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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA OS MUSEUS COMO LOCAIS DE MEDIAÇÃO CULTURAL E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA AS UNIVERSIDADES Por: Ana Cláudia Pimenta Luz Orientador Prof.ª Mônica Ferreira de Melo Rio de Janeiro 2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

OS MUSEUS COMO LOCAIS DE MEDIAÇÃO CULTURAL E SUA

CONTRIBUIÇÃO PARA AS UNIVERSIDADES

Por: Ana Cláudia Pimenta Luz

Orientador

Prof.ª Mônica Ferreira de Melo

Rio de Janeiro

2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

OS MUSEUS COMO LOCAIS DE MEDIAÇÃO CULTURAL E SUA

CONTRIBUIÇÃO PARA AS UNIVERSIDADES

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Docência do ensino superior

Por: Ana Cláudia Pimenta Luz

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Jorge e Maria (in

memoriam), por terem servido de base

para as escolhas e desafios da minha

vida.

Ao meu irmão Eduardo, pela ajuda,

paciência e incentivo.

Aos amigos que, de alguma forma, me

ajudaram em algumas etapas desta

jornada.

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DEDICATÓRIA

Dedico essa pesquisa à minha mãe,

Maria Pimenta Luz (in memoriam) que

sempre me contagiou com sua alegria, fé

e esperança em mim, e me ajudou a

escrever esse trabalho.

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RESUMO

Esta pesquisa busca analisar as propostas de mediação cultural do Centro

Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro (CCBB/RJ), com base no estudo de

caso do programa “Práticas e Reflexões com Educadores”, realizado pela

equipe de Arte educação dessa instituição, centrado nos anos de 2010 e 2011.

A partir de uma análise das práticas desenvolvidas pelo programa educativo do

CCBB/RJ, será abordada a questão da mediação cultural em museus,

destacando a oferta de atividades de ateliê para o público, relacionadas aos

conteúdos das exposições em curso, e em consonância com as abordagens

pós-modernas de ensino da arte. Objetiva-se configurar uma prática escolar

em artes mais reflexiva e investigativa que valorize a experiência, a abertura, a

complexidade e o aprofundamento no processo produtivo e cognitivo dos

alunos.

Palavras-chave: Mediação cultural, Arte – educação, Arte Contemporânea

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METODOLOGIA

Para este estudo, optamos pela abordagem qualitativa uma vez que

buscaremos no universo das crianças, um universo de significados, crenças e

valores das ações e relações humanas vividas por elas. (Minayo, 1994, p. 22-

23). O cenário será o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB/RJ) e envolverá a

análise das ações desenvolvidas pela equipe de arte – educadores do

programa educativo do CCBB/RJ. Será feita uma pesquisa bibliográfica sobre

arte contemporânea bem como um histórico sobre arte-educação no Brasil e

mediação cultural, tal como foi estudado por Ana Mae Barbosa, Vigotsky e

John Dewey, entre outros.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - A ARTE E SEU ENSINO NO BRASIL 11

CAPÍTULO II - CONTRIBUIÇÕES DA ARTE NO 23

PROCESSO COGNITIVO

CAPÍTULO III – ESTRATÉGIAS NO CAMPO DA 33

ARTE TENDO EM VISTA CONCEBÊ-LA COMO

MEDIADORA NA CONSTRUÇÃO DO

CONHECIMENTO

CONCLUSÃO 44

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 47

BIBLIOGRAFIA CITADA (opcional) 49

ÍNDICE 50

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INTRODUÇÃO

A ideia de desenvolver esse estudo surgiu ao realizar o trabalho como

educadora e da minha participação como ouvinte em programações culturais

promovidas pelos setores educativos dos museus da cidade do Rio de

Janeiro. Por uma questão de delimitação da pesquisa, neste trabalho

abordarei especificamente os encontros promovidos pelo Setor educativo

Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro (CCBB RJ).

Os encontros “Práticas e Reflexões com educadores” acontecem no

último sábado de cada mês no CCBB do Rio de Janeiro, sendo que o estudo

de caso do programa é realizado por uma equipe de arte-educadores da

empresa Sapoti produções. O programa constitui-se de encontros gratuitos e

abertos a educadores e interessados em geral, não apenas a professores de

arte. Tem como conteúdo as exposições de artes visuais que acontecem na

instituição e os participantes tem a oportunidade de visitar, além de se

aprofundar em questões mais específicas do universo da arte e do seu ensino,

tendo em vista um possível trabalho em sala de aula.

Em cada exposição, é oferecido um encontro específico – em diversas

datas – incluindo um material gráfico impresso, desenvolvido para o projeto,

com imagens de obras da exposição e um texto contendo informações sobre o

assunto abordado, com caráter reflexivo e provocativo, convidando o educador

a desenvolver possíveis projetos pedagógicos.

O intuito inicial do programa era preparar melhor ou estimular o trabalho

do educador que pretende levar seu grupo de alunos para visitar uma

exposição e desenvolver um planejamento que compreenda também um

trabalho anterior e posterior a essa visita. No entanto, embora não tenha sido

formalmente um curso e, sim, encontros diferenciados, um público crescente

de professores passou a procurar regularmente o programa como um espaço

de formação contínua em arte. Além de um ambiente para discussão e troca

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de ideias entre profissionais do ensino de arte e educação em geral, os

participantes buscam novos conhecimentos, em especial em relação à arte

contemporânea brasileira e internacional.

Entre 2010 e 2011, anos em que pude participar dos encontros, foram

realizados aproximadamente doze diferentes exposições de artes visuais e

dezesseis encontros no CCBB/RJ que o programa acompanhou. A

oportunidade de levar um grupo de 40 alunos ao CCBB em 2011, graças ao

sorteio de ônibus promovidos em cada encontro, pôde representar aquilo que

para a maioria dos estudantes é a chance de ter um primeiro contato com a

arte. Os alunos foram recepcionados por um grupo de integrantes do CCBB

educativo e através de uma visita guiada chamada de “reconhecendo o prédio

do CCBB”, puderam ter acesso ao espaço físico do prédio e às exposições em

curso, além de participar de atividades no ateliê de artes.

Nestes encontros pude ver a importância do trabalho que é realizado pelo

setor educativo daquela instituição, que oferece gratuitamente aos educadores

um material didático de boa qualidade para trabalhar com os alunos, além de

procurar levar profissionais sérios para dialogar com os professores sobre

temas ligados as exposições que estão acontecendo naquele momento, e

proporcionar um ambiente ideal para as trocas de experiências entre os

profissionais que participam dos encontros.

Para atingir uma unidade estético-conceitual neste trabalho, ele foi

dividido em três capítulos. No capítulo I, intitulado A Arte e seu ensino no

Brasil, procura conceituar a arte e traçar um breve histórico sobre o ensino

dessa disciplina no Brasil.

No capítulo II, intitulado Contribuições da arte no processo cognitivo: o

programa educativo do CCBB RJ, mostra como os departamentos educativos

dos museus, e especificamente o setor educativo do CCBB/RJ, colaboram nos

processos compartilhados entre museu e escola e na construção de propostas

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de mediação cultural, prevendo um público diversificado e que soma histórias,

vivências, saberes e conhecimentos, também diferentes.

No capítulo III, intitulado Estratégias no campo da arte tendo em vista

concebê-la como mediadora na construção do conhecimento, procuro discutir,

a partir de reflexões teóricas e de experiências, a ideia de que a arte-educação

tem um papel de destaque como mediadora nas relações entre arte e público,

tendo em vista que um dos papéis preponderantes do professor de Arte na

contemporaneidade é o de mediador cultural.

Ao final desta pesquisa, objetiva-se configurar uma prática escolar em

artes mais reflexiva e investigativa que valorize a experiência, a abertura, a

complexidade e o aprofundamento no processo produtivo e cognitivo dos

alunos.

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CAPÍTULO I

A ARTE E SEU ENSINO NO BRASIL

Com todas as linguagens e possibilidades que oferece, a arte pode

representar um campo fértil de mediação entre nós e o mundo. A arte-

educação, por sua vez, se deparou com essa possibilidade a partir do

momento em que passou a considerar a arte como ponto principal do processo

de ensinar/aprender arte. Mas o que é arte? Vários autores já se fizeram essa

pergunta e se debruçaram sobre o problema tentando encontrar uma definição

para o conceito. Segundo COLI (1995)

“Dizer o que seja a arte é coisa difícil. (...) se buscamos uma

resposta clara e definitiva, decepcionamo-nos: elas são

divergentes, contraditórias, além de frequentemente se

pretenderem exclusivas, propondo-se como solução única”.

(pág. 7)

Arte pode ser considerada um conjunto de técnicas empregadas na

confecção de um determinado objeto, que deva parecer “perfeito” do ponto de

vista acadêmico. De acordo com a definição de Rodrigo Naves (In

ARGAN,1996)

“A arte é um fazer exemplar que, em última análise, tem como

horizonte a produção de objetos perfeitos, que sirvam de guia

às demais atividades. Nessa busca, ela é também criação de

valores, já que deve se perguntar a todo instante pelo sentido

do agir humano e operar de modo a garantir e ampliar seus

próprios fundamentos. E esse movimento traz consigo

necessariamente uma temporalidade de ordem histórica, em

que passado, presente e futuro se condensam na presença

instigante de um objeto particular. A partir dessa formulação o

estabelecimento de vínculos entre a produção artística e

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aspectos sociais, éticos, históricos e cognoscitivos pode se

realizar sem a necessidade de privilegiar qualquer uma das

instâncias envolvidas, desde que as análises partam dos

trabalhos de arte e observem neles a especificidade dos nexos

propostos”. (pag. xx)

Desde os tempos primitivos, o homem teve a necessidade de fazer

registros como uma forma de explicitar suas ideias, sentimentos e crenças.

São estes registros que permitem às novas gerações uma melhor

compreensão dos vários momentos históricos, dos valores e, principalmente,

compreender as consequências destes na vida do homem. Os artistas

procuram explorar em suas obras aquilo que mais os intrigam ou encantam no

mundo. Cores vibrantes, contrastes entre materiais e técnicas, mistérios da

existência ou simplesmente as coisas do cotidiano.

A arte nasceu há cerca de 25 mil anos, quando o homem de

Neanderthal evoluiu para o ancestral homem de Cro-Magnon. A imaginação

veio com o aumento da inteligência, que trouxe ainda a habilidade de criar

imagens esculpidas e pintadas. Com a construção de monumentos destinados

a rituais, surgiu a arquitetura. Segundo OSTROWER (1999)

“Desde as primeiras culturas, o ser humano surge dotado de

um dom singular: mais do que “homo faber”, ser fazedor, o

homem é um ser formador. Ele é capaz de estabelecer

relacionamentos entre os múltiplos eventos que ocorrem ao

redor e dentro dele. Relacionando os eventos, ele os configura

em sua experiência do viver e lhes dá um significado. Nas

perguntas que o homem faz ou nas soluções que encontra, ao

agir, ao imaginar, ao sonhar, sempre o homem relaciona e

forma”. (pág. 9)

Durante milhares de anos, acompanhando a ascensão e a queda de

cada civilização, essas três formas de arte – pintura, escultura e arquitetura –

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encarnaram as ambições, os sonhos e os valores da cultura. Embora os

primeiros artistas fossem anônimos, muito do que sabemos sobre as

sociedades antigas vem da arte que nos legaram. Segundo STRICKLAND

(2002),

“Os zigurates e os baixo-relevos encontrados nas ruínas da

Mesopotâmia e nas pirâmides do Egito dão testemunho de

civilizações complexas. A arte grega atingiu o pináculo da

beleza quando o respeito pelo indivíduo floresceu em Atenas;

as relíquias romanas atestam o poder do maior império no

mundo antigo. Os artistas se especializaram cada vez mais em

representar a figura humana em espaços realísticos até a

Idade Média, quando a arte mudou radicalmente. Com o triunfo

do cristianismo, o interesse pelo corpo e pelo mundo declinou

rapidamente. A pintura e a escultura estilizadas passaram a

existir apenas para ensinar religião e adornar catedrais –

verdadeiras obras-primas do período medieval”. (pág. 2)

Para OSTROWER (1999)

“Criar é, basicamente, formar. É poder dar uma forma a algo

novo. Em qualquer que seja o campo de atividade, trata-se,

nesse ‘novo’, de novas coerências que se estabelecem para a

mente humana, fenômenos relacionados de modo novo e

compreendidos em termos novos. O ato criador abrange,

portanto, a capacidade de compreender; e esta, por sua vez, a

de relacionar, ordenar, configurar, significar”. (pág. 9)

Historicamente falando o conceito de mediação cultural está fortemente

associado a educação em museus. É importante então buscar entender as

relações entre arte e educação para compreender as bases contextuais desta

associação. Farei a seguir um breve histórico sobre o assunto.

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1.1. Ensino da arte no Brasil – História

Foi sob a influência de John Dewey que se desenvolveu o modernismo

no ensino da arte, cujas ideias nos foram trazidas pelo educador Anísio

Teixeira. Considerado o grande modernizador da educação no Brasil, Teixeira

foi aluno de Dewey na Universidade de Columbia e teve um papel de destaque

no chamado movimento Escola Nova que ocorreu entre os anos de 1927 e

1934. A Escola Nova utilizou o conceito de John Dewey de que a arte seria

uma experiência consumatória, identificando este conceito, de forma

equivocada, como a ideia de experiência final. De acordo com BARBOSA

(2008, pág. 1) “A experiência consumatória para Dewey é pervasiva, ilumina

toda a experiência, não é apenas seu estágio final”.

Ainda BARBOSA (2008, pág. 2), cita o livro de José Scamarelli, Escola

Nova: esboço de um sistema, onde o autor nos dá os pressupostos da reforma

Carneiro Leão e muitos exemplos práticos de aulas, nos quais a função da arte

está explicitamente ligada à interpretação simplificadora da “experiência

consumatória de Dewey”. De acordo com as descrições de Scaramelli, a arte

era usada para ajudar a criança a organizar e fixar noções apreendidas em

outras áreas de estudo. A expressão através do desenho e dos trabalhos

manuais era a última etapa de uma experiência para completar a exploração

de um determinado assunto. Segundo BARBOSA (2008),

“A ideia fundamental era dar, por exemplo, uma aula sobre

peixes explorando o assunto em vários aspectos e terminando

pelo convite aos alunos para desenharem peixes e fazerem

trabalhos manuais com escamas, ou ainda, dar uma aula sobre

horticultura e jardinagem e levar as crianças a desenharem ou

uma horta”. (pág. 2)

Atualmente, a Escola fundamental no Brasil ainda utiliza a prática de

colocar a arte, através da colagem, desenho, pintura, entre outras técnicas, no

final de uma experiência, ligando-se a ela por meio do conteúdo. Este método

baseia-se na ideia de que a arte pode ajudar a compreensão dos conceitos,

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porque há elementos afetivos na cognição que são por ela mobilizados. Muito

comuns na década de 1990, os chamados projetos adotados por algumas

escolas baseiam-se na estratégia descrita acima.

1.1.1. As Escolas especializadas em arte para crianças

O surgimento da arte como atividade extracurricular se dá no final da

década de 1920 e início da década de 1930, junto com as primeiras tentativas

de se criar escolas especializadas em arte para crianças e adolescentes. Em

São Paulo, foi criada a Escola brasileira de Arte, que funcionava em uma sala

anexa ao grupo escolar João Kopke. Alunos das escolas públicas na faixa

etária de oito a quatorze anos, após serem submetidas a uma prova para ver

se possuíam aptidão para artes, podiam estudar gratuitamente desenho,

pintura e música. O professor Theodoro Braga, figura de destaque nesta

escola, criou um método no qual a orientação era vinculada a estilização da

flora e fauna brasileiras. Publicou diversos artigos nos quais defendia um

ensino voltado para a natureza e se colocava claramente contra o método da

cópia de estampas. BARBOSA (2008) destaca: “Tarsila do Amaral em uma

entrevista ao Correio da tarde de 28 de janeiro de 1931 elogia o trabalho de

Theodoro Braga e de Anita Malfatti no ensino da arte, conferindo dois o

mesmo valor” (págs. 2 e 3). Com uma orientação baseada na livre expressão e

no espontaneísmo, a artista Anita Malfatti oferecia cursos para crianças e

jovens na escola Mackenzie e em seu ateliê.

Entre 1936 e 1938, período em que o escritor Mário de Andrade atuou

como seu diretor, o Departamento de cultura de São Paulo criou um curso para

crianças na biblioteca infantil municipal. Sua contribuição foi muito importante

para que a produção pictórica da criança começasse a ser olhada com mais

seriedade e passasse a ser investigada com critérios baseados na filosofia da

arte. No curso de filosofia e história da arte, que era ministrado por Mário de

Andrade na Universidade do Distrito Federal, o ponto de partida era o estudo

comparado do espontaneísmo e da normatividade do desenho infantil e da arte

primitiva. BARBOSA (2008, pág. 3) cita outra importante contribuição do

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escritor que dirigiu uma pesquisa preliminar sobre a influência dos livros e do

cinema na expressão gráfica livre de crianças de quatro a dezesseis anos de

classe operária e de classe média, alunos dos parques infantis e da Biblioteca

infantil de São Paulo. A autora destaca ainda que seus artigos de jornal muito

contribuíram para a valorização da atividade artística da criança como

linguagem complementar, como arte desinteressada e como exemplo de

espontaneísmo expressionista a ser cultivado pelo artista. As atividades que

eram desenvolvidas pelas escolas ao ar livre do México ao que parece,

influenciaram bastante sua interpretação do desenho infantil e sua ação

cultural.

Durante os anos de 1937 a 1945, a Universidade do Distrito Federal,

local em que foi criado o primeiro curso de formação para professores de

desenho por Anísio Teixeira, é fechada pela ditadura implantada no Brasil.

Nome importantes como Portinari e Mário de Andrade atuaram como

professores no curso. Como não havia outro curso para professores de

desenho no país, os alunos tiveram que se dividir entre a Escola Nacional de

Belas Artes e o curso de pedagogia, para cursar as disciplinas que faltavam

para concluir o curso. Eram discriminados em ambos os cursos. Depois desta

experiência muitas faculdades criaram cursos para professores de desenho,

destacando-se na década de 1960 o curso oferecido pela Fundação Armando

Alvares Penteado.

1.1.2. Arte que valoriza a livre expressão da criança

Com o objetivo de valorizar a arte e liberar a expressão da criança,

fazendo com que ela se manifestasse livremente sem interferência do adulto,

começam a surgir a partir de 1947 ateliês para crianças em várias cidades do

Brasil. Trata-se de uma espécie de neo-expressionismo que dominou a Europa

e os Estados Unidos do pós-guerra e se manifestou com muita força no Brasil

recém saído de um longo período ditatorial. Desses ateliês destaca-se a escola

criada no Recife por Lula Cardoso em 1947. Sua proposta básica era dar à

criança papel, lápis e tinta, e deixar que ela se expressasse livremente. Em

1948 foi criada por Augusto Rodrigues a Escolinha de Arte do Brasil. A escola

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seguia o mesmo princípio da anterior e começou a funcionar nas dependências

de uma biblioteca infantil no Rio de Janeiro.

A Escolinha de Arte do Brasil também oferecia cursos de formação para

professores, que depois de formados passaram a divulgar a proposta da

Escolinha, criando eles mesmos escolinhas de arte por todo o Brasil. Além das

escolas, estes novos educadores criaram o chamado Movimento Escolinha de

Arte (MEA). O Movimento tentou convencer a escola comum da necessidade

de deixar a criança se expressar livremente usando lápis, argila, tinta, entre

outros materiais, tarefa que se mostrou quase impossível uma vez que as

escolas eram obrigadas a seguir os programas editados pelo Ministério da

educação. Em 1948, o arquiteto Lúcio Costa recebeu o convite para elaborar o

programa de desenho da escola secundária, que era baseado na proposta da

Bauhaus. Não tendo sido oficializado pelo Ministério da Educação, esse

programa só irá influenciar o ensino da arte a partir de 1958, quando uma lei

federal regulamenta a criação de classes experimentais.

Alguns dos novos métodos de ensino introduzidos na década de 1930,

como por exemplo, o método naturalista de observação e o método de arte

como expressão de aula, passa a ser designada como arte integrada no

currículo, isto é, relacionada com outros projetos que incluíam várias

disciplinas. Alguns dos livros de artes plásticas na escola, publicados nas

décadas de 1960 e 1970 por autores brasileiros, são considerados redutores

por darem ênfase a descrição de técnicas como o uso do lápis de cera e

varsol, desenho de olhos fechados, pintura de dedo, desenho de giz molhado,

entre outras técnicas.

1.1.3. O golpe militar de 1964

Com a ditadura de 1964 professores foram perseguidos e escolas

experimentais aos poucos foram sendo extintas. Até as escolas de educação

infantil foram fechadas e o ensino da arte em escolas primária foi dominado

por temas e desenhos, comemorações cívicas, religiosas entre outras festas.

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A experiência renovadora da Universidade de Brasília, onde estava sendo

criada uma escolinha de Arte baseada em pesquisas e em ideias aprendidas

com a Bauhaus de cercar a criança com o bom desenho, foi extinta.

Em 1969, a arte fazia parte do currículo de todas as escolas particulares

de prestígio, enquanto que nas escolas públicas raramente era desenvolvido

um trabalho de arte. Entre 1968 e 1972, tem início em escolas especializadas

no ensino da arte, uma série de experiências que buscavam relacionar projetos

de arte de classes de crianças e adolescentes, com o desenvolvimento dos

processos mentais envolvidos na criatividade. Na década de 1960 a Escolinha

de Arte de Recife realizou um projeto muito criativo chamado de “Igaraçú visto

pelas crianças”. No início da década de 70, a Escolinha de Arte de São Paulo

ousou ao introduzir crianças e adolescentes à fotografia. Já no Rio Grande do

Norte, slides de artistas modernos eram projetados para as crianças, depois

das aulas expressionistas. Essas ações foram consideradas um revolução para

a época. Segundo BARBOSA, (2008)

“a escola de arte Brasil (São Paulo), a Escolinha de arte

do Brasil (Rio de Janeiro), a Escolinha de Arte de São

Paulo, o Centro Educação e Arte (São Paulo), o NAC –

Núcleo de Arte e cultura (RJ), as classes para crianças da

FAAP (...) foram algumas escolas especializadas que

tiveram ação multiplicadora nos fins da década de 1960,

influenciando professores que iriam atuar ativamente nas

escolas a partir de 1971, quando a educação artística se

tornou disciplina obrigatória nos currículos de 1º e 2º

graus....”. (pág. 10)

A reforma educacional de 1971 estabeleceu um novo conceito de ensino

de arte, segundo o qual as artes plásticas, artes cênicas e música deveriam ser

ensinadas por um mesmo professor, da primeira à oitava séries do primeiro

grau. A fim de preparar estes professores que agora deveriam tornar-se

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polivalentes, foram criados em 1973 cursos de licenciatura em educação

artística. Educação artística foi a nomenclatura que passou a designar o ensino

polivalente de artes plásticas, música e teatro. Como consequência dessa nova

exigência do Ministério da educação, professores que eram graduados em

desenho foram obrigados a retornar a universidade para cursarem mais um ou

dois anos em busca dessa especialização. BARBOSA (2008) cita que:

“As Secretarias de Estado (educação e/ou cultura) que

desenvolveram um trabalho mais efetivo de reorientação e

atendimento de professores de educação artística foram as do

Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Não é (...)

por acaso que tenham sido possíveis, na década de 1970,

experiências como a da Escola de Artes Visuais e do Centro

Educacional de Niterói, no Rio de Janeiro e em Minas Gerais a

do Centro de Arte da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte

(...)”. (pág. 11)

Em consequência do estado de abandono em que se encontrava o

ensino da arte no Brasil, foi criado em 1977 pelo MEC o Prodiarte (Programa

de desenvolvimento integrado de Arte/educação), cujo objetivo era integrar a

cultura da comunidade com a escola, estabelecendo convênios com as

universidades e órgãos estaduais. Os estados em que o programa se destacou

foram: Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Paraíba.

1.1.4 Década de 1980

A partir da década de 1980 o ensino da arte se fortificou. Em

consequência foi criado no curso de pós-graduação em artes da USP a linha

de pesquisa em arte educação, que passou a oferecer cursos de

especialização, mestrado e doutorado. Outras iniciativas iguais a esta só viriam

a ocorrer a partir da década de 1990, quando universidades situadas em

outros estados brasileiros passaram a oferecer outras linhas de pesquisa em

ensino da arte. Outro fator que influenciou positivamente na qualidade do

pensamento sobre o ensino da arte foi a ação política desencadeada por

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vários congressos e festivais, que passaram a acontecer no Brasil a partir de

1983, destacando-se o festival de Ouro Preto e o Congresso sobre História do

ensino da arte, entre outros.

Com a criação dos novos cursos de pós-graduação verificou-se um

aumento na produção de pesquisas em arte/educação. Entre os temas

analisados destaca-se a questão da Proposta Triangular, que segundo a

definição de BARBOSA (2008, pág. 13) “... foi sistematizada a partir das

condições estéticas e culturais da pós-modernidade. A pós-modernidade em

arte/educação caracterizou-se pela entrada da imagem, sua decodificação e

interpretações na sala de aula junto à já conquistada expressividade”.

No Museu de Arte Contemporânea da USP, uma equipe composta de quatorze

arte/educadores, trabalhando principalmente com a estética empírica para a

leitura da obra de Arte, experimentou, entre os anos de 1987 a 1993, a

proposta triangular com crianças, adolescentes e adultos iletrados. Trabalhou-

se o conceito de educação inclusiva, criando um setor de exposições especiais

para cegos e deficientes físicos, que permite o exercício do tato em esculturas

e posteriormente em equivalências volumétricas de pinturas e desenhos.

Em 1997 o governo federal estabeleceu os PCN (Parâmetros

curriculares nacionais), que desconsideram o trabalho desenvolvido por Paulo

Freire na época em que atuou como secretário municipal de educação, que

promoveu uma revolução curricular. Da mesma forma a proposta triangular

ficou escondida na área de arte. Os PCNs não funcionaram conforme era

esperado, o que levou o governo a editar uma espécie de cartilha que

ensinavam a usar os PCNs, determinando entre outras regras qual imagem

deverá ser exibida para os alunos, bem como o tempo de exibição. “Um

autêntico exemplo da educação bancária que Paulo Freire tanto rejeitou”.

1.2. Arte – educação em museus

Os primeiros serviços educativos em museu foram organizados no Rio

de Janeiro, por Ecyla C. e Sígrid P. de Barros. Segundo BARBOSA (2008, pág.

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17) “no período dominado pelo modernismo, a criação de ateliês livres, oficinas

(...) ou atividades de animação cultural foi prática frequente nos grandes

museus com o MAM do Rio de Janeiro, que movimentou a cidade com os

Domingos de criação e com o ateliê livre de Ivan Serpa. Da mesma forma

como ocorreu no Rio de Janeiro, ateliês livres criados no Centro cultural e a

Pinacoteca de São Paulo foram experiências bem conduzidas. Com relação a

formação dos professores de arte, a partir do final da década de 1980 o

MAC/SP e o Lasar Segall foram muito influentes para esses profissionais,

introduzindo-os à condição pós-moderna.

Nestas duas instituições os ateliês voltados para crianças e

adolescentes se utilizavam de linguagens específicas para educar, como por

exemplo a gravura no caso do MAC, não sendo mais conduzidos pelo

expressionismo. Na década de 1990 o MASP recriou e alguns museus e

Centros Culturais criaram seu setor educacional, entre eles o MAM (RJ e SP),

MAC/Niterói, Centro Cultural Banco do Brasil (RJ e SP), Itaú Cultural, os

Museus de Belém, de Curitiba, de Belo Horizonte, de Florianópolis, entre

outros.

Um exame das atividades oferecidas, revela que algumas instituições

conduzem o olhar do visitante de acordo com um roteiro previamente

elaborado, mostrando-lhe somente aquilo que os monitores se prepararam

para falar. Ao invés desse tipo de conduta o ideal seria permitir ao visitante tirar

as suas próprias conclusões sobre o que está vendo.

Um bom exemplo desse tipo de proposta, segundo Ana Mae Barbosa (2008) é:

“A pedagogia questionadora usada pelo CCBB/SP em algumas

de suas exposições é muito apropriada. Em vez de visita

guiada, com informações fornecidas pelos monitores (ou

educadores) são propostas questões que exigem reflexão,

análise e interpretação sem que sejam evitadas informações

que esclarecem e/ou apoiam interpretações. Em outros casos

de educativos de museus a animação cultural predomina e

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funciona como instrumento de sedução, sem grande valor para

levar ao entendimento da arte. São os programas preferidos

pelos professores visitantes quando nada entendem de arte”.

(Pág. 18)

No caso das megaexposições, ocorre um terceiro caso no qual o setor

educacional dos museus e centros culturais ainda precisa se submeter às

determinações do curador da mostra. Neste caso o monitor funciona como um

mero reprodutor das ideias do curador, reproduzindo a informação que

recebeu muitas vezes sem entendê-las bem. Felizmente esse tipo de situação

ocorre com pouca frequência.

Ana Mae Barbosa (2008, pág. 18) destaca a importância de publicações

produzidas por museus e centros culturais, que ajudam na compreensão arte.

Um dos livros citados pela autora é De olho no MAC, publicado em 1992 e que

ajuda crianças e adultos iletrados na leitura da obra de arte.

O MAC e Sesc se distinguiram na produção de exposições para

crianças, destacando-se a mostra O Labirinto da moda, que foi considerada

bem idealizada e a melhor embasada teoricamente. A partir dessa mostra

passa a existir uma preocupação em preparar os monitores para a

compreensão da arte, e não apenas para explicar a exposição. Isso de dava

através de um curso bem planejado, que contava com presença de

profissionais da arte que ministravam aulas durante o período em que a

exposição estava ocorrendo, além de reuniões para discussão de textos. Em

1998, dois importantes cursos de arte-educação foram organizados pelo Sesc:

A Compreensão e o prazer da arte, que contou com a presença de

professores, especialistas e artistas que usam novas tecnologias em suas

obras.

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CAPÍTULO II

CONTRIBUIÇÕES DA ARTE NO PROCESSO

COGNITIVO

O ensino da arte vem desde a década de 1970 se constituindo, segundo

Azevedo (1997), como uma “questão socialmente problematizada”. O assunto

tem sido tema de várias pesquisas e tratado em abundância pela literatura

educacional brasileira, contando inclusive com um amplo movimento de

discussão institucionalizada sobre o campo denominado “arte – educação”.

Mas o que é arte – educação?

Segundo BARBOSA

“É todo e qualquer trabalho consciente para desenvolver a

relação de públicos (criança, comunidades, terceira idade etc.)

com a arte. Ensino de arte tem compromisso com continuidade

e currículo, quer seja educação formal ou informal. Arte

Educação foi o termo usado por meus mestres. Eu acrescentei

o hífen, Arte-Educação, no momento em que arte era recusada

pelos educadores, nos anos de sua introdução obrigatória no

currículo escolar, em torno de 1973-1974, para dar ideia de

diálogo e mútuo pertencimento entre as duas áreas. Na época,

meus mestres gostaram da ideia. Recentemente, em 2000, um

linguista nos aconselhou a usar a barra, pois este sinal, sim, é

que significa mútuo pertencimento. Tanto é assim que a barra

é muito usada em endereços de sites, quando um assunto

específico está dentro de outro mais amplo. Mas

Arte/Educação e ensino de arte são faces diferentes de uma

mesma moeda, a moeda concreta da intimidade com a arte”.

(extraído de um trecho da entrevista com Ana Mae Barbosa;

disponível em: http://pt.scribd.com/doc/53830501/arte-

educacao-lucio-teles-1, acessado em 18/07/2012)

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Nesse sentido, a arte educação tem se caracterizado como um campo

amplo de conhecimento que, durante a sua trajetória histórica e sócio

epistemológica, vem agregando diferentes estudos, os quais são frutos de

pesquisas científicas na área da arte e seu ensino, pesquisas artísticas e da

produção de conhecimento, através da prática de ensino experimental de arte,

na educação escolar e não-escolar.

Como campo de conhecimento empírico-conceitual, a arte – educação

tornou-se aberta a diferentes enfoques e vêm agregando uma diversificada

linha de atuação, estudo e pesquisa, tais como: a história do ensino de arte no

Brasil, a formação de professores para o ensino de arte, o ensino da arte na

educação escolar e não-escolar, o ensino inclusivo de arte, o ensino das artes

visuais, teatro/educação, entre outros.

Sobre o ensino da arte na educação escolar, diferentes estudos vêm

sendo realizados. A partir desses estudos diferentes tratamentos didáticos e

metodológicos foram encontrados, como por exemplo: produção de desenho,

pintura e atividades artísticas livres; realização de dramatizações didáticas;

realização de jogos teatrais e jogos dramáticos; ensino do desenho, dos

elementos da linguagem visual e a aplicação desses conteúdos a objetos;

releitura de obras de grandes artistas, entre outros.

Por trás de cada uma das atividades citadas existe uma concepção de

ensino de arte, que teve sua origem ao longo da trajetória histórica da arte

educação no Brasil, uma vez que essas são práticas que historicamente vêm

se afirmando na educação escolar.

Segundo Barbosa (2005), nos últimos anos a necessidade de

compreendermos a área de arte educação em relação à cultura que nos cerca

tem gerado muitos estudos importantes, entre eles os trabalhos realizados por

Räsänem (1998), Agirre (2000) e Eisner (2002). De um modo geral, esses

teóricos buscaram estabelecer quais as concepções de ensino de arte estão

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presentes nas práticas pedagógicas na contemporaneidade. O diagnóstico

realizado por esses pesquisadores estão relacionados aos seus contextos

sociais e históricos imediatos, isto é, referem-se ao ensino de arte

desenvolvido respectivamente na Finlândia, Espanha e Estados Unidos. No

entanto, como este fenômeno tem se caracterizado na realidade educacional

brasileira?

O principal objetivo desse capítulo é investigar se a Arte pode ser

considerada como um fio condutor do processo de aprendizagem e que

elementos metodológicos servem de pressupostos para esta visão de

educação. Sendo assim, como a Arte poderia contribuir para o

desenvolvimento deste novo enfoque educacional que está se apresentando

atualmente, visto que o ser humano, para que possa estar integrado a este

contexto, precisa ser competente, autônomo, pensar por si mesmo e ser capaz

de enfrentar todas as mudanças que chegam à nossa porta a todo o momento.

E a escola, o que tem a ver com tudo isso? Qual seria o seu papel e da

educação neste contexto atual: a reprodução de conhecimentos, o

desenvolvimento da autonomia ou das competências no ser humano?

Ao analisar a influência da Arte no processo da aprendizagem, surgem

perguntas que nos incentivam a buscar respostas a fim de compreender

melhor essa questão e nos viabiliza ir cada vez mais fundo em sua essência,

uma vez que a sua ligação com o ser humano é muito estreita, especialmente

no que se refere à valorização das potencialidades de cada indivíduo e o

respeito pelo seu processo de desenvolvimento.

Gardner, autor da teoria das inteligências múltiplas, afirma que os

primeiros conhecimentos realizados pelas crianças são de certa forma

intuitivos, pois, são construídos a partir das interações com objetos físicos e

com outras pessoas, adquirindo através de sistemas de percepções sensoriais

e interações motoras, estimuladas pelo mundo externo. Relações de causa-

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efeito, compreensões da natureza e da constituição de objetos e do mundo,

também dos números, formarão a base de teorias que surgirão depois. Neste

sentido, a criança passa por um processo de construção para a elaboração do

seu conhecimento baseada nas descobertas e experiências vividas.

Segundo Gardner (1999) existe a necessidade de se educar para o

desenvolvimento das pessoas num sentido amplo e global, percebendo-as

como um todo, isto é, há alguém que pensa, que investiga, que sente, que é

bom é de grande valia:

“Acredito que três preocupações muito importantes devem

animar a educação (...). Há o domínio da verdade – e seu

avesso, o que é falso ou indeterminável. Há o domínio da

beleza – e a sua ausência, em experiências e objetos que são

feios ou kitsch. E há o domínio da moralidade – o que

consideramos ser bom e o que consideramos ser maligno”.

(pág. 14 e 15)

Nesse sentido a Arte vem ganhando espaços cada vez maiores na

educação atual. Ao viabilizar caminhos para uma educação diferenciada, mais

coerente e reflexiva, irá contribuir para o desenvolvimento pleno das

potencialidades das pessoas, através do desenvolvimento de suas múltiplas

inteligências, ajudando-as a pensar por si mesmas, sendo capazes de

solucionar problemas e fazer escolhas a partir de normas estabelecidas

durante o processo de busca pelo conhecimento.

2.1. A Arte e sua importância no desenvolvimento da aprendizagem

Partindo do pressuposto que o homem pensa, vê, ouve, sente,

experimenta, e que o corpo é ação e pensamento, pode-se afirmar que cada

ser representa um todo em relação ao mundo que o cerca, pois precisa

interagir com o meio para que seja capaz de construir o seu conhecimento e

fazer novas descobertas.

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Neste sentido, o pensamento se dá na ação, na sensação, na

percepção, através do sentimento. Através deste processo de construção e de

descoberta do mundo, cada um vai ampliando seus horizontes de sonhos e

conhecimentos na relação com outras pessoas, com o mundo, com os objetos,

adquirindo com isso as percepções iniciais que influenciarão toda a sua

subsequente compreensão do seu contexto de vida.

Pensar no processo de fruir e conhecer a Arte é pensar no próprio

ensino de arte. Poetizar no sentido de se encantar com tudo que nos rodeia,

tornando-se capaz de criar, fantasiar. Já o fruir representa o momento da

descoberta como se fosse único e todo seu, e o conhecer seria a razão das

descobertas, das experiências. Portanto, ensinar arte significa pensar na leitura

e produção na linguagem da arte. Um modo único de despertar a consciência

e novos modos de sensibilidade, emoção e conhecimentos.

A educação em arte possibilita o desenvolvimento do pensamento

artístico e da percepção estética, que caracterizam um modo particular de

ordenar e dar sentido à experiência humana. Este componente curricular

oportuniza ao aluno a possibilidade de se relacionar de maneira criativa com as

demais disciplinas, tornando-o capaz de exercitar sua imaginação ao construir

textos, desenvolver estratégias pessoais na resolução de problemas, conhecer

outras culturas, além de perceber e valorizar a sua realidade cotidiana.

A arte convida todos os sentidos, como o tato, visão e audição, a se

abrirem e assim permitirem uma compreensão mais significativa das questões

sociais, valores que governam os diferentes tipos de relações entre os

indivíduos na sociedade. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais

(1998):

“O conhecimento da arte abre perspectivas para que o aluno

tenha uma compreensão do mundo na qual a dimensão

poética esteja presente: a arte ensina que é possível

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transformar continuamente a existência, que é preciso mudar

referências a cada momento, ser flexível. Isso quer dizer que

criar e conhecer são indissociáveis e a flexibilidade é condição

fundamental para aprender”. (pág.20 e 21)

A Arte como componente curricular precisa ser trabalhada

observando alguns critérios fundamentais, que são seus

campos fundamentais:

a) O conhecimento artístico como produção e fruição: O

conhecimento artístico não tem como objetivo definir leis e

compreender como as coisas são, nem mesmo conceituar

como elas se encontram ou se formaram. A intenção da arte é

que através das formas artísticas, combinações de imagens, a

criança possa ter o domínio do imaginário, da criatividade. A

produção neste sentido tem a intenção de desafiar o cotidiano

para revelar como as coisas que estão ao nosso redor

poderiam ser, expressando desta forma através da linguagem

da arte seus pensamentos, ideias, emoções. A obra de arte

apresenta o resultado da experiência humana, é o seu produto

histórico/cultural.

A fruição acontece no momento em que os espectadores ao

apreciarem uma obra de arte, posicionam-se e dão sentido e

significado às obras observadas. A significação, a

compreensão, está na interação entre o espectador e a obra

de arte. O conhecimento através da fruição se dá a partir das

relações significativas, das percepções das qualidades de

linhas, texturas, cores, sons, movimentos. O sentimento, a

intuição, a apropriação da obra de arte como elemento seu, faz

com que a criança perceba-se como sujeito parte daquele

contexto, conseguindo desta forma que ela possa imaginar-se

dentro deste processo, além de conceber ideias e situações

novas.

Tanto na produção quando na fruição – apreciação – estão

presentes habilidades de relacionar e solucionar questões

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propostas pela organização dos elementos que compõem as

formas artísticas. Conhecer arte envolve o exercício conjunto

do pensamento, da intuição, da sensibilidade e da imaginação.

b) conhecimento artístico como reflexão. Para que aconteça a

produção de sentidos e assim o enriquecimento do seu

conhecimento sobre a arte, é necessário que aconteça o

processo de investigação sobre o campo artístico como

atividade humana. É a partir deste momento que o

conhecimento que está sendo construído começa a ser

contextualizado no tempo, num sentido histórico, e no espaço.

“A experiência de refletir sobre a arte como objeto de

conhecimento, onde importam dados sobre a cultura em que o

trabalho artístico foi realizado, a história da arte e os elementos

e princípios formais que constituem a produção artística, tanto

de artistas quanto dos próprios alunos”. (pág.43 e 44).

O repensar no já pensado, que é o processo de reflexão, proporciona

uma aprendizagem rica em significados para o processo de construção do

conhecimento.

Aprender arte, nesta perspectiva envolve não apenas uma atividade de

produção artística, mas também a conquista da significação daquilo que é

feito, pelo desenvolvimento da percepção estética, tendo o contato com o

fenômeno artístico visto e estudado.

Este processo de aprendizagem leva ao desenvolvimento de

potencialidades, que podem contribuir para a capacidade de relacionar

conteúdos de outros componentes curriculares à construção do conhecimento.

Neste sentido, a maneira de ver, pensar e sentir o mundo, de se expor e

se posicionar nas mais diversas situações do dia-a-dia, fazem com que o

indivíduo comece a perceber ideias de formas diferentes.

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A Arte nos possibilita a junção entre pensamento e sentimento que nos

ajuda a significar o mundo. Assim, o ser humano é a soma de percepções

únicas que buscam o constante despertar, no sentido da constante busca do

conhecimento.

2.2. Arte e criatividade:

Dentro do processo ensino/aprendizagem em arte, busca-se o

desenvolvimento da imaginação, da capacidade crítica em relação ao mundo

em volta e da percepção, que adquire um significado mais amplo. Dessa

forma, também se amplia o conceito de criatividade. O processo criativo é

desenvolvido através do “fazer arte”, da leitura e interpretação do objeto ou

acontecimento artístico diante de sua contextualização. Segundo Ana Mae

Barbosa:

“Desconstruir para construir, selecionar, reelaborar, partir do

conhecido e modificá-lo de acordo com o contexto e a

necessidade são processos criadores, desenvolvidos pelo

fazer e ver Arte, fundamentais para a sobrevivência no mundo

cotidiano (BARBOSA, 2002, p.18)”.

Os conceitos de criatividade, originalidade e imaginação constituem o

núcleo da estética romântica que se formou no século XVIII. O conceito de

criatividade, remontando à Antigüidade, estava também associado à loucura,

pela sua natureza de irracionalidade, principalmente relacionado ao gênio na

criação artística. Outra concepção que encontra sua origem no pensamento do

século XVIII consiste em associar a capacidade criativa à imaginação. Esta

seria a livre associação de ideias obtida por inspiração e dom, que favorecia os

“gênios”, indivíduos de mente criativa, capazes de criar numa condição

diferenciada dos demais indivíduos.

A palavra imaginação foi empregada inicialmente, no século XVIII, como

um termo que compreendia a totalidade dos processos mentais. Porém, em

função da influência de valores clássicos, perpetuando oposições tradicionais,

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principalmente entre juízo e imaginação, o termo imaginação manteve a

correspondência com a faculdade formadora de imagens.

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte (1998)

“A imaginação criadora permite ao ser humano conceber

situações, fatos, ideias e sentimentos que se realizam como

imagens internas, a partir da articulação da linguagem. Essa

capacidade de formar imagens acompanha a evolução da

humanidade e o desenvolvimento de cada criança e

adolescente. Visualizar situações que não existem abre o

acesso a possibilidades que estão além da experiência

imediata”. (pág.34)

Neste sentido a imaginação é colocada na base da criação artística,

como mediadora entre o real e o sonho, a fantasia. Ela permite estabelecer

relações entre o mundo dos sentidos e a obra de arte. Como aponta Vygotsky

(1982), a imaginação criadora é motivada pela capacidade de fantasiar a

realidade:

“A imaginação criadora é resultante da capacidade de fantasiar

situações. O indivíduo irá criar segundo a sua capacidade de

imaginar e fantasiar com base numa série de fatores, entre

eles, a experiência acumulada, enquanto um produto de sua

época e seu ambiente.” (págs.31-32)

Percebe-se a forte influência que a imaginação e a fantasia exercem

sobre a atividade criadora, que irá ser desenvolvida a partir dos conhecimentos

construídos individualmente e socialmente, de forma tal que os estímulos do

meio ambiente atuam imperativamente sobre a capacidade imaginativa e

criativa de cada um. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte

(1998)

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“A emoção é movimento, a imaginação dá forma e densidade à

experiência de perceber, sentir e pensar, criando imagens

internas que se combinam para representar essa experiência.

A faculdade imaginativa está na raiz de qualquer processo de

conhecimento, seja científico, artístico ou técnico. A

flexibilidade é o atributo característico da afetividade

imaginativa, pois é o que permite exercitar inúmeras

composições entre imagens, para investigar possibilidades e

não apenas reproduzir relações conhecidas.

No caso do conhecimento artístico, o domínio do imaginário é o

lugar privilegiado de sua atuação: é no terreno das imagens

(forma, cor, som, gesto, palavra, movimento) que a arte realiza

sua força comunicativa.

A imaginação e a imagem são elementos indispensáveis na

apreensão dos conteúdos, possibilitando que a aprendizagem

estética se realize nos meios de conhecer de cada aluno e na

materialidade da linguagem artística”. (pág. 34 e 35)

A imaginação criadora é a fonte originária da criatividade e se dá

segundo fatores internos e externos ao indivíduo. A criatividade é entendida

enquanto campo interdisciplinar e que sugere a existência de novos

fenômenos, através da capacidade de investigar possibilidades e não apenas

reproduzir relações conhecidas.

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CAPÍTULO III

ESTRATÉGIAS NO CAMPO DA ARTE TENDO EM VISTA

CONCEBÊ-LA COMO MEDIADORA NA CONSTRUÇÃO

DO CONHECIMENTO

3.1. ARTE – EDUCAÇÃO COMO MEDIAÇÃO CULTURAL E SOCIAL

A prática da mediação cultural nas exposições de arte, atualmente é

bastante comum e diversos museus e centros culturais contam com um setor

educativo e com uma equipe exclusiva para atender o público visitante e

pensar em projetos que possam ressignificar seu acervo e suas mostras.

Inicialmente é necessário estabelecer o que entendemos por mediação

cultural. O conceito de mediação no campo da educação começa a fazer

sentido a partir das ideias sócio construtivistas em contraposição ao ideário da

educação tradicional. No entanto, como explica BARBOSA (2009):

“O conceito de educação como mediação vem sendo

construído ao longo dos séculos. Sócrates falava da educação

como parturição das ideias. Rousseau, John Dewey, Vygotsky

e muitos outros atribuíam à natureza, ao sujeito ou ao grupo

social o encargo da aprendizagem, funcionando o professor

como organizador, estimulador, questionador, aglutinador. O

professor mediador é tudo isso.” (pág.13)

Mediação, segundo Vigotsky (1978), acontece através dos artefatos

presentes nas relações do indivíduo com o mundo, tais como as diversas

formas de linguagens, as quais trazem consigo conceitos do contexto cultural

ao qual pertence o sujeito. Desta forma, ao tomarmos a Arte como forma de

linguagem, podemos tê-la como mediadora de relações entre o sujeito e sua

realidade. Mas ao tomarmos esta Arte como parte da realidade é que

encontramos o papel de um outro sujeito, o mediador, aquele que se coloca

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entre o fazer artístico, o processo criativo, e o apreciar e fruir, podendo ser

desta forma o próprio artista criador.

Para entendimento do conceito de mediação e, consequentemente, da

ideia do professor mediador, Ana Mae Barbosa convoca importantes

pensadores do ato educacional que atuaram em épocas e contextos diversos,

tendo em comum uma perspectiva democrática de educação.

Mais próximo de nossa época e de nosso contexto, Paulo Freire que

também bebia nessas mesmas fontes, defendia a ideia de que aprendemos

uns com os outros mediatizados pelo mundo. A complexidade desta

aparentemente simples constatação desmonta aquela lógica unidirecional do

ato educacional e convoca uma multi-lógica fundada no diálogo. O professor

mediador que organiza, estimula, questiona e aglutina em sua ação educativa

precisa considerar as relações de uns com os outros e as várias camadas

contextuais que o mundo nos oferece. Conforme Barbosa (2009) destaca:

“Segundo Paulo Freire, ninguém aprende sozinho e ninguém

ensina nada a ninguém; aprendemos uns com os outros

mediatizados pelo mundo. No século XX, o conceito de

educação como ensino passa a ser minimizado para dar lugar

a ideias socioconstrutivistas, que atribuem ao professor o papel

de mediar as relações dos aprendizes com o mundo que

devem conquistar pela cognição. A arte tem enorme

importância na mediação entre os seres humanos e o mundo,

apontando um papel de destaque para a arte-educação: ser a

mediação entre a arte e o público.” (pág. 13)

A arte com todas as suas linguagens e possibilidades pode ser um

campo fértil de mediação entre nós e o mundo. A arte – educação tem

enfrentado esta possibilidade desde que passou a considerar a arte como

conhecimento culturalmente situado como foco do processo de

ensinar/aprender arte. A proposta triangular traz a arte como cultura para o

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centro da ação educativa e considera as práticas de produção, de difusão e de

recepção em seus contextos e relações como dimensões da mediação cultural.

Aquele que atua em projetos baseados na cultura popular, por exemplo,

tem esta função de mediar Arte e indivíduo, de modo que estas manifestações,

que fazem parte de um contexto sócio-histórico e cultural, sejam propostas

como instrumentos construtores do conhecimento crítico daquele que é

pertencente ao contexto. E a partir do momento em que são formadores do

conhecimento, estes projetos devem ser abordados de forma consciente e

conscientizadora de toda uma realidade que vai além da manifestação, mas

possui uma história política, econômica e social. Segundo Barbosa (2009):

“O lugar experimental dessa mediação é o museu. Pensamos

nos museus como laboratórios de arte. Museus são

laboratórios de conhecimento de arte, tão fundamentais para a

aprendizagem da arte como os laboratórios de química o são

para a aprendizagem da química. Compete aos educadores

que levam seus alunos aos museus estender em oficinas,

ateliês e salas de aulas o que foi aprendido no museu.” (pág.

13)

As correntes contemporâneas de ensino de arte também contemplam

este campo não formal de arte-educação, obtendo fontes de pesquisa em

textos, pesquisas e materiais. Ainda segundo Barbosa (2009):

“Temos um campo aberto no Brasil, um campo abrangente em

formação no qual se entrecruzam diferentes áreas de

conhecimento. Interessante é perceber que a delimitação e o

desenho desse campo vêm se configurando sobretudo de

baixo para cima. Com as práticas de mediação buscam-se

teorias para fundamentar as experiências e, em razão da

necessidade de mediadores para a cena contemporânea, eles

próprios têm se organizado em cursos de aprofundamento e,

principalmente, investindo em formações em serviço. Em

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busca de suprir a ausência de formações específicas, as

formações em serviço, ou seja, os processos de formação que

acompanham o desenrolar dos trabalhos, configuram-se como

uma característica de nosso contexto.” (págs. 8 e 9)

O entendimento da mediação cultural, portanto, está neste texto

atrelado ao entendimento mais amplo de arte como cultura, da ação

educativa como prática dialógica e com o compromisso do educador

mediador com as dimensões políticas da práxis educacional. Obviamente, a

questão da mediação cultural pode ser entendida por outros pontos de vista

e outras bases político-conceituais. Os campos das práticas artísticas, de

sua difusão e recepção, são atravessados por várias questões calcadas em

posicionamentos, por uma série de representações que se naturalizaram ao

longo do tempo e que hoje merecem reflexões. Ao longo deste capítulo nos

debruçaremos sobre algumas importantes questões.

3.2. A mediação cultural em exposições de arte

Acompanhando tendências pós-modernas do ensino de arte, a vivência

educativa em exposições tem sido muito mais pautada em uma postura

reflexiva e construtiva. Por isso, no campo não formal da educação que

desempenham os museus e centros culturais hoje, o mediador não é aquele

que nos oferece dados e respostas, mas sim a figura que nos instiga a pensar

aproximações de nosso repertório em relação ao universo das imagens.

A noção de mediação cultural pressupõe, portanto, que no ato da

experiência, o momento da visita a uma exposição de arte, haja uma relação

dialética entre sujeito e objeto de conhecimento, e entre estes dois vértices, um

educador. O mediador posiciona-se como um contextualizador, ele promove o

encontro entre o repertório que o próprio público possui com as referências

imagéticas e teóricas que ele tem acerca do artista, da obra, do tema, do

enredo, dos aspectos formais, etc. Martins (2005) afirma que “A mediação

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pode ser compreendida como um encontro, mas não como qualquer encontro.

Um encontro sensível, atento ao outro”. (pág. 44)

Barbosa (2009) destaca que:

“Recentemente uma pesquisa demonstrou que o processo de

mediação mais eficiente se dá em exposições e museus.

Crianças de sete ou oito anos quando desenham dentro dos

museus, depois de verem uma exposição, rompem com o

esquema (linha de base abaixo e céu acima) mais

frequentemente do que quando desenham na escola de volta

dessa visita. Não se conhece pesquisa demonstrando que elas

desenham de modo diferente quando veem as obras originais

no museu e quando veem as obras em reprodução na sala de

aula. A hipótese é que há distinção, mas outros ainda podem

testá-la.” (pág. 14)

Quando os museus e campos culturais se viram diante da necessidade

de ter um membro de sua equipe responsável por receber o público, este

profissional era conhecido como guia. Ser um guia incumbia saber e decorar o

maior número de informações acerca de determinada obra ou tema. Ele era

aquele que ‘guiava’; ele passava informações e detalhamentos, conforme

Barbosa (2008) o termo “visita guiada pressupõe a cegueira do público e a

ignorância total”. (pág. 31)

A partir do momento em que aconteceu uma mudança, ou seja, o

profissional não determinava mais tantos limites para o espectador, mas o

comandava dentro do espaço, o posto passou a ser do monitor. O monitor era

aquele que concedia explicações, o que muitas vezes aniquilava as múltiplas

possibilidades de interpretações dos objetos artísticos. Cocchiarale (2006)

afirma que o público está em uma busca ansiosa pela explicação verbal de

obras reais e concretas, como se sem a palavra fosse-nos impossível entendê-

las. “A explicação assassina a fruição estética, já que ao reduzir a obra a uma

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explicação mata sua riqueza polissêmica e ambígua, direcionando-a num

sentido unívoco”. (pág. 14)

Sendo assim, o monitor era o profissional que determinava o percurso

da visita, os olhares e as percepções. Este, porém, também é um termo

preconceituoso, para Barbosa (2008) “(...) monitor é quem ajuda um professor

na sala de aula ou é o que veicula a imagem gerada no HD, no caso de

computadores. Atrelada à palavra, vai a significação de veículo e de falta de

autonomia e de poder próprio”. (pág. 30)

Em decorrência de uma ressignificação da arte, o educador de museus

precisou desdobrar e alterar sua posição diante do público. Assim surge o

mediador supracitado, aquele que relaciona, dialoga, atrai do espectador sua

própria contextualização daquela obra de arte. Cocchiarale (2006) assegura

que “O monitor, o educador, o mediador deve ser menos a pessoa que

transmita conteúdos e mais alguém que estimule o público a estabelecer

algumas relações de seu próprio modo”. (pág. 15)

Com esta mesma consciência é que deve atuar o mediador em qualquer

que seja a instância; seja diante de projetos sociais, educativos, culturais; seja

em instituições como escolas e universidades; seja em museus, pinacotecas,

exposições, etc. O seu papel é sim criar um elo entre espectador e criação,

mas um elo que, por mais que não seja imparcial (já que não se pode ignorar a

identidade do mediador), seja feito de modo que haja identificação entre

mensagem e receptor, de maneira contextualizada, consciente, crítica, criativa

e sensível. Segundo Barbosa (2009)

“O prestígio dos departamentos de educação dos museus de

arte é muito recente, embora ainda haja enorme resistência por

parte de curadores, críticos, historiadores e artistas à ideia do

museu como instituição educacional, o que os leva a

considerar os educadores profissionais de segunda categoria.

Nicholas Serota, diretor da Tate Gallery e da Tate Modern, vem

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defendendo o conceito mais contemporâneo e amplo de

educação em museus, que, para ele, não se restringe a um

departamento que lida com criança, escola, comunidade,

cursos para adultos e guias de exposições, entre outros. A

curadoria e o design das exposições também são

educação.”(pág. 14)

Compreende-se que enquanto mediador, o educador é muito mais um

propositor do que um depósito de informações e dados a ser despejado.

Conforme Martins (2005):

“O papel de um mediador é importante para a criação de

situações onde o encontro com a arte, como objeto de

conhecimento, possa ampliar a leitura e a compreensão do

mundo e da cultura. Capaz também de abrir diálogos internos,

enriquecidos pela socialização dos saberes e das perspectivas

pessoais e culturais de cada produtor/fruidor/aprendiz. Pois, o

objetivo maior não é propiciar contato para que todos os

aprendizes conheçam este ou aquele artista, mas sim que eles

possam perceber como o homem e a mulher, em tempos e

lugares diferentes, puderam falar de seus sonhos e seus

desejos, de sua cultura, de sua realidade, da natureza à sua

volta e de suas esperanças e desesperanças, de seu modo

singular de pesquisar a materialidade através da linguagem da

arte.” (pág. 17)

A prática da reflexão e de um provocador estético já é bastante

presente; ainda que a titulação seja lenta e a palavra monitor continue sendo

usada consecutivamente. Por mais que mediação já seja um termo de uso

comum, sobretudo no campo específico dos museus e espaços expositivos,

sempre é válido lembrar que este conceito provém de teorias de

desenvolvimento e aprendizagem da psicologia sócio-histórica.

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A arte-educação permite não apenas o conhecimento em arte e/ou

através da arte, mas o desenvolvimento de habilidades que vão além das

físicas, mas, sobretudo, ultrapassam barreiras da imaginação e da

compreensão multicultural por meio das obras de arte. Ela permite que o

indivíduo desenvolva suas capacidades criativas e de associação inter e

multidisciplinar de conhecimentos diversos ao seu contexto, proporcionando

um maior reconhecimento do meio e do outro através de uma relação que,

quando não se faz por meio da prática artística concreta, se faz através do

pensamento artístico.

3.3. A avaliação do processo de mediação em espaços culturais

Conforme a terminologia mediação trouxe para o ensino de arte

realizado em museus novas perspectivas de atuação, percebe-se que a

reflexão do processo é intrínseca e que a avaliação deve ser realizada de

forma sistemática. O exercício educativo realizado em exposições se enriquece

ao passar por um processo crítico de análise do trabalho desempenhado para

estar em constante modificação das ações e adaptação aos públicos.

Para tanto, podem ser adotadas diversas formas de avaliação da prática

do setor destinado ao ensino de arte. Conforme Luckesi apud Ferraz; Fusari

(1993, p. 121), a avaliação é um meio, e não um fim e é preciso que ela esteja

preocupada com uma transformação do ensino, e não com um julgamento de

valor deste ou daquele aprendizado. Estas formas de avaliação, portanto,

precisam ser embasadas dentro de uma perspectiva educacional e serem

analisadas constantemente buscando o retorno necessário.

De acordo com Barbosa (2009):

“Segundo Serota, Charles Eastlake, ao se tornar diretor da

National Gallery de Londres em 1855, conferiu aos museus o

papel de instituições públicas com o objetivo eminentemente

educacional, simplesmente adotando uma nova forma de expor

diferente do mero vestir paredes. Ele estabeleceu a política de

pendurar as pinturas por ordem cronológica, ilustrando escolas

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de pintura (quatrocento, primitivos italianos e outras).

Transformou os museus de arte de gabinetes de tesouros em

livros de História da arte. Naquela época, aprendia-se História

da arte decorando as datas de nascimento e morte dos

artistas, o inventário de suas obras, a localização delas e as

características das diferentes escolas.” (pág. 14)

A temática da avaliação, porém, é ainda pouco trabalhada no campo da

arte-educação em geral. Mais agravante é a situação quando se pensa na

avaliação do ensino de arte não formal. Conforme Barbosa (2009):

“Precisamos de pesquisas que avaliem os melhores

procedimentos para atingir os objetivos educacionais de hoje,

que se concentram principalmente na flexibilidade de pensar e

agir, na capacidade de elaborar em direção à melhor qualidade

de vida no planeta e no aprender a aprender. Há uma rejeição

a avaliação no Brasil, em especial no terceiro setor, em que os

belos discursos muitas vezes escondem o autoritarismo

castrador do pensamento.” (pág. 22)

Os resultados da pesquisa ampliariam as possibilidades de refletir

acerca da avaliação dentro do sistema acadêmico, mas também retornariam

conclusões, dados e possibilidades para a mediação em seu próprio campo,

na prática; criando fontes de pesquisa. Barbosa (2009) cita Marques dizendo

que:

“(...) é pelo caminho da pesquisa e da avaliação que se pode

desenvolver o enorme potencial educativo das exposições de

arte e dos museus para o entendimento do mundo que nos

cerca, da cultura do nosso país e do fortalecimento do ego

cultural dos excluídos.” (pág. 22)

Segundo investigação realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica

Aplicada do Ministério da Cultura, no que tratam das características de

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consumo e oferta cultural, 78% dos brasileiros nunca vão a museus e 83% das

pessoas das classes D e E não frequenta este tipo de instituição. Estes

números apresentam dados muito críticos que evidenciam a falta de hábito dos

brasileiros de ter acesso a ambientes ligados à cultura.

Neste sentido que o mediador de museus pode articular à sua prática a

função de um formador de público, visto que desta estatística a maior parte

dos espectadores só têm acesso aos museus por meio da escola. Thistlewood

(1999) defende a presença de um educador dentro dos espaços culturais e

reforça o papel social do museu dizendo que é importante compreender o

enorme potencial dos museus de arte como condensadores culturais. (pág.

153)

Várias influências de todo o mundo têm sido sintetizadas neles, a ponto

de os museus de arte de hoje (...) serem uma mistura de palácio, monumento

popular, academia, laboratório propriedade pública e casa da moeda. Nesse

sentido não é uma instituição que os estudantes (ou qualquer outro cidadão)

sejam displicentemente introduzidos, porque será impossível ignorar seu

conteúdo cultural. A introdução ao museu de arte e o seu acervo deve ser

orientada, isto é, acompanhada de instrução.

A respeito da ausência de frequência por parte da maior parte da

população a estes espaços culturais, Bourdieu (2007) afirma que os museus

abrigam preciosos objetos artísticos que se encontram, paradoxalmente,

acessíveis a todos, porém interditados à maioria das pessoas. O sociólogo

comenta ainda que a inacessibilidade seja provocada pela falta de instrução do

público em geral e evidencia a falta do habitus culto – conceito próprio de

Bourdieu (1989) – e que não permite o leigo reconhecer o valor daquele objeto

colocado no contexto específico.

A fim de diminuir esta lacuna que existe no habitus culto dentro do

espaço dos museus, a figura do mediador pode representar um importante

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papel ao proporcionar um diálogo entre os repertórios trazidos pelo público e o

conhecimento que possui, oferecendo assim uma atividade de troca. Para

Thistlewood (1999) “existem essencialmente dois caminhos para encorajar a

frequência aos museus de arte, mas qualquer que seja a escolha é inevitável a

responsabilidade educacional”. (pág. 147)

Assim sendo, o educador de museus pode ser uma figura encorajadora

de acesso aos bens culturais expostos. Franz (2001) afirma que:

“Diante de obras de arte, mais do que dar respostas, ele [o

mediador] deve ensinar a fazer boas perguntas, a

problematizar, ele deve levar o aluno a mobilizar seu próprio

potencial em torno da obra apresentada”. (pág. 53)

Desta forma, os agentes mediadores colocam-se entre as

referências/expectativas, o professor, o público e a obra, relacionando,

dialogando e propondo um contato diferenciado com a arte.

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CONCLUSÃO

Chegamos ao final desse trabalho, no qual defendemos a tese de que

a arte – educação pode ser usada como um instrumento de mediação cultural,

apoiados na análise de livros que tratam dos temas que foram abordados.

Para isso, ensaiamos nessa monografia um conjunto de conceitos, que foram

aqui avaliados para tentar reuní-los – já que vêm de campos e experiências

diferentes – e fazê-los funcionar num contexto educacional.

Partimos dessa premissa para buscar entender de que maneira a arte

pode contribuir para a construção de conhecimentos significativos na

educação. Para isso, procuramos compreender a estrutura da arte – educação

a partir do referencial teórico citado, que aborda o desenvolvimento da

imaginação, da curiosidade, da expressão, da cognição e da criatividade

através do fazer com a arte, bem como investigar a aplicabilidade da

interdisciplinaridade no processo de ensino e aprendizagem em arte.

A educação, responsável pelo desenvolvimento social e cognitivo do

sujeito, pode utilizar-se da arte para auxiliar nesse processo. A arte – educação

contribui na construção do conhecimento, onde oportuniza ao indivíduo o

domínio das diversas linguagens.

Estamos vivendo um momento no qual a arte configura-se numa área

do conhecimento que, pelo fato de poder adaptar e adaptar-se aos diversos

fatores sócio - econômicos, políticos, históricos e culturais, é capaz de articular

a interação de outras áreas,.

O ensino da arte proporciona a criticidade, estimula o desenvolvimento

do indivíduo e interage de forma lúdica e espontânea no cotidiano. Através do

ensino com arte, o estudante desenvolve o prazer em aprender e a

desenvolver seu cognitivo através do olhar observador.

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Conclui-se que, exercer a mediação não se trata apenas de uma

função de apoio, mas de instrução e incentivo de educar o olhar descobridor,

curioso e indagante. A comunicação com o público visitante do museu ocorre

por meio de exposições que buscam motivá-los e envolvê-los emocional e

intelectualmente.

O Mediador por meio do diálogo torna amplo o olhar do observador a

respeito da Arte e suas Visualidades, e também dos ambientes em que ela

pode ser apreciada e observada.

A expectativa do visitante em relação ao museu é um fator importante

no processo de aprendizagem que estes espaços podem proporcionar.

Conhecer o que o visitante sabe sobre o museu, o que espera encontrar na

visita e como a mediação influencia no alcance destas expectativas parece ser

um elemento de grande contribuição para a elaboração de novas exposições e

atividade educativas.

Através da mediação é possível potencializar as relações entre os

conteúdos específicos e o significado destes para os jovens, de modo que

contribuam para sua aprendizagem sobre artes e educação, entretanto, com o

cuidado de não estabelecer dependência completa da mediação, aspecto mais

característico da escola, principal contexto de educação formal.

A mediação, embora sendo um tema em debate, representa para

muitos curadores a forma encontrada para proporcionar o aprendizado quando

são estabelecidos objetivos educacionais bem definidos em uma exposição. O

papel da mediação deve estar presente nas discussões quando se propõe

elaborar novas atividades cujo objetivo seja contribuir para a educação de

jovens estudantes.

A prática da atividade de Mediador, não é uma tarefa simples, mas é

possível de ser realizada. Fazer com que o observador interaja e compreenda

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as imagens de uma forma diferente a que está habituado; essa prática o torna

mais interessado, reflexivo e frequentador de espaços destinados a Arte, como

está acontecendo no espaço que motivou essa pesquisa, o CCBB/RJ.

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BIBLIOGRAFIA CITADA

1 – http://pt.scrib.com/doc/53830501/arte-educação-lucio-teles-1. Trecho da

entrevista com Ana Mae Barbosa. Acessado em 18/07/2012.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

A Arte e seu ensino no Brasil 11

1.1 – Ensino da arte no Brasil - História 14

1.1.1 – As Escolas especializadas em arte para 15

crianças

1.1.2 – Arte que valoriza a livre expressão da criança 16

1.1.3 – O golpe militar de 1964 17

1.1.4 – Década de 1980 19

1.2 – Arte – educação em museus 20

CAPÍTULO II

Contribuições da arte no processo 23

cognitivo

2.1 – A Arte e sua importância no desenvolvimento 26

da aprendizagem

2.2 – Arte e criatividade 30

CAPÍTULO III

Estratégias no campo da arte tendo em vista 33

Concebê-la como mediadora na construção do

conhecimento

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3.1 – Arte – educação como mediação cultural e 33

social

3.2 – A mediação cultural em exposições de arte 36

3.3 – A avaliação do processo de mediação em espaços 40

culturais

CONCLUSÃO 44

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 47

BIBLIOGRAFIA CITADA 49

ÍNDICE 50