triagem neonatal

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PESQUISA MÉDICA | N o 16 | Out/Dez 2010 30 OS DEZ SINAIS DE ALERTA PARA IMUNODEFICIÊNCIA PRIMÁRIA NA CRIANÇA POR CRISTIANA BRAVO Uma gota de sangue a mais no teste do pezinho pode ser suficiente para avaliar o sistema imunológico do recém-nascido e detectar a presença de imunodeficiência grave combinada. O exame entrou em fase de teste em setembro último IMUNOLOGIA A s imunodeficiências primárias (IDPs) são enfer- midades de origem genética que levam a uma resposta inadequada do sistema imune. Essas deficiências causam maior suscetibilidade a infecções, inclusive causadas por vacinas com microrganismos atenuados, como a BCG. Além disso, estima-se que a incidência seja de um caso em 2 mil nascidos vivos, ou seja, tão frequentes quanto doenças já incluídas na tria- gem neonatal de distúrbios metabólicos (teste do pezi- nho) como fenilcetonúria (1/14.000) e hipotireoidismo (1/5.000). Entre as IDPs, está a imunodeficiência grave combi- nada (SCID − severe combined immunodeficiency), causada por uma série de defeitos genéticos que provocam a dis- função das células T e B. Pacientes portadores de SCID não diagnosticados evoluem para óbito no primeiro ano de vida. Em virtude da gravidade da SCID, pesquisado- res do Instituto de Ciências Biomédicas da Universida- de de São Paulo (ICB-USP) desenvolveram um exame Triagem neonatal de imunodeficiências primárias para detecção desses defeitos genéticos na triagem neonatal. O exame ainda está em fase experimental; as coletas de sangue neonatal, realizadas com o tes- te do pezinho, iniciaram-se em setembro. “As coletas vão durar dois anos e serão feitas em dois hospitais da cidade de São Paulo ligados à Unifesp [Universidade Federal de São Paulo]”, informa o professor Antonio Condino Neto, coordenador do projeto. “Serão reali- zados de dois a três mil testes”, diz ele. Essa pesquisa foi financiada pela Baxter International, empresa far- macêutica norte-americana, e pela Fundação Jeffrey Modell, entidade dedicada ao estudo das IDPs. Conscientização do pediatra Atualmente, sem a triagem neonatal, o médico pe- diatra é fundamental para o reconhecimento clínico das IDPs. Para facilitar esse diagnóstico, a Fundação Jeffrey Modell elaborou dez condições clínicas deno- minadas “Sinais de Alerta” (ver quadro, à página XX). Esses sinais foram adaptados ao nosso meio pelo Grupo Brasileiro de Imunodeficiências (Bragid). A presença de um ou mais sinais é indicativo de IDP e é necessário que o médico peça exames laboratoriais para investigação diagnóstica. É de extrema impor- tância que o pediatra esteja muito atento aos sinais de alerta para IDP e encaminhe os casos suspeitos para os serviços de referência precocemente. Essa atitude possibilita a adoção de medidas terapêuticas específi- cas, como o transplante de medula, e melhora o prog- nóstico e a qualidade de vida desses pacientes. Para ler mais: http://www.projetodiretrizes.org.br/ans/diretrizes/ diretrizes_vii.pdf http://www.imunopediatria.org.br/ 1 Duas ou mais pneumonias no último ano 2 Oito ou mais otites no último ano 3 Estomatites de repetição ou monilíase por mais de dois meses 4 Abscessos de repetição ou ectima 5 Um episódio de infecção sistêmica grave (meningite, osteoartrite, septicemia) 6 Infecções intestinais de repetição/diarreia crônica 7 Asma grave, doença do colágeno ou doença autoimune 8 Efeito adverso ao BCG e/ou infecção por micobactéria 9 Fenótipo clínico sugestivo de síndrome associada à imunodeficiência 10 História familiar de imunodeficiência

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Page 1: Triagem Neonatal

PESQUISA MÉDICA | No 16 | Out/Dez 201030

OS DEz SInAIS DE AlErtA PArA IMUnODEfICIênCIA PrIMárIA nA CrIAnçA

Por Cristiana Bravo

Uma gota de sangue a mais no teste do pezinho pode ser suficiente para avaliar o sistema imunológico do recém-nascido e detectar a presença de imunodeficiência grave combinada. O exame entrou em fase de teste em setembro último

imunologia

As imunodeficiências primárias (IDPs) são enfer-midades de origem genética que levam a uma resposta inadequada do sistema imune. Essas

deficiências causam maior suscetibilidade a infecções, inclusive causadas por vacinas com microrganismos atenuados, como a BCG. Além disso, estima-se que a incidência seja de um caso em 2 mil nascidos vivos, ou seja, tão frequentes quanto doenças já incluídas na tria-gem neonatal de distúrbios metabólicos (teste do pezi-nho) como fenilcetonúria (1/14.000) e hipotireoidismo (1/5.000).

Entre as IDPs, está a imunodeficiência grave combi-nada (SCID − severe combined immunodeficiency), causada por uma série de defeitos genéticos que provocam a dis-função das células T e B. Pacientes portadores de SCID não diagnosticados evoluem para óbito no primeiro ano de vida. Em virtude da gravidade da SCID, pesquisado-res do Instituto de Ciências Biomédicas da Universida-de de São Paulo (ICB-USP) desenvolveram um exame

Triagem neonatal de imunodeficiências primárias

para detecção desses defeitos genéticos na triagem neonatal. O exame ainda está em fase experimental; as coletas de sangue neonatal, realizadas com o tes-te do pezinho, iniciaram-se em setembro. “As coletas vão durar dois anos e serão feitas em dois hospitais da cidade de São Paulo ligados à Unifesp [Universidade Federal de São Paulo]”, informa o professor Antonio Condino Neto, coordenador do projeto. “Serão reali-zados de dois a três mil testes”, diz ele. Essa pesquisa foi financiada pela Baxter International, empresa far-macêutica norte-americana, e pela Fundação Jeffrey Modell, entidade dedicada ao estudo das IDPs.

Conscientização do pediatraAtualmente, sem a triagem neonatal, o médico pe-

diatra é fundamental para o reconhecimento clínico das IDPs. Para facilitar esse diagnóstico, a Fundação Jeffrey Modell elaborou dez condições clínicas deno-minadas “Sinais de Alerta” (ver quadro, à página XX). Esses sinais foram adaptados ao nosso meio pelo Grupo Brasileiro de Imunodeficiências (Bragid).

A presença de um ou mais sinais é indicativo de IDP e é necessário que o médico peça exames laboratoriais para investigação diagnóstica. É de extrema impor-tância que o pediatra esteja muito atento aos sinais de alerta para IDP e encaminhe os casos suspeitos para os serviços de referência precocemente. Essa atitude possibilita a adoção de medidas terapêuticas específi-cas, como o transplante de medula, e melhora o prog-nóstico e a qualidade de vida desses pacientes.

Para ler mais:http://www.projetodiretrizes.org.br/ans/diretrizes/

diretrizes_vii.pdf

http://www.imunopediatria.org.br/

1 Duas ou mais pneumonias no último ano

2 Oito ou mais otites no último ano

3 Estomatites de repetição ou monilíase por mais de dois meses

4 Abscessos de repetição ou ectima

5 Um episódio de infecção sistêmica grave (meningite, osteoartrite, septicemia)

6 Infecções intestinais de repetição/diarreia crônica

7 Asma grave, doença do colágeno ou doença autoimune

8 Efeito adverso ao BCG e/ou infecção por micobactéria

9 Fenótipo clínico sugestivo de síndrome associada à imunodeficiência

10 História familiar de imunodeficiência