universidade candido mendes pÓs-graduaÇÃo … · crianças de cinco anos em uma instituição...

38
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA A FORMAÇÃO DA PERSONALIDADE ATRAVÉS DOS CONTOS DE FADAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL Por: Maria do Carmo Gomes Costa Orientadora Profa. Edla Trocoli Rio de Janeiro 2012 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

Upload: hacong

Post on 11-Nov-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A FORMAÇÃO DA PERSONALIDADE ATRAVÉS DOS CONTOS

DE FADAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Por: Maria do Carmo Gomes Costa

Orientadora

Profa. Edla Trocoli

Rio de Janeiro

2012

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

2

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A FORMAÇÃO DA PERSONALIDADE ATRAVÉS DOS CONTOS

DE FADAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Educação Infantil e

Desenvolvimento

Por: Maria do Carmo Gomes Costa

3

AGRADECIMENTOS

....ao meu marido que sempre me

apoiou, a minha amiga Carmem

Clemente e a minha orientadora Edla

Trocoli.

4

DEDICATÓRIA

.....dedico a todos os professores que

alimentam a fantasia da criança na

Educação Infantil para seu

desenvolvimento e que, através deles,

mantém os contos e o imaginário vivos.

RESUMO

5

Em muitas instituições escolares os contos de fadas se tornou uma

rotina banal, corriqueira e muitas vezes, introduzida como forma de

entretenimento ou para acalmar as crianças “agitadas”. São histórias contadas

sem significados e com bonitas ilustrações, numa mensagem pobre e sem

nenhuma preocupação de conhecer uma versão melhor para os alunos de

cinco anos.

Outro elemento é o falso conhecimento quando se referem a fantasia,

magia e encantamento. Os professores preferem mostrar a literatura a uma

realidade racional onde o intelecto é mais importante que as emoções e o

inconsciente.

Segundo Radino, as fantasias e os elementos mágicos desencadeiam

uma série de preconceitos nos educadores, pois estes acreditam que estes

elementos prejudicam ou dificultam a visão realista do mundo, e assim estes

contos são tachados de mentira. Os professores da Educação Infantil ignoram

a importância da fantasia dos contos de fadas.

Através da contribuição da Psicanálise atribui-se que os contos de fadas

enriquecem a vida interior da criança e que as narrativas são sempre atuais e

que dão soluções temporárias quanto permanentes na vida presente do

ouvinte.

6

METODOLOGIA

Para elaboração deste trabalho foi utilizado a pesquisa de campo com

crianças de cinco anos em uma instituição particular através da narração oral,

apresentação com acessórios e suportes, cenário, avental de bonecos,

miniaturas, luvas de boneco, música e teatro de sombras.

Foi privilegiado também a pesquisa teórica bibliográfica fazendo menção

no desenvolvimento infantil com implicação na psicanálise e na psicologia.

Dentre os autores pesquisados que merecem destaque são Bruno Bettelheim

e Glória Radino.

7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

A IMPORTÂNCIA DA NARRATIVA NA EDUCAÇÃO INFANTIL 10

1.1 - As fadas e a visão de mundo na sala de aula 10

1.2 - Imagens sim, textos não 12

1.3 - As dificuldades no uso dos contos de fadas 14

CAPÍTULO II

A IMPORTÂNCIA DA FANTASIA NO DESENVOLVIMENTO 17

1.1 - O mundo imaginário dos contos de fadas 17

1.2 - Fantasias e sonhos 22

CAPÍTULO III

A TERRA DAS FADAS 27

1.1 - histórico dos contos de fadas na literatura infantil 27

1.2 - Comparando os contos de fadas com outras literaturas 31

1.3 - Os contos de fadas e seus significados 33

1.3.1 – João e Maria 33

1.3.2 – Chapeuzinho Vermelho 34

CONCLUSÃO 37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 38

ÍNDICE 39

8

INTRODUÇÃO

Durante séculos os contos de fadas, que eram destinados aos adultos

por não transmitirem ensinamentos morais, foram transmitidos oralmente de

geração à geração.

Somente no século XVII os contos de fadas tiveram uma versão infantil,

de modo casual, pelo francês Charles Perrault. Os contos não foram

escritos diretamente para as crianças, portanto agradou a todos (crianças e

adultos) pois era condizente a educação moralista que estava sendo criada

e a nova concepção de infância.

Os contos de fadas perduram até hoje, século XXI, resistindo todas as

formas de comunicação.

E no nosso tempo, mesmo com a distância das narrativas originais, os

contos maravilhosos ainda encantam o universo infantil.

E por que será? Por que as crianças, em todos os níveis intelectuais e

sociais, ainda se encantam por histórias que estão “longe” de sua realidade

contemporânea?

A maioria da chamada “literatura infantil” tende a entreter as crianças e

a despertar a sua criatividade. Mas para dar significado a sua vida, a

responder seus conflitos internos e a viajar no mundo imaginário não há

outra literatura melhor que os contos de fadas.

Infelizmente, nas experiências vividas em sala de aula, muitos

professores da educação infantil ainda não percebem a importância dos

contos de fadas no desenvolvimento intelectual e emocional dos alunos.

Esta constatação motivou a escolha desse tema com o objetivo de enfocar a

importância dos contos de fadas na formação da personalidade da criança e

portanto dominar os obstáculos que a vida oferece.

Assim, este estudo está organizado em três capítulos.

No primeiro capítulo observa-se que a maioria das escolas de educação

infantil prioriza o lado racional. O professor é preparado como um técnico

com o objetivo de “avaliar” o conhecimento. As contações de histórias tem

9

como objetivo acalmar uma turma agitada, onde não há prazer ao contar

histórias porque não conhece os ricos significados dos contos. O professor

apenas verbaliza sem a “música” das palavras e sem a importâncias desse

espaço.

E infelizmente não há um interesse pelo professor de buscar uma

literatura rica e com uma versão melhor para os contos de fadas.

Geralmente são histórias com textos pequenos ou eles contam “qualquer

coisa”.

Há uma preocupação em preencher o educando com tarefas,

responsabilidades e esvaziar o direito maior do aluno que é ser criança.

No segundo capítulo identifica a importância da fantasia e da

imaginação que os contos de fadas provocam na criança.

As crianças pequenas têm dificuldades de verbalizar os conflitos e

angústias que são inerentes no processo de seu desenvolvimento.

O que acontece no seu mundo interno e externo é complexo para uma

criança pequena. E os contos de fadas, cheio de metáforas, auxiliam, mais

que adultos com suas questões cientificas, no consolo de suas questões

existenciais.

No terceiro capítulo apresenta um breve histórico dos contos de fadas,

alguns contos de fadas e seus significados e a comparação de fábulas com

outras literaturas infantis.

10

CAPÍTULO I

A IMPORTÂNCIA DA NARRATIVA NA EDUCAÇÃO

INFANTIL

1.1 – As fadas e a visão de mundo na sala de aula

“Para atingir principalmente suas funções consoladoras, seus significados simbólicos e, acima de tudo, seus significados interpessoais; o conto de fadas deveria ser contado em vez de lido. Se ele é lido, deve ser lido com envolvimento emocional. Na estória e na criança, com empatia pelo que a estória pode significar para ela. Contar é preferível a ler porque permite uma maior flexibilidade.” (Bettelheim, 1980 p.185).

Ouvir histórias é muito importante principalmente aquelas contadas pela

nossa mãe ou por aquela pessoa que amamos porque a contação aproxima da

pessoa querida, está ligado com a emoção.

E quando se pensa em emoção as crianças são perspicazes, pois elas

entendem o que está envolvido nesta palavra que são: sonhos, fantasias,

imaginário e o desconhecido. Tudo imbuído nesse sentimento e este nos

contos de fadas.

Porém, o locutor não necessariamente precisa ser conhecido

fisicamente ou fazer parte da família. A própria história bem contada nos

aproxima deste locutor, tendo por ele afetividade. Quem não se emociona,

mesmo adulto, em ouvir uma boa mensagem pelo pregador que tem o dom da

homilética e não se encanta pela pessoa que transmitiu.

Os contos não precisam ser clássicos bastam ter a magia, a emoção e a

fantasia tão interligados. Contos que podem ser criados no ambiente familiar

por autores desconhecidos, mas conhecidos pelos seus ouvintes ávidos de

paixão. Parábolas para explicar problemas do dia a dia, conselhos metafóricos

que nos fazem entender através do abstrato o concreto.

Segundo Reiyzabal é colocado que:

11

“Desde o nascimento a criança faz parte dessa transmissão cultural de valores, costumes, normas e interditos. Por intermédio das cantigas de ninar, das brincadeiras de roda, dos contos de fadas, a criança vai, aos poucos, tornando-se um ser simbólico, social e cultural. Essa humanização é assegurada pela continuidade da transmissão cultural. A inserção na língua materna é permeada pela afetividade e é fundadora da criança como um ser simbólico. Portanto, a transmissão oral é muito mais do que comunicação, é formadora do individuo.” (Reiyzabal, 1999 p.12).

Infelizmente contar histórias às crianças pequenas se tornou uma rotina

banal, corriqueira, em todos os lugares independente da classe social, seja

âmbito familiar ou escolar.

Em muitas instituições infantis essa prática tem sido quase intuitiva,

sempre como forma de entretenimento ou para acalmar as crianças “agitadas”

objetivando, então, o bem estar do professor.

As histórias são contadas tendo como prioridades os aspectos

cognitivos da criança e o ambiente alfabetizador.

Em experiências em algumas escolas da Educação Infantil há a

constatação que as crianças gostam de ouvir histórias quando estes contos

são trabalhados “livres”, sem nenhuma intenção didática. E nesse espaço o

professor pode usar recursos como: teatro de pano, sombras, cenário, música

de fundo, fantoches, vídeos, áudio, caracterização do ambiente e do professor,

ou simplesmente com a própria voz. Depois houve a introdução do lúdico com

o pedagógico pois a orientação de algumas instituições achavam melhor que

fizessem um trabalho didático pois imaginavam que as histórias estavam

“soltas”.

Como as crianças de cinco anos estavam desenvolvendo a escrita e

tendo um ambiente alfabetizador foi proposto, então, a fazer um livrinho em

grupo. As atividades, porém, ficaram cansativas, enfadonhas. Perdeu-se o

objetivo da magia, da reflexão, do prazer de ouvir as historias e da fantasia tão

importante para o desenvolvimento da personalidade da criança, ou seja, a

maturidade psicológica.

Atualmente um dos grandes desafios é ter na prática um plano

pedagógico voltado as necessidades da criança em um todo.

12

A nova LDB (1996) declara que “... a educação infantil, primeira etapa

da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da

criança até seis anos de idade, em seus aspectos físicos, psicológicos,

intelectual e social.” (art. 29).

Segundo a psicóloga Glória Radino, as escolas atualmente valorizam de tal

forma o livro e a letra impressa, que acaba subestimando a transmissão oral,

acreditando que só podem contar histórias as crianças que não são

alfabetizadas.

Se uma criança já sabe ler, por que, então, a transmissão oral? Estas

idéias são incorporadas principalmente depois da Educação Infantil.

É relevante informar que a oralização enriquece a bagagem para a

antecipação a leitura.

“Poderá ler melhor quando tiver o hábito de imaginar o que lê. Ou seja, que fora de sua função emotiva de prazer e de dor, os contos, ademais, têm uma função pedagógica fundamental, pois ensinam a construir o seu imaginário que todos somos no tempo. E este ser é o que ensina e forma a razão.” (Jean, 1990 p.181 -182).

1.2 – Imagens sim, textos não

É fato que hoje não existe literatura infantil sem ilustração. E de fato o

critério visual para as crianças na pré-alfabetização, cinco anos, é importante,

como é aconselhado por especialistas. As crianças precisam das imagens para

ter interação com o livro, para favorecer a capacidade de observação e análise.

É imprescindível que crianças ao manusear um livro tenham ilustrações para

“ler”, imaginar o que supostamente estaria escrito naquelas palavras inseridas

no livro. “... a ilustração faz parte de código e transmite uma mensagem tanto

qual a escrita.” (Radino, 2003 p. 181).

Porém, segundo a professora Amarilha “... nem sempre é usada em

benefício do leitor”.

Segundo a psicóloga, os primeiros contos de fadas no século XIX eram

narrativas a serem lidas e haviam poucos livros com ilustrações apesar destas

13

serem ricas. O que compreendia as histórias eram as vozes animadas,

calorosas e afetivas e que as pessoas ouviam e imaginavam a aparência física

das personagens e o ambiente geográfico. Cada ouvinte com sua fantasia.

Enfim, as ilustrações eram desnecessárias.

O outro dado que a professora Amarilha reforça é a necessidade de

ilustração dos livros infantis faz com que a leitura não precise de mediação do

adulto, do pai, da professora. E ocorre, então, a falsa autonomia que acaba

gerando a dependência deste tipo de livro e assim ficam despreparados para

texto mais longos e com menos gravuras.

É verdade que os dados apontados pela professora Amarilha são para

séries iniciais. Porém, voltando a Educação Infantil, especialmente as crianças

na pré-alfabetização, os professores ao invés de contar histórias, somente

fazem a leitura e depois mostram as imagens para as crianças reforçando a

teoria de que o acumulo de ilustração poderá bloquear sua imaginação já que

está tudo visualizado naquela imagem concreta.

“Por essa razão, um conto de fadas perde muito de seu significado pessoal quando suas figuras e situações recebem substância não através da imaginação da criança, mas da de um ilustrador. Os detalhes especiais derivados de sua própria vida particular, com os quais a mente de um ouvinte retrata a estória que lhe contam ou que ouve, tornam a estória muito mais uma experiência pessoal. Adultos e crianças igualmente preferem, com freqüência, o caminho mais fácil de ter alguém que execute a tarefa trabalhosa de imaginar a cena da estória. Mas se deixarmos um ilustrador determinar nossa imaginação, ela se torna menos nossa e a estória perde muito de seu significado pessoal.” (Bettelheim, 1980 p.76).

Nas pesquisas feitas na sala de aula há a constatação que os

professores preferem as fábulas encantadas com livro a partir de desenhos

bonitos, coloridos e sem nenhuma preocupação de conhecer uma versão

melhor para os alunos. Muitos dos professores da Educação Infantil não

conhecem as versões originais de Perrault e os Irmãos Grimm. Não há objetivo

quando “contam” os contos de fadas. Muitas vezes são livros que os pais

trazem para a escola com ilustrações de desenhos animados famosos e com

uma versão muito pobre perdendo os seus significados. Leitura não é isto.

14

“Ler não se faz só com os olhos e o cérebro; mas por meios dos ouvidos, do corpo, do olfato, da imaginação e do afeto.” (Radino, 2003 p.5)

1.3 - As dificuldades no uso dos contos de fadas

“Se o adulto não tiver condições emocionais para contar a história inteira, com todos os seus elementos, suas facetas de crueldade, de angústia (que fazem parte de vida, senão não fariam parte do repertório popular...), então é melhor dar outro livro para a criança ler... Ou esperar o momento em que ela queira ou necessite dele e que o adulto esteja preparado para contá-lo,... De qualquer maneira, ou se respeita a integridade, a inteireza, a totalidade da narrativa, ou se muda a história... (e isso vale, aliás, como conduta para qualquer obra literária, produzida em qualquer época, por qualquer autor... Mutilar a obra alheia, acho que é um dos poucos pecados indesculpáveis...” (Abramovid,1995 p.121).

Os contos de fadas afloram sentimentos nas crianças entre os quais o

medo é o mais observado pelos professores. Estes preferem não utilizar desta

literatura para as crianças de dois a três anos de idade. A partir dos cinco anos

os professores “adaptam” a literatura mudando as narrativas que mostram

crueldade, desespero, cólera, furor tornando-a mais suave e dando uma falsa

proteção aos ouvintes.

Outro elemento é o falso conhecimento quando se referem a fantasia,

magia e encantamento. Os professores preferem mostrar a literatura em uma

realidade racional onde o intelecto é mais importante que as emoções e o

inconsciente. Antes mesmo das crianças ouvirem e se identificarem com os

contos os professores dizem que as histórias encantadas foram feitas por um

autor e que os mitos representados são falsos, não existem. Muitos fazem com

boas intenções pois acreditam que havendo omissão reforçará a idéia da

existência do mito e consequentemente seriam considerados mentirosos.

“A vantagem de ser criança é que, apesar de os adultos dizerem que sua fantasia não é real, ela acredita naquilo que imagina.” (Radino, 2003 p.191).

15

“A criança que pensa em fadas e acredita nas fadas Age com um deus doente, mas com um deus Porque embora afirme que existe o que não existe Sabe como é que as cousas existem, que existindo, Sabe que existir existe e não se explica, Sabe que não há razão nenhuma para nada existir, Sabe que se é estar em algum ponto Só não sabe que o pensamento não é um ponto qualquer.” (Fernando Pessoa, Poemas Completos De Alberto Caeiro).

O que chama também a atenção na Educação Infantil em relação aos

contos é a preocupação do professor na explicação dos contos de fadas.

Porém não cabe ao professor ou qualquer adulto interpretar e explicar a moral

da história e também pedir que as crianças ao ouvir o conto preencham “fichas

literárias”. Mas podemos pedir que recontem a história, que brinquem com a

fantasia através dos brinquedos, bonecos ou entre si, e sobretudo contar

várias vezes se assim eles solicitarem.

Ao ouvir várias vezes as crianças estão dominando a linguagem dos

símbolos dos contos. Linguagens vivenciadas no seu dia a dia, no seu jogo do

“faz-de-conta ” quando estão se divertindo com seus brinquedos ou qualquer

outro entretenimento.

“Explicar para uma criança porque um conto de fadas é tão cativante para ela destrói, acima de tudo, o encantamento da história que depende em grau considerável, da criança não saber absolutamente porque está maravilhada. E ao lado do confisco desse poder de encantar vai também uma perda do potencial da história em ajudar a criança a lutar por si só e dominar exclusivamente por si só o problema que fez a história significativa para ela. As interpretações adultas, por mais corretas que sejam, roubam da criança a oportunidade de sentir que ela, por sua própria conta, através de repetida audições e de ruminar acerca da história, enfrentou com êxito uma situação difícil.” (Bettelheim,1980 p.27).

Vimos neste capítulo que a mente das crianças é diferente da mente

dos adultos e que as crianças precisam aprender por si só, os simbolismos

incluídos nas narrativas orais feitas pelos adultos. E que também estas

atividades sejam livres para que a criança desenvolva suas emoções.

16

Elas precisam ser livres pois já perderam os parques, as praças e as

casas diminuíram.

Também precisam dos brinquedos, da música, da expressão corporal,

artes plásticas, contos de fadas. Não basta as escolas possuírem isto nos seus

currículos ou nos seus planos pedagógicos se na prática o professor não está

preparado, não se especializa, não procura a arte ou a leitura do mundo

através da palavra.

Que os professores compreendam o direito da criança de ser criança.

17

CAPÍTULO II

A IMPORTÂNCIA DA FANTASIA NO

DESENVOLVIMENTO

“O príncipe sonhou que era uma borboleta e não sabia, ao acordar, se era um homem que tinha sonhado ser uma borboleta ou uma borboleta que agora sonhava ser um homem.” (Provérbio Taoísta)

1.1 – O mundo imaginário dos contos de fadas

Os corpos e as mentes não se desenvolvem de um dia para o outro. E

muitas vezes, os adultos querem que seus filhos ou alunos tenham uma

compreensão madura ou um pensamento igual ao deles. Para alcançar uma

maturidade psicológica, não necessariamente precisa-se ter uma maturidade

cronológica. Precisa-se, porém, de passar por um longo e lento processo e

tendo início no inconsciente, através dos significados que estão muito ligados

na imaginação. Apenas na idade adulta é que se pode obter uma resposta

inteligente sobre estes significados que foram vivenciados desde a tenra idade.

Bettelheim coloca “... que muitos perderam o desejo de viver, e, pararam

de tentá-lo, porque tal significado lhes escapou.”

E mais;

“Para mim este trabalho deixou claro que se as crianças fossem criadas de modo que a vida fosse significativa para elas, não necessitaria, ajuda especial. Fui confrontado com o problema de deduzir quais as experiências na vida infantil mais adequadas para promover sua capacidade de encontrar sentido na vida; dotar a vida, em geral, de mais significados. Com respeito a esta tarefa, nada é mais importante que o impacto dos pais e outros que cuidam da criança da maneira correta. Quando as crianças são novas, é a literatura que canaliza melhor esta tipo de informação.” (1980 p.27)

18

Segundo o psicanalista esta literatura são os contos de fadas que são

“... destinados a desenvolver a mente e a personalidade da criança.”

Os contos de fadas seguem o mesmo caminho que a criança pensa ao

ler o mundo e sendo assim ela sente consolo neste tipo de literatura porque as

suas mensagens podem dar soluções.

As suas mensagens são mais esclarecedora do que a explicação

realista de um adulto, pois uma criança de cinco anos ainda não consegue

abstrair questões cientificas e por isso elas ficam confusas.

Piaget diz que na etapa pré-operatória “Esquemas cada vez mais

complexos são construídos, de forma a preparar e a dar origem ao

aparecimento da função simbólica...” (1994 p.40).

Para Glória Radino os contos de fadas respondem as perguntas das

crianças porque os seus enigmas são apresentados de formas simbólicas.

De acordo com Bettelheim:

“Se uma criança aceita como verdade o que seus pais lhe dizem que a

Terra é um planeta mantido firmemente em seu caminho pela gravidade então

a criança só pode imaginar que a gravidade é uma corda.” (1980 p.62).

Ou é mais fácil acreditar que Deus ou um outro ser superior segura a

Terra para não deixá-la cair.

Muitas crianças acreditam que a bolinha de gude não foi feita somente

para brincar, mas para observar. Algumas ficam fascinadas quando olham

para o objeto e imaginam que dentro dela há outros seres. E o mundo, onde

elas estão, também é uma bola de gude em que há outros seres maiores

observando-as também; e assim sucessivamente.

O “mundo” infantil é cheio de magias onde se mistura fantasia e

realidade, pois quando se trata de realidade cientifica ela transfere para

fantasia, quando é a realidade física, cotidiana ou psicológica ela faz o inverso,

retira da fantasia e transfere para a realidade com o objetivo de vencer os

obstáculos que vida oferece; problemas financeiros, morte de uma pessoa

querida da família, separação dos pais, complexo de inferioridade, violência

familiar, entre outros.

19

Um dos exemplos é o jogo do “faz de conta” onde a criança imita vários

papéis sociais. Ela entra no mundo imaginário e cria e recria várias situações

que muitas vezes dão a hipótese para as resoluções dos seus problemas. Ela

se posiciona como um adulto, e naquela fantasia acredita que o é, para

enfrentar situações que vão além de sua experiência cotidiana.

Entretanto, as crianças de cinco anos sabem que bruxas, duendes,

fadas..., não existem. Elas sabem que os pais não iam deixá-las abandonadas

numa floresta como aconteceu com João e Maria e também não iam sentar

entre as cinzas como fez Cinderela “... já que uma semelhança física seria

muito amedrontadora para ela...” (Bettelheim).

E, portanto o psicanalista defende que:

“Depois da idade de aproximadamente cinco anos - a idade onde os contos de fadas tornam-se verdadeiramente significativo - nenhuma criança normal considera estas estórias tão verdadeiras quanto a realidade externa. A menininha deseja imaginar que é uma princesa vivendo no castelo e tece fantasias elaboradas de que o é, mas quando mãe a chama para jantar, sabe que não é... exatamente como uma menininha sabe que sua boneca não é realmente seu neném, por mais que a chame assim e a trate como tal.” (Bettelheim – 1980 p.80-81).

As crianças sadias sabem que os contos de fadas não estão

descrevendo o mundo real. Entretanto, muitos adultos têm medo do que a

fantasia pode causar nas crianças. Acreditando que possam deixá-las fora da

realidade por ter no final da história um final feliz com príncipes encantados,

casamentos maravilhosos que duram para sempre, princesas em seus

castelos... Então, os adultos, não querem “iludir” as crianças com esta literatura

achando que o acúmulo de fantasias possa tirar as crianças “dos seus pés do

chão”.

No ponto de vista dos adultos é até compreensível, porém como aponta

Bettelheim os finais felizes não se referem à realidade externa, mas a sua

realidade interior. O final feliz refere que a criança conseguirá enfrentar os

obstáculos que a vida oferece e sairá vitoriosa, e se tornará independente.

Aliás, o final feliz é uma maneira otimista dela encarar a vida, a criança precisa

desse lado positivo para acreditar em si mesmo e vencer as suas dificuldades.

20

“Se uma criança, por qualquer razão, é incapaz de imaginar seu futuro

de modo otimista, estabelece-se uma parada no desenvolvimento”.

(Bettelheim, 1980 p.157)

Por outro lado, os céticos acreditavam que este tipo de literatura

influencia de maneira negativa na vida das crianças, deixando-as mais

conturbadas, pois psicologia infantil e a psicanálise revelaram que a

imaginação infantil pode ser sádica, violenta e ansiosa. E, portanto, muitos

adultos e principalmente muitos religiosos não permitem que crianças pré-

operatórias ouçam versões que mostrem violência. Eles preferem que os

contos de fadas sejam bem “adaptados” para o universo infantil, ficando assim

sem significados. E por isso ao censurar os contos de fadas muitos adultos

pensam que estão protegendo as crianças.

Segundo Glória Radino as crianças precisam verbalizar os sentimentos

de medo, raiva, inveja, entre outros. Sentimentos, estes, que estão de forma

fantasiada desde muito cedo.

Infelizmente, muitos baniram os contos de fadas tradicionais preferindo

contos em que os monstros deveriam ser amigos das crianças, pois assim elas

não ficariam assustadas. E esqueceram-se dos monstros que ela teme

realmente, que são aqueles que ela teme ser e que algumas vezes as

persegue. E sendo assim, esses adultos não percebem que a criança não

tendo o conhecimento dos monstros, que estão escondidos no seu

inconsciente, e impedindo que ela crie fantasias através dos contos de fadas

para lutar contra estes monstros, a sua ansiedade crescerá e se sentirá

incapaz frente às situações.

Quando se refere à fantasia, se refere a fantasia rica. Fantasia esta que

flutua na imaginação dos adultos. Ela poderá dar as respostas a muitas saídas

no seu caminho profissional, sentimental, entre outros. Quando uma pessoa

adulta pensa antes de fazer algo que possa ser importante para sua vida, são

as suas idéias ou fantasias ricas que conduzirão a uma realidade concreta. É

esta fantasia rica fornecida para as crianças que impedem que a sua

imaginação fique limitada somente a algumas preocupações. E que “...fique

21

atada aos limites reduzidos de alguns devaneios ansiosos ou de realizações de

desejos...” (Bettelheim – 1980 p.150).

Há muita distinção entre o pensamento adulto e de uma criança. Os

pensamentos dos adultos são ordenados, ele pode explorar varias

possibilidades para chegar a um resultado satisfatório. Para as crianças as

suas fantasias, são os seus pensamentos. Quando uma criança começa a se

preocupar com ela mesma ou com os outros ou imaginar que pode dar certo

isto e não aquilo, ela desenvolve a fantasia em torno desse resultado. É a sua

forma de “brincar com as idéias” ou no seu jogo do faz de conta. É por isso que

“... o pensamento racional como forma de organizar seus sentimentos e

compreensão do mundo só servirá para confundi-la e limitá-la.” (Bettelheim –

1980 p.150).

Ora, impedindo a criança de ouvir os contos de fadas tradicionais

também impedirá a elaboração da fantasia em torno das imagens. Vimos no

primeiro capítulo a importância das narrativas das histórias e que muitas vezes

não necessitam da ilustração, pois perde muito do seu significado pessoal, da

sua fantasia particular. Sendo assim, o ilustrador interpreta na sua visão de

mundo. Bettelheim no seu livro Psicanálise dos contos de fadas cita Tolkien

que considera que:

“... por melhor que sejam as ilustrações, contribuem bem pouco para os contos de fadas... Se uma estória diz que ‘Ele subiu uma montanha e viu um rio no vale abaixo’, o ilustrador pode apreender, ou quase aprender sua própria visão de cena, mas cada ouvinte formará seu próprio quadro que será constituído de todas as montanhas, rios e vales que já viu, mas especialmente do vale da montanha, e do rio que formaram para ela a primeira personificação do mundo.” (1980 p. 76).

Infelizmente crianças e adultos preferem um caminho que não seja

trabalhoso para ambos, um caminho em que outra pessoa trabalhe a

imaginação por eles, ou seja, de imaginar a cena da história.

Ao perguntar para uma criança depois que ouviu uma história qual foi a

imagem que ela produziu sobre o monstro, ela, obviamente, ira falar de um

monstro com suas características particulares. Por outro lado, ver o monstro

22

com a sugestão do ilustrador, que tem as idéias mais completas que a da

criança, pode deixá-la fria ou acomodada.

1.2 – Fantasias e sonhos

“A invenção, o imaginário e a memória são uma coisa só. Não se pode

separar a memória da invenção, a fantasia da realidade.” (Lygia Fagundes

Telles).

Apresenta-se no primeiro capítulo que não se pode “explicar” os contos

para as crianças. Porém, o adulto deve procurar ser sensível e entender a

importância dos significados para as crianças e compreender qual a

mensagem para ser contada naquele momento e que, enquanto a criança se

diverte, os contos esclarecem por si mesmo o desenvolvimento da

personalidade da criança.

E também quando se entende em um olhar psicanalístico fica mais claro

a percepção de que os contos influenciam muito no desenvolvimento infantil.

Porém, os contos de fadas não fazem milagres por isso não se deve

subestimar ou deixar de priorizar uma educação coerente dos seus pais e

outros que cuidam da criança.

Segundo a psicóloga Radino, a psicanálise revela que realidade externa

não é mais importante que a fantasia. A psicanálise quebrou os conceitos do

que é certo ou verdade pura, mostrando que toda manifestação da realidade é

através dos desejos.

“Freud percorreu um longo caminho até chegar à compreensão de que

fantasia e realidade caminham inseparavelmente juntas.” (Radino, 2003

p.120).

Ao nascer, a criança terá todo ciclo de aprendizagem para desenvolver

seu caráter e a sua própria personalidade. Desde os primeiros dias de vida ela

“aprende” que para obter os seus impulsos, desejos, necessidades, terá que

comunicar através dos choros, gritos, para ser atendida e muitas vezes faz isso

de forma inconsciente. E assim, ela vai assimilando que alguém responderá as

suas dores abdominais, desconforto, fome, etc.

23

Entretanto, quando seus desejos são cumpridos há uma satisfação,

porém, quando estes não são, há uma frustração. E quando é atendida como

por exemplo sugar o seio da mãe ela sentirá prazer, pois os seus desejos e

suas fantasias foram realizadas. Suas fantasias se realizam porque ela é

capaz de fazer sucção como se tivesse mamando mesmo que sua mãe não

esteja presente. E neste momento ela acredita ou sente que ao chupar a

chupeta ou fazer a sucção estará sugando o seio.

Segundo Melanie Klein quando a criança suga pela primeira vez usa-se

o instinto, mas para que este instinto seja objeto de sua consciência precisa

estar sob uma representação de uma idéia.

Percebe-se, então, que o inconsciente é regido pelo prazer e a criança

transfere este prazer para a arte, o jogo do faz de conta, contos de fadas e os

sonhos.

Através dos seus pacientes neuróticos, Freud percebe que o

inconsciente possui uma linguagem e através dessa linguagem ele teve acesso

para compreender o que se passa nas pessoas que são: loucura; sentimento

de culpa; depressão; medo; crise de ansiedade; problemas sexuais de origem

emocional; estresse; complexos; traumas; dentre outros.

Segundo Radino, Freud rompe com o modelo positivista que dava

importância o sujeito da verdade e cria o sujeito do desejo. “...a psicanálise não

vai colocar a questão do sujeito da verdade, mas a questão da verdade do

sujeito. Ela vai perguntar exatamente por esse sujeito do desejo que o

racionalismo recusou...” (Garcia Roza, 1984 p. 23). Verdade? Mentira? Para a

psicanálise pouco importa. Trata-se de fantasia e essa representa a verdade

do sujeito. É tão importante como qualquer realidade – trata-se da realidade

psíquica. (Segal, 1993).

Em 1900, Freud publicou “A interpretação dos sonhos” para aprofundar

sobre o psiquismo humano. Ele percebe que os sonhos de uma pessoa sadia

com suas loucuras e também por suas incompreensões não diferem dos

sonhos dos neuróticos. “Uma pessoa sadia é virtualmente um neurótico, só

que os únicos sintomas que ela consegue produzir são os seus sonhos.”

(Garcia Roza, 1984 p.63).

24

Freud então consegue compreender os fenômenos psíquicos e a

realidade psíquica aproximando, através das interpretações dos sonhos, dos

ricos materiais simbólicos que estão nos contos de fadas, na arte, na poesia e

no mito.

“A compreensão da linguagem onírica abriu as portas para conhecermos a neurose, mas, também, para compreendermos os fenômenos psíquicos. E o próprio Freud, na terceira edição, 1911, que aponta que, por meio de interpretações dos sonhos, estaremos cada vez mais próximos do rico material da poesia, do mito, dos usos da linguagem e do folclore, concebendo esses materiais como manifestações do inconsciente.” (Radino, 2003 p.122).

Freud então considerava que quando a criança se sente frustrada

durante o dia ela realiza os seus desejos nos sonhos.

Entretanto o estudo aqui apresentado não pretende aprofundar sobre os

sonhos, mas introduzir que os sonhos, segundo Radino, tem uma linguagem

simbólica assim como os contos de fadas.

“Os contos de fadas do mesmo modo que os sonhos, são representações de acontecimentos psíquicos. Mas, enquanto os sonhos apresentam-se sobrecarregados de fatores de natureza pessoal, os contos de fadas encerram os dramas da alma com materiais pertencentes a todos os homens em comum. Eles nos revelam esses dramas na sua rude ossatura, despojados dos múltiplos acessórios individuais que entram na composição dos sonhos.” (Silveira, 1999 p.1).

A outra descoberta que a psicanálise vislumbrou foi que:

“...a de que o inconsciente é atemporal e que seus conteúdos, além de não estarem ordenados não sofrem desgastes do tempo. A temporalidade é uma característica da consciência.” (Radino, 2003 p. 123).

Sabe-se que a psicanálise constitui-se de três estruturas: id, ego e

superego. E segundo a psicanálise nascemos apenas com o id e as outras

duas estruturas desenvolvem-se pelo meio que nos cerca.

25

Segundo a pedagoga Taicy de Ávila, o id não se refere no tempo do

aqui e agora, ele não está preocupado com a concretização dos desejos mas

de se satisfazer por meio de realizações alucinatórias.

Transferindo a estrutura do id para a história dos contos de fadas o “Era

uma vez...”, “Num reino muito distante...”, não pertence ao aqui e agora de

uma realidade externa, mas de um “mundo” imaginário onde se “sai” do mundo

concreto e “entra” para o mundo dos desejos, dos sonhos, das realizações.

“O conteúdo do inconsciente é, ao mesmo tempo, o mais oculto e o mais familiar, o mais obscuro e o mais limitador; cria ansiedade mais atroz ou a maior esperança. Não está limitado por um tempo, localização ou sequencia lógica de eventos específicos, como definido pela nossa racionalidade. Sem nos darmos conta, o inconsciente nos leva de volta aos tempos mais remotos de nossas vidas. Os lugares mais estranhos, mais antigos, mais distantes, e ao mesmo tempo mais familiares de que fala o conto de fadas. Sugerem uma viagem ao interior de nossa mente, nos domínios da consciência e do inconsciente.” (Bettelheim, 1980 p. 79).

Segundo Radino, a criança sabe que todo conto se inicia em outro

tempo e que começa em “Era uma vez...”, porém ela sabe que fará uma

viagem maravilhosa e voltará em “...viveram felizes para sempre.” (Radino)

Esses rituais são: a fantasia, a viagem da terra do nunca, dos sonhos

acordados.

Acontece também com o adulto quando este “viaja” ao ler um livro ou

quando assiste a um filme no cinema. Ele chora, ri, sente raiva pelos

personagens, muitas vezes se coloca no lugar dele. Depois que o filme acaba

sente até meio desnorteado principalmente se este filme “mexeu” com sua

alma.

Pode-se concluir que os adultos não podem censurar os contos de

fadas só porque afloram sentimentos das crianças, como medo, raiva, inveja.

Pois estes sentimentos já estão internalizados na criança desde cedo. Ela

precisa “botar para fora”. “A idéia de que o contato com tanta fantasia

desorganiza, ao contrário de que se imagina, pode servir como fonte de

26

elementos simbólicos para a própria organização mental”. (Radino, 2003 p

135).

“A criança que tem uma fantasia pobre, como foi observado durantes as brincadeiras, se apresenta mais orientada na área de motricidade revelando muita ação e pouco pensamento nas atividades de jogos. Em contraste, a criança com alto teor de fantasia é mais estruturada e criativa e tende a ser mais agressiva verbalmente do que fisicamente.” (Biblow, 1973).

27

CAPÍTULO III

A TERRA DAS FADAS

Segundo Nelly Coelho, os contos de fadas sempre encantarão os

ouvintes e leitores em qualquer faixa etária porque já faz parte dos “livros

eternos”. Eles atravessam séculos ou até milênios e permanecem vivos em

uma época onde os meios de comunicação são bem variados e a tecnologia

bem privilegiada. E por quê?

Onde surgiram os contos de fadas? Onde nasceram as fadas? Onde

surgiram Branca de Neve, Cinderela, Chapeuzinho Vermelho, João e Maria...

Em que lugar do mundo nasceram as bruxas, magias, metamorfoses que

faziam sapos virarem príncipes, aboboras em carruagens, animais falantes?

Quem inventou estas histórias que os avós de nossos avós já contavam em

um ambiente familiar? Por que as crianças em todos os níveis intelectuais e

sociais ainda se encantam pelos contos que estão “longe” de sua realidade

contemporânea?

1.1– Breve histórico dos contos de fadas na literatura infantil

Os contos de fadas surgiram ao longo dos séculos ou milênios (datados

no séc. II d.C.) e foram sofrendo alterações conforme as mudanças sócio-

culturais. Em diversas culturas, e em outros continentes já existiam narrativas

muito semelhantes aos da literatura infantil francesa.

E durante séculos os contos eram introduzidos pela linguagem oral.

Segundo Radino “... não existiam escolas, livros e nem a infância como

concebemos hoje.”

Segundo Nelly Coelho nos tempos primordiais a comunicação que se

dava de uma pessoa para outra era muito difícil, pois eles viviam distantes

geograficamente, eram separados por: montanhas, mares, rios. Em um tempo

em que as viagens eram feitas a pé, a cavalos ou barcos precários. Enfim, o

28

poder da Palavra venceu todos estes obstáculos e teve a força de fazer

integração humana.

Segundo Darnton, os contos franceses retratam a França entre os

séculos XV e XVIII numa época em que os camponeses sofriam muito com a

guerra, fome, epidemias e eram submetidos aos senhores feudais da época

por não fornecerem terras suficientes para que eles pudessem ser

independentes.

Segundo o autor era muito comum a existência de madrasta, órfãos,

fome, maus tratos, entre outros. Por isso que os contos registram muito sobre

comida, abandono dos pais como: “João e Maria”, “ O Pequeno Polegar” e

“Chapeuzinho Vermelho”.

Os camponeses “alimentavam as suas almas” criando e ouvindo contos

e teciam fantasias de serem vitoriosos contra as humilhações a que eram

submetidos.

E estas histórias chegaram, então, nos salões da aristocracia no século

XVII pelo francês e burguês Charles Perrault.

Porém, muito antes disso, no século V e XV os camponeses difundiam

estas histórias oralmente e estes contos ultrapassavam fronteiras e ganhavam

interpretações diferentes. E quando surgiram as escolas abertas, muitas

pessoas ingressaram para os centros urbanos. E por medo que o velho hábito

de contar histórias desaparecesse coube, então, aos escritores coletarem

estas narrativas orais e “prendessem” no papel. Surge, então, o primeiro livro a

ser lido nos salões aristocráticos. Este livro traz algumas histórias que eram

transmitidas oralmente como, por exemplo, “A Bela Adormecida no Bosque”,

“Chapeuzinho Vermelho”, “O Gato de Botas”, “O Pequeno Polegar” e

“Cinderela”.

E sob a influência de um novo clima moral que estava acontecendo na

época, Perrault suavizou as narrativas que tratavam de violência e deu um

toque de mágica para os contos. Apesar de ele não ter escrito para as

crianças, ele se preocupou em adaptar para este público com o intuito de

colocar uma lição de moral no final de cada conto. Segundo Canton (1994),

com essa publicação, Perrault “pretendia elevar os contos populares à

29

categoria de ‘grande arte’, impregnando-os de finesse literária e de lições de

moral que penetrariam nas mentes infantis de um modo divertido” (p. 42).

Segundo o site psicointegração.com Perrault publicou uma série de 41

volumes e é considerado o pioneiro e o mais famoso narrador de histórias de

contos de fadas. Porém o autor napolitano Basile merece destaque e pode

reivindicar pelo mérito de ser o pioneiro pois inaugurou o conto de fadas

literário moderno 1634-6. Segundo Radino, referindo também a Basile escreve

que “...as suas primeiras publicações influenciaram muitos autores, inclusive o

próprio Perrault, retratando algumas transformações que os contos de fadas

sofreram, desde sua narrativa oral até os contos literários.” (p. 71).

Perrault nunca deixou de ser um fenômeno, mesmo tendo recebido

críticas sobre a ideologia dominante que ele colocava nos contos, como:

submissão, doçura, resignação, paciência e aceitação da dominação machista.

Os seus contos continuam encantando o imaginário infantil “... e continua

atraindo os adultos também. Têm sido objeto de estudos de pesquisadores das

mais diversas áreas, como da historia, da etnologia, da filologia, da literatura,

da psicanálise, etc.” (Radino, 2003 p.80).

Segundo Nelly Coelho a literatura infantil nasceu com Charles Perrault.

Mas, segundo a autora, somente cem anos depois, na Alemanha, no século

XVIII se expande pela Europa e pelas Américas em uma nova versão pelos

Irmãos (Jacob e Wilhelm) Grimm.

Segundo Nelly eles eram filólogos e folcloristas e estudiosos da

mitologia germânica e se interessavam muito pelos contos populares da sua

terra, resolveram, então, com a ajuda da velha camponesa Katherina

Wieckmann e a amiga Jeannette Hassenpflug, a registrar contos que eram

conhecidos em seu país.

Na primeira edição (Contos de fadas para crianças e adultos) os irmãos

Grimm registraram os contos nas versões originais, sem adaptações (há

controvérsias). Na segunda edição, influenciado pelo cristianismo na época

romântica, retirou episódios que retratavam muita violência “... principalmente

aqueles que eram praticados contra crianças” (Nelly Coelho). E segundo

Radino desaparecem as mães originais como más e aparecem as madrastas.

30

Também “O Gato de Botas” e “O Pequeno Polegar” são retirados por serem de

origem francesa.

“As motivações subjacentes às revisões e ampliações, bastante utilizadas por Wilhelm, parece notavelmente psicológicas. Era como se Wilhelm, que achava que todas as edições depois de 1819 deveriam endereçar-se sobretudo às crianças, estivessem empenhado em recuperar a infância ou o paraíso perdido. E, com sua habilidade em construir o tom infantil apropriado, criou um estilo uniforme de contos de fadas que se tornou um clássico.” (Canton, 1994, p.58).

No Brasil atualmente, não se tem todas as traduções das obras dos

irmãos Grimm. Mesmo assim, segundo Adelino Brandão (1995) mostra a

influência, mesmo indireta, nos contos populares da cultura brasileira.

Na Dinamarca nasce Hans Christian Andersen, em Odense, em 1805.

Não menos importante que os anteriores.

Segundo Carvalho, Andersen também resgatou a cultura popular como

Perrault e os irmãos Grimm. Mas, diferente destes que registravam os contos e

adaptavam de acordo com a época, Andersen não só registrou como vivenciou

como protagonista. Ele sentiu e interpretou os seus contos.

Segundo Nelly Coelho ele escreveu os contos com muita ternura, o lado

violento “... escreveu com ternura, sem pieguices e, realista que foi, não omitiu

os traços de violência que parecem inerentes à vida. Violência ou injustiça

contra os desvalidos: eis o que o tocou mais fundo...” (Coelho, 1991, p.148).

Segundo Radino “Alguns autores, como Marc Soriano considerou

Andersen o primeiro escritor a criar uma narrativa para crianças.” (Radino,

2003, p. 88).

“Porque ele primeiro sonhou sua infância e transfigurou para oferecê-la aos outros sob forma literária, utilizando as mesmas técnicas que Perrault, mas acrescentando a ela mais emoção e nelas expressando a densidade da vida através de uma mistura complexa de sonho e de realidade, de fantástico e de sensibilidade humana.” (Gillig, 1999, p.39).

E foi considerado pelo Paul Hazerd como “o príncipe dos escritores da

infância.”

31

Por seus contos terem um final muito triste muitos especialistas não

consideravam seus livros direcionados para as crianças. Alguns de seus

contos foram: “A sereiazinha”, “O soldadinho de chumbo”, “A vendedora de

fósforos”, “O patinho feio”.

Muitos dos seus contos continuam imortais, porém, por terem finais

trágicos alguns foram adaptados com finais felizes como o exemplo da

“Pequena sereia” feito pela Disney.

Independentemente dos finais tristes ou felizes ele usou uma linguagem

muito poética e suave em relação à violência. E sua moralidade foi transmitida

nos contos pelo lado sutil e não doutrinário.

“Não a imprimiu (referindo-se à moral) de modo direito, mas através de sua arte magistral; não corrigiu o vicio, nem premiou a virtude, mas apenas mostrou que o maior premio à virtude é o privilégio e a beleza de tê-la na alma.” (Carvalho, 1984, p. 110).

1.2 – Comparando os contos de fadas com outras literaturas

Por que as crianças, em todos os níveis intelectuais e sociais, ainda se

encantam por histórias que estão “longe” de sua realidade contemporânea?

É claro que há literaturas infantis, de bons autores brasileiros

interessantes e que despertam a curiosidade das crianças. Este estudo não

nega o valor inestimável de outras obras literárias de grandes autores da

cultura brasileira.

O problema, que foi mencionado no primeiro capítulo, é que o objetivo

de muitos livros infantis é somente para o entretenimento ou para a pré-

alfabetização, ou seja, em um ambiente alfabetizador e mecânico.

Segundo o psicanalista Bettelheim aponta que:

“Para que uma estória realmente prenda a atenção da criança, deve entretê-la e despertar sua curiosidade. Mas para enriquecer sua vida, deve estimular-lhe a imaginação: ajudá-la a desenvolver seu intelecto e a tornar clara suas emoções; estar harmonizada com suas ansiedades e aspirações; reconhecer plenamente suas dificuldades e, ao mesmo tempo, sugerir soluções para os problemas que a perturbam... nada é tão enriquecedor e satisfatório para a criança, como para o

32

adulto, do que o conto de fadas folclórico.” (Bettelheim, 1983, p. 13).

Segundo a psicanálise, esses contos começam no ponto psicológico

emocional onde a criança se encontra. Eles enriquecem a vida interior da

criança. As suas narrativas são sempre atuais que dão soluções tão

temporárias quanto permanentes na sua vida presente.

Muitos contos modernos evitam os problemas existenciais, são histórias

que não mencionam morte de seus familiares, envelhecimento, fome, enfim

atributos inerentes à vida.

Há também os contos realistas, e, sobre estes contos Bettelheim afirma

que as histórias realistas também são interessantes e muito úteis para o

aprendizado da criança. “Mas o modo como estas estórias se desenrola é tão

alheio ao modo como funciona a mente da criança quanto os eventos

sobrenaturais do conto de fadas em relação ao modo como o intelecto maduro

compreende o mundo.” (Bettelheim, 1983).

Histórias muito realistas fazem com que as crianças extraiam algo de

importante, porém, somente este tipo de literatura não dará significados

pessoais. Infelizmente, são histórias que as crianças ouvem, se informam, mas

não se enriquecem, tendo a necessidade de ouvir também os contos de fadas,

ou seja, “condenar as estórias realistas para as crianças seria tão tolo quanto

banir os contos de fadas...” (Bettelheim, 1983). Por isso, como já foi

mencionado neste estudo, as fantasias são combustíveis para o

desenvolvimento da criatividade, e nada melhor que os contos de fadas. Que

quão rico são, os contos de fadas são capazes de despertar na criança novos

sentimentos e sensações em diferentes épocas de suas vidas com significados

diferentes a cada leitura. Tão complexos, mas também tão fáceis de entender,

os contos de fadas podem, sem muito esforço, serem comparados a uma obra

de arte.

1.3 – Os contos de fadas e seus significados

1.3.1 – João e Maria

33

A história começa com uma problemática real: pais pobres que não tem

recursos suficientes para sustentar seus filhos e decidem abandoná-los na

floresta. Percebe-se, porém, que a pobreza e a privação não mudam o caráter

do homem, ele se torna mais egoísta. E a saúde das pessoas a seu redor fica

em segundo plano.

As crianças ouvem a conversa dos pais e Maria, a menor, começa a

chorar demonstrando a ansiedade interior de ser abandonada pelos pais.

Na primeira tentativa dos pais levarem as crianças e abandoná-las, João

consegue voltar para casa tendo marcado o caminho de volta. Na segunda vez

João marca com pães o percurso. Ele estava tão desnorteado que não pensou

que na floreta havia muitos pássaros e que seu plano, dessa vez, não daria

certo, pois os pássaros comeriam os pães. Ele teria que ter estudado as

marcações do percurso para encontrar o caminho de volta. Provavelmente o

medo de morrer de fome fez com que João não pensasse com clareza.

Agora, perdidos na floresta encontram uma casa feita de biscoitos e

gengibre. Eles, porém, vencidos pela ansiedade não pensam na destruição

daquilo que lhes daria abrigo quando devoraram o teto e a janela da casa.

A casa de biscoitos e gengibre é uma imagem inesquecível, pois é

atraente e tentador. Sabe-se que é um perigo quando se cede às tentações.

Segundo a psicanálise a casa representa a mãe que sustenta os filhos no seu

ventre e eles se alimentam dela. É por isso que eles se sentiam no céu. Ao

ceder à tentação com uma gula desenfreada, traz a ameaça da destruição

representada pela bruxa. A bruxa representa os problemas da vida e através

de um planejamento inteligente, eles conseguem sozinhos derrotar o inimigo e

ficar com o seu tesouro. Voltam para casa felizes e encontram o pai

arrependido e sozinho pois a madrasta já havia morrido.

As crianças percebem que não é através da fuga que conseguem

resolver os problemas e sim enfrentá-los com um planejamento inteligente.

1.3.2 – Chapeuzinho Vermelho

34

Na história de João e Maria a bruxa só tenta comer as crianças, mas na

história de Chapeuzinho Vermelho o lobo mau engole a criança e a avó, na

versão Perrault.

Chapeuzinho Vermelho ganhou muitas versões e a mais famosa foi

pelos irmãos Grimm, tendo um final feliz para Chapeuzinho e a avó.

Na história de Perrault o título é “Capinha Vermelha”, entretanto, para

muitos estudiosos de contos de fadas o título mais apropriado é “Chapeuzinho

Vermelho”.

Segundo Andrew Lang, um dos estudiosos mais eruditos sobre contos

de fadas, considera que se todas as versões de Chapeuzinho Vermelho

fossem parecidas com a versão de Perrault não fariam muito sucesso. O

sucesso veio com os irmãos Grimm.

Na história de Perrault o lobo não se disfarça de vovozinha. Seguem-se

apenas dois diálogos e engole a menina. Perrault conta a história com objetivo

de moralizar enfatizando que meninas não podem dar ouvidos a qualquer tipo

de gente, principalmente aqueles lobos “gentis” que seguem as meninas

inocentes nas ruas.

Segundo Bettelheim, “Capinha Vermelha” de Perrault perde muito do

seu atrativo, pois fica muito óbvio. Percebe-se que o lobo é uma metáfora e

que deixa pouca imaginação para o ouvinte. Segundo o psicanalista, estas

simplificações, juntas com a lição de moral diretamente, transformam num

conto que especifica tudo, ou seja, “... a imaginação do ouvinte não entra em

ação para dar um significado pessoal à estória.” (Bettelheim, 1983, p. 205).

“O valor do conto de fadas para a criança é destruído se alguém detalha

os significados. Perrault faz pior – reelabora-os. Todos os bons contos de

fadas têm significados em muitos níveis; só a criança pode saber quais

significados são importantes para ela no momento.” (Bettelheim, 1983, p. 205).

Os irmãos Grimm contam duas versões para Chapeuzinho Vermelho.

Nas duas versões a protagonista é ameaçada a ser devorada igual a João e

Maria. Porém, Chapeuzinho não passa fome como João e Maria sua vida

parece ser alegre e cheia de fartura. Como na história de João e Maria, existe

35

uma estrada ou floresta porém muito conhecida pela Chapeuzinho e por isso

ela não se perde.

Segundo Bettelheim, a versão de Chapeuzinho Vermelho tem uma

linguagem simbólica que muitas vezes não identificada pelos adultos e de fácil

entendimento para as crianças que internalizam os significados de caráter

psicológico escritos pelos irmãos Grimm.

No conto a menina ouve atentamente o pedido da mãe para seguir a

estrada e não desviar do caminho, todavia a menina é induzida facilmente pelo

lobo a observar os cantos dos pássaros e a beleza das flores fazendo com que

a menina opte pelo outro caminho. Bettelheim explica que:

“Chapeuzinho deixa o lar voluntariamente. Não teme o mundo externo, e sim reconhece sua beleza, e aí está o perigo. Se o mundo fora do lar e dos deve se torna atraente demais, poderá acontecer uma volta a um comportamento baseado ao princípio do prazer.” (2003, p.207).

Conforme o psicanalista, no conto cita também a questão masculina

representada pelos personagens do caçador e o lobo. Eles são exemplos de

altruísmo, proteção, sedução, violência. O caçador de acordo com o

psicanalista, “... é a figura mais atraente tanto para os meninos como para as

meninas, porque salva os bons e castiga o malvado.” (Bettelheim, 1983, p.

208).

E finalmente, como é típico dos contos de fadas no final da história a

justiça é feita e o bem prevalece.

Foi apresentado que os contos de fadas têm seus significados muito

peculiares para as crianças. E por isso não se deve explicar esses significados

para o ouvinte. Deve permitir que a linguagem de caráter psicológico internalize

na criança e que ela verbalize através de seu faz de conta e brincadeiras. E

que estes contos a estimule e alimente a sua imaginação para lidar com os

problemas interiores.

36

CONCLUSÃO

“O que é o contador, quer se trate da história oral, quer da escrita, senão aquele que não deve esquecer de sua infância, que recusa a esquecê-la e deixar-se ‘normalizar’ completamente? Aquele que, por isso mesmo, se torna cúmplice da criança, que a auxilia a prolongar sua brincadeira, a construí-la, a enriquecê-la, que a faz passar da brincadeira de símbolo para o que já toma forma de criação.” (Jacqueline Held, 1980, p.221).

Os contos de fadas são pouco utilizados na instituição escolar. Quando

são utilizados é para atividade pedagógica. Gostar somente de contos de

fadas ou saber da importância para a criança não é o suficiente. O importante

é saber qual é a finalidade dos contos em uma instituição escolar. É tornar-se

cúmplice da criança; é instigar a fantasia, a criatividade, a afetividade e as

brincadeiras; é educar a infância com o olhar da criança; é conhecer a si

mesmo como professor. Transformar os contos de fadas em tarefas perde seu

lúdico e sua estética e impede que a fantasia floresça.

Este estudo foi baseado na psicanálise, mas não basta o professor

somente conhecê-la “... e saber qual aluno deve ser encaminhado a um

profissional. O professor deve conhecer-se para ter condições de compreender

as mensagens de seus alunos e poder acolhê-lo em sua integridade.” (Radino,

2003, p41).

O adulto é responsável em alimentar a fantasia da criança e de manter

os contos imaginários vivos “As verdadeiras fadas, o verdadeiro e único

encantador é o narrador ou a narradora do conto.” (Radino, 2003, p. 241).

37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

AMARILHA, Marly. Estão mortas as fadas? Literatura infantil e prática pedagógica. Petrópolis: Vozes; Natal: EDUFRN, 1997. ARIÈS, P. História social da criança e da família. Trad. Dora Flaksman 2 ed. Rio de Janeiro: LTC,1981. BETTELHEIM, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. 14. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1983. CARVALHO, B. V. A Literatura Infantil. Visão Histórica e Crítica. 3ª Ed. São Paulo: Global. CARVALHO, S. M. R. Assis, por princípio a criança. IN: Experiências de Educação Pré-Escolar em Periferias Urbanas, setembro 1984. Curitiba. Anais do Seminário. Curitiba: Fundação Educacional do Estado do Paraná/Fundepar, 1984. COELHO, Nelly Novaes. O conto de fadas. São Paulo: Ática, 1987. COELHO, Nelly Novaes. O conto de fadas: símbolo – mitos – arquétipos. São Paulo: Paulinas, 2008. RADINO, Glória. Contos de fadas e realidade psíquica: a importância da fantasia no desenvolvimento. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003

38

ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTOS 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

A IMPORTÂNCIA DA NARRATIVA NA EDUCAÇÃO INFANTIL 10

1.1 - As fadas e a visão de mundo na sala de aula 10

1.2 - Imagens sim, textos não 12

1.3 - As dificuldades no uso dos contos de fadas 14

CAPÍTULO II

A IMPORTÂNCIA DA FANTASIA NO DESENVOLVIMENTO 17

1.1 - O mundo imaginário dos contos de fadas 17

1.2 - Fantasias e sonhos 22

CAPÍTULO III

A TERRA DAS FADAS 27

1.1 - histórico dos contos de fadas na literatura infantil 27

1.2 - Comparando os contos de fadas com outras literaturas 31

1.3 - Os contos de fadas e seus significados 33

1.3.1 – João e Maria 33

1.3.2 – Chapeuzinho Vermelho 34

CONCLUSÃO 37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 38