uma abordagem fenomenolÓgica na educaÇÃo

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 5012 UMA ABORDAGEM FENOMENOLÓGICA NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL: PERCEPÇÕES SOBRE SUSTENTABILIDADE FÁBIO PESSOA VIEIRA 1 RESUMO Compreender as concepções de sustentabilidade, constituídas no lugar, é uma perspectiva de envolver-se com outra possibilidade de construção das relações ambientais tendo como caminho, as percepções e a relação do homem com o meio ambiente. Destarte no presente estudo propõe-se, a partir da perspectiva do envolvimento ambiental, trabalhar com o vivido, com as subjetividades, indo ao caminho das percepções, a partir de uma abordagem fenomenológica que propicie à Educação Ambiental uma perspectiva de valorizar as experiências buscando compreender como a concepção de sustentabilidade é experienciada por sujeitos diversos que em um mesmo território, podem possuir uma relação íntima com o ambiente. Palavras-Chave: Educação Ambiental: Fenomenologia; Percepção; Sustentabilidade ABSTRACT Understanding the concepts of sustainability established at the place, it is a prospect of getting involved with another possibility of construction of environmental relationships as having way, perceptions and man's relationship with the environment. Thus in the present study proposes, from the perspective of environmental involvement, working with experienced, with subjectivities, going to the path of perceptions, from a phenomenological approach that provides environmental education a perspective of valuing the experiences trying to understand as the concept of sustainability is experienced by many subjects in the same territory may have a close relationship with the environment. Key-Words: Environmental Education; Phenomenology; Perception; Sustainability 1. Introdução Uma abordagem fenomenológica na Educação Ambiental no qual a temática da sustentabilidade possa vir a ser constituída a partir das percepções emergiu de inquietações pedagógicas sobre o discurso do desenvolvimento e do progresso, associados à ideia de desenvolvimento sustentável, como se aqueles fossem homogêneos nos diversos espaços tempos, desprezando as subjetividades e singularidades dos territórios, dos lugares e dos sujeitos. O que vem sendo imposto na educação ambiental e mais especificamente na temática do desenvolvimento sustentável, suprime a escala local a partir da idealização da global em um processo que inviabiliza o envolvimento do homem com o lugar e consequentemente com o meio ambiente, nos permite compreender que a 1 Professor Assistente e Líder do Grupo de Pesquisa GEAS - Grupo de Estudo sobre Educação Ambiental e Sustentabilidade - da Universidade Federal do Tocantins. Tocantinópolis (TO) Brasil. Acadêmico do Doutorado em Ciências do Ambiente da Universidade Federal do Tocantins. E-mail: [email protected]

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DE 9 A 12 DE OUTUBRO

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UMA ABORDAGEM FENOMENOLÓGICA NA EDUCAÇÃO AMBIENTAL: PERCEPÇÕES SOBRE SUSTENTABILIDADE

FÁBIO PESSOA VIEIRA1

RESUMO Compreender as concepções de sustentabilidade, constituídas no lugar, é uma perspectiva de envolver-se com outra possibilidade de construção das relações ambientais tendo como caminho, as percepções e a relação do homem com o meio ambiente. Destarte no presente estudo propõe-se, a partir da perspectiva do envolvimento ambiental, trabalhar com o vivido, com as subjetividades, indo ao caminho das percepções, a partir de uma abordagem fenomenológica que propicie à Educação Ambiental uma perspectiva de valorizar as experiências buscando compreender como a concepção de sustentabilidade é experienciada por sujeitos diversos que em um mesmo território, podem possuir uma relação íntima com o ambiente. Palavras-Chave: Educação Ambiental: Fenomenologia; Percepção; Sustentabilidade

ABSTRACT Understanding the concepts of sustainability established at the place, it is a prospect of getting involved with another possibility of construction of environmental relationships as having way, perceptions and man's relationship with the environment. Thus in the present study proposes, from the perspective of environmental involvement, working with experienced, with subjectivities, going to the path of perceptions, from a phenomenological approach that provides environmental education a perspective of valuing the experiences trying to understand as the concept of sustainability is experienced by many subjects in the same territory may have a close relationship with the environment. Key-Words: Environmental Education; Phenomenology; Perception; Sustainability

1. Introdução

Uma abordagem fenomenológica na Educação Ambiental no qual a temática

da sustentabilidade possa vir a ser constituída a partir das percepções emergiu de

inquietações pedagógicas sobre o discurso do desenvolvimento e do progresso,

associados à ideia de desenvolvimento sustentável, como se aqueles fossem

homogêneos nos diversos espaços tempos, desprezando as subjetividades e

singularidades dos territórios, dos lugares e dos sujeitos.

O que vem sendo imposto na educação ambiental e mais especificamente na

temática do desenvolvimento sustentável, suprime a escala local a partir da

idealização da global em um processo que inviabiliza o envolvimento do homem com

o lugar e consequentemente com o meio ambiente, nos permite compreender que a

1 Professor Assistente e Líder do Grupo de Pesquisa GEAS - Grupo de Estudo sobre Educação

Ambiental e Sustentabilidade - da Universidade Federal do Tocantins. Tocantinópolis (TO) – Brasil. Acadêmico do Doutorado em Ciências do Ambiente da Universidade Federal do Tocantins. E-mail: [email protected]

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homogeneização do discurso sustentável revela uma crise não apenas ambiental,

mas também das formas de produção de conhecimento.

A perspectiva de desenvolvimento sobre o meio ambiente, construída na

sociedade moderna cientificista implica em não incluir-se, não comprometer-se, não

entremeter-se com o meio ambiente criando condições para a degradação ambiental

vigente na sociedade atual. Este desenvolver retira a autonomia, as relações de

pertencimento construídas em comunidades originárias com o lugar, com o meio

ambiente.

Assim esta pesquisa investigará – a partir de percepções ambientais –,

concepções de sustentabilidade com a inspiração da fenomenologia que permite ser

honesta com o cotidiano e com o fenômeno a ser investigado buscando

compreender a existência deste, e como que assentado em um diálogo de saberes a

Educação Ambiental pode se apropriar de conceitos, aqui mais especificamente o de

sustentabilidade, construídos no cotidiano e que tenha como valor epistêmico para

tal diálogo, o conhecimento científico bem como, as experiências vividas e o

envolvimento com o lugar.

Destarte, o objetivo proposto, neste estudo, é de compreender como que as

percepções sobre o meio ambiente em um território específico, a Reserva

Extrativista – RESEX – do Extremo Norte do Tocantins, possibilitam uma forma

diversa de produção do conhecimento, mais especificamente na construção de um

conceito de sustentabilidade, construído no lugar, voltado para a Educação

Ambiental.

Para o caminho metodológico, a ser construído nesta pesquisa, faz-se

preponderante guiar-se, por este com passos, que estão no seu estágio inicial,

porém que buscam um aprofundamento nos seguintes aspectos: uma leitura

rigorosa sobre as condições geográficas e históricas que permitam a compreensão

sobre as bases científicas para o modelo de produção de conhecimento que

deflagrou a crise ambiental, além de contribuir para a discussão epistemológica de

outras formas de relação com o meio ambiente. Para tanto, autores como Santos

(2010), Porto-Gonçalves (2013) e Santos (2006) serão os suportes; inspirações

humanísticas potencializarão a compreensão sobre o envolvimento do homem com

o lugar a partir de suas experiências com o meio ambiente. Assim, Leff (2006, 2010),

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Tuan (2012), Larrosa (2002), serão os alicerces teóricos e filosóficos; discussões

metodológicas sobre possibilidades outras de se construir uma educação ambiental

na escala do lugar, serão realizadas com Guimarães (2004) e Vieira (2014); Husserl,

(1990), Merleau-Ponty (1999, 2004), Galeffi (2000), Ales Bello (2004), Giorgi (2012).

Souza (2013) e Dutra (2002) são os autores que dão suporte à discussão

fenomenológica, no que tange a abordagem e aos métodos.

2. Discussão Teórica

Com base em pressupostos epistemológicos de objetivar cientificamente a

representação do real, o paradigma científico moderno de fato fez com que o real

fosse ignorado a partir de um epistemicídio de comunidades originárias, sobretudo

de países do Sul em nome da usurpação territorial e da construção de uma única

forma de progresso e desenvolvimento.

Ignorar os saberes dos povos colonizados foi uma das formas de produção do

conhecimento da ciência moderna. Esse ignorar, no que se refere às questões

ambientais, tem como forte fundamento a criação de um paradigma que separou

homem e natureza a partir da necessidade de o homem poder justificar o progresso

e os avanços da técnica a partir de uma racionalidade de controlar, de cientificizar a

natureza, a partir da expropriação dos recursos naturais.

Conforme aponta Santos (2010, p. 25), esse paradigma da modernidade,

além de dualizar o homem da natureza, a partir da objetivação desta, se assenta em

“[...] uma separação absoluta entre conhecimento científico – considerado o único

válido e rigoroso – e outras formas de conhecimentos como o senso comum ou

estudos humanísticos [...]”.

Assim o que se viu foi o paradigma moderno e cientificista – constituído por

um modelo colonialista, no qual os recursos naturais existentes são explorados

como se fossem inesgotáveis a partir de uma arrogância metodológica que permitia

ao homem degradar o meio ambiente em nome do desenvolvimento – criar as bases

para o progresso e para a consequente crise ambiental na qual vivemos.

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Desta maneira, propor a discussão da percepção sobre sustentabilidade, na

educação ambiental, de diversos sujeitos, com base em um diálogo de saberes e

com uma abordagem fenomenológica transcendental/existencial, é acreditar em uma

perspectiva que crie condições para a elaboração de um conhecimento outro,

diverso do paradigma moderno cientificista, construído a partir das experiências

singulares e da relação de pertencimento com que cada sujeito possua com o seu

lugar. Sustentabilidade que tenha como pressupostos, em seu processo de

construção, as experiências, o cotidiano e a percepção do ambiente a partir da

valorização do lugar.

Assim, a proposição de compreender como é construída a percepção de

sustentabilidade para sujeitos diversos, buscará a contemplação do mundo real

vivido tendo como, primeiramente uma inspiração e abordagem e posteriormente

como método, a fenomenologia.

2-1. Mundo Moderno Colonial, Produção do Conhecimento e Meio

Ambiente

O mundo moderno-colonial teve o seu início, conforme aponta Porto-

Gonçalves (2013), a partir da afirmação da Europa como centro hegemônico do

mundo em meados do século XV. As bases para a consolidação deste mundo – ao

terem como pilares a colonização do continente americano, a escravização de povos

na América, sobretudo os indígenas bem como negros trazidos da África, a

consequente devastação das florestas deste continente, seja para a retirada de

metais preciosos como ouro e prata, seja por causa das monoculturas – deram início

ao processo não apenas de exploração da natureza em larga escala, como também

da expropriação de diversos povos originários do seu território.

A subjugação dos saberes dos povos colonizados foi uma das formas de

produzir o conhecimento da ciência moderna. No que se refere às questões

ambientais, este ignorar, tem como forte fundamento a criação de um paradigma

que separou homem e natureza a partir da necessidade de o homem poder justificar

o progresso e os avanços da técnica a partir de uma racionalidade de controlar, de

cientificizar a natureza, a partir da expropriação dos recursos naturais.

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Leff (2006) ao tecer uma teorização sobre a crise ambiental permite o pensar

a possibilidade de construir outros caminhos visando romper com o paradigma da

modernidade.

[...] a crise ambiental problematiza os paradigmas estabelecidos do conhecimento e demanda novas metodologias capazes de orientar um processo de reconstrução do saber que permita realizar uma análise integrada da realidade. (LEFF, 2006, p.60).

Destarte a perspectiva aqui trabalhada, ao construir outro caminho de

produção de conhecimento, tendo como base um diálogo entre saberes, emerge da

necessidade de se compreender que pelo fato de a maior parte do mundo não estar

incluída no progresso, o mundo colonial, é que existe a possibilidade de discutir a

epistemologia pós-colonial, definida por Santos (2010), como:

[...] um conjunto de correntes teóricas e analíticas, com forte implantação nos estudos culturais, mas hoje presentes em todas as ciências sociais, que têm em comum darem primazia teórica e política às relações desiguais entre o Norte o Sul na explicação ou na compreensão do mundo contemporâneo. (SANTOS, 2010, p. 28).

Assim o diálogo entre saberes cria condições para uma descolonização do

modo de pensar o mundo, imposta pela base moderno-colonial. Condições que se

referem a uma perspectiva de permitir que saberes outros que historicamente, foram

considerados como uma maneira de produção de conhecimento menos válida do

que o conhecimento científico, a partir da lógica da monocultura, ou seja, da cultura

científica como única, possam emergir nos espaços de discussão e produção do

conhecimento, aqui sobre as questões ambientais e mais especificamente sobre a

educação ambiental.

2.2 A Fenomenologia, Envolvimento Ambiental e Educação Ambiental

Para prosseguir a discussão sobre o diálogo de saberes imbricado nas

questões ambientais utilizo a fenomenologia na perspectiva de valorizar as

experiências – experiências estas que possibilitam uma singularidade de saberes

que por sua vez dialogam entre si –, o vivido, buscando compreender como a

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concepção de sustentabilidade é experienciada por sujeitos diversos que vivenciam

em um mesmo território, em uma relação íntima com o ambiente.

Construída por Husserl, a fenomenologia se preocupa em investigar a

essência dos fenômenos, passa associar a ciência ao mundo vivido, não apenas

como uma abordagem filosófica, mas sim na construção de um método que vai ao

encontro das coisas, rejeitando as ideias pré-concebidas e que parte do eu, das

subjetividades para produzir o conhecimento.

Galeffi (2000, p.13) aponta que para Husserl, a fenomenologia é o "caminho”

que tem por “meta” a constituição da ciência da essência do conhecimento. Essa

essência – que consiste na parte mais invariável do vivido é anterior às experiências

e imanente ao objeto – se dá em uma relação indissociável entre o ser e o ambiente

que o circunda, entre a consciência e os objetos que o homem está diretamente em

contato.

O método fenomenológico existencial, elaborado por Merleau-Ponty, permite

ser honesto com o cotidiano, e com as experiências. Essa valorização do cotidiano

possibilita uma compreensão do que está posto e não propor o que dever ser, – no

caso específico desta pesquisa, a concepção de sustentabilidade construída por

sujeitos diversos – distante de um modelo pronto, único e já conceituado de

desenvolvimento sustentável pensado impositivamente, desconsiderando as

subjetividades e a relação com o lugar edificada pelos sujeitos que o compõem.

Assim no mundo do vivido e das experiências impossíveis de se repetirem é

que se propõe estudar a concepção de sustentabilidade a partir de um ato singular,

subjetivo e que possua uma ligação estreita e íntima com o lugar, e com o meio

ambiente, distanciando-se do pensar hegemônico e universal, de como deve ser o

desenvolvimento sustentável.

Destarte acreditar na relação do homem, com o meio ambiente a partir de

suas experiências é o caminho para uma oposição radical a uma forma única e

dominante de se pensar o desenvolvimento sustentável. Para tanto buscaremos

radicalizar teórica e filosoficamente para propor os caminhos de se pensar a

sustentabilidade como produto das experiências humanas.

Vieira (2014) destaca que a perspectiva de desenvolvimento sobre o meio

ambiente, vigente no mundo moderno-colonial tem como base a não inclusão, o não

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comprometimento, com o meio ambiente, criando condições para a degradação

ambiental vigente na sociedade atual, a partir de um desenvolvimento que nega as

subjetividades e o pertencimento, com o lugar, com o meio ambiente.

Na tentativa de ter uma alternativa, ao modelo de desenvolvimento do

mundo moderno-colonial busca-se, com o auxílio de um dicionário da língua

portuguesa, o significado da palavra, envolvimento, cujas algumas das definições,

particularmente nos interessam: “inclusão; comprometimento; engajamento; ligação”.

Assim lança-se a perspectiva do envolvimento ambiental, em que o

comprometimento de sujeitos preocupados com a atual degradação ambiental, cria

condições para que um novo paradigma científico se assente.

Paradigma esse, apoiado no diálogo de saberes e no envolvimento com o

lugar possibilitará um engajamento pensado no lugar e pelos “seus” e não por

agentes externos, no sentido de propor alternativas de sustentabilidade. Com isso

visa-se uma alternativa ao modelo progressista do mundo moderno-colonial, a partir

de uma implicação ética que alie conservação ambiental à melhoria das condições

de renda, dos extrativistas, pautados em uma justiça social, que possibilite uma

forma singular e diversificada de se viver no lugar, com vistas à construção de

territorialidades ambientais, distantes daquela forma autoritária e hegemônica

construída pelo paradigma da sociedade moderna e cientificista.

Um envolvimento ambiental construído a partir da compreensão de que

homem e natureza são elementos constitutivos do meio ambiente sem um pensar

hierarquizante do homem sobre a natureza, e sim um pensar construído do homem

com a natureza. Essa quebra de hierarquia criará caminhos, para conceber a

sustentabilidade que possa ser constituída a partir da percepção e da participação

de sujeitos locais, com suas culturas, seus saberes e identidades diversos, que

deem outro significado para esta sustentabilidade distante de um significado único e

universal, coadunando com o pensar de Enrique Leff:

[...] a sustentabilidade baseada em uma política da diversidade e da diferença implica fazer descer de seu pedestal o regime universal e dominante do mercado como medida de todas as coisas, como princípio organizador do mundo globalizado e do próprio sentido da existência humana. (LEFF, 2010, p.26)

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Compreende-se que Tuan (2012) em seus estudos sobre percepção

ambiental ao explorar as ligações de intimidade e de pertencimento existentes entre

o homem e o meio ambiente e como os significados e valores produzidos por

determinados grupos possibilitam um envolvimento com um lugar, uma “filia”,

permite um rigor ao envolvimento ambiental na medida em que o lugar configura-

se não apenas como conceito, mas sim como categoria central para a compreensão

deste envolvimento.

Ainda, com Tuan (p. 19), o conceito de Topofilia “[...] elo afetivo entre a

pessoa e o lugar ou ambiente físico. Difuso como conceito vivido e concreto como

experiência pessoal [...]”, não só coaduna com a perspectiva do envolvimento

ambiental, como ratifica a percepção conforme a ideia de ter para tal envolvimento,

uma relação com o lugar a partir das experiências vividas.

Assim, envolver-se em outro caminho para discutir o conceito de

sustentabilidade na educação ambiental é buscar alternativas para que as

subjetividades e singularidades existentes na experiência do ser no mundo permitam

a construção de uma Educação Ambiental que não se limite a caminhos que

apontem que o sustentável ocorre apenas na perspectiva de desenvolvimento

produzida pelo mundo moderno-colonial, mas sim que propicie o surgimento de

concepções de sustentabilidades, que reconheçam as potencialidades culturais e a

sociobiodiversidade do lugar.

3. Metodologia

A perspectiva apresentada até aqui pretende trabalhar com o método

fenomenológico, que visa à subjetividade como constituinte na produção do

conhecimento, que descarta o pré-concebido e que propõe à busca de um retorno à

própria consciência, ao acontecimento das coisas, associados à vivência do homem

em um mundo já existente, mas que não se encontra acabado e que tem em suas

experiências a possibilidade de constituir outra abordagem científica.

A pesquisa terá como fenômeno a ser estudado a concepção de

sustentabilidade – na Reserva Extrativista do Extremo Norte do Tocantins, localizada

no município de Carrasco Bonito, na região do Bico Papagaio, Norte do Estado do

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Tocantins – e compreender como as percepções sobre o que é sustentabilidade

auxiliam os mais diversos sujeitos, a ampliarem o seu repertório para uma educação

ambiental constituída com o lugar.

A escolha de uma RESEX, para compreender a percepção de

sustentabilidade, é por acreditar que referente às atividades econômicas, as

atividades primeiras de relação do homem com a natureza permitem um maior

envolvimento com o meio ambiente, a partir de uma territorialização de determinada

área, utilizada por populações originárias, cuja subsistência baseia-se no

extrativismo.

No caso da RESEX do Extremo Norte do Tocantins, é a extração do babaçu,

que movimenta esse envolvimento, sendo que o objetivo inicial é a produção de óleo

com comercialização inicial para o mercado europeu, principalmente para indústrias

de cosméticos e farmacêutica.

Assim, o envolvimento dos beneficiários da Associação, existente nessa

RESEX, refere-se a uma relação íntima com a natureza construída pelos associados

que detém o controle da gestão do babaçu, constituindo-se em uma defesa da

natureza pelas próprias populações.

Os sujeitos a serem investigados, nesta pesquisa são: Beneficiários da

Reserva Extrativista do Extremo Norte do Tocantins; e pesquisadores que já

desenvolveram atividade de pesquisa na Unidade de Conservação.

Destarte para o desenvolvimento da pesquisa serão efetuados alguns

procedimentos como: análise bibliográfica e cartográfica, obtenção de dados

secundários do ICMBIO – das Unidades de Conservação e Reservas Extrativistas –

para auxiliar na compreensão das percepções ambientais sobre sustentabilidade

dos diversos sujeitos da pesquisa; visitas de campo com o objetivo de realizar as

narrativas com os sujeitos desta pesquisa.

Assim será utilizada uma metodologia qualitativa por intermédio de realização

de análises de documentos e de narrativas dos sujeitos na qual a técnica da

observação participante possibilitará a participação do pesquisador no lugar

permitindo uma interação com os diversos sujeitos da pesquisa ao compartilhar o

cotidiano com a perspectiva de captar as significações e as experiências subjetivas

dos próprios intervenientes no processo de interação social.

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Ao trabalhar com as narrativas a pergunta norteadora, desta pesquisa,

coaduna com essa técnica ao solicitar que os sujeitos narrem “A partir de suas

experiências com o lugar diga o que você entende por um meio ambiente

sustentável, na Reserva Extrativista do Extremo Norte do Tocantins”. No decorrer da

pesquisa, com o envolvimento dos sujeitos, é que será definido o número de

participantes.

A técnica da narrativa permitirá transpor o método fenomenológico, filosófico,

para o domínio da pesquisa empírica a partir da aplicação de métodos consolidados

na fenomenologia.

Inicialmente na constituição da pesquisa, já se deu início a suspensão ou

epoché no momento em que não há nenhuma hipótese que se sobreponha ao real,

ao vivido, ao perceptivo sobre a sustentabilidade. A partir de então será realizada a

redução à essência ou redução eidética, com o objetivo de excluir o conhecimento

prévio do fenômeno, para estar na experiência concreta da vivência, através das

descrições sobre sustentabilidade contidas nas narrativas.

Após realizar leituras das narrativas o próximo passo será identificar as

unidades de significação, presentes nessas narrativas, e na sequência transcrever

para uma linguagem mais próxima à vivência do pesquisador visando, com o saber

científico, compreender as percepções de sustentabilidade descritas. Nas leituras e

releituras das narrativas é preponderante estar aberto para a descoberta e não ir à

busca de alguns trechos do que se espera ou do que se acredita, sobre o que é a

sustentabilidade.

E com a perspectiva de que o que é vivido não está pronto, nem pré-definido

por uma forma de produção de conhecimento, de como as percepções são

singulares e diversificadas a partir das experiências, é que abordaremos que se

buscará nesta pesquisa compreender a percepção de sustentabilidade existente em

uma comunidade, a RESEX do Extremo Norte do Tocantins, como um caminho para

ampliar o repertório de saberes sobre a sustentabilidade, bem como proporcionar

outro envolvimento na produção do conhecimento científico.

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4. Considerações Finais

A proposta de pesquisa sobre uma abordagem fenomenológica na educação

ambiental buscará apresentar uma perspectiva de envolver-se com as relações

ambientais, tendo como caminho compreender a relação do homem com o meio

ambiente e as suas concepções de sustentabilidade a partir do envolvimento com o

lugar.

Dessa maneira, trazer neste estudo possibilidades de se compreender

sustentabilidades, na educação ambiental, destacando o pensar essa educação a

partir de um diálogo de saberes, da percepção e das experiências de diversos

sujeitos, é realizar uma crítica à forma de produção de conhecimento do mundo

moderno-colonial e como essa visão de mundo refletiu diretamente na relação com o

meio ambiente, dominada por uma racionalidade econômica que objetiva a natureza,

reduzindo as possibilidades de envolvimento do homem com o lugar em nome de

um desenvolvimento.

A Fenomenologia, como inspiração e método será a âncora na medida em

que o fenômeno a ser estudado, a concepção de sustentabilidade, será desvelado

na pesquisa a partir das experiências e do vivido.

Trabalhar, com as subjetividades tendo como suporte a fenomenologia é uma

tentativa de compreender que o que tem sido imposto sobre o desenvolvimento

sustentável, é uma supressão da escala local a partir da idealização da global em

um processo que inviabiliza o envolvimento com o lugar e consequentemente com o

meio ambiente. Isso nos permite uma análise, de que a homogeneização do

discurso sustentável revela uma crise não apenas ambiental, mas também das

formas de produção do conhecimento, na medida em que destaca o conhecimento,

constituído pela objetivação científica, como uno.

Assim é que se permite, no campo das possibilidades construir um caminho

de uma Educação Ambiental dialógica ao buscar com o lugar compreender que é

possível construir concepções de sustentabilidades dialogando com outros saberes,

rompendo com o pensamento produzido pela sociedade moderno-colonial que

despreza as experiências vividas e o os diversos saberes.

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Um caminho que possa ser constituído com a premissa de que a

sustentabilidade está para além do viés econômico mercadológico e que incluía em

sua definição a riqueza dos saberes e da biodiversidade já existentes, em

determinadas comunidades, considerando a autonomia dos que produzem os mais

variados territórios e lugares vividos por cada um.

Referências

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