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Esse PDF é uma degustação da publicação

Tomos Fantásticos: Fantasia Medieval e Heroica

Editora 9Bravos

www.9bravos.com.br

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© 2014 by Ana Cristina Rodrigues, Ana Lucia Merege, Carol Chiovatto, Elsen Pontual, Bruno Leandro, Gian Danton, Lucas Fernando Maziero, Andre Zan-ki Cordenonsi, Alícia Azevedo, Pedro Caldeira, David Barreto, Arthur Lima e Sávio Roz.

Todos os direitos reservados à 9Bravos.

1 edição, 2014.

Edição: Ricardo S. AndradeDiagramação: Página 42/Marcelo AmadoIlustração de capa: Davi Sales – www.davisales.com.brLayout de capa: Kelly Adriano – www.kellyadriano.comRevisão parcial: Arthur Ferreira Jr.’.

Editor responsável: Ricardo S. Andrade

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Tomos fantásticos : fantasia medieval e heroica / organizado por Ricardo Sodré Andrade. – Salvador : 9Bravos, 2014. – (Tomos fantásticos, 1)

Vários autores.ISBN: 978-85-67178-03-5

1. Contos brasileiros I. Andrade, Ricardo Sodré CDD 869.93

Índice para catálogo sistemático: 1. Contos : Literatura brasileira 869.93

Todos os direitos reservados. A reprodução não autorizada desta publi-cação, por qualquer meio, seja total ou parcial, constitui violação da Lei 9.610/98.

9BravosCaixa Postal 10537CEP: 40170-970 - Salvador - BA - Brasil [email protected] | www.9bravos.com.br

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CONTOS

A SERPENTE E AS POMBAS Ana Lúcia Merege

A CIDADE NO FIM DE TUDOAna Cristina Rodrigues

TIRANOCarol Chiovatto

A BALADA DE WARENElsen Pontual

ALIANÇA IMPROVÁVELBruno Leandro

O CORAÇÃO NEGROGian Danton

NOBRE SACRIFÍCIOLucas Fernando Maziero

O MORRO DA GRUTA SUSSURANTEAndre Zanki Cordenonsi

HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

UMA CANÇÃO DO VELHO BARDOPedro Caldeira, David Barreto e Arthur Lima

OS GUERREIROS JACTANCIOSOSSávio Roz

CONTO BONUSAntecede o romance sobre o universo

de Alluim e a Ordem do Dragão

A ASSASSINA DO REINO DE GELO Alícia Azevedo

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Ana Lúcia Merege é carioca e vive em Niterói - RJ. É autora da série de fantasia “O Castelo das Águias” (Editora Draco), dos romances juvenis Pão e Arte (Editora Escrita Fina) e O Caçador (Franco Editora) e do ensaio Os Contos de Fadas (Editora Clari-dade), além de contos e artigos. Concilia a atividade literária com seu trabalho na Biblioteca Nacional, pesquisas sobre Mitologia, Li-teratura e História.

Para conhecer a autora e seu trabalho acesse http://www.estantemagica.blogspot.com ou escreva para [email protected]

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I

No ano do Senhor de 797, às vésperas do equinócio de primavera, uma nuvem escura pairou sobre a aldeia de Aachen. Momen-tos antes o céu estava azul, por isso a surpresa foi grande, principalmente na praça onde os mercadores recolhiam as sobras da feira. Todos levan-taram as cabeças e viram, mas não puderam entender o fenômeno: uma nuvem surgida do nada, que se alongava como um caminho desenhado no céu. Terminava a alguns passos da igreja, da qual, naquele momento, vinha saindo um jovem padre carregado de rolos de pergaminho.

– Chuva, hoje? Será? – murmurou ele, erguendo os olhos distraí-dos. Logo, porém, tornou a baixá-los, passando a observar um cavaleiro que se aproximava a passo lento, o rosto ensombrado pela aba do chapéu de viagem.

– Paz, em nome de Deus. – A saudação latina, familiar a todos os cristãos.

– A paz esteja com você, bom padre – disse o homem, e puxou as rédeas. Sua voz era rouca, talvez por causa da poeira das estradas. O acento não era germânico, mas nesses dias isso estava longe de ser uma surpresa. Eram muitos os estrangeiros em Aachen.

– De onde vem? – indagou o padre. O cavaleiro respondeu com um gesto vago. Talvez quisesse dizer que estivera em muitos lugares antes de chegar ali. De fato, seu rosto era o de um homem viajado, marcado pelo sol e pelo vento e com olhos argutos que esquadrinhavam cada centímetro da pequena praça. As roupas eram boas, embora sem luxo; a espada presa à sela tinha uma bainha magnífica, de couro avermelhado, trabalhado com gravações a fogo. Isso fazia um estranho contraste com o cesto de palha trançada que o cavaleiro levava à sua frente. Ele manti-nha a mão sobre a tampa, mesmo enquanto parado, como se a proteges-se – como se algo frágil e muito precioso, viajasse naquele cesto rústico.

Sob a nuvem, a praça estava quase vazia, exceto por um homem que puxava uma carroça abarrotada de pranchas de madeira. Tinha as roupas cobertas de serragem, lascas encaracoladas entre os cabelos. O cavaleiro

a serpente e as pombas | 9

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Ana Cristina Rodrigues é escritora e historiadora. Trabalha na Biblioteca Nacional, entre livros, gente e algumas (poucas, feliz-mente) traças. Gosta de histórias movimentadas e com ironia, mas também aprecia histórias calmas e reflexivas.

Mora em Niterói com a família, que inclui um filho e um número variável de animais. Já publicou em revistas, zines e coletâneas tan-to no Brasil quanto internacionalmente, e reuniu algumas dessas histórias em “AnaCrônicas – Pequenos Contos Mágicos” (2009). Atualmente, além de viver num minizoo, coordena a Fábrica dos Sonhos, é editora da Llyr Editorial, finaliza “Escrevi meu livro, e agora?”, a sair pela Editora Estronho, e tenta finalizar seu primeiro romance.

Também mantém um blog que pode ser acessado emhttp://talkativebookworm.wordpress.com

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Sabia que estava perdida. De resto, sua mente era um es-paço em branco. Não lembrava do seu nome ou de quem era, por mais que tentasse.

Talvez pensasse melhor fora daquele sol escaldante e foi essa ideia que a fez se levantar, gemendo com o incômodo do corpo dormente. Devia estar ali deitada por muito tempo para os músculos reclamarem tanto. Bateu as mãos na roupa, coberta de uma poeira fina, quase uma areia. Esticou-se para estalar as costas e pesquisou seus arredores, procu-rando por uma sombra, um abrigo do brilho que fazia os olhos arderem. O lugar, como tudo o mais, não lhe era familiar. Mas como até a própria pele lhe parecia estranha, poderia estar na porta de casa sem saber.

Um grande descampado coberto de grama surgia até quase o ho-rizonte, onde era interrompido por uma série de colinas suaves. Nada se movia por ali, não havia pássaros ou outros animais e nenhuma brisa mexia as hastes das plantas rasteiras. E o principal para ela, sem árvores ou qualquer outra proteção.

Sem muitas esperanças, virou de costas e ficou surpresa. A cena era tão diferente que parecia estar a quilômetros de distância. A sua frente descortinava-se um deserto, com dunas gigantescas que se mo-viam em um balé disforme ao sabor de um vento terrível. Ao fundo, montanhas gigantescas erguiam-se, sombras negras contra um hori-zonte acinzentado.

Agora, além de saber que estava perdida, tinha a consciência de ter uma grande decisão em seus ombros. Confusa, olhou para baixo e reparou que estava justamente em um limiar, na divisão entre a grama e a areia, a campina e o deserto, o horizonte das colinas e as montanhas negras. Suspirou e fechou os olhos, tonta com aquele o torvelinho do vento na areia e com a tempestade em sua mente. Não podia ficar ali parada, precisava tomar um caminho, fazer alguma coisa.

Quando voltou a encarar o mundo, um detalhe prendeu a sua atenção. Nas bordas do deserto, uns poucos metros de onde estava, havia uma árvore. O calor insuportável já a fizera suar. A pele ardia e um zumbido anunciava uma imensa dor de cabeça. Sem mais hesitar ou refletir, tomou a direção da

a cidade no fim de tudo | 35

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Carol Chiovatto nasceu em Niterói, Rio de Janeiro, mas foi criada em São Paulo. Publicitária e apaixonada pelo universo da literatura insólita, está entre os autores das coletâneas a serem pu-blicadas Caçadores de Bruxas, da Editora Buriti, com “A Última Feiticeira de Florença” e Livros, da Editora Estronho, com “Todo Poder Emana... de Onde?”.

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Não havia uma pessoa sequer em toda a vastidão de seu Reino que o amasse. O povo o temia, e o rei sabia disso – adorava isso. Suportava sua rotina insossa apenas pelo momento de andar a ca-valo pelo Reino, pela sensação de poder que lhe subia a espinha quando um aldeão desviava o olhar; uma mãe escondia os filhos.

Fitou-se no espelho de prata, mirando os olhos mortos do reflexo, palidamente azuis, sem nenhum brilho. Havia decidido cavalgar pelo Reino naquele dia, mas caíra uma daquelas tempestades de verão que destrói colheitas inteiras. Sorriu – uma expressão vazia que não tocava seus olhos – ao imaginar os súditos arrastando o que sobrara de suas comidas magras; a implorar para que não lhes tomasse um dos filhos como escravo.

Pelo espelho, viu a serva abrir a porta quietamente, e fitou-a através do reflexo. A jovem não ergueu o olhar, mas sabia estar sendo observada. Em verdade, a julgar por sua expressão atormentada, esperava o pior de seu chamado. O rei suspirou, afastou uma mecha dos cabelos negros dos olhos, e virou-se para encarar a moça de frente, atentando aos ombros encolhidos, quase como se quisesse se defender de um golpe de espada.

– Quantos anos você tem, Gadelha? – Sua voz soou, como sempre, como milhares de estacas afiadas.

Lágrimas encheram os olhos da menina, que se encolheu mais e respondeu, num sopro:

– C-catorze, senhor.Considerou sua forma fina um minuto ou dois, e virou-lhe as cos-

tas outra vez.– Sua servidão acabou. Volte para a casa de seu pai.Pelo espelho, viu os olhos amendoados arregalarem-se, e enche-

rem-se de lágrimas outra vez. Será que ela falaria? Ele sabia que seu pai havia morrido e a garota não tinha para onde voltar.

– S-senhor, obrigada! – e refreou o impulso de agradecer mais, para não correr o risco de desagradá-lo. Sabia-se em todo o Reino que seu humor assemelhava-se a uma mistura volátil.

tirano | 59

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Elsen Pontual. Pernambucano de Olinda, 30 anos, servidor pú-blico e contador de estórias por vocação. Membro convidado do site airmandade.net, onde publica online. Tem no fantástico e insólito seus mais fiéis companheiros e acredita que a arte de contar estórias é o que nos faz humanos. Alguns de seus contos podem ser encon-trados na antologia Dragões da editora Draco; Contos de Oficina da editora Bagaço e no ebook Contos Fantásticos - Desafios Lite-rários.

Twitter: @ElsenPontualSite: www.outraestoria.blogspot.com

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I

Dentre os inúmeros feitos que as palavras são capazes de realizar, talvez o mais triste de todos seja o quebrar de uma promessa. É por isso, meu amigo, que não encontro alegria no relato que escrevo, mas sinto conforto na certeza de que se há alguém no mundo capaz de me perdoar, esse será você.

Então, que todos ouçam meu conselho e abram seus corações, pois nessa era de penúria e sofrimento, onde a mentira caminha viva e a jus-tiça é cega, surda e morta, a verdade pura e inviolada é algo que deve ser saboreado como a mais fina das iguarias.

II

Minha mente fervilhava de curiosidade quando me aproximei da clareira. O bilhete misterioso trazia apenas informações sobre a hora e o local da reunião, omitindo qualquer detalhe de sua natureza. Para melhorar, fechava com a promessa de tesouros e recompensas além da imaginação.

Confesso que ao chegar, fiquei um pouco decepcionado. Não sei ao certo o que esperava encontrar, mas o círculo verdejante, tenuamente aquecido pelo sol de fim de tarde, não me parecia nada grandioso. Apenas uma larga porção de grama com um enorme menir tombado no centro.

A luz que definhava juntamente com a tarde conferia às árvores certo ar espectral e o silêncio que antecede o anoitecer começava a ser quebrado pelo despertar das aves e feras notívagas, mas nada disso esta-va sequer perto do cenário fantástico que o bilhete insinuara. Talvez eu houvesse chegado cedo demais.

A mensagem era clara ao marcar o início da reunião para os pri-meiros raios de luar e ainda faltava algum tempo para o anoitecer. No entanto, eu não conhecia bem aquelas matas e não queria correr o risco de me atrasar, portanto resolvi antecipar minha chegada.

a balada de waren | 77

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Bruno Leandro [da Costa Coelho Rocha] nasceu em 01/02/1983 no Rio de Janeiro, cidade maravilhosa e capital do estado de mesmo nome. É estudante de Letras - Inglês/Literaturas pela UERJ e mo-nitor da Sociedade Brasileira de Cultura Inglesa.

Mantém um espaço online para seus contos, crônicas e fluxos de pensamento em http://www.blogdobrunoleandro.blogspot.com.br, mas, esse conto é sua publicação de estreia por uma editora.

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I

Ragart tirou uma flecha da aljava e aprontou seu arco. Estava feliz, pois era sua primeira vez nas grandes caçadas. A caça, é claro, eram os ogros. O jovem elfo sentia que aquele seria o melhor dia de sua vida.

A “caçada”, se é que podia ser realmente assim chamada, era na ver-dade um embate entre forças opostas, um confronto entre dois lados da natureza que julgavam estar certos. Os elfos, donos de sabedoria, beleza e compaixão inigualável pelas criaturas, enfrentavam os ogros, seres julgados por eles maquiavélicos, horrendos e covardes, em uma escaramuça física e de vontades, não apenas para eliminá-los das regiões onde a paz deveria reinar, mas, também para fazer com que vissem seus erros e deles se arre-pendessem, se tal coisa fosse possível. Por outro lado, os ogros julgavam-se fortes, corajosos e destemidos, e não admitiam dividir seu espaço com o que era fraco, assim como não entendiam as noções de honra e nobreza que os outros seres tinham em alta conta. Para eles, o que valia era olhar adiante, sem uma vez sequer se dobrar aos sentimentos e emoções alheios.

Ragart ainda era jovem para os padrões de sua raça e nada conhecia do mundo fora da floresta, mas sua habilidade com as armas era notória e, estando na idade da Passagem, quando seria reconhecido como um elfo adulto e protetor de sua tribo, tinha direito a passar por um dos testes de maioridade. A caçada havia sido sua escolha, pois, como os irmãos e irmãs de seu povo, achava que os ogros precisavam ser detidos em suas maldades.

Assim que tudo estava pronto, Ragart saiu de sua morada, cons-truída no alto das árvores da Floresta dos Cinco Sentidos e, descendo por uma corda, foi encontrar-se com os companheiros de jornada. Além do arco e das flechas, ele também trazia uma adaga e uma espada à cin-tura, para caso a luta se tornasse mais física. As lâminas élficas tinham sua própria magia, feita para encontrar e destruir o mal e sua magia duraria enquanto seus donos estivessem vivos. Sua manopla esquerda, de superfície circular, fazia as vezes de escudo.

a aliança improvável | 105

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Gian Danton (pseudônimo do professor universitário Ivan Carlo Andrade de Oliveira) é roteirista de quadrinhos desde 1989, ten-do ganhado diversos prêmios na área. Tem participado de diver-sas antologias literárias, entre elas Super-heróis (Draco), Erótica Steampunk (Ornitorrinco) e Fantasiando (Regência). Seu primeiro romance, Galeão, foi publicado em 2013 pela editora 9Bravos.

Seu blog: http://ivancarlo.blogspot.com.br

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O cavaleiro avançou pela floresta escura. O cavalo tro-tava lentamente, assustado, e seus passos ecoavam na mata. Aqui e ali o vento lúgubre dedilhava as folhas das árvores, numa harmonia de mau agouro. A lua cheia avançava por entre a copa das árvores, criando jatos de luz. De tempos em tempos um morcego passava por eles.

Foi quando ouviu. Inicialmente pareceu um choro. Depois o som se tornou mais nítido. Era a voz de uma mulher cantando uma melodia de tristeza e desespero.

O cavaleiro puxou a rédea e aguçou o ouvido até ter noção de onde vinha o som. Só então continuou.

A floresta foi se abrindo aos poucos para revelar um castelo de pedra, no meio do nada. O cavaleiro procurou, mas não encontrou ne-nhum soldado nas seteiras. Havia um fosso em volta, repleto de água e de seres que se debatiam lá embaixo (peixes?), mas a ponte estava abai-xada. Parecia que queriam que ele se aproximasse.

À medida em que avançava, o cântico se tornava mais e mais forte e mais e mais triste. Era, sem dúvida, uma mulher.

O cavalo passou assustado pela ponte. Olhava para baixo, para as coisas escondidas na água escura e relinchava, medroso. Mas o cavaleiro manteve firme a rédea e obrigou-o a ir em frente.

Lá dentro, nenhuma alma viva e nenhum som além dos cascos do cavalo e do lamento feminino que ecoava nas paredes de pedra.

No centro do pátio uma construção destacava-se com portas enor-mes, totalmente abertas. Havia luz ali e era de lá que vinha o canto triste.

Mais uma vez o cavalo recuou, e mais uma vez a mão firme obri-gou-o a ir em frente.

Ao entrar, o cavaleiro teve sua atenção despertada por algo no teto. Era uma gaiola de ferro. Lá dentro, uma mulher de longos cabelos ne-gros e olhos azuis o fitava, triste, e cantava. Suas vestes estavam esfarra-padas e aqui e ali podia-se ver a pele branca. Os pezinhos descalços se destacavam, belos, em meio ao metal frio e escuro. Ela segurava as barras de ferro com as mãos pequenas e alvas.

o coração negro | 121

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Lucas Fernando Maziero nasceu em Mococa, interior de São Paulo. É técnico em eletrotécnica, mas sua verdadeira paixão está nos livros. Não possui publicações anteriores, senão em blogs e sites de contos, e uma singela participação no e-book “Contos Fantásti-cos - Desafios literários” do site A Irmandade.

Mantém um blog chamado Caverna dos Contos cavernadoscontos.blogspot.com.br

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Os primeiros traços da estação invernal já se faziam sen-tir. Ventos frios agitavam os galhos secos e desnudos das árvores, anun-ciando que, dentro em breve, tanto estas como as ruas e telhados seriam polvilhados por uma neve monocromática. Logo as pessoas circulariam com suas vestimentas mais grossas. Tom, acostumado a sentir diaria-mente o bafejar quente da fornalha, usava uma túnica leve de lã, deixan-do à mostra o peito ruborizado pelo esforço de malhar o ferro. Era um contínuo tinir de metal, que ia desde o amanhecer até o ocaso, quando mãos e braços se mostravam exaustos. Apenas o martelo e a bigorna pareciam infatigáveis.

Tom era ferreiro, e naquela manhã cinzenta terminava de forjar um lote de espadas destinadas ao arsenal do castelo real. Seu filho ajudava-o na forjaria, controlando o calor da fornalha. Lá do fundo se ouvia a respi-ração profunda do fole. Quebrando o ritmo daquele trabalho monótono, o som das batidas vigorosas do malho contra o ferro se misturou com as badaladas insistentes dos sinos, vindas da catedral ao longe. Interrom-pendo a malhada, Tom levou o olhar na direção de sua filha pequena, que vinha correndo, chamando-o chorosa:

– Papai, papai...Surgindo também o filho, com um semblante afogueado e triste,

Tom entendeu que o pior aconteceu: sua esposa, Lauren, enfim partira, após um longo tempo de sofrimento e prostração. Temia a chegada da-quele momento, cada dia que passava dava-lhe mais e mais certeza de que não havia como evitá-lo. Tom sentiu-se ainda mais triste ao ver o abalo que a perda da mãe causava em seus filhos. Largando o martelo, abraçou os dois, e assim permaneceram por um tempo, enternecidos.

Entrementes, o dobrar dos sinos continuava, atraindo muitas pes-soas para a catedral. A aglomeração que se formava estava inquieta, e um dos sacristãos chamou a todos para o interior da nave, onde ficariam sabendo quem havia falecido.

No castelo, ao lado do rei, se encontrava o arcebispo, que chegara ao amanhecer para aplicar a extrema-unção à rainha. Ao se dar o faleci-mento de Sua Alteza, o arcebispo ordenou a um de seus assistentes que

nobre sacrifício | 133

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Andre Zanki cordenonsi é um autor gaúcho de fantasia e ação. Professor universitário em Santa Maria, escreve sobre o que lhe passa na cabeça e não o deixa dormir à noite, quando as ideias se derramam no teclado como um trem descarrilado.

É autor da saga Duncan Garibaldi e contista, espalhando fantasia e terror por antologias diversas.

Pode ser contatado no site http://www.duncangaribaldi.com.br

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As ferraduras do cavalo malhado retiniam em um ba-ter arrastado pelas pedras das Montanhas Tempestade, espantando o silêncio obscuro que se espalhava naquela região sem vida. Aqui e ali, uma árvore raquítica ainda exibia seus galhos ressequidos bradando as pontas contra o sol inclemente. Torrões de terra se confundiam com o cascalho da montanha, formando uma trilha perigosa e pouco convida-tiva. Mais do que as lendas e crendices do povo simples das Planícies, provavelmente eram as agruras do caminho que solapavam o avanço dos viajantes, que preferiam contornar a região e se afastar do Morro da Gruta Sussurrante, alcunha que só era proferida sobre o sol aberto e na companhia dos amigos, pois se dizia que trazia má sorte.

Mas o caminho longo que serpenteava por entre as florestas das serras mais baixas não era o destino da montaria suada que subia len-tamente as encostas da montanha; em seu dorso, um homem rude e de aspecto feroz contemplava a terra devastada da montanha com os olhos ressequidos pelos ventos, pela baixa temperatura e pelo sol forte. Cus-pindo no chão, ele esfregou os olhos com as mãos calejadas e voltou a encarar a montanha, procurando incessantemente a entrada da Gruta.

“A Gruta Sussurrante?” – assustaram-se os homens da Vila da Pedrardente, um vilarejo empobrecido, habitado por agricultores esfo-meados e caçadores sem escrúpulos que sobreviviam junto ao sopé da montanha e pagavam tributo ao Barão de Vingolf.

O cavalo malhado esteve ali há três dias e o cavaleiro precisou usar o último berloque de ouro que havia surrupiado do tesouro do pai para extrair alguns nacos de informação entre a população supersticiosa. Le-vara semanas para chegar até o local e precisava alcançar a Gruta o mais rápido possível, mas nenhum daqueles homens maltrapilhos ousara se aproximar da montanha mais do que o estritamente necessário.

– Aquele é um lugar amaldiçoado – resmungou o estalageiro, um homem gordo e de papadas volumosas, cuja voz retumbava como um trovão dentro da choupana emporcalhada onde ele servia uma sopa in-sossa e uma cerveja aguada.

o morro da gruta sussurrante | 147

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Alícia Azevedo nasceu no Rio de Janeiro, mas mora em Petró-polis. É professora, editora e escritora. Já participou de várias an-tologias, entre elas: FCdoB 2008/2009, da ed. Tarja; Insanas, da ed. Estronho; Sagas vol. 2, da ed. Argonautas; Imaginários, da ed. Draco; Caminhos Fantásticos, da ed. Jambô, Caçadores de Vampi-ros, da ed. Buriti...

Alimenta seus devaneios literários, de forma esporádica, através do blog: www.alluim.blogspot.com

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“Sabemos o que somos, mas ignoramos o que podemos nos tornar.” Ato IV, Cena V de Hamlet. W. Shakespeare

IA morte é apenas o começo

Sua alma estava em agonia. Tudo fugia ao seu controle. Talvez nunca tivesse tido o controle real das coisas, mas aquela crença a for-talecia, a tornava mais humana. Tinha medo de perder isso, pois sabia que alguns caminhos não têm volta. Naquela noite mais escura que de costume, seus pensamentos a atormentavam. Olhava o corpo inerte sobre a cama ao seu lado e tentava obter um pequeno vislumbre do seu futuro daquele mo-mento em diante. Será que tudo que amava estava fadado a perecer?

Sentia-se sozinha mais uma vez. Aquele homem ali deitado tinha lhe dado uma perspectiva quando tudo parecia sombrio, e agora ele se foi. Uma dor profunda invadia o seu corpo, mas ninguém mais deveria saber disso. Aquela dor pertencia somente a ela, e a mais ninguém. O ranger da porta a despertou de sua tristeza, e a familiaridade da voz que ouviu acalentou o seu coração.

– Nix, está bem?– Sim.Sua voz soava trôpega. Olhou para o jovem na porta, tentando

ocultar seus sentimentos, mas foi em vão. Ele a conhecia e sabia que ela não estava nada bem. Sempre tinha sido transparente e honesta com ele. Aproximou-se de Nix e segurou suas mãos trêmulas. Puxou a moça e a levantou da cadeira. Abraçou-a com grande ternura e permaneceu assim por um longo tempo. Uma lágrima fugidia escorreu pela sua face alva e morreu no ombro de seu amante.

Jorhar era um homem forte e bonito, com traços finos, e estavam juntos há pouco mais de um ano. Era difícil manter um relacionamento com todos os segredos e as imposições da guilda, mas eles tentavam. En-contravam-se escondidos, viviam de momentos, mas nunca deixaram que

A assassina do reino de gelo | 189

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