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Page 1: Tratamento cirúrgico do ameloblastoma sólido em adolescentesabccmf.org.br/cmf/Revi/2011/julho-setembro/09-Tratamento cirúrgico... · Em dezembro de 1999, o adolescente L.M.N.,

Novaes-Silva A & Stateri HQ

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Tratamento cirúrgico do ameloblastoma sólido em adolescentes

Surgical treatment of solid ameloblastoma in adolescents AdAlberto NovAes silvA1, HirAm Queiroz stAteri2

RELATO DE CASO

RESUMO

A decisão sobre a abordagem cirúrgica do ameloblas-toma em grupos etários mais jovens é um dilema, con-siderando as opções de procedimentos mais radicais ou conservadores. Este estudo apresenta e discute a proposta de tratamento de dois casos de ameloblastoma sólido acome-tendo pacientes adolescentes, os quais foram submetidos à dissecção do nervo alveolar inferior, preservação da margem inferior da mandíbula e reconstrução óssea imediata. Os pacientes estão em fase de proservação de dez anos, não apresentam recorrência e a área operada está apta para reabilitação com implantes.

Descritores: Ameloblastoma. Adolescente. Nervo mandibular.

Correspondência: Adalberto Novaes Silva Rua Luis Phillipe Pereira Leite, S/N – Alvorada – Cuiabá, MT, Brasil – CEP 78048-902 E-mail: [email protected]

1. CD, MD, Cirurgião Craniomaxilofacial, Coordenador da Unidade de Deformi-dades Craniomaxilofaciais do Hospital Universitário - Universidade Federal de Mato Grosso – Professor do Departamento de Clínica Cirúrgica – Faculdade de Medicina, Cuiabá, MT, Brasil.

2. CD, Residente de Cirurgia Bucomaxilofacial do Hospital de Câncer de Mato Grosso, Cuiabá, MT, Brasil.

ABSTRACT

The decision on the surgical treatment of ameloblas-toma in younger age groups is a dilemma, considering the options of conservative or more radical procedures. This study presents and discusses the proposed treatment of two cases of solid ameloblastoma involving adoles-cent patients who underwent dissection of the inferior alveolar nerve, preservation of the inferior margin of the jaw bone and immediate reconstruction. Patients are in the process of preservation of ten years, have no recurrence and the operated area is able to implant reconstruction.

Key words: Ameloblastoma. Adolescent. Mandibular nerve.

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INTRODUÇÃO

O ameloblastoma é um tumor odontogênico epitelial dos maxilares, localmente invasivo, de crescimento lento, com alto índice de recidiva, porém com metástase extremamente rara1-3. O primeiro relato de neoplasma dessa natureza na literatura científica é creditado a Broca, em 1868. A patologia foi descrita detalhada-mente por Falkson, em 1879, mais tarde Malassez introduziu o termo adamantinoma, em 1885, e somente em 1934 Churchill o denominou de ameloblastoma4,5. Representa 1% de todos os cistos e tumores dos maxilares e 11% dos tumores odontogênicos6,7. É classificado em sólido ou multicístico, unicístico e periférico1,4,7,8.

De acordo com os dados da literatura, a doença ocorre em todas as faixas etárias, com pico maior de incidência na terceira e quarta décadas. O tumor em pessoas jovens é considerado pouco frequente e corresponde a aproximadamente 10 a 15% de todos os casos relatados de ameloblastoma9.

A literatura descreve variadas formas de tratamento, com propostas de métodos mais conservadores, como marsupialização, enucleação e curetagem (associados ou não a métodos físico-químicos), e propostas mais radicais, com ressecções marginais, segmentares ou mesmo desarticulações mandibulares1,10. A opção por ressecções radicais objetiva redução da recorrência9. As recons-truções ósseas podem ocorrer com enxertos ósseos livres, sendo o ilíaco anterior a área doadora mais utilizada. Em caso de remoção de segmentos mandibulares mais extensos, a melhor opção pode ser o enxerto ósseo vascularizado, sendo nesse caso a fíbula a área doadora mais utilizada11.

Numerosas séries de ameloblastoma têm sido relatadas, no entanto, poucos artigos discutem o tumor em crianças e adoles-centes2,3,9. A proposta deste trabalho é apresentar e discutir o trata-mento do ameloblastoma sólido em dois adolescentes, enfatizando circunstâncias relevantes da abordagem cirúrgica empregada, referentes à preservação da margem inferior da mandíbula, do nervo alveolar inferior (NAI) e reconstrução óssea imediata. Apre-sentam-se resultados tardios da proposta de tratamento utilizada.

RELATO DOS CASOS

Caso 1Em dezembro de 1999, o adolescente L.M.N., do sexo mascu-

lino, com 16 anos de idade, compareceu ao ambulatório acompa-nhado dos pais (Figuras 1 a 6). Referiu-se que o paciente havia sido submetido a cirurgia para curetagem de cisto em mandíbula com dez anos de idade. Procurou atendimento atual porque radiografia solicitada para tratamento odontológico de rotina demonstrou alteração óssea da mandíbula. Ao exame físico extrabucal, não se observaram alterações dignas de nota. Ao exame físico intrabucal, observou-se discreto apagamento do sulco gêngivo-jugal inferior do lado esquerdo, permanência do dente canino inferior esquerdo decíduo no arco e ausência do elemento canino inferior esquerdo permanente. Na radiografia panorâmica, notou-se imagem radiolú-cida, multilocular, mal definida, em região de corpo de mandíbula do lado esquerdo, estendendo-se dos dentes canino inferior esquerdo decíduo até primeiro molar inferior esquerdo permanente. As imagens tomográficas demonstravam área de osteólise multilocular.

Sob anestesia local realizou-se biopsia incisional, com o estudo histopatológico compatível com o diagnóstico de ameloblastoma do tipo multilocular, sólido, folicular.

Discutiram-se as possíveis formas terapêuticas com o paciente e a família, vantagens, desvantagens e riscos. O tratamento insti-tuído foi ressecção segmentar da mandíbula contendo os dentes envolvidos na lesão, com margem de segurança, dissecção e preservação do nervo alveolar inferior, da base mandibular e reali-zação de reconstrução imediata com enxerto ósseo livre da crista ilíaca anterior no mesmo tempo cirúrgico. Realizou-se fixação do enxerto ósseo com miniplaca de titânio sistema 2.0 mm.

Realizado controle clínico e por imagem do paciente por período de dez anos. Não há evidência de recidiva até o momento, com satisfatória integração do enxerto ósseo ao leito receptor. Paciente informado que possibilidade de recidiva da lesão após esse período é remota, mas possível, havendo, portanto, necessi-dade de manter-se em acompanhamento. Foi proposta reabilitação com implantes, mas paciente optou por manter o uso de prótese parcial removível para restabelecimento da função mastigatória.

Figura 1 – Caso 1: Radiografia panorâmica demonstrando área radiolúcida multilocular mal definida, localizada em corpo de mandíbula esquerdo, estendendo-se do dente canino decí-duo esquerdo até o primeiro molar homolateral. Presença de

reabsorção radicular dos dentes envolvidos.

Figura 2 – Caso 1: Tomografia computadorizada em corte coro-nal evidenciando área de osteólise irregular em corpo de mandíbu-

la esquerdo. Ausência de abaulamento de corticais.

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Caso 2Paciente A.R.M., do sexo feminino, 14 anos, compa-

receu ao ambulatório em junho de 2001, acompanhada dos pais (Figuras 7 a 15). Relatou-se que havia sido submetida à extração de um dente na mandíbula do lado direito há dois anos e, desde então, a região não havia cicatrizado.

Ao exame físico extrabucal, notou-se abaulamento em topografia de corpo de mandíbula do lado direito, indolor à palpação. Os exames imaginológicos de radiografia panorâmica e tomografia computadorizada evidenciaram área osteolítica em região de corpo e ângulo de mandí-bula direito, unilocular, associada à inclusão do segundo e terceiro molares inferiores, limites bem definidos e ocasionando significativa expansão de cortical vestibular e lingual.

As características clínicas, imaginológicas e histopa-tológicas revelaram tratar-se de ameloblastoma do tipo unilocular, sólido, folicular.

O tratamento cirúrgico instituído foi o mesmo do caso anterior. No sétimo dia pós-operatório, radiografia de controle revelou fratura patológica de mandíbula em ângulo direito. Como não havia alterações oclusais signi-ficativas ou defeitos estéticos, foi realizado o tratamento conservador, com bloqueio maxilo-mandibular por período de 40 dias.

No controle pós-operatório de dez anos, o exame tomo-gráfico evidenciou área de osteólise bem circunscrita em região operada de ramo de mandíbular direito, sugerindo as possibilidades de reparo fibro-ósseo ou recidiva da lesão. Optou-se por realizar a exploração cirúrgica da referida área lítica e também remoção das placas de fixação óssea, visando à facilitação da colocação de implantes. A área lítica foi enucleada e realizou-se osteotomia periférica como margem de segurança. Verificou-se, também, que as placas estavam completamente integradas ao tecido ósseo, inviabilizando sua remoção. O exame histopatológico da área lítica revelou tratar-se de neuroma traumático, sem indícios de recidiva de ameloblastoma.

Figura 3 – Caso 1: Ressecção segmentar de corpo de mandíbula lado esquerdo, preservação da margem inferior da mandíbula

(seta), dissecção do nervo alveolar inferior (seta) e transposição do feixe para uma posição mais lateral.

Figura 6 – Caso 1: Radiografia panorâmica de pós-operatório tardio, demonstrando satisfatória integração do enxerto ósseo ao

leito receptor.

Figura 4 – Caso 1: Peça cirúrgica e relação da lesão com as raízes dentárias, demonstrando inviabilidade da realização de trata-

mentos com manutenção dos dentes envolvidos.

Figura 5 – Caso 1: Bloco de enxerto de ósseo do ilíaco anterior adaptado no defeito cirúrgico. Síntese óssea com miniplaca de

titânio. Emergência do nervo alveolar inferior dissecado mais distal-mente na mandíbula (seta).

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Na sequência do tratamento, realizou-se reabilitação da mandíbula do lado operado, com implantes osseoin-tegráveis.

A técnica cirúrgica realizada nos dois casos clínicos foi muito parecida à descrita por Kuriakose et al.12, em 2003. A exposição da mandíbula se deu por acesso transoral, utilizando incisão no sulco gêngivo-jugal e labial inferior. O primeiro passo é a identificação do nervo mentual quando ele emerge do forame. O segundo passo envolve exposição do canal mandibular e feixe vásculo-nervoso. Inicia-se com uma delicada osteotomia e remoção circunferencial de pequena porção de fragmento ósseo adjacente ao forame mentual. Uma janela óssea foi realizada posteriormente ao forame (osteotomia do osso cortical vestibular). Com utili-zação de curetas e descoladores, cuidadosamente o feixe vásculo-nervoso é liberado do canal mandibular, distal-mente até o local onde será realizada a osteotomia vertical do segmento mandibular que será removido contendo a lesão. Com o feixe vásculo-nervoso alveolar inferior libe-rado do canal mandibular, o ramo incisivo é seccionado para facilitar a transposição do feixe para uma posição mais lateral, permitindo uma ressecção segmentar da mandíbula sem seccionar o nervo. Adicionalmente realiza-se uma oste-otomia mais periférica nos locais onde se julga necessário aumentar a margem de segurança. O bloco de enxerto de ósseo foi trabalhado para adaptar-se no defeito cirúrgico, e os pequenos espaços remanescentes foram preenchidos com osso medular. Tung-Yiu et al.13 descreveram tratamento do ameloblastoma com preservação do nervo alveolar inferior e utilização de lupas binoculares e instrumentos de microcirurgia. Nesse estudo recomenda a remoção dos vasos acompanhando o tumor e cauterização de suas extre-midades. Não se utilizou instrumento de magnificação de imagem nos nossos casos descritos.

Figura 7 – Caso 2: Radiografia panorâmica demonstrando área osteolítica unilocular localizada em região de corpo e ângulo de mandíbula do lado direito, com a presença de dentes segundo e

terceiro molares inclusos e associados à lesão. Feixe vásculo-nervoso alveolar inferior deslocado inferiormente.

Figura 8 – Caso 2: Tomografia computadorizada em corte axial demonstrando lesão lítica unilocular localizada em corpo de man-díbula lado direito, com margens bem definidas e abaulamento de

corticais.

Figura 9 – Caso 2: Acesso cirúrgico intrabucal com exposição do corpo e ângulo de mandíbula do lado direito e dissecção do

nervo mentual.

Figura 10 – Caso 2: Ressecção segmentar de corpo e ramo de mandíbula lado direito, dissecção do nervo alveolar inferior (seta) e

preservação da margem inferior da mandíbula (seta).

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DISCUSSÃO

Verifica-se na literatura que o ameloblastoma sólido tem uma incidência bastante baixa na faixa etária infantil e que o tipo unicístico é o mais incidente nos indivíduos abaixo dos 20 anos de idade2,3,5,9. Neste artigo, apresentaram-se casos de ameloblastoma sólido acometendo uma faixa etária incomum1.

O tratamento do ameloblastoma continua um tema controverso na literatura7,8,13. Vários fatores interferem na escolha do método cirúrgico, tal como idade do paciente, histologia da neoplasia (se unicístico ou sólido), tamanho e localização da lesão, carac-terísticas imaginológicas, se a patologia é primária ou recidiva, presença de doenças sistêmicas associadas que possam compro-meter o quadro clínico do paciente, possibilidade de proservação, a experiência do cirurgião e também a participação do paciente e família na escolha da terapêutica após os devidos esclarecimentos sobre riscos e benefícios de cada proposta terapêutica.

Em estudo de ameloblastoma em crianças e adolescentes, Zhang et al.7 revisaram 37 pacientes com idade máxima de 18 anos e correlacionaram os achados radiográficos com o tipo histológico. Verificaram que 57,1% dos casos de tumor sólido manifestaram-se como lesões radiolucentes uniloculares. A

Figura 11 – Caso 2: Bloco de enxerto ósseo do ilíaco ante-rior adaptado no defeito cirúrgico. Síntese óssea com mini-placa de titânio. Paciente com bloqueio maxilo-mandibular

transoperatório.

Figura 12 – Caso 2: Radiografia panorâmica demons-trando fratura de ângulo de mandíbula no pós-operatório

precoce.

Figura 13 – Caso 2: Radiografia panorâmica após 90 dias de imobilização maxilo-mandibular (observar remodelação da

margem inferior da mandíbula no local fraturado).

Figura 15 – Caso 2: Radiografia panorâmica demonstrando implantes e componentes protéticos instalados.

Figura 14 – Caso 2: Tomografia computadorizada após 10 anos de pós-operatório, demonstrando boa integração do

enxerto ósseo ao leito receptor e presença de área lítica bem delimitada em ramo mandibular direito, sugerindo as possibi-lidades de recidiva da lesão ou reparo fibro-ósseo. O exame

histopatológico revelou tratar-se de neuroma traumático.

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Trabalho realizado no Hospital Universitário Júlio Muller – Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, MT, Brasil. Artigo recebido: 17/3/2011 Artigo aceito: 11/6/2011

mesma observação podemos verificar no caso clínico 2, que foi apresentado no presente artigo, no qual a lesão era unilocular e tratava-se de um ameloblastoma sólido. Portanto, quando o ameloblastoma aparece radiograficamente como lesão unilocular, o diagnóstico de tipo sólido também deve ser considerado.

Mesmo sabendo que o tipo sólido tem uma taxa maior de recorrência, fizemos a opção por tratamento mais conservador, considerando principalmente a idade da paciente, na qual uma cirurgia mais agressiva poderia trazer maiores transtornos ao crescimento facial, à estética e ao desenvolvimento psicológico do adolescente. Essa decisão deve também ser baseada na locali-zação e na extensão da lesão, pois pretendendo manter a margem inferior da mandíbula, para favorecer a reconstrução imediata com enxerto ósseo livre, há necessidade da análise da possibi-lidade de ressecção da neoplasia com margem de segurança.

Se as neoplasias apresentadas fossem unicísticas, haveria maior tranquilidade para oferecer com segurança uma técnica cirúrgica mais conservadora, sem ressecções segmentares1,4,7,14.

Em geral, a preservação do nervo alveolar inferior no trata-mento do ameloblastoma é considerada somente quando a lesão é unicística ou o feixe vásculo-nervoso contorna o tumor. Se ressecção em bloco é realizada, usualmente o feixe vásculo-nervoso é removido com o tumor. No entanto, não há evidência de que a neoplasia invade além da superfície epineural do nervo alveolar inferior8,13. Baseado nessas considerações, sendo possível realizar um acompanhamento rigoroso, propôs-se, nos dois casos clínicos apresentados, ressecção segmentar da lesão, com dissecção e preservação do nervo alveolar inferior.

O sacrifício do nervo alveolar inferior durante uma ressecção de mandíbula resulta em anestesia do lábio inferior, pode ocasionar dificuldade em reter saliva, prejuízos na fala e morde-dura acidental dos lábios2,12,15. Nos dois casos relatados neste trabalho, a recuperação neurossensorial ocorreu gradativamente ao longo dos meses. Atualmente, os pacientes queixam-se de pequena área no mento com redução da sensibilidade, mas que não traz transtornos aos mesmos. Algum grau de distúrbio sensorial é esperado, decorrente da manipulação e também do prejuízo da vascularização do segmento do nervo dissecado.

Baseados em diversos trabalhos da literatura2,8,12,13,15 nos quais realizou-se tratamento do ameloblastoma com preservação do nervo alveolar inferior, foi proposta para os casos apresentados a ressecção segmentar da mandíbula, com preservação da margem inferior e do nervo alveolar inferior e reconstrução óssea imediata com enxerto livre do ilíaco anterior. A preservação da margem inferior da mandíbula propicia uma qualidade da reconstrução óssea com mais predictibilidade. Esse fato pode ser observado nos casos apre-sentados, em que os pacientes apresentam osso com quantidades e qualidades favoráveis à reabilitação com implantes passados 10 anos da remoção da neoplasia e enxerto ósseo. Salienta-se que a fratura mandíbular pós-operatória observada no caso nº 2 provavelmente poderia ter sido evitada se tivesse sido utilizado sistema de fixação óssea adequada, com placa de reconstrução mandibular. Utilizaram-se placas sistema 2.0 mm por ausência no nosso hospital, naquele período, de placas mais indicadas para aquela situação.

Ressalta-se que, mesmo tendo obtido sucesso a longo prazo com a decisão que foi tomada, há escolhas terapêuticas um pouco mais conservadoras que as habituais para o tratamento do amelo-blastoma sólido, que os riscos de recidiva tumoral são maiores com essa opção feita, fato que foi devidamente esclarecido à família. Também, mesmo após esse longo período de acompanhamento, a família e os pacientes foram orientados que devem manter-se sob vigilância da equipe responsável pelo tratamento, considerando a possibilidade mesmo que remota de recidiva muito tardia9.

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