um auto de gil vicente tópicos

2
Literatura Portuguesa II Paula Cruz 1 UM AUTO DE GIL VICENTE, de Almeida Garrett ACTO I • Este Acto desenrola-se no largo dos Paços de Sintra. À esquerda, o palácio real; à direita e no fundo, montes e arvoredos. Inicia-se o crepúsculo da madrugada. • Pêro Sáfio alude a umas “vodas reais”: casamento da infanta D. Beatriz com o duque de Sabóia. • Existem amores contrariados — Bernardim Ribeiro/Infanta D. Beatriz; Pêro Sáfio/Paula Vicente. • Pêro Sáfio faz referência a obra Menina e Moça ou Saudades , de Bernardim Ribeiro, e a uma personagem, Bimnardel ou Narbindel, desse mesmo livro. Alude também a peça vicentina Cortes de Júpiter , que serve de base a esta obra de Garrett. Pêro Sáfio caracteriza ironicamente os embaixadores italianos — Chatel é “um refinado sonso de italiano”; o Barão de Saint-Germain — “todo galante e cortesão”, e o doutor Passario todo grave como um Bártolo”. • Bernardim Ribeiro critica a corte utilizando as seguintes expressões: “vossas comédias, que assim trazem embelecada esta corte de comediantes, que de mais não cuidam”. • Bernardim Ribeiro, de forma sentenciosa, tenta definir a amizade e o amor: a “amizade é um tráfico — e o próprio amor, o mais nobre. o mais sublime afecto humano, é mercadoria que se vende e troca pelas vis e mesquinhas conveniências da terra”. • Chatel caracteriza D. Beatriz através das seguintes expressões: “É muito moça”; “tem um cabedal de instrução”; “folga com livros de cavalarias e cancioneiros”. • D. Beatriz manifesta, ao Bispo de Targa, o desejo de ficar só com Paula Vicente, a fim de lhe confidenciar os seus amores infelizes. • A Infanta D. Beatriz sente-se triste, angustiada, desesperada e revoltada devido ao amor- paixão que sente. ACTO II • O Acto II desenrola-se nos Paços da Ribeira: “Gótico florido inclinando fortemente a Renascença. Tochas e placas com luzes”. • Para Paula Vicente, na corte, “Tudo é representar e fingir”. As produções poéticas de seu pai são “sublimes criações do seu engenho”; graciosas pinturas do seu estilo”. • Os que na corte assistem às representações das peças de Gil Vicente caracterizam-no como “comediante; jogral; chocarreiro”. • Paula Vicente, ao proferir a expressão “Que duas almas tão semelhantes e tão diversas”, pretende comparar Gil Vicente com Bernardim Ribeiro. • Gil Vicente utiliza um trocadilho (Judia — nome; judias — forma verbal. O jogo de palavras significa que Joana do Taco, que vai fazer o papel de moura, judia de origem, pratica diabruras”, incomodando e preocupando Gil Vicente. • Gil Vicente manifesta-se muito apreensivo com a representação do Auto: Pois a esta hora, nós já vestidos, a corte al junta toda”; “Há uma hora que quero começar o ensaio geral e é sempre isto”; “Tenho cá uma coisa que me diz, uma coisa que me agoura mal deste auto da infanta”. • Paula Vicente refere-se, de forma sarcástica, às duquesas e condessas (“E elas existem para aí”) pois pensa que, apesar de pertencerem a uma elevada hierarquia social, não são superiores a ela: “Que são elas mais que eu?” • Paula Vicente, enquanto Providência, apresenta os seguintes elementos caracterizadores: Ceptro na mão, coroa na cabeça, túnica roçagante, cauda sobraçada”, • Paula Vicente evidencia sentimentos de enfado, inveja, ingratidão, ironia e revolta. • Bernardim Ribeiro faz a seguinte proposta a Gil Vicente: “Não é ver o Auto que eu quero, é entrar nele. Peço-vos um papel no vosso auto”; “Quero um papel com máscara”. o objectivo desta proposta é ter uma oportunidade de estar junto da infanta sem ser

Upload: paula-cruz

Post on 07-Jun-2015

6.386 views

Category:

Documents


3 download

DESCRIPTION

Um Auto de Gil Vicente

TRANSCRIPT

Page 1: Um Auto de Gil Vicente tópicos

Literatura Portuguesa II

Paula Cruz

1

UM AUTO DE GIL VICENTE, de Almeida Garrett

ACTO I • Este Acto desenrola-se no largo dos Paços de Sintra. À esquerda, o palácio real; à direita e no fundo, montes e arvoredos. Inicia-se o crepúsculo da madrugada. • Pêro Sáfio alude a umas “vodas reais”: casamento da infanta D. Beatriz com o duque de Sabóia. • Existem amores contrariados — Bernardim Ribeiro/Infanta D. Beatriz; Pêro Sáfio/Paula Vicente. • Pêro Sáfio faz referência a obra Menina e Moça ou Saudades, de Bernardim Ribeiro, e a uma personagem, Bimnardel ou Narbindel, desse mesmo livro. Alude também a peça vicentina Cortes de Júpiter, que serve de base a esta obra de Garrett. Pêro Sáfio caracteriza ironicamente os embaixadores italianos — Chatel é “um refinado sonso de italiano”; o Barão de Saint-Germain — “todo galante e cortesão”, e o doutor Passario “ todo grave como um Bártolo”. • Bernardim Ribeiro critica a corte utilizando as seguintes expressões: “vossas comédias, que assim trazem embelecada esta corte de comediantes, que de mais não cuidam”. • Bernardim Ribeiro, de forma sentenciosa, tenta definir a amizade e o amor: a “amizade é um tráfico — e o próprio amor, o mais nobre. o mais sublime afecto humano, é mercadoria que se vende e troca pelas vis e mesquinhas conveniências da terra”. • Chatel caracteriza D. Beatriz através das seguintes expressões: “É muito moça”; “ tem um cabedal de instrução”; “ folga com livros de cavalarias e cancioneiros”. • D. Beatriz manifesta, ao Bispo de Targa, o desejo de ficar só com Paula Vicente, a fim de lhe confidenciar os seus amores infelizes. • A Infanta D. Beatriz sente-se triste, angustiada, desesperada e revoltada devido ao amor-paixão que sente.

ACTO II

• O Acto II desenrola-se nos Paços da Ribeira: “Gótico florido inclinando fortemente a Renascença. Tochas e placas com luzes”. • Para Paula Vicente, na corte, “Tudo é representar e fingir”. As produções poéticas de seu pai são “sublimes criações do seu engenho”; “graciosas pinturas do seu estilo”. • Os que na corte assistem às representações das peças de Gil Vicente caracterizam-no como “comediante; jogral; chocarreiro”. • Paula Vicente, ao proferir a expressão “Que duas almas tão semelhantes e tão diversas”, pretende comparar Gil Vicente com Bernardim Ribeiro. • Gil Vicente utiliza um trocadilho (Judia — nome; judias — forma verbal. O jogo de palavras significa que Joana do Taco, que vai fazer o papel de moura, judia de origem, “pratica diabruras”, incomodando e preocupando Gil Vicente. • Gil Vicente manifesta-se muito apreensivo com a representação do Auto: “Pois a esta hora, nós já vestidos, a corte al junta toda”; “ Há uma hora que quero começar o ensaio geral e é sempre isto”; “ Tenho cá uma coisa que me diz, uma coisa que me agoura mal deste auto da infanta”. • Paula Vicente refere-se, de forma sarcástica, às duquesas e condessas (“E elas existem para aí”) pois pensa que, apesar de pertencerem a uma elevada hierarquia social, não são superiores a ela: “Que são elas mais que eu?” • Paula Vicente, enquanto Providência, apresenta os seguintes elementos caracterizadores: “Ceptro na mão, coroa na cabeça, túnica roçagante, cauda sobraçada”, • Paula Vicente evidencia sentimentos de enfado, inveja, ingratidão, ironia e revolta. • Bernardim Ribeiro faz a seguinte proposta a Gil Vicente: “Não é ver o Auto que eu quero, é entrar nele. Peço-vos um papel no vosso auto”; “ Quero um papel com máscara”. o objectivo desta proposta é ter uma oportunidade de estar junto da infanta sem ser

Page 2: Um Auto de Gil Vicente tópicos

Literatura Portuguesa II

Paula Cruz

2

ACTO III

reconhecido pela corte. • Durante o ensaio geral do Auto, Paula Vicente adopta uma atitude irónica e crítica. • O Auto é representado na corte, na “sala de dossel”. • No Auto está presente a temática dos amores contrariados: “Que me importa amanhã? Eu vivo para hoje, vivo para esta hora. Que me dá a mim que acabe o mundo depois!”; “E ela? Não viste se ...? Não pareceu sentir?... Não observaste?...”; e dos amores desencontrados: Pêro Sáfio ama Paula Vicente; Paula Vicente ama Bernardim Ribeiro. • Para D. Manuel I, o Auto que está a ser representado é “Gentil romance! E bem cantado”. • Bernardim Ribeiro, na corte, teve o papel de moura e representou-o improvisando versos com a emoção e amor que estava a sentir pela infanta. • Chatel evidencia a sua perspicácia: “Aqui há mistério! E eu hei-de descobri-lo!”. • O Acto III desenrola-se na Recâmara do Galeão de Santa Catarina. • Garcia de Resende elogia D. João II por ter sido o impulsionador da descoberta do caminho marítimo para a Índia. Refere ainda que o rei D. Manuel I colheu os frutos semeados em reinados anteriores (no de D. João II) e usufruiu das riquezas provenientes da Índia. • Chatel evidencia, mais uma vez, a sua perspicácia: “Parece-me que ainda temos grande tormenta antes de começar a viagem. Estarei alerta.” • D. Beatriz pede a Inês de Melo o cofre onde se encontra o livro Saudades de Bernardim Ribeiro. • O livro Saudades reflecte os amores contrariados de D. Beatriz e de Bernardim Ribeiro, e nele há a transposição para a ficção de eventuais vivências amorosas reais. • D. Beatriz, adoptando uma atitude superior, sente desprezo por Chatel, importunando-se com a sua presença. • Chatel quer revelar o segredo relativo a história do Auto por interesses materiais: “Basta que a duquesa saiba que eu sei o que ela não quer que se saiba: está feita a minha fortuna.” • Chatel galanteia Paula Vicente: “Formosa e discreta Paula”; “ Boca tão formosa”; “ O meu desejo é servir-vos como mereceis”; “ Tão bela”. • Para confundir as suspeitas de Chatel, Paula Vicente confessa-lhe que a personagem que fez de Moura era um homem que a amava a ela e que por “loucos amores” endoideceu. • D. Beatriz chama ao seu camarim Paula Vicente, a fim de lhe confidenciar o seu sofrimento amoroso. Na perspectiva de Paula Vicente, D. Beatriz é boa, inocente, tímida, desgraçada por amores. • Paula Vicente refere-se, deste modo, a Bernardim Ribeiro, a quem ama: “Mas aquele infeliz que não tem outra glória... que esse funesto amor que o mata”. • Paula Vicente tem ciúmes de D. Beatriz, considerando-a como rival, porque Bernardim Ribeiro em vez de a amar a ela, ama a infanta D. Beatriz. • D. Beatriz faz algumas confidências a Paula Vicente: o seu desterro; a mágoa que sente; o choro do pai, rei D. Manuel I; a certeza do amor de Bernardim Ribeiro; o anel que Bernardim Ribeiro lhe restituiu. • Bernardim Ribeiro considera D. Beatriz como uma Mulher-Anjo: “Do Céu, Anjo do Céu que te manda a este baixo mundo”. • Bernardim Ribeiro, em desvario, despede-se de D. Beatriz: “A flor dos meus anos murchou na tristeza e no desconsolo”, arremessando-se ao mar: “Que tomem também a minha vida”. • No momento da despedida D. Manuel I mostra, com veemência, os sentimentos para com a filha:”O último adeus, minha filha, um abraço ainda!”, “ Meu Deus, se eu matei a minha filha”.