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ViCtr' Um serviço de combate ao racismo e ò discrímino;ão ANO III - N. 0 15 - OUTUBRO/NOVEMBRO -1989 XUXA PISA NA BOLA A apresentadora Xuxa Meneghel não aceita Paquita Negra Veja o porque (p.5) AIDS: Terror de Laboratório. (p.10) ( CADERNO EDUCAÇÃO I 0 que rola nas EsCOlaS (p. 12,13 e 14) CUT E Mov. NEGRO 0 Presidente da CUT fala sobre Sindicalismo, Eleições e aponta o caminho de diálogo com o MN. (p. 8/9)

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ViCtr'

Um serviço de combate ao racismo e ò discrímino;ão

ANO III - N.015 - OUTUBRO/NOVEMBRO -1989

XUXA PISA NA BOLA A apresentadora Xuxa Meneghel não aceita Paquita Negra Veja o porque

(p.5)

AIDS: Terror de

Laboratório. (p.10)

( CADERNO EDUCAÇÃO

I 0 que rola nas EsCOlaS (p. 12,13 e 14)

CUT E Mov. NEGRO 0 Presidente da CUT fala sobre Sindicalismo, Eleições e aponta o caminho de diálogo com o MN.

(p. 8/9)

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Página 2 Outubro/Novembro-89 Jornal Maioria Falante

Çp^-BUMERANGUE -^ZUMBI: morto-vivo; alma de cavalo-e-boi'{ cazumbi; fantasma afro-brasileiro que vaga a noite." „

"ZUMBI: Chefe do Quilombo dos Palamares. (Dicionário do Aurélio)

"ZUMBI: Herói brasileiro e mártir da luta contra a cultura capitalista." (Movimento Negro)

FATO É FATO

Para os anos 90, já começa a ser esboçada a criação de

uma macro-entidade, capaz de traçar uma política para o Movimento Negro, extraída, dos instrumentos ideológicos, representados até aqui, pelas organizações de combate ao racismo.

Tal fato ocorre, ao mesmo tempo cm que a inserção do discurso racial, se faz cada vez mais presente nos partidos políticos e de forma menos intensa nos sindicatos.

Com isto, a questão passa a ser, por quais caminhos andará o MN na próxima década? Se pensarmos que até o início dos anos 80, o discurso do movimento antagonizava as figuras de Ganza-Zumba, como o negro que se submeteu ás negociações do patrão, tendo como pagamento as terras de Cucaú. Enquanto Zumbi, foi o xiíta que rachou com os conciliadores, lutando para manter um estado independente, assentado sobre uma sociedade comunal, não racista, onde o controle da produção e o consumo era socializado.

Fica evidenciado que houve um deslocamento político, levando Ganga-Zumba ao ostracismo. Ao mesmo tempo, um privilegismo á figura de Zumbi. Aliás, até o presidente Sarney rendeu homenagens à Zumbi, durante o centenário da Abolição. A burguesia sabe o que quer.

Hoje, o discurso centrado no mártir de Palmares, aparenta uma homogeneidade, que não existe na prática, tão pouco, o rompimento com o Estado. Sinal dos tempos?

Os 101 anos da Abolição e o centenário da República, exigem uma reflexão profundçi a cerca de táticas e estratégias a serem adotadas diante da cultura dominante. Há anos os seus intrumentos ideológicos preparam e desembocam, cientificamente, as revoltas dos oprimidos em um espaço nitidamente classista.

Países como África do Sul e os Estados Unidos tiveram durante um largo tempo, a acomodação da demanda não branca, com a oferta da política do apartheid, ou da promoção social do percentual negro tolerável. Assimilar o instrumental do opressor para transformá-lo gradualmente, adotado por segmentos históricos da esquerda brasileira é ao que parece, contorno visível do MN para a próxima década. E sendo assim, exigirá um esforço desdobrado, considerando-se que o modelo econômico capitalista, já prevê a saída para um capitalismo mais apiedado e quem sabe até, com o confinamento do MN à categoria de elite, distanciando-se de vez, da maioria reprovada em cultura e valores de dominação. Todo cuidado é pouco, herdeiros de Zumbi... ou seria de Ganga-Zumba?

Em Manaus, um anúncio em destaque num jornal lo- cal, colocado por uma em- presa de recursos humanos, convocando "recepcionista com boa aparência, cor branca, loira, comunicativa e de boa caligrafia" provo- cou reação do MOAN, Movi- mento Alma Negra, que ameaçou entrar na Justiça para fazer valer o que deter- mina a Constituição no Art. 5.°, inciso 41 -) "prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da Lei". A Presi- dente do MOAN, Vanda Go- rete, disse que o Conselho de Desenvolvimento e Parti- cipação da Comunidade Ne- gra estava disposto a apoiar a ação contra o racismo.

Aguardamos maiores da- dos, com a solidariedade ne- cessária. _

O Grupo de Apoio à Pre- venção às AIDS, em apoio a iniciativa da Associação das Prostitutas do Estado do Rio de Janeiro, promoverá na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, nos dias 22 e 23 de Novembro, das

09,00 às 18,00 hs, o Semi- nário SOS MORTE CIVIL.

Os interessados poderão atualizar os seus conheci- mentos, através de nomes como Mareia Rachid, Jane Galvão (ARCA), Her- bert Daniel (VIDDA), Os- mar Souza, Guida Maria Losso (ONG's), Paulo Fatal (GAPA), entre outros.

A militante e Presidente da Associação das Prostitu- tas do Estado do Rio de Janeiro, Eurídice Francisco Coelho, vem implementan- do ações mais efetivas, não só em relação ás Prostitutas, mas a coletividade.

• Os bastidores da organi-

zação da caminhada que reuniu quase 5 mil crianças e adolescentes no centro do Rio de Janeiro no dia 11 de outubro, deixou antever o perigo do controle estatal sobre os movimentos popu- lares.

A caminhada em favor da aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente no Congresso Nacional foi for- temente apoiado pela FU- NABEM, pela Secretaria Municipal de Desenvolvi-

M9^6C

mento Social e pela Arqui- diocese do Rio.

O ato público na Cinelân- dia discorria bem quando' foi dada a palavra ao Padre Renato, da Casa do Menor de Miguel Couto (Nova Igua- çu) que tentou denunciar o extermínio de crianças e adolescentes na Baixada Flu- minense incluindo policiais militares como participantes dos esquadrões da morte, responsáveis pela matança. No momento em que o Pa- dre Renato ia denunciar es- ta ação criminosa, que per- manece sem esclarecimento por parte das autoridades, os organizadores do ato pú- blico simplesmente impedi- ram arbitrariamente o ora- dor de continuar falando, diante de uma platéia per- plexa com a censura e que exigia, aos gritos, que o Pa- dre continuasse seu discur- so. Os organizadores com habilidade canônica coloca- ram uma menina para decla- mar uma poesia e desmobili- zara"! o referendo, que in- dignamente se afastou do palco. Ao ser chamado no- vamente para falar, depois de algum tempo o Padre já não foi tão incisivo como anteriormente, resultando em sucesso a manobras das lideranças.

Ao final da manifestação pode-se perceber o por que da ação de censura dos or- ganizadores do Ato ao Padre Renato. Um dos organizado- res ao microfone puxou vi- vas à FUNABEM, à SMDS e, por fim, agradeceu à Polícia Militar pelo apoio. A mesma PM que o Padre Renato acu- sara de co-participante do extermínio de crianças e adolescentes.

É aí que mora o perigo. O movimento popular não pode se deixar manipular pelos agentes do Estado in- filtrados no seu meio para impedir o seu desenvolvi- mento, senão a democracia será só para inglês ver.

ITàimiA FALANTE Diretor hespontóvel: Bebei Nepomuceno Conselho Editorial: Júlia Theodoro, Éle Semog e Togo loruba. Coordenaçio de Textos e Edição: Togo loruba, Éle Semog e Beth

Silva Santos. Colaboradores: Uelinton Farias Alves, Valdete Lima, Ligia Dabul,

Luiz Carlos Vieira, Luiz Carlos de Almeida (RJ), Juan Chalimin; Abílio Ferreira, Arnaldo Xavier, Lilia Ladislau, Míriam Braz (SP); Dora Bertulio de Lima (MT);Sônia Aparecida P. Pereira, Agostinho Benedito (PR); Vera'Devse Barcellos, Paulo Ricardo Moraes, Jones Lopes, Júlio César CamisolSo (RS); Walmir Trindade (PB).

Correspondentes: Mônica Russo, Miki Willis (EUA); Adriano Botelho de Vasconcelos (Portugal)

Administração: Júlia Theodoro Secretária: Márcia Amáncio Circulaçio e Distribuição: J. Ayrton Martins e Renato Moreira Santos Foto: João Morais llustraçáo: Togo loruba, Zé Roberto, Manei. Revisão: Valdete Lima, Beth Silva Santos, Éle Semog. Composlçio Gráfica: Márip Jorge A. dos Santos. Arte Final e Diagramaçâo: Miro Zager, Mônica Zager. Impressão: Tribuna da imprensa. MAIORIA EDUCAÇÃO: Eli Gomes, Azoilda Louretto da Trindade,

Maria Jpsé Lopes da Silva, Eliane Souza (CoordenaçSo). Agências: AGÈN e ANGOP. Apoio: Coordenadoria Ecumênica de Serviços (CESE), Centro de

ArticulaçSo de Populações Marginalizadas (CEAP), Núcleos de Estudos do Negro (NEM), Movimento Quilimblsta/RS e Comitê Contra a DiscriminaçSo Racial e Social (RACISO).

As matérias assinadas sâo de inteira responsabilidade dos autores. Endereço: Rua da Lapa, 200, Sala 808 - LAPA - Rio de Janeiro -

RJ - BRASIL - CEP. 20.021 Telefone: (021) 252-2302.

- A Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos tem-se empenhado em enriquecer o seu acervo bibliográ- fico com obras editadas no Brasil, pa- ra serem enviadas para Washington e amplamente divulgadas entre as bi- bliotecas de pesquisa. ' Com este objetivo, vimos pedir a

sua colaboração no sentido de nos incluir entre as entidades que rece- bem suas publicações.

Libiary of Congress Office Brazil

- Com satisfação acuso o recebi- mento do JMF.

Declaro que este jornal é de uma importância fundamental pela sua

contribuição à consciência da socie- dade, a luta contra toda discrimina- ção.

Elza Medeiros/João Pessoa-PB XXX

- Solicito que seja enviado o JMF para juntar ao meu acervo, que pretendo transformar em biblioteca.

Aracy Magrão/Biblioteca Aiacy Magrão - POA/RS

XXX - Vimos propor permuta entre o

JMF e o Beijo da Rua que é editado pelos programas "Prostituição e Direitos Civis".

Beijo da RUA/RJ XXX

...O cárcere é a herança que a maioria de nós negros recebemos após a farsa da Abolição. Prova disto é o que vimos na questão do menor abandonado: as prisões estão cheias de jovens que foram treinados na FUNABEM para que hoje ocupassem a faculdade do crime. Vamos acabar com isto; vamos trabalhar por uma melhor condição social para nós ne- gros.

Nós aqui de dentro da penitenciá- ria, estamos conscientes desta luta pois, entendemos agora que não de- vemos voltar a delinquir pois, se as- sirp o fizéssemos, estaremos trilhando

o mesmo caminho daqueles que se opõem à nossa luta.

Este trabalho é espinhoso, pois so- mos marginalizados e muitos não nos dão crédito. Pedimos a todo o Movimento Negro do Brasil para acreditar em nós, pois, um trabalho como o nosso, depende do apoio de todos; toda forma de ajuda cultural e social é de suma importância para que, realmente, haja um trabalho de conscientização e ressocialização de todos nós do I.C.C.N.N.M.

Nós não votaremos, pois a socie- dade entende que o preso não tem es- te direito; não temos cidadania, po- rém os nossos ideais são de cidadãos que lutam por um Brasil melhor. Nós do I.C.C.N.M.M. estamos confiantes no voto de vocês, nossos irmãos. As- sim teremos a certeza de um Brasil político e cultural: sem discrimina- ção e sem violência, e o mundo, sem Apartheid.

Axé Brasil. Axé Sul Sudeste, Axé África do Sul e Axé ao nosso Patrono Nelson Mandela, pois para ele, e, para todos nós, a luta é a nossa vida.

José Carlos N. S. Brasileiro - Pre- sidente; José Clever Soares de Melo - Secretário. INSTITUTO CULTURAL NELSON MANDELA (Penitenciária Lemos de Brito)

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Jornal Maioria Falante Outubro/N ovembro-89 Página 3

Exemplo Democrático por Eliane Potiguara

O grito de guerra dado pelo povo do Xingu, em Aiiamaa, contra as agressões ao meio-ambiente e à ecologia provocados pelos grandes projetoss hidrelétricos do Brasil alcançou repercussão em todo o mundo, levando entidades não-

govemamentais internacionais a convidar nossos parentes indígenas a visitar povos de outras nações, com o objetivo de mobilizar a opinião pública mundial em apoio à causa indígena de preservação da natureza e de sua cultura.

Dessa forma e com esse objetivo, fomos convidados por quatro entidades sediadas na França — Fundação Terra-Brasil, Fundação Cinquiéme Monde, Comitê Toulouse-Bauru e Club Horizont, que patrocinaram exclusivamente a alimentação, as passagens aéreas e hospedagem em

residência particular (1 .a

semana) em Paris e Hotel Arcade (2.a semana) em Toulouse. Não tivemos ajuda para despesas pessoais, pois as referidas entidades não dispunham de recursos.

Somos participantes do movimento indígena e consideramos de extrema

validade o espaço que nos possam abrir para denunciar as atrocidades cometidas contra nossa gente. Eu, ELIANE POTIGUARA, como coordenadora do Grumin (Grupo Mulher - Educação Indígena) e MANOEL FERNANDES MOURA (Tukano) na qualidade de Coordenador das Organizações Indígenas do Amazonas participamos desta viagem. Deixou de participar da delegação o parente PAULO PAIAKAN que, no dia do nosso embarque, chegavasde volta ao Brasil de uma viagem ao Japão, cumprindo a mesma missão de esclarecimento.

Paulinho Paiakan

Numa avaliação do trabalho por nós realizado, consideramos bons seus resultados pela repercussão positiva de nossos

esclarecimentos junto à comunidade francesa e por extensão, a européia, através das diversas conferências que realizamos nas universidades, nos meios políticos daquele país, através dos contato feito com suas principais lideranças.

Nosso propósito de levar conhecimento dos nossos companheiros, o resultado de nossa missão, está intimamente ligado à atitude de respeito que mantemos em relação aos nossos irmãos, que devem estar rigorosamente informados sobre o trabalho que desenvolvemos em prol da causa indígena.

Desmantelando os Mitos Racistas

por Juan Chalimin

£ comum, tentarem fazer as nossas cabeças, dizendo que os índios e os negros, tinham culturas imprestáveis, etc.

Para acabar com estas mentiras.

apresentamos algumas diferenças publicadas na revista "MENSAGEIRO-a serviço dos Povos Indígenas", acerca da sociedade indígena en comparação com a sociedade "branca", imperialista, opressora e corrupta.

SOCIEDADE INDÍGENA X TRABALHO X SOCIEDADE "DO BRANCO"

A Terra e as riquezas da terra são de todos.

A terra e suas riquezas tem DO- NO, poucos donos e muitos ficam sem nada.

Todos possuem os meios para produzir: para caçar, pescar, plan- tar, fazer enfeites, utensílios. Não existem patrões e empregados.

Uma pequena minoria é dona dos meios de produção: o material para ser trabalhado, as máquinas para fabricar produtos, dinheiro para comprar tudo. A grande maio- ria para sobreviver tem que traba- lhar para estes donos.

Cada pessoa é dona de seu tra- balho, isto é, não é necessário ven- der o seu trabalho para sobreviver.

Há os donos das fábricas, das fazendas, das máquinas e a grande maioria que tem que trabalhar pa- ra eles a fim de sobreviver.

Nas aldeias se trabalha para so- breviver, não para vender e ficar rico.

Nesta sociedade se trabalha para produzir, vender, ficar rico. Quem fica rico, não é o trabalhador, mas o dono das coisas.

0 governo nas aldeias (Tuxuas, Cacique, conselheiro, tem que tra- balhar para o bem de todos).

0 Governo nesta sociedade é também dono de muita coisa e es- tá a serviço dos DONOS e muitos aproveitam para tirar vantagens para si'.

MENSAGEIRO - n.o b7, Maio/Junho 89.

^MCtíA VES^ Endereço: caixa postal 15023

80531 - Curitiba - Brasil

Assine o jornal "Marcha Verde".

Um jornal em defesa dos povos do Terceiro Mundo. Contra o im- perialismo, o racismo, o sionismo, o fascismo e o reacionarismo.

Assinatura anual: enviar NCz$ 4,00 em selos; Assinatura semestral: enviar NCz$ 2,00 em selos. Nome: Endereço: Cidade: Estado: CEP: Profissão: Idade Assinatura:

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Página 4 Outubro/Noyembio-89 Jornal Maioria Falante

por Togo lomba ALÉM-PARAÍBA: 0 Estado da Arte Popular

O descompromisso da burguesia com a cultura popular, pode ser me- dido em todos os setores marginali- zados socialmente. A Arte popular não fugiria desta camisa- de força. O Estado, desinteressado em formular uma política cultural que atenda ao artista anônimo, procura normalizar através da Fundação Nacional das Artes - FUNARTE - Um assistèn- cialismo que privilegia uma minoria, em detrimento da comunidade artís- tica. I

O Jornal MAIORIA FALANTE, buscou em Além Paraíba, refletir a Arte popular, ouvindo o Artista plás- tico José Heitor, 52, aposentado da rede ferroviária Lcopoldina, auto- didata, cujas obras ganham há 26 anos, os espaços públicos de muni- cípios mineiros, como Além Paraí- ba, Estrela Dalva, São José e Pira- pitinga. Do que concluímos fica a dura opção: ou o artista popular re- pensa o seu papel político, junto com outros segmentos organizados, cobrando do Estado a sua parte de- vida, ou continuará como instrumen- to político daqueles que o oprime.

O ESTADO DA ARTE

José Heitor, místico e de sensibilida- de aguçada, revela de imediato, a sua inquietude social, transmitida em suas obras esculpidas em cedro, mogno e ou- tras madeiras nobres. O movimento po- pular de Além Paraíba, e o Movimento Negro, não conseguiram, ainda, encon- trar uma atitude comum, capaz de unir as reinvidicações políticas através da ma- nifestação crítica, contida nos trabalhos de J. Heitor e de outros artistas.

Aliás, de um modo geral, ao fazer convergir o exercício político para os partidos, o próprio movimento popular tem restringido a ação política das artes, apenas como instrumento de mobiliza- ção. Deste modo. as ações de tornam iso- ladas, como foi o grupo de Arte Cruz e Souza, que existiu no período de 1967 a 1977, fundado por José Heitor, e mais, Darci Policarpo, Rolando Amaral, Lauro Hermes, Carlos Costa, Alvânia Santos, José Aguiar e Murilo Montinho, divul- gando a arte popular de Além Paraíba.

0 Escultor José Heitor, família e obra.

O ARTISTA O Estado, por não ter interesse em

uma política cultural, de fato, não con- segue fixar o artista do interior em sua região, aumentando mais ainda o êxodo rural. Por este motivo, o grupo Cruz e Souza se viu esvaziado em 1977.

Atualmente, José Heitor, apesar de contribuir para valoração da Arte além- paraibana e mesmo, contribuir para o turismo local, recebe apoios individua- lizados. Para se ter uma idéia, a Funda- ção Cultural de Além Paraíba, apoia o artista, emprestando o carro para o transporte das esculturas.

Segundo J. Heitor, somente conhe- ceu a Fundação Nacional de Arte - FUNARTE - quando entre 1980 e 1983, atendendo ao convite do ex-de- putado e pintor Abdias do Nascimen- to, esteve no Rio, quando então conhe- ceu aquela Fundação.

Sobre o ex-deputado, ele continua: "Eu conheci o Abdias em 1966, através do escritor Rosário Fusco.

E foi o ex-governador que em 1967, durante o 80.° aniversário da Abolição, levou 10 obras, para expor no Museu de Imagem c do Som no RJ. Depois des- sa exposição, eu voltei para o meu am- biente, onde continuo até hoje. Eu que- ro passar o meu conhecimento para a po- pulação daqui. Outra coisa, ao invés de vender minha obra, às vezes eu prefiro fazer permutas, trocando por madeiras, por exemplo.

Agora, quando é preciso vender, aí é melhor o sentido mais coletivo, como a colocação da obra em uma praça, ou mesmo igreja.

A minha oficina é a "Senzala de Ar- te", este nome é porque sendo a senzala, um lugar de angústia e sofrimento, eu posso então reviver e sentir o que os meus antepassados sentiram e aí, trans- portá-los para madeira, como objeto de Arte".

Perguntado, o que pensava da fra- se - "pesquisar na fonte c devolver ao povo, em forma de Arte", de Solano Trindade, ele respondeu:

- Esta aí um problema, devolver?! Mas isso não é tirar do povo e devol-

ver o povo, tem sentido? É como se tiras- se a essência do povo e devolvesse a ele, em forma de arte.

Eu acho que assim ele estaria sempre superpondo e não criando. Há que se le- var mais a sério a nossa arte, acho que poderia haver no Movimento Negro, uma assembléia de críticos de arte, galerias de

• arte do negro, etc, porque senão os nos- sos valores não serão nunca respeitados. Eles procuram tirar a essência da nossa arte, colocando-a como simples objeto decorativo".

O ESQUEMA

Entre o artista e o público, há o inter- mediário, o "marchand".

Há muita literatura sobre o papel so- cial do intermediário.

A experiência de José Heitor, é mais uma, dentre centenas.

"Houve um psicanalista do Rio de Janeiro, que no princípio, por ser gran- de amigo, comprou algumas obras.

Ele foi comprando de tal maneira que de repente, a cada dois meses, eu tinha que criar uma obra para ele. Com o tempo, reclamei, falei que eu não tinha ambiente e pedi para que ele pagasse as obras como promissórias, assim eu pode- ria pagar a minha casa. Isso ocorreu du- rante 4 anos.

Eu dei um basta nessa coisa e ele, co- mo psicanalista afirmou que se eu não produzisse mais, com o apego que eu ti- nha pelas artes, poderia até morrer dé sofrimento.

Aí, passei a viver só de ordenado. Ho- je eu vivo do que ganho, mas não sacrifi- co a minha obra. Mc valorizo mais agora, porque respeito a arte. Hoje, montei um acervo de 30 obras e pretendo inaugurar a minha sala de exposição. Eu acho que levar a experiência a alguém, já completa a minha ação, como artista c cidadão.

Para sobreviver estou montando uma oficina de Artesanato, para que a produ- ção em série possa agüentar a minha obra maior".

Assim é José Heitor, que se despede, deixando o seu pensamento:

- "Quando se procura a essência em suas raízes, o fruto é mais sadio".

Lemi Ayó,Juventude e Cultura por Éle Semog

Em fevereiro de 1987, um grupo de jovens do bairro de São Cristóvão, zona norte do Rio, fundou a Sociedade Afro Cultural Lemi Ayó, dissidência do Bloco Afro-Cultural Eri Okan, que por sua vez foi descendente dissidente do Afoxé Te- rê Babá, que no início dos anos 80, sur- giu no Rio de Janeiro, como o primeiro a buscar os mesmos caminhos, do então revolucionário Ilê Aiyê, da Bahia.

Este é apenas um exemplo, e não se- ria capicioso afirmar que o surgimento dos blocos afros nas terras cariocas, está intimamente ligado às rixas e enfrenta- mentos pessoais, do que à perspectiva de uma política cultural, preocupada em disseminar os valores negros através da dança e da música de origem africanas, como forma de resistir ao massacre im- posto pelos criminosos brancos.

Ainda que com tantas controvérsias, o resultado da participação desses blocos como estimuladores de consciência ra- cial, pode ser considerado positivo, num Estado em que o samba tem as suas raí- zes fincadas, e significa, para a maior par- te da população negra, o eixo principal da cultura.

A proposta do Lemi Ayó (que quer dizer força e alegria em iorubá) é expli-

Integrantes do grupo afro Lemi Ayó _ cita em um dos diversos documentos do grupo: "...a opção por um trabalho es- sencialmente cultural, não político^iarti- dário nem discriminatório, se funda na fé em uma herança cultural que resistiu durante séculos a quaisquer tentativas de aniquilamento, sendo ontem, como ainda é hoje, o mais forte e autêntico meio pelo qual a população negra se consagra no esforço de superar sua con- dição de segmento social ç racial discri- minado."

Conversando com alguns dirigentes da entidade, a maior parte de jovens en- tre 19 e 30 anos, militantes, pude perce- ber uma certa rejeição à forma como -o

Movimento Negro vem atuando, embo- ra não tenham feito nenhuma crítica ex- plícita. Segundo o presidente da.Lemi Ayó, Antônio Martins, "o grupo pro- cura se fortalecer pela objetividade de suas ações junto às comunidades caren- tes, entidades sociais, clubes recreati- vos" para os associados, estão con- cluindo um projeto que prevê cursos de arte, capoeira, judô, dança afro e percussão, que será implantado para atender 40 crianças do Morro do Sal- gueiro, e outro, prevendo o atendi- mento de 150 crianças da Escola de Samba Lins Imperial, através dos mes- mos cursos, que têm duração de 4 me- ses.

Como parte de seus eventos, a So- ciedade Afro Cultural Lemi Ayó, pro- move a 3.a NOITE DA JUVENTUDE NEGRA, com a presença de alguns dos melhores grupos e blocos afros de mú- sica e de dança. O programa conta, também, com exposições de colares, máscaras e figurinos africanos, além de livros de escritores negros brasilei- ros. Tudo isso rodeado por um painel de informes sobre a situação dos po- vos negros do mundo. A festa será no dia 04 de novembro, no Clube dos Subtenentes e Sargentos do Exército, situado na rua Henrique Dias, 95, Ro- cha, com início às 23 horas. Os convi- tes podem ser adquiridos pelos tele-

fones 580-6374 e 5813959. ,

•QUE LOMBO

por Éle Semog

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UM MACHO AOS TRAPOS

1 - Agora surge no Rio de Janeiro um grupo de fê- meas alardeando que "homem nâo gosta de mulher", ba- seadas em algumas evidências sociais de valor científico duvidoso, porém bastante intuitivo. Embora tenha mais horas de cama do que urubu de vôo, percebo o machis- mo como uma rede de comportamentos que dá o senti- do e imprime o ritmo da sociedade. Fico aliviado e bus- co exercer o meu papel, com a pouca experiência das minhas horas de vôo, administrando os conflitos decor- rentes da convivência com o anseio de algumas mulhe- res. Observo-as tentando modificar a superestrutura cen- trando os esforços em argumentos e ações de fundo se- xista, que se fragilizam no confronto com os sistemas de exploração, de moral, de organização familiar.

2 - Esse desejo de paridade que as mulheres vêm bus- cando, faz lembrar o esforço inútil do seu Sísifo, um se- nhor lá da Comunidade Econômica Européia, que pas- sou a vida inteira tentando equilibrar um cubo de gelo sobre a ponta de uma agulha. Q que o mulherio deve en- tender, e os negros também; é o machismo como um sis- tema integrado, que gerencia a própria auto-evolução, para interferir em milhares de ecossistemas, movimentar bilhões e bilhões de dólares e controlar bilhões de vidas humanas, organizadas socialmente a partir do núcleo fa- miliar.

3 - Quando, há dois anos, iniciei esta série de crôni- cas no JMF, acreditava que o machismo poderia ser des- truído em 50, 60 anos, se o esforço da luta se voltasse, desde agora, para o terreno doméstico, através de uma ação direta da mãe sobre a criança. Já percebera, então, que o sistema educativo c um instrumento de propaga- ção do machismo, e as creches, as escolas, as universida- des, voltadas para a promoção da pessoa em função da produção da riqueza, são verdadeiros celeiros doutriná- rios. Quanto às populações excluídas do sistema educa- tivo, a própria miséria e a luta pela sobrevivência são, na- turalmente,, meio de cultura do machismo.

4 - Eu e milhões de mulheres estamos bem abaixo do nível de tensão social que a falocracia provoca. E preve- jo, pelo tipo de trabalho quê vem sendo executado pela vãguardafeminina, que o mínimo a se conseguir nas pró- ximas décadas, é uma legislação impertinente em um ou outro país, capaz de condenar um homem a seis meses de prisão por passar a mão na bunda de uma mulher, ou que obrigue um pai, também sob pena de prisão, a ficar com o filho por algumas horas, dias, por qualquer funda- mento neo-sociológico da razão ocidental, para que a mãe possa dedicar o seu tempo de mulher a algum afazer feminino, que vai desde uma reorganização psíquica, até se habilitar à vida comum com um novo companheiro, ou companheira.

5 - Quando escrevo sobre machismo penso na angús- tia como uma ficção. Talvez seja por isto (fazer da ver- dade um desejo contínuo de mentiras, para que possa defender-me buscando realidades inatingíveis), que com- pactuo com a lógica cruel dos nossos conflitos, onde o homem residente se transforma num asteróide inerte, o anti-sentido, portanto completamente vulnerável e frágil ao rigor dos tantos desejos que impulsionam a coisa hu- mana. Verdade e realidades, destarte, não pertencem aos parâmetros exuzíacos (de Exu), pois se esgotam numa prática onde, constato que, caminhar não é di- fícil, difícil é fazer caminhos e não ter por onde voltar.

6 - Deprimido. Ando todo amargo e cheio de trapos por dentro. A vida tem sido muito dura comigo, embo- ra eu a trate, sempre, às bordoadas. Está tudo meio as- sim, feito um poeta e um poema, onde um tenta engolir o outro, mais pelo prazer da indigestão do que pelo sen- tido que significam, entre si, como alimento. Sinto-me parecido com o amor dentro de uma dessas mulheres, que só é amor, enquanto ela souber que quem a ama so- fre por amai.

7 - Brochei geral! Não vai ter mais QUE LOMBO, es- te bastião de defesa do machismo. É bruxaria na certa... Vai ver escreveram o meu nome numa página da Bíblia e depois ferveram junto com uma calcinha e tomaram três goles numa noite de lua cheia. Mas ainda que sem tesão para escrever esta coluna, elas continuam boazudas, gos- tosonas, tesudas, peitudas, meigas, carinhosas, compa- nheiras. Hummm, só de pensar, que coisa boa! melhor do que uma mulherada, só duas mulherada.

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Outubro/Novembro-89 Página 5

TAMBORES FEMINISTAS

I

Como reprodução do machismo, há pouca divulgação das experiências dos grupos de mulheres instrumentistas. No Rio de Janeiro, há a Banda

de Mulheres do RA CISO e a Banda Odara e seu Ritmo Rabo de Saia (vide JMF n.0 10), que foi desarticulada, recentemente.

Reconhecer a opressão vivida pelas mulheres negras, no cotidiano cultural, pode corresponder, de certa forma, ao sentimento da mulher descendente de orientais. Como meio de demonstrar a ideologia do etnocentrismo e do ma- chismo, buscamos a experiência do grupo TAIKO MIYARABI no Japão, como forma de socializar a informação dos segmentos oprimidos.

Vamos conferir.

por Togo lomba

O TAIKO é um ritmo japonês, en- contrado no arquipélago de Okinawa, a leste do Mar da China. Tradicional- mente este ritmo de base percussiva, foi mais uma forma de expressão ma- chista. Entretanto, o sinal de proces- so de conscientização da mulher, nos diferentes setores da vida contempo- rânea japonesa se dá com o surgimen-

to de grupos como "Kodo", o "Ode- koza" e o TAIKO MIYARABI", for- mados por mulheres percussionistas.

Para Kawata Kimiko, líder do "Miyarabi" - que quer dizer "Jovens Meninas"-.

"Não é a força da batida, mas o ritmo do corpo que cria o seu verda- deiro som. O que produzimos é o som feminino e quando atinge o pú- blico, é como se ele estivesse sendo embalado com a pulsação da vida, no seio materno."

Segundo ela, a sua busca não é por um concerto de tambores, mas por uma "performance total". E ela continua: "Quando executamos uma coreografia, tentamos fazer com que os tambores contem histórias da vi- da, amor e natureza, como as da lite- ratura e poesias clássicas do Japão. Os tambores se encarregam de emi- tir som e fala e então, combinamos isto com os sintetizadores, violinos ou outros instrumentos musicais mais exóticos."

Kawata Kimiko, já foi reconheci- da pela criação de um "novo" som de TAIKO, quando recebeu um prêmio da Agência Cultural em 1982, no Fes- tival Anual de Artes. Seu sonho^agora é dar concertos no exterior, levando o ritmo feminino das percussionistas de TAIKO MIYARABI.

Adaptação de matéria publicada na Revista "Japão ilustrado".

Qualquer maneira de amor vale a pena por Fernanda Carneiro

Os Encontros Feministas são, no mínimo, excitantes. Na véspera, co- meça a bater aquela ansiedade que a gente sente antes de um encontro amoroso.

Dessa vez aconteceu em Bertioga. Uma cidade paulista onde um pedaço de mar faz uma enseada mansa, com barcos de pesca enfeitando o visual. Ali naquele mesmo lugar, há cinco anos atrás, vivemos o Encontro Femi- nista Latino Americano e do Caribe. O mais marcante de nossa História. Foi ali que apareceu, para nós mes- mas, a força da organização feminis- ta:5mil mulheres latinas com espaço e conforto para viver múltiplos encon- tros, de trocas de histórias e de sabe- res, numa condição de igual.

Hoje, 1989, num Encontro Nacio- nal, a competência, autonomia e cria- tividade também dominaram. E a po- pularização do feminismo é visível. Já não somos mais algumas universitárias e acadêmicas. Somos milhares, mi- lhões por esse país afora. Em Bertio-

ga, na Colônia do SESC, éramos oi- tocentas mulheres de todas as cores, sabores, classes, profissões, origens. Éramos um bando de mulheress vi- vendo a sensualidade espontânea do feminino, ávidas para se conhecer e se reconhecer no encontro com as outras.

Num Encontro Feminista tudo pode acontecer. É só propor e anun- ciar. Quem estiver interessada se jun- ta e pronto. Não há disputa possível é um encontro! E assim em grupos de vivências, oficinas, debates, conversas de bar, na piscina, nos quartos, salas, restaurantes é saletas... todas as for- mas de comunicação acontecem: tea- tro dança, toques, olhares, massa- gens, dramatizações carinhos, dese- nhos, pinturas, mensagens e troca de histórias da vida. Todos os sentidos podem ser acionados.

Há quem prefira os debates. O que se espera é que o corpo, coração e pensamento se desenvolvam integra- dos entre si. Tudo depende da coor-

Xuxa e a negritude

por Valdete Lima

A apresentadora de TV Xuxa Meneguel perdeu uma grande oportunidade de dar uma expli- cação mais convincente e mos- trar seus conhecimentos de An- tropologia quando perguntada sobre o porque de suas Paquitas serem apenas louras, sem outros tipos diferentes que não corres- pondem à verdadeira etnia brasi- leira.

Segundo ela, as meninas sele- cionadas são o resultado do apu- rado bom-gosto de sua produ- ção. Os testes são feitos calcados na dança e a "lourinha padrão- global" acha que realmente a ra- ça branca tem aquele molho ne- cessário ao seu programa.

Esquece a grande apresenta- dora - cujos méritos não tira- mos - no mínimo, a História do Brasil. Desde tempos imemoriais é público e notório o pendor do negro para a dança. Os Egípcios já provavam isto quando desco- bertos os primeiros desenhos que mostravam a dança em for- ma pictórica. Haja vista o suces- so dos afoxés, onde basicamente a bela dança africana contagia a quem assiste.

Xuxa perdeu uma grande oportunidade de - já que apre- goou aos quatro ventos seu gran- de amor por Pele - mostrar que entende um pouquinho da raça. Entendemos que furar o blo- queio da "poderosa" TV Globo é difícil e mesmo que ela quises- se colocar modelos negras lindas e dançantes não poderia. Mas uma resposta mais delicada e convincente tomar-se-ia mais simpática.

Há pouco tempo a TV Man- chete passou um programa exce- lente para quem pensa como ela analisar: "African Pop". Toda a musicalidade muito bem retrata- da em todos os níveis: melodia, letra e dança. Logo depois, na comemoração da Revolução Francesa, um dos carros mais aplaudidos foi o da raça negra e quem deu o ápice do brilhantis- mo da festa foi um soprano americana negra que cantou com toda a propriedade a Mar- selhesa em forma de ópera.

Desta maneira. Maioria Fa- lante quer registrar o grande equívoco da declaração de Xu- xa que, infelizmente, agrada a uma fatia do mercado indiscri- minadamente: tanto baixinhos louros como baixinhos negros a admiram, e que merecem mais respeito.

denadora que propôs ou do grupo que se juntou. Nas plenárias, trocam- se as emoções vividas, combinam-se Campanhas e Lutas comuns e... mar- ca-se o próximo encontro.

A PRESENÇA NEGRA "O mais marcante para mim do

encontro foi ver a presença maior de mulheres negras discutindo temas do seu interesse. Foi ver que as concep- ções do Movimento Negro podem incorporar uma perspectiva feminis- ta. Reafirmamos a necessidade de olhar dentro da condição feminina a condição da negra e na questão ra- cial ver a condição da mulher negra", comenta uma militante do Movimen- to Negro.

Se hoje parece corriqueiro que dentro de pensamento feminista mo- derno a situação da mulher negra se- ja vista como uma repetição com agravantes da situação mundial das mulheres, na prática, na vida social e nos movimentos sociais a integra- ção ainda está caminhando. Em 1986, em Petrópolis/RJ, haviam 15 mulheres do Movimento Negro. Em Garanhuns/PE, 1987, haviam 40. Em 1989, em Bertioga/SP, haviam

Filha Troca-se por gado p0^1"3"1^"^ Ser forçada aos 13 anos a abandonar os estudos e a casar com o noivo es-

colhido pelo pai é sina de jovens africanas de vários países. O Zimbabwe não é exceção. A tradição, feita pela penúria, tende a manter-se, mesmo em al- turas de mais desafogo. Dar a alguém a filha em casamento significa mais bois, ou mais burros, a engrossar os bens da família.

Hoje, as jovens começam, ainda que timidamente, a protestar contra uma situação que as marginaliza em relação aos seus irmãos masculinos.

desejaria ser professora no" futuro c As jovens do distrito de Gokwe, situado trezentos quilômetros a oeste de Harare, um dos maiores do Zimbabwe pelo seu tamanho e número de habitantes, são vendidas como escravas pelos seus pais a tro- co de comida e animais.

Segundo as estatísticas do censo nacional de 1982, há um total de 300 mil habitantes neste distrito, a maioria dos quais são camponeses que tentam sobreviver numa das áreas menos desenvolvidas do país.

Mazvidzo, a escola do distrito, perde um total de 30 estudantes anualmente, que são dadas em casa- mento pelos seus pais.

"Isto afeta o bom funcionamen- to do ensino, já que muitas moças são casadas antes de terminar a esco- la primária", comenta Jacob Majaya, diretor da escola.

Isso deve-se ao fato de os pais serem analfabetos e não valorizarem os benefícios da educação, especial- mente para as mulheres.

Na sexta série, há quatro jovens que foram prometidas _ em casamen- to a homens muito mais velhos, que poderiam ser seus pais e além disso têm mais do que uma esposa.

Uma destas mulheres, Rosemary Chibaya, de 13 anos, declarou que

ajudar os seus irmãos e irmãs a estu- dar. Mas são apenas ilusões, pois o normal é que a sua vida termine con- finada a uma casa, criando os filhos e cultivando a terra do homem que o seu pai escolheu para seu marido.

"O meu pai quer casar-me porquê necessita de burros e bois para arar a terra e também precisa de dinheiro para pagar as despesas da escola dos meus irmãos", diz Chibaya, com voz cheia de raiva e dor.

O seu pai nunca lhe revelou os seus planos, mas preparou tudo para a troca. Quando o comunicou a Chi- baya, esta fugiu de casa, mas ele en- controu-a, bateu-lhe e trouxe-a de volta.

Outra jovem, Masufi Mangovhi, da quinta série, foi oferecida pelo pai ao seu futuro marido desde que nasceu e deve casar-se logo que ter- mine a escola primária. O homem que será seu marido tem atualmente três mulheres, todas elas mais velhas que Mangovhi.

Muitas outras mulheres que, co- mo Mangovhi, se opõem a este siste- ma, estão à mercê dos pais, pois não se atrevem a desobedecer-lhes, te- mendo ser expulsas do meio familiar.

mais de cem! E não só em grupos de interesse se juntaram mulheres para compreender a questão racial. A cul- tura lúdica do povo negro balançou as mulheres numa oficina de dança onde se ouviram atabaques batidos por mãos negras femininas. Esse ba- lanço, nas festas, reforçava o caminho comum da construção do feminismo alegre, sensual, místico, receptivo e amoroso, produtivo, autônomo, coo- perativo. Convivendo e compartilhan- do de forma amorosa nossas vidas, vamos trabalhando o que é possível e necessário: a valorização social da mulher -v partir de sua aceitação de si mesma.

E atenção mulheres negras, bran- cas, mestiças, caboclas, índias e nís- seis, em 1991, temos' um encontro marcado em Goiás.

Você já foi a um Encontro Fe- minista, Nega, Não? Então vál

Fernanda Carneiro - feminista, do Grupo Nós Mulheres - RJ.

Jacob Mayara considera que é in- dispensável que as autoridades visi- tem regularmente a região e procu- rem encontrar soluções para o pro- blema.

Os professores fizeram várias reu- niões com os pais, explicando-lhes as vantagens de dar uma boa educa- ção, quer aos filhos, quer às filhas.

"Há alguns pais ambiciosos, a úni- ca coisa que interessa é usar as filhas para acumular dinheiro", explica Majaya.

Kempton Makamure, professor da Universidade de Zimbabwe e te- soureiro da Rede Africana de Pre- venção e Proteção contra o abuso e maus tratos das crianças, culpa o sistema sócio econômico pela de- gradação social da população rural.

Tradicionalmente, em tempos de fome, considerava-se normal e be- néfico para a família casar as filhas para conseguir dinheiro ou alimento.

Mas atualmente, quando se tem cada vez mais em conta os direitos dos indivíduos, "esta prática é vista como um abuso, e cada criança de- ve ter a oportunidade de terminar os seus estudos", defende o diretor da escola Majaya.

Segundo observadores, esta prá- tica, só leva á deserção cada vez maior de estudantes da escola pri- mária.

De acordo com o ministro da Educação, Fay Chung, mais de 20 mil mulheres jovens de todo o p.aís abandonam prematuramente a escola primária por ano.

• Míriam Ncube 6 da Agtncia iPS. Matéria publicada no Jornal África

eoltado em Lisboa. (6.9.1989 p.101.

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Página 6 Outubro/Novembro -89 Jornal Maioria Falante

"Atores Negros"

Iléa Ferraz por Nely Cabral e Sueli Fontes

Conquistando espaços, rompendo barreiras, buscando aperfeiçoar-se, o negro ocupa hoje um difícil mercado de trabalho - o campo das artes.

Iléa Ferraz, atriz, desenhista e escultora, traz para nós um pedaço de sua trajetória que é também uma demonstração de garra, de quem não cala diante da história de opressão do negro no Brasil.

Começando pelo teatro, já trabalhou na televisão, no rádio, na área de educação com um projeto de animação cultural e no Carnaval.

Com diversidade e competência, prepara-se agora para nova atuação no teatro com a montagem de "Os Negros" - texto de Jean Genet e direção de Maurício Abud, inédito no Brasil, com

estréia prevista para a primeira quinzena de outubro no TUCA — São Paulo.

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Jomal MAIORIA FALANTE - Como começou o teatro em sua vida? Iléa Ferraz - Quando criança, assisti muitos espetáculos tea- trais. Tive oportunidade de co- nhecer muitos atores. Mais tarde cursei a Escola Martins Pena. Juntamente com um grupo de atores negros e brancos, encena- mos a peça "WOYZECK", feita com muita paixão e muita luta, pois não tínhamos patrocínio. As pessoas iam assistir e achavam esquisito aquela montagem, pois havia muitos atores negros.

Certa vez um senhor pergun- tou se os atores brancos estavam ajudando em alguma coisa para a libertação dos negros na África do Sul,

Fiz o PERU, de Giorge Feij- deau; alguns trabalhos nos Cem Anos da Abolição — Missa dos Quilombos, Arena Canta Zumbi, na Rádio Roquete Pinto, Via Sa- cra, com elenco todo negro; al- gumas novelas na TV — Helena, Tenda dos Milagres e Pacto de Sangue; e "Pais dos Elefantes",

uma peça que participou do Festival de Avengon, na França.

JMF - O que significa fazer tele- visão?

IF - Fazer televisão é bom, pois abre espaços. De uma maneira ou de outra a gente fica conheci- da e as pessoas lembram quando querem formar novos elencos. Quando fiz a "Tenda dos Mila- gres", na Rede Globo, tive a oportunidade de conhecer gran- de parte do elenco de atores ne- gros do Brasil. O mercado de tra- balho é muito fechado. Difícil de penetrar. JMF — De que maneira o negro é aproveitado na TV? IF - Um ator é um ator por que ele é um ator. Agora ator negro, ele é um ator negro. Isto está cla- ro. Quer dizer, eu sou uma atriz negra, o fato de eu ser negra é um referencia] que é sempre lem- brado, sempre. Quando eu sou chamada para um trabalho é por que estão necessitando de uma atriz negra. Dificilmente um ator negro é chamado para um papel que não seja especifica-

mente para negros. São os escra- vos, as empregadas, os bandidos.

Quando se tem a oportunida- de de fazer um trabalho cujo protagonista seja uma empregai ou um bandido, por exemplo, não se convidam atores negros. A televisão já mostrou isso; assu- me até o ponto que interessa. Geralmente os atores negros re- presentam papéis secundários, como pano de fundo, com raras exceções. Seria bom que não houvessem as exceções. Que nós. atores negros, sejamos chamados para interpretar papéis, que não reforcem a imagem da subser- viência.

JMF - Em determinada época havia, dentro do Movimento Ne- gro, uma cobrança na forma da pessoa se vestir, usar o cabelo... IF - Se você usa um vestido de seda ou um cabelo trançado, ali- sado, etc para ser aceito pela so- ciedade como uma negra, isto é grave. A questão para mim fun- damental é do negro ter possibi- lidade de optar. Em alguns mo- mentos, porém, há necessidade de radicalizar para fazer valer

Iléa Ferraz com o ator Cosme dos

os valores de sua cultura. JMF — Você já militou no Mo- vimento Negro? IF — Há várias maneiras de se lutar para o crescimento, orga- nização e integração do negro na sociedade brasileira. Temos por exemplo, um grupo de ato- res negros que trabalha já há al- guns anos, pensando e questio- nando as alternativas do ator ne- gro no mercado de trabalho. A mudança só se dará a partir da nossa própria iniciativa. Há um certo paternalismo em relação ao negro, que não permite o aprofundamento da questão. Eles, produtores e diretores, acreditam que os atores são re- calcados ou que no Brasil não existem "essas coisas". O negro precisa formar quadros, ou seja, produzir, dirigir, iluminar, escre- ver para conquistar o seu espaço. JMF - Estamos preparando um espetáculo que vai estrear em ou- tubro em São Paulo, que há qua- tro anos tentamos montar. É uma peça de Jean Genet, um au- tor francês, cujo texto é conside- rado mais completo da drama-

Santos, atores da novela "Helena ".

turgia universal. Foi um texto pedido por negros de ilhas sob a dominação francesa, que esta- vam se libertando do colonialis- mo.

Agora vai ser montada em São Paulo com uma produção de Luiz Armando Queiroz.

Quando a questão do negro fica no nível do folclore, da apa- rência, é até possível conseguir patrocínio com facilidade. Mas quando levamos a questão a fundo, eles dão para trás. JMF — Você já vivenciou algu- ma situação de racismo? IF - Há pouco tempo em São Paulo vivi uma situação deste tipo: fui impedida de utilizar a entrada social de um prédio. Quando afirmei que aquilo era discriminação, racismo, o por- teiro me disse: - "Está no re- gulamento, moça. Por aqui só pessoas muito, mas muito bem vestidas".

( .) Nely Cabral á professora da SMC/DGAC

(.) Sucly Pontes é Professora de Psicologia na Universidade

Gama Filho - UGF.

Uma sociedade de Homens de Cor por Jota Moraes e Eliane Souza

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O Secretário da Associação dos Homens de Cor, Aloisio Rocha.

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A Sociedade Protetora dos Desvalidos, localizada no Terreiro de Je- sus — Salvador, foi fundada em 1832 e tinha como objetivo libertar os escravos e a organização social dos mesmos.

Consta que seus fundadores eram trabalhadores e se cotizaram para comprar o prédio que funciona como sede da sociedade. Logo após a "Abolição" muitos negros que ficaram sem moradia foram ali abrigados.

Atualmente, apesar das dificuldades financeiras, a sociedade paga uma pensão às viúvas e em caso de doenças um benefício aos associa- dos. Com um quadro de trezentos membros, a entidade só possui dois funcionários que recebem salário, um boy e a contadora Edivaldina Go- mes dos Santos que expõem sobre as dificuldades da associação — falta de apoio, de recursos, de divulgação dos trabalhos.

O Sr. Aloisio Rocha, atual secretário, com 51 anos de participação — é neto de um dos fundadores — fala sobre a importância da educação social, que sempre foi uma das preocupações da entidade, e que muitos negros criaram ordens religiosas, artísticas e científicas até hoje desco- nhecidas. Na década de 20/30 havia um curso noturno em cujo currícu- lo constava alfabetização, matemática e desenho.

Este mandato será caracterizado pela ampliação da assistência médi- ca, criação de uma sala de leitura e estabelecimento de convênios com a Secretaria de Educação.

O Sr. Aloisio prega que na censura ao erro que o homem branco co- meteu contra a população negra não deve haver violência. Ele crê num país igual para todos e pensa que já superamos momentos difíceis. Quan- to ao futuro governante do Brasil: um representante comprometido com as causas do negro, principalmente com a educação; a saúde e a moradia para o povo.

Associação Protetora dos Desvalidos Praça Anchieta 17-1.° andar Terreiro de Jesus Salvador/Bahia - CEP 40.020 Fone: 243-0415.

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Jornal Maioria Falante Outubro/Novembro -89 Página 7

ASSIM por Luisinho Gomes

A partir desta edição do JMF, Literal- mente Assim passa a exibir poemas dos livros que recebemos da rapa-

ziada. O critério de publicação é o que der na telha da minha sensibilidade. Vou logo avisando que autores inéditos terão pouca chance, já que considero o maior sacrifício conseguir colocar um livro na rua. E mais, poesia péssima, sofrível, medíocre, não vai ter vez.

CARNAVAL Ana de Santana

Despir o nu e agasalhar o mal vestido, como quem quer a coisa e nunca se espanta, senão à despedida.

Resta um canto suave e um prazer imedido na exorcisão das teias do armário.

qualquer ovo que se machuca entre os dedos e se espalha lentamente pelo corpo, auspiciosamente, entre a calma do ócio e o desprezo da revolta, um sorriso e talvez um aperto de mãos De costas. Para dar mais prazer.

E um vento que sopra rasteiro, sibilino uma tempestade que nunca desabará c o choque. Carnaval.

(livro "Sabores Odores* Sonhos", 1985, União dos Escritores Angolanos)

ANIMAIS DA TERRA Carlos Lima

Agora estou sozinho não para matar-me sóbrio como uma carniça salto o sono cuidado meu coração cuidado um homem que diz sim trazendo ainda algumas luzes de julho você sfbe a primavera diz que tudo terminou olhe para você olhe para mim a cidade inteira passa por aqui meu amor deixe-me sair tocar em todos agora deixe-me dizer-lhe (como um ator que se volta para o público) as primeiras linhas são imparciais) dizem tudo o que não querem dizer "um negócio de sexta-feira ou de sábado" i.e. nenhuma luz te reinventa também convenhamos há poucas maneiras

satisfatórias de se caminhar peta agonia de um homem

(livro 'Terra", Edição Europa, 1988, RJ)

TIPOS DE VIDA Jônatas Conceição da Silva

As primeiras letras do alfabeto me foram ensinadas pelo patrão. Tipograficamen te... As caixas alta e baixa nada diziam no relevo da nossa vida.

Na penumbra da casa ensimesmado aprendi com tipos variados a compor a vida. Aquele alfabeto foi amargo e difícil mas seu aprendizado ensinou-me o amor e o ódio o pão e o patrão. Tudo tipografwamente...

(livro "Outras Miragens", Confraria do Livro, 1989, SP)

NO BRASIL WÔ HA' PR6CÜHCB110 V£ COR

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COU BOM-P/A, DtpefiVt VA HORA)! BSrAMX « 4011 VAZA bBMOUSrRAfl & fRoVAO- V? UMA VBZ POIL XOVAS A mxisriHüA (fc r^cp^ceiro

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Jornal Maioria Falante Outubro/Novembro-89 Jornal Maioria Falante Página 9

CUT - Os caminhos do Sindicalismo As vésperas da eleição presidencial o Jornal

MAIORIA FALANTE e o Centro de Articulação de Populações Marginalizadas — CEAP, receberam a visita de Jair Meneguelli,

presidente da Central Única dos Trabalhadores, CUT, uma das principais organização popular da América Latina.

Aos 42 anos, Jair Meneguelli, que é ferramenteiro e trabalhou durante vinte anos na FORD, vem, como liderança operária,

desempenhando uma luta árdua à frente da CUT pelos direitos fundamentais dos trabalhadores.

Em tom coloquial, a conversa transcorreu em tomo das perspectivas dos trabalhadores em relação à saúde, aos salários,

à educação e à questão racial. Neste sentido, esta entrevista marca um momento histórico da aproximação efetiva do Movimento

Negro, com o movimento organizado dos trabalhadores. É a oportunidade para se refletir sobre as formas de se agregar as

forças populares que foram dispersas pelos liberais, quando da importação de mão-de-obra européia, após a Abolição, que

estrategicamente criaram divisores de raça e de classe no Brasil. Para nós do J M F e do CEAP, consideramos que foi dado um passo fundamental com a CUT, na ampliação das perspectivas

dos que lutam pelas transformações estruturais da sociedade brasileira. A luta contra o racismo e a discriminação deve

interagir com a luta dos trabalhadores e se complementarem no esforço por uma sociedade 'digna para o povo brasileiro.

por Éle Semog e Uelinton Farias Alves

A CUT DIANTE DA EMINÊNCIA DA HIPERINFLAÇÃO E DAS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS.

JAIR MENEGUELLI - Realiza- mos uma plenária nacional recente- mente onde tivemos a oportunidade de fazer uma análise da conjuntura, pegando aspectos em comum e polí- ticos. A gente está detectando, a par- tir da afirmação de diversos econo- mistas, de chegarmos à situação de hiperinflação. A gente sabe que o go- verno tentará de todas as maneiras, sonegando informações, burlando os dados, manter o processo inflacioná- rio no patamar dos 30 por cento, isso para garantir, evidentemente, não a eleição presidencial, mas sim a possibilidade de eles se aglomerarem em torno de um candidato que dè

continuidade aos interesses da classe dominante, a burguesia; por que"caso contrário, se a economia degringolar será fatal e a lei da reflexão política dará possibilidade ao voto de protes- to favorecendo as forças de esquer- da.

O voto de protesto, para as pes- soas ligadas à área militar, para as pes- soas que, como Collor, que se negava a receber o apoio de certos políticos tradicionais, embora ele seja um polí- tico tradicional... Ele já tem o apoio do Antônio Carlos Magalhães (Minis- tro das Comunicações) e vai ter apoio, evidentemente, no restabeleci- mento da Aliança Democrática. Ora se o governo não conseguir controlar esta situação, ele perde a possibilida- de de influenciar, com o controle econômico, uma candidatura de di- reita. Nós do movimento sindical, em função desta possibilidade de chegar-

mos a uma hiperinflação temos que nos armar, não podemos esperar mais para depois correr atrás dos fatos; ou seja, permitir que a hiperinflação chegue para depois nos organizarmos na luta contra ela. Temos c que con- vencer as lideranças sindicais de que é necessário colocarmos o bloco na rua. Irmos para a porta das fábricas, paia as feiras livres, para os bancos, o co- mércio; começar a alertar a popula- ção de que a saída do governo, da classe dominante, de evitar a hiperin- flação é aquela saída clássica de arro- char salários... reprimir a demanda, para exportar mais, captai dólares e continuar pagando os juros da dívida externa.

A CUT E A QUESTÃO ELEITO- RAL, QUANDO LIBERAIS E CON- SERVADORES BUSCAM VOTOS ATRAVÉS DO PROTESTO EM RE- LAÇÃO À SITUAÇÃO ECONÔMI- CA.

JAIR MENEGUELLI - A candi- datura à presidência da República é outia tarefa do movimento sindical. Veja a CUT na sua pluialidade, sem sei um paitido político, abaica todas as tendências do sindicalismo nacio- nal, poitanto em nossas categorias te- mos quem vota em Lula, no Brizola, no Ulysses, no Colloi c quem sabe, ate no Malluf. E temos que icspcitai, não podemos condenai a falta de po- litização que c a meu vei, uma defi- ciência da cúpula, se quizermos cha- mar assim, ou da própria vanguarda do movimento sindical, que ainda não conseguiu uma fórmula didáti- ca de esclarecer a população que não dá para a gente ficar votando em re- presentante da classe dominante. Em uma empresa que fui no estado de Alagoas, tentava explicar isso aos tia- balhadores. Os 12 ônibus que carre- gavam os operários da empresa, ti- nham adesivos do Collor. Eu mostra- va que aquilo era obra de patrão e que se Collor era bom para o dono da empresa, evidentemente não po- deria ser bom para os trabalhadores.

E preciso a classe trabalhadora dar um salto político c fazer a ligação das

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suas reivindicações históricas, imedia- tas, com a candidatura presidencial,

não podemos desvincular uma coisa da outra. A eleição está diretamente ligada aos nossos interesses, solução da classe trabalhadora e todas as suas preocupações, sejam elas salariais, se- jam por condições de trabalho, ou

por discriminação, das mais diversas que nós temos; é o negro, c a mulher, c o homossexual, o menor... Temos que nos atirar nas ruas, discutir com a população e possivelmente vamos nos dividir entre alguns candidatos, mas seguramente vamos estai unidos contra os que significam o atraso para este país.

ELEIÇÕES: Prá onde vamos. Ou não vamos? Poucos dias nos separam do nosso sonho antigo: eleger o pre-

sidente da República, já que o último eleito renunciou des- vairadamente e seu vice foi expulso pelas botas e canhões

militares. Quase trinta anos depois náo temos claro ainda quais são as reais diferenças das propostas dos grupos políticos que lançaram candidaturas com o propósito de governar o Brasil numa determina- da direção.

por Jorge Barros

As eleições anteriores paia verea- dores, prefeitos, deputados, senado- res e governadores do Estado funcio- naiam sempre como um treinamento paia o grande dia. No entanto, os re- sultados desse tieino quase sempre não foi satisfatório. Seis meses depois de eleitos os representantes já estão distantes dos programas e das idéias difundidas na campanha. Seja no Le- gislativo ou no Executivo a decepção é a mesma. Exemplos não nos faltam. São vereadores e congressistas aumen- tando seus salários em índices supe-

riores à inflação. São prefeitos e go- vernadores incompetentes na admi- nistração da coisa pública, frustrando expectativas de mudanças que os tra- balhadores exigem.

Esse leque de frustrações teve co- mo fator mais significativo o engodo produzido pela Nova República. A brasilidade resgatada na Campanha Diretas-já afogava-se, quando a vitória de Tancredo Neves no Colégio Eleito- ral da Ditadura Militar, estendeu-lhe as mãos dando a ela novo fôlego, que no entanto, foi curto devido a ascen- são do conservadorismo sarneysiano ao poder da Nova Velha República. Isto foi o coroamento do naufrágio. Quem já conhecia os velhos vilões

que empenharam nossas riquezas aos gringos ficaram surpresos quando vi- ram que havia muito "democrata", opositores da Ditadura que não eram menos corruptos e que também eram. comprometidos com o Fundo Mone- tário Internacional - o FMI. A paitii daí uma sensação de "não ter jeito" tomou nossas cabeças e foi dentro

dessa moldura que caminhamos para as eleições presidenciais. A idéia de que "são tudo uns ladiões", expres- sa na linguagem populai, faz com que não peicebamos a impoitância desse, momento.

Nessas eleições nós não podemos mudar tudo, mas podemos não mu-' dar nada. Paia isso basta não fazer

nada, deixai como está. Não se im- poitai que seja o Collor, o Afif, ou o Maluf o próximo presidente da República, pois com eles nada muda, já que nem nas suas empresas ocor- rem benefícios significativos para os trabalhadores. Exercitemos melhor isso, considerando apenas os candi- datos que podem vencer as eleições.

O ENTENDIMENTO DA CUT QUANTO A ESPECIFICIDADE DO TRABALHADOR NEGRO, A OR- GANIZAÇÃO DE SETORES DA POPULAÇÃO DISCRIMINADOS... DIFÍCEIS ARTICULAÇÕES E AL- TERNATIVAS.

JAIR MENEGUELLI - Olha, eu vou ser honestíssimo e sincero com vocês. Não esperem que a CUT tenha a resposta para todos os problemas deste país. Não esperem. Temos defi- ciências mil, precisamos dar um salto político, sair do ponto-de-vista mera- mente reivindicatório salarial. Nós não conseguimos ainda dar esse pas- so... As vezes me pergunto: o que vo- cês estão fazendo pela discriminação «ciai, pela discriminação da mulher, da homossexualidade? Ora, será que com cinco anos de Central, com uma proposta totalmente nova, enfrentan- do todas as dificuldades do sistema, porque nós não temos contribuição sindical como as confederações desse país tem. A CÚT hoje vive de espon- taneidade, vive da vontade de alguns sindicatos, em mantê-la em funciona- mento. Ora, então não esperem que a CUT tenha a solução dos proble- mas. Nós estamos numa briga hoje sa- larial, que é o que consegue tocar a classe trabalhadora para a mobiliza- ção, daí a mulher dizer que nós te- mos que resolver alguma coisa ao in- vés de ela estar integrada na luta den- tro da CUT, para levar os seus proble- mas, para nos fazer compreender. Ao invés do negro dizer se nós estamos fazendo alguma coisa?, ele deve estar dentro da CUT, lutando, dentro da executiva, das direções estaduais, dos sindicatos levando essas questões, ou simplesmente ficar esperando que a gente o faça alguma coisa.

Eu posso dizer para vocês que a maioria da diretoria do sindicato de São Bernardo do Campo é negra, o presidente é negro, aí eu gostaria de discutir esse assunto com vocês. Será que nós temos necessariamente que ter no movimento sindical, seja no sindicato, seja na Central, que estabe- lecermos departamento feminino, de- partamento do homossexual, do ín- dio, do negro, do menoi? Ou temos que convencei a todos que a discri- minação é uma questão que temos responsabilidade igual, todos, bran- cos, negios, mulheres. Como é que nós vamos resolver esta questão para não ficar regionalizado a situação no Brasil?

O POVO NEGRO NO BRASIL, PRISIONEIRO DE GUERRA DU- RANTE QUASE 400 ANOS, É A PRÓPRIA HISTORIA DO TRABA- LHO DESSE PAIS. NÃO SE PRE- TENDE A TUTELA DA CUT. MAS A SUA DIREÇÃO DEVE SER SENSÍVEL ÀS LUTAS POPULA- RES DECORRENTES DA EXPLO- RAÇÃO.

JAIR MENEGUELLI - Vamos resgatar. Primeiro este país não tem história: ou, pelo menos, o povo não :onhece a história desse país. porque ;la sempre foi sacaneada. Hoje, na es- cola, em 1989, as crianças ainda aprendem que o Brasil foi descober- to a partir de uma calmaria. Perce- bem o que é feito com as nossas mentes?

Este é um problema que nós temos que destacar. As crianças, as pessoas não aprendem a partir da escola a his- tória desse país, ou quando aprendem é de uma forma mentirosa. Aprende- mos ainda, na escola, que os tais dos bandeirantes, que exterminaram os índios e os negros, são nossos heróis. Aprendemos a idolatrá-los. Isso é evi- dente que é uma educação voltada para um interesse.

Em São Bernardo do Campo, que é considerado um setor politizado em função das lutas nestes últimos anos, se vê reclamações de companheiras trabalhadoras, timidamente, dizerem que seus empregos seriam mantidos se elas saissem com o chefe, porque foi essa a imposição feita a elas. Quantas vezes companheiras chegam no sindicato dizendo que o chefe se' deu ao direito de passar a mão nas bundas delas? Quase que diariamente. E elas não podem se voltar contra is- so porque dependem do maldito em- prego.

A outra discriminação clara numa empresa, estou falando da fábrica, onde é a minha vivência maior, eu fi- quei lá vinte anos dentro da FORD, se o negro fosse inteligente, ou mais inteligente do que um branco, jamais teria condições de vir a sei o chefe da seção... jamais. Eia laríssimo ver um negro da capa amarela, que era chamado de feitoi (risos). Em vinte anos de FORD só conheci um negro que usava capa amarela (Chefia). Vol- to a dizer, essa discussão dentro do movimento sindical é ainda muito e' porádica. Ela é fundamentada em guns casos específicos que aco.

cem e têm só reclamações, e sempre no sindicato.

Pensa-se na questão da mulher, marginalizada na mão-de-obra, em função das provocações e do salário que recebe. Quando vem uma com- panheira do sindicato reclamai aí c que a diretoria vai analisar aquela situação. Assim é o caso do negro. O movimento sindical ainda não pa- rou paia discutir isto de uma foima globalizada, fora do maldito salário. Outio exemplo é a creche.

Só se consegue sensibilizar aqueles que vivem a situação.

SÃO MUITAS LUTAS NA LU- TA DO TRABALHADOR, F. PRECI- SO TRANSFORMA-LAS NUMA SO. SE UM OPERÁRIO ESTA NOI- VO A LUTA PELA CRECHE NÃO É DE SEU INTERESSE.

JAIR MENEGUELLI - Ele não discute. Se está casado a mulhei fica em casa tomando conta das crianças e cie não vai discutii. Você só pega as pessoas que realmente precisam, pa- ia discutii o assunto da creche. Vo- cê pcicebe que é uma coisa individua- lizada, se não afeta, dane-se. Este é o raciocínio hoje, não dá paia a gente fugii disto. Esta não é uma tarefa do Jaii Meneguelli, Presidente da CUT, assim como não é uma tarefa indivi- dual de cada um de vocês. C uma ta- refa nossa, de colocaimos essa discus- são, de fazermos alguns seminários, alguns encontros. Não um seminário onde só tenha negros. Não um semi- nário para tratar da questão da mu- lher, onde só tenha mulher, pois vai ser uma choradeira desgraçada. É a mesma coisa que discutirmos dívida externa entre países devedores.

Não vamos revolucionar se a gen- te não disser quem é que está massa- crando essas minorias. Eu acho que a partir daí podemos avançar; não é pegando casinhos específicos que acontecem... Quando vocês falam que no lançamento da Frente Brasil (co- ligação do PT, PC do B e PSB), em São Bernardo do Campo, exatamen- te no dia 13 de maio, não teve ne- nhum negro falando, concordo com vocês, foi um equívoco, mas eu colo- co que é a partir dessa questão que devemos discutir. O fato de nos pró- ximos dias 13 colocarmos um negro no palanque não resolve a coisa. O branco pode ser menos explorado que o negro e a mulher, mas ele tem

Maluf, Afif e Collor foram forja- dos politicamente dentro e próximo ao regime militar. Por isso comungam com os mesmos ideais da ideologia do binômio "Segurança & Desenvol- vimento" engendrado na Escola Su- perior de Guerra. Os três apostam no modelo desenvolvimentista da década de 70 que queria transformar o Brasil cm potência mundial, o que foi con- seguido no futebol. Na economia pas- sada a primeiro na América do Sul e oitavo no mundo ocidental, mas isso a custa de muita fome, desemprego, favelização, ou seja muita humilhação para o povo brasileiro. Os vinte e um anos de ditadura mais os quatro de "transação" transformaram o povo brasileiro dos valentes e aguerridos de 64 numa massa silenciosa e incrédula. Disso se aproveitam aqueles que dese- jam manter os privilégios conquista- dos nesse período, tais como conces- são de TV, de rádio, monopólio in- dustriais, entre outros, que desejam impjgir a todo custo aos eleitores bra- sileiros, e aos trabalhadores em parti- cular, os seus candidatos. Deles o que mais se destaca é Fernando Collor, que foi produzido nos estúdios de TV para encarnar uma candidatura populista de direita.

A impressão que nos dá é que se a eleição não fosse obrigatória o Brasil

corria um sério risco de ficar sem pre- sidente da República, porque o nível de representatividade dos candidatos é bem baixo. Isso é decorrência da di- tadura que inibiu o surgimento de li- deranças fora dos padrões aceitáveis, tipo Maluf, Afif e Collor.

A oposição frustrada com Ulysses, divide-se entre Lula, Brizola e Covas, os três que podem não deixar as coi- sas como estão. Não que se vá im- plantar no Brasil, agora, uma repú- blica socialista como eles apregoam mas que o conjunto de medidas que propõem não priorizam o capital, c desenvolvimento ao custo do sangue e do suor da classe trabalhadora. Tra- ta-se de uma revisão das prioridades de aplicação dos escassos recursos, que podem ser ampliados com a mo- ratória ou com uma renegociação da dívida externa em patamares que interessem ao povo brasileiro.

Apesar da diferença. Lula, Covas e Brizola, não necessariamente nesta ordem, apresentam projetos de go- verno distintos, embora na mesma direção. Lula estaria mais para o go- verno da co-participação popular, de fazer junto. Brizola mais para o su- pridor de necessidades, no velho es- tilo paternalista e Covas mais para o

estilo modernista, próximo do libera- lismo progressista (não confundir com Afif). Nesta tríade, logicamente um mais que outro, poderíamos espe- rar algumas possibilidades de mudan- ças paia melhoi.

Diante deste quadro como pode- mos tomai esta a eleição dos nossos sonhos? Para isso é necessário perce- bemos o que não queremos que exis- ta na sociedade brasileiia. Não quere- mos continuai pagando a dívida ex- terna. Não queremos o latifúndio. Não queiemos o desempiego. Não queremos a fome e a miséiia dentre outros grandes males que assolam a nossa vida diariamente. Uma vez que isto esteja claro nas nossas cabeças é fácil perceber que candidatos pos- sibilitam isso ou não. Certamente não serão aqueles que se firmaram politicamente no momento em que tudo o que não queremos se solidifi- cou. Nós não podemos aceitar im- passíveis que nos empurrem goela abaixo agora tudo aquilo que não queremos e que à força dos canhões nos impuseram. Agora, não!

JORGE BARROS - Bacharel em Ciências Sociais e militante de movimentos sociais.

que entender que está junto com os outros explorados.

O POVO NÃO COMPREENDE BEM ESSE NEGÓCIO DE ARRO- CHO E HIPERINFLAÇÃO, ENTÃO QUE TIPO DE APOIO A CUT PO- DE DAR AOS MOVIMENTOS PO- PULARES?

JAIR MENEGUELLI - Concor- do. Às vezes a gente faz muitas reu- niões e muito pouca ação. De repente a gente acaba se perdendo em tantas discussões. Veja a questão da creche, sempre tivemos uma preocupação in- dividualizada. Esse ou aquele sindica- to que tem alguma formulação... você tem uma dúzia de sindicatos que têm uma formulação política maior sobre temas específicos. A partir do último congresso nós implantamos a Secreta- ria de Política Social. Nós já avança- mos mais um passo. C a partir dessa Secretaria que estamos tentando fa- zer a ligação do movimento sindical com o movimento popular.

Por entender que não bastaria bri- gar para ter mais salários, brigar para ter uma comida melhor durante o al- moço e a família no bairro onde o trabalhador mora? Nós não fazemos essa ligação. A situação da fábrica es- tá ligada diretamente ao local da mo- radia. Por isso nós temos interesse em nos ligarmos a todos os movimentos populares, com todos os problemas das minorias desse país, para começar a fazer seminários e chegar a condi- ção de descobrirmos uma fóimula didática, paia não ficaimos só no maixismo, no leninismo que nem as vanguaidas entendem e baixarmos á uma realidade que dê para entender a situação da comida, da barriga; das enfermidades, da saúde, que estão lá em baixo, Eu quero dizer pra vocês: nos ajudem por favor.

EM ALGUMAS FABRICAS AS IGREJAS PENTECOSTAIS ESTÃO DESMOBILIZANDO OS TRABA LHADORES QUE SE ORGANIZAM PARA DEFENDEREM OS SEUS INTERESSES

JAIR MENEGUELLI - Eta as- sunto complicado, esse. Vou dar um exemplo maior. Numa empresa em São Bernardo do Campo, na Bras- temp, de um ano para cá, sabe qual é a preferência na seleção de pessoal? não é ser mais branco, negro ou mu- lher; é ser crente. A Hrastemp tem seis mil empregados. Porque isso? C aquela velha história... eu embora se- ja católico, de vez em quando me atrevo e me impressiono em ver o quanto é grande esse guarda-chuva da Igreja Católica, que abarca entre os seus fiéis. Lula, Jair Meneguelli. Delfim Neto, Malluf...

No debate com os presidenciáveis. uma pergunta sobre o aborto, que c um assunto seríssimo nesse país. K- vou, de repente, todo mundo a res- ponder: eu sou contra porque sou ca- tólico. Ora, vá para o inferno. Isso é resposta que se dê para a sociedade. Eu acho que o que temos hoje, i uma paite pequena da Igreja Católica que começa a mudar a sua forma, ;i sua pregação aos setores oprimidos

Na verdade, a Igreja como um lo- do, sempre foi aliada das classes do- minantes. Esse é um assunto que te- mos que começar a discutir dentro do movimento sindical, para come- çarmos a influenciar as estruturas, a conjuntura da Igreja. 1- isso aí.

Participaram desta entrevista Éle Semog, Ivanir dos Santos, Togo loruba, Jairo Pereira, Jorge Da- mião, Luiz Cláudio de Oliveira,

Maitê da Silva Barros, Luiz Car- los Vieira e Vânia.

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Página 10 Outubro/Novembro - 89 Jornal Maioria Falante

AIDS, Produzida ou não em laboratório?

por Beth Silva Santos

Pela primeira vez, cientistas e estudantes de países avançados de todo o mundo irão se en-

contrar numa conferência Mundial para discutir informações sobre o vírus da AIDS, ou seja, sua origem, sua forma de contágio, seu potencial de ameaça à vida, a cura. os cuidados e outros estudos científicos que visam a utilização da AIDS na rciluçSo da população mundial, e como arma para extermínio de deter- minadas raças. A Conferência acontecerá nos dias 27, 28 e 29 de novembro, no Hotel Holiday Inn, Filadélfia, Estados Unidos.

O Presidente do Conselho Nacional de Auditores Públicos, Samuel Evens, há muito tempo líder dos direitos civis, soli- citou uma investigação sob alegações de que o vírus da AIDS foi desenvolvido co- mo parte de um projeto para se criar uma raça específica. O propósito seria a eliminação de povos específicos, tais co- mo nígros e outros não brancos.

í altamente provável qu^ o vírus da Deficiência Imunológica Humana (HIV) tenha sido criado cm um laboratório ou em vários laboratórios. Até hoje, nin- guém determinou satisfatoriamente uma fonte natural para o vírus. Há muitas evi- dências em livros científicos de que esta origem é possível e que realmente já ocorreu. Fm 1972, Van Der Maaten e seus companheiros descreveram um Ví- rus de gado que eles chamaram "Bovine Visna". "Visna" é muito parecido com o vírus da AIDS, HIV, e produz uma doença degenerativa do sistema nervoso, assim como a AIDS age nos seres huma- nos. Posteriormente, outros pesquisado- res examinaram o Vírus "Boyjne Visna" e determinaram que ele é tão semelhante ao HFV, que lhe deram o nome de Vírus Semelhante ao da Deficiência Imunológi- ca Bovina (Bovine Immunodeficicncy-li- ke Virus - BIV).

Atualmente não se pode postular uma diferença genética entre a raça negra e outras raças que justifique a incidência da AIDS nas populações negras dos Esta- dos Unidos c dos países em desenvolvi- mento. A célula-T funciona como coor- denadora das funções de imunidade em muitas infecções e é ativada por vários desafios às defesas do organismo, tais co- mo infecções múltiplas. Uma das primei- ras funções paia qualquer infecção é a ativação das células-T e tais células ativa-

.das ficam suscetíveis à inflação, e destrui- ção, pelo HIV. Assim, qualquer popula- ção que é exposta à graves desafio* à de- fesa do organismo que resulte na ativa- ção da célula-T, será mais suscetível ao desenvolvimento da AIDS após a infec- ção do HIV. De fato, a publicação de um estudo no periódico da Associação Médi- ca americana mostrou um ponto de simi- landade entre o sistema imunológico dos homossexuais e o dos negros da África Central. Esta similaridade entre grupos de raças diversificadas é facilmente ex- plicada pelo fato de que ambos estão ex- postos à múltiplas infecções com vírus, bactéria e parasitas intestinais: os da África Central por causa das apavoran- tes condições sob as qua^s eles vivem, e também, graças à severidade das condi- ções impostas pelo Fundo Monetário In- ternacional à economia destes países; e os homossexuais por causa do seu estilo de vida que efetivamente quebra as bar- reiras normais que o sistema sanitário constrói entre o que nós comemos e a que nós excretamos.

COMO A AIDS SE ESPALHOU NOS GUETOS DE NOVA YORK?

O rápido alastramento da pobreza, das drogas e da AIDS não foi simples- mente uma ocorrência natural. Foi o que delineou Roderick Wallace, um membro do Departamento de Epidemo- logia e Medicina Social da Faculdade Al- bert Einstein, em Nova Iorque, "deterio- ramento urbano contagioso" foi o resul- tado da política deliberada de "redução planejada" para a vizinhança mais pobre de Nova Iorque nos anos 70.

Para continuar com o plano de "re- dução planejada", no início de 1972 os Corpos de Bombeiros foram intencional- mente fechados nas áreas dos guetos, e estas áreas, então, foram incendiadas, co-- mo era de se esperar. Usando o Rronx para um caso de estudo do fenômeno na- cional, Wallace mostra como, quando o fogo foi controlado, as pessoas foram di rígidas; á vizinhança, aumentando assim o superpovoamento. Casas cheias impli- ca em mais fogo e fuga para outras áreas. Este processo espalhou epidemia de dro- ga pelo Bronx - inicialmente na parte sul. Wallace diz que o alastramento da droga é ordinariamente contido por um tipo de sistema de defesa. Uma rede de relacionamentos pessoais mediada oor igrejas, clubes, escolas e grupos de comu- nidade. O "Deterioramento urbano con- tagioso" destrói esta rede, resultando não apenas na aceleração do vício em

Dr. John denuncia o genocídio.

droeas, mas no aumento rápido de ho- micídios, mortalidade infantil e, mais re- centemente, de casos de AIDS.

A migração forçada de população mistura viciados em drogas injetáveis com populações relativamente sem ví- cios, isso acelera o alastramento da AIDS. No começo de 1987, o índice de AIDS entre os homens de 25 à 44 anos no sul do Bronx aumentou de uma média de 8 para 22 por cento, índice comparável ao dos centros urbanos da África Central.

A partir do momento em que a AIDS não é apenas adquirida pelo sexo e por agulhas contaminadas, mas que também evolui com mais rapidez em condições de superpopulação, pobreza e sujeira, as causas e efeitos delineados por Wallace são obviamente corretos. Em 1980, a AIDS ficou em terceiro lugar na causa de mortes em Nova Iorque, e campeã en- tre homens de 30 à 40 anos c mulheres de 25 a 39 anos de acordo com uma de- claração dada por um Membro da Comis- são de Saúde de Nova Iorque, Stephen Joseoh, em 23 de janeiro deste ano.

Quando se examina estas medidas, fica evidente que qualquer que seja a efi- cácia no controle da proliferação da AIDS, elas certamente recairão, também, no controle de proliferação de popula- ção, especialmente entre aquelas mais fortemente afetadas. Todas estas medidas irão reduzir a taxa de nascimento, ou au- mentar a taxa de mortalidade entre as populações que fizeram uso delas.

Na opinião de Samuel Evans, antes de se afirmar que todos estes questionamen- to não têm fundamento, ou que não pas- sam de "teoria de conspiração", é me- lhor que se pergunte e que se responda todas as questões pertinentes ao assunto até esgotá-lo. E é isso que promete esta Conferência Mundial.

Repinique O SERPAJ/AL - Serviço de Paz e Justiça da Amé-

rica Latina, delegou ao Jornal MAIORIA FALANTE, representado por TOGO IORUBA, a incumbência de articular a organização e a participação no "Tribunal dos Povos", dos vários segmentos do Movimento Ne- gro.

Para tal, realizou-se no IPCN - Instituto de Pesqui- sas das Culturas Negras-no dia 28 Ago 89 um Encon- tro-Consultivo, onde compareceram representantes doMN-RJ. "

Agora, dando prosseguimento aos trabalhos pre- paratórios, fará realizar uma reunião no dia 21 Nov 89, às 20,00 hs,noC £ A P~ Rua da Lapa, 220 SI809 Lapa-RJ, para discutir a participação e representa- ção de brasileiros no citado Tribunal. A equipe de Coordenação Internacional será eleita no Encontro de Quito, em 1990.

Os militantes das Entidades dos demais estados poderão obter maiores informações pelo telefone (021) 252-2302, ou através de carta. Rua da Lapa, 200 s/808 - Rio de Janeiro - RJ - CEP. 20021 .-

Nos dias 28 e 29 de outubro, o Instituto de Arti- culação das Religiões Afro-Brasiteiras - INAB. ex- IPELCY. rcalizou-sc o X Encontro Regional das Reli- giões Afro-Brasileiras.

Neste encontro foram discutidos assuntos do in- teresse das comunidades de terreiros, tais como: as Igrejas eletrônicas, avaliação dos encontros regio- nais, o projeto Tradição dos Orixás, além de lança- mento de livros, exibição do vídeo "Ousando o Crioulo Dança", etc.

Maiores informações pelo tel:. (021) 224-6771 com Gésia, Jairo ou Luiz Cláudio.-

O FTPASE - Movimento Espiritualista de Pre- servação dos Cultos AFRO-BRASILEIROS, reali- zou o ENCONTRO DAS RELIGIÕES AFRO-BRA- SILEIRAS no dia 1,° de outubro p.p. na Quadra da Escola de Samba Império Serrano, Madureira-RJ.

O Evento organizado pela Federação de Umban- da c Nações Africanas teve por finalidade a unifica- ção das Religiões Espiritualistas e a discussão ampla pela liberdade de crença e o livre exercício do culto religioso, ao qual compareceram lideranças religiosas e de ação popular.

Informações sobre o FIPÁSE pelo tel. 248-6864

A propósito: criança negra não brinca, não ganha brinquedo? Não tem Dia da Criança? Sabemos que o poder aquisitivo da maioria negra não dá para adqui- rir brinquedos tão caros quanto os anunciados na te- levisão Mas só por isto não colocam criança negra em comerciais? O Programa de Domingo da TV Man- chete foi todo dedicado à criança e aos comerciais infantis, mas o negro foi totalmente alijado do pro- cesso. E logo na Manchete que se diz tão democráti- ca?!

Com a palavra a Estrela.

Criança: triste Brasil 0 a. Martin Gtnte, representan-

te da DEFENSA DE LOS NI- NOS, INTERNACIONAL -

D.CJ. (órgio com status consultivo na Oiganizaçfo das Nações Unidas), esteve no Rio de Janeiro acompanhando a ma- nifestaçio de protesto e o ato-show Da Lei do Ventre Livre ao Menor Abando- nado, promovido peto CENTRO DE AR- TICULAÇÃO DE POPULAÇÕES MAR- GINALIZADAS - CEAP, que neste ano enfatizou o extermínio, por assassinato, de crianças e adolescentes btasüeiros.

Em visita ao Jornal MAIORIA FA- LANTE, o si. Guate nos concedeu esta entrevista.

porÉleSemog

Jornal MAIORIA FALANTE - Qual a função, ou o papel que a Defesa De Los Ninõs Internacional (DCI) se propõe a desempenhar?

Martin Garate — Promover os direitos das crianças. A melhor maneira de de- fesa desses direitos, pensa a DCI, é as pessoas se colocando no direito das crianças e atuando através de organiza- ções no mundo inteiro.

JMF - Como o st. avalia a situação na América Latina? MG - É uma situação... Está intima- mente ligada á situação de grande po- breza que vive a maioria dos latino- americanos. Podemos falar que as crianças que vivem esta situação so- frem um grande abandono social, eco- nômico e cultural, tudo que é funda- mental para o seu desenvolvimento integral como pessoa. Por isso uma ofensiva pelos direitos da criança pas- sa por uma mudança estrutural da so- ciedade, que permita a maioria margi- nal ascender aos benefícios da econo- mia. JMF - A dívida externa é um fator agravante, ou depende da política im- plementada por cada país, em relação

aos problema do menor? MG - Os governos têm sentido o quan- to a dívida externa afeta a questão do menor. Nos últimos anos vem crescen- do na Euiopi a preocupação e a ação pela defesa da criança e se espalhando pelo Terceiro Mundo. Nós temos cons- ciência que a defesa da criança sofre com a dívida. Sabemos que a dívida externa já foi praticamente paga.

JMF - Existe uma posição da DCI so- bre a prática do aborto? MG — Se ele acontece pela situação econômica da mãe, ou da família, nlo se pode condenar a mãe. A DCI é com- posta por diversas culturas e valores, e neste sentido se respeita o pensamento de cada pessoa. Não defendemos nem condenamos, mas se compreende a existência de violência econômica e respeitamos o direito de abortai. JMF - As informações mais recentes estimam em S milhões o número de abortos no Brasil no período de um ano.

■ I

. Martin Garate'' MG - No Brasil a situação é mais im- pactante pela quantidade. Mas a mes- ma situação de miséria e abandono existe na Colômbia, no Chile, na Bolí- via. E a tendência é da Argentina e do Uruguai entrarem poi essa mesma si- tuação.

JMF - Existe uma política da DCI quanto a questão da AIDS e o menor abandonado? MG - Depende muito da percepção ídeste problema. No Chile fazemos

um trabalho de informação e educa Ição paia a criança. Não tem uma regr [geral, depende da prioridade que cad país dedica. Na Bolívia a preocupaçã( maior é com a educação em relação i droga. Depende muito de como a po breza de manifesta... JMF - De que forma a DCI esta estrutu rada e como se dá o relacionamento no: diversos pontos do mundo?

'MG - Gostaríamos de manter uma rela ção mais intensa com as diversas oigani zações que trabalham com crianças, ma.1

ainda temos limitações. Existe um Comi te-Executivo que funciona por áreas (Eu ropa, África, América Latina e América do Norte), e cada representante faz fluii as propostas do Comitê, interagindo atra- vés da dinâmica do trabalho em cada país e dos informes que as diferentes se- ções enviam. O que pretendemos, pata breve, é criai uma rede de comunicação ide dados poi computadot, só com otga- inizações que trabalhem pela defesa das crianças. .,.

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Jornal Maioria Falante Outubro/Novembro - 89 Página 11

A Escravidão Infanto-Juvenil no Estado do Rio de Janeiro

por Willmann da Silva Andrade e Evahides José Raia

mO,E\J NÂO QUERO íRl i EU QUERO ESTUDAR

HZiÊQl

Nio é de hoje que o jornal MAIORIA FALANTE e a po- pulação deste Estado vem de-

nunciando o trabalho de crianças e

adolescentes nos canaviais da região de Campos e adjacências. Trabalho esse que lembra o período da Escravatura no Brasil.

Recentemente foi constatado e do- cumentado através das Autoridades a exploração de crianças e adolescentes pela firma latifundiária JAMORMA SERVIÇOS AGRÍCOLAS LTDA e seus Senhores de Engenho e bem como diversas empreiteiras prestadoras de serviços de extração da cana para as Usinas. Serviços estes executados por crianças e adolescentes sem formação física para o trabalho braçal, vítimas da sub-nutrição numagritante afronta ao Direito da Criança, já que os servi- ços prestados pelas mesmas, naquela região, são notórios serviços da época do cativeiro, ainda assim, devemos in- dagar daqueles Senhores de Engenho o seguinte:

Quantos escravos "crianças" são ne- cessários para cada Engenho?

Quantos no còmputo geral da Es- cravaria, seriam crianças e adolescen- tes?

Qual a taxa de sobrevivência é a sua, sob o regime Servil?

Qual é a massa de criança importa- da de outro Estado?

Achamos que os últimos aconteci- mentos ocorridos com as crianças nes- te Estado,ao que se refere á Explora- ção e Maus Tratos, é um caso de Polí- cia que merece uma investigação rigo- rosa colocando na cadeia os responsá- veis por tais agressões e interditando os "ENGENHOS, SIMPLESMENTE SENZALAS".-

REPIIMIQUE

Eleição de Diretoria de Entidade Afro

por Raimundo Santa Rosa

Em reunião realizada no dia 01 de outubro, no Centro Cultural José Bonifácio, os compo- nentes dos grupos Afros e Afoxés do Rio de Ja- neiro, elegeram a nova Diretoria da classe. Os representantes dos grupos Agbara-Dudu, Orumi- lá, Alafin Ai Ye, Ojó, Kti Dudu, Lemy Ayó. fi- lho de Dan, Águas de Oxalá, Olodumaré dos Palmares e Filhos de Gandhi, escolheram para Presidente Renato Branco, do Águas de Oxalá e Vice-Presidente Alcinéia Martins, do Agbara Dudu. Entre outros assuntos discutidos, esteve a questão das posturas do ano anterior e desem- penho da Diretoria passada.

O nome da entidade que era Associação de Grupos Afros do Rio de Janeiro, passa a se cha- mar Associação Cultural dos Grupos Atros e Afoxés do Rio de Janeiro, onde não restringe a participação de outras entidades que não seja Grupo Afro.

A próxima reunião da nova entidade tratará de assuntos sobre as novas diretrizes: o estatuto, a data do cocktail de lançamento, e posse da Di- retoria.

Axé X Igrejas Eletrônicas por Gesia de Oliveira

Quando no dia treze de maio co- memorava-se mais um aniversário da "Abolição da Escravidão" no Brasil, neste mesmo período, transitava na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, Projeto do Sr. Wilson Leite Passos, Vereador (PDS/RJ), conhecido por suas posições de direita. O pretexto mal disfarçado era proteção dos ani- mais mas tendo como objetivo cer- cear a liberdade religiosa da Comuni- dade Afro-Brasileira. num flagrante desrespeito à Constituição Brasileira.

Como senão bastasse isso, acaba de ser aprovada pela Câmara, o Proje- to do Sr. Vereador Vilso Macedo, considerando a Igreja Universal do Reino de Deus, entidade pública.

Gésia de Oliveira, dirigente do CEAP e do Instituto de Articulações das Religiões Afro-Brasileiras, trouxe ao JMF suas preocupações.

CONCEPÇÃO AFRO "É público e notório que as igre-

jas eletrônicas, entre as quais se in- clui a Universal do Reino de Deus, fazem campanha sistemática contra as Comunidades Religiosas Afro-brasileiras. Recentemente ado- taram as passeatas com cartazes nos quais escrevem: "Fora Exus, Cabo- clos e Orixás. Abaixo o Satanás".

Deturpam assim, valores e concei- tos religiosos e culturais afro-brasilei- ros, interpretando-os segundo seus próprios valores e sistemas de signi- ficação. E o que é mais grave, incitam o ódio religioso de seus adeptos, con- tra as religiões afro-brasileiras, regis- trando-se já por diversas vezes, casos de agressão física às pessoas e comuni dades de terreiros, não só no Rio de Jáheiro, mas em todo o Brasil.

As bases ideológicas sobre as quais alicerçam o racismo dessas igre- jas é a intolerância em querer a nega- ção de ser negro e de sua cultura. O desejo delas é tentar impor suas pró- prias concepções como verdades únicas.

Na visão do mundo africano, o homem é sagrado e o cerne de sua in- dividualidade é constituído com ma- téria de seu ancestral divino (Orixá) do qual herda as características do- minantes de sua personalidade.

É importante ressaltar que não fa- zemos proselitismo religioso, nem atacamos outras religiões, limitamo- nossa viver de acordo com as tradi- ções herdadas de nossos antepassa- dos.

Se as igrejas Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da Gra- ça de Deus, Igreja da Nova Vida, ata- cam as religiões afro-brasileiras não fossem movidos pelo ódio, não esti- vessem à serviço de projetos internos e externos de dominação, talvez lhes restasse sensibilidade para perceber a real significação de simbologia religio- sa afro-brasileira.

Constatariam que nossas visões de mundo são intrinsecamente ecológi- cas. Sua postura de integração, de res- peito e de parceria com a natureza não resulta de modismos pequeno- burgueses, diante da destruição do equilíbrio ambiental, provocado por uma visão de mundo européia, cujos valores máximos são o lucro e a ambi- ção desmedidos.

A postura ecológica do africano resulta de uma visão do Cosmo como uma totalidade.Está integrada de ma- neira dinâmica, transformadora, mas respeitando a natureza própria de ca- da ser. É essa visão solitária entre to- dos os seres, a responsável pelo res- peito a todo ser, mormente os seres

vivos, pois nessa visão de mundo é a vida. o poder de realização, o axé (força, energia).

Não esqueçamos que foi graças ao expansionismo colonialista dos antepassados do Sr. Wilson Leite Passos e, não africano, que incalcu- láveis riquezas naturais da América e da África foram e continuam a ser dizimadas impiedosamente, in- clusive o próprio povo destas re- giões.

Quanto ao ritual, simbolicamen- te a oferenda de animais, ou outras, propiciam a circulação de Axé entre a realidade divina e a realidade huma- na, sendo o sangue animal portador de Axé por excelência.

Como as divindades ou Orixás (e forças cósmicas) não são onipotentes, é fundamental a manutenção desta relação dialética entre o Olorum e o Aiyê, através das oferendas.

A oferenda de animais reveste-se de profundo respeito, cuja carne é consumida por todos os participantes da cerimônia que é pública.Esta gran- de refeiçãocomunitária possui impor- tante significação simbólica, reforço os laços de solidariedade grupai e o Axé de todos os participantes segun- do os princípios da visão de mundo, vivenciada nas comunidades - Terrei- ro-que, embora não esteja imune às influências da visão de mundo do- minante na sociedade, se estrutura se- gundo princípios inteiramente dife- rentes.

E finalmente, perguntaríamos ao Sr. Wilson Leite Passos por que não se preocupa com as centenas ou tal- vez milhares de crianças que morrem diariamente de fonte no Brasil? Cer- tamente, porque não se enquadram nos padrSes eugénicos defendidos por ele, e cuja defesa recebeu Comenda do Governo da Áustria.

Dudu Odara - fazendo escola

por Betão

O Bloco Afro DUDU ODARA provou que fazer festa não é ne- cessariamente fechar um determi- nado clube, vender ingressos e ter grandes atrações artísticas, de maior evidência nos meios de Co- municação dominante.

Dudu Odara teve opção para outros segmentos de nossa cultu- ra: os Blocos Mirins e os Co-irmãos sem a pretensão de ser o maior en- contro afro do Rio de Janeiro esse bloco, com apenas um ano de existência teve a ousadia, coragem e felicidade de optar pela festa de rua . onde não poderia ser melhor.

As comemorações do primeiro aniversário tiveram início com uma Missa rezada pelo Pároco da Irmandade de Santa Anastácia, após a qual deu-se início 'as ativi- dades infantis com o Grupo "Va- mos Brincar de Quilombo", com oficinas e brincadeiras com as crianças presentes. Tiveram tam-

bém aprescntaçõc>. de Baterias Mi- rins das Lscolas do Samba Man- gueira, Vila Isabel e Império Uo Futuro, além do Grupo de Dança c Capoeira do Morro do Fubá.

Á noite (oram os Blocos Afros que não deixaram barato suas apresentações. A cada momento a festa tomava um pique mais quen- te.

Até a manhã do dia seguinte ainda havia dezenas de pessnns no local, dando a impressãoileque ;i festa não terminara

Tem sido imiito comentada J

festa, o que repercute positivu- mente para a Diretoria do Bloco Dudu Odara. sinalizando o cami- nho certo também para os demai» Grupos Alros.

São Diretores do Duda Odara: Botão - Paulo Braga - Már- cio - Roxo - Jorge Luiz - Pe- rez - Aírton - Nelson - Cris- tina e Luiz, que muito contri- buíram para o sucesso do evento.

Valeu DUDU ODARA.

BLOCO AFRO CARNAVALESCO DUDU ODARA Rua Clara Nunes, 170 ■ Madureira RJ • Tal.: (021) 351-1102

ODARA C.G.C. 32.271.230/0001-69

Terreirão (Ensaios) - Sábados a partir das 20,00 hs.

Som Afro - Reggae - Calípso Aulas de Dança e Capoeira -

Gratuitas

Informação com o Diretor Social (Retio)

3.a e 5." a partir das 19,00 hs Sábados a partir das 16,00 hs. i

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Página 12 Outubro/Novembro-89 Jornal Maioria Falante

Creche Comunitária: realidade ou ilusão

por Maitê Barros

A realidade das creches comunitárias, nos obri- ga a transcrever realida-

des e ilusões. É importante que a reflexfo seja em cima do que chamamos, ótica científica. Se- nSo vejamos: o sistema vigente visa a preservar e fortalecer a do- minação de classe. Para isso se impõem uma política educacio- nal que satisfaça unicamente seus interesses. Através da polí- tica educacional no sentido mais amplo, a classe dominante ob- tém e amplia a legitimidade do sistema político que serve à sua dominação, através da ideologia que corresponde aos seus interes- ses e de combate as contra-ideo- logias. A partir daí, podemos as- segurar que a grande realidade das creches comunitárias, nada mais é que o reflexo da citada política educacional.

O dia em que as creches co- munitárias oferecerem às crian- ças alimentação rica em proteí- nas, lipídios, glicídios, hidratos de carbono, vitaminas, etc. O dia em que as creches comunitárias oferecerem às crianças todo um estímulo a partir da valorização do seu corpo, criatividade, per- cepção, sensibilidade, defesa de identidade.

O dia em que as creches co- munitárias forem contempladas pelos artigos constantes do De- creto n.o 69.514 de 09.11.71 que dispõe sobre a execução de medidas de proteção materno-in- fantil, competência do Ministé- rio da Saúde, e a portaria 3296 MF de 03.09.86 e outras, e ocu- pe em média área cujo total da construção seja de 500 a 700 m^.

O dia em que as creches co- munitárias tiver em sua equi- pe técnica, arte-educadores, nu- tricionistas, psicólogos, assisten- tes sociais, treinando pessoas da •comunidade, trocando saber: aí então a ilusão será vencida pela realidade. Temos em mãos, leis, decretos, portarias, aprovadas pela consolidação das leis do tra- balho, relação de mais de 316

creches conveniadas, com órgãos públicos, livros, manuais, discur- sos, pronunciamentos. Não fun- ciona, são letras mortas no pa- pel, falácias.

Existe no Brasil, 25 milhões de crianças na faixa etária de 0 a 6 anos. A proporção de mães de crianças pequenas que trabalham fora, tem aumentado assustado- ramente. Em cada 3 crianças, uma mãe trabalha fora, segundo dados de 1977, enquanto em em 1970 em cada 7 crianças uma trabalhava fora. Se refle- tirmos, rapidamente, vamos en- contrar o fio da meada. Vamos saber que o exército de reserva, começa a ser cultivado pelos dominadores, quando o nenê ainda está no ventre. À creche comunitária é o segundo passo, outros muitos outros devem ser dados.

Que alegria para uma mãe, quando consegue uma vaga na creche já pode trabalhar descan- sada. Terá esta criança um aten- dimento educativo complemen- tar ao da sua família e com ela partilhada? E a empresa será que está atendendo a portaria 3.296 de 03.09.86 e o Decreto 93.408 de 10.10.86 e Instrução Norma- tiva 1% de 22.07.87? Será que quando for freqüentar o Jardim da Infância ou o CA. (classe de

alfabetização), terá o rendimen- toesperado?

Quem conseguirá terminar o 1.° grau? Será que a repetência e a evasão escolar, já não ronda esta criança nos seus primeiros anos de vida na creche comunitá- ria? É uma evidência. Os domi- nadores necessitam minar pes- soas, milhões de pessoas que os perpetuarão no poder. E nós... O que fazemos? Como conscienti- zar, possibilitando a consciência crítica de mães, avós, tias e tios, pai e vizinhança?

O fio da meada está sendo pu- xado, com muito cuidado. O pri- meiro encontro de creches co- munitárias, realizado em 14 de outubro, contou com o apoio do Centro de Articulação de Po- pulações Marginalizadas (CEAP), do Jornal Maioria Falante, da Creche Comunitária, do Comitê Contra a Discriminação Racial e Social (Raciso) e da 29.B Região Administrativa Comunitária do Complexo do Alemão, de traba- lhadores das mais diferentes áreas, interessadas nesta questão.

E resultou na formação de uma comissão composta por mi- litantes do movimento popular, encanegado de organizar o Fó- rum permanente de Creche Co- munitárias. Maiores informações, tel: (021) 224-6771 e (021) 252-2302 (Maitê, Wanda, Beth).

ENCONTRO DE CRECHES

COMUNITÁRIAS

Encontro de Creches Co- munitárias cria COMISSÃO EXECUTIVA, popular, en- carregada de organizar o Fórum permanente de Cre- ches Comunitárias.

Com esta finalidade fo- ram eleitos:

- Cleide Silva - Casa Santa Marta.

— Elisabete Carvalho - Creche Cantinho feliz - Santa Tereza.

— José Pinto — Centro Comunitário Eliana Satur- nino Braga - do Morro da Baiana.

- Odete Carvalho - Ir- mandade Santo Antônio de Pádua - Morro,de São Car- los.

- Deley de Acari. — Wanda Ferreira de Oli-

veira — Grupo Meriti Mais Mulher.

0 ensino da Sociologia vai ser obrigatório no Segundo Grau

por Jorge Barros

Por decisão da Assembléia Constituinte Estadual os depu- tados do Rio de Janeiro aprova- ram a inclusão do ensino da so- ciologia nos cursos de 2.° Grau da rede escolar pública e priva- da. A decisão que acompanha medida semelhante de outras

assembléias legislativas estaduais, possibilitará aos estudantes o acesso a informações sobre a organização social, econômica e política do Brasil dentro de um marco que possibilite o res- gate da cidadania dos jovens flu- minenses que conseguirem al- cançar e curse secundário.

Com o ensino da sociologia os estudantes terão ricas discus-

sões sobre alguns conceitos tais como: ideologia, classes sociais, classes dominante, burguesia, proletariado, hegemonia, poder, modo de produção econômica e outros fundamentais para a com- preensão da sociedade em que vi- vemos. É mais um instrumento importante para a construção de uma sociedade livre e democráti- ca.

Reflexões no âmbito da Cultura X Educação

por Lourdes Peixoto Nogueira

A dificuldade de se lidar com a questão cultural nesse país pode ser re-

tratada, ainda hoje, na frase de Sérgio Ricardo para o filme "Deus e o Diabo na Terra do Sol", de Glauber Rocha: "O Sertão vai vi- rar mar, o mar vai virar sertío"; litoral e interior se opõem numa relação em que à dificuldade da vida no sertão se opõe ao sonho de vida no litoral.

A primeira vista se poderia di- zer que em contraposição a uma cultura tnteriorana tão agredida em suas raízes estaria uma cultura litorânea, urbana, sedimentada: ora, se a relação não é estanque a grave questão social do país, prin- cipalmente no campo, interpene- tra sertão e litoral através da che- gada constante de retirantes aos grandes centros urbanos.

O tratamento dado, em certos casos, tanto pela história como pela literatura a determinadas questões nacionais evidencia a preocupação das nossas elites em trazer sempre à tona um país uni- forme, sem quaisquer conflitos: Antônio Conselheiro e a popula- ção de Canudos foram massacra- dos duplamente; primeiro, com a guerra, e depois, pelo Golpe de 64, através da inundação da região para evitar romarias. Outro Conse- lheiro, o Aires, de Machado de As- sis, quer inaugurar a nova história do Brasil, rasgando os documen- tos sobre o tíáfico de escravos.

Se somarmos a tudo isso o fa- to de que ainda bem recentemen- te no finai do século XIX - se procurava o caráter nacional da li- teratura brasileira, através da defi- nição do homem brasileiro; de quem era 1928 Mário de Andrade procurava responder a essa per- gunta com o seu Macunaíma e que há pouco tempo, a publica- ção de um manifesto denunciando o assassinato da natureza pluricul- tural brasileira pelos meios audio-

visuais de comunicação, vereipos que, no bojo da discussão, está a chamada identidade nacional, on- de se embute a questão da cultu- ra.

A escola, tradicionalmente, não discute essas questões, sim- plesmente as ignora. Considera cordial uma história com confli- tos, considera homogênea uma clientela heterogênea e parte do princípio que a cultura desse país se expressa no eixo - Rio-São Paulo -, é branca, com os valores de classe média. Dessa forma a transmissão de conteúdos se pro- cessa num código indecifrável ao aluno.

Numa sociedade de classes, a criança chega à escola, sem uma identidade própria, com sua per- sonalidade fragmentada. A função da escola seria resgatar a totalida- de desse aluno, ajudando-o no co- nhecimento de si próprio, da rea- lidade que o cerca, no reconheci- mento de uma identidade comum, coletiva e da possibilidade de transformação dessa realidade.

A questão da cultura no con- texto escolar é fundamental ao desenvolvimento desse processo:

1.° - Numa concepção mais ampla, valorizando diferentes for- mas de manifestações culturais, considerando que além da cultu- ra da classe dominante existem outras formas de expressão oriun- das das camadas'populares.

2.° - Dinamizando tais for- mas de expressão com a finalidade de preservá-las.

3.0 - Pesquisando, no contex- to cultural de cada comunidade as suas formas próprias de expressão não só para incentivá-las, como para incorporá-la?*à prática edu- cacional.

Desse modo, num processo de construção do conhecimento, o aluno deixa de ser apenas a soma de valores que lhe são impostos pela mídia da classe dominante.

(•) Professora de Língua Portuguesa.

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Jornal Maioria Falante Outubro/Novembro-89 Pái gina 13

Uma Escola "Aberta JJ

por Venicio da Cunha Fernandes

Escola aberta: escola informal,, sem currí- culo? Escola formal

democrática?

Sob a designação Escola Aberta, podemos compreen- der a escola informal despreo- cupada com o estabelecimen- to de um currículo, a partir do qual todas as atividades pedagógicas seriam desenvol- vidas, e voltadas para a forma- ção do indivíduo, tendo co- mo princípio e fim, a liberda- de dele.

Também podemos com- preender, sob a mesma desig- nação, a escola formal, presa a um currículo e democrática, no que concerne à sua gestão administrativa e pedagógica; aquela que todos os seus seg- mentos - alunos, professores, funcionários, diretores, pais de alunos — participam do princípio ao fim de todo pro- cesso educacional.

Poderíamos agora, depois de apresentar estes dois pon- tos-de-vista, defender um ou outro, todavia, antes disso, procuraremos focalizar a es- cola atual: como ela se en- contra? Que papel ela vem de- sempenhando na Sociedade?

A escola mudou, não po- demos negar. Não há mais as varas de marmelo, os grãos de milho e os caroços de fei- jão - tjunbém, os marmelei- ros foram cortados, o milho e o feijão ficaram caros e o salá- rio do professor... que horror. Contingências...

A escola de hoje está defa- sada de seu tempo; enquanto o mundo evolui numa veloci- dade espantosa, ela segue a

passos lerdos e descompassa- dos. Sua tecnologia continua a mesma: o giz e o quadro e, quando muito, um mimeógra- fo à álcool. Além disso, per- manece dissociada do contex- to social.

As profissionais que atuam nela, os professores, conti- nuam como bonecos de ven- tríloquo. Não questionam a função que lhes é outorgada pelo próprio sistema: a de for- madora dos indivíduos.

Estes, para eles, são como cofre onde depositam conhe- cimentos e mais conhecimen- tos.

É difícil determinar a qua- lificaç|o profissional dos nos- sos atuais educadores (dó ter que constatar isso).

A hierarquia dos cargos su- planta a necessidade de envol- ver todos os seus segmentos - alunos, professores, funcioná- rios e direção numa propos- ta de ação educacional inte- grada. O Professor está subor- dinado à direção das escolas, dos currículos escolares e conteúdos programáticos. Por sua vez, no caso das escolas públicas, a direção se subme- te às diretrizes das secretarias municipais e estaduais de edu- cação. Sendo assim, quem as- sume as responsabilidades pe- los erros e acertos da própria escola?

Geralmente o professor é quem mais falha (quando não cisma de culpar os alunos), as direções, as secretarias muni- cipais e estaduais de educação as que mais acertam. Assim,a escola não para para reflitir sobre as suas falhas e os seus acertos; sobre o papel de cada sujeito da educação. Não per- cebe, ou não quer perceber, que a Educação é um proces- so, e que esse processo requer que, ao fim de cada ciclo de trabalho, se observe, e avalie os resultados refletidos no de- senvolvimento humano e inte-

lectual dos alunos, e não suas notas e reprovações.

Comparo a escola atual à Camicleta do Xazam e Sheri- fe (um seriado que passou há anos na TV), no que o tempo passa ela vai largando os seus trapos pingentes pelo meio do caminho, até ficar na carcaça.

Pensar numa Escola Aber- ta é pensar numa escola onde a atenção dos sujeitos da edu- cação esteja sempre volta- da para cada passo dado, para que as mudanças pelas quais o mundo vem passando, no que diz respeito à moral, à tecno- logia e a cultura. Essa mesma escola deve estar sempre apta a digerir e selecionar o que de melhor as mudanças e os pas- sos dados lhe oferecem.

Enfim, por Escola Aberta, compreendo a escola ciente de seu papel e de sua função social, a escola que está ligada intimamente com o tempo e o espaço onde se situa, a esco- la sempre aberta às mudanças pelas quais o mundo passa. Nela o professor, aluno, fun- cionário, direção, pais dos alunos e comunidade devem ser responsáveis de fato pelas ações educacionais que se su- cederem.

Dentro da atual realidade da escola, observo que para haver qualquer mudança será necessário que ela se veja no espelho, abra seu quarto escu- ro, cure o seu xenofobismo, que seus segmentos consti- tuintes revejam o seu papel dentro dela, assumam a res- ponsabilidade de seus atos e estabeleçam diálogo franco entre si.

Acredito que, com a cons- tituição de uma Escola Aber- ta, Autônoma e Democrática, o panorama da educação bra- sileira será transformado e em conseqüência, as relações hu- manas e sociais.

(,) Professor de Língua Portuguesa e Coordenador

de Animação Cultural.

*&£ l^

Livros Infanto -Juvenis

I) MENINA BONITA DE LA- ÇO DESFITA - Ana Maria Machado Editora Melhoramentos. - História de uma menina

negra e suas conversas com um coelho intrigado com sua cor da pele. No final ele descobre o segredo.

Recomendado pela profes- sora Maria de Lourdes Rocha, língua portuguesa, ex-coorde- nadora da saía. de leitura do CIEP Presidente Agostinho Neto.

II)flISTÓRÍA DE TRANCO- SO - Joel Rufino dos Santos Editora Ática. - História que prende o inte-

resse do leitor. Muito apreciado pelas crianças tanto pela narrati- va quanto por suas ilustrações.

Recomendado pela professora Assunção de Maria da Silva — al- fabetizadora, licenciada em His- tória. III) NA PRAIA - Nair de Medei-

ros Barbosa Editora FTD. Indicato como sugestão para

ser trabalhado em turmas de ai- fabetização por apresentar voca- bulário fácil, beleza plástica das ilustrações e interessante história que prende a atenção do leitor.

Recomendado pela Professora Elierte Santos, alfabetizadora e fono-audióloga.

OMEGRINHO

GANG^ZUMB/^

IV) O NEGRINHO GANGA ZUMBA - Rogério Borges.. Editora do Brasil S/A.

- História interessante onde o autor mistura realidade, sonho e fantasia. Ele retrata a vida de um menino de forma fascinante

De fácil interpretação para adultos e crianças.

Recomendado por Elizabeth Carvalho, educadora da creche

comunitária Cantinho Feliz (San- ta Tereza).

«òLWr • 'xjt 2«,A-«r—v

V)CASA DE CARAMUJO - Zé Zuca. Editora Vozes. Coleção maravilhosa pelas his-

tórias de forma original. As ilus- trações completam a beleza da obra que prende o interesse de adultos e crianças, mesmo as pe- quenas e não alfabetizadas.

Sugestão de Paula S. Souza Ferreira - aluna da l.a série - CAP/UFRJ.

VI) NA TERRA DOS ORIXÁS Ganymedes José. Editora do Brasil Literatura infanto-juvenil

com belíssimas ilustrações de Edu Andrade. A narrativa em- polgante conta a história dos orixás africanos.

Recomendado por Zenaide Wemeck de Azevedo, professo- ra, elemento da equipe do De- partamento Cultural do DGAC/ SME;

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Página 14 Outubro/Novembro -89 Jornal Maioria Falante

que rola na comunidade escolar de Jardim América

por Eliane Souza

A sala de leitura do CIEP Graciliano Ramos, de Jardim América, coor-

denada pela professora Marilene tem por objetivo desenvolver um trabalho que atenda à política educacional de resgate da escola pública, enquanto instituição prestadora de serviço educacio- nal de qualidade à clientela das camadas populares.

A dinâmica desenvolvida ba- seia-se em atividades que possi- bilitem despertar no aluno o gos to pela leitura, que auxiliem o professor na dinamizaçâo de al- guns conteúdos, que trabalhem o emocional do aluno a partir de sua realidade e em projátos

que dêem oportunidade ao alu- no, elaborar seu próprio texto, bem como exercer, precocemen- te a sua cidadania, através de um processo eleitoral, elegendo um nome para a sala de leitura; por exemplo: Os projetos "Quem pinta um conto, aumenta um ponto" e valorize sua sala de lei- tura: Dê um nome para ela", tem o apoio dos professores regentes, de Educação Artística e da Ani- mação Cultural e estão sendo de- senvolvidos pelos alunos do "CA" à4.a série.

O projeto "Quem pinta um conto, aumenta um ponto" teve como incentivo a história infan- til "Bom dia, todas as cores" e sob a orientação da Professora Ana Cirene, os. alunos pintaram os painéis da história vencedora

"O palhaço sem amigo". Profes- sores e funcionários doaram pla- cas de eucatex para a pintura dos painéis, morim para a confecção dos livros de pano e livros infan- tis para a premiação das histórias vencedoras e o comércio local, as tintas.

Coube a Profa. Marta a orien- tação quanto à confecção dos li- vros de pano e os convites para o evento que aconteceu no dia 25 de setembro como culminância do projeto.

Foram premiadas as seguintes histórias infantis: 1.° lugar "O Palhaço sem amigo" - de Márcio e Júlio; 2.° lugar - "A Árvore Mentirosa" - de Sidney, Ander- son e Sérgio;3.° lugar - "A Flo- resta Encantada" — Roselaine; 4.° lugar — "A Árvore que Que-

ria Cantar" - Anderson; 5.° lu- gar - "A Casa Abandonada e Assombrada" - Vanderley.

Com o incentivo do projeto "Valorize sua sala de leitura..." foram lidas as histórias infan- tis — "Maria-vai-com-as-outras", "Nicolau tinha uma idéia..." e "Zero Zero Alpites" que revelam à criança a importância de uma identidade pata as pessoas, plan- tas, animais, lugares, objetos, etc. A partir deste fato, os alu- nos escolherão o nome para a sala de leitura, que se condizen- te e fruto do trabalho reflita a sensibilidade e a crítica dos alu- nos.

II - "Verdejar" - em defesa do meio ambiente. A coordena- ção de Animação cultural do CIEP Graciliano Ramos desen-

volveu este projeto e premiou o texto da aluna Simone Muniz Moreira, da 4.a série — 2.° lu- gar no concurso de redação - A Natureza.

A NATUREZA A natureza é bela, mas se as

pessoas não tiverem cuidado, ela pode ser um desastre. A natureza está sendo destruída, ela está sendo destruída por nós. As pes- soas estão destruindo a natureza, elas não estão vendo o que fa- zem. A natureza deve ser bem tratada, principalmente pelas pessoas. Você já pensou se não existissem mais árvores?

Eu, plantaria a última semen- te e cuidaria dela com muito cui- dado e carinho.

Eliane Souza É professora e Coordenadora do MAIORIA EDUCAÇÃO.

Almanaque da Super Turma

"Nosso trabalho evoluiu num grupo de alunos do CIEP AMILCAR CABRAL, de Bangú.

Haviam muitas oficinas e estávamos pensando em mais uma, que é a nossa oficina de histórias em quadrinhos.

Haviam várias pessoas, e foi diminuindo até ficarem três alunos."

QUEM SOMOS NÓS

Alex Sandro Silva Jesus — 13 anos - Turma 601

Wellington de Souza e Silvai - 13 anos - Turma 601

Sérgio Gustavo de Macedo Silva - 12 anos - Turma 601.

APOIO:

Animação Cultural.

DE BANGU

Exposição de Artes Populares

Lançamento da banca perma- nente de revista em quadrinhos — l.a edição do almanaque da da super turma.

Apoio: Animação Cultural (Marquinho).

UMA ALTERNATIVA PEDAGÓGICA

PALESTRA SOBRE MAKARENKO COM RENÊ CAPRILES

DIA. 06 DE NOVEMBRO DE 1989

ÜOCAL: CIEP TANCREDO NEVES

Rdo Catete,77

HORÁRIO: 18 h. ÀS 2ih.

INFORMAÇÕES: SECRETARIA MUNiCIRU. DE EDUCAÇÃO 3***TA^NTp VWm-en*. 1 ,^1

"Uma visão crítica da educação do negro nos cem anos de República", foi o tema da palestra realizada pela Prof.a ELI GOMES PACHECO, colabora- dora do Caderno de Educação do Jornal Maioria Falante no VIII Simpósio de História promovido pela Universidade Federal do Espírito Santo, de 02 a 06 de outubro de 1989. Também participaram do Simpósio LUIZ CARLOS PRESTES, EDGAR CARONE, RENATO PACHECO, e outros.

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Jornal i à^ Outubro/Novembro - 89

NARCOTRÁFICO: quem lucra ? Página 15

por Juan Chalimín

E muito difícil abordar um tema tão delicado. Certamente caímos em

dois riscos. 0 1.° é ser confundi- do como defensor dos tóxicos, e o 2.°, como ingênuo, sem notar o que há por baixo dos panos. De qualquer modo, deve-se ten- tar ver além, apesar deste tema ser complexo, portanto farei uma análise pessoal e depois, ce- derei o espaço para um outro.

que ao meu entender conheça mais a psicologia dos poderosos.

A questão das drogas deixou de ser somente um problema de traficantes e policiais e tem se transformado — pelo menos nos EE.UU. - em uma guerra santa. À primeira vista parecia ser jus- to, pois quem não condena o ter- rível flagelo que é o tóxico e a sua dependência?

Para os EE.UU. é necessário enfrentar a luta ern sua origem - nos centros de produção e pro- cessamento — e por meios emi- nentemente repressivos. Este seg- mento que não dá ênfase à de- manda como gerada da oferta, não só encobre a realidade mer- cantil-financeira da questão das drogas, mas também tem um cla- ro objetivo, ou seja, transferir os custos das drogas, senão tam-

bém, tem o lado político, que é de transferir os custos da lula aos países onde se cultiva, pro- duz, processa e inicia o tráfico de entorpecentes.

QUEM LUCRA ? De todas as formas, como já

dissera, deixo aqui o espaço, pa- ra ilustrar com a opinião de al- guém que conhece mais os norte- americanos, o Comandante Fidel Castro, segundo o discurso pro- clamado em 17/9/87, ele dizia: ..."Vocês sabem por experiência, a tragédia que significa o merca- do e o desenvolvimento da pro- dução de drogas, criado pela so- ciedade de consumo; porque foi a sociedade de consumo, o mer- cado que deu vez ao tradicional hábito do cultivo da Icoca na Bo- lívia, no Peru e em outros países, um hábito ancestral milenar, não como droga, mas como um chá, ou se fosse hábito de tomar café. Entretanto, este costume foi convertido em um grande comér- cio internacional.

A culpa do crescimento da coisa como droga, está lá nos EE.UU., entretanto eles prefe- rem reprimir fora dos Estados Unidos, e com isto matam muita gente de fome. Gente que não tem outra alternativa do que cul- tivar COCA, mas eles querem re- solver o problema com métodos repressivos e não mediante cola- boração econômica, com atenua-

ção da díviaa externa, para que ps países possam desenvolver-se, garantindo emprego para todos, para o operário ou o camponês. Não permitir o uso de pesticidas.

O que nos revolta é ver que ps EE.UU. não reprimem destaJor- ma lá, no seu país, mas sim na América Latina. Eles que já pro- duzem a Cocaína sintética. Tal- vez por isto que eles tenham que acabar com os que produzem a droga natural.

Todo mundo sabe que o prin- cipal produtor de maconhas do mundo é o EE.UU., com um va- lor de 18 bilhões de Dólares e que o milho que no passado fo- ra o principal produto dos ame- ricanos, hoje ocupa o segundo lugar.

Eles agem assim porque sa- bem que o consumo da droga é filho do sistema capitalista. Eles que educaram o seu povo com idéia do excesso, do esbanjamen- to, como poderão contê-los ago- ra?

Somente se combaterá o nar- cotráfico com a conquista de trabalhos dignos, como educa- ção, sem prostituição, da moral.

Tudo isso será solucionado com unrgoverno popular, do po- vo e para o povo. Convém medi- tarmos... Já estão próximas as eleições na América Latina.

• Militante de esquerda e defensor dos Direitos Humanos.

CHILE: a vez da democracia

Este final de década consolidará a retomada democrática na América do Sul. Aos poucos, a política do endurecimento militar, vai sendo trocada por regimes civis, é verdade que ainda atrelados a ditadura

do FMI. A reta final das eleições no Chile, depois de quase vinte anos, poderá coincidir com o provável 2.° turno das eleições no Brasil, quando também, se elegerá um presidente em período maior de abstinência.

Ao ouvir os refugiados chilenos, Gabriel Maureira, ex-militante do movi- mento de esquerda revolucionário e Gabriela Gordova, militante do Partido Socialista do Chile, constatamos os contornos imprescindíveis daqueles que não se deixam amortecer diante da opressão.

Jornal Maioria Falante: Como se apresenta a esquerda no Chile, às vés- peras das eleições de 14 de dezem- bro? Gabriel Cordova: Quando se fala em esquerda no Chile, deve-se compreen- der os marxistas-leninistas. A campa- nha do plebiscito conseguiu uma am- pla aliança com os partidos Social- Democrata, o Socialista e a Esquerda Cristã, mais tarde com o Partido Co- munista e o Partido pela Democracia. Conseguindo-se, assim, a vitória do "Não" a Pinochet. Depois se criou uma nova aliança que levou a candi- datura de Patrício Aylwin, um mili- tante da Democrata-CristS, como candidato único. Gabriel Maureira: A primeira cons-

tatação é que a esquerda está mais dividida do que em 73. Naquele tempo, o bloco revolucionário (MIR) e alguns segmentos do Partido Socialista e a outra, a Unidade Popu- lar, de Salvador Allende. Hoje esta divisão não existe. A maioria do MIR acompanha o PC. E surgiram outros partidos como o Partido pela Democracia (PPD). O Partido Socia- lista fragmentou-se em quase 17 par- tidos. O MIR subdividiu-se em três e a Frente Democrática Manoel Ro- driguez (FDMR) nasceu com um gru- po do PC, encarregado da luta arma- da. Agora, um segmento forma com o MIR Pascal Allende - outra dissi- dência do MIR - uma aliança... .JMF: Como se dão as alianças?

Gabriel Moureira: Depende dos obje- tivos a atingir. Há três grandes blo- cos da esquerda, a Esquerda Unida (IU), que constitui o Partido Amplo da Esquerda Socialista (PAIS), for- mado pelo Partido Comunista Chile- no, o Partido Socialista Almeida, o MIR Maioria e a Esquerda Cristã. Outro grupo é a Esquerda Social Democrata, formada pelo Partido Pela Democracia e outros. E por último, a Esquerda Armada, inte- grada pela Frente Manoel Rodri- guez, o MIR "Pascal Allende", o Amapu Lautaro, etc. Destes o gru- po PAIS tem a consciência que foi derrotado e que precisarão ganhar o tempo perdido... Gabriel Cordova: O plebiscito não quis Pinochet e mostrou que não querem a luta armada. Por isso, tem-se que em primeiro lugar, ele- ger o Patrício Aylwin...

"No Brasil: A esquerda no governo dará maior chan- ce a participação social, com mudanças reais e profun- das".

JMF: Se a luta armada perdeu, qual será a alternativa? Gabriel Moureira: A alternativa é aprofundai o caminho andado. Lu- tar por mais espaço político, liber- tar os 500 presos políticos que estão no Chile. No Chile, ninguém tem dú- vida que Patrício Aylwin será o ven- cedor, o próprio Pinochet reconhece isso. A partir de 90, i esquerda deve- rá lutar por rflaior representação po- pular, mas a demanda fundamental é estabelecer uma Assembléia Consti- tuinte. . _

JMF: Há possibilidades de um no- vo golpe militar? Gabriel Maureira: A política com os EUA não deve interessar um golpe... Gabriel Cordova: ..E porque também Patrício Aylwin tem o apoio da de- mocracia cristã internacional, dos Es- tados Unidos e da Social-democrata. Agora junto às eleições presidenciá- veis no Chile haverá dois testes com a eleição para senadores e deputados. O gancho real foi o plebiscito ae julho, quando fixou para 4 anos o mandato de governo e não 8 anos, como fizera Pinochet.

JMF: Haverá espaço para o Comunis- mo? Gabriel Maureira: Acho difícil, pois a Democracia Cristã é o principal parti- do. O segundo maior é o Partido Pela Democracia. O que fica claro é que o PC continuará forte no meio sindical e estudantil. Gabriel Cordova: Havendo espaço pa- ra a esquerda se organizar, haverá maior liberdade para que haja maior trabalho de massa.

JMF: Como se explica o partido de Patrício Aylwin comprometido com o golpe no passado e agora este apoio do seu nome, dado pela esquerda? Gabriel Cordova: Muitos partidos de esquerda não engoliram bem isto. É preciso trabalharmos juntos, desde que não fira determinados pontos. Gabriel Maureira: No Chile há mui- tos que não votariam em Aylwin, mas outras opções seriam piores. JMF: Vocês estão vivendo no Brasil, atualmente,' como encaram as elei- ções por aqui? Gabriel Maureira: Hás pessoas que não pensam no Brizola como esquer- da, por ele ser populista. Eu tenho medo que sendo o Brizola eleito, pos- 5a. acontecer o que houve com. o

por Togo lomba e Juan Chalimin

Allende. no Chile. A burguesia tem medo dele, como no Chile tinham do Salvador Allende.

"A esquerda chilena está mais dividida do que 73".

"O Patrício Aylwin será o futuro presidente chile-

no'

Gabriel Cordova: Me preocupa a subi- da do Afif. Já imaginou chegar no 2.° turno, o Afif e o Collor? Gabriel Maureira; Penso que se a di- reita ganhar, não haverá espaço para o fascismo. A ditadura já passou. Se a direita ganhar, eles terão maiores possibilidades de renogociarem a dívi- da com o FMI, mas o trabalhador te- rá que pagar por isso. Com a direita, as reformas estruturais não se confi- gurarão. Agora a esquerda no poder, seja com Brizola ou Lula, dará a maior chance para a participação so- cial, com mudanças reais e profundas. JMF: Mudando de assunto, como vo- cês vislumbram a política econômica européia a partir de 92, com a unida- de? Gabriel Maureira; O Patrício Aylwin acabou de visitar a Alemanha, Espa- nha, França. E ele foi como se já fosse o presidente. O ministro italia- nos Júlio Andreotti telefonou para Aylwin, confirmando a relação conr o Chile, a partir de agora, mesmo an- tesklaseleições. Quanto a questão eco- nômica é preciso dizer que muitos países mantiveram uma diplomacia fria com o Chile, mas uma relação co- mercial muito quente. Acho que isto não vai mudar.

Page 15: Um serviço de combate ao racismo e ò discrímino;ão · pensarmos que até o início dos anos 80, o discurso do movimento antagonizava as figuras de Ganza-Zumba, como o negro que

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IX Encontro de Negros Norte-Nordeste

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uma nova ordem social, capaz de transformai e recriar a realidade.

"...estamos tendo grandes avanços, na medi- da em que são colocadas todas as contradições e retrocessos. Isto é um sinal de crescimento." (Wanda Maria Ferreira - Diretoria da Divisão de Educação e Cultura do Sistema Penal - RJ)

"...me parece que aqui vai sair uma coisa mais diferenciada dos outros encontros, mais político em termos de lutas para transformar es- ta realidade de opressão que o negro vive no Brasil." (Jairo Pereira - Instituto de Articula- ção das Religiões Afro-brasileiras-RJ)

"...No momento em que o negro se unir ele vai destruir esta minoria que está aí, ele vai re-. verter a situação, ele vai tomar o poder. Não é esse poder que está aí, mas um poder sem opressores e oprimidos, um poder socialista, um poder mesmo de povo para povo." (Ana Célia - Militante do M N de Salvador).

"...As discussões do Movimento Negro não atingem as camadas mais populares. O que a gente vê? Uma reprise de discursos convencio-

nais de lideranças que está desgastado." (João Batista Santos - Militante do M N de Sergipe).

"...infelizmente nós não estamos saindo da- qui com nada para Recife de novo. E não é por- que não tenha nada de novo é simplesmente a dinâmica. Ela está falha. (...) O Movimento Ne- gro Norte/Nordeste não está pegando a essên- cia, a proposta: discutir do ponto de vista da realidade específica dessas regiões para estabele- cer a unidade real. (...) O Movimento Negro não tem um programa referencial que oriente a atuação desse militante nos vários espaços aon- de ele ocupa. O pessoal termina confundindo as coisas, transformando a ocupação de espaços num fim e não num meio para levar adiante uma proposta de transformação social sob o ponto de vista do negro." (Marcos Pereiras- Militante dosM N U e presidente do Sindicato dos Bancários - Pernambuco)

"...Momento em que os negros, segmento importante da sociedade brasileira se reúne para discutir a sua organização e a sua intervenção na vida política da sociedade brasileira". (Edson Santos - Vereador do P C do B - RJ).

João Jorge, do Crupo Ülodum (BA) foi um dos organizadores

por Sueli Fontes e Vilma Costa

O Encontro teve como tema central "O Negro c as relações de poder, o Estado e os partidos políticos". Este, possibilitou uma reflexão no i

sentido de entender a participação política co.- mo um exercício importante da cidadania e da disputa do espaço também no plano institucio- nal. O que nos remete a uma questão: que con- cepção de poder possui, o Movimento Negro? Ouo cuidados precisamos ter para não reprodu- zir a concepção dos dominadores.'

Ficou claro que o Movimento Norte/Nordes- te está procurando caminhar de forma articula- da com o movimento social do qual é parte in- tegrante. 0 movimemo sindical e o comunitá- rio por exemplo, se fizeram representar através das lideranças do Movimento Negro.

Destacamos dois pontos que mereceram atenção especial nas discussões: (1) garantir que o movimento seja autônomo e indepen- dente, direcionado pelos seus reais interesses, não admitindo-se, portanto, o atrolamento a partidos políticos; (2) investir na formação de quadros, como forma de capacitar a militáncia

para o embate'político e a conquista de esnaçn neste terreno.

Foi significativo a existência de um encon- tro que conseguiu aglutinar tanta diversidade. Um momento de estímulo, ampliação e fortale- cimento da militáncia, apontando ainda para uma maior articulação a nível nacional, t^ntre- tanto as conclusões não foram claramente defi- nidas, o que inviabilizou a construção de um plano de ação unificado. Acreditamos que a di- nâmica implementar não foi suficiente, pois dificultou a troca de experiência, o aprofunda- mento e a sistematização dos temas. Apesar des- ses entraves, foram formadas, expontaneamen- te, grupos para discussão de questões específi- cas: imprensa, bloços-afro, religião, mulheres.

O Movimento Negro hoje tem pela frente grandes batalhas a serem vencidas. O racismo, como toda e qualquer forma de opressão, preci- sa ser encarado como um problema do conjunto da sociedade e não apenas de negros.

Assim o Movimento Negro, assumindo a direção da luta aponta para a construção de

Militantes do Movimento Alma yegra-AM ea dep. federal Benedita da Silva.

II Encontro de Negros Sul/Sudeste por Amauri Mendes Pereira

Nos dias 7, 8,e 9 de ou- tubro, realizou-se em São Paulo-SP, (no pré- dio da Faculdade de

História da U.S.P). o II ENCON- TRO DE NEGROS DO SUL/SU- DESTE.

Aglutinou em torno de 400 par- ticipantes de todos os estados desta região e discutiu-se:

- A Cultura Negra - Violência Racial - O Estado e o Movimento

Negro - A Luta da Mulher Negra - Organização do Movimento

Negro.

Entre outras propostas, foram aprovadas:

o Realização do III Encontro do Sul/Sudeste em 1990, no Espíri- to Santo.

■ o O indicativo (em consonân- cia com deliberação semelhante do IX Encontro Norte/Nordeste) da realização do 1 Encontro Nacional do Movimento Negro, em 1991. v:

o Sc definiu o processo de or- ganização através de Coordenações Estaduais, compostas por cinco (5) membros, eleitos em Foros Esta- duais de Entidades do Movimento Negro, convocados especificamente para esta finalidade.

o Um Manifesto que deverá ser entregue aos presidenciaveis.

Estiveram presentes no II ENSS' também, os representantes da Coor- denação do Encontro de Negros do Norte/Nordeste, que apresenta- ram as principais deliberações do seu Encontro, realizado em setem- bro p.p., e os representantes da Coordenação do Encontro de Ne- gros do Centro-Oeste, que realiza- rão seu II Encontro em Abril de 1990.

O 11 Encontro de Negros do Sul/ Sudeste não conseguiu abranger o amplo feixe de militáncia negra que hoje se organiza e se expressa tanto nas grandes cidades quanto nos mais distantes municípios do inte- rior.

É importante frizár que este problema oconeu porque ao final do I Encontro, nSo ficaram defini-

dos, nem o Estado onde seria reali- zado o II Encontro, nem a compo- sição de sua Comissão Organizado- ra. O mesmo deverá ocorrer com o próximo, que já está convocado pa- ra o ano de 1990, no Espírito San- to, e já tem definido o seu processo de organização através de coordena- ção estaduais compostas de cinco (5) membros, eleitos em Foros Es- taduais convocados para tal finali- dade.

A PARTICIPAÇÃO APENAS DAQUELES QUE POSSUEM

CONTATO COM OS ORGANIZADORES

Ou por problema financeiros, ou por falta de contatos eficazes e de informação, ou até mesmo por falta de motivação; o fatp é que deixa- ram de comparecer importantes militantes . e Entidades tanto das Capitais quanto do interior de to- dos os estados.

É bem verdade que o grupo or- ganizador procurou articular pes- soas e Entidades nos estados.

Para que o próximo se realize com muito maior representativi- dade é necessário propagandas e

divulgação mais ampla e com maior antecedência.

Da mesma forma, é necessário se incrementar as atividades reali- zadas por negros assumidos e não- negros, solidários, encontrados em Escolas, em locais de trabalho e mo- radia, em clubes, etc.

Esta Movimentação na base é decisiva para a ampliação e o ama- durecimento do Movimento Negro como um todo.

A DEFICIÊNCIA TEÓRICA

A deficiência teórica - mani- festada no II Encontro de Negros do Sul/Sudeste se fez pela inexis- tência de uma linha definida de orientação. A ausência de textos introdutórios aos temas em deba- te, pela quantidade de propostas sem condições de serem levadas à prática, etc. - tem uma estreita relação com o nível de organização do Movimento. Além do mais, há militantes que vivem enaltecendo a "presença negra na construção do Brasil", ou "a força da Cultura Negra", ou "a importância históri- ca do Movimento Negro", ou ain-

da a "necessidade de se articular às lutas mais gerais".

É necessário a criação de setor de publicações, como uma políti- ca editorial e a realização de semi- nários. É necessário se conhecer melhor o papel e os mecanismos do racismo como ideologia de do- minação, para se poder lutar me- lhor.

É importante, também, se co- nhecer experiências históricas e métodos de reflexão desenvolvi- dos por pensadores europeus que contribuíram para os conhecimen- tos universais sobre o desenvolvi- mento das sociedades.

Enfim, é necessário se adestrar na "arma da teoria" para romper- mos os limites impostos pelo racis- mo, e para conseguirmos contribuir com o avanço das lutas sociais rumo à transformação da sociedade bra- sileira. Vale dizer que, a mais im- portante deliberação do II Encon- tro de Negros do Sul/Sudeste, foi asde realizar em 1991 oi Encontro Nacional de Entidades do Movimen- to Negro.