uea apostila de comércio exterior

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5/21/2018 UEAApostiladeComrcioExterior-slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/uea-apostila-de-comercio-exterior 1/104  UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS - UEA ESCOLA SUPERIOR DE CIÊNCIAS SOCIAIS. CURSO DE ECONOMIA – EaD mediada COMÉRCIO EXTERIOR Prof. Dr. Waldemar Antônio da Rocha de Souza, Livre-Docente Prof. Dr. Tristão Sócrates Baptista Cavalcante Manaus (AM) Agosto de 2014

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Comercio Exterior

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  • UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS - UEA

    ESCOLA SUPERIOR DE CINCIAS SOCIAIS. CURSO DE ECONOMIA EaD mediada

    COMRCIO EXTERIOR

    Prof. Dr. Waldemar Antnio da Rocha de Souza, Livre-Docente

    Prof. Dr. Tristo Scrates Baptista Cavalcante

    Manaus (AM)

    Agosto de 2014

  • 1

    Sumrio UNIDADE 1 .......................................................................................................................... 5

    1.1 TEORIAS DO COMRCIO INTERNACIONAL .......................................................... 5 1.1.1 Teorias Clssicas do comrcio internacional: .............................................................. 6

    1.1.1.1 Teoria das Vantagens Absolutas: .............................................................................. 6

    1.1.1.2 Teoria das Vantagens Comparativas: ........................................................................ 7

    1.1.1.3 Teorema Hecksher-Ohlin: ......................................................................................... 8

    1.1.2 Novas Teorias do Comrcio Internacional: .................................................................. 8

    1.2 POLTICAS COMERCIAIS E MODELOS DE INDUSTRIALIZAO: .................... 9 1.2.1 Aspectos Gerais das Polticas Comerciais: .................................................................. 9

    1.2.2 O protecionismo no mbito do sistema multilateral de comrcio: ............................. 12

    1.2.2.1 Proteo Indstria Nascente: ................................................................................ 12

    1.2.2.2 Promoo da Segurana Nacional: .......................................................................... 13

    1.2.2.3 Deslealdade Comercial: ........................................................................................... 14

    1.2.2.4 Restries no Balano de Pagamentos ........................................................ 14

    1.2.2.5 Surto de Importaes: .............................................................................................. 14

    1.2.2.6 Excees Gerais: ..................................................................................................... 14

    1.2.2.7 Falhas de Mercado: ................................................................................................. 15

    1.2.3. Industrializao por Substituio de Importaes ...................................... 15

    1.2.4. Industrializao Orientada para Exportaes: ........................................................... 17

    1.2.5 Poltica Comercial Estratgica: .................................................................................. 18

    1.3 BARREIRAS TARIFRIAS X NO TARIFRIAS .................................................. 19 1.3.1 Barreiras no-tarifrias: .............................................................................................. 19

    1.3.2 Barreiras Tarifrias / Modalidades de Tarifas: ........................................................... 21

    UNIDADE 2 ........................................................................................................................ 22

    2.1 ORGANIZAO MUNDIAL DO COMRCIO (OMC) ............................................ 22 2.1.1 Aspectos Gerais: ......................................................................................................... 22

    2.1.2 Estrutura Institucional: ............................................................................................... 24

    2.1.3 Processo Decisrio na OMC: ..................................................................................... 25

    2.1.4 Os Acordos Internacionais no mbito da OMC: ........................................................ 25

    2.2 O ACORDO GERAL SOBRE TARIFAS E COMRCIO (GATT): ........................... 26 2.2.1 Artigos do GATT ....................................................................................................... 26

    2.3 O ACORDO GERAL SOBRE O COMRCIO DE SERVIOS (GATS) ................... 29 2.3.1 Generalidades: ............................................................................................................ 29

  • 2

    2.3.2 Introduo: ................................................................................................................. 29

    2.3.3 Principais Dispositivos do GATS: ............................................................................. 31

    UNIDADE 3 ........................................................................................................................ 32

    3.1 O SISTEMA GERAL DE PREFERNCIAS (SGP) .................................................... 32 3.2 SISTEMA GLOBAL DE PREFERNCIAS (SGPC) ................................................... 33 UNIDADE 4 ........................................................................................................................ 35

    4.1 A INTEGRAO REGIONAL .................................................................................... 35 4.1.1 Estgios de Integrao: ............................................................................................... 35

    4.1.2 Efeitos Econmicos da Integrao Regional: ................................................ 37

    4.1.3- Efeitos Polticos da Integrao Regional: ................................................................. 38

    4.2 ACORDOS REGIONAIS DE COMRCIO E A OMC ............................................... 38 4.2.1 NAFTA- Histrico e Objetivos: ................................................................................. 38 4.2.2 Liberalizao comercial intrabloco: ........................................................................... 40

    4.3 ACORDOS DE INTEGRAO COMERCIAL NAS AMRICAS ........................... 40 UNIDADE 5 ........................................................................................................................ 43

    5.1 MERCOSUL: ESTGIO ATUAL DE INTEGRAO E OBJETIVOS..................... 43 5.1.1 Objetivos .................................................................................................................... 46 5.2 ESTRUTURA INSTITUCIONAL E SISTEMA DECISRIO DO MERCOSUL....... 47 5.3 TARIFA EXTERNA COMUM E REGRAS DE ORIGEM ......................................... 55

    5.3.1 REGIME DE ORIGEM DO MERCOSUL: ............................................................... 58

    UNIDADE 6 ........................................................................................................................ 60

    6.1 PRTICAS DESLEAIS DE COMRCIO ................................................................... 60 6.2 DEFESA COMERCIAL ............................................................................................... 61

    6.2.1 O Sistema de Defesa Comercial no Brasil: ................................................................ 61

    6.3 MEDIDAS ANTIDUMPING, COMPENSATRIAS E SALVAGUARDAS COMERCIAIS .................................................................................................................... 62

    6.3.1 DUMPING E MEDIDAS ANTIDUMPING ............................................................. 62

    6.3.1.1- Determinao do Valor Normal: ............................................................................ 63

    6.3.1.2- Determinao do Preo de Exportao: ................................................................. 64

    6.3.1.3- Determinao da Margem de Dumping: ................................................................ 64

    6.3.1.4- Determinao de Dano e Nexo Causal: ................................................................. 65

    6.3.1.5- Investigao e Aplicao de Direitos Antidumping: ............................................. 66

    6.3.2 SUBSDIOS E MEDIDAS COMPENSATRIAS ................................................... 66 6.3.2.1- Tipos de Subsdios: ................................................................................................ 68

  • 3

    6.3.2.2 Investigao e Aplicao de Medidas Compensatrias: ......................................... 69

    6.3.3.3 Medidas de Salvaguarda:......................................................................................... 70

    UNIDADE 7 ........................................................................................................................ 71

    7.1 O Sistema Integrado de Comrcio Exterior (SISCOMEX) ........................................... 71 7.2 CAMEX E SECEX ....................................................................................................... 73

    7.2.1 Competncias da CAMEX ......................................................................................... 73

    7.2.1.1 Estrutura da CAMEX: ............................................................................................ 75

    7.2.2 Secretaria de Comrcio Exterior (SECEX): ............................................................... 75 7.3 RECEITA FEDERAL, BACEN E MRE ...................................................................... 78

    7.3.1 Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB) ........................................................ 78 7.3.2 BACEN ...................................................................................................................... 80

    7.3.3 Ministrio das Relaes Exteriores (MRE): ............................................................... 81 UNIDADE 8 ........................................................................................................................ 81

    8.1 CONTRATOS DE COMRCIO INTERNACIONAL ................................................. 81 8.1.1 Conceitos Iniciais: ...................................................................................................... 81

    8.1.2 Clusula de fora maior e clusula de hardship: ........................................................ 82

    8.1.3 Garantias em um contrato internacional: .................................................................... 83

    8.2 Conveno de Viena sobre o Contrato de Compra e Venda Internacional de mercadorias (CVIM): .......................................................................................................... 84 8. 2.1 Generalidades: ........................................................................................................... 84

    8.2.2 Princpios Fundamentais: ........................................................................................... 85

    8. 2.3 Aplicao da Conveno de Viena sobre o Contrato de Compra e Venda Internacional de Mercadorias: ............................................................................................. 86

    8.2.4 No-aplicao da Conveno de Viena sobre o Contrato de Compra e Venda Internacional de Mercadorias: ............................................................................................. 86

    8.3 INCOTERMS ................................................................................................................ 87

    8.3.1 Generalidades: ............................................................................................................ 87

    8.3.2 INCOTERMS 2010: ................................................................................................... 89

    UNIDADE 9 ........................................................................................................................ 89

    9.1 CLASSIFICAO ADUANEIRA ............................................................................... 89 9.2 SISTEMA HARMONIZADO DE DESIGNAO E CODIFICAO DE MERCADORIAS: ............................................................................................................... 90

    9.2.1 Estrutura do Sistema Harmonizado (SH): ................................................................. 91 9.3 NOMENCLATURA COMUM DO MERCOSUL (NCM) ........................................... 92 9.3.1 Generalidades: ............................................................................................................ 92

  • 4

    9.3.2 Regras Gerais Complementares: ................................................................................ 92

    9.3.3 Classificao de mercadorias ..................................................................................... 93

    UNIDADE 10 ...................................................................................................................... 94

    10.1 REGIMES ADUANEIROS ........................................................................................ 94

    10.2 EXPORTAES E INCENTIVOS FISCAIS ............................................................ 98 10.2.1 Imunidade de ICMS: ................................................................................................ 98

    10.2.2 Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI): ........................................................ 99 10.2.3 Manuteno do Crdito do IPI: ................................................................................ 99

    10.2.4 Imunidade das contribuies sociais e de interveno no domnio econmico: ...... 99

    10.2.5 Crdito Presumido de IPI: ........................................................................................ 99

    10.2.6 Drawback: .............................................................................................................. 100

    10.2.7 Empresas Comerciais Exportadoras: ...................................................................... 101

    10.2.8 Exportao Ficta: .................................................................................................... 101

    10.2.9 Consideraes sobre o SIMPLES Nacional: .......................................................... 101

    10.3 IMPORTAES E CONTRIBUIES .................................................................. 102 10.3.1 Iseno de ICMS: ................................................................................................... 102

  • 5

    UNIDADE 1

    1.1 TEORIAS DO COMRCIO INTERNACIONAL O comrcio internacional compreende toda a circulao de bens e servios entre as

    fronteiras dos pases, abrangendo as operaes de compra e venda, aluguel, leasing, doao, financiamento e consignao, dentre outras. Em suma, no importa a natureza da operao realizada; se ela envolver circulao de mercadorias e servios entre pases, poderemos consider-la dentro do escopo do comrcio internacional.

    Dessa forma, d-se o nome de comrcio internacional ao conjunto global de relaes comerciais estabelecidas pelos pases entre si, por meio das quais estes buscam satisfazer suas necessidades. Mas, afinal, qual o fundamento da existncia do comrcio internacional? O que motiva os pases a realizarem as trocas internacionais?

    As teorias do comrcio internacional buscam explicar o fundamento das trocas internacionais, determinando o porqu de os pases comercializarem bens e servios entre si. Ao mesmo tempo em que fundamentam a origem do comrcio internacional, elas tambm explicam as vantagens do livre comrcio e seus efeitos econmicos.

    Segundo Paul Krugman, os pases participam do comrcio internacional por dois motivos bsicos. Em primeiro lugar, em razo dos benefcios decorrentes das diferenas entre eles, o que lhes permite se especializarem na produo daquilo que fazem melhor em relao aos outros. Em segundo lugar, porque a especializao leva a economias de escala, isto , ao se especializarem, os pases produzem numa escala maior e de maneira mais eficiente do que se produzissem eles mesmos todos os bens de que necessitam.

    Com efeito, muito difcil imaginar o mundo de hoje sem o fenmeno do comrcio internacional. A globalizao e a interdependncia entre os pases aprofundou-se destacadamente na segunda metade do sculo XX, gerando um mercado global e intensificando as relaes econmicas internacionais. Os Estados esto cada vez mais ligados economicamente, por meio de elevado fluxo comercial de bens e servios e movimentos internacionais de capitais. As empresas transnacionais ganham cada vez maior destaque, com a intensificao do fenmeno da internacionalizao da produo.

    Nesse cenrio globalizado, os governos buscam solucionar o dilema entre liberalizar o comrcio ou proteger a indstria nacional, o que tem se tornado a tarefa mais importante (e mais rdua) dos formuladores das polticas de comrcio exterior. Sabendo que as relaes econmicas internacionais influenciam decisivamente no desenvolvimento e crescimento dos Estados, os governos se deparam diariamente com a dvida a respeito de qual nvel de liberalizao comercial devem permitir.

    Essa uma questo muito difcil de ser resolvida, ainda mais por tratar de interesses antagnicos: de um lado, a indstria nacional deseja receber proteo; do outro, os consumidores querem comprar produtos mais baratos. Para Krugman, os conflitos de interesses dentro das naes impactam mais a determinao da poltica comercial do que os conflitos de interesses entre as naes. Assim, nem sempre a anlise de custo-benefcio feita pelos economistas colocada em prtica. Ao contrrio, a poltica comercial , muitas vezes, conduzida ao arrepio de consideraes econmicas, com foco na proteo a setores com maior capacidade de fazer seu lobby junto ao governo.

  • 6

    Compreender quem ganha e quem perde (e o quanto ganham e quanto perdem) com as aes governamentais em matria de poltica comercial uma das grandes misses da economia internacional. Para que se possa discutir os efeitos econmicos do comrcio e assessorar corretamente os governos na formulao de polticas comerciais, faz-se necessrio, todavia, compreender corretamente o padro do comrcio3 o que nos explicado pelas teorias do comrcio internacional.

    1.1.1 Teorias Clssicas do comrcio internacional

    A cincia econmica tem suas origens no estudo do comrcio internacional, sendo este considerado, desde os primrdios, um fator de desequilbrio no concerto das naes, permitindo que alguns Estados se colocassem na vanguarda do processo de desenvolvimento.

    No sculo XV, tem incio na Europa o expansionismo martimo, por meio do qual os Estados buscavam encontrar novos mercados consumidores e fornecedores de matrias-primas e metais preciosos. O antigo sistema feudal descentralizado dava, ento, lugar aos Estados modernos, em que a deciso poltica estava centralizada nas mos do soberano. No contexto das Grandes Navegaes e centralizao do poder poltico, os Estados implementaram a poltica econmica do mercantilismo e a burguesia emergiu como classe social de destacada importncia no perodo.

    No final do sculo XVIII, a concepo mercantilista de riqueza comeou, todavia, a ser contestada pelo pensamento liberal, que consagrava outro papel aos Estados. David Hume publica em 1758 seu ensaio Da Balana Comercial e Adam Smith publica em 1776 A Riqueza das Naes. Eram os primeiros passos da filosofia liberal, que fundamentava a existncia do comrcio internacional.

    1.1.1.1 Teoria das Vantagens Absolutas

    No ano de 1776, Adam Smith publica a sua obra-prima Uma investigao sobre a natureza e as causas da riqueza das naes, tambm chamada simplesmente de A riqueza das naes. Em sua tese, Smith advoga que a fonte da riqueza o trabalho, contrariando a idia mercantilista que atribua esse papel quantidade de metais preciosos existente no territrio de um pas.

    Segundo Adam Smith, o Estado deveria abster-se de intervir na economia, deixando que os mercados se autorregulassem. Adam Smith pregava, assim, a existncia da mo invisvel do mercado. Para ele, cada indivduo, ao tentar satisfazer seu prprio interesse, promove de uma forma mais eficaz o interesse da sociedade do que quando realmente o pretende fazer. Apesar de cada indivduo agir egoisticamente em prol de si mesmo, a sociedade como um todo sai beneficiada. Existe uma frase que sintetiza muito bem as ideias de Adam Smith:

    No da benevolncia do padeiro, do aougueiro ou do cervejeiro que eu espero que saia o meu jantar, mas sim do empenho deles em promover seu auto-interesse .

    De acordo com Adam Smith, o Estado no deveria intervir na economia, a no ser para impedir a existncia de monoplios, ou em atividades que, embora no despertem interesse da iniciativa privada, sejam fundamentais. Jaime de Mariz Maia4, seguindo essa mesma linha de pensamento, afirma que a filosofia liberal limitava a participao dos Estados s atividades de preservao da justia, defesa nacional e complementao da iniciativa privada (realizao de empreendimentos para os quais h desinteresse da iniciativa particular).

  • 7

    No campo do comrcio internacional, as idias de Adam Smith deram fundamento diviso internacional da produo. Cada pas se especializaria na produo de bens em que possusse maior eficincia, isto , em bens que pudesse produzir a um custo menor. O excedente de produo (aquilo que excede a capacidade de consumo interno) deveria ser objeto de trocas comerciais com outros pases. Essa era a Teoria das Vantagens Absolutas, segundo a qual o comrcio internacional resultante da diviso da produo possibilita diminuio de custos e aumento do bem-estar sociedade como um todo.

    1.1.1.2 Teoria das Vantagens Comparativas

    A Teoria das Vantagens Comparativas, tambm chamada de Teoria dos Custos Comparados, foi elaborada por David Ricardo. Ela tem como objetivo principal explicar que o comrcio internacional ser possvel mesmo quando um pas for mais eficiente na produo de todos os bens. Em outras palavras, o comrcio internacional existir ainda que um pas possua vantagens absolutas na produo de todos os bens considerados. Para David Ricardo, o comrcio internacional no seria determinado pelas vantagens absolutas, mas sim pelas vantagens comparativas.

    Todavia, segundo a Teoria das Vantagens Comparativas, o comrcio internacional traz benefcios mesmo diante desse tipo de situao. Embora seja mais eficiente que o Brasil tanto na produo de sapatos quanto na produo e bolsas, a Inglaterra relativamente mais eficiente na produo de sapatos. Para produzir bolsas, o Brasil at que chega perto da Inglaterra... Mas o Brasil no um produtor muito bom de sapatos. Concluso: as vantagens comparativas no se baseiam na eficincia de um pas, mas sim na deficincia deste na produo de um bem.

    No modelo ricardiano, os custos de produo esto baseados unicamente na produtividade do trabalho. Assim, os pases se especializaro na produo de bens que o seu trabalho produz de forma relativamente eficiente e importaro bens que seu trabalho produz de forma comparativamente ineficiente. Segundo Paul Krugman, o modelo das vantagens comparativas faz projees equivocadas em vrios aspectos:

    1) O modelo das vantagens comparativas prev um grau de especializao muito elevado, que no existe na prtica.

    2) O modelo ricardiano considera que o comrcio internacional no produz efeitos indiretos sobre a distribuio de renda no interior dos pases.

    Todavia, os efeitos prticos do comrcio internacional sobre a renda so bastante fortes.

    3) O modelo ricardiano no reconhece que uma das causas do comrcio internacional so as diferenas entre as dotaes de recursos entre os pases. Tal constatao s aparece com o Teorema Hecksher-Ohlin, conforme a seguir.

    4) O modelo das vantagens comparativas no leva em conta que uma das causas do comrcio so as economias de escala.

    Ainda que o modelo ricardiano no seja o retrato mais fiel da realidade, seus principais pressupostos tm sido confirmados por meio de evidncias empricas. Com efeito, o que determina a especializao de um pas na produo de um bem so as vantagens comparativas e no as vantagens absolutas.

  • 8

    1.1.1.3 Teorema Hecksher-Ohlin

    O Teorema Hecksher-Ohlin leva o nome de dois economistas suecos (Eli Hecksher e Bertil Ohlin), os quais buscaram explicar a causa do comrcio internacional. Afinal de contas, por que os pases comercializam entre si? Porque existe o comrcio internacional?

    Segundo o Teorema Hecksher-Ohlin, os pases se especializam na produo de bens intensivos no fator de produo abundante em seu territrio. Dessa forma, se um pas possui abundncia do fator de produo terra, ele ir se especializar na produo e exportao de bens que sejam intensivos em terra. Do mesmo modo, se um pas possui abundncia do fator de produo capital, ele se especializar na produo e exportao de bens intensivos em capital.

    O Teorema Hecksher-Ohlin no nega a Teoria das Vantagens Comparativas, mas sim a complementa, explicando o porqu cada pas possui vantagem na produo de determinado bem. Com efeito, o fator determinante da especializao a dotao de fatores de produo. Da esse teorema ser tambm conhecido como Teoria da Proporo dos Fatores.

    O comrcio internacional , assim, decorrente das diferentes dotaes dos fatores de produo entre os pases. Em outras palavras, o comrcio internacional somente existe em funo de os pases possurem diferentes dotaes de terra, capital e produtividade da mo-de-obra. Ao comercializarem seus produtos, como se os pases estivessem comercializando fatores de produo. Cabe destacar que no modelo Hecksher-Ohlin considera-se que as tecnologias dos pases so as mesmas, somente variando a dotao dos fatores de produo. Destaque-se que dizer que as tecnologias dos pases so as mesmas significa assumir que a tecnologia uma constante nesse modelo.

    1.1.2 Novas Teorias do Comrcio Internacional

    Segundo Paul Krugman, as economias de escala permitem que exista comrcio entre dois pases mesmo que estes possuam idnticas dotaes de fatores de produo. Cabe destacar que as economias de escala tm um papel determinante para o comrcio internacional, na medida em que a maioria dos setores produtivos caracteriza-se por possu-las.

    As economias de escala, tambm chamadas de ganhos de escala, ocorrem quando o aumento dos fatores produtivos (trabalho, capital) empregados na fabricao de um bem leva a um aumento mais do que proporcional da produo. H economias de escala, por exemplo, quando os fatores de produo so duplicados e a produo mais do que dobra. Podemos dizer que, diante de economias de escala, o custo de se produzir o prximo produto (custo marginal) cada vez menor.

    Outra explicao para a existncia do comrcio internacional entre pases com estruturas produtivas semelhantes foi dada por Linder, que desenvolveu a chamada Teoria dos Gostos dos Consumidores. Para Linder, o comrcio internacional seria determinado pelo comportamento da demanda, a qual influenciada pelos gostos dos consumidores. Os gostos dos consumidores, por sua vez, so condicionados pelo nvel de renda de uma economia. Nesse sentido, se a renda de um pas elevada, haver maior demanda por bens sofisticados; por outro lado, se a renda baixa, a demanda por bens sofisticados no ser muito grande. Quanto mais semelhante for o nvel de renda, maior ser o volume das trocas comerciais entre os pases.

  • 9

    1.2 POLTICAS COMERCIAIS E MODELOS DE INDUSTRIALIZAO: 1.2.1 Aspectos Gerais das Polticas Comerciais

    A poltica comercial , ao lado da poltica monetria, fiscal e cambial, uma vertente da poltica macroeconmica conduzida por um governo. Ela determina a forma pela qual um pas se relaciona com outros pases no que diz respeito ao comrcio exterior (exportaes e importaes). Assim, a poltica comercial pode ser entendida como um conjunto de medidas governamentais que influencia as transaes comerciais que um pas tem com os outros.

    A conduo da poltica comercial determina o grau de abertura econmica de um pas. Em tempos de globalizao, h uma forte tendncia de interconexo das economias e de aprofundamento do comrcio exterior. Todavia, nem sempre foi assim. Em outras pocas, as prticas protecionistas preponderavam. Se analisarmos a prpria Histria do Brasil, perceberemos o quanto isso verdade.

    Fazendo uma rpida regresso temporal, voltemos dcada de 90. O incio dessa dcada representa um ponto de inflexo na mudana da poltica comercial brasileira, na medida em que se promove a abertura comercial. O governo Collor (1990-1992), logo em seu incio, levou a cabo notria mudana no regime de importaes brasileiras. Nesse sentido, foram eliminadas diversas restries ao comrcio at ento existentes: reduziram-se as alquotas dos tributos na importao e acabou-se com as chamadas reservas de mercado (proibio s importaes), como a existente no setor de informtica.

    O protecionismo uma poltica comercial que representa a contraposio s ideias liberalistas apregoadas pelas teorias do comrcio internacional. Os protecionistas enxergam o livre comrcio como algo perigoso aos interesses nacionais e pregam pela proteo indstria nacional. Assim, uma poltica comercial protecionista a que impe restries livre circulao de mercadorias e servios.

    Na viso dos protecionistas, a indstria nacional no deve ser exposta concorrncia ou ento sair perdendo, sofrendo graves prejuzos. Se voc gosta de acompanhar jornais e revistas, j deve ter percebido o quanto a indstria nacional tem chorado nos ltimos tempos, pleiteando junto ao governo brasileiro a adoo de medidas protecionistas. No Brasil, chega-se a argumentar que h um risco de desindustrializao do Pas diante da concorrncia com os produtos chineses.

    Para falar um pouco sobre a histria do protecionismo, precisamos voltar Idade Moderna, quando a poltica econmica dos Estados era baseada no mercantilismo, que no foi um sistema aplicado homogeneamente na Europa. Na verdade, haviam vrios estilos de mercantilismo. Espanha e Portugal tinham como base fundamental a extrao das riquezas coloniais; a Inglaterra, por sua vez, buscou desenvolver mais seu comrcio exterior de produtos manufaturados.

    Podemos dizer que as principais caractersticas do mercantilismo eram: i) protecionismo alfandegrio (com o objetivo de obter supervits comerciais); ii) atuao ativa do Estado (intervencionismo estatal) e; iii) busca de acumulao de ouro e prata (quanto mais ouro e prata um pas possusse em seu territrio, mais rico ele seria). Os mercantilistas consideravam tambm que a existncia de uma populao numerosa seria benfica ao pas, uma vez que resultaria em maior disponibilidade do fator de produo trabalho.

  • 10

    Os tericos mercantilistas pregavam o desenvolvimento econmico por meio do enriquecimento das naes pelo comrcio exterior e pela explorao das riquezas coloniais. Quanto mais um pas exportasse e menos importasse, mais riqueza teria ele no seu territrio. Para isso, os Estados adotavam prticas de protecionismo alfandegrio - com a imposio de barreiras tarifrias ao comrcio exterior - e medidas que incentivassem a exportao. O objetivo era aumentar o bem-estar nacional por meio da acumulao de ouro e prata, que poderia ocorrer por meio do comrcio exterior ou da explorao colonial.

    Segundo os mercantilistas, quanto mais ouro e prata um pas possusse em seu territrio, mais caros se tornariam seus produtos, os quais valeriam mais no mercado internacional11. Assim, esses produtos seriam exportados por preos elevados e, consequentemente, entraria ainda mais ouro e prata no territrio do pas. Mas ser que isso era verdade? No. David Hume contestou essa lgica mercantilista. Para ele, os supervits e dficits que um pas tivesse em sua Balana Comercial seriam automaticamente corrigidos pelas foras do mercado. Era a Teoria Fluxo-Espcie-Preo. Vejamos!

    Se um pas tiver muito ouro e prata em seu territrio, seus produtos, de fato, se tornam mais caros no mercado internacional. No entanto, como os produtos esto muito caros, a demanda por eles se reduz (Lei da Oferta e da Procura) e, portanto, entra menos ouro e prata no territrio do pas (dficit comercial). Com a entrada de menos ouro e prata em seu territrio, os preos dos produtos iro se reduzir e, consequentemente, aumentar a demanda por eles no mercado internacional. A consequncia sero supervits na Balana Comercial e o aumento do ingresso de ouro e prata. Percebam, caros amigos, que trata-se de um mecanismo de ajuste automtico da Balana Comercial. Assim, para Hume, no haveria uma acumulao infinita de ouro e prata.

    Modernamente, fala-se na existncia de um neomercantilismo, que uma poltica comercial eminentemente protecionista, baseada em estmulos s exportaes e imposio de restries s importaes. O objetivo principal dessas polticas alcanar supervits na Balana Comercial, o que conquistado por meio de estmulos s exportaes e imposio de barreiras s importaes. A caracterstica marcante do neomercantilismo (neoprotecionismo) a ampla utilizao de barreiras no-tarifrias, o que nos permite afirmar que trata-se de um protecionismo mais requintado. um nova forma de protecionismo.

    No sculo XVIII, com o surgimento da Teoria das Vantagens Absolutas de Adam Smith e, em seguida, da Teoria das Vantagens Comparativas de David Ricardo, o protecionismo comea a perder ainda mais seu espao. Isso no quer dizer que ele no fosse empregado a essa poca, mas j existia uma nova forma de se pensar o comrcio internacional. Surge o livre-cambismo, que pregava que os mercados possuem a capacidade de se autorregularem e que um comrcio internacional livre de barreiras seria fundamental para o crescimento e desenvolvimento econmico. O livre-cambismo apregoado por Adam Smith pregava a remoo dos obstculos legais ao comrcio internacional.

    Todavia, no perodo entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundiais, particularmente a partir da quebra da Bolsa de Nova York em 1929, os pases recrudesceram fortemente as prticas protecionistas.

    Numa tentativa de combater o protecionismo, em 1947, os pases assinaram o GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e por meio de sucessivas Rodadas de Negociao foram progressivamente reduzindo as tarifas aduaneiras incidentes nas importaes.

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    Com essas progressivas redues tarifrias e o crescente acesso a mercados, comea a ganhar expresso uma nova forma de protecionismo: a utilizao de barreiras no-tarifrias. Se no passado as tarifas eram muito elevadas - impedindo o comrcio - e agora elas haviam sido rebaixadas, como proteger as indstrias nacionais? Os pases no podiam voltar atrs em relao s suas concesses tarifrias. Logo, eles precisavam proteger sua indstria com o uso de barreiras no-tarifrias.

    No existe uma definio precisa do que sejam barreiras no-tarifrias. O entendimento que vocs precisam ter o de que barreiras no-tarifrias so todas as restries ao comrcio internacional que no so impostas por meio de tarifas aduaneiras. Assim, uma regulamentao tcnica (requisitos de segurana para brinquedos, por exemplo) ou uma medida sanitria e fitossanitria so espcies de barreiras no-tarifrias.

    As barreiras no-tarifrias se transformaram, assim, na nova cara do protecionismo, muitas vezes passando a constituir-se em obstculos arbitrrios e desnecessrios ao comrcio internacional. Era preciso, portanto, regulament-las. E quem melhor do que uma organizao internacional para faz-lo?

    Pois bem, em 1994 foi criada a Organizao Mundial do Comrcio. Nosso objetivo, pelo menos por agora, no falar detalhadamente sobre a OMC. O que precisamos saber que desde sua criao, o protecionismo continuou a decrescer. A partir daquele momento, haveria uma organizao internacional responsvel por administrar o sistema multilateral de comrcio, contribuindo para a liberalizao do comrcio internacional, seja por meio da progressiva reduo tarifria, seja por meio de um esforo de regulamentao das barreiras no-tarifrias.

    As prticas protecionistas perduram at os dias atuais. Logo, embora possamos dizer que, ao longo do tempo houve uma progressiva reduo do protecionismo, este, de forma alguma, foi eliminado. Destaque-se, ainda, que a crise financeira de 2008 provocou um recrudescimento das prticas protecionistas. E um detalhe importante: o protecionismo adotado tanto por pases desenvolvidos quanto por pases em desenvolvimento.

    Atualmente, o protecionismo se evidencia principalmente no campo agrcola, setor econmico bastante protegido, principalmente pelos pases desenvolvidos. Como exemplo, cita-se os elevados subsdios concedidos pelos pases europeus aos produtos agrcolas. Esse , inclusive, um empecilho ao fechamento da Rodada de Doha os pases desenvolvidos no querem fazer concesses em termos de acesso a mercado no que diz respeito aos produtos agrcolas, enquanto pedem concesses em NAMA (Non Agricultural Market Access).

    A poltica comercial adotada por um pas est, portanto, diretamente relacionada estratgia de desenvolvimento por ele levada a cabo. Em outras palavras, a estratgia de desenvolvimento de cada pas varia segundo o grau de exposio de sua economia ao mercado internacional. Os pases que adotam polticas comerciais de orientao liberal so a favor dos esquemas preferenciais (SGP e SGPC) e dos acordos regionais de integrao. Em aulas futuras, abordaremos detalhadamente os acordos regionais e os esquemas preferenciais. Por ora, basta sabermos que todos esses acordos (esquemas preferenciais e acordos regionais) se baseiam na reduo e at eliminao dos direitos aduaneiros incidentes sobre as operaes de comrcio exterior e, portanto, esto diretamente, ligados ao liberalismo.

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    1.2.2 O protecionismo no mbito do sistema multilateral de comrcio

    O sistema multilateral de comrcio, hoje administrado pela OMC, foi criado para limitar a adoo de prticas protecionistas. No que a OMC (Organizao Mundial do Comrcio) impea a adoo desse tipo de prtica, mas suas regras so um fator dissuasrio do protecionismo.

    As regras do sistema multilateral inibem a utilizao de prticas protecionistas, na medida em que regulamentam como estas podem ser usadas. Desta forma, fica expressamente condenado o uso de medidas protecionistas que se configurem em prticas arbitrrias e discriminatrias ou ainda em restries veladas ao comrcio internacional.

    Existem vrias situaes em que a Organizao Mundial do Comrcio autoriza sejam adotadas prticas protecionistas. As prticas protecionistas encontram amparo na normativa da OMC quando destinadas proteo da indstria nascente, promoo da segurana nacional, deslealdade comercial, diante de restries no Balano de Pagamentos, diante de um surto de importaes ou, ainda, em razo de excees gerais relacionadas no art. XX do GATT.

    1.2.2.1 Proteo Indstria Nascente

    A proteo indstria nascente, ideia originalmente concebida pelo alemo Friedrich List, est regulamentada pelo art. XVIII do GATT, intitulado Ajuda do Estado em favor do desenvolvimento econmico. Vejamos o teor do referido dispositivo:

    ARTIGO XVIII- AJUDA DO ESTADO EM FAVOR DO

    DESENVOLVIMENTO ECONMICO 1. As Partes Contratantes reconhecem que a realizao dos objetivos do presente Acordo ser facilitada pelo desenvolvimento progressivo de suas economias, em particular nos casos das Partes Contratantes cuja economia no asseguram populao seno um baixo nvel de vida e que est nos primeiros estgios de seu desenvolvimento.

    2. As Partes Contratantes reconhecem, alm disso, que pode ser necessrio para as Partes Contratantes previstas no pargrafo primeiro, com o objetivo de executar seus programas e suas polticas de desenvolvimento econmico orientados para a elevao do nvel geral de vida de suas populaes, tomar medidas de proteo ou outras medidas que afetem as importaes e que tais medidas so justificadas na medida em que elas facilitem a obteno dos objetivos deste Acordo. Elas estimam, em conseqncia, que estas Partes Contratantes deveriam usufruir facilidades adicionais que as possibilitem:

    (a) conservar na estrutura de suas tarifas aduaneiras suficiente flexibilidade para que elas possam fornecer a proteo tarifria necessria criao de um ramo de produo determinado, e

    (b) instituir restries quantitativas destinadas a proteger o equilbrio de suas balanas de pagamento de uma maneira que leve plenamente em conta o nvel elevado e permanente da procura de importao suscetvel de ser criada pela realizao de seus programas de desenvolvimento econmico.

    A normativa da OMC bem restritiva em relao aos pases que podem utilizar esse mecanismo protecionista. Segundo o dispositivo supracitado, somente podem invocar a proteo indstria nascente como argumento para adotar medidas que afetem as importaes aqueles pases cujas economias estejam nos primeiros estgios de desenvolvimento. Assim, pela normativa da OMC, no qualquer pas que poder alegar a proteo indstria nascente

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    como argumento para a poltica protecionista. No pensem que o Brasil, por exemplo, conseguiria fazlo! Esse instrumento para pases como Haiti, Somlia, etc.

    Destaque-se que no poder ser concedida indstria nacional por tempo indeterminado com fundamento no art. XVIII do GATT. Tal proteo temporria, limitada ao tempo necessrio para que a indstria possa sair dos primeiros estgios de desenvolvimento.

    O princpio do aprender fazendo (learning by doing) permite justificar a proteo indstria nascente. Isso quer dizer que uma indstria protegida durante seus primeiros estgios de desenvolvimento consegue desenvolver-se tecnologicamente e, ao acumular conhecimento e experincia, passa a gozar dos benefcios das economias de escala.

    O argumento da indstria, embora tenha muita lgica, tem algumas premissas questionveis. H indstrias, por exemplo, que so protegidas em sua fase inicial e, posteriormente, se tornam competitivas por outro motivo que no o protecionismo. Segundo Krugman, para justificar o argumento da indstria nascente, necessrio ir alm do ponto de vista plausvel, ainda que questionvel, de que os setores sempre precisam ser protegidos quando novos. Nesse sentido, a teoria econmica defende que a proteo indstria nascente se justifica diante de falhas de mercado, como as imperfeies do mercado de capitais.

    Apesar das controvrsias em torno do argumento da indstria nascente, trs das maiores economias mundiais (EUA, Alemanha e Japo) promoveram seu desenvolvimento econmico com base nessa ideia. Assim, no incio de seu desenvolvimento industrial, estes pases fecharam as portas ao comrcio exterior.

    Segundo alguns economistas, a existncia de falhas de mercado (mercado financeiro ineficiente, por exemplo) um argumento para a utilizao de prticas protecionistas (tarifas e subsdios) que tenham como objetivo proteger a indstria nascente. Mais frente, nos aprofundaremos sobre as falhas de mercado.

    1.2.2.2 Promoo da Segurana Nacional

    A promoo da segurana nacional est definida no art. XXI do GATT, dispositivo transcrito a seguir:

    ARTIGO XXI- EXCEES RELATIVAS SEGURANA Nenhuma disposio do presente Acordo ser interpretada:

    (a) como impondo a uma Parte Contratante a obrigao de fornecer informaes cuja divulgao seja, a seu critrio, contrria aos interesses essenciais de sua segurana;

    (b) ou como impedindo uma Parte Contratante de tomar todas as medidas que achar necessrias proteo dos interesses essenciais de sua segurana:

    (i) relacionando-se s matrias desintegrveis ou s matrias primas que servem sua fabricao;

    (ii) relacionando-se ao trfico de armas, munies e material de guerra e a todo o comrcio de outros artigos e materiais destinados direta ou indiretamente a assegurar o aprovisionamento das foras armadas;

    (iii) aplicadas em tempo de guerra ou em caso de grave tenso internacional; (c) ou como impedindo uma Parte Contratante de tomar medidas destinadas ao cumprimento de suas obrigaes em virtude da Carta das Naes Unidas, a fim de manter a paz e a segurana internacionais.

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    Com base nesse dispositivo, alguns tericos protecionistas justificam a proteo a certas indstrias, como por exemplo, a indstria blica, a indstria energtica ou mesmo a indstria de alimentos. Segundo estes, se o pas entrar em um conflito armado, precisar contar com uma indstria blica eficiente para poder lhe fornecer os armamentos de que necessita, no dependendo de nenhum fornecedor estrangeiro em uma situao destas.

    Em relao proteo indstria de alimentos, muitos pases a justificam por consider-la uma atividade estratgica, com o argumento de que sua populao no pode ficar dependendo do fornecimento de alimentos por outro pas. H algum tempo atrs, os Estados Unidos se utilizaram do argumento da segurana nacional para impor restries exportao de alimentos e commodities agrcolas para seu territrio. Alegavam como fundamento o receio do bioterrorismo.

    1.2.2.3 Deslealdade Comercial

    A deslealdade comercial outro argumento que pode ser utilizado para a adoo de prticas protecionistas, estando definida no art. VI do GATT. Falaremos mais desse assunto em aulas posteriores. Por enquanto, basta sabermos que, para combater prticas desleais de comrcio, como o dumping ou o subsdio, admite-se que sejam adotados mecanismos protecionistas, respectivamente as medidas antidumping e compensatrias.

    1.2.2.4 Restries no Balano de Pagamentos

    Polticas protecionistas tambm podem ser usadas quando um pas estiver sofrendo restries em seu Balano de Pagamentos. Essa possibilidade est definida no art. XII do GATT, que estabelece que uma Parte Contratante poder, com o fim de resguardar sua posio financeira exterior e equilibrar o seu Balano de Pagamentos, restringir o volume ou o valor das mercadorias permitidas para importar. Essas restries devero, no entanto, ser impostas na medida do necessrio para afastar a ameaa iminente de diminuio relevante de suas reservas monetrias ou deter tal diminuio ou ainda para aumentar suas reservas monetrias no caso de estas serem muito exguas, considerando uma taxa razovel de crescimento.

    Diante da crise financeira internacional de 2008, alguns pases alegaram restries em seu Balano de Pagamentos para adotarem medidas protecionistas. Foi o caso, por exemplo, do Equador, que adotou salvaguardas comerciais para se proteger diante do desequilbrio de suas contas externas.

    1.2.2.5 Surto de Importaes

    Um surto de importaes tambm pode exigir uma poltica comercial protecionista, estando prevista essa possibilidade no art. XIX do GATT. Falaremos mais sobre isso na aula sobre Defesa Comercial. Por enquanto, basta sabermos que, diante de um surto de importaes que cause ou ameace causar dano indstria nacional possvel que sejam adotadas salvaguardas comerciais. Essa medida tem como objetivo fornecer uma proteo temporria indstria nacional, de forma que esta possa ganhar flego por um instante.

    1.2.2.6 Excees Gerais

    O art. XX do GATT relaciona vrias situaes em que se admitem prticas protecionistas. Dentre as mais importantes citamos: i) medidas necessrias proteo da sade e da vida das pessoas e dos animais e preservao dos vegetais ( o que d embasamento para a aplicao de medidas sanitrias e fitossanitrias e regulamentaes tcnicas); ii) medidas

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    relativas conservao dos recursos naturais esgotveis, se tais medidas forem aplicadas conjuntamente com restries produo ou ao consumo nacionais; iii) medidas necessrias proteo da moralidade pblica.

    1.2.2.7 Falhas de Mercado

    Muitos economistas de ndole protecionista defendem as barreiras s importaes tendo como argumento a existncia de falhas de mercado.

    As falhas de mercado podem ser de vrios tipos, variando desde imperfeies no mercado de trabalho at a ineficincia do mercado de capitais. Pode ser que o sistema financeiro de um Estado no permita a alocao eficiente de recursos; ou ento, a mo-de-obra utilizada em um determinado setor to especializada que estaria desempregada em outro setor; ou ainda, as empresas inovadoras no conseguem auferir os lucros das suas inovaes. Em todos esses casos, pode-se identificar mercados que no esto em equilbrio.

    Segundo parte da literatura econmica, quando existirem falhas de mercado, os benefcios do livre comrcio no sero adequadamente quantificveis. Alm disso, a produo industrial gera benefcios que no so captados pela anlise convencional. H, por exemplo, a possibilidade de que a produo de um determinado bem aperfeioe a tecnologia de toda a economia.

    Dessa forma, quando ocorrem falhas de mercado, uma tarifa poder aumentar o nvel de bem-estar no interior do pas. Por outro lado, cabe destacar que tericos liberalistas argumentam que as falhas de mercado devem ser corrigidas por outras polticas domsticas que no comerciais.14 Nesse sentido, a opo pelo protecionismo tarifrio seria apenas a segunda melhor opo (teoria do segundo melhor).

    Exemplificando, suponha que o mercado de trabalho de um determinado pas est em desequilbrio, impedindo o pleno emprego. Nesse caso, o ideal seria uma poltica econmica direcionada para flexibilizar as relaes trabalhistas, tornando menos gravosos os encargos patronais. Todavia, essa pode ser no ser uma soluo politicamente aceitvel, j que os trabalhadores fazem parte de sindicatos com poder de presso. A poltica comercial intervencionista (protecionista) surge, ento, como uma segunda melhor opo para solucionar o problema.

    1.2.3. Industrializao por Substituio de Importaes

    Para tratar da substituio de importao, precisamos falar sobre as teorias estruturalistas desenvolvidas no mbito da CEPAL (Comisso Econmica para a Amrica Latina), foro no qual Ral Prbisch comeou a difundir suas ideias. Ral Prbisch chegou concluso de que a liberalizao comercial no to benfica aos pases em desenvolvimento quanto para os pases desenvolvidos. Assim, os primeiros possuam uma desvantagem relativa nas trocas internacionais. A razo disso seria o fenmeno da deteriorao dos termos de troca?

    Quando se fala em termos de troca, a referncia que se faz relao existente entre as exportaes e as importaes de um pas. Se os bens exportados por um pas valerem cada vez mais no mercado internacional frente aos bens importados, isso ser positivo para esse pas do ponto de vista dos ganhos do comrcio. Por outro lado, se o preo relativo dos bens exportados decair com o passar do tempo, isso ser negativo do ponto de vista dos ganhos do comrcio.

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    A deteriorao dos termos de troca um fenmeno que Ral Prbisch pode observar ao comparar o ritmo de crescimento dos preos dos bens industrializados e dos bens primrios. Ao analisar a evoluo desses preos ao longo do tempo, Prbisch verificou que os bens primrios valem cada vez menos no mercado internacional se comparados aos bens industrializados.

    Os termos de troca se deterioram em virtude da diferena na elasticidade-renda da demanda dos bens primrios e dos bens industrializados.25 Os bens primrios, que so exportados pelos pases em desenvolvimento, possuem menor elasticidade-renda do que os bens industrializados, isto , a demanda por eles menos suscetvel a alteraes na renda da economia. Assim, em um cenrio de crescimento econmico (elevao da renda), o preo dos bens primrios mantem-se mais ou menos constante, enquanto o preo dos bens industrializados cresce progressivamente.

    O grande problema da deteriorao dos termos de troca que os pases em desenvolvimento se especializam na produo de bens primrios, enquanto os pases desenvolvidos se especializam na produo de bens industrializados. Essa a decorrncia natural do Teorema Hecksher-Ohlin!

    Seguindo as ideias de Prbisch, se os pases em desenvolvimento aceitassem passivamente os desgnios do Teorema Hecksher-Ohlin e continuassem se especializando na produo e exportao apenas de bens primrios, isso lhes traria graves prejuzos. Com efeito, isso traria efeitos perversos aos termos de troca dos pases em desenvolvimento, que sairiam perdendo no jogo do comrcio internacional.

    Dessa forma, os pases em desenvolvimento necessitavam desenvolver seu setor industrial a qualquer custo, substituindo as importaes de bens manufaturados e de maior valor agregado pela produo domstica. Essa a ideia que fundamenta a teoria da substituio de importaes.

    A teoria da substituio de importaes foi o modelo seguido pelos pases da Amrica Latina para promover sua industrializao. Voltando no tempo, possvel verificar que, inclusive o Brasil, adotou esse modelo de industrializao, o que restou bastante evidenciado durante os governos de Getlio Vargas e Juscelino Kubitschek.

    Os principais crticos dessa teoria estruturalista afirmam que a substituio de importaes a causa do atraso econmico dos pases latinoamericanos, que foram por ela estimulados a adotar prticas protecionistas. Quando um pas leva a cabo esse tipo de industrializao, a indstria nacional no se beneficia das economias de escala, uma vez que sua atuao fica limitada ao mercado interno. Se a atuao da indstria nacional no se restringisse ao mercado domstico, seu mercado consumidor seria maior, o que lhe permitiria auferir ganhos de escala.

    Alm disso, a poltica de substituio de importaes impede que a indstria nacional fique exposta concorrncia estrangeira. Uma vez sem concorrncia, a indstria nacional no tem incentivos para desenvolver seus produtos e processos e investir em tecnologia, terminando por ficar obsoleta.

    A poltica de substituio de importaes insula o setor industrial da concorrncia internacional por meio da utilizao de barreiras comerciais. Dessa forma, pode-se afirmar que esse tipo de poltica tende a incluir um vis em favor do setor urbano industrial. Com a migrao do campo para a cidade, diminui o nmero de trabalhadores no campo. Assim,

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    comea a faltar mo-de-obra para trabalhar na produo agrcola, o que aumenta os custos de produo e, portanto, os preos desses produtos.

    Cabe destacar, todavia, que quando um pas adota uma poltica de substituio de importaes, ele no consegue proteger todos os setores industriais, devendo escolher quais setores sero beneficiadas. Isso d margem corrupo de funcionrios do governo, que ficam suscetveis ao lobby feito pela indstria nacional.

    Voltando a falar sobre Ral Prbisch, embora sua teoria da substituio de importaes fosse eminentemente protecionista, ele afirmava que os pases da Amrica Latina no deveriam ficar completamente insulados do comrcio internacional. Ao contrrio, ele considerava que estes deveriam buscar uma maior integrao econmica entre si, j que possuam o mesmo nvel de desenvolvimento econmico. Suas ideias, inclusive, culminaram na criao da ALALC (Associao Latino-Americana de Livre Comrcio).

    1.2.4. Industrializao Orientada para Exportaes

    Nas dcadas de 50 e 60, acreditava-se que o melhor caminho para promover o desenvolvimento industrial de um pas seria por meio de uma estratgia de substituio de importaes. No entanto, ao analisar as economias dos pases latino-americanos (que aplicaram largamente essa doutrina!), verifica-se que esse tipo de poltica no foi bem sucedida.

    O desenvolvimento industrial poderia ser alcanado atravs de outra estratgia, orientada para exportaes. Com efeito, pases que adotaram essa estratgia atingiram altas taxas de crescimento, como o caso dos Tigres Asiticos e da prpria China (hoje 2 economia do mundo!). Tais pases tm adotado polticas direcionadas conquista do mercado externo, caracterizando-se pela extrema abertura ao comrcio internacional.

    Enquanto na substituio de importaes, a indstria nacional se desenvolve visando abastecer o mercado interno, na industrializao voltada para exportaes o foco o mercado internacional. Em outras palavras, enquanto no primeiro modelo predomina o protecionismo, no segundo a filosofia mais liberal.

    A anlise da experincia vivenciada pelas economias do Leste Asitico tem marcado as discusses de economistas ao redor do mundo, que buscam entender quais as razes para o alto crescimento econmico desses pases. Essa tarefa no , entretanto, to simples quanto aparenta e existem verses diferentes sobre o desenvolvimento asitico.

    As economias do Leste Asitico, apesar de no praticarem o livre comrcio integralmente, possuem taxas de proteo efetivas baixas, inferiores s dos pases em desenvolvimento. Segundo alguns autores, a poltica comercial seria, portanto, a razo principal para o rpido crescimento asitico.

    Comparando-se o modelo de industrializao voltada para exportaes com o modelo de substituio de importaes, possvel inferir que no primeiro a indstria nacional exposta concorrncia internacional. Essa exposio faz com que ela tenha incentivos para investir em tecnologia e aperfeioar seus produtos e processos.

    No modelo de industrializao voltada para exportaes, as empresas no ficam limitadas ao mercado domstico, possuindo acesso ao mercado internacional como um todo. Por um lado, isso resulta em maior vulnerabilidade externa; por outro, permite que elas possam auferir os benefcios das economias de escala.

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    Destaque-se, ainda, que os pases pequenos conseguem auferir maiores benefcios do uso de polticas industriais orientadas para exportaes, haja vista o exemplo dos Tigres Asiticos.

    1.2.5 Poltica Comercial Estratgica

    Na dcada de 80, surgiram nos pases desenvolvidos novas ideias defendendo a interveno governamental na economia. Esses novos argumentos se baseavam fundamentalmente na existncia de setores de alta tecnologia, os quais se tornaram importantes aps o surgimento do chip de silcio.

    Como estudamos anteriormente, um dos argumentos a favor de uma poltica comercial ativista a existncia de falhas de mercado. Podemos apontar que uma das falhas de mercado reconhecidas pelos economistas o problema da apropriabilidade.

    O problema da apropriabilidade existe nos setores de alta tecnologia. Ele est relacionado ao fato de que as empresas de determinados setores geram conhecimentos que so utilizados por outras empresas sem que estas ltimas tenham que pagar por isso. O investimento em pesquisa e desenvolvimento gera externalidades positivas, que beneficiam vrios outros setores e empresas do mesmo setor.

    Dessa forma, possvel afirmar que alguns setores intensivos em tecnologia geram externalidades positivas que no so apropriadas em sua integralidade pelas empresas inovadoras. Mas o que isso quer dizer?

    No to difcil, meus amigos! Imaginem o caso de uma indstria produtora de equipamentos eletrnicos. Para desenvolver novos modelos, essas indstrias necessitam investir consideravelmente em pesquisa e desenvolvimento. Aps a realizao de tais investimentos, um equipamento de ltima gerao produzido. Mas a, uma outra empresa, utilizando-se da engenharia reversa, desmonta esse equipamento e descobre o segredo industrial, rapidamente desenvolvendo um modelo com a tecnologia parecida.

    Perceba que, nesse caso, a segunda empresa apropriou-se do conhecimento gerado pela empresa inovadora. Com efeito, o conhecimento gerado pela empresa inovadora (externalidade positiva) no foi apropriado integralmente por ela. Em outras palavras, apesar de ela ter investido, terceiros se beneficiaram. Esse o problema da apropriabilidade, segundo o qual as empresas inovadoras tm dificuldade de se aproveitar integralmente das externalidades por elas geradas!

    Em razo disso, o governo deve estimular a produo de bens de maior valor agregado e de maior potencial de irradiao econmica. Afinal de contas, ningum quer investir para que outros se beneficiem. necessrio, portanto, um estmulo estatal!

    Por tudo isso que podemos dizer que as polticas comerciais estratgicas se caracterizam pelo estmulo do governo produo e competitividade de bens de alto valor agregado e de maior potencial de irradiao econmica (gerao de externalidades positivas), os quais so destinados fundamentalmente para os mercados de exportao.

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    1.3 BARREIRAS TARIFRIAS X NO TARIFRIAS 1.3.1 Barreiras no-tarifrias

    As barreiras comerciais se dividem em barreiras tarifrias e barreiras no-tarifrias. Barreiras tarifrias so, conforme o prprio nome explicita, as tarifas incidentes sobre as importaes, isto , os direitos aduaneiros. Barreiras no-tarifrias, por sua vez, so, a grosso modo, qualquer barreira que no seja na forma de tarifa.

    Durante anos de negociaes comerciais sob a gide do GATT e, a partir de 1994, no mbito da OMC, as barreiras tarifrias foram progressivamente reduzidas a patamares bem reduzidos. Com efeito, as regras do sistema multilateral possuem uma espcie de trava em relao aos direitos aduaneiros. Os membros da OMC elaboram listas de compromissos (schedule of concessions), nas quais consolidam as tarifas mximas a serem cobrados para cada produto. Feito isso, no podem voltar atrs unilateralmente, mas somente via renegociao.

    Diante do impedimento de elevar direitos aduaneiros j reduzidos, os pases comearam a utilizar-se de barreiras no-tarifrias, que atualmente so a principal forma de protecionismo existente. E aqui, meus amigos, no h limite para a maldade!. Existem variados tipos de barreiras no-tarifrias, usadas com o objetivo de restringir o comrcio e proteger a indstria domstica. Vejamos quais so as principais barreiras no-tarifrias:

    a) Cotas tarifrias / Cotas no-tarifrias: tanto as cotas tarifrias quanto as no-tarifrias so restries quantitativas s importao. As cotas no-tarifrias consistem em um limite quantitativo alm do qual o Governo no autoriza a entrada do produto no Pas. As cotas tarifrias, por sua vez, consistem em um limite quantitativo alm do qual, embora o Governo autorize a entrada do produto no Pas, a alquota do imposto de importao (II) incidente superior.

    Se o Governo institui uma regra que dispe que s entram no Brasil 6.000 toneladas de coco ralado por ano, temos a uma cota no-tarifria. J se o Governo estabelece que podem entrar no Brasil 6.000 toneladas de coco ralado pagando 2% de I.I e, acima dessa quantidade, o imposto ser de 15%, teremos uma cota tarifria.

    A cota no-tarifria , dentre todos os mecanismos protecionistas, o que causa maiores distores ao fluxo do comrcio internacional. Isso se explica porque, frente a uma tarifa aduaneira, o exportador estrangeiro poder aumentar sua eficincia, reduzir custos e, em decorrncia disso, obter acesso ao mercado do pas importador. Diante de uma cota, de nada adianta o exportador estrangeiro aumentar sua eficincia; ele no ter um acesso ao mercado do pas importador alm do que a cota lhe faculta.

    Cabe destacar que o art. XI do GATT, reconhecendo que a cota no tarifria um mecanismo protecionista altamente pernicioso, probe a utilizao de restries quantitativas. Em situaes excepcionais, como por exemplo para conter restries no Balano de Pagamentos ou, ainda, frente a um surto de importaes, admite-se a utilizao de cotas no-tarifria.

    b) Subsdios: consistem em uma contribuio financeira concedida por um governo com o objetivo de proporcionar uma vantagem a um setor especfico da economia.

    Os subsdios podem ser basicamente de dois tipos: i) subsdios exportao e; ii) subsdios de ajuda interna. Teremos um subsdio exportao se o governo determinar, por exemplo, que para cada quilograma de soja exportado, o agricultor receber US$ 3,00. O

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    subsdio de ajuda interna, por sua vez, ficaria caracterizado se o governo determinasse, por exemplo, que para cada quilograma de soja produzido, o agricultor receber US$ 3,00.

    Tanto os subsdios exportao quanto os de ajuda interna representam distores ao comrcio internacional, uma vez que modificam as escolhas dos agentes econmicos. Os subsdios no so uma prtica incentivada pela Organizao Mundial do Comrcio (OMC) em virtude de no serem dotados de transparncia. Embora os membros da OMC tenham a obrigao de notificar essa organizao internacional sobre todos os subsdios concedidos, isso nem sempre cumprido.

    No curto prazo, os subsdios s exportaes podem trazer Resultados positivos para a economia, uma vez que tero como efeito expandir as exportaes lquidas. Com efeito, se a indstria nacional for estimulada a exportar por meio de subsdios, nada mais natural do que ocorram supervits na Balana Comercial. Todavia, no longo prazo, os subsdios s exportaes distorcem a alocao eficiente dos fatores de produo, trazendo prejuzos economia.

    Os efeitos dos subsdios exportao sobre os preos so exatamente o inverso dos efeitos provocados pelas tarifas. As tarifas aumentam o preo do bem no pas importador e reduzem o preo desse mesmo bem no pas exportador. Os subsdios exportao reduzem o preo do bem no pas importador (mercados de destino) e aumentam o preo do bem no pas exportador (mercado interno). A reduo do preo das exportaes (preo do bem no pas importador) piora os termos de troca do pas que concede os subsdios exportao.

    c) Medidas Antidumping / Medidas Compensatrias: so medidas de defesa comercial autorizadas pela normativa da OMC para fazer frente, respectivamente, prtica de dumping e subsdio que causem dano indstria nacional.

    Tanto as medidas antidumping quanto as medidas compensatrias possuem natureza jurdica no-tributria, uma vez que se configuram em sanes de ato ilcito, fugindo ao conceito de tributo. Considerando-se que elas no possuem natureza jurdica tributria, podemos afirmar que so barreiras no-tarifrias.

    Na atualidade, pode-se dizer que h um recurso abusivo a medidas antidumping, configurando-se esta uma nova forma de protecionismo. As medidas compensatrias ainda so menos disseminadas, uma vez que possuem implicaes polticas, por representarem contestao poltica econmica do pas que concede o subsdio.

    e) Medidas de Salvaguarda: so medidas de defesa comercial aplicadas para conter um surto de importaes que est causando dano grave indstria nacional. Podem ser aplicadas na forma de elevao do imposto de importao (barreiras tarifrias) ou na forma de restries quantitativa (barreiras no-tarifrias).

    f) Licenas de Importao: representam a autorizao governamental para a realizao de uma importao, sendo concedidas, normalmente, antes do embarque da mercadoria no exterior. Quanto utilizadas de forma arbitrria, tornam-se uma grave restrio s importaes.

    g) Taxas Mltiplas de Cmbio: consiste em adotar taxas de cmbio diferenciadas conforme o produto objeto da importao. Se o governo deseja conferir proteo a determinada indstria, ele fixa uma taxa cambial elevada para as importaes de bens por ela produzidos. Ao contrrio, se o governo deseja flexibilizar as importaes de determinado produto, ele ir fixar taxas cambiais favorecidas.

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    A ttulo de exemplo, imagine que o governo deseja proteger a indstria automobilstica. Para isso, ele estabelece que a taxa cambial a ser utilizada na importao de automveis dever ser US$ 1,00=R$3,00 (considere que a taxa de mercado seja US$ 1,00= R$2,00). Com isso, se o importador est comprando um carro de US$10.000,00, ele ter que pagar R$ 30.000,00, valor muito superior ao que seria cabvel se fosse utilizada a taxa de mercado.

    No Brasil, a Instruo n 70 da SUMOC (Superintendncia da Moeda e do Crdito), implantada em 1953, estabelecia taxas mltiplas de cmbio, classificando as mercadorias importadas em cinco grupos diferentes.

    h) Regulamentaes Tcnicas: so medidas impostas pelos pases como forma de garantir que os produtos cumpram requisitos mnimos de qualidade/desempenho. o caso, por exemplo, dos brinquedos, que devem cumprir normas de segurana a fim de se evitar acidentes envolvendo crianas.

    i) Medidas sanitrias e fitossanitrias: so medidas impostas pelo governo como forma de proteger a sade e a vida das pessoas e animais e preservar os vegetais. Como exemplo, citamos as restries que a Unio Europia impe sobre as exportaes brasileiras de carne bovina.

    j) Prticas Arbitrrias de Valorao Aduaneira: a valorao aduaneira, conforme estudaremos em aula posterior, o processo de determinao da base de clculo dos direitos aduaneiros (imposto de importao). Se um pas utiliza mtodos de valorao aduaneira com o objetivo de superdimensionar a base de clculo do imposto de importao, estaremos diante de uma barreira no-tarifria.

    l) Acordos Voluntrios de Restrio s Exportaes (AVREs): so acordos bilaterais por meio dos quais um pas exportador se compromete a limitar suas exportaes de um determinado produto para o mercado do pas importador. Podemos dizer que tais acordos so voluntrios apenas no nome, j que sua concluso ocorre, normalmente, sob ameaas de retaliao. Para viabilizar os AVREs, o pas exportador impe restries quantitativas (cotas) s exportaes.

    m) Requisitos de Contedo Nacional: so medidas adotadas pelo governo que condicionam a concesso de vantagens e benefcios a uma preferncia por produtos nacionais. Como exemplo, citamos a vinculao de linhas de crdito mais favorecidas a empresas que utilizem em seu processo produtivo mais de 60% de insumos nacionais.

    n) Formalidades Alfandegrias: os procedimentos aduaneiros podem transformar-se em restries no-tarifrias quando forem exageradamente burocrticos e complicados, implicando em custos adicionais aos operadores de comrcio exterior. No mbito da OMC, discute-se, atualmente, sobre a necessidade de promover a facilitao de comrcio, que consiste, fundamentalmente, na desburocratizao das operaes de comrcio exterior.

    1.3.2 Barreiras Tarifrias / Modalidades de Tarifas

    No sistema tributrio brasileiro, o termo tarifa utilizado como sinnimo de preo pblico, no possuindo, portanto, natureza tributria. Entretanto, ao estudarmos Comrcio Internacional, tarifa tem outro significado bem distinto.

    Em Comrcio Internacional, o termo tarifa utilizado para se fazer referncia aos direitos aduaneiros, que so os gravames incidentes nas exportaes. Assim, tarifa

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    sinnimo de imposto de importao ou imposto de exportao. Destaque-se, entretanto, que muito mais comum associ-la ao imposto de importao, uma vez que no muito comum que os pases se utilizem do imposto de exportao.

    Os direitos aduaneiros (tarifas) so sempre impostos com finalidades extrafiscais, buscando promover a regulao da economia. Ao impor uma alquota elevada do imposto de importao, o governo protege a indstria contra a concorrncia estrangeira; por outro lado, ao reduzir a alquota do imposto de importao, estimula-se a entrada do bem no pas.

    H diversos tipos (modalidades) de tarifas: a) Tarifas ad valorem: so impostas na forma de um percentual incidente sobre a base

    de clculo, que pode ser o valor aduaneiro (no caso de uma importao) ou o preo normal (no caso de uma exportao). Exemplo: 35%, 20%, 10%.

    b) Tarifas especficas (ad mensuram): so valores impostos sobre uma determinada unidade de medida. Exemplo: R$ 2,00 / kg; R$ 3,00 /litro.

    c) Tarifas mistas (compostas): so aquelas que incorporam elementos das tarifas ad valorem e das tarifas especficas. Exemplo: R$ 5,00 / kg + 10%.

    d) Tarifas tcnicas: so impostas levando-se em considerao o contedo ou os componentes de um determinado produto. Exemplo: R$ 3,00/ kg de couro; R$ 2,00/ kg de ferro.

    Embora restrinjam as trocas internacionais, provocando distores na alocao tima dos fatores de produo, as tarifas so consideradas a forma mais transparente de protecionismo. Em razo disso, a OMC defende a tarificao das barreiras comerciais como forma de evitar que sejam impostas restries veladas ao comrcio internacional na forma de barreiras no-tarifrias.

    UNIDADE 2

    2.1 ORGANIZAO MUNDIAL DO COMRCIO (OMC) 2.1.1 Aspectos Gerais

    Quando se fala, atualmente, em sistema multilateral de comrcio, a referncia ao conjunto de acordos e regras que regulam o comrcio internacional, os quais so administrados pela Organizao Mundial do Comrcio (OMC). Esse sistema multilateral porque no fica restrito a apenas uma regio do globo terrestre, vinculando 159 Estados / territrios aduaneiros1, os quais so membros da OMC.

    Em 1944, quase ao final da Segunda Guerra Mundial, numa tentativa de combater o protecionismo, que havia se acirrado bastante no perodo entre guerras, os aliados reuniram-se na Conferncia de Bretton Woods, na qual foram estabelecidas as bases de um novo sistema para regular as relaes econmicas internacionais.

    Na Conferncia de Bretton Woods, os pases participantes decidiram que a nova ordem mundial seria constituda a partir da criao de trs organizaes internacionais: o FMI (Fundo Monetrio Internacional), o BIRD (Banco Internacional para a Reconstruo e Desenvolvimento) e a OIC (Organizao Internacional do Comrcio). O objetivo era promover a cooperao internacional por meio da institucionalizao de um sistema a reger as relaes econmicas internacionais. Cada uma dessas organizaes teria objetivos bem definidos!

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    Caberia OIC (Organizao Internacional de Comrcio) a tarefa de regular o comrcio internacional, administrando e coordenando a aplicao de acordos e regras de comrcio, assim como supervisionando a poltica comercial dos pases.

    O FMI e o BIRD foram criados, mas a OIC no logrou xito. A Carta de Havana, que seria o estatuto dessa organizao internacional no foi ratificada pelos EUA, um dos pases mais importantes no cenrio internacional. Segundo Vera Thorstensen, a Carta no foi sequer submetida ao Congresso dos EUA, j que os congressistas temiam que fosse restringida a soberania desse pas no campo do comrcio internacional.

    A OIC no foi constituda, mas, em 1947, os pases celebraram um acordo internacional conhecido por GATT 47 (Acordo Geral sobre Tarifas e Comrcio). Esse acordo internacional regeu o sistema multilateral de comrcio durante quase 50 anos, at que fosse criada a OMC.

    Sob a gide do GATT-47, foram desencadeadas diversas rodadas de negociao, as quais tinham por objetivo a progressiva liberalizao do comrcio internacional. As sucessivas rodadas de negociao representam o reconhecimento pelas Partes Contratantes do GATT de que o livre comrcio no seria alcanado de uma hora para a outra. Ao contrrio, a liberalizao comercial ser alcanada de forma progressiva. Era a consagrao do princpio do gradualismo.

    A OMC foi criada em 1994 pelo Acordo de Marrakesh, tambm denominado de Acordo Constitutivo da OMC, que o instrumento jurdico sobre o qual se assentam as bases dessa organizao internacional. Vamos dar uma olhada no que diz o prembulo desse acordo:

    As Partes do presente Acordo,

    Reconhecendo que as suas relaes na esfera da atividade comercial e econmica devem objetivar a elevao dos nveis de vida, o pleno emprego e um volume considervel e em constante elevao de receitas reais e demanda efetiva, o aumento da produo e do comrcio de bens e servios, permitindo ao mesmo tempo a utilizao tima dos recursos mundiais em conformidade com o objetivo de um desenvolvimento sustentvel e buscando proteger e preservar o meio ambiente e incrementar os meios para faz-lo, de maneira compatvel com suas respectivas necessidades e interesses segundo os diferentes nveis de desenvolvimento econmico,

    Reconhecendo ademais que necessrio realizar esforos positivos para que os pases em desenvolvimento, especialmente os de menor desenvolvimento relativo, obtenham uma parte do incremento do comrcio internacional que corresponda s necessidades de seu desenvolvimento econmico,

    Desejosas de contribuir para a consecuo desses objetivos mediante a celebrao de acordos destinados a obter, na base da reciprocidade e de vantagens mtuas, a reduo substancial das tarifas aduaneiras e dos demais obstculos ao comrcio assim como a eliminao do tratamento discriminatrio nas relaes comerciais internacionais,

    Resolvidas, por conseguinte, a desenvolver um sistema multilateral de comrcio integrado, mais vivel e duradouro que compreenda o Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comrcio, os resultados de esforos anteriores de liberalizao do comrcio e os resultados integrais das Negociaes Comerciais Multilaterais da Rodada Uruguai,

    Decididas a preservar os princpios fundamentais e a favorecer a consecuo dos objetivos que informam este sistema multilateral de comrcio, Acordam...

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    As funes da OMC esto definidas pelo art. 3 do Acordo de Marrakesh e so as seguintes:

    a) Administrar os acordos internacionais entre seus membros: no mbito da OMC, so firmados vrios acordos internacionais entre seus membros. Cabe OMC, por meio de seus rgos, facilitar a aplicao, administrao e funcionamento desses acordos. Ressalte-se que h dois tipos de acordos firmados no mbito dessa organizao internacional: os acordos multilaterais e os acordos plurilaterais.

    Existe uma diferena muito importante entre acordos multilaterais e acordos plurilaterais. Enquanto os acordos multilaterais vinculam ou obrigam todos os membros da OMC, os acordos plurilaterais somente vinculam aqueles membros que expressamente a eles desejarem se obrigar. Em outras palavras, os acordos plurilaterais so de adeso facultativa; os acordos multilaterais so obrigatrios para todos os membros da OMC.

    b) Servir como um frum para as negociaes internacionais de comrcio: os pases-membros realizam, sob a gide da OMC, negociaes internacionais sobre os diversos temas relacionados ao comrcio. Ressalte-se que tais negociaes so realizadas levando-se em considerao o princpio da reciprocidade, por meio do qual os pases concedem vantagens mtuas entre si. Em outras palavras, um pas faz concesses, mas espera receber outras em troca.

    c) Solucionar controvrsias comerciais entre seus membros: quando um pas-membro acredita que algum outro membro da OMC est adotando poltica comercial incompatvel com as regras do sistema multilateral, possvel que seja instaurada uma controvrsia no mbito dessa organizao internacional.

    d) Proceder reviso das polticas comerciais dos pases membros O mecanismo de exame de polticas permite que o sistema multilateral de comrcio seja mais transparente, possibilitando que os membros da OMC conheam as polticas comerciais uns dos outros. Ao mesmo tempo, permite que estes recebam um feedback sobre suas prprias polticas comerciais.

    As revises so peridicas e ocorrem em intervalos diferentes, segundo a participao de cada pas no comrcio internacional de bens e servios. E.U.A, Unio Europia, Japo e China, que so os 4 (quatro) membros da OMC com maior participao no comrcio internacional, tm suas polticas examinadas a cada dois anos.

    e) Alcanar maior coerncia na formulao de polticas econmicas em escala global, incluindo cooperao como o FMI e o Banco Mundial. A palavra de ordem aqui cooperao entre organizaes internacionais, que devem buscar coordenar a formulao de polticas econmicas em escala global.

    2.1.2 Estrutura Institucional

    O art.4 do Acordo de Marrakesh estabelece a estrutura institucional da OMC. O rgo mximo dessa organizao internacional a Conferncia Ministerial, composta por representantes de todos os membros, que se reunir pelo menos uma vez a cada dois anos reunies ordinrias. A Conferncia Ministerial tem como tarefa desempenhar as funes da OMC quando est reunida. Mas e quando a Conferncia Ministerial no est reunida? Quem desempenha as funes da OMC?

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    Existe um rgo chamado de Conselho Geral, tambm composto por representantes de todos os Estados-membros, que desempenhar as funes da OMC nos intervalos entre as reunies da Conferncia Ministerial. O Conselho Geral desempenhar a funo de rgo de Soluo de Controvrsias e ainda de rgo de Reviso das Polticas Comerciais. Descendo na escala hierrquica dos rgos da OMC, funcionam sob a orientao do Conselho Geral trs outros rgos: o Conselho para o Comrcio de Mercadorias, o Conselho para o Comrcio de Servios e o Conselho de TRIPS (Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comrcio). O Conselho para o Comrcio de Mercadorias tem como funo principal supervisionar o funcionamento dos acordos multilaterais relacionados ao comrcio de mercadorias. O Conselho para o Comrcio de Servios, por sua vez, tem como funo supervisionar o Acordo Geral sobre o Comrcio de Servios (GATS). Por fim, o Conselho de TRIPS tem como funo supervisionar o Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao comrcio (TRIPS).

    Cada um desses trs Conselhos tem a faculdade de estabelecer rgos subsidirios que sejam necessrios. Com base nessa permisso dada pelo Acordo de Marrakesh, so criados os Comits. Subordinados ao Conselho para o Comrcio de Mercadorias, existem uma srie de Comits, dentre os quais destacamos o Comit de Acesso a Mercados, Comit de Agricultura,

    Comit de Medidas Sanitrias e Fitossanitrias, Comit de Barreiras Tcnicas ao Comrcio, Comit de Medidas de Investimento Relacionadas ao Comrcio, dentre outros. Cada um desses Comits responsvel por administrar um acordo multilateral da OMC.

    Existem, ainda, outros Comits, que esto subordinados diretamente ao Conselho Geral, como o Comit de Comrcio e Desenvolvimento, Comit de Restries por Balana de Pagamentos, Comit de Comrcio e Meio Ambiente, Comit de Acordos Regionais de Comrcio e Comit de Assuntos Oramentrios, Financeiros e Administrativos.

    2.1.3 Processo Decisrio na OMC

    Integram a OMC atualmente 159 membros11, o que torna as negociaes comerciais conduzidas no mbito dessa organizao internacional extremamente complexas, sendo difcil chegar-se a um acordo. Tal fato agrava-se mais ainda quando analisamos o processo decisrio previsto em seus atos constitutivos.

    No mbito da OMC, de acordo com o art. 9 do Acordo de Marrakesh, a regra geral que as decises sejam adotadas por consenso. Sobre o consenso, importante sabermos que ele totalmente diferente de uma unanimidade. Se fosse uma unanimidade, todos os membros precisariam votar em uma determinada alternativa para que ela fosse a escolhida. O consenso, por sua vez, construdo, pois uma alternativa considerada escolhida por consenso quando nenhum pas se manifesta formalmente de maneira contrria a ela.

    2.1.4 Os Acordos Internacionais no mbito da OMC

    O sistema multilateral de comrcio passou a levar em considerao outros temas, como o comrcio de servios e propriedade intelectual. Podemos dizer, assim, que a criao da OMC na Rodada Uruguai trouxe novos temas agenda multilateral, em contraposio ao GATT 47, que somente tratava do comrcio de mercadorias.

    O single undertaking justamente o princpio que impe que todos os membros da OMC estejam vinculados aos acordos multilaterais firmados sob a gide dessa organizao internacional. Em outras palavras, se um pas for membro da OMC, ele estar automaticamente

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    obrigado por toda a normativa multilateral. Dessa forma, um membro da OMC no pode simplesmente escolher a quais acordos ele dever se submeter. Se membro da OMC, ele automaticamente se vincula a toda a normativa multilateral.

    2.2 O ACORDO GERAL SOBRE TARIFAS E COMRCIO (GATT) O surgimento do GATT em 1947 se confunde com a prpria criao do sistema

    multilateral de comrcio, tendo suas origens na Conferncia de Bretton Woods, quando se decidiu pela criao da OIC (Organizao Internacional do Comrcio), iniciativa esta que no logrou xito.

    Embora a OIC no tenha sido criada, em 1947, os pases celebraram o Acordo Geral sobre Tarifas e Comrcio (GATT), o qual trouxe as bases da nova ordem das relaes internacionais no campo do comrcio. Durante quase 50 anos de 1947 at 1994 o GATT regeu sozinho o sistema multilateral de comrcio.

    O objetivo do GATT era combater as prticas protecionistas ento existentes, as quais restringiam e distorciam as trocas internacionais. Nesse mister, o GATT estabeleceu medidas que visavam combater o protecionismo, seja no campo tarifrio ou no-tarifrio.

    Dessa forma, quando os pases criaram o GATT em 1947, eles procuraram inserir em seu texto medidas que impedissem ou regulassem melhor a adoo de prticas protecionistas. A filosofia dos criadores do GATT era estabelecer uma medida para cada prtica protecionista. E assim o fizeram, contemplando compromissos de reduo/eliminao de tarifas e regulamentao de barreiras no-tarifrias.

    Logicamente, os pases sabiam que a liberalizao do comrcio internacional no ocorreria da noite para o dia. Ao contrrio, tinham em mente que ela seria fruto de um processo demorado e custoso, j que envolvia inmeros interesses dspares. Com efeito, um dos princpios institudos pelo GATT 47 foi o gradualismo, segundo o qual a liberalizao do comrcio internacional seria buscada por meio de sucessivas Rodadas de Negociao. Outro princpio do sistema multilateral de comrcio a flexibilidade, que est presente em inmeros mecanismos, evitando que as regras sejam fixas e sem excees.

    As negociaes comerciais deveriam, por sua vez, obedecer ao princpio da reciprocidade, por meio do qual os pases fazem concesses, mas igualmente espera receb-las. A ideia central que todos os pases saiam ganhando e no somente alguns.

    2.2.1 Artigos do GATT

    De acordo com Art. I, a clusula da nao mais favorecida, sempre que um membro da OMC conceder um privilgio a qualquer pas integrante ou no da OMC ele dever estender este privilgio a todos os outros membros dessa organizao internacional.

    Segundo o Art. II, os membros da OMC no podero conceder tratamento menos favorvel que o previsto em uma lista de concesses por eles definida. Tais listas consistem nos compromissos em matria tarifria assumidos pelas Partes Contratantes do GATT. Ao definir sua lista, os pases estabelecem, portanto, o limite mximo do imposto de importao que iro cobrar para um determinado produto.

    O princpio do tratamento nacional, que outra vertente do princpio da no-discriminao, possui trs acepes diferentes, todas descritas no Artigo III do GATT. Em

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    linhas gerais, o princpio do tratamento nacional (tambm chamado de princpio da paridade) probe os membros da OMC de conceder tratamento mais favorvel aos produtos domsticos do que aos produtos de outros membros da OMC, uma vez que estes ltimos tenham adentrado o territrio aduaneiro. Enquanto a clusula da nao mais favorecida veda a discriminao entre diferentes origens, o princpio do tratamento nacional veda a discriminao entre produto nacional e produto estrangeiro. Suponha, por exemplo, que sobre uma mercadoria nacional incida uma alquota de ICMS de 15%. Nesse caso, essa mesma alquota de ICMS incidir tambm sobre o produto importado.

    O art. VI do GATT permite a adoo de prticas protecionistas na eventualidade de ocorrncia de prticas desleais de comrcio dumping e subsdio. Diante da ocorrncia de dumping, devero ser aplicados direitos antidumping e diante da ocorrncia de subsdio devero ser aplicados direitos compensatrios.

    Importante ressaltar que nem todo dumping e nem todo subsdio so punveis com a aplicao de medidas de defesa comercial, mas to somente aqueles que causem dano ou ameaa de dano indstria nacional, ou ainda, retardamento real em sua implantao. O Acordo sobre a Implementao do Art. VI do GATT e o Acordo sobre Subsdios e Medidas Compensatrias regulam melhor essa matria.

    O princpio da transparncia, presente no Art. X, tambm um dos pilares do sistema multilateral de comrcio, existindo desde o GATT-47. Trata-se da obrigao de publicar todas as normas e regulamentos que afetem o comrcio internacional, o que tem por objetivo central permitir maior segurana jurdica e previsibilidade nas relaes comerciais.

    Nos diversos acordos da OMC, est previsto o princpio da transparncia, que se manifesta por meio obrigaes de notificao. Se um membro estabelece uma nova medida relativa ao comrcio, esta dever ser notificada OMC, o que permitir que todos os outros membros dessa organizao internacional dela tomem conhecimento.

    A imposio de cotas sobre a importao , dentre todas as prticas protecionistas, a que resulta em maior distoro ao comrcio internacional. Frente a um subsdio ou a um aumento de tarifas, o exportador pode aumentar sua eficincia e mesmo assim obter acesso ao mercado. J diante de uma restrio quantitativa, no h alternativa eficiente, j que a partir do ingresso de certa quantidade de produtos importados, no sero mais autorizadas licenas de importao, restringindo o acesso ao mercado. Por isso, a OMC probe, em seu art. XI, como regra geral, a utilizao de restries quantitativas.

    Existem excees importantes proibio da imposio de restries quantitativas: 1) Admite-se a utilizao de restries quantitativas em virtude de desequilbrios no Balano de Pagamentos. 2) Admite-se a imposio de medidas de salvaguarda na forma de restries quantitativas.

    Da leitura do art. XVI podemos depreender vrios conceitos importantes relacionados concesso de subsdio. Em primeiro lugar, o que um subsdio?

    Subsdio, de acordo com o conceito da OMC, qualquer forma de proteo das rendas ou sustentao dos preos que tenha direta ou indiretamente por efeito elevar as exportaes de um produto (subsdio s exportaes) ou reduzir importaes desse mesmo produto (subsdio na forma de ajuda interna).

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    O subsdio uma forma muito menos danosa de protecionismo do que as cotas e as tarifas, causando menor distoro ao comrcio. No entanto, no uma forma de protecionismo incentivada pela OMC, que prega pela tarificao das barreiras. Mas se o subsdio menos danoso do que as cotas e as tarifas, por que sua utilizao no incentivada?

    A utilizao dos subsdios no incentivada pela OMC porque eles no so dotados de transparncia. Embora o art. XVI estabelea que as Partes Contratantes que concedem um subsdio tm a obrigao de notific-lo, muitos pases no o fazem.

    O art. XXIV do GATT estabelece a possibilidade de que os membros da OMC concedam preferncias tarif