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UNIVERSIDA DE CANDIDO MENDES PÓS-GRA DUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE Cultura da Agressividade – A Violência através da M ídia Por: Claudia Furtado Sardinha Orientador Profª. Fabiane Muniz Rio de Janeiro 2006

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

Cultura da Agressividade – A Violência através da Mídia

Por: Claudia Furtado Sardinha

Orientador

Profª. Fabiane Muniz

Rio de Janeiro

2006

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

Cultura da Agressividade – A Violência através da Mídia

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Comunicação

Empresarial

Por: Claudia Furtado Sardinha

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AGRADECIMENTOS

...A Benjamin Franklin por ter

descoberto a eletricidade, ao meu

computador amigo por não ter falhado

na hora em que mais precisei, aos

meus paistrocinadores e a minha irmã

que teve participação fundamental

neste processo.

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DEDICATÓRIA

Dedico a todos aqueles que não se

deixam manipular pela mídia. Lutemos

contra o mau uso dos meios de

comunicação.

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“... O trágico fim de dois psicopatas que

tentaram manipular a mídia em proveito

próprio. Nós do Top Story jamais

deixaremos que nos usem. Queremos

trazer a notícia em toda sua

complexidade. A verdade é a heroína de

hoje, e nos orgulhamos por trazê-la...”

(Filme 15 Minutos, personagem Robert

Hawkins)

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RESUMO

A agressividade, a violência são frutos de ações e vivências amplas no campo

social, político e psicossocial. O que prioritariamente quer se ressaltar neste

projeto é a preocupação com os destinos humanos, a favor do homem e da

vida, das percepções abertas para o que, em nosso mundo, agita-se e

conforma-se em atos flageladores de nós mesmos, um “necrofilia”. Por que

esse gosto pela morte, assassinatos a sangue frio? Para que tornar algo

trágico em sensacionalismo barato?

Desta forma, num pequeno histórico, pontuado por exemplos relevantes,

tentaremos justificar a maneira como a comunicação é transmitida ao receptor

e como este a interpreta.

Pegando carona no filme 15 minutos (com Robert de Niro e Edward Burn),

vamos mostrar que a violência na mídia vai mais além do que simples

programas informativos, para formadores de opinião. Vamos mostrar a visão

distorcida que a mídia nos passa, banalizando os atos e tornando natural

vivermos cercados de violência.

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METODOLOGIA

Para que se compreenda de forma prática esse trabalho, é preciso

empreender um estudo geral da Violência como um todo, buscando os

elementos utilizados no processo de realização do trabalho do jornalista.

A mídia perdeu seu papel inicial, o de informar e/ou educar. Essas funções não

são mais suficientes para manter um titã como os meios de comunicação, que

irão buscar em outros caminhos o seu maior desenvolvimento, ou seja, o

melhor lucro.

O primeiro método utilizado nesta monografia foi ter como base um filme,

usando algumas de suas cenas como ilustração do tema. Também foram

utilizados livros com referência ao tema, jornais e revistas com enfoques

violentos, além de entrevista com uma psicóloga para uma análise da mente

humana e sua busca pelo ato violento.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09

CAPÍTULO I - A violência como entretenimento 10

CAPÍTULO II - A violência através da mídia 20

CAPÍTULO III – Semsura: Censura 29

CONCLUSÃO 34

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 36

ÍNDICE 38

FOLHA DE AVALIAÇÃO 39

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INTRODUÇÃO

As pessoas, hoje em dia, se vendem pela fama. Isso dá margem a pessoas

insanas e aproveitadoras emergirem de forma catastrófica e, muitas vezes,

somente para obter fama com a desgraça alheia. Para que tornar a violência,

algo tão trágico, em sensacionalismo barato? Afinal, não passa disso. Qual a

graça que tem exibir a morte de uma pessoa? Mas é na busca de passar a

informação que se baseia a mídia, para, nada mais nada menos, ganhar mais

audiência. É então que surgem programas como Ratinho e Linha Direta, que

possuem uma roupagem de ajuda à sociedade, mas abusam do apelo ao

sádico e trágico, aguçando nossos sentidos mais primitivos.

Este trabalho visa mostrar esta realidade, através de comparações e análises

de estudiosos e de materiais de pesquisa referentes ao tema, como funciona a

mente humana quando exposta a este tipo de informação. Baseando-se no

filme 15 minutos e em livros como o Cultura da Agressividade, Dialética do

Esclarecimento e Identidade, vamos expor a visão da mídia, alheia a qualquer

coisa que não dê audiência, e do público, sedento por este tema. Quanto mais

trágico o evento, maior a quantidade de público. Podemos ver isso claramente

no filme que é a base deste projeto. Então podemos nos perguntar, onde a

notícia acaba e o direito de privacidade começa com a real exploração do

sensacionalismo e dos chamados reality shows?

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CAPÍTULO I

A VIOLÊNCIA COMO ENTRETENIMENTO

Dez de setembro, sábado. Finalmente cheguei a América. Eu vim pelo

cinema. Quando era uma criança, vi um filme chamado “A felicidade não se

compra”, dirigido por Frank Capra. Desde então quero vir à América. Terra da

liberdade, lar dos valentes, o país onde se pode ser alguém. Logo que

cheguei, um anúncio em uma vitrine me chamou atenção: Faça seus próprios

filmes. Por isso, a primeira coisa que fiz, foi arrumar uma câmera de vídeo.

Bem, para se cativar a mídia, para aparecer nela, devemos chamar a

sua atenção, a qualquer preço. Basta ter um bom tema sensacionalista.

E isso eu tinha! Comecei filmando o que acontecia ao meu redor, como

por exemplo, uma cobrança de dívidas antigas que meu companheiro de

viagem tinha a fazer. Uma simples visita aos devedores acarretou num

assassinato. Filmei tudo. Era a minha chance de ser famoso. “Eu amo a

América”, foi o que ele disse, “aqui ninguém é responsável pelo o que faz”.

Isso, após ter visto que um rapaz iria fazer um filme sobre seus assassinatos e

nem mesmo ser julgado por isso, afinal, foi considerado temporariamente

insano.

Esse é o nosso segundo dia na América. O primeiro foi excitante, cheio

de vibração e emoção. E aqui comigo está o astro do meu novo filme, meu

parceiro. Descobrimos numa banca de jornal que, para filmar a vida de um

assassino, estavam oferecendo um milhão de dólares. Então o jornaleiro disse,

“vale a pena ser assassino nesse país”.

1.1 – Indústria cultural

Quando se fala em indústria cultural é importante destacar que ela é o

fruto de uma sociedade capitalista industrializada, no qual até mesmo a cultura

é vista como um produto a ser comercializado. Afinal, o que é a indústria

cultural? Podemos dizer que é tudo o que é produzido pelo sistema

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industrializado de produção cultural (televisão, rádio, jornal, revistas etc) e

elaborado de forma a influenciar, aumentar o consumo, transformar hábitos,

educar, informar, pretendendo-se ainda, em alguns casos, ser capaz de atingir

a sociedade como um todo.

Assim, cada vez mais, a máquina da indústria cultural, ao preferir a

eficácia de seus produtos, determina o consumo dos mesmos e exclui tudo o

que é novo, tudo o que ela configura como risco. A identidade do domínio que

a indústria cultural exerce sobre os indivíduos, aquilo que ela oferece de

continuamente novo não é mais do que representação. Sob formas diferentes,

de algo que é sempre igual; a mudança oculta um esqueleto, no qual muda tão

pouco como no próprio conceito de lucro, desde que este adquiriu o

predomínio sobre a cultura.

Com seus produtos, a indústria cultural pratica o reforço das normas

sociais, repetidas vezes até a exaustão, sem discussão. Ela fabrica seus

produtos com a finalidade de serem trocados por moeda, promover a

deturpação e a degradação do gosto popular, obter uma atitude sempre

passiva do consumidor simplificando ao máximo seus produtos. Eles são

construídos propositalmente para um consumo descontraído, não

comprometedor. Segundo Adorno (1944), cada um desses produtos reflete o

mecanismo econômico que domina o tempo do trabalho e o tempo do lazer.

O consumo desses produtos, que pode levar à alienação/revelação, é

entendido como um processo no qual o indivíduo é levado a não meditar sobre

si mesmo e sobre a totalidade do seu meio social, transformando-o com isso

em mero joguete e, afinal, em simples produto para alimentar o sistema que o

envolve.

Os conteúdos veiculados pela indústria cultural são objetos de análise

de muitos estudiosos, que dizem que os produtos da indústria cultural serão

bons ou maus, alienantes ou reveladores, conforme a mensagem por eles

vinculada. Com efeito, a mensagem oculta pode ser mais importante do que a

que se vê, já que aquela que escapa ao controle da consciência, não será

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impedida. Assim, não está impedida pelas resistências psicológicas aos

consumos e penetra provavelmente no inconsciente dos espectadores.

Toda essa indústria cultural vem, com a atualidade, se tornando

“engajada”, se voltando massificamente para a questão da violência urbana.

Com isso, irão surgir diversos filmes, livros, exposições e músicas voltadas

para o combate e muitas vezes, para a patologia da violência.

A cultura norte-americana já possuía um histórico de violência em seus

roteiros, talvez influenciando assim, a cultura brasileira que, com o estouro do

filme Cidade de Deus, divulga, ainda mais, a indústria cultural da violência.

Algum dos grandes exemplos desta máquina na sociedade brasileira foi

o filme Belline e a Esfinge. No Brasil, para a maioria, as metrópoles são o

cenário da violência urbana, causada entre outros motivos, pelo desemprego,

baixos salários e conseqüente aumento do número de miseráveis. E é

exatamente neste cenário que a história do filme, com Fábio Assunção e Malu

Mader, acontece.

Belline e a Esfinge

Inspirado no livro homônimo do titã Tony Bellotto, Bellini e a Esfinge tem

início quando um médico já idoso e bem estabelecido na profissão vai até a

agência de investigações comandada por Dora Lobo (Guttman) a fim de

requisitar seus serviços: aparentemente, ele se apaixonou por uma prostituta e

deseja descobrir seu paradeiro. Para cuidar do caso, Lobo escala o detetive

Belline (Assunção). Imediatamente, o sujeito mergulha na noite paulistana,

passando a freqüentar o submundo da prostituição e do tráfico, e conhece

Fátima (Mader), uma stripper que pode saber mais do que diz. Então, o velho

médico é assassinado em circunstâncias misteriosas e a investigação muda de

rumo, enquanto Bellini tenta se acertar com sua nova parceira, a detetive

Beatriz.

Não, Bellini e a Esfinge não revoluciona o gênero policial. Mas pelo

menos um mérito inquestionável: em sua falta de pretensão, consegue ser um

filme agradável para os olhos e delicioso para mentes despreocupadas. Ou

seja, cumpre com o a maior eficiência a função original do cinema: divertir. E

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ainda preenche um espaço vazio no cinema brasileiro: o do thriller que

realmente nos faz querer descobrir o final da história.

Logo, nos vem a mente a seguinte questão, de como poderíamos nos

distrair com a exibição de violência, no qual toda e qualquer atitude é

banalizada e considerada normal? Mas é exatamente este o papel que o

cinema brasileiro desempenha nos últimos tempos. Não que seja desfavorável,

visto que o público gosta deste tema, e então voltamos ao assunto da indústria

cultural. Tudo é apenas um ciclo, que culminará na visão do lucro.

Os filmes brasileiros se aproximam, cada vez mais, do cinema

“hollywoodiano”, espirrando sangue em quem estiver interessado.

Cidade de Deus

Um outro exemplo é o filme cidade de Deus, que revolucionou toda a

estética e temática de filmes brasileiros. Este, foi e ainda é um sucesso de

bilheterias, foi o filme escolhido para representar o Brasil na maior premiação

cinematográfica que existe - o Oscar.

Assim como o filme anterior, este trás em seu roteiro um elevado nível

de violência, que o Diretor Fernando Meirelles não fez questão de esconder,

mostrando o lado mais negativo da vida nos morros e do tráfico drogas

existentes nesses locais, sem deixar de lado uma pitada bem brasileira nas

músicas, cenário e na ambientação.

Cidade de Deus é o filme certo no momento certo: foi lançado em meio

a uma das maiores crises de violência da história de nosso país. A produção

retrata de forma realista – e, consequentemente, chocante – o terrível universo

do tráfico que é, sem dúvida, o maior responsável pelas barbaridades que

todos enfrentamos atualmente. Mergulhando sem reservas em um mundo

praticamente desconhecido por parte da sociedade, que de seu confortável

sofá encara todos os habitantes de favelas como um mero constrangimento. O

filme prova que o problema é infinitamente mais complexo do que o Jornal

Nacional tenta nos fazer acreditar: capturar Elias Maluco (ou qualquer outro

traficante) será tão eficaz no combate ao tráfico quanto a morte de Osama Bin

Laden o será para o fim do terrorismo mundial. O problema não reside em uma

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pessoa, mas em um sistema cujo “código de honra” é mais sangrento do que a

guerra do Vietnã e cujos lucros são bem maiores do que a indústria do tabaco,

por exemplo.

Produzido a partir do livro homônimo de Paulo Lins, o filme narra uma

série de casos verídicos que fazem parte da história de Cidade de Deus, um

das favelas mais perigosas do Rio de Janeiro. Criado na década de 60 par

servir como lar de desabrigados, o local passou a ser palco de batalhas

violentas entre diferentes gangues que disputam a supremacia no tráfico – e o

roteiro se concentra especialmente na rivalidade entre o perigoso Zé Pequeno

e o trágico Mane Galinha, que entra na guerra para vingar a morte do irmã. Ao

mesmo tempo, somos apresentados ao jovem Buscapé, cujo grande objetivo é

tornar-se um fotógrafo profissional e fugir daquela triste vida.

Analisando de forma quase didática a hierarquia desta cruel indústria, o

filme leva o espectador a compreender melhor as difícies escolhas que se

apresentam aos sofridos “civis” que se encontram no meio do fogo cruzado:

manter-se honesto e viver em uma honrosa miséria ou aliar-se aos bandidos e

ter uma renda mais generosa? Em certo momento, Buscapé, que acabara de

ser demitido em função do preconceito de seu patrão, vê Zé Pequeno passear

alegremente em sua moto e questiona os méritos de sua própria honestidade.

Seja como for, uma coisa é certa: criminoso ou não, o morador da favela é

visto com desconfiança pela sociedade. Então, por que insistir no pudor?

Com este filme surgiu uma microssérie transmitida pela Rede Globo,

chamada Cidade dos Homens. Esta ainda mais que o filme, explica ao

telespectador, didaticamente, como funciona o tráfico e, até mesmo, a

geografia dos morros. Por outro lado, imaginamos o quão verídico esses

produtos são. Afinal, sem mesmo conviver, conhecer e vivenciar, podemos

escrever um roteiro que retrata a violência ou todos os esquemas que lá

ocorrem? Esta pergunta nos vem à mente todas as vezes que assistimos

filmes como esses, ou lemos livros como o de Patrícia Melo, Inferno, que

retrata a vida no morro baseando-se em documentários e jornais. Nós, leigos,

acreditamos pura e simplesmente porque foi mostrado na televisão, que nos

dias atuais, passa credibilidade perante o público. Mas de onde vem essa

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credibilidade? Não podemos afirmar certamente, afinal todas as reportagens

são feitas de forma superficial devido ao pouco tempo para a pesquisa. Porque

acreditar que criminosos, como Fernandinho Beira-Mar irão simplesmente

comandar toda uma cidade, comparando suas atitudes a de grandes terroristas

islâmicos? Até que ponto isso não é sensacionalismo barato? Por esses

motivos, entre outros, é que devemos sempre nos questionar até onde vai a

verdade e onde se inicia o poder da mídia.

Nunca antes na história, fama e lei estiveram tão próximas e tão

perigosamente alinhadas. Com a atual demanda insaciável por notícias, todos

desde criminosos a policiais, de advogados a políticos juntaram-se ao ranking

de celebridades procuradas e geradores de informação. Assassinos contratam

porta-vozes e dividem suas confissões em primeira mão. Enquanto isso, todos

de ladrõezinhos a advogados do Presidente, buscam por seus espaços na luz

da publicidade. Crime, tragédia, caos: nós podemos temê-los, mas não se

pode negar que isso é o mundo de hoje e traz audiência, dinheiro e poder.

Então, até onde as pessoas mais desesperadas da sociedade vão, para

conseguir seus 15 minutos de fama? E quão disposto está o público a assistir

isso?

E assim bolamos um plano. Matar alguém famoso; a Ariadne. Tudo seria

filmado e depois, teríamos apenas de falar o seguinte: “nós somos insanos”.

Afinal, quem filmaria seus próprios crimes? Depois de matá-la e sermos

apanhados, iremos a um hospital psiquiátrico. Uma vez no hospital, eu direi

que não sou demente. Apenas fingi para ser absolvido. Passaremos por

psiquiatras. Eles vão comprovar que somos normais. E pela lei, não podemos

ser julgados pelo mesmo crime duas vezes. Sairemos livres, ricos e famosos.

Será que o júri irá aceitar isso? Sim, sou mais esperto que os americanos. Eles

assistem e se emocionam com esses programas. Não só vão acreditar, como

vão derramar em lágrimas por mim.

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Todo grande filme tem de ter uma grande tragédia. E assim,

prosseguimos nosso plano. Contatamos a emissora conhecida e negociamos a

venda do filme. Apenas duas coisas foram exigidas: exclusividade e a rendição

em canal aberto e ao vivo.

Quem diz que não se pode fazer sucesso na América? Vim pra cá sem

nada, sem conhecer ninguém. E veja só, sou um sucesso nacional. Veja,

estamos na televisão!

Minha idéia. Você não entende? É um grande filme americano. Eu sou o

diretor, eu sou tudo. É o que os americanos querem: sexo e violência. E a

mídia pode ser uma grande aliada.

“... o trágico fim de dois psicopatas que tentaram manipular a mídia em

proveito próprio. Nós, do Top Story, jamais deixaremos que nos usem.

Queremos trazer a notícia em toda a sua complexidade. A verdade é a heroína

de hoje e nos orgulhamos por trazê-la...”

Os jornalistas se vendem por uma notícia; pessoas se vendem pela

fama. Isso dá margem a pessoas insanas e aproveitadoras, emergirem de

forma catastrófica e, muitas vezes, somente para obter fama na desgraça

alheia. Um grande exemplo que temos é o caso da Daniela Perez, assassinada

por um companheiro de elenco, Guilherme de Pádua. Vimos como a mídia

repercutiu o incidente, levando a repetição de uma fita cassete, com a voz de

Guilherme dizendo que a atriz Daniela Perez foi morta porque Deus permitiu e

que ela estava melhor que todos nós etc, em vários canais de televisão por

semanas.

Outro caso de abuso da mídia foi a trágica morte dos Mamonas

Assassinas, que tiveram suas entranhas estampadas por todas as publicações

impressas,e as mesmas imagens distribuídas pela internet.

Para que tornar algo tão trágico em sensacionalismo barato? Afinal, não

passa disso. Qual a graça que tem em exibir a morte, assassinatos a sangue

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frio? Mas é exatamente nisso que se apóia, principalmente, a televisão. Seus

pontos de audiência crescem, pois há quem assista. Existe quem se delicie

com tamanha nojeira e assim surgem programas como Ratinho e Linha Direta

que, com uma roupagem de ajuda à sociedade, aguçam todo nosso mais

profundo sentimento sádico e trágico.

A televisão, por exemplo, é uma “arma” poderosa que influencia toda

uma sociedade. Por isso, deve ser utilizada com muita cautela, e é neste

âmbito que iniciam-se discussões com relação aos programas exibidos pelas

emissoras. Cenas fortes de violência exibidas no horário nobre chocam pais de

famílias que exigem a retirada destes programas. Argumentos, como

incidentes com crianças armadas que matam adolescentes, que acreditam ser

vampiros, todos influenciados pela “caixa mágica”, colocam a culpa nos

programas fantásticos ou reais.

Por outro lado, se estes fossem tão perigosos e influenciáveis, todos

estaríamos à beira de um assassinato ou qualquer acidente. Logo, até que

ponto a mídia realmente influencia esses adolescentes e, até que ponto essa

postura é fruto de mentes insanas que se deixam levar por programas

fantasiosos? Não podemos deixar que uma espécie de censura nos impeça de

cumprir nosso direito de cidadão que é de nos informar ou, até mesmo, nos

entreter. Até mesmo, porque não sabemos até que ponto a televisão influencia

ou é influenciada. O que veio primeiro: o ovo ou a galinha? Ao final, devemos

lembrar que não é só a televisão, a mais forte das mídias, que é a vilã da

história. A mídia impressa, como jornais e revistas, bem como todo conteúdo

da internet, todos têm sua parcela de culpa na disseminação, na divulgação

desta indústria cultural da violência.

1.2 - Origens da motivação humana

Com o impacto diário de boatos e notícias que dão conta de uma onda

de criminalidade difusa, que reúne características de banditismo e crueldade, a

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população vive, reage e sobrevive com formas infantis de mecanismos de

autodefesa e ataque.

Há uma sucessiva divulgação de informações mal digeridas e não

elaboradas, que vão dos cortiços as mansões, das favelas aos sem-terra. O

resultado é um idioma de indelicadezas, de vadiagem orgulhosa,

sadomasoquismo que vai do berço ao fim da vida do ser humano, sacrificando

os rituais de socialização.

No mundo real atual, uma grande tragédia como a de uma criança que

leva uma arma para a escola e atira em seus colegas, é mostrada em todos os

canais e estampada em milhares de jornais e revistas, inclusive indo parar na

internet quase que instantaneamente. As câmeras, fotográficas ou filmadoras,

mostram tudo. Os jornalistas querem entrevistar as famílias, alunos ainda em

estado de choque e assim, temos uma sociedade que absorve tudo isso.

Voltemos aos tempos remotos, quando surgiram os mandamentos e, dentre

eles, Não Matarás. O homem responde com um impulso filogenético

programado para a agressão, herdado de uma era pré-histórica.

Realmente, proto-hominídeos e os homens primitivos eram caçadores,

consumidores de segunda ou terceira ordem. Conseguimos essas informações

dos ossos animais encontrados junto ao dos australopithecus sul-africano e

outro depósitos de fósseis. Tanto nas pesquisas relativas a esse antepassado,

bem como ao homem de neanderthal, parece que o estranho padrão

comportamental de matar um ao outro começou desde cedo entre os

hominídeos. A vontade de matar apenas transformou-se com a prosperidade

da cultura, fazendo com que o homem de hoje procurasse justificativas

ideológicas capazes de inibir o tabu e evitar arrependimentos.

O homem é o único primata capaz de torturar e eliminar membros da

mesma espécie sem razão biológica, econômica e com prazer.

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CAPÍTULO II

A VIOLÊNCIA ATRAVÉS DA MÍDIA

“A busca da imparcialidade – isto é, a transmissão dos

fatos como eles realmente ocorreram – faz parte do

código de ética dos bons jornais e revistas do país.

Apesar disso, é impossível haver neutralidade absoluta

na imprensa. A própria seleção dos assuntos tratados,

bem como o espaço que se dá a eles, já revelam uma

opção dos editores – feita em geral de acordo com seus

interesses, sua ideologia e sua forma de ver o mundo”

(Citação do livro Texto e Interação).

A informação jornalística é, em sua essência, impessoal e objetiva;

sendo caracterizada pelo uso primordial da função referencial – centrada no

contexto, nos fatos; possui caráter informativo, é uma linguagem de

constatação, segundo Roman Jakobson. Contudo, o que na realidade é

percebido no conteúdo desta, é a presença de outras importantes funções

como a emotiva (centrada no remetente, exterioriza os sentimentos, emoções)

e a conativa (centrada no destinatário, esperando-se deste uma resposta),

também definida por Jakobson. A predominância de uma com relação às

outras irá variar de acordo com o efeito q que se pretende produzir no público a

que se destina.

Assim, se a intenção da matéria jornalística é principalmente informar o

interlocutor sobre os fatos, predomina a função referencial; se a intenção é

colocar em destaque o locutor (aquele que fala no texto), expressando suas

emoções, sentimentos e opiniões, destaca-se a função emotiva; se a intenção

é estimular ou convencer o interlocutor, há o predomínio da função conativa.

Logo, a notícia não é apenas baseada em fatos. Desde a apuração destes até

a formulação da matéria ocorre um certo posicionamento, que pode ser visto

até mesmo na escolha do que será publicado. A notícia não está livre de

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influências, e isso sempre esteve claro para o leitor, que se vê diante de

publicações direcionadas às classes sociais.

“... o poder da informação nunca saiu das mãos de certos grupos da

classe dominante, os quais filtram essas informações segundo seus interesses

e manipulam a linguagem de modo a deixar chegar ao público leitor, apenas

aquilo que lhes interessa e com a versão que lhes convém” (Maria Alice Faria.

O Jornal da Sala de Aula. São Paulo, 1989)

Um desses recursos utilizados para se direcionar a matéria de acordo com

o público-alvo, é o discutido no livro “Argumentação e Discurso Político”. O

autor, Haquira Osakabe, comenta sobre questões que são formuladas para a

configuração das imagens que sustentam o discurso e, de acordo com ele, no

preparo de uma matéria jornalística são feitas questões que irão subsidiá-las.

O jornalista deve se informar sobre estas cinco perguntas básicas:

1- Que imagem faço do ouvinte para lhe falar dessa forma? A relação

interpessoal que se articula entre locutor e ouvinte; o quadro de

conhecimento que o locutor situa o ouvinte.

2- Que imagem penso que o ouvinte faz de mim para que eu fale dessa

forma? A imagem que o ouvinte tem do locutor político

3- Que imagens o locutor procura atender?

4- Que imagem tenho do assunto para falar dessa forma?

5- Que imagem penso que o ouvinte tem do assunto para eu falar dessa

forma?

Todas estas questões deixam claro que a notícia não é baseada em fatos e

sim, construída em cima de questões pré-formuladas, que são as bases para a

definição do público-alvo. Contudo seria errôneo afirmar que apenas para um

público-alvo é direcionada esta matéria. Existem interesses, muitas vezes

políticos, em informar ou não o leitor sobre um fato, até mesmo a ausência da

mídia no local do acontecimento, por motivos financeiros ou de segurança.

Em uma palestra “A violência na ótica da mídia”, o jornalista Maurício

Menezes cita o exemplo de Senador Camará, onde a polícia se ausenta por

considerar o local muito perigoso e, se questiona porque, então, a mídia deve

comparecer? E ela não o faz. Mas não só pela falta de segurança (afinal

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muitas vezes são enviados repórteres para guerras), mas sim, mais uma vez,

pela falta de interesse. Os jornais de hoje se tornaram “etilizados”, atendendo

apenas a uma pequena camada da população e, tornando-se assim, cada vez

mais distante do que consideramos como imprensa – a lente da verdade.

Para comprovar a teoria acima apresentada, será feito um comparativo entre

reportagens da mesma data, de jornais com públicos-alvos diferentes, após as

mesmas.

O Dia – Quinta-feira, 12 de setembro de 2002

CRIME EM GUERRA

O dia do terror foi aqui

Fernandinho Beira-Mar comanda a maior rebelião da história do presídio

de segurança máxima Bangu1 e ordena matança de Uê e mais três traficantes

rivais. Albeniza Garcia, Marcelo Leite e Patrícia Melo e Souza.

“Derrubamos duas torres!”. Com o grito de guerra em alusão ao atentado ao

World Trade Center – há um ano, nos EUA -, presos do Comando Vermelho

(CV) que ocupavam as galerias A e C de Bangu1 anunciaram, ontem de

manhã, o ataque à galeria D, onde estavam 12 traficantes da facção criminosa

Amigos dos Amigos (ADA), rivais do CV. Mais violenta rebelião da história do

presídio – que deveria ser de segurança máxima -, o motim foi comandado

pelo atacadista de drogas Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar,

que estava armado com pistolas e granadas. Quatro guardas, dois operários e

dois faxineiros foram feitos de reféns e algemados às grades, com botijões de

gás ao lado. O Secretário de Segurança, Roberto Aguiar, garantiu que houve

corrupção no presídio. “Algumas chaves foram dadas aos presos. Por isso, os

13 agentes (um faltou ontem) serão processados”, afirmou. Até às 22h30, a

rebelião não havia terminado. Segundo Aguiar, quando as negociações

terminassem, os presos de Bangu1 seriam transferidos para o Batalhão de

Choque, no Centro.

Foram executados Ernaldo Pinto de Medeiros, o Uê, e dois cunhados

dele: Vanderley soares, o Orelha, e Carlos Roberto Cabral da Silva, o

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Robertinho do Adeus. Elpídio Rodrigues Sabino, o Pídio, também morreu. Em

dexembro, ele tentou matar, a mando de Uê, um dos chefões do CV: Márcio

dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, do complexo do Alemão. Um dos

criadores do ADA, Celso Luiz Rodrigues, o Celsinho da Vila vintém, foi dado

como morto às 18h, quando uma fonte do Serviço de Operações Especiais

(SOE) do Desipe, por telefone, informou ter visto o bandido entre os rebelados.

Investigadores da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE), que

ajudam nas negociações, revelaram que Celsinho foi espancado e obrigado

por Beira-Mar a entregar ao CV as favelas que domina.

Com a divulgação de nomes dos possíveis mortos, o clima de medo se

espalhou pela cidade, principalmente porque, nas áreas por eles dominadas, o

comércio foi obrigado a baixar as portas. Em pelo menos dez bairros, a ordem

de luto foi cumprida. Fontes da polícia suspeitam que Beira-Mar conversa (...)

Transferência de Fernandinho Beira-Mar não será imediata

A transferência de presos como Fernandinho Beira-Mar precisa ser

aprovada pela justiça e, os estados hospedeiros precisarão aceita-los,

adiantou Antônio Rodrigues. Os secretários informaram ainda que, por

questões administrativas, a União só poderá ajudar Benedita (foto), co caso de

Bangu, com verbas. A Constituição Federal não permite que o governo resolva

questões estaduais, como motins, sem que haja uma intervenção.

A governadora também ligou para o candidato do PT a presidente, Luiz

Inácio Lula da Silva, e para o presidente nacional do partido, José Dirceu, para

explicar os fatos ocorridos em Bangu. Acometida de forte gripe, Bené soube da

rebelião no fim da manhã, quando gravava programa eleitoral para TV. Os

coordenadores da campanha decidiram cancelar a agenda da candidata à

tarde – debate sem a presença de Bené.

Reportagens de Bartholomeu Britto, Élcio Braga, Fábio Varsano, Fernanda

Galvão, Isabela Kopke, Luiz Sérgio Magalhães, Marcelo Fefer, Mônica

Rodrigues, Pedro Motta Lima.

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Jornal do Brasil – Quinta-feira, 12 de setembro de 2002

Comando Vermelho toma Bangu1

Por ordem de Fernandinho Beira-Mar, presidiários ligados ao CV

eliminaram quatro rivais da facção Amigos dos Amigos.

A briga entre facções criminosas no interior da penitenciária de

segurança máxima Bangu1, na Zona Oeste, impôs luto a pelo menos 20

bairros o Rio, deixou os cariocas assustados e colocou em xeque a autoridade

do Estado. Até às 23h30 de ontem, traficantes da facção Comando Vermelho

mantiveram oito reféns e mataram quatro traficantes o grupo rival, os Amigos

dos Amigos (ADA). Entre eles, Ernaldo Pinto de Madeiros, o Uê.

Ontem foi a primeira rebelião na penitenciária de Bangu1 desde que a

unidade, apontada como de segurança máxima, foi inaugurada, em julho de

1988. Ás 8h30, os traficantes Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-

Mar, e Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marinho VP, se aproveitaram do

início da revista diária para render dois agentes penitenciários e roubar as

chaves das celas. A ação estava planejada pela cúpula do CV desde janeiro.

Na ocasião, o chamado conselho da facção, formado também por Isaías

Costa Rodrigues, o Isaías do Borel, preso em Bangu3 e, por Odair Marlon

Duarte, o Aldair da Mangueira, decidiu pela revolta. Os motivos: o primeiro

seria a intenção dos líderes e de Beira-Mar de fazer do CV a única facção a

dominar o comércio de drogas no Estado. O outro seria uma vingança pela

morte do preso Oséas Gonzaga, o Mau-Mau, do Morro da Mineira. Ele foi

morto com um tiro no ano passado por integrantes da facção Terceiro

Comando, aliada da ADA, dentro de sua cela.

Após renderem os agentes e mais quatro funcionários de uma obra, os

criminosos seguiram até a galeria D, onde estariam os traficantes Wanderley

Soares, o Orelha, e Carlos Roberto da Costa, Robertinho do Adeus,

integrantes de sua quadrilha e que foram presos em abril. Os três, junto com

Marcelo Lucas da Silva, o Café, foram assassinados.

Armados com duas pistolas, uma escopeta e uma granada, retiradas do paiol

de Bangu1, Fernandinho Beira-Mar e outros bandidos fizeram de refém Celso

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Luis Rodrigues, o Celsinho da Vila Vintém, do ADA. O traficante foi espancado

e obrigado a falar ao celular com Isaías do Borel, que está em Bangu3.

chorando, Ccelsinho disse, após a morte do amigo Uê, que passaria a integrar

o CV. O preso Elpídio Rodrigues Sabino, também da galeria D, foi esfaqueado.

O domínio sobre a unidade fez os traficantes colocarem uma bandeira

vermelha numa das guaritas de Bangu1.

O comando da PM decretou estado de alerta nos batalhões. Á noite, o

subsecretário de integração Operacional, Carlos Augusto Leba, o comandante-

geral da PM Francisco Braz, e três delegados da Polícia Civil negociavam a

libertação de seis reféns. Cerca de 1.500 policiais faziam a segurança externa

do presídio. Um agente penitenciário e um operário foram libertados às 19h.

A delegacia de Repressão a Ações Criminosas Organizadas (DRACO)

abriu inquérito criminal para apurar a responsabilidade sobre a fuga. O diretor

da unidade, Ricardo Couto, foi demitido e os 12 agentes que estavam de

plantão na manhã de ontem foram afastados.

- Houve corrupção, conivência e crime – disse o Secretário de

Segurança, Roberto Aguiar.

Poder de dentro da cadeia

Beira-Mar queria se vingar de inimigos presos

No dia seguinte em que Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-

Mar, desembarcou em sua cela em Bangu1, em 26 de abril, vindo da

carceragem da Polícia Federal em Brasília, a cúpula de segurança do Rio já

previa a guerra que ia se travar, ontem, nas galerias do presídio. Naquele

mesmo dia, o traficante, apontado pela polícia como um dos maiores

distribuidores de drogas da América Latina, também já tinha em mente a

vingança contra os principais líderes do Terceiro Comando e do ADA presos

na unidade.

- Isso sempre foi um desejo de Beira-Mar – afirmou um policial da

Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE), sem querer justificar.

Antes mesmo de chegar ao Rio, Beira-Mar já era alvo de disputa entre o

governo do Estado, o Ministério da Justiça e a Polícia Federal. O secretário de

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Segurança Pública, Roberto Aguiar, sempre viu a presença do traficante em

Bangu1 como uma ameaça à segurança da cidade.

- Enquanto estiver aqui, Beira-Mar mostrou que Roberto Aguiar não

estava errado. Mesmo encarcerado num presídio de segurança máxima, o

traficante continuou comandando seus negócios e a tramar assassinatos. Em

junho, uma operação do Ministério Público do Rio, gravações de conversas

telefônicas autorizadas pela Justiça revelaram o bando de Beira-Mar

negociando a compra de mísseis e granadas com um fornecedor que teria

ligações com a organização terrorista Al Qaeda, comandada por Osama Bin

Laden.

Os grampos também revelam que o traficante tem um esquema de

propina para policiais civis e militares que trabalham na área da Favela Parque

Jorge, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. As gravações também

mostram a face violenta de Beira-Mar. Em 27 de junho, de sua cela em

Bangu1, na galeria A, o traficante comandou a execução, usando um telefone

com viva-voz, de dois bandidos que o teriam traído, na Favela Beira-Mar, em

Duque de Caxias.

Como podemos perceber, as notícias acima são dos jornais O Dia e

Jornal do Brasil, que possuem como principais públicos-alvos as classes C/D e

A/B, respectivamente. Por esse motivo iremos reparar toda uma forma

específica de tratamento dado a linguagem.

Enquanto no jornal O Dia há uma pessoalização, trazendo o leitor para

mais próximo do texto, através da quase oralidade da linguagem, percebida em

termos como “arriar as portas”, ou chamar a governadora do Estado do Rio de

Janeiro de “Bené”. No Jornal do Brasil, pelo fato da notícia se situar distante de

seu público, há uma certa impessoalidade no texto, como se não houvesse

qualquer ligação do que se fala com quem lê. E exatamente por esse motivo,

no jornal destinado a classes sociais mais baixas, pressupõem-se que seu

público convive neste meio de violência tratando todo traficante, e suas

facções de forma “mais íntima”, como por exemplo citando a todo tempo o

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“CV” ou “Uê”, e não o Comando Vermelho ou Ernaldo Pinto de Medeiros, como

é feito no Jornal do Brasil.

Em todas notícias, procura-se detalhar algumas informações, mas até

mesmo essas são diferentes em cada redação. No primeiro jornal citado,

aprofunda-se indicando as linhas de ônibus eu foram apedrejados ou

queimados; lojas fechadas e serviços parados. No segundo, explica-se, passo-

a-passo, como foram realizados os assassinatos. A explicação do último, nãoé

feita impunemente, mas sim com o intuito de chocar o leitor, muitas vezes

tornando “pior o que já é horrível”.

Contudo, essa diferenciação não se dá apenas no âmbito ideológico,

mas também na estrutura gramatical. No jornal O Dia, sua primeira matéria

inicia-se com dois adjuntos adverbiais, deixando para o final da sentença o

sujeito. Este recurso é geralmente uttilizado para fazer um suspense,

transformando o que seria notícia num romance. O recurso utilizado pelo jornal

do Brasil, é o oposto. Inicia sua primeira matéria já com o sujeito tornando a

informação mais direta, sem rodeios.

A metáfora também é muito utilizada porém, mais uma vez, de forma a

situar o leitor e seu meio. “Ela é o desvio da significação própria da palavra,

nascido de uma comparação mental ou característica comum entre dois seres

ou fatos. Dado seu caráter enfático, incisivo e direto, a metáfora produz

impacto em nossa sensibilidade: daí sua grande força evocativa e emotiva. É a

mais importante e freqüente figura de estilo”, segundo a Gramática Essencial

da Língua Portuguesa. Esta é uma das figuras de linguagem mais utilizadas

por jornalistas, seja qual for o seu intuito. Sendo assim, a diferença irá

aparecer quando falarmos da metáfora de esfriamento. São utilizadas para

dissolver conteúdos considerados do meio quente, ou seja, aqueles em que a

informação é dirigida apenas a especialistas. Sendo utilizadas principalmente

em jornais em que a redação considere seu leitor com menor repertório

lingüístico e que necessite de algum atrativo para prendê-lo a leitura. No nosso

caso, o jornal O Dia quando fala “a pleno vapor”, utilizando termos ferroviários

para tal comparação.

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Já no Jornal do Brasil a metáfora será utilizada também, só que esta de

forma a incrementar o texto, tornando-o mais literário. Além disso, os verbos e

o vocabulário deste veículo se mostram muito mais sofisticados, como o haver

no lugar de ter e palavras como periculosidade.

O jornalista domingos Meirelles, na palestra sobre violência, afirma que

o crime que nos é noticiado quase todo dia, ao contrário do que a mídia diz, é

um crime desorganizado. E continua dizendo que para ser organizado ele

precisa de poder. E o poder não está presente no tráfico dos morros, mas sim

em quem está por trás disto: pessoas “importantes”, como empresários e

políticos. Todo este alarde com relação ao tráfico de drogas, apenas nos faz

desviar o olhar do verdadeiro crime organizado, que atualmente movimenta

muito dinheiro.

Com isso, surge a mídia tentando transformar um gatinho num leão e

obtém sucesso por possuir credibilidade perante as pessoas e saber que tudo

que noticia causa um grande impacto em quem assiste. E por isso, deve-se

tomar cuidado com as palavras como guerra e manchetes como Tráfico

impõem lei do terror, afinal, muitas vezes os profissionais de jornalismo podem

causar um efeito nocivo na população que já vive tão alarmada e temerosa.

Em junho de 2002, o jornal Folha de são Paulo e a Editora Rocco

promoveram um evento para o lançamento do livro Linguagem da Violência,

com um debate sobre o assunto. A pesquisadora Elizabeth Rondelli, do Núcleo

de Estudos e Projetos em Comunicação da UFRJ, é uma das organizadoras

do livro. Na análise da cobertura dos fatos violentos pelo meios de

comunicação, ela concluiu que os que mais causam comoção na opinião

pública envolvem a participação da polícia. Os exemplos que a pesquisadora

apresenta são as chacinas no presídio Carandiru, em São Paulo, quando 111

presos foram mortos por policiais em 1992 e na Candelária, no Rio de Janeiro,

quando policiais mataram 8 meninos de rua em 1993.

Além disso, ela afirma que os meios de comunicação operam como

macrotestemunha social e dão uma visibilidade exagerada da violência para o

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público. “a mídia interfere no fato, dramatiza e exagera na cobertura do

episódio violento”, observa Rondelli.

Outros tipos de matérias também são feitas, como as interpretativas,

que são as explicações dos porquês dos fatos, as causas e efeitos, geralmente

utilizados pelas edições dominicais dos jornais e revistas, devido

principalmente ao fato da notícia já ter sido bem desenvolvida pelos outros

veículos. Esse aprofundamento dos fatos é feito com pesquisas, índices,

gráficos, tabelas, entrevistas.

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CAPÍTULO III

SEMSURA: CENSURA

“Claro que qualquer censura é abjeta. Todos devem ter o

direito de veicular tudo. Em contrapartida, o telespectador

deve ter assegurado o seu direito de filtrar o que entra ou

não entra em sua casa (direito que tem sido

sistematicamente ignorado). Quem decide o que vai

passar na televisão de cada casa não é a emissora, mas

o dono da casa. A emissora deve ter o direito de veicular

o que quiser, sem sofrer nenhuma forma de censura. Em

contrapartida, o cidadão deve ter o direito de selecionar o

que sua família deve ver.”

(Eugênio Bucci, 1999)

Já não resta dúvida de que a televisão e os meios de comunicação

contribuem para o comportamento agressivo das pessoas e para a difusão de

uma cultura em que a violência é aceita como “normal”. Em 2001 a Unesco

divulgou uma pesquisa realizada em vinte e três países (Brasil, inclusive) com

cinco mil estudantes de até 12 anos. O Estudo Global da Unesco sobre

Violência na Mídia – o primeiro do gênero em escala mundial – mostra dados

incontestáveis. A população infanto-juvenil de países considerados de “alta

tecnologia”, que dispõe de maior acesso a meios eletrônicos de diversão

(como televisão e videogames), tende a apreciar mais a violência. No Canadá

e na Europa, por exemplo, 18,9% das crianças gostam de violência, ao passo

que na África (área de baixa tecnologia), o índice baixa para 7,3%. Os efeitos

da violência na mídia, entretanto, são semelhantes em todos os países,

independentemente das diferenças culturais. O fato é que a televisão domina a

vida das crianças: 97% delas assistem televisão regularmente (a média

mundial é de 3 horas por dia, enquanto o Brasil apresenta uma das maiores

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taxas – 4,5 horas por criança). Em conseqüência, elas tendem a confundir

realidade e ficção. Para isso, é necessário que haja uma regulamentação para

as emissoras de televisão, principalmente a televisão aberta.

Nos Estados Unidos, criou-se um órgão regulador das emissoras, que

consiste em incentivar a concorrência entre emissoras. O Estado atribuiu ao

mercado a responsabilidade pelo conteúdo dos programas exibidos, pois as

tentativas de regular a programação televisiva costumam entrar em conflito

com a garantia de liberdade de expressão. Cabe aos pais, então, evitar que as

crianças tenham acesso àqueles programas prejudiciais ao bem-estar infantil.

Já no Canadá, uma das principais preocupações do Estado consiste em

assegurar a existência de programas que retratem os valores nacionais.

Emissoras públicas e privadas possuem em comum o compromisso de

oferecer aos telespectadores opções que se contraponham aos programas de

origem norte-americana. A tradicional intervenção do Estado no setor facilitou

a implementação de políticas para proteger a infância dos programas de

televisivos. No Brasil, não há uma efetiva fiscalização das leis estabelecidas,

para as emissoras de televisão. Assim, esta se mantém onipotente e

onipresente na sociedade, espalhando o seu poder e, por conseqüência, a

violência indiscriminada.

Temos que lembrar que a televisão é uma concessão pública e como

tal, deve ter uma inter-relação com a sociedade, e responder a ela. Em outros

países isso já ocorre, como é o caso da França, EUA, Inglaterra, Suécia e

outros, onde a liberdade de expressa é total. Nestes países, quase todos com

controle de horário de exibição por faixa etária, já existem os mecanismos para

expressão democrática da cidadania frente às televisões e sua programação.

São conselhos consultivos, ombudsman, conselhos de ética, ou seja, nada

como poder de censura, mas com a possibilidade da população influenciar na

programação, expressando a sua opinião e sua indignação frente ao que

considerar inadequado para determinados horários. No Brasil, a televisões não

prestam contas a ninguém, não obedecem ao código de restrição de horário

estabelecido pelo Ministério da Justiça em 1990, e só se importam com o

IBOPE. É bom ressaltar que há também programas que merecem nosso

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aplauso e que, com certeza têm boa acolhida pelo público. A televisão é um

instrumento preciosíssimo de aquisição de conhecimento e ampliação de

horizontes. Ao mesmo tempo ela também tem a esperteza de fisgar o

espectador pelo lado perverso de todos nós. O ser humano tem aspectos que

são voyeuristas, exibicionistas, sadomasoquistas e, é através desta fascinação

pelo perverso que a televisão fisga o telespectador.

Como diria Marta Suplicy em julho de 1999, não queremos censura nem

moralismo e patrulhamento ideológico. Brigamos muito para conseguir que

temas tabus pudessem ser tratados nos meios de comunicação. Não será

agora que apoiaremos qualquer retrocesso. Mas é preciso quebrar o monólogo

que se estabeleceu entre emissoras de televisão e telespectadores. O medo

da censura não pode ser uma porta aberta para o não exercício da cidadania e

impedimento de um diálogo produtivo entre sociedade e emissoras.

Segundo uma entrevista feita com a psicóloga infantil Márcia Regina

Ribeiro, a Unesco estabeleceu, em 1996, os quatro pilares da educação que

influenciaram o mundo todo, pautando um discurso de não violência, através

da compreensão da diversidade. Esses quatro pilares são:

1- Aprender a conhecer (aprendizagem nunca termina, é contínua)

2- Aprender a fazer (o que se aprende tem de se por em prática)

3- Aprender a conviver (aprender a viver junto, com todas as

diferenças)

4- Aprender a ser (aprender a ser ético, solidário)

Baseando-se nisso, Márcia afirma não ser a censura a solução para o

problema da violência difundida pela televisão, mas sim a censura familiar. São

os pais das crianças que têm o direito e o dever de selecionar o que a criança

assistirá. Esta é a maior intervenção que deveria ser feita. Contudo, continua a

psicóloga, com a modernidade, a noção de limites impostos não está clara,

facilitando a não compreensão do que é certo ou errado. Sendo assim, o

Estado acaba intervindo, como no caso do Siro Darlan que fez cumprir-se a lei

de faixa etária dos cinemas. Para a psicóloga, tudo não passa de uma questão

de processo, no qual os pais têm de dar uma referência do certo e errado para

seus filhos seguirem. É na infância que se iniciam esses fundamentos, para

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que a criança atinja a adolescência com discernimento. E, se construída essa

base, o programa de televisão não modificará sua personalidade.

Márcia ainda comenta que a censura estipulada (para televisão aberta)

de transmitir programas inadequados após as 18 horas, passou a ser

inapropriado, visto que na atualidade, as famílias gastam mais tempo em frente

a televisão nos horários classificados como indevidos. Logo, crianças na faixa

dos cinco ou seis anos, no qual visões fantasmagóricas estão muito presentes,

personificam o que ocorre em novelas, por exemplo. A essa altura, nos

perguntamos se os próprios programas infantis, como os desenhos e contos

de fada, não passam uma carga de violência para as crianças. Mas Márcia

responde que a violência sempre esteve presente nos desenhos, só que

nestes com um objetivo. Para poder lidar com sentimentos como a morte e a

violência, é mais recomendável o uso de animações. Esses acontecimentos

ocorrem com uma personagem, havendo um certo nível de abstração e sendo

assim, melhor “digerido” pela criança. No caso da violência, acrescenta o

conceito de pulsão, que é a energia que move o ser humano. Essa pulsão tem

um caráter ambivalente, traduzida pelo amor (traço do afeto), e pelo ódio (traço

do desafeto). Possuímos as duas forças antagônicas, e por serem

estruturantes, não podem ser vistas separadamente.

As novelas, ou qualquer outro programa representado por seres

humanos, provocam um efeito negativo quando transmitem violência. Esses

são mais próximos da realidade infantil. Paralisadas por se verem na cena,

crianças apresentam casos de diurese noturna. Mas o que cabe fazer para

evitar tais reações? A psicóloga explica que não será a censura que impedirá

esse processo. Cabe à família e a escola trazerem para dentro de casa os

mitos, e organizá-los. “Por trás de muitos medos há uma desorganização de

idéias. Aí é que acredito na função da escola e da família, organizando o que é

real ou fantasia. O que é humano ou não.”

Alguns crimes de jovens tiveram como veredicto a influência de jogos,

filmes, músicas e programas televisivos. Contudo, a culpa não

necessariamente seria destes veículos, mas sim da educação de seus pais. Se

analisássemos a fundo essas premissas, veríamos que não passam de

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falácias. Afinal, se aqueles fossem os “grandes vilões da história”, todos que

por alguma vez o assistissem seriam, de alguma forma, influenciados e, por

conseguinte, grandes criminosos.

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CONCLUSÃO

Segundo Winifred Gallagher em seu livro Identidade, uma teoria da

formação da personalidade do ser humano é construída. Esse ser humano é

formado por duas influências: O temperamento – antiga palavra que até bem

pouco tempo não tinha sido muito usada no século XX – deriva da mesma raiz

latina de temperatura, evocando o clima emocional característico da pessoa,

ou seu estado de ânimo. Nessa disposição inata, as reações básicas da

pessoa à vida, fisiológicas e psicológicas, entrelaçam-se inextricavelmente. E

ainda, O caráter, que em grego significa gravar, cinzelar, é o termo venerável

para esses padrões de comportamento que a vida, particularmente em seus

inícios, imprime no temperamento, criando a personalidade. Juntamente com

as clássicas influências de aprendizagem, como família, educação e classe

social, esse aspecto ambiental da identidade inclui todas as inúmeras

experiências provadas que, tal como as evocadas pela famosa Madeleine de

Proust, tornam nossa memória e nossa personalidade únicas.

Baseando-se nesta teoria, podemos afirmar que todo ser humano é

influenciado pelo seu meio. E, os meios de comunicação não escapam a esta

responsabilidade, já que influem tanto no âmbito social quanto no econômico.

Logo, um profissional seja da área jornalística, da publicidade ou um

cineasta, tem de ter um enorme cuidado com o que irá passar para seu

público, pois este não estará livre de se tornar um grande manipulador social.

Precisa-se perceber toda a complexidade do psiquismo do ser humano, que

mesmo de forma inconsciente, toma decisões e atitudes baseadas no que lhe

aparece a sua volta. Se um estilo de roupa ou adereço se propaga como uma

praga, por que não personalidades, trejeitos? E assim, criamos uma legião de

identidades que seguem os mesmos passos.

Por outro lado, há de se perceber que mesmo sob influências, cada um

possui sua individualidade, adquirida durante seu percurso de vida, a educação

familiar e a escolar. Não se pode partir do pressuposto que todos fazem parte

de uma só mente. Não somos um consenso. Longe disso. Precisamos aguçar

nossas diferenças e aprender a lidar com elas, pois o maior problema deste

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animal “racional” chamado ser humano é ignorar a diversidade. Por essa razão

são travadas guerras durante toda a história de nossa existência.

Pessoas todos os dias mudam suas vidas em função do que lhes é

passado, seja pela televisão, rádio ou jornal. Trancam-se dentro de seus

apartamentos, freqüentam novos lugares e adquirem uma postura passiva,

devido à manipulação da mídia. Seja como for, somos todos levados a oha

pela “lente da verdade” com olhos de outrem e, através dessa visão, formar

nossa opinião “própria”.

“Somos todos iguais, mas uns mais

iguais que os outros”.

- Banda Engenheiros do Havaí

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

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GALLAGHER, WINIFRED. Identidade. 1998.

JARES, XESÚS. Educação para a Paz. 2ª ed., 2002.

PALESTRA. A Violência na ótica da Mídia. Rio de Janeiro - RJ, 2002.Palestrantes: Domingues Meirelles, Maurício Menezes e João Maria

Veja, Revista. Edição de 18 de setembro de 2002. São Paulo: Editora Abril, 2002.

JB online, jornal. Edição de 12 de setembro de 2002. Rio de Janeiro

O Dia online, jornal. Edição de 12 de setembro de 2002. Rio de Janeiro

MELO, PATRÍCIA. Inferno. São Paulo: Editora companhia das Letras, 2000.

NASSAR, PAULO. O que é Comunicação Empresarial. São Paulo: Brasiliense, 1995.

FILME 15 MINUTOS

FILME BELLINE E A ESFINGE

FILME QUEM MATOU QUIXOTE?

SÉRIE CIDADE DOS HOMENS

MÁRCIA REGINA RIBEIRO, psicóloga.

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Sites de pesquisa:

www.odia.ig.com.br

www.jbonline.terra.com.br

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www.soudapaz.com.br

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 02

AGRADECIMENTO 03

DEDICATÓRIA 04

RESUMO 05

METODOLOGIA 06

SUMÁRIO 07

INTRODUÇÃO 09

CAPÍTULO I

A violência como entretenimento 10

1.1 – Indústria Cultural 10

1.2 – Origem da motivação humana 17

CAPÍTULO II

A violência na ótica da mídia 19

CAPÍTULO III

Semsura: Censura 29

CONCLUSÃO 34

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 36

ÍNDICE 38

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

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