trecho do livro "826 notas de amor para emma"
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I n t r o d u ç ã o
Quando minha filha era recém-nascida, eu
costumava balançá-la até que ela adormecesse no
cestinho que nós colocamos com todo carinho em
seu quarto. Minha esposa, Lissa, passava horas
alimentando Emma, então, o mínimo que eu podia
fazer era assumir a responsabilidade de embalá-la.
Para ser honesto, aqueles minutos eram valiosos.
Escutar os pequenos sons que Emma fazia ao
adormecer. A maneira como eu ficava maravilhado
com seus dedinhos, cada cílio milagroso em seus
olhos, as preciosas dobrinhas dos seus lábios.
Esse era um momento meu. Para embalar, refletir,
saborear.
Com frequência, a cachorrinha da família,
Lucy, se enroscava no tapete ao nosso lado. Ela
amava Emma e gostava de ficar em qualquer
cômodo onde sua “irmã” estivesse.
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Uma vez, quando Emma estava perto do seu
primeiro aniversário, mas ainda me permitia
embalá-la até adormecer, olhei para Lucy. Não sei
o que me fez pensar nisso, mas, de algum modo,
percebi que um dia teria de explicar a Emma que
Lucy morrera. Lucy era, àquela época, três anos
mais velha e, levando em conta a expectativa de
vida dos cães, deduzi que no oitavo aniversário de
Emma eu teria de partir seu coração. De alguma
maneira, eu teria de encontrar palavras para
explicar por que Lucy não estava mais conosco.
Esse pensamento me fez chorar. Não sabia
como iria lidar com isso. Se, por um lado, estava
extremamente feliz em compartilhar com Emma
as alegrias do mundo, por outro, o pensamento em
abrir seus olhos para as tragédias... Não, obrigado.
Eu não tinha ideia de que acabaria me
sentando com ela quatro vezes para contar que
tinha câncer. Essencialmente, mentir quatro vezes
para ela ao tentar prometer que sobreviveria. Eu
não iria sobreviver. Agora sei que este câncer
me matará. É só uma questão de tempo. É claro
que queria que fosse bastante tempo, mas,
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recentemente, meu médico disse que tenho 8% de
chances de viver por mais cinco anos.
Emma tem agora quatorze. Eu tenho 8% de
chances de vê-la se formar no Ensino Médio.
Essas palavras são quase impossíveis de se
escrever. Há períodos em que não consigo encarar a
realidade do fim da minha vida. Não tenho medo da
morte. Se eu não tivesse Emma, seria capaz de dizer:
“Bem, tem sido um bom passeio”. O que não suporto
é o pensamento de deixar minha pequena menina, de
não estar lá para vê-la crescer, para dar-lhe conselhos
e advertências, rir e brincar. Ser seu pai.
Então, tive de achar uma outra maneira. Não
sei quanto tempo ainda tenho. Mas descobri uma
forma de fazê-la saber todos os dias o quão amada
é, o quanto eu a apoio e o quanto eu me importo
com a pessoa que ela se tornou. Escrevo bilhetes
de guardanapo para ela, os quais coloco dentro da
sua lancheira todas as manhãs.
Partilho este livro porque nenhum de nós sabe
quanto tempo ainda nos resta. Sim, caminhamos
pelo planeta com a esperança de sermos
invencíveis, mas sabemos que a vida nos pode ser
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tirada a qualquer instante. Eu tenho a “dádiva” de
perceber que o fim está se aproximando. Posso
reservar um tempo para fazer um balanço e
dizer para as pessoas que amo o quanto elas
significam para mim. É a única coisa que
importa. Sua casa, sua conta bancária, suas
habilidades, sua profissão — nada disso importa.
Tudo se resume aos relacionamentos duradouros
que construímos. É isso. É tudo isso.
Este livro é um chamado. Para acordar.
Conectar-se. Compartilhar seus sentimentos. Faça
aquele telefonema. Escreva aquele bilhete. Porque
eu conheço muito bem a fragilidade da vida e sei o
quanto é importante reservarmos um tempo para
nos aproximar daqueles que amamos, enquanto
ainda estamos aqui, enquanto ainda podemos.
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1.
Tudo começou com um guardanapo
Dobrei lentamente o guardanapo e o coloquei
na lancheira de Emma. Ultimamente, minhas
mensagens passaram a focar na temática do
beisebol. Emma estava se tornando uma ávida
jogadora de softball, e eu amava usar essas
analogias. Eu me considero um ladrão de base,
sempre procurando por oportunidades, pronto
para ver quais direções novas a vida pode tomar.
Querida Emma, você não pode roubar a segunda base e ainda assim manter seu pé na primeira. Com amor, papai.
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Mas houve um momento em que arrastei meus
pés. Não estava pronto para correr para a segunda
base, embora fosse o que meu time precisasse.
Minha esposa, Lissa, é cinco anos mais velha
do que eu. Sempre me senti muito sortudo por
ela ter me escolhido, um jovem pretensioso, para
ser seu parceiro por toda a vida. (Curiosamente,
minha mãe é cinco anos mais velha do que meu
pai.) No entanto, um dos desafios em ser casado
com alguém mais velho é que, às vezes, tive que
entrar de cabeça nas mudanças da vida antes
mesmo de estar preparado. Fui um dos primeiros
entre meus amigos a comprar uma casa. Eu me
casei bem antes deles. Agir como um adulto me foi
imposto inúmeras vezes.
No começo de 1999, Lissa veio até mim e disse
francamente:
— Já é hora.
Tenho certeza de que houve mais discussões
que levaram a essa declaração, mas aquelas três
palavras foram as que mais importaram. Já era hora
de tentar engravidar. Eu tinha somente 29 anos,
mas Lissa estava com 34, e já era hora. Casados há
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apenas alguns anos, eu não tinha certeza se estava
pronto para o próximo passo. Há muito tempo eu
rezava para ter uma filha, mas era para o futuro.
Quando eu estivesse pronto para crescer.
Eu sabia, Lissa tocaria no assunto.
Honestamente, sabia que o começo dessa aventura
poderia ser bastante divertido para mim. Além
disso, parece que todo mundo nos dias de hoje
precisa de algum tipo de aconselhamento sobre
fertilidade, e não achei que engravidaríamos de
imediato. Eu teria tempo para me preparar.
Embora a gente não tenha engravidado logo,
não demorou muito. O começo dessa aventura foi
muito mais rápido do que o esperado. Em pouco
tempo, eu estava encarando a paternidade.
Os oito meses e meio seguintes foram
uma enxurrada de atividades e preparações.
Frequentamos todos os tipos de cursos.
Escolhemos um pediatra. Passamos horas a fio em
lojas olhando macacões e outras parafernálias de
bebês. Adaptamos a casa para as necessidades de
um bebê e preparamos o quartinho. (Um conselho
para todos os futuros pais: monte o berço dentro
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do quarto! Eu gostei tanto de montá-lo que tive de
fazer duas vezes!)
E, claro, lemos todos os livros sobre nomes
de bebês publicados na América do Norte. Eu
era fortemente a favor de Elizabeth ou Matthew.
Na verdade, eu queria escolher Matthias, a
versão alemã de Matthew, mas eu sabia que não
poderia ganhar esta batalha. Sequer tentei. Lissa
rapidamente vetou Elizabeth por causa de uma
antiga colega de quarto com quem ela não se dava
muito bem. Lissa gostava de Benjamin e Chloe.
Infelizmente, tínhamos um gato, o Ben, e chamar
nosso filho de Ben pareceu estranho. Eu vetei
Chloe porque imaginava provocações no parquinho
começando com rimas engraçadinhas.
Após o ultrassom da vigésima semana,
descobrimos que minhas preces haviam sido
atendidas. Teríamos uma menina. Meu coração se
encheu de alegria quando pude ver uma imagem
mais real do bebê crescendo dentro da Lissa. Uma
pequena menina. Finalmente, a ideia de se tornar
um pai começou a parecer mais atrativa.
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