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305 Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, 17: 305-320, 2007. Tribos, Cacicados ou Estados? A dualidade e centralização da chefia na organização social da América pré-colombina Marcia M. Arcuri* ARCURI, M. M. Tribos, Cacicados ou Estados? A dualidade e centralização da chefia na organização social da América pré-colombina. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, 17: 305-320, 2007. Resumo: Este artigo apresenta uma breve discussão bibliográfica dos pressupostos teóricos que fundamentaram as interpretações arqueológicas e etnográficas recentes sobre as formas de organização política e social na América pré-colombiana. Procura-se demonstrar que a exigüidade de argumentos pautados no aprofundamento de nossa compreensão das cosmovisões ameríndias, sobretudo no que tange suas noções de poder e chefia, pode ser um dos principias fatores limitantes ao debate acadêmico sobre a complexidade social e as relações de poder na América indígena. Palavras-chave: Política – Religião – Chefia – América Indígena – Espacialização. por Julian Steward (1948), em The Handbook of South American Indians, publicação a partir da qual o conceito de “chiefdom”, ou chefia, passava a ser amplamente debatido nos estudos sobre a Amazônia. 1 Com o objetivo de explicar os estágios evolutivos de diferentes agrupamentos huma- nos e suas formas de adaptação ao meio ambiente, Julian Steward desenvolveu um modelo determinado pelas relações entre os modos de produção, a organização social e as formas de exercício político de uma determina- da sociedade. Sua teoria baseou-se em moldes evolucionistas cujos parâmetros vislumbravam s estudos antropológicos sobre a América indígena publicados nas décadas de 1940, 1950 e 1960 deram origem a um intenso debate sobre a natureza da organiza- ção social e política dos povos amazônicos, uma polêmica que influenciou de forma determinante as investigações arqueológicas e etnológicas brasileiras dos últimos cinqüenta anos. Em 1962, Elman Service publicou Primitive Social Organization: An Evolutionary Perspective, propondo que os grupos indígenas que viveram na América do Sul teriam atingido diferentes estágios de complexidade na sua organização social. Esses estágios poderiam ser medidos em quatro níveis de uma escala evolutiva descrita a partir do modelo de tipologias sociais anteriormente apresentado O (*) Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo. Pós-doutorado. [email protected] (1) Com a publicação do The Handbook of South American Indians, Kalervo Oberg seria o primeiro a aplicar o modelo de Steward às populações das terras baixas da América do Sul, discutindo a forma de organização política das populações indígenas do Xingu que, segundo o autor, não apresentavam chefias centralizadas (Oberg 1949).

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Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo, 17: 305-320, 2007.

Tribos, Cacicados ou Estados? A dualidade e centralização da chefiana organização social da América pré-colombina

Marcia M. Arcuri*

ARCURI, M. M. Tribos, Cacicados ou Estados? A dualidade e centralização da chefia naorganização social da América pré-colombina. Revista do Museu de Arqueologia eEtnologia, São Paulo, 17: 305-320, 2007.

Resumo: Este artigo apresenta uma breve discussão bibliográfica dospressupostos teóricos que fundamentaram as interpretações arqueológicas eetnográficas recentes sobre as formas de organização política e social naAmérica pré-colombiana. Procura-se demonstrar que a exigüidade de argumentospautados no aprofundamento de nossa compreensão das cosmovisõesameríndias, sobretudo no que tange suas noções de poder e chefia, pode serum dos principias fatores limitantes ao debate acadêmico sobre a complexidadesocial e as relações de poder na América indígena.

Palavras-chave: Política – Religião – Chefia – América Indígena – Espacialização.

por Julian Steward (1948), em The Handbook ofSouth American Indians, publicação a partir daqual o conceito de “chiefdom”, ou chefia,passava a ser amplamente debatido nosestudos sobre a Amazônia.1

Com o objetivo de explicar os estágiosevolutivos de diferentes agrupamentos huma-nos e suas formas de adaptação ao meioambiente, Julian Steward desenvolveu ummodelo determinado pelas relações entre osmodos de produção, a organização social e asformas de exercício político de uma determina-da sociedade. Sua teoria baseou-se em moldesevolucionistas cujos parâmetros vislumbravam

s estudos antropológicos sobre aAmérica indígena publicados nas

décadas de 1940, 1950 e 1960 deram origem aum intenso debate sobre a natureza da organiza-ção social e política dos povos amazônicos, umapolêmica que influenciou de forma determinanteas investigações arqueológicas e etnológicasbrasileiras dos últimos cinqüenta anos.

Em 1962, Elman Service publicou PrimitiveSocial Organization: An Evolutionary Perspective,propondo que os grupos indígenas queviveram na América do Sul teriam atingidodiferentes estágios de complexidade na suaorganização social. Esses estágios poderiam sermedidos em quatro níveis de uma escalaevolutiva descrita a partir do modelo detipologias sociais anteriormente apresentado

O

(*) Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade deSão Paulo. Pós-doutorado. [email protected]

(1) Com a publicação do The Handbook of South AmericanIndians, Kalervo Oberg seria o primeiro a aplicar o modelode Steward às populações das terras baixas da América doSul, discutindo a forma de organização política daspopulações indígenas do Xingu que, segundo o autor, nãoapresentavam chefias centralizadas (Oberg 1949).

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as formas de organização social com podercentralizado, a produção de excedentes e ahegemonia político-cultural, ou seja, critériosespelhados no modelo ocidental de “Estado”,como meta civilizacional. No extremo oposto àcategoria de maior complexidade, identificadano Estado, estariam as sociedades marginaisclassificadas como “bandos”. Esses seriamgrupos caçadores-coletores nômades queestariam predestinados ao “primitivismo”, poissuas formas de subsistência limitavam-se àescassez de recursos e às precárias condiçõesde adaptação a ambientes inóspitos. Em umsegundo estágio viriam as “tribos”, ou socieda-des agricultoras assentadas de forma maispermanente. Esses seriam os grupos ligadospor laços de sangue, cujas relações de linha-gens determinavam-se pela ausência de podercentralizado. O terceiro estágio de desenvolvi-mento social seria o dos “cacicados” (no inglês,chiefdoms). No modelo de Steward, oscacicados diferenciavam-se pela introdução dainstitucionalização do poder político e religio-so, dando espaço às hierarquias sociaismarcadas pela especialização técnica deindivíduos, ou grupos, reconhecidos por suafunção social ou trabalho. A identidade grupaldos cacicados transcendia os limites dasrelações por laços sanguíneos. Por fim, noquarto e mais avançado estágio de complexida-de, viria o “Estado”. Seriam sociedades queteriam atingido alto grau de desenvolvimentoeconômico, organizadas sob a égide de umsistema político de alianças diplomáticas, comcontrole coercitivo e teriam como principaiscaracterísticas internas a densidade populacional,a intensificação da produção agrícola e pasto-ril, a burocratização do poder público e aestratificação social.

Obviamente, Steward não partia exclusiva-mente de observações pessoais. Conforme jáapontado por Thomas Meyers, no Handbook ofMiddle Amercican Indians, Steward cita seucontemporâneo Paul Kirchhoff (1948), autordo Handbook of Middle American Indians, como oprimeiro a chamar a atenção para a superiorida-de dos povos circuncaribenhos em relação àsimplicidade que caracterizava os grupos amazô-nicos, tidos como opostos às sociedade mais

complexas dos Andes centrais (Meyers 1999: 82).Meyers aponta Kirchhoff, e também AlfredMétraux (1942), como as principais influências àelaboração da “inexata teoria de Steward, queatribui à limitação dos recursos ambientais dafloresta tropical amazônica o fator determinantepara a distinção no grau de complexidade dessespovos em relação às sociedades circuncaribenhas”(Meyers 1999: 93).

Conforme mencionamos, este modeloevolucionista de tipologias sociais serviu de panode fundo para o desenvolvimento de inúmerosprojetos de investigação científica que buscavampreencher lacunas na história da Américaindígena, ao longo de todo o século vinte. Entreos principais os que discutem esta temática, sejade forma teórica ou em estudos de casos,destacam-se os trabalhos de Betty Megers (1954,1971, 1973, 1975); Betty Meggers & CliffordEvans (1957); Marshall Sahlins (1960, 1985);Michael Coe (1961); Donald Lathrap (1968,1970, 1974, 1977); Carl Sauer (1952); RobertCarneiro (1970); Patrick Helms (1979); JoséBrochado (1980); Warren DeBoer (1981);Thomas Meyers (1981, 1982, 1999); AntônioPorro (1985, 1996); Anna Roosevelt (1987,1989); José Oliver (1998); Carlos Fausto (2001,2005); Denise Gomes (2005); Denise Shaan(2001, 2004); Eduardo Góes Neves (1996,1999a, 1999b, 2001); Michael Heckenberg(1996, 1998, 1999a 1999b); James Petersen(2000) e Petersen, Neves e Heckenberg (2001),entre outros.

Este artigo não pretende contribuir comdados novos ou esclarecedores à polêmicadiscussão sobre existência de cacicados entreos povos amazônicos. No Congresso daSociedade de Arqueologia Brasileira, realiza-do em 2007, pudemos observar o clarointeresse da comunidade arqueológica pelodebate sobre o tema no concorrido simpósioCacicado Amazônico, debatendo complexidadesocial na f loresta tropical, que reuniu ascomunicações dos especialistas: CarlosFausto, Denise Shaan, Eduardo Góes Neves eMichael Heckenberg. Ainda que tenham sidoapresentados distintos vieses de análise,pertinentes aos resultados de cada um dostrabalhos expostos, acreditamos que as

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propostas interpretativas não são excludentes,pois contemplam dados suficientes para justificara presença, nas “terras baixas”, da complexidadesocial originalmente atribuída unicamente àschamadas “altas culturas” da Mesoamérica e dosAndes. Esta é uma questão que há muito vemnorteando nosso trabalho, no que concerne àsrelações entre as chefias políticas e religiosas e àsrelações centro x periferia, nos períodos dehegemonia da Tríplice Aliança, liderada pelosmexicas (os astecas) e do Tahuantinsuyu inca.Nesse sentido, lançamos aqui uma perguntacontundente aos resultados obtidos em anos depesquisa sobre a natureza dos domínios político ereligioso dos mexicas e dos incas: qual o sentido deadotarmos o modelo ocidental de “Estado”,centralizador e unificado, para estudarmossociedades que fundamentam a organizaçãosocial, a espacialização, as relações políticas e ouniverso religioso na dualidade?

Cabe lembrar, que foi no trabalho de ElmanService intitulado A Origem do Estado e daCivilização, publicado em 1975, que a discussãosobre o conceito de chefia comparado às formasde organização política das chamadas “socieda-des igualitárias”, ainda nos moldes do modeloteórico de Steward, ganhou ênfase. No textocitado, Service fundamenta sua argumentaçãodiscutindo a natureza do poder e das leis, asformas de liderança e o surgimento do podercoercitivo. É interessante notar que essasmesmas questões vinham sendo tambémdiscutidas, com rigoroso embasamento teórico,por Pierre Clastres, que um ano antes haviapublicado A Sociedade contra o Estado.

No que concerne ao aparecimento doEstado, Service apóia-se na definição deGordon Childe, que explicava a origem dasprimeiras ‘civilizações’ como resultado de uma“revolução urbana” que se fundamentava nasseguintes características: a formação de agrupa-mentos populacionais variando entre sete evinte mil habitantes, a presença de grupos detrabalhadores especializados habitando a áreaurbana (artesãos, mercadores, sacerdotes etc.),a produção de excedentes agrícolas destinadosa um governo centralizado, a presença deedificações públicas monumentais, a formaçãode elites governantes, uma produção ‘artística’

sofisticada, a assimilação e controle de conheci-mentos matemáticos e astronômicos, o uso delinguagens codificadas (escritas), o estabeleci-mento de redes de comércio de longa distânciae a institucionalização política da chefiabaseada no poder coercitivo (Service 1975: 7).

Ainda que seja impossível negar a coerên-cia dessa associação entre a estratificação, aburocratização e a coerção nas formas depoder entre as sociedades complexas de altadensidade populacional, pretende-se demons-trar neste artigo que não apenas a concepçãoimprecisa das noções de chefia mas, sobretu-do, a conseqüente identificação do podercentralizado como base fundamental para aformação do Estado, são problemas aindapouco resolvidos na literatura sobre as formasde organização social na América pré-colombiana.

Pesquisas realizadas nos últimos vinte anosproporcionaram avanços no conhecimentoque demonstram que os quatro tipos deagrupamento descritos por Steward tornaram-se inadequados à tarefa de tentar melhorcompreender o passado da América, poisdesconsideram elementos da cosmovisãoameríndia fundamentais às noções de organiza-ção social e política. Esta discussão recai,sobretudo, no debate que envolveu a definiçãode fronteiras idiossincráticas que pudessemprecisar a comparação das sociedades enqua-dradas na tipologia dos cacicados, e aquelascaracterizadas pelo estágio de evolução ‘tribal’,ou seja, as sociedades chamadas igualitárias.

Seria impossível não atribuir o principalavanço neste debate teórico aos estudosetnográficos realizados sobre os povos daAmazônia, e Brasil Central, nos últimostrinta anos. Contudo, os dados levantadospelas pesquisas arqueológicas neste mesmoperíodo agregam de forma significativa,abrindo as perspectivas de análise, a nossover, para uma completa revisão teórica.2

Surge daí um componente crucial ao debate:

(2) Destaca-se aqui o sistemático trabalho que vem sendorealizado pelo Projeto Amazônia Central, inaugurado em1995, sob a coordenação dos arqueólogos Eduardo GóesNeves , Michael Heckenberger e James Petersen.

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a somatória de evidências que testemunham apresença de sociedades complexas na Amazô-nia Central, uma área que segundo atipologia de Steward era ocupada apenas porgrupos da categoria das tribos. Em suma, osdados que sustentam a produção acadêmicaatual sobre a Amazônia tornaram-se osprincipais indicadores da necessidade debuscarmos novos parâmetros para a investi-gação das sociedades ameríndias e, nesta linhade raciocínio, este artigo propõe indagarmosaté que ponto esses avanços científicos nospermitem questionar, também, a existência desociedades estatais na América pré-colombia-na. Se aceitamos que foi justamente aincompreensão de certas noções específicas dechefia o que mais prejudicou as interpreta-ções evolucionistas que se pautaram exclusiva-mente em teorias ambientais, assim como ainconsciência, naquela época, de que era adinâmica da oposição de forças duais com-plementares o principal alicerce dascosmovisões ameríndias, não teria a idéia decentralização do Estado nas mãos de umúnico governante também distorcido asanálises sobre a organização política dassociedades consideradas estatais?

Para discutirmos a hipótese de que acrítica ao modelo tipológico de Stewardaplicado às sociedades ameríndias deveestender-se na discussão sobre o conceito deEstado, será necessário abordar três aspectosteórico-metodológicos que, a nosso ver, sãoindissociáveis e fundamentais ao estudo sobrea América Pré-colombiana: o primeiro delesrefere-se aos alcances e limites da interpretaçãodas evidências arqueológicas à luz dos relatosetno-históricos, sobretudo dos Cronistas dosséculos XVI e XVII, assim como sua imprescin-

dível comparação aos dados etnográficosatuais;3 o segundo concentra-se na já enuncia-da má interpretação do significado do concei-to de “chefia”, assim como outros tais como“poder”, “guerra”, “governo” e tanto quantosão aqueles que nos servem de ferramentapara o estudo das sociedades ameríndias; e emterceiro lugar não podemos ignorar que odebate acadêmico dos últimos cinqüenta anosnos remete à associação dos fatores econômi-cos (economia de subsistência, aproveitamentode recursos, tecnologia de produção, agricultu-ra intensiva e acúmulo de excedentes) eculturais (tradições, cosmovisões e regras deconvívio político e social) que estavam empauta nas histórias de tão diversas sociedadesameríndias, fatores esses que só agora podemser analisados segundo melhores definiçõescontextuais.

O primeiro aspecto citado, sobre o diálogoentre as evidências arqueológicas, etno-históri-cas e etnográficas, está intimamente ligado aoinegável alcance dos trabalhos de abordagemmultidisciplinar. Muitos dados são necessáriospara se discutir o grau de desenvolvimento deuma determinada sociedade. Se, por um lado, aação interdisciplinar encontra forte resistêncianos meios acadêmicos mais conservadores, poroutro, as referências às pesquisas realizadasnessa linha tornam-se cada vez mais comuns.Um bom exemplo pode ser conferido nostextos publicados em A História do Índio noBrasil, organizado por Manuela Carneiro daCunha. Conforme aponta a autora, naintrodução:

“Sabe-se pouco da história indígenado Brasil: nem a origem nem as cifras depopulação são seguras (...), mas a

(3) Em uma recente publicação sobre o culto da divindademesoamericana Tezcatlipoca, Guilhem Olivier nos lembra que“a utilização de materiais separados cronologicamente, às vezespor vários séculos, foi alvo de sérias críticas... A propósito dasrealizações artísticas sobre as quais não dispomos detestemunhos escritos contemporâneos, George A. Kluber,baseando-se no ‘princípio de disjunção’ elaborado por ErwinPanofsky, considerou que a continuidade das formas nãoimplica a continuidade dos significados, e só ‘a evidênciaintrínseca’ permite-nos analisar essas obras arcaicas. Em

oposição a esta teoria, [muitos] autores... sustentaram, comjusta razão, a legitimidade de uma utilização crítica das fontesescritas do século XVI para melhor se compreender a artemesoamericana anterior a àquela época. Recorrer àsinvestigações etnográficas para interpretar certos aspectos dareligião pré-colombiana pode suscitar também sériasreservas... No entanto, vários investigadores souberamintegrar, de forma fortuita, testemunhos etnográficos em seustrabalhos dedicados ao México antigo” (Olivier 2004: 24-25).

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pesquisa arqueológica veio corroborar oque os cronistas diziam: a Amazônia, nãosó na região de várzea, mas em suas váriasáreas de Terra Firme, foi povoadadurante longo tempo por populosassociedades, sedentárias e possivelmenteestratificadas. Essas sociedades sãoautóctones, ou seja, não se explicamcomo o resultado da difusão de culturasandinas mais ‘avançadas’...” (Cunha1992: 11-12).

O trecho citado refere-se à grandepolêmica da historiografia da Américaindígena sobre a origem das chamadas“sociedades complexas” e as possíveis relaçõesentre as populações que se desenvolveram nabacia amazônica e as chamadas “altas cultu-ras” andinas. Esta discussão está diretamenteligada à questão do modelo de tipologiassociais de Steward aplicado aos gruposindígenas da América do Sul, e à hipótesedefendida por alguns pesquisadores daexistência de cacicados na Amazônia:

“... há hoje um consenso de que, nosmil anos que precederam a ocupaçãoeuropéia, diversas regiões da planícieamazônica alcançaram um grau dedesenvolvimento sócio-cultural maiscomplexo daquele que a etnografia temobservado desde o século XIX. Adescoberta de sítios arqueológicos dedimensões inusitadas de aterros artifici-ais com evidências de funçãohabitacional e funerária, esta últimacom elementos sugestivos de acessodiferenciado a bens materiais, levouarqueólogos a entrever a existência deformações políticas do tipo doscacicados da área circuncaribenha.Muito embora as seqüências arqueológi-cas não apontem muito claramente paraa contemporaneidade daquele horizontecultural com o início da colonização,havia a expectativa de que os relatos dosprimeiros viajantes trouxessem otestemunho de um modo de vidaconsentâneo com as evidências arqueoló-

gicas e com o tipo de organizaçãopolítica presumida” (Porro 1996:76).

Em “The Pristine Myth: The Landscape of theAmericans in 1492”, William Denevan (1992)apresenta evidências de estudos demográficos aosargumentos, cada vez mais concretos, de que aAmérica estava densamente povoada no início doséculo XVI. Se os dados demográficos abstraídosde cálculos pautados exclusivamente nos relatosdos cronistas sempre foram passíveis dequestionamento, os avanços tecnológicosrecentes permitiram que outras fontes depesquisa como, por exemplo, o manejo dasflorestas originais, a agricultura e as demaisevidências da construção sistemática de umapaisagem antropogênica por assentamentospermanentes revigorassem as discussões. Aindaassim, conforme apontando anteriormente,análises fundamentadas em fatores naturais eeconômicos, que recaem unicamente sobreevidências do aproveitamento dos recursosambientais, são insuficientes quando o objetivo étentar reconstruir a forma de organizaçãopolítica e social de uma determinada sociedade.Pautado nessa premissa Eduardo Góes Nevesapresenta ao debate uma relativa resistência àidentificação de cacicados na Amazônia. Reba-tendo, por exemplo, a interpretação de AnnaRoosevelt das evidências de aterros e valas nossítios arqueológicos da Ilha de Marajó comoindicativos da presença de estruturas políticascentralizadas, Góes Neves nos lembra que,mesmo podendo estar associadas à guerra, essasevidências não são suficientes para sustentar oargumento de uma centralização política. Umapossível interpretação, nas palavras do autor,estaria também na resposta local a problemasecológicos como as cheias anuais (1999: 336).Em “Agricultural Limitations of the Amazon inTheory and Practice” Thomas Meyers (1992: 93)apresenta a mesma linha de raciocínio:

“...a presença de campos de cultivonão apenas nas áreas de várzea, mastambém nas terras firme são umimportante indicativo de que as primei-ras poderiam ser inteiramente destruídaspela inundação. Quando isso ocasional-mente ocorreu, no século XVII, os

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indígenas recorreram à produção doscampos de terra firme, que os primeirosmissionários mal sabiam da existência.”(Meyers 1992: 93)

Nas conclusões do texto, Meyers afirma quea teoria das limitações ambientais da florestatropical amazônica resulta de comparaçõesinexatas entre o grau de complexidade socialatingida pelas sociedades que lá se desenvolverame as culturas circuncaribenhas, lembrando quemuita evidência contrária foi ignorada pelosadeptos do determinismo ambiental que tem emBetty Meggers sua principal expressão (Meyers1992: 93).

A comparação dos trabalhos citados deEduardo Neves e Thomas Meyers nos fazperceber que, independentemente doposicionamento divergente desses autoressobre a suposta formação de cacicados amazô-nicos, ambos, junto a tantos autores destedebate, apresentam evidências contrárias àlógica das limitações ambientais que teriamcomprometido o desenvolvimento da agricul-tura na Amazônia.

“Do geógrafo Carl Sauer, Lathrapherdou a perspectiva que enxergava...nos campos inundáveis das áreas defloresta tropical das terras baixas comocentros remotos de desenvolvimentocultural como, por exemplo, dedomesticação de plantas. Nesta perspec-tiva... a floresta tropical, ou partes dela,não encontrou limitações para odesenvolvimento cultural, mas, demodo contrário, enfrentou um estímulopara o estabelecimento de sociedadessedentárias estáveis...” (Neves 1996: 41)

Nesse sentido, se queremos aprofundar adiscussão sobre as sociedades complexas, énecessário ampliar o espectro de análise,extrapolando a lógica do universo da produçãode subsistência, para que a hipótese aumentodensidade populacional > aumento de complexidadesocial possa ser avaliada a partir de novospressupostos teóricos. Em outras palavras,devem-se incorporar dados que compreendema pluralidade de opções, sobretudo as de

ordem cultural, nos estudos das formas deagrupamento humano. Esses são temas queenvolvem conceitos dos campos da antropolo-gia política (Sahlins 1960, 1972; Mauss 1924,Clastres [1974] 2003) e da arqueologia cognitiva(Renfrew 2001) que, a nosso ver, tornaram-seum indispensável alicerce teórico para osestudos históricos da América Pré-colombiana.Tornou-se evidente o avanço proporcionadopelas análises interdisciplinares.

Mesmo quando o principal objetivo decertas pesquisas foi o de avaliar as possibilida-des econômicas de adaptabilidade, ou asperspectivas de evolução que o ambienteconferia a um determinado grupo de assenta-mento permanente, a preocupação em compi-lar dados sobre a economia daquele grupolevou necessariamente a indagações sobre asformas de produção e distribuição de alimen-tos e produtos. Em outras palavras, os estudossobre as formas de organização social epolítica das sociedades ameríndias levaram,necessariamente, a discussões que transcendemo âmbito local. As relações sociais passaramnaturalmente a serem discutidas, também, soba luz das relações supra-aldeanas. Assim,aquilo que poderia ser entendido pelo viés dasrelações de produção, passa a fazer parte detemáticas como a identificação de rotas e redescomerciais, a demarcação de fronteirasterritoriais, as diferentes naturezas e possíveisrelações entre chefias – e não somente aexistência ou não de uma chefia nos moldes doautoritarismo despótico do Estado (Clatres2003: 222), as formas e a legitimidade dopoder (político e/ou religioso) nas relaçõesentre grupos e, como não poderia deixar deser, as noções e relações de guerra.

Para abordar estas questões de formasistemática, propomos aqui uma discussão apartir de estudos de casos de sociedadesclassificadas na literatura como cacicados etribos, respectivamente do Caribe e da Amazô-nia, atendo-nos ao conhecido debate acadêmi-co sobre as possíveis influências de populaçõesamazônicas, ou do Brasil Central, nas socieda-des caribenhas (Rouse 1992; Lathrap 1970;Siegel 1989, 1991b; Heckenberger e Petersen1995; Oliver 1998).

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Tribos e cacicados no Caribe e na América doSul: centro, chefia e relações de poder noespaço comunal

Tomemos como primeiro exemplo o estudode caso do sítio arqueológico Caguana, localiza-do no centro-oeste do atual Porto Rico.Segundo o arqueólogo José Oliver (1998),Caguana pode ser interpretado como oprincipal centro cerimonial de Porto Rico, etalvez até do Caribe (Oliver 1998: 1; Siegel1992). As evidências indicam que Caguana foierigido pelos capas (c.1200-1525d.C.),antecessores diretos dos taínos. Os capasdescendiam de uma longa tradição de aldeiassedentárias agricultoras e ceramistas chamadasaladoide. Acredita-se que os grupos saladoidesemigraram do Orinoco (Rouse 1992), muitoprovavelmente provindo do leito médio do rioAmazonas (Lathrap 1970; Siegel 1991a).Escavações arqueológicas realizadas nas maisantigas aldeias saladoides do atual Porto Ricodemonstram que o padrão de assentamentocaracterizava-se por “círculos concêntricos”,padrão esse que foi muito difundido tambémno Brasil Central (Heckenberger y Petersen1995; Siegel 1989).

Apoiado na hipótese dessa migraçãoproveniente da Amazônia, Oliver demonstraque, desde os princípios da colonizaçãosaladoide das Antilhas, a praça pública servia,além de recinto para atividades cotidianas,como espaço adequado aos ritos e à organiza-ção da vida comunal. Fundamentalmente, apraça central era destinada ao enterro dosmortos. A comunicação entre descendentes(vivos) e antepassados (mortos) gerava, a partirdesta função, o centro cerimonial que, comoveremos adiante, explica o desenvolvimentodos cacicados.

Oliver, com base na historiografia (Siegel1992), desenvolve o conceito da praça centralnas aldeias saladoides como axis-mundi, ouespaço central de comunicação entre o mundonatural (vivente) e o “extraordinário” (dosantepassados e das essências espirituais), o quecondiz com sua função de cemitério. Entre asdiversas atividades rituais realizadas no espaçocomunal da praça central, o autor destaca a

prática do jogo de bola que, como bem explicaGillespie (1991: 332-333):

“...eram levados a cabo em momentosde disjunção, ou de separação... [porexemplo] durante os solstícios, noprimeiro dia da temporada de planta-ção, no começo da temporada dechuvas, ou de seca...”

Gillespie afirma que “este conceito seaplica igualmente aos jogos realizados nosmomentos de separação social”, exemplificandocom o ritual de iniciação dos jovens apinayés, daregião do Tocantins. A autora nos lembra que“os jogos estão associados ao conceito deperiodicidade, porque estes introduzem ouenfatizam uma disjunção no seio da sociedade,enquanto o movimento periódico dos astrosintroduz uma disjunção no tempo e no espaço,separando o cosmo em noite e dia, verão einverno...” (Gillespie 1991: 333)

Esta noção de disjunção, ou de separação,a que se refere Gillespie é parte de um conceitomais amplo de “metades” (moieties), ou dualidades,que se apresenta como um denominadorcomum às mais diversas formas de organizaçãosocial ameríndias. Para a maioria desses grupos,o princípio dinâmico da dualidade comple-mentar de forças antagônicas (ou de metades) éa base que sustenta o equilíbrio da natureza edo cosmo. Os princípios que regem os ciclosde vida e morte dos animais e dos homens, sãoos mesmos que determinam os ciclos de vida emorte das plantas, ditados pela passagem dasestações do ano. São princípios que se funda-mentam na concepção do tempo marcado pelaobservação dos astros. A rotatividade dosastros indica o tempo cíclico, ritual, da mesmaforma que e a linearidade determinada noregistro do calendário também indica o tempoda tradição, sendo o passado e a ancestralidaderetomados no exercício ritual. Nesse sentidode relação entre as metades, a praça centralsaladoide funcionava como entidade coesiva,mantendo a comunidade unida por umsentido comum, como a genealogia, o parentes-co e a descendência (Oliver 1998: 30-31). Poroutro lado, é importante ressaltar que os“momentos de separação social” a que se

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refere Gillespie são também a ocasião em que umindivíduo se diferencia, se qualifica ou se destacaem relação ao resto do grupo. Indagamos, então:seriam esses princípios geradores de hierarquiassociais?

Similarmente aos apinayés e outros gruposde fala Macro-Jê das regiões do Araguaia eTocantins, como por exemplo os xerentes, asaldeias saladoides do Caribe organizavam-se deforma autônoma, destituídas de sistemapolítico supra-aldeano, constituindo gruposconstituídos por linhagens, clãs e metades ecom a ausência de liderança ou de caciques.Como aponta Oliver: “... podemos inferirque o costume saladoide de enterrar gruposde indivíduos na praça central da aldeiaobedece à importância que se dava à organi-zação comunal sobre a individual, acima dosinteresses sócio-políticos e econômicos dosdistintos segmentos da sociedade. Não é de seestranhar que nenhum enterro saladoideencontrado até hoje leve sinais de distinçãode hierarquia ou status (Oliver 1998:50).

Nesse sentido, poderíamos afirmar que odebate sobre a distinção entre tribos e cacicados,pelo viés de análise sobre a centralização dachefia, pode estar associado a uma discussãoanterior a respeito da essência da dualidade, ouda noção de metades, na configuração doespaço comunitário, onde eram organizadas asrelações entre os indivíduos e a comunidade, eo espaço cósmico, onde eram organizadas asrelações entre as comunidades, a natureza e asentidades supranaturais.

Os saladoides, assim como os apinayés eos xerentes, praticavam o jogo de bola napraça central do povoado. Curt Nimuendajú(1967: 175-177) descreve uma narrativa deorigem dos apinayés, conhecida comoTecware, em que é realizado um jogo de bolana praça central. Igualmente àquilo que éobservado no Popol Vuh, uma narrativa deorigem mantida pelos quiché-maias daMesoamérica, encontramos registros de queos apinayés associam o movimento da bola deborracha do Tecware à cabeça-troféu, em umasimbologia alusiva aos movimentos dos astrosnas jornadas diárias do Sol e da Lua (Oliver1998: 55).

Nota-se, portanto, que as sociedades semchefia, ou tribais, do Caribe e da América doSul compartilharam noções fundamentais aosmodos de organização social, ritual e política: arelação entre metades, a prática do jogo debola na praça central da aldeia e a interação dasforças naturais e “extraordinárias” (como dia ea noite, a vida e a morte, o passado e o presen-te) a partir da atividade ritual que legitima oespaço central e coletivo da aldeia. A dinâmicadessa dualidade complementar é motora doequilíbrio estabelecido no eixo central, ou axis-mundi, daquela sociedade.

Os casos saladoide, apinayé e xerentecitados nos ajudam a compreender a organiza-ção social de sociedades tribais nas suasrelações intra-aldeanas. Contudo, se o focodeste estudo são os cacicados, deve-se observarcomo se dão as relações supra-aldeanas eidentificar as noções de chefia e poder que,supostamente, diferem os cacicados dassociedades igualitárias, ou tribos.

Ainda no estudo do centro cerimonial deCaguana, Oliver expande sua análise paraoutros centros cerimoniais de Porto Ricorelativos à etapa de domínio caciquil taíno. Oautor apresenta a teoria de Vescelius (1977)sobre os centros cerimoniais localizados naperiferia dos assentamentos, isto é, nas regiõesfronteiriças, e não no centro geográfico dacomunidade. Vescelius teria sido o primeiroautor a focar a questão dos centros cerimoniaiscomo “fenômeno dinâmico de grande significa-ção na política aborígine e na formação doscacicados”:

“... o elemento realmente inovador erevolucionário no estudo de Vescelius éa possibilidade de que os centroscerimoniais não necessariamente devemcoincidir com o centro geográfico e como assento principal de um cacicado..., masque poderia localizar-se nas bordas oufronteiras entre dois, três ou maisunidades políticas, cumprindo assim afunção de marcar a separação oudisjunção e, a sua vez, de estabelecer umequilíbrio ou ponto de contato entre asdiferentes unidades políticas. Recordamos

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aqui a função simbólica das cerimônias erituais que a praça cumpria na aldeiaapinayé do Brasil: marcar a separaçãoentre as duas metades... e enfatizar osmomentos de disjunção na sociedade, notempo e no espaço...” (Oliver 1998: 88)

É interessante o paralelo que pode sercriado com o modelo dos “Portos de Comér-cio” (Ports of Trade) desenvolvido por KarlPolanyi (1957), que AnneChapmann aplicou ao estudode alguns sítios “periféricos” daMesoamérica. Mesmo considera-das as limitações da análise deChapmann, como no caso dosítio de Xoconosco (Arcuri2003), não se pode negar que aautora propôs pensarmospossíveis relações de neutralida-de nos limites fronteiriços dodomínio político asteca, noséculo XV. As contestações quesurgiram a partir do texto deChapmann (Berdan 1976;Voohries 1991) demonstraram,por sua vez, que o estudosistematizado das fontes provaser inegável a necessidade de separticularizar as relações detroca, reciprocidade, conflitoou neutralidade dos sítioslocalizados em regiões de fronteira (de domíniopolítico), assim como a relação centro xperiferia no âmbito interno, quando procura-mos entender territorialidade em sociedadesameríndias. Acreditamos ser esta uma proble-mática de abordagem indispensável ao pesquisa-dor que discute paradigmas de centralizaçãopolítica e modelos evolutivos adotados nosestudo das sociedades pré-colombianas.

Observa-se na Figura 1 um mapeamentodos centros cerimoniais taínos de Porto Rico,os campos de “batey” (uma modalidade dejogo de bola). Eles estão localizados predomi-nantemente nas regiões fronteiriças. Naetapa taína, os centros cerimônias não serestringiam a organizar ou equilibrar asforças sociais no âmbito intra-aldeia, mas

ampliar esse equilíbrio às várias partesdesiguais que funcionavam sob uma liderançacaciquil (Oliver 1998: 88). No estudo sobrecacicados no Panamá, Mary W. Helms (1979:28-29) refere-se à mesma questão comrelação à prática do Krun (uma versão localdo jogo de bola) como “um fórum de expres-são pública da habilidade do chefe numasituação de competição e rivalidade (...) umaexpressão cerimonial de prestígio...”

(Oliver 1998:90)

Na tese de doutorado “O Doméstico e oRitual: cotidiano Xaray no Alto Paraguay até oSéculo XVI”, Maria Clara Migliacio (2006:284) discute a forma em que os Xaray, do AltoParaguay, dispõem o espaço coletivo e ritual(dos sepultamentos) de forma circular, emtorno do espaço doméstico caracterizado pelacentralidade. Esta aparente ‘inversão’ darelação centro x periferia pode ser comparadaà transferência do espaço ritual dos campos debatey às zonas de fronteira, identificada porJosé Oliver, no momento em que a região‘periférica’ da aldeia passa a assumir função de‘centro’ nas relações supra-aldeanas. Noâmbito das relações supra-aldeanas, devemospensar não apenas na coesão do grupo, mastambém nas interações entre as elites. Aqui osconceitos de chefia, reciprocidade e guerra,

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assim como as noções de hierarquização,circulação e “display” (Sahlins 1972) entram empauta, tornando-se o mote da discussão sobre oque distingue os cacicados das sociedadesigualitárias.

Conforme já mencionado, os cacicadosdiferenciam-se das sociedades igualitárias porapresentarem pela primeira vez, na escalaevolutiva dos modelos teóricos, a institucio-nalização do poder político e religioso centrali-zado. Pesquisas mais recentes demonstram,contudo, que, mais do que identificar o estágiode ‘evolução social’ de determinado grupo (sejaele bando, tribo, cacicado ou estado), torna-senecessário esclarecer quais os processos e osmúltiplos fatores que levam uma determinadasociedade a organizar-se de forma mais oumenos hierárquica, ou “complexa”.

Este é o ponto em que se nota que éimpossível dissociar por completo os estudossobre os cacicados daqueles que buscamentender a demografia da América indígena, oque coloca a historiografia sobre a ocupação daAmazônia e os resultados mais recentes dasescavações dos sítios arqueológicos de terraspretas4 da floresta tropical no centro do debate.

A partir da metade do século XX a Amazôniapassa a ocupar espaço destacado nas discussõesarqueológicas e antropológicas da América doSul, sobretudo pautadas na polêmica gerada pelaspublicações de Betty Meggers (1954, 1971, 1973,1975). As interpretações de Meggers foramamplamente debatidas ao longo das últimas trêsdécadas. Ao deparar com claras evidências decerâmica policrômica de iconografia elaborada emontículos artificiais na Ilha de Marajó, elemen-tos indicativos de complexidade social, Meggersprocurou explicações justificadas em umainfluência externa, buscando um ‘centro deorigem cultural’ de onde teriam migrado aspopulações que se assentaram na região ‘ecologi-camente limitada’ da floresta tropical amazônicaque era, por essa lógica, uma região periférica. Os

registros arqueológicos encontrados por Meggersna Ilha de Marajó teriam resultado de ondasmigratórias provenientes da região andina. Comoaponta o arqueólogo Eduardo Neves:

“Meggers formulou uma hipótesesugerindo que fatores ambientaisestabeleceram um limite para o potenci-al de desenvolvimento das sociedadesamazônicas... [sugerindo] que o fatorlimitante fundamental seria o potencialagrícola dos solos (...) Meggers e Evansforam também influenciados pelapremissa de que os Andes Centraisteriam sido o grande pólo de inovaçãocultural da América do Sul, e que,portanto, a Amazônia e o resto doterritório brasileiro teriam sido umaárea marginal durante toda a Pré-História do continente” (Neves 1999:361-362).

A limitação do ambiente amazônico teriajustificado ainda, segundo Meggers, o colapsodaquela ocupação complexa, o que podia seridentificado nos vestígios arqueológicos dacerâmica ‘rudimentar’ encontrada nos extratosmais próximos à superfície do solo (Megger eEvans 1957). Em reação aos postulados deMeggers e Evans, Donald Lathrap criou umahipótese contrária, no início da década de 1970,sustentando que a cerâmica da América do Sulteria sido inventada dentro da Amazônia,sugerindo como centro de origem Proto-Tupi aconfluência do rio Madeira com o Amazonas.Inspirado pelas propostas de Lathrap o arqueólo-go José Brochado passou a avaliar, na década de1980, as variações internas do tronco Tupi,procurando estabelecer comparações ao históricodas diferenciações cerâmicas da Amazônia.Brochado lançou a hipótese de que o aparecimen-to Proto-Tupi teria resultado de uma divisão entreos povos produtores da cerâmica Guarita, naAmazônia Central:

“Baseado em pressupostos da lingüísti-ca histórica, [Brochado] considerou que adiferenciação das línguas e das cerâmicasao longo de diferentes expansões teriaresultado da separação espaço-temporal

(4) Solos férteis, formados pelo sucessivo acúmulo dedejetos, ricos em fósforo e carbono negro. Sobre o assuntover Neves 1999; Neves et al. 2001).

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do Proto-Tupi, causada por pressõespopulacionais contínuas devidas a umaumento demográfico no interior daregião amazônica. Desta separação, ascorrelações mais evidentes ligam osGuarani às cerâmicas encontradas nooeste da Amazônia e os Tupinambá àscerâmicas do leste amazônico...” (Noelli1996: 21)

No trecho citado, Francisco Noelli refere-seao trabalho de Brochado, que discute aquestão do centro de origem das rotas deexpansão dos Tupi. Esta polêmica, comoafirma o próprio autor, não está definida.Contudo, Noelli sugere que, considerando-se acomparação das informações lingüísticas,arqueológicas, etnográficas, etnobiológicas eecológicas, “...os Tupi seriam um povo de altosedentarismo, que teriam se expandido emconseqüência do crescimento demográfico queredundava em fracionamento de aldeias (...)implicando complexas relações interétnicas quedeveriam oscilar entre contatos belicosos eamistosos” (1996: 34)

A argumentação de Noelli de 1996 foiduramente questiona por Eduardo Viveirosde Castro e Greg Urban. Viveiros de Castrocriticou o abandono injustificado de umantigo modelo de migração Tupi-Guarani nosentido sul-norte,5 em favor da proposta deum modelo expansão radial, defendido porBrochado, que pressupunha o centro deorigem na Amazônia Central há pelo menos2000 anos. Viveiros de Castro postula,então, sua pergunta: “...se os povos Tupiestavam na costa atlântica há pelo menos2000 anos, porque não chegaram a desenvol-ver estruturas sócio-políticas ‘complexas’ dotipo cacicados da várzea amazônica?” (Vivei-ros de Castro 1996: 59-60)

Em resposta, Noelli aceita algumas daslimitações das hipóteses do modelo de expansãoradial de Brochado indicadas por Viveiros deCastro e Urban, mas alega que muitos dosresultados proporcionados pela arqueologia epelos estudos lingüísticos após 1984, ano emque Brochado publicou seus estudos, contri-buíram para reafirmar alguns pontos específi-cos, como por exemplo a relação das cerâmicasdo Alto Amazonas e da bacia do Paraná. Noelliaponta também que tampouco as interpreta-ções dos dados arqueológicos até hoje refutama hipótese de Brochado.

Os trabalhos de arqueologia realizadosnos sítios de terras pretas da Amazônia nasúltimas duas décadas colocaram à prova ateoria de Meggers e contribuíram para amesma linha de raciocínio de Latrhap, Bro-chado, Noelli e Porro. A nosso ver, a discussãodo centro de origem Tupi-Guarani não deveestar dissociada da polêmica hipótese deMeggers de uma expansão originada nosAndes que teria dado origem aos gruposresponsáveis pela produção das complexascerâmicas tapajônicas e marajoaras. Entre osprincipais trabalhos que contribuíram paraesse debate nas duas últimas décadas podemoscitar os dos arqueólogos Anna Roosvelt,Eduardo Neves, James Petersen, MichaelHeckenberger. Em linhas gerais, esses pesquisa-dores propõem que as terras pretas sãoevidência de uma ocupação intensiva deconsiderável área do território amazônico emtempos pré-colombianos por sociedades quenão figuravam no cenário à época da chegadados europeus. Ademais, a iconografia dacerâmica encontrada nesses sítios apresenta-secomo inegável testemunho da hierarquização ecomplexidade do universo ritual que caracte-rizou a vida das sociedades amazônicasantepassadas, como bem demonstraram asarqueólogas Denise Schaan e Denise Gomes,nos trabalhos publicados nos últimos anos.Tais evidências, pensadas à luz da discussãosobre os grupos da floresta tropical amazônicae os saladoides e taínos do Caribe, traz à tona aterceira e última questão levantada inicialmente,sobre a associação entre fatores econômicos eculturais nos modos de organização social.

(5) É importante notar que a correlação entre os dadosprovenientes dos estudos lingüísticos e as evidênciasarqueológicas não é direta e muitos teóricos questionam estetipo de análise. Colin Renfrew (1987) discute a necessidadede se desenvolver metodologias que integrem dadosarqueológicos e lingüísticos para estudar a história e odesenvolvimento das populações.

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Não se pode perder de vista que os sítiosde terras pretas que foram foco de pesquisanos últimos anos estão localizados, sobretu-do, nas regiões de várzea dos leitos dosprincipais rios da bacia hidrográfica amazôni-ca. A questão não é tanto dissociar opotencial econômico de determinada regiãocomo atrativo para o assentamento humano,mas comparar as evidências no sentido deentender que as hipóteses lançadas pelodeterminismo ecológico que influencioutantas pesquisas realizadas na América doSul e no Caribe não são corroboradas pelaevidência arqueológica. É aqui que os fatoresculturais que determinam as formas deorganização social ganham peso. Se a econo-mia e a subsistência da comunidade nãopodem ser ignoradas, o que devemos nosperguntar é se os critérios de avaliação decomplexidade social adotados na tipologiaevolucionista de Steward são adequados, aexemplo da evidência amazônica e caribenha,para classificar as sociedades ameríndias. Ouse, ao contrário, as noções de chefia nãocoercitiva (Clastres 2003: 223), de poderlegitimado pela transformação, pela tradiçãoe pela ancestralidade, assim como a noção deguerra como “consumo produtivo” (Viveirosde Castro 1993: 186; Seeger, Da Matta eViveiros de Castro 1979: 3 apud Fausto2001:328), não explicariam melhor asformas de organização social ameríndias?

Ao analisar a história dos guaranis doBrasil Meridional, John Manuel Monteiroaponta que enquanto para os tupinambás omotor da sociedade era a guerra, para osguaranis “a religião era o elemento unificador”.Apoiado em Clastres, Monteiro aponta ocaso guarani do conflito entre o chefe e oprofeta, ou os karai, que contestavamfortemente a autoridade do chefe e, ao queindicam os relatos do XVI e XVII, atraíamgrandes levas migratórias movidas pelo“messianismo”.

Talvez este seja o caminho a se percorrerpara discutir a pergunta de Viveiros deCastro sobre por que não se teria formadoum cacicado tupi na Amazônia central. Sepensamos as noções de chefia e de guerra

pautadas no poder não coercitivo, não seriamais adequado pensarmos uma interpreta-ção pautada na idéia da Sociedade contra oEstado proposta por Clastres?

Esta é uma discussão que, a nosso ver,está longe de ser resolvida. Se por um ladonão podemos negar as transformações porque passa uma sociedade frente a um expres-sivo aumento demográfico, o que acarretaem novos tipos de relações sociais, ditadaspela disponibilidade ou disputa de recursos;tampouco podemos ignorar que as evidênci-as etnográficas e arqueológicas sugerem,cada vez mais, que o “Estado” talvez não fossenecessariamente o caminho almejado porgrande parte das populações indígenas daAmérica pré-colombiana. Nas palavras deClastres:

“Se parece ainda impossível determi-nar as condições de aparecimento doEstado, podemos em troca precisar ascondições de seu não aparecimento (...)Chefia e linguagem estão, na sociedadeprimitiva, intrinsecamente ligadas; apalavra é o único poder concedido aochefe: mais do que isso, a palavra paraele é um dever (...) o chefe é generoso...somente um bom orador [como oprofeta tupi-guarani do século XV]pode ter acesso à chefia (...) Palavraprofética, poder dessa palavra: teríamosnela o lugar originário do poder, ocomeço do Estado no Verbo? Profetasconquistadores das almas antes desenhores dos homens?... o que osselvagens nos mostram é o esforçopermanente para impedir os chefes deserem chefes [políticos], é a recusa daunificação, é o trabalho da conjuraçãodo Um, o Estado” (Clastres 2003: 222-234)

Ora, a cosmovisão das sociedadesameríndias fundamentava-se no princípio dadualidade complementar, princípio esse queregulava tanto a organização ritual no espaçoda praça central dos apinayés e das aldeiassaladoides, quanto os jogos de bola deborracha praticados pelos capas, taínos e

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povos da Mesoamérica. Igualmente, osregistros andinos indicam que a administra-ção pública organizava-se segundo os princípi-os cosmológicos das metades do acima(hanan) e do abaixo (hurin), e que cadametade era administrada por duas chefias.6

Nesse sentido, não seria nossa obcecadanecessidade de identificar o caminho doaparecimento do Estado e da “unidade”(Clastres 2003: 233), um passo em falso natentativa de se compreender o passado pré-colombiano?

Para evitarmos a circularidade do argumen-to, é fundamental que o debate historiográficoseja alimentado com dados ainda inéditos, sejapela interpretação de novos vestígios arqueológi-cos, estudos lingüísticos, etnográficos e camposafins. O que contemplamos neste momento éque as pesquisas nas terras pretas da AmazôniaCentral indicam uma maior densidadedemográfica na região do que se sabia, ao

mesmo tempo em que há também indícios deocupações descontínuas e que somam-se àequação os vestígios cerâmicos amazônicos comdatações que superam, às vezes, a marca de5.000 anos (Neves, Jornal da USP/XXI, 760, 24-30 abril 2006: 6-7). Todos esses são fatores desuma importância, que justificam a ação perma-nente dos projetos de investigação, pois muito hápor se preencher nas lacunas da história daAmérica indígena.

Acreditamos, assim, que as terras baixas daAmérica do Sul oferecem um dos campos maispromissores no sentido de re-avaliarmos osmodelos de organização social propostos paraas demais regiões da América pré-colombina.Em conseqüência, torna-se fundamental reveros postulados e interpretações das formas dedistribuição espacial, das noções deterritorialidade, das relações centro x periferiae, sobretudo, das relações de poder entre associedades ameríndias.

(6) Sobre o conceito de metades e dualismo fundamentadona idéia de “espelho”, para as sociedades andinas, ver Platt1978; Moseley 1992 e Bauer 1998.

Tribes, Chiefdoms or States? Duality and power centralization in the social organizationof Precolumbian America. Revista do Museu de Arqueologia e Etnologia, São Paulo,17: 305-320, 2007.

Abstract: This paper discusses the theoretical approaches to recentarchaeological and ethnographic interpretations of ‘Native Americans’ socialand political organization. Our aim is to highlight the needs for new compara-tive studies that comprehend some fundamental aspects of the indigenouscosmovisions, particularly their notions of chiefdom, in order to surpass someof the limiting factors to the academic debates on social complexity and powerrelations in the Native America.

Keywords: Politics – Religion – Chiefdom – Indigenous America – Spatiality.

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