universidade cÂndido mendes projeto a vez do … otilia lima sobral.pdf · com o advento do novo...

51
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO MESTRE PÓS GRADUAÇÃO “LATO SENSU “ DIREITO DO CONSUMIDOR O CONTRATO DE SEGURO NO DIREITO BRASILEIRO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR POR: MARIA OTILIA LIMA SOBRAL ORIENTADOR: SÉRGIO RIBEIRO SILVA RIO DE JANEIRO/ 2005

Upload: doanh

Post on 13-Dec-2018

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO MESTRE PÓS GRADUAÇÃO “LATO SENSU “ DIREITO DO CONSUMIDOR

O CONTRATO DE SEGURO NO DIREITO BRASILEIRO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

POR: MARIA OTILIA LIMA SOBRAL

ORIENTADOR: SÉRGIO RIBEIRO SILVA

RIO DE JANEIRO/ 2005

Page 2: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

2

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO MESTRE PÓS GRADUAÇÃO “LATO SENSU “ DIREITO DO CONSUMIDOR

O CONTRATO DE SEGURO NO DIREITO BRASILEIRO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

OBJETIVOS: Apresentação de monografia a Universidade Candido Mendes como condição prévia para conclusão do curso de Pós Graduação “Lato Sensu” em Direito do Consumidor

POR: MARIA OTILIA LIMA SOBRAL

Page 3: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

3

AGRADECIMENTOS

Deus pela serenidade, equilíbrio e proteção. Meus filhos Franclim e Laisa, por todo o carinho dedicado para que este momento pudesse ser concretizado. Minhas queridas amigas de turma Vilda e Adriana pela colaboração e solidariedade com que me acolheram, além do carinho ímpar nas horas difíceis. Professor Sérgio, pelo brilhante desempenho em sala de aula. A todos aqueles que junto comigo realizaram este sonho.

Page 4: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

4

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus filhos, à minha querida mãe que no seu silêncio contribuiu para que este trabalho se realizasse e ao meu pai (in memorium).

Page 5: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

5

RESUMO

O presente trabalho teve como objetivo principal delinear os pontos mais

controvertidos do contrato de seguro, segundo a ótica do Código de

Defesa do Consumidor. Partindo das demandas judiciais mais comuns

nesta área e da prática jurisprudencial emanada destes casos, tem-se um

panorama global da situação do contrato de seguro, sempre norteada

pelos princípios legais que o regem, incluídos na legislação civil, na

legislação específica dos seguros e, é claro, no CDC. O principal foco de

estudo não foi a análise dos efeitos do CDC no contrato de seguro, mas

sim em que aspectos o código pode ser utilizado na defesa dos

consumidores lesados. E isso de uma forma simples, tratando o Código

de Defesa do Consumidor não como uma lei capaz de tirar o consumidor

de situações desagradáveis e financeiramente prejudiciais, mas ajudando

a situação à realidade da lei. Dessa forma, a cláusula considerada

meramente restritiva de direitos, que atenda os requisitos delineados pelo

CDC, deve ser respeitada. Sendo cláusula abusiva, o tratamento é

diferente, pugnando por sua nulidade. Analisando o contrato de seguro

por esta linha de raciocínio os resultados são mais coerentes, deixando

de lado as inúmeras controvérsias verificadas quando do estudo

jurisprudencial. O caso concreto passa ser o foco, e não o papel

secundário. Foi analisado o contrato de seguro como um contrato de

adesão, onde as cláusulas já estão preestabelecidas, cabendo a parte

contraente aderir a todas as cláusulas, inclusive as limitativas, e estando

ele sob a proteção Contratual do Código de Proteção do Consumidor,

surge o problema de como devem ser interpretadas tais cláusulas, e se

elas se caracterizam cláusulas abusivas.

Page 6: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

6

METODOLOGIA

A metodologia utilizada neste trabalho, abordando o tema Contrato de seguro no

direito brasileiro em face ao código de defesa do consumidor, teve três momentos:

no primeiro momento, a pesquisa do material bibliográfico, com a preocupação de

buscar autores de que discorresse sobre o assunto de maneira clara e objetiva. No

segundo momento a seleção desse material, fazendo uma leitura detalhada, com a

finalidade de focar os pontos mais importantes e polêmicos sobre o assunto. E por

fim, no terceiro momento, buscar na legislação pertinente, ou seja, no código civil,

código de defesa do consumidor e na constituição federal, fundamental legal para as

afirmações feitas pelos autores.

Page 7: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................... 8 CAPÍTULO I – CONTRATO DE SEGURO........................................11 CAPÍTULO II. O CONTRATO DE SEGURO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFSA DO CONSUMIDOR.......................................................... 23 CONCLUSÃO ................................................................................. 44 ANEXO ............................................................................................. 46 BIBLIOGRAFIA................................. ............................................... 47 ÍNDICE................................................................................................ 49 FOLHA DE AVALIAÇÃO ............................................................... 51

Page 8: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

8

INTRODUÇÃO O presente trabalho monográfico traz como tema o Contrato de

Seguro no Direito Brasileiro em face do Código de Defesa do

Consumidor.

O contrato de seguro é uma das modalidades contratuais de

adesão e por sua carga relativa à segurança dos bens humanos mais

importantes (vida e patrimônio), mereceu destaque no Código de Defesa

do Consumidor, que o enquadrou como uma das hipóteses de incidência

desta legislação.

Entendemos que o contrato de seguro gera direitos e obrigações

para as partes. Ao segurado compete o pagamento do prêmio, que é a

contraprestação ao segurador, em virtude do risco que este assume, e ao

segurador compete pagar a indenização prevista ao segurado de seus

prejuízos, na hipótese de ocorrer o risco previsto contratualmente.

O referido estudo encontra a sua justificativa pelo fato dos

cidadãos de uma maneira geral, salvo raríssimas exceções, não possuem

conhecimento da extensão e, principalmente, dos limites impostos pelo

contrato de seguro. Essa ausência ou negligência de informações em sua

grande parte causada pelos corretores de seguros.

São exatamente estas situações conflituosas que chegam ao

Judiciário que foram alvo desse estudo, que se inspirou na grande

Page 9: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

9

repercussão do Código de Defesa do Consumidor no ramo de seguros

para analisar e avaliar as teses defendidas pelos segurados e seguradoras

em juízo.

Não foi objetivo desse estudo analisar todos os pontos

controversos e todas as questões relativas ao contrato de seguro, pois não

seria possível num trabalho desta natureza. Por esta razão, o limite do

estudo foi traçado pela análise dos contratos de seguros em face do

Código de Defesa do Consumidor.

Esse trabalho tem como objetivo alertar aos consumidores no

que se refere às cláusulas abusivas e restritivas de direito, como também

as cláusulas limitativas que norteiam os contratos de seguros.

Foram analisados, os processos relativos aos contratos de

seguros, de forma a entender que os mesmos devam ser tratados de

maneira imparcial, analisando as provas trazidas aos autos e jamais

esquecendo dos princípios do contrato de seguro.

A metodologia utilizada foi o uso de entendimentos

doutrinários e jurisprudenciais, assim como o levantamento de dados

acerca dos contratos de seguros.

O presente trabalho, além de ser um trabalho didático-

científico, é uma pesquisa teórica e bibliográfica, para fins metodológico

e aplicação que, segundo Carvalho1, “ é a atividade de localização de

fontes diversas de informação escrita para coletar dados gerais ou

1 GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa, São Paulo: Atlas, 1998. p. 58.

Page 10: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

10

específicos a respeito de um tema.” Conforme Lakatos2, ela visa colocar

o estudante em contato direto com tudo aquilo que foi escrito sobre

determinado assunto, a fim de estuda-lo, sendo portanto o primeiro

passo de toda pesquisa científica.

Para manter uma seqüência lógica para nosso trabalho, foi o

mesmo estruturado da seguinte forma:

No primeiro capítulo será tratado o instituto do contrato de

seguro de modo geral, trazendo sua contextualização histórica, dos

elementos e classificação dos contratos de seguro. Analisamos também a

modalidade do contrato de adesão que nasce da necessidade de

uniformização das cláusulas com o intuito de promover uma

dinamização das relações contratuais, numa pluralidade de situações

uniformes. Este tipo de contrato cria para o leigo a impossibilidade de

disposição sobre o conteúdo do contrato, restando apenas a possibilidade

se aceitar ou não o proposto. Contudo, isto, por si só, não caracteriza

adequadamente o contrato de adesão, o que será exposto ao longo desse

trabalho.

No segundo e último capítulo será examinado o foco

principal da nossa pesquisa, ou seja, o contrato de seguro frente ao

Código de Defesa do Consumidor. Tratamos de estabelecer um

parâmetro entre as cláusulas limitativas e restritivas inseridas nos

contratos de seguros.

2 LAKATOS, M. de. A metodologia Científica. São Paulo: Atlas, 1993, p. 37

Page 11: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

11

CAPÍTULO I. CONTRATO DE SEGURO 1.1 Origem histórica

O contrato de seguro surgiu na idade medieval, sendo totalmente

desconhecido do Direito Romano. O seu surgimento deu-se em função da

importância e desenvolvimento da navegação3.

Nesta época o contrato de seguro não tinha credibilidade, em função da falta

de segurança que tal modalidade de contrato oferecia. O caráter idêntico ao do jogo e

da aposta ensejava a freqüente falência das seguradoras, e conseqüentemente o

segurado não recebia nenhuma indenização na ocorrência do sinistro.

Desta forma o primeiro ramo a surgir foi o seguro marítimo, conhecido no

século XVI. Com relação ao seguro terrestre, houve o seu desenvolvimento a partir

do século XVII, na Inglaterra. Entretanto a difusão de um modo geral iniciou-se no

final do século XVIII e início do século XIX, e difundindo amplamente a final, no

século XX, atingindo excepcional desenvolvimento até a atualidade.

No Brasil, a primeira modalidade a ser regulamentada fio o seguro marítimo,

através do Código Comercial de 18504.

Com relação aos seguros terrestres, a sua regulamentação inicial deu-se através

do Decreto nº 4.720, de 16 de dezembro de 1901, modificado posteriormente pelo

art. 3º, inciso VIII, da Lei nº 1.616, de 30 dezembro de 1906. Entretanto, o Decreto

nº 5.072, de 12 de dezembro de 1903, foi de suma importância, pois submeteu as

companhias de seguros à autorização para funcionamento do país.

No Código Civil Brasileiro de 1916, a matéria de seguro de coisas e de vida foi

disciplina em cinco diferentes seções, a saber: I- Das disposições gerais sobre o

3 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 101 4 Idem, p. 103

Page 12: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

12

seguro; II- Das obrigações do segurado; III- Das obrigações do segurador; IV- Do

seguro mútuo; e V- Do seguro de vida.

1.2 Previsão legal

O contrato de seguro está disciplinado pelo Código Civil (Lei 10.406/2002) em

seu art.757, que define este contrato como aquele pelo qual “ o segurador se obriga,

mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo

a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”.

1.3 Conceito

Para conceituar o contrato de seguro é necessário recorrermos à doutrina.

Segundo Pontes de Miranda: “É o contrato pelo qual o segurador se vincula,

mediante pagamento a ressarcir ao segurado, dentro do que se convencionou, os

danos produzidos por sinistro, ou a prestar capital ou renda quando ocorrer

determinado fato, concernente a vida humana ou ao patrimônio”5.

No entender de Caio Mario “...é o contrato por via do qual uma das partes

(seguradas) se obriga para com a outra (segurado), mediante o recebimento de um

prêmio, a indeniza-la ou a terceiros, de prejuízos resultantes de riscos previstos”6.

Para Fran Martins: “...aquele que uma empresa assume a obrigação de

ressarcir o prejuízo sofrido por outrem em virtude de evento incerto, mediante

pagamento de uma determinada importância”7.

No entendimento de Fabio Ulhoa Coelho: “ É o contrato em que uma parte

(Sociedade Seguradora) se obriga, mediante pagamento de um prêmio, a pagar à 5 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de Direito Privado. São Paulo: Rssoi, 1997. p. 105. 6 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições do Direito Civil: Obrigações. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1998 p. 95 7 MARTINS, Fran. Contratos Comerciais. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 111

Page 13: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

13

outra parte seguradora, ou a terceiros, beneficiários, determinada quantia caso

ocorra evento futuro e incerto”8.

As definições apresentadas no Código Civil para o contrato de seguro são

genéricas, assim como todo o tratamento dado por este diploma legal ao instituto.

Tendo em vista o imenso campo de abrangência dos seguros na sociedade atual e a

rápida evolução das necessidades sociais, o legislador preferiu deixar para a

legislação extravagante a disciplina das diversas subespécies de seguro. Ao Código

restou a disciplina geral deste contrato.

Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado

o Código Comercial de 1850, o que não significará a abolição dos conceitos

contrários do Direito Privado e do Comercial, sobre tudo porque o novo diploma traz

em seu Livro II a disciplina do Direito Empresarial.

No entender de Orlando Gomes: “O seguro é contrato mercantil, pois, por

imposição legal, só empresas organizadas sob forma de sociedade anônima podem

celebra-lo na qualidade de segurador... A natural exigência de que o segurador seja

uma sociedade por ações desloca o contrato do Direito Civil para o Direito

Comercial, tornando-o um contrato mercantil”9.

Ao contrato de seguro também é aplicada as regras do Código de Defesa do

Consumidor. É o que se depreende da análise de caput do art. 2º e do art. 3º,

parágrafo 2º deste diploma legal, in verbis: “art. 2º Consumidor é toda pessoa física

ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. (...)

art. 3º ... parágrafo 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de

consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de

crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.

Da definição do Código Civil depreende-se a existência de duas partes: o

segurador e segurado, que, no entanto, não são únicas, uma vez que pode surgir a

8 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva. 1998. p. 88 9 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 1999. p. 410

Page 14: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

14

figura do beneficiário, terceiro que receberia a indenização no caso de seguros de

vida e obrigatório contra acidentes de trabalho em que resultasse a morte do

segurado. Este estaria contido na expressão “interesse legítimo do segurado”,

mostrando mais uma vez a redação mais apurada no novo Código Civil, já que no

Código Civil de 1916, a estipulação em favor de terceiro tem que vir expressa nos

dispositivos que tratam de seguro de vida.

O objeto do contrato de seguro, segundo Caio Mario da Silva Pereira: “é o

risco, que, por enquanto, limitar-nos-emos a defini-lo como o evento futuro e

incerto, o qual, em se concretizando, ensejará o cumprimento da contraprestação de

“indenizar” por parte do segurador”10.

1.4 Elementos do contrato de seguro

Para podermos entender melhor como se caracteriza o contrato de seguro, se

faz necessário conhecermos os seus elementos:

a) A proposta – que é, geralmente, um documento emitido pela

seguradora, em formato padronizado, que aborda os limites

dos interesses das partes na contratação do seguro e as

condições iniciais, bem como valor do prêmio e da

indenização.

b) A apólice – que é documento principal regulador das

responsabilidades e obrigações de cada uma das partes e se

constitui no contrato instituído pela seguradora, mediante

regras impostas pela lei e pelo órgãos oficiais que fiscalizam

esta atividade econômica.

c) O estipulante – que é pessoa física ou jurídica que contrata o

seguro a favor de um segurado.

10 PEREIRA, Caio Mário da Silva, Op. cit., p. 410

Page 15: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

15

d) O beneficiário – que é a pessoa física ou jurídica a qual se

destina o valor da indenização na hipótese de ocorrência do

sinistro previsto na apólice. Em algumas situações o

beneficiário poderá ser também o estipulante e o segurado.

e) O risco – que é o hipotético evento causador do dano físico,

moral, ou patrimonial ao segurado e em razão do qual é

contratado o seguro.

f) O sinistro – que é a ocorrência do evento danoso previstos na

contratação do seguro.

g) O prêmio – que é o valor pelo qual o segurado paga para

obter a garantia do seguro e que é recebido pela seguradora

como pagamento pela assunção do risco.

h) A cobertura – que é o valor garantido pela seguradora na

hipótese de ocorrência do evento danoso denominado de

sinistro.

i) A carência – que é o período de tempo em que o segurado

paga a sua contraprestação mas que o segurador não está

obrigado a indenizar se ocorrer o evento danoso.

j) A franquia – que é um limite de valor que deverá ser

suportado pelo próprio segurado, na hipótese de sinistro, e a

partir do qual passa a se responsabilizar a seguradora, tudo

conforme estipular o contrato. A franquia é contratual, pode

ser maior, menor ou não existir.

k) O rateio – que é uma condição contratual que prevê a

possibilidade do segurado assumir uma proporção da

Page 16: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

16

indenização do seguro quando o valor segurado é inferior ao

valor efetivo do bem segurado.

l) O prazo de vigência – que representa o período de cobertura

do seguro, deve ser examinado e considerado como elemento

formador do valor do prêmio. Embora os seguros de uma

forma geral sejam contratados por um ano, já existem no

mercado várias modalidades de seguro que cobrem períodos

de meses, semanas, ou até dias.

A renovação dos contratos de seguro não é automática, salvo em alguns

contratos com cláusula neste sentido, portanto, havendo interesse do segurado na sua

prorrogação, deve procurar a seguradora antes de vencido o prazo de vigência do

seguro, sob pena de passar algum tempo descoberto antes da formalização do

contrato e do início de sua nova vigência.

1.5 Classificação do contrato de seguro

Segundo Loureiro: “ o contrato de seguro pode ser classificado em bilateral

sinalagmático, oneroso, aleatório, consensual, de execução sucessiva ou continuada,

de adesão, de boa-fé.”11

O contrato de seguro é um contrato bilateral, pois ambas as partes contraem

obrigações decorrentes do referido contrato. O fato de em muitos casos não houver

sinistro, não muda a natureza jurídica bilateral do contrato, pois, houve a obrigação

do segurador em cobri- lo, caso ocorresse, sendo tal posição pacífica na doutrina12.

É um contrato sinalagmático em virtude de haver dependência recíproca das

obrigações, ou seja, para que uma das partes possa exigir seus direitos decorrentes do

11 LOUREIRO, Luiz Guilherme de Andrade V. Seguro saúde (Lei n. 9656/98; Comentários, doutrina e jurisprudência. São Paulo: LEJUS, 2000. p. 37 12 Idem, ibidem.

Page 17: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

17

contrato, mister tenha cumprido suas obrigações decorrentes da mesma relação

jurídica contratual.

Em virtude de que o segurado procura obter uma proteção patrimonial, e o

segurador visa obter vantagem patrimonial, é um contrato oneroso, pois existe o

intuito especulativo, gerando ônus e vantagens para ambos os contraentes.

Trata-se de contrato aleatório, em razão de que, entre as prestações devidas

não há equivalência, não há como saber, na contratação do seguro o que vai receber

no final, pois o acontecimento previsto contratualmente e passível de indenização

(risco), pode ocorrer ou não. A aleatoriedade é uma das mais evidentes

características dos contratos de seguro.

Segundo Maria Helena Diniz: “ o ganho ou a perda dos contraentes

dependerá de fatos futuros e incertos, previstos no contrato, que constituem o risco.

A natureza aleatória do contrato de seguro advém de sua própria função econômico-

social”13.

O contrato de seguro é um contrato consensual, pois surge através do acordo

de vontades, apesar da obrigatoriedade da forma escrita prevista no Código Civil14.

Segundo Orlando Gomes: “ basta o consenso manifestado pela forma

própria”15. Para Maria Helena Diniz : “ o contrato de seguro é um contrato formal,

sendo a forma escrita exigência para a substância do contrato”16.

Trata-se de contrato de execução sucessiva ou continuada, por tratar-se de

negócio que se destina a uma certa duração, por menor que seja o tempo, a fim de

proteger o bem ou a pessoa. Tal duração será até o término da vigência do contrato,

13 DINIZ, Maria Helena. Seguro. In: Tratado Teórico e Prático dos Contratos. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 319. 14 Idem, p. 320. 15 GOMES, Orlando. Teoria Geral dos Contratos. Contratos em espécie. Seguros. In: Contratos: Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 207 16 DINIZ, Maria Helena. Seguro. In: Tratado Teórico e Prático dos Contratos: São Paulo: Saraiva, 1993. p. 321

Page 18: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

18

ficando o segurador obrigado a garantir os interesses do segurado previstos

contratualmente durante toda a vigência.

O contrato de seguro é um contrato de adesão17, em virtude de que, o

contraente, ou seja, o segurado, na contratação, deve aderir a todas as cláusulas

preestabelecidas pelo segurador, não lhe sendo facultado discutir quaisquer uma

delas. Tal situação ocorre em virtude de que há uma necessidade de se uniformizar as

cláusulas e condições para todos os segurados, tendo em vista certos elementos que

serão analisados, como a mutualidade, o cálculo das probabilidades e

homogeneidade, a fim de que se possa definir o valor de seu preço, de seu prêmio, e

a delimitação dos riscos que serão cobertos na hipóteses de sinistro.

1.6 Do princípio da boa-fé

O contrato de seguro é, primordialmente um contrato de boa-fé. A boa-fé é

exigida tanto ao segurado, quanto ao segurador, prevendo a lei sanções para quem

contratar de má-fé. A boa-fé é a alma do contrato de seguro, pois, o segurado, ao

contratar, deve fazer declarações verdadeiras, a fim de que a espécie de seguro

contratado, e os riscos cobertos possam ser devidamente honrados pelo segurador,

pois dependendo do risco a ser coberto, é que se definirá o valor do preço, e com o

recebimento dos preços dos segurados, é que o segurador forma um fundo que

propicia o pagamento das indenizações.

Ao segurador também é exigida a boa-fé, quando ao expedir a apólice, tiver

conhecimento de que o risco passou, estará agindo de má-fé. Além deste hipótese,

uma questão muito relevante, que merece atenção é a da devida entrega ao segurado

das condições do seguro, para que tenha conhecimento das cláusulas, especialmente

as limitativas. Além da efetiva entrega ao segurado, as cláusulas limitativas não

podem ser obscuras, mal redigidas, ambíguas, pois neste caso não estaria o segurador

contratando de boa-fé.

17 Op. cit., p. 322.

Page 19: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

19

1.7 Dos contratos de adesão

1.7.1 Conceito

Define-se o contrato de adesão como negócio jurídico no qual a participação

de um dos sujeitos da relação sucede pela aceitação em bloco de uma série de

cláusulas formuladas antecipadamente, de modo geral e abstrato, pela outra parte,

para construir o conteúdo normativo e obrigacional de futuras relações concretas18.

“Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela

autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de

produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar

substancialmente seu conteúdo.”19

1.7.2 Características

O contrato de adesão caracteriza-se por permitir que seu conteúdo seja pré-

construído por uma das partes, eliminada a livre discussão que precede normalmente

à formação dos contratos20.

O traço característico do contrato de adesão é a possibilidade de pré-

determinação de sua cláusulas, a determinação do conteúdo da relação negocial, pela

parte que faz a oferta ao público, o fornecedor. Um elemento essencial, portanto, do

contrato de adesão é a ausência de uma fase pré-negocial, a falta de um acordo

prévio sobre as cláusulas que comporão o contrato. Há uma pré-fixação de seu

conteúdo, deixando ao oblato a alternativa de aceitar ou rejeitar o contrato, sem

poder modificá- lo de maneira relevante, sendo que seu consentimento manifesta-se

na adesão ao conteúdo pré-estabelecido pelo fornecedor do bem ou serviço com

quem se deseja contratar.

18 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 55 19 FRONTINI, Paulo Salvador. Contratos de Adesão, São Paulo: Revista do Advogado, 1990. p. 83-87 20 GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Forense: Rio de Janeiro, 1999. p. 04

Page 20: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

20

Há um esquema contratual constituído por uma série de cláusulas ou condições

destinadas a normatizar a seqüência de relações jurídicas contratuais.

O conteúdo desses contratos tem uma determinação prévia e unilateral, sendo

as cláusulas redigidas antecipadamente por um dos sujeitos da relação.

Os contratos de adesão só têm existência no momento que ocorre a aceitação

em bloco das cláusulas pré-concebidas pela outra parte, ou seja, só existe quando o

indivíduo consente. Formam-se, como qualquer contrato, pela composição de

vontades distintas. Orlando Gomes21, neste sentido, procura ressaltar que os efeitos

jurídicos advindos do contrato de adesão ratificam a posição contratualista, não

justificando tratamento especial como categoria distinta.

A função do contrato de adesão é, portanto, agilizar os negócios jurídicos,

democratizando as relações negociais, possibilitando que um maior número de

contratantes tenha acesso aos bens22.

Há, entretanto, desvantagens no contrato de adesão. E ele normalmente só é

lembrado, debatido e estudado em função dessas desvantagens conhecidas como

cláusulas abusivas. Normalmente, essas cláusulas não são percebidas e identificadas

no momento de contratar, isto é, o aderente normalmente não tem idéia de que está

acordando. Esse tema específico voltará a ser debatido mais à frente.

Esta relação contratual pode ser definida por dois ângulos:

a) Enquanto configura apenas a formação das cláusulas por

uma só das partes, é chamada de condições gerais dos

contratos.

b) Quando há efetiva adesão ao contrato, formando-se a

relação jurídica bilateral, temos o contrato de adesão 21 GOMES, Orlando. Contrato de Adesão: Condições Gerais dos Contratos. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1995. p. 46. 22 Idem, Ibidem, p. 47

Page 21: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

21

propriamente dito, passando assim, a observar eficácia no

mundo jurídico. Em suma, são dois aspectos do mesmo

fenômeno em momentos diversos. No entanto as condições

gerais dos contratos, enquanto não ingressem no comércio

jurídico, não passam de simples amostra de formulário,

como se refere Orlando Gomes23, usando expressão alemã.

Ou seja, não tem interesse jurídico, são meras formulações.

Por seu turno o comportamento do cliente que cria uma

relação concreta só tem relevância jurídica quando implica

adesão às condições gerais do contrato preestabelecidas

pelo empresário.

1.7.3 Condições gerais dos contratos de adesão

Não obstante todas as discussões, estudos e debates acerca da natureza, da

formação, constituição, conceito e características dos contratos de adesão, ocorre

ainda uma célere discussão acerca da terminologia do contrato de adesão: uma, para

diferenciá- lo das condições gerais do contrato, outra distingue-o dos contratos por

adesão.

A figura jurídica do contrato de adesão apresenta-se sob duplo aspecto,

conforme o ângulo no qual seja formalizada. Analisando na perspectiva da

formulação das cláusulas por uma das partes, de modo uniforme e abstrato,

denomina-se condições gerais do contrato.

Segundo Theodoro Junior: “quando analisado no plano efetivo, já tomado

corpo na eficácia jurídica, é chamado contrato de adesão, sendo analisado no

prisma do modo por que se formam as relações jurídicas bilaterais”24.

23 Op. cit., p. 119 24 JUNIOR, Humberto Theodoro. Contratos – Princípios Gerais – Tendências do Direito Contratual Contemporâneo. Revista dos Tribunais: São Paulo, RT 765, 1999. p. 33

Page 22: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

22

O contrato de adesão é configurado pelo monopólio, de fato ou direito, do

fornecedor. Caso contrário será contrato por adesão, como nos ensina Orlando

Gomes: “É pressuposto, pois, do contrato de adesão o monopólio de fato, ou de

direito, de uma das partes que elimina a concorrência para realizar o negócio

jurídico. Se a situação não se configura desse modo, poderá haver contrato por

adesão, jamais contrato de adesão.25”

Enquanto não ingressam no comércio jurídico, tais condições não têm

interesse prático ou dogmático. Por seu turno, o comportamento do cliente que

provoca a formulação de uma relação concreta somente reveste significação

particular se implica adesão às condições gerais previamente estatuídas pelo

empresário.

25 GOMES, Orlando. Contratos. Op. cit., p. 101

Page 23: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

23

CAPÍTULO II. O CONTRATO DE SEGURO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR 2.1 Considerações iniciais

O advento do Código de Defesa do Consumidor em 1990, ocasionou

mudanças significativas nas relações contratuais de toda natureza, pois forçou os

fornecedores a estarem atentos às exigências legais, sendo então mais um aliado dos

consumidores.

A nova concepção contratual distancia-se daquela onde o que vale é a vontade

das partes. O que o CDC deixou claro é que as diferenças entre os contratantes

podem e devem ser levadas em conta, pois acarretam muitos prejuízos àqueles mais

fracos. É exatamente procura do equilíbrio contratual que a lei aparece na sociedade

de consumo moderna para destacar seu papel como limitadora e legitimadora da

autonomia da vontade, protegendo então os interesses sociais, valorizando a

confiança, as expectativas e a boa-fé dos contratantes.

No que se refere aos aspectos contratuais da proteção do consumidor, o CDC

rompeu com as tradições do direito privado, assentadas no liberalismo do século XIX

para instituir uma nova realidade.

Inicialmente, enfatizou o princípio do equilíbrio do contrato em detrimento

daquele que estabelece que os contratos devem ser cumpridos (pacta sunt servanda).

Para entendermos melhor essa afirmação, citamos o art. 6º, inciso V do Código

de Defesa do Consumidor, que declara: “ São direitos do consumidor: (...)V – a

modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais

ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente

onerosas”. Desta forma é possível perceber que a intenção maior do legislador foi

assegurar o equilíbrio contratual e não a vontade declarada no contrato.

Page 24: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

24

Nota-se também que há a primazia da boa-fé contratual, dando a este princípio

caráter basilar das relações de consumo.

O Código de Defesa do Consumidor também impôs ao fornecedor o dever de

prestar declaração de vontade, se tiver veiculado oferta, apresentação ou publicidade,

gerando mais responsabilidades ao anunciar o produto ou o serviço, exatamente

visando transparência maior ao consumidor. E se o fornecedor veicular uma oferta

específica, determinada, ficará obrigado nos termos dela, resolvendo-a em perdas e

danos caso não a cumpra. Estes são alguns exemplos significativos das inovações e

mudanças que o CDC impôs às relações contratuais.

As alterações sofridas nas regras tradicionais foram necessárias, uma vez que,

as mesmas não mais atendem aos anseios das relações contratuais atuais,

principalmente quando se fala em contratos de adesão que, como já visto

anteriormente, são capazes de gerar mais abusividades do que os demais.

2.2 O Código de Defesa do Consumidor em relação ao contrato de

seguro

No que se refere ao contrato de seguro mais especificamente, a interpretação é

voltada em favor dos segurados nos casos em que há flagrante ambiguidade de

interesses. Outro lado da interpretação é a prevalência das cláusulas acertadas sobre

as impressas. Desta forma, quando se estiver diante de uma situação em que esteja

em jogo uma cláusula escrita à mão pelo segurado e outra impressa no modelo do

segurador, prevalecerá a escrita, pressupondo-se ser esta decorrente de um acordo

entre as partes sobre aquele ponto específico.

A interpretação dos contratos de seguro assegurada pelos mais diversos

Tribunais do país demonstra que há uma preocupação constante em sempre,

guardadas as devidas proporções, beneficiar o segurado.

Page 25: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

25

Porém, é de se frisar que o crescimento do mercado segurador é observado

atentamente pelos organismos de controle, que reconhecem sua importância sem

deixar que a visão capitalista deturpe as conquistas já alcançadas pelo Código de

Defesa do Consumidor.

2.3 O contrato de seguro como relação de consumo

No artigo 3º parágrafo 2º do CDC, estão elencados os serviços merecedores de

sua proteção. Dentre eles, o contrato de seguro se destaca como uma atividade do

mercado de consumo, não havendo quaisquer dúvidas sobre sua inclusão, pois está

explicitamente indicado. In verbis: Art. 3º (...) Parágrafo 1º (...) parágrafo 2ºServiço

é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração,

inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as

decorrentes de caráter trabalhista.

Portanto, fica assim caracterizado que o contrato de seguro é objeto de

proteção do Código de Defesa do Consumidor, devendo estar enquadrado em sua

regras elementares. Entretanto, há que se ressaltar que o seguro é um tipo de

contratação que tem legislação específica desde 1966, pelo Decreto nº 73/66, que

regula todas as operações de seguro privado no país, dando-lhes a regulamentação

necessária ao seu efetivo comportamento no mercado.

Nos contratos, ocorre o grande problema do desequilíbrio das forças dos

contratantes. Sendo que, uma das partes é muito vulnerável, hipossuficiente26, é o

pólo mais fraco da relação contratual, pois esta parte não pode discutir o conteúdo do

contrato; mesmo com conhecimento de que determinada cláusula é abusiva, restando

somente a opção de aceitar nas condições que lhe é oferecida pelo fornecedor.

No que se refere as contratações feitas na forma de adesão, foi necessário um

rigor maior do CDC, principalmente pela incidência maior de abusividades. No

entanto, o artigo 54 deste código deixou claro que estes contratos (de adesão) não

26 GRINOVER, Ada Pelegrini. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 72

Page 26: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

26

podem ser abominados, pela sua importância crucial nas contratações num mundo

globalizado e mais dinâmico. Por este motivo, ao mesmo tempo que no Código de

Defesa do Consumidor se proíbem as cláusulas abusivas, são admitidas

simplesmente as cláusulas limitativas de direitos, com a ressalva de estarem estas

bem redigidas e destacadas do texto principal.

Contudo, para estas cláusulas, o que se tenta é a informação e não a ignorância

do consumidor. Assim, um consumidor mais informado terá melhores condições de

se defender, ao contrário daquele que não tinha conhecimento do que estava

contratando. A cláusula limitativa ou restritiva de direitos não é nula de pleno direito,

como entendem alguns operadores jurídicos. Deve sim estar “engessada” em

parâmetros bem definidos, como faz o Código de Defesa do Consumidor. Fora destes

limites, poderá ser declarada nula. Do contrário, a nulidade não se faz presente. É o

que se vê no art. 54 do CDC e seus parágrafos, in verbis: art. 54 Contrato de adesão

é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou

estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o

consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. Parágrafo

1º A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do

contrato. Parágrafo 2º Nos contratos de adesão admite-se cláusula resolutória,

desde que alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto

no parágrafo 2º do artigo anterior. Parágrafo 3º Os contratos de adesão escritos

serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a

facilitar sua compreensão pelo consumidor. Parágrafo 4º As cláusulas que

implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque,

permitindo sua imediata e fácil compreensão.

Há que ressaltar que o referido artigo em seu parágrafo 4º admite

expressamente as cláusulas limitativas, desde que elas sejam redigidas com destaque,

de modo a permitir sua imediata e fácil compreensão.

Estas cláusulas, portanto, para que possa efetivamente ter validade e estar a

salvo de qualquer contestação, devem ser incluídas na apólice ou em outro

Page 27: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

27

documento qualquer e entregue ao segurado, com total clareza e melhor

transparência possível.

2.4 Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos contratos

de seguro

Com o advento do Código de Defesa do Consumidor, os contratos de consumo

em as relações que ligam o consumidor ao profissional, fornecedor de bens ou

serviços sofreram enormes transformações, com o intuito de preservar um provável

desequilíbrio entre as partes contratantes, tal seja o consumidor. Com a promulgação

da Constituição Federal de 1988, entre os direitos individuais, está inserida a norma

que prevê a defesa do consumidor, no artigo 5º, XXXII: O Estado promoverá na

forma da lei a defesa do consumidor.

Na referida Constituição, nos Atos das Disposições Constitucionais

Transitórias, em seu artigo 48, ficou determinado que o Congresso Nacional, dentro

de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará Código de Defesa

do Consumidor.

Diante de tal previsão constitucional, adveio o Código de Defesa do

Consumidor (Lei nº 8.078/90), cuja necessidade é de regular as “relações de

consumo”. Nas relações contratuais, o citado Código regula-as, de maneira assegurar

um justo equilíbrio dos direitos e obrigações das partes contratantes, e desta forma,

harmonizando as forças do contrato através desta regulamentação especial.

No entanto, o novo direito dos contratos está evitando que tal desequilíbrio

ocorra, procurando a equidade contratual entre as partes. A professora Cláudia Lima

Marques27 revela a importância dos contratos de seguro para tornar o direito dos

contratos mais social, a fim de tornar o desequilíbrio entre as partes menos

alarmante.

27 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p.133

Page 28: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

28

Os contratos de seguro foram responsáveis por uma grande evolução

jurisprudencial no sentido de conscientizar-se da necessidade de um direito dos

contratos mais social, mais comprometido com a equidade e menos influenciado pelo

dogma da autonomia da vontade.

As linhas de interpretação asseguradas pela jurisprudência brasileira aos

consumidores de seguro, são um bom exemplo da implementação de uma tutela

especial para aquele contratante em posição mais vulnerável na relação contratual.

No contrato de seguro, esta vulnerabilidade do contratante também está

presente, ou seja, há um enorme diferencial entre as partes contratantes, entretanto

com o surgimento do Código de Defesa do Consumidor vem ocorrendo uma

conscientização da necessidade de uma relação contratual mais social, com o

comprometimento com a equidade do que influenciado pela manifestação da

autonomia da vontade.

Deste modo, estas relações de consumo necessitavam de uma intervenção

regulamentadora do legislador, qual seja a intervenção de reequilíbrio, mormente

agora instrumentalizado com as normas do Código de Defesa do Consumidor.

A atividade secundária está abrangida pelo Código de Defesa do Consumidor,

em fase do artigo 3º, inciso 2º, incluindo como serviço para proteção e defesa do

consumidor.

O inciso acima mencionado define o serviço como qualquer atividade

fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza

bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de

caráter trabalhista.

Diante de tal artigo, verifica-se a aplicabilidade do Código de Proteção do

Consumidor aos contratos de seguro. Segundo José Geraldo Brito Filomeno28, um

28 FILOMENO, José Geraldo Brito. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro: Forense, 1990. p. 40.

Page 29: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

29

dos autores do anteprojeto do Código, faz uma clara colocação sobre o assunto:

Aliás, o Código fala expressamente em atividades de natureza bancária, financeira,

de crédito e securitária, aqui se incluindo igualmente os planos de previdência

privada em geral, além dos seguros propriamente ditos, de saúde, etc.

Segundo Cláudia Lima Marques29, em seu posicionamento sobre contratos

submetidos ao CDC, dentre eles, o contrato de seguro, demonstra a devida aplicação

do referido Código em tais contratos:

Resumindo, em todos estes contratos de seguro podemos identificar o

fornecedor exigido pelo art. 3º do CDC, e o consumidor: Note-se que o destinatário

do prêmio pode ser o contratante com a empresa seguradora (estipulante) ou terceira

pessoa, que participará como beneficiária do seguro. Nos dois casos, há um

destinatário final do serviço prestado pela empresa seguradora. Como vimos, mesmo

no caso do seguro-saúde, em que o serviço é prestado por especialistas contratados

pela empresa (auxiliar na execução do serviço ou preposto), há a presença do

‘consumidor’ ou alguém a ele equiparado, como dispõe o art. 2º e seu parágrafo

único.

Portanto os contratos de seguro estão submetidos ao Código de Proteção do

Consumidor, devendo suas cláusulas estarem de acordo com tal diploma legal,

devendo ser respeitadas as formas de interpretação e elaboração contratuais,

especialmente a respeito do conhecimento ao consumidor do conteúdo do contrato, a

fim de coibir desequilíbrios entre as partes, principalmente em razão da

hipossuficiência do consumidor em relação ao fornecedor.

Atualmente, não é o modo de formação dos contratos que é responsável pelo

surgimento de desequilíbrios contratuais, mas sim, a inserção de cláusulas limitativas

e abusivas, introduzidas unilateralmente pelo fornecedor, pelo fato de ocupar uma

posição de destaque e poder, estabelecendo antecipadamente o conteúdo do contrato,

situação que ocorre nos contratos de seguro.

29 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. Op. cit., p. 114

Page 30: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

30

Geralmente, os contratos de adesão, e ai podemos inserir o contrato de

seguro, não são totalmente eivados de vícios da manifestação de vontade, mas sim,

em condições gerais demonstram através de redação capciosa não em todo o texto,

mas em determinadas cláusulas ou pontos específicos apresentam estas deformações

contratuais.

O contrato de seguro é sem dúvida um contrato de adesão, ou seja, cujas

cláusulas contratuais são determinadas unilateralmente, suprimindo-se todas e

quaisquer negociações prévias, opondo-se visivelmente aos contratos individuais,

onde são permitidas e realizadas discussões e negociações amplas das cláusulas

contratuais.

Cabe ressaltar que as cláusulas limitativas e abusivas não são exclusivamente

parte integrante dos contratos de adesão e dos contratos de consumo; também podem

estar presentes nos contratos paritários.

Diante da aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de

seguro, mister se faz um estudo de suas cláusulas limitativas, a fim de que possa ser

verificado como devem ser utilizadas tais cláusulas no contexto contratual, sob a

égide deste diploma legal, e se, de alguma forma, as cláusulas limitativas podem se

tornar abusivas.

2.5. A interpretação das cláusulas limitativas dos contratos de seguro

em face do Código de Defesa do Consumidor

2.5.1. Da cláusula limitativa

Com aplicação do Código de Defesa do Consumidor nos Contratos de

Seguro, a questão das cláusulas limitativas no contrato em questão tem gerado muitas

controvérsias.

Page 31: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

31

2.5.1.1. Conceito de cláusula limitativa

Cláusula limitativa é aquela que implica em limitação do direito do

consumidor30. Tal cláusula limita e impõe algumas situações contratadas pelo

consumidor, ou seja, tal cláusula não é abusiva, a princípio, apenas limita e impõe

desvantagem, sendo que a mesma não é proibida pelo Código de Defesa do

Consumidor. Toda situação ou estipulação que implicar ou carecer qualquer

limitação de direito do consumidor, bem como a que indicar desvantagem ao

aderente, deverá estar obrigatoriamente exposta, de forma mais clara, no contrato de

adesão.

2.5.1.2. As cláusulas limitativas inseridas no contrato de seguro

O contrato de seguro, em virtude de sua natureza jurídica, possui diversas

cláusulas limitativas. Tal situação ocorre em decorrência de que, na cobertura do

risco, o contrato de seguro se alicerça em alguns fundamentos que são a mutualidade,

cálculo das probabilidades e homogeneidade para definir o valor de seu preço, ou

seja, o valor do prêmio, e da futura indenização, e a delimitação dos riscos que

estarão cobertos. Portanto, o contrato de seguro possui cláusulas que são limitativas

dos riscos, para viabilizar suas contratações e indenizações.

Há que se ressaltar que tais situações ganham real importância com o dever

do fornecedor ao consumidor sobre o conteúdo do contrato.

No Código de Defesa do Consumidor, as cláusulas limitativas do risco não

ficaram proibidas, pois nesta questão, existe plena harmonia com o Código Civil.

Há que se ressaltar também, que a existência da cláusula limitativa tem por

finalidade restringir a obrigação assumida pelo segurador de acordo com o principio

milenar de que ninguém pode ser coagido a assumir obrigação maior do que deseja.

30 FILOMENO, José Geraldo Brito. Código de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Op. cit., p. 41.

Page 32: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

32

Reside portanto, nesta visão a própria essência da liberdade de contratar; as partes

manifestam a sua vontade livremente, estabelecendo as obrigações que entenderem

possíveis.

A maioria dos consumidores que concluem contratos pré-redigidos o fazem

sem conhecer precisamente os termos do contrato. Geralmente, o contratado não tem

a oportunidade de estudar e analisar com cuidado as cláusulas do contrato, ora

celebrado, seja porque eles as receberá somente após concluir o mesmo, seja porque

eles se encontram disponíveis somente em outro local, seja porque o instrumento

contratual é longo, impresso em pequenas letras e em linguagem técnica, tudo

desestimulando a sua leitura e colaborando para que o consumidor se contente com

as informações gerais prestadas pelo contratante.

No direito comparado, quando se analisam as cláusulas de limitação da

responsabilidade e seus efeitos nos contratos de consumo, dois temas são sempre

destacados: a necessidade de equilíbrio do contrato e o de segurança nas relações

contratuais.

As cláusulas limitativas de responsabilidade da parte mais forte, assim como

as de exclusão, desequilibram a relação contratual, impedindo uma composição

eqüitativa dos interesses privados que o contrato é regulado. Na ocorrência de cisão

deste equilíbrio entre direitos e obrigações de cada uma das partes contratadas, ao

retirar ou limitar as garantias normais que teria a parte mais fraca em contratos sem

este tipo de cláusula, enseja o desequilíbrio contratual entre as partes.

A argumentação da admissibilidade das cláusulas de limitação da

responsabilidade do fornecedor em função da redução da contraprestação, como se

fosse possível reduzir o preço de um produto comparar a irresponsabilidade ou o

direito de prejudicar os outros, não resistiu a uma análise ética.

Desta forma, coube ao legislador estabelecer alguns parâmetros quanto à

possibilidade de limitar o contrato, os direitos do contratante mais fraco, ou seja,

verificando a possibilidade de limitar a obrigação/responsabilidade do contratante

mais fraco. Há que ressaltar, que nesta linha raciocínio o legislador impôs novas

Page 33: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

33

normas, representadas pela sua maioria imperativa no Código de Defesa do

Consumidor.

Atualmente, a tendência é contestar a validade das cláusulas limitativas de

responsabilidade, mas com o cuidado de evitar generalizações perigosas que possam

ameaçar o equilíbrio, a justiça do contrato, deixando para a Justiça o papel de

solidificação do princípio.

O Código de Defesa do Consumidor enfrentou a inclusão de algumas

cláusulas limitativas de responsabilidade do fornecedor em contratos de consumo e,

para tanto, criou formas especiais a serem cumpridas para a sua completa validação.

O legislador também concentrou e previu no CDC uma linha de proibição

genérica às cláusulas limitativas que atenuem a responsabilidade por vícios de

qualquer natureza dos produtos e serviços (art. 25 e 51, I do CDC) e as que atenuem

a responsabilidade de indenizar, prevista na seção sobre o fato do produto ou do

serviço e sobre qualidade de produtos ou serviços (art. 24 e 25 do CDC).

No entender de José Aguiar Dias:

“Sem embargo de sua utilidade, pois estimula os negócios, mediante o

afastamento da incerteza sobre o quantum da reparação, a cláusula limitativa

muitas vezes resulta em burla para o credor. Dificilmente se dá o caso de ser o

dano real equivalente à reparação prefixada: o mais freqüente é representar um

simulacro de perdas e danos.

Continuando, ainda destaca: quando a soma arbitrariamente fixada resulte em

verdadeira lesão para o credor, principalmente quando se trate de transporte,

cujo contrato geralmente é de natureza a excluir a liberdade de discussão por

parte do interessado no serviço. Portanto, diante da própria natureza jurídica do

contrato de seguro, as cláusulas limitativas são inerentes a tal espécie de

contrato, e em razão da aplicabilidade do Código de Proteção ao Consumidor

Page 34: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

34

aos contratos de seguro, tais cláusulas devem estar de acordo com os preceitos

estabelecidos no citado Código.”31

Dentre os tais preceitos, no tocante às cláusulas contratuais, pode-se destacar

o artigo 46, que dispõe sobre a necessidade de dar ao consumidor conhecimento

prévio do conteúdo do contrato, e que veda a redação contratual efetuada de forma

que dificulte a compreensão do sentido e alcance de sua cláusulas.

2.6. Das cláusulas limitativas e as cláusulas abusivas no contrato de seguro

As cláusulas limitativas são inerentes aos contratos de seguro, em virtude da

necessidade de se delimitar os riscos cobertos no contrato.

Na análise da classificação dos contratos de seguro, o mesmo é tratado como

um contrato de adesão. Os contratos de adesão são frutos da sociedade de consumo e

da massificação das relações de consumo, e as suas características, antes do advento

do Código de Proteção ao Consumidor eram disciplinados pela doutrina e

jurisprudência, não tendo a legislação pátria regulamentado tal conceituação jurídica.

Portanto, o Código de Proteção ao Consumidor (Lei n.º 8.078/90) é a primeira

lei brasileira a disciplinar tal modalidade contratual, conceituando-a em seu artigo

54.

Pela definição do referido artigo, verifica-se que o contrato de seguro é um

contrato de adesão, devendo suas cláusulas obedecerem os dispositivos contidos nos

parágrafos do artigos em tela.

No tocante às cláusulas limitativas, o parágrafo 4º nos revela que deverão ser

redigidos com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão. Fica evidente

que o Código de Proteção do Consumidor não proibiu a inserção de cláusulas

limitativas nos contratos, mas regulamentou a sua inserção dentro do contesto

contratual.

31 DIAS, Aguiar José. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 59.

Page 35: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

35

O Código Civil Brasileiro, em seu art. 760 determina que os riscos assumidos

deverão constar na apólice.

É de se analisar, portanto, que sobre as cláusulas limitativas, o Código Civil e

o Código de Proteção ao Consumidor estão em sintonia. Ocorre que, as cláusulas

limitativas merecem maior atenção em relação a abusividade, ou seja, se em algum

momento as cláusulas limitativas se caracterizam como abusivas, serão nulas de

pleno direito, conforme dispõe o artigo 51 do referido texto legal.

No tocante as cláusulas limitativas, indispensáveis para contratação de

seguros, conforme já analisado, estas devem estar inseridas no corpo contratual nos

moldes do parágrafo 4º do artigo 54 do CDC, ou seja, devidamente incluídas na

apólice, redigidas em destaque, e de fácil compreensão, além de que devem ser

entregues ao segurado, para que este tenha pleno conhecimento das limitações ao seu

direito.

O insigne Desembargador Sérgio Cavalieri Filho nos distingue a cláusula

limitativa do risco e da cláusula abusiva nos contratos de seguro, nos seguintes

termos:

“Tenho sustentado que a principal diferença entre a cláusula limitativa do risco,

da qual acabamos de falar, e a cláusula abusiva está em que a primeira tem

por finalidade restringir a obrigação assumida pelo segurador, enquanto a

segunda objetiva restringir ou excluir a responsabilidade decorrente do

descumprimento de uma obrigação regularmente assumida pelo segurador, ou

ainda a que visa a obter proveito sem causa. E, como todos sabemos,

obrigação e responsabilidade são coisas distintas, que não podem ser

confundidas.”32

32 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Visão Panorâmica do Contrato de Seguro e suas Controvérsias. São Paulo: Revista do Advogado, 1996, n. 47, p. 7-13.

Page 36: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

36

Portanto, a princípio, as cláusulas limitativas nos contratos de seguro não são

vedadas, não sendo consideradas abusivas, devendo estar inserida no contexto

contratual de acordo com o determinado no Código de Proteção ao Consumidor.

Ocorre que, nos casos concretos, a forma como está inserida uma cláusula

limitativa, seu conteúdo em relação ao objeto do contrato, ou até a apresentação de

uma proposta simplificada na contratação, com a posterior entrega ao segurado do

contrato, e muitas vezes, sem até tal entrega, causando um total desconhecimento das

cláusulas, especialmente as limitativas ocasionam um profundo desequilíbrio entre as

partes, gerando o conflito de interesses, entre o segurado que almeja a proteção

pessoal ou patrimonial, e o segurador, que necessita limitar os riscos para a

viabilização das indenizações.

Desse modo, no conflito de interesses entre segurado e segurador, o contrato

deve ser interpretado segundo o artigo 47 do Código de Proteção ao Consumidor,

favorável ao consumidor, ou seja, ao segurado.

O referido Código, na esfera contratual, visa a coibir desequilíbrios entre as

partes, disciplinando como devem ser as relações jurídicas contratuais, devendo o

fornecedor dar conhecimento prévio ao consumidor sobre o conteúdo do contrato,

além de utilizar redação clara, destacando as que importem em limitação ao direito

do consumidor, como se verifica nos artigos 46, e 54 §§ 3º e 4º.

Em não se observando tais preceitos exigidos pelo ordenamento jurídico,

acarretará uma profunda desigualdade entre as partes contratantes, na qual o

segurado terá pago o prêmio, sem conhecimento das cláusulas que limitam seu

direito a indenização na hipótese de risco. Cabe analisar a extensão do disposto pelo

Código de Proteção ao Consumidor no tocante à interpretação das cláusulas

limitativas, a fim de que tais cláusulas não caracterizem como abusivas.

O professor Fernando Noronha define cláusulas abusivas como sendo:

aquelas em que contratos entre partes de desigual força reduzem unilateralmente as

Page 37: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

37

obrigações do contratante mais forte ou agravam as do mais fraco, criando uma

situação de grave desequilíbrio entre elas33.

Portanto, cláusulas abusivas são aquelas em que uma parte se aproveita da sua

posição de superioridade para impor em seu benefício vantagens excessivas, que ou

defraudam os deveres de lealdade e colaboração que são os pressupostos da boa-fé,

ou sobretudo, aniquilam uma relação de equidade que é um princípio de justiça

contratual. Desta forma, o resultado desta relação será uma gravíssima situação de

desequilíbrio entre os direitos e obrigações de uma e de outra parte contratante.

Regulando o contrato de seguro, este tem submissão aos preceitos estipulados

no Código de Defesa do Consumidor, e no artigo 46, define que: os contratos que

regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores se não lhes for dada

oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos

instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e

alcance.

Não obstante, para que uma cláusula seja considerada abusiva, é necessária

que a mesma contenha vantagens econômicas indevidas, ou facilidades originadas

pelo abuso do predisponente, tornando a negociação mais onerosa ao consumidor,

implicando em vantagem pecuniária, originária de uma flagrante demonstração de

inferioridade jurídica do aderente.

Ademais o Código de Defesa do Consumidor, no art. 51, que trata da

proteção contratual, enumera, não em numerus clausus, mas exemplificadamente, as

cláusulas nulas:

Artigo 51 – São nulas de pleno direito, entre outra, as cláusulas contratuais

relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(...)

33 NORONHA, Fernando. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais (autonomia, boa-fé, justiça contratual). 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

Page 38: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

38

IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, que coloquem o

consumidor em desvantagem exagerada, ou seja incompatíveis com a boa-fé ou a

equidade.

Com relação a interpretação dos contratos, o Código de Defesa do

Consumidor, reza no Art. 47: As cláusulas contratuais serão interpretadas de

maneira mais favorável ao consumidor.

Há que ressaltar que o legislador, preocupado com a posição ocupada pelo

aderente, procurou de maneira preventiva, evitar eventuais discrepâncias entre as

partes contratantes, determinando que a interpretação deverá ser feita de maneira

mais favorável ao consumidor, em detrimento da empresa que estabelece

unilateralmente as cláusulas contratuais.

Prática abusiva é, portanto a desconformidade com os padrões

mercadológicos de conduta boa, lícita numa relação perante o consumidor. Devem

ser consideradas como condições irregulares de negociações de consumo, que

desobedecem os alicerces da ordem jurídica, seja pelo âmbito da boa-fé, seja pela

ótica dos costumes e da ordem pública.

De um modo geral, as práticas abusivas nem sempre se mostram como

atividades enganosas, pois muitas vezes apesar de não desobedecerem o requisito da

veracidade, carregam uma carga alta de imoralidade econômica e de opressão.

O Código de Defesa do Consumidor prevê uma série de situações, sejam elas

contratais ou não, que abusam da boa-fé do consumidor, ou de sua situação de

flagrante inferioridade econômica ou técnica.

Sua manifestação, geralmente ocorrem através de atividades pré ou pós-

contratuais, e assim como propriamente contratuais, em que o consumidor sente-se

indefeso, e se as tem, não sentir-se-á incentivado, habilitado ou motivado para

exercer.

Page 39: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

39

Desta forma, as práticas abusivas estão espalhadas pelo Código de Defesa do

Consumidor, não se limitando as situações enumeradas pelo Art. 39. Tampouco

também se limitam ao CDC, mas também estão presentes na Lei n.º 8.137/90 – Lei

dos Crimes contra a Ordem Tributária, Econômica e Contra as Relações de

Consumo).

Diante dos preceitos elencados no Código de Defesa do Consumidor, no

tocante à correta inserção das cláusulas limitativas no contexto contratual, sua forma

de interpretação, o dever de informar o conteúdo do contrato, todos devem ser

observados na elaboração e contratação de seguros.

Na hipótese de não entrega ao segurado da apólice, ou as condições gerais

que contem as cláusulas aplicadas ao seguro contratado, tal situação gera um

profundo desequilíbrio entre as partes contratantes, colocando o segurado-

consumidor em desvantagem excessiva em relação ao segurador-fornecedor. Tal

situação ocorre em virtude de que, se não são entregues ao segurado as cláusulas que

limitam o contrato de seguro, não pode o segurado ter conhecimento das mesmas.

Na contratação, o segurado-consumidor paga o prêmio e adquire direitos, e no

momento que necessita da cobertura de um determinado risco, tem conhecimento de

que aquele determinado risco estava limitado em seu contrato sua não cobertura,

devendo tal situação ser analisada sob o prisma do Código de Proteção do

Consumidor.

Ocorre que, muitas vezes, o segurado não recebe as condições gerais do

contrato de seguro celebrado, que contém as cláusulas que regem-no, recebendo

somente a apólice com os valores contratados, e um sucinto manual. Portanto, todas

as cláusulas que forem limitativas, e se enquadrarem na situação acima prevista,

tornar-se-ão cláusulas abusivas, pois não obedecidas as disposições previstas no

Código de Defesa do Consumidor para a validade das cláusulas limitativas sem

qualquer contestação, especialmente no tocante ao Art. 46, além de colocar o

consumidor em desvantagem, e não estar compatível com a boa-fé, reputando-se

abusiva, conforme disposto no Art. 51, inciso IV do citado Código.

Page 40: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

40

A prova da efetiva entrega do contrato contendo as condições gerais, deve ser

feito pela Seguradora, conforme Art. 6º, inciso VIII do Código de Proteção ao

Consumidor, que permite a inversão do ônus da prova em favor do consumidor.

Além das situações alhures apresentada, as cláusulas limitativas devem estar

corretamente inseridas no contexto contratual, nos moldes do preceituado no § 4º do

Artigo 54 do referido texto legal. Portanto, as cláusulas limitativas, além de serem

redigidas com destaque, devem ter redação clara, de modo a não restar dúvidas ao

segurado no tocante à limitação imposta contratualmente.

Cabe analisar que, nos contratos de seguro em que as cláusulas limitativas

estiverem redigidas como as demais, sem qualquer destaque, ou a sua redação for

obscura, ambígua, de modo a não delimitar correta e claramente as limitações

impostas, tal situação também coloca o consumidor em situação de desvantagem

exagerada, além de abusar da boa-fé do segurado.

Portanto, quando as cláusulas limitativas nos contratos de seguro não

estiverem de acordo com o estabelecido no Código de Defesa do Consumidor, tais

cláusulas não só deverão ser interpretadas em favor do segurado-consumidor, mas

também deverão ser consideradas nulas de pleno direito, por não obedecerem o

determinado no referido Código, e por conseguinte, colocando o segurado em

desvantagem excessiva.

Para as empresas que o lançam no mercado, o seguro é o contrato pelo qual

elas captam recursos para pagar eventuais sinistros e, o restante, investir nas

operações financeiras, visando lucro. É um contrato baseado única e exclusivamente

em estatísticas. Funciona da seguinte forma: oferece-se um produto (seguro de

automóvel, por exemplo) para o mercado.

Page 41: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

41

Dos contratos firmados, apenas 10 ou 15% resultarão em sinistros pagos34. O

restante, pode perfeitamente ser aplicado nas operações financeiras (títulos públicos,

valores mobiliários, etc..) para garantir o pagamento dos sinistros e o restante lucro.

Quando bem estruturado, é um dos mercados mais promissores da atualidade,

gerando fontes de riquezas e investimento para o país.

Mesmo sendo expressiva sua participação no mercado, o seguro não deixa de

ter importância nos aspectos sociais, daí a grande regulamentação legal que sofre este

tipo de contrato. Um exemplo bastante válido é o seguro obrigatório (DPVAT), em

relação ao qual, pelo seu caráter social, a legislação que o regula chegou a conceder a

indenização mesmo quando não há pagamento do prêmio respectivo.

O que se quer deixar claro é que o seguro facultativo é um contrato baseado

na mutualidade. Se, por um lado, há uma obrigação de indenizar da seguradora, há,

por outro, a obrigação de pagar o prêmio estipulado. Os riscos cobertos devem estar

também muito bem especificados, pois é com base neles que o valor do prêmio será

calculado, limitando e particularizando as hipóteses de incidência. Norteando tudo

isso, aparece ainda a boa-fé do segurado, sem a qual ele perde o direito de ser

indenizado.

Este é o ponto central da discussão. O Código de Defesa do Consumidor veda

as cláusulas abusivas e não as limitativas (ou restritivas) de direito. É aqui que se

deve centrar o estudo.

A principal diferença entre a cláusula limitativa e a abusiva é que a primeira

tem como objetivo restringir a obrigação assumida pelo segurador, enquanto a

segunda, a finalidade primeira é excluir ou reduzir a responsabilidade decorrente do

descumprimento de uma obrigação assumida, ou ainda aquela que visa a obtenção de

uma vantagem sem causa.

As cláusulas limitativas, no contrato de seguro, têm papel importantíssimo,

pois é com base nelas que o segurador terá a noção exata dos riscos que está 34 O percentual varia conforme a conjuntura econômica, a determinação da SUSEP, a gravidade do risco coberto, enfim, para cada seguro há todo um estudo estatístico que irá determninar, com alguma segurança, a margem de contratos que terá como conseqüência a indenização securitária.

Page 42: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

42

cobrindo e até onde pode haver indenização securitária. Quando o seguro exclui, por

exemplo, o pagamento da indenização se o segurado, ao colidir seu veículo, estava

embriagado, isto não significa que a seguradora está abusando ao estabelecer esta

cláusula limitativa. Pelo contrário. Além de estar respaldada pela legislação de

trânsito, é somente com base nela que o prêmio pago pelo segurado é menor. Se não

for assim, o valor do seguro aumentaria demasiadamente, onerando o consumidor, e

não a seguradora, pois, como já dito, é com o dinheiro dos prêmios que a seguradora

responde aos sinistros ocorridos. Portanto, quando o Poder Judiciário sentencia

contra as cláusulas limitativas, não é contra a seguradora sua decisão. É contra toda a

massa de segurados que pagaram o prêmio.

A cláusula limitativa do risco é válido e eficaz, e não fere nenhum princípio

do CDC, eis que ao assinar o contrato, as partes tinham em mente o que estava sendo

segurado. A única restrição que faz o Código é quanto à apresentação destas, que

devem ser destacadas do corpo geral das condições, utilizando-se de recursos como

por exemplo negrito, letras em itálico, letras maiores, enfim, informar ao segurado da

importância das mesmas.

As seguradoras têm obedecido às ordens impostas, cabendo ao segurado fazer

a sua parte, ou seja, lê- las, dando atenção maior ao que está sendo enfatizado.

Diferentes são as cláusulas abusivas, que realmente afastam a obrigação

assumida de sua concretização. Estas sim, merecem ser totalmente repelidas e

devidamente enfrentadas pelo Poder Judiciário, pois contrariam o Código de Defesa

do Consumidor.

Exemplo bastante comum desta espécie de cláusula é o encontrado no seguro-

saúde. A cláusula que limita os dias de internação é abusiva. Se a doença que

acometeu o segurado tem cobertura, como limitar os dias de tratamento? Este tipo de

cláusula impede a efetiva concretização da obrigação assumida pelo segurador. Outro

exemplo é a imposição do foro de eleição. Se o contrato foi firmado em Florianópolis

e a seguradora só possui sede no Rio de Janeiro, seria absurdo pensar que só a ação

Page 43: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

43

proposta nesta comarca poderia dirimir os conflitos oriundos do contrato. Impor esta

condição ao segurado é dificultar seu acesso à justiça, sendo totalmente abusivo.

Dessa forma, ao se impor a nulidade a uma cláusula contratual com base no

Código de Defesa do Consumidor, deve-se ter em mente esta diferenciação entre

cláusulas limitativas/restritivas e as cláusulas abusivas, para somente nesta última

atribuir a penalidade mencionada. Do contrário, o consumidor não estará sendo

equiparado ao fornecedor, como quer o CDC, e sim, sobrepondo-se a este, o que

deve ser totalmente repugnado.

Page 44: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

44

CONCLUSÃO

Diante o exposto nesta monografia, podemos destacar as seguintes

conclusões:

Os contratos de seguro, devem ter suas contratações e cláusulas submetidas

aos preceitos estabelecidos no Código de Defesa do Consumidor. Entretanto, diante

da própria natureza jurídica e social dos contratos de seguro, e das características

demonstradas, estes possuem cláusulas que limitam o direito do segurado,

delimitando os riscos que estão cobertos, com exclusão de alguns.

Visando a proteção das relações de consumo entre segurador e segurado,

garantindo- lhe uma convivência justa e harmônica, é imperativo que o Código de

Defesa do Consumidor se destaque na manutenção dos direitos e garantias,

principalmente da parte contratante considerada hipossuficiente (consumidor). Deste

modo, as cláusulas limitativas do contrato de seguro destacam-se apenas para limitar

o risco do segurador, não podendo de nenhuma forma extrapolar outros direitos ou

garantindo vantagem indevida, sobrepondo-se sobre a outra parte contratante, sob

pena das mesmas seres consideradas abusivas, e portanto, nulas de pleno direito.

Sendo o contrato de seguro uma modalidade de adesão, é imprescindível que

o contratado seja tratado numa relação de equivalência, ou seja, tais relações de

consumo devem ser claras o suficiente, para que as cláusulas limitativas sejam

destacadas no contrato, de maneira que não possa ultrajar e colocar o consumidor em

desvantagem.

Portanto, as cláusulas limitativas nos contratos de seguro não são proibidas,

mas devem estar de acordo com o dispositivo no Código de Defesa do Consumidor

seja aplicada, em que todas as cláusulas dispostas possam estar de acordo com o

preceito da equidade das partes contratantes, visando desta forma a prevalência do

equilíbrio, harmonia e paz social.

Page 45: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

45

Cabe ainda analisar que, nos contratos de seguro em que as cláusulas

limitativas estiverem redigidas como as demais, sem qualquer destaque, ou sua

redação for obscura, ambígua, de modo a não delimitar correta e claramente as

limitações impostas, tal situação também coloca o consumidor em desvantagem

exagerada, além de abusar da boa-fé do segurado.

Contudo, quando as cláusulas limitativas nos contratos de seguro não

estiverem de acordo com o estabelecido no Código de Proteção ao Consumidor, tais

cláusulas não só deverão ser interpretadas em favor do segurado-consumidor, mas

também deverão ser consideradas nulas de pleno direito, por não obedecerem o

determinado no referido Código, e por conseguinte, colocando o segurado em

desvantagem excessiva.

Page 46: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

46

ANEXO

Page 47: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

47

BIBLIOGRAFIA

ALVIM, Pedro. O contrato de seguro. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense,

1996

BITTAR, Carlos Alberto. Direitos do Consumidor: Código de defesa do

consumidor. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forende, 1991.

COELHO, Fábio Ulhoa. Princípios da tutela contratual dos

consumidores. In: O empresário e os direitos do consumidor. 1ª ed. São

Paulo: Saraiva, 1999

DINIZ, Maria Helena. Seguro. In: Tratado Teórico e Prático dos

Contratos: vol. 4. ed. São Paulo. São Paulo, 1998

FILHO, Sérgio Cavalieri. Visão Panorâmica do Contrato de Seguros e

suas Controvérsias. Revista do Advogado, São Paulo, 1996, n. 47, 1997

GOMES, Orlando. Teoria geral dos contratos. Contratos em espécie:

seguro. In: Contratos. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002

GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código brasileiro de defesa do

consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. Rio de Janeiro:

Forense, 2002

MONTEIRO, Washington de Barros. Do contrato de seguro. In: Curso

de direito civil: Direito das obrigações: 2ª parte. 28ª ed. São Paulo:

Saraiva, 1999

Page 48: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

48

NORONHA, Fernando. O direito dos contratos e seus princípios

fundamentais (autonomia, boa-fé, justiça contratual). São Paulo:

Saraiva, 1998

RODRIGUES, Sílvio. Do contrato de seguro. In: Direito Civil: Dos

contratos e das declarações unilaterais da vontade. São Paulo, 1991. p.

367-389

VENOSA, Sílvio de Salvo. Teoria geral dos contratos. São Paulo: Atlas,

1998

WALD, Arnold. O Contrato – generalidades. Seguros. In: Curso de

direito civil brasileiro: Obrigações e Contratos. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1997

Page 49: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

49

ÍNDICE

INTRODUÇÃO .................................................................................... 8 CAPÍTULO I – CONTRATO DE SEGURO 1.1 Origem histórica ............................................................................. 11 1.2 Previsão legal ................................................................................. 12 1.3 Conceito ......................................................................................... 12 1.4 Elementos do contrato de seguro ................................................... 14 1.5 Classificação do contrato de seguro .............................................. 16 1.6 Do princípio da boa-fé .................................................................. 18 1.7 Dos contratos de adesão ............................................................... 19 1.7.1 Conceito ..................................................................................... 19 1.7.2 Característica ............................................................................. 19 1.7.3 Condições gerais dos contratos de adesão ................................. 21 CAPÍTULO II. O CONTRATO DE SEGURO EM FACE AO CÓDIGO DE DEFSA DO CONSUMIDOR 2.1 Considerações iniciais ................................................................ 23 2.2 O CDC em relação ao contrato de seguro ................................... 24 2.3 O contrato de seguro como relação de consumo ......................... 25 2.4 Da aplicação do CDC nos contratos de seguros.......................... 27 2.5 A interpretação das cláusulas limitativas contratos de seguros.... 30 2.5.1 Da cláusula limitativa ............................................................... 30

Page 50: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

50

2.5.1.1 Conceito de cláusulas limitativa ............................................ 31 2.5.1.2 As cláusulas limitativas inseridas no contrato de seguro ....... 31 2.6 Das cláusulas limitativas e as cláusulas abusivas ........................ 34 CONCLUSÃO ................................................................................. 44 ANEXO ............................................................................................. 46 BIBLIOGRAFIA................................. ............................................... 47 ÍNDICE................................................................................................ 49 FOLHA DE AVALIAÇÃO ............................................................... 51

Page 51: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PROJETO A VEZ DO … OTILIA LIMA SOBRAL.pdf · Com o advento do novo Código Civil (lei nº 10.406/02), também foi revogado o Código Comercial de 1850,

51

FOLHA DE AVALIAÇÃO

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PROJETO A VEZ DO MESTRE

Pós-Graduação “Lato Sensu”

Título: Contrato de Seguro no Direito Brasileiro em face ao Código de

Defesa do Consumidor

Data da Entrega: 14 de Abril de 2005

Avaliado por: Professor Sérgio Ribeiro Silva Grau: __________