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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO A VEZ DO MESTRE A DISTÂNCIA PROJETO DE PESQUISA NOME: REJANE APARECIDA DE ASSIS SOUZA CURSO: Psicopedagogia TEMA: Motivar para ensinar PROBLEMA: Como trabalhar com o aluno de forma lúdica e compromissada usando a motivação para ensinar e aprender? para subsidiar os colegas, professores, na questão da motivação e aprendizagem JUSTIFICATIVA: Sentindo a necessidade de se pesquisar e trabalhar a forma visando que o educando encontra para lidar com a sua vida escolar cotidiana, pensou-se que, neste trabalho de pesquisa de pós-graduação tentaria por vezes buscar algo que fosse solidário, pensando que nesta vinculação está uma das mais belas instituições da teoria walloniana: o produto último da elaboração de uma inteligência, um descobrimento, uma aprendizagem concreta, pessoal, corporificada em alguém, é uma pessoa, a construção da pessoa é uma autoconstrução. O processo que começou pelo feto tem no horizonte a individualização e que ela vai de um tipo de sociabilidade para outro, através da socialização e neste caminho este indivíduo encontra-se com seu mediador, motivacional em forma de professor. Sabe-se que o mundo real não é um contexto fixo, não é só nem principalmente o universo

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO A VEZ DO MESTRE A DISTÂNCIA

PROJETO DE PESQUISA

NOME: REJANE APARECIDA DE ASSIS SOUZA

CURSO: Psicopedagogia

TEMA: Motivar para ensinar

PROBLEMA:

Como trabalhar com o aluno de forma lúdica e compromissada usando a

motivação para ensinar e aprender?

para subsidiar os colegas, professores, na questão da motivação e aprendizagem

JUSTIFICATIVA:

Sentindo a necessidade de se pesquisar e trabalhar a forma visando que o

educando encontra para lidar com a sua vida escolar cotidiana, pensou-se que, neste

trabalho de pesquisa de pós-graduação tentaria por vezes buscar algo que fosse

solidário, pensando que nesta vinculação está uma das mais belas instituições da teoria

walloniana: o produto último da elaboração de uma inteligência, um descobrimento,

uma aprendizagem concreta, pessoal, corporificada em alguém, é uma pessoa, a

construção da pessoa é uma autoconstrução.

O processo que começou pelo feto tem no horizonte a individualização e que ela

vai de um tipo de sociabilidade para outro, através da socialização e neste caminho este

indivíduo encontra-se com seu mediador, motivacional em forma de professor. Sabe-se

que o mundo real não é um contexto fixo, não é só nem principalmente o universo

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físico. O mundo que rodeia o desenvolvimento do aluno é hoje, mais que nunca, uma

clara construção do social onde as pessoas, objetos, espaços e criações culturais,

políticas ou sociais adquirem um sentido peculiar, em virtude das coordenadas sociais e

históricas que determinam sua configuração. Há múltiplas realidades como há múltiplas

formas de viver e dar sentido a vida. A motivação é um universo complexo e desafiador,

que tem impulsionado pesquisas instigantes relacionadas em torno dessas dimensões

diferenciadas e das relações estabelecidas a partir das relações desenvolvidas na escola

entre professor/aluno e aluno/aluno.

A busca de estar sempre motivando motivado propõe solidariedade,

companheirismo e conseqüentemente a competência que nasce da sensibilidade do ser

humano. A pluralidade cultural e as contradições socieconômicas demandaram a

construção de uma escola motivada desafiadora, onde alunos e professores possam

construir sua história de ser ético, cidadão íntegro, que a escola estaria acolhendo,

assegurando, estimulando e motivando o sucesso desses educandos promissores,

trabalhando cooperativamente a solidariedade de pais, aluno, professores, especialistas,

funcionários e voluntários por meios de estratégias tais como o uso das capacidades e

potencialidades como forma de motivação: motivar para ensinar, só assim alcançar-se-á

êxito para toda a vida.

OBJETIVOS:

Ø Transformar o processo ensino-aprendizagem a partir de estratégias e recursos

motivacionais possíveis de serem usadas nas práticas educativas.

Ø Refletir sobre formas, maneiras e feitos de motivar o educando para o

enfrentamento de desafios.

HIPÓTESE:

Melhoria do processo ensino-aprendizagem a partir de estratégias que motivam a

enfrentar desafios para a vida.

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DELIMITAÇÃO:

O Universo da pesquisa compreenderá crianças de 6 a 8 anos de ambos os sexos

do 1º ciclo de classe social diversificada de uma escola municipal Said Albeny do

interior de M. G.

COMENTÁRIOS DO PROFESSOR-ORIENTADOR

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO A VEZ DO MESTRE A DISTÂNCIA

MOTIVAR PARA ENSINAR

REJANE APARECIDA DE ASSIS SOUZA

Coordenador:

Prof. Carly Barbosa Machado

Rio de Janeiro - RJ

Fevereiro / 2005

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES - UCAM

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO “A VEZ DO MESTRE”

MOTIVAR PARA ENSINAR

REJANE APARECIDA DE ASSIS SOUZA

Trabalho monográfico apresentado

como requisito parcial para a obtenção

do Grau de Especialista em

Psicopedagogia.

Rio de Janeiro - RJ

Fevereiro / 2005

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Agradeço à Deus por tanta misericórdia e por

tanto amor.

Agradeço à meus pais, colegas e mestres

pela compreensão e carinho.

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Dedico este trabalho a meus pais, colegas e

mestres pela participação direta ou indireta nessa

vitória.

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“Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não

tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine.

Ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os

mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira

tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria.”

(Coríntios, 13:1-2).

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RESUMO

Um dos objetivos deste trabalho é refletir sobre formas, maneiras e feitos de

motivar o educando para o enfrentamento de desafios, procurar-se-á onde, como

e quando começa a aprendizagem da língua e qual é a motivação que se precisa

para alcançar êxito. Quais são as implicações de tais aprendizagens? É possível ir

construindo estratégias de leitura e escrita através do afeto, da motivação, do

querer, do fazer e do querer ser. Este trabalho tem como objetivo transformar o

processo ensino-aprendizagem a partir de estratégias e recursos motivacionais

possíveis de serem usadas nas práticas educativas onde o professor e o aluno do

curso superior interage por meio de reflexão sobre a importância de se promover o

processo de inclusão escolar com um envolvimento coletivo, visando acertar o

percurso de ensino-aprendizagem através da motivação.

Todo corpo de trabalho apresenta uma reflexão sobre o processo de

motivar para ensinar embasadas em pesquisas e observações que poderão

funcionar como instrumentos para o aperfeiçoamento e a formação do corpo

docente em seu desempenho em relação a motivação na sala de aula. Porém, é

bom lembrar que estão sendo apresentadas sugestões como alternativas para

auxiliar caminhos que contribuam para o melhor desempenho do educador em sua

vida profissional. Sabe-se todos que se tratando de motivação e aprendizagem

não há fórmulas prontas a serem seguidas portanto, o que se apresenta nesta

pesquisa são apenas experiências de vivências, análises e reflexões que devem

ser entendidas como exemplos apenas.

É urgente nesta pesquisa levar ao leitor a perceber que o processo de

motivação e aprendizagem é um passo crucial no sentido de modificar atitudes

discriminatórias para se criar comunidades acolhedoras desenvolvendo assim

uma sociedade motivada, humana e feliz.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................................. 12

CAPÍTULO 1 – DISPONIBILIDADE PARA A APRENDIZAGEM E SENTIDO DA APRENDIZAGEM ....................................................................................................... 14

1.1 - O QUE APRENDE-SE E QUANDO APRENDE-SE ....................................... 14 1.2 - MOTIVAÇAO, AUTOCONCEITO E REPRESENTAÇÕES MUTUAS ........ 18 1.3 - SENTIDO E SIGNIFICADO: O AMBITO AFETIVO-RELACIONAL E O COGNITIVO NA APRENDIZAGEM....................................................................... 23 1.4 - O ESTADO INICIAL DOS ALUNOS .............................................................. 28

CAPÍTULO 2 – O QUE FAZ COM QUE O ALUNO E A ALUNA APRENDAM OS CONTEÚDOS ESCOLARES?.................................................................................... 31

2.1 - ALGUMAS CONCEPÇÕES DA APRENDIZAGEM E DO ENSINO ESCOLAR MAIS HABITUAIS ENTRE OS DOCENTES .......................................................... 32 2.2 - APRENDER CONCEITOS, PROCEDIMENTOS E ATITUDES .................... 32 2.2.1 - O que permite que os alunos aprendam conceitos na escola?.................... 33 2.2.2 - Disposição dos professores para ensinar na construção do próprio conhecimento de procedimentos ............................................................................. 37

2.3 – O QUE PERMITE AOS ALUNOS APRENDER DETERMINADAS ATITUDES?.................................................................................................................................... 39 2.4 – ENSINAR: CRIAR ZONAS DE DESENVOLVIMENTO PROXIMAL E NELAS INTERVIR.................................................................................................................. 43 2.4.1 - ENSINAR, AJUDAR, AJUSTAR, DAR ASSISTENCIA NA ZONA DE DESENVOLVIMENTO PROXIMAL....................................................................... 44

CAPÍTULO 3 – O PROFESSOR COMO FIGURA-CHAVE NA MOTIVAÇÃO DOS ALUNOS........................................................................................................................ 47

3.1 - INFLUÊNCIA DA FIGURA DO PROFESSOR \NA MOTIVAÇÃO DOS ALUNOS .................................................................................................................... 48 3.1.1 - Deficiências na formação inicial................................................................. 48 3.1.2 - É urgente valorizar o trabalho do professor ............................................... 49 3.1.3 - Educar e motivar, tarefas fundamentalmente artísticas.............................. 49 3.1.4 - Importância de conhecer a fundo a matéria que se ensina......................... 50 3.1.5 - O professor, objeto de conhecimento de seus alunos.................................. 51 3.1.6 - Alguns paradoxos sobre a promoção dos professores ................................ 51

CAPÍTULO 4 – CONDICIONANTES CONTEXTUAIS DA MOTIVAÇÃO PARA APRENDER E ENSINAR............................................................................................ 52

4.1 - INÍCIO DA AULA............................................................................................. 53 4.1.1 - Curiosidade ................................................................................................. 53 4.1.2 - Interesse....................................................................................................... 54 4.1.3 - Importância dos conteúdos.......................................................................... 55

4.2 - ORGANIZAÇÃO DAS ATIVIDADES............................................................. 56 4.2.1 - Autonomia.................................................................................................... 56 4.2.2 - Interação dos alunos ................................................................................... 59

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4.3 - INTERAÇÃO DO PROFESSOR COM OS ALUNOS ..................................... 61 4.3.1 - Antes de realizar uma tarefa ....................................................................... 62 4.3.2 - Durante a tarefa .......................................................................................... 62 4.3.3 - Ao final da tarefa......................................................................................... 63

4.4 - AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM............................................................. 65 4.5 - COMO AUMENTAR A MOTIVAÇÃO DOS ALUNOS NÃO É UM TEMA FÁCIL......................................................................................................................... 68

CONCLUSÃO.................................................ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ..............ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO.

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INTRODUÇÃO

A sala de aula está sendo focalizada, como uma configuração social

complexa e um lugar privilegiado para a construção e sistematização de

conhecimentos. Entretanto, a proposição iniciais de estudos sobre interação em

sala de aula sempre se pautaram por concepções empiristas centradas na

transmissão e reprodução desse conhecimento escolarizado. Tais estudos,

outrora privilegiavam a análise do papel unilateral do professor, traduzido em

condutas ou padrões de liderança responsáveis pelos diversos climas

socioemocionais dos grupos ou classes. Em outros termos, as interações sociais

(entendidas como atuações docentes) eram apenas vistas como variáveis ante-

cedentes responsáveis por determinados produtos no contexto ou no desempenho

dos alunos.

Pode-se afirmar que a interação produz novos patamares de desenvolvi-

mento cognitivo, novos saberes, novas atitudes, novas identidades. E que não se

pode mais afirmar que as mediações importantes são exclusivas do professor,

pois também os alunos ou pares desempenham papel mediador essencial. Nossa

síntese atual, a esse respeito, permite uma direção bastante importante para o

tema em foco: o conhecimento só se produz na intersubjetividade e esta não

apresentam um padrão previsível ou sempre harmonioso. As relações

interpessoais são dinâmicas e produtivas, mas também tensas e conflituosas, po-

dendo gerar rupturas ou obstáculos ao processo de conhecer ou de aprender.

Admite-se que grande parte da produção dos contextos interativos não

ocorre no nível manifesto, planejado ou intencional do currículo formal e sim na

dimensão já definida como currículo oculto. Já se sabe que essa categoria,

abrangente e difusa, supõe vivências, exposições a modelos, reforçamentos ou

recompensas, repressões,. São processos responsáveis por aprendizagens mais

intrínsecas, situacionais, revestidas de maior significado para os sujeitos e que

podem alterar sua estrutura mais profunda, em termos de motivações,

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autoconceito, identidade, valores. O campo pedagógico implica, por isso mesmo,

um conjunto de dimensões simbólicas, estruturantes das relações ou interações.

No conjunto dessas dimensões, destaca-se a organização do espaço e do

tempo - elementos simbólicos que expressam concepções sobre as práticas

escolares. Mesmo que a cota de poder e de controle do professor nessa orga-

nização seja objetivamente maior e assimétrica, essas são categorias também

definidas externamente, por disposições curriculares, pelas instalações e até pela

arquitetura escolar. A disposição física e a configuração espacial de uma sala de

aula dizem muito do currículo oculto e das relações latentes: como são percebidos

as relações professor-aluno e o lugar desses atores nessa relação? Quem ordena

o espaço? Tal ordenamento é flexível ou sempre previsível e predeterminado?

Quais são as formas de transgressão usadas pelos alunos, em busca de um lugar

de produção e de uma identidade diferenciada do perfil idealizado pelo professor

nesse tema tão importante que é motivar para ensinar.

Nessa pesquisa estudou no primeiro capítulo sobre disponibilidade para a

aprendizagem e sentido da aprendizagem e no segundo capítulo viu-se o que faz

com que o aluno e a aluna aprendam os conteúdos escolares e no terceiro

capítulo, tem-se o professor como figura-chave na motivação dos alunos e

finalmente no quarto e último capítulo, ponderou-se sobre condicionantes

contextuais da motivação para aprender e ensinar.

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CAPÍTULO 1 – DISPONIBILIDADE PARA A APRENDIZAGEM E SENTIDO DA APRENDIZAGEM

Formular-se-á a questão das relações entre os aspectos cognitivos e os

afetivo-relacionais na construção da aprendizagem no âmbito escolar. O enfoque

adotado parte daquilo que significa construir significados sobre os conteúdos do

ensino, e, a partir daí, explora aspectos tais como enfoques da aprendizagem,

motivação e sua relação com o autoconceito, construção deste durante as

interações significativas para o aluno, representações mútuas que nelas intervêm

e expectativas que ajudam a gerar. Tudo isso conduz ao sentido e, daí,

novamente ao significado, para salientar suas estreitas conexões.

1.1 - O QUE SE APRENDE E QUANDO SE APRENDE

Assim como se considera que na aprendizagem interferem os aspectos

afetivo-relacionais e, em geral, tudo o que costuma ser incluído nas capacidades

de equilíbrio pessoal, está-se convencidos de que estas não são construídas no

vazio nem à margem de outras capacidades. Quando se aprende, envolvê-se

globalmente na aprendizagem, e o processo e seu resultado também repercutem

de maneira global. Por isso, o que se forja nas situações de ensino, é algo mais

que a possibilidade de construir significados sobre conteúdos concretos, mesmo

quando estas são consideradas de forma ampla e diversificadas.

Quando se fala de atribuir significado, fala-se de um processo que mobiliza

em nível cognitivo, e que leva a revisar e a recrutar os esquemas de conhecimento

para dar conta de uma nova situação, tarefa ou conteúdo de aprendizagem. Essa

mobilização não acaba nisso, mas, em função do contraste entre o dado e o novo,

os esquemas recrutados podem sofrer modificações, de leves a drásticas, com o

estabelecimento de novos esquemas, conexões e relações na estrutura

cognoscitiva.

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Esse processo foi caracterizado como sendo animado por um interesse,

uma motivação, em que se quebra um equilíbrio inicial, provocando um

desequilíbrio que obriga o indivíduo a levar a cabo determinadas ações para

conseguir um novo estado de equilíbrio (reequilíbrio). Se, após o processo, tudo

sair bem, o indivíduo terá aprendido. Se não sair tão bem, não terá aprendido

aquilo que se pretendia que aprendesse (embora possa ter aprendido outras

coisas: por exemplo, que o que ele sabe não é tão sólido como parece).

É óbvio que é uma visão muito dinâmica do processo de aprendizagem,

apesar de muito parcial, pois ainda não introduzi-se o pólo do ensino. Sem dúvida,

apesar de dinâmica, é uma visão fria, e de certa maneira artificial, daquilo que se

pode supor que acontece. Disse-se que o processo de aprender pressupõe uma

mobilização cognitiva desencadeada por um interesse, por uma necessidade de

saber. O que torna possível este interesse? Deve-se estritamente a constatação

do desequilíbrio cognitivo? De qualquer forma, o que faz com que, por trás da

percepção do desequilíbrio, algumas pessoas, em algumas ocasiões, sejam

capazes de dedicar-se a fundo até chegar a se reequilibrar novamente e outras,

ou as mesmas pessoas em oportunidades diferentes, simplesmente abandonem a

tarefa, enfoquem-na desacertadamente e, afinal, não conquistem seu objetivo

(aprender)?

E provável que não se possa dar uma única resposta a estas perguntas;

certamente ela não pode ser dada apenas a partir do âmbito das competências e

capacidades cognitivas: tanto na tomada de consciência do desequilíbrio como na

ação desencadeada depois dela intervêm aspectos cognitivos e emocionais (que,

por exemplo, podem fazer com que o desequilíbrio seja negado, impedindo assim

a aprendizagem; ou mesmo que o desequilíbrio seja aceito e a pessoa se sinta

incapaz de superá-lo, o que novamente impede aprender).

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Como todo mundo sabe, intervêm na aprendizagem numerosos aspectos

de tipo afetivo-relacional, e, como todo mundo também sabe, a aprendizagem e o

sucesso com que venha a resolvê-los desempenham um papel definitivo na

construção do conceito que se tem de si mesmo (autoconceito), na estima que se

professa (auto-estima) e, em geral, em todas as capacidades relacionadas com o

equilíbrio pessoal. Nem é preciso indicar que essas capacidades mediatizam a

atualização de outras: as de relação interpessoal ou as cognitivas, para dar

exemplos bastante claros.

Embora todo mundo saiba essas coisas, a verdade é que ainda dispõe-se

de poucos dados sobre o que implicaria um estado mais específico de

conhecimento; isto é, não se sabe precisamente como interagem os aspectos

afetivo e cognitivo, bem como não sabem com certeza como interior para

potencializar essa relação em benefício da formação global do aluno. É preciso

acrescentar ainda que, freqüentemente, também não se soube aproveitar o

conhecimento já disponível atualmente, portanto, que o planejamento, a

implantação e a avaliação de situações escolares de ensino e aprendizagem nem

sempre têm as características mais adequadas para fomentar essa formação, cuja

tendência para o “intelectual” parece definitivamente instalada, sobretudo nas

etapas superiores.

Não se quer dizer que quando se ensina não se leve em consideração a

existência de aspectos afetivos; assinalam apenas que, talvez por terem tido por

muitos anos uma visão enormemente simplificadora do ensino (e talvez porque

quando começam a construir uma representação mais realista dele e, portanto,

mais complexa, essa representação se nutriu essencialmente de elementos que

têm a ver com o cognitivo), o aspecto afetivo-relacional foi ficando de lado, assim

como o acompanhante fiel e discreto que, às vezes, ajuda, às vezes, interfere e,

às vezes, bloqueia. Para se ser sincero, deveria reconhecer que muitas vezes

foram esses bloqueios que permitiram perceber sua presença; na verdade, um

pouco tarde.

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Dado que uma hipótese subjacente no construtivismo, entendido em toda

sua amplitude, é que quando aprende, e ao mesmo tempo em que se aprende,

está forjando a forma de ver o mundo e de relacionar com ele, e dado que parte

importante dessa aprendizagem é realizada na escola, precisa-se de uma

explicação integrada sobre o funcionamento de alguns aspectos afetivos,

relacionais e cognitivos na aprendizagem escolar. E isso o que se pretende

quando se fala de sentido e significado (Coll, 1988) e daquilo que estrutura sua

relação.

E preciso assinalar em seguida que é uma explicação hipotética, pois não

dispõe-se de dados empíricos que a apóiem, pelo menos em seu conjunto; e é

preciso assinalar também que é uma explicação parcial, pois as construções às

quais refere-se (autoconceito, representações, atribuições etc.) não são

construídas apenas no contexto da educação escolar, âmbito do qual ocupar-se-á,

mas também em outros contextos de desenvolvimento. Além do mais, a

abordagem do contexto escolar também é parcial, pois não se ocupa aqui da

influência da relação entre iguais, certamente intensa nessa construção. Enfim, é

uma explicação genérica, pois não dá conta das diversas casuísticas (como as

dos alunos com necessidades educativas especiais de caráter permanente, por

exemplo) que, sem dúvida, deveriam graduá-la.

Apesar dessas evidentes limitações, a tentativa pode ter sentido, pois

pretende apontar as vinculações que podem existir entre diversos e importantes

fatores presentes nas situações educativas, que as tornam extraordinariamente

potentes, mas também extraordinariamente complexas.

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1.2 - MOTIVAÇAO, AUTOCONCEITO E REPRESENTAÇÕES MUTUAS

Para além das condições “objetivas” das situações de ensino e

aprendizagem que, podem predispor mais ou menos à realização de

aprendizagens significativas, o que interessa é saber como os alunos as

percebem, pois essa interpretação não é alheia à forma como irão abordá-las nem

às estratégias de aprendizagem que vão pôr em jogo. Essas estratégias variarão.

De acordo com a intenção com a qual o aluno enfrente a tarefa: intenção de

estabelecer relações entre o que lhe é apresentado e o que sabe, intenção de

cumprir estritamente as exigências etc.

Freqüentemente, as diversas intenções têm sido relacionadas à motivação

intrínseca e extrínseca que, por sua vez, aparecem como algo que o aluno possui,

como um elemento que se refere exclusivamente ao seu universo pessoal (o que

é traduzido pela prática educacional em exemplos como os seguintes: “Não se

pode trabalhar com este grupo; estão completamente desmotivados”. “Sempre é

melhor trabalhar com os do primeiro ciclo da Educação Primária; eles têm tanta

vontade de aprender!”).

Convém indicar a respeito, em primeiro lugar, que as situações às quais

refere-se são situações sociais, e incluem “outros significativos” para o aluno, seu

professor e outros colegas, dos quais cabe esperar algum papel; isto é, o fato de o

aluno estar ou não motivado não é uma responsabilidade unicamente sua. Em

segundo lugar, como foi assinalado por Coll (1988), aludir a motivação do aluno —

intrínseca ou extrínseca —, para explicar por que, às vezes, é movido pela

intenção de aprender e outras apenas pela de cumprir, não resolve o problema,

pois nesse caso será preciso explicar por que, às vezes, ele se sente

intrinsecamente motivado e em outras não. Em terceiro lugar, o que o aluno traz a

cada situação concreta não se identifica exclusivamente com os instrumentos

intelectuais de que dispõe, mas também envolve os aspectos de caráter

emocional, relacionados com as capacidades de equilíbrio pessoal; isto é, a

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representação que faz da situação, as expectativas que esta gera, seu próprio

autoconceito e, enfim, tudo o que lhe permite encontrar sentido ou não — em uma

situação desafiadora como é a de aprender. Por isso, para explicar o sentido que

o aluno pode atribuir a uma tarefa de aprendizagem e, portanto, a motivação que

sente, deve-se recorrer aos aspectos mencionados, tentando descobrir sua

delicada engrenagem.

Ao mesmo tempo em que são construídos significados sobre os conteúdos

do ensino, os alunos constroem representações sobre a própria situação didática,

que pode ser percebida como estimulante e desafiadora ou, pelo contrário, como

intratável e tediosa, desprovida de interesse ou inatingível para suas

possibilidades. Naturalmente, também constroem representações sobre eles

mesmos nas quais podem aparecer como pessoas competentes, interlocutores

interessantes para seus professores e colegas, capacitados para resolver os

problemas colocados ou, no pólo oposto, como pessoas pouco capazes,

incompetentes ou com poucos recursos. Por sua vez, os “outros” (presentes na

situação) de aprendizagem podem ser percebidos em uma ampla gama de

representações que oscila entre um pólo no qual colegas e professor podem ser

vistos como pessoas que compartilham objetivos e ajudam na consecução da ta-

refa ou, no pólo oposto, como rivais e repressores.

Assim, pode-se afirmar que, quando se aprende, aprende-se os conteúdos

e também se aprende o que se pode aprender; quando não se aprende os

conteúdos, pode-se aprender algo: que não se é capaz de aprender (e pode

atribuir isso a diferentes causas, nem todas igualmente prejudiciais para a auto-

estima). Tudo isso ocorre durante as interações estabelecidas em aula, em torno

das tarefas cotidianas, entre alunos e entre os alunos e o professor; e durante

essas interações é que se constrói a motivação intrínseca, que não é uma

característica do aluno, mas da situação de ensino/aprendizagem, e afeta a todos

seus protagonistas. Tapia e Montero (1990, p. 187 et seqs.) assinalam que a meta

perseguida pelo sujeito intrinsecamente motivado é “a experiência do sentimento

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de competência e autodeterminação, sentimento experimentado na própria

realização da tarefa e que não depende de recompensas externas” (o que seria

próprio da motivação extrínseca).

Isso quer dizer (pelo menos assim o interpretam) que, quando alguém

pretende aprender e aprende, a experiência vivida lhe oferece uma imagem

positiva de si mesmo, e sua auto-estima é reforçada, o que, sem dúvida, constitui

uma boa bagagem para continuar enfrentando os desafios que se apresentem. O

autoconceito, influenciado pelo processo seguido e pelos resultados obtidos na

situação de aprendizagem, por sua vez, influencia a forma de enfrentá-la e, em

geral, como foi evidenciado por Rogers (1987) e Rogers e Kutnick (1992), a forma

de comportar-se, de interagir, de estar no mundo.

O autoconceito (Fierro, 1990) inclui um amplo conjunto de representações

(imagens, juízos, conceitos) que temos sobre nos mesmos, e que englobam

aspectos corporais, psicológicos, sociais, morais e outros. Pode referir-se ao

indivíduo, globalmente considerado, ou a alguma dimensão ou aspecto concreto,

O autoconceito refere-se ao conhecimento de si mesmo e inclui juízos valorativos,

chamado de auto-estima. Situando no contexto escolar, foi demonstrada a relação

entre o autoconceito e o rendimento escolar, e não há muitas dúvidas sobre o fato

de que crianças e adolescentes com um alto nível de auto-estima obtêm melhores

resultados na escola. Mais discutível é o sentido dessa relação (a auto-estima é

que influencia os resultados ou estes é que são responsáveis por uma elevada

auto-estima?), embora pareça sensato pensar que o que existe é uma influência

mútua, uma relação circular ou em espiral.

O autoconceito é aprendido ou forjado no decorrer das experiências da

vida; as relações interpessoais, particularmente as vinculadas aos “outros

significativos” (pais, irmãos, professores, colegas, amigos etc.), constituem os elos

mediante os quais a pessoa tece a visão de si mesma. No decorrer das interações

que vivem, a criança elabora essa visão a partir da interiorização das atitudes e

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percepções que esses “outros” têm a seu respeito, de modo que as atitudes

vividas na relação interpessoal vão criando um conjunto de atitudes pessoais em

relação a ela mesma. Assim, acaba considerando-se simpática ou incômoda,

esperta ou desajeitada, chata ou encantadora, porque é isso que os demais lhe

transmitem, muitas vezes de forma totalmente inconsciente.

Na perspectiva que vem elaborando, pode ser interessante refletir sobre o

fato de que interações que acontecem na escola (e poderia afirmar que todas as

interações) são afetadas pelas representações mútuas dos protagonistas da

interação. Coll e Miras (1990) assinalam que as representações que os

professores têm de seus alunos (o que pensam e esperam deles, as capacidades

e intenções que lhes atribuem) funcionam como um filtro para interpretar seu

comportamento e valorizá-lo, contribuindo para gerar algumas expectativas que,

às vezes, podem chegar a modificar a atuação dos alunos no sentido por elas

indicado. (Os autores acrescentam que o fenômeno) das representações também

ocorre em sentido inverso, pois as representações que os alunos têm de seus

professores também podem chegar a ser determinantes da atuação destes.

Na origem das representações está, naturalmente, a informação procedente

da observação mútua, embora em situação escolar não se deve menosprezar de

forma alguma a influência que possam ter as informações recebidas: no caso dos

alunos, por colegas de outros cursos, pela “fama” do professor etc. (“é uma fera,

suspende um monte”, parece muito duro, mas no fundo, nada”). No caso dos

professores, essa influência provém das informações transmitidas sobre um grupo

de uma classe ou sobre algum aluno individual por seus colegas, pelos relatórios

de avaliação, pelos históricos escolares, por informes psicológicos. Tudo contribui

para formar uma imagem do outro, que pode ser reforçada ou totalmente

modificada pela experiência cotidiana.

Em suma, quando um professor entra em sua sala de aula, quer seja na

primeira série da Educação Primária ou na última da Educação Secundária, traz

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consigo uma visão dos seus alunos que, indubitavelmente, influencia aquilo que

vai lhes propor, a forma de propor e sua avaliação; reciprocamente, a percepção

que os alunos têm de seu professor levá-los-á a interpretar de um jeito ou de outro

as propostas. No sentido que uns e outros atribuem ao que devem fazer intervém

não só como cada um vê a si mesmo, mas como cada um vê seu interlocutor (e

como acha que o outro o vê).

E como se vêem mutuamente alunos e professores? No caso destes

últimos, o que os leva a formar esta ou aquela representação de um determinado

aluno é sua maior ou menor proximidade de sua “imagem de aluno ideal”, variável

para cada professor, mas com algumas características majoritariamente

compartilhadas: respeito pelas normas estabelecidas, interesse pelo trabalho,

constância, esforço, participação. Em síntese, o que geralmente valoriza-se é a

assunção das regras de jogo que a instituição define para conseguir seus

objetivos (Coll e Miras, 1990). É preciso acrescentar a isso variáveis relacionadas

ao aspecto físico dos alunos (com uma certa tendência a esperar melhor

comportamento e rendimento dos alunos mais atraentes!) e aos estereótipos

ligados ao sexo, que levam a prever uma maior competência dos alunos em

função do sexo em determinadas áreas curriculares, bem como diferenças no

respeito às normas escolares.

Nas representações construídas pelos alunos sobre seus professores, os

fatores afetivos são fundamentais: a disponibilidade mostrada ao aluno, o respeito

e o afeto a ele transmitido, a capacidade de mostrar-se acolhedor e positivo

constituem os eixos em torno dos quais os alunos formam uma representação dos

seus professores. O peso desses fatores é tanto mais elevado quanto mais baixo

for o nível de escolaridade; assim, no ensino secundário, embora continuem sendo

importantes, esses fatores equilibram-se com outros, de caráter talvez mais

“acadêmico”: conhecimento da matéria, capacidade para motivar e envolver os

alunos, clareza das exposições etc. Os aspectos afetivos e os relacionados ao

papel de “instrutor” ligado à tarefa docente (junto com o de “mantenedor da

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disciplina”; Hargreaves, 1977) se mantêm estáveis nas representações dos alunos

mais velhos, porém também neles adquirem importância aspectos mais

específicos, como o desempenho do professor perante situações conflituosas ou

comprometidas.

As representações mútuas, a forma de ver, constituem um elemento

essencial para compreender a relação que se estabelece entre as pessoas

durante uma interação. Dado que essa forma de ver mutuamente não é neutra,

mas valorativa, cabe esperar seu influxo na forma de relacionar. No âmbito da

escola, como é que as representações influenciam a interação educativa

responsável pelo sentido e significado que o aluno atribui ao que lhe é proposta?

Isso leva agora a ocupar das expectativas.

1.3 - SENTIDO E SIGNIFICADO: O AMBITO AFETIVO-RELACIONAL E O

COGNITIVO NA APRENDIZAGEM

Talvez essa trama de relações complexas explique que o autoconceito seja

ao mesmo tempo causa e efeito do rendimento escolar; obviamente, quem

aprende é uma pessoa, globalmente considerada, de modo que o caminho que

segue e os resultados que obtém não influenciam apenas determinadas

capacidades (de tipo cognitivo, por exemplo), mas a elaboração de uma imagem

pessoal que, convém recordar, nunca é neutra.

Com esta imagem o aluno aproxima-se da tarefa de aprender; de uma

tarefa que não é simples, que vai lhe exigir um forte envolvimento e uma atividade

intelectual nada desprezível: prestar atenção, selecionar, estabelecer relações,

conscientizar-se delas, avaliar etc. O fato de poder fazer tudo isso, isto é, de estar

na disposição de realizar o processo que o conduzirá à elaboração de

aprendizagens as mais significativas possíveis, depende, em boa parte, de poder

atribuir sentido a tudo isso. Com o termo sentido, como já se disse (Coll, 1988;

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1990), alude-se aos componentes motivacionais, afetivos e relacionais da

contribuição do aluno ao ato de aprender.

Para uma tarefa — de aprendizagem ou de qualquer tipo —ter sentido, é

preciso haver algumas condições. Há pelo menos três exigências cujo grau de

presença determinará que essa tarefa tenha maior ou menor sentido para quem a

realizar. Em primeiro lugar, é imprescindível saber o que é para fazer, a que res-

ponde, qual é a finalidade perseguida com isso, com quais outras coisas pode

relacionar-se, em que projeto geral pode ser inserido. Em suma, a resposta para

estas perguntas, ou outras, parecidas, que contribuam para fazer o aluno ter claro

o objetivo que se persegue com uma tarefa e as condições de realização, é

fundamental para que possa atribuir-lhe sentido. Essa condição exige, entre outras

coisas, um esforço dos professores para ajudar os alunos a compreenderem o que

se pretende realizar; também pode contribuir para que o próprio professor se

interrogue sobre o sentido das tarefas propostas, o que, sem dúvida, redundará

em propostas cada vez mais razoáveis e atraentes.

Se fosse apenas o caso de compreender o propósito de uma tarefa, a

tentativa de mostrar os fatores afetivos e relacionais envolvidos na atribuição de

sentido poderia esbarrar no ceticismo do leitor (embora esses fatores sejam tão

poderosos que às vezes negam a fazer as coisas sem saber exatamente de que

se trata, simplesmente porque não quer ou não pode). Na verdade, “conhecer ou

compreender o propósito” não e um processo asséptico, estritamente cognitivo;

quando se está diante de uma proposta, esta pode parecer atraente, sensata,

estimulante, intratável, fora de lugar ou completamente delirante, e estas nuanças

(importantes nuanças!) fazem parte da compreensão que dela elaboram.

Para atribuir o sentido necessário que permitirá envolver realmente em uma

tarefa, ela deve parecer atraente, deve interessar, deve poder perceber que ela

preenche uma necessidade; essa necessidade pode funcionar então como motor

da ação. Nem sempre é fácil perceber a necessidade de determinada

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aprendizagem; nem sempre ela está na faixa do nosso interesse. Como

ressaltaram os grandes renovadores da educação, já no inicio deste século

(Claparêde, 1932; Dewey, 1947), a necessidade, o interesse, são criados e

suscitados na própria situação de ensino/aprendizagem.

Essa condição, para o sentido, pode levar a revisar não só algumas das

tarefas que propõe ou dos conteúdos que se ensina, mas também, e talvez

sobretudo, a forma de apresentá-los ou de organizá-los. Há diferença entre “a

lição ou unidade que temos de ensinar agora” e participar de um projeto para o

qual é necessário dispor de certos instrumentos conceituais e procedimentais; há

diferença entre ajustar-se a certos temas e a uma ordem previamente

estabelecidos e poder participar da escolha de determinados tópicos a serem

trabalhados.

Trata-se de que os alunos não apenas conheçam os propósitos que

norteiam uma atividade, mas que os tornem seus, que participem do planejamento

dessa atividade, de sua realização e de seus resultados de forma ativa, o que não

supõe unicamente que façam, que atuem e que realizem; também exige que

compreendam o que estão fazendo, que se responsabilizem por isso, que dis-

ponham de critérios para avaliar e modificar isso se for necessário. Quando uma

tarefa que se ajusta às possibilidades dos alunos lhes é apresentada como algo

que permite preencher determinadas necessidades (de aprender, de saber, de

influir, de mudar) e quando lhes é oferecida a oportunidade de envolver-se nela

ativamente, está proporcionando as condições para que essa tarefa lhes

interesse. Nem sempre há interesse; ele deve ser criado, e, depois de ter sido

suscitado, deve ser cuidado para não decair. Seu melhor alimento é, não deve-se

esquecer disso, a experiência de que se aprende e de que se pode aprender.

A percepção de que se pode aprender atua como um requisito

imprescindível para atribuir sentido a uma tarefa de aprendizagem. Está deve

consistir em um desafio, isto é, em algo que ainda não foi adquirido pelo aluno e

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que está dentro de suas possibilidades, embora lhe exija certo esforço. A pessoa

precisa sentir-se razoavelmente capaz, com recursos, para realizar esse esforço;

outra coisa diferente é que os recursos mencionados aludam à atuação autônoma

ou à atuação compartilhada, que se traduzam em ajudas quantitativa e

qualitativamente distintas. Realmente imprescindível é que quem deve aprender

entenda que, com sua contribuição e esforço, e com a ajuda necessária, podera

superar o desafio proposto.

Quando isso não ocorre, deve parar de falar de desabo e referir à

aprendizagem como carga que desanima, como desafio que não pode ser

superado. Nesses casos, tanto faz que se compreenda ou que se ache

interessante o que se pretende; a aprendizagem deixou de ser tudo isso para

converter-se em um espelho que devolve uma imagem desvalorizada de si

mesmo, que não ajuda a restituir a confiança nas próprias possibilidades,

podendo-se prever o fracasso. Com relação a tudo isso, é preciso refletir sobre a

influência que as notas podem chegar a exercer no autoconceito, especialmente

quando acabam sendo o principal mediador daquilo que ocorre na aula, isto é,

quando são os mais valorizados, implícita ou explicitamente. Também deveria

analisar o que sente um aluno que se esforçou e deu o melhor de si ao receber

uma qualificação negativa; provavelmente não tenha mais muito sentido para ele

continuar esforçando-se.

Desse modo, a forma de ver a si mesmo influi na forma de ver a situação de

ensino/aprendizagem; um autoconceito negativo, não constitui uma boa bagagem

para aprender. Convém recordar agora os numerosos aspectos envolvidos nas

interações que contribuem para forjar o autoconceito na escola (representações

mútuas, expectativas, atribuições), o que impede considerá-lo apenas como algo

que o aluno “traz” para a situação educativa. Convém recordar também o caráter

mediador do autoconceito entre as exigências feitas pela instituição e as respostas

que o aluno pode construir para elas.

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E, sobretudo, cabe insistir em sua dimensão estruturadora entre o social e o

individual, entre o cognitivo, o afetivo e o relacional que intervêm na formação glo-

bal da pessoa. Nessa formação, a construção de conhecimentos desempenha um

papel muito importante, não só pelo que supõe em si, mas porque por meio dela

são construídas: uma visão de si mesmo e dos demais, das situações em que se

encontra e das próprias capacidades para enfrentá-las, visão que nunca é neutra.

O sentido que se pode atribuir á aprendizagem é requisito indispensável

para a atribuição de significados característicos da aprendizagem significativa. E

isto que impele a aprender, e é também a contribuição para uma situação que

envolverá ativamente. Por sua vez, a construção de significados própria da

aprendizagem significativa e, conseqüentemente, a adoção de um enfoc1ue

profundo relacionado com a motivação intrínseca exige tomar algumas decisões

suscetíveis não só de favorecer o domínio de procedimentos, a assunção de

atitudes e a compreensão de determinados conceitos, mas de gerar sentimentos

de competência, autoestima e de respeito por si mesmo no sentido mais amplo.

Partir daquilo que o aluno possui, potencializá-lo e conota-lo positivamente

é sinal de respeito por sua contribuição, o que, sem dúvida, favorece sua auto-

estima. Colocar desafios ao seu alcance, observar uma distância ótima entre o

que traz e o que lhe é colocado incentivam seu interesse e lhe permitem confiar

em seu próprias possibilidades; proporcionar-lhe as ajudas necessárias possibilita

forjar uma imagem positiva e ajustada. Interpretar a situação de ensino como um

contexto compartilhado contribui para que o aluno se sinta, ao mesmo tempo,

como um interlocutor interessante e com a segurança que dá saber que outro

mais especializado está ali para ajudar, para ensinar a chegar onde ainda é

impossível chegar sozinho.

Garantir que o aluno possa mostrar-se progressivamente autônomo no

estabelecimento de objetivos, no planejamento das ações que o conduzirá a eles,

em sua realização e controle e, enfim, naquilo que pressupõe autodireção e auto-

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regulação do processo de aprendizagem traduz confiança em suas possibilidades

e educa na autonomia e na responsabilidade. Valorizar seus resultados em

relação ás suas capacidades e ao esforço realizado talvez seja a única coisa que

com justiça cabe fazer, incentivando a auto-estima e a motivação para continuar

aprendendo.

(É desnecessário dizer que tudo isso está inscrito no âmbito) de interações

caracterizadas pelo respeito mútuo e pelo sentimento de confiança que

proporcionam. Interações presididas pelo afeto, nas quais há possibilidade de se

enganar e de se modificar; nas quais também têm seu lugar a exigência e a

responsabilidade, a rivalidade e o companheirismo, a solidariedade e o esforço.

Nessas interações, e em muitas outras que se estabelecem dentro e fora do

contexto escolar, as pessoas são forjadas e educadas em todas suas

capacidades; portanto, é conveniente cuidar delas, pois o que nelas se constrói é

muito, certamente mais do que parece à primeira vista.

1.4 - O ESTADO INICIAL DOS ALUNOS

Com que os alunos contam ao iniciar um determinado processo de

aprendizagem? A partir de que base, mediante a ajuda necessária, podem realizar

a atividade construtiva que implica aprender algo de um modo significativo? Em

linhas gerais, e apesar de serem aspectos que sem dúvida estão inter-

relacionados, a concepção construtivista assinala três elementos básicos que

determinam aquilo que se denomina estado inicial dos alunos, como que uma

radiografia, no momento de iniciar qualquer processo de aprendizagem.

Em primeiro lugar, os alunos apresentam uma determinada disposição para

realizar a aprendizagem proposta. Esta disposição ou enfoque com o qual

abordam a situação de aprendizagem de novos conteúdos geralmente não é algo

inexplicável ou imprevisível, mas surge como resultado da confluência de

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numerosos fatores de índole pessoal e interpessoal. O grau de equilíbrio pessoal

do aluno, sua auto-imagem e auto-estima, suas experiências anteriores de

aprendizagem, sua capacidade de assumir riscos e esforços, de pedir, dar e

receber ajuda, são alguns aspectos de tipo pessoal que desempenham um papel

importante na disposição do aluno diante da aprendizagem.

Mas, estes não são os únicos fatores que incidem ou podem incidir nesta

disposição. Outros elementos, como a representação inicial dos alunos sobre as

características da tarefa que deverão realizar (conteúdo, atividades, material,

avaliação etc.), seu interesse por ela ou, em outra ordem de coisas, a

representação e as expectativas que têm em relação ao professor e aos seus

próprios colegas, sem dúvida fazem parte do conjunto de fatores que acabam

determinando o animo com o qual os alunos se posicionam diante da tarefa de

aprender um novo conteúdo e o sentido que lhe atribuem em princípio.

Em segundo lugar, em qualquer situação de aprendizagem, os alunos

dispõem de determinadas capacidades, instrumentos, estratégias e habilidades

gerais para completar o processo. Por um lado, o aluno conta com determinadas

capacidades cognitivas gerais ou, em termos mais correntes, com certos níveis de

inteligência, raciocínio e memória que lhe permitirão um determinado grau de

compreensão e realização da tarefa. Mas essas capacidades gerais não são

apenas de caráter intelectual ou cognitivo. O aluno também conta com

determinadas capacidades motoras, de equilíbrio pessoal e de relação

interpessoal, tal como foi exposto anteriormente. Neste sentido, entende-se que o

aluno põe em jogo um conjunto de recursos de índoles diferentes que, de maneira

mais ou menos geral e estável, é capaz de utilizar em qualquer tipo de

aprendizagem.

Por outro lado, em estreita inter-relação com essas capacidades para

realizar a aprendizagem, o aluno dispõe de um conjunto de instrumentos,

estratégias e habilidades gerais que foi adquirindo em contextos diferentes, ao

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longo de seu desenvolvimento e, de maneira especial, no contexto escolar.

Instrumentos como a linguagem (oral e escrita), a representação gráfica e

numérica, habilidades como sublinhar, anotar ou resumir, estratégias gerais para

pesquisar e organizar informação, para revisar, para ler um texto de maneira

compreensiva ou para escrever reflexivamente sobre um tema, são alguns

exemplos desse conjunto de recursos de tipo geral que podem fazer parte, em

uma ou outra medida, do repertório inicial do aluno e com os quais conta (ou não)

para enfrentar a aprendizagem do novo conteúdo.

Sem dúvida, os dois aspectos globais (a disposição apresentada pelos

alunos diante da aprendizagem e as capacidades, instrumentos, habilidades e

estratégias gerais que são capazes de utilizar) constituem elementos importantes

da radiografia dos alunos no início da aprendizagem de um novo conteúdo. Neste

sentido, poderiam perguntar se e preciso levar em conta algo mais para poder

determinar suas possibilidades de aprendizagem no início do processo e,

conseqüentemente, para organizar e planejar o ensino do novo conteúdo.

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CAPÍTULO 2 - O QUE FAZ COM QUE O ALUNO E A ALUNA APRENDAM OS CONTEÙDOS ESCOLARES?

Sempre que os, professores e professoras, propõem ensinar determinados

conteúdos escolares aos alunos e alunas colocam-se em funcionamento, quase

sem pretender, uma série complexa de idéias sobre o que significa aprender na

escola e sobre como se pode ajudar os estudantes nesse processo. Essas idéias,

que vem forjando ao longo da atividade educacional, graças à experiência e à

reflexão, constituem a concepção de aprendizagem e ensino. Esta, que é a própria

teoria, atua como referência-chave para a tomada de decisões sobre o quê,

quando e como ensinar e avaliar. No entanto, nem todos os profissionais de uma

mesma escola compartilham as mesmas idéias, e por isso, quando é preciso

tomar uma decisão de equipe (por exemplo: quando é melhor começar a ler? com

que método? que livro didático pode ser mais útil para trabalhar Matemática na 5ª

serie da Educação Primária? etc.), costumam misturar-se argumentos

contraditórios, que é melhor compreender e avaliar do que censurar ou

simplesmente rejeitar.

O propósito geral deste trabalho é conseguir interpretar melhor as idéias

que professores e alunos têm sobre o processo de aprendizagem escolar e

identificar sua limitação ou não. Expor-se-á a idéia que têm do aluno e aluna que

aprendem, da concepção de aprendizagem e como concebem o papel do ensino

nesse processo. Esta proposta será o parâmetro para aprofundar a concepção

que, seja mais potente entre todas; e, enfim, mais especificamente, tentar expor o

que implica para o aluno e a aluna aprender diferentes tipos de conteúdos

escolares: conceitos, procedimentos e atitudes.

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2.1 - ALGUMAS CONCEPÇÕES DA APRENDIZAGEM E DO ENSINO

ESCOLAR MAIS HABITUAL ENTRE OS DOCENTES

A maioria dos docentes estaria de acordo em afirmar que aqueles que

aprendem são os alunos e alunas das classes. Entretanto, longe dessa primeira

aproximação geral, a explicação que dariam dessa afirmação seria muito

diferente, como também o seria a prática em aula. No intuito de analisar as

características das concepções de aprendizagem e ensino escolar mais difundida

entre os professores. A aprendizagem escolar consiste em conhecer as respostas

corretas para as perguntas formuladas pelos professores. O ensino proporciona

aos alunos o reforço necessário para obter essas respostas.

A aprendizagem escolar consiste em adquirir os conhecimentos relevantes

de uma cultura. Nesse caso, o ensino proporciona aos alunos a informação de que

necessitam. A aprendizagem escolar consiste em construir conhecimentos. Os

alunos e as alunas elaboram, mediante sua atividade pessoal, os conhecimentos

culturais. Por tudo isso, o ensino consiste em prestar aos alunos a ajuda

necessária para que possam ir construindo-os.

Embora a primeira postura apresente características muito diferentes das

duas restantes e mantenha com elas escassos pontos de contato, a segunda e a

terceira concepção podem ser relacionadas entre si, pois ambas ocupam-se de

como os alunos adquirem conhecimentos, porém divergem na explicação desse

processo.

2.2 - APRENDER CONCEITOS, PROCEDIMENTOS E ATITUDES

É muito difícil falar de quem aprende sem se referir imediatamente aos

conteúdos aprendidos e ao como é possível ajudar os alunos nesse processo,

para que sejam bem-sucedidos. Baseando nessa apreciação, analisar-se-á os

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aspectos da aprendizagem de conceitos, procedimentos e atitudes relacionando-

os com as oportunidades de ensino oferecidas pelo professor e pela professora

com seu trabalho. Antes de prosseguir, uma advertência: a aproximação que

faremos da aprendizagem é no entanto muito geral, pois a natureza do conteúdo

escolar (Língua, Artes, Matemática etc.) implica diferenças significativas na forma

como os alunos aprendem.

2.2.1 - O que permite que os alunos aprendam conceitos na escola?

O que, entre outros requisitos, permite que os alunos aprendam conceitos

de maneira significativa na escola é: possuir uma série de saberes pessoais.

Contar com professores dispostos a trabalhar considerando os alunos como

centro de sua intervenção. Saberes pessoais dos alunos: ter conhecimentos

conceituais prévios organizados, pertinentes e relevantes, com os quais conectar

a nova informação objeto de aprendizagem. Possuir outros conhecimentos, mais

no campo dos procedimentos, que lhes permitam: encontrar na memória o

conhecimento mais relevante, (próximo) ou especificamente relacionado ao

conteúdo da nova informação a ser aprendida (estratégias de ativação e

recuperação). Poder explicitar esse conhecimento para tomar consciência daquilo

que sabem e de como o sabem e permitir que outros (o professor, os colegas)

também tomem conhecimento.

Elaborar, conectar, situar e reter os novos conhecimentos em estruturas de

significado mais ou menos amplas. O aluno e a aluna utilizam estratégias de

codificação e retenção para estabelecer um significado comum entre os elementos

da informação que devem ser aprendidos, e também para salientar as relações

implícitas entre os elementos que compõem a informação. Para isso pode-se fazer

perguntas, elaborar resumos, tomar notas, comparar diferentes elementos do texto

ou estes elementos com os que aparecem em outros textos orais ou escritos,

checar os objetivos assinalados pelo autor, elaborar mapas conceituais etc.

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Poder regular, em algum grau, o próprio processo de aprendizagem.

Confirmar, por exemplo, se são ou não cumpridos os objetivos previstos, revisar

continuamente o que é feito, propor novas maneiras de fazer para conseguir

aprender o conceito (Estratégias de direção, regulação e controle dos próprios

processos de pensamento e ação). Há diferenças importantes no desenvolvimento

e aprendizagem dos alunos nesse processo.

Ter motivos relevantes que lhes permitam encontrar sentido na atividade de

aprendizagem de conceitos, que os faça sentir-se satisfeitos por: deixar de atuar

em condições de imediatismo e como reação ao que os envolve, poder antecipar,

refletir e organizar as “coisas” (materiais e abstratas; reais ou imaginárias); estabe-

lecer seus traços ou características básicas de modo independente das condições

em que se apresentam; fazer e resolver perguntas como: que é? que

características têm? em que é igual ou diferente de...? o que faz com que, quando

isso acontece, aquilo também ocorra? Identificar o que lhes é familiar e diferenciar

o desconhecido, sentir curiosidade por averiguar tudo o que ignoram etc. A

percepção dessa capacidade ajudará os alunos a sentirem confiança nas próprias

possibilidades de conhecer, dominar e administrar o mundo que os rodeia.

Ter inclinação para acreditar que a construção do conhecimento conceitual

não se faz contra os outros, mas com os outros (poder sentir-se bem perguntando

e sendo perguntado, resolvendo dúvidas e ajudando os outros a resolver as suas,

revendo processos e concepções e ajudando os outros a realizar a mesma tarefa

etc.). Estar disposto a acreditar que as dúvidas podem ser compartilhadas e que o

próprio conhecimento é perfectível. Ter inclinação para acreditar que o avanço na

construção das próprias idéias e conceitos deve-se ao esforço pessoal.

Debater as próprias opiniões ou compará-las com as de outros, usar essas

idéias pessoais para resolver determinados problemas e avaliar o resultado etc.

As atividades de ensino e aprendizagem, se selecionadas e apresentadas

adequadamente, podem ajudar os alunos a se conscientizarem das suas próprias

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representações, idéias e crenças, a averiguar algumas das suas limitações e a se

predisporem positivamente a modificá-las.

Os professores podem apresentar o novo conceito ou informação já

elaborada, tal como se quer que os alunos o aprendam, em um texto escrito ou

em uma explicação oral, ou podem apresentar o conceito como resultado de uma

série de atividades de exploração ou descoberta dos alunos. Em qualquer caso,

trata-se de ajudá-los no esforço de atribuir significado à nova informação que lhes

chega por diferentes meios. Para isso, os professores levarão em conta uma série

de critérios de apresentação da informação e de organização e funcionamento das

atividades.

A nova informação seja apresentada em termos funcional para os alunos,

em situações e contextos de solução de problemas próximos da vida cotidiana.

Tudo isso faz com que os alunos percebam a utilidade da nova informação e torna

mais fácil relacioná-la com o que já conhecem. Dado que os conhecimentos

prévios têm essas características, se não apresentar os saberes novos em um

nível parecido, dificilmente ambos poderão entrar em conflito.

Por sua parte, as atividades de descoberta deverão ser de âmbito de

exploração restrito, para possibilitar que os alunos identifiquem facilmente as

variáveis que é preciso levar em consideração e possam reunir os dados

percebendo que têm controle sobre o que indagam e sobre a situação de

indagação. Além disso, ao longo das atividades de aprendizagem por descoberta

(proposição do problema, etc.), os alunos devem perceber a si mesmos como

capazes de dar a razão daquilo que estão fazendo a cada momento e de explicar

o sentido de cada atividade no projeto global de descoberta.

Em suma, trata-se de que os professores consigam tornar explícitas as rela-

ções de cada uma das atividades de aprendizagem com o projeto geral e

organização e apresentação de dados não será um impedimento para a

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aprendizagem final do conceito. Isto é, pode-se aprender o que é o clima

mediterrâneo como resultado de um processo que consiste, por exemplo, em

reunir e interpretar dados sobre a pluviosidade, a temperatura e outros, de

diferentes cidades litorâneas, para extrair algumas constantes gerais que se

repetem em cada caso; reunir e comunicar, finalmente, “descoberta” em um

gráfico, resumo de todos os que foram consultados, que mostre claramente as

características desse clima. A aprendizagem do conceito, por este método, será

possível se conseguir não perder o significado de cada uma das atividades do

processo e se não encontrar dificuldades demais para ler e elaborar gráficos.

Os professores devem possibilitar a verbalização dos conceitos (em

situações de atividade compartilhada com outros e na resolução de problemas) de

maneira cooperativa, pois isso permite aos alunos negociar seu significado,

confrontar suas idéias para resolver dúvidas, usá-los de modo funcional, estudar

sua utilidade em diferentes contextos. Devem confiar no esforço dos alunos e

ajudá-los, sugerindo pistas para pensar, devolvendo uma avaliação do seu próprio

progresso, levando em consideração o ponto pessoal de partida e o processo pelo

qual os alunos chegam ao conhecimento.

Como muitos leitores já devem ter percebido, na aprendizagem de

conceitos, é necessário que procedimentos e atitudes sejam trabalhados. Assim,

pode-se diferenciar entre os procedimentos que são selecionados por sua

relevância na construção do conhecimento de uma matéria ou disciplina (por

exemplo, elaboração e leitura compreensiva de gráficos de dados estatísticos em

Ciências Sociais) e os relacionados com aprender a aprender e controlar a própria

atividade de aprendizagem e pensamento. Estes últimos têm sido ensinados

isoladamente de todos os demais. No entanto, a importância da sua integração

com outros conteúdos vinculados ao conhecimento de uma área curricular

específica é que, nesse caso, adquirem sentido e podem ser utilizados sem perder

nada do seu significado.

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Aprender a resumir, tomar notas, elaborar um plano de trabalho,

estabelecer momentos de acompanhamento ou auto-avaliação do processo de

aprendizagem fazem sentido quando servem para alcançar uma meta específica

(compreender as características do clima mediterrâneo) e quando as dificuldades

apresentadas por seu uso podem ser tratadas no contexto da atividade de ensino.

Visto que esses procedimentos se apresentam ao longo da atividade de

aprendizagem dos alunos, alguns dos elementos da proposta de aprendizagem de

conceitos que se acabe de ler também podem ser encontrados.

2.2.2 - Disposição dos professores para ensinar na construção do próprio

conhecimento de procedimentos

Os professores têm de intervir para suscitar as representações (ou idéias)

que os alunos têm sobre o procedimento, para ajuda-los a manifestarem o grau de

domínio que possuem na execução. Para isso, os professores têm de fazer o

seguinte: ativar, explicitar e trabalhar com as idéias que os alunos têm sobre o

procedimento objeto de aprendizagem. Para conhecer as idéias dos alunos, pode

ser necessário programar a atividade educacional de modo que o aluno e a aluna

possam: explicitar a pertinência de um procedimento na consecução de uma meta

(como poderia saber se as plantas alimentam-se apenas pelas raízes?); verbalizar

ou desenhar as operações que compõem o procedimento (que passos seriam

necessários para explorar como as plantas recebem seu alimento? que materiais

poderiam ser mais convenientes nesse processo? que podemos fazer para ler

muita bem essa estória?); apresentar e argumentar suas idéias e crenças e

debatê-las com outros mais experientes. Se as atividades de aprendizagem forem

selecionadas e apresentadas adequadamente, pode ser possível não só que o

professor conheça a competência dos alunos no âmbito dos procedimentos, mas

que estes tomem consciência delas, averigúem suas limitações e mostrem-se

dispostos a modificá-las.

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Ativar a competência prévia dos alunos no tocante a procedimentos,

possibilitando que sigam uma lista de instruções para a solução de um problema,

ensaiem um processo, imitem outros, ou fiquem totalmente imersos em uma

experiência interessante e significativa (cuidar do pássaro da classe, organizar os

livros da pequena biblioteca ou, por exemplo, conviver alguns dias com outros, em

alguma colônia, no início do curso escolar, para conhecer os costumes das aves

de rapina).

Os professores devem apresentar aos alunos o novo procedimento que

devem aprender (a nova informação) de modo que possam atribuir-lhe significado

em algum grau. Tudo isso será favorecido se os professores levarem em conta

uma série de critérios de apresentação da informação relacionada ao procedi-

mento em si mesmo e de organização e funcionamento das atividades de

aprendizagem desse procedimento.

Critérios de apresentação da informação ou do próprio procedimento: ao

apresentar o procedimento, os professores devem tentar explicitar as ordens ou

instruções que dirigem o processo de realização do procedimento de modo lógico,

claro e significativo para os alunos. Trata-se de conseguir explicitar os elementos

relevantes que o compõem com a ajuda da palavra, das ilustrações que

considerarmos necessárias e do comportamento ou execuções do modelo (podem

atuar como tal o próprio professor ou algum outro aluno que dominar a matéria). A

finalidade é que os alunos consigam conceber os requisitos necessários à tarefa,

que apreciem globalmente sua execução (como um todo único) e que apreciem

também a qualidade e a natureza do processo e do resultado esperado.

Proporcionar outras situações úteis para os alunos, a fim de que possam

diversificar o uso do procedimento e possibilitem o exercício de uma prática

generalizada e constante. Essas situações devem oferecer aos alunos a

oportunidade de executar de forma voluntária, consciente e inovadora o

procedimento, bem como de revisar a execução e realizar seu aperfeiçoamento.

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A verbalização dos procedimentos em situações de atividade compartilhada

com outros e na resolução de problemas de forma cooperativa permite que os

alunos e alunas negociem o significado dos mesmos em situações de atividade

conjunta e confrontem suas idéias, podendo resolver dúvidas e usá-las de modo

funcional, estudando sua utilidade em diferentes contextos.

Confiar no esforço dos alunos na construção de procedimentos e ajudá-los

com sugestão de pistas para pensar, devolvendo uma avaliação de seu próprio

progresso, levando em conta o ponto pessoal de partida, pedindo-lhes explicações

sobre seu próprio processo e o processo pelo qual os alunos chegam ao

conhecimento e sua generalização em diferentes situações e contextos.

Apresentar atividades de avaliação em que seja possível atribuir a consecução da

aprendizagem a causas internas, modificáveis e controláveis.

2.3 – O QUE PERMITE AOS ALUNOS APRENDER DETERMINADAS

ATITUDES?

Saberes pessoais dos alunos. Estar familiarizado com certas normas e

possuir tendências de comportamento que se manifestam em situações

especificas, perante objetos e pessoas concretas que sirvam de base às novas

normas e atitudes objeto de aprendizagem. Poder recordar, entre todos os que

estão na memória, avaliações, juízos ou sentimentos que merecem determinadas

coisas pessoas, objetos e situações mais relevantes e especialmente relacionados

com a nova norma ou atitude.

Mostrar-se disposto a expressar a outros suas idéias ou opiniões, por meio

da palavra, do gesto ou de qualquer outro modo possível, como medida para obter

algum grau de consciência sobre elas e conseguir que outros também as

conheçam. A consciência pública e privada de uma atitude constituem um

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elemento importante para a aprendizagem de outras novas, porque torna possível,

de acordo com as possibilidades de desenvolvimento e aprendizagem dos alunos,

que eles reflitam sobre os próprios comportamentos e idéias, analisem suas

relações e implicações mútuas e avaliem o grau de coerência ou discrepância

entre, por exemplo, sua atitude e outras informações novas sobre a realidade, as

atitudes ou opiniões de pessoas queridas e significativas e também entre a própria

atitude e a ação ou comportamento próprio.

Poder aceitar tudo o que implica a mudança de atitude com confiança e

segurança em si. O fato de poder ou não mostrar uma atitude determinada não

depende apenas de conhecer o argumentos que a sustentam, mas da

possibilidade de relacioná-la com determinados afetos, emoções e motivos que,

às vezes, nos impedem de mudar. Toda inovação pessoal implica certo grau de

temor e pressupõe a aceitação de algum tipo de risco.

A mudança de atitude na escola é possível se o aluno e a aluna contam

com o apoio de um coletivo (como o grupo da classe) que avalia positivamente

essa modificação de atitudes e aceita o desafio da mudança constituindo-se como

referencial e suporte, graças à qualidade das relações geradas no mesmo. Isto é,

os alunos estarão em melhores condições de aprender atitudes se a escola e o

grupo de classe permitem a discussão dos argumentos que as apóiam, regulam

as exigências de mudança mediante a participação, a cooperação e a

responsabilidade de todos os seus membros, aceitam o conflito como algo

necessário e não necessariamente negativo e enfocam os problemas sem

dramatismo exagerados nem culpas desmoralizadoras.

O grupo escolar deve ter claramente estabelecidos (e compartilhar as

normas que os regulam) os critérios de valor pelos quais é regido. A qualidade da

interação que se estabelece na escola e no grupo, tomando como base os valores

estabelecidos, atuará como referencial de ajustamento da própria ação pessoal e

da atividade compartilhada. Isto é, alguém se dispõe a comportar-se de uma

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determinada maneira ou a acatar uma norma se considerar que há consenso a

respeito entre os membros do grupo, fundamentalmente entre aqueles que aprecia

ou aos quais atribui valor ou autoridade.

Os professores devem facilitar o conhecimento e a análise das normas

existentes no centro escolar e no grupo de classe para que os alunos possam

compreendê-las e respeitá-las. Também devem ficar claramente estabelecidas as

formas de participação para que os alunos as conheçam e contribuam para melho-

rá-las, para trocá-las por outras ou anulá-las, se for o caso. E importante regular o

cumprimento e o desenvolvimento das mas e acordos estabelecidos.

É função dos professores ajudar os alunos a relacionarem

significativamente as normas a determinadas atitudes que se pretende que

desenvolvam em situações concretas (no laboratório, no trabalho em grupo, nos

espaços comuns da escola, em uma saída, em uma exposição dos professores

etc.). Nesse sentido, pode ser útil apresentar as normas e atitudes vinculando-as a

situações coneretas e familiares para os alunos, a fim de que possam apreender

claramente os argumentos que as sustentam e alguns dos comportamentos que

as exemplificam em realidades concretas.

A aprendizagem de atitudes se apóia, como demonstramos, na elaboração

de representações conceituais e no domínio de determinados procedimentos

(estratégias de memória, estratégias de relação com os outros etc.). Por sua vez,

as atitudes estão na base do desenvolvimento pessoal de estratégias de direção,

orientação e manutenção da própria atividade de aprendizagem. Por exemplo,

atitudes como o rigor ou a curiosidade baseia-se no exercício experiente de certos

procedimentos e, por sua vez, ajudam os alunos a perseverar na consecução da

qualidade da atividade. Da mesma forma, o respeito pela diversidade (atitude) per-

mite que as pessoas continuem interessadas em conhecer as características de

outros (conceitos) até conseguir apreciá-los em toda a sua identidade, sem

necessidade de comparações desqualificadoras e reciprocamente. Poder chegar a

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conhecer, apreciar e avaliar outras pessoas por aquilo que elas são implica

também se conhecer e apreciar-se, em suma, confiar nas próprias capacidades e

auto-estima.

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2.4 – ENSINAR: CRIAR ZONAS DE DESENVOLVIMENTO PROXIMAL E NELAS

INTERVIR

A aprendizagem escolar é um processo ativo do ponto de vista do aluno, no

qual ele constrói, modifica, enriquece e diversifica seus esquemas de

conhecimento a respeito de diferentes conteúdos escolares a partir do significado

e do sentido que pode atribuir a esses conteúdos e ao próprio fluo de aprendê-los.

Ao mesmo tempo, devido à peculiar natureza social e cultural dos saberes que os

alunos devem aprender, esse processo ativo não pode, na escola, ser confiado ao

acaso nem se separar de uma atuação externa, planejada e sistemática, que

oriente e guie na direção prevista pelas intenções educativas presentes no

currículo.

A conjunção de ambas as idéias pressupõe que essa atuação externa, isto

é, o ensino, deve ser entendido, necessariamente, não concepção construtivista,

como uma ajuda ao processo de aprendizagem. Ajuda necessária, porque sem ela

é altamente improvável que os alunos cheguem a aprender, e a aprender da

maneira mais significativa possível, os conhecimentos necessários ao seu

desenvolvimento pessoal e à sua capacidade de compreensão da realidade e de

atuação nela, que a escola tem a responsabilidade social de transmitir. Mas

apenas ajuda, porque o ensino não pode substituir a atividade mental construtiva

do aluno nem ocupar o seu lugar (Coll, 1986, 1990).

Essa caracterização do ensino como ajuda, tentando responder algumas

interrogações específicas a respeito: que características deve ter essa ajuda para

poder tornar efetivo seu objetivo de orientar e guiar a aprendizagem; que critérios

de intervenção podem ser seguidos na prática habitual para que se registrem

essas características; o que supõe entender o ensino como ajuda do ponto de

vista da atuação do professor.

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2.4.1 – Ensinar, ajudar, ajustar, dar assistência na zona de desenvolvimento

proximal

As distintas características, condições e processos ressaltamdos desenham

uma imagem global muito determinada daquilo que o processo de ensino implica:

possibilitar e demarcar a participação dos alunos, adaptar-se a ela de maneira

contingente e ao mesmo tempo forçar formas cada vez mais elaboradas e inde-

pendentes de atuação, tudo isso na medida do possível em cada situação, e

graças a uma conjunção de recursos e atuações muito diversos, tanto no plano

cognoscitivo como no afetivo e de relacional. Três comentários finais sobre essa

imagem e tentativa de pô-la em prática em aula serão úteis para acabar de perfilar

seu significado.

O primeiro deles é que, como frisaram Coll e Solé (1989), essa imagem

leva a delimitar três elementos básicos como eixos da tarefa do professor: o

planejamento detalhado e rigoroso do ensino, a observação e reflexão constante

de e sobre o que acontece na aula, e a atuação diversificada e elástica em função

tanto dos objetivos e do planejamento desenhado como da observação e da

análise que vão sendo realizadas. De acordo com esses eixos, o professor fica

definido claramente como um profissional reflexivo que toma decisões, coloca-as

em prática, as avalia e as ajusta progressivamente em função dos seus

conhecimentos e da sua experiência profissional, e não como um mero executor

das decisões de outros ou como um aplicador mecânico de fórmulas fixas de

atuação.

O segundo comentário leva a ressaltar que a tarefa de oferecer ajudas aos

alunos passa pelos diversos níveis ou planos da prática educacional. Isto é, não

depende unicamente daquilo que cada professor individual possa fazer na sala de

aula, mas também tem a ver com decisões tomadas no nível de ciclo, de etapa, de

seminário sobre questões como materiais curriculares a serem usados pelos

alunos, livros didáticos, agrupamentos de alunos, distribuição e uso de espaços,

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estruturação de horários etc. De acordo com a noção ampla de ajuda educacional

que se delimita, todos esses elementos podem e devem ser considerados como

suportes e apoios para a aprendizagem e como instrumentos do ensino, e devem

ser considerados passíveis (sempre no contexto das possibilidades e da infra-

estrutura real da escola) de atuação diversificada.

Em terceiro lugar, acredita-se que vale a pena ressaltar que um ensino

realizado de acordo com as características e para-metros que assinala é um

ensino que pode responder de maneira adequada à diversidade dos alunos e que

integra essa resposta ao desenvolvimento habitual da tarefa docente. Assim, cada

um dos critérios que viemos desenvolvendo podem ser considerados critérios de

resposta à diversidade dos alunos, sendo essa resposta entendida como algo

consubstancial à atuação habitual dos professores, dirigido ao conjunto dos

alunos, e que pode dar-se em diferentes dimensões e planos da vida da sala de

aula e da escola (Onrubia, 1993).

Enfim, está conscientes de que uma caracterização do ensino como a que

expôs anteriormente sem dúvida representa um desafio para que dedica à tarefa

docente, e que, colocada em prática, não está de forma alguma isenta de

problemas, dificuldades e limitações muitas vezes impostas PCNs próprias

condições de realização dessa tarefa.

Por isso, e de acordo com os mesmos princípios que se utiliza para

desenhar essa caracterização, entende-se que esse desafio só poderá ajudar a

aprendizagem e o desenvolvimento das escolas e das aulas se for enfrentado

partindo dos conhecimentos e experiência prévios de cada professor e utilizando-

os como eixo a partir do qual deve ser colocado qualquer processo de mudança, e

partindo igualmente da história, da situação e das condições reais de cada escola;

se for colocado em termos de tarefas concretas abordáveis a cada momento, em

função dessas condições e dos instrumentos de apoio disponíveis, e se for

entendido autenticamente como um processo progressivo, com seus avanços,

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retrocessos, bloqueios e conflitos, e no qual, às vezes, o avanço pode ser lento e

aparentemente pouco espetacular, mas nem por isso menos decisivo e

importante.

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CAPÍTULO 3 – O PROFESSOR COMO FIGURA-CHAVE NA MOTIVAÇÃO DOS ALUNOS

O professor Esteve (1994) afirma: “O elemento mais característico na

educação das últimas décadas é a escolarização plena de 100% (as crianças nas

idades definidas como de escolaridade obrigatória, alcançando no ensino médio

níveis de participação crescente que constituem cada ano um novo recorde. A

passagem de um sistema de ensino de elite para o novo sistema de ensino de

massas supôs o aparecimento de novos problemas qualitativos sobre os quais se

impõe uma reflexão profunda. Trabalhar com um grupo de crianças Fiomogêneo

não é o mesmo que atender a 100% das crianças de um pais, com os 100% de

problemas sociais que essas crianças trazem consigo” (p. 78).

Essa constatação tem implicações claríssimas no terreno da motivação,

especialmente dos alunos do ensino médio. A mudança produzida é

impressionante e fez variar substancialmente o trabalho dos professores. Quando

a sociedade não oferece muitas saídas aos jovens e as perspectivas de encontrar

trabalho ao sair da escola são poucas, parece que toda a responsabilidade de

motivar os alunos recai nos professores. A tarefa não é fácil, mas é necessária.

Se analisarem atentamente todos os processos correspondentes ao

planejamento, implementação e avaliação das atividades de ensino-

aprendizagem, verão que o professor ou a equipe de professores tomam uma

quantidade notável de decisões das quais, muitas vezes arrastados pelas rotinas,

não se está plenamente conscientes. Um importante grupo de decisões diz

respeito às que um professor toma durante o desenvolvimento de uma aula ao

interagir com os alunos. Muitas decisões têm importância na criação ou

manutenção da motivação dos alunos.

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3.1 - INFLUÊNCIA DA FIGURA DO PROFESSOR \NA MOTIVAÇÃO DOS

ALUNOS

Antes de começar a analisar de forma sistemática a influência das

diferentes tarefas e decisões dos professores na motivação de seus alunos, e

algumas considerações prévias em torno da figura do professor que parecem

importantes, já que definem, ainda que vagamente, o marco em que o professor

deve realizar todas as suas tarefas. Se um professor não está motivado, se não

exerce de forma satisfatória sua profissão, é muito difícil que seja capaz de

comunicar a seus alunos entusiasmo, interesse pelas tarefas escolares; é,

definitivamente, muito difícil que seja capaz de motivá-los.

3.1.1 - Deficiências na formação inicial

Parece claro que a formação inicial dos professores não é adequada para o

exercício da profissão. No caso dos professores do ensino fundamental, parecem

escassos os conhecimentos das diferentes áreas e muito limitados os do campo

psicopedagógico. A situação é muito pior se examinam a formação dos

professores do ensino médio, cujos conhecimentos pedagógicos primam por sua

ausência. Parece urgente a revisão dos estudos do professor de ensino

fundamental e a criação de alguns estudos de professor de ensino médio em

ciências, letras, sociais etc., nos quais se combinaria a formação cientifica nas

disciplinas básicas de cada especialidade com a formação psicopedagógica. Se

pensassem em estudos estruturados em dois ciclos, o primeiro poderia ser

dedicado à formação cientifica e poderia ser comum para estudantes que pensam

se dedicar à pesquisa ou à indústria; o segundo ciclo deveria ocupar-se da

formação psicopedagógica de caráter geral e das didáticas específicas. Aqui

deveria incluir-se a formação necessária para que o professor seja capaz de

motivar seus alunos. Este será um dos principais problemas que deverá enfrentar

durante o exercício de sua profissão e, portanto, deveria ser um dos tópicos

principais em sua formação.

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3.1.2 - É urgente valorizar o trabalho do professor

Deve-se reconhecer que, no decorrer dos anos, a profissão foi perdendo

prestígio social, sendo evidente a desmoralização que globalmente afeta os

professores. A Parte as medidas econômicas das quais aqui não se tratar, podem

ser tomadas outras para ajudar a recuperar o prestígio perdido. A atitude do

governo não ajuda a dignificar o oficio. Um exemplo basta. É inadmissível que se

indique a professores como devem ensinar, que escolas psicopedagógicas devem

seguir. Aceita-se que se indique aquilo que se deve ensinar, que se fixem os

conhecimentos mínimos que a escola deve dar aos cidadãos, da mesma maneira

que se indicam as intervenções cirúrgicas que a Seguridade Social deve oferecer

a seus doentes. Mas, da mesma maneira que seria inaceitável e impróprio que o

governo indicasse as técnicas cirúrgicas que os cirurgiões devem seguir para

implantar uma prótese de quadril, e inaceitável que o governo dê indicações sobre

a metodologia que os professores deverão seguir.

Portanto é urgente valorizar o oficio de professor. O governo, as escolas e

os próprios professores devem considerar isso o objetivo primordial. Caso

contrário, encontrar-se-ão professores cada vez mais desmotivados que não serão

psicologicamente capazes sequer de abordar o problema da motivação de seus

alunos.

3.1.3 - Educar e motivar, tarefas fundamentalmente artísticas

Os conhecimentos de psicologia são muito importantes, mas não

transformam um mau professor num bom professor. Podem ajudar a melhorar, a

refletir de maneira sistemática sobre o fato educativo, podem iluminar determi-

nadas parcelas normalmente obscuras, podem dar idéias ao planejar o ensino de

determinada matéria... Os processos de ensino-aprendizagem são satisfatórios

quando se estabelece uma conexão, uma sintonia entre o professor e os alunos,

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uma cumplicidade. Isso só determinado professores-artistas são capazes de fazer.

Como nos meios de comunicação audiovisual, alguns profissionais comunicam

mais que outros.

Às vezes se diz que o mais motivador para um aluno é ter um bom

professor. Também se diz que um bom professor é aquele que sabe motivar seus

alunos. Deve-se reconhecer que existem grandes professores com escassos

conhecimentos de psicopedagogia mas grande intuição e capacidade de interagir

com seus alunos. Sua simples presença já é motivadora. Ao entrar na classe, a

atitude dos alunos muda, mostrando-se dispostos a realizar tarefas que com

outros professores pareciam impossíveis.

3.1.4 - Importância de conhecer a fundo a matéria que se ensina

Para ensinar é muito importante, não se deve enganar, o conhecimento da

matéria em questão. Devem conhecer os tópicos básicos da matéria, as

metodologias normalmente utilizadas, as estruturas que traçam sua lógica, sua

história, a relação com outras ciências. Isso é condição necessária, ainda que

insuficiente, para poder ensinar com êxito. Se essa condição não se dá, a

reciclagem dos professores deve começar pelo aprofundamento da matéria. As

idéias psicopedagógicas serão um luxo supérfluo se não dominar a matéria. Esses

tipos de curso sobre conteúdos científicos têm muito pouco êxito deferentes

programas das escolas de verão e de formação permanente de professores.

Conhecer a fundo a matéria que se ensina e vibrar com ela é indispensável para

comunicar aos alunos a motivação que se costuma considerar mais valiosa do

ponto de vista pedagógico: a motivação intrínseca.

No decorrer dos anos os conhecimentos dos professores ficam facilmente

fossilizados. Nesse sentido, e necessária uma formação permanente, já que é

importante que os professores falem dos temas da atualidade, os quais interes-

sam aos alunos. Essa é uma importante regra para que se aproximem da matéria.

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3.1.5 - O professor, objeto de conhecimento de seus alunos

Uma característica especialmente difícil da tarefa do professor é que ele

mesmo é objeto de conhecimento de seus alunos. Além da comunicação explícita,

daquilo que o professor diz e explica, ele comunica muitas outras coisas: maneira

de raciocinar, estilo cognitivo, personalidade, atitudes, valores. Sabe-se que as

atitudes, os valores, a ética se mostram, não se demonstram, O autêntico

professor não pode apenas se fazer de professor, deve sê-lo.

Essa é uma característica que faz com que a vocação de professor seja a

uma só vez difícil e apaixonante. A própria pessoa do professor pode ser uma

fonte de motivação importantíssima. O tipo de relação que se estabelece com os

alunos pode gerar uma confiança e um aumento da atenção que são condições

indispensáveis para a aprendizagem.

3.1.6 - Alguns paradoxos sobre a promoção dos professores

Devem lutar contra um paradoxo que afeta a profissão: “A promoção de um

professor consiste em deixar de sê-lo”. Muitos bons professores, quando

alcançam um alto nível de competência, deixam de sê-lo ou reduzem ao mínimo

suas tarefas docentes, transformando-se em gestores, diretores, administradores

ou assumindo qualquer outro tipo de ocupação que os vai afastando do trabalho

docente e do contato com os alunos. Isso aconteceu a muitos dos melhores

professores da escola pública, que atualmente ocupam cargos públicos, trabalham

com pesquisa ou desempenham diversas funções que os afastaram da docência.

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CAPÍTULO 4 – CONDICIONANTES CONTEXTUAIS DA MOTIVAÇÃO PARA APRENDER E ENSINAR

De acordo com as idéias que acabou de descrever, para que os alunos

realizem a atividade escolar com motivação suficiente parece necessário intervir,

no mínimo, em duas direções: tentando mudar a idéia geral sobre a possibilidade

de melhorar ou não as capacidades e habilidades, e o conceito que o aluno tem

de si mesmo com relação às possibilidades de êxito nas diferentes arcas.

Ensinando modos de pensar que, no momento de realizar as tarefas escolares,

permitam enfrentá-las a fim de aprender, com a atenção voltada para a busca e

utilização de estratégias que permitam superar as dificuldades, aprender com os

erros e construir representações conceituais e procedimentos que facilitem a

percepção de progresso e contribuam para manter a motivação elevada.

Como os professores podem conseguir as duas coisas? Assinalam

inicialmente que os professores, ao deijuir objetivos de aprendizagem, apresentar

a matéria, propor tarefas, responder às demandas dos alunos, avaliar a apren-

dizagem e exercer o controle e a autoridade, criam ambientes que afetam a

motivação e a aprendizagem. As diferentes formas de enfrentar a atividade

escolar que se descrevem não surgem por si sós, mas se vêem afetadas pelo

contexto que professores, e, em certa medida, os pais criam com modo de

atuação. Como os modos de atuação contribuem para criar ambientes

facilitadores da motivação para aprender ou, ao contrário, inibidores dela? Para

responder a essa pergunta é necessário examinar em que medida a atividade do

professor na sala de aula responde aos objetivos almejados em diferentes

momentos do desenvolvimento da aula.

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4.1 - INÍCIO DA AULA

Algo que todo professor deve conseguir no começo de uma aula, como

condição necessária para motivar seus alunos a aprender, é atrair sua atenção

despertando sua curiosidade e interesse, características que é preciso distinguir,

como mostraram Hidi e Anderson (1992), e mostrando a importância do que vão

aprender.

4.1.1 - Curiosidade

A curiosidade é uma atitude, manifesta na conduta exploratória, ativada

pelas características da informação tais como sua novidade, complexidade,

caráter inesperado, ambigüidade e variabilidade, as quais o professor pode utilizar

para atrair a atenção dos alunos. Os fenômenos implicam — em geral —

experiências novas e inesperadas, capazes de despertar a curiosidade dos

alunos.

Sua aplicação em diferentes momentos da aula pode servir para despertar

a curiosidade. Ainda que para muitos alunos, acostumados a aceitar sem

questionar o que os professores apresentam, não seja necessário introduzir a

matéria do modo exposto, agir dessa maneira pode ajudar muito não que seja o

suficiente — no caso dos alunos que não progridem, já que em princípio esse

modo de ensinar supõe orientar a aprendizagem para a compreensão dos

fenômenos, e não para a memorização dos fatos. Iniciar as aulas sem tentar

despertar a curiosidade mediante a apresentação de problemas ou de informação

nova ou surpreendente mas, como comprovam que alguns professores fazem,

começando diretamente a explicar, pode contribuir para que os alunos considerem

que o objetivo é memorizar e ser aprovado, e isso talvez desencadeiem formas

negativas de enfrentar as atividades como se descrevem. Por esse motivo, os

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professores deveriam examinar o grau em que usam estratégias como apresentar

informação nova, incerta, surpreendente ou incongruente com os conhecimentos

prévios do aluno e variar os elementos da tarefa para despertar a curiosidade.

4.1.2 - Interesse

Com o termo interesse se faz referência ao fato de manter a atenção

centrada em algo — neste caso, o desenvolvimento de uma explicação ou de uma

tarefa, na medida cm que a informação que se recebe pode relacionar-se com o

que já se sabe. Trata-se, pois, de um processo diferente da curiosidade, a qual

implica dirigir a atenção para um fenômeno novo, incerto, surpreendente ou

incongruente, seguido de uma atividade orientada para a exploração dele que

facilite seu conhecimento e compreensão. Uma vez que o interesse depende da

facilidade com que a informação se relaciona com o que já se sabe, é

particularmente motivador, por um lado, o professor começar as aulas levando em

conta o que seus alunos sabem sobre o tema; por outro, seu discurso expositivo

— como o de um texto escrito — possuir uma coesão e uma progressão temática

claras que facilitem a hierarquização e a compreensão da relação entre as idéias;

bem como o ritmo da exposição permitir assimilar seu conteúdo e, finalmente, a

informação se apresentar sempre que possível com imagens concretas,

especialmente se permitem ao aluno estabelecer uma conexão com ele mesmo.

Quando essas características não estão presentes, torna-se mais dificil

manter a atenção centrada na informação que se recebe. Isso pode propiciar

lacunas na compreensão que, como assinalam antes, desencadeiam

freqüentemente processos de má adaptação como tensão, atribuição do problema

à falta de capacidade etc. Por esse motivo, parece claro que nós, professores, não

devemos deixar de examinar, de um lado, em que medida a forma e o ritmo em

que apresentamos a informação podem estar contribuindo vira manter o interesse

não só dos alunos mais rápidos, mas também dos que não progridem, e, de outro,

o grau ela que tanto a forma com que expomos como as perguntas, tarefas e

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problemas que apresentam estão suficientemente ilustrados com exemplos

concretos.

4.1.3 - Importância dos conteúdos

Outro processo que pode se ver afetado positivo com negativamente pela

atividade que os professores desenvolvem no início da aula é a percepção da

importância dos conteúdos que se devem aprender ou das tarefas que se devem

realizar. Todo aluno enfrenta a atividade escolar com a seguiu te pergunta —

explícita ou implícita —: “Para que necessito saber isto?”, buscando assim o

significado — instrumental ou de meta — da tarefa. A resposta a essa pergunta

vai condicionar em boa medida os incentivos que o sujeito tem para acolher uma

explicação, estudar um tema ou realizar uma tarefa e, em conseqüência, o esforço

que empregam.

A determinação do significado de uma atividade de pende ao menos de

dois fatores: de um lado, do grau ela que o aluno é capaz de situar a tarefa no

contexto de que já sabe e, de outro, do grau em que é capaz de determinar as

implicações futuras de sua realização. Que o aluno seja capaz de ambas as

coisas dependem em boa medida da atividade do professor. Este pode ou não

relacionar explícita mente o conteúdo da matéria com as experiências,

conhecimentos prévios e valores dos alunos, na medida em que os conhece por

terem sido estabelecidos em aulas anteriores.

Se professores, não utilizam atividades que manifestam a importância

interna da aprendizagem almejada, ou se as mensagens utilizadas indicam que o

que está em jogo é sair-se bem ou mal diante dos outros etc. como ilustrávamos

com os exemplos expostos, em vez de gerar processos de enfrentamento

motivacional mente adequado, ativam-se a ansiedade e as estratégias de

enfrentamento centradas mais na consecução ou evitação de um resultado

externo à tarefa — o juízo de êxito ou fracasso que se vai receber do professor —

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que na própria aprendizagem. A motivação, como se pode comprovar, não

depende só do aluno, mas também do contexto. Daí a importância de os

professores avaliarem e modificarem, se preciso, a meta que suas mensagens

privilegiam, já que ela define por que é relevante ao aluno fazer ou aprender o que

se pede.

4.2 - ORGANIZAÇÃO DAS ATIVIDADES

Após introduzir um tema e dar as explicações relevantes, os professores

normalmente propõem aos alunos diferentes tipos de atividade. A apresentação

de uma atividade qualquer — resolver problemas, fazer experiências, analisar

textos, fazer uma redação etc. — pode variar de acordo com certas características

que têm repercussões importantes na motivação. Referiu-se ao grau de autonomia

de que o aluno dispõe para a realização de uma tarefa e ao tipo de interação entre

os alunos que tal tarefa requer.

4.2.1 - Autonomia

Para que uma pessoa assuma de bom grado a tarefa de mudar suas

normas de comportamento, a primeira condição é que, embora essa mudança

possa vir sugerida, ela a assuma como algo que deseja e escolhe de forma

autônoma e voluntária. Isso também é válido no caso dos alunos porque, se essa

condição não ocorre, podem rejeitar a atividade escolar e não progredir em sua

aprendizagem. A aceitação da atividade escolar como algo positivo e desejável se

vê facilitada ou dificultada dependendo da forma como os professores a

apresentam.

Para que os alunos sintam que trabalham no que querem porque eles

assim o querem, é importante que o professor ofereça o máximo de possibilidades

de opção, por exemplo deixando que escolham companheiro ou companheira

quando têm de trabalhar em grupo, oferecendo-lhes vários temas de trabalho para

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que escolham um quando possível etc. Esse é um recurso que o professor pode

controlar facilmente e cuja importância reside no fato que acabou de mencionar:

todos sentem mais à vontade quando trabalham para conseguir o que interessa e

que eles mesmos escolhem que quando fazem algo que não é imposto.

A condição anterior, no entanto, pode não ser suficiente porque, ainda que

se possa escolher, a escolha se faz no contexto de uma atividade rejeitada em

seu conjunto seja por que motivo for — não entender seu significado, não se sentir

capaz etc. — e cuja realização se percebe, em conseqüência, como algo imposta.

Por isso é necessário, como mostrou deCharms (1976), que os alunos percebam

que o que estão aprendendo aumenta suas capacidades e lhes abre a

possibilidade de escolher quando antes não podiam. Os professores e professoras

podem contribuir ou não para isso na medida em que com suas mensagens

ajudem seus alunos a perceber o valor de aceitar como próprio o que em princípio

vem imposto. Por exemplo, se uma aluna manifesta rejeição pelo desenho técnico

dizendo que não tem habilidade e não gosta de desenhar, uma vez que consiga

fazer um desenho razoável, experimentando que não é dificil e que tudo é possível

aprender, o professor pode lhe dizer: “Agora você tem como escolher ou não,

porque sabe como fazê-lo. Antes não podia”. A ausência de mensagens que

ajudem a fazer com que os alunos tomem consciência desse fato pode estar

contribuindo para a rejeição e desmotivação.

O fato de os alunos aceitarem as atividades escolares como algo próprio se

vê facilitados ou dificultados também quando nas aulas se trabalha com base em

projetos de desenvolvimento pessoal, estratégia que nos Estados Unidos está

começando a se impor associada ao que se conhece como “Avaliação baseada

em portfólios” (Tierney, Carter e Desai, 1991). A idéia é a seguinte. O professor

expõe as razões pelas quais é interessante ser capaz de fazer algo: um tipo de

produção escrita, resolver um problema da vida real, problemas que implicam, por

exemplo, o domínio de determinados princípios matemáticos etc. Posteriormente

oferece aos alunos projetos alternativos de trabalho — individuais ou em grupo —

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que possam ajudá-los a desenvolver as capacidades assinaladas, negociando

com cada um o projeto que deve realizar e os objetivos pessoais que deve

alcançar, por exemplo determinado número de produções escritas com

determinado nível de qualidade, ou certo tipo e número de problemas resolvidos

etc.

A fase de negociação dá oportunidade ao professor de discorrer com cada

aluno ou grupo de alunos sobre a viabilidade de suas opções, assim como de

ajudá-los a se organizar por etapas etc. As aulas são planejadas e desenvolvidas

posteriormente pelo professor como um processo não tanto informativo quanto de

ajuda à formulação de perguntas sobre como proceder, de assessoramento sobre

a realização de cada etapa etc. Isso não significa que não haja aulas expositivas,

mas não a priori. Elas são planejadas nos momentos em que se prevê que a maior

parte dos alunos vai necessitar de um tipo de informação. A avaliação orientada

para facilitar aos alunos caminhos que lhes permitam me elaborar está associada

a atividades diárias.

Quando é necessário avaliar, os alunos escolhem entre os trabalhos

realizados os que consideram suas melhores produções, assinalando os critérios

usados, e os apresentam para a avaliação. Então o professor assinala em que

progrediram e em que não progrediram e por quê, e negocia com os alunos um

novo projeto que deve levar em conta os resultados alcançados no anterior.

Como se pode deduzir, trabalhar em um projeto com que houve

possibilidade não só de aceitar ou rejeitar, mas de elaborar, contribui para a

percepção de que não se é uma marionete do outro, mas que se faz algo

escolhido com autonomia que beneficia a si mesmo. No entanto, na medida em

que a situação atual não implica propor aos alunos seus trabalhos escolares no

contexto de projetos de desenvolvimento, é dificil que possam superar a sensação

de fazer coisas que não têm muito sentido para eles, o que evidentemente

desencadeia processos negativos do ponto de vista motivacional.

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4.2.2 - Interação dos alunos

O modo de os alunos enfrentarem a atividade escolar ou a maneira de se

portarem diante dos outros depende também, em boa medida, de como

professores e professoras organizam as atividades de aula, promovendo entre

eles interações de cooperação (há professores que organizam os alunos em equi-

pes para fazer os trabalhos) ou de competição (às vezes se busca a competição

entre os alunos individualmente ou entre equipes), ou não promovendo interação

alguma (o que ocorre quando os alunos trabalham sempre individualmente), assim

como de que as condições exigidas para trabalhar em grupo sejam adequadas. As

diferentes formas de interação promovidas pelo professor têm diferentes efeitos

sobre a motivação, como mostram em uma síntese recente dos trabalhos sobre

esse ponto (Tapia, 1992b, cap. 10).

De acordo com os trabalhos revistos, tanto os dados experimentais como

os obtidos a partir da análise do que os alunos percebem nas aulas apresentam

as seguintes conclusões: A organização das atividades escolares em um contexto

competitivo é a que tem efeitos motivacionalmente mais negativos para a maioria

dos alunos. A razão principal é que sempre há perdedores. O trabalho individual

pode ter efeitos mais ou menos positivos dependendo do tipo de tarefa, do tipo de

metas e das mensagens dadas pelo professor. A organização da atividade escolar

em grupos cooperativos sob certas condições parece ser um fator especialmente

útil tanto para estimular o interesse e o esforço dos alunos para aprender como

para facilitar seu rendimento (Tapia, 1992b, cap. 10; ColI e Colomina, 1989;

Johnson e Johnson, 1985; Solomou e Globerson, 1989). Mas que significa “sob

certas condições”?

Refere-se sobretudo às condições imediatas que podem tornar efetivo ou

não o uso de atividades de cooperação: tipo de tarefa, tamanho do grupo,

composição do grupo e características dos alunos. Por exemplo, nem todas as

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tarefas são adequadas para o trabalho em grupo, nem todas as que permitem o

trabalho em grupo admitem as diferentes formas de organização grupal

anteriormente descrita. Por seus efeitos positivos, tanto sobre a motivação como

sobre a aprendizagem, as tarefas mais adequadas para o trabalho em grupo

parecem ser as abertas, que admirem várias soluções, nas quais os participantes

têm a possibilidade de optar entre diferentes formas de atuação, selecionar como

trabalhar ou que informação recolher etc. (ColI e Colomina, 1990).

No entanto, às vezes os professores organizam trabalhos em grupo sem

considerar essas características, o que pode gerar efeitos contrários aos

esperados. O mesmo ocorre se os grupos são grandes, pois a responsabilidade

tende a se diluir ao se esperar que “alguém faça o trabalho”, ou se forçam a

formar um grupo alunos que não se aceitam mutuamente de bom grado. Além

disso, às vezes se propõe que os alunos trabalhem em grupo sem considerar se

tem a capacidade necessária para tirar proveito da atividade em questão. O

professor tem de considerar não só a adequação das demandas da tarefa às

capacidades sociais e cognitivas dos alunos, mas também o tipo de “guia” ou

“estruturação da atividade” que deve propor a seus alunos antes de começar a

tarefa e o tipo de ajuda que vai proporcionando-lhes ao longo de sua realização,

para evitar que se percam por não terem capacidade de organizar-se sozinhos.

Sobre esse ponto, Solomon e Cloberson (1989) assinalam que quando os

alunos têm um guia claro sobre o que fazer tendem a se desmotivar menos, não

se produzindo os efeitos negativos anteriormente citados (por exemplo, tendência

a deixar que outros façam o trabalho). Ás vezes, no entanto, quando têm de

realizar tarefas que implicam certa atividade exploratória durante um tempo

prolongado, não é possível nem desejável um alto grau de estruturação.

Nesses casos cabe especular, já que não há evidência a respeito, que o

trabalho do professor há de ser o de facilitar formas de interação positivas —

ensinar a valorizar as observações dos colegas por pequenas que pareçam,

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mostrar os efeitos negativos de atitudes inadequadas sobre a aprendizagem

individual e as conquistas coletivas etc. Não se entra no tipo de ajuda que os

membros do grupo podem prestar-se entre si, ajuda cujo grau de elaboração

parece ser um dos fatores determinantes dos efeitos positivos da colaboração

entre iguais sobre a aprendizagem e o desenvolvimento cognitivo. Trata-se mais

de o professor elaborar formas de apresentar a matéria, de reagir diante das

exposições dos outros e de realizar tarefas que evitem conseqüências negativas

para a motivação. Quando os professores não agem desse modo, a tensão criada

pela não-aceitação dos demais faz aflorar o pensamento de que “na situação de

grupo vão me avaliar”, ativando-se, assim, mecanismos para preservar a auto -

estima e não aprender.

Finalmente, é preciso assinalar que as atividades de cooperação não se

realizam no vazio, mas no contexto de finido pelo clima geral da aula, dependendo

em grande medida da atuação dos professores. Em alguns de nossos estudos

(Tapia, 1192b, cap. 10), observamos que quando esse clima é definido pela

percepção do interesse do professor em que cada aluno aprende, de que na aula

reina a ordem e há objetivos claros, de que o ritmo da aula é adequado e de que

não há favoritismos — tudo o que pensar na importância motivacional do conteúdo

das mensagens e instruções que os professores dão a seus alunos antes, durante

e depois das tarefas escolares , o uso de atividades cooperativas, após um

adequado controle das condições que dão lugar a efeitos negativos, costuma ser

uma forma de trabalho não só aceita mas preferida pelos alunos, com efeitos

claros sobre sua motivação, desenvolvi mento cognitivo e rendimento.

4.3 - INTERAÇÃO DO PROFESSOR COM OS ALUNOS

Um dos fatores contextuais que mais contribuem para definir a motivação

dos alunos e facilitar ou dificultar a aprendizagem são as mensagens dadas pelo

professor antes, durante e depois das tarefas escolares, especialmente se são

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consistentes — se orientam na mesma direção e ocorre de forma regular (Merino

e Tapia, 1990).

4.3.1 - Antes de realizar uma tarefa

As mensagens que um professor transmite a seus alunos não no começo

de uma exposição mas antes de realizar uma tarefa podem orientar sua atenção

em diferentes direções. Podem, por exemplo, sugerir que a tarefa é realmente

importante para diferentes tipos de metas, ao apresentá-la relacionando-a com

diferentes objetivos (por exemplo: “O importante é que vocês aprendam a resolver

problemas como estes”, “Estudem, que vão ter uma prova” etc.). Mas, além disso,

podem orientar a atenção dos alunos para o processo em vez de para o resultado

podem ajudar a estabelecer metas realistas (“Não é preciso fazê-lo perfeito neste

momento; fixem-se apenas..?’); podem sugerir as estratégias empregadas para

realizar a tarefa, ajudando o sujeito a pensar e a não ficar bloqueado (por

exemplo, na análise de um texto, o professor pode dizer: “Ao fazer a análise,

lembrem-se de que devem responder a estas perguntas: qual é o conteúdo

essencial do texto? Em que contexto — literário, histórico, cultural — cabe situá-

lo? A partir de que critérios vão avaliar seu conteúdo? E sua forma? Que avaliação

fazer de um e de outra?”).

4.3.2 - Durante a tarefa

Quando as tarefas são realizadas em aula e não em casa, as mensagens

que os professores transmitem durante sua realização ao aluno que pergunta ou

ao que observam estar em dificuldades também podem ter repercussões na

motivação. Quando um aluno pergunta, não é a mesma coisa dar-lhe

imediatamente a solução de seu problema, dizer-lhe simplesmente que se esforce

ou, uma vez analisada sua dificuldade, dar-lhe pistas que o ajudem a superá-la,

corno por exemplo: “Você se lembra dos passos que assinalamos na aula?

Repasse um por um, que talvez o ajude”.

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Da mesma forma, dizer a alguns alunos que não discutam um problema

não é a mesma coisa que lhes dizer: “Não aprende mais quem impõe suas idéias

mas quem é capaz de mudá-las se as do companheiro (ou companheira) são

melhores”. Isto é, as mensagens que um professor transmite enquanto os alunos

trabalham não só podem salientar a importância da tarefa para alcançar

determinado objetivo, mas podem ajudar o sujeito a aprender como realizar a

tarefa, ensinando-lhe a planejá-la e a estabelecer metas realistas, a dividi-las em

etapas, e a buscar e comprovar possíveis meios de superar as dificuldades.

As mensagens que salientam os pontos assinalados orientam o sujeito para

metas de aprendizagem e ensinam a pensar, que é uma das condições para que

os alunos possam perseguir essas metas. No entanto, os professores também

podem transmitir mensagens que afetam negativamente a motivação de aprender.

Dizer “Esforce-se” a um aluno cine pergunta, quando ele não sabe como

continuar, é deixá-lo sem ação. Perguntar à classe quem sabe a resposta ao que

o aluno perguntou em particular pode pô-lo em evidência e fazer com que não

volte a perguntar.

A natureza exata das mensagens que um professor pode dar durante a

tarefa varia muito. No entanto, é possível categorizá-las em função das metas que

salientam, das expectativas que geram, da ajuda que proporcionam e do grau em

que supõem para o sujeito uma avaliação positiva ou negativa de sua conduta e

sua pessoa.

4.3.3 - Ao final da tarefa

Quanto às mensagens transmitidas pelo professor ao término de uma

tarefa, também podem ter repercussões motivacionais variadas. O professor pode

dizer simplesmente se a tarefa foi corretamente realizada ou não. Ou, além disso,

dizer: “Vamos nos fixar nos passos que X deu para realizar a tarefa”. “Lembrem-se

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de que o importante não é que a tarefa esteja correta, mas que tenham aprendido

o procedimento para resolver esse tipo de problema.” Mensagens como essas

orientam os alunos para o processo seguido, até a tomada de consciência do que

se aprendeu e por quê, fazendo-os compreender que não importa que tenham se

equivocado porque o importante é avançar.

Em contrapartida, mensagens como “O que você sente ao constatar que é

capaz de fazê-lo?”, se acompanhadas de mensagens como as anteriores,

contribuem não tanto para que o aluno se sinta reforçado do exterior quanto a que

desfrute o domínio de uma tarefa que implicava um desafio, o que pode facilitar o

desenvolvimento da “necessidade de experimentar esse domínio”.

Se os professores não transmitem mensagens como as indicadas ou, o que

é pior, se em vez disso dão mensagens que implicam uma avaliação negativa

(“Está tudo errado. Assim não vão chegar a lugar nenhum”) ou comparação com

os colegas (“A maioria de seus colegas fez melhor que você. Você tem de

melhorar”), mensagens que implicam uma ameaça contra a auto-estima,

contribuem para que os alunos não vejam as situações escolares como

oportunidades de aprender, mas como ocasiões cm que o que está em jogo é a

própria imagem, e isso, como já assinalou, desencadeia padrões de

enfrentamento inadequados.

A interação de professores e professoras com seus nos, no entanto, não se

limita ao que aqueles dizem a estes. O dito “Não fale tanto e aprenda com o

exemplo” aplica-se ao tema que nos ocupa. Quando os professores dizem cm voz

alta o que pensam acerca de seus próprios acertos e erros, suas preferências

sobre o trabalho, suas expectativas e outros aspectos de sua conduta, eles se

constituem em modelos dos quais os sujeitos aprendem o interesse por aprender,

como enfrentar uma dificuldade ou que não convém errar diante dos demais.

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Isso pode ser observado, por exemplo, nas seguintes verbalizações ouvidas

quando um professor tenta resolver um problema: “Vejamos..., isto é fácil”. “Por

que não consigo?” “Que faço de errado? Vejamos...”. E também no modo como

um professor ou professora responde a um aluno que detectou um erro cometido

enquanto aqueles escreviam na lousa: “Bem, equivoquei-me... Você nunca erra?”,

ou “Obrigado por estar atento. Se não fosse você, eu teria induzido vocês a erro”.

Os professores diferem bastante no grau em que são conscientes do valor

motivador ou desmotivado de tais verbalizações (Tapia, 1992a). Pode argumentar-

se, e é certo, que uma verbalização isolada não tem maior importância. Mas, se

um professor ou professora manifesta sistematicamente com seu exemplo diante

dos alunos que o que conta é preservar a própria imagem mais que aprender, é

pouco provável que seus alunos atuem de modo diferente. Assim, pois, o exemplo

que os professores dão sobre suas metas é outro fator determinante da motivação

que deve ser objeto de reflexão e mudança se quer melhorar a motivação dos

alunos.

4.4 - AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM

O último, mas talvez o mais importante, dos fatores contextuais que

condicionam a motivação ou desmotivação dos alunos diante das tarefas

escolares é a avaliação da aprendizagem. Com esse termo nos referimos não só

às qualificações que os alunos recebem, mas também a um processo que vai

desde o que o professor diz — ou não diz — a eles antes da avaliação para ajudá-

los e motivá-los a fazê-la, passando pela apresentação das tarefas e modos de

acolhida de informação — pontual ou continua —, até o uso a ser feito

posteriormente da informação recebida. Ao longo desse processo, os professores

podem agir de diferentes modos que fazem com que a avaliação afete de modo

positivo ou negativo a motivação.

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Toda avaliação implica basicamente um juízo sobre a qualidade da

execução de uma tarefa por parte do aluno. Em conseqüência, quer se trate do

juízo que o professor emite sobre a execução quando o aluno vai à lousa fazer

uma tarefa, quando corrige o que fez em seu caderno, ou quando avalia uma

prova, tais juízos manifestam o êxito ou o fracasso do aluno. Por isso, dado que o

fracasso tem normalmente um impacto negativo sobre a motivação, se a avaliação

ocorre sem que se busque minimizar essa experiência às vezes os professores,

sem necessidade, exigem tarefas muito difíceis se leva em conta a complexidade

do tema e o tempo dedicado em aula —, se produz um nível de fracasso que

contribui para que diminuam as expectativas do aluno e, conseqüentemente, sua

disposição para se esforçar.

Por outro lado, toda avaliação busca manifestar conhecimentos e

habilidades relacionados com diferentes conteúdos e tarefas. As vezes, no

entanto, os professores fazem perguntas e propõem tarefas sobre as quais os

alunos podem se perguntar: “Para que preciso saber isso?” Isto é, se os

professores exigem de seus alunos conhecimentos pouco importantes ou se,

mesmo importantes, aqueles não manifestam antes de realizar a tarefa de

avaliação a utilidade dos conhecimentos ou habilidades sobre a tarefa em

questão, a motivação de seus alunos se vê afetada negativamente.

Assim mesmo, toda avaliação pode servir, no caso de o aluno não conhecer

ou não dominar adequadamente o que se lhe pergunta, para que os professores

lhe dêem in formação que lhe permita corrigir seus erros. O uso dessa informação

se produzir ou não condiciona os alunos a perceber a avaliação como uma

ocasião para aprender ou, ao contrário, como um evento que serve para julgá-los,

mas não ajudá-los.

Para que o primeiro caso seja possível, é preciso que: a) as tarefas de

avaliação sejam planejadas de modo que permitam dizer ao aluno não só se sabe

ou não; b) o conjunto da avaliação responda a um modelo que permita mostrar se

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o aluno está alcançando Um gresso significativo na aquisição de um conteúdo ou

nos procedimentos determinados, cm vez de proporcionar informação sobre

aprendizagens isoladas; c) a informação sobre o que está mal, por que está mal e

como superar o problema, obtida pelos procedimentos anteriores, seja dada aos

alunos de modo que possam superar suas dificuldades; d) se evite na medida do

possível a comparação entre os alunos ao dar-lhes os resultados, já que, caso

contrário, se ativaria a preocupação de evitar juízos de valor que possam

prejudicar a própria estima, o que resulta emocionalmente negativo.

No entanto, como puderam comprovar em estudo recente realizado com

professores de ensino médio (VilIa e Tapia, no prelo), em muitos casos as tarefas

de avaliação utilizadas não permitem determinar a origem das falhas dos alunos, o

que contribui para a maioria deles ver as avaliações como um julgamento e não

como uma ocasião em que podem aprender. Ao longo destas páginas, tentou

mostrar que a motivação dos alunos no momento de realizar as atividades

escolares depende da interação entre, por um lado, as metas pessoais que estão

em jogo, o modo como aprenderam a pensar no momento de encarar as

diferentes tarefas e as dificuldades que carregam e, por outro, diferentes fatores

contextuais ligados à atividade dos professores.

A consideração desses fatores tem obviamente implicações que deveriam

estar presentes no momento de tentar motivar os alunos para a aprendizagem. De

um lado, os professores deveriam avaliar suas pautas de atuação para ver em que

medida se ajusta às que, de acordo com os princípios expostos, são desejáveis.

De outro, se poderia tentar algo que parece possível mas difícil: ajudar os alunos a

tomar consciência dos fatores que influem em sua própria motivação, para ensiná-

los a controlá-los, de modo que, ainda que os professores falhem, eles saibam

como agir. Fica, pois, para reflexão posterior como podem conseguir ambas as

coisas.

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4.5 - COMO AUMENTAR A MOTIVAÇÃO DOS ALUNOS NÃO É UM TEMA

FÁCIL

O que um professor pode fazer para que seus alunos se interessem por sua

matéria? Como assegurar que os alunos serão capazes de realizar o esforço

sistemático que o estudo e a compreensão dos principais temas requerem? Por

que determinado aluno não avança em minha matéria quando as capacidades que

intuímos nele são mais que suficientes? Como poderia conseguir que o interesse

que determinado aluno tem por outra matéria o tivesse também pela minha? De

que maneira deveria organizar minha classe para que a maioria dos alunos se

interessasse pelas atividades e tarefas realizadas? Que conteúdos ou que tipo de

conteúdo são mais adequados para que os alunos realizem uma aprendizagem

significativa?

Todas essas perguntas e outras semelhantes os, professores, fazem e faz

com freqüência. O problema é que muitas vezes não se têm respostas claras e

contundentes. A motivação é um dos temas-chave para que possam alcançar os

objetivos que propõe, isto é, que os alunos aprendam e desenvolvam ao máximo

suas capacidades em todos os âmbitos.

Analisa-se as diferentes tarefas realizadas pelos professores e as decisões

correspondentes, e ver como incidem no tema da motivação dos alunos. Começar

revendo algumas idéias elementares sobre aprendizagem e motivação, para

concentrar posteriormente na figura do professor e analisar as implicações que

suas atividades têm na motivação e aprendizagem dos alunos.

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CONCLUSÃO

Conclui-se que diante de tudo que foi expostos, o professor, em sua reação

com o aluno, com outros professores e com organismos da instituição escolar,

vive uma situação educacional. Com efeito, é comum que, ao tentar entender o

processo de ensino-aprendizagem na escola, se mencionem apenas elementos

intrínsecos à sala de aula, como se fosse possível isolar a classe do contexto

cultural no qual se insere, para focalizar unicamente sua dinâmica interna.

A sala de aula está inserida numa instituição educativa onde o professor

mediador torna-se também um motivador enquanto trabalho cotidiano,

individualmente e/ou coletivo. A cultura estabelece para a educação formal,

algumas expectativas, cria necessidades, impões valores; o jovem que a escola

recebe motivado ou não se sociabilizou (e continua se sociabilizando) dentro de

uma determinada cultura ou subcultura seja através dos grupos de que participa,

seja pelas influências dos meios de comunicação de massa, e finalmente, o

mesmo que se disse do aluno pode ser dito do professor. Tradições e costumes

da sociedade são prolongados para dentro do ambiente da sala de aula. Deste

modo, a sociedade onde a escola se insere profundamente na determinação dos

objetivos da instituição, bem como, reciprocamente, os objetivos desta estão

contribuindo junto com outros fatores para a constituição da cultura.

Caso o aluno se posicione de forma apenas reativa, confirmam-se os

lugares sociais e hierárquicos previamente delineados para a relação

pedagógica; ela se marcará por exterioridade e ausência de significado do

conhecimento e pela alienação do sujeito em relação a esse conhecimento.

Caso a organização dos alunos propicie um padrão mais proativo, ou seja,

capaz de iniciar e estruturar novas situações, ressignificando e buscando maior

congruência em suas relações com o professor e com o conhecimento - as

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bases de atuação do professor também se modificam. Afinal, ambos os atores

são, ao mesmo tempo, reativos e proativos, não apenas emitindo respostas face

à estimulação do outro, como também produzindo padrões diferenciados de

interação e interlocução. Os professores costumam condensar essa idéia

quando dizem que a relação com os alunos é uma química. De fato, às vezes, a

combinatória dos elementos é suave e equilibrada; em outras, chega a ser

explosiva.

As interações pedagógicas são, assim, dimensões constitutivas do

processo ensino-aprendizagem, capazes de promover ou alterar toda a lógica do

currículo, da organização do trabalho escolar e da disciplina em sala de aula.

Evidências disso se expressam de inúmeras formas: no sentido positivo da

produção, quando os alunos aderem aos projetos ou propostas do professor, por

mais desafiantes e exigentes que sejam ou quando se organizam para encontrar

soluções pertinentes ao cotidiano da classe; por outro lado, no sentido negativo,

fartos exemplos se repetem quando os alunos boicotam as mínimas pretensões

didáticas do professor, optando pela apatia, pelo tédio ou ainda quando subvertem

a organização do trabalho escolar, por meio de irreverência e indisciplina. No li-

mite, isso se expressará em vandalismo e violência contra colegas, contra o

próprio professor, contra o patrimônio físico da escola e, ainda, contra a comuni-

dade escolar - atos que hoje perpassam todas as camadas sociais e todas as

estruturas escolares, minando a relação pedagógica e qualquer possibilidade de

aprendizagem efetiva e evidenciando o caráter inócuo de qualquer medida

repressora exterior à própria relação.

Nesse plano relacional, não se pode desconsiderar o peso de um grande

catalisador: a afetividade. É a construção de vínculos de empatia e de

identificação que define o que já foi designado como poder de referência ou de

sedução do professor- no sentido efetivamente etimológico do verbo seduzir: o de

trazer para o seu lado. É essa disponibilização afetiva que também mobiliza os

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dois pólos dessa relação para novos estados motivacionais e para a atribuição de

novos sentidos às aprendizagens. Enfim, essa reserva de energia, bem direciona-

da e articulada a competências, pode criar parcerias e até cumplicidade; suas

lacunas ou disfunções podem representar desgastes e desistências, transfor-

mando potenciais parceiros ou interlocutores em opositores de times diferentes -

um se ilude no oficio de ensinar e o outro insiste em recusar seu oficio de apren-

der.

Como foi dito, o professor tem uma influência direta sobre a situação em

sala de aula, no seu relacionamento com o aluno, no planejamento e adaptação

das condições de aprendizagem, no seu relacionamento com colegas que

ministram a mesma disciplina ou fazem parte do mesmo departamento.

Entretanto, conhece-los e refletir sobre eles, discriminar o que pode fazer do que

não pode e atuar sobre aquilo que for possível, é indispensável para a ação

profissional do educador ou do professor e a única maneira de se lhe dar um

sentido e um significado. Entende-se que há uma interação e uma influência

recíproca entre a habilidade que permite ao professor uma efetiva ação

pedagógica em sala de aula, interação, motivação e aprendizagem de discentes e

docentes em busca de um êxito.

A aprendizagem escolar é um processo complexo, que envolve

integralmente o aluno e a aluna. São eles que aprendem. No entanto, tornar isso

possível é uma aventura coletiva. Em primeiro lugar, porque a sociedade é um

ente continuamente exigente em relação às capacidades de todos os que a

compõem, e com isso contribui para concretizar nossas próprias exigências. Em

segundo lugar, porque a cultura de certo modo, faz de nós quem somos, e poder

apropriar-nos dela, revisá-la criticamente e contribuir para sua renovação

pressupõe, por sua vez, nos responsabilizarmos pela elaboração de nossa

identidade. E, em terceiro lugar, porque, sem a contribuição de professores

conscientes de que o conhecimento é uma construção, a aprendizagem escolar

seria uma viagem incerta, de conseqüências duvidosas.

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