “introduzir um novo quadro de reforma no sistema educativo, tendo em vista dar respostas adequadas aos desafios globais da sociedade cabo-verdiana (…) ”, segundo a nota introdutória. A qualificação do corpo docente é nomeada como uma das inovações deste novo Decreto-legislativo.

o Plano Estratégico para a Educação reforça as medidas de Políticas do Plano Nacional de Educação para todos (2002) e o Programa do Governo (2006-2010) prevê o fortalecimento da Educação Especial com ênfase na integração escolar das crianças com NEE.

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PERGUNtA DE PARtIDA

As práticas atuais, relativamente à formação de professores, nomeadamente do ensino secundário, serão adequadas a este novo cenário que se desenha com a inclusão de alunos com nEE nas turmas ditas regulares?

O estudo, cujos resultados apresentamos em síntese, teve a pretensão de responder à seguinte pergunta de partida: quais as necessidades de formação contínua, percecionadas pelos professores do Ensino Secundário e por responsáveis da educação e formação, para dar resposta aos alunos com nEE nas Escolas Inclusivas, em Cabo Verde?

recorremos à definição de necessidades de formação de professores proposta por Mesa et al. (1990, p. 178): “o conjunto de preocupações, desejos, carências e problemas sentidos ou percecionados pelos professores no desenvolvimento do processo pedagógico”.

A partir desta definição, foi possível decompor a pergunta de partida em questões orientadoras do estudo: quais são as preocupações dos professores e dos responsáveis face à inclusão dos alunos com nEE?; quais são os principais problemas que os professores sentem quando lecionam em turmas inclusivas?; quais são as carências formativas explicitadas pelos professores e pelos responsáveis da educação, face à inclusão de alunos com nEE?; quais são os desejos dos professores e dos responsáveis, relativamente à formação para a inclusão?

mEtODOLOGIA

Este estudo é de natureza qualitativa, orientado para a descoberta do real a partir da perspetiva dos sujeitos, procurando obter-se informação tão rica e aprofundada quanto possível (Carmo e Ferreira, 2008) e tem um caráter

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Educação Inclusiva

descritivo e exploratório, uma vez que pretende compreender e explicar a situação actual, respondendo às questões orientadoras anteriormente colocadas (Quiwy e Van Campenhoudt, 1992; Carmo e Ferreira, 2008).

Para concretizarmos o que nos propusemos compreender, construímos um plano de estudo aberto, como é caraterístico dos planos qualitativos, no qual os resultados de cada etapa constituíram a base para a realização da etapa seguinte, podendo ser sintetizado no esquema que apresentamos em seguida.

Para a recolha de dados optamos pela entrevista semidireta e, para o tratamento de dados, recorremos à técnica da análise de conteúdo (Bardin, 2008).

Ao nível da realização das entrevistas (etapas 2 e 3), participaram diretamente neste estudo duas (2) dirigentes da educação e formação de professores e oito (8) professores.

3ª Etapa:

Esclarecer aspetos decorrentes das entrevistas aos profs. do Ensino Secundário

Entrevista a duas responsáveis atuais da educação e formação de profs.

2ª Etapa:

Identificar necessidades de formação dos profs. e saber o papel atribuído à formação.

Entrevistas a profs. do Ensino Secundário.

1ª Etapa:

Conhecer o contexto, base para elaboração do guião da entrevista.

Contatos informais com responsáveis pela educação e formação em CV.

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REsULtADOs DO EstUDO

Este estudo possibilitou a identificação das necessidades de formação contínua e os constrangimentos decorrentes da inexistência de um órgão/Gabinete responsável pela formação em geral de professores do ES no País.

Em termos genéricos, concluiu-se que os entrevistados concordam com a inclusão de alunos com NEE e com a formação de todos os agentes educativos envolvidos no processo de inclusão. segundo os mesmos, a atual formação de professores não dá resposta às reais necessidades da escola inclusiva porque as novas competências exigidas ao professor centram-se essencialmente no domínio pedagógico, isto é, no domínio de estratégias e técnicas, aliadas à formação específica na área de educação especial, não ministradas ainda pelas Entidades Formadoras dos Professores do ES no País.

no estudo, foi reconhecido o contributo positivo da formação contínua no desenvolvimento pessoal e profissional do professor. no entanto, revela que apenas “fazer a formação” não basta para que haja o sucesso que se espera, isto é, o contributo da formação contínua do professor Cabo-verdiano está atualmente condicionado por fatores intrínsecos (por exemplo, a forma como o professor se sente na sociedade e suas reais necessidades de formação) e extrínsecos (referentes às condições/estratégias de formação a serem utilizadas e ao acompanhamento do professor pós-formação). Por isso, se por um lado nenhum dos entrevistados se mostrou indisponível para participar na formação, por outro, revelaram alguma reserva quanto à sua adesão à mesma. Portanto, quanto à adesão do professor à formação, concluiu-se que ela está condicionada a aspetos de ordem pessoal (personalidade do professor), relacional (estratégias de comunicação da entidade formadora e ME com o professor) e profissional (resolução dos problemas existentes na classe).

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PIstAs

Deixamos algumas pistas para a melhoria da formação do professor do ES em Cabo Verde:

A primeira relaciona-se com os fatores contextuais, mais propriamente com a forma como os professores têm investido na sua formação em Cabo Verde. Existem Princípios que devem ser respeitados na conceção dos cursos (que é a modalidade que parece ser a mais utilizada em Cabo Verde para formar professores do ES). o respeito pelo 1º Princípio aconselha a conceber a formação como um processo “continum” (Marcelo-Garcia, 1999). não tem sido esta a prática.

Recomenda-se que o Governo/ME e as entidades formadoras criem as condições para que passem a ser respeitados os Princípios subjacentes à Formação do Professor, a começar pela definição das políticas de formação do professor, a criação de um órgão responsável pela gestão dos processos formativos, passando pela discussão de estratégias para resolver os problemas da classe e para motivar os docentes a aderir às ofertas formativas.

A segunda relaciona-se com a criação de condições para respeitar as preferências dos professores, principalmente os processos mais adequados para a organização da formação para a inclusão. Se por um lado, todos reconhecem a importância da formação contínua, é necessário também respeitar o percurso profissional de cada professor.

Assim, recomenda-se que a formação contínua seja realizada na Escola do professor, no período de férias entre períodos (preferencialmente) e que sejam conhecidas previamente as experiências, motivações e expetativas pessoais e profissionais de cada professor, de forma a orientar a formação no sentido de responder às necessidades formativas específicas e a problemas concretos da prática profissional.

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A terceira relaciona-se com o processo de implementação da “Escola Inclusiva”. o estudo permitiu reconhecer que, mesmo havendo uma orientação geral para a educação inclusiva, “ela não está operacionalizada” ainda nas escolas do ES nem no processo de Revisão Curricular em curso.

Recomenda-se que sejam dadas maior atenção à abordagem das nEE no processo de revisão Curricular, à criação de condições básicas para a sensibilização da comunidade educativa e da sociedade em geral e à formação de professores especializados nesta área (Educação Especial).

A quarta relaciona-se com a criação de um ambiente próprio para que as escolas iniciem um processo de adesão ao acolhimento de casos de alunos com nEE. A situação actual em que trabalha o professor (turmas muito heterogéneas) principalmente nos centros urbanos, não é compatível com o que é esperado do professor que trabalha para a inclusão. o ensino condicionado à forma de ser e de estar do aluno e em particular do com nEE implica um conjunto de adaptações na Turma/ Escola.

Recomenda-se que seja reduzido o número de alunos/turma; haja a sensibilização de todos os agentes educativos (alunos, professores, pessoal não docente, pais); e sejam criadas modalidades de compensação do professor que trabalha com os alunos com nEE, nomeadamente a redução da carga horária, a atribuição de uma compensação financeira, bónus em termos de anos de serviço, entre outras.

Foram identificadas algumas limitações neste estudo, as quais se atribuem a diferentes fatores:

Um deles prende-se com o número de participantes que limita a possibilidade de generalização de resultados. No entanto, como em todos os estudos qualitativos, o facto de se recorrer a um número menor de informantes permitiu uma recolha de dados com mais profundidade e, como vimos, possibilitou a identificação de preocupações, problemas e carências que poderão ajudar na tomada de decisões.

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outro fator é a inexistência de dados fiáveis de alunos com nEE. Ainda não existem em Cabo Verde instrumentos que permitam o recenseamento destes alunos. Existindo, possibilitariam o enriquecimento do estudo, pois impulsionariam a pesquisa sobre a inclusão dos mesmos na escola e principalmente da relação que estabelecem com os seus professores.

A inexistência de estudos anteriores nas áreas de formação de professores do ES e Educação Especial em Cabo Verde dificultou também a realização deste trabalho. Isto justifica o caráter exploratório do mesmo.

numa reflexão final sobre os resultados deste estudo, há algumas questões que consideramos pertinentes colocar:

- Estamos atualmente perante o fenómeno do “mal-estar docente” dos professores do ES em Cabo Verde? - Como conseguir motivar os professores do ES para a adesão às ofertas formativas? - Será possível, a curto prazo, criar e implementar um plano de formação contínua de professores que responda, simultaneamente, às necessidades profissionais de cada professor em exercício e às necessidades do sistema educativo?

Estas questões poderão vir a ser objeto de estudos posteriores, contribuindo para o alargamento do conhecimento da problemática das necessidades e dificuldades dos professores no nosso país.

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formAção e AvAliAção de doCentes

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(DEs)ENCANtOs DA INAUGURAÇÃO PROfIssIONAL DOs DOCENtEs

Cândida Mota-Teixeira; Elisabete Ferreira

Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação- Universidade do Porto

[email protected]; [email protected]

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Formação e Avaliação de Docentes

REsUmO

A materialização de ideias, acerca dos professores neófitos concorre para estabelecer um patamar de compreensão (e não de conclusão) para o estudo dos problemas mais comuns aos professores nas sociedades compósitas e complexas da contemporaneidade. O presente estudo decorre do projeto de investigação FIPAIF (Formação inicial de profissionais de ajuda e identidades dos formadores: um estudo sobre o ensino e a enfermagem). Sob a égide de uma metodologia qualitativa de recorte de investigação segundo entrevistas biográficas aos docentes neófitos - três educadores de infância, e quatro professores do 1º e 2º ciclo do ensino básico, licenciados na escola superior de educação do Instituto Politécnico do Porto, integrados no mercado de trabalho há cerca de 5 anos, sublinharemos o significado iniciação profissional dando a conhecer alguns dos maiores des(encantos) associados a este período inaugural. Estes períodos foram sentidos com apreensão que se traduzem em cortes e rupturas que geram acentuados níveis de mal-estar docente (Lopes, 2007; Mota-Teixeira, 2009). A inexistência de apoio e de (in)formação contextual processual e pedagógica, a indisponibilidade para o outro e para o novo, por parte dos docentes mais experientes, resultou em inquietudes que desaceleraram as conquistas identitárias que ambicionavam no inicio da carreira profissional.

Palavras-chave: desenvolvimento profissional; (des)encantos; constrangimentos; clima de trabalho; iniciação profissional.

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1. INtRODUÇÃO

o processo inaugural de construção profissional faz-se com “avanços e recuos, com consensos e rupturas, na relação do actor social [os profissionais] com os seus pares e com a sociedade” (Sarmento, 2002:131). nesta circularidade relacional, os profissionais confrontam-se com desafios de (in)certezas: certezas das suas perspectivas que a certificação, à partida, lhes confere, incertezas pelas inquietações adjacentes a um mundo incógnito, apesar de aparentemente familiar. Esta travessia para a outra margem pauta-se por rupturas e, simultaneamente, pelo aparecimento de tensões adicionais (Mota-Teixeira, 2009), que quando debilmente geridas podem gerar consequências graves quer de foro pessoal, quer profissional.

Neste mundo aparentemente incógnito, os docentes experienciam múltiplas tarefas que não se esgotam no trabalho pedagógico da sala de aula (Cardona, 2006), perpassando os muros da sala e os muros da escola. São tarefas que apontam para perspetivas plurais de interações entre pares (Mesquita, 2011) onde se conta com a solidariedade da comunidade aprendente (Correia & Matos, 2001). De facto, as solidariedades que cuidam, que ajudam, que esclarecem e que incentivam, nem sempre se registam na proporção desejada (Day, 2004). A iniciação profissional, grande parte das vezes, estreia os docentes em caminhos de “sozinhez” que se revelam inibidores do desenvolvimento profissional e condicionador do desenvolvimento da pessoa (Fuentes & Mota-Teixeira, 2007).

Ancoramos a presente investigação em estudos realizados anteriormente (Mota-Teixeira, 2009), agora redimensionados por novas complexidades educativas que investigamos no projeto de investigação FIPAIF. As narrativas orais suportaram a recolha de dados que posteriormente analisados deram origem a uma triangulação geradora de gnoses interpretativas, críticas e hipoteticamente (trans)formadoras da

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Formação e Avaliação de Docentes

agência humana dos docentes neófitos (Ferreira, 2012).

Evidenciam-se, neste texto, os processos de socialização que ocorrem nos períodos de iniciação profissional, dando conta de narrativas tradutoras dos constrangimentos de mal-estar (solidão profissional; excesso de tarefas; fadiga física e psicológica; falta de solidariedade entre pares; desconforto e desencanto com a máquina técnico-burocrática) e aponta-se para uma praxeologia potenciadora de desenvolvimento profissional e da agência humana (ibidem).

2. VOOs DE INICIAÇÃO PROfIssIONAL

É na transição entre os dois mundos - socialização primária (família, escola…) e socialização secundária (empresas, profissões…) que o indivíduo incorpora o habitus profissional. Estes voos de iniciação profissional ocorrem, objectivamente, com a entrada no mundo do trabalho, assumindo aqui, através de um jogo de mudanças, de interacções e de relações sociais a sua primeira identidade de trabalhador (Dubar, 1998).

Esta transição é designada por Azevedo (1999:95) de “voo de borboleta”, por ser um voo aprazível e por ser, simultaneamente, incerto. revela que este “esconde um segredo: em cada dia e em cada momento que o voo se esboça, ele nunca se repete. É sempre novo no seu ziguezaguear. Ora sobe, ora desce, ora vira para um lado, ora passa para o outro, ora avança, ora retrocede” (ibidem). Neste dizer metafórico, os docentes projetam, após a obtenção do diploma, o seu futuro num contexto de enorme turbulência e imprevisibilidade.

nesta circularidade de voos, a identidade profissional redimensiona-se a cada instante, isto é, neste “caos vocacional [o docente] percorre áreas

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tão diversas como os questionamentos intra-individuais, as mudanças intra-organizacionais e as mutações interorganizacionais” (ibid.:96). De facto, inaugura-se e conquista-se um novo estatuto, “com direitos e obrigações, talvez com vantagens, pessoais, sociais, económicas, mas, frequentemente, com o preço do isolamento no meio dos seus pares, com olhares que ferem” (Silva, 2007:55). neste encalço podem ocorrer desabamentos de ideais traduzíveis, na maioria das vezes, em crises identitárias.

2.1. REfERENCIAIs fUNDAmENtAIs NA CONstRUÇÃO DA IDENtIDADE PROfIssIONAL: (DEs) ENCANtOs

A construção da identidade docente encerra variáveis múltiplas e consubstancia-se em distintos referenciais. As instituições de formação ocupam na vida pessoal e profissional dos seus estudantes, enquanto tempo primeiro de socialização profissional (Lopes et al, 2007) um grande referencial que os acompanha ao longo da vida profissional. São referenciais poderosíssimos de desenvolvimento de competências e conhecimentos (ibidem). Em paralelo surgem as instituições de trabalho enquanto espaços de reconfiguração desses mesmos saberes e enquanto plataformas de (trans)formação da identidade situadas. Surgem neste contexto grandes encantos, essencialmente com a possibilidade de colocarem em marcha modos de ação pedagógica apreendidos.

A diversidade de novas variáveis que tiveram que mobilizar, a quantidade, por vezes «avassaladora», de acontecimentos e informações, coincidentes e cumulativas, que tiveram que «digerir», todos os dias e a todo o momento, fizeram com que os protagonistas do estudo vivenciassem constrangimentos vários e elevados níveis de stress (Machado, 2007).

realça-se, em primeiro plano, uma imensidão de tarefas de difícil

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gestão, pelo que a falta de tempo é uma denominação comum em todos os seus discursos, já que se esforçam por dar resposta às variadas solicitações que se lhes apresentam (Gordon, 2000). A sua identidade de papel e a abordagem acional da profissão passa pelas dimensões de integração teórico-prática (pesquisa), reflexão (na ação e sobre a ação), planificação, consistência e organização (recursos, de espaço e de tempo), avaliação, entre outras questões técnico-burocráticas (ibidem). A protagonista do estudo - Maria (P.2º ciclo) reforça a ideia das múltiplas tarefas quando narra: “para além da…de dar aulas, há outras questões que também estão ligadas à escola, a parte de direção de turma, aquela parte mais administrativa.

neste ofício cumulativo mobilizam um conjunto de recursos pessoais, alguns dos quais o indivíduo percebe, ainda, como insuficientes. Daí o desconforto sentido. Aliado a este desânimo surge o desfasamento entre as expectativas iniciais sobre a profissão e o confronto com uma realidade diferente. Marta (E.I), de forma desencorajada diz: Eu posso dizer que (…) nós não fazemos atividades pedagógicas… não dá”.

questionam as convicções e precipitam-se numa indagação, que faz com que esta fase seja, naturalmente, vivenciada de forma crítica (Lopes, 2007; Ferreira-Alves, 1994; Gordon, 2000).

reivindicam, essencialmente os profissionais do 2º ciclo do Ensino Básico, melhores condições de trabalho, que lhe permitam desenvolver práticas educativas de qualidade. Declaram não possuir recursos materiais adequados e que os próprios alunos reconhecem essa fragilidade: “Primeiro eles dizem que não cabem todos no laboratório, o laboratório é metade desta sala, não cabem todos lá dentro. não dá… é impensável” (Maria, P.2º ciclo). os stressores típicos, nestes casos, passam pela falta de condições que obviamente geram constrangimentos, fadigas e imprevisibilidades esgotantes, como nos conta Alda (P.2º ciclo): “há certas salas que não têm mesmo condições. Chegou-me a acontecer não ter cadeiras para os alunos

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todos… era um caos!”.

Nem sempre a vontade de dar resposta a todas as solicitações é possível, já que implicam a mobilização de um conjunto de recursos pessoais, alguns dos quais o indivíduo percebe, ainda, como insuficientes (Gordon, 2000). Daí o desconforto sentido. Aliado a este desânimo surge o desfasamento entre as expectativas iniciais sobre a profissão e o confronto com uma realidade diferente. questionam as convicções e precipitam-se numa indagação, que faz com que esta fase seja, naturalmente, vivenciada de forma crítica (Lopes, 2007; Ferreira-Alves & Gonçalves, 2001; Gordon, 2000). Sublinhamos, agora, as solidariedades ausentes (Correia & Matos, 2001) como indicador de grande descontentamento.

A inexistência de apoio e de (in)formação contextual processual e pedagógica, a indisponibilidade para o outro e para o novo, por parte dos docentes mais experientes, resultou em inquietudes que desaceleraram as conquistas identitárias que sofregamente apeteciam (Huberman, 1998; Gordon, 2000; Cordeiro-Alves, 2001). Realçamos o facto de os protagonistas idealizarem um maior apoio, interação e maior valorização por parte dos pares. Aliás, Maria (P 2º ciclo) ilustra esta significação, enunciando: “eu acho que nós somos encarados, não é por toda a gente, mas por grande parte somos encarados por: oh, eles não percebem nada disto, são uns miúdos - em certa parte acontece isso”.

Abraham (1988) argumenta que tal desvalorização é fortemente alimentada no seio da própria comunidade docente, o que dificulta o estabelecimento de uma identidade profissional positiva e valorizadora. Atribui tais dificuldades a obstáculos de ordem interna, que impedem ou dificultam o sentido de pertença a um grupo profissional, com finalidades e identidade bem definidas. Em consequência, este tipo de indivíduos tende a isolar-se e a sentir-se altamente insatisfeito com a profissão. Contudo, neste caso, os sujeitos do estudo, apesar da desvalorização sentida, não

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Formação e Avaliação de Docentes

questionam os sentidos e fundamentos da pertença à profissão.

3.CONsIDERAÇÕEs fINAIs

Este trabalho não ambiciona permanecer numa sociologia da denúncia (Correia, 1998:109). Ambiciona, antes de mais, alertar as organizações educativas, os professores, os educadores e outros atores educativos para profissionalidades não assépticas, que vivem quotidianos de iniciação profissional “dilemáticos e, por isso, desgastantes” (Lopes, 2012:13). Assim, face aos indicadores de descontentamento encontrados, centrados na ausência de solidariedade entre pares, nas múltiplas tarefas e na falta de condições ótimas para um ensino de qualidade foi nosso objectivo enunciar um papel comunicacional e activo de acção humana recombinado numa lógica compósita de acções (sensata, comunicacional, dialógica e crítica), na medida em que, os professores/educadores devem ser tomados como profissionais do desenvolvimento humano que interferem, de forma intencional, racional e planificada no desenvolvimento de outros seres humanos (Ferreira, 2012). E como tal, precisam de equilíbrio e de uma profilaxia, fundamentalmente, relacional. Podemos, pois, depreender que estes profissionais são “obrigados” a viver na linha de confluência entre o pessoal e o profissional e que esta conjuntura apela a uma necessidade constante de referências éticas, de pontos de apoio, de valores que ajudem a estruturar um espaço de reflexão e de exercício profissional colegialmente partilhado.

Sublinha-se que as estratégias de sobrevivência que estes sujeitos forjam centram-se na formação continua e/ou complementar que lhe proporciona a partilha de saberes e de angústias, o contato com os outros e o (des)envolvimento de identidades solidárias e colaborativas. Encontram nos muros da sala, na sua própria gestão curricular (que a fazem invisível ao

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olhos de outros pares) e na interacção e relação com os alunos os patamares de maior satisfação, a profilaxia do mal-estar.

Neste encalço, Ferreira (2012) tem defendido recorrentemente uma organização educativa comunicativa, autónoma, sustentada no reconhecimento de uma ética do afecto e da relação. Também Azevedo (1999) atribui ao modus operandi da escola, a imperfeição dos voos. Diz que transportar na bagagem conteúdos, não é garantia suficiente para planar em “voo de borboleta” (ibid.), acrescenta as atitudes plurais no encorajamento a voos mais altos. Estes coadjuvantes poderão ser diretas, no contexto da sala, no âmbito de competências muito específicas e no âmbito da dimensão pessoal, sendo que o mais importante é diluir as inseguranças sentidas nesta fase. Urge, de facto, “o cuidado de pensar a ética” (Ferreira, 2012:151) da escola. Urge uma “ética do cuidado construída numa razão dialógica” (ibidem) que apoie os docentes principiantes na construção das suas identidades profissionais.

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PROfEssIONAL DEVELOPmENt IN CAPE VERDE: A sAmPLE Of PRImARy AND sECONDARy sChOOL tEAChERs

Courtney Creamer

Bridgewater State University

[email protected]

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Formação e Avaliação de Docentes

ABstRACt

This study was developed to answer questions about professional development training (PDT) for teachers in Cape Verde. Specific study questions centered on whether Cape Verde teachers have had PDT since completing their teacher licensing program, how current that training has been, and whether PDT is available to teachers on a regular basis. To systematically gather data on these questions, a survey was developed and distributed to 136 teachers on three islands of Cape Verde: Brava, Fogo, and Santiago. To illuminate answers from these surveys, follow-up interviews were conducted with 23 teachers. results indicate that the opportunities for, and perceptions of Professional Development training for teachers in Cape Verde varies between islands, administrators, and teachers. A majority of teachers have had some PDT, though definitions and perceptions of this training vary. Results also show great variability around how current Professional Development Training has been, and the regularity with which Cape Verde teachers are provided PDT.

Keywords: professional development for teachers; Cape Verde education; teacher training.

REsUmO

Este estudo foi desenvolvido para responder a questões sobre a formação para o desenvolvimento profissional (FDP) de professores em Cabo Verde. As questões do estudo estão centradas no fato de os professores de Cabo Verde receberem FDP desde que completam o seu programa de licenciatura. São questões sobre como tem sido a formação e se a FDP está disponível para os professores de forma regular. Para recolher

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sistematicamente dados sobre estas questões, a pesquisa foi desenvolvida e endereçada a 136 professores em três ilhas de Cabo Verde: Brava, Fogo e Santiago. Para esclarecer as questões dessa pesquisa, foram realizadas entrevistas a 23 professores. os resultados indicam que as oportunidades para e as percepções sobre a formação para o desenvolvimento profissional dos professores em Cabo Verde variam entre as ilhas, os administradores e os professores. A maioria dos professores tiveram alguma FDP, embora as definições e percepções deste treinamento variem. os resultados também mostram grande variabilidade em torno de como a atual Formação para o Desenvolvimento Profissional tem ocorrido e da regularidade com que os professores de Cabo Verde têm beneficiado dessa Formação.

Palavras-chave: desenvolvimento profissional de professores; educação em Cabo Verde; formação de professores.

PROBLEm, PURPOsE, sIGNIfICANCE

As an aspiring teacher, one who will most likely accept a job in the future from a Massachusetts school district with a high Cape Verdean population, I took part in a Study Tour to Cape Verde in January of 2012, a tour whose purposes included familiarizing participants with the educational system of Cape Verde and asking questions about teaching approaches, students, schools, and national educational outcomes. During this tour, many of my questions about education in Cape Verde were answered. other questions, on teacher training and on-going professional development, were, beyond the scope of the meetings at hand. Upon returning from the tour, I was challenged with writing a literature review and discovered that little to no research had been conducted in English to my knowledge on the topic of professional development opportunities for Cape Verdean teachers in Cape Verde. The purpose of this study is to examine if any professional development opportunities, such as workshops

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for teachers to learn new ways of enhancing teaching strategies and training sessions for teachers on different areas of pedagogy, exist for teachers in Cape Verde. The significance of this study is important because there has been little to no research in English previously conducted and published about professional development opportunities for teachers in Cape Verde that I have discovered. This research aims to inform Cape Verde education policy makers, as well as other interested professionals from Africa and around the world, about matters surrounding professional development in Cape Verde. This research can demonstrate to the Cape Verdean Ministry of Education officials whether or not Cape Verdean teachers feel they have had appropriate opportunities for professional development, and whether they have taken or would take advantage of these opportunities if offered.

REsEARCh QUEstION

Do Cape Verdean Teachers receive Professional Development? If so, to what extent and how often do teachers take advantage of the opportunities? Do teachers feel these opportunities have been helpful?

POPULAtION & sAmPLING

The researcher traveled to three islands of Cape Verde to conduct this research; Fogo, Brava, and Santiago. These islands were chosen to be visited as part of the Bridgewater State University Winter Study Tour 2013 in which the researcher accompanied to carry out the study. In order to collect data, the researcher visited a total of 14 schools on Fogo, Brava, and Santiago Islands that were chosen in advance by Bridgewater State University’s International relation Coordinator Harold Tavares. He chose the schools based on a variety of factors such as; urban and rural locations and student population (large and small) so that the data would not be skewed by similar

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demographics. The researcher handed out 136 surveys to teachers in the schools. The surveys were given to primary and secondary Cape Verdean teachers who were currently working at the time of the researchers visit in each school. Interviews were then conducted by the researcher in order to provide specific information that could not be received through a simple survey, 23 teachers and 5 principals were interviewed. The teachers who were interviewed consisted of teachers from various disciplines who have been teaching in the school at the time of the visit. In all cases, the principal was required to choose two individuals that would be interviewed by the researcher, if there were no teachers available at the moment; the researcher interviewed the principal, asking the same general questions that were asked of the teachers.

INstRUmENtAtION

A 14 question paper survey was used as method of collecting data for this study. The survey consisted of a variety of questions that the participant responded to by either circling the best answer provided or writing in their response in the designated areas. The questions were developed in advance by the researcher as a way to determine if Cape Verdean teachers receive professional development. The researcher chose to use a survey as an instrument to gather data for this study because it would be the most effective and efficient way to gather information in a short amount of time.

PROCEDURE AND tImE fRAmE

In order to conduct this study, the researcher spent two weeks in Cape Verde from January 4, 2013 to January 18, 2013. She traveled to three islands, went to 14 schools, interviewed 23 teachers and 5 principals, and received 136 completed surveys from teachers. The researcher along with

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an interpreter, Ismael Monterio, accompanied the 2013 Bridgewater State University Winter Study Tour to all the schools in order to conduct interviews and administer surveys. Schools were visited in the morning and in the afternoon, depending on the itinerary that was provided by Bridgewater State University. The visits to each school lasted approximately 2 hours. Within that time, the researcher, with the help of the interpreter, would interview two teachers per school while the principal gave each teacher in the building the paper survey, provided by the researcher. The principal was asked by the interpreter to provide the researcher with two teachers to talk with. By asking the principal on the spot, there would be no bias in the choosing of the best teacher in the school for the researcher to interview. The researcher and interpreter would have a brief conversation in the school with each of the chosen teachers about that teacher’s personal experience or lack of experience with professional development. The researcher would ask questions that were on the survey and asked the teacher to elaborate and tell her exactly what opportunities that teacher had or didn’t have. The goal of the interviews was to get more detailed information about what types of professional development programs were available or not available for teachers and why. Another goal for the researcher was to try and understand the reasons behind the teacher receiving or not receiving professional development opportunities. The researcher wrote down all responses from the teachers translated in English from Portuguese by the translator in a notebook. on the island of Fogo, the researcher visited 6 schools, three secondary schools (Teixeira de Sousa, Teixeria de Sousa Middle School, and Curral Grand) and three primary schools (Pedro Monterio Cardosa, Santa Fillomaina, and Curral Grand) and interviewed 10 teachers and 3 principals.

On the island of Brava, the researcher visited 3 schools, two secondary (Brava Secondary School and Our Lady of Grace funded by Americans) and one primary school (Manuel Gomes). The researcher interviewed four teachers and two principals. She received 17 completed surveys from all of the schools combined.

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on the island of Santiago, the researcher visited 5 schools, two primary schools (Moia Moia and Alti Safendi) and three secondary schools (Domingos Ramos, Pedro Gomes and Alfredo da Cruz Silva). The researcher interviewed 9 teachers and received 59 completed surveys form the schools combined.

sCOPE AND LImItAtIONs

This study represents just a small sample of teachers in Cape Verde. It was not possible to attend every school on every island in Cape Verde to collect data; therefore there is a possibility that some schools and teachers have a greater opportunity for professional development programs than others. In schools that were attended, not every teacher was able to be surveyed.

The sample from each school visited is not the complete population of teachers in the school, as some teachers were not present during sampling. The surveys were designed by the researcher based on knowledge from a previous literature review that focused on professional development in Cape Verde and other small island developing states. Some of the questions on the survey were irrelevant to this study while others provided little to no detail for this study. The survey was created in English and translated into Portuguese by the means of a computer translating program that was available to the researcher, Google Translate. The computer translation, unfortunately, did not translate the correct grammar and language as it was in English which could have confused many of the teachers reading and taking the survey. Even though Portuguese is the official language in Cape Verde, many individuals do not speak it as fluently as they speak Creole. The type of Portuguese used by the computer translation could have been a different version than the people of Cape Verde are familiar with. one of the largest limitations for this study was the language barrier. Because

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Formação e Avaliação de Docentes

the researcher does not speak the native language of Portuguese or Creole, she depended on an interpreter for all means of communication with teachers and administrators for this study. There were many times when the researcher had to change the wording of questions for clarification when interviewing teachers because the vocabulary used in English is not always the same vocabulary that is used in Portuguese or Creole. The data collected from interviews and surveys may not be as accurate as it could have been.

The results from the study of the surveys suggest that a high majority 72% of the teachers in Cape Verde indicated that they have had opportunities for professional development after their initial teacher training program while 28% of the teachers surveyed indicated they have not received any professional development opportunities. of the teachers who have had opportunities for professional development trainings, 92% indicated that it was helpful. For those teachers who have never been offered a professional development opportunity, 98% of them say they would attend if a professional development opportunity was presented to them. When asked if teachers would be willing to pay for training sessions, 72% of surveyed teachers said yes while only 28% said no. When asked what time of day would be preferred for professional development training sessions, 75 teachers said Saturday morning, 55 teachers said before school, 25 teachers said afterschool and 12 said Saturday evening. When given a list of seven categories that teachers could get workshops to improve their skills on, Technology in the Classroom ranked the highest with 71 teachers choosing it. next was, Meeting the needs of All Learners with 60 teachers, followed by Lesson Planning with 50 teachers. next was, Teaching Instruction Strategies followed by Classroom Management with 47 and Group Work Skills with 28. Lastly was reading Instruction with only 24 teachers choosing that category.

In the interviews, more teachers indicated that they had not received any professional development training since their initial teacher training

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programs. In fact, 72% said they had not had any professional development training opportunities since the completion of their original teacher training program while only 28% said they did have professional development opportunities. While interviewing a teacher in Praia, he said “There is no trainings available now, Cape Verde is very poor in this.” Another teacher mentioned that he had training 30 years ago in Cuba but nothing in Cape Verde. Of the 28% who have had training, 75% said it was helpful and they would definitely attend again. “I always ask for more training whenever I go- I love them!” said a kindergarten teacher in Praia. When asked if teachers wanted more professional development opportunities in the future, 100% said yes. “We all must improve to not be stable and to achieve more” said one teacher in Brava. Another teacher said “It’s always good to learn even though there is no money for higher education (professional development) it is always great to have more knowledge.” Another teacher said “Absolutely! I would love more training! I would welcome it with open arms!” When asked what areas or topics were in most need of training, the most common answer was how to motivate students the second most common answer was Portuguese and math instruction techniques. 100% of teachers interviewed would attend professional development training opportunities if they were offered and would all be willing to pay for them if necessary.

CONCLUsION

results indicate that the opportunities for, and perceptions of professional development training for teachers in Cape Verde varies between islands, administrators, and teachers. A majority of teachers have had some professional development training, though definitions and perceptions of this training vary. Results also show great variability around how current professional development training has been, and the regularity with which Cape Verde teachers are provided professional development training.

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Formação e Avaliação de Docentes

It is clear to see how much Cape Verdeans value their education. 100% of teachers interviewed expressed great interest in learning more about teaching and said they would attend any workshops that were offered even if they had to pay for it themselves. There is conflicting data between the surveys and the interviews as far as who has had professional development opportunities prior to the completion of teacher training programs completed at the college level. Most of the teachers that were interviewed expressed a great need and interest for more professional development/teacher training programs and workshops. There is a longing for more resources and support for teachers who are having difficulty in the classroom. One of the biggest things teachers want to do is to be able to motivate their students more so that they will want to learn. From the teachers that were interviewed, there are hardly any opportunities for professional development and they would love to see more of that in the future.

REfERENCEs

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AVALIAÇÃO DE DEsEmPENhO DOs PROfEssOREs DO ENsINO sECUNDÁRIO Em CABO VERDE: AmBIÇÕEs E LImItEs

José rito Baptista Teixeira

Aldeia SOS – Assomada - Cabo Verde

[email protected]

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REsUmO

A problemática da melhoria da qualidade do ensino é cada vez mais referenciada, tantos nos escritos, nos debates políticos e nos media contemporâneos. Ela abrange todos os países independentemente do seu grau de desenvolvimento. Cabo verde, reafirmou desde o ano 2000, a avaliação dos professores enquanto eixo para melhorar a qualidade da educação e do ensino, bem como a melhoria da prestação pedagógica, desempenho profissional, aperfeiçoamento e a valorização do trabalho dos docentes. o presente artigo tem como objetivo explorar as seguintes questões de partida: Em que medida essa avaliação em curso, atinge os objetivos preconizados pelo decreto regulamentar vigente? Será que ela é pertinente, eficaz e está adaptada aos desafios contemporâneos? Para podermos responder a essa questão baseámos a nossa pesquisa numa análise diacrónica e sincrónica. Para além da análise de estatísticas e informações qualitativas, aplicamos entrevistas às pessoas chaves e inquéritos em todas as ilhas com exceção da Boavista, totalizando cerca de 1/5 da população docente efetiva do ensino secundário incluindo os diretores. A pesquisa revelou-nos através dos testes não paramétricos, toda a complexidade do processo de avaliação, na sua dimensão heurística e praxeológica bem como o seu caracter contraditório. Evidenciamos um certo “insularismo” e algumas posturas anti-avaliação.

Palavras-chave: avaliação de desempenho; avaliação formativa; desenvolvimento profissional dos professores.

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Formação e Avaliação de Docentes

RésUmé

Le besoin d’améliorer la qualité de l’enseignement est de plus en plus référencée dans les écrits, les débats politiques et dans les media contemporains. Il touche tous les pays et tous les degrés de développement. En ce qui concerne le Cap Vert depuis l’année 2000, il a été choisi l’évaluation de la performance des enseignants, en tant instrument pour le développement de son système éducatif, ainsi que l’amélioration des performances professionnelles et la valorisation du travail des enseignants. Cet article a pour objectif répondre aux questions de départ qui sont les suivantes : Dans quelle mesure l’évaluation des enseignants mise en œuvre au Cap Vert atteint les objectifs proposés par le décret en vigueur? L’évaluation est-elle, pertinente, efficace et adaptée aux défis contemporains? Afin de répondre aux questions posées, notre recherche a été basée sur l’analyse diachronique et synchronique. En plus de l’analyse des statistiques et des informations qualitatives nous avons appliqué des entrevues à des personnes clés et réalisé des enquêtes sur toutes les îles à l’exception de Boa Vista, totalisant environ un cinquième des enseignants de l’école secondaire du pays y compris les directeurs. La recherche nous a révélé par des tests non paramétriques, la complexité du processus d’évaluation dans sa dimension heuristique et praxéologique et son caractère contradictoire.

mots-clés: évaluation de la performance; évaluation formative; développement professionnel des enseignants.

1. ENQUADRAmENtO DO tEmA

As mudanças na educação e na sociedade impõem novas exigências aos professores, que doravante devem fornecer conhecimentos básicos para ajudar os jovens a se tornarem totalmente autônomos através da aquisição de competências-chave.

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Todavia a evolução dessas mudanças sociais cada vez mais rápida e de aparência por vezes caótica repercutem-se de forma direta na educação e ensino, transformando tanto as condições de acesso à profissão, como o seu exercício, o desenvolvimento de carreira e identidade profissional dos seus membros. (TARDIF, Maurice et LESSARD, Claude 2004)

Com efeito, o trabalho docente tornou-se uma atividade profissional que faz apelo a conhecimento e competências pluridisciplinares e o ensino tornou-se uma atividade especializada e complexa, exigindo daqueles que o exercem um verdadeiro profissionalismo, pois “as diferenças de eficácia dos professores são responsáveis em grande medida pela diferença de aprendizagem dos alunos”. (KELLAGHAn , Thomas et GrEAnEy Vincent – 2002). Por isso a aprendizagem ao longo da vida ganha cada vez mais sentido.

neste contexto face aos desafios relacionados com a necessidade de melhorar a qualidade dos sistemas educativos, muitos países tem enveredado por reformas, em vários domínios (organização escolar, revisão dos programas, construção e melhoria das escolas etc), mas o que dominou no seio da educação durante os anos 80, 90 e início do ano 2000 foi o recurso à avaliação como forma de melhorar a qualidade do ensino. (KELLAGHAn , Thomas et GrEAnEy Vincent – 2002,)

no caso concreto de Cabo verde, o estudo sobre a reforma educativa de 1987, concluiu que havia “ausência de um sistema de avaliação e controle” assim no início da década de 90, (em plena reforma) em virtude das inovações introduzidas no sistema educativo, foi elaborado o Estatuto do Pessoal Docente (Decreto Lei nº 10/97, de 8 de Maio) que constitui um passo significativo na medida em que define pela primeira vez, os objetivos da avaliação de desempenho diferentes dos agentes da Função Publica.

Por essa via em 2000 a partir do decreto regulamentar de nº 10/2000, Cabo Verde reafirma a escolha da avaliação de desempenho dos professores enquanto eixo para o desenvolvimento do seu sistema

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Formação e Avaliação de Docentes

educativo e valorização dos docentes, com os seguintes objetivos:

a) Melhorar a qualidade da educação e do ensino ministrados;

b) Adaptar o sistema educativo às necessidades educacionais;

c) Melhorar a prestação pedagógica e a qualidade profissional dos docentes;

d) Valorizar e aperfeiçoar o trabalho dos docentes.

2. hIPOtEsEs

Apesar da justeza desses propósitos na legislação atual cabo-verdiana, avançamos com a hipótese de que a avaliação que se pratica nas escolas secundarias do país, não é eficaz e não cumpre os objetivos propostos pois “seria ingénuo, imprudente e contrário à própria ideia de liberdade na construção do nosso futuro aceitar a avaliação, sem um ponto de vista crítico “ (Jorro, Anne 2007).

Pois segundo a autora, esta confrontação é importante em triplo sentido:

1º - reveste-se de um caracter contraditório, pois o real está sempre em desintonia com o desejado, suscitando questionamentos sobre a diferença (distância) identificada entre as duas realidades.

2º - Integra uma dimensão heurística no facto de questionarmos se a atividade não tem um potencial não explorado, se os atores não podem mobilizar de forma diferente as competências e ações profissionais.

3º - É caracterizada pela sua praxeologia nas decisões de ajustamento que podem ser efetuadas.

neste contexto, formulamos as seguintes perguntas de partida, das quais só vamos responder às duas primeiras neste artigo:

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Será que a avaliação em curso, atinge os objetivos preconizados pelo decreto regulamentar vigente?

Será que ela é pertinente, eficaz e está adaptada aos desafios contemporâneos? Se sim, em que medida? Se não: que fazer para que essa avaliação seja um instrumento capaz de melhorar a prestação pedagógica, a qualidade profissional, valorizar e aperfeiçoar o trabalho dos professores?

3. OBJEtIVOs

Compreender em que medida a avaliação de desempenho dos professores contribui para o cumprimento dos objetivos preconizados

Identificar os principais obstáculos que dificultam a sua implementação tendo em conta a pertinência, validade e fiabilidade.

Fornecer pistas para a melhoria do desempenho dos professores e do sistema de avaliação.

4. mEtODOLOGIA

Para podermos responder a essas questões baseámos a nossa pesquisa numa análise diacrónica e sincrónica. Para além da análise de estatísticas e informações qualitativas, aplicamos entrevistas às pessoas chaves e inquéritos.

4.1. EsPAÇO DA AmOstRA

Foram abrangidos um total de 368 inquiridos, sendo 347 professores e 21 diretores das escolas secundarias, de todo o país com exceção da ilha da Boavista que representa cerca de 1% do total dos 2.356 dos professores

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Formação e Avaliação de Docentes

a nível nacional. os inquéritos foram realizados no ano letivo 2006-2007 e contaram com a autorização e colaboração da Direção Geral do Ensino Básico e Secundário e da Inspeção Geral.

relativamente à distribuição dos professores nota-se que as ilhas de Santiago, São Vicente, Santo Antão e Fogo concentram mais de 90% dos professores do ensino secundário, por isso os inquéritos foram distribuídos de forma proporcional, respeitando a sua variação percentual por ilhas, conforme o quadro abaixo.

Quadro 1 – Distribuição proporcional dos inquéritos por ilhas, tendo em conta a repartição dos docentes pelo País

Ilhas /Distribuição de inquéritos

Inquéritos realizados

% de docentes coberta pelo

inquérito

% de docentes a nível nacional por

ilhas- em 2005/06*Santiago (ST) 198 57,1 57,59S.Vicente (SV) 61 17,6 18,50S. Antão (SA) 39 11,2 9,7

Fogo (FG) 19 5,5 5,6Sal (SL) 10 2,9 2,84

Brava (BRV) 7 2,0 1,27Maio (MAI) 7 2,0 1,18

S. Nicolau (SN) 6 1,7 2,12Boavista (BV) ---- ---- 1,15

Total 347 100 100* Dados provisórios – Gabinete de Estudos e Planeamento do Ministério de Educação

4.2. tRAtAmENtO E ANÁLIsE DOs DADOs

Para a análise e tratamento de dados, recorremos ao programa

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SPSS (Statistical Package for Social Science), onde utilizamos os testes não-paramétricos para as variáveis qualitativas, mais concretamente o teste independência do qui-quadrado (X ²) que permite verificar se duas variáveis estão relacionadas e o Coeficiente de correlação de Spearman que mede o grau de associação entre as mesmas.

5. REsULtADOs E DIsCUssÃO

respostas às questões de partida: Será que a avaliação em curso, atinge os objetivos preconizados pelo decreto regulamentar vigente? Será que ela é pertinente, eficaz e está adaptada aos desafios contemporâneos?

A resposta a esta questão vem mostrar toda a complexidade do processo de avaliação de desempenho, na medida em que a resposta à questão levantada, não se resume a um simples “SIM” ou nÃo”, devido a dois fatores chaves que intervêm na apreciação dos professores que são, os anos de serviço e o tipo de contrato.

A partir do teste de qui-quadrado e a correlação de Sperman, distinguimos dois grupos bem identificados:

o primeiro grupo constituído por professores com menos anos de serviço e com um Contrato a Termo, e os de Contrato Administrativo de Provimento que consideram que a avaliação a que são submetidos tende a atingir completamente os objetivos preconizados e os ajuda a melhorar o seu desempenho enquanto profissionais. Para esses indivíduos a avaliação parece ser um instrumento importante para melhorar o seu desempenho visto que a avaliação joga um papel importante na revalidação dos contratos.

o segundo grupo, constituído por professores com mais anos de serviço e do quadro Definitivo da escola estão pouco convencidos e menos recetivos a esta ideia. Consideram mesmo que esta avaliação além de não atingir os objectivos, não tem qualquer impacto na sua vida profissional. De

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Formação e Avaliação de Docentes

referir a existência nesse grupo de professores e diretores que consideram que os objetivos são parcialmente atingidos. neste grupo a avaliação parece estar mais vinculada às progressões e promoções na carreira.

Em todo o caso, os resultados da análise põem em evidência os dois pontos de vista diametralmente opostos.

Entretanto a reivindicação de formação continua, a denúncia da falta de seguimento e de apoio, do relativo “isolamento” (individualismo) da parte dos professores, a existência de uma percentagem significativa (mais de 40%) de docentes que declaram que não tomam conhecimento sempre das suas avaliações, ou a existência de uma percentagem de professores (15%) com uma postura anti-avaliação, apesar dos indícios de uma avaliação indulgente cuja pirâmide é invertida (51%, declaram ter avaliação de Mbom, 32% de Bom e apenas 1% tem uma avaliação de Suficiente); as criticas feitas reclamam especialmente da falta de formação dos diretores no domínio da avaliação, ou do uso da avaliação enquanto instrumento de poder e disciplina o que aumenta o risco de “deslizamento entre o pessoal e o profissional (...) que visa não avaliar um ethos profissional, mas a julgar a personalidade” (JORRO, Anne 2007), a grande subjetividade, a predominância de uma avaliação de cima para baixo, em detrimento da auto-avaliação, ou co-avaliação que facilitaria a reflexão e a criação de uma cultura de rede entre outras; permite-nos afirmar que a avaliação que se pratica em Cabo Verde sofre de inúmeras insuficiências que compromete o cumprimento dos objetivos e torna difícil uma resposta apropriada aos desafios atuais.

Por outro lado, este conjunto de problemas leva-nos a pôr em causa a sua pertinência, validade e fiabilidade se tivermos em conta as posições defendidas por De Ketele et roegiers (1993,) e Paquay et al. (2004) devido a um certo “insularismo” na aplicação da avaliação.

Segundo estes autores a pertinência significa que a avaliação responde à sua função de base, neste caso os objetivos preconizados.

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Em relação aos dois primeiros objetivos, a) Melhorar a qualidade da educação e do ensino ministrados; b) Adaptar o sistema educativo às necessidades educacionais; constatamos que apesar de certos professores considerarem que são atingidos, a ausência de analise e tratamento das avaliações por parte das escolas e dos serviços centrais, a falta de uma articulação entre essa avaliação e a avaliação das necessidades, recursos e ações da instituição não permitem o fornecimento do feed back necessário para melhorar e adaptar o sistema educativo às necessidades educacionais. De salientar ainda que segundo as Delegações do Ministério de Educação, muitas escolas não enviam as fichas de avaliação para serem homologadas o que pode confirmar a versão dos professores quando declaram não ter conhecimento das suas avaliações, ou que não são avaliados.

Em relação aos dois últimos objetivos, c) Melhorar a prestação pedagógica e a qualidade profissional dos docentes e d) Valorizar e aperfeiçoar o trabalho dos docentes, a ausência de ligação entre a avaliação e a formação leva- nos a concluir que esta, não está ao serviço da formação e o exercício do ensino não é considerado como uma profissão em que se exige um aperfeiçoamento constante, exigindo dos que o exercem competências múltiplas para adaptação às mais diversas situações.

na medida em que a avaliação não é contínua, as necessidades individuais e coletivas não são tidas em conta a fim de permitir fixar prioridades para melhorar e aperfeiçoar a prática docente. neste contexto podemos afirmar que a avaliação não responde à sua função primeira, ou seja não é pertinente.

no que concerne à validade, ela supõe que se avalie realmente o que foi proposto avaliar. Uma avaliação é valida se ela incide claramente sobre o objeto avaliado: se se quer avaliar a qualidade do ensino é necessário identificar claramente em que reside esta qualidade e desenvolver estratégias para a alcançar.

relativamente à validade, constatamos que a maior parte dos

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Formação e Avaliação de Docentes

professores, diretores, sindicatos entre outros declaram que os critérios de avaliação são validos, contudo põem o problema em relação aos intrumentos de recolha que variam de escola para escola.

A fiabilidade diz respeito à confiança que se tem nas operações efetuadas. Uma avaliação é fiável se são tomadas todas as precauções para que haja uma constância no julgamento independente de quem seja o observador-avaliador, o momento ou as circunstâncias dessa avaliação.

A falta de regulamentação e de comunicação durante a sua implementação engendra uma multiplicidade de pontos de vista e práticas diversas que os próprios professores desconhecem em quê são realmente avaliadas. Pode-se mesmo dizer que esta situação leva a uma certa “insularidade” na implementação da avaliação. (Citado por FERREIRA, Cristina A. 2002)

É por isso que os professores caracterizam a avaliação de subjetiva e pedem a clarifição dos critérios enquanto os sindicatos propõem «a atribuição de tarefas mais precisas para professores, explicitando os seus deveres e responsabilidades” de forma a melhor avaliar o trabalho docente.

Por outro lado a existência de uma percentagem significativa de professores (quase 60%) que declaram não concordar com a sua avaliação (em que metade destes aceita para evitar conflitos), bem como as posturas anti-avaliação de alguns professores refletem um certo mal-estar (medo?) em relação à sua fiabilidade contudo a “ avaliação não levanta muitas reações defensivas quando o seu valor é realmente compreendido. Ela contribui, no imaginário social, para um desenvolvimento profissional ou uma readaptação organizacional. “ (Jorro, Anne 2007). Pelos motivos apontados podemos dizer que essa avaliação não é fiável.

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6. CONCLUsÃO

Do exposto podemos concluir que:

Existe uma grande diferença entre o que é prescrito pela lei e a prática.

A avaliação de desempenho do pessoal docente parece estar mais cen-trada na lo gica do controlo administrativo (os diretores avaliam os professo-res para responderem às normas legais, o ponto de vista dominante é dos administradores escolares) e a gestão das carreiras (a avaliação visa tomar decisões para revalidação do contrato progressão ou promoção) do que o desenvolvimento profissional dos docentes

os conjuntos de problemas evidenciados põem em causa a pertinência, validade e fiabilidade da avaliação de desempenho com base nesse instru-mento.

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Estatuto do Pessoal Docente – Decreto legislativo 10/97 de 8 Maio, capitulo VII e subsecção II- artigo 29

Avaliação do pessoal docente - Decreto regulamentar n° 10/2000 - 4 setembro

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PERfIL PROfIssIONAL DE PROfEssOREs DA EDUCAÇÃO sUPERIOR COmO ELEmENtO CONstItUtIVO DE IDENtIDADE

DOCENtE

aMaria da Conceição Valença da Silva1; bMaria da Conceição Carrilho de Aguiar; cNatércia Alves Pacheco

a,bUniversidade Federal de Pernambuco, Brasil; cUniversidade do Porto, Portugal

[email protected]; [email protected]; [email protected]

1 Bolsista da CAPES

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Formação e Avaliação de Docentes

REsUmO

no contexto de ressurgimento da atenção sobre a qualidade do trabalho do professor, a questão da identidade docente emerge como temática significativa, uma vez que o foco envolve a constituição do ser professor. nessa perspectiva, o presente estudo aborda a identidade profissional docente, e, nesta fase da pesquisa, buscou-se identificar e analisar o perfil profissional dos professores através da aplicação de um questionário, para evidenciar possíveis aspectos relacionados aos processos identitários dos docentes. o locus de recolha das informações foi a Faculdade Asces, na qual participaram trinta professores. o estudo demonstrou que a identidade profissional docente, particularmente daqueles que exercem a docência na Educação Superior, está atravessada por várias interações: as histórias de vida dos professores, sua formação e o conhecimento especializado, as relações com o grupo profissional, pela singularidade dos sujeitos, numa permanente reinvenção de relações pessoais e profissionais compartilhadas em cada cultura e entre culturas.

Palavras-chave: perfil profissional; identidade profissional docente; educação superior.

RésUmé

Dans le contexte de résurgence de l’attention sur la qualité du travail de l’enseignant, la question de l’identité professionnelle enseignante émerge en tant que thématique significative, étant donné que le focus de l’étude est sur la constitution de l’être enseignant. Dans ce sens, cette étude fait une approche de l’identité professionnelle de l’enseignant. Dans cette phase de la recherche nous cherchons à identifier et à analyser le profil

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professionnel des enseignants a partir de l’application d’un questionnaire sur les aspects ayant un rapport aux démarches identitaires des enseignants. La Faculté Asces s’est constituée en tant que locus de la recherche, dans laquelle ont participé trente enseignants. L’étude confirme que l’identité professionnelle enseignante, en particulier de ceux qui exercent au niveau de l’Enseignement Supérieur, est traversée par plusieurs interactions: les histoires de vie des enseignants, leur formation et leurs connaissances spécialisées, leurs rapports avec le groupe professionnel d’appartenance, la singularité des sujets, dans une permanente réinvention des rapports personnels et professionnels partagés dans chaque culture et entre cultures.

mots clés: profil professionnel ; identité professionnelle enseignante; enseignement supérieur.

1. INtRODUÇÃO

no atual cenário educacional a temática - identidade profissional docente1 - ganha relevo, uma vez que envolve a constituição do ser professor.

Esta pesquisa aborda a identidade profissional docente na Educação Superior, e, nesta fase, buscou-se identificar e analisar o perfil profissional de trinta professores que exercem a docência e são membros do núcleo Docente Estruturante (NDE)2 de Cursos de Graduação. A recolha das informações deu-se através de um questionário, assumindo-se este como elemento que sinaliza aspectos constitutivos de processos identitários. A análise dos dados respaldou-se na Análise de Conteúdo (BARDIN, 2010). Trata-se de uma pesquisa qualitativa, cujo locus de investigação foi a Faculdade Asces, situada em Caruaru/PE/Brasil.

1 neste estudo – identidade profissional docente – entendida no sentido plural de sentimentos de identidade profissional docente.2 O NDE - órgão responsável mais diretamente pela (re)construção, implantação e consolidação do Projeto Pedagógico de Curso. BrASIL/MEC. resolução n. 1 de 17 de junho de 2010.

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neste momento, optou-se por identificar o perfil destes docentes pelo acesso aos respectivos grupos nas reuniões já agendadas pelas coordenações dos cursos. Entretanto, no decorrer da pesquisa serão identificados e analisados os perfis dos demais docentes desta e de mais três Instituições de Educação Superior (IES) que constituem o campo da pesquisa.

2. DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO sUPERIOR: ALGUNs ImPAssEs E DEsAfIOs

No atual cenário educacional é exigida da atuação docente o fortalecimento das dimensões ética, didática e política, numa perspectiva multireferencial, que possibilite o professor analisar fenômenos socioeducacionais, entender e explicar a realidade, tomar decisões, assumir posições críticas e intervir no processo de transformação da sociedade e de nós mesmos, como sujeitos inconclusos, culturais. Tais processos estão relacionados à construção de identidade profissional docente.

Há um reconhecimento no âmbito da educação de que a prática docente é de natureza relacional. Tal prática tem também como base a formação do professor. Contudo, os saberes utilizados por um número significativo de docentes da Educação Superior são, prioritariamente, aqueles que provêm da experiência, das lembranças e dos registros da memória da época em que eram alunos, sem evidência de um contributo teórico que dê sustentação à atividade docente (PIMEnTA e AnASTASIoU, 2002; TARDIF e LESSARD, 2007).

Perante o atual contexto educacional permeado por impasses e desafios, algumas inquietações remetem-nos a indagar: a) que perfil profissional têm professores que exercem a docência em Instituições de Educação Superior? quais aspectos desse perfil suscitam relações com a identidade profissional docente? A partir destas questões, pretende-

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se neste estudo sinalizar alguns elementos do perfil de um determinado grupo de professores, na perspectiva de instigar outros questionamentos relevantes para esta pesquisa.

Importante fator na construção de identidade profissional docente é a formação dos professores, cujos processos incluiriam uma concepção ampliada de pedagogia universitária que envolve várias dimensões e a perspectiva de processualidade (CUnHA, 2010). referindo-se à formação, Pacheco (1996) diz-nos que trata-se de um processo que está relacionado ao exercício de compreender o outro, que é ao mesmo tempo semelhante e diferente de cada um de nós. Para esta autora a formação é sempre uma escuta e uma troca. Daí que seja fundamental assumir que a formação de professores universitários, sendo diferente da de outros níveis de ensino, é tanto mais necessária quanto estes são também, em grande percentagem, formadores de futuros professores.

outros fatores também estão relacionados à construção de identidade profissional docente, como, por exemplo, a categoria administrativa da IES (faculdade, centro universitário ou universidade), se é pública ou privada, uma vez que se diferenciam em vários aspectos, como: visão de educação; missão institucional; organização acadêmica; interesses sociais, educativos, políticos, econômicos etc., com implicações diretas nas atividades desenvolvidas pelos professores. quer dizer, a depender do perfil da instituição e de sua intencionalidade e dinâmica organizacional, os processos identitários dos docentes vão se constituindo e assumindo diferentes características e contornos.

3. PERfIL DE PROfEssOREs DE EDUCAÇÃO sUPERIOR E IDENtIDADE DOCENtE: QUE CONEXÕEs?

Ao referir-se às identidades profissionais Dubar (2006) define-as como maneiras socialmente reconhecidas para os indivíduos se identificarem uns

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aos outros, no campo do trabalho e do emprego. ou seja, como afirma Lopes (2001, p.188), é uma “identidade social particular que decorre do lugar das profissões e do trabalho no conjunto social e, mais especificamente, do lugar de uma certa profissão e de um certo trabalho na estrutura da identidade pessoal e no estilo de vida do ator”.

na busca de conhecimento do perfil profissional de professores de Educação Superior, interessou-nos obter informações sobre a formação e a atuação docentes, com o objetivo de identificar suas relações com os processos identitários. Entretanto, solicitamos outras informações para identificação do grupo, como: idade e sexo.

quanto à faixa etária, 24 professores têm entre 25 e 50 anos, e destes, 18 têm idade entre 30 e 50 anos, o que demonstra ser um grupo com certa experiência de vida e de docência. Cerca de 20 docentes tem entre 5 e 14 anos de experiência, 4 tem entre 15 e 19 anos de docência, 5 tem entre 20 e 40 anos de experiência, e apenas 1 professor não informou.

A maioria é composta por profissionais do sexo masculino. Estes dados parecem ser generalizáveis, embora haja atualmente uma tendência para um maior equilíbrio entre homens e mulheres em qualquer nível de ensino. Mas continua ainda a ser um dado a ter em conta nos discursos em que se supõe que as mulheres criam mais laços com os alunos e os homens com as matérias a ensinar. Preconceito ou não, estas ideias interferem na construção identitária deste grupo profissional.

no que concerne à formação dos professores, buscamos informações sobre o percurso escolar compreendendo o nível médio, o nível superior e a pós-graduação. Com relação ao nível médio, dos 30 docentes apenas um cursou o magistério. quanto à formação de nível superior é bastante variada e abrange os seguintes cursos: Administração, Biomedicina, Ciências Econômicas, Direito, Enfermagem, Fisioterapia, odontologia, Química Industrial, apenas um professor não informou. Dos 30 professores, 21 concluíram o curso de graduação entre 1990 e 2009, período em que são

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retomadas as políticas de expansão da educação superior no Brasil.

quanto à pós-graduação, 29 docentes fizeram cursos relacionados à formação inicial (diferente da docência) e apenas um fez o curso de Mes-trado em Ensino de Ciências. Em continuidade, perguntamos aos docentes sobre cursos de formação continuada, diferentemente daqueles cursos de pós-graduação. os dados sinalizaram que professores têm buscado adquirir conhecimentos referentes à atuação docente, uma vez que 26 deles disse-ram já ter feito algum tipo de curso relacionado à docência.

Quanto aos aspectos da atuação docente, interessou-nos saber sobre o regime de trabalho dos professores e sobre outra atividade profissional, uma vez que a identidade profissional docente vai se constituindo também pelas exigências institucionais e estas variam mediante o tempo de perma-nência do professor na IES, bem como dos seus interesses profissionais.

Do total de professores, 25 tem regime de trabalho entre parcial e in-tegral e 5 são horistas3. Contudo, há exigências legais do Ministério da Edu-cação com critérios definidos para composição do nDE (regime de trabalho, titulação etc.) De acordo com Aguiar (2004), a produção dos docentes como grupo profissional e a construção da identidade profissional estão ligados às relações com as instituições empregadoras e às consequentes transforma-ções mediante relações com os sistemas educativos.

Dos professores envolvidos neste estudo, 21 exercem outra função na IES além do ensino (pesquisa, extensão, gestão etc.). quanto à outra profissão, 17 docentes informaram exercer outra profissão e 13 exercem só a docência.

Como se observa, o processo de constituição da identidade profissional do professor é complexo, vai se configurando em diferentes tempos/espaços/trajetórias, é individual e coletivo, não é um produto, é um processo de permanente reinvenção, de relações pessoais, profissionais, 3 regimes Parcial e Integral (atividades de ensino, pesquisa, extensão, gestão etc.); regime Horista (apenas atividades de ensino).

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experienciais, culturais compartilhadas, ou, como diz Dubar (2005), é um processo de dupla transação biográfica e relacional.

4. CONsIDERAÇÕEs CIRCUNstANCIAIs

Em síntese, este estudo revelou-nos que quanto à formação dos professores, a maioria dos inquiridos tem uma trajetória de formação específica, diferentemente da docência. A formação para a atuação docente na Educação Superior acontece num processo contínuo. Alguns professores demonstraram a necessidade de conhecimentos e saberes da docência. Entretanto, um fator instigou-nos à seguinte indagação: que necessidades motivam essa busca de conhecimentos da docência, uma vez que esta não é a atividade prioritária da maioria dos professores?

Com relação à atuação docente, as informações recolhidas sinalizaram que a maioria dos professores tem um considerável tempo de experiência docente. Percebeu-se que a construção identitária tem sido circunstanciada considerando a carga horária de trabalho de cada professor, as exigências do Ministério da Educação, as diferentes atividades por eles desenvolvidas, bem como as exigências da própria instituição educacional mediante o seu perfil, a sua organização e o seu funcionamento.

Com relação ao número de docentes que não exerce outra profissão, é significativo, mas instigou-nos a outra indagação: haverá influências entre a experiência de ser professor e a outra profissão?

Como se percebe, a identidade profissional docente está permeada por variadas interações: histórias de vida dos professores, formação, conhecimento especializado, relações com o grupo profissional, conhecimento das especificidades da profissão e de sua prática, e ainda pela singularidade dos sujeitos, dentre os fatores relacionados à construção de uma identidade.

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REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Aguiar, M. C. C. (2004). A Formação Contínua do Docente como elemento na construção de sua identidade. 2004. Tese (Doutorado em Ciências da Educação) – Universidade do Porto.

Bardin, L. (2010). Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70.

Brasil (1996). Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394. Ministério da Educação, 1996.

Cunha, M. I. (2010). A Educaçao Superior e o Campo da pedagogia Universitária: legitimidades e desafios. In: Trajetórias e lugares de formação da docência universitária: da perspectiva individual ao espaço institucional. Araraquara/SP: Junqueira & Marin; Brasília/DF: CAPES: CnPq.

Dubar, J. C.(2005) A Socialização: construção das identidades sociais e profissionais. São Paulo: Martins Fontes.

______ (2006). A Crise das Identidades: a interpretação de uma mutação. Portugal, Porto: Edições Afrontamento.

Lopes, A. (2001). Libertar o desejo, resgatar a inovação: a construção de identidades profissionais docentes. Lisboa: Instituto de Inovação Educacional - IIE, 496p.

Melo, M. M. de O.; Cordeiro, T. S. C. (Orgs.) (2008). Formação pedagógica e docência do professor universitário. recife: Ed. Universitária da UFPE.

Pacheco, N. A. Tempos de “Sozinhez” em Pasárgada: estratégias identitárias de estudantes dos PALoP em Portugal. 1996. Tese (Doutorado em Ciências da Educação) - Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, Universidade do Porto, Porto, 1996.

Pimenta, S. G. & Anastasiou, L. (2002). Docência no Ensino Superior. São Paulo: Cortez.

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Tardif, Maurice & Lessard, Claude (2007). O Trabalho Docente: elementos para uma teoria da docência como profissão de interações humanas. 3. ed. Petrópolis, rJ: Vozes.

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RUmOs INDAGADOREs CON(sEN)tIDOs NA fORmAÇÃO INICIAL DE PROfEssOREs

Susana Cristina Pinto; Cândida Mota-Teixeira

Instituto Superior de Ciências Educativas, Felgueiras; Instituto Piaget, Vila Nova de Gaia e Universidade do Porto

[email protected]; [email protected]

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REsUmO

o presente artigo reflete sobre os ambientes e as práticas e/ou os rumos (indagadores) dos estudantes em contexto de duas turmas do Mestrado em Educação Pré-Escolar e 1.º Ciclo do Ensino Básico, de dois institutos, situados no norte de Portugal. nestes meandros de prática pedagógica vivenciamos experiências (intituladas de) contidas, sentidas, con(sen)tidas e com sentido nas instituições de estágio e respetivos docentes cooperantes, as quais nos merecem dedicação reflexiva e indagadora. o principal objetivo deste ensaio é: narrar experiências observadas e vivificadas inerentes às práticas. os métodos que suportam esta análise reflexiva são de natureza dialógica e consideram instrumentos diversos – observação, relatos, portefólios reflexivos –, típicos de uma estratégia metodológica de investigação-ação, que nos sustentam e informam enquanto professoras investigadoras. A consecução do objetivo elencado permitiu um crescimento dos estudantes e também dos educadores cooperantes, e simultaneamente, permitiu-nos reequacionar modos de ação supervisora.

Palavras-chave: formação inicial; estágio pedagógico; supervisão de prática pedagógica; educação de infância.

ABstRACt

The present article corresponds to the work that we have been done in the supervised teaching practice (Preschool) from the Master’s degree in Preschool and Primary School Education. This document contemplates a reflexive analysis about our supervised teaching practice and we wonder it means several kinds of experiences: contained, felt, consensual and mea-ningful. These experiences belong to institutions internship and to their res-

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pective cooperating teachers; so we purpose to talk about it in a way that make possible the growing not only of internship students, but also of coo-perating teachers and our emancipation, as two investigators and teachers. We use various instruments - observation, reports, reflective portfolios -, typical of a methodology of action inquiry.

Keywords: initial training; supervised teaching practice; teaching practice; preschool education.

INtRODUÇÃO

neste artigo evidenciamos experiências de prática pedagógica de estágios do Mestrado em Educação Pré-Escolar e 1.º Ciclo do Ensino Básico (CEB), concretamente na valência de jardim-de-infância; estudantes estes integrados em dois institutos politécnicos do norte de Portugal, nos quais cada professora/supervisora realizou o seu estudo na correspondente instituição de ensino superior. Aquelas experiências assumiram uma dimensão crítico-construtiva, emersa num paradigma qualitativo de investigação, que visou uma compreensão holística das práticas de supervisão de estágios e que assentou na estratégia metodológica de investigação-ação.

nesta linha, a supervisão pressupôs a vivência de climas de transparência, de mútua aprendizagem, de fusão entre um saber teórico e um saber prático, conforme anunciam Alarcão e Tavares (2003, p. 19) que partem da convicção, assente em Dewey, “de que a formação profissional deve ter uma componente teórica e uma componente prática”.

Damos ainda conta de jogos relacionais (contidos), que adotamos para que a relação entre educador cooperante e estudante se estabeleça e se mantenha com qualidade; tendo nós o cuidado de manter uma eficaz cooperação e um acordo tácito entre a prática observada e a prática idealizada.

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À semelhança de Serafini e Pacheco (1990, p. 1) partimos do pressuposto de que a observação “como elemento regulador da tomada de decisões adquire um significado curricular na formação de professores” e, acrescentamos: serve os propósitos da supervisão pedagógica, pois “aborda-se a observação como processo de reflexão, inserido numa estratégia de formação. Por outro lado, apresenta-se um instrumento de observação com propósitos de avaliação”.

Todavia, entre as práticas observadas e as que gostaríamos de observar, temos traçado diálogos entre pares (as duas supervisoras) e com os estudantes; com o objetivo de, em conjunto, empreendermos estratégias de superação e de maximização de aprendizagens. As estratégias relacionais (Ferreira, 2012) constituem-se plataformas de diálogo, de transformação e de emancipação (Freire, 2004), que servirão de guião de discussão para a presente investigação.

Estes espaços, denominados de reuniões de prática de ensino supervisionada, constituem-se em verdadeiros “nichos” de discussão, pesquisa e indagação, onde a supremacia do educador, enquanto profissional do desenvolvimento humano (Baptista, 2005), vai tomando forma e vai resistindo a práticas educativas não intencionalizadas.

Analisamos e interpretamos as nossas experiências em supervisão à luz de ensaios de referência na temática (Alarcão & Tavares, 2003; Vieira, Moreira, Barbosa, Paiva & Fernandes, 2006), não obstante o facto de não fazer parte do escopo deste trabalho uma abordagem teórica da supervisão da prática pedagógica. Assim, num dueto em comunhão (duas supervisoras de dois institutos politécnicos privados), atentamos numa reflexão acesa entre as práticas desenvolvimentalmente adequadas e entre as práticas “bolorentas; repetitivas e institucionalizadas” que se nos apresentam num quotidiano de qualidade algo aparente. Conferiremos consistência a esta dimensão discursiva através de instrumentos reconhecidos e validados, que recorrentemente utilizamos com os nossos estudantes: Cor (High/Scope Educational research Foundation, 1992); ECErS-r (Harms, Clifford & Cryer,

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2008); SAC (Portugal & Laevers, 2010) e que nos ajuda(ra)m a sustentar inferências rumo a uma educação de infância de qualidade. Sublinhamos os portefólios de prática pedagógica como instrumentos chave desta construção.

No entanto, nem sempre os estudantes estagiam nos centros de estágio ideais, em termos de práticas pedagógicas de qualidade; nem sempre o educador cooperante faz jus à palavra cooperação e, nestes meandros, temos que adotar um estilo de supervisão “hábil” e obviamente crítico (nos bastidores), para que o estudante consiga consentidamente apreender a essência do trabalho de educador de infância, levando assim a cabo os propósitos de uma observação/cooperação formativa e formadora.

não deixamos, entretanto, de evidenciar e questionar as estratégias de supervisão que vamos adotando em prol de uma sintonização entre estudantes-formação e qualidade educativa, que por vezes consegue incentivar os educadores cooperantes a (re)formularem as suas práticas, conseguindo ajudar as supervisoras a acrescentarem pontos aos seus futuros desempenhos. Acerca dos estudantes, apenas evidenciamos aquilo que constitui(u) a nossa ação básica e fulcral: o seu desenvolvimento profissional e a construção de uma identidade alicerçada em plataformas de qualidade crescente, assim como a solidariedade que comungamos e partilhamos no dia-a-dia de formação.

1. NOtAs mEtODOLÓGICAs

A escrita deste artigo tem como suporte um leque diversificado de experiências de duas supervisoras. Uma com experiência docente de cerca de vinte e três anos e outra (sua ex-aluna) com uma experiência neófita de dois anos, sendo que a primeira sempre foi professora do ensino superior e a segunda primeiramente foi educadora de infância, por um período de sete anos. Ambas são educadoras de infância de formação base, com graduação em Desenvolvimento Curricular e têm idades compreendidas

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entre os quarenta e os quarenta e cinco anos de idade. neste hiato de duas décadas de experiências, tecem-se reflexões construtivas de ideais tipo de supervisão pedagógica e hierarquizam-se os domínios privilegiados.

Deste modo dialógico, emergem três categorias de supervisão interpretativas, decorrentes de análise de casos, de narrativas e da orientação/análise de portefólios reflexivos: experiências contidas; experiências con(sen)tidas; experiências consentidas e experiências com sentido.

os métodos que suportam esta análise reflexiva são de natureza dialógica (Freire, 2004) e consideram instrumentos diversos, típicos de uma estratégia metodológica de investigação-ação. no presente ensaio, temos o intuito de narrar e descrever as experiências observadas e vivificadas, inerentes às práticas pedagógicas dos estudantes do Mestrado em epígrafe. Por conseguinte, a amostragem compreende os estudantes do referenciado curso de mestrado dos dois institutos, no ano letivo de 2012/2013. As duas turmas, uma de cada instituição, eram compostas por estudantes do género feminino, que estavam a frequentar o 3.º, e último, semestre do Mestrado em Educação Pré-Escolar e 1.º CEB. referimo-nos a turmas com dezassete e vinte estudantes.

Entre as lógicas contidas e com sentido, importa-nos continuar a desenhar perfis de desempenho, capazes de habitar uma educação problematizadora (Freire, 2004), ainda que para tal os cenários de supervisão subentendam alterações constantes, tanto que os dilemas que a pós-modernidade nos coloca exigem a formação de profissionais reflexivos e em desenvolvimento permanente e não apenas técnicos cumpridores de tarefas (Severino, 2007). Das experiências con(sen)tidas, ambicionamos a diluição dos parênteses e o efetivo consentimento de um crescimento plural entre estudante – cooperante – supervisor(a).

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2. EXPERIÊNCIAs VIVIDAs E sENtIDAs

2.1 EXPERIÊNCIAs CONtIDAs

As experiências vivenciadas em contexto de supervisão são maioritariamente contidas, na medida em que se insurgem como alheias ao desejado, isto é, marginalizadas e opressivas face às demandas teóricas (Barros, 2008). Nestes contextos, as supervisoras assumem-se como estrategas do conhecimento, ou seja, entre aprovações fictícias (risos artificiais) e conversas de bastidores com as formandas, as docentes vão intentando um conhecimento pedagógico, diluindo os conflitos, as perdas, as lutas, os estereótipos, as categorias, as graduações e as concorrências, transformando-os em mais-valias formativas.

o nosso papel, enquanto supervisoras, consiste em colocar andaimes, incentivando a estudante a explorar os conhecimentos que adquiriu de forma crítica, construtiva e sustentada. o sentimento que nos afeta é o de liberdade, de inconformismo, de mudança, podendo encontrar interrogações retóricas e induzindo o estudante a agir mentalmente, em rumo da conscientização (Freire, 2004); cuja atitude crítica, move-nos e impulsiona-nos a um cenário de supervisão dialógico e humanista (Severino, 2007). Não obstante, muitas vezes, as estudantes assumem um papel passivo, isto é, percebendo que não podem transformar, limitam-se mais à visualização e menos à observação participante. neste processo, elas impregnam e vivem inquietudes que geram um inevitável conhecimento; sendo, contudo, as supervisoras um “andaime” securizante, o qual assegura um cenário de aprendizagem pela descoberta guiada (Alarcão & Tavares, 2003).

nestas experiências contidas, as estudantes retraem experimentações, saberes, aptidões, conhecimentos, atitudes e competências, pois sentem-se algo contraídas nas decisões que têm que tomar e nas práticas implementadas. Isto porque, muitas vezes, não

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querem entrar em atrito com as ideologias e as pedagogias dos educadores cooperantes; cujas práticas destes últimos poderão desconhecer a implementação de instrumentos de avaliação da qualidade educativa em sede de educação pré-escolar.

2.2 EXPERIÊNCIAs CON(sEN)tIDAs

Por sua vez, as experiências con(sen)tidas representam a afirmação dos orientadores cooperantes em colaborar; muito embora, podendo não estar abertos, à partida, à permeabilidade de novas práticas ou de práticas diferentes. não deixa de ser relevante assinalar que, por vezes, estes educadores cooperantes poderão equacionar modos de trabalho diferentes dos seus, ainda que se pressinta uma certa efemeridade desta transformação.

Assim sendo, adotamos atitudes de insistência estratégica que os levam a transformar as suas práticas. Entramos num jogo de valorização de pormenores, encetamos uma espécie de jogos “teatrais”, através das quais os induzimos a reformular práticas…

Entretanto, facultamos instrumentos validados que “silenciosamente” conduz os educadores ao equacionamento de uma hipotética mudança. A título de exemplo, incentivamos os estudantes a aplicar a ECErS-r, para que – no “silêncio” con(sen)tido – o docente cooperante condescenda uma aprendizagem sustentada. Outros instrumentos já referenciados – Cor e/ ou SAC – servem de plataformas de (in)formação e de troca de saberes entre estudantes e educadores cooperantes. repare-se que o uso destes instrumentos, ou até de artigos científicos, têm como objetivo a (in)formação dos educadores cooperantes, no sentido de estes estarem recetivos à mudança que os referenciais podem imprimir nas suas próprias práticas. Só desta forma, se efetiva a equiparação entre o que se idealiza da formação e o que de facto os estudantes colhem e experienciam.

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2.3 EXPERIÊNCIAs CONsENtIDAs

As denominadas experiências consentidas e/ou com sentido traduzem-se em experiências partilhadas, nem sempre de fácil acesso. num compromisso metodológico de investigação-ação, almejam-se desempenhos alicerçados em relações dialéticas, contextuais, relacionais e cooperadas (Severine, 2007), no sentido em que o potencial desta estratégia propicia a transformação das situações de trabalho (Silva, 1996; Estrela & Estrela, 2001; Sá-Chaves, 2002; Ponte, 2002; Caetano, 2004, cit. por Vieira et al., 2006). Face ao aferido, os docentes cooperantes entram neste processo de “achamento de si”, do outro (estudante estagiário) e de sustentabilidade das suas práticas. Este cenário parece algo raro. Talvez seja mais um cenário idealizado; em que, numa tríade, comungaríamos de experiências, descobertas, indagações. Este é (seria) o cenário idealizado; uma ocorrência que nos apraz(aria) supervisionar a todo o instante. Um quadro onde todos aprende(ría)mos com todos; onde nos descobri(ría)mos; onde experimenta(ría)mos autenticamente a estratégia investigativa de investigação-ação.

A noção de intervenção que defendemos, nesta categoria, remete-nos para a ideia de projeto construído numa dinâmica intrínseca; remete-nos para a ideia de produção do novo partindo do existente, ou seja, para um encadeamento original do existente” (Correia, 1998, p. 1). Esta formação para a mudança, para a produção do novo, implica novas atitudes, tal como o envolvimento e o empenhamento de cada um na sua própria formação. os indivíduos desenvolvem as suas aptidões, enriquecem os seus conhecimentos, melhoram as suas qualificações profissionais, fazem evoluir as suas atitudes ou o seu comportamento, reorganizam os seus valores na perspetiva de um desenvolvimento global equilibrado e independente, mas em interação com o meio social a que pertencem (ibidem). Esta formação para o desenvolvimento deve ter subjacente a preocupação expressa por Schwartz (1969, p. 69 cit. in Mota-Teixeira, 2009, p. 226):

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Formação e Avaliação de Docentes

“tomar toda a pessoa capaz de se transformar em agente de mudança, isto é, de melhor compreender o mundo [...] que a cerca e de agir sobre as estruturas onde vive modificando-as; de trazer a cada um a tomada de consciência do seu poder como agente actuante, de desenvolver seres autónomos no sentido de se situarem e compreenderem o ambiente que os rodeia, de o influenciar e de compreender o jogo relativo entre a evolução da sociedade e de si próprio”.

Promovemos, por conseguinte, um ciclo de supervisão com contornos coincidentes aos pressupostos defendidos por Alarcão e Tavares (2003, p. 98), que se baseia no seguinte: observação (propriamente dita); análise de dados (focalizados em incidentes críticos observados) e, posterior, discussão/reflexão das praxis. neste processo, faculta-se documentação pedagógica que ajuda a sustentar o feedback das supervisoras. Ainda, neste encalço, colocam-se às alunas desafios de melhoria.

CONCLUsÃO

Mais do que supervisoras somos mediadoras de relações contidas, con(sen)tidas e efetivamente consentidas. os contextos influenciam-nos, levam-nos a adotar estratégias diferenciadas; no entanto, não podemos deixar de assumir a nossa preferência por uma supervisão do tipo colaborativo, isto é, do tipo consentida de colegialidade e de qualidade sustentada. Referimo-nos a uma (super)visão informada por um saber teórico-prático, onde a dimensão pessoal se assume como fronteira entre o con(sen)tido e o dito e não dito das práticas pedagógicas.

Das duas experiências em dois contextos diferentes, dois institutos politécnicos, sobressaem práticas de ensino supervisionadas muito semelhantes, mais tendentes para as experiências contidas e con(sen)tidas.

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Há, assim, que refletir sobre os processos de construção da identidade profissional e colocar em primeiro patamar a relação entre o eu, o outro e os outros. É nesta alternância entre o eu e o outro que nos consentimos educadoras e professoras e que idealizamos os nossos cenários de supervisão.

Por conseguinte, as relações entre educador cooperante, professoras/supervisoras e alunas estagiárias são cruciais na qualidade da construção do conhecimento prático.

As relações e as práticas de supervisão consentidas e providas de sentido pedagógico serão um cenário de formação humanista/dialógica a alcançar. Esta atitude transformadora resultará na aquisição de uma perspetiva nova sobre a supervisão que beneficiará o trabalho de educador de infância e o seu profissionalismo.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Alarcão, I. & Tavares, J. (2003). Supervisão da prática pedagógica. Uma perspectiva de desenvolvimento e aprendizagem. Colecção de Ciências da Educação e Pedagogia. (2.ª Ed.). Coimbra: Almedina.

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Baptista, I. (2005). Dar rosto ao futuro, a educação como compromisso ético. Porto: Profedições.

Correia, J. A. (1998). Para uma Teoria Critica da Educação. Porto: Porto Editora.

Ferreira, E. (2012). (D)enunciar a autonomia contributos para a compreensão da génese e da construção da autonomia na escola secundária.

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247

Formação e Avaliação de Docentes

Porto: Porto Editora.

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Fundação de Investigação Educacional High/Scope. (1992). Protocolo de Observação - COR. ypsilanti, Michigan: High/Scope Press.

Harms, T., Clifford, r. M. & Cryer, D. (2008). Escala de Avaliação do Ambiente em Educação de Infância. Edição revista. Porto: Livpsic/Legis Editora.

Mota-Teixeira, C. (2009). (Re)Construção da Identidade Profissional: Perspectivas e Inquietações dos Educadores de Infância em início de carreira profissional. Tese de Doutoramento em Perspetivas Didáticas e Áreas Curriculares. Santiago de Compostela: Universidade de Santiago de Compostela, Espanha.

Portugal, G. & Laevers, F. (2010). Avaliação em Educação Pré-Escolar. Sistema de Acompanhamento das Crianças. Porto: Porto Editora.

Serafini, o. & Pacheco, J. A. (1990). A observação como elemento regulador da tomada de decisões: a proposta de um instrumento. Revista Portuguesa de Educação, 3 (2), pp. 1-19.

Severino, M. A. F. (2007). Supervisão em educação de infância: supervisores e estilos de supervisão. Penafiel: Editorial novembro.

Vieira, F., Moreira, M. A., Barbosa, I., Paiva, M. & Fernandes, I. S. (2006). Caleidoscópio da supervisão: imagens da formação e da pedagogia. Mangualde: Edições Pedago, Lda.

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orgAnizAção esColAr e AvAliAção instituCionAl

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AVALIAÇÃO EXtERNA DE EsCOLAs Em PORtUGAL: ImPACtO NO PROCEssO DE AUtOAVALIAÇÃO DAs EsCOLAs

aMaria da Graça Bidarra; bCarlos Barreira; cManuela Soares

a,bFaculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra; cAgrupamento de Escolas de Lagares da Beira

Oliveira do Hospital

[email protected]; [email protected]; [email protected]

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REsUmO

Tendo como ponto de partida a revisão da literatura sobre a avaliação das escolas no quadro das políticas educativas, as implicações dos estudos sobre a eficácia das escolas e as iniciativas que se têm vindo a desenvolver, designadamente em Portugal, procurámos conhecer o desempenho no domínio Capacidade de auto-regulação e melhoria da escola, mais concretamente no que diz respeito à autoavaliação, de acordo com os resultados no primeiro ciclo da Avaliação Externa das Escolas (AEE). Por outro lado, procurámos refletir sobre o impacto e os efeitos desta atividade no processo de autoavaliação. De acordo com estes objetivos, em termos metodológicos, optámos por um estudo de natureza documental (Estudo 1), procedendo-se à análise dos relatórios anuais de AEE produzidos pela Inspecção-Geral da Educação (IGE). Esta serviu de base a um segundo estudo de natureza descritiva com recurso a uma amostra não probabilística intencional de casos típicos (Estudo 2), no âmbito do qual aplicámos um inquérito por questionário dirigido aos diretores das Unidades de Gestão (UG) que obtiveram classificações de insuficiente e suficiente no domínio supracitado, no ano de 2007/2008. Constituem aspetos fundamentais a ter em conta no Estudo 1, que foi no domínio Capacidade de auto-regulação e melhoria da escola que as escolas obtiveram níveis mais baixos de classificação. no Estudo 2, a AEE parece ter constituído um incentivo às escolas que obtiveram piores resultados no referido domínio, já que as alterações introduzidas no processo de autoavaliação, ao que parece com tendência a alicerçar-se em fins emancipatórios, se verificam, na grande maioria das UG, sendo notória a perceção de um elevado grau de impacto da AEE no processo de autoavaliação.

Palavras-chave: avaliação de escolas; avaliação externa; auto-avaliação.

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

ABstRACt

Considering the study effectuated on the evaluation of schools within the frame of educational policies, the implications of the studies on the efficiency of schools and the initiatives that have been developing, namely in Portugal, we look to understand at the performance in the capacity of the domain of self-regulation and improvement of schools, more specifically, what regards self-evaluation and the improvement of schools according to the results of the first cycle of Schools’ External Evaluation (SEA). on the other hand, we seek to reflect upon the impact and the effects this activity has on the self-evaluation process. In accordance with these objectives and in methodological terms, we choose a documental study (Study 1), proceeding to the analysis of the annual reports of Schools’ External Evaluation (SEA), produced by the Inspecção-Geral da Educação (IGE). This served as basis for a descriptive study with resource a sample non probabilistic intentional of typical cases (Study 2). In this second study, an inquiry per questionnaire was applied to the directors of the Management Units (MU) who obtained insufficient and sufficient classifications in the above stated domain in the year 2007/2008. The fundamental aspects to consider in the first study are that schools got lower classification marks within the capacity of self-regulation and the improvement of schools domain. In the second study, it seems that the SEA gave schools with the worse classifications an incentive in the above domain considering that the changes introduced in the self-evaluation process, with the tendency to be founded upon emancipatory ends in the vast majority of the MU. The awareness of how much impact the SEA has on the process of self-evaluation is notorious.

Keywords: school evaluation; self-evaluation; external evaluation.

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INtRODUÇÃO

Ao longo dos últimos anos tem vindo a ganhar maior visibilidade a intensa atividade das escolas para estabelecer e cumprir os múltiplos objetivos a que são cometidas, em parte devido à divulgação dos resultados no âmbito da avaliação em que têm sido envolvidas. Podemos dizer que se tem procurado conhecer melhor as escolas, nos seus processos e resultados, bem como estas têm vindo a criar dispositivos no sentido de se autoconhecerem para melhorarem o seu funcionamento. Em suma, tem vindo a desmitificar-se a escola e a sua avaliação, ainda que não se tenham eliminado dilemas e tensões que esta atividade suscita, designadamente no que diz respeito à sua função (controlo vs. melhoria) e dinâmicas (avaliação interna vs. externa) (Clímaco, 2002; Marchesi, 2002), sendo igualmente reconhecida a importância de um suporte social e de um quadro normativo (Clímaco, 2002).

Foi, pois, com a publicação da Lei nº 31/2002 de 20 de Dezembro, que aprova o sistema de avaliação da educação e do ensino não superior, e de uma experiência piloto realizada em 2006, que se desencadeou mais recentemente um processo de avaliação externa de escolas de ensino não superior (AEE), que completou o primeiro ciclo em 2010-2011. Este sistema integra duas modalidades de avaliação: a auto avaliação ou avaliação interna, realizada por cada escola ou agrupamento de escolas, e a avaliação externa, da responsabilidade da administração educativa.

o quadro de referência da AEE, que presidiu ao primeiro ciclo de avaliação, foi elaborado com base num referencial inspirado em experiências nacionais e internacionais (IGE, 2009a; ME, 2006), contemplando cinco domínios fundamentais, que integram entre dois e cinco subdomínios ou fatores, num total de 19, e as correspondentes questões orientadoras: Resultados (como conhece a escola os seus resultados, quais são e o que faz para os garantir?); Prestação do Serviço Educativo (para obter esses resultados, que serviço educativo presta a escola e como o presta?);

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

Organização e Gestão Escolar (como se organiza e é gerida a escola para prestar o serviço educativo?); Liderança (que lideranças tem a escola, que visão e que estratégia estão subjacentes à sua organização e gestão?); e Capacidade de Regulação e Melhoria da Escola (como garante a escola o controlo e a melhoria deste processo?) (IGE, 2009a; ME, 2006).

As classificações dos cinco domínios e fatores que constituem o quadro de referência foram atribuídas numa escala qualitativa com quatro níveis: Muito Bom, Bom, Suficiente e Insuficiente, sendo que a distinção entre estes níveis se realizou pelo balanço entre o número de pontos fortes e fracos, pelo caráter mais ou menos generalizado das ações e procedimentos adotados pela unidade de gestão e pelo respetivo impacte na melhoria dos resultados dos alunos.

Entre os objetivos do programa de AEE destaca-se precisamente o de promover a auto avaliação das escolas, defendendo-se a articulação da avaliação externa com a cultura e os dispositivos de auto avaliação das mesmas (IGE, 2009a). Assim, se a auto avaliação de escolas constitui o ponto de partida da avaliação externa é igualmente um dos domínios em que é esperado o impacto ou efeito desta. É precisamente no âmbito do último domínio Capacidade de Regulação e Melhoria da Escola que encontramos o fator auto avaliação.

Parece-nos, pois, oportuno começar por analisar os resultados obtidos neste domínio, procurando desta forma dar a conhecer o lugar da auto avaliação no quadro da avaliação externa das escolas, no que diz respeito às apreciações de que tem sido alvo. neste sentido, retomamos parcialmente os dados obtidos de um estudo que realizámos sobre os principais resultados e tendências do processo de avaliação externa de escolas entre 2006 e 2010 que envolveu 960 agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas (Barreira, Bidarra & Vaz-rebelo, 2011), e os de um estudo mais recente (Soares, Barreira & Bidarra, no prelo) que dá conta do impacto da avaliação externa no processo de autoavaliação das escolas.

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relativamente ao primeiro estudo, os dados aqui apresentados baseiam-se nos resultados publicados pela IGE nos Relatórios sobre a Avaliação Externa de Escolas (IGE, 2008, 2009b, 2010, 2011). No Quadro 1, reproduzem-se as percentagens de cada nível de classificação nos domínios do quadro de referência, nos diferentes anos letivos. Por conveniência de representação gráfica e de análise da evolução da classificação nos diferentes domínios, adotámos uma escala de 1 a 4 correspondente aos quatro níveis de classificação: Insuficiente, Suficiente, Bom e Muito Bom que constituem a escala de avaliação utilizada.

Conforme se pode ler no quadro 1 e na Figura 1, a classificação obtida nos vários domínios que integram o quadro de referência aponta para um predomínio de níveis de classificação positivos de Bom/Muito Bom superiores aos restantes níveis de classificação, com excepção do domínio Capacidade de autorregulação e melhoria da escola. Este constitui sempre o domínio em que os níveis de classificação são inferiores, enquanto que os domínios Organização e gestão escolar e Liderança são os que obtêm uma percentagem superior dos níveis de classificação de Bom e de Muito Bom, seguidos da Prestação do serviço educativo e Resultados.

Quadro 1 – Percentagens dos níveis de classificação atribuídos às escolas em função dos domínios do quadro de referência (Percentagens-coluna por ano letivo)

Classificação Ano ResultadosPrestação do serviço educativo

Organização e gestão escolar

LiderançaCapacidade de

autorregulação e melhoria da escola

Muito Bom 2006-2007 10 14 29 40 112007-2008 4 10 24 32 62008-2009 7 9 23 33 4

2009-2010 12 13 29 36 4

Bom 2006-2007 55 63 61 43 482007-2008 56 59 64 52 37

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

2008-2009 60 73 67 51 362009-2010 64 70 63 56 46

Suficiente 2006-2007 34 22 9 16 392007-2008 37 31 11 15 502008-2009 33 18 10 15 542009-2010 24 17 8 8 47

Insuficiente 2006-2007 1 1 1 1 22007-2008 3 0 0 1 72008-2009 0 0 0 1 62009-2010 0 0 0 0 3

figura 1 – Evolução das pontuações obtidas nos domínios

Considerando que foi no Domínio Capacidade de autorregulação e melhoria da escola que as escolas revelaram pior desempenho estabelecemos como principal objetivo do segundo estudo conhecer o impacto e os efeitos da avaliação externa no processo de autoavaliação das escolas.

neste sentido, construímos um questionário com uma seção referente aos aspetos relativos ao processo de auto avaliação que sofreram alterações após a AEE, que contempla oito itens de resposta dicotómica Sim/não, de caráter factual, e outra sobre questões de opinião, com utilização de uma escala ordinal de cinco pontos, adequada à formulação

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do item (exemplo: 1- pouco impacto- 5 muito impacto; 1- regulação para a conformidade- 5-regulação para a emancipação). Este questionário foi dirigido às Unidade de Gestão (UG, 11 agrupamentos e sete escolas não agrupadas que se candidataram à AEE) da DrC-IGE intervencionadas no ano letivo de 2007/2008 que obtiveram a classificação de Suficiente/Insuficiente no domínio Capacidade de autorregulação e melhoria da escola. Trata-se, assim, de uma amostra não probabilística, intencional de casos típicos.

numa primeira leitura dos dados relativos à perceção das alterações após a intervenção da AEE, podemos registar um número significativamente maior de respostas afirmativas relativamente ao número de respostas negativas (cf. quadro 2), indicando que, de uma forma geral, na maioria das unidades de gestão, todos os aspetos relativos ao processo de autoavaliação foram alvo de alteração após a AEE.

Quadro 2- Alterações ao processo de auto avaliação após a AEE

Itens

Respostas / Total de UG Não

respondeuSim Não

Quadro de referência.

E1, E2, E3, E4,

E5, E6, E8, E10,

E11, E12, E13,

E14, E15, E16,

E17, E18 / 16

UG

E7 / 1 UG E9

Modelo de auto avaliação

implementado.

E1, E2, E3, E4,

E5, E6, E8, E9,

E10, E11, E12,

E13, E15, E16,

E17, E18 / 16

UG

E7, E14 / 2

UG

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

Estruturas responsáveis pela auto

avaliação.

E1, E2, E3, E4,

E5, E6, E8, E9,

E10, E11, E12,

E13, E14, E15 /

14 UG

E7, E16, E17,

E18 / 4

UG

Constituição da equipa de auto

avaliação.

E1, E2, E3, E4,

E6, E8, E9, E11,

E12, E13, E14,

E15, E16 / 13 UG

E5, E7, E17,

E18 / 4 UGE10

Recursos disponibilizados no

processo de auto avaliação.

E1, E2, E3, E4,

E6, E8, E9, E11,

E12, E13, E16,

E17, E18 / 13 UG

E5, E7, E14,

E15 / 4 UGE10

Instrumentos utilizados.

E1, E2, E3, E4,

E6, E8, E9, E10,

E11, E12, E13,

E14, E15, E16,

E17, E18 / 16

UG

E5, E7 / 2 UG

Gestão da informação.

E1, E2, E3, E4,

E6, E8, E9, E10,

E11, E12, E13,

E16, E17, E18 /

14 UG

E5, E7, E14,

E15 / 4 UG

Divulgação dos resultados do

processo de auto avaliação.

E1, E2, E3, E4,

E6, E8, E9, E10,

E11, E12, E13,

E15, E16 / 13 UG

E5, E7, E14,

E17, E18 /

5 UG

numa segunda leitura dos dados (cf. Figura 2) permite constatar que as alterações relativas ao processo de auto avaliação com um peso mais significativo se verificaram no quadro de referência e no Modelo de auto

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CEDU 2013 - Nas Pegadas das Reformas Educativas

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avaliação implementado e nos Instrumentos utilizados (89%), nas Estruturas responsáveis pela auto avaliação e na Gestão da informação (78%). A Constituição da equipa de auto avaliação, os Recursos disponibilizados no processo de auto avaliação e a Divulgação dos resultados do processo de auto avaliação foram igualmente alvo de alteração em 72% das UG.

figura 2 - Percentagem de respostas afirmativas relativa aos aspetos do processo de auto avaliação que, de uma forma geral, sofreram alterações após a AEE.

Em resposta à questão Qual a sua perceção sobre o grau de impacto da AEE no processo de auto avaliação na escola/agrupamento de escolas que dirige? (cf. quadro 3), constata-se que a perceção que as escolas têm sobre o grau de impacto da AEE no processo de auto avaliação é elevado, situando-se 13UG acima do nível intermédio e apenas duas abaixo deste nível.

Quadro 3 - Perceção sobre o grau de impacto da AEE no processo de auto avaliação na escola/agrupamento de escolas

1 2 3 4 5

- E5, E7 E10, E14, E18E1, E2, E3, E4, E9,

E11, E12, E13, E15, E17

E6, E8, E16

O UG 2 UG 3 UG 10 UG 3 UG

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

relativamente ao grau de conformidade/emancipação das práticas de auto avaliação desenvolvidas pelas escolas (cf. Quadro 4), os resultados obtidos na questão Como se situa a escola/agrupamento de escolas que dirige relativamente ao grau de conformidade/emancipação das práticas de auto avaliação que desenvolve? indicam que 13UG se situam acima do nível intermédio, traduzindo uma perceção de desenvolvimento de práticas de auto avaliação orientadas para a emancipação.

Quadro 4 – Perceção sobre o grau de conformidade/emancipação das práticas de auto avaliação desenvolvidas

1 2 3 4 5

- -E5, E7,

E11, E17, E18

E1, E2,

E3, E4, E8, E9, E12,

E13, E14, E15, E16

E6, E10

O UG 0 UG 5 UG 11 UG 2 UG

CONCLUsÃO

Da análise das classificações obtidas nos diferentes domínios do quadro de referência da AEE, pelas UG que participaram no presente estudo que se caraterizam pela obtenção de níveis de classificação de suficiente e insuficiente no domínio da Capacidade de autorregulação e melhoria da escola, ressalta que a classificação de Suficiente é igualmente predominante nos domínios Resultados e Prestação do Serviço Educativo. Já nos domínios da Organização e Gestão e Liderança, a classificação de Bom é a mais frequente, recaindo nestes igualmente a atribuição de Muito Bom, ainda que num número reduzido de escolas. A atribuição de Insuficiente regista-se também em apenas um caso no domínio dos Resultados e noutro no domínio Capacidade de autorregulação e melhoria da escola.

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Estes dados aproximam-se dos obtidos a nível nacional entre 2006/2007 e 2009/2010, onde se constata também que os domínios com níveis de classificação superiores são os domínios da Organização e Gestão e Liderança e o domínio com classificação inferior o da Capacidade de autorregulação e melhoria da escola (cf. Barreira, Bidarra & Vaz-rebelo, 2011; Bidarra, Barreira & Vaz-rebelo, 2011).

no entanto, a AEE parece ter tido efetivamente um efeito “catalisador da auto avaliação junto das escolas que obtiveram classificações mais fracas no domínio 5” (Inspeção Geral de Educação, 2011a, p. 66). A grande maioria das escolas procedeu à reformulação do dispositivo de auto avaliação implementado, adoptando um modelo mais estruturado. Por outro lado, algumas escolas começaram a utilizar os materiais disponibilizados pela IGE e o seu quadro de referência. o dispositivo de auto avaliação foi alargado a outras áreas/serviços na maioria das escolas, verificando-se também, que os procedimentos de auto avaliação passaram a desenvolver-se ao longo do ano. Foram também criados novos instrumentos de recolha de dados, tendo sido, na maioria dos casos, aplicados a vários elementos da comunidade. É de salientar o facto de existirem escolas que criaram pela primeira vez um dispositivo de auto avaliação.

Cumpre ainda salientar a perceção do elevado grau de impacto da AEE no processo de auto avaliação das escolas, traduzido nas opiniões das UG, que é consonante com as alterações registadas, existindo igualmente uma perceção de que as práticas de auto avaliação se alicerçam em propósitos emancipatórios. Isto leva-nos a questionar como se passa de uma situação generalizada de práticas de auto avaliação que não permitem o conhecimento sustentado do desempenho da escola e, consequentemente, inviabilizam a elaboração de planos de ação de melhoria com impacto no processo de ensino e aprendizagem, para uma situação que revela uma intenção que ultrapassa a mera conformidade. quererá isto dizer que apesar da dificuldade inerente à implementação de processos de auto avaliação que,

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

além de tempo, necessitam de conhecimentos técnicos e envolvimento de todos os atores educativos, as escolas já estão a desenvolver uma verdadeira cultura de auto avaliação?

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

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Clímaco, M.C. (2002). A inspecção e avaliação das escolas. In J. Azevedo (Ed.), Avaliação das escolas: Consensos e divergências (pp. 63-67). Porto: ASA.

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Lei n.º 31/2002. Diário da república – I Série - A nº 294 de 20 de

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CEDU 2013 - Nas Pegadas das Reformas Educativas

262

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AVALIAÇÃO EXtERNA DAs EsCOLAs Em PORtUGAL. QUE ImPACtO E EfEItOs NA EsCOLA E NA sALA DE AULA?

aIsabel Fialho; bJosé Saragoça; cMaria José Silvestre; dSónia Gomes

aUniversidade de Évora; bCesnova/FCS-UnL e Universidade de Évora; cAgrupamento de Escolas nº 2 de Évora;

dAgrupamento de Escolas de Castro Verde

[email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]

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REsUmO

Portugal iniciou, em 2007, um Programa de Avaliação Externa das Escolas, sob a responsabilidade da Inspeção-Geral de Educação. Atualmente está em curso o segundo ciclo de avaliação. Desta avaliação externa resulta um relatório que é enviado para as escolas e ao qual estas podem responder com um Contraditório. o trabalho que apresentamos é parte de um estudo desenvolvido no âmbito de um projeto de investigação em curso, intitulado «Impacto e Efeitos da Avaliação Externa nas Escolas do Ensino não Superior». A partir da análise dos Contraditórios aos relatórios oficiais procurámos respostas para duas questões: A avaliação externa teve impacto na escola e conduziu as escolas a implementarem mudanças na organização e em contexto de sala de aula? Se sim, que mudanças foram planeadas e/ou implementadas? Metodologicamente, recorremos à análise de conteúdo dos Contraditórios, a partir de uma matriz de categorização previamente estabelecida em torno de duas variáveis: «impacto e efeitos do Relatório na escola» e «impacto e efeitos do Relatório na sala de aula».

os principais resultados evidenciam que, em geral, os relatórios produzem impactos e efeitos maioritariamente positivos, sendo globalmente assumidos como um instrumento potenciador de autorregulação escolar e de aprendizagem e melhoria contínuas.

Palavras-chave: avaliação externa de escolas; contraditórios; impacto; escola; sala de aula.

RésUmé

Portugal a commencé, en 2007, un Programme d’Évaluation Externe des Écoles (EEE), sous la responsabilité de l’Inspection Générale d’Éducation. Actuellement, est en cours le deuxième cycle d’évaluation. Cette évaluation externe a produit un rapport, envoyé aux écoles évaluées, auquel elles

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

peuvent répondre produisant un Contradictoire.

Le travail que nos présentons est inclus dans une étude, produite en contexte d’un projet de recherche, dont le titre est «Des Impacts et des Effets de l’Évaluation Externe des Écoles de l’Enseignement non Supérieur». L’analyse des rapports et des Contradictoires officiels, nous a permis de répondre aux questions suivantes: l’évaluation externe a eu un impacte au niveau de l´institution et a conduit les écoles vers un chemin de changements, permettant améliorer soit l’organisation, soit la classe? quels changements ont été planifiés et/ou accomplis? En ce qui concerne la méthodologie, nous avons mettre en cours l’analyse de contenu des Contradictoires, à partir d’une matrice de catégories établie préalablement autours de deux variables: «des impacts et des effets du rapport à l’école» et «des impacts et des effets dans la classe». Les principaux résultats indiquent que, en général, les rapports produisent des impacts et des effets majoritairement positifs, étant globalement considérés comme un outil/instrument d’auto--régulation organisationnel et d’apprentissage et amélioration continues.

mots-clés: évaluation externe d’écoles; contradictoires; impacte; école; classe.

1. INtRODUÇÃO

Este trabalho insere-se no projeto de investigação «Impacto e Efeitos da Avaliação Externa nas Escolas do Ensino não Superior» (AEEEnS) que teve por objetivo evidenciar os consensos e as divergências entre Relatórios e Contraditórios produzidos no âmbito do processo de Avaliação Externa das Escolas (AEE), em Portugal. o Projeto AEEnS (projeto PTDC/CPE-CED/116674/2010, financiado por Fundos FEDEr através do Programa operacional Fatores de Competitividade – CoMPETE e por Fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia de

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Portugal) cruza duas das vertentes temáticas que compõem o abrangente tema deste Colóquio, As pegadas das reformas educativas. De facto, a questão investigativa central que abordamos insere-se na especificidade da qualidade das escolas, problemática que abarca quer o subtema das políticas educativas, quer o subtema da avaliação institucional.

A avaliação da qualidade das escolas constitui, hoje, um processo generalizado, ainda que diversificado, que assume enorme importância nos sistemas de educação/formação dos países mais desenvolvidos.

A AEE teve início, em Portugal, em 2007, após a publicação da Lei nº 31/2002, sob a responsabilidade da Inspeção-Geral de Educação (IGE), atual Inspeção-Geral da Educação e Ciência (IGEC). Integrando a dupla vertente de avaliação externa e autoavaliação/avaliação interna, o programa de AEE foi antecedido de uma fase piloto, a qual, por sua vez, surgiu após algumas experiências avaliativas diversificadas, quer na génese, quer nos modelos implementados, quer na área de abrangência. Ele emerge num contexto politicamente marcado: o interesse geopolítico de adesão à então Comunidade Económica Europeia (Fialho, 2011), na década de 80 do século passado, donde resulta, para o campo das políticas educativas, a existência de um modelo de governança educativa que Barroso (2005) denomina de burocrático-profissional.

Este programa opera com um referencial que permite a avaliação das escolas ao nível dos resultados e das diferentes áreas e domínios da organização, gestão e liderança. o primeiro ciclo avaliativo decorreu entre 2006-2011 e o segundo ciclo teve início em 2011-2012, estando atualmente em curso. Desta avaliação externa resulta um relatório, que é enviado para as escolas, ao qual estas podem responder com um Contraditório.

A AEE assume, atualmente, uma dimensão instrumental de regulação do sistema educativo (IGE, 2012; oCDE, 2012), devendo os seus resultados servir de base a decisões de política educativa de nível macro, meso e micro, constituindo-se assim como sustentáculo dessas decisões (Terrasêca, 2010).

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

2. QUEstÕEs E OBJEtIVO DO EstUDO

O presente estudo centrou-se na análise de conteúdo de Contraditórios redigidos pelas escolas portuguesas, no âmbito do 1º e do 2º ciclos da AEE, com vista à construção de significados, a partir de elementos discursivos explícitos e/ou implícitos, sobre eventuais impactos e efeitos do relatório.

Em concreto, perspetivámos encontrar respostas para as seguintes interrogações: a avaliação externa teve impacto nas escolas e conduziu as unidades de gestão escolares a implementarem mudanças na organização e em contexto de sala de aula? Se sim, que mudanças foram planeadas e/ou implementadas?

3. métODO

Centrámo-nos no paradigma interpretativista, assumindo, por conseguinte, que o conhecimento emerge como resultado das interpretações dos investigadores acerca das perceções manifestadas pelos atores escolares nos Contraditórios aos Relatórios da AEE. Assim, levámos a cabo uma abordagem predominantemente qualitativa, por considerarmos que seria esta a que melhor responderia aos objetivos da investigação. Trata-se de um estudo contextualizado, no qual analisámos um largo número de informações complexas e pormenorizadas, que teve por base a análise discursiva documental de 69 Contraditórios elaborados pelas escolas.

os critérios de seleção da amostra foram os seguintes: 1) representação das quatro regiões da área territorial da IGEC; 2) Contraditórios relativos a unidades orgânicas participantes nos 1º e 2º ciclos avaliativos; 3) Contraditórios relativos a unidades orgânicas que obtiveram classificações mais altas e mais baixas, em cada um dos ciclos avaliativos.

A amostra é constituída por 100 escolas, 50% das quais obtiveram as

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classificações mais altas nos relatórios e 50% tiveram as classificações mais baixas. Foram analisados todos os contraditórios (n=69) da amostra o que significa que apenas 35% exerceram o direito de contraditório, sendo 37 do 1º ciclo avaliativo e 32 do 2º ciclo.

A recolha e a análise dos dados iniciaram-se com a produção da matriz de categorização, que incluiu a definição das subcategorias, usadas na análise de conteúdo.

4. APREsENtAÇÃO E DIsCUssÃO DOs REsULtADOs

Na análise dos Impacto e efeitos do Relatório na escola, encontrámos referências que evidenciam quer aspetos positivos quer aspetos negativos que decorreram da AEE nas escolas como podemos constatar no quadro 1.

Quadro 1: Comparação entre os Contraditórios do 1º e do 2º ciclo avaliativos, no que diz respeito às mudanças planeadas ou implementadas nas escolas a partir da AEE

Ciclos avaliativos

subcategorias

1.º ciclo de AE 2.º ciclo de AEtOtALClassifica-ções

mais baixas Classificações

mais altas total Classifica-ções mais baixas

Classifica-ções mais altas total

N=20 % N=17 % N=37 % N=24 % N=8 % N=32 % N=69 %

Oportunidade de melhoria 7 35% 5 29% 12 32% 7 29% 2 25% 9 28% 21 30%

Promoção da reflexão

interna 4 20% 3 18% 7 19% 13 54% 4 50% 17 53% 24 35%

Responsabiliza-ção da Escola/

AE 0 0% 1 6% 1 3% 0 0% 1 13% 1 3% 2 3%

Motivação dos atores 0 0% 3 18% 3 8% 1 4% 1 13% 2 6% 5 7%

Mobilização para a ação

coletiva 0 0% 2 12% 2 5% 3 13% 0 0% 3 9% 5 7%

Maior sucesso da Escola/AE 1 5% 0 0% 1 3% 1 4% 0 0% 1 3% 2 3%

Desmotivação dos atores 1 5% 0 0% 1 3% 1 4% 0 0% 1 3% 2 3%

Diminuição da imagem externa da

escola

0 0% 1 6% 1 3% 0 0% 0 0% 0 0% 1 1%

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

A leitura do quadro permite-nos verificar que:

- globalmente, os impactos do Relatório nas escolas são mais visíveis no 2º ciclo do que no 1º ciclo da AEE; os impactos negativos do relatório são residuais em ambos os ciclos avaliativos – [‘desmotivação dos atores’ (3%) e ‘diminuição da imagem externa da escola/AE’ (1%)];

- nos Contraditórios do 1º ciclo avaliativo, a subcategoria ‘oportunidades de melhoria’ é a que regista mais ocorrências (32%), pese embora o facto de, nos Contraditórios do 2º ciclo, o impacto mais significativo dos relatórios da AEE se verificar na subcategoria ‘Promoção da reflexão interna (53%)’;

- o discurso dos Contraditórios assume, ainda, como impactos importantes dos relatórios ‘a motivação dos atores’ e ‘a motivação para a ação coletiva’, orientada para a melhoria da qualidade educativa, expressões identificadas em 7% dos Contraditórios.

As referências seguintes, retiradas dos Contraditórios, ilustram o impacto da avaliação externa na promoção da reflexão interna – “Constituindo o relatório recebido mais um instrumento de reflexão e debate para a comunidade educativa, a sua divulgação, análise e consequente debate foi imediatamente promovido”, e na oportunidade de melhoria contínua – “os pontos fracos evidenciados no vosso relatório serão considerados oportunidades de melhoria na senda da melhoria contínua de resultados e práticas de funcionamento”.

no que se refere aos Impactos e efeitos do Relatório em contexto de sala de aula, a análise que efetuámos revelou que os Contraditórios descortinam muito pouco sobre as mudanças que, nesse âmbito, decorreram da AEE. Efetivamente, apenas dois Contraditórios do 1º ciclo da AEE contêm asserções que indiciam que, à data da sua redação, já tinham sido implementadas mudanças, a partir do diagnóstico traçado pela AEE: “De notar que algumas das sugestões apresentadas pela equipa de

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avaliação foram já implementadas” e “Na sequência da avaliação externa, o Agrupamento já pode contar com a existência de um conjunto de materiais, para o ensino das ciências e actividades experimentais”.

na verdade, as unidades de gestão que optaram por redigir um Contraditório fizeram-no no curto espaço de tempo pré-estabelecido, logo após a receção do relatório, sem que houvesse oportunidade de observar/avaliar a abrangência dos impactos e efeitos do mesmo sobre a organização.

Todavia, nos Contraditórios são frequentes as referências à importância da AEE e, em particular, do respetivo relatório, para a melhoria das dinâmicas e dos serviços prestados pelas organizações escolares. Em alguns Contraditórios (poucos) especificam--se as modificações que se pretendem implementar, nomeadamente em contexto de sala de aula, como se pode observar no Quadro 2.

Quadro 2: Comparação entre os Contraditórios do 1º e do 2º ciclo avaliativos, no que concerne às mudanças que as escolas afirmam pretender implementar

Ciclos avaliativos

subcategorias

1.º ciclo de AE 2.º ciclo de AE

tOtALClassifica-ções

mais baixas

Classificações

mais altastotal

Classifica-ções

mais baixas

Classifica-ções

mais altastotal

N=20 % N=17 % N=37 % N=24 % N=8 % N=32 % N=69 %

Afirmação da

intenção de

proceder a

mudanças, sem

referir se as

mesmas são ou

não ao nível da

sala de aula

11 55% 6 35% 17 46% 11 46% 5 63% 16 50% 33 48%

Afirmação da

intenção de

proceder a

mudanças em

contexto de sala

de aula

1 5% 1 6% 2 5% 0 0% 0 0% 0 0% 2 3%

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

A análise dos dados do quadro, relativos aos 37 Contraditórios do 1º ciclo avaliativo, permite-nos chegar aos seguintes resultados:

– dos 20 Contraditórios de escolas com classificações mais baixas, em apenas uma (5%) consta, de forma explícita, que há uma intenção de, no futuro, se implementarem mudanças em contexto de sala de aula. No entanto, em 11 desses 20 Contraditórios (55%) afirma-se a intenção de proceder a mudanças, sem referir se as mesmas se situam ou não ao nível da sala de aula;

– dos 17 Contraditórios emanados de escolas com classificações mais altas, somente um (6%) contém, de forma explícita, referências à intenção de proceder, no futuro, a mudanças em contexto de sala de aula. Porém, em 6 (35%) afirma-se que se planeiam mudanças, sem especificar se estas são ou não ao nível da sala de aula.

no que diz respeito ao 2º Ciclo da AEE, a análise do quadro anterior evidencia que:

– dos 24 Contraditórios de escolas com classificações mais baixas, em 11 (46%) afirma--se a intenção de proceder a mudanças, sem referir se estas se situarão ou não em contexto de sala de aula;

– dos 8 Contraditórios de escolas com classificações mais altas, em 5 (63%) afirma-se que se planeiam mudanças, sem especificar se estas são ou não ao nível da sala de aula.

Estabelecendo comparações entre as informações destacadas no texto anterior, parece poder afirmar-se que:

– não existe, em ambos os ciclos avaliativos, uma diferença expressiva entre as escolas avaliadas com classificações mais baixas e as que obtiveram classificações mais altas, no que concerne à expressão da intenção de proceder a alterações ao nível da sala de aula;

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– relativamente à intenção de implementar mudanças na organização mediante o feedback emitido pelos avaliadores externos (sem especificar o tipo de alterações), as escolas com níveis mais baixos de classificação no 1º ciclo da AEE expressam-no em maior número nos seus Contraditórios, verificando-se a tendência contrária no 2º ciclo avaliativo, cabendo esse papel às unidades de gestão com níveis mais altos de classificação.

5. CONCLUsÃO

A partir do que expusemos cremos poder concluir que as organizações escolares realizaram já um caminho no sentido de compreenderem melhor a importância e o sentido da prestação de contas através da AEE, principalmente as que obtiveram classificações mais altas, revelando a intenção de implementar mudanças de acordo com as sugestões deixadas pelos avaliadores externos. De facto, cerca de metade dos Contraditórios (48%) evidencia a intenção dos atores procederem a mudanças, embora seja residual o número daqueles que destacam as mudanças planeadas ou implementadas ao nível da sala de aula.

Constatámos ainda que os Contraditórios evidenciam a ocorrência de impactos e efeitos dos Relatórios nas escolas, maioritariamente impactos positivos, sendo os impactos negativos residualmente referidos.

Destacamos a aprendizagem organizacional que as escolas efetuaram ao longo do período em estudo (entre 2006 e 2012). De facto, as escolas assumem expressamente que uma boa classificação pode não ser um sinal de que tudo está bem, ou de nada há a mudar ou a melhorar, no sentido da prestação de um serviço educativo de excelência. A análise dos Contraditórios evidenciou ainda o caráter formativo atribuído pelas escolas à AEE, sendo o relatório acolhido como um instrumento potenciador de autorregulação e de aprendizagem e melhoria contínuas. Efetivamente, o relatório produzido pela AEE parece cumprir os objetivos de promoção da

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

melhoria organizacional, ao promover a reflexão interna, a autocrítica e a autoavaliação das escolas.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Barroso, J. (2005). o Estado, a educação e a regulação das políticas públicas. Educação e Sociedade [on-line], Campinas, 26 (92), 725-751, Especial - out. 2005. retirado de http://www.cedes.unicamp.br.

Fialho, I. (2011). A avaliação externa das escolas no Alentejo. In Bravo Nico (Coord.), Escola(s) do Alentejo: um mapa do que se aprende no sul de Portugal. Mangualde (Portugal): Edições Pedago, 262-271.

IGE (2012). Avaliação externa das escolas: avaliar para a melhoria e a confiança - 2006-2011. Lisboa: MEC. retirado de http://www.ige.min-edu.pt/upload/relatorios/AEE_2006_2011_rELATorIo.pdf.

Lei n.31 (2002, 20 de dezembro). Aprova o sistema de avaliação da educação e do ensino não superior, desenvolvendo o regime previsto na Lei n.º 46/86, de 14 de outubro (Lei de Bases do sistema Educativo).

OCDE (2012). Santiago, P., Donaldson, G., Looney, A., & nusche, D. (2012). OECD reviews of evaluation and assessment in education: Portugal 2012. OECD Publishing.

Terrasêca, M. (2010). Avaliação externa - Porquê e para quê? Contributos para um parecer sobre a avaliação externa de escolas. (Parecer apresentado ao CNE em Junho de 2010).

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PROJEtO tURmAmAIs: A CAmINhAR PARA O sUCEssO EsCOLAR

Ana Maria Cristóvão; Isbel Fialho; Hélio Salgueiro; Marília CidUniversidade de Évora

[email protected]; [email protected];[email protected]; [email protected]

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

REsUmO

Com o alargamento da escolaridade obrigatória para o 12.º ano e com a manutenção de modelos organizacionais de escola desajustados da realidade atual, tendem a agravar-se problemas como a reprovação ou o abandono precoce do sistema de ensino. O Projeto TurmaMais parte da convicção de que é possível melhorar os resultados escolares dos alunos através da manipulação das variáveis dimensão e composição da turma. o grande objetivo do Projeto TurmaMais é o de melhorar o desempenho escolar dos alunos. Este objetivo é tão válido para os alunos com dificuldades de aprendizagem, como para os alunos com elevado rendimento escolar e com os quais, habitualmente, os docentes pouco podem avançar quando integrados em turmas heterogéneas. o Projeto tem apresentado evidências muito favoráveis à sua continuação e disseminação em outras escolas. o presente texto apresenta o Projeto TurmaMais, a sua origem, os princípios e dinâmicas organizacionais.

Palavras-chave: organização escolar; programa Mais Sucesso Escolar; projeto TurmaMais, melhoria de resultados.

ABstRACt

The extension of compulsory education to 12 school years and the poorly adjusted school organizational models tend to worsen problems such as failure or early withdrawal of the education system. The TurmaMais Project bases upon the conviction that it is possible to improve students’ outcomes by manipulating the variables size and composition of the class. The major objective of the Project TurmaMais is to improve the students’ academic performance, valid for students with learning disabilities as for students with high academic performance, which teachers usually have

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CEDU 2013 - Nas Pegadas das Reformas Educativas

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less opportunity to make progress when integrated into heterogeneous classes. The Project has shown evidence in favor of its continuation and dissemination to other schools. This paper presents the TurmaMais project, its origin, principles and organizational dynamics.

Key-words: school organization; More School Success program; TurmaMais project, outcomes improvement.

PROGRAmA mAIs sUCEssO EsCOLAR

Num estudo da OCDE, em 2007, denominado No more Failure. Ten Steps to Equality in Education, recomendava-se que os países que apresentassem maiores taxas de retenção desenhassem e implementassem estratégias que permitissem “identificar e ajudar sistematicamente aqueles que revelam atraso na aprendizagem e reduzir as altas taxas de retenção (…). As elevadas taxas de retenção em alguns países necessitam de ser reduzidas, alterando e encorajando abordagens alternativas”.

Em Portugal, com o alargamento da escolaridade obrigatória para o 12.º ano e com a manutenção de modelos organizacionais de escola desajustados da realidade atual, tendem a agravar-se problemas como a reprovação ou o abandono precoce do sistema de ensino. neste sentido, em 2009, o Ministério da Educação, através da então Direção-geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular, lança o Programa Mais Sucesso Escolar (PMSE) que consistia no apoio ao desenvolvimento de projetos de escola para a melhoria dos resultados escolares no ensino básico, “ com o objetivo de reduzir as taxas de retenção e de elevar a qualidade e o nível de sucesso dos alunos” (Despacho n.º 100/2010, de 5 de Janeiro).

o PMSE teve a particularidade de a sua origem partir de experiências inovadoras de organização pedagógica realizadas em duas escolas, designadamente, na Escola Secundária Rainha Santa Isabel e no

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

Agrupamento de Escolas de Beiriz. Estas escolas dentro do quadro da autonomia de gestão pedagógica que possuíam definiram os projetos de intervenção, designados de Projeto TurmaMais, que apresentamos neste texto, e o Projeto Fénix. Ainda um conjunto mais pequeno de escolas apresentou projetos independentes, que apesar de diferentes tinham por base as ideias matriciais do PMSE, sendo denominados de Híbridas. Assim, o PMSE é composto por três tipologias: TurmaMais, Fénix e Híbridas.

As escolas ou agrupamentos de escolas foram convidadas a participarem no PMSE em Junho de 2009, através de um Edital Mais Sucesso Escolar. As escolas/agrupamentos que se queriam candidatar tinham que elaborar um plano detalhado de recuperação dos resultados dos alunos. no plano de trabalho cada escola ou agrupamento de escola comprometia-se, com as Direções regionais de Educação (DrE) respetivas, a atingir em cada ano taxas de sucesso escolar consideráveis, com redução sucessiva das taxas de retenção em 1/3 relativamente à sua taxa histórica de retenção por um período de 4 anos.

Na base do PMSE estão subjacentes ideias matriciais como o ciclo de estudos como unidade de análise, a melhoria das condições organizacionais escolares de ensino e aprendizagem, a melhoria de resultados escolares sem quebra de exigência, o desenvolvimento de mecanismos de coordenação e regulação inter escolas. no que concerne aos recursos necessários, as dimensões contempladas foram os créditos horários, a dimensão, rotatividade e natureza das parcerias/protocolos com o Ministério e os Centros de Investigação.

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PROJEtO tURmAmAIs

A ORIGEm DO PROJEtO tURmAmAIs

no ano letivo 2000/2001 a Escola Secundária com 3.º Ciclo rainha Santa Isabel, de Estremoz iniciou experimentalmente, no 7º ano de escolaridade, a Gestão Flexível do Currículo1. A escola teve a oportunidade de criar uma hora semanal comum a todos os docentes que compunham cada Conselho de Turma com o objetivo de promover uma maior troca de experiências. Foram ainda criadas novas áreas curriculares de Formação Cívica, Estudo Acompanhado e Área Projeto. Acreditava-se que a introdução destas novas áreas curriculares seria uma mais-valia para melhorar as aprendizagens dos alunos.

Apesar de muito trabalho realizado, no primeiro ano experimental da Gestão Flexível do Currículo, os resultados no final do ano letivo evidenciaram um aumento do insucesso escolar. A escola concluiu que este modelo não os ajudava a melhorar os problemas relacionados com o insucesso escolar.

os docentes tentavam obter respostas e questionavam-se “como é possível manter nestes alunos, ao longo de todo o ano letivo, as altas expectativas com que regressam à escola e iniciam os trabalhos nos meses de setembro e outubro?” (Magro-C, T., 2011, p.19). A solução encontrada, como afirmou a coordenadora do projeto, passava por “doses periódicas e reforçadas de atenção. Evitar o acumular do insucesso, promover o hábito de recuperação imediatamente após o insucesso. Sabíamos que para atuar neste sentido teríamos que retirar estes alunos da sua turma de origem” (Magro-C, T.2011, p.19). Para dar resposta aos problemas desta escola, foi proposta a criação de uma turma a mais, que funcionasse como uma 1 Por gestão flexível do currículo entende-se a possibilidade de cada escola organizar e gerir autonomamente o processo de ensino/aprendizagem, tomando como referência os saberes e as competências nucleares a desenvolver pelos alunos no final de cada ciclo e no final da escolaridade básica, adequando-o às necessidades diferenciadas de cada contexto escolar e podendo contemplar a introdução no currículo de componentes locais e regionais (Despacho n.º 9590/99 (2.ª série), de 14 de Maio).

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

plataforma rotativa de alunos não tendo, por isso, alunos fixos, nascia assim, o que hoje chamamos Projeto TurmaMais.

Em Julho de 2002 a Escola Secundária com 3º Ciclo rainha Santa Isabel apresenta o Projeto TurmaMais à Direção regional de Educação do Alentejo, que por sua vez autorizou o seu funcionamento para o 7º ano de escolaridade, solicitando também o seu acompanhamento e avaliação à Universidade de Évora. no final do ano letivo de 2002/2003 os resultados dos alunos do 7º ano surpreenderam, as taxas de retenção tinham diminuído de 38 % para 16 %.

no ano letivo 2005/2006 o projeto é candidatado, através do Centro de Investigação em Educação e Psicologia da Universidade de Évora (CIEP-UÉ) e em parceria com a Direção Regional de Educação do Alentejo (DREALE), ao apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, no âmbito de um programa de apoio a medidas de combate ao insucesso e ao abandono escolar. O Projeto candidata-se com a designação “TurmaMais, uma plataforma giratória no combate ao insucesso e abando escolar”, a sua aprovação leva que, entre os anos letivos 2005/2006 e 2006/2007, o Projeto seja alargado a três escolas do Alentejo (Magro-C, T. & Fateixa, J., 2010).

no ano letivo 2009/2010,com a implementação do PMSE, estiveram envolvidos 67 agrupamentos/escolas que utilizaram a metodologia TurmaMais, em 2010/2011 63 agrupamentos/escolas e em 2011/2012 59 agrupamentos/escolas distribuídos pelas várias regiões de Portugal Continental.

PRINCÍPIOs E DINÂmICAs ORGANIzACIONAIs DO PROJEtO tURmAmAIs

O PTM assenta na ideia de promoção do sucesso escolar, não compreendendo só os alunos com dificuldades, mas promovendo o sucesso

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CEDU 2013 - Nas Pegadas das Reformas Educativas

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escolar de todos os alunos, alunos com dificuldades, alunos médios, alunos bons e excelentes alunos. Para alcançar este objetivo o PTM centra-se na ideia de mudança do conceito de organização de turma como estratégia para melhoria de resultados escolares.

PROJEtO tURmAmAIs: ORGANIzAÇÃO DA tURmA

Em Portugal a constituição das turmas encontra-se legislada e a lei nesta matéria afirma que “deve ser respeitada a heterogeneidade das crianças e jovens, podendo, no entanto, o diretor , perante situações pertinentes, e após ouvir o conselho pedagógico, atender a outros critérios que sejam determinantes para a promoção do sucesso e o combate ao abandono escolares” (Despacho n.º 5048-B/2013). A lei determina ainda um número mínimo e máximo de alunos por cada turma tendo em conta os pressupostos anteriores.

o PTM com o objetivo primordial de promoção do sucesso escolar e de combate ao insucesso e abandono escolar insere-se nas exceções de organização de turmas que a lei permite. Assim, o PTM tem como princípio a criação de uma turma ad hoc sem alunos, designada TurmaMais, que acolhe por períodos determinados de tempo (geralmente seis semanas), grupos de alunos com resultados escolares semelhantes provenientes de diversas turmas do mesmo ano de escolaridade e disciplina, como se pode observar na figura 1.

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

Turmas de Origem

figura 1. Constituição da turmamais

A nível organizacional, a tipologia TurmaMais vai implicar a constituição de grupos temporários de alunos conforme os seus níveis de desempenho que durante seis a sete semanas vão estar sujeitos a uma rotação entre a turma de origem e a TurmaMais, esta rotação é estabelecida previamente pelo conselho de turma. A rotação dos alunos tem em conta as características dos alunos face aos seus interesses pela disciplina, ao trabalho desempenhando e às relações interpessoais que podem possibilitar a rotação. Todos os alunos de cada turma vão ser chamados a participar na TurmaMais num momento previamente calendarizado pela equipa educativa.

A rotação dos grupos de alunos ocorre normalmente da seguinte

Turma B

X alunos

Turma A

X alunos

Turma C

X alunos

TurmaMais

(alunos da Turma A, B e C)

Nível 5

Nível 4

Nível 3

nível 2/1

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forma:

1º período – o período é dividido em duas fases diferentes, a primeira fase, de cerca de seis a sete semanas, a TurmaMais será frequentada pelos alunos de nível 4/5, na segunda parte do 1º período por alunos com mais dificuldades, nível 2;

2º período – o período é dividido em duas fases diferentes, a primeira fase, de cerca de seis a sete semanas, a TurmaMais será frequentada por alunos de nível 4, na segunda parte do 2º período a TurmaMais é frequentada por alunos de nível médio, nível 3/2;

3º período – reservado a alunos em risco de retenção.

Este modelo de organização permite aos docentes trabalharem com grupos de alunos temporários; de menor dimensão e menos heterogéneos, quer nas turmas de origem quer na TurmaMais; permite aos professores adotarem estratégias de diferenciação pedagógica para poderem responder às necessidades individuais dos alunos, tanto para os bons alunos como para os alunos que possuem mais dificuldades.

AsPEtOs ORGANIzAtIVOs DO PROJEtO tURmAmAIs

As escolas envolvidas no programa têm autonomia de combinar as variáveis (disciplinas, anos e ordem de grupos) de acordo com o que pensem ser a melhor forma para atingir os níveis de sucesso contratualizado. A metodologia do PTM permite uma margem de manobra considerável, no que respeita às disciplinas a envolver e os grupos de alunos a frequentar a TurmaMais.

o Programa Mais Sucesso Escolar, em particular a tipologia TurmaMais, tem subjacente o princípio de ciclo de estudo como unidade organizativa. Por ciclo de estudos entende-se uma etapa definida na estrutura do sistema

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

educativo, com determinado tempo de duração e com uma identidade própria, a nível de objetivos, finalidades, organização curricular, tipo de docência e programas.

Como afirma Verdasca (2009) no quadro de autonomia da escola e da sua esfera organizacional existe espaço para estruturar agrupamentos de alunos e equipas de docentes na base de ciclo de estudos. A lógica de ciclo de estudos, e o que lhe está associado, lança novos desafios no âmbito da gestão curricular, como afirma o autor “faz emergir perspetivas inovadoras de flexibilização, reorganização e adaptação do currículo, potenciando novas soluções em termos de (re)organização pedagógica dos agrupamentos internos dos alunos e respetivas equipas de docentes” (Verdasca, 2009, p.1).

Da lógica do PTM surge um conjunto de implicações organizacionais que, como afirma Verdasca (2009), têm um impacto direto e imediato nas condições escolares de ensino e aprendizagem, das quais destacamos:

a) o desenvolvimento de dinâmicas organizativas flexíveis em termos de (re)agrupamento e (re)distribuição de alunos;

b) menor heterogeneidade dos grupos e respetivos níveis e ritmos de aprendizagem;

c) gestão direcionada e focalizada do critério horário ao acom-panhamento e apoio direto a alunos, de acordo com as suas necessi-dades e capacidades;

d) constituição de equipas docentes, tendo a seu cargo o acompanhamento das gerações escolares ao longo de todo o ciclo de estudos e sendo cada equipa integralmente responsável pelo acom-panhamento de uma coorte de alunos;

e) maior autonomia organizacional da escola e flexibilização curricular pedagógica, na distribuição de alunos e docentes e na afe-tação de outros recursos;

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f) maior intercomunicabilidade, implicação e corresponsabili-zação da comunidade escolar, maior estreitamento e regularidade de contacto com as Associações de Pais, no âmbito do acompanhamen-to e evolução da vida escolar dos alunos;

g) criação e dinamização da ‘rede de escolas do programa mais sucesso escolar’ em estreita cooperação e parceria com centros de investigação de universidades.

Segundo Verdasca (2011) a tipologia TurmaMais além de ser uma tecnologia organizacional que se apoia no princípio do ciclo de estudos “contribui enquanto experiência afirmada no terreno e reconhecida como referência de sucesso, para a corroboração da sua adequabilidade e extensibilidade como fator organizacional pedagógico potenciador das condições para uma melhoria das aprendizagens e dos resultados escolares dos alunos.”

CONsIDERAÇÕEs fINAIs

o Projeto TurmaMais e a originalidade da sua tecnologia permitiram um reforço do direito à excelência, garantindo uma maior possibilidade de recuperação dos alunos com dificuldades e elevando o interesse e resultados dos alunos com bom desempenho escolar.

os resultados obtidos nos três primeiros anos de PTM permitiram fazer um balanço positivo, os dados, na generalidade, apontam para uma melhoria progressiva do sucesso escolar. No entanto, como sublinha Verdasca (2012), o processo “adquire complexidades e dificuldades acrescidas à medida que se caminha para níveis tendencialmente residuais” (pp.140-141). É necessário que as escolas continuem a desenvolver a sua capacidade de autorregulação no sentido de otimizarem recursos e garantirem um trabalho sustentado que conduza à melhoria e consolidação

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

do sucesso dos alunos.

O lançamento do Programa Mais Sucesso Escolar, e neste caso, do Projeto TurmaMais e todo o trabalho de divulgação, sensibilização, envolvimento dos professores, técnicos, pais, alunos vieram de alguma forma agitar o interior da escola, pois levaram ou a que se fizesse uma reflexão sobre o trabalho escolar realizado, opções a tomar e modos de concretização.

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

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REfERÊNCIAs LEGIsLAtIVAs

Lei n.º 46/86, de 14 de outubro - Lei de Bases do Sistema Educativo, republicada no Diário da república – I Série-A, n.º 166, 30 de Agosto de 2005

Despacho n.º 100/2010, de 5 de Janeiro

Despacho n.º 5048-B/2013

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DIREtOR DE tURmA NO QUOtIDIANO DA EsCOLA

Lionilda Mágueda Évora de Sá Nogueira

Universidade de Cabo Verde

[email protected]

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REsUmO

Vivemos num mundo globalizado em que o mercado de trabalho exige um novo perfil de trabalhador capaz de desenvolver competências designadamente criatividade, iniciativa e capacidade para trabalhar em equipa (Libaneo, 2003). Assim a escola se vê confrontada com as reivindicações por parte da sociedade de uma educação de qualidade. Com a massificação do ensino, a escola acolhe atualmente alunos de estratos socioeconómicos diferenciados e cujo perfil é diferente dos alunos anteriormente albergados. Tal situação requer da escola novas competências para o desenvolvimento de novos papéis (Formosinho, 2009). Neste contexto a direção das escolas não consegue dar uma resposta eficiente e eficaz devido a massificação do ensino e pelo surgimento de novo perfil de aluno. Surgem assim os órgãos de gestão intermédia, designadamente o diretor de turma, o orientador pedagógico, coordenador de disciplina de entre outros. O diretor de turma desempenha o cargo de docente e de gestor enquanto membro dos órgãos de gestão intermédia. Este artigo intitulado visa apresentar o papel do Diretor de Turma no desenvolvimento curricular, na gestão do currículo da turma e relação funcional com outros docentes. Desenvolvemos o trabalho empírico junto a professores que desempenham o cargo de Diretores de Turma na Escola Secundária Pedro Gomes situada na cidade da Praia.

Palavras-chave: gestão escolar; diretor de turma; currículo.

REsUmé

Dans le cadre de la globalisation, le marché de travail devient de plus en plus exigeant concernant le profil du travailleur. Il faut être capable de développer des compétences, notamment la créativité, l’esprit

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d’initiative et le travail collaboratif (Libaneo, 2003). Dans ce contexte, l’école est obligée de répondre à la demande d’une éducation de qualité. Avec le phénomène de la démocratisation de l’enseignement, à l’heure, l’école a accueilli des élèves de couches socioéconomiques défavorisées et différenciés avec un profil différent par rapport aux anciens élèves. Ce scénario exige de l’école de nouvelles compétences pour le développement de nouvelles taches (Formosinho, 2009). Dans ce contexte, l’école ne réussit pas à donner des réponses efficientes et efficaces à cause de cette massification et du nouveau profil de l’élève. Ainsi, sont créés des organes de gestion intermédiaires, notamment l’enseignant responsable de classe, l’orienteur pédagogique, le coordinateur etc. L’enseignant responsable de classe a les tâches d’enseignant et de gestionnaire. Ce papier dont le titre vise présenter le rôle de l’enseignant responsable de la classe au niveau de développent, management du curriculum et des rapports inter personnelles avec les autres enseignants. Nous avons développé une étude de cas parmi les enseignants responsable de la classe de l’École Secondaire Pedro Gomes de la cité Praia.

mots-clés: direction de l’école; classe de directeur; curriculum.

INtRODUÇÃO

Cabo Verde ascendeu à independência em Julho de 1975. Após a independência, considerando o contexto sociopolítico, o currículo se revelava obsoleto. Assim ao currículo foram sendo feitas algumas adaptações não só em conteúdos, mas também na sua estruturação e nos anos 90 avançou-se com a reforma do Ensino Básico e Secundário, que se consubstanciou a partir da Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) publicada a 19 de Dezembro de 1990 e que define a configuração do Sistema Educativo em subsistemas com os respetivos objetivos.

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

Em 2002 através do Decreto nº 20/2002 (Bo de Agosto de 2002) estabeleceu-se o Regime de Organização e Gestão dos Estabelecimentos do Ensino Secundário. Esse decreto adequa o papel do Diretor de Turma ao contexto atual.

Durante o período que antecedeu a independência, a orientação dos alunos e coordenação dos professores sempre estiveram na agenda de preocupação. Através da reforma do ensino liceal em 1895 (Decreto 14 de Agosto de 1895, criou-se o cargo de Diretor de Classe. Em 14 de Outubro de 1936, o Decreto 27084 no seu art.28º e 1ª) cria a figura do Diretor do Ciclo. Em 1968, o estatuto do ciclo Preparatório (Decreto 48572 de 9 de Setembro de 1968) substitui o Diretor de Ciclo pelo Diretor de Turma.

Neste trabalho pretende-se dar relevância ao papel do Diretor de Turma, gestor intermédio enquanto profissional de destaque na organização escolar, na medida que para além da função docente, coordena os trabalhos dos diferentes docentes da turma, de forma que o ensino contribua para a formação integrada e integral do aluno, desenvolve também a função de interface entre os intervenientes do processo de ensino-aprendizagem, a saber, alunos, professores, pais/EE e órgãos de gestão da escola.

1. O PAPEL DO DIREtOR DE tURmA NO DEsENVOLVImENtO CURRICULAR E GEstÃO DO CURRICULO DA tURmA

o termo currículo definido por vários autores varia desde a sua relação com material didático e métodos pedagógicos (ribeiro, 1990) até ao conceito mais alargado defendido por Foshay (1969) que entende ser um conjunto de experiências significativas vividas na escola sob orientação do professor.

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1.1 DEsENVOLVImENtO CURRICULAR

A construção do currículo é dinâmica e compreende quatro fases de um processo: justificação, planeamento, implementação e avaliação. Existem vários mecanismos para implementação de currículos dependendo da maior ou menor grau de autonomia das escolas. Tratando-se de uma escola com autonomia curricular, o currículo é elaborado pela própria escola. no entanto, nos países com forte centralização administrativa, nomeadamente, França e Portugal o currículo é definido ao nível do Ministério da Educação cabendo as escolas a sua implementação e gestão. nesses casos considerando que as escolas possuem realidades diferentes, convém que o currículo seja adaptado à realidade local (zabalza, 1992).

Os principais atores chamados a intervir na implementação e gestão do currículo, são os órgãos de gestão da escola responsável pela execução, os órgãos intermédios, nomeadamente os Coordenadores de Disciplina que juntamente com os seus pares definem estratégias de implementação da respetiva disciplina tendo sempre como pano de fundo a visão holística do currículo. Por fim o professor é chamado a intervir diariamente na concretização desse currículo a partir da criação de situações de aprendizagem na disciplina da sua especialidade, (Roldão, 2007).

Considerando o esforço de cada docente, é natural que se verifique a necessidade de coordenação desses diferentes esforços e essa função é desempenhada pelo Diretor de Turma. Segundo Roldão (2007), tal coordenação permite:

•Estruturar as aprendizagens da turma como um todo coerente e adequado às necessidades;

Definir as prioridades curriculares tendo por base a análise da situação da turma;

Estabelecer consensos relativamente ao perfil de competências

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necessárias ao aluno;

Consensualizar ao nível do Conselho de Turma, as atitudes e valores a promover nos alunos evitando diferentes níveis de exigências por parte dos docentes.

Cabe ao Diretor de Turma enquanto líder do Conselho de Turma, fazer um diagnóstico da turma relativo aos saberes já adquiridos e as possíveis lacunas, de modo que ao nível do Conselho de Turma crie-se mecanismos de superação, (Skinner, citado ribeiro, 1990).

Um outro domínio de intervenção do Diretor de Turma está relacionado com a definição em Conselho de Turma de competências a desenvolver no aluno.

1.2 GEstÃO CURRICULAR

Segundo Chiavenato (1998) gerir é fazer com outros realizem as atividades pretendidas pelo gestor visando o alcance de determinado(s) objetivo(s). Gerir constitui um conjunto de processos e procedimentos através dos quais se tomam as decisões necessárias quanto aos modos de implementação e organização de um currículo proposto, no quadro de uma instituição escolar, (roldão, 2007).

na gestão curricular, o Diretor de Turma tem como função articular com os diferentes interlocutores, designadamente, alunos, pais /Encarregados de Educação e professores. O papel do Diretor de Turma na gestão curricular visa coordenar as diferentes disciplinas lecionadas de modo que os saberes construídos não sejam segmentados e/ou deficientes.

A gestão curricular abarca quatro dimensões, nomeadamente, reconstrução, diferenciação, adaptação e construção.

A reconstrução do currículo consiste na implementação do currículo

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validado pelos órgãos competentes do Ministério da Educação, tendo em conta a realidade da turma.

Com base no diagnóstico da turma e o currículo validado o Diretor de Turma juntamente com a equipa docente define as prioridades a adotar e os professores farão a necessária adequação nas respetivas disciplinas. A diferenciação se refere à necessidade de levar em conta o ritmo de cada aluno.

O Diretor da Turma conjuntamente com o Conselho de Turma deverá definir estratégias diferenciadas de trabalhos a serem implementadas nas aulas.

A adaptação se impõe devido à heterogeneidade em termos de faixa etária e cultura dos alunos da turma, com vista à promoção do sucesso do aluno e da turma.

A construção se refere a situações em que os docentes elaboram e implementam projetos pedagógicos, designadamente de saúde escolar, clube de leitura, entre outros, aonde cabe ao Diretor de Turma coordenar as diferentes iniciativas, promovendo a interdisciplinaridade.

2. A LIDERANÇA DO DIREtOR DE tURmA E A RELAÇÃO INtERPEssOAL COm Os sEUs PAREs

2.1 DIREtOR DE tURmA, LÍDER DA tURmA E DO CONsELhO DE tURmA

Ser líder consiste na capacidade de influenciar alguém de modo a fazer o que o líder deseja.

o Diretor de Turma é um docente da turma que acumula as funções de Diretor de Turma. no quadro de suas funções, deve ser um conselheiro, tutor dos alunos, responsável e interessado no sucesso escolar dos seus

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alunos. Deve acompanhar e orientar o processo de ensino-aprendizagem.

Além disso cabe-lhe estabelecer a mediação entre docentes dessa turma e alunos, gerir conflitos entre os diferentes intervenientes, designadamente, alunos, professores pais/EE. É o coordenador de equipas de trabalho, o responsável pela planificação, elaboração e acompanhamento de projetos pedagógicos, quem propõe ao Conselho de Turma estratégias e o principal responsável pela sua implementação. Recolhe, trata e divulga informações pertinentes à vida escolar dos seus alunos.

Compete ainda ao Diretor de Turma fazer um levantamento da situação sócio económica e o rendimento escolar do aluno, contribuir para a integração saudável do aluno, verificar as faltas, publicita-las e informar às famílias, colaborar na conservação e asseio do material escolar, preparar as pautas, livros de frequência para as reuniões de avaliação, incentivar os alunos para a assunção de responsabilidades comunicar com os pais/EE sobre o aproveitamento do educando e presidir às reuniões do Conselho de Turma.

2.2 RELAÇÕEs INtERPEssOAIs COm Os PAREs

Alguns autores referem às competências de relacionamento interpessoal, (Herdeson et al. 1994, citado Silva, 2007) destaca a importância da afetividade nas relações interpessoais que passa por ter o interlocutor como pessoa. zins (1996) reitera o papel da afetividade na construção de uma boa relação interpessoal conjuntamente com a empatia, autenticidade, disponibilidade para prestar apoio e colaboração.

A interação do Diretor de Turma com os seus grupos pares ocorre ao longo de todo ano escolar. Entretanto os momentos em que essa colaboração demonstra ser mais relevante é no início do ano letivo nas reuniões de preparação metodológica aonde se deve refletir conjuntamente, visando o

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estabelecimento de objetivos pedagógicos e dos da escola a atingir.

no final do ano letivo, para além dos encontros de avaliação das aprendizagens é o momento também de se fazer o balanço do ano, refletir sobre os pontos fortes e fracos, e recolher subsídios para a preparação do próximo ano.

Neste contexto o Diretor de Turma desempenha um papel de líder, animador/moderador, coordenando e dinamizando a interacção entre docentes e optimizando a reflexão estabelecida.

3. PERfIL E fUNÇÕEs DO DIREtOR DE tURmA

Segundo o Decreto-Lei 20/2002 de 19 de Agosto de 2002, que trata da Organização e Gestão das escolas secundárias em Cabo Verde, o Diretor de Turma é um docente com a totalidade dos alunos da turma e que é nomeado sob a proposta do Conselho Pedagógico.

No dia-a-dia do Diretor de Turma cabe-lhe a tarefa de para além das atividades de caráter burocrático comunicar com os seus interlocutores.

A literatura é pródiga na afirmação de que a linguagem da escola constitui um motivo de afastamento de muitos pais/EE, pela utilização de muitos termos técnicos. nessa ótica o Diretor de Turma deve estar atento à linguagem que utiliza e a sua adequação às caraterísticas sociais e culturais das famílias, para além de segundo Artigot, (citado por Cruz, 2006) desenvolver qualidades como pessoa, técnico da educação e orientador familiar.

Enquanto pessoa deve desenvolver, humanidade, amizade, autenticidade, exigência, justiça e espírito desportivo.

Para além de qualidades humanas o Diretor de Turma deve revelar competência técnica no domínio da educação nas áreas de Psicologia,

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Pedagogia, Didática Específica, organização e Administração Escolar e conhecimentos na sua especialidade.

no que respeita às qualidades como orientador familiar deve: -recolher e disponibilizar as informações de alunos e famílias; -receber os pais semanalmente e -solicitar a colaboração desses na realização de atividades.

Em Cabo Verde a legislação propõe como perfil do Diretor de Turma qualidades como pessoa nomeadamente: capacidade de relacionamento, senso e ponderação; tolerância, compreensão e espírito de diálogo associadas sempre a atitudes de rigor e firmeza; espírito metódico e dinamizador.

no que respeita às funções esse mesmo decreto prevê as de caráter burocrático designadamente, organizar um ficheiro da turma sobre a condição socioeconómica do aluno, o rendimento escolar e outros; registo, divulgação e participação às famílias das faltas dos alunos; receber semanalmente os pais e encarregados de educação e; presidir as reuniões do Conselho de Turma, de entre outros.

Da análise da legislação verificou-se algum esvaziamento das competências do Diretor de Turma relativamente ao proposto na literatura. As funções previstas na lei são mais de foro administrativo do que pedagógico, embora também compete ao Diretor de Turma coordenar as reuniões de conselho de turma.

4 . APREsENtAÇÃO E ANÁLIsE DOs DADOs

Por ocasião das reuniões de preparação metodológica na Escola Secundária Pedro Gomes realizámos uma formação destinada aos Diretores de turma. Para o efeito, foi dividido o grupo de Diretor de Turma em dois grupos de trinta e oito formandos cada.

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A formação foi organizada em dois momentos: a apresentação da temática seguida de debate e, trabalho de grupo com apresentação e discussão em plenária.

4.1 ORGANIzAÇÃO E fUNCIONAmENtO DA EsCOLA

Essa escola apresenta uma infra-estrutura adequada com espaços em condições de uso. Possui para além das 32 salas de aula, laboratório, biblioteca, placa desportiva de entre outros.

Dos 1140 alunos, 684 pertencem ao turno da manhã repartidos em 21 turmas e 623 ao da tarde, distribuídos em 22 turmas.

no que se refere ao corpo docente, a escola possui um corpo docente qualificado com 46% licenciados e 4% o Curso Médio. São professores com alguma experiência; 46% possuem de 10 a 15 anos de e 2% apenas 1 ano. 54% possuem contrato de trabalho e 46% pertencem ao Quadro da Função Pública.

no que concerne ao pessoal não docente, verifica-se baixa qualificação e muitos anos de experiência. Dos 13 funcionários, 54% detêm a 4ª classe e 8% 10º ano de escolaridade. 54 % possuem de 10 a 15 anos de serviço e 8% de 6 a 10 anos. 77% trabalham em regime de contrato e 23% pertencem ao quadro.

4.2 mEtODOLOGIA

A amostra utilizada neste trabalho é constituída por trinta e oito Diretores de Turma, representando 50% do universo. O grupo foi dividido em quatro pequenos grupos.

Foi solicitado como questões de reflexão as seguintes:

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• principais dificuldades enfrentadas pelo Diretor de Turma

• medidas que visem a melhoria do trabalho de Diretor de Turma

• participação dos pais na vida escolar e propostas de melhoria e

• estratégias de melhoria das competências linguísticas dos alunos.

4.3 APREsENtAÇÃO DOs REsULtADOs

PRINCIPIAs DIfICULDADEs ENfRENtADAs PELO DIREtOR DE tURmA

• Turmas numerosas

Na opinião dos Diretores de Turma, as turmas numerosas vem dificultando o trabalho dos Diretores de turma no atendimento aos alunos.

• Baixa participação dos pais/EE na escola. Alguns pais se dirigem a escola apenas no início e fim do ano letivo. outros só comparecem quando convocados.

• Vulnerabilidade da escola em relação ao meio em que está inserida.

O liceu tem sofrido algumas situações de insegurança, designadamente alunos que vão armados à escola e devido ao meio onde a escola se encontra inserida.

• não comparência de alguns professores às reuniões de Conselho de Turma.

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• Atribuição do cargo de Diretor de Turma a professores de disciplinas opcionais

o facto de se atribuir direção a docentes que não lecionam o total de alunos da turma significa que esse mesmo não conhece todos os alunos. Tal situação cria constrangimentos em termos de comunicação e qualquer ajuda que o Diretor deseja prestar, para além de ir contra ao que está legislado (art.).

• A não introdução no horário, do espaço reservado ao encontro do Diretor de Turma com os seus alunos.

A não contabilização no horário das duas aulas de Direção de Turma tem constituído constrangimento por permitir o atendimento conjunto dos alunos.

mEDIDAs QUE VIsAm A mELhORIA DO tRABALhO DE DIREtOR DE tURmA

Como medidas conducentes à melhoria do cumprimento eficaz das funções do Diretor de Turma:

• Implementação efetiva do Conselho de Turma

• realização de atividades com os pais/EE

Das diferentes discussões havidas confirmou-se várias vezes a não comparência dos pais na escola e mesmo não envolvimento na vida escolar do filho. Assim propôs-se o desenvolvimento de atividades com os pais

• Formação para os pais/EE

• Socialização e partilha de experiência entre os Diretores de Turma.

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Organização Escolar e Avaliação Institucional

5. CONCLUsÕEs

O Diretor de Turma é o responsável pelo desenvolvimento curricular, pela gestão curricular da turma e relação funcional entre os intervenientes no processo de ensino e aprendizagem. No entanto a legislação cabo-verdiana aponta como funções atividades mais burocráticas e que se enquadram mais na relação funcional entre o Diretor de Turma e a comunidade educativa.

Por vezes é atribuída a função de Diretor de Turma a docentes das disciplinas opcionais.

As turmas são numerosas e assim dificultam o trabalho do Diretor de Turma.

A não comparência de alguns docentes às reuniões de Conselho de Turma.

A participação deficiente dos pais.

A vulnerabilidade da escola a nível da insegurança em relação ao meio circundante e aos próprios alunos.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Chiavenato, I. (1998). Teoria Geral da Administração, Brasil, McGRAW-HILL.

Cruz, P. (2006). O Papel do Director de Turma face aos desafios da autonomia – um estudo de caso”, Tese de dissertação de Mestrado, Universidade Portucalense, Porto.

Libâneo, J. (2004). Organização e Gestão de escolas. Goiânia: Alternativa.

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Ribeiro, C. A. (1990). Desenvolvimento Curricular, Ed. Texto Editora.

Roldão, M. C. (2007). Director de Turma e a Gestão Curricula, Cadernos de Administração e organização Educacional-nº1.

Silva Carriço, M. I. (2007). O Director de Turma e a Gestão Curricular no Conselho de Turma . Dissertação de Mestrado, Universidade Portucalense, Porto.

Teixeira, S. (1998). Gestão das Organizações, McGRAW-HILL.

zabalza, M. (1992). Planificação da Educação Pré-escolar. Porto: Edições ASA.

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proCessos e reAlidAdes eduCAtivAs

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tRABALhO DE PROJEtO: EXPERIÊNCIAs VIVIDAs E sENtIDAs Em CONtEXtO DE EDUCAÇÃO DE INfÂNCIA

Cândida Mota-Teixeira; Beatriz Silva

Instituto Piaget, Universidade do Porto; nuclisol Jean Piaget Mirandela, Universidade de Santiago de Compostela

[email protected]; [email protected]

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Processos e Realidades Educativas

REsUmO

A equipa pedagógica da Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) – Nuclisol, Jean Piaget de Mirandela, Portugal, tem desenvolvido um projeto educativo que visa uma articulação estreita com a comunidade envolvente na recuperação de tradições. neste sentido, tem colocado em marcha projectos em articulação com a família, com a autarquia, com a cultura e com as gentes locais. nesta perspectiva, daremos conta de um manancial de experiências pedagógicas sentidas e vividas na esteira da metodologia de projeto, evidenciado a escuta ativa das crianças (grupo de 4/5 anos) e da comunidade educativa. Sublinharemos a forma como formulamos os problemas, como equacionamos as soluções, como planeamos e gerimos a mudanças necessárias ao exímio desenvolvimento dos projetos. Frisaremos, ainda, transformações geradas na comunidade local, destacando as sinergias colaborativas enquanto andaimes de (des)envolvimento dos projetos e da qualidade educativa, a que estes nos transportam. num registo qualitativo, e na esteira da investigação ação, interpretam-se as experiencias pedagógicas, centradas em projetos, enquanto conducentes a ações solidárias, de valorização da cultura local, de implicação de toda a comunidade aprendente e, sobretudo, de potenciadoras de uma ciência social crítica e transformadora (Habermas,1987).

Palavras-chave: trabalho de projeto; investigação ação; educação de infância; trans(formação); exploração olivícola.

ABstRACt

The teaching team of Private Institution of Social Solidarity (IPSS) - nuclisol, Jean Piaget of Mirandela, Portugal, has developed an educational project that aims to a close articulation with the envolved community and

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restoring traditions. In this sense, it has set in motion projects in conjunction with the family, with the municipality, with the culture and local people. In this perspective, we will realize a wealth of teaching experience felt and experienced in the wake of the design methodology, demonstrated active listening of children (group of 4/5 years) and the educational community. Underline how we formulate the problems as we equate the solutions, we plan and manage the necessary changes to the project development expert. say further transformations generated in the local community, while highlighting the synergies collaborative scaffolding of developed projects and educational quality, that they transport us. A record qualitative and action in the wake of the investigation, to interpret the experiences teaching, focusing on projects while leading to solidarity actions, appreciation of local culture, the implication of the all learning community and, especially, the enhancer of a science social critique and transformative (Habermas, 1987).

Keywords: work design; action research; childhood education; formation and olive exploration.

1. INtRODUÇÃO

nos últimos tempos, tem-se apostado em produzir conhecimento, que argumente a lógica plural da educação, pelo que agremiamos esta tendência investigativa a necessidades prementes do nosso contexto de estudo – educação de infância (E.I).

Esta dimensão educativa, permeável a uma educação com todos e para todos, permite-nos cultivar uma educação ativa centrada em modos de trabalho de projeto, alicerçada na estratégia metodológica de investigação ação e ancorada numa ciência social crítica e transformadora. Assim, a descrição e interpretação que aqui se apresenta, em torno dos projetos vivenciados na IPSS – nuclisol de Mirandela, visa exercer a ciência social numa práxis crítica, na qual os saberes da comunidade tenham ligação

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Processos e Realidades Educativas

direta com a ação social transformadora (Habermas,1987).

Sublinhamos a vivência de uma conjuntura de desertificação em terras do nordeste transmontano português, que acarreta inúmeras fragilidades sociais e institucionais que decidimos (trans)formar. Convictas de que a infância é mobilizadora de consciências e de que as práticas que aí se tecem, deixam sementes de transformação nas comunidades, empreendemos projetos singulares, tais como “a apanha da azeitona”; “produção de azeite” e “confecção de sabão”. Tomamos como exemplo este ciclo de projetos, no entanto, poderíamos resgatar outros que, igualmente, cumprem os preceitos desta pedagogia em participação (oliveira-Formosinho, 2011) e desta pedagogia crítica (Freire, 2004).

Esta dinâmica encerra atitudes de implicação, na qual a comunidade aprendente se torna construtora de conhecimentos e elabora estratégias de superação de “situações-limite” (ibidem). Assim, com os referidos projetos ambiciona-se valorizar um bem alimentar essencial – o azeite, percebendo os processos e os procedimentos da sua produção e aplicação (finalidades várias); estimar a nossa cultura local; recuperar olivais abandonados; angariar fonte de rendimentos para sobreviver à crise e sobretudo consciencializar as famílias e restante comunidade para a importância de dar continuidade à exploração olivícola.

numa pedagogia em participação, o ciclo de projetos potenciará diferentes aprendizagens numa vivência plural da realidade e na construção da experiência dessa pluralidade (oliveira-Formosinho, 2011). Possibilitando a todos os envolvidos um reequacionamento de práticas, ideias e conceitos.

2. DA EXPLORAÇÃO OLIVÍCOLAs Em ABANDONO à EDIfICAÇÃO DE PROJEtOs

A desertificação em Trás-os-Montes é uma realidade que afeta a

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vida das gentes e põe em causa o desenvolvimento económico, social e cultural. Estas tendências, resultantes do modelo de desenvolvimento que tem moldado a evolução das sociedades e das economias europeias (e globais), estão intimamente ligadas com os conhecidos processos de êxo-do rural. Estes são responsáveis pelo declínio populacional das áreas mais periféricas e consequentemente, originam fragilidades várias (Vaz, 2011). ora, este facto inunda, inevitavelmente, as instituições educativas e requer destas um olhar atento e trans(formador).

Esta instituição educativa, fazendo parte de uma grande cooperati-va de desenvolvimento – Instituto Piaget, não poderia ficar alheia a factos que afetam a sociedade civil e que, direta ou indiretamente, influenciam a educação das crianças. Pelo que, a sua equipa multidisciplinar aproveitou as problemáticas referidas, uniu esforços, interesses e pertinências curricu-lares, des(envolvendo) todos os atores educativos.

Percebe-se, face ao exposto, que no contexto de E.I os docentes experienciam múltiplas tarefas que não se esgotam no trabalho pedagógico da sala de atividades, perpassando os muros da sala e os muros institucionais. São tarefas que apontam para perspetivas plurais de interações entre pares onde se conta com a solidariedade da comunidade aprendente e onde se tenta fazer a diferença. Diferença que se (re)faz nos e pelos projetos que se empreendem, numa ação concertada entre as crianças, equipa educativa, famílias e a comunidade. E, juntos tentam produzir melhorias (Monteiro, 1998).

3. mEtODOLOGIA EmERGENtE

A estratégia metodológica que sustenta este estudo alicerça-se na IA, por esta ser permeável à prática e por desencadear processos de reflexão que visam e permitem engajar caminhos de conscientização e de mudança

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Processos e Realidades Educativas

(Máximo-Esteves, 2008). Assim, a ação concretizou-se no próprio contexto transformando-o e transformando-se.

repare-se que esta sequencialidade de projetos em rede (Katz & Chard, 2009) se desencadeou no momento em que necessitamos de criar oportunidade de participação das crianças em visitas de estudo e não havia meios financeiros para tal. Portanto, em equipa analisamos (im)possibilidades de resolução, verificamos as oportunidades curriculares (ibidem) e formamos redes antecipatórias com as crianças. A partir desta aceitação, gradualmente, o projeto foi-se estendendo aos familiares numa dimensão interpretativa e participativa, passando pela articulação e integração das dimensões de investigação e intervenção/ação. Perseguiu, deste modo, as fases propostas pela IA: “diagnóstico e planificação da ação, implementação, avaliação e definição de novos conhecimentos” (Monteiro, 1998:17).

A articulação da IA e do modo de trabalho de projetos em rede (Katz & Chard, 2009) experienciado constituíram-se num desafio de participação potenciando um envolvimento colectivo e solidário de todos os atores implicados num processo de intervenção sociocostrutivista. Pelo que a ação desta equipa se aproximou, inevitavelmente, desta perspectiva, sendo esta entendida como “um processo complexo e dinâmico que, visa a mudança” (Fernandes et al, 2001 citado por Ludovico e Teixeira, 2007:50).

Numa pedagogia da escuta e da negociação ensaiamos experienciar o currículo num comprometimento com o trabalho de projeto e com a IA, perspetivando-se a aprendizagem dai decorrente, como um processo “consciente, integrador de uma estrutura aberta e de um cenário de aprendizagem significativa” (Miranda, 1999 citado por Mendonça, 2002:18).

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4. ItINERÁRIOs DE PROJEtOs VIVIDOs E sENtIDOs

Daremos conta, resumidamente, dos itinerários vividos e sentidos neste ciclo de trabalho em projeto. Assim, em primeiro plano, as crianças compartilham, de várias maneiras, o seu conhecimento prévio e as suas experiências relacionadas ao assunto. De seguida procedeu-se à elaboração de uma rede antecipatória permeada pela reflexão da equipa acerca das possibilidades curriculares que esta indagação possibilitava, primando-se por um planeamento realizado em participação. Desta forma permitiu-se ao grupo “beneficiar da sua diversidade, das capacidades e competências de cada criança, num processo de partilha facilitador da aprendizagem e do desenvolvimento” (DEB, 1997: 26).

Incentivou-se á pesquisa, junto das famílias e comunidade e integrou-se esta possibilidade de aprendizagem na semana do festival do azeite novo promovida pelo pelouro da educação e da cultura da autarquia local. neste encalço procedeu-se a uma visita ao lagar de azeite de Carvalhais, guiada pelos estudantes e docentes da Escola Profissional ai sediada. Assistiu-se a todo o processo de transformação do azeite, desde a chegada da azeitona trazida pelo agricultor, até ao produto final. Terminando com uma degustação de torradas com azeite.

De facto, esta visita foi uma mais-valia a nível da aprendizagem, provocando contagio e curiosidade, junto das famílias. Ora, este facto originou a possibilidade de explorarmos a apanha da azeitona de um olival abandonado em Cabanelas, gentilmente cedido por uma habitante idosa.

o tempo frio e rigoroso que se fez sentir não permitiu a participação desejada por parte das famílias, pese embora tenhamos conquistado um número considerável de intervenientes. Produziram-se cerca de 2.100 kg de azeitona que deram origem a 300 litros de azeite. Através desta vivência, proporcionamos às crianças o acompanhamento de todo o processo de produção do azeite, desde a apanha da azeitona à extração final.

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Processos e Realidades Educativas

De realçar que este azeite produzido serviu para consumo próprio e para venda, de forma a proporcionarmos vivências formativas às crianças (visitas de estudo, passeios), colmatando necessidades financeiras que algumas das atividades impunham.

A atividade procurou ser o resultado de todo o trabalho pedagógico desenvolvido: consciencializar as famílias para a importância de dar continuidade à exploração olivícola e junto das crianças dar a conhecer hábitos culturais da nossa região. Seguidamente, exploraram-se potencialidades do azeite através de mapas concetuais, uma vez que estes envolvem as crianças em atividades de investigação: hipóteses, questões, recolha, análise da informação e conclusões (Máximo-Esteves, 2008).

Proporcionou-se, ainda, na sequência de eventos propostos pelo Pelouro da Educação e da Cultura, uma visita de estudo à exposição “o ciclo do azeite” ao auditório municipal. Ali, encontramos uma representação do olival, da apanha tradicional da azeitona e os vários tipos de azeite que podemos encontrar no mercado.

no final da visita, graciosamente, prepararam-nos um lanche, onde serviram torradas com azeite, confeccionadas com a azeitona proveniente das oliveiras que encontramos a ornamentar os parques e jardins da cidade. A partir desta degustação, despoletou-se um interesse e gosto pelas torradas com azeite, aprendeu-se que serão mais saudáveis com azeite do que com a manteiga e procedeu-se á sua confecção para um lanche alargado a todas as crianças e famílias.

De salientar que nesta fase do projeto a força mais motivadora, tanto para as crianças como para os adultos, foi o prazer da descoberta e do conhecimento. Aliás, como refere Spodek (2002:187), “é importante que a aprendizagem se faça de uma forma divertida e que as crianças façam as coisas de que gostam”.

Mais tarde, surgiu a oportunidade de alargar conhecimentos

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através da audição de uma história, na qual sobressaía a confecção de sabão a partir do azeite. obviamente, que quisemos re(produzir) esta experiencia. Decorreram daqui inúmeras aprendizagens, tais como: a possibilidade de rentabilizar o azeite para fins distintos dos alimentares; descoberta de que o sabão não engordura a roupa e que a lava com eficácia; sensibilização das famílias para a produção artesanal do sabão e a sua utilização quotidiana.

Subsequente, ainda, da exploração olivícola fomos convidados, pela autarquia, a participar num concurso de rótulos para as garrafas de azeite. Elaboraram-se registos, pesquisou-se, comparou-se e elegeram-se os rótulos a concurso.

Em jeito de culminância, e em colaboração com as famílias das crianças, estas vestiram-se de azeitoneiro(a)s e foram passear pela cidade, a fim de promoverem os costumes e hábitos da nossa cultura.

De referir que a avaliação foi, ao longo do(s) presente(s) projeto(s) “(…) um mediador contínuo” Mendonça (2002:19), que esteve presente ao longo de todas as etapas. neste processo as crianças sintetizaram o saber adquirido e apresentaram-no aos outros, socializando os seus conhecimentos e partilhando-os. Em conjunto, as crianças teceram comparações entre aquilo que aprenderam, analisaram o contributo que cada criança deu à qualidade das tarefas realizadas e o trabalho de equipa que realizaram ao longo de todo o processo (Vasconcelos,2012). Assim, na lógica da IA esta fase é essencial para que os sujeitos participantes realizem uma reflexão síntese de tudo o que aprenderam, abrindo possibilidades de inauguração de outro ciclo de descoberta e aprendizagem (Diego, 2000).

o trabalho de projeto afigura-se como uma plataforma de desenvolvimento óptimo para uma cidadania ativa, apresentando-se permeável a uma escuta ativa; a uma negociação democrática e a uma reflexividade permanente (Vasconcelos, 2012).

Aliás, a natureza da educação de infância nem permitiria outro tipo

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Processos e Realidades Educativas

de vivência curricular, uma vez que o trabalho de projeto, como forma de aprendizagem, “acentua a participação ativa das crianças no planeamento, desenvolvimento e avaliação do seu próprio trabalho” (Katz & Chard, 2009:5). Pelo que, o presente ciclo de projetos, se alimentou de uma sinergia emancipadora, de trabalho em parceria, sedimentando um sentimento colaborativo e participativo visando a busca de mudanças e superações.

5. CONCLUsÕEs

Através das práticas narradas, dos entendimentos e das situações vivenciadas procuramos investigar o problema e elaborar acções estratégicas para superação do mesmo. neste encalço permitimo-nos colocar em prática uma educação dialógica, problematizadora e com perspetivas emancipatórias (Freire,2004). Estas dimensões foram agenciadas por todos os sujeitos, isto porque gerir o currículo em EI na perspectiva de “adequação, contextualização e articulação [com a comunidade de aprendizagem], assume uma complexidade e uma postura crítica não só para entender o real como para mudá-lo” (Ludovico &Teixeira, 2007 citado por Mota-Teixeira, 2008:50).

Assim, na atualidade o azeite, para a comunidade aprendente, é muito mais do que um complemento de uso culinário, servindo para múltiplos fins. Pelo que vale a pena, apostar na exploração dos minifúndios que, tem vindo a ser absorvidos pelas grandes explorações agrícolas, e realizar a apanha da azeitona de modo tradicional. Resiste-se, deste modo, ao abandono destas pequenas produções usando as mais-valias colhidas para fins comunitários e solidários.

Criamos, através deste ciclo de projetos, oportunidades de participação e erigimos novas posturas epistemológicas perante o conhecimento e a ação, refletida em novas práticas que corporizam os princípios da participação e do partenariado.

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Perspetiva-se, no âmbito do doutoramento em Ciências da Educação a realizar na universidade de Santiago de Compostela, acerca das cidades educadoras, contribuir para que a autarquia expanda estas práticas a outras instituições educativas, na tentativa da conquista de um investigador coletivo que se envolva em práticas de recuperação de tradições, que re(conheçam) a exploração olivícola como fonte de conhecimento e como fonte de transformação da vivencia crísica que se ensaia em terras transmontanas.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

DEB. (1997). Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar. Lisboa: Ministério da Educação.

Freire, P. (2004). Conscientização: teoria e prática da libertação. São Paulo. Editora Moraes Lda.

Habermas, J. (1987). Conhecimento e Interesse. RJ. Guanabara.

Katz, L. & Chard, S. (2009). A Abordagem por Projectos na Educação de Infância (2ª edição). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

Máximo-Esteves, L. (2008). Visão Panorâmica da Investigação-Acção. Porto: Porto Editora.

Mendonça, M. (2002). Ensinar E Aprender Por Projectos. Porto: Edições ASA.

Monteiro, A. (1998). Investigação-ação: uma postura inovadora perante o conhecimento e a intervenção sociais. Cadernos de educação de infância. nº 46. Lisboa: APEI.14-17.

Mota-Teixeira, C. (2008). Trajectos de Construção da Identidade Profissional em Contextos de Inserção Profissional: Perspectivas e Inquietações dos Educadores de Infância. Dissertação de Doutoramento: Universidade de Santiago de Compostela.

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Processos e Realidades Educativas

oliveira-Formosinho, J. & Gambôa, r. (2011). O Trabalho de Projeto na Participação-em-Participação. Porto: Porto Editora.

Spodek, B. (2002). Manual de Investigação em Educação de Infância. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

Vasconcelos, T. (Coord.) (2012). Trabalho por Projectos na Educação de Infância: Mapear Aprendizagens/Integrar Metodologias. Lisboa: Ministério da Educação

Vaz, M,H. (2011). Azeite de trás-os-montes. Lisboa: Instituto Piaget.

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A ABORDAGEm DE PROJEtO COmO AUtONOmIA E AGÊNCIA RELACIONAL NO ENsINO sUPERIOR

Elisabete Ferreira; Cândida Mota-Teixeira

Faculdade de Psicologia e de Ciências da EducaçãoUniversidade do Porto

[email protected]; [email protected]

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Processos e Realidades Educativas

REsUmO

o presente artigo sublinha os enredos formativos que os docentes do ensino superior vivenciam quando optam por estratégias de ensino-aprendizagem centradas em itinerários de projeto. Esta abordagem permite, um ensino centrado no auto questionamento, na problematização e na elaboração de propostas de projetos e, na construção de competências científicas, suportadas pelo domínio da investigação e da indagação (Mesquita, 2011). Defende-se que uma aprendizagem centrada em projetos favorece: i) a orientação para uma profissionalidade docente ativa e interativa; ii) a dialética entre teoria- prática; iii) uma perspetiva de trabalho centrada em problemas e na interdisciplinaridade, mobilizando a criação de constantes mapas mentais por parte de estudantes e docentes (Vasconcelos, 2012); iv) o investimento pessoal, orientando o formando para objetivos de desenvolvimento profissional (Mota-Teixeira, 2009); v) uma orientação para os fins sociais da aprendizagem (Dewey, 1959); vi) uma estreita combinação de comunidade e autoria; (Freire, 1997) e por último vii) a edificação de uma agência relacional (Ferreira, 2012). A partir de narrativas e trabalhos de estudantes da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP), problematizamos, as potencialidades de aprendizagem em projeto supra mencionadas. Evidenciaram-se, de incontestável importância a autonomia e a agência relacional enquanto andaimes do (des)envolvimento de aprendizagens significativas dos estudantes.

Palavras-chave: aprendizagem em projeto; narrativas; agência relacional, autonomia.

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ABstRACt

This article addresses the educational issues that university lecturer experience when they opt for teaching strategies focused on project itinerary.This approach allows to focus the learning on self-questioning problematisation, drafting of project proposals and building scientific competencies, supported by investigation (Mesquita, 2011). Project-based learning supports: i) orientation towards an active and interactive teaching; ii) The dichotomy between theory and practice; iii) a work perspective centered in problems and interdisciplinary relationships, supporting the creations of mental maps by students and lecturers (Vasconcelos, 2012); iv) self-investment, leading the student towards professional development objectives (Mota-Teixeira, 2009); v) orientation towards learning whit social ends (Dewey, 1959); vi) a strong relationship between community and authorship (Freire, 1997); vii) the building of a relationary agency (Ferreira, 2012). Based on narratives and papers developed by students of FPCEUP, we explore the potential of project-based learning in its various forms, as mentioned above. Autonomy and relationary agency revealed themselves as the most important foundations of the development of meaningful learnings of students.

Keywords: project-based learning; autonomy; narratives; reflationary agency.

INtRODUÇÃO

nos últimos anos, os processos de ensino e aprendizagem no Ensino Superior (ES) e o cuidado no acolhimento e envolvimento dos estudantes universitários no quotidiano escolar ganharam novos contornos, de reconhecimento e estatuto por parte dos docentes e dos órgãos de gestão do ES. Esta valorização geral e específica apresenta-se como uma tendência

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Processos e Realidades Educativas

de reconhecimento da importância destas dimensões na promoção do bem-estar para e o sucesso académico dos estudantes. nesta perspetiva e, nos últimos três anos letivos, temos vindo a desenvolver com estudantes de licenciatura, um modo de trabalho pedagógico que apresenta um conjunto de caraterísticas e que se baseia na aprendizagem em projeto. Propõe-se aos estudantes assumirem a elaboração de um projecto a pesquisar em torno dos conteúdos da gestão democrática das organizações e que se sustenta num ambiente crítico e problematizador que se desenrola em narrativas dos estudantes e numa dinâmica de agir relacional em contexto de sala de aula.

O agir relacional, em contexto de sala de aula, apoia-se num princípio relacional de agência humana (Ferreira, 2007), que do nosso ponto de vista, se concretiza na intencionalidade educativa e no desempenho diferenciado de papéis, ainda que, estruturados em interação simétrica. Deste modo, valoriza-se a autonomia, a autoria, a participação e o entusiasmo, o envolvimento dos discentes e docente, para e na escolha e no desenvolvimento do projeto, a propósito, da aprendizagem de saberes teóricos específicos.

o trabalho que trazemos resulta então, desta vivência de ensino e aprendizagem, entre a docente e os estudantes. Neste texto apresentaremos, sintetizando, a unidade curricular em que ocorre e dando conta, de algumas narrativas e dos discursos dos jovens estudantes a propósito desta proposta de trabalho.

Assim e, no âmbito do curso de licenciatura em Ciências da Educação, da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCEUP), lecionamos uma unidade curricular (UC), no 4º semestre, intitulada: organizações e Administração Educacional que é desenvolvida num tipo de aulas teórico-práticas, de 3 horas num total de 84 h; a unidade curricular visa contribuir para o estudo da administração educacional e das organizações em geral. Apresenta a investigação e a caraterização

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das organizações e da administração pública e educacional em Portugal através dos contributos de domínios organizacionais, psicossociológicos, comunicacionais e políticos. nesta disciplina têm destaque os processos de governação democrática, a autonomia, as lideranças e a tomada de decisão juvenil nas organizações em geral, e em particular, nas escolas. Se considerarmos as principais competências visadas para os estudantes, estas podem-se sintetizar nas seguintes: i)·Analisar, identificar e aplicar diferentes modelos e imagens organizacionais na análise e compreensão das organizações educativas; ii)·Problematizar a escola democrática; iii) Analisar processos democráticos, a autonomia, as lideranças e a tomada de decisão dos jovens em contextos organizacionais. Por sua vez, o desenvolvimento dos conteúdos programáticos propostos ocorre numa dinâmica pedagógica que inclui: i).Sessões teóricas de exposição de conteúdos e, respetivo debate; ii) Sessões teórico-práticas de análise de textos e realização de exercícios orientados; iii) Dinâmicas de pesquisa, individual, de grupo e a realização de um role-play; iv).Trabalho de grupo e organização do portefólio; v)Trabalho e estudo autónomo do aluno; vi) Orientação tutória.

Do ponto de vista da avaliação, esta é discutida com os estudantes mas apresenta-se uma proposta avaliativa de modalidade distribuída com teste final. Logo a classificação final é função da qualidade do trabalho, ao longo do ano, em contexto de sala de aula, através da organização de um portefólio e do “ Trabalho de Grupo em Dinâmica e Pesquisa” e da discussão e participação, no contexto das horas de contato; e ainda, através, da apresentação da pesquisa e do projeto desenhado em grupo e vivido na experiência final, de organização de um role-play, materializado num Fórum intitulado: Pensar Livre. A organização e simulação deste momento ocorre no final das aulas e estrutura-se em duas áreas temáticas: “Escola, Jovens Experiências e Aprendizagens” e “Em Educação, organizações e Processos Democráticos”.

nesta dinamização é esperado dar conta dos saberes adquiridos e da

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construção argumentativa para o desempenho do papel, de cada um, e com vista a refletirem os contributos da UC para o desempenho da sua profissão, a de mediador socioeducativo e da formação. neste contexto e com estes objetivos e metodologia acontecem-nos enredos formativos que valem a pena serem refletidos.

nesta comunicação selecionamos o recorte que visibiliza estratégias diferenciadas de ensino e aprendizagem e possíveis (e)feitos. Através de uma ilustração empírica, o objetivo é desvendar os fatores que nos permitem refletir sobre a autonomia e o sucesso dos estudantes e, por fim, trazer um entendimento informado pelo quotidiano e que pode ser expandido para uma compreensão mais profunda da exigência em termos de conhecimento dos professores do Ensino Superior.

1. A ABORDAGEm DE PROJEtO COmO AUtONOmIA E AGÊNCIA RELACIONAL

Temos vindo a proclamar a ciência tal qual se pensa, se sente e se faz e com isto, queremos enaltecer o paradigma holístico e humanista de abordagem nas ciências sociais e humanas. E nesse sentido, admite-se falar em metodologia de projeto a ser desenvolvida numa UC de nível de licenciatura, e que tradicionalmente, cumpre um modelo pedagógico de cariz teórico e prescritivo que é assim, desafiado num auto-questionamento crítico numa lógica de acção que se pretende emancipadora.

Com esta comunicação, mais do que discutir ou aferir o lugar desta abordagem, pretende-se demonstrar que qualquer escola, universidade incluída, pode ser entendida enquanto estúdio de interação e de relação intergeracional. Portanto, um local privilegiado em processos relacionais, comunicacionais e emocionais. Falar de escola neste olhar, implica assumir a relação dos saberes no favorecimento e desenvolvimento das novas gerações com entusiasmo e rigor científico. Este princípio de ação

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requer emoção no sentido de ânimo e de bem-querer, entre todos, os que partilham saberes, culturas e fazeres, no campo escolar e educativo. não obstante, sabemos que no quotidiano escolar persiste uma lógica de ação racionalizadora, como única e capaz de produzir aprendizagem e saber; por isso, importa-nos desenvolver uma outra compreensão que implique emocionalmente os professores e os estudantes e, promova outras lógicas de ação no quotidiano académico, que permitam uma reflexão com destaque para o paradigma de uma relação autónoma de ensino; na medida em que, se acentua uma maior proximidade e preocupação entre os estudantes e os professores a par do reconhecimento de uma maior autonomia dos estudantes quer para a escolha das componentes da pesquisa quer pela liberdade que o estudo autónomo promove. na perspetiva de Freire (1997: 105-106) sem autonomia não é possível haver ensino nem aprendizagem, no fundo, o essencial nas relações […] é a reinvenção do ser humano no aprendizado da sua autonomia.“ o que equivale a dizer que este modo de aprendizagem baseado na autoria e criatividade dos estudantes pressupõe um desenvolvimento de saber argumentativo, crítico e transformador logo um outro desafio relacional entre docente e estudantes. Decerto e deste saber-fazer, podemos referir que definem o essencial de uma agência relacional na medida em que se sustenta num diálogo de confiança e reciprocidade de saberes diferentes e distribuídos.

neste sentido pretendemos concretizar uma narrativa sobre a relação docente no ensino superior e no âmbito, da orientação de estudantes em formação, contemplando questões relacionadas às possibilidades desta formação desencadear diálogos com o saber-fazer autónomo, criativo e inovador.

Temos um princípio de trabalho com os estudantes e um tipo de orientação pedagógica que assenta na autonomia e nas lideranças distribuídas que coloca o ênfase no grupo, na participação e na possibilidade de formar uma equipa de pensamento que nos permita um sério

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envolvimento promotor de aprendizagens significativas.

2. A AGÊNCIA RELACIONAL COmO ANDAImE DE (DEs)ENVOLVImENtO DE APRENDIzAGENs sIGNIfICAtIVAs

no Ensino Superior ao desenvolvermos a nossa prática docente numa intencionalidade educativa de princípio ético e relacional, expressamos certamente a valorização de uma outra racionalidade de compreensão dos saberes e do desenvolvimento da ciência.

neste olhar a agência relacional enquanto relação de autoria e de interação expressa-se com os estudantes universitários, a todos os níveis, de comunicação e na construção dos conteúdos, o progresso de trabalhos e pesquisas. realiza-se com entusiasmo e no reforço crítico e reflexivo, a agência relacional enquanto andaime necessário às aprendizagens significativas que obviamente permitem os saberes fluírem. Seguimos neste fazer e agir relacional o pressuposto de Sousa Santos (1998), em que “todo o conhecimento é auto-conhecimento”, supondo-se o conhecimento científico como ato de criação, isto é, “A ciência não descobre, cria, e o acto criativo protagonizado por cada cientista e pela comunidade científica no seu conjunto tem de se conhecer intimamente antes que conheça o que com ele se conhece do real.” (ibidem: 52). Este apelo à criação é muito valorizado pelos estudantes que se descobrem em novos conhecimentos e interpelações de si, dos outros e do mundo. Trata-se, então, da necessidade “ de uma outra forma de conhecimento compreensivo e íntimo que não nos separe e antes nos una pessoalmente ao que estudamos” (ibidem: 53).

A agremiação recomendada por Sousa Santos (ibidem) percebe-se nas narrativas escritas que produziram acerca do processo de aprendizagem exposto. Assim, referem, sublinhando as questões da autonomia conquistada: “ o que mais valorizei foi a possibilidade de decidir, a autonomia […] e tudo o que aprendi. Tornou-se único e compensatório porque deu-

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me novos olhares para o mundo atual e principalmente para a escola” (org, 2013). De facto e em geral, os estudantes valorizam a autonomia que detém e que lhes é reconhecida pela docente, para a escolha e a tomada de decisão sobre os temas e realçam ainda, “a liberdade de pesquisa para a problematização” (org, 2012).

Exaltam, como circunstância deste trabalho de projeto, a possibilidade de pesquisa exploratória, as questões críticas e reflexivas, bem como, o jogo entre a formação e a transformação que se foi tecendo e que resulta em aprendizagens significativas dos estudantes, como se pode observar no excerto desta narrativa: “ os incentivos à pesquisa, o processo contínuo de incentivo à visão crítica e reflexiva, face às questões de organização e administração […] contribui para um desenvolvimento formativo e transformativo fulcral ” (org, 2013).

A gratificação desta tipologia de aprendizagem é ainda traduzida pelos estudantes e, como referem, nos ” novos olhares [sobre] o mundo atual e principalmente [sobre] a escola” (org, 2011). Evidenciam a mais-valia da orientação docente que coloca andaimes de desenvolvimento aos estudantes (rogoff e Wertsch, 1984, in Mota-Teixeira, 2009) enquanto os “ direcciona e instiga à pesquisa” (org.2013).

Percebe-se nesta perspetiva de trabalho centrada em problemas e na interdisciplinaridade enquanto mobilizadora e criadora de mapas mentais por parte dos estudantes e da docente (Vasconcelos, 2012) e enquanto geradora de aprendizagens significativas (Mesquita, 2011), um contributo valioso para a discussão de estratégias de ensino e aprendizagem no quotidiano académico.

A propósito da avaliação final, enquanto atividade de culminância do projeto formativo, assumir o formato de role-play afigurou-se como “estratégia inovadora e original” (org,2013) para os sujeitos, pelo que anunciam uma estreita combinação entre as competências de autoria; (Freire, 1997; Ferreira, 2012) e a edificação de uma agência relacional

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(Ferreira,2012), reforçada na expressão “o role-play foi uma estratégia dinâmica, reflexiva, interativa que levei como bagagem” e ainda, “permitiu o contato com a realidade, reflexão e, acima de tudo, dar voz ao nosso trabalho” (org, 2013). nesta lógica reforçam que apesar de estarem “a representar personagens o poder de argumentação teve que ser trabalhado” (Org.2013).

Lê-se claramente, nos seus discursos, proventos orientadores de uma profissionalidade interativa e numa dialética constante entre teoria- prática (Leite e Arez, 2011); bem como um investimento pessoal e profissional no projeto, conforme narram: “ao colocarmos por escrito o trabalho da aula permitiu-nos reflectir sobre os erros, as falhas e o que podíamos melhorar”. Exibem o cariz trans(formador) desta estratégia. nas dinâmicas sentidas e vividas pelo projeto e no projeto sublinha-se o papel da “agência humana” nas organizações educativas e, nesta circunstância, Friedberg (1995: 11) diz: “compreender a dimensão organizacional [da] acção colectiva dos homens”, entendendo-a, sobretudo, como “um contexto de ação entre outros” (ibidem).

CONsIDERAÇÕEs fINAIs

A presente investigação alicerça-se em múltiplas questões que desencadeiam em nós, docentes, um processo de pensamento que tem as suas origens “na esfera motivadora da consciência, uma esfera que inclui as nossas inclinações e necessidades, os nossos interesses e impulsos e os nossos afetos e emoções (Vygotsky (1986:282). Pelo que, colocamos o enfoque (rogoff, 1990) na competência do ensino aprendizagem indagando: i) Como reconhecer no desenvolvimento humano e na relação das pessoas com o saber, o caráter cognitivo e emocional? ii) Como trazer para o quotidiano das nossas escolas o significado da e na aprendizagem? iii) o que equivale a dizer da vontade e do entusiasmo de saber aplicado

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à metodologia de projeto? Este inventário questionador defende a escola como um lugar plural, como agência relacional, como espaço gerador de autonomias e autorias, conforme evidencia o estudo em questão. Isto porque experimentamos um comprometimento com e em propostas pedagógicas potenciadoras do desenvolvimento do ser humano na totalidade das suas possibilidades (Pinto, 1999), isto é, na aplicabilidade do projeto como autonomia e agência relacional. Neste meandro de análise assume-se uma nova centralidade, que se manifesta na proximidade e no envolvimento que os estudantes atingem, e que do nosso ponto de vista, pode também, ser promotor do sucesso educativo no ensino superior e expandir-se para uma outra compreensão das exigências do trabalho docente no ensino superior.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Dewey, J. (1973). Vida e Educação. São Paulo: Edições Melhoramento.

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Ferreira, E. (2011). “Entre uma ética da administração educativa e uma agência humana como currículo”. In C. Leite, J. A. Pacheco, A. F. M., & A. Mouraz (Org.). Políticas, fundamentos e práticas do currículo. (pp. 90-98). Porto: Porto Editora.

Ferreira, E. (2012). (D)enunciar a autonomia contributos para a compreensão da génese e da construção da autonomia na escola secundaria. Prémio Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação/Porto Editora 2011. Porto: Porto Editora.

Formosinho, J. & Machado, J. (2000). “Autonomia, projecto e lideran-ça”. In Políticas educativas e autonomia das escolas. Edições Asa, pp.117-138.

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Processos e Realidades Educativas

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Friedberg, E. (1995). O Poder e a Regra – Dinâmica da Acção Organizacional. Lisboa: Instituto Piaget.

Leite, T. e Arez, A. (2011). “A Formação através de Projetos na Iniciação à Prática Profissional”. Da Investigação às Práticas, I (3). 79-99. Consultado a 27 de maio em http://www.eselx.ipl.pt/cied/publicacoes/inv/2011_vol1_n3/79_99.pdf.

Mesquita, E. (2011). Competências do professor – Representações sobre a formação. Lisboa. Silabo.

Mota-Teixeira, C. (2008). Trajectos de Construção da Identidade Profissional em Contextos de Inserção Profissional: Perspectivas e Inquietações dos Educadores de Infância. Dissertação de Doutoramento: Universidade de Santiago de Compostela.

Pinto, J. M. (1999). “Flexibilidade, Segurança e Identidades Sócio – Profissionais”. In Cadernos de Ciências Sociais, nº 21/22.

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Sousa Santos, B. (1998). Um Discurso sobre as Ciências (10º edição). Porto: Edições Afrontamento.

Vasconcelos, T. (Coord.) (2012). Trabalho por Projectos na Educação de Infância: Mapear Aprendizagens/Integrar Metodologias. Lisboa: Ministério da Educação.

Vygotsky, L.S. (1986). Thought and language. Cambridge, MA: MIT. Press.

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A sURVEy Of READING INstRUCtION AND READING AttItUDEs IN thE REPUBLIC Of CAPE VERDE

David A. Almeida

Bridgewater State University

[email protected]

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ABstRACt

Preliminary conversations with educators in Cape Verde (CV) raised questions about reading attitudes and reading instruction in the nation’s primary schools. Specifically, these questions were: “What methods do primary level CV teachers use to teach children to read?” and “What attitudes do primary level CV teachers hold concerning academic reading, pleasure reading, and the use of children’s literature for instruction?” In order to formally examine these and other literacy-related questions in Cape Verde, this study surveyed more than 1000 primary level teachers across all nine inhabited islands. In addition, to illuminate answers from the surveys, interviews with over 100 teachers were conducted. Results indicate that most primary level teachers in CV use a bottom-up approach to reading instruction, and follow strictly the official government-provided textbook for reading instruction, which most of them dislike. Most teachers report they do not focus on reading children’s storybooks as vehicles for instruction, preferring to use only short excerpts from these books, if they use them at all. Teachers indicate that while they sometimes read for pleasure, this is not typical for most Cape Verdeans, who prefer oral interactions over reading. A high percentage of respondents indicate that in CV, poverty and a lack of government-provided children’s books in schools prevent the formation of a “habit of reading” for most Cape Verdeans.

Keywords: Cape Verde education; literacy in Cape Verde; reading attitudes in Cape Verde; reading instruction in Cape Verde.

REsUmO

Conversas preliminares com educadores em Cabo Verde (CV) trouxeram questões sobre as atitudes de leitura e o ensino da leitura nas

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escolas primárias do país. Especificamente, estas questões foram: “quais são os métodos que os professores de CV do ensino básico usam para ensinar as crianças a ler?” e “que atitudes os professores de CV do ensino básico adoptam em relação à leitura académica, leitura por prazer, e ao uso da literatura infantil para a educação?” Com o objectivo de analisar estas e outras questões relacionadas com a alfabetização em Cabo Verde, este estudo inquiriu mais de 1.000 professores de nível primário em todas as nove ilhas habitadas. Além disso, para esclarecer as respostas do inquérito, foram realizadas entrevistas com mais de 100 professores. Os resultados indicam que os professores do ensino básico em CV usam uma abordagem de cima para baixo para o ensino da leitura e seguem rigorosamente o manual fornecido pelo governo para o ensino, e que a maioria deles não gosta de ler. A maioria dos professores refere que não se foca na leitura de livros de histórias infantis como veículos de ensino, preferindo usar apenas pequenos excertos desses livros, ou não os usar de todo. os professores indicam que, embora às vezes leiam por prazer, isso não é típico para a maioria dos cabo-verdianos, que preferem interações orais à leitura. Uma elevada percentagem dos inquiridos indica que em CV, a pobreza e a falta de dotação das escolas com livros infantis nas escolas impedem a formação de “hábitos de leitura” para a maioria dos cabo-verdianos.

Palavras-chave: educação; literacia; atitudes de leitura; ensino da leitura; Cabo Verde.

In 2007, Commeyras and Inyega, published “An integrative review of teaching reading in Kenyan primary schools” and encouraged others to study reading instruction in Africa, asking researchers “to follow our example and to locate all pertinent literature and to conduct a review of the state of reading education in each of the African countries” (p.278). The republic of Cape Verde is one African nation where reading education has not before been thoroughly examined, and observations made and data

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collected during an informal pilot study in 2010 raised questions about the similarities that might exist between Kenya and Cape Verde, as far as reading instruction is concerned.

Located approximately 350 miles off the coast of West Africa, Cape Verde gained its independence from Portugal in 1975. During previous observational visits to Cape Verde primary schools this researcher observed teaching practices similar to those observed in Kenya by Commeyras and Inyega, including a bottom-up approach to reading instruction, centered on the recitation and memorization of phonetic constructs and word parts, the copying of words off of the blackboard, and no use of story books by teachers.

In order to examine these observations more formally for Cape Verde, a study of reading instruction in representative primary schools on all nine inhabited islands of Cape Verde was carried out. A survey, consisting of twenty (20) questions on reading instruction and reading attitudes in Cape Verde was developed in English and translated into Portuguese. In addition, 1:1 interviews with randomly selected primary teachers were held. The surveys were distributed to all 2972 primary level teachers in Cape Verde and interviews were carried out with 116 teachers. In order to assure randomness, two schools from each of the nine islands were randomly selected by Cape Verde’s office of the Minister of Education and five teachers from each school were randomly selected by the school’s principal. This researcher traveled, along with an interpreter fluent in English, Portuguese, and Cape Verdean Creole, to each island over the course of one year, in order to interview these subjects. Data was then collected, coded, and analyzed.

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REsULts

out of the 2972 questionnaires distributed, 1071 questionnaires were returned for a total return rate of 36 %. A minimum of 10 teachers were interviewed on each island, for a total of 116 primary level (grades 1-6) teachers, across all nine islands.

Results showed that the average number of years of experience for primary teachers is 16.5, with the least number of years of experience being 1 and the greatest number of years of experience being 36. Teachers indicated that the two most common approaches (almost evenly split across research subjects) that Cape Verdean teachers use to teach reading are “An approach which emphasizes teaching whole words first and then examining the parts of those words later on” and “An approach which emphasizes teaching letter sounds and syllables before teaching whole words”.

When asked if teachers used storybooks as part of their reading instruction (translated into Portuguese as livros de contos infantis) 78% of the teachers responded on the surveys that they did use storybooks, but when shown samples of storybooks during the interviews, only 12% of the early primary teachers said that they used storybooks for reading instruction and only 5% of teachers teaching grades 4, 5 and 6 said they used such materials. Most often, teachers said that they didn’t use story books to teach children how to read because none were available to them, they did not relate to the lives of Cape Verdean children, and there was no time to fit them into the curriculum. The vast majority of teachers stated that, while they do use the government provided textbook to teach reading, most do not like it because it is bland, lacks motivational activities for children, and does not represent the reality of Cape Verdean children. Teachers report that they often supplement this textbook with photocopies of material found in textbooks from Portugal, which have been donated to them. A majority of teachers noted that their school does not have a school library, and only very few teachers had a classroom library for student use.

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Teachers were also asked questions about Cape Verdean attitudes on reading for pleasure. To the question, “Approximately how many hours per week do you estimate most of your students spend reading for pleasure outside of school?” the highest percentage response (72%) indicated that primary students might spend 1-5 hours per week reading for pleasure outside of school, though during the interviews it became apparent that 1-2 hours per week was more accurate, with that amount getting lower as students advance in grade level. Teachers were then asked how many hours per week they, themselves, spend reading for pleasure and the most common response was the same, 1-5 hours per week, with interviews showing that a more accurate amount of time was at the lower level of the scale, at perhaps only 1 hour per week at most. over ninety percent of those responding to a question about reading attitudes among Cape Verdean adults described feeling that Cape Verdeans have developed a culture that embraces conversation and an oral tradition and is less interested in reading novels, children’s stories, and other fictional literature.

Commeyras & Inyega’s (2007) study on African teachers demonstrated that teachers in Kenya would like their students to be fluent and voluntary readers, but they cite language issues, a lack of resources, and a strong oral tradition as difficulties they face in achieving that goal. Primary level teachers in Cape Verde present, in the current study, a profile similar to that found by Commeyras & Inyega in Kenya; Cape Verdean teachers describe themselves as a group of dedicated educators who generally do not have books readily available to them, are not pleasure readers themselves, and may not understand the research-based importance of using story books as part of a balanced approach to literacy instruction.

yet Commeyras & Inyega end with a concern that post-colonial and utilitarian views on literacy seem to prevent change in African schools, a concern that may not be appropriate for Cape Verde. Cape Verde primary teachers split evenly between strict, bottom-up approaches to reading

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instruction and approaches which started with whole words and then moved to examining letters and sounds; they discussed often the desire to be the best teachers they can be, and other research shows that they are hungry for professional development, though they may not have had the opportunity to participate in any (Creamer, 2013).

The current Cape Verde Minister of Education is at present working decisively towards educational reform, and a new reading program has been developed for all of Cape Verde; moreover teacher training institutions like the University of Cape Verde and Cape Verde’s Institute of Pedagogy are strongly interested in preparing new teachers for a 21st century reality. As Cape Verde moves forward as a nation, interest in modernizing curriculum, instruction, and educational policy are at the forefront. (World Bank, 2013)

REfERENCEs

Commeyras, M. & Inyega, H.n. (2007) An integrative review of teaching reading in Kenyan primary schools, Reading Research Quarterly, Vol 42 (2), AprMayJune, pp 258-281.

Creamer, Courtney (2013) Professional Development for Teachers in Cape Verde. Unpublished Undergraduate Research Thesis. Bridgewater State University, Bridgewater, MA, U.S.A.

World Bank (2013) “Cape Verde - Education and Training Consolidation and Modernization Project.” Cape Verde - Education and Training Consolidation and Modernization Project. Retrieved from http://www1.worldbank.org/publicsector/pe/bankcape.htm 25 June 2013.

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EU E ELEs: A CONstRUÇÃO DA IDENtIDADE Em ALUNOs DO ENsINO BÁsICO

Dulce Martinsa; Carolina Carvalhoa ; Ana Paula Gamab;Cristina Carvalhoc; David Tavaresd; Edite Fiúzae; Jesuína Fonsecaf; Joseph

Conboya; Maria Helena Salemaf; Maria Odete Valenteg

aIEUL, Universidade de Lisboa;bINUAF, Loulé; c Agrupamento de Escolas D. Manuel I, Tavira; dESTESL, Instituto Politécnico de Lisboa; eUniversidade

Lusófona; fUIDEF, Universidade de Lisboa; gFCUL, Universidade de Lisboa

[email protected]; [email protected];[email protected]; [email protected]; [email protected];

[email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]; [email protected]

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REsUmO

Partilhando a ideia que a identidade individual é um conceito que expressa caraterísticas singulares que se constroem e desenvolvem na ação de relacionamento com os outros, o domínio da identidade cruza-se com o da aprendizagem. Este estudo faz parte de um projeto investigação, cujo objetivo principal é compreender a relação entre a natureza do feedback do professor, a identidade do aluno e o comprometimento do aluno na escola. A finalidade deste trabalho foi a construção de um questionário. Pretendia-se compreender como os alunos do Ensino Básico vão construindo a sua identidade de aluno, partindo das questões: a) Como me vejo enquanto aluno?; b) Como os meus colegas me veem enquanto aluno?; c) Como os professores me vêem enquanto aluno? Alunos do 6º e 9º ano de escolaridade, entre os 10 e os 19 anos de idade, num total de 44, responderam a um questionário em formato de resposta aberta.

Uma análise preliminar indica que os alunos têm imagens positivas e negativas de si mesmos enquanto alunos, verificando-se semelhanças entre as imagens que os alunos referem de si e as que consideram que os colegas e os professores têm deles enquanto alunos. os alunos de 6º ano descrevem-se com um maior número de imagens, tanto positivas como negativas. Contudo, as imagens destes alunos são semelhantes às descritas pelos alunos de 9º ano. Estes resultados sugerem-nos que as imagens que os alunos vão construindo acerca das suas posições são estáveis.

Palavras-chave: identidade; feedback; alunos do Ensino Básico.

ABstRACt

Sharing the idea that individual identity is a concept which expresses unique characteristics that are constructed and developed during the

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relations established with others, identity domain is interconnected with learning. This study is part of a research project in which the main goal is to understand the relation between teacher feedback, student´s identity and student´s school engagement. The finality of this work was the construction of a questionnaire. The goal was to understand how Basic Level students construct their image as students, based on the following questions: a) How do I see myself as a student?; b) How my colleagues see me as a student?; c) How my teachers see me as a student. Students from the 6th and 9th grade, between 10 and 19 years, in a total of 44 answered to an open response questionnaire. A preliminary analysis indicates that students have both positive and negative images of themselves as learners, with registered similarities between the images that students have of themselves and the images they consider their colleagues and teachers to have of them as students. Sixth grade students describe themselves with a greater number of images, both positive and negative. However these student´s images resemble the ones described by the 9th grade students. These results suggest that the images students construct about their positions are stable.

Keywords: identity; feedback; Basic Level students.

INtRODUÇÃO

na literatura vários significados são associados ao conceito de identidade. Black, Mendck e Solomon (2009) referem que diversas disciplinas o utilizam e procuram esclarecer. Consequentemente, a resposta para o que é a identidade não é consensual e simples. Mais útil do que ter a resposta para esta questão talvez seja compreender o impacto dos contextos de interação dos sujeitos no desenvolvimento da sua identidade. Por exemplo, os discursos e as práticas da escola. Assim, a identidade é (co) construída pela participação em diferentes práticas sociais, incluindo, entre outras, as escolares.

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Na maioria dos países ocidentais a escolaridade é obrigatória e todas as crianças têm de a frequentar durante um determinado período de tempo. Esta realidade gera investimento ou rejeição de determinada disciplina, consequentemente, respostas emocionais de gosto/não gosto; uma posição que cada aluno ocupa de acordo com o seu desempenho escolar, bom/mau aluno ou os discursos políticos sobre as questões de avaliação, aprovado ou retido.

Enquanto aprendentes desenvolvemos relações complexas com os vários conteúdos escolares, tanto dentro como fora da sala de aula. Podemos então aceitar que a identidade origina formas de ser, de agir, de nos relacionar com os agentes educativos e com as práticas de sala de aula que influenciam não só as decisões que o aluno vai tomando sobre a escola (Freire, Carvalho, Freire, Azevedo & oliveira, 2009), como também as posições que vai ocupando na comunidade escolar (Holland, Lachiotte, Skinner & Cain, 1998; Gee, 2000; Hand, 2006). A identidade do aluno joga então um papel central na forma como ele próprio se vê enquanto aluno e como se posiciona e participa na sala de aula, o que nos leva a sugerir que a identidade do aluno influencia o comportamento do professor, incluindo o feedback que lhe dá quando interage com ele.

Hattie (2009) considera que o feedback não é apenas informação dada pelos professores sobre o desempenho dos alunos. Os alunos também dão feedback aos professores pelos erros que cometem, pelos comportamentos que adotam, pela desmotivação que manifestam, pelas hesitações que revelam. o feedback que os alunos dão aos professores ajuda-os a gerir a sua prática, ou seja, o feedback é consequência de um desempenho e numa sala de aula não são apenas os alunos que manifestam desempenhos. o feedback revela-se como um aspeto importante na relação entre professor e aluno (Black & Wiliam, 1998; Black, Harrison, Lee & Marshall, 2002; Hattie, 2009) e possibilita ao aluno reificar uma posição.

O presente trabalho faz parte do projeto Feedback, Identidade

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e Trajectórias Escolares: Dinâmicas e Consequências (FITE-PTDC/CPE-PEC/121238/2010). o objetivo principal é compreender a dinâmica e as consequências da natureza do feedback dos professores no desenvolvimento da identidade dos alunos e nas suas trajetórias escolares. Concretamente neste trabalho pretende-se perceber como os alunos do 6º e 9º ano de escolaridade vão construindo a sua identidade de aluno. Para isso os alunos responderam a três questões: Como me vejo enquanto aluno?; Como os meus colegas me veem enquanto aluno?; Como os professores me veem enquanto aluno?. As respostas dadas pelos alunos serão analisadas no presente trabalho.

2. métODO

2.1 PARtICIPANtEs

os participantes deste estudo eram alunos da área metropolitana de Lisboa e da região do Algarve num total de 44 alunos: duas turmas do 6º ano de escolaridade, 7 raparigas e 7 rapazes da zona de Lisboa e 6 raparigas e 9 rapazes do Algarve. no 9º ano participaram 1 rapariga e 14 rapazes da zona de Lisboa.

no 6º ano as idades estavam compreendidas entre os 10 e os 13 anos e no 9º entre os 15 e os 19 anos de idade. os alunos do 6º ano integravam turmas do ensino regular. A turma do 9º ano eram alunos a frequentar um Curso de Educação e Formação (CEF).

2.2 INstRUmENtO E PROCEDImENtO

o instrumento utilizado surgiu numa fase inicial do projeto referido. optámos por um questionário com seis questões de resposta aberta, com o

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qual indagámos como os alunos vão construindo a sua identidade de aluno. neste trabalho, só iremos tratar três dessas questões. O preenchimento deste questionário foi supervisionado por alguns investigadores do projeto FITE, nas suas zonas de trabalho, bem como nos anos de escolaridade de docência.

Este trabalho de investigação decorreu durante o horário escolar das turmas de 6º e 9º ano e os alunos colaboraram voluntariamente.

3. REsULtADOs

A análise dos resultados procurou compreender como os alunos do Ensino Básico vão construindo a sua identidade de aluno. Partindo das questões de estudo mencionadas, as respostas escritas dos participantes ao questionário foram investigadas de um modo indutivo. Assim, os gráficos apresentados ao longo deste trabalho são o resultado da elaboração de várias grelhas de redução de dados, isto é, do “recorte, agregação e enumeração” para representar o conteúdo (Bardin, 2011, p. 129), com recurso ao NVivo, versão 10. A utilização deste software, de análise de dados qualitativos, permitiu-nos encontrar padrões nas respostas dos alunos do 6º e do 9º ano.

nas respostas dos alunos emergiram duas categorias que designámos: caraterísticas académicas e caraterísticas relacionais. Em ambas havia caraterísticas positivas e negativas. Estas caraterísticas traduzem o discurso que cada participante faz da sua posição de aluno.

no Gráfico 1 apresentamos as caraterísticas académicas positivas dos participantes por ano de escolaridade. A leitura deste Gráfico revela que são os alunos do 6º ano que recorrem a uma maior variedade de caraterísticas e em ambos os casos a caraterística mais utilizada, bom aluno, sugere que as classificações escolares são determinantes para a posição que construo de mim enquanto aluno. Interessante é a caraterística bem comportado ser a mais referida pelos alunos mais velhos, como que sugerindo que o comportamento que se adota na sala de aula me posiciona como aluno.

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Gráfico 1: Caraterísticas académicas positivas para a questão “Como me vejo enquanto aluno?”

o bom aluno parece surgir como caraterística académica principal, sendo as restantes subsequentes a esta e presentes em discursos diversos. Isto é, para se ser bom aluno tem de se reunir algumas das outras caraterísticas identitárias, como ser bem comportado, trabalhador, responsável. Claramente, estas caraterísticas estão presentes nos discursos e nas comparações dos professores quando interagem com os alunos na sala de aula.

As caraterísticas académicas negativas surgem no Gráfico 2 e em oposição ao Gráfico 1 em menor número.

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Gráfico 2: Caraterísticas académicas negativas para a questão “Como me vejo enquanto aluno?”

Em ambos os anos de escolaridade as duas caraterísticas académicas que se revelaram negativas são Distraído e Preguiçoso. Se no gráfico anterior muitos alunos se viam com caraterísticas de bom aluno, verifica-se que alguns se opõem, posicionando-se de diferente forma em relação à sua identidade enquanto aluno. Ao recorrerem às caraterísticas Distraído e Preguiçoso é possível perceber como os alunos se centram nas questões da atenção e na quantidade de trabalho desenvolvido, para se posicionarem enquanto alunos.

nos Gráficos 3 e 4 apresentamos as respostas dos alunos participantes à segunda questão de estudo “Como os meus colegas me veem enquanto aluno?”

As caraterísticas académicas positivas e negativas que surgem são enumeradas com maior frequência pelos alunos mais novos, os de 6º ano. Assim, no Gráfico 3 conseguimos verificar que a caraterística Inteligente é a que se destaca claramente como a mais utilizada pelos alunos do 6º ano

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para descreverem a posição onde os colegas os colocam. Por outro lado, à semelhança do Gráfico 1, a característica Bom aluno é muito referida, tanto pelos alunos do 6º ano como pelos alunos do 9º ano, como uma das mais salientes.

Gráfico 3: Caraterísticas académicas positivas para a questão “Como os meus colegas me veem enquanto aluno?”

Tal fato parece indicar que as classificações escolares são determinantes, não só na posição que construo de mim enquanto aluno, mas também no posicionamento que penso que os outros me atribuem enquanto aluno.

Em seguida, no Gráfico 4 em oposição ao Gráfico 3, as caraterísticas negativas surgem em menor número.

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Gráfico 4: Caraterísticas académicas negativas para a questão “Como os meus colegas me veem enquanto aluno?”

A leitura deste gráfico permite observar que, tanto para os alunos do 6º ano como para os alunos do 9º ano, a caraterística mais saliente no seu posicionamento enquanto alunos para os seus colegas, é Preguiçoso. É possível assim perceber que, à semelhança do que se observa no Gráfico 2, a questão do esforço despendido na sala de aula parece ser tão determinante no posicionamento que tenho de mim enquanto aluno, como no posicionamento que penso ter para os outros. Curioso é também o fato de haver alunos do 9º ano, um curso CEF, que se posicionam como sendo alunos com dificuldades.

nos Gráficos 5 e 6 surgem as carateristicas académicas reveladas pelos alunos participantes relativas ao seu posicionamento na terceira questão de estudo “Como os professores me veem enquanto aluno?”.

Este gráfico revela que os alunos do 6º ano destacam na sua esmagadora maioria a característica Empenhado, como a de maior relevância no posicionamento que os professores lhes atribuem enquanto alunos. Esta

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caraterística poderá ter surgido por ser valorizada pelos professores no seu discurso em relação ao esforço despendido e ao envolvimento dos alunos na aula.

Gráfico 5: Caraterísticas académicas positivas para a questão “Como os professores me veem enquanto aluno?”

quanto aos alunos do 9º ano, as caraterísticas Bem comportado e Bom aluno são as mais referidas, sugerindo que para os alunos mais velhos, o comportamento nas aulas e as classificações escolares são determinantes para o posicionamento que lhes é atribuído pelos seus professores enquanto alunos.

Em oposição ao Gráfico 5, surge o Gráfico 6. A partir da sua observação verificamos que as caraterísticas que os alunos do 6º ano e do 9º ano mais salientam surgem relacionadas com a quantidade de atenção prestada na aula (Distraído) e a quantidade de trabalho desenvolvido (Preguiçoso).

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Gráfico 6: Caraterísticas académicas negativas para a questão “Como os professores me veem enquanto aluno?”

nos alunos mais novos, verifica-se que a grande maioria associa a caraterística Preguiçoso a um eventual posicionamento negativo que os seus professores lhes atribuem enquanto alunos.

4. DIsCUssÃO

Independentemente do ano de escolaridade e da idade dos alunos observámos alguma regularidade nas caraterísticas usadas para descreverem as suas posições como as que consideram que os professores e os colegas têm deles enquanto alunos. o que pode sugerir que a posição que vou construindo de mim enquanto aluno vai sendo formatada pela interação que vou estabelecendo com os outros, colegas e professores, no contexto escolar ou que a minha posição de aluno está bastante consistente entre como eu me posiciono na sala de aula e os outros me posicionam. E se isso pode ser positivo, se me vejo como um bom aluno e com caraterísticas

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positivas, também pode ser uma fragilidade quando estas caraterísticas são negativas.

os alunos de 6º ano descrevem-se com um maior número de caraterísticas, positivas e negativas, mas estas são as mesmas dos alunos de 9º ano. Estes resultados sugerem-nos que o aluno vai construindo a sua identidade ouvindo diferentes vozes e que as posições que os alunos vão construindo acerca de si próprios são estáveis e refletem muito do feedback dado pelos professores.

5. CONsIDERAÇÕEs fINAIs

A identidade é (re)construída na ação com os outros em contextos diversificados. os modos como os sujeitos se posicionam enquanto alunos dão sentido à sua trajetória escolar, uma vez que se baseiam em esquemas de pensamento e de ação (Abrantes, 2003; 2005). É possível perceber que tanto os alunos de 6º como os de 9º ano incorporam discursos e posições que lhes permite adquirir uma identidade enquanto aluno. neste sentido, a trajetória escolar parece ser marcada não somente pela interiorização de discursos e práticas presentes no feedback dos professores, mas igualmente pela participação e comparações vividas na sala de aula. Por exemplo, a caraterística Bom aluno, das mais referidas pelos alunos, revela como os alunos se vem e são vistos com analogias ao envolvimento positivo e bem sucedido nas atividades de aprendizagem (Kuh, 2003). Por outro lado, os sujeitos enquanto alunos também adotam uma atitude pouco envolvida com a aprendizagem ao se intitularem de Distraídos e Preguiçosos, no sentido em que se opõem aquilo que no discurso escolar se julga ser caraterísticas de bom aluno (Vasconcelos, 2008).

A experiência vivida na forma de julgamentos e comparações presentes no feedback dos professores e dos colegas sobre o que cada

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aluno realiza na sala de aula origina e aglutina um conjunto de “rótulos” que quando usados repetidamente reificam a posição que cada um ocupa aos olhos de todos os outros com quem interage na sala de aula, os colegas e professor.

AGRADECImENtOs

Este trabalho é apoiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia com o contrato PTDC/CPE-PEC/121238/2010 e pela Unidade de Investigação e Desenvolvimento em Educação e Formação do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa. os autores agradecem ao bolseiro de investigação do projeto João Santos.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Abrantes, P. (2003). Identidades Juvenis e Dinâmicas de Escolaridade. Sociologia, problemas e práticas, 41, 93-115.

Abrantes, P. (2005). As transições entre ciclos de ensino: entre problema social e objecto sociológico. Interacções, 1, 25-53. Recuperado em 4 de Junho, 2013, de http://www.eses.pt/interaccoes.

Bardin, L. (2011). Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70.

Black, L. ; Mendick, H. & Solomon, y. (2009) (Eds). Mathematical Relationships in education - Identities and participation. London: routledge.

Black, P. & Wiliam, D. (1998). Inside the black box: Raising standers through classroom assessment. London: School of Education, King’s College.

Black, P.; Harrison, C.; Lee, C.; Marshall, B. & Wiliam, D. (2002). Working inside the black box. Assessment for learning in the classroom. London: GL Assessment.

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Freire, S.; Carvalho, C.; Freire, A.; Azevedo, M. & oliveira, T. (2009). Identity construction through schooling: listening to students voices. European Educational Research Journal, 8(1), 80-88.

Gee, J.P. (2000) Identity as an Analytic Lens for research in Education, Review of Research in Education, 25, 99-125.

Hand, V. (2006). operationalizing Culture and Identity in Ways to Capture the negotiation of Participation across Communities. Human Development, 49, 36-41.

Holland, D., Lachiotte, W. Jr., Skinner, D., & Cain, C. (1998). Identity and agency in cultural worlds. Cambridge: Harvard University Press.

Hattie, J. (2009). Visible Learning: a synthesis of over 800 meta-analises relating to achievement. London and new york: routledge.

Kuh, G. (2003). What We’re Learning About Student Engagement from NSSE. Change, 35(2), 24-32.

Vasconcelos, E. (2008). Uma análise da identidade do sujeito-aluno a partir do enunciado “ser bom aluno”. Revista Forum Identidades, 4(2), 141-151. recuperado em 15 de Abril, 2013, de http://200.17.141.110/periodicos/revista_forum_identidades/revistas/Arq_ForUM_InD_4/SESSAO_L_FORUM_Pg_141_151.pdf

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EstRAtéGIAs PEDAGÓGICAs PARA O DEsENVOLVImENtO DE UmA COmPEtÊNCIA COmUNICAtIVA BILINGUE

Elvira Reis

Universidade Jean Piaget de Cabo Verde

[email protected]

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REsUmO

Este artigo aborda a competência comunicativa bilingue e apresenta estratégias pedagógicas que fomentam o desenvolvimento da referida competência, indispensável à construção de conhecimentos, num processo de aprendizagem que se quer significativa e permanente. Faz parte do trabalho de investigação tutelado, realizado no âmbito do doutoramento em Educação e Desenvolvimento Humano, com recurso à metodologia qualitativa interpretativa. Propõe-se uma abordagem transdisciplinar que focaliza a correlação entre três disciplinas: Cultura Cabo-verdiana, Língua Portuguesa e Formação Pessoal e Social. Para além dos conhecimentos à volta dos conteúdos específicos de cada disciplina, o que leva ao desenvolvimento de uma competência científica, a tónica é colocada na clarificação de valores universais, internacionais e nacionais, com base em três técnicas fundamentais: discussão de dilemas morais, jogos de papéis/ desenvolvimento de habilidades sociais que favorecem o desenvolvimento de competências sociais, socorrendo-se das metáforas do quotidiano cabo-verdiano, enquanto expressão do imaginário. neste sentido, as estratégias permitem o desenvolvimento dos quatro pilares da educação segundo Delors: saber, saber ser, saber fazer e saber viver juntos.

Palavras-chave: bilinguismo; competência comunicativa; estratégia pedagógica; transdisciplinaridade; educação para os valores.

ABstRACt

This paper addresses the bilingual communicative competence and presents teaching strategies that foster the development of those powers essential to the construction of knowledge in a learning process that is both significant and permanent. It is part of the research work protected, held under the PhD in Education and Human Development, using the

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interpretive qualitative methodology. We propose a transdisciplinary approach that focuses on the correlation between the three subjects: Culture Cape Verdean, Portuguese and Personal and social Development In addition to the knowledge around the specific content of each discipline, which leads to the development of scientific competence, the emphasis is on the clarification of universal values , international and national, based on three fundamental techniques: discussion of moral dilemmas games roles / development of social skills that foster the development of social skills, bailing up the metaphors of everyday life in Cape Verde, as an expression of the imagination. In this sense, the strategies allow the development of the four pillars of education Delors: namely, how to be know-how and know how to live together.

Keywords: bilingualism; communicative competence; pedagogical strategy; transdisciplinarity; education values.

INtRODUÇÃO

A fraca atenção à cultura da língua em Cabo Verde compromete os resultados escolares. O uso do crioulo cabo-verdiano (CCV) é generalizado, a língua portuguesa (LP) só é usada na sala de aula, mas os conteúdos científicos continuam a ser transmitidos apenas em LP. o aluno possui fraca competência linguístico-comunicativa, já que, muitas vezes, não conhece as fronteiras entre CCV e a LP. Limita-se a reproduzir conhecimentos, num discurso onde o léxico aportuguesado se mistura com a morfo-sintaxe do CCV. não tem hábitos de leitura e manifesta uma fraca competência de compreensão oral e escrita.

Geralmente, o aluno não consegue interpretar o enunciado e vai perdendo direito à frequência do sistema de ensino por excesso de reprovações. os professores acham que o problema da interpretação do enunciado é da responsabilidade do professor de LP, pois, a eles só

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compete a transmissão dos conteúdos científicos. quanto ao veículo dessa transmissão e a garantia de que a mensagem chega aos alunos não são da sua conta. Acham, ainda, que o professor de LP é quem deve corrigir os erros dos alunos.

Este pensamento não favorece o ensino e a aprendizagem. A preocupação com uma boa comunicação pedagógica deve ser transdisciplinar, visto que a metalinguagem é comum a todas as disciplinas. Uma boa aprendizagem depende de uma boa comunicação, ou seja, professor e alunos têm de partilhar os mesmos significados.

Também, é necessário que a formação dos professores e a definição curricular e metodológica integrem a nossa realidade, a fim de valorizar a cultura.

A forma como o ensino em Cabo Verde se encontra organizado dificulta o sucesso escolar e, consequentemente, atiça a exclusão. Muitos alunos, por não possuírem instrumentos intrapsicológicos que lhes permitam descodificar a mensagem do professor, encaram a prática discursiva como desanimadora, desinteressante e afastam-se, por se sentirem incapazes de aprender. Uma vez que só se conseguem exprimir e, portanto, se realizar em CCV, a única língua adquirida no seu ambiente sociocultural, mas, que não é tida em conta no ensino. Faz-se necessário a valorização do mundo de referências do aluno, cuja realidade linguística não é a LP, e o dinamizador deste processo é o professor.

Assim, propõe-se neste trabalho uma coordenação entre o CCV e a LP, onde o ensino de ambas aconteça em paralelo e o CCV sirva de base ao ensino da LP ou de qualquer outra língua, desde o ensino pré-escolar, onde o aluno aprende a expressar e a brincar com as duas línguas, consciente de que a primeira é tão valiosa quanto a segunda e que as duas são igualmente necessárias para o seu desenvolvimento.

A cultura da comunicação, convida-nos a uma correlação

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interdisciplinar e transdisciplinar na qual é útil o diálogo entre: LP e a disciplina de Formação Pessoal e Social (FPS); e, propomos, ainda, uma terceira disciplina – a de Língua e Cultura Cabo-verdianas (LCCV). O objectivo é colocá-las em diálogo à volta da pedagogia de valores, para o desenvolvimento de uma dupla competência linguística, a valorização do mundo de referências do aluno e a clarificação de valores universais, internacionais e nacionais

1. A EDUCAÇÃO PARA Os VALOREs E A DUPLA COmPEtÊNCIA COmUNICAtIVA

nota-se que a pedagogia sem uma base sólida nos valores não tem valor. Daí a ligação que se pretende entre a pedagogia de valores e a formação linguística, pois, a língua é, sobretudo, um meio de percepção axiológica do mundo.

Com base na hierarquização sistematizada pela UnESCo pretende-se relacionar os diferentes níveis de clarificação de valores com as disciplinas que se quer correlacionadas:

1.Valores universais que funcionam como axiomas – a LP é aqui o veículo privilegiado para acesso aos bens da cultura que exemplifiquem esses valores axiomáticos, já que o volume de bens da cultura universal disponível em CCV é reduzido.

2.Valores da cultura europeia ou mundial que alargam a aceitação do outro e preparam para a compreensão e tolerância – a LP também é um veículo privilegiado, principalmente para acesso à cultura europeia.

3.Valores nacionais, onde a cultura nacional é ponto de referência para a identidade étnica e social e os valores são estimuladores da identificação – o CCV é um instrumento de experiências axiológicas, algumas delas com manifestação muito original em Cabo Verde. É o caso, por exemplo, da

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morabeza. Assim, uma reflexão sobre o campo semântico da morabeza em LCCV, metáforas relacionadas, seria enriquecedora.

A emoção é importante na interiorização de valores que não são aceites só na base da razão, já que a ordem do coração, como a chamou Blaise Pascal é um princípio, particularmente, válido nos adolescentes que não aturam o vazio emocional. Daí que a língua materna (LM), carregada emocionalmente, deva ser a aliada deste processo.

Assim, aproximamo-nos da pedagogia do diálogo e o aluno tem de saber que o diálogo é uma necessidade, visto que as descobertas nascem da confrontação de opiniões. Facilmente, dar-se-á conta da existência do diálogo entre o CCV e a LP, o que é natural e só a sua ausência seria preocupante. o diálogo como forma de pensar pode ser um objectivo da educação.

2. CORRELAÇÃO INtERDIsCIPLINAR: fPs, LCCV E LP

A pedagogia de valores requer que a educação proporcione um vínculo e uma aprendizagem cívicos, sensíveis às matrizes culturais, mas capaz de animar uma socialização intercultural. Esta é a vocação da disciplina de FPS que carecerá da LM na expressão da visão do mundo do aluno e da LP na clarificação de valores universais e europeus.

Na comunicação intercultural, o domínio da LP é muito importante. o conhecimento de outras culturas é indispensável à compreensão e à apreciação da nossa, pois leva à aceitação das diferenças, ao reconhecimento da relatividade das normas de cada cultura, propondo que a análise de padrões culturais seja feita unicamente no contexto da função que desempenham na totalidade de fenómenos da cultura, tida apenas como diferente das outras e nunca superior.

Conhecemos as atrocidades cometidas pela intolerância imposta

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por atitudes etnocentristas que motivaram o colonialismo, a escravatura, o genocídio e o extermínio dos considerados incivilizados e bárbaros.

Hoje, o apelo é à tolerância e ao respeito pela diversidade na unidade e, nisto, a aprendizagem de línguas ganha uma importância fulcral, pois, quem domina línguas domina as relações de contacto entre os povos. Daí a necessidade de se fazer um efectivo ensino da LP, pois, é ela que permitirá a nossa ligação com o mundo.

Essas questões podem, por uma lado, ser trabalhadas na disciplina de FPS, com o objectivo de clarificar valores como o respeito pelas diferenças, a paz e a tolerância, por outro, a disciplina de LCCV pode aproveitar esse mesmo conteúdo e trabalhar a comunicação intercultural, especificando pontos convergentes e divergentes entre as culturas em diálogo, destacando a riqueza da diversidade cultural.

A globalização forçou a educação a redefinir suas estratégias, suas formas de realização pessoal e social, onde vencer as limitações impostas pela diversidade cultural requer o domínio de diferentes línguas. Este domínio garante ao aluno a livre expressão do eu, o que se torna fácil, numa comunidade onde a sua cultura é valorizada. Daí a necessidade da disciplina de língua e cultura cabo-verdiana (LCCV) que se preocupe com a forma como o cabo-verdiano vê o mundo, a sua maneira de pensar a sua forma de ser e de estar na sociedade. As metáforas do quotidiano cabo-verdiano, enquanto expressão do imaginário, são uma fonte inesgotável desses elementos, por isso devem fazer parte deste currículo.

o desafio é de se fazer uma educação para uma sociedade plural e inclusiva que todos os grupos podem perceber como legítima. Assim, é necessário que o curriculum vise a construção de conhecimentos, atitudes e destreza necessários para edificar e viver numa comunidade aberta e os professores devem ajudar os alunos a examinar e a descobrir o significado da comunidade e dos conhecimentos e valores culturais que trazem para a escola, e a compreender as semelhanças e diferenças com os conhecimentos

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escolares e culturais do outro. O estudo das metáforas já referidas facilitaria a descoberta de tal significado e a compreensão das diferentes culturas.

Por isso, é de se focalizar as estratégias que optimizem a auto estima do aluno, o desenvolvimento da empatia e a aprendizagem de habilidades para a comunicação, pois, no mundo multicultural, teremos que trabalhar, estabelecer trocas e pensar com os outros sem subjugação. Estes aspectos podem ser objecto de estudo para desenvolver objectivos de qualquer uma das disciplinas apresentadas.

Na relação entre a cultura da língua, a educação para os valores e o desenvolvimento humano focalizaremos os quatro pilares da educação de Delors, segundo o qual o indivíduo deverá: «aprender a ser» como processo aglutinador de elementos próprios do «aprender a conhecer»; «aprender a fazer», «aprender a viver juntos».

Cabo Verde, enquanto país globalizado, não poderá ficar alheio a esta matéria que se revela de importância universal, e deverá apostar na reformulação e reforço da disciplina de FPS, que servirá de estandarte para a formação de um cidadão intercultural, preparado para o exercício pleno da cidadania. Esta consiste na assunção de deveres e responsabilidade, na participação na vida social e política do país e no ensino/aprendizagem de princípios e valores sobre os quais se assenta a nossa sociedade.

A educação para os valores visa o desenvolvimento integral do homem, isto é, mais do que inteligência, é cultura enquanto forma de vida. Daí a necessidade de construirmos esquemas de valores para poder (com) viver em sociedade.

Por isso, esse desenvolvimento integral carece de uma correcta cultura da língua o que implica o efectivo ensino da escrita da CCV para eternizar toda a nossa tradição oral, através da qual podemos passar os valores nacionais de geração em geração. Com efeito grande parte da tradição oral cabo-verdiana se tem vindo a perder, pois, a memória colectiva tem sido a

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única forma de a preservar e esta tem limitações.

A capacidade de expressão é fundamental para a participação activa e plena na vida social. E a metaforização e a alegorização podem ser utilizadas enquanto técnicas de argumentação nas duas línguas: LP e CCV. Por isso, esta disciplina preocupar-se-á em desenvolver conhecimentos, sensibilidades e procedimentos para criar no aluno o interesse e a preocupação com a cultura e a estética da língua. A produção escrita de poesia, anedotas, contos, adivinhas, lengalengas, provérbios, metáforas, peças de teatro, romances, etc., em CCV, deve ser incentivada através desta disciplina.

3. EstRAtéGIAs PEDAGÓGICAs PARA UmA DUPLA COmPEtÊNCIA COmUNICAtIVA

Exemplificaremos aqui o jogo de papéis, como facilitadora do desenvolvimento de uma competência bilingue e clarificadora de valores, numa correlação interdisciplinar e transdisciplinar.

3.1.DRAmAtIzAÇÃO

Personagens:

- Uma jovem cabo-verdiana

- Um jovem guineense

- Um jovem português

G. Amiga, amiga, konprá, konprá, amiga, baratu, baratu,

C.V. Larga’m nhê brose, trivide, nhe brose e de mi ma bó.

G. (Ainda, segurando o braço da jovem) Konpra, amiga, e baratu.

C.V. Já N deze’b pa bo larga’m nhe brose N ka ti ta konpra nenhum kosa kê N ká ten denher.

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Processos e Realidades Educativas

G. Kantu bo ten, kantu bo ten? N ta dixi’u N ta dixi’u.

P. Deixa a miúda em paz. (nesta altura o guineense solta o braça da jovem e esta agarra o braço do português que a fitou com um olhar de espanto, mas ela nem deu por isso). não estás a ver que ela não quer ser agarrada.

G. N ka fazê’l nada.

P. o que disseste?

G. Eu só queria que ela me comprasse.

P. Há! É? E quanto custas?

G. Barato, barato.

P. Mas pelos vistos ela não te quer nem de graça.

C.V. Há! Ise agora ka bo dezê pamade, de grasa, se’l dam N ta tmá sin e ta korré.

G. Pamó k’N tá dób de grasa, se min N ka podê pega na bó e bó bo ta pega na brose de portuga.

C.V. Kel li go é ka bo bizniz.

G. É ka nha bizniz pamó min N ka kopu leti.

C.V. Kopolet? O kê ke bo kre dezê ke kopolet.

G. N ka branku N ka riku.

C.V Há! Bo N e kope de lete?

G. Nou.

C.V. E ken ke e kulpode se bo e un kaneka de folha de kafé de sevada pret e margoz.

P. Com licença, menina. Solta o meu braço, porque eu preciso ir. não estou minimamente interessado nessa vossa discussão.

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C.V. Hádê mose já bo tá bai? Bo ka kré dá un voltinha na prasa ma min?

P. não obrigado! (o português saí e a jovem dirige-se ao guineense furiosa)

C.V. Bezot pret é só pa trapalha vide dun kriston. Ben ke kel português podia f´ka mas ma min se bo ka ta sentá preli ne bos paranoia. Bsot ben pra li so pa ben eskurese algen juizo.

Análise – na Guiné, o contacto físico demonstra atenção, mas a cabo-verdiana não o tolerou. Entretanto, não previu que o português, também, pudesse não o tolerar e fez-lhe a mesma coisa.

A comunicação falhou, originando o cómico da linguagem. A metáfora kopu leti- branco/rico - não é do conhecimento da jovem, mas, rapidamente, entende a sua funcionalidade e usa outra com sentido contrário, Kaneka de folha de kafe de sevada – preto/pobre. Essas metáforas oferecem informações culturais, permitem comparar aspectos da nossa cultura em épocas diferentes. Podem ser trabalhadas na disciplina de FPS para clarificar valores negativos como: o racismo e a discriminação, evidenciados através da utilização da língua. Podem ser aproveitadas na disciplina de LP, procurando na cultura portuguesa metáforas com sentidos próximos e, como é óbvio, na de LCCV, onde a tradução pedagógica e análise contrastiva possam evidenciar as diferenças e semelhanças linguísticas, trabalhar as transferências e interferências e, assim clarificar as fronteiras em o CCV e a LP, num ambiente pedagógico lúdico e descontraído.

4. CONCLUsÃO

Julgamos ter ficado clara a necessidade de novas metodologias de ensino da LP, de introdução de uma disciplina de LCCV, e o reforço da de FPS, a fim de melhorar a competência comunicativa, diminuir o insucesso

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Processos e Realidades Educativas

escolar, reforçar as relações interculturais, contribuir para uma verdadeira clarificação de valores e, consequentemente, fomentar o exercício da cidadania e a formação do cidadão global.

As metáforas revelam-se importantes para o desenvolvimento da capacidade de argumentação, de interpretação da realidade, visto que elas representam a visão do mundo do cabo-verdiano e estão presentes quer no pensamento científico, quer na linguagem quotidiana. Portanto, podem ser exploradas para melhor conhecer nossa cultura e a dos outros.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Carrillo, I. (1991) Habilidades Sociais, in M. Martínez e J.M. Puig (Coords.). La Educación moral. Perspectivas de Futuro y técnicas de trabajo. Barcelona: Graó.

Delors, J. et al (1998). Educação um Tesouro a Descobrir. Relatório para a UNESCO da comissão internacional sobre educação para o século XXI. Porto: Edições ASA

Kohlberg, L. (1992). Psicología del desarrollo moral. Bilbao: Desclée de Brouwer.

Lorenzo Modelo, M.ª M. (2004) «A Educacíon en valores: unha visión pedagóxica desde tres estratexias» In Dossier Alumnos: Seminario de Sociedade civil, educación e cidadanía intercultural. Universidade de Santiago de Compostela.

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COmPEtÊNCIAs REEDIfICADAs NA/COm A EstRAtéGIA mEtODOLÓGICA DE PROJEtO

Cândida Mota-Teixeira; Susana Cristina Pinto

Instituto Piaget, Vila nova de Gaia e Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação Universidade do Porto; Instituto Superior de Ciências

Educativas Felgueiras

[email protected]; [email protected]

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Processos e Realidades Educativas

REsUmO

O ambiente de aprendizagem no ensino superior politécnico em Portugal, nomeadamente no que concerne ao ensino no Mestrado em Educação Pré-Escolar e 1º Ciclo do Ensino Básico, mais concretamente na unidade curricular de Prática Pedagógica, centra-se num estímulo constante para o domínio e aplicabilidade do trabalho de projeto em contexto de jardim-de-infância. neste âmbito, e numa lógica qualitativa assente na investigação-ação, registamos os maiores ganhos conquistados pelos estudantes enquanto dinamizadores de uma prática centrada em projetos: maior autonomia; capacidade crítica; articulação mais eficaz da teoria/prática; aumento da capacidade dialógica; maior destreza no trabalho em equipa e sobretudo a conquista de um desenvolvimento profissional mais opulento. Evidenciamos, ainda, esta estratégia metodológica enquanto potenciadora de uma maior compreensão da essência do processo de ensino/aprendizagem da educação pré-escolar (Vasconcelos, 2007). os estudantes, enquanto experimentavam e refletiam os itinerários processuais do trabalho em projeto, vivenciavam com mais entusiasmo a sua praxis e nós, docentes, alocamos que a abordagem metodológica da produção do projeto constituiu, ela própria, um projeto formativo para ambas as partes e uma possibilidade de redimensionar as práticas pedagógicas que se vivenci(av)am no contexto pré-escolar da atualidade.

Palavras-chave: formação inicial; estratégias de ensino/aprendizagem; projetos de acção; projeto formativo; educação pré-escolar.

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ABstRACt

The learning environment in polytechnic higher education in Portugal, especially regarding teaching in the Master on Preschool Education and Primary Education, specifically in the subject of Teaching Practice, focuses on a constant stimulus for the domain and applicability of the project work in a preschool context. In this context, and from a qualitative perspective, we intend to make the greatest gains made by students known as the motor for a practice focused on projects: greater autonomy, critical capacity, more effective articulation between theory and practice; increased capacity for dialogue; greater skills in team work and, mostly, the achievement of a richer professional development. We also point out this methodological strategy as a promoter for a greater understanding of the essence of teaching / learning in preschool education (Vasconcelos, 2007). While students experience and reflect the procedural itineraries of project work, they also experience their praxis with more enthusiasm and we, teachers, feel that the methodological approach of the project production is, itself, a formative project for both parties and a possibility to resize the teaching practices experienced in the preschool context of today.

Keywords: initial strategies; teaching / learning; action projects; project training; preschool education.

1. INtRODUÇÃO

Com o novo paradigma de formação, sustentado no projeto formativo de Bolonha, as dimensões de trabalho de projeto intensificaram-se, dando cariz à aprendizagem autónoma veiculada por esta reforma. Assim, a implementação do trabalho de projeto nos estágios em educação de infância promoveu e espicaçou a aprendizagem ativa, assim como a auto e

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Processos e Realidades Educativas

hétero crítica metodológica.

numa lógica de investigação qualitativa – ancorada na investigação-ação (Máximo-Esteves, 2008) – apreendemos as principias vantagens dos estudantes do Mestrado em Educação Pré-Escolar e 1º Ciclo de Ensino Básico (CEB), como propulsoras de práticas centradas em projetos. observamos, através das reflexões contidas nos portefólios – realizados pelas estagiárias para a sua avaliação na unidade curricular de Prática de Ensino Supervisionada –, as competências conquistadas e exigidas nas experiências da aprendizagem centrada em projetos.

Após ponderada análise de conteúdo (Bardin, 1995) aos mesmos portefólios, realçamos a metodológica de projeto como a melhor estratégia para entender os procedimentos inerentes ao ensino/aprendizagem com crianças em idade pré-escolar. note-se, aliás, que o trabalho de projeto transporta consigo a possibilidade de redimensionar as práticas pedagógicas, através de dinâmicas transformadoras, críticas e dialógicas. nesta senda, destacam-se as competências de: autonomia; capacidade crítica; articulação teoria/prática; capacidade dialógica; trabalho em equipa; desenvolvimento pessoal e profissional.

1.1 COmPEtÊNCIAs ImPREsCINDÍVEIs Em EDUCAÇÃO DE INfÂNCIA

Cientes não só da centralidade e necessidade da definição de competência, assim como da divergência de opiniões da mesma, adotamos para o nosso estudo as seguintes conceptualizações: i) são múltiplos os significados da noção de competência, passando esta pela capacidade de agir em situação, mobilizando, para tal, conhecimentos capacidades e atitudes (Le Boterf, 1994); ii) capacidade de agir eficazmente num determinado tipo de situação, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles (Perrenoud,1999).

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Assim, o desempenho competente em situação depende do equipamento, cognitivo e afetivo, de um dispositivo, cujos conteúdos são disponibilizados na ação, pelo que o trabalho de projeto se afigura como desencadeador de inúmeras competências.

Uma pessoa é competente, na área de educação de infância, na medida em que domina determinados saberes relativos ao seu âmbito de acção e é capaz de os utilizar em problemas ou situações de carácter prático. Possui, portanto, saberes singularizados no seu campo específico e é capaz de enfrentar, com êxito, as situações complexas que se lhe apresentam.

na perspetiva de Condon et al. (2007:216), este carácter prático assume-se como uma “capacidade para desempenhar com eficácia uma determinada actividade, mobilizando os conhecimentos, habilidades e destrezas necessárias para concretizar os objectivos da actividade”. Estes atributos concretizam-se nos conhecimentos e capacidades intelectuais, nas habilidades e destrezas, nas atitudes e valores, que são os componentes fundamentais de toda a competência (ibid.:ibidem). Sob o ponto de vista da formação inicial, fazem-se referência a competências de ordem profissional que o educador de infância deve adquirir e que se concretizam em torno de um conjunto de saberes (saber, saber fazer e saber estar) que adquirem sentido, ou sobressaem quando os profissionais agem num contexto prático. Estes saberes são experimentados nos contextos dos estágios curriculares, operacionalizados em lógicas de alternância. Nestas comunidades de experimentação profissional, os estudantes apreendem e experimentam banhos de práticas que se traduzem num conhecimento profissional imprescindível a um bom desempenho (Severino, 2007).

Convém referir que quando falamos em competências as dividimos em duas categorias distintas e obviamente complementares, competências específicas e transversais.

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Processos e Realidades Educativas

2. mEtODOLOGIA

A partir do compromisso com os estudantes, aquando da dinamização do trabalho de projeto, intentamos assumir a mudança e consequente melhoria da qualidade da prática pedagógica. Adotamos, por isso, uma metodologia de prática dialógica, a investigação-ação, pretendendo-se a adoção processual de uma postura transformadora que incentivasse a “melhoria das práticas mediante a mudança e a aprendizagem a partir das consequências dessa mudança” (Vilelas, 2009:195).

Nesta linha de pensamento, optamos por esta estratégia, uma vez que a prática de ensino supervisionada das estudantes (todas do género feminino) do Mestrado em Educação Pré-Escolar e 1º CEB se assume como um processo constante de investigação e que pressupõe uma intervenção ativa. A investigação-ação constituiu-se, assim, num excelente guia para orientar as práticas educativas destas duas turmas de mestrado integrado (uma docente com dezassete estudantes e a outra com vinte), pertencentes a duas instituições de ensino superior politécnico privado do norte de Portugal, com o objetivo de melhorar o ensino e os ambientes de aprendizagem que as estudantes habitavam (Fernandes, 2001). o estudo decorreu no ano letivo de 2012/2013, durante o 3.º semestre do aludido mestrado.

Desenvolveram-se, assim, um conjunto de ciclos de planificação, ação, observação e reflexão, vertidos no(s) portefólio(s) do practicum. na avaliação acerca dos projetos desenvolvidos, aí contida, patenteamos as evidências desenhadas através da análise de conteúdo (Guerra, 2006). Não podemos negligenciar o facto de os diálogos ocorridos ao longo das supervisões de estágio serem coadjuvantes interpretativos.

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3. CAmINhOs CONDUCENtEs AO tRABALhO DE PROJEtO

Através de referenciais teóricos (Katz & Chard, 2009; Vasconcelos, 2012) incentivamos as estudantes a enveredarem pela estratégia metodológica de trabalho de projeto, conscientes de que este modus operandi conduziria a uma aprendizagem mais autónoma e mais crítica. Assim, ancoradas numa metodologia de investigação-ação, pretendíamos que as estudantes desenhassem as possibilidades de intervenção de acordo com as inquietações encontradas através de um diagnóstico fidedigno. neste encalço, surgiram projetos variados: os peixes; as experiências da natureza; a biblioteca; os morcegos; o arco-íris; prevenção rodoviária; medos, entre outros.

Assinala-se que a condução dos projetos obedeceu a lógicas veiculadas por Vasconcelos (2012), conforme se sistematiza no quadro seguinte:

Quadro 1: síntese das fases do trabalho de projeto (Vasconcelos, 2012)

fase I

Definição do problema

Formulação de um problema ou questão;

Definição de dificuldades/ansiedades a resolver;

Conversação com as crianças;

Desenho e esquematização de ideias (pelas crianças).

fase II

Planificação e desenvolvimento do

trabalho

Previsão de possíveis metas a atingir;

Elaboração de mapas conceptuais, teias, etc.;

Definição de: o que fazer, por onde começar, como realizar;

Divisão de tarefas.

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Processos e Realidades Educativas

fase III

Execução

Pesquisas das crianças (através de experiências diretas e

daquilo que pretendem fazer);

Organização, seleção e registo de informação pelas crianças;

Elaboração de gráficos e síntese da informação obtida;

Aprofundamento da informação recolhida, através da

discussão, representação e contraste com as ideias iniciais.

fase IV

Divulgação/ Avaliação

Solidificação do saber;

Sintetização e apresentação dos conhecimentos adquiridos

pelas crianças;

Exposição dos trabalhos realizados.

A partir do exposto e considerando que “a atitude investigativa é a base para o ser humano se colocar em projeto e que aqui se encontra o recurso fundamental à mudança e à inovação educativa” (Mendonça, 2002:21), transformaram-se, colaborativamente, intenções em ações (Barbier,1996).

3.1 COmPEtÊNCIAs EmERGENtEs DO tRABALhO DE PROJEtO

A(s) noção(ões) de competência(s), supra citadas, ajuda(m) a um pleno entendimento nos meandros de uma reflexão sobre a formação de educadores de infância, sintonizando-nos com o trabalho pedagógico centrado em projetos.

Trata-se de erigir reflexivamente o tipo de competências desenvolvidas no contexto dos projetos edificados nas duas instituições de ensino superior proponentes e resultantes da análise das práticas, sobretudo nos/dos portefólios construídos pelas estudantes. Assim, nas dinâmicas vivenciadas, as estudantes edificaram projetos através dos quais desenvolveram competências vividas, sentidas e conquistadas em três

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dimensões complementares, conforme quadro 2.

Quadro 2: Dimensões – Competências instrumentais, interpessoais e sistémicas

Competências instrumentais Competências interpessoais Competências sistémicas

® Capacidade de análise e síntese;

® Destreza para organizar e planificar;

® Conhecimento básico da profissão;

® Comunicação escrita e oral;

® Habilidade para obter e tratar informação;

® Resolução de problemas;

® Capacidade para tomar decisões.

® Capacidade crítica e autocrítica;

® Trabalho em equipa;

® Habilidade para as relações interpessoais;

® Capacidade para trabalhar em equipas interdisciplinares;

® Capacidade para adquirir um compromisso ético.

® Capacidade para aplicar, na prática, conhecimentos teóricos;

® Habilidade para a investigação;

® Capacidade para aprender;

® Capacidade para se adaptar a novas situações;

® Capacidade para gerar novas ideias (criatividade);

® Capacidade para trabalhar autonomamente;

® Capacidade para empreender novos projetos.

Desta tríade interpretativa, consideramos que as estudantes erigiram três tipologias de competências, a saber: i) competências instrumentais: que dizem respeito a um saber fazer em ação; ii) competências interpessoais: que significam a capacidade de trabalhar consigo mesmo e com o outro, numa relação de alteridade; iii) competências sistémicas: que veiculam a transversalidade de competências entre o saber ser, estar e fazer – numa relação dialética com o contexto prático e teórico. Das competências assinaladas destacam-se as competências transversais. A conquista de autonomia e a capacidade de mobilizar novos saberes – quer para si, quer para as crianças e educadores cooperantes – emergem com grande centralidade. Evidenciam-se, ainda, as competências interpessoais vivenciadas pelas dinâmicas de trabalho em equipa transdisciplinar. Das competências instrumentais destacam-se as competências de resolução de

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Processos e Realidades Educativas

problemas.

4. CONCLUsÕEs

o trabalho de projeto, enquanto metodologia ativa, conduz a avenidas de liberdade (Vasconcelos, 1997), possibilitando (des)envolvimentos múltiplos. Como sugere Cortesão et al. (2002), este funciona como uma porta aberta para a curiosidade do(a)as estudantes e do(a)s docentes, sendo simultaneamente um suporte para a educação, a cidadania e a aprendizagem ao longo da vida.

os trabalhos de projeto propostos erigiram-se a partir de estudos em profundidade de uma situação ou de um problema, o que consentiu proventos de consciência através de uma análise reflexiva constante, documentada em portefólios. Exigiu, portanto, uma articulação entre as intenções e as ações, entre a teoria e a prática, organizada num plano que estruturou essas mesmas ações.

As estudantes puderam perceber que esta dinâmica metodológica distanciou-se de uma atividade tradicional e isolada de ensino-aprendizagem, pelo sentido que possuiu, pelas intencionalidades que orientou, pela organização que previu, pelo tempo de execução e pelos efeitos que produziu, em detrimento de uma atividade ocasional (Cortesão et al., 2002).

Desta articulação espiralada, as competências transversais, nomeadamente a competência de autonomia, evidenciaram-se. Pese embora este tipo de trabalho tenha apelado a participações plurais, exigiu simultaneamente tomadas de decisão, um forte trabalho de pesquisa, de implicação e de inovação. Permitiu, ainda, a concretização de intenções através do plano apropriado e negociado, a capacidade relacional connosco, com os outros e com o contexto (Boutinet, 1999). ora, tendo

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em consideração que esta abordagem valorizou o agir, a ação entre o eu e os outros, a criação ativa da pessoa humana e os processos internacionais; tornou-se permeável, por conseguinte, às conquistas autónomas do ser. Aliás como reitera Ferreira (2012), a autonomia emerge como um recurso exigente de possibilidades de desenvolvimento humano.

numa lógica de projeto formativo, interpreta-se que quer sejamos docentes, quer sejamos estudantes ou quer sejamos crianças em idade pré-escolar, se estivermos envolvidos em dinâmicas que mobilizem a pesquisa, a discussão e a criação de consensos, se criam condições para um projeto individual e colectivo que se traduz em comprometimentos potenciadores do desenvolvimento contínuo dos implicados (Day, 2004).

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

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Cortesão, L. (2002). Trabalhar por Projectos em Educação. Uma Inovação Interessante? Porto: Porto Editora.

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Processos e Realidades Educativas

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Mendonça, M. (2002). Ensinar e Aprender Por Projectos. Porto: Edições ASA.

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CEDU 2013 - Nas Pegadas das Reformas Educativas

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Vilelas, J. (2009). Investigação: O Processo de Construção do Conhecimento. Lisboa: Edições Sílabo.

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supervisão pedAgógiCA

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PRÁtICAs DE APOIO à sUPERVIsÃO PEDAGÓGICA COm RECURsO A Um AmBIENtE VIRtUAL NA UNIVERsIDADE DE

CABO VERDE1

Adriana Mendonça; Maria João Gomes

Universidade de Cabo Verde; Universidade do Minho

[email protected]; [email protected]

1 Este trabalho é financiado através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia – Programa Ciência Global – referência: SFrH / BD / 51465 / 2011

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Supervisão Pedagógica

REsUmO

neste artigo pretendemos relatar uma experiência de apoio à supervisão de estágio e de dinamização de duas disciplinas na licenciatura de Ciências da Educação – Percurso de Desenvolvimento Pessoal e Social na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV), com recurso à plataforma Moodle. Esta experiência, em curso, enquadra-se num projeto de Investigação-Ação (IA) a decorrer e com o qual se pretende melhorar a prática de orientação/supervisão de estágios pedagógicos no contexto da Uni-CV. Este texto reporta-se a um dos momentos de desenvolvimento do projeto, relativo à caraterização das competências tecnológicas dos estudantes- estagiários, principais destinatários desta ação e das suas expectativas em relação ao trabalho com ambientes virtuais de aprendizagem. Os dados foram recolhidos com recurso a um inquérito por questionário e a partir da sua análise constatamos que os inquiridos têm alguma facilidade de navegação na Web, possuem também competências básicas para o trabalho em ambientes online, assim como vontade experienciar trabalhar em diferentes ambientes de aprendizagem. As principais dificuldades identificadas, prendem-se com a dificuldade de acesso a um computador e à Internet.

Palavras-chave: ambientes virtuais; estagiários; supervisão de estágio.

ABstRACt

This article aims at relating experiments as a support to training supervision as a way of dynamic touch to the two disciplines in the degree program of the Educational Science in the area of Personal and Social Development at the University of Cape Verde (Uni-CV), using the Moodle.

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CEDU 2013 - Nas Pegadas das Reformas Educativas

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This experiment, an ongoing project is part of a research-Action and the course which is aimed at improving the act of guidance / supervision of teaching practice in Uni-CV. This text refers to one of the stages of the development of the project as it relates to the technological skills of the students -trainees, the main recipients of this action and its expectations in working with virtual learning environments. The data were collected using a questionnaire survey and from the analysis, it was found that the respondents can browse the webs with ease, also possess basic skills to work in online environments, as a result willing to experience working in different learning environments. The main difficulties identified, relates to the difficulty of access to a computer and the Internet.

Keywords: virtual environments; trainees; probation supervisión.

1. CONtEXtUALIzAÇÃO

Este texto reporta-se a uma fase de um projeto de Investigação – Ação (IA) em desenvolvimento e que envolve os estudantes-estagiários, da Licenciatura em Ciências da Educação – Percurso Desenvolvimento Pessoal e Social na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV), no Campus do Palmarejo, situado na cidade da Praia, ilha de Santiago, durante o ano letivo 2012/2013.

o projeto em curso tem como objetivo melhorar as práticas de supervisão de estágio pedagógico de estudantes da Uni-CV, com recurso a um Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), no caso em análise, a plataforma MOODLE (acrónimo de “Modular Object-Oriented Dynamic Learning Environment” disponível em http://moodle.org/). A familiarização com ambientes virtuais de aprendizagem, pretende proporcionar ao estudante-estagiário, futuro professor do ensino secundário de Cabo Verde, a oportunidade de contato com abordagens diferenciadas de ensino e de aprendizagem, que poderão revelar-se essenciais nas suas práticas diárias quer enquanto docentes, quer, eventualmente, enquanto futuros

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Supervisão Pedagógica

participantes em iniciativas de formação contínua.

A crescente exigência na formação dos professores, designadamente, para fazer face às novas realidades educativas e sociais representa um aspeto que deverá estar sempre presente nas práticas pedagógicas. Como sublinha Simões (2007, p. 99),

“os professores estão imersos num contexto sociocultural amplo, mas também, e ao mesmo tempo, numa “cultura” profissional. É essencial tomar consciência das várias culturas que influenciam o seu trabalho quotidiano, as suas acções e decisões. neste sentido, os professores devem estar preparados para terem uma atitude constante de investigação das suas práticas profissionais. Faz então sentido uma cultura de escola que ofereça oportunidades para a reflexão crítica e a indagação constante.”

A importância dos ambientes online está fortemente relacionada com as características que os mesmos oferecem, designadamente: (i) flexibilidade e interatividade, (ii) vinculação a uma verdadeira comunidade virtual de aprendizagem e (iii) acesso a materiais de estudo e a outros recursos (Duart & Sangrá, 2000b cit. por Miranda, Morais & Dias, 2005).

Para além da facilidade de acesso à informação que a web garante,

“construir espaços de formação online constitui um desafio que não se limita à simples disponibilização de conteúdos no ambiente ou na plataforma. (…) o que está em causa é a necessidade de criação de uma nova pedagogia baseada na partilha, na exposição das perspectivas individuais entre pares a na colaboração e iniciativa conjunta orientada para a inovação e criação.” (Dias, 2004, cit. por Miranda, Morais & Dias, 2005, p. 1902)

Subjacente a este estudo está a convição de que proporcionar aos estudantes-estagiários, futuros profesores, a oportunidade de participarem em atividades de formação que envolvam o uso de um Ambiente Virtual

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de Aprendizagem (AVA) contribui para a sua literacia digital, amplia a sua visão no que concerne às potencialidades pedagógicas dos ambientes online, desenvolve competências de aprendizagem online que podem ser rentabilizadas em futuras iniciativas de formação contínua e proporciona-lhes novas forma de partilhar e construir conhecimento.

2. DEsENhO DO EstUDO

O projeto de IA que nos encontramos a desenvolver prevê a realização de atividades pedagógicas nomeadamente na dinamização de uma experiência de apoio à supervisão de estágio e de dinamização de duas disciplinas na licenciatura de Ciências da Educação com recurso a um AVA. Este processo tem estado a ser desenvolvido no segundo semestre do ano letivo de 2012/1023, tendo sido antecedido de um trabalho de caraterização das condições existentes, em termos de competências tecnológicas dos estudantes-estagiários, principais destinatários desta ação e das suas expectativas em relação ao trabalho com ambientes virtuais de aprendizagem. neste texto procede-se à análise e discussão dos dados recolhidos nesta fase preliminar.

2.1. O INstRUmENtO DE RECOLhA DE DADOs

Como instrumento de recolha de dados optou-se pelo questionário impresso, com aplicação direta por parte da investigadora, primeira autora deste texto. o questionário desenvolvido tinha como principal objectivo caraterizar o estudante-estagiário, especificamente no que concerne às suas competências tecnológicas, comportando questões fechadas, e apenas uma questão semi-aberta.

Procedeu-se a um processo simples de validação do questionário

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construido para o efeito, através da sua análise por um professor/investigador no dominio da Tecnologia Educativa , bem como realização de uma pré-testagem do mesmo no que concerne à clareza e pertinência das questões, através da sua aplicação junto de um grupo de recém licenciados em Ciências da Educação. Com base neste conjunto de procedimentos, elaborou-se a versão final do questionário que foi aplicada aos participantes neste estudo.

2.2. sUJEItOs PARtICIPANtEs

Participaram neste estudo todos os alunos em processo de estágio pedagógico no ano letivo 2012/2013, no contexto da Licenciatura em Ciências da Educação – Percurso Desenvolvimento Pessoal e Social na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV), no Campus do Palmarejo, como referenciado. O estudo envolveu 11 sujeitos, ou seja, a totalidade do estudantes da Uni-CV nas condições descritas.

2.3. APREsENtAÇÃO DOs DADOs

Atendendo a que este artigo visa a caraterização das competências tecnológicas dos estudantes- estagiários e uma vez que a caraterização dos individuos inquiridos foi apresentada em Santos e Gomes (2012), iremos restringir-nos essencialmente a esses dados.

os inquiridos que referem ter acesso a computadores, 5 possuem um, enquanto os restantes (2) mencionam que têm um computador emprestado e os restantes 4 inquiridos não respondem à questão.

relativamente aos locais de acesso à Internet, a maioria dos inquiridos (8 indivíduos), diz ter acesso à Internet em casa (local onde residem durante este período de estágio). Percebemos que os estagiários também acedem a partir de outros espaços, designadamente nas escolas secundárias onde estão a realizar o estágio, onde o acesso à Internet é realizado essencialmente a partir de dispositivos móveis, muitas vezes utilizando o

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acesso pessoal subscrito pelo próprio estagiário. Atualmente, mesmo na Uni-CV, grande parte dos estudantes e docentes recorrem aos dispositivos móveis para aceder à Internet, principalmente porque têm possibilidade de navegar livremente por todos os sites, incluindo o Facebook, cujo acesso se encontra bloqueado pelos serviços técnicos da instituição, por ter sido considerado um forte distrator durante as aulas.

os 3 indivíduoxs que não conseguem aceder à Internet a partir da sua residência, ou por não terem cobertura de rede, ou por não terem um computador, fazem-no quando se deslocam à Uni-CV, muitas vezes com recurso à ajuda dos colegas.

no que se refere à frequência do acesso à Internet, 7 inquiridos acedem “algumas vezes por semana”, enquanto 4, o fazem “diariamente”. Consideramos que, numa fase final da licenciatura, seria importante que o acesso à Internet por parte de todos os inquiridos fosse diário, atendendo ao pontencial da mesma, nomeadamente num país em que o acesso a recursos de informação bibliográficos, mesmo ao nível das bibliotecas existentes, é limitado. Contudo, temos que reconhecer, que face aos custos ainda elevado dos equipamentos e das tarifas de acesso à Internet em Cabo Verde, já é produtivo que todos os estudantes inquiridos acedam à Internet “várias vezes por semana”.

quando questionados sobre os serviços ou equipamentos que os inquiridos dispõem, constatamos que todos têm telemóvel, email e têm acesso a redes sociais, designadamente o Facebook. Pudemos perceber que alguns estagiários criaram neste 2º semestre o seu email para poderem comunicar com a supervisora, orientadores e colegas, quando foram informados da intenção de recorrer às TIC no contexto de duas das disciplinas que iriam frequentar.

relativamente às atividades que desenvolvem quando acedem à Internet, constatamos que estas variam, sendo que as principais são: (i) “a pesquisa de informações para o trabalho na Uni-CV” (10 indivíduos), (ii) “a

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interação em redes sociais” (6 indivíduos), (iii) “pesquisa de informação para o desenvolvimento do estágio” (2 indivíduos), (iv) “interação através do chat” (3 indivíduos) e do Skype (1 indivíduo).

no que concerne à utilização da Moodle, constatamos que todos já tinham ouvido falar dessa plataforma, mas apenas um inquirido a tinha utilizado antes do ano letivo 2012/2013, ano em que se encontram a realizar o estágio pedagógico.

Finalmente, quando questionados sobre como poderiam recorrer às TIC para dinamizar três atividades nas escolas onde irão fazer o estágio, sentimos que houve algumas dificuldades na elaboração das respostas, que em nosso entender, estavam relacionadas com o desconhecimento geral dessas questões . Parece provavel que durante todo o seu percurso académico e, por vezes até profissional, a utilização das TIC não tenha sido uma prática recorrente, sendo-lhes difícil imaginar tais actividades em contextos pedagógicos. Ao analisar algumas das respostas facultadas, verificamos que a “atividade” mais apontada (5 indivíduos) foi a utilização do power point para a dinamização das suas aulas nas escolas secundárias, de alguma forma “mimetizando” as suas experiências com as TIC ao nível da Uni-CV.

3. CONsIDERAÇÕEs fINAIs

Os dados apresentados representam a realidade de muitos dos nossos estudantes-estagiários no país. Ainda existem estudantes que não dispõem de um computador pessoal ou mesmo de acesso facilitado a um computador, o que acaba por dificultar a realização de qualquer trabalho, principalmente na fase final da licenciatura.

Contudo, atualmente o acesso à Internet está mais facilitado e a um custo relativamente acessível, pois um indivíduo poderá ter um dispositivo

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para acesso à internet móvel (pen), que lhe garante o acesso à Internet em qualquer zona geográfica do país (com cobertura de rede).

Como vimos, a quase totalidade dos inquiridos (10 indivíduos) admite que têm competências médias/razoáveis de utilização dos computadores e da Internet, porém relativamente à frequência do acesso à Internet, 7 inquiridos acedem “algumas vezes por semana”, enquanto 4, fazem-no “diariamente”. na nossa perspetiva, existirem apenas 4 indivíduos com a prática de acesso diário à Internet, acaba, atualmente, por representar um dado ligeiramente preocupante. no entanto, pensamos que isso se deve essencialmente à falta de hábito, pois alguns destes estudantes-estagiários, apenas neste último ano da sua licenciatura, estabeleceram práticas mais frequentes de acesso à Internet, devido à necessidade de trabalho na Moodle e de comunicação com a supervisora de estágio.

Os dados demostram também que ainda existe um desconhecimento quase generalizado das potencialidades das TIC em contexto de sala de aula, sendo ainda complexo para estes estudantes-estagiários pensarem em atividades/estratégias que possam ser dinamizadas com recurso às mesmas. Porém, esta dificuldade é ainda mais acentuada, quando percebemos que as escolas onde estes estudantes-estagiários desenvolveram a sua prática pedagógica, também não apresentam condições para que tal ocorra (uma das escolas não tem tomadas elétricas em algumas salas e as turmas são numerosas – 37 a 40 alunos - o espaço de sala de aula é exiguo).

quando nos referimos à necessidade de realizar alterações nas metodologias de ensino e de aprendizagem, assentes na introdução de tecnologias educativas, não podemos deixar de destacar que o ritmo da sua introdução depende muito de instituição para instituição, atendendo a que cada uma tem subjacente uma filosofia de educação, muitas vezes vinculada a raízes culturais, económicas e sociais, muito próprias e específicas do país a que pertence.

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REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Miranda, L.; Morais, C. & Dias, P. (2005). Estilos de aprendizagem em ambiente online. In Bento Silva & Leandro Almeida (Coords.), Actas do VIII Congresso Galaico Português de Psicopedagogia, pp. 1897-1912. Braga: CIEd/IEP/UM.

Santos, A., M. & Gomes, M. J. (2012, novembro). relação dos estagiários e seus orientadores com as TIC: um estudo realizado no ano lectivo 2011/2012 no Departamento de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Cabo Verde. In Atas do II Congresso Internacional TIC e Educação, Lisboa, pp.902-920. Acedido em http://ticeduca.ie.ul.pt/atas/pdf/349.pdf

Simões, A. M. V. (2007). Formação, desenvolvimento profissional e aprendizagem ao longo da vida: que desafio para as escolas e para os professores em contextos de mudança? In Flores, M., A. & Viana, I., C. Profissionalismo docente em transição: as identidades dos professores em tempos de mudança. Braga: Centro de Investigação em Educação (pp. 94- 08).

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PRÁtICAs DE sUPERVIsÃO DE EstÁGIO, NA PERsPEtIVA DE EDUCAÇÃO COmPARADA: DUAs EXPERIÊNCIAs ENVOLVENDO

A UNI-CV E A UCP

Adriana Mendonça1; Sílvia Maria Castro Fortes Cardoso

Universidade de Cabo Verde; Universidade Católica Portuguesa

[email protected]; [email protected]

1 Este trabalho é financiado através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia – Programa Ciência Global – referência: SFrH / BD / 51465 / 2011

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REsUmO

neste artigo, procuramos interpretar e partilhar duas experiências de realização de estágios pedagógicos na área de Ciências da Educação, nos cursos de Licenciatura em Ciências da Educação (Universidade de Cabo Verde) e Mestrado em Ensino de Informática (Universidade Católica Por-tuguesa), na perspetiva de educação comparada. Do ponto de vista me-todológico, apoiamo-nos na observação e análise, recorremos a notas de campo com a descrição das experiências vividas. Destas, concentramo-nos nas atividades e comportamentos manifestos e observados enquanto su-pervisoras pedagógicas. Da nossa análise, percebemos que, apesar das diferenças evidentes, as práticas supervisoras de estágio, nos dois cursos são substanciais semelhanças. Mas têm particularidades interessantes do ponto de vista da formação de professores. A experiência portuguesa reve-lou-se mais complexa e metodologicamente mais exigente para professor e alunos. Isto, provavelmente por se tratar de níveis académicos diferentes. Contudo a exigência e a taxa de esforço colocada no Mestrado em Ensino de Informática, não seria de todo descabida se aplicada à Licenciatura em Ciências da Educação, contribuindo para o aprofundamento da formação ministrada neste âmbito.

Palavras-chave: supervisão pedagógica; formação de professores; estágio pedagógico e profissionalizante; Ciências da Educação; ensino de Informática.

ABstRACt

In this paper, we interpret and share two experiences of conducting teaching practice in the area of Education, on the courses of Science in

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Education (Cabo Verde University) and a Master in Computer Teaching (Portuguese Catholic University), by a comparative education perspective. From the methodological point of view, we rely on the observation and analysis, we used the field notes describing the experiences. From these experiments, we focused on activities and behaviors manifest and observed while teaching supervisors. From our analysis, we realized that despite the obvious differences, the supervisory practices of stage in the two courses have substantial similarities as well as interesting peculiarities in terms of teacher training and professional education. The Portuguese experience proved more complex and methodologically more demanding for teachers and students. This is probably because it was different academic levels. However the requirement and the rate of stress placed on the Masters in Education would not at all unreasonable if applied to the course of Science in Education, contributing to the deepening of the training in this area.

Keywords: pedagogical supervision; teacher training; educational training; education sciences; teaching Informatics.

INtRODUÇÃO

A formação e o desenvolvimento profissional do professor pressupõem uma complexidade de situações e experiências de formação e atuação profissional onde, de forma gradual, evolutiva e processual, o professor adquire competências múltiplas e multifacetadas especializando-se, numa perspetiva de formação ao longo da vida.

Este processo desenha um desenvolvimento profissional, que se pretende contínuo e sistemático e que envolve distintos níveis de realização: a formação inicial, a iniciação/indução, o desenvolvimento profissional permanente (Flores, 2000), ou de formação contínua (Marcelo, 1994), interativa, acumulativa e integrativa de uma variedade de formatos (Fullan, 1987, cit. in Marcelo 1994).

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A primeira carateriza-se pela apropriação de competências fundamentais ao exercício profissional e à sua experimentação em situação de estágio. Para ribeiro (1993, p.8) “o sentido fundamental da formação inicial reside em preparar o futuro professor para desempenhar a sua função e para continuar a desenvolver-se no entendimento e na prática de ensino”.

A segunda pela socialização profissional na procura de ajustamento, marcado pela melhoria e aprofundamento dos conhecimentos e competências. Acontece durante o período da indução que decorre num espaço de 3 a 5 anos (Flores, 2000). Neste período, processa-se “a aprendizagem do papel institucional na perspetiva da socialização organizacional, que permite ao neófito integrar-se no contexto profissional, na medida em que compreende os valores, o conhecimento e o comportamento associados a determinada profissão e/ou organização” (ibidem, p. 45).

A terceira, na perspetiva de formação ao longo da vida, envolve a atividade de aprendizagem profissional contínua, pela expansão das competências existentes, ajustamentos e apropriação de novas competências face aos desafios do desenvolvimento integral dos sistemas de ensino e educação.

nessa trajetória o professor mune-se de conhecimentos científicos e técnicos, ajusta atitudes e valores, devendo expressar competências científicas, técnicas e relacionais no seu quadro de referências profissionais. Assim sendo, “ a competência profissional do professor exige a promoção de uma articulação entre a teoria e a prática de ensino” (Flores, 2000, p. 44), para que o professor em formação possa tornar-se competente e realizado, pessoal e profissionalmente.

Assim se justifica a supervisão pedagógica na formação e acompanhamento do profissional docente, como um elemento fundamental no processo de construção e experimentação das competências profissionais, com particular enfase na formação inicial dos professores.

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Assim, pareceu-nos pertinente partilhar, aqui, a nossa experiência sobre esta matéria na aprendizagem profissional (supervisão), que pressupõe uma prática docente acompanhada, ou supervisionada, onde um “professor, em princípio, mais experiente e mais informado, orienta um outro professor ou candidato a professor no seu desenvolvimento humano e profissional” (Alarcão & Tavares 2003, p.16).

A supervisão de qualquer atividade e, especificamente, a supervisão da prática atividade, envolve, no nosso entender, uma responsabilidade muito grande, atendendo a que dela poderão resultar mudanças nas práticas dos indivíduos supervisionados, que poderão ser determinantes para o exercício da sua futura profissão e consequente construção do mesmo, enquanto pessoa e profissional.

Para tanto, o supervisor deve munir-se de um conjunto de competências específicas que o permitam desempenhar com sucesso este desiderato, dada a responsabilidade de orientação do professor na linha de um desempenho de qualidade associadas à integração dos indivíduos e ao seu sucesso educativo, e a responsabilidade que acarreta o facto de se colocar na posição de orientar alguém, supostamente com necessidades de formação e acompanhamento na construção da sua profissionalidade.

Para Alarcão (1996, p. 126), o supervisor é um “facilitador, criador e dinamizador de contextos da aprendizagem e confiante em que os professores têm potencialidades para aprender, para se desenvolverem, para continuarem a sua qualificação, precisando para isso apenas de contextos favoráveis, de apoios e desafios”. no contexto de realização dos estágios pedagógicos, Pacheco (1995), apela à importância deste referindo que,

“apesar de muitas críticas organizacionais, o estágio surge como uma etapa fundamental da aprendizagem profissional de um professor, tornando-se necessário não só problematizar o fim último das aulas assistidas, que são vistas como sendo mais para os observadores do

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que para os alunos, como também equacionar a compartimentação que existe, no modelo integrado, entre ciências da especialidade/ciências da educação, entre universidade/escola e entre teoria/prática” (idem, 1995, p.190).

A supervisão é importante na formação do estudante professor/estagiário, que, com base nas orientações e acompanhamento das mesmas, gere as práticas pedagógicas, aperfeiçoando-as. Vieira (2010, p.36) considera que “o apoio do supervisor no questionamento da prática do estagiário, assim como o desenho e análise de práticas alternativas, é necessário a uma experimentação fundamentada e orientada para a qualidade das aprendizagens”.

Apesar da multiplicidade de definições que existem, podemos resumir a supervisão pedagógica numa estratégia de formação envolvendo o supervisor e o supervisionado, numa relação de acompanhamento, ajuda, cooperação e superação, que se desenvolve num clima relacional positivo, num processo que se pretende aberto do ponto de vista metodológico (Vieira, 2010). Neste processo, o supervisor possui uma função globalizadora do conhecimento, através da integração das diferentes componentes curriculares e o supervisionado deve ter uma postura recetiva, interativa, proativa e dialogante, para se permitir aprender e desenvolver as suas competências.

Nesta comunicação referimos a supervisão pedagógica associada às experiências pessoais, na Universidade Católica de Braga (UCP) e na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV), para fomentar debate e construção académica em torno do tema, na expetativa da partilha e influência mútuo nos processos de melhoria das mesmas práticas. Tivemos como base metodológica a observação e análise, ancoradas na investigação qualitativa.

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O métODO

A investigação científica requer, que o investigador se aproprie e manipule um conjunto de princípios que o orientam e garantam a validade da informação e consequente estudo. Pardal & Correia (1995) afirmam que, para toda a investigação é necessário um método que não é mais que uma caraterização do percurso adequado ao objeto de estudo e que assume caráter científico quando as opções feitas são devidamente sustentadas evidenciando uma correlação explicativa entre a teoria e a prática.

neste estudo, pretendemos provocar a reflexão sobre as experiências e as expetativas vividas, com base no conhecimento organizado dos pontos de vista teórico e prático na supervisão pedagógica. Assim, procurámos conhecer as situações vivenciadas por nós, nos dois espaços de realizações, relações e emoções, buscando, na organização do nosso vivido, retirar contributos com sentidos e significados para consolidar a nossa experiências e o equacionamento de soluções de mudança.

De muitas resoluções metodológicas decidimo-nos pela abordagem qualitativa, procurando apreender os percursos e seus significados na especificidade de cada situação e comparativamente. Assim, propomo-nos a compreender as ocorrências, induzindo novas formas de estar e instituindo novas formas de agir e agindo em harmonia com os nossos interesses (Almeida & Freire, 2000) e normas institucionais.

o acompanhamento da experiência na Uni-CV foi feito com estagiários da licenciatura em Ciências da Educação – Percurso de Desenvolvimento Pessoal e Social, numa das escolas secundárias da cidade da Praia. quanto à experiência, baseou-se na supervisão das Práticas de Ensino Supervisionadas, em Braga e em Sta. Maria dos estagiários em turmas constituídas por alunos do 2º e 3º ciclos do Ensino Básico e do Ensino Secundário Profissional.

As observações foram realizadas pela supervisora de estágio (Uni-

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CV) e orientadora científica (UCP). A primeira participou da observação nos dois espaços, nas perspetivas de observação participante e não participante (Estrela, 1994). No processo, conforme sugerido por Vilelas (2009), teve-se como referencial da observação o lugar, as pessoas, a ação e a descoberta. Esta foi sempre acompanhada de registo de conversas informais e notas de campo (Carmo & Ferreira, 2008). Este estudo integra-se num doutoramento na Universidade do Minho sob o tema “Contributos das TIC e dos ambientes online para a formação de professores em Cabo Verde: um projeto de investigação- ação na Uni-CV”.

ANÁLIsE CONCLUsIVA

Pensamos que o modelo de gestão pedagógica e da sua supervisão, nas práticas de ensino supervisionadas da UCP é interessante para a prática da Uni-CV, em aspetos, como sejam: a planificação realizada em colaboração com o supervisor pedagógico (no caso da Uni-CV orientador), para posterior disponibilização à supervisora científica, uma semana antes da aula assistida; a participação em todas as atividades/reuniões do grupo disciplinar; a integração de atividades propostas pelos estagiários e destinadas à comunidade educativa no plano de atividades da escola; a elaboração de um relatório de progresso, de forma a partilhar e discutir as práticas dos estagiários durante o estágio nas escolas; flexibilização na organização dos elementos integrantes de um plano de aula; a nível da prática pedagógica (trabalho com os alunos na sala de aula); a permanente aplicação de um instrumento para avaliação dos alunos, a criação de uma ficha de atividades para cada aula, para ser disponibilizada aos alunos que acabam por realizar as tarefas mais rapidamente do que os outros, de forma a mantê-los interessados e ocupados, evitando distrações.

Também, e em resposta a elementos de avaliação formativa contínua implementados pela UCP nos estágios, deve-se questionar, nas práticas da

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Uni-CV, a introdução de um “relatório de progresso”, que, tanto permite monitorar as práticas e sistematizar a experiência no sentido da reflexão e consequente evolução, como a avaliação intermédia dando lugar a possíveis ajustes e, não menos importante, permite os estagiários organizarem-se, esclarecendo muitas das dúvidas que surgem, não as deixando para o final do processo (como acontece na Uni-CV), acarretando muitas ansiedades por parte dos seus orientadores e dos próprios estagiários.

quando à organização e planificação do estágio, da parte da UCP, há uma elaboração prévia do plano de estágio, exequível face às possibilidades contextuais e devidamente concebido em matéria de planeamento e planificação, tendo como pano de fundo a cultura colaborativa de partilha e construção no núcleo de estágio (estagiários e supervisores/orientadores), bem como uma planificação das atividades de ensino. Assim, consolidam-se as intenções para a ação, permitindo o aprofundamento de conceitos, bem como uma melhor gestão do tempo e das atividades previstas. Esta perspetiva também seria interessante para a experiência da Uni-CV.

Da gestão curricular pelos estagiários, há uma grande diferença de método e diversidade do trabalho em sala de aula, em que na experiência da UCP ressalta-se a facilidade criada para o acesso ao moodle pelos alunos em geral, para beneficiar dos recursos disponibilizados nas atividades de aula, bem como interagir com professor e colegas, de entre outros conteúdos, sendo frequentemente utilizado e com bastante entusiasmo por estes; a projeção do estágio antevendo oportunidades letivas e não letivas de intervenção no contexto de estágio; as dinâmicas construídas pelos projetos de complemento curricular e de formação da comunidade escolar.

Da orientação/supervisão, destaca-se que a qualidade da relação científica e relacional entre orientadores e estagiários tem bastante peso na supervisão da UCP, sendo, neste caso, facilitador do processo de estágio onde é fundamental o acompanhamento permanente do estagiário dos pontos de vista teórico e prático; o modelo de acompanhamento relaciona a teoria,

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a metodologia e a prática pedagógica que sai reforçada da apresentação dos relatórios por parte da UCP; a autonomia do estagiário e a “intervenção cirúrgica” dos orientadores.

Da experiência da Uni-CV, registámos a dificuldade de conciliar as planificações com a programação da própria disciplina e/ou com as orientações que, por vezes são facultadas pelo supervisor.

Das duas experiências, vimos fragilidades pedagógicas dos estagiários, que se prenderam com o articular de significados e sentidos dos conteúdos teóricos da ação pedagógica com a ação letiva e não letiva, ou seja, de contextualizar e usar assertivamente e não intuitivamente os conceitos teóricos pedagógicos envolvidos na sua conduta da ação educativa. naturalmente, porque os estagiários estarão a ensaiar a entrada em cena pedagógica, falta-lhes a visão de conjunto que, entretanto, vão desenvolvendo durante o processo.

Ainda, na perspetiva de reciprocidade de influências positivas da organização dos estágios pedagógicos em análise, existe diferença substancial em recursos físicos, materiais, conhecimentos tecnológicos dos estagiários e orientadores, e a organização geral do estágio pedagógico, a desfavor da Uni-CV e associado às condições existentes na Escola Caboverdiana, que contamos vir a ser superado com o desenvolvimento do Programa tecnológico “Mundo novu”, que prevê os petrechos da mesma para uma educação renovada, reforçada e ajustada às perspetiva da inclusão e da globalização. Ficamos a aguardar a boa nova.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Alarcão, I. & Tavares, J. (2003). Supervisão da Prática Pedagógica. Uma Perspectiva de Desenvolvimento e Aprendizagem. (2ª ed.) Coimbra: Livraria Almedina.

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Alarcão, I. (1996). Formação reflexiva de professores: Estratégias de supervisão. Porto: Porto editora.

Almeida, L., & Freire, T. (2000). Metodologias da investigação em psicologia e educação (2ª ed.). Braga: Psiquilíbrios.

Carmo, H. & Ferreira, M., M. (2008). Metodologia da Investigação: guia para a auto-aprendizagem. (2ª ed.). Lisboa: Universidade Aberta.

Estrela, M. T. (1994) Relação pedagógica, disciplina e indisciplina. Porto: Porto.

Flores, M. A. (2000). A Indução no Ensino: desafios e constrangimentos. Lisboa: Ministério da educação. Instituto de Inovação Educacional.

Marcelo, C. (1994). La formacion del professado para el câmbio educativo. Barcelona:PPU.

Pacheco, J. A. (1995). Formação de professores: teoria e praxis. Instituto de Educação e Psicologia: Universidade do Minho.

Pardal, L. & Correia, E. (1995). Métodos e Técnicas de Investigação Social. Porto: Areal.

Vieira, Flávia et al. (2010). No caleidoscópio da supervisão: Imagens da formação e de pedagogia. (2ª ed.). Magualde: Edições Pedagogo.

Vilelas, J. (2009). Investigação: o processo de construção do conheci-mento. Lisboa: Sílabo.

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O ACOmPANhAmENtO CIENtÍfICO E téCNICO-PEDAGÓGICO DO PROJEtO tURmAmAIs. ImPACtO NAs EsCOLAs

Isabel Fialho; Ana Maria Cristóvão; Hélio Salgueiro; Marília Cid

Universidade de Évora

[email protected]; [email protected];[email protected]; [email protected]

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REsUmO

o Projeto TurmaMais constitui um projeto inovador centrado na escola, assente em pressupostos de eficácia e orientado para a melhoria. É assumido como um projeto das escolas, de natureza flexível e aberta, cuja implementação e desenvolvimento têm sido acompanhados de forma sistemática por equipas de apoio externo criadas para o efeito. o clima de proximidade entre as escolas e as equipas de apoio, a abertura e disponibilidade, a vontade das escolas em experienciar novas formas organizacionais e pedagógicas têm sido o motor das mudanças na cultura da escola, visíveis no crescimento das taxas de sucesso e na diminuição do abandono escolar. O presente texto aborda a metodologia usada no apoio/acompanhamento do projeto TurmaMais, que acontece de forma contextualizada próxima, regular e horizontal e se desenvolve a dois níveis (técnico-pedagógico e científico), sendo concretizado por duas equipas que desempenham funções distintas mas complementares e articuladas. Também evidenciamos o impacto desse acompanhamento, através de diversos testemunhos.

Palavras-chave: Projeto TurmaMais; acompanhamento técnico-pedagógico; acompanhamento científico; impacto.

ABstRACt

The Project TurmaMais is an innovative project focused on schools, based on assumptions of efficiency and targeted for improvement; it is assumed as a project of the schools, with a flexible and open nature, which implementation and development have been systematically backed up by external teams. The climate of closeness between schools and support teams, the openness and availability and the willingness of schools to experience new organizational and teaching forms have been the heart of the change in the schools culture, noticeable by the growing rates of

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success and dropout decline. This paper discusses the methodology used in the support/monitoring of the TurmaMais project, which takes place on a regular basis, in a contextualized, horizontal and close way and is developed on two levels (technical-scientific and pedagogical), implemented by two teams that play distinct but complementary and articulated roles. Also showed the impact of this support/monitoring, through various testimonies.

Keywords: TurmaMais project; technical-pedagogical monitoring; scientific monitoring, impact.

APOIAR A mUDANÇA NAs EsCOLAs

O Projeto TurmaMais (PTM) foi lançado em 2009 pelo Ministério da Educação (ME), de Portugal, integrado num programa de combate ao insucesso escolar no ensino básico - Programa Mais Sucesso Escolar (PMSE) que visa apoiar o desenvolvimento de projetos de escola. no ano letivo de 2009-2010, o PTM funcionou em 67 escolas, em 2010-2011, em 63 e em 2011-2012, em 59 escolas que se encontram distribuídas por diversas regiões de Portugal continental. o Projeto TurmaMais tem como principal objetivo criar condições organizacionais e pedagógicas que levem à melhoria efetiva das aprendizagens e dos resultados escolares dos alunos, apostando na prevenção do insucesso e abandono escolares. Assenta em pressupostos do movimento das escolas eficazes (Fialho, 2012) e valoriza a interação com centros de investigação e universidades para reforço da credibilidade e da confiança social perante a comunidade educativa (Verdasca, 2011, p.35).

A investigação mostra-nos que a inovação centrada na escola é a que melhor pode contribuir para a mudança efetiva e que os serviços de apoio externo, a consultoria ou o acompanhamento são fatores potenciadores da melhoria. A implementação do Programa Mais Sucesso Escolar - TurmaMais (PMSE-TM) nas escolas é acompanhada por equipas de docentes que disponibilizam apoio científico e pedagógico em áreas consideradas

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prioritárias para garantir que as escolas alcancem as metas de sucesso contratualizadas com o Ministério da Educação.

o projeto TurmaMais tem sido acompanhado de forma sistemática por duas equipas externas com funções distintas mas complementares e articuladas que, através de diversas modalidades de apoio (técnico-pedagógico e científico), contribuem para o desenvolvimento de competências e de capacidades internas geradoras de mudança. Este acompanhamento decorre de forma contextualizada próxima, regular e horizontal, num processo de construção da mudança “nos” e “com” os professores, tendo em conta as necessidades, a autonomia e a maturidade organizacional de cada escola.

o acompanhamento/apoio técnico-pedagógico é assegurado por dois professores com um conhecimento aprofundado do projeto, com origem na escola onde este foi criado, a Escola Secundária Rainha Santa Isabel de Estremoz. Esta proximidade tem sido fundamental pois os professores podem partilhar problemas, e em conjunto encontrar soluções para a melhoria organizacional de cada escola. Esta equipa desenvolve duas modalidades de acompanhamento/apoio: presencial e à distância. o acompanhamento/ apoio presencial concretiza-se em reuniões ordinárias (com o diretor, os coordenadores do projeto na escola e os professores) realizadas em todas as escolas, ao longo do ano letivo (geralmente duas por ano); reuniões extraordinárias nas escolas que revelam dificuldades em atingirem as metam contratualizadas e cinco reuniões de encerramento do ano letivo que reúnem as escolas de cada uma das Direções regionais de Educação. os temas debatidos nas reuniões ordinárias são diversos, procuram sempre ir ao encontro das necessidades das escolas, numa lógica de criar desafios e de promover o debate para que cada escola trilhe os seus próprios caminhos em função da sua realidade concreta.

As reuniões regionais de final de ano promovem o benchmarking, servem para as escolas fazerem o balanço do ano, partilhar materiais e

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experiências e para debater propostas de trabalho a desenvolver no ano letivo seguinte.

o acompanhamento à distância é realizado por e-mail, telefone e envio regular de cartas com recomendações, sugestões e palavras de incentivo. Estas cartas são, na opinião das escolas, um elemento importante no apoio e acompanhamento, constituem um estímulo ao trabalho dos docentes, ajudam a alimentar o debate e a reflexão iniciada nas reuniões ordinárias.

o Acompanhamento Científico é da responsabilidade de uma equipa de professores/investigadores do Centro de Investigação em Educação e Psicologia da Universidade de Évora (CIEP-UE). A sinergia entre esta equipa e a equipa que apoia as escolas no terreno permite o desenvolvimento de um trabalho centrado nas reais necessidades dos professores do PTM. No âmbito do acompanhamento/apoio científico são desenvolvidas diversas ações: realização de eventos científicos (seminários nacionais e encontros regionais) com o objetivo de criar momentos de debate, reflexão e partilha entre professores e entre estes e especialistas de reconhecido mérito em áreas significativas para o PTM; dinamização de formação em áreas consideradas prioritárias pelos professores, de que são exemplos: 1) a avaliação na lógica do ciclo de estudos, a monitorização de resultados e a definição de metas de sucesso; 2) a avaliação formativa; 3) o trabalho colaborativo entre os docentes e a reflexão partilhada sobre a prática; 4) o envolvimento das famílias no percurso escolar dos educandos; 5) a diferenciação pedagógica.

ÁREAs DE INtERVENÇÃO DO PROJEtO tURmAmAIs E ImPACtO NAs EsCOLAs

Para uma melhor compreensão das áreas de intervenção do PTM e do impacto nas escolas, recorremos aos testemunhos de diversos atores

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organizacionais. O melhor reconhecimento do trabalho desenvolvido pelas equipas de acompanhamento/apoio é o que nos chega através dos testemunhos de quem diariamente vivencia nas escolas o Projeto TurmaMais. São essas vozes que nos fazem acreditar que este projeto está a fazer uma “revolução” silenciosa nas escolas, está a romper com práticas rotineiras e a fazer emergir novas dinâmicas de trabalho.

Foi no sentido de se criar uma profunda reflexão no interior das escolas com o Projeto TurmaMais, sobre o modo como se poderia operacionalizar a avaliação segundo a lógica do ciclo de estudos, que estas foram incentivadas a desenvolver processos sistemáticos de monitorização das aprendizagens dos alunos. Esta era uma necessidade que se impunha às escolas com o PTM que contratualizaram com o Ministério da Educação taxas crescentes de sucesso escolar (Fialho, 2012). o uso sistemático da monitorização de resultados tem-se traduzido na introdução de uma lógica de análise de progressão controlada por ciclo de estudos, diferente da lógica que tem como mero fim a retenção ou progressão do aluno, no final do ano letivo (Favinha, Silvestre & Magro-C, 2011).

A monitorização sistemática é reconhecida por diversos investigadores como um dos fatores de eficácia com maior impacto nos resultados escolares dos alunos. Com efeito, a monitorização constante das dificuldades e necessidades que os alunos manifestam ao longo do seu percurso escolar evita o impacto cumulativo de acontecimentos negativos resultantes da não satisfação dessas necessidades e/ou não superação dessas dificuldades. A contratualização das metas de sucesso, se por um lado responsabiliza as escolas pela prestação de contas, por outro, focaliza as escolas em objetivos concretos, gerando no seu interior dinâmicas mobilizadoras de práticas inovadoras, capazes de gerar atitudes positivas dos professores em relação aos alunos e expectativas elevadas relativamente às suas capacidades de aprendizagem, provocando ganhos em termos de rendimento escolar (Fialho, 2012). São vários os testemunhos de professores que dão conta do

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modo com as escolas se foram apropriando destes pressupostos:

“(…) no final do terceiro período, deu-se um “terramoto pedagógico”, com a chegada de uma das mais pertinentes “cartas à escola”,(…) sobre a importância da monitorização dos resultados e da avaliação à luz da lógica de ciclo. A esta distância, pensamos que esta carta constituiu um momento de viragem, um ponto de não retorno, em relação à forma como a maior parte do corpo docente encarava a avaliação no final do ano letivo e, em consequência, a retenção ou transição dos alunos. As “ondas de choque” prolongar-se-iam no ano seguinte…

(…) a monitorização dos resultados escolares permite aos professores, alunos e encarregados de educação acompanharem melhor o nível das aprendizagens realizadas e por realizar, sabermos onde estamos e onde queremos chegar, numa perspetiva de avaliação continuada, à luz da lógica de avaliação de ciclo.

(…) decidimos estender algumas das práticas pedagógicas, nomeadamente, a monitorização dos resultados escolares, a todos os anos do 3º ciclo e, a título experimental, a duas turmas do 2º ciclo.

(…) discutimos nos órgãos e estruturas de gestão pedagógica as metas de sucesso a alcançar (no âmbito do PMSE-TM e do 20/15), confrontando com os resultados estabelecidos.” (Campos, Lisboa & Lamela, 2011)

Num outro testemunho, Lemos, Cartaxo e Gomes (2011) sublinham o papel da monitorização mas também das metas de sucesso, enquanto estratégias de responsabilização e compromisso:

“(…) foram, então, desencadeados processos de monitorização dos resultados escolares dos alunos que permitiram uma análise sistemática dos mesmos e uma intervenção atempada.

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Procedeu-se, assim, à recolha regular de dados quantitativos relativos ao desempenho de cada aluno nas diversas disciplinas, fez-se a sua análise e estabeleceram-se, com os próprios alunos, metas para o sucesso, responsabilizando-os pela melhoria dos seus resultados.”

Ao longo do Projeto, a avaliação formativa surge de forma recorrente como uma área de intervenção prioritária, que exige reconceptualização de práticas de avaliação no sentido de conduzir à apropriação de uma “avaliação formativa alternativa” (Fernandes, 2011), intrinsecamente articulada com os processos de aprendizagem e de ensino, utilizada de forma deliberada, sistemática e contínua, recorrendo a uma diversidade de processos de recolha de informação, em que os alunos são chamados a participar, nomeadamente através da autoavaliação; os professores distribuem regularmente feedback a todos os alunos e o seu poder de avaliar é partilhado com outros intervenientes. os testemunhos seguintes constituem exemplos desta mudança paradigmática na avaliação das aprendizagens em sala de aula - Uma das práticas que evoluiu com o Projeto TurmaMais foi a criação e utilização de instrumentos de trabalho, desenvolvidos no âmbito de uma avaliação formativa, orientados para ajudar o aluno a participar na sua avaliação e a melhorar as suas aprendizagens. (Lemos, Cartaxo & Gomes, 2011); a chamada de atenção para a realização de tarefas de caráter formativo, que permitam ao professor orientar e regular o processo ensino-aprendizagem, identificar dificuldades, corrigir e indicar um caminho a seguir, ou seja, intervir atempadamente (Campos, Lisboa & Lamela, 2011).

o trabalho colaborativo e a reflexão partilhada sobre a prática docente impõem a constituição de equipas educativas e o reforço das lideranças intermédias. Os conselhos de turma são espaço privilegiado para o planeamento das atividades educativas de acordo com as características do grupo de alunos, reflexão sobre a prática e sobre os desempenhos e resultados dos alunos e resolução de problemas que emergem no dia-a-dia. o testemunho de Campos, Lisboa & Lamela (2011) reconhece a necessidade

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de constituição de equipas educativas que reforcem o trabalho colaborativo e que façam da análise e resolução dos problemas dos alunos o principal foco da sua ação. Duarte (2001) relata que a necessidade de melhoria dos resultados escolares, juntamente com a descoberta de novas perspetivas acerca da partilha da informação vieram, assim, despoletar uma atitude reflexiva sobre práticas. Também Lemos, Cartaxo & Gomes (2011) sublinham que a oportunidade de trabalhar em parceria pedagógica, (…) permitiu aos professores inovar, diversificar estratégias, monitorizar resultados e dar um apoio mais individualizado aos seus discentes, concorrendo para uma melhoria da qualidade do processo de ensino/ aprendizagem.

Outra das áreas de intervenção foi a promoção do envolvimento das famílias na vida escolar dos seus educandos. A investigação evidencia que o envolvimento dos pais favorece o sucesso escolar, sendo a cooperação escola-família, apontada como um dos fatores das escolas eficazes (Hallinger & Murphy, 1986). os testemunhos seguintes evidenciam a consciencialização desta necessidade: quando incentivados a participar de forma ativa os pais fazem-no de forma tão mais empenhada quanto mais concretos forem os objetivos a atingir (Vasconcelos, Freitas e Teixeira, 2011); a partilha da informação contribui para a aproximação entre alunos, professores e pais, corresponsabilizando-os relativamente aos resultados escolares e permitindo a todos dar o seu contributo para a tão desejada melhoria das aprendizagens (Duarte, 2011).

A escola confronta-se com a necessidade de se reorganizar para vencer o desafio de acolher todas as crianças e jovens, desenvolver o currículo nacional e assegurar a diferenciação pedagógica (Formosinho & Machado, 2011). A diferenciação pedagógica requer a utilização de práticas educativas flexíveis proporcionando a “todos os alunos um ensino de qualidade, dinâmico e útil” (Correia, 2005, p. 41), atendendo às suas características, interesses e estilos de aprendizagem. A este propósito, Duarte (2011) dá-nos um testemunho interessante, que começa:

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“Era uma vez uma escola igual a tantas outras, onde os alunos eram todos diferentes e as aulas eram todas iguais. (…) Porém, um dia, nessa escola, os professores decidiram que, se os alunos eram todos diferentes, as aulas não podiam continuar a ser todas iguais.

(…) o simples facto de existir um espaço onde pudéssemos diversificar as estratégias e onde o ensino pudesse ser mais individualizado e adequado ao perfil dos alunos parecia ser a solução por que todos ansiávamos.”

Lemos, Cartaxo e Gomes (2011) sublinham que a oportunidade de trabalhar em parceria pedagógica, de lecionar em grupos de alunos com níveis de desempenho equivalentes e de ter um número reduzido de alunos por turma permitiu aos professores inovar, diversificar estratégias, monitorizar resultados e dar um apoio mais individualizado aos seus discentes, concorrendo para uma melhoria da qualidade do processo de ensino/aprendizagem.

REfLEXÃO fINAL

É nossa convicção que as mudanças educativas que visam ter incidência real na vida da escola, terão de ser geradas a partir do seu interior. As equipas de acompanhamento/apoio têm desenvolvido a sua ação no sentido de capacitar as escolas para a mudança e melhoria, incidindo nas dimensões organizacional e pedagógica com o objetivo de implicar os professores na (re)construção de uma nova cultura de escola, sustentada na análise reflexiva dos processos de organização e gestão e das práticas em sala de aula.

o clima de proximidade entre as escolas e as equipas de apoio, a abertura e disponibilidade, a vontade das escolas em experienciar novas formas organizacionais e pedagógicas têm sido o motor das mudanças

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na cultura da escola, visíveis no crescimento das taxas de sucesso e na diminuição do abandono escolar. os professores que participaram no Projeto TurmaMais reconhecem essas mudanças: o Projeto cumpriu a sua missão, tendo-se tornado aquilo que todos os projetos devem ser, um exemplo de boas práticas. Temos a esperança de poder contribuir, com a nossa experiência (…), para que outros tenham sucesso. Criando ambição onde existia resignação. (Chico e Saúde, 2011). Independentemente dos resultados finais, da obtenção ou não da meta contratualizada, acreditamos que o PMSE-TM trouxe mais-valias para o futuro que são irreversíveis (Campos, Lisboa & Lamela, 2011). o Projeto TurmaMais tem sido um grande desafio para os professores, implicando muito empenho e alterações na sua prática profissional (Lemos, Cartaxo & Gomes).

Todos os testemunhos apresentados são importantes indicadores de impacto do Projeto TurmaMais que configuram processos de melhoria estimulados e apoiados pelas equipas de acompanhamento, são o resultado de um percurso que as escolas têm vindo a fazer, com mais ou menos sucesso, com mais ou menos resistências, não são acontecimentos pontuais mas antes fruto de uma grande caminhada.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

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Chico, P. & Saúde, I. (2011). Criando ambição. Agrupamento de

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Fialho, I. (2012). Projeto TurmaMais, do insucesso escolar à eficácia e melhoria das escolas. In L. L. Santos et al. (orgs.). X Colóquio sobre questões curriculares & VI Colóquio luso-brasileiro de currículo. Desafios contemporâneos no campo do currículo. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais. [ISBn: 978-85-80007-053-8]

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Formosinho, J. & Machado, J. (2012). Autonomia da escola, organização pedagógica e equipas educativas. In I. Fialho & J. Verdasca

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Supervisão Pedagógica

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Lemos, I.; Cartaxo, M. J. & Gomes, n. (2012). AprenderMais com a TurmaMais – Agrupamento de Escolas Lima de Freitas – Setúbal. In I. Fialho & J. Verdasca (orgs.). TurmaMais e Sucesso Escolar: fragmentos de um percurso, pp. 125-136. Évora: Universidade de Évora.

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sUPERVIsÃO DO EstÁGIO NA fORmAÇÃO DE fUtUROs PROfEssOREs NO ENsINO sECUNDÁRIO CABO-VERDIANO

aIsabel Salomé de Lima; bAna Isabel Andrade; cNilza Costa

aEscola Secundária Abílio Duarte; bcUniversidade de Aveiro

[email protected]; [email protected]; [email protected]

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Supervisão Pedagógica

REsUmO

O Estágio Pedagógico é a parte do processo de formação do futuro professor, com início no contexto real da prática profissional docente. Trata-se de uma fase em que a supervisão ocupa o epicentro do processo formativo, ou seja, traduz-se em um momento importante de acompanhamento, orientação e reflexão que, permitindo dotar o formando de competências necessárias ao seu desenvolvimento pessoal e profissional, capacita-o para enfrentar com sucesso os desafios inerentes aos contextos educativos da actualidade, os quais decorrem das exigências colocadas pela sociedade contemporânea, em constante transformação. Entre os diversos e mais importantes factores condicionantes do sucesso do Estágio Pedagógico, destaca-se a forma como o mesmo se encontra estruturado e organizado. Através deste artigo, inserido num projecto mais vasto de doutoramento em Didáctica e Formação área da Supervisão da Universidade de Aveiro, pretende-se apresentar os resultados de um questionário aplicado a 10 supervisores e um outro a 19 orientadores de Estágio Pedagógico dos cursos de História, Filosofia e Geografia dos anos lectivos 2007 a 2010, no Ensino Secundário cabo-verdiano. A partir da análise dos dados de caracterização da organização e do funcionamento do Estágio Pedagógico, procura-se identificar e debater propostas que visem contribuir para a sua melhoria, tendo em atenção as recomendações constantes da literatura especializada, sem prejuízo da sua adequação à realidade do país.

Palavras-chave: formação inicial de professores; estágio pedagógico; supervisão.

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RésUmé

Le Stage Pédagogique est la partie du processus de formation du futur professeur, qui a lieu dans le contexte réel de la pratique professionnelle de l’enseignant Il s’agît d’une phase dans laquelle la supervision occupe le centre du processus de la formation. C’est-à-dire qu’il constitue un moment important d’accompagnement, d’orientation et de réflexion, permettant au futur professeur d’acquérir les compétences nécessaires à son développement personnel et professionnel, en le rendant capable d’affronter avec succès les défis inhérents aux contextes éducatifs actuels, lesquels découlent des exigences de la société contemporaine qui se trouve en transformation constante. Parmi les plus divers et plus importants facteurs qui conditionnent son succès, il faut souligner la manière dont le Stage Pédagogique se trouve structuré et organisé. Avec cette communication, intégrée dans un projet plus vaste et insérée dans le cadre du programme de formation doctorale en Didactique et Formation, section de la Supervision de l’Université d’Aveiro, on voudrait présenter les résultats d’un questionnaire appliqué à 10 superviseurs scientifiques et à 19 superviseurs du Stage Pédagogique des formations en Histoire, Philosophie et Géographie des années scolaires de 2007 à 2010 dans l’enseignement secondaire capverdien. À partir de l’analyse des données de caractérisation de l’organisation et du fonctionnement du Stage Pédagogique, on cherche à identifier et à débattre les propositions qui contribuent à son amélioration, en tenant en compte des recommandations constantes de la littérature spécialisée, sans porte préjudice à son adéquation à la réalité du pays.

mots clés: formation de professeurs; stage pédagogique; supervision.

ENQUADRAmENtO tEÓRICO

no actual mundo dinâmico e impulsivo, é patente a inquietação,

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Supervisão Pedagógica

um pouco por todo o lado, relativamente à problemática da qualidade educacional, com particular enfoque na qualidade do processo de ensino/aprendizagem em que o ofício do professor se traduz no alargamento de novas responsabilidades e na assunção de papéis diferenciados.

Como escreve Hargreaves (1998), estamos num período em que “filosófica e ideologicamente, os avanços nas telecomunicações, a par da disseminação mais rápida e mais lata da informação, estão a fazer com que as velhas certezas ideológicas percam reputação” (p. 10). Tal afirmação pressupõe que a formação de professores habilitados a responder às novas exigências da profissão em cenários do imprevisível e da ambiguidade exige uma formação ao longo da vida, devendo sair da instituição formadora motivados para a “aprendizagem contínua, confiantes nas suas capacidades e, com ajuda adequada, capazes de estabelecer e conseguir atingir as suas próprias metas de aprendizagem” (Eraut, 2005, p. 10).

Assim, a formação inicial de professores é vista como “início, institucionalmente enquadrado e formal, de um processo de preparação e desenvolvimento da pessoa, em ordem ao desempenho e realização profissional numa escola ao serviço de uma sociedade historicamente situada” (Estrela, 2002, p. 18). nesta óptica, percebe-se que esta etapa de formação prepara o professor apenas para a entrada na profissão. Tal como se lê no relatório da Unesco sobre a Educação para o Século XXI, nenhuma formação basta para toda a vida, pois a permanente transformação da sociedade actual exige uma continuada mudança de saberes (Delors, et al., 2005).

Perrenoud (1993), nesta perspectiva, sublinha que “a formação deixou de ser normalizada” e que “já não pretende dar resposta certa para cada situação-tipo, mas sim, dar recursos com vista a analisar e a enfrentar uma grande variedade de situações”.

Neste âmbito, o estágio pedagógico (EP), na formação do professor, tem sido encarado como um espaço-tempo decisivo, devidamente

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articulado com a escola onde se realiza e a instituição superior que o organiza, constituindo-se num processo fundamental na construção das bases essenciais ao desenvolvimento pessoal e profissional do formando (Formosinho, 2009), de modo a que possam estar preparados para lidar com os problemas da docência hoje.

A supervisão na formação deve ser entendida como sendo “um processo em que um professor, em princípio mais experiente e mais informado, orienta um outro professor ou candidato a professor no seu desenvolvimento humano e profissional” (Alarcão e Tavares, 2007, p. 16). Depreende-se desta asserção que a acção supervisiva ocorre num tempo continuado, o que justifica a sua definição como processo, tendo ainda como objectivo o desenvolvimento humano e profissional do professor, por um lado, e, por outro, situa-se no âmbito da orientação de uma acção profissional, o que justifica também a sua designação de orientação da prática pedagógica.

Aos supervisores/orientadores é, assim, exigida a capacidade de passar do nível da observação da realidade para a sua compreensão mais profunda, o que pressupõe serem profissionais capazes de valorizar as tentativas de aprendizagem, mesmo que tendencialmente erróneas do futuro professor, e pô-las ao serviço do seu desenvolvimento, incentivando a reflexão na e sobre a sua acção (Alarcão 1996). Porque só assim os professores poderão corrigir, melhorar as suas práticas, promover o sucesso educativo dos seus alunos e do seu próprio sucesso profissional. Estes tornar-se-ão nesta linha, “agente de mudança de si próprio, dos outros e da sociedade” (Amaral, Moreira & ribeiro, 1996, p. 94). A supervisão do EP deve, nesta linha, processar-se num clima de mútua colaboração e ajuda entre os vários actores envolvidos, de modo a que se desenrole com base numa atitude de permanente diálogo. nesta linha, Alarcão e Tavares (2007) pressupõem profissionais qualificados, para garantia de uma formação sustentada e de qualidade.

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Supervisão Pedagógica

PROCEDImENtOs NA RECOLhA E tRAtAmENtO DOs DADOs

neste texto, delineamos os seguintes objectivos: a)caracterizar a organização e o funcionamento do estágio pedagógico na formação dos futuros professores para o ES cabo-verdiano; b) referenciar as necessidades de melhoria da organização e do funcionamento do estágio pedagógico; c) sugerir propostas de melhoria à luz dos resultados de investigação concernentes à problemática da formação de professores, sem prejuízo da sua adequação à realidade do país.

Para atingir esses objectivos, recorremos a dados sobre a organização e funcionamento do EP de um questionário dirigido a 10 supervisores e um outro a 19 orientadores que supervisionaram o Estágio Pedagógico dos cursos de Geografia, História e Filosofia referentes aos anos lectivos de 2007 – 2010.

Para análise e tratamento dos dados contidos nos questionários recorreu-se ao programa de análise de conteúdo WebQDA (Souza, F., et al 2011), para às questões abertas, e o programa estatística SPSS (Maroco, 2003), para as questões fechadas.

APREsENtAÇÃO DOs REsULtADOs

os dados revelaram que os supervisores são licenciados na área de ensino. Em termos de formação pós-graduada, apenas um estava a frequentar o doutoramento, mas 70,0% detinha o grau de mestrado; 20,0% estava ainda a frequentar esse nível e os restantes conservavam o grau de licenciatura. Contudo, importa referir que as formações pós-graduadas e as em curso nada têm a ver com áreas de especialização do ramo de ensino e/ou de educação. Em relação aos orientadores, todos possuíam o grau de licenciatura, se bem que a formação de um deles não correspondesse à área na qual orientou o estágio. no que concerne à pós-graduação, apenas

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um orientador se encontrava a frequentar o curso de mestrado, igualmente sem qualquer ligação com a área de ensino e/ou educação.

Tanto os supervisores como os orientadores afirmaram que antes do exercício das funções de supervisão já haviam exercido outras, sobretudo ao nível do Ensino Secundário. outra coincidência tem a ver com o percurso profissional em que, pelos dados analisados, os elementos de ambos os grupos, antes de exerceram as funções de supervisão, na sua maioria, tinham lecionado nos diferentes níveis de ensino em Cabo Verde, com maior destaque no secundário.

No exercício das funções de supervisão, 50,0% dos supervisores afirmou ter um ano de experiência; 20,0% cinco anos; 10,0% menos de um ano, enquanto que os restantes, na razão de 10,0% não responderam à questão. Verificou-se ainda que 52.6% dos orientadores possuía apenas um ano de experiência; 36,8% dois anos, enquanto que 5,3% apresentava três anos e os restantes (5,3%) cinco anos.

Em relação ao arranque do estágio, verificou-se que tanto os supervisores como os orientadores iniciaram essa fase no primeiro semestre relativo aos anos lectivos 2007 a 2010, conforme previsto no regulamento de Estágio (rE) então em vigor, se bem que em datas diferentes, já que 50,0% dos supervisores respondeu ter iniciado o estágio no primeiro trimestre e os restantes no início do segundo trimestre. Dos orientadores, 42,1% afirmou ter iniciado o seu estágio no primeiro trimestre e 57,9% no início do segundo trimestre.

Pode-se aferir que, na maioria dos casos, a duração do estágio não correspondeu ao tempo estabelecido no regulamento então vigente (duração de um ano letivo). Esta constatação foi confirmada com as respostas dos supervisores, porquanto, 70,0%, respondeu que o mesmo durou seis meses; 20,0%, oito meses e 10,0%, sete meses. no que concerne aos orientadores, 5,3%, respondeu que durou três meses, 52,6% seis meses, 5,3% oito meses e 36,8% nove meses.

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Supervisão Pedagógica

Tendo sido questionados quanto à suficiência do período de tempo disponível para a formação dos estagiários, 70% dos supervisores respondeu que sim e 30%, respondeu que não. Já em relação aos orientadores, 52,6% respondeu que sim, 26,3%, disse não e 21,1% não respondeu. Desafiados a justificar as suas opiniões, conseguimos registar um número bastante significativo de respostas. Da análise dessas respostas, tanto em relação às matrizes de respostas afirmativas quanto negativas, é possível identificar duas opiniões de natureza distinta no tocante ao tempo disponível à formação dos estagiários.

Dos que responderam afirmativamente, viu-se que alguns acreditavam na exequibilidade desse tempo, sob a condição de o estágio se realizar logo no princípio do ano lectivo (supervisor); ou seja, o estágio deve decorrer durante o ano lectivo completo e de preferência, com cada estagiário numa turma (orientador). nessa mesma categoria houve quem acredita que seis meses seria o tempo mais do que suficiente, argumentando que quem em seis meses não mostrar qualidades nem competências para leccionar, dificilmente as mostrará em mais tempo. (orientador); na medida em que um estagiário empenhado, consegue em 6 meses de trabalho sair com um conhecimento científico-pedagógico mínimo que lhe ajudará no exercício da sua futura função (supervisor).

na opinião dos que integram as matrizes de respostas negativas, um trimestre constitui um lapso de tempo bastante exíguo para a adaptação do estagiário à nova realidade (supervisor); pois, os alunos vêm sem experiência, por isso é necessário tempo suficiente para adaptarem à realidade da profissão (orientador). outrossim, consideraram seis meses um período de tempo insuficiente para colmatar todos os constrangimentos eventualmente surgidos na decorrência dessa actividade, pelo que o estágio deveria ter a duração de um ano (supervisor); sendo que um semestre traz muitas limitações no sentido de apoiar os estagiários que precisam de um maior acompanhamento a fim de colmatar as suas necessidades.

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(orientador).

quanto ao número de núcleos por supervisores, os dados permitiram-nos aferir que 80,0% dos inquiridos trabalharam cada um com dois núcleos e 20,0% com três, o que, de certa forma se harmoniza com o rE da época: um máximo de três núcleos por cada supervisor.

no tocante ao número de estagiários por núcleo, é de realçar que cada orientador não poderia ter a seu cargo mais do que cinco estagiários, conforme o RE então em vigor. Porém, excepcionalmente, esse número poderia ser elevado para oito, mediante acordo entre a Direção-geral do Ensino e a instituição de formação, de acordo com o Dec. Lei nº23/96. Desta forma, o número de estagiários por núcleo estaria conforme o estabelecido no rE, sendo que: 80,0% dos supervisores dispunha de núcleos de cinco estagiários; 10,0% com quatro e 10,0% com sete. quanto aos orientadores, 57,9% dispunha de núcleos com cinco estagiários, 26% com quatro e 15,8% com seis.

Em relação ao número de turmas por núcleo, 30,0% dos supervisores respondeu que os núcleos eram constituídos por seis turmas; 20,0%, por cinco; 10,0%, por quatro; 10,0%, por três e 10,0%, por uma. quanto aos orientadores, 36,8%, respondeu que o núcleo possuía duas turmas, 31,6%, três, 26,3%, cinco e 5,3%, por uma, com afectação direta nos números de aulas, que oscilam entre 15 a 33 por cada estagiário.

Aos supervisores pediu-se ainda opinião sobre quantas vezes um supervisor devia ir à escola onde decorre o estágio, tendo a análise dos dados demonstrado que 70,0% respondeu quantas vezes forem necessárias; 20,0% duas vezes por semana e 10,0% sempre que possível.

As opiniões apresentadas a fim de justificarem as suas respostas são divergentes e, para as analisar, criamos duas categorias: a) revela conhecimento de suas funções enquanto supervisores; b) não revela conhecimento de suas funções enquanto supervisores.

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Supervisão Pedagógica

na primeira categoria, foram incluídas as matrizes em que os inqueridos dão a entender conhecimento muito próximo daquilo que estipula o rE então em vigor, no que tange à forma de actuação do supervisor, por exemplo: As visitas devem ser ajustadas de acordo com as necessidades de cada estagiário e de questões muito específicas que aparecem ao longo do processo; nessa mesma categoria inclui-se uma matriz um pouco diferente, segundo a qual, para além de supervisor o docente lecciona outra cadeira e, assim, o tempo fica limitado para as actividades do estágio. Este supervisor deixa uma opinião muito clara sobre o assunto, ao demonstrar conhecimento de suas funções. Contudo, relativamente às outras funções anteriormente assumidas na instituição, aliadas às novas surgidas posteriormente aquando da realização do estágio, o mesmo qualifica como um factor do incumprimento daquilo que é estabelecido no rE em vigor. na segunda categoria, foram incluídas as matrizes em que os inquiridos evidenciam desconhecer as funções do supervisor no RE, então em vigor, por exemplo: Estando o estagiário sob a responsabilidade do orientador, o supervisor deve ir de vez enquanto.

Sobre a participação dos supervisores em reuniões de planificação do EP, verificou-se pela análise dos dados que 60% participava; e 40% não participava.

quanto ao número de aulas dos estagiários assistidas pelos supervisores, 31,6% dos orientadores afirmou que o supervisor assistiu 10 a 13 aulas de cada estagiário;21% 2 a 5 aulas, igualmente 21% 6 a 9 aulas e 15, 8% com menor ou igual a 16 aulas.

Ante este cenário, parece haver uma discrepância entre o exercício prático da supervisão do estágio, no terreno, e aquilo que o então rE estabelecia, segundo o qual, o supervisor devia observar as aulas de cada estagiário em número mínimo de 15, com vista à recolha de informações relativamente aos objectivos traçados nos encontros de pré-observação.

Em relação à formação específica para exercer a função de

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supervisor, pela análise dos dados 90,0% respondeu não ter tido qualquer tipo de preparação para o efeito. Só um respondeu possuir tal formação, apontando o próprio estágio pedagógico efetuado aquando da licenciatura como competência para o exercício da mesma função. Dos orientadores 89,5% respondeu não ter tido qualquer formação específica. Apenas 10,5% respondeu que sim, referenciando a sua formação em ensino.

CONCLUsÃO

os resultados a que chegamos no contexto deste estudo, elucidam-nos, com a relativa clareza, que os inquiridos são conhecedores da realidade dos contextos onde os estágios eram realizados.

Contudo, os resultados desafiam-nos a repensar o programa de organização e funcionamento das actividades do estágio. Com efeito pode-se concluir pela situação de alguma perturbação da boa operacionalização do processo de estágio marcado por uma duração insuficiente, tendo havido mesmo casos de uso inferior a 50% do tempo estabelecido no RE, então em vigor .

Também, parece haver um relativo desconhecimento daquilo que é, à luz do pensamento actual, a verdadeira função da supervisão na formação dos futuros professores. A Uni-CV deve desempenhar um importante papel na formação dos professores que já exercem as funções de supervisão/orientação, ou que desejam vir a exercê-las, designadamente através de workshops ou mesmo criação de cursos de pós-graduação na área de supervisão em prol da qualidade da formação dos professores.

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Supervisão Pedagógica

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Alarcão, I. (1996). reflexão crítica sobre o pensamento de D. Schön e os programas de formação de professores. In I. Alarcão (Ed.), Formação reflexiva de professores. Porto: Porto Editora.

Alarcão, I., & Tavares, J. (2007). Supervisão da prática pedagógica. Uma perspectiva de desenvolvimento (3ª edição ed.). Coimbra: Almedina.

Amaral, M. et al (1996). O papel do supervisor no desenvolvimento do professor reflexivo. Estratégia de supervisão. In I. Alarcão (Ed.) Formação reflexiva de professores (pp. 89-122). Porto: Porto Editora.

Delors, J. et al. (2005). Educação: Um tesouro a descobrir. relatório para a UNESCO da comissão internacional sobre educação para o Século XXI. (Vol. 9ª). rio Tinto: ASA.

Estrela, M. T. (2002). Modelos de formação de professores e seus pressupostos conceptuais. Revista de Educação, Vol. XI, 17-42.

Eraut, M. (2010). Prefácio. In C. Day (Ed.), Desenvolvimento profissional de professores. os desafios da aprendizagem permanente (pp. 7-14). Porto: Porto Editora.

Formosinho, J. (2009). A formação prática dos professores. Da prática docente na instituição de formação à prática pedagógica nas escolas. In Formação de professores. Aprendizagem profissional e acção docente (pp. 93-115). Porto: Porto Editora.

Hargreaves, A. (1998). os Professores em tempo de mudança: o Trabalho e a Cultura dos Professores na Idade Pós-moderna. Alfragide: McGraw-Hill.

Maroco, J. (2003). Análise estatísticas – Com a utilização do SPSS. Edições Sílabo.

Souza, F., et al (2011), “questionamento no processo de análise de

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dados qualitativos com apoio do software WebqDA”. EduSer: revista de educação, Inovação em Educação com TIC, Vol 3(1), pp 19-30 (ISSn: 1645-4774). (on-line) https://www.webqda.com/publicacoes (acesso14/07/2011)

DOCUmENtO LEGIsLAtIVO

Decreto Lei nº23/96 de 22 de Julho

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tiC nA eduCAção

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“INtERAÇÃO” Em AmBIENtEs VIRtUAIs DE ENsINO E APRENDIzAGEm: QUE mODELO DE INtERAÇÃO sERVE

mELhOR A fORmAÇÃO A DIstÂNCIA?

Maria da Luz Correia; Maria Luísa Inocêncio

Universidade de Cabo Verde

[email protected]; [email protected]

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REsUmO

No âmbito da monitorização de um curso do campus virtual da Uni-CV, iniciado em Março de 2013, o Núcleo de Apoio ao Ensino a Distância tem dado especial atenção às questões operativas das representações dos participantes sobre “interação” no ambiente virtual de ensino e aprendizagem. Os resultados da análise exploratória das declarações e das atuações de formadores e formandos seguem a tendência assinalada noutras investigações sobre modelos de formação de formadores e práticas de ensino em ambientes virtuais de ensino e aprendizagem. A análise das declarações - respostas a um questionário, apreciações e justificação de atuações em entrevista, registos eletrónicos de apreciações dos formandos - evidencia a polissemia do termo “interação” e a existência de concepções antagónicas de ensino e de aprendizagem vinculadas, por um lado, ao modelo de ensino transmissivo e, por outro lado, a um modelo de ensino baseado na concepção construtivista sociocultural do ensino e da aprendizagem. As conclusões do estudo exploratório serão um contributo para a requalificação pedagógica e tecnológica da equipa docente do curso.

Palavras-chave: interação; interatividade; modelo de ensino de orientação construtivista sociocultural; aprendizagem de qualidade.

RésUmé

Au cours d’un monitorage du champ virtuel de l’Université du Cap Vert, commencé en mars 2013, l’équipe de support à la Formation à Distance, est en train d’analyser des questions opératives des représentations que les participants ont sur « interaction » dans un milieu virtuel d’enseignement et d’apprentissage. Les résultats de l’analyse exploratoire des déclarations et des actuations des formateurs et des apprenants suivent la tendance

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identifiée chez d’autres investigations. L’analyse des déclarations – des réponses au questionnaire, des appréciations et des justifications de l’actuation (interviews), des enregistrements électroniques des appréciations des apprenants – met en évidence la polysémie du terme “interaction” et l’existence de conceptions antagoniques de l’enseignement et de l’apprentissage liées au modèle d’enseignement transmissif et à un modèle de l’enseignement basé sur une conception constructiviste socioculturel de l’enseignement et de l’apprentissage. Les conclusions de l’étude exploratoire seront un apport à la requalification pédagogique et technologique de l’équipe d’enseignants du cours.

mots-clés: interaction; interactivité; modèle d’enseignement d’orientation constructiviste socioculturel; apprentissage de qualité.

INtRODUÇÃO

O Núcleo de Apoio ao Ensino a Distância - NaEaD da Universidade de Cabo Verde partilha as conclusões de um estudo exploratório realizado no acompanhamento do primeiro -Curso de Complemento Pedagógico - CCPL da Licenciatura, em e-learning. As questões operativas das representações dos participantes sobre “interação” no processo de ensino e aprendizagem têm merecido especial atenção pelo potencial que representam na construção do modelo pedagógico institucional. A adopção de um modelo de e-learning parte de dois pressupostos: (i) os ambientes e-learning possibilitam novas formas de ensinar e aprender; e (ii) a adopção de uma concepção de ensino e aprendizagem sócio-construtivista melhora o potencial dos ambientes e-learning institucionais para multiplicarem o aprendido fora da formação. Compete ao docente a tarefa de conceber as actividades, acompanhar, orientar as discussões e definir as normas de participação (Moreira, Pedro e Santos, 2009).

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1. QUADRO tEÓRICO DE REfERÊNCIA

A interação e o envolvimento na construção colaborativa de conhecimento são elementos que têm vindo a destronar as estratégias de mero consumo ou transmissão de conteúdos distribuídos na Internet. A abordagem sócio-construtivista do conhecimento está a transformar as tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) em Tecnologias de Interação/Integração Cognitiva (Moreira, Pedro e Santos, 2009). Vários estudos (mencionados em Moreira, Pedro e Santos, 2009) destacam elementos como o controlo e a autonomia do aprendente no processo de aprendizagem, os elementos relacionados com a interação e mostram que a qualidade da interação é directamente responsável pelo aumento da motivação dos aprendentes.

Abordamos a questão das concepções dos docentes sobre interação recorrendo à tipologia de dimensões da atuação docente (Mercer, 1998: 84). As dimensões e atuações dos professores estão associadas a determinadas concepções sobre o papel do professor e do aluno. Seleccionámos um conjunto de quatro dimensões. A dimensão I - “a aprendizagem é um processo individual versus processo social e comunicativo”- permite interpretar a maneira como os professores justificam, por exemplo, a organização das actividades de aprendizagem em que os alunos trabalham juntos e partilham responsabilidades. A dimensão II - “o conhecimento deve ser transmitido pelo professor ou encontrado pelo aluno individual versus deve ser construído conjuntamente”- permite interpretar a maneira como os docentes justificam o uso de recapitulações e reformulações da informação apresentada pelos alunos. A dimensão IV - “completar a tarefa é prioritário versus o processo de aprendizagem é prioritário” -permite interpretar a justificação que o professor dá para interromper as actividades com a revisão dos progressos dos alunos, porque atribui uma importância fundamental à qualidade do processo de aprendizagem. Finalmente, a dimensão V - “aprender é uma responsabilidade do aluno versus pode ser estimulada

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pelo professor” - refere-se a atuações que consideram a utilização dos erros como elemento de uma estratégia de revisão do percurso de aprendizagem dos alunos para ajudá-los a reconstruir conhecimento.

A importância das interacções orientadas para o desenvolvimento de processos colaborativos em ambientes virtuais de aprendizagem para a promoção das actividades de participação, partilha e colaboração estão profundamente associadas aos contextos de aprendizagem (Dias, 2009). Na investigação sobre participação, entendida como interação entre colegas e o professor, destacamos que a participação tem um efeito positivo na percepção que os alunos formam da aprendizagem e na qualidade da avaliação das tarefas, e favorece a redução das taxas de reprovação (Hrastinski, 2008). o ensino, na epistemologia construtivista sociocultural, é um processo de adaptação da ajuda à medida das necessidades que o professor vai detectando (Coll, 2001, in Coll, Mauri e Onrubia, 2006). Um dos principais elementos da ajuda consiste em guiar o formando num duplo processo de construção: (i) a construção de significados sobre os novos conteúdos, com progressiva atribuição de sentido; e (ii) a construção de uma representação adequada das tarefas de aprendizagem (a interpretação que o formando faz das instruções da tarefa). Ambos os processos de construção têm avanços e recuos, pelo que o professor deve ir ajustando o grau e o tipo de ajuda (Coll, 2007).

2. mEtODOLOGIA

no quadro teórico exposto, a unidade de análise é a actividade conjunta. Consideramos indicadores objectivos (registos electrónicos na plataforma Moodle) e indicadores subjectivos (as declarações dos estudantes relativas à actividade de ensino e aprendizagem na primeira metade do semestre 1 do curso). Foram considerados os indicadores electrónicos da atuação dos docentes.

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2.1. PERGUNtAs QUE ORIENtARAm A PEsQUIsA

O conteúdo das perguntas reporta-se ao período compreendido entre o início do curso, em 25 de Março, e o dia 31 de Maio.

Perguntas:(1) Como os estudantes descrevem a interação ocorrida durante a atividade nas quatro disciplinas?; (2) Como os estudantes apreciam a interação durante a atividade nas quatro disciplinas?; (3) Quais são os elementos que os estudantes explicitam sobre o que entendem por “interação” no CCPL?; (4) Quais são os indicadores electrónicos da interação na comunidade virtual de cada disciplina?; (5) Quais são os indicadores da interação exterior à atividade virtual?

2.2. ABORDAGEm mEtODOLÓGICA

A opção metodológica para o estudo de caso é qualitativa, com tratamento quantitativo sempre que o objectivo da investigação o justifique. Adopta-se uma perspectiva situada e da interatividade, bem como a perspectiva fenomenológica (elementos subjectivos das declarações dos participantes). A triangulação dos dados visa alcançar a convergência de duas ou mais fontes independentes (yin, 2006).

os 8 participantes (30%) são estudantes (E1,…, E8) do CCPL; 25%-homens e 75%-mulheres. o CCPL é o primeiro curso da iniciativa da UNI-CV realizado em e-learning; o semestre 1 tem quatro unidades curriculares e quatro docentes das disciplinas (“D1”, “D2”, “D3” e“D4”).

Instrumentos para a recolha de dados: (i) um questionário para os estudantes em formato electrónico e um guião para as entrevistas semi-estruturadas com três componentes -Parte A (tipo de interação com os outros participantes no CCPL); Parte B (interação do estudante com os recursos); e Parte C (grau de satisfação sobre a interação em cada

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disciplina). O guião das entrevistas aos estudantes visa recolher declarações complementares às respostas ao questionário. A recolha de dados decorreu no período compreendido entre 23 e 31 de Maio (questionários) e de 31 de Maio a 14 de Junho (entrevistas).

3. REsULtADOs

A apresentação dos resultados da recolha de dados segue as perguntas orientadoras (P).(P1) Na descrição da interação com os docentes, os estudantes pediram esclarecimentos: 37,5% a 50% sobre questões técnicas, via e-mail pessoal; 62,5% a 75% (D2, D4) sobre questões técnicas, via e-mail de estudante; 12,5% (D1) a 25% (D2, D3) ao formador sobre a disciplina (como fazer os trabalhos, prazos de entrega,…) via e-mail pessoal; 12,5% (D1) a 25% (D2, D3) ao formador sobre a disciplina (como fazer os trabalhos,…) via e-mail de estudante.

Os estudantes responderam a perguntas da Coordenação do NaEaD - 37,5% (D1), 12,5% (D3) -,do formador - 62,5% (D2, D3) - 50% (D1) e 37,5% (D4).

os estudantes tomaram a iniciativa de: comunicar com outro colega do CCPL sobre a atividade via e-mail pessoal e via e-mail de estudante: entre 12,5% e 25%.

(P2)Apreciação da interação com os docentes -Ex.: “o professor de (D1) é o que mais gera interação, envolve mais as pessoas” (E19); “A única experiência de interação é nos Fóruns de (D1), permite criar temas e faz muitos comentários, o que é bom” (E12); “os docentes que menos interagem com os alunos são de (D2) e de (D4). Este, por exemplo, não diz se os trabalhos estão bem” (E19); “A interacção com os docentes, à excepção da docente da disciplina (D1), não favoreceu tanto. Não houve grande interacção” (E7); “o professor de (D2) dá algum feedback e o de (D3) é o que

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menos reage aos trabalhos”; “na disciplina (D4) estou bastante insatisfeita, a interacção professor-aluno é praticamente nula”(E15); “na disciplina (D4) foi mais complicado. Escrevi-lhe um e-mail, mas nunca me respondeu. Tive que pedir ajuda à Directora do núcleo” (E18).

Interação com os colegas - Ex.: “a interacção entre colegas foi muito boa. Somos 5 colegas na Escola e aproveitamos para trocar e debater ideias, tiramos dúvidas umas às outras” (E7); “Em relação à interacção entre colegas, tive a sorte de trabalhar com colegas no mesmo local. Partilhamos dúvidas, questões” (E18); “A interacção com os colegas é muito pouca ou quase inexistente. Há alguma interacção com os colegas nos fóruns de (D1)” (E19).

Interação com os recursos do repositório em cada disciplina:

- Declarações descritivas: consultaram recursos do repositório do docente da disciplina: 100% (D1, D2); 87,5% (D3 e D4); descarregaram recursos do repositório criado pelo docente da disciplina: 87,5% (D1, D2); 75% (D3) e 62,5% (D4); consultaram recursos (vídeos, páginas web) exteriores à Moodle da Uni-CV, através de links: 50% (D1), 37,5% (D4) e 25% (D2).

- Declarações de apreciação. Ex.: “Ler textos e fazer trabalhos, ler, ler e fazer trabalhos. Sentiu-se que faltava qualquer coisa. Embora no que toca a (D1), o professor disponibilizou alguns vídeos” (E7); “os alunos fogem à leitura dos textos exigidos pelos professores porque têm preguiça” (E12); “Considero o material disponibilizado pelos docentes como ponto de partida para a realização de outras pesquisas. Estimula a busca e a investigação. Eu aprendi bastante, estou contente”(E18); “O professor de (D3) recorreu muito ao texto, é cansativo” (E18); “sinto que aprendo coisas novas, pois estes conteúdos incentivam-me a pesquisar mais e consequentemente acaba-se por aprender mais” (E19).

- Interação com as ferramentas Moodle. Ex.: “o problema dos alunos

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desde o início esteve ligado à inscrição nas disciplinas” (E1); “o pouco que sei descobri sozinha; tenho enviado trabalhos por e-mail. às vezes na minha página não aparece a opção submeter ficheiro” (E12).

(P3) Identificámos elementos da definição geral e de interação em situações concretas.

Definição - Ex.: “Interagir” é “contactar com os outros e com os colegas” (E15); “Interacção é dar e receber” (E19); “A interacção varia consoante a disciplina e a percepção de cada docente”(E18).

Interação no fórum virtual - Ex.: “Gostei do trabalho do resumo da nossa participação no fórum na disciplina (D1). o professor faz comentários às nossas contribuições, há realmente interacção” (E7); “novo tema é quando proponho um tema novo que me suscita alguma dúvida mas que está no âmbito das temáticas” (E19).

Interação na dimensão avaliação da aprendizagem: Ex.:“Devia haver avaliação dos trabalhos, não se sabe se estamos a corresponder às expectativas” (E17); “qualquer aluno precisa de feedback para melhorar e eu quero aprender” (E12); “o retorno dos docentes, à excepção de (D1), é muito pouco” (E19); (e-mail) “(D1) agradecida pela crítica construtiva sobre o meu trabalho”(E12).

Mudanças na interação de docentes - Ex.: “o professor de (D4) dá feedback aos trabalhos, mas antes não dava. Será que fizeram alguma reunião chamando a atenção dos professores?” (E19); “o professor de (D4) apenas atribui classificação aos trabalhos, sem qualquer comentário. E fez isto só ultimamente. Devia haver avaliação dos trabalhos para saber se estamos a corresponder às expectativas”(E7).

(P4) no fórum virtual das disciplinas (D2) e (D3) participaram apenas estudantes e no fórum da disciplina (D4) não se registou qualquer participação. no fórum da disciplina (D1) registaram-se 146 respostas, tendo o docente realizado a abertura do fórum, com normas de participação; os

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TIC na Educação

estudantes iniciaram 72,72% dos temas e contribuíram com 52,73% de respostas.

(P5)os indicadores identificados enquadram-se em duas subcategorias da interação exterior à atividade virtual. (i) interação com colegas de profissão (docentes) para preparar a participação nas atividades virtuais de aprendizagem (Ex.:“Existe interacção com as três colegas” (E12); (ii) interação prevista para favorecer a aprendizagem dos alunos próprios na escola (Ex.: “Professor (D1), Achei excelente a sua sugestão, será possível ultrapassar certas dificuldades e motivar o aluno” (E7).

5. DIsCUssÃO E CONCLUsÕEs

A representação de “interação” pelos estudantes incide em “dar e receber”. As apreciações das formas concretas de interação e de atuação docente são relacionadas com o feedback para aprender. Dimensões da interação identificadas: (i) a dimensão interação no ambiente virtual da formação entre docente-estudante-conteúdo de aprendizagem; (ii) a dimensão interação no exterior, preparatória da atividade virtual (aprendizagem entre estudantes); (iii) a dimensão interação na formação virtual projectada para a interação na atividade profissional (escola), quando o estudante-professor transfere as suas aprendizagens para favorecer a aprendizagem dos seus alunos. As dimensões (ii) e (iii) parecem ter boas potencialidades para expandir a influência educativa em contextos exteriores ao contexto virtual da formação. Estes resultados contribuem para repensar os modelos de avaliação online de duas formas: focalizando os feedbacks dos docentes às atividades dos formandos para promover aprendizagens significativas e redireccionando o foco para as práticas de ensino que favorecem interacções em que os formandos são co-construtores de conhecimento.

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REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

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Hrastinski, S. (2008). What is online learner participation? A literature review.Computers & Education, 51, 1755-1765.

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NAtIVOs DIGItAIs: AtREVE-tE A EmPREENDER1

Karine P. de Souza; Bento Silva

Universidade do Minho

[email protected]; [email protected]

1 Este trabalho é financiado por Fundos nacionais através da FCT - Fundação para a Ciência e a Tecnologia no âmbito do projecto PEst-oE/CED/UI1661/2011 do CIEd.

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REsUmO

Este artigo pretende apresentar as caraterísticas da geração digital, chamada de geração de nativos digitais, abordando as tendências da sociedade em rede e da necessidade de formações empreendedoras por meio das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC). Apesar dessa nova cibercultura, em que jovens encontram uma nova forma de se expressar e criar, ainda existe uma grande carência de formações para que essas tecnologias ressoem novas práticas sociais. Para tanto, descrevemos um recorte do estudo da pesquisa de doutoramento, com uso de um recurso didático inovador, Projeto Agentes Digitais, ação sobre Empreendedorismo Digital, com atividades para o desenvolvimento de competências que visam o empreendedorismo e a integração de tecnologias educativas, que foi desenvolvido com Escola Secundária Carlos Amarante em Braga - Portugal. O estudo parte da compreensão teórica do mundo digital e da geração de nativos digitais para descrever um projeto sobre como educar nessa modernidade.

Palavras-chave: Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação – TDIC; empreendedorismo; nativos digitais.

ABstRACt

This article aims to present the characteristics of the digital generation, called a generation of digital natives, addressing the trends in network society and the need for entrepreneurial training by means of Digital information and Communication Technologies (TDIC). Despite this new cyberculture, in which young people are in this networked society a new way to express themselves and create, there is still a great lack of training for these new social practices reverberate technologies. To this end, we describe a snip

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TIC na Educação

of doctoral research study, using an innovative educational resource, design Digital Agents, action on Digital Entrepreneurship, with activities for the development of skills to entrepreneurship and the integration of educational technology, which was developed with high school Carlos Amarante in Braga-Portugal. The study of the theoretical understanding of the digital worl and the generation of digital natives to describe a project on how to educate this modernity.

Keywords: Digital information and Communication Technologies (TDIC); entrepreneurship; digital natives.

INtRODUÇÃO

Este texto busca uma compreensão da “Sociedade em Rede” (Castells, 2009) e as respetivas marcas comunicacionais do tempo que a identificam – conectividade, mobilidade e ubiquidade – (Santaella, 2010), incidindo a análise na geração que vive essa utopia de grande avanço tecnológico e na abordagem das competências necessárias para a formação dessa geração que apelidamos de nativos digitais, adotando a terminologia prenskiana (Prensky, 2001).

no entanto, quando pesquisamos sobre o estado do mundo digital, encontramos um grande fosso entre continentes, países e mesmo fortes divisões internas dentro de cada país. Apesar de ser um desejo manifesto da generalidade das populações que o direito à informação (acesso à Internet) fosse acrescentado à Carta dos Direitos Humanos, o fato é que dos 7 bilhões de habitantes do mundo em 2012, apenas 34,2% têm acesso Internet (World Internet Usage, 2012)1.

o desafio presente neste estudo é compreender quem é essa nova geração de nativos digitais e o que podemos fazer para apoiá-las com 1 Fonte: Internet World Stats (dados para 30 de junho de 2012) - http://www.internetworldstats.com/stats.htm

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formações que estejam adequadas ao tempo, para que possam atrever-se a empreender em suas comunidades. Para tal, num primeiro momento buscaremos fundamentação teórica sobre a geografia dos utilizadores da Internet e caraterísticas da geração digital, para, num segundo momento, apresentarmos um recorte do Projeto Agentes Digitais, e sua aplicação junto de jovens portugueses.

QUEm sÃO Os NAtIVOs DIGItAIs?

na tentativa de compreender a geração digital, alguns autores como Lafuente (2009), Maciel (2009) e Vee & Vraking (2009), apresentam-nos a dinâmica geracional desde o final da 2ª guerra mundial, apontando para a existência de quatro gerações, que representamos graficamente na figura 1.

figura 1 - Gerações Digitais

De acordo com os autores referidos, a geração dos “Baby Boomers” tem como caraterística principal a autoridade e a disciplina, muito marcada pelo acontecimento da 2ª. Guerra Mundial. A “geração X”, décadas de 60 e 70 do século XX, é marcada pelo contato com a globalização, o uso regular da televisão, o aumento do acesso a informação e diminuição do grau de disciplina e autoridade, fortemente influenciada pelo movimento da contracultura que grassou um pouco por todo o mundo, particularmente no mundo de cultura ocidental (simbolizada na expressão “make love, not war”). A terceira geração, denominada de y, é marcada pela integração do computador pessoal e da Internet no cotidiano dos jovens, ampliando a sua

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capacidade de inovar através da sua energia e desenvoltura com os avanços tecnológicos. A quarta geração surge na viragem do milénio (2000), face aos rápidos e grandes avanços tecnológicos, nomeadamente dos dispositivos da web 2.0 (blog, facebook, twiter, youtube…), e que é apelidada de “Homo zappiens” (Vee & Vraking, 2009). Estaríamos perante uma geração z que dispõe de uma vasta quantidade de recursos, sendo atraída pelo desafio das ferramentas da Web 2.0.

Esta divisão geracional não é estanque, nem quer dizer que todos os jovens nascidos em determinada etapa cronológica tenham essas caraterísticas geracionais, pois para isso, no que respeita às marcas digitais, seria necessário que tivessem acesso e convivessem (imersivamente) com as tecnologias e, como vimos, a exclusão digital ainda é muita elevada. Por outro lado, como o nosso foco não será a nomenclatura da geração (X, y ou z), utilizaremos a denominação mais ampla de nativos digitais, conforme faz Prensky (2001), para os que nasceram com a tecnologia digital e o advento da Internet, designando os antecedentes de Imigrantes Digitais.

Para ilustrar quem são e como vivem estes jovens (nativos digitais), utilizaremos os dados de Cardoso, Espanha e Lapa (2009) que comentam como jovens portugueses vivem em seu quarto de dormir, em como utilizam tudo ao mesmo tempo (TV, rádio e a Internet).

Segundo o estudo dos autores, 86% dos jovens portugueses acede a Internet de sua casa, 47,9% de um espaço escolar, com um tempo médio de 2 horas por dia, com uso maior no fim de semana. os jovens que não acedem a partir de casa fazem-no na Escola, que em Portugal tem contribuído para esbater a divisão digital (Silva e Pereira 2011). o que também se constata na pesquisa de Maciel (2009), realizada no Brasil, encontrando uma geração constantemente conectada, por vezes impaciente e imediatista, possuidora de planos de curto prazo e no viver agora. outro autor que também carateriza essa geração é Tapscott (2010), que ao entrevistar cerca de 10 mil jovens constatou que desenvolveram novas formas de pensar, interagir, trabalhar

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e socializar. o autor clarifica as seguintes atitudes e comportamentos dessa geração:

Eles cresceram sendo atores, iniciadores, criadores, jogadores e colaboradores (...) e situa as 8 normas dessa geração: “ 1) liberdade, 2) customização, 3) escrutínio, 4) integridade, 5) colaboração, 6) entretenimento, 7) velocidade e 8) inovação (Tapscott , 2010, p.92).

Estes estudos referendam que os jovens socializados na Web 2.0 deixam de ser apenas consumidores para ser construtores, pois são envolvidos no acesso e produção de conteúdos, de forma colaborativa. Para tal, faz-se premente que os jovens desenvolvam as literacias necessárias para atuar uma sociedade que vive na economia do conhecimento.

Diante de uma geração que dorme, acorda, vive constantemente conectada e que está em feedback constante, troca conhecimentos online com todo o mundo e quebra todas as barreiras, surgiu um dos nossos desafios para o projeto: Como manter o diálogo intergeracional? Como educar nessa modernidade?

Oliveira (2011), em sua tese de doutoramento, teoriza sobre um aprendente cyborgue, sobre a necessidade de um contexto educacional com novos espaços de aprendizagem, sejam eles híbridos, para promover o uso de tecnologias móveis e ubíquas. Ancorados no desafio da inclusão digital e do empreendedorismo com as TIC, apresentamos algumas atividades desenvolvidas com jovens de uma escola pública de Portugal, no Projeto Agentes Digitais, um dispositivo que visa a formação de jovens de empreendedores.

mEtODOLOGIA

A metodologia desta pesquisa integra os procedimentos da investigação-ação da aplicação do projeto “Agentes Digitais” junto de jovens

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portugueses, como já fora aplicado no Brasil (Fortaleza), no âmbito do projeto de doutoramento da investigadora. Assim, este texto apresenta um recorte do projeto desenvolvido em Portugal, ancorado na fundamentação do mundo digital e do perfil da geração digital, tal como efetuamos nos pontos anteriores.

Desta forma, entre outras técnicas, apresentamos alguns dos resultados com base no diário de campo da pesquisadora e da análise das atividades desenvolvidas pelos jovens portugueses da escola secundária. na apresentação e análise os resultados da aplicação do Projeto, tivemos em vista compreender as ferramentas utilizadas pelos jovens portugueses e suas potencialidades.

REsULtADOs: Um mODELO DE PRÁtICA EmPREENDEDORA

O projeto foi desenvolvido com 27 alunos, caraterizados como nativos Digitais, pois de acordo diagnóstico todos possuem acesso as TIC, tanto em casa, como nas atividades escolares. os alunos são de classes sociais diversas, estudam numa Escola Secundária da região de Braga, da rede pública no 12º ano, encontrando-se num processo de transição para o mercado de trabalho.

A metodologia mobilizou resoluções de problemas e situações de motivação para a superação da crise, pois os jovens da escola pública foram desafiados a utilizar as TIC como uma nova forma para resolver problemas sociais com ações empreendedoras.

No contexto dos princípios propostos pela Comissão das Comunidades Europeias (CCE, 2012) sobre Educação Empreendedora, o projeto foi desenhado e repensado para a realidade portuguesa. Em que o projecto desenvolveu algumas ferramentas, compreendendo as caraterísticas dos nativos digitais de Portugal.

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Como estratégia de finalização dos trabalhos foi desenvolvido um seminário para apresentação das ideias, tendo os jovens apresentado os projetos de empreendedorismo digital, promovendo a socialização para a comunidades e empresários locais.

No intuito de aprofundar e compreender a transposição do objeto de aprendizagem com o uso da Web 2.0, apresentamos o mapa analítico que vincula os objetivos do projeto, as estratégias utilizadas e os projetos desenvolvidos pelos jovens (cf. figura 2).

figura 2- mapa analítico da aplicação do Projeto

Com base na análise do mapa (figura 2) e da descriminação das ferramentas utilizadas, à luz dos estudos de Lévy (2000) e o´reilly (2005), observamos que as atividades adequam-se ao perfil dos nativos digitais, fazem aproveitamento da inteligência coletiva e utilizam a web como espaço de convergência, as experiências surgem dos usuários tendo em vista a colaboração em redes sociais. Nessa circunstância, rompeu-se com a utilização de software como único dispositivo. As ferramentas utilizadas caraterizam-se pela sua rapidez e possibilidade de colaboração, conforme o exemplo do uso do Prezi, Facebook, Email, Mapas, Google drive, formulários

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online, qrcode, respondendo à insígnia da geração de nativos digitais. O uso da Web 2.0 teve a finalidade de trespassar de meros consumidores de informação, para jovens construtores e inovadores com seus projetos voltados para os problemas locais e com um propósito global. nesse sentido, a abordagem metodológica do projeto vai de encontro ao cenário que as pessoas esperam poder trabalhar, aprender e estudar em qualquer lado e a qualquer hora, porque as tecnologias móveis são cada vez mais “cloud-based” (Johnson et al., 2013), aumentando as possibilidades de acesso à informação independentemente do dispositivo ou do local. o mundo laboral está também cada vez mais colaborativo e conectado, mudando consideravelmente a forma de como se trabalha, se organizam e estruturam os espaços e os projetos.

Nos recortes do diário de campo destaca-se a importância de trabalhar a temática, tendo os alunos relatado que passaram a repensar como as tecnologias poderiam ajudar a melhorar a sua comunidade interligando-a com o mundo2. Todo o material e as atividades foram voltadas para o uso de ferramentas que já faziam parte do cotidiano dos alunos, o diferencial da proposta metodológica tange em compreender as emergências que envolvem as TIC, principalmente no mundo do trabalho, pois geram novas oportunidades num cenário mais global, fazendo interagir o local no global, aspeto que alguns autores designam pelo neologismo de glocalização (robertson, 1992), em que o local age como sendo os “nós” da Sociedade em Rede.

o que podemos observar durante a aplicação do projeto foi que os jovens aprenderam a estruturar uma ideia empreendedora, além de potencializar uma caraterística dos nativos digitais, o trabalho em equipe, tanto para a criação do projeto, como para avaliação do mesmo. Essa abordagem aconteceu durante a atividade de Pitch Digital em que aconteceram processos de apresentação, avaliação e autoavaliação das ideias empreendedoras. Este processo dos jovens expressarem as suas 2 Estes depoimentos estão integrados no site do projeto. Cf. https://sites.google.com/site/geramovel

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ideias faz com que repensem suas próprias práticas (Almeida & Valente, 2011). Também, Lopes (2009) releva a importância de agregar esse tipo de atividade na Educação Empreendedora, como forma de não potencializar a individualização, caraterística encontrada nos nativos digitais (Lafuente, 2009; Maciel, 2009).

Os jovens atreverem-se a empreender geraram novas oportunidades em suas comunidades, como podemos exemplificar pelos projetos gerados (cf. figura 2). os projetos “Santo Estevão Innovation”, “reciclasa”, “Agrempréstimos” envolvem uma ação social digital; e os projetos “Chinchon”, “JMJ Shirts”, “CarhomeWash” e “Hummel” envolvem negócios digitais. Conforme depoimento de um jovem, sobre o Projeto CarhomeWash “projeto como esse, com a utilização da Web, com a proximidade do serviço a comunidade nunca foi visto em Braga”, vincando “a colaboração, a rapidez na entrega e confiabilidade do serviço” e, deste modo, referendam a vantagem de uma Web na proximidade às comunidades.

Tendo em vista as análises, ainda que preliminares do projeto, destacamos que as práticas educativas podem promover uma interação constante entre alunos e professores, a fim de privilegiar o diálogo, o questionamento, a crítica, a criação, o aprender, o pensar, o empreender e o inovar. Desta forma, os nativos digitais podem agir como agentes de aprendizagem, capazes de empreender projetos inovadores com as TIC que respondam a necessidades das suas comunidades.

CONsIDERAÇÕEs fINAIs

Alicerçado na implementação do projeto e na análise das políticas de inclusão digital dos países pesquisados, Portugal e Brasil, podemos constatar a relevância do projeto Agentes Digitais, tendo em vista uma maior consciência das possibilidades que as tecnologias proporcionam ao gerar novas realidades para os jovens nativos digitais, tornando-se criadores

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de novas riquezas em suas comunidades, agregando valor aos projetos.

Destacamos, assim, que projetos desta natureza podem ser aplicados em outros países da Comunidade Lusófona, nomeadamente em Cabo Verde, tendo em vista aumentar o índice de inclusão digital dos países e alavancar os programas de políticas públicas, como é exemplo o programa “Mundu Novu”3 que possui no empreendedorismo um dos seus pilares, possibilitando oportunidades de desenvolvimento digital e social dos seus jovens nativos digitais.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

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Johnson, L., Adams Becker, S., Cummins, M., Estrada, V., Freeman, A., & Ludgate, H. (2013). NMC Horizon Report: 2013 Higher Education Edition. Austin, Texas: The new Media Consortium. Disponível em: http://www.nmc.org/publications/2013-horizon-report-higher-ed.

Lafuente, F. (2009). Do conflito à ação. HSM Management, São Paulo, v. 3, n. 74, p. 70-76, maio 2009. 3 Em Cabo Verde, na mesma linha, podemos destacar o programa “mundu Novu”, lançado em 2009, visando instituir um novo modelo de educação ancorado nas tecnologias (Santos e Silva, 2013).

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Tapscott, D. (2010). A Hora da geração digital. Como os jovens que cresceram usando a Internet estão mudando tudo, das empresas aos

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TIC na Educação

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Vee, W. & Vraking, B. (2009). Homo zappiens: educando na era digital. Porto Alegre: Artmed.

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A WebQuest NO ENsINO DA INfORmÁtICA: APRENDIzAGENs E REAÇÕEs DOs ALUNOs

Sónia Catarina Cruz; Maria João Gomes Pires

Faculdade de Ciências Sociais - Universidade Católica Portuguesa (Braga)

[email protected]; [email protected]

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TIC na Educação

REsUmO

Este artigo pretende proporcionar uma visão geral sobre a importância da introdução da WebQuest no processo de ensino e aprendizagem, tendo como base um estudo de caso sobre uma turma de um Curso Profissional. Por isso, pretendemos saber a opinião dos alunos relativamente à utilização da WebQuest nas aulas de Modelação 3D e se realmente melhora a aprendizagem.

Palavras-chave:WebQuest; Modelação 3D; aprendizagem ativa; colaboração; criatividade.

ABstRACt

This articleaims to providean overview ofthe importanceof the introduction ofWebquestin teachingand learning, based on acase study ofa classof aProfessional Course. Sowe intendthestudents’ opinion regarding the use ofWebquestin class3D Modelingandreally improvesstudent learning.

Keywords: Webquest: 3D Modeling; active learning; collaboration; creativity.

INtRODUÇÃO

A integração das tecnologias na educação é fundamental no desenvolvimento e preparação dos alunos para o mercado de trabalho (Cruz, Júnior, Coutinho, & Carvalho, 2007), pois esperam-se indivíduos que demonstrem flexibilidade, destreza, autonomia, criatividade e capacidade

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de criar projetos e ideias novas. Para desenvolver estas competências, o professor deve utilizar ferramentas tecnológicas inovadoras e adequadas ao contexto do conteúdo da disciplina e do perfil da turma. Foi desta ideia que implementamos a WebQuest nas aulas de edição 3D, com o intenção de integrar a utilização das tecnologias no sentido de oferecer uma aprendizagem mais ativa, colaborativa e pela descorberta, onde os alunos assumem uma posição de investigadores e artistas criativos.Tendo como evidência experiências de autores sobre a implementação das WebQuests(Cruz, et al., 2007) consideramos importante aplicar esta ferramenta Web2.0 em contexto sala de aula, idealizando a nossa investigação de acordo com os seguintes objetivos: (1) Investigar se a WebQuest é adequada no ensino e aprendizagem de modelação 3D; (2) Perceber se a WebQuest proporciona a aprendizagem; (3) Analisar a opinião dos alunos acerca da realização da WebQuest; e (4) Observar e analisar as reações dos alunos durante a atividade.

mEtODOLOGIA

Face aos objetivos de investigação, optamos pelo estudo de caso isto porque, de acordo com yin (2005), o estudo empírico investiga fenómenos atuais em contextos reais, possibilitando estudar o caso num ambiente natural e aprender com ele, respondendo a algumas questões que pudessem surgir. no presente estudo foram utilizados dois inquéritos por questionário ou survey, uma grelha de observação e realizou-se uma análise dos projetos desenvolvidos pelos alunos. o estudo incidiu numa experiência em contexto real, no início do segundo período do ano letivo de 2012/2013, numa turma de 11.º ano do curso profissional Técnicos de Multimédia, módulo de edição de objetos tridimensionais.

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WEBQUEst

As WebQuests são atividades contextualizadas e motivadoras, disponibilizadas na Internet e propostas por professores para serem resolvidas colaborativamente por um grupo de alunos ou individualmente (Dodge, 1995). A dinâmica da atividade segue o modelo de aprendizagem construtivista que se baseia numa participação ativa dos alunos na resolução de problemas e no estímulo do pensamento crítico(Lima & Capitão, 2003).AWebQuest como recurso de aprendizagem deve ser devidamente organizada e elaborada obedecendo a determinados parâmetros. De acordo com Dodge (1995),para se conseguir eficiência e clareza no propósito, a WebQuest deve ser constituída pelas páginas de Introdução, a Tarefa, o Processo, os Recursos, a Avaliação e a Conclusão. Dodge (1995) e Carvalho (2002) admitem que podem ser incluídas duas páginas de ajuda, uma página de ajuda ao professor e uma página de ajuda aos alunos, disponibilizando informação sobre a WebQuest e a sua navegação. Antes de ser aplicada e resolvida pelos alunos, a WebQuest deve ser analisada e avaliada de acordo com uma Checklist de Dodge (1999), que permite “help you look at the Process section and focus on the small details that can make or break a project”.

DEsCRIÇÃO DA WEBQUEst – EDIÇÃO 3D

Para darmos o nosso contributo em relação aos estudos realizados sobre a utilização das WebQuests em contexto sala de aula e às suas potencialidades de adaptação, decidimos criar uma WebQuest de curta duração, disponível online emhttp://Webquest-edicao3d.weebly.com.o tema da WebQuest é sobre edição 3D, módulo integrante do programa curricular da disciplina Técnicas de Multimédia, onde se enquadram os tipos de superfícies nUrBS (Non-Uniform Rational B-Spline) existentes na modelação de objetos tridimensionais. o desafio desta atividade prendeu-

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se em construir um cenário 3D, utilizando o SoftwareAutodeskMaya, sendo o cenário constituído por, pelo menos, quatro objetos 3D, utilizando as primitivas nUrBS e as suas respetivas técnicas. os alunos nesta atividade tiveram liberdade de escolher o cenário que iriam construir, usando a imaginação e a criatividade, bem como os conhecimentos já adquiridos para perceberem qual ou quais as técnicas mais adequadas na construção dos objetos pretendidos.

A WebQuest foi desenvolvida tendo como base a estrutura proposta por Bernie Dodge (1995). Foram ainda adicionadas duas páginas de ajuda, como sugerem Carvalho (2002) e Dodge (1995). A página de ajuda ao aluno descreve sucintamente como está organizada a WebQuest e a sua duração. A página de ajuda ao professor informa como se vai proceder a atividade, qual o público-alvo e os objetivos esperados. A página Introdução contextualiza os conteúdos programáticos que vão ser abordados na atividade, fazendo um resumo dos conteúdos em estudo, explicando a necessidade de se conhecer e diferenciar os tipos de superfícies nUrBS e as suas técnicas de modelação. nesta página, o aluno encontra informação relativa ao número de elementos do grupo e sobre o cenário que deve construir.A página Tarefa possui informação sobre o desafio proposto, ou seja, o que o aluno deve fazer/construir e que ferramenta e técnicas utilizar na construção do cenário 3D. o Processo é constituído por quatro etapas onde são apresentadas todas as instruções de orientação que devem seguir para a realização da tarefa proposta, informando a duração de cada etapa. Desta forma, os alunos teriam que se organizar para conseguirem realizar, com sucesso e a tempo, a construção do cenário. Numa das etapas são apresentados diversos exemplos de recursos para o alunos pesquisarem na Internet. Na Avaliação encontram-se definidos os critérios de avaliação que são considerados para uma avaliação final dos trabalhos. Esta avaliação recai sobre a capacidade de os alunos se organizarem em grupo, pesquisarem informação na Internet, a criatividade da construção dos objetos 3D e a disposição dos objetos pelo cenário. Nesta página os alunos são encaminhados para um

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inquérito de avaliação da atividade, e de autoavaliação relativamente à sua aprendizagem utilizando a WebQuest.Na Conclusão indicam-se aos alunos as vantagens de se ter utilizado esta WebQuest,nomeadamente, conhecer melhor os tipos de superfícies nUrBS e saber escolher o tipo de ferramenta mais adequada para modelar determinado objeto 3D.

APREsENtAÇÃO E ANÁLIsE DOs REsULtADOs

CARAtERIzAÇÃO DA AmOstRA

A amostra dos alunos em estudo é de nove elementos, sendo equilibrada em termos de representação por género, com 5 alunos do género masculino e 4 do género feminino. A média de idades é de 17 anos, tendo o aluno mais novo 16 anos e o mais velho 18 anos. Em relação às disciplinas preferidas, 55% dos alunos dizem não ter nenhuma disciplina preferida, 27% consideraram a disciplina preferida Design Comunicação e Audiovisuais e 18% dos alunos a disciplina Técnicas de Multimédia. Acerca do tempo que é dedicado ao estudo, 56% dos alunos declaram que apenas estudam no dia anterior ao teste, 22% duas vezes por semana, 11% afirmam que estudam todos os dias e outros 11% dos alunos referem que estudam uma vez por semana.

Dado ser uma turma de um curso associado à área de informática, todos os alunos possui computador pessoal, bem como ligação à Internet em casa, o que facilita a realização de atividades fora das aulas. relativamente ao tempo que passam por dia no computador, 56% dos alunos responderam que passam em média duas horas ou mais, 33% uma hora e apenas 11% dos alunos passam em média quarenta e cinco minutos em frente ao computador. quando questionadossobre o horário em que estão mais tempo ligados ao computador, o horário entre as 20h e as 00h é o mais usual (89%). Todos os alunos inquiridos consideram que aprendem

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melhor quando o professor utiliza as novas tecnologias nas aulas. quando questionados sobre o tipo de utilização do computador, a amostra refere que, preferencialmente, o utiliza para conversar com os amigos nas redes sociais (100%), ouvir música (89%), fazer trabalhos/pesquisar informação (78%), utilizar o email (67%), jogar (56%), gravar DVD (33%) e outras como ver filmes (11%).no que respeita às novas tecnologias mais utilizadas, todos os alunos demostraram a sua preferência pelo Facebook(100%), seguido dos programas da Microsoft Office (67%), o Adobe Photoshop (56%), o Messenger, Blog e o Google Sites (33%), o Skype, Audacity e o MovieMaker (22%).

ANÁLIsE DOs REsULtADOs sOBRE A UtILIzAÇÃO DA fERRAmENtA WebQuest

Através dos dados registados na grelha de observação, podemos comprovar que os alunos sentiram-se motivados, entusiasmados e muito interessados na atividade. Este interesse foi visível nas duas sessões pois os alunos não estavam familiarizados com a ferramenta WebQuest e daí a própria atividade conseguir obter mais atenção e envolvimento dos alunos nas tarefas, até por ser uma novidade para eles. Outra justificação é o facto de que até ao momento, nas aulas, os alunos construíam um portefólio de objetos 3D, sem um objetivo aparente. Durante as duas sessões da WebQuest, observamos os alunos a debaterem ideias sobre qual a melhor técnica a ser utilizada na construção dos objetos, quais os objetos que iriam desenvolver e a analisarem os sites com tutoriais. Verificouse também alguma competição entre os grupos em tentar construir o cenário mais original e com mais objetos 3D.

Os resultados, apresentados a seguir, foram recolhidos através do segundo questionário, onde podemos comprovar que todos os alunos navegaram sem dificuldades na WebQuest e na Internet(100%), sendo

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que 67% responderam que foi “Fácil” e 33% “Acessível”. Aprender através da WebQuest foi considerada “Interessante” por 89% dos alunos e 11% consideraram “nem interessante nem aborrecida”, sendo que o mesmo aconteceu quando questionados sobre o que achavam da WebQuest como uma nova forma de lecionar a aula: 89% acharam “Desafiante” e 11% “nem desafiante nem aborrecida”. quando questionados se gostavam que os professores utilizassem WebQuest nas aulas, 78% dos alunos admitiram que “Sim” e 22% responderam que “Talvez”.

relativamente à aprendizagem dos alunos na utilização das técnicas de modelação 3D, utilizando as tarefas propostas na WebQuest, 56% dos alunos referiram que aprenderam “Sempre” a utilizar a técnica mais adequadas, e 44% disseram “Às vezes”. Podemos justificar este facto por existirem alguns elementos da turma que possuem mais dificuldades na modelação, mas apesar desta dificuldade, 67% dos elementos acharam as tarefas propostas desafiantes e 33% “nem desafiantes nem aborrecidas”.

na pesquisa, observação dos vídeos tutoriais e documentos fornecidos pela investigadora, 44% dos alunos mencionaram que conseguiram “Às vezes” enriquecer os seus conhecimentos sobre as Curvas, sendo que 56% referiram que conseguiram “Sempre”. Estes valores percentuais são fundamentados com a questão, se os alunos analisaram a informação e a documentação apresentada na WebQuest. Ora 44% dos elementos responderam que “Às vezes” e 56% responderam “Sempre”. na questão sobre se aprenderam a construir os objetos propostos, 22% afirmaram que “Às vezes” e 78% responderam “Sempre”. os alunos que analisaram com cuidado os recursos disponíveis na Internet ena WebQuest, conseguiram aprender melhor e enriqueceram os seus conhecimentos. os que não analisaram convenientemente a informação sentiram mais dificuldades na modelação.

no questionário, os alunos também realizaram a sua autoavaliação. relativamente à questão se foi empenhado nas tarefas, 89% responderam

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que “Sempre” foram empenhados e 11% “Às vezes”. Acerca da superação das dificuldades, 44% dos alunos responderam que conseguiram superar “Às vezes” e 56% afirmaram que conseguiram “Sempre”. relativamente à atenção dos alunos nas atividades, 78% responderam que estão “Sempre” atentos e 22% “às vezes”. No registo dos raciocínios e as conclusões, 56% dos alunos mencionaram que registavam “Sempre” os seus raciocínios e 33% fizeram “Às vezes” o registo.

quando questionados se adquiriram conhecimentos, 78% mencionaram que “Sempre”, e 22% “Às vezes”. relativamente à sua iniciativa de apresentar ideias novas ou propostas, 56% responderam que “Sempre” o fizeram, e 33% disseram que “Às vezes”. Todos os alunos afirmaram que foram capazes de aplicar os conhecimentos adquiridos na atividade proposta e que foram empenhados no desenvolvimento do trabalho de grupo (100%).Foi também pedido aos alunos que exprimissem, através de uma resposta aberta, a sua opinião relativamente ao que mais gostaram de fazer na WebQuest. Todos referiram, sem exceção, que gostaram de ter a liberdade de escolher o cenário e os objetos que iriam construir: “o que mais gostei nesta atividade foi juntar tudo o que aprendi e fazer um cenário e ter liberdade de o fazer como queria” (a07).

CONCLUsÃO

Depois de concluído o estudo e analisados os resultados, podemos concluir que a WebQuest, como ferramenta e recurso educativo, revelou-se uma ferramenta inovadora e adaptável à disciplina de Técnicas de Multimédia, mesmo na área de modelação 3D, tornando as duas sessões mais motivadoras, promovendo o interesse pelos conteúdos do módulo da disciplina e uma aprendizagem mais eficaz. o mais importante nesta WebQuest foi, tentar oferecer uma aprendizagem ativa, em que os alunos assumissem um papel de actores criativos, inovadores, e que compreendessem e

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adquirissem conhecimentos através de pesquisas orientadas na Internet.nas tarefas propostas, os alunos tiveram de desenvolver competências essenciais tais como pesquisar tutoriais na Internet, selecionar e analisar a informação que realmente interessava para o seu trabalho, identificar as técnicas mais adequadas na construção de objeto 3D, diferenciar as técnicas de modelação das Curvas NURBS e compreender o seu funcionamento. Apesar de surgirem algumas dificuldades durante realização da atividade isso deveu-se ao próprio grau de dificuldade dos conteúdos da disciplina e da realização do projeto no complexo programa AutodeskMaya 2013. Tendo como referência os trabalhos finais dos alunos, podemos afirmar que os objetivos desta atividade foram atingidos e ultrapassados. os alunos esforçaram-se colaborativamente, debateram e competiram entre eles, sendo responsáveis pela sua própria aprendizagem. Segundo os dados recolhidos podemos afirmar que as aulas se tornam mais desafiantes e interessantes e os alunos mais confiantes e autónomos.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

Carvalho, A. A. (2002). WebQuest: um desafio aos professores para os alunos. Disponível em: http://webs.ie.uminho.pt/aac/Webquest (consultado em 06 de Fevereiro de 2013).

Carvalho, A. A. (2007). Rentabilizar a Internet no Ensino Básico e Secundário: dos recursos e Ferramentas online aos LMS. Sísifo. Revista de Ciências da Educação. n.º3, 25-40.

Cruz, S., Júnior, J. B., Coutinho, C., & Carvalho, A. A. (2007). o Bloque e o Podcast para apresentação da aprendizagem com WebQuests. V Conferência Internacional de Tecnologias de Informação e Comunicação em Educação (pp. 893-904). Braga: Universidade do Minho.

Dodge, B. (1995). Some Thoughts About WebQuests. Some Thoughts

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About Webquests. Disponível em: http://Webquest.sdsu.edu/about_WebQuests.html (consultado em 05 de Fevereiro de 2013).

Dodge, B. (1999). Process Checklist. Disponível em: http://projects.edtech.sandi.net/staffdev/tpss99/processchecker.html (consultado em 07 de Fevereiro de 2013).

Lima, J. r., & Capitão, z. (2003). e-Book: E-Learning e E-Conteúdos. Aplicações das teorias tradicionais e modernas de ensino e aprendizagem à organização e estruturação de e-cursos. V. n. Famalicão: Centro Atlântico.

yin, r. K. (2005.). Estudo de caso: Planeamento e métodos. 3ª edição. Porto Alegre: Bookman.

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E-mail: A fERRAmENtA EsQUECIDA PELOs PROfEssOREs NA COmUNICAÇÃO COm ALUNOs E PAIs

Sónia Cruz; Vítor Machado

Faculdade de Ciências Sociais - Universidade Católica Portuguesa (Braga)

[email protected]; [email protected]

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REsUmO

Este trabalho aborda a temática da utilização do e-mail como ferramenta de comunicação entre professores, entre professores e a turma e, consequentemente, como a mesma pode ser aplicada em contexto educativo, promovendo situações de aprendizagem. Descreve-se, em primeiro lugar, como esta ferramenta se desenvolveu ao longo das últimas décadas e o papel importante que detém não só para enviar ou receber mensagens mas também como se tornou o nosso endereço virtual, a nossa identidade, para aceder a redes sociais, a plataformas virtuais de aprendizagem, a imensas ferramentas Web 2.0 ou outras aplicações disponíveis na Internet. Ao conquistar milhões de pessoas em todo o mundo, promove e fortalece laços de amizade e relações profissionais e, ao mesmo tempo, contribui indubitavelmente para a divulgação e partilha do conhecimento. As competências relacionadas com a utilização do e-mail são parte integrante do Currículo e os professores não o podem esquecer, como ferramenta pedagógica, quando planificam as suas atividades, na medida em que é algo que os próprios alunos já utilizam quotidianamente. E como professores, por que não tirar proveito desta mais-valia em favor da aprendizagem? É uma realidade o facto de, por vezes, nos esquecermos que ele existe, porque já faz parte da nossa vida e só iremos dar-lhe novamente o devido valor se algum dia não conseguirmos aceder às infindáveis ferramentas, aplicações, plataformas de aprendizagem, redes sociais, etc., simplesmente porque o e-mail, tal como o conhecemos, deixou de ‘funcionar’. Tendo por base esta problemática, pretende-se demonstrar que o e-mail é um dos meios de comunicação que os professores mais utilizam, que é prático, funcional, versátil, acessível, rápido e económico. os dados apresentados resultam de um inquérito cujas respostas validadas reportam a uma amostra de cento e vinte e três docentes dos ensinos pré-escolar, básico e secundário.

Palavras-chave: e-mail; ferramenta pedagógica; professores; comunicação.

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ABstRACt

This paper regards the use of the e-mail as a communication tool among teachers, between teachers and students in a class and, consequently, how it can be used in an educational context, promoting learning situations. Firstly, we describe how this tool has developed for the last few decades and the important role it has, not only in sending and receiving messages, but also how it has become our virtual address, our identity, to access social networks, virtual learning platforms, countless web 2.0 tools or other applications that are available online. It has conquered millions of people around the world as it promotes and strengthens friendship bonds and professional relationships and, at the same time, it undeniably contributes to release and share knowledge. The skills related to the use of e-mail are an integral part of the curriculum and the teachers cannot forget them, as a pedagogical tool, when planning their activities, as it is something that students already use daily. And as teachers, why can’t we benefit from this asset in favor of learning? It is a reality that sometimes we forget that it exists, because it’s been part of our lives and we will only give it back the due value if we are prevented from accessing the endless tools, applications, learning platforms, networks, etc., simply because the e-mail, as we know it, no longer ‘works’. Bearing this in mind, we aim to show that the e-mail is one of the communication media that teachers more often use, since it is practical, functional, versatile, accessible, fast and economical. The data we present are the result of a survey whose validated answers regard a sample of one hundred and twenty-three pre-school, primary and secondary teachers.

Keywords: e-mail; pedagogical tool; teachers; communication.

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INtRODUÇÃO

o presente trabalho foi realizado com o objetivo de estudar a utilização do e-mail como ferramenta pedagógica e de comunicação em contexto educativo. É do conhecimento comum que a navegação na Internet e o uso do e-mail são, nos nossos dias, aspetos essenciais da capacidade de procurar, receber e transmitir informação. “nunca é demais reforçar de que ser letrado, no século XXI, não se cinge a saber ler e escrever, como ocorrera no passado. Esse conceito integra também a Web e os seus recursos e ferramentas que proporcionam não só o acesso à informação mas também a facilidade de publicação e de compartilhar online. Estar online é imprescindível para existir, para aprender, para dar e receber” (Carvalho, 2008). neste sentido, o e-mail tornou-se, ao longo da última década, um meio de comunicação deveras difundido.

Mas, afinal para que mais usamos o e-mail? Será que exploramos o potencial pedagógico que ele nos oferece? É importante começar por conhecer uma ferramenta, para nos irmos apropriando das suas funcionalidades e potencialidades, integrando-as nas nossas práticas letivas. Mas será que com o e-mail isto também aconteceu? Por vezes já nos esquecemos que ele existe, porque já faz parte da nossa vida, e só iremos dar-lhe novamente o devido valor se algum dia não conseguirmos aceder às infindáveis ferramentas, aplicações, plataformas de aprendizagem, redes sociais, etc., simplesmente porque o e-mail, tal como o conhecemos, deixou de ‘funcionar’.

O desenvolvimento acelerado das novas tecnologias trouxe uma atitude diferente perante o que é “novo”. na sociedade do século XXI, o que hoje é novo, amanhã será obsoleto, mudança que está a provocar uma metamorfose global e radical, na forma de trabalhar, de nos informar, de nos educar, de nos divertir, de nos relacionar, na forma de vender e consumir, enfim, em todos os aspetos da vida social e familiar (Meirinhos, 2000: 3). E uma escola que não integre os novos meios informáticos, corre

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o risco de se tornar, também ela, obsoleta (Adell, 1997). Cabe-nos a nós corresponder a esta transformação da nossa vida de uma forma crítica e cautelosa, apropriando-nos das ferramentas necessárias às nossas vivências, quer sejam pessoais, profissionais ou sociais. E o e-mail, com as suas potencialidades ou constrangimentos, é uma dessas ferramentas entre tantas outras que são, de alguma forma, um ponto de partida para a aprendizagem e não um ponto de chegada.

A UtILIzAÇÃO DO E-mail ENtRE PROfEssOREs E O PROfEssOR E A tURmA

o presente trabalho baseou-se numa investigação de caráter descritivo e exploratório para analisar a utilização do e-mail na comunicação entre professores e a turma e também como este recurso da Web pode ser utilizado como ferramenta pedagógica. Tendo em atenção um estudo realizado por Monforte e Martinez (2003) que nos apresenta o tipo de mensagens utilizado na comunicação entre professor e aluno, e com base na pesquisa bibliográfica apresentada sobre as potencialidades e constrangimentos da utilização do e-mail na educação do século XXI, bem como a utilização dos recursos desta ferramenta em contexto educativo, procedeu-se à construção do instrumento de recolha de dados, numa primeira fase.

Numa segunda fase recolheram-se os dados através do preenchimento de um inquérito online, realizado com recurso à ferramenta «Formulários» dos Google Docs, ao qual responderam 123 professores do Pré-Escolar, do 1º, 2º e 3º Ciclos, Secundário e Superior, independentemente da disciplina que lecionam, a 12 questões relacionadas com a temática supracitada. o período de recolha reporta-se a 5 e 31 de dezembro. o inquérito foi disponibilizado online através da ferramenta e-mail e encontra-se disponível online em https://docs.google.com/spreadsheet/

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Email=true&formkey=dHE2TG51nmz5UmhDz0ppcDI5a3l2z2c6Mq.

Numa terceira fase foram analisados e tratados os dados e apresentadas as respetivas conclusões. o questionário era composto por duas partes distintas. Em primeiro lugar procurou-se identificar/caracterizar os participantes a partir de sete questões que incidem nos seguintes aspetos: género; idade; habilitações académicas; a região onde exercem funções docentes; os cargos/função que desempenham; situação profissional e tempo de serviço; Assim, foram inquiridos, ao nível nacional, 31 e 92 docentes do género masculino e feminino, respetivamente, que se situam entre os 20 e os 65 anos de idade e cujas habilitações académicas se posicionam entre o Bacharelato e o Doutoramento. Indicam funções de coordenador (16%), subcoordenador (4%), diretor de turma (28%), professor (92%), membro da direção (2%) e outros (13%). São, maioritariamente, professores de quadro de escola/agrupamento (57%), sendo que 5% referiu pertencer a quadro de zona Pedagógica e os restantes 38% contratados. o tempo de serviço referido situa-se entre 1 e 20 anos de serviço (74%). Os restantes 26% declararam estar ao serviço da educação há mais de 20 anos.

Em segundo lugar, e após a caracterização da amostra, pretendemos analisar a importância do e-mail na comunicação entre professores e entre professor e aluno. nesta segunda parte, a utilização do e-mail como ferramenta pedagógica foi também uma questão que considerámos crucial para o nosso estudo e daí ela merecer uma reflexão mais pormenorizada.

Da totalidade dos professores inquiridos, 95% respondeu que utiliza diariamente o email e os restantes 5% mencionou que usa este recurso duas a três vezes por semana ou somente ao fim de semana. Segundo os dados recolhidos, estes docentes, considerando a quantidade de mensagens de e-mail que enviam, fazem-no, preferencialmente, para colegas de trabalho (63%) e amigos (16%). O envio de mensagens para alunos é referido por 11%, enquanto que esta ferramenta ainda não é utilizada na comunicação entre o professor e o encarregado de educação (0%). Este dado leva-nos a

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concluir que a comunicação família-escola parece ainda não dar lugar às novas tecnologias.

relativamente à comunicação entre colegas professores, procurou-se analisar o tipo de mensagens partilhadas. Concluímos que o email é já uma ferramenta conhecida e utilizada pela maioria dos docentes inquiridos, tendo, desta forma, bastante potencial para poder ser explorado como um recurso pedagógico.

no entanto, ainda 12% referiu nunca e 14% raramente ter utilizado o e-mail para informar os seus alunos sobre atividades; 11% nunca e 15% raramente partilhou informação ou materiais de estudo; 15% nunca e 26% raramente usou o e-mail para dar feedback aos seus alunos sobre as atividades realizadas; e, por último, 33% declarou nunca e 24% raramente ter realizado a avaliação das aprendizagens através desta ferramenta. Estes dados revelam que muitos professores, apesar de conhecerem e utilizarem diariamente este recurso ao nível pessoal e profissional, ainda não o consideram uma ferramenta para comunicar com os seus alunos dentro ou fora do contexto de sala de aula. A sua utilização como ferramenta de comunicação é mais utilizada entre professores do que entre professor e alunos.

Mas esta parece ser uma questão de prática pedagógica e não de formação na utilização do e-mail. Area (2002) apud Meirinhos & osório (2007) refere que muitos professores pertencem a um grupo social, que pela sua idade foi culturalmente alfabetizado em tecnologias e formas culturais impressas e que as tecnologias da comunicação apresentam-se, neste momento, como geradores de uma rutura com essas raízes culturais. As respostas à pergunta 16 do nosso inquérito vêm corroborar esta opinião, na medida em que quando questionados sobre a importância que o e-mail pode ter para facilitar a comunicação entre os professores e o professor e os seus alunos, 55% referiu ser muito importante e 38% mencionou ser importante. Os professores reconhecem a sua importância, mas há ainda

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muito a fazer, na prática.

O E-mAIL COmO fERRAmENtA PEDAGÓGICA

Também neste estudo foi necessária a utilização do e-mail por parte dos professores inquiridos, sendo indispensável salientar a importância de todos, professores e alunos, possuírem uma conta de e-mail. Quando esta oportunidade é dada aos nossos alunos, ela pode ser considerada, de certa forma, uma maneira de promover a inclusão digital dos mesmos. No caso da Internet, e em especial das ferramentas Web 2.0, possuir um e-mail é fundamental para poder registar-se em diversos serviços gratuitos, além da possibilidade óbvia de trocar mensagens com outras pessoas e de poder ser encontrado na rede.

A questão 17 do nosso inquérito reporta ao uso do e-mail como um recurso pedagógico. os professores inquiridos foram questionados sobre a frequência de utilização do e-mail para: 17.1. avisar os alunos dos prazos para entrega de trabalhos; 17.2. enviar pistas para os temas em estudo; 17.3. esclarecer dúvidas; 17.4. propor trabalhos de enriquecimento curricular; 17.5. enviar links para atividades; 17.6. arquivar documentos (atividades, tarefas, etc.); 17.7. Sugerir links de interesse relacionados com a disciplina; 17.8. desenvolver a expressão escrita.

Analisados os dados recolhidos, o e-mail é utilizado, maioritariamente, como uma ferramenta de arquivo de documentos e para sugestão de links de interesse relacionados com a disciplina. Mas em todas as questões, à exceção da número 8, a maioria dos professores utiliza, por vezes ou muitas vezes, o e-mail como uma ferramenta de comunicação que, ao mesmo tempo, desenvolve aprendizagens significativas ao nível da autonomia, da organização e pesquisa. É de salientar que o e-mail é utilizado por uma percentagem menor relativamente às atividades mais relacionadas com a construção da própria informação, nomeadamente a proposta de trabalhos

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de enriquecimento curricular (utilizada por vezes por 31% e muitas vezes por 24%) e o desenvolvimento da expressão escrita (utilizada por vezes por 27% e muitas vezes por 11%). Estes resultados deixam transparecer a utilização do e-mail mais como uma ferramenta de comunicação, partilha de informação e organização e arquivo de documentos.

Reportamo-nos agora ao grau de concordância dos docentes inquiridos no que concerne às seguintes afirmações constantes da pergunta 18 do nosso inquérito: 18.1. o e-mail é uma ferramenta para construir uma rede de contactos na sala de aula; 18.2. O e-mail é uma forma de promover a inclusão digital; 18.3. O e-mail é uma forma de aceder a outros recursos gratuitos (ex. ferramentas Web 2.0); 18.4. Arquivar documentos através do e-mail é mais ecológico e sustentável; 18.5. As mensagens de e-mail ocupam um pequeno espaço de armazenamento; 18.6. Com o e-mail é mais fácil receber e organizar os trabalhos dos alunos; 18.7. Com o e-mail, a qualquer hora e em qualquer sítio posso “chegar” aos alunos; 18.8. As mensagens de e-mail têm a durabilidade que nós quisermos.

O e-mail é considerado maioritariamente como uma ferramenta de comunicação, de organização e arquivo, e a resposta a esta última questão veio reforçar esta mesma ideia, na medida em que o grau de concordância em todas as questões (concordo ou concordo plenamente), à exceção unicamente da questão 18.6, situa-se entre os 85% e 90%. Então, a conclusão referida na seção 3, de que são mais as potencialidades do que os constrangimentos é também aqui corroborada, sugerindo o e-mail como ferramenta de comunicação em contexto educativo e pedagógica, na medida em que o e-mail se apresenta como um meio muito popular, prático, funcional, versátil, rápido e económico e que, com todas estas características, cabe ao profissional de educação decidir como este recurso o pode ajudar melhor na difusão e partilha do conhecimento, explorando todas as suas mais-valias e adequando-as às suas próprias necessidades, bem como à dos seus alunos. queremos ainda salientar o facto de 60% do

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total da amostra concordar e 30% concordar plenamente com o enunciado “O e-mail é uma forma de promover a inclusão digital”, consolidando o que já tínhamos referido no parágrafo inicial desta subseção.

Com o emergir de uma nova filosofia subjacente à rede global, surge uma nova geração da Internet que denominamos de Web 2.0. É um mundo tão vasto que não podemos, de longe, utilizar todas as suas ferramentas e aplicações. Fica a certeza de necessitarmos transformar a prática pedagógica, integrando a cultura digital em favor do melhor rendimento da aprendizagem dos alunos. Contudo, fica também a dúvida: basta a competência digital dos professores para enfrentar com autoridade e confiabilidade a busca por uma educação atual e de qualidade? A Web 2.0 é o que conhecemos hoje. E amanhã? quantas novas ferramentas virão? Estaremos preparados para utilizá-las e garantir que os alunos saibam fazer uso destas para o seu próprio crescimento cognitivo? Assim, quantos desafios e conflitos ainda estão por vir? (Pereira & oliveira, 2012). Como as autoras também referem, a maior arma para enfrentarmos tanto os desafios como os conflitos será o conhecimento produzido por cada cidadão, pois serão as aprendizagens relacionadas com a pesquisa, o tratamento e a seleção da informação que farão o diferencial competitivo dos povos. E a resposta não estará somente na formação mas na atitude dos professores perante todas estas questões.

CONCLUsÃO

Pelo que expusemos anteriormente, consideramos que o e-mail é uma ferramenta crucial tanto na comunicação entre professores e entre o professor e a turma e também como ferramenta pedagógica. A escola tem sido lenta em reconhecer tanto o impacto das novas ferramentas de aprendizagem como as mudanças que ocorrem ao nível do ambiente onde esta ocorre – tanto que a própria aprendizagem fica comprometida caso a instituição educativa não comece por perceber o papel importante que

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detém. Mas os resultados do nosso estudo indicam que muitos professores já estão no bom caminho porque sabemos que é um processo que precisa de tempo e amadurecimento. Esta ideia é corroborada por Carvalho (2008) quando afirma que o professor, para além de ser um especialista na sua área, é um orientador do processo de aprendizagem dos alunos, apoiando-os, incentivando-os à reflexão e ao debate. o mesmo autor acrescenta que não se muda de método de ensino de um ano para o outro, mas é importante estarmos conscientes de outras abordagens e da necessidade de ir introduzindo práticas pedagógicas que ajudem o aluno a aprender colaborativamente, que facilitem a interação professor-alunos e alunos-alunos online. E o email é uma das ferramentas que nos possibilita uma experiência de aprendizagem para além do contexto de sala de aula. É que este recurso já está presente em todas as esferas da vida social e cabe-nos a nós, professores, atuar no sentido de compensar as desigualdades sociais e regionais que o acesso às novas tecnologias de informação e comunicação está a originar.

REfERÊNCIAs BIBLIOGRÁfICAs

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