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1 TRAMAS DE AFETO E SAUDADE: EM BUSCA DA BIOGRAFIA DE OBJETOS E PRÁTICAS VITORIANOS NO BRASIL OITOCENTISTA. Irina Aragão dos Santos (UFRJ) 1 Resumo: Em uma sociedade em que os códigos da boa conduta, com influências vitorianas, demandavam a discrição, o controle das emoções, o jamais expressar em público os arroubos das paixões e sentimentos; ser distinto é saber se comportar em qualquer ambiente, não ceder às comoções e aos seus excessos, ser contido nos modos e no trajar. Os romances, as joias de afeto, os mementos e os quadros feitos de cabelos foram espaços autorizados para a expressão da afetividade. Neles foi permitido o exagero na exaltação da emoção, em declarações gravadas no metal, no retrato usado sobre o corpo, em uma pulseira de cabelos envolvendo o pulso ou num quadro ou memento exposto em ambiente doméstico. Foram peças exibidas para o olhar do outro, ou peças restritas a poucos olhares, mas circunscritas às normas em vigor, para falar de pessoas queridas. Tramas e ornamentos de cabelos que falavam da vida, esperança, desejo, amor, saudade e morte. Cabelos que personificaram o objeto, pois são a parte do corpo que não se deteriora, não perde a cor, conserva a textura, na morte tal qual em vida, transformados em composições artísticas. Uma reflexão histórica comparativa sobre os objetos feitos de cabelos e a produção de significados, usos, variações de valores, formas de inserção social dos objetos de afeto e saudade, para conhecer os valores da sociedade vitoriana britânica e como esta moral e suas manifestações chegaram, circularam e interagiram nas grandes cidades brasileiras, na segunda metade do século XIX. Palavras-chave: Cultura material; Vitoriano; Afetividade; Cabelos. Abstract: In a society in which the codes of good conduct, with Victorian influences, demanded discretion, control of emotions, never expressing in public the outbursts of passions and feelings, being distinct meant knowing how to behave in any environment, not giving in to commotions and its excesses, being contained in modes and in the way of dressing. The objects of affection and longing made of hair were allowed spaces for the expression of affection. On them, the exaggeration in declaration of emotion was permitted, in dedications written on metal, portraits used on the body, hair bracelet involving the wrist or hair picture and memento exposed at home. Sentimental objects were exposed to the gaze of another, or restricted to a few glances, which complied with the rules in force to express family ties, friendship and affection. A comparative historical reflection on hairwork objects and the production of meanings, uses, variations of values, forms of social inclusion and the cultural biography of objects of affection and longing to understand the rituals and values of the British Victorian society and how this moral and their expressions arrived, circulated and interacted in large Brazilian cities, along the second half of the nineteenth century. Key words: Material culture; affection, hair; Victorian era. 1 Departamento de Artes e Design. Texto realizado a partir de trabalho de Doutorado, desenvolvido junto ao Programa de Pós-Graduação em História Comparada, Instituto de História / UFRJ

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TRAMAS DE AFETO E SAUDADE: EM BUSCA DA BIOGRAFIA DE OBJETOS E PRÁTICAS VITORIANOS NO BRASIL OITOCENTISTA.

Irina Aragão dos Santos (UFRJ) 1

Resumo: Em uma sociedade em que os códigos da boa conduta, com influências vitorianas, demandavam a discrição, o controle das emoções, o jamais expressar em público os arroubos das paixões e sentimentos; ser distinto é saber se comportar em qualquer ambiente, não ceder às comoções e aos seus excessos, ser contido nos modos e no trajar. Os romances, as joias de afeto, os mementos e os quadros feitos de cabelos foram espaços autorizados para a expressão da afetividade. Neles foi permitido o exagero na exaltação da emoção, em declarações gravadas no metal, no retrato usado sobre o corpo, em uma pulseira de cabelos envolvendo o pulso ou num quadro ou memento exposto em ambiente doméstico. Foram peças exibidas para o olhar do outro, ou peças restritas a poucos olhares, mas circunscritas às normas em vigor, para falar de pessoas queridas. Tramas e ornamentos de cabelos que falavam da vida, esperança, desejo, amor, saudade e morte. Cabelos que personificaram o objeto, pois são a parte do corpo que não se deteriora, não perde a cor, conserva a textura, na morte tal qual em vida, transformados em composições artísticas. Uma reflexão histórica comparativa sobre os objetos feitos de cabelos e a produção de significados, usos, variações de valores, formas de inserção social dos objetos de afeto e saudade, para conhecer os valores da sociedade vitoriana britânica e como esta moral e suas manifestações chegaram, circularam e interagiram nas grandes cidades brasileiras, na segunda metade do século XIX. Palavras-chave: Cultura material; Vitoriano; Afetividade; Cabelos. Abstract: In a society in which the codes of good conduct, with Victorian influences, demanded discretion, control of emotions, never expressing in public the outbursts of passions and feelings, being distinct meant knowing how to behave in any environment, not giving in to commotions and its excesses, being contained in modes and in the way of dressing. The objects of affection and longing made of hair were allowed spaces for the expression of affection. On them, the exaggeration in declaration of emotion was permitted, in dedications written on metal, portraits used on the body, hair bracelet involving the wrist or hair picture and memento exposed at home. Sentimental objects were exposed to the gaze of another, or restricted to a few glances, which complied with the rules in force to express family ties, friendship and affection. A comparative historical reflection on hairwork objects and the production of meanings, uses, variations of values, forms of social inclusion and the cultural biography of objects of affection and longing to understand the rituals and values of the British Victorian society and how this moral and their expressions arrived, circulated and interacted in large Brazilian cities, along the second half of the nineteenth century. Key words: Material culture; affection, hair; Victorian era.

1 Departamento de Artes e Design. Texto realizado a partir de trabalho de Doutorado, desenvolvido junto ao Programa de Pós-Graduação em História Comparada, Instituto de História / UFRJ

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O presente artigo recebeu o mesmo título da minha tese de doutorado (2014). A

intenção não é realizar um resumo daquele trabalho, mas reiterar conteúdos e conceitos que

considerei importantes ao pensar práticas vitorianas adotadas pela boa sociedade2 oitocentista

brasileira. Portanto, inicio uma reflexão sobre a adoção dos modos, modas e valores europeus

por parte da sociedade brasileira, na segunda metade do século XIX, a partir dos objetos que

aquela sociedade elegeu para significar e expressar sentimentos e emoções.

Os objetos, como parte da cultura material organizada em um contexto, nos permitem

pensar a História pelo entorno socialmente transformado pelo homem e pelas relações

mediadas em sociedade por estas construções-criações. Os objetos estão vinculados às

questões cotidianas, daí podermos considerá-los ricos e diversos testemunhos históricos. As

ideias que os geraram, bem como as demandas da rotina, estão circunscritas a uma ordem e

estrutura sociais, a uma cultura e tradição, a mentalidades e valores, às transgressões e

contestações, a um estágio de conhecimento técnico e tecnológico, às economia e política em

vigor.

Objetos de afeto e saudade – confeccionados com cabelos humanos – adornos

pessoais3, quadros, mementos4, caderneta e outros pequenos objetos5 – foram os motivadores

2 Resgata das reminiscências de Francisco de Paula Ferreira Rezende (1832-93) por Ilmar Mattos, a expressão procura designar a reduzida elite econômica, política e cultural do Império, que partilhava códigos de valores e comportamento modelados na concepção europeia de civilização (VAINFAS, 2002, p. 95). 3 Adotei os termos adorno pessoal ou objeto de adorno pessoal para definir os objetos usados sobre o corpo, e/ou intervenções feitas no corpo tais como pinturas, tatuagens, escarificações, body modifications, como extensão de pensamentos, meios de expressar e comunicar ideias, ou um diálogo do sujeito com os próprios valores e os modelos sociais. São classificadores, demarcadores, mediadores e meios sinaléticos de representar situações, condições, relações, ritos, padrões e códigos de conduta em sociedade, discursos e representações de um indivíduo e/ou grupo em um contexto histórico. Ao longo da história, foram usados para marcar, identificar e adornar; ao nome adorno pessoal foram atribuídos diversos sinônimos: acessório, adereço, atavio, bijuteria, dixe, enfeite, folheado, joia, quinquilharia, ornamento, ornato e tesouro. E quando faço a opção por usar o termo joia, o faço pela ótica aqui apresentada, e levo em consideração todos os objetos de adorno pessoal, que são valiosos para os seus usuários, pela combinação de diversos aspectos tais como a originalidade da ideia que gerou a peça; o uso criativo e inovador dos materiais; a composição da forma; a preocupação com a produção, as referências culturais e os sentidos que lhe foram aferidos, inclusive o prazer; as emoções e a afetividade – que não estão necessariamente vinculados ao status dos materiais e ao valor de circulação comercial (SANTOS, 2014). Foram identificadas As peças abotoaduras, alfinetes, anéis, brincos / argolas, broches, capas para botões de roupa, chatelaines, colares, terços, crucifixos, fechos decorados, medalhões relicários, passa-fitas, pendentes, pulseiras e sinetes confeccionados ou decorados com cabelos. 4 Memento: verbete “do latim memento, lembra-te” […] 2. Marca que serve para lembrar qualquer coisa. 3. Papel ou caderneta onde se anotam coisas que devem ser lembradas; memorial, memorando, memória.” (FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1986, p. 1117). Este termo é utilizado para denominar objetos que fazem menção a pessoas mortas. Podem ser confeccionados em porcelana com retratos, madeira, tecido e cabelos. As dimensões

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e o ponto de partida para estudar a sociedade brasileira na segunda metade do século XIX. O

estranhamento vivenciado em analisar estes objetos, por ocasião do mestrado6, me levou a

pensar em um cenário histórico distante e distinto do atual. Despertaram a minha curiosidade

e me conduziram a listar diversas questões a partir do levantamento de referências,

exemplares e leituras sobre o período vitoriano. Busquei conhecer estes objetos em

bibliografia especializada (BELL, 1998; BENNETT, MASCETTI, 1999; BURY, 1985;

CAMPBELL, 2005; CHANLOT, 1986; DAWES, 1991; DeLORME, 2004; FLOWER, 2002;

GERE, RUDOE, 2010; LUTHI, 2011, 2001, 1999; MAY, 2003; O’DAY, 1974; PARRY,

2000; PHILLIPS, 2000, p. 44-45, 66-67, 88-89 e 2006, p. 148-151; SPEIGHT, 1872) e em

coleções estrangeiras para, a seguir, mapeá-los em acervos de brasileiros.

Lidar com peças estranhas, aquelas que não mais pertencem ao nosso contexto, pode ser

uma estratégia instigante no pensar uma sociedade, pois, o artefato está no jogo social, e esse

jogo social tem que ser entendido em todas as dimensões e a dimensão material é uma delas

(MENESES apud HAYMANN, 2011, p. 422). O estranhamento, portanto o distanciamento,

nos conduz a refletir em como estes objetos funcionaram; como foram produzidos; nos

critérios que elegeram as características de construção de suas formas e as que os

transformaram em um tipo; e por quais razões foram desejados, adquiridos, usados,

guardados, reconfigurados, descartados e desmontados.

O corpo dos objetos, portanto, veio e vem sendo alterado ao longo dos anos, conforme

as experiências humanas em sociedade. O estágio de conhecimento técnico e tecnológico,

usos, funções, materiais, valores e sentidos coletivos a eles atribuídos, influenciaram e/ou

determinaram a construção de uma nova forma e vice-versa. Sua existência, seu corpo, sua

materialidade são históricos. Significados comuns produzem sentidos, desencadeiam

e composições variam, mas de um modo geral apresentam coroas e arranjos de flores, salgueiros chorões, nomes, datas, urnas funerárias, túmulos etc. Neste trabalho, mementos são peças menores que os quadros, com composições colocadas dentro de molduras com apoios no verso, como um porta-retratos, que devem ser colocados sobre consoles, mesas, criados mudos, pianos etc. 5 Outros objetos de uso pessoal, decorados com composições feitas de cabelos, figuram entre as peças encontradas neste levantamento de referências: caixinhas porta palitos de dentes, pequenas caixas porta joias, carnets de baile, leques, pequenos porta retratos de bolso (com fotografias ou miniaturas) e pequenos frascos de perfume com apliques decorativos de cabelos. 6 Um catálogo de joias de afeto foi elaborado para a dissertação de mestrado (SANTOS, 2009). As peças foram identificadas em museus e coleções particulares brasileiros. Das 144 peças estudadas, 34 peças foram confeccionadas com cabelos, o que, então, sugeriu um tipo específico de objetos.

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dinâmicas e atribuem valores, quando homens reconhecem significados, podem falar uns com

os outros, e se fazem entender aos outros e a si mesmos pelas diversas formas de expressão

destes significados. Então, objetos significam, traduzem e “costuram” os diversos aspectos do

cotidiano e atuam como agentes da vida social. A sua agência e vida social dependem do

contexto e de suas construções. Os atributos dados aos objetos não são únicos, tampouco têm

previsão de permanência através do tempo, podem ser ressignificados, apropriados ou

esquecidos. A cada cenário histórico, objetos têm novos papeis e inserções sociais. Realizar a

biografia de um objeto nos possibilita desenhar a sua trajetória (GONÇALVES, 2007;

KOPYTOFF, 2008) de vida, sobrevida ou morte. Neste exercício, que nos leva a pensar suas

participações na sociedade, podemos apontar as transformações cotidianas de uma sociedade.

Se objetos fazem mediações das relações sociais, aos estudá-los, percebemos os movimentos

da sociedade.

Os objetos de afeto e saudade, confeccionados com cabelos, por mais de 60 anos foram

desejados, valorados e estiveram em moda. Circularam e significaram códigos reconhecidos

pelos iniciados no bom tom7 e elegância vitorianos. Gozaram de prestígio em espaços de

moda e exposições nacionais e internacionais. Foram citados em anúncios e jornais femininos,

expostos em vitrines de reconhecidos artesãos e joalheiros. Retratados em fotografias e

pinturas. Desenhados em catálogos e explicados em manuais ilustrados, que ensinavam

pessoas a confeccionarem as próprias peças. E, com a chegada do novo século e das novas

ideias, lentamente saíram de cena, passaram a ser associados ao mau gosto e perderam todos

os atributos que os fizeram circular e viver. Peças devem ter sido desfeitas e os materiais

nobres aproveitados em novas peças, guardadas e esquecidas em gavetas e armários, doadas,

jogadas fora ou ressignificadas em novos papeis, para estar em espaços apropriados como

museus e coleções. Não mais são objetos cotidianos que expressam afetividade e emoções,

são objetos curiosos, bizarros e exóticos que exemplificam hábitos e práticas estranhos ao

presente. Cabelos como matéria-prima? Que nojo!Que macabro! Que interessante!

Comentários que registrei ao longo do trabalho. Em um momento foram objetos de desejo, em

outro passaram a objetos repugnantes. Mas, a opinião não é unânime. Ao citar e expor 7 As regras de etiqueta e do bom tom – modelos de comportamento consolidados como distintos e elegantes – foram reproduzidos em manuais de civilidade, que circularam na Europa a partir do século XVI. No Brasil, ao longo do século XIX, inúmeros tratados e manuais de etiqueta e civilidade foram editados e reeditados. Um exemplo disso é O novo manual do bom-tom que em 1900 chega a sexta edição (RAINHO, 1997, p. 141).

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exemplos atuais nas artes, no design, na moda, nas práticas étnicas do passado e nas atuais, se

abria um espaço para a reavaliação das opiniões. E mais uma vez, pude observar variações

nas atribuições de valor dadas a um material, que ora é sinônimo de beleza, saúde, cuidados,

boa aparência e bom gosto, ora é lixo corporal e substância repulsiva e indesejada, ora é

matéria-prima na confecção de objetos. O asco não está no material, mas no confronto de

valores do cenário em que este material está e circula, no papel que desempenha e nas

qualidades que lhe são dadas.

O cabelo é um material natural, dado pela natureza ao homem, que o reconfigurou e

ressignificou socialmente (SANTOS, 2014). Deixou de ser da natureza e passou a ser o

material com funções outras que as dadas pela natureza. Atribuições, significados e atuações

sociais lhe foram conferidas. No século XIX, o objeto, construído com cabelos, foi entendido

tanto como espaço autorizado para declaração e expressão de emoções e sentimentos,

vínculos afetivos e familiares, homenagens, quanto como item da moda, que explorava um

material tão versátil nos efeitos visuais e nas maneiras de trabalhá-lo. E foi item da moda, por

justamente comunicar os códigos das emoções e sentimentos dentro do decoro e das normas

de elegância da época. Ao seguir a moda, uma senhora elegante reconhecia as qualidades e os

elementos sinaléticos de um artigo de bom gosto e as mensagens expressas nas composições

daquelas peças. O conjunto de preferências e escolhas cotidianas determinavam o seu gosto e,

consequentemente, seu estilo de vida, o que a distinguia dos comuns e a aproximava, e

também diferenciava, de seus pares.

Os sentimentos e emoções são também elementos da dinâmica social, são tributários

das relações sociais e do contexto cultural em que emergem (REZENDE, COELHO, 2010, p.

11), não são naturais, são produzidos socialmente. Desse modo, os sentimentos vitorianos e as

maneiras como poderiam ser expressos foram organizados socialmente. Os objetos de afeto e

saudade foram, portanto, expressões externas de sentimentos e foram pautados por uma

gramática comum (REZENDE, COELHO, 2010, p. 48), um código corrente, que aquela

sociedade compreendia, assumia, reproduzia e pelo qual se sentia afetada. Logo, não devemos

estranhar que, em todos os espaços autorizados para falar e expressar sentimentos e afeições,

houvesse, nos objetos de afeto e saudade, objetos decorativos, trabalhos artesanais, romances,

pinturas e gravuras, espetáculos teatrais, cemitérios, um código compartilhado e expresso em

inscrições, textos, símbolos, composições, ornamentos, estilo, técnicas e materiais.

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Direcionei meu interesse para os objetos que, a priori, pareceram distantes, anônimos e

estranhos; objetivando analisar como eles intervieram num contexto, mediaram relações,

significaram e representaram ideias, valores e emoções; e que podem se apresentar tão

próximos e familiares, quando os reconhecemos em situações e ações similares no presente.

Acredito que este exercício seja uma contribuição para compreender as dinâmicas e práticas

sociais, a partir de questões e informações levantadas do exame de fontes materiais, e do seu

diálogo com as fontes visuais e escritas.

Após avaliar mais de 600 objetos nas coleções estrangeiras 8 , foi possível listar

parâmetros descritivos, que determinaram significados, mensagens, elementos gráficos,

composições, formas, cores e materiais comuns aos objetos de afeto e saudade. Desta

avaliação, foram definidos os critérios de análise, organizados em fichas catalográficas9, que

orientaram o registro, estudo e comparação dos exemplares levantados em museus e coleções

particulares brasileiros10. O estudo sistematizado desta categoria de objetos foi relevante para

organizar conteúdos, buscar documentação de apoio e compreender a ascensão, apogeu e

declínio dos objetos de afeto e saudade, confeccionados com cabelos humanos.

8 Na Inglaterra: acervo da colecionadora Ann Louise Luthi, Museu Britânico (British Museum), Museu de Londres (Museum of London), Museu de Maidstone (Maidstone Museum & Bentlif Art Gallery), Maidstone / Kent, Museu Victoria e Albert (Victoria & Albert Museum); em Paris: Museu de Artes Decorativas (Musée des Arts Décoratifs) e Museu Carnavalet (Musée Carnavalet); na Rússia: Museu Estatal de História (Государственный Исторический Музей) / Moscou e Hermitage / St. Petersburgo; na Argentina: Museu Nacional de Arte Decorativa (Museo Nacional de Arte Decorativo) / Buenos Aires. Acervos virtuais consultados: Leila’s Hair Museum, Independence, Missouri / EUA, disponível em: http://www.roadsideamerica.com/story/11479, http://www.youtube.com/watch?v=N5iGUpWCiz4 e http://www.hairwork.com/leila/, acessos em: 10.07.2011; Metropolitan Museum of Art. Disponível em: http://www.metmuseum.org/collections/search-the-collections?ft=jewelry. Acesso em: 14.07.2013. 9 A divisão de conteúdos nas fichas catalográficas está organizada em dados operacionais (número do cadastro; data em que foi realizada a identificação e avaliação da peça; fonte do acervo; identificação da peça no acervo da instituição; tipo, categoria e estilo do objeto; localização e data de aquisição da peça para o acervo; proveniência do objeto; autoria ou fabricação; cronologia de sua produção e uso), dados morfológicos (descrição do objeto, imagem do objeto, dimensões e inscrições), dados técnicos (materiais, peso, técnicas de fabricação, condições de uso, estado de conservação), referências bibliográficas, observações e palavras-chaves. 10 No Rio de Janeiro: Casa Museu Benjamin Constant (01 caderneta) / RJ, Fazenda Sto. Antônio do Paiol / Valença (01 quadro), Museu D. João VI – Escola de Belas Artes / UFRJ (02 joias), Museu Histórico Nacional / RJ (12 joias, 03 mementos e 03 quadros) e Museu Imperial / Petrópolis (04 joias); na Bahia, em Salvador: Fundação Instituto Feminino da Bahia (16 joias, 02 mementos e 38 quadros) e Museu Carlos Costa Pinto (03 joias); no Rio Grande do Sul, em Piratini: Museu Histórico Farroupilha (01 quadro); em Minas Gerais, em Juiz de Fora: Museu Mariano Procópio (02 joias e 03 quadros); em São Paulo: Museu Paulista / USP (02 joias e 01 quadro); colecionadores (07 joias e 01 quadro).

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Nos acervos brasileiros foram identificadas e estudadas 102 peças (48 adornos pessoais,

48 quadros, 05 mementos e uma caderneta), que pertencem à categoria dos objetos de afeto e

saudade.

Os objetos de afeto e saudade foram espaços de memória, impregnados de valores e

significados afetivos para a boa sociedade oitocentista. Estas peças foram associadas aos

sentimentos como paixão, amor, carinho, saudade e pesar; às homenagens à pessoa querida;

às datas comemorativas; aos objetos de moda; às representações de luto, compromisso,

intimidade, familiaridade e sensualidade. Traduziram a amizade, a lembrança, a

comemoração, os pactos de amor, a cumplicidade, a fé e a esperança em composições feitas

com cabelos tramados, trançados e modelados. Os arranjos foram elaborados com retratos;

iniciais ou monogramas centrais, emoldurados por contorno oval ou na forma de escudo;

nomes e datas; palavras soltas fazendo menção às juras de amor; frases de fidelidade;

corações transpassados por flechas ou em chamas sobre altar; mãos entrelaçadas; a aljava, o

arco e a flecha; flores solitárias ou corbelhas, coroas, buquês e guirlandas de flores; anjos ou

mulheres ou homens apoiados e/ou rezando ao lado de túmulo ou de urna funerária; pássaros

voando em bando, ou em pares, ou solitários; paisagens; cachos, mechas e volutas de cabelos;

plumas e penas atados por fitas e laços. Estes objetos foram confeccionados em diversos

materiais: os adornos pessoais tanto com metais nobres11 – ouro e prata, quanto com ligas de

cobre prateadas ou douradas, combinados ao esmalte12 e às gemas13 ; os mementos e os

quadros tiveram a estrutura e as molduras elaboradas com madeira e/ou latão, e a base da

11 São considerados materiais nobres e tradicionais na joalheria: o ouro, a platina e alguns metais de seu grupo (rutênio, ródio, paládio, ósmio e irídio), a prata e as pedras preciosas. 12 Esmalte: material cerâmico, formado por substâncias inorgânicas. Como no vidro, a sílica (SiO2) é o componente fundamental do esmalte. Em seu estado normal, o esmalte é transparente e incolor, podendo ser transformado em opaco e colorido pelo acréscimo de óxidos, opacificadores e corantes. O esmalte é usado como decoração, revestimento e proteção para os metais que oxidam. Na esmaltação a quente sobre metais, superfícies inteiras são cobertas ou têm alguns espaços preenchidos por esmaltes com pontos de fusão, entre 720ºC e 800ºC. O processo é artesanal e os metais utilizados no processo são: ouro, prata, cobre e suas ligas (latão, prata germânica, alpaca, tombac, bronze) e ferro. 13 Gema [do latim – gemma]: pedra preciosa; substâncias naturais orgânicas ou inorgânicas, que por suas características intrínsecas (cor, beleza, raridade, dureza e brilho) são utilizadas como adornos pessoais. As gemas podem ser de origem mineral (exemplo: esmeralda), de origem vegetal (exemplo: âmbar) e animal (exemplo: pérola). Nomenclatura atual para definir as pedras consideradas preciosas, que são usadas na joalheria (IBGM/DNPM. Manual Técnico de Gemas. 4 ed. Brasília: IBGM/DNPM, p. 13; SCHUMANN, Walter. Gemas do mundo. 3 ed. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1990, p. 10).

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composição em opalina14, vidro ou tecido. Objetos construídos, ornamentados e bordados

com cabelos tiveram linguagem própria. O cabelo é o principal elemento identitário desta

linguagem, seguido dos demais elementos que foram permutados entre si a gosto de quem

encomendou e/ou de quem confeccionou. O gosto vitoriano os adotou para expressar decoro e

elegância, sentimentos e emoções.

A Inglaterra foi o modelo de sociedade civilizada e próspera, sinônimo de progresso e

crescimento econômico, e a disposição do pensamento vitoriano poderia ser resumida em:

focado no futuro, otimista, racional, positivo, materialista, imperialista, moralista e confiante.

Foi chamada de Workshop of the World15, pois, em meados do século XIX, detinha 60% da

produção industrial mundial (ALENCASTRO, 2001; ARAUJO, 2012; BETHELL, 2009;

CALANCA, 2008, p. 130-187; FALCON e MOURA, 1981, p. 28-34; FORTY, 2007;

FRANCO, 2005; FREYRE, 2000, 2008; GAY, 2002, p. 163-165, 170-171; PATERSON,

2008; PAXMAN, 2010, p. 224; SCHMITT, 2010). Através de sua política comercial e

mercadorias, os ingleses divulgaram sua percepção de mundo moderno, impuseram novos

hábitos cotidianos – o gosto, a moral e os valores vitorianos –, influenciaram economias

regionais, retardaram o crescimento industrial nas ex-colônias, espalharam pelo mundo

representantes comerciais e especialistas nas novas tecnologias. Todas as sociedades que

almejaram avanços e status semelhantes, perseguiram os modelos ingleses.

Em tempos vitorianos, em que a população nos grandes centros urbanos crescia, pessoas

dividiam espaços e atuavam em um mesmo cenário; regras de agir e de se comportar foram

importantes para que houvesse ordem. A agressividade deveria ser contida; os impulsos e os

arroubos emotivos deveriam ser controlados. Anônimos, indivíduos foram reconhecidos como

distintos pela adoção de conduta e objetos adequados ao espaço público. O saber destes

modos os individualizava das massas e dos que desconheciam as maneiras de um homem

14 Opalina: vidro translúcido, com efeito óptico, leitoso esbranquiçado, similar ao da gema Opala, que tem como principal característica o brilhante jogo de cores: incolor, branca com matizes pálidos de amarelo, vermelho, verde, marrom, cinza e azul. Teve origem em Veneza no século XVI, e, posteriormente, na manufatura de cristais Baccarat (França, no século XVIII). Tornou-se moda no período do Romantismo. Foi usado na confecção de vasos, vasilhas, copos, caixas, garrafas, frascos de perfume, objetos decorativos e de toalete, lustres, candelabros, apliques, jarros e bacias. Foi produzido na Bélgica, Boêmia, França, Itália, e no Brasil, ao longo do Segundo Reinado, foi importado (MOUTINHO, Stella R. O.; PRADO, Rúbia B. Bueno do; LONDRES, Ruth R. O. Dicionário de artes decorativas & decoração de interiores. 2. ed., rev. e atual. Rio de Janeiro: Lexikon, 2011, p. 311-312). 15 Tradução livre da autora: A oficina / fábrica do mundo.

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civilizado. Ser reservado é ser elegante e cortês. A reserva, que promove um sentimento de

liberdade individual (REZENDE, COELHO, 2010, p. 110), abriu espaço para divagar,

imaginar e sonhar sem a censura ou repreensões externas. O afeto e os impulsos encontraram

na discrição o espaço para se expandir, e à discrição foram permitidos suportes para que

exprimisse os arroubos da comoção.

Os ingleses promoveram o modelo ideal no comportamento e na aparência do cidadão

em sociedade; pelo trajar, configurou-se a manifestação material de atitudes como

circunspecção e austeridade, que caracterizavam em larga medida a moralidade da era

vitoriana (ARAUJO, 2012, p. 25; CALANCA, 2008, p. 98; STEVENSON, 2012, p. 38-39).

Homens respeitáveis e distintos adotaram a aparência do industrial abastado, do comerciante

ou do profissional liberal bem-sucedidos e elegantes: roupas simples, mas bem modeladas e

cuidadas, despojadas de adornos, em tecidos escuros (o preto é a cor preferida) e lisos; pela

barba, bigode, suíças, costeletas, cavanhaque e cabelos limpos, bem aparados e penteados

sabe-se dos seus bons hábitos de higiene. O traje masculino completo era composto de calça

comprida, camisa, gravata de nó corredio, colete, casaca, sobrecasaca, jaquetão ou paletó. Os

acessórios adequados, que compunham a toalete, eram o chapéu (cartola ou chapéu-coco16

conforme a ocasião e ambiente), uma bengala, que poderia ter castão elaborado em materiais

nobres ou um guarda-chuva inglês. Os adornos pessoais deveriam ser usados com parcimônia,

nada de excessos: um alfinete de gravata, abotoaduras, relógio de algibeira sustentado com

corrente, aliança ou um anel, capas para botões foram comuns em trajes de festa e as joias de

afeto e saudade (anel, alfinete, broche ou pendente na corrente junto ao relógio de algibeira)

por compromisso ou luto. O calçado também deveria ser mantido em impecável aparência.

Em contrapartida, a mulher, em meados dos oitocentos, teve a aparência oposta à masculina.

O espaço de circulação e responsabilidade feminino foi o doméstico (GAY, 2002, p. 56-81;

SCOTT, 1994, p. 11-2717). Mulheres casadas burguesas cuidavam do conforto e bem-estar da

16 Chapéu-coco: de origem inglesa e, portanto, também chamado de bowler, derby ou billycock (STEVENSON, 2012, p. 40-41, 59). 17 Compreendo gênero como conceito construído pelas sociedades, que diz respeito às relações humanas, entre homens e mulheres, e as disputas de poder – de dominação e de subordinação – dentro de sua estrutura. É histórico. Gênero, portanto, se faz expressar nas ideias, instituições e estruturas, práticas cotidianas, rituais (SCOTT, 1994, p. 11-14) e na cultura material. Objetos expressam, reproduzem e reiteram estas relações e dinâmicas. Sem dúvida, pensar os objetos de afeto e saudade pelo prisma de gênero, implicaria estudar as dinâmicas e os papéis sociais conformados para homens e mulheres na sociedade vitoriana e, consequentemente, os objetos como mediadores destas organizações. Ao iniciar este trabalho, após a leitura de Gênero e Artefato, de

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família, gerenciavam o lar. Seguir a moda, preocupar-se com frivolidades, cuidar da

aparência, conhecer e adotar os bons modos em sociedade foram imperativos às senhoras

burguesas. Os seus trajes eram diversificados – conforme as situações cotidianas e os

ambientes frequentados –, elaborados e sofisticados na construção e composição,

ornamentados, volumosos e acompanhados de acessórios e adornos pessoais.

Naquele cenário, a boa sociedade percebe na moral vitoriana o modelo, o que valoriza a

família e os vínculos familiares, o comportamento e as atitudes polidas e adequadas, ditas

civilizadas, em sociedade. Dentre os muitos atributos do cidadão bem nascido, o controle dos

sentimentos e emoções o tornam distinto. É elegante no trajar, coerente com a ocasião,

contido no se expressar. Os objetos foram espaços autorizados para a expressão de

sentimentos e emoções, que, pelo impulso, poderiam transbordar em exageros da comoção,

arroubos da paixão e símbolos de afetividade, em desenhos e composições, iniciais e

declarações, e materiais. O cabelo como material passa a ser mais um recurso para firmar

vínculos afetivos e tornar peças – usadas sobre o corpo ou no espaço doméstico,

individualizadas e únicas. O cabelo que humaniza os objetos, torna presente o sentimento,

remete à emoção, faz lembrar o quê, ou quem, não se quer esquecer. Cabelos em joias, em

objetos pessoais e decorativos, confeccionados por processos artesanais e em composições

singulares, em oposição aos feitos em escala industrial, despojados de individualidade e

personalidade, iguais, privados de emoção. E não poderia ser diferente no Brasil...

Com a chegada da Corte portuguesa ao Brasil. Uma nova atmosfera e um novo status

foram realidades nestas terras. De Colônia a Império, foi necessário transformar o entorno e

responder as novas solicitações. Como Império, o Brasil deveria figurar e se apresentar como

tal. As cidades e a infraestrutura precisaram ser reorganizadas, planejadas e modeladas para o

presente e o futuro de crescimento e progresso (ALENCASTRO, 2001; BETHELL, 2009;

FRANCO, 200518; FREYRE, 2000, 2008; FRIDMAN, 2009). A corte e a boa sociedade

Vânia Carneiro de Carvalho (2008), compreendi que não tinha como interesse, e tampouco como meta, a análise de gênero daquela sociedade e dos objetos atribuídos aos gêneros. No presente, me preocupo em localizar, conhecer, compreender os objetos de afeto e saudade, feitos com cabelos humanos, e os deslocamentos sofridos por estes objetos em seus sentidos, significados e papéis. Acredito que o conteúdo proposto neste estudo, sim, poderá, em ocasião posterior, oferecer referências e questões para uma reflexão sobre os objetos de afeto e saudade como agentes das relações de gênero. 18 Afonso Arinos de Melo Franco, em Desenvolvimento da Civilização Material no Brasil, chama atenção para as reais e sensíveis mudanças que aconteceram no Brasil no período do Segundo Reinado. O autor afirma: O

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demandaramcidades mais modernas, que atendessem os seus hábitos e desejos. Abriu-se

oportunidades de bons e lucrativos negócios para financistas, comerciantes, artesãos,

profissionais liberais etc. Vieram especialistas do Velho Mundo com a experiência de quem

conhece o ofício, o gosto e as exigências da boa sociedade. Além do dilúvio de produtos

importados19, principalmente ingleses, foi iniciada e ampliada a produção e oferta de artigos

nacionais. Em Ingleses no Brasil (2000), Gilberto Freyre traça um panorama dos negócios e

comércio promovidos pelos ingleses – especializados em produtos da revolução industrial:

equipamentos, máquinas, estruturas de produção, infraestrutura para transportes, saneamento

e iluminação; e franceses – reconhecidos especialistas em artigos de luxo e modas femininas

(p. 172), nas ruas elegantes das grandes cidades brasileiras, após a abertura dos portos.

A influência cultural e material europeia se fez presente no cotidiano das grandes

cidades brasileiras e nas casas burguesas do interior, a divulgação e a grande oferta de

mercadorias favoreciam os negócios e o consumo (ALENCASTRO, 2001; FREYRE, 2000,

2008). Pessoas e famílias elegantes adotaram os hábitos europeus ao encomendar e adquirir

mercadorias no Brasil e/ou ao visitar capitais culturais como Londres, Paris, Viena e Berlim –

destinos da boa sociedade brasileira em viagem ao Velho Mundo, onde renovavam ideias e

consumiam produtos da moda e mergulhavam nas maravilhas da civilização20.

reinado de d. Pedro I e a Regência que se lhe seguiu cobrem um extenso período de dezoito anos (1822-1840), em que os progressos da civilização material foram a bem dizer insignificantes no Brasil (p. 136). Franco atribui à era do café o forte impulso para as melhorias: Na última década, a partir de 1850, grandes coisas tinham ocorrido, direta ou indiretamente causadas pelo café, cuja lavoura se expandia enormemente, e também pela inflação de crédito, causada pelo recolhimento do capital empregado no tráfico negreiro, oficialmente suspenso em 1850. Foi o tempo do Código Comercial, do telégrafo elétrico, do calçamento, dos esgotos, da iluminação a gás, de um Banco do Brasil mais sólido que o do Brasil-Reino e o Primeiro Reinado. Durante o período, segundo Taunay [Afonso de E. Taunay, História do Café no Brasil, 1939] , fundaram-se 62 empresas industriais, 14 bancos, 3 caixas econômicas, 20 companhias de navegação a vapor, 23 de seguros, 4 de colonização, 8 de mineração, 3 de transportes, 2 de gás e, finalmente, 8 de estradas de ferro. A mais importante delas foi a que deu início à mecanização dos transportes (p. 140). 19 Metade do comércio brasileiro com o exterior passou pelos cais cariocas durante o século XIX, para, a seguir, alcançar as demais capitais e cidades brasileiras (ALENCASTRO, 2001, p. 24). 20 Segundo Mariana Muaze (2008, p. 107): […] as viagens para a Europa, assim como a aquisição de imóveis em cidades socialmente importantes, tais como Petrópolis e Rio de Janeiro, faziam parte de uma nova lógica de investimentos e aplicação do capital. Ao invés de terras, os lucros obtidos passavam a ser investidos em outros bens de prestígio vinculados à educação, instrução, etiqueta, viagens, frequência em salões, saraus, espetáculos de teatro lírico etc. No fundo, havia uma pretensão de aproximar, se possível igualar, os códigos de comportamento das províncias enriquecidas àquelas das capitais, não só do Império, mas de todo o “mundo civilizado”.

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A boa sociedade no Rio de Janeiro – capital do império, e em outras grandes cidades

brasileiras, demandava os produtos da moda, leia-se produtos europeus importados ou

similares nacionais. Estar na moda significava conhecer e seguir as inovações europeias –

francesas e inglesas, divulgadas em jornais femininos, expostas nas vitrines dos magazines

elegantes na rua do Ouvidor, orientadas pelos manuais do bom tom e exibidas na vida social.

Adotar produtos da moda e as boas maneiras foi sinônimo de distinção para a boa sociedade,

e uma aproximação dos seus pares europeus.

O termo boa sociedade traduz, portanto, as características descritas por Maria do Carmo

Rainho (2002, p. 16-17; 1995, p. 139 21 ) para parte da sociedade brasileira que se fez

apresentar e representar por práticas, atitudes, aparência e consumo distintivo. Neste grupo,

além da classe senhorial e dos políticos, incluímos burgueses – negociantes, bacharéis,

profissionais liberais, banqueiros, altos funcionários do Estado e outros, que adotaram um

estilo de vida civilizado. Foram homens e mulheres que, além da influência política que

exerceram, possuíam poder econômico e prestígio social, e adotaram os modos e as modas

civilizados. Nos oitocentos, ser civilizado significava conhecer e fazer uso dos modelos

europeus de se apresentar e estar em sociedade, o que foi sinônimo de ter maneiras polidas e

elegantes, construir a aparência e a imagem em concordância com os ditames da moda.

Conhecê-los, consumi-los e usá-los com desenvoltura e “naturalidade” distinguiu e demarcou

a distância entre os que pertenciam à boa sociedade e as pessoas da sociedade comum.

Jornais femininos fluminenses – O Album Semanal, O Espelho, Jornal das Senhoras,

Semana Familiar, Echo das Damas, Archivo das Familias e A Estação22 – dentre vários

assuntos, contemplaram suas leitoras com comentários sobre os penteados da moda, sem

esquecer das novidades que aconteciam na Europa; publicaram dicas de elegância, cuidados

com a aparência, exemplos ilustrados de arranjos e enfeites para os cabelos; recomendaram

receitas caseiras para tratamentos e divulgaram serviços, como os oferecidos pela As Tranças 21 Maria do Carmo Rainho, no texto A distinção e suas normas: leitura e leitores dos manuais de etiqueta e civilidade, 1995, cita Francisco de Paula Ferreira de Rezende, bacharel mineiro do início do século XIX, para quem a sociedade aparece dividida nas seguintes classes: a dos brancos e sobretudo daqueles que por sua posição constituíam o que se costuma chamar a boa sociedade; a do povo mais ou menos miúdo; e finalmente a dos escravos (REZENDE, Francisco de Paula Ferreira de. Minha recordações. São Paulo: Itatiaia, 1988, p. 171). 22 Foram consultados os exemplares disponíveis na Fundação Biblioteca Nacional: O Album Semanal (1851 e 1852), O Espelho (1859), Jornal das Senhoras (1854 e 1855), Semana Familiar (1862), Echo das Damas (1879), Archivo das Familias (1881); e na biblioteca da Fundação Casa de Rui Barbosa: A Estação (1881, 1882, 1895).

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Vencedoras, produtos nacionais (Tónico Oriental – para Augmentar, suavizar e aformorsear

O Cabello – Deliciosamente perfumado)23 e estrangeiros disponíveis no mercado ou que

poderiam ser encomendados no exterior (Rowlands’ Macassar Oil24; L’Extrait Capillaire des

Benedictins du Mont-Majella, de Paris25; Orizalinede James Smithson – um unico vidro basta

para dar immediatamente aos cabelos e a barba a sua cor natural – Qualquer que ella seja;

L. Legrand – com este liquido não é preciso lavar-se a cabeça nem antes nem depois –

Applicação simples – Resultado immediato – Não mancha a pelle, nem é contrário a saude. A

venda em casa de todos os cabelleireiros – ambos disponíveis à 207 rue St. Honoré, em

Paris26). 27

Anúncios de cabeleireiros constam do Almanak Laemmert28 desde a sua primeira edição

em 1844. Nesta, nas páginas 243 e 244, oito profissionais oferecem seus serviços à sociedade

fluminense. Foram listados por nomes e/ou sobrenomes estrangeiros seguidos de seus

endereços no centro da cidade – J. Borrieiro, rua d’Ajuda 13; Henrique Hellot e C., rua

d’Ouvidor 66; ou seguidos de explicação sobre as suas atividades – José Pinto Ramos que faz

tudo quanto pertence, a sua arte e encarrega-se de encommendas para fora da côrte: tem

sala de cortar o cabello; ou Alexandre e Francisco Desmarais29, que se identificavam e

distinguiam como Cabelleireiros da Casa Imperial, localizados na elegante rua do Ouvidor;

ou acompanhados de descrição de seus produtos – Teissier, tem sempre hum sortimento de

cabellos postiços para homens e senhoras, pós muito aperfeiçoados para tingir o cabelo, e

todas as qualidades de perfumarias. Passados dois anos, na edição de 1846, na página 315,

23 Anúncio publicado no A Mulher – Periodico Illustrado de Litteratura e Bellas-Artes. Consagrado aos interesses e direitos da mulher brazileira. Redactoras: Josefa A.F.M. de Oliveira e Maria A.G. Estrella. Anno I. Junho, 1881. New York. Typ. de E. Perez, 44 College Place. Jornal dedicado aos brasileiros residentes em Nova York; e no A Estação – Jornal Illustrado para a Familia – Rio de Janeiro, 31 de Janeiro de 1881, Anno X, N. 2, p. 18. 24 Anúncio publicado no A Estação – Jornal Illustrado para a Familia – Rio de Janeiro, 30 de Abril de 1884, Anno XIII, N. 8, p. 36. 25 Anúncio publicado no A Estação – Jornal Illustrado para a Familia – Rio de Janeiro, 31 de Dezembro de 1895, Anno XXIV, N. 24, p. 160. 26 Anúncios publicados no A Estação – Jornal Illustrado para a Familia – Rio de Janeiro, 31 de Janeiro de 1881, Anno X, N. 2, p. 18. 27 Os trechos de publicações da época foram transcritos conforme a grafia na fonte consultada. 28 Almanak administrativo, mercantil, e industrial do Rio de Janeiro, considerado o primeiro almanaque publicado no Brasil. Editado no Rio de Janeiro, entre 1844 e 1889, pelos irmãos Eduard e Heinrich Laemmert, fundadores da Livraria Universal e Tipografia Laemmert. Disponível em: http://www2.cultura.gov.br/site/2008/05/14/almanak-laemmert/. Acesso em 30.06.2014. 29 Em Memórias da Rua do Ouvidor, Joaquim Manuel de Macedo menciona a Desmarais como sendo a primeira loja de perfumarias naquela rua.

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em Cabelleireiros foram listados nove profissionais, destes, três nomes são novos e seis da

primeira edição, onde então Teissier passou a se diferenciar ao ser identificado como

Cabelleireiro de Pariz... Naquele tempo, os nomes estrangeiros, a propaganda de produtos

importados, os serviços à la alguma técnica de fora foram sinônimos de qualidade. Oferecer

um produto impar, ser reconhecido e frequentado por freguesia de bom gosto sugeria a

distinção, a boa colocação no mercado e, portanto, lucros.

A loja de perfumarias Desmarais30teve no seu gênero a glória e a primazia de que gozou a do Wallerstein31; exerceu o governo e fez o encanto do nariz, dos cabelos, e das barbas da cidade do Rio de Janeiro; introduziu os preciosos segredos que carbonizam a neve que a idade derrama sem piedade sobre as mais graciosas cabeças; acabou com as últimas e mais pertinazes cabeleiras apolvilhadas e de rabicho, substituindo-as por melhores e dissimuladas cabeleiras em favor dos calvos, e em socorro de belezas descabeladas; por força de lógica reformadora, abolindo o polvilho, não ousou ou não soube então explorar o pó-de-arroz simples ou composto, mas em compensação brilhou em apuros do nácar; e até ganhou não pouco dinheiro em moscas.

Loja prodígio!... tornou como redivivos em moças vivas cabelos de moças defuntas, e deu às moças já velhas o condão de deixar em sua passagem e em seus vestígios suaves odores de juventude.32

Essências, sabonetes, escovas, suavíssimas esponjas, adornos de toucador, vidrinhos de cheiro, espelhos, bonecas, cabelos anelados, etc., só as do Desmarais, a que, eu o creio, chegavam encomendas até de Goiás e de Mato Grosso. (MACEDO, 2005, p. 134)

A cabeleira vasta na mulher [brasileira] era insígnia de classe alta (DABADIE, 1858,

p. 104, apud FREYRE, 2008, p. 83)33 ,portanto, penteados e arranjos para o cotidiano e

30 A Casa do Desmarais é citada por José de Alencar no romance Lucíola (2005, p. 21). 31 Wallerstein foi a luxuosa e famosa loja, localizada na rua do Ouvidor, responsável por trazer as últimas modas de Paris para as brasileiras. Segundo Macedo, O Wallerstein foi o Carlos Magno da rua do Ouvidor. Ó loja do Wallerstein!... A lembrança dos seus primores faz ainda palpitar corações, não de velhas, porque não há senhoras que o sejam, mas de senhoras que foram meninas e jovens durante o florescimento daquele gênio do bom gosto, florescimento que perdurou desde o fim do primeiro reinado até além da coroaçãoo do Imperador o Sr. D. Pedro II. […] Algum tempo depois, Mr. Wallerstein, o Napoleão da moda e da elegância sem Waterloo imaginável, farto de área colheita, e no apogeu da glória dos altos preços, bateu asas, e foi-se do Rio de Janeiro. Le roi est mort; vive le roi”... A casa mudou de nome e chamou-se Masset. (2015, p. 128-131). 32 Faz menção aos cabelos postiços em circulação no mercado. O que chama a atenção é a menção aos cabelos de moças defuntas, que também foram mercadoria. 33 DABADIE, F. Récites et types américain, a travers l’Amerique du Sud. Paris, 1858, p. 104. (apud FREYRE, 2008, p. 83). Nesta nota, Dabadie expõe os hábitos de higiene com os cabelos, ou da não higiene..., no cotidiano das damas aristocráticas no Brasil. Segundo o autor, piolhos eram comuns na cabeleira das senhoras, que se faziam catar […] por suas mucamas, […], mulatas e escravas. […] Eram raros entre elas [escravas] os piolhos porque raras eram entre elas as cabeleiras, algumas por terem apenas carapinhas, outras por cortarem e até rasparem higienicamente o cabelo, substituindo-o por turbantes ou rodilhas; ou fazendo cobrir, quando saíam de casa, de penas brancas ou de cor, que usavam seguindo diferentes rituais. Ter cabelos longos e piolhos e contar com as mãos de mucamas para catá-los lenta e voluptuosamente, distinguia os lugares sociais, significava luxo. No Brasil, a esta prática deu-se o nome de cafuné.

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ocasiões festivas foram elaborados não apenas por mãos profissionais, mas por senhoras e

suas criadas habilidosas. A experiência do dia a dia recebeu um reforço das orientações

publicadas nas revistas femininas, o que reitera o interesse da boa sociedade fluminense em

manter padrões de aparência e elegância similares aos de seus iguais europeus.

Gradativamente, nas edições seguintes do Almanak Laemmert, o número de anunciantes

aumentou e os comunicados tornaram-se mais elaborados, acrescidos de ilustrações, nomes de

profissionais, seguidos de seus endereços, e passaram a descrever seus principais serviços e

mercadorias, dentre elas, produtos de toucador, perfumarias finas, escovas de dentes, cabelos

postiços34 (tranças, cabelleiras, bandós, crescentes e almofadas), fórmulas para tingimento e

tratamento dos cabelos, pentes, flores e enfeites para penteados, objetos de fantasia, objetos

para toilette de luxo, presentes e charutos. As mercadorias tão variadas e fora do universo das

aparências, oferecidas pelos cabeleireiros, nos faz pensar que estes estabelecimentos

buscavam diversificar seus negócios e oferecer para a sua clientela artigos elegantes, inclusive

encarregando-se de encomendá-los em Paris ou Nova York. Ao longo do oitocentos, no

Brasil, houve interesse por penteados, pela beleza dos cabelos e por outras práticas com

cabelos...

Na edição de 1847, após listados os cabeleireiros, na página 374, pela primeira vez no

Almanak Laemmert, são citadas Clerot, localizado à rua dos Ourives 17,

[…] desenhador em cabellos, encarrega-se de fazer tumulos, firmas, ramalhetes de todas as espécies, cestas de flores de cabellos, cordões, fitas para relogios, collares, pulseiras, brincos, cruzes, memorias e todos os generos de desenho e trancelins dos mesmos. Trabalha á vista das pessoas que o desejarem. Tem também um grande sortimento de medalhas, pulceiras, alfinetes, brincos, memorias de ouro, e geralmente tudo o que pertence a bijouteria para obras de cabello.

... e José Randé, entrançador de cabellos da Casa Imperial, estabelecido à rua dos Ourives

18, casas especializadas na criação de objetos de cabelos...

34 No Brasil, os cabelos postiços foram consumidos por pessoas que quiseram realizar um penteado da moda, disfarçar a calvície e esconder os cabelos crespos e as suas origens: […] o uso de perucas de cabelos lisos, claros, importados, tinha boa aceitação. A cabeleira postiça aristocrática, às vezes branca, empoada com talco, apreciada na Europa nos séculos XVII e XVIII, não tivera voga na América portuguesa. Quando o adereço já caía em desuso na Europa, entra na moda no Império para esconder o cabelo pixaim. Diversos cabeleireiros da corte fazem propaganda da mercadoria (ALENCASTRO, 2001, p. 86).

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Além das peças identificadas por mim nos acervos brasileiros de dez museus (41

adornos pessoais, 01 caderneta, 05 mementos e 48 quadros) e em quatro coleções particulares

(07 adornos pessoais e 01 quadro), os anúncios são indícios da oferta e, portanto, da demanda

por objetos confeccionados com cabelos na Corte. Dentre muitos hábitos, serviços e produtos

importados do Velho Mundo para o Brasil, os objetos feitos de cabelos são testemunhos do

gosto pelos artefatos da moda, da compreensão e adoção dos valores e significados que lhes

foram atribuídos ao longo do período vitoriano.

Artista em cabellos da Casa Imperial. Gillet participa ao respeitavel publico, e em particular seus freguezes, que seu filho Eugene Gillet, discipulo dos primeiros artistas de Paris, offerece-se para apromptar quaesquer trabalhos de cabellos, os mais delicados que sejão, como ramos de flores, tumulos, grinaldas e letras, tudo de relevo, ainda nunca visto nesta corte. Os oito annos que este jovem artista estudou em Paris dão-lhe a facilidade de poder rivalisar com os primeiros artistas da Europa, e para o respeitavel publico se convencer podem ver-se alguns de seus trabalhos na Rua dos Ourives 52. (Almanak Laemmert, em Notabilidades, Artistas em Cabellos, 1864, p. 21)

No Almanak Laemmert, foi possível observar que, no Rio de Janeiro, houve razoável

oferta de serviços de artistas entrançadores e desenhadores de cabelos, profissionais

especializados na execução de objetos com cabelos. Em torno de vinte e cinco nomes –

estabelecimentos e/ou artesãos – disponibilizaram suas habilidades e arte na cidade. A partir

dos dados obtidos nas edições de 1847 a 1889, do Almanak Laemmert, é possível observar

que a maior concentração destes profissionais ocorreu na rua dos Ourives (atual rua Miguel

Couto)35, seguida da rua do Ouvidor e da rua da Carioca. Alguns anunciaram no Almanak

Laemmert por um ano, outros por dois, mas houve casas que anunciaram por longos períodos

– Lourenço Roberto (9 anos), Carlos Estanislau Biné (14 anos), Francisco Augusto Labiche

(16 anos), os de Oliveira36 (20 anos), Guilherme Méziat – Ao amor perfeito (26 anos) e os

Gillet37 (33 anos) –, o que nos sugere certa estabilidade no mercado. As alterações nos nomes

35 BERGER, 1974, p. 88-89. 36 Maria Roberto de Oliveira ou D. Maria Roberto de Oliveira, Maria Rosa de Oliveira dividiram o mesmo endereço por 20 anos. Creio que trata-se de uma empresa familiar, iniciada por Lourenço Roberto, que anunciou no Almanak Laemmert de 1855 a 1862, na rua da Alfândega 100; e voltou a anunciar em 1865, mas em novo endereço: à rua do Sabão 96. A partir de 1866, no mesmo endereço, passou a ser anunciado o nome Maria Roberto de Oliveira. 37 A família Gillet apresenta cinco variações em seu nome nos anúncios: Mme. Gillet, Gillet (nome anunciado por 24 anos), Felix Gillet (anunciou simultaneamente ao nome Gillet, por um ano. Estabelecido no mesmo endereço.), Julio Eugenio Gillet (anunciou simultaneamente ao nome Gillet, por dois anos. Estabelecido no mesmo endereço) e Viuva Gillet.

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anunciados chamaram a minha atenção. Ora José Randé, ora Margarida Randé, ora Augusto

Labiche, ora Francisco Augusto Labiche, ora Mme. Gillet, ora Gillet, ora Viuva Gillet. Alguns

nomes modificados foram acompanhados de um novo endereço, outros não. Estas variações

talvez seguissem as inovações implementadas nas empresas, como, por exemplo, a chegada

de uma nova geração de artesãos e/ou criadores ou reorganização administrativa.

Por mais de quarenta anos divulgaram e atenderam a freguesia local e nacional que

buscavam objetos feitos em cabelos. Os gostos mais exigentes, que não abriram mão do

produto importado, encontraram no Almanak Laemmert, a partir da edição de 1859 a 1868 e

em 1870, na seção Annuncios de Paris, anúncios do reconhecido artista francês Lemmonier,

se fazendo conhecer e disponibilizando seus serviços.

Entre os 102 objetos levantados nos acervos de museus e nas coleções particulares

brasileiros, uma peça tem autoria explicitada por dedicatória e 14 têm etiquetas fixadas no

verso, identificando as casas que foram responsáveis pela confecção destas peças: sete

estabelecidas no Rio de Janeiro (duas peças assinadas Gillet38 e cinco por Ao amor perfeito –

Guilherme Méziat39), cinco em Paris (J. Heymann40, Orfévreie & Bijouterie Mascar41 e três

por Mon Charleux-Jeaudonnenc42), uma em Lyon (Grand-Clement Orfévre43) e outra em

Hamburgo (Heinrich Langhagene44).

38 Gillet: quadro sem referência do Museu Marino Procópio / Juiz de Fora / MG (na composição consta a data 11 de março de 1876) e quadro de coleção particular de Maria Izabel Tavares Cavalcanti (na composição consta a data 19 de outubro de 1864. Na etiqueta vem escrito, à mão, número 132). 39 Ao amor perfeito – Guilherme Méziat: referências 5668-IX-14 (na composição consta o ano 1889) e 5669-IX-15 (na composição consta a data 28 de outubro de 1889) do Instituto Feminino da Bahia; referências 017.076 (na composição consta a data 04 de novembro de 1869) e 017.077 (na composição consta a data 04 de outubro de 1879) do Museu Histórico Nacional; referência 85.20.03 do Museu Mariano Procópio. 40 J. Heymann – Dessins & Bijoux Artistiques en Cheveux – Bould. St. Martin 45, Paris. Quadro com referência 5677-IX-23 do Instituto Feminino da Bahia. Na etiqueta, é mencionado que a casa recebeu medalha de prata na Exposição Internacional de 1878, em Paris. Na composição consta o ano 1879. 41 Orfévreie & Bijouterie Mascar – Artiste [...] Cheveux – Place de la Prefecture. Quadro com referência 5657-IX-03 do Instituto Feminino da Bahia. A etiqueta no verso do quadro tem partes rasgadas, o que dificultou a transcrição das informações. 42 Mon Charleux-Jeaudonnenc – Bijoutier et Dessinateur en Cheveux – Passade du Havre 39, 41, 43, Paris. Quadros com referências 5683-IX-29 e 5688-IX-34 (na composição consta a data 09 de setembro de 1924) do Instituto Feminino da Bahia e referência RG5166 do Museu Paulista / USP. 43 Grand-Clement Orfévre – Dessi [...] Table [...] D’oy [...] – Quar. St. Antoine 22, Lyon. Quadro com referência 5666-IX-12 do Instituto Feminino da Bahia. A etiqueta no verso do quadro tem partes rasgadas o que dificultou a transcrição das informações. 44 Heinrich Langhagene – C. Busse Nachflg., Bergstr. 13, Hamburg. Quadro com referência 5656-IX-02 do Instituto Feminino da Bahia. Na etiqueta, consta o número da peça 28081, datada de 12 de setembro de 1898. Segundo Gilberto Freyre, no Brasil oitocentista, os modelos de elegância e luxo, foram inspirados não mais nos

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Outro indício do interesse das senhoras brasileiras pelo trabalho artesanal em cabelos é

sugerido pelo anúncio do entrançador Carlos Estanislao Biné, na edição de 1866 do Almanak,

que além de oferecer grande sortimento de joias para cabellos, o artista passa a oferecer

lições em casas particulares para entrançar cabellos (p. 596). As aulas particulares foram

anunciadas nas edições do Almanak Laemmert entre 1866 e 1870. Deste anúncio, várias

perguntas se formaram: houve grande procura pelas aulas? Quem contratou as aulas? Que

técnicas foram ensinadas? Que objetos foram construídos? Manuais e catálogos de modelos

foram apresentados? Houve alguma publicação nacional? A única peça, dentre as elencadas,

que pode ser exemplo da habilidade amadora das senhoras da boa sociedade carioca, é a

caderneta bordada com cabelos por Maria Joaquina da Costa Botelho de Magalhães45. A

dedicatória escrita na contracapa da caderneta manifesta a autoria do bordado:

Meu querido amigo e adorado esposo, hoje teu aniversário natalício ofereço-te esta lembrança que bordei com meus cabelos procurando um emblema significativo do santo amor que nos une. Que tenhas muitos e muitos longos anos de vida e felicidade é o que do fundo d’alma deseja aquela que se desvanece em ser tua querida esposa e verdadeira amiga.

Maria Joaquina da Costa Botelho de Magalhães, 18 de outubro de 1870.

A realidade do mercado expressa nos anúncios é reiterada pelos romances em que

personagens se relacionam em tramas, dilemas e questões aos quais os(as) leitores(as) foram

sensíveis e reconheceram as aflições e emoções, os objetos citados e os seus papéis, códigos

de valores, a moral, os modos e gostos que permeavam as narrativas. Personagens e histórias

idealizados ou inspirados em pessoas ou tipos reais. Com pequenas ou grandes alterações,

afinal, como escrever ficção sem que haja referências ao mundo em que se vive, ao cotidiano,

onde as mazelas, estruturas e inquietações da sociedades circulam e se transformam? O

cotidiano que foi interpretado, maquiado, exagerado ou realíssimo para o leitor se identificar,

se emocionar, se apiedar ou negar... Nestes escritos, transparecem pelas banalidades

cotidianas as dinâmicas do contexto, mediadas pela cultura material de antes, de então e das

inovações.

modelos ibéricos, mas nos franceses, nos ingleses e nos alemães (2008, p. 69), o que torna os artesãos alemães referências para a boa sociedade na compra de objetos da moda. 45 Dedicatória escrita na primeira folha da caderneta presenteada por Maria Joaquina da Costa Botelho de Magalhães, para Benjamin Constant, por ocasião de seu aniversário, em 18 de outubro de 1870. Caderneta identificada sob registro 0363, como objeto pessoal, em ficha catalográfica do acervo do Museu Casa de Benjamin Constant, em Santa Teresa / Rio de Janeiro / RJ. A peça foi doada à instituição em 1982, por Benjamin Constant Magalhães Fraenkel. Dimensões: 88mm x 131mm; espessura: 8mm.

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Estas páginas foram escritas unicamente para a senhora. Vazei nelas toda a minha alma para lhe transmitir um perfume da mulher sublime que passou na minha vida como sonho fugace. Creio que não o consegui; por isso, fecho aqui alguns fios da trança de cabelos, que cortei no momento de dizer o último adeus à sua imagem querida.

Há nos cabelos da pessoa que se ama não sei que fluido misterioso, que se comunica com o nosso espírito. A senhora há de amar Lúcia, tenho certeza; talvez, pois, aquela relíquia, ainda impregnada de seiva e fragrância da caricatura angélica, lhe revele o que eu não pude exprimir. (José de Alencar, Lucíola, 1862)46

Adornos pessoais, mementos e quadros feitos com cabelos, foram encomendados,

importados, copiados, vendidos, usados e compreendidos pela boa sociedade oitocentista

brasileira como valiosos objetos de afetividade e saudade. Dialogaram com hábitos locais,

que os aceitaram como legítimos, e os significados a eles atribuídos fizeram sentido.

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