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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA REGISTRADO(A) SOB N° ACÓRDÃO i MUI UM uni mil mu um uni mi mi Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 994.02.061614-7, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes JOSÉ ANDRÉ BITENCOURT e PEDRO MARQUES DE SOUZA BRÁS sendo apelados PEDRO MARQUES DE SOUZA BRÁS e JOSÉ ANDRÉ BITENCOURT. ACORDAM, em 2" Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PROVIMENTO EM PARTE À APELAÇÃO DO RÉU E NÃO CONHECERAM DO RECURSO ADESIVO DO AUTOR. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores NEVES AMORIM (Presidente sem voto), BORIS KAUFFMANN E JOSÉ CARLOS FERREIRA ALVES. São Paulo, 18 de maio de 2010 JOSÉ ROBERTO BEDRAN RELATOR

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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA

REGISTRADO(A) SOB N°

A C Ó R D Ã O i MUI UM uni mil mu um uni mi mi

Vistos, relatados e discutidos estes autos de

Apelação n° 994.02.061614-7, da Comarca de São Paulo,

em que são apelantes JOSÉ ANDRÉ BITENCOURT e PEDRO

MARQUES DE SOUZA BRÁS sendo apelados PEDRO MARQUES DE

SOUZA BRÁS e JOSÉ ANDRÉ BITENCOURT.

ACORDAM, em 2" Câmara de Direito Privado do

Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte

decisão: "DERAM PROVIMENTO EM PARTE À APELAÇÃO DO RÉU

E NÃO CONHECERAM DO RECURSO ADESIVO DO AUTOR. V.U.",

de conformidade com o voto do Relator, que integra

este acórdão.

O julgamento teve a participação dos

Desembargadores NEVES AMORIM (Presidente sem voto),

BORIS KAUFFMANN E JOSÉ CARLOS FERREIRA ALVES.

São Paulo, 18 de maio de 2010

JOSÉ ROBERTO BEDRAN RELATOR

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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

VOTO N°. APEL.N0. COMARCA APTES.

APDOS.

18638 994.02.061614-7 (266.032.4/1-00) SÃO PAULO JOSÉ ANDRÉ BITENCOURT E SOUZA BRÁS. OS MESMOS

PEDRO MARQUES DE

Ação cominatória. Abstenção de prática de concorrência desleal em atividade empresarial. Sócio retirante que constitui outra empresa, no mesmo ramo de atividade e na mesma praça da sociedade da qual se retirou. Ato de deslealdade configurado. Implícita, no contrato de cessão das cotas societárias, a cláusula de não-restabelecimento. Impossibilidade de, embora reconhecida a prática de concorrência desleal, vedar o exercício da atividade empresarial pelo infrator por prazo superior a cinco anos, limitando a sua área de atuação futura. Sentença parcialmente reformada neste capítulo. Dano moral. Não configuração. A necessidade de contratar advogado para a tutela de direitos em Juízo não enseja ressarcimento por danos morais. Autor que se conformou com o capítulo da sentença que não reconheceu a ocorrência de danos materiais. Apelação do réu provida, em parte. Não-conhecimento do recurso adesivo do autor.

1. Ação de preceito cominatório c.c. pedido de

indenização por danos materiais e morais, em razão de concorrência desleal

em atividade empresarial, foi julgada parcialmente procedente pela r.

sentença de fls. 113/117, de relatório adotado.

Inconformado, apelou o réu para buscar a reforma,

sustentando que o autor apenas ajuizou esta ação em decorrência de

desentendimentos familiares, inexistindo ato de concorrência desleal. Porque

•jr^ ARTES GRÁFICAS-TJ

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não provado qualquer prejuízo material ou moral, injustificável a ordem de

abstenção num raio de 2 km do estabelecimento do autor, do exercício de

sua atividade empresarial.

Adesivamente, também apelou o autor, para que o réu,

uma vez reconhecida a concorrência desleal, seja condenado ao pagamento

de danos morais. Além disso, afirma cabível impor-lhe o dever de não alienar

o estabelecimento empresarial para terceiros, já que, se isso acontecer,

perpetrará a concorrência desleal.

Recursos regularmente processados, com resposta

apenas do autor e isentos de preparo.

É o relatório.

2. Convence, em parte, o inconformismo do réu.

Inicialmente, salienta-se que a prática de concorrência

desleal também pode ocorrer nos casos de alienação ou cessão de cotas

societárias pelos sócios retirantes, não ficando restrita ao contrato de

trespasse.

Assim, tanto o alienante do estabelecimento

empresarial - por meio do contrato de trespasse -, como o sócio retirante -

por meio do contrato de cessão ou alienação de cotas -, poderão praticar

atos contrários à livre concorrência e desleais aos adquirentes ou à empresa

de qual se retirou.

No caso concreto, malgrado não haja o

comprovado a existência de danos materiais, coisa nem sequer por ele

APEL. N° 9 9 4 . 0 2 . 0 6 1 6 1 4 - 7 ( 2 6 6 . 0 3 2 . 4 / 1 - 0 0 ) - SÃO PAULO - VOTO N. 1 8 6 3 8 SPS JUÍZA: CELINA D . TRIGUEIROS TEIXEIRA PINTO PROC. N° 5 . 7 3 3 / 2 0 0 1

ARTES GRÁFICAS -TJ

autor

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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

impugnada, indiscutível a prática de concorrência desleal pelo réu, sócio

retirante da sociedade, tendo em vista que, logo depois de seu desligamento,

constituiu outra empresa, no mesmo ramo de atividade e na mesma região

daquela que anteriormente integrava.

E é inadmissível que o sócio retirante, em curtíssimo

espaço de tempo, venha estabelecer-se "... em idêntico ramo, na mesma

praça, para fazer concorrência ao adquirente do estabelecimento, a menos

que haja autorização expressa" (MARIA HELENA DINIZ, Código Civil

Anotado, 11a Ed., Saraiva, 2005, art. 1.147), ensinança aplicável, pelos

mesmos fundamentos, à situação do sócio remanescente em relação ao

retirante.

Entretanto, reconhecida a concorrência desleal, e

mesmo que inexistente cláusula de não-restabelecimento no contrato de fls.

22/23, não teria cabimento impor, de maneira definitiva e perpétua, que o réu

se abstenha, num raio de 2 km do estabelecimento do autor, de exercer o

seu direito ao livre comércio.

Pelo Código Civil atual, "na omissão do contrato, o

alienante do estabelecimento comercial não pode restabelecer-se na mesma

praça, concorrendo com o adquirente, no prazo de 5 anos seguintes ao

negócio, sob pena de ser obrigado a cessar suas atividades e indenizar este

último pelos danos provenientes de desvio eficaz de clientela sobrevindos

durante o período do restabelecimento (art. 1147)." (FÁBIO ULHOA

COELHO, Manual de Direito Comercial, 14a ed., Saraiva, 2008, pág. 31).

APEL. N° 9 9 4 . 0 2 . 0 6 1 6 1 4 - 7 ( 2 6 6 . 0 3 2 . 4 / 1 - 0 0 ) - SÃO PAULO - VOTO N . 1 8 6 3 8 SPS JUÍZA: CELINA D . TRIGUEIROS TEIXEIRA PINTO PROC. N° 5 . 7 3 3 / 2 0 0 1

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É certo que as regras do Código Civil de 2002 não

podem ser aplicadas retroativamente ao caso, uma vez que a retirada do réu

ocorreu no ano de 2000 (fls. 22/23).

Entretanto, na vigência do Código Civil de 1916,

doutrina e jurisprudência já se posicionavam no sentido de reconhecer a

operância e eficácia da cláusula de não-restabelecimento, ainda que omisso

o contrato. E a admitiam-na nos contratos de trespasse, desde que limitada

quanto ao mesmo ramo de atividade, pelo período de cinco anos e na

mesma região.

Como ensina FÁBIO ULHOA COELHO, citado na r.

sentença, "... A jurisprudência brasileira sobre o tema teve início com célebre

pendência judicial entre a Companhia Nacional de Tecidos de Juta e Antônio

Álvares Penteado, em que tiveram atuação profissional grandes nomes do

direito nacional, e estrangeiro, como Rui Barbosa, Carvalho de Mendonça,

Vivante e Planiol. A questão era a seguinte: O Conde Álvares Penteado

constituiu a Companhia Nacional de Tecidos da Juta, transferindo-lhe o

estabelecimento comercial de que era titular (a Fábrica Sant Anna), e em

seguida alienou todas as suas ações nesta sociedade. Algum tempo depois

restabeleceu-se na mesma praça, constituindo uma sociedade concorrente

(a Companhia Paulista de Aniagem). O instrumento da alienação era omisso

quanto à possibilidade de restabelecimento do alienante, e a Companhia

Nacional de tecidos de Juta defendia a tese de que a cláusula de não-

restabelecimento seria implícita em avenças desta natureza. Esta tese, que

hoje é dominante na jurisprudência e na doutrina, não logrou, naquela

oportunidade, sagrar-se vencedora".

APEL. N° 994.02.061614-7 (266.032.4/1-00) - SÃO PAULO - VOTO JUÍZA: CELINA D. TRIGUEIROS TEIXEIRA PINTO PROC. N° 5.733/2001

f"1 lA 18638 SPS

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"Hoje, portanto, entende-se que, na omissão do

contrato, o alienante de estabelecimento comercial não pode restabelecer-se

na mesma praça, concorrendo com o adquirente, sob pena de ser obrigado a

cessar suas atividades e indenizar este último pelos danos provenientes do

desvio eficaz de clientela sobrevindos durante o período do

restabelecimento. O mesmo critério pode ser aplicado ao cedente de controle

acionário. São hipóteses de concorrência desleal cuja repressão tem base

contratual." (Manual de Direito Comercial, 7a ed., Saraiva, São Paulo, 1996,

págs. 22/23).

Com efeito, aplicada essa orientação à espécie, sob

pena de violação ao princípio da livre concorrência e do livre exercício da

atividade profissional, inadmissível impor, em caráter perpétuo, restrições ao

exercício da atividade empresarial do réu.

Quando da prolação da sentença, seria o caso de impor

ao réu a abstenção do exercício da atividade pelo prazo de cinco anos a

partir da alienação das suas cotas sociais.

Então, considerando-se que desde a retirada do réu da

sociedade com o autor já se passaram dez anos, prazo superior ao que seria

justo estabelecer, poderá o réu, doravante, exercer sua atividade

empresarial, ainda que na mesma da do autor, em qualquer espaço

geográfico, sem limitação territorial.

3. Incognoscível o recurso adesivo do autor.

Não recebida, pela irrecorrida decisão de fls. 127, a

apelação por ele interposta às fls. 122/126, impossível, agora, beneficiar-se

APEL. N° 9 9 4 . 0 2 . 0 6 1 6 1 4 - 7 ( 2 6 6 . 0 3 2 . 4 / 1 - 0 0 ) - SÃO PAULO - VOTO N?S1LB638 SPS \ JUÍZA: CELINA D. TRIGUEIROS TEIXEIRA PINTO H \ PROC. N° 5 . 7 3 3 / 2 0 0 1 \

ARTES GRÁFICAS-TJ \ 41.0035

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do adesivo, sob pena de violação, por via transversa, do princípio da

singularidade recursal.

4. Isso não obstante, se cognoscível fosse, não teria

provimento.

Cinge-se o inconformismo ao capítulo da sentença que

não reconheceu a existência de dano moral.

O autor pleiteou a condenação do réu ao pagamento de

danos morais com base nos seguintes fundamentos: "... Tendo havido,

entretanto, a concorrência desleal do Apelado, o que motivou a presente

demanda, é evidente que isso resultou em dano ao Apelante. O fato de ver

gradativamente a clientela se baldeando para o estabelecimento do

concorrente, o fato de ver diminuído o seu ganho empresarial, o fato de ter

que constituir advogado para pleitear em juízo a retirada do concorrente

desleal, tendo que acompanhar o processo com todo o desgaste que isso

representa, tudo isso constitui um transtorno a que o Apelante não deveria

ter se submetido se houvesse, por parte do Apelante uma conduta ética ..."

(fls. 147).

Observa-se que a eventual diminuição da clientela do

estabelecimento do autor e a possível redução de seu faturamento mensal

não caracterizam dano moral. Ao contrário, tais circunstancias, em tese,

ensejariam a ocorrência de danos materiais, nas modalidades de danos

emergentes e lucros cessantes. Porém, deste capítulo da r. sentença, o autor

não recorreu.

APEL. N° 994.02.061614-7 (266.032.4/1-00) - SÃO PAULO - VOTO HA< 18638 SPS JUÍZA: CELIKA D. TRIGUEIROS TEIXEIRA PINTO PROC. N° 5.733/2001

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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Por outro lado, por ser necessária à proteção de seu

direito, a simples contratação de advogado não seria causa para gerar

ressarcimento por danos morais, que, no caso, não se caracterizam in re

ipsa.

5. Do exposto, dá-se provimento, em parte, à apelação

do réu e não se conhece do recurso adesivo do autor.

lOSE.ROBERTCTBEDRAN

Relator

APEL. N° 9 9 4 . 0 2 . 0 6 1 6 1 4 - 7 ( 2 6 6 . 0 3 2 . 4 / 1 - 0 0 ) - SÃO PAULO JUÍZA: CELINA D. TRIGUEIROS TEIXEIRA PINTO PROC. N° 5 . 7 3 3 / 2 0 0 1

VOTO N. 18638 SPS

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