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Revista Vox, n. 9, p. 88-107, jan.-jun. 2019. ISSN: 2359-5183. 88 Uma discussão historiográfica sobre o escravismo no Brasil: as perspectivas de Jacob Gorender e de Sidney Chalhoub *1 A historiographical discussion about slavery in Brazil: the perspectives of Jacob Gorender and Sidney Chalhoub João Carlos Furlani *2 Nicodemo Valim de Sena *3 Resumo: Neste artigo, temos por finalidade examinar e relacionar as propostas de Jacob Gorender e de Sidney Chalhoub no que diz respeito ao mesmo objeto: o escravismo no Brasil. Para tanto, centraremos nossa análise nas obras O escravismo colonial, de Gorender, e Visões da liberdade, de Chalhoub, visto que, em tais produções, os historiadores fundamentam suas concepções relativas à escravidão no Brasil. Apesar de trilharem itinerários teórico-metodológicos díspares, ambos os escritores adquiriram notável importância na historiografia brasileira, servindo como referência para inúmeros outros trabalhos. Além das nítidas diferenças, tentaremos demonstrar como as falas dos autores, mesmo mediante divergências, acabam por se relacionar analogamente em determinados momentos. Por fim, versaremos sobre os motivos pelos quais Gorender e Chalhoub caminham em distintas direções, apesar de terem o mesmo objeto de pesquisa. Palavras-chave: Escravidão; Historiografia brasileira; História do Brasil; Jacob Gorender; Sidney Chalhoub. Abstract: In this article, we aim to analyze and relate the proposals of Jacob Gorender and Sidney Chalhoub with regard to the same object: slavery in Brazil. Therefore, our analysis will focus on the works O escravismo colonial of Gorender and Visões da liberdade of Chalhoub, since in such productions, the authors base their views on the slavery in Brazil. In spite of their different theoretical and methodological paths, both authors have acquired remarkable importance in Brazilian historiography, serving as a reference for many other works. In addition to the clear differences, we will try to demonstrate how the authors’ statements, even through divergences, end up relating in an analogous way at certain moments. Finally, we will discuss the reasons why Gorender and Chalhoub walk in different directions, despite having the same research object. Keywords: Slavery; Brazilian historiography; History of Brazil; Jacob Gorender; Sidney Chalhoub. Recebido em: 26/04/2019 Aprovado em: 24/06/2019 *1 O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (Capes) - Código de Financiamento 001 e da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes). *2 Doutorando em História Social das Relações Políticas pelo Programa de Pós-Graduação em História (PPGHis) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), sob orientação do Prof. Dr. Gilvan Ventura da Silva. Mestre em História pelo PPGHis/Ufes. Licenciado e bacharel em História pela Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: [email protected]. *3 Doutorando em História Social das Relações Políticas pelo Programa de Pós-Graduação em História (PPGHis) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), sob orientação do Prof. Dr. Nelson Pôrto Ribeiro. Mestre em História pelo PPGHis/Ufes. Licenciado e bacharel em História pela Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: [email protected].

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Revista Vox, n. 9, p. 88-107, jan.-jun. 2019. ISSN: 2359-5183.88

Uma discussão historiográfica sobre o escravismo no Brasil: as perspectivas de Jacob Gorender e de

Sidney Chalhoub*1

A historiographical discussion about slavery in Brazil: the perspectives of Jacob Gorender and Sidney Chalhoub

João Carlos Furlani*2

Nicodemo Valim de Sena*3

Resumo: Neste artigo, temos por finalidade examinar e relacionar as propostas de Jacob Gorender e de Sidney Chalhoub no que diz respeito ao mesmo objeto: o escravismo no Brasil. Para tanto, centraremos nossa análise nas obras O escravismo colonial, de Gorender, e Visões da liberdade, de Chalhoub, visto que, em tais produções, os historiadores fundamentam suas concepções relativas à escravidão no Brasil. Apesar de trilharem itinerários teórico-metodológicos díspares, ambos os escritores adquiriram notável importância na historiografia brasileira, servindo como referência para inúmeros outros trabalhos. Além das nítidas diferenças, tentaremos demonstrar como as falas dos autores, mesmo mediante divergências, acabam por se relacionar analogamente em determinados momentos. Por fim, versaremos sobre os motivos pelos quais Gorender e Chalhoub caminham em distintas direções, apesar de terem o mesmo objeto de pesquisa.Palavras-chave: Escravidão; Historiografia brasileira; História do Brasil; Jacob Gorender; Sidney Chalhoub.

Abstract: In this article, we aim to analyze and relate the proposals of Jacob Gorender and Sidney Chalhoub with regard to the same object: slavery in Brazil. Therefore, our analysis will focus on the works O escravismo colonial of Gorender and Visões da liberdade of Chalhoub, since in such productions, the authors base their views on the slavery in Brazil. In spite of their different theoretical and methodological paths, both authors have acquired remarkable importance in Brazilian historiography, serving as a reference for many other works. In addition to the clear differences, we will try to demonstrate how the authors’ statements, even through divergences, end up relating in an analogous way at certain moments. Finally, we will discuss the reasons why Gorender and Chalhoub walk in different directions, despite having the same research object.Keywords: Slavery; Brazilian historiography; History of Brazil; Jacob Gorender; Sidney Chalhoub.

Recebido em: 26/04/2019Aprovado em: 24/06/2019

*1 O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (Capes) - Código de Financiamento 001 e da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes).*2 Doutorando em História Social das Relações Políticas pelo Programa de Pós-Graduação em História (PPGHis) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), sob orientação do Prof. Dr. Gilvan Ventura da Silva. Mestre em História pelo PPGHis/Ufes. Licenciado e bacharel em História pela Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: [email protected]. *3 Doutorando em História Social das Relações Políticas pelo Programa de Pós-Graduação em História (PPGHis) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), sob orientação do Prof. Dr. Nelson Pôrto Ribeiro. Mestre em História pelo PPGHis/Ufes. Licenciado e bacharel em História pela Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: [email protected].

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Introdução

Tradicionalmente, a escravidão é pensada como uma forma de relação social de produção e que no Brasil, foi adotada, de maneira geral, desde o período colonial até o final do Império. A prática escravista foi marcada, em território brasileiro,

principalmente, pelo uso de pessoas escravizadas trazidas do continente africano, além daquelas provenientes de tribos indígenas, que também foram vítimas desse processo.

É igualmente comum encontrarmos narrativas que afirmam que os cativos foram utilizados, sobretudo, na agricultura e na mineração, sendo, portanto, essenciais para a manutenção da economia. Contudo, boa parte da imagem dos escravizados foi consolidada no imaginário citadino, onde desempenhavam vários tipos de serviços domésticos ou urbanos, como podemos ver na Figura 1. A escravidão, por essa ótica tradicional, seria, por fim, abolida, em termos jurídicos, com a assinatura da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888.

Figura 1 – Pintura de Jean-Baptiste Debret, de 1839, retratando o cotidiano de uma sociedade escravista1

Fonte: Le diner. Les dèlassemens d’une aprés diner, Jean-Baptiste Debret, litografia em aquarela neoclassicista, 16 x 13 cm, 1839.

1 “Le diner. Les dèlassemens d’une aprés diner”, traduzida para o português como “O jantar. Passatempos depois do jantar”, é uma litografia realizada pelo artista francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848), que passou quinze anos no Brasil, onde buscou compreender o cotidiano de uma sociedade construída sobre a escravidão. Em sua obra, retratou a divisão entre senhores e escravos.

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João Carlos Furlani e Nicodemo Valim de Sena

É claro que a visão retratada acima é, no mínimo, reducionista. Sabemos que essa questão não é tão simples ou fácil de ser resumida, uma vez que ela marcada por inúmeras ações políticas, práticas culturais e relações socioeconômicas de difícil compreensão, que nos levam, amiúde, a conclusões precipitadas, ou mesmo mal fundamentadas, desse delicado processo de nossa história.

Hoje, sabemos que as experiências de escravidão no Brasil foram múltiplas. Enquanto os escravizados nas grandes propriedades viviam em senzalas coletivas, aqueles de pequenas propriedades, muitas vezes, moravam na mesma casa de seus senhores. Com essa simples constatação, é possível pensarmos em distintas relações entre escravizados e senhores, que perpassam por situações de violência e fugas, mas também de estratégias e negociações (cf. SLENES, 2011; SILVA; REIS, 1989).

Os escravizados não tinham uma única função, trabalhavam nos mais diferenciados ofícios – carpinteiros, sapateiros, pedreiros, cortadores de cana, carneadores, cozinheiras, amas-de-leite, engomadeiras, entre outros –, como apontam os registros contidos no Arquivo Público do Rio de Janeiro, por exemplo. Os preços cobrados pelos escravizados também eram variáveis. O ofício exercido, o sexo, a idade e a condição física dos cativos influenciavam em seu valor de venda e troca nesse desumano mercado (cf. CHALHOUB, 1990). Por falar nesse comércio, o próprio tráfico pode ser problematizado, se pensarmos na relação entre redes de poder ultra marítimas e a reprodução endógena de escravos (cf. CAMPOS, 2011).2

As constatações descritas acima – e suas críticas – tornam-se cada vez mais evidentes ao nos debruçarmos sobre a historiografia relativa a essa temática, na qual distintas correntes de pensamento dividem os trabalhos de historiadores, sociólogos e antropólogos. Mesmo que, teoricamente, se ocupem sobre o mesmo tema, o enfoque e os objetivos de seus estudos são múltiplos.

Dentre os trabalhos mais recorrentes, encontramos uma vasta gama de citações às clássicas obras de Gilberto Freyre (2006) e de Sergio Buarque de Holanda (2010) e às fragmentadas opiniões de Caio Prado Júnior (1972; 1977; 1992; 2000). Além destas perspectivas, as obras de Fernando Henrique Cardoso (1977), Emília Viotti da Costa (2012), Florestan Fernandes (1978), João José Reis (1988; 1989), Eduardo Silva (1989), Sílvia Lara (1988), Manolo Florentino e José Roberto Góes (1997) se destacam entre os

2 Outra discussão atual se refere à utilização do termo “escravizado” no lugar de “escravo”, uma vez que este último poderia gerar certa naturalização da escravidão nos indivíduos cativos, como se estes fossem inerentes à tal condição (HARKOT-DE-LA-TAILLE; SANTOS, 2012, p. 8). Todavia, é preciso alertar que, apesar dos ganhos obtidos a partir das discussões linguístico-culturais, seria um equívoco considerar que todos os autores que adotam o vocábulo “escravo” estariam naturalizando a condição de escravidão. É importante compreendermos as definições do conceito no uso de sua aplicação e os interesses dos autores em emprega-las, uma vez que os conceitos são historicamente construídos, perdem e ganham distintos significados ao longo do tempo, comportando, em si mesmos, camadas temporais diversas (KOSELLECK, 2006, p. 103-105).

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historiadores. Não menos importantes, e até mesmo mais emblemáticas, O escravismo colonial, de Jacob Gorender, publicada em 1978, e Visões da liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na corte, escrita por Sidney Chalhoub e publicada em 1990, se consolidam como pilares historiográficos sobre a escravidão brasileira. Obviamente, uma série de artigos, monografias, dissertações e teses acadêmicas vem sendo publicadas, sobretudo, a partir do século XXI.

Nosso interesse nasce da constatação de correntes historiográficas distintas, que se conflitam, antes de tudo, por bases teóricas. Desta forma, nossa pretensão, neste artigo, não é a de discutir ou a de oferecer uma nova interpretação sobre a escravidão no Brasil, mas, antes disso, analisar as visões deste processo pela ótica de dois consagrados autores, Gorender e Chalhoub, buscando relacionar analogamente seus respectivas argumentos, estabelecendo uma comparação, de modo que seja possível observar similaridades e divergências a respeito de um mesmo objeto, assim como é sugerido por Ciro Flamarion Cardoso e Hector Perez Brignoli (2002, p. 409-413).3 Para isso, também dispomos dos métodos de Análise de conteúdo, tal qual expostos por Lawrence Bardin, sobretudo no que se refere à elaboração de complexos categoriais.4

Jacob Gorender: entre a tradição e a inovação

Jacob Gorender, nascido em Salvador, em 20 de janeiro de 1923, e morto em São Paulo, em 11 de junho de 2013, foi um dos mais importantes historiadores marxistas brasileiros. Em 1992, recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal da Bahia e, em 2000, foi o vencedor do concurso “Intelectual do Ano” da União Brasileira de Escritores. Mas, antes disso, viveu sua infância nos cortiços habitados pela comunidade pobre de sua cidade natal. Seu pai, Nathan Gorender, judeu ucraniano socialista e antissionista, emigrou no início do século XX para a Argentina, onde viveu por cinco anos até seguir para a Bahia e constituir família. Jacob Gorender, com 21 anos, recebeu treinamento militar como membro do corpo de comunicações, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Em seguida, partiu em direção ao porto de Nápoles, no sul

3 O método comparativo, por longo tempo, foi associado a comparações de grande síntese meta-históricas. Contudo, observa-se sua constante utilização em pesquisas literárias e discursivas. Marc Bloch (1930, p. 31-39), outrora, já afirmava que aplicar o método comparativo no quadro das Humanidades consiste em buscar as semelhanças e as diferenças que apresentam duas séries de natureza análoga, tomadas de meios sociais distintos, em especial, para explicá-las.4 A autora define o método como um conjunto de instrumentos cada vez mais sutis e em constante aperfeiçoamento, que se aplicam a “discursos” extremamente diversificados. O fator comum destas técnicas múltiplas é uma hermenêutica controlada, baseada na inferência. Constitui-se, basicamente, de quatro etapas: 1) a pré-análise; 2) a exploração do material; 3) o tratamento dos resultados obtidos, inferência, interpretação; e 4) síntese final (BARDIN, 2009, p. 101).

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João Carlos Furlani e Nicodemo Valim de Sena

da Itália, onde chegou em setembro de 1944, para lutar na II Guerra Mundial, como integrante da Força Expedicionária Brasileira. Curiosamente, décadas mais tarde, seria preso e torturado durante o período de ditadura militar no Brasil (MAESTRI, 2005, p. 4).

Após o fim da guerra, retomou o curso universitário, na Bahia. Mas logo abandonou para militar profissionalmente no Partido Comunista Brasileiro (PCB), legalizado em 1945. Em fins de 1946, já no Rio de Janeiro, Gorender ingressou na redação do semanário comunista A Classe Operária e no secretariado metropolitano do PCB. No Rio de Janeiro, Gorender também dirigiu a Imprensa Popular e o Voz Operária. Em abril de 1968, fundou o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), juntamente com Mário Alves, Apolônio de Carvalho e com a ajuda de outros militantes marxistas (MAESTRI, 2005, p. 5-7).

O pensamento de Gorender sobre a formação da social brasileira, contudo, nasceu em sua experiência na prisão, onde defendeu, sob a forma de curso, a transição da sociedade brasileira, do escravismo ao capitalismo, sem passagem pelo feudalismo, criticando abertamente outras posições marxistas sobre o assunto. Em fins de 1971, em liberdade, Jacob Gorender trabalhava como tradutor e dedicava-se ainda à sua interpretação sobre a formação social brasileira (MAESTRI, 2005, p. 8-9). Em 1974, já com 51 anos de idade, e influenciado por suas convicções políticas, dedicou-se plenamente à redação de O escravismo colonial, que foi publicado apenas em 1978 pela editora Ática, de São Paulo.

A obra de Gorender, apesar das críticas, rapidamente tornou-se um sucesso. Ao defender o caráter escravista colonial do passado brasileiro, superava a controvérsia “passado feudal-passado capitalista”, que dividia os intelectuais marxistas, como observado no clássico Formação histórica do Brasil, de Nélson Werneck Sodré, publicado em 1963. Em tal obra, o autor resumia a compreensão de desenvolvimento da sociedade pelos marxistas nas seguintes etapas: “a comunidade primitiva, o escravismo, o feudalismo, o capitalismo e o socialismo” (SODRÉ, 1963, p. 4). Divisão que Gorender negava firmemente.

Em linhas gerais, com O escravismo colonial, Jacob Gorender buscava superar a tradicional apresentação cronológica do passado brasileiro para definir em forma categorial-sistemática sua estrutura escravista colonial. De acordo com Mário Maestri (2005, p. 9), o objetivo de Gorender empreendia um estudo “estrutural” da realidade colonial, para penetrar “as aparências fenomenais e revelar” sua “estrutura essencial”, isto é, seus elementos e conexões internos e o movimento de suas contradições. Em outras palavras, propunha uma superação epistemológica radical da interpretação da formação social brasileira.

Gorender, preocupado com a inserção de seu trabalho em meio às demais reflexões sobre a escravidão, dedica um capítulo de sua obra para esclarecer as opções teórico-

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metodológicas que nortearam sua investigação. Nesta seção, Gorender (1978, p. 15-18) apresenta três linhas de interpretação da sociedade brasileira: a primeira, responsável por criar um “quadro de uma sociedade patriarcal ou feudal”; a segunda, que mapeou uma sociedade capitalista bem-definida; e, por fim, a terceira, caracterizada por ser uma espécie de meio-termo entre as duas primeiras linhas de interpretações, uma vez que buscava sintetizá-las. O objetivo de Gorender (1978, p. 18), ao realizar uma categorização das pesquisas anteriores sobre a temática que se dedicou, foi evidenciar as diferenças e contribuições de sua obra. Em O escravismo colonial, de fato, há a elaboração de um novo quadro da sociedade, fundamentado num modo de produção denominado escravista colonial.

Para Gorender, um erro claro de autores anteriores foi iniciar suas investigações por um ambiente externo, do sistema colonial. Ao contrário, dever-se-ia esboçar as análises de maneira centrífuga, ou seja, a partir das relações de produção da economia colonial. Mais tarde, em entrevista, Gorender (1988, p. 137) declara:

Eu acredito que nas “Reflexões metodológicas”, que compõem a introdução do meu livro O escravismo colonial, esteja bastante claro o motivo da escolha do tema, decorrente da metodologia marxista, que coloca o modo de produção como o sistema básico da formação social.

É neste sentido que Gorender retorna à Karl Marx e afirma que é imprescindível que o estudo da formação de uma sociedade deva partir da análise dos modos de produção, que, em seu caso, é o escravismo colonial (ADOLFO, 2014, p. 121).

De modo mais específico, Jacob Gorender (1978, p. 53) aborda um problema do escravismo colonial, que, de acordo com ele, é o primeiro: o confronto entre portugueses e indígenas, duas formações sociais heterogêneas, que ele denomina como sendo a dos europeus, provenientes da sociedade feudal ibero-lusitana, e a dos indígenas tribais, procedidos do comunismo primitivo.

Ao escapar às definições oferecidas por Marx, no que diz respeito às possibilidades resultantes de um conflito entre “modos de produção” distintos de duas sociedades, Gorender (1978, p. 54) sustenta que o modo dominante de Portugal, na época da colonização, não se transferiu para o território conquistado, tampouco os lusitanos deixaram subsistir o modo de produção das tribos indígenas nas áreas de seu domínio.5

5 A afirmação de Marx, da qual Gorender analisa é feita a partir o seguinte trecho: “O povo conquistador submete o conquistado ao seu próprio modo de produção (por exemplo, os ingleses neste século na Irlanda e, em parte, na Índia); ou deixa o antigo [modo de produção] subsistir e se satisfaz com tributo (p. ex., turcos e romanos); ou tem lugar uma ação recíproca, da qual emerge algo novo, uma síntese (em parte, nas conquistas germânicas)” (MARX, 2011, p. 73).

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Acrescenta que não houve possibilidade de síntese. Diante disso, Gorender (1978, p. 55) define o escravismo colonial como surgido e desenvolvido dentro do “determinismo sócio-econômico rigorosamente definido, no tempo e no espaço. Deste determinismo de fatores complexos [...] é que o escravismo colonial emergiu como um modo de produção de características novas, antes desconhecidas na história humana”. Sendo assim, teríamos, um “modo de produção historicamente novo”.

Ainda referente aos “modos de produção”, Gorender assevera que o escravismo americano apresentou aparência de ressurreição do escravismo mediterrâneo, principalmente do romano. Tal visão se expressa no seguinte excerto:

Há em ambos, de fato o traço comum do trabalho escravo como tipo dominante de exploração da mão-de-obra. Mas a estrutura e dinâmica foram distintas em um e outro, tanto que a sociedade imperial romana se defrontou com o impasse representado pela impossibilidade de evolução do escravismo patriarcal ao escravismo mercantil moderno (GORENDER, 1978, p. 58).

Apesar de não desenvolver em termos mais sofisticados, Gorender (1978, p. 58-59) ressalta que o escravismo colonial deve ser estudado ao nível categorial-sistemático do conhecimento histórico, ou seja, não de forma linear ou de um desdobramento cronológico. Todavia, a sua opção pelo materialismo histórico e o desenvolvimento de um modo de produção, mesmo que à brasileira, será munição para as críticas que o acusam de um engessamento e uso ideológico da História.

Sidney Chalhoub: uma opção pela cultura

A partir dos anos de 1980, as teorias materialistas sobre a sociedade brasileira começaram a perder espaço para os estudos voltados para questões ditas mais culturais, que valorizavam temas como a violência, o cotidiano, a liberdade, a resistência, a família, entre outros. É nesse meio que Sidney Chalhoub se insere.

Graduado em História, em 1979, pela Universidade de Lawrence, em Appleton, Wisconsin, Estados Unidos da América, Chalhoub voltou ao Brasil, onde realizou o mestrado na Universidade Federal Fluminense, concluído em 1984, sob orientação de Robert Andrew Wayne Slenes. Finalizou seu doutorado, em 1989, na Universidade Estadual de Campinas, onde já lecionava, também sob orientação de Slenes. E é exatamente com sua tese de doutorado, Visões da liberdade: uma história das últimas

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décadas da escravidão na Corte, que Chalhoub despontou como um dos mais prestigiados historiadores do país.

A carreira de Chalhoub, como historiador, certamente, foi muito produtiva. Escreveu dezenas de artigos, livros e notas em jornais. Inclusive, em 1997, recebeu um prêmio Jabuti, na categoria “ensaio”, pelo livro Cidade febril: cortiços e epidemias na corte imperial (1996), e o Prêmio ABL de História e Ciências Sociais, em 2013, pelo livro A força da escravidão (2012). Sua carreira como professor da Unicamp foi longa, de 1985 a 2015, quando passou a lecionar na Universidade Harvard.

É importante compreendermos um pouco da trajetória de Chalhoub, uma vez que, como dissemos, ele está inserido num processo de transformação das práticas historiográficas no Brasil. As tendências sobre o conhecimento histórico e as demandas de um novo local de produção marcaram muitos historiadores da década de 1980 em diante, sendo estas importantes características de diferenciação entre os trabalhos de Sidney Chalhoub e os de Jacob Gorender, por exemplo.

Caracterizada por um período de difusão dos programas de pós-graduação em História, de distensão da ditadura militar, a ascensão de uma chamada “nova esquerda” – em contraposição ao viés marxista tradicional – e dos movimentos sociais, a historiografia brasileira, sem dúvida, não ficou à margem desse processo (QUADROS, 2011, p. 31-32).

Antes mesmo de defender sua tese doutoral, Chalhoub já atuava na Unicamp, instituição que, de maneira geral, era caracterizada por uma produção historiográfica com influências dos historiadores marxistas britânicos, responsáveis, sobretudo, pelo movimento da “História vista de baixo”.6 Em outras palavras, o contexto em que estava inserido foi também responsável por sua escrita da História – que se contrastava largamente com a das décadas anteriores – e, é claro, do desenvolvimento de sua obra Visões da liberdade.

O próprio Chalhoub assevera sua intenção em escrever sua tese. Nas palavras do autor:

Este livro foi uma contestação, mais ou menos explícita ao longo dos capítulos, mas sempre presente, daquilo que batizei aqui de “teoria do escravo-coisa”. Tal teoria – tão difundida na produção historiográfica que é quase supérfluo ficar arrolando nomes de autores – defende a ideia que as condições extremamente duras da vida na escravidão

6 História vista de baixo é uma corrente historiográfica oriunda da Inglaterra, que busca produzir conhecimento histórico a partir do ponto de vista de mulheres e homens considerados comuns, e que muitas vezes foram esquecidos, mas que foram tão sujeitos histórico quanto os chamados grandes homens, que, por longo tempo, eram os protagonistas da disciplina História (cf. THOMPSON, 2001).

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teriam destituído os escravos da capacidade de representar o mundo a partir de categorias e significados sociais que não aqueles instituídos pelos próprios senhores. […] Procurei demonstrar também que a outra face da teoria do escravo-coisa é a ênfase na rebeldia negra. Apesar das diferenças de formulação, a ideia sempre presente aqui é a de que as práticas mais abertas de resistência por parte dos negros eram a única maneira de eles se afirmarem como pessoas humanas, como sujeitos de sua própria história (CHALHOUB, 1990, p. 249-250).

Grosso modo, Chalhoub (1990, p. 250) pretendeu contrapor as teorias que são concebidas, de maneira mais evidente, por Jacob Gorender e Fernando Henrique Cardoso, uma vez que estes autores representam linhas de pensamento que considera dicotômicas e problemáticas. O autor é bem crítico em relação a ideias mais progressistas que buscam distanciar-se da ideia de “escravo-coisa”, mas que acabam indo para outro extremo e criando mais um mito, o do eterno “escravo rebelde”. Para Chalhoub, tal posicionamento não fugia da coisificação imposta aos escravizados. É por isso que afirma:

O fato de muitos escravos terem seguido este caminho não significa que eles tenham simplesmente “espelhado” ou “refletido” as representações de seus “outros” sociais. Os cativos agiram de acordo com lógicas ou racionalidades próprias, e seus movimentos estiveram sempre firmemente vinculados a experiências e tradições históricas particulares e originais. E isto ocorria mesmo quando escolhiam buscar a liberdade dentro do campo de possibilidades existente na própria instituição da escravidão –– e lutavam então para alargar, quiçá transformar, este campo e lutavam então para alargar, quiçá transformar, este campo de possibilidades (CHALHOUB, 1990, p. 252).

Tais afirmações, mais duras, encontram-se à guisa de conclusão na obra de Chalhoub. Mas para chegar a estas considerações um longo processo foi trilhado. Visões da liberdade foi concebida e dividida em três partes, nas quais o autor buscou abordar: a percepção e as atitudes dos escravos diante das mudanças que sofreram com a intensificação da transferência dos cativos do Norte para o Sudeste, em meados do século XIX; as alforrias e a Lei de 1871, que seriam um indicativo de conquista dos objetivos dos escravos; e as lutas impostas pela “cidade negra” contra a instituição da escravidão.7 Chalhoub, portanto, encara os escravizados como sujeitos históricos,

7 Para Chalhoub (1990, p. 186), a “cidade negra” seria “[...] o engendramento de um tecido de significados e de práticas sociais que politiza o cotidiano dos sujeitos históricos num sentido específico – isto é, no sentido

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agindo e reagindo frente às adversidades de sua época, não apenas como “coisas” ou “humanos coisificados”.

Assim como Gorender, Chalhoub busca evidenciar algumas questões sobre seus métodos de investigação. Dialoga com Robert Darton e Carlo Ginzburg, apesar de não aceitar completamente suas práticas de pesquisa (CHALHOUB, 1990, p. 15-17). As análises de Visões da liberdade são construídas a partir de um argumento teórico: a superação da ideia de transição histórica, que qualifica o período em questão como uma passagem do modo de produção escravista para uma ordem burguesa, ou, ainda, da escravidão para a liberdade. É evidente a crítica de Chalhoub às macro-teorias de base/superestrutura, responsáveis, em sua visão, por fabricar uma interpretação linear e previsível do movimento histórico. Nesse sentido, como forma de superar a ideia de transição, Chalhoub propõe a noção de processo histórico, que seria capaz de evidenciar os aspectos culturais e ideológicos da sociedade em contraposição ao determinismo econômico.

Outro autor basilar na argumentação teórica de Visões da liberdade é Edward Palmer Thompson. Chalhoub (1990, p. 26) enxerga no historiador britânico marxista a possibilidade de efetivar a “análise das mudanças históricas, através da reconstituição dos conflitos ocorridos em torno de diferentes normas e valores”. Em sua análise, Thompson (2001) buscou efetuar de forma proveitosa um diálogo interdisciplinar entre a História, a Antropologia e a Sociologia, capaz de promover uma “ambivalência dialética”, que seria favorável para compreender os conflitos ideológicos dos sujeitos históricos durante o processo de escravidão e da consequente abolição (CHALHOUB, 1990, p. 20-26).

Duas visões, dois polos?

Não é preciso muito esforço para percebermos nítidas diferenças entre as posições de Jacob Gorender e de Sidney Chalhoub, como foi apresentado até aqui. Contudo, é preciso compreendermos um pouco mais aqueles pontos centrais que os distanciam teoricamente. Mas, além disso, é fundamental também buscarmos certas semelhanças entre suas obras.

Em O escravismo colonial, como vimos anteriormente, Jacob Gorender procura superar a apresentação cronológica do passado para definir em forma categorial-

da transformação de eventos aparentemente corriqueiros no cotidiano das relações sociais na escravidão em acontecimentos políticos que fazem desmoronar os pilares da instituição do trabalho forçado”.

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sistemática sua estrutura escravista colonial. Todavia, Sidney Chalhoub (1990, p. 20) argumenta que apesar dessas análises estruturais apresentarem diferenças, nelas permanecem “a vigência da metáfora base/superestrutura; da ideia frequentemente geradora de reducionismos grotescos”. Mais que isso, essas abordagens postulam “uma espécie de exterioridade determinante dos rumos da história”, que, de certa maneira, desconsideram a intenção dos agentes históricos.

A defesa de Gorender de um “modo de produção”, portanto, entraria, claramente em choque com as perspectivas que Chalhoub defenderia mais tarde. Para este último, o “movimento da história” deve ser levado em considerando, uma vez que seria problemática essa ênfase dada ao modo de produção escravista em relação à “transição” ao trabalho livre, pois tal perspectiva remete a uma noção de linearidade e de previsibilidade de sentido de movimento histórico, apesar de negar tal fato. Para Chalhoub (1990, p. 18-19), “por mais variadas que sejam as nuanças, da vigência da metáfora base/superestrutura; da ideia, frequentemente geradora de reducionismos grotescos, de determinação em última instância pelo econômico”, a decadência ou extinção da escravidão, nessas abordagens, se explicam, em última instância, a partir da lógica da produção e do mercado.

Chalhoub é um exímio crítico das noções de escravidão e de escravo de Gorender, não à toa elegeu este último como um dos representantes da “teoria do escravo-coisa”. A aproximação de Gorender com as prerrogativas de Aristóteles sobre a escravidão e os escravizados reforçaria este argumento. Lembremos que, para o filósofo grego:

[...] é necessário dispor de instrumentos próprios para a tarefa que tem de ser desempenhada, assim também quem estiver à frente do governo da casa deve ter seus instrumentos, uns inanimados outros animados [...], a coisa possuída é um instrumento para viver e a propriedade consiste num conjunto de instrumentos; o escravo é uma espécie de propriedade viva e todo o ajudante é como que o primeiro de todos os instrumentos (Aristóteles, Política, 1253b, 25-30).

A característica mais significativa no ser escravizado reside, portanto, na sua condição de “propriedade” de outro ser humano. O escravo, então, é o ser sujeito ao senhor a quem pertence, nunca ao contrário. É essa afirmação da qual Gorender (1978, p. 60-61) compartilha ao aludir às afirmações de Aristóteles – e também de Montesquieu –, a noção de que a propriedade traz consigo a “sujeição pessoal”, o que seria chamado de “coisificação” por Chalhoub. Contudo, Gorender (1978, p. 64), em alguma medida, tenta fugir deste juízo, ao afirmar que foram os “próprios escravos que exteriorizaram sua condição antagônica, na medida em que reagiram ao tratamento de coisas”. Mesmo que não desenvolva seus argumentos de maneira tão incisiva quanto

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Chalhoub, Gorender também abrange o fator da resistência como um dos pressupostos da abolição. De maneira geral, ambos os autores compreendem que os escravizados, mesmo sendo tratados, por muitos de seus senhores e leis, como animais, coisas e propriedade privada, nunca perderam até o último resíduo de humanidade. Apesar dessa aproximação, nos pontos específicos as divergências surgem.

Chalhoub (1990, p. 129) declara que “assim como não ‘adquiriu’ a escravidão, o escravo não ‘adquire a liberdade: ele sempre conserva a liberdade ‘pela natureza’, de forma ‘latente’, e o cativeiro significa apenas que ele foi vítima de um ‘fato’”. E acrescenta que os escravizados não eram passíveis de aceitação dessa condição. A preocupação de Gorender é outra, logo, as conclusões seguem outras direções. Em sua perspectiva, a escravidão, por si mesma, não indica um modo de produção, podendo aparecer de maneira mais ou menos acidental e ser meramente acessória de relações de produção de tipos diferentes, sendo então uma “categoria sociológica” (GORENDER, 1978, p. 60).

Ao tratar das modificações ocorridas no domínio do senhor perante o escravo, Gorender declara que, entretanto, tais mudanças não alteravam as leis econômicas objetivas do modo de produção escravista. Em suas palavras: “Quanto mais acentuado o caráter mercantil de uma economia escravista, o que se deu, sobretudo nas colônias americanas, tanto mais forte a tendência de extremar a coisificação do escravo” (GORENDER, 1978, p. 68). Chalhoub (1990, p. 26), por outro lado, não se prende a valores econômicos como determinantes dessa “coisificação” dita por Gorender, explicitando, então, que as condições escravocratas e de liberdade aos escravizados não eram:

[...] assunto econômico, pois afinal dependia a autonomia ou não dos negros em suas atividades produtivas [...]. Este era um assunto político, pois afinal, o governo podia agora interferir mais decisivamente na organização das relações de trabalho. Insinuava-se aqui também a questão social.

Chalhoub faz tal declaração a partir das discussões sobre o significado da liberdade para os negros em meios escravistas, durante o Segundo Reinado. Entretanto, ao longo de sua obra, defende tal posição no que concerne às condições dos escravos, juntamente, com a ideia inicial de propriedade privada, que Gorender também trata.

Chalhoub enfatiza também que os cativos se posicionavam sobre a escravidão o que tornava as transações ainda mais complexas. Os negros tinham suas próprias concepções de cativeiro justo ou pelo menos tolerável: suas relações afetivas mereciam algum tipo de consideração; os castigos físicos deveriam ser moderados; havia maneiras de os escravos manifestarem-se no momento da venda (CHALHOUB, 1990, p. 27). Mesmo que Gorender não deixe explicita tal afirmação em sua obra, o autor dá a entender

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situações semelhantes, desde ao trabalho até as fugas, atentados e insurreições. De modo semelhante ao descrito por Chalhoub, Gorender (1978, p. 71) acrescenta: “[...] a classe escravocrata amadureceu uma compreensão ‘sábia’ a respeito do castigo e a expressou nas formas concentradas de sua ideologia. Tal compreensão consistiu em que o castigo deve ser moderado”.

Mesmo em um único território, os escravizados não eram os mesmos. Gorender (1978, p. 75-77) propõe uma divisão, na qual os classifica em tipos: os de predominância agrária, “escravos rurais assenzalados”; considera-se aí também os de mineração; na cidade, escravos mais treinados, os “negros de ganho”; e por último os “escravos domésticos”, tanto rurais quanto urbanos, como o nome já diz, viviam a serviço pessoal da família do senhor.

É especialmente sobre esses escravos urbanos e domésticos que boa parte da discussão de Chalhoub é conduzida, expondo diversos relatos de julgamentos, os quais pesquisou no Arquivo Público do Rio de Janeiro. São diversos os casos de escravos que iam ao Tribunal, por motivos distintos, seja pela busca de liberdade, por reclamações de maus tratos ou por disputa de herança após a morte de seu senhor, que lhe havia prometido a alforria, entre outros. Porém, assim como Chalhoub destacou minuciosamente em sua pesquisa, podemos perceber que, analogamente como Gorender declarou, os negros passaram a lutar por sua própria liberdade; e a zona urbana, sendo mais propícia para isso, pela maior flexibilidade com os escravos, foi o palco inicial para essa batalha.

Apesar desses “encontros” entre os autores, seus posicionamentos teóricos protagonizavam as disputas por um saber sobre o passado. Em 1990, imediatamente após as celebrações do I Centenário da Abolição, Gorender escreveu A escravidão reabilitada, abrindo um novo capítulo para as discussões historiográficas sobre a escravidão no Brasil.

Das salas de aula ás páginas de jornais

Como sugere o título, A escravidão reabilitada constitui, em parte, uma resposta às críticas contra a interpretação escravista do passado brasileiro que reabilitava as teses de um escravismo patriarcal, benigno e consensual defendidas, sobretudo, por Gilberto Freyre (MAESTREI, 2005, p. 37). Gorender (1990a, p. 43) apontou, inclusive, raízes ideológicas nas obras que analisou, expondo o forte viés socialdemocrata do revisionismo historiográfico sobre a escravidão.

Além de ser uma resposta a uma historiografia de retorno às teses freyreanas, A escravidão reabilitada serviu também como uma carta aberta em defesa à historiografia

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materialista e à sua proposta de modo de produção escravista colonial, apresentada em O escravismo colonial.

Como outrora abordamos, as macro-teorias, o determinismo estruturalista e o materialismo histórico perderam força perante a renovação historiográfica em curso, sobretudo a partir dos anos de 1980. Alguns autores, contudo, afiançam que as críticas às teorias marxistas seriam, em verdade, fruto da “hegemonia das forças sociais conservadoras” (MAESTRI, 2005, p. 38).

É fato que Gorender caiu nas graças de uma parcela de historiadores e sociólogos. Para os defensores do materialismo histórico e das interpretações totalizantes, como Mário Maestri (2005, p. 40), as propostas atuais da História praticamente encerraram os modos de produção, uma vez que justificavam que tais teorias eram apenas visão ideológica da prática historiográfica. Segundo o autor, os historiadores contemporâneos se dedicam a “campos mais gentis e menos tensos, como a história da vida privada, da cultural, das mentalidades, das festas, dos sentimentos, dos costumes, dos hábitos, do sexo como desvio, etc., sobretudo das elites do passado e do presente” (MAESTRI, 2005, p. 40). Maestri, contudo, não define o que ele chama de “elite” nos estudos contemporâneos e, ao que parece, desconsidera a produção historiográfica da História vista debaixo, que se compromete exatamente com os indivíduos comuns.

Apesar das defesas, é fato também que as propostas de Gorender foram extremamente criticadas. Com a publicação de A escravidão reabilitada, parece que um novo fôlego de críticas foi retomado, e Chalhoub não ficou de fora dessa empreitada. Nas páginas da Folha de S. Paulo, de 24 de novembro de 1990, com o título “Gorender põe etiquetas nos historiadores”, Chalhoub faz uma resenha do mais recente livro de Gorender.

O debate historiográfico sobre as interpretações do fenômeno escravista no Brasil atinge o espaço público, sai dos debates acadêmicos e, como afirma Quadros (2011, p. 48), “invade as páginas de um dos periódicos de maior circulação no país”. A Folha de S. Paulo, que publicou a referida resenha crítica de Sidney Chalhoub, também recebeu a réplica de Jacob Gorender e a tréplica de Sílvia Lara.

Sidney Chalhoub, já em seu título, acusa Gorender de etiquetar os historiadores. E, num tom de deboche, compara Gorender a Simão Bacamarte, famoso personagem de O Alienista, de Machado de Assis. Vejamos:

No conto de Machado de Assis, Bacamarte quer estudar profundamente a loucura, determinar-lhe os diversos graus, classificar-lhe os casos etc., num procedimento taxonômico bastante característico do século 19. Em A escravidão reabilitada (sic), a monomania classificatória se ocupa dos historiadores que se atreveram a escrever sobre a história da escravidão e da abolição no Brasil em anos recentes –– especialmente

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depois de 1978, ano em que Gorender fez saber ao mundo que havia descoberto as leis eternas e imutáveis que regiam o funcionamento do modo de produção escravista colonial.8

Para Chalhoub, é evidente o objetivo de Gorender: “[...] explicar a seus leitores aquilo que ele realmente acha, e achou desde sempre, sobre este ou aquele aspecto da história da escravidão”.9 Contudo, diferentemente de Simão Bacamarte, que buscava comprovar seus pressupostos teóricos por meio da observação empírica, reavaliando e adaptando suas hipóteses, Jacob Gorender, nas palavras de Sidney Chalhoub:

[...] nunca fez uma pesquisa histórica prolongada nos arquivos da escravidão brasileira – limitou-se, até hoje, a ler alguns documentos impressos e livros de viajantes –, e então fundamenta seus procedimentos de crítica historiográfica no truque e na pilhagem.10

A severa crítica de Chalhoub, portanto, se dirige aos procedimentos metodológicos e a compreensão da escrita da História. Nem o tão criticado positivismo padecia de tantos problemas. Assim, prossegue Chalhoub sobre a acusação de “ventriloquismo” em Gorender: “[...] trata-se da arte de fingir que é um outro sujeito quem fala, quando na realidade é ele mesmo quem está falando. O método permite que o autor reconstitua os argumentos dos outros a seu bel-prazer”. Já o “método da pilhagem”, que também é imputado ao historiador baiano: “[...] consiste na prática gorendista de pinçar documentos isolados de seu contexto para ‘comprovar’ as leis do modo de produção etc.”.11

As palavras de Chalhoub podem ter sido vistas como uma resposta justa às acusações que Gorender lançou sobre a historiografia brasileira a partir de 1980. Contudo, a rigidez e o tom de deboche de suas palavras teriam despertado a fúria dos defensores do modo de produção escravista colonial e do próprio Gorender, que, redige uma réplica a Chalhoub, intitulada “Como era bom ser escravo no Brasil”, publicada em 15 de dezembro de 1990, na Folha de S. Paulo.

8 CHALHOUB, Sidney. Gorender põe etiquetas nos historiadores. Folha de S. Paulo, 24 nov. 1990. Caderno Letras, p. H-7. O sic foi utilizado por Chalhoub com um tom de crítica e sátira a ideia de “reabilitada” do livro de Gorender.9 CHALHOUB, Sidney. Gorender põe etiquetas nos historiadores. Folha de S. Paulo, 24 nov. 1990. Caderno Letras, p. H-7.10 CHALHOUB, Sidney. Gorender põe etiquetas nos historiadores. Folha de S. Paulo, 24 nov. 1990. Caderno Letras, p. H-7.11 CHALHOUB, Sidney. Gorender põe etiquetas nos historiadores. Folha de S. Paulo, 24 nov. 1990. Caderno Letras, p. H-7.

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Para Maestri (2005, p. 39), Chalhoub procura “depurar” o debate sobre o escravismo “de qualquer sentido político e ideológico, tornando-o mero tema acadêmico, despido de qualquer transcendência epistemológica e social”.

Em sua defesa, Gorender afirma que a tese O escravismo colonial trata, antes de tudo, sobre “[...] a contradição inerente ao escravo entre ser coisa e ser pessoa”. Essa seria, em verdade, resultado do tratamento social com os negros cativos, transformados em mercadorias dentro do sistema escravista, porém ainda seriam humanos dotados de subjetividade.12 Logo, eram injustas as acusações de uma máxima de “escravo-coisa” em sua obra.

Gorender aproveita também para defender seu mais recente livro, A escravidão reabilitada. Em sua visão, as “tendências acadêmicas” contemporâneas, “desenharam semelhante perfil histórico mistificador”, que acabaram reabilitando o escravismo.13 Num tom provocativo, alega:

Na ilha-fantasia das Bermudas, o personagem de A Tempestade de Shakespeare se deixou arrebentar pelo enlevo do “admirável mundo novo”. Hoje, se acreditasse nas teses universitárias da historiografia pretensamente avançada, decerto poderia exclamar: “Admirável mundo velho! Como era bom ser escravo no Brasil!”.14

Pensava-se que a polêmica – ao menos de maneira pública – se encerraria por aí. Contudo, em 12 de janeiro de 1991, Sílvia Lara publica uma tréplica na Folha de S. Paulo, com o sugestivo título “Gorender escraviza história”. O objetivo de Lara é, sem delongas, expor o que estava “oculto nessa discussão”, o motivo pelo qual “tantas linhas a discutir se os escravos eram, afinal, ‘coisas’ ou sujeitos de sua própria história”. Nesse sentido, Lara explicita o que antes era sugerido ao posicionamento de Gorender: a presença de proposições estalinistas na escrita da História. Para a autora, o historiador baiano compartilhava da “[...] velha crença de que uma boa ‘teoria geral’ substitui com vantagens o diálogo com as evidências”.15

Assim como Chalhoub, a crítica lançada por Lara recai sobre os aspectos teórico-metodológicos dispostos em Gorender. Nas palavras da autora:

12 GORENDER, Jacob. “Como era bom ser escravo no Brasil”. Folha de S. Paulo, 15 dez. 1990b. Caderno Letras, p. F-2.13 GORENDER, Jacob. “Como era bom ser escravo no Brasil”. Folha de S. Paulo, 15 dez. 1990b. Caderno Letras, p. F-2.14 GORENDER, Jacob. “Como era bom ser escravo no Brasil”. Folha de S. Paulo, 15 dez. 1990b. Caderno Letras, p. F-2.15 LARA, Sílvia Hunold. Gorender escraviza história. Folha de S. Paulo, 12 jan. 1991. Caderno Letras, p. F-2.

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Não nos preocupamos em saber se os escravos agiam ou não segundo as leis de um bem construído conceito de modo de produção ou qualquer outra modalidade teórica disponível no mercado. Ao estudar a escravidão no Brasil procuramos encontrar e ouvir os escravos: não conceitos abstratos, nem arquétipos de heróis ou vítimas. Em nossos textos, os escravos, fugitivos e libertos, têm nomes. Suas histórias mostram como seres humanos submetidos à escravidão tinham outros valores e projetos – diferentes daqueles de seus senhores – e lutaram por eles enquanto escravos. Construíram alternativas de vida, lutaram de diversas formas e conquistaram “direitos”, transformando as próprias relações de dominação a que estavam submetidos. Suas ações e valores só podem ser compreendidos no interior através das relações sociais tecidas por eles e seus senhores. Deixar de lado noções anacrônicas de violência e liberdade significa apenas dar voz para esses homens e mulheres afirmarem suas concepções a respeito destas palavras.16

Tanto a obra quanto o pensamento de Gorender, segundo Lara – e ao que tudo indica, Chalhoub –, parecem não estar em sintonia com os pressupostos da historiografia contemporânea. Ao contrário, estariam presos num passado de explicações estruturantes e reducionistas que impediriam de dar voz aos mais distintos sujeitos e temas da História. Tal posição, contudo, não é aceita por Maestri, que afirma que a pesquisa histórica havia sido reduzida a “mero campo de estudo dos fatos singulares da formação social brasileira, desconectada de compreensão totalizante dos fenômenos em discussão”.

Considerações finais

Chegamos, enfim, ao ponto de conclusão de nosso texto, porém, com um duplo sentimento. Em primeiro lugar, de uma “missão inacabada”. Pois ler, debater, novamente ler e analisar as obras de Jacob Gorender e Sidney Chalhoub exigem mais páginas e discussões mais detalhadas. Em contrapartida, acreditamos que conseguimos, em algum nível, cumprir com nosso objetivo, que era o de expor e relacionar as propostas sobre a escravidão desses dois importantes historiadores brasileiros. Realçamos isso, pois nos deparamos com diversos trabalhos que se contentam em simplesmente caracterizar o pensamento de um e de outro, mas sem, de fato, relacioná-los. Com isso, há uma perda significativa dos motivos das divergências entre ambos. Mais ainda, há o engano de pensar que todos os pressupostos defendidos por Gorender estão em conflito com os de Chalhoub, como se representassem o negativo (ou o positivo) de uma mesma imagem.

16 LARA, Sílvia Hunold. Gorender escraviza história. Folha de S. Paulo, 12 jan. 1991. Caderno Letras, p. F-2.

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A classificação de “marxista” ou “culturalista”, “nova” ou “velha esquerda” geram algumas impressões equivocadas, ou melhor, criam certas ilusões de que os autores representam polos completamente distintos, apesar, é claro, de divergirem fundamentalmente nos motivos e na forma de elaboração de suas teses. Ao nos posicionarmos filosoficamente e agirmos de acordo com nossos pressupostos teóricos, mesmo ao tratar do mesmo tema, logicamente chegaremos a resultados distintos e nos importaremos com problemas ainda mais distintos.

Temos, portanto, dois autores com formações e práxis diversas, escrevendo em períodos díspares, provavelmente, por objetivos diferentes, mas que se cruzam, e, por muitas vezes, até dialogam. Entretanto, as divergências existem, são muitas, e são acentuadas no lugar que devem ser. O escravismo colonial nasce de um historiador, com uma formação marxista, militante, combatente, crítico daqueles que sacralizam cada ponto e vírgula saídos das penas dos clássicos do marxismo, mas fiel ao seu posicionamento teórico-metodológico sistemático do materialismo histórico e dos modos de produção. Já Visões de liberdade nasce de um historiador crítico cultural, influenciado pela historiografia marxista inglesa, que dialoga com os métodos provindos da Sociologia e da Antropologia, preocupado tanto com a teoria quanto com seus métodos de pesquisa. Independentemente da forma de compreender o mundo e as relações de seus indivíduos, tanto Jacob Gorender quanto Sidney Chalhoub são importantes nomes para a historiografia brasileira, responsáveis, à sua maneira, por oxigenar os debates sobre a escravidão.

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