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Toxicologia do Mercúrio José Tarcísio Penteado Buschinelli

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Page 1: Toxicologia do Mercúrio · Mercúrio: formas químicas •Metálico: Hg0 •Iônico: Hg+ •Orgânico: R – Hg Toxicocinética e toxicodinâmica completamente diferentes entre cada

Toxicologia do Mercúrio

José Tarcísio Penteado Buschinelli

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Mercúrio: formas químicas

• Metálico: Hg0

• Iônico: Hg+

• Orgânico: R – Hg

Toxicocinética e toxicodinâmica completamente diferentes entre cada forma

Este fato não é válido só para o mercúrio. Sempre deve-se saber que forma de metal se está focando

Que chumbo? Que arsênico? Que cromo? etc.

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Mercúrio: formas químicas e efeitos principais • Metálico Hg0 : Efeitos neurotóxicos centrais (perda de memória,

tremor, distúrbios de humor) e muito leves (teóricos) nos rins. (Hidrarigirismo e micromercurialismo)

• Iônico Hg+ : Efeitos renais importantes e leves (teóricos) em SNC. No passado sais de mercúrio foram usados como diuréticos e alguns eram era usados EV.

• Orgânico R–Hg : Efeitos neuróticos centrais (surdez, cegueira) e periféricos (paralisias e perda de sensibilidade), e teratogênese. (Doença de Minamata)

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Mercúrio metálico (Hg0 CAS 7439-97-6)

• Líquido volátil a temperatura ambiente. (Ponto de fusão: -39 C Ponto de ebulição: 356 C)

• Absorção por pele e pulmão ( cerca de 80% do inalado é absorvido) mas não há absorção pelo TGI (<0,01%)

• Como não tem carga elétrica tem distribuição fácil no corpo e penetra no SNC.

• É oxidado a Hg+ ou Hg+2 pela catalase e excretado principalmente pela urina, e ainda pelas fezes e um pouco pelo suor

• O t1/2 biológico é complexo, mas quase tudo Hg0 absorvido é eliminado em 2 meses, mas no SNC permanece por mais tempo (2 anos?)

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Mercúrio metálico: Efeitos sub-agudos

• Em concentrações muito elevadas (800-900 µg/m3 ) causa pneumonite química com elevada mortalidade.

• Em concentrações menores pode ocorrer quadros irritativos de vias aéreas e na sequência ocorre um quadro que envolve o SNC com tremores e fasciculações musculares, alterações de comportamento, e ainda um quadro renal com hematúria e oligúria, que pode evoluir para insuficiência renal por necrose tubular proximal.

• O afastamento da exposição, em geral, reverte o quadro.

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Mercúrio metálico: Efeitos crônicos

• A exposição a baixas concentrações causa efeitos em SNC

• Quadro inicial: Micromercurialismo: quadro astênico-vegetativo pouco específico como fraqueza, cansaço fácil, anorexia, perda de peso, e alterações neurocomportamentais. Se a exposição é a concentrações relativamente baixas (30-80 µg/m3) este quadro se mantém indefinidamente, até o afastamento da exposição e geralmente há melhora após o afastamento

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Mercúrio metálico: Efeitos crônicos

• Se a exposição é maior (> 100 µg/m3) pode ocorrer evolução para o Hidrargirismo (ou Mercurialismo), que é caracterizado por alterações de humor caracterizados por irritabilidade, agitação, tremores, perda da memória recente, insônia e depressão. Em casos graves pode aparecer alucinações e delírios.

• O tremor é fino, desaparece durante o sono e é interrompido periodicamente com o aparecimento de um movimento grosseiro e descontrolado (“hatter’s shakes”). O afastamento da exposição não reverte totalmente os danos ao SNC, podendo haver alguma melhora, mas casos graves e com longa exposição geralmente não apresentam melhora significativa.

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Mercúrio metálico: Efeitos crônicos

• Pode aparecer ainda neuropatia periférica sensitiva, com parestesias de extremidades, gengivite frequentemente acompanhada com perda de dentes. Estas alterações geralmente desaparecem poucas semanas após o afastamento da exposição.

• Na intoxicação crônica por Hg0 não são observadas lesões em outros órgãos, como rins.

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Mercúrio iônico (sais e óxidos)

Exemplos:

• cloreto mercúrico (HgCl2 CAS 7487-94-7),

• cloreto mercuroso ou calomelano (Hg2Cl2 CAS 10112-91-1)

• nitrato mercúrico ou nitrato de mercúrio II (Hg(NO3)2 CAS 10045-94-0)

• óxido mercúrico ou óxido de mercúrio II (HgO CAS 21908-53-2)

A absorção é basicamente pelo TGI (pele e pulmões são desprezíveis)

A excreção é principalmente por via renal

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Mercúrio iônico (sais e óxidos) • A intoxicação aguda por compostos inorgânicos de Hg geralmente é por

ingestão acidental ou tentativa de suicídio. A dose única de 1 grama ingerida de uma vez é geralmente fatal. Leva a diarreia intensa com sangue e IRA.

• A intoxicação crônica ocupacional por compostos inorgânicos de mercúrio é rara. O mais comum é a exposição simultânea ao mercúrio metálico em forma de vapor e ao composto inorgânico em processos industriais, e neste caso, o principal problema é o Hg0

• Uma dermatite grave (acrodímia) é causada por compostos inorgânicos de mercúrio. É caracterizada por inchaço doloroso e vermelhidão nas palmas das mãos e nas plantas dos pés, mas foi mais observada em crianças tratadas com medicamentos a base de mercuriais no passado.

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Mercúrio orgânico • Os mais importantes são os alquilmercúrios.

• Hg ligados covalentemente a grupos alquil, como metil ou etil. O metilmercúrio (CH3-Hg+ ou MeHg CAS 22967-92-6)

• Importante citar que enquanto o metilmercúrio é um cátion com carga positiva que está sempre ligado em um ânion (nitrato, cloreto, etc.) e forma cristais pouco solúveis em água e solúveis em lipídeos, o dimetilmercúrio ((CH3)2Hg CAS 593-75-8) é um liquido volátil e rapidamente absorvido através da pele e depois é demetilado no organismo formando metilmercúrio.

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Mercúrio orgânico: alquilmercúrios • São absorvidos por TGI, pulmão e pele

• Causa perda de visão, audição e equilíbrio, paralisia e perda de sensibilidade. Também causa graves malformações em fetos, principalmente em SNC.

• É denominada de “Doença de Minamata”, que surgiu no Japão na baia de mesmo nome nos anos 50, por poluição da água por MeHg lançado por uma indústria química. (suicídio dos gatos)

• Por vários anos foi uma doença misteriosa (Kybio) . Sir Donald Hunter, médico inspetor da fábricas da Inglaterra ajudou a elucidar o caso.

• Outras epidemias como a Iraque nos anos 60 por sementes tratadas com MeHg como fungicidas.

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Bibliografia • ACGIH. Mercury BEI. In: ______. TLVs and BEIs with 7th edition documentation. Cincinnatti, c2017. 1

CD-ROM.

• BAXTER P. J., IGISU H. Mercury. In Baxter P. J., Aw Tar-Ching, Cockcroft A. , Durrington P. , and Harrington J. M.. In: Hunter’s Diseases of Occupations. Tenth edition. Hodder Arnold and Hachet UK Company Edição Vitalsouce. Part two: Metals. C. 2010 Chapter 26. Eletronic book.

• BERLIN M., ZALUPS R., FOWLER B., Mercury. In: Nordberg G. Fowler B., Nordberg M. (Ed.) The Handbook on the Toxicology of Metals. Forth edition. Vol II Especific Metals. Elservier C. 2015 Chapter 46

• SOLEO L., D´ERICO M.N., LOVREGLIO P.. Metalli – Mercurio. In: Alessio L., Franco G., Tomei F. (Ed.). Trattato di Medicina del Lavoro. Piccin Ed. Padova Vol II c. 2015 Capitolo 67

• TOKAR E., BOYD W., FREEDMAN J.H., WAALKERS M.P. Toxic Effects of Metals In: Klaassen, Curtis. Casarett & Doull's Toxicology: The Basic Science of Poisons, Eighth Edition McGraw-Hill Education. Edição do Kindle. . History and Scope of Toxicology. In: KLAASSEN, C. D. (Ed.). Casarett and Doull´s toxicology: the basic science of poisons. New York: Mc Graw Hill, c2013.p Chapter 23. Electronic book.

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Caso 2017 • BVL, 23 anos, masculino, branco, solteiro, natural de Sombrio-SC,

ensino fundamental incompleto. Atendimento Santa Casa-SP 27/07/2017 (paciente acompanhado pela Tia).

• Trabalhou por 1 ano como ajudante de serviços gerais em uma recicladora e costumava quebrar lâmpadas fluorescentes (com marreta em local improvisado) para vender os cacos para indústria cerâmica

• Quebrava cerca 1.000 lâmpadas por dia, mas não era uma atividade diária

• Em maio/16 apareceu um grande estoque de lâmpadas fluorescentes para ser quebrado e começou a quebrar cerca de 4.000 lâmpadas por dia em hora extra (18 as 21 horas)

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Caso 2017 • Em 07/16 começou a teve episódio de hematúria. Após algumas

semans começou a ter depressão, ideias suicidas, alucinações visuais (via o demônio, sic), desatenção, labilidade emocional, inapetência (perdeu cerca de 10 Kg em 3-4 meses).

• Nega que tenha tido alterações de SNP, como perda de força, sensibilidade ou parestesias.

• A Tia, que é professora, o levou a médicos da região que o afastaram do trabalho e emitiram CAT por Hidrargismo.

• Encontrou um empresário do ramo no RS que orientou a procurar o nosso serviço

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Caso 2017 Exames:

• Em nov 2016 (após afastamento de 3 meses) – Hg-S de 39,4 g/L (normal até 10 g/L, mas não é usado em toxicologia por sua baixa meia vida e inúmeros interferentes, inclusive dieta)

• Em dez 2016 – Proteinúria

• Em jan 2017 – Hg-S 11,7 g/L

- Hg-U 270,3 g/g.creat. ( IBMP 35 g/g.creat. e BEI ACGIH 20 g/g.creat. )

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Caso 2017 • Objetivo a consulta saber se o paciente está bem e não apresentará

problemas no futuro.

• Paciente relata que está bem nos últimos meses, que todos os sintomas desapareçam.

• Exame clínico (incluindo neurológico detalhado) normal

• Exames laboratoriais, inclusive renais, normais

• Conduta:

1. Tranquilizar o doente e a família

2. Denuncia formal da empresa aos órgãos de fiscalização de trabalho e meio ambiente do estado.

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À disposição para perguntas

José Tarcísio Penteado Buschinelli