universidade candido mendes pÓs-graduaÇÃo lato … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10...

60
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU INSTITUTO A VEZ DO MESTRE A AUTO-ESTIMA NO COTIDIANO ESCOLAR Por: Elizabete Amaro da Silva Orientadora Prof. Mary Sue Pereira Rio de Janeiro 2009

Upload: dinhcong

Post on 24-Jan-2019

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

A AUTO-ESTIMA NO COTIDIANO ESCOLAR

Por: Elizabete Amaro da Silva

Orientadora

Prof. Mary Sue Pereira

Rio de Janeiro

2009

Page 2: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

2

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS – GRADUAÇÃO LATO SENSU

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

A AUTO-ESTIMA NO COTIDIANO ESCOLAR.

Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do Mestre

Universidade Cândido Mendes como requisito parcial para

Administração e Supervisão Escolar.

Por: Elizabete Amaro da Silva.

Page 3: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

3

AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, professores, religiosos e todos que ajudaram-me a construir positivamente minha auto-estima, possibilitando-me o despertar de outros seres neste aspecto fundamental a vida humana.

Page 4: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

4

DEDICATÓRIA

Aos meus pais, professores, religiosos e todos que ajudaram-me a construir positivamente minha auto-estima, possibilitando-me o despertar de outros seres neste aspecto fundamental a vida humana.

Page 5: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

5

RESUMO

Este trabalho é fruto de uma experiência vivida durante minha atuação

profissional como professor junto a alunos de classes populares em escolas

públicas a mais de vinte anos. Nele procuro explicar como o indivíduo constrói

seu autoconceito e conseqüentemente sua auto-estima e a relação que estes

indicadores tem na vida acadêmica dos alunos. Destaco ainda a importância

dos professores neste aspecto como também algumas experiências bem

sucedidas nesta área.

Page 6: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

6

METODOLOGIA

Este trabalho foi possível através de observações, pesquisas e análises

de fontes bibliográficas específicas que fundamentaram a realização e a

conclusão sobre as questões propostas sobre a temática da auto-estima no

universo escolar.

Page 7: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I: A CONSTRUÇÃO DA AUTO- ESTIMA 10

CAPÍTULOII: A ESCOLA E A AUTO-ESTIMA. 23

CAPÍTULO III: EXPERIÊNCIAS BEM SUCEDIDAS. 45

CONCLUSÃO. 53

BIBLIOGRAFIA 57

ÍNDICE 59

FOLHA DE AVALIAÇÃO 60

Page 8: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

8

INTRODUÇÃO

As experiências vividas por nós educadores do Ensino Fundamental do

Colégio Estadual Vila Bela nas duas últimas décadas em contato cotidiano com

os alunos deste segmento, possibilitou-nos percebermos, cada vez mais a

questão da baixa estima de nossa clientela, composta majoritariamente por

crianças e jovens oriundos das classes menos favorecidas, economicamente e

socialmente, onde o acúmulo de “fracasso escolar” é um fato concreto em

nosso meio. Somando-se a isso o fato de que são eles, públicos da escola

pública estadual, os que mais dependem desta escola para receber educação

formal.

Um olhar sobre as últimas décadas, nos resultados obtidos no ensino

fundamental da rede estadual, constatamos um índice considerável de

repetência e evasão escolar. Neste aspecto Freire, (1989) afirma que

sucessivas repetições de exemplos de fracasso escolar das crianças pobres

fazem com que desenvolvam um sentimento de indignação e comprovação de

uma realidade desigual e desvantajosa para os alunos pertencentes às classes

populares. É necessário que a escola favoreça o desabrochar de

personalidades mais autoconfiantes e seguras.

A formação do autoconceito (percepção que a pessoa tem de si

mesma) e consequentemente da auto-estima (sentimento que a pessoa tem do

seu próprio valor) é uma característica dinâmica ser humano adquire e constrói

na medida em que desenvolve a percepção e a compreensão de seus valores

Page 9: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

9 pessoais e sociais, adquiridos inicialmente no ambiente familiar e escolar,

espaço onde o aluno convive com pessoas significativas, para ele, e que

influenciarão na estruturação de sua identidade.

Nesta abordagem a escola deve possibilitar a formação de indivíduos

enquanto gênero humano repleto de valores e habilidade que deverão ir

ampliando-se cada vez mais na relação individual ou grupal. Para Moysés

(2001) o fato de o aluno considerar-se bom ou ruim pode acabar influenciando

seu desempenho escolar, na medida em que poderá afetar o seu grau de

esforço de persistência e o seu nível de ansiedade. Estudos neste setor

apontam que as pessoas com percepções positivas de suas capacidades

aproximam-se das tarefas com confiança e alta expectativa de sucesso e

conseqüentemente acabam saindo-se bem o que é ratificado por Libânio

(1984) quando afirma que o meio escolar é o espaço físico e humano da

escola, é um elemento motivador de disposições de aprendizagens,

acrescentamos que tanto no aspecto cognitivo como também afetivo.

A relação professor-aluno é significativa, pois é ele o responsável em

grande parte pelo que o aluno aprende e por esse motivo é que além da

orientação de ensino, ele pode estimular a criança por meio de exemplos

Souza (2001) afirma que a relação afetiva entre professor-aluno pode ser a

mola propulsora para o desempenho adequado do aluno na escola.

Diante desta realidade, este trabalho propõe-se a contribuir na reflexão

por parte dos docentes, sobre o seu papel na construção do autoconceito

positivo do aluno, pois este influenciará no desempenho escolar do aluno.

Page 10: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

10

CAPÍTULO I

A CONSTRUÇÃO DA AUTO-ESTIMA.

O tema da auto-estima atualmente é muito estudado por vários

profissionais que, de uma certa maneira ou de outra, trabalham ou estão

envolvidos com pessoas de diferentes fases do desenvolvimento. Esta é uma

construção que se inicia desde os primeiros dias de nossas vidas, nos

primeiros contatos interpessoais.

Os estudos e as pesquisas no campo do autoconceito e da auto-estima

vão aprimorando-se cada vez mais. Na década de 1970 e 1980 nos estudos

referentes a este tema, formou-se um certo consenso de que autoconceito é a

percepção que a pessoa tem de si mesma, ao passo que auto-estima é a

percepção que ela tem de seu próprio valor. O autoconceito procede de

processos cognitivos. Ele é fruto de percepção que a pessoa tem de si mesma

e como todo processo de percepção esta sujeito a fatores internos e externos à

própria pessoa. As informações que vamos colhendo aqui e ali a nosso

respeito, junto de opiniões alheias, forma possivelmente os primeiros

rendimentos do nosso autoconceito. É a essas informações vão se somando

aquelas avaliações originárias que fazemos de nós próprios fazemos dos

nossos desempenhos, ações, habilidade e características pessoais. Vão

formando, na nossa estrutura cognitiva, uma área de conhecimento acerca de

Page 11: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

11 nós próprios. Aquilo que achamos que somos, tanto do ponto de vista físico

quanto do social e do psicológico, vai assim ganhando corpo.

O sentimento que acompanha essa percepção que temos de nós

próprios constitui na nossa auto-estima que é a resposta no plano afetivo de

um processo originado no plano cognitivo. É a avaliação daquilo que sabemos

a nosso respeito: gosto de ser assim ou não?

Moysés (2003) afirma que a auto-estima se revela em nós como a

disposição que temos para nos vermos como pessoas merecedoras de

respeito e capazes de enfrentar os desafios básicos da vida.

O autoconceito é fruto de diferentes percepções que a pessoa faz

sobre si mesma, por isso comporta várias facetas. As que se baseiam na

aparência física, nas habilidades sociais, no desempenho intelectual e nas

habilidades motoras – essas facetas são as que a maior parte dos

pesquisadores tende a considerar como fundamentais na sua construção.

Veremos como se dá a sua formação.

Na criança pequena, a formação do autoconceito obedece às leis do

desenvolvimento cognitivo uma vez que ele é um caso particular de conceito. E

sua formação, embora possa ter sido matizada pelas cores dos sentimentos,

não deixa de se caracterizar por um processo de cunho cognitivo. Lev Vygotsky

em seu livro Pensamento e Linguagem, publicado em 1934, faz uma

abordagem sobre como se dá a formação de conceitos e, em 1962, na obra

Formação Social da Mente, retomou a essa questão sobre as funções mentais

superiores, abordando-a na ótica da internalização.

Page 12: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

12 Em Vygotsky (1984, p. 65) encontramos a explicação que todas essas

funções começam a se processar quando a criança se relaciona com o mundo

externo, isto é, com pessoas e situações sociais. Com a continuação do

contato e com o passar do tempo, esse processo, que era interpessoal passa a

ser internalizado, tornando-se intrapessoal, adquirindo o caráter de processos

internos como resultado de um desenvolvimento prolongado. Sua transferência

para dentro está ligada à mudança nas leis que governam sua atividade; elas

são incorporadas em um novo sistema com suas próprias leis.

Esse processo de internalização é feito com base em um sistema de

signos, no qual se destaca a linguagem.

1. 1. Rótulos e Atitudes.

O autoconceito, na criança vai se formando inicialmente através das

relações com as pessoas a sua volta, a princípio por meio da linguagem não-

verbal e, depois pela linguagem propriamente dita. A linguagem não verbal se

dá de forma muito sutil, com reações de alegria ou de aborrecimento

provocados pelos atos realizados que podem ser aceitos ou não o grau de

solicitude com que seus desejos e suas necessidades são satisfeitos e até

mesmo o jeito com que são acolhidos no colo. Através da linguagem verbal é

emitido oralmente o que se pensa a respeito do outro. Os adultos costumam

reagir aos comportamentos das crianças pequenas ora com aplauso e

incentivos, ora com zangas e repreensões. Assim, a criança vai ouvindo que é

Page 13: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

13 “boazinha e bonitinha” ou “boba e feia”. Após um certo período de tempo e com

a repetição desses padrões de comportamento, aquilo que surgiu como um

processo interpessoal começa a ser incorporada à própria estrutura cognitiva

da criança, tornando-se pessoal. Agora é ela que se aplaude diante de uma

situação bem sucedida ou se acabrunha ante o fracasso.

Vygotsky nos alerta que a transferência está ligada a mudanças e que

essas “são incorporadas em um novo sistema com suas próprias leis”. A

passagem dos conteúdos interpsicológicos (conceitos e informações

assimilados intelectualmente e emocionalmente pela criança). Ao contrário,

eles irão interagir com os conteúdos já existentes na mente da criança, isto é,

com: o “novo sistema com suas próprias leis”. Como cada criança traz as

marcas da sua individualidade, a internalização se fará de acordo com tais

marcas. O resultado final será a mescla do social representado por pessoas e

circunstâncias que a cercam com o individual. Bakhtin resumiu esse processo

de forma muito especial: “as palavras dos outros introduzem sua própria

expressividade, seu tom valorativo, que assimilamos, reestruturamos e

modificamos” (1992, p. 314).

A rede de influência dos conteúdos interpsicológicos (conceitos e

informações assimilados intelectualmente e emocionalmente pela criança) é

muito mais ampla do que se pode supor a primeira vista. Uma vez que a

construção da identidade é uma construção social e história, mediada pelos

mais diferentes tipos de linguagem, ela está sujeita a uma imensa gama de

interpretações e reações. E é isto o que impede a tratar a questão do

autoconteito e da auto-estima de forma simplista.

Page 14: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

14

Numa perspectiva histórico-social, ao se procurar entender a

problemática da auto-estima no âmbito educacional, não há como negar a

presença das mais variadas influências, a começar pelos contextos sócio-

econômico e cultural. É algo que passa pelo próprio grupo, pela família e pelas

interações existentes.

O caminho da internalização do autoconceito pode ser muito diferente e

peculiar a cada situação e a cada ser: uma criança nascida em um lar de pais

amorosos, que desejam a sua vinda, recebe atenção, afeto e cuidado desde os

primeiros dias de vida. Quando começa a falar, as recompensas pela

“gracinhas” que faz superar, em muito as repreensões que recebe quando faz

algo errado. Aprende a confiar nos adultos que a cercam e a vê-los como fonte

de amor e segurança. Dessa forma, vai plasmando o seu autoconceito com

base nas relações estabelecidas, aprendendo a se ver como alguém digno de

amor, alguém que tem valor. Nesse contexto de amor e confiança aprende a se

sentir segura. As demais influências externas, ao se fazerem sentir, vão

encontrá-la mais autoconfiantes.

A aprendizagem que a criança faz sobre as referências a seu respeito é

lenta gradual. As mais fáceis de ter seu sentido apreendido são as que nascem

de comentários ao seu comportamento. Assim ao observar a situação em que

foram geradas, as reações emocionais do interlocutor e a própria entonação

com que são ditas, a criança vai fazendo aproximações do seu significado real,

ao mesmo tempo em que vai internalizando tais comentários, até chegar a

adotá-lo como seus.

Page 15: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

15

1.2. As Referências Positivas.

Moysés (2003), relata em seu livro “A auto-estima se constrói passo a

passo”, uma experiência que teve com uma aluna, aparentemente sem muito

atrativos, cuja mãe a havia inscrito em um concurso de “Rainha da Escola”.

Estavam ambas vendendo voto, quando a professora perguntou para a aluna:

“Quem é a menina mais bonita da escola?”. Ao que ela me respondeu com

outra pergunta: “Tirando eu?”. Não tinha dúvida de que haviam lhe feito crer

que era, de fato, a menina mais bonita da escola. E a própria atitude da mãe

confirmava tal crença.

Ao contrário da experiência anterior, em uma escola de periferia onde a

pesquisadora trabalhou, vivenciou outra situação. Era início do ano letivo e

primeiro dia de aula. Chegou uma mãe arrastando um menino de seis anos. Ao

entregá-lo a professora ela fez os seguintes comentários: “Este menino não

presta. É o demo em figura de gente. Pode meter a mão na cara dele se for

preciso. Ele é uma peste. Ninguém agüenta com ele”. Pouco menos de um

mês depois, ele havia cortado a camisa de um colega com gilete, quase

atingindo-lhe as costas, pisoteando a merenda de um outro colega e

estrangulando os gatinhos que haviam nascido no porão da escola. Ameaçava

todos, dizendo compenetrado: “Eu sou uma peste. Sou o demo. Ninguém

aguenta comigo”. Ou seja, já havia internalizado tudo aquilo que sua mão

afirmava a seu respeito. Acredito que nem soubesse direito significado da

expressão “demo em figura de gente”, mas todo ódio e desprezo que a mãe

colocava na voz ao falar ao seu respeito já deviam ter sido por ele

Page 16: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

16 internalizados. É possível que, em situações anteriores, ao apanhá-lo

comportando de maneira “inadequada”, ela se referisse a ele usando aquelas

expressões. E o resultado foi que ele não só se apropriou das palavras, mas

manteve-se coerente como que dele se esperava.Nestes fatos podemos

observar que a percepção que os pais tem da criança influencia

significativamente na formação do autoconceito dos filhos.

Ao o processo de formação do autoconceito mediante a formação do

conceito baseado na teoria cognitivista de cunho social, não deixamos de

reconhecer a grandiosa contribuição abordar da psicanálise no entendimento

das motivações das conseqüências desse processo de internalização. O

psicanalista Bruno Bettelheim(1998), tratou dessa questão no seu livro “Uma

vida para meu filho” onde aborda o tema da construção da identidade,

deixando claro que a principal motivação da criança pequena é obter amor e

aprovação dos pais ou das pessoas que ela considera importante. Ele afirma:

“todas as situações pai/filho estão carregadas de sentimento só as ações paternas imbuída de sentimentos positivos por nossos filhos convencem-no de sua importância para nós, uma experiência de que ele necessita desesperadamente para poder acreditar que também pode ser importante para os outros (Bettelheim, 1998 pág. 52)”.

Enfatiza especialmente a questão da empatia e que os pais devem

cultivar em relação à busca da identidade do filho, nutrindo assim elos

saudáveis e consistente que ajudarão a enfrentar os desafios da vida. O

contrário também pode ocorrer gerando insegurança e instabilidade na criança.

Page 17: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

17

Para aquele psicanalista, o fato da criança saber que o que ela faz dá

prazer aos seus pais faz com que ela se sinta importante por se autoconhecer

como fonte de prazer. Essa provação funciona como incentivo para formação

de um eu diferenciado dos demais – esse processo ocorre nos primeiros anos

de vida.

Existe aqui uma nítida mudança de percepção. Antes, a fonte de prazer

era atribuída às suas ações,mais tarde a si própria.

Nesse processo, percebe-se que na sua origem havia uma relação

interpessoal, na qual o sentimento dos pais eram por eles captados. Tais

sentimentos, inicialmente externo a criança acabam por se internalizar. Na

internalização há uma mudança de percepção onde cada indivíduo em

formação interagirá com a idéia captada dos pais de que “suas ações dão

prazer”, transformando-a em uma nova idéia. Aquilo que era externo passou,

então, a fazer parte do pensamento da própria criança, ganhando na

passagem, uma nuance pessoal.

Ocorre se o processo de aprovação pode se dar na origem de um

autoconceito positivo o contrário também é verdadeiro. A criança

permanentemente desaprovada em suas ações pode, pelo mesmo processo,

reagir negativamente, como forma de defesa ou retaliação não só aos pais,

como também a si mesmo.

Dessa forma, constatamos a importância dos pais ou dos “outros

significantes” (que são as pessoas que a criança considera importante) para a

formação do autoconceito e da auto-estima da criança. É com eles que a

Page 18: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

18 criança estabelece as relações mais significativas para a formação de sua

identidade. Através da relação exercida pelas “pessoas significantes”, ora de

poder e controle, aprovação e recompensa ou reprovação e controle, prêmio ou

castigo, aprovação ou reprovação que essas figuras vão influindo sobre a

estrutura inicial do seu autoconceito. Além dessa influência estarão presente

todos os fatores de ordem social e contextual; aspectos externos da formação

do autoconceito. Os aspectos internos derivam da forma como todas essas

influências foram elaboradas na intimidade da pessoa. Implicam atos do

pensamento, emoções e sentimentos, e mesmo dos estados motivacionais.

Eles irão interagir com conteúdos já existente na mente das pessoas, isto é,

com o “novo sistema com suas próprias leis”. Cada ser humano tem sua

própria historia, sendo assim as influencias sofridas e o significados dessas

para cada um é muito peculiar e próprio da trajetória pessoal de cada indivíduo.

Isso explica por que certas situações afetam mais profundamente – positivo ou

negativamente – a auto-estima de algumas pessoas do que de outras; por que

certas situações voltadas para o aumento da auto-estima funcionam bem com

uns e deixam de funcionar com outros.

É importante ter em mente que a auto-estima representa o nível de

satisfação que a pessoa sente quando se confronta com seu autoconceito.

Como ele é multifacetado, certos ângulos do autoconceito podem ser muitos

elevados e a auto-estima pode ser calcada nele mais do que nos demais. A

exemplo desse aspectos podemos citar os nossos craques de futebol, que

muitos vivenciaram na infância o insucesso escolar e a discriminação social,

Page 19: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

19 mas destacaram-se de tal forma no futebol que passaram a erigir sua auto-

estima baseados nessa imagem. Hoje, mostram-se orgulhosos de si mesmo.

O autoconceito, sendo multifacetado, encerra múltiplas possibilidades de

ação principalmente na escola onde os educadores costumam atribuir maior

importância ao conceito acadêmico. Essa prática e atitude deve abrir espaço,

para uma outra mais aberta já vivenciada por alguns educadores..

O autoconceito acadêmico passa a ser mais um ângulo dentre os vários

possíveis a ser enfocados. Há uma gama de possibilidades que podem ser

trabalhadas para além das habilidades vinculadas à escola. Campos como o

das artes, dos esportes, da cidadania e da consciência grupal oferecem

variadas opções de trabalho nesse setor. Experiências bem sucedidas em

qualquer uma dessas áreas, acabam oferecendo pontos de apoio reais para a

auto-estima.

1.3. O Processo de Mudança no Autoconceito e na Auto-

Estima.

Uma grande contribuição para reflexão e compreensão do ponto de

vista cognitivo no aspecto referente ao conceito, seu processo de formação e

mudanças no autoconceito encontramos em Vygotsk, no seu livro “Pensamento

e Linguagens” nos Capítulos 2 e 3. A abordagem proposta por ele possibilita

uma explicação, ao meu ver, muito clara sobre a formação do autoconceito e

como este pode ser modificado por determinadas situações e fatores.

Page 20: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

20

Durante o desenvolvimento do indivíduo os conceitos evoluem. Estes,

em princípio, relativos a situações concretas, particulares e circunstanciais.

Com o passar do tempo, passam a ser cada vez mais generalizados e

abstratos.

A criança sempre que se vê diante de um saber mais organizado, um

saber que for previamente preparado e que obedece a uma determinada

hierarquização conceitual (saber não-espontâneo) -, ela tem oportunidade de

sair do patamar onde se encontra e ascender a um outro, mais elevado. Ao

fazê-lo passa atribuir um novo significado a sua situação anterior. Há todo um

trabalho mental por trás desse movimento, como nos assegura Moysés:

"Acreditamos que os dois processos – do desenvolvimento dos conceitos espontâneos e dos conceitos não-espontâneos – se relacionam e se influenciam constantemente e fazem parte de um único processo: o desenvolvimento da formação de conceitos, que é afetado por diferentes condições externas e internas, mas que é essencialmente um processo unitário (Moysés 2003, p.29)”.

Numa reflexão, os conceitos espontâneos são um ponto de referência,

um ponto de partida que vai abrir caminho para que o conceito não –

espontâneo se forme, mas este, por sua vez, transforma aqueles que são

revistos agora de uma nova ótica, ganhando assim, novos significados.

Com o desenvolvimento das funções mentais superiores, isto é, com

aumento da sua capacidade de analisar, discerni e julgar, aspectos muitos

concretos do seu autoconceito podem deixar de ser pontuais e particulares

para se tornarem cada vez mais generalizados. Tudo dependerá das

circunstâncias internas e externas.

Page 21: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

21

Em situações de circunstâncias externas desfavoráveis, como as

existentes nos orfanatos, podem ajudar a consolidar autoconceitos. Bastam

alguns conteúdos concretos negativos para contagiar os demais. O contrário

também pode acontecer quando as condições são favoráveis. Experiências

sistemáticas de sucesso não são frutos do acaso, só foram favoráveis por

terem sido previamente arranjadas. Sejam elas por situações previstas – sejam

elas por uma apresentação pública em uma roda de capoeira, um programa de

melhoria da auto-estima ou um tutoramento de aprendizagem – podem ser

comparadas aos conceitos não – espontâneos, enquanto todas as situações

fortuitas do dia a dia se assemelhariam aos conceitos espontâneos.

A semelhança dos primeiros, tais experiências sistemáticas tende a

modificar as idéias mais particulares e pontuais, atribuindo-lhes novos

significados, ao mesmo tempo que as amplia e as generaliza. No campo da

autopercepção, isto poderia, pois explicar porque as experiências

sistematizadas que favorecem o desenvolvimento de certas habilidades e

talentos acabam por elevar o autoconceito e a auto-estima da pessoa.

É importante notar que o mesmo pode ser aplicado para as

experiências sistemáticas de insucesso. Impossível não lembrar dos repetentes

crônicos existentes nas nossas escolas que, ano após ano, são levados a

confirmar suas “inabilidades e incapacidades”, ampliando e generalizando um

autoconceito que encontra, naquele ambiente, poucas chances de se elevar.

É imprescindível conhecer os mecanismos subjacentes à construção, à

manutenção e à mudança da auto-estima quando se pretende desenvolver

trabalho nessa linha. Nada mais falso de que idéia de bastam algumas

Page 22: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

22 palavras ou alguns atos para se transformar uma baixa auto-estima em uma

auto-estima positiva. “Auto-estima é coisa séria que exige mais atenção de pais

e educadores comprometidos com o futuro de crianças e jovens”. (Moysés,

2003).

Numa reflexão, os conceitos espontâneos são um ponto de referência,

um ponto de partida que vai abrir caminho para que o conceito não-espontâneo

se forme, mas este, por sua vez, transforma aqueles que são revistos agora de

uma nova ótica, ganhando, assim, novos significados.

Com o desenvolvimento das funções mentais superiores, isto é, com o

aumento da sua capacidade de analisar, discernir e julgar, aspectos muito

concretos do seu autoconceito podem deixar de ser pontuais e particulares

para se tornarem cada vez mais generalizados. Tudo dependerá das

circunstâncias internas e externas.

Em situações de circunstâncias externar desfavoráveis, como as

existentes nos orfanatos, podem ajudar a consolidar autoconceitos. Bastam

alguns conteúdos concretos negativos para contagiar os demais. O contrário

também pode acontecer quando as condições são favoráveis. Experiências

sistemáticas de sucesso não são frutos do acaso, só foram favoráveis por

terem sido previamente arranjadas. Sejam elas por situações previamente

arranjadas – sejam elas uma apresentação pública em uma roda de capoeira,

um programa de melhoria da auto-estima ou um tutoramento de aprendizagem

– poderiam ser comparadas aos conceitos não- espontâneos, enquanto todas

as situações fortuitas do dia-a-dia se assemelhariam aos conceitos

espontâneos.

Page 23: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

23

CAPÍTULO II

A ESCOLA E A AUTO-ESTIMA

A escola atual enfrenta muitos e variados desafios. A expansão da

oportunidade de vagas na escola pública, que é uma coisa positiva, (94%,

segundo o IBGE 2000) garante a escolaridade de crianças e jovens dos 7 a 14

anos. Tamanha expansão trouxe, no seu bojo, um problema que ainda está

longe de ser resolvido: a presença maciça de uma população que a escola

ainda não se encontra preparada para atender. Refiro-me ao imenso

contingente de alunos oriundo da classe pobre inclusive os pertencentes aos

40% da população brasileira que recebem, em média, menos de um salário

mínimo.

Em meio ao desconhecimento e preconceitos a escola vai agindo às

cegas. Visível é a sua dificuldade em saber lidar com a clientela pobre, da qual

geralmente tem uma representação negativa (Moysés, 2003).

Aquino (1991, p. 189), após realizar uma pesquisa na escola de periferia

urbana, constatou que o mito da desqualificação para aprender, inseridos no

ambiente escolar, impede que sua bagagem cultural própria seja aproveitada

ou mesmo reconhecida, instituindo-se uma intensa dissociação entre a vivência

e a experiência escolar.

Se na exteriorização de seu preconceito a escola identifica a pobreza com

carência intelectual. Goldsten (1986),vivenciou o oposto trabalhando com uma

Page 24: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

24 turma de multirrepetentes em uma escola da periferia urbana, constatou que

quando se dá oportunidade a esse tipo de aluno se expressar, ele é capaz de

falar de forma bastante crítica e reflexiva sobre si mesmo, seu mundo e suas

experiências.

Para Moysés (2003) é evidente que associar o aluno pobre à incapacidade

intelectual é puro preconceito. Fugir desse raciocínio requer vontade e ousadia,

mas é possível, como também é possível instalar um novo tipo de

relacionamento, tornando a escola em lugar de crescimento humano e não

somente intelectual.

2.1. A Auto- estima no desempenho escolar.

Constantemente as pesquisas têm mostrado que o autoconceito

acadêmico (percepção que a pessoa tem de si mediante o seu desempenho

acadêmico) está relacionado com o desempenho acadêmico e com a

motivação (Pajares 1998). Nas décadas de 70 e 80 as pesquisas voltadas para

a análise da auto-estima no contexto da sala de aula ganha impulso e através

de estudos ficou constatado que há uma relação entre as notas escolares e o

autoconceito do aluno. Na década seguinte, os estudo sobre a auto-estima

constataram que ela era também afetada pelo fracasso escolar (Moysés,

2003).

O autoconceito acadêmico nasce da percepção que o aluno tem das suas

habilidades e desempenho acadêmico, principalmente o cognitivo, tão

valorizado pelas escolas. O fato de se considerar bom ou ruim pode acabar

Page 25: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

25 influenciando o seu desempenho escolar na medida em que poderá afetar o

seu grau de esforço, de persistência e o seu nível de ansiedade. Estudos

nesse setor apontam que pessoas com percepções positivas das suas

capacidades aproximam-se das tarefas com confiança e alta expectativa de

sucesso consequentemente, acabam se saindo bem”.

Há no entanto muita discordância sobre a influência que a auto-estima

exerce sobre o nível do rendimento do aluno.

Embora a questão seja bastante complexa, há pesquisadores que

entendem que dada à natureza recíproca da motivação e do comportamento

humano, é improvável que essa questão seja definitivamente resolvida (Hatiee,

1992, Pajares 1998, in Moysés 2003). Outros autores são mais inclinados a

considerar que a auto-estima é mais provavelmente o resultado do que a causa

do desempenho escolar. Sua conclusão foi a de que é preciso haver um certo

nível de auto-estima para que o aluno alcance sucesso escolar. E mais: que a

auto-estima e o desempenho andam de mãos dadas, alimentando-se

mutuamente. (Holly 1987, in Moysés 2003).

A criança que ao entrar na escola, apresenta-se de maneira geral

autoconfiante , acreditando-se capaz de se sair bem diante das dificuldades,

aquele espaço não chegará a lhe causar temor. Será apenas mais um desafio.

Para aquela que não tiver tanta confiança assim em si mesma, a nova situação

poderá despertar atitudes defensivas. Para a criança que duvidar de sua

capacidade de enfrentar as exigências escolares com sucesso e ostentar níveis

baixos de auto-estima, o novo espaço irá se apresentar como um campo de

batalha a aumentar suas feridas. A escola passará a ser sinônimo de

Page 26: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

26 sofrimento. Ali entrará acreditando do ser impossível a tarefa de proteger seu

sentimento de autovalorização. É esse tipo de criança que, em geral, apresenta

maiores dificuldade de se sair bem dos estudos.

Refletindo sobre o descompasso que ainda há entre as potencialidades

que o aluno traz e o estreito mundo da escola, (com suas relações autoritárias

e suas práticas pedagógicas fragmentadas, descolada da realidade),

entendemos o motivo de haver tantos alunos nessa condição. É um grande

desafio que deveria ser refletido e enfrentado pela escola e educadores.

A escola aberta do Calabar citada em Moysés (2003),é um exemplo de

atenção às necessidades de sua clientela. Situada numa favela entre os bairros

de classe alta e média na cidade de São Paulo, é uma escola comunitária de

ensino fundamental, fundada em 1983 por um grupo de jovens inconformados

com ab falta de estabelecimentos de ensino na favela, eles decidiram arregaçar

as mangas e a construíram em forma de mutirão. Atualmente conta com 300

alunos. Lá o ensino busca respeitar as peculiaridades das crianças. Como diz a

professora Maria Luiza Passos: “Aqui as crianças têm uma educação é voltada

para a realidade delas”. A escola comunitária pode falar do negro como belo,

bonito e cidadão. Tais elementos não são citados nos livros didáticos de outras

escolas, causando evasão escolar e excluindo a criança ela não se vê nem vê

a comunidade onde mora. Para nós o mais gratificante é mostrar para as

crianças que eles são capazes de mudar esse contexto social superando os

limites que a realidade lhe apresenta.

A prática dessa escola é um exemplo concreto para preservar a auto-

estima dos alunos, ajudando-os a se manterem na escola. Lá são valorizados

em suas origens étnicas e também não valorizados como pessoas.

Refletindo, ainda sobre a questão do aluno que entra na escola com medo

do fracasso, há teorias psicológicas que tentam explicar o que ocorre. Uma

Page 27: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

27 delas e a de atribuição de causalidade, estudada há quase meio século por

Fritz Heider. Analisando a forma como as pessoas atribuem as causas de suas

ações, constatou que há algumas que acham que tudo depende do seu próprio

controle ou que julgam que tudo decorre do ambiente. Ou seja, que

causalidade pode ser atribuída a fatores pessoais ou a fatores impessoais

(Heider, 1970).

Após vários refinamentos, B. Weiner (in Moysés, 2003) submeteu essa

teoria ao contexto escolar. Verificou em seus experimentos que quando os

estudantes eram colocados em situações nas quais tinham que analisar seu

próprio desempenho tendiam a atribuí-lo a quatro fatores: à própria

capacidade, ao esforço pessoal, à dificuldade da tarefa, à sorte ou ao acaso.

Esses quatro fatores, podiam ser vistos como fatores pessoais (capacidade e

esforço) ou impessoais (dificuldade da tarefa e sorte). Constatou-se também

que dois desses componentes (capacidade e dificuldade da tarefa) tenham

natureza estável, ao passo que os outros dois (sorte e esforço) estavam sujeito

a mudança.

Em síntese, e usando uma terminologia própria da causalidade, as pessoas

podiam ser classificadas com duas óticas: a do locus de controle e a do grau

de estabilidade dos fatores presentes na situação. Quanto ao locus de controle,

este podia ser interno ou esterno, em quanto os fatores podiam ser estáveis ou

instáveis (Moysés, 2003).

Trazendo essa teoria para situação de sala de aula, podemos ter a

seguinte explicação: alunos familiarizados com o sucesso assumem seus

próprios desempenhos e responsabilidade pelo fracasso. Estas são atitudes

Page 28: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

28 típicas de quem tem o locus de controle interno. a medida que elas confiam no

poder de controlar seus próprios destinos, dão mais valor à aprendizagem e

dedicam maiores esforços nos estudos. Por isso alimentam expectativas

positivas a respeito do seu desempenho. Resultado: elas estão mais propícias

ao êxito. E, se por acaso advém o fracasso, sabe encará-lo de maneira

construtiva e com pequena dose de frustração.

Este é um processo de reação circular: o sucesso faz aumentar a confiança

e esta acaba favorecendo a obtenção daquele. Mas é claro que esta explicação

deve ser vista como uma tendência geral. Há trajetória que fogem a este

modelo.

Em relação aos alunos marcados pelo fracasso, a situação é outra. Eles

tendem a atribuí-lo à sua falta de capacidade. E o que é mais interessante: no

momento em que conseguem se sair bem nas atividades escolares, não

acreditam tenham sido por seu próprio mérito. Pensam, ao contrário, que o fato

só ocorreu porque houve boa vontade do professor. Ou então porque a tarefa

era mais fácil, ou, ainda, porque tiveram sorte ( Weiner e Kukla apud Moysés

,2003).

Qual o professor que nunca deparou com esse tipo de aluno? é fácil

percebê-lo no meio da turma. É aquele que se sente fraco e impotente diante

das tarefas mais simples, escusando-se até mesmo de tentar resolvê-las. É

inseguro e já aprendeu a se sentir culpado por não conseguir se sair bem. A

qualquer experiência de sucesso é atribuída a sorte, boa vontade do professor

e facilidade da tarefa – aspectos que escapam ao seu controle. A única coisa

Page 29: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

29 que lhe resta é se sentir culpado pelo maus resultados, como se tudo

conspirasse contra ele.

As marcas deixadas no decorrer da trajetória pessoal de cada aluno pode e

deve ser olhadas como possibilidade onde a escola e os educadores têm um

papel social e humano a desempenhar.

2.2. Possibilidades e Saídas.

A análise da temática do insucesso escolar levou alguns pesquisadores

como Cingtom apud Moysés ( 1986) a concluírem que os alunos que passam

por essa situação não tem muitas escolhas para minimizar seu sofrimento. A

que lhe parece melhor e evitar o fracasso. Mas ao fazê-lo assume atitudes tão

defensivas e fica tal modo ansioso e está tão convencido de sua incapacidade,

que não consegue evitá-la. Não se pode dizer que ele não se esforce. Ao

contrário muitas vezes ele está imbuído das melhores intenções. A sua

ansiedade, porém, põe tudo a perder. Falta-lhe a serenidade de analisar a

tarefa com clareza, o que lhe impede de fazer opções e mesmo a adaptadas à

situação. Conclusão: em função da insegurança sentida, faz as atividades de

forma errada, agravando a certeza de que nada de positivo pode ser feito. Está

convencido de que o que lhe falta é capacidade. E o que é pior, ao ver que seu

empenho é inútil, desiste de esforça-se e julga-se um fracassado. E

exatamente por isso, Tais, crenças são extremamente difíceis de se combater.

Nathaniel Branden, um conhecido estudioso de auto-estima na

atualidade, chama a atenção para o cuidado que se deve ter com esse tipo de

Page 30: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

30 aluno e deve procurar manter expectativas racionais e positivas a seu respeito,

e principalmente procurar evitar que ele seja alvo de zombaria ou crítica por

parte de quem quer que seja. Ele sabe que, à medida que passam a ter no

fracasso a sua “marca registrada, mais difícil se torna qualquer iniciativa

visando mudar a auto-percepção. Diante do sucesso, eles tendem, não

somente, a, negá-lo, como também a agir de forma contraproducente a fim de

evitá-lo. Pode parecer absurdo, mas esses alunos sabotam o próprio êxito

quando estão a ponto de atingí-lo. Essa é pelo menos, a face visível da

questão. Ocultas podem estar as movimentações profundas que os levam a

isso. Seria essa auto-sabotagem uma forma de reagir a sua própria situação

escolar? Estariam preferindo ser identificado como pertencentes aos grupos

que andam na contramão dos objetivos educacionais? Sentir-se iam mais

confortável nessa posição?

Para Forquim esse fenômeno não é novo. Ele registra em seu livro:

Escola e Cultura (1993,p.136) que na raiz dos movimentos agressivos e

violentos de contra cultura juvenil, ocorridos na década de 1980, na Inglaterra,

havia uma reação às novas imposições curriculares.Tais imposições

afastavam qualquer possibilidade de priorizar o espírito comunitário.Em seu

lugar reinava a ênfase sobre o individualismo.Na opinião de Forquim as

medidas adotadas estavam erradas porque deixou de levar em conta a

singularidade dos grupos de alunos oriundos de famílias operárias.Errou

também ao ignorar que eram social e historicamente determinadas as relações

que tais alunos mantinham com o universo escolar e com a situação do

Page 31: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

31 ensino.Se eles reagiam à escola, porque a viam como responsáveis pelo seu

fracasso.

A forma de reação,consciente ou inconsciente de cada aluno , como

também de cada pessoa ou de cada grupo é peculiar a cada um. Há aqueles

que aparentam não reagir, simplesmente se deixam levar como os alunos que

me referi nas páginas iniciais e os que encontram-se em nossas escolas nas

turmas de repetentes.

É possível que haja alunos que saiam da escola após uma história de

fracassos, mantendo sua auto-estima positiva, mas para outros a realidade é

bem diferente. Para esses, o mau desempenho juntam-se a baixa auto-estima,

gerando uma situação que os arrastam para a evasão escolar. Ou seja, quando

avaliado como insuficiente ou quando é reprovado, tende a incorporar como

parte do seu autoconceito a informação de que é “intelectualmente incapaz”,

fenômeno que era da área cognitiva passa a tomar conta de toda a pessoa que

julga-se como incompetente e fracassada. Esse sentimento de desvalia que o

acompanha muitas vezes levam-no a afastar-se da situação escolar em certas

ocasiões e a situação é apoiada ou reforçada pela família.

A evasão passa a ser assim um caminho “natural“. O aluno após ter

vivenciado o insucesso escolar, freqüente por exemplo, em algumas turmas de

alfabetização com alunos com defasagem idade série, acaba saindo

prematuramente do processo educacional. “A grande maioria se evade porque

simplesmente não conseguem mais tolerar novos fracassos e sentimentos

incomensuráveis de baixa estima e de desvalorização” (Hamacheck, 1979.

p.180).

Page 32: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

32

Essa relação entre auto-estima e evasão escolar, vem sendo estudada

há alguns anos por pesquisadores. Walz e Bleuer (in Moysés,2003)

confrontando a auto-estima dos alunos que se evadem da escola com a de

outros que fiicaram, perceberam que havia diferença significativa entre ambos.

Os que evadidos tendiam a tê-la em níveis mais baixos da que os que ficaram.

Confirmando essa associação, uma outra pesquisa constatou que

dentre os sete principais fatores que concorrem para a avasão escolar, quatro

estariam relacionados com a auto-estima. Alunos evadidos tendem a cultivar o

sentimento de que lhes falta inteligência ou habilidade para sair-se bem nos

estudos e se caracterizam por ter um baixo nível de auto-estima, reforçado

consciente ou inconscientemente por pais e professores ( Reasoner apud

Moysés,1985).

Na realidade brasileira, o elevado contingente de alunos que evadem

a escola após experiências de reprovação é um fato bastante significativo e

quantitativo (que o diga a nossa pirâmide educacional). Num mundo marcado

pela competitividade, não é difícil imaginar que, ao interromper seus estudos,

tenham a sua auto-estima afetada.

Tão preocupante quanto a relação entre a evasão escolar e a auto-

estima é a relação que ela tem com o crime e a violência no meio juvenil.

Segundo Moysés (2004), as pesquisas mais recentes nessa área tendem a

confirmar que a delinqüência foi a forma encontrada por jovens pobres que

viviam em guetos, em cidades da América do Norte, para aumentar a sua

auto-estima. Estes eram marcados pelo fracasso escolar e tendiam a ter a

auto-estima baixa. Em outras pesquisas ficaram confirmadas que a auto-estima

Page 33: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

33 baixa pode se tornar uma força poderosa nas personalidades dos jovens que

marcados pela raiva e pela hostilidade se transforma, não raro, em violência.

Outros fatos que ficaram comprovados com jovens pré-adolescentes

pertencentes a “gangues” é que esses grupos lhes dão forte sentimento de

pertencimento, isto é, permite-lhes que se sintam integrados, propiciando a

identidade do reconhecimento, como também existe uma grande pressão dos

companheiros para que permaneçam no grupo. Todos esses fatores são

relacionados com a auto-estima.

Outras pesquisas nas quais procuraram analisar os fatores que

promoviam a violência mostrou que o mais comum deles é o que poderia

chamar de “compensação da auto-imagem”,ou seja, para se defender de uma

auto-imagem negativa, muitos jovens partem para agressão. Usam a violência

como forma de compensar seus sentimentos de insegurança e baixa auto-

estima (Davis apud Moysés,1991).Pode-se afirmar que as relações nocivas

que a auto-estima baixa mantém com outros aspectos da personalidade é um

mecanismo psicodinâmico subjacente a todo comportamento desviante.São

saídas que os alunos buscam, consciente ou inconscientemente, quando o

espaço escolar destrói seus sonhos e possibilidades de auto-afirmação.

Existem outras saídas de cunho positivo que deveriam ser

oferecidas, estas já foram e são constatadas na prática através de relatos de

pesquisas. Uma é debscobrir a capacidade não valorizada no ambiente escolar

e aproveitá-las, a outra, é prestar apoio direto específico no trato com

habilidades que eles ainda não dominam.

Page 34: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

34 Em outras palavras: um caminho é privilegiar atividades que vão

atingir outras facetas do autoconhecimento, que não as acadêmicas. Outro é

investir em ações circunscritas ao âmbito cognitivo, com vistas a elevar-lhes o

autoconceito acadêmico.

A teoria das Múltiplas Inteligências, ainda tímida aqui no Brasil ,

elaborada por Howard Gardner rompe com a visão tradicional dos estudos

sobre inteligência ao negar que os indivíduos sejam possuidores de uma

inteligência única e quantificável. Ao contrário reconhece oito tipos de

inteligências: lingüística, lógico-matemática, espacial, cinestésico-corporal,

musical, interpessoal, intrapessoal e naturalista. Afirma que, embora as

pessoas possam ter todo esse aspectro, cada um revela características

cognitivas especiais, tendo-as em maior ou menor grau combinando-as entre si

de uma forma peculiar. A escola deveria dar oportunidade para que todos os

alunos pudessem desenvolver seus múltiplos talentos e seus pontos fortes

(Campbell et al, 2000).

Em seu livro ensino a Aprendizagem por meio da inteligências-múltiplas,

o professor Campbell descreve que muitos alunos que não conseguem

demonstra as inteligências acadêmicas tradicionais ficam confinados a baixa

estima e seus pontos fortes podem permanecer não percebidos, tanto para a

escola para a sociedade em geral.

É recente no Brasil interesse dos educadores por esse enfoque, talvez

por implicar radical na forma de encarar a educação. Mas já há escolas

começando a avaliar o aluno com esse olhar mais amplo. O professor Celso

Antunes em seu livro as inteligências múltiplas e seus estímulos, além de

Page 35: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

35 apresentar abordagem geral sobre essa teoria, sugere, também, alguns

procedimentos para estimula-lá tanto em casa quanto na sala de aula

(Antunes,1998).

Os pesquisadores Scheire 1979 e Convington 1989 (Apud Moysés

2003), estudiosos conceituados na área da auto-estima apresentam dois casos

interessantes em relação ao segundo tipo de ação, citada anteriormente, sobre

o investimento do aluno âmbito cognitivo. O primeiro refere-se a um amplo

levantamento do que envolve testagens em meio capazes de elevar o

autoconceito dos alunos que fracassam em atividades escolares. Eles

encontraram resultados expressivos em um experimento, no qual, uns grupos

de pais foram em duas atividades básicas: a de se comunicar amistosamente

com os seus filhos a respeito das atividades escolares. Sentaram-se para

estudar com os filhos, ajudando-os a ganhar competência nos assuntos

estudados.

O segundo caso foi o de pesquisa que foi desenvolvida a dez anos

depois que encontrou resultados semelhantes a da anterior: aumento do nível

da auto-estima implicou um aumento nas notas escolares, acontecendo o

inverso quando o nível da auto-estima decresceu. E o mais importante foi

constatação de que o tutoramento da aprendizagem mediana instrução direta

para melhorar a aprendizagem, refletindo-se no desempenho escolar e no

aumento da auto-estima do aluno.

Esses resultados mostram que, mediante, um acompanhamento

direto das atividades dos alunos, é possível mobilizar o autoconceito e que

este tem, realmente, estreita relação com o desempenho escolar. Tanto o

Page 36: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

36 tutoramento feito pelos pais como os que foram realizados pelos professores,

tiveram efeitos positivos. É possível que esse tutoramento tenha sido realizado

tendo como base a zona de desenvolvimento proximal (ZDP), descrita por

Vygotsky (1984), onde as soluções para os problemas são alcançados apartir

da relação do conteúdo já assimilado com o que o que está sendo

ensinado,através do estímulo do adulto ou companheiro mais capaz em

determinada área.

Em geral, as primeiras déias que nos surgem a mente, quando se fala

em tutoramento pelos pais são: estariam eles em, condição intelectual de

realizar essa tarefa? Teriam disponibilidade para tal ? Temos fortes indícios

para supor que não, pelo menos no que se refere aos alunos das escolas

publicas. Basta para isso consultar as estatísticas oficiais sobre os indicadores

sócioeconômico da população brasileira (IBGE,2000).

Uma outra pesquisa realizada sobre a relação escola- família ( Santa-

Rita et ali,1997), constatou na escola pública que 63% dos pais não

ultrapassaram o ensino fundamental, havendo muito poucos com formação

superior. No que diz respeito às mães, o quadro manteve-se praticamente o

mesmo, com um pequeno aumento no número das que tinham completado o

ensino fundamental.

Quanto a forma como a família trata a construção dos filhos,

constatando que na escola pública, 53% dos pais responderam que verificam

sempre as suas notas,66% na rede privada. As demais opções eram às vezes,

raramente, nunca (agrupando essas respostas chegou-se a um índice de

20%).

Page 37: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

37

Uma vez que a maioria dos alunos envolvidos estariam na faixa dos

13-14 anos era de se esperar que os pais verificassem sempre suas notas, no

entanto pouco mais da metade assim procedeu. Nem mesmo na rede privada

esse índice foi elevado,como se poderia supor, tendo-se em vista o

investimento financeiro feito.

É evidente, que o tratamento por parte da família encontra sérias

restrições , se admitidas as condições sócio-culturais em que, normalmente

vive a grande parte dos alunos que fracassaram na escola. Isso não impede

que sejam feitas tentativas de aproximá-la escola constantemente. Atualmente,

em virtude da gestão participativa, já há um bom, aos poucos, obtendo deles

maior atenção para os seus problemas. Neste contexto fica mais fácil envolvê-

los no processo de ajuda aos filhos.

2.3. A Escola e os diferentes observadores: Pais e Filhos

A questão sobre os variados aspectos da auto-estima é um referencial

importante, instigante e significativo para nós educadores. Porque a auto-

estima é afetada quando pais, ou mesmo professores, dão atenção especial à

criança nos estudos.

No entender de Bettelheim, o filho encontra nos pais o “alimento”

necessário à nutrição dos seus sentimentos positivos em relação a si mesmo ,

a chave para o seu sucesso. Mas quando ele ingressa na escola, essa

“alimentação” passa a ter um ingrediente essencial: além de uma relação

Page 38: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

38 positiva, é preciso que eles também se envolvam com seus assuntos

intelectuais. Isso é verdadeiro para a maioria das crianças .

Acontece que, longe de compartilhar a mesma ótica, pais e filhos

divergem quanto à visão do que se passa na escola. Para os pais o julgamento

sobre o desempenho do filho envolve, via de regra preocupações com o futuro,

ao passo que para este, trata-se de algo que só tem sentido no presente.

Qualquer outro alcance escapa à sua compreensão imediata. A reação dos

pais, porém, se passa no presente. É apenas isso o que o filho capta. Dessa

forma, pode não entender exatamente o que os pais querem dizer quando o

repreendem com expressões do tipo “assim você não vais ser ninguém quando

crescer”. Compreende, no entanto, que lhes causou uma insatisfação.

Dentre as reações possíveis a esse descontentamento, há duas

enfatizadas por aquele autor. Uma, é a criança desejar conhecer melhor os

valores paternos, passando assim a se interessar por tudo o que lhes parece

importante. Se a obtenção de bons resultados na escola, no presente, é

percebida como algo de valor para os pais, então, aplicar-se aos estudos

parece-lhe um modo relativamente fácil de se sentir importante e valorizada.

Isso é válido também para outras pessoas que a criança considera como

importante, como, por exemplo, sua professora.

Mas pode, também, dar-se o oposto. Em certas circunstâncias, a

criança pode chegar a sentir que os pais estão somente interessados em sua

situação escolar e não nela, como pessoa. “Isso pode induzi-lo a odiar os

estudos. (...) conseqüentemente, pode vir a ressentir-se da escola e de tudo o

Page 39: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

39 que ela representa. A detestar o trabalho escolar a ponto de ser, realmente,

incapaz de fazê-lo.”Bettelheim (1989 ).

Analisando esse processo do ponto de vista psicanalítico,Bettelheim

acredita que a escola pode fazer muito pouco a esse respeito, uma vez que o

conflito original era entre os pais e o filho e não entre o filho e a escola. Desse

modo, sustenta que o conflito subjacente, inconsciente, não será resolvido, a

não ser que os pais deixem de pressionar a criança para se sair bem na

escola, fazendo-a ter certeza de que estão mais interessados nela do que nas

suas notas. Chamo a atenção para o fato de ele afirmar que esse sentimento

negativo perdura no inconsciente. “independentemente o que venha a ser

obtido por um profissional que trabalhe com a criança para melhorar seu

desempenho acadêmico.

Na percepção de Bettelheim, a solução para esse tipo de problema

estaria na empatia que deveria ser cultivada pelos pais em relação aos

sentimentos e motivações dos seus filhos. E isso só é alcançado quando

conseguem se colocar no lugar deles. No entanto, envolvidos com as próprias

motivações, os próprios interesses e os próprios sentimentos, eles vão se

afastando cada vez mais do universo infantil. Daí não haver em muitas das

suas reações sequer um vestígio da criança que ele foi um dia.

A respeito da empatia, há uma obra clássica na literatura educacional:

Quando eu voltar a ser criança de Janusz Korczak (1981).

Um livro raro, tocante, sensível, comovente, como nos é apresentado

na sua contracapa. “Belo e terno, ele não discursa sobre a criança, mas se faz

Page 40: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

40 porta-voz dela, voltando a ser criança e revivendo um mundo através dos

olhos, sensações, tristezas e desencantos que toda criança vive”.

De fato, ao acompanharmos as dificuldades enfrentadas por esse

professor, transformado por um passe de mágica novamente em criança, que

vive, perplexa e assustada, as agruras de um cotidiano escolar marcado pela

ausência de respeito aos sentimentos infantis, passamos a compreender o

sentido da palavra empatia. Ela é algo que não pode faltar na sala de aula, na

medida em que gera o respeito do educador para com o aluno. Por isso, na

medida em que gera o respeito do educador para com o aluno. Por isso,

precisa ser desenvolvida na relação pedagógica. Mas, para se colocar no lugar

do outro, sentir-se como ele para poder ajudá-lo, é preciso sentir-se

psicologicamente forte e seguro, com a sua auto-estima em alta. Daí a

pergunta: como andará a auto-estima dos professores brasileiros na

atualidade? Estariam eles em condições de ajudar os seus alunos?

2.4. A Auto-Estima dos Professores.

As pesquisas realizadas sobre auto-estima por Moysés (1994) – com

professores de 1ª a 5ª série, levou-a a seguinte constatação: Quando o assunto

é auto-estima ela observou nas conversas com professores um certo paradoxo:

aparentemente, mantém níveis baixos de auto-estima, mas mostram-se

interessados em melhorar a auto-estima dos seus alunos. Qual seria a razão

disso?

Page 41: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

41

Apesar de complexo, o problema apresenta elementos que permitem

algumas inferências. Comecemos pela auto-estima da professora ou do

professor. A teoria das representações sociais oferece um suporte sólido para

compreendê-la melhor.

A representação social, segundo alguns de seus teóricos, é uma forma de

conhecimento socialmente elaborada e compartilhada, tendo um objetivo

prático. Ela concorre apara a construção de uma realidade comum a um

determinado grupo social e nela estão presente tanto o aspecto individual como

o social. O individual, por tratar-se de uma construção mental, e social, pelo

fato de ser essa construção compartilhada por diferentes pessoas de um

determinado grupo. Assim, diante de uma dada realidade, as pessoas vão

construindo-se psico-socialmente de acordo com o que e a seu modo

conseguem captar e compreender. Na verdade, trata-se de uma construção

parcial, uma vez que a realidade não se deixa aprender em sua totalidade. O

que fica, então, é uma redução da realidade, uma versão simplificada dela.

Significa dizer que o não compreendido, as incongruências, os aspectos mais

profundos e complexos da realidade, tudo isso vai sendo deixado de lado. O

que resta é algo socialmente construído na mente de cada um. Não é a

realidade, mas a sua representação social.

Ao estudar as representações sociais de professores de escola públicas

de educação básica, na cidade do Rio de Janeiro (Moysés 1994b) revelou que

não foi surpresa para ninguém: no núcleo das representações sociais que os

professores compartilhavam a seu próprio respeito, havia a idéia de que eram

profissionais desvalorizados, Reconheciam ser o seu trabalho marcado pelo

Page 42: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

42 desânimo e pela desesperança. Tratava-se de representações que me

pareceram bastante consolidadas e uniformemente disseminadas entre os

mais de 400 professores participantes do estudo.

A situação, ao que parece, não mudou nesses últimos anos. Tudo concorre

para que a maioria dos professores continue tendo de si, como categoria

profissional, representações sociais assinaladas pela desvalorização. Mas não

haveria uma íntima relação entre essa representação social e a auto-estima

desse profissional? É evidente que há professoras e professores que, a

despeito de qualquer representação social negativa da classe, mantém a seu

respeito uma elevada auto-estima. As bases dessa auto-estima encontram-se,

provavelmente, calcadas muito mais na auto percepção do seu próprios valor

do que na representação social dos seus pares. Não se pode, no entanto,

negar que o peso dessa representação coletiva, que é reforçada no dia-a-dia

por inúmeros indícios externos, acabe por se impor à própria auto-estima.

Acredito que a explicação para aquele paradoxo resida exatamente em tais

indícios. Embora seja fato que muitos deles, como salários, condições de

trabalho e prestígio social, mostrem-se resistente e ou inacessíveis a uma ação

pessoal visando à mudança, há na sala de aula certas situações que podem

ser mudadas pela ação da vontade. O nível de auto-estima da turma é uma

delas. Um professor interessado, conhecedor dessa temática, poderia

desenvolver, com seus alunos, uma ação voltada para o aumento desse nível.

Sendo bem-sucedido nessa empreitada, o seu sucesso poderia funcionar

então, como um indício externo do seu próprio valor como profissional.

Page 43: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

43

Mesmo sem estar muito certa disso, Moysés (2003) pensa que essa seja

uma possibilidade. Melhor seria, entretanto, que essa ação fosse inserida na

sua prática pedagógica. Que o seu dia-a-dia na escola fosse marcado pelo

compromisso com a educação; que seus alunos fossem tratados

holisticamente, isto é, como seres que sentem, agem e pensam. Talvez assim

esse professor estivesse mais apto a perceber os efeitos de certas situações

de cunho cognitivo sobre os sentimentos e as emoções dos seus alunos, como

costuma acontecer com o fracasso escolar e a auto-estima. Mais, que ele se

visse por esse mesmo prisma. Afinal, tanto o seu sucesso quanto o seu

fracasso têm repercussões sobre os sentimentos que nutre em relação a si

mesmo.

Bom mesmo seria que, nessa percepção, se visse como parte de um tecido

maior, em constante interação. Tarefa difícil? Nem tanto. Hoje é possível

encontrar disseminadas por todo o país idéias que apontam nessa direção.

Não são poucos os que se voltam para uma maior integração com a

comunidade. Igualmente avulta o número dos que já compreenderam a

importância de atuar nas diferentes instâncias coletivas em que se inserem: a

da sua classe profissional, a do seu gênero (refiro-me aqui particularmente às

professoras, pois que são a grande maioria no ensino fundamental), a da

comunidade da sua escola e tantas outras.

Henryane Chaponay resume muito bem a importância dessa

participação, ao afirmar que “(...) na medida em que uma pessoa parte de um

coletivo, se enriquece pessoalmente, cresce como pessoa, tem um olhar

positivo sobre os outros, o que não a impede de ser crítica, porque é isso que a

faz avançar. Nesse aspecto o grupo e o coletivo cresce enquanto conjunto.

O professor deve procurar meios individuais para trabalhar a sua auto-

estima. No entanto,a saída para esse sentimento de desvalia que incomodam

a classe dos profissionais do ensino está na ação coletiva, na construção da

cidadania, que é direito de todos, no restante da auto-estima em diferente

segmentos da população. Nesse campo, temos diversas experiência e projetos

realizados por grupos particulares e organizações não governamentais, que

vem levantando a bandeira da cidadania em diferentes segmentos da

Page 44: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

44 população, como também da construção da auto-estima positiva dos

organizadores e participantes dos mesmos.

Page 45: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

45

CAPÍTULO III

EXPERIÊNCIAS BEM SUCEDIDAS NO QUE CONCERNE A

AUTO-ESTIMA.

Atualmente observamos nos noticiários da mídia, nas páginas da Internet,

em comunidades locais, cristãs ou leigas várias ações e projetos voltados para

o resgate da auto-estima de crianças e adolescentes que estão sendo feitas

por pessoas ou grupos. Dentre essas experiências bem sucedidas citaremos

os Projetos Gol de Letra, Mangueira do Amanhã, Projeto Olodum.. Além

desses podemos ainda lembrar outros como: Os Meninos do Morumbi, Projeto

Axé, Geledés (com crianças e jovens negros), a Orquestra de Cordas da

Grota, Reforço Escolar, Vestibular Alternativo para Negros e Carentes, Grupo

de Cidadania (para jovens cotistas das Universidades Públicas).

Esses projetos, grandes ou pequenos, consolidados ou não, são

desenvolvidos com a preocupação como resgate da auto-estima, que é o traço

que os une. Neste capítulo selecionamos três deles,os quais apresentaremos

sua forma de atuação, não só em relação a auto-estima como também, em

muitos casos, em relação à própria consciência grupal étnica, social e de

cidadania. Fruto das mais diferentes iniciativas, servem para ilustrar as várias

alternativas possíveis nesse campo. Servem, sobretudo, como estímulos e

exemplos a serem seguidos.

Page 46: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

46

Iniciaremos pelo projeto fundação Gol de Letra, localizada na zona norte de

São Paulo, nasceu de um sonho acalentado pelos jogadores Raí e Leonardo,

conhecidos por sua atuação na seleção brasileira de futebol.

Instituída em 1999 como uma organização não governamental, atende 150

jovens de ambos os sexos, com idade entre 7 e 14 anos e desenvolve

atividades educativas que tem como meta despertar o prazer de aprender

através de quatro eixos de educação: atendimento direto, desenvolvimento

cultural, mobilização e desenvolvimento institucional.

Apesar de recente, o programa de atendimento já vem dando sinais

visíveis de estar melhorando a auto- estima dos seus participantes que podem

participar de atividades esportivas, de arte-educação, dança, música, teatro e

artes plásticas, de informática, de leitura e escrita, além de passeios. Os

educadores deste projeto buscam conscientizar os jovens da importância da

auto-superação , incentivando, o valor da cooperação, do espírito de grupo e

da solidariedade.

Outra iniciativa que está dando certo é o trabalho desenvolvido a décadas

pela Estação Primeira de Mangueira onde foi implantado um espaço de

promoção social, do resgate da cidadania e da valorização da auto-estima. O

programa social já ganhou reconhecimento internacional sendo premiado pela

UNESCO como o melhor projeto social dos países em desenvolvimento, e pela

BBC de Londres, como modelo de desenvolvimento social para o Terceiro

Mundo.

Esse programa integra ações de educação, lazer, cultura, saúde e

esporte. Pelo menos três dos seus projetos preocupam-se explicitamente com

Page 47: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

47 o resgate da auto-estima de crianças e jovens: o educacional, o esportivo e o

da escola de samba mirim.

O Centro Integrado de Educação Pública (CIEP) Nação Mangueirense é

palco do primeiro deles. Nas palavras da diretora Terezinha Labruna:

“Falar do projeto educacional do Programa Social da Mangueira é unir

amor e trabalho, dedicação e abnegação. Quando decidimos fazer deste Ciep

uma referência escolar para toda a rede pública de ensino estadual e

municipal, tínhamos em mente basicamente duas coisas: a primeira,

proporcionar educação e cultura de boa qualidade aos nossos alunos. A

segunda, incluir o maior número possível de atividades extracurriculares.

Permanecendo mais tempo no CIEP, o aluno aprende mais, pratica mais

esportes e garante mais lazer, mais amigos, mais cidadania e menor tempo

ocioso.”Moysés, (2002)

Essas atividades extracurriculares abrem um leque de oportunidades

para aos alunos. Explorando suas competências ou criando outras, vai lhes

permitindo u m novo olhar sobre si mesmos. A avaliação das capacidades

cognitivas deixa de ter um peso tão grande como ocorre na maioria das

escolas, na mediada em que se pode avaliar o aluno em outras áreas. Há

inúmeras oficinas que permitem que eles mostrem seu lado artístico ou suas

habilidades específicas. Fazem parte do programa “Artisticamente Mangueira”

e incluem, por exemplo, ginástica rítmica desportiva, street dance, desenho e

fabricação de instrumentos. Ao lado dessas, há que introduz os jovens no

mundo da informática, oficina sempre muito procurada.

Page 48: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

48

O Projeto Olímpico também promove as potencialidades dos jovens e das

crianças nas diferentes modalidades de esportes.

O projeto que tem maior visibilidade nos meios de comunicação é o

Mangueira do Amanhã que em 1987 organizou a escola de samba mirim

Mangueira do Amanhã onde o brilho, a presença, ritmo e emoção encantam

todos que a vêem passar com seus 2.500 figurantes – crianças e adolescentes

de 7 a 17 anos. Tudo ali é o resultado do trabalho de todos: escolha do tema,

músicas, alegorias, fantasias e reuniões. E o aspecto mais fascinante nisso

tudo é que cada um tem a possibilidade de conferir o valor do seu trabalho pelo

calor dos aplausos, dos flashes dos fotógrafos ou das luzes das estações de

TV. Ainda que efêmero, aquele momento de glória é alimento duradouro para a

auto-estima.

A despeito de ser uma atividade voltada para o lazer, a preocupação com

aspectos educativos é uma constante.Para ser integrante é necessário que a

criança tenha obtido aprovação escolar, o que é um ótimo incentivo aos

estudos. Além disso, o cuidado com preservação da cultura popular que está

presente na escolha dos enredos é um fator a mais a enriquecer a sua

formação cultural.

“Além de ensinar as crianças a compor, criar alegorias, ser passistas,

ritmistas e percussionistas, as ensinamos a se comportar e vestir

adequadamente, manter o cuidado com a higiene e cumprir horários e

compromissos. Quem vai representar a Mangueira no futuro precisa saber ser

gente comprometida, e os pequenos só serão alguém na vida se cumprirem e

Page 49: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

49 respeitarem regras. Daí a disciplina aplicada a quem chega para estudar e

trabalhar conosco. O Mangueira do Amanhã é a base da nossa grande escola.”

Alcione in Moysés (2003)

É difícil manter-se insensível ao desfile da Mangueira do Amanhã. Para

quem assiste a ele é emoção que passa. Para quem o faz é, provavelmente,

emoção que se cristaliza em sentimentos de autoconfiança e de identidade

grupal.

Por último citaremos o tão conhecido projeto Olodum de Salvador que

tem como um dos principais objetivos o resgate, a valorização e a preservação

da cultura negra. Os valores da cultura afro ali se fazem presentes, exaltados

na beleza da raça, na sua dignidade, na sua fortaleza. Mas se fazem também

no uso dos instrumentos de percussão e no seu ritmo forte a nos falar da mãe

África.

O projeto Olodum não é apenas a banda e o bloco. Ele mantém, também,

diferentes atividades, onde podemos destacar o programa da escola Criativa

que tem por objetivo desenvolver a formação de crianças, jovens e adultos,

fornecendo-lhes conhecimentos adicionais àqueles adquiridos nas escolas

públicas, ampliando-lhes a sua formação cultural. Seus cursos e seminários

concorrem, também, para aumentar-lhes a auto-estima, na medida em que

visam dar-lhes condições para exercer o papel de cidadãos conscientes e

aptos na sociedade.

São oferecidos cursos que vão desde os de conteúdos acadêmicos, como

os de português, história, inglês, aos de informática, usos da Internet e

Page 50: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

50 educação social. Incluem também a dança afro, a percussão, o artesanato,

além de um bom acesso ao mundo do conhecimento universal por meio do

videoclube e de um banco de dados afro-brasileiros.

Dentre os objetivos específicos da Escola Criativa Olodum podemos citar:

o combate ao racismo, o desenvolvimento de atividades, sociais culturais e

pedagógicas para melhoria das condições de vida da população negra e afro

descendente; revisão crítica da história escrita dos afro brasileiros e promover

o diálogo entre os diferentes grupos étnicos .

Como observamos há uma ênfase não só no desenvolvimento das

potencialidades dos jovens que estão nas suas fileiras, como também uma

marcante preocupação em oferecer-lhes subsídios para compreender melhor a

cultura negra. Resgatar os valores dessa cultura é despertar-lhes a consciência

do seu próprio valor como pessoas e como grupo. Essa, talvez seja a chave

que faz do Olodum um dos grupo conhecidos e respeitados no nosso país.

Importa destacar, também, que são visíveis o orgulho e a satisfação que

muito desses educadores sentem do próprio trabalho. Ao que parece, esse é

um campo de ação no qual todos os atores acabam contagiados pelo mesmo

entusiasmo. Penso, mesmo, que há uma reação circular entre o educador e o

aprendiz, na qual o nível de satisfação de um interfere no desempenho do

outro. Infelizmente, isso é válido também para a situação oposta. Por esse

motivo, deixo aqui um tema para reflexão: até que ponto o fato de ter

professores tão desmotivados e insatisfeitos com o que fazem não está

influenciando o mau desempenho dos seus alunos? Até que ponto o nível de

Page 51: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

51 auto-estima de um não estaria influenciando o nível de auto-estima do outro? É

um caso a pensar.

Além dessas, há uma outra lição a tirar dos exemplos trazidos. Estou me

referindo à força do trabalho coletivo. Percebe-se em quase todos eles a forte

interdependência da auto-estima individual com auto-estima do grupo. Mais

intensa nos projetos que incluem apresentações públicas, também nos demais

ela se manifestas, uma vez que cada um percebe que sozinho o seu brilho

diminui ou se apaga. Seja se exibindo publicamente ou reivindicando seus

direitos de cidadão, o fato de se perceber como membro de um grupo com

identidade própria possibilita à criança ou ao jovem sentir-se mais seguro para

atuar.

Essa forma de trabalhar a auto-estima é uma nova tendência que vem se

firmando e que contribui para reverter a imagem que há tantos anos vem

impregnando as ações nessa área: a da exacerbação do individualismo. O que

está verificando na atualidade é uma conscientização, cada vez maior, da

importância de crescer individualmente na mesma medida em que se cresce

como conjunto.

Edgar Morin considera absolutamente fundamental combater todas as

formas de egocentrismo, chamando a atenção para um dos seus aspectos

mais perversos: o processo de auto-proteção. Ou seja, a pessoa deprecia as

palavras e os atos do outro, enfatizando o que ele tem de pior, ao mesmo

tempo em que elimina o que é desfavorável em si mesmo, selecionando e

transformando tudo o que lhe é desonroso (Morin, 2000). Ou seja, “vê o cisco

no olho do próximo, mas ignora a trave no seu próprio olho”. Essa atividade

Page 52: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

52 tenta, exatamente, contrapor a esse egocentrismo um movimento contrário: o

de destacar o que o outro tem de bom.

Evidentemente, na prática, nem todos estão abertos, de imediato, para

essa tarefa. Daí a necessidade de enfatizar que esse processo é gradual e

muitas vezes lento, pois a valorização do “ser” não faz parte da nossa cultura.

Faz-se necessário de fato, uma mudança de paradigma no tocante as relações

interpessoais, principalmente na escola, espaço privilegiado para convivência e

perpetuação das práticas, que podem e deveriam ser sempre pautadas no

respeito e na ética cidadã, possibilitando e criando oportunidade para que as

novas gerações desenvolvam de forma mais plena o potencial que trazem

dentro de si auxiliando no autoconhecimento e melhoria dos grupos de

convivência, seja na escola ou em outros espaços..

Page 53: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

53

CONCLUSÃO

No relato exposto ao longo deste trabalho pudemos identificar que os

projetos só foram possíveis porque houve uma preocupação, algum ou muito

investimento, por parte de uma pessoa ou de um grupo ,em fazer algo que

pudesse levar o grupo alvo a olhar-se e perceberem-se enquanto sujeitos e

partir da realidade existente, rever ou ratificar, através de ação concretas o seu

autoconceito em uma dimensão mais plural, holística, para além do acadêmico,

com enfoque nas competências pessoas, possibilitando assim a construção ou

reforço de uma auto-estima positiva.

No cotidiano escolar, a compreensão que o professor tem do que venha a

ser auto-estima é fundamental na orientação da sua prática. Percebê-la como

algo que se constrói dia-dia na intimidade das relações que ele mantém com

seus alunos é o primeiro passo. Quem está convencido disso respeita as

diferenças individuais, tem consideração pela pessoa do aluno, compreende a

suas peculiariedades a tenta trabalhar para tirar dele o melhor. Mais: não

ridiculariza nem evidência suas fraquezas. Antes, demonstra ter uma forte

convicção de que confia em seu potencial. Por esse motivo, mobiliza esforços

para lhe oferecer oportunidades de exercitá-lo. Nada mais distante de um

trabalho com a auto-estima do que imaginar que bastam alguns elogios para

obter a sua elevação. O que produz mudanças é a autopercepção que de se é

capaz; algo que só a própria pessoa consegue ver.

Outra forma de o educador ter um papel ativo na mudança da auto-

estima é ir registrando todos os pequenos progressos feitos pelo aprendiz.

Page 54: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

54 Relacioná-los aos esforços desprendidos é o estímulo para que ele continue se

esforçando. Isso é válido para qualquer tipo de situação que envolve

aprendizagem. Será que aqueles jovens que participaram do projetos citados

como Olodum e projeto Pai e Mãe outros teriam chegado onde chegaram se só

tivessem recebido elogios após a execução de uma peça completa ao violino?

Tudo indica que não.

É importante para o educador – seja ele formal ou informal – saber o

motivo pela qual é importante trabalhar auto-estima de seus alunos. Transitar

por essa área requer cuidado. Os riscos de exacerbar o narcisismo e os

sentimentos de onipotência são grandes. Essa é uma tarefa que deve estar a

serviço de algo muito maior do que a insuflar egos. O trabalho nesta ótica

objetiva presta apoio aos alunos- em especial a certos alunos – para que a

educação cumpra suas metas.

Aqui foram apresentados exemplos de ações das mais diversas

naturezas. São sugestões que poderão servir de base para novos trabalhos.

Creio que a educação formal tem muito que aprender com os projetos

desenvolvidos no âmbito da educação não-formal,quer pela justeza dos seus

propósitos, quer pelos resultados obtidos.

Com louvor e significância são projetos que vão explorando novos

caminhos, tendo em vista o resgaste de valores humanos como solidariedade e

o respeito por si mesmos e pelo próximo. Há, nas atividades que promovem,

um elemento fundamental: a possibilidade de oferecer uma opção construtiva

àquele que está inclinado para o comportamento delinqüente: “Se tivesse

outros projetos como esse não teria a criminalidade que tem hoje”.

Page 55: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

55

Aqui foram expostos apenas alguns deles, mas já se contam a centenas

de projetos e ações que trabalham nesta linha em todo o Brasil.

As diferentes experiências realizadas podem trazer subsídios para uma

prática pedagógica mais preocupada com a não exclusão de seus alunos.

Estou convencida do potencial que atividades desse tipo têm para fazer frente

ao sentimento de desvalia que se observa entre os alunos que convivem com

histórias de fracasso. Acredito, igualmente, que poderá servir de inspiração

para novos trabalhos que começam a se feitos em escolas preocupadas com a

política de inclusão.

O atual momento por que passa a educação brasileira, marcado pela

autonomia das escolas em relação as suas propostas curriculares, parece estar

propício a novas aberturas. Talvez fosse a hora de analisar novas proposições,

como, por exemplo, a da teoria das inteligências múltiplas. Ainda que por vias

tortuosas, o que muitos desses projetos aqui apresentados estão fazendo nada

mais é do que a privilegiar talentos desprezados pela escola.

Independentemente do caminho a ser seguido, há uma viagem a ser

feita. Viagem que se impõe pelas vertiginosas mudanças da virada do século e

que precisam concretizar as promessas deste que se inicia.

Vivemos hoje em escala planetária. Somos cidadãos da Terra. Nessa

morada cujos limites se estreitam, aprender a conviver com todos, a executar a

tolerância e a compreensão é um interativo. É tarefa de toda sociedade prepara

as novas gerações para enfrentar esse desafio. Cabe aos educadores um

papel de destaque nesse cenário. Seria bom que todos estivessem alertas para

as exigências da educação no futuro. E uma delas vem falar da necessidade

Page 56: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

56 de trabalhar a totalidade do ser humano, e não apenas uma de suas facetas.

Significa dizer que tem que haver espaço para discutir a própria condição

humana.

Tratando especificamente desse tema, Edgar Morin (2000) enfatiza

as questões da compreensão que se deve haver entre todos os povos e as

pessoas, destacando-a como um dos aspectos básicos dessa educação.

“Educar para compreender a matemática ou disciplina determinada

é uma coisa; educar para a compreensão humana e a outra. Nela encontra-se

a missão propriamente espiritual da educação: ensinar a compreensão entre as

pessoas como condição e garantia da solidariedade intelectual e moral da

humanidade”.

Na sociedade contemporânea, com a mundialização, as

conseqüências dos nossos atos podem atingir escadas anteriormente

inimagináveis. Mais do quer nunca, precisamos desenvolver em nós a

consciência de que, apesar das divergências, somos iguais na nossa

humanidade e como educadores contemporâneos temos a tarefa de possibilitar

na escola seja vivenciado experiências pautadas na ótica do respeito mútuo e

compreensão humanitária de nossas saudáveis e naturais diferenças.

BIBLIOGRAFIA.

Page 57: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

57

ANTUNES, Celso (1991). As inteligências múltiplas e seus estímulos.

Campinas: Papirus.

AQUINO, Léa G.T. (1999). “A sala de aula sem mitos e sem mágicas: Um

espaço para possibilidades”. Dissertação de mestrado. Niterói: Universidade

Federal Fluminense.

BAKHTIN, M. (1992). Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes.

BETTELHEIM, Bruno ( 1989 ). Uma vida para seu filho. Rio de Janeiro:

Campus.

BRUNER, Jerome (1998). Realidade mental, mudos possíveis. Porto Alegre:

Artes Médicas.

FORQUIN, Jean-Claude (1993).Escola e Cultura. As bases sociais e

epistemológicas do conhecimento escolar. Porto Alegre: Artes Médicas.

FREIRE, Paulo; SHOR, Ira (1986). Medo e ousadia. Cotidiano do professor.

Rio de Janeiro: Paz e Terra.

GOLDSTEIN, M.S. (1986). A exclusão da escola de 1º grau: A perspectiva dos

excluídos. São Paulo: Fundação Carlos Chagas.

HAMACHECK, Don (1979). Encontros com self. Rio de Janeiro:

Interamericana.

HEIDER, Fritz (1970). Psicologia das relações interpessoais. São Paulo:

Pioneira.

IBGE, (2000). Síntese dos Indicadores Sociais 1999. Rio de Janeiro: IBGE.

KORCZAK, Janucs (1970). Quando eu voltar e ser criança. São Paulo:

Summus.

Page 58: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

58 LINHARES, Célia F; GARCIA, Regina L. (orgs.) (1996). Dilemas de um final de

século: O que pensam os intelectuais. São Paulo: Cortez.

MORIN, Edgar, (2000).Os sete saberes necessário à educação do futuro. São

Paulo: Cortez; Brasília: Unesco.

MOYSÉS, Lucia M.M, (1986). “Mudanças de auto – estima em menores

institucionalizados. Boletim da Associação Brasileira de Psicopedagogos de

São Paulo, vol. 5, n° 10.

______ (2001). A auto-estima se constrói passo a passo. Campinas: Papirus

______ (1994). O desafio de saber ensinar. Campinas: Papirus.

SANTA-RITA, T.; MOYSÉS, L.M.N. e COLINVAUX, D. (1997). “Construção do

conhecimento e formação continua”. Relatório de pesquisa Niterói:

Universidade Federal Fluminense/ CNPq.

VYGOTSKY, Lev S. (1987). A Formação Social da Mente. São Paulo

Martins Fontes.

______ (1987). Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes.

Page 59: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

59

ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I :

A CONSTRUÇÃO DA AUTO-ESTIMA 10

1.1-Rótulos e Atitudes 12

1.2-As Referências Positivas 15

1.3 - O Processo de Mudança no Autoconceito 20

CAPÍTULO II:

A ESCOLA E A AUTO-ESTIMA 23

2.1 – A Auto-Estima no Cotidiano Escolar 24

2.2-Possibilidades e Saídas 29

2.3 A Escola e os seus diferentes observadores 37

2.4-A Auto-Estima dos Professores 40

CAPÍTULO III:

EXPERIÊNCIAS BEM SUCEDIDAS 45

CONCLUSÃO 53

BiBLIOGRAFIA 57

ÍNDICE 59

AVALIAÇÃO 6

Page 60: UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO LATO … capÍtulo i: a construÇÃo da auto- estima 10 capÍtuloii: a escola e a auto-estima. 23

60