universidade candido mendes pÓs-graduaÇÃo lato … · (pós-graduado - lato senso) em direito...

81
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU INSTITUTO A VEZ DO MESTRE Advocacia Empresarial Preventiva: Da Legal Due Diligence e Auditoria Jurídica Societária e Contratual como meio de mitigar riscos. Por: Demetrius dos Santos Ramos Orientador Prof. Ms.Francis Rajzman Rio de Janeiro 2010

Upload: trandang

Post on 19-Nov-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

Advocacia Empresarial Preventiva: Da Legal Due Diligence e

Auditoria Jurídica Societária e Contratual como meio de mitigar

riscos.

Por: Demetrius dos Santos Ramos

Orientador

Prof. Ms.Francis Rajzman

Rio de Janeiro

2010

Page 2: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

1

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

Advocacia Empresarial Preventiva: Da Legal Due Diligence e

Auditoria Jurídica Societária e Contratual como meio de mitigar

riscos.

Monografia apresentada ao Instituto A Vez do Mestre

– Universidade Candido Mendes, como requisito

parcial para a obtenção do título de Especialista

(Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e

dos Negócios.

Por: Demetrius dos Santos Ramos.

Page 3: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

2

RESUMO

O presente estudo tem por finalidade trazer à baila a necessidade da

implementação da Advocacia corporativa nas empresas com o fito de propiciar

uma melhor gestão aos negócios por ela celebrados, seja nos momentos de

uma fusão, cisão, incorporação de uma sociedade por outra, seja num momento

de reestruturação societária, na celebração de contratos, acordos e convênios

com terceiros e a administração pública, seja para salvaguardar os interesses

de todas as classes de acionistas visando uma maior aplicação dos modernos

conceitos de governança corporativa no tipo societário das companhias

fechadas e sociedades limitadas, analisando e conceituando o que é uma legal

due diligence societária, bem como abordando alguns dos aspectos

componentes do direito societário como o capital social, órgãos sociais, forma

de deliberações, acordos de acionistas, acordo de cotistas, sempre

demonstrando a necessidade de se manter um componente de auditoria jurídica

atuante junto às empresas, mitigando riscos e adotando as práticas necessárias

a maior lisura e consecução dos objetivos da sociedade, em conformidade com

os ditames legais, bem como a análise dos principais institutos das relações

obrigacionais instituídos pela nova ordem Civil-Constitucional regentes dos

contratos, findando com a análise dos principais contratos de fomento mercantil.

Palavras-chaves: legal due diligence; auditoria; direito societário e contratual.

Page 4: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

3

A Nilsa, companheira e fonte de inspiração e serenidade sempre; Lucas, espero ser merecedor de seu orgulho e admiração.

Page 5: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

4

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 05 1 - O CONCEITO DE LEGAL DUE DILIGENCE 07 2 – DA AUDITORIA SOCIETÁRIA 12

2.1 – DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS 14

2.1.1 – Das companhias 18 3 – DOS LIVROS SOCIAIS 26 4 – DO CAPITAL SOCIAL 27 5 – DOS ÓRGÃOS SOCIAIS 31

5.1 – DA ASSEMBLEIA GERAL 32 5.2 – DA DIRETORIA 37

6 – DOS ACORDOS DE ACIONISTAS 43 7 – DOS ASPECTOS CONTRATUAIS 45 8 – CONTRATO DE CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO (CCB) E DE FACTORING 59 8.1 – AS CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO (CCB)

NOS CONTRATOS DE ABERTURA DE CRÉDITO E SUAS CONTROVÉRSIAS 59

8.1.1 – Da Constitucionalidade Da Cédula De Crédito Bancário 61

8.2 – CONTRATOS DE FATURIZAÇÃO (FACTORING) E A LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS

EM 12% A.A 68

CONCLUSÃO 71 BIBLIOGRAFIA 75

Page 6: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

5

INTRODUÇÃO

Este trabalho foi realizado como requisito parcial a obtenção do título de

especialista em Direito Empresarial e dos Negócios do Instituto “A Vez do

Mestre” em convênio com a Universidade Cândido Mendes, cuja temática

aborda a “Advocacia Empresarial Preventiva: Da Legal Due Diligence e

Auditoria Jurídica Societária e Contratual como meio de mitigar riscos”.

Nesse sentido reside o interesse e consequente motivação em elaborar

esta investigação que emergiu nas discussões em sala de aula como tema

sugerido pela Ilustre Mestre Professora Ieda Tatiana Cury, tendo em vista o

aumento de fusões, aquisições, cisões, aberturas de capital de sociedades e

outras operações com o fito de fomentar a economia nacional e atingir os

objetivos dos envolvidos, bem como de experiências profissionais no exercício

da advocacia preventiva junto às instituições financeiras, abordando

precipuamente a análise dos documentos societários de empresas que tomam

crédito, alguns comentários sobre a formalização de contratos e assessoria na

tomada da decisão da concessão do crédito.

Tendo em vista estas considerações, os objetivos imediatos desta

pesquisa são: identificar na doutrina existente aspectos capazes de nortear a

análise dos documentos necessários a adequada regularidade das sociedades e

as melhores práticas contratuais, considerando o que os doutrinadores

descrevem e informam, além de captar os enfoques, as tendências e

jurisprudências e prioridades sobre o tema abordado, focando na demonstração

da necessidade do componente jurídico corporativo, assessorando, de maneira

preventiva como meio de mitigar riscos, desta forma buscar-se-á responder as

seguintes questões: Por que proceder a uma legal due diligence ou uma

auditoria jurídica societário e/ou contratual? E, os procedimentos

supramencionados podem mitigar riscos?

Tentar-se-á explicitar sobre o tema apoiado na legislação existente, ainda

que de forma analógica, através de uma pesquisa bibliográfica e em conceitos

fundamentados no método dialógico confrontando idéias doutrinárias de autores

Page 7: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

6

distintos, com o intuito de fomentar a atividade da advocacia preventiva como

órgão componente das sociedades em todas as atividades desenvolvidas pela

sociedade, visando o esclarecimento com a conseqüente mitigação de riscos

que podem advir de suas operações sendo demonstrada a necessidade de uma

legal Due diligence societária e/ou contratual ou auditoria jurídica como forma

de nortear os investimentos, bem como auxiliar e orientar os administradores

das sociedads na busca por uma melhor governança corporativa como forma de

se alcançar os objetivos pretendidos com o menor custo e risco possíveis

tornando-se o auditor legal, por todos os seus fundamentos, indispensável ao

bom andamento dos negócios.

Assim, no capítulo 1 discorrer-se-á sobre a origem e o conceito adotados

para definir a legal due diligence e a auditoria jurídica, em seguida serão

realizados alguns apontamentos sobre a auditoria societária, na sequência

alguns dos requisitos formais dos tipos societários, objeto do presente estudo,

passando desde a formação de seu capital social, até aos órgãos sociais –

assembleia geral e diretoria findando com a análise dos acordos de acionistas,

onde, ao final, será apresentada uma sugestão de check-list, para orientar aos

interessados num ponto de partida sobre a auditoria jurídica societária e

contratual. Com relação a parte contratual buscar-se-á o que de mais moderno

preleciona a doutrina com enfoque Civil-Constitucional analisando dois dos

principais tipos contratuais utilizados na captação de crédito no mercado, bem

como da análise da boa-fé objetiva e seus deveres anexos.

Page 8: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

7

1 - O CONCEITO DE LEGAL DUE DILIGENCE

Alguns autores informam que a terminologia due diligence, apesar de

apresentar-se como expressão anglo-saxônica, tem sua primeira aplicação,

conforme hoje entendida, no Direito Romano derivando da expressão diligentia

quam suis rebus, “a diligência de um cidadão em gerenciar suas coisas”1,

sendo, muitos anos após sua provável origem, aplicada para designar, na

prática empresarial, uma análise profunda da “‟saúde” jurídica, econômica,

financeira, social, ambiental, etc... de uma pessoa jurídica, ou seja, em todas as

suas vertentes, orientando compradores, vendedores e principalmente

investidores em procedimentos de aquisição, fusão, cisão, abertura e

fechamento de capital, privatizações e joint ventures, dentre outras possíveis,

sendo, todavia, as citadas que mais se utilizam dessa prática.

Ainda sobre a conceituação o Prof. Jayme Roso2 esclarece e

veementemente rechaça a simplória tradução de que due diligence é o “dever

de diligência” ou “dever de cautela” como alguns especialistas costumam

conceituar, conforme abaixo se segue:

Pois bem o clássico Black‟s Law Dictionary (5ª edição) conceituou: “due diligence é uma medida de prudência, ou atividade ou assiduidade, como se pode esperar, e normalmente é feita por, de um homem razoável e prudente, em determinadas circunstâncias; não mensurada por qualquer padrão absoluto, mas dependendo de fatos relativos de um caso especial” A terminologia jurídica conceitual no regime anglo-saxão ainda utiliza o raciocínio construtivo da sintaxe latina medieval, daí a dificuldade com que se deparam os colegas que não tiveram a oportunidade de ingressar no mundo maravilhoso da língua de Virgílio, ao terem que interpretar e, sobretudo, traduzir termos jurídicos complexos.

1 SANTOS, Thiago Carvalho. A importância da Due diligence no universo empresarial. Disponível em: http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1153 Acesso em: 28/05/2009; 2 ROSO, Jayme Vita. A Due Diligence na Joint Venture. Disponível em: http://www.auditoriajurídica.com.br/artigos.php?cod=3 Acesso em: 28/05/2009;

Page 9: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

8

A Due Diligence consiste em procedimento detalhado multidisciplinar de

investigação, coleta de dados e informações seguindo roteiro pré-estabelecido,

racional e metodológico com vistas a embasar parecer estritamente técnico,

apresentando uma “radiografia” do momento estudado da empresa para que as

partes interessadas possam tomar suas decisões cientes dos riscos envolvidos

na operação.

Como parte integrante de uma Due Diligence, está inserida a legal due

diligence, voltada à análise da parte legal da empresa estudada, focando, com

o perdão da redundância, os aspectos jurídicos envolvidos nas mais variadas

disciplinas do direito, dentre as quais se destacam, as áreas societária,

trabalhista, tributária, contratual, concorrencial, consumidor, ambiental e

administrativa regulatória (no caso de atividades dependentes de autorização e

fiscalização pelo governo).

No presente estudo os termos legal due diligence e auditoria jurídica,

apesar da dicotomia apresentada pelo ilustre Prof. e doutrinador Jayme Vita

Roso3 - um dos pioneiros sobre o tema no Brasil – que informa ser a auditoria

jurídica gênero da Due diligence, esta última tendo por escopo nortear e opinar

sobre as melhores práticas a serem adotadas para a consecução dos objetivos

almejados em uma operação envolvendo interesses empresariais, enquanto que

a auditoria jurídica visa apenas analisar e relatar os documentos e dados

determinados, apresentando um parecer conclusivo. Data maxima venia a

expertise do ilustre doutrinador, ousar-se-á em utilizar como sinonímias as

expressões, dado o intuito pedagógico que o presente trabalho se propõe.

Assim, nos dizeres de GUIMARÃES4, Auditoria é o “ato de examinar as

operações de uma associação, empresa, privada ou pública emitindo parecer

sobre elas com sugestões.”

3 VITA ROSO, Jayme. O valor agregado dos contratos internacionais de transferência de tecnologia: o novo Código Civil brasileiro e o rol do auditor jurídico. Disponível em: http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=599 Acesso em: 28/05/2009; 4 GUMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. 6ª ed. rev. e atual. São Paulo: Rideel, 2004, pág. 106;

Page 10: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

9

O termo auditoria tem sua maior aplicabilidade na área contábil, haja vista

que, até o presente estudo, ainda não foi regulada a auditoria jurídica em nosso

ordenamento jurídico, apesar de já haver projeto de lei sob o nº 6.854 de 2006,

da autoria do Deputado Raul Jungman5 (PPS-PE) junto ao Congresso Nacional,

dispondo ser a auditoria jurídica atividade privativa de advogado, com a

alteração do art. 1º da lei. 8.906, de 04 de julho de 1994, que dispõe sobre o

Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil, descrevendo na

exposição de motivos que “A auditoria jurídica exercida por advogados é

atividade hodierna, que deve não só ser estimulada, como exercitada por

profissionais qualificados e ter chancela da OAB, que precisa regulamentá-la”.

Nesse projeto, que está em consonância com o pensamento do professor

Jayme Roso6, consta a definição muito próxima da defendida pelo douto autor,

para o qual:

“Auditoria Jurídica é trabalho que pode ser desempenhado unicamente por advogado no regular exercício da profissão, mediante contratação prévia e escrita, dentro dos cometimentos conferidos por lei, destinada a operar a revisão de processos de qualquer natureza ou proceder à avaliação de uma ou plúrimas situações concretas que lhe são apresentadas, no âmbito da advocacia, para emitir, concluído o trabalho, nas duas hipóteses, com observância dos princípios éticos e legais, parecer vinculante.”

Sobre a responsabilidade do advogado que emitir parecer em auditoria

jurídica sugere-se a aplicação das mesmas sanções já previstas no Estatuto da

5 JUNGMAN, Raul. projeto de lei 6.854 de 2006, Altera o artigo 1º da Lei nº 8.906, de 04 de julho de 1994, que “dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB.” Disponível em: http://www.camara.gov.br/sileg/integras/385714.pdf acesso em 29/05/2009. 6 VITA ROSO, Jayme. Auditoria jurídica para a sociedade democrática. São Paulo: Escolas Profissionais Salesianas, 2001. Pág 44. apud in VITA ROSO, Jayme. Poderá a auditoria jurídica servir de aopio à governabilidade das instituições? Disponível em: http://www.auditoriajurídica.com.br/artigos.php?cod=5 Acesso em 05/05/2009;

Page 11: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

10

OAB, destacando sempre que a atividade exercida é de meio, e não de fim7, ou

seja, tem por finalidade orientar e demonstrar os pontos críticos àqueles que

contrataram o seu serviço, cabendo a avaliação de concretizar o negócio ou não

ao administrador, diferentemente da prevista no art. 8º, § 6º da LSA, onde há

responsabilidade do Avaliador e subscritor pelos danos causados por culpa ( lato

senso) devidamente apurada e demonstrada, sendo certo que, conforme

proposto pelo professor Roso, deve nortear todo o trabalho a ética e a

probidade necessárias e esperadas do operador do direito.

De forma analógica, tendo em vista a lacuna existente em nosso

ordenamento, pode-se utilizar o conceito trazido pela Lei nº. 6.385/19768 que

regula os mercados de capitais e criou a Comissão de valores Mobiliários

(CVM) e no que o Conspícuo Professor Nelson Eizirik9 - citando em paráfrase

Nelson Luiz G. F. Pinto e Marco Antônia G. Torres - descreve como dever de

diligência, em parecer sobre a responsabilidade civil e administrativa do

avaliador de empresas, no âmbito da lei de sociedades anônimas e mercado de

capitais:

“O dever de diligência, em todos os ramos do direito que a ele se referem, é usualmente empregado como uma consagração do standard do bonus pater familiae, que significa que cabe ao agente, no desenvolvimento de suas atividades, empregar o zelo e o cuidado que o tipo médio ou homem comum utilizaria na condução dos seus próprios negócios. No entanto, em se tratando de responsabilidade pelo exercício de atividade profissional, entende-se que o dever de diligência

7 Sobre o tema ler o artigo do Professor e Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Nagib Slaibi Filho intitulado “A obrigação de diligência e a responsabilidade civil do profissional liberal” Disponível em: http://www.tj.rj.gov.br/institucional/dir_gerais/dgcon/pdf/artigos/respo_civil/nagib_slaibi.pdf. Acesso em: 28/05/2009; 8 Art. 26. (...) §2º - As empresas de auditoria contábil ou auditores contábeis independentes responderão, civilmente, pelos prejuízos que causarem a terceiros em virtude de culpa ou dolo no exercício das funções previstas neste artigo; 9 EIZIRIK, Nelson. Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, pág. 210-211;

Page 12: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

11

não se exaure na observância da conduta do homem médio, exigindo-se do agente o comportamento que seria esperado do bom profissional na atividade por ele desenvolvida. Assim, a disciplina da responsabilidade de auditores e contadores obriga-os a atender aos Standards da profissão, responsabilizando-os pelos prejuízos causados caso deixem de proceder com a habilidade e diligência que um profissional razoavelmente competente e cauteloso procederia (...) Logo, o primeiro requisito que o avaliador deve atender para evitar a possibilidade de vir a ser obrigado a ressarcir eventuais prejuízos é atuar com a habilidade e perícia que normalmente se espera de um profissional competente.” (grifo nosso)

Bem como consagrado na lei 8.906/94 que em seu artigo 3210 define a

responsabilização do advogado, quando demonstrado o dolo ou culpa no

exercício de seu mister.

Assim, conforme preleciona a melhor doutrina sobre o tema, o Professor

e Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Sergio Cavalieri

Filho11 descreve que:

Não é obrigado o advogado a aceitar uma causa, mas, se firmar contrato com o cliente, assume obrigação de meio, e não de resultado, já que não se compromete a ganhá-la, nem a absolver o acusado. A sua obrigação é defendê-lo com o máximo de atenção, diligência e técnica, sem qualquer responsabilidade pelo sucesso ou insucesso da causa. Consequentemente, não há presunção de culpa nessa espécie de responsabilidade, a despeito de ser contratual. O cliente só poderá responsabilizar o advogado pelo insucesso da demanda provando que ele obrou com dolo ou culpa. (grifo nosso)

É com base nestes entendimentos que o presente estudo será

desenvolvido com a estipulação de alguns pontos críticos e a determinação de

check-list’s pontuais para se iniciar uma auditoria jurídica preventiva, destacando

10 Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa. 11 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. – 7ª. ed. São Paulo: Atlas, 2007 – pág. 377;

Page 13: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

12

que a grande maioria dos autores descrevem a due diligence apenas como o

procedimento preparatório utilizado principalmente em operações de abertura de

capital (IPO – initial ofert), fusão, incorporação e aquisição de empresas (M&A

– merger and agreement), conforme já citado, destacando que limitar-se-á a

discussão apenas de alguns aspectos societários e contratuais, sendo certo que

uma auditoria jurídica completa açambarca quase todos os ramos do direito

com vistas a um parecer o mais completo possível, por isso tal atividade em

regra é desenvolvida por grandes escritórios, capazes de agregarem todos os

ramos do direito, bem como diversas outras áreas, ainda por se tratar a due

diligence de procedimento multidisciplinar, conforme já exposto acima.

2 – DA AUDITORIA SOCIETÁRIA

Vista pelos escassos autores do tema12, em uma ordem cronológica de

trabalho, como a primordial das auditorias a ser realizada dentro das empresas,

sendo que a auditoria societária tem por objetivo à identificação, organização e

avaliação dos documentos relativos à constituição e devida regularidade dos

atos sociais de uma empresa, observando o que algumas leis determinam,

especificamente para a exploração de determinadas atividades empresariais,

será necessário que se revistam de um tipo societário específico, assim, por

exemplo, de acordo com o artigo 25 da Lei 4.595/64, que dispõe sobre a

política e as instituições monetárias, bancárias e creditícias, com exceção das

cooperativas de crédito, as instituições financeiras constituir-se-ão unicamente

sob o tipo de sociedade anônima13.

12 NEJM, Edmundo e BRUNA, Sérgio Varella apud in ASSUMPÇÃO, Antônio Augusto Francia ET AL in ABRAHAM, Marcus (org.) – Manual de Auditoria Jurídica - Legal Due Diligence: uma visão multidisciplinar no Direito Empresarial Brasileiro. São Paulo: Quartier Latin, 2008, pág. 25; 13 Art. 25. As instituições financeiras privadas, exceto as cooperativas de crédito, constituir -se-ão unicamente sob a forma de sociedade anônima, devendo a totalidade de seu capital com direito a voto ser representada por ações nominativas;

Page 14: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

13

Desta forma não serão analisados todos os tipos societários, pois não

se enquadram nos objetivos do presente estudo, sendo analisado apenas o tipo

societário regulado na Lei. 6.404/76 que dispõe sobre as sociedades por ações,

também, conhecida como Lei das Sociedades Anônimas (LSA).

Ainda buscando conceituar a auditoria societária seu objeto e

procedimento, Edmundo Nejm e Sérgio Varella Bruna14 descrevem, de forma

sucinta, ser:

“Avaliação dos atos constitutivos da empresa e do seu estado perante os órgãos de registro do comércio, a fim de que possam ser identificados eventuais entraves à operação em andamento, bem como a análise de seus livros societários, com vistas a verificação da regularidade dos atos neles registrados. No tocante as empresas de capital aberto, devem também ser verificados: os registros na comissão de Valores Mobiliários e Bolsa de Valores; a emissão de títulos pela empresa auditada; as ofertas públicas eventualmente realizadas; a conduta da companhia quanto à observância dos direitos minoritários”

Ressalta-se que os efeitos buscados em virtude da auditoria jurídica

elaborada podem ser imediatos ou a longo prazo, haja vista que passa a ser

ferramenta fundamental na assessoria aos diretores das companhias na busca

de maior proficiência e dos princípios mais avançados da governança

corporativa, desta forma, Lucas Alexandre Barquette15, em ensaio publicado no

CONPENDI, descreve sucintamente sobre a necessidade e expectativas dos

administradores ao utilizarem-se da auditoria jurídica como meio de viabilizar o

sucesso do negócio.

A visão do uso da auditoria jurídica para o sucesso de um empreendimento pode ter alcance imediato ou a longo prazo. Para saber o momento certo de utilizar essa estratégia, é necessário estudar, avaliar e mapear o negócio, buscando definir e reconhecer os fatores de riscos a serem evitados, identificar e

14 Opus cit. pág. 26; 15 BARQUETTE, Lucas Alexandre. O uso estratégico da auditoria jurídica para o sucesso do negócio. Disponível em: www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/brasilia/16_373.pdf Acesso em: 29/05/2009.

Page 15: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

14

reconhecer os erros. A partir desse ponto será preciso estabelecer diretrizes e traçar metodologias que serão aplicadas por meio do planejamento jurídico estratégico traçado pelo auditor-advogado, voltado para a maximização dos resultados empresariais e para a diminuição dos riscos, contingências e passivos verificados no caso concreto.

Dada a complexidade do presente estudo, analisar-se-á apenas o tipo

societários citados, ficando os demais tipos societários como sugestão de

elaboração de futuro estudo complementar.

2.1 – DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS

Regulada pela lei 6.404/76 as sociedades anônimas são definidas pelo

Prof. Fran Martins16 da seguinte forma:

“Sociedade anônima é a sociedade em que o capital é dividido em ações, limitando-se a responsabilidade do sócio ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas. Essas sociedades têm um modo de constituição próprio e seu funcionamento está condicionado a normas estabelecidas na lei ou no estatuto. São consideradas sociedades institucionais ou normativas e não contratuais, já que nenhum contrato liga os sócios entre-si. As sociedades anônimas em regra são reguladas por lei específica.”

No mesmo sentido é o pensamento do Insigne Professor Modesto

Carvalhosa17, in verbis:

“Como pessoa jurídica de direito privado, de natureza mercantil, em que o capital se divide em ações de livre negociabilidade, limitando-se a responsabilidade dos subscritores ou acionistas ao preço de emissão das ações por eles subscritas ou adquiridas”

16 MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial: empresa comercial, empresários individuais, microempresa, sociedades comerciais, fundo de comércio. ed. rev.e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1999, pág. 229; 17 CARVALHOSA, Modesto, Apud in ASSUMPÇÃO, Antônio Augusto Francia ET AL, opus cit. Passim;

Page 16: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

15

Neste sentir pode-se classificar com base na melhor doutrina que a

sociedade anônima possui as seguintes características:

1. Capital social dividido em ações transferíveis;

2. Sociedade de capitais e não de pessoas;

3. Responsabilidade dos acionistas limitada ao preço de emissão das ações

adquiridas ou subscritas;

4. Seu caráter sempre será empresarial por força da lei, independente do

objeto social;

5. Possibilidade de subscrição do seu capital social por oferta pública.

Apenas para esclarecer cada ponto o capital social é dividido em ações,

que têm a capacidade de circulação autônoma, quando se tratar de companhia

aberta ou quando não houver limitação de oferta aos atuais acionistas.

As ações podem ser ordinárias, preferenciais ou de fruição, conforme os

direitos e privilégios de cada espécie – cabe destaque nesse ponto para as

golden share que são ações de classe especial criadas pela lei 8.031/1991 e

posteriormente mantidas pela lei 9.491/1997 e finalmente incluídas na LSA

através da Lei 10.303/2001 com a inclusão do parágrafo 7º no artigo 1718,

utilizadas no âmbito dos processos de privatização, onde tais ações conferem

poderes especiais para que o ente desestatizante possa intervir, conforme

prévia estipulação, inicialmente apenas com relação ao direito de veto,

posteriormente de determinadas matérias, sempre que as decisões sociais

fossem de interesse público, também previamente descritas no Estatuto Social -

no que se refere à circulação ou transferência serão sempre nominativas seja

18 Art. 17 – As preferências ou vantagens das ações preferenciais podem consistir: (...) §7º. Nas companhias objeto de desestatização poderá ser criada ação preferencial de classe especial, de propriedade exclusiva do ente desestatizante, à qual o estatuto social poderá conferir os poderes que especificar, inclusive o poder de veto às deliberações da assembléia geral nas matérias que especificar. *§ 7º acrescido pela Lei nº 10.303, de 31/10/2001.

Page 17: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé
Page 18: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé
Page 19: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

18

subscrição e/ou integralização do capital social diretamente pelos seus

fundadores de forma particular

2.1.1 – Das companhias

As sociedades anônimas podem também ser classificadas como

Companhias Abertas ou Fechadas, sendo tal distinção pacífica na doutrina no

que se refere à admissão de suas ações e demais valores mobiliários à

negociação através do mercado de balcão ou, de forma secundária, na Bolsa de

Valores.

O Professor Tavares Borba21, ao enfrentar tal distinção nos afirma que:

Conforme já ressaltado, o que imprime a uma sociedade anônima a condição de companhia aberta é a admissão e seus valores mobiliários às negociações de mercado. Para tanto, impõe-se o registro da empresa na CVM (art. 21 da lei 6.385/76), quer para negociação na Bolsa, quer para negociação no mercado de balcão. A CVM (art. 4º, §3º da lei 6.404/76) poderá classificar as companhias abertas em categorias, fixando exigências diversas para cada categoria. O simples registro, só por si, transforma a companhia fechada em aberta. (...) Ainda que nenhum título da sociedade tenha ido ao mercado, a formalidade do registro já a torna uma companhia aberta.

Rubens Requião22, grande “mestre dos mestres”, ao tratar sobre a

distinção entre as duas espécies de sociedade anônima enfaticamente

preleciona que:

É fácil compreender a profunda distinção, de princípios e de finalidades, entre a sociedade anônima fechada, de estilo

, § 1º. Qualquer que seja o objeto, a companhia é mercantil e se rege pelas leis e usos do comércio. 21 BORBA, José Edwald Tavares. Direito Societário. 10ª ed. rev. aum. e atual.. Rio e Janeiro: Renovar, 2007, pág. 165; 22 REQUIÃO, Rubens, Apud in BERTOLDI, Marcelo M. Curso avançado de direito comercial. 4ª ed. ver. atual. e ampl. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, 2008, pág. 231;

Page 20: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

19

comum, e a sociedade anônima aberta. Enquanto a sociedade fechada se rege por regras da autonomia da vontade, consagradoras dos interesses privatistas e egoísticos de seus sócios, objetivando sobretudo o lucro pessoal, a sociedade anônima aberta objetiva outros interesses ligados ao mercado, no qual atua desde a colheita de recursos para a sua constituição e, posteriormente, para se autofinanciamento. Suas ações inundam o mercado alimentando os pregões das bolsas, onde são cotadas, ensejando outros tantos negócios lucrativos, aos quais são estranhas as sociedades anônimas fechadas.

Coadunando com o mesmo entendimento o Professor Fran Martins23,

ainda descreve um fato muito típico referente às companhias fechadas ao trazer

à baila a chamada sociedade anônima de capital fechado com estrutura familiar:

Não se deve confundir a companhia fechada com a chamada sociedade familiar. Esta é sempre uma sociedade fechada, ficando, porém, as suas ações em poder dos membros de uma mesma família ou de pessoas muito aproximadas dessas; por isso essas ações não são negociadas nas bolsas ou no mercado de balcão, isto é, não são as ações oferecidas à venda ao público em geral. Pode existir uma sociedade não-familiar, com grande número de ações, que será considerada fechada se as suas ações não forem oferecidas ao grande público, por intermédio das bolsas ou do mercado de balcão.

Há ainda autores que citam as companhias fechadas intuitu personae,

onde cláusulas limitativas da circulação das ações prevalecem no estatuto

social, conforme o artigo 36 e seu parágrafo único da LSA, sendo certo que

neste tipo societário, em regra, também é relevante a pessoa do sócio-

acionista.

Desta forma Maria Bernadete Miranda24 em artigo publicado na internet

discorre sobre tema tão intrigante e representativo da realidade das companhias

fechadas brasileiras e esclarece que:

23 Opus Cit. Pág 237; 24 MIRANDA, Maria Bernadete. Restrições à Circulação de Ações em Companhia Fechada. Disponível em: http://www.direitobrasil.adv.br/arquivospdf/artigos/artigo3.pdf. Acesso em 25/05/2009;

Page 21: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

20

As “sociedades anônimas de pessoas” apresentam, certas características próprias, que as distinguem das demais companhias, tais como: 1 - limitação à circulação das ações, seja no estatuto, seja em acordo de acionistas; 2 - quorum deliberativo mais elevado do que o legal, para certas e determinadas questões, tanto na assembleia geral, quanto no conselho de deliberação, o que equivale à atribuição de um poder de voto à minoria; 3 - a distribuição equitativa dos cargos administrativos entre os grupos associados; 4 - a solução arbitral dos litígios societários. Na Europa Continental e na América Latina, a possibilidade jurídica das “sociedades anônimas de pessoas” está ligada à mais larga admissão da validade jurídica e da execução específica de estipulações em acordo de acionistas, como é o caso da nossa Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976.

Ainda conclui, através dos institutos da fidelidade e da confiança,

componentes da affectio societatis,25 que trata-se do elemento subjetivo

fundamental a constituição de uma sociedade de pessoas significando a

vontade, ânimo de constituir uma sociedade e empreender para o seu sucesso,

largamente utilizados na sociedades limitadas e nas sociedades onde a

responsabilidade dos sócios é, em regra, ilimitada, ao afirmar que:

Há, assim, dois elementos componentes da “affectio ou bona fides societatis”, representativos do duplo aspecto dessa relação: a fidelidade e a confiança. A fidelidade é o escrupuloso respeito à palavra dada e ao entendimento recíproco que presidiu à constituição da sociedade, ainda que o quadro social se haja alterado, mesmo completamente. E a confiança é também um dever do sócio para com os demais, dever este de tratá-los não como contrapartes, num contrato bilateral em que cada qual persegue interesses individuais, mas como colaboradores na realização de um interesse comum. Portanto não nos resta dúvida que essa característica de contrato de boa fé varou os séculos e marca ainda, as nossas “sociedades de pessoas”, mesmo revestidas da forma acionária.

25 Ibid.

Page 22: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

21

Outro ponto crucial para a escolha pelo tipo societário de companhia

fechada reside no alto custo de manutenção e exacerbada fiscalização por parte

da Comissão de Valore Mobiliários (CVM), considerados também como os

principais fatores motivadores do fechamento de capital de companhias abertas,

como por exemplo os altos custos com a publicação de demonstrativos

financeiros (art. 176, §1º da LSA); os custos de manutenção de um conselho de

administração, que nas companhias fechadas não é obrigatório (art. 138, §2º da

LSA interpretação a contrario senso); os consideráveis gastos necessários para

o cumprimento do requisito obrigatório, nas companhias abertas, no que se

refere às auditorias independentes (art. 177, §3º da LSA); os custos com a

manutenção do registro junto à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) (art. 4º

e §§ da LSA); o custo com a publicação de fatos relevantes, convocações,

publicações em jornal de grande circulação e na mídia oficial para assembléias

gerais, arquivamento de inúmeros atos na respectiva Junta Comercial, além de

outras formalidades determinadas na lei e nas normas expedidas pela CVM ,

sobre o tema elucida de forma objetiva Lídice Marques da Silva Xavier26,

acrescentando sobre a fiscalização realizada pela CVM:

Não só a nebulosa atmosfera do mercado de capitais, cuja purificação é objetivo da moderna legislação, como também diversos outros fatores podem ser apontados como motivação do fechamento do capital. Nessa linha, podemos citar: (...) Fiscalização: Não rara a tentativa de evitar intensa fiscalização da CVM nas companhias, exercida por força de lei, bem como a incidência de normas jurídicas impostas por essa autarquia, tais como o disclosure, obrigatoriedade de oferta pública para aquisição de ações, e diversas outras.

26 XAVIER, Lídice Marques da Silva. Fechamento de capital das companhias abertas in Revista de Direito empresarial IBMEC, vol. 3. Pág. 49;

Page 23: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

22

Em contrapartida as companhias abertas tem como seu principal atrativo

a possibilidade de seus valores mobiliários poderem ser negociados no mercado

de capitais, desta forma, como bem nos ensina Eizirik27:

A função econômica essencial do mercado de capitais é a de permitir às empresas, mediante a emissão pública de seus valores mobiliários, a captação de recurso não exigíveis para o financiamento de seu projetos de investimento ou mesmo para alongar o prazo de suas dívidas; como não se tratam de empréstimos, a companhia não está obrigada a devolver os recursos aos investidores (...), mas, isto sim a remunerá-los, sob a forma de dividendos, caso apresente lucros em suas demonstrações financeiras.

Cabe destacar que são valores mobiliários passíveis de negociação no

Mercado Financeiro, além das ações todos os descritos nos incisos do art. 2º

da Lei 6.385/1976, que dispões sobre o mercado de valores mobiliários e cria a

CVM.

Após essa brevíssima explanação sobre as sociedades anônimas e sua

classificação inicial, passar-se-á aos atos necessários a regular constituição

desse tipo societário, assim sendo, e de acordo com a doutrina são três as

etapas que envolvem a constituição de uma Sociedade anônima, definidas como

providências preliminares, constituição propriamente dita e providências

complementares.

No artigo 80 e 81 da LSA estão descritas as providências preliminares

quais sejam:

1. Subscrição por pelo menos duas pessoas de todas as ações em

que se divide o capital social fixado no estatuto;

2. Realização, entrada, de pelo menos 10% (dez por cento) do preço

de emissão das ações subscritas em dinheiro, e

3. Depósito junto a uma instituição financeira autorizada pela CVM da

parte do capital realizado em dinheiro.

27 EIZIRIK, Nelson; GAAL, Ariádna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de Freitas. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 2. ed. rev. e atual.- Rio de Janeiro: Renovar, 2008, pág. 8

Page 24: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

23

Nos artigos 82 a 93 a constituição propriamente dita e seus requisitos,

quais sejam:

1. O registro de emissão (específico de companhias abertas);

2. Projeto de estatuto;

3. Prospecto (específico para companhias abertas);

4. Lista, boletim de entrada;

5. Convocação de assembleia e assembleia de constituição;

6. Requisitos para constituição por subscrição particular (específico

para companhias fechadas) e

7. Demais providências;

E nos artigos 94 a 99 as providências complementares, quais sejam:

1. Arquivamento e publicação dos atos das companhias constituídas

por assembleia ou escritura pública;

2. Sobre os atos do registro do comércio;

3. Publicações e transferência de bens e

4. Responsabilidade dos primeiros administradores.

Destarte tais providências, cumpre ao auditor jurídico verificar se todos

os requisitos determinados na legislação foram cumpridos, bem como da

regularidade do estatuto social que deve conter as diretrizes e condições

básicas da empresa, sendo necessários alguns requisitos obrigatórios no

Estatuto Social, conforme nos esclarece o professor Tavares Borba28:

O estatuto deverá dispor sobre a denominação e o domicílio da sociedade, o capital e as características das ações, a administração da sociedade, as assembleias-gerais, as demonstrações financeiras, a distribuição do lucro, a duração da sociedade e a forma de liquidação, bem como sobre tudo o mais que for considerado relevante. Constitui o estatuto a lei interna da sociedade, funcionando como corpo normativo da atuação social e como instrumento de polarização dos acionistas, através de seus direitos e obrigações.

28 Opus Cit. Pág. 213;

Page 25: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé
Page 26: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

25

o Eleição dos membros do conselho de administração ou

diretores, indicando a respectiva qualificação completa e o

prazo de gestão;

o Fixação dos honorários dos administradores e dos

conselheiros fiscais; fecho da ata (com assinatura de todos

os subscritores e o visto do advogado)

No caso de se utilizar a constituição por escritura pública esta deve ser

assinada por todos os subscritores, contendo necessariamente a qualificação

dos subscritores; o estatuto social; a relação das ações tomadas pelos

subscritores e as importâncias pagas sob forma de entrada; a transcrição do

recibo de depósito do valor correspondente a 10% (dez por cento) do preço das

ações subscritas em dinheiro; transcrição do laudo de avaliação dos peritos no

caso de subscrição do capital com bens e a nomeação dos primeiros

administradores e, quando for o caso, dos fiscais, tudo na forma do artigo 88, §

2º da LSA.

Ressaltando que tanto na subscrição através da assembleia geral ou por

escritura particular é requisito formal o visto por um advogado.

Em seguida devem ser observados os requisitos complementares, que se

referem em regra ao arquivamento e publicação dos atos constitutivos.

Para que a sociedade possa adquirir personalidade jurídica será

necessário que seus atos constitutivos sejam levados a registro na Junta

Comercial competente, por exemplo no caso de instituições financeiras há

necessidade de autorização governamental, na forma da lei 4.595//64. Somente

depois de cumpridas as exigências advindas do órgão regulador é que será

possível o registro da companhia na Junta Comercial competente para que

então a sociedade possa exercer suas atividades adquirindo personalidade

jurídica.

Na forma do art. 36 da lei 8.934/94 a empresa deve levar a registro no

prazo de 30 (trinta) dias os atos constitutivos da empresa, nesse caso os

efeitos do registro retroagirão ao dia da sua constituição efetivamente.

Page 27: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé
Page 28: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé
Page 29: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

28

4 – DO CAPITAL SOCIAL

Trata-se dos bens que compõem ou que foram repassados ou subscritos

pelos acionistas de acordo com o número e tipo de ações por estes adquiridas,

são o montante pecuniário transferido do patrimônio de cada acionista para a

formação de acervo próprio da companhia.

Apesar de redundante, necessário se faz esclarecer que o capital social

será divida em ações que por sua vez podem ser dividida em três espécies,

conforme já explicitado, sendo elas Ordinárias, Preferenciais ou de Fruição, esta

última uma variação dos outros dois tipos citados, sendo que tais espécies

também podem ser divididas em classes distintas, como por exemplo, ação

preferencial da classe A, B ou C, etc.

No que tange as ações ordinárias as classes poderão ser estabelecidas,

conforme disponham sobre:

1. Sua possibilidade de conversão em ações da espécie preferencial;

2. Exigência de nacionalidade brasileira do acionistas; ou

3. Direito de voto em separado para o preenchimento de

determinados cargos de órgãos administrativos.

Destaca-se que para a mudança estatutária das classes das ações

ordinárias será necessária a concordância de todos os titulares das ações

atingidas, caso estas alterações não estejam reguladas no estatuto social.

No que se refere as ações preferenciais, as classes podem ser

estabelecidas, conforme o tipo de privilégio assegurado para cada classe, por

exemplo na prioridade de distribuição de dividendo, fixo ou mínimo, o direito de

eleger, em votação separada um ou mais membros dos órgãos de

administração, dentre outros possíveis.

Destarte ressaltar que uma companhia fechada poderá ter a composição

de capital social dividido da seguinte forma, por exemplo: 50% (cinquenta por

cento) das ações emitidas na espécie preferenciais de quaisquer classes com

restrição do direito de voto, e cinquenta por cento de ações Ordinárias de

Page 30: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

29

quaisquer classes no máximo, conforme determina o artigo 15, §2º da LSA.

Destacando apenas que esta é apenas uma das formas de divisão que capital

social pode assumir, podendo, entretanto ser composto exclusivamente por

ações ordinárias, ou por percentual inferior a 50% (cinqüenta por cento) de

ações preferenciais.

Para o doutrinador Waldirio Bulgarelli31 o capital social constitui-se numa

fictio juris, citando Brunetti, conforme abaixo:

O capital social constitui-se numa fictio juris concebida para a salvaguarda dos credores sociais, sendo tutelado por duas séries de normas, uma regulando a constituição da sociedade, a fim de que o valor efetivo do patrimônio inicial não seja inferior ao capital social e outra visando a integridade do capital durante a vida da sociedade.

Complementa o Insigne Professor e Advogado Nelson Eizirik32 que “o

Capital social constitui uma noção construída na prática mercantil para

possibilitar a garantia dos credores e o funcionamento da empresa.”

Num primeiro momento o capital social, conforme já esclarecido,

corresponde à totalidade do patrimônio da sociedade se já totalmente

integralizado no momento de sua criação, posteriormente com a movimentação

empresarial e a consecução de seu objeto social, o patrimônio tende a se

distanciar do capital social, que em regra é intangível, e mantém-se inalterado,

enquanto que o patrimônio poderá crescer ou diminuir conforme os resultados

dos negócios da companhia.

Desta forma nos dizeres do Professor e Doutrinador Nelson Eizirik33:

31 BULGARELLI, Waldirio apud in ADIERS, Leandro Bittencourt. Função e natureza jurídica das demonstrações financeiras. Caráter constitutivo das decisões assembleares tomadas por órgãos das sociedades anônimas. A ação reguladora e princípios essenciais vinculadores de companhias abertas com valores mobiliários no mercado de capitais. Imposições da ordem Constitucional Econômica. Prazos de prescrição na leis das Sociedades Anônimas in Revista de Direito empresarial IBMEC, vol. 3. Pág. 26; 32 Opus Cit, pág. 303; 33 Ibid;

Page 31: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

30

O capital social, formado pela contribuição dos sócios e pelas reservas, é representado por uma cifra constante do estatuto social, somente podendo ser alterado pela assembleia geral nas hipóteses previstas em lei. O capital, que tem uma existência de direito, não de fato, evidentemente não se confunde com o patrimônio, formado pelo conjunto de bens, direitos e obrigações da empresa; o capital constitui um valor estático, ao passo que o patrimônio é dinâmico, por excelência, sofrendo mutações.

A intangibilidade se refere ao fato de que “os acionistas não poderão

receber, a título de dividendos, os recursos apontados à sociedade sobre a

rubrica de capitalização” 34.

Em casos específicos o capital social poderá sofrer mutações, o artigo

166 da LSA determina que o capital poderá ser aumentado:

1. por deliberação da assembleia geral ou do Conselho de

Administração, observado o que dispuser o estatuto, nos caso de

emissão de ações dentro do limite autorizado no estatuto (trata-se

de aplicação da modalidade de companhia de capital autorizado,

onde é definido no estatuto a mutação do capital social, de forma

previamente estabelecida, sem a necessidade de alteração

estatutária);

2. Por conversão, em ações, de debêntures ou partes beneficiárias,

pelo exercício de direitos conferidos por bônus de subscrição, ou

de opção de compra de ações;

3. por deliberação da assembleia geral extraordinária convocada

para decidir sobre a reforma do estatuto social, no caso de

inexistir autorização para aumento ou de estar a mesma esgotada,

integralizando parte das chamadas reservas de capital

(obedecendo a previsão estabelecida para o item 1) e

4. Poderá também ser aumentado mediante subscrição de novas

ações, na forma do artigo 170 da LSA, somente após a realização

34 BERTOLDI, 2008, opus cit. pág. 241;

Page 32: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

31

de pelo menos ¾ do capital social, destacando que o preço

dessas novas emissões deverá ser fixado sem diluição injustificada

das participações dos acionistas antigos, bem como deve lhes ser

preferencialmente oferecidas para subscrição as ações recém-

criadas, dentro de um prazo nunca inferior a trinta dias.

Para a redução do capital social devem ser observados os requisitos

expostos no artigo 173 e seus §§ da LSA, tais hipóteses são classificadas como

redução voluntária e redução compulsória, que nos dizeres de CARVALHOSA,

200935 são assim definidas:

A redução voluntária depende da deliberação da assembleia geral. Mesmo havendo capital excessivo ou perdas consideráveis, a ponto de se recomendar a medida, não é a assembleia geral obrigada a promovê-la, nem a acatar proposta que a respeito, eventualmente, façam os administradores. Também na redução compulsória, a deliberação é da competência da assembleia geral. Só que, neste caso, trata-se não propriamente de deliberação, mas de homologação de proposta que, por dever legal, devem fazer os administradores. Serão os casos de não-substituição de acionistas cujas ações tenham sido reembolsadas (art. 45) ou quando não forem encontrados compradores para as ações caídas em comisso (art. 107).

Nesses casos específicos, devem ser cumpridas várias formalidades

prescritas no artigo 173 e seguintes da LSA, bem como a da publicidade desse

ato, haja vista o interesse dos fornecedores ou terceiros com quem a sociedade

contraiu obrigações que devem ser protegidos, pois com tal procedimento parte

da liquidez apresentada num primeiro momento da celebração de um contrato

35 CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas, Lei nº 6.404 de 15 de dezembro de 1976, com as modificações das Leis n. 9.457, de 5 de maio de 1997, 10.303, de 31 de outubro de 2001, e 11.638 , de 28 de dezembro de 2007. 4ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, pág. 606;

Page 33: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

32

de fornecimento de materiais ou de financiamentos junto a instituições

financeiras que basearam-se, primária ou secundariamente neste número.

5 – DOS ÓRGÃOS SOCIAIS

Existe a previsão na Lei da Sociedades Anônimas de quatro órgãos

deliberativos, quais sejam:

1. Assembleia Geral (artigos 121-127 da LSA dentre outras

passagens);

2. Conselho de Administração (artigos 138-142 da LSA; órgão

facultativo nas companhias fechadas);

3. Diretoria (Artigos 143-160) e

4. Conselho Fiscal (Artigos 161-165; órgão facultativo nas

companhias fechadas).

Tais órgãos, dada a complexidade envolvida no tema, são merecedores

de estudo mais aprofundado de suas atribuições, restando no caso concreto

análise por parte do auditor da competência dos atos celebrados por cada

órgão da sociedade, se as decisões foram tomadas nos limites dos poderes

estabelecidos para cada órgão, dos requisitos necessários para a validade das

decisões tomadas, como no que se refere aos quoruns estabelecidos na lei ou

no Estatuto Social, a responsabilidade civil, administrativa e penal dos

administradores no caso de atos contrários ao objeto social ou que atentem

contra a companhia, conflitos de agências, obrigatoriedade de aprovação das

contas e etc.

Trata-se, pois, de parte estritamente formal na análise casuística a ser

feita pelo auditor, que deve verificar cada ato societário celebrado, bem como

da sua regularidade junto à companhia, acionistas, terceiros e órgãos Estatais,

conforme o caso.

Page 34: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

33

Neste sentir, passar-se-á ao estudo dos dois principais órgãos

societários indispensáveis a qualquer tipo de sociedade anônima, seja ela

companhia fechada ou aberta, a assembleia geral e a diretoria.

5.1 – DA ASSEMBLEIA GERAL

O principal órgão societário é a assembleia geral de acionistas cujo

funcionamento está regulado, principalmente Capítulo XI, dos artigos121 a 136

da LSA, além de outras passagens constantes em toda a lei, que, conforme os

ensinamentos de Bertoldi36 que discorre com a segurança, que lhe é peculiar,

afirmando que: “a assembleia geral é o órgão deliberativo de mais alto grau na

sociedade anônima, cabendo a ela deliberar sobre todos os assuntos da

companhia, desde os mais corriqueiros até aqueles de maior relevância.”

As assembleias são divididas em duas espécies no que tange a sua

competência definida na LSA: Assembleias gerais ordinárias e assembleias

gerais extraordinárias.

Serão ordinárias as assembleias quando tiverem por objeto as matérias

listadas no art. 132 da LSA e extraordinárias as demais, conforme está disposto

no artigo 131 da LSA.

Cabe ao Advogado auditor a verificação dos atos societários celebrados

pela assembleia geral, tanto ordinária quanto extraordinária, alguns quesitos

formais, como a assinatura no livro de presença por parte dos acionistas; a

escolha do presidente e do secretário pelos acionistas presentes; se a sua

convocação cumpriu os ditames previstos na lei, principalmente no que se refere

aos prazos para convocação; se os quóruns previstos tanto no estatuto, quando

não contrários à lei, bem como os definidos na própria LSA, foram cumpridos,

como por exemplo para a instalação em primeira convocação da A.G.E onde

será necessária a presença de no mínimo dois terços dos acionistas, outras

previstas no art. 136 necessitam de quorum qualificado para aprovação das

36 Opus Cit. Pág 313;

Page 35: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

34

matérias ali contidas, etc; se as suas decisões foram devidamente publicadas,

arquivadas e registradas nos livros e órgãos competentes; observar, conforme o

caso as peculiaridades de cada tipo societário, conforme dispõe o próprio artigo

133, §4º e 5º da LSA.

Ponto que deve ser analisado de forma criteriosa refere-se à aprovação

sem reservas das demonstrações financeiras pela assembleia geral Ordinária,

que possui várias especificidades, como a necessidade da disponibilização ou

publicação com antecedência de ao menos um mês de relatório da

administração sobre os negócios sociais e principais fatos administrativos do

exercício findo; cópia das demonstrações financeiras; quando for o caso,

parecer dos auditores independentes sobre as contas da companhia e demais

documentos pertinentes constantes da ordem do dia.

Haja vista que a lei acaba por orientar erroneamente ao leitor desavisado

de que trata-se de requisito formal para a propositura da ação de

responsabilidade seja a assembleia geral ordinária que aprovou as

demonstrações financeiras e as contas da companhia sem reservas aos

administradores anulada judicialmente para posteriormente propor-se a ação de

responsabilidade. Tal equívoco, conforme os ensinamentos do Professor

Carvalhosa37 não são passiveis de questionamento haja vista a dispensabilidade

de tal requisito quando a ação proposta revestir-se de caráter ut singuli:

Ora, se fundamento da ação de responsabilidade é precisamente o vício (art. 158), mesmo que haja aprovação, sem reserva, pela assembleia geral, não fica absolutamente o acionista minoritário impedido de propor ação social ut singuli contra os administradores por fraude nas demonstrações financeiras e suas contas.

Concluindo seu pensamento, Carvalhosa38 esclarece que tal requisito

também não encontra fundamento ação ut universi proposta pela própria

empresa, ou substitutivamente por acionista conforme abaixo:

37 Opus cit. Pág 398-399; 38 Ibid;

Page 36: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

35

Isto porque deliberando a assembleia geral acionar os administradores, estará obviamente retificando sua deliberação anterior de aprovação das contas daqueles, já que o pressuposto é o da existência de fraude. Logo, a deliberação de agir contra os administradores, para responsabilizá-los, automaticamente anula a deliberação anterior de aprovação sem ressalvas. (...) Por tudo isso, conclui-se que não tem qualquer fundamento a interpretação de que primeiro deve-se anular judicialmente a deliberação da assembleia geral, para depois ingressar com ação de responsabilidade.

Sobre o tema citado segue abaixo transcrição da ementa de processo

onde a Desembargadora Celia Meliga Pessoa discorre sobre os pricípios

estudados, conforme se segue:

2009.001.04369 - APELACAO

DES. CELIA MELIGA PESSOA - Julgamento: 07/04/2009 - DECIMA OITAVA CAMARA CIVEL

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO EMPRESARIAL. SOCIEDADE ANÔ-NIMA. AÇÃO SOCIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DOS ADMINIS-TRADORES. LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA DA ACIONISTA.Sentença que extinguiu o processo sem resolução do mérito. Ilegitimidade ativa da acionista para pleitear prejuízos próprios em sede de ação social prevista no art. 159 da Lei das S.A. Ação de responsabilidade civil dos administradores, que se presta exclusivamente a veicular pretensão de reparação de danos da companhia, possuindo o acionista legitimação extraordinária para ajuizá-la tão-somente em prol da companhia, não podendo desvirtuá-la para fins de obter reparação individual por danos indiretos decorrentes dos danos diretamente sofridos pela sociedade da qual é acionista. Recorrente que tenta distorcer os fatos e os fundamentos apresentados de forma nítida, coerente, objetiva e correta na sentença. Inteligência do art. 159, caput e § 4º, da Lei das S.A. Apelante que possui legitimação extraordinária subordinada ou subsidiária, eis que somente pode ir a juízo quando presente omissão do legitimado ordinário na propositura da demanda. Substituição processual expressa na citada norma, quando a assembleia geral deliberar contrariamente ao ajuizamento da ação de responsabilidade civil dos sócios e o acionista detiver mais de 5% do capital social. Requisitos preenchidos. Ação social que deve ser fundada em

Page 37: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

36

dano causado à companhia e visar a reparação dos prejuízos causados pelos administradores ao patrimônio social. Exame da petição inicial a demonstrar que a acionista, ao pugnar pela reparação da quantia referente a seu prejuízo individual, descaracterizou sua qualidade de substituta processual, tornando-se, assim, carecedora de legitimidade ad causam, eis que desvirtuou a pertinência subjetiva da lide, sendo desleal à relação jurídica em litígio, consistente na obrigação dos administradores perante a companhia, motivo pelo qual correta a sentença ao acolher a preliminar de ilegitimidade ativa. Além disso, ainda que não fosse caso de ilegitimidade ativa, a ação, nos termos em que foi posta, se mostra via inadequada, por não se prestar a veicular demanda em que o titular do direito de ação por legitimação extraordinária postula direito substantivo próprio. No que pertine aos honorários advocatícios, assiste parcial razão à apelante, uma vez que 10% do valor da causa se mostra excessivo e configura locupletamento sem causa. Inteligência do art. 20, §4º, do CPC, a demonstrar que quando improcedente a pretensão autoral, os honorários devem ser fixados consoante apreciação eqüitativa do magistrado. Parâmetros. Correção técnica das peças de defesa que impugnaram corretamente toda a matéria de defesa pertinente. Grau de especialização da matéria. Elevado valor da causa e indiscutível importância para as partes. Diligência dos causídicos. Porte e solidez das sociedades personagens da lide. Verba honorária que deve ser fixada em R$ 100.000,00 (cem mil reais) para cada patrono, eis que se trata de litisconsortes com diferentes procuradores. Quantia que se encontra na média dos valores fixados nesta corte para casos similares. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO.

Na mesma esteira a ilustre Ministra Nancy Andrighi39 do STJ, “Tribunal da

Cidadania”, ao versar sobre o tema, apoiada na melhor doutrina pátria, informa

em trecho de seu voto que:

A regra é, assim, a adoção da ação uti universi, ou seja, uma

demanda proposta pela sociedade empresária contra seu

administrador, após a sua destituição em Assembléia Geral, para

se ver ressarcida de prejuízos próprios.

Excepcionalmente, admite-se que o minoritário exerça tal ação

social, que então denomina-se uti singuli. Trata-se de

39 STJ - QUARTA TURMA – Resp 1.014.496 /SC. Ministra Nancy Andrighi. Publicado em 01/04/2008;

Page 38: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

37

legitimação extraordinária. O minoritário exerce aí papel de

verdadeiro substituto processual, pois pleiteia em nome próprio

direito alheio (da sociedade empresária).

Outro ponto que merece atenção está ligado a alienação e oneração de

bens do ativo não circulante e de garantias prestadas pela companhia, de

acordo com o artigo 142, VIII da LSA - com nova redação dada pela lei

11941/2009 - compete ao conselho de Administração deliberar sobre estas, não

sendo possível ao estatuto determinar diferentemente, ou seja, quando da

ausência de um Conselho de Administração caberá a assembleia geral decidir

sobre tais temas, pois admitir que pudesse ser atribuída tal competência a

diretoria, seria nos dizeres de Carvalhosa40, “outorgar aos diretores todo o

poder de dispor do patrimônio social que pertence aos sócios”, e conclui

informando que:

A lei vigente, ao outorgar competência originária ao conselho, deixa que o estatuto, por questão de segurança da integridade o patrimônio social, devolva tais poderes à assembléia geral, jamais que os delegue aos diretores. (grifo nosso)

Desta forma, resta claro no que se refere administração extraordinária

esta prescindir de autorização de órgão colegiado, quando ausente o conselho

de administração esta autorização recai sobre a assembleia geral que for

convocada para decidir sobre tal instituto, não podendo o terceiro envolvido na

relação alegar a teoria da aparência, pois presente estará a teoria da

publicidade. Tais teorias serão abordadas no próximo tópico.

5.2 – DA DIRETORIA

A diretoria é o principal órgão administrativo da sociedade, constituída de

no mínimo dois administradores pessoas naturais, residentes no país e com

prazo máximo de três anos para sua gestão - devendo os administradores

Page 39: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

38

manterem-se no cargo até a investidura de seus substitutos - permitida a

recondução, destituíveis a qualquer tempo, é através de seus diretores que as

companhias se relacionam com terceiros, sendo certo que estes representarão

a sociedade em todos os seus atos ordinários e extraordinários de gestão, a

representação orgânica é exclusiva dos diretores e indelegável ao conselho de

administração ou a outro órgão da companhia. Baseados na teoria do órgão,

que nos informa que a quando um componente da diretoria assume alguma

obrigação no exercício de suas atividades, na verdade trata-se da própria

companhia através de seu diretor que assume tal obrigação. É um instituto

utilizado também no direito administrativo, conforme, mutatis mutandis,

preleciona a Professora Di Pietro41:

Pela teoria do órgão, a pessoa jurídica manifesta a sua vontade por meio dos órgãos, de tal modo que quando os agentes que os compõem manifestam a sua vontade, é como se o próprio Estado o fizesse; (...) Na realidade, o órgão não se confunde com a pessoa jurídica, embora seja uma de suas partes integrantes; a pessoa jurídica é o todo, enquanto os órgãos são parcelas integrantes do todo.

Com base nesse entendimento destacar-se-á algumas questões que

devem ser levadas em conta no momento de uma due diligence societária.

Tratar-se-á dos efeitos da representação colegiada quando o estatuto

assim dispuser; da administração ordinária e extraordinária e seus reflexos nas

teorias da aparência e da publicidade; atos sem poderes ou com excesso de

poderes.

Algumas companhias optam por determinar a seus administradores

poderes para que atuem de forma isolada ou conjuntamente para obrigar-se a

sociedade, de regra para os atos de gestão as assinaturas isoladas de seus

administradores, quaisquer que sejam, é a regra inserta no artigo 144 da LSA,

todavia, para uma melhor gestão dos negócios buscando uma melhor

40 Opus cit. pág 152; 41 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2008, pág‟s 479-480;

Page 40: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

39

governança grande parte das companhias, tanto abertas como fechadas,

dispõem que em negócios acima de “x” valores, para a prestação e garantias

reais e ou fidejussórias, para aquisição e alienação de bens da empresa e

demais atos que importem em obrigações de considerável vulto para a

instituição serão necessárias as assinaturas, pelo menos em conjunto d dois

administradores, podendo, conforme o caso, depender da assinatura do CEO

em conjunto com o vice-presidente da companhia, conforme o caso, após,

inclusive a deliberação por parte do conselho ou da assembléia geral

extraordinária convocada para decidir sobre tal assunto.

Neste termos podemos identificar algumas situações, quando no caso um

administrador exerce as funções atinentes aos negócios da companhia,

independente de deliberação de qualquer outro órgão, conforme disposto na

LSA ou Estatuto, estar-se-á diante de atos de sua competência originária, diz-se

que são atos de competência ordinária.

Quando um administrador necessita de autorização de outro órgão da

companhia para executar determinados atos, diz-se que são atos de

competência extraordinária.

Dentre alguns atos classificados como extraordinários estão os insertos

no artigo 142, VI, VII e VIII da LSA, bem como os de alienação e a oneração de

bens componentes do ativo da companhia, etc...

Nos casos de competência extraordinária, não cabe a outra parte

contratante alegar a teoria da aparência para tentar resguardar direitos que,

conforme o caso, serão considerados nulos perante a companhia, neste sentir,

o Professor Modesto Carvalhosa42 esclarece que:

Prevalece o princípio da publicidade (art. 289) em todos os atos de administração extraordinária, quando se pressupões que o terceiro contratante usará de todas as cautelas para verificar a representatividade dos diretores. Também não será a companhia responsável pelos atos praticados por diretores sem representação, quando terceiros contratantes devessem ter

42 Opus cit. Pág 182;

Page 41: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

40

conhecimentos em razão da profissionalidade de seus atos ou de sua organização.

Em contrapartida à teoria da publicidade está a teoria da aparência,

oriunda, em regra, de atos ordinários de gestão, onde o terceiro que se obriga

através do administrador, acredita, por tratar-se de atos de gestão ou de

adesão, estar celebrando diretamente com a companhia, nesta esteira deve-se

destacar a necessária presença da boa-fé subjetiva do contratante e do

administrador, pois não há que discutir sobre a intenção das partes em se

obrigarem mutuamente, sendo certo que, como já destacado, o terceiro deve

acreditar estar contratando com a companhia através de seu administrador

ordinário, “de maneira que sua ignorância não esteja fundada em negligência,

mas sim em elementos objetivos, os quais tenham credibilidade suficiente para

uma atuação que demonstre a sua convicção de estar segundo o direito.”43

Desta forma segundo Carvalhosa prevalece a teoria da aparência,

quando se tratar de atos de gestão ou administração ordinária da companhia,

havendo boa-fé do terceiro, não podendo a mesma arguir nulidade do ato. Será

o negócio eficaz obrigando-se a sociedade, destacando que atos absolutamente

estranhos ao objeto da sociedade, não se tratando de quaisquer de seus

desdobramentos, não poderá o terceiro alegar boa-fé.

No exercício de seu mister deve o administrador guardar o zelo e

diligência esperado de um profissional capaz de conduzir os negócio da

companhia, alguns de seus deveres e responsabilidades estão elencados nos

artigos 153-157 da LSA, desta forma, estão seus atos sujeitos a

responsabilidade civil, administrativa e penal, conforme o caso, sendo certo que

nos casos onde, após aprovação da assembleia geral poderá ser proposta ação

de responsabilidade civil face ao administrador que causar prejuízo a companhia

por dolo ou culpa, na forma dos artigos 158, 159 e §§ da LSA.

43 VENCESLAU, Rose . Cláusula Geral da Boa-fé Objetiva apud in TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena e MORAES, Maria Celina Bodin de. Código Civil interpretado conforme a Constituição da República – 2ª ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Renovar, 2007, pág. 606;

Page 42: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

41

Destaca-se que não serão os administradores responsabilizados pelo

resultado de sua gestão quando regularmente exercida, pois estar-se-ia imputar

todos os fatores externos capazes de levar uma empresa ao insucesso como

condições capazes de gerar responsabilidade aos administradores.

Destaca-se que nas companhias fechadas há peculiaridade de que os

administradores são solidariamente responsáveis, cabendo aos que não

participaram para o evento danoso ação regressiva contra os causadores do

dano.

Sobre as ações de responsabilidade cabe destacar que a lei determinou

critérios para a sua proposição pela companhia, e extraordinariamente por

qualquer acionista, na omissão da companhia em promovê-la no prazo de três

meses e ainda no caso de minoria correspondente a cinco por cento no mínimo

do capital social discordar da assembléia que deliberar por não promover a

ação de responsabilidade.

Ressalta-se que tal ação de prazo de 03 (três) anos o prazo prescricional

para a propositura da ação social, nos termos do art. 287, II e alíneas da LSA

Sobre o tema seguem abaixo algumas jurisprudências analisando os

requisitos objetivos em cada caso, extraídas do Sítio do Tribunal de Justiça do

Rio de Janeiro:

1. 2008.001.09368 - APELACAO

DES. MARCO ANTONIO IBRAHIM - Julgamento: 29/04/2009 - VIGESIMA CAMARA CIVEL AUTORA SOCIEDADE ANONIMA FECHADA PAGAMENTO DE DESPESAS PESSOAIS DE SOCIO DESVIO DE FINALIDADE OBRIGACAO DE FILHOS DE PRESTAR ALIMENTOS INEXISTENCIA DE DIREITO DE CREDITO CONTRA O ESPOLIO INEXISTENCIA DE DIREITO DE REEMBOLSO Direito societário. Direito civil. Administrador. Lei de Sociedades Anônimas. Ação de cobrança ajuizada por sociedade anônima fechada, cujos acionistas são pessoas da mesma família. Pretensão da companhia contra o Espólio de uma de suas acionistas para obter reembolso de quantias que por doze anos foram vertidas para seu sustento. Hipótese em que não havia autorização assemblear ou norma estatutária prevendo o desvio de recursos da companhia para manutenção da matriarca da família, que era uma das acionistas e não ocupava cargo administrativo. Inteligência do artigo 154, da Lei nº 6.404/76.

Page 43: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

42

Inaplicabilidade do artigo 305 do Código Civil de 2002. Impertinência da alegação de que a empresa cumpriu sua "função social". Conduta ilícita do administrador da companhia, que não poderia destinar recursos da empresa para finalidade diversa de seu objeto social. 1º recurso provido. 2º recurso prejudicado.

2. 2004.001.13955 - APELACAO

DES. MARLAN MARINHO - Julgamento: 05/04/2005 - DECIMA QUARTA CAMARA CIVELPROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. AÇÃO ORDINÁRIA. RESPONSABILIDADE CIVIL. SOCIEDADE ANÔNIMA. ATO DE SEUS ADMINISTRADORES. LEGITIMIDADE ATIVA. AUSÊNCIA DE PRÉVIA DELIBERAÇÃO DA ASSEMBLÉIA GERAL. CONSEQÜÊNCIA. Somente a companhia administrada ou seus acionistas têm legitimidade ativa para a ação que busca indenização por ato de seus administradores. A propositura da ação, no entanto, subordina-se á prévia deliberação da assembléia geral, nos exatos termos do art. 159 da Lei n.º 6.404/76.

3. 2007.002.33363 - AGRAVO DE INSTRUMENTO

DES. BERNARDO MOREIRA GARCEZ NETO - Julgamento: 21/05/2008 - DECIMA CAMARA CIVEL Sociedade anônima. Ação de responsabilidade civil dos administradores. Inércia da assembléia geral. Legitimação extraordinária do acionista minoritário. Percentual do artigo 159, § 4.º , da Lei 6404. Verificação no momento em que ocorreu a lesão. Inexistência de prejudicialidade externa em relação à demanda, na qual se questiona o aumento do capital social. Agravo provido.

4. 2006.001.63659 - APELACAO

DES. FERDINALDO DO NASCIMENTO - Julgamento: 21/03/2007 - DECIMA QUARTA CAMARA CIVEL RESPONSABILIDADE CIVIL DE ADMINISTRADOR SOCIEDADE ANONIMA DUPLICATA DESCONTOS ILEGAIS ABUSO DE PODER RESSARCIMENTO DOS DANOS

Responsabilidade civil de administrador e acionista majoritário pelos prejuízos provocados na sociedade anônima. Descontos ilegais de duplicatas. Numerários não eram repassados ao caixa da firma. Os réus agiram com absoluta inobservância de seus deveres quanto ao dever de lealdade para com a empresa na qual eram diretor e acionista majoritário, havendo manifesto desvio e abuso de poder, o que viola os arts. 153,155 I e II da Lei 6404/76 em razão das ações praticadas, tais como descontos ilegais de duplicatas, ausência de repasse dos numerários ao caixa da firma, contato em prol de empresa concorrente, pagamento a maior dos honorários da diretoria no período entre 1988 e 1991, retirada de importância a título de honorários

Page 44: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

43

mesmo tendo renunciado a eles, restando claro o dever de ressarcir os prejuízos provocados. Recurso conhecido e desprovido.

Deve o auditor analisar com a independência a ele peculiar se há algum

caso de responsabilidade dos administradores, e orientar a companhia sobre

tais atos e os procedimentos a serem adotados, bem como precipuamente

auxiliar os administradores na busca da full disclosure, indicando as melhores

práticas de governança, sempre viabilizando juridicamente e alertando em todos

os atos sociais que importem em obrigações ou responsabilidade da companhia,

de forma a se alcançar os efeitos desejados dessa ação preventiva.

6 – DOS ACORDOS DE ACIONISTAS

Tema de fundamental relevância presente na grande maioria das

companhias como forma de se garantir uma melhor governabilidade os acordos

de acionistas estão regulados no artigo 118 da LSA e em linhas gerais referem-

se ao poder de controle das companhias, mas também podem referir-se a

compra e venda de ações, preferência para adquiri-las ou do exercício do direito

de voto.

Segundo Nelson Eizirik44, ao divagar em consulta formulada sobre

intrigante tema do direito societário, discrimina a natureza jurídica do referido

instituto da seguinte forma:

O acordo de acionistas pode ser definido como um contrato celebrado entre acionistas da companhia para compor seus interesses individuais e para estabelecer normas sobre a sociedade da qual participam, de forma a harmonizar seus interesses societários e implementar o próprio interesse social.

Verificado o caráter contratual civil presente no referido instituto, para que

o mesmo seja oponível a terceiros deve o mesmo ser averbado na sede social,

44 Opus Cit. Pág 25;

Page 45: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

44

nos livros de registro e certificados de ações nominativas ou junto a instituição

financeira responsável no caso de ações escriturais.

Nestes acordos os acionistas quaisquer temas poderão ser tratados e

obrigarão, considerados os modernos princípios norteadores das relações

contratuais insertos em nossa legislação civil através da Lei 10.406/02 que

instituiu o Novo Código Civil Brasileiro, principalmente os princípios da função

social do contrato e da boa-fé objetiva, bem como considerando o conceito de

obrigação como processo e não apenas como uma análise estática da relação,

sendo todas as vertentes externas relevantes também que as partes possam

alcançar os objetivos ali descrito, todavia, somente nos casos previstos na LSA

é que produzirão efeitos perante a companhia, mesmo que sejam cumpridas

todas as formalidades necessárias a sua validade e eficácia, inclusive perante

terceiros.

Conforme descrito nos artigo 118 da LSA os acordos de acionistas

podem ser aglutinados e classificados em duas modalidades: acordo de

bloqueio - onde haverá restrição a circulação das ações ou a determinação de

preferência para adquiri-las - ou acordos de voto - onde o objetivo do acordo é

tratar de assuntos pertinentes ao exercício do direito de voto ou poder de

controle, destacando que este último foi introduzido na LSA pela lei

10.303/2001, considerada pela doutrina como a reforma da S.A.

A importância em analisar-se este instituto por parte do auditor jurídico

está intrinsecamente ligada aos fundamentos de sua atividade, sendo certo que

os mesmos devem ser analisados em conjunto com os demais documentos

societários, verificando seus requisitos formais de validade e eficácia perante

terceiros.

Destarte ser também de vital importância que se verifique no caso

concreto quando do descumprimento, quando averbado na sede da companhia,

dos acordos de voto, bem como se as providências determinadas nos

parágrafos do artigo 118, conforme o caso foram devidamente adotadas e

registradas na ata da assembléia competente.

Page 46: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

45

Deve o auditor no seu mister, de forma preventiva e, de acordo com os

interesses da companhia, sugerir, quando for o caso em seu relatório final,

parecer favorável ao cancelamento ou até criação de acordos de acionistas

capazes de melhor garantir os interesses dos acionistas e a governabilidade da

sociedade.

Não se pode negar que um dos principais fundamentos da auditoria

jurídica está intrinsecamente ligado ao apoio da governabilidade das companhias

como um todo, pois através de exames periódicos, e pareceres conclusivos, a

administração da companhia poderá adotar as providências necessárias para a

mitigação dos riscos que a não observância de tais requisitos podem acarretar

para a companhia, seja através da formalização e publicação de seus atos,

conforme determina a lei para que possa ser oponível a terceiros, seja

arquivando os mesmos junto a companhia para que produza os efeitos internos

necessários; na orientação da constituição de garantias a terceiros para a

consecução de seus objetivos sociais ou para visando estratégia de negócios

viabilize seus interesses.

7 – DOS ASPECTOS CONTRATUAIS

Neste tópico passar-se-á a análise de alguns pontos destacando alguns

dos mais relevantes institutos regentes das relações obrigacionais, numa visão

constitucional do direito civil, desta forma, trataremos das cláusulas gerais e das

nuances da boa-fé objetiva.

Não se pode iniciar este estudo sem apresentar os paradigmas regentes

da nova ordem civil constitucional, surgidas com a edição do Código Civil de

2002, que buscam concretizar os direitos contratuais, neste sentido a lex civile

persegue três grandes paradigmas, quais sejam: a Socialidade, a eticidade e a

operabilidade.

A socialidade pode ser traduzida como limites ao exercício de direitos

subjetivos impostos pela sociedade, onde não mais subsiste a idéia de relação

estritamente inter partes, pois todas as relações contratuais devem atingir seus

Page 47: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

46

objetivos sem que haja a perturbação da paz social, devem assim cumprir a sua

função social, não apenas como limites externos a relação, mas como fonte

interna obrigacional de cooperação entre as partes e entre estas e a sociedade,

em busca do fim comum que é o adimplemento.

A Eticidade remete ao conceito de ética que segundo DEOCLECIANO45

são “normas e princípios que dizem respeito ao comportamento do indivíduo no

grupo social a que pertence”, bem como também pode ser tida como a “ciência

que estuda o fim para o qual a conduta dos homens deve ser orientada”46, assim

a eticidade emerge de cláusulas gerais regentes do direito civil com vistas a que

as partes mantenham em suas relações uma conduta ética, TEPEDINO47 bem

conceitua as cláusulas gerais, conforme abaixo descrito:

Cuida-se de normas que não prescrevem uma certa conduta mas, simplesmente, definem valores e parâmetros hermenêuticos. Servem assim como ponto de referência interpretativo e oferecem ao intérprete os critérios axiológicos e os limites para a aplicação das demais disposições normativas.

Dentre as cláusulas gerais advindas deste paradigma estão a boa-fé

objetiva, a função social, o abuso de direito, equidadade, os bons costumes,

etc...

Da Operabilidade, ou concretude remete o operador do direito às

peculiaridades do caso concreto, onde a aplicação do direito se dará, levando a

distintas soluções para uma situação jurídica regulada abstratamente dado a

singularidade das pessoas envolvidas na situação fática, observando as

desigualdades entre as partes na relação obrigacional com o fito de se buscar o

equilíbrio entre os contratantes.

Segundo Orlando Gomes Contrato é “... o negócio jurídico bilateral, ou

plurilateral, que sujeita as partes à observância de conduta idônea a satisfação

45 Opus Cit, pág 298. 46 CHAVES, Cristiano de Farias e ROSENVALD, Nelson. Direito das Obrigações. 4ª. ed., atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, pág. 105 47 TEPEDINO, Gustavo, apud in CHAVES, Cristiano de Farias e ROSENVALD, Nelson. Direito das Obrigações. 4ª. ed., atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, pág. 107

Page 48: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

47

dos interesses que regularam.”48 Deste conceito ainda clássico pode-se retirar

alguns dos caracteres principais dos contratos, quais sejam: pluralidade de

partes, ainda que num primeiro momento apenas uma das partes seja

determinada e a outra seja apenas num futuro, ao menos no momento do

adimplemento, determinável, não é o caso do presente trabalho, mas não se

pode deixar de esclarecer que será necessário que as pessoas possuam

capacidade para tais atos, assim, o menor de dezesseis anos não celebrará

contrato se não estiver devidamente representado por seus responsáveis e o

maior de dezesseis e menor de dezoito ao menos assistido por seus

responsáveis, no primeiro caso o negócio será considerado nulo pela própria

previsão contida no artigo 166, I do Código Reale e anulável o celebrado por

agente relativamente incapaz, na forma do artigo 171, I do Código Civil (quanto

ao ato-fato jurídico tido como o que é celebrado entre os menores de dezesseis

anos como por exemplo quando uma criança compra uma bala seus efeitos são

reconhecidos por boa parte da doutrina, não sendo objeto do presente

trabalho).

Com relação à sujeição dos efeitos contratuais, estas serão melhor

analisadas quando do estudo da boa-fé objetiva e seus deveres anexos, sendo

que neste momento apenas cabe destacar que o vínculo jurídico estabelecido

entre as partes com vistas ao adimplemento obrigacional, poderá, conforme o

caso, ser exigido coercitivamente (através da prestação jurisdicional).

Os interesses podem ser sintetizados sob a forma de obrigações de

fazer, não fazer, dar ou restituir coisa, conforme o objeto da relação contratual.

Por fim vê-se a transitoriedade como uma de suas características, pois o

contrato, segundo Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald49 “... até mesmo porque

não pode haver uma relação obrigacional perpétua, o que implicaria, como se

pode extrair de seu conceito, uma verdadeira servidão humana.” com isto

remeter-se-á aos preceitos existentes para a validade do negócio jurídico

48 GOMES, Orlando. Contratos. 18ª. ed., atual. por Humberto Theodoro Júnior. Rio de Janeiro: Forense, 1999, pág.10. 49 CHAVES, Cristiano de Farias e ROSENVALD, Nelson. Direito das Obrigações. 4ª. ed., atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, pág.11.

Page 49: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

48

constante do art. 104 da lei civil, qual sejam: 1) agente capaz; 2) objeto lícito,

possível, determinado ou determinável e 3) forma prescrita ou não defesa em

lei. Quanto ao aspecto da forma cabe o destaque da necessidade, quando da

substância do ato, de ser celebrado por instrumento público, conforme a

conjugação dos artigos 108 e 109 do Código Civil, sendo, considerados

inválidos, remetendo –se ao prescrito no artigo 166, IV do CC/02.

De forma magistral Para Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald50,

abandonando a visão patrimonialista do direito Romano, de forma objetiva e

sucinta, sintetizam o que foi demonstrado ao afirmarem que:

Assim sendo, considerada a evolução histórica do Direito das Obrigações, já vista alhures, é possível, então, conceituar a obrigação como a relação jurídica transitória, estabelecendo vínculos jurídicos entre duas diferentes partes (denominadas credor e devedor, respectivamente), cujo objeto é uma prestação pessoal, positiva ou negativa, garantindo o cumprimento, sob pena de coerção judicial.

Desta feita passar-se-á ao estudo da boa-fé objetiva, suas nuances e

deveres anexo.

A boa-fé objetiva, após vários anos de angustiante ausência normativa

pátria, ressurge no ordenamento jurídico brasileiro, na seara Cível

explicitamente, através Código de Proteção e Defesa do Consumidor, Lei

8.078/90, que em seu art. 4º, III51 eleva tal instituto a princípio que norteará as

relações de consumo, ganhando maior destaque no art. 51, IV52 da mesma lei

50 Opus Cit. passim. 51 Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (...) III – harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (artigo 170 da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores. 52 Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...)

Page 50: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

49

sendo que somente 13 (treze) anos após com entrada em vigor da Lei

10.406/02 (Código Civil Brasileiro) as relações privadas, distintas das relações

de consumo, voltaram a ter a proteção principiológica da boa-fé objetiva

positivada nos art.‟s 11353 e 42254 do referido código.

É cediço que tal princípio tem sua origem no Direito Romano, conforme

bem esclarece o Prof. Roberto Senise Lisboa55, ao destacar sua presença em

uma das principais fontes históricas do direito moderno em dois institutos

denominados fides e bona fides, esclarecendo que: “bem antes do advento do

contrato de massa é possível o estudo da boa-fé, contemplando-se o instituto

da fides e bona fides no Direito Romano”. Devemos entender o termo fides com

o sentido de poder e promessa, uma forma de respeito à palavra dada, como

honra, melhor dizendo “palavra de honra” – termo largamente utilizado, inclusive

como jargão popular até hoje – que acompanhava o contrato celebrado,

principalmente em seus acessórios e como bona fides – tradução literal de boa-

fé56 - a margem dada ao julgador para decidir no caso concreto57.

Todavia não podemos deixar de destacar que no Brasil já houve outros

códigos que trouxeram no seu texto a proteção principiológica da boa-fé objetiva

na seara Cível, a citar o Esbôço de Teixeira de Freitas (1855); o Projeto do

Código Civil Brasileiro e Comentário de Joaquim Felício Santos (1881); o Projeto

de Código Civil Brasileiro de A. Coelho Rodrigues (1893), dentre outros escritos.

IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade. 53 Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. 54 Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. 55 LISBOA, Roberto Senise. Princípios gerais dos contratos. Apud in OLIVEIRA, Camila Nucci de. Boa-fé Objetiva dos Contratos no Código Civil de 2002. Disponível em:<http://www.franca.unesp.br/BOA_fe.pdf>. Acesso em: 08/4/2009. 56 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário técnico jurídico – 6 ed. rev. e atual. São Paulo: Rideel, 2004, pág. 130. 57 DUARTE, Ronnie Preus. Boa-fé, abuso de direito e o novo Código Civil brasileiro. Apud in OLIVEIRA, Camila Nucci de. Boa-fé Objetiva dos Contratos no Código Civil de 2002. Disponível em: <http://www.franca.unesp.br/BOA_fe.pdf>. Acesso em: 08/4/2009.

Page 51: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

50

Apesar dos precedentes citados Bevilácqua, ao elaborar e redigir, não

fez constar explicitamente do texto do Código Civil de 1916 tão relevante

princípio, apesar de citá-lo em diversas passagens, trazendo para o operador

da época consideráveis questões sobre a sua aplicabilidade a qualquer tipo de

contrato, sendo certo que a boa-fé subjetiva já estava inserta com sua

aplicabilidade consolidada.

Necessário se faz distinguir entre a boa-fé objetiva e a boa-fé subjetiva,

onde a última está ligada a intenção das partes no momento de celebrar o

contrato, denota-se um estado de consciência, a intenção do indivíduo, seu

estado psicológico ou íntima convicção58, de acordo com o Doutrinador e Prof.

Silvio de Salvo Venosa59:

“Na boa-fé subjetiva, o manifestante de vontade crê que sua

conduta é correta, tendo em vista o grau de conhecimento que

possui de um negócio. Para ele há um estado de consciência ou

aspecto psicológico que deve ser considerado”

Já para definir a boa-fé objetiva o Insigne Prof. Venosa conclui por

diferenciá-la destacando o princípio de conduta comum esperada do “homem

médio”, conforme assevera a seguir:

A boa-fé objetiva, por outro lado, tem compreensão diversa. O

intérprete parte de um padrão de conduta comum, do homem

médio, naquele caso concreto, levando em consideração os

aspectos sociais envolvidos. Desse modo, a boa-fé objetiva se

traduz de forma mais perceptível como uma regra de conduta,

um dever de agir de acordo com determinados padrões sociais

estabelecidos e reconhecidos.

58 MELO, Lucinete Cardoso de. O princípio da boa-fé objetiva no Código Civil . Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 523, 12 dez. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6027>. Acesso em: 08/04/2009. 59 VENOSA, Silvio de Salvo Apud in ALMEIDA, William. A boa-fé Contratual diante da nova Codificação Civil. Disponível em: < http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1560/A-boa-fe-contratual-diante-da-nova-codificacao-civil>. Acesso em: 08/04/2009.

Page 52: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

51

Conclui-se, portanto, que a boa-fé objetiva atua no campo do

comportamento ético esperado do homem médio, segundo o qual, não advém

qualquer análise quanto a vontade do contratante na celebração do contrato,

mas de sua conduta na celebração execução do contrato, adequando-se ao

conceito de domínio público, conhecimento geral, padrão esperado de

comportamento social, de modo que atitudes contrárias poderão ser

interpretadas como má-fé.

O Célebre “Mestre dos Mestres” o Prof. Orlando Gomes60, mesmo antes

da presença do referido texto no Código Civil não conseguiu viver o necessário

para contemplar a boa-fé objetiva à regular nossas relações privadas, mas já

demonstrava a sua relevância ao analisá-la e compará-la com o descrito no

Código Civil Alemão:

Ao princípio da boa-fé empresta-se ainda outro significado. Para

traduzir o interesse social de segurança das relações jurídicas,

diz-se como está expresso no Código Civil alemão, que as partes

devem agir com lealdade e confiança recíprocas. Numa palavra,

devem proceder com boa-fé. Indo mais adiante, aventa-se a idéia

de que entre o credor e o devedor é necessária a colaboração,

um ajudando o outro na execução do contrato. A tanto, evidente,

não se pode chegar, dada a contraposição de interesses, mas é

certo que a conduta, tanto de um como de outro, subordina-se a

regras que visam a impedir dificulte uma parte a ação da outra.

Demonstradas tais distinções passar-se-á as nuances existentes na boa-

fé objetiva presentes no CDC e Código Civil/02, onde de acordo com o Prof. Dr.

Gustavo Tepedino61, a boa-fé objetiva apresenta “três funções fundamentais”

nas relações contratuais, como bem postula, citando novamente o seu

ressurgimento com o CDC:

60 Op. Cit. pág. 23.

Page 53: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

52

Em termos práticos, a boa-fé objetiva, introduzida no

ordenamento jurídico brasileiro por força do Código de Defesa

do Consumidor, e expandida, paulatinamente, por obra da

doutrina e da jurisprudência, foi finalmente consagrada no

dispositivo em análise, desempenhando, na teoria contratual,

três funções fundamentais: (i) função interpretativa dos

contratos; (ii) função restritiva do exercício abusivo de direitos

contratuais; e (iii) como o dever de informação e o dever de

lealdade.

O Prof. Tepedino, ao dissertar sobre tais funções esclarece que no

primeiro caso há um comando hermenêutico que deve ser aplicado a todas as

cláusulas contratuais no sentido “mais conforme a lealdade e honestidade em

relação aos propósitos comuns”.

Para o segundo caso, função restritiva do exercício abusivo de direitos

contratuais, Tepedino define que a boa-fé limita certos direito próprios que

outrora podiam ser exercidos na seara da relação contratual, destacando a

proteção contida no art. 18762 do CC no caso de exercício irregular de direito e

de abuso de direito pelos contratantes.

Finalizando, Tepedino destaca que na sua terceira função a boa-fé

objetiva exerce uma função integradora ao dispor que, “embora menos aparente

no artigo em análise, pode ser deduzida do art. 422, em conformidade com a

melhor doutrina e à semelhança da interpretação atribuída ao § 242 do BGB”63.

Concluindo, Tepedino discorre sobre a fusão das três funções quando de

forma sucinta, mas não menos magistral, informa da necessidade de se

coadunar a função positiva da boa-fé com a função negativa, no que se refere

61 TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena e MORAES, Maria Celina Bodin de. Código Civil interpretado conforme a Constituição da República – 2ª ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Renovar, 2007, pág. 231. 62 Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. 63 Opus Cit.

Page 54: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

53

aos atos a serem praticados pelos contratantes na busca pela consecução dos

objetivos contratados, asseverando que:

O papel hermenêutico desempenhado pela boa-fé, em certa

medida, tem condão de definir melhor os contornos tanto dos

deveres anexos antes mencionados (função positiva da boa-fé)

quanto do grau de restrição por ela imposto ao exercício das

posições jurídicas individuais (função negativa), fazendo

abusivo o exercício que extrapola tais limites.

Insta fomentar alguns dos principais deveres anexos das relações

obrigacionais quais sejam: 1) Venire Contra Factum Proprium; 2) Supressio; 3)

Surrectio; 4) Tu Quoque 5) Duty to Mitigate the Loss, dentre outros.

No Venire Contra Factum Proprium há um dever anexo de vedação de

atos contraditórios aos estipulados pelas partes contratualmente, com vistas a

impossibilitar o adimplemento contratual, Anderson Schreiber64 informa que

independente de seu nomen juris, tratam-se de modelos de comportamento

vedados pela boa-fé como Standards, todavia negativos, trazendo a venire

como exemplo: “ exemplo eloqüente é o da venire contra factum proprium, ou

seja, do comportamento contraditório à legítima confiança despertada em

outrem, „tipo‟ de conduta vedado pela boa-fé objetiva”

Na Supressio, ocorre uma supressão de um direito anteriormente válido,

também conhecido como neutralização de um crédito, onde um direito que não

tenha sido exercido durante um determinado lapso de tempo, não poderá mais

sê-lo, nos dizeres de Carlos Afonso Pereira e Rafael Viola65:

Em outras palavras, pelo não exercício prolongado e um direito, cria-se na contraparte a expectativa legítima de que não será

64 SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão aos filtros da reparação à diluição dos danos. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, pág. 46 in notas de rodapé; 65 VIOLA, Rafael e SOUZA, Carlos Afonso Pereira de. Teoria Geral dos Contratos. Apud in DELGADO, Milton. Direito Civil. Coleção Tópicos de Direito Vol 2. Rio e Janeiro: Lumen Juris, 2009, pág. 231.

Page 55: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

54

exercido. Interessante notar que a supressio assume feições semelhantes à prescrição. No entanto enquanto neste instituto o legislador previu os prazos na lei, não podendo ser alterados pelas partes (art. 192), naquele não existe prazo previsto, tampouco necessita apenas de lapso temporal. Com efeito a supressio necessita de dois fatores: (i) lapso temporal e (ii) indícios objetivos de que esse direito não mais seria exercido.

Na Surrectio, há o nascimento de um direito de não uso pela parte

credora de determinado direito, trata-se de mais um dever negativo, congênere

a Supressio, assim explicitado pela insigne professora Judith Martins Costa66 ao

parafrasear Menezes Cordeiro:

A surrectio é a mesma situação encarada sob o prisma da contraparte, considerada como criação de um direito de não-exercício de posição jurídica atribuída a parte adversa, nas condições acima mencionadas afim de proteger sua confiança. Para sua configuração, há de se exigir não só o decurso considerável de tempo, que pode Sr variável caso a caso, como também indícios objetivos de que o direito não seria exercido, não sendo necessário, contudo, se cogitar de intenções subjetivas.

Assim pode-se afirmar que a supressio e a surrectio são as

consequências, da mesma conduta, para cada uma das partes contratantes,

quais sejam credor e devedor respectivamente.

O Tu Quoque trata dos casos onde uma pessoa que viola determinada

norma fica vedada de cobrar que outrem a cumpra, assim, também nos dizeres

de Menezes Cordeiro67:

“no aflorar de uma regra pela qual a pessoa viola uma norma jurídica não poderia, sem o abuso, exercer a situação que essa mesma norma lhe tivesse atribuído. Ou seja, corresponde a

66 COSTA, Judith Martins. Os Avatares do Abuso do Direito e o Rumo Indicado pela Boa-Fé. Apud in Congresso Internacional e Direito Civil-Constitucional. Direito Civil Contemporâneo: novos problemas à luz da legalidade constitucional: anais do congresso internacional de direito civil-constitucional da cidade do Rio de Janeiro/Gustavo Tepedino, Organizador.-São Paulo: Atlas, 2008. Pág. 84. 67 CORDEIRO, Menezes. Apud in VIOLA e SOUZA, Op. Cit, pág. 232.

Page 56: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

55

vedação àquele que violou determinada norma do exercício da posição jurídica que a mesma lhe outorga.”

Por fim, no Duty to Mitigate the Loss, que traduzindo para o português

seria o dever de mitigação de prejuízos, do devedor por parte do credor, traduz-

se também pelo princípio presente na lei processual civil da menor onerosidade

da execução, onde deve o credor buscar a mitigação de prejuízos do devedor,

nesse caso trata-se de conduta positiva.

Todas as condutas descritas são hoje vistas sob a perspectiva da

obrigação como um processo e não mais sob um análise estática anteriormente

adotada, trata-se de verdadeira aplicação do direito civil-constitucional,

buscando a eficácia plena das relações obrigacionais visando o adimplemento e

a conclusão das três fases obrigacionais, assim entendidas como a fase pré-

contratual, a própria execução do contrato e a fase pós-contratual, evitando que

surja responsabilidade civil advinda da violação de um desses deveres anexos,

não como mero inadimplemento contratual, mas como geradores, no caso

concreto de abuso de direito compensável, conforme o caso.

Conclui-se, por fim, que as principais nuances apresentadas pela boa-fé

objetiva apresentada pelo Código Civil estão muito ligadas a Celebração e a

Execução dos Contratos e seus efeitos, conforme esclarece o Prof. Tepedino:

Em outras palavras, o intérprete deverá integrar ao regulamento

contratual os deveres de lealdade, de transparência e de

informação, bem como impor sacrifício a direitos subjetivos e

potestativos dos contratantes em favor do interesse comum

perseguido pelo contrato, definidor de suas finalidades

econômicas e sociais.

Resta clara a intenção da função social, onde os interesses individuais

ficam mitigados diante do interesse coletivo, que após a 2ª Guerra Mundial

ganha novos contornos e proteções para certas categorias através de

microssistemas, dentre os quais o Código de Defesa do Consumidor, a proteger

Page 57: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

56

essa categoria – consumidores – das intempéries e desmandos do fornecedor,

que até a instituição de tal microssistema no ordenamento jurídico brasileiro

estava subjugada ao que determinava o fornecedor com todos os abusos

inimagináveis na presente data, apesar da técnica de microssistemas ser

veementemente atacada por diversos doutrinadores, não sendo a via adequada,

mas sendo reconhecida sua importância.

Todos os preceitos ditados acima aplicam-se as relações consumeristas

regidas pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), mas diferente das

relações contratuais entre duas partes regidas pelo CC/02, há a presunção de

vulnerabilidade entre o fornecedor e o consumidor, disposta nos princípios

regentes das relações consumeristas no art. 4º, I do CDC ao informar:

Art. 4º (...)

I – reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo.

Desta forma, há aplicabilidade da boa-fé objetiva tanta na fase pré-

contratual, por exemplo a vedação de propaganda enganosa e dever de

informação, na sua celebração/execução buscando nivelar as partes aplicando

como questão de ordem pública a Vulnerabilidade do Consumidor, e em sua

fase pós-contratual, proteção contra vicio ou defeito do produto ou serviço entre

outros, onde são protegidos, com contornos constitucionais, os direitos dos

consumidores, neste sentir alguns juristas como Jones Figueiredo Alves,

Lucinete Cardoso de Melo entre outros destacam que o legislador ao aprovar o

Código Civil foi infeliz, pois não estendeu as mesmas proteções aos

contratantes na fase pré-contratual e pós-contratual, com o brilhantismo que lhe

é peculiar, o Conspícuo Doutrinador e Prof. Gustavo Tepedino68 disserta sobre

o tema em artigo publicado:

De certa maneira, tais preceitos já nos indicam que a proteção

dispensada à relação de consumo stricto sensu, com a perfeita

caracterização do consumidor e do fornecedor, não poderia ser

68 TEPEDINO, Gustavo. As Relações de Consumo e a Nova Teoria Contratual. Disponível em: <http://www2.uerj.br/~direito/publicacoes/publicacoes/diversos/tepedino.html>. Acesso em 08/04/2009.

Page 58: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

57

suficientemente efetivada se não se expandisse o espectro

dessa tutela para um momento pré-contratual e para uma fase

pós-contratual - lembrada também pelo Professor Junqueira na

tarde de ontem -; e, ainda, para as situações cujos sujeitos

pudessem ser considerados stand by como já se disse ontem -

ou consumidores equiparados, ou seja, aquelas pessoas que

estivessem em situação de desvantagem em decorrência de uma

relação de consumo, embora nesta não inseridas.

Concluindo pela necessidade da reunificação dos conceitos e princípios

gerais norteadores do Direito Civil Constitucional como um arcabouço aplicável

não apenas a certas categorias, ao qual defende sua relevância, mas critica a

criação e partição de princípios gerais para apenas tais grupos por ele citados

como “guetos”, criticando a criação e estigmatização dos microssistemas

jurídicos utilizados como meio de proteção a certos grupos de pessoas, como

os Consumidores:

Não acredito que pudéssemos, como pretendem alguns

valorosos colegas, a partir apenas desses dois artigos, dar uma

dimensão generalizante às regras ali emanadas, extraindo

interpretação que vá além das vítimas na responsabilidade por

acidente de consumo e daquele que está prestes a se tornar

consumidor ou que potencialmente é consumidor.

Entretanto, mediante a aplicação direta dos princípios

constitucionais nas relações do Direito Privado, devermos utilizar

o Código do Consumidor, quer em contratos de adesão, mesmo

quando não se constituam em relação de consumo, quer nas

circunstâncias contratuais em que se identificam, pela identidade

de ratio, os pressupostos de legitimação da intervenção

legislativa em matéria de relações de consumo: os princípios da

isonomia substancial, da dignidade da pessoa humana e da

realização plena de sua personalidade parecem ser os

pressupostos justificadores da incidência dos mecanismos de

Page 59: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

58

defesa do consumidor às relações interprivadas. Verifica-se

então que os princípios inovadores nesses dois dias analisados

– a interpretação mais favorável, a inversão do ônus da prova

diante da verossimilhança do pedido ou da hipossuficiência, a

proteção da boa-fé objetiva, cujo sentido a jurisprudência tem

conseguido perceber, dentre outros - vão sendo mais e mais

associados não à qualificação do consumidor como um status,

uma espécie de salvo-conduto para o exercício de atividades

econômicas, mas à preocupação constitucional com a redução

das desigualdades e com o efetivo exercício da cidadania,

perspectiva que não poderia deixar de compreender, segundo a

vontade normativa do constituinte, todas as relações

consideradas de direito privado.

Por todo o exposto, urge a necessidade da adequação por parte da

doutrina e até dos legisladores brasileiros de uma melhor aplicação do princípio

da boa-fé objetiva nas relações privadas, tendo em vista que nas relações de

consumo, já o são pelos magistrados e militantes da advocacia, adequando,

conforme o caso a proteção às três fases contratuais, destacando já existir no

congresso um projeto de lei que visa alterar e ampliar a boa-fé objetiva às

relações privadas distintas das relações consumeristas, alterando o conteúdo

do art. 422.69

No tocante ao posicionamento suscitado pelo Prof. Gustavo Tepedino,

apesar da necessidade de um maior aprofundamento sobre o tema, parece ser

o mais adequado, devendo nortear tanto a doutrina, jurisprudência quanto os

legisladores, no sentido de unificarem-se os princípios gerais de direito privado

como um todo, dando fim à segregação hoje existente na legislação brasileira,

adequando o direito ao que toda a sociedade busca: a harmonia e a paz social,

como fundamentos de um estado democrático de direito ético determinado pelo

consenso comum, e não imposto de forma arbitrária pelo Estado em algumas

relações e apenas a certas categorias, destacando que no momento em que se

69 PL 6960/02 – Disponível em: <www.senado.gov.br>. Acesso em: 08/04/2009;

Page 60: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

59

busca uma “moralização da atividade pública”, mister que se estabeleçam,

também, diretrizes éticas capazes de acompanhar a evolução da sociedade

brasileira, protegendo a relação contratual em todas as suas fases sem

distinção de categorias na busca de uma constitucionalização do direito privado

e maior equilíbrio entre os contratantes em conformidade com a boa-fé (objetiva

e subjetiva) e os costumes solidificados na sociedade brasileira.

8 – Contrato de Cédula de Crédito Bancário (CCB) e de Factoring

Por serem dois dos principais instrumentos contratuais celebrados pelas

empresas, discorrer-se-á sobre algumas de suas características e

peculiaridades.

8.1 – AS CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO (CCB) NOS CONTRATOS DE

ABERTURA DE CRÉDITO E SUAS CONTROVÉRSIAS

As Cédulas de Crédito Bancário (CCB) surgiram em nosso ordenamento

jurídico através da Medida Provisória nº 1.929/99, sucessivamente editada até o

advento da lei 10.931/04 que revogou expressamente a última MP (última

edição nº 2.160-25) e, atualmente, regula o instituto em seu capítulo IV artigos

26 a 45, sendo que no art. 26 as CCB‟s são classificadas como: “Título de

Crédito emitido, por pessoa física ou jurídica, em favor de instituição financeira

ou de entidade a esta equiparada, representando promessa de pagamento em

dinheiro, decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade”, desta

forma possuem força de título executivo extrajudicial, na forma do art. 585, VIII

do CPC que também é explicitado no art. 28 da lei 10.931/04:

Art. 28 - A Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial e

representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma

nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de

Page 61: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

60

cálculo, ou nos extratos de conta corrente, elaborado conforme

previsto no § 2º.

Tal artigo explicita as características de um título de crédito, em harmonia

ao conceito que Vivante70, a quem coube a definição tida como a mais completa,

declarou: “O título de crédito é o documento necessário para o exercício do

direito, literal e autônomo, nele mencionado”, praticamente transcrito no art. 887

da lei 10.406/0271 (Código Civil), com divergência na melhor aplicabilidade da

palavra “mencionado”, como definiu Vivante, ao invés de “contido” como na lei.

A CCB surge como mecanismo de simplificação, flexibilidade, celeridade

e segurança para o Sistema Financeiro Nacional suprindo incertezas criadas

pela evolução jurisprudencial à cerca da exequibilidade dos contratos de

abertura crédito, que tiveram a sua liquidez e certeza mitigadas pelo Superior

Tribunal de Justiça com a edição de várias súmulas72 sobre o tema.

Com a criação da CCB, pelo poder executivo e posteriormente pelo

legislador infraconstitucional, tenta-se reverter o quadro de insegurança que

pairava sobre as operações de crédito causadas pelo judiciário, aumentando o

risco das Instituições Financeiras (IF), em não reaver com rapidez seus

recursos, e como conseqüência aumentando as taxas de juros aplicadas nas

operações de crédito ofertadas.

Destaca-se que a criação do instituto das Cédulas já encontrava boa

experiência em nossa legislação pátria como, por exemplo, as Cédulas de

Crédito Rural 73, Cédulas de Crédito Industrial 74, Cédula de Crédito ao

70 VIVANTE Apud in BERTOLDI, Marcelo M. Curso Avançado de Direito Comercial,- 4. ed. rev., atual., e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, pág. 366. 71 Art. 887 – O Título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei. 72 Súmula: 300 - O instrumento de confissão de dívida, ainda que originário de contrato de abertura de crédito, constitui título executivo extrajudicial. Súmula: 233 - O contato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato de conta-corrente, não é título executivo Súmula: 247 - O contrato de abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui documento hábil para ajuizamento da ação monitória. Súmula: 258 - A nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito não goza de autonomia em razão da iliquidez do título que a originou. 73 Decreto-Lei 167/67. 74 Decreto-Lei 413/69

Page 62: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

61

Exportador 75, dentre outras, com experiência aprovada pela jurisprudência e

pelos costumes comerciais, todavia, apesar de sua relevância e de suprir a

necessidade do mercado, cumprindo assim com o “espírito da lei” definido por

Montesquieu76, a CCB, ainda hoje, gera controvérsias que serão abordadas a

seguir.

8.1.1 – Da Constitucionalidade Da Cédula De Crédito Bancário

Alguns juristas tentam arguir a inconstitucionalidade das CCB‟s nos

contratos de abertura de crédito por entenderem haver um erro formal na

elaboração da lei 10.931/04, que ao contrariar o disposto no art. 5º caput e LIV

c/c art. 59, parágrafo único da CRFB/88 c/c art. 7º da LC 95/98 violaria a forma

exigida ao contemplar mais de um tema na mesma lei, é o pensamento dos

Ilustres Prof‟s. Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery que, conforme

abaixo, defendem a inconstitucionalidade formal e substancial, além de

questionarem a liquidez da CCB:

Na verdade, a Cédula de Crédito Bancário nada mais é do que o

antigo Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente (cheque

especial), tratado na LPAII com outro nome. Como não se obteve êxito

no Poder Judiciário com o antigo procedimento, cria-se, por lei, um

substituto exatamente idêntico. Continuam e persistem os mesmos

defeitos verificados quanto àqueles contratos de abertura de crédito: a)

o título, nada obstante a norma conferir-lhe eficácia executiva, não é

executivo porque lhe falta liquidez; b) a liquidação do título, feita por

planilha ou juntada de extratos, continua a ser unilateral, apenas por

parte do credor (...) deixando-se nas mãos do credor, unilateralmente,

a criação do conteúdo do título. 77

75 Lei nº 6.313/75 76 MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis. Tradução de Jean Melville. São Paulo: editora Martin Claret, 2004, passim 77 Apud in TJ/SP, Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais de Direito Privado, Apelação Cível com revisão 581.179-4/9-00 - Rel. Des. Romeu Ricupero, julg. em 17/12/2008, passim

Page 63: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

62

Sobre a inconstitucionalidade formal e material da CCB, NERY E NERY,

entendem que são flagrantes os confrontos com o texto constitucional e com a

Lei Complementar 95/98, como se segue:

Inconstitucionalidade formal e material. Descumprimento da CF 5º,

caput e LIV e LC 95/98 7º. (...) Quanto à forma, referimo-nos à

desobediência da garantia do devido processo legal (CF 5º caput e

inciso LIV), porque nela se inseriu matéria que nada tem a ver com o

objeto da lei, descumprindo-se o rito estabelecido pela LC 95/98 7o. A

LC 95/98, que regula o processo legislativo e traça os princípios

fundamentais a respeito da elaboração das leis (...) O objeto da LPAII

é a regulação do patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias.

São conexas e correlatas a esse objeto a instituição da letra de crédito

imobiliário (LPAII 12) e a cédula de crédito imobiliário (LPAII 20),

matérias afetas ao objeto da LPAII. Ao contrário, a cédula de crédito

bancário não é matéria conexa ou correlata ao patrimônio de afetação

de incorporação imobiliária. Constitui, isto sim, instrumento a que se

pretende dar eficácia executiva genérica, nada tendo a ver com

incorporação imobiliária. É o "Pilatos no Credo" da lei do patrimônio de

afetação. Essa intromissão de assunto que nada tem a ver com o

objeto da lei - que tem de ser um só (LC 95/98 7o I) - foi banida do

sistema jurídico brasileiro pela LC 95/98 7o, que, como norma

complementar à Constituição, deve ser entendida como extensão da

CF, motivo por que suas regras têm de ser respeitadas pela legislação

ordinária. (...) Essa inconstitucionalidade, por ofensa às regras do

processo legislativo, é, a um só tempo, formal e substancial. São

inconstitucionais, portanto, os arts. 26 a 45 da LPAII. 78

Ainda, conforme Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery:

Inconstitucionalidade material. Descumprimento da CF 5º caput

Há, ainda, outra inconstitucionalidade material na LPAII porque a

norma, desatendendo não só o princípio constitucional do devido

processo legal, em seu aspecto material (substantive due process

78 Ibid, Passim

Page 64: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

63

clause - v. Nery-Nery, CF Comentada, coments. CF 5o LIV), como

também os princípios constitucionais da proporcionalidade e da

razoabilidade, confere liquidez a título que intrinsecamente não tem,

característica essa confessada pela própria norma. Isso quer dizer

que a cédula de crédito bancário não é, em princípio, um título líquido;

só se tornará líquido se acompanhado de instrumentos criados

unilateralmente pelo credor. Ou seja, para ser líquido bastaria a

interveniência unilateral do banco credor, que cria o conteúdo do

título. (...) Cédula assim emitida é nula pleno jure, como ocorre de

ordinário nos contratos de adesão. A MedProv 2160-25 foi revogada

pela L 10931, de 2.8.2004 (LPAII - DOU 3.8.2004), que instituiu a

cédula de crédito bancário, copiando literalmente os dispositivos sobre

a matéria constantes da revogada MedProv 2160-25. Corrigida a

inconstitucionalidade formal, de que padecia a referida MedProv,

criaram-se outras, formal e material, de modo que, mesmo instituída

por lei, a cédula de crédito bancário continua a ser um instrumento

inconstitucional que não pode ser válido e nem ter eficácia no mundo

jurídico, econômico e social. Demais disso, do ponto de vista técnico,

a cédula de crédito bancário, nada obstante tenha sido introduzida no

sistema jurídico por lei, continua a ser um título desprovido de eficácia

executiva, porque ilíquido. Só será título legitimamente líquido se

contiver valor certo em seu corpo (e não em extratos e demonstrativos

criados unilateralmente pelo credor), e tiver sido assinado em preto

pelo devedor" (cf. Código de Processo Civil Comentado e Legislação

Extravagante, 10a edição, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais,

2007, notas 24 a 27 ao art. 585 do CPC, pp. 987-989).79

Neste sentido são os julgados da 19ª Câmara - Ap.7.126.679/4; 20ª

Câmara- Ap. 7.144.874/7; 23ª Câmara - AI . 250.201/3 e AI 7.219.213/7 e 20ª

Câmara - Ap 7.075.654-6.

Na mesma seara, e rebatendo de forma magistral o questionamento

anterior, na decisão exarada no mesmo acórdão onde foi relator o

Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Dr. Romeu

Ricupero:

79 Ibid, Passim

Page 65: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

64

Porém o fato objetivo é que a lei de regência, no caso a lei

complementar nº 95/98, não traz previsão de nulidade para a lei que

desrespeitar seus preceitos.

Antes, há dispositivo expresso estabelecendo que a não observância

do comando ali existente não autoriza seu não cumprimento (art 18:

Eventual inexatidão formal de norma elaborada mediante processo

legislativo regular não constitui escusa válida para seu

descumprimento)

(...)

Essa lei complementar disciplinou a forma de elaborar uma lei, mas

não estabeleceu um sancionamento para o caso de seu não

descumprimento.

Não se pode, portanto concluir pela nulidade de lei ordinária que tenha

deixado de respeitar a disciplina ali estabelecida. 80

Ao versar sobre o espírito da lei, elucida no mesmo voto o

Desembargador Ricupero:

Quis o legislador que o crédito rotativo concedido ao mutuário sob os

auspícios desse normativo, pudesse ser materializado mediante

documento com força executiva, desde que o mutuante observasse a

série de requisitos ali estabelecidos como forma de determinação do

valor da dívida.

(...)

O fato é objetivo: a vontade do Estado era essa e cristalizou-se na lei.

81

Conforme bem complementa, de forma incisiva, o ilustre Mestre Valdir

Carlos Pereira Filho ao qual mesmo que extensa a nota de rodapé, merece

transcrição de boa parte para não restar qualquer dúvida sobre a intenção do

legislador:

80 Ibid, Passim 81 Ibid, Passim

Page 66: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

65

“Entretanto, sempre há aqueles que, para se furtar de suas obrigações

ou protelar seu pagamento usam os meios judiciais e lançam teses

descabidas, que em nada enriquecem o debate jurídico, mas que

podem abalar a segurança jurídica. Um exemplo é recente acórdão de

29/06/2005 da 23ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça

de São Paulo (Agravo de Instrumento nº 7.011.347-2) que afastou o

reconhecimento as CCB como título executivo extrajudicial por

entender ser a Lei 10.931/04 inconstitucional por dispor d vários

assuntos sem conexão e sem estarem mencionados no seu art. 1º,

violando assim a Lei Complementar nº 95/98, já que não se trata de

uma codificação.

(...)

Este quadro resulta da falta de análise dos efeitos econômicos das

decisões judiciais e de enxergar o escopo da lei 10.931/04 que é

justamente trazer segurança e certeza, desrespeitou-se o espírito da

lei e o interesse coletivo em benefício de um caso particular, sem

considerar a discutível fundamentação dessa decisão.” 82

Em sintonia com os argumentos apresentados seguem algumas ementas

de decisões declarando não haver tal vício, de forma predominante em nossos

tribunais:

EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO

BANCÁRIO. A cédula de crédito bancário é título com força executiva,

expressamente atribuída pelo art. 28 da Lei 10.931/04. Via eleita pelo

agravante, que se mostra adequada à luz do art. 585, inc. VIII, do

CPC. Jurisprudência Dominante no eg. STJ e no TJRJ. Aplicação do

art. 557, § 1º-A, do CPC. PROVIMENTO DO RECURSO. 83

APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO PROCESSUAL CIVIL – CÉDULA DE

CRÉDITO BANCÁRIO – LEI Nº 10.931/04 0- TÍTULO EXECUTIVO

EXTRAJUDICIAL DOTADO DE CERTEZA, LIQUIDEZ E

82 PEREIRA FILHO, Valdir Carlos.Cédula de Crédito Bancário in Contratos Bancários. Coord. FONTES, Marcos Rolim Fernandes e WAISBERG, Ivo – São Paulo: Quartier Latin, 2006, pág. 283. 83 TJ/RJ, 18ª Câmara Cível. Ag. de Instrum. 33947/2008 – Rel. Des. Célia Maria Vidal Meliga Pessoa, julg em 09/12/2008.

Page 67: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

66

EXIGIBILIDADE (ART. 28) – RESTOU DEMONSTRADO QUE O

DOCUMENTO DE FLS. 18/20 PREENCHEU OS REQUISITOS

ESSENCIAIS (ART. 29) – PROSSEGUIMENTO DO FEITO

EXECUTIVO – DÁ-SE PROVIMENTO AO RECURSO (CPC, ART. 557,

CAPUT).84

AGRAVO. EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. CONTA

GARANTIDA. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO TÍTULO

EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL.

A cédula de crédito bancário ostenta a natureza de título executivo

extrajudicial, por força do que dispõem os artigos 585, VIII, do CPC e

28, da Lei 10931/04. Precedentes jurisprudenciais. Recurso provido.85

AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA EXECUÇÃO CÉDULA

DE CRÉDITO BANCÁRIO. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDUDICIAL.

1) A cédula de crédito bancário ostenta a natureza de título executivo

extrajudicial, por força do que dispõem os artigos 585, VIII, do CPC e

28, da Lei 10931/04. Precedentes jurisprudenciais. A existência de

conta corrente vinculada ao negócio jurídico representado no título não

afasta sua força executiva. 2) desprovimento do recurso.86

Somam-se aos já citados os seguintes julgados no TJ/RJ:

2007.001.69736 da 7ª Câmara Cível, 2007.002.35771 da 8ª Câmara Cível,

2008.002.03067 da 19ª Câmara Cível e 2007.001.69185 também da 19ª

Câmara Cível.

Desta forma, apesar de ainda existir controvérsia na doutrina e na

jurisprudência acerca da constitucionalidade e liquidez da CCB, dever-se-á

inclinar-se para a corrente majoritária no sentido de entender como válida e

constitucional a CCB, como já bem esclarecido, há intenção do Estado em

consagrar tal Título especificamente para viabilizar os contratos bancários e

financeiros para lhes garantir segurança, liquidez e celeridade, bem como os

84 TJ/RJ, 12ª Câmara Cível. Ap. Cível. 2008.001.27723 – Rel. Des. Márcio Guimarães Neto, julg em 09/12/2008. 85 TJ/RJ 18ª Câmara Cível. Agravo. 9203/08. Rel. Des. Jorge Luiz Habib, julg em 12/08/2008. 86 TJ/RJ 2ª Câmara Cível. Apelação Cível. 2007.001.64189. Rel. Des. Heleno Ribeiro P. Nunes, julg em 20/02/2008.

Page 68: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

67

argumentos muito mais consistentes afastando a inconstitucionalidade material e

formal, combatida pela corrente minoritária, que coaduna ainda o entendimento

do STF no sentido de não ser possível o questionamento sobre a

inconstitucionalidade de norma por via reflexa, sendo necessário que haja

confronto direto com o texto constitucional para ser aguida, conforme o julgado

abaixo:

RE 147684 / DF - DISTRITO FEDERAL

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE

Julgamento: 26/06/1992 Órgão Julgador: Tribunal Pleno

1. RE: descabimento: ofensa reflexa a constituição por violação da

norma interposta. O RE não e via adequada a apuração da

inconstitucionalidade reflexa: se a constituição, explicita ou

implicitamente, remete o trato de determinada matéria a lei ordinária,

não cabe o recurso extraordinário por contrariedade a lei fundamental,

se a aferição desta pressupõe a revisão da inteligência e da aplicação

dadas a norma sub-constitucional interposta: analise da jurisprudência.

2. RE: descabimento: acórdão recorrido com dois fundamentos

suficientes (ainda que reciprocamente excludentes), pelo menos um

deles, de base infraconstitucional. E da estrutura dos recursos de

revisão in jure, como o RE, o requisito do nexo de causalidade entre o

erro de direito denunciável e denunciado pelo recorrente e a

sucumbência, que lhe demarca o interesse processual de recorrer:

desse modo, não cabe o RE, hoje restrito a matéria constitucional, se a

decisão recorrida, da competência originaria do superior tribunal de

justiça - o que afasta a possibilidade do recurso especial - tem mais de

um fundamento independente e bastante a alicerçar-lhe a conclusão e

algum deles, pelo menos, e de alçada infraconstitucional ou só obliqua

e mediatamente constitucional.

Por todo o exposto resta indubitável a Constitucionalidade da Cédula de

Crédito Bancário (CCB) – quando cumpridos todos os requisitos formais

Page 69: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

68

exigidos na lei que a regula – utilizada na celebração de contratos de natureza

bancária, seja por afastar-se a tese de confronto direto com o texto da Carta

Política de 88 e não haver previsão de declaração de inconstitucionalidade por

via oblíqua; por haver permissivo previsto na própria legislação complementar

(LC 95/98), determinando que o descumprimento do previsto naquela norma

não caracteriza a nulidade da nova lei; bem como cumpre com sua finalidade e o

“espírito da lei”, o de possibilitar a circulação de riquezas com maior segurança

jurídica, celeridade, liquidez e certeza da dívida, seja por estar inscrito no

próprio título, seja pela fácil constatação, através de extrato bancário –

facilmente impugnado no caso de discordância nos embargos à execução

através dos demonstrativos de depósito ou transferência – o que não torna

ilíquida a CCB, por tratar-se de simples demonstrativos do abatimento da

dívida.

8.2 – CONTRATOS DE FATURIZAÇÃO (FACTORING) E A LIMITAÇÃO DOS

JUROS REMUNERATÓRIOS EM 12% A.A

O contrato de faturização surge no Brasil, de acordo com Fran Martins,

“como meio de atender às pequenas e médias empresas, na obtenção de

capital de giro, sem as dificuldades geralmente observadas no desconto

bancário, muitas vezes de difícil acesso aos “pequenos comerciantes”87.

Tais contratos possuem uma natureza jurídica de cessão de crédito sem

garantia subsidiária do cedente, segundo o Ilustre Doutrinador Gustavo

Tepedino:

Dentre os efeitos da cessão, destaca-se a responsabilidade do

cedente, que varia conforme se trate de ato praticado a título oneroso

ou gratuito.

(...)

87 MARTINS, Fran. Contratos e Obrigações Comerciais. ed. rev. e aum. Rio d Janeiro: Forense, 2002, pág. 472.

Page 70: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

69

Na cessão onerosa, o cedente é responsável pela existência do

crédito transferido no momento da cessão, mas não pela solvência do

devedor como dispõe o art. 296, ... 88

Por suas características de exclusão da responsabilidade do cedente, e

com isso um alto grau de risco de inadimplência assumido em sua formação,

gera-se certo desconforto e contraprestação em patamares por vezes desleais,

sendo refúgio apenas daqueles que não conseguem descontar seus títulos em

instituições financeiras, equivocando-se os que acreditam ser um serviço pouco

utilizado, pelo contrário, a cada dia surgem novas empresas neste ramo, sendo

que durante certo tempo ficou, inclusive, vedado pelo BACEN enquanto não

havia o mínimo de regulação, haja vista o entendimento, mesmo que equivocado

de confundir as empresas de factoring com instituições financeiras.

Destaca-se o instituto do endosso sem garantia, previsto na LUG sobre

Letras de Câmbio e Notas Promissórias, presente no caso de tais cessões,

desobrigando, assim, o endossante tanto da aceitação da letra como do

pagamento da mesma, que hoje, utiliza muito mais um contrato de cessão sem

coobrigação, haja vista os numerosos títulos que podem ser utilizados e o

tamanho da pulverização dos mesmos pelos sacados.

Como pessoas de tal relação destacamos a presença do Faturizado e

Faturizador, sendo o primeiro aquele que cede os títulos e o segundo o que

adquire os títulos, ressaltando-se o caráter do faturizador não possuir direito de

regresso contra o faturizado, apenas sobre o devedor principal do título

adquirido.

Há dois modelos clássicos de faturização, o primeiro conhecido como

faturização convencional (Convencional Factoring) e o segundo como

faturização no vencimento (Maturity Factoring), que diferem quanto ao

vencimento das faturas adquiridas, uma antes e a outra posterior ao vencimento.

88 TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena e MORAES, Maria Celina Bodin de. Código Civil interpretado conforme a Constituição da República – 2ª ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Renovar, 2007, pág. 583.

Page 71: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

70

Questão de grande valor, hoje pacificada na jurisprudência e na doutrina,

é sobre a limitação dos juros aplicados a operações realizadas por empresas de

Factoring, que no brasil estão limitados a 12 % a. a. (Doze por cento ao ano)

sobre o montante contratado, no caso de descaracterização da operação de

faturização e configuração de operação de empréstimo, por estar explicitamente

vedado a capitalização de juros em patamar superior a 12 % a. a. (Doze por

cento ao ano), na forma da lei civil e tributária, nos casos de empréstimos

realizados por instituições não financeiras, conforme regulado pelo Banco central

do Brasil (BACEN) e Conselho Monetário Nacional (CMN), ainda em

conformidade com os julgados do STJ que se seguem:

AgRg no AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 776.350 - RJ

(2006/0087107-7)

RELATOR : MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE

INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. TÍTULO EXTRAJUDICIAL.

PRESUNÇÃO DE LIQUIDEZ. EMPRESA DE FACTORING.

EMPRÉSTIMO GARANTIDO. CHEQUES. POSSIBILIDADE. JUROS.

LIMITAÇÃO. LEI DE USURA. DESPROVIMENTO. Julg 02/12/2008

No caso dos autos, consignou o Tribunal Fluminense que, em razão

de terem sidos "os cheques emitidos pelo próprio contratante, fica

descaracterizada a operação de Factoring , passando a ser um

empréstimo com cheques em garantia" (fl. 688) para concluir pela

inexigibilidade dos títulos.

RECURSO ESPECIAL Nº 623.691 - RS (2004/0001616-5)

RELATOR : MINISTRO CESAR ASFOR ROCHA

AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL E AÇÃO

INDENIZATÓRIA. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM CESSÃO

DE CRÉDITO A EMPRESA DE FACTORING VINCULADA A

INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INCIDÊNCIA DA LEI DE USURA. JUROS

MORATÓRIOS. DANO MORAL. PROTESTO INDEVIDO. QUANTUM

INDENIZATÓRIO EXCESSIVO. REDUÇÃO.

Page 72: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

71

"Tratando-se de empresa que opera no ramo de factoring, não

integrante do Sistema Financeiro Nacional, a taxa de juros deve

obedecer à limitação prevista no art. 1º do Decreto nº 22.626, de

7.4.1933" (REsp n. 330.845/RS, relatado pelo eminente Ministro Barros

Monteiro, DJ de 15/09/2003). O fato de a empresa de factoring ser

vinculada a instituição financeira tampouco altera tal disciplina. Os

juros moratórios podem ser convencionados no limite previsto no

Decreto n. 22.626/33, consoante jurisprudência pacificada nesta

Corte. Julg em 27/09/2005

RECURSO ESPECIAL Nº 330.845 - RS (2001/0079550-1)

RELATOR : MINISTRO BARROS MONTEIRO

CONTRATO DE FINANCIAMENTO. EMPRESA DE FACTORING.

LIMITAÇÃO DA TAXA DE JUROS. INCIDÊNCIA DA LEI DE USURA.

– Tratando-se de empresa que opera no ramo de factoring, não

integrante do Sistema Financeiro Nacional, a taxa de juros deve

obedecer à limitação prevista no art. 1º do Decreto nº 22.626, de

7.4.1933. Recurso especial não conhecido. Julg em 17/06/2003

Desta forma, já está pacificado na doutrina e jurisprudência que quando

uma empresa de Factoring tenta descaracterizar suas operações de cessão de

crédito sem coobrigação, realizando verdadeiros mútuos com garantias de

cheques ou outros títulos, está adstrita a cobrança de apenas juros em 12%

(doze por cento) a. a., não havendo mais justo motivo para quaisquer

questionamentos nesse sentido, desde que descaracterizado o contrato de

faturização, do contrário haverá apenas a cessão de crédito, nos moldes já

explicitados.

CONCLUSÃO

Por todo o exposto conclui-se que a árdua tarefa de realizar uma legal

due diligence societária requer do Advogado um vasto conhecimento sobre o

tema, todas as suas nuances e possíveis variações, atentando sempre para os

princípios éticos que lhe são peculiares ao redigi seu parecer e orientar os

Page 73: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

72

administradores, acionistas, investidores, terceiros ou até a administração

pública sobre o estado de saúde jurídica em que se encontra a sociedade

analisada, prevenindo riscos desnecessários por parte dos que adotam este

instrumento como forma de balizar uma maior governança corporativa mitigando,

conforme já explicitado, os riscos na celebração de operações, bem como

auxiliando e norteando os acionistas na busca de seus principais objetivos, com

as devidas adequações estatutárias ou através de acordos de acionistas capaz

de realizar os seus interesses, desta forma conclui-se por utilizar como

referência para uma análise societária adequada o seguinte check-list, baseado

no que a melhor doutrina utiliza para a consecução de seus objetivos dividido em

passos, a seguir:

1. Análise do status atual da companhia, o estatuto social vigente com

alterações posteriores não consolidadas; das atas de eleição da

diretoria; procurações vigentes e já vencidas num período mínimo de

06 (seis) anos, em média dois períodos de gestão; das certidões

extraídas para a verificação de seu regular registro na junta comercial

e lavratura nos livros competentes;

2. Informações sobre o capital social subscrito e integralizado nos

prazos determinados na lei e estatutariamente e sua previsões de

aumento ou redução;

3. Lista dos acionistas com a sua regular qualificação e discriminação

de ações nos livros competentes, sendo analisada em confronto com

o estatuto social;

4. No caso de necessidade de autorização governamental, se as

exigências estabelecidas na legislação específica foram

integralmente cumpridas, bem como da validade e autenticidade dos

documentos;

5. Análise de todas as alterações estatutárias seja por aumento de

capital, mudança da forma de gestão, reestruturação societária ou

para o cumprimento de determinação legal; informações e

Page 74: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

73

documentos pertinentes a filiais, subsidiárias ou outras companhias

da qual a sociedade auditada faça parte ou possuo alguma

participação, bem como de todos os convênios celebrados pela

sociedade com a descrição das obrigações e vantagens cedidas ou

adquirias, conforme o caso;

6. A verificação de todas as atas da assembléia geral, seja ordinária ou

extraordinária, bem como das reuniões da diretoria, e seu correto

arquivamento e publicação, conforme o caso;

7. A verificação de todos os livros societários analisando os aspectos

formais necessários a sua validade e dos atos nele arquivados;

8. A análise das obrigações contratuais de maior vulto e interesse da

sociedade, sob os aspectos referentes a vencimento antecipado da

dívida no caso de mudança de controle da companhia, bem como de

outorga de garantias reais ou fidejussórias com os instrumentos que

a formalizaram;

9. Cronograma de distribuição de dividendos, indicando se já forma

pagos e quando forma ou serão pagos;

10. informações contábeis da companhia e de todas as subsidiárias,

controladas, filiais e empresas da qual participe, ainda que

minoritariamente, capazes de orientar e ratificar os dados

investigados

11. A existência de proteção aos acionistas minoritários (tag along); ou

posison pill’s para dificultar a mudança do controle societário, bem

como de todos os acordos de acionistas arquivados na companhia

além de

12. todos os demais documentos, certidões, extratos e contratos que se

fizerem necessários a elaboração de uma parecer capaz de se

revestir das características necessárias a execução, com a devida

proficiência esperada do causídico no exercício de seu mister.

Com a aplicação da cautela devida e diligência pertinente, através dos

pontos acima descritos poder-se-á chegar a uma boa análise e redação de

Page 75: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

74

parecer conclusivo sobre a companhia no que se refere a legal due diligence

societária, lembrando que esta é apenas uma pequena vertente da due

diligence que, conforme a necessidade, deverá ser complementada pelas

demais áreas do direito dentre outras como financeira, contábil, administrativa,

etc...

No que se refere aos aspectos da auditoria contratual, os princípios

explicitados e a análise das obrigações como processo sob a nova perspectiva

jurídica Civil-Constitucional, devem nortear toda a análise dos contratos postos a

auditoria, observando os requisitos específicos de cada contrato, sua

formalização e comprimento das solenidades, quando descritas para que se

aperfeiçoem e produzam os efeitos esperados com o adimplemnto, ou se não

for o caso do cumprimento espontâneo em conformidade com o que foi

acordado, a busca da prestação jurisdicional de forma plena sem receio de

vícios capazes de viabilizar a inexecução de seus direitos, utilizando-se sempre

dos conceitos aqui apresentados, bem como dos deveres anexo presentes em

toda a relação obrigacional exprimida através de contratos.

Dos contratos em espécie apresentados, estes foram selecionados por

serem duas das principais formas das empresas conseguirem recursos junto ao

mercado financeiro, para a execução regular de suas atividades ou como forma

de financiamento da atividade produtiva da empresa, ressalta-se que aspectos

concorrenciais, tributários, trabalhistas, regulatórios dentre outros foram

omitidos por não se tratarem do objeto do presente estudo.

Page 76: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

75

BIBLIOGRAFIA

ABRÃO, Carlos Henrique. Cofres de Segurança in Contratos Bancários.

Coord. FONTES, Marcos Rolim Fernandes e WAISBERG, Ivo – São Paulo:

Quartier Latin, 2006;

ADIERS, Leandro Bittencourt. Função e natureza jurídica das

demonstrações financeiras. Caráter constitutivo das decisões

assembleares tomadas por órgãos das sociedades anônimas. A ação

reguladora e princípios essenciais vinculadores de companhias abertas

com valores mobiliários no mercado de capitais. Imposições da ordem

Constitucional Econômica. Prazos de prescrição na leis das Sociedades

Anônimas in Revista de Direito empresarial IBMEC, vol. 3.

BERTOLDI, Marcelo M. Curso avançado de direito comercial. 4ª ed. ver.

atual. e ampl. São Paulo: Editora revista dos Tribunais, 2008;

BORBA, José Edwald Tavares. Direito Societário. 10ª ed. rev. aum. e atual..

Rio e Janeiro: Renovar, 2007;

CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas, Lei nº

6.404 de 15 de dezembro de 1976, com as modificações das Leis n. 9.457,

de 5 de maio de 1997, 10.303, de 31 de outubro de 2001, e 11.638 , de 28

de dezembro de 2007. 4ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009;

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. – 7ª. ed.

São Paulo: Atlas, 2007;

CHAVES, Cristiano de Farias e ROSENVALD, Nelson. Direito das Obrigações.

4ª. ed., atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009

Page 77: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

76

COSTA, Judith Martins. Os Avatares do Abuso do Direito e o Rumo Indicado

pela Boa-Fé. Apud in Congresso Internacional e Direito Civil-Constitucional.

Direito Civil Contemporâneo: novos problemas à luz da legalidade

constitucional: anais do congresso internacional de direito civil-constitucional da

cidade do Rio de Janeiro/Gustavo Tepedino, Organizador.-São Paulo: Atlas,

2008.

CURY, Ieda Tatiana. Apostila de Direito empresarial utilizada na pós-

graduação em direito empresarial e dos negócios. Material elaborado para

complementação pedagógica.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21ª ed. São Paulo:

Atlas, 2008;

EIZIRIK, Nelson. Temas de Direito Societário. Rio de Janeiro: Renovar, 2005;

EIZIRIK, Nelson; GAAL, Ariádna B.; PARENTE, Flávia; HENRIQUES, Marcus de

Freitas. Mercado de Capitais – Regime Jurídico. 2. ed. rev. e atual.- Rio de

Janeiro: Renovar, 2008;

GOMES, Orlando. Contratos. 18ª. ed., atual. por Humberto Theodoro Júnior.

Rio de Janeiro: Forense, 1999;

GUMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. 6ª ed. rev. e

atual. São Paulo: Rideel, 2004;

MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial: empresa comercial, empresários

individuais, microempresa, sociedades comerciais, fundo de comércio. ed. rev.e

atual. Rio de Janeiro: Forense, 1999;

Page 78: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

77

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil: Direito das

Obrigações, Vol. 5, 2ª Parte. – 34ª. ed. rev. e atual. por Carlos Alberto Dabus

Maluf e Regina Beatriz Tavares da Silva. – São Paulo: Saraiva, 2003;

MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis. Tradução de Jean Melville. São Paulo:

editora Martin Claret, 2004;

NEJM, Edmundo e BRUNA, Sérgio Varella apud in ASSUMPÇÃO, Antônio

Augusto Francia ET AL in ABRAHAM, Marcus (org.) – Manual de Auditoria

Jurídica - Legal Due Diligence: uma visão multidisciplinar no Direito

Empresarial Brasileiro. São Paulo: Quartier Latin, 2008;

PATACO, Vera Lucia Paracampos; VENTURA, Magda Maria; RESENDE, Érica

dos Santos. Metodologia para trabalhos acadêmicos e normas de

apresentação gráfica. Rio de Janeiro: Ed. Rio, 2004;

PEREIRA FILHO, Valdir Carlos. Cédula de Crédito Bancário in Contratos

Bancários. Coord. FONTES, Marcos Rolim Fernandes e WAISBERG, Ivo –

São Paulo: Quartier Latin, 2006;

SCHONBLUM, Paulo Maximilian Wilhelm. Contratos Bancários. – Rio de

Janeiro: Freitas Bastos, 2005

SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da

erosão aos filtros da reparação à diluição dos danos. 2ª ed.- São Paulo: Atlas,

2009

TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena e MORAES, Maria Celina

Bodin de. Código Civil interpretado conforme a Constituição da República –

2ª ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Renovar, 2007;

Page 79: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

78

XAVIER, Lídice Marques da Silva. Fechamento de capital das companhias

abertas in Revista de Direito empresarial IBMEC, vol. 3;

________________Pinheiro Neto Advogados. Company Formation in Brazil,

disponível em:

http://www.pinheironeto.com.br/upload/tb_pinheironeto_livreto/pdf/07110809254

0CompanyFormation_port.pdf Acesso em: 29/05/2009

BARQUETTE, Lucas Alexandre. O uso estratégico da auditoria jurídica para

o sucesso do negócio. Disponível em:

www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/brasilia/16_373.pdf Acesso em:

29/05/2009

JUNGMAN, Raul. Projeto de lei 6.854 de 2006, Altera o artigo 1º da Lei nº

8.906, de 04 de julho de 1994, que “dispõe sobre o Estatuto da Advocacia

e a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB.” Disponível em:

http://www.camara.gov.br/sileg/integras/385714.pdf acesso em 29/05/2009.

MIRANDA, Maria Bernadete. Restrições à Circulação de Ações em

Companhia Fechada. Disponível em:

http://www.direitobrasil.adv.br/arquivospdf/artigos/artigo3.pdf

Acesso em 25/05/2009;

SANTOS, Thiago Carvalho. A importância da Due diligence no universo

empresarial. Disponível em:

http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1153 Acesso em:

28/05/2009;

SLAIBI FILHO, Nagib. A obrigação de diligência e a responsabilidade civil

do profissional liberal. Disponível em:

Page 80: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

79

http://www.tj.rj.gov.br/institucional/dir_gerais/dgcon/pdf/artigos/respo_civil/nagib

_slaibi.pdf. Acesso em: 28/05/2009;

VITA ROSO, Jayme. A Due Diligence na Joint Venture. Disponível em:

http://www.auditoriajurídica.com.br/artigos.php?cod=3 Acesso em: 28/05/2009;

_____________________. Auditoria jurídica para a sociedade democrática.

São Paulo: Escolas Profissionais Salesianas, 2001. Pág 44. apud in VITA

ROSO, Jayme. Poderá a auditoria jurídica servir de apoio à

governabilidade das instituições?

Disponível em: http://www.auditoriajurídica.com.br/artigos.php?cod=5 Acesso

em 05/05/2009;

__________________________ O valor agregado dos contratos

internacionais de transferência de tecnologia: o novo Código Civil

brasileiro e o rol do auditor jurídico. Disponível em:

http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=599 Acesso

em: 28/05/2009;

Portal do Banco Central do Brasil <www.bcb.gov.br> acesso em: 04 de abril de

2009;

ALMEIDA, William. A boa-fé Contratual diante da nova Codificação Civil.

Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1560/A-boa-fe-

contratual-diante-da-nova-codificacao-civil>.

Acesso em: 08/04/2009.

MELO, Lucinete Cardoso de. O princípio da boa-fé objetiva no Código Civil .

Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 523, 12 dez. 2004.

Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6027>.

Acesso em: 08/04/2009

Page 81: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … · (Pós-graduado - lato senso) em Direito Empresarial e ... fechadas e sociedades limitadas, ... como da análise da boa-fé

80

OLIVEIRA, Camila Nucci de. Boa-fé Objetiva dos Contratos no Código Civil

de 2002.

Disponível em:<http://www.franca.unesp.br/BOA_fe.pdf>. Acesso em:

08/4/2009.

TEPEDINO, Gustavo. As Relações de Consumo e a Nova Teoria Contratual.

Disponível em:

<http://www2.uerj.br/~direito/publicacoes/publicacoes/diversos/tepedino.html>.

Acesso em 08/04/2009.

Portal do Superior Tribunal de Justiça <www.stj.jus.br> acesso em: 04 de abril

de 2009;

Portal do Supremo Tribunal Federal <www.stf.jus.br> acesso em: 04 de abril de

2009;

Portal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro <www.tj.rj.gov.br>

acesso em: 04 de abril de 2009;

Portal do Tribunal de Justiça Estado de São Paulo <www.tj.sp.gov.br> acesso

em: 04 de abril de 2009.

Artigo disponível em:

<http://bdjur.stj.gov.br/jspui/bitstream/2011/16258/1/Direiro_Consumidor_Novo_

C%C3%B3digo_Civil.pdf>