trauma torácico

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Trauma TorcicoAUTORESAlessandro Wasum MarianiMembro do Grupo de Transplante Pulmonar do InCor Ps-graduando nvel doutorado da Disciplina de Cirugia Torcica e Cardiovascular do Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina da USP ltima Reviso: 30/05/2010

Ricardo Mingarini Terra

Mdico Assistente do Servio de Cirurgia Torcica do Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina da USP Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da USP

INTRODUO E DEFINIESO politraumatismo atualmente a maior causa de bitos em pacientes at a quarta dcada de vida. Estima-se que nos Estados Unidos 25% das mortes devidas a politrauma estejam diretamente associadas ao traumatismo torcico. Muitas dessas mortes poderiam ser evitadas por medidas simples, uma vez que menos de 10% dos traumatismos fechados do trax e apenas 15% a 30% das leses penetrantes exigem toracotomia para tratamento.

ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIAO trauma torcico pode ser causado por traumas contusos (acidentes automobilsticos, quedas e impactos em geral), penetrantes (leses por arma de fogo ou arma branca) ou pela associao dos anteriores (por exemplo, acidente automobilstico com contuso e leso penetrante associadas). A fisiopatologia do trauma torcico est relacionada com trs alteraes bsicas: a hipxia, a hipercarbia e a acidose. A hipxia tecidual definida como a oferta inadequada de oxignio aos tecidos. A hipovolemia condio associada hipxia, no s no trauma torcico, mas em qualquer tipo de trauma que origine sangramento importante. Entretanto, o trauma torcico pode ainda gerar ou mesmo agravar a hipxia tecidual por outros dois fatores: a alterao na relao ventilaoperfuso ou pela alterao nas relaes pressricas dentro da cavidade torcica (tabela 1).

Tabela 1: Mecanismos geradores de hipxia tecidual no trauma torcico e suas respectivas causas Mecanismos geradores de hipxia Hipovolemia Alterao na relao ventilaoperfuso Alteraes pressricas na cavidade torcica Causas Sangramento Contuso, hematoma, colapso alveolar etc. Pneumotrax hipertensivo, Pneumotrax aberto, hemotrax, etc.

A hipercarbia definida como o acmulo de CO2 ocorre em virtude de uma ventilao inadequada. Esta pode ser ocasionada por alteraes nas relaes pressricas da cavidade torcica, que podem gerar colapso pulmonar, ou pelo rebaixamento do nvel de conscincia, com queda do estmulo respiratrio, podendo levar inclusive parada respiratria.

A acidose metablica gerada pelo estado de hipoperfuso tecidual (choque) e tambm est presente em outras modalidades de trauma que no o torcico. Porm, no trauma torcico, esta pode ser agravada em virtude da associao com acidose respiratria devida a estado de hipoventilao.

ClassificaoO trauma de trax pode ser classificado quanto ao mecanismo de trauma (contuso ou penetrante) ou ainda em fechado ou aberto.

ATENDIMENTOO trauma torcico pode gerar diversas leses, muitas vezes superpostas umas s outras, e tambm superpostas a leses de outras regies, por exemplo, o abdome. Por isso, o atendimento vtima de trauma deve ser regrado e orientado de forma a diagnosticar e tratar as leses encontradas ordenadamente, permitindo assim melhor resultado.

Atendimento InicialO atendimento a uma vtima de trauma torcico deve contemplar todos os passos do atendimento ao politraumatizado. A sistematizao proposta pelo ATLS do Colgio Americano de Cirurgies de fundamental importncia, pois garante pronto diagnstico e tratamento com um ganho de tempo fundamental (tabela 2).

Tabela 2: Sistematizao proposta pelo ATLS no atendimento ao politraumatizado A (Airway) B (Breathing) C (Circulation) D (Disability) E (Exposure) Manuteno de vias areas prvias e controle cervical Avaliao e manuteno da respirao e mecnica ventilatria Manuteno da circulao e controle da hemorragia Avaliao do estado neurolgico Exposio do paciente (retirada das roupas) e controle do ambiente (por exemplo, evitar hipotermia)

Atendimento Especfico s Leses TorcicasO atendimento das principais leses torcicas acontece durante as avaliaes primria e/ou secundria, dependendo da sua potencial gravidade. Segundo orientao do ATLS, dividiremos as leses torcicas conforme o visto na tabela 3.

Tabela 3: Leses torcicas Diviso segundo ATLS Leses com risco iminente de vida (devem ser diagnosticadas e prontamente tratadas no exame primrio) Leses com potencial risco de vida (devem ser suspeitadas e investigadas/tratadas no exame secundrio) Pneumotrax simples hemotrax Contuso pulmonar

Obstruo da via area Pneumotrax hipertensivo Pneumotrax aberto

Trax instvel hemotrax macio Tamponamento cardaco

Lacerao traqueobrnquica Traumatismo contuso do corao Ruptura traumtica de aorta Ruptura traumtica de diafragma Ferimentos transfixantes do mediastino

O alto ndice de suspeita deve ser uma das caractersticas do atendimento ao politraumatizado. Na avaliao primria do segmento torcico, todas as leses com risco iminente de vida devem ser rapidamente identificadas e imediatamente tratadas, mesmo que parcialmente, no sentido de maximizar a probabilidade de a vtima sobreviver. Na avaliao secundria procede-se ao exame completo da vtima em busca das leses com potencial risco de vida. No trax, existem oito leses potencialmente letais que devem ser identificadas e tratadas ainda que para isso seja necessrio lanar mo de exames auxiliares. Lembrando que o exame deve incluir todas as regies anatmicas, anterior e posteriormente.

DIAGNSTICO E CONDUTA DIANTE DE LESES TORCICASPneumotrax definido como a presena de ar na cavidade pleural que ocasiona o colapso pulmonar e pode acarretar insuficincia respiratria aguda. O quadro clnico em geral apresenta dispnia de intensidade varivel, muitas vezes associada dor torcica. Ao exame fsico podemos identificar o hipertimpanismo percusso e a diminuio ou ausncia de murmrio vesicular ausculta. O diagnstico pode ser confirmado com a radiografia de trax, que demonstra linha de pleura afastada do gradeado costal, bem como colapso pulmonar (figura 1). A conduta a ser tomada a drenagem torcica fechada.

Figura 1: Radiografia de trax mostrando Pneumotrax

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Drenagem TorcicaA tambm chamada drenagem pleural fechada (sob selo dagua) deve ser realizada nos casos de trauma, segundo a orientao do ATLS, no 5. ou 4. espao intercostal do lado afetado, anteriormente linha mdio-axilar. O ATLS tambm recomenda a explorao digital da cavidade torcica antes da insero do dreno torcico durante a drenagem, com objetivo de averiguar a possibilidade de hrnia diafragmtica. O dreno recomendado o tubular multiperfurado calibroso (para adultos, 36 french) para evitar a obstruo. O dreno deve ser introduzido cuidadosamente no sentido cranial e posterior. A fixao pele deve ser realizada com fio resistente, alm de curativo adequado (figura 2). Importante lembrar de nunca pinar o dreno.

Figura 2a, 2b, 2c, 2d e 2e: passos da drenagem torcica

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Pneumotrax HipertensivoSituao de elevada gravidade, considerada pela classificao como uma das seis leses com risco iminente de vida, o Pneumotrax hipertensivo causa desvio do mediastino podendo provocar colapso circulatrio (compresso de grandes vasos e cmaras cardacas), ocasionando choque que, se no prontamente tratado, leva morte. Importante diagnstico diferencial com tamponamento pericrdico e com choque hipovolmico. O desvio mediastinal pode ser severo de forma a comprimir o parnquima do pulmo no lesado (figura 3). Para o diagnstico encontramos: dispnia, taquipnia, diminuio da ausculta de murmrios vesiculares, hipertimpanismo percusso e reduo da expanso torcica do lado acometido. Um sinal que pode ser de difcil identificao desvio traqueal, principalmente em pacientes brevilneos e obesos. Em casos em que a vtima no est chocada, a turgncia jugular pode ser visualizada (freqentemente presente na clnica do tamponamento). O tratamento inicial consiste na imediata descompresso que pode ser obtida facilmente com a puno do hemitrax. Esta deve ser realizada antes da drenagem com dreno tubular, por ser mais fcil e rpida. A tcnica consiste na introduo de uma agulha calibrosa (por exemplo, jelco 14 gauge) no 2. espao intercostal, facilmente palpvel, com a linha hemiclavicular, sempre na borda superior da costela para no lesar o feixe vsculo-nervoso que se localiza no bordo inferior do arco costal. A agulha introduzida a 90 graus do plano da parede torcica. Quando o jelco atinge o Pneumotrax hipertensivo, muitas vezes pode ser reconhecida a rpida sada de ar sobre presso; nesse momento, podemos introduzir o componente plstico e recuar o componente metlico para evitar perfurao inadvertida do pulmo. O tratamento definitivo que deve ser realizado aps a puno a drenagem pleural sob selo dgua de forma semelhante ao descrito acima.

Figura 3: Pneumotrax hipertensivo

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Pneumotrax AbertoEsta leso, tambm conhecida como ferida torcica aspirativa, uma das seis leses com risco iminente de vida, em razo da severa insuficincia respiratria subjacente. caracterizada pela perda de parte da parede torcica, permitindo uma ampla comunicao do espao pleural com o meio externo. O diagnstico pode ser realizado na inspeo, que evidencia perda importante de tecidos da parede torcica. Se o dimetro da ferida tiver mais que dois teros do dimetro da traquia, durante a inspirao, o ar adentrar preferencialmente atravs da ferida cavidade pleural, e no pelas vias areas aos pulmes, gerando grave insuficincia respiratria. A ferida deve ser coberta imediatamente com um curativo de trs pontos fixos e um solto. O trax deve ser drenado de forma habitual ao trauma, e o paciente, to rpido quanto possvel, encaminhado ao tratamento definitivo. A intubao orotraqueal e a ventilao com presso positiva podem ser institudas a qualquer momento como tratamento da insuficincia respiratria.

O tratamento definitivo o desbridamento e a reconstruo cirrgica da parede. Caso o fechamento primrio no seja possvel, enxertos e retalhos podem ser usados no intuito de reestabelecer a integridade da caixa torcica.

Hemotrax definido como a presena de sangue na cavidade pleural que pode ser proveniente de leses de parnquima pulmonar, parede torcica, grandes vasos como cava, aorta e seus ramos, leses cardacas ou de rgos abdominais. Para o diagnstico podemos encontrar sinais de derrame pleural, como a reduo ou ausncia de murmrio vesicular e macicez percusso. A presena de dispnia depende do grau de compresso pulmonar, bem como sinais de choque hipovolmico dependem do volume sangneo perdido. Muitos pacientes apresentam-se assintomticos em virtude da hemotrax de pequeno volume. A radiografia simples de trax faz o diagnstico demonstrando linha de derrame pleural ou, quando feita em decbito dorsal, velamento difuso do hemotrax acometido (figura 4). A conduta a ser realizada a drenagem pleural fechada, como descrita anteriormente com drenos tubulares multiperfurados de grosso calibre e reposio volmica conforme a necessidade. Figura 4: hemotrax

Hemotrax MacioConsidera-se macio o hemotrax que apresente um dos seguintes critrios: sada imediata de 1.500 ml ou mais de sangue drenagem do hemitrax acometido; perda de um tero da volemia drenagem do hemitrax; sangramento superior a 200 ml/h durante duas ou mais horas sem a normalizao dos parmetros hemodinmicos (excluda outra causa); ou sangramento contnuo pelo dreno, exigindo transfuses repetidas, sem que haja outro foco de sangramento. O tratamento do hemotrax macio consiste em controle do sangramento e reposio volmica, que devem ser realizados concomitantemente. O controle do foco hemorrgico no hemotrax macio traumtico exige explorao cirrgica da cavidade torcica.

Trax Instvel decorrente de mltiplas fraturas de costelas, ocasionando a perda da rigidez do segmento do envoltrio sseo acometido. A presena de duas ou mais fraturas em dois ou mais arcos costais suficiente para determinar a instabilidade. Pode estar associada insuficincia respiratria de graus variados, que decorre no da instabilidade torcica, mas da Contuso pulmonar subjacente. O grau de dispnia depende das reservas muscular ventilatria e pulmonar prvias e da extenso da rea de flacidez, alm das leses associadas principalmente gravidade da Contuso pulmonar. A inspeo revela o sinal caracterstico do movimento paradoxal do trax. A palpao pode demonstrar crepitao de arcos e intensa dor. A radiografia de trax apresenta mltiplas fraturas de arcos costais, podendo demonstrar tambm a Contuso pulmonar. A tomografia computadorizada de trax no imprescindvel para o diagnstico, mas, quando possvel, diante das condies clnicas do paciente, ela demonstra detalhes como a presena de intercorrncias pleurais, lacerao pulmonar, pneumomediastino e, principalmente, a extenso do dano parenquimatoso. Analgesia vigorosa e eficiente a prioridade no tratamento, podendo ser usados desde antiinflamatrios no-hormanais, opiceos e derivados, bloqueios intercostais, at mesmo peridural torcica. Tratar as complicaes pleurais como acima descrito (hemotrax, Pneumotrax). A assistncia ventilatria deve ser instituda e consiste desde simples suplementao de O 2 at ventilao mecnica com presso positiva para manter PO2 acima de 60 mmHg e PCO2 abaixo de 48 mmHg. Lembrar que, associado ao quadro de Contuso pulmonar, pode ocorrer sndrome do desconforto respiratrio do adulto (SDRA), portanto, na ausncia de hipotenso sistmica, a infuso de cristalides deve ser criteriosa. A fixao cirrgica da parede torcica contra-indicada pela maioria dos autores.

Contuso Pulmonar e Sndrome do Desconforto RespiratrioA Contuso pulmonar a leso torcica potencialmente letal mais comum. Seu espectro de apresentao varia desde quadros assintomticos at quadros graves de insuficincia respiratria, com sndrome do desconforto respiratrio. O diagnstico contempla histria de trauma violento de trax; dispnia progressiva muitas vezes de inicio tardio; hipoxemia, em geral, progressiva; radiografia de trax revelando infiltrado alveolar que mais tardiamente pode evoluir com reas de condensao. A tomografia computadorizada de trax delimita de forma mais precisa a extenso da leso. Para os casos mais leves, a observao rigorosa, o controle da dor e a fisioterapia respiratria so indicados. Nos casos graves, alm dos cuidados acima, se impem: restrio hdrica, aps a estabilizao do possvel choque hipovolmico de outra causa, diurticos e a assistncia ventilatria por ventilao no invasiva ou intubao orotraqueal com ventilao mecnica utilizando-se estratgias de ventilao especficas.

Obstruo de Via Area (Intratorcica)Em razo de sua gravidade, importante que as leses crticas que afetam as vias areas devam ser reconhecidas e abordadas durante o exame primrio. A permeabilidade das vias areas deve ser garantida, e a inspeo da orofaringe procura de corpos estranhos fundamental. Existe grande associao de trauma de laringe com trauma torcico. A obstruo da via area intratorcica deve ser sempre suspeitada e investigada, pois muitas vezes oligossintomtica. Corpos estranhos (objetos, fragmentos sseos e dentes), alm de sangue, so causas comuns de obstruo de via area no paciente politraumatizado. O quadro clnico em geral composto por dispnia, taquipnia e estridor. A dificuldade de fonao pode ser identificada, e a alterao de murmrio vesicular unilateral pode ocorrer na presena de obstruo brnquica (por exemplo, corpo estranho). A radiologia pode demonstrar objetos radiopacos, alterao na coluna area da traquia (difcil visualizao) e atelectasia pulmonar (quando ocorre obstruo completa do brnquio). A broncoscopia o exame definitivo para a avaliao e o tratamento. Inicialmente, a oxigenoterapia suplementar e at a ventilao mecnica se necessrio, so indicados, garantindo o suporte ventilatrio. A intubao orotraqueal sempre a forma preferencial de garantir a via area; na impossibilidade desta, muitas vezes se impe a necessidade de acessos como a cricotiroidostomia por puno ou cricotiroidostomia cirrgica, uma vez que a traqueostomia um procedimento preferencialmente eletivo. Entretanto, em alguns casos, na impossibilidade de se locar uma cnula por via orotraqueal ou

cricotiroidostomia, se faz necessria a realizao da traqueostomia na sala de urgncia, que, por ser complexa, deve preferencialmente ser realizada por cirurgio com treinamento em vias areas. A broncoscopia, principalmente a rgida, o tratamento-padro para a remoo de corpos estranhos de via area. Em casos de sangramento intenso na via area, a intubao seletiva pode ser um recurso valioso. O tratamento cirrgico por toracotomia reservado para poucos casos em que a broncoscopia foi ineficiente. Outra causa de obstruo das vias areas no trauma torcico o afundamento das clavculas com compresso da traquia contra a coluna vertebral. O tratamento consiste em pinar as cabeas claviculares com pinas cirrgicas e tracion-las anteriormente. Concomitantemente, abduzem-se os braos da vtima, tracionando-os em sentido posterior, de preferncia com os membros superiores pendendo nas laterais da maca. Aps a descompresso, avalia-se a estabilidade dos anis cartilaginosos e a necessidade da colocao de uma cnula traqueal distal ao esmagamento.

Lacerao TraqueobrnquicaA ruptura traqueobrnquica pode ser dividida em leses da traquia cervical ou leses da traquia torcicas e brnquios.

Lacerao de Traquia CervicalPode ser decorrente de trauma direto com contuso traqueal, da hiperextenso do pescoo que ocorre em impactos frontais ou de ferimentos cervicais penetrantes. O quadro clnico pode apresentar sinais externos de trauma cervical, cornagem, alterao vocal, dispnia, enfisema de subcutneo cervical. O diagnstico definitivo pode ser estabelecido por broncoscopia. Deve-se estabelecer a permeabilidade de vias areas, aps a estabilizao, bem como avaliao cirrgica para tratamento conservador ou cirrgico. O tratamento conservador consiste em observao, caso o paciente esteja com ventilao espontnea ou em traqueostomia com colocao do balonete abaixo da leso, se a ventilao mecnica for necessria. O tratamento cirrgico pode ser realizado pela rafia primria da leso ou resseco e anastomose do segmento acometido, considerando-se o tamanho e as caractersticas da leso.

Lacerao de Traquia Torcica ou Brnquios Principais causada por compresso ntero-posterior do trax, desacelerao sbita (impactos frontais ou quedas de grandes alturas) e, menos freqentemente, por ferimentos penetrantes. Constituem diagnstico a histria de trauma torcico fechado de grande energia ou penetrante, desconforto respiratrio, escarro hemoptico ou hemoptise, enfisema de subcutneo, fuga area significativa e constante pelo dreno torcico aps a drenagem pleural. O diagnstico definitivo pode ser estabelecido pela broncoscopia. Se houver insuficincia respiratria ou perda area intensa pelo dreno pleural, realizar intubao seletiva contralateral para garantir a ventilao do paciente. A toracotomia para abordagem da leso pode ser necessria para corrigir o defeito, podendo ser realizadas sutura primria, broncoplastia ou traqueoplastia, a depender do local e da extenso da leso.

Tamponamento CardacoO Tamponamento cardaco ocorre mais comumente em ferimentos penetrantes, porm, ocasionalmente pode ser encontrado em traumas contusos. O saco pericrdico uma estrutura fibrosa inelstica, por isso uma pequena quantidade de lquido pode ser suficiente para restringir o enchimento cardaco. Da mesma forma, a remoo de quantidades mnimas de sangue, como 20 ml, podem ocasionar melhora hemodinmica imediata. O quadro clnico clssico do tamponamento de difcil identificao no atendimento de urgncia ao trauma, logo, a suspeita deve sempre lembrada. A clssica trade de Beck no trauma no deve ser esperada: elevao da presso venosa central que suspeitada pela distenso das veias do pescoo pode estar ausente devido hipovolemia; abafamento de bulhas cardacas de difcil reconhecimento em virtude do ambiente barulhento de pronto-socorro; hipotenso muitas vezes interpretada somente como choque hipovolmico. O pulso paradoxal, que a reduo da presso sistlica em mais de 10 mmHg durante a inspirao, e o sinal de Kussmaul, que o aumento da presso venosa durante a inspirao, podem estar presentes, mas na situao de emergncia tambm so de difcil identificao.

A atividade eltrica sem pulso em paciente vtima de trauma na ausncia de hipovolemia e de Pneumotrax hipertensivo sugere fortemente Tamponamento cardaco. A ultra-sonografia quando disponvel pode, com boa margem de segurana, demonstrar a presena de derrame pericrdico, porm, no se deve atrasar o atendimento para aguard-la, em virtude da gravidade do caso. O tratamento do choque com reposio volmica mandatrio. A evacuao do sangue deve ser realizada por pericardiocentese (puno pericrdica com agulha e sob monitorizao eletrocardiogrfica) ou cirurgicamente pela drenagem pericrdica (realizada pela inciso de marfan) ou pela pericardiotomia por toracotomia de urgncia. A deciso entre essas modalidades de tratamento depender dos recursos disponveis e de experincia e treinamento da equipe de atendimento. Todos os doentes com pericardiocentese positiva para sangue devida a trauma necessitam de avaliao cirrgica para toracotomia ou esternotomia para inspeo e correo da causa de sangramento.

Ferimento Transfixante do Mediastino leso de potencial gravidade pela probabilidade de leso a estruturas como os grandes vasos (aorta, cava e seus ramos), corao, traquia e esfago. Diante do ferimento transfixante do mediastino devem-se considerar duas situaes: o paciente hemodinamicamente normal e o paciente hemodinmicamente instvel. Para o paciente hemodinamicamente normal existe muita controvrsia se existe ou no necessidade de explorao cirrgica de urgncia. Atualmente, com o desenvolvimento de mtodos diagnsticos, muitos servios determinam que, enquanto o paciente se mantiver estvel e normal do ponto de vista hemodinmico, ele deve ser manejado com tomografia computadorizada, endoscopia digestiva e respiratria, alm de outros exames. A conduta cirrgica ento tomada com base nos achados desses exames ou se houver instabilizao do paciente. Para o paciente hemodinamicamente instvel no existe controvrsia e est indicada a explorao cirrgica imediata.

Traumatismo Contuso do CoraoA leso cardaca decorrente do trauma torcico fechado pode variar de uma contuso miocrdica subepicrdica, subendocrdica ou transmural, at ruptura de cmara cardaca com Tamponamento cardaco. A contuso pode apresentar-se como infarto do miocrdio, arritmias e at falncia miocrdica (rara). O diagnstico dado por sinais externos de trauma na regio esternal, eletrocardiograma com elevao do segmento ST (alteraes de onda T), presena de arritmias cardacas em pacientes no hipoxmicos. Os exames laboratoriais devem ser colhidos na suspeita, pois a elevao de CPK, CKmb e troponina nas primeiras 6 horas sugerem leso miocrdica, e seus nveis parecem correlacionados com o risco de arritmia e disfuno ventricular. O ecocardiograma evidencia reas hipocinticas sugestivas de contuso. Como cuidados gerais, devem-se evitar hipoxemia, monitorizao em UTI por pelo menos 48 horas (com ECG contnuo) e tratamento especfico das arritmias.

Traumatismo Penetrante do CoraoLeso extremamente grave pode levar ao choque hemorrgico de rpida instalao e Tamponamento cardaco (figura 5). Quando o paciente portador de leso como essa chega vivo a uma unidade de atendimento, diagnstico e tratamento imediato so imperativos para evitar a evoluo ao bito. O quadro clnico pode ser composto por ferimento da rea de Ziedler (quadriltero limitado superiormente pelo ngulo de Louis, inferiormente pelo apndice xifide, e lateralmente pelas linhas mamilares), choque com sinais de tamponamento, choque hemorrgico grave. A toracotomia de urgncia deve ser realizada rapidamente para alvio do tamponamento e controle do sangramento.

Figura 5: Ferimento penetrante cardaco

Toracotomia de UrgnciaNo caso especifico do ferimento penetrante do pr-cordio, em vtimas que estejam em atividade eltrica sem pulso, a toracotomia de reanimao est indicada. importante notar que nem toda toracotomia feita de urgncia toracotomia de reanimao. Esse termo define uma entidade especfica: o paciente tem atividade eltrica sem pulso e um ferimento penetrante do pr-cordio. Esta toracotomia sempre realizada do lado esquerdo. As finalidades desse acesso so: abertura do saco pericrdico para evacuao de sangue e cogulos; controle direto do foco de hemorragia; massagem cardaca interna; pinamento da aorta descendente no ponto mais caudal possvel. A toracotomia de urgncia deve ser realizada no 5. espao intercostal ntero-lateral, preferencialmente esquerda, e a abertura do saco pericrdico deve ser realizada paralelamente ao nervo frnico. A abordagem na ausncia de ferimento penetrante do pr-crdio com atividade eltrica sem pulso deve ser uma toracotomia do lado do hemitrax acometido, ampla o suficiente para inspeo e controle das leses sangrantes. Para o tratamento de certas leses, pode ser necessria a seco tranversal do esterno e o prolongamento da inciso para o outro lado (inciso tipo clam-shell).

Leso EsofgicaO esfago pode ser lesado em virtude de ferimentos penetrantes do trax, devidos a leses iatrognicas como na passagem de sondas e, mais raramente, nos traumas fechados de trax. Na maioria das vezes, a leso esofgica assintomtica na sua fase inicial, porm, a demora no diagnstico e o aparecimento de complicaes como mediastinite levam a situaes graves com alta mortalidade. A histria de ferimento transfixante ao mediastino deve sempre levantar a suspeita. Pode aparecer dor aps manipulao do esfago, como na passagem de sondas e endoscpios. O enfisema mediastinal pode estar presente. Em fase tardia (12 a 24 horas) aparecem dor, febre, empiema pleural, toxemia, sinais de mediastinite e at mesmo choque. O diagnstico definitivo pode ser realizado com endoscopia digestiva alta. A conduta na fase aguda deve ser o tratamento cirrgico com toracotomia direita e correo cirrgica primria da leso. J na fase tardia deve-se iniciar antibioticoterapia de amplo espectro, com debridamento

cirrgico, se necessrio, e desvio esofgico por esofagostomia cervical e gastrostomia para alimentao, deixando a correo definitiva postergada.

Ruptura Traumtica de Aorta apontada como causa freqente de morte sbita aps colises automobilsticas ou quedas de grandes alturas. Quando o paciente sobrevive ao evento inicial, a recuperao passa a ser possvel, desde que a ruptura seja identificada e tratada precocemente. Nesses casos, freqente o hematoma restrito ao mediastino, que, se extravasar para o espao pleural, leva a hipotenso, choque e conseqente bito em minutos, se no prontamente tratado. Sinais e sintomas so freqentemente ausentes, sendo importante investigar o mecanismo de trauma. Sinais radiolgicos que podem estar presentes so alargamento de mediastino (principal sinal), desvio da traquia para a direita, apagamento da janela aorto-pulmonar, fratura de 1. e 2. arcos costais, entre outros. A arteriografia considerada o mtodo diagnstico padro, porm, com o avano tecnolgico, a tomografia computadorizada aparece com boa capacidade de diagnstico. O tratamento cirrgico deve ser realizado o mais rpido possvel, porm, por cirurgio qualificado e com o suporte adequado.

Ruptura Traumtica do DiafragmaDecorrente de traumatismos fechados com compresso torcica ou abdominal ou ferimentos penetrantes da transio traco-abdominal. mais comum esquerda nos casos de trauma contuso. Pode passar despercebida na fase aguda, podendo ser diagnosticada em fase crnica at anos aps o trauma. Raramente na fase aguda podem ser auscultados rudos hidroareos no trax. Durante a drenagem de trax, a explorao digital pode sugerir a presena das vsceras abdominais. A radiografia de trax pode demonstrar a presena de contedo areo prprio do abdome em cavidade de torcica, alm da posio anmala de sondas gstricas (figura 6). O exame contrastado constitui em exame que pode firmar o diagnstico. A ultra-sonografia pode revelar alteraes no diafragma. A tomografia computadorizada de trax tambm confirma o diagnstico. A ressonncia nuclear magntica reservada para casos selecionados em geral j crnicos para diferenciar hrnia de eventrao e paralisia diafragmtica.

igura 6: Raio X de hrnia difragmtica

Clique na imagem para ampliar A hrnia diafragmtica tem indicao cirrgica, e, na fase aguda, a via de acesso preferencial a abdominal, e para casos crnicos, a via preferencial passa ser a toracotomia (figura 7).

Fraturas de Costela e EsternoA fratura de costela a mais freqente das leses de parede torcica. Pode acontecer isolada ou em associao com outras leses, mais freqentemente, pneumo ou hemotrax. As fraturas de primeiras costelas (1. a 3.) sinalizam trauma de grande intensidade, uma vez que estas esto protegidas pela escpula, clavcula e membro superior, podendo associar-se a trauma cervical, de crnio, coluna, leses pulmonares importantes e grandes vasos. As fraturas de clavcula e esterno se relacionam com trauma direto e tambm esto associados a traumas de grande magnitude. As costelas intermedirias (4. a 9.) sofrem a maioria dos traumas contusos. A compresso nteroposterior da caixa torcica fora as costelas para fora, fraturando-as na sua poro mdia. A fora aplicada diretamente sobre as costelas tende a fratur-las e direcion-las para dentro do trax, aumentando o risco de leses como o Pneumotrax. A existncia de fraturas nas ltimas costelas (10. a 12.) deve aumentar a suspeita de trauma abdominal associado (em geral heptico ou esplnico). O quadro clnico pode se apresentar-se com dor e crepitao palpao do ponto fraturado. Na fratura de esterno, podemos encontrar, alm de dor, deformidade esternal. A radiografia de trax demonstra as fraturas. As fraturas de cartilagem anterior ou disjunes costocondrais tm as mesmas implicaes das fraturas de costela, porm, no so vistas na radiografia de trax. A conduta nas fraturas de arcos costais no complicadas consiste no controle eficaz da dor e fisioterapia para prevenir complicaes.

Para a fratura de esterno, alm de analgesia e fisioterapia em casos de grande deformidade, pode ser indicada correo cirrgica. A tabela 4 resume os principais sinais e sintomas das leses torcicas e a tabela 5 resume o tratamento destas leses. Tabela 4: Sinais e sintomas das principais leses traumticas Leso Sinais e sintomas Obstruo da via area Dispnia; estridor; sinais de hipoxemia Pneumotrax hipertensivo Dispnia; taquipnia; reduo ou ausncia de MV, hipertimpanismo e reduo da expanso torcica do lado acometido; desvio traqueal, sinais de choque Pneumotrax aberto Dispnia, leso extensa de parede torcica Trax instvel Dispnia, dor torcica, crepitao de arcos, movimento paradoxal; sinais de hipoxemia hemotrax macio Choque hipovolmico; reduo ou ausncia de MV; macicez percusso Tamponamento cardaco Hipotenso arterial; turgncia jugular; abafamento de bulhas; pulso paradoxal e sinal de Kussmaul (no presentes se choque hipovolmico associado) Pneumotrax simples Dispnia, dor torcica; reduo ou ausncia de MV, hipertimpanismo e reduo da expanso torcica do lado acometido hemotrax Dispnia; reduo ou ausncia de MV, macicez percusso do lado acometido Contuso pulmonar Dispnia; sinais de hipoxemia, sinais de trauma violento parede torcica Lacerao traqueobrnquica Dispnia; enfisema de subcutneo, enfisema de mediastino; estridor; sinais de hipoxemia Traumatismo contuso do corao Arritmias, sinais de trauma contuso violento ao prcrdio Ruptura traumtica de diafragma Dispnia, reduo de MV, ausculta de rudos hidroareos no trax Obs: importante salientar que no trauma torcico todos os sinais e sintomas dependem do grau da leso (por exemplo, um Pneumotrax pequeno menos sintomtico que um de maior volume) e da freqente associao de leses (por exemplo, em casos de tamponamento, a turgncia jugular, o pulso paradoxal e o sinal de Kussmaul podem no estar presentes se houver choque hipovolmico associado). Tabela 5: Conduta nas principais leses traumticas Leso diagnosticada Conduta proposta Obstruo da via area Assistncia ventilatria (se necessrio, cricotiroidostomia) e desobstruo por broncoscopia rgida ou, raramente, toracotomia Pneumotrax hipertensivo Puno descompressiva e drenagem pleural Pneumotrax aberto Curativo em trs pontos seguido de drenagem pleural Trax instvel Analgesia vigorosa e assistncia ventilatria hemotrax macio Drenagem pleural, reposio volmica e toracotomia exploradora Tamponamento cardaco Pericardiocentese e/ou drenagem pericrdica Pneumotrax simples Drenagem pleural hemotrax Drenagem pleural Contuso pulmonar Analgesia vigorosa e fisioterapia respiratria; quando necessrio, restrio hdrica e assistncia ventilatria Lacerao traqueobrnquica Permeabilizao da via area e cirurgia, se necessrio Traumatismo contuso do corao Monitorizao cardaca e tratamento de arritmias Ruptura traumtica de aorta Tratamento cirrgico especializado Ruptura traumtica de diafragma Na fase aguda, laparotomia e correo da hrnia Ferimentos transfixantes do mediastino Investigao extensa e cirurgia conforme achados

TPICOS IMPORTANTES E RECOMENDAES O trauma torcico pode ser causado por traumas contusos, penetrantes ou pela associao de ambos. A fisiopatologia do trauma torcico est relacionada com trs alteraes bsicas: a hipxia, a hipercarbia e a acidose. O atendimento a uma vtima de trauma torcico deve contemplar todos os passos do atendimento ao politraumatizado, conforme as normas do ATLS.

As leses torcicas com risco iminente de vida so: obstruo de via area, Pneumotrax hipertensivo, Pneumotrax aberto, Trax instvel, hemotrax macio e Tamponamento cardaco. As leses com potencial risco de vida so: Pneumotrax simples, hemotrax, Contuso pulmonar, Lacerao traqueobrnquica, traumatismo contuso do corao, Ruptura traumtica de aorta, Ruptura traumtica de diafragma e ferimentos transfixantes do mediastino. O tratamento inicial do Pneumotrax hipertensivo consiste na imediata descompresso atravs de puno torcica com agulha calibrosa (ex: jelco 14 gauge) no 2 espao intercostal O hemotrax considerado macio se houver sada imediata de 1.500 ml ou mais de sangue drenagem do hemitrax acometido; perda de um tero da volemia drenagem do hemitrax; sangramento superior a 200 ml/h durante duas ou mais horas sem a normalizao dos parmetros hemodinmicos (excluda outra causa); ou sangramento contnuo pelo dreno, exigindo transfuses repetidas, sem que haja outro foco de sangramento. A Contuso pulmonar a leso torcica potencialmente letal mais comum. Seu espectro de apresentao varia desde quadros assintomticos at quadros graves de insuficincia respiratria, com sndrome do desconforto respiratrio A broncoscopia, principalmente a rgida, o tratamento-padro para a remoo de corpos estranhos de via area No caso especifico do ferimento penetrante do pr-cordio, em vtimas que estejam em atividade eltrica sem pulso, a toracotomia de reanimao est indicada.

ALGORITMOSAlgoritmo 1: Avaliao primria do trauma torcico

Algoritmo 2: Avaliao secundria do trauma torcico

BIBLIOGRAFIA1. American College of Surgeons Committee on Trauma. ATLS Advanced Trauma Life Support course for physicians. 7. ed. Chicago: American College of Surgeons; 2004. Calhoon JH, Grover FL, Trinkle JK. Chest trauma aproach and management. Clin Chest Med 1992;13:5567.

2.

3. Freire E et. al. Trauma: a doena dos sculos. Rio de Janeiro: Atheneu; 2001. 4. Pearson G, Cooper JD, Deslauriers J, Ginsberg RJ, Hiebert CA, Patterson GA et al. Thoracic surgery. 2. ed. Philadelphia: Churchill Livingstone; 2002. 5. Saad Jr R. Trauma de trax e cirurgia torcica. So Paulo: Robe Livraria e Editora; 1993.