trabalho lit bra i arcadismo

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS DEPARTAMENTO DE LÍNGUA E LITERATURA PORTUGUESA LITERATURA BRASILEIRA I AMANDA COSTA DE OLIVEIRA MICHELE RAIMUNDA PANTOJA ARCADISMO Lira XIV Minha bela Marília, tudo passa; A sorte deste mundo é mal segura; Se vem depois dos males a ventura, Vem depois dos prazeres a desgraça. Estão os mesmos Deuses Sujeitos ao poder ímpio Fado: Apolo já fugiu do Céu brilhante, Já foi Pastor de gado. A devorante mão da negra Morte Acaba de roubar o bem, que temos; Até na triste campa não podemos Zombar do braço da inconstante sorte. Qual fica no sepulcro, Que seus avós ergueram, descansado; Qual no campo, e lhe arranca os brancos ossos Ferro do torto arado. Ah! enquanto os Destinos impiedosos Não voltam contra nós a face irada, Façamos, sim façamos, doce amada, Os nossos breves dias mais ditosos. Um coração, que frouxo A grata posse de seu bem difere, A si, Marília, a si próprio rouba, E a si próprio fere.

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Page 1: Trabalho Lit Bra I Arcadismo

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONASINSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS

DEPARTAMENTO DE LÍNGUA E LITERATURA PORTUGUESALITERATURA BRASILEIRA I

AMANDA COSTA DE OLIVEIRAMICHELE

RAIMUNDA PANTOJA

ARCADISMO

Lira XIV

Minha bela Marília, tudo passa;A sorte deste mundo é mal segura;Se vem depois dos males a ventura,Vem depois dos prazeres a desgraça.

Estão os mesmos DeusesSujeitos ao poder ímpio Fado:Apolo já fugiu do Céu brilhante,

Já foi Pastor de gado.

A devorante mão da negra MorteAcaba de roubar o bem, que temos;Até na triste campa não podemosZombar do braço da inconstante sorte.

Qual fica no sepulcro,Que seus avós ergueram, descansado;Qual no campo, e lhe arranca os brancos ossos

Ferro do torto arado.

Ah! enquanto os Destinos impiedososNão voltam contra nós a face irada,Façamos, sim façamos, doce amada,Os nossos breves dias mais ditosos.

Um coração, que frouxoA grata posse de seu bem difere,A si, Marília, a si próprio rouba,

E a si próprio fere.

Ornemos nossas testas com as flores.E façamos de feno um brando leito,Prendamo -nos, Marília, em laço estreito,Gozemos do prazer de sãos Amores.

Sobre as nossas cabeças,Sem que o possam deter, o tempo corre;E para nós o tempo, que se passa,

Também, Marília, morre.

Com os anos, Marília, o gosto falta,E se entorpece o corpo já cansado;triste o velho cordeiro está deitado,e o leve filho sempre alegre salta.

A mesma formosuraÉ dote, que só goza a mocidade:Rugam-se as faces, o cabelo alveja,

Mal chega a longa idade.

Que havemos de esperar, Marília bela?Que vão passando os florescentes dias?As glórias, que vêm tarde, já vêm frias;E pode enfim mudar-se a nossa estrela.

Ah! Não, minha Marília,Aproveite-se o tempo, antes que façaO estrago de roubar ao corpo as forças

E ao semblante a graça.

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GONZAGA, Tomás Antônio. Marília de Dirceu.

Sobre este 1º poema, responda:

1. O carpe diem é um lugar comum da literatura clássica e uma das convenções temáticas do Neoclassicismo. Por que podemos, apesar disso, entender a lira XIV como um poema confessional, isto é, que exprime os sentimentos do poeta?

Devido à ansiedade do eu lírico em se “prender em laço estreito” podemos ver um homem preocupado com o passar do tempo e com argumentos dignos de alguém experiente. Assim podemos retratar um homem de meia idade apaixonado por Marília, uma adolescente na flor da vida.

Há um momento no qual podemos constatar uma certa malícia e um erotismo negaceados. É um dos poucos momentos de emoção genuína: o poeta lembra o tempo que passa, que com os anos os corpos se entorpecem, e diz à Marília:

“Ornemos nossas testas com as flores.E façamos de feno um brando leito,Prendamo -nos, Marília, em laço estreito,Gozemos do prazer de sãos Amores.”

2. Explique o tema do carpe diem no poema. Comprove com passagens do texto.

Nesta lira, é possível perceber a presença do carpe diem. Aqui a ideia de aproveitar o tempo, de não deixar que os dias se passem sem que a vida seja aproveitada faz com o pastor convide sua amada Marília para que, ambos, gozem juntos o prazer que a juventude lhes concede.

"Minha bela Marília, tudo passa;A sorte deste mundo é mal segura;Se vem depois dos males a ventura,Vem depois dos prazeres a desgraça"

Nos versos acima, percebe-se que o eu lírico está mostrando à Marília a efemeridade do tempo, visto que “tudo passa”, e que se por um lado, pela sorte, depois de um mal vem um bem, talvez pela mesma sorte possa ocorrer o oposto e isso não se pode prever ou controlar, é “mal segura”.

"Prendamo-nos, Marília, em laço estreito,Gozemos do prazer de sãos Amores.Sobre as nossas cabeças,Sem que o possam deter, o tempo corre;E para nós o tempo, que se passa,Também, Marília, morre."

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Mais uma vez ele fala sobre o tempo e que este “corre” e apela para que se unam em “laço estreito”. Não deseja mais “esperar”, deseja os “florescentes dias”, como mostra os versos a seguir:

"Que havemos de esperar, Marília bela?Que vão passando os florescentes dias?As glórias, que vêm tarde, já vêm frias;E pode enfim mudar-se a nossa estrela.Ah! Não, minha Marília,

E mais ainda podemos ver o “aproveite o dia, o presente momento” (carpe diem) nos versos que se seguem:

Aproveite-se o tempo, antes que façaO estrago de roubar ao corpo as forçasE ao semblante a graça. ”

3. Considere agora esta ode de Ricardo Reis (heterônimo de Fernando pessoa) e o 1º poema, de Tomás Antônio Gonzaga. A seguir, responda:

Quando, Lídia, vier o nosso outono Com o inverno que há nele, reservemos Um pensamento, não para a futura Primavera, que é de outrem, Nem para o estio, de quem somos mortos, Senão para o que fica do que passa O amarelo atual que as folhas vivem E as torna diferentes.

a) Em que consiste a “filosofia de vida” que a passagem do tempo sugere ao eu lírico do poema de Tomás Antônio Gonzaga?

A passagem do tempo no poema de Tomás Antônio Gonzaga sugere ao eu lírico a ideia de aproveitar o tempo, de não deixar que os dias se passem sem que a vida seja aproveitada pois a sorte que “é mal segura” pode mudar a qualquer momento podendo não voltar ao que está sendo vivido visto que, “com os anos o corpo já cansado se entorpece”.

b) No 2º poema, em que sentido Ricardo Reis utiliza a metáfora “outono”?

Neste poema, Ricardo Reis associa a passagem do tempo às estações do ano. A primavera, que é caracterizada como a sua própria juventude vivida agora pelo eu lírico, torna então o outono o tempo futuro, pois é a estação seguinte à primavera, é quando as folhas murcham, ou seja, é quando a idade avança pois a juventude, a primavera, já passou.

c) Os dois poetas valorizam o momento presente, embora o façam de modo diferente. Em que consiste essa diferença?

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A diferença entre os poemas de Tomás Antônio Gonzaga na Lira XIV e a ode acima citada de Ricardo Reis em relação à valorização do momento presente, o carpe diem, se dá pela argumentação presente na Lira de Gonzaga, gerada a todo momento em seus versos, argumentação esta que não percebemos na ode de Reis pois valoriza-o de maneira impassível, com a frieza de quem aceita a condição do efêmero como dado imutável e, diante desse fato, não esboça ações de efetiva fruição do instante, o carpe diem neste poema nada mais é que o reconhecimento de que o instante é o que se realiza como vida.

4. O filme “A missão” é uma releitura da obra Uruguaia. Faça um comentário sobre o filme enfocando o olhar do colonizador sobre o colonizado.

A chegada dos jesuítas na tribo indígena, apesar de uma inicial resistência de alguns índios, fez com que os mesmos começassem a ser doutrinados, os índios passaram a adorar a cruz e assistir a missa, passaram a ser conduzidos, pela moral da religião católica, religião essa que moldava os índios à cultura européia.

Ao tirarem os índios de seu habitat natural e levá-los para a civilização européia, aqueles eram vestidos de acordo com a cultura própria da região. Quando, nos seus afazeres de escravos, os modos de agradecimento e a obediência incondicional aos seus donos, demonstra a idéia que estes homens tinham sobre os índios. Na cena em que a pequenina índia conta para o clero e o Estado diz que aquela criatura é um animal, e que um animal pode ser treinado para contar.

O clímax se faz presente nas cenas finais do filme, com a chacina da respectiva tribo por ela não ter se submetido às ordens do clero por pressão do Estado.

O final do século XV e início do XVI é o período em que a Europa começa a se questionar sobre quem habita o outro lado do mundo. É a época das grandes navegações, das grandes "descobertas". As missões religiosas provenientes do Velho Mundo fazem parte deste contexto histórico e de uma visão européia ainda bastante etnocêntrica. Acho importante ressaltar aqui essas características para uma melhor compreensão do papel dos jesuítas na disputa econômica que estava em jogo, embora fundamentalmente sua função principal fosse a evangelização. Seu objetivo, sua MISSÃO era propagar a fé cristã, catequizando os índios; para tal, aprendiam suas línguas, criavam escolas e desenvolviam as artes, especialmente a música e o teatro. É interessante pensar no papel dos jesuítas na colonização brasileira, por exemplo. Eles construíram estradas, atuaram no ensino, nas artes, na medicina, na agricultura. Foram perseguidos e participaram diretamente dos conflitos, tanto com os colonos que queriam escravizar os índios quanto (na parte final do filme) com o poder político representado pela figura do Marquês de Pombal - primeiro-ministro do Rei D. José de Portugal -, que tomou medidas drásticas contra a Companhia de Jesus. Pombal conseguiu a expulsão dos jesuítas de Portugal e de suas colônias em 1759. Mais tarde, em 1773, fez com que a instituição religiosa fosse extinta pelo Papa Clemente XIV. O filme conta a história da disputa entre espanhóis e portugueses pelo território onde se localizam as missões jesuítas.

Padre Gabriel está do lado dos índios, contra os mercenários, mas se opõe à força e à violência, opção de Dom Rodrigo. Diferentemente dos colonos que veem os nativos como inferiores e os qualificam como não humanos, sem alma e, consequentemente,

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passíveis de escravização. Portanto, se opõem radicalmente aos missionários, em seu objetivo de salvar almas e conquistar adeptos para a fé cristã. O título do filme aponta para duas acepções da palavra missão. Em primeiro lugar este conceito estaria estritamente relacionado à instituição missionária jesuíta, cujo objetivo era propagar a religião cristã; em segundo lugar, à idéia de função, que aponta para a possibilidade de interferência dos padres missionários na realidade, particularmente na defesa dos índios.