uff - universidade federal fluminense polo … · que me permitiu chegar até aqui e concluir mais...
TRANSCRIPT
UFF - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
POLO UNIVERSITÁRIO DE CAMPOS DOS GOYTACAZES
BACHAREL EM CIÊNCIAS SOCIAIS
JÉSSICA JORGE FELIPE DE SOUZA CASTRO
“A categoria „meio ambiente‟ e os pescadores e marisqueiras de São João da Barra:
Quando a Teoria „esbarra‟ nas práticas sociais”
Campos dos Goytacazes
2016
UFF - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
POLO UNIVERSITÁRIO DE CAMPOS DOS GOYTACAZES
BACHAREL EM CIÊNCIAS SOCIAIS
JÉSSICA JORGE FELIPE DE SOUZA CASTRO
“A categoria „meio ambiente‟ e os pescadores e marisqueiras de São João da Barra:
Quando a Teoria „esbarra‟ nas práticas sociais”
Trabalho de conclusão de curso
apresentado à Universidade Federal
Fluminense como requisito parcial para
obtenção do grau Bacharel em Ciências
Sociais.
Orientador: Prof. Dr. José Colaço Dias Neto
Campos dos Goytacazes
2016
JÉSSICA JORGE FELIPE DE SOUZA CASTRO
“A categoria „meio ambiente‟ e os pescadores e marisqueiras de São João da Barra:
Quando a Teoria „esbarra‟ nas práticas sociais”
Trabalho de conclusão de curso
apresentado à Universidade Federal
Fluminense como requisito parcial para
obtenção do grau Bacharel em Ciências
Sociais.
Aprovada em ___ de ______________de 2016.
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________
Prof. Dr. José Colaço Dias Neto (Orientador) - UFF
_____________________________________________
Profª. Dra María Gabriela Scotto - UFF
_____________________________________________
Profª. Dra. Juliana Blasi Cunha - UFF
Campos dos Goytacazes
2016
À Atafona, em especial aos pescadores e marisqueiras por toda a sua essência.
À minha mãe, dona Rose, por ter acreditado em mim.
AGRADECIMENTOS
Sou uma pessoa de fé e não poderia deixar de agradecer primeiramente a Deus, àquele
que me permitiu chegar até aqui e concluir mais uma etapa de minha vida com tantas
provações. Hoje, mais do que nunca tenho a certeza que foi preciso errar, chorar, cair,
levantar, sorrir, tentar, compartilhar e experimentar. Experimentar uma fase que é única e
inesquecível.
Sigo então, falando de minha mãe, àquela que devo todo sentimento de gratidão.
Pessoa única que fez dos meus sonhos os seus. Obrigada mãe, nunca esquecerei seu esforço
para realizar a pré matricula na UFF Niterói.
Ao meu marido, companheiro e receptor de tantas fraquezas minhas, obrigada pela
paciência e tolerância, principalmente na reta final deste trabalho.
Aos amigos que antecederam essa trajetória acadêmica e despertaram em mim o amor
pela ciência humana, meu sentimento de agradecimento. Família HUMANOMAR, devo a
vocês o inicio de toda essa história.
Muitas são as pessoas que fizeram e ainda fazem parte dos meus anseios profissionais,
por isso, agradeço aqui de forma geral a todos que contribuíram direta ou indiretamente para a
conquista desse sonho. Obrigada por cada oportunidade dada, por cada batalha posta à tona,
por cada crédito de confiança. “As pessoas aprendem umas com as outras...” Provérbios,
27.17a.
À UFF e seus encantos: obrigada professores, coordenadores, amigos de turma e todos
que acreditam na Educação Pública de qualidade, com vocês aprendi e reaprendi muitas
coisas. Sou grata por ter convivido com vocês, por deixado um pouquinho de mim e está
levando um pouquinho de cada um.
Professor Zé Colaço, obrigada por ter acreditado em mim e ter compartilhado “Quanto
Custa ser Pescador artesanal”.
Por fim, no entanto, não menos importante, devo este trabalho a toda comunidade
pesqueira de Atafona. A todos pescadores, marisqueiras e comunitários que me permitiram
conhecer um pouco mais de suas vidas. Obrigada pela luz, pela essência, e pelo valor de
coisas tão simples.
À vocês, todo o meu carinho e esforço.
“Tem hora que a gente se pergunta
Por que é que não se junta tudo numa coisa só?
A gente fica meio... meio desencontrado do que a gente é... né?
... se abusá não dá nem tempo de aprendê as coisa...”
Fernando Anitelli
RESUMO
Diversas foram as consequências desencadeadas pelo processo de industrialização do
século XX, dentre elas a “Crise Ambiental”. Tal fato introduziu no mundo várias correntes
científicas e consagrou a temática. Consequentemente, muitos foram e até hoje são os
conceitos que tentam definir a categoria „meio ambiente‟, portanto, este trabalho visa
compreender quais são essas perspectivas, como elas se construíram e onde nesse contexto,
surge a leitura da classe pesqueira, em especial de Atafona. Teoria e práticas sociais são
postas em evidência e fomentam uma discussão em torno do discurso, das relações de poder e
suas ramificações. Sendo assim, pode-se notar que há muitas “respostas prontas” advindas de
uma corrente de pensamento conservacionista, que constrói e regula o que deve ser falado ou
não, aquilo que é visto como „discurso correto‟. Tal discurso caracteriza-se como técnico e,
consequentemente, intocável, tentando moldar, posicionar e definir o sujeito a quem ele deve
ser e o que deve fazer. O trabalho levou em consideração a observação de processos
empíricos e as histórias de vida dos interlocutores da pesquisa.
Palavras-chave: Meio ambiente; Pesca artesanal; Teoria; Práticas Sociais; Discurso;
Topofilia;
ABSTRACT
The twentieth-century industrialization triggered several consequences, among them,
the so-called environmental crisis. Such fact introduced the world various scientific currents
and consecrated the thematic. Consequently, many were and still are the concepts that try to
define the category 'environment', therefore, this work seeks to understand what are these
perspectives, how they were built and where, in this context, arises the reading of the fishing
class, especially in Atafona. Theory and social practices are put in evidence and encourage a
discussion about the discourse of power relations and its ramifications. Thus, it can be noted
that there are many "ready answers" resulting from a conservationist current of thought,
which builds and regulates what should be spoken or not, what is seen as 'correct speech'. This
speech is characterized as technical and hence untouchable, trying to mold, position and set
the subject to whom it supposed to be and what it should do. The study takes into
consideration the observation of empirical processes and life histories of the research partners.
Keywords: Environment; Small-scale fishing; Theory; Social practices; Speech; topophilia;
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO............................................................................................ 10
2 MORADORA, ARTICULADORA LOCAL E ETNÓGRAFA .................. 14
3 O MEIO AMBIENTE NA TEORIA ............................................................ 23
4 O MEIO AMBIENTE E AS PESSOAS ...................................................... 29
5 CONCLUSÃO: O LUGAR DO DISCURSO E LUGAR DAS PRÁTICAS
REFERÊNCIAS ...........................................................................................
45
51
10
1. INTRODUÇÃO
A questão ambiental surgiu com toda força na agenda política de diversos países nas
ultimas décadas e tem tomado forma a partir de várias temáticas. A gestão e utilização dos
recursos naturais não renováveis, os conflitos em torno das diferentes concepções de
conservação ecológica, os mecanismos de compensação para grupos sociais e populações
extrativistas que são afetadas por grandes empreendimentos, são algumas delas. A
denominada “Crise Ambiental”, como é conhecida na literatura, teve inicio no mundo a partir
da intensificação do processo de industrialização do século XX, que caracterizou o que viria a
ser a Ecologia Política. Nessa época, as relações entre os seres humanos e a biosfera, assim
como a poluição e a degradação do ambiente adquiriram dimensões planetárias. Essa crise
trouxe a necessidade de novos padrões de relacionamento com a natureza e seus recursos,
caracterizando assim, desde então, um questionamento a partir dos estilos de vida e de
consumo, na ética e na cultura, na dinâmica política e social e principalmente na organização
do espaço, o que caracteriza fortemente a disputa entre os interesses públicos e privados até os
dias de hoje.
Esta problemática, como não poderia deixar de ser, incidiu fortemente na atividade
pesqueira artesanal, que é o foco do presente estudo. O universo da atividade pesqueira
artesanal, tal como se conhece no litoral brasileiro e fora dele, se constitui, de um modo geral,
com base nos conhecimentos práticos característico de um ofício que se mantém através da
transmissão oral e informação, realizada normalmente de geração para geração de pessoas
ligadas por laços de parentesco, vicinais ou de amizade. Em geral, também se caracteriza pelo
uso de recursos técnicos para captura de “baixo impacto ambiental”, quando comparados a
outras formas de pescaria como as realizadas por empresas ou grandes grupos que exploram
os recursos naturais aquáticos.
Como o espaço marítimo e costeiro é também um espaço de conflitos e disputas, a
pesca artesanal tem sofrido grande impacto de outras atividades de exploração de recursos
naturais não renováveis, tais como aquelas ligadas à Cadeia Produtiva de Petróleo e Gás ou de
grandes empreendimentos portuários em diversas regiões de nosso país.
Em São João da Barra, município localizado litoral do Norte Fluminense, a atividade
pesqueira artesanal ocupa um lugar de considerável destaque na economia local desde a
fundação da cidade. Com a chegada de novas atividades econômicas na região, como por
11
exemplo, a construção do Complexo Portuário do Açu1, o município vem sofrendo uma série
de impactos nos meios natural, social e econômico, tornando a pesca artesanal uma das
atividades vulneráveis após a chegada de novos empreendimentos associados ao Complexo.
Esse cenário resulta não somente em diversos trabalhos acadêmicos já realizados na região,
mas também na execução de inúmeras medidas mitigatórias e de compensação, dentre elas os
Projetos de Educação Ambiental (PEA).
Assim, a monografia aqui apresentada se insere num conjunto de pesquisas empíricas
realizadas no litoral fluminense sobre atividade pesqueira, desempenhada por grupos sociais
que vivem da captura de espécies aquáticas e do extrativismo e que, de acordo com os
recentes debates políticos e jurídicos, tem sido reconhecidas como “populações tradicionais”.
É de longa data o interesse das Ciências Sociais – e mais especificamente da Antropologia –
pelos estudos empíricos e de caráter etnográfico sobre a vida social de pescadores de “beira de
praia” e de “águas interiores” no estado do Rio de Janeiro.
Desde os trabalhos de Luiz de Castro Faria2, sobre os pescadores de Ponta Grossa dos
Fidalgos nos anos de 1940 e Arraial do Cabo na década seguinte, passando pelos trabalhos de
Elina Pessanha3, Luiz Fernando Dias Duarte
4, Roberto Kant de Lima
5, Marco Antonio da
Silva Mello e Arno Vogel6 – todos realizados nos anos de 1970 em variadas localidades do
estado do Rio de Janeiro – a pesca artesanal tem sido considerada como uma importante
atividade através da qual podemos observar processos de mudança social e impactos de
grandes empreendimentos sobre a vida social de famílias inteiras. Mais recentemente, a
“questão ambiental” associada à economia capitalista em seus moldes contemporâneos, tem
sido levada em consideração pelos trabalhos que tomam pescadores, pescadoras e suas
famílias como interlocutores de pesquisa.
O trabalho que segue, neste sentido, se incorpora ao conjunto de trabalhos recentes
realizados por jovens pesquisadores e pesquisadoras associados ao Núcleo de Estudos
Antropológicos do Norte Fluminense Luiz de Castro Faria, o Neanf/UFF, coordenado pelo
Prof. José Colaço, cuja uma de suas linhas de pesquisa é justamente “Estruturas Tradicionais,
1 ASSOCIAÇÃO DOS GEÓGRAFOS BRASILEIROS (AGB) – GRUPO DE TRABALHO EM ASSUNTOS
AGRÁRIOS. Relatório dos Impactos Socioambientais do Complexo Industrial-Portuário do Açu. Rio de
Janeiro – Setembro/2011. 2 s/d e 2000.
3 (2003).
4 (1999).
5 (1997).
6 (2004).
12
Meio Ambiente e Conflitos”. Aqui tem se tomado a atividade pesqueira na região norte
fluminense como objeto de estudo.
Fig.1 - Sr. Inácio - 85 anos, pescador em atividade. Ex-morador da
ilha da Convivência e Pontal. Cehab, 2014.
“A Categoria „Meio Ambiente‟ e os Pescadores e Marisqueiras de São João da Barra:
Quando a teoria „esbarra‟ nas práticas sociais” está organizado em quatro capítulos. O
primeiro capítulo, intitulado “Moradora, articuladora local e etnógrafa”, retrata com detalhes a
minha trajetória no campo, desde a atuação voluntária em Projetos de Educação Ambiental
até a inserção no curso de Ciências Sociais. Descreve também o sentimento de pertencimento
que construí em relação ao meu lugar e as atividades que o mantém. Narro sobre as
possibilidades para a monografia e a dificuldade que tive em encontrar um objeto
antropológico, justamente pelos diferentes “papéis” que obtive nessa jornada.
A fim de contrapor construções teóricas e práticas sociais sobre uma dada categoria, os
capítulos seguintes deste trabalho, apresentam respectivamente, um resumo dos conceitos
levantados sobre o „meio ambiente‟ e o registro descritivo da cultura material e imaterial de
determinado lugar e pessoas.
O segundo capítulo, O “Meio Ambiente na Teoria”, aborda a etimologia das palavras
MEIO e AMBIENTE, considera as mudanças geográficas e políticas ocorridas no mundo no
final do século XX que trouxeram a importância de ações ligadas às questões ambientais e
apresenta leis e diretrizes advindas delas. Expõe as correntes da Educação Ambiental
conservacionista e emancipatória.
No capítulo que leva o título de “Meio ambiente e as pessoas” o leitor encontrará
histórias sobre o distrito de Atafona, que narram a relação entre o Homem e a Natureza.
Através da oralidade foram descritas transformações sociais que marcam a região como um
13
campo vasto de investigação. Como sujeitos primordiais, foram selecionados alguns
pescadores artesanais e marisqueiras e também alguns filhos jovens, personagens da vida real
que caracterizam essa construção antropológica.
O quarto e último capítulo deste trabalho problematiza os discursos levantados sobre a
categoria Meio Ambiente, à luz das relações de poder, tal como formuladas por Michel
Foucault7, como também os trabalhos de Yi-Fu Tuan
8, que relacionam Espaço, Lugar e a
Topofilia.
7 (1979).
8 (1983 e 1980).
14
2. MORADORA, ARTICULADORA LOCAL E ETNÓGRAFA.
Dizem que “Filho de peixe, peixinho é”, mas qual ditado popular definiria o contrário?
Nascida e criada em Atafona, bairro do município de São João da Barra/RJ, minha relação
com a atividade pesqueira não inicia com influência na área profissional dos meus pais, por
exemplo. Filha de Pedreiro e doméstica, e não tendo nenhum contato anterior com
comunidade de pesca, foi com o tempo que construí um sentimento de pertencimento que me
fez arrastar essa temática até a faculdade. Características pessoais, como facilidade com
comunicação e curiosidade, foram essenciais para o que seria o início de uma trajetória de
participação social e liderança comunitária. Óbvio que até então, não percebida.
Em novembro de 2007, através de uma informação “boca a boca”, dita de costume em
bairros pequenos como o meu, recebi o convite para uma Oficina de Cinema Ambiental que
aconteceria na região. Sem saber muito ao certo o que seria e movida por um espírito afim a
qualquer tipo de arte, me desloquei ao ponto de inscrição e deparei-me com um cartaz que
dizia – “Venha fazer um filme!”. Esse informativo estava colado no portão de entrada da
Escola Estadual a qual eu fazia parte e vinha acompanhado por alguns logotipos (Órgão
Licenciador, petrolífera e consultoria), até então desconhecidos por mim. Quando adentrei ao
local, logo encontrei pessoas conhecidas que participavam do meu círculo social, como por
exemplo, integrantes do Grupo Teatral Nós na Rua. No primeiro momento percebi que todos
ali presentes compartilhavam da mesma ideia sobre o que seria aquela oportunidade, a de
atuar em um trabalho audiovisual, especificadamente como possíveis “atores”! Dada à
apresentação da equipe, que por sinal era muito peculiar, com sua maioria homens e barbudos,
deu-se inicio ao processo de “entrevista”, quase daquelas de emprego, o detalhe é que havia o
registro audiovisual, estávamos todos sendo filmados. Realmente me senti muito importante
nesse dia, toda a estrutura do processo de seleção levava-nos a entender que era uma coisa
muito séria, até mesmo “profissional”. Meus conhecidos ali presentes se faziam todos
curiosos, assim como eu, claro. E entre uma pessoa e outra que era entrevistada, levantávamos
questionamentos sobre os momentos dentro “da salinha”. Lembro-me de ouvir várias
respostas inusitadas, como a da minha amiga Adrinny, que havia demonstrado seus dons
musicais. Enfim, no final fomos todos “selecionados” para participar da Oficina de Cinema
Ambiental MARHUMANO, e não, não seríamos os “atores” como imaginado, a proposta era
experimentar produzir um trabalho audiovisual e atuar por de trás das câmeras. Como o
15
número de inscritos estava abaixo do esperado, todos foram contemplados, em média 14
participantes. Iniciava então a minha experimentação com a ferramenta audiovisual, que
naquele momento parecia-me o ponto de partida, mas seria apenas um instrumento de
inserção na futura área de Humanas.
O projeto MARHUMANO na verdade se enquadrava numa condicionante9 do Processo
de Licenciamento Ambiental de uma petrolífera, na época, atuante no Campo de Polvo10
. Em
um mês de oficinas experimentais, dentre elas gestão ambiental e ferramentas audiovisuais,
tive a chance de produzir dois documentários sobre regiões de São João da Barra, um sobre a
atividade pesqueira e outro sobre a chegada do empreendimento portuário a comunidade rural
do 5º distrito. Ao descobrir a possibilidade de “dar voz” a um problema do meu lugar, fiz de
cada dia daquela experiência um verdadeiro laboratório de aprendizado. Ao propor roteiros
que falavam sobre a atividade pesqueira do meu município e principalmente a chegada do
Porto do Açu11
, superei minhas próprias expectativas. Acredito que naquele momento, o
motivo que me levou a pensar nesses temas, se relacionava com o fato de eu ter criado
relações próximas com a comunidade do 5º distrito, por acompanhar um trabalho social
religioso desde criança naquela região. O resultado do Projeto foi digno de um trabalho
intenso de 30 dias, e não poderia ter sido diferente, me envolvi como entrevistadora,
produtora e roteirista. “Maragado” e “Tabuaçu” foram produtos da minha primeira
experimentação no Campo de Pesquisa, mesmo sem saber da existência desse formato.
9 Condicionantes Ambientais consistem nos compromissos e garantias que o empreendedor deve assumir, com
base em seu projeto e nos programas e medidas mitigadoras previstos nos estudos ambientais. 10
O Campo de Polvo está localizado na porção sul da Bacia de Campos, uma bacia sedimentar brasileira situada
na costa norte do estado do Rio de Janeiro, estendendo-se até o sul do estado do Espírito Santo, entre os
paralelos 21 e 23 sul. Possui aproximadamente 115.800,00 quilômetros quadrados. 11
Com 17 km de píeres, que poderão receber até 47 embarcações, o Porto do Açu está em construção em São
João da Barra, no norte fluminense desde 2007. Atualmente o empreendimento é formado pelo Terminal 1 (T1 -
offshore) e pelo Terminal 2 (T2 – onshore).
16
Fig.1 – Gravações do documentário Maragado, Projeto MARHUMANO. Atafona, Novembro de 2007.
Através destes, pude perceber memórias de vidas, narrativas históricas e
problemáticas camufladas diante do contexto político-social da época. Mas para o pensamento
de menina, muito me interessava “fazer algo” pelo meu lugar e por aquilo que até então tinha
como despercebido. Foi daí que conheci o Senhor “dois mil”, Seu Floristo, Flavinho, entre
outros pescadores de Atafona e, pude intimidar a relação com personagens que me viram
crescer, como a dupla sertaneja Zé Carlos e Rogério (também pescadores) e Dona Djanira,
trabalhadora de taboa do Açu (e também assistida do Projeto Social cristão que eu fazia
parte). A partir de então, iniciei minha jornada como voluntaria nos projetos e programas de
Educação Ambiental, com a perspectiva de contribuir de alguma forma para a mudança social
dos cenários que me influenciavam, o que me trouxe futuramente a Graduação em Ciências
Sociais, por perceber que minha veia jornalística e cineasta eram apenas um meio e não o fim.
Meu envolvimento em projetos e programas de cunho socioambiental não resultou
somente como uma abertura para os caminhos profissionais, os laços e referências pessoais
são para mim as marcas mais importantes e significativas. Foi através do técnico Igor
Barradas (MarHumano) que arrisquei a experimentação de um Cineclube no município. Pela
indicação do Josinaldo Medeiros, também deste projeto, fui encaminhada a experiência do
Projeto Geração Futura do Canal Futura. E pela Maria Claudia Pitrez, vulgo Cacá, que
conheci o que seria antropologia. Sua amizade me deu a honra de adquirir conhecimentos
práticos sobre aquilo que hoje faz todo o sentido no que diz respeito à área que escolhi atuar.
Como antropóloga, num trabalho de mestrado12
que incluía a Festa de Nossa Senhora da
Penha e os pescadores da região, Cacá fez-se para mim a primeira influencia nas Ciências
Sociais, foi com ela que pude ter o contato primário com o “Campo” num sentido mais amplo,
12
Título: "Calmaria" e "Alvoroço" no encontro das águas: ritmo e pertencimento entre pescadores e veranistas
na praia de Atafona, R.J, Ano de obtenção: 2014.
17
ainda sem ser aluna de graduação, estava eu a fazer entrevistas e observação participante.
Nesse momento, diferente de produzir um documentário ambiental, eu sentia algo muito mais
desafiante, como se não fosse só aquilo que as câmeras registram, e realmente não era. Não
que eu tivesse deslegitimado todo o processo que havia me envolvido anteriormente, pelo
contrário, foi a partir dele que comecei a problematizar tais situações.
Fig 2 – Reunião do Cineclube Ocaso na Secretaria
Municipal de Meio Ambiente para planejamento da
Mostra de Cinema Ambiental. S.J. da Barra, 2008.
A primeira experiência profissional veio a partir desses laços afetivos formados
durante o voluntariado. Minha articulação comunitária ganhou impulso, e o que se tornava
algo natural para mim, fazia-se necessário para os processos de mobilização dos projetos de
Educação Ambiental. Em 2010, ainda menor de idade fui selecionada para o trabalho de
Agente Local de Comunicação do PEA-BC (Programa de Educação Ambiental da Bacia de
Campos), seria este o meu primeiro emprego formal. Nesse momento ainda não entendia as
relações e posicionamentos que o “formato” me exigia, em minha maneira de ser, além de
falar muito alto os impulsos de uma adolescente de 16 anos, as atitudes retratavam a “ferro e
fogo” raízes de uma comunitária13
. Só fazia sentido cumprir aquela função se eu fosse “eu”,
expondo o que interpretava como certo, enfatizando o conhecimento prático e geracional dos
moradores e problematizando a participação cidadã. Com a ruptura do diagnóstico ambiental
e as informações adquiridas durante seu processo, comecei a entender, a partir daquela
experiência, os meus “papéis” para a Educação Ambiental.
Particularmente o processo de ruptura do PEA-BC foi muito doloroso, grande parte
disso se deve ao fato das relações pessoais construídas, como citado acima. Na época, a
13
No sentido de pertencimento.
18
empresa de consultoria responsável pelo Projeto MARHUMANO, o qual eu continuara como
voluntária era também executora do diagnóstico da Bacia de Campos, e, portanto minha
“empregadora”. No momento de falência e conflito da empresa com a petrolífera contratante,
eu não me encontrava somente diante de um cenário empresarial e trabalhista, pelo contrário,
as emoções que pulsavam em mim, estavam envolvidas diretamente com as relações pessoais
construídas até ali. Desta forma, os problemas internos acabaram sendo totalmente expostos.
Afinal, os nomes citados acima como referências já não eram mais somente técnicos e
monitores, viraram amigos e deixaram-me perceber um sistema que até então eu não entendia
no papel de “comunitária”.
Um fato marcante desse estágio da minha vida envolve expectativas de uma
adolescente em plena construção profissional, afinal, nesta fase estava eu a encerrar o ciclo do
ensino médio e buscando definir escolhas para graduação. Já não existia mais uma menina de
13 anos com tanto tempo disponível para o trabalho voluntário, depois do término do
Diagnóstico PEA-BC tive que encarar a vida adulta e arriscar outros horizontes profissionais,
afinal, minha realidade exigia conciliar estudo e trabalho. Num determinado dia, recebi a
noticia que o processo de consulta do diagnóstico iria retornar através de uma nova
consultoria, e tive a boa nova de saber que outros agentes locais seriam contratados. Lembro-
me que naquele momento muito me intrigava o fato de haver a possibilidade desses agentes
não serem lideranças locais. Para minha surpresa, duas pessoas das quais eu havia mobilizado
na região do Açu, durante meu trabalho como agente local, foram contempladas com a
contratação. O fato surpresa foi perceber que de alguma maneira meu trabalho havia sido
“jogado fora”, por simplesmente se perder no meio de uma transição de empresas. Quero
dizer que quando o diagnóstico retornou, eu mantinha a esperança de reaver o trabalho que
havia feito de mobilização, articulação e relatoria no território. O fato de presenciar novas
pessoas no meu “papel” até me deixava feliz, por ser quem eram, mais o que me incomodava
de verdade era vê-las fazendo tudo de novo, como se o meu trabalho não tivesse sido válido,
ou então, válido só durante um determinado tempo. Uma sensação de uso abusivo tomou
conta de mim naquele instante, era como se eu tivesse sido “sugada” como liderança até a
ultima gota, e quando se esgotassem as relações pessoais, eu não “teria utilidade”. Tomei-me
por uma emoção de racionalidade e forcei-me a não me envolver mais com assuntos do tipo.
Meu objetivo era conquistar o ensino superior e trabalhar com ferramentas audiovisuais na
linha da Educação Ambiental, pois nelas eu encontrava a liberdade de expressão que me
faltava durante determinados processos, sempre pensando no sentido de mudança social da
realidade que vivia.
19
Foram quase dois anos distante das atividades de cunho ambiental do formato aqui
apresentado, e até mesmo nesse período, não pude passar despercebida ao Campo. Em um
trabalho profissional terceirizado a uma agencia bancária, realizei empréstimos orientados
para trabalhadores autônomos, grande parte do histórico desse crédito indicava o público da
atividade pesqueira, em especial pescadores artesanais que tentavam acessar o Plano do
Governo para financiamento de barcos. Não contive meu olhar crítico nessa experiência,
dessa vez o papel profissional nada tinha a ver com Projetos ambientais, no entanto minha
imagem como “moradora” e por vez conhecedora de histórias de vidas sobre aquele grupo,
fazia da minha posição operacional intimidadora. Como se eu adentrasse numa esfera
desconfortável para aqueles pescadores, o acesso a questões financeiras.
No final de 2012 o Projeto MarHumano também retorna suas ações com nova
consultoria e plano de trabalho, mesmo período que adentro a Universidade no Curso de
Ciências Sociais. Havia algo relacionada à primeira fase do projeto que me prendia enquanto
participante, mesmo que o tempo disponível já não fosse o mesmo. Então em 2013 surge
novamente a oportunidade de atuar como profissional. Desta vez eu não seria uma funcionária
direta da empresa de consultoria, mas sim contratada da própria Associação (produto do
Projeto) – um observatório Ambiental. Fazia sentido para eu tentar aquela vaga, pois minha
atuação na Associação Observar de São João da Barra não se misturava com o papel de
consultoria, eu conseguia atuar como liderança mesmo estando numa posição mais
institucionalizada. Entretanto, as questões ali encontradas giravam em torno da organização
interna e interesses pessoais, pois com a reformulação do Projeto o grupo também mudou.
Minha atuação durou o suficiente para eu entender que o impulso que me movia no início em
prol da organização comunitária não se limitava a um ou outro projeto. Minha persistência no
formato novo só fazia sentido porque eu acreditava na retomada da “versão MarHumano”.
Quando nada disso foi possível, e os interesses pessoais dos próprios membros do
observatório prevaleceram ao objetivo do Coletivo, já não quis mais estar ali. Foi então, que
mais uma vez movida pelas relações pessoais fui indicada a outro Projeto, desta vez o PEA-
CF (Projeto de Educação Ambiental do Campo de Frade14
), mais conhecido como REDE
(Rede de Estudos para o Meio Ambiente), que atuo até hoje.
14
O Campo Frade fica na Bacia de Campos, a uma profundidade de 1.128 m (3,700 pés), a cerca de 370 km (230
milhas) a nordeste do Rio de Janeiro.
20
Fig. 3 – Aplicação de Diagnóstico Rápido
Participativo (DRP) na comunidade pesqueira de
Atafona. Projeto Observar, 2013.
Fig. 4 – Aplicação de questionário de consulta
comunitária na comunidade pesqueira de Atafona.
Projeto REDE, 2014.
De todas as experiências até aqui, a da Rede de Estudos para o Meio Ambiente tem
sido a mais complexa, pois sobre ela tenho experimentado claramente tantos papéis, a de
MORADORA e por vez integrante de um Coletivo, a de ARTICULADORA LOCAL,
referencialmente assistente técnica, e ETNÓGRAFA, por estar escrevendo este trabalho. Das
experiências e fatos vividos nesse projeto muito teria aqui a contar, mas tomarei por base um
contexto geral. Minha atuação no Projeto Rema marca claramente uma mudança na minha
posição profissional, no melhor sentido posso dizer que esse tem sido o meu mais amplo
espaço de experimentação. Quando iniciei no Projeto em Março de 2014, um ano e meio do
seu período inicial, fui contratada justamente num contexto diferenciado dos outros
municípios da Rede. Visando o objetivo futuro de organização comunitária para gestão
pública, o plano de trabalho previa contratação de um dos jovens participantes do projeto para
trabalho de articulação e mobilização local. Em São João da Barra, devido ao contexto
histórico de participação social, o Projeto Rede também teve seu período de evasão, e,
portanto não alcançou um jovem na linha dos requisitos exigidos. Esse contexto diferenciado
da minha posição em relação aos outros articuladores locais, também me trouxe alguns
problemas e conflitos. Nesse instante eu estava lidando com a personificação de uma imagem
de “Liderança-técnica”, porque de todos os contratados, somente eu possuía um histórico de
participação em Projetos de Educação Ambiental. Por vezes tomei-me a refletir sobre o
quanto isso poderia parecer invasivo e pré-conceituoso para com as pessoas ao meu redor.
No decorrer do projeto REDE, passei de estagiária a assistente técnica, o que na
prática diz muito mais, pois me fiz participante de um processo recíproco de aprendizado.
Estar atuante como profissional numa empresa multinacional na área que almejo é com
21
certeza muito encantador, no entanto, de maior valor tem para mim o aprendizado que pude
obter na prática, desde os serviços administrativos à formação pedagógica. Claro que, o
desafio constante envolve o posicionamento de Articuladora x “jovem” (como chamamos os
integrantes do Projeto), esse tem sido um experimento enriquecedor, pois hoje, consigo
enxergar no grupo que eu faço parte, a jovem que eu fui com 13 anos, e através dos impulsos
e inquietações vindas dos jovens, posso mediar muito melhor o meu papel profissional. No
que diz respeito ao “Campo” e o papel “técnico” frente às comunidades prioritárias do
Projeto, eu ainda sinto falta de certas liberdades de expressão, que estão condicionadas a um
processo que visa autonomia, mas não é tão autônomo assim. Meus maiores embates por
incrível que pareça são indicados pela falta de condicionamento a esse “formato robótico” de
burocracias e diretrizes operacionais. Mas, ao contrário do Projeto Observar, faz sentido eu
continuar nessa Rede de Estudos do Meio Ambiente, porque enxergo até aqui o produto que
construímos e me identifico com os jovens que ajudei a mobilizar, portanto, hoje mesmo que
eu deixe de atuar profissionalmente, viso continuar como integrante do Coletivo porque
entendo que minha participação social deve estar acima de qualquer posição de trabalho, para
que possam fazer sentido minhas bandeiras de luta.
Fig. 5 – Oficina Elaborativa do Projeto REDE,
atividade conduzida pela articuladora. S.J. da Barra,
2015.
Fig.6 – Participação em Audiência Pública como
integrante do Coletivo Enredados. S.J. Barra, 2016.
Por fim, estudar e me relacionar profissionalmente com a comunidade pesqueira, em
especial com os pescadores e marisqueiras de Atafona, como também seus descendentes, me
fez perceber um cenário vasto de possibilidades para a monografia, além de estimular em mim
um sentimento de pertencimento local surpreendente. Contudo, a definição de um tema foi
algo desafiador. Diante da minha vasta, e, no entanto precoce experiência com Projetos
22
Ambientais, a dificuldade em encontrar um objeto antropológico ou sociológico se deu
justamente pelos diferentes “papéis” que obtive nessa jornada.
Ao conhecer o trabalho do Prof. José Colaço com pescadores artesanais em Ponta
Grossa dos Fidalgos, ainda na disciplina de metodologia de Pesquisa, logo me identifiquei e
propus a ele ser sua orientanda. No início, tomei como referência várias situações observadas
no Campo, entre elas a própria relação dos pescadores com a Colônia de Pesca. Meu
incômodo muitas vezes se dava às questões de discursos apresentada pelos mesmos e suas
consequências na participação/organização social. Até esse momento, discussões como essa
eram apenas ramificações de um cenário muito maior, que já há algum tempo vinham sendo
discutidas dentro das teorias socioambientais. Então, alertada pelo meu orientador, caberia a
um trabalho monográfico da linha de sua orientação, menos preocupação em “resolver” um
problema social e mais interessado em refletir sobre ele a partir da construção de uma
etnografia. Sendo assim, buscando praticar o olhar sociológico, parti de uma situação pontual
que me intrigava nas saídas de Campo, e que sempre apareceu nas falas dos pescadores: O
Meio Ambiente! Dada categoria que se encontra dentro de tantas outras que o “mundo
técnico” da Educação Ambiental tenta definir. De que maneira isso aparece para aqueles que
são os “sujeitos prioritários” 15
de tantas ações educativas?
Para mim, a necessidade de descrever perspectivas e práticas sociais de um
determinado grupo em relação a esta categoria, se deu justamente quando eu percebi que o
Meio Ambiente não é algo tão fechado e formal como a Ciência, ou mesmo as Teorias de
Educação nos impõem. Cabe aqui dizer, que administrar os diferentes posicionamentos ou
“papéis” durante esse trabalho, tornou-se o maior desafio, alertado e conduzido pelo Prof.
Colaço durante o processo de orientação desta pesquisa, bem como na construção deste texto
que o leitor tem em mãos.
15
Grupos sociais afetados pela ação ou omissão dos Órgãos de gestão ambiental Pública, em situação de risco e
ou vulnerabilidade socioambiental (QUINTAS, 2009).
23
3. MEIO AMBIENTE NA TEORIA
Muitos são os conceitos que tentam definir o termo "Meio-Ambiente". Pensando em
definição propriamente dita, é preciso compreender esse termo no sentido individual de suas
palavras, sendo elas MEIO e AMBIENTE.
O dicionário nos faz entender que MEIO significa metade de um todo, intermédio,
condição, circunstância, plano, maneira e até corpo ou ambiente onde se passam fenômenos
especiais ou substância sólida, líquida ou gasosa, dentro da qual vivem os seres. Nesse
contexto, ousa-se dizer, que MEIO já apresenta um sentido de espaço, instrumento,
ferramenta... Algo totalmente utilizável. Por sua vez, AMBIENTE traduz aquilo que envolve
os corpos por todos os lados. Aplica-se ao ar que nos rodeia, ou ao meio em que vive ou está
cada um, ambiente físico, social, familiar. Assim, antes mesmo de formarem uma só
definição, ambas já se interligavam.
A expressão meio ambiente (milieu ambiance) foi utilizada pela primeira vez pelo
naturalista Geoffrey de Saint-Hilaire16
em sua obra Études progressives d´un naturaliste, de
1835, onde milieu significa o lugar onde está ou se movimenta um ser vivo, e ambiance
designa o que rodeia esse ser.
Foram várias mudanças geográficas e políticas ocorridas no mundo no final do século
XX que trouxeram a importância de ações ligadas às questões ambientais e por consequência
a discussão de conceitos afins a esse assunto. Como diz Castells17
, em A Era da Informação-
Economia Sociedade e Cultura:
“Entre os diversos movimentos sociais que surgiram
no último quarto desse século, pode–se afirmar que o
movimento ambientalista tomou uma posição de destaque. Isso
porque a modernização alcançada no decorrer do período,
além de proporcionar ao homem o bem – estar, o conforto e a
praticidade, também lhe trouxe problemas de saúde, fome,
falta de água, de energia, entre muitos outros”. (CASTELLS,
1999).
Ao atingir tais dimensões, incontroláveis, esses problemas sociais obrigaram o setor
político, econômico e o setor das comunicações a dedicar maior atenção ao fato, causando
16
Étienne Geoffroy Saint-Hilaire (1772-1844) foi um naturalista e zoólogo francês. É considerado o fundador da
teratologia, ramo da medicina que estuda as malformações congênitas. 17
Manuel Castells Oliván (1942) é um sociólogo espanhol, teve um importante papel no desenvolvimento da
sociologia urbana Marxista. Enfatizou o papel dos movimentos sociais na transformação conflitiva da paisagem
urbana. Atualmente Castells vive entre Barcelona e Santa Mônica.
24
forte impacto em valores culturais e instituições da sociedade, uma vez que tem exigido
transformações dos meios de produção, de consumo e uma nova organização social.
No mesmo período da utilização de Saint-Hilaire, por volta de 1866 nascia através do
biólogo Haeckel18
, o que chamamos hoje de Ecologia. Essa palavra deriva de duas outras, que
no grego significam: oikos, que quer dizer “morada”, e logos, que se entende por “estudo”. A
Ecologia começa como um novo ramo das Ciências Naturais, e seus estudos passam a sugerir
novos campos do conhecimento como, por exemplo, a ecologia humana e a economia
ecológica. Mas só na década de 1970 o termo “ecologia” passa a ser conhecido do grande
público. Com frequência, porém, ele é usado com outros sentidos e até como sinônimo de
meio ambiente. E segundo alguns estudiosos, aí está o problema. Kurt Kloetzel19
através do
seu livro „O QUE É MEIO AMBIENTE‟, trouxe algumas dessas observações:
“Embora a distância não seja grande, ecologia e meio
ambiente de forma alguma são sinônimos. A primeira, segundo
uma definição que remonta a mais de um século, seria a
“ciência da morada”, a economia doméstica da natureza, por
assim dizer. Seu objeto de estudo são as relações entre o
organismo e seu hábitat. Meio Ambiente, por sua vez – ou,
mais elegantemente, o ecossistema -, vem a ser a própria
morada.”. (KLOETZEL, 1998)
Resumidamente, ecologia é algo voltado aos seres vivos e suas relações, e meio
ambiente, algo muito maior, voltado para tudo e todos.
Através da Política Nacional do Meio Ambiente, artigos 2 e 3 da Lei Federal 6.938/81,
compreende-se Meio ambiente por "Conjunto de condições, leis, influências e interações de
ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas
formas..., o meio ambiente é um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e
protegido, tendo em vista o uso coletivo". Essa descrição para muitos é algo totalmente
limitado, pois, trata de um conceito restrito ao meio ambiente natural, sendo inadequado, pois
não abrange de maneira ampla todos os bens jurídicos protegidos, como afirma, por exemplo,
os advogados dessa área.
As definições apresentadas por essas leis em geral são bastante amplas, sendo difícil o
entendimento completo do que vem a ser meio ambiente. Exposto pela Proin/Capes &
18
Ernst Heinrich Philipp August Haeckel (1834-1919) foi um biólogo, naturalista, filósofo, médico, professor e
artista alemão que ajudou a popularizar o trabalho de Charles Darwin e um dos grandes expoentes do cientismo
positivista. 19
Kurt Kloetzel (1923-2007) foi um médico e professor brasileiro. Formado em Engenharia, Kurt cursou
Medicina na Faculdade de Medicina da Universidade de São. Foi fundador, em 1978, do Departamento de
Medicina Social da Universidade Federal de Pelotas. Inquieto, polêmico e generoso, combinava o
reconhecimento internacional de pesquisador a uma postura humanista e solidária. Adepto da medicina dita
“socializada” viu com entusiasmo a criação do Programa de Saúde da Família. Autor de uma dezena de livros e
questionador inato, tornou-se o grande inspirador da educação permanente dos profissionais de saúde.
25
Unesp/IGCE, em 1999, Meio Ambiente é definido como a interação entre os meios físico,
biológico e socioeconômico. Por que:
(1) - O meio físico condiciona, primeiramente, as características do meio biológico e
socioeconômico, através de fluxos de energia e matéria.
(2) e (3) - Os meios biológico e socioeconômico, por realimentação, completam a interação
com o meio físico, regulando seus processos (Fornasari Filho et al., 1992 apud Fornasari &
Bitar, 1995).
Analisando o Art. 225 da Constituição Federal, encontramos a seguinte frase: “Todos
têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à qualidade de vida impondo-se ao Poder público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Com isso podemos supor que a
sociedade como um todo é responsável pela preservação do meio ambiente, pois ele é dado
como um direito e sua manutenção um dever. Essa relação entre homem e meio ambiente vai
para, além disso, como afirma EMÍDIO, 2006:
“O meio ambiente concebido, inicialmente, como as condições
físicas e químicas, juntamente com os ecossistemas do mundo
natural, e que constitui o habitat do homem, também é, por
outro lado, uma realidade com dimensão do tempo e espaço.
Essa realidade pode ser tanto histórica (do ponto de vista do
processo de transformação dos aspectos estruturais e naturais
desse meio pelo próprio homem, por causa de suas atividades)
como social na medida em que o homem vive e se organiza em
sociedade, produzindo bens e serviços destinados a atender
“as necessidades e sobrevivência de sua espécie” (EMÍDIO,
2006, p.127).
O ambiente natural se contrasta com o ambiente construído, que compreende as
áreas e componentes que foram fortemente influenciados pelo homem. O modo de ver o
mundo no qual evidenciam as inter-relações e a interdependência dos diversos elementos na
constituição e manutenção da vida está diretamente ligado à capacidade de intervir na
natureza para satisfação de necessidades de desejos crescentes, onde surgem tensões e
conflitos quanto ao uso do espaço e dos recursos. Isso se apresenta como perspectiva
ambiental, o que neste trabalho busco colocar a partir especificamente da comunidade de
pesca artesanal de Atafona, através de seus pescadores e marisqueiras.
Foi o contexto mundial marcado pela degradação do “meio ambiente” e do seu
ecossistema que despertou a reflexão sobre as práticas sociais e criação necessária de
26
articulação com a produção de sentidos sobre a Educação Ambiental20
. Pensando na
amplitude do que seria ambiental, podemos aqui considerar uma questão que diz respeito a
um conjunto de atores sociais, dentre eles os educadores. Porém, desde que se formulou o
termo “Educação Ambiental”, diversas foram as classificações e denominações que tentaram
explicar e dar sentido as práticas e reflexões pedagógicas relacionadas à questão. Muitas
discussões se fizeram pelo fato de caracterizarem a Educação Ambiental como formal, não
formal e informal; alguns até discutiram as modalidades da Educação Conservacionista, ao
Ar Livre e Ecológica; outros ainda, a Educação “para”, “sobre o” e “no” ambiente.
Um dos cenários que registra em grande parte uma dessas linhas de pensamento
(Conservacionista e ecológica), é o universo escolar, que utiliza como alternativa para a
inclusão da temática ambiental "a aprendizagem em forma de projetos".
Fig.7 e 8 – Projeto “Gentileza gera Gentileza” desenvolvido pela Escola Municipal Professor Ivan Rocco March
em 2013. Rio de Janeiro. Fonte: Rio Educa.
Na vertente da Educação Ambiental transformadora, o Educador Frederico Loureiro21
em suas construções teóricas, faz um contraponto às formas de entendimento da educação
ambiental como um conjunto homogêneo e distinto da educação. Muitos dos seus trabalhos
embasaram a formação pedagógica da equipe executora do Projeto REMA, já citado aqui.
20
Educação Ambiental é o nome que historicamente se convencionou dar às práticas educativas relacionadas à
questão ambiental. Assim, “Educação Ambiental” designa uma qualidade especial que define uma classe de
características que juntas, permitem o reconhecimento de sua identidade, diante de uma Educação que antes não
era ambiental. 21
Carlos Frederico Loureiro é biólogo, mestre em Educação e doutor em serviço Social. Atua há cerca de três
décadas em educação ambiental, tendo realizado trabalhos junto a diferentes setores sociais por meio de
instituições acadêmicas, instâncias governamentais (Ibama, Centro de Recursos Ambientais da Bahia, secretarias
de educação) e organizações como IBASE, IBAM, SENAC e SESC. É facilitador da Rede de Educação
Ambiental do Rio de Janeiro. Atualmente é professor associado da faculdade de educação da Universidade
Federal do Rio de Janeiro.
27
Vejamos que para ele a educação ambiental é uma perspectiva que se inscreve e se dinamiza
na própria educação:
“... formada nas relações estabelecidas entre as múltiplas
tendências pedagógicas e do ambientalismo, que têm no
“ambiente” e na “natureza” categorias centrais e identitárias.
Neste posicionamento, a adjetivação “ambiental” se justifica
tão somente à medida que serve para destacar dimensões
“esquecidas” historicamente pelo fazer educativo, no que se
refere ao entendimento da vida e da natureza, e para revelar
ou denunciar as dicotomias da modernidade capitalista e do
paradigma analítico-linear, não-dialético, que separa:
atividade econômica, ou outra, da totalidade social; sociedade
e natureza; mente e corpo; matéria e espírito, razão e emoção
etc.” (LOUREIRO, 2004, p. 66)
José Quintas22
, um dos principais estudiosos da Gestão Ambiental Pública no Brasil,
interpreta o artigo 225 citado acima, como defesa e preservação de um bem público,
considerado como “o meio ambiente ecologicamente equilibrado”, pelo Poder Público e a
coletividade. Neste sentido o modo de apropriação dos seus elementos constituintes, pela
sociedade, pode alterar as suas propriedades e provocar danos ou, ainda, produzir riscos que
ameacem a integridade desse “bem”. Segundo Quintas, a mesma coletividade que deve ter
assegurado o seu direito de viver num ambiente que lhe proporcione uma sadia qualidade de
vida, também precisa utilizar os recursos ambientais para satisfazer suas necessidades.
“Na vida prática, o processo de apropriação e uso
dos recursos ambientais não acontece de forma tranquila. Há
interesses em jogo e conflitos (potenciais e explícitos) entre
atores sociais que atuam de alguma forma sobre os meios
físico-natural e construído, visando o seu controle ou a sua
defesa.” (QUINTAS, 2002a).
Para a Educação Ambiental transformadora e emancipatória, a problemática ambiental
gira em torno do resultado obtido entre a relação da sociedade e natureza em dado momento
histórico. Análises sobre isso indicam a existência de dois tipos de relações interdependentes:
a dos seres humanos entre si (meio social) e destes com a natureza não humana (meio físico-
natural). Nesse sentido:
“... os seres humanos estabelecem relações sociais e por meio
delas atribuem significados à natureza (econômico, estético,
sagrado, lúdico, econômico-estético etc.). Agindo sobre ela (a
natureza) instituem práticas e alterando suas propriedades
garantem a reprodução social de sua existência. Estas
relações (dos seres humanos entre si e com o meio
físiconatural) ocorrem nas diferentes esferas da vida societária
(econômica, política, religiosa, científica, jurídica, afetiva,
étnica, etc.) e assumem características específicas decorrentes
do contexto social e histórico onde acontecem. Portanto, são
22
Servidor aposentado do IBAMA e formulador da Política Nacional de Educação Ambiental
28
as relações sociais que explicam as múltiplas e diversificadas
práticas de apropriação e uso dos recursos ambientais
(inclusive a atribuição deste significado econômico).”
(QUINTAS, 2004, p. 117).
29
4. O MEIO AMBIENTE E AS PESSOAS
“Atafona tu és bonita e sensual, ouço a noite os teus gemidos quando o mar embrutecido
arranca-te pedaços do pontal. Este mar neste delírio tem ciúme do teu rio.” - Jair Vieira
Atafona23
, conhecida historicamente pela erosão marítima e tradicional Festa de Nossa
Senhora da Penha24
, guarda em sua cultura muitas peculiaridades. Cenário de consideráveis
transformações “naturais”, revela através da oralidade pertinentes histórias entre o HOMEM e
a NATUREZA.
Conta à narrativa de São João da Barra que o município foi fundado por Lourenço do
Espírito Santo em 1630, um pescador, que acompanhado de sua família mais outros
companheiros de profissão, tomou rumo a fora a fim de “fazer a vida”. Vindo de Cabo Frio,
Lourenço liderou estadia no local que viria a ser o primeiro bairro do município, Atafona,
erguendo ao leito do Rio Paraíba do Sul algumas cabanas e a capela de Nossa Senhora da
Penha. São poucos, e arrisco dizer quase nada, os registros físicos que revelam essa história,
no entanto são os relatos “boca a boca” que traduzem e mantém viva a memória, aqui em
especial, da comunidade pesqueira, que até hoje habita o redor do Rio, nas localidades da
“Cehab e Baixada”.
Ainda sobre Lourenço e toda sua relação com os meios naturais, contam as “histórias
de pescadores” que seu filho e esposa foram levados pelo rio. Os discursos são muitas vezes
poéticos e revelam várias vertentes, a mais conhecida diz que, o filho do casal se afagou no
rio e dias depois ao chorar sua morte foi encontrado o corpo da mãe. Muitos acreditam que a
esposa do Pescador tenha se jogado águas à dentro, outros “romantizam” a história e afirmam
que o filho veio busca-la por saudade. O fato é que a figura do Rio Paraíba do Sul a partir
dessa história tomou muitos outros sentidos. Ainda criança, especialmente no âmbito escolar,
lembro-me perfeitamente de lendas locais contadas a partir desses símbolos: o rio, pescadores,
morte e figura feminina. No entanto, foi na experiência com Projetos ambientais que pude
afinar meu conhecimento sobre essas histórias, como por exemplo, a da “moça bonita do
mangue”. Dizem pescadores que a lenda se refere a uma mulher jovem que foi violentada e
morta no manguezal de Atafona prestes a se casar. Há quem diga já ter visto o “fantasma” da
23
Engenho de moer grãos, manual ou movido por animais; moinho, azenha. 24 Tal Festa ocorre desde 1879, no primeiro final de semana após a Páscoa, no balneário de Atafona.
A “Festa da Penha” pode ser pensada como um elemento aglutinador de três segmentos sociais distintos que se
mobilizam e se articulam em torno desse momento extraordinário da vida coletiva de Atafona. Pode ser
considerada, nos termos de Geertz, como um dos “planos da organização social” desse lugar. (BLASI CUNHA,
2007, p.35)
30
moça rondando pelo local com um vestido branco, e arriscam o palpite que ela busca o seu
noivo, por isso em especial os pescadores homens são os que mais visualizam a imagem.
Dona Nelite Moreira, como gosta de ser chamada, é a caranguejeira mais antiga da
região e também última moradora da ilha da Convivência25
. Tive a oportunidade de conhecê-
la em 2007, para entrevista do Projeto MarHumano, no entanto, na ocasião todo o registro
audiovisual gravado não foi autorizado pela mesma e não pode ser divulgado. Dona Nelite
alegava não gostar de exposição e preferiu não participar do documentário, mesmo sendo uma
das maiores referencias da história local. Enfim, em 2013 o Museu da Pessoa26
(SP), em
trabalho conjunto com o Projeto Rede esteve na região para captar histórias orais e mais uma
vez a caranguejeira foi indicada como personagem principal. Dessa vez, seis anos depois a
autorização foi dada e se fez registrado um dos mais detalhados contos da região:
“Esse mangue era o mangue da moça bonita, então veio um pessoal de fora fazer piquenique no mangue, assim,
no alto. Aí veio uma moça muito bonita aonde tinha um namorado. Esse namorado, muita gente, enganou a
turma, carregou ela pra lá pra dentro do mangue. Lá ele amarrou a moça num tronco de árvore: amarrou perna,
amarrou braço, fechou a boca - amarrada, tudo na árvore, encostou no pé de árvore e amarrou. Ali a moça ficou,
muito longe, ninguém escutava grito, boca tapada. E o povo aqui em terra. Eu sei que no alvoroço de muita
gente, eles foram embora. O rapaz também foi, o que era namorado dela, pra não dar na coisa que ele tava com
ela dentro dos manguezais, sabe? Aí o que ele faz? Ele vai embora e quando chegam lá na terra do povo, o ovo
dá por falta da moça. Perguntam pra ele: "Você não viu ela, não?”,“ Eu não, eu tava pensando que ela tava aqui
junto com vocês". Aí disseram: "Não, ela não veio". Aí voltaram pra trás, procuraram, procuraram e não
acharam. Nada de grito, nada, nada. Aí desenganados, foram embora. A moça com aboca amarrada ia gritar
como? Ali ela se acabou com mosquito, os bichos do mato, de caça e o maruim acabou com ela. Ela ficou no
osso pregado no coisa, toda amarrada. Ali ela se acabou. Aí botaram o nome deste mangue "O mangue da moça
bonita", é o maior caranguejo que tem. Nunca mais achou ela, nunca mais. E nós panhando caranguejo nesse
mangue à noite, era um Siriba, que isso aqui é uma Siriba. Era uma casca de Siriba onde tá aquela menina lá
naquele outro tronco lá, comprido, que essa Siriba caiu e se acabou lá mesmo. Então a casca ficou o fundo pro
Norte e a frente no Sul. Mas naquela casca dava muito caranguejo, nós de noite tava panhando caranguejo, e
quando nós olhamos lá pra dentro do oco da casca, nós vimos a cabeça dela e a canela das pernas. Menina, nós
corremos dentro desse mangue e arrebentemo todinha. Eu tenho marca até hoje no meu corpo! Largamo
caranguejo, largamo lamparina, largamos tudo! Saímos na queda dentro do mangue e o outro cá no átrio gritando
nós pra nós não se perder, eu e as quatro camarada. Nós ficamos a tempo de morrer. Eu disse: "Gente, pense em
Deus e vamos sair devagarzinho". O coco da cabeça da moça, deste tamanhozinho a cabeça da moça, e as
canelas das pernas. Agora os braços ninguém sabe, o bicho carregou, né? Aí eu sei que ela se acabou ali. Aí
25
Ilha fluvial na foz do Rio Paraíba do Sul, entre São Francisco do Itabapoana e São João da Barra/RJ.
Seu povoamento teria sido feito por náufragos de um navio holandês em meados do século XIX. Nos últimos
tempos a ilha tem sofrido com a ação furiosa do mar, que destruiu parte de seu território. Atualmente não possui
nenhum morador. 26
O Museu da Pessoa é um museu virtual e colaborativo de histórias de vida fundado em São Paulo, em 1991.
Desde sua origem tem como objetivo registrar, preservar e transformar em informação, histórias de vida de toda
e qualquer pessoa da sociedade.
31
botaram o nome "Mangue da Moça Bonita". Só trabalhava seis horas, que ela gemia da tarde, da noite,
escurecendo. Todo mundo sentia o gemido dela lá dentro do manguezal. Quando chegava meio dia não podia
trabalhar, era proibido; meia noite também era proibido por causa do gemido dela. Quem que entrava? Ninguém!
Ficava esperando passar as horas pra ir “panhar” o caranguejo, que era o lugar do caranguejo bonito. Foi assim, a
lenda é assim.”
Pode-se considerar que essa é uma lenda que ganhou destaque entre outras, porque
suas simbologias se fazem presentes na oralidade de uma comunidade que além de acreditar
na mesma, se identifica com a ligação “homem-natureza” presente na narrativa, como aparece
na figura do manguezal. Poesias, peças teatrais e até mesmo visitas guiadas destacam essa
relação.
Fig.9 – Imagem ilustrativa da “Moça bonita do mangue”.
Blog do Acruche, 2010.
Fig.10 - Visita guiada da palestra de Patrimônios
materiais e imateriais. Projeto Mulher
Ação/CHEVRON, 2014.
Outras histórias que perpassam por Atafona são: visita de Chico Xavier em 1967;
histórias da aparição de discos voadores em 1977; a energia das areias monazíticas; a história
do francês na ilha do Lima; a Ilha da Convivência (onde moraram os Muxuangos27
, habitantes
caiçaras únicos no Brasil, descendentes de piratas holandeses); a lenda da Capela de Nsa. dos
Navegantes e tesouros da navegação; histórias sobre os homens das máscaras de chumbo que
explodiram dinamites na foz do Paraíba por causa de experiências extraterrestres; local das
filmagens de Norma Benguel e Antônio Pitanga em “A garganta do mundo”, Sônia Braga em
“Gabriela , Cravo e Canela”, "Ruinas de Atafona" de Frederico Alvim ,"Atafona Por que?" de
Gilberto Pessanha e Freire e o clip Amor Marginal do artista pernambucano Johnny Hooker,
entre outros.
Diante de tantos acontecimentos, sem dúvida Atafona se tornou para São João da
Barra, um lócus de transformações socioambientais e, portanto, objeto de interesse de muitos
27
LAMEGO, Alberto Ribeiro. - Planície do Solar e da Senzala. Rio, 1934 "Muxuango e Mocorongo"
32
trabalhos acadêmicos também. Destaco aqui, “As formas de sociabilidade” observadas pela
antropóloga Juliana Blassi Cunha, no de que diz respeito a influencia dos “Campistas” 28
sobre esse lugar e suas práticas.
“As famílias da “sociedade” campista espalharam suas
residências de vilegiatura por espaços de Atafona que se
tornaram as suas ruas “principais”; impondo, assim, de
maneira marcante sua presença no balneário. Os moradores
de São João da Barra, que, antes mesmo do campista,
iniciaram a construção de casas nos arreadores da Estação,
parecem ter sumido ou se perdido, em meio a marcante
presença do campista. Os moradores locais, em sua maioria,
famílias de pescadores vindos da região e das vizinhas Ilhas da
Convivência e do Pessanha, instalaram-se no Pontal e em seus
arredores.”. (BLASI CUNHA, 2007, p.94).
Fig. 11 - Montagem extraída do site SJBOnline, na matéria intitulada
“Atafona: a eterna briga entre o homem e o mar” de 17/08/2012.
Entretanto, com tantas histórias e personagens “famosos” que desenham a cultura
local, há na essência do cotidiano de Atafona, indivíduos tão importantes quanto. Tomarei
aqui o papel de apresentá-los como ponto principal dessa pesquisa.
28 À distância em linha reta entre São João da Barra e Campos dos Goytacazes (ambas no Rio de Janeiro)
é 31.52 km, mas a distância de condução é 41 km. O interesse econômico de Campos pela saída para o mar de São João da Barra foi o elemento que, inicialmente,
estreitou a relação entre as duas cidades. Mesmo com a decadência do porto, no entanto, o campista continuou a
procurar as terras são-joanenses, mais especificamente, à localidade de Atafona. O interesse predominante, no
entanto, passou a ser as atividades ligadas à prática de vilegiautura. Desde fins do século XIX e início do XX,
algumas poucas famílias de Campos começaram a frequentar o balneário de Atafona “no verão”, seus meses de
férias. (BLASI CUNHA, 2007, págs. 43 e 44).
33
Pescadores artesanais e Marisqueiras:
Atafona é historicamente definida como primeiro povoado de São João da Barra pela
chegada de pescadores e é onde atualmente se localiza a Colônia de Pescadores Z-2, que
conta com 1660 pescadores cadastrados (conforme contato com a mesma). A pesca artesanal
de São João da Barra tem uma importância significativa na produção pesqueira do Estado do
Rio de Janeiro, garantindo uma produção mensal de 200 toneladas de pescado, conforme
dados da Secretaria Municipal de Pesca (BARRETO, 2014). Sobre as marisqueiras os dados
não são tão claros, porque o cadastro na Colônia de Pesca atualmente não garante o registro
da atividade perante o Ministério da Pesca, portanto, o número de registros da Instituição não
representa a quantidade real de trabalhadoras da região. Mas estima-se, pelas conversas e
visitas de Campo, que sejam em média 50 mulheres envolvidas na atividade, que em Atafona
se destinam especificamente ao descascar do camarão.
Dona Elenilce faz parte desse grupo profissional a mais de 25 anos e atualmente
trabalha com a filha que herdou e administra a atividade. Quando estive no campo com essa
família, pude visualizar um cenário de três gerações exercendo o ofício: Dona Elenilce, sua
filha Nilce, e a neta Julia de 12 anos. Nilce, atualmente grávida, compra o camarão dos
pescadores, um deles, seu marido, distribui entre as mulheres interessadas neste trabalho, e
por seguinte, empacota, lava e armazena o produto em casa, esquematizando a venda por
sistema de vizinhança (Onde pessoas conhecidas já são acostumadas a comprar). Ela paga
R$3,00 por cada quilo descascado.
Em conversa com esse grupo de mulheres, pude levantar algumas questões sobre a
categoria Meio Ambiente. Em uma das entrevistas, pedi a cada uma delas que relacionasse
para mim palavras chaves que para elas representavam esse termo. Das respostas, obtive algo
muito curioso. Apenas a Dona Elenilce, pessoa mais velha do grupo, respondeu-me com
bastante certeza a palavra “homem”, enfatizando: “É ele que provoca tudo de ruim, todo
mundo tem que fazer sua parte. Nós somos responsáveis pelo Meio Ambiente!” Julia, Maria
Aparecida e Nilce me responderam natureza, animais e plantas.
Adentrei no quesito informação e questionei sobre as possíveis fontes para assuntos
dessa “categoria”. Com exceção da Júlia que tem como fonte de informação a Escola, todas
me responderam que costumam “ouvir falar desse assunto” no rádio e na TV, e se consideram
informadas, entretanto, não o quanto gostariam. Ainda sobre conhecimento, perguntei quais
os assuntos que mais lhes interessavam. Dona Elenilce me respondeu que seriam as leis e
34
diretrizes ambientais, pois o homem fica sempre impune a essas questões, em sua opinião, já
Maria Aparecida e Nilce me disseram que se interessam por Projetos e Programas, apesar de
não visualizarem muitas ações desse tipo no município. Nesse momento perguntei se tinham
ouvido falar dos projetos “Rede”, “Pesca em arte”29
ou “Região do Petróleo”30
, Júlia me
respondeu que até conhecia jovens que participaram do Rema, mas que ela não sabia muito
sobre o tal. Mãe e filha, como também Mª Aparecida, me responderam que conheciam o
“Pesca em arte” e que participaram de um questionário produzido pelo mesmo. (O grupo não
me reconheceu como profissional associada a Projetos de Educação Ambiental).
Dona Elenilce prorrogou a conversa comigo e fez questão de dizer que “O Meio
Ambiente é a vida!”. Ao observá-la no trabalho minucioso de descascar camarão, debatemos
sobre o papel do ser humano para com esse “Meio”, no sentido de espaço e recursos naturais.
A marisqueira experiente, com muita clareza e fôlego em suas palavras, fez questão de deixar
claro para mim, que o homem faz parte do Meio Ambiente e não somente o usufruiu sendo
algo deslocado, como se costumou ouvir. Em suas palavras ela justifica que, “Se o Meio
Ambiente é vida, nós também estamos nele e somos ele, porque nós somos vivos! Se eu
destruo algo da natureza estou me destruindo, e se cuido, não estou fazendo „bem‟ a ele,
estou fazendo bem a mim mesmo”.
Percebi que a interpretação do que seja essa categoria, está muito associada com a
percepção individual de mundo e de como nos inserimos nele, como também a relação do
profissional que lida diretamente com o recurso natural. No caso da Dona Elenilce, talvez
pelo tempo de atividade, ela reconheça que não é somente o “preservar do rio” que garantirá a
manutenção da sua atividade. Em boa parte da sua narrativa ela coloca questões como a do
registro de pesca, por exemplo. E alega que sua maior indignação se deve ao fato, das
marisqueiras não serem reconhecidas formalmente como tais, e sim, como pescadoras, o que
para ela é uma ofensa, não pela atividade em si, porque a própria afirma já ter “puxado rede”,
mas sim pela identidade. Particularmente em seu caso, ela me diz com ar de tristeza, que já
29
A concepção e a implementação do Projeto PESCA EM ARTE são uma resposta à Linha de Ação A
estabelecida na Nota Técnica CGPEG/DILIC/IBAMA 001/10, que propõe a organização comunitária para a
participação na gestão ambiental, no âmbito do licenciamento, visando o desenvolvimento de processos
formativos junto ao público prioritário definido pelas diretrizes pedagógicas do IBAMA e identificado a partir
dos resultados do Diagnóstico Participativo do PEA-BC realizado entre 2011 e 2012. 30
A definição do tema, bem como a escolha dos municípios e dos atores sociais que configuram a proposta do
Projeto Região do Petróleo se fundamentam nos resultados do Diagnóstico Participativo realizado pelo PEA-BC
entre 2011 e 2012. Tal diagnóstico, entre outros aspectos, revelou que os royalties são um dos temas que mais
interessam a todos os grupos sociais que vivem nas áreas de influência dos empreendimentos petrolíferos que
acontecem na Bacia de Campos, com destaque para o fato de que esses grupos têm necessidade de dispor de
mais informações sobre o tema em pauta. Nesse sentido, a concepção e a implementação do Projeto Territórios
do Petróleo foram orientadas pela Nota Técnica CGPEG/DILIC/IBAMA 001/10, cuja Linha de Ação é a B.
35
teve muitas oportunidades de se registrar como “pescadora” (categoria reconhecida pelo
Ministério da Pesca), mas que essa não é a sua função, e que entende como necessário o
reconhecimento de uma atividade muito específica, exercida por ela e tantas outras mulheres
da região.
Fig.12 - Do fundo: Lenilce, à direita Dona Nilce, abaixo
Júlia e Maria Aparecida. Cehab, 2015. Fig. 13 – Dona Elenilce descascando camarão. Cehab,
2015.
Dona Claudia e Sr. Oniel, são casados há 40 anos e sempre foram moradores de
Atafona. Tive a oportunidade de conhecê-los no Projeto Rema, por trabalharem como
diaristas em serviços de manutenção do Espaço físico do projeto. Dona „Clau‟, como
carinhosamente é chamada, já trabalhou com um pouco de tudo em sua vida, desde
empregada doméstica à marisqueira. Atualmente devido aos problemas de saúde para evitar
maiores esforços ela se mantém com o trabalho temporário no Projeto e administra a atividade
marinha com o marido, que além de continuar pescando, adquiriu uma formação em
marinheiro de convés. Juntos herdaram uma barca e terceirizam o serviço de transporte fluvial
para o município de São Francisco do Itabapoana.
Morador do antigo Pontal em Atafona e pescador desde os 12 anos, Sr. „Niel‟ me diz
logo no inicio da conversa que nunca deixou de pescar e que o único período de sua vida que
trabalhou com outra coisa, foi mais ou menos em 2013, quando recebeu uma oportunidade no
Porto do Açu, com trabalho braçal.
Quando pergunto aos dois sobre o que pensam do “Meio Ambiente”, Sr. Niel fica
pensativo, mas Dona Clau logo responde: “Meio ambiente é pra cuidar! Não jogar lixo no rio,
não cortar as árvores...”, para completar, o marido diz “Os pescadores cuidam muito do meio
ambiente, a gente sempre toma cuidado com o lixo no rio, que já não está como antes... Se
não acaba de vez o peixe!”. Para problematizar um pouco mais a situação, eu proponho que
eles relacionem meio ambiente com alguma palavra que para eles sejam afim ao termo, e
36
como resultado, ambos dizem: “difícil né!?” - Esboçando um leve sorriso... Mas, acabam
pensando um pouco e colocam como resposta: PROTEGER, CUIDAR, A NATUREZA, O RIO.
Assim como o grupo de marisqueira, questiono sobre onde eles escutam falar sobre
esse assunto, e logo Dona Clau coloca que o radio local sempre divulga noticias relacionadas
aos problemas dos pescadores, como recentemente o assoreamento do rio. Sr Niel confirma
esta informação e me diz que eles (os pescadores) sempre relatam em grupos de conversa
sobre os problemas com a natureza e a escassez do pescado.
Na conversa surge também o assunto sobre, “De quem é a responsabilidade sobre o
Meio Ambiente?”, em concordância ambos me dizem que é o homem, porque o homem
destrói o Meio Ambiente! Mas, ao final Dona Claudia me diz que as pessoas poderiam fazer
mais e que a “prefeitura” não dá assistência como deveria, se referindo aos problemas
ambientais já ocorridos na região, como por exemplo, a erosão marítima e a chegada do Porto
do Açu.
Sr. Niel não é o único que diante do cenário oscilante da atividade pesqueira, optou
por aceitar oportunidades profissionais do empreendimento. Esse assunto permitiu-me
conhecer mais desses personagens reais e adentrar indiretamente no sentido da categoria Meio
ambiente.
Sêo Manoel José e o Flávio, conhecido como Flavinho, também são pescadores natos
e moradores das comunidades Cehab e Pontal. Conhecido pela participação no documentário
Maragado, Flávinho não escondeu o reconhecimento ao lembrar-se da entrevista feita por
mim no projeto Humanomar em 2007. Confesso que esse fator influenciou positivamente no
desenvolver da entrevista.
No inicio, quando perguntei sobre o “Meio Ambiente”, Sêo Manoel ficou preocupado
em me dar uma “resposta adequada”, mas logo falou: “Meio ambiente pra mim é limpeza
dentro da água, não é?”, tentando deixa-lo à vontade, ponderei que diante da minha pesquisa
não existia certo ou errado, que o que importava para mim naquele momento era como ele
entendia o MEIO AMBIENTE.
No decorrer da conversa, em meio a varias reclamações sobre a sujeira no Rio Paraíba
(que deságua em Atafona), o Sêo Manoel me disse que além dos pescadores não cuidarem do
lugar que pescam, até as mulheres que moram naquela região jogam todo o tipo de lixo dentro
do rio. Ele me contou que há sim alguns amigos pescadores que se preocupam com essa
questão, mas que são poucos em vista de tantos que trabalham com isso. Ele ainda comparou,
citando o Norte do Espírito Santo como um lugar “limpinho”, dizendo que lá existe a Policia
Federal que fiscaliza a poluição no mar. Nesse momento, eu perguntei se essa figura (Da
37
Policia Federal) que ele citou, representava o Meio Ambiente para ele, e recebi resposta
positiva, acrescentada pela justificativa de “se eles estão cuidando do ambiente, é bom sim”.
Para complementar a conversa, pedi ao Senhor Manoel que me dissesse algumas
palavras chaves em relação ao Meio Ambiente, como havia feito com outros entrevistados.
Depois de ficar pensativo, o pescador me respondeu que “tem a ver com o ser humano”, sem
muitas justificativas. E que na opinião dele, os Projetos deveriam fazer algo para cuidar disso
(se referindo ao problema da poluição). Nesse momento, questionei se os Projetos
representavam o Meio Ambiente, e como resposta, ouvi que sim.
“Onde o Senhor ouve falar sobre esse assunto, Meio Ambiente?”, questionei. “É na
televisão, nas reportagens, nos jornais. Lá eu vejo sobre a conservação”. Seu Manoel até citou
algumas tragédias, como poluição, derramamento de óleo, e o desastre de „Mariana‟.
Iniciando a conversa com o Flavinho, que pesca desde seus 15 anos, descobri que
desde 2013 ele começou a trabalhar no Porto do Açu, depois de ter feito um curso de
marinheiro de convés, e abandonou o oficio de pescador como profissão. A partir disso
perguntei a ele o porquê dele estar ali fazendo a rede, e ele me respondeu dizendo que estaria
no seguro desemprego, aguardando outra vaga, e que sempre que pode se junta aos amigos
para ajudar com os materiais de pesca. Quando inicio o assunto sobre o Meio Ambiente,
diferente do Senhor Manoel, o Flavinho fica mais nervoso e até chega a dizer que não sabe
sobre o tema. Com influencia do Senhor Manoel, aos poucos o pescador começa a se sentir à
vontade e me responde algumas coisas:
Ele me diz, assim como seu amigo, que o ambiente é o rio, e está muito sujo.
Confirma também que são os próprios pescadores que jogam o lixo. Diz-me, em relação às
palavras chaves, que meio ambiente é natureza. Em meio a isso ele coloca que sabe pouco
sobre o assunto e que é preciso cuidar do que se têm (dando a entender sobre o recurso
natural).
Aproveitando o contexto do Porto do Açu, questiono a ele se em seu tempo de
trabalho viu ou ouviu falar sobre esse assunto embarcado. Ele diz que sim, que lá muitas
pessoas trabalham com proteção do mar, com segurança, com separação do lixo... E que há
sempre uma equipe fazendo palestras. Pergunto se na opinião dele isso é importante, com
expressão de certeza ele me diz que sim.
38
Fig. 14 – Flavinho e Sêo Manoel. Cehab, 2015.
Fig. 15 – Píer dos pescadores, Cehab, 2016.
Em reflexão sobre o sentido amplo da palavra meio-ambiente, e por seguinte da
categoria estabelecida à mesma, aqui já apresentada nos termos técnicos, tomei-me a pensar
sobre os sentidos práticos que essas pessoas (descritas acima) dariam a essa construção. O
papel de “conservação” é a informação mais aparente nos depoimentos e no que se percebe, é
produto de um contexto intencional de “culpabilização”31
, por isso pescadores e marisqueiras
sentem-se muitas vezes muito mais culpados de certas coisas, do que são. O discurso é algo
identificado por mim, muito pertinente nas relações dadas a partir da categoria Meio
Ambiente;
Jovens filhos de pescadores/marisqueiras:
Não há dados oficiais que registrem o número atual de filhos de pescadores entre 12 e
21 anos em Atafona. Faixa etária da pré e adolescência, também juventude. Por isso, gostaria
de considerar os dados que tive acesso até o momento no Projeto Rede, que particularmente
trabalha com a organização comunitária de jovens da comunidade pesqueira.
Desde o início de 2013 o Projeto vem atuando na mobilização desses atores sociais, no
entanto, os resultados nem sempre são positivos, pois além de ser um grupo
consideravelmente pequeno, e faixa de evasão é grande. Muito se deve à necessidade de
conciliar trabalho e estudo, como também à cultura local de participação social.
Podemos considerar a partir de 2013, um número de 100 jovens entre essa idade que
possuem ligação direta com a atividade de pesca, ou seja, filhos, netos, sobrinhos ou até
mesmo jovens pescadores, de acordo com dados do REDE. Mas, o que cabe aqui, é que desse
número, pude observar mais de perto três jovens com perfis completamente diferentes.
31
Ação de culpabilizar, colocar a culpa em alguém.
39
Jorge Victor, atualmente 16 anos, é morador da Vila Esperança, bairro vizinho à
Cehab também em Atafona, mas passou a maior parte da sua vida na região da Baixada
(Pontal). Filho de pescador e dona de casa, vive os conflitos de pais separados. Atualmente
cursa o ensino fundamental em escola pública. Vitor frequenta as atividades do Projeto Rema
desde 2014.
Cristina Nascimento, 16 anos, é moradora do Centro, distrito sede de São João da
Barra. Caçula entre três irmãos, nasceu num contexto não esperado para seus pais, mais de 10
anos do segundo filho. Seu pai é pescador “de rio” aposentado e sua mãe ex-gari. A jovem
estuda ensino médio técnico no Instituto Federal Fluminense de Campos e possui uma página
de poesias em rede social. Ingressou ao Projeto Rema em 2015.
João Julio, vulgo Julinho, é um adolescente de 12 anos que mora na comunidade da
Cehab. Estudante do ensino fundamental público e filho de pescador, sonha em dar
continuidade a atividade do pai, como também se tonar um marinheiro de convés. Nunca
participou de nenhum projeto de Educação Ambiental.
As conversas com os jovens se deram naturalmente durante todo o processo de
atividade do Projeto Rede, no entanto cabe aqui enfatizar, que a relação pessoal para com eles
é algo opcional e neste caso muito clara e evidente, visto que o papel “Articuladora” para
mim, nunca supriu os contatos de “moradora”, aqui mais especificamente “jovem” (categoria
de descrição do Projeto para com os participantes), por isso fiz-me bem próxima dos jovens
do projeto e durante esse tempo pude observar muitas questões pessoais e comportamentais,
mesmo num primeiro momento não os tendo como interlocutores.
Para Jorge Victor, em sua maneira excêntrica de ser, Meio Ambiente sempre foi
“cuidar” de algo muito importante, em suas falas ficam claras as considerações que ele faz ao
sentido de preservação. “Ambiente é preservar a natureza, é cuidar do rio, é não desmatar, não
jogar lixo.”, para ele o papel do homem se faz presente na manutenção desses recursos
naturais, visto que, em seu ponto de vista, a vida humana é dependente dos mesmos. Em
conversas e questionamentos diretos sobre a categoria, o jovem apresentou algumas reações
desconfortáveis, como por exemplo, pedir um tempo para pensar sobre o assunto e até mesmo
dizer que não saberia responder. No entanto, suas respostas orais sempre foram às mesmas. O
que aqui gostaria de destacar e considerar gira em torno das “respostas indiretas”, aquelas que
pude perceber durante algumas atividades do projeto, principalmente nas saídas de Campo.
Apesar de não ter sido criado com o pai, Victor sempre vivenciou muitas atividades do
ofício, e até já arriscou pescar e consertar rede. Sua ligação com o lugar (Atafona) e a
profissão de pesca é algo totalmente visível. Em uma das atividades extras propostas por essa
40
aprendiz de etnógrafa que aqui vos narra, foi composta por uma Oficina de Fotografia, onde o
jovem Jorge Victor se destacou claramente em sua sensibilidade e percepção com o “meio”.
Os detalhes fotografados pelo jovem e o comportamento diante da atividade, traduziu para
mim, toda a compreensão e leitura que o jovem fez e faz do “seu” lugar. Por que sim, há de
notar um espírito de pertencimento. Em muitas postagens em rede social o jovem manifesta
sua tristeza pela transformação do Pontal, localidade que sofre constantemente com a erosão
marítima e já apresenta um índice de mais de 200 casas tomadas pelo mar, uma delas a do
Jorge Victor.
Fig.16 – Postagem do Jovem Victor Hugo em
rede social após a atividade de Fotografia do
projeto Rede. 2014
Fig. 17 – Uma das fotografias obtida pelo jovem na
Oficina do Projeto Rede. 2014
Cristina, jovem também já apresentada acima, narra uma história muito peculiar em
relação à atividade do pai e consequentemente sobre o “Meio Ambiente”. Nascida num
cenário financeiro muito difícil para a família, Cris assim como sua mãe, contam que muitas
escolhas de suas vidas precisaram ser tomadas pelos chefes desse lar, incluindo a situação
profissional. Dona Rose era doméstica no período do nascimento da filha não trabalhava fora,
em compensação, o seu esposo, pescador por mais de 30 anos se encontrava numa posição
conflituosa em relação ao seu ofício, principalmente pela sua idade, pelas dificuldades da
profissão e também pela escassez do pescado. Por isso, com muita emoção e orgulho, a
41
Cristina conta-me, que o pai buscou outra profissão, pensando no seu bem estar e futuras
dificuldades que voltariam a passar com o cenário incerto de sua atividade. Sendo assim,
ambos começaram a trabalhar numa empresa de limpeza Pública, e a pescaria fora
abandonada pelo Seu Adriano. Lembrando que essa é uma família localizada no Centro de
São João da Barra e na época pertencente ao grupo de pescadores do Rio Paraíba do Sul, que
se instalam até hoje na “Beira Rio”, local próximo ao Cais do Imperador, diferente no sentido
de vulnerabilidade dos pescadores da Cehab ou Pontal já descritos aqui.
Desde meus primeiros contatos com essa jovem-mulher, poeta, carismática e muito
madura, percebi que sua criação é minuciosamente pautada na simplicidade da compreensão
sobre o que é vida, passada pelos seus pais. Em uma das conversas que tive antes de
introduzir diretamente o objeto que me interessava, Cris pôde me contar que mesmo que seu
pai não pescasse mais e ela não tenha vivenciado diretamente o manejo dessa profissão, ela
conseguia sentir e entender completamente a relação entre o pescador e o recurso natural,
porque Seu Adriano sempre fez questão de conta-la suas histórias e fazer com que a filha
reconhecesse e entendesse a importância dessa atividade.
Cristina escreve muito bem, pois possui uma afinidade com a literatura. Minha
conversa em relação ao que seria Meio Ambiente para ela se materializou através da rede
social, pela falta de tempo comum entre nós. De uma maneira romântica, posso dizer, que
todas as suas palavras traduzem para mim claramente, a relação histórica pessoal que ela criou
para enxergar o mundo. Quando perguntado: “O que é Meio Ambiente para você?”, ela
respondeu: “Meio ambiente pra mim é a fonte de vida que me alimenta, juntamente com
Deus. Entendo como algo do qual eu preciso, mas não cuido por apenas necessitar. Cuido
porque eu amo, de verdade. Eu amo a natureza, e todas suas fases, todas suas faces. Por isso
lamento tanto essa destruição em massa do bem maior que nos sustenta.”.
Posso compreender dessa fala que há uma perspectiva de algo não somente simbólico
e característico da ecologia, como ouvimos muitas vezes, mas também ligado ao poder
imaterial, que ela mesma relaciona com o divino. Muito curioso por que nesse primeiro
momento pude perceber que a jovem constrói um pensamento de “receptora” de algo, como
podemos ler em “que me alimenta”, colocando-se fora desse “Meio Ambiente”. No entanto na
segunda frase, fica claro uma relação de troca, de algo que ela usa e precisa devolver. Quando
leio “apenas necessitar”, interpreto como a maneira de dizer que existe uma realidade de
mundo que depende dessa categoria, mas que não a reconhece como deveria e, portanto só
age como manutenção de algo que garante sua sobrevivência, no entanto, ela expõe que
42
particularmente pratica um sentimento de afeto (comparado até com amizade) por esse “Meio
Ambiente”, e que cuidaria independente de explora-lo.
Interessante quando ela traz a questão de “fases e faces”, porque respectivamente
significam etapas de algo em desenvolvimento ou que sofre sucessivas alterações e um dos
lados de um objeto ou coisa. Ou seja, há um entendimento que esse “Meio Ambiente” faz
parte de um processo muito mais amplo do que podemos imaginar e que ele é inconstante e
ilimitado. Ao final dessa primeira resposta ela qualifica mais uma vez essa categoria como
algo à parte do indivíduo, quando se refere ao bem maior que nos sustenta.
Peço para que defina esse termo em palavras chaves e ela apresenta: reflexo de Deus,
sustento humano, fonte de vida. Comparações diferentes com outras interpretações aqui
ilustradas.
Minha segunda pergunta remete a relação entre ela e esse “Meio Ambiente”: “Sempre
quis estabelecer uma relação muito estreita com o meio ambiente, e o fiz. A destruição dele
me dói na alma, e sua beleza é motivo certo do meu riso. Somos quase que amigos, por assim
dizer”, muito curioso porque ela compara com uma amizade, e de seus significados há uma
interpretação que compreende bem o que ela realmente quis dizer, “Aceitação mútua acerca
de alguma coisa: acordo de amizade”.
Dando continuidade a conversa, pergunto onde ela escuta falar sobre esse assunto, e
confirmando as informações citadas acima, me responde somente que sua relação com o
“Meio Ambiente” advém das narrativas contadas pelo seu pai, caracterizada como “histórias
de pescador” e completa que esse foi seu contato mais aprofundado com o assunto.
Posso então concluir aqui, que se qualifica como conhecimento para essa jovem aquilo
que remete ao saber prático, de uma profissão que lida diretamente com a matéria e espaço
natural. E que através da oratória se constrói uma percepção individual de algo.
Para finalizar, busco relacionar esse assunto com sua participação no Projeto de
Educação Ambiental que se denomina REDE de ESTUDOS PARA O MEIO AMBIENTE e
ela me diz que: “Meu entendimento sobre meio ambiente sempre foi bastante consolidado e
até bem afetuoso. O REDE me deu mais conhecimento sobre questões socioambientais,
técnicas, burocráticas, e sobre tantas outras coisas que nem poderia enumerar. Mas sobre meu
conceito de meio ambiente não alterou em nada. Nem acho que algo seria capaz de alterar”.
Fica claro em meu ponto de vista que há uma divisão entre aquilo que se vive no real e
aquilo que se materializa ou interpreta da realidade. Essas interpretações permeiam por
categorias técnicas e questões práticas.
43
Para Julinho, de uma forma geral a categoria “Meio Ambiente” está relacionada com a
importância da atividade pesqueira para sua vida. Em seu depoimento fica claro o sentimento
de pertencimento e valorização dado a profissional do pai. Nesse caso, não questionei
diretamente sobre o termo aqui proposto. A conversa ocasionada por uma situação específica
do meu trabalho no Rema, me proporcionou um depoimento incrível, posso dizer.
Ao entrevistar o pescador “Batista”, pai do Julinho, conversávamos sobre a
importância da atividade no município, quando o jovem se fez presente. Claramente
interessado no assunto, Julinho tomou para si todas as questões relacionadas ao oficio da
pesca e declarou com propriedade sua opinião, deixando a equipe e principalmente essa
estudante de Ciências Sociais, totalmente surpresa com a sua maturidade.
Dentre os assuntos relatados, o jovem respondeu que a atividade pesqueira é um dos
trabalhos mais antigos da região e que o considera importante, por que, muitas famílias são
sustentadas a partir dele. Disse-me que os pescadores valorizam sua atividade porque é um
oficio passado de pai para filho e, portanto a única opção profissional encontrada por eles.
Julinho relata que os filhos de pescadores não costumam “querer pescar” porque almejam
uma profissão mais fácil e com maior retorno financeiro, no entanto, com expressão de
orgulho me diz que, também é uma questão de “gosto” – “não é pra qualquer um não, tem
aqueles que não levam jeito, nem aguentam subir no barco”, diz o jovem. Julinho relata que já
tem sua “tripulação” e que não vê a hora de se tornar maior de idade. Questiono sobre quem
são esses “tripulantes” e ele me responde que são seus primos, também filhos de pescadores.
Nesse momento o aprendiz de pescador ressalta que, “Pra se interessar pela pesca tem que ser
filho de pescador. Se não, não adianta não! Eles até tentam pescar pra ganhar um dinheirinho,
mas só quem é filho quer ficar.”.
Sêo Batista já tem um barco em construção para o Julinho e me contou que só deixa o
filho ir pescar em época de férias e finais de semana. Afirma que a vontade veio do filho e ela
“faz gosto”, mas nunca o obrigou. Até relata sobre seu primogênito de 22 anos que foi poucas
vezes para o mar e não seguiu a profissão. Emocionado o pescador conta-me que o filho
caçula é um orgulho e já possui todos os saberes do trabalho artesanal, inclusive o manejo do
barco.
Para além da aptidão pela atividade pesqueira, Julinho mostrou-se informado quanto
aos problemas e apontamentos da classe. Ao perguntar sobre participação em Espaços de
Controle Social, ele deixa claro em sua resposta que já participou de reuniões com o seu pai
por interesse próprio, principalmente sobre a questão do assoreamento do Rio Paraíba do Sul,
44
colocado impressionantemente por ele, como maior problema vivenciado atualmente pelos
pescadores de Atafona.
Por fim, pergunto: “Em sua opinião, qual o futuro da pesca em São João da Barra?” e
ele responde-me: “Se não resolverem essa questão da „Boca da Barra‟ (assoreamento) os
pescadores não terão como pescar não e a situação vai ficar muito ruim. Fazer outro caminho
por Gargaú ficaria muito complicado e caro”.
Marcou-me desse encontro a seguinte colocação do jovem: “Ainda bem que ainda não
se aposentou (referindo-se ao pai), pois tenho ainda tenho muito a aprender com ele”.
Interessa-me pensar que jovens como Jorge Hugo, Cristina e principalmente Julinho,
mesmo não sendo maioria, valorizam a cultura dos pais e tomam isso com parte de uma
cultura local. Essa percepção e sentido de pertencimento não é algo que se deve diretamente a
Projetos ou Programas de Educação Ambiental, é uma construção pessoal, por isso me refiro
a eles como exceção. Porém, são estes formatos de condicionantes que apresentam
oportunidades de conhecimento teórico e prático sobre a participação e controle social, o que
na maioria das vezes desperta em jovens como estes o “olhar mais apurado” à sua realidade.
Na fala da Cris encontrei uma certeza de que muitas vezes resistimos ao conhecimento
e que a liberdade de compreensão também é algo construído, muitas vezes pelos nossos pais,
dentro de casa... Entender uma categoria como essa pelo viés daqueles que não a categorizam
é dar espaço a algo que não precisa ser milimetricamente definido ou constante.
45
5. CONCLUSÃO: O LUGAR DO DISCURSO E LUGAR DAS PRÁTICAS
Para Foucault em A Ordem do Discurso (1970), o discurso atravessa todos os
elementos da experiência, pois ele aparece em todo conjunto de forma que comunica um
conteúdo, qualquer que seja a linguagem à qual pertençam. O que mais me desperta nessa
análise é o papel que o conteúdo dos discursos desempenha na ordenação do mundo, aqui
consideremos o Meio Ambiente e a Teoria como um deles: um discurso dominante tem o
poder de determinar o que é aceito ou não numa sociedade, independentemente da qualidade
do que ele legitima. O discurso dominante não está comprometido com uma verdade absoluta
e universal. Pelo contrário, é ele que produz a verdade (logo, esta é arbitrária), que legitima
certo campo de enunciados e marginaliza outros - num processo que o autor chama de partilha
da verdade.
Seguindo a relação de poder e discurso apresentada por Foucault, interessa aqui
compreender, que haverá sempre um discurso acima do outro; haverá sempre um discurso
constrangendo os demais a se restringirem à verdade que ele impõe. Portanto, não importa a
substância daquilo que um discurso pronuncia, e sim o seu posicionamento nessa malha de
tensões sociais. No caso de comunidades pesqueiras, por exemplo, não é difícil notarmos
esses cenários, basta compreendermos o processo de utilização do recurso natural e seus
desencadeamentos.
“Essas produções de verdades não podem ser dissociadas do
poder e dos mecanismos de poder, ao mesmo tempo porque
esses mecanismos de poder tornam possíveis, induzem essas
produções de verdades, e porque essas produções de verdade
têm, elas próprias, efeitos de poder que nos unem, nos atam.” (FOUCAULT, 1977/2003: 229)
Diante da construção teórica da categoria Meio Ambiente e das interpretações e
vivências aqui apresentadas por pescadores, marisqueiras e também alguns jovens
pertencentes a esse grupo, podemos compreender que há uma ideia e percepção formatada
pelas diretrizes da Educação Ambiental majoritária, ou seja, aquela Educação Ambiental
ecológica e conservacionista que ainda dita um discurso preponderante sobre esse contexto. É
esse discurso contrário a Educação Ambiental transformadora e emancipatória, que
condiciona atores sociais como estes apresentados aqui e em muitos outros trabalhos, em
“predadores” do seu próprio território, e não pertencentes a uma sociedade “perfeita”.
Discurso também que classifica, apropria e organiza os espaços socioambientais desses
46
indivíduos, como podemos notar no histórico das instituições responsáveis por essas questões
no Brasil.
O IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis) foi criado em 1989, com a promulgação da Lei nº 7.735. Segundo o canal
informativo da Instituição, antes havia várias áreas que cuidavam do ambiental em diferentes
visões, muitas vezes contraditórias.
Com a fusão de vários Órgãos, legitimou-se como atribuições do IBAMA, exercer o
poder de polícia ambiental, executar as ações das políticas nacionais de meio ambiente,
referentes às atribuições federais, relativas ao licenciamento ambiental, ao controle da
qualidade ambiental, à autorização de uso dos recursos naturais e à fiscalização,
monitoramento e controle ambiental; e executar as ações supletivas de competência da União
de conformidade com a legislação vigente. (NR). Conforme Lei nº 11.516, de 28 de agosto de
2007.
Como podemos observar no trabalho sobre Diferentes percepções da natureza, de
VALPASSOS & COLAÇO; 2006, no caso do DNOS (Departamento Nacional de Obras de
Saneamento), o que se apresentava era uma cosmovisão antropocêntrica, onde as reformas
empreendidas na natureza visavam à correção da natureza e, por consequência, o
aperfeiçoamento do capital humano nacional. Assim, a natureza era algo que deveria ser
controlada, racionalizada e transformada em função do welfare e do progresso da população
brasileira. Ainda neste trabalho, a atuação do IBAMA, por sua vez, apresenta outra
perspectiva, onde a preservação da natureza constitui o principal objetivo a ser alcançado. O
foco é uma apropriação racional dos recursos naturais, de modo que as gerações futuras
possam vir a usufruir deles. Estabelece-se, dessa forma, outro projeto, onde os recursos
naturais são entendidos eles próprios como bens nacionais.
Por isso, é notável perceber nos pescadores artesanais, uma atitude de resistência e,
muitas vezes, de confronto diante das Políticas Ambientais. Em Ponta Grossa dos Fidalgos –
povoado situado às margens da Lagoa Feia na região norte fluminense –, por exemplo, as
políticas públicas [...] foram sempre arcadas por um sentimento de desconfiança dos
pescadores em relação às agências governamentais. (Valpassos; Colaço; 2006).
A política pública do seguro defeso já há algum tempo vem sendo pauta de discussões
sobre o conhecimento prático e teórico, e inúmeros são os trabalhos que descrevem o
sentimento dos pescadores em relação a isso. O conhecimento sobre a época de reprodução
das espécies e definições técnicas para esses períodos demarcam claramente a posição do
discurso citado acima. Dessa forma, os pescadores conseguem manifestar “um saber que não
47
encontra mais vestígios onde apoiar-se” (Vogel & Mello 1985:21). Além disso, nada (ou
quase nada) do que os pescadores e/ou marisqueiras dizem ou praticam é incorporado nas
políticas de gestão destes ecossistemas. Portanto, eles se veem no “direito” de criarem um
modo próprio de interagir no ambiente. Isso só acontece porque eles não se enxergam nas
regras de "preservação" ou quando se enxergam, conforme já citado acima, se veem como
"predadores”.
Tanto em Atafona como em Ponta Grossa dos Fidalgos, resistir e enfrentar condições
técnicas não são simplesmente disputas de poder, leva em conta à compreensão de um espaço
social dado e ocupado por determinado grupo. O IBAMA encontra a resistência dos
pescadores na aceitação de suas normas, pois estes não concordam que o período de defeso,
estabelecido na Portaria nº. 71 seja correto para todas as espécies, o que faz com que a
atuação do órgão se assemelhe, muitas vezes, mais a repressão de sua atividade do que a
preservação de seus próprios interesses. (Sobre pescadores da Lagoa Feia; Valpassos e
Colaço, 2006). Portanto, pescadores interpretam a ação de transgredir uma regra não como
uma mera infração, mas como uma forma de agir sobre regras exógenas não legitimadas pelo
seu grupo social. (Um estudo sobre a comunidade pesqueira de Atafona; Falcão 2014). Nota-
se então que:
“... historicamente, as normas jurídicas são formuladas em
instâncias aparentemente desconectadas das práticas que
constituem os sentimentos morais das sociedades. Portanto, a
distância entre as normas (oficiais) e as práticas (sociais)
pode, em muitas situações concretas, gerar tensões,
constrangimentos, desacordos, e conflitos entre grupos sociais
estabelecidos e órgãos ligados à administração da vida
pública.” (DIAS NETO; 2015).
Seguindo adiante sobre as diferentes percepções da natureza e o “espírito” muitas
vezes personificado que os recursos naturais ganham nesses modos de vida, podemos dizer
que, as orientações do IBAMA difundiram entre os pescadores uma série de ideias que
enfatizam a necessidade de preservação dos recursos naturais, como podemos notar
subjetivamente nas falas dos entrevistados; portanto aquilo que pode ser dito ou feito em uma
sociedade é definido por critérios muito mais arbitrários que propriamente orientados por um
significado maior, uma fundamentação conceitual sólida. Importa apenas o que o discurso
dominante estabelece como verdade, em favor de sua manutenção.
Podemos perceber que o discurso é algo que sustenta e pode ser sustentado pela
ideologia de um grupo ou instituição social. Em outras palavras, o discurso é baseado em um
conjunto de pensamentos e interpretações resultantes da posição social desse grupo ou
indivíduo, o que permite a relação de ambos com a sociedade e seus interesses.
48
E foi pensando nessa relação que me deparei com a Topofilia. Um termo usado para
explicar "o elo afetivo entre a pessoa e o lugar ou ambiente físico", também trabalhado pelo
Geógrafo Tuan, este é um conceito que relaciona sentimentos com a construção do espaço,
enfatizando as relações entre a cultura e o ambiente natural, e o que o lugar pode simbolizar.
Foi na leitura dos trabalhos do Tuan e interpretando as histórias que vivi e ouvi em Atafona,
que compreendi que este é um elo fortemente presente na identificação dos moradores com o
lugar e no conhecimento pessoal de cada um em relação ao que representa Atafona e a
atividade pesqueira. O pescador, por exemplo, descreve um sentimento de afetividade e
lembranças íntimas produzidas pelo meio ambiente natural, que dá sensação de abrigo. Yi-fu
Tuan (1974) define que a topofilia assume muitas formas e varia muito de amplitude
emocional e intensidade. Certos meios ambientes naturais têm figurado de maneira
proeminente nos sonhos da humanidade de um mundo ideal (ou “perfeito” como apresentado
aqui): a floresta, a praia, o vale e a ilha. O que facilmente percebe-se na fala desse grupo em
relação ao Rio Paraíba do Sul.
O que mais me chama atenção no trabalho de Tuan, são as ligações afetivas evocadas
pelo ambiente e que transformam um espaço em lugar, os sentidos que os sentimentos dão
sobre aquele espaço. Nas falas dos pescadores, moradores da região e também das
marisqueira de Atafona, compreende-se bem essa relação através da memória, principalmente
dos trabalhadores e moradores mais antigos. Não somente o Rio Paraíba do Sul, mas todas as
histórias da Ilha da Convivência e do Pontal contam muito sobre o território e explicam bem a
construção sobre Meio Ambiente para essas pessoas, tão como as relações entre a cultura e o
ambiente natural, e o que o lugar pode simbolizar (WARF, 2006, p.234).
Em outra obra do Tuan, nomeada “Espaço e Lugar” de 1977, o autor procura teorizar
sobre o sentir e pensar o espaço – perspectivas da experiência humana. Ele demonstra como o
antropocentrismo32
do lugar, constantemente reforçado através das experiências cotidianas,
conflita não só existencialmente, mas também epistemologicamente com o rarefeito conceito
espaço. O autor expõe a constante relação dialética entre homem e lugar, onde o segundo seria
uma construção puramente humana – visto que objeto (espaço-ambiente) se revelaria sujeito
(lugar) e que os significados decorrentes dessa ligação conduziriam as ações humanas. Sendo
32 Ideia surgida na Europa do fim da Idade Média, que considera o Homem o centro do cosmos. O
antropocentrismo sugere que o homem deve ser o centro das ações, da expressão cultural, histórica e filosófica.
49
a natureza do lugar e do espaço relativa, variaria de acordo com a experiência ambiental em
seus muitos matizes: cultural, social e histórico.
Sendo assim, pode-se compreender que apesar dos seres humanos serem dotados de
órgãos sensoriais comuns, noções de mundo são dadas de acordo com as práticas sociais na
qual estes indivíduos estão inseridos. Considera-se também que aspectos subjetivos pessoais
como a experiência espacial trazem à tona percepções individuais, como por exemplo, a
relação do pescador com o mar, rio ou Lagoa. No livro Quanto Custa ser Pescador
Artesanal?, DIAS NETO, 2015, entende-se essa relação nas narrativas sobre os mapas da
Lagoa Feia, quando lemos que:
“... a relação que os pescadores mantinham com o ambiente
gerava percepções muito distintas sobre o que são e para que
servem os recursos naturais, quando comparada com as
narrativas da engenharia sanitária ou preservacionista.”
(DIAS NETO, 2015)
O discurso constrói o conhecimento, portanto, regula através da produção de
categorias de conhecimento e conjuntos de textos o que é possível de ser falado e o que não é.
Assim ele produz e reproduz poder e conhecimento simultaneamente, o que vemos claramente
na posição da Educação Ambiental. Interpretamos então das respostas do campo, onde muitas
vezes ao levantar a pergunta “O que é o Meio Ambiente?”, recebi como resposta expressões
negativas e até mesmo a frase: Não sei responder!, a existência de um discurso visto como
técnico, e, portanto “intocável”, existente sobre esta categoria. Percebemos então, como o
discurso tenta definir o sujeito, moldando-o e posicionando-o a quem ele deve ser e o que
deve fazer.
Posso aqui dizer, que as conversas diretamente obtidas da categoria “Meio Ambiente”
(o que é Meio Ambiente para você?), como apresentado no capítulo anterior, são produtos de
uma Educação Ambiental mais “conservacionista” e se apresentam como “respostas prontas”,
pela preocupação com o „discurso correto‟. Contrariamente, é dando-se conta das histórias e
casos desses personagens da vida real, e tomando por evidência seus ritos e costumes, que
percebemos o verdadeiro significado do meio ambiente, ou seja, a forma que eles interpretam,
praticam e se envolvem com o mesmo. Resultando em algo completamente relacionado com a
afetividade e apego que nos fala Yi-Fu Tuan, onde a relação com o meio ambiente natural em
Atafona é totalmente mediada pela atividade de pesca e mariscagem de muitas famílias que
habitam esse lugar.
Portanto, a relação de Discurso e Poder já citada aqui e notavelmente vivenciada desde
o inicio dos tempos, é percebida através da desconstrução histórica de sistemas ou regimes
50
como geradores de opiniões, significados e como discurso. Isso nos faz entender como e por
que algumas categorias do pensamento e linhas de argumentação se tornam geralmente
verdades enquanto outras maneiras de pensar, ser e agir são marginalizadas. “Essa vontade de
verdade assim apoiada sobre um suporte e uma distribuição institucional tende a exercer sobre
os outros discursos [...] uma espécie de pressão e como que um poder de coerção”
(FOUCAULT, 1996, p. 18).
Cabe então ressaltar ao final deste trabalho, que mesmo que os termos técnicos sirvam
a ciência e a política num modelo ditador de discurso, e condicionem atores sociais como
pescadores e marisqueiras a “responderem” de tal maneira „correta‟ para se sentirem incluídos
em tal, „Meio Ambiente‟ não deixará de ser a vida dessas pessoas, esteja categorizada numa
teoria ou não.
51
REFERÊNCIAS
ACERVO VIRTUAL LUIZ CASTRO DE FARIA. Trajetória. Disponível em:
< http://castrofaria.mast.br/trajetoria.htm>. Acessado em 14/03/2016.
BLASI CUNHA, J. Atafona: Formas de Sociabilidade em um balneário na região Norte -
Fluminense, 2007.
CASTELLS, M. A Era da Informação-Economia Sociedade e Cultura, Vol 3. Paz e Terra,
1999.
CASTRO FARIA, L. de. Os Pescadores de Ponta Grossa dos Fidalgos: Um Estudo de
Morfologia Social. (Título Provisório) Inédito. Conforme originais incorporados ao acervo
do Museu de Astronomia e Ciências Afins – MAST/CNPq, no Observatório do Valongo, Rio
de Janeiro/RJ (sem data).
CASTRO FARIA, L. de. Pecadores e Pescarias. In:______. Escritos Exumados vol 2:
dimensões do conhecimento antropológico. Niterói: Eduff, 2000.
CHEVRON BRASIL. Operação no Campo Frade. Disponível em:
<https://www.chevron.com.br/negocios/exploracao-producao-petroleo/campo-frade.aspx>.
Acessado em 10/02/2016.
COLAÇO, J. Quanto Custa Ser Pescador Artesanal? Etnografia, relato e comparação
entre dois povoados pesqueiros no Brasil e em Portugal. 1. ed. Rio de Janeiro: Editora
Garamond, 2015. 312p.
COLAÇO, J. & VALPASSOS, C. Diferentes Percepções da Natureza: As intervenções
politécnicas, a fiscalização ambiental e os pescadores artesanais na Lagoa Feia. Revista
Anthropológicas, v. 17, p. 95-116, 2006.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Capítulo - VI Do Meio
Ambiente, Art. 225. Disponível em:
<file:///C:/Users/souzaj1/Downloads/CF%201988%20art.%20225.pdf>. Acessado em
28/12/2015.
DISTANCIA CIDADES.COM. A distância entre São João da Barra e Campos dos
Goytacazes. Disponível em: < http://br.distanciacidades.com/distancia-de-sao-joao-da-barra-
a-campos-dos-goytacazes>. Acessado em 17/01/2016.
DUARTE, L. F. D. As redes de suor: a reprodução social dos trabalhadores da produção
da pesca em Jurujuba. Niterói: Eduff, 1999.
EMÍDIO, T. Meio Ambiente e Paisagem. São Paulo: Senac, 2006.
FALCÃO, H. G. O mar como um palco de contestações: um estudo sobre a comunidade
pesqueira de Atafona- RJ. In: 29ª Reunião Brasileira de Antropologia, 2014, Natal. Anais
Grupos de trabalho, 2014. v. 1.
FOUCAULT, M. Microfísica do poder. (Machado, R., Org.). 295p. Rio de Janeiro: Graal.
(Original publicado em 1979). (Coleção Biblioteca de Filosofia e História das Ciências
Humanas, VII), 1993.
52
_____. A ordem do discurso. Tradução de Laura Fraga de Almeida Sampaio. São Paulo:
Loyola, 1996.
_____. Poder e Saber. Em: Foucault, M. Ditos & Escritos IV. (Ribeiro, V.L.A., Trad.). (pp.
223-240). Rio de Janeiro: Forense Universitária. (Original publicado em 1977). (Coleção
Ditos & Escritos, IV), 2003.
FORNASARI FILHO, N.; BITAR, O.Y. O meio físico em estudos de impacto ambiental-
EIAs. In: BITAR, O.Y. (Coord.). Curso de geologia aplicada ao meio ambiente. São Paulo:
Associação Brasileira de Geologia de Engenharia (ABGE) e Instituto de Pesquisas
Tecnológicas (IPT), 1995. Cap.4.1, p.151-163.
KANT DE LIMA, R. Os Pescadores de Itaipu. Meio Ambiente, conflito e ritual no litoral
do Estado do Rio de Janeiro. Niterói: Eduff, 1997.
KLOETZEL, K. O que é meio ambiente?. São Paulo: Brasiliense, 1998.
KLOETZEL K. Cartão de visita [Business card]. Diagn Tratamento. 2005; 10(2): 102-3.
LOUREIRO, C. F. B. Educação Ambietal Transformadora. In: Layrargues, P. P.
(Coord.) Identidades da Educação Ambiental Brasiliera. Brasília: Ministério do Meio
Ambiente, 2004.
MELLO, M. A. S. & VOGEL, A. Gente das Areias: Sociedade, História e Meio Ambiente
no Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: EdUFF, 2004.
MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Conceitos de Educação Ambiental. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/educacao-ambiental/politica-de-educacao-ambiental.> Acesso em:
Acesso em: 29 de Outubro de 2015.
MUSEU DA PESSOA. História de Nelite Moreira da Anunciação, publicado em
25/09/2013. Disponível em: <http://www.museudapessoa.net/pt/conteudo/historia/dona-
nelite-a-mulher-que-pegava-caranguejo-utilizando-lampiao-52244>. Acessado em
10/02/2016.
PALACIO DO PLANALTO – PRESIDENCIA DA REPÚBLICA. LEI Nº 6.938, DE 31 DE
AGOSTO DE 1981. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938.htm>. Acessado em 25/11/2015.
PALACIO DO PLANALTO – PRESIDENCIA DA REPÚBLICA. LEI Nº 7.735, DE 22 DE
FEVEREIRO DE 1989. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/leis/L7735.htm>. Acessado em 25/11/2015.
PALACIO DO PLANALTO – PRESIDENCIA DA REPÚBLICA. LEI Nº 11.516, DE 28
DE AGOSTO DE 2007. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-
2010/2007/lei/l11516.htm>. Acessado em 25/11/2015.
PARAHYBANO. Porto do Açu recebeu R$ 633 milhões no 1º trimestre, publicado em
23/05/2014. Disponível em: <http://www.parahybano.com.br/site/porto-do-acu-recebeu-r-
633-milhoes-no-1o-trimestre/>. Acessado em 10/02/2016.
PEA-BC – PROGRAMA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL DA BACIA DE CAMPO.
Projetos em andamento. Disponível em: <http://www.pea-
bc.ibp.org.br/index.php?view=projeto-selecao>. Acessado em 11/02/2016.
53
PESSANHA, E. G. F. Os companheiros. Trabalho e Sociabilidade na Pesca de Itaipu.
Niterói: Eduff, 2003. 156p.
PITREZ, M. C. M. M."Calmaria" e "Alvoroço" no encontro das águas: ritmo e
pertencimento entre pescadores e veranistas na praia de Atafona, R.J, 2014.
PORTAL DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Parâmetros Curriculares Nacionais - Meio
Ambiente. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/meioambiente.pdf.>
Acessado em: 29/10/2015.
PREFEITURA DE SÃO JOÃO DA BARRA. Poder público desenvolve ações direcionadas
à pesca, publicado em 09/06/2014. Disponível em: <http://www.sjb.rj.gov.br/noticia-
3098/poder-publico-desenvolve-acoes-direcionadas-a-pesca>. Acessado em 28/12/2015.
PROIN/CAPES e UNESP/IGCE. Material Didático: arquivos de transparência (CD). Rio
Claro: Departamento de Geologia Aplicada, 1999. Disponível em:
<http://www.rc.unesp.br/igce/aplicada/ead/estudos_ambientais/ea02a.html.> Acessado em:
29/10/2015.
QUINTAS, J.S. Educação ambiental e sustentabilidade. Brasília: IBAMA, 2003. (Mimeo).
_____. Introdução a Gestão Ambiental Pública. Brasília: Edições IBAMA, 2002 a.
_____. Curso de formação do analista ambiental: concepção pedagógica. Brasília:
Edições IBAMA, 2002b (Série Meio Ambiente em Debate 43).
_____. Repensar a educação ambiental: um olhar crítico. São Paulo, Cortez, 2009.
SAINT-HILAIRE, G. Études progressives d‟un naturaliste. Paris, 1835. Disponível
em:<https://books.google.com.br/books?id=pTcAAAAAQAAJ&printsec=frontcover&dq=%
C3%8>. Acessado em: 21/11/2015.
SILVA, T. de C. O Meio Ambiente da Constituição Federal de 1988. Disponível em:
<http://www.oab.org.br/editora/revista/revista_08/anexos/o_meio_ambiente_na_constituicao_
federal.pdf>. Acesso em: 29/10/2015.
SJB ONLINE. Atafona: a eterna briga entre o homem e o mar, publicado em 17/08/2012.
Disponível em: < http://www.sjbonline.com.br/noticias/atafona-a-eterna-briga-entre-o-
homem-e-o-mar>. Acessado em 11/02/2016.
TUAN, Yi-Fu. Espaço e Lugar: a perspectiva da experiência. São Paulo: Difel, 1983.
______. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. São
Paulo: Difiel, 1980.
WARF, B. Humanistic Geography. In: WARF, B. (ed.). Encyclopedia of Human
Geography. Thousand Oaks/ London/ New Delhi: SAGE Publications, 2006.