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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE A INEFICÁCIA DAS PENAS DIANTE DA REALIDADE CARCERÁRIA DO BRASIL Por: Camilo Sales D’ Ornellas Orientador Profº Wilian Rocha Rio de Janeiro 2011/2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A INEFICÁCIA DAS PENAS DIANTE DA REALIDADE CARCERÁRIA

DO BRASIL

Por: Camilo Sales D’ Ornellas

Orientador

Profº Wilian Rocha

Rio de Janeiro

2011/2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

A INEFICÁCIA DAS PENAS DIANTE DA REALIDADE CARCERÁRIA

DO BRASIL

Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Direito e Processo Penal.

Por: Camilo Sales D’ Ornellas

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a minha esposa e aos meus filhos, pois foram eles a

razão de todo o meu esforço para concluir mais essa etapa.

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Num lugar onde o banho de sol, o papel higiênico, o lanche, a melhor cela, etc., são pagos... Os maus tratos e a tortura predominam... o calor é quase insuportável... entre outras coisas, pode-se dizer que já se conhece o inferno (PIEDADE, 2004).

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RESUMO

A presente monografia tem como objetivo abordar a ineficiência das penas devido o

caos em que se encontra o sistema prisional brasileiro, ao mesmo tempo em que

aponta alternativas diante das deficiências do Estado. Aborda as violações aos

direitos dos encarcerados os quais são retirados do meio social com o intuito de

proteger a sociedade e prepará-los para sua posterior reintegração social. Quando o

cárcere, que serviria de local correcional virou, na verdade, um depósito humano

com um amontoado de gente vivendo em condições desumanas. Apesar da

evolução do sistema prisional, do direito penitenciário e da lei penal, quase nada

mudou em relação à pena privativa de liberdade. Sendo questão antiga a polêmica

da superlotação carcerária, o que vem colaborando para a falência da pena de

prisão, que tem como agravante a forte atuação do crime organizado dentro dos

presídios, bem como a falta de um regime diferenciado no país. Uma vez que a crise

tornou-se insustentável como atesta a realidade dos fatos veiculada quase que

diariamente pela mídia, se faz necessária uma reformulação do sistema prisional.

Sendo, portanto, imprescindível que o Brasil, que se encontra com seu Sistema

Penitenciário há muito estrangulado, e com os índices de criminalidade em ascensão

diária, reveja sua legislação e a atuação das autoridades penitenciárias.

Palavras-chaves: cárcere – superlotação - deficiências – ressocialização

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METODOLOGIA

O método utilizado foi o bibliográfico, onde foram consultadas obras de

autores consagrados, bem como artigos da internet, periódicos, revistas, etc., os

quais vieram contribuir para o desenvolvimento da pesquisa. Desta forma, os

materiais levantados foram devidamente fichados após uma leitura cuidadosa a fim

de compor um conjunto de informações as quais foram selecionadas e classificadas

de acordo com os assuntos pré-definidos que nortearam o estudo. O processo para

esse tipo de pesquisa aponta fases significativas a fim de contribuir para que o

investigador percorra um caminho pautado na organização e, assim, consiga, em

curto espaço de tempo, resultados significativos para, posteriormente, serem

refletidos e analisados na construção de um trabalho de pesquisa.

A pesquisa do tipo qualitativa é uma espécie na qual se considera haver

uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, ou seja, a forma qualitativa se

dá pelo fato de que “(...) o qualitativo engloba a ideia do subjetivo, passível de expor

sensações e opiniões” (BICUDO In: BORBA, 2006, p. 106). Valendo observar que a

interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são processos básicos

na pesquisa qualitativa, não requerendo o uso de métodos e técnicas estatísticas.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - Evolução Histórica do Sistema Prisional 10

CAPÍTULO 2 – O Caráter Ressocializador da LEP 19

CAPÍTULO III - A Ineficácia da Pena Privativa de Liberdade 29

CONSIDERAÇÕES FINAIS 39

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 48

ÍNDICE 54

FOLHA DE AVALIAÇÃO 56

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INTRODUÇÃO

A pesquisa tem por intuito abordar a questão da ineficácia das penas

diante da realidade carcerária do Brasil o qual, diante da superlotação que há muito

se apresenta em seus presídios, tem como consequência tal ineficácia. A falência do

sistema prisional brasileiro, sem dúvida, afastou a finalidade precípua da pena, que

consiste na reeducação do infrator para sua futura reintegração à sociedade.

A realidade é que o caos formado através da superlotação passou a não

permitir que haja condições básicas de higiene, assistência médica adequada,

oportunidade de desenvolver um trabalho ocupacional, entre outros. Assim, a prisão,

como forma de punição e regeneração está simplesmente condenada ao fracasso. O

que acaba ocorrendo no Brasil é que a pena é duplicada, quando não triplicada, pois

o ingresso do preso num presídio brasileiro, por si só, já pode ser considerado como

um castigo, já que ali são tratados, na maioria dos estabelecimentos prisionais,

como verdadeiros animais, tal qual ocorria nos tempos primórdios com a aplicação

de castigos dessa espécie. Mas o objetivo do legislador penalista não é proporcionar

castigo e sim punir com a privação de liberdade visando recuperar o detento.

Com o intuito de incentivar a recuperação do detento, finalidade precípua

da aplicação da pena foi editada a Lei de Execução Penal, a qual nunca foi

devidamente implementada nos estabelecimentos prisionais brasileiros. Uma vez

que não previu o legislador a falta de estrutura para que se cumpram as suas

determinações, no entanto, se estas fossem cumpridas seria um estímulo à

reintegração na sociedade daquele que cumpre sua pena e retorna para o convívio

social.

A Política Criminal atual tem se mostrado ineficiente e com isso a

criminalidade vem aumentando assustadoramente. Esse aumento incontrolável da

violência leva um maior número de pessoas à privação de liberdade por motivo de

infração penal. Superlotando os cárceres de um sistema prisional falido como o

existente no país atualmente, que há muito já vem funcionando em estado precário.

Com a agravante de que, não existe critério estabelecido em relação ao

recolhimento do detento ao sistema prisional, ou seja, não há uma conduta

específica em relação à classificação das espécies crime. Assim, os presídios

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superlotados, que se transformaram em verdadeiras escolas do crime, levam

aqueles que cometem pequenos delitos a se tornarem um especialista em crime de

natureza grave, uma vez que os detentos mais perigosos se tornam “donos” do

espaço prisional. Sendo comum a mídia veicular matéria a respeito de rebeliões que

ocorrem nos presídios, onde sentenciados são mortos por seus próprios

companheiros de cela, funcionários e familiares de detentos transformados em

reféns, resgates e fugas audaciosas praticadas por criminosos, entre outras

atrocidades.

Ignorando totalmente o poder repressivo concedido ao Estado, os

condenados a cumprirem penas em regime fechado, adquirem um poder que chega

a sobrepor ao do Estado. Simplesmente pelo fato dos próprios detentos se dividirem

em facções dentro dos presídios, as quais protegem os mais fracos de possíveis

vinganças das facções “inimigas”, já demonstra a impotência e a fragilidade do

Estado quanto a ditar regras no cárcere. Sem comando, os presos adquirem um

domínio muito grande sobre o “território” ao qual se dizem “donos” dentro da prisão,

criando suas próprias leis e ignorando totalmente o papel já não tão repressor assim

do Estado. Tendo este sua posição reconhecida apenas quando os detentos se vêm

diante de situações nas quais necessitam fazer suas reivindicações, principalmente,

quando se trata da questão dos Direitos Humanos.

No entanto, os problemas que há muito são enfrentados no sistema

prisional brasileiro têm suas raízes na estrutura econômica, política e social do país.

Com a agravante de que o Poder Público sempre tentou passar para a sociedade a

ideia de que os problemas do sistema penitenciário se encontram sob controle.

É dentro desse contexto que a pesquisa pretende apresentar no primeiro

capítulo a evolução histórica do sistema prisional, a qual tenta esclarecer as raízes

das primeiras instituições prisionais, bem como a evolução da lei e das penas. No

segundo capítulo serão tratadas a legislação e a tentativa de ressocialização do

apenado, quando serão abordadas questões pertinentes à Lei de Execução Penal e

o desrespeito aos seus ditames por parte do Poder Público. No terceiro e último

capítulo será abordada a ineficácia das penas privativas de liberdade como

consequência do deficiente sistema prisional brasileiro, com suas mazelas e o caos

que se formou ao longo dos anos nas cadeias de todo o país.

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CAPÍTULO 1 – EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO SISTEMA PRISIONAL

1.1 A ORIGEM DO CÁRCERE

Nos tempos primórdios o exercício do direito ocorria nos termos do

Código de Hamurabi ou da Lei do Talião, a qual determinava: "olho por olho, dente

por dente" que, apesar de ter fundamento religioso no Judaísmo ou Mosaísmo

também tinha cunho vingativo.

Na Antiguidade não havia pena de privação de liberdade, a detenção

tinha apenas o objetivo de preservar os réus para aguardarem o julgamento ou

serem executados. Posteriormente as punições se davam com a pena de morte, às

penas corporais e às infamantes. Ainda não existia uma arquitetura penitenciária

própria para abrigar os suspeitos, estes eram colocados em lugares diversos para

aguardar a celebração do julgamento. Eram utilizados: calabouços, aposentos em

ruínas ou insalubres de castelos, porões, torres, conventos abandonados, palácios e

outras edificações (ESPERON, 2011). O Hospício de San Michel, em Roma, foi a

primeira instituição penal, que, a princípio, tinha o objetivo de encarcerar "meninos

incorrigíveis", por esse motivo recebeu a denominação de “Casa de Correção”

(MAGNABOSCO, 1998).

Vale citar as observações de Dilton Canto, o qual observa que as prisões:

(...) originaram-se por exigência do próprio homem, pela necessidade de um ordenamento coercitivo que assegurasse a paz e a tranquilidade em sua convivência com os demais seres humanos. Trata-se de uma imposição do próprio relacionamento inerente ao contrato social (CANTO, 2000, p. 12).

O autor acima citado, além de mencionar em sua obra a evolução do

cárcere na Antigüidade, também faz menção à Idade Média e à Idade Moderna. O

livre arbítrio dos governantes ditava as sanções na Idade Média, e estas eram

impostas em função do "status" social do réu. Em geral as penas consistiam na

amputação dos braços, na forca, na roda e na guilhotina o que acabava se

transformando no espetáculo favorito das multidões. Além da exposição do

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condenado sendo arrastado, tendo seu ventre aberto, as entranhas arrancadas às

pressas para que tivesse tempo de vê-las sendo lançadas ao fogo.

Ney Teles relata essa espécie de discriminação social da seguinte forma:

Nos primórdios da colonização o sistema penal brasileiro estava contido nas ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas. Elas consagravam a desigualdade de classes perante o crime, devendo o juiz aplicar a pena de acordo com a gravidade do caso e a qualidade da pessoa. Os nobres, em regra, eram punidos com multa; aos peões ficavam reservados os castigos mais pesados e humilhantes (TELES, 1999, p. 59).

Mas com o surgimento do Império Bizantino foi criado o Corpus Juris

Civilis, pelo imperador Justiniano, que conseguiu restabelecer a ordem através de

suas obras: Código, Digesto, Institutas e Novelas. Somente muito tempo depois,

obedecendo à evolução da sociedade, foi que a pena de morte foi substituída pela

pena privativa de liberdade, provocando o surgimento de um grande número de

casas de detenção. Nas primeiras prisões ou casas de força, como eram

denominados os locais de reclusão dos condenados, as penas eram perpétuas com

detenção em celas solitárias e muradas. Alexandre Mariano Costa explica que:

As penas começaram a serem aplicadas durante os tempos primitivos, nas origens da humanidade. Pode-se dizer que se inicia com o período da vingança privada que se prolongou até o século XVIII. Naquele período não se poderia admitir a existência de um sistema orgânico de princípios gerais, já que grupos sociais dessa época eram envoltos em ambiente mágico e religioso. Fenômenos naturais como a peste, a seca, e erupções vulcânicas eram considerados castigos divinos, pela prática de fatos que exigiam reparação (COSTA, 1999, p. 15).

Na Idade Moderna, entre os séculos XVI e XVII a pobreza se alastrou por

toda a Europa e o aumento da criminalidade se deu através das divergências

religiosas, das guerras, das expedições militares, das devastações de países, da

extensão dos núcleos urbanos, da crise no meio feudal, da economia agrícola, entre

outras. Foi quando se deu o aumento da delinquência e a pena de morte deixou de

ser uma solução adequada. Apenas na metade do século XVI, com o início do

movimento para desenvolver as penas privativas de liberdade ocorreram as

construções de prisões organizadas para corrigir os condenados (LUCENA, 2011).

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Porém, Cesare Beccaria já afirmava, há mais de dois séculos atrás, que: “o réu não

deve ficar encarcerado senão na medida em que se considere necessário para o

impedir de escapar-se ou de esconder as provas do crime” (BECCARIA, 1983, p.

55).

À época as Instituições visavam reformar os delinquentes através do

trabalho e da disciplina. Era uma espécie de prevenção geral, pois tinha a pretensão

de desestimular a prática da vadiagem e da ociosidade. Infelizmente, na atualidade

tais medidas também não correspondem à realidade, pois como foi possível

perceber, a finalidade do encarceramento, a princípio, com a criação das instituições

prisionais, era a de ressocialização do detento.

1.2 A EVOLUÇÃO DO CÁRCERE NO BRASIL

Aquele tipo de prisão sem critério existente na Antiguidade, onde o

indivíduo reparava o dano causado com penas consideradas verdadeiras

atrocidades e atentado à dignidade humana como se fosse um prêmio pelo dano

sofrido pela vítima não foi aceito pelo direito pátrio que não admite a vingança

privada. Considerando a privação de liberdade um procedimento necessário, porém,

com responsabilidade por parte do Poder Público para que o encarceramento não

seja banalizado levando ao total descrédito da capacidade de punir do Estado, uma

vez que a principal função deste é tutelar os direitos do cidadão.

As palavras de Russel-Wood demonstram a antiga preocupação brasileira

com a condição do encarceramento:

Um decreto de 1821, firmado pelo príncipe regente D. Pedro, marca o início da preocupação das autoridades com o estado das prisões: ninguém será “lançado” em “masmorra estreita, escura ou infecta” porque “a prisão deve só servir para guardar as pessoas e nunca para as adoecer e flagelar” (RUSSEL-WOOD, 1981, p. 39).

Independentemente de se levar em consideração que o Estado tem

participação no aumento gradativo da criminalidade, pois foram diversos fatores

como o abandono social, cultural e econômico que lançaram o indivíduo à margem

da sociedade, favorecendo sua integração no mundo do crime. Mas o Brasil sempre

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se preocupou com a humanização dos presídios. Assim, a Constituição Imperial de

25 de março de 1824, em seu artigo 179, § 21 já demonstrava essa preocupação

determinando que: “as cadeias serão seguras, limpas e bem arejadas, havendo

diversas casas para a separação dos réus, conforme suas circunstâncias e natureza

dos seus crimes” (DOTTI, 2011). Tem-se assim, consolidada na Lei soberana de

1824, a confirmação dessa preocupação com as instalações dos presídios. Ainda no

mesmo século, mais precisamente com a chegada da Família Real no Brasil,

Carvalho Filho comenta as condições das prisões da época onde os apenados:

Também alocavam-se em prédios militares e fortificações. O Aljube, antigo cárcere eclesiástico do Rio de Janeiro, usado para a punição de religiosos, foi cedido pela Igreja para servir de prisão comum após a chegada da Família Real. Em 1829, uma comissão de inspeção nomeada pela Câmara Municipal afirmaria: “O aspecto dos presos nos faz tremer de horror”; eram 390 detentos, e cada um dispunha de uma área aproximada de 0,6 por 1,2 m². Em 1831, o número de presos passaria de 500. Em 1856, o Aljube foi desativado (CARVALHO FILHO, 2000, p. 38).

Essa superlotação do cárcere se arrasta até os dias atuais, parecendo ser

um problema eternamente sem solução.

1.3 AS RAÍZES DO DIREITO PENITENCIÁRIO

Conforme a linha de estudos de Canto, as raízes do Direito penitenciário

começaram a formar-se no Século XVIII, a partir dos estudos de Becaria e Howard.

Por muito tempo o condenado foi considerado apenas como objeto da execução

penal e somente mais recentemente se reconheceu os direitos da pessoa humana,

com o advento da Declaração Universal dos Direitos Humano, a qual implementou a

relação de Direito Público entre o Estado e o condenado. Portanto, a partir da

necessidade de proteção do condenado foi originado o Direito Penitenciário, que tem

por finalidade a exigência ética em relação à dignidade do homem como pessoa

moral. Motivando a criação da Comissão Penitenciária Internacional, renomeada

posteriormente para Comissão Penal e Penitenciária (1929), que deu origem à

elaboração das Regras Mínimas da ONU (LUCENA, 2011).

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1.3.1 A Evolução da Legislação Penal

Com a independência do Brasil, em 1823 a Assembléia Constituinte

decretou que fosse provisoriamente aplicada a Legislação do Reino. Então,

continuaram em vigor as Ordenações Filipinas, até que foi promulgada a

Constituição de 1824 quando estas foram revogadas parcialmente. Ainda no ano de

1823 os parlamentares José Clemente Pereira e Bernardo Pereira de Vasconcelos

tinham a missão de elaborar um Código Penal e cada qual apresentou seu projeto,

sendo escolhido o de Bernardo, o qual sofreu alterações e veio a constituir o Código

de 1830. Nas observações de Dilton Ávila Canto:

O Código de 1830 sofreu influências do Código Francês de 1810 e da Baviera de 1813, tendo, por sua vez, influenciado o Espanhol de 1848, que foi a base do de 1870 e que, por sua vez, veio a se constituir em modelo para os demais códigos de língua espanhola. Vê-se, assim, a importância de nosso Código do Império. Apesar disso recebeu severas críticas, porque foi considerado liberal, estabeleceu a imprescritibilidade das penas, considerou a religião com primazia — incriminação dos delitos religiosos como mais importantes — e manteve a pena de morte (CANTO, 2000, p. 15).

No Código de 1830 a pena de morte foi mantida, conforme mencionou o

autor acima citado. Porém, a mesma acabou sendo revogada de forma tácita por D.

Pedro II, quando ocorreu a execução de Mota Coqueiro, no Estado do Rio, o qual

sofreu acusação injusta e só depois de morto foi provada sua inocência.

Em seguida ao Código Penal surgiu o Código de Processo Penal que foi

editado em 1832. Desde então, até o advento da República, foram promulgadas

outras tantas leis. Então, com a chegada da República foi editado o novo Código

Penal, pelo Decreto 847, de 11 de outubro de 1890, baseado no projeto de Batista

Pereira, no qual foram adotados os princípios da escola clássica. Em 1932, Vicente

Piragibe procedeu com a compilação das leis vigentes que passou a se chamar

Consolidação das Leis Penais. Com a Revolução de 1937 o Presidente Getúlio

Vargas, visando reformas legislativas, ordenou ao Ministro da Justiça, Francisco

Campos, que solicitasse a Alcântara Machado a elaboração do novo Código. Assim,

foi editado o Decreto nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, que passou a vigorar em

1º de janeiro de 1942. Em seguida foram editados o Código de Processo Penal, a

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Lei das Contravenções Penais, a Lei de Introdução ao Código Penal e o Código

Penal Militar. Pelo fato do Código de 1940 ter sido planejado durante um período

revolucionário, quando o Estado era o poder maior foi dada à figura humana uma

maior importância, predominando os direitos individuais deixando os crimes contra o

Estado no último lugar da lista (CANTO apud SILVA, 2003, p. 27-28).

Contudo, Dilton Canto comenta o curto tempo de vida da reforma do

Código Penal em 1969:

Em 1962, Nelson Hungria ficou encarregado de elaborar um novo projeto de Código. Em 1964 foi designada uma comissão para a revisão do projeto final, composta pelo próprio Nelson Hungria, Aníbal Bruno e Heleno C. Fragoso. Em 1969 o projeto foi promulgado pelo Decreto-Lei n. 1.004, de 21 de outubro, mas restou revogado sem ter vigência (CANTO apud SILVA, 2003, p. 28).

Canto também teceu comentários a respeito da alteração do Código

Penal que se deu com a edição da Lei nº 7.209, de 11 de julho de 1984:

O Código Penal de 1984 alterou substancialmente certos aspectos contidos no ordenamento anterior. Dentre as modificações, podemos citar, como relevantes, a figura do arrependimento posterior, a criação de um artigo próprio para a reabilitação e o desaparecimento das penas acessórias. Os principais colaboradores do projeto do Código Penal de 1984 foram Ariel Ditti, Francisco de Assis Toledo, Hélio Fonseca, Miguel Reale Júnior, Ricardo Antunes Andreucci e Rogério Lauria Tucci (CANTO apud SILVA, 2003, p. 29).

Exatamente na mesma data foi editada também a Lei nº 7.210, a “Lei de

Execução Penal”. Apesar de ser mundialmente visto como um exemplo de diploma

de execução penal, no Brasil, desde sua edição (1984) não se conseguiu colocar em

prática nem 50% de suas determinações. Como por exemplo, a criação de

estabelecimentos prisionais adequados e a instituição de colônias agrícolas ou

industriais para o regime semi-aberto. A mencionada lei vem sofrendo reformas para

adaptação da realidade atual. Contudo, vale ressaltar que, no Brasil, em geral, a Lei

Penal é reformada sob o clamor popular de algum crime bárbaro, portanto, são

medidas paliativas que acalmam a ira popular não surtindo efeito em longo prazo.

Dois exemplos marcantes foram o caso da filha da autora de novelas da

rede globo, quando foi editada a Lei. 8.072, a Lei de crimes Hediondos, e mais

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recentemente o caso do sequestro da jovem em São Paulo, cujo namorado terminou

por matá-la, quando foi extinto o Capítulo IV – Do Protesto por Novo Júri do Código

de Processo Penal, cujos artigos 607 e 608 asseguravam, em condenação igual ou

superior a 20 anos, o direito a novo júri.

1.3.2 A Evolução das Penas

A pena de morte só foi eliminada após a edição do segundo Código Penal

brasileiro no ano de 1890, quando surgiu o regime penitenciário de cunho

correcional com a finalidade de ressocialização e reeducação do detento. É possível

distinguir no conteúdo histórico das penas as diversas fases de evolução da

vingança penal, as quais envolvem: a vingança privada, a vingança divina e a

vingança pública. De acordo com Dotti:

A pena privada, ou seja, a pena aplicada por membros da comunidade que se uniam, ou ainda, individualmente agiam de maneira a punir um indivíduo da comunidade, é o primeiro modelo punitivo de que se tem notícia (...) A pena pública, incorporando a ideia de manutenção de garantia, se desenvolve paralelamente ao fortalecimento das comunidades (...) Gradualmente, a expulsão da comunidade é substituída pela morte, penas corpóreas, banimento temporário ou perda de bens (DOTTI, 1998, p. 52).

A maioria das penas que eram aplicadas na Europa durante a Idade

Média se resumia a penas físicas. Sendo que os suplícios que eram menos

aplicados não se confundiam com as penas físicas. Como bem observado por

Michel Foucault, o suplício é uma espécie de técnica e tem que produzir um

sofrimento intenso e ainda explica que:

O suplício se inseriu tão fortemente na prática judicial, porque é revelador da verdade e agente do poder. Ele promove a articulação do escrito com o oral, do secreto com público, do processo de inquérito com a operação de confissão; permite que o crime seja reproduzido e voltado contra o corpo visível do criminoso, faz com que o crime, no mesmo horror, se manifeste e anule (FOUCAULT, 2004, p.47).

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Para Cesare Beccaria a pena, já naquela época, tinha a finalidade de

servir de exemplo, o que funcionava como medida de prevenção: "é preferível

prevenir os delitos a ter de puni-los; e todo legislador sábio deve antes procurar

impedir o mal que o reparar (...)" (BECCARIA, 2002, p.101).

Mas em relação ao objetivo das penas em geral, extrai-se a definição de

Aurélio Buarque de Holanda Ferreira o qual afirma que: “(...) pena é a punição

imposta ao contraventor ou delinquente, em processo judicial de instrução

contraditória, em decorrência de crime ou contravenção que tenha cometido com o

fim de exemplá-lo e evitar a prática de novas infrações” (FERREIRA, 1989, p. 1.070).

A pena restritiva de liberdade tem a reabilitação do condenado como a

finalidade principal, pois o descrédito na ressocialização seria impedir qualquer

chance ao detento de se recuperar. Mas como bem colocou Eduardo Lins e Silva:

As estatísticas atuais são alarmantes. A pena de prisão é um remédio opressivo e violento, de conseqüências devastadoras sobre a personalidade humana, e que deve ser aplicada, como verdadeira medida de segurança, só aos reconhecidamente perigosos. Se não a pudermos eliminar de uma vez, só devemos conservá-la para os casos em que ela é indispensável. Há, hoje, um consenso universal, a partir da Organização das Nações Unidas, que preconiza a adoção de penas alternativas, em substituição à pena de prisão, destinada esta, ultima ratio, para a segregação dos delinqüentes criminosos (SILVA, 2001, p. 68).

Nos dias atuais a tendência é buscar alternativas para penalizar os

criminosos e não só deixá-los no isolamento, pois é preciso levar em consideração

que a pena de prisão no sistema isolado determina a perda total da dignidade.

Motivo pelo qual, vários doutrinadores acreditam que desta forma a ressocialização

se torna muito mais difícil, principalmente quando ocorre a tortura e o tratamento

desumano, os quais são expressamente proibidos pela Constituição Federal.

1.3.3 O Sistema Atual

Atualmente são dois os métodos do Direito Penitenciário: o científico e o

estatístico. O primeiro é um dos elementos da política criminal, que se refere ao

diagnóstico do fenômeno criminal, a verificação do custo econômico-social, e a exata

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aplicação do programa de recuperação. O segundo diz respeito à estatística criminal

estudada pelo método estatístico, o qual se destina à pesquisa da delinquência

como fenômeno dominante das massas. Dividindo-se essas estatísticas em três

ordens: policiais, judiciais e penitenciárias. Foi somente no século XX que se teve a

visão real dos problemas da execução penal, com base nas normas de direito penal

e processual penal, atividade administrativa e função jurisdicional, as quais

obedecem às modernas exigências da Lei penal. Desse processo foram extraídos

dois princípios: o da individualização da execução da pena e o do reconhecimento

dos direitos subjetivos do condenado.

Com o reconhecimento da autonomia do Direito Penitenciário pela

Constituição Federal de 1988 em seu artigo 24, I: “Compete à União, aos Estados e

ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: direito tributário, financeiro,

penitenciário, econômico e urbanístico”. Assim, o direito penitenciário passou a ser

um conjunto de normas jurídicas que disciplinam o tratamento dos sentenciados,

sendo disciplina normativa derivada, principalmente, da unificação de normas do

Direito Penal e do Direito Processual Penal. Valendo observar que a reforma penal

não se fará sem a renovação do ensino universitário no que tange às disciplinas

relacionadas com o sistema penal.

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CAPÍTULO 2 – O CARÁTER RESSOCIALIZADOR DA LEP

2.1 A Lei de Execução Penal – LEP

A Lei de Execução Penal – LEP, nº 7.210 foi inserida no sistema jurídico

do Brasil, em 11 de julho de 1984, como forma de regulamentar o cárcere, reeducar

o condenado e prepará-lo para o convívio social novamente. Também foram

implementadas leis de execução penal em vários outros países como: a Polônia,

Argentina, França, Espanha, e outros estados-membros da ONU.

A citada Lei brasileira, para muitos, terminou sendo uma simples utopia,

uma vez que o § Único do seu artigo 85, dispõe a respeito de uma determinação que

visa evitar a superlotação do cárcere:

Art. 85. O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade. Parágrafo Único – O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária determinará o limite de capacidade do estabelecimento, atendendo a sua natureza e peculiaridades.

Porém, apesar do Legislador Ordinário já em 1984 ter se preocupado com

o antigo problema da superlotação do sistema penitenciário brasileiro ao editar a

LEP, o Poder Executivo não se aparelhou para executar de maneira satisfatória os

comandos determinados nos seus 204 artigos, pois se os mesmos fossem bem

executados certamente poderiam ter impedido que o sistema penitenciário

apresentasse o caos atual em que se encontra.

As formas de aplicação da lei penal devem atender às exigências da vida

pessoal e social de cada detento, ainda que este esteja detido provisoriamente. Para

tanto, são necessárias medidas para que se alcance o desenvolvimento social

eliminando-se definitivamente com a ideia de que "preso bom é preso morto".

De acordo com Júlio Fabrine Mirabete, “a pena deve ser usada como

profilaxia social, não só para intimidar o cidadão, mas também para recuperar o

delinquente” (MIRABETE, 2000, p. 39). Percebe-se que a intenção do legislador,

bem como dos grandes juristas é a reforma dos valores ético-morais da sociedade,

despertando a consciência dos cidadãos para o fato de que qualquer nação só se

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faz grande a partir do respeito à dignidade de seus entes, sejam estes livres ou

privados em sua liberdade. A princípio, a intenção da LEP era atender ao princípio

da classificação penitenciária que mais tarde viria ser determinado pela Constituição

Federal, em seu artigo 5º, inciso XLVIII, o qual dispõe que “a pena será cumprida em

estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do

apenado”.

Sabe-se que constantemente são necessárias modificações nas normas

penais e processuais, pois estas são instrumentos de repressão. Entretanto, tais

modificações normativas sempre irão obedecer aos preceitos Constitucionais.

Assim, a Lei nº 10.792/03 modificou alguns artigos da Lei nº 7.210/84, mas entre

muitos manteve o texto do artigo 8º: “O condenado ao cumprimento de pena

privativa de liberdade, em regime fechado, será submetido a exame criminológico

para a obtenção dos elementos necessários a uma adequada classificação e com

vistas à individualização da execução”. Mesmo estando mantida a exigência de

exame para classificação, o qual deve ser realizado ao início da execução, na

prática, esse exame não está sendo feito.

Entre os dispositivos que sofreram alterações está o caput do artigo 112 o

qual foi bastante modificado:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão. (Redação dada pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)

Conforme o dispositivo acima citado o sistema progressivo constante no

Código Penal e adotado pela Lei de Execução Penal passou por profundas

alterações em razão da nova redação, pois se exclui de forma expressa o parecer da

Comissão Técnica de Classificação e o exame criminológico. Entretanto, não foi

modificada a questão objetiva, pois o condenado continua tendo que cumprir ao

menos 1/6 da condenação, e os aspectos do mérito são substituídos, apenas, pelo

bom comportamento carcerário, a ser comprovado pelo diretor do estabelecimento.

Contudo, não define a Lei o que significa bom comportamento carcerário.

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É certo que a Lei de Execução Penal, reconhecido instrumento legal da

modernidade, está muito longe da perfeição. Necessitando certas situações de

adequação constitucional, uma vez que o sistema político brasileiro sofreu sensível

alteração no período posterior a sua edição. O fato é que a Lei de Execuções Penais

determina as responsabilidades de cada envolvido, tanto do poder público quanto do

detento. Cabendo ao Estado, entre outras obrigações, garantir aos presos o direito à

saúde, ao ensino, existência de instalações higiênicas e a oportunidade de

reabilitação. As más condições que vivem os encarcerados é a principal responsável

pela onda de violência que invade os presídios.

2.1.1 Os Direitos Humanos do Detento

A LEP em seu artigo 41 enumera os direitos do preso, sendo que os

direitos humanos dos mesmos constam em documentos internacionais e nas mais

modernas Constituições. Entretanto, a Constituição brasileira nada menciona a esse

respeito, somente o Código Penal que, em seu artigo 38 determina: “O preso

conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a

todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral”.

Nas prisões é que ocorrem as violações dos direitos humanos. Os

inevitáveis problemas do cárcere são: a superlotação; a presença de drogas; as

rebeliões; a péssima administração carcerária; a falta de segurança; a reincidência;

entre outros. O fato é que pesquisas demonstram que o Brasil está torturando

presos em penitenciárias, eliminando qualquer possibilidade de recuperação dos

mesmos e paralelamente desperdiçando o dinheiro público.

A garantia dos direitos humanos dos detentos passa pela reformulação

dos regimentos internos dos presídios brasileiros e pela correta aplicação da Lei de

Execução Penal.

2.1.2 Os Direitos Trabalhistas do Detento

A Lei de Execução Penal prevê um ganho de três quartos do salário

mínimo para o interno, conforme determina o artigo 29 da LEP: “O trabalho do preso

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será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a três quartos do

salário mínimo”, não tendo o mesmo direito aos encargos sociais, a vínculo

empregatício ou demandas trabalhistas - reclamações trabalhistas.

A divergência dos direitos trabalhistas entre os internos e os

trabalhadores livres gera conflitos sociais graves. Com o trabalho do detento no

cárcere, as chances de reincidência diminuem, pois parte de sua remuneração

mensal vai para um fundo, espécie de poupança, o qual somente poderá ter acesso

quando receber novamente sua liberdade, nos termos do § 2º do artigo 29:

“Ressalvadas outras aplicações legais, será depositada a parte restante para

constituição do pecúlio, em cadernetas de poupança, que será entregue ao

condenado quando posto em liberdade”. Contudo, ao sair do presídio, o então ex-

interno não terá sequer uma comprovação (carteira de trabalho) de que exerceu uma

função reconhecida no mercado de trabalho e, consequentemente, não poderá

competir em igualdade com outro candidato para uma possível colocação no

mercado. Tudo isso ocorre porque as empresas conveniadas com os Presídios não

levam em consideração os benefícios da Consolidação das Leis do Trabalho,

baseando-se apenas na Lei de Execução Penal. Desta forma, surge o preconceito

por parte da própria sociedade, que não valoriza os ex-presidiários, mesmo que

durante o período de detenção tenham trabalhado como qualquer pessoa que se

encontra em liberdade. Surgindo assim, mais complicações no processo de

ressocialização do preso. Mas é interessante observar o artigo 34 da LEP: “O

trabalho poderá ser gerenciado por fundação, ou empresa pública, com autonomia

administrativa, e terá por objetivo a formação profissional do condenado”.

Esse tipo de situação não é observado em muitas das penitenciárias

brasileiras quando, através de um convênio com o Governo dos Estados, empresas

privadas colocam suas instalações no interior do presídio, por iniciativas próprias ou

mediante convite de dirigentes penitenciários, e se aproveitam da mão de obra

barata do preso para alcançar seus objetivos comerciais. Vale lembrar que o ócio é

capaz de induzir o indivíduo ao erro. Assim, a função laborativa está vinculada ao

bom comportamento e desenvolvimento da auto-estima do detento. Porém, o

trabalho do preso tem uma remuneração muito baixa ou com nenhuma

remuneração, o que retira do trabalho do preso sua função reformadora ou

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pedagógica e o caracteriza como castigo ou trabalho escravo. A partir de suas

pesquisas Thompson faz observações a respeito do trabalho do preso:

(...) como vemos o condenado em questão é um "faxina", que "é o preso classificado para qualquer ocupação laboral". Há a consciência do status especial de que goza e a valorização disso. No caso, a atividade na cozinha é a mais importante, em vista do acesso à direção, aos instrumentos que guarnecem a cozinha e principalmente em razão do melhor acesso à comida (THOMPSON, 1980, p. 60).

Sabe-se que o Instituto da remição já criou raízes na comunidade

carcerária e, excluindo a questão dos erros de cálculo, todos sabem quanto ao

abatimento de pena através da atividade laboral, e muitas vezes os condenados são

obrigados a ficar "aguardando vaga" para trabalharem.

2.1.3 A Polêmica do Regime Disciplinar Diferenciado

O Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) diz respeito a um novo instituto

jurídico, o qual foi introduzido, mais precisamente, no artigo 52 da Lei de Execução

Penal com nova redação a partir da edição da Lei nº 10.792, de 1º de dezembro de

2003:

Art. 52. A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório, ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes características: (Redação dada pela Lei nº 10.792, de 2003) I - duração máxima de trezentos e sessenta dias, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada; (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003) II - recolhimento em cela individual; (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003) III - visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas; (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003) IV - o preso terá direito à saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol. (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003) § 1o O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade. (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003)

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§ 2o Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando. (Incluído pela Lei nº 10.792, de 2003) .

Vale ressaltar que é permitida a inclusão cautelar em RDD, ou seja, o

isolamento preventivo, por dez dias, por decisão administrativa, com fundamento no

artigo 60 da LEP:

A autoridade administrativa poderá decretar o isolamento preventivo do faltoso pelo prazo de até dez dias. A inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado, no interesse da disciplina e da averiguação do fato, dependerá de despacho do juiz competente (Redação dada pela Lei nº 10.792, de 2003).

Entretanto, a inserção do preso no regime disciplinar diferenciado fica

condicionada ao despacho do juiz competente.

2.2 O CARÁTER RESSOCIALIZADOR DA PENA

2.2.1 Finalidade

A finalidade da ressocialização é a humanização da estada do detento no

cárcere, quando passa a ser focado não só como o delinquente, mas como o centro

da reflexão científica.

A pena de prisão caminha para uma nova finalidade, com um modelo

inovador no qual o castigo não é suficiente, o importante é orientar o indivíduo

dentro da prisão para que o mesmo possa ser reintegrado à sociedade de maneira

efetiva, evitando com isso a reincidência.

Nos dizeres de Maurício Lopes:

Montesquieu tomava um episódio da história do direito romano para assentar que: "quando um povo é virtuoso, bastam poucas penas"; Beccaria advertia que: "proibir uma enorme quantidade de ações indiferentes não é prevenir os crimes que delas possam resultar, mas criar outros novos"; e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão prescrevia que "a lei não estabelecesse senão penas

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estritas e evidentemente necessárias" (art. VIII). (“Alternativas para o direito penal e o princípio da intervenção mínima” - RT 757/402) (LOPES, 1997, p. 78).

O principal objetivo da ressocialização é inibir a reincidência. Nessa linha

de pensamento, tem-se a transcrição das palavras de Alessandro Molina citado por

Cezar Bittencourt: (...) acredita-se, não é castigar implacavelmente o culpado

(castigar por castigar é, em última instância, um dogmatismo ou uma crueldade),

senão orientar o cumprimento e a execução do castigo de maneira tal que possa

conferir-lhe alguma utilidade (MOLINA apud BITTENCOURT, 2000, p. 381).

De acordo com Eduardo Lins e Silva:

(...) regenere a pessoa para a vida útil e produtiva, delegando esta atribuição à sociedade civil organizada. Como se vê, o espírito da lei é sempre no sentido de apostar na recuperação da pessoa, mas o grande desafio consiste em criar condições efetivas para que isso ocorra (SILVA, 2001, p. 25-26).

Damásio de Jesus também se refere à ressocialização como parte de um

sistema reabilitador, que nos dá a ideia de prevenção à pena privativa de liberdade.

Assim, considera que a prisão não deva se torna um instrumento de vingança, mas

sim um meio de reintegração do indivíduo que cometeu a infração na sociedade

(JESUS, 1995, p. 93).

A ideologia da recuperação do condenado é uma das principais metas

dos projetos de prevenção. Odete Maria de Oliveira observa que:

(...) o mundo da prisão é antes de mais nada um mundo complexo. Não há objetivos comuns definidos, exceto o imediatismo de segregar o indivíduo da sociedade. O conflito do preso com os funcionários da prisão e com os demais presos é uma constante. A vida social numa prisão é sobremaneira difícil e quase impossível devido a um ambiente de desconfiança total, esperteza e desonestidade lá reinantes (OLIVEIRA, 1996, p. 76).

Sabe-se que a prevenção específica consiste em retirar imediatamente do

meio social o indivíduo que acabara de cometer um crime. Por outro lado, a

prevenção geral, atua a partir da indução ao medo por parte daqueles que estão

propensos a delinquir, fazendo com que os mesmos não venham cometer qualquer

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ato de infração. Deixando claro que o Estado poderá agir de forma rápida e eficaz

para puni-los.

2.2.2 O Benefício do Indulto

A saída no indulto de Natal, de Dia das Mães, etc., muitas vezes, só

funciona como uma desculpa para o detento conseguir a liberdade para praticar atos

ilícitos durante sua estadia fora do presídio. Alguns presos nem mesmo retornam ao

presídio, o que os tornam foragidos da justiça. O benefício é um verdadeiro voto de

confiança da segurança pública para com o apenado, mas este é incapaz de

reconhecer tal crédito.

A saída do preso que se encontra sob tutela do Estado deveria funcionar

como objeto reeducador, mas termina por ser apenas mais uns dias fora dos muros

do presídio ou mais um dia de assaltos, etc., ou senão, mais uma oportunidade para

não retornar à vida carcerária.

De acordo com as palavras de Renato Marcão:

Visa-se com tal benefício o fortalecimento de valores ético-sociais, de sentimentos nobres, o estreitamento dos laços afetivos e do convívio social harmônico pautado por responsabilidade, imprescindíveis para a ressocialização do condenado, bem como o surgimento de contra-estímulos ao crime (MARCÃO, 2004, p. 149).

O benefício do indulto tem o cunho de melhorar a vida do preso no

cárcere e orientá-lo para o seu momento de liberdade, bem como demonstrar um

indiscutível respeito aos seus direitos fundamentais. Porém, nem todos os apenados

merecem ou sabem utilizar tal benefício.

2.2.3 O Tratamento Reeducativo para com o Detento

A reeducação tem por objetivo reformar a pessoa humana do detento, de

acordo com sua própria vocação, para que ele possa se reintegrar na comunidade

dando sua contribuição para o desenvolvimento do bem comum. O tratamento

reeducativo diz respeito ao direito da obrigação da assistência educativa, prevista no

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artigo 17 da LEP, o qual determina: “A assistência educacional compreenderá a

instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado”.

Durante o tratamento de reeducação a personalidade do condenado é

observada por meio de exames médico-biológico, psicológico e psiquiátrico.

Também é feito um estudo social do caso, através de método interdisciplinar. Na

realidade o tratamento reeducativo compreende um conjunto de medidas penais,

educativas, sociológicas, psicológicas, e os métodos científicos utilizados no

procedimento junto ao infrator, com o objetivo de tentar modificar sua personalidade

para preparar a sua reintegração social e prevenir a reincidência (LUCENA, 2011).

Denise de Roure ressalta com propriedade que “falar em reabilitação é

quase o mesmo que falar em fantasia, pois hoje é fato comprovado que as

penitenciárias em vez de recuperar os presos os tornam piores e menos propensos

a se reintegrarem ao meio social” (ROURE, 1998, p. 17). Há quem defenda o termo

reintegração para substituir a ressocialização, considerando que este representa um

papel passivo do delinquente e aquele uma participação ativa por parte das

instituições.

2.5 As Regras do Sistema Carcerário

O regime de progressão da execução da pena foi implementado no

sistema Penitenciário Brasileiro desde 1940, com a edição do Código Penal

brasileiro, e posteriormente pela Lei nº 7.210/84, a Lei de Execução Penal, apesar

das reformas sofridas o instituto da progressão do regime tem caráter objetivo e

subjetivo, fazendo com que a pena tenha início no regime carcerário para depois

progredir do mais rigoroso ao mais brando, ou seja, fechado, semi-aberto e aberto.

Cezar Bittencourt ressalta que:

(...) a ressocialização não é o único e nem o principal objetivo da pena, mas sim, uma das finalidades que deve ser perseguida na medida do possível. (...) mas o ambiente carcerário, em razão de sua antítese com a comunidade livre, converte-se em meio artificial, antinatural, que não permite realizar nenhum trabalho reabilitador sobre o recluso (BITENCOURT, 2004, p. 25-49).

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Como frequentemente é veiculado pela mídia, no ambiente carcerário

existem normas internas que são impostas por aqueles presos que têm certo “poder”

sobre os outros. Contudo, para Júlio Fabrine Mirbete:

A ressocialização não pode ser conseguida numa instituição como a prisão. Os centros de execução penal, as penitenciárias, tendem a converter-se num microcosmo no qual se reproduzem e se agravam as graves contradições que existem no sistema social exterior (...) A pena privativa de liberdade não ressocializa, ao contrário, estigmatiza o recluso, impedindo sua plena reincorporação ao meio social. A prisão não cumpre uma função ressocializadora. Serve como instrumento para a manutenção de estrutura social de dominação (RT 662, p. 250 apud MIRABETE, 2000, p. 24).

O julgado acima citado nos remete novamente à eterna problemática da

inútil tentativa de ressocialização do detento dentro dos presídios brasileiros.

Falconi cita Espinoza na questão da ressocialização:

(...) Espinoza trata de teorias que explicam a necessidade da ressocialização que são: “Ressocialização Legal”, “Teoria das Expectativas” e “Teoria da Terapia Social Emancipadora” que segundo essas, “o delito não é somente uma responsabilidade do cidadão delinqüente, mas também da comunidade em que os fatos se desenrolam” (ESPINOZA apud FALCONI, 1998, p. 116).

O autor acima citado coloca muito acertadamente a necessidade de

colaboração de toda a sociedade na ressocialização do apenado, pois caso

contrário, ao ser libertado, é essa mesma sociedade que vai ser lesada por ele.

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CAPÍTULO 3 - A INEFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

3.1 A PROBLEMÁTICA DA SUPERPOPULAÇÃO CARCERÁRIA

O caos que envolve a vida carcerária no país deixa evidente que a forma

como o assunto está sendo tratado não tem condições de melhorar a situação dos

presídios no país. Há muito, as autoridades brasileiras veiculam na mídia a intenção

de "resolver o problema da superlotação das prisões". Sendo a sobrecarga das

populações carcerárias um assunto constante entre os doutrinadores, bem como nas

comissões de inquérito parlamentar e nos relatórios oficiais do governo. Além disso,

a falência do sistema penitenciário vem sendo constantemente retratado através da

opinião pública que afirma serem os presídios brasileiros, verdadeiros depósitos de

pessoas e permanentes escolas do crime. A superlotação do sistema carcerário é

talvez o mais crônico problema que deixa apreensivos os operadores do direito.

Também é preciso levar em consideração que a maior rigidez das leis e o

clamor público levam os presídios à superlotação, mas algumas alterações

legislativas e uma verdadeira ressocialização do encarcerado talvez pudesse liberar

novas vagas nos presídios brasileiros. As prisões superlotadas se apresentam

extremamente perigosas, já que aumentam as tensões provocando a violência entre

os presos, as tentativas de fuga e os ataques aos carcereiros culminando em

rebeliões. Não sendo novidade que a maior parte dos incidentes advindos de

protestos nos cárceres do país está ligada à superlotação.

Castilho coloca a situação atual dos presídios:

(...) de trinta em trinta dias, depara-se com as mesmas avaliações: falta de higiene, preso comum misturado aos reincidentes, mulheres convivendo com os homens (...) Já sou recebido de mal grado pelo Diretor da Cadeia, que me faz cara feia. Esses dias fui obrigado a interditar o funcionamento de duas celas solitárias escuras, que, segundo o Diretor, eram necessárias para castigar os presos mal comportados. Mas que castigo é esse? Quem vive em uma cela pequena, com mais de cinco, ir para uma, sozinho, é presente. A única coisa ruim é a falta de ventilação e a falta de luz (CASTILHO, 1988, p. 126).

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Vale ressaltar que a superpopulação carcerária se dá também pela

desinformação que o preso tem em relação à sua situação dentro do cárcere. Muitos

continuam presos após o cumprimento da pena, alguns recebem sursis e continuam

na prisão, outros não sabem que é possível solicitar o livramento condicional, desde

que sejam observadas as exigências legais e, uma vez concedido, a imediata

liberação do Alvará de Soltura. Além da remição da pena que não é controlada.

Atualmente a prisão é chamada de Universidade do crime, pois o

indivíduo entra para o cárcere porque cometeu um pequeno furto e sai sabendo

como planejar um assalto a mão armada. Portanto, não é possível acabar com a

violência das prisões, senão, eliminando o próprio sistema de encarceramento. Mas

esta possibilidade é uma utopia, já que o fim das prisões somente se aplicaria numa

sociedade igualitária, na qual o homem não fosse o seu próprio opressor. Conforme

as palavras de Alba Zaluar:

No Brasil como em toda América Latina ainda vigoram muitos elementos do sistema inquisitorial de fazer justiça. A confissão do acusado continua sendo mais importante do que a evidência conseguida mediante investigação. Daí a prática constante das torturas em delegacias e quartéis. A isso se chama ‘inquérito’. Na fase posterior, na maior parte das vezes, os processos judiciais continuam secretos (ZALUAR, 1996, p. 35-36).

Para diminuir a violência do ambiente prisional, só há uma medida a ser

tomada, a redução radical do encarceramento. Pode-se dizer que a prisão,

considerando seu contexto, por si só é uma violência com amparo legal.

3.1.1 Consequências da Falta de Espaço no Cárcere

A falta de espaço nas cadeias se tornou uma rotina tão frequente que o

juiz gaúcho decidiu não encarcerar uma quadrilha de ladrões de caminhão no Rio

Grande do Sul. O que será da sociedade brasileira se a falta de espaço nos

presídios levar os magistrados a tomarem decisões como esta?

O Ministério Público do Rio Grande do Sul solicitou ao Tribunal de Justiça do Estado para reverter a decisão de não prender uma quadrilha de ladrões de caminhão. (...) O juiz que manteve os

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bandidos em liberdade alegou superlotação do sistema carcerário. (...). Na segunda-feira (25), a polícia gaúcha encontrou partes de veículos desmanchados, ferramentas e armas nos esconderijos do grupo, mas a Justiça não permitiu a prisão preventiva de 15 suspeitos. O Juiz Paulo Oliveira Irion alegou que os crimes foram cometidos sem violência ou ameaça e que os presídios gaúchos estão superlotados e em condições precárias. "Se assim for o entendimento, coitada da sociedade gaúcha. Nós ficaremos reféns, é o passaporte para o crime," acredita o delegado Ranolfo Vieira Jr. Para tentar impedir que a quadrilha continue a agir livremente, o Ministério Público recorreu, nesta terça-feira, ao Tribunal de Justiça do Estado. A promotoria pediu que os desembargadores revertam à decisão do juiz e mandem prender os suspeitos. (...). A Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul apóia a decisão de não prender os suspeitos, diz que a culpa está na demora do Estado em construir novos presídios e alerta que outros juízes podem tomar decisões semelhantes. "Infelizmente nós não temos obtido respostas com a celeridade que a sociedade precisa. Essas decisões podem acontecer", afirma o vice-presidente da Associação de Juízes, Marco Aurélio Xavier (O GLOBO, 2009).

3.1.2 A Lei nº 12.403/11 - Tentativa de Esvaziamento das Prisões

A nova lei nº 12.403, de 04 de maio de 2011 modificou vários dispositivos

do Código de Processo Penal, entre eles o que diz respeito à prisão processual,

fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares. Mas a mencionada norma

já está gerando polêmica, pois tal legislação isenta de detenção os autores de

crimes com condenação até quatro anos, entre os quais estão incluídos: o furto

simples, o disparo de arma de fogo, o porte de arma de fogo, o armazenamento e a

transmissão de foto pornográfica de criança, a receptação, o homicídio culposo no

trânsito, o cárcere privado, a formação de quadrilha, a apropriação indébita, a

corrupção de menores, a destruição de bem público, a comercialização de produto

agrotóxico sem origem, o contrabando, entre outros (PIEDADE, 2011). Ressaltando

que, no caso do autor não ser reincidente caberá a aplicação de fiança ou medidas

cautelares diversas da prisão preventiva.

A nova lei implementou também a prisão domiciliar, a qual substitui a

prisão preventiva em situações específicas como: maior de 80 (oitenta)

anos; extremamente debilitado por motivo de doença grave; imprescindível aos

cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com

deficiência; gestante a partir do 7o (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto

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risco. Outra inovação é que a partir de agora o delegado pode conceder a liberdade

provisória com fiança em casos que a pena máxima não seja superior a quatro anos.

O fato é que a edição da referida legislação teve por intuito o

esvaziamento das prisões. Porém, na ânsia de resolver o problema do cárcere, o

legislador pátrio não atentou para o problema social que o novo dispositivo pode

acarretar. A despenalização dos crimes com condenação até 4 anos vem gerando

mais insegurança ainda na sociedade que já sofre com a impunidade que reina no

país atualmente e clama por instituições fortes, “com mecanismos e ferramentas

para o enfrentamento dessas novas formas de criminalidade. Infelizmente, os

parlamentares são abastecidos com uma produção doutrinária, acadêmica e

científica que só contempla o lado do acusado.”

3.2 OBJETIVOS DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

No entender de Beccaria, a pena sempre teve a finalidade de servir de

exemplo, funcionando assim, como medida de prevenção: "é preferível prevenir os

delitos a ter de puni-los; e todo legislador sábio deve antes procurar impedir o mal

que o reparar (...)" (BECCARIA, 2002, p. 101). Quanto à definição literária, Aurélio

Buarque de Holanda Ferreira explica que a finalidade da “pena é a punição imposta

ao contraventor ou delinquente, em processo judicial de instrução contraditória, em

decorrência de crime ou contravenção que tenha cometido com o fim de exemplá-lo

e evitar a prática de novas infrações” (BECCARIA, 2002, p. 101).

Entretanto, como bem observa Eduardo Lins e Silva atualmente são

alarmantes as estatísticas. “A pena de prisão é um remédio opressivo e violento, de

consequências devastadoras sobre a personalidade humana, e que deve ser

aplicada, como verdadeira medida de segurança, só aos reconhecidamente

perigosos” (SILVA, 2001, p. 68). Mas a sociedade humana, desde os tempos antigos

sempre teve a necessidade de uma estrutura repressiva contra os atos atentatórios

ao convívio social, criando-se assim um modelo de sanção contra os respectivos

atos, conceituando-se pena.

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O artigo 59 do Código Penal brasileiro determina que:

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Portanto, “de acordo com a legislação penal, a pena deve reprovar o mal

produzido pela conduta praticada pelo agente, bem como prevenir futuras infrações

penais” (GRECO, 2009, p. 489). A questão é que o objetivo de prevenção da pena

está subdividido em três finalidades: a ressocialização, a intimidação e a repressão.

A finalidade da pena tem caráter retributivo, quando o mal praticado, de forma

compensadora, é devolvido ao agente causador do dano.

Contudo, duas teorias fundamentam a finalidade das penas: a Teoria

Absoluta e a Teoria Relativa. A primeira defende a tese da retribuição e a segunda a

tese da prevenção. De acordo com Roxin citado por Rogério Greco:

A teoria da retribuição não encontra o sentido da pena na perspectiva de algum fim socialmente útil (...). A concepção da pena como retribuição compensatória realmente já é conhecida desde a antiguidade e permanece viva na consciência dos profanos com uma certa naturalidade: a pena deve ser justa e isso pressupõe que se corresponda em sua duração e intensidade com a gravidade do delito, que o compense (ROXIN apud GRECO, 2009, p. 489).

A sociedade, de uma maneira geral, precisa sentir que o autor do fato foi

punido e a pena de caráter retributivo atende a essa finalidade, pois a sociedade

“tende a se satisfazer com essa espécie de ‘pagamento’ ou compensação feita pelo

condenado, desde que, obviamente a pena seja privativa de liberdade” (GRECO,

2009, p. 489). Considerando-se que para a sociedade nada substitui a pena privativa

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de liberdade quando se trata de punir o autor de ato danoso, já que a pena

alternativa traz consigo sempre uma sensação de impunidade.

A Teoria Relativa, por sua vez, tem seu fundamento na prevenção, pois “a

pena aplicada ao autor da infração penal tende a refletir junto à sociedade, evitando-

se, assim, que as demais pessoas, que se encontram com os olhos voltados na

condenação de um de seus pares, reflitam antes de praticar qualquer infração penal”

(GRECO, 2009, p. 490).

E ainda, conforme afirma Paulo de Souza Queiroz:

(...) a pena presta-se não à prevenção negativa de delitos, demovendo aqueles que já tenham incorrido na prática de delito; seu propósito vai além disso: infundir, na consciência geral, a necessidade de respeito a determinados valores, exercitando a fidelidade ao direito; promovendo, em última análise, a integração social. (QUEIROZ, 2001, p. 40).

René Ariel Dotti descreve a função da pena da seguinte forma: “A pena

criminal é a Sanção Penal imposta pelo Estado e consistente na perda ou restrição

de bens jurídicos do autor da infração, em retribuição à sua conduta e para prevenir

novos ilícitos” (DOTTI, 2001, p. 433). Já Sebastian Soler, citado por Mirabete, afirma

que “a pena é uma sanção aflitiva imposta pelo Estado, através da ação penal, ao

autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na

diminuição de um bem jurídico e cujo fim é evitar novos delitos” (SOLER apud

MIRABETE, 2002, p. 246).

Não se pode negar que a punição ao crime é de interesse social, ou

seja, de natureza difusa e coletiva, e a função da pena é a ressocialização. Mas

Reale Júnior, em uma conclusão acertada afirma que a finalidade da pena poderá

ser encarada por vários ângulos, “como o do condenado, o da sociedade e o do

Estado. A finalidade atribuída à pena variará também se investigada quanto ao

momento de sua cominação e execução, bem como se analisada de acordo com a

natureza da sanção imposta” (REALE JÚNIOR, 2002, p. 43).

Para o condenado, a pena é um eterno castigo, mesmo que haja a

suspensão da execução da pena ou que o condenado seja considerado inocente.

Sob o aspecto do interesse da sociedade a pena será imposta como punição e

intimidação, ainda que para a vítima seja encarada sempre como uma vingança. Já

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para o Estado, de acordo com Reale Júnior a pena é "uma forma necessária de

controle social, para garantir respeito a determinados valores, garantia que se

reafirma pela execução da pena, quando este valor é afrontado por uma ação

delituosa" (REALE JÚNIOR, 2002, p. 435).

De acordo com as mais modernas tendências, se buscam alternativas

para penalizar os criminosos e não só isolá-los, pois se considera que a pena de

prisão no sistema isolado determina a perda total da dignidade humana. Por isso,

vários doutrinadores acreditam que o isolamento torna a ressocialização muito mais

difícil, principalmente quando ocorre a tortura e o tratamento desumano, os quais

são expressamente vetados no texto constitucional.

3.4 A FALÊNCIA DA PENA DE PRISÃO

Num momento em que a doutrina penal questiona a falência da pena de

prisão, como forma de sanção a delitos comuns, propondo alternativas de punição

que não a privação de liberdade, é visível a inoperância do sistema penitenciário

que, além de não recuperar os detentos os devolve à sociedade sem que haja

qualquer melhoramento psicológico e sociológico.

César Roberto Bitencourt em seu livro a ‘Falência da pena de prisão:

causas e alternativas’, fala da desumanização e crueldade existente no ambiente

carcerário, pois afirma que “existem centros penitenciários em que a ofensa à

dignidade humana é rotineira, tanto em nações desenvolvidas como em

subdesenvolvidas. As mazelas da prisão não é privilégio apenas de países do

terceiro mundo” (BITENCOURT, 2004, p. 35). De uma forma geral, as deficiências

prisionais nos vários pontos do país se apresentam com características

semelhantes.

É indiscutível o fato de que o sistema prisional brasileiro está falido e,

além de sua inutilidade para resolver os problemas da criminalidade, também existe

um desrespeito aos direitos humanos garantidos pela Constituição Federal com

relação aos condenados. O que se percebe é que a ressocialização é incompatível

com o encarceramento num sistema como o existente no Brasil, já que a prisão, nas

condições atuais, exerce um efeito devastador sobre a personalidade do preso,

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incentivando o lado negativo do mesmo, agravando os distúrbios de conduta. Nesse

caos do Sistema Penitenciário, os detentos, de um modo geral, se encontram à

disposição dos carcereiros, tendo suas penas agravadas por estes últimos sem que

haja qualquer controle do Judiciário. Normalmente, estes “carrascos” do cárcere são

funcionários mal remunerados, de baixa formação, que agem a serviço do crime

organizado. Sendo assim, percebe-se a necessidade urgente de integração dos

órgãos governamentais e dos órgãos não-governamentais para minimizar ou

solucionar o problema do cumprimento da pena.

As questões referentes à viabilidade de um processo de ressocialização

não devem ser descartadas pelas autoridades responsáveis e precisam ser

devidamente analisadas. A aplicação de penas alternativas é uma das soluções para

a questão gerada pela superlotação do sistema penitenciário, porém, são

necessários meios de fiscalização capazes, que certamente custariam muito menos

para o Estado do que investir em casas de reclusão, e tanto o retorno social quanto

o educacional tem muito mais valor para o detento e para a comunidade.

A verdade é que as prisões brasileiras vêm mantendo os detentos em

situação deplorável, equiparada às situações da época dos castigos corporais, pois

os presos primários são misturados com reincidentes e os que praticaram os crimes

considerados leves com presos de alta periculosidade, em celas abarrotadas de

gente, onde os espaços que foram construídos para abrigar cinco pessoas terminam

por abrigar vinte, onde são encontrados doentes misturados com indivíduos sadios,

todos mantidos na ociosidade, sem as mínimas condições de higiene, entregues à

própria sorte, submetidos a toda modalidade de exploração pelos inescrupulosos,

quando o mais fraco se torna objeto da satisfação do desejo sexual do mais forte ou,

daqueles chamados de “dono da cela” (SILVA, 2003).

Mário Ottoboni relata que, num trabalho realizado com os presos durante

12 anos, o aprendizado mais importante foi o fato de que “de presos nós não

entendíamos nada. Quem não passou pela experiência de viver atrás das grades ou

se esquivou da humildade de aprender com os presos ficará sempre na condição de

teórico, estará sempre distante da realidade” (OTTOBONI, 2001, p. 27). São

necessários novos métodos de tratamento penal que permitam a reabilitação do ser

humano para que possam posteriormente viverem com seus semelhantes e que, ao

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retornar à sociedade, não venham delinquir novamente. Afastando a idéia de que a

prisão tem apenas a função de castigar, usando a política do medo com os detentos.

3.5 A REINCIDÊNCIA COMO CONSEQUÊNCIA DA INEFICÁCIA

O artigo 63 do Código Penal brasileiro dispõe:“verifica-se a reincidência

quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que,

no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior” (Redação dada

pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

No inciso I do artigo 64 é possível observar a existência de um prazo

depurador de cinco anos em relação à reincidência, assim determina o citado

dispositivo:

I - não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Portanto, de acordo com o dispositivo acima transcrito é preciso haver

uma sentença condenatória transitada em julgado seguida da prática de um novo

delito cometido dentro do prazo de cinco anos para que se caracterize a

reincidência. Nesse sentido, Aramis Nassif analisa a questão da reincidência e sua

associação em relação à função da pena:

A pena tem como objetivo a recuperação do agente. Trata-se, em tese, de aplicar medidas orientadas para ressocialização do delinquente e, por óbvio, significa mais que evitar simplesmente a reincidência. O cumprimento da sanção, para realizar seu conteúdo teleológico, deveria, por exemplo, resultar em preparação profissional, ensinar a fazer uso do ócio de uma forma construtiva, educar, melhorar as relações pessoais e despertar a consciência sócio-axiológica (NASSIF, 2001, p. 8).

Carlos Lemos observa que tendo as medidas penais como objetivo a

reintegração do apenado na sociedade, estes devem retornar ao convívio social com

um comportamento adequado para o mesmo. O autor ainda alega que não é

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necessário grande esforço para se perceber que a ressocialização pode ajudar na

prevenção da criminalidade. Sendo assim, “o grande número de condenados

reincidentes pode ser reduzido com maior eficácia, com uma reintegração eficiente”

(LEMOS, 2007, p. 29).

Infelizmente, conforme aponta a realidade brasileira, o que se tem

atualmente é uma situação que se apresenta com altos índices de reincidência, pois

as prisões brasileiras não têm estruturas para adotar medidas eficazes a fim de

proporcionar aos apenados a sua reintegração na sociedade após o término de suas

penas. Alguns desses apenados chegam a sair da prisão com total sentimento de

revolta em relação à sociedade o que os leva à prática de um novo crime.

Agravando-se a situação quando o indivíduo é injustamente condenado ou apenas

por pequenos delitos e se vê obrigado a passar um enorme tempo em situação

degradante e em convivência com criminosos de alta periculosidade e se

acostumam a lidar com a realidade das infrações penais mais sofisticadas.

Daí a importância da avaliação e do exame criminológico que não existe

no país, pois a falta deste acarreta a reunião de todos os tipos de criminosos

convivendo num mesmo cárcere, levando um preso de baixo potencial ofensivo a se

tornar um preso altamente perigoso.

Assim, vale citar as palavras de Carlos Eduardo, o qual chama atenção

para os grandes índices de reincidência no Brasil, afirmando que os mesmo chegam

próximo aos 70%. O autor aponta esse alto índice como consequência da falha dos

órgãos públicos que operam na gestão do sistema prisional no país, deixando claro

que as esferas públicas não conseguem lidar, de uma forma profissional, com o

problema carcerário do país, o que se reflete diretamente na questão da

insegurança pública (LEMOS, 2007, p. 47).

Vale citar as palavras de Michel Foucault, o qual entende que o trabalho

prisional é a via mais apropriada para a transformação do indivíduo, daí a

necessidade do preso ter uma ocupação, pois “além dele produzir, ele acaba se

amoldando às normas do sistema industrial, e com o tempo vai perdendo a sua

personalidade violenta, e se transformando num ser mais tranquilo, mais dócil,

passando a reconhecer o fruto do seu trabalho” (FOUCAULT, 2004, p. 87).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Atualmente tornou-se incontestável a ineficiência do sistema penitenciário

na recuperação do apenado, uma vez que estes quando libertados demonstram a

falta de condição de convívio social, por vezes, passam a seres humanos piores do

que aqueles que foram encarcerados. Evidente que não há dúvidas de que o

sistema penitenciário brasileiro rigorosamente está falido, tendo como consequência

os efeitos devastadores de superlotação, as fugas e mortes que se tornaram uma

rotina no cárcere.

Além da inutilidade da prisão como objeto de ressocialização e como

solução para conter a criminalidade, a situação se agrava com a corrupção existente

dentro dos presídios fazendo com que os presos obtenham várias regalias como

armas, telefones celulares, bebidas, etc. Ficando impossível o controle do poder

público diante da quantidade de propina que transita no ambiente carcerário. O

tratamento de ressocialização pretendido pela Lei de Execução Penal é incompatível

ao recolhimento do detento por um sistema como o existente atualmente no Brasil.

Percebe-se ainda, que uma maior repressão por parte do aparelho estatal

não tem sido o caminho ideal para a mediação de conflitos sociais ou a redução

drástica da criminalidade. Portanto, novas alternativas terão que ser aplicadas para

aplacar tal situação. A sociedade deverá buscar perspectivas mais humanitárias,

oferecer melhores condições sociais: de alimentação, educação, saúde, de trabalho,

enfim, uma vida mais digna ao cidadão, ou seja, investir mais na construção da

cidadania.

Uma opção diante da superlotação da população carcerária brasileira

seria a aplicação de medida alternativa que serve como benefício ao réu que ao

invés de cumprir uma pena com sua liberdade privada, exceto nos crimes contra

vida, prestaria serviços em estabelecimentos públicos com o intuito da

ressocialização. Assim, este não seria apenas um benefício concedido ao réu, mas

sim um benefício social frente à superlotação dos presídios brasileiros e a fácil

marginalização de criminosos que não são de alta periculosidade, mas quando

privados da sua liberdade no convívio com criminosos de alta periculosidade passam

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a ter pouca chance de ressocialização. A superlotação destrói qualquer tentativa de

implementação de políticas públicas, bem como aumenta a taxa de reincidência. No

entanto, o problema do sistema prisional brasileiro está ligado à situação econômica,

política e social do país. Sendo fato que nas prisões brasileiras, dificilmente se

recupera os condenados. A falta de profissionais treinados para lidar com a

execução penal é um dos principais motivos de corrupção dentro do cárcere, o que

leva os detentos a adquirirem um poder que os permitem ditar normas dentro do

cárcere acima daquelas definidas pelo Estado.

Portanto, a ideia moderna de punição já não comporta mais castigos,

torturas e isolamentos dos detentos, pois isso não só impede a sua recuperação

tornando-os mais revoltados e violentos como também envolve mais verba pública

para custear o encarceramento, uma vez que neste jogo o que se tem é o dinheiro

público pagando a conta da cadeia dos irrecuperáveis. Quanto mais revolta for

gerada no cárcere, mais altos se apresentam os índices de criminalidade dentro das

próprias instituições prisionais.

Tamanha é a inoperância do sistema prisional brasileiro que a ineficácia

da pena privativa de liberdade se tornou uma realidade incontestável. Quando, na

verdade, a finalidade da pena é promover uma punição que tanto se aplique como

exemplo para aqueles que se envolvem com o mundo do crime quanto sirva como

medida corretiva para aquele que cometeu um delito.

Atualmente existe uma urgente necessidade de adaptação da Lei de

Execução Penal às condições do país, à reestruturação de suas prisões, bem como

a reformulação do Sistema Carcerário como um todo, pois da forma que está pensar

em ressocialização é uma utopia.

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REFERÊNCIAS

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 02

AGRADECIMENTO 03

RESUMO 04

METODOLOGIA 05

SUMÁRIO 06

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO 1

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO SISTEMA PRISIONAL

1.1 A ORIGEM DO CÁRCERE 10

1.2 A EVOLUÇÃO DO CÁRCERE NO BRASIL 12

1.3 AS RAÍZES DO DIREITO PENITENCIÁRIO 13

1.3.1 A Evolução da Legislação Penal 14

1.3.2 A Evolução das Penas 16

1.3.3 O Sistema Atual 17

CAPÍTULO 2

O CARÁTER RESSOCIALIZADOR DA LEP

2.1 A Lei de Execução Penal – LEP 19

2.1.1 Os Direitos Humanos do Detento 21

2.1.2 Os Direitos Trabalhistas do Detento 21

2.1.3 A Polêmica do Regime Disciplinar Diferenciado 23

2.2 O CARÁTER RESSOCIALIZADOR DA PENA 24

2.2.1 Finalidade 24

2.2.2 O Benefício do Indulto 26

2.2.3 O Tratamento Reeducativo para com o Detento 26

2.5 As Regras do Sistema Carcerário 27

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CAPÍTULO 3

A INEFICÁCIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE 29

3.1 A PROBLEMÁTICA DA SUPERPOPULAÇÃO CARCERÁRIA 29

3.1.1 Consequências da Falta de Espaço no Cárcere 30

3.1.2 A Lei nº 12.403/11 - Tentativa de Esvaziamento das Prisões 31

3.2 OBJETIVOS DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE 32

3.4 A FALÊNCIA DA PENA DE PRISÃO 35

3.5 A REINCIDÊNCIA COMO consequência DA INEFICÁCIA 37

CONSIDERAÇÕES FINAIS 39

REFERÊNCIAS 41

ÍNDICE 44

FOLHA DE AVALIAÇÃO 46

Page 46: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · RESUMO A presente ... cárcere, que serviria de local correcional virou, na verdade, ... uma relação dinâmica entre o mundo

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