ual - custo dos acidentes de viação

158
 CUSTO ECONÓMICO E SOCIAL DOS ACIDENTES DE VIAÇÃO EM PORTUGAL Documento 1/2012/CARS ARLINDO ALEGRE DONÁRIO E RICARDO BORGES DOS SANTOS Lisboa 2012

Upload: vitor-hugo-g-correia

Post on 03-Nov-2015

9 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

n

TRANSCRIPT

  • Custo EConmiCo E soCial dos

    aCidEntEs dE Viao Em Portugal

    Documento 1/2012/CARS

    Arlindo Alegre donrio e ricArdo Borges dos sAntos

    Lisboa 2012

  • TTULOCusto Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal

    AUTORESArlindo Alegre Donrio e Ricardo Borges dos Santos

    EDITORAEDIUAL

    CEU Cooperativa de Ensino Universitrio, C. R. L.Rua de Santa Marta, n. 56

    1169-023 Lisboa

    CAPA Samuel Asceno

    DESIGN | COMPOSIO GRFICASamuel Asceno

    ISBN978-989-8191-35-9

    DEPSITO LEGAL

    Autoridade Nacional de Segurana Rodoviria e Centro de Anlise Econmica de Regulao Social (CARS) da Universidade Autnoma de Lisboa

    Documento 1/2012/CARS

    DONRIO, Arlindo; SANTOS, Ricardo Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal. Lisboa: Ediual, 2012ISBN 978-989-8191-35-9

  • ndice

    ndice de grficos e quadros ..............................................................................................7

    Sinopse ................................................................................................................................. 11

    Introduo ........................................................................................................................... 13

    I Interveno do Estado. Regulamentos e Eficincia ....................................... 19

    II Comparao Europeia ............................................................................................ 25

    III Evoluo dos Acidentes de Viao com Vtimas em Portugal (19592010) ................................................................................................................................... 29

    IV Mtodos para a Estimao do Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao ............................................................................................................................ 37

    4.1 Mtodo Conhecido por Willingness To Pay (WTP) ................................. 38

    4.2 Mtodo do Capital Humano ......................................................................... 42

    4.3 Metodologia Utilizada ................................................................................... 43

    V Dos Dados ................................................................................................................... 45

    VI Componentes do Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao ..............................................................................................................................47

    6.1 Valor da perda de produo ......................................................................... 48

    6.1.1 Perda de produo relativa s vtimas mortais ........................... 48

    6.1.2 Feridos graves ...................................................................................... 51

    6.1.2.1 Custos hospitalares com feridos graves ............................ 52

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal4

    6.1.2.2 Custos relativos perda de produo potencial total com feridos graves ........................................................................................... 52

    6.1.3 Feridos ligeiros..................................................................................... 55

    6.1.4 Custos administrativos das seguradoras ....................................... 55

    6.1.5 Custos indiretos com instituies pblicas devido segurana rodoviria ........................................................................................................... 56

    6.1.6 Custos de funcionamento dos Tribunais ....................................... 57

    6.1.7 Custos hospitalares relacionados com vtimas mortais e feridos graves .................................................................................................................. 58

    6.1.8 Custos de transporte das vtimas .................................................... 58

    6.1.9 Custos com entidades fiscalizadoras ............................................. 58

    6.1.10 Custos dos danos materiais nos veculos .................................... 59

    6.1.11 Custos relacionados com peritagens de acidentes ................... 59

    6.1.12 Honorrios pagos a advogados ..................................................... 59

    6.1.13 Valor das custas judiciais ................................................................ 60

    6.1.14 Custos com funerais ......................................................................... 60

    6.1.15 Valor dos danos no patrimoniais ................................................ 60

    VII Estudo Emprico .................................................................................................... 65

    7.1 Valor total da perda de produo ................................................................ 65

    7.1.1 Valor da perda de produo relativa s vtimas totais ............... 65

    7.1.2 Valor da perda de produo das vtimas mortais ........................ 67

    7.1.3 Valor da perda de produo dos feridos graves .......................... 69

    7.1.4 Valor da perda de produo dos feridos ligeiros ......................... 70

    7.2 Custo econmico e social dos acidentes de viao................................. 72

    7.2.1 Custo mdio por acidente com vtimas ......................................... 78

    7.2.2 Custo mdio por acidente com vtimas mortais .......................... 79

    7.2.3 Custo mdio por acidente com feridos graves ............................. 80

  • 5ndice

    7.2.4 Custo mdio por acidente com feridos ligeiros ........................... 82

    7.3 Custo mdio por vtima mortal, grave e ligeira ....................................... 83

    7.3.1 Custo mdio por vtima ..................................................................... 84

    7.3.2 Custo mdio por vtima mortal ........................................................ 85

    7.3.3 Custo mdio por ferido grave ........................................................... 87

    7.3.4 Custo mdio por ferido ligeiro ......................................................... 88

    7.4 Anlise economtrica .................................................................................... 89

    7.4.1 Dos dados e denominao das variveis ....................................... 89

    7.4.2 Dos testes realizados relativos s sries temporais. ................... 91

    7.4.3 Dos modelos economtricos relativos ao total de Vtimas, mortos e feridos graves e ligeiros............................................................................... 92

    7.4.3.1 Total de vtimas ........................................................................ 92

    7.4.3.2 Modelos economtricos relativos s vtimas mortais .... 95

    7.4.3.3 Modelos economtricos relativos aos feridos graves ..... 97

    7.4.3.4 Modelos economtricos relativos aos feridos ligeiros ... 99

    7.4.4 Anlise da covarincia por conjuntos de variveis independen-tes ....................................................................................................................... 100

    7.4.4.1 Anlise da covarincia do nmero total de vtimas ..... 101

    7.4.4.2 Anlise da covarincia do nmero de vtimas mortais 104

    7.4.4.3 Anlise da covarincia do nmero de feridos graves .. 105

    7.4.4.4 Anlise da covarincia do nmero de feridos ligeiros 107

    VIII Concluses ........................................................................................................... 109

    8.1 Concluses gerais.......................................................................................... 109

    8.2 Concluses especficas ................................................................................ 113

    8.2.1 Evoluo dos custos consubstanciados na perda potencial de produo do total de vtimas ...................................................................... 114

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal6

    8.2.2 Evoluo dos custos consubstanciados na perda potencial de produo das vtimas mortais ..................................................................... 115

    8.2.3 Evoluo dos custos consubstanciados na perda potencial de produo com feridos graves ...................................................................... 116

    8.2.4 Evoluo dos custos consubstanciados na perda potencial de produo dos feridos ligeiros ...................................................................... 117

    8.2.5 Evoluo do custo econmico e social dos acidentes de via-o ................................................................................................................. 118

    8.2.6 Evoluo do custo mdio total por acidente com vtimas ...... 119

    8.2.7 Evoluo do custo mdio por acidente com vtimas mortais 120

    8.2.8 Evoluo do custo mdio por acidente com feridos graves ... 120

    8.2.9 Evoluo do custo mdio por acidente com feridos ligeiros . 121

    8.2.10 Evoluo do custo mdio por vtima ......................................... 121

    8.2.11 Evoluo do custo mdio por vtima mortal ............................ 122

    8.2.12 Evoluo do custo mdio por ferido grave ............................... 122

    8.2.13 Evoluo do custo mdio por ferido ligeiro ............................. 123

    8.2.14 Anlise economtrica .................................................................... 123

    IX Recomendao ....................................................................................................... 127

    Bibliografia ........................................................................................................................ 129

    Anexos ............................................................................................................................... 137

  • ndice de grficos e quadros

    Grfico n.2.1 Mortos por milho de habitantes em acidentes de trfego em 5 pases: Portugal, Grcia; Itlia, Espanha e Frana (1991 -2008) ............................. 25

    Grfico n.2.2 Mortos por milho de habitantes em acidentes de trfego. Por-tugal comparado com quatro pases com baixas taxas (1991 2008) .................... 26

    Grfico n. 2.3 Mortos por milho de habitantes em acidentes de trfego. Portugal comparado com a Unio Europeia a 15 e 27 pases (1991 -2008) ......... 27

    Grfico n. 3.1 Evoluo do nmero de acidentes com vtimas em Portugal (1959 -2010) ......................................................................................................................... 29

    Grfico n. 3.2 Evoluo do nmero de mortos em acidentes rodovirios em Portugal. Perodo de 1959 -2010 .................................................................................... 31

    Grfico n. 3.3 Evoluo do nmero de feridos graves em acidentes rodovirios em Portugal (1987 -2010) ................................................................................................. 33

    Grfico n. 3.4 Evoluo do nmero de feridos graves em acidentes rodovirios em Portugal registados pelos hospitais e pela Polcia (2000 -2009) ...................... 34

    Grfico n. 3.5 Evoluo do nmero de feridos ligeiros em acidentes rodovirios (1996 -2010) ......................................................................................................................... 35

    Grfico n. 7.1.1.1 Valor da perda de produo do total de vtimas ................ 66

    Grfico n. 7.1.1.2 Valor da perda de produo das vtimas mortais .............. 67

    Grfico n. 7.1.1.3 Valor da perda de produo relativa aos feridos gra-ves ......................................................................................................................... 69

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal8

    Grfico n. 7.1.1.4 Valor da perda de produo relativa aos feridos leves .... 71

    Grfico n. 7.2.1 Evoluo do custo econmico e social dos acidentes rodovi-rios ........................................................................................................................................ 72

    Quadro n. 7.2.1 Evoluo do custo econmico e social dos acidentes rodovi-rios com vtimas mortais, no perodo de 1996 a 2010. .......................................... 74

    Quadro n. 7.2.2 Evoluo do custo econmico e social dos acidentes rodovi-rios com feridos graves, no perodo de 1996 a 2010. ............................................. 75

    Quadro n. 7.2.3 Evoluo do custo econmico e social dos acidentes rodovi-rios com feridos ligeiros, no perodo de 1996 a 2010. ........................................... 76

    Grfico n. 7.2.1.1 Evoluo do custo econmico e social mdio por acidente com vtimas ......................................................................................................................... 78

    Grfico n. 7.2.2.1 Evoluo do custo econmico e social mdio por acidente com vtimas mortais ......................................................................................................... 79

    Grfico n. 7.2.3.1 Evoluo do custo econmico e social mdio por acidente com feridos graves ............................................................................................................ 81

    Grfico n. 7.2.4.1 Evoluo do custo econmico e social mdio por acidente com feridos ligeiros .......................................................................................................... 82

    Grfico n. 7.3.1.1 Evoluo do custo mdio por vtima .................................... 84

    Grfico n. 7.3.2.1 Evoluo do custo mdio por vtima mortal ....................... 85

    Grfico n. 7.3.3.1 Evoluo do custo mdio por ferido grave .......................... 87

    Grfico n. 7.3.4.1 Evoluo do custo mdio por ferido ligeiro ........................ 88

    Quadro n. 7.4.3.1.1 Modelos dinmicos (ADL(1,1)).Resultado das regresses. Varivel explicada: Ln VTIMAS TOTAIS

    t ................................................................... 93

    Quadro n. 7.4.3.2.1 Modelos dinmicos [ADL(1,1)]. Resultado das regresses. Varivel explicada: Ln Mortos

    t ...................................................................................... 95

    Quadro n. 7.4.3.3.1 Modelos dinmicos [ADL(1,1)].Resultado das regresses. Varivel explicada: Ln Feridos Graves

    t ....................................................................... 97

    Quadro n. 7.4.3.4.1 Modelos dinmicos [ADL(1,1)]. Resultado das regresses. Varivel explicada: Ln Feridos Leves

    t .......................................................................... 99

  • 9ndice

    Quadro n. 7.4.4.1.1 Anlise da covarincia por conjuntos Vtimas Totais .................................................................................................................. 101

    Quadro n. 7.4.4.2.1 Anlise da covarincia por conjuntos Vtimas Mor-tais ........................................................................................................................... 104

    Quadro n. 7.4.4.3.1 Anlise da covarincia por conjuntos Feridos Gra-ves ........................................................................................................................... 106

    Quadro n. 7.4.4.4.1 Anlise da covarincia por conjuntos Feridos Leves ....................................................................................................................... 107

    Quadro n 8.1.1 Custos individuais mdios associados aos diferentes tipos de vtima ................................................................................................................................. 111

    Quadro n 8.1.2 Custos individuais mdios relativos aos acidentes com vti-mas ...................................................................................................................................... 112

  • Sinopse

    O presente estudo teve como objectivo apurar os custos econmicos e sociais dos acidentes rodovirios em Portugal.

    Foi desenvolvido no Centro de Anlise Econmica de Regulao Social (CARS) da Universidade Autnoma de Lisboa, por solicitao da Autorida-de Nacional de Segurana Rodoviria, adiante designada por ANSR, que tem por misso o planeamento e coordenao a nvel nacional de apoio poltica do Governo em matria de segurana rodoviria.

    O conhecimento destes custos constitui uma primeira fase para uma anlise posterior sobre as causas dos acidentes de trfego, o que permitir a concretizao de polticas que levem sua minimizao a fim de contribuir para a maximizao do bem -estar social.

    O apuramento emprico dos custos sociais dos acidentes constitui um indicador da magnitude do problema social da resultante, dado que no possvel, atravs de qualquer dos mtodos que se utilizem, apurar com preciso esse custo social.

  • Introduo

    Atravs dos tempos a mobilidade sempre foi e um desejo do indi-vduo. Permite que as pessoas se relacionem e que as transaes de bens e servios se efetuem, aumentando o nvel e qualidade da vida humana, aspirao que traduz a essncia do indivduo na busca contnua da reali-zao permanente das suas pretenses.

    Ao longo da histria da humanidade mobilidade humana associam-se custos inerentes a par dos benefcios que da derivam; mas foi no sculo XX que a mobilidade rodoviria (para alm da mobilidade area) se desenvolveu, de forma exponencial, com a utilizao de veculos motori-zados, permitindo a diminuio do tempo gasto nos percursos realizados, incrementando as transaes econmicas a nvel global.

    A mobilidade rodoviria, e o seu incremento diacrnico, permitiram Humanidade aumentar o seu ritmo de desenvolvimento, traduzido em elevados benefcios; mas resulta da evidncia emprica e dos estudos terico empricos que de todas as escolhas emergem benefcios e custos, sendo que um dos principais objetivos minimizar esses custos, que o mesmo dizer, obterem -se os benefcios com o mnimo de sacrifcios para se alcanar a eficincia, ou seja, a maximizao do bem estar (ou utilidade) social.

    A circulao rodoviria permite obter maior eficincia econmica, reduzindo o tempo de transporte mas, simultaneamente, tem impacto negativo no ambiente, na segurana, havendo, por conseguinte, objetivos

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal14

    conflituantes, pelo que s da ponderao entre os custos e benefcios se poder, tendencialmente, encontrar o equilbrio, o qual se consubstancia na minimizao dos custos sociais dos acidentes.

    Mesmo em termos tericos poder dizer se que, no mbito da circula-o rodoviria, ser improvvel (ou mesmo impossvel) a reduo a zero dos acidentes, dado que no humanamente possvel o afastamento do risco, seja dos acidentes, seja de qualquer outra atividade humana. Com efeito, todas as dimenses da vida humana e todas as escolhas tm inerente um risco e incerteza, maior ou menor, sendo um dos objetivos dos indi-vduos e da sociedade em geral, no eliminar o risco totalmente, porque impossvel, mas minimiz -lo. No mbito da segurana rodoviria, cabe ao Estado, atravs da sua interveno reguladora, desenvolver e implantar polticas que contribuam para a minimizao do custo social dos acidentes, com o objectivo da maximizao do bem -estar social.

    Nas opes que o indivduo faz, este levado a maximizar o seu interesse, diminuindo, para si, os custos inerentes s mesmas e, tendo em considerao determinados valores morais e ticos (que entram na sua equao pessoal), muitas vezes so negativamente afetados os interesses de outros grupos de indivduos devido a essas escolhas.

    Numa anlise custo benefcio verifica se, com frequncia, que as opes efetuadas tm um custo social superior ao benefcio social (embora com benefcios superiores aos custos para determinados indivduos ou grupos), gerando ineficincia social e, em consequncia, diminuindo a funo de bem -estar coletivo.

    A mobilidade rodoviria implica a existncia de um elevado risco, o qual, per se, constitui um dos elementos do custo social dos acidentes, ao lado dos custos patrimoniais de vria ordem, bem como, dos custos no-patrimoniais ou custos morais, os quais no so refletidos no produto e rendimento nacional.

    No mbito da mobilidade rodoviria, a fim de maximizar o bem estar social, a vivncia em sociedade implica que os indivduos aceitem uma srie de regras para tornar possvel a sua interao nas diversas instncias da vida social, valorando uma ampla gama de fatores, para que a seguran-

  • 15

    a, que pode ser considerada um bem primrio e um bem de mrito, possa ser maximizada com a consequente minimizao dos custos sociais dos acidentes de forma eficiente.

    No quadro terico em que desenvolvemos este estudo, consideramos que o indivduo, ao tomar a deciso de fazer uma viagem, o modo de a fazer, em que tempo e por quanto tempo, tem em considerao os benef-cios esperados e os custos que espera suportar, procurando maximizar a diferena entre os benefcios e os custos privados esperados.

    Na sua escolha, o indivduo avalia as alternativas marginalmente1. Por norma, a sua deciso no toma em conta os custos e benefcios externos que podero emergir do seu comportamento, sendo os custos e benefcios externos designados, respetivamente, por externalidades negativas e positivas.

    Atendendo a que a circulao rodoviria desencadeia custos e bene-fcios sociais (globais) que afetam, no apenas o indivduo que decide ter determinado comportamento na utilizao de um veculo, mas tambm outros indivduos da sociedade, considerando que estes procuram minimi-zar os custos e maximizar a utilidade adveniente dos seus comportamentos e aes, o custo social (global) tende, em regra, a ser superior ao custo suportado pelos indivduos (que designamos por custo privado) que tm determinado comportamento ou praticam certas aes.

    Deste modo, o mercado de segurana e mobilidade rodovirias falha no que concerne eficincia, surgindo assim razes para a interveno do Estado, atravs de polticas de vria natureza, de modo a que os indivduos internalizem os custos externos que provocam, pois s atravs dessa internalizao se obtero comportamentos eficientes.

    A regulao da mobilidade viria justifica se porque o mercado falha na resoluo eficiente do problema da segurana rodoviria. Os indivduos procuram maximizar a realizao dos seus prprios interesses e podem adotar comportamentos que afetem a segurana da circulao, como

    1 O termo marginal refere -se variao do custo total ou do benefcio total devidos a

    uma nova viagem.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal16

    conduzir sem seguro ou sem carta de conduo, utilizar veculos sem proteo para os ocupantes, conduzir sob os efeitos do lcool ou de outras substncias que elevam o nvel de risco de acidentes, de mortos e feridos, risco que, per se, constitui um dos fatores de custo dos acidentes como foi referido anteriormente.

    A interveno do Estado atravs do estabelecimento de normas jur-dicas tem por finalidade a diminuio de condutas com efeitos negativos para a sociedade, interveno reguladora que uma das formas que o Esta-do tem de afetar o comportamento dos indivduos no sentido de aumentar a eficincia, a par da atuao sobre as vias de circulao. A segurana rodoviria pode ser considerada um bem de mrito cuja utilidade pode no ser adequadamente valorada pelos usurios das vias, devido falta ou deficiente informao, nomeadamente, do risco emergente da circulao.

    Dado que os acidentes so eventos raros na vida de um condutor, passageiro ou peo, e ocorrem pela combinao no esperada de vrias circunstncias, os indivduos podem avaliar incorretamente as probabili-dades de que o acidente se produza, dado que, de forma geral e em mdia, as probabilidades subjetivas so diferentes das probabilidades objetivas, e quanto maior essa diferena, maior ser o erro na avaliao do risco objectivo. Por esta razo no tomaro em conta todos os riscos que podem emergir do seu comportamento, gerando se, deste modo, ineficincia com danos para os prprios e para os outros indivduos da sociedade.

    A interveno reguladora do Estado tambm se justifica pela funo de compensao que o sistema de responsabilidade civil visa atravs do segu-ro automvel obrigatrio (com prmios de seguro por vezes diferenciados segundo o nvel de risco dos indivduos), sobretudo devido existncia de falhas de mercado relativas aos danos morais. Outra das razes consiste na existncia de externalidades associadas aos acidentes de trfego que no podem ser internalizadas, como ocorre no caso de danos no patrimoniais,

  • 17

    custos humanos, cuja compensao integral difcil ou mesmo impossvel, ou de danos que provocam a morte2.

    Frequentemente, verifica se o incumprimento das regras de circulao rodoviria, que permitem a mobilidade com o mnimo de custos, havendo razes para a interveno do Estado como regulador atravs da produo de normas jurdicas e da sua aplicao em caso de violao das mesmas, dada a existncia de falhas no mercado da mobilidade e segurana rodo-virias.

    Essa interveno do Estado fundamenta se ainda na existncia de ou-tras falhas neste mercado, entre as quais se destacam: a) as externalidades de vrios tipos, incluindo os danos patrimoniais e morais provocados a terceiros e a poluio do ambiente; b) a existncia de falhas de informao; c) a existncia de bens com caractersticas de bens pblicos (estradas); d) mercados incompletos (consubstanciados na ausncia de mercado para certos bens no patrimoniais) e o prprio risco gerado na conduo de veculos.

    Considerando que os acidentes rodovirios tm como causa a inte-rao de mltiplos fatores, formando um sistema complexo e dinmico, as polticas adequadas para a minimizao dos custos sociais devero ser integradas, ou seja, dever ter -se em conta os vrios conjuntos de fatores determinantes dos acidentes e muitas vezes a sua interao e potenciao do risco.

    2 As vtimas que sofrem a perda de um parente, apenas podem ser parcial e simbolica-

    mente compensadas. Vid. Artigo 496 do Cdigo Civil.

  • I Interveno do Estado.

    Regulamentos e Eficincia3

    As normas4 de segurana rodoviria e de responsabilidade civil repre-sentam duas modalidades diferentes de controlo de atividades que geram um nvel de risco elevado.

    As normas de responsabilidade civil so, por natureza, privadas e produzem efeitos de forma indireta dado que influem no comportamento dos indivduos atravs dos custos esperados (efeito preveno). A sua aplicao verifica se ex post em relao ao dano5.

    A internalizao das externalidades efetua -se por iniciativa privada e a maioria dos elementos dos custos externos avaliam -se de acordo com os critrios estabelecidos no mercado. Para que as normas de responsabi-lidade civil sejam aplicveis necessrio que exista um dano causado vtima. Estes colaboram na identificao dos causadores do dano porque esperam obter deles uma indemnizao e, deste modo, contribuem para a eficcia dessas normas.

    3 Segue se Donrio (2010a), pp.338 e segs.4 O sistema legal pode ser considerado um bem pblico pois no pode ser dividido em

    unidades para serem trocadas individualmente no mercado. um bem indivisvel que

    justifica a interveno do Estado para otimizar a afectao dos recursos.5 Sobre este tema veja se Shavel (1983) e Blomquist (1988).

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal20

    Por outro lado, os regulamentos de circulao impem certas proi-bies e estabelecem modelos de comportamento, como os relativos conduo sob os efeitos do lcool, cumprimento dos limites de velocidade, o uso do cinto de segurana e outras similares. Estes regulamentos so, por natureza, pblicos e normalmente tm alguma eficcia direta sobre o comportamento dos condutores. Supem restries para o indivduo que se traduzem em custos, perda de utilidade e a sua finalidade conseguir segurana na circulao de modo a minimizar os custos sociais. Estabe-lecem modelos de conduta e preveem sanes que constituem um custo potencial para os infratores.

    A maioria destas normas provm do Estadolegislador, que assume a funo de estabelecer as regras de utilizao das vias de comunicao. O Estado administrao e o Estado jurisdicional intervm na aplicao direta dessas normas atravs das foras de segurana e do sistema judicial6.

    Os efeitos das normas regulamentares produzem -se ex ante ao evento danoso, isto , a infrao associa -se a uma sano, independentemente da ocorrncia efetiva de um acidente. Os regulamentos fundamentam se na ideia de que o risco que a conduo envolve deve situar se dentro de determinados limites para que seja socialmente aceitvel que, desta forma, contribui para a minimizao dos custos sociais dos acidentes.

    O dever de suportar certo nvel de risco impe um custo aos utiliza-dores das vias e influi no nvel de risco dos acidentes, pois os indivduos, com a informao que possuem em cada momento, tendem a adotar um comportamento que maximize a diferena entre os custos e os benef-cios esperados. Para controlar os acidentes de trfego o esforo dever concentrar -se na alterao do comportamento dos condutores e dos demais utilizadores, considerando os incentivos criados pelas normas e pela probabilidade da sua aplicao, tendo em conta, tambm, os outros fatores determinantes dos acidentes, entre os quais se destacam os relacionados com os veculos e com o ambiente fsico (estradas, autoestradas) e cultural

    6 Caetano (1977), pp.36 37.

  • 21I Interveno do Estado. Regulamentos e Eficincia

    (que integra o conjunto de valores morais, entendendo se este conceito em sentido amplo, incluindo os os valores ticos, sociais e religiosos).

    Como afirma Bonni7, o impacto dos regulamentos sobre o comporta-mento dos utilizadores das vias depender da distribuio e intensidade das preferncias individuais segundo os tipos de atitude face ao risco. A precauo na conduo exige que os utilizadores das vias tenham uma perceo adequada do nvel de risco e para que atuem de modo eficiente devero assumir todos os custos e benefcios das suas aes. Se o indiv-duo esperar que parte dos custos das suas aes e comportamentos seja externalizado, o seu comportamento tender a ser ineficiente e a procura do nvel de atividade aumentar, implicando comportamentos como o aumento da velocidade, uso mais frequente do veculo, maiores nveis de lcool no sangue ou ingesto de substncias que alteram a perceo do nvel de risco e diminuem os reflexos ou outras infraes das regras que tendem a aumentar o risco de acidentes.

    As sanes previstas nas normas reguladoras no mbito da conduo rodoviria, associadas probabilidade da sua aplicao (sano esperada), constituem incentivos que induzem os indivduos a desenvolverem um comportamento que tende para o nvel de cuidado timo, diminuindo o nmero de acidentes e suas consequncias8. Conjuntamente com o siste-ma de responsabilidade civil, os regulamentos constituem um conjunto de modificadores do comportamento dos indivduos que, para alm da eficcia singular de cada um, recebe os efeitos sinergticos existentes da sua aplicao conjunta.

    A perceo do risco distorcida quando no se detm a totalidade de informao sobre as vias, aumentando a probabilidade objetiva de acidentes, pela subestimao ou sobre estimao desse risco, gerando ineficincia, dado que o comportamento dos indivduos baseia se na

    7 Bonni, (1985), pp.131 211.8 Como referimos, parte dos acidentes no so registados pelas autoridades, em particular,

    os que apenas provocam danos materiais, devido a que a sua informao poderia ocasio-

    nar um aumento dos prmios dos seguros. Por outro lado, a interveno das autoridades

    policiais poderia acarretar uma sano para o causante se tivesse cometido uma infrao.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal22

    probabilidade subjetiva9. Assim, uma informao incompleta constitui uma falha de mercado, fundamentando a regulao social no mercado de segurana e mobilidade rodovirias atravs da produo de regras sobre a circulao de trfego.

    O aumento da probabilidade objetiva de aplicao da lei tende a dimi-nuir a diferena entre as probabilidades subjetiva e objetiva, o que leva a aumentar a eficincia do comportamento dos indivduos. Deste modo, uma baixa probabilidade objetiva de aplicao da lei gera uma maior diferena probabilidade subjetiva que determina o comportamento do condutor, elevando nvel de ineficincia, com diminuio da eficcia das normas.

    Os regulamentos estabelecem um padro uniforme geral de compor-tamento na conduo automvel, independentemente das circunstn-cias pessoais, dos veculos e do ambiente, devido falta de informao completa por parte dos decisores quanto ao nvel de risco especfico gerado por cada condutor ou outro utilizador das vias. Considera se que os agentes policiais, como qualquer outro indivduo, procuram maximizar os seus interesses, valorando os custos e benefcios que esperam obter10. Em Portugal, o Cdigo da Estrada estabelece que os agentes no recebem percentagem das multas aplicadas; porm, os agentes policiais podem ter que suportar alguns custos pela aplicao da lei, nomeadamente, devido a deslocaes aos tribunais e porventura alguns custos no patrimoniais. Se os custos esperados forem superiores aos benefcios, geram -se incentivos para evitar a aplicao de sanes previstas na lei.

    Por outro lado, se os salrios forem relativamente baixos, e na ausncia de outros incentivos positivos, e considerando que se a estrutura de valores morais (em sentido lato) com o seu conjunto de sanes internas (tradu-zidas na culpa) e externas (reprovao social) e recompensas externas e internas no for elevada, podem gerar -se incentivos tendentes prtica de corrupo, o que diminui a eficcia da aplicao da lei.

    9 Kahneman (1979) p.285 e segs.10 Becker (1974)

  • 23I Interveno do Estado. Regulamentos e Eficincia

    Em termos econmicos, o risco desejado em relao conduo au-tomvel forma parte do processo de escolha dos indivduos agindo racio-nalmente, dentro dos limites temporais, de rendimento e de outros bens. Considerando que a segurana um bem normal ou superior, sujeito lei da utilidade marginal decrescente, as normas de circulao rodoviria, criando incentivos, incidem sobre o comportamento dos condutores e outros usurios das vias que afetam a procura de segurana, influindo no nvel de risco que, em cada momento, os indivduos decidem assumir. Como assinala Alan Stone11, os regulamentos limitam as escolhas:

    Regulation has been defined as a state imposed limitation on the discretion that may be exercised by individuals organizations, which is supported by the threat of sanction.

    A eficcia da aplicao dos regulamentos leva a colocar a questo da compensao ou efeito substituio que podem gerar. A imposio de um determinado regulamento com o fim de aumentar a segurana viria pro-vocar uma variao positiva no comportamento dos indivduos, para que estes possam alcanar os seus objetivos de outra forma. Se essa alterao de comportamento se verifica, o indivduo procura bens alternativos e, em consequncia, a sua eficcia tender a diminuir.

    Entre as teorias existentes sobre a compensao dos efeitos, desta-camos a do risco homeosttico, desenvolvida por Gerald J. S. Wilde12. Este autor procura integrar a heterogeneidade dos fatores que determinam estes acidentes num conceito nico de risco desejado. Os incentivos criados pelas normas incluem alteraes sejam ex ante (como no caso dos regu-lamentos sobre a segurana dos veculos e do meio ambiente, incluindo as estradas), sejam expost (sistema de responsabilidade civil) que podero ter eficcia reduzida devido aos eventuais efeitos substituio. Segundo esta teoria a diminuio do risco de acidentes verificar se no longo prazo apenas se for alterado o nvel do risco desejado.

    11 Stone (1982) p.10. Apud Viscusi (1998), p.307.12 Wilde (2001)

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal24

    Sam Peltzman13, por outro lado, desenvolve uma teoria de compensa-o de risco na qual considera a segurana como um bem normal que est sujeito s restries do rendimento e do tempo, cuja procura depende, tam-bm, do seu preo e do preo dos bens alternativos. Assim, o equipamento obrigatrio instalado nos veculos, como o cinto de segurana, airbag e outros, tende a provocar efeitos de substituio:

    The mandatory installation of safety devices does not by itself change the private demand for safety, but it may change some relevant prices the response to which may mitigate some the technological promise of these devices.

    A instalao de equipamentos passivos no veculo, por um lado ten-der a diminuir o risco de acidentes e seus efeitos mas, por outro lado, considerando o nvel de risco desejado, leva os condutores a tender a alte-rar o seu comportamento, elevando o nvel de risco quanto velocidade e a outras manobras que coartam parte dos efeitos desses equipamentos de segurana. Este autor parte do conceito de maximizao da riqueza e relaciona a poupana de tempo com a gnese da riqueza.

    13 Peltzman (1975), pp.680 681.

  • II Comparao Europeia

    Para se ter uma viso geral da magnitude do problema, em termos comparativos, veja se no grfico seguinte o nmero de mortos por milho de habitantes em cinco pases do sul da Europa, no perodo de 1991 -2008:

    Grfico n.2.1Mortos por milho de habitantes em acidentes de trfego em 5 pases:

    Portugal, Grcia; Itlia, Espanha e Frana (1991 2008)

    Elaborao prpria com dados do Eurostat

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal26

    No incio do perodo, entre os cinco pases, Portugal era o que tinha a taxa de mortos por milho de habitantes mais elevada (323 mortos por milho de habitantes), chegando ao fim do perodo, em 2008, com a taxa de 79 mortos por milho de habitantes, aproximando -se da Itlia, com uma taxa de 79, de Espanha, 68 e da Frana, com 67.

    Contudo, Portugal registou a maior taxa de variao de decrscimo entre estes cinco pases, com uma taxa de variao acumulada no fim do perodo de menos 147%, seguindo -se a Espanha com uma taxa de menos 131%, a Frana com menos108%, a Itlia com menos 63% e, por fim, a Grcia com a taxa de menos 43%.

    Seguidamente, faz -se a comparao das taxas de mortos por milho de habitantes de Portugal com quatro pases com baixas taxas de mortos por milho de habitantes, Frana, Alemanha, Reino Unido e Pases Baixos, o que pode ser visualizado no seguinte grfico:

    Grfico n.2.2Mortos por milho de habitantes em acidentes de trfego.

    Portugal comparado com quatro pases com baixas taxas (1991 2008)

    Elaborao prpria com dados do Eurostat

  • 27II Comparao Europeia

    Verifica se que ao longo do perodo houve uma aproximao positiva, estando Portugal, no fim do perodo, ainda com uma taxa superior aos quatro pases considerados.

    Por ltimo, compara -se a taxa de mortos por milho de habitantes em Portugal com a Unio Europeia a 15 e a 27 pases.

    Grfico n. 2.3Mortos por milho de habitantes em acidentes de trfego.

    Portugal comparado com a Unio Europeia a 15 e 27 pases (1991 2008)

    Elaborao prpria com dados do Eurostat

    Verifica se que Portugal teve uma evoluo positiva ao longo do per-odo, aproximando -se das mdias da Unio Europeia a 27 e a 15 pases. No final do perodo, a taxa de mortos por milho de habitantes era de 78 na Unio Europeia a 27 pases, sendo a de Portugal de 83, e a taxa da Unio Europeia a 15 pases para o ano de 2007 era de 73 mortos por milho de habitantes. Verificou se, por parte de Portugal, um decrescimento acentu-ado, com aproximao das taxas da Unio Europeia.

  • III Evoluo dos Acidentes de Viao com Vtimas

    em Portugal (1959 2010)

    Os acidentes14 com vtimas em Portugal, ao longo do perodo de 1959--2010, registaram uma evoluo com ciclos de crescimento e diminuio, o que pode ser visualizado no grfico seguinte:

    Grfico n. 3.1Evoluo do nmero de acidentes com vtimas em Portugal (1959 2010)

    Elaborao prpria com dados da Direco Geral de Viao e ANSR

    14 Sempre que se referem acidentes quer se significar acidentes com vtimas, se outra

    coisa no for referida.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal30

    Desde o incio do perodo at 1973 o crescimento foi contnuo, com exceo do ano de 1970, iniciando -se em 1974 uma fase de diminuio at 1977. A partir dessa data e at 1982 o seu nmero voltou a subir, atingindo neste ano a cifra de 35324 acidentes com vtimas, nmero semelhante ao verificado 10 anos antes, em 1972. A partir do ano de 1982 e at 1985 o nmero de acidentes voltou a descer, correspondendo a um perodo de diminuio do crescimento econmico.

    De 1985 a 1992 verificou se a fase de maior crescimento do nmero de acidentes com vtimas atingindo -se o mximo absoluto de todo o perodo em 1992, com 50851 acidentes com vtimas havendo evidncia da existncia de correlao positiva com o nvel de desenvolvimento econmico, com a adeso de Portugal Comunidade Europeia em 1986.

    Nos anos de 1993 e 1994 voltou a verificar -se uma diminuio do nmero de acidentes. De 1994 a 1997, o nmero de acidentes voltou a subir para, a partir deste ltimo ano, se iniciar uma diminuio que se manteve de forma contnua at 2008. Em 2009 o nmero de acidentes voltou a subir e no ltimo ano da srie, em 2010, o nmero caiu ligeiramente (0,16%) em relao a 2009.

    Evoluo do Nmero de Mortos em Acidentes Rodovirios em PortugalAs vtimas mortais em Portugal ao longo do perodo de 1959 -2010 evi-

    denciam uma evoluo tendencialmente crescente e posterior diminuio, o que pode ser visualizado no grfico seguinte:

  • 31III Evoluo dos Acidentes Rodovirios com Vtimas em Portugal (1959 2010)

    Grfico n. 3.2Evoluo do nmero de mortos em acidentes rodovirios em Portugal.

    Perodo de 1959 2010

    Elaborao prpria com dados da ANSR

    Em Portugal, o nmero de mortos era registado em funo das vtimas que morriam dentro das 24 horas seguintes data do acidente. Esse nme-ro era subavaliado ao ser confrontado com o critrio que j vinha sendo seguido na maioria dos pases europeus (e outros), onde eram consideradas como vtimas mortais as que falecessem dentro dos 30 dias seguintes data do acidente, como consequncia do mesmo.

    Verificava se uma discrepncia de critrios entre os registos efectua-dos em Portugal e nos restantes pases, pelo que foi determinado que para comparaes internacionais, o nmero de mortos em acidentes rodovirios registados em Portugal, dentro das 24 horas seguintes data do acidente, deveria ser multiplicado pelo fator 1.14. Contudo, os registos anuais de mortos continuaram a efetuar -se com base no critrio das 24 horas para o cmputo do nmero de mortos em acidentes rodovirios.

    Neste contexto, passou a registar se o nmero de mortos que se ve-rificassem dentro dos 30 dias seguintes data do acidente, a fim de se uniformizar o critrio nacional com o critrio seguido internacionalmente.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal32

    A Autoridade Nacional de Segurana Rodoviria verificou que, em mdia, o nmero de mortos em consequncia dos acidentes era superior em 26% em relao ao nmero de mortos registados relativamente s vtimas que faleceram dentro das 24 horas seguintes data do acidente.

    O nmero de mortos foi crescente, em termos gerais, at 1975, quando alcanou o valor mximo absoluto, com 2676 (utilizando o critrio de mortos dentro das 24 horas seguintes ao acidente); no perodo de 1959-2010, a partir do ano de 1975, a tendncia foi decrescente, de forma no acentuada, at 1984, tendo voltado a aumentar at ao ano de 1988, a partir do qual a tendncia decresceu, atingindo o nmero de 741 mortos em 2010.

    Evoluo do Nmero de Feridos Graves em Acidentes Rodovirios em Portugal

    Quanto ao nmero de feridos graves, causados por acidentes rodo-virios, a sua evoluo pode ser visualizada no grfico seguinte15, para o perodo de 1987 -2010:

    15 Apenas foram disponibilizados dados a partir de 1987.

  • 33III Evoluo dos Acidentes Rodovirios com Vtimas em Portugal (1959 2010)

    Grfico n. 3.3Evoluo do nmero de feridos graves em acidentes rodovirios

    em Portugal (1987 2010)

    Elaborao prpria com dados da Direco Geral de Viao e ANSR

    A evoluo do nmero de feridos graves em acidentes rodovirios ao longo do perodo foi decrescente. Entre o incio e o fim do perodo, a taxa de variao acumulada de feridos graves foi de menos 144%. Ao longo do perodo apenas em quatro dos anos da srie temporal se verificaram taxas de variao positivas, nomeadamente, em 2009 com uma taxa de variao positiva de cerca de 1%.

    Quanto ao nmero de feridos graves, existe uma discrepncia entre os dados recolhidos pelas autoridades policiais e os registados pelos hos-pitais, situao que se verifica em Portugal e noutros pases, como referido por vrios investigadores16, constatando se que o nmero de registos de feridos graves efectuado pelos hospitais superior ao nmero registado pela polcia17.

    16 Amoroso (2008), Elvik (2009), Derriks, (2007) Chisvert, Ye Fan (2010) e Ronan (2008)17 Polcia e Autoridades Policiais designam tanto a Polcia de Segurana Pblica como a

    Guarda Nacional Republicana.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal34

    Quanto a Portugal, no que respeita aos feridos graves, pode observarse no grfico seguinte a evoluo das duas sries temporais dos dados disponibilizados pelo Ministrio da Sade18 (dados dos hospitais) e pela ANSR (dados registados pela autoridades policiais).

    Grfico n. 3.4Evoluo do nmero de feridos graves em acidentes rodovirios em Portugal registados pelos hospitais e pela Polcia (2000 2009)

    Elaborao prpria com dados da ANSR e Ministrio da Sade

    A diferena de registos entre as duas sries temporais elevada. Atendendo a que poder verificar se (como est evidenciado em vrios estudos referidos na nota de rodap 16) que a classificao dos registos efectuados pela polcia pode ser enviesada classificando se um ferido como leve quando no hospital classificado como grave a utilizao dos registos feitos pelas autoridades policiais para o apuramento do custo econmico e social dos acidentes rodovirios leva a um enviesamento dos resultados, apurando -se um valor dos custos com feridos graves inferior ao que se obteria com a utilizao do nmero registado pelos hospitais.

    18 Apenas nos foram disponibilizados dados para o perodo de 2000 -2009.

  • 35III Evoluo dos Acidentes Rodovirios com Vtimas em Portugal (1959 2010)

    Evoluo do Nmero de Feridos Ligeiros em Acidentes Rodovirios em Portugal

    Quanto ao nmero de feridos ligeiros, causados por acidentes rodovi-rios, veja se o grfico seguinte19:

    Grfico n. 3.5Evoluo do nmero de feridos ligeiros em acidentes rodovirios (1996 2010)

    Elaborao prpria com dados da ANSR

    No que concerne aos feridos leves, houve uma tendncia mdia de-crescente ao longo do perodo, mas menos acentuada que no caso dos mortos e feridos graves, consubstanciando -se em 1996, em cerca de 56 mil feridos ligeiros passando para cerca de 44 mil em 2010.

    19 Apenas foram disponibilizados dados a partir de 1996.

  • IV Mtodos para a Estimao do Custo Econmico e

    Social dos Acidentes de Viao

    Existem vrias metodologias entre as quais se destacam as seguintes:

    a) Metodologia do Capital Humano ou do Produto Interno Bruto20.Fundamenta se no produto potencial que o indivduo, que morre ou

    fica incapacitado, poderia produzir durante a sua vida til na ausncia do acidente. Integram -se os custos dos acidentes relacionados com a perda de produo futura, os custos hospitalares, os danos materiais com o veculo e outros, os custos administrativos, adicionando -se os custos no patrimoniais;

    b) Metodologia com base nas indemnizaes efetuadas pelos tribu-nais.

    Este mtodo considera que os custos dos acidentes so valorados pela sociedade atravs das indemnizaes efetuadas pelos tribunais como proxy dos custos reais;

    c) Metodologia com base no princpio do seguro de vida21.

    20 Donrio (2010a), pp.101 112 e 649 660.21 Mishan (1976), pp.300 303.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal38

    Baseia se no uso do prmio que um indivduo estaria disposto a pa-gar, associado probabilidade de ser morto ou ficar ferido num acidente de viao. Uma das crticas feitas a este mtodo que se baseia apenas na compensao a terceiros e no vtima mortal (por impossibilidade natural);

    d) O mtodo da Disposio a Pagar (mais conhecido na verso inglesa por Willingness to Pay).

    Considera o montante mximo que o indivduo estaria disposto a pagar para diminuir a probabilidade de ter um acidente e morrer ou ficar ferido.

    Contudo, as duas principais metodologias que tm vindo a ser utiliza-das so: a do Capital Humano e a da Disposio a Pagar (Willingness toPay) que se analisam de seguida.

    4.1 Mtodo Conhecido por Willingness To Pay (WTP)

    um mtodo ex ante22, fundamentando -se nos princpios da economia do bem -estar, indo ao encontro do denominado princpio da soberania do consumidor, tendencialmente traduzindo os interesses e preferncias (gostos) do indivduo, o qual considerado racional e maximizador dos benefcios e minimizador dos custos de qualquer natureza.

    Em concreto, o mtodo willingness to pay23 traduz -se no montante que o indivduo estaria disposto a pagar para reduzir o risco24 de um aci-

    22 Feldman (1997), p 2. Este autor denomina de probabilistic willingness -to -pay23 Willingness to pay traduz o que em economia se denomina por Excedente do consu-

    midor que consiste na utilidade que excede o preo de mercado ou, mais exatamente,

    traduz a variao do nvel de utilidade do indivduo pela reduo do risco de acidente e

    de morrer ou ficar ferido.24 A reduo do risco no observvel no mercado mas desenvolve se dentro do quadro

    da escassez, atravs das escolhas, traduzindo um custo de oportunidade.

  • 39IV Mtodos para a Estimao do Custo Econmico e Social dos Acidentes Rodovirios

    dente (e portanto o risco de morrer ou ficar ferido), o que consubstanciar a Preferncia Afirmada (PA) pelo indivduo que pode ser diferente da Preferncia Revelada (PR), esta traduzida no que o indivduo atualmente gasta relativamente sua segurana25 (em termos rodovirios) atravs do seu comportamento.

    Este mtodo26 serve como proxy para estimar o potencial valor de mercado de bens que efetivamente no so transacionveis, integran-do os determinantes do custo dos acidentes, nomeadamente, os custos traduzidos na diminuio da funo de utilidade social, ou seja, tende a captar os custos sociais para alm dos suportados pela vtima do acidente (externalidades). Podem mencionar -se os custos relativos ao rendimento, ao valor do lazer, ao valor de evitar a dor e o sofrimento, bem como, o risco relativo a determinada atividade.

    Note se que o risco constitui um custo individual e social em qualquer dimenso da vida, pelo que a existncia de elevado risco de acidentes um fator que dever ser levado em considerao, sempre que possvel, devendo ter -se em conta, nas medidas tomadas para diminuir os acidentes e seus efeitos, as atitudes dos indivduos face ao risco27. De salientar que considerando que a maioria dos indivduos avessa ao risco, a existncia de elevado nvel de risco de acidentes traduz -se num elevado fator aditivo do custo dos acidentes.

    Este mtodo traduz um efeito substituio (um trade off) entre um determinado estado atual do mundo com um dado nvel de bem -estar (utilidade) sem acidentes e, outro estado potencial do mundo com um nvel

    25 Frey, (2004) Due to the hypothetical nature of the questions asked and the unfamiliarity

    of the task, one cannot exclude that respondents fail to consider the effect of their budget

    constraints and substitutes.p 7.26 Carthy (1999) ...collective WTP and WTA amounts can most effectively be estimated

    by asking a representative sample of people more or less directly about the sums that

    they would individually be willing to pay or to accept as compensation for pre specified

    variations in safetycommonly referred to as the direct contingent valuation (CV)

    approach.27 Donrio (2010a), pp.421 423 e Donrio (2010b), pp.15 22.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal40

    inferior de bem estar devido s consequncias de um potencial acidente, o qual funo, entre outros fatores, do nvel de cuidado desenvolvido28 no mbito da circulao rodoviria.

    Sendo a vida o bem supremo do qual depende a utilidade de todos os outros bens, em caso de morte a funo utilidade do indivduo nula. Assim, o valor da vida, numa viso ontolgica, infinito, no podendo, por conseguinte, ser mensurvel per se. O que se pretende obter o que se denomina como Valor Estatstico da Vida (VEV) e no o valor da vida de uma pessoa em concreto, porque no mensurvel. O valor estatstico da vida, como refere Arianne Blaeij is concerned with the valuation of changes in the level of risk exposure, rather than the valuation of life of a specific individual, and reported this as a normalised value29.

    No mesmo sentido refere Barbara Moyer Faigin30, num estudo efectu-ado em 1976, nos Estados Unidos da Amrica:

    ...the cost components and the total of these components are indicators of the significance of the motor vehicle accident problem.

    Contudo, importa sublinhar que o que se pretende obter com o mtodo willingness to pay, no valorar a vida, per se, de um determinado indi-vduo31, mas sim, obter o quantum potencial da disposio do indivduo a pagar para reduzir uma percentagem do risco de morrer ou ficar ferido ou, como referido anteriormente, a soberania do consumidor revelando as suas preferncias. Citamos, ainda, Jos Mara Abelln Perpin sobre o valor da vida:

    Como los costes humanos no pueden medirse directamente, se infieren a partir de la agregacin de las disposiciones a pagar de un gran nmero de

    28 Donrio, (2010a), pp.165 178.29 Blaeij (2003), p.4.30 Faigin (1976).31 Broome (1982). Se determinados indivduos soubessem com certeza que iriam morrer

    com o desenvolvimento de determinada atividade, isto , a probabilidade (como aconte-

    cimento certo) de morrer, as suas respostas ao quantum estariam dispostos a aceitar para

    correrem esse risco (neste caso, certeza) a soma tenderia para infinito e o custo social de

    qualquer projeto ou atividade superaria sempre os benefcios sociais.

  • 41IV Mtodos para a Estimao do Custo Econmico e Social dos Acidentes Rodovirios

    personas por una pequea reduccin en el riesgo de morir en un accidente de trfico. Esta agregacin proporciona, en consecuencia, el valor monetario atribuido por la sociedad a evitar que una persona cualquiera (una vida estadstica) fallezca a consecuencia de un accidente de trfico32.

    Neste mtodo, dever -se - ter em considerao o efeito do nvel de rendimento e/ou riqueza (variveis compsitas), ou de outros bens (como a vida e a integridade fsica) conhecido na literatura econmica do comportamento por endowment effect33 (ponto de referncia), o qual tem efeitos quanto ao WTP versus a propenso de aceitar uma compensao (willingness to accept WTA). O endowment effect reflecte a diferena entre WTP e WTA.

    Este efeito reforado pelo framing34 effect35 que traduz o efeito do modo como apresentada a questo, levando a que pequenas alteraes na apresentao da questo (framing), relativamente a assuntos estocs-ticos, podem ter elevados impactos na deciso do quantum um indivduo est disposto a pagar para diminuir o risco de morrer ou ficar ferido num acidente de viao, no obstante, a essncia das questes seja equivalen-te36, dependendo as respostas do modo como so entendidas as questes colocadas: se como ganhos ou como perdas.

    Segundo Thaler37, a compensao mnima para aceitar um risco de 0.001 de uma morte imediata seria uma ou duas vezes superior, em mag-nitude, ao que o indivduo estaria disposto a pagar (WTP) para eliminar um idntico nvel de risco em relao ao futuro. Esta discrepncia baseia se no

    32 Abelln Perpin (2010).33 Tversky (1991).34 Tversky (1981).35 Kahneman (1979), pp.285 e segs36 A descoberta destes efeitos por Kahneman e Tversky puseram em causa o axioma de

    independncia da teoria da utilidade esperada que foi desenvolvida por John von Neuman

    e Oskar Morgenstern (1947)37 Thaler (1980).

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal42

    que considerado averso s perdas (loss aversion38) quando o bem vida avaliado como uma perda (no imediato endowment effect instantaneo39) e como um ganho, quando entendida como uma diminuio do risco de morrer.

    O endowment effect pe em causa o teorema de Coase, segundo o qual, a afetao dos direitos legais a uma parte, ou outra, no afetar os resultados se os custos de transao forem suficientemente baixos, levando a que as partes procuraro um resultado eficiente seja qual for a atribuio legal inicial dos direitos40, pois o valor atribudo a um direito, na presena deste efeito, varia em funo da atribuio inicial do direito.

    4.2 Mtodo do Capital Humano

    um mtodo ex post que se fundamenta na produo potencial per-dida pelo acidentado, morto ou ferido, baseando -se nos efeitos negativos para a sociedade, no tendo em conta as preferncias dos indivduos, como acontece com o mtodo willingness to pay.

    Neste mtodo, um dos fatores mais importantes do custo social dos acidentes consubstancia -se na produo potencial perdida (por morte ou incapacidade) atualizada por um fator de desconto ao perodo base (que o do acidente).

    Os custos de sade (hospitalares e afins), os danos com veculos e outros danos materiais so considerados neste mtodo, acrescentando -se os custos estimados com a diminuio da utilidade, traduzidos na dor (fsica ou psicolgica) e sofrimento do acidentado e seus familiares, a que chamaremos danos morais ou danos no patrimoniais.

    Os danos morais devero ser computados atravs de qualquer dos mtodos utilizados e constituem perdas intangveis traduzidas na dimi-

    38 KAHNEMAN (1979), pp.285 e segs;39 KAHNEMAN (2003), p.5340 Coase (1988).

  • 43IV Mtodos para a Estimao do Custo Econmico e Social dos Acidentes Rodovirios

    nuio da utilidade devida ao dano provocado nos bens fsicos ou morais que integram a funo utilidade41 (ou funo felicidade) de cada indivduo, afetando o que conhecido universalmente por joi de vivre42. Os danos mo-rais, como lgico, so independentes da capacidade de obter rendimento.

    Dado que este mtodo tem em considerao o produto interno bruto (PIB) per capita, os valores do custo social dos acidentes variam em funo do mesmo, sendo superior para os pases com um PIB per capita mais elevado, mesmo seguindo metodologia idntica.

    A utilizao deste mtodo leva normalmente obteno de valores inferiores em relao utilizao do mtodo willingness to pay, consti-tuindo como que um limite inferior para a tomada de medidas polticas para a preveno de acidentes.

    Tendo em conta o que foi referido quanto ao mtodo WTP, as elevadas discrepncias que se tm verificado no que tange ao valor estatstico da vida, estimado por estudos diversos , em parte, explicado pelo diferente modo como so efetuadas as perguntas aos entrevistados, devido aos endowment effect e framing effect, que levam a que sejam dadas respostas muito diferentes em relao ao quantum um indivduo est disposto a pagar para diminuir a percentagem do risco de morrer ou ficar ferido num acidente de viao.

    Tambm por estas razes, consideramos que o mtodo do Capital Humano para estimar o custo social dos acidentes de viao tende a ser mais robusto do que o mtodo WTP.

    4.3 Metodologia Utilizada

    No obstante o mtodo willingness to pay ter vindo a ser seguido em vrios estudos, seguimos, neste estudo, a metodologia do Capital Humano (CH): embora seja um mtodo ex post, permite -nos utilizar dados

    41 Ou, em linguagem jurdica, integram a esfera jurdica do sujeito.42 Gerondeau (1979).

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal44

    de vrias instituies, sobretudo pblicas, para um perodo de 15 anos, evidenciando a evoluo do custo dos acidentes em Portugal, mostrando o nvel de eficcia das medidas polticas que ao longo dos anos tm vindo a ser implantadas.

    Este mtodo tende a estimar um valor inferior ao mtodo willingnessto pay, baseando -se, sobretudo, em dados histricos, permitindo estimar um valor que constitui uma base como limite inferior para a tomada de medidas polticas fundamentadas na anlise custo -benefcio.

    Por seu lado, o mtodo WTP teria que ser baseado em inquritos nacionais, s sendo possvel apurar os custos dos acidentes para o per-odo (ano) em que fossem efectuados os inquritos. Consideramos que o mtodo escolhido (CH) nos dar uma boa aproximao dos custos sociais dos acidentes rodovirios em Portugal permitindo -nos analisar a evoluo desses custos ao longo de um perodo de 15 anos.

  • V Dos Dados

    Os dados considerados neste estudo referem -se a:

    a) Nmero anual de acidentes com vtimas;b) Nmero anual de acidentes com vtimas mortais;c) Nmero anual de acidentes com feridos graves;d) Nmero anual de acidentes com feridos leves;e) Nmero de acidentes com feridos na sua globalidade.

    Objetivamos estimar o custo mdio que representa cada vtima mortal e cada ferido grave para a sociedade, de forma a determinar o custo social dos acidentes com vtimas mortais e o custo social dos acidentes com feridos graves em Portugal continental.

    O custo social dos acidentes rodovirios funo dos danos patri-moniais e no patrimoniais causados na sequncia dos sinistros. De um acidente rodovirio resultam, necessariamente, efeitos negativos, a nvel patrimonial, fsico ou outros, que implicam um custo no s para o indi-vduo como para a sociedade no seu todo, ou seja, verificam se externa-lidades negativas.

    Os dados utilizados neste estudo foram disponibilizados pelos seguin-tes organismos:

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal46

    Administrao Central do Sistema de Sade; Autoridade Nacional de Segurana Rodoviria; Ministrio da Sade; Banco Central Europeu; Fundao Francisco Manuel dos Santos (FFMS) (PORDATA, servio

    pblico de informao estatstica da FFMS); Polcia de Segurana Pblica; Guarda Nacional Republicana; Instituto Nacional de Emergncia Mdica; Instituto de Seguros de Portugal; Instituto das Tecnologias de Informao na Justia; Instituto Nacional de Estatstica.

    No que tange aos dados das componentes remanescentes do custo social dos acidentes rodovirios que no nos foi possvel obter junto das entidades que tm essa competncia, basemo nos num estudo efectuado em 1987 pela Preveno Rodoviria Portuguesa para estimar esses valores, tomando como critrio de base o nmero de mortos e feridos registado em cada ano, considerando a estrutura como constante das diversas rubricas sem disponibilizao de dados (sobretudo da Justia).

  • VI Componentes do Custo Econmico e Social dos

    Acidentes de Viao

    Os custos econmicos e sociais dos acidentes podem ser classificados em:

    Patrimoniais No patrimoniais ou morais.

    Por sua vez, os custos patrimoniais so classificados em: Directos Indirectos.

    Os custos patrimoniais directos dos acidentes de viao incluem: Danos nos veculos e outros na propriedade pblica e privada; Custos hospitalares relacionados com vtimas; Custos consubstanciados no tempo gasto com as visitas hospita-

    lares; Custo de transporte das vtimas; Custos relacionados com peritagens de acidentes; Interveno direta de entidades fiscalizadoras; Custos com os funerais das vtimas.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal48

    Os custos patrimoniais indiretos dos acidentes de viao incluem: Valor da perda potencial de produo das vtimas mortais e feri-

    dos; Custos administrativos das seguradoras; Valor das custas judiciais; Honorrios pagos a advogados; Custos de segurana ou preveno rodoviria; Custos de funcionamento dos tribunais; O custo traduzido no nvel de risco dos acidentes; Custo relacionado com externalidades negativas que afetam o

    ambiente e que no sero considerados neste estudo.

    Os danos no patrimoniais consubstanciam -se na dor e sofrimento su-portado pelas vtimas e terceiros, custos que sero analisados mais adiante.

    6.1 Valor da perda de produo

    No que respeita ao valor da perda de produo43 o clculo resulta do somatrio de:

    Vtimas mortais; Feridos graves; Feridos ligeiros.

    6.1.1 Perda de produo relativa s vtimas mortais

    Ao clculo do valor da perda de produo (no mbito do mercado) das vtimas mortais optou -se por aplicar o mtodo do produto bruto, no retirando o consumo a este, pois considerou se que, mesmo quando os

    43 Para o clculo valor da perda de produo seguimos de perto a metodologia utilizada

    por Donrio (2010a), pp 655 -657.

  • 49VI Componentes do Custo Econmico e Social dos Acidentes Rodovirios

    indivduos se retiram do mercado de trabalho, continuam a consumir, con-tribuindo assim para o crescimento da Despesa Interna e, por conseguinte, aumentando o produto interno (identidade fundamental entre as ticas da despesa e do produto e do rendimento).

    Os custos relativos s vtimas mortais deveriam ter ainda em consi-derao os custos traduzidos na perda de produo referentes perda potencial de produo fora do mercado (que se consubstancia no trabalho no remunerado), no mbito da casa, famlia e da comunidade44. Estes so custos de oportunidade traduzidos nas perdas do trabalho realizado fora do mercado, consubstanciados em trabalho realizado fora do horrio nor-mal no desempenho da profisso. Embora de difcil estimao, h estudos45 que estimam estes custos em aproximadamente 30% do rendimento do trabalho formal (no mercado). Assim, as perdas resultantes dos acidentes de viao, diminuem a funo de utilidade social e geralmente no so captadas na computao do produto nacional.

    No clculo do valor da perda de produo das vtimas mortais, utilizou--se o produto per capita portugus, o nmero de anos de atividade perdida por pessoa falecida, o nmero total de mortos46 de cada ano acrescido de 26%47 e a taxa de atualizao do valor da perda de produo. Esta taxa funo da taxa de juros mdia lquida das aplicaes financeiras e da taxa anual de crescimento da produo.

    No que tange ao produto per capita portugus, utilizou se o produto interno bruto per capita anual, a preos constantes de 200648, expurgando, assim, a influncia da inflao e, simultaneamente, utilizando um ano base relativamente prximo da atualidade, minimizando potenciais erros de

    44 Faigin (1976), p 1.45 Atkins (1981), p47.46 As estatsticas apenas consideravam como mortos as vtimas que morriam no lo-

    cal do acidente ou nas 24 horas seguintes. Para efeitos de comparao internacional

    acrescentava -se mais 14%.47 A ANSR estimou que em mdia o nmero oficial das vtimas mortais superior em

    cerca de 26%.48 Ver Fundao Francisco Manuel dos Santos

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal50

    interpretao da variao do nvel geral de preos. Dado que o produto per capita diferente nos vrios pases, a perda de produo tambm diferente, existindo dificuldades nas comparaes internacionais quanto s estimaes e clculos efectuados em cada pas.

    Relativamente ao nmero de anos de atividade perdida por vtima mortal, utilizamos os dados da Autoridade Nacional de Segurana Rodovi-ria49, referentes ao nmero de mortos por classe etria de forma a poder calcular a idade mediana da vtima mortal.

    Assim, e dado que a esperana mdia de vida de cada indivduo em Portugal estimada em 80 anos, obteve -se o nmero de anos de atividade perdida por pessoa falecida atravs da diferena entre a esperana mdia de vida e a idade mediana de cada indivduo morto. De notar que o custo estimado mede o valor da atividade do indivduo, sem atender se est ou no empregado.

    O nmero anual de mortos, utilizado para calcular o valor global da perda de produo por pessoa falecida, foi o recolhido pela Autoridade Na-cional de Segurana Rodoviria integrado no relatrio de 2010, atualizado com um acrscimo de 26%, devido ao facto de a ANSR ter concludo que o valor anual das vtimas mortais deve ser corrigido de forma a espelhar de forma mais correta a realidade.

    Taxa de Atualizao UtilizadaA taxa de atualizao50 do valor da perda de produo uma taxa

    compsita da taxa de juros mdia lquida das aplicaes financeiras e da taxa anual de crescimento da produo. No que respeita taxa de juros mdia lquida das aplicaes financeiras, optou se por utilizar a taxa Euribor mdia51 (com maturidade de 6 meses, no perodo de 1996 a 2010, uma vez que este perodo corresponde ao intervalo temporal em anlise),

    49 Autoridade Nacional de Segurana Rodoviria (2010)50 Esta taxa tambm pode ser denominada como taxa de preferncia temporal.51 Ver Banco Central Europeu

  • 51VI Componentes do Custo Econmico e Social dos Acidentes Rodovirios

    dado que esta taxa de juro representa a evoluo da oferta e procura de moeda no mercado interbancrio europeu e, por conseguinte, representa a capacidade que o sistema bancrio tem de se financiar e, simultaneamente, prover as necessidades de liquidez financeira do sistema econmico, representando, deste modo, uma boa proxy para a mensurao da taxa de juros mdia lquida das aplicaes financeiras.

    Optou se, ainda, pelo prazo de vencimento a 6 meses dado ser aquele que, por exemplo, face maturidade de 3 meses, capta com maior seguran-a a tendncia da evoluo da taxa e, simultaneamente, face, por exemplo, ao vencimento a 12 meses mais flexvel na capacidade de ajustamento do mercado financeiro.

    A taxa anual de crescimento da produo utilizada no clculo da taxa de atualizao do valor da perda de produo a taxa mdia de crescimento anual do produto interno bruto portugus a preos constantes de 200652, no perodo de 1996 a 2010. Note se que se expurgou o efeito inflao uma vez que se considerou que o valor da perda de produo deve ser calculado em termos da riqueza efetivamente gerada e no incluindo a volatilidade do nvel geral de preos existente na economia, enviesando, assim, a anlise pretendida.

    Optou -se, tambm, por utilizar a idade mediana da vtima mortal, ao invs da idade mdia.

    6.1.2 Feridos graves

    O custo relacionado com os feridos graves pode ser dividido em cinco componentes:

    Custos hospitalares, incluindo os farmacuticos; Custos emergentes da perda de produo potencial total relacio-

    nados com os feridos graves com 100% de incapacidade permanente;

    52 Ver Fundao Francisco Manuel dos Santos.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal52

    Perda de produo relativa baixa de produtividade devido a incapacidades permanentes parciais;

    Perda de produo devido a incapacidades temporrias; Custos relacionados com o prmio de risco.

    6.1.2.1 Custos hospitalares com feridos graves

    Traduzem se n os gastos em que a sociedade incorre com o tratamento dos feridos graves, seja qual for o seu nvel de gravidade, no sentido da sua estabilizao ou recuperao, os quais so registados pelos hospitais e concentrados no Ministrio da Sade.

    6.1.2.2 Custos relativos perda de produo potencial total com feridos graves

    a) Feridos graves com 100% de incapacidade permanenteOs custos traduzidos na perda de produo relacionados com os fe-

    ridos graves com 100% de incapacidade permanente consubstanciam -se na perda de produo dentro e fora do mbito do mercado. Os indivduos com 100% de incapacidade permanente no s esto incapacitados para desenvolver qualquer atividade, bem como, a sua situao requer que ou-tros recursos sociais sejam utilizados para proverem s suas necessidades, nomeadamente, capital humano, o que constitui um custo de oportunidade.

    b) Feridos graves com nveis de incapacidades parciais permanentesParte dos feridos graves resultantes dos acidentes rodovirios fica com

    nveis de incapacidades parciais permanentes. Estas situaes tm efeitos que, de um modo geral, tm uma durao para toda a vida do indivduo, efeitos que se refletem na sua produtividade.

    Os vrios nveis de incapacidades permanentes, que so determina-dos clinicamente, afetam a produo futura, dentro e fora do mercado.

  • 53VI Componentes do Custo Econmico e Social dos Acidentes Rodovirios

    A percentagem de incapacidade permanente constitui uma proxy para o apuramento do custo relativo diminuio da produo esperada que potencialmente se obteria na ausncia dessas mesmas incapacidades.

    c) Feridos graves com incapacidades temporriasOutra parte dos feridos graves suporta incapacidades temporrias,

    totais ou parciais, mais ou menos longas, que se podem prolongar para alm do tempo da sua hospitalizao at sua recuperao, cujos efeitos constituem, tambm, uma parcela do custo dos acidentes rodovirios.

    d) Feridos graves e prmio de riscoNo caso de indivduos avessos ao risco, podemos definir o prmio de

    risco como o montante mximo que o indivduo est disposto a pagar (ou a no receber) para afastar determinado nvel de risco, o que vai determinar o equivalente certo, que est relacionado com a probabilidade umbral.

    Nos casos em que emergem litgios concernentes s indemnizaes ou compensaes existem dois meios principais da sua resoluo, para alm do acordo entre as partes:

    i) atravs dos acordos com as seguradoras, eii) atravs da via judicial.Considerando que a maior parte dos acidentados avessa ao risco, e

    tendo em conta que o grau de averso ao risco varia inversamente com o nvel de riqueza e rendimento dos indivduos, o prmio de risco ser tanto maior quanto maior for o grau de averso ao risco e, por conseguinte, ser tanto maior quanto menor for o rendimento e a riqueza dos indivduos, desde que os mesmos sejam avessos ao risco.

    No caso portugus, a elevada variabilidade (varincia) das sentenas quanto a casos semelhantes e a grande dilao judicial, torna a procura de tutela judicial semelhante a um prospecto com elevado risco. Por outro lado, a maior previsibilidade e menor varincia das indemnizaes fixadas pelas seguradoras, bem como, o menor tempo decorrido entre o acidente e o pagamento das indemnizaes pelas mesmas, corresponde ao que se poder entender como a situao com mais elevado grau de certeza.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal54

    Deste modo, os indivduos avessos ao risco (feridos graves) tendem a preferir o certo ao incerto quanto resoluo dos conflitos, o que significa que optam por obter as indemnizaes fixadas pelas seguradoras, ainda que com um valor esperado menor que a mdia fixada pela tutela judicial53, para casos semelhantes.

    Essa diferena, entre a mdia das indemnizaes fixadas pelos tribu-nais e as fixadas pelas seguradoras para casos similares, pode considerar se o prmio de risco que constitui um custo social e dever integrar o custo social dos acidentes.

    Assim, a funo de utilidade social (para alm da funo de utilidade individual) negativamente afetada, de forma duradoura, devido a essas incapacidades permanentes sofridas por parte dos feridos graves. Em certas situaes de elevado nvel de incapacidade permanente, recursos fsicos e humanos (capital humano) so desviados de outras funes pro-dutivas (dentro e fora do mbito do mercado) para atender satisfao de necessidades dos acidentados com incapacidades permanentes.

    e) Efeitos das incapacidades permanentesAs leses consubstanciadas em incapacidades permanentes geram

    sobretudo dois tipos de efeitos:a) Danos patrimoniais, traduzidos nos danos materiais relativos aos

    veculos, gastos mdicos e farmacuticos, bem como, os que se consubstan-ciam nas leses produzidas nos indivduos (danos patrimoniais pessoais) que impossibilitam total ou parcialmente o desempenho das atividades normais da vida (seja no mbito ou fora do mercado), e

    b) Danos no patrimoniais, que podem ser permanentes e que, no implicando necessariamente uma perda econmica em sentido restrito, constituem um verdadeiro custo social, nomeadamente, traduzido na angstia sentida pelo risco do resultado do tratamento quanto ao nvel de

    53 Donrio (2010a), pp.236 238 e 325 328.

  • 55VI Componentes do Custo Econmico e Social dos Acidentes Rodovirios

    recuperao da vtima acidentada54, a qual no s sentida pela vtima como, tambm, pelos familiares e amigos.

    6.1.3 Feridos ligeiros

    No que tange ao clculo do valor da perda de produo dos feridos ligeiros, considerou se, por excesso, que os indivduos que sofrem feri-mentos leves na sequncia de um acidente, estaro, em mdia, inactivos por um perodo de 24 horas, verificando se que, em muitos casos, existe internamento hospitalar por um perodo inferior a 24 horas, com a conse-quente perda do valor de produo.

    6.1.4 Custos administrativos das seguradoras

    So custos indiretos que se traduzem em custos administrativos das seguradoras, relativos ao seu funcionamento, salrios de trabalhadores, publicidade, administrao, custos fiscais conectados com os acidentados em acidentes rodovirios.

    Nesta rubrica utilizamos os dados fornecidos pelo Instituto de Segu-ros de Portugal (ISP). Pese embora as dificuldades em obter dados para o perodo em anlise, isto , de 1996 a 2010, o ISP conseguiu fornecer dados relativamente ao perodo de 2000 a 2009. Neste contexto, optou -se por considerar os anos de 1996 at 1999 como tendo um valor de custos administrativos das seguradoras igual ao ano 2000, bem como, o ano 2010 sendo igual ao ano 2009.

    54 S (1992)

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal56

    6.1.5 Custos indiretos com instituies pblicas devido segurana rodoviria

    Existem entidades pblicas cujo objectivo a segurana rodoviria, traduzindo a interveno do Estado, dada a existncia de falhas no mer-cado de segurana e mobilidade rodovirias.

    Com efeito, a maioria dos utentes das vias rodovirias tem uma infor-mao imperfeita, no s quanto s probabilidades efetivas de acidentes, como tambm, quanto s externalidades negativas que a sua conduta, no mbito rodovirio, pode provocar.

    As probabilidades subjetivas, baseadas nos mecanismos heursticos, so influenciadas por vrios enviesamentos (bias), nomeadamente, os indivduos tendem a julgar as probabilidades de futuros eventos baseados na facilidade de imaginar tais acontecimentos, o que se traduz na disponi-bilidade heurstica que leva a outro enviesamento conhecido por hindsight bias que se traduz no conhecimento e entendimento que o indivduo tem acerca de um evento apenas depois do mesmo se ter verificado, podendo, assim, mais facilmente, imaginar acontecimentos semelhantes, sobresti-mando, consequentemente, as probabilidades.

    Outro enviesamento na avaliao das probabilidades consiste na representatividade que se consubstancia no julgamento das probabili-dades condicionais de acordo com o modo como os dados representam a hiptese ou o exemplo em que os indivduos se baseiam. Por vezes, este modo heurstico de julgar as probabilidades errneo.

    Um outro enviesamento traduzido na lei dos pequenos nmeros leva a que os indivduos pensem que pequenas amostras representam o processo de gerao dos dados, induzindo -os em erro.

    Assim, justifica se a necessidade da existncia de organismos com ob-jetivos de minimizar os custos econmicos e sociais dos acidentes atravs da utilizao de vrios instrumentos, como acontece com a Autoridade

  • 57VI Componentes do Custo Econmico e Social dos Acidentes Rodovirios

    Nacional de Segurana Rodoviria, cujos custos devero ser considerados no mbito dos custos econmicos e sociais dos acidentes.

    Tendo sido criada em 2007, s a partir de 2008 existem valores ora-mentais provenientes da ANSR. Assim, pressups se que os valores dos anos anteriores (desde 1996 at 2007) no que concerne aos gastos com segurana rodoviria so idnticos aos de 2008.

    No entanto, os custos da ANSR no so os nicos que compem esta rubrica. Neste contexto, socorremo -nos de um estudo efectuado pela Preveno Rodoviria Portuguesa em 198755, de forma a estimar -se os custos remanescentes com a segurana rodoviria. Assim, aos valores do oramento da ANSR adicionaram -se os montantes estimados com base no referido estudo, para o perodo em anlise.

    6.1.6 Custos de funcionamento dos Tribunais

    Parte dos custos de funcionamento dos tribunais devero ser imputa-dos ao custo econmico -social dos acidentes, como custos indiretos, dado que so utilizados recursos pela procura de tutela judicial face aos litgios emergentes de acidentes de viao, o que acontece sobretudo nos casos de vtimas mortais e feridos graves. Os referidos litgios emergentes tm, tambm, outros custos indiretos que se consubstanciam no contributo para a dilao judicial.

    No nos foram disponibilizados os dados necessrios por parte das entidades competentes (no mbito da Justia), pelo que estimmos esses valores com base no estudo da Preveno Rodoviria Portuguesa de 1987, j referido, tendo em conta os mortos e feridos e considerando a manu-teno das estruturas.

    55 Donrio (2010a), pp.106 e seguintes.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal58

    6.1.7 Custos hospitalares relacionados com vtimas mortais e feridos graves

    Nesta rubrica utilizamos os dados fornecidos pela Administrao Central do Sistema de Sade (ACSS) do Ministrio da Sade de Portugal. Apesar das dificuldades em obter dados para o perodo em anlise, a ACSS conseguiu fornecer dados para o perodo de 2000 a 2009. Neste contexto, optou -se por considerar os anos de 1996 at 1999 como tendo um valor de custos hospitalares relacionados com vtimas mortais e feridos graves igual ao de 2000, bem como, o ano de 2010 sendo igual ao de 2009.

    6.1.8 Custos de transporte das vtimas

    Os custos referentes ao transporte de vtimas mortais e feridos foram disponibilizados pelo Instituto Nacional de Emergncia Mdica (INEM) para o perodo de 2004 at 2009. Dado que o perodo aqui em anlise abrange de 1996 at 2010, optou -se por considerar o valor do transporte de 1996 at 2003 igual ao de 2004, bem como, o de 2010 idntico ao de 2009.

    6.1.9 Custos com entidades fiscalizadoras

    Nesta rubrica utilizam -se os dados fornecidos pela Polcia de Seguran-a Pblica (PSP) e pela Guarda Nacional Republicana (GNR). Verificaram se dificuldades em obter dados para o perodo em anlise, mas a PSP dispo-nibilizou dados referentes ao perodo de 2000 at 2010. No que GNR diz respeito, foi possvel obter dados para o perodo de 2001 at 2010. Neste contexto, uniformizou -se a informao disponibilizada por estas duas Instituies, em termos temporais, atravs da extrapolao da informao relativa aos dados da GNR para o ano de 2000. Aps este procedimento, optou -se por considerar os anos de 1996 at 1999, tal como em rubricas anteriores, como tendo um valor de custos de fiscalizao igual ao de 2000.

  • 59VI Componentes do Custo Econmico e Social dos Acidentes Rodovirios

    6.1.10 Custos dos danos materiais nos veculos

    Estes so danos patrimoniais materiais que se distinguem dos danos patrimoniais pessoais. Os danos patrimoniais materiais manifestam -se na perda de utilidade de bens econmicos. Para a valorao dos bens reprodu-zveis danificados devido ao acidente, dever se ter em conta (sempre que possvel), o custo de reposio ou reparao, optando pelo que resulte mais baixo, a fim de minimizar os custos sociais, ou seja, maximizar a eficincia.

    Nesta rubrica utilizamos os dados fornecidos pelo Instituto de Seguros de Portugal (ISP). Apesar das dificuldades em obter dados para o perodo em anlise, o ISP conseguiu fornecer dados para o perodo de 2000 a 2009. Neste contexto, optou -se por considerar os anos de 1996 at 1999 como tendo um valor de custos administrativos das seguradoras igual ao ano de 2000, bem como, o de 2010 sendo igual ao de 2009.

    6.1.11 Custos relacionados com peritagens de acidentes

    As entidades competentes no puderam disponibilizar os dados ne-cessrios. Neste sentido, utilizou -se o estudo da Preveno Rodoviria Portuguesa de 1987 e estimaram -se os valores referentes a esta rubrica para o perodo em anlise.

    6.1.12 Honorrios pagos a advogados

    As entidades competentes (no mbito da Justia) no puderem dispo-nibilizar os dados necessrios. Neste sentido, optou -se, uma vez mais, por utilizar o estudo da Preveno Rodoviria Portuguesa de 1987 e estimar -se os valores referentes a esta rubrica para o perodo em anlise.

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal60

    6.1.13 Valor das custas judiciais

    As custas judiciais (mbito da Justia) refletem o valor, o preo da des-pesa ou encargo com o processo judicial at verificao do seu desfecho final, expresso numa determinada situao de facto ou na declarao de um direito, desde logo sendo, tambm, um fator a ter em linha de conta na composio e no clculo do custo econmico e social dos acidentes rodovirios. Embora tenhamos tido alguma informao relativa aos valores das custas relacionadas com os processos de acidentes rodovirios, esta no era suficiente em termos quantitativos para que pudssemos estimar um valor aproximado da realidade. Neste sentido, optou -se, uma vez mais, por utilizar o estudo da Preveno Rodoviria Portuguesa de 1987 e estimar -se os valores referentes a esta rubrica para o perodo em anlise.

    6.1.14 Custos com funerais

    Embora os custos com funerais sejam de certa forma despiciendos para o clculo do custo econmico e social dos acidentes rodovirios, estes so uma rubrica relevante pelo seu cariz tradicional e religioso e, por isso, devem ser tidos em conta. No entanto, no foi possvel termos acesso a uma informao atualizada por via das entidades competentes no terem disponibilizado os dados necessrios prossecuo deste trabalho. Neste sentido, optou -se, uma vez mais, por utilizar o estudo da Preveno Rodo-viria Portuguesa de 1987 e estimar -se os valores referentes a esta rubrica para o perodo em anlise.

    6.1.15 Valor dos danos no patrimoniais

    Existem custos que emergem dos acidentes que no so quantificveis pelo mercado, mas que, por reduzirem a utilidade dos indivduos nos casos de feridos diminuem o prazer de viver para o acidentado e seus

  • 61VI Componentes do Custo Econmico e Social dos Acidentes Rodovirios

    entes queridos e, no caso de morte, os efeitos deste custo so para os familiares. Este sofrimento e dor constituem verdadeiros custos para a sociedade, consubstanciando custos pessoais morais. A sua estimao, no sendo efetuada pelo mercado, s possvel atravs da utilizao de proxies.

    Com efeito, a ausncia de um preo determinado pelo mercado, quan-to a estes custos no patrimoniais, traduz uma das falhas de mercado, levando fundamentao da interveno do Estado para lhe atribuir um preo, no de indemnizao, pois tal ser impossvel nos casos de morte (dado que a funo utilidade se anula para a vtima mortal) mas, tambm, para as situaes de certas incapacidades permanentes quando so afe-tados rgos que desempenham funes determinantes para o bem estar (utilidade) do indivduo em causa.

    Haver, tambm, efeitos negativos em terceiros, dado que so elimina-das ou diminudas capacidades de consumir ou usufruir de determinados bens que levam a uma diminuio da funo utilidade (ou do bem estar). Efetivamente, para retirar utilidade (prazer) pelo uso ou consumo de de-terminados bens condio necessria a existncia de certas capacidades que, quando eliminadas ou diminudas, no possvel a sua utilizao plena ou parcial. Entre essas situaes podem mencionar -se, entre outras, a perda da viso, da audio ou da locomoo. Nestes casos, e outros afins, emergem dois tipos de efeitos56:

    1 Diminuio da capacidade de obter rendimento no mbito do mercado e a sua proxy traduzida na diminuio dos servios prestados fora do mercado, ou seja, os servios realizados em casa, na famlia e na comunidade (que so custos de oportunidade), impondo potencialmente outros custos que decorrem da utilizao dos servios de outras pessoas e utilizao de outros bens que no seriam utilizados na ausncia dessas incapacidades devidas aos acidentes;

    2 Diminuio da funo utilidade devido eliminao ou diminui-o de certas funes da vtima, tendo em conta o princpio da utilidade marginal decrescente. Por exemplo, no caso da perda da viso (ou outra

    56 Pintos Ager (2000) e Friedman (1982).

  • Custo Econmico e Social dos Acidentes de Viao em Portugal62

    funo essencial para o bem estar), a compensao que seja atribuda vitima, por maior que seja, no poder ser aplicada em bens cuja utilidade apenas se poder obter com a utilizao dessa funo que foi afetada em consequncia do acidente. Deste modo, o conjunto de opes do indivduo para obter utilidade fica necessariamente reduzido, consubstanciando, per se, uma diminuio da sua funo utilidade (logo traduzindo um custo ou desutilidade) qu