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dos ecossistemas e da biodiversidade Um relatório preliminar A economia

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Page 1: Um relatório preliminar

A economia dos ecossistemas e da biodiversidade 1

dos ecoss i s t emas

e da b iod ive rs idade

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A economi a

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Fotos: Capa e título, todas as imagens PNUMA/ Topham

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e da b iod ive rs idade

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A economi a

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ISBN-13 978-92-79-089602

© European Communities, 2008A reprodução é autorizada desde que citada a fonte.

Traduzido e impresso com o apoio da Confederação Nacional da Indústria

Fotos da capa (em sentido horário a partir do topo): Ian McAllister/UNEP/ Topham; Ian Johnson/UNEP/Topham; Alex Wong/UNEP/ Topham; Lim Kien Hock/UNEP/Topham

Uma obra de Banson, Cambridge – Reino Unido

Page 5: Um relatório preliminar

Preâmbulo 3

A diversidade biológica é fonte de riqueza natural da Terra e proporciona a base para a vida e prosperidade de toda a humanidade. No entanto, a biodiversidade

desaparece rapidamente em todo o mundo. Estamos, por assim dizer, apagando o disco rígido da natureza sem ao menos saber quais os dados nele contidos. O objetivo da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) e de seus 190 Países Signatários é de reduzir signifi cativa men te a perda de biodiversidade até 2010. Este é um objetivo ambicioso que só será alcançado por meio do esforço conjunto de todos os setores da sociedade. Portanto, é preciso que os tomadores de decisão, os cientistas, o público e o setor privado firmem alianças nacionais e internacionais.

A partir das discussões no âmbito da reunião entre os Ministros do Meio Ambiente do G8+5 realizada em Pots-dam em maio de 2007, decidimos lançar uma iniciativa conjunta para ressaltar os benefícios econômicos da bio-diversidade e os custos de sua perda e da degradação dos ecossistemas.

O sucesso desta iniciativa conjunta depende da qualidade das lideranças e por isto ficamos muito satisfeitos quando Pavan Sukhdev, Gerente Executivo do Departamento de Mercados Globais do Deutsche Bank e fundador-diretor do projeto de “Contabilidade Verde” para a Índia, aceitou ser o líder do estudo.

Pavan Sukhdev e sua equipe tiveram o desafio de reunir um grande volume de informações em um curto período de tempo. Felizmente, eles tiveram o apoio e a contribui-ção de várias organizações internacionais, bem como de vários especialistas de renome.

Os resultados da Fase I da iniciativa que lançamos um ano atrás em Postsdam serão apresentados durante o segmento de alto nível da CDB COP 9. Convidamos e incentivamos os Países Membros da CDB e as organiza-ções internacionais a participarem ativamente da Fase II deste trabalho que será iniciada logo após a COP 9.

PREÂMBULO

Stavros DimasComissário para o Meio AmbienteComissão Européia

Sigmar GabrielMinistro Federal do Meio AmbienteAlemanha

Page 6: Um relatório preliminar

4 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Nem tudo que é muito útil custa caro (água, por exemplo) e nem tudo que custa caro é muito útil (como o diamante).

Este exemplo expressa não um, mas dois dos principais desafios de aprendizagem que a sociedade enfrenta na atualidade. Em primeiro lugar, estamos ainda descobrin-do a “natureza do valor” conforme o nosso conceito de

“capital” passa a incluir o capital humano, social e natural. Ao reconhecer e trabalharmos para desenvolver ou con-servar estes outros “capitais”, estamos trabalhando em prol da sustentabilidade.

Em segundo lugar, ainda estamos buscando entender o “valor da natureza”. A natureza é fonte de muito valor no nosso dia-a-dia apesar de estar fora do mercado e ser di-fícil atribuir-lhe um preço ou um valor. Como temos perce-bido, a ausência de valoração está na raíz da degradação dos ecossistemas e da perda de biodiversidade.

O nosso projeto acerca da “Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade” tem como enfoque este segundo de-safio ao defender de forma ampla e contundente a neces-sidade de conservar os ecossistemas e a biodiversidade.

UMA BúSSolA EConôMiCA DEFEitUoSA?

Alguns leitores ficarão surpresos ao descobrir que o exemplo acima é tão antigo quanto a própria economia. Ele foi retirado da obra clássica de Adam Smith publicada em 1776. Talvez um terceiro desafio seja, portanto, en-tender por que a humanidade levou 200 anos para enten-der de fato os dois primeiros desafios!

Duzentos e cinquenta anos atrás, havia terra em abun-dância, a energia não era um dos principais fatores no processo produtivo e o insumo de produção mais escas-so era o capital financeiro. Os tempos mudaram. Quando Adam Smith desenvolveu as suas teorias econômicas, o capital e o comércio mundial eram medidos em milhões e não trilhões de dólares como hoje. Bill McKibben (2007) aponta a máquina a vapor e o “crescimento do PIB” como as descobertas mais importantes do século 18, em que ambas melhoraram a qualidade de vida de parcela significativa da humanidade. O crescimento do PIB gerou empregos, evitou recessões e passou a ser o parâmetro de avaliação do progresso. No entanto, o crescimento do PIB não reflete dimensões fundamentais da riqueza nacional e do bem-estar tais como a melhoria na quali-

PREFÁCIO

Pavan Sukhdev, líder do Estudo

dade dos serviços de saúde, a abrangência do sistema educacional e as mudanças na qualidade e quantidade dos nossos recursos naturais.

Pode-se dizer que estamos tentando navegar nas águas desconhecidas e agitadas de hoje com uma bússola econômica antiga e defeituosa. E este não é apenas um problema nacional de natureza contábil – é um problema de mensuração que permeia todas as camadas da socie-dade, desde o governo, passando pelos setores empre-sariais até chegar aos indivíduos, além de também afetar nossa capacidade de criar uma economia sustentável em harmonia com a natureza.

A EConoMiA DoS ECoSSiStEMAS E DA BioDivErSiDADE – “tEEB”

Em março de 2007, os Ministros do Meio Ambiente do G8+5 reuniram-se em Potsdam. Inspirados pelo movi-mento pela pró-atividade e pela mudança na política pro-movida pelo Relatório Stern da Economia das Mudanças Climáticas, eles expressaram a necessidade de desen-volver um projeto semelhante a respeito dos aspectos econômicos relacionados à perda de ecossistemas e da biodiversidade. O Ministro do Meio Ambiente da Alema-nha, Sigmar Gabriel, com o apoio do Comissário Europeu para o Meio Ambiente, Stavros Dimas, assumiu a lideran-ça e aceitou o desafio de organizar tal estudo.

O nível de complexidade e o escopo da tarefa eram ób-vios e sua urgência era inegável. Em vista disso, fiquei ao mesmo tempo honrado e um pouco apreensivo quando o Comissário Dimas e o Ministro Gabriel me ofereceram o cargo de líder do estudo. Ainda estamos nos primórdios da ciência da biodiversidade e dos ecossistemas. Seus benefícios para a humanidade ainda não foram mapea-dos e compreendidos plenamente e a teoria econômica de valoração monetária é por vezes polêmica. No entan-to, acreditava na visão que motivou este projeto, além de acreditar que sua realização era importante e oportuna, e assim foi com satisfação que aceitei o convite.

Recordei-me da ansiedade que senti quando, quatro anos atrás, alguns amigos e eu lançamos o ambicioso projeto de “Contabilidade Verde” para a Índia e seus estados com o objetivo de criar um parâmetro de “sus-tentabilidade” prático para suas economias, ajustando as medidas clássicas do PIB e refletindo grandes exter-

Page 7: Um relatório preliminar

Preâmbulo 5

nalidades não consideradas, tais como as relativas aos ecossistemas e à biodiversidade. A maior parte dos resul-tados deste projeto já foi publicada (Fundo Verde do Es-tado Indiano, 2004-2008) e alguns já foram utilizados em uma experiência produtiva da qual depreendemos muitas lições, dentre as quais, a importância de questionar as expectativas das pessoas, inclusive as nossas.

Ao chegar ao final da Fase I do TEEB, gostaria de agra-decer o apoio e a participação de um grande número de pessoas que contribuíram de todas as partes do mundo (ver Agradecimentos, página 65).

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a todos os membros da nossa “equipe básica”, que trabalharam in-cansável e continuamente por semanas a fio, se ausen-tando dos seus locais de trabalho para compilar, avaliar, extrair e resumir grandes quantidades de material que chegaram a nossas mãos e que colaboraram na redação deste relatório preliminar. Gostaria de agradecer aos que contribuíram com seu conhecimento e artigos acerca de vários aspectos do tema; recebemos mais de 100 contri-buições em resposta à nossa solicitação em setembro de 2007 e março de 2008. A nossa reunião-chave (Bruxelas, março de 2008) atraiu mais de 90 participantes de cerca do mesmo número de instituições, muitos dos quais nos escreveram depois com informações e conselhos. Re-passamos muito do trabalho da Fase I para um conjunto de centros de pesquisa de renome que nos entregaram excelentes meta-estudos e artigos em um curto período de tempo ao que gostaríamos de agradecer às equipes no FEEM, IEEP, Alterra, GHK, ECOLOGIC e IVM.

Além disso, nossos colegas na EEA, IUCN e UFZ nos deram um apoio valioso na redação e na edição. Gosta-ria de agradecer ao nosso notável Conselho Consultivo, tanto pela sua participação e por dedicar tanto tempo e me aconselhar acerca deste projeto. Finalmente, gostaria de agradecer aos governos e instituições que apoiaram este projeto: G8+5, UNEP, IUCN, EEA e especialmente às equipes dos nossos anfitriões e patrocinadores DG Environment, Comissão Européia e BMU, Alemanha.

DEStAqUES DA FASE i

Surge um novo modelo: colegiado, colaborativo e global. Temos esperança de que este modelo seja também ado-tado durante a Fase II e, de fato, pretendemos aumentar e expandir a nossa base de contribuidores, prestadores de serviço, parceiros e consultores.

A Fase I do TEEB gerou cinco produtos principais e seus resumos estão disponíveis no Anexo do Relatório Preli-minar. Todos estes meta-estudos e artigos forneceram uma base sólida de informações para a análise nas quais podemos nos basear para lançar a Fase II.

Gostaria, neste momento, de destacar três aspectos im-portantes do nosso trabalho preliminar na Fase I e os ob-jetivos que pretendemos alcançar na Fase II.

O primeiro aspecto que verificamos é que a pobreza e o desaparecimento de ecossistemas e da biodiversidade são questões inexoravelmente relacionadas. Os resulta-dos das nossas investigações apontam os pobres como sendo os beneficiários diretos de muitos dos serviços fornecidos pelos ecossistemas e pela biodiversidade. Dentre as atividades econômicas mais afetadas estão a agricultura de subsistência, a criação de animais, a pesca e o extrativismo informal – atividades desenvolvidas pela maioria dos pobres no mundo. Esta conclusão (ver Capí-tulo 3, “PIB dos Pobres”) deve ser objeto de estudos mais aprofundados para confirmação em nível global e preten-demos realizar essa pesquisa durante a Fase II. A perda de capital natural que se dá anualmente é expressa em poucos pontos percentuais do PIB. Se, no entanto, ex-pressarmos essa perda em termos humanos com base no princípio da equidade e do nosso conhecimento dos fluxos de benefícios, então o argumento para a redução de tais perdas ganha força considerável.

Esta é uma questão relacionada ao direito dos pobres de-senvolverem uma atividade econômica derivada da natu-reza que responde por pelo menos metade de seu bem-estar e que seria impossível substituir. Devemos também argumentar que os Objetivos de Desenvolvimento do Mi-lênio estão hoje atrelados a esta questão básica.

O segundo aspecto está relacionado à ética – os riscos, a incerteza e o valor presente são questões que foram abordadas pelo Relatório Stern. Na maioria dos estudos de valoração que tivemos oportunidade de examinar, as taxas de desconto estavam entre 3% e 5% ou mais altas. Uma taxa de desconto de 4% significa que um serviço prestado pela natureza terá menos de quinze por cento da sua utilidade para nossos netos (em um prazo de 50 anos). Esta é uma posição ética difícil de ser defendida. Na Fase II, enfrentaremos essa questão ao aplicar uma gama discreta de taxas de desconto que representam diferentes perspectivas éticas.

Finalmente, e talvez de forma mais importante, estamos con vencidos de que cada um dos aspectos da economia dos ecossistemas e da biodiversidade que examinamos e incluímos aqui, assim como na Fase II, devem ter como en-foque principal o usuário final – quer seja ele o formulador de política, o administrador local, a empresa ou o cidadão.

noSSoS oBjEtivoS PArA A FASE ii

A Fase II do TEEB pretende arrematar o trabalho de in-vestigação realizado durante a Fase I e alcançar quatro importantes objetivos. São eles:

Page 8: Um relatório preliminar

6 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

• consolidar e publicar o “marco científico e econômi-co” que ajudará a estabelecer os parâmetros para os exercícios valoração da maioria dos ecossistemas da Terra, incluindo no seu escopo todos os valores mate-riais dos biomas mais relevantes;

• avaliar em maior profundidade e publicar a “metodo-logia de valoração recomendada”, incluindo biomas (ex. oceanos) e alguns valores (ex. valores de opção e de quase-opção) que não foram plenamente investi-gados durante a Fase I;

• assegurar a participação de todos os “usuários finais” chave do nosso trabalho de valoração logo no início do processo para que os produtos estejam sintoniza-dos com suas necessidades e sejam de uso fácil em termos da sua organização, acessibilidade, praticida-de e utilidade de modo geral.

• avaliar a fundo e publicar um conjunto de políticas di-rigidas aos tomadores de decisão e administradores para fornecer subsídios econômicos para a reforma política e para avaliações do impacto ambiental a fim de garantir o desenvolvimento sustentável e a melhor conservação dos ecossistemas e da biodiversidade.

No decorrer dos meus quase 25 anos de atuação pro-fissional no meio bancário e de mercados, aprendi duas lições que sempre me foram de grande valia. A primeira

é que “os problemas são semeados durante as épocas de prosperidade” e a segunda é que “não é possível ge-renciar o que não é mensurado”. Qualquer que seja o nível de dificuldade, se realmente quisermos administrar nossa segurança ecológica, devemos medir os ecossis-temas e a biodiversidade – cientifica e economicamente. A bússola econômica que utilizamos teve sua utilidade quando foi criada, mas deve ser atualizada ou substituí-da. Convido-os a analisar, novamente, a capa do nosso relatório preliminar: não é à toa que o título e as imagens estão tortas. Precisamos desenvolver uma nova bússola e com urgência.

referências

Smith, A. (1776) An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations. Edinburgh. Available at www.adamsmith.org/smith/won-index.htm (last access 13 May 2008).

McKibben, B. (2007) Deep Economy: The Wealth of Communities and the Durable Future. Times Books, New York.

Green Indian States Trust (2004-2008) Green Accounting for Indian States Project (GAISP). Available at www.gistindia.org (last access 13 May 2008).

Page 9: Um relatório preliminar

A economia dos ecossistemas e da biodiversidade 7

CONTEÚDO

Preâmbulo 3

Prefácio 4

Sumário Executivo 9

Capítulo 1 A BioDivErSiDADE E oS ECoSSiStEMAS nA AtUAliDADE 11

Capítulo 2 BioDivErSiDADE, ECoSSiStEMAS E BEM-EStAr HUMAno 15 Apressãosobreabiodiversidadecontinuaráeobem-estarhumanoseráafetado 16 AlimentoénotíciaemTerra… 16 ...enoMar 16 Oabastecimentodeáguaestáemrisco 18 Anossasaúdeestáemjogo 18 Crescimentoedesenvolvimento 20 Mudançasclimáticasebiodiversidade 20 Impactosobreospobres 21 Nãoépossívelmantermosascoisascomoestão 21 Qualopróximopasso? 25 Referências 26

Capítulo 3 A CAMinHo DE UM MArCo DE vAlorAção 29 Muitasfalhas,umúnicoproblema 29 Economia,éticaeequidade 31 Reconhecerriscoseincertezas 31 Taxadedescontoeética 31 Descontoeequidadeintergeracional 33 Descontoemumcontextodebemestar 33 Descontandoasperdasdabiodiversidade 34 Odesafiodaavaliação 35 Oscustosdaperdadabiodiversidade 37 Ocustodaconservaçãodabiodiversidade 40 Marcodevaloraçãoproposto 43 Reunindoosaspectoseconômicoseecológicosnomarcodevaloração 43 Princípios-chavedasmelhorespráticasnavaloraçãodeserviçosecossistêmicos 46 Referências 47

Capítulo 4 DA EConoMiA à PolítiCA 51Repensarossubsídiosdehojepararefletirasprioridadesdeamanhã 51Recompensarbenefíciosnãoreconhecidos,penalizarcustosnãocomputados 52 Pagamentosporserviçosecossistêmicos 53 Estendendooprincípiodo“poluidorpagador” 54 Criaçãodenovosmercados 54Compartilharosbenefíciosdaconservação 56Mensuraroquegerimos:métricaparaasustentabilidade 58Imaginandoumnovomundo 60Referências 61

Page 10: Um relatório preliminar

8 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Uma prévia da Fase ii 63

Agradecimentos 65

Sinopse dos estudos 69

qUADroS Quadro1.1:Termos-chave 12 Quadro2.1:Biocombustíveisgerammuitodebate 16 Quadro2.2:RecifesdeCorais 17 Quadro2.3:Gênero,pobrezaebiodiversidadeemOrissa,India 20 Quadro2.4:Amudançanousodosoloeatransformaçãodosserviços 22 Quadro2.5:Cicloviciosodapobrezaedadegradaçãoambiental:Haiti 25 Quadro3.1:ProjetosdeEstradanaFlorestaMaia:falhademercadoapartirdafalhadeinformação 29 Quadro3.2:Oefeitodossubsídiosnapesca 30 Quadro3.3:Odescontoeoparadoxootimista 32 Quadro3.4:“PIBdospobres” 34 Quadro3.5:Osváriosvaloresdorecifedecorais 37 Quadro3.6:Reunindoasinformações–umexemplodeumestudodo

CustodeFaltadeAçãoPolíticanaperdadabiodiversidade 38 Quadro4.1:Subsídiosprejudiciaisaomeioambiente 51 Quadro4.2:Subsídiosquedistorcemocomércio 52 Quadro4.3:PagamentosporserviçosambientaisnaCostaRica 54 Quadro4.4:Aexperiênciacombancosdehabitats,créditosdeespéciesameaçadaseBiobanking 55 Quadro4.5:ReflorestamentodoCanaldoPanamá 56 Quadro4.6:OexemplodeVittel 57 Quadro4.7:ÁreasprotegidasemUganda 57

FiGUrAS Figura2.1:Preçosdascommoditiesmundiais 15 Figura2.2:Tendênciasglobaisdosestoquesmarinhosapartirde1974 17 Figura2.3:Perdaglobaldabiodiversidade(ARE)2000-2050eacontribuição

dasatividadesparaessaperda 23 Figura3.1:AConexãoentreabiodiversidadeeoresultadodeserviçosecossistêmicos 35 Figura3.2:Valoraçãodeserviçosecossistêmicos 36 Figura3.3:Estabelecendoumaanálisedecenário 38 Figura3.4:MarcodeValoraçãoProposto:contrastandoestadosapropriadosdomundo 42 Figura3.5:Benefíciosecossistêmicosdeumaflorestaprotegida,Madagascar 44 Figura3.6:BenefíciosecossistêmicosparaaGrandeLondres,ReinoUnido 45 Figura4.1:Utilizaçãodesoloeáguaparaproduçãodediversosalimentos 59 MAPAS Mapa1.1:Conflitosambientais 13 Mapa2.1:Espéciesdeplantaporeco-região 19 Mapa2.2:Retornoagrícola 19 Mapa2.3:AbundânciaRelativadeEspécies1970(MNP/OECD2007) 22 Mapa2.4:AbundânciaRelativadeEspécies2000(MNP/OECD2007) 22 Mapa2.5:AbundânciaRelativadeEspécies2010(MNP/OECD2007) 23 Mapa2.6:AbundânciaRelativadeEspécies2050(MNP/OECD2007) 23 tABElAS Tabela2.1:ServiçosecossistêmicoseosObjetivosdeDesenvolvimento

doMilênio(ODM):Relaçõesetrade-offs 24 Tabela3.1:Valorandoa“opçãodebiodiversidade” 31 Tabela3.2:Taxasdedescontoeresultados 33 Tabela3.3:ProjeçãodobenefíciototaldearmazenamentodecarbononasflorestasEuropeias 37 Tabela3.4:Resultadosdosestudossobrecustosdeconservação 40

Page 11: Um relatório preliminar

Sumário executivo 9

A Natureza nos fornece uma grande variedade de benefí-cios tais como alimento, fibras naturais, água potável, solo fértil, sequestro de carbono e muitos outros. Apesar de o nosso bem-estar estar diretamente vinculado ao fluxo contínuo destes “serviços ecossistêmicos”, eles são, de forma geral, bens públicos não-negociados e, portanto, não são registrados pela nossa bússola econômica atual. Como resultado, a biodiversidade está se reduzindo, nos-sos ecossistemas estão sendo continuamente degrada-dos e nós, consequentemente, estamos sofrendo.

Inspirados nas ideias desenvolvidas pela Avaliação Ecos-sistêmica do Milênio, nossa iniciativa, a Economia Ecos-sistêmica e da Biodiversidade (TEEB), visa promover uma melhor compreensão do real valor econômico fornecido pelos serviços ecossistêmicos e disponibilizar ferramen-tas econômicas que levem tais valores em consideração. Estamos certos de que os resultados do nosso traba-lho terão um impacto positivo na elaboração de políticas mais eficazes para a proteção da biodiversidade e para o alcance dos objetivos descritos na Convenção sobre a Diversidade Biológica.

O TEEB será desenvolvido em duas fases, sendo que o presente relatório apresenta um resumo dos resultados obtidos na Fase I. Ele descreve o grande significado dos ecossistemas e da biodiversidade e discorre acerca das ameaças ao bem-estar da humanidade se nenhuma ação for tomada para reverter os danos e perdas atuais. A Fase II irá além para demonstrar como utilizar tal conhe-cimento para desenvolver ferramentas e políticas ideais.

FASE i

Grande parte da biodiversidade do mundo já desapare-ceu. A recente alta dos preços das commodities e dos alimentos demonstra as consequências desta perda para a humanidade. Medidas corretivas devem ser adotadas com urgência, pois a perda de espécies e a degradação dos ecossistemas têm efeitos sobre o bem-estar huma-no. É claro que o crescimento econômico e a conversão de ecossistemas naturais em áreas de produção agrícola continuarão a acontecer. Não podemos – e não devemos – coibir as iniciativas legítimas dos países e dos indivídu-os de alcançarem níveis mais altos de desenvolvimento econômico. No entanto, devemos assegurar que este desenvolvimento ocorra levando em consideração o valor real dos ecossistemas naturais. Essa é uma questão im-

SUMÁRIO ExECUTIVO

portante tanto para o gerenciamento econômico quanto ambiental.

Os Capítulos 1 e 2 deste relatório descrevem como a per-da da biodiversidade e a consequente perda de serviços ecossistêmicos continuarão a ocorrer no ritmo atual ou até em ritmo mais acelerado caso políticas adequadas não sejam efetivadas. Na falta de tais políticas, alguns ecossistemas poderão ser degradados a tal ponto que não será possível recuperá-los. Pesquisas acerca do cus-to da inação sugerem que, se nos mantivermos no cami-nho atual, em um cenário de business-as-usual, teremos que enfrentar sérias consequências até o ano 2050:

• 11% das áreas naturais que existiam no ano 2000 se-riam perdidas, principalmente por causa da conver-são para a agricultura, da expansão da infraestrutura e das mudanças climáticas;

• quase 40% das terras atualmente cultivadas com agricultura de baixo impacto poderiam ser conver-tidas para uso intensivo, acarretando perdas ainda maiores de biodiversidade;

• 60% dos recifes de coral seriam perdidos, possivel-mente já em 2030, por causa da pesca, poluição, do-enças, espécies invasoras exóticas e pelo branquea-mento do coral resultante das mudanças climáticas.

As tendências atuais verificadas na terra e no mar de-monstram que a perda de biodiversidade gera graves problemas para a saúde e o bem-estar da humanidade. As mudanças climáticas estão agravando este quadro. Assim como com a mudança do clima, os mais pobres representam o segmento mais afetado pela perda con-tínua da biodiversidade. São eles os que dependem de modo mais direto dos serviços ecossistêmicos que estão sendo comprometidos por uma análise econômica defi-ciente e desacertos na política.

O objetivo maior do nosso trabalho é fornecer as ferra-mentas necessárias aos formuladores de política para que possam incorporar o valor real dos serviços ecos-sistêmicos em suas análises. Assim, por ser a economia dos ecossistemas uma disciplina ainda em construção, o Capítulo 3 descreve as principais dificuldades em desen-volver e aplicar metodologias apropriadas. Em particular, há escolhas éticas que devem ser tomadas entre as gera-ções atuais e futuras e entre as populações de diferentes partes do mundo e em níveis distintos de desenvolvimen-

Page 12: Um relatório preliminar

10 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

to. Sem levar em conta esses aspectos, os Objetivos do Milênio não podem ser alcançados.

Algumas políticas promissoras já estão sendo postas em prática. O Capítulo 4 descreve várias políticas que surtem efeitos positivos e que poderiam ser ampliadas e/ou re-produzidas em outros países. Os exemplos apresentados são de campos diferentes, mas transmitem as mesmas mensagens acerca do desenvolvimento da economia dos ecossistemas e da biodiversidade:

• repensar os subsídios atuais para refletir prioridades futuras;

• enfatizar os serviços ecossistêmicos não reconheci-dos atualmente e assegurar que os custos dos danos aos ecossistemas sejam reconhecidos ao criar novos mercados e promover os instrumentos de política ade-quados;

• compartilhar os benefícios de conservação;• medir os custos e os benefícios dos serviços ecos-

sistêmicos.

FASE ii

A abordagem econômica a ser trabalhada durante a Fase II será específica do ponto de vista espacial e será cons-truída a partir do conhecimento previamente adquirido acerca da função e dos serviços fornecidos pelos ecos-sistemas. Também examinaremos como os ecossiste-mas e serviços correlatos responderão a políticas especí-ficas. Basicamente, serão levadas em conta as questões éticas e de equidade e os riscos e incertezas inerentes aos processos naturais e ao comportamento humano.

A maioria dos benefícios da biodiversidade e dos ecossis-temas representa bens públicos que não são valorados. Há diferentes abordagens para solucionar este problema. Uma das mais interessantes são as políticas que recom-pensam a preservação do fluxo destes bens públicos. Outra é aquela que estimula os “mercados obrigatórios” que estabelece um valor de troca para o fornecimento ou uso destes serviços. Os pagamentos pelos serviços ecossistêmicos (PSE), por exemplo, podem criar uma demanda para corrigir os desequilíbrios que lesam a bio-diversidade e impedem o desenvolvimento sustentável. A

Fase II examinará a opção apresentada pelo PSE, mas também pelos outros novos e inovadores instrumentos.

Há novos mercados sendo constituídos de forma a dar apoio e compensar a biodiversidade e os serviços ecos-sistêmicos. Para serem bem-sucedidos, eles necessitam infraestrutura institucional adequada, incentivos, finan-ciamento e governança: em resumo, necessitam inves-timento e recursos. No passado, o Estado era conside-rado o único responsável pela gestão dos ecossistemas. Cada vez mais, fica claro que os mercados também têm um papel a desempenhar neste sentido – com a vanta-gem de prescindirem de dinheiro dos cofres públicos.

O requisito principal é o desenvolvimento de um parâ-metro econômico mais eficaz do que o PIB para avaliar o desempenho da economia. O sistema de contabilidade nacional deve ser mais inclusivo para conseguir medir os grandes benefícios que os ecossistemas e a biodiversida-de proporcionam ao bem-estar humano. Ao reconhecer tais benefícios, estes sistemas ajudariam os formuladores de política a adotar medidas condizentes e a elaborar meca-nismos de financiamento adequados para a conservação.

Os países, empresas e indivíduos precisam conhecer o custo real de uso do capital natural da Terra e os efeitos que as políticas e as ações, quer sejam individuais, quer sejam coletivas, têm sobre a capacidade de recupera-ção e da sustentabilidade dos ecossistemas naturais. Acreditamos que políticas que expressem o valor real da biodiversidade e dos ecossistemas naturais contribuirão para o desenvolvimento sustentável ao garantir o forne-cimento dos bens e serviços ecossistêmicos, sobretudo alimento e água, de modo transparente e equitativo. Isso não apenas protegerá a biodiversidade, os ecossistemas e os serviços ecossistêmicos, como também aumentará o bem-estar da geração atual e das subsequentes.

Se quisermos atingir nossos ambiciosos objetivos, tere-mos que nos valer do conhecimento, habilidades e talen-to de países, organismos internacionais, universidades, empresas e da sociedade civil em todo o mundo. Esta-mos prontos para trabalhar juntos e de forma flexível e construtiva para obter ganhos ainda mais significativos em 2009 e 2010.

Page 13: Um relatório preliminar

A biodiversidade e os ecossistemas na atualidade 11

recompensando a conservação florestalOs líderes das comunidades que vivem nas florestas da América Latina reivindicam o direito de receber uma compensação econômica pelos serviços ambientais que suas comunidades fornecem ao conservar milhões de hectares de florestas nativas nos trópicos. E parece que estão sendo atendidos: o governo do Brasil acaba de de-cidir que pagará os moradores da Amazônia pelos “eco-serviços” prestados por eles na preservação da grande área verde do país.

Terra Daily, 6 de abril de 2008

verifica-se aumento do número de refugiados ambientais Os refugiados ambientais já somam 25 milhões de pesso-as e estima-se que até o ano 2020, aproximadamente 60 milhões de pessoas se deslocarão das áreas desertificadas da África subsaariana em direção ao norte da África ou Eu-ropa. No entanto, esta migração sul-norte é ínfima quando comparada às migrações internas que ocorrem dentro da própria África. A maioria dos refugiados internos se estabe-lece nas já populosas megacidades, uma tendência proble-mática em vista dos poucos recursos disponíveis, como a água. Reféns de um ambiente em degradação, sem acesso à água potável e com os preços de alimentos cada vez mais altos, os refugiados e as populações locais estão sujeitos à pobreza, doenças e a rebeliões.

http://knowledge.allianz.com 19 de março de 2008

Colapso do ecossistemaNo dia 27 de fevereiro de 2008, entre 500 e 700 tonela-das de peixes mortos foram encontrados nas gaiolas dos criatórios localizados em Amvrakikos, na Grécia (Elefthe-rotypia 20 de fevereiro de 2008). Os cientistas acreditam que a redução do fluxo de água doce para o golfo po-deria estar por trás destes incidentes. Estima-se que o custo para recuperar parte das funções da lagoa será em torno de 7 milhões de euros.

EC DG ENV 2008

Mercados emergentes para os serviços ambientaisUm fundo de investimentos recentemente adquiriu os direitos aos serviços ambientais gerados por 370.000 hectares de re-serva florestal na Guiana por reconhecer que tais serviços – o armazenamento de água, a manutenção de biodiversidade e a regulação das chuvas – algum dia terão um valor negocia-do nos mercados internacionais. A receita será compartilha-da, sendo que 80% serão repassados para a comunidade local. A reserva sustenta 7.000 pessoas e faz a captura de 120 milhões de toneladas de carbono. O presidente Jagdeo, da Guiana, citou este caso como um possível modelo para pagamento de todos os serviços do gênero.

www.iNSnet.org 4 de abril de 2008

A s notícias transcritas acima nos permitem vislumbrar um novo nexo emergente: a correlação entre a natureza, sua preservação e destruição, o bem-

estar humano e, por fim, o dinheiro. Tradicionalmente, a natureza sempre teve o papel de prover as necessidades da humanidade e a imagem de uma “mãe natureza” faz parte de rituais, épicos e crenças de sociedades de todas as épocas. Durante os últimos cinquenta anos, no entanto, a complexa relação entre a riqueza humana, o bem-estar e a biodiversidade, os ecossistemas e seus serviços es-tão cada vez mais sendo compreendidos a partir de sua dimensão ecológica e econômica. O nosso conhecimento acerca das muitas variáveis desta relação está aumentando

“O aquecimento global está nas manchetes de hoje.A degradação dos ecossistemas estará nas manchetes amanhã.”

Corporate Ecosystems Services Review, WRI et al., março de 2008

rapidamente. Concomitantemente, estamos mais conscien-tes das perdas naturais que vêm ocorrendo – ambientes degradados, declínio de espécies.

Muitas espécies animais de maior destaque, como os pandas, os rinocerontes e os tigres estão ameaçados de

A BIODIVERSIDADE E OS ECOSSISTEMAS NA ATUALIDADE 1

Page 14: Um relatório preliminar

12 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Quadro 1.1: Termos-chave

• Um ecossistema é um complexo dinâmico de comunidades vegetais, animais e de microorga-nismos e os seus ambientes inorgânicos intera-gindo como uma unidade funcional. Exemplos de ecossistemas incluem desertos, recifes de coral, áreas úmidas, florestas tropicais, flores-tas boreais, pradarias, parques urbanos e ter-ras cultivadas. os ecossistemas compreendem tanto as áreas intocadas pelos homens, como as florestas tropicais virgens, ou áreas modifi-cadas pela ação do homem.

• Serviços ecossistêmicos são os benefícios que as pessoas obtêm dos ecossistemas. Exem-plos incluem alimento, água potável, lenha, re-gulação climática, proteção de desastres natu-rais, controle de erosão, matéria prima para a fabricação de medicamentos e recreação.

• A biodiversidade é a quantidade e a variabilida-de de organismos vivos dentro de uma espécie (diversidade genética), entre espécies e entre ecossistemas. A biodiversidade não é por si só um serviço ecossistêmico, mas garante o for-necimento de tais serviços. o valor atribuído à biodiversidade como tal é refletido pelo serviço ecossistêmico cultural denominado “valores éticos”.

extinção, ao passo que as florestas tropicais, as áreas úmidas, os recifes de coral e outros ecossistemas estão sendo afetados negativamente pela atividade humana. Desastres naturais como enchentes, secas e desliza-mentos de terra passaram a ser ocorrências corriqueiras nos dias atuais, ao passo que a escassez de alimento e de água está dominando as manchetes em todo mundo.

Apesar da percepção de que estes fenômenos estão de alguma maneira interligados, parece existir a expectativa de que tudo será “normalizado” em breve. As diversas dimensões da perda de biodiversidade ou a relação entre a perda da biodiversidade, as mudanças climáticas e o desenvolvimento econômico são ignorados. O declínio das espécies e a degradação dos ecossistemas estão in-trinsecamente ligados ao bem-estar humano e, a menos que tomemos medidas corretivas em caráter de urgência, a “normalização” dos serviços – no sentido de podermos usufruir os benefícios oferecidos pelo meio ambiente – ja-mais será alcançada.

A humanidade recebe incontáveis benefícios do ambien-te natural na forma de bens e serviços (reunidos sob o tí-tulo geral de serviços ecossistêmicos) tais como alimento, madeira, água potável, energia, proteção contra enchen-

tes e erosão do solo (ver Quadro 1.1). Os ecossistemas naturais também são fonte de muitos medicamentos e são um repositório para os nossos resíduos, inclusive o carbono. O desenvolvimento humano também é moldado pelo meio ambiente e esta interligação tem grande impor-tância social, cultural e estética. o bem-estar de todas as populações humanas do mundo depende direta-mente dos serviços fornecidos pelos ecossistemas.

No entanto, os níveis de muitos dos benefícios que deri-vamos do meio ambiente caíram nos últimos 50 anos à medida que perdemos biodiversidade em todo mundo. Vejam os exemplos a seguir:

• Nos últimos 300 anos, as áreas de cobertura florestal encolheram cerca de 40%. As florestas desaparece-ram por completo em 25 países e outros 29 países perderam mais de 90% de sua cobertura florestal. As perdas continuam a acontecer (FAO 2001; 2006).

• Desde 1900, o mundo perdeu cerca de 50% de suas áreas úmidas. Apesar da maior parte desta perda ter ocorrido nos países setentrionais durante os primei-ros 50 anos do século 20, desde os anos 1950, há pressão crescente para a conversão de áreas alaga-das tropicais e subtropicais (Moser et al 1996).

• Aproximadamente 30% dos recifes de coral – que, em geral, têm níveis de biodiversidade mais altos do que as florestas tropicais – foram irreparavelmente danificados pela pesca, poluição, doenças e bran-queamento de coral (Wilkinson 2004).

• Nas últimas duas décadas, 35% dos mangues de-sapareceram. Alguns países perderam até 80% por meio da conversão para aquicultura, super explora-ção e tempestades (Millennium Ecosystem Assess-ment 2005a).

• A ação do homem levou a uma taxa de extinção de espécies (antropogênica) estimada em 1.000 vezes o ritmo de extinção “natural” da história de longo prazo da Terra (Millennium Ecosystem Assessment 2005b).

A consequência de tais tendências é que cerca de 60% dos serviços ecossistêmicos da Terra que examinamos foram degradados nos últimos 50 anos, sendo que a atu-ação humana foi a principal causa deste fenômeno (Mil-

Entradas ambientais começam a fazer parte dos balanços patrimoniais. Talvez em breve as me-lhores coisas da vida não sejam mais de graça

21deabrilde2005,CidadedoPanamáOEconomista,ediçãoimpressa

Page 15: Um relatório preliminar

A biodiversidade e os ecossistemas na atualidade 13

Causa do conflito

Água terra/solo Peixe Biodiversidade

intensidade do conflito

Crise diplomáticaManifestações (parcialmente violentas)Uso de violência (escopo nacional)violência sistemática/coletiva

Fonte: WBGU, 2008

Mapa 1.1: Conflitos ambientais

lennium Ecosystem Assessment 2005c). Declínios ainda mais significativos devem ocorrer nas próximas décadas em virtude de fatores como o crescimento populacional, mudança no perfil de exploração da terra, expansão eco-nômica e mudança climática global. As principais orga-nizações econômicas internacionais tais como o Banco Mundial e a Organização para a Cooperação e Desenvol-vimento Econômico (OCDE) reiteram estas previsões pre-ocupantes. A OCDE descreveu um conjunto assustador de desafios que devem ser enfrentados pela humanidade: enfrentar as mudanças climáticas, interromper a perda de biodiversidade, assegurar o fornecimento de água potável e saneamento básico e reduzir os impactos da degrada-ção ambiental para a saúde humana (OCDE 2008).

A pressão se intensificou mesmo durante o curto período de tempo transcorrido desde a publicação das Avaliações Ecossistêmicas do Milênio em 2005. Em 2007, mais pes-soas estavam vivendo em áreas urbanas do que em áreas rurais pela primeira vez na história da humanidade. Du-rante os anos de 2007 e 2008, o esforço para desenvolver os biocombustíveis resultou em enormes mudanças na forma de uso da terra e em um acelerado aumento de

preços de alguns produtos alimentares básicos. As con-tinuadas taxas de crescimento acelerado em alguns dos grandes países em desenvolvimento resultaram em uma demanda maior do que a oferta para várias commodities, o que colocou ainda maior pressão nos sistemas naturais. Pesquisas mais recentes sobre as mudanças climáticas sugerem impactos muito mais profundos que as previsões anteriores, incluindo o risco de conflitos humanos causa-dos pela competição pelos recursos da biodiversidade e serviços ecossistêmicos. (WBGU 2008).

Estas tendências podem mudar a nossa relação com a natureza, mas continuaremos a depender dela. Os recur-sos naturais e os ecossistemas que os fornecem, estão na base das atividades econômicas que desenvolvemos, da nossa qualidade de vida e da nossa coesão social. No entanto, o modo como organizamos as nossas econo-mias não enfatiza o caráter de dependência desta relação – não existem economias sem o meio ambiente, mas existe meio ambiente sem economia.

Várias iniciativas buscam preencher estas carências ao atribuir um valor monetário para os serviços ecossistêmi-cos. Tais abordagens têm o seu sentido, mas acima de tudo, precisamos retomar uma postura de humildade pe-rante o mundo natural. Assim como os povos tradicionais, precisamos tratar a natureza com deferência pela simples razão de que a natureza tem seus limites e regras próprios.

Estamos consumindo a biodiversidade e os ecossistemas em ritmo frenético e insustentável e nossas ações já estão começando a ter sérios impactos socioeconômicos. Se pretendermos encontrar soluções para os problemas que nos defrontam, devemos entender o que está acontecen-do com a biodiversidade e os ecossistemas e como estas mudanças afetam os bens e serviços que eles disponibili-

Page 16: Um relatório preliminar

14 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

zam. Em seguida, teremos que avaliar a maneira que uti-lizamos as ferramentas econômicas para assegurar que as gerações futuras continuem a usufruir os benefícios destes bens e serviços.

Este é um desafio de grande complexidade – não obstante, deve ser enfrentado. No entanto, os últimos 100 anos da história demonstram que a humanidade geralmente agiu tí-mida e tardiamente face a ameaças semelhantes – amianto, CFCs, chuva ácida, diminuição dos cardumes, BSE (do-ença da vaca louca), contaminação dos Grandes Lagos e, mais recentemente e de forma mais dramática, as mudan-ças climáticas. A destinação de apenas 1% do PIB mun-dial até 2030 pode redundar em melhorias significativas na qualidade do ar e da água e da saúde humana e pode assegurar o cumprimento das metas climáticas. Como a OCDE observou: “Pode-se chamar isto do custo do se-guro” (OCDE 2008). Ao voltarmos o nosso olhar para o passado, conseguimos reconhecer os erros cometidos e extrair valiosas lições para o futuro (EEA 2001).

A perda de biodiversidade e dos ecossistemas é uma ameaça para a sobrevivência do nosso planeta, de nossa economia e da sociedade humana. Somos da opinião de que este problema deve ser enfrentado o quan-to antes. Não dispomos de todas as respostas, mas esperamos que as diretrizes descritas no restante deste documento sejam capazes de angariar amplo apoio.

referências

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Page 17: Um relatório preliminar

Biodiversidade, ecossistemas e bem-estar humano 15

Fonte: Base de dados da FAO sobre Preços das Commodities Internacio-

nais; Base de dados do Panorama Econômico Mundial do FMI, 2007

“Nenhum lugar está a salvo, nem o árido Sahel da África, nem

as regiões exportadoras de grãos da Austrália e nem as áreas

sujeitas a secas do sudoeste americano. Para combatê-las [as

mudanças climáticas], a comunidade da ONU…começou a

utilizar um conjunto de recursos globais – conhecimento científico

e de engenharia, participação corporativa e liderança cívica.

Começamos a nos dar conta que o impressionante know-how

mundial pode solucionar questões aparentemente sem solução

quando enxergamos nossos problemas do ponto de vista correto.”

Ban Ki-Moon, Secretário Geral da ONU, 2008

O firme otimismo do Secretário-Geral da ONU acerca de nossa capacidade para enfrentar as mudanças climáticas também vale como uma convocação

para solucionar o problema da perda de biodiversidade. Será de fato necessária uma resposta global e um esforço conjunto por todas as nações e por todos os segmentos sociais para alcançar o nosso objetivo.

Os padrões de consumo e produção atuais dependem dos ecossistemas mundiais. Diversos tipos de política podem afetar a capacidade de recuperação de ecossis-temas naturais e também de ecossistemas modificados pela ação do homem. Do setor de transportes ao setor elétrico, passando pela agricultura e o bem-estar cultu-ral, nossas políticas e ações podem ter muitas conse-quências não previstas. Como demonstrado pela Ava-liação Ecossistêmica do Milênio (Millennium Ecosystem Assessment 2005a), o efeito das pressões cumulativas sobre os ecossistemas algumas vezes não é sentido por vários anos até que seja alcançado um ponto crítico a partir do qual ocorre uma sucessão de rápidas mudan-ças não-lineares. Iniciamos este capítulo com exemplos específicos que demonstram vários efeitos deste tipo, da alimentação à saúde. Em seguida, identificamos alguns aspectos comuns aos exemplos apresentados, sobretu-do o impacto desproporcional sobre os pobres.

B IODIVERSIDADE, ECOSSISTEMAS E BEM-ESTAR HUMANO

Este capítulo demonstra que a degradação dos ecossis-temas pode ter consequências abrangentes, como por exemplo, os riscos para a saúde que a perda de uma es-pécie vegetal pode acarretar. A conclusão, como exposto na parte final do capítulo, é que não podemos continuar a nos portar como atualmente, nem mesmo no curto prazo.

2

Figura 2.1: Preços das commodities mundiaisJaneiro 2000 – Fevereiro 2008 (US$/ton)

jan-00 jan-02 jan-04 jan-06 jan-08

500

400

300

200

100

0

Milho

trigo

Arroz

Óleo (escala da direita)

100

90

80

40

20

0

Page 18: Um relatório preliminar

16 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Quadro 2.1: Biocombustíveis geram muito debateA bioenergia tem um papel importante no combate às mudanças climáticas, especialmente quando a biomassa é usada para geração de calor e eletrici-dade. no entanto, os biocombustíveis também são outra fonte de competição para áreas com escas-sez de solo e a escala de conversão de terras po-tenciais para o agrocombustível é extraordinária. o Fundo Monetário internacional afirma que, “em-bora os biocombustíveis ainda contabilizem ape-nas 1,5% do fornecimento global de combustíveis líquidos, eles foram responsáveis por quase me-tade do aumento no consumo das maiores safras em 2006-2007, principalmente devido ao etanol produzido a base de milho nos EUA”. os relatórios indicam que este padrão pode ser replicado em qualquer outro local do mundo.

FMi, Abril de 2008

Chappatte/International Herald Tribune

A PRESSÃO SOBRE A BIODIVERSIDADE CONTINUA­RÁ E O BEM­ESTAR HUMANO SERÁ AFETADO

AliMEnto é notíCiA EM tErrA…

O aumento do preço dos alimentos causou revoltas em muitos países. Em fevereiro de 2007, milhares de pesso-as invadiram as ruas da Cidade do México para protestar contra o aumento de 400% no preço do milho utiliza-do no preparo de tortillas – fato atribuído à crescente demanda por biocombustíveis nos Estados Unidos. Na Ásia, muitos governos precisaram intervir para segurar o aumento vertiginoso dos preços do arroz e para ad-ministrar os estoques, ao passo que nas Filipinas houve distribuição de alimentos para as pessoas afetadas nas áreas rurais.

Há muitas explicações para o aumento dos preços dos alimentos. A demanda crescente por alimento e, em es-pecial, carne (cuja produção requer mais terra por caloria), a alta dos preços de energia (que é um insumo importan-te) e o aumento da demanda por biocombustíveis são todas causas possíveis para o aumento de preços.

Em 2007, o índice de preços dos alimentos calculado pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) aumentou cerca de 40% compa-rado aos 9% de aumento no ano anterior (FAO 2008). Da mesma forma, foi verificado um aumento dramático dos preços nos primeiros meses de 2008. Quase todas as commodities agrícolas fazem parte dessa tendência de aumento (FAO 2008). Conforme a demanda pelas com-modities básicas aumenta, também aumenta a pressão para converter ecossistemas naturais em terras para cultivo agrícola e para intensificar a produção em terras

já convertidas. Já se verifica que um maior consumo de carne é uma das principais razões do desmatamento em todo mundo (FAO 2006).

Não há sinais de que a conversão de ecossistemas naturais para o cultivo agrícola diminuirá em um futuro próximo. A demanda por alimento crescerá conforme as populações aumentarem e aumentará também o seu consumo de carne. A oferta não consegue acompanhar o aumento da demanda, pois o rendimento das colhei-tas não cresce no mesmo ritmo. Além disso, o relatório de 2007 do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) prevê que até mesmo um pequeno au-mento na temperatura global diminuiria a produtividade agrícola dos países tropicais e subtropicais (IPCC 2007).

... E no MAr

A principal ou única fonte de proteína animal de mais de um bilhão de pessoas vem do mar, especialmente nos países em desenvolvimento (Millennium Ecosys-tem Assessment 2005a). No entanto, metade das espé-cies marinhas selvagens está esgotada e outros 25% já foram super explorados (FAO 2007). Temos “pescado a rede alimentar”: quando os estoques de espécies maio-res se exaurem, os pescadores passam para as espé-cies menores. Os peixes menores estão sendo utilizados para produzir farinha ou óleo de peixe para a aquicultu-ra e na alimentação de galinhas e porcos. A aquicultura, que utiliza gaiolas móveis em mar aberto (e.g. para atum vermelho), está em expansão, em particular na China e no Mediterrâneo e foi responsável por 27% da produção mundial de peixes em 2000 (Millennium Ecosystem As-sessment 2005a). A aquicultura, no entanto, ainda de-pende da pesca marinha para obter insumos e, do ponto

Desculpe, estou

ocupado salvando o

planeta.

Page 19: Um relatório preliminar

Biodiversidade, ecossistemas e bem-estar humano 17

Quadro 2.2: Recifes de Coraisrecifes de corais são os ecossistemas mais ricos em biodiversidade (espécies por unidade de área) do mundo, apresentando maior diversidade que as próprias florestas tropicais. Sua saúde e resili-ência estão em declínio devido à pesca excessiva, poluição, doenças e às mudanças climáticas.

Em três décadas, os recifes de coral caribenhos foram reduzidos em 80%. Como resultado, recei-tas advindas do turismo do mergulho (quase 20% da receita total do turismo) têm diminuído e prevê-se uma perda de US$ 300 milhões por ano. isso é mais do que o dobro do que se perde no setor de pesca, também altamente impactado (PnUMA, Fevereiro de 2008).

A explicação para isto é que, em 1983, após vá-rios séculos de pesca excessiva de peixes her-bívoros, houve uma repentina transferência de domínio dos corais para as algas nos sistemas de recife da jamaica. Com isso, a cobertura de algas foi tomada praticamente por uma única espécie de ouriço-do-mar, cujas populações entraram em declínio após serem expostas a um patógeno es-pecífico para aquela espécie. quando essa po-pulação de ouriços entrou em colapso, os recifes sofreram alteração no seu estado (aparentemen-te de forma irreversível), e passaram a ter baixa capacidade de suporte dos recursos pesqueiros. Este é um excelente exemplo da segurança que se tem em ecossistemas biodiversos. A redução da diversidade herbívora não teve efeito imediato até que a população de ouriços-do-mar despen-casse, ilustrando como o sistema havia se torna-do vulnerável devido a sua dependência em uma única espécie.

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de vista global, pode não reduzir a nossa dependência na pesca marinha selvagem.

“Pescar a rede alimentar” tem vários impactos sobre a biodiversidade dos oceanos. Acredita-se que a prolife-ração de águas-vivas ocorrida na última década seja re-sultado dessa situação. As águas-vivas já são a principal espécie planctófaga em muitas áreas e há certa preo-cupação que essa alteração não possa ser facilmente revertida já que as água-vivas também se alimentam dos ovos dos peixes com os quais competem (Duffy 2007).

A perda de biodiversidade pode prejudicar o abasteci-mento de frutos do mar para a população humana e ter efeitos negativos sobre a economia. Há cada vez mais indícios de que a diversidade de espécies é importante para a pesca marinha, tanto em curto prazo, ao aumentar a produtividade, quanto em longo prazo, ao aumentar a capacidade de recuperação das espécies. A diversidade genética é especialmente importante neste último senti-do. Um estudo de 2006 (Worm et al. 2006) concluiu que todas as empresas pesqueiras terão falido em menos de 50 anos se as tendências atuais não forem revertidas. O estudo descobriu que uma baixa diversidade está as-

Fonte: FAO 2006

60

50

40

30

20

10

074 76 78 80 82 84 86 88 90 92 94 96 98 00 02 04 06

Subexplorado+moderadamenteexplorado

Totalmenteexplorado

Superexplorado+Esgotado+Emrecuperação

Figura 2.2: Tendências globais dos estoques marinhos a partir de 1974Percentagem de estoques avaliados

Page 20: Um relatório preliminar

18 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

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sociada a taxas de produtividade pesqueira mais baixas, “colapsos” mais frequentes e uma capacidade de recupe-ração mais baixa após a realização de pesca excessiva do que sistemas naturalmente ricos em espécies.

Pode-se fazer uma comparação entre a segurança que a biodiversidade oferece e os mercados financeiros. Uma carteira diversificada de espécies, assim como de ações, fornece uma proteção contra as flutuações do meio am-biente (ou do mercado) que levam à queda de ações isoladas. O efeito estabilizador de uma carteira “biodiver-sa” será especialmente importante conforme a mudança ambiental for acelerada pelo aquecimento global e pelo impacto humano.

o ABAStECiMEnto DE ÁGUA EStÁ EM riSCo

Os recursos hídricos – tanto o abastecimento de água como a sua qualidade – também estão sob pressão. Vá-rias partes do mundo já convivem com a escassez de água. O risco de a água causar conflitos entre os povos foi um dos principais temas do Fórum Econômico Mun-dial em Davos. As Nações Unidas acreditam que há água em quantidade suficiente para atender as necessidades de todos – mas apenas se mantivermos estes mananciais limpos, utilizando-os de forma sensata e compartilhando-os de maneira equitativa.

Na Ásia, a água utilizada na irrigação dos grãos que alimen-tam a China e a Índia pode secar como resultado das mu-danças climáticas. O aquecimento global derrete as geleiras que deságuam nos grandes rios da Ásia durante a estação seca e é justamente neste período que a água é mais ne-cessária para irrigar as plantações das quais centenas de milhões de pessoas dependem. no exemplo acima, as mudanças climáticas poderiam exacerbar os proble-mas crônicos associados à escassez de água. Além disso, o serviço ecossistêmico que fornece um supri-mento constante de água potável seria comprometido.

Em muitos lugares, os ecossistemas desempenham fun-ções de regulação importantíssimas. As florestas e as várzeas podem ter um papel importante na determinação dos níveis de precipitação (em nível regional e local), na capacidade da terra em absorver e reter essa água e na sua qualidade. Em outras palavras, os ecossistemas aju-dam a determinar se teremos secas, enchentes ou água própria para consumo. Com frequência, essa função só é valorizada depois de perdida.

A noSSA SAúDE EStÁ EM joGo

O valor medicinal de certas plantas é conhecido há milha-res de anos e a biodiversidade contribuiu para aumentar nosso conhecimento sobre o corpo humano. Da mesma forma, os ecossistemas fornecem enormes benefícios para a saúde e, portanto, benefícios de ordem econômi-ca também. O corolário é que a perda de biodiversidade pode produzir prejuízos muito grandes e estamos cada vez mais cientes deste fato (Conseil Scientifique du Patri-moine Naturel et de la Biodiversité – no prelo).

Há uma relação direta entre a biodiversidade e o sistema de saúde moderno (Newman and Cragg 2007): • Aproximadamente metade dos medicamentos sintéti-

cos tem origem na natureza, inclusive 10 dos 25 medi-camentos mais vendidos nos Estados Unidos.

• De todos os medicamentos utilizados no tratamento do câncer, 42% são de origem natural e 34% são de origem seminatural.

• Na China, mais de 5.000 das 30.000 espécies de plan-tas superiores são utilizadas para fins terapêuticos.

• Três quartos da população mundial dependem de me-dicamentos naturais tradicionais.

• Os medicamentos derivados de recursos genéticos geraram um faturamento total entre US$ 75 bilhões e US$ 150 bilhões nos Estados Unidos em 1997.

• A árvore de gingko biloba levou à descoberta de substân-cias altamente eficazes no tratamento de doenças cardio-vasculares que geram lucros de US$ 360 milhões por ano.

Page 21: Um relatório preliminar

Biodiversidade, ecossistemas e bem-estar humano 19

Número de espécies por eco-região

10.000

0

US$ por hectare

1.800

0

Mapa 2.1: Espécies de planta por eco-região (Kier et al. 2005, J. Biogeog. 32:1107)

Mapa 2.2: Retorno agrícola (Strassburg et al. 2008, baseado nos dados de Naidoo & Iwamura. 2007. Biol. Conserv. 140: 40)

Apesar dos indiscutíveis benefícios para a saúde, as espécies vegetais estão desaparecendo rapidamente e essa tendência continuará a menos que sejam tomadas medidas em caráter de urgência. A Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN publicada em 2007 iden-tificou um aumento significativo de espécies ameaçadas durante esta década. O relatório estima que 70% das plantas em todo mundo estão ameaçadas (IUCN 2008).

Um estudo recente de escopo mundial revela que cen-tenas de plantas medicinais, cujos princípios ativos são utilizados por mais de 50% dos medicamentos, estão à beira da extinção. Essa situação levou os es-pecialistas a fazerem a um apelo para “assegurar o futuro do sistema de saúde” (Hawkins 2008).

A relação entre biodiversidade e saúde também possui um aspecto referente à equidade da distribuição. É co-mum haver um descompasso entre as regiões onde os benefícios são produzidos, onde são usufruídos e onde são assumidos os custos de oportunidade para sua con-

servação. As fontes vegetais de muitos dos novos me-dicamentos são quase sempre encontradas nas regiões tropicais mais pobres (ver Mapa 2.1). Os beneficiários geralmente se encontram nos países ricos onde os me-dicamentos são disponibilizados a preço acessível. São as pessoas destes países que têm maior interesse em conservar os habitats naturais nas regiões ricas em bio-diversidade. No entanto, a conservação tem custos para as populações locais, em particular custos de oportuni-dade como a perda de potenciais retornos agrícolas (ver Mapa 2.2) pela não conversão destes habitats. A trans-ferência de parte dos benefícios dos países ricos para as populações locais poderia ser uma forma de estimular a conservação dos habitats e das espécies naturais que beneficiam todo o mundo.

Resta claro que se abusarmos das funções naturais que sustentam o nosso planeta, comprometeremos a qua-lidade de vida das gerações futuras – e dificultaremos sobremaneira a vida dos que já vivem à margem da so-ciedade.

Page 22: Um relatório preliminar

20 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Quadro 2.3: Gênero, pobreza e biodiversidade em Orissa, India

o impacto da perda da biodiversidade, geralmente não muito visível, tem sérias implicações na ques-tão da redução de pobreza e bem-estar para as mulheres, uma vez que afeta gravemente seu pa-pel como “coletoras”. Estudos nas regiões tribais de orissa e Chattisgarth, estados da índia que já foram densamente cobertos por florestas, registra-ram como o desmatamento resultou em perda de vidas, em mulheres tendo que andar o quádruplo

Sarojini Thakur, Chefe da Sessão de Gênero, Secretaria da Com-

monwealtht, comunicação pessoal, 15 de maio de 2008.

CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO

O crescimento populacional, o aumento da riqueza mun-dial e a mudança dos padrões de consumo estão na base de muitas das tendências descritas. Está claro que os países desenvolvidos estão fazendo uso de recursos de forma insustentável. As pegadas ecológicas da Euro-pa, dos Estados Unidos e do Japão são muito maiores do que as dos países em desenvolvimento. Além disso, as economias emergentes já estão trilhando o mesmo caminho. Tanto a Índia quanto a China possuem pegadas ecológicas duas vezes maiores do que suas “biocapa-cidades” (Goldman Sachs 2007) – o índice que indica a capacidade de seus ecossistemas em fornecer recursos renováveis. O Brasil, por outro lado, tem uma das “bio-capacidades” mais altas do mundo, quase cinco vezes o tamanho de sua pegada ecológica, mas, infelizmente, esta vem diminuindo como resultado do desmatamento (Goldman Sachs 2007).

Se as práticas atuais forem mantidas, não será possível alimentar populações cada vez maiores e mais ricas sem que a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos sejam ameaçados. Com base apenas nas projeções popula-cionais, será preciso aumentar a produção de alimentos em 50% para atender a população mundial prevista para o ano de 2050 (Departamento das Nações Unidas para Questões Econômicas e Sociais/Divisão Populacional 2008). A produção de culturas irrigadas deverá aumentar em 80% até 2030 para atender a essa demanda.

Calcula-se que 35% da superfície da Terra já foram con-vertidos para cultivo agrícola, limitando, assim, a produti-vidade futura de sistemas naturais (Millennium Ecosystem Assessment 2005b). A maior parte da terra é utilizada pelo setor pecuarista. As pastagens compreendem 26% da superfície da Terra, ao passo que grãos para consu-mo animal são cultivados em cerca de um terço da terra arável (FAO 2006). A ampliação da produção agrícola terá efeitos na biodiversidade e nos serviços de ecossistema conforme mais terra for convertida para a produção de alimentos. O setor pecuário competirá diretamente com

os seres humanos pelas terras, a água e outros recursos naturais. O setor pecuarista é o maior responsável pela contaminação das águas. É também o principal fator do desmatamento: 70% da área desmatada na Amazônia são utilizados para pastagem e os grãos para alimenta-ção de animais são cultivados em grande parte das de-mais terras (FAO 2006).

MUDAnçAS CliMÁtiCAS E BioDivErSiDADE

As mudanças climáticas estão por trás de muitas das questões apresentadas neste capítulo. O ciclo El Niño-La Niña no oceano Pacífico demonstra claramente como a biodiversidade é sensível ao clima. Um pequeno aumento na temperatura da superfície do mar em 1976 e 1998 levou a uma série de fenômenos mundiais que fizeram o ano de 1998 ser conhecido como o “ano em que o mundo pegou fogo”. Os danos irreparáveis incluem (US Department of Commerce 2008):• as florestas queimadas que não se recuperarão em

uma escala de tempo relevante;• um aumento na temperatura da superfície das águas

no centro-oeste do oceano Pacífico de 19ºC para 25ºC;• prevalência de espécies mais tolerantes ao calor vi-

vendo dentro dos corais; • um deslocamento para o norte das correntes de ar.

Fenômenos complexos como os descritos acima de-monstram a nossa vulnerabilidade a pontos de ruptura para além daqueles diretamente relacionados com as crescentes temperaturas e níveis de dióxido de carbono.

As perdas de biodiversidade também podem contribuir para a mudança do clima de maneiras complexas. Há muitos exemplos de como as supersafras ou mudanças nos padrões de uso da terra foram responsáveis por mu-danças sociais e econômicas que levaram a uma maior dependência de carbono.

A drenagem das turfeiras resulta em perda de carbono. No entanto, as mudanças climáticas previstas poderiam resultar em altas taxas de liberação do carbono do solo,

da distância para colher produtos da floresta e na inabilidade de acesso às ervas medicinais, que fo-ram exauridas. Essa perda reduz renda, aumenta o trabalho pesado e afeta a saúde física. Há também evidências que demonstram que o status relativo das mulheres dentro da família é melhor nas vilas com cobertura florestal, onde sua contribuição para a renda familiar é maior do que nas vilas com escassez de recursos naturais.

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Biodiversidade, ecossistemas e bem-estar humano 21

contribuindo, assim, para maiores concentrações de gás de efeito estufa na atmosfera (Bellamy et al. 2005). Sob as mesmas condições climáticas, pradarias e florestas ten-dem a ter estoques de carbono orgânico mais altos do que terras cultivadas e são tidas como sequestradores líquidos de carbono. No entanto, o desmatamento e a intensifica-ção de áreas cultivadas estão em franca expansão.

A fim de compreender plenamente essas complexidades será preciso mais do que modelos econométricos de en-foque energético. Precisaremos levar em consideração o conhecimento de como nos adaptar e de como vulnera-bilidades podem surgir a partir dos processos ecológicos. Para tanto, devemos estabelecer um diálogo muito mais amplo do que o atual entre economistas, cien-tistas e ecologistas.

iMPACto SoBrE oS PoBrESUm aspecto da perda de biodiversidade é o seu alto, porém não reconhecido, impacto sobre as popula-ções pobres. Por exemplo, se a mudança do clima re-sultar em uma seca que diminua a renda do segmen-to mais pobre dos 28 milhões de etíopes pela metade, o balanço econômico global quase não seria afetado – o PIB mundial cairia em menos de 0,003%.

O problema da distribuição dos efeitos nocivos é particu-larmente difícil de ser equacionado porque os principais responsáveis pelo problema – os países ricos – não serão os mais afetados, pelo menos no curto prazo.

Os dados neste sentido são claros. As consequências da perda de biodiversidade e da degradação de serviços ecossistêmicos – água, alimentos e peixes – não estão sendo compartilhadas de forma equitativa entre as popu-lações do mundo. As áreas mais ricas em biodiversidade e serviços ecossistêmicos encontram-se nos países em desenvolvimento, onde bilhões de pessoas delas depen-dem para seu sustento. No entanto, os agricultores de subsistência, os pescadores, os pobres nas áreas rurais e as sociedades tradicionais são os mais afe-tadas pela degradação. E este desequilíbrio tende a au-

mentar ainda mais. As estimativas dos custos ambientais mundiais em seis categorias principais, das mudanças climáticas até a sobrepesca, demonstram que os custos são gerados pelos países de renda alta e média, mas seus efeitos são sentidos sobretudo nos países mais po-bres (Srinivasan et al 2007).

Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs) ex-pressam a intenção do mundo de reduzir a pobreza. Há fortes indícios de que estes objetivos só poderão ser atin-gidos se houver boas práticas ambientais e governança. Um exemplo que sugere este vínculo é a situação do Haiti (ver Quadro 2.5), em que a degradação florestal e suas consequências comprometeram o fornecimento de água e a produtividade agrícola a tal ponto que a erradicação da fome e da pobreza (ODM1) provou ser impossível, além de terem afetado a saúde e a mortalidade infantil (ODM4, ODM5 e ODM6). Na Tabela 2.1, fazemos o mapeamen-to dos serviços ecossistêmicos em relação aos ODM. A relação entre eles é profunda e abrangente e, por-tanto, todos os oDMs estarão comprometidos, e não apenas o oDM7 sobre a sustentabilidade ambiental, caso a degradação do ecossistema e as perdas de biodiversidade continuarem no ritmo atual.

NÃO É POSSÍVEL MANTERMOS AS COISAS COMO ESTÃO

Caso novas políticas não sejam implementadas, a perda de biodiversidade e de serviços ecossistêmicos continua-rá. Em alguns casos, essas perdas serão, inclusive, mais acirradas. Em outros, o ecossistema será degradado a ponto de não ser possível recuperá-lo. Alguns efeitos possíveis da falta de ação são:

• Áreas naturais continuarão a ser convertidas em terras para cultivo agrícola e serão afetadas pela expansão da infraestrutura e pelas mudanças climáticas. Até o ano de 2050, 7.5 milhões de quilômetros quadrados devem ser perdidos, ou seja, 11% dos níveis de 2000 (ver próxima seção) (Braat, ten Brink et al. 2008).

• A terra atualmente utilizada para cultivo de produtos agrícolas de forma extensiva (baixo impacto), que for-nece importantes benefícios da biodiversidade, será cada vez mais utilizada para a agricultura intensiva, com perdas de biodiversidade ainda maiores e com danos ao meio ambiente. Quase 40% da terra sendo utilizada para cultivo de produtos agrícolas de forma extensiva devem ser perdidas até o ano de 2050 (Bra-at, ten Brink et al. 2008).

• 60% dos recifes de coral podem morrer até 2030 em virtude de danos causados pela pesca, poluição, do-ença e invasão de espécies não nativas e do bran-queamento de coral, cada vez mais comum com a mudança do clima. Com isso, serão perdidos locais de procriação vitais e também fontes de renda impor-tantes para muitos países (Hughes et al. 2003).

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Page 24: Um relatório preliminar

22 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Mapa 2.4: Abundância Relativa de Espécies 2000 (MNP/OECD 2007)

Mapa 2.3: Abundância Relativa de Espécies 1970 (MNP/OECD 2007)

0-10 10-20 20-30 30-40 40-50 50-60 60-70 70-80 80-90 90-100 legenda para os mapas

Quadro 2.4: A mudança no uso do solo e a transformação dos serviços

Por séculos, os seres humanos têm causado a per-da da biodiversidade (conforme mapas abaixo). Até o ano 2000, apenas cerca de 73% da biodi-versidade natural global remanesciam. os maiores declínios da biodiversidade ocorreram nos campos e florestas temperadas e tropicais, onde as civiliza-ções humanas se desenvolveram primeiro (Mc neill e Mc neill 2003).

Espera-se que outros 11% da biodiversidade ter-restre se percam até 2050. isto é uma média, e inclui

as regiões desérticas, tundras e polares. Em alguns biomas e regiões, prevê-se a perda da biodiversidade em 20%. Áreas naturais continuarão a ser convertidas em áreas agricultáveis, sendo a corrente expansão de infra-estrutura e os crescentes efeitos das mudanças climáticas os maiores causadores da perda da biodi-versidade. Para o mundo como um todo, estima-se que a perda de áreas naturais no período de 2000 a 2050 seja de 7,7 milhões de quilômetros quadrados ou cerca de 750 milhões de hectares, que corresponde ao tamanho da Austrália. Estes ecossistemas naturais de-vem sofrer transformações devido ao uso da terra pelo homem nas próximas décadas. A perda da biodiversi-dade no estudo Custo da inação Política (Cost of Policy

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Biodiversidade, ecossistemas e bem-estar humano 23

0-10 10-20 20-30 30-40 40-50 50-60 60-70 70-80 80-90 90-100 legenda para os mapas

infra-estruturaMudanças climáticasÁrea cultivadaFlorestasÁrea de pastoFragmentaçãoBiocombustíveis madeireirosDeposição de nitrogênio

total

-12 -10 -8 -6 -4 -2 0ArE (%)

Mapa 2.5: Abundância Relativa de Espécies 2010 (MNP/OECD 2007)

Mapa 2.6: Abundância Relativa de Espécies 2050 (MNP/OECD 2007)

Figura 2.3: Perda global da biodiversidade (ARE) 2000-2050 e a contribuição das atividades para essa perda

Font

e: M

NP

/OE

CD

200

7

inaction – CoPi) é medida pelo indicador Abundância relativa de Espécies (ArE), uma medida confiável de biodiversidade que foi reconhecida pela Convenção sobre Diversidade Biológica.

o impacto na maneira de viver é local e, portanto, não se reflete necessariamente em números globais. os mapas dão uma ideia mais clara e as figuras abaixo mostram as alterações sofridas pela biodiversidade baseadas no indicador de Abundância relativa de Es-pécies (ArE) nos anos de 1970, 2000, 2010 e 2050. os maiores impactos são previstos para a África, índia, China e Europa (Braat, ten Brink et al. 2008).

Page 26: Um relatório preliminar

24 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

• Manguezais valiosos devem ser convertidos para uso particular, muitas vezes com prejuízos para as popu-lações locais. Áreas de procriação importantes serão perdidas, assim como as zonas de proteção contra tempestades e tsunamis.

• Se a pesca continuar nos níveis atuais, várias em-presas pesqueiras devem falir. O colapso da maioria das empresas pesqueiras do mundo pode ocorrer até a segunda metade do século a menos que haja uma resposta política eficaz e fiscalização constante (Worm et al. 2006).

Tabela 2.1: Serviços ecossistêmicos e os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM): Relações e trade-offs (compensações)

Serviços Ecos­sistêmicos

Relação com ODM

Relações com as metas

Resultado conflitante

Avaliação

Serviços de fornecimento e regulação

ODM 1: Erra-dicar pobre-za extrema e fome

Fornecimento diário de água, madeira e alimentação estabilizado: isso influencia o padrão material mínimo na vida dos pobres, alivian-do a pobreza e a fome.

Maiores conflitos pela água, exploração de re-cursos do solo, costeiros e marinhos e a resiliência da agrobiodiversidade poderiam ser trade-offs

Relações fortes e diretas: a inter-venção precisa ser receptiva aos serviços ecos-sistêmicos, à biodiversidade e à resiliência dos ecossiste-mas cultivados

Serviços de áreas úmidas e florestas

ODM 3: Promover igualdade en-tre os gêneros e capacitar mulheres

Madeira e água: proximidade e disponibilidade adequadas ajudariam alcançar igualdade entre os gêneros por reduzir essa carga que recai prin-cipalmente nas mulheres

Poderia haver maior ex-tração de água subterrâ-nea. O fortalecimento de direitos sobre a terra para as mulheres poderia, no entanto, garantir enorme-mente a prevenção da perda da biodiversidade

Relação indireta

Serviços de for-necimento (plan-tas medicinais) e regulação (água)

ODM 5: Aprimorar a saúde materna

Melhor disponibilidade de água potável e serviços médicos tradicionais criariam condi-ções viáveis (ver Quadro 2.3)

Relação indireta

Serviços de fornecimento e regulação

ODM 6: Combater HIV/AIDS, malá-ria e outras doenças

Isto seria facilitado au-mentando-se a disponibi-lidade de água potável

Relação indireta

Serviços de fornecimento

ODM 8: De-senvolver uma Parceria Global para o Desen-volvimento

Práticas de troca justas e igua-litárias e uma ordem econômi-ca global saudável refletiriam o custo real de exportação/importação na perspectiva dos serviços ambientais

Relação indireta

Serviços de fornecimento e regulação

ODM 4: Re-duzir mortali-dade infantil

Criando condições facilitado-ras, por exemplo por meio de água potável (veja Quadro 2.5)

Relação indireta

Serviços de fornecimento e regulação

ODM 2: Alcan-çar educa-ção primária universal

Fornecimento de serviços pode ser afetado pela expan-são de infra-estrutura para a educação (escolas e estradas)

Relação fraca ou pouco clara

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Biodiversidade, ecossistemas e bem-estar humano 25

Quadro 2.5: Ciclo vicioso da pobreza e da degradação ambiental: Haiti

o Haiti é o país mais pobre do Hemisfério oeste e um dos mais ambientalmente degradados. Mais de 60% de sua renda deriva de ajuda dos Estados Unidos e de outros países, e 65% de sua popula-ção sobrevive com menos de US$ 1 por dia. Pra-ticamente todo o país era, originalmente, coberto por florestas, mas hoje há menos de 3% de co-bertura florestal remanescente. Como consequên-cia, de 1950 a 1990, a quantidade de terra arável reduziu em mais de dois quintos devido à erosão do solo. Ao mesmo tempo, o desmatamento dimi-nuiu a evaporação para a atmosfera no país, e a quantidade de chuva total em muitas localidades caiu em mais de 40%, reduzindo o fluxo de água e a capacidade de irrigação. o Sistema de irrigação de Avezac suporta apenas metade dos 9.500 acres (3.845 hectares) inicialmente planejados. quando há chuva, os morros não conseguem mais reter ou filtrar a água de maneira eficiente. Devido ao

desmatamento, mesmo chuvas moderadas podem produzir enchentes devastadoras. Águas correntes e subterrâneas são carregadas com sedimentos e poluição que degradaram os ecossistemas estuá-rios e costeiros. Como consequência, quase 90% das crianças haitianas têm infecção crônica cau-sada por parasitas intestinais presentes na água que bebem. Devido às enchentes, o Haiti perdeu metade de seu potencial hídrico, uma vez que a Barragem de Peligre foi entupida com sedimentos.

o Haiti é um clássico exemplo do “círculo vicioso” de extrema pobreza e degradação ambiental. Uma boa parte da pobreza e do sofrimento humano no país resulta da perda de suas florestas, e a própria pobreza extrema é uma das causas do desmata-mento e uma poderosa barreira ao manejo florestal sustentável. A diminuição da pobreza deve ser a estratégia central para restaurar a biodiversidade e as florestas do Haiti.

AmorandChristensen2008

• Conforme o comércio e a mobilidade globais aumen-tam, também aumentarão os riscos de invasão de espécies não nativas prejudiciais à produção de ali-mentos e madeira, infraestrutura e saúde.

Se quisermos evitar essas consequências e salvaguardar o nosso capital natural e o bem-estar de gerações futu-ras, não podemos continuar agindo como de costume, fazendo o business-as-usual. A falta de políticas tem um custo muito alto.

No entanto, algumas soluções já estão sendo postas em prática e a economia teria um importante papel a desempenhar. Apesar das florestas estarem sob ameaça de serem convertidas para o cultivo agrícola, em pastos ou para a produção de biocombustíveis, elas são impor-tantes sequestradores de carbono e repositórios de bio-diversidade e essa capacidade poderia ser reconhecida por meio de um valor de mercado mais alto (ver REDD no Capítulo 4).

QUAL O PRÓXIMO PASSO?

Administrar a demanda por alimento, energia, água, me-dicamentos e matéria-prima e ao mesmo tempo minimi-zar os impactos negativos sobre a biodiversidade e os serviços de ecossistema é o principal desafio para a so-ciedade atual. Alcançar um equilíbrio adequado entre as demandas exige a compreensão do fluxo de recursos e da capacidade biológica necessária para sustentar estes fluxos e absorver os resíduos.

A partir da visão geral acerca dos problemas que aco-metem a biodiversidade, os serviços de ecossistema e a cadeia de bem-estar humano apresentada neste capítulo, podemos identificar cinco vertentes. Essas vertentes po-dem ajudar na priorização dos temas apresentados em Potsdam em março de 2007.

1. O problema da perda da biodiversidade é cada vez mais urgente em termos do ritmo, dos custos desta perda e dos riscos em cruzar os “pontos de ruptura”.

2. A nossa compreensão crescente, ainda que difusa, proporciona subsídios suficientes para justificar ação imediata.

3. Ainda está em tempo de agirmos, mas a janela de oportunidade está se fechando.

4. Mudanças aparentemente pequenas em um local po-dem ter impactos imprevisíveis, porém significativos, em outros locais.

5. Os pobres são sempre os que sofrem de forma mais aguda com essa situação.

O clássico desafio de aumentar as oportunidades eco-nômicas e fornecer bens e serviços continua atual, mas agora há que se levar em consideração os limites eco-lógicos globais. Da mesma forma, não alcançaremos a justiça social se aumentarem as desigualdades entre os que usufruem os bens e serviços ecológicos e aqueles que não têm acesso a eles. O ressentimento cada vez maior em relação ao uso desigual dos recursos do pla-neta pode prejudicar a colaboração e a confiança inter-nacionais, comprometer os benefícios de uma economia global integrada e até mesmo ameaçar a sua existência.

Page 28: Um relatório preliminar

26 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

É preferível agir de forma preventiva e reduzir os déficits ecológicos antes que tenhamos uma situação insusten-tável. Não haveria necessariamente um período de priva-ções se a demanda por recursos ecológicos diminuísse. Na verdade, seriam até criadas oportunidades de cresci-mento econômico e melhoria da qualidade de vida. Por outro lado, há muitos exemplos históricos que demons-tram que quando as sociedades que operam com um déficit ecológico são forçadas a reduzir o uso de recursos e utilizar apenas sua própria “biocapacidade”, ocorre um declínio acentuado na qualidade de vida (Diamond 2005).

Ainda temos tempo de agir. Uma grande variedade de estratégias e abordagens já está sendo utilizada para criar soluções tecnológicas e organizacionais com vistas a reduzir o impacto do ser humano na natureza. Entre elas, podemos citar:• Natural Step (www.naturalstep.org), biomimética

(Benyus 1997); • Factor 4/Factor 10 (www.factor10-institute.org);• Natural Capitalism (Hawken et al. 1999); • Cradle to Cradle Design (www.mbdc.com), ecologia

industrial (www.is4ie.org); • emissões zero (http://www.zeri.org/); and • iniciativas em relação a resíduos, arquitetura susten-

tável etc.

Tecnologias sociais também estão sendo desenvolvidas. Por exemplo, a reforma tributária ecológica cobra impos-tos a partir do volume de resíduos gerados ao invés do trabalho realizado (Pearce et al. 1989).

Medidas econômicas que não levam em conta as falhas do mercado e da regulação, além de políticas que não conseguem alcançar níveis adequados de conservação da biodiversidade e dos ecossistemas, parecem estar na base do crescimento insustentável da sociedade. Des-sa forma, precisamos nos fazer duas perguntas básicas. Em primeiro lugar, quais são as ferramentas econômicas necessárias para nos guiar em direção a um futuro sus-tentável e seguro do ponto de vista ecológico? Segundo, como essa “caixa de ferramentas” econômica pode nos ajudar a avaliar e a reformar políticas para garantir desen-volvimento sustentável, segurança ecológica e a conse-quente conservação de ecossistemas e biodiversidade?

Os próximos capítulos tentam encontrar respostas para estas perguntas fundamentais. No Capítulo 3, examina-mos como a economia dos ecossistemas e da biodiversi-dade pode ser utilizada para atribuir valor aos benefícios desconhecidos e aos custos da conservação da biodiver-sidade. No Capítulo 4 investigaremos alguns exemplos bem-sucedidos de como a economia pode nos auxiliar a desenvolver políticas para o futuro.

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Page 30: Um relatório preliminar
Page 31: Um relatório preliminar

A caminho de um marco de valoração 29

Dalia Amor CondeDuke University, Comunicado pessoal, 27 de abril de 2008

O capítulo anterior demonstrou as várias dimen-sões do declínio contínuo dos ecossistemas e da biodiversidade, o seu significativo impacto

sobre a humanidade e a necessidade urgente de ações. Aqui consideramos como a falha de reconhecimento do valor econômico da natureza contribuiu para este declínio contínuo. Nós avaliamos o desafio de estabelecer valores econômicos advindos dos benefícios do ecossistema e da biodiversidade que não são levados em consideração atualmente e consideramos questões vitais de ética e equi-dade que precisam estar no cerne desta avaliação. Este capítulo identifica as dificuldades em avaliar os serviços ecossistêmicos e os principais aspectos do trabalho que vamos realizar na Fase II, quando essas dificuldades serão abordadas enquanto se firma um marco preferencial e as metodologias para estimar os valores dos ecossistemas e da biodiversidade.

MUITAS FALHAS, UM úNICO PROBLEMA

A perda da biodiversidade e a degradação dos ecossis-temas continuam, apesar de formuladores de política, administradores, ONGs e empresas no mundo todo estarem buscando formas de interromper a corrente. Existem várias razões para essa perda, mas motivado-res econômicos perversos, como as falhas de mercado, assimetria de informação e falhas de políticas são fatores significativos. Os mercados tendem a não alocar valores econômicos aos grandes benefícios públicos da conser-vação, mas o fazem quanto aos bens e serviços privados, cuja produção pode resultar em dano aos ecossistemas.

O termo falha de mercado pode se referir a qualquer coisa desde falta de mercados para bens e serviços pú-blicos (chamada falha de bens públicos, por exemplo, ausência de “mercados” para a conservação de espé-cies e para a maioria dos serviços de regulação e suporte dos ecossistemas) até imperfeições estruturais e proces-suais de mercado que geram ineficiência e distorção (por exemplo, pode-se argumentar que algumas distorções no preços do carbono atualmente sejam atribuídas a te-tos baixos de emissões). Além disso, há potencial para que instrumentos econômicos produzam resultados so-cialmente inaceitáveis – pode-se dizer que os mercados de carbono ajudaram a legitimar os níveis de emissão dos gases de efeito estufa (42 bilhões de toneladas), o

Quadro 3.1: Projetos de Estrada na Floresta Maia: falha de mercado a partir da falha de informação

os projetos de construção da estrada na reserva da Biosfera Maia para ligar México e Guatemala estiveram sujeitos a uma avaliação de custo-bene-fício. Uma área estimada em 311.000 hectares do habitat do jaguar encontrava-se em risco de des-matamento devido a estes projetos. Alguns dos projetos mostraram taxas negativas de retorno de investimento baseando-se no aspecto econômico, enquanto outros seriam negativos se levássemos em consideração apenas as emissões de dióxido de carbono (25 milhões de toneladas em 30 anos). Uma avaliação mais completa, incluindo o valor da biodiversidade, apresentaria conclusões mais firmes em direção à continuidade da conservação

que talvez represente cinco vezes mais que a habilidade da Terra em absorver estes gases (Stern, 2006).

A dimensão do desafio da falha de mercado não deve ser subestimada: para alguns serviços, (por exemplo: beleza cênica, funções hidrológicas e ciclos de nutrientes) é difí-cil até mesmo de se obter um perfil sobre a demanda e a oferta. Há um elemento de falha de informação que leva à falha de mercado.

Existem muitos casos no mundo em que a falha de in-formação é superada por medidas como a Avaliação de Impacto Ambiental (AIA). É possível fornecer argumentos que levam a opções menos destrutivas. A viabilidade de projetos de construção de estradas que ligam México e Guatemala através da floresta Maia (veja quadro 3.1) foi economicamente questionada. Na Índia, a informação fornecida ao Supremo Tribunal indiano a respeito do valor dos ecossistemas e da biodiversidade ajudou a estabele-cer taxas de compensação para a conversão da floresta, o que tornará mais difícil para as autoridades competen-tes tomar decisões que destruam o valor público. No en-tanto, a falha de informação é comum. Por exemplo, as

A CAMINHO DE UM MARCO DE VALORAçãO3

Page 32: Um relatório preliminar

30 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Quadro 3.2: O efeito dos subsídios na pesca

os subsídios são considerados um dos motivado-res mais importantes da pesca excessiva, e, por-tanto, motivadores indiretos da degradação e do esgotamento da biodiversidade marinha.

• os subsídios financiam a expansão da pesca. Globalmente, o fornecimento de subsídios à indústria da pesca foi estimado em US$ 20-50 bilhões anuais, o último aproximadamente equi-valente ao “valor final de mercado da pesca”.

• Mais da metade dos subsídios no Atlântico nor-te têm efeitos negativos por causa do desen-volvimento das frotas. isto inclui subsídios de

Avalição Ecossistêmica do Milênio 2005a: Capítulo 18

desguarnição, que normalmente ocorrem para modernização das frotas e aumento de seu do poder de pesca.

• Embora a quantidade de embarcações de pes-ca tenha se estabilizado no final da década de 1990, os subsídios para combustível mantêm as frotas operando até mesmo quando os pei-xes são escassos.

• A Política Comum de Pesca da União Europeia, por exemplo, permite que as embarcações se-jam desguarnecidas para reduzir o esforço de alguns países enquanto subsidiam simultane-amente outros para aumentar sua capacidade de pesca.

autoridades locais concedem licenças para a conversão do solo, o que leva à fragmentação do habitat ou dani-fica o meio ambiente por causa de ganhos econômicos privados marginais. Com frequência, os tomadores de decisão não possuem fatos, fundamentos e argumentos suficientes ou mesmo apoio para tomar uma decisão di-ferente e evitar a perda da biodiversidade. Isto é desas-troso, uma vez que a biodiversidade, hoje perdida, traria mais benefícios para a região que os ganhos privados. Existem muitos casos de perda econômica local e social em prol de ganhos privados a curto prazo.

A falta de direitos de propriedade bem estabelecidos é outra causa para a falha de mercado. Muitas pessoas em países em desenvolvimento podem ter ineficazes direitos legais sobre a terra onde vivem e trabalham. Isto pode se tornar um incentivo para destruir a terra ao invés de gerenciar sua sustentabilidade. As falhas de política surgem devido a incentivos que en-corajam uma ação prejudicial. Incentivos fiscais e subsí-dios podem levar a que o mercado trabalhe para a des-truição do capital natural, até mesmo quando os ativos naturais oferecem um fluxo sustentável de serviços para a economia e para a sociedade. Subsídios ambientalmen-te prejudiciais (em inglês EHS – Environmentally harmful subsides, vide Capítulo 4, sobre subsídios) prejudicam práticas ambientais sólidas, uma vez que encorajam ou-tras atividades menos desejáveis. A pesca é um exemplo (veja quadro 3.2). Este tipo de subsídio com frequência é economicamente ineficiente, incitando uma crescente demanda para reforma.

Falhas de política também ocorrem quando o sistema de incentivos fracassa em recompensar aqueles que trabalham para melhorar o meio ambiente, ou em pena-lizar aqueles que causam os danos ambientais. Muitas práticas agrícolas podem incentivar a biodiversidade de alto valor. Mas sem o reconhecimento apropriado, por exemplo, por meio de pagamentos pelos serviços am-

bientais (PSA), algumas boas práticas correm o risco de desaparecer.

A ausência de mecanismos compensatórios àqueles que perdem com os danos ao meio ambiente é frequente. Normalmente, atividades de mineração não cobrem os prejuízos causados no curso dos rios, como a degrada-ção de peixes e os danos à saúde. Muito embora estas falhas ainda sejam a regra, existem mudanças em alguns países. A Costa Rica é um exemplo de quem pratica o PSA (veja o Capítulo 4, Quadro 4.3), embora a aborda-gem seja amplamente usada em países desenvolvidos na forma de subsídios agro-ambientais. Afinal, compartilhar benefícios está se tornando um conceito mais aceitável e pagamentos de passivo e compensação são oferecidos em níveis que começam a atuar como incentivos reais. Estes aspectos serão abordados mais profundamente no próximo capítulo.

Por último, devido às pressões populacionais, à pobreza e à baixa efetividade das medidas de proteção, as políti-cas de desenvolvimento em alguns momentos resultam em ecossistemas naturais transformados em paisagens agrícolas ou urbanas, em situações que por razões so-ciais e ambientais não seriam as escolhas ideais. Este é um exemplo de falha de política motivada pela falha institucional e de informação. São necessárias redes for-mais e informais, além de regras para respaldar as res-postas às políticas para que gerenciem de forma eficaz os serviços ecossistêmicos. Os custos destes marcos institucionais podem ser chamados de custos da política. Retomaremos esse tópico posteriormente.

Porém, antes de discutir e analisar os benefícios e custos gostaríamos de levantar três questões importantes – ris-cos, incertezas e o princípio de equidade – que devem ser abordados. Não apenas porque estas questões in-fluenciam a análise, a avaliação e o planejamento de so-luções devido às várias falhas descritas acima, mas por-

Page 33: Um relatório preliminar

A caminho de um marco de valoração 31

Tabela 3.1: Valorando a “opção de biodiversidade”

Medidas de: opção Financeira

“opção de Biodi-versidade”

a) Valor corrente

Preço Spot Todas as variáveis – estado atual

b) Nível de Proteção

Preço Strike Todas as variáveis – estado futuro

c) Vida útil da proteção

Expiração Horizonte de conservação

d) Incerteza Volatilidade Implícita

Incerteza modelada

e) Desconto Taxa de Juros Taxa de desconto social

Esta analogia com opções financeiras ilustra como seria complexo precificar uma “opção de biodiversi-dade”. Todas as 5 variáveis de a) a e) para uma opção financeira tem valores de mercado, e NENHUMA de-las valora a biodiversidade.

que são, em essência, questões éticas profundas que se traduzem em premissas subjacentes para o nosso marco analítico. Nós assinalamos que selecionar uma taxa de desconto apropriada, um componente vital de qualquer análise custo-benefício, é o resultado de escolhas éticas implícitas ou explícitas.

ECONOMIA, ÉTICA E EQUIDADE

“A economia é o mero arsenal; seus alvos são escolhas éticas.”

Sanjeev Sanyal, Diretor, GAISP

A economia desenvolveu técnicas para lidar com riscos, incertezas e questões de equidade. O desconto é a ferra-menta chave em muitas análises econômicas convencio-nais porque ajuda a estimar o valor do fluxo de caixa re sultante de decisões tomadas hoje. As abordagens econômicas convencionais também podem ser impor-tantes para valorar a biodiversidade, mas não podem, ne-cessariamente, ser aplicadas de forma rotineira devido ao potencial de consequências extremas de decisões sobre a biodiversidade. Destacamos abaixo a complexidade de apli-cação da economia em campos como o da biodiversidade.

rEConHECEr riSCoS E inCErtEZAS

o tratamento dado às mudanças climáticas no re-latório Stern mencionou uma questão amplamente reconhecida porém ainda não conclusiva sem dei-xar arestas: como avaliar resultados probabilísticos, quando um dos resultados é o extermínio da civiliza-ção que conhecemos?

O dilema também se aplica quando se avaliam os riscos de colapso do ecossistema. A dificuldade foi ressaltada quando um estudo acadêmico (Costanza et al. 1997) es-timou o valor econômico de serviços ecossistêmicos em US$ 33 trilhões (comparado a US$ 18 trilhões do PIB global). Este resultado foi criticado, por um lado por ser muito alto, mas por outro lado, por ser “uma questão que subestima significativamente o infinito” (Toman, 1998).

Se expressada na linguagem das finanças, a economia global é uma “opção escassa” para as mudanças climá-ticas e a biodiversidade e precisa pagar um ágio para comprar proteção. O resultado mais citado do Relatório Stern é que 1% do custo anual seria necessário para proteger a economia mundial de uma perda de até 20% do consumo global – este é um exemplo da mencionada

“opção de ágio”.

No caso da perda de biodiversidade e ecossistemas, a proporção destes ágios dependerá de vários aspectos do ecossistema em questão: a sua situação atual, o pon-to limite em que ocorre falha na provisão dos serviços ecossistêmicos, a sua meta para a conservação e a me-

lhor estimativa das incertezas (veja Tabela 3.1). Este é um exercício extremamente complexo, pois não há nenhum valor de mercado para estas medidas.

Descrevemos no Capítulo 2 os riscos alarmantes do “bu-siness-as-usual”: a perda da água doce devido ao des-matamento, erosão do solo e perda de nutrientes, perdas de produtividade agrícola, perda de pesca; problemas de saúde e a pobreza. A tentativa de valorar as perdas levanta dimensões éticas importantes, especialmente a respeito do valor do bem-estar humano no futuro com-parado com o presente. Acreditamos que a economia da incerteza e do desconto pode ajudar a tratar estas ques-tões éticas.

tAXA DE DESConto E étiCA

Compreendemos questões (como a extinção de espé-cies) para as quais não há um consenso sobre o aspecto da ética mais adequado a ser aplicado. A natureza ética dessa questão é, no entanto, amplamente reconhecida. Um grupo de especialistas em ética (IUCN – Grupo de Especialistas em Ética, 2007) recentemente descreveu a questão da seguinte maneira:

“Se o comportamento humano é a principal causa da cri-se de extinção da biodiversidade, a ética – que é a averi-guação do que pessoas e sociedades consideram cor-reto a ser feito em determinada situação – deve ser parte da solução. Entretanto, a ética raramente é aceita como um ingrediente essencial e normalmente é descartada como sendo uma questão muito teórica para ajudar com

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32 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Joan Martinez-Alier 2008

Quadro 3.3: O desconto e o paradoxo otimista

Há duas razões principais para descontar. A pri-meira é chamada de “preferência temporal” pelos economistas. refere-se à propensão dos indivídu-os a optar por 100 unidades de poder de compra hoje a 101, 105, ou mesmo 110 no próximo ano, não por causa da inflação de preços (que está ex-cluída da justificativa), mas devido ao risco de fi-car doente ou morrer e não ser capaz de usufruir da renda no ano seguinte. independente da razão para esta atitude, ela não deve ser aplicada a uma nação ou sociedade com um horizonte de tem-po de milhares ou centenas de milhares de anos. Economistas, geralmente, criticam a “preferência temporal”. A crítica contrária mais famosa foi, pro-vavelmente, a do economista de Cambridge, Frank ramsey em 1928.

neste contexto de teoria do crescimento, os eco-nomistas concordam com o desconto no futuro por outras razões. Eles podem concordar com ra-msey quando diz que usufruir posteriormente de benefícios em razão de fazê-lo de forma imediata, é uma prática indefensável e surge, meramente, pela falta de imaginação”. Mas o abatimento ocor-rerá, segundo o próprio ramsey, porque se assu-me que o investimento de hoje e a mudança téc-nica gerarão crescimento econômico. os nossos descendentes serão mais ricos do que nós. Eles terão três, quatro ou mesmo cinco carros por fa-mília. Portanto, a utilidade marginal, ou satisfação incremental que obterão pelo terceiro, quarto ou quinto carro, será cada vez mais baixa. Descontar à medida que a utilidade marginal decresce pode ser eticamente justificado.

Crescimento é, portanto, a razão para menos-prezar o consumo e os benefícios futuros. Seria

também uma razão para desprezar futuras neces-sidades para bens e serviços ambientais? não, principalmente se pensarmos em eventos irrever-síveis. o crescimento econômico pode produzir Parques temáticos jurássicos para crianças e adultos, mas nunca vai conseguir a ressurreição do tigre caso ele desapareça.

A teoria do crescimento é teoria econômica. não exclui de seus cálculos o valor da perda da nature-za e tampouco retira das contas os gastos “defen-sivos” – aqueles gastos que ocorrem nas tentativas de compensar a perda da natureza (construindo diques contra o aumento no nível do mar induzido pelas mudanças climáticas ou vendendo água en-garrafada em áreas poluídas).

Se tentarmos calcular o aumento real da econo-mia em razão de investimentos e mudanças posi-tivas (que ninguém negaria) e a perda de serviços ambientais causada pelo cresci men to econômico, o equilíbrio seria duvidoso. De fato, entramos na questão de valores incomensuráveis.

o desconto dá espaço para o surgimento do “pa-radoxo do otimista”. os economistas modernos favorecem o desconto não por causa da “prefe-rência pura”, mas por causa do decréscimo da utilidade marginal de consumo na medida em que ocorre o crescimento. A premissa do crescimen-to (medido pelo PiB) justifica usarmos uma maior quantidade de recursos e poluirmos ainda mais. Desta forma, nossos descendentes, que de acor-do com a premissa, encontrariam-se em melhor condição que nós, paradoxalmente, do ponto de vista ambiental, enfrentarão situações piores que as atuais.

problemas práticos e urgentes confrontando o conser-vacionismo.”

Os economistas descontam qualquer benefício futuro quando comparado a um benefício atual. Por um lado, é apenas uma expressão matemática de uma visão de sen-so comum que um benefício hoje vale mais que o mesmo benefício no futuro. Mas as considerações éticas surgem, por exemplo, quando consideramos desistir da renda atu-al em benefício das gerações futuras, ou o oposto: ganhar benefícios agora à custa das gerações futuras.

A taxa de desconto financeiro considera apenas o valor momentâneo do dinheiro ou o preço pela sua escassez e relaciona o valor presente de um fluxo de caixa futuro

com o seu valor nominal ou valor futuro. As taxas de des-conto simples para bens e serviços consideram a prefe-rência presente, ou em outras palavras, a preferência de um benefício atual ao invés de um benefício futuro. As taxas de desconto social são mais complexas e incluem aspectos éticos de difícil escolha: consumir agora versus consumir depois – maiores benefícios para a sociedade em si que para o indivíduo. As preferências embasadas nesta escolha cobrem o valor relativo de bens e serviços futuros podendo seu retorno ser maior ou menor que o atual e transferido a outra pessoa ou geração.

O quadro 3.3, acima, explica o conceito básico de des-conto e o paradoxo da abordagem econômica conven-cional.

Page 35: Um relatório preliminar

A caminho de um marco de valoração 33

DESConto E EqUiDADE intErGErACionAl

O Relatório Stern ressaltou a importância crucial da escolha das taxas de desconto em decisões de longo prazo que vão além dos cálculos econômicos conven-cionais. A taxa de desconto foi descrita como “a maior incerteza de toda a economia das mudanças climáticas” (Weitzman, 2007).

Isto acontece porque os eventos considerados vão acon-tecer em 50 anos ou mais e o resultado de escolher di-ferentes taxas de desconto em períodos tão longos de tempo é significativo, como demonstra a tabela 3.2. O efeito de apenas pequenas diferenças na taxa de des-conto, aplicado a um fluxo de caixa de US$ 1 milhão em 50 anos é dramático. Uma taxa de desconto zero sig-nifica que o custo ou o benefício vale o mesmo hoje do que em 50 anos, mas pequenos aumentos na taxa resul-tam em reduções substanciais do valor presente no fluxo de caixa futuro. Uma taxa de desconto de 0.1% produz um valor presente de 95% do fluxo de caixa futuro (US$ 951.253). Descontando a 4%, o resultado é apenas 14% do fluxo de caixa futuro, somente US$ 140.713.

Aplicar uma taxa de desconto de 4% em 50 anos significa que a biovidersidade futura ou determinado benefício ecossistêmico vai valer para nossos netos apenas um sétimo do que vale para nós!

Se a nossa abordagem ética vê nossos netos valoran-do a natureza da mesma forma que a nossa geração e merecendo tanto quanto nós merecemos, a taxa de desconto para valorar este benefício ao longo deste pe-ríodo de tempo deve ser zero. Diferentemente de bens manufaturados e serviços que estão crescendo em quantidade (por isso, o argumento de descontar futuras unidades de mesma utilidade), os serviços da nature-za não são de fato propensos a serem produzidos em maiores quantidades no futuro. Talvez a taxa de descon-to para biodiversidade e benefícios do ecossistema deve inclusive ser negativa baseada no fato de que gerações futuras serão mais pobres em termos de meio ambien-te do que aquelas que vivem hoje, como Paul Ehrlich (2008) sugeriu (vide também quadro 3.3). Isto levanta questões importantes a respeito das políticas atuais que assumem taxas de desconto positivas (Dasgupta, 2001; 2008). Quando se espera que a renda cresça, bens e serviços prestados mais tarde são relativamente menos valorados (porque representam uma porção menor da renda futura). Isto respalda o usual fator de desconto po-sitivo. O contrário é verdade quando se espera que os valores dos bens ou renda diminuam – bens e serviços futuros se tornarão mais valorados que no presente. No caso da biodiversidade é questionável se será igual, mais ou menos disponível no futuro e, portanto, até mesmo a direção da taxa de desconto é incerta.

DESConto EM UM ContEXto DE BEM EStAr

Na Economia do Bem-Estar o objetivo é maximizar o benefício social do consumo para todos os indivíduos, sendo que o “consumo” deve cobrir uma ampla gama de bens e serviços, inclusive saúde, educação e meio ambiente. Agregar utilidade social para os indivíduos é problemático e propenso a juízos de valor, como, por exemplo, comparar o valor do consumo para uma pes-soa rica e para uma pobre.

Quais são as taxas de desconto “apropriadas” para as comunidades e países com pobreza e dificuldades sig-nificativas? Considerando o alívio da pobreza agora, os benefícios e custos do pobre de hoje são mais valorados do que os das futuras gerações (que poderão viver em melhores condições). Este é um argumento ético para altas taxas de desconto!

Mas o pobre de hoje confia diretamente na conservação da biodiversidade para suprimentos vitais como água doce e madeira. Portanto, é justificável fornecer mais opções de renda para o rico de hoje se isto prejudicasse estes supri-mentos vitais? Considere alguns exemplos de trade-offs eticamente indefesáveis. Um ecossistema florestal pode ser essencial para o bem estar de agricultores pobres a jusante de um rio, por meio do fornecimento de fluxos de nutrientes, aquíferos de recarga, regulação de fornecimen-to de água sazonal, prevenção de erosão do solo e conten-ção do dano causado pelas enchentes e perdas devido à seca. Pode ser eticamente difícil justificar a destruição de uma bacia hidrográfica com significativa cobertura flores-tal para gerar valor econômico que tem utilidade para os agentes desta destruição (por exemplo, lucros obtidos com minerais e madeira, ou com a geração de empregos, etc.), enquanto, por outro lado, os custos de restaurar benefícios de ecossistemas destruídos podem ser os mesmos ou me-nores do ponto de vista econômico, mas impossíveis de serem suportados em termos humanos na medida em que recaem sobre estas comunidades rurais menos favoreci-das (veja quadro 3.4). Nós vemos estas situações como efeitos ruins dos objetivos econômicos –  a economia é o mero arsenal, mas suas metas são escolhas éticas.

Tabela 3.2: Taxas de desconto e resultados

Fluxo de Caixa futuro

taxa de desconto

anual

valor presen-te de fluxo de caixa futuro

1.000.000 4 140.713

1.000.000 2 371.528

1.000.000 1 608.039

1.000.000 0,1 951.253

1.000.000 0 1.000.000

Page 36: Um relatório preliminar

34 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

DESContAnDo AS PErDAS DA BioDivErSiDADE

Nós não sugerimos que haja sempre “trade-offs” (com-pensações) defensáveis para os ecossistemas e biodi-versidade, especialmente se ecossistemas significativos pararem de funcionar em conjunto como provedores de serviços de abastecimento e de regulação, ou se a bio-diversidade sofrer extinções significativas. A avaliação de trade-offs usando a análise custo-benefício e o desconto funciona melhor para escolhas marginais, envolvendo pe-quenas perturbações sobre um caminho de crescimento comum. Entretanto, a realidade é que há trade-offs, ex-plícitos ou implícitos, em qualquer escolha humana. Até mesmo quando se tenta estabelecer uma fronteira em que os trade-offs não se aplicam, isto já constitui um trade-off.

Os trade-offs envolvem a escolha entre alternativas e, no caso da perda da biodiversidade, não há sempre alterna-tivas comparáveis. Para que o desenvolvimento seja con-

siderado sustentável, uma condição limítrofe chamada “sustentabilidade fraca” é definida como sendo a situação em que qualquer capital, natural, humano e físico, não pode ser diminuído. Mas também sugere que uma forma de capital pode ser substituída por outra, o que não é verdade: mais riqueza física nem sempre pode ser subs-tituída por um meio ambiente saudável, nem vice-versa. Entretanto, é importante que todos os aspectos do “ca-pital natural” do trade-off sejam, pelo menos, apropria-damente reconhecidos, valorados e refletidos na análise custo-benefício, e mesmo isto ainda não está sendo fei-to na maioria das decisões relacionadas aos trade-offs. Existe uma condição limite chamada “sustentabilidade forte” o que requer a não diminuição do capital natural líquido: isto é mais difícil de alcançar, muito embora es-quemas de reflorestamento compensatório sejam exem-plos de instrumentos desenhados para alcançar susten-tabilidade forte. Finalmente, qualquer trade-off precisa ser eticamente defensável e não apenas economicamente consistente.

Gundimeda e Sukhdev 2008

Quadro 3.4: “PIB dos pobres”

o significado econômico completo da biodiver-sidade e do ecossistema não figura nas estatísti-cas do PiB, mas indiretamente a sua contribuição para a subsistência e bem estar são reconhecidos. Contrariamente, o custo real de esgotamento ou degradação do capital natural (disponibilidade de água, qualidade da água, biomassa da floresta, fertilização do solo, solo arável, micro climas se-veros etc) se verifica no nível micro, mas não é re-gistrado ou levado à atenção dos formuladores de políticas. Se levarmos em consideração os setores agrícolas, criação de animais e silvicultura de for-ma apropriada, as perdas significativas do capital natural observado tem um impacto muito forte na produtividade e riscos nestes setores. Coletiva-mente, nós denominamos estes setores (agricul-tura, criação animal e silvicultura informal) o “PiB dos Pobres” porque é a partir destes setores que muitos dos pobres do mundo em desenvolvimento obtêm a sua subsistência e emprego. Além disso, vemos que o impacto da degradação do meio am-biente e perda da biodiversidade afeta a propor-ção do PiB que chamamos de “PiB dos pobres”.

o uso final das valorações de ecossistemas e de biodiversidade na Contabilidade da renda nacio-nal, ou por meio de contas satélites (físicas e mo-netárias) ou em contas ajustadas do PiB (“Contas verdes”) não garante que formuladores de política leram os sinais corretos para políticas com tra-de-offs significativos. Um “foco no beneficiário” ajuda a reconhecer melhor o significado humano

destas perdas. Explorando um exemplo (o pro-jeto GAiS, Green Indian States Trust 2004-2008) para este relatório preliminar, descobrimos que os beneficiários mais significativos da biodiversida-de da floresta e serviços ecossistêmicos são os pobres e o impacto econômico predominante da perda ou negação destas entradas é a segurança de renda e bem estar do pobre. Se focarmos no princípio da “equidade” esta conclusão se fortale-ce ainda mais, já que a pobreza dos beneficiários faz com que as perdas em serviços ecossistêmi-cos sejam ainda mais agudas (proporcionalmente a suas rendas e subsistência) que para o povo da índia como um todo. Descobrimos que o “PiB dos Pobres” per capita na índia (utilizando cálculos e a taxa de câmbio de 2002/03) aumentou de US$ 60 para US$ 95 se incluirmos o valor dos serviços ambientais; do mesmo modo, se lhes são negados estes serviços, o custo de substituir estes meios de subsistência perdidos, ajustado segundo o princípio da equidade, subiria a US$120 per capita, o que é mais uma evidência do “ciclo vicioso” da pobreza e da degradação ambiental.

Exploraremos esta abordagem para o mundo em desenvolvimento mais amplamente na Fase ii. nós acreditamos que por meio do uso destas medidas setoriais e forçando uma reflexão do princípio da equidade por meio do seu significado “humano” (uma vez que a maior parte dos 70% mais pobres do mundo depende desse fator) deveremos dar a importância adequada na formulação de política e contribuir para deter a perda de biodiversidade.

Page 37: Um relatório preliminar

A caminho de um marco de valoração 35

Com a biodiversidade, não estamos apenas considerando horizontes de longo prazo como é o caso das mudanças climáticas. A degradação dos ecossistemas já é extensi-va e observável e alguns de seus efeitos são dramáticos, como a perda da água doce que já está causando tensão internacional. Perdas significativas da biodiversidade e extinções de espécies estão acontecendo no presente e espécies emblemáticas como o tigre-de-bengala-real na Índia estão sob ameaça. Uma taxa de desconto maior ou menor pode mudar a quantificação do custo social de perdas iminentes, mas não mudaria a natureza do resul-tado, perda de serviços ecossistêmicos vitais e da valiosa biodiversidade.

Nos documentos complementares da Fase I (IUCN, 2008), aproximadamente 200 estudos de valoração de florestas foram examinados. Muitos deles incluíram o desconto de fluxos anuais para poder calcular o valor agregado para o capital natural. Vimos que a maioria dos estudos usou ta-xas de desconto de pelo menos 3-5% e nenhum abaixo de 3%. A nossa intenção na Fase II é não descartar este trabalho, mas recalcular seus resultados com diferentes pressupostos de desconto.

Portanto, na Fase ii vamos propor um marco concei-tual para a economia da biodiversidade e dos ecos-sistemas que inclui avaliações de sensibilidade dos valores dos ecossistemas para escolhas éticas. A nossa intenção é apresentar uma gama discreta de

escolhas de descontos vinculados com pontos de vista éticos diferentes, possibilitando que o usuário final faça uma escolha consciente.

O DESAFIO DA AVALIAÇÃO

A avaliação econômica pode esclarecer os trade-offs por meio da comparação de benefícios e custos levando em consideração os riscos. Isto pode ser aplicado para usos alternativos dos ecossistemas. Mas existem muitas difi-culdades mencionadas nesta seção e que serão aborda-dos na Fase II.

Antes que a valoração econômica possa ser aplicada é necessário avaliar as mudanças do ecossistema em ter-mos biofísicos. A maioria dos benefícios fornecidos pelos ecossistemas é indireta e resulta de um processo eco-lógico que com frequência envolve longos períodos de defasagem, assim como mudanças não lineares (veja fi-gura 3.1). As pressões podem aumentar gradativamente até que certo limite seja alcançado, levando ao colapso de certas funções. Um exemplo típico é o “dieback” da floresta (redução da biomassa da floresta) causado pela acidificação. Os impactos das pressões nos ecossiste-mas, incluindo o papel das espécies, a importância de todos os níveis de biodiversidade, o relacionamento entre os componentes biológicos e físicos do ecossistema e as consequências com relação ao fornecimento de serviços são difíceis de prever.

Pressões

Pressões de conexãovia ação de política?

Benefício (valor)

(ex. disposição

para pagar pela

proteção da floresta

ou por mais flores-

tas ou por produtos

cultivados)

Valores econômicos

e sociais (às vezes

valores de mercado)

Manutenção ecusto de restauração

Produtos intermediários Produtos finais

Estrutura biológica

ou processo

(ex. floresta

habitat ou produtividade

líquida primária) Serviço

(ex. proteção do ali-

mento, ou produtos

cultivados)

Figura 3.1: A Conexão entre a biodiversidade e o resultado de serviços ecossistêmicos

Fonte: Roy Haines-Young, apresentado por J-L Weber, the Global Loss of Biological Diversity, 5-6 março de 2008, Bruxelas

Função

(ex. lenta passa-

gem da água, ou

biomassa)

Page 38: Um relatório preliminar

36 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

A valoração econômica agrega a compreensão biofísica e tem como objetivo medir as preferências das pessoas para os benefícios dos processos do ecossistema. Estes benefícios podem incorrer em diferentes categorias da população em diferentes escalas geográficas e temporais.

A nossa habilidade de avaliar os benefícios fornecidos pelos ecossistemas ou os custos de sua perda é limitada pela falta de informação em vários níveis. Provavelmente, existem benefícios que ainda não identificamos, e então podemos avaliar, até mesmo em termos quantitativos, apenas parte da gama total dos serviços ecossistêmicos. Será possível fazer uma avaliação quantitativa em termos biofísicos apenas para parte destes serviços, aqueles para os quais as “funções produtivas” ecológicas são relativamente bem entendidas e para os quais existem dados suficientes disponíveis. Devido à limitação de nos-sas ferramentas, apenas uma pequena parte desses ser-viços pode ser valorada em termos monetários.

Portanto, é importante não limitar as avaliações a valores monetários, mas incluir a análise qualitativa, assim como, de indicadores físicos. O diagrama da “pirâmide” na figu-ra 3.2 ilustra este ponto importante.

As abordagens de mensuração variam dependendo da medida utilizada. Para os serviços de abastecimento, (combustível, fibra, comida, plantas medicinais, etc) me-dir os valores econômicos é relativamente direto, uma vez

que estes serviços são amplamente comercializados no mercado. O preço de mercado das commodities, assim como da madeira, dos produtos agrícolas ou do pescado fornece uma base tangível para a valoração econômica, muito embora possa estar significativamente distorcida devido a externalidades ou intervenções do governo e talvez requeira alguns ajustes no momento de fazer com-parações internacionais.

Para os serviços de regulação e culturais, que geralmen-te não possuem nenhum preço de mercado (com exce-ções como é o caso do sequestro de carbono) a valora-ção econômica é mais difícil. Entretanto, um conjunto de técnicas vem sendo utilizado por décadas para estimar o valor de não-mercado dos bens ambientais, baseado ou em alguma informação de mercado que está indireta-mente relacionada aos serviços (métodos de preferência revelada) ou em mercados simulados (métodos de pre-ferência declarada). Estas técnicas estão sendo aplica-das de forma convincente a muitos componentes dos serviços ecossistêmicos e da biodiversidade (uma visão geral da adequabilidade destes métodos para valorar os serviços ecossistêmicos é a Avaliação Ecossistêmica do Milênio (Millennium Ecosystem Assessment, 2005b), mas o tema é controverso.

Fundamentalmente, existe a pergunta ética sobre até que ponto algumas funções da biodiversidade que dão apoio à vida podem ser totalmente abordadas pela valo-

não-especificado

Gama completa de serviços ecossistêmicos sustentados pela biodiversidade

revisão qualitativa

Avaliação quantitativa

valoração monetária

Monetário: ex. custo de purificação da água evitado, valor do fornecimento de água, valor do armazenamento do carbono

quantitativo: ex. metros cúbicos de água purificada, toneladas de carbono armazenado, parcela da população afetada pela perda do fornecimento de alimento

qualitativo: gama e materialidade de vários ecossistemas e benefícios de biodiversidade fornecido pela instância do ecossistema

avaliado e lacunas de conhecimento

Fonte: P. ten Brink, Workshop sobre a Economia da Perda Global da Diversidade Biológica, 5-6 março de 2008, Bruxelas

Figura 3.2: Valoração de serviços ecossistêmicos

Page 39: Um relatório preliminar

A caminho de um marco de valoração 37

ração econômica e podem ser consideradas como par-te de um possível trade-off em vez de serem abordadas como restrições ecológicas. Da mesma forma, a valora-ção econômica pode não ser apropriada para abordar valores espirituais. Considerando essas limitações, pro-gressos expressivos foram alcançados, desde 1990, por economistas em parceria com cientistas (cientistas na-turais) para aprimorar estes métodos. Há um consenso crescente sobre as condições sob as quais tais métodos podem ser usados e uma crescente confiança na com-paração dos resultados. Estas técnicas são agora comu-mente aplicadas para medir a ampla gama de valores, incluindo muitos valores indiretos e de não-uso.

Outro conjunto de desafios diz respeito à avaliação das consequências da perda da biodiversidade e dos ecos-sistêmicos em larga escala. Em primeiro lugar, os méto-dos de valoração normalmente não cobrem efeitos se-cundários das perdas para a economia como um todo. Para avaliar estes efeitos, o uso de modelos econômicos é necessário. Mesmo que existam algumas tentativas promissoras (Pattanayak e Kramer, 2001, Gueorguieva e Bolt, 2003, Munasinghe, 2001, Benhin e Barbier, 2001), ainda é uma área de pesquisa em andamento. Em se-gundo lugar, a maioria das evidências em valoração vem de estudos de caso individuais sobre um ecossistema ou espécie em particular. Alguns estudos tentaram fazer uma avaliação global dos serviços ecossistêmicos mundiais (por exemplo, Costanza et al. 1997), mas mesmo sen-do úteis em chamar atenção e em gerar discussão, são controversos. Outros estudos dão enfoque aos níveis de espécies ou de gêneros (Craft e Simpson 2001, Godoy et al. 2000, Pearce 2005, Small 2000). Qualquer avaliação integral em uma escala mais ampla levanta dificuldades substantivas: como definir um marco coerente, como li-dar com a limitação dos dados, como agregar valores para estimar os impactos globais nas mudanças de lon-ga escala nos ecossistemas.

Na Fase II, esperamos confiar na lógica da “transferência de benefícios”, isto é, usar um valor estimado em um deter-minado sítio como um valor aproximado dos mesmos ser-viços ecossistêmicos de outro sítio. A transferência de be-nefício é mais fácil para alguns valores homogêneos (como a absorção do carbono que é um bem global), do que para

outros específicos do local ou dependentes do contexto (como a proteção de bacias hidrográficas). Entretanto, de-vemos reconhecer o trade-off entre fornecer uma avaliação incompleta por um lado e usar estimativas inferidas (ao in-vés de estimativas primárias baseadas em pesquisas).

Tanto por razões ecológicas como econômicas, é neces-sário precaução no escalonamento e na agregação de valor estimado de mudanças marginais pequenas para avaliar o efeito de grandes mudanças. Os ecossistemas com frequência respondem ao estresse de uma forma não linear. Grandes mudanças nas condições ou no ta-manho do ecossistema podem ter um efeito abrupto no seu funcionamento, o qual não poderá ser extrapolado facilmente a partir do efeito de pequenas mudanças. Nor-malmente, como alguns serviços fornecidos pelos ecos-sistemas diminuem à medida em que os usamos continu-amente, a extrapolação de benefícios deve reconhecer e ser limitado pela “lei de rendimentos decrescentes”.

OS CUSTOS DA PERDA DA BIODIVERSIDADE

Existe um conjunto substancial de evidências dos valores monetários vinculados à biodiversidade e aos ecossiste-mas, e, portanto, dos custos de sua perda. Uma série de estudos de caso recentes e contribuições gerais fo-ram recebidos em resposta a uma chamada por evidên-cias para compor este informe (veja o website do TEEB

Tabela 3.3: Projeção do benefício total de armazenamento de carbono nas florestas Europeias

latitude

35-45 45-55 65-65 65-71

Valor por hectare (US$ 2005)

728,56 1.272,85 468,00 253,33

Fonte: ten Brink and Bräuer 2008, Braat, ten Brink et al. 2008

Quadro 3.5: Os vários valores do recife de corais

os recifes de corais fornecem uma ampla gama de serviços para aproximadamente 500 milhões de pessoas. Algo como de 9-12% dos peixes do mundo vivem diretamente nos recifes (Mumby et al. 2007), mas os peixes que estão perto do lito-ral também dependem dos recifes de corais para reprodução, como viveiro ou alimentação (Millen-nium Ecosystem Assessment 2005c). Geralmente o turismo é o benefício preponderante. A recrea-ção nos recifes foi estimada em US$ 184 por visita globalmente (Brander et al. 2007) e US$ 231-2.700 por hectare por ano no sudeste da Ásia (Burke et al. 2002) e US$ 1.654 por hectare por ano no Caribe (Chong et al. 2003). os recifes de corais fornecem recursos genéticos para pesquisa médica, peixes ornamentais e a cultura da pérola é extremamente importante para as economias de alguns estados insulares, como a Polinésia Francesa. os recifes protegem áreas litorâneas em muitas ilhas: o servi-ço vital foi estimado em US$ 55-1.100 por hectare por ano no sudeste da Ásia (Burke et al. 2002).

Fonte: Ministère de l’Ecologie, du Développe-

ment et de l’Aménagement durables 2008, Bra-

at, ten Brink et al. 2008, Balmford et al. 2008.

Page 40: Um relatório preliminar

38 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Quadro 3.6: Reunindo as informações – um exemplo de um estudo do Custo de Falta de Ação Política na perda da biodiversidade

Em novembro de 2007, um consórcio começou um trabalho sobre o “Custo da Falta de Ação Política”, ou estudo CoPi (Braat, ten Brink et al. 2008) sobre o custo de não interromper a perda da biodiversidade. A abordagem CoPi é espelhar a imagem da valora-ção dos benefícios com o uso de análise de cená-rios. o seu termo de referência previu a construção de uma figura quantitativa global entre agora e 2050, e tentar fazer esta valoração em termos monetários.

Este projeto foi bem sucedido em estabelecer uma abordagem apropriada (veja o diagrama), identifican-do a lacuna de dados e problemas metodológicos e fornecendo cifras indicativas. Alguns resultados inte-ressantes, mesmo que ilustrativos, foram produzidos.

Mudança

no uso do

solo, clima,

poluição, uso

da água

Cenário

linha de base

da oCDE

Políticas

internacionais

Mudança

na Biodi-

versidade

Mudança

nas funções

do ecos-

sistema

MoDElo DA PErDA DE BioDivErSiDADE

o modelo GloBio foi usado para projetar mudanças na biodiversidade terrestre até 2050 (oCDE 2008). os indicadores principais foram mudanças no uso e na qualidade e a abundância relativa de espécies originais de um ecossistema (ArE), para todos os biomas do mundo. o modelo fornece estimativas regionais para a conversão de floresta natural para manejada, agricultura extensiva e intensiva e para o declínio de áreas naturais. As atividades que mais demandaram conversão de áreas foram as agríco-las e as madeireiras, embora o desenvolvimento de infraestrutura, a fragmentação e as mudanças climáticas estão previstos para se tornarem cada vez mais importantes. A perda esperada de biodi-versidade até 2050 é de 10-15% (declínio em ArE), sendo a perda mais extrema na savana (cerrado) e nos prados.

Mudança

no valor

econômico

Figura 3.3: Estabelecendo uma análise de cenário

Mudança

nos serviços

ecos-

sistêmicos

http://ec.europa.eu/environment/nature/biodiversity/eco-nomics/index_en.htm para uma lista de submissões e o relatório síntese).

O nosso Relatório COPI (Costs of Policy Inaction, “Custos da Inação Política”, Braat, ten Brink et al. 2008) da fase I fez uma primeira revisão da literatura e bancos de dados sobre valoração geral e tentou construir uma visão quan-titativa global da perda da biodiversidade em termos bio-físicos e monetários (veja quadro 3.6). Também foi feita uma revisão mais direcionada da valoração em estudos de caso sobre os ecossistemas (IUCN, 2008).

Os estudos de valoração existentes variam no seu es-copo, qualidade, metodologia e adequabilidade para ser usado em avaliação de longa escala. Com frequência, os valores econômicos estimados não são comparáveis por-que podem ser de natureza diferente ou expressados em unidades diferentes, ou ainda as estimativas podem não estar claramente relacionadas a um serviço específico ou uma área.

É necessário um esforço especial para avaliar valores indiretos de uso, especialmente aqueles de serviços de regulação, que estão recebendo cada vez mais atenção

Page 41: Um relatório preliminar

A caminho de um marco de valoração 39

como consequência da Avaliação Ecossistêmica do Mi-lênio. Para o sequestro de carbono, valores substanciais foram encontrados, embora variem dependendo do tipo de floresta, por exemplo, se decídua ou conífera, e de sua localização geográfica.

Alguns valores significativos foram estimados para a re-gulação da água, embora sejam altamente específicos. O valor da proteção da bacia fornecido por ecossistemas litorâneos intactos, como manguezais e outros pântanos, foi estimado em US$ 846 por hectare por ano na Malásia e US$ 1.022 por hectare no Havaí, Estados Unidos da

América. De maneira geral, os valores dos serviços múlti-plos da bacia hidrográfica tendem a variar de US$ 200 a 1.000 por hectare por ano (Mullan and Kontoleon, 2008). O valor da polinização das abelhas para a produção de café foi estimado em US$ 361 por hectare por ano (Ri-cketts et al., 2004), embora os benefícios sejam apenas concedidos para produtores a 1 quilometro de distância das florestas naturais. Estas abordagens estão sendo refinadas gradualmente, permitindo melhores avaliações dos trade-offs entre usos concorrentes dos ecossiste-mas. (veja, por exemplo, Barier et al., 2008).

o cenário utilizado foi em grande medida desenvol-vido pela oCDE e sua linha de base (oCDE 2008). o mesmo é amplamente coerente com outros exercí-cios de modelagem como aqueles da FAo e de outras agências das nações Unidas. o modelo em si prevê uma taxa de perda da biodiversidade mais lenta na Eu-ropa (comparada com uma taxa crescente no mundo).

AvAliAnDo MUDAnçAS noS SErviçoS ECoSSiStÊMiCoS E APliCAnDo vAlorES MonEtÁrioS

As mudanças no uso do solo e na biodiversidade são traduzidas em mudanças nos serviços ecossistêmicos. A avaliação encontra-se respaldada em grande medida na literatura de valoração e soluções criativas foram de-senvolvidas para a extrapolação no sentido de preen-cher as lacunas de informações. Está é uma área em que mais trabalho se faz claramente necessário na Fase ii.

A maior dificuldade tem sido encontrar estudos para monetizar as mudanças nos serviços ecossistêmicos. Embora haja muitos estudos de caso, nem todas as regiões, ecossistemas e serviços são igualmente co-bertos. Frequentemente, existem dificuldades na iden-tificação de valores por hectare na transferência de benefício. Muitos estudos estão baseados em perdas marginais e os valores são, com frequência, específi-cos para as localidades.

oS rESUltADoS DA vAlorAção

nos primeiros anos do período de 2000 a 2050, estima-se que a cada ano perdem-se serviços ecossistêmicos com um valor equivalente de EUr 50 bilhões aproxima-damente, apenas para ecossistemas baseados no solo (ressalta-se que esta é uma perda de bem estar, não uma perda do PiB, uma vez que grande parte destes benefícios não está incluída no PiB). Perdas no nosso estoque natural são experimentadas não apenas no ano da perda, mas continuam ao longo do tempo, e são adicionadas a perdas de mais biodiversidade nos anos

subsequentes. Essas perdas cumulativas no bem-estar poderiam ser equivalente a 7% no consumo anual em 2050. Esta é uma estimativa conservadora, pela seguinte razão:

• é parcial, pois exclui várias categorias de per-das conhecidas, por exemplo, a biodiversidade marinha, desertos, o Ártico e Antártica; alguns serviços ecossistêmicos também foram exclu-ídos (regulação de doença, polinização, ser-viços ornamentais etc), enquanto outros são poucos representados (controle de erosão), ou subrepresentados (turismo); perdas causadas por espécies alienígenas invasivas também fo-ram excluídas;

• as estimativas da taxa da mudança do uso do solo e perda da biodiversidade são globalmen-te bastantes conservadoras;

• os efeitos negativos da retroalimentação da perda da biodiversidade e dos ecossistemas no crescimento do PiB não estão plenamente contabilizados neste modelo;

• os valores não consideram a não linearidade e efeitos limiares no funcionamento do ecossis-tema.

ConClUSõES E PrÓXiMoS PASSoS

o estudo demonstrou que o problema é poten-cialmente severo e economicamente significativo, mas sabemos pouco dos impactos econômicos e ecológicos da perda futura de biodiversidade. tra-balhos posteriores estão sendo planejados para a Fase ii para abordar os pontos mencionados aci-ma, e para trabalhar em um marco e metodologia em linha com as nossas recomendações.

1. O Custo da Inação da Política (COPI): o caso de não alcançar as

metas estabelecidas para 2010 (ENV.G.1/ETU/2007/0044) foi elabo-

rado por um consórcio liderado por Alterra, juntamente com o Institu-

te for European Environmental Policy (IEEP) e mais a Ecologic, FEEM,

GHK, NEAA/MNP, UNEP-WCMC e Witteveen & Bos.

Page 42: Um relatório preliminar

40 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Ainda que existam evidências crescentes do valor de al-guns serviços de regulação, muitos outros, como a re-gulação da saúde, têm sido pouco explorados até agora, embora haja indícios que eles sejam significativos (Patta-nayak e Wendland, 2007).

A importância econômica da contribuição da biodiversi-dade agregada para a resiliência do ecossistema (a ca-pacidade de um ecossistema em absorver choques e estresses de formas construtivas) é provavelmente muito alta, mas ainda não bem quantificada, apesar de estu-dos terem analisado aspectos como a contribuição da diversidade de culturas à produção agrícola e geração de renda (Di Falco and Perrings, 2005, Birol et al. 2005). Esta importante lacuna no conhecimento reflete a dificuldade de quantificar os riscos do colapso de um sistema desde uma perspectiva ecológica e medir a disposição a pagar das pessoas pela redução de riscos que ainda não estão bem compreendidos.

O custo real da perda da biodiversidade e ecossistemas também inclui valores de opção. Embora sejam difíceis de medir, esses valores, atribuídos à conservação dos recursos para possíveis usos futuros, são relevantes, pois o conhecimento tende a aumentar e também porque parte da perda da biodiversidade e dos serviços por ela sustentados são irreversíveis. A metodologia preferencial

para medir valores de opção (especialmente valores de bioprospecção) foi preparada como parte do trabalho preparatório da Fase I (Gundimeda, 2008). Na Fase II propomos aprofundar esta abordagem.

O CUSTO DA CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE

Perder biodiversidade e serviços ecossistêmicos pode causar um custo tremendo para a sociedade devido à perda subsequente de vários serviços regulatórios e de abastecimento como a produção de alimentos, regula-ção da água e resiliência das mudanças climáticas. Tudo isto cria os argumentos necessários para a proteção da biodiversidade, apesar da taxa de perda demandar ações urgentes. Mas a conservação também tem seu custo, que precisa ser incluído na tomada de decisão. É importante saber que estes custos fornecem a base para determinar o relacionamento entre custo e benefício e identificar as opções mais custo-efetivas para a conservação.

Uma avaliação abrangente de custo precisa incluir vários tipos de custo: a conservação da biodiversidade pode re-querer o uso de restrições que levam a custos de oportuni-dade de não se ter alcançado desenvolvimento econômico; custos de gestão surgem para medidas como, por exem-plo, programas de criação e reprodução; e os custos de

OC= custos de oportunidade TC= custos de transação MC= custos de manejo

Tabela 3.4: Resultados dos estudos sobre custos de conservação

Fonte objeto Custos levantados

Estimativas

Frazee et al. 2003

Conserving the Cape Floristic Region (África do Sul)

OC + MC Inicial de US$ 522 milhões e des-pesas anuais de US$ 24.4 milhões

Chomitz et al. 2005

Rede dos ecossistemas protegidos (Bahia, Brasil)

OC OC 10.000 ha

Wilson et al. 2005

Preservação da floresta tropical (certas regiões)

OC Sumatra: US$ 0.95/ha/ano Borneo: US$ 1.10/ha/ano Sulawesi: US$ 0.76/ha/ano Java/Bali: US$ 7.82/ha/ano Malásia: US$ 27.46/ha/ano

Ninan et al. 2007

Benefícios de floresta de produto não ma-deireiro (Nagarhole National Park, India)

OC Valor presente líquido US$ 28.23 por domicílio anual

Sinden 2004 Proteção da Biodiversidade (Brigalow Belt, New South Wales)

OC US$ 148.5 milhões

Comissão Europeia 2004

Proteção da Biodiversidade dentro da rede Natura 2000 (cobrindo 18% do terri-tório da União Europeia-25)

MC + TC EUR 6.1 bilhões anuais durante um período de 10 anos

Bruner et al. 2004

Expansão da conservação da floresta para todas as áreas prioritárias (mundo todo)

OC MC US$ 5.75/ha/ano por 10 anos

Page 43: Um relatório preliminar

A caminho de um marco de valoração 41

transação estão associados à elaboração, implementação e controle de políticas para a conservação da biodiversidade.

Mundialmente, entre US$ 8 bilhões e US$ 10 bilhões são investidos por ano na conservação da biodiversidade (James et al. 2001, Pearce 2007); as áreas protegidas recebem uma porcentagem significativa destes recursos. No nível global, devem ser necessários US$ 28 bilhões anuais nos próximos 30 anos para expandir as áreas consideradas prioritárias pela IUCN para 10% da área de todos os países (James et al. 2001). Esta estimativa de custo inclui custos de aquisição e de manejo dos atuais e futuros locais de reserva da biodiversidade. Se o siste-ma de área protegida for expandido para cobrir espécies chaves atualmente desprotegidas e atender às necessi-dades biológicas/ecológicas, seria necessário gastar até US$ 22 bilhões por ano em custos de gerenciamento (Bruner et al. 2004).

Mas, proteger o fornecimento dos serviços ecossistêmi-cos e os benefícios da biodiversidade em áreas protegi-das poderia custar muito pouco: apenas duas ordens de magnitude a menos do que o valor do benefício prove-niente dos ecossistemas e da biodiversidade. Balmford et al. (2002) utilizaram-se desta ideia e propuseram que com um investimento anual de US$ 45 bilhões – cerca de um sexto do necessário para conservar os serviços ecossistêmicos no mundo todo – poderíamos proteger serviços naturais que valem US$ 5 trilhões em áreas pro-tegidas: uma relação custo-benefício excelente (100:1).

Os custos da conservação podem variar entre regiões devido a diferenças em suas economias e estruturas de custo. Encontram-se custos de conservação tão baixos quanto US$ 0.01 por hectare em áreas remotas e tão altos quanto US$1.000 por hectare por ano em áreas densamente povoadas. Os benefícios de serviços pro-venientes de diferentes ecossistemas variam de algumas centenas de dólares para mais de US$ 5.000 por hec-tare por ano, e, em alguns casos, muito mais. Um caso extremo é o do recife de corais, para o qual o PNUMA estimou um valor total dos serviços ecossistêmicos en-tre US$100.000 e US$600.000 por quilômetro quadrado; baseado em uma estimativa de custo de US$775 por qui-lômetro quadrado para manter áreas marinhas protegidas, o custo de manejo de recife de corais pode ser tão baixo quanto 0.2% do valor do ecossistema protegido (UNEP 2007) – o custo de oportunidade da conservação do re-cife de corais não está incluído nesta comparação. En-tretanto, para possibilitar uma conservação custo-efetiva dos serviços ecossistêmicos, é necessário conhecer a distribuição espacial dos benefícios e dos custos da pro-teção da biodiversidade.

Embora as cifras disponíveis até agora se apliquem a uma pequena parte da natureza, os formuladores de po-lítica querem a visão geral. Quando a rede Natura 2000

de áreas protegidas começou a surgir na União Europeia, uma linha de pensamento comum era o custo de geren-ciar e alcançar as metas. O custo de implementar esta rede de proteção de áreas, que então representava 18% do território da União Europeia com 25 estados, foi esti-mado em mais de 6 bilhões de Euros anuais (Comissão Europeia 2004). Estes custos incluíam o gerenciamento, restauração e fornecimento de serviços (como recreação e educação), mas excluiam gastos da compra de terra para a conservação da natureza. O custo total de conser-vação é mais alto se incluirmos filantropia e subsídios. Por exemplo, nos Estados Unidos da América, a caridade pri-vada ao “meio ambiente e animais” foi estimada em US$ 9 bilhões em 2005 (Giving, USA, 2006).

As áreas protegidas em países em desenvolvimento são consideradas, por hectare, mais baratas para se esta-belecer e serem gerenciadas do que em países desen-volvidos. Além disso, embora os países desenvolvidos representem 60% da área total de locais de reserva de biodiversidade, a necessidade real de orçamento para a conservação chega a apenas 10% do orçamento global (James et al. 1999). O custo de atingir uma determinada meta de conserva-ção depende dos instrumentos de política escolhidos e de seu detalhamento. Durante o teste desta premissa, descobriu-se que a simples modificação no detalhamen-to do instrumento de conservação pode redundar em uma economia de até 80% para a proteção de uma de-terminada espécie. Um pré-requisito necessário, mas não suficiente, para despesas custo-efetivas é garantir que o gasto em conservação esteja de acordo com as priorida-des atuais de conservação. Apenas 2-32% de padrões de despesa pelas agências de conservação podem ser explicados pelas diretrizes para a priorização da conser-vação da biodiversidade (Halpern et al. 2006).

Outro aspecto a ser considerado é a distribuição de re-cursos entre as diversas partes da biodiversidade. Em termos econômicos, parece que os custos marginais de investimentos em conservação estão aumentando, ou seja, embora as “primeiras unidades” de conservação possam ser compradas a baixos custos, cada unidade adicional tem valor mais alto. No entanto, pesquisadores acreditam que existem “frutas ao alcance da mão” quan-do se trata da conservação da biodiversidade. Proteger um grande número de espécies é relativamente barato, mas os custos podem explodir na medida em que as últimas poucas espécies, habitats ou ecossistemas são incluídos nas metas de conservação.

A escassez generalizada de estudos apontando para os benefícios e custos da conservação da biodiversidade, especialmente em âmbito local e regional, contribui para a não alocação de recursos suficientes para a conservação e as quedas no orçamento observadas. Apenas um nú-

Page 44: Um relatório preliminar

42 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

mero limitado de estudos avaliou simultaneamente os cus-tos e benefícios da proteção da biodiversidade e serviços ecossistêmicos em projetos de conservação específicos. Alguns estudos foram específicos à área, como a avalia-ção da proteção dos serviços ecossistêmicos em Mada-gascar, que revelou que a biodiversidade do país fornece uma gama de serviços que trazem benefícios em um valor duas vezes maior que os custos de gerenciamento dos recursos da biodiversidade na ilha. Outros estudos foram específicos ao setor, por exemplo: foi estimado que um sistema de área de proteção de marinha, que representa a diminuição de 20% da pesca total da área e resultou na perda de lucro de US$ 270 milhões por ano (Sumaila et al. 2007), ajudaria a sustentar a pesca em um valor de US$ 70-80 bilhões por ano (FAO 2000) criando 1 milhão de empregos (Balmford et al. 2004). Além disso, a metodolo-gia usada para estudos de custos de conservação, com frequência não possui entendimento comum quanto ao quê incluir e como medir estes custos. A visão resultante da economia da conservação é incompleta e não há um método explícito de distribuição espacial para distribuir o financiamento para a conservação (Bruner et al. 2008).

Embora a conservação da biodiversidade seja economi-camente razoável, despesas globais atuais (estimadas em US$ 10-12 bilhões anuais) representam pouco para as necessidades esperadas. Uma vez que a conserva-ção, principalmente em países em desenvolvimento, so-fre com a escassez de recursos financeiros, países em desenvolvimento devem ser priorizados quando da alo-cação de recursos adicionais para a conservação global da biodiversidade de modo a aumentar a efetividade das medidas de proteção. Entretanto, como os objetivos de conservação dos países em desenvolvimento, com frequ-ência, competem com seus objetivos de desenvolvimento, existem importantes questões sociais a serem abordadas no contexto local, como: direito de propriedade versus o acesso a direitos de uso, direitos para residentes locais versus direitos para migrantes e vizinhos pobres, subsis-tência e questões de bem estar, e a persistência do “do ciclo vicioso” da pobreza e degradação do meio ambiente. Ao abordar estas questões na Fase II, precisamos reco-nhecer a sobreposição de políticas que afetarão a viabi-lidade de um conjunto de ferramentas econômicas para formuladores de política no mundo em desenvolvimento.

QuantificaremapearpeixesmarinhosA

QuantificaremapearpeixesmarinhosB

Quantificaremapeardiferenças

nospeixes

Quantificaremapeardiferençasnoriscoparaprodução

depeixes

Quantificaremapeardiferençasemfornecimento

deágua

Quantificaremapeardiferençasnoriscodoforneci-mentodeágua

Quantificaremapearovaloreconômicodas

diferençasdospeixes

Quantificaremapearovaloreconômicodasdiferençasnoriscodaproduçãodepeixes

Quantificaremapearovaloreconômicodas

diferençasnofornecimentodeágua

Quantificaremapearovaloreconômicodasdiferençasnoriscodofornecimentodeágua

Quantificaremapearconse-quênciaseconômicaslíquidasdeaçãodereduzir/evitaraperdadabiodiversidade

Quantificaremapearovaloreconômicodasdiferençasnoriscoefluxodebenefícios

QuantificaremapearoriscoparaospeixesA

QuantificaremapearoriscoparaospeixesB

QuantificaremapearfornecimentodeáguaA

QuantificaremapearfornecimentodeáguaB

Quantificaremapearoriscoparaoforneci-mentodeáguaA

Quantificaremapearoriscoparaoforneci-mentodeáguaB

ComoafetaoPIBglobal?

ComoafetaoPIBnacional?

Comoafetaosobjetivosdereduçãodapobreza?

Comoafetaaestabilidaderegional?

Comoafetaaequidade?

Avaliar as consequências socioeco-nômicas da ação para interromper/reduzir a perda da biodiversidade e da degradação do meio ambiente

Figura 3.4: Marco de Valoração Proposto: contrastando estados apropriados do mundo

Motivadores da perda da

biodiversidade e degradação do

meio

Ação política para interrom-per/reduzir a perda da bio-diversidade e

degradação do ecossistema

Chave

EColoGiA

EConoMiA

PolítiCA

MUnDo B com ação

MUnDo A sem ação

quantificar e mapear os

custos da ação

Page 45: Um relatório preliminar

A caminho de um marco de valoração 43

MARCO DE VALORAÇÃO PROPOSTO

As considerações feitas neste capítulo levaram a um mar-co de valoração (veja Figura 3.4) que pretendemos usar na Fase II, em conjunto com nossa meta-análise de estu-dos de valoração, para que se possa preparar um marco que seja globalmente abrangente e geograficamente es-pecífico e uma estrutura estimativa para a valoração eco-nômica dos ecossistemas e da biodiversidade. O marco é baseado em estudos científicos (Balmford et al. 2008) e em questões relacionadas com a ética, equidade e na taxa de desconto discutidas anteriormente.

Abaixo seguem os elementos chaves para o nosso marco proposto:

• Examinar as causas da perda da biodiversidade: planejar cenários apropriados para avaliar as conse-quências da perda da biodiversidade, o que significa incluir informações sobre o que causa essa perda.Por exemplo, a perda de peixes marinhos ocorre pelo excesso de pesca, então seria adequado com-parar um cenário de business-as-usual (excesso de pesca contínuo) com um cenário em que a pesca seja manejada. A evidência sugere que se perde bio-diversidade justamente onde seria socialmente mais vantajoso preservá-la. A identificação das falhas de mercado, de informação e de política pode ajudar a identificar soluções políticas.

• Avaliar políticas alternativas e estratégias confron-tadas pelos tomadores de decisão: a análise pre-cisa contrastar dois ou mais “estados” ou cenários que correspondam à ação alternativa (ou inação) para reduzir a perda da biodiversidade e dos ecosssitemas (Mundo A e Mundo B). Esta abordagem também é usada para a avaliação de impacto e análise custo-benefício para assegurar que os tomadores de deci-são tomem decisões informadas baseadas em uma análise sistemática de todas as implicações das vá-rias escolhas políticas.

• Avaliar os custos e benefícios das ações para con-servar a biodiversidade: a análise precisará abordar diferenças em benefícios obtidos pela conservação da biodiversidade (por exemplo, purificação da água obtida pela proteção de florestas) e o custo incorrido (por exemplo, benefícios perdidos pela conversão das florestas para cultivo agrícola).

• identificar riscos e incertezas: há muitas coisas que não sabemos sobre como a biodiversidade é valiosa para nós, mas isto não significa que aquilo que não se sabe não tenha valor – corremos o risco de per-der serviços ecossistêmicos muito importantes, mas ainda não reconhecidos. A análise precisa identificar estas incertezas e avaliar estes riscos.

• Ser geograficamente explícito: a valoração econô-mica precisa ser espacialmente explícita porque a pro-dutividade natural do ecossistema e o valor de seus serviços variam conforme sua localização. Além disso, os benefícios podem ser usufruídos em locais diferen-tes daqueles onde são produzidos. Por exemplo, as florestas de Madagascar têm produzido medicamen-tos para o tratamento do câncer que salvam vidas em todo o mundo. Ademais, a escassez relativa de um serviço, assim como fatores socioeconômicos locais, podem afetar os valores de forma substancial. Consi-derar as dimensões geográficas também permite um melhor entendimento dos impactos da conservação em objetivos de desenvolvimento e para a compreen-são dos trade-offs entre benefícios e custos de várias opções, e, assim, apontar regiões que podem ofere-cer melhor custo-benefício para a conservação.

• Considerar a distribuição dos impactos da perda da biodiversidade e conservação: os beneficiários de serviços ecossistêmicos, com frequência não são os mesmos daqueles a quem incorrem os custos da conservação. Incompatibilidades podem levar a de-cisões corretas no âmbito local, mas inadequadas para a sociedade como um todo. Políticas efetivas e equitativas reconhecerão estas dimensões geográficas e as corrigirão com as ferramentas apropriadas, assim como pagamentos para os serviços ecossistêmicos.

As figuras 3.5 e 3.6 ilustram a dimensão dos serviços ecossistêmicos e, portanto, a necessidade de conside-rar o padrão geográfico na produção e no uso desses serviços. Até mesmo grandes cidades como Londres de-pendem de uma diversidade de benefícios produzida por ecossistemas e biodiversidade, com frequência em uma distância considerável.

Este marco será usado durante a Fase II, mas não será possível coletar informação para elaborar mapas deta-lhados para todos os tipos de serviços ecossistêmicos e biomas. Além disso, a avaliação dependerá em grande parte da “transferência de benefícios”, tornando claras as premissas e definindo as condições em que será possível extrapolar as informações limitadas, considerando escala e dependência espacial dos vários serviços. As bases de dados geográficas serão utilizadas, destacando-se onde será necessário preencher as lacunas de informação existentes.

rEUninDo oS ASPECtoS EConôMiCoS E EColÓGiCoS no MArCo DE vAlorAção

A valoração dos ecossistemas requer a integração de eco-logia e economia em um marco interdisciplinar. A ecologia deve fornecer a informação necessária na geração de servi-ços ecossistêmicos, enquanto a economia contribuiria com as ferramentas para a estimativa de seus valores (veja 3.4).

Page 46: Um relatório preliminar

44 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Figura 3.5: Benefícios ecossistêmicos de uma floresta protegida, Madagascar

Fonte: Balmford et al. 2008

Benefícios ecossistêmicos de uma floresta protegida em um país com alta biodiversidade

ParqueNacionaldeMasoala,Madagascar

Medicamentos. Asflores-tastropicaisdeMadagas-carpossuemumadiversi-dadedeplantascomaltopodermedicinalefarma-cêutico,taiscomoarosy periwinkle (vincarósea),queéusadaporcurandei-rostradicionaiseéutilizadacomoinsumoparamedi-camentoscontraocâncernaEuropa,porexem-plo.Valorestimado:US$1.577.800,00

Recreação. Aimpressionantediversi-dadedasflorestasdeMadagascar,comespéciesúnicascomoolêmurvermelho(red-ruffed lemur)atraiumaisde3miltu-ristasparaMasoalaem2006,amaioriaamaioriadeorigemeuropéiaedaAméricadoNorte,mas37%deMadagascar.Valorestimado:US$5.160.000,00

Produtos da Floresta. OitomildomicíliospróximosaoParqueNacionaldeMasoalausamprodutosdaflorestaemseudia-a-diaparaalimentação,usomedicinalemateriaisdeconstruçãoetear.Valorestimado:US$4.270.000,00

Controle de erosão. FlorestascomoaMasoalaprotegemosolocontraaerosão,oqueajudaareduzirasedimentaçãodearrozaisecriadourosdepeixes.Valorestimado:US$380.000,00

Armazenamento de carbono. Odesmatamentoevitadoajudaareduzirosimpactosdasmudançasclimáticas,porexemplo,emLondres(elevaçãodoníveldomar)enaNamí-bia(maiormortalidadedevidoàsmudançasdoclima).Valorestimado:US$105.110,00

Fontes:1. Disposição a pagar estimada das empresas farmacêuticas pela proteção da floresta em Madagascar (considerando o tamanho do Parque nacional de Masoala como 2.300ha, de Kremen et al 2000); extraído de Simpson rD et al 1996 valorando a biodiversidade para uso em pesquisa farmacêutica. jornal de Economia Política 104:163-1852-5. valor presente líquido, calculado pela composição de um valor anual esperado do benefício ecossistêmico, descontado progressivamente no futuro (a taxa de desconto utilizada foi conservadora, de 20% ao ano, por 30 anos). Extraído de: Kremen C et al. (2000), incentivos econômicos para a conservação de florestas tropicais através de escalas. Science 288: 1828-18324. Fotos de turistas da l’Association Nationale pour la Gestion des Aires Protégées (AnGAP)5. número de domicílio de http://news-services.stanford.edu/pr/00/forests67.html

Créditos das fotos: lêmur vermelho (red-ruffed lemur) varecia rubra (jenni Douglas, Wikimedia Commons), imagens de Satélite (Nasa World Wind)

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A caminho de um marco de valoração 45

Figura 3.6: Benefícios ecossistêmicos para a cidade Londres, Reino Unido

Fonte: Balmford et al. 2008

Medicamentos. Hácer-cade392criançascomleucemiaoulinfomasemLondres.Em1970,somente127teriamso-brevivido,mas,graçasàmelhorianostratamentosutilizandoavinblastinaevincristinaderivadasdavincaróseadeMada-gascar,312destascriançasagoraapresentamaltasexpectativasdevida.

Enchentes. NacidadedeLon-dres,1,2milhãodepessoasvivememáreasinundáveis,sobriscocrescentedeelevaçãodoníveldomar.Londresemite53milhõesdetoneladasdeCO2acadaano,oquecontribuiparaasmudançasclimáticas.AsflorestastropicaisdoParqueNacionaldeMasoalaemMadagascarcapturam44milhõesdetoneladasdeCO2.

Valores de Existência. ASociedadeRealdeProteçãoàsAves,comcercade120milassociadosemLondres,trabalhaparaconservar101milhectaresdeflorestatropicalnaIndonésiae75milhectaresnaSerraLeoa,alémde200reservasnoReinoUnido.

6 Saúde Física e Mental. EmLon-

dres,pelomenos22.500criançascomatédezanosapresentamdistúrbioscomoaHiperatividadeeoDéficitdeAtenção,oqueostornamaispropensosaabando-naraescolaeenvolver-seemcrimes.Ascriançasqueinteragemcomanatureza(porexemplo,noLondonWetlandsCentre,querece-be180milvisitantesacadaano)reduzemem30%ossintomasdessesdistúrbios.

Pescados. Oslondrinosconsomem72miltone-ladasdepeixeporano,amaiorparteadvindadoMardoNorte,mastambémdaregiãocosteirabanhadapeloOceanoPacífico,quepossuiasáreasdepescamaisprodutivasdomundo.

Café. Maisde1,3bilhãodexícarasdecafésãoconsu-midasemLondrestodososanos.Abelhasnativasdeflo-restastropicaisimpulsionamaprodutividadeem20%nasplantaçõesdecaféadjacen-tes,oqueajudaosagricul-toresasupriremademandadasegundacommoditymaisconsumidanomundo,apósopetróleo.Quase25%detodoocaféconsumidonoReino

UnidovemdoVietnã.

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Fontes:1. vincristina e vinblastina são parte do tratamento padrão da leucemia infantil e do linfoma de Hodgkin. As estatísticas da incidência do câncer e de sobrevivência em londres, com base no censo de 2001 (http://statics.gov.uk)2. http://citylimitslondon.com e Watson r. & Pauly D. (2001) nature 414 534-5363. http://faostat.fao.org e rickets tH et al. (2004) PnAS 101:12579-12582 e Clay j. (2004) World Agriculture and the Environment: A Commodity-by-Commodity Guide to Impact and Practices, island Press4. http://environment-agency.gov.uk/regions/thames/ e http://www.wdm.org.uk/news/carbondioxideemissionsuk09012007.htm e Kremen at al. (2000)5. A Grande londres abriga 12,2% da população do reino Unido, dos quais eram membros da Sociedade real para a Proteção de Aves (Royal Society for the Protection of Birds – rSPB em 2007 (http://www.rspb.org.uk)6. Comparado com aqueles engajados em atividades urbanas externas, conforme relatórios disponíveis em http://www.rspb.org.uk/ourwork/policy/health. outras fontes: http://www.wwt.org.uk e http://www.environment-agency.gov.uk

Créditos das fotos: xícara de café (Wikimedia Commons). imagens de Satélite (nasa World Wind)

Benefícios ecossistêmicos para uma cidade no mundo desenvolvidoOcasodacidadedeLondres,ReinoUnido

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46 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

A valoração de serviços ecossistêmicos regulatórios e de alguns serviços de abastecimento deve estar baseada em um entendimento dos processos físicos e biológicos subjacentes que levam ao fornecimento desses serviços. Por exemplo, para valorar a regulação da água fornecida por uma floresta, é necessário primeiramente ter informa-ções sobre o uso do solo, a hidrologia da área e outras características, de modo que se tenha uma avaliação bio-física do serviço fornecido.

Este tipo de entendimento torna possível estimar o custo do valor econômico, mas existem alguns desafios que precisam ser tratados:

• Medir a quantidade e qualidade de serviços forneci-dos pelos ecossistemas e pela biodiversidade em vá-rios estados possíveis é um desafio chave, e também uma oportunidade para evitar falhas de generaliza-ção. A valoração é melhor aplicada condições ou si-tuações alternativas (como por exemplo os serviços prestados segundo práticas divergentes do uso do solo, consequência dos diferentes cenários políticos). Exemplificando, a captação hídrica nas florestas tro-picais pode fornecer benefícios líquidos à conserva-ção da água, comparando a mesma área se utilizada para pastagem ou cultivo, mas estes benefícios não podem exceder os benefícios agroflorestais no mes-mo lote de terra (Chomitz and Kumari 1998, Konar-ska 2002). Estimar a biodiversidade existente nesses diferentes cenários seria outro desafio. Seria impor-tante abordar essa avaliação baseada em cenários de forma adequada para garantir que o objetivo prin-cipal das valorações (estimar os custos de benefícios da conservação da biodiversidade) não fique perdido na modelação de usos alternativos do solo.

• A não linearidade no fluxo de serviços precisa de uma atenção especial. Por exemplo, estudos recen-tes em mangues no litoral da Tailândia levaram em consideração que o serviço ecosssitêmico que for-nece proteção ao litoral não varia ao longo da área do mangue natural. Isto leva a conclusões políticas e valores significativamente diferentes daqueles obtidos em estudos prévios, em particular a combinação es-perada entre conservação e desenvolvimento (Barbier et al. 2008). Outro aspecto importante é a existência de efeitos limiares e a necessidade de se avaliar de quanto tempo um ecossistema dispõe antes que al-guns de seus serviços entrem em colapso. Ainda há grandes lacunas no conhecimento científico sobre o papel das espécies nos ecossistemas e quais fatores chaves produzem fluxos de serviços benéficos que assegurem sua resiliência. Entretanto, para alguns serviços, há evidência da influência de certos indica-dores biofísicos (áreas de habitat, indicadores de saú-de, diversidade de espécies, etc). O Estudo Exploran-do a Ciência – Scoping the Science – (Balmford et al.

2008) revisou como está o conhecimento ecológico sobre uma série de serviços ecossistêmicos e avaliou as informações disponíveis. As conclusões deste es-tudo serão utilizadas na Fase II e servirão de base para a avaliação econômica por meio da:

º construção de cenários para o fornecimento da cada serviço ecosssitêmico;

º definição de um método para pelo menos um con-junto de serviços de modo a gerar uma quantifica-ção global e o mapeamento do fornecimento do serviço em diferentes cenários, no qual a valoração econômica será baseada;

º formulação de pressupostos razoáveis que per-mitam a extrapolação de valores estimados para certos ecossistemas para que se possa preencher as lacunas dos dados;

As relações entre os processos dos ecossistemas e os benefícios que eles fornecem às pessoas variam em complexidade. É necessário um sistema de classificação, que pode ser desenvolvido a partir do sistema elaborado no contexto da Avaliação Ecossistêmica do Milênio (Mil-lennium Ecosystem Assessment 2005b). Esse sistema ainda pode ser aprimorado de modo a fornecer uma boa base para a valoração econômica (seguindo, por exem-plo, Boyd e Banzhalf 2007, Wallace 2007, Fisher et al. in press). Parece ser útil fazer uma distinção entre serviço

“final” (ex. fornecimento de culturas agrícolas e água lim-pa) que fornece benefícios diretamente importantes para o bem estar humano e serviços “intermediários” que ser-vem como insumos para a produção de outros serviços (ex. polinização, regulação da água). O valor econômico da polinização, por exemplo, não pode ser avaliado se-paradamente do fornecimento de culturas. A perspectiva do usuário final: o valor dos serviços intermediários pode apenas ser medido por meio de sua contribuição para a produção dos benefícios ao usuário final. A intenção é estruturar a classificação dos serviços para a avaliação que será feita na Fase II em torno desta perspectiva.

PrinCíPioS-CHAvE DAS MElHorES PrÁtiCAS nA vAlorAção DE SErviçoS ECoSSiStÊMiCoS

Estes princípios baseiam-se nas recomendações feitas no Workshop da Economia da Perda Global da Diversi-dade Biológica organizado no contexto deste projeto em Bruxelas em março de 2008 (ten Brink and Bräuer 2008).

1. O foco da valoração deve ser em mudanças margi-nais ao invés do valor “total” de um ecossistema.

2. A valoração de serviços deve ser específica ao con-

texto, específica ao ecossistema e relevante ao esta-do inicial do ecossistema.

3. Boas práticas em “transferência de benefícios” pre-cisam ser adaptadas à valoração da biodiversidade,

Page 49: Um relatório preliminar

A caminho de um marco de valoração 47

na medida em que é necessário mais estudo sobre como agregar os valores das mudanças marginais.

4. Os valores devem ser guiados pela percepção dos beneficiários.

5. Abordagens participativas e formas de incluir as pre-ferências das comunidades locais podem ser usadas para ajudar que a valoração seja mais aceita.

6. As questões de irreversibilidade e resiliência não de-vem ser negligenciadas.

7. Conexões biofísicas substancias ajudam no exercício de valoração e contribuem para a sua credibilidade.

8. Existem incertezas inevitáveis na valoração de servi-ços ecossistêmicos, portanto, uma análise de sensi-bilidade deve ser disponibilizada para os tomadores de decisão.

9. A valoração tem o potencial de trazer esclarecimentos sobre objetivos conflitantes e trade-offs, mas deve ser apresentada de forma conjunta com outras informa-ções qualitativas e quantitativas e talvez não seja a última palavra.

na Fase ii, vamos explorar a literatura existente sobre va-loração com maior profundidade e desenvolver uma me-todologia que permita selecionar técnicas de valoração e que inclua a aplicação de transferência de benefícios e a agregação. O trabalho terá como base o marco descrito neste capítulo e será refinado da seguinte forma:

1. Irá focar na contribuição de serviços para benefícios finais para as pessoas, evitando, dessa forma, a du-pla contagem.

2. Existirá um “foco espacial” claro, nas localidades onde os serviços e benefícios surgem.

3. identificará riscos, observando a fragilidade de um ecossistema e se ele está perto de seu limiar; isso irá refletir na escolha de uma abordagem de avaliação, reconhecendo as limitações da análise convencional onde as mudanças não são marginais.

4. Da mesma forma, para a estimação de valores de opção dos fluxos de serviços ecossistêmicos, reco­nhecerá as limitações do desconto quando não considerarmos as pequenas variações em uma de-terminada trajetória de crescimento..

Finalmente, devemos afirmar aqui que a valoração não é um fim em si mesmo e deve ser orientada para as neces-sidades dos usuários finais. Isto inclui formuladores de política e tomadores de decisão em todos os níveis do

governo. Também inclui organizações corporativas e de consumidores, uma vez que os atores do setor privado são usuários significativos dos benefícios da biodiversida-de e potencialmente administradores de biodiversidade e ecossistemas.

Nosso esforço na Fase II será de engajar estes usuários finais para assegurar que o resultado do trabalho, o re-latório final sobre a Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade, seja relevante, comprometida e efetiva em assegurar uma reflexão apropriada do valor econô-mico da biodiversidade. A ênfase em usuários finais nos leva a enfocar a relevância política da avaliação econômi-ca e parte do Capítulo 4 já é uma prévia de exemplos que apresentam boas estimativas econômicas e fundamen-tos usados para apoiar melhores políticas para a conser-vação dos ecossistemas e da biodiversidade.

notas finais

1.O Estudo Explorando a Ciência (Scoping the Science) teve como líder científico a Universidade de Cambridge e foi feito em colaboração com o Instituto Europeu de Po-lítica Ambiental (IEEP, na sigla em inglês), Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Centro de Moni-toramento da Conservação Mundial das Nações Unidas (UNEP-WCMC) e o Centro de Pesquisa da Universidade Alterra-Wageningen.

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Page 53: Um relatório preliminar

Da economia à política 51

Quadro 4.1: Subsídios prejudiciais ao meio ambiente

A oECD define como subsídio “o resultado de uma ação governamental que confere uma vantagem aos consumidores ou produtores, a fim de com-plementar sua renda ou reduzir os seus custos”.

no entanto, esta definição ignora as consequên-cias para os recursos naturais e não abrange o subsídio como resultado da inação. Subsídios ambientalmente prejudiciais são o resultado de uma ação ou omissão do governo que “confere uma vantagem aos consumidores ou produto-res, a fim de complementar seus rendimentos ou reduzir seus custos, mas que vai contra as boas práticas ambientais”.

A imperfeição da bússola econômica da socie-dade pode ser reparada com uma abordagem econômica apropriada aplicada à informação

certa. isso permitirá o aprimoramento das políticas em vigor, a formulação de novas políticas e a criação de novos mercados: todos são fatores necessários para a melhoria da qualidade de vida das pessoas e o restabelecimento da saúde do planeta.

No último capítulo descrevemos como a biodiversidade é seriamente afetada pelas políticas – ou ausência delas. Uma vez que não existem mercados para a maioria dos “bens e serviços públicos” da biodiversidade e dos ecos-sistemas, seus custos e benefícios muitas vezes são distri-buídos entre diferentes atores ou em diferentes níveis, as-sim como qualquer “externalidade”. Há pouco ou nenhum reinvestimento privado na manutenção e conservação desses recursos. Frequentemente, o poluidor não paga por causar prejuízos a terceiros. A pesca subsidiada esgo-ta os estoques de peixes em níveis muito acima dos que ocorreriam na ausência de tais subsídios. Serviços flores-tais vitais – como regulação e abastecimento de água, re-tenção do solo, fluxo de nutrientes, melhoria de paisagens – não recompensam os beneficiários e são fornecidos em níveis muito inferiores aos desejáveis. O benefício da con-servação de uma espécie para gerações futuras é global, ao passo que os custos para a sua conservação são locais e não compensados, e por isso ocorre a extinção.

Apesar de todos esses “desencontros”, há espaço para otimismo. Em nossos estudos de Fase I, observamos várias boas políticas já em vigor em muitos países que abordam essas questões. No entanto, é necessário que se faça uma análise mais profunda da economia da bio-diversidade e serviços ecossistêmicos para tornar essas soluções reproduzíveis em diferentes escalas e para que sejam funcionais após seus estágios iniciais, fases “piloto” e em outros locais que não os atuais.

O relatório final sobre A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade (TEEB) abordará sistematicamente uma vasta gama de opções de políticas para melhorar a conservação da biodiversidade e dos serviços ecossis-têmicos, e irá demonstrar como são geradas melhorias nas políticas a partir da aplicação e integração da nova economia dos ecossistemas e da biodiversidade. A se-guir, vamos dar alguns exemplos para ilustrar como os

valores econômicos dos benefícios e custos dos ecossis-temas podem ser internalizados e utilizados para ajudar a melhorar as políticas vigentes ou oferecer novas opções.

Os exemplos vêm de diferentes áreas de políticas, mas transmitem quatro mensagens principais, detalhadas nas seções seguintes:

• repensar os subsídios de hoje para refletir as priorida-des de amanhã;

• recompensar benefícios não reconhecidos, penalizar os custos não computados;

• compartilhar os benefícios da conservação; • mensurar o que gerimos.

REPENSAR OS SUBSÍDIOS DE HOJE PARA REFLE­TIR AS PRIORIDADES DE AMANHÃ

Subsídios existem em todo o mundo e nos diversos setores da economia. Eles afetam a todos nós e mui-tos deles afetam a saúde dos ecossistemas do plane-ta. os subsídios prejudiciais devem ser modificados de modo a frear a perda da biodiversidade e para pos-sibilitar o manejo adequado dos recursos do planeta.

Os subsídios podem apoiar a inovação social e ambiental, bem como o desenvolvimento tecnológico e econômico.

DA ECONOMIA À POLÍTICA4

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52 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Quadro 4.2: Subsídios que distorcem o comércio

As políticas comerciais influenciam as tendências globais de biodiversidade. Dispositivos legais rela-tivos ao comércio agrícola e pesqueiro (por exem-plo, tratamentos favoráveis ou tarifas preferen-ciais) podem ter um impacto significativo sobre os padrões de utilização da terra e dos recursos nos países exportadores e importadores. Acordos de comércio internacional, combinados com políticas nacionais orientadas para a exportação, podem levar os países a concentrarem-se na exportação de recursos naturais em um nível insustentável. Por exemplo, os Acordos de Pesca da União Eu-ropeia levaram ao esgotamento de recursos por

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Por outro lado, podem resultar em ganhos privados, sem benefícios sociais e podem levar à ineficiência econômica e a distorções de mercado. Pior, eles podem resultar em perdas de biodiversidade e danos aos ecossistemas. Em alguns casos, o apoio racional a um objetivo social como a segurança alimentar persiste por mais tempo que sua finalidade, resultando em custos econômicos e ambien-tais desnecessários.

Os subsídios, em sua maioria, são intencionais e intro-duzidos para um propósito claro e específico, como os pagamentos para o desenvolvimento da energia nuclear comercial nas décadas de 50 e 60, e os incentivos agrí-colas para reconstrução da agricultura europeia devas-tada após a II Guerra Mundial. Muitos são dispositivos permanentes – insumos e produtos agrícolas geralmente são subsidiados diretamente, junto com energia, alimen-tação, transporte e água.

Há subsídios menos óbvios que existem como tra-ços acidentais de políticas ou falta de políticas, o que significa que os custos dos danos à biodiversidade e aos ecossistemas são ignorados. Por exemplo, raramente a água captada tem seu preço estabelecido considerando seu valor de recurso, empresas raramente pagam pelo valor do material genético que usam como base para seus produtos, e geralmente os custos de danos causa-dos à floresta ou áreas costeiras não são pagos.

Isso já começou a mudar. Embora os subsídios existen-tes sejam bem defendidos por interesses escusos, os formuladores de políticas têm reconhecido a importância de aperfeiçoá-los, por razões ambientais e econômicas. Dois caminhos têm se mostrado promissores. Os subsí-dios podem ser extintos ou modificados de forma a pro-mover a utilização dos recursos respeitando-se o meio ambiente – como as mudanças nos subsídios agrícolas realizadas nos Estados Unidos da América e na União

Europeia. Os subsídios podem ser substituídos, com a utilização de recursos privados para manter fluxos finan-ceiros direcionados a determinadas práticas de uso da terra, a exemplo do leilão da paisagem na Holanda. As paisagens são divididas em elementos distintos, como uma árvore, uma cerca viva ou um lago. Embora o pro-prietário da terra continue a ter propriedade sobre o item, cidadãos fazem lances em leilão para apoiar a conser-vação de um elemento específico e, assim, arrecada-se dinheiro para sua preservação. Assim, tanto a renda dos agricultores quanto a conservação da biodiversidade po-dem ser asseguradas sem subsídios estatais.

RECOMPENSAR BENEFÍCIOS NÃO RECONHECI­DOS, PENALIZAR CUSTOS NÃO COMPUTADOS

Acertar nos preços é uma regra fundamental para uma economia saudável. Como geralmente os benefícios da biodiversidade e dos ecossistemas constituem na verda-de bens públicos que não têm preço, isso pode ser fei-

embarcações da UE fora da UE, resultando no uso insustentável de recursos naturais nesses países.

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Da economia à política 53

to de duas maneiras: instituindo-se políticas adequadas (que recompensem a preservação do fluxo desses bens públicos e penalizem sua destruição), e incentivando-se mercados adequados (principalmente os “mercados de conformidade” que atribuem valores comerciais privados ao fornecimento ou utilização desses bens e criam es-truturas de incentivos para pagar por eles). Destaca-se o exemplo de pagamentos por serviços ecossistêmicos, e alguns mercados emergentes, que poderiam aproveitar o poder da oferta e da procura se houver infraestrutura, incentivos, governança e financiamento adequados.

PAGAMEntoS Por SErviçoS ECoSSiStÊMiCoS

os pagamentos por serviços ecossistêmicos (PSE) podem criar demanda, uma força de mercado ne-cessária para corrigir o desequilíbrio que prejudica a biodiversidade e dificulta o desenvolvimento sus-tentável.

Os PSE são pagamentos por um serviço ou pelo uso da terra que viabilizam garantir tal serviço (UNEP/IUCN 2007). Os governos estão criando cada vez mais pro-gramas de incentivos que apoiam os proprietários que protegem os serviços ecossistêmicos por meio da com-pensação por receitas perdidas (Millennium Ecosystem Assessment 2005). Os pagamentos são particularmente importantes quando não é possível comprar e reservar terra para conservação, ou onde não é possível estabe-lecer áreas protegidas.

Os pagamentos podem ser internacionais (PSEI). Um exemplo importante é o Mecanismo de Desenvolvimen-to Limpo (MDL), que opera no âmbito do Protocolo de Quioto. A Conferência das Partes realizada em Bali con-cordou em considerar projetos REDD (Redução de Emis-sões por Desmatamento e Degradação Florestal) como parte do regime pós-2012. Este é um marco importante, pois engloba 18-20% das emissões globais de gases de efeito de estufa geradas pelo desmatamento de florestas tropicais e mudanças no uso da terra relacionadas (Rede de Ação pelo Clima, Rede CAN 2008). Evitar o desma-tamento e criar e restaurar florestas podem, simultanea-mente, proteger a biodiversidade e os serviços ecossis-têmicos, bem como combater as mudanças climáticas.

Mas é preciso haver apoio financeiro significativo – pos-sivelmente US$ 10 bilhões por ano para um impacto sig-nificativo sobre as taxas de desmatamento (Dutschke e Wolf 2007) – e ainda há incerteza sobre como implemen-tar estratégias REDD e sobre o seu escopo (Miles 2007). É preciso elaborar mecanismos financeiros adequados para estimular a atividade. Uma opção é um mecanismo baseado no mercado que permitiria o comércio de cré-ditos por desmatamento evitado. As vantagens de co-meçar cedo com projetos-piloto devem ser ponderadas

contra o risco de se empurrar a pressão do desmata-mento para florestas vizinhas.

Iniciativas REDD podem reduzir significativamente as emissões de gases de efeito estufa a um custo baixo, e ao mesmo tempo, ajudar a conservar as florestas e sua biodiversidade. No entanto, é preciso considerar os ris-cos potenciais de efeitos em cadeia. É improvável que estratégias REDD incluam apoio a outros serviços ecos-sistêmicos além de armazenamento de carbono, e outros serviços podem ser danificados por pressões de desma-tamento deslocadas. Por exemplo, as pressões para re-tirada de lenha e forragem de uma floresta degradada no âmbito de um projeto REDD poderiam se deslocar para uma área de floresta vizinha com ecossistemas mais sau-dáveis e mais biodiversidade, e a área vizinha seria então afetada. Iniciativas REDD poderiam resultar em reduções de emissões, mas ao custo da perda de biodiversidade.

O PSE pode ser substancial e apoiar políticas convencio-nais de biodiversidade. O governo dos Estados Unidos gasta mais de US$1,7 bilhão por ano em pagamentos diretos a agricultores para a proteção do meio ambiente (Kumar 2005). Os pagamentos no âmbito do Programa de Incentivo à Qualidade Ambiental do Ministério da Agri-cultura incentivam o uso sustentável da irrigação, nutrien-tes e fertilizantes, manejo integrado de pragas e proteção da vida selvagem. Da mesma forma, o mecanismo da União Europeia para promover a agricultura ecológica e silvicultura é parte importante dos programas de desen-volvimento rural da UE (Comissão Europeia 2005), que totalizam cerca de 4,5 bilhões de euros por ano (Comis-são Europeia 2007). Em 2005, esquemas agro-ambien-tais cobriam uma área de 36,5 milhões de hectares na UE-27 (excluindo a Hungria e Malta), por meio de 1,9 milhão de contratos com agricultores. O PSE pode dar às comunidades a oportunidade de melhorar suas vidas por meio do acesso a novos mercados. Uma característi-ca de sucesso é a combinação de “incentivos e punição” por meio da introdução de legislação de proteção junto

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com incentivos para a conservação. Isto pode ser parti-cularmente importante para as populações de países em desenvolvimento (ver Quadro 4.3).

EStEnDEnDo o PrinCíPio Do “PolUiDor PAGADor”

Há uma crescente tendência ao uso de avaliações de danos para enfrentar a degradação da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos. Muitas vezes, o poluidor é obrigado a pagar pelos danos causados, seja por meio do pagamento pelos projetos de limpeza e restauração em si, ou por meio de sentenças indenizatórias punitivas emitidas por tribunais. Alguns exemplos importantes são:

• o derramamento de Exxon Valdez, – uma mancha de óleo de 7800 quilômetros quadrados que ainda afeta a pesca no Alasca, tendo custado ao poluidor US$3,4 bilhões em multas, custos de limpeza e indenização (Space Daily 2008).

• Rio Guadiamar – principal fonte de água das maris-mas do Parque Nacional de Doñana na Espanha, foi afetado pelo devastador rompimento de uma barra-gem na mina de Aznalcóllar, que liberou lamas tóxicas cuja limpeza e recuperação geraram para as autori-dades espanholas custos de mais de 150 milhões de euros (Nuland e Cals, 2000).

Estes incidentes estabeleceram grandes precedentes para a recuperação de custos baseada em eventos. O princípio do “poluidor-pagador” pode ainda ser ampliado

por meio de mercados de conformidade, criados para que as externalidades de custo possam ser computadas, securitizadas e niveladas, a fim de serem negociadas en-tre poluidores, que arcam com um preço determinado pelo mercado para cobrir seus custos por poluírem. Esse tema será abordado na próxima seção.

CriAção DE novoS MErCADoS

já estão se formando novos mercados que promo-vem e recompensam a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos. Alguns deles têm o potencial de crescer. Mas, para serem bem-sucedidos, mercados precisam de infraestrutura institucional, incentivos, governança e financiamento adequados – em suma, investimento.

Tradicionalmente, o estado tem sido considerado o úni-co responsável pela gestão dos serviços públicos dos ecossistemas, mas agora está claro que os mercados também podem contribuir para essa tarefa, muitas vezes sem gasto de dinheiro público. Abordagens baseadas no mercado podem ser flexíveis e custo-efetivas – uma ca-racterística geralmente ausente das políticas tradicionais

Quadro 4.3: Pagamentos por serviços ambientais na Costa Rica

De 1997 a 2004, a Costa rica investiu cerca de US$ 200 milhões em seu programa de PSE, pro-tegendo mais de 460 mil hectares de florestas e plantações florestais, e indiretamente contribuin-do para o bem-estar de mais de 8.000 pessoas. Diversas associações e parcerias nos níveis na-cional e internacional foram construídas em torno do programa, contribuindo para sua sustentabili-dade financeira de longo prazo.

o programa de PSE na Costa rica é praticamente uma estratégia nacional para a conservação flo-restal e da biodiversidade e o desenvolvimento sustentável. tem sido uma poderosa ferramen-ta para demonstrar os valores adicionais dos ecossistemas florestais além da madeira, e, as-sim, oferece incentivos aos produtores para que forneçam estes valores. A legislação garante compensação por quatro serviços ambientais: redução da emissão de gases de efeito estufa, serviços de água, valor paisagístico e biodiver-sidade.

o programa de PSE contribuiu para a redução do desmatamento, ao mesmo tempo em que reati-vou a indústria florestal.

Portela e Rodriguez 2008

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Da economia à política 55

Quadro 4.4: A experiência com bancos de habitats, créditos de espécies ameaçadas e biobancos

nos Estados Unidos, empresas ou indivíduos po-dem comprar créditos ambientais dos Bancos de Mitigação das Áreas úmidas para pagar pela de-gradação de ecossistemas de áreas úmidas cau-sada por atividades agrícolas ou de desenvolvi-mento. Mais de 400 bancos foram aprovados até setembro de 2005, quase três quartos dos quais patrocinados por entidades privadas, ao passo que em 2006 o comércio de créditos bancários das áreas úmidas atingiu um montante de US$ 350 milhões (Bean et al. 2007).

Um sistema cap-and-trade de biodiversidade nos Estados Unidos criou “créditos de espécies ame-açadas”, que podem ser utilizados para com-pensar os impactos negativos de uma empresa sobre as espécies ameaçadas e seus habitats. o volume de mercado em maio de 2005 foi su-perior a US$ 40 milhões, com 930 operações realizadas e mais de 44.600 hectares de habitat de espécies ameaçadas protegidas (Fox e nino-Murcia 2005).

Em 2006, a Austrália iniciou um projeto-piloto em new South Wales por meio da lei de Bio-banking de 2006 para criar incentivos para pro-teger terras particulares com alto valor ecoló-gico (Governo de new South Wales 2006). o projeto permitiu que imobiliárias comprassem “créditos de biodiversidade” para compensar os impactos negativos sobre a biodiversidade. Es-ses créditos podem ser criados por meio da me-lhoria e proteção permanente da terra (thomp-son e Evans, 2002).

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de conservação. Contudo, há dificuldades, uma vez que “os mercados de serviços ambientais” podem ser imper-feitos, às vezes carecendo de profundidade, liquidez, e concorrência. Geralmente, não é fácil estabelecer preços, pois a maioria dos serviços ecossistêmicos são serviços públicos, prestados ampla e remotamente sob a forma de externalidades positivas. Em alguns casos, os cus-tos de transação não compensam os ganhos potenciais. Os governos podem ajudar a sanar algumas dessas de-ficiências fornecendo um marco institucional adequado, por exemplo, modificando as regras de imputabilidade, ou limitando o uso dos recursos e emitindo licenças ne-gociáveis para permitir flexibilidade dentro do limite es-tabelecido. O Esquema de Comércio de Emissões da União Europeia para créditos de carbono (EU-ETS) é um excelente exemplo de “mercado de conformidade”. Os governos também podem facilitar a participação priva-da para dar visibilidade aos serviços ecossistêmicos, por exemplo, por meio da rotulagem.

Mecanismos e produtos financeiros têm sido desenvolvi-dos para lidar com o passivo ambiental. Bancos de habi-tats e espécies (ver Quadro 4.4) estão entre os instrumen-tos mais inovadores, oferecendo créditos negociáveis. Mercados para produtos que são produzidos de forma sustentável permitem aos consumidores expressar suas preferências de proteção da biodiversidade e de ecossis-temas de forma que as empresas compreendam. Esses mercados estão crescendo rapidamente – os mercados da agricultura orgânica, alimentos e produtos de madeira certificados estão crescendo três vezes mais rápido do que a média e o mercado de commodities produzidas de forma sustentável pode chegar a US$ 60 bilhões por ano até 2010 (The Economist 2005). No Reino Floral do Cabo na África do Sul – local muito rico em biodiversidade que abriga quase 10 mil espécies de plantas – os produtores de vinho que se comprometem a preservar pelo menos 10% dos seus vinhedos recebem o status de excelência,

que podem anunciar nos rótulos dos produtos. Eles tam-bém podem aumentar as receitas do turismo ecológico desde a criação da Eco-Rota Montanha Verde em 2005 (Green Mountain 2008). Esta certificação e rótulos eco-lógicos são populares como instrumentos baseados no mercado, embora possivelmente com menor potencial de longo prazo do que os esquemas de comércio e ne-gociação descritos aqui (ver Quadro 4.4).

Se a perda dos serviços ecossistêmicos representar risco para seu negócio, empresas também investirão na ges-tão desses serviços mesmo sem vantagens diretas para seus produtos ou sua reputação. Este já é um ponto cla-ro a favor do pagamento com recursos privados por mo-tivos puramente financeiros, como demonstra o exemplo de Vittel (ver Quadro 4.6).

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COMPARTILHAR OS BENEFÍCIOS DA CONSERVAÇÃO

As áreas protegidas poderiam produzir benefícios a partir de bens e serviços ecossistêmicos em valo­res que variam entre US$4,4 e 5,2 bilhões por ano.

Balmford et al. 2002

é fundamental compreender melhor a economia dos serviços ecossistêmicos para garantir e aumentar as áreas protegidas, mostrando como perceber e com-partilhar seu valor com as comunidades locais sem comprometer seus benefícios para a biodiversidade.

Mais de 11% da superfície terrestre do planeta já está legalmente protegida, graças a uma rede de mais de 100.000 áreas protegidas (UNEP-WCMC/IUCN-WCPA 2008), que juntas contêm a maior parte da biodiversida-de do planeta. A rede Natura 2000 da UE é um exemplo, que representa cerca de 20% do território dos 27 mem-bros da UE (UE 2008).

Mas a rede de áreas protegidas não está completa, e as que existem estão ameaçadas (Bruner et al. 2001) pela falta de financiamento e apoio político. Especialmente no contexto do nosso trabalho, as áreas protegidas enfren-tam pressão financeira gerada pelos ganhos potenciais advindos da exploração da madeira, da carne, dos bio-combustíveis e de outros recursos (CDB 2003, 2004; Ter-borgh 1999).

É preciso compreender e explicitar melhor os valores eco-nômicos produzidos pela conservação. A avaliação pode ajudar a informar as escolhas de políticas para a criação ou manutenção de áreas protegidas. Exemplos como o Sistema de Barragem Gabcikovo-Nagymaros na Hungria mostram que quando o valor da biodiversidade é medi-do em relação aos benefícios dos grandes projetos de desenvolvimento, a possibilidade de proteger áreas sen-síveis aumenta. Neste exemplo específico, a análise de-

monstrou que o capital natural envolvido excedia ampla-mente o benefício do projeto de barragem proposto, que teria causado enormes impactos negativos sobre a biodi-versidade nas áreas úmidas de Szigetkov (OCDE, 2001).

As comunidades locais são as primeiras a arcar com os custos da perda de biodiversidade. Por isso, elas devem compartilhar os benefícios da conservação.

As comunidades locais, bem como os governos locais, normalmente buscam o crescimento e o desenvolvi-mento econômico, atraindo mais pessoas e empresas, promovendo a construção civil e o desenvolvimento de infraestrutura. Podem considerar as áreas protegidas como entraves ao desenvolvimento, especialmente onde a terra é escassa e seu uso é limitado. É o nível local que arca com os custos decorrentes das restrições ao uso da terra, mas os benefícios tendem a se estender muito além das fronteiras municipais.

Essa incompatibilidade deve ser corrigida, de preferência por meio da participação nas receitas oriundas das áreas protegidas, como em Uganda (ver Quadro 4.7). Os cus-tos da conservação comunitária, como as perdas agro-pecuárias, podem ser significativos e precisam ser ad-ministrados pelas comunidades, pelos conservadores da floresta e pelas ONGs. É comum a falta de indenização adequada, embora existam outros exemplos recentes

Quadro 4.5: Reflorestamento do Canal do Panamá

Seguradoras e grandes companhias de navegação estão financiando um projeto de 25 anos para res-taurar os ecossistemas florestais ao longo dos 80 quilômetros do Canal do Panamá. é a rota de na-vegação preferida entre os oceanos Atlântico e Pa-cífico, com mais de 14.000 navios tendo passado pelo canal em 2007. Mas seu funcionamento está sendo cada vez mais afetado pelas cheias, abas-tecimento de água irregular e assoreamento como resultado do desmatamento das terras circunvizi-nhas (Gentry et al. 2007).

os custos de manutenção do canal estão aumen-tando, e há um risco crescente de que tenha que ser fechado. As companhias de navegação enfren-tavam prêmios de seguro cada vez mais altos, até que a Forestre – entidade seguradora especializa-da focada em riscos florestais – convenceu-as a fi-nanciar a restauração do ecossistema (the Banker 2007). As vantagens são menor erosão e um fluxo mais controlado de água doce para o canal, o que reduz o risco de seguro para que as transportado-ras possam se beneficiar de prêmios mais baixos.

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Da economia à política 57

Assim, a valoração e o compartilhamento dos benefícios da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos podem ajudar as políticas de proteção da biodiversidade a aten-der as necessidades das comunidades locais de maneira mais efetiva. Se os benefícios se propagam para além do nível local, transferências podem recompensar os esfor-ços das comunidades e ajudá-las a encontrar os recur-

de sucesso (por exemplo, Bajracharya et al. 2008), onde uma pesquisa com os moradores locais concluiu que os benefícios socioeconômicos superaram os custos.

Quando os benefícios são menos diretos do que no exemplo de Uganda citado acima, transferências fiscais entre governos central, regionais e locais podem garantir receitas locais, que representariam uma parte dos bene-fícios do ecossistema. O Brasil também demonstra como este tipo de financiamento funciona. Desde 1992, muni-cípios no estado do Paraná recebem transferências inter-governamentais por conta das áreas protegidas. Os indi-cadores de qualidade que determinam os pagamentos levam em consideração as metas de conservação alcan-çadas. Como resultado, houve um aumento no número e na qualidade das áreas protegidas. Modelos similares foram desenvolvidos em 12 dos 27 estados brasileiros e outros estão considerando essa abordagem (Ring 2008).

Na Europa, Portugal lidera a utilização de transferências fiscais intergovernamentais para municípios em áreas da Rede Natura 2000 no âmbito das Diretivas para Habitats e Aves da União Europeia.

Os custos da perda e degradação dependem do quanto as comunidades locais dependem da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos. Muitas comunidades indí-genas são totalmente dependentes dos recursos locais para sobreviverem. Especialmente nesses casos, “áreas de conservação comunitárias” baseadas em sistemas de utilização de recursos naturais tradicionalmente sustentá-veis representam mais uma alternativa, e podem ser mais eficazes do que as áreas protegidas convencionais (IUCN 2008). Elas podem ter estruturas de governança adapta-das às necessidades locais, bem como às competências e conhecimentos locais disponíveis.

Quadro 4.7: Áreas protegidas em Uganda

Desde 1995, a legislação de Uganda deixou a gestão de recursos naturais nas mãos das auto-ridades locais. Por conseguinte, a Ugandan Wil-dlife Authority (UWA), desembolsa 20% de todas as receitas do turismo em áreas protegidas (AP) para as comunidades locais vizinhas às AP. Esse percentual foi estabelecido sem um retrato preci-so da economia de APs, mas mesmo uma aproxi-mação grosseira dos custos e benefícios permite a melhoria da subsistência local, simultaneamente contribuindo para a preservação da biodiversida-de. é claro que tal sistema de compartilhamento de benefícios só funciona a longo prazo se real-mente compensar as comunidades locais pelas restrições de uso impostas pela AP. Portanto, co-nhecer melhor os custos e benefícios envolvidos permitirá conciliar a conservação da biodiversida-de em curso e reforçar os meios de subsistência rural (ruhweza 2008).

Algumas áreas protegidas no âmbito do “Progra­ma de Compartilhamento de Receitas” da Ugan­dan Wildlife Authority

Parque Nacional Impenetrável de Bwindi Parque Nacional dos Gorilas Mgahinga Parque Nacional do Lago Mburo Parque Nacional Rainha Elizabeth Parque Nacional das Montanhas Rwenzori Parque Nacional Kibaale Parque Nacional Semliki Parque Nacional das Cataratas de Murchison Parque Nacional do Monte Elgon

Tendências populacionais de espécies seleciona­das no Parque Nacional do Lago Mburo

Espécies 1999 2002 2003 2004 2006Zebra 2.249 2.665 2.345 4.280 5.986Búfalo 486 132 1.259 946 1.115Antílope d’água 598 396 899 548 1.072Hipopótamo 303 97 272 213 357Impala 1.595 2.956 2.374 3.300 4.705

Fonte: UWA 2005

Quadro 4.6: O exemplo de Vittel

A empresa de água mineral vittel (nestlé Waters) estava preocupada com a contaminação por ni-tratos causada pela intensificação de atividades agrícolas. Começou então a pagar agricultores lo-calizados em sua área de captação para que tor-nassem suas práticas mais sustentáveis. Um ele-mento chave do sucesso dessa iniciativa foi que a vittel ganhou a confiança dos agricultores e man-teve seus níveis de renda, oferecendo-lhes paga-mentos apropriados. Ela também financiou todas as alterações tecnológicas necessárias, poupando os agricultores de gastarem do próprio bolso. A empresa trabalhou intensivamente com os agricul-tores para identificar práticas alternativas adequa-das e incentivos mutuamente aceitáveis.

Perrot-Maître 2006

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Uma melhor compreensão da economia da biodiversida-de contribuirá para:

• Criar fluxo de caixa: a crônica escassez de financia-mento para áreas protegidas totalizou US$ 38,5 bi-lhões em 2001 (Balmford et al. 2002). Quantificar os benefícios financeiros e não-financeiros dos ecossis-temas é a chave para obtenção de financiamento pri-vado e geração de renda para as áreas protegidas por meio de pagamentos por serviços ecossistêmicos.

• Obter apoio político: a clareza sobre os benefícios econômicos da manutenção dos serviços ecossis-têmicos pode aumentar o apoio político até o ponto normalmente alcançado em setores como agricultura, desenvolvimento industrial e planejamento regional.

• Melhorar a formulação de políticas: o estabelecimen-to de valores para a biodiversidade e serviços ecos-sistêmicos será uma ferramenta de apoio à formula-ção de políticas sobre o uso da terra, com base na quantificação dos efeitos das decisões e permitindo a comparação das opções como níveis de pastagem ou extração de madeira.

• Melhorar as estruturas de governança: as áreas pro-tegidas são muitas vezes geridas de acordo com modelos que não levam em conta a distribuição de competências relevantes e as preocupações dos mais afetados pela proteção. Uma melhor compreensão dos custos e benefícios da conservação e do uso da biodiversidade pode ajudar a melhorar a distribuição de responsabilidades na gestão (Birner e Wittmer 2004).

MENSURAR O QUE GERIMOS: MÉTRICA PARA A SUSTENTABILIDADE

“Como as Contas Nacionais se baseiam em transa­ções financeiras, elas não levam em conta a Natu­reza, para a qual não devemos nada em termos de pagamentos, mas à qual devemos tudo em termos de meios de subsistência.”

Bertrand de Jouvenel 1968

Nossa bússola econômica está com defeito devido a ex-ternalidades não contabilizadas em todos os níveis – na-cional, corporativo e individual. A seguir, resumiremos os trabalhos em curso para corrigir esta falha e descrevere-mos como podemos contribuir na Fase II.

A inadequação da contabilidade nacional é reconhe-cida há pelo menos 40 anos. Hoje, é fundamental ir “além do PIB”, já que métricas inadequadas nos custaram muito caro em termos de crescimento não sustentável, ecossistemas degradados, perda de biodiversidade, e até mesmo em redução do bem-estar humano per capita, especialmente nos países em desenvolvimento.

Em novembro de 2007, a Comissão Europeia, o Parla-mento Europeu, o Clube de Roma, a WWF e a OCDE organizaram uma importante conferência em Bruxelas, com o título Além do PIB. Estiveram presentes 650 for-muladores de políticas e formadores de opinião de todo o mundo. A conferência enfocou a necessidade de outros parâmetros além do PIB como medida do que a socie-dade valoriza, evidenciada pelo fato de que a devastação resultante de eventos como o furacão Katrina e o tsunami na Ásia aparecem como aumento do PIB, apesar das tra-gédias humanas e perdas materiais.

O consenso da conferência é de que precisamos adicio-nar medidas ambientais e sociais à atual métrica do PIB (Além do PIB 2007). Estabelecer exclusivamente o clás-sico crescimento do PIB como meta pode não ser de grande ajuda para muitos dos nossos problemas mais urgentes. Por exemplo, pode não ser capaz de resolver a pobreza persistente na África e na Ásia, nem nos equipar

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para enfrentar as mudanças climáticas e o desenvolvi-mento insustentável.

O chamado para ação não vem apenas dos formuladores de políticas e especialistas, mas também do público. Em uma pesquisa (GlobeScan 2007) sobre medidas de pro-gresso além do PIB, três quartos dos inquiridos (em 10 países, inclusive Austrália, Brasil, Canadá, França, Alema-nha e Rússia) concluíram que os governos deveriam “olhar para além da economia e incluir estatísticas de saúde, so-ciais e ambientais na mensuração do progresso nacional “.

O Sistema de Contas Nacionais (SCN) utilizado amplamen-te não reconhece muitas externalidades significativas nas áreas de recursos naturais, saúde e educação. Isto signifi-ca que as melhorias desejáveis em saúde e educação são contabilizadas como despesas em vez de investimentos. Serviços ecossistêmicos valiosos que são fontes de ren-da não são sequer reconhecidos, e o desmatamento não é registrado como uma forma de depreciação.

Gerenciar melhorias na saúde, educação e qualidade ambiental sem uma estrutura formal para estabelecer seu valor financeiro pode ser um exercício frustrante. Es-colhas e barganhas políticas subótimas tendem a surgir na ausência de um “critério de sustentabilidade”. A pu-blicação de um indicador de “poupança verdadeira” por muitos anos pelo Banco Mundial mostrou que era de fato possível ir além da métrica do PIB, em nível mundial (Ban-co Mundial 2008). No entanto, a utilidade desta métrica foi limitada por sua necessidade de incluir padrões míni-

mos nos dados coletados em todos os países, limitando assim a gama de ajustes de capital natural que poderiam ser incluídos no cômputo da poupança verdadeira.

o desenvolvimento de uma métrica mais inclusiva de contabilidade da renda e da riqueza nacional deve ser uma prioridade, especialmente para países mais pro-pensos a perdas de ecossistemas e biodiversidade. Pode fazer a diferença entre uma trajetória viável e sustentável da economia e um desastre, não apenas para países em desenvolvimento, mas para todos nós.

O Sistema Integrado de Contabilidade Ambiental e Eco-nômica da ONU (UNSD 2008) pode ser um ponto de partida para a elaboração de uma contabilidade holística da renda e riqueza nacional que reflita as externalidades nas áreas de recursos naturais, saúde e educação. Atu-almente, poucos países produzem estatísticas holísticas de renda nacional nessas bases, e não há comparabi-lidade, já que diversas áreas são abordadas, diferentes externalidades são capturadas, e existem vários graus de granularidade.

Uma revisão do Sistema de Contas Nacionais de 1993 está sendo finalizada pela Comissão Estatística das Na-ções Unidas, envolvendo um grande número de organi-zações-chave, inclusive o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA, Banco Mundial, FMI, OCDE, Comissão Europeia e institutos de estatística em todo o mundo. Entendemos que um componente impor-tante da revisão do SCN é o reconhecimento de uma ver-são melhorada do SEEA como padrão. O processo de revisão do SEEA em curso, por iniciativa do Comitê de Especialistas da ONU sobre Contabilidade Econômico-Ambiental (UNCEEA, na sigla em inglês), é uma medida oportuna e necessária para que a métrica da renda na-cional avance para “além do PIB”. Acreditamos que os ecossistemas, a biodiversidade e sua valoração merecem especial atenção. é muito importante que o desenvol-vimento da contabilidade dos ecossistemas e da bio-

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Figura 4.1: Utilização de solo e água para produção de diversos alimentos

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60 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

diversidade em termos físicos e monetários seja pro-movido como uma prioridade-chave desde o início na revisão SEEA em curso, com base no trabalho da contabilidade econômico-ambiental e outros.

No nível corporativo, há um reconhecimento gradual da necessidade de se redefinir o sucesso das empresas, e reforçar a avaliação de desempenho e a comunicação para refletir uma visão mais ampla da empresa do que a de mera otimizadora de capital financeiro para seus acio-nistas. Modelos de tripolaridade (triple bottom line) e de relatórios de sustentabilidade estão sendo adotados por um número crescente de empresas. A Global Reporting Initiative (GRI) apresentou orientações detalhadas para utilização nos relatórios de sustentabilidade. O Carbon Disclosure Project tem sido bem-sucedido em estimular a divulgação voluntária de um número crescente de em-presas e países ano após ano. Todas estas iniciativas são, no entanto, baseadas em divulgação voluntária, e não são seguidas por um número suficiente de empresas para se-rem consideradas como normas de mercado.

na Fase ii, vamos nos aproximar de organizações en-volvidas na redefinição de métricas de desempenho corporativo e normas de relatoria, pois pretendemos aprimorar as orientações de valoração do uso do ca-pital natural pelas empresas, inclusive a mensuração da pegada de carbono.

Os consumidores constituem uma importante fonte de pressões para mudança do uso do solo de ecossiste-mas naturais, especialmente por meio da demanda por alimentos. Diferentes tipos de alimentos têm “pegadas ecológicas” dramaticamente diversas (ver Figura 4.1). É difícil para os consumidores incorporar esses fatores em suas opções de compras, a menos que os produtos – especialmente os alimentos – divulguem com clareza sua pegada ecológica no ponto de venda. Uma metodologia padrão confiável é um pré-requisito básico, que iremos explorar mais com grupos de usuários finais na Fase II. o objetivo é identificar e desenvolver métricas padrão para a pegada do consumidor (em termos de utiliza-ção de terra, água e energia), baseadas em princípios de ecologia e economia que sejam simples de enten-der e implementar pelos comerciantes.

IMAGINANDO UM NOVO MUNDO

Aos poucos, tem sido aceito que ecossistemas saudáveis que mantém altos níveis de biodiversidade são mais re-sistentes à pressão externa e, consequentemente, mais capazes de manter a prestação de serviços ecossistêmi-cos para a sociedade humana. Países e cada vez mais empresas e cidadãos querem conhecer e compreender a realidade dos custos de utilização do capital natural da Terra e as consequências das políticas sobre a resiliência e sustentabilidade dos ecossistemas.

Ainda enfrentamos muitas lacunas no conhecimento so-bre a situação e as tendências da biodiversidade e os fatores e pressões que contribuem para a sua perda, mas os cenários que esboçamos para a perda projetada de biodiversidade, ecossistemas e serviços ecossistêmicos apontam firmemente para o alto risco de mais perdas para o bem-estar e o desenvolvimento humano.

Este capítulo destacou diferentes abordagens para subs-tituir a bússola econômica antiga e quebrada da socieda-de e empregar uma nova bússola: repensar os subsídios de hoje, elaborar políticas e estruturas de mercado que recompensam os benefícios reconhecidos e penalizam os custos não capturados, e compartilhar os benefícios da conservação e das áreas protegidas de forma mais equitativa. Algumas peças do kit de ferramentas da nova economia e das novas políticas já estão sendo utilizadas em alguns países ou regiões, e outros ainda estão de-senvolvendo estudos de caso iniciais mostrando o seu potencial, mas de modo geral ainda há muito a ser feito.

Imagine agora que essas medidas não tenham sido apli-cadas apenas em projetos-piloto ou um único país. Ima-gine que as minúsculas sementes plantadas agora este-jam se tornando árvores majestosas. Imagine como elas podem contribuir para a melhoria da qualidade de vida em 2030 e daí por diante.

Imagine um crescimento do bem-estar e da segurança humana que não se baseie mais no PIB per capita cada vez mais alto e catástrofes climáticas e ecossistêmicas cada vez mais graves sendo manchetes nos jornais to-das as manhãs.

Imagine um mundo seguro e estável, com acesso univer-sal a água potável e alimentos saudáveis, com equidade no acesso à educação e oportunidade de renda, e com segurança social e política – um mundo que atinge e até vai além dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.

Biodiversidade e serviços ecossistêmicos são agora re-conhecidos como infraestrutura vital para a realização do bem-estar humano. Estamos convencidos de que A Eco-nomia dos Ecossistemas e da Biodiversidade, se usada com cuidadosa consideração das opções éticas subja-centes, pode oferecer uma contribuição decisiva para a preservação da biodiversidade e dos serviços ecossistê-micos, melhorando o nosso bem-estar e o de gerações futuras.

“Um outro mundo não só é possível, ele está a cami-nho. Em um dia calmo, posso ouvir sua respiração.”

Arundhati Roy, autora de The God of Small Things, no Fórum Social Mundial de 2003

Page 63: Um relatório preliminar

Da economia à política 61

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Page 65: Um relatório preliminar

A economia dos ecossistemas e da biodiversidade 63

A Fase II do estudo A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade (TEEB) pretende continuar o trabalho iniciado na Fase I e buscará alcançar cinco importantes objetivos. São eles:

• Elaborar um marco científico e econômico, integran-do o conhecimento ecológico e econômico para a produção de um modelo para a avaliação dos servi-ços ecossistêmicos em diferentes cenários.

• Identificar “metodologias de valoração”, aplicáveis em diferentes condições e pressupostos, para os valores econômicos da biodiversidade e dos serviços ecos-sistêmicos mais tangíveis e significativos, nos biomas mais importantes do mundo.

• Examinar os custos econômicos da perda da biodi-versidade e dos serviços ecossistêmicos em todo o mundo, em um cenário onde o desenvolvimento não considera a biodiversidade, e os custos e benefícios de ações para reduzir a perda da biodiversidade em cenários alternativos, com enfoque em uma perspec-tiva de médio a longo prazo.

• Elaborar uma “ferramenta política” que apoie reformas políticas e avaliações de impacto integradas, para ga-rantir que toda informação relevante seja considerada na análise dos prós e dos contras das diferentes alter-nativas, de modo a fomentar o desenvolvimento sus-tentável e a melhor conservação dos ecossistemas e da biodiversidade.

• Promover o engajamento dos principais usuários da biodiversidade em um estágio inicial de suas ativida-des de forma a garantir que o resultado desse estudo considere suas necessidades e seja acessível, prático, flexível e, acima de tudo, útil.

Para entender o significado desses objetivos no escopo do trabalho desenvolvido na Fase II, algumas considera-ções são listadas abaixo, assim como pontos importan-tes a serem considerados e atividades que deverão ser conduzidas:

1 Marco científico e econômico: a estrutura concei-tual, conforme apresentada no Capítulo 3, deverá servir como uma base prática para a avaliação. Será

UMA PRÉVIA DA FASE II

proposta a classificação dos serviços ecossistêmi-cos, estruturada sob a perspectiva de um usuário. A análise do conhecimento ecológico deverá ser com-plementada, de modo a incluir os serviços ecossis-têmicos que não foram cobertos pela Fase I. A partir dessa revisão, serão definidos métodos (usando o modelo espacialmente explícito) para avaliar a provi-são dos serviços ecossistêmicos em termos biofísi-cos sob diferentes cenários, de forma a servirem de base para sua valoração econômica. A devida aten-ção será dada para os riscos e incertezas associadas aos processos ecológicos, assim como ao comporta-mento humano. Também será considerada a análise das consequências de se aplicar diferentes taxas de descontos no cálculo dos custos e benefícios.

2 Metodologias de valoração: a extensa literatura sobre metodologias será avaliada, utilizando-se os exemplos fornecidos em resposta à nossa solicitação por evidências, na Fase I. Alguns biomas (ex. ocea-nos) e alguns valores (ex. valores de opção e valores de quase-opção) que não foram analisados a fundo na Fase I serão avaliados com maior profundidade. O trabalho da Fase II indicará as metodologias de valo-ração mais apropriadas para serem utilizadas em dife-rentes condições, determinadas pelos biomas e pelo contexto econômico e político-social. A Fase II deverá considerar os pontos fortes e fracos das diferentes técnicas, analisando seu grau de aplicabilidade e o tipo de informação necessária. Os principais desafios identificados no Capítulo 3 deste relatório precisarão ser revistos. Isso inclui a definição de uma metodolo-gia para a transferência de benefícios e para a agre-gação com credibilidade e que seja apropriada para avaliações em larga escala. A Fase I também ilustrou o valor de utilizar indicadores biofísicos na construção de métricas a partir da ecologia para a economia (ex. Abundância Relativa de Espécies – utilizada no estudo do Custo da Ação Política). A Fase II deve avaliar as medidas qualitativas e quantitativas disponíveis que possam ser usadas na formulação, direcionamento e aplicação das políticas, assim como nas avaliações econômicas.

3 Custos da inação política e custos políticos: será

finalizada uma avaliação global das consequências econômicas da inação política e das ações para re-duzir a perda da biodiversidade e dos serviços ecos-

Page 66: Um relatório preliminar

64 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

sistêmicos, utilizando-se da literatura sobre valoração e de avaliações prévias em larga escala e cenários globais, inclusive o estudo COPI conduzido na Fase I. No entanto, para ser significativa, uma avaliação glo-bal não pode ser reduzida a um único exercício de quantificação e será complementada com níveis de análise menos consolidados, relevantes para o pro-cesso de tomada de decisão.

4 Ferramenta política: reconhecendo a importância da ação política, será elaborada uma ferramenta que tenha como base as políticas já em curso em alguns países e que, aparentemente, têm potencial de serem escalonadas no nível local ou replicadas para outros lugares. Essa ferramenta deve ser importante para todo o mundo, de modo que possa ser útil aos toma-dores de decisão nos diversos países. Em todos os casos, a ferramenta deve considerar a questão eco-nômica. Por exemplo, a economia das áreas protegi-das terá um foco específico: o valor econômico das áreas protegidas no momento não é adequadamente reconhecido e o fortalecimento das políticas relaciona-das não é robusto nem dispõe de recursos financei-ros adequados. A Fase II terá por objetivo demonstrar como as políticas podem ser modificadas quando po-demos considerar da melhor maneira os valores que a biodiversidade tem para as pessoas e para a recons-trução de uma sociedade desestruturada.

5 interfaces com os usuários: para se chegar a uma escala global, são necessárias alianças entre todos os setores da sociedade. Assim, é preciso estabele-

cer relações com atores-chave como, por exemplo, grupos responsáveis pelo aprimoramento do Sistema Integrado de Responsabilidade Ambiental e Econômi-ca (SIRAE – 2003), por projetos de Economia Verde (ex. PNUMA), por sistemas de contabilidade nacional (ex. Comitê das Nações Unidas de Especialistas em Economia Ambiental), pelo financiamento das áreas protegidas (Ex. PA NETWORK) e pelo desenvolvimen-to de sistemas de pagamento por serviços ecossis-temas. Da mesma forma, será útil continuar com os esforços em andamento que visam a melhorar os relatórios de desempenho corporativo, de modo a incluir a questão da sustentabilidade (ex. Global Re-porting Initiative – GRI), organizações de consumido-res à frente das escolhas sustentáveis, e os governos envolvidos em iniciativas similares (que, por exemplo, contabilizam as “pegadas de consumo”, dissemina-ção de informações dos pontos de venda, etc).

A biodiversidade deve se tornar responsabilidade de to-dos que detém poder e recursos para agir. A Fase II, por-tanto, visa a fornecer informações relevantes sobre polí-ticas que apoiem e acelerem a construção de políticas para a conservação e uso sustentável da biodiversidade em todas as regiões do mundo. Visa ainda a incentivar o desenvolvimento de novas métricas de “sustentabilidade” que complementem as conhecidas métricas do Produ-to Interno Bruto (PIB) que tratam do crescimento e da rentabilidade corporativas. Os primeiros passos já foram tomados, e estamos confiantes que o relatório final do TEEB planejado para a Fase II será um trabalho apreciado por todos que o lerem.

Page 67: Um relatório preliminar

A economia dos ecossistemas e da biodiversidade 65

AGRADECIMENTOS

Agradecemos aos membros do Painel Consultivo, que forneceu orientação e apoio desde o estágio inicial do projeto:Joan Martinez-Alier, Giles Atkinson, Karl-Göran Mäler, Pe-ter May, Jacqueline McGlade, Julia Marton-Lefevre, Her-man Mulder, Lord Nicholas Stern, Achim Steiner.

Agradecemos aos pesquisadores que conduziram os diversos estudos contratados durante a Fase I, por seu trabalho de alta qualidade em prazos tão exíguos. Estes estudos estão disponíveis no página do TEEB na internet (veja http://ec.europa.eu/ environment/nature/biodiversi-ty/economics/index_en.htm).

oS CUStoS DA inAção PolítiCA: o CASo DE não AlCAnçAr AS MEtAS EStABElECiDAS PArA 2010 (EStUDo CoPi) – contrato com a Comissão Europeia

Parceiros e colaboradoresAlterra: Leon Braat (coordenador), Chris Klok IEEP: Patrick ten Brink (coordenador adjunto), Marianne

Kettunen, and Niele Peralta Bezerra Ecologic: Ingo Bräuer, Holger Gerdes FEEM: Aline Chiabai, Anil Markandya, Paulo Nunes,

Helen Ding, Chiara TravisiGHK: Matt RaymentMNP: Mark van Oorschot, Jan Bakkes, Michel Jeuken,

Ben ten BrinkUNEP-WCMC: Matt Walpole, Katarina Bolt Witteveen &

Bos: Ursula Kirchholtes

ConsultoresAgência Federal Alemã para Conservação da Natureza:

Horst KornInstituto para Estudos Ambientais: Pieter van Beukering

AnÁliSE Do EStUDo EXPlorAnDo A CiÊnCiA – contrato com a Comissão Europeia

Parceiros e colaboradoresUniversidade de Cambridge: Andrew Balmford (scientific

leader), Ana S.L. Rodrigues, Rhys Green, James J.J. Waters, Kelly Flower, James Beresford, Hannah Peck

IEEP: Patrick ten Brink, Marianne Kettunen

A Fase I desse projeto foi apoiada pelo Ministério Federal para o Meio Ambiente, Conservação da Natureza e Se-gurança Nuclear da Alemanha (BMU) e pela Comissão Europeia (Diretoria Geral de Meio Ambiente), junto com a Agência Europeia de Meio Ambiente (EEA), na iniciativa do Sr. Jochen Flasbart, Diretor Geral de Conservação da Natureza do BMU, e do Sr. Ladislav Miko, Diretor de Pro-teção do Meio Ambiente Natural da Comissão Europeia.

Membros do grupo principal e colaboradores deste relatório:Mark Schauer (BMU)Katarina Lipovska, Aude Neuville, Alexandra Vakrou, Stephen White (Comissão Europeia, Diretoria Geral de

Meio Ambiente).Jock Martin (EEA)Heidi Wittmer and Christoph Schröter-Schlaack (Centro

para Pesquisa Ambiental de Helmholtz – UFZ)Patrick ten Brink (Instituto para Políticas Ambientais

Europeias – IEEP)Pushpam Kumar (Departamento de Geografia e Instituto

para Água Sustentável, Gerenciamento Integrado e Pesquisa Ecossistêmica, Universidade de Liverpool)

Haripriya Gundimeda (Instituto de Teconlogia da Índia, Mumbai)

Gostaríamos de agradecer aos seguintes especialis-tas pelas importantes contribuições ao relatório:Carlos M. Rodriguez and Rosimeiry Portela

(Conservação Internacional)Alice Ruhweza (Forest Trends)John Hanks (Serviço de Conservação Internacional,

África do Sul)Ronan Uhel, Hans Vos, Jean-Louis Weber, Charlotta

Colliander, and Charlotte Islev (EEA)Augustin Berghöfer, Florian Eppink, Carsten Neßhöver,

Irene Ring, and Frank Wätzold (UFZ)Dalia Amor Conde and Norman Christensen

(Universidade de Duke)Roberto Constantino (Mexico)Pedro Pereira (Brasil)Aditi Halder (Confederação da Indústria da Índia)Sarojini Thakur (Commonwealth Secretariat)Timothy Patrick Fox (“Engage Carbon”, Chennai, India)Zoe Cokeliss (Context – Londres)

Page 68: Um relatório preliminar

66 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Alterra: Rik Leemans, Rudolf de Groot, Leon Braat(UNEP/CMMC): Matt Walpole, Katie Bolt, Lera MilesCentro de Pesquisa Social e Econômica do Meio

Ambiente Global, Universidade de East Anglia: Kerry Turner, Brendan Fisher

WWF-EUA: Robin Naidoo, Taylor H. Ricketts Universidade da California: Claire Kremen, Alexandra-

Maria Klein Bryn Mawr College: Neal M. Williams Universidade da British Columbia: Reg Watson

O estudo também teve contribuições de muitos especia-listas que forneceram informações, sugestões e revisões; eles não podem todos ser mencionados aqui (cf o relató-rio completo do estudo).Revisão dos Custos de Conservação e Prioridades de Ação: Andrew Balmford, Aaron Bruner (Conservação In-ternacional), Robin Naidoo (WWF – EUA)

AnÁliSE EConôMiCA E SíntESE – contrato com a Comissão Europeia

Parceiros e colaboradoresFEEM: Anil Markandya, Paulo Nunes, Chiara Travisi,

Aline Chiabi, Helen DingEcologic: Andreas R. Kramer, Ingo Bräuer, Aaron Best,

Sören Haffer, Kaphengst Timo, Gerdes HolgerGHK: Matt RaymentIEEP: Patrick ten Brink, Marianne KettunenIVM: Pieter van Beukering, Onno J. Kuik, Luke Brander,

Frans Oosterhuis, Dini Helmers

Contabilidade do Ecossistema para o Custo das Per-das de Biodiversidade: Estrutura e Estudo de Caso para as Áreas úmidas Costeiras Mediterrâneas – coor-denado pela EEA, com doações do BMU (governo alemão)

Parceiros e colaboradoresEEA: Jean-Louis Weber, Ronan Uhel, Rania SpyropoulouETCLUSI: Françoise Breton, Juan ArévaloETCBD: Dominique Richard Universidade de Nottingham: Roy Haines-Young, Marion

Potschin Universidade se Liverpool: Pushpam Kumar Universidade de Autonomous of Madrid: Berta Martin,

Pedro Lomas, Erik GomezTour du Valat: Pere Tomas, Driss EzzineInstituto Nacional do Delta do Danúbio: Iulian Nichersu,

Eugenia Marin

EStUDo DA EConoMiA DA ConSErvAção DA Bio-DivErSiDADE FlorEStAl – coordenado pela Agência Europeia para o Meio Ambiente/EEA, com doações do BMU (governo alemão)

Parceiros e colaboradoresIUCN: Joshua Bishop, Sebastian Winkler

Universidade de Cambridge: Katrina Mullan, Andreas Kontoleon

EEA: Ronan Uhel, Hans Vos, Jean-Louis Weber, Jock Martin

Várias organizações têm contribuido para a primeira fase do projeto com recusos, estudos ou experiência, notavel-mente o Departamento de Meio Ambiente, Alimentação e Questões Rurais – DEFRA do Renio Unido, Ministério do Desenvolvimento da França, IUCN, OECD, UNEP-WCMC e BfN. Em particular, somos gratos aos membros do grupo de trabalho pelo seu apoio e conselho: Martin Brasher, Andrew Balmford, Joshua Bishop, Pascal Blan-quet, Eric Blencowe, Katie Bolt, Leon Braat, Guy Duke, Anantha Kumar Duraiappah, Robert Flies, Mark Hayden, Katia Karousakis, Marianne Kettunen, Ariane Labat, Ste-fan Leiner, Katarina Lipovska, Anil Markandya, Robin Miè-ge, Helen Mountford, Shaun Mowat, Jonathan Murphy, Paulo Nunes, Vanessa Nuzzo, Patrizia Poggi, Ana Rodri-gues, Guillaume Sainteny, Hugo-Maria Schally, Burkhard Schweppe-Kraft, Martin Sharman, Anne Teller, Ronan Uhel, Hans Vos, Jean-Louis Weber, Sebastian Winkler, and Karin Zaunberger.

Gostaríamos de agradecer em especial ao DEFRA do Reino Unido, por fornecer os resultados de seus vários estudos em valoração econômica, inclusive “Um guia in-trodutório para valoração dos serviços ecossistêmicos” e ao Ministério do Desenvolvimento da França, por forne-cer os resultados de seu estudo em recifes de corais “La préservation des écosystèmes coralliens: aspects scien-tifiques, institutionnels et socio-économiques”. Todo o material está disponível na página da internet do TEEB (veja http://ec.europa.eu/ environment/nature/biodiversi-ty/economics/index_en.htm).

Vários relatórios, artigos e outras contribuições têm sido recebidos em resposta à consulta por evidências feita na internet, organizada pela Comissão Europeia. Esse mate-rial também será usado na Fase II do estudo. Gostaríamos de agradecer a todos que participaram desta consulta.

Sobrenome nome instituição

Alwi Tanya Borneo Tropical Rainforest FoundationAzqueta Diego University of AlcaláBaumgärtner Stefan Leuphana University of Lüneburg Bearzi Giovanni Tethys Research InstituteBellon Maurizio Conservation International Bernstein Johannah Berrisford Kate Bozzi Pierluigi University ofe Rome “La Sapienza”Brander Keith Brotherton Peter Natural England

Page 69: Um relatório preliminar

A economia dos ecossistemas e da biodiversidade 67

Sobrenome nome instituição

Bullock Craig OptimizeCarraro Carlo University of VeniceCerulus Tanya Departement Leefmilieu, Natuur en Energie (LNE) VlaanderenChalad Bruns Pakping Coordination Centre for Natural Resources & Environment management & Environment partnershipsChristie Mike Aberystwyth UniversityCobra Jose European Cork ConfederationCokeliss Zoe Context, LondonCostanza Robert University of Maryland, USADanby Ian BASC De Corte Pieter European Landowners Organisation (ELO)Deke Oliver German Advisory Council on Global Change (WBGU)Dieterich Martin University of HohenheimDietzsch Laura Amazon Institute of Environmental Research, BrazilEijs Arthur Ministry of Environment, NLFarooquee Nehal G.B. Pant Institute of Himalayan Environment and Development Gast Fernando Instituto Alexander von HumboldtGauthier Sylvie Canadian Forestry ServiceGibby Mary Royal Botanic GardenGokhale Yogesh The Energy and Resources InstituteGraham Andrea National Farmers UnionGrieg-Gran Maryanne International Institute for Environment and DevelopmentGroth Markus Leuphana Universität Lüneburg Gundimeda Haripriya Indian Institute of Technology, IndiaHauser Andreas BAFU Federal Office For the EnvironmentHeikkilä Jaakko MTT Economic Research Henson Webb John IUCN UK Hoppichler Josef Federal Institute for Less-Fa- voured and Mountainous AreasKälberer Achim Free Journalist, BerlinKirchholtes Ursula Witteveen+Bos, NLKumar Anil M S Swaminathan Research FoundationLa Notte Alessandra University of Torino, Dept. of Economics

Sobrenome nome instituição

Lehmann Markus Convention on Biological DiversityLindhjem Henrik Norwegian University of Life SciencesLüber Sigrid European Coalition for Silent Oceans MacDonald Alistair Delegation of the European Commission to the PhilippinesMarthy William Martín-López Berta Universidad Autónoma de MadridMichalowski Arthur Wroclaw University of EconomicsMoran Dominic Scottish Agricultural College (SAC)Mowat Shaun UK DefraMyers Norman Navrud Ståle Norwegian University of Life SciencesNinan Karachepone Centre for Ecological N Economics and Natural Resources Institute Social and Economic ChangePerrings Charles Arizona State University and DIVERSITAS ecoSERVICESSmale Melinda International Food Policy Research InstituteSpijkerman Lilian Conservation International Sud Ridhima Development Alternatives Thornberry Brian Biodiversity Policy Unit, National Parks & Wildlife Service, IrelandTschirhart John Vaissière Bernard INRA, Laboratoire Pollinisation & Ecologie des Abeillesvan den Hove Sybille van Ham Chantal IUCN – The World Conservation UnionWaliczky Zoltan Royal Society for the Pro tection of Birds (RSPB), UKWätzold Frank Helmholtz Centre for Environmental Research Wensing Daan Triple E, NLWhite Richard Devon Wildlife TrustWossink Ada University of ManchesterYessekin Bulat National Council on Sustainable Development of the Republic of KazakhstanYoung Carlos Instituto de Economia – Eduardo UFRJ

Page 70: Um relatório preliminar

68 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Nota: alguns colaboradores responderam à consulta por conta própria.

Mais de 90 especialistas em economia, ecologia e políti-ca participaram do workshop sobre a economia da perda global da diversidade biológica, realizada nos dias 5 e 6 de março em Bruxelas, Bélgica. Nós somos muito gratos pela ideias geradas e pelas recomendações resultantes dessa oficina. Os procedimentos do evento e as apresentações realizadas estão disponíveis na página do TEEB na inter-net: http://ec.europa.eu/environment/nature/bio diversity/eco nomics/index_en.htm, e no seguinte endereço: http://www.ecologic-events.de/eco-loss-biodiv/index.htm.

Gostaríamos de agradecer especialmente aos coorde-nadores das sessões – Kerry Turner, Pushpam Kumar, Ben ten Brink, Alistair McVittie, Patrick ten Brink, Ståle Navrud, Joshua Bishop, Anantha Duraiappah, Anil Ma-rkandya, and Heidi Wittmer – e aos autores dos estudos de caso – Salman Hussain, Katrina Mullan, and Jean-Louis Weber – pelas suas importantes contribuições.

Agradecimento especial a Roger Cowe de Context, Londres, Jennifer Scarlott, da Iniciativas em Conserva-ção Internacional Nova Iorque, EUA, e David Skinner, da Comissão Europeia, pela edição; a Banson, Cambridge, Reino Unido, pela edição e lay-out; e a Manfred Heuser, de Welzel+Hardt, Wesseling, Alemanha, pela impressão sob prazos rigorosos.

Page 71: Um relatório preliminar

A economia dos ecossistemas e da biodiversidade 69

CUSto DA inAção PolitiCA (CoPi): o CASo DE não AlCAnçAr A MEtA BioDivErSiDADE 2010

Braat l. (Alterra) and ten Brink, P. (iEEP) et al, Maio de 2008 (para Diretoria Geral de Meio Ambiente, Comis-são Europeia)

O estudo apresenta os impactos do desenvolvimento econômico global de acordo com o cenário base da Or-ganização para a Cooperação e o Desenvolvimento Eco-nômico (OCDE, março de 2008) sobre biodiversidade ter-restre e dos oceanos, sobre os serviços ecossistêmicos associados e sobre os sistemas social e econômico, em termos quantitativos e monetários. A partir de um modelo de mudança futura da biodiversidade (Global Biodiver-sity Outlook 2, CBD 2006) e na Avaliação Ecossitêmica do Milênio (2005), foram calculadas as perdas anuais de bem estar nos níveis global e regional devido a diminuição da biodiversidade e a perda de serviços ecossistêmicos. O estudo é investigativo, e identifica números prelimina-res quanto aos impactos e à importância econômica de abordar a perda da biodiversidade e de esclarecer abor-dagens metodológicas para uma análise mais ampla de suas implicações para o bem estar da sociedade.

AnÁliSE DA EConoMiA DA PErDA DA BioDivErSiDADE: EStUDo EXPlorAnDo A CiÊnCiA

Balmford, A., rodrigues, A. (Universidade de Cam-bridge), Walpole, M. (WCMC), ten Brink, P., Kettunen, M. (iEEP), e Braat, l. e de Groot, r. (Alterra), Maio de 2008 (para Diretoria Geral de Meio Ambiente, Comis-são Europeia)

Este estudo abordou duas questões principais. Primeira-mente, desenvolveu um marco conceitual para estimar as reais consequências econômicas de ações políticas para a conservação da biodiversidade e dos ecossistemas. Esse marco, que pode ser usado como um instrumen-to para se testar pacotes de políticas em uma variedade de escalas espaciais, conta com uma avaliação espacial da variação dos benefícios marginais e dos custos da conservação da biodiversidade. A segunda tarefa visou fornecer uma visão geral coerente sobre o conhecimento existente em ecologia, sobre o qual se baseou a parte econômica do estudo. Para uma diversidade de proces-sos ecológicos (como polinização e regulação de água) e

SINOPSE DOS ESTUDOS

de benefícios (ex. pesca, carne de caça), o projeto reali-zou uma revisão da literatura e consultou especialistas de modo a compreender: sua relação com o bem-estar hu-mano; como a perda da biodiversidade e a degradação dos ecossistemas podem influenciar a provisão de cada processo ou benefício, inclusive em termos de resiliência no longo prazo; quais desafios essas provisões enfren-tam; e quais são as tendências atuais. Essencialmente, esse estudo investigou como o conhecimento atual está longe de quantificar e mapear, em uma escala global, as estimativas de produção de cada processo ou benefício, sob o qual uma valoração econômica espacial explícita pode se basear. O resultado é um quadro misto, com algumas áreas suficientemente avançadas em conheci-mento, de modo a formar a base da valoração econô-mica, enquanto em outras áreas ainda são necessárias muitas pesquisas.

rEviSão SoBrE A EConoMiA DA PErDA DA BioDivErSiDADE: AnÁliSE EConôMiCA E SíntESE

Markandya, A., nunes, P.A.l.D. (FEEM), Brauer, i. (Ecologic), ten Brink, P. (iEEP), e Kuik, o. e rayment. M. (GHK), Abril de 2008 (para Diretoria Geral de Meio Ambietne, Comissão Europeia)

Este relatório revisou uma série de artigos e outros ma-teriais submetidos em resposta à “consulta por evidên-cias” realizada pela Comissão Europeia. Foram recebidas cento e dezesseis contribuições de 55 participantes. A principal mensagem é que estamos testemunhando uma perda progressiva da biodiversidade e que esta perda é a causa de grande redução do bem-estar. Em segundo lugar, a valoração econômica da perda da biodiversidade pode fazer sentido – quando se escolhe um nível claro da diversidade, quando se formula um cenário concreto para mudanças na biodiversidade, quando as alterações estão dentro de determinados limites, e quando a pers-pectiva do valor da biodiversidade se torna explícita. A consulta por evidências também esclareceu que existe uma série de gargalos na literatura sobre valoração. Por exemplo: o valor do conhecimento das comunidades indígenas sobre a conservação da biodiversidade ainda carece de mais pesquisa, assim como o valor da bio-diversidade de recursos marinhos, especialmente aque-les de locais mais profundos, e também a valoração de material genético. Além disso, o estudo conclui que esti-

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70 A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

mativas de valores econômicos devem ser consideradas. Na melhor das hipóteses, sabe-se o mínimo acerca da biodiversidade. Pesquisas devem priorizar mais estudos de caso da perda da biodiversidade e formas práticas de se lidar com tal perda no nível local (país). Devem, ainda, explorar informações sobre valoração existentes e técni-cas de transferência de valores. Mais importante, a biodi-versidade não deve ser um problema ambiental isolado e sua importância no contexto das questões econômicas e outras questões globais, como as mudanças climáticas, deve ser analisada com maior profundidade.

EStUDo SoBrE A EConoMiA DE ConSErvAçÂo DA BioDivErSiDADE DE FlorEStAS

Kontoleon, A. et al., Universidade de Cambridge, Dept de Economia da terra, Março de 2008 (para iUCn)

Este estudo examina evidências a partir de estudos de caso existentes sobre os custos e os benefícios de se proteger a biodiversidade de florestas, de modo a avaliar como esses valores podem ajudar no processo de toma-da de decisão de políticas sobre biodiversidade; e iden-tifica falhas de informação. A pesquisa cobre quase 200 estudos que valoram uma gama de benefícios advindos da biodiversidade de florestas, e 40 estudos que estimam seus custos de conservação. Todos os tipos de florestas foram abordados, embora tenham sido priorizados os es-tudos relacionados a florestas com valor significativo de biodiversidade. Todas as regiões geográficas que apre-sentaram evidências foram incluídas, e os estudos indi-viduais incluem uma mistura de estimativas locais, nacio-nais, regionais e globais. O estudo também avalia opções alternativas financeiras e de políticas para a conservação da biodiversidade de florestas: áreas protegidas, regula-mentações de uso do solo e acesso à tecnologia; incenti-vos, como taxas de uso e pagamentos subsidiados; e ins-trumentos de mercado como esquemas de certificação.

ContABiliDADE ECoSSitÊMiCA PArA o CUSto DA PErDA DA BioDivErSiDADE: MArCo E EStUDo DE CASo PArA AS ÁrEAS úMiDAS CoStEirAS MEDitErrÂnEAS

Um estudo da Agência Europeia para o Meio Ambien-te, Março de 2008 (Fase i)

O estudo de caso sobre as áreas úmidas mediterrâneas visou demonstrar tanto a viabilidade de se elaborar ba-lanços dos ecossistemas e seu interesse pela formula-ção de políticas. As questões por trás dos balanços dos ecossistemas estão relacionadas com a sustentabilidade dos ecossistemas, com a quantidade necessária para reinvestir na sua manutenção e restauração de modo a manter as funções e serviços no futuro e a valorar os serviços inexistentes no mercado e atualmente não con-tabilizados no consumo doméstico ou coletivo, e, que, portanto, não são considerados um componente de seu bem-estar. Dentre as principais conclusões, citam-se: o balanço deve ser conduzido fora de sistemas socioeco-lógicos dominados por áreas úmidas, e não em um nível mais estreito; os valores das funções ecológicas e dos serviços ecossistêmicos precisam ser medidos em três escalas diferentes: micro, médio e macro, de modo a po-der incluir serviços de alto valor regulatório; na escala mi-cro, os gráficos do balanço poderiam ser elaborados de modo a abranger as necessidades dos atores locais; na escala global, balanços potenciais do ecossistema po-dem ser feitos com o apoio de programas de observação da Terra; na escala média (países e regiões), o desenvol-vimento dos balanços deve considerar o atual processo de revisão do Sistema de Balanço Econômico Ambiental das Nações Unidas.

informações detalhadas destes estudos estão em HttP://ec.europa.eu/environment/nature/biodiversi-ty/economics/index_en.htm

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