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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE LETRAS ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS REPRESENTAÇÕES NA CULTURA EMPRESARIAL: UM ESTUDO DE CASO Maria Gorete Costa Marques DOUTORAMENTO EM LINGUÍSTICA Linguística Aplicada 2011

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  • UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE LETRAS

    REA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

    REPRESENTAES NA CULTURA EMPRESARIAL: UM ESTUDO DE CASO

    Maria Gorete Costa Marques

    DOUTORAMENTO EM LINGUSTICA

    Lingustica Aplicada

    2011

  • UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE LETRAS

    REA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

    REPRESENTAES NA CULTURA EMPRESARIAL: UM ESTUDO DE CASO

    Maria Gorete Costa Marques

    DOUTORAMENTO EM LINGUSTICA

    Lingustica Aplicada

    Tese de Doutoramento no ramo do conhecimento de Lingustica, rea de Especialidade de Lingustica Aplicada, realizada sob a orientao do Professor Doutor Carlos A. M. Gouveia, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, e co-orientao do Professor Doutor Lus Filipe Barbeiro, da Escola Superior de Educao e Cincias Sociais do Instituto Politcnico de Leiria.

    2011

  • mes parents

  • I

    AGRADECIMENTOS

    Lhomme ne peut dcouvrir de nouveaux ocans tant quil na pas le courage de perdre de vue la cte.

    Andr Gide

    A TODOS os que me incentivaram a perder a terra de vista e a navegar em mares desconhecidos, deixo o meu agradecimento:

    Ao Professor Doutor Carlos Gouveia, que aceitou orientar o meu trabalho de investigao, e me acompanhou de forma sria e comprometida.

    Ao Professor Doutor Lus Filipe Barbeiro, co-orientador da presente tese, pelo apoio ao longo da sua redaco.

    Ao Grupo Electrofer, por ter aberto as suas portas, e, em especial ao Departamento de Recursos Humanos, na pessoa da Dra. Cristina Neves, e a Gertrudes Domingues.

    Fundao para a Cincia e a Tecnologia, pela atribuio da bolsa parcial SFRH/BD/47459/2008.

    Professora Doutora Carminda Silvestre, pelos seus ensinamentos e palavras de incentivo.

    Aos meus pais e ao meu irmo, que sempre acreditaram que eu era capaz e a quem devo o melhor de mim.

  • II

    A todos os amigos e colegas que me acompanharam nesta aventura e que do cor minha vida, em especial: aos sempre disponveis, Antnio, Goreti, Ins e Lusa, s minhas companheiras de gabinete, Ana e Marisa, e aos incansveis, Ana, Filomena, Miguel, Pedro, Rosa e Sofia.

    Ao Joel, por ter feito parte da minha vida.

    Aos que vivem no meu corao e velam por mim.

    A todos, obrigada!

  • III

    RESUMO

    A realidade contempornea coloca, simultaneamente, no terreno empresarial, a competitividade, o valor humano e a responsabilidade social, aos quais acresce um novo paradigma comunicacional. As empresas tm, por um lado, de responder a exigncias econmicas, com um foco muito direccionado para a satisfao do cliente, e, por outro, de investir na sua projeco social e nas pessoas que as compem, conscientes do valor da participao destas no seu sucesso. Nesta perspectiva, o modo como as empresas se representam, quer internamente, quer externamente, fundamental, em termos do seu sucesso ou do seu insucesso. As suas representaes realizam-se por meio de discursos

    semiticos que veiculam valores, atitudes e relaes e que, ao criar identidades, formas de pensar e de agir, tm implicaes na cultura empresarial.

    Com base nesta concepo, analisam-se, nesta tese, prticas discursivas verbais e visuais, com implicaes na construo de representaes na cultura de um grupo empresarial portugus. Estuda-se, em concreto, um conjunto de corpora multimodais, que representa a voz institucional do grupo e a dos seus colaboradores de topo.

    Para tal, seguem-se os princpios da Lingustica Sistmico-Funcional e da Semitica Social, aplicados ao Discurso Empresarial, com nfase no sistema da transitividade (Halliday, 1994, 2004), das estruturas de representao da Gramtica Visual (Kress & van Leeuwen, 1996, 2006) e no inventrio scio-semntico da representao dos actores sociais (van Leeuwen, 1996, 2008).

    Da anlise realizada em trs dimenses da realidade (o grupo na cultura, a cultura do grupo e a cultura no grupo), observam-se diferentes representaes, resultado das dinmicas complexas entre a sociedade, a cultura e o discurso semitico. Conclui-se que o estudo semitico-discursivo das representaes permite configurar uma cultura empresarial, mediada por dinmicas de natureza diversa, que (re)constri permanentemente as prticas.

    Palavras-chave: discurso, actores sociais, representao, semitica, cultura empresarial.

  • IV

    ABSTRACT

    Contemporary reality simultaneously brings competitiveness, human value and social responsibility to the corporate field, together with a new communicational paradigm. Companies have to keep up with economic demands oriented towards the improvement of customer care, on the one hand, and to invest both in their social projection and in the dynamics of their human resources, on the other. Given this, the way companies represent themselves, both internally and externally, is crucial to their success or unsuccess. Their representations, which are realized by means of semiotic discourses which convey values, attitudes and relations and, by creating identities, ways of thinking and acting, have

    implications in the corporate culture.

    Based on this conception, this thesis analyses verbal and visual discursive practices,

    which construct representations of the culture of a Portuguese business group. More specifically, the research focuses on selected multimodal corpora, which represent the institutional voice of the group and that of its top collaborators.

    To pursue this objective, research is grounded on the principles of Systemic-Functional Linguistics and Social Semiotics, both applied to Entrepreneurial Discourse, with an emphasis on the system of transitivity (Halliday 1994, 2004), the structures of representation explored in Kress & van Leeuwens Visual Grammar (1996, 2006), and the representation of social actors (van Leeuwen 1996, 2008).

    The analysis of the given data in three dimensions (the group in the culture, the culture of the group, and the culture in the group) reveals different representations, which are the result of the complex dynamics between society, culture and semiotic discourse. The semiotic and discursive study of representations allows for the configuration of a corporate culture, mediated by different dynamics, which permanently (re)constructs practices.

    Keywords: discourse, social actors, representation, semiotics, corporate culture.

  • V

    NDICE

    AGRADECIMENTOS I RESUMO IIII ABSTRACT IV NDICE DE FIGURAS VII NDICE DE QUADROS E DIAGRAMAS VIII

    INTRODUO 13

    PARTE UM - ENQUADRAMENTO

    1. DA CULTURA E DAS ORGANIZAES 21 1.1. AS ORGANIZAES COMO OBJECTO DE ESTUDO: BREVE PERSPECTIVA HISTRICA 22

    1.1.1. DA CULTURA CULTURA ORGANIZACIONAL 29 1.2. O DISCURSO EMPRESARIAL 36 1.3. AS PRTICAS SOCIAIS COMO ELEMENTO DA REPRESENTAO 38 1.4. SNTESE 41

    2. METODOLOGIA DE INVESTIGAO 43 2.1. QUESTES METODOLGICAS GERAIS 43 2.2. DESCRIO DO GRUPO EMPRESARIAL 46 2.3. RECOLHA E CARACTERIZAO DOS CORPORA 47

    2.3.1. PROCEDIMENTOS DE RECOLHA 47 2.3.2. CARACTERIZAO DOS CORPORA 49

    2.3.2.1. Stio Internet 49 2.3.2.2. Brochuras 51 2.3.2.3. Blogue 53 2.3.2.4. Manual de Acolhimento 56 2.3.2.5. Entrevista 58

    2.4.SNTESE 61 APNDICE 63

    3. ENQUADRAMENTO TERICO: A GRAMTICA SISTMICO-FUNCIONAL 65 3.1. O SISTEMA DA TRANSITIVIDADE COMO CATEGORIA ANALTICA 79

    3.1.1. PROCESSOS E PARTICIPANTES 79 3.1.2. CIRCUNSTNCIAS 87

    3.2. SNTESE 90

    4. ENQUADRAMENTO TERICO: A SEMITICA SOCIAL 93 4.1. A GRAMTICA DO DESIGN VISUAL 95

    4.1.1. ESTRUTURAS DE REPRESENTAO 101 4.2. A REPRESENTAO DAS PRTICAS SOCIAIS 111

    4.2.1. A REPRESENTAO DE ACTORES SOCIAIS 112 4.3. SNTESE 118

  • VI

    PARTE DOIS - ANLISE

    5. O GRUPO NA CULTURA 121 5.1. STIO INTERNET 122 5.2. BROCHURAS 137 5.3. BLOGUE 153 5.4. SNTESE 162

    6. A CULTURA DO GRUPO 167 6.1. BOAS VINDAS 168 6.2. O GRUPO 174 6.3. TRABALHAR NO GRUPO 195 6.4. ASPECTOS LEGAIS 205 6.5. SNTESE 209

    7. A CULTURA NO GRUPO 213 7.1. REPRESENTAO PELOS NOMES 214

    7.1.1. ORGANIZAO 219 7.1.2. ELEMENTOS HUMANOS 222 7.1.3. SECTOR DE ACTIVIDADE 229 7.1.4. TRABALHO 236 7.1.5. QUALIDADE 239 7.1.6. VALORES 241

    7.2. SNTESE 249

    PARTE TRS - SISTEMATIZAO

    8. CONSIDERAES GERAIS E FINAIS 253 8.1. AS DIMENSES DE ANLISE 253 8.2. RELAES DE SIGNIFICADO 260 8.3. ASPECTOS METODOLGICOS 265 8.4. SNTESE 269

    CONCLUSO 271 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 275 ANEXOS (EM SUPORTE DIGITAL CD-ROM)

  • VII

    NDICE DE FIGURAS

    Figura 1: Representao do movimento pendular das teorias 29

    Figura 2: Sociedade, cultura e linguagem - Relao de interdependncia 39 Figura 3: Pginas do stio Internet 51 Figura 4: Processo transaccional unidireccional 102 Figura 5: Representao do vector e da Meta 102 Figura 6: Processo reaccional transaccional 103 Figura 7: Contedo mental 103 Figura 8: Processo classificacional - Taxonomia fechada 106 Figura 9: Processo analtico no-estruturado 107 Figura 10: Processo analtico estruturado temporal 107 Figura 11: Processo analtico estruturado exaustivo 108 Figura 12: Processo analtico estruturado inclusivo 108 Figura 13: Processo analtico topogrfico 109 Figura 14: Processo simblico atributivo 110 Figura 15: Pgina principal do stio 123 Figura 16: Primeira pgina da empresa 124 Figura 17: Segunda pgina da empresa 129 Figura 18: Terceira pgina da empresa 133 Figura 19: Representao do processo transaccional unidireccional 144 Figura 20: Representao a partir de uma sequncia visual 144 Figura 21: Representaes narrativas 146 Figura 22: Processo transaccional unidireccional 151 Figura 23: Aco focada na Meta 151 Figura 24: Processos narrativos e conceptuais 153 Figura 25: Representaes narrativas e conceptuais 159 Figura 26: Representao dos valores do grupo 242

  • VIII

    NDICE DE QUADROS E DIAGRAMAS

    Quadro 1: Descrio do corpus das entrevistas 60 Quadro 2: Caracterizao dos entrevistados do sexo masculino 63 Quadro 3: Caracterizao dos entrevistados do sexo feminino 63 Quadro 4: Ocorrncias de nomes 216 Quadro 5 : Principais ocorrncias de nomes 218 Quadro 6: Ocorrncias-Empresa, empresas, grupo e grupos - Com e sem designao 220 Quadro 7: Significados das ocorrncias do nome pessoa 223 Quadro 8: Outras ocorrncias 226

    Diagrama 1: Processos de converso 104 Diagrama 2: Processo classificacional Taxonomia multinivelada 105 Diagrama 3: A representao dos actores sociais no discurso: rede de sistema 114

  • () it is our responsibility as researchers to choose our value commitments, as it is to choose

    our theoretical frameworks and methodologies, and let those values inform the design, conduct, and dissemination of our studies and of the research programs they instantiate.

    Drnyei, Z. (2007: 314)

  • 13

    INTRODUO

    A presente tese de doutoramento, subordinada ao ttulo Representaes na Cultura Empresarial: um Estudo de Caso tem como objectivo geral estudar um conjunto de prticas discursivas multimodais, com implicaes na construo de representaes na cultura de um grupo empresarial portugus, o Grupo Electrofer, com sede na zona da Marinha Grande. Para a prossecuo deste objectivo, parte-se de uma perspectiva de anlise semitico-discursiva, nomeadamente no que se refere a aspectos do discurso verbal e visual.

    Atravs da sua linguagem como prtica social, o grupo produz e reproduz representaes de si prprio, dos seus valores e de relaes internas e externas, que, por sua vez, constituem a sua prpria cultura. Parte-se, pois, de uma concepo da linguagem que no se coaduna com o seu entendimento tradicional, em que esta vista como um conceito autnomo, um mero sistema de frases constitutivas de uma entidade abstracta, existente acima dos falantes, ou seja, externo sociedade. Assim, pretende-se, nesta tese, que integra um estudo de caso, cumprir os seguintes objectivos particulares:

    (i) demonstrar que o discurso semitico, enquanto prtica social no contexto empresarial, veicula valores, atitudes e relaes simblicas, bem como imagens institucionais;

    (ii) analisar como se processam discursivamente os valores, as relaes e a imagem institucional do grupo empresarial em estudo, nos diferentes meios, e pela voz institucional do grupo e de colaboradores;

  • 14

    (iii) determinar como as representaes na cultura deste grupo empresarial so construdas, nos diversos meios e pelos diferentes intervenientes atrs referidos, assim afirmando a especificidade do grupo no contexto das representaes das culturas organizacionais.

    O cumprimento dos objectivos acima definidos realiza-se a partir de uma anlise de cariz interdisciplinar, onde se seguem os princpios da Lingustica Sistmico-Funcional (Halliday 1994, 2004) e da Semitica Social (Hodge & Kress, 1988; Kress & van Leeuwen, 1996, 2006; van Leeuwen, 2005; van Leeuwen, 1996, 2008), aplicados ao Discurso Empresarial, no seguimento de trabalhos como Bargiela-Chiappini & Harris (1997), Silvestre (2003), Bargiela-Chiappini, Nickerson & Planken (2007) e Bargiela-Chiappini (2009).

    A investigao, que inclui dados analticos verbais e visuais, procura responder s seguintes questes:

    (i) Como que os usos lingusticos constroem a realidade da identidade do grupo?

    (ii) O que revelam as escolhas semiticas, nos dados em anlise, sobre o grupo?

    (iii) De que forma os sistemas verbal e visual constroem diferentes dimenses do significado na sua ressemiotizao conjunta?

    Do percurso desenvolvido ao longo da investigao, resulta a organizao estrutural da tese em funo de trs eixos gerais fundamentais: uma primeira parte de enquadramento terico-metodolgico; uma segunda parte de explanao analtica e uma terceira parte de discusso e problematizao dos resultados. Dessa organizao em trs partes Parte I: Enquadramento; Parte II: Anlise; Parte III: Sistematizao resulta um total de oito captulos, apresentados de forma

  • 15

    relativamente independente desta introduo e da concluso da tese. Assim, e por forma a tornar claro o modo como se progride ao longo da tese, registe-se que, no primeiro captulo da primeira parte, intitulado Da Cultura e das Organizaes, se traa um percurso contextualizador dos pressupostos que subjazem investigao, no que diz respeito cultura empresarial. Com a evoluo das teorias das organizaes (subcaptulo 1.1.) e o desenvolvimento do estudo da cultura organizacional, a linguagem surge aqui como um elemento fundamental no estudo da cultura (subcaptulo 1.2.). O interesse pelo seu papel em contextos organizacionais e profissionais promove o desenvolvimento do Discurso Empresarial (subcaptulo 1.3.). Neste enquadramento, e seguindo a definio de cultura dos Estudos Culturais, estabelece-se o pressuposto sobre o qual assenta esta tese: a inter-relao entre cultura e empresa realizada pelo discurso, que constitui a cultura empresarial.

    Na continuao desta primeira parte, no captulo 2, tecem-se, num primeiro momento, reflexes terico-metodolgicas que interligam a lingustica aplicada a contextos reais pesquisa qualitativa e metodologia do estudo de caso. Num segundo momento (subcaptulo 2.2.), descreve-se o grupo empresarial em que se baseia a anlise, seguindo-se, na terceira parte (subcaptulo 2.3.), a explanao dos procedimentos de recolha dos corpora, primeiro, e a sua caracterizao, de seguida.

    No captulo 3, o primeiro do enquadramento terico-metodlogico, procede-se descrio dos princpios da Gramtica Sistmico-Funcional, com especial nfase para o carcter scio-semitico da lngua e, especificamente, para o seu uso como representao da realidade (metafuno ideacional). De seguida, explana-se o sistema da transitividade, um instrumento que analisa a representao da realidade, atravs dos significados experienciais expressos na orao.

    Como captulo final da primeira parte, no captulo 4, descrevem-se os fundamentos da Semitica Social, incluindo as pontes que a ligam ao enquadramento terico anterior, de acordo com os quais se podem estudar todos os sistemas semiticos humanos, por serem intrinsecamente sociais nas suas condies

  • 16

    e contedo. Esta descrio serve para introduzir a teoria da Gramtica Visual de Gunther Kress e de Theo van Leeuwen, que abarca as estruturas de representao visual do significado representacional (subcaptulo 4.1.), e a concepo de Theo van Leeuwen relativa s representaes das prticas sociais, concretamente o inventrio para a anlise da representao dos actores sociais (subcaptulo 4.2.).

    Os diferentes instrumentos analticos descritos na primeira parte so aplicados, na segunda parte da tese, a distintos corpora: stio Internet, brochuras, blogue e manual de acolhimento dos colaboradores. Com este pluralismo no s terico e metodolgico, mas tambm de dados, visa-se uma anlise discursivo-semitica completa da representao do grupo, pela sua voz consciente, enquanto entidade prestadora de servios ou entidade empregadora, com preocupaes financeiras e no financeiras. A anlise enriquecida com a incluso da anlise da voz de alguns colaboradores em resposta a uma entrevista, assim se complementando o estudo do modo como o grupo se representa com o estudo do modo como este percepcionado no seio da prpria cultura do grupo.

    Em razo destas consideraes, no captulo 5, o primeiro de anlise, realiza-se, na primeira parte, a anlise multimodal do stio Internet do grupo empresarial (subcaptulo 5.1.), na segunda, a das brochuras (subcaptulo 5.2.) e, na terceira, a do blogue (subcaptulo 5.3.). Para tal, recorre-se ao sistema da transitividade e s estruturas de representao visual, a partir dos quais se analisam as principais categorias semnticas das oraes e principais participantes e processos das estruturas de representao visual, respectivamente.

    No captulo 6, concretiza-se a anlise do manual de acolhimento dos colaboradores do grupo, com base no inventrio scio-semntico de van Leeuwen. Procura-se verificar que categorias da representao dos actores sociais so realizadas neste corpus, ou seja, examinar se o grupo e os colaboradores so ou no includos no discurso e, a s-lo, que papis sociais lhes so atribudos.

    No captulo 7, busca-se compreender de que forma o grupo percepcionado pelos colaboradores, isto , analisar como eles se posicionam perante o grupo e os

  • 17

    seus valores, com base nas respostas entrevista, entretanto descrita no captulo 2. A anlise efectuada, anlise de frequncias simples, meramente de enfoque lexical, restringindo-se, em particular, aos nomes que convergem para a representao do grupo.

    No captulo 8, o nico da terceira parte, procede-se a uma reflexo auto-avaliativa do percurso desenvolvido, mapeando a investigao realizada no quadro do tema das representaes na cultura empresarial, discutindo-se as implicaes do carcter dinmico dessa cultura e apontando-se caminhos de investigao possveis. Na primeira parte, recuperam-se e sistematizam-se os resultados obtidos nas anlises das dimenses, com vista a uma reflexo geral sobre todos os dados em estudo, a partir de uma viso conjunta e unificada dos mesmos. Trata-se, na prtica, de validar as anlises parciais em funo de uma lgica de reflexo e de contextualizao dos dados, especificando-se, na segunda parte (subcaptulo 8.2.), o estabelecimento de diferentes tipos de relaes de significado. Finaliza-se o captulo com algumas reflexes de mbito terico-metodolgico, onde se enuncia o carcter inovador da investigao.

    Por fim, resumem-se os momentos estruturais da tese e os principais resultados das anlises enquadrados nas diferentes dimenses da realidade do grupo empresarial.

  • PARTE UM - ENQUADRAMENTO

  • 21

    1. DA CULTURA E DAS ORGANIZAES

    No presente captulo, apresenta-se uma perspectiva sumria das principais teorias organizacionais, com o objectivo de dar conta da evoluo do entendimento de organizao. O traar dessa evoluo possibilita, por um lado, a compreenso geral das mudanas ocorridas no universo organizacional, desde o incio do sculo XX, e, por outro, o mapeamento da emergncia da cultura organizacional na histria das organizaes.

    Na segunda parte, recuperam-se alguns dos contributos tericos mais relevantes dos estudos da cultura no seu quadro antropolgico e sociolgico, considerados marcantes para o conceito de cultura organizacional. Procura-se, nessa sequncia, descrever o entendimento de cultura organizacional, num pendor mais normativo e interpretativo, no sem antes reflectir sobre a cultura nas teorizaes que antecedem os anos oitenta do sculo passado, poca em que a cultura organizacional se afirma com estatuto de objecto de investigao autnomo.

    A evoluo do entendimento de organizao e da cultura abre espao para o estudo da linguagem em contexto, que se autonomiza no campo do Discurso Empresarial, objecto de descrio na segunda parte do captulo. Por ltimo, esboam-se as linhas de pensamento que subjazem anlise de representao do grupo empresarial, enquadradas no Discurso Empresarial. So inter-relacionados os conceitos de cultura, empresa e discurso, para mostrar que as prticas sociais so um elemento de representao da cultura empresarial.

  • 22

    1.1. AS ORGANIZAES COMO OBJECTO DE ESTUDO: BREVE PERSPECTIVA HISTRICA

    Com a Revoluo Industrial, as organizaes tomam novas configuraes, sendo objecto de estudo na perspectiva de vrias disciplinas, da resultando diferentes teorias. Para uma melhor compreenso da sua evoluo, segue-se uma breve resenha histrica das principais teorias e estudos, seguindo a proposta de diviso de Pina e Cunha, Rego & Cardoso (2007) em teorias dos sistemas fechados, teorias sistmicas (sistemas abertos), teorias interaccionistas e estudos organizacionais positivos.

    As teorias dos sistemas fechados centram-se na organizao do trabalho e no funcionamento da empresa. Neste mbito, desenvolvem-se as abordagens clssicas que se centram na organizao cientfica do trabalho, em teorias do comportamento administrativo/de gesto e em teorias humanistas que se centram na Escola das Relaes Humanas.

    No incio do sculo XX, ganha importncia a abordagem taylorista e a metfora da organizao como mquina, dos tempos em que a organizao era vista como um sistema fechado com primazia sobre a eficincia dos processos de transformao, a partir de uma racionalidade tcnica e universal, sujeita ao grupo tcnico-dirigente (Lopes & Reto, 1988: 26). O foco da ateno recai sobre a vertente interna da empresa, mais concretamente, sobre a preocupao pelo aumento de produtividade e pela produo em massa.

    Na sequncia da teoria de Frederick Taylor, Principles of Scientific Management (1911), centrada na diviso das funes dos trabalhadores,1 buscam-se formas de aumentar a eficincia atravs do estudo e da melhoria do sistema de produo, da definio de um sistema explcito de regras e responsabilidades, e de melhoria da qualidade da administrao (Morgan, 1980; Pina e Cunha et al., 2007). Neste campo, surgem os trabalhos de Henri Fayol e de Max Weber, apontados como

    1 O uso dos termos trabalhador(es) ou colaborador(es) segue a lgica dos paradigmas organizacionais

    dominantes e o seu valor jurdico, sendo objecto de reflexo na anlise da representao dos colaboradores (captulos 6 e 7).

  • 23

    referncia no estudo do comportamento organizacional com base na racionalidade tcnico-burocrtica (Lopes & Reto, 1988: 28).

    No obstante o facto de ambos se dedicarem ao organizar da organizao, defendem diferentes concepes organizacionais. Fayol preconiza uma concepo assente na organizao e na realizao do trabalho, concretizada em teorias do comportamento administrativo (ou de gesto). Este autor prope tambm princpios da funo administrativa a partir da qual pretende aumentar a racionalidade organizacional (Watson, 2006: 172).

    Para Pina e Cunha et al. (2007: 133), Weber desenvolve uma concepo sociolgica fundada no processo de organizao do trabalho e no processo de tomada de decises de acordo com as regras discursivas analisveis e no num processo resultante de carisma ou de tradio. Este autor entende a burocracia como uma forma racional de organizao, assente na racionalidade e na autoridade, entre outras caractersticas. Associa, assim, burocracia a regras e no a autoridades tradicionais ou carismticas, cujo impacte perdura at actualidade.2

    As teorias dentro da abordagem clssica supramencionadas inscrevem-se numa dimenso apenas racional e economicista, o que as torna redutoras (Hatch, 2005). Sucedem-se novas teorias que, embora se mantenham ligadas abordagem clssica e s configuraes universais da organizao, preconizam uma abertura envolvente. Uma nova concepo da administrao do trabalho e das organizaes surge com a Escola das Relaes Humanas, desenvolvida a partir dos anos 30 e promovida por Elton Mayo, que rompe com a abordagem anterior pelo apelo a motivaes psicolgicas e sociais e ao predomnio social do comportamento e das relaes interpessoais. Os estudos de Hawthorne, desenvolvidos entre 1927 e 1932, numa fbrica de Chicago, constituram um momento fulcral para a criao da Psicologia Organizacional (Schwartzman, 1993). Cria-se a ideia da organizao como sistema social onde o trabalhador percepcionado como um cidado e no

    2 A expanso semntica valorativa que se atribui hoje ao termo burocracia no invalida a importncia

    da sua teoria burocrtica nas organizaes.

  • 24

    como uma mquina, estando a produtividade aliada sua satisfao. A componente humanista serve de cenrio para o desenvolvimento de questes relacionadas com a qualidade de vida na organizao e com um maior respeito pelo ser humano. Acrescente-se que, a partir dessa componente, nos anos cinquenta e sessenta, se projecta o Desenvolvimento Organizacional, fortemente influenciado pela Psicologia Organizacional.

    A perspectiva do Desenvolvimento Organizacional, no ignorando que a cincia organizacional se preocupa, essencialmente, com os aspectos estruturais e

    estveis das organizaes, assume que as mesmas so realidades dinmicas. Os elementos duradouros e estveis da realidade organizacional so considerados importantes. Contudo, as organizaes no so estticas, esto em movimento e, nesse processo de mudana, partes da organizao adquirem uma vida prpria. Isso acontece como resposta, quer s solicitaes, quer s influncias dos diferentes actores com quem a organizao se relaciona (Pina e Cunha, Ferreira & Martinez, 2008: 18). Face a esta realidade, o acento tnico desta corrente assenta na gesto da mudana e dos resultados humanos, sendo atribudo um papel fulcral aos agentes externos, na forma de consultores. Nos anos setenta, a imagem do consultor passa a ter um carcter mais prescritivo, centrando-se os estudos em variveis como a eficincia. A partir dos anos oitenta, a vaga do Desenvolvimento Organizacional perde o seu fulgor. No entanto, importa realar que a mesma assume um carcter multidisciplinar mais complexo, resultado de novas contribuies provenientes da Antropologia e da Sociologia (Schwartzman, 1993).

    Refira-se que as teorias ora descritas, na perspectiva da organizao como um sistema fechado, se centram em aspectos especficos da organizao, mormente a produo, a administrao e a ligao da organizao ao humano. Neste conjunto, a envolvente no tem o lugar central que passar a ter nas teorias sistmicas (ou dos sistemas abertos).

    As teorias sistmicas, desenvolvidas aps a Segunda Guerra Mundial, consideram que as organizaes so sistemas complexos que, por sua vez, se

  • 25

    integram em supra-sistemas. A organizao passa a ser vista como um sistema

    complexo, aberto influncia da envolvente, onde a socializao organizacional tem um papel de transmisso de valores, crenas e comportamentos. Esta concepo distancia-se dos modelos anteriores e reala as trocas constantes entre o interior da organizao e o meio exterior, tornando-se estes factores fulcrais no estudo do funcionamento interno das organizaes. O grau da relao da organizao com o meio varia de acordo com as diferentes teorias preconizadas, nomeadamente a teoria dos sistemas, as teorias contingenciais e as teorias ambientais sociolgicas.

    A teoria dos sistemas foca-se na organizao como um sistema social construdo com base nas interdependncias e interaces sistemticas com subsistemas internos (como a organizao do trabalho) e com o exterior. Esta relao supe uma troca de informao, energia e matria. Nesta perspectiva, refira-se o contributo de Katz & Kahn (1970) cujo modelo terico estrutura a organizao com caractersticas de um sistema social planeado, que considera de modo interdependente as estruturas, as relaes e a envolvente. A teoria contingencial, que se desenvolve a partir dos finais dos anos cinquenta, refora a ideia da influncia do meio, bem como de variveis culturais, sociais e tecnolgicas, ou seja, defende a permeabilidade da estrutura da organizao face a variveis internas e externas. Refiram-se, neste mbito, os trabalhos de Joan Woodward (de 1958 e 1965, que refere em 1982). A autora estuda a forma como a tecnologia uma varivel externa influencia a estrutura organizacional e, em consequncia, a eficcia da organizao. Ferreira, Neves & Caetano (2001: 101) explicam que as caractersticas estveis ou instveis, de certeza ou incerteza, simples ou complexas, turbulentas ou no turbulentas do ambiente externo so tambm estudadas e analisadas em distintas dimenses, apontando, nestes domnios, os estudos de Tom Burns & G. M. Stalker (1961) e os de Paul Lawrence & Jay Lorsh (1967, 1969). Em relao aos primeiros, os autores destacam a anlise de diferentes estruturas organizacionais face s condies ambientais, enquanto, para os segundos, destacam, por um lado, a associao do trabalho a especialidades, respeitando a envolvente, e, por outro, a

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    necessidade de entendimentos partilhados. Neste processo de entendimento com a envolvente as palavras-chave so a diferenciao e a integrao. Para os autores, a estrutura, o desenho organizacional, os papis, o processo de deciso e a liderana so instrumentos de adaptao e reaco face s contingncias do meio. Lawrence e Lorsh estabelecem uma relao de simbiose entre o ambiente interno e externo das organizaes, uma vez que, por via das mudanas ocorridas no mbito tecnolgico, cultural, poltico e social, as diferentes especialidades da organizao sentem necessidade de criar entendimentos partilhados.

    No mbito da literatura da teoria organizacional, o contributo de Henry Mintzberg para a abordagem contingencial, merece particular nfase. Desenvolve, em 1979, um modelo de estruturas organizacionais que tenta compreender a forma como as organizaes se estruturam e formulam as suas estratgias de acordo com diferentes circunstncias. Um dos principais contributos do autor resulta do facto de ele ter percebido que muita da literatura produzida sobre os dinamismos complexos que ocorrem nas organizaes sofria de um defeito: as concluses eram muitas vezes formuladas para organizaes inteiras, quando claramente s se aplicavam a uma parte das mesmas (Mintzberg, 2004: 31). Com o seu modelo, Mintzberg procura ultrapassar as limitaes de modelos explicativos anteriores, que apontavam para a possibilidade de existir uma forma nica de estruturar e gerir uma organizao.

    A importncia da envolvente ganha maior relevncia, o que leva ao surgimento de novas teorias. Pina e Cunha et al. (2007: 277-294) mencionam os estudos de Hannan & Freeman (1977), para a teoria da ecologia organizacional, os de Pfeffer & Salancik (1978), para a teoria da dependncia de recursos, e os de Meyer & Rowan (1977), para o institucionalismo. Estas teorias vm, de forma geral, alertar para os efeitos do meio externo no comportamento organizacional, para as diferenas entre as organizaes e para os nveis de institucionalizao da organizao.

    De acordo com o descrito, o enfoque no estudo das organizaes centrou-se inicialmente em componentes internas, passando, posteriormente, para componentes externas. As teorias interaccionistas dos anos oitenta vm dar um novo equilbrio

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    relao entre a organizao e a envolvente, preconizando um papel activo da organizao. Em geral, estas teorias acompanham as mudanas nos processos de organizao, produo e gesto. Analisam, em particular, a gesto da produo japonesa (como filosofia de gesto de produo), desenvolvem o paradigma da qualidade e centram-se na cultura organizacional. Para esta viragem, contribuem sobremaneira factores sociais, econmicos e polticos, designadamente a incapacidade de os EUA competirem economicamente com outros pases, em particular com o Japo, e o fracasso dos modelos mais racionalistas da gesto das organizaes. Esta conjuntura abre caminho para estudos de anlise da adaptao das organizaes a especificidades nacionais, numa abordagem de mbito cultural. A cultura, a qualidade e a certificao da organizao so includas como factores de diferenciao entre as organizaes mais e menos bem sucedidas. A alterao da dinmica do contexto empresarial, nomeadamente pela expanso e internacionalizao das organizaes, conduz necessidade de compreender a relao entre a cultura e o desempenho organizacional (Ferreira et al., 2001: 449). Sendo a cultura organizacional um conceito fulcral para o enquadramento desta tese, retomam-se, no prximo ponto, alguns contributos tericos fundamentais para a sua compreenso.

    A necessidade de adequar processos de negcios qualidade de bens e servios levou ao surgimento, nos EUA, do conceito de reengenharia, uma corrente, de tendncia racional, cujo objectivo reinventar os processos e as prticas das organizaes, visando a reduo de custos e a obteno rpida de resultados.

    Ainda nos anos noventa, algumas teorias organizacionais dedicam-se aprendizagem organizacional, no descurando a relao entre a organizao e os meios internos e externos. Segundo esta perspectiva, na qual se enquadra o trabalho de P. Senge (1990), a vantagem de uma organizao em relao a outra passa pela aprendizagem organizacional. Neste sentido, no basta que a organizao se adapte s mudanas, mas deve antecip-las, pela criao, aquisio, transferncia e integrao de conhecimento. A organizao no se adapta simplesmente ao meio

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    envolvente, mas constri-o, altera-o, de forma dinmica. Trata-se de uma evoluo baseada no princpio de que a organizao deve centrar-se mais na aco humana do que na prescrio.

    Actualmente, os estudos sobre as organizaes mantm como foco as questes econmicas e humanas. No entanto, de acordo com Pina e Cunha et al. (2007: 395), as tentativas de resposta ao reconhecimento dessas questes dividem-se entre, por um lado, a organizao econmica e o problema de governao organizacional e, por outro, a organizao humana e a busca da felicidade. No que respeita ao primeiro ponto, discutem-se modelos que integram diferentes interesses (teoria das partes interessadas stakeholders e a teoria dos accionistas shareholders) ou o foco no cliente, que remetem para temticas da responsabilidade social, da cidadania e do equilbrio entre o econmico e o humano (Frederick, 2006). A questo da importncia da organizao humana e a busca da felicidade surgiu como consequncia das mudanas do mercado agora globalizado e assente na exigncia competitiva. Neste mbito, surgem os estudos organizacionais positivos, que tm observado as dinmicas positivas das organizaes (Ribeiro, 2010). A condio humana , ento, o ncleo de actuao em conceitos operacionalizados pelas organizaes. Evidenciam-se as organizaes positivas, que buscam o melhor desempenho dos colaboradores com base na preocupao em relao a eles, enquanto pessoas, e promovem a virtuosidade organizacional. Neste sentido, desenvolve-se uma dimenso de procura do bem-estar do colaborador, na sua dimenso pessoal, familiar ou espiritual, uma dimenso mais orientada para os colaboradores, fortemente influenciada pela psicologia positiva. Refere-se busca de sentido interior e de significado para o trabalho (Pina e Cunha, Cunha & Mendona, 2010: 167). Em suma, os estudos organizacionais positivos centram a sua anlise na tentativa de compreender a dinmica dentro das organizaes que produzem resultados excepcionais, quer para as organizaes, quer para os seus membros (Ribeiro, 2010).

    Com esta breve contextualizao, no se ambicionou retratar exaustivamente as teorias e abordagens organizacionais, mas mostrar a evoluo da linha de

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    pensamento organizacional, ora numa relao de continuidade, ora de oposio. Se, como defendem Pina e Cunha et al. (2007: 456), as teorias se movimentam pendularmente, com posies que oscilam entre a vertente humana/social e a vertente racional/tcnica, o pndulo no tem funcionado em torno de um ponto fixo (figura 1), desde as teorias dos sistemas fechados s correntes de positividade das organizaes:

    Figura 1: Representao do movimento pendular das teorias

    Com efeito, da perspectiva da organizao como um sistema fechado ao meio envolvente, onde o cumprimento de regras, a preocupao pela eficincia da produo interna e a viso do homem como complemento da mquina imperam, promoo da virtuosidade organizacional e da responsabilidade social, vrios quadros tericos conceptuais foram sendo concebidos. Relembra-se, neste percurso, a progressiva consciencializao da interaco entre a organizao e o meio envolvente. nesse patamar que se autonomizam os estudos da cultura organizacional, conceito discutido no prximo ponto.

    1.1.1. Da Cultura Cultura Organizacional

    evoluo do conceito de cultura organizacional no so alheias as diferentes vises e formulaes do conceito de cultura. A opo pela discusso

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    destes conceitos, to complexos quanto abrangentes, justifica-se por no se conceber o estudo da cultura organizacional isolado, na sua origem, dos estudos sobre a cultura propriamente dita.

    O foco especfico na cultura no recente, pelo que diferentes definies se foram estabelecendo, de acordo com a nfase na sua dimenso subjectiva, ou em aspectos relacionados com valores, modelos de comportamento, critrios normativos interiorizados, ou na dimenso objectiva que as formas culturais assumem como memria colectiva ou tradio codificada e acumulada no tempo (Ferin, 2002: 33).

    O conceito , na realidade, deveras difcil de delimitar, pela sua evoluo e pelo seu uso em diferentes disciplinas e correntes de pensamento. Refira-se, neste enquadramento, o contributo terico da Antropologia e da Sociologia, bem como a concepo da cultura que visa entender os mecanismos de compreenso simblica, numa perspectiva antropolgica-descritiva (Ferin, 2002: 37). Esta ltima perspectiva fulcral pela procura de uma definio cientfica da cultura, tendo sido uma alavanca para a sua compreenso. neste mbito que se inserem os trabalhos de autores como Edward B. Tylor e Bronislaw Malinowsky, que, embora sigam diferentes nfases, contribuem para a assuno da Antropologia Cultural.

    A relao entre a cultura e a sociedade um aspecto transversal a diversas abordagens. Crespi (1997: 42) refere essa relao apresentando, por um lado, a concepo sociolgica de mile Durkheim, do domnio do social sobre o indivduo, e, por outro, o entendimento de Max Weber, de acordo com o qual o indivduo contribui para a mudana da sociedade. A um nvel simblico, saliente-se a abordagem de Geertz, nos anos setenta, de acordo com a qual os fenmenos culturais so interpretados como fenmenos simblicos. Geertz preconiza uma abordagem semitica da cultura, pela etnografia, e orienta a sua anlise para o estudo do significado, como descreve no incio da sua obra The Interpretation of Cultures (1993: 5):

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    Believing, with Max Weber, that man is an animal suspended in webs of significance he himself has spun, I take culture to be those webs, and the analysis of it to be therefore not an experimental science in search of law but an interpretative one in search of meaning.

    No obstante a importncia do contributo deste autor, -lhe apontado o facto de no debruar a sua interpretao dos fenmenos culturais sobre questes de poder e de conflito e, de forma mais abrangente, sobre os contextos sociais em que tais fenmenos so produzidos (Thompson, 1998). Em termos descritivos, Thompson (1998: 173) define a cultura como:

    () o estudo do conjunto de crenas, costumes, ideias e valores, bem como dos artefactos, objectos e instrumentos materiais, que so adquiridos pelos indivduos enquanto membros de um grupo ou sociedade. (itlico no original)

    J com os Estudos Culturais se difunde a ideia da necessidade da reformulao do conceito de cultura. No seu ensaio de 1958, Culture & Society, Raymond Williams (1990: 295) adianta:

    The history of the idea of culture is a record of our meanings and our definitions, but these, in turn, are only to be understood within the context of our actions.

    O autor recupera a evoluo do conceito, do seu entendimento como cultivo, sistemas de significao, modos de vida, erudio ou prticas artsticas, para ampliar o conceito e assumir que a cultura no um domnio estanque, mas que envolve todas as dimenses inter-relacionadas, toda a experincia ordinria. Esta inter-relao recuperada adiante, neste mesmo captulo, inserida no mbito das prticas sociais como elemento de representao.

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    A compreenso da cultura no corresponde, pois, a uma total inovao nos anos oitenta, quando se autonomiza o estudo da cultura organizacional, dado que j anteriormente existiam trabalhos que contemplavam a interpretao de comportamentos organizacionais em termos culturais. Em diferentes teorizaes se dava conta desse elemento, apesar de no lhe ser atribuda relevncia como um factor analtico determinante. Torres (2003) defende que, com o trabalho de Max Weber, nos anos trinta, se lanam algumas bases para a gnese da cultura como varivel. A autora desenvolve a ideia de que tambm em Elton Mayo se observa o desenvolvimento de alguns postulados assentes na humanizao das organizaes, com indicadores scio-culturais, e na viso da cultura como varivel dependente. Lembra o contributo de Elliott Jacques (apud Torres, 2003: 111) que define, j em 1952, a cultura da empresa como um modo de pensar e de concretizao partilhada por todos, sendo que, para ser aceite, cada novo membro dever apreend-la.

    As teorias sistmicas, que analisam a organizao como um subsistema influenciado por outros subsistemas internos e externos, marcam uma viragem no sentido em que a cultura aparece como varivel simultaneamente integradora e flexvel.

    No enquadramento scio-econmico descrito no primeiro ponto deste captulo, a cultura organizacional adquire um estatuto de investigao autnomo nos anos oitenta, embora seja, como refere Hatch (2005: 217), provavelmente o conceito no mbito das organizaes mais difcil de definir. O conceito multidimensional, ao nvel da sua anlise, pela possibilidade de se centrar no indivduo, no grupo, na organizao ou no plano nacional e objecto de diferentes registos de anlise e categorizaes. A panplia de definies relativas a este conceito mostra a importncia da noo de partilha no seu desenvolvimento, bem como a influncia de vrias reas como a Antropologia, a Sociologia, a Psicologia e o Comportamento

    Organizacional.

    Para alm de diferentes definies da cultura organizacional, coexistem metodologias de abordagem e formas de operacionalizao que no recolhem

  • 33

    consenso. Da mesma forma, coexistem diferentes tentativas de categorizao da literatura. Nomeie-se, por exemplo, a categorizao de J. Martin (1992) (integradora, diferenciadora e fragmentada) e a de S. Sackmann (1991) (culturalista ou holstica; funcionalista, simblico-cognitiva e construtivista). Em geral, as abordagens situam-se particularmente na tentativa de explicao do sucesso/insucesso das organizaes e a sua implicao na motivao e desempenho dos trabalhadores. Conforme enfatiza Du Gay (2003: 151), dada primazia cultura no governo da vida organizacional contempornea, sendo aquela vista como forma de estruturar o modo como as pessoas pensam, sentem e agem nas organizaes.

    Nestes termos, num pendor mais normativo e prescritivo, uma organizao que possua uma cultura apropriada considerada mais efectiva ou excelente, o que pode remeter, consequentemente, para questes humanistas e estruturalistas mais radicais. Refira-se a influncia de A. Wilkins & W. Ouchi (1983), W. Ouchi (1986) e R. Kilmann, M. Saxton & R. Serpa (1986) e T. Peters & R. Waterman (1987), de acordo com os quais a cultura uma ferramenta de gesto, uma varivel que se pode gerir para obter melhor eficcia. Estes autores defendem que, se a cultura influencia o comportamento atravs das normas e dos valores, deveria ser possvel gerir as normas e valores da organizao de forma que os comportamentos desejados e o desempenho organizacional fossem mais ou menos garantidos. Paralelamente a esta perspectiva, coexistem anlises de pendor interpretativo-analtico, profundamente influenciadas por Geertz (1973), que encaram a organizao como instncia social, resultante das aces dos actores. Por serem dinmicas e reguladas, as suas prticas operam em permanente construo e reconstruo, pelo que a cultura vista como

    uma construo social. neste sentido que Smircich (1983) argumenta que, para alm de uma anlise econmica, as organizaes so percebidas pelos seus aspectos simblicos, expressivos e ideacionais. As perspectivas supracitadas, normativa e interpretativa, defendem concepes da cultura manifestamente diferentes: por um lado, uma concepo tcnica que privilegia questes de eficcia e, por outro, uma concepo a um nvel

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    epistemolgico que enfatiza a explicao de aspectos da vida organizacional proporcionada pela cultura (Gomes, 1994: 280). Ambas preconizam o objectivo de explicar a expresso da cultura na organizao, manifestando, contudo, interesses distintos: a primeira centra-se na manuteno da cultura, enquanto a segunda se foca na forma como a cultura construda e reconstruda interactivamente atravs de smbolos, rituais e valores. Cabe ainda referir que, num entendimento interpretativo, a organizao se constitui como aco comunicativa dos seus membros, por sua vez criadora da sua cultura.

    Neste enquadramento, as contribuies de E. Schein e de G. Hofstede so referidas pela sua importncia ao nvel do simblico da organizao e da sua cultura externa, respectivamente. Nas suas obras, Schein (1996) e Schein & Purg (2008) explanam que a cultura organizacional um conjunto de valores e prticas utilizados por um grupo na resoluo de questes e transmitidos a outros membros, como sistema que molda o comportamento dos indivduos. Hofstede (1991), por sua vez, desenvolve, o conceito de cultura como programao mental da mente, a um nvel mais abstracto e cognitivo, a noo de programao mental colectiva que distingue os membros de uma categoria de outra. Este autor defende que as manifestaes de cultura (smbolos, heris, rituais e valores) se realizam em diferentes nveis de profundidade, permeados pelas prticas, as quais so a parte visvel das culturas. As organizaes so, desta forma, manifestaes de sistemas culturais mais gerais.3

    O panorama ora apresentado serve essencialmente para realar alguns pontos de referncia, nomeadamente a assuno de que (i) a racionalidade per se e a lgica de gesto da cultura se concentram na rentabilidade econmica; (ii) a organizao tem ou cultura, de acordo com diferentes perspectivas tericas; (iii) a dinmica social se inscreve na organizao, cujo espao partilhado entre o objectivo, o

    3 Na sua obra Cultures and Organizations: Software of the Mind, este autor apresenta um modelo de

    dimenses culturais mensurveis (distncia hierrquica; individualismo/colectivismo; controlo da incerteza; masculinidade/feminilidade). Hofstede reviu e actualizou a sua obra acrescentando a dimenso orientao a longo/curto prazo, na 2. edio (2005), e a dimenso indulgncia/restrio, na 3. edio (Hofstede, Hofstede, J.G. & Minkov, 2010).

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    subjectivo e o simblico, onde actuam actores sociais e (iv) a cultura organizacional uma construo, com base na comunicao, referente a diferentes contextos sociais, culturais e polticos.

    Nesta sequncia, estudar a cultura organizacional passa tambm por estudar a comunicao e, em concreto, a linguagem. Com efeito, de entre os elementos culturais partilhados pela semelhana ou pela diferena, como pressupostos, valores e crenas, insere-se a linguagem. De forma transversal s diferentes abordagens, a linguagem inscreve-se como uma varivel dependente, como um conjunto de signos verbais que reflecte a cultura da organizao. Realce-se, nomeadamente, o interesse pelo domnio da linguagem especfica (acrnimos, siglas ou termos prprios), pela linguagem como agente de socializao organizacional, numa perspectiva tendencialmente prescritiva, e o interesse pela fuso da linguagem com mitos, rituais e artefactos culturais.

    Alis, o crescente interesse do papel da linguagem em contextos organizacionais e profissionais promoveu uma mudana, a partir dos anos oitenta, nas cincias sociais e humanas. De acordo com Alvesson & Krreman (2000: 137), os investigadores de diversas reas como a Antropologia Cultural, a Sociologia, a Psicologia Social e a Teoria da Comunicao procuram o entendimento das sociedades, das instituies sociais, das identidades e mesmo das culturas como uma construo discursiva. Nos estudos organizacionais, vive-se o que estes autores designam de linguistic turn na ps-modernidade, que contempla o estudo discursivo da organizao como forma de entender o seu funcionamento.

    Assim, o estudo da cultura organizacional complementado no s com abordagens de gesto, psicolgicas, antropolgicas ou sociolgicas, mas, ultimamente, tambm com abordagens de natureza discursiva. Perfilam-se, ento, novos campos multidisciplinares, onde cabem diferentes designaes, razes e especificidades, que estudam a linguagem como um processo social em contextos organizacionais e profissionais, designadamente o Discurso Empresarial, perspectiva na qual se inscreve a presente tese.

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    1.2. O DISCURSO EMPRESARIAL

    O estudo da linguagem como processo social nos contextos organizacionais e profissionais permitiu que, sob esta noo, se integrasse uma diversidade de tpicos e abordagens que contriburam para o desenhar de um campo de estudo multidisciplinar.

    De acordo com a especificidade de questes tericas ou focos de anlise, diferentes designaes foram sendo propostas para designar este campo: Professional Discourse (Gunnarson, Linell & Nordberg, 1997), Institutional Discourse (Agar, 1985; Drew & Sorjonen, 1997), Professional Communication (Pan, Scollon & Scollon, 2002), Organizational Communication (Mumby & Clair, 1997) ou Business Discourse (Ehlich & Wagner, 1995; Bargiela-Chiappini & Nickerson, 1999, 2001, 2002; Bargiela-Chiappini, Nickerson & Planken, 2007; Bargiela-Chiappini, 2009). Sobre os alicerces da ltima designao acima enunciada, Bargiela-Chiappini & Nickerson (2002: 277) esclarecem:

    Business discourse as contextual and intertextual, self-reflexive, although not

    necessarily political, is founded on the twin notion of discourse as situated action and of language at work.

    Posteriormente, Bargiela-Chiappini, Nickerson & Planken (2007: 3) referem que a designao Business Discourse considera a forma como as pessoas comunicam oralmente ou por escrito em organizaes comerciais para que o seu

    trabalho seja realizado. Silvestre (2003: 16) introduz o conceito de Discurso Empresarial:

    () o discurso empresarial no se refere apenas ao discurso que ocorre nas empresas, mas tambm ao facto de estas existirem como resultado da sua constituio em funo de prticas discursivas diversas.

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    Com esta definio, avana a noo de que as empresas tambm so constitudas pela linguagem, ideia que se adopta e se retoma no prximo ponto da tese. Reconhecendo-se que a linguagem um instrumento completo para estudar a cultura, o Discurso Empresarial constitui uma abordagem adequada para estudar a cultura.

    Este campo de estudo considerado hoje como uma promissora rea de pesquisa multidisciplinar (Harris & Bargiela-Chiappini, 2003; Bargiela-Chiappini, 2009). A multidisciplinaridade , alis, de acordo com Bargiela-Chiappini (2004; 2009), simultaneamente a maior fora e a maior fraqueza de tal rea, no sentido em que, por um lado, a consolidao do campo multidisciplinar poder ser um passo em direco interdisciplinaridade, e, por outro, a existncia desta ltima depende da comunicao entre as disciplinas para conseguir uma identidade mais coerente. Acredita-se, pois, que a compreenso do universo da empresa depende da construo do conhecimento atravs de diferentes saberes.

    Na base deste campo permanece, na realidade, uma forte influncia da Lingustica Aplicada, que alvitra um campo onde diferentes reas se aliam a partir de disciplinas distintas. Este campo desenvolve-se com estudos onde a linguagem entendida como um processo socialmente situado em contextos profissionais, sem fronteiras estanques no que respeita s reas que estudam a linguagem, o discurso e a comunicao; aprofunda-se, alis, pela convergncia de abordagens metodolgicas e de disciplinas como a Sociologia, a Comunicao Organizacional, a Antropologia, a Etnografia, a Gesto Internacional, a Pragmtica, a Anlise Conversacional e a

    Anlise do Discurso. De referir que, apesar das influncias norte-americanas da Comunicao

    Organizacional e da partilha comum de preocupaes, o desenvolvimento deste campo se caracteriza, em geral, por uma anlise prxima do texto, focada em documentos reais, uma anlise contextual, que procura formas de explicar as relaes entre os seus nveis macro e o micro (Nickerson & Planken, 2009). Adianta-se que a anlise prxima do texto sustentada por Nickerson & Planken no

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    se resume ao que dito ou escrito na empresa. Actualmente, vrios investigadores deste campo debruam-se sobre a multimodalidade, entendida, na acepo de Kress & van Leeuwen (2001: 20), como o uso de vrios modos semiticos na concepo de um produto ou de um evento semitico, conjuntamente com a forma particular como os ditos modos so combinados (conceito que se retoma no captulo 3). Evidenciem-se, a ttulo de exemplo, os trabalhos sobre as pginas internet de Lemke (2002), de Askehave & Nielsen (2005) e de Bargiela-Chiappini (2005).

    Neste panorama, a noo de que a multimodalidade um dos caminhos futuros do estudo do discurso empresarial (Bargiela-Chiappini, 2009; Nickerson & Planken, 2009) consubstancia-se inequivocamente nesta tese, que abarca o estudo de diferentes modos semiticos, seguindo a concepo de texto de Halliday (apresentada no captulo 3). Assim, e relembrando a definio de Silvestre (2003) de Discurso Empresarial, o estudo da empresa passa pelo estudo de prticas sociais, assunto que se desenvolve abaixo.

    1.3. AS PRTICAS SOCIAIS COMO ELEMENTO DA REPRESENTAO

    Se a cultura organizacional, como definida anteriormente, tem como alicerce a concepo antropolgica e social da cultura, como partilha de valores de grupo ou de uma sociedade ou como modo de vida, que mudanas podero ocorrer na compreenso do seu conceito se se propuser seguir uma nova concepo de cultura? A resposta depender, certamente, da noo de cultura adoptada.

    Para o intento desta investigao, segue-se o pensamento Raymond Williams, apresentado anteriormente, que, ao considerar a cultura ligada experincia do quotidiano, expe um novo sentido de cultura, simblico e dinmico: culture is ordinary. Entende-se, ento, a cultura como um elemento dinmico fundamental na reproduo social, sendo a linguagem no apenas um mediador da produo de

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    significado que reflecte relaes de significao, mas um elemento que constri e reconstri prticas sociais. De forma simplificada, pode-se representar graficamente essa relao do seguinte modo:

    Figura 2: Sociedade, cultura e linguagem - Relao de interdependncia

    Fairclough (1989, 2006) defende a bi-dimenso linguagem-sociedade, ao afirmar que estas interagem numa relao interna e dialctica. A linguagem um processo e uma prtica que faz parte da sociedade sendo tambm por ela determinada. O uso da linguagem como prtica social, que contm uma dimenso cultural, o discurso. Fairclough (2006: 9) nota, no entanto, que o discurso no se reduz ao verbal:

    Discourse is associated with a particular way of conceptualizing and

    researching language, as well as other semiotic forms such as visual images

    or body language (facial expressions, gestures and so forth).

    O discurso constri a sociedade, construdo por ela e, com base nele, constroem-se as identidades e as relaes sociais dos participantes discursivos.

    Retomando a discusso sobre o conceito de cultura empresarial, e lembrando as premissas apresentadas, especificamente a definio de cultura de Raymond Williams e os princpios do Discurso Empresarial de Silvestre (2003), a delimitao do estudo da cultura organizacional ganha novos contornos. Elege-se, aqui, a expresso cultura empresarial em substituio da designao cultura organizacional,

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    em coerncia com os pressupostos apresentados e em virtude de se estudar o modo como um grupo empresarial em particular se representa. Esta opo terminolgica

    afigura-se relevante, na medida em que, numa primeira instncia, organizao mais abrangente do que empresa. As diversas definies do termo, das quais se destaca a de Schein (1986), tm em comum a integrao de quatro elementos interdependentes: pessoas, estrutura, objectivos e diviso funcional do trabalho (Santos, 2008: 12). A empresa definida, segundo o Dicionrio da Lngua Portuguesa Contempornea, no ponto 4, como uma organizao particular ou estatal

    que produz bens ou servios, com vista obteno de lucros. Trata-se, pois, de um tipo particular de organizao. uma organizao com uma caracterstica especial que a distingue das demais o facto de a sua principal finalidade ser a maximizao do retorno, no mdio e longo prazos, do capital nela investidos pelos detentores do seu capital. (Santos, 2008: 26). Acrescente-se que o conceito actual de empresa tem sido profundamente influenciado pelo pensamento de Peter Drucker, um dos maiores pensadores da Gesto do sculo XX.4 Para este autor (2002), a empresa abrange, alm de outros aspectos, uma dimenso social, uma dialctica entre o interior da empresa e o exterior e integra preocupaes financeiras e no financeiras.

    A empresa constituda por um grupo de pessoas, estruturas, objectivos e funes com finalidades especficas em torno de prticas sociais que se congregam ao nvel ideacional (crenas, valores), interpessoal (aces, relaes e procedimentos) e textual (atravs de gneros textuais usados na empresa), entre outros aspectos de natureza tangvel e intangvel.

    Essas prticas sociais, que contm sempre uma dimenso cultural, constroem-se semitico-discursivamente, isto , por diferentes modos como o verbal, o visual ou o espacial. Pense-se na forma como uma empresa se representa, nomeadamente ao divulgar verbal e visualmente a sua misso, as suas competncias, os seus servios, nos mais diversos meios tecnolgicos, ou ao adoptar uma filosofia de open

    4 Atribui-se-lhe o ttulo de pai da gesto moderna, por ter introduzido diversos conceitos basilares

    na gesto, de entre os quais se destaca a importncia das pessoas numa organizao.

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    space e, mais especificamente, nas escolhas de disposio ergonmica. Nesta perspectiva, diferentes escolhas da empresa concorrem para diferentes representaes e relaes sociais no seio empresarial que, por sua vez, tm

    implicaes na construo da cultura empresarial. A empresa, como construo semitico-discursiva, veicula sistemas de

    valores, atitudes, relaes simblicas e uma imagem institucional, tanto interna como externamente. A partir da, criam-se identidades, formas de pensar e de agir, em suma, cria-se a cultura empresarial.

    1.4. SNTESE

    Neste captulo, procurou-se, numa primeira instncia, dar conta da abrangncia terica dos estudos das organizaes. A complexidade do universo organizacional fomentou o desenvolvimento de teorias racionalistas, humanistas ou interaccionistas, seguindo uma menor ou maior abertura ao entrecruzar de disciplinas, resultante das mudanas de paradigmas sociais, culturais e econmicos. No obstante a diversidade de teorias, prevalece o objectivo comum da anlise da estrutura e do funcionamento das organizaes: melhorar o seu desempenho, seja financeiro, humano ou social.

    A breve contextualizao das organizaes como objecto de estudo fulcral para a compreenso de que, no obstante a clara evoluo das abordagens e a progressiva abertura a diferentes reas do saber social e comportamental, outras reas e perspectivas podem enriquecer o conhecimento sobre as organizaes.

    Seguindo esse entendimento, explanou-se o conceito de cultura organizacional, descrito dentro dos padres comummente reconhecidos de origem antropolgica e sociolgica, para depois se projectar uma concepo de cultura dinmica sustentada por Raymond Williams. Com essa abordagem da cultura, aliada

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    definio de Discurso Empresarial de Silvestre (2003) e aos princpios da Lingustica Sistmico-Funcional, compreende-se a inter-relao entre cultura e empresa, realizada pelo discurso semitico que, ao veicular formas de pensar e de agir no universo empresarial, cria a cultura empresarial.

    Este raciocnio est subjacente ao longo de toda a presente tese, quer nas escolhas terico-metodolgicas, que se descrevem nos prximos captulos, quer na anlise dos corpora.

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    2. METODOLOGIA DE INVESTIGAO

    Neste captulo, apresenta-se e descreve-se a metodologia seguida na presente investigao em duas partes complementares. Na primeira, organizam-se reflexes

    torico-metodolgicas que abrangem a ligao da lingustica aplicada a estudos em contexto real e pesquisa qualitativa, sendo dada particular relevncia metodologia do estudo de caso e triangulao de dados. Na segunda parte, descreve-se sumariamente o grupo empresarial no qual se baseia a anlise. De seguida, d-se conta da recolha dos corpora e da justificao para a sua escolha. Por fim, caracteriza-se a natureza de cada corpus a analisar, seguindo-se a sua descrio.

    2.1. QUESTES METODOLGICAS GERAIS

    O entendimento da cincia no se pode centrar apenas no rigor cientfico aferido pela medio, pelo quantificvel (Santos, 1990: 17) ou no puro conhecimento terico. Exige-se que a mesma desenvolva esprito crtico e que actue na sociedade, mais concretamente, que tenha impacte. Por este motivo, torna-se imperioso descobrir que papel podero desempenhar as diferentes cincias na resoluo de problemas individuais, interpessoais, sociais, interculturais polticos ou tcnicos (Knapp & Antos, 2008). No caso concreto desta investigao, esta questo reveste-se de particular relevncia pelo facto de os estudos de Lingustica Aplicada se terem confinado, no esprito de muitos, ao domnio do ensino de lngua. Esta tendncia tem vindo a ser ultrapassada, com o alargamento dos estudos a questes

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    mais gerais da linguagem e da comunicao. Decorrente dessa abrangncia, possvel desenvolver uma infinidade de estudos em contexto real, envolvendo actores e estruturas sociais, cujas contribuies servem objectivos prticos. Acresce que o enquadramento terico em que se fundamenta a investigao que ora se desenvolve serve este mesmo pensamento. Como refere Halliday (1994: xxix), as aplicaes da Lingustica variam desde pesquisas de natureza terica resoluo prtica de questes. Nesta base, Halliday avana numerosos objectivos de aplicao da Lingustica, de entre os quais se destaca compreender: (i) a qualidade dos textos a razo pela qual um texto possui um determinado significado e avaliado como tal; (ii) de que forma a linguagem varia de acordo com o falante e com as funes para as quais usada e (iii) a relao entre linguagem /cultura e linguagem/situao.

    , portanto, neste sentido, em que se alia a teoria praxis, que se orienta a metodologia deste estudo, adoptando-se uma perspectiva de carcter fundamentalmente qualitativo. Com efeito, a pesquisa qualitativa, frequentemente relacionada com as Cincias Sociais, tambm se desenvolve na Lingustica Aplicada, nomeadamente em situaes de aprendizagem em sala de aula e de contextos profissionais (Duff, 2008: 31). A investigao qualitativa permite o uso de materiais empricos, nomeadamente estudos de caso, histrias de vida, observao e artefactos.

    O estudo de caso , de acordo com Yin (2003: 13), uma pesquisa emprica que investiga um fenmeno contemporneo no contexto da vida real, sobretudo quando as fronteiras entre fenmeno e contexto no so evidentes. Os seus princpios gerais reagrupam objectivos transversais representando diferentes correntes ideolgicas, particularmente: (i) procurar verdades externas e a confirmao de previses; (ii) compreender o fenmeno (o como e o porqu), a partir de uma perspectiva holstica; (iii) compreender as condies scio-econmicas e polticas que podem discriminar determinadas pessoas ou grupos.

    Pelo exposto, o estudo de caso um instrumento que, independentemente das reas em que utilizado, do foco em anlise (individual, de grupos, organizaes ou

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    pases) ou da natureza do seu estudo, mantm os seus princpios metodolgicos, bem como as suas prioridades. No caso da Lingustica Aplicada, da Sociologia, da Antropologia, da Educao e da Cincia Poltica, adequado sobretudo a entidades como grupos sociais, comunidades, instituies ou organizaes (Duff, 2008: 33-34).

    A abrangncia dos objectivos do estudo de caso compatvel com a pluralidade das suas tipologias, da sua estrutura, do seu carcter exploratrio, e com a possibilidade de triangulao, que se define pelo recurso a vrios tipos de informao para anlise, combinando-se diferentes prticas e mtodos em diversos domnios. Dados, mtodos, perspectivas, teorias e, inclusivamente, investigadores podem ser triangulados para a produo de observaes e de interpretaes convergentes ou divergentes. O objectivo , como Duff (2008: 144) explica, fortalecer a validade do estudo:

    () there are many kinds of triangulation, some more experimental and postmodern than others, but the principal goal is to investigate the research problem from different perspectives in order to provide possibly more complex and ideally more valid insights into observed or tacit linguistic behaviour and knowledge. Not all perspectives will necessarily converge, but such disfunctions themselves can be important findings.

    Nesta investigao, adopta-se a metodologia do estudo de caso, seguindo a perspectiva de que um caso pode ser estudado para facilitar a compreenso de questes ou para o redesenhar de uma generalizao. Mais do que procurar convergncias ou divergncias de uma verdade, pretende-se esboar um retrato das representaes na cultura empresarial. Trata-se de um estudo de caso nico, por se centrar apenas num grupo empresarial, e instrumental, na medida em que funciona como instrumento para a compreenso de um assunto geral (Stake, 1995: 39). Embora se desenvolva uma pesquisa de natureza qualitativa, incluem-se

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    instrumentos de quantificao que contribuem para um melhor aprofundamento da anlise das representaes.

    2.2. DESCRIO DO GRUPO EMPRESARIAL

    A regio de Leiria, e particularmente a Marinha Grande, possui um tecido empresarial fortemente implantado, constitudo sobretudo por pequenas e mdias empresas, grande parte delas de natureza familiar. Neste universo empresarial, que no tem sido alheio s exigncias de mudana para um paradigma global, desenvolveu-se o grupo empresarial em estudo, o Grupo Electrofer. Na sua origem, esteve uma pequena empresa familiar, criada em 1985, dedicada construo de ferragens para redes elctricas de baixa e mdia tenso. Alargou, depois, a sua aco ao tratamento de superfcies, de forma a evitar a subcontratao de servios, tornando-se pioneira em processos de zincagem. Por essa via, entrou no mercado da indstria automvel, situando-se a empresa Electrofer IV inicialmente em Palmela.

    Pela sua progressiva especializao em diferentes reas, criam-se diferentes empresas, algumas delas funcionando como fornecedoras e clientes umas das outras, constituindo-se, assim, o Grupo Electrofer. Actualmente, conta com cerca de trezentos trabalhadores e um volume de negcios de 30 milhes de euros. A administrao do grupo mantida pelo fundador (scio-gerente de sociedades com a sua esposa), excepo de uma das empresas constituda em sociedade com outro empresrio.

    O grupo constitudo fundamentalmente por cinco empresas:

    - Electrofer II (fabrico e montagem de estruturas metlicas); - Electrofer III (tratamento de superfcies atravs de galvanizao por imerso a quente);

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    - Electrofer IV (tratamento de superfcies atravs de zincagem electroltica de peas metlicas); - Supertrat (tratamento de superfcies pela decapagem, metalizao e pintura de estruturas metlicas); - ETS (equipamentos para tratamentos de superfcies).

    Estas empresas operam na zona industrial da Marinha Grande desde 2008, ano em que o grupo inaugurou as suas instalaes. Esta mudana permitiu que todas as empresas se agrupassem num s espao, o que no acontecia anteriormente.

    A escolha do referido grupo no obedeceu a qualquer critrio terico, para alm do critrio da sua localizao e do seu crescimento. O facto de o mesmo pertencer regio de Leiria contribuiu para a colaborao entre o universo acadmico (resultante da condio profissional da investigadora como docente do Instituto Politcnico de Leiria) e o universo empresarial da regio, que a natureza prtica do estudo j implicava. sua seleco, no foi tambm alheio o seu perfil de crescimento. Com efeito, trata-se de um grupo que cresceu consideravelmente at 2009, quer em rea de superfcie, quer em volume de negcios. A partir de 2010, a sua situao econmica sofreu um revs, em resultado da crise econmica nos sectores aos quais se dedica.

    2.3. RECOLHA E CARACTERIZAO DOS CORPORA

    2.3.1. Procedimentos de Recolha

    O primeiro passo para a concretizao da recolha dos corpora foi dado atravs de um primeiro contacto com o administrador do grupo empresarial. Apresentaram-se, em reunio presencial, os objectivos do estudo e o pedido de

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    colaborao do grupo para a sua realizao, designadamente para a recolha de corpora. De acordo com a indicao do administrador, seguiu-se uma reunio com o responsvel do Controlo e Gesto do grupo e vrios contactos presenciais, via telefone e correio electrnico, com a responsvel do Departamento de Imagem e Comunicao do grupo (que veio a deixar de exercer funes no Grupo em Janeiro de 2010, extinguindo-se o Departamento).

    A escolha dos corpora norteou-se fundamentalmente pela procura de textos autnticos que espelhassem a cultura do grupo empresarial e que fossem ao encontro dos objectivos estipulados. Obviamente, tendo em conta o universo de pesquisa, a possibilidade de acesso informao foi uma das linhas orientadoras da sua seleco. Nesta medida, optou-se, numa primeira fase, pela recolha de todos os documentos de livre acesso elaborados pelo prprio grupo, onde se incluem o stio Internet e o blogue disponveis em linha.

    Posteriormente, a responsvel do Departamento de Imagem e Comunicao facultou as brochuras de divulgao do grupo e de duas das empresas, no total de quatro brochuras. Considerando que as representaes se projectam tanto externa como internamente, procurou-se seleccionar o documento de maior relevncia para os colaboradores, materializado no manual de acolhimento dos colaboradores. A responsvel do Departamento de Recursos Humanos entregou-o em Fevereiro de 2010.

    Numa segunda fase do processo de recolha de corpora, foi necessria uma colaborao mais estreita com o grupo. A concretizao desta fase, que implicou a realizao de entrevistas semi-estruturadas junto dos responsveis do grupo e dos departamentos das empresas, constituiu a fase mais exigente do processo de recolha de dados. Saliente-se, todavia, que a sua prossecuo foi possvel graas ao apoio interno do Departamento de Recursos Humanos.

    Em suma, considera-se que os corpora recolhidos, que se caracterizam no prximo ponto, se adequam aos objectivos e metodologia propostos, pela sua natureza, diversidade e dimenso. No seu conjunto, formam um estudo de caso

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    suficientemente abrangente para validar empiricamente os pressupostos que fundamentam a anlise, designadamente o de que o discurso semitico, enquanto prtica social no contexto empresarial, veicula valores, relaes simblicas e imagens institucionais.

    2.3.2. Caracterizao dos Corpora

    2.3.2.1. Stio Internet

    O desenvolvimento tecnolgico, e particularmente a Internet, possibilitou um novo formato dinmico no domnio da informao. Em consequncia, surgiram novos modos de comunicao, onde a rapidez se privilegia cada vez mais. Neste contexto virtual, desenvolvem-se diferentes categorias de stios Internet: desde stios pessoais, educacionais, governamentais, de entretenimento, a stios comerciais (Garrand, 2001). De acordo com Lynch & Horton (2001:37), cada pgina de um stio Internet deve possuir alguns aspectos bsicos, como um ttulo informativo, a identidade do criador (autor ou instituio), a data de criao ou de reviso, uma pgina de menu, ou uma pgina inicial. Tambm o layout deve ser definido de forma coerente, para mostrar ritmo e unidade atravs das pginas, nomeadamente atravs da cor que lhe confere uma estrutura e uma identidade visual. Todos os elementos acima referidos cabem nas diferentes estruturas de construo do stio, ou seja, na organizao da informao em linha, que, segundo Guru & McLaren (2006: 5), se pode realizar de trs modos: (i) de um modo mais simples, atravs de sequncias lineares em que a informao organizada de forma cronolgica, alfabtica ou por tpicos lgicos sequenciados; (ii) por meio de hierarquias que organizam corpos complexos de informao e (iii) atravs de redes.

    No universo empresarial, o stio Internet um dos meios de representao dinmico cada vez mais utilizado com o objectivo de publicitar as empresas, bem

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    como os seus servios/produtos, no devendo a sua funo de representao ser descurada. A identidade das empresas construda atravs de uma rede de associaes, pelas hiperligaes que vo sendo descobertas pela mo do visitante. As empresas optam frequentemente por apresentar aspectos que consideram significativos, desde o seu historial (que poder incluir dados autobiogrficos, sucessos, inovaes), estatuto, dimenso, liderana, reputao, reconhecimento de terceiros, manifestao de sentimentos, atravs da combinao de diferentes sistemas semiticos, tornando os stios uma realidade multimodal.

    Guru & McLaren (2006: 3) sustentam que a transmisso da informao no stio Internet assume diferentes formas, consoante as caractersticas das empresas: (i) indirecta, unidireccional e geral, onde notcias e notas de imprensa so publicadas em linha; (ii) directa, unidireccional, bidireccional ou interactiva, geral ou personalizada, em que se usa o stio organizacional como um recurso informacional para consumidores e investidores; ou (iii) directa, unidireccional, bidireccional ou interactiva, geral ou personalizada, onde se criam e desenvolvem comunidades digitais centradas na sua especializao.

    Por fim, no se podem alhear as escolhas acima referidas da opo de orientao do stio de uma empresa na Internet. Na verdade, a empresa dever ter em considerao se pretende um stio orientado para as audincias, para a empresa ou se pretende ser misto. No primeiro caso, o stio pode ser organizado para mltiplas categorias de audincia; no segundo caso, a informao sobre a empresa apresentada em vrias seces do stio, esperando-se que a audincia seleccione a informao de que necessita e, no ltimo caso, o stio pode ser misto, pela coexistncia dos modelos anteriores e pela diviso do espao.

    O stio em estudo (Figura 3) cinge-se pgina principal do Grupo e s pginas de uma das suas empresas, Electrofer II Construes Metlicas, pelo facto de ainda no terem sido construdas as hiperligaes para as outras empresas do Grupo, isto , Electrofer III Tratamento de Superfcies, Electrofer IV e Supertrat.

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    Sendo a construo de stios Internet um processo contnuo e no um projecto nico com contedo esttico (Lynch & Horton, 2001: 2), torna-se fundamental aceder informao, dat-la e contextualiz-la. Neste caso, importa referir que as pginas foram recolhidas no dia 10 de Fevereiro de 2009, no stio http://www.electrofer.pt (ver Anexo I). Na figura 6, representam-se as pginas em anlise, porm, no anexo I, encontram-se pginas que incluem fotografias das obras.

    Figura 3: Pginas do stio Internet

    A construo deste stio seguiu o entendimento tradicional de que a imagem acompanha e complementa o texto verbal, sendo que os textos foram redigidos pela scia da empresa, as fotografias tiradas por uma empresa externa e a composio (criao do stio) foi elaborada pela responsvel pelo Departamento de Comunicao e Imagem.

    2.3.2.2. Brochuras

    A brochura um gnero que contempla objectivos diferentes, nomeadamente informar, persuadir ou educar, podendo ser considerada no domnio de escrita das

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    relaes pblicas (Oketch, 2006; Newson & Haynes, 2010). A brochura empresarial um dos gneros frequentes na divulgao de produtos e servios, cujo discurso constri a identidade das empresas, combinando diferentes sistemas semiticos. Merecem especial destaque os estudos de Askehave (1998, 1999), Askehave & Swales (2001) e Bhatia (2002, 2004) sobre a brochura empresarial enquanto gnero. Bhatia (2002: 11) especifica que, apesar de ser informativa, a brochura se torna promocional no carcter e no tom. Mais tarde, este autor (2004: 62) insere a brochura empresarial na colnia de gneros promocionais e considera-a um gnero misto por ser promocional e dar informaes ou opinies (Bhatia, 2004: 62).

    Este tipo de texto caracteriza-se por ser frequentemente composto por diferentes sistemas semiticos, onde se combinam sobretudo o verbal e o visual, por variar nas suas dimenses e, de acordo com Rubens (2001: 11), por conter no mximo dezasseis pginas. Em numerosos casos, a brochura apresenta uma estrutura geral constituda pela apresentao da empresa, nomeadamente no que tange sua histria, sua viso, sua misso, aos seus objectivos e a outras informaes que se relacionem com as suas actividades, as suas parcerias, os seus patrocinadores e os seus contactos (Oketch, 2006: 232). De notar que este tipo de brochura pode agir como adjuvante na criao de relaes, particularmente como parceiro qualificado (Askehave 1998: 137). A brochura pode informar um potencial cliente de que a empresa possui qualidades necessrias para estabelecer relaes ou parcerias. Assim, pode ser usada para demonstrar as suas qualidades e as suas potencialidades.

    As quatro brochuras recolhidas constituem a totalidade das brochuras existentes no grupo, sendo uma dirigida ao pblico interno e as restantes a clientes ou ao pblico em geral. A primeira brochura (ver Anexo II-A) pertence ao Grupo Electrofer e dirigida ao pblico interno. Trata-se de uma brochura que possui uma mensagem de Natal, datada de 2007, onde se incluem imagens, a mensagem natalcia, o resumo da histria do grupo e uma breve introduo s empresas que a ele pertencem. A segunda brochura (ver Anexo II-B), de 2006, pertence empresa Electrofer II Construes Metlicas que, em doze pginas, apresenta textos sobre

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    a empresa e a sua produo, bem como fotografias das suas obras. A terceira brochura (ver Anexo II-C), tambm pertencente referida empresa, tem como tema as barreiras acsticas absorventes por ela produzidas. Apresenta, em duas pginas e atravs de fotografias e grficos, o sistema de barreiras de isolamento acstico. A ltima brochura (ver Anexo II-D), da empresa Electrofer 3 Tratamento de Superfcies, apresenta uma explicao do processo de galvanizao a quente, as fases de produo e as vantagens deste processo.

    2.3.2.3. Blogue

    O weblogue, ou mais vulgarmente blogue, considerado um stio Internet, frequentemente actualizado, dinmico e interactivo, no qual se colocam mensagens datadas. J em 2002 Stauffer (2002: 4) definiu o blogue como um stio, implementado atravs de software especial, actualizado frequentemente e com entradas cronolgicas, como se de um dirio se tratasse, no obstante os temas de domnio pblico. A inovao tecnolgica levou a que a criao de um blogue fosse acessvel a qualquer utilizador da Internet. Em consequncia, assistiu-se proliferao de blogues sobre os mais variados assuntos, pelo que a sua natureza, tal como a sua prpria definio, se encontram ainda em processo de construo. Poder-se- referir que o blogue difere do stio Internet habitual pela apresentao da informao (Stauffer, 2002) ou das ferramentas utilizadas (Wagner, 2005); porm, ser igualmente legtimo referir a diferena na dinmica do seu contedo (Richardson, 2006; Weil, 2006).

    Para um utilizador comum da Internet, o blogue continua a ser associado a um carcter essencialmente pessoal e/ou ldico, onde, num estilo informal, se partilham pensamentos ou informaes sobre inmeros assuntos. Realce-se, no entanto, que a concepo do blogue evoluiu e, no caso particular do blogue no contexto empresarial, verifica-se rapidamente que este no possui as mesmas

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    caractersticas do blogue pessoal. Alis, se este ltimo proliferou num curto espao tempo, a comunidade empresarial foi mais lenta na sua adopo como ferramenta de comunicao (Flynn, 2006: 6). Os termos blogue empresarial e blogue corporativo foram adoptados para, na maioria dos casos, designar indistintamente esta nova realidade. Simonis (2008: 9) distingue os termos, especificando que um blogue empresarial um blogue sobre a organizao, empresa ou actividade profissional, com perfil externo, enquanto um blogue corporativo dilui a pessoa e coloca a organizao ou a empresa em primeiro lugar. Em lngua portuguesa, os termos

    variam entre blogue/blog e empresarial/corporativo. De acordo com um levantamento realizado no motor de busca Google (http://www.google.pt), em Fevereiro de 2010, o par mais utilizado blog corporativo. Porm, restringindo o levantamento a usos do Portugus Europeu, o resultado difere, sendo blogue empresarial a escolha tendencial.

    Wack (2004) foca uma nova concepo do blogue, que se afasta do seu conceito tradicional quanto aos objectivos, participantes e caractersticas:

    A corporate blog is a blog published by or with the support of an organization

    to reach that organization's goals. In external communications the potential

    benefits include strengthened relationships with important target groups and the positioning of the publishing organization (or individuals within it) as industry experts. Internally blogs are generally referred to as tools for collaboration and knowledge management.

    O blogue , assim, visto como uma ferramenta que deve funcionar de acordo com os objectivos da organizao e que pode adquirir uma funo externa, a que se associa uma estratgia de marketing, ou interna, como plataforma de conhecimento e colaborao. Uma organizao que pretenda desenvolver relaes com o pblico externo, nomeadamente com clientes ou com os mdia, recrutar colaboradores, testar produtos/servios ou gerir o conhecimento e a cooperao dos colaboradores

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    internamente, pode, se for adequado, criar um blogue. Pela sua natureza diversificada, este tipo de blogue caracterizado em diferentes categorias que se relacionam directamente com as razes da sua criao. Dugan (2004) divide-o em trs categorias: blogue interno, de eventos e de produtos. Ma & Zhang (2007: 118) consideram uma diviso que contempla o blogue de eventos, de produtos e de conhecimento. Wack (2005: 8), por sua vez, distingue seis categorias, trs ao nvel externo e trs ao nvel interno. Ao nvel externo, este autor distingue o blogue de vendas, o relacional e o de marca. Ao nvel interno, distingue o blogue de conhecimento, o colaborativo e o de cultura organizacional. Independentemente da sua forma de categorizao, o blogue corporativo pode, de facto, cumprir diferentes misses: (i) ser uma ferramenta de venda de produtos e servios, cujo pblico-alvo so (potenciais) clientes; (ii) ajudar a criar, manter ou fortalecer relaes com determinado pblico-alvo, nomeadamente com clientes; (iii) permitir fortalecer uma marca, um produto ou o perfil de uma organizao; (iv) servir para partilhar informaes ou conhecimento como repositrio junto dos colaboradores internos; (v) fornecer ferramentas de pesquisa que promovam a discusso de ideias entre os colaboradores internos ou (vi) ser um meio para fortalecer a cultura organizacional interna atravs de contedos informais.

    A fronteira entre o contedo de um blogue corporativo e de um stio Internet de uma organizao , no raras vezes, tnue. Mazurek (2008: 403) refere, a este respeito, a existncia de diferentes modelos da sua implementao: o blogue como nica ferramenta Internet; o blogue coexistente com o stio; o blogue e o stio integrados funcionalmente e, por fim, o blogue que se integra no stio.

    O grupo em estudo possui um blogue independente criado pela responsvel do Departamento de Comunicao e Imagem, a 16 de Setembro de 2009, no endereo http://electrofergrupo.blogspot.com. data de acesso (02 de Janeiro de 2010) encontravam-se disponveis 21 mensagens das quais 18 em 2008 (12 em Setembro e 6 em Outubro) e 3 em Janeiro de 2009, para as quais no constam quaisquer comentrios de resposta (ver Anexo III). Este um blogue interessante, na

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    medida em que, de acordo com a responsvel, a informao disponvel se destina fundamentalmente ao consumo interno. Considera-se, todavia, que o blogue possui um carcter simultaneamente interno e externo. Por um lado, funciona como um blogue de conhecimento interno, um repositrio e meio de partilha de informao, onde se integram, a ttulo de exemplo, as guias de transporte das empresas Electrofer II e Supertrat, uma folha de requisio da empresa ETS ou as novas senhas de almoo; por outro lado, o blogue funciona como marca que pretende fortalecer o perfil da empresa perante o pblico externo. Esta aco visvel, nomeadamente, atravs de um anncio de emprego, de um autocolante com a nova morada do grupo, de uma fotografia de um presente para clientes, ou atravs da publicao de polticas do grupo.

    2.3.2.4. Manual de Acolhimento

    O manual de acolhimento insere-se na concepo de programas de acolhimento ao colaborador recm-chegado e funciona como uma das formas de socializao activa. Como Pina e Cunha et al. (2007: 483) sustentam, serve como introduo vida quotidiana da empresa, sublinhando as vantagens legais e adicionais de que beneficia o pessoal. O manual considerado um instrumento fundamental da prtica organizacional, quer para o colaborador recm-chegado, quer para a organizao que pretende orient-lo e transmitir-lhe os seus valores. Pretende-se, pois, facilitar a integrao do colaborador e a assimilao de informaes para o seu bom desempenho e estabelecimento de relaes no local de trabalho. Apesar de no possuir uma estrutura rgida, o manual segue geralmente parmetros definidos pela organizao, convergentes numa estrutura que inclui informaes sobre a vida e funcionamento da organizao, a sua estrutura, a dinmica de funcionamento dos subsistemas da gesto de recursos humanos, os benefcios sociais, os servios de apoio, bem como outras informaes. Em Alcobia (2008), apresenta-se uma

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    estrutura tpica do manual de acolhimento que inclui um breve resumo do contedo de cada uma das suas seces, designadamente: boas vindas (informao de acolhimento de boas vindas, saudao ao colaborador); histria da organizao (informao acerca dos fundadores, marcas, histria da organizao); informaes gerais sobre a organizao (localizao geogrfica, viso, princpios e valores, organograma, descrio dos departamentos e funes); procedimentos de preveno e proteco (equipamentos de segurana, alarmes e segurana, sadas de emergncia); descrio de responsabilidades (responsabilidades, funes e servios dos diferentes departamentos); cdigo de conduta (normas a serem respeitadas) e perspectivas de carreira e formao. Importa salientar que, para alm de funcionar como um instrumento facilitador da integrao dos colaboradores recm-chegados, o manual recontextualiza esta prtica social, constri a empresa, o papel dos colaboradores e estabelece relaes entre os diferentes participantes.

    O manual em anlise (ver Anexo IV), facultado pela Directora dos Recursos Humanos do grupo, encontra-se disponvel para consulta na rede informtica interna e contm quarenta e trs pginas repartidas entre imagens e textos escritos relativos a (i) boas vindas; (ii) descrio do grupo (misso, valores, h