uma abelha na chuva

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“Uma abelha Na chuva” Uma obra de Carlos de Oliveira Colégio de torre de dona chama 2008/2009

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Page 1: Uma Abelha Na Chuva

“Uma abelha

Na chuva” Uma obra de

Carlos de Oliveira

Colégio de torre de dona chama

2008/2009

Page 2: Uma Abelha Na Chuva

Índice

1.Introdução

1.1. Apresentação do autor e da sua obra em geral

1.1.1.Bibliografia do autor

1.1.2. Sobre a sua obra

1.2. Síntese da obra “Uma abelha na chuva”

1.2.1. Análise do título

2.Caracterização das personagens

2.1.Maria dos Prazeres

2.2.Alváro Silvestre

2.3.Personagens secundárias

3.Tempo e espaço da narrativa

3.1.Tempo de discurso

3.2.Tempo psicológico

3.3.Espaço físico

3.4.Espaço interior

3.5.Espaço social

3.6.Espaço psicológico

4.Narrador e focalização

5.Simbologia da água (chuva), da abelha e do mel

6.Conclusão

Page 3: Uma Abelha Na Chuva

1.1.1.Apresentação do autor e da sua obra em geral

Nascido a 10 de Agosto de 1921 em Belém do Pará – Brasil, Carlos de Oliveira cedo vem viver, passados dois anos, primeiro para a Camarneira e depois para a vila de Febres, onde seu pai exerce medicina. A infância, passa-a nos terrenos pantanosos e arenosos da Região da Gândara. Frequenta durante dois anos o ensino secundário em Cantanhede e em 1933 passa a sua residência para Coimbra, cidade onde permanece durante 15 anos, a fim de concluir os estudos liceais e universitários. Ingressa na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra em 1941, onde estabelece amizade, convívio intelectual e solidariedade ideológica e política com outros jovens, entre os quais Joaquim Namorado, João Cochofel, Fernando Namora. Em 1942 publica o seu primeiro livro de poemas Turismo, com ilustrações de Fernando Namora, integrado na colecção “Novo Cancioneiro” e em 1943 publica o seu primeiro romance, Casa na Duna, na colecção “Novos Prosadores”. Em 1944, publica o romance Alcateia, também na colecção “Novos Prosadores”, obra que será apreendida. Neste mesmo ano, publica a 2ª edição de Casa na Duna. Em 1945 publica um novo livro de poesias, Mãe Pobre e apresenta uma nova edição de Alcateia. Os anos 1945 e seguintes serão, para Carlos de Oliveira, bem profícuos quanto à integração e afirmação no grupo que veicula e espera por um “novo humanismo”, com a participação nas revistas Seara Nova e Vértice e a colaboração no livro de Fernando Lopes-Graça Marchas, Danças e Canções – colectânea de poesias de vários poetas, musicadas por aquele, canções que vieram a ser conhecidas por “heróicas”. 4 / 5 1947 é o ano da conclusão da sua licenciatura em Ciências Histórico-Filosóficas, e no ano seguinte instala-se definitivamente em Lisboa, não deixando, contudo, de se deslocar periodicamente a Coimbra e à Gândara. Em 1949 casa com Ângela, jovem madeirense que conhecera na Faculdade, que será sua companheira e colaboradora permanente. Em 1953 publica Uma Abelha na Chuva, o seu quarto romance e, talvez, o mais conhecido. Em 1957 organiza, com José Gomes Ferreira, os dois volumes de Contos Tradicionais Portugueses, em que aborda o imaginário popular. Em 1968 publica dois novos livros de poesia, Sobre o Lado esquerdo e Micropaisagem e colabora com Fernando Lopes no filme, por este realizado e terminado em 1971, Uma Abelha na Chuva, tendo por base a obra homónima. Publica em 1971 O Aprendiz de Feiticeiro, colectânea de crónicas e artigos, e Entre Duas Memórias, livro de poemas, pelo qual lhe é atribuído no ano seguinte o Prémio de Imprensa. Em 1976 reúne toda a sua poesia em Trabalho Poético, dois volumes, apresentando os livros anteriores, revistos, e os poemas inéditos de Pastoral, livro que será publicado autonomamente no ano seguinte. Publica em 1978 o seu último romance Finisterra, paisagem povoada de inspiração gandaresa, obra que lhe proporciona a atribuição do Prémio Cidade de Lisboa, no ano seguinte. Morre na sua casa em Lisboa a 1 de Julho de 1981, com 60 anos incompletos.

Page 4: Uma Abelha Na Chuva

1.1.2.Bibliografia do autor

Obras principais: Turismo, “Novo Cancioneiro”, Coimbra 1942; Casa na Duna,

romance, Coimbra 1943; Alcateia, romance, Coimbra 1944; Mãe Pobre, poesia,

Coimbra 1945; Colheita Perdida, poesia, Coimbra, 1948; Pequenos Burgueses,

romance, Coimbra, 1948; Descida aos Infernos, poesia, Porto, 1949; terra de

Harmonia, poesia, Lisboa, 1950; Uma Abelha na Chuva, romance, Coimbra, 1953 (um

dos seus romances mais celebres, que remota algo da tradição camiliana, adaptada ao

cinema por Fernando Lopes no filme com o mesmo titulo); Cantata, poesia, Lisboa,

1960; Sobre o Lado Esquerdo, poesia, Lisboa, 1968; Micro paisagem, poesia, Lisboa,

1968; Entre Duas Memorias, poesia, Lisboa, 1971; O Aprendiz de Feiticeiro, crónicas,

Lisboa, 1971; Trabalho Poético, poesia, Lisboa, 1977 – 1978, (compilação das sua

sobras poéticas); Pastoral, 1977; Finisterra, romance, Lisboa, 1978, etc. Tem as suas

obras compiladas num volume desde 1992.

Page 5: Uma Abelha Na Chuva

1.2 – Síntese da obra “Uma Abelha na Chuva”

Um certo viajante (Álvaro Silvestre), chegou a Corgos, dirigindo-se à redacção da

Comarca, debaixo de uma verdadeira tempestade.

Este pagaria o que fosse preciso para publicar uma confissão, o mais rapidamente

possível.

Antes que o pudesse fazer, a sua esposa, D. Maria dos Prazeres, chega a Corgos

também, e dirigindo-se à redacção, encontra o seu marido no escritório e o papel com a

confissão, guardando-o para que este não seja publicado.

Depois, inicia-se o regresso a casa, sendo este um pouco tempestuoso, tanto pelo tempo

meteorológico, como pelo estado psicológico das personagens. Pelo caminho surgem

algumas dificuldades, que então superadas por Jacinto, o cocheiro, que os leva até casa.

Segue-se o serão em casa dos Silvestres, juntando-se a eles o Padre Abel, D. Violante e

D. Cláudia. O Dr. Neto só chega mais tarde.

Com a chegada deste, inicia-se uma conversa onde o tema é a morte e a vida, e a

incapacidade do ser humano face à morte. É ainda neste serão que surge, vinda do Dr.

Neto, como que uma insinuação profética, ao comparar a vida dos homens com as

abelhas que ele próprio cria. Depois de todos se terem ido embora, Álvaro divaga pela

casa, bêbado, afogado pela bebida e pelos sentimentos.

Seguidamente, Álvaro confronta-se com D. Maria dos Prazeres, na relação Burguesia /

Nobreza.

A noite passa, e Álvaro pela madrugada, sai de casa, e num passeio pelo campo,

descobre Clara, filha do Oleiro e Jacinto, o seu cocheiro, escondidos no palheiro,

conversar. É então, que descobre que Clara está grávida, sendo Jacinto o pai. Ouve

também Jacinto gabar-se dos olhares da sua patroa, D. Maria dos Prazeres.

Estarrecido, volta para casa, sem saber o que fazer. Álvaro, depois decidido, vai contar

ao Mestre António que a sua filha Clara desgraçou-se. O Oleiro ao saber disso, decide

castigar o cocheiro. Em troca da sua filha, pede ajuda ao seu servente, Marcelo que

aceita e depois de perseguirem Jacinto, e novamente debaixo de uma tempestade,

matam-no e jogam-no ao mar. Clara descobre que o seu pai e Marcelo mataram o amor

da sua vida.

Álvaro, ao saber disso, culpabiliza-se pela morte do Ruivo. Depois, há outro serão em

casa dos Silvestres, onde se encontra Álvaro, D. Maria dos Prazeres, D. Violante, Padre

Abel, D. Cláudia e Dr. Neto, sendo como tema de conversa todos estes acontecimentos.

No dia seguinte, Clara suicida-se, atirando-se a um poço. Dr. Neto, ainda

tenta fazer algo para a salvar, mas já nada consegue. A abelha tinha sido arrastada pela

força da água.

Page 6: Uma Abelha Na Chuva

1.2.1.Análise do título

Existem títulos que instalam e estabelecem a dúvida, deixando-nos perplexos,

longamente aprisionados ao que o titulo quer dizer, é o que acontece nesta obra.

Ora o título “Uma Abelha na Chuva”, não nos fornece qualquer pista para o rumo que a

história poderá ter.

Page 7: Uma Abelha Na Chuva

2.1.Maria dos Prazeres

Características físicas: malares salientes; os cabelos negros aconchegados num novelo

espesso e entrançados sobre a nuca; a boca de lábios tímidos; os olhos grandes, vivos,

quase ansiosos; pálida; de meia-idade e de voz gelada.

Carácter: era uma mulher altiva, fria, preconceituosa em relação ao marido. Fazia

realçar o domínio que tinha sobre o marido humilhando-o. Era serva de todas as

ilegalidades que o marido cometeu. É arrogante, cínica, decidida, intimida facilmente o

marido, tenta o rebaixa, usa a ironia, transmite negativismo, refere-se aos cavalos e ao

cocheiro com desprezo. A sua maneira de vestir transmitia superioridade, esta parecia

permanecer a uma classe social mais bem posicionada que a do marido.

Características físicas e psicológicas que se fundem: Boca de lábios tímidos; olhos

grandes quase ansiosos; o xaile de lã clara, caído pelos ombros; punha no conjunto uma

nota de intimidade inesperada; mulher esplêndida gelava o jornalista; o franzir irónico

da boca; a avidez do olhar; o tom escarninho da voz gelada; mulher de mão cheia, mas

dura de roer.

Page 8: Uma Abelha Na Chuva

2.2. Álvaro Silvestre

Descrição física: homem gordo, baixo, de passo molengão, de rosto gordo, barriga

levemente caída, dedos brancos e grossos, de mãos limpas e barba bem escanhoada, o

peso do tronco roliço arqueava-lhe as pernas fazia-o bambolear, respiração alterosa.

Aspecto físico: rosto gordo, feições paradas, sonolentas, olhos pouco ágeis, beiço

lentamente caído, dedos brancos grossos, rugas.

Vestuário: está vestido com uma samarra com gola de raposa, chapéu escuro de aba

larga, ao velho uso, a camisa apertada, sem gravata e botas de meio cano.

Características psicológicas: era inseguro, tinha pouca instrução, tinha receio, tem

remorsos pelas ilegalidades que cometeu, consciente das atitudes erradas que praticou,

deseja redimir-se. É cobarde (dizendo que fez induzido pela mulher), teme a mulher, é

dependente. É através dos tiques que se nota o temer (o medo), só em pensar que a

mulher possa chegar e ficar por dentro do que ele fez, fica amedrontado. Vivia seguido

pelas tentações e tinha ar de seriedade, era imbecil, ladrão.

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2.3.Personagens Secundárias

Jacinto, o cocheiro

Jacinto, o cocheiro era alto ruivo com queixo espesso, nariz correcto, a fronte não muito

ampla mas firme. Parecia uma moeda de oiro, um relevo enérgico aos tendões do

pescoço.

O Casal Jacinto e Clara

Um casal apaixonado, é o único casal da obra que vai dar frutos. Consideram mais

importante o amor do que o dinheiro. Têm uma importante relação aberta e de respeito

mútuo. Estão juntos porque se amam, mesmo contra a vontade do pai de Clara que não

pretende outro parceiro para a filha com valores monetários (lavrador com terras, com

dinheiro).

Padre Abel e D. Violante Caracterização do Padre Abel e de D. Violante: Parecidos como o ovo e o espeto. Ela

maciça e baixa, o padre esgrouviado. Foram retirados da sociedade por Maria dos

Prazeres e novamente por ela voltaram a essa mesma sociedade. Persiste uma dúvida

quanto a serem ou não irmãos. É um relacionamento estranho, o aspecto semelhante aos

restantes casais da obra é o facto de a mulher ser o oposto fisicamente ao homem.

D. Cláudia e Dr. Neto Descrição de D. Cláudia: era professora, pálida, frágil, tinha constituição linfática, e é

medrosa. Temia a natureza, a chuva, o sol, o mar, o vento, a própria vida humana, as

relações sociais, os pequenos equívocos da convivência, as conversas mais acaloradas,

assustavam-na. Tinha receio de se casar.

Descrição de Dr. Neto: era tímido a seu modo, amava as coisas vivas e criadoras,

amava a realidade. É bondoso, bom sujeito. Para além de médico era agricultor e

apicultor, por isso amava a natureza.

Estavam juntos por conveniência e mesmo com ideias e maneiras diferentes eles

entendiam-se.

Relação: Cada um fazia a sua vida. Era um amor platónico, temiam o casamento, daí o

adiarem constantemente. Para ela o motivo desse adiamento era o medo de alcançar

uma criança. Era frágil. Ele tinha uma doença daí o medo de trazer uma criança ao

mundo quando duvidava se poderia ia sua doença"" ser transmitida à criança.

Mestre António O retrato físico e psicológico: Homem altíssimo e curvado, lembrava um desses

alentados troncos que a força do vento acabava por empenar no desabrigo da planície.

Era cego. Homem implacável, rígido, frustrado, cruel, de orelhas surdas, tinha insónias

de remorso, homem voluntarioso e efémero, sem escrúpulos. Tinha a voz áspera, os

dentes arranhavam-lhe as palavras e ouvi-lo era desagradável como ouvir um raspar de

unhas sobre o vidro. Cingiu os lábios de tal forma que os transformou numa espécie de

lancetada roxa. Vingativo. A cegueira do oleiro não é apenas física, porque na verdade

este não via com bons olhos o namoro da filha, (Clara) com Jacinto, por este ser pobre.

Page 10: Uma Abelha Na Chuva

Pretendia para a filha um partido rico de preferência um lavrador com terras. É

vingativo.

Marcelo O retrato psicológico: Era frio, calculista, ingénuo. Acreditava no seu patrão porque

ama Clara mas também acaba por executar o plano macabro de matar Jacinto. Foi

vítima de um plano chantagista feito pelo patrão. É uma personagem ambígua.

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3.1.Tempo de discurso

"Primeiro, a fonte brotou tenuemente, muito ao longe, na infância; depois, a água

mansa turvou-se ao longo do caminho, do tempo, com o lixo que lhe foram atirando das

margens; e agora é cachoante, escura, desesperada.” (p. 20)

3.2.Tempo psicológico

O tempo psicológico diz respeito ao modo como as personagens do romance vivem o

passar do tempo. As analepses traduzem uma vivência interior por parte das

personagens que refugiando-se no passado, fogem a um presente insuportável.

Page 12: Uma Abelha Na Chuva

3.3.Espaço físico

"Eu, Álvaro Rodrigues Silvestre, comerciante e lavrador no Montouro, freguesia de S.

Caetano, concelho de Corgos." (p. 6)

Geograficamente, a acção é localizada com alguma precisão. A localidade referida no

romance, como Montouro, S. Caetano e Fonterrada localiza-se na região de Cantanhede,

na zona litoral do distrito de Coimbra.

3.4.Espaço interior

É fundamental nesta obra, a clara oposição que se estabelece entre o quarto de Álvaro

Silvestre/D. Maria dos Prazeres e o palheiro onde Clara e Jacinto se encontram.

“ O quarto era espaçoso, carregava-o de móveis para lhe dar algum conforto, mas a

mobília de castanho, o lustre maciço de madeira, a mesa de pau santo em frente da

janela, as ramagens densas do papel que forrava as paredes de alto a baixo, não tinha

alcançado a intimidade que sonhara. Tencionava agora mobilá-lo de coisas simples,

claras. Começara pelo tapete nova cor de cinza. “(Cap. XIV)

O quarto de Álvaro/D. Maria caracteriza-se pelo desconforto, o frio e, apesar de todos

os móveis que o enchem, a ausência da «intimidade».

“ Envolvia-os o calor do gado: a vaca, o jumento, duas ou três galinhas. Afundados na

palha, cingidos um ao outro, mal sentiam o frio da madrugada que entrava pelas

frinchas do tabuado. Da meia obscuridade vinha o resfolegar sereno dos animais. A

vaca tinha-se aquietado e não tornara a mugir. (...) O ar pesava. Adensara-o a respiração

nocturna, deles e dos bichos. Na penumbra levedava um cheiro a estrume e madrugada.

“ ( Cap. XVI): - o palheiro, apesar de ser um espaço destinado aos animais, é um lugar

aconchegante, cheio de calor, de sons e de cheiros.

O frio do quarto em casa dos Silvestres representa a falta de comunicação, a frustração

amorosa, os conflitos que o casal vive; a descrição sensorial do palheiro representa a

comunicação, o amor, a fecundidade, a harmonia que caracterizava a relação entre Clara

e Jacinto.

3.5.Espaço social

Influenciado pelo movimento neo-realista, Carlos de Oliveira coloca a questão social na

base dos conflitos: "Uma Abelha na Chuva" ilumina as trágicas consequências

psicossociais resultantes da união forçada entre a moribunda aristocracia da província e

a burguesia rural.

A tese do romance pode sintetizar-se assim: não existe uma significativa mudança social

que não produza sofrimento; e o pobre, devido à sua condição de subserviente, acaba

por ser a verdadeira vítima dos ódios e tragédias dos poderosos.

Page 13: Uma Abelha Na Chuva

3.6.Espaço psicológico

O espaço psicológico manifesta-se através do monólogo interior de algumas

personagens, revelando-se, assim, os conflitos vividos pelos protagonistas na sua

consciência.

Page 14: Uma Abelha Na Chuva

4.Narrador e focalização

A representação da história é conduzida por um narrador omnisciente, capaz de

penetrar no universo psicológico, social e cultural que determina o comportamento das

personagens, e principalmente pela utilização da focalização interna, isto é, concedendo

um papel dominante à perspectiva subjectiva e parcial que as personagens têm da

própria história.

Focalização:

A focalização interna (ou seja, a representação da história através da óptica de uma ou

mais personagens) aquela que o narrador utiliza de modo mais insistente; a focalização

omnisciente, como processo de vigência de uma visão (a do narrador) transcendente à

história, é concedida uma função meramente acessória; a focalização externa, na

condição de modo de apresentação do exterior de personagens e eventos, apenas

esporadicamente surge actualizada como signo da representação.

Quando abre a narrativa, é em focalização externa que é apresentada a personagem em

acção: " Pelas cinco horas duma tarde invernosa de Outubro, certo viajante entrou em

Corgos, a pé, depois de árdua jornada...". para além desta referência outra surge no Cap.

XIII que serve para apresentar uma outra personagem "...saltou da boleia para receber as

ordens da dona da charrete, uma senhora pálida, de meia idade, agasalhada num xaile de

lã e com manta de viagem enrolada nas pernas: -Perguntem no café se o viram."

Além destas duas ocorrências, pode dizer-se que não mais se repete o recurso à

focalização externa, como processo representativo autónomo.

Page 15: Uma Abelha Na Chuva

5.Simbologia da água (chuva), da abelha e do mel

As Abelhas As Abelhas: simbolizam as "trabalhadoras disciplinadas e incansáveis". Asseguram a

continuidade da espécie ao trabalharem para a colmeia fazendo o mel. A colmeia remete

para o lar, para a casa que simboliza a concha, o bem-estar a protecção.

Oposição às abelhas temos o casal Álvaro Silvestre e Maria dos Prazeres (esta

referência é feita por Dr. Neto), que diz "todos eles fabricam fel; abelhas cegas,

obcecadas". As abelhas cegas remetem para o única objectivo deste casal que são os

interesses económicos que os levam "a roubar ao balcão, nas feiras, nas soldadas dos

trabalhadores e na legítima de meu irmão", confissão. A abelha obcecada serve para

vincar o que de negativo e imperfeito existe porque uma abelha cega não é útil para a

colmeia. Este casal também não é útil à sociedade porque para além de todos estes

defeitos não asseguram a perenidade, a continuidade do nome e da riqueza pois é um

casal infértil. Ainda, através de Dr. Neto, este diz que ajudou "anos e anos, aquela obra

de pintar e repintar, a colmeia dos Silvestres, sem atender a que lá dentro o enxame

apodrecia" .

A colmeia remete para o lar, para a casa que simboliza a concha, o bem-estar a

protecção que são sensações que não existem na casa dos Silvestres porque se vive num

ambiente degradado, corrompido perverso, sendo que este último se afigura na

personagem de Álvaro quando veio avisar o mestre António. O ambiente da casa dos

Silvestres é tão viciado que não pode produzir nada de bom. Por tudo isto são o oposto

das abelhas pois não há equilíbrio na sua casa e só produzem fel.

Comparação as abelhas: Clara que juntamente com Jacinto forma um casal

equilibrado onde reina a harmonia, tal como na colmeia. O Jacinto tem nome de flor da

qual Clara se alimenta para produzir mel, o filho. O zangão é o Jacinto que após a

cópula com a abelha morre. No último capítulo, a referência é a de que a abelha foi

apanhada por uma chuva forte, da qual não consegue sair ou abrigar-se pelo que tentou

debater-se, mas acabou por morrer. Tudo estava contra ela, pelo que não se conseguiu

defender, era uma luta injusta.

Dr. Neto também tem todas as qualidades da abelha, para além de ser ele próprio

apicultor.

Page 16: Uma Abelha Na Chuva

A água

A chuva é o sinónimo de agressividade no ambiente social e está presente nos conflitos

pessoais e nos momentos mais importantes da acção. Nos momentos de grande

desconforto, de grande tensão, a chuva está patente, aumenta a sua densidade consoante

o conflito está acentuado.

A fonte quando a água jorra e corre da terra simboliza a evocação de memórias do

passado: quando Álvaro Silvestre recorda a sua infância como refúgio; um tempo de

bem-estar por oposição ao desconforto do presente. Para Maria dos Prazeres a fonte é

também a imagem do passado, mas depois toma-se num rio.

O mar é o espaço para onde o corpo de jacinto é atirado. Simboliza a dinâmica da vida,

pelos seus movimentos de ondas, e Jacinto acaba por ter um fim que se enquadra na

dinâmica que era a sua vida, repleta de projectos por concretizar.

Do poço se recolhe a água que a vida, sendo por isso um espaço de origem da vida. No

entanto, Clara atira-se ao poço, acabando por provocar-lhe a morte, como se fosse

castigada pela ousadia de projectar uma outra vida sem o apoio do seu pai.

O mel - evoca a ideia de perfeição e de doçura e também o da transformação. Ao nível

de Álvaro e D. Maria, dos Prazeres "todos eles fabricam fel", é junto do par

Jacinto/Clara que o mel (isto é, a doçura, a perfeição apoiada no tempo) é susceptível de

ser encontrado: tanto a gravidez de Clara como os projectos de ambos e até o

envolvimento espacial em que estes últimos são considerados (c. XVI) apontam para

um futuro de optimismo (ou seja, de doçura idêntica à do mel) que o decorrer do tempo

social e histórico propiciará.

Clara = abelha. Uma abelha morre = ficam as outras. Clara morre = ficam as outras

pessoas.

A chuva = a classe opressora, a força da opressão.

Colmeia apodrecida = colmeia morta = classe social a desaparecer.

Colmeia verde = cidade verde = esperança na vitória = a consciência do povo desperta

preparada para a luta.

Page 17: Uma Abelha Na Chuva

6.Conclusão

Esta obra é de fácil leitura, mas no entanto é de difícil interpretação. “Uma Abelha na

Chuva” é uma obra actual, pois transitando este romance para os nossos dias com as

devidas alterações, continua a retractar situações com consequências brutais para os

seus intervenientes, fruto da mesquinhez e da ganância do ser humano, cujo único

objectivo consiste em suplantar-se a si próprio ou aos outros sem olhar a meios e sem

medir as consequências que os seus actos possam provocar.

Trata-se de uma obra que retrata os problemas sociais sob forma de denúncia e promove

os mais desfavorecidos e humildes, analisa as condições de vida daqueles que se

encontram no topo da pirâmide e dos que se encontram na base dessa mesma pirâmide.

É por isso um romance de leitura obrigatória porque serve de alerta para o eterno

problema das classes sociais mais desfavorecidos.

Diana Cristo