tipagem de cepas de yersinia pestis dos focos do estado

79
1 1 Fundação Oswaldo Cruz Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães Departamento de Saúde Coletiva Mestrado em Saúde Pública TIPAGEM DE CEPAS DE Yersinia pestis DOS FOCOS DO ESTADO DO CEARÁ, BRASIL, POR RFLP-IS100 Ana Carolina de Melo da Silva Recife, 2004

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1

1

Fundação Oswaldo Cruz Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães Departamento de Saúde Coletiva

Mestrado em Saúde Pública

TIPAGEM DE CEPAS DE Yersinia pestis DOS FOCOS DO ESTADO DO CEARÁ, BRASIL, POR

RFLP-IS100

Ana Carolina de Melo da Silva

Recife, 2004

2

ANA CAROLINA DE MELO DA SILVA

TIPAGEM DE CEPAS DE Yersinia pestis DOS FOCOS DO ESTADO DO CEARÁ, BRASIL, POR RFLP-IS100.

Dissertação apresentada ao Curso de

Mestrado em Saúde Pública do Centro

de Pesquisas Aggeu Magalhães da

Fundação Oswaldo Cruz, para obtenção

do Título de Mestre em Saúde Pública,

Área de Controle de Endemias e

Métodos de Diagnóstico de Doenças

Infecciosas e Parasitárias.

Orientadora: Dra. Nilma Cintra Leal Co-Orientadora: Dra. Alzira Maria Paiva de Almeida

Recife/2004

2

3

TIPAGEM DE CEPAS DE Yersinia pestis DOS FOCOS DO ESTADO DO CEARÁ, BRASIL, POR RFLP-IS100.

ANA CAROLINA DE MELO DA SILVA

Comissão Examinadora

_________________________________________ Dra. Nilma Cintra Leal

CPqAM/FIOCRUZ (Orientadora)

_________________________________________ Dra. Alzira Maria Paiva de Almeida CPqAM/FIOCRUZ (Co-Orientadora)

_________________________________________ Dra. Constancia Flavia Junqueira Ayres CPqAM/FIOCRUZ (Membro Interno Titular)

_________________________________________ Dra. Marise Sobreira Bezerra da Silva

UPE (Membro Externo Titular)

_________________________________________ Dra. Tereza Cristina Leal Balbino

CPqAM/FIOCRUZ (Membro Interno Suplente)

_________________________________________ Dr. Valdir Queiroz Balbino

UFPE (Membro Externo Suplente)

Recife, 2004.

3

4

SUMÁRIO

DEDICATÓRIA i

AGRADECIMENTOS ii

LISTA DE FIGURAS E TABELAS iii

LISTA DE ABREVIATURAS v

RESUMO vi

1. Introdução 01

1.1 Histórico 01

1.2 Situação Atual no Mundo e no Brasil 02

1.3 Ciclo Epidemiológico 03

1.4 Formas Clínicas 03

1.5 Prevenção e Controle 04

1.6 Agente Etiológico 05

1.7 Genoma da Y. pestis 05

1.8 Diagnóstico 07

1.8.1 Clínico 07

1.8.2 Laboratorial 07

1.8.2.1 Bacteriológico 07

1.8.2.2 Sorológico 08

1.8.2.3 Molecular 08

1.9 Epidemiologia Molecular da Y. pestis 09

1.10 Justificativa 11

2. Pergunta-Condutora 12

3. Objetivo 13

3.1 Geral 13

3.2 Específicos 13

4. Procedimentos Metodológicos 14

4.1 Desenho de Estudo 14

4.2 Área de Estudo 14

4.3 População de Estudo 14

4.4 Reativação e Caracterização das Cepas 16

4.5 Provas Bioquímicas 16

4

5

4.6 Fenótipo de Pigmentação 18

4.7 Extração de DNA plasmidial 18

4.8 Extração de DNA total 18

4.9 Marcadores de Virulência 20

4.10 Amplificação da IS100 20

4.11 RFLP-IS100 21

4.11.1 Construção da sonda IS100 21

4.11.2 Clivagem e transferência 21

4.11.3 Hibridização 22

4.11.4 Detecção 22

5. Resultados 24

5.1 Provas Bioquímicas 24

5.2 Fenótipo de Pigmentação 24

5.3 Perfil Plasmidial 24

5.4 Marcadores de Virulência 24

5.5 Amplificação da IS100 25

5.6 RFLP-IS100 25

6. Discussão 36

7. Conclusões 40

8. Referências Bibliográficas 41

ANEXO

ARTIGO 48

5

i

DEDICATÓRIA

Aos meus pais Janete e Evangelista que sempre

tentaram me entender e me apoiar nos momentos de

angustia e alegria; aos meus irmãos Heloisa e Antônio

pela força e amizade, e ao amor inocente de meu

sobrinho Cássio.

Ao meu marido Wellington que em todos os momentos

me incentivou e me apoiou com todo seu amor e carinho;

e que me deu o maior presente – meu filho em caminho

João Guilherme.

i

ii

AGRADECIMENTOS

A Deus por toda força e saúde para nunca desisti nos momentos mais difíceis.

A minha família que sempre me apoiou, e me incentivou a lutar por todos os

meus objetivos.

A Dra. Nilma Cintra Leal pelos ensinamentos, ao longo dos quatro anos de

orientação.

A Dra. Alzira Maria Paiva de Almeida pelo apoio nos momentos de

necessidades científicas.

Aos técnicos Issac Martins e Yara Nakasawa e em especial a Silvana Santos

por toda a força na realização e incentivo nos procedimentos metodológicos.

As Dras. Marise Sobreira e Tereza Cristina pelo apoio técnico e Científico, nos

momentos de dúvidas.

Ao Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães por todo o suporte técnico e

científico.

Ao Departamento de Saúde Coletiva do CPqAM, pelos ensinamentos e

formação no mestrado em Saúde Pública.

Aos Professores do Mestrado em Saúde Pública pelos conhecimentos

adquiridos.

Aos colegas mestrandos Marinalda, Érika, Fábio, Erlene Luciana, Salvea,

Odaleia, Geiseane, Cristina, Karina, em especial a amiga Maria Sandra.

As amigas Gerlane, Claúdia e Betânia pelo incentivo e interesse na minha vida

profissional e pessoal.

A todos os colegas do Departamento de Microbiologia do CPqAM.

ii

iii

LISTA DE FIGURAS E TABELAS

Figura 1. Área de Estudo: Estado do Ceará com as áreas de focos de

peste.

15

Figura 2. Variedades Geográficas ou Biovars de Yersinia pestis

identificadas com base na fermentação do glicerol e redução do

nitrato.

17

Figura 3. Crescimento de Yersinia pestis no meio agar Vermelho

Congo. A: Colônias pigmentadas, vermelhas (pgm+); B: Colônias não-

pigmentadas, brancas (pgm-).

19

Figura 4. Variedades Geográficas ou Biovars de Yersinia pestis

encontradas nas cepas analisadas.

27

Figura 5. Gel de agarose 0,6% representativo dos perfis plasmidiais

das cepas de Y. pestis.

28

Figura 6. Gel de agarose 1% representativo das amplificações

geradas por PCR-Multiplex, com primers direcionados aos genes irp2,

caf1, lcrV e pla das cepas de Y. pestis.

29

Figura 7. Hibridização da sonda IS100 com fragmentos de DNA total

de cepas de Y. pestis gerados pela clivagem com a enzima HindIII.

30

Figura 8. Representação esquemática dos grupos obtidos pela

hibridização da sonda IS100 com DNA total de cepas de Y. pestis

clivado com a enzima HindIII.

31

Tabela 1. Descrição da População de cepas estudadas segundo a

origem, Área Geográfica, Município, Ano de Isolamento, Amplificação

32

iii

iv

da IS100, perfil plasmidial e genes de virulência.

Tabela 2. Distribuição das cepas estudadas segundo origem, foco,

município, ano de isolamento e resultado da tipagem por RFLP-IS100.

35

iv

v

LISTA DE ABREVIATURAS

BAB – Blood Agar Base

BHI – Brain Heart Infusion

CPqAM – Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães

DNA – Ácido Desoxirribonucléico

FIOCRUZ – Fundação Oswaldo Cruz

FUNASA – Fundação Nacional de Saúde

G - Glicerol

IS100 – Insertion Sequence 100

MS – Ministério da Saúde

N - Nitrato

PCR – Polymerises Chain Reaction

PFGE – Pulsed-field Gel Electrophoresis

HA – Hemaglutinação Passiva

RAPD – Random Amplified Polymorphism DNA

RFLP – Restriction Fragment Length Polymorphism

SRP – Serviço de Referência de Peste

SSC – Citrato trissódico

TBE – Tris Borato

UV – Ultravioleta

VNTR – Variable-Number Tandem Repeats

v

vi

RESUMO

As atividades de vigilância da peste promovidas pelo Serviço de

Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS) têm evidenciado que a

Yersinia pestis, agente causador da peste continua circulando entre os

roedores silvestres nos focos endêmicos do Nordeste do Brasil. Dando

continuidade aos estudos desenvolvidos pelo Serviço de Referência de Peste

(SRP) do Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães e motivados pelo recente

interesse nos estudos da Y. pestis devido às ameaças de terrorismo

bacteriológico, cepas de Y. pestis isoladas dos focos de peste do estado do

Ceará e pertencentes à coleção de culturas do SRP, foram analisadas com o

objetivo de verificar diversidade genética entre elas, visando identificar uma

ferramenta útil para reconhecer o surgimento de novos clones ou variantes e

introdução de novas cepas no território brasileiro. Quarenta e três cepas foram

caracterizadas quanto ao conteúdo plasmidial, presença de genes de

virulência, reações de fermentação do glicerol e redução do nitrato. 14 delas

foram analisadas quanto ao polimorfismo dos tamanhos dos fragmentos de

restrição reconhecidos por sonda dirigida à IS100. Trinta e oito cepas se

revelaram glicerol negativo (G-) e nitrato positivo (N+) e se enquadram no biovar

Orientalis. Cinco cepas se revelaram G- e N- que foram consideradas como

variantes atípicas. Todas as cepas produziram colônias pigmentadas no meio

agar Vermelho Congo. 31 cepas amplificaram os quatro genes de virulência

pesquisados; os genes lcrV e irp2 estavam presentes em todas as amostras.

Foram identificados oito perfis de RFLP-IS100 sem associação com a presença

ou ausência de plasmídeos, nem com a variante nitrato negativo, no entanto

possibilitou agrupar cepas originadas de um mesmo município, de diferentes

hospedeiros e diferentes anos. As outras cepas estavam distribuídas em

diferentes perfis, no entanto uma banda comum estava presente em todas as

cepas. Outros estudos são necessários, com cepas de outros focos do Brasil e

de outros países para definir o potencial desta banda como marcador

geográfico em estudos epidemiológicos.

vi

1

1. INTRODUÇÃO

1.1 Histórico

A peste é uma doença infecciosa causada pela bactéria Yersinia pestis.

Conhecida desde a Antigüidade, provavelmente originada no Planalto Central

Asiático, é uma das doenças mais antigas e causou grande mortalidade em

diferentes épocas na população humana. Durante a era Cristã, três grandes

pandemias foram bem caracterizadas: a primeira pandemia, denominada Peste

de Justiniano devastou o mundo conhecido entre 542 a 602 d.C. A segunda

pandemia, a Peste Negra, novamente dizimou a população, matando 25

milhões de pessoas apenas na Europa, durante o século XIV. A terceira

pandemia ou pandemia Contemporânea iniciou-se em 1894 e de Hong Kong

dispersou-se por todo o mundo (POLLITZER, 1954).

Segundo Mollaret (1989), a expansão desta pandemia se extinguiu com

a 2a Guerra Mundial, à medida que os antigos navios foram substituídos pelos

modernos navios à prova de ratos. Entretanto, esta pandemia deixou focos

endêmicos em várias partes do mundo.

Em 1894, Alexander Yersin isolou o agente etiológico da peste. O papel

da pulga na transmissão da doença foi descoberto por Louis Simond em 1898

(POLLITZER, 1954).

Durante a última pandemia, a peste penetrou no Brasil, em 1899, pelo

porto de Santos no estado de São Paulo. Inicialmente atingiu várias cidades

litorâneas, de onde foi eliminada através de medidas sanitárias adequadas,

mas focalizou-se entre os roedores silvestres, na área rural, principalmente na

região Nordeste. No estado do Ceará, a peste foi registrada pela primeira vez

1

2

em Fortaleza no ano de 1900, de onde se irradiou e posteriormente se

focalizou em diversas áreas: Serra da Ibiapaba, Serra de Baturité e Chapada

do Araripe (WHO, 1965).

1.2 Situação Atual no Mundo e no Brasil

Apesar dos avanços científicos e tecnológicos, a peste ainda representa

um problema de saúde pública porque persiste em vários focos naturais em

diversos países da África, Ásia e Américas. Enquadra-se entre as doenças de

notificação obrigatória em nível internacional e sujeita à quarentena (classe I do

Regulamento Sanitário Internacional), fazendo-se necessária a vigilância

permanente nas áreas de foco.

Durante os últimos 15 anos 36.876 casos foram notificados em 24

países com 2.847 mortes (WHO, 2003).

Em 2000 foram notificados 2.513 casos de peste humana em 11 países,

com um total de 232 óbitos. Ocorreram na África 2.431 casos sendo 227 fatais,

na Ásia, 57 casos com 5 óbitos e nas Américas 25 casos com todos os

pacientes curados.

Em 2001, 12 países notificaram 2.671 casos, incluindo 175 mortes,

sendo a África o continente mais atingido, com 2.557 casos (94,3% do total dos

casos notificados) e 165 mortes, seguido da Ásia com 102 casos (5,7%) e 10

mortes e Américas com 12 casos (0,4%) curados (WHO, 2003).

No Brasil a incidência de peste humana e a ocorrência de epizootias

declinaram nas áreas de foco; entretanto, atividade residual de peste tem sido

detectada nos animais sentinelas, exigindo vigilância permanente dos focos

2

3

(VIEIRA et al., 1994; VIEIRA; COELHO, 1998; ARAGÃO et al., 2002; FUNASA,

2002).

1.3 Ciclo Epidemiológico

A peste é uma doença infecciosa primariamente de roedores e a

transmissão se dá através das picadas das pulgas infectadas. O homem é

infectado acidentalmente, quando em contato com roedores ou outros animais

e suas pulgas. Carnívoros selvagens e domésticos (raposas, cães e gatos)

também estão envolvidos no ciclo epidemiológico da peste, quando são

picados por pulgas infectadas ou ao devorar roedores infectados (PERRY;

FETHERSTON, 1997).

A transmissão inter-humana pode ocorrer por aerossóis na forma

pneumônica, por acidentes com tecidos e materiais em trabalhos de campo ou

no laboratório, ou na eventualidade da utilização da bactéria como agente de

guerra biológica (PERRY; FETHERSTON, 1997; INGLESBY et al. 2000).

1.4 Formas Clínicas

No homem, a doença pode apresentar-se em três formas clínicas

principais: bubônica, pulmonar e septicêmica (BUTLER et al., 1983).

A peste bubônica é a forma mais comum e caracteriza-se pela presença de

linfadenite regional (bubão) na cadeia que drena a região da picada da pulga

(inguinal ou femural próximo aos membros inferiores e cervical, lombar ou

dorsal quando próxima aos membros superiores), o paciente usualmente

desenvolve sintomas como febre alta, dor de cabeça, calafrios e dores

generalizadas, podendo ter complicações gastrintestinais, como náuseas,

3

4

vômitos e diarréia. Quando diagnosticada precocemente é tratável em no

mínimo 50% dos casos (BUTLER et al., 1983).

A peste septicêmica geralmente aparece na fase terminal da forma

bubônica não tratada. Clinicamente se confunde com outras septicemias

causadas por outros bacilos Gram-negativos, com calafrios, febre alta,

dispnéia, hemorragias cutâneas e distúrbios gastrintestinais. Quando não

tratada sobrevêm o coma e a morte no fim de 2 a 3 dias (BUTLER et al., 1983).

A peste pneumônica é a forma mais preocupante, pela alta letalidade e

pelo seu alto potencial de contágio. Quando transmitida homem a homem pode

provocar epidemias explosivas. Pode ser primária ou secundária à peste

bubônica ou septicêmica por disseminação hematogênica. O período de

incubação é curto (2 a 3 dias) e o quadro infeccioso é grave, de evolução

rápida, com sinais e sintomas pulmonares discretos. Os doentes apresentam

dor torácica, respiração curta e rápida, cianose e expectoração sanguinolenta

rica em bacilos pestosos (BUTLER et al., 1983).

As três formas da doença respondem bem a antibioticoterapia

apropriada, reduzindo significativamente a mortalidade. As drogas

preconizadas para o tratamento são: estreptomicina, cloranfenicol, tetraciclina e

sulfazidina. Atualmente, as quinolonas vêm sendo utilizadas, especialmente em

casos graves (WHO, 1999).

1.5 Prevenção e Controle

A vigilância nos focos é realizada através da pesquisa da Y. pestis nos

roedores e suas pulgas e na detecção de anticorpos antipestosos circulantes

em animais sentinelas: carnívoros domésticos (cães e gatos) e algumas

4

5

espécies de roedores resistentes à infecção. As medidas de controle abrangem

a notificação dos casos humanos, tratamento adequado dos doentes e

profilaxia dos comunicantes, além da eliminação das pulgas com inseticidas

apropriados e a desratização e anti-ratização, dificultando-se o acesso do

roedor, ao abrigo, alimento e água (VIEIRA; COELHO, 1998; FUNASA, 2002).

1.6 Agente Etiológico

O gênero Yersinia da família Enterobacteriaceae é composto de 11

espécies, das quais três são patógenos humanos (Y. pestis, Y. enterocolitica e

Y. pseudotuberculosis).

O agente etiológico da peste, Y. pestis, é um bacilo Gram-negativo,

imóvel, anaeróbio facultativo, com coloração bipolar (MOLLARET; THALL,

1974). A espécie caracteriza-se por apresentar baixo número de reações

bioquímicas positivas e grande homogeneidade, com um único sorotipo, um

fagotipo e um biotipo. Devignat (1951) identificou três biovars ou variedades

geográficas: Antiqua (G+, N+), Medievalis (G-, N+) e Orientalis (G-, N+) com base

na capacidade das culturas em fermentar o glicerol e converter o nitrato a

nitrito. Cada variedade foi associada à primeira, segunda e terceira pandemia,

respectivamente. Entretanto estes biovars não apresentam diferenças quanto à

virulência ou formas clínicas da doença.

5

6

1.7 Genoma da Y. pestis

A virulência da Y. pestis é codificada em genes plasmidiais e

cromossomais. As cepas típicas de Y. pestis apresentam três plasmídeos

(pYV, pFra, pPst) que codificam importantes fatores de virulência.

O plasmídeo pYV (70 Kb) está presente nas três espécies de yersínias

patogênicas. Codifica a dependência ao cálcio a 37ºC, proteínas antifagocíticas

(Yops), proteínas regulatórias e um sistema de secreção. Estes produtos

permitem sobrevivência e multiplicação da bactéria nos tecidos linfóides dos

hospedeiros (CORNELIS et al., 1998).

O plasmídeo pFra (100Kb) contém o gene caf1 que codifica para a sub-

unidade estruturai da proteína capsular F1 que possui atividade antifagocítica,

e o gene da toxina murina (ymt), envolvida no processo de transmissão pelas

pulgas (LINDLER et al., 1998).

No plasmídeo pPst (9,5 Kb) estão os genes que codificam a bacteriocina

pesticina (pst), uma coagulase e um ativador do plasminogênio (pla), requerido

para o bloqueio do trato digestivo das pulgas e disseminação no sítio da picada

da pulga (SODEINDE; GOGUEN, 1988).

No cromossomo foi descrita uma região de 102 Kb denominada locus

pgm, limitado por duas seqüências de inserção (IS100). Esta região contém um

segmento de aquisição de ferro que é considerada uma ilha de patogenicidade

da Y. pestis (HPI) e um segmento de pigmentação, e é sujeita a extensivas

deleções em seus segmentos, por recombinação entre as IS. No segmento de

aquisição de ferro existe um grupo de genes (irp2, ybt) envolvidos na

biossíntese do sideróforo yersiniabactina. O segmento de pigmentação contém

o locus hms responsável pela capacidade da bactéria desenvolver colônias

6

7

pigmentadas (pgm+) no meio agar Vermelho Congo (BUCHRIESER et al.,

1998).

Várias seqüências de inserção (IS) são encontradas em múltiplas cópias

no genoma da Y. pestis, integradas no cromossomo e/ou nos plasmídeos

(FILIPPOV et al., 1995; SIMONET et al., 1996; HUANG et al., 2002; MOTIN et

al., 2002).

As IS são pequenos segmentos de DNA bacteriano (<2,5 Kb) capazes

de se transportar dentro do cromossomo ou para outro cromossomo, causando

inserções, deleções e recombinações, resultando em mutações silenciosas,

inativação de genes, bloqueio ou inativação do controle da expressão gênica

(MAHILLON; CHANDLER, 1998).

Na cepa CO92 foi descrito um total de 140 cópias das IS, sendo 66 da

IS1541, 44 da IS100, 21 da IS285 e nove da IS1661; a cepa KIM apresentou

uma pequena diferença no número de IS tendo sido encontradas 58 cópias da

IS1541, 35 de IS100, 19 da IS285 e 10 cópias da IS 1661 (PARKHILL et al.,

2001; DENG et al., 2002).

1.8 Diagnóstico

1.8.1 Clínico

O diagnóstico clínico geralmente é baseado nos sintomas dos pacientes

e histórico epidemiológico. A peste bubônica é caracterizada pela presença dos

bubões, febre alta e prostração (BUTLER et al., 1983).

7

8

1.8.2 Laboratorial

O diagnóstico laboratorial é realizado por técnicas bacteriológicas (identificação

e isolamento da bactéria) e/ou sorológicas (detecção de anticorpos

antipestosos). Para análise bacteriológica podem ser utilizadas amostras de

sangue, aspirado de bubão, fluido cefalorraquidiano, secreção brônquica, e

medula óssea (no homem), além de fragmentos de vísceras de roedores e

triturados de pulgas. O diagnóstico sorológico é realizado em soro humano, dos

roedores e outros mamíferos (CHU, 2000).

1.8.2.1 Bacteriológico

Exame Direto

São utilizadas técnicas de coloração que empregam corantes como o azul de

metileno (Azul de Loeffler), corante de Wayson, ou o método de Gram, em

esfregaços de fluído de bubão, líquido céfalorraquidiano (LCR), esputo ou

sangue (no homem), amostras de sangue, medula e vísceras dos roedores

infectados (CHU, 2000).

Cultura

Para isolamento e identificação da Y. pestis, diversas amostras de

material humano ou dos animais são cultivadas em placas de gelose (base de

agar sangue: BAB, Difco) a 28ºC, em pH na faixa de 7,4 a 7,6 por 48 horas. As

colônias da Y. pestis são translúcidas e pequenas. A identificação da bactéria é

confirmada pela sensibilidade ao bacteriófago antipestoso específico. Para o

crescimento da bactéria recomenda-se o brain heart infusion broth (BHI, Difco),

nas mesmas condições de temperatura e pH utilizadas para crescimento em

8

9

meio sólido. A cultura após 24 a 48 horas apresenta um sobrenadante flocular

sem turvação (KARIMI, 1978).

1.8.2.2 Sorológico

A prova de hemaglutinação (HA) é o teste recomendado pela

Organização Mundial de Saúde, utiliza hemácias de carneiro sensibilizadas

com o antígeno capsular F1, da Y. pestis, para detectar anticorpos em soros

humanos, de roedores e de carnívoros (CHU, 2000).

1.8.2.3 Molecular

Como alternativa aos métodos convencionais de diagnóstico da peste,

tem sido utilizada a técnica de PCR (Polymerase Chain Reaction) e suas

variações: Nested-PCR, Multiplex-PCR, para detectar a Y. pestis diretamente

em pulgas, fragmentos de vísceras de roedores e em sangue. Na Multiplex-

PCR, é possível identificar simultaneamente vários genes presentes em

plasmídeos e no cromossomo da Y. pestis em uma mesma reação

(HINNEBUSCH; SCHWAN, 1993; CAMPBELL et al., 1993; NORKINA et al.,

1994; TSUKANO et al., 1996; LEAL; ALMEIDA 1999).

1.9 Epidemiologia Molecular da Y. pestis

A Y. pestis é uma espécie bastante homogênea; possui apenas um

biotipo, um fagotipo e um sorotipo. Entretanto, Devignat (1951) identificou três

biovars ou variedades geográficas que foram associadas a cada uma das três

pandemias. Posteriormente através da análise do polimorfismo de restrição do

rDNA (ribotipagem) foram identificados 20 ribotipos que foram associados aos

9

10

biovars (GUIYOULE et al., 1994; 1997). Foi sugerido que um clone do ribotipo

O (biovar Antiqua: G+, N+) foi responsável pela primeira pandemia de peste;

outra variante do ribotipo O que perdeu a capacidade de reduzir o nitrato, foi

responsável pela segunda pandemia (biovar Medievalis: G+, N-);

posteriormente outra variante do ribotipo O, o ribotipo B, perdeu a capacidade

de fermentar o glicerol (biovar Orientalis: G-, N+) e causou a terceira pandemia.

Esta hipótese é sustentada pelo perfil de restrição com as enzimas EcoRI e

EcoRV dos dois clones que diferem apenas pela perda de um sítio de restrição

no ribotipo B (GUIYOULE et al., 1994; 1997).

Outros métodos moleculares como a análise da Variabilidade do Número

de Repetições em tandem (VNTR), e Eletroforese em Campo Pulsado (PFGE)

estão sendo utilizados para tipagem da Y. pestis (KLEVYTSKA et al., 2001;

HUANG et al., 2002).

A análise do polimorfismo dos fragmentos de restrição reconhecidos por

sondas derivadas das seqüências de inserção (IS) da Y. pestis mostrou-se

eficaz para estudos epidemiológicos e taxonômicos para a tipagem da Y. pestis

(HUANG et al., 2002).

10

11

1.10 Justificativa

A peste está atualmente incluída entre as doenças re-emergentes pela

Organização Mundial de Saúde (OMS), em vista da ocorrência de epidemias

no Zaire, Tanzânia, Índia e Madagascar (WHO, 2003). No Brasil, ainda

persistem vários focos naturais, principalmente na região Nordeste, exigindo

ações permanentes de vigilância e controle. O surgimento de cepas de Y.

pestis multi-drogas resistentes (GALIMAND et al., 1997), e a recente

preocupação com ações de bioterrorismo (INGLESBY et al., 2000) renovaram

o interesse em técnicas de tipagem dos isolados de Y. pestis para

rastreamento de cepas e para determinar a origem dos isolados (HUANG et al.,

2002).

Vários estudos: sensibilidade aos antimicrobianos, perfil protéico, perfil

plasmidial, tipagem por RAPD-PCR, amplificação das regiões espaçadoras

intergênicas 16S-23S (Ribotipagem-PCR) já foram realizados nas cepas

brasileiras de Y. pestis, entretanto nenhuma correlação entre as diferenças

observadas e as características epidemiológicas dos isolados foi encontrada

(HUDSON et al., 1973; 1975; ABATH et al., 1989; LEAL et al., 1996; 1997;

CAVALCANTI et al., 2002; SOBREIRA, 2002).

A análise do polimorfismo dos fragmentos de restrição reconhecidos

com sondas derivados das seqüências de inserção da Y. pestis (RFLP-IS)

revelou-se promissora para a tipagem e estudos sobre a distribuição geográfica

das cepas (HUANG et al., 2002; MOTIM et al., 2002).

O RFLP-IS poderá contribuir para o conhecimento dos clones existentes

no Brasil, e na identificação de novos clones que surgirem por mutações

espontâneas ou pela introdução de uma nova cepa.

11

12

2. PERGUNTA-CONDUTORA

Qual a variabilidade genética identificada pela sonda de

IS100 em isolados de Yersinia pestis do estado do

Ceará, Brasil?

12

13

3. OBJETIVO

3.1 Objetivo geral

Verificar polimorfismos genéticos e fenotípicos em cepas de Yersinia

pestis, isoladas do estado do Ceará, Brasil.

3.2 Objetivos específicos

Caracterizar o padrão de restrição reconhecido pela sonda IS100 em

isolados de Y. pestis;

Determinar o conteúdo plasmidial, presença de marcadores de

virulência e o fenótipo de pigmentação de cepas de Y. pestis;

Verificar associações entre o perfil determinado pelo RFLP-IS100 e o

perfil plasmidial, os marcadores de virulência e o fenótipo de pigmentação das

cepas de Y. pestis.

Verificar associações entre o perfil determinado pelo RFLP-IS100 e a

origem dos isolados de Y. pestis.

13

14

4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

4.1 Desenho de Estudo

O estudo epidemiológico é descritivo de uma série temporal de casos,

constituída de uma população representada por cepas de bactérias isoladas de

diferentes fontes (humano, roedor, pulga), de diferentes áreas geográficas do

estado do Ceará, em momentos distintos no tempo.

4.2 Área de Estudo

As cepas utilizadas neste estudo são provenientes de focos da Serra da

Ibiapaba e da Serra de Baturité no estado do Ceará (ARAGÃO et al., 2002;

CAVALCANTI et al., 2002) (Figura 1).

4.3 População de Estudo

Foram analisadas 43 cepas de Y. pestis de pacientes (22), roedores (20)

e pulgas (1), isoladas no período de 1971 a 1997, nos focos da Serra da

Ibiapaba (36) e Baturité (7). A tabela 1 mostra a distribuição das cepas pela

origem. Após isolamento as cepas foram estocadas em câmara fria a 4ºC em

camada alta de gelose (BAB) na bacterioteca do Departamento de

Microbiologia do Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães da Fundação Oswaldo

Cruz (CPqAM/FIOCRUZ) (ALMEIDA et al., 1985; 1989; LEAL; ALMEIDA,

1999).

14

15

Figura 1. Área de Estudo: Estado do Ceará com as áreas de focos de peste.

15

16

4.4 Reativação e Caracterização das Cepas

As cepas foram reativadas por semeio em caldo (BHI), incubadas a 28ºC

por 48 horas, e em seguida plaqueadas em gelose. Para confirmação da

identificação e pureza as culturas foram testadas quanto à sensibilidade ao

fago antipestoso (KARIMI, 1978). Para extração do DNA total e plasmidial as

cepas foram cultivadas em BHI a 28ºC por 24 horas.

Uma alíquota de cada cultura, representante do isolado estudado foi

conservada em camada alta de gelose a 4ºC e em estoque congelado a -80ºC

em BHI com 25% de glicerol, para estudos futuros.

4.5 Provas Bioquímicas

As provas de fermentação do glicerol e redução do nitrato foram

realizadas segundo Bahmanyar e Cavanaugh (1978). Para verificar a

capacidade de fermentar o glicerol as culturas, crescidas previamente em BHI

a 28ºC por 24 horas, foram inoculadas em caldo (Phenol red broth, Difco)

contendo 1% de glicerol e incubadas a 37ºC por 72 horas. A prova de redução

do nitrato foi realizada semeando as culturas em BHI, em caldo Nutriente

(Difco) contendo nitrato de potássio (KNO3 1%); depois de incubadas a 37ºC

por 72 horas, a reação foi revelada pela adição das soluções A (4g de ácido

sulfanílico em 500ml de ácido acético 5N) e B (2,5g de 1- cloreto de

naphtalamina em 500ml de ácido acético 5N). Como controle foi utilizado a

cepa Y. pestis PKR 684.

16

17

G+ N+

Antiqua G+ N-

Medievalis G- N+

Orientalis

Figura 2. Variedades Geográficas ou Biovars de Yersinia pestis identificadas

com base na fermentação do glicerol e redução do nitrato.

17

18

4.6 Fenótipo de Pigmentação

Para determinar o fenótipo da pigmentação (pgm) as culturas foram

plaqueadas no meio ágar Vermelho Congo segundo Bahmanyar e Cavanaugh

(1978), por 72 horas a 28º C. Como controle foi utilizada a cepa Y. pestis EV76

(pgm-).

4.7 Extração de DNA Plasmidial

O DNA plasmidial das cepas foi extraído segundo protocolo descrito por

Leal (1998), a partir de 1000µL de cultura em BHI. O DNA foi submetido à

eletroforese em gel de agarose 0,6%, corado com brometo de etídio e

visualizado em luz ultravioleta (UV). Foi utilizado como controle a Y. pestis

EV76, que possui os três plasmídeos típicos da espécie (9,5; 70; 100Kb).

4.8 Extração de DNA total

O DNA total ou genômico das cepas foi extraído segundo protocolo

descrito por Leal (1998), a partir de 1000µL da cultura, e quantificado por

comparação com DNA do fago λ clivado com a enzima HindIII, em gel de

agarose 1%, corado com brometo de etídio e visualizado em luz ultravioleta.

4.9 Marcadores de Virulência

Para verificar a presença de marcadores de virulência mais

característicos em Y. pestis foi empregada a técnica Multiplex-PCR, onde em

uma mesma reação são utilizados quatro pares de primers direcionados aos

genes plasmidiais pla, lcrV e caf1 e ao gene irp2 cromossomal (LEAL;

ALMEIDA, 1999).

18

19

B A

PPggmm-- PPggmm++

Figura 3. Crescimento de Yersinia pestis no meio agar Vermelho Congo. A:

Colônias pigmentadas, vermelhas (pgm+); B: Colônias não-pigmentadas,

brancas (pgm-).

19

20

As reações foram preparadas em um volume total de 25µL por tubo

contendo a seguinte mistura: tampão (KCl a 500mM; Tris-HCl (pH 8,4) a

200mM; MgCl2 a 1,5 mM; cada didesoxirribonucleotídeos dATP, dCTP, dGTP

e dTTP a 200 µM (Invitrogen Life Technologies); 20 pmol de cada primer; 1U

da enzima Taq DNA polimerase; 20ng do DNA total.

As amplificações foram realizadas em termociclador (Perkin-Elmer),

programado para 25 ciclos de 1 minuto a 94ºC, 2 minutos a 50ºC, 3 minutos a

72ºC e uma etapa final de 7 minutos a 72ºC. O produto da amplificação foi

analisado, por eletroforese, em gel de agarose a 1% em tampão TBE (Tris

Borato), sob voltagem de 100V, corado em brometo de etídio e visualizado sob

UV. Em cada grupo de amostras analisadas foi incluído um tubo com 20ng de

DNA purificado da cepa Y. pestis P.CE 882, como controle positivo e um tubo

sem DNA como controle negativo.

4.10 Amplificação da IS100

Foram realizados ensaios de amplificação com o DNA de 26 cepas de Y.

pestis (Tabela 1) e um par de primers dirigidos a IS100, descrito por Huang, et

al. (2002): IS100-1 (5’GCGCTGGCTGCACGATGTC3’) e IS100-2

(5’GCGCTGGCTGCACGATGTC3’).

As reações foram preparadas em um volume total de 25µL nas

condições já descritas.

As amplificações foram realizadas em termociclador (Perkin-Elmer),

programado para 30 ciclos de 1 minuto a 94ºC, 1 minuto a 55ºC, 1 minuto e 30

segundos a 72ºC e uma etapa final de 7 minutos a 72ºC. O produto da

amplificação foi analisado, por eletroforese, em gel de agarose 1% em tampão

20

21

TBE (Tris Borato), sob voltagem de 100V, corado em brometo de etídio e

visualizado sob UV.

4.11 Polimorfismo dos Fragmentos de Restrição reconhecidos pela sonda

IS-100 (RFLP-IS100)

4.11.1 Construção da sonda IS100

A sonda IS100 foi obtida pela amplificação do DNA da cepa Y. pestis

P.CE 05 com os primers IS 100-1 e IS 100-2 descritos por Huang et al. (2002).

A confirmação de que havia sido amplificado o segmento esperado foi obtida

pelo seqüenciamento do segmento amplificado utilizando o Kit Thermo

Sequenase CyTM5 Dye Terminator Cycle Sequencing (Amersham Biosciences)

seguindo protocolo do fornecedor em seqüenciador automático Alf II

(Amersham Biosciences), e a seqüência obtida foi comparada com seqüências

publicadas no Geny Bank www.ncbi.nlm.nih.gov/.

A marcação da sonda foi realizada durante a reação de PCR, conforme

descrito no item 4.10, utilizando a mistura de dNTP marcada com digoxigenina

do Kit digoxigenina-dUTP DIG DNA Labeling and Detection (cat. No. 1093657 -

Boehringer Mannheim). Após a amplificação, a sonda foi quantificada e titulada

para determinação da concentração a ser utilizada na hibridização.

4.11.2 Clivagem e transferência

Um µg do DNA total de 14 cepas (tabela 2) foi digerido com 1U da

enzima HindIII em tampão recomendado pelo fabricante (Amersham

Biosciences) por 24 horas a 37ºC. A separação dos fragmentos foi realizada

em gel de agarose 0,8% com 30cm de comprimento em Tampão TBE, sob

21

22

voltagem de 50V por 18 horas. O gel foi corado com brometo de etídio por 30

minutos e fotografado sob UV. O DNA foi transferido para membranas de

náilon pré-tratadas em tampão 20xSSC, segundo Southern (1975), no

VacuGene XL (Pharmacia Biotech). Após a transferência as membranas foram

imersas em 20xSSC por 10 minutos para eliminar a agarose, e expostas à UV

por 10 minutos para fixar o DNA.

4.11.3 Hibridização

As membranas foram pré-hibridizadas em 100mL do tampão de

hibridização “standard” (5xSSC, N-lauroysarcosine, SDS 0,1%, 0,02% de

agente de bloqueio) incubadas por 30 minutos em forno (HybaidTM) a 68ºC. A

hibridização foi realizada em 50mL do tampão de hibridização “standard” e 10µl

da sonda por 16 horas em forno (HybaidTM) a 68ºC.

Após hibridização as membranas foram lavadas, 2 vezes por 5 minutos

a temperatura ambiente no tampão de lavagem 1 (0,1% SDS; 2XSSC) sob

agitação e 2 vezes por 15 minutos em tampão de lavagem 2 (0,1%SDS;

0,1xSSC) a 68ºC sob agitação, para remoção das moléculas da sonda ligadas

inespecíficamente.

4.11.4 Detecção

Depois da hibridização as membranas foram imersas no tampão de

lavagem (ácido maléico, 0,3% Tween 20) por 1 a 5 minutos, incubadas no

tampão de bloqueio por 30 minutos, e com o conjugado anti-DIG-AP

(Boehringer Mannheim) por 30 minutos.

22

23

As membranas foram lavadas 2 vezes por 15 minutos no tampão de

lavagem, e incubadas em solução recém preparada, de substrato cromogênico

(NBT/Xphosphate) (Boehringer Mannheim), por 5 minutos, no escuro evitando

exposição à luz.

A formação do precipitado de cor iniciou-se em poucos minutos e a

reação foi interrompida com água deionizada, quando a intensidade das

bandas foi considerada satisfatória.

23

24

5. RESULTADOS

5.1 Provas Bioquímicas

Trinta e oito cepas se revelaram glicerol negativo (G-) e nitrato positivo

(N+) e se enquadram no biovar Orientalis e cinco cepas se revelaram G- e N-

(Tabela 1) não sendo enquadradas em nenhuma das três variedades

bioquímicas (Fig.4).

5.2 Fenótipo de Pigmentação

Todas as cepas analisadas produziram colônias pigmentadas. 40 cepas

produziram colônias pigmentadas, vermelhas (pgm+) e 3 cepas produziram

tanto colônias pigmentadas, vermelhas (pgm+) quanto colônias não

pigmentadas, brancas (pgm-) em diferentes proporções no meio ágar Vermelho

Congo.

5.3 Perfil Plasmidial

As 43 cepas estudadas apresentaram quatro perfis plasmidiais

diferentes. A presença dos três plasmídeos típicos (pFra, pYV e pPst), foi

observada em 30 cepas. Em três cepas foi visualizado os plasmídeos pYV e

pPst, em seis cepas os plasmídio pFra e pYV e em quatro cepas apenas o

plasmídeo pYV foi visualizado (Fig. 5, Tabela 1).

5.4 Marcadores de Virulência

Das 43 cepas analisadas foi observada amplificação dos quatro genes

alvo em 31 cepas. Seis cepas amplificaram apenas os genes irp2, caf1 e lcrV;

quatro cepas amplificaram os genes irp2, lcrV e pla, e duas cepas amplificaram

24

25

apenas os genes lcrV e irp2. A amplificação dos genes irp2 e lcrV foi observada

em todas as 43 cepas analisadas (Fig. 6 , Tabela 1).

5.5 Amplificação da IS100

O DNA de 26 cepas (Tabela 1) foi utilizado em ensaios de PCR com

primers específicos para amplificar a seqüência de inserção IS100. O

fragmento esperado foi amplificado em apenas nove cepas, nas outras 15

cepas nenhuma banda foi visualizada. A cepa P.CE 05 foi escolhida como

referência para os ensaios de tipagem por RFLP–IS100, porque a banda

amplificada sempre se mostrou bastante forte e nítida nas diversas repetições.

5.6 Análise do Polimorfismo dos Fragmentos de Restrição reconhecidos

pela sonda IS100 (RFLP-IS100)

Numerosas bandas foram reconhecidas pela sonda. Na parte superior

do gel as bandas estavam muito próximas e pouco nítidas dificultando a

análise. Na metade inferior as bandas se apresentaram bem nítidas e

separadas e facilmente distinguíveis umas das outras (Fig. 7). Para as análises

foram consideradas um total de 19 bandas nítidas e bem separadas que

permitiram construir um esquema baseado na presença ou ausência de seis a

nove bandas (Fig. 8).

Dessa maneira foram identificados oito perfis denominados de grupo I a

GVIII (GI a GVIII). O perfil da P.CE 05 usada como referência foi considerado

GI. Quatro outras cepas apresentaram perfis semelhantes ao da cepa de

referência e foram incluídas no mesmo grupo GI. Três cepas apresentaram

outro perfil, semelhante ao do GI com uma banda a mais e foram classificadas

25

26

no GII. As outras seis cepas apresentaram perfis diferentes entre si e foram

classificadas nos grupos GIII a GVIII (Tabela 2).

Das cinco cepas incluídas no GI, quatro foram isoladas em 1979,

originadas da mesma espécie de roedor, Bolomys lasiurus, do mesmo

município, Guaraciaba do Norte, localizado na Serra da Ibiapaba. A outra cepa

foi originada de um lote de pulgas (Pulex irritans) do mesmo município, em

1982.

Três cepas do GII também foram todas do foco da Serra da Ibiapaba,

sendo uma isolada em 1980, originada de B. lasiurus do município de Ipueiras

e as outras duas isoladas em 1982, uma originada de B. lasiurus e a outra de

um paciente do município de Ipu.

26

27

G- N-

Atípica G- N+

Orientalis

Figura 4. Variedades Geográficas ou Biovars de Yersinia pestis encontradas

nas cepas analisadas.

27

28

5

Figura 5. Gel de agaro

de Y. pestis. Linhas, 1:

28

1 2 3 4

pFra pYV pPst

se 0,6% representativo dos perfis plasmidiais das cepas

P.CE 04; 2: P.CE 20; 3: P.CE 11; 4: P.CE 14; 5: EV76.

29

M 1 2 3 4 5 6 8

Figura 6. Gel de agarose 1% representativo da

PCR-Multiplex, com primers direcionados aos gen

cepas de Y. pestis. Linha M: 100pb DNA-ladder; 0

P.CE 05; 04: P.CE 06; 05: P.CE 07; 06: P.CE 11; 0

29

7

pla lcrV caf1 irp2

s amplificações geradas por

es irp2, caf1, lcrV e pla das

1: P.CE 03; 02: P.CE 04; 03:

7: P.CE 13; 08: P.CE 882.

30

01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14

Figura 7. Hibridização da sonda IS100 com fragmentos de DNA de cepas de Y.

pestis gerados pela clivagem do DNA total com a enzima HindIII. Linhas 01:

P.CE 01; 02: P.CE 03; 03: P.CE 04; 04: P.CE 05; 05: P.CE 06; 06: P.CE 07; 07:

P.CE 09; 08: P.CE 11; 09: P.CE 13; 10: P.CE 14; 11: P.CE 17; 12: P.CE 19; 13:

P.CE 20; 14: P.CE 21.

30

31

01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14

I

GI GII GIII GIV GV GVI GVII GVII

Figura 8. Representação Esquemática dos grupos obtidos pela hibridização da

sonda IS100 com DNA total de cepas de Y. pestis clivado com a enzima

HindIII. GI. Linhas 01: P.CE 04; 02: P.CE 05; 03: P.CE 06; 04: P.CE 07; 05:

P.CE 14; GII Linhas 06: P.CE 09; 07: P.CE 11; 08: P.CE 21; GIII. Linha 09:

P.CE 13; GIV. Linha 10: P.CE 03; GV. Linha 11: P.CE 19; GVI. Linha 12: P.CE

20; GVII. Linha 13: P.CE 17; GVIII. Linha 14: P.CE 01.

31

33

Tabela 1. Distribuição das cepas estudadas segundo a fonte, foco, Município e ano de Isolamento,

Amplificação da IS100, conteúdo plasmidial e genes de virulência.

Cepa Fonte Foco Município Ano deIsolamento

Amplificação IS100

Conteúdo plasmidial/Amplificação dos genes de virulência

pFra/ caf1 pYV/ lcrV pPst/ pla P.Exu 540 Humano Ibiapaba São Benedito 1971 NR +/+ +/+ +/+

P.Exu 554 Humano Ibiapaba São Benedito 1971 NR +/+ +/+ +/+

P.Exu 509 Humano Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1971 NR -/+ +/+ +/+

P.Exu 527 Humano Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1971 + -/- +/+ -/-

P.Exu 541 Humano Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1971 NR -/+ +/+ -/-

P.Exu 542* Humano Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1971 + +/+ +/+ +/+

P.Exu 538 Humano Ibiapaba Ipu 1971 + +/+ +/+ +/+

P.Exu 557 Humano Ibiapaba Ipu 1972 NR +/+ +/+ -/-

P.Exu 558 Humano Ibiapaba Ipu 1972 NR +/+ +/+ +/+

P.Exu 556 Humano Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1972 NR +/+ +/+ +/+

P.CE 01 Humano Ibiapaba Ipu 1978 NR +/+ +/+ -/-

P.Exu 789 Humano Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1978 NR +/- +/+ +/+

P.Exu 804 Humano Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1978 NR +/+ +/+ +/+

P.Exu 797 Rattus rattus Ibiapaba Ipu 1978 NR +/+ +/+ +/+

P.Exu 792* Humano Ibiapaba Ipu 1978 NR +/+ +/+ +/+

P.Exu 801 Humano Ibiapaba Ipu 1978 + +/+ +/+ +/+

P.Exu 807* Humano Ibiapaba Ipu 1978 NR -/+ +/+ +/+

P.CE 03 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipu 1979 + +/+ +/+ +/+

33

34

Cepa Fonte Foco Município Ano deIsolamento

Amplificação IS100

Conteúdo Plasmidial/Amplificação dos genes de virulência

pFra/ caf1 PYV/ lcrV pPst/ pla

P.CE 04 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 + +/+ +/+ -/+

P.CE 05 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 + +/+ +/+ +/+

P.CE 06 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 - +/+ +/+ +/+

P.CE 07 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 - +/+ +/+ +/+

P.Exu 835 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipueiras 1979 - +/+ +/+ +/+

P.Exu 833 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 - +/+ +/+ +/+

P.Exu 842 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 - +/+ +/+ +/+

P.Exu 809 Humano Ibiapaba Ipu 1979 + +/+ +/+ +/+

P.Exu 861 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipueiras 1980 - +/- +/+ +/+

P.CE 09* Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipueiras 1980 - +/+ +/+ +/+

P.CE 11 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipu 1982 - -/- +/+ -/-

P.CE 14 Pulex irritans Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1982 - +/+ +/+ +/+

P.CE 18 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipueiras 1982 NR +/- +/+ +/+

P.CE 19 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipueiras 1982 NR +/+ +/+ -/-

P.CE 20 Bolomys lasiurus Ibiapaba Iboapina 1982 - -/- +/+ +/+

P.CE 21 Humano Ibiapaba Ipu 1982 - +/+ +/+ +/+

P.CE 30 Calomys callosus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1986 - -/+ +/+ -/+

P.CE 882 Humano Ibiapaba Ipu 1997 + +/+ +/+ +/+

P.Exu 795 Humano Baturité Aratuba 1978 NR +/+ +/+ +/+

P.Exu 796 Humano Baturité Aratuba 1978 NR +/+ +/+ +/+

P.CE 17 Bolomys lasiurus Baturité Aratuba 1982 - +/+ +/+ +/+

34

35

Cepa Fonte Foco Município Ano deisolamento

Amplificação IS100

Conteúdo plasmidial/Amplificação dos genes de virulência

pFra/ caf1 pYV/ lcrV pPst/ pla

P.CE 24 Rattus rattus Baturité Redenção 1982 - +/+ +/+ -/-

P.CE 13* Bolomys lasiurus Baturité Maranguape 1982 - +/+ +/+ +/+

P.CE 28 Bolomys lasiurus Baturité Mulungú 1983 - +/+ +/+ +/+

P.CE 25 Humano Baturité Aratuba 1983 - +/+ +/+ -/-

NR: Não Realizada; * Biovar atípico (G-, N-).

35

36

Tabela 2. Distribuição das cepas estudadas segundo origem, foco, município,

ano de isolamento e resultado da tipagem por RFLP-IS100.

Cepa Fonte Foco Município Ano RFLP-IS100.

P.CE 01 Humano Ibiapaba Ipu 1978 GVIII

P.CE 03 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipu 1979 GIV

P.CE 04 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 GI

P.CE 05 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 GI

P.CE 06 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 GI

P.CE 07 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 GI

P.CE 09* Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipueiras 1980 GII P.CE 11 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipu 1982 GII

P.CE 14 Pulex irritans Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1982 GI

P.CE 19 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipueiras 1982 GV

P.CE 20 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ibiapina 1982 GVI

P.CE 21 Humano Ibiapaba Ipu 1982 GII

P.CE 17 Bolomys lasiurus Baturité Aratuba 1982 GVII

P.CE 13* Bolomys lasiurus Baturité Maranguape 1982 GIII

* Biovar atípico (G-, N-).

36

37

6. DISCUSSÃO

A peste está incluída entre as doenças reemergentes pela Organização

Mundial da Saúde devido ao aumento mundial do número de casos humanos;

ocorrência de epidemias em vários países como Perú, India, Madagascar;

surgimento de cepas multidrogas resistentes; e a possibilidade do uso da Y.

pestis em ações de bioterorismo (GALIMAND et al., 1997; INGLESBY et al.,

2000; WHO, 2003). Estes aspectos renovaram o interesse no estudo da Y.

pestis especialmente aplicando técnicas que possibilitem determinar a origem

de uma cepa em uma área sem história de peste ou o surgimento de novos

clones nas áreas endêmicas.

A peste penetrou no Brasil, durante a última pandemia, em 1899, pelo

porto de Santos no estado de São Paulo. Inicialmente atingiu várias cidades

litorâneas, de onde foi eliminada através de medidas sanitárias adequadas,

mas focalizou-se entre os roedores silvestres, na área rural, principalmente na

região Nordeste. No estado do Ceará, a peste foi registrada pela primeira vez

na cidade de Fortaleza no ano de 1900, de onde se irradiou e posteriormente

se fixou em diversas áreas: Serra da Ibiapaba, Serra de Baturité e Chapada do

Araripe (WHO, 1965).

A incidência de peste humana e a ocorrência de epizootias declinaram

nas áreas de foco; entretanto, atividade residual de peste tem sido detectada

nos animais sentinelas, exigindo vigilância permanente dos focos (ARAGÃO et

al., 2002; FUNASA, 2002).

Vários estudos (sensibilidade aos antimicrobianos, perfil protéico, perfil

plasmidial, RAPD-PCR; ribotipagem) foram realizados nas cepas brasileiras de

Y. pestis, no entanto nenhuma correlação pode ser estabelecida entre as

37

38

diferenças encontradas e as características epidemiológicas (HUDSON et al.,

1973; ABATH et al., 1989; GUIYOULE et al., 1994; LEAL et al., 1997; LEAL,

1998; CAVALCANTI et al., 2002; SOBREIRA, 2002).

Esforços estão sendo feitos no sentido de encontrar marcadores

eficientes para detectar mudanças no genoma da Y. pestis que possam ser

associados às características epidemiológicas da peste no Brasil. No presente estudo os resultados das reações de fermentação do

glicerol e redução do nitrato confirmaram que a maioria das cepas de Y. pestis,

dos focos do estado do Ceará, analisadas pertencem a variedade Orientalis (G-

, N+) correspondendo à cepa que se supõe ter sido disseminada durante a

última pandemia (DEVIGNAT, 1951). Cinco cepas não se enquadram nessa

variedade porque não fermentam o glicerol nem reduzem o nitrato. Esta

variedade (G-, N-) também não se enquadra nas outras variedades (G+, N+ e

G+, N-) descritas por Devignat (1951) sendo consideradas atípicas. Esta

característica (G-, N-) foi descrita em cepas brasileiras e de outros países

(HUDSON et al., 1973; KARIMI et al., 1974; MOTIN, et al., 2002; SOBREIRA,

2002), não se descartando a possibilidade de ter ocorrido mutação durante a

estocagem das cepas analisadas.

Todas as cepas dos focos do estado do Ceará, analisadas neste estudo,

produziram predominantemente colônias pigmentadas no meio agar Vermelho

Congo, e o gene irp2 foi amplificado em todas as cepas mesmo após repiques

e vários anos de estocagem. A informação para a pigmentação está codificada

em genes localizados no segmento de pigmentação; e o gene irp2 esta

localizado no segmento de aquisição do ferro do locus pgm. Este locus de

cerca de 102 Kb, limitado por duas IS100, pode sofrer deleções

38

39

espontaneamente in vitro: por completo ou apenas no segmento de

pigmentação. Almeida et al. (1994) constataram a perda do gene irp2 in vitro

em cepas de Y. pestis brasileiras.

Estudos anteriores sobre o conteúdo plasmidial de cepas brasileiras de

Y. pestis mostraram que a maioria possui os três plasmídeos típicos (pFra,

pYV, pPst); entretanto, foi detectada a ausência de plasmídeos em algumas

cepas e a presença de bandas de DNA adicionais. A ocorrência de bandas de

DNA extra nessas cepas não foi relacionada a nenhuma característica

epidemiológica relevante e posteriormente foi mostrado que as mesmas podem

ter resultado de rearranjos dos plasmídeos típicos (multímeros do pPst, formas

lineares do pYV e do pFra), que ocorreram durante a estocagem, após o

isolamento (LEAL et al., 1997; 2000; CAVALCANTI et al. 2002).

As IS são distribuídas nos três plasmídeos e no cromossomo da Y.

pestis. O genoma da Y. pestis é muito plástico e a perda dos plasmídeos ou de

segmento de DNA cromossomal pode ocorrer in vitro durante a estocagem.

Além disso, as populações das culturas de Y. pestis são muito heterogêneas

(PROTSENKO et al. 1992); diferentes colônias da mesma cultura podem

apresentar conteúdo plasmidial diferente, assim como certos segmentos de

DNA podem estar presentes ou ausentes. Portanto perda de plasmídeos ou de

segmentos do DNA cromossomal poderiam interferir nos resultados da tipagem

por RFLP-IS100. Diante disto foi necessário determinar o perfil plasmidial e a

presença de genes de virulência plasmidiais e cromossomais para estabelecer

eventuais correlações com o resultado da RFLP-IS100. Para o estudo foram

selecionadas as amostras que apresentaram o perfil plasmidial e dos genes de

39

40

virulência mais próximas das cepas típicas de Y. pestis, tendo sido descartado

as variantes que apresentaram perfil atípico.

A tipagem de cepas brasileiras de Y. pestis por RAPD-PCR,

polimorfismo de restrição do rRNA e polimorfismo dos segmentos amplificados

com primers direcionados às regiões espaçadoras intergênicas 16S-23S não

detectou diferenças entre as cepas de Y. pestis estudadas (GUIYOULE et al.,

1994; LEAL, 1998; SOBREIRA, 2002).

Nas reações de PCR com o DNA total de 26 cepas e primers dirigidos a

IS100 da Y. pestis apenas nove cepas amplificaram o segmento esperado.

Este resultado foi surpreendente porque numerosas cópias de IS100 estão

presentes no genoma da Y. pestis (PARKHILL et al., 2001; DENG et al., 2002).

A EV76 que foi usada como controle da PCR com os primers da IS100,

surpreendentemente não amplificou a IS. Tal resultado sugere duas

possibilidades, mutação in vitro no fragmento da IS100, na região de

hibridização do primer ou falha técnica na PCR.

A análise dos fragmentos de restrição reconhecidos pela sonda

direcionada a IS100 possibilitou a identificação de oito perfis denominados GI a

GVIII (Fig. 7). O padrão de hibridização com maior concentração de bandas na

parte superior da membrana e bandas separadas na parte inferior foi

semelhante ao observado por Huang et al. (2002).

Vale salientar a presença de uma banda comum em todas as cepas. A

P. CE 17 isolada em 1982, originada de B. lasiurus do município de Aratuba na

serra de Baturité exibe um perfil totalmente diferente das demais exceto pela

banda comum. Em contrapartida o perfil da outra cepa do foco da serra de

Baturité analisada, P. CE 13, também isolada em 1982, originada de B. lasiurus

40

41

do município de Maranguape é bastante semelhante ao do GII, exceto pela

presença de uma banda.

Das cinco cepas do GI quatro foram isoladas em 1979, originadas da

mesma espécie de roedor, B. lasiurus, do mesmo município, Guaraciaba do

Norte, localizado na Serra da Ibiapaba. A outra cepa foi originada de um lote de

pulgas (P. irritans, a pulga do homem) três anos mais tarde (1982), no mesmo

município, sugerindo a permanência deste clone na região.

41

42

7. CONCLUSÕES

Não foi encontrada correlação entre os perfis de RFLP-IS100 e a

presença ou ausência dos plasmídeos. Não foi possível estabelecer correlação

com as variantes nitrato negativo. O RFLP-IS100 possibilitou o agrupamento de

cepas de um mesmo município do foco da Ibiapaba, originados de diferentes

hospedeiros e anos diferentes. Não foi possível demonstrar qualquer

associação no foco de Baturité uma vez que apenas duas cepas foram

analisadas. As outras cepas foram distribuídas em diferentes perfis, entretanto,

apresentaram a banda comum. Outros estudos são necessários com cepas de

outros focos do Brasil e de outros países para definir o potencial diagnóstico

desta banda como marcador geográfico em estudos epidemiológicos.

42

43

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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49

50

ARTIGO

TIPAGEM DE CEPAS DE Yersinia pestis DOS FOCOS DO ESTADO DO

CEARÁ, BRASIL, POR RFLP-IS100.

A.C. de Melo, A.M.P. de Almeida e N.C. Leal Departamento de Microbiologia, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães -

FIOCRUZ/MS, Recife (PE), Brasil.

Manuscrito a ser submetido para publicação na revista

Letters in Applied Microbiology

50

MELO, A.C Tipagem de Cepas de Yersinia pestis por RFLP-IS100 1

TIPAGEM DE CEPAS DE Yersinia pestis DOS FOCOS DO ESTADO DO

CEARÁ, BRASIL, POR RFLP-IS100.

A.C. de Melo, A.M.P. de Almeida e N.C. Leal Departamento de Microbiologia, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães -

FIOCRUZ/MS, Recife (PE), Brasil.

A.C. de Melo, A.M.P. de Almeida e N.C. Leal Objetivos: Conhecer os clones de Yersinia pestis existentes nos focos do estado do Ceará, Brasil, identificar um marcador que possibilite a detecção do surgimento de novos clones ou a introdução de novas cepas. Métodos e Resultados: As amostras foram caracterizadas quanto ao polimorfismo dos fragmentos de restrição reconhecidos por sonda dirigida para a IS100 (RFLP-IS100). Foram identificados oito perfis de RFLP-IS100 denominados GI a GVIII. Conclusão, Significância e Impacto dos Resultados: Nenhuma correlação foi encontrada entre os perfis de RFLP-IS100 e a presença ou ausência dos plasmídeos, nem com as variantes nitrato negativo. A RFLP-IS100 possibilitou o agrupamento de cepas de um mesmo município originadas de diferentes hospedeiros e diferentes anos. As outras cepas estavam distribuídas em diferentes perfis, entretanto, apresentaram uma banda comum. Outros estudos são necessários com cepas de outros focos do Brasil e de outros países para definir o potencial diagnóstico desta banda como marcador geográfico em estudos epidemiológicos.

Correspondência para: Nilma Leal, CPqAM/FIOCRUZ/MS, Campus da UFPE, Cidade

Universitária, 50670-420 Recife (PE), Brasil. (e-mail: [email protected]).

Mestrado em Saúde Pública

MELO, A.C Tipagem de Cepas de Yersinia pestis por RFLP-IS100 2

INTRODUÇÃO

A Yersinia pestis é o agente causador da peste, doença infecciosa dos roedores

usualmente transmitida pelas pulgas, que ocasionalmente podem transmitir a doença a

outros mamíferos e ao homem.

Os registros disponíveis comprovam que a peste foi responsável por elevada

mortalidade em diferentes épocas (Perry e Fetherston, 1997). Atualmente mesmo com a

substancial redução da morbimortalidade continua apresentando grande importância,

acentuada em decorrência do surgimento de cepas resistentes aos antibióticos utilizados

na terapêutica padrão da peste, o que, considerando o seu possível uso na guerra

bacteriológica, a torna uma ameaça à humanidade (Galimand et al. 1997; Inglesby et al.

2000; WHO, 2003).

Pelos métodos fenotípicos de tipagem a Y. pestis se mostra uma espécie muito

homogênea, com apenas um sorotipo, um fagotipo e um biotipo com três biovars:

Antiqua, Medievalis e Orientalis ou Oceanica (Perry e Fetherston, 1997). Os biovars,

definidos pelos resultados das provas de fermentação do glicerol e redução do nitrato,

não se distinguem quanto ao poder patogênico ou a forma clínica da doença, mas têm

uma distribuição geográfica característica sendo por isto considerados variedades

regionais e foram associados a cada uma das pandemias do passado (Devignat, 1951).

Essas informações fenotípicas são insuficientes para rastrear a origem de uma

cepa ou o surgimento de novos clones, por isto vários métodos moleculares estão sendo

utilizados para avaliar semelhanças e diferenças intraespecíficas na Y. pestis. Através da

análise do polimorfismo de restrição do rDNA (ribotipagem) foram identificados 20

ribotipos que foram associados aos biovars (Guiyoule et al. 1994; 1997). A análise do

número variável de repetições em tandem (VNTR), e eletroforese em campo pulsado

(PFGE) estão sendo utilizados para tipagem da Y. pestis (Klevytska et al. 2001; Huang

Mestrado em Saúde Pública

MELO, A.C Tipagem de Cepas de Yersinia pestis por RFLP-IS100 3

et al. 2002) e a análise do polimorfismo do tamanho dos fragmentos de restrição

reconhecidos por sondas derivadas das seqüências de inserção (IS) da Y. pestis (RFLP-

IS) permitiu discernir perfis variados entre cepas de diferentes origens (McDonough et

al. 1997; Huang et al. 2002; Motin et al. 2002).

Neste trabalho foi analisada uma coleção de cepas de Y. pestis dos focos do

estado do Ceará para melhor conhecimento dos clones existentes, identificar um

marcador útil para acompanhar uma possível introdução de novas cepas no território

brasileiro e possibilitar a detecção do surgimento de novos clones.

MATERIAIS E MÉTODOS

Bactérias e condições de cultivo

Foram utilizadas neste estudo 43 cepas de Y. pestis dos focos da Serra da Ibiapaba e

Serra de Baturité, estado do Ceará, isoladas no período de 1971 a 1997 (Almeida et al.

1985; Aragão et al. 2002). Depois de reativadas, as cepas foram cultivadas em caldo

BHI (Brain Heart Infusion Broth, Difco) a 28ºC por 24 a 48 horas para análises

bacteriológicas e moleculares. O fenótipo de pigmentação das culturas foi determinado

por semeio em agar Vermelho Congo segundo recomendações de Bahmanyar e

Cavanaugh (1978). As provas de fermentação do glicerol e redução do nitrato foram

realizados como descrito por Bahmanyar e Cavanaugh (1978). As cepas Y. pestis EV76

e PKR 684 foram utilizadas como controle.

Mestrado em Saúde Pública

MELO, A.C Tipagem de Cepas de Yersinia pestis por RFLP-IS100 4

Extração de DNA plasmidial, total e amplificação de genes de virulência

O DNA plasmidial foi extraído segundo Leal et al. (1997), usando como controle a Y.

pestis EV76 que possui os três plasmídeos prototípicos. O DNA total foi extraído

segundo Maniatis (1982), e quantificado por comparação com DNA do fago λ clivado

com a enzima HindIII.

A presença dos genes plasmidiais pla, lcrV e caf1 e do gene cromossomal irp2

foi determinada por Multiplex-PCR em termociclador (Perkin-Elmer) utilizando DNA

extraído das culturas e primers específicos, conforme descrito por Leal e Almeida

(1999). Em cada grupo de amostras analisadas foi incluído um tubo com DNA

purificado da Y. pestis P.CE 882 (Leal e Almeida, 1999; Aragão et al. 2002; Cavalcanti

et al. 2002), como controle positivo e um tubo sem DNA como controle negativo.

Construção da sonda IS100

Inicialmente foram realizados ensaios de amplificação com o DNA total de 26 cepas e

um par de primers dirigidos a IS100 da Y. pestis descrito por Huang et al. (2002):

IS100-1 (5’GCGCTGGCTGCACGATGTC3’) e IS100-2

(5’GCGCTGGCTGCACGATGTC3’). Na Y. pestis P.CE 05 a banda amplificada se

mostrou forte e reprodutível nas sucessivas repetições e esta cepa foi considerada como

referência na tipagem das outras cepas. A confirmação de que havia sido amplificado o

segmento esperado foi obtida pelo seqüenciamento do segmento amplificado utilizando

o Kit Thermo Sequenase CyTM5 Dye Terminator Cycle Sequencing (Amersham

Biosciences) seguindo protocolo do fornecedor em sequenciador automático Alf II

(Amersham Biosciences) e a seqüência obtida foi comparada com seqüências

Mestrado em Saúde Pública

MELO, A.C Tipagem de Cepas de Yersinia pestis por RFLP-IS100 5

publicadas no Geny Bank www.ncbi.nlm.nih.gov/. A marcação da sonda foi realizada

durante reação de PCR, utilizando a mistura de dNTP marcada com digoxigenina do Kit

digoxigenina-dUTP DIG DNA Labeling and Detection (cat. No. 1093657 - Boehringer

Mannheim). A sonda obtida foi quantificada e titulada para determinação da

concentração de uso.

Clivagem, transferência e hibridização

DNA total das 14 culturas (Tabela 1) foi digerido com a enzima HindIII (Amersham

Biosciences) e submetido a eletroforese em gel de agarose 0,8% em Tampão TBE, sob

voltagem de 50V por 18 horas. Os fragmentos de DNA foram transferidos dos géis para

membranas de náilon pré-tratadas em 20 x SSC, usando o sistema VacuGene XL

(Pharmacia Biotech). As pré-hibridizações e hibridizações foram realizadas a 68ºC em

forno (HybaidTM). A reação foi revelada usando o conjugado anti-DIG-AP (Boehringer

Mannheim) e o substrato cromogênico NBT/Xphosphate (Boehringer Mannheim).

RESULTADOS

Fermentação do glicerol e redução do nitrato

Trinta e oito cepas se revelaram glicerol negativo (G-) e nitrato positivo (N+) e se

enquadram no biovar Orientalis. Cinco cepas se revelaram G- e N- não sendo

enquadradas em nenhuma das três variedades bioquímicas.

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Pigmentação no meio agar Vermelho Congo

Todas as cepas analisadas produziram colônias pigmentadas. 40 cepas produziram

colônias pigmentadas, vermelhas (pgm+). Três cepas produziram tanto colônias

pigmentadas, vermelhas (pgm+) quanto colônias não pigmentadas, brancas (pgm-) em

diferentes proporções no meio ágar Vermelho Congo.

Conteúdo plasmidial

As 43 cepas estudadas apresentaram quatro perfis plasmidiais diferentes. A presença

dos três plasmídeos típicos (pFra, pYV e pPst), foi observada em 30 cepas. Em três

cepas foi visualizado os plasmídeos pYV e pPst, em seis cepas os plasmídio pFra e pYV

e em quatro cepas apenas o plasmídeo pYV foi visualizado.

Amplificação de genes de virulência por multiplex-PCR

Foi observada amplificação dos quatro genes alvo em 31 cepas. Seis cepas amplificaram

apenas os genes irp2, caf1 e lcrV; quatro cepas amplificaram os genes irp2, lcrV e pla,

e duas cepas amplificaram apenas os genes lcrV e irp2. A amplificação dos genes irp2 e

lcrV foi observada em todas as 43 cepas analisadas.

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Polimorfismo dos fragmentos de restrição reconhecidos pela sonda IS100 (RFLP-

IS100)

Numerosas bandas foram reconhecidas em 14 cepas submetidas à hibridização com a

sonda IS100. Para as análises foram consideradas um total de 19 bandas bem

individualizadas (Fig. 1) que possibilitaram a construção de um esquema baseado na

presença ou ausência de seis a nove bandas (Fig. 2). Dessa maneira foram identificados

oito perfis denominados GI a GVIII. O perfil da cepa P. CE 05 usada como referência

foi considerado GI. Quatro outras cepas apresentaram perfil semelhante ao da cepa de

referência e foram incluídas no mesmo grupo (GI). Três cepas apresentaram outro

perfil, semelhante ao do GI, porém com mais uma banda e foram enquadradas no GII.

As outras seis cepas apresentaram cada uma um perfil diferente e foram distribuídas nos

grupos GIII a GVIII. Uma banda estava presente em todas as amostras dos oito grupos

(Fig. 2).

Das cinco cepas incluídas no GI, quatro foram isoladas em 1979, originadas da

mesma espécie de roedor, Bolomys lasiurus, do mesmo município, Guaraciaba do

Norte, localizado na Serra da Ibiapaba. A outra cepa foi originada de um lote de pulgas

(Pulex irritans) do mesmo município, em 1982.

As três cepas do GII também foram todas do foco da Serra da Ibiapaba, sendo

uma isolada em 1980 originada de B. lasiurus do município de Ipueiras e as outras duas

isoladas em 1982, uma originada de B. lasiurus e a outra de um paciente do município

de Ipu.

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DISCUSSÃO

A peste está incluída entre as doenças reemergentes pela Organização Mundial da Saúde

devido ao aumento mundial do número de casos humanos; ocorrência de epidemias em

vários países como Perú, India, Madagascar; surgimento de cepas multidrogas

resistentes; e a possibilidade do uso da Y. pestis em ações de bioterorismo (Galimand et

al. 1997; Inglesby et al. 2000; WHO, 2003). Estes aspectos renovaram o interesse no

estudo da Y. pestis especialmente aplicando técnicas que possibilitem determinar a

origem de uma cepa em uma área sem história de peste ou o surgimento de novos clones

nas áreas endêmicas.

A peste penetrou no Brasil, durante a última pandemia, em 1899, pelo porto de

Santos no estado de São Paulo. Inicialmente atingiu várias cidades litorâneas, de onde

foi eliminada através de medidas sanitárias adequadas, mas focalizou-se entre os

roedores silvestres, na área rural, principalmente na região Nordeste. No estado do

Ceará, a peste foi registrada pela primeira vez na cidade de Fortaleza no ano de 1900, de

onde se irradiou e posteriormente se fixou em diversas áreas: Serra da Ibiapaba, Serra

de Baturité e Chapada do Araripe (WHO, 1965).

A incidência de peste humana e a ocorrência de epizootias declinaram nas áreas

de foco; entretanto, atividade residual de peste tem sido detectada nos animais

sentinelas, exigindo vigilância permanente dos focos (Aragão et al. 2002; FUNASA,

2002).

Vários estudos (sensibilidade aos antimicrobianos, perfil protéico, perfil

plasmidial, RAPD-PCR; ribotipagem) foram realizados nas cepas brasileiras de Y.

pestis, no entanto nenhuma correlação pode ser estabelecida entre as diferenças

encontradas e as características epidemiológicas (Hudson et al. 1973; Abath et al. 1989;

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Guiyoule et al. 1994; Leal et al. 1997; Leal, 1998; Cavalcanti et al. 2002; Sobreira

2002).

Esforços estão sendo feitos no sentido de encontrar marcadores eficientes para

detectar mudanças no genoma da Y. pestis que possam ser associados às características

epidemiológicas da peste no Brasil.

No presente estudo os resultados das reações de fermentação do glicerol e

redução do nitrato confirmaram que a maioria das cepas de Y. pestis, dos focos do

estado do Ceará, analisadas pertencem a variedade Orientalis (G-, N+) correspondendo

ao clone que se supõe ter sido disseminado durante a última pandemia (Devignat, 1951).

Cinco cepas não se enquadram nessa variedade porque não fermentam o glicerol nem

reduzem o nitrato. Esta variedade (G-, N-) também não se enquadra nas outras

variedades (G+, N+ e G+, N-) descritas por Devignat (1951) sendo consideradas atípicas.

Esta característica (G-, N-) foi descrita em cepas brasileiras e de outros países (Hudson

et al. 1973; Karimi et al. 1974; Motin, et al. 2002; Sobreira 2002), não se descartando a

possibilidade de ter ocorrido mutação durante a estocagem das cepas analisadas.

Todas as cepas dos focos do estado do Ceará, analisadas neste estudo,

produziram predominantemente colônias pigmentadas no meio agar Vermelho Congo, e

o gene irp2 foi amplificado em todas as cepas mesmo após repiques e vários anos de

estocagem. A informação para a pigmentação esta codificada em genes localizados no

segmento de pigmentação; e o gene irp2 esta localizado no segmento de aquisição do

ferro do locus pgm. Este locus de cerca de 102 Kb, limitado por duas IS100, pode sofrer

deleções espontaneamente in vitro: por completo ou apenas no segmento de

pigmentação. Almeida et al. (1994) constataram a perda do gene irp2 in vitro em cepas

de Y. pestis brasileiras.

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Estudos anteriores sobre o conteúdo plasmidial de cepas brasileiras de Y. pestis

mostraram que a maioria possui os três plasmídeos típicos (pFra, pYV, pPst);

entretanto, foi detectada a ausência de plasmídeos em algumas cepas e a presença de

bandas de DNA adicionais. A ocorrência de bandas de DNA extra nessas cepas não foi

relacionada a nenhuma característica epidemiológica relevante e posteriormente foi

mostrado que as mesmas podem ter resultado de rearranjos dos plasmídeos típicos

(multímeros do pPst, formas lineares do pYV e do pFra), que ocorreram durante a

estocagem, após o isolamento (Leal et al 1997; 2000; Cavalcanti et al. 2002).

As IS são distribuídas nos três plasmídeos e no cromossomo da Y. pestis. O

genoma da Y. pestis é muito plástico e a perda dos plasmídeos ou de segmento de DNA

cromossomal pode ocorrer in vitro durante a estocagem. Além disso, as populações das

culturas de Y. pestis são muito heterogêneos (Protsenko et al. 1992); diferentes colônias

da mesma cultura podem apresentar conteúdo plasmidial diferente, assim como certos

segmentos de DNA podem estar presentes ou ausentes. Portanto perda de plasmídeos ou

de segmentos do DNA cromossomal poderiam interferir nos resultados da tipagem por

RFLP-IS100. Diante disto foi necessário determinar o perfil plasmidial, presença de

genes de virulência plasmidiais e cromossomais para estabelecer eventuais correlações

com o resultado da RFLP-IS100. Para o estudo foram selecionadas as amostras que

apresentaram o perfil plasmidial e dos genes de virulência mais próximas das cepas

típicas de Y. pestis, tendo sido descartado as variantes que apresentaram perfil atípico.

A tipagem de cepas brasileiras de Y. pestis por RAPD-PCR, polimorfismo de

restrição do rRNA e polimorfismo dos segmentos amplificados com primers

direcionados às regiões espaçadoras intergênicas 16S-23S não detectou diferenças entre

as cepas de Y. pestis estudadas (Guiyoule et al. 1994; Leal, 1998; Sobreira, 2002).

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Nas reações de PCR com o DNA total de 26 cepas e primers dirigidos a IS100

da Y. pestis apenas nove cepas amplificaram o segmento esperado. Este resultado foi

surpreendente porque numerosas cópias de IS100 estão presentes no genoma da Y.

pestis (Parkhill et al. 2001; Deng et al. 2002). A EV76 que foi usada como controle da

PCR com os primers da IS100, surpreendentemente não amplificou a IS. Tal resultado

sugere duas possibilidades, mutação in vitro no fragmento da IS100, na região de

hibridização do primer ou falha técnica da PCR.

A análise dos fragmentos de restrição reconhecidos pela sonda direcionada a

IS100 possibilitou a identificação de oito perfis denominados GI a GVIII (Fig. 2).

Vale salientar a presença de uma banda comum em todas as cepas. A P. CE 17

isolada em 1982, originada de B. lasiurus do município de Aratuba na serra de Baturité

exibe um perfil totalmente diferente das demais exceto pela banda comum. Em

contrapartida, o perfil da outra cepa do foco da serra de Baturité analisada, P. CE 13,

também isolada em 1982, originada de B. lasiurus do município de Maranguape é

bastante semelhante ao do GII, exceto pela presença de uma banda.

Das cinco cepas do GI quatro foram isoladas em 1979, originadas da mesma

espécie de roedor, B. lasiurus, do mesmo município, Guaraciaba do Norte, localizado na

Serra da Ibiapaba (Tabela 1). A outra cepa foi originada de um lote de pulgas (P.

irritans) três anos mais tarde (1982), no mesmo município, sugerindo a permanência

deste clone na região (Tabela 1).

Em conclusão, não foi encontrada correlação entre os perfis de RFLP-IS100 e a

presença ou ausência dos plasmídeos, também não foi possível estabelecer correlação

com as variantes nitrato negativo. No grupo II, uma amostra foi nitrato negativo e duas

foram nitrato positivo, enquanto a amostra do GIII foi negativo. O RFLP-IS100

possibilitou o agrupamento de cepas de um mesmo município do foco da Ibiapaba,

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originados de diferentes hospedeiros e diferentes períodos. Não foi possível demonstrar

qualquer associação no foco de Baturité, uma vez que apenas duas cepas foram

analizadas. As outras cepas foram distribuídas em diferentes perfis, entretanto, todas

apresentaram uma banda comum. Outros estudos são necessários com cepas de outros

focos do Brasil e de outros países para definir o potencial desta banda como marcador

geográfico em estudos epidemiológicos.

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MELO, A.C Tipagem de Cepas de Yersinia pestis por RFLP-IS100 16

01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14

Figura 1.

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01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14

I

GI GII GIII GIV GV GVI GVII GVII

Figura 2.

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Tabela 1. Distribuição das cepas estudadas segundo origem, foco, município, ano de

isolamento e resultado da tipagem por RFLP-IS100.

Cepa Origem Foco Município Ano RFLP-IS100.

P.CE 01 Humano Ibiapaba Ipu 1978 GVIII

P.CE 03 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipu 1979 GIV

P.CE 04 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 GI

P.CE 05 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 GI

P.CE 06 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 GI

P.CE 07 Bolomys lasiurus Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1979 GI

P.CE 09* Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipueiras 1980 GII P.CE 11 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipu 1982 GII

P.CE 14 Pulex irritans Ibiapaba Guaraciaba do Norte 1982 GI

P.CE 19 Bolomys lasiurus Ibiapaba Ipueiras 1982 GV

P.CE 20 Bolomys lasiurus Ibiapaba Iboapina 1982 GVI

P.CE 21 Humano Ibiapaba Ipu 1982 GII

P.CE 17 Bolomys lasiurus Baturité Aratuba 1982 GVII

P.CE 13* Bolomys lasiurus Baturité Maranguape 1982 GIII

* Biovar atípico (G-, N-).

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Figura 1. Hibridização da sonda IS100 com fragmentos de DNA de cepas de Y. pestis

gerados pela clivagem com a enzima HindIII. Linhas 01: P.CE 01; 02: P.CE 03; 03:

P.CE 04; 04: P.CE 05; 05: P.CE 06; 06: P.CE 07; 07: P.CE 09; 08: P.CE 11; 09: P.CE

13; 10: P.CE 14; 11: P.CE 17; 12: P.CE 19; 13: P.CE 20; 14: P.CE 21.

Figura 2. Representação Esquemática dos grupos obtidos pela hibridização da sonda

IS100 e DNA de cepas de Y. pestis clivado com a enzima HindIII. GI. Linhas 01: P.CE

04; 02: P.CE 05; 03: P.CE 06; 04: P.CE 07; 05: P.CE 14; GII Linhas 06: P.CE 09; 07:

P.CE 11; 08: P.CE 21; GIII. Linha 09: P.CE 13; GIV. Linha 10: P.CE 03; GV. Linha

11: P.CE 19; GVI. Linha 12: P.CE 20; GVII. Linha 13: P.CE 17; GVIII. Linha 14: P.CE

01.

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