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sem fins lucrativos Uma experiência em fortalecimento institucional de organizações Centro de Estratégias para Organizações Sociais Realizador Investidor Social

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sem fins lucrativos

Uma experiênciaem fortalecimento

institucionalde organizações

Centro de Estratégiaspara Organizações Sociais

Realizador Investidor Social

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Centro de Estratégiaspara Organizações Sociais

sem fins lucrativos

Uma experiênciaem fortalecimento

institucionalde organizações

Rebecca RaposoMariana Tavares

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Raposo, Rebecca Uma experiência em fortalecimento institucional de organizações sem fins lucrativos / RebeccaRaposo, Mariana Tavares. -- 1. ed. -- São Paulo :Via Impressa Edições de Arte, 2014.

Bibliografia.

1. Organizações não governamentais2. Organizações sem fins lucrativos3. Planejamento estratégico 4. Terceiro setorI. Tavares, Mariana. II. Título.

14-04022 CDD-658.4012

Índices para catálogo sistemático:1. Organizações sem fins lucrativos : Administração estratégica : Administração 658.4012

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5Uma experiência em fortalecimentoinstitucional de organizações sem fins lucrativos

Apresentação por Rebecca Raposo

Apresentação por Paulo Castro

Prefácio por Rosa Maria Fischer

Capítulo 1 | Panorama: o terceiro setor brasileiro

Capítulo 2 | Assessoria CEOS: uma experiência em fortalecimento institucional de organizações sem fins lucrativos

Capítulo 3 | Assessoria CEOS 2011: o programa na perspectiva das organizações sociais participantes

Conclusão

Linha do tempo

Referências bibliográficas

Sumário

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119

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Apresentação

Rebecca RaposoDiretora-presidente do CEOS

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7Uma experiência em fortalecimentoinstitucional de organizações sem fins lucrativos

Este livro tem o desejo de ampliar o entendimento e a valorização do fortalecimento institucional de organizações sem fins lucrativos – causa à qual o Centro de Estratégias para Organizações Sociais (CEOS) se dedica –, tanto por parte de financiadores quanto das próprias entidades. Nossa moti-vação é a convicção de que o desenvolvimento do pleno potencial das organizações que compõem o terceiro setor é fundamental para o avanço social e democrático da sociedade brasileira, como descreve nossa visão.

O CEOS é uma organização sem fins lucrativos fundada em 2007, com a missão de ampliar o impacto e a sustentabilidade do setor social brasileiro, por meio do fortalecimento institucional de suas organizações sociais. Para tal, nossa ação protagônica é a Assessoria CEOS, programa de consultoria em gestão estratégica, com duração de até dezoito meses, para cinco organizações escolhidas por meio de um processo seletivo online.

Em 2011, realizamos a primeira edição da Assessoria CEOS. Encerrada em 15 de junho de 2012, a experiência resultou em transformações significativas não somente para as organizações participantes, mas também para o próprio Centro. A operação de um programa denso como esse traz lições que, acreditamos, são relevantes e devem ser disseminadas. Assim, o objetivo desta publicação, além de promover a importância da causa pela qual trabalhamos, é compartilhar a metodologia da Assessoria CEOS e as aprendizagens trazidas pelo primeiro edital.

Os limites e possibilidades de uma publicação sobre fortalecimento institucional de organizações sociais

Por sua natureza essencialmente estratégica, que busca um olhar aprofundado sobre a organização apoiada, a Assessoria CEOS não permite escala em seus resultados. Assim, esta publicação é uma maneira de ampliar o alcance da expertise construída pelo Centro em torno do programa.

Temos ciência, porém, de que um livro como este tem limites. Sabemos que sua leitura não será suficiente para que o empreendedor social identifique e transforme, por conta própria e sem apoio, os pontos frágeis da gestão de sua organização. Ainda que as páginas a seguir expliquem cada uma das etapas de trabalho da Assessoria CEOS, nossa intenção não foi, em momento algum, produzir uma espécie de “manual de instruções”, tarefa que seria improdutiva.

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Também não há aqui nenhuma pretensão de apresentar a Assessoria CEOS como uma metodologia definitiva em fortalecimento institucional. O programa idealizado e operacionalizado pelo Centro é apenas uma forma, entre outras possíveis, de se trabalhar a gestão de organizações sem fins lucrativos. Ao tornar pública essa experiência, identificamos processos e conhecimentos que podem ser úteis para outras organizações sociais, financiadores e até mesmo instâncias governamentais, no sentido de apontar o que se deve considerar ao estabelecer parcerias com organizações da sociedade civil.

Nossa motivação maior é disseminar uma experiência, visando chamar a atenção para a necessidade e a relevância do fortalecimento institucional das organizações sem fins lucrativos, ao mesmo tempo que contribuímos para a ampliação do conhecimento sobre e para a sociedade civil organizada. Dessa forma, cumprimos uma de nossas crenças, a de que o compartilhamento e a difusão sistemática de informações aceleram o processo de aprendizagem coletivo.

Estrutura: do panorama histórico ao depoimento dos gestores participantes

Este livro é dividido em três capítulos, seguidos por uma conclusão. Uma vez que acreditamos na inter-relação entre o fortalecimento institucional da sociedade civil organizada e a consolidação da democracia brasileira, o primeiro capítulo se dedica à construção de um panorama do que se convencionou denominar “terceiro setor”, pensando o contexto macro ao qual ele se articula. São discutidos temas como sua formação histórica, suas características centrais, as atuais estratégias de financiamento e mesmo a questão da nomenclatura mais adequada para as entidades sociais, uma vez que o próprio conceito de “terceiro setor” tem sido colocado em xeque. Para fins desta publicação, o termo será mantido como forma de se referir ao conjunto que agrega as organizações sem fins lucrativos dedicadas ao interesse público.

Para a construção de tal cenário, nos embasamos em uma pesquisa bibliográfica que resgatou a produção intelectual brasileira sobre o setor a partir dos anos 1990, sem nenhuma intenção de esgotar um tema tão complexo. Nosso objetivo não é encontrar respostas definitivas, mas sim levantar perguntas que consideramos pertinentes e urgentes. Nesse sentido, é interessante observar como muitas das questões em debate na literatura de duas décadas atrás seguem atuais. Cabe apontar também que a decisão de desenvolver esse panorama de forma retrospectiva é um reflexo direto da limitada reflexão intelectual sobre o setor nos últimos dez anos – o que, acreditamos, dificulta o avanço de sua infraestrutura, como o estabelecimento de um marco regulatório e de estratégias eficientes de financiamento.

O cenário construído nessa seção contextualiza a discussão sobre fortalecimento institucional que guia o segundo capítulo. Nele, explicamos a fundação do CEOS à luz do momento histórico debatido no capítulo anterior, os pressupostos teóricos que guiam seu trabalho e de que forma estes se concretizam por meio de práticas. Expomos, passo a passo, a metodologia da Assessoria CEOS, seguida das lições trazidas tanto pela operacionalização do programa quanto pela avaliação externa realizada no segundo semestre de 2012.

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No terceiro capítulo, abrimos espaço para que os gestores das cinco organizações participantes da Assessoria CEOS 2011 deem seu depoimento sobre a experiência. Tais empreendedores tiveram papel fundamental no desenvolvimento do programa e têm muito a contribuir para o debate sobre fortalecimento institucional. Por fim, na conclusão, fazemos um balanço da Assessoria CEOS, da causa à qual nos dedicamos e do atual momento do terceiro setor brasileiro, marcado por crescen-tes desafios e dificuldades para o pleno exercício do papel social e político que lhe cabe. Discutimos também o próprio CEOS e sua vivência enquanto organização-meio, o que tem exigido de nós importantes reflexões.

Agradecimentos

Esta publicação foi possível por meio do apoio do Instituto C&A, investidor social comprometido com o fortalecimento institucional da sociedade civil organizada, parceiro do CEOS desde nossa fundação e também um dos financiadores da Assessoria CEOS 2011. Cabe aqui nosso agradecimento ao Instituto pelo apoio ao longo de toda nossa trajetória.

Tivemos também o suporte de um grupo de pessoas que são referência em suas respectivas áreas e que, ao se dispor a fazer comentários a este livro, generosa e voluntariamente, agregaram a ele uma riqueza de olhares que consideramos fundamental: Eduardo Szazi, que fez apontamentos ao primeiro capítulo; e o comitê editorial, que deu contribuições relevantes para a estrutura e o conteúdo deste livro. O comitê é formado por:

Cristina Meirelles, coordenadora-geral da CASA7 – Memórias e Aprendizagens;

Judi Cavalcante, associado-fundador do CEOS;

Karen Worcman, diretora-presidente do Museu da Pessoa;

Marco Antônio Vieira Souto, diretor de planejamento da ArtPlan e membro do Conselho Consultivo do CEOS.

O Centro também agradece aos outros três financiadores institucionais – Fundação Vale, Instituto Oi Futuro e um quarto apoiador, que prefere permanecer anônimo –, bem como à nossa apoiadora Teresa Bracher, que, junto com o Instituto C&A, possibilitaram a realização da Assessoria CEOS 2011. Agradecemos ainda às cinco organizações sociais participantes do primeiro edital, com quem tanto aprendemos: Associação Vaga Lume, Centro de Educação Ambiental e Assessoria (CEAA), Espaço Progredir, Instituto de Cidadania Empresarial do Maranhão (ICE-MA) e Instituto Pombas Urbanas.

Por fim, expressamos nossa gratidão a todos que construíram os seis anos do CEOS junto conosco – vocês sabem quem são. Esta publicação, a primeira na história do Centro, é mais uma etapa dessa trajetória compartilhada. Esperamos que ela seja útil para os leitores e uma contribuição, ainda que modesta, para o avanço da cidadania brasileira.

Boa leitura!

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ApresentaçãoPaulo CastroDiretor-executivo do Instituto C&A

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Por que apoiamos o CEOS

É com o entusiasmo próprio de quem valoriza a evolução do novo que o Instituto C&A apresenta esta publicação, dedicada ao registro, à síntese e à reflexão da trajetória do Centro de Estratégias para Organizações Sociais (CEOS) em seu trabalho pelo desenvolvimento da sociedade civil brasileira.

O foco das discussões deste livro recai sobre a Assessoria CEOS, tática central desta organização, que é ao mesmo tempo jovem (pois foi criada em 2007) e madura (feita por gente experiente) e cuja implantação contou com o apoio-semente do Instituto C&A.

O novo que o CEOS nos traz diz respeito à concepção de um programa de consultoria em gestão estra-tégica para organizações sociais operacionalizado a partir de um modelo inusitado de financiamento.

Nesse modelo, o CEOS utilizou seu capital social para alavancar recursos junto a investidores sociais privados, constituindo um fundo que viabilizou a quase totalidade da consultoria. A diferença – apro-ximadamente 10% dos custos envolvidos – entrou como contrapartida das cinco organizações que se beneficiaram do programa, em um gesto com efeitos práticos e também simbólicos, que apon-tava desde o início para o objetivo final da consultoria: fortalecer e empoderar as instituições parti-cipantes na busca pela sustentabilidade, a ser entendida aqui na acepção mais ampla da palavra.

À parte a questão do financiamento, a Assessoria CEOS inovou por abraçar o desafio de oferecer atendimento individualizado aos que desfrutaram do programa. Criou-se um método para o todo, é verdade. Todavia, foram a atenção às particularidades das instituições participantes, conforme sua natureza e seu perfil, e um plano de ação alicerçado em diagnóstico que determinaram o processo de consultoria que cada organização viveria.

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Era sabido desde o início que a escolha de tal caminho teria implicações sobre a escala. Porém, tinha-se também consciência de que o sucesso de um trabalho desse gênero está intimamente relacionado à proximidade entre o time de consultores e a equipe da organização, especialmente de suas lideranças. Nesse sentido, a opção do CEOS não foi gerar uma metodologia para replicação deliberada, mas sim produzir conhecimento a partir da experimentação em profundidade de um projeto.

Quando se adquire domínio sobre um assunto, é possível extrair dali conclusões, orientações, sugestões, ferramentas e outros tipos de produtos, para servir a diferentes instituições, em diferentes estágios – e como esta publicação registra, o próprio CEOS se beneficiou desse processo. A edição deste livro é o primeiro passo em um mar de possibilidades e deve interessar a todas as organizações sociais que compreendem a importância da gestão para o desenvolvimento institucional (ou fortalecimento institucional, conforme adotado pelo CEOS). Naquelas que ainda não valorizam tal ação, esperamos que as próximas páginas contribuam para despertar essa consciência.

Do lado do Instituto C&A, é correto admitir que, quando a proposta de atuação do CEOS nos foi apre-sentada, ela nos encantou e nos perturbou também: tirou-nos da zona de conforto na medida em que resgatou dentro de nós o dilema clássico do investidor social privado, de decidir entre aportar recursos em ações sociais consagradas ou apostar na inovação.

A certeza de que as velhas ideias não serão capazes de solucionar os problemas sociais que se acumulam iluminou nosso caminho. Junto com ela, ratificamos a crença de que impulsionar a experimentação de projetos sérios, estruturados com competência por organizações sociais que se comprometem a fazer um trabalho dedicado, é algo esperado dos investidores sociais privados.

Correr riscos também faz parte da cultura de doar, e o bônus recebido tende a ser duplo: vem dos benefícios do projeto social apoiado em si, que deve ser acompanhado por meio do diálogo contínuo e construtivo que caracteriza uma boa parceria; e vem do fortalecimento da própria organização social que encabeça o projeto e solicita o nosso apoio, como consequência desse diálogo frutífero e da corresponsabilidade que se estabelece.

Ainda no âmbito do Instituto C&A, vale ressaltar que a decisão por financiar a constituição do CEOS foi influenciada e influenciou positivamente um movimento que corria em paralelo, que era a imple-mentação, em nosso portfólio, de um programa voltado ao fortalecimento das organizações sociais. Mais uma prova de que a abertura para o mundo vale a pena!

O apoio de ações que respondiam ao propósito do fortalecimento institucional figurava em nossa história desde o início dos anos 1990, quando o Instituto C&A foi criado, mas foi no exato período de constituição do CEOS que a necessidade de adicionar consistência ao trabalho que realizávamos passou a gritar dentro de nós.

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Aspiração

Garantia do direito à educação de crianças e adolescentes, para uma sociedade participativa, justa e sustentável.

Missão do Instituto C&A

Promover a educação de crianças e adolescentes das comunidades onde a C&A atua, por meio de alianças e do fortalecimento de organizações sociais.

Coincidência, convergência, alinhamento ou sintonia, o fato é que as conversas com o CEOS foram inspiradoras, retroalimentaram nossas reflexões e, como acontece na relação com tantos e tantos parceiros, dinamizaram nossa prática. Foi neste contexto que se deu o lançamento, em 2009, do programa Desenvolvimento Institucional do Instituto C&A, ocupado em apoiar processos e iniciati-vas que promovam o desenvolvimento institucional de organizações da sociedade civil como estra-tégia para o desenvolvimento social.

Com mais atores especializados no tema do fortalecimento institucional, mais investidores convencidos a aportar recursos na área, mais projetos implementados e mais conhecimentos produzidos, vamos aos poucos aumentando a massa crítica a este respeito. Os ganhos virão para todos – para a sociedade civil, para as organizações sociais e seus diversos públicos e para a democracia. As páginas a seguir ilustram o que é possível realizar na direção do desenvolvimento institucional, bem como o enorme potencial que ainda temos a explorar.

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Prefácio

Rosa Maria Fischer

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Foi, para mim, muito prazerosa a leitura deste livro, que narra a jornada de criação do Centro de Estratégias para Organizações Sociais (CEOS) e a inédita experiência de fortalecimento institucional que é a Assessoria CEOS. Prazerosa não apenas pela narrativa clara e objetiva, mas também porque me permitiu percorrer a trajetória do chamado terceiro setor brasileiro nos últimos trinta anos, reco-nhecer o cenário atual e conjecturar sobre o futuro.

Poucos textos nos propiciam, como este, tanta informação bem sistematizada e o estímulo para reflexões profundas acerca dos ciclos de vida das organizações, em especial daquelas que pro-porcionam a participação e organização da sociedade civil no trato das questões que afetam sua própria sociabilidade. Mais do que isso, a leitura deste livro, escrito em linguagem simples, direta e assertiva, favorece a compreensão de uma das mais complexas questões sociológicas: aquela que diz respeito à relação entre Estado e sociedade civil. Ou seja, a relação que define os direitos e de-veres, as atribuições e garantias que indicam quais são os limites e as abrangências da democracia enquanto espaço institucional.

Portanto, ao narrar a experiência de assessorar cinco organizações da sociedade civil, o CEOS não está apenas nos oferecendo mais um relato de métodos de consultoria para o desenvolvimento organizacional. Está, na verdade, nos provocando a refletir sobre dilemas mais profundos, que to-cam em pontos nevrálgicos para a constituição da cidadania: qual a sociedade que queremos? Qual democracia somos capazes de construir?

A elaboração do trabalho do CEOS é tão robusta e corajosa que parte de uma concepção própria do conceito de fortalecimento institucional como “a criação das condições necessárias para que a organização sem fins lucrativos tenha impacto real na causa em que trabalha”. Reflete simultanea-mente o conhecimento sólido e uma postura de comprometimento com valores, direcionando, de um lado, a uma abordagem sistêmica e integrada dos conteúdos e práticas oferecidos e, de outro, aos princípios éticos obedecidos no relacionamento com as organizações atendidas.

Indo além e superando a rigidez dos parâmetros técnicos e das precisões teórico-conceituais, o trabalho desenvolvido não hesitou em distribuir afeto nas relações com as pessoas. Está presente em minha memória, quando da singela reunião de encerramento da Assessoria CEOS 2011, a enor-me carga de emoção dos depoimentos dos gestores das cinco organizações atendidas, a carinhosa troca de agradecimentos, a enorme expectativa de concretizar as transformações concebidas com o apoio da consultoria.

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Tais resultados, que não podem ser avaliados apenas com métricas quantitativas, são indicativos de que, mais do que a modernização dos modelos de gestão, a Assessoria CEOS construiu com as organizações pontes de confiança, que as capacitaram a atuar com estratégias de colaboração capazes de otimizar as ações.

Os depoimentos dos gestores na parte final deste livro ressaltam os benefícios obtidos já no transcorrer da consultoria. Ainda que a elaboração de projetos seja tarefa rotineira das organizações sociais, todos ressaltam que o aprendizado da gestão de programas e projetos trazido pela Assessoria CEOS lhes permitiu reformular suas práticas. A concepção e implantação de estruturas de governança também foi um achado surpreendente. É estimulante assistir como a descoberta de ferramentas de gestão e de novos conceitos pode impactar positivamente o desempenho das organizações, a vida e o relacionamento das pessoas.

Para o leitor desavisado, talvez este livro possa parecer a descrição de um insucesso. Afinal, depois de enorme esforço para instituir o CEOS como uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), empregar toda a experiência acumulada da equipe para formular a Assessoria CEOS e, finalmente, usar de muita criatividade e energia para constituir o Fundo de Investimento em Organizações Sociais (Fios) (fundo de captação de recursos financeiros que assegurou a primeira rodada do programa), resulta que não haverá continuidade desse tipo de ação. É um engano, porém, pensar assim, pois o conjunto dessas vivências, o aprendizado obtido, a confirmação das hipóteses que direcionaram o trabalho e o esforço empreendido pelo CEOS para visualizar os próximos passos constituem um quadro de “caso de sucesso”.

O CEOS foi generoso ao registrar todos os altos e baixos, explicitar didaticamente todas as inter-venções e despir-se de vaidades, mostrando os limites das ações e decisões que tomou. Dessa forma, propicia ao leitor condições reais de análise e reflexão. Por certo, tais informações servirão de alimento para outros empreendedores contaminados pela vontade de “servir, articular, representar e transformar”.

De certo modo, ao elaborar um primeiro capítulo que faz uma análise exaustiva e bem fundamentada da trajetória das organizações sem fins lucrativos no Brasil e que termina por delinear os impasses do cenário atual, o CEOS prepara o leitor para o entendimento dos motivos que levaram à descontinuidade da Assessoria CEOS. Essa parte do livro, por si só, já é uma grande contribuição à compreensão do processo histórico, o que oferece bases concretas para atuar, hoje, na construção do futuro. Leitura obrigatória para estudantes e empreendedores em formação!

O que se espera ao fim da leitura é que venha mais. Mais ações que respondam à pergunta formu-lada pelo próprio CEOS: para quem nosso conhecimento faria maior diferença? Que cada leitor seja estimulado a fazer mais e melhor, como o CEOS tão bem exemplifica.

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Capítulo 1 | Panorama: o terceiro setor brasileiro

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Compreender o cenário atual do terceiro setor brasileiro não é possível sem atentar para a trajetória que nos trouxe até aqui. Afinal, as organizações sem fins lucrativos se constituem em diálogo direto com o contexto social, econômico, político e cultural no qual se inserem, o que faz com que seu desenvolvimento seja resultado de um processo específico de cada país, impossível de ser replicado. Nesse sentido, no caso brasileiro, entendemos que contar a história do terceiro setor é, em última instância, contar a história do processo de consolidação da democracia, que está em permanente construção.

Neste capítulo, nos dedicamos a traçar um panorama do terceiro setor, abordando algumas ques-tões definidoras: uma breve trajetória histórica, os diferentes papéis atribuídos às organizações sem fins lucrativos, suas diversas nomenclaturas, as possíveis características comuns de uma ampla gama de organizações que compõem um mesmo universo, a questão do financiamento. Ao fim, tratamos do cenário atual, apresentando alguns dados das últimas pesquisas de perfil do setor e discutindo, em linhas gerais, os avanços obtidos e os desafios que permanecem.

É importante esclarecer que não há aqui a intenção de esgotar quaisquer desses assuntos, cada um deles passível de um livro e pesquisa próprios. Nosso objetivo é criar um cenário para contextualizar a discussão sobre o desenvolvimento da sociedade civil, focando no fortalecimento institucional das organizações sociais, que será tratado no segundo capítulo – e cuja importância e pertinência são cada vez mais reforçadas pelo atual estado de coisas.

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A relevância dessa ação social cristã, mantida em aliança com o Estado, dá-se não só por constituir a gênese do que viria a ser chamado de “organização sem fins lucrativos”, mas tam-bém por ditar as características fundantes da filantropia brasileira.

Estão aí as raízes sólidas de uma cultura da doação pessoalizada, permeada por valores cristãos, intermediada basicamente pelo campo institucional da religião, que vai marcar práticas e concepções da ação social privada no Brasil, a qual, por sua vez, se mistura, nessas longas origens, com a lógica hierárquica da proteção senhorial, com base no dom e na lealdade. É um campo em que se misturam e confundem público e privado, confessional e civil, marcas de origem a serem levadas em conta até hoje quando se considera um “terceiro setor” na sociedade brasileira.2

Ter em mente tais raízes históricas é importante para colocar em perspectiva as especificidades do terceiro setor brasileiro. Características como as citadas acima se manifestam, por exemplo, nas lógicas que pautam o debate atual a respeito do financiamento das organizações sem fins lucrativos, como veremos adiante. Além disso, perceber que, no Brasil, o desenvolvimento da sociedade civil viveu os efeitos de um Estado centralizador, patrimonialista e assistencialista, que se colocava como fonte por excelência da

2 Idem.

Trajetória: os marcos históricos do terceiro setor brasileiro sob a perspectiva da sua relação com o Estado

Se consideramos que há uma relação intrínseca entre a evolução do terceiro setor brasileiro e o processo de consolidação da democracia no país, faz sentido observarmos o desenvolvimento histórico desse setor pelo viés do seu relacio-namento com o Estado, a partir de seus principais marcos. Ao longo do tempo, tal relação se deu ora pela via da colaboração, ora pela via do conflito, como discutimos a seguir.

As raízes na caridade cristã

Até o fim do século XIX, no Brasil, as organizações dedicadas a assistência social, saúde e educação eram, em sua maioria, criadas pela Igreja católica e financiadas por doações de benfeitores. Tem-se a Igreja como principal ator social, em um paradigma de atuação da caridade cristã. No entanto, já aqui havia uma presença forte do Estado no desenvolvimento de tais ações. A Igreja não atuava sozinha, mas sim “com mandato do Estado, em uma situação de simbiose entre as duas instituições”1.

1 Leilah Landim, “Desenvolvimento social susten-tado: propostas práticas de atuação – 24 de novem-bro de 1998”, em Fórum permanente do terceiro setor: 1ª coletânea de artigos (junho de 1998-junho de 1999) (São Paulo, Senac, 1999), p. 57.

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vida pública, ajuda a explicar as diferenças de robustez do terceiro setor nacional em relação àquele dos Estados Unidos, país que tem no associativismo e no individualismo liberal as bases de sua cultura cívica.

Do Estado Novo a um Estado em crise

O Estado e a Igreja permaneceram como atores sociais centrais durante o Estado Novo (1937-1945), quando o paradigma passou a ser o da estatização da ação social. O governo Getulio Vargas, espelhado na longa trajetória social da Igreja, desenvolveu políticas públicas baseadas na caridade cristã. Ao mesmo tempo, proliferaram as organizações sem fins lucrativos voltadas à prestação de serviços para setores da população excluídos das políticas estatais. Se a essas organizações já cabia, até aqui, uma atuação sob a égide do Estado, a partir de meados dos anos 1930 tal relacionamento se estreitou, na perspectiva da terceirização de serviços públicos. Não por acaso, “data desse período a legislação que regulamenta tais relações”3, como a Lei de Utilidade Pública Federal, de 1935.

Até mesmo organizações mais politizadas, como os Centros Populares de Cultura (CPC), no início dos anos 1960, mantinham interlocução com o Estado. Foi com o golpe militar, em 1964, que tanto essa relação quanto a própria composição de forças no cenário social sofreram mudanças. Passou-se a um paradigma do controle estatal, tendo o Estado autoritário e a sociedade – não mais a Igreja – como atores sociais principais e o conflito como mote desse relacionamento. No campo econômico, o processo de moderni-zação e urbanização contribuiu na composição de uma nova dinâmica de sociedade, permitindo o desenvolvimento de uma classe média urbana com papel fundamental na construção do ter-ceiro setor.

Durante o regime militar, enquanto partidos políticos e as próprias entidades de assistência social eram impedidos de existir – de acordo com o Ato Institucional no 2 (AI-2), de 1965, e 3 Idem.

o Decreto-Lei no 41, de 1966, respectivamente –, começou a se consolidar no país um “campo de organizações autônomas, baseadas em ideá-rios modernos da igualdade, da associação, dos direitos”4, com forte caráter politizado, para fa-zer frente ao autoritarismo estatal. Ao longo dos anos 1970, o desenvolvimento de organizações cada vez mais distantes do Estado e próximas de movimentos sociais tornou-se característica comum de países marcados por ditaduras, nos continentes latino-americano, africano e asiático.

Nesse cenário, emergiram fundações e agências no hemisfério Norte voltadas a dar assessoria e financiamento aos projetos autônomos do Sul. A tais instituições específicas se convencionou chamar “organizações não governamentais” (ONGs), termo que se generalizou e passou a ser utilizado como sinônimo de organização sem fins lucrativos5.

A estrutura dos movimentos populares requeria determinadas assessorias, fossem elas jurídicas, agronômicas ou econômicas. É nesse instante que surgem as organizações hoje chamadas não governamentais. As ONGs surgiram com a exata função e a meta de assessorar os movimentos sociais, dando-lhes o que pediam e suprindo-os naquilo de que estavam carentes.6

Concomitante ao desenvolvimento desses novos atores sociais desvinculados do poder público, a conjuntura econômica e política mundial colocou em xeque a figura do Estado. A crise do petróleo, nos anos 1970, e a recessão econômica, no iní-cio dos anos 1980, afetaram sua capacidade de promover desenvolvimento. Ao mesmo tempo, o modelo de Estado de bem-estar social esgotou-se, jogando por terra o entendimento de que cabe ao Estado, sozinho, responder às demandas socioe-conômicas da sociedade.

4 Ibidem, p. 58.5 Uma discussão específica do tema será feita na

seção que reflete sobre as diferentes nomenclatu-ras aplicadas às organizações sem fins lucrativos, adiante neste capítulo.

6 Thomas Miguel Pressburger, “ONGs e cidadania”, em Hebe Signorini Gonçalves (org.), Organizações não governamentais: solução ou problema? (São Paulo, Estação Liberdade, 1996), p. 98.

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[...] a crise do Welfare State coincide com a crise econômica que os países desenvolvidos enfrentaram nos anos 1970. Com a redução na oferta de empregos, cai a massa salarial, base de financiamento do sistema, e cresce a demanda, pressionada pela carência dos desempregados. Da crise econômica brotou a crise social que por sua vez arrastou o modelo de bem-estar.7

Para onde seguir, diante da lacuna deixada pelo Estado de bem-estar social? Por um lado, a crescente adesão ao modelo liberal passou a atribuir ao mercado um papel central no oferecimento de serviços que, antes, eram de responsabilidade exclusiva do Estado. Por outro, o estímulo a alternativas locais de participação na esfera pública ganhou ainda mais força.

Da clandestinidade à legitimidade

Se as organizações sem fins lucrativos (algu-mas delas em situação de clandestinidade) conseguiram transformar o ambiente hostil da ditadura militar em terreno fértil para sua atuação política, a retomada da democracia foi um ponto de virada crucial. Com a rede-mocratização, em 1985, vieram importantes reflexões: quais passam a ser as motivações de tais organizações, quando já não há um Es-tado autoritário para se contrapor? Há espaço para elas, uma vez que voltam à ativa, formas tradicionais de organização, como sindicatos e partidos políticos?

Mas cidadania e democracia são conceitos cuja realização se dá em longo prazo, arti-culando agendas complexas, especialmente em um contexto de forte herança autoritária. O que a permanência das organizações e seu subsequente crescimento mostram é que elas são atores relevantes por si só, essenciais em uma democracia fortalecida e cada vez mais dinâmica, cuja construção exige formas de participação diversas. Além disso, o fim do re-gime militar deixou desafios concretos para as organizações, como as consequências de um

7 Hebe Signorini Gonçalves, “O Estado diante das or-ganizações não governamentais”, em ibidem, p. 50.

modelo econômico responsável por uma das piores distribuições de renda do mundo.

Em 1988, outro marco para a sociedade civil bra-sileira: a aprovação da nova Constituição Federal. O documento adota três tipos de democracia – direta, via plebiscitos e referendos; representati-va, via eleições; e participativa, via conselhos – e passou a reconhecer como legítima a participa-ção cidadã nas políticas sociais, dando respaldo para tal. Sua formulação contou com o envolvi-mento direto de movimentos sociais e sindicais, historicamente imprescindíveis para a criação de condições sociopolíticas favoráveis à atuação das organizações sem fins lucrativos.

A Constituição de 1988 marcou uma nova mudança de paradigma, do controle estatal para a cidadania. A sociedade e o Estado permaneceram como atores sociais principais, em uma dinâmica não mais de conflito, mas de diálogo. Um ambiente político-legal aberto às organizações sem fins lucrativos foi estabelecido no país, reforçando a ideia introduzida pela Carta das Nações Unidas, em 1945, a respeito da legitimidade de atuação dos cidadãos na esfera pública, entendida como um campo amplo, que ultrapassa o governamental. O conjunto do terceiro setor cresceu, cada vez mais complexo em naturezas, focos e agendas. Nada mais apropriado para uma sociedade em transição.

Autonomia ou complemento do Estado?

Nos anos 1990, mudanças profundas na ordem mundial criaram um novo contexto com o qual as organizações sem fins lucrativos tiveram de dialogar. Internacionalmente, a derrocada do sistema comunista europeu, com a queda do Muro de Berlim (em 1989), e a globalização de-ram novos contornos às relações entre Estado, sociedade e mercado. Com os avanços tecno-lógicos e de comunicação, as possibilidades de interlocução e auto-organização, inclusive em escala global, ganharam força.

Nacionalmente, a adoção de políticas neoliberais arraigou-se ao longo da década. As privatizações nas duas gestões de Fernando

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Henrique Cardoso (FHC – 1995-1998 e 1999-2002) levaram ao enxugamento do Estado, fortalecendo a noção de administração pública enquanto gerenciamento técnico. Em 1994, a implantação do Plano Real durante o governo Itamar Franco (1992-1994), que tinha FHC como ministro da Fazenda, contribuiu na estabilização da inflação, mas a política econômica teve consequências sociais importantes, como o aumento do desemprego e a redução do investimento estatal em gastos sociais.

O governo FHC adotou medidas específicas relacionadas às organizações sem fins lucrativos que provocaram alterações no papel desempenhado por elas, bem como no tipo de relacionamento mantido com o Estado. Em 1995, a criação do Programa Comunidade Solidária estabeleceu uma ponte entre governo e sociedade civil por meio de parcerias. O programa tornou-se o carro chefe das políticas públicas sociais do governo, sob liderança da antropóloga e então primeira-dama Ruth Cardoso, precursora de uma mudança de paradigma ao questionar a ideia de assistencialismo em nome de uma ação social organizada.

Em 1998, instituíram-se as Organizações Sociais (OSs), responsáveis pela gestão de instituições públicas nas áreas de saúde e cultura, em claro processo de terceirização da ação do Estado. No ano seguinte, foi estabelecida a titulação de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), que criou o termo de parceria, um novo instrumento de acordo entre governo e sociedade civil. Por meio dessas medidas, a interlocução entre os dois atores foi facilitada, resultando tanto no aumento do acesso a recursos públicos por parte das organizações quanto na crescente participação destas nas políticas sociais de governos, não só o federal, mas também os estaduais e municipais.

Por outro lado, tais ações deixavam claro o papel atribuído às organizações pelo poder público: novamente, o de prestadoras de ser-viços, não autônomas, e sim complementares ao Estado. Para as entidades com caráter mais politizado, tratava-se de um caminho diferente

daquele visualizado para a sociedade civil no jogo democrático.

Diante desse cenário, é possível compreender os esforços de articulação das organizações sem fins lucrativos durante os anos 1990. Reunir-se em grupos e associações corporativos tanto respondia ao reconhecimento das organizações como um ator cada vez mais relevante e presen-te na vida coletiva quanto fortalecia um conjunto de entidades que via seus pressupostos de ação cada vez mais em disputa. Assim, em 1991, é fundada, em São Paulo, a Associação Brasileira de ONGs (Abong), motivada por objetivos como a radicalização da democracia e a articulação com organizações e movimentos nacionais e internacionais compromissados com transfor-mações estruturais. Ainda em 1991, dá-se iní-cio ao processo de estabelecimento da Civicus, exemplo de espaço internacional de mobilização da sociedade civil organizada.

É também nessa década que são fundadas duas associações dedicadas a organizar a ação social das empresas: em 1995, o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE) e, em 1998, o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, ambos com sede em São Paulo. Em um contexto de defesa da ideia de um Estado enxuto a quem não cabe responsabilizar-se sozinho pelas demandas sociais do país, o estabelecimento dessas instituições é sintomático. Por meio delas, dois conceitos passam a fazer parte do debate público: o investimento social privado, via GIFE, e a responsabilidade social empresarial, via Instituto Ethos8.

É compreensível também que, com a exigência crescente de profissionalização das organiza-ções sem fins lucrativos – consequência direta da ampliação de seus espaços de atuação e do aumento da demanda de trabalho –, a comuni-dade acadêmica brasileira tenha se voltado ao terceiro setor. Data dessa época a fundação de dois importantes espaços dedicados ao tema: o Centro de Estudos do Terceiro Setor (CETS),

8 Uma discussão específica do tema será feita na se-ção que reflete sobre o financiamento para o ter-ceiro setor, adiante neste capítulo.

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da Fundação Getulio Vargas (FGV), em 1994, e o Centro de Empreendedorismo Social e Admi-nistração em Terceiro Setor (CEATS), da Univer-sidade de São Paulo (USP), em 1998, ambos na capital paulista.

Por fim, cabe destacar experiências autônomas de mobilização da sociedade civil, ainda na década de 1990. Em 1992, no Rio de Janeiro, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – a ECO-92 – colocou pela primeira vez a sociedade civil organizada como ator relevante a ser consultado em um debate de escala internacional. Em 1993, a Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, conhecida como Campanha contra a Fome e liderada pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, tornou-se um episódio emblemático da participação cidadã voluntária ao mobilizar parte significativa da sociedade em torno do combate à fome.

Inimigo público

Em 2003, com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva para presidente, as organizações sem fins lucrativos viram-se diante de nova mudança no cenário social brasileiro. Em suas gestões (2003-2006 e 2007-2010), as políticas sociais voltaram a ser área prioritária da ação estatal direta, especialmente por meio do investimento em programas de distribuição de renda, como o Bolsa Família (ampliação do benefício Bolsa Escola, criado pelo então governador do Distrito Federal, Cristovam Buarque, e nacionalizado na gestão FHC). Essa é também a postura da atual gestão de Dilma Rousseff (2010-2014), que representou a continuidade do projeto petista para o país.

É importante chamar a atenção para as diferenças na relação estabelecida entre governo e sociedade civil nas gestões de Lula e Rousseff. Em razão de sua proximidade histórica com organizações e movimentos sociais, o governo Lula centralizou esse relacionamento na figura do então presidente, que se ocupava diretamente da mediação com os interlocutores da sociedade civil.

No governo Dilma, essa relação foi instituciona-lizada, principalmente por meio da Secretaria--Geral da Presidência da República. Ainda que tenha sido criado em maio de 2003 (portanto, durante a gestão Lula) com a principal atribuição de “intermediar as relações do governo federal com as entidades da sociedade civil”, conforme descrito em seu site, foi durante a gestão de Rousseff que esse ministério foi de fato empo-derado para responder por tal intermediação.

Mais impactante que as mudanças de governo, no entanto, foi uma notícia veiculada em setembro de 2006, no jornal Folha de S.Paulo. Nela, uma denún-cia era feita contra uma organização sem fins lucra-tivos, que teria recebido mais de R$ 18 milhões da União desde o início do governo Lula. A partir daí, outros casos semelhantes foram levantados pela imprensa, culminando, em outubro de 2007, na ins-tauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), conhecida como CPI das ONGs, para apurar o mau uso de recursos públicos pelas ONGs e Oscips.

A CPI foi duramente criticada por especialistas da área, preocupados com uma possível criminalização generalista do terceiro setor, uma vez que foram apontadas irregularidades em 29 convênios realiza-dos entre governo e 11 ONGs, número ínfimo quan-do considerado o universo total das organizações – à época, cerca de 270 mil. Após ser prorrogada quatro vezes, a CPI foi encerrada em 1o de novembro de 2010, sem o alarde dedicado à sua instauração e com estragos consumados na reputação do setor.

Infelizmente, a CPI das ONGs nada tem a ver com uma tentativa de controle social ou de intensificação de instrumentos de transparência, o que também defendemos. Tratou-se de mais uma investida contra organizações que batem de frente com os interesses políticos e econômicos de alguns grupos. O desin-teresse da imprensa comercial pelos resultados da CPI é mais uma evidência de que a instalação desta comissão teve como objetivo principal a perseguição política.9

Em 2011, novos escândalos envolvendo relações promíscuas entre poder público e organizações 9 Associação Brasileira de ONGs (Abong), “Nota so-

bre fim da CPI das ONGs”, 17 nov. 2010. Disponí-vel em: www.abong.org.br/noticias.php?id=2576.

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sem fins lucrativos (muitas delas de fachada, ou seja, legalmente formalizadas, mas sem atuação pública de fato) vieram à tona, agora no governo Dilma Rousseff. Em resposta, a presidenta afastou três ministros – Pedro Novais, do Turismo, Orlando Silva, do Esporte, e Carlos Lupi, do Trabalho – por fraude e desvio de recursos públicos com a participação direta de ONGs. Além disso, determinou, em outubro de 2011, a suspensão por trinta dias da transferência de recursos às organizações sem fins lucrativos, com o objetivo de averiguar o cumprimento real dos acordos estabelecidos até então. Em fevereiro de 2012, o governo cancelou 181 convênios, após um grupo de trabalho composto pela Casa Civil, pela Controladoria Geral da União (CGU) e pelo Ministério do Planejamento analisar 1.403 contratos.

Por um marco regulatório para o terceiro setor

Após os escândalos de 2011, foram feitas mais de quarenta propostas legislativas envolvendo as organizações sem fins lucrativos, não no sentido de fortalecê-las, mas sim no de controlá-las – o que revela uma visão restrita do Legislativo a respeito do papel do terceiro setor na democracia brasileira. Coube à sociedade civil organizada tomar a frente e cobrar de Dilma Rousseff um compromisso de campanha: o estabelecimento de um marco regulatório para o terceiro setor, que garantiria uma legislação mais clara e transparente no que se refere ao repasse de recursos públicos, trazendo segurança jurídica não só ao Estado, mas também às próprias organizações.

Tal compromisso envolveu a iniciativa de um grupo de movimentos sociais e organizações da sociedade civil, como Fundação Grupo Esquel Brasil, Abong, Fundação Avina e GIFE, que, em 2010, se reuniu em torno de uma agenda comum, dando base à Plataforma por um Novo Marco Regulatório para as Organizações da Sociedade Civil. Seu objetivo era reivindicar “uma política pública de fomento à participação cidadã por meio de organizações

sociais autônomas”, conforme descrito em seu site. A Plataforma foi encaminhada a todos os então candidatos à Presidência, tendo sido formalmente respondida por Dilma Rousseff e José Serra. Ambos comprometeram-se a, se eleitos, convocar uma comissão mista para elaborar, em um ano, uma proposta legislativa que respondesse à Plataforma.

Com a eleição de Rousseff e após interlocuções com o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, foi instituído, em setembro de 2011, um grupo de trabalho (GT), coordenado pela Secretaria-Geral e composto por representantes de órgãos do governo federal e organizações da sociedade civil, além de contribuições de especialistas. Seu objetivo era “avaliar, rever e propor aperfeiçoamentos na legislação federal relativa à execução de programas, projetos e atividades de interesse público e às transferências de recursos da União mediante convênios, contratos de repasse, termos de parceria ou instrumentos congêneres”10. Encerrado em julho de 2012, o GT elaborou um projeto de lei que inclui a proposta de um novo instrumento de acordo entre governo e organizações sem fins lucrativos.

O Projeto de Lei estabelece um novo instrumento de contratualização entre o governo e as organi-zações da sociedade civil, o Termo de Fomento e Colaboração, definindo obrigações relativas ao chamamento público e à prestação de contas, tanto para os administradores públicos como para as organizações.11

Ao instaurar a necessidade de licitação, o termo de fomento contribuiria para o combate a improbidades administrativas, como a contratação de organizações de fachada ou o favorecimento de entidades ligadas a figuras políticas, em todos os níveis de governo (federal,

10 Secretaria-Geral da Presidência da República, Re-latório final do Grupo de Trabalho Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, Brasília, 2012.

11 Abong, “Abong 2010 a 2013: em defesa dos direi-tos e bens comuns”, relatório trienal, São Paulo, 2013, p. 13. Disponível em: www.abong.org.br/final/download/revista_abong.pdf.

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estadual e municipal). Além disso, estimularia o protagonismo das organizações, garantindo a entidades autônomas acesso a recursos públicos para cumprir seus programas próprios. Até o momento, o projeto de lei não recebeu parecer da presidenta.

Também não houve avanço na criação de um fundo de financiamento para organizações sem fins lucrativos, outra reivindicação da socieda-de civil que teve sua constituição anunciada em março de 2012 por Gilberto Carvalho e que, tal qual o marco regulatório, tinha lançamen-to previsto para junho daquele ano. Segundo matéria publicada no jornal Valor Econômico, o fundo seria composto por recursos de empre-sas estatais e privadas. Inicialmente, receberia aportes do Banco Nacional de Desenvolvimen-to Econômico e Social (BNDES), da Petrobras e da Fundação Banco do Brasil, totalizando um caixa de R$ 200 milhões. “[O fundo] Dará autonomia de gestão para as organizações”12, assegurou Carvalho ao veículo.

Legitimidade posta à prova

Não foi apenas o Legislativo brasileiro que, a partir dos escândalos recentes, endureceu sua postura diante das organizações sem fins lucrativos. Desde então, o tom adotado pela imprensa sofreu alterações substantivas em relação ao que se via nos anos 1990, quando a ECO-92 e a Campanha contra a Fome ganharam as manchetes com um viés positivo. Ainda que representantes da sociedade civil organizada sejam constantemente requisitados pelos veículos para comentar determinados assuntos, assumindo a condição de especialistas, quando se trata de discutir o terceiro setor brasileiro as incompreensões e os questionamentos passaram a ser frequentes.

É muito comum que matérias da grande mídia

12 Cristiane Agostine, “Dilma lançará fundo para ONGs e marco regulatório do terceiro setor”, Va-lor Econômico, São Paulo, 28 mar. 2012. Disponível em: www.valor.com.br/politica/2592280/dilma--lancara-fundo-para-ongs-e-marco-regulatorio--do-terceiro-setor.

associem as ONGs a interesses privados de todo tipo: vinculadas a partidos, a igrejas, a políticos, a governos, a interesses de certas empresas, a estratégias de organizações internacionais, e assim por diante. Tudo isso existe, claro, mas não caracteriza ou define o sentido de existência do setor. Tal atitude da mídia indica a dificuldade, quando não a má vontade, de reconhecer nas organizações da sociedade civil que defendem e promovem direitos, um campo ético-político que busca expressar o interesse público sobre questões e temas relevantes para a sociedade.13

O que se vê é a dificuldade da imprensa em separar o joio do trigo – o que, a bem da verdade, é reflexo do próprio setor das organizações sem fins lucrativos, que, internamente, também enfrenta obstáculos nesse sentido. Com base nos casos pontuais de corrupção noticiados, não raro viram-se veículos reconhecidos e colunistas de renome acabando por criminalizar e deslegitimar todo um setor. Exemplo disso é o editorial publicado pelo jornal Estado de S. Paulo, em abril de 2012, quando foi anunciada a criação do fundo de financiamento para o setor social:

Não há cálculo confiável de quanto se desperdiçou dos cerca de R$ 20 bilhões que o governo repassou nos últimos seis anos para entidades privadas sem fins lucrativos, como as organizações não gover-namentais (ONGs), nem de quanto desse dinheiro foi parar nos bolsos de políticos e seus protegidos. Mesmo assim, o governo do PT quer aumentar o bolo que alimenta essas organizações, e para isso vai criar um fundo de financiamento que inicialmente disporá de R$ 200 milhões fornecidos por institui-ções controladas pelo governo, mas poderá contar com recursos privados.14

Fica clara uma leitura dos fatos que desconsidera as contribuições do terceiro setor para a vida pública – inclusive em termos dos serviços que presta à população, desonerando o Estado – e

13 Domingos Armani, “As Ongs pelo olhar da mídia”, 17 fev. 2013. Disponível em: domingosarmani.wordpress.com/2013/02/.

14 Estado de S. Paulo, “Agora, ONGs governamentais”, 8 abr. 2012. Disponível em: www.estadao.com.br/noticias/impresso,agora-ongs-governamen-tais-,858525,0.htm.

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seu papel no fortalecimento da democracia brasileira. Quando o objeto do texto jornalístico são as organizações da sociedade civil como um todo, a politização do debate é deixada de lado em nome de argumentos como a necessidade de transparência, a desconfiança sobre suas intenções e a suposta falta de controle por parte do Estado (sem considerar, nesse caso, que não se trata da inexistência de instrumentos de prestação de contas para o governo, mas sim de sua ineficiência, como discutiremos adiante).

Por fim, cabe questionar: que efeito uma cobertura alarmista a respeito da sociedade civil organizada tem sobre a opinião pública? De que maneira ela ajuda a mobilizar um debate sério a respeito da participação cidadã no conjunto da sociedade? A disputa pelo imaginário coletivo é também uma tarefa à qual o terceiro setor brasileiro precisa se dedicar. Entre os desafios, um se mostra particularmente premente, em um cenário de apropriações de seus objetivos: esclarecer a que se prestam as organizações sem fins lucrativos.

Afinal, para que servem as organizações do terceiro setor?

Responder a essa questão é tarefa mais complexa do que imagina quem observa o terceiro setor brasileiro à distância. Por um lado, é preciso considerar a enorme diversidade de organizações que o compõem, no que se refere a propósitos de existência, agendas políticas, estratégias de atuação e mesmo entendimentos a respeito tanto do papel da organização dentro do terceiro setor quanto deste como um todo. Reside aqui sua riqueza, uma vez que tal diversidade é resultado da efetivação dos direitos civis garantidos pela Constituição de 1988.

Por outro lado, deve-se observar a relação es-tabelecida entre o papel desempenhado pelas organizações e as expectativas e demandas de seus diferentes públicos de interesse – os cha-mados stakeholders. Ainda que as organizações

tenham lugar próprio na democracia, sua iden-tidade se dá nas relações estabelecidas com outros atores sociais, como Estado, mercado, imprensa e sociedade em geral. Não à toa, a percepção a respeito do papel a ser desempe-nhado pelo terceiro setor varia de acordo com o stakeholder, assim como fatores sócio-histó-ricos têm um peso importante nessa avaliação, conforme permite observar o breve panorama que desenhamos acima.

Resposta à diversidade

Diante de uma sociedade democrática cada vez mais complexa e dinâmica, a diversidade nas maneiras de organizar-se garante que deman-das distintas tenham um espaço de articulação condizente. Nesse sentido, as organizações sem fins lucrativos têm tarefa própria na cons-trução de um cenário de participação política no qual a exclusividade de um ou outro modelo de mobilização perdeu o sentido.

A crescente presença e atuação da sociedade civil e do denominado terceiro setor é o resultado concreto e mais visível da crescente insuficiên-cia dos partidos, enquanto detentores exclusivos da representação política de cidadãos. Não são mais. Ao lado do modelo clássico da democracia representativa, a sociedade começa a forjar [...] um sistema paralelo de participação direta.15

A complexidade social também justifica que um mesmo setor reúna organizações com os mais diversos propósitos. E cabe apontar: tais propó-sitos não são estanques. Mudanças no cenário exigem que as organizações se adaptem, cor-rendo o risco, caso contrário, de se tornarem obsoletas e distantes da realidade com a qual têm de dialogar – e exemplos históricos dessa transição não faltam.

As entidades assistenciais mais antigas, por exemplo, vão pouco a pouco transformando seus objetivos e suas formas de atuação, seja em função dos novos valores que passam a ser 15 Joaquim Falcão, “Transformação dos partidos e da

lei” (1993), em Democracia, direito e terceiro setor (Rio de Janeiro, Editora FGV, 2004), p. 26.

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socialmente difundidos, seja em função das organizações mais recentes. O discurso sofre uma mutação: de “assistir o mais carente” e “tirar a criança da rua” passa-se a pensar em termos de “educar para a cidadania”, “formar o indivíduo para a vida em sociedade”.16

Meios e fins

As organizações sem fins lucrativospodem ser de três tipos:

advocacy: dedicam-se à defesa de interesses de determinado grupo ou causa social, principalmente por meio de lobby;

organizações-meio: voltadas à criação e ao desenvolvimento da infraestrutura setorial, por meio de estratégias como a capacitação de outras entidades e movimentos sociais;

organizações-fim: prestam serviços a determinadas parcelas da sociedade em áreas diversas, como educação, saúde e geração de renda.

Tais categorias não são puras, mas sim um recurso analítico. Na prática, as funções se misturam e confundem.

A natureza das atividades de algumas organizações pode ser entrelaçada de um tal modo que não pode-mos usar um único tipo para classificá-las. A mesma organização trabalha prestando um serviço, monta sistemas de informações e especialização técnica sobre uma área específica de interesse social e é muito ativa em fazer lobby para a melhor participa-ção das pessoas na sua área de interesse.17

16 Simone de Castro Tavares Coelho, Terceiro setor: um estudo comparado entre Brasil e Estados Unidos (São Paulo, Senac, 2000), p. 192-3.

17 Marcos Kisil, “Organização social e desenvolvi-mento sustentável: projetos de base comunitária”, em Evelyn Ioschpe (org.), Terceiro setor: desenvol-vimento social sustentado (São Paulo, Paz e Terra, 1997), p. 143.

Cada uma dessas linhas estratégicas de atua-ção traz consigo um entendimento específico do papel a ser desempenhado pela organização. Nesse sentido, os resultados da pesquisa “Relação com o Estado na visão das ONGs: uma sociologia das percepções”, publicada em 2013 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Apli-cada (Ipea), são bastante ilustrativos. O estudo investigou as percepções de cinquenta dirigen-tes de organizações sem fins lucrativos no que se refere às relações entre Estado, mercado e sociedade civil no país. Um dos aspectos pes-quisados diz respeito à função das organizações em sua relação com a sociedade e o Estado.

“As quatro funções que tocam a relação entre ONGs e sociedade foram classificadas como ‘servir’, ‘articular’, ‘representar’ e ‘transformar’. A mais recorrente entre elas (também no con-junto de todos os critérios de autodefinição) foi ‘servir’.”18 No que se refere à relação com o Es-tado, as funções seriam “complementar” (res-posta preponderante), “substituir” e “fiscalizar”.

Servir x transformar

Dentre todas as funções identificadas pela pesquisa, duas costumam tomar o centro do debate, em uma dicotomia. A identidade do terceiro setor está nas organizações com atuação complementar ao Estado – as que “servem” – ou nas dedicadas a um papel de contraponto a ele – as que “transformam”? Ou, ainda, essa oposição é ou não uma falsa questão, ou seja, garantir o acesso a serviços públicos por parcelas marginalizadas da sociedade seria apenas “servir” ou também “transformar”?

Enquanto às primeiras cabe um papel de inter-venção direta nos problemas de uma dada rea-lidade, as últimas dedicam-se principalmente à proposição de um novo projeto de sociedade. Em comum, há a inevitabilidade da interlocu-ção com o Estado, seja para garantir o acesso a direitos, seja para pressionar por mudanças estruturais; seja para participar no desenho da 18 Fernando Lima Neto, “Relação com o Estado na

visão das ONGs: uma sociologia das percepções”, Texto para Discussão n. 1820, Brasília, Ipea, mar. 2013, p. 10. Disponível em: www.ipea.gov.br/por-tal/images/stories/PDFs/TDs/td_1820.pdf.

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implantação de projetos, planos e programas ou liderá-los, seja para exercer o controle social sobre tais ações.

Quando assumem o papel de prestadoras de serviços, as organizações são cobradas não só para que apresentem resultados concretos sobre as demandas específicas a que buscam atender, mas também para que tragam me-lhorias substantivas para o conjunto da socie-dade. E não se trata de responder apenas aos vazios deixados pela ausência de ação direta e efetiva do Estado, mas também às conse-quências do atual modelo econômico.

A primazia da economia e do mercado, junta-mente com a institucionalização dos meca-nismos democráticos, implica reconceituar o papel das ONGs e do “terceiro setor”. Sendo, a princípio, alternativas no campo da política, o interesse por elas cresce devido ao seu po-tencial papel funcional na economia. Surge, desta forma, o interesse de organismos como o Banco Mundial, o BID [Banco Interameri-cano de Desenvolvimento] e até de algumas empresas com relação ao papel que possam ter as organizações da sociedade civil, no sentido de aliviar a pobreza e os problemas sociais onde o mercado traz consigo.19

No entanto, o fato é que, mesmo que a orga-nização assuma para si tal responsabilidade, não cabe a ela ser substituta do poder público. Ao contrário do Estado, que deve garantir a universalidade de suas políticas, as organi-zações respondem a grupos específicos da sociedade. Acima de tudo, as entidades não têm capacidade nem orçamento para substi-tuir o Estado em suas atribuições. E cabe a pergunta: deveriam ter?

Se vamos pensar que o nosso papel é com-plementar ao Estado no sentido de atenção aos mais pobres, estamos recusando o es-paço público como espaço de geração de direitos; estamos recusando o papel dos ato-19 Andrés A. Thompson, “Do compromisso à

eficiência? Os caminhos do terceiro setor na América Latina”, em Evelyn Ioschpe (org.), Terceiro setor: desenvolvimento social sustentado, cit., p. 45.

res sociais da sociedade civil, esses protago-nistas da luta pelos direitos, como aqueles que podem influenciar não só a qualidade de vida, mas a superação dos problemas que são as bandeiras do tema da cooperação.20

Assim, independentemente da linha de atuação que a organização defina como a mais apropria-da para o cumprimento da sua missão – isto é, seja ela uma entidade dedicada ao advocacy, uma organização-meio ou uma organização-fim –, é essencial que tal atuação não seja despo-litizada em seus objetivos. Quando observamos a evolução do terceiro setor brasileiro, partindo de um forte aspecto caritativo até a posição de protagonista na luta por direitos, reduzi-lo ao en-tendimento de que as organizações são meros balcões de serviços enfraquece o potencial de transformação social que o setor carrega con-sigo. Em última instância, tal transformação é o propósito central das organizações compromis-sadas com o coletivo e mesmo dos princípios constitucionais que atribuem à cidadania um protagonismo vital em nossa democracia.

Que nome tem?

Os diferentes entendimentos a respeito da participação das organizações sem fins lucrativos na vida pública têm reflexo em uma questão de base: o nome atribuído a elas. Afinal, um título traz consigo uma série de significados implícitos. Ao conferi-lo a essa ou aquela entidade, cria-se uma delimitação a respeito de quem cabe nesse grupo, o que − como em toda classificação − implica dizer que as selecionadas compartilham características mínimas.

Nesse sentido, tendo em mente a diversidade do terceiro setor, não à toa as possibilidades são diversas: “Essa multiplicidade de denomi-nações apenas demonstra a falta de precisão 20 Silvio Caccia Bava, “Parcerias e alianças estratégi-

cas: relações com agências da cooperação interna-cional – debate”, em Plataforma Ibase II: as ONGs e o processo democrático no Brasil (Rio de Janeiro, Ibase/Finep, 1997), p. 100.

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conceitual, o que, por sua vez, revela a dificul-dade de enquadrar toda a diversidade de orga-nizações em parâmetros comuns”21.

Organizações da sociedade civil

O grupo mais amplo ao qual as organizações sem fins lucrativos costumam ser vinculadas é a sociedade civil. Presente já no século XVIII, com particular relevância para a filosofia política mo-derna, o conceito foi ressignificado no fim dos anos 1980, como estratégia de afirmação em um contexto político em transformação.

Recuperada no contexto das lutas pela demo-cratização, a ideia de sociedade civil serviu para destacar um espaço próprio, não governa-mental, de participação nas causas coletivas. Nela e por ela, indivíduos e instituições parti-culares exerceriam a sua cidadania, de forma direta e autônoma.22

No entanto, utilizar a expressão “sociedade civil” para referir-se especificamente às organizações sem fins lucrativos acaba por refletir uma ideia restrita a respeito do que a compõe. Em última instância, todas as instituições autônomas em relação ao Estado são “organizações da sociedade civil”, sejam elas organizações sem fins lucrativos ou empresas privadas, com as quais as primeiras têm pouca similaridade.

Aqui, seria proveitoso redefinir o que entende-mos por “sociedade civil” e deixar de considerar essa expressão como aplicável unicamente a um setor, o terceiro. Essa prática implica, de certa forma, que o setor empresarial está fora da so-ciedade civil e é, portanto, “não civil”.23

Organizações não governamentais ou sem fins lucrativos

De uso mais comum, esses dois títulos buscam 21 Simone de Castro Tavares Coelho, Terceiro setor: um

estudo comparado entre Brasil e Estados Unidos, cit., p. 58.22 Rubem César Fernandes, “O que é o terceiro se-

tor?”, em Evelyn Ioschpe (org.), Terceiro setor: desen-volvimento social sustentado, cit., p. 27.

23 Lester Salamon, “Estratégias para o fortalecimento do terceiro setor”, em ibidem, p. 108.

identificar determinadas entidades ao diferen-ciá-las de outras. Atuam, portanto, na chave da negação, seja em relação ao Estado – “não governamental” – ou ao mercado – “sem fins lucrativos”. Ainda aqui, cabe o apontamento de que não são denominações exclusivas às orga-nizações voltadas para fins públicos, uma vez que englobam instituições de interesse restrito, como igrejas e sindicatos.

O termo “organização não governamental” (ONG) advém da denominação em inglês non--governmental organization (NGO), criada nas Nações Unidas para referir-se, como vimos, às organizações dos países desenvolvidos volta-das a assessorar e financiar projetos sociais no Terceiro Mundo.

Chamou-se assim às organizações internacio-nais que, embora não representassem governos, pareciam significativas o bastante para justificar uma presença formal na ONU. [...] Por extensão, com a formulação de programas de cooperação internacional para o desenvolvimento estimula-dos pela ONU, nas décadas de 1960 e 1970, cresceram na Europa ocidental ONGs destina-das a promover projetos de desenvolvimento no Terceiro Mundo. Formulando ou buscando pro-jetos em âmbito não governamental, as ONGs europeias procuraram parceiros mundo afora e acabaram por fomentar o surgimento de ONGs nos continentes do hemisfério sul.24

Com o desenvolvimento dessas iniciativas locais nos países do Sul, gradualmente o termo passou a ser utilizado para referir-se não às organizações internacionais apoiadoras, mas às entidades na-cionais receptoras de tal auxílio. Em função do contexto autoritário dos anos 1970, estas tinham forte caráter político, com uma ideologia identifi-cada com a esquerda, o que acabou por marcar a sigla no país ao longo das décadas.

No Brasil, o termo ONG foi adotado por organizações de assessoria que, no final da década de 1960 e na de 1970, no contexto da ditadura, se dedicavam à educação popular junto a grupos de base, de forma 24 Rubem César Fernandes, “O que é o terceiro se-

tor?”, cit., p. 26.

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quase clandestina, e centros de defesa dos direitos humanos, tendo apoio de agências de cooperação internacional. Na década de 1980, essas organizações se alinharam às forças sociais que impulsionaram o processo de redemocratização, que culminou com o fim do período autoritário em 1985 e a “Constituição Cidadã” de 1988. Na década de 1990, elas proliferaram e passaram a assumir, cada vez mais, voz própria e protagonismo na arena política nacional.25

Atualmente, a sigla tem aplicação mais geral. É uti-lizada para referir-se a todo o universo não gover-namental, o que leva as organizações mais politiza-das, dedicadas à defesa e à promoção de direitos, a questionar a apropriação do termo. Dessa forma, por vezes, ONG é identificada como uma categoria interna ao terceiro setor, que distingue subtipos de organizações com ideários específicos em relação a um conjunto mais abrangente.

Tudo se tornou ONG: tanto a organização que trabalha em sustentação ao movimento social, quanto uma organização filantrópica tradicional; isso contribuiu para a estigmatização das organi-zações ligadas aos movimentos sociais, pois pas-saram a ser confundidas com outros tipos de or-ganizações que fazem parte do chamado universo das fundações e associações sem fins lucrativos, que possuem convênios ou outros tipos de con-tratos com o setor público, mas que tiveram sua atuação contestada por uma série de escândalos, de malversação de fundos e corrupção.26

Organizações do terceiro setor

O termo em inglês third sector foi cunhado por pesquisadores norte-americanos nos anos 1970, expandindo-se para a Europa na década seguinte. No Brasil, foi a partir dos anos 1990 que

25 Abong, “Abong 2010 a 2013”, cit., p. 8. 26 Articulação D3 Diálogos, Direitos e Democracia

e Centro de Estudos em Administração Pública e Governo da EAESP-FGV, “Apresentação e resumo executivo”, em “Pesquisa Arquitetura Institucional de Apoio às Organizações da Sociedade Civil no Brasil”, relatório final Eixo Cooperação Internacio-nal, São Paulo, fev. 2013, p. 13. Disponível em:

http://www.avina.net/por/wp-content/uploa-ds/2013/09/rf_eixo_coop_internac.pdf

a noção de um “terceiro setor” ganhou espaço, partindo não das próprias organizações, mas sim como um título atribuído de fora para dentro, incorporado ao vocabulário de stakeholders como o Estado.

Podemos ter escolhido mal a nossa identidade de ONGs ou o nome ONG, mas esta é uma identidade construída. Enquanto terceiro setor é uma identidade que nos está sendo outorgada. [...] Ainda que nos tirem do baú sem fundo das entidades sem fins lucrativos, onde entram Golden Cross, universidades privadas, entidades particulares etc., o Estado delimita o que entende de organizações da sociedade civil com fim público e chama isso de terceiro setor.27

Nomear um terceiro setor significa identificar, pela lógica, um primeiro e um segundo: o Estado e o mercado, respectivamente. Aqui, não se trata de focar a negação, mas sim a inevitável relação entre tais setores. Às organizações do terceiro setor caberiam características que não têm espaço nos outros dois, como uma flexibilidade em relação à burocracia estatal e a promoção da equidade em relação ao mercado.

Recorremos hoje à expressão terceiro setor para distingui-lo do primeiro, que é o setor público, e do segundo, representado pelas atividades lucrativas. Com essa denominação, queremos também enfatizar o caráter autônomo e inédito desse algo novo que está mudando a sociedade e que se define por não ser nem governo nem empresa, por não querer submeter-se nem à lógica do mercado nem à lógica governamental.28

Cabe a cada uma dessas três esferas articular de maneira específica os recursos disponíveis em função dos fins vislumbrados: recursos públicos para fins públicos, no caso do Estado; recursos privados para fins privados, no caso do mercado; e recursos privados para fins públicos,

27 Jorge Eduardo Saavedra Durão, “Parcerias e alian-ças estratégicas: construção de redes, fóruns e pla-taformas – debate”, Plataforma Ibase II: as ONGs e o processo democrático no Brasil, cit., p. 47.

28 Ruth Cardoso, “Fortalecimento da sociedade civil”, em Evelyn Ioschpe (org.), Terceiro setor: desenvolvimento social sustentado, cit., p. 8.

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no caso do terceiro setor. Como se vê, no entanto, os setores compartilham fontes de financiamento e/ou públicos-alvo, marcando uma relação que nem sempre se pauta pela complementaridade.

A verdade é que a distinção entre os setores tem sido, nas últimas décadas, borrada pela intensa interação entre eles, sendo que nessa relação está presente tanto a cooperação como a competição. Entendemos por competição a situação em que o mesmo tipo de serviço é oferecido por organizações em diferentes setores, que disputam não apenas a clientela como principalmente os recursos existentes.29

Por fim, vale apontar uma discussão que a expressão “terceiro setor” levanta: “a ideia de ‘setor’ é abrangente, tendendo à homogeneização, diluição ou ocultação de diferenças que podem ser social e politicamente significativas, segundo os contextos e critérios de análise”30. Mais uma vez, a diversidade das organizações sem fins lucrativos vem à tona. Quais as possíveis consequências de incluir em um mesmo setor desde organizações de base até filantropias empresariais? De que maneira isso afeta aspectos como a articulação efetiva desse coletivo, essencial para seu fortalecimento político? São questões pertinentes, que não devemos perder de vista.

O que diz a lei brasileira

Ainda que todas essas denominações sejam de uso frequente, nenhuma delas está prevista na legislação brasileira. Para além dos nomes fantasia – ou seja, a designação utilizada pela organização perante o público –, juridicamente existem apenas duas formas possíveis de registro: associação civil (ou sociedade civil sem fins lucrativos) e fundação.

Na associação civil, indivíduos unem esforços em torno de um objetivo comum que não visa o lucro. Já a fundação destina um patrimônio público ou

29 Simone de Castro Tavares Coelho, Terceiro setor: um estudo comparado entre Brasil e Estados Unidos, cit., p. 40.

30 Leilah Landim e Neide Beres, Ocupações, despesas e recursos: as organizações sem fins lucrativos no Brasil (Rio de Janeiro, Nau, 1999), p. 9.

privado a um interesse social. A existência dessas duas formas não é aleatória: “correspondem a duas manifestações típicas do chamado ‘espírito comunitário’, razão de ser do terceiro setor: o associar e o dar”31. Podem ser entendidas também pela chave do financiamento: quando há um capital inicial que garanta a sustentabilidade financeira da organização, esta é instituída como fundação; caso contrário, a configuração de associação civil é mais apropriada.

Nem toda associação dedica-se a um interesse coletivo, mesmo que seja sem fins lucrativos: clubes de colecionadores, por exemplo, agregam indivíduos em torno de um mesmo objetivo, mas não visam um benefício público. Da mesma forma, é importante esclarecer que, uma vez instituída uma fundação, o patrimônio que a compõe deixa de pertencer ao seu instituidor e passa a destinar-se à coletividade – torna-se, assim, propriedade pública, o que não significa dizer que passa a compor o patrimônio estatal.

Nomear é também um ato político

Claro está que estabelecer uma designação que dê conta das especificidades das organizações dedicadas à transformação social é tarefa árdua, sujeita às mudanças históricas do setor. No entanto, há uma preocupação constante, comum a todas essas possibilidades: o entendimento de que o nome traz consigo significados tácitos.

[...] esses termos não são neutros – terceiro setor, por exemplo, é ideia fundamentalmente construída em contexto norte-americano e chega aqui importada (como ONG chegou), carregada de pressupostos e conotações que merecem mediações e retraduções para sua operação mais efetiva, teórica e prática, no contexto da sociedade brasileira. Transformações, termos e fenômenos novos nesse campo dinâmico de mobilizações, interações e parcerias não se dão em tábula rasa.32

31 Joaquim Falcão, “Diretrizes para uma nova legisla-ção do terceiro setor” (1999), em Democracia, direito e terceiro setor, cit., p. 169.

32 Leilah Landim, “Desenvolvimento social susten-tado”, cit., p. 55.

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Para um setor que vê seus pressupostos em constante disputa e questionamento – e que nem mesmo se reconhece ou atua enquanto se-tor organizado e consolidado, em determinados cenários –, o nome que lhe é atribuído, por si ou por outros, não é apenas uma questão de base, mas também uma questão política.

O que caracteriza uma organização do terceiro setor?

Se temos chamado a atenção até aqui à diversidade que marca a composição do terceiro setor brasileiro e suas consequências, é necessário nos dedicarmos ao outro lado: quais são as similaridades possíveis que nos permitiriam agrupar diferentes organizações em torno de uma mesma denominação? Em meio a tanta multiplicidade, é possível identificar características comuns?

Não é a homogeneidade que caracteriza o setor. Ao contrário, é sua histórica e crescente heterogeneidade. Heterogeneidade de forma jurídica, de áreas e modos de atuação, de tempo de criação, de gestores, de clientes e público-alvo. Não é a unidade, mas a diversidade que o caracteriza.33

Os cinco critérios internacionais

Nos anos 1990, o professor Lester Salamon, vinculado à Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, dedicou-se à definição de cinco critérios que permitiriam identificar as organizações sem fins lucrativos, com o objetivo final de quantificar a contribuição de tais entidades para o produto interno bruto (PIB) das nações. Esse trabalho originou o manual Handbook on Nonprofit Institutions in the System of National Accounts, desenvolvido em parceria com as Nações Unidas. Nele, é estabelecido um método que permite contabilizar, a partir da metodologia já existente de cálculo do PIB, a participação do terceiro setor no resultado 33 Joaquim Falcão, “Diretrizes para uma nova legisla-

ção do terceiro setor”, cit., p. 168.

econômico dos países-membros da ONU. Dessa forma, obtêm-se referências comparáveis internacionalmente.

No Brasil, essas diretrizes norteiam a definição das organizações mapeadas na pesquisa “As fundações privadas e associações sem fins lucrativos no Brasil”, conhecida como Fasfil34. O documento é a base de dados pública mais sólida sobre o setor social brasileiro, motivo pelo qual é a maior referência para a análise da sociedade civil organizada local. No entanto, as informações a respeito da contribuição de tais organizações para o PIB do Brasil seguem indefinidas, uma vez que a adesão do governo a esse cálculo é eletiva.

Segundo os cinco critérios, as organizações sem fins lucrativos, simultaneamente:

são instituições formalmente constituídas;

estão localizadas fora do aparato formal do Estado;

não distribuem lucros entre seus sócios;

são autogovernadas;

mobilizam um nível significativo de partici- pação voluntária, seja porque se engajar em sua constituição é uma decisão livre de seus fundadores, seja por possuírem em seus quadros um corpo de voluntários.

Ainda segundo Salamon, “o que singulariza o terceiro setor é o fato de encarnar certos valores que nos são caros”35. São esses valores, como altruísmo e compaixão, que diferenciam sua atuação em relação a outros setores que poderiam dedicar-se aos mesmos temas e serviços. Subjacentes a isso, há duas noções principais. Por um lado, os indivíduos têm “capacidade e obrigação de agir por autoridade 34 A Fasfil é realizada por Abong, GIFE, Ipea, IBGE

(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e Secretaria-Geral da Presidência da República. Já teve três edições: 2002, 2005 e 2010. Os três docu-mentos estão disponíveis para download em www.ibge.gov.br/.

35 Lester Salamon, “Estratégias para o fortalecimento do terceiro setor”, cit., p. 92.

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própria a fim de melhorar suas vidas e a dos outros”, o que o autor resume como iniciativa individual; por outro, “as pessoas têm obrigações em relação não apenas a si próprias, mas também ao próximo e às sociedades maiores de que são parte”, noção de solidariedade que “torna a ação organizada e voluntária ainda mais importante que a individual”.

Pode-se, pois, dizer que o terceiro setor é, em primeiro lugar, um conjunto de instituições que encarnam os valores da solidariedade e os valores da iniciativa individual em prol do bem público. Isso não significa que tais valores não sejam evidentes também em outros domínios, mas sim que no Terceiro Setor eles alcançam a plenitude.36

Amadorismo x profissionalização

Na década de 1990, a participação de voluntários nas organizações – um dos cinco critérios – constituía-se de fato em uma de suas características centrais, em um momento em que a profissionalização era um esforço que ainda começava a ganhar força no terceiro setor.

No Brasil, datam desse momento iniciativas como o programa Voluntários, de responsabilidade da Comunidade Solidária, criado em 1996. Seu objeti-vo era propor uma “nova cultura de voluntariado”, que ainda operava de maneira informal. Dois anos depois, foi promulgada a Lei do Trabalho Voluntário (Lei no 9.608), que regulamenta e dá contornos profissionais à atividade, visando evitar problemas trabalhistas entre as partes envolvidas.

O voluntariado tradicional, das ações de simples as-sistência aos “mais necessitados”, e baseado fun-damentalmente nos valores religiosos da caridade e no antigo paradigma da assistência social, vem mudando na direção à construção da cidadania pela defesa de direitos. Observa-se um progressivo esgotamento dos modelos antigos, isto é, de ações justificadas apenas pela boa vontade e de traba-lhos fundamentados só em motivos pessoais.37

36 Idem. 37 Monica Corullón, “Voluntariado: estímulo e for-

mação 30 de março de 1999”, em Fórum permanente do terceiro setor: 1ª coletânea de artigos, cit., p. 88.

A forte presença do voluntariado nas organiza-ções sem fins lucrativos foi um dos fatores para que se associasse a elas uma característica não muito lisonjeira: o amadorismo. Havia o enten-dimento de que um quadro voluntário teria bai-xo nível de comprometimento com o trabalho. Além disso, a proibição de se remunerarem os dirigentes das organizações contribuía para difi-cultar sua profissionalização, o que foi alterado pela Lei das Oscips.

Com espaços crescentes de articulação e de-manda de trabalho, é natural que as organiza-ções se deparassem com a necessidade de se preocupar não só com a qualidade de sua ativi-dade-fim, mas também com sua própria gestão. Visando aprimorá-la, conceitos até então vistos como exclusivos do mundo empresarial passa-ram a ser parte constante do universo do ter-ceiro setor. O fato é que as organizações envol-vem uma complexidade pouco reconhecida por quem não está familiarizado com seu cotidiano.

Mesmo uma pequena organização do terceiro setor apresenta uma complexidade de proces-sos organizacionais que supera a das empresas de mercado: prestação de serviços a públicos muito diversos, dependência por tipos e fontes de recursos diferentes, uso de voluntários, rela-cionamentos com atores sociais dos mais diver-sos, entre outros.38

Com a profissionalização e o consequente forta-lecimento do setor, as organizações passaram a ser vistas como uma opção viável de trabalho remunerado. Segundo dados da pesquisa Fas-fil 2010, tais organizações empregam 2,1 mi-lhões de pessoas, o que representa 4,9% dos trabalhadores brasileiros. Somente entre 2006 a 2010, foram criados cerca de 293 mil postos de trabalho. No entanto, em 72% das entidades não há nenhum empregado formali-zado. O que os dados da pesquisa mostram é que as vagas de emprego são mal distribuídas 38 Andres Pablo Falconer, “O terceiro setor como

mercado de trabalho” (29 de fevereiro de 2000), em Fórum permanente do terceiro setor: 2ª coletânea de artigos (julho de 1999-julho de 2000) (São Paulo, Se-nac, 2000), p. 58-9.

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– 1,2% das entidades respondem por mais de 60% do pessoal assalariado – e geograficamen-te concentradas – 58% dos trabalhadores estão em entidades localizadas no Sudeste, dos quais 35% em São Paulo.

Esses números podem ser lidos, por um lado, como indicativo de que os esforços governa-mentais de descentralização da riqueza no país, historicamente concentrada na região Sudeste, não estão tendo o efeito esperado. Por outro, como mais um sinal do cenário de dificuldades que as organizações sem fins lucrativos têm enfrentado no que se refere à sua sustentabili-dade financeira, o que, como veremos adiante, impacta na (ou mesmo inviabiliza a) sua capaci-dade de contratação adequada.

No que diz respeito à remuneração, a pesqui-sa aponta uma média de 3,3 salários mínimos mensais (R$ 1.667,05), o que significa uma movimentação de R$ 46 bilhões. Há dife-renças regionais: o Sudeste oferece o maior salário e o Nordeste, o menor. Além disso, repete-se a diferença de remuneração entre gêneros que se vê no conjunto do mercado. A remuneração média das mulheres equivale a 75% da remuneração média dos homens, em todas as regiões. Ainda assim, as mulheres são maioria no setor, em todo o país, respon-dendo por 62% da mão de obra.

Profissão x militância

A profissionalização das organizações teve im-pacto também na qualificação de sua mão de obra, viabilizada por fatores como a crescente oferta de formação acadêmica específica para gestores do terceiro setor. Ainda segundo a Fasfil 2010, 33% dos assalariados das orga-nizações têm nível superior. Cada vez mais, o setor atrai profissionais que veem nele uma alternativa de carreira.

No entanto, mais do que à qualidade técnica, os trabalhadores do terceiro setor têm a imagem associada a valores. Entende-se que optar pela atuação em uma organização sem fins lucrati-

vos envolve motivações diferentes daquelas de uma carreira no setor privado. Seu compromis-so não é com a realização financeira, mas com os propósitos da organização.

O interesse no terceiro setor como nova alternati-va de emprego parece advir também da perda de sentido do trabalho em empresas convencionais – bancos, corretoras, indústria, comércio – para muitos jovens, e da necessidade de realização profissional a partir de um trabalho que não só supra necessidades materiais, como outras aspi-rações e anseios baseados em valores sociais.39

O social no centro

Essa visão do trabalhador comprometido com o bem público reflete o que pode ser conside-rada a principal característica comum às orga-nizações sem fins lucrativos: o entendimento de que o compromisso com o social é seu prin-cipal alicerce.

Se existe um ponto em comum nas organizações da sociedade civil ou no “terceiro setor” é o de colocar no centro do cenário o social, as pesso-as. Se a política se estrutura cada vez mais ao redor do poder e a economia em relação ao lu-cro, o espaço comum do “terceiro setor” são as necessidades humanas, uma certa utopia com relação ao social.40

No entanto, a atribuição a priori de uma espécie de “boa índole” natural a todas as organizações é não só irreal, mas também perigosa. Irreal por-que as organizações estão postas na sociedade, e não acima dela – são, portanto, suscetíveis a desvios de comportamento, como organizações de todo e qualquer setor; perigosa porque acaba por abrir espaço para apropriações indevidas do seu universo, como mostram os escândalos en-volvendo organizações de fachada. O compro-misso com valores não é um dado natural, mas uma construção cotidiana.

A ideia que quero destacar é que a sociedade

39 Ibidem, p. 57-8.40 Andrés A. Thompson, “Do compromisso à efici-

ência?”, cit., p. 47.

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civil vale tanto quanto vale a sociedade, da mes-ma forma que o governo. Não há anjos ou demô-nios, e a reflexão nessa área requer o abandono da postura maniqueísta que tem caracterizado o debate e que trata as organizações da socieda-de civil como a tradução angelical de espíritos isentos aos jogos de interesses. A ética política é respeitada ou não, tanto em setores da socie-dade civil quando do Estado.41

Representatividade construída

Há, por fim, uma derradeira característica co-mum às organizações, que marca uma especi-ficidade do setor: o fato de que a organização sem fins lucrativos é autodeclaratória em sua representatividade.

Não advém do voto a legitimidade das ONGs, das múltiplas associações, confederações, enti-dades e cidadãos que participam destes. Advém de seu compromisso com a causa pública. Ad-vém da representatividade de seu objeto, de sua ação, de sua proposta, do caráter público nem lucrativo, nem corporativo, de sua finalidade. Não é o voto quem legitima uma ONG de direitos humanos ou de defesa do meio ambiente. É a crescente adesão popular a ambos os temas.42

A legitimidade de uma organização sem fins lucrativos só pode ser atribuída de fora para dentro, e cabe à organização construí-la; tam-bém não é perene, mas sim material frágil que pode ser danificado. Se a entidade não é reconhecida enquanto ator legítimo pela sociedade – em nome de quem diz atuar –, perde relevância. Em momentos de ataque generalizado ao setor, o que mais pode con-tribuir em sua defesa do que a legitimidade construída pelas organizações perante aque-les a quem respondem diretamente?

Aqui reside um desafio para o terceiro setor:

41 Fúlvia Rosemberg, “Sociedade civil como parcei-ra do Estado na prestação de serviços”, em Hebe Signorini Gonçalves (org.), Organizações não gover-namentais: solução ou problema?, cit., p. 105-6.

42 Joaquim Falcão, “A democracia concomitante” (2001), em Democracia, direito e Terceiro Setor, cit., p. 87.

para que seu poder seja eficaz e alcance os objetivos a que se propõe, não basta que afir-me exercê-lo em nome do bem da sociedade. É fundamental que seja percebido pela própria so-ciedade – por seus públicos-alvo e pela opinião pública – como um bem, como um ator que age em seu benefício. É necessário que as pessoas acreditem na sua legitimidade. O terceiro setor precisa da aceitação e do apoio da sociedade.43

Capital: o financiamento das organizações do terceiro setor brasileiro

Para que uma organização sem fins lucrativos consiga desenvolver um trabalho sólido, em lon-go prazo, que lhe permita cumprir sua missão e ser reconhecida enquanto força cívica por seus stakeholders, um instrumento central apresen-ta-se nessa equação: dinheiro.

Ao contrário das empresas privadas, que têm como principal motivação gerar lucro, para as organizações sem fins lucrativos dinheiro é meio, não fim. E não se trata de “qualquer” dinheiro. No terceiro setor, cujo trabalho dialoga diretamente com interesses sociais e políticos, a independên-cia e a lisura de sua atuação são fatores que não podem ser ignorados, para não se correr o risco de colocar à prova a legitimidade da organização. Dessa forma, conflitos de interesse e perda de autonomia são preocupações constantes, o que torna o debate sobre as possíveis fontes de finan-ciamento do setor ainda mais complexo.

Financiamento público

O entendimento de que o acesso a recursos pú-blicos é um direito da sociedade civil organiza-da não é tão recente quanto se pensa (e ainda hoje não é consenso, como mostra o editorial do Estado de S. Paulo citado). Não se trata de defender que o Estado responsabilize-se inte-gralmente pelo financiamento das organizações,

43 Carlos Cuenca, “Terceiro Setor: regulamentação e legitimidade 28 de julho de 1998”, em Fórum per-manente do terceiro setor: 1ª coletânea de artigos, cit., p. 22.

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o que afetaria tanto sua autonomia quanto sua sustentabilidade, ao gerar dependência de uma única fonte. Trata-se, em última instância, do tipo de participação da sociedade civil que se quer estimular na democracia brasileira.

Durante a década de 1980 e meados da década de 1990, havia um questionamento da legitimi-dade com relação a esse acesso [aos recursos públicos]. Hoje, essa legitimidade não só é asse-gurada, como a luta é para que ela se efetive em políticas claras e democráticas. De um dilema nos discursos e ações das ONGs, o acesso aos recursos públicos se transforma em um direito.44

Para além de valores republicanos, o Estado possui razões econômicas para apoiar essa participação. Com a crescente atuação das organizações na prestação de serviços para parcelas da sociedade, se elas deixarem de dedicar-se a essa tarefa, caberá ao Estado fazê-lo – o que envolve não só custos, mas também capacidade operacional e capilaridade, dois atributos que o Estado não possui, apesar de ter recursos para tal.

Além disso, não é verdade que o volume trans-ferido é um peso para o orçamento público. Segundo a pesquisa “Transferências federais a entidades privadas sem fins lucrativos (1999-2010)”, realizada pelo Ipea em 2011, ainda que o volume de recursos repassados pela União para tais entidades tenha dobrado entre 1999 e 2010 – partindo de R$ 2,2 bilhões, no segundo mandato de FHC, para R$ 4 bilhões, no fim do governo Lula –, estes representam no máximo 2,5% do total de transferências obrigatórias e voluntárias feitas pelo governo. Em 2010, os citados R$ 4 bilhões representaram 0,48% do PIB do país.

Quando se observa as organizações beneficiárias desse valor, os dados da pesquisa deixam claro como os recursos são concentrados. Houve queda no número de organizações receptoras: de 4.898, em 2006, para 3.342, em 2010. No que se refere à área temática, 42% 44 Abong, Sustentabilidade das ONGs no Brasil: acesso a

recursos privados (Rio de Janeiro, Abong, 2010), p. 25. Disponível em: www.abong.org.br/download.php?id=682.

dos recursos transferidos entre 2000 e 2010 foram para entidades dedicadas a ciência, tecnologia e saúde. Chama mais atenção o tipo de organização beneficiada: o valor destinado às fundações privadas concentra, em média, um terço das transferências realizadas (exceto em 2008), valor que se deve principalmente aos recursos para fundações de pesquisa – organizações cujo trabalho, de grande mérito e relevância, tem natureza bem diversa das organizações sem fins lucrativos tradicionais.

Já para as organizações sem fins lucrativos, a relação com o Estado é “uma via de mão dupla”. É o que conclui o já citado estudo “Relação com o Estado na visão das ONGs”: se, por um lado, esse relacionamento “representa a possibilidade de se estabelecer uma parceria estratégica que potencializa os resultados das ONGs”, por outro, “traz simultaneamente uma série de obstáculos e impedimentos burocráticos que comprometem a autonomia destas instituições”45.

Na visão dos entrevistados, os recursos provenientes de parcerias com o Estado tornam possível a ampliação do público-alvo, a diversificação de serviços e objetivos perseguidos pela entidade e, até mesmo, influenciar políticas públicas. Contudo, estas vantagens em potencial implicam um conjunto de dificuldades administrativas que, muitas vezes, influencia negativamente a execução dos projetos das ONGs. A falta de continuidade na provisão de recursos e a burocracia são apontadas como empecilhos comuns neste tipo de parceria.46

De fato, esse relacionamento é permeado por desafios. Questiona-se seu impacto na autonomia das organizações, uma vez que, ao selecionar quais causas ou organizações apoiar, o Estado passa a ter controle sobre a agenda do setor. Além disso, a burocracia excessiva exige das organizações uma estrutura digna de grandes instituições. Para organizações de menor porte, o acesso a recursos públicos torna-se inviável. Já para aquelas com condições de adaptar-se a tais exigências, a necessidade de contratação 45 Fernando Lima Neto, “Relação com o Estado na

visão das ONGs”, cit., p. 5.46 Ibidem, p. 8.

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de novos quadros, como um profissional da área administrativa com dedicação exclusiva a essa parceria ou mesmo um advogado, leva ao inchaço de sua estrutura. E vale perguntar: toda essa burocracia tem sido efetiva para reprimir desvios?

Nesse sentido, outro fator tem de ser considerado. A legislação brasileira que regula o relacionamento entre Estado e sociedade civil é dispersa e confusa. Há uma pluralidade de qualificações e tratamentos, o que gera insegurança jurídica. Não raro, organizações tornam-se inadimplentes não por má-fé, mas como reflexo da dificuldade de atender a requisitos cada vez mais complexos e da ausência de uma legislação clara e consolidada. É o caso, por exemplo, de organizações que se relacionam com mais de um ministério, os quais muitas vezes possuem regras diferentes ou mesmo contraditórias entre si.

Atualmente, existem quatro formas principais de contratualização entre Estado e organizações sem fins lucrativos, aplicadas de acordo com a natureza da organização:

termos de parceria, voltados para Oscips;

contratos de gestão, com foco em OSs;

convênios e contratos de repasse, aplicá- veis a organizações sem nenhuma das titulações acima.

A administração de tais instrumentos cabe ao Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse (Siconv), do Governo Federal, portal eletrônico aberto à consulta pública que reúne os procedimentos de seleção, formalização, execução, acompanhamento e prestação de contas dos contratos. Importante enquanto esforço de construção de uma ferramenta de transparência, o Siconv é um sistema demasiadamente complexo, o que acaba por ter sobre as organizações os impactos que discutimos acima.

Para além desses quatro instrumentos jurídicos, há ainda as emendas parlamentares, que permitem o repasse direto para organizações previamente selecionadas, e os editais, por meio

dos quais órgãos públicos lançam chamadas por projetos em áreas temáticas específicas. Entre todas as formas, o convênio é a predominante. Segundo dados do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, entre janeiro e junho de 2013, foram firmados 853 convênios entre a União e organizações sem fins lucrativos, contra 93 contratos de repasse e 11 termos de parceria. Ainda assim, os convênios são alvo frequente de críticas, principalmente pela falta de controle sobre os critérios de contratação do Estado.

Pouco adianta impor mais e mais regras às entidades se o agente público segue tendo ampla liberdade de escolher quem bem lhe apraz para receber recursos governamentais. Com isso, punem-se os bons com a sobrecarga burocrática, e deixa-se impune o mau, que pegou o recurso e deu-lhe cabo sozinho, ou, pior, dividindo com o agente público mal-intencionado. Sabemos que o excesso de controles burocráticos tem sido notoriamente ineficaz.47

Outra forma que o Estado possui para apoiar o terceiro setor é por meio de uma legislação tributária que estimule seu financiamento, com medidas como isenções de impostos e incentivos fiscais.

O Estado pode fomentar o terceiro setor de duas maneiras principais: através de transferências diretas de recursos, em convênios e contratos, seja em forma de doações, seja de prestações de serviço, ou indiretamente, através de isenções de impostos e incentivos fiscais. No primeiro caso o Estado paga à entidade que ele escolheu. No segundo, deixa de arrecadar impostos através de renúncia fiscal; ele nem toca no dinheiro. Nas isenções, ele abre mão do dinheiro que seria usado para pagar os impostos, que fica com a própria entidade. Nos incentivos fiscais, o Estado deixa de arrecadar uma parcela dos impostos, que é doada pelo contribuinte a uma entidade. Ou seja, quem escolhe para onde e para quem e quando vai o dinheiro é o contribuinte. Não é o Estado.48

47 Eduardo Szazi, “Cooperação entre Estado e socie-dade civil”, Estado de S. Paulo, 8 dez. 2011.

48 Joaquim Falcão, “Diretrizes para uma nova legisla-ção do Terceiro Setor”, cit., p. 156.

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Na prática, no entanto, o que se tem é um sis-tema tributário confuso, que acaba por desesti-mular doações de pessoas físicas e jurídicas. Si-tuação oposta ao que se vê nos Estados Unidos, por exemplo, onde a filantropia é respaldada e estimulada pela legislação.

As críticas crescentes às dificuldades enfrenta-das pelas organizações para acessar recursos pú-blicos têm estimulado a proposição de alternati-vas. Como já discutido, os esforços de articulação da Plataforma por um Novo Marco Regulatório para as Organizações da Sociedade Civil e do gru-po de trabalho estabelecido em 2011 resultaram em um novo instrumento de contratualização, o Termo de Fomento e Colaboração. Da mesma forma, está posta a discussão a respeito de um fundo público para a participação social, bandeira levantada pelas organizações já nos anos 1990: “[fundos públicos] seriam formas mais transpa-rentes de financiamento. Porque o financiamento direto é extremamente perigoso”49.

Financiamento privado

Como vimos, foi a partir da década de 1990 que a iniciativa privada passou a envolver-se com mais fôlego nos temas sociais do país. De lá para cá, ganhou força o entendimento de que as empresas têm responsabilidades perante seus stakeholders, em função dos impactos de sua atuação, sejam eles ambientais, sociais ou econômicos. Com consumidores cada vez mais críticos, torna-se fundamental uma postura pró-ativa – não à toa, cerca de 60% das empresas brasileiras possuem alguma atuação social, de acordo com dados do Ipea, de 2006.

Ao longo dos anos, a iniciativa privada evoluiu de uma postura assistencialista, baseada em doações com foco em curto prazo, que não consideravam as prioridades do beneficiário, até o investimento social privado que hoje pauta sua atuação. Nesse sentido, cabe 49 Cândido Grzybowski, “Parcerias e alianças estra-

tégicas: relações com governos e órgãos multila-terais”, em Plataforma Ibase II: as ONGs e o processo democrático no Brasil, cit., p. 62.

retomar aqui a importância do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social e do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE) para o setor social brasileiro.

O Instituto Ethos – que hoje conta com um quadro de 1.523 associados, dos quais 54% com sede em São Paulo50 – foi responsável por introduzir nas empresas do país o conceito de responsabilidade social empresarial, “forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona”51. Trata-se de incorporar às práticas de negócio da empresa o compromisso com o desenvolvimento sustentável da sociedade – ou seja, o foco é interno, em sua própria gestão.

Já o GIFE propõe um novo olhar para as relações externas da empresa. O grupo advoga a ideia de um “repasse voluntário de recursos privados de forma planejada, monitorada e sistemática para projetos sociais, ambientais e culturais de interesse público”52, a que se denominou investimento social privado. Ao propor a adoção de conceitos como foco e planejamento para a ação social das empresas, o GIFE aproximou os universos do segundo e do terceiro setor. Atualmente, possui cerca de 140 associados, que investem aproximadamente R$ 2 bilhões por ano.

Uma vez colocada para as empresas a necessidade de envolver-se de maneira mais efetiva no cenário social, o apoio às organizações sem fins lucrativos desenhou-se como uma estratégia eficiente. Para a iniciativa privada, é uma forma de responder à pressão social sem que seja necessário construir uma estrutura interna dedicada ao desenvolvimento de projetos e programas. É também uma maneira de manter o público interno motivado 50 Informações disponíveis no site da instituição, re-

lativas a 12 de julho de 2013.51 Instituto Ethos, “Perguntas frequentes”. Disponí-

vel em: www.uniethos.org.br/DesktopDefault.aspx?TabID=3344&Alias=ethos&Lang=pt-BR.

52 GIFE, “O investimento social privado”. Disponí-vel em: www.gife.org.br/ogife_investimento_so-cial_privado.asp.

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diante do compromisso da empresa com o bem público. E é, acima de tudo, um caminho efetivo para a construção de legitimidade perante o consumidor, uma forma de agregar valor à sua imagem e, assim, destacar-se em um mercado cada vez mais competitivo.

Para as organizações sem fins lucrativos, essa relação também traz vantagens. Há menos burocracia envolvida do que em relação à parceria com o Estado e os recursos costumam ser repassados dentro de prazos mais fixos, o que é essencial para a saúde financeira da organização. Além disso, a própria comunicação se estabelece de maneira mais fácil entre as partes envolvidas do que com o poder público.

Mas há desafios importantes. O primeiro deles: como chegar até a iniciativa privada? Os institutos, fundações e empresas são cada vez menos acessíveis para organizações sem fins lucrativos de pequeno porte, localizadas fora dos grandes centros ou dedicadas a áreas temáticas pouco populares, o que torna a distribuição desses recursos menos democrática do que se esperaria. Exemplo disso é a concentração do investimento social realizado pelas entidades que compõem o GIFE: de 100 associados ouvidos pelo Censo GIFE 2011-2012, 91 aplicam recursos na região Sudeste, enquanto apenas 50 o fazem na região Norte.

Outra observação importante é que a grande maioria das formas de relação com os fundos privados nacionais se estabelece não a partir de uma busca ativa, mas sim a partir da ação dos próprios fundos ou de conhecimentos pessoais prévios, muitas vezes com a mediação de terceiros.53

Além disso, são poucos os investidores privados compromissados com um apoio à organização em longo prazo. Em geral, o financiamento é referente a doze meses, de maneira a responder ao orçamento anual da empresa. Fica clara a dificuldade da iniciativa privada de trabalhar em consonância com as especificidades do setor social, que envolve um tempo diferente 53 Abong, Sustentabilidade das ONGs no Brasil, cit., p. 43.

do segundo setor para efetivar-se. Essa lógica imediatista acaba por exigir da organização que fragmente sua ação, impacto que parece ser mais fácil de compreender quando fazemos um paralelo com a realidade empresarial:

Imagine que você é um empresário dirigindo uma rede de cafés e pretende levantar capital para abrir novos pontos de comércio. Você conhece um po-tencial investidor, que diz: “Eu adoraria financiar seu negócio, mas apenas a operação de chai latte [tipo de bebida], não café, e apenas para apoiar as bebidas que você vender em Cleveland no ano que vem”. Pode parecer absurdo, mas é esse o tipo de coisa que as pessoas que dirigem organizações sem fins lucrativos ouvem o tempo todo. Seja se oferecem moradia, ou educação pré-escolar, ou formação de mão de obra, as organizações sociais normalmente veem seu financiamento restrito a programas, locais e prazos específicos.54

O que se observa é uma mudança no tipo de relacionamento estabelecido entre financiador privado e organização. Com o objetivo de atender à necessidade de prestação de contas em curto prazo, que prioriza dados quantitativos em detrimento dos qualitativos, a relação ganha um tom instrumental. Há um anuviamento das fronteiras entre doação e prestação de serviços: financiadores declaram realizar aportes de recursos livres quando, na realidade, contratam organizações para operar seus próprios projetos. Torna-se cada vez mais raro o investimento no protagonismo e no fortalecimento da organização 54 David Bornstein, “For Ambitious Nonprofits,

Capital to Grow”, The New York Times, 27 jun. 2012. Disponível em: opinionator.blogs.nytimes.com/2012/06/27/fixes/?_php=true&_type=blogs&_r=0. O trecho é uma tradução livre da seguinte versão original: “Imagine that you’re an entrepreneur running a chain of coffee bars and you want to raise capital to open up in new locations. You meet a potential investor, and he says, ‘I’d love to finance your business, but only the chai latte operation, not the coffee, and only to support drinks you sell in Cleveland next year’. It might sound absurd, but this is the kind of thing that people running nonprofit organizations hear all the time. Whether they are providing housing or preschool or vocational training services, social organizations typically find their funding restricted to specific programs, locations and time frames”.

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enquanto instituição, em nome do apoio restrito a projetos pontuais.

No caso de grande parte das experiências das organizações com os fundos privados nacionais, nenhuma delas relata ter utilizado a forma an-teriormente definida como “financiamento insti-tucional”. Ao contrário, há inúmeras restrições, e mesmo insuficiências, na possibilidade de uso dos recursos para os denominados gastos insti-tucionais. Ora, não há como realizar atividades sem custos institucionais.55

Essas questões se articulam com a principal tendência do investimento social privado bra-sileiro: seu caráter operador, e não financiador. Institutos, fundações e empresas têm como es-tratégia frequente destinar recursos a projetos próprios, em vez de repassá-los às organizações sem fins lucrativos para que viabilizem suas propostas. É o que mostra o Censo GIFE 2011-2012: 69% dos associados executam, com sua equipe, seus próprios projetos; 44% viabilizam financeira ou tecnicamente projetos próprios executados por terceiros; e 49% apoiam proje-tos de terceiros56. Ainda aqui, seria necessária uma investigação, pois, considerando que a conceituação de tais categorias é pouco densa, é possível que as dificuldades de diferenciação entre contratar e apoiar tenham enviesado as respostas dadas.

Tal estratégia tem consequências importantes. Por um lado, estimula a concentração e elitização do empreendedorismo social, uma vez que mantém os recursos concentrados nas organizações que possuem orçamento garantido. Por outro lado, limita as organizações dependentes de financiamento ao papel de fornecedoras de expertise, em vez de estimular seu protagonismo e autonomia – o que, em última instância, fragiliza a sociedade civil como um todo. 55 Abong, Sustentabilidade das ONGs no Brasil, cit., p. 41.56 Aos respondentes era dada a opção de selecio-

nar mais de uma resposta, visto que uma mesma instituição pode atuar por meio de diferentes estratégias. Por esse motivo, a porcentagem não soma 100%.

As fundações e institutos corporativos apoiavam significativamente projetos de autoria das OSCs [organizações da sociedade civil] até poucos anos atrás. Hoje, predomina o apoio a OSCs como suporte e serviço qualificado à elaboração, execução e/ou acompanhamento de programas e projetos próprios. O motivo é produzir resultados mais claros em menor prazo, supostamente com menos riscos, daí o fortalecimento da autoria de iniciativas por parte de institutos e fundações, abrindo espaços para OSCs como provedoras de serviço.57

Vê-se, portanto, que há muito a se avançar. Não se pode ignorar o fato de tratar-se de uma relação que aproxima universos com agendas muitas vezes antagônicas, principalmente em termos ideológicos, gerando certa desconfiança mútua. Mas é preciso ter em mente que, em uma sociedade complexa, as soluções para os problemas sociais só poderão ser atingidas por meio de parcerias multissetoriais, que agreguem valor a todos os envolvidos e tenham um compromisso, acima de tudo, com o bem público.

Cooperação internacional

A crescente dependência financeira das organi-zações sem fins lucrativos brasileiras em relação ao Estado e à filantropia empresarial é resultado direto das mudanças na presença da cooperação internacional no país. Com uma participação que, como discutimos, foi fundamental para a exis-tência de nossas organizações, as agências de cooperação internacional têm passado por recon-figurações importantes desde os anos 1990.

Algumas das mudanças mais decisivas para as ONGs brasileiras advieram das profundas transformações no campo da cooperação internacional ao desenvolvimento, especialmente na Europa na década de 1990. Ocorrências como a redução da cooperação governamental ao desenvolvimento, declínio das contribuições 57 Domingos Armani, “Projetos sem pé nem cabe-

ça”, 29 nov. 2012. Disponível em: domingosarma-ni.wordpress.com/2012/11/29/projetos-sem-pe--nem-cabeca/.

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do público em geral, questionamento da eficácia da cooperação ao desenvolvimento, aumento do desemprego e dos problemas sociais etc. levaram as agências de cooperação europeias a (i) um profundo processo de reestruturação institucional, que redefiniu sua identidade, sua imagem pública e fortaleceu vantagens comparativas e competências na captação de recursos, dando mais ênfase ao trabalho de “ lobby” e “advocacy”, (ii) maior dependência de recursos governamentais, (iii) realinhamento dos recursos, favorecendo a África e a Europa do Leste e reduzindo o apoio à América Latina, (iv) redução do número de organizações apoiadas no Brasil e maior rigor na seleção de novos parceiros, (v) concentração temática e regional no caso do Brasil, (vi) maiores exigências em questões de eficiência organizacional e desenvolvimento institucional, especialmente nas áreas de planejamento, avaliação, monitoramento, gestão e “accountability” e, por fim, (vii) ampliação das oportunidades de parcerias não financeiras com as organizações apoiadas.58

A própria posição do Brasil no cenário internacional estimulou tais alterações. Com posição fixa entre as dez maiores economias do mundo, o país passou a ser entendido como rico, capaz de equalizar sua desigualdade social e financiar sua própria sociedade civil, deixando de ser prioridade das agências. Hoje, o Brasil é visto como um ator global relevante, capaz de prover ajuda internacional, principalmente para a África.

Ainda assim, é importante entender qual papel cabe hoje à cooperação internacional no orçamento das organizações sem fins lucrativos brasileiras. Mesmo que existam poucas fontes de dados públicos e atualizados a respeito de tais movimentações, o que se observa não é que a cooperação internacional deixou o país, mas sim que a dependência das organizações dessa fonte não se dá mais nos termos anteriores.58 Idem, “Breve mapa do contexto das ONGs bra-

sileiras”, Porto Alegre, mar. 1999. Disponível em: domingosarmani.files.wordpress.com/2009/02/breve-mapa-contexto-ongs1.pdf.

Em pesquisa feita com suas associadas, em 2009, a Abong concluiu que as agências de cooperação internacional “continuam sendo a base a partir da qual as associadas à Abong se estruturam, ainda que venha diminuindo o volume de recursos aportados”59. A conclusão é que as organizações foram levadas a captar mais recursos em outras fontes, sem que tenha havido a substituição direta das agências por outro financiador único, mas sim sua pulverização. Vale registrar também que tal diminuição veio acompanhada de outras formas de apoio, como o crescimento nos editais de projetos vindos de países europeus e a nacionalização das organizações internacionais, o que permite sua melhor inserção no contexto brasileiro e facilita os trâmites relativos à mobilização de recursos para o país.

O que o recuo da presença internacional no orça-mento das organizações brasileiras mostra é a necessidade de nacionalização do financiamento do nosso setor social. Se a diminuição dos volumes transferidos para as organizações já estimulou a diversificação de suas fontes, é preciso que o acesso a recursos públicos e privados seja facilitado para que o terceiro setor brasileiro fique cada vez menos vulnerável a tur-bulências em céus estrangeiros.

Doações individuais

Nesse sentido, o estímulo à doação de pessoa física, no Brasil, merece investimento. É aqui que o dinheiro aportado na organização é mais livre de interesses e condicionalidades. Além disso, a doação individual é uma forma de desenvolver a cidadania e estimular a participação do sujeito na vida pública, inclusive influindo na condução de políticas públicas.

Há poucos dados organizados a respeito das doações individuais no país. Segundo levanta-mento feito pela pesquisa “Arquitetura institu-cional de apoio às organizações da sociedade civil no Brasil”, “os poucos estudos existentes apontam que há uma cultura de doação des-59 Abong, Sustentabilidade das ONGs no Brasil, cit., p. 72.

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tinada a entidades religiosas e organizações pequenas locais, ou para campanhas e eventos emergenciais, como catástrofes naturais”60. Outro número citado pela pesquisa baseia-se no estudo feito pela empresa RGarber, a pedido da ChildFundBrasil, com base em dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), de 2003 e 2009, e dados preliminares do Censo 2010, ambos do IBGE. Segundo a pesquisa, há, no Brasil, 17 milhões de doadores, o que corresponde a 9% da população.

Em termos globais, o relatório “World Giving Index 2012”, publicado pela organização inter-nacional Charities Aid Foundation, permite com-parar cenários. O documento sinaliza as tendên-cias de doação em 146 países, considerando três comportamentos individuais: doar dinheiro a instituições, voluntariar tempo a elas e ajudar um estranho. O Brasil ficou em 83o no ranking, atrás de países como Haiti (67o) e Estônia (79o); em 2010, estava colocado em 76o.

Enquanto na Austrália, país mais generoso do mundo, 60% dos entrevistados disseram ter pra-ticado algum tipo de solidariedade, no Brasil a porcentagem cai para 27%. Entre os três com-portamentos mapeados, os brasileiros são mais generosos ao ajudar um estranho (44%), item seguido por doar dinheiro (24%) e, por fim, doar tempo (12%).

Mas alterações recentes no poder de consumo da população brasileira podem impactar nesses números. Em depoimento a uma matéria do jor-nal Valor Econômico, em setembro de 2012, Mar-celo Furtado, então diretor-executivo no Brasil da organização ambientalista Greenpeace, chamou a atenção para a participação da classe C no orçamento da organização: “O grosso da nossa base de doações vem da classe C”, disse. “Há cinco anos, a contribuição média era de R$ 16 por mês. Hoje, o tíquete médio subiu a R$ 30, o 60 Articulação D3 Diálogos, Direitos e Democracia

e Centro de Estudos em Administração Pública e Governo da EAESP-FGV, “Apresentação e resumo executivo”, cit., p. 39.

que não é um valor desprezível para o Brasil”61, completou. Essa percepção foi confirmada por outra matéria, agora da BBC Brasil, publicada em julho de 2013. Segundo dados levantados pelo veículo, “embora a maior parte das doações em dinheiro a ONGs no Brasil ainda venha das clas-ses A e B, a classe C já é hoje, proporcionalmen-te à renda, a que mais doa”62.

Novos públicos, novas estratégias. As organizações têm investido em formas inovadoras de atingir os indivíduos visando estimular a doação de pessoa física. Exemplos disso são a abordagem direta nas ruas, o chamado face to face, no qual representantes terceirizados da organização mobilizam transeuntes para que façam doações; as microdoações, em que os indivíduos são estimulados a doar valores baixos, como centavos; além das possibilidades trazidas pelo uso da internet e das redes sociais, como o crowdfunding, forma de financiamento coletivo. Vê-se, assim, uma adaptação aos novos tempos por parte das organizações: se o objetivo é conseguir adesão – não só financeira – à sua causa, é necessário chegar até o indivíduo que se deseja mobilizar, acompanhando as mudanças de comportamento e perfil dos novos potenciais doadores.

Autofinanciamento

Há ainda uma outra estratégia possível para a arrecadação de recursos pelas organizações sem fins lucrativos: o autofinanciamento. Trata-se de medidas adotadas pelas entidades para gerar suas próprias receitas, como venda de produtos, cobrança de mensalidade a sócios, aluguel de seus espaços, endosso de produtos com sua marca ou mesmo lucro de investimentos.

O autofinanciamento tem se tornado comum

61 “Uma virada de página da cidadania”, Valor Econô-mico, 6 set. 2012. Disponível em: www.valor.com.br/cultura/2819598/uma-virada-de-pagina-da--cidadania.

62 Rafael Gomez, “ONGs internacionais ampliam arrecadação no Brasil e miram classe C”, BBC Brasil, 8 jul. 2013. Disponível em: www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/07/130627_ongs_abre_presenca_rg.shtml.

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no terceiro setor brasileiro. Segundo uma pesquisa realizada pela organização Sitawi, em 2013, quase metade (48%) das entidades sem fins lucrativos do país possuía alguma atividade comercial. Pode-se compreender esse número como resposta a um cenário de riscos e insta-bilidade para as organizações, dependentes de financiamentos que vêm acompanhados de uma série de condicionalidades, o que as estimula a buscar autonomia.

Essa porcentagem poderia ser maior, caso hou-vesse mais clareza a respeito das possibilidades das organizações de engajar-se em atividades co-merciais. Novamente, fatores como a burocracia excessiva e a ausência de uma legislação clara, aliadas à falta de informação sobre o tema, aca-bam por desestimular a adoção dessa estratégia.

Muitas organizações acham que não podem pra-ticar atividades de autofinanciamento ou ativida-des de negócios geradoras de receitas; outras sentem que se fizerem isso, sua reputação ou relacionamento com os doadores será afetado desfavoravelmente. Mesmo quando as OSCs são cientes da respectiva legislação, muitas vezes não entendem quais impostos precisam pagar, quais formulários preencher, ou quais procedimentos administrativos seguir.63

Não há legislação específica para a atividade co-mercial de organizações sem fins lucrativos, assim como a determinação sobre quais impostos serão recolhidos (ou isentados) em decorrência de tal atividade exige uma análise caso a caso, visto que varia de acordo com fatores como a natureza da entidade e o regulamento do estado e do muni-cípio. Em termos gerais, o fundamental é que os recursos trazidos pelas ações de autofinanciamen-to sejam revertidos para a missão da organização.

[...] a finalidade não lucrativa é representada pela reaplicação de todo resultado positivo na consecução dos objetivos institucionais a que a entidade se propõe. Como dito, não há qual-quer vedação a que as OSCs desenvolvam

63 Eduardo Szazi e Ricardo de Oliveira Campelo, “O ambiente legal e regulamentar para o autofi-nanciamento de OSC no Brasil”, Série de guias le-gais NESsT, nov. 2010, p. 4.

atividades comerciais, desde que isso não ca-racterize desvio de finalidade, ou seja, desde que a atividade comercial não se torne um fim em si mesmo, sobrepondo-se aos fins sociais que levaram à criação da OSC.64

No entanto, ainda que seja uma estratégia legíti-ma de captação de recursos, é preciso atenção. Se o autofinanciamento responde por fração representativa do orçamento da organização, ainda que signifique capacidade produtiva, pode ser indicativo de que a entidade está sen-do desviada de sua causa social. Há o risco de seu protagonismo ser deixado de lado, motivo pelo qual se entende como saudável que as ati-vidades comerciais sejam uma fonte de renda complementar, e não central, da organização. É necessário cautela para que a condição de “sem fins lucrativos” da organização não seja coloca-da à prova, o que feriria o princípio que legitima seu status e, consequentemente, seu acesso a incentivos e isenções fiscais.

Transparência e accountability

Independentemente da fonte do recurso, uma preocupação é e deve ser constante para as organizações sem fins lucrativos: a prestação de contas à sociedade. Uma vez que obtém recursos por falar em nome do bem público, a entidade tem de estar ciente de que o dinheiro que passa por seu caixa não lhe pertence, mas é, em essência, dinheiro público (no sentido de pertencer à sociedade, não necessariamente ao Estado). Dessa forma, é necessário compro-misso radical com a transparência e com sua responsabilização pública, noção expressa por meio do conceito de accountability.

Há também razões práticas para a adoção de uma gestão transparente. Manter-se em cumprimento dos instrumentos de regulação do Estado é essencial para que as organi-zações possam receber novos recursos. Além disso, como discutido, se a organização não for reconhecida como idônea e legítima, seu papel político será esvaziado (como é possível 64 Ibidem, p. 21.

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observar em momentos como a CPI das ONGs). Assim, é preciso estabelecer estratégias de comunicação que considerem todas as partes interessadas na prestação de contas, desde os funcionários da organização até a sociedade como um todo.

Quando uma organização do terceiro setor é tida como accountable, isso significa que ela é idônea, que presta contas aos seus mem-bros ou à comunidade a que serve e que está estreitamente vinculada aos interesses des-tes, preservando sua reputação e idoneidade. Para que uma instituição seja accountable, ela deve estar “aberta” à fiscalização em todos os aspectos gerenciais.65

O que se vê, no entanto, é que a adoção de tais práticas não é consenso entre as organizações do terceiro setor brasileiro. A pesquisa “Trans-parência através da web”, publicada em 2009 pelo Núcleo de Apoio à Pesquisa e Educação Continuada (Napec), mapeou as informações institucionais disponibilizadas por 114 organi-zações de todo o país, em seus respectivos sites, para verificar os mecanismos de trans-parência e prestação de contas adotados. Apenas 33% das organizações divulgam rela-tórios de atividades e financeiros anuais em seus sites. Entre as que os publicam, algumas limitam seu conteúdo a informações técnicas, deixando de fora a parte financeira.

Ainda de acordo com a pesquisa, quando con-sideradas as informações disponibilizadas nos sites, há transparência em relação aos pro-gramas e projetos desenvolvidos – 94% das organizações divulgam tais informações. É também comum a publicização das fontes de financiamento (80%), mas com um adendo: “Muitas vezes este indicador (financiadores) é encontrado sob a denominação: parcerias, apoios etc. É importante distinguir parcerias não financeiras de financiadores. Ambas as informações devem constar no site, mas é

65 Simone de Castro Tavares Coelho, Terceiro setor: um estudo comparado entre Brasil e Estados Unidos, cit., p. 172.

necessário fazer a distinção entre elas”66. Sobre informações financeiras das organiza-ções, apenas 25% divulgam balanço patrimo-nial e relatório de auditoria.

A pouca transparência não é necessariamente uma escolha consciente da organização. Podem estar envolvidos fatores como ausência de estru-tura administrativa capacitada ou mesmo falta de clareza a respeito das consequências desse modo de agir, motivada por receios como a divulgação de informações à “concorrência” ou a exposição de problemas internos da organização. Além dis-so, a transparência não é garantida somente por meio do acesso aos dados. É preciso publicá-los em formatos amigáveis, para que possam ser de fato compreendidos e analisados pelo público inte-ressado. Pensar os mecanismos da transparência é tão importante quanto advogar sua importância.

Nesse sentido, é preciso chamar a atenção para o fato de que, ao contrário do que ima-gina o senso comum, não é verdade que não há controle público sobre as organizações sem fins lucrativos. Estas são reguladas por dife-rentes instâncias do poder (municipal, estadu-al e federal) e por diversos órgãos do Estado (como a Receita Federal, o Tribunal de Contas da União – TCU – e ministérios), cada um com seus mecanismos próprios de prestação de contas. O problema, portanto, é outro.

Existem atualmente vários cadastros e bancos de dados públicos, com informações sobre as associações e fundações atuantes no país. [...] Há inúmeros cadastros que não se comunicam. O problema não é a falta de informações presta-das pelas associações e fundações, mas, sim, a falta de interesse do poder público em utilizar e sistematizar os dados disponíveis.67

66 Angelita Rangel e Maria Emilia Melo, “Transpa-rência através da web: mecanismos e indicadores para o fortalecimento institucional de ONGs”, Rio de Janeiro, Núcleo de Apoio à Pesquisa e Educação Continuada (Napec), 2009, p. 10. Dis-ponível em: www.abong.org.br/final/download/ttransparencia2.pdf.

67 Abong, Ação das ONGs no Brasil: perguntas e respostas (São Paulo, Abong, 2005), citado em ibidem, p. 3.

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Nem o próprio Estado possui capacidade ope-racional para lidar com a enorme quantidade de informação gerada pelos atuais modelos de prestação de contas. Em maio de 2013, segundo matéria publicada no jornal Estado de S. Paulo, estudos do TCU sobre a fiscalização de convênios federais apontaram falhas sistêmicas na estrutu-ra da União, como o baixo número de servidores e a falta de qualificação de parte deles.

O órgão com situação mais frágil era o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), com mais de 15 mil prestações de con-tas não analisadas, cujo valor chegava a cerca de R$ 4 bilhões. Para fiscalizar esses convênios havia apenas 89 servidores efetivos.68

Esse cenário não é exclusividade das esferas federais. Em abril de 2013, uma denúncia pu-blicada no jornal Folha de S.Paulo apontou que o governo Geraldo Alckmin repassou R$ 383,5 mil em recursos para duas entidades que, se-gundo seu próprio cadastro, estavam proibidas de receber verbas públicas via parcerias com o Estado. Segundo a matéria, elas eram parte de uma lista de organizações que tiveram ne-gado ou bloqueado o Certificado de Regularida-de Cadastral de Entidades (CRCE), criado pelo governador como “resposta à suspeita de que parlamentares direcionavam recursos a asso-ciações em troca de benefícios”69. À época, o governo informou ter aberto uma investigação preliminar para apurar possíveis irregularidades relativas ao caso.

O que esses episódios mostram é que irregula-ridades no uso do dinheiro público envolvendo organizações sem fins lucrativos não provêm da ausência de instrumentos de controle, mas sim de sua ineficiência. Novamente, fica clara a

68 “TCU aponta falhas sistêmicas na fiscalização do governo”, Estado de S. Paulo, 13 mai. 2013. Disponível em: www.estadao.com.br/noticias/nacional,tcu-aponta-falhas-sistemicas-na-fiscali-zacao-do-governo,1031310,0.htm.

69 Paulo Gama, “Governo de São Paulo deu verba a entidades reprovadas”, Folha de S.Paulo, 8 abr. 2013. Disponível em: www1.folha.uol.com.br/poder/1258892-governo-de-sao-paulo-deu-ver-ba-a-entidades-reprovadas.shtml.

necessidade de um marco regulatório específico para o terceiro setor, que proponha mecanismos de prestação de contas consolidados, os quais sejam amigáveis para as organizações e permi-tam um controle de fato por parte do Estado e da sociedade como um todo.

Nesse sentido, a autorregulação das organiza-ções pode ser um caminho possível, com a de-finição e adoção de práticas e comportamentos que vão além das exigências legais, tal qual em outros setores profissionais. Com a conjunção entre uma regulação governamental inteligente e uma autorregulação que promova a responsa-bilização das organizações, quem sai fortalecido é não só o setor social, como a própria demo-cracia brasileira.

Onde estamos: o terceiro setor hoje

Segundo dados da Fasfil 2010, o Brasil tem 290,7 mil fundações privadas e associações sem fins lu-crativos. Sua presença no país acompanha a distri-buição da população: 44% localizam-se na região Sudeste e apenas 5% na região Norte. A idade média é de 14,4 anos, prova de que a década de 1990 foi especialmente fértil para o setor. Em ter-mos de área temática, as organizações religiosas são maioria (28,5%), seguidas por associações patronais e profissionais (15,5%) e por aquelas de-dicadas ao desenvolvimento e à defesa de direitos (14,6%). Pelo que mostra o estudo, a vocação das organizações brasileiras não é substituir o Estado: “Atuando nas áreas tradicionais de políticas públicas de Saúde, Educação e pesquisa e Assistência social encontram-se apenas 18,6% dessas entidades”70.

A comparação com os resultados das edições da pesquisa relativas a 2002 e 2005 mostra que o número de organizações continua crescendo, ainda que em ritmo menos acelerado do que em períodos anteriores. A tendência de queda no

70 Abong, GIFE, Ipea, IBGE e Secretaria-Geral da Presidência da República, “As fundações privadas e associações sem fins lucrativos no Brasil 2010”, Estudos & Pesquisas: Informação Econômica, Rio de Ja-neiro, n. 20, 2012. Disponível em: <ftp://ftp.ibge.gov.br/Fundacoes_Privadas_e_Associacoes/2010/fasfil.pdf.

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número de trabalhadores formalizados foi re-vertida e houve aumento nas remunerações. A composição do setor segue a mesma, “manten-do-se a representatividade mais expressiva do conjunto de instituições voltado para a defesa de direitos e interesses dos cidadãos”71.

Força cívica em crise

Mas não é o número de organizações que deter-mina a solidez e o poder cívico da sociedade civil organizada. Ainda que avanços existam, o que se observa no dia a dia das organizações sem fins lucrativos é um cenário de dificuldades crescen-tes, e mesmo de retrocessos, o que tem exigido do setor um momento de revisão de seus pres-supostos. “A observação das organizações e a escuta às suas lideranças neste momento revela um sentimento de impotência e de perplexidade. Faz-se cada vez mais o que é possível, e cada vez menos o que se gostaria de fazer.”72

No que se refere à relação das organizações com o Estado, é inegável o aumento de espa-ços de articulação, formulação e avaliação de políticas públicas, como conselhos e confe-rências, que estimulam o diálogo e a parce-ria entre esses atores. O acesso a recursos públicos também foi ampliado, ainda que haja desafios, como discutido. Trata-se de uma relação que, ainda hoje, não encontrou solu-ções definitivas para garantir sua efetividade. Seguem valendo as palavras utilizadas por Ruth Cardoso, em artigo de 1997: “Estamos aprendendo, governo e sociedade, a pensar e agir juntos, a identificar o que cada um faz melhor, sem que isso implique confusão de papéis ou abdicação da autonomia e respon-sabilidade inerente a cada parceiro”73.

É mais urgente, contudo, que o terceiro se-tor reveja seu posicionamento perante outro 71 Idem.72 Domingos Armani, “O fim das Ongs como nós

as conhecemos”, 8 jun. 2012. Disponível em: do-mingosarmani.wordpress.com/2012/06/08/o-fim--das-ongs-como-nos-as-conhecemos/.

73 Ruth Cardoso, “Fortalecimento da sociedade ci-vil”, cit., p. 9.

stakeholder: a própria sociedade. Com uma ima-gem pública negativa, não é de se espantar a perda de confiança nas organizações sem fins lucrativos. É o que mostra a pesquisa “Trust Baro-meter 2013”, realizada pela agência de relações públicas Edelman em 26 países74. Os resultados identificaram que, para os brasileiros, as orga-nizações do terceiro setor são menos críveis que a mídia e o setor empresarial, sendo mais confiáveis apenas que o governo.

Nesse sentido, as manifestações que tomaram as ruas do país em junho de 2013 estimulam reflexões. O que se viu foram parcelas significativas da sociedade mobilizando-se de maneira direta, sem intermediários, e com discursos críticos às instituições representativas convencionais, como os partidos políticos. Ainda que seja precipitado determinar as consequências desses acontecimentos para a vida política do país, é possível questionar-nos sobre o que eles mostram a respeito da necessidade de uma aproximação do terceiro setor com a sociedade, de maneira que as organizações consigam voltar a ser reconhecidas como um canal efetivo e legítimo de promoção das transformações sociais necessárias para um país mais justo.

Desafios mundiais

Fato é que um número significativo de organi-zações sem fins lucrativos brasileiras tem sido minado em sua capacidade de exercer o papel político que lhe cabe, em um país que, apesar de avanços socioeconômicos inegáveis, segue com questões históricas a responder.

A sociedade brasileira vem se transformando aceleradamente. Entre os anos 2000 e 2010, o PIB cresceu 40% e a riqueza per capita, mais de 130%. [...] O crescimento econômico, entre-tanto, não altera substancialmente os padrões de concentração de renda e de propriedade que caracterizam a história brasileira. Os subsí-74 Edelman, “Trust Barometer 2013”, Annual Global

Study, Edelman Insights, 20 jan. 2013. Disponível em: pt.slideshare.net/EdelmanInsights/global--deck-2013-edelman-trust-barometer-16086761.

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dios governamentais às grandes empresas e ao agronegócio continuam suplantando o apoio aos pequenos empreendimentos, à agricultura fami-liar e à construção de alternativas econômicas sustentáveis do ponto de vista socioambiental. As desigualdades continuam sendo estruturan-tes da sociedade brasileira: desigualdades no acesso à renda e aos recursos, desigualdades de gênero, de raça e entre regiões. Permanecem altos os níveis de violência e insegurança nas ci-dades, onde a ocupação é desordenada.75

Como exercer de maneira efetiva a tarefa de articulação do interesse público em um panorama de profunda instabilidade finan-ceira? Como construir-se enquanto ator po-lítico com poder de pressão suficiente para apresentar uma voz crítica, se as condições de existência autônoma em longo prazo são cada vez mais frágeis?

Tais mudanças, por fim, podem vir a pôr em questão a representatividade e a força polí-tica de um campo ético-político importante para o processo sociopolítico brasileiro.Isto porque há um claro vínculo entre as condições de sustentabilidade deste campo de atores autônomos na sociedade civil e a amplitude e qualidade de nosso desenvolvi-mento e de nossa democracia.76

Esse cenário preocupante não se restringe ao Brasil. Em seu relatório “State of Civil So-ciety 2011”, a aliança internacional Civicus identificou dificuldades da mesma natureza em escala global, como: crescente influên-cia da agenda política local e/ou interesses comerciais na priorização dos doadores so-bre quais temas ou regiões apoiar; doações baseadas em projetos de curto prazo, que pressionam por resultados e pela otimização de recursos; procedimentos onerosos para pedido de financiamento e prestação de 75 Abong, “Abong 2010 a 2013”, cit., p. 10.76 Domingos Armani, “Organizações da sociedade

civil: sustentabilidade e democracia”, em Domin-gos Armani e Rubén Pecchio (orgs.), Novos desafios à luta por direitos e democracia no Brasil: sustentabilidade das organizações da sociedade civil (Recife, Aliança In-terage, 2010), p. 45-60.

contas; e um regime tributário pouco esti-mulante para a doação e o financiamento77.

O caminho é fortalecer-se

As organizações ouvidas pela Civicus afirmaram ter tomado medidas visando sua sobrevivência, como mudanças programáticas, redução no número de projetos e áreas de intervenção e corte de despesas – comportamentos cada vez mais frequentes entre as organizações brasileiras, aos quais é possível adicionar a precarização das relações de trabalho e de sua profissionalização, por meio de ações como o acúmulo de funções na equipe e a terceirização. Nesse cenário, a criatividade e o poder de inovação das organizações da sociedade civil organizada são colocados à prova, impactando em sua capacidade de buscar novas formas de intervenção social.

É em contextos como esse que a importância do fortalecimento institucional das organizações sem fins lucrativos revela-se de maneira inequívoca. Mais do que nunca, as organizações precisam ter claro seu papel diante desse cenário, assumir um compromisso radical com a transparência e as melhores práticas de governança, conceber projetos e programas que cumpram de fato seu protagonismo. É imperativa também a adoção de estratégias de comunicação com a sociedade, para que a disputa pela identidade do setor social seja feita em termos que lhe sejam favoráveis e justos. Para que um cenário que exige revisões seja transformador, é necessário à organização ter capacidade de adaptar-se e responder aos desafios de maneira efetiva. Isso só pode acontecer com uma gestão fortalecida.

77 Civicus, “State of Civil Society 2011”, Joanes-burgo, abr. 2012. Disponível em: socs.civicus.org/2011/wp-content/uploads/2012/04/State-of--Civil-Society-2011.pdf.

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Capítulo 2 | Assessoria CEOS: uma experiência em fortalecimento institucional de organizações sem fins lucrativos

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É em diálogo com o panorama desenhado no capítulo anterior que devemos entender a fundação do Centro de Estratégias para Organizações Sociais (CEOS). Seu foco no fortalecimento institucional das organizações sem fins lucrativos brasileiras é uma resposta direta às dificuldades mapeadas; da mesma forma, os pressupostos teóricos e o modelo operacional definidos para o Centro foram pensados tendo em vista as demandas geradas por um momento histórico específico.

Neste capítulo, discutimos a fundação do Centro, as premissas que guiam seu trabalho de fortaleci-mento institucional e como tal visão é aplicada na prática, por meio do programa Assessoria CEOS. Mostramos, passo a passo, como o programa é desenvolvido, de maneira a compartilhar essa experiência com o conjunto do setor social brasileiro. Por fim, voltamos a atenção para as lições aprendidas pelo Centro com a operacionalização da Assessoria CEOS, em 2011 – conhecimento que, esperamos, será útil a outros.

É imoral pretender que uma coisa desejada se realize magicamente, simplesmente porque a desejamos. Só é moral o desejo acompanhado da severa vontade de prover os meios de sua execução.

José Ortega y Gasset

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O CEOS – Centro de Estratégias para Organizações Sociais

O CEOS começou a ser concebido em 2006 por um grupo de amigos com vasta experiência profissional nos três setores – público, privado e social. Diante de uma avaliação de cenário, decidiram unir esforços em torno de um projeto único, que, no entendimento de todos, contri-buiria para mitigar os desafios que o terceiro setor enfrentava e que, de lá para cá, se acen-tuaram, como discutimos no capítulo anterior.

O modelo operacional do Centro foi sendo de-senhado de maneira progressiva, a partir de decisões estratégicas fundantes: qual seria o público beneficiário da organização, de que maneira o CEOS poderia contribuir com ele, como financiar esse trabalho. Conforme eram definidas respostas a essas questões, não só se desenvolvia o Centro, mas também, simul-taneamente, o programa Assessoria CEOS. De certa forma, o CEOS foi concebido para abrigar o programa, cuja realização é sua razão de ser. Contar a história de um é, portanto, contar a his-tória do outro.

Quem: o público-alvo do CEOS

A pluralidade de vivências no setor social dos profissionais envolvidos na fundação do Centro garante ao grupo uma soma de olhares que

partem de pontos de vista diferentes sobre o terceiro setor. Alguns integraram o quadro de organizações sem fins lucrativos; outros trabalharam com filantropia empresarial; e há ainda quem tenha passado pelo setor público. Em meio a esse mosaico de perspectivas, a troca de impressões, em meados dos anos 2000, identificava um consenso: estava claro que caminhávamos para um cenário cada vez mais desafiador para o setor social, no qual as organizações sem fins lucrativos que não contam com mantenedores são as mais vulneráveis. Como explica Rebecca Raposo, diretora-presidente do CEOS: “Olhando para o setor social como um todo, qual era o lado mais frágil? Para quem nosso conhecimento nos três setores faria mais diferença? Nossa resposta foi: para as organizações sociais”1.

Foi a partir dessa reflexão que o Centro definiu seu público-alvo: as organizações sem fins lucrativos brasileiras. Por trás da decisão, há uma premissa a respeito do papel político que tais entidades desempenham em nossa sociedade. O CEOS entende que as organizações são fundamentais para o fortalecimento da democracia participativa. Para que possam exercer sua função cívica em sua plenitude, de maneira autônoma, elas devem estar sólidas. Ao colocar a expertise de seus integrantes a serviço das organizações, o Centro poderia colaborar

1 Entrevista concedida em 5 de março de 2013.

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para a garantia de tal solidez, como explica Vinicius Precioso, associado-fundador do CEOS:

As organizações do terceiro setor são um es-paço de busca por soluções inovadoras para os problemas socioambientais que enfrenta-mos. Elas não possuem muitas das amarras do poder público e estão mais próximas dos seus públicos atendidos. Falam diretamente com as comunidades, sem intermediários. O que falta a essas organizações, muitas vezes, é foco, aper-feiçoar sua gestão para potencializar resultados. O CEOS tem muito a contribuir neste sentido.2

Para o CEOS, trabalhar com uma organização no sentido de fortalecê-la é um passo fundamental para o enriquecimento do setor social como um todo. Não se entende uma entidade como um ator isolado, mas sim como parte integrante de uma cadeia complexa de inter-relações. Capacitar uma organização significa empoderá-la para melhor exercer sua missão, o que tem impacto em sua equipe, em seu público-alvo, nos espaços de arti-culação em que ela atua, em sua área temática e, em última instância, na sociedade brasileira – pres-supostos que embasaram a Missão e a Visão do Centro. Da mesma forma, se uma organização dei-xa de existir, toda sua ampla rede de stakeholders é prejudicada. É para evitar essa descontinuidade e desarticulação civil que o CEOS trabalha. Em resu-mo, nossa causa é fortalecer outras causas.

Cabe chamar a atenção para outra premissa que ditou a definição do público-alvo do Centro: a atuação em esfera nacional. O CEOS entende que, para o avanço das estruturas democráti-cas brasileiras, faz-se necessária a presença de atores sociais fortalecidos em todo o terri-tório, capazes de articular soluções locais que atendam à riquíssima diversidade deste país de dimensões continentais. Garantir o princípio da igualdade de acesso, promovendo a descentra-lização da região Sudeste não só em termos de recursos financeiros, mas também no que se refere a conhecimentos estratégicos, é uma preocupação constante para o Centro, refletida no próprio desenho da Assessoria CEOS, como discutiremos adiante. 2 Entrevista concedida em 18 de março de 2013.

O que: a contribuição do CEOS para as organizações

Uma vez definido o foco nas organizações sem fins lucrativos brasileiras, o passo seguinte foi determinar o que, afinal, o Centro teria a ofe-recer para seu público-alvo. Novamente, as diferentes experiências profissionais dos funda-dores e o rico debate promovido a partir de tal diversidade tiveram papel fundamental.

Partindo de sintomas distintos, chegou-se a uma mesma causa: a necessidade de inves-timento na área-meio das organizações, isto é, em sua gestão. Seja enquanto financiador, seja enquanto parte integrante de uma orga-nização, identificou-se uma demanda recor-rente por apoio que partia de equipes com expertise em suas respectivas atividades-fim, mas não em temas como planejamento estra-tégico, governança e gestão administrativo--financeira. Ficou clara a vocação do CEOS para organização-meio, dedicada à difusão de conhecimentos, ferramentas e práticas que fortaleçam a gestão das organizações e auxi-liem em uma esfera onde, geralmente, há um vácuo estratégico.

Aqui, mais uma vez, o caráter plural dos fun-dadores teve impacto direto, embasando ou-tra premissa do trabalho do Centro que foi de-terminante na metodologia desenhada para a Assessoria CEOS. Somadas, as diversas áreas de expertise desses profissionais promoviam uma visão sistêmica a respeito da gestão de organizações sem fins lucrativos. Ao se ob-servar as experiências anteriores dos funda-dores, solidificou-se a certeza de que não é possível um resultado efetivo, em longo pra-zo, de fortalecimento de uma entidade social se os diferentes aspectos que compõem sua vida organizacional – desde o planejamento estratégico até a infraestrutura – não forem simultaneamente tratados. Um trabalho que se propõe a impactar a organização de ma-neira profunda, como é o caso da Assessoria CEOS, não poderia se furtar desse esforço.

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Como: a forma de financiamento do CEOS

No entanto, abordar o fortalecimento institu-cional das organizações sem fins lucrativos a partir de tal olhar sistêmico exige horas exten-sas de trabalho, o que encarece a consultoria, representando um custo alto – quando não im-peditivo – para as entidades. Como promover o acesso democrático a um modelo de gestão integrado sem abrir mão do compromisso com a profundidade do trabalho, por um lado, e com a equidade, por outro?

A solução veio pelo estabelecimento do Fundo de Investimento em Organizações Sociais (Fios), no qual investidores sociais, físicos ou jurídicos, fazem doações que respondem pelo financia-mento do programa. Dessa forma, as organi-zações sem fins lucrativos assessoradas pelo CEOS são desoneradas não só de custos, mas também do próprio esforço de captar recursos para sua área-meio. Essa tarefa passa a caber à equipe do Centro, responsável por mobilizar financiadores para que contribuam com o fun-do, como explica Rebecca Raposo: “[O desenho de um fundo] Era uma forma de utilizar nosso capital social, construído ao longo de trajetórias sólidas nas diferentes áreas do trabalho social, para promover o investimento na área-meio, deixando que as organizações sociais trabalhas-sem sua área-fim”.

Os recursos captados pelo Fios são revertidos às organizações não em forma monetária, mas em inteligência, por meio do processo de trabalho da Assessoria CEOS. Para a iniciativa privada, inves-tir no Fios é uma maneira de contribuir na resolu-ção de um problema que a afeta diretamente, já que é comum o discurso de que as organizações sem fins lucrativos têm dificuldades de gestão, o que prejudicaria as parcerias estabelecidas entre os dois setores. A partir desse modelo, o CEOS buscou transformar em objeto de investimento o que os financiadores consideravam como uma deficiência, simultaneamente os desobrigando de uma atuação direta no tema.

Além disso, por meio do fundo, o Centro as-sume um papel de mediador no que se refe-

re a quais organizações beneficiar com tais recursos (baseando-se em critérios claros de escolha, por meio de um processo seletivo, conforme discutiremos adiante). O investidor social passa a apoiar uma causa, e não um projeto específico. Segundo Gabriel Ligabue, associado-fundador do Centro:

A missão do CEOS foi construída com base na visão do grupo fundador de que é preciso forta-lecer não necessariamente apenas a organização social que o financiador quer, mas aquela que é importante para o fortalecimento da sociedade ci-vil como um todo. O desafio do Fios vem daí: esti-mular o financiador a doar para um fundo difuso.3

Bloco na rua

Uma vez definidos as diretrizes e o modelo operacional do CEOS, a equipe do Centro passou a dedicar-se à captação de cotas de doação para o Fios, que, nesse primeiro mo-mento, financiariam tanto a Assessoria CEOS quanto o próprio estabelecimento do Centro, até então sem nenhuma infraestrutura con-solidada. Mas como procurar apoio para uma organização sem existência legal – ou mes-mo sem nome?

Dicionários de latim, grego e tupi foram consul-tados, sem sucesso. Partiu-se, então, para uma abordagem mais direta: a descrição do que é a organização. Resultou daí o termo CEOS, como sigla para Centro de Estratégias para Organiza-ções Sociais. A coincidência veio a seguir, quan-do se descobriu que, na mitologia grega, CEOS é o titã da inteligência – matéria-prima por ex-celência do nosso trabalho.

Nome escolhido, a assembleia de fundação, na qual se redigiu o estatuto, foi realizada em 11 de julho de 2007. Já a existência jurídica do Centro foi oficializada em cartório, enquanto associação sem fins lucrativos, em 8 de agosto do mesmo ano, data comemorada internamente como ani-versário do CEOS. Apenas cinco anos depois, em 2012, viria o título de Oscip.3 Entrevista concedida em 5 de março de 2013.

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Apoio-semente

Foi também em 2007 que o Centro conseguiu seu primeiro apoio financeiro. Concedida pelo Instituto C&A, a cota inicial para o Fios atuou como uma espécie de seed money, recurso que viabiliza a instituição de uma organização sem fins lucrativos – praticamente inexistente no atual cenário brasileiro. Cabe aqui, portanto, nosso agradecimento e reconhecimento públicos ao Instituto por sua ousadia e confiança.

Esse apoio inicial ganha ainda mais valor quando consideramos as dificuldades de se implantar uma organização-meio no Brasil. Se as organizações-fim enfrentam escassez em suas fontes de financiamento, a realidade das entidades dedicadas a processos de gestão é ainda mais complexa. Suas especificidades dificultam a aproximação com investidores sociais, por exemplo o fato de sua natureza estratégica inviabilizar resultados em grande escala quantitativa. E não podemos esquecer o momento histórico com o qual o processo de estabelecimento do CEOS coincidiu: a crise econômica mundial de 2008, que impactou nos esforços de captação de recursos para o fundo.

Na busca por fortalecer o Centro e sua metodologia de trabalho em meio a tais adversidades, a partir do primeiro semestre de 2008, a equipe do CEOS passou a se dedicar à prestação de serviços para organizações sem fins lucrativos, em um esforço simultâneo à captação de aportes para o Fios. A intenção era criar maturidade para as duas linhas de trabalho que, junto com a Assessoria CEOS, estruturam o Centro: a realização de consultorias, no formato tradicional, para organizações sem fins lucrativos e o desenvolvimento de inteligência para eventos na área social.

70/30

As consultorias trabalham de maneira pontual temas que compõem a Assessoria CEOS, definidos depois de consideradas a necessidade mais imediata da organização e sua disponibilidade de recursos. Não há restrição a respeito da área temática à qual a entidade se dedica, pois o Centro entende que a necessidade de uma gestão fortalecida é comum a todas as organizações sem fins lucrativos, independentemente de sua área-fim.

Além disso, o CEOS estrutura a inteligência de eventos, como conferências e congressos, com o objetivo de desenvolver estratégias que agreguem valor, reflexão e conteúdo à prática social. Na visão do Centro, eventos representam investimentos altos para o financiador, sendo necessário tanto otimizar seus possíveis resultados em termos de mobilização e transformação quanto contribuir para o posicionamento da organização promotora.

No entanto, ainda que sejam duas linhas de trabalho que dialoguem diretamente com nossa Missão, há limites para sua realização. Com o objetivo de impedir que o CEOS se transforme em uma consultoria privada com formato jurídico de organização sem fins lucrativos, a assembleia fundadora definiu um modelo de receita que estabelece uma razão entre doações e geração de renda própria. O orçamento do Centro deve ser composto de aproximadamente 70% de aportes para o Fios (que viabiliza nossa ação protagônica, a Assessoria CEOS) e 30% de consultorias e eventos. Trata-se de uma segurança para que a prestação de serviços – não só legítima, como necessária no cenário de filantropia brasileiro – não se torne a razão de ser do CEOS, convertendo-o em simples consultoria.

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Outra determinação da assembleia diz respeito ao estabelecimento de parcerias com o poder público. Em razão dos riscos e condicionalidades debatidos no capítulo anterior, nossos fundadores determinaram que o CEOS não aceitaria recursos de órgãos governamentais até que possuísse meios para gerir a enorme insegurança legal que esse relacionamento implica – como a contratação de serviços jurídicos –, o que ainda não é viável. Dessa forma, o CEOS segue totalmente dependente das instituições privadas e das prestações de serviços para sua sustentabilidade financeira.

“Walk the talk”

No fim de 2008, o fundo recebeu um segundo aporte, feito pela Fundação Vale. No ano seguinte, o Instituto Oi Futuro, por meio de seu programa Oi Novos Brasis, realizou a terceira doação. Por fim, em 2010, as duas cotas remanescentes

Prestações de serviços nos moldes convencionais, devem responder por cerca de 30% do orçamento do CEOS

Financiado por meio de doações ao Fios, deve responder por cerca de 70% do orçamento do CEOS

Ação socialprotagônicaAssessoria CEOSPrograma degestão estratégicapara organizaçõessem fins lucrativos

Consultoriaem gestãoestratégica para organizaçõessem finslucrativos

Desenvolvimento de inteligência para eventos da área social

Prestação de serviços

Modelo de financiamento do CEOS

foram doadas por um financiador que prefere permanecer anônimo. Três anos e catorze portas batidas depois, o CEOS atingiu seu objetivo em relação ao Fios e pôde passar a dedicar-se ao desenvolvimento do programa.

Ao longo de todo esse processo, a equipe do CEOS empenhou-se também no fortalecimento institucional do próprio Centro, em um esforço de “praticar o que se prega” – ou walk the talk, na expressão em inglês. As ferramentas e práticas que embasam a Assessoria CEOS foram aplicadas internamente, e muitos dos consultores que atuam no programa contribuíram de maneira direta nesse processo. A experiência nos deu ainda mais confiança nos conhecimentos compartilhados com as organizações assessoradas pelo Centro e a certeza de sua necessidade para as instituições.

Além disso, como parte do apoio concedido pelo Instituto Oi Futuro, o CEOS recebeu, ele próprio,

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assessoria em fortalecimento institucional. O tra-balho foi realizado pelo Instituto Hartmann Re-gueira durante o período de um ano. Ainda que os conteúdos trabalhados não fossem estra-nhos à equipe do Centro, a consultoria externa foi essencial no mapeamento das deficiências em relação à nossa gestão, o que foi conside-

rado no momento de planejamento e eleição de prioridades para investimento. Acima de tudo, receber tal consultoria foi essencial para refor-çar a crença do CEOS de que o fortalecimento institucional é de fundamental importância para a solidez de uma organização – e, consequente-mente, para o setor como um todo.

Ampliar o impacto e a sustentabilidade do setor social do Brasil, por meio do fortalecimento institucional de suas organizações sociais.

O desenvolvimento do pleno potencial das organizações de sociedade civil é fundamental para o avanço social e democrático da sociedade brasileira. Um tecido social forte, do qual as organizações sociais são parte importante, é responsável pelo grau de civilidade e de exercício de cidadania de uma comunidade.

Organizações sociais fortes e autônomas são fundamentais para a cidadania.

Transparência e responsabilização (accountability) são indispensáveis para a conquista da confiança pública.

Fortalecimento e desenvolvimento precisam de conhecimento e de prática, simultaneamente.

As parcerias intersetoriais são relevantes para o avanço da agenda social, respeitadas as diferenças culturais e organizacionais.

O acesso contínuo a informações precisas e a sistemas organizados é fundamental para o exercício responsável, transparente e efetivo das ONGs.

O compartilhamento e a difusão sistemática de informações aceleram o processo de aprendizagem coletivo.

Servir, sempre dentro dos mais altos padrões de qualidade, as organizações sociais.

Acolher a inovação para aprimorar serviços e permanecer na vanguarda do pensamento e da prática social.

Valorizar parceiros, colaboradores e financiadores.

Preservar a credibilidade por meio de autonomia, consistência e objetividade.

Praticar a responsabilidade social e fiscal em todo processo operacional.

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Por que fortalecer organizações sem fins lucrativos? A cada vez que uma organização fecha suas portas em razão da ausência de meios neces-sários para garantir sua sobrevivência, a socie-dade civil brasileira, composta por uma série de instituições das mais variadas naturezas, perde um componente de sua riqueza e complexidade.

O que chamamos de tecido social se refere à rede que as diferentes organizações geram entre si. Quanto maior o número de organizações produtivas, mais dinâmica, forte e autorregulada será a sociedade, daí a analogia com o tecido que, quanto mais entrelaçado e com fios, mais forte se apresenta.4

Limites da informalidade

As organizações sem fins lucrativos costumam ser fruto de uma vontade. São fundadas por indivíduos ou grupos motivados a contribuir para a resolução de um problema social, a promoção de uma causa, o atendimento a um público. Na maioria das vezes, a entidade começa a operar de maneira informal, em um ambiente marcado por aspectos como a participação direta dos fundadores e processos de tomada de decisão que escutam todos os envolvidos.

No entanto, as condições que permitem a criação da organização não necessariamente garantem sua sobrevivência em longo prazo – muitas vezes, podem até ameaçá-la. É preciso que a entidade tenha clareza a respeito de seu papel, seus objetivos, suas forças e seus limites, para que não perca de vista o propósito que motivou sua fundação. E é quando a organização, na figura do empreendedor social, assume essa visão estratégica a respeito de seu trabalho que fica a clara a necessidade de cuidado no que se refere à sua gestão.

4 Jose Bernardo Toro, A construção do público: cidada-nia, democracia e participação (Rio de Janeiro, Editora Senac Rio/(X) Brasil, 2005), p. 23.

A fragilidade das entidades não governamentais tem levado ao desaparecimento precoce de muitas delas. A informalidade, tão útil nos primeiros passos de uma associação de interesse público, torna-se rapidamente uma ameaça à sua perenidade. O ideal generoso e altruísta presente na sua criação deve ser acompanhado pela visão gerencial e por rigor financeiro para a obtenção dos frutos almejados. [...] O receio da burocratização é compreensível, já que ela sufoca a inovação, mas a ausência de procedimentos para a ação atomiza o sistema de valores humanos que sustentou o nascimento da iniciativa.5

Termos e conceitos

Nesse sentido, a compreensão acerca da importância do fortalecimento institucional das organizações tem ganhado espaço no setor social brasileiro, especialmente porque as adversidades do contexto atual têm sido sentidas por parte expressiva delas. Mesmo entre investidores sociais há mais clareza sobre o assunto – ao menos no discurso, o que, com frequência, não se reflete em seus orçamentos.

Afinal, seria possível imaginar bons projetos sem organizações sociais qualificadas?Não, é claro que não…Mas então por que a maior parte dos financia-dores de projetos opta pela visão de que só é necessário apoiar projetos sociais, e não as organizações? 6

Se há consenso sobre sua relevância, o mesmo não pode ser dito a respeito do conceito ou mes-mo de sua denominação. Além do próprio “forta-lecimento institucional” – adotado pelo CEOS –, há “desenvolvimento institucional”, “desenvolvi-mento organizacional” ou variações em inglês, como “capacity building”, “institutional building” ou “institutional strengthening”.

5 Jacques Marcovitch, “Da exclusão à coesão social: profissionalização do Terceiro Setor”, em Evelyn Ioschpe (org.), Terceiro setor: desenvolvimento social sustentado (São Paulo, Paz e Terra, 1997), p. 122.

6 Domingos Armani, “Organizações sociais = ali-cerces da sociedade”, 21 out. 2012. Disponível em: domingosarmani.wordpress.com/2012/10/21/organizacoes-sociais-alicerces-da-sociedade/.

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No que se refere a seu conteúdo, em termos gerais, é possível identificar duas grandes tendências. A primeira entende o trabalho na área-meio de uma organização sem fins lucrativos a partir de um olhar mais operacional, preocupado com questões ligadas apenas a processos gerenciais da entidade. Já a segunda considera também a dimensão política da organização, procurando integrar ao trabalho um olhar estratégico, que considera não só o micro, mas também a esfera macro na qual a entidade se insere.

Em um momento como o atual, os limites da visão gerencial ficam claros, uma vez que muitos dos desafios que têm impactado nas organizações dizem respeito ao ambiente sociopolítico no qual elas atuam. Crescimento da concorrência, diminuição das fontes de financiamento, interlocução crescente com cada vez mais atores, aumento da participação em espaços de articulação, controle social cada vez mais rígido, má reputação, entre outros. Apenas uma organização sólida e pró-ativa diante da necessidade de adaptação em seu padrão institucional pode fazer frente a esse cenário, sem que precise desviar-se de sua missão e abrir mão de sua autonomia – muito menos fechar suas portas.

A visão do CEOS sobre fortalecimento institucional

A partir da experiência de seus fundadores nas diversas abordagens relativas ao tema, o CEOS desenvolveu uma perspectiva própria a respeito do que é fortalecimento institucional de orga-nizações sem fins lucrativos e de como ele se concretiza por meio de práticas e conteúdos.

Na visão do Centro, fortalecimento institucional se define como “a criação das condições necessárias para que a organização sem fins lucrativos tenha impacto real na causa em que trabalha”. Significa, em outras palavras, garantir estruturas e processos internos à organização que a fortaleçam no sentido de permitir o cumprimento da sua missão. No entanto, a consolidação de tais condições

institucionais não se dá por meio de cursos e ferramentas nem do mero estabelecimento de processos administrativos, ainda que essas iniciativas possuam méritos. Para o CEOS, como dito anteriormente, é necessário que todos os diferentes aspectos que compõem a vida organizacional da entidade, respeitada em suas especificidades, sejam vistos como igualmente importantes e interdependentes.

Qualidade humana

Um aspecto fundante da maneira como o CEOS aborda o fortalecimento institucional de uma organização é a valorização de suas relações interpessoais, com especial cuidado à figura do empreendedor social, isto é, à liderança da organização. Como pondera Rebecca Raposo, esse elemento tem impacto direto na viabi-lização das transformações organizacionais necessárias para seu fortalecimento.

O que eu aprendi é que o trabalho com a liderança, com o ser humano que está à frente do processo, é tão importante quanto o trabalho com a organização. E eles são bons quando são simultâneos. Eu não acredito que apenas processos, métodos e sistemas sejam suficientes para garantir uma produção adequada, não custosa e prazerosa – porque, ao fim e ao cabo, as pessoas fundam organizações sociais para trazer qualidade de vida para outras pessoas, mas não podem, para isso, impactar negativamente a qualidade de vida da equipe e do próprio gestor. Se você trabalha com um líder que está conduzindo um bom processo, o fortalecimento institucional vai dar certo. Mas, da mesma forma, você pode ter um líder que emperra o trabalho.

Trata-se, portanto, de um esforço que considera simultaneamente aspectos tangíveis e intangíveis da organização. Para o CEOS, empreendedores sociais e sua equipe são capazes de incorporar inovações às entidades, uma vez apoiados tanto por conhecimentos, ferramentas e práticas quanto por um suporte emocional que ajude todos, especialmente seu principal gestor, a lidar com as mudanças inerentes ao processo.

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Nesse sentido, é preciso considerar que, na imensa maioria das vezes, uma organização sem fins lucrativos sente necessidade de rever sua gestão somente quando o modelo anterior atingiu seu limite. Em um momento de rees-truturação institucional, dinâmicas antigas são refeitas ou mesmo abandonadas, o que costu-ma gerar desconforto entre membros da equipe e pode, inclusive, resultar em desligamentos. Dessa forma, mudanças organizacionais têm impacto profundo na entidade, o que reforça a importância do olhar sobre a qualidade humana desse processo.

A maneira mais adequada encontrada pelo CEOS para viabilizar o suporte ao empreendedor foi o coaching. Detalhes sobre seu funcionamento serão discutidos adiante neste capítulo, mas cabe aqui chamar a atenção ao fato de que essa estratégia não pode ser descasada do processo de fortalecimento da organização, ou seja, do aspecto institucional do trabalho. Da mesma forma, o Centro vê nas ferramentas de gestão um meio valoroso, mas que não se encerra em si mesmo, isto é, sua simples adoção não garante mudanças estruturais efetivas. Para que sejam úteis, tais ferramentas devem atender a objetivos estratégicos claros.

Particularidades do setor

Tal pressuposto é reforçado pelo entendimento do CEOS de que, para que um processo de mu-dança institucional em organizações sem fins lucrativos seja efetivo, as especificidades desse tipo de entidade devem ser respeitadas. Não basta que conceitos e metodologias adotados pela gestão de empresas privadas sejam impor-tados para o setor social, sem forte contextuali-zação. Deve-se ter clareza de que estão em jogo instituições de naturezas muito distintas.

[A profissionalização], neste caso, significa, na maioria das vezes, a incorporação acrítica e fora do contexto dos instrumentos provenientes do campo empresarial com todo o seu jargão típico do mercantilismo, tais como marketing, management, outsourcing, merchandising, resizing e outros do

gênero. Desta forma, estas tendências agravam a sua crise de identidade: as organizações do “terceiro setor” deveriam funcionar como empresas eficientes no fornecimento de serviços ou deveriam funcionar como organizações portadoras de ideias de transformação e de utopias sociais?7

Nesse aspecto, a experiência dos profissionais que atuam no CEOS mostra-se um importante diferencial. O fato de conhecerem de perto a realidade do terceiro setor garante respeito às características inerentes a uma entidade sem fins de lucro e agrega legitimidade à sua posição de consultor. Além disso, o Centro reconhece o quão relevante é o trabalho presencial na organização, de maneira que sejam consideradas no processo suas particularidades internas. A forma como se manifestam os desafios institucionais em uma entidade é peculiar a ela, o que reforça a importância de um contato in loco para que a intervenção leve, de fato, à transformação. No campo do fortalecimento institucional, o conhecimento teórico é indispensável, mas perde efetividade quando aplicado à prática de maneira mecânica.

Olhar sistêmico

A imersão presencial na entidade é uma forma de manifestar o compromisso do CEOS com o trabalho em profundidade. O Centro acredita que, somente por meio de uma visão integrada a respeito da organização, as deficiências presentes em sua área-meio podem ser de fato identificadas e corrigidas. Partindo da noção de que cada organização é uma espécie de órgão vivo, resultado da interconexão de seus elementos formativos, não é possível tratar de uma única esfera de maneira isolada, mas sim sempre em conexão com todo seu conjunto.

É essencial que o próprio líder tenha essa visão global a respeito de sua entidade. Quando isso

7 Andrés A. Thompson, “Do compromisso à efici-ência? Os caminhos do terceiro setor na América Latina”, em Evelyn Ioschpe (org.), Terceiro setor: de-senvolvimento social sustentado, cit., p. 45-6.

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ocorre, o processo de mudança institucional atinge grande qualidade. Tal perspectiva se aplica especialmente em relação à captação de recursos, atividade que foi esvaziada de seu caráter estratégico, como discutiremos adiante neste capítulo. Hoje, a sustentabilidade de uma organização está reduzida a essa tarefa, realizada de maneira descasada das outras esferas que compõem a organização. Quando a captação de recursos atende a objetivos estratégicos claros da entidade, há reflexos diretos em sua sustentabilidade – razão pela qual o Centro entende que a terceirização dessa função tem limites.

Há ainda duas outras formas centrais nas quais se manifesta a importância de uma área-meio fortalecida para a captação de recursos. Por um lado, a chance de sucesso é maior quando a organização possui um bom posicionamento, o que envolve aspectos como a qualidade de sua atividade-fim e a confiança pública em torno da entidade – esferas diretamente atreladas à gestão. Por outro, o diálogo com possíveis investidores sociais é facilitado quando há alinhamento tanto no discurso da organização quanto na linguagem adotada entre segundo e terceiro setores. Se, cada vez mais, a iniciativa privada é a fonte por excelência de recursos das organizações sem fins lucrativos, é necessário aproximar os universos para que haja entendimento mútuo, caminho para um diálogo mais qualificado e produtivo.

Pela autonomia das organizações

Em última instância, o que está em jogo quando se discute captação de recursos é a garantia de autonomia das organizações sem fins lucrativos brasileiras para realizar sua missão. Entidades em estado de precariedade financeira tornam-se frágeis, o que pode abrir espaço para o sequestro de seu protagonismo em nome de prestações de serviços que visam exclusivamente a manutenção de sua sobrevivência. Nesse sentido, o Centro entende que ter

qualidade em sua área-meio, bem como em sua atividade-fim, contribui na busca por novos apoiadores, de modo a promover a diversificação das fontes de recursos, o que é essencial para sua saúde financeira.

Gerar autonomia é, na visão do CEOS, uma das mais importantes contribuições que o trabalho de fortalecimento institucional pode trazer a uma organização. Quando ela tem clareza a respeito do aspecto sistêmico de sua gestão, quebra-se um ciclo de dependência na tomada de decisão da entidade – inclusive em relação a consultorias externas, como o próprio Centro. Tendo em mente esse compromisso com o empoderamento da organização e, principalmente, do empreendedor social, o CEOS tem como regra não captar recursos para os projetos e programas de suas assessoradas nem operacionalizar seus processos internos, como explica Rebecca Raposo:

O que nós sempre deixamos claro tanto para os financiadores quanto para as organizações é que o CEOS oferece uma assessoria estratégica, mas a responsabilidade por implantar os processos na organização teria de ser dela, caso contrário gera-se dependência. É como se você terceirizasse o aprendizado: eu contrato você, você faz por mim e pronto.

Compartilhar um conhecimento estratégico, apoiando a principal liderança e sua equipe no processo de mudança organizacional, é o grande objetivo do CEOS, mas sempre com consciência de que esse papel tem limites e deve, acima de tudo, contribuir para a construção de uma organização autônoma e fortalecida. Apresentaremos a seguir a maneira encontrada pelo Centro para aplicar tais pressupostos à realidade das organizações.

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Fortalecimento institucional na prática: a Assessoria CEOS

A Assessoria CEOS é um programa de consulto-ria em gestão estratégica, com duração de até dezoito meses, oferecido para cinco organiza-ções sem fins lucrativos brasileiras escolhidas por meio de um processo seletivo online. Uma vez realizado um diagnóstico situacional de cada entidade participante, é definido um plano de ação sobre como serão trabalhados os conteú-dos e práticas nos seguintes temas – considera-dos como módulos da Assessoria CEOS8.

planejamento estratégico;

governança;

gestão de programas e projetos;

comunicação estratégica;

gestão administrativo-financeira;

implantação de sistema financeiro;

tecnologia da informação;

infraestrutura física.

Cada módulo é conduzido por um consultor. O trabalho é realizado por meio de encontros presenciais (o que envolve cerca de 150 horas técnicas, no total) e à distância (cerca de 450 horas). O financiamento de toda a consultoria é assegurado pelo Fios, cabendo às organizações uma contrapartida referente aos custos de pas-sagem aérea, hospedagem e alimentação dos consultores para o trabalho in loco.

Paralelamente à realização de tais módulos temáticos, o dirigente da organização recebe suporte contínuo da equipe do CEOS por meio de coachings online periódicos. Encerrados os módulos, cada entidade participante organiza, a partir dos conhecimentos adquiridos em todos os temas, um plano diretor de sustentabilidade. Ao final do trabalho, o resultado esperado são organizações autônomas; com leitura crítica so-bre o contexto no qual se situam; com efetivo alinhamento estratégico entre a governança, a direção e a equipe técnica; devidamente posi-cionadas; gestoras de sua matriz de sustenta-bilidade; e geradoras de impactos sociais mais duradouros em sua área temática.

Coaching à distância

8 Além dos oito temas listados a seguir, o primeiro edital da Assessoria CEOS previa também a realização de um módulo de gestão de pessoas. Infelizmente, Ana Luisa Curty, a profissional destacada para esse trabalho, parceira de confiança do Centro que nos acompanhou desde nossa fundação, faleceu em junho de 2009, momento em que a equipe do CEOS se dedicava à captação de recursos para o Fios. Diante dessa circuns-tância, o CEOS optou por suspender o módulo, pois não haveria tempo hábil para a substituição de uma profissional tão competente e alinhada com os valores e a metodologia do programa.

Processoseletivoà distância

DiagnósticosituacionalPresencial e à distância

MódulosPresenciale à distância

Plano Diretor de SustentabilidadePresencial e à distância

Processo de trabalho Assessoria CEOS

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É dessa forma que, em termos gerais, define-se a Assessoria CEOS. A seguir, nos dedicamos à tarefa de apresentar, de maneira detalhada, cada etapa desse processo, compartilhando os métodos desenvolvidos e os conteúdos trabalhados no programa.

Processo seletivo

Desenhar um processo seletivo que dê conta de atender às especificidades de um programa cujo foco está na gestão das organizações sem fins lucrativos não é tarefa fácil. Uma série de questões coloca-se, sendo a principal delas: como conseguir identificar, por meio de um edital, o estágio organizacional da entidade candidata, de maneira a auferir se ela está em condições de colocar em prática o conheci-mento trazido pelo Centro?

O CEOS entende que a escolha das organizações participantes é um dos elementos definidores de todo o processo de trabalho da Assessoria CEOS. É preciso que elas tenham uma determi-nada maturidade institucional para que o pro-grama possa contribuir para seu fortalecimento de maneira plena. Por um lado, organizações muito vulneráveis não conseguirão acompanhar o processo; por outro, não faria sentido ofere-cer o programa a organizações já consolidadas, pois os resultados seriam apenas incrementais e, portanto, desproporcionais ao investimento feito. Trata-se, enfim, de um equilíbrio delicado, visando minimizar os riscos de um edital aberto sem que sejam criados obstáculos excessivos, que acabem por excluir do processo as orga-nizações fragilizadas em sua gestão – público--alvo por excelência da Assessoria CEOS.

Além disso, identificar o real grau de interesse e abertura do empreendedor de cada entidade candidata ao programa também é fundamen-tal, uma vez que, como dito, o engajamento da liderança no processo de trabalho tem impacto direto na qualidade da transformação promovi-da. Não basta, portanto, que o processo sele-tivo seja bem-sucedido a respeito do aspecto institucional, sem considerar a esfera interpes-

soal – respeitando o pressuposto do Centro sobre a necessidade de um esforço que se dedica simultaneamente a questões tangíveis e intangíveis da organização.

A preocupação constante com a identificação do nível de engajamento da organização e de seu principal gestor com o programa se explica não só tendo em vista o desenrolar da Assessoria CEOS, mas também porque, ao fim e ao cabo, o Centro é responsável pelos resultados do programa perante os investidores sociais que contribuíram com o Fios. Ainda que nenhum processo seletivo seja integralmente efetivo em seus filtros – o que seria incompatível com a própria natureza de um edital que procura ser aberto a organizações dos mais variados perfis –, preocupar-se com o estabelecimento de alguns critérios de seleção representa uma proteção para o próprio CEOS.

Por fim, é importante chamar a atenção para um último aspecto definidor do processo seletivo elaborado pelo CEOS, que é o compromisso do Centro com o princípio do acesso democrático, discutido anteriormente. Garantir condições iguais de disputa entre organizações dos mais diversos portes, áreas temáticas9 e regiões geográficas guiou o desenho do edital. Seu objetivo é claro: selecionar entidades com base na qualidade do seu trabalho e compromisso com o programa. É também em razão desse entendimento que o CEOS acredita ser essencial que a inscrição no processo seletivo seja gratuita e feita por um meio democrático: a internet.

A preocupação em chegar a organizações de to-das as regiões do país estimulou o investimento

9 As categorias aceitas são aquelas qualificadas pela pesquisa “As fundações privadas e associações sem fins lucrativos no Brasil” – conhecida como Fasfil, discutida no capítulo anterior –, com ex-ceção das classes “religião” e “associações patro-nais e profissionais”, ambas voltadas a interesses coletivos, mas não públicos. São elas: habitação; saúde; cultura e recreação; educação e pesquisa; assistência social; meio ambiente e proteção ani-mal; desenvolvimento e defesa de direitos; e ou-tras instituições privadas sem fins lucrativos não especificadas anteriormente.

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em estratégias online de divulgação do processo seletivo, em um esforço iniciado um mês antes da abertura do edital. Um email marketing foi en-viado para as redes do terceiro setor das quais o CEOS participa, que, por sua vez, divulgaram o assunto entre seus próprios contatos. Além disso, organizações parceiras concederam seus mailings ao Centro, o que ampliou ainda mais a esfera de alcance. Por fim, investiu-se nos veícu-los jornalísticos, tanto naqueles especializados no setor social quanto nos da grande imprensa.

Etapas 1 e 2.Enquadramento e avaliação quantitativa via questionário

O instrumento de inscrição no processo seletivo da Assessoria CEOS é um questionário online, acessível por meio do site do Centro, que deve ser preenchido pela principal liderança das organizações candidatas. O questionário foi desenhado de maneira a atender a dois objetivos principais: em primeiro lugar, garantir o

enquadramento da entidade nos pré-requisitos e critérios do programa; em segundo, permitir uma avaliação a respeito de seu estágio de desenvolvimento institucional, por meio de indicadores quantitativos.

Para tal, o formulário é composto de duas partes, em um total de cerca de sessenta questões. Na primeira parte, a organização preenche dados cadastrais, por meio do que é possível verificar se ela atende aos seguintes pré-requisitos:

Ter sede e atuação no Brasil:

Ainda que o CEOS considere como legítima a contribuição à sociedade civil organizada de outros países, o foco da Assessoria CEOS são as entidades brasileiras, por razões como logística e custo. Além disso, uma vez que o Centro entende as organizações sem fins lucrativos em diálogo direto com o contexto sociopolítico no qual elas se inserem – aspecto que deve ser considerado em um trabalho como a Assessoria CEOS –, atuar

Processo seletivo Assessoria CEOS

Etapa 1

Enquadramentovia questionário1. Sede2. Natureza jurídica3. Idade4. Nível de influência5. Contrapartida6. Comunicação

Etapa 2

Avaliaçãoquantitativavia questionárioAvaliação do estágio de desenvolvimento institucional da organização por meio de pontuação numérica

Etapa 3

Avaliaçãoqualitativavia entrevistaAvaliação do interesse e abertura do(a) principal dirigente em submeter a organização ao processo da Assessoria CEOS

Etapa 4

Comitê de SeleçãoAvaliação da relevância social da organização, somada à ponderação a respeito do melhor uso possível dos recursos captados

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internacionalmente exigiria uma adaptação a realidades sobre as quais o Centro não possui expertise construída.

Ser constituída sob a forma de associação ou fundação privada:

Uma vez que o CEOS não possui expertise para lidar com cooperativas, restringiu-se o escopo do programa aos dois formatos jurídicos previstos para organizações sem fins lucrativos que englobam a grande maioria do setor social. O fato de, no questionário, a instituição assinalar qualquer outra opção a respeito de sua natureza demonstra ou seu não enquadramento nos critérios, ou sua informalidade legal.

Ter entre cinco e dez anos de existência legal, a ser comprovados por meio do estatuto social e do cartão do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) emitido pelo site da Receita Federal:

Em seu livro Administrando organizações do terceiro setor10, Mike Hudson discute que os ciclos de vida das organizações sem fins lucrativos se dividem entre períodos médios de cinco anos. Segundo ele, no intervalo de tempo que considera como a juventude da organização, entre cinco e dez anos de existência, problemas típicos relativos à gestão começam a se manifestar. Entre eles, confusão nos papéis decisórios e nas funções da governança, dificuldades em relação a limites entre burocracia e administração, bem como os primeiros esforços de sistematização do trabalho desenvolvido e a crescente presença de novos funcionários, que ainda não se apropriaram da história da entidade.

O CEOS optou por focar nesse ciclo de vida institucional das organizações, partindo do entendimento de que os conteúdos trabalhados pelo programa atenderiam diretamente a dificuldades como as citadas por Hudson. Além disso, como dito, o caráter estratégico e denso da Assessoria CEOS exige da organização certo nível de maturidade que, em geral, não ocorre antes dos seus cinco anos de existência.10 São Paulo, Makron Books, 1999.

Demonstrar nível de influência por meio da participação em espaços coletivos, como fó-runs, grupos de trabalho, redes e outras ins-tâncias colaborativas relacionadas à causa:

Para o CEOS, a participação da entidade em espaços de articulação é um indicativo impor-tante do seu nível de engajamento em relação à causa para a qual se dedica. Além disso, apoiar o fortalecimento institucional de uma entidade atuante em instâncias colaborativas significa empoderá-la no sentido de aprimorar o papel político por ela desempenhado nesse ambiente, o que acaba por fortalecer o poder de controle social do grupo como um todo.

Dispor de mais de três horas semanais para dedicação à implantação dos aprendizados da Assessoria CEOS na organização, seja o prin-cipal gestor, seja os interlocutores da equipe responsáveis por cada módulo temático:

Uma vez que o Centro acredita que a organização precisa ser autônoma no que se refere aos seus processos de gestão, cabe à sua própria equipe implantar os conhecimentos e métodos propostos pela Assessoria CEOS. Portanto, é preciso que a entidade esteja disposta a dedicar tempo e atenção ao programa, caso contrário as mudanças organizacionais não serão possíveis. Nesse sentido, o principal gestor deve estar ciente de seu papel ativo na Assessoria CEOS, pois cabe a ele liderar esse processo internamente.

Comprometer-se a assumir a contrapartida referente aos custos de hospedagem, alimen-tação e transporte aéreo e terrestre dos con-sultores nas atividades presenciais:

O CEOS entende ser importante exigir da orga-nização algum tipo de participação financeira no processo de trabalho, como forma de garantir seu engajamento no programa e minimizar o ris-co de seleção de uma entidade com um nível de comprometimento abaixo do esperado. Assim, a organização se torna não só um stakeholder, mas também um shareholder da Assessoria CEOS. Trata-se também de uma maneira de reforçar a crença do CEOS na capacidade das

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próprias organizações sociais: o fato de que elas possuem fragilidades institucionais não significa que não tenham potencial e força próprios para ser protagonistas da sua transformação. Enten-demos tal fragilidade como uma conjuntura, e não uma condição nata.

Por fim, a contrapartida, ainda que represente cerca de 10% dos custos totais do programa, é uma forma de diminuir o valor da cota de doação captada pelo Centro por meio de investidores sociais – valor esse que é significativo em razão do grande número de horas técnicas de trabalho que a Assessoria CEOS exige.

Comprometer-se a disponibilizar um espaço físico equipado, fora da organização, para a realização de oficinas:

Como parte do método de trabalho da Assessoria CEOS, as oficinas de temas como planejamento estratégico e governança são realizadas fora do ambiente físico da organização, a fim de possibilitar à equipe sentir-se em um local neutro e mais aberto a mudanças de percepção do que a sede da entidade. Por esse motivo, requer-se que a organização esteja disposta a providenciar esse ambiente, devidamente equipado, da maneira que achar mais adequada – seja por meio de parcerias com outras organizações locais, seja pelo aluguel de um espaço, para aquelas que tiverem condições financeiras para tal.

Ter instalado na organização o sistema de comunicação Skype:

O coaching periódico entre a equipe do CEOS e o principal gestor da organização é realizado por meio de Skype, serviço gratuito de comunicação. As diretrizes para o download da ferramenta são incluídas no regulamento do processo seletivo, para que, caso a organização ainda não disponha do sistema ou o desconheça, possa providenciá-lo.

Preencher integralmente o formulário de inscrição online:

Uma vez que se trata de um questionário longo, foi construído um sistema eletrônico que possibilita seu preenchimento gradual, ou seja, é possível respondê-lo por partes, de maneira

a retornar à tarefa em momentos posteriores. Os questionários incompletos até o prazo final da inscrição são desclassificados. Uma vez encerrado o edital, realiza-se uma pesquisa de opinião, por email, com as organizações cujas inscrições tiveram de ser descartadas por esse motivo, ainda que atendessem a todos os critérios de enquadramento. O objetivo da consulta é compreender o motivo da desistência para, assim, aprimorar o edital a cada edição do programa.

O sistema eletrônico permite a passagem para o segundo bloco do questionário às organizações inscritas que se enquadrem de maneira simultânea em todas essas determinações. Caso contrário, uma mensagem automática avisa o usuário de sua desclassificação, apontando qual critério não foi atendido, para que a organização esteja ciente do motivo impeditivo de sua participação no restante do processo seletivo.

O segundo bloco do questionário é composto por questões cujas respostas permitem identificar o estágio organizacional da entidade. São atribuídas notas ponderadas às perguntas, de maneira a gerar uma pontuação numérica ao final do preenchimento. Dessa forma, a partir dos resultados de cada organização, tem-se um ranking quantitativo das inscritas.

As perguntas desse bloco versam sobre os se-guintes temas:

nível de envolvimento do gestor na organização; governança; planejamento estratégico; perfil orçamentário; gestão administrativo-financeira; gestão de pessoas; comunicação estratégica; gestão de projetos; sistemas de monitoramento e avaliação; infraestrutura tecnológica.

Tal qual no primeiro bloco, também essas são perguntas fechadas, ou seja, suas respostas se

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limitam à escolha de uma entre as alternativas listadas. Há apenas duas perguntas abertas ao final do bloco, cujas respostas podem ser escritas livremente pelo gestor: a primeira, sobre as motivações para a fundação da organização; a segunda, sobre a diferença que o gestor acredita que a Assessoria CEOS pode trazer para essas motivações.

No total, a inscrição no processo seletivo, por meio do preenchimento dos dois blocos do questionário, tem duração de um mês entre sua abertura e seu encerramento. Calcula-se outro mês para a análise das candidaturas, seguida pela divulgação, no site do CEOS, das organizações que passaram para a etapa seguinte do edital.

Etapa 3. Avaliação qualitativa via entrevista

Ciente das limitações intrínsecas a um questio-nário, o CEOS instituiu uma etapa qualitativa no processo seletivo, viabilizada por meio de uma entrevista com a principal liderança da organi-zação candidata. É nesse momento que a aber-tura e o compromisso do empreendedor social em relação à Assessoria CEOS são avaliados, além de ser a oportunidade para o esclareci-mento de possíveis dúvidas ou inconsistências registradas no questionário.

A entrevista é realizada por Skype, tem duração média de quarenta minutos e baseia-se em um roteiro que contém cerca de quinze perguntas. O áudio é gravado, com a devida permissão do entrevistado, para que trechos possam ser disponibilizados ao comitê de seleção, bem como para que haja registro da conversa em arquivo. As perguntas procuram investigar: como o gestor soube do programa, qual é sua trajetória pessoal no terceiro setor, se pode fazer um balanço sobre a causa da organização e sobre a instituição em si, qual é sua avaliação sobre as oportunidades e limitações da entidade, quais são seus desafios em relação à governança e à equipe, quais são seus desejos pessoais e suas expectativas em relação à Assessoria CEOS.

A conversa com a liderança permite identificar seu entendimento a respeito da importância da área-meio para a organização. Nessa oportu-nidade, a equipe do CEOS deixa claro ao diri-gente as seguintes questões: os papéis atri-buídos, por um lado, à sua figura na condução do processo da Assessoria CEOS no interior da organização e, por outro, ao CEOS no apoio a essa tarefa; os riscos de que ocorram desliga-mentos de funcionários ao longo do processo; a importância de seu compromisso com o cumprimento do plano de ação estabelecido em conjunto entre o CEOS e a organização; e, por fim, os termos da cláusula suspensiva pre-sente no contrato, aplicada caso a organização não honre seus deveres, o que resulta no seu desligamento e no consequente informe aos investidores sociais do Fios.

A cláusula suspensiva se justifica porque, ainda que o CEOS compreenda que cada organização e respectivo gestor possuam um tempo próprio para adaptar-se a um processo intenso como a Assessoria CEOS, há um limite para a flexibilidade possível no programa, especialmente em razão dos recursos disponíveis, que dão conta de um número determinado de horas de trabalho. Há também o risco de que determinada organização não corresponda ao grau de comprometimento exigido pelo processo. Portanto, após a emissão de três comunicados não atendidos, recorre-se a essa cláusula. A organização suspensa é substituída pela primeira suplente, e o CEOS busca estratégias para cobrir a parte do recurso do Fios alocada na primeira organização, de forma a assegurar a integralidade da Assessoria CEOS para a suplente. Esta, por sua vez, precisará se comprometer com um esforço ainda maior em termos de tempo, pois terá de acompanhar o cronograma já iniciado.

Nessa etapa do processo seletivo, são realizadas entrevistas com duas organizações por dia. Ao final, o conteúdo qualitativo das entrevistas é cruzado com o ranking quantitativo gerado na etapa anterior, de maneira a definir quais organizações passarão para a etapa final. Aqui, a experiência profissional da equipe do

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CEOS tem um peso importante, uma vez que a avaliação a respeito das falas dos dirigentes exige um olhar sensível e com legitimidade para emitir juízo de valor – é inevitável que a avaliação qualitativa do discurso escape aos limites de critérios estritamente objetivos.

São fatores de exclusão aspectos como a existência de ações que caracterizem evangelização no âmbito do trabalho da organização ou o fato de a entidade ser uma filial, cuja estratégia seja definida não por ela, mas pela matriz. Em alguns casos, mesmo que se identifique a ausência de condições para a realização da Assessoria CEOS, são feitos encaminhamentos, tais como a promoção de contatos entre entidades que podem se apoiar ou mesmo a sugestão de investimento em aspectos pontuais relativos à gestão, como a realização de um planejamento estratégico.

Etapa 4. Comitê de seleção

Cabe ao comitê julgar as organizações finalistas e selecionar aquelas cinco que participarão do programa, bem como duas suplentes. Com poder de decisão soberano e inquestionável, o comitê deve ter como princípios norteadores: priorizar as organizações que estão no momento de vida institucional mais propício para incorporar os benefícios oferecidos pela Assessoria CEOS; avaliar a relevância social da organização; e contemplar a diversidade geográfica e temática. Há a preocupação de ponderar o melhor uso possível dos recursos captados, uma vez que cabe ao Centro uma espécie de papel de fiador das organizações selecionadas em relação aos investidores sociais do Fios.

O comitê é formado por um representante de cada financiador, especialistas do setor social – se possível, de diferentes regiões do país – e um representante da governança do CEOS, para que a perspectiva estratégica do próprio Centro tenha voz. É importante que o grupo reúna pessoas com trajetórias e olhares distintos, de maneira a garantir a avaliação mais inclusiva possível a respeito das organizações finalistas. Nesse sentido, em um segundo edital, há a

intenção de garantir assentos a representantes das organizações que passaram pelo processo da Assessoria CEOS.

Essa etapa final é conduzida ao longo de uma tarde de trabalho. A equipe do CEOS inicia o encontro, trazendo uma visão geral a respeito do processo seletivo e seus resultados (critérios, números, análise dos inscritos, lições aprendidas e oportunidades de melhoria), seguida pela apresentação de cada uma das organizações finalistas. A partir de tais informações, cabe aos membros do comitê deliberar. Então, cada componente do grupo dá seu voto a cinco organizações, o que resulta na identificação das mais votadas e, portanto, selecionadas para o programa. Os resultados são divulgados no site do CEOS, acompanhados do envio de um email para as organizações contempladas, solicitando documentos para a elaboração dos contratos.

Diagnóstico situacional

Uma vez selecionadas as cinco organizações participantes, o próximo passo é a realização de um diagnóstico situacional de cada uma delas. Para que a Assessoria CEOS tenha impacto efetivo na organização, é necessário que o processo de trabalho considere suas especificidades, como seus talentos e pontos críticos, que o diagnóstico permite identificar. Antes de dar início à intervenção na organização, o CEOS precisa compreender sua causa e sua forma de fazer, bem como ter dimensão da demanda e do escopo do trabalho – que, naturalmente, diferem de uma entidade para outra. Além disso, esse documento atua como marco zero do programa, permitindo uma análise comparativa ao fim da consultoria.

O diagnóstico é feito por meio de duas estratégias principais. A primeira é a leitura do material institucional da organização, para que a equipe do CEOS se familiarize com a trajetória e o momento atual da entidade. Os materiais solicitados para leitura são:

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estatuto;

ata de fundação;

último planejamento estratégico;

último balanço financeiro;

últimos três relatórios de atividades;

materiais de comunicação, como folders, cartazes e publicações;

organograma;

composição dos conselhos;

quadro de pessoal, com nome, formação, função, tempo de casa e remuneração, em valor aproximado;

quadro com resumo dos programas e projetos realizados e em andamento.

A segunda estratégia é a realização de entrevistas individuais e confidenciais com representantes dos diversos níveis da organização – governança, direção e equipe – e, quando possível, da população por ela atendida. O CEOS entende que os profissionais envolvidos na entidade têm ciência a respeito de sua realidade e devem ser ouvidos, para que o Centro possa, a partir desse mosaico de perspectivas, formar uma “fotografia” o mais completa possível.

Cada conversa tem duração média de uma hora, atendendo a um roteiro com cerca de trinta per-guntas, divididas em três blocos:

funcional: estrutura hierárquica da organização, distribuição de papéis e responsabilidades, estratégias de planejamento e supervisão das ações;

institucional: percepção do entrevis- tado sobre a evolução da organização, entendimento sobre governança, conhecimento da missão, dos valores, dos princípios e dos documentos-guia da organização, bem como de seu modelo de sustentabilidade financeira;

comportamental: mapeamento de desafios e oportunidades, talentos e limitações, expectativas e desejos da organização e da equipe, sob a visão do entrevistado.

A partir dos insumos levantados por meio des-ses dois caminhos, a equipe do CEOS gera um relatório composto por:

breve histórico da organização;

aspectos positivos: as forças da organização;

aspectos negativos: os desafios que a organização precisa superar;

os objetivos traçados para a Assessoria CEOS, diante do cenário identificado;

os resultados esperados;

o plano de trabalho do programa para a organização;

recomendações à liderança;

conclusão.

Cabe destacar a importância da condução dessa etapa do programa por um profissional sênior. É preciso experiência e sensibilidade para que sejam identificados os aspectos críticos da organização, principalmente em relação ao reconhecimento das tensões invi-síveis, não verbalizadas pelos entrevistados. Nem sempre quem está diretamente envol-vido no cotidiano da entidade tem clareza a respeito das fontes dos desafios enfrentados, por não ter distanciamento crítico para tal – papel que cabe, então, ao consultor externo, devidamente capacitado para a tarefa.

Entre os conteúdos do relatório, é importante chamar a atenção para o plano de trabalho. Nele, são definidos os módulos temáticos que deverão ser trabalhados na organização. Embora haja uma linha mestra na metodologia

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da Assessoria CEOS, ela não é aplicada linearmente a todas as entidades, pois, como dito, cada uma delas tem desafios próprios a trabalhar. Assim, o plano de trabalho permite que o Centro personalize a Assessoria CEOS de acordo com a organização, dentro dos limites permitidos pelo formato do programa.

Depois de elaborado, o documento é enviado para consideração do principal gestor da organização. A seguir, é feita uma leitura compartilhada entre a liderança e a equipe do CEOS, página por página. Nesse momento, possíveis divergências são equacionadas e o plano de trabalho é validado, com o estabelecimento de cronograma, carga horária, metas e responsáveis para cada ação.

Na visão do CEOS, a entrega de um relatório-diagnóstico para a organização justifica-se por motivos diversos. Inicialmente, há um fator simbólico: por tratar-se de um programa cujos resultados não são percebidos em curto prazo, é importante a elaboração de produtos palpáveis, que tornem tangíveis os esforços. Além disso, a discussão conjunta do documento permite o alinhamento com a direção a respeito do cenário encontrado pelo CEOS no diagnóstico e das condutas a serem adotadas ao longo da Assessoria CEOS. Enquanto mediador em um processo de mudança que, naturalmente, gera um ambiente de incerteza e desconforto, o Centro necessita desse alinhamento para que tenha legitimidade na gestão de conflitos e dúvidas.

Outro aspecto importante é que, uma vez que a responsabilidade por operacionalizar as ações propostas pelo programa cabe unicamente à organização, a aprovação conjunta do plano de trabalho torna-se um passo fundamental para engajar o grupo em torno da Assessoria CEOS. É com essa intenção que uma versão executiva do relatório validado pela instância gestora é apresentada a toda a equipe da organização, inclusive como maneira de dar uma devolutiva para o grupo, que contribuiu para o diagnóstico por meio das entrevistas concedidas.

Módulos

Com a validação do plano de trabalho, dá-se início à realização dos módulos temáticos definidos para a organização. Cada módulo é conduzido por um consultor, em visitas ou oficinas presenciais com duração média de três dias, das quais participam os profissionais da organização que se dedicam ao respectivo tema e/ou a principal instância da entidade, no caso de temas transversais, como planejamento estratégico e governança. Ao final do módulo, a equipe da entidade tem como resultado produtos e planos de trabalho específicos.

O formato de trabalho in loco permite ao consultor atuar diretamente com os membros da organização que, no cotidiano, respondem por aquela área. Esse contato direto garante que tais profissionais sejam ouvidos em suas demandas, dúvidas e ansiedades. Dessa forma, tanto a intervenção do consultor na organização torna-se mais precisa e produtiva quanto os profissionais recebem uma formação específica em seu campo de atuação.

Apresentamos a seguir, em linhas gerais, os principais conteúdos trabalhados em cada um dos módulos. Antes, porém, cabe retomar a noção de visão sistêmica que conduz o trabalho do CEOS. O formato baseado em módulos exige que a entidade direcione atenção integral para cada tema, uma vez que não são realizados dois módulos simultâneos. Ao final do processo, o grupo é capaz de distinguir como todas as esferas que compõem a organização têm impacto sobre o bom andamento do conjunto, o que evidencia o fato de que a entidade precisa se fortalecer enquanto um todo articulado, e não a partir de uma visão que se restrinja a determinados elementos da vida institucional.

Planejamento estratégico

Para as organizações cujo diagnóstico identificou a necessidade de realização do planejamento estratégico, é esse o primeiro tema a ser trabalhado pela Assessoria CEOS. É por meio

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dele que a entidade reflete sobre seu futuro e define as diretrizes e metas para tal, resoluções que devem ser consideradas pelos módulos seguintes. “Planejar é falar do futuro, do destino. Um processo de planejamento tem como objetivo definir a rota e estabelecer os limites e indicadores que serão usados como referência para manter-se no caminho escolhido.”11

Com base nos insumos trazidos pelo diagnóstico, o consultor promove uma oficina com duração de três dias, em um espaço fora da sede da organização, da qual participam liderança e equipe. Por meio de um debate coletivo, aspectos fundantes da organização são colocados em pauta, de maneira a alinhar conceitos e visões a respeito da entidade: missão, visão, valores e princípios; forças, oportunidades, fraquezas e ameaças; e diretrizes e objetivos estratégicos para os próximos cinco anos.

Para muitas organizações, tal oficina representa uma experiência inédita de reunião de todo o seu grupo interno para troca de impressões sobre o trabalho realizado pela entidade. É preciso, portanto, delicadeza na condução e no trato das questões levantadas, que não raro envolvem aspectos da vida institucional alheios ao campo do planejamento estratégico. Fica clara, novamente, a importância da presença de um profissional sênior, com familiaridade em relação ao cotidiano de uma organização sem fins lucrativos, para que haja compreensão a respeito das especificidades que regem as relações pessoais no interior de uma entidade dessa natureza.

Além disso, é necessário considerar que, imersas no atendimento das demandas cotidianas, tanto a equipe quanto a própria liderança acabam condicionadas a pensar em termos operacionais, e não estratégicos. Dessa forma, a oficina tem de estimular uma mudança de olhar do grupo a

11 Beatriz Ferrari Masson, Helena Maria de Jesus Cravo Roxo, Marta Campos de Oliveira e Roberto Rivetti Suelloto, “Auto-avaliação em instituições financeiras: estudos de casos”, em Rosa Maria Fischer e Elidia Maria Novaes (orgs.), Construindo a cidadania: ações e reflexões sobre empreendedorismo e gestão social (São Paulo, CEATS-FIA, 2005), p. 102.

respeito de sua prática. É fundamental que os participantes compreendam a importância de dedicar tempo e atenção a aspectos intangíveis da organização, os quais, ainda que pareçam secundários em curto prazo, são definitivos para a solidez da entidade.

Em termos de conteúdo, a oficina aborda os seguintes temas, de acordo com a estrutura lógica a seguir:

cenário do terceiro setor brasileiro

evolução histórica, em termos gerais;

especificidades da gestão social;

sustentabilidade nesse contexto;

planejamento estratégico: alinhamento de conceitos

o que é;

matriz de planejamento;

matriz de planejamento estratégico: propósito, missão, visão de futuro, diretrizes estratégicas e objetivos estratégicos;

matriz de planejamento operacional: ações, projetos, metas, indicadores e orçamento;

matriz FOFA – forças, oportunidades, fraquezas e ameaças12

forças em relação ao ambiente interno da organização: pontos fortes, causas do sucesso, impactos positivos e sugestões de ações potencializadoras;

fraquezas em relação ao ambiente interno: pontos críticos, causas da fragilidade, impactos negativos e sugestões de ações para neutralizá-los;

12 Da sigla em inglês SWOT: strengths, weaknesses, op-portunities and threats.

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oportunidades relativas ao ambiente externo da organização: situações de natureza política, econômica, social, tecnológica ou legal, entre outras, que, se conhecidas a tempo, poderão ser bem aproveitadas pela instituição, caso haja condições internas para tal;

ameaças relativas ao ambiente externo: situações de natureza política, econômica, social, tecnológica ou legal, entre outras, que, se conhecidas a tempo, poderão ter seu impacto neutralizado, caso haja condições internas para tal;

missão, visão, valores, princípios e públicos

visão: por que e para que a organização existe;

missão: o que a organização faz, para quem, onde, com que finalidade e, se necessário, como;

valores e princípios: como a organização realiza seu trabalho;

públicos: para quem a organização trabalha;

construção das diretrizes estratégicas e dos objetivos estratégicos

o que é;

correlação entre os objetivos estratégicos e as linhas programáticas da organização.

A partir da discussão coletiva de todos esses aspectos, são desenvolvidos os seguintes produtos: matriz de planejamento estratégico preenchida; matriz de planejamento operacional preenchida; matriz FOFA preenchida; consolidação do texto da missão, visão, valores e princípios da organização; identificação de práticas e

comportamentos internos que, de acordo com o grupo, devem ser estimulados ou descartados para que haja mudanças na vida institucional. Todo esse material compõe uma espécie de kit, que deve ser de conhecimento de todos e estar sempre à disposição para consulta.

Ao final desse módulo, espera-se que a organização tenha um posicionamento claro e possa apoiar-se em critérios objetivos na tomada de decisão e na definição de prioridades, sempre tendo em mente as metas de longo prazo desenhadas. Além disso, as definições estratégicas desse módulo darão elementos para pautar a comunicação da organização, valorizar os programas e projetos – desenvolvidos de maneira a atender a diretrizes estratégicas claras – e orientar a captação de recursos.

Governança

Ainda que seja um aspecto indispensável da vida institucional das organizações sem fins lucrativos, a governança é um conceito estranho a muitas delas. Em geral, não há clareza sobre a que se refere o conceito, qual é seu real papel na organização e de que maneira as instâncias que a compõem se relacionam com as ações cotidianas da entidade.

O que está em jogo, como o termo indica, é o ato de governar. No contexto das organizações sem fins lucrativos, discutir a governança significa voltar a atenção para esferas como a assembleia de sócios e os conselhos (deliberativo, consultivo, fiscal, entre outros), que orientam a diretoria na condução da entidade e conferem a ela a devida transparência, quando em pleno funcionamento. Conforme a organização evolui – número maior de beneficiários, aumento no quadro de pessoal e expansão do orçamento, por exemplo –, sua estrutura administrativa tende a se tornar cada vez mais complexa. É fundamental que a liderança tenha apoio na tomada de decisões estratégicas.

Nesse sentido, é preciso que as instâncias que compõem a governança não sejam encaradas

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pela liderança e equipe como esferas desca-sadas da organização, existentes apenas para cumprir formalidades jurídicas. É necessário que haja clareza a respeito da contribuição que cabe à governança e de como ela se articula com os outros níveis da entidade:

à governança cabe pensar a estratégia da organização, tendo em mente um horizonte de cinco a dez anos. Instâncias como a assembleia de sócios e os conselhos refletem sobre os caminhos e orientações que permitirão à entidade atingir o ponto desejado em longo prazo, os recursos necessários para tal, as potencialidades a serem fortalecidas e as limitações a serem enfrentadas;

à diretoria cabe pensar a tática da organização, em um horizonte de um a dois anos. Seu objetivo é definir como atender às orientações estratégicas da governança, identificando os instrumentos, métodos e ferramentas que tornarão possível à entidade chegar ao ponto desejado em longo prazo;

à equipe, por fim, cabe a execução da tática definida pela diretoria, por meio do trabalho técnico. É essa construção cotidiana que, repetida e melhorada ao longo dos anos, viabilizará, na prática, o alcance do ponto de transformação desejado pela governança.

O que a experiência do CEOS mostra é que nem sempre há entendimento a respeito dos papéis e responsabilidades atribuídos a cada um dos níveis, confusão que pode impactar de maneira negativa nos fluxos de trabalho e de tomada de decisão da entidade. É comum que uma esfera se aproprie de tarefas que caberiam à outra, o que tanto gera vácuos na divisão de funções quanto deixa a equipe desamparada em relação a quem se voltar para apoio.

No processo da Assessoria CEOS, é o diagnós-tico situacional que estabelece o modo como a governança será trabalhada. Nas organizações

onde não é necessária uma intervenção direta, o tema é incorporado ao módulo de planeja-mento estratégico, por meio da exposição de conceitos básicos e definições gerais, durante a realização da oficina.

Há casos, no entanto, em que a revisão dos documentos jurídico-institucionais, do proces-so da governança e do relacionamento entre direção e conselhos – tarefa que faz parte da construção do diagnóstico – leva o CEOS a propor ajustes, o que pode envolver inclusive a definição de um novo processo e uma nova es-trutura de governança. Nesse caso, é realizada uma oficina com duração de dois a três dias, fora da sede da entidade, com a participação dos membros da assembleia ou do principal conselho e da liderança.

A oficina atende a dois objetivos principais: por um lado, alinhar e ouvir os conselheiros em relação ao planejamento estratégico de-finido pela liderança e equipe no âmbito da Assessoria CEOS; e, por outro, sugerir alte-rações na governança, seja para adequá-la a exigências legais que eventualmente não es-tavam sendo contempladas, seja para poten-cializar a contribuição trazida pelas diferentes instâncias à organização. A oficina trabalha os seguintes conteúdos:

apresentação dos principais pontos do diagnóstico situacional

fontes de informação utilizadas;

principais pontos positivos e negativos identificados;

atual estrutura de governança da organização;

atual modelo de sustentabilidade;

cenário do terceiro setor brasileiro

evolução histórica, em termos gerais;

especificidades da gestão social;

sustentabilidade nesse contexto;

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governança: alinhamento de conceitos

o que é;

ciclo de vida das organizações sem fins lucrativos;

papéis e responsabilidades dos conselheiros;

instâncias possíveis, com respectivas funções;

atual processo de governança da organização;

estrutura de governança sugerida pelo CEOS;

planejamento estratégico: alinhamento de visões

consolidação da missão, visão, valores e princípios;

matrizes de planejamento estratégico, operacional e FOFA do ponto de vista dos conselheiros;

perguntas de reflexão para os conselheiros;

construção de um plano de trabalho para a governança

proposta e aprovação de um novo processo de governança;

definição de um calendário de encontros para o conselho.

Caso seja necessária uma revisão realmente profunda da governança, que envolva alterações em sua estrutura e composição, a Assessoria CEOS apoia a liderança da organização em cada passo desse processo: contribui na identificação de possíveis membros para cada instância, no estabelecimento de estratégias de abordagem, no conteúdo da carta-convite, na definição de quais materiais devem ser entregues ao conselheiro e, por fim, na mediação da reunião de posse. O objetivo do Centro é auxiliar o gestor para que,

ao final do programa, a nova estrutura de governança esteja funcionando de fato.

Esse trabalho direto com os conselheiros traz outro resultado fundamental: o engajamento desses atores em torno da organização. Um esforço de alinhamento como o promovido pela oficina aproxima a governança do cotidiano da entidade, contribuindo para tornar esse relacionamento mais tangível. Além disso, a clareza mútua a respeito de papéis e responsabilidades ajuda a conter expectativas, o que é uma proteção tanto para a liderança quanto para os conselheiros, uma vez que ambos passam a conhecer os limites de sua atuação e de quanto demandar do outro – o que é essencial para o estabelecimento de uma relação saudável e produtiva.

Gestão de programas e projetos

A realização de programas e projetos sociais é a base do trabalho de toda organização sem fins lucrativos. No entanto, nem sempre as ações desenvolvidas consideram as diretrizes estratégicas definidas pela entidade. É comum a implementação de projetos que visam responder a demandas emergenciais identificadas pela organização, relegando a um segundo momento a reflexão sobre de que maneira esse projeto se justifica quando observado em diálogo com os objetivos em longo prazo da entidade. É necessário também que as políticas, os programas e os projetos sejam planejados e operados a partir de uma concepção lógica. Deve haver integração entre as ações, idealizadas de forma articulada, e não descasadas.

Partindo desses pressupostos, o módulo é organizado de maneira a contribuir para que a organização retome um olhar estratégico a respeito dessa esfera de seu trabalho. Não à toa, conteúdos e definições tratados no planejamento estratégico são retomados aqui, como pano de fundo para o debate. São apresentados conceitos, práticas e instrumentos de elaboração, implementação e avaliação de programas e projetos sociais, com base nas ações já desenvolvidas pela organização,

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visando aproximar tais conceitos da realidade dos participantes.

Para tanto, é realizada uma oficina de três dias, na sede da entidade, da qual participam os membros da equipe responsáveis pela área de gestão de programas e projetos. A fim de fami-liarizar-se com a organização, o consultor soli-cita o envio prévio das seguintes informações:

projetos realizados nos últimos três anos;

expectativas da organização em relação ao módulo;

desejos e necessidades específicos da equipe em relação ao módulo.

Cada dia da oficina envolve uma parte exposi-tiva e outra prática. Os conteúdos abordados são os seguintes:

política, programa e projeto

o que é;

a lógica da ação planejada;

planejamento na área social

especificidades;

metodologias;

pressupostos conceituais e valorativos;

elaboração de projeto

construção da árvore de problemas e objetivos;

identificação dos atores envolvidos;

escolha das alternativas de ação;

estrutura básica e escrita do documento;

marco lógico: matriz de planejamento do projeto

o que é;

objetivos;

componentes;

monitoramento e avaliação

conceitos de eficiência, eficácia e efetividade;

indicadores de processo, resultados e impacto;

marco zero;

componentes

Os resultados trazidos pelo módulo são tanto estratégicos quanto práticos. Por um lado, a or-ganização passa a ter elementos para reavaliar e sistematizar sua carteira de programas e pro-jetos, considerando a pertinência e relevância das ações em relação à sua causa e garantindo, assim, coerência entre o discurso e a prática. Além disso, uma carteira organizada e articula-da contribui para a revisão do fluxo operacional da entidade, o que tem impacto positivo no pró-prio desenvolvimento das ações – e por isso, em alguns casos, também na otimização de re-cursos –, além de reforçar uma leitura sistêmica de gestão organizacional.

Por outro lado, o módulo tem resultados tam-bém no que se refere à agilidade na redação dos projetos. Discutir a lógica que rege as ações desenvolvidas pela entidade permite criar um padrão de escrita que facilita a tarefa. Os direcionamentos recebidos, como clareza, coerência, abordagem e linguagem, geram do-cumentos de melhor qualidade. Esse esforço tem impacto direto no trabalho de captação de recursos, além de dar insumos para a comuni-cação institucional.

Comunicação estratégica

Se entendemos a comunicação como um processo de comunhão, no sentido de compartilhar e tornar comuns ideias, valores e iniciativas, a importância de ações de disseminação e mobilização em torno das bandeiras de uma organização sem fins lucrativos torna-se clara. É por meio da comunicação que a entidade articula atores

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diversos – sejam eles financiadores, apoiadores, público-alvo ou órgãos públicos –, o que torna o planejamento dessa área um fator fundamental para seu sucesso.

Partindo do entendimento de que o ato de comunicar-se é essencialmente intuitivo, é comum que as organizações sem fins lucrativos desenvolvam práticas e produtos de comunicação institucional de maneira orgânica e imediata, sem que atendam a objetivos prévios ou se articulem de forma clara. No entanto, a partir de determinado estágio organizacional, esse modelo atinge seu limite, passando a ter impactos consideráveis na eficiência e eficácia do trabalho desenvolvido. É preciso que se estabeleça um planejamento para a área de comunicação, de maneira a torná-la mais um elemento que impulsiona a entidade em direção ao cumprimento de sua missão.

Dessa forma, o objetivo do módulo é definir um plano de comunicação que atenda às definições do planejamento estratégico da entidade. A tarefa implica estabelecer uma linha de comunicação que paute todos os diferentes produtos, tanto em termos de identidade visual quanto de linguagem e mensagens que componham seu conteúdo.

O plano de comunicação é construído de maneira colaborativa entre consultor e entidade, em uma oficina de três dias, realizada em sua sede, com membros da equipe dedicados à área de comunicação. Antes do trabalho presencial, o consultor analisa os seguintes documentos enviados previamente pela organização:

planejamento estratégico;

organograma;

breve descrição de cargos e perfis dos profissionais ou dirigentes que respondem pela comunicação;

plano de ação de comunicação;

manual de identidade visual;

exemplos de produtos de comunicação (site, folders, cartazes, folhetos);

exemplos de comunicados, ofícios e documentos oficiais;

exemplos de veiculação na mídia sobre a organização e seus dirigentes;

exemplos do acervo fotográfico.

Na oficina, são abordados os seguintes conteúdos:

comunicação

o que é;

por que nos comunicamos;

contexto cultural;

processo comunicacional;

desafios para a comunicação no terceiro setor

tipos de organização;

barreiras para a comunicação;

redes formal e informal;

marketing

o que é;

princípios básicos;

marketing aplicado ao mercado x marketing social;

planejamento

para que comunicar;

por que planejar;

como planejar;

componentes.

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A discussão desses elementos permite que a equipe identifique e defina, com o apoio do consultor, os diferentes aspectos que compõem o plano de comunicação. São eles:

objetivos geral e específicos da comunicação da entidade;

mensagens-chave;

mapeamento dos públicos de interesse da organização, por prioridade;

mapeamento e descrição dos produtos de comunicação que atenderiam a cada um desses públicos;

porta-vozes e respectivas alçadas.

A partir dessas decisões, a entidade organiza o que, como e para quem dizer. Sua comunicação institucional passa a ter foco e objetivos claros, atingindo e engajando os públicos que lhe são prioritários e, principalmente, evitando desgaste e desperdício de recursos em torno de ações aleatórias. Estabelece-se também um plano operacional, que estimula a organização a pre-ver prazos, custos, cronogramas e responsáveis para a implementação do que foi planejado.

O exercício de reflexão e construção proposto por esse módulo contribui para que a organi-zação tenha entendimento claro acerca de sua identidade e imagem, o que melhora seu posi-cionamento. Nesse sentido, é essencial que o módulo reflita sobre as especificidades da co-municação na área social, cujo conteúdo deve ser cuidadoso no respeito aos valores e princí-pios da entidade e na forma como seu púbico beneficiário é retratado. Fica clara, assim, a importância de um profissional com experiência no terceiro setor para a condução dessa tarefa.

O módulo impacta também na qualidade dos produtos de comunicação, que passam a ter linguagem e identidade visual uniformes – ou seja, há alinhamento entre site, folders, cartazes, releases para imprensa etc. –,

bem como na agilidade e eficiência do fluxo operacional, uma vez que são estabelecidas referências e prioridades para o trabalho. Por fim, cabe apontar, tendo em vista a discussão promovida no capítulo anterior a respeito do atual contexto do setor social, que ser uma organização bem posicionada, cuja missão é compreendida e valorizada pelos stakeholders e sociedade em geral, é cada vez mais um fator definitivo para sua sustentabilidade e relevância.

Gestão administrativo-financeira e implantação de sistema financeiro

A área financeira é, sem dúvida, onde reside o maior nível de ansiedade por parte das organizações sem fins lucrativos. A realização desse módulo é cercada por expectativas, de maneira a exigir do CEOS especial atenção no alinhamento com a entidade a respeito de formato, conteúdo e objetivos do trabalho realizado pelo programa nessa esfera da vida organizacional. É esse o único tema no qual a Assessoria CEOS auxilia a entidade na operacionalização dos processos, no caso da implantação do sistema financeiro.

Tal qual discutido nos módulos de gestão de programas e projetos e comunicação estratégica, o que se observa é uma lógica que entende a gestão dessa área como uma esfera que se encerra em si mesma, e não que deve responder à estratégia da organização. Como resultado, tem-se uma gestão administrativo-financeira pautada em resoluções imediatistas, que acabam por reduzir os esforços relacionados a estratégias que promoveriam a sustentabilidade da organização em longo prazo – o que é cada vez mais urgente.

Nesse sentido, a intervenção da Assessoria CEOS visa aperfeiçoar processos, de forma a tornar a entidade mais sustentável ao longo do tempo, bem como a rever seus procedimentos e sistemas de controle internos, contribuindo para que sejam mais eficientes e transparentes. Para tal, o trabalho é dividido em dois módulos.

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O primeiro, com um olhar essencialmente estratégico, atua sobre a gestão administrativo-financeira em seus processos e diretrizes. O consultor realiza uma visita técnica de dois dias, mediada pelo principal responsável pela área na organização. São levantadas todas as informações referentes à rotina administrativo-financeira da entidade, o que inclui entrevistas com os membros da equipe que trabalham com o tema. Além disso, antes da visita, o consultor analisa os seguintes materiais, quando existentes:

documento formal de constituição da organização;

regimentos, normas e regulamentos internos;

planejamento estratégico;

relatório de atividades mais recente;

organograma;

quadro de pessoal, com função, cargo, tipo de vínculo empregatício estabelecido com a organização, jornada mensal e remuneração;

termos de colaboração, convênio, parcerias e contratos estabelecidos com outras organizações, inclusive governamentais;

relatório financeiro do ano anterior, especificando as diferentes fontes de financiamento e o total de recursos oriundos de cada uma delas;

orçamento para o ano corrente;

documentos contábeis formais relativos aos últimos três semestres;

outras planilhas que contenham dados financeiros relativos ao ano anterior e ao ano corrente, bem como projeções para o ano seguinte.

A partir das informações levantadas, o con-sultor desenvolve uma proposta de inter-

venção para a área administrativo-financei-ra da entidade, registrada em um relatório composto pelos seguintes conteúdos:

objetivos do plano;

riscos e oportunidades identificados;

características das receitas;

processos de trabalho e estrutura organizacional;

proposta de intervenção, na forma de um plano de ação;

conclusões.

O plano de ação estrutura as medidas que o consultor sugere serem adotadas pela organização, visando mitigar os riscos e fomentar as oportunidades identificadas. Para cada ação, o profissional do CEOS apresenta os resultados esperados, os indicadores de resultado, um responsável da organização que responderá por sua execução e uma sugestão de prazo.

Entre as recomendações feitas pela proposta de intervenção, é constante a necessidade de implantação de um software integrado de gestão financeira, uma vez que a maioria das organizações controla suas finanças por meio de programas de uso genérico, como Excel, limitados em sua confiabilidade e eficiência. É para apoiar a equipe da entidade nessa tarefa que se realiza o segundo módulo, agora com foco no aspecto prático da gestão administrativo-financeira.

Para tal, o consultor responsável por essa etapa realiza uma visita de cinco dias à organização, trabalhando diretamente com os funcionários responsáveis pela área. O sistema informatizado é implantado e configurado com o apoio do consultor, que se responsabiliza por treinar os funcionários da organização para o uso cotidiano do software.

Ao final dos dois módulos, a organização terá uma gestão administrativo-financeira efetiva e adequada às suas necessidades, com planos

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de controle orçamentário e administrativo revisitados ou implantados e estruturação ou revisão de procedimentos que visem criar uma rotina consolidada de trabalho para a área. Além disso, espera-se que possíveis ajustes sugeridos no modelo de receita, como a incorporação de novas atividades, resultem em aspectos como a ampliação do número de produtos e serviços remunerados oferecidos pela organização, a diversificação de suas fontes de financiamento e o aumento de sua receita.

Tecnologia da informação

Para além de módulos que tratam dos processos da organização, como os discutidos acima, a Assessoria CEOS dedica atenção também à sua infraestrutura. Isso se dá porque o Centro entende que as condições nas quais a equipe trabalha têm impacto direto em sua produtividade e em seu engajamento, assim como uma gestão inteligente de seus recursos tecnológicos e espaciais pode favorecer o fluxo operacional e reduzir custos, por meio da adoção de medidas de consumo consciente e otimização de recursos.

Para o módulo de tecnologia da informação, o primeiro passo é o preenchimento, pela organização, de um questionário online, cujo objetivo é permitir ao consultor familiarizar-se com as condições de tecnologia da entidade. O questionário aborda os seguintes temas:

informações sobre a equipe;

disponibilidade de verba;

quantidade e tipos de equipamentos;

informações sobre ambiente de rede;

tipo de uso da internet;

práticas de manutenção dos equipamentos;

tipos de softwares utilizados.

A seguir, o consultor realiza uma visita técnica

de dois a três dias à entidade. Na ocasião, é feita uma avaliação das instalações físicas e dos recursos existentes em tecnologia da informação, seguida por entrevistas com os responsáveis e usuários a respeito de sua avaliação sobre a situação atual, as demandas e necessidades.

Com base nas informações levantadas, o consultor organiza um plano de ação para a entidade. Ainda durante a visita, o plano é apresentado à equipe, para que seja discutido em conjunto. Uma vez realizados os ajustes necessários, formaliza-se um documento com o seguinte conteúdo:

avaliação sobre os recursos da organização

infraestrutura;

distribuição de dados;

equipamentos;

softwares;

ações sugeridas

imediatas (de três a seis meses);

de médio prazo (de seis meses ao fim da Assessoria CEOS);

de longo prazo (após a Assessoria CEOS).

As mudanças propostas são distribuídas tem-poralmente, de acordo com sua urgência, com o nível de intervenção exigido e com a alocação de recursos. Dessa forma, é possível que a orga-nização priorize as medidas de acordo com suas possibilidades orçamentárias. Além disso, ter cla-reza a respeito dos próximos passos estabelece metas concretas para a entidade, o que, por um lado, ajuda a conter ansiedades e, por outro, é um aliado importante na captação dos recursos que venham a contribuir na efetivação dessas ações.

Uma vez implantado, o plano de ação contribui para a produtividade da organização, por meio

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81Uma experiência em fortalecimentoinstitucional de organizações sem fins lucrativos

de elementos como agilidade no acesso aos do-cumentos e fluidez no processo de produção da equipe técnica. O bom uso dos equipamentos representa redução nos custos de aquisição e manutenção, bem como na incidência de pro-blemas técnicos na rede e nos bancos de dados da organização – onde, em geral, encontra-se armazenada toda a inteligência construída pela entidade, o que deve ser objeto de zelo. É por esse motivo que conteúdos como segurança e legalidade dos equipamentos são também abor-dados pelo plano de ação, visando proteger o patrimônio da organização.

Infraestrutura física

As condições dos espaços nos quais as ativida-des da organização sem fins lucrativos são reali-zadas costumam ser preteridas. Em um contexto de insegurança financeira, é cada vez mais raro que a organização seja proprietária de sua sede, o que agrava o lugar ocupado pela infraestrutura na lista de prioridades de investimento da entidade. Faz-se somente o estritamente necessário, sem que haja clareza sobre as diversas contribuições trazidas pelo uso inteligente do espaço para o for-talecimento da organização.

Nesse sentido, os principais objetivos do mó-dulo de infraestrutura física são: otimizar o uso do espaço disponível, visando aprimorar o fluxo operacional e a produtividade da equipe; adequar o espaço às exigências climáticas, estéticas, funcionais e legais; e reduzir os custos de manu-tenção e consumo de energia elétrica e água, o que representa economia não só financeira, mas também dos recursos naturais.

O módulo se dá por meio de uma visita técnica de dois a três dias à organização, precedida pelo envio dos seguintes documentos:

planta de todos os pavimentos, com layout existente, em via impressa e eletrônica;

fotos dos espaços internos e fachadas;

cópia das últimas doze contas de água e luz para análise do consumo;

listagem de todos os equipamentos eletroeletrônicos instalados e em uso, identificados por ambiente.

Tal qual no módulo de tecnologia da informação, a equipe responde a um questionário prévio, que mapeia as seguintes questões:

tipo de uso de cada espaço;

número de usuários de cada espaço;

percepções sobre gastos de água e energia elétrica;

percepções sobre uso e disposição dos ambientes e circulação neles;

qualidade dos móveis;

acessibilidade;

condições de iluminação e ventilação;

temperatura dos ambientes;

mapeamento de avarias, como infiltrações e rachaduras.

Na visita técnica, o primeiro passo é a verificação das necessidades identificadas pelo módulo de tecnologia da informação, de maneira a garantir a articulação entre as ações sugeridas pelos dois consultores. A seguir, os dados técnicos informa-dos são checados e, se necessário, complemen-tados. Por fim, é feito um estudo de caso pelo consultor, que analisa cada um dos ambientes da organização a partir dos seguintes aspectos:

acústica;

conforto térmico;

ventilação natural e artificial;

iluminação natural e artificial;

ergonomia;

equilíbrio estético;

tipo de uso do espaço;

atendimento às necessidades de uso.

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Uma experiência em fortalecimentoinstitucional de organizações sem fins lucrativos

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A partir das informações levantadas, o consultor organiza um relatório no qual aponta as inter-venções necessárias em todos os ambientes da organização. Seguindo a lógica do módulo de tecnologia da informação, as mudanças são divididas em curto, médio e longo prazos. Sugere-se, por exemplo, desde a simples troca do tipo de lâmpada utilizada ou a mudança na disposição dos móveis em uma sala, de maneira a facilitar a circulação de seus usuários, até a construção de novos espaços, o que exige uma intervenção relevante no ambiente.

O módulo estimula a organização a adotar cri-térios de eficiência e sustentabilidade em seus espaços, o que tanto os torna mais funcionais e produtivos quanto reduz o uso de recursos naturais e, portanto, também financeiros. Para as organizações que possuem sede própria, essa intervenção representa uma valorização importante do imóvel. Já para as que ocupam edifícios em regime temporário, investir nas condições de trabalho da equipe e no bom uso dos espaços traz retornos tangíveis e intangíveis que contribuem diretamente para sua solidez.

Plan

ejam

ento

estra

tégi

co • estimular o olhar estratégico, não só operacional, por parte do grupo• promover alinhamento a respeito de conceitos e visões sobre a organização• estabelecer diretrizes estratégicas para o trabalho da organização em longo prazo

Informações levantadas pelo diagnóstico situacional

Oficina de três dias, fora da organização, com liderança e equipe

• cenário social brasileiro• o que é planejamento estratégico e operacional• matriz FOFA• missão, visão, valores e princípios e públicos• diretrizes e objetivos estratégicos

• matrizes preenchidas, em documento conhecido e apropriado por todos• organização com posicionamento claro• critérios de decisão e definição de prioridades estabelecidos• missão e visão consolidadas• elementos para orientar a comunicação, os programas e projetos e a captação de recursos

Módulo Objetivos Insumos Formato Conteúdos Resultados/produtos

Módulo Objetivos Insumos Formato Conteúdos Resultados/produtos

Gove

rnan

ça • alinhar governança e diretoria sobre papéis e responsabilidades• engajar os membros da governança em torno da organização• promover ajustes no processo e na estrutura de governança, se necessário

Informações levantadas pelo diagnóstico situacional; se necessário, insumos do módulo de planejamento estratégico

Parte da oficina de planejamento estratégico; se necessário, oficina de dois a três dias, fora da organização, com conselheiros e liderança

• o que é governança• papéis e responsabilidades• as diferentes instâncias e suas funções• formas possíveis de estrutura de governança

• diretoria e governança atuando com clareza sobre os limites e responsabilidades de cada um • conselheiros engajados • estrutura de governança funcionando de fato • criação de novas instâncias, se necessário

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83Uma experiência em fortalecimentoinstitucional de organizações sem fins lucrativos

Módulo Objetivos Insumos Formato Conteúdos Resultados/produtosGe

stão

de

prog

ram

as

e pr

ojet

os• estimular o olhar estratégico do grupo a respeito da carteira de programas e projetos • estabelecer uma concepção lógica, ordenada e articulada para o planejamento e a operação de políticas, programas e projetos

Insumos do módulo de planejamento estratégico e dados institucionais específicos solicitados pelo consultor

Oficina de três dias, na organização, com equipe pertinente

• o que é política, programa e projeto• planejamento e elaboração de projeto• marco lógico• monitoramento e avaliação

• carteira de programas e projetos reavaliada e sistematizada, pertinente em relaçãoà causa e alinhada com as diretrizes doplanejamento estratégico da organização• coerência e consistência na relação lógica entre os elementos de um projeto e clareza e concisão em sua escrita • elementos para o fluxo operacional, comunicação e captação de recursos

Módulo Objetivos Insumos Formato Conteúdos Resultados/produtos

Com

unic

ação

es

traté

gica

• definir um plano de comunicação que atenda às diretrizes estratégicas • definir uma linha de comunicação, com identidade visual, linguagem e discurso alinhados

Insumos do módulo de planejamento estratégico e dados institucionais específicos solicitados pelo consultor

Oficina de três dias, na organização, com equipe pertinente

• o que é comunicação• comunicação no terceiro setor• marketing aplicado ao mercado x marketing social• planejamento de comunicação

• plano de comunicação e operacional preenchidos• identidade e imagem definidas• melhor posicionamento da organização• produtos de comunicação com forma e conteúdo uniformes• produção e fluxo operacional mais eficientes e ágeis

Módulo Objetivos Insumos Formato Conteúdos Resultados/produtos

Gest

ão a

dmin

istra

tivo-

finan

ceira

e

impl

anta

ção

de s

istem

a fin

ance

iro • aperfeiçoar os processos vinculados à gestão administrativo-financeira • oferecer ferramentas de planejamento e controle orçamentário que ajudem a tornar a organização mais sustentável em longo prazo• rever e ajustar os procedimentos e sistemas de controle internos, visando torná-los mais eficientes

Insumos do módulo de planejamento estratégico e dados institucionais específicos solicitados pelo consultor

Visita técnica de dois dias à organização; treinamento de cinco dias para equipe pertinente

• revisão da gestão administrativo- financeira• riscos e oportunidades identificados• características das receitas• processos de trabalho estrutura organizacional• formas de intervenção

• software integrado de gestão financeira instalado e em uso• equipe pertinente treinada para o uso do software• processos e procedimentos de gestão estruturados ou revistos• planos de controle orçamentário e administrativo revisitados ou implantados

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Módulo Objetivos Insumos Formato Conteúdos Resultados/produtosTe

cnol

ogia

da

info

rmaç

ão

• aprimorar o uso e a qualidade dos recursos tecnológicos da organização• contribuir com a produtividade e o engajamento da equipe• reduzir custos

Informações específicas solicitadas pelo consultor

Questionário online respondido pela equipe; visita técnica de dois a três dias à organização

• infraestrutura tecnológica• distribuição de dados• equipamentos• softwares• segurança e legalidade dos recursos

• plano de ação com medidas em curto, médio e longo prazos definido• fluxo operacional aprimorado• redução de despesas com manutenção e suprimentos• redução na incidência de problemas técnicos

Módulo Objetivos Insumos Formato Conteúdos Resultados/produtos

Infra

estru

tura

fís

ica

• otimizar o uso do espaço, visando aprimorar o fluxo operacional e a produtividade da equipe• adequar o espaço às exigências climáticas, estéticas, funcionais e legais• reduzir custos de manutenção e consumo de energia elétrica e água

Insumos do módulo de tecnologia da informação e informações específicas solicitadas pelo consultor

Questionário respondido pela equipe; visita técnica de dois a três dias à organização

• acústica• conforto térmico• ventilação natural e artificial• iluminação natural e artificial• ergonomia• equilíbrio estético• eficiência no uso do espaço

• plano de ação com medidas em curto, médio e longo prazos definido• espaços mais funcionais, com circulação facilitada e melhores condições de trabalho para a equipe• fluxo operacional aprimorado • redução nos custos com energia elétrica e água• imóvel valorizado, quando sede própria

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Plano diretor de sustentabilidade

Uma vez encerrada a realização dos módulos temá-ticos determinados para cada organização, a última etapa da Assessoria CEOS é o desenvolvimento do plano diretor de sustentabilidade pelas enti-dades, com o apoio da equipe do Centro. Trata-se de uma espécie de plano de negócios, cujo preen-chimento estimula a organização a reunir e articular em um mesmo documento todos os conteúdos trabalhados pelo programa ao longo dos módulos. Esse plano guiará a captação de recursos pela organização, tanto instituindo metas claras e justifi-cadas para o trabalho quanto organizando um arquivo-síntese que servirá de base sempre que a entidade precisar escrever um projeto para um potencial financiador.

Ao exigir o cruzamento de informações traba-lhadas em diferentes módulos, o exercício de construção desse plano torna tangível à lide-rança e sua equipe o olhar sistêmico a respeito da gestão que o CEOS pretende promover. Além disso, é por meio desse documento que o Centro evidencia o entendimento de que a captação de recursos não é uma tarefa que se encerra em si mesma, mas sim deve ser pen-sada ao final de um processo que passa, antes, pelo desenvolvimento de uma visão estratégi-ca da organização.

Para desenvolvê-lo, a organização deve res-ponder a um roteiro fornecido pelo CEOS, bem como preencher tabelas desenhadas para servir de insumo ao plano, cuja estru-tura é a seguinte:

bloco 1. apresentação da instituição

propósito, missão, visão, princípios e valores;

fatos importantes da sua história;

conquistas alcançadas e os diferenciais do seu trabalho;

seu papel na comunidade e os serviços prestados;

apresentação dos principais números

(pessoas beneficiadas, localidades nas quais atua etc.);

apresentação da equipe e dos membros da governança;

bloco 2. cenário

os desafios sociais que a organização pretende solucionar, considerando a matriz FOFA;

estratégias e soluções desenvolvidas pela organização para responder a tais desafios;

metas e objetivos: resultados que serão obtidos e público beneficiado;

bloco 3. menu de projetos

apresentação do(s) projeto(s) proposto(s) pela organização;

custos vinculados a cada projeto;

orçamento total resumido;

apresentação dos apoiadores já assegurados;

bloco 4. retorno para os financiadores

apresentação dos benefícios e retornos para os financiadores do projeto (inserção de logo em produtos de comunicação, contrapartida em horas técnicas, como palestras e formações para a equipe do financiador etc.);

bloco 5. conclusão

bloco 6. possíveis anexos

orçamento detalhado do projeto;

outras informações que a organização julgar importante.

O CEOS estimula que o plano seja desenvolvido

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Uma experiência em fortalecimentoinstitucional de organizações sem fins lucrativos

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não de maneira individual pelo gestor, mas em conjunto com a equipe. Trata-se de um processo trabalhoso, que envolve discussões a respeito da organização, o que é essencial para a construção de alinhamento e engajamento internos. A intenção é que o documento seja revisto a cada ano, para que siga relevante no papel de guia para o trabalho da entidade.

Visando apoiar o preenchimento do plano e das tabelas por parte da organização e alinhar conceitos básicos sobre captação de recursos, é realizada uma aula presencial, em São Paulo, para os principais gestores das entidades. A aula é ministrada pela equipe do CEOS e aborda os seguintes conteúdos:

a cadeia lógica da captação de recursos;

o plano diretor de sustentabilidade

o que é;

ponto de partida: a matriz do planeja mento estratégico;

etapas da captação de recursos;

passos do desenvolvimento do documento-base.

Essa reunião também atua como um evento de encerramento da Assessoria CEOS. Após a manhã de trabalho dedicada à aula, são reali-zados dois outros momentos. O primeiro é um plantão de dúvidas, com a presença dos con-sultores de todos os módulos, para que os gestores possam aproveitar a ocasião e equa-cionar pendências temáticas. O segundo se dedica a um balanço dos avanços em cada organização, seguido por uma “formatura” sim-bólica dos gestores, o que inclui a entrega de um certificado que permite à entidade comprovar para seus financiadores a formação recebida em determinadas áreas de sua gestão.

Para encerrar o dia, é feita uma confraternização entre as lideranças, a equipe do CEOS, os consultores e os membros do comitê de seleção, convidados para o momento de celebração do fim do programa. Como explica Rebecca Raposo: “O programa tem de ser encerrado em uma nota positiva, porque os gestores têm muito trabalho a realizar depois do encerramento da Assessoria CEOS. Por isso, precisam ter a força para que o processo de desenvolvimento institucional continue”.

Coaching

Paralelamente à realização dos módulos pelos consultores e do plano diretor de sustentabi-lidade pela organização, a equipe do CEOS conduz coachings semanais com o gestor de cada entidade. O objetivo é garantir que o Centro acompanhe permanentemente o anda-mento da organização e dê suporte à liderança na tomada de decisão e na gestão das tensões cotidianas, o que ajuda a mantê-la engajada no programa. Além disso, trata-se de uma oportunidade periódica de interlocução aber-ta e direta da organização com o CEOS, o que permite que dúvidas e ansiedades sejam sanadas ou mesmo que possíveis ajustes sejam feitos no processo de trabalho em tempo hábil.

As conversas têm duração de uma hora e são realizadas por meio da ferramenta de comunicação Skype. Antes do coaching, cada gestor envia sua pauta, de maneira que a equipe do CEOS possa preparar-se para responder às possíveis demandas que serão levantadas no momento da conversa. O coaching é mantido no período de seis meses após o evento de encerramento, agora mensalmente, com o objetivo de sanar novas dúvidas surgidas após a presença direta do CEOS na organização.

Lições aprendidas

O monitoramento e constante diálogo com a organização que o coaching permite ao CEOS foram essenciais para a identificação de

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importantes lições a respeito do processo de trabalho da Assessoria CEOS. A confirmação de pressupostos e a necessidade de ajustes na metodologia e gestão foram levantadas, com a clareza de que toda primeira experiência de um programa com essa abrangência traz desafios, incompletudes e riscos que são tão inerentes quanto imponderáveis, por maior que seja o esforço para prevê-los e mitigá-los. Cabe a nós aprender com eles, de maneira a promover práticas ainda mais sólidas e positivas.

Além dos insumos trazidos pelas estratégias de acompanhamento previstas no programa, depois de encerrada a primeira edição da Assessoria CEOS foi realizada uma avaliação externa, com o objetivo de sistematizar essas aprendi-zagens e identificar novas questões que merecem a atenção do Centro. Cabe registrar que parte considerável dos aspectos levanta-dos pela avaliação externa não foi surpresa para o CEOS, o que comprova a efetividade do monitoramento realizado no decorrer do pro-grama pela equipe do Centro.

Viabilizada pelo Instituto C&A, a avaliação externa foi conduzida pelo Instituto de Desenvolvimento Educacional, Cultural e de Ação Comunitária (IDECA), organização sem fins lucrativos com longa trajetória na área de avaliação de proje-tos sociais. Realizada no segundo semestre de 2012, teve caráter eminentemente qualitativo, baseando-se na leitura de todos os documen-tos produzidos pelo programa e nas entrevistas com a equipe do CEOS, com todos os consul-tores envolvidos e com os gestores das cinco organizações participantes da primeira edição:

Associação Vaga Lume – São Paulo, SP;

Centro de Educação Ambiental e Assessoria (CEAA) – Piracuruca, PI;

Espaço Progredir – Nova Iguaçu, RJ;

Instituto de Cidadania Empresarial do Maranhão (ICE-MA) – São Luís, MA;

Instituto Pombas Urbanas – São Paulo, SP.

A seguir, dividimos as lições metodológicas que o CEOS aprendeu a respeito de como trabalhar o fortalecimento institucional de organizações sem fins lucrativos a partir da Assessoria CEOS. Nossa intenção é que tais aprendizagens contribuam para o processo de construção de conhecimento coletivo sobre o terceiro setor, sempre com o compromisso maior de fortalecê-lo.

Sobre os pressupostos que embasam a Assessoria CEOS

Todos os pressupostos que guiaram o desenho tanto do CEOS quanto da Assessoria CEOS, discutidos no início deste capítulo, se mostraram verdadeiros. O primeiro deles, mais fundamental, é a respeito da pertinência de nossa causa. O que a experiência com a primeira edição do programa mostrou é que há extensa demanda por apoio à gestão por parte das organizações sem fins lucrativos. Nesse sentido, o depoimento de Deborah Baesse, então coordenadora-geral do ICE-MA, registrado no relatório da avaliação externa, é significativo:

Nunca se tem muito recurso em uma organização social, muito menos para esse tipo de tarefa. Um dia chegou um edital em todas as redes que a gente participa. Fui ao site do CEOS, pesquisei e falei: era isso que a gente precisava, esse apoio para poder aliar esses processos administrativos.13

Frases como “um processo como esse é exatamente o que precisamos” foram muito comuns nas respostas abertas do questionário que inicia o processo seletivo. Foi esse também o teor das diversas reclamações recebidas pelo Centro, vindas de organizações que não se enquadraram no critério de idade exigido pelo edital: todas registravam sua inconformidade, ressaltando a urgência do trabalho de fortalecimento institucional.

Outro pressuposto confirmado diz respeito ao formato sistêmico do programa. A partir da vivência com a Assessoria CEOS, o Centro segue convicto de que é a profundidade do processo

13 IDECA, “Relatório de avaliação Programa Asses-soria CEOS”, São Paulo, 2012, p. 9.

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de aprendizagem proporcionado que garante o impacto na organização. Também ficou claro que resumir o processo à realização de formações não é suficiente. A primeira edição do programa reforçou o entendimento de que o mero acesso à informação não basta, uma vez que não há garantias da real transferência da teoria à prática. Observou-se a dificuldade vivida por algumas organizações participantes na implantação dos processos, mesmo com o apoio direto do CEOS – dificuldade essa que se torna impeditiva quando a entidade tem de responsabilizar-se sozinha por sua própria transformação, sem nenhum apoio prático.

Nesse sentido, o apoio ao gestor confirmou-se como essencial para o bom andamento do programa, assim como a necessidade de seu real engajamento para garantir que as intervenções previstas sejam de fato adotadas internamente – caso contrário, não há transformação possível. A importância do trabalho presencial também foi reforçada, permitindo que o consultor adapte sua metodologia de trabalho à realidade da organização. Esse contato direto entre consultor e entidade trouxe um resultado inesperado bastante satisfatório na primeira edição do programa: o envolvimento dos consultores para além de suas obrigações. Houve diversos casos em que esses profissionais doaram tempo e trabalho extras às organizações, em caráter pro bono, por se sentirem engajados no trabalho por elas desenvolvido.

Por fim, vale apontar a relevância de se trabalhar com profissionais experientes no terceiro setor, um dos diferenciais da Assessoria CEOS e pressuposto com o qual o Centro tem grande compromisso. É necessário que o consultor tenha maturidade para saber quando e como flexibilizar seu planejamento, conduzindo o trabalho de acordo com a estrutura e a demanda encontradas, o que só é possível por parte de profissionais com conhecimento sólido em sua área temática e clareza sobre como tais conteúdos se articulam à realidade das organizações sem fins lucrativos. Esse entendimento é reforçado pelo depoimento de Sylvia Guimarães, diretora-presidente da Associação Vaga Lume:

É muito importante o fato de ser um time [de consultores] alinhado com a temática do terceiro

setor. É muito raro você, como uma ONG, poder pagar por um serviço que é especializado para uma ONG, ou poder receber um serviço de pessoas que entendem a sua realidade. Porque tem muita coisa oferecida por aí que não tem nada a ver com a sua realidade, e o mundo privado tende a achar que a sua realidade é sempre mais simples. Mal sabem eles.14

Sobre a operacionalização do programa

A experiência de colocar em prática, pela primeira vez, o programa idealizado ao longo do desenvolvimento do Centro trouxe importantes lições a respeito da própria gestão da Assessoria CEOS, como discutimos a seguir.

Tempo

Não foi uma surpresa constatar que, idealmente, o processo de trabalho da Assessoria CEOS deveria desenrolar-se não em dezoito meses, mas em três anos, seguidos por um acompanhamento periódico, à distância, por mais dois anos. Como dito, no entanto, o programa tem de lidar com o calendário dos financiadores, o que impõe certos limites aos quais o Centro tem de se adaptar – contexto no qual cabe entender a própria duração de dezoito meses como uma conquista.

A necessidade de extensão do período de trabalho se explica por uma série de razões. A primeira está ligada ao fato de que, paralelamente ao intenso processo da Assessoria CEOS, tanto a liderança quanto a própria organização seguem realizando sua atividade-fim. Não há dedicação exclusiva ao programa, o que interfere na velocidade com que os conteúdos e práticas são incorporados à entidade. O depoimento de Marcelo Palmares, diretor-presidente do Instituto Pombas Urbanas, esclarece a questão:

A gente entende que a Assessoria CEOS não vi-ria com uma solução. Ela apontaria caminhos para a solução, e cabe a nós agora darmos esse passo para empreender essas decisões. O que acontece é que, se o nosso tempo fosse total-14 Ibidem, p. 32.

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mente dedicado para a instituição, talvez esses passos já teriam sido tomados, com um pouco mais de determinação.15

Além disso, o CEOS entende que se trata de um programa cujo objetivo é suscitar uma mudança de visão e comportamento por parte da organização assessorada, o que não se dá em curto prazo nem é passível de padronização, uma vez que cada entidade e respectiva liderança possuem tempos próprios de transformação. Sabe-se, no entanto, que estender o programa para três ou cinco anos teria um impacto no orçamento da Assessoria CEOS de tal natureza que inviabilizaria sua realização.

Contrapartida das organizações participantes

Outro aspecto a ser revisto em uma segunda edição do programa, também relativo a custos financeiros, diz respeito ao modelo de contra-partida exigido das entidades assessoradas. Pretende-se adotar um modelo de fundo, para o qual cada organização contribuiria com um valor fixo determinado, valor esse que seria o mesmo para todas as entidades.

Na primeira edição, o que aconteceu foi que as organizações localizadas fora de São Paulo acabaram penalizadas, tendo gastos maiores com passagem aérea e hospedagem dos consultores do que as entidades sediadas na capital paulista, onde reside a maioria dos profissionais do CEOS que ministram os módulos. Com a intenção de ser democráticos, acabamos por aplicar uma regra linear para todos, que se mostrou injusta ao igualar situações diferentes. Com o modelo de fundo, o valor arrecadado responderia pelos gastos logísticos, cabendo à equipe do Centro o controle sobre tais despesas.

Encontro entre gestores

Uma reivindicação feita por todos os gestores participantes da primeira edição do programa foi a promoção de outros momentos de encontro entre as organizações assessoradas, para além

15 Ibidem, p. 34.

da aula presencial sobre captação de recursos e o evento de encerramento. Isso seria importante não só para permitir a troca de impressões e experiências entre pessoas envolvidas em um mesmo processo, mas também para a construção de networking e parcerias.

Uma possível solução seria a realização de um encontro inaugural do programa, com a presença de todas as lideranças. Dessa forma, o estabelecimento de vínculos se daria já no primeiro momento do programa, além de ser uma oportunidade para que o CEOS alinhasse conceitos e procedimentos da Assessoria CEOS e apresentasse os consultores e os conteúdos de seus respectivos módulos, bem como os resultados esperados pelo programa. Seria, portanto, um momento de apresentação da Assessoria CEOS para os novos participantes.

Além disso, ainda em relação à interlocução entre as lideranças, seria possível a promoção de videoconferências ao longo do processo. No entanto, é necessário ter clareza de que todas essas medidas têm impacto nos custos do pro-grama, o que torna ainda mais desafiadora a captação de recursos para o Fios.

Gestão do programa

O grande desafio enfrentado na primeira edição do programa no que se refere à sua operaciona-lização diz respeito ao papel de supervisão desempenhado pela equipe do CEOS. Ainda que o trabalho tenha corrido de maneira satisfatória, foram identificados diversos pontos de melhoria para um próximo edital.

Cabe ao CEOS intermediar as relações entre os consultores e a organização. Dessa forma, seria tarefa do Centro certificar-se de que possíveis lições de casa deixadas por cada consultor fossem realizadas pela organização, bem como acompanhar o andamento da implementação dos planos de trabalho temáticos. Ainda que tenha havido tal supervisão, é necessária a sistematização desse controle, inclusive de maneira a aprimorar o apoio à entidade na

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realização e organização de tais tarefas.

Há espaço para melhoria também nas relações de supervisão estabelecidas pelo Centro com os próprios consultores. Mostrou-se relevante o estabelecimento de mais oportunidades de encontro, tanto anteriores quanto posteriores à visita do consultor à entidade. Além disso, seria produtiva a realização de reuniões gerais com uma periodicidade maior, garantindo um alinha-mento constante a respeito do andamento do programa em cada organização.

Sobre a metodologia do programa

Foi no processo de trabalho que se identificou grande parte dos ajustes necessários para que a Assessoria CEOS flua da maneira mais produtiva possível. A seguir, discutimos as lições aprendidas relativas a algumas das etapas do programa.

Fios – Fundo de Investimento em Organizações Sociais

Verdadeira ousadia do CEOS, o modelo de finan-ciamento baseado em um fundo mostrou-se acertado, na medida em que viabiliza que o Centro aplique, na prática, pressupostos que lhe são caros, como a democratização do acesso aos recursos da filantropia empresarial por par-te de organizações sem fins lucrativos que, de outra forma, teriam dificuldade para acessar tais financiadores. Além disso, a lógica de deter-minação de cotas evita que o Centro se torne dependente de um único financiador.

No entanto, há dificuldades inerentes com as quais o CEOS tem de lidar. Como dito, trata-se de um formato que representa uma responsabi-lidade tripla para o Centro, já que cabe a ele (1) desenvolver a inteligência e operar o programa, (2) captar um volume considerável de recursos e (3) avalizar o impacto do programa sobre a gestão da organização participante, o que não está sob o completo controle do CEOS – mesmo com um bom processo seletivo –, pois depende

da resposta e do comprometimento da entidade. Em adição, para além do fato de que cada cota envolve um valor significativo (o que dificulta o processo de captação), o sistema de cotas compromete o cronograma e o planejamento da Assessoria CEOS, já que somente é possível lançar o processo seletivo quando todas as cotas estão preenchidas – e é preciso lembrar que cada investidor tem métodos de contratação e desembolso muito distintos. Para tais questões, o Centro segue em busca de estratégias de mitigação dos riscos.

Processo seletivo

O edital desenhado para o programa mostrou-se bastante positivo. Aqui, cabe reforçar o compro-misso do CEOS com a abertura do processo seletivo em termos de área temática, porte e região geográfica das organizações candidatas. Ainda que os financiadores apostem cada vez mais na restrição do escopo das organizações apoiadas, seja para uma área geográfica especí-fica, seja para determinados temas, o CEOS sustentou a ideia de ampliação desse filtro, o que possibilitou a seleção de organizações valo-rosas atuantes em partes distintas do país. O Centro entende ser fundamental que essa característica se mantenha em edições futuras.

No que se refere aos critérios exigidos pelo processo seletivo, a ampliação do intervalo de idade acena como uma possibilidade em uma segunda edição do programa. É o que explica Adriana Fonseca, diretora de planejamento e gestão do CEOS: “Muitas organizações ficaram descobertas em razão do critério de idade. É preciso ampliar o espectro das entidades participantes, com diferentes intensidades no processo”.

As alternativas possíveis seriam estender o limite etário para quinze anos ou retirar do critério de idade o poder de excluir uma organi-zação do processo seletivo – resolução essa que aumentaria o nível de complexidade do grupo de organizações assessoradas, o que teria consequências na quantidade de horas técnicas

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necessárias e, portanto, novamente, no custo do programa, o que não é desejável.

A necessidade de ajuste no processo seletivo se manifestou em dois outros aspectos pontuais: o questionário que responde pelas duas primeiras etapas do edital e as formas de divulgação do processo seletivo. No primeiro caso, a principal alteração seria no número de perguntas que compõem o formulário. É possível refiná-lo, de maneira que sejam feitas apenas as perguntas realmente necessárias para a seleção e identi-ficação do estágio organizacional da entidade. Dessa forma, seu preenchimento seria mais simples e objetivo, o que facilitaria a inscrição e estimularia a participação de um número maior de organizações – no primeiro edital, 21 das 70 orga-nizações candidatas foram desclassificadas por não terem preenchido o formulário integralmente.

Ainda sobre o questionário, um aprendizado trazido pela primeira edição do programa foi o entendimento de que todas as informações relativas a critérios e pré-requisitos devem constar no formulário, mesmo que estejam registradas no regulamento do edital. O que se viu foi que 15 das 29 organizações eliminadas– número considerável – se autoexcluiu do pro-cesso ao assinalar a inexistência da ferramenta Skype na instituição, mesmo que o regulamento explicasse, de maneira didática, o passo a passo para seu download gratuito. Ficou claro que muitas entidades não leram o regulamento, o que acarretou sua própria desclassificação do edital.

No que se refere à divulgação, em termos gerais, a modelagem definida se mostrou efetiva. A aposta na divulgação via internet trouxe resultados positivos: 45% dos inscritos souberam do programa via email marketing, 36% via sites e redes na internet e 18% via divulgação de parceiros. No entanto, para a segunda edição, o CEOS entende como necessária a intensificação de estratégias que viabilizem uma descentralização maior do Sudeste, pois, apesar dos esforços para tal na primeira edição, 54% das inscrições recebidas

partiram de entidades localizadas nessa região. Ainda que esse cenário reflita diferenças estruturais que fogem à intervenção do CEOS, como o modelo concentrado de renda do país, a divulgação em redes temáticas, por exemplo grupos específicos para garantia de direitos ou educação, pode contribuir para a ampliação da participação de outras regiões.

Diagnóstico situacional

A idealização de uma etapa específica para a construção do diagnóstico situacional de cada organização participante mostrou-se fundamental para o programa, como esclarece o depoimento de Maria Gabriella de Giacomi, coordenadora do Espaço Progredir:

No que diz respeito às demandas que nós tínhamos, eu acho que eles acertaram no alvo. [...] Eles conseguiram verbalizar e mostrar o que a gente tinha, conseguiram dar nome ao nosso mal-estar. Além disso, conseguimos reconhecer as dinâmicas que estavam criando problema, coisa que a gente não tinha percebido.16

Ainda assim, é possível torná-lo mais preciso em suas conclusões, o que permitiria uma adaptação maior do programa à realidade da organização. O CEOS entende como necessária, por exemplo, uma participação mais ativa dos consultores por meio de perguntas específicas sobre cada módulo já no momento do diagnóstico, reduzindo ainda mais a necessidade de eventuais adaptações diante de cenários e situações conhecidos somente quando o consultor chega à entidade.

Módulos

O formato de trabalho baseado em módulos trouxe os resultados esperados não apenas no que se refere à promoção da visão sistêmica que o Centro deseja promover, mas também em razão de seu caráter prático. Como discutido, muitos dos benefícios trazidos pelo programa serão identificados pela entidade em longo prazo. Dessa forma, é essencial que os

16 Ibidem, p. 13.

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módulos permitam intervenções imediatas na organização. Por meio de resultados concretos, as lideranças e equipes se mantêm engajadas no processo de trabalho, como demonstra o depoimento de Maria da Luz Fonseca, diretora-presidente do CEAA:

[No módulo de infraestrutura física, o consultor,] Deu orientações para facilitar nosso trabalho, a economia de energia, o que estava sendo desperdiçado e a própria cara da instituição, cor, pintura e tudo. [...] Fomos trocando o que estava roubando eletricidade, trocamos a fiação, pintamos a casa da cor que ele sugeriu, e a facilidade do trabalho também melhorou pelo novo layout.17

Ainda assim, a primeira edição da Assessoria CEOS trouxe aprendizados essenciais a respeito da melhor maneira de o Centro explorar o formato de módulos. Mesmo que o CEOS tenha sido flexível ao adaptar os temas à necessidade específica das organizações participantes, alguns módulos teriam sido mais efetivos se o consultor dispusesse de mais horas de trabalho. É preciso que o programa seja ainda mais personalizado.

Nesse sentido, uma solução seria adotar um modelo de banco de horas, em vez de módulos fixos. A Assessoria CEOS seria composta não por um número determinado de módulos – atualmente, oito –, mas por uma quantidade de horas disponíveis para cada entidade participante. Seria possível, assim, adaptar o período necessário para cada módulo de acordo com a demanda identificada no diagnóstico situacional.

Outros dois ajustes se mostram relevantes. O primeiro é a expansão dos temas trabalhados, de maneira a incluir módulos como gestão de pessoas e captação de recursos. Ainda que o tema da captação tenha sido tratado no formato de aula, o conteúdo a ser explorado é extenso. O CEOS tem clareza de que tanto o processo de construção do plano diretor de

17 Ibidem, p. 21.

sustentabilidade quanto seus resultados teriam sido mais produtivos para a organização se fossem acompanhados de um módulo específico para o debate dos aspectos práticos vinculados à captação de recursos. Além disso, o aperfeiçoamento das ementas dos módulos, tornando-as mais claras e completas, ajudaria no esclarecimento a respeito do conteúdo a ser trabalhado por cada módulo, alinhando expectativas e mitigando ansiedades por parte das organizações.

Coaching

Ainda que tenha sido uma das principais causas dos bons resultados da Assessoria CEOS, em uma segunda edição do programa o coaching será ainda mais efetivo, consideradas as lições trazidas pela experiência inaugural. Hoje, o Centro tem mais clareza a respeito das potencialidades desse mecanismo de trabalho e de como atuar para que ele seja mais bem explorado tanto pelo CEOS quanto pela organização participante.

Um primeiro aspecto é o fato de que grande parte dos gestores não possui familiaridade com o conceito de coaching e seus objetivos. Cabe ao Centro esclarecer sua natureza logo no início do programa, de maneira que as lideranças possam fazer bom uso das horas previstas. Uma vez que o coaching é utilizado também para manter o gestor engajado em torno de seu papel no programa, esse momento poderia ser utilizado para a discussão entre o CEOS e a liderança a respeito da ementa do próximo módulo a ser realizado na organização, de maneira a garantir alinhamento.

Outra opção a ser explorada em uma segunda edição do programa seria o uso do coaching temático, isto é, para além do coaching regular, seriam realizadas conversas programadas entre os consultores dos módulos e os membros responsáveis pela implantação daquele tema na organização assessorada. Dessa forma, a liderança teria a oportunidade

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de esclarecer dúvidas técnicas diretamente com o profissional responsável pela área, o que é mais produtivo, além de ser uma forma de estimular a organização a implantar o plano de trabalho temático enquanto a Assessoria CEOS está em desenvolvimento.

Se, até aqui, apresentamos o programa em sua metodologia conforme idealizado pelo CEOS e as possíveis alterações que potencializariam seus resultados a partir da perspectiva do próprio Centro, abrimos espaço no capítulo seguinte para que as cinco lideranças participantes da primeira edição do programa apresentem suas impressões a respeito da vivência. O objetivo é dar voz a atores que compartilharam com o CEOS a construção de uma experiência única em fortalecimento institucional e que, portanto, têm muito a contribuir para esse esforço de produção de conhecimento coletivo sobre o tema.

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Capítulo 3 | Assessoria CEOS 2011: o programa na perspectiva das organizações sociais participantes

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Evolução do processo seletivo

70 organizações sem fins lucrativos inscritas;

41 organizações aprovadas para a segunda etapa;

20 organizações aprovadas para a terceira etapa;

12 organizações aprovadas para a quarta etapa;

5 organizações selecionadas.

Distribuição geográfica das organizações inscritas

54% da região Sudeste;

14% da região Nordeste;

13% da região Centro-Oeste;

10% da região Sul;

9% da região Norte.

Análise das inscrições reprovadas

62% não dispunham de recursos para a contrapartida exigida;

52% informaram não possuir a ferramenta de comunicação Skype na organização;

21% não poderiam assegurar um espaço fora da organização para a realização de atividades;

21% não tinham natureza jurídica de associação ou fundação privada;

21% não participavam de instâncias coletivas.

Os principais números do processo seletivo:

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O primeiro edital da Assessoria CEOS, única edição do programa realizada até o momento, contou com a procura de setenta organizações sem fins lucrativos de todo o país. O processo seletivo teve início em 18 de novembro de 2010, com a abertura das inscrições, e transcorreu até 25 de fevereiro de 2011, data da reunião do comitê de seleção. Em 28 de fevereiro, os resultados foram divulgados1.

No quadro ao lado, apresentamos os principais números do processo seletivo.

O trabalho nas cinco organizações selecionadas teve início em março de 2011. Contra as expectativas do CEOS, já no primeiro edital a cláusula suspensiva prevista no contrato estabelecido entre o Centro e as entidades teve de ser acionada para uma das organizações. Ao longo de cinco meses de trabalho – período em que foram realizados o diagnóstico situacional e os módulos de planejamento estratégico e governança na entidade –, o CEOS emitiu três comunicados que registravam a necessidade de maior comprometimento na realização das

1 Para as datas de cada etapa do processo seletivo, ver a linha do tempo na página 119.

ações propostas pelo programa. A diretoria da organização não respondeu a tais informes, deixando de aderir às diretrizes e regras da Assessoria CEOS, explicitadas na entrevista que compõe o processo seletivo e registradas no contrato. A suspensão foi, então, acordada em conferência realizada via Skype entre as partes e, posteriormente, registrada em termo de distrato.

Dessa forma, em setembro de 2011, o Instituto Pombas Urbanas, primeiro suplente indicado pelo comitê de seleção, integrou-se à Assessoria CEOS. Nossa apoiadora Teresa Bracher fez um aporte complementar ao Fios, de maneira a cobrir os recursos referentes às horas de trabalho dedicadas à organização suspensa. Dessa forma, o Instituto Pombas Urbanas pôde receber o programa em sua integralidade.

O evento de encerramento da Assessoria CEOS 2011 ocorreu em 15 de junho de 2012, seguido pelo coaching mensal até dezembro do mesmo ano. O quadro a seguir traz um panorama das atividades realizadas pelo programa em cada uma das organizações:

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A seguir, os gestores das cinco instituições que construíram a experiência da Assesso-ria CEOS 2011 junto com o Centro dão seu depoimento a respeito de sua vivência, com-

Localização de cada organização

partilhando reflexões sobre o programa e a importância do fortalecimento institucional de organizações sem fins lucrativos.

Instituto Pombas Urbanas São Paulo, SP

Associação Vaga Lume São Paulo, SP

Espaço Progredir Nova Iguaçu, RJ

Centro de Educação Ambiental e Assessoria (CEAA) Piracuruca, PI

Instituto de Cidadania Empresarial do Maranhão (ICE-MA) São Luís, MA

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Organização: Associação Vaga Lume

Sede: São Paulo, SP

Site: www.vagalume.org.br

Missão: Criar oportunidades para intercâm-bios culturais por meio da leitura, da escrita e da oralidade, valorizando o protagonismo de pessoas e de comunidades rurais da Amazô-nia Legal brasileira.

Em 2000, três amigas paulistanas partiram em uma expedição de um ano pela Amazônia Legal brasileira. O objetivo era realizar um projeto que lhes permitisse não só promover o acesso à lei-tura em regiões afastadas dos grandes centros, mas também aprender com a riqueza cultural daquelas localidades. Nesse período, foram estabelecidas parcerias com Secretarias de Educação de vinte municípios para o desenvol-vimento de bibliotecas comunitárias nas zonas rurais, processo que inclui desde a seleção e doação do acervo até a capacitação de media-dores de leitura.

Os resultados positivos da experiência leva-ram suas fundadoras a dar continuidade a um projeto que, inicialmente, tinha a intenção de ser pontual. Para tanto, em 16 de outubro de 2001, foi fundada a Associação Vaga Lume. Além do trabalho de implantação de bibliotecas comunitárias, a organização também se dedica à promoção de intercâmbios culturais entre adolescentes de diversas regiões do Brasil, estimulando o desenvolvimento da leitura e escrita e valorizando a troca de vivências.

Hoje, a organização possui uma metodologia consolidada, presente em 160 comunidades distribuídas em 23 municípios da Amazônia Le-gal brasileira. Entre a equipe fixa – que trabalha na sede da organização, em São Paulo – e os voluntários, a Associação mobiliza cerca de 185 pessoas. Participa de uma rede, uma associa-ção internacional e um fórum em sua área te-mática. A seguir, Sylvia Guimarães, presidente

da Associação e única fundadora que segue na organização, faz um balanço a respeito de sua experiência com a Assessoria CEOS.

Quando nos inscrevemos no edital da Assessoria CEOS, eu vivia uma situação de muita sobre-carga enquanto principal gestora da organização. Por um lado, havia conseguido montar uma nova equipe, boa, porém recém-contratada, sem uma visão de para onde caminhávamos. Também estávamos com dificuldade de visualizar nossos principais programas a partir de uma perspectiva de médio e longo prazo, pois não havia um planejamento estratégico para nos orientar. Por outro lado, tínhamos uma gover-nança pro forma, pouco atuante na organização. Estar sozinha na diretoria, sem apoio na gestão da Vaga Lume, estava se tornando insusten-tável, em uma situação bastante cansativa e estressante.

O principal resultado da Assessoria CEOS na organização foi a questão da governança. Passamos pelo processo de instalação de uma governança ativa, no qual a participação e con-dução da equipe do CEOS foram um marco. Hoje, temos conselhos mais apropriados da organização, que podem me apoiar em alguns processos. Foi uma grande mudança, que envolveu muito trabalho, mas acredito que vá trazer resultados no futuro da organização.

O fato de ter de me reportar aos conselhos fez com que eu aprendesse uma nova postura de liderança na Vaga Lume. Ainda que eu seja a principal gestora e que os membros da gover-nança não me façam cobranças, passa a exis-tir uma instância a quem devo prestar contas e que me avalia, o que traz um compromisso ainda maior com a transparência e com os resultados da organização. Isso te coloca em uma nova posição enquanto gestora.

A Assessoria CEOS também fortaleceu a equipe como um todo, mesmo que desde o fim do programa tenha havido mudanças em sua com-posição. O fato de termos hoje um planejamento estratégico garante um elemento norteador.

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A equipe se sente mais segura ao saber que a Vaga Lume é uma organização que tem uma visão de futuro e que as decisões não estão apenas na minha cabeça, mas sim que existe um documento compartilhado e transparente. Isso dá autonomia para as pessoas e permite que elas se empoderem mais do processo.

Vejo o impacto do planejamento estratégico também no meu papel como gestora da equipe. Passei a cobrá-la mais a respeito dos objetivos das ações planejadas. Ainda acompanho a reali-zação e entrega das tarefas, mas tenho tentado sair da esfera operacional para pensar nos obje-tivos maiores das áreas. Para mim, esse módulo foi um marco. As oficinas foram muito boas e permitiram um momento de trabalho em equipe e um olhar sobre o grupo bastante importantes.

Outro marco foi o módulo de gestão de progra-mas e projetos. O trabalho ajudou a formar o olhar da equipe da área de educação para ques-tões como o marco lógico. Além disso, fortaleceu nosso esforço em torno de estratégias de avalia-ção das nossas ações, que são um processo de busca antigo da Vaga Lume. Com o programa, investimos mais nas ações de avaliação na pon-ta; hoje, há cadernos de controle nas bibliotecas comunitárias, onde é feito o registro semestral das atividades, cujos resultados nós tabulamos.

Percebo que o maior desafio de participar de um processo como esse é estar aberto a no-vas ferramentas e conhecimentos, ao mesmo tempo que reconhecendo o ritmo da organi-zação. Em 2012, transferi todo o meu foco à construção da governança e, por isso, decidi não participar do planejamento de atividades da equipe. Como resultado, tivemos eventos muito desgastantes para o grupo. Assim, compreendendo que o processo da Assessoria CEOS é um processo de transformação que, como tal, exige que sejam feitas rupturas com o modelo anterior, o grande desafio é enten-der quais mudanças são as certas para aquele momento e quais exigem que você, enquanto gestor, faça ponderações e vá mais devagar. Por isso, acredito que o programa deveria du-

rar mais, ter dois anos, para que as mudanças aconteçam dentro desse ritmo possível.

A Assessoria CEOS traz um olhar sistêmico para a organização. Todos os aspectos da entidade são analisados, como em um check-up médico. Para o trabalho ser completo, senti falta de módulos voltados à captação de recursos, que é nossa área mais frágil, e à gestão de pessoas, com um olhar cuidadoso sobre o organograma da entidade. Ainda assim, o programa não só atendeu às minhas expectativas, como as superou. Nunca havia visto nada parecido, principalmente em relação aos profissionais envolvidos. Todos são sérios, com muita experiência no terceiro setor, o que é bastante especial. É raro ter esse tipo de diálogo com pessoas que entendem sua realidade e que, por isso, trazem sugestões factíveis. É fundamental essa escuta, pois a profissionalização passa por você incorporar conhecimentos que estão fora da organização, e não se fechar em sua própria prática.

Para que sejam eficientes em sua missão, as organizações do terceiro setor precisam de gestão tanto quanto qualquer empresa. O produto da organização, que é muito valioso para a sociedade, só vai melhorar com o fortalecimento de sua área-meio. Para a Vaga Lume, o melhor investimento que um financiador pode fazer na organização não vem na forma da doação de livros, mas sim na nossa capacitação, para que a entidade consiga, de forma autônoma, cada vez mais livros nos próximos anos. É claro que é válido o apoio à atividade-fim, mas toda organização deseja ser autossustentável, capaz de gerar resultados sempre, não só quando esse investidor está presente. Com a Assessoria CEOS, tenho ainda mais certeza de que o fortalecimento institucional é a melhor contribuição que um investidor pode fazer para uma organização sem fins lucrativos e seus beneficiários.

Sylvia Guimarães2

2 Depoimento concedido em 29 de outubro de 2013.

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Organização: Centro de Educação Ambiental e Assessoria (CEAA)

Sede: Piracuruca, PI

Site: www.ceaa-pi.com.br

Missão: Contribuir para o desenvolvimento local sustentável do Piauí, por meio de assessoria técnica, educação ambiental e articulação de políticas públicas para comu-nidades rurais e urbanas.

Fundado em 31 de março de 2003, o CEAA é uma associação sem fins lucrativos com sede em Piracuruca, município no interior do Piauí. A organização foi criada com o objetivo de assessorar grupos de agricultores que recebiam recursos governamentais para a criação de assentamentos rurais, mas não sabiam como gerenciar tais financiamentos ou elaborar novos projetos que explorassem as potencialidades dessas unidades produtivas.

Com foco em agricultura familiar, a organização apoia todo o processo de desenvolvimento de assentamentos rurais, desde a aquisição do terreno até a distribuição do excedente da produção. Oferece também capacitação nas áreas de associativismo, cooperativismo, educação e gestão ambiental e geração de renda, a partir de princípios como agroecologia e desenvolvimento sustentável. A articulação de políticas públicas é outra estratégia de trabalho importante, inclusive em temas indiretos com relação à sua área principal de atuação, como o acesso à energia elétrica nas unidades produtivas.

Hoje, o CEAA é referência na região tanto para os agricultores que buscam assessoria quanto para órgãos públicos municipais, estaduais e federais. Acompanha 3 mil famílias, distribuídas entre 197 assentamentos. Possui 54 funcionários, incluindo voluntários, e participa de dois grupos de trabalho, dois fóruns e três conselhos em sua área temática. A seguir, Maria da Luz Fonseca, fundadora e

coordenadora-geral da organização, discute a experiência do CEAA na Assessoria CEOS.

O CEAA interessou-se pela Assessoria CEOS porque sentíamos necessidade de apoio na nossa esfera institucional. Percebíamos que estávamos crescendo, mas precisávamos nos organizar melhor, com mais reflexão. Pensávamos muito no micro, nos projetos que desenvolvemos, mas tínhamos dificuldade de ordenar as ideias a respeito do macro, ou seja, do CEAA como um todo.

O edital do programa nos foi enviado por um parceiro de trabalho que, conhecendo nossas vontades e limitações, sugeriu que participássemos. Respondemos ao questionário, mas, mesmo sem conhecer o CEOS, quando se pensa em uma organização de São Paulo, sabíamos que seria um processo seletivo com entidades muito maiores do que nós. Como é que o CEAA, no interior do Piauí, um grãozinho de areia no fundo do mar, seria selecionado? Acabamos surpreendidos.

Hoje, eu digo: existe um CEAA antes da Assessoria CEOS e outro depois do programa. Sempre fomos uma entidade responsável, com credibilidade, mas tínhamos dificuldades em todos os aspectos, desde a elaboração de projetos até o planejamento das ações cotidianas. Apagávamos incêndios, em especial eu, enquanto principal gestora, porque era a mim que todos recorriam. Com o programa, criamos uma equipe de fato, com coordenadores para cada área e projeto. Com isso, minha condição tanto pessoal quanto profissional melhorou muito. Nesse novo modelo, percebemos que as ações podem ser realizadas por meio da distribuição de tarefas.

Outro avanço importante é que já não tentamos atender a todas as demandas que chegam até nós, o que antes tornava o trabalho pesado e desgastante. Por recomendação da Assessoria CEOS, passamos a encaminhar para as devidas instâncias as solicitações do nosso público que não fazem parte das nossas linhas de atuação. Dessa forma, temos mais tempo para nos dedicar à nossa atividade.

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Os módulos foram essenciais para o salto de qualidade que demos. Adotamos o software de gestão financeira recomendado pelo programa e conseguimos colocar em prática o treinamento específico que recebemos, organizando nossa área financeira. O módulo de infraestrutura física também foi primordial, porque nos deu um novo olhar sobre nosso escritório. Mudanças como a reorganização dos espaços e as cores da fachada tiveram grande impacto, percebido e elogiado por todos.

Considero os módulos de gestão de programas e projetos e de comunicação estratégica como marcos do programa. Sempre elaboramos projetos, mas as oficinas desse módulo ampliaram nossa visão sobre esse trabalho. A qualidade dos nossos projetos melhorou, assim como a prestação de contas, o que foi percebido pelos nossos financiadores. Vimos o impacto disso também na captação de recursos, pois conseguimos novos apoios financeiros.

Já o módulo de comunicação trouxe mais visibilidade para a instituição e as ações que desenvolvemos. Temos uma riqueza que não sabíamos como mostrar para o mundo. Com as diretrizes do consultor, definimos as melhores formas para isso. O CEOS nos colocou em contato com uma agência de design que oferece desconto para organizações sem fins lucrativos e, assim, atualizamos nosso logo e folder informativo. Desenvolvemos um mural em nossa sede para nos comunicar com nosso público. Além disso, temos um programa quinzenal na rádio local, onde falamos sobre nossas atividades e campanhas ambientais. Criamos também um blog e nosso site.

Temos ainda desafios pela frente. A descentralização do trabalho em torno da minha pessoa foi fundamental, mas a mudança tem sido superada aos poucos. Depois da Assessoria CEOS, quatro membros da equipe deixaram a organização, pois perceberam que o CEAA não seria mais o mesmo e que o nível de comprometimento com a organização aumentaria. Também acredito que o tempo de

duração do programa foi menor do que o ideal. Alguns módulos precisariam ser estendidos e o monitoramento do planejamento estratégico também seria beneficiado. Hoje, não sentiríamos os receios que tivemos no início do trabalho, assim como eu não deixaria nem o vigia fora das oficinas, para que o conhecimento seja uniforme em toda a equipe.

Uma organização social que recebe uma consultoria como a Assessoria CEOS passa por muitas mudanças, mas sua essência e seu modo de trabalhar são respeitados. O CEOS valoriza o saber da instituição assessorada, mas também abre um horizonte para que a gente veja novas possibilidades. O trabalho é feito de maneira participativa, com a preocupação de compreender as pessoas.

O que aprendemos com a Assessoria CEOS é que ninguém consegue manter um projeto de vida sozinho. É preciso ter o apoio de outras instituições, porque o grande desafio não é fundar uma organização social, mas sim garantir sua continuidade. Além disso, de nada adianta só a teoria. É preciso ouvir, aprender e colocar esse aprendizado em prática. A gestão de uma organização é muito dinâmica e complexa, mas, se você tiver os mecanismos para lidar com ela, o trabalho não se torna algo pesado. É importante entender também que a gestão se faz no coletivo, abrindo espaço para que outras pessoas opinem.

É preciso que se compreenda a importância e a beleza de se trabalhar com gente. É fundamental ouvir as pessoas e entender suas culturas, contribuindo para que elas avancem em seu aprendizado e na qualidade de suas ações. A Assessoria CEOS conseguiu fazê-lo perfeitamente. Temos humildade para dizer que o CEAA ainda não está pronto. Estamos no caminho em direção ao nosso ideal, e as lições trazidas pela Assessoria CEOS, sem dúvida, vão nos ajudar a alcançá-lo.

Maria da Luz Fonseca3

3 Depoimento concedido em 17 de outubro de 2013.

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Organização: Espaço Progredir

Sede: Nova Iguaçu, RJ

Site: www.progredir.org

Missão: Atuar na prevenção e no tratamento da dependência química de adolescentes e jovens da Baixada Fluminense, fortalecendo suas famílias, seus vínculos afetivos e sociais, tornando-os agentes multiplicadores de qualidade de vida.

Fundado em 6 de fevereiro de 2003, o Espaço Progredir é uma associação civil sem fins lucrativos que se dedica ao tratamento e à prevenção do uso de drogas, com foco principal em jovens de 14 a 21 anos. A organização possui duas unidades próprias em Nova Iguaçu e conta com trinta funcionários, incluindo voluntários. Em 2012, atendeu 850 pessoas em seu núcleo de prevenção e 110 em seu núcleo de tratamento. Participa de duas redes, um fórum e um conselho municipal relativos à sua área temática.

O Espaço Progredir foi criado por um grupo de amigos que trabalhavam em um abrigo, onde a questão da dependência química entre jovens era muito presente. Os profissionais percebiam a ausência de alternativas de projetos e instituições aos quais pudessem encaminhar os jovens para tratamento dentro de sua própria comunidade, e não em isolamento social. Assim, em 2003, o grupo decidiu deixar o abrigo para dedicar-se ao desenvolvimento de um projeto próprio com esse objetivo.

Com os bons resultados trazidos pela área de tratamento, em 2010 a organização passou a dedicar-se também à prevenção ao uso de drogas, por meio de oficinas culturais e educacionais para toda a comunidade da região. Hoje, o Espaço Progredir tem uma metodologia consolidada, sendo a única organização a oferecer tratamento especializado para adolescentes na região da Baixada Fluminense. Além disso, mantém um trabalho importante de influência em políticas públicas, esforço que lhe rendeu a condição de

referência no Estado no que se refere à sua área de atuação.

A seguir, Aida Leitão e Mariagabriella de Giacomi, ambas fundadoras e membros da diretoria da organização, falam a respeito da experiência vivida pelo Espaço Progredir na Assessoria CEOS.

O Espaço Progredir procurou a Assessoria CEOS porque percebemos que tínhamos um problema central ligado à governança da organização. Muitas pessoas trabalhavam como gerentes, mas ninguém assumia a direção. Havia confusão de papéis: não sabíamos quem deveria assumir qual tarefa. Além disso, sentíamos necessidade de melhoria nas relações interpessoais no ambiente de trabalho. Começamos como um grupo de amigos e, quando passamos a ter uma divisão entre patrão e funcionário, tivemos dificuldade em conduzir esse relacionamento de forma satisfatória.

Para nós, o momento mais impactante da Assessoria CEOS foi o diagnóstico situacional. Com ele, percebemos que tínhamos uma percepção dos nossos problemas, mas não uma noção exata da sua extensão. Quando o diagnóstico nos trouxe clareza sobre tudo aquilo que precisávamos trabalhar na organização e deu um nome ao nosso mal-estar, nos sentimos muito mobilizadas. Por outro lado, ficamos também com muito medo, porque não sabíamos se daríamos conta nem se realmente queríamos passar por esse processo, que envolve tantas mudanças na organização.

Todos os módulos foram extremamente enriquecedores e estimulantes. Percebíamos o quanto estávamos carentes de informações e o quanto precisávamos aprender para crescer. Além disso, um aspecto que nos tocou e ajudou muito foi a sensibilidade humana dos consultores. Não se trata de uma pessoa que vem à organização apenas para transmitir um conteúdo, de maneira fria, como se fôssemos uma empresa. Cada profissional percebeu a nossa situação e procurou nos ajudar a nos desenvolver, dentro dos nossos limites. Na

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mesma medida em que apontaram nossas falhas e dificuldades, valorizaram nosso potencial e conhecimento.

Outro destaque foram os planos de trabalho te-máticos. Ainda que não tenhamos conseguido concretizá-los integralmente, temos neles uma linha que nos guia e que organiza nossas expec-tativas. Fazemos, a cada ano, aquilo que temos condições e, quando conseguimos uma verba para investimento, sabemos exatamente para onde direcionar esse recurso, já que as ações estão traçadas.

A Assessoria CEOS traz segurança para que as pessoas desenvolvam seu trabalho. Ajuda a or-ganização a crescer, respeitando sua identidade. O CEOS levou muito em consideração nossas particularidades e respeitou nossas dificuldades, sentimentos e dúvidas, o que é fundamental. O programa não traz um pacote pronto, mas sim traça um plano de trabalho dentro daquilo que nós somos. Assim como, na escola, a gente tem de respeitar o desenvolvimento de cada aluno a partir de sua cultura e aprendizado, foi exata-mente isso que o CEOS fez no Espaço Progredir.

Em termos de gestão, podemos separar a or-ganização entre antes e depois da Assessoria CEOS. Hoje, há mais clareza a respeito do papel de cada um. Funções foram assumidas de uma maneira mais definida e com mais qualidade, o que trouxe melhorias na gestão de cada uma das áreas da instituição. Percebemos que per-díamos tempo e recursos ao procurar atender a todas as solicitações que chegavam até nós.

Passamos a ter reuniões semanais de equipe para discutir questões relativas à instituição e aos programas, o que antes era feito por meio de conversas informais, nos corredores, o que impedia o controle e a sistematização das de-cisões. Também em resposta a uma fragilidade apontada pela Assessoria CEOS, atualizamos e organizamos todos os nossos documentos insti-tucionais, como regimento interno e titulações. Utilizamos no dia a dia o software de gestão financeira indicado pelo programa, o que nos

trouxe mais controle e facilidade na contabili-zação das despesas. Isso ajudou no desenvol-vimento dos projetos, que hoje contam com informações financeiras mais exatas.

A captação de recursos é outra área para a qual a Assessoria CEOS contribuiu. A partir do tra-balho com a árvore de problemas e objetivos, no módulo de gestão de programas e projetos, conseguimos identificar novos aspectos para compor o cenário sobre o uso de drogas. Quan-do apresentado aos financiadores, esse conteú-do traz uma imagem de competência e credibi-lidade para a organização. A árvore também nos ajudou a explicar para educadores e oficineiros as causas do problema que tratamos e as expli-cações metodológicas de nossa atuação, o que alinha objetivos e linguagens, auxiliando cada profissional a trabalhar com mais competência.

Outro aspecto importante é que o CEOS nos estimulou a abrir os olhos para o mundo e procu-rar parcerias em locais em que nunca tínhamos pensado, ensinando-nos que não precisamos resolver nossos problemas sozinhos. Exemplo disso é a parceria que estabelecemos com a Agência-Escola Marco Zero, do curso de Comu-nicação Social da universidade Unigranrio. Os estudantes que compõem a agência se interes-saram pelo plano de comunicação que apresen-tamos e têm nos apoiado no desenvolvimento do novo folder informativo e do novo site do Espaço Progredir.

Naturalmente, nem tudo está 100%. A questão da liderança segue um desafio para a principal gestora, que tem encontrado dificuldade em exercer seu papel, o que tem lhe gerado des-conforto. Tivemos avanços importantes em termos das relações humanas na organização, porque agora conseguimos separar melhor a esfera profissional da pessoal. Porém, ainda há questões a se trabalhar nessa esfera. Por isso, sentimos falta do módulo de recursos humanos, assim como de mais tempo para a realização do módulo relativo aos programas e projetos, que é fundamental para toda organização social.

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sobre qual o caminho para nos fortalecer. Não chegamos até o fim, mas o estamos trilhando.

Aida Leitão e Mariagabriella de Giacomi4

Organização: Instituto de Cidadania Empresarial do Maranhão (ICE-MA)

Sede: São Luís, MA

Site: www.icema.org.br

Missão: Contribuir com o desenvolvimento sustentável do estado do Maranhão, cons-truindo relações intersetoriais que favoreçam a equidade social e a participação cidadã.

Iniciativa de dezesseis empresas locais incomodadas com a situação socioeconômica e política do estado, o ICE-MA foi fundado em 21 de fevereiro de 2001 como uma associação civil sem fins lucrativos. A decisão de criar uma entidade do terceiro setor partiu do fato de o grupo fundador não encontrar eco em associações comerciais ou federações industriais, uma vez que o Instituto não tem objetivos corporativos nem pretende trabalhar apenas com empresas, mas sim promover o diálogo intersetorial visando o desenvolvimento territorial do Maranhão.

Com sede em São Luís, o ICE-MA desenvolve projetos em articulação com os três setores. Oferece apoio às empresas associadas que desejam dar início a ou consolidar suas práticas sustentáveis e projetos de responsabilidade social empresarial, de voluntariado e de investimento social privado em cultura, educação e formação profissional nas áreas de vulnerabilidade social da cidade. Além disso, o ICE-MA desenvolve o Movimento Nossa São Luís, ação que engaja atores da sociedade em torno de uma agenda e um conjunto de metas comuns, com influência direta em políticas públicas. 4 Depoimentos concedidos em 15 de outubro

de 2013.

Outro desafio é dar continuidade àquilo que começamos com a Assessoria CEOS. Não podemos dizer que, depois de um ano de estímulo direto por parte do CEOS, continuemos com o mesmo engajamento de antes. Não é fácil, pois entramos na rotina e nas dificuldades do cotidiano. Também sentimos que aproveitamos pouco as supervisões semanais com a equipe do CEOS. Não sabíamos como utilizá-las e, em meio a um processo com mudanças tão grandes, não tínhamos clareza sobre as nossas próprias dúvidas. Quando a poeira assenta e você começa a vivenciar esses processos de fato, as dificuldades aparecem; na época, não tínhamos esse olhar tranquilo. Seria interessante que o CEOS pensasse em questões que pudessem direcionar o gestor nessa conversa, para que se faça bom uso do tempo com profissionais tão capacitados.

O que a Assessoria CEOS nos ensinou é que não adianta haver pessoas extremamente qualificadas na equipe se, enquanto instituição, você não consegue dar condições para que o trabalho aconteça. Além disso, é preciso cuidar de quem cuida. As organizações sociais que trabalham com crianças e adolescentes são valorizadas, mas não se dá o mesmo peso para quem apoia os adultos que cuidam desse público jovem, o que é fundamental. Dedicar-se à área social é difícil e desgastante, porque envolve muitas frustrações. Se as pessoas responsáveis por guiar a instituição não estão bem, a atividade-fim não vai ter os resultados desejados; se os gestores estão perdidos, a instituição também vai se perder. Por isso é tão importante o trabalho que o CEOS desenvolve.

A Assessoria CEOS representou bastante trabalho e desafios para o Espaço Progredir, mas também nos trouxe um estímulo que vamos levar conosco por muito tempo. Para nós, ficou claro que o trabalho na atividade-meio é essencial para qualquer organização sem fins lucrativos, pois, no fundo, a gestão é a base da instituição. Se as raízes são fortes, os frutos ficam mais bonitos. Hoje, temos clareza

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Hoje, o Instituto conta com 78 empresas associadas e cerca de 30 parceiros locais, nacionais e internacionais ligados à sua causa. A equipe é formada por nove funcionários, incluindo voluntários. A organização participa de uma rede, um fórum e três grupos de trabalho em sua área temática.

O ICE-MA foi a única instituição participante da Assessoria CEOS 2011 cuja principal gestora deixou a organização após o programa, o que já era previsto e foi tema de trabalho da Assessoria CEOS. A seguir, três integrantes do Instituto que vivenciaram o programa a partir de perspectivas diferentes dão seu depoimento sobre a experiência: Deborah Baesse, ex-coordenadora-geral do ICE-MA; Luís Alfredo Lima, que participou da Assessoria CEOS enquanto coordenador da área de programas e projetos e hoje responde pela gestão do Instituto, junto com Daniel Madorra; e Darci Fontes, fundador e membro da diretoria da organização.

Antes da Assessoria CEOS, o ICE-MA já tinha certa maturidade organizacional e um bom nível de estruturação interna. Entre 2010 e 2011, passamos por processos focados na discussão da nossa filosofia e na natureza do negócio, além da participação de membros da nossa equipe e governança em formações voltadas a empreendedores. No entanto, sentíamos uma deficiência muito grande em questões mais práticas e ferramentais, dedicadas à profissionalização dos nossos processos operacionais. Quando nos deparamos com o edital da Assessoria CEOS, pensamos: “Esse programa é exatamente o que a gente precisa”.

Nossa expectativa, portanto, era em relação à gestão de processos. Além disso, eu já vinha planejando minha saída do ICE-MA desde 2011. Faço parte do Instituto desde antes de sua criação formal e, naquele momento, minha avaliação era de que um ciclo havia se fechado e que a renovação era importante tanto para a instituição quanto para mim. Em função de uma série de

motivos, essa transição foi adiada para o ano seguinte, o que permitiu que fosse trabalhada pela Assessoria CEOS. Da minha parte, como gestora, havia a preocupação de deixar tudo o mais organizado e sistematizado possível.

A partir do programa, passamos a entender com mais clareza a composição das receitas do Instituto, enxergando de uma forma bem objetiva a natureza de nossas despesas. Isso nos permitiu trabalhar melhor nossa carteira de associados, reconhecendo sua heterogeneidade, já que o ICE-MA atua com empresas de pequeno a grande porte. Com a Assessoria CEOS, entendemos qual era o momento de cada associado em relação ao tema da responsabilidade social empresarial, o que deu direcionamento à atuação. Também repensamos os salários da equipe e, hoje, o Instituto possui diretrizes que uniformizaram todos os cargos e remunerações.

Considero o módulo de comunicação um marco do programa no ICE-MA. Com o apoio do consultor, conseguimos enxergar a necessidade de trabalhar a identidade do Insti-tuto e do Movimento Nossa São Luís, enten-dendo as diferenças entre eles e estabelecendo estratégias para a comunicação dessas marcas. Antes da Assessoria CEOS, lidávamos com a questão de maneira intuitiva, mas agora há um entendimento melhor sobre os riscos e benefí-cios dessa característica do nosso trabalho, os públicos que desejamos atingir, a melhor forma para lidar com eles, os porta-vozes de cada uma das nossas ações. A partir das diretrizes desse módulo, refizemos diversos materiais de comunicação, iniciando pelo site do Instituto.

Outro marco que destaco foi o diagnóstico situacional. Receber a devolutiva e enxergar as questões da organização foi muito bom. No caso do Instituto, nossas impressões batiam diretamente com as conclusões do diagnóstico. O documento apontava como pontos positivos aquilo que a gente de fato já intuía que eram nossas forças e trazia como pontos a melhorar

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aspectos que estavam nos incomodando. Ali, a gente viu que CEOS e ICE-MA falariam a mes-ma língua.

Além dos resultados referentes aos processos, o programa trouxe contribuições fundamentais para a estratégia da organização, que considerávamos resolvida. O grande impacto que o programa trouxe para o ICE-MA, que não enxergávamos como um problema quando fizemos a inscrição no edital, foi em relação à governança. Entendíamos que estávamos trilhando um caminho interessante, com uma governança próxima, mas não o suficiente. Ainda que houvesse o engajamento de um ou outro diretor, o grupo como um todo permanecia distante. O programa nos mostrou que isso não é sustentável e que precisávamos fazer um trabalho sério de envolvimento dessa esfera. Para o Instituto, esse foi o principal desafio do programa, pois trabalhar a governança é absolutamente necessário, mas também complicado, pois passa por um processo de convencimento, engajamento e alinhamento de ideais e projetos políticos.

É preciso muita responsabilidade para a condução de um trabalho como a Assessoria CEOS, porque, dependendo de como você tira aquelas pedrinhas do lugar, você pode destruir a organização. O CEOS traz um suporte por meio do coaching que foi muito importante para nós. Além disso, outro diferencial é a metodologia do programa. A Assessoria CEOS traz conhecimento e apoio técnico para o gestor implementar mudanças que não são simples, mas há também um planejamento com começo, meio e fim, prazos e tarefas. Desde o início, fica muito claro para a organização de onde estamos saindo, aonde queremos chegar e qual o caminho metodológico para isso.

Gerir uma organização social é de uma complexidade imensa. Hoje, eu vejo que dedicar tempo, energia e recurso (que nunca existe) para a atividade-meio é tão ou mais importante que o investimento na atividade-

fim. Se a organização não possui uma área-meio estruturada e profissionalizada, o fim é comprometido. É um erro pensar que esse trabalho possa ficar para depois, não seja tão necessário ou se trate de um luxo, como tantas vezes ouvimos de financiadores. Para mim, está muito claro que esse investimento traz um diferencial para o que você pode oferecer à sociedade.

Deixei o ICE-MA em dezembro de 2012, após a eleição da nova gestão. Não há dúvidas de que o programa teve muito impacto no meu trabalho como gestora. Como grande parte dos profissionais do terceiro setor, não tenho formação em gestão, mas sim na área-fim à qual me dedico. Enquanto profissional, a Assessoria CEOS me possibilitou, por meio de um exercício prático, entender e sistematizar conhecimentos sobre gestão e sobre os processos que as organizações vivem. Isso é algo que vou carregar para todos os lugares que eu for.

Deborah Baesse5

Participei da Assessoria CEOS no papel de co-ordenador de programas e projetos do ICE-MA. No início de 2013, com a saída de Deborah Baesse do cargo de gestora, passei a dividir essa função com Daniel Madorra, até então co-ordenador do programa Movimento Nossa São Luís, em uma gestão compartilhada. Junto com Deborah, estive à frente da condução da Asses-soria CEOS no ICE-MA, já tendo em mente a sucessão que viria.

Não tenho dúvidas de que ter passado pelo processo de formação trazido pela Assessoria CEOS ajudou no meu papel atual como gestor. Quando estamos à frente de uma área especí-fica, ainda que seja realizado um trabalho muito positivo na condução desse setor da organiza-ção, não temos a visão do todo. A participação no programa ampliou meu olhar, entendendo

5 Depoimento concedido em 16 de outubro de 2013.

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que as áreas precisam estar conectadas para que haja avanços na missão do Instituto.

Durante muito tempo, o ICE-MA esteve focado em sua atividade-fim, deixando adormecidas as atividades de suporte. Era necessário o estabe-lecimento de estratégias, com processos ope-racionais claros e definidos. A partir dessa luz trazida pela Assessoria CEOS, redefinimos nos-sas funções e setores. Hoje, a instituição tem uma área única de programas e projetos, uma comunicação que responde a todos eles e uma administração financeira integrada, o que antes era segmentado para cada ação desenvolvida pelo Instituto.

O programa nos trouxe avanços fundamentais no trabalho com a governança, o que ao mes-mo tempo é nosso principal desafio. Até então, a equipe tomava decisões que não lhe cabiam. O módulo de governança foi muito educativo, dei-xando claro para os conselheiros qual o seu papel no Instituto. Após as oficinas, tivemos resultados imediatos no envolvimento desses atores em torno do ICE-MA. Hoje, temos uma governança comprometida, mas vivemos o desafio de con-duzir um processo de alinhamento com novos membros a cada mudança de composição das instâncias, o que acontece de três em três anos. Estamos passando por esse momento atualmen-te, a partir do novo ciclo que começou em 2012.

Outro marco foi o módulo de comunicação. A Assessoria CEOS nos ajudou a compreender que o Instituto é uma organização híbrida. Te-mos como foco o trabalho com as empresas, mas também mantemos um forte diálogo com o poder público e as instituições do terceiro se-tor; conversamos, portanto, com três públicos diferentes. Além disso, no conjunto das em-presas associadas, há desde grandes compa-nhias até empresas de varejo. Com o programa, tivemos um salto importante ao perceber que precisamos de uma comunicação que chegue a todos. É necessário pensar uma comunicação mais arrojada, compreendendo o papel estraté-gico dessa área da organização.

Destaco ainda a ida para São Paulo, em razão do evento de encerramento. O encontro com as outras organizações participantes foi funda-mental. A troca de experiências é inspiradora, pois nos permite identificar os caminhos trilha-dos por outras organizações para solucionar desafios que nós também vivemos. Senti falta de outros momentos como esse ao longo do programa.

A Assessoria CEOS transfere ferramentas e conhecimentos para que as instituições sociais possam entender seu papel social e melhorar cada vez mais seu processo de intervenção na-quilo que ela se propõe a fazer. As organizações, assim como as pessoas, cumprem estágios de desenvolvimento que precisam ser observados, respeitados e cuidados. É preciso reconhecer que esse desenvolvimento se dá de maneira constante e que cabe à organização estar aten-ta para que evite a estagnação, caindo em uma zona de conforto a respeito de seu trabalho.

Nesse sentido, destaco um diferencial impor-tante do trabalho desenvolvido pelo CEOS, que foi o cuidado em selecionar as pessoas-chave da organização que contribuiriam para alavan-car o desenvolvimento do Instituto. O programa procurou engajar não as pessoas com menor carga de trabalho, mas sim aquelas mais com-prometidas e ativas, com uma memória acumu-lada sobre a instituição, o que foi muito relevan-te para os resultados atingidos.

Uma instituição social está desenvolvida quando tem consciência do seu papel, consegue comu-nicar o que faz e é reconhecida por esse trabalho, o que amplia sua credibilidade e legitimidade com seus públicos de relacionamento. Hoje, há enorme dificuldade de apoio financeiro para que a organização tenha esse momento de sistema-tização e revisitação de sua prática. Não se tra-ta de cumprir tarefas, mas sim de refletir sobre aquilo que está sendo feito e quais lições estão sendo aprendidas.

De seu lado, os financiadores precisam ter consciência de que, ao investir na atividade-

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-meio de organizações sociais, estão apoiando um processo de fortalecimento de uma área fundamental para o Brasil, que é o terceiro setor. Trata-se de organizações que possuem competência e aprendizado acumulado que podem alavancar diversos processos, sobretudo políticas públicas. Por isso, esse apoio é muito importante para que as entidades possam desenvolver melhor seus papéis e fortalecer cada vez mais a causa a que se dedicam.

Luís Alfredo Lima6

O interesse do ICE-MA pela Assessoria CEOS partiu do nosso desejo de, diante da construção contínua da organização, ter o olhar de uma consultoria que pudesse nos ver de fora para dentro, identificando melhorias que nós, ligados à instituição, não temos distanciamento para observar. Percebíamos que o Instituto estava em um momento de crescimento e queríamos a garantia de que estávamos no rumo correto. Além disso, tínhamos interesse na contribuição de profissionais que pudessem trazer experiências sobre o terceiro setor nacional. Quando tomamos conhecimento do edital do programa, vimos a oportunidade para isso.

Junto com o CEOS, conseguimos identificar diversos pontos de melhoria. Entre eles, destaco o trabalho com a governança. O programa nos possibilitou entender o papel fundamental dessa esfera para a organização e a necessidade de que as instâncias estejam próximas e os conselheiros disponíveis para contribuir. Uma vez que a governança se propõe a participar da gestão de uma organização, ela precisa de fato estar presente para apoiar os recursos humanos que há na equipe, responsáveis por conduzir o dia a dia da entidade. A partir da Assessoria CEOS, nossa governança entendeu que sua responsabilidade é maior do que nos propúnhamos antes do programa. Hoje, as reuniões são mais frequentes e com um quórum maior.

6 Depoimento concedido em 18 de outubro de 2013.

Outro aspecto importante trabalhado pelo programa foi a comunicação do ICE-MA. Sempre tivemos necessidades nessa área, demanda que a Assessoria CEOS também identificou. Depois do programa, melhoramos 500%. Começamos a ver que se trata de um elemento fundamental para uma instituição como a nossa. Temos uma equipe interna com três pessoas dedicadas à área e contratamos uma empresa de comunicação que presta serviços para nós, a partir de uma negociação em que parte do trabalho é pro bono. Nossas ações passaram a ter uma visibilidade maior; hoje, a presença de informações sobre o ICE-MA na mídia local é frequente.

Além disso, a Assessoria CEOS nos apontou um problema que precisávamos resolver, a respeito do regime de contratação dos funcionários, até então feita pelo modelo de prestação de serviços. Sempre nos preocupamos em regularizar essa situação, mas o programa deixou claro que isso era inegociável, principalmente considerando a missão e os valores do Instituto. Hoje, 100% da equipe é contratada em regime CLT. Também fizemos pequenos ajustes apontados pelo programa em nossa gestão administrativo-financeira, como a adoção da prática de cotação de preços, com pelo menos três fornecedores, para todas as prestações de serviços, o que antes era feito em apenas alguns processos. São medidas que contribuem para a transparência do ICE-MA, de maneira que nossos associados estejam respaldados de que todos os processos da organização são tão profissionais quanto em uma empresa.

A partir das mudanças trazidas pela Assessoria CEOS, nos sentimos preparados para alçar novos horizontes. Ampliamos nosso portfólio, passando a prestar serviços na área de responsabilidade social empresarial não apenas para empresas associadas, como fazíamos, mas também para o conjunto do segundo setor local. Vimos que era uma oportunidade do ICE-MA crescer, explorando melhor seu capital intelectual e tendo recursos financeiros para manter a organização. Hoje, estamos com o primeiro contrato com uma em-presa que não faz parte da nossa base.

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O ICE-MA é tão ciente da importância do fortalecimento institucional para as organizações sem fins lucrativos que, dentro dos nossos limites, realizamos esse trabalho por meio do programa Diálogos, o qual visa capacitar líderes empresariais e sociais de maneira a consolidar esse diálogo intersetorial. É comum que as entidades sociais sejam formadas por pessoas que nem sempre têm acesso ao conhecimento de como organizar sua estrutura ou se apresentar perante um financiador. No entanto, são profissionais com enorme expertise sobre seus espaços e grande poder mobilizador da população local. Com uma consultoria como a Assessoria CEOS, você fortalece a organização de maneira que ela possa desempenhar seu papel e interagir com outros setores de uma forma mais tranquila, sendo valorizada e reconhecida por gestores públicos e privados.

Aqui, identifico um diferencial do CEOS. Trata-se de um trabalho extremamente profissional, com um conhecimento profundo tanto do cenário nacional do terceiro setor quanto do olhar do empresário nessa relação. Ficou muito claro que o CEOS compreende os diversos setores. Além disso, a estrutura do programa é muito bem planejada, definida e documentada, com um cronograma de atividades a ser cumprido. Isso traz segurança para a organização assessorada de que o trabalho trará os resultados esperados.

A principal aprendizagem trazida pela Assessoria CEOS, a meu ver, é a certeza de que sempre temos muito que aprender. O programa nos trouxe conhecimentos e nos ajudou a encontrar soluções que não conseguíamos enxergar. Considero esse tipo de consultoria um divisor de águas para uma organização. Além disso, é preciso ter ciência de que nenhuma instituição pode melhorar sua atuação se não houver uma entrega de fato não só da equipe operacional, mas também da governança. Hoje, temos clareza de que esse bolo só cresce se tiver esses dois ingredientes.

Somente com equipe e governança alinhadas, integradas e comprometidas, a instituição é capaz de se transformar e dar sua contribuição de fato para o conjunto da sociedade.

Darci Fontes7

Organização: Instituto Pombas Urbanas

Sede: São Paulo, SP

Site: www.pombasurbanas.org.br

Missão: Promover o desenvolvimento de Cidade Tiradentes, zona leste de São Paulo, por meio da arte, de suas raízes culturais e da capacidade transformadora do jovem.

O grupo de teatro Pombas Urbanas foi criado em 1989, em São Miguel Paulista, zona leste de São Paulo, a partir do projeto Semear Asas. Concebido por Lino Rojas (1942-2005), diretor peruano radicado no Brasil, o projeto promovia oficinas para jovens e adolescentes da região, visando formar atores e técnicos para o teatro. Em seu trabalho, o grupo Pombas Urbanas se dedicava tanto à pesquisa e produção de espe-táculos quanto ao desenvolvimento de ações que visavam aproximar o teatro de populações sem acesso a atividades culturais.

Com o objetivo de multiplicar a experiência do projeto Semear Asas e desenvolver seu trabalho artístico e social de maneira mais sistemática, o grupo decidiu fundar sua própria associação sem fins lucrativos. Assim, em 2 de setembro de 2002, foi criado o Instituto Pombas Urbanas. Em 2004, um galpão abandonado de 1.600 m2, no bairro de Cidade Tiradentes, foi cedido ao grupo pela pre-feitura, em regime de comodato por vinte anos. Nascia ali o Centro Cultural Arte em Construção.

O primeiro projeto realizado pelo Instituto, Do Teatro à Comunidade, da Comunidade ao Teatro, visava fazer teatro com, na e para a comunida-de. No entanto, diversas demandas chegavam à organização vindas dos moradores do bairro, marcado pela ausência de aparelhos de cultura.7 Depoimento concedido em

21 de outubro de 2013.

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Assim, o Instituto foi ampliando seu foco de maneira a abarcar outras linguagens artísticas, tendo como público central as crianças e os adolescentes da região. Hoje, são realizados projetos e cursos em teatro, circo, música, capoeira, dança, inclusão digital, comunicação comunitária e incentivo à leitura por meio da arte. O centro cultural, aberto à comunidade, abriga espetáculos semanais, como saraus, cinema, música, dança e teatro, além de manter uma biblioteca comunitária com mais de 10 mil livros e 3.443 usuários.

O Instituto conta com trinta integrantes, incluindo voluntários, e mantém cinco núcleos artísticos, como o próprio grupo de teatro Pombas Urbanas e outros coletivos formados por ex-alunos. A organização atende 250 alunos por semestre e possui um teatro com capacidade para 140 lugares por apresentação. Em 2012, mais de 20 mil pessoas passaram pelo Centro Cultural. O Instituto participa de dois fóruns e sete redes ligados à sua área de atuação.

A seguir, Adriano Mauriz e Marcelo Palmares, ambos alunos de Lino Rojas, atores do grupo Pombas Urbanas e membros da presidência do Instituto, dividem impressões a respeito de sua vivência na Assessoria CEOS.

Antes da Assessoria CEOS, o Instituto Pombas Urbanas era uma organização completamente anárquica, elemento perfeito... para o fazer teatral! Conseguíamos realizar nossas atividades, mas todas as ações eram feitas ao mesmo tempo, sem que fossem estabelecidas prioridades entre elas. Vivíamos uma confusão entre os diferentes personagens dessa história: o Instituto, o grupo de teatro, o Centro Cultural. Isso afetava nossa condição enquanto gestores, porque misturávamos nossos papéis. Havia momentos em que o ator falava quando cabia ao gestor e vice-versa. Estabelecer critérios para as duas situações era muito conturbado.

O programa nos ajudou a esclarecer o papel de cada um e a entender em que momento o grupo ou o Instituto deve prevalecer. Instituir a governança e seu papel dentro da organização também foi fundamental para estabelecer um

caminho mais claro para a tomada de decisão, que antes ficava muito solta. Nossa formação teatral com Lino Rojas nos ensinou que tudo é de todos, mas o programa nos ajudou a perceber que o que valia para um grupo de teatro não se encaixava em uma instituição com sete núcleos, formada por membros de diferentes faixas etárias, experiências e entendimentos. Não é possível dar a mesma medida para todos. Hoje, todos opinam, mas as decisões passam pela validação da governança.

Trabalhamos três eixos principais com a Assessoria CEOS: a consolidação da gestão, dos projetos e da estrutura física do nosso centro cultural. Em todos eles, conseguimos avanços significativos. Antes do programa, não tínhamos funcionários em regime CLT; hoje, são quatro, o que inclui uma profissional dedicada à área administrativa. Além disso, em 2012, fomos contemplados pelo edital Desenvolvimento & Cidadania, da Petrobras. Com esse apoio, que tem duração de dois anos, conseguiremos consolidar uma cooperativa, modelo jurídico que, com o apoio do CEOS, identificamos como o mais adequado para a gestão dos nossos convênios, contratos e emendas.

Sobre os projetos, conseguimos aprovar nosso plano anual de atividades no Programa de Ação Cultural (ProAC) da Secretaria de Estado da Cultura, que apoia a produção cultural por meio da renúncia fiscal do ICMS. O passo seguinte é captar tais recursos, a partir desse plano já estruturado. Por fim, estamos reformando o centro cultural. Construímos seis salas e um estúdio multimídia. Essa reforma considera os aportes feitos pelo módulo de infraestrutura física ao nosso projeto arquitetônico, nos ajudando a priorizar em quais aspectos da estrutura nós investiríamos nesse momento.

Muitas dessas decisões atendem a necessidades que nós já sentíamos, mas que não sabíamos como conduzir ou deixávamos para segundo plano. Com a Assessoria CEOS, tivemos de dar esse passo, que é custoso, mas importante para a evolução do

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Instituto. O programa também criou um marco organizacional, com documentos aos quais podemos recorrer. Pretendemos voltar a eles no início do próximo ano, para identificar as metas atingidas e os desafios que temos pela frente.

Um dos momentos mais marcantes que vivemos nesse processo foram as oficinas do módulo de planejamento estratégico, realizadas com toda a equipe, fora da nossa sede, para que discutíssemos a organização. Promover essa reflexão fora do ambiente de trabalho trouxe outra visão sobre nós mesmos. Quando voltamos para a sede, algo tinha mudado em todos os participantes. De certa forma, o mais marcante não eram as oficinas, mas sim a volta para a organização e os processos que se davam depois desses encontros. Passávamos a nos olhar sob outra perspectiva.

A presença de todos nessas oficinas também foi fundamental. Trabalhamos muito a questão do coletivo pelo teatro e foi importante ver como isso poderia funcionar para a gestão do Instituto. Não se trata de abrir mão da nossa essência em nome de uma mudança na forma de trabalho, mas sim de pensar como essa característica poderia impulsionar nossas ações enquanto organização. Nisso, vemos a abordagem do CEOS como um diferencial. O Centro teve respeito, sensibilidade, carinho e afeto ao entrar em nossa organização, entender nosso trabalho e nos ajudar a destrinchar esse turbilhão de ações que desenvolvemos. O programa não chega com uma fórmula pronta, mas encontra um caminho em conjunto, o que é muito importante.

Estamos em processo de amadurecimento, porque a Assessoria CEOS envolve grandes mudanças na organização. O tempo foi um obstáculo, pois tivemos o inconveniente de começar o trabalho depois das outras organi-zações; ao mesmo tempo que equilibrávamos facas e fogos da instituição, tivemos de avançar com o programa, o que foi desafiador. Há também barreiras que ainda não conseguimos ultrapassar, que são muitos pessoais e envolvem

a forma como cada um lida com o Instituto. Mesmo que o CEOS dê diretrizes, cabe à organização lidar com seus problemas. Hoje, temos mais consciência sobre eles, o que é o primeiro passo para resolvê-los.

O que nos move é a natureza artística e pedagógica do nosso trabalho, e não propriamente a gestão do Instituto. Mas entendemos que é preciso dar os passos para que a gestão seja qualificada e a organização estruturada, inclusive para que a gente possa dedicar mais tempo à nossa vocação e realizar nosso trabalho com mais qualidade. Para isso, entendemos que a organização social precisa dar-se o tempo de empreender e colocar processos de gestão em prática. Costumamos dedicar toda energia para o nosso fazer, vendo a gestão como algo secundário. Para ter o desenvolvimento e o avanço que tivemos, inclusive de compreensão, foi necessário nos darmos esse tempo.

Receber o tipo de consultoria que a Assessoria CEOS traz é fundamental porque permite que a organização dê passos com mais segurança, avance com mais qualidade em direção às suas metas e tenha credibilidade, o que também estimula os financiadores a acreditarem nesse trabalho. Isso vale para organizações que se dedicam à nossa área temática. Nós trabalhamos com arte, com seres humanos, em situações adversas. Muitas vezes, o coração e a emoção nos movem muito, e não conseguimos ter distanciamento para tomar determinadas decisões. Por isso, ter uma visão distanciada e analítica do nosso trabalho é fundamental. Com a Assessoria CEOS, ouvimos o que esperávamos e precisávamos ouvir. Para que a gente avance em nossos sonhos e utopias, é necessário que cada coisa esteja em seu lugar.

Adriano Mauriz e Marcelo Palmares8

8 Depoimentos concedidos em 15 de outubro de 2013.

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Conclusão

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Os processos de monitoramento e avaliação adotados ao longo da Assessoria CEOS, as conclusões da avaliação externa e, em particular, os depoimentos dos gestores participantes registrados no capítulo anterior demonstram que a primeira experiência do programa confirmou as premissas originais do CEOS e trouxe os resultados esperados.

Transformações foram observadas em todas as cinco organizações, independentemente da causa e área temática à qual se dedicam – seja cultura, educação, assistência social, meio ambiente ou mobilização social. Todas experimentaram profundas reordenações organizacionais, o que confirma o pressuposto do CEOS de que o fortalecimento institucional é uma necessidade transversal a todo o terceiro setor. Como este é diverso por natureza, e não por defeito, processos voltados à gestão devem seguir sendo disponibilizados para todas as entidades sociais.

Da mesma forma, comprovou-se que a área geográfica não deve ser referência para a delimitação do foco da ação de fortalecimento institucional, quando se considera também o fortalecimento do espaço cívico. Afinal, cabe questionar: existem argumentos convincentes para defender a tese de que a consolidação de uma organização social atuante na área rural do Piauí não tem a mesma relevância para o fortalecimento do tecido social brasileiro que a de uma entidade localizada no Sudeste? É possível advogar com consistência a favor da concentração dos investimentos nas entidades de maior visibilidade pública, com a expectativa de que tal decisão tenha impactos no conjunto da sociedade?

A partir da experiência com a Assessoria CEOS, o Centro tem hoje a vivência concreta dos efeitos positivos trazidos pela diversidade temática e geográfica. Vemos que, uma vez empoderadas, as organizações fortalecem os diversos espaços de articulação política dos quais fazem parte. Assim, o pressuposto de que o objetivo do fortalecimento institucional de organizações sociais deve ser a consolidação do papel político da sociedade civil organizada, composta por entidades que se distribuem por todo o território nacional, com igual peso e importância, foi de fato confirmado.

Não podemos resolver os problemas estando no mesmo nível de consciência que os gerou originalmente.

Albert Einstein

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Balanço: principais resultados da Assessoria CEOS 2011

Dentre os insumos trazidos pela avaliação ex-terna e pelas falas dos gestores participantes a respeito dos principais resultados da Assessoria CEOS 2011, destacamos:

a compreensão sistêmica da organização, com entendimento a respeito da importân-cia da gestão estratégica não apenas para a entidade em si, como também para a própria causa por ela escolhida;

a compreensão e aplicação, na prática, do trabalho coletivo. Embora, na área social, o discurso corrente seja o do trabalho compartilhado, as ferramentas para que isso de fato ocorra – a governança e o processo de delegação – estavam ausentes ou eram praticadas de forma equivocada nas organizações;

a apropriação das ferramentas de gestão, a partir de uma visão estratégica e sistê-mica. Assim, áreas como a comunicação, os programas e projetos, a administração financeira e a infraestrutura física e tecnoló-gica da organização estão sendo utilizadas em função da visão de futuro e da causa abraçada pela entidade, e não apenas de seus projetos, que, embora nobres e ne-cessários, são apenas o fim da cadeia de um processo de intervenção consistente;

a distribuição das metas ao longo do tempo, com orçamentos que facilitam a captação

dos recursos e permitem a avaliação da efetividade das realizações;

o empoderamento, no sentido da apropriação da vida organizacional e do processo de fortalecimento institucional por parte do gestor e sua equipe. Todos os empreendedores sociais reconhecem em seus depoimentos que, com o fim da Assessoria CEOS, ainda há muito por fazer: sustentar as conquistas, concluir a implantação de diversos processos ou ainda operar novas metas. Todos, sem exceção, estão se responsabilizando por isso. Essa é a autonomia que buscávamos.

Novos cenários, novas dinâmicas

Passada a vivência com a Assessoria CEOS 2011, no entanto, o que o Centro percebe é um contexto que torna a realização de um programa dessa envergadura e ambição cada vez mais inviável financeiramente. Os investidores sociais reagem com interesse ao modelo inovador da Assessoria CEOS, baseado em uma intervenção em profundidade na organização, mas questionam o custo significativo do programa e sua pequena escala – ou seja, o mesmo fator que gera reconhecimento acaba por se tornar impeditivo para sua concretização.

O que se percebe é que, entre 2007 (ano de fundação do CEOS) e hoje, o terceiro setor brasileiro passou por mudanças significativas. Os investidores sociais, cada vez mais operadores, apostam menos no

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apoio livre a empreendedores sociais, com argumentos que apontam para a clara confusão entre apoio financeiro e assistencialismo. Sem esse apoio, as organizações e seus empreendedores não conseguem sustentar o processo das transformações sociais, que dependem da realização das metodologias criadas e requerem tempo para que se desenvolvam em sua plenitude.

Nesse cenário, um modelo de financiamento como o Fios, baseado na ideia de um fundo que apoia uma causa, e não projetos, torna-se insustentável, o que tem consequências sobre a viabilidade da própria Assessoria CEOS. Como explica Gabriel Ligabue,

A dinâmica do investimento social mudou muito entre a fundação do CEOS e hoje. A possibilidade de você ter um fundo difuso, ou seja, onde um doador aporta um recurso de maneira desinteressada, tornou-se praticamente inexistente. Hoje em dia, o Fios não se sustenta como ideia nem, portanto, a própria Assessoria CEOS, porque é o fundo que permite o processo democrático tal qual foi pensado.

A pressão para que as organizações sociais gerem cada vez mais resultados numéricos no menor tempo e ao menor custo possíveis transfere para o terceiro setor uma lógica de mercado que, na área social, tem impactos preocupantes. Sem dúvidas, o CEOS defende o rigor no processo de gestão – seja de projetos, seja das próprias organizações sociais –, mas não reconhecer as diferenças intrínsecas ao setor social é feri-lo de morte. De certa forma, é como se o terceiro setor tivesse sido “comprado pelo mercado”, como resume Rebecca Raposo. A noção de concorrência que se estabeleceu no setor leva investidores e mesmo organizações a reivindicarem para si a tarefa de criar soluções (e delas reivindicar a autoria) para problemas sociais cada vez mais complexos, em uma

esfera onde a cooperação e o estabelecimento de parcerias multissetoriais efetivas pautadas pelo interesse público deveriam ser a regra.

Junte-se a isso um cenário que, ao estimular uma busca frenética por números e novidades, deixa cada vez menos espaço para a reflexão. Opera-se muito, pensa-se pouco. “As pessoas executam, mas não sabem exatamente por qual motivo”, define Ligabue. Para o CEOS, tal situação é especialmente problemática porque entendemos que o papel da sociedade civil não é apenas responder a vácuos deixados pelo poder público ou pelo mercado, mas também – e tão importante quanto – trazer questionamentos.

Para onde caminhamos

Vivemos um momento sem precedentes na história da sociedade civil brasileira. Observa-se o crescimento da demanda por estratégias que fortaleçam a participação direta dos cidadãos na vida social e política, seja por meio da ida às ruas em manifestações que reivindicam pautas diversas, seja por meio da articulação online. Coloca-se em xeque não apenas o papel de partidos políticos, como o das próprias organizações sociais.

Também é representativo o crescimento de modelos híbridos, como os negócios sociais, que, ao aliar lucro e impacto social, requerem ainda mais clareza ética para que sejam efetivos e representem de fato um possível “caminho do meio”. Assim, a figura do empreendedor social nos moldes que conhecíamos, enquanto uma liderança visionária cujo projeto é apoiado por investidores desinteressados, passa por profundas transformações.

Em vista desse cenário, é tempo de revisão de papéis para o CEOS. Se viabilizar a Assessoria CEOS torna-se tarefa cada vez mais difícil,

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cabe ao Centro adaptar seus pressupostos e metodologias às demandas e potencialidades do novo contexto e praticar o que ele próprio prega. Como descreve Rebecca Raposo, “a missão do CEOS segue firme. O que muda é a estratégia”. Ou, como explica Gabriel Ligabue,

Hoje, a proposta do CEOS faz mais sentido ainda, porque o que se vê são grupos hegemônicos dentro do investimento social, sendo que o que precisamos é de pluralidade. Os problemas sociais são cada vez mais complexos, portanto a sociedade civil tem de ser plural.

A revisão em seu modo de fazer passa também pelo papel das organizações-meio no cenário atual. Para que nosso trabalho seja efetivo, é necessário tanto clareza por parte de financiadores a respeito da importância do investimento na gestão estratégica quanto uma mudança de postura por parte das organizações-fim, que tendem a deixar sua área-meio em segundo plano em nome da operação de programas e projetos. Essa tendência é reforçada pela pressão de investidores sociais com foco excessivo e monocórdico em projetos, com tempos curtíssimos para sua realização. Vê-se o investimento na própria organização como algo custoso e sem retornos imediatos, portanto com baixa prioridade nos orçamentos – o que é exacerbado em um cenário de baixa reflexão.

É aqui que reside a oportunidade de novos caminhos para o CEOS. Se a operação tornou-se inviável, o Centro aposta na reflexão como estratégica para o cumprimento de sua missão. Um setor social sustentável passa também por organizações sociais críticas e abertas ao debate, a fim de que haja avanços coletivos, e não individuais. Para o Centro, essa tarefa está intimamente ligada à nossa própria natureza: a organização-meio não é dona das respostas, mas responsável por fazer as perguntas certas.

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CRÉDITOS ASSESSORIA CEOS 2011Investidores sociaisFundação ValeInstituto C&AInstituto Oi FuturoDoador anônimo

Organizações sem fins lucrativos participantesAssociação Vaga LumeCentro de Educação Ambiental e Assessoria (CEAA)Espaço Progredir Instituto de Cidadania Empresarial do Maranhão (ICE-MA)Instituto Pombas Urbanas

Membros do comitê de seleçãoAnna Peliano | IpeaCristiane Félix | Instituto C&AMarcos Flávio Azzi | Instituto AzziPedro Genescá | Instituto Oi FuturoRosa Maria Fischer | CEATS-USPSheila Najberg | Instituto DynamoTeresa Bracher | Instituto AcaiaVera Lyra | FEA-UFBAVinicius Precioso | CEOSVivian Medeiros | Fundação Vale Representante de doador anônimo

Consultores participantes Adriana Fonseca | Planejamento estratégico e governançaAlberto Motta | Infraestrutura físicaGabriel Ligabue | Gestão administrativo-financeiraJosé Otávio Gonçalves | Tecnologia da informaçãoJudi Cavalcante | Comunicação estratégicaRebecca Raposo | Planejamento estratégico e governançaRita Dias | Implantação de sistema financeiroThereza Holl | Gestão de programas e projetos

Equipe CEOS Rebecca Raposo | Diretora-presidenteAdriana Fonseca | Diretora de planejamento e gestãoVinicius Precioso | Diretor de relacionamento institucionalVanessa Lucena | Gerente-assistenteMariana Tavares | Assessora de comunicação

Centro de Estratégiaspara Organizações Sociais

Ficha técnica

Comitê editorial:Cristina MeirellesKaren WorcmanJudi CavalcanteMarco Antônio Vieira Souto

Pesquisa, entrevistas e redação: Mariana TavaresEdição: Rebecca RaposoPreparação: Bibiana LemeRevisão: Vanessa Lucena Vinicius Precioso

Projeto GráficoVia Impressa Edições de ArteCarlos Magno Bomfim

Designers Douglas GermanoPaulo OtávioRobinson Pereira

Revisão TécnicaRicardo Sampaio Mendes

CTP | Impressão e AcabamentoGarilli Gráfica e Editora

1a EdiçãoSão Paulo | maio | 2014

Publicação viabilizada com o apoio do Instituto C&A.

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