texto teórico ed 7 relacionamento e liderança

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11~l2 COLABORAÇÃO INTERNACIONAL QUAIS CARREIRAS E PARA QUAL SOCIEDADE? (I) * Jean-François Chanlat PALAVRAS-CHAVE: carreira, gestão de carreira, modelos e tipos de carreira, carreiras e cultura. KEYWORDS: career,career management, models and kinds of careers, careers and culture. * Professor da École des Hautes Études Commerciales, Canadá. ([email protected]) Assinatura E-mail RAE - Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 35, n. 6, p. 67-75 Nov./Dez. 1995 67

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Page 1: Texto Teórico ED 7 Relacionamento e Liderança

11~l2COLABORAÇÃO INTERNACIONAL

QUAIS CARREIRAS E PARAQUAL SOCIEDADE? (I)

* Jean-François Chanlat

PALAVRAS-CHAVE:carreira, gestão de carreira, modelos e tipos de carreira, carreiras e cultura.

KEYWORDS:career,career management, models and kinds of careers, careers and culture.

* Professor da École des Hautes Études Commerciales, Canadá.

([email protected]) Assinatura E-mail

RAE - Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 35, n. 6, p. 67-75 Nov./Dez. 1995 67

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l1~lECOLABORAÇÃO INTERNACIONAL

1. ARTHUR, M.8., HALL, D.T.,LAURENCE, 8.S. (Eds.)Handbook of career theory.New .York: CambridgeUniversity, 1989.

r.,

2. PETERS,T., WÂTERMAN, R.Le prix de t'exoeitence: lessecrets des m$./Ieursentreprises. Pari$:lnteréditions, 1983; OUCHI, W.Théorie Z faire face au défijaponais. Paris: Inter édltlons,1982; ARCHIER, G., SERIEYX.L' emteptise du 3'"" type. Pa-ris: Editions du Seuil, 1984;AKTOUF, O. Le managemententre tradition et renou-vellement. Montréal: GaêtanMorin, 1989.

3. KANTER, R. M. Careers andthe wealth of nations: a macro-perspective on the structure andimplications of career forms.Handbook of career theory.New York: CambridgeUniversity, 1989.

4. GORZ,A.Métamorphoses dutravail Quête du senso Paris:Galilée, 1988.

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Profundamente ligados ao modo de funcionamentoda sociedade industrial e às características de cadapaís, os modelos tradicional e moderno com-preendem quatro tipos de carreira: burocrática,profissional, empreendedora e sociopolítica.

Deeply linked to the operational modes of industrialsociety and to the characteristics of each country,the traditional and modern models comprise fourkinds of career: bureaucratic, professional,enterprising and sociopolitic.

A gestão de carreira é, hoje em dia,um tema da moda, em especial,nas empresas que se destacam

com os últimos desenvolvimentos em ma-téria de gestão de recursos humanos. Omeio universitário faz eco a essas múlti-plas preocupações já há algum tempo, compublicações nesta área. Entretanto, esseinteresse não é um fato recente. Há sem-pre entre as empresas - em particular en-tre as mais importantes - aquelas que es-tão interessadas no desenvolvimento deseu pessoal. O que é novo, na verdade, é aimportância que essa questão tomou nosdias de hoje e o caráter sistemático dasabordagens que se desenvolveram na ma-téria'.

Esta preocupação, como veremos adian-te, configura-se em um contexto de profis-sionalização da gestão de Recursos Huma-nos e, mais genericamente, da renovaçãodos discursos gerenciais, que se apresentadesde o início dos anos 802• A mobilizaçãode pessoal torna-se central nestas novastomadas de posição. Face à concorrêncianacional e internacional e aos novos valo-res sociais, a empresa - se quer sobrevi-ver - deve levar em consideração seu qua-dro de pessoal como um recurso funda-mental. Para tanto, deve observar os dese-jos, as necessidades e as motivações decada um. Agestão de carreira torna-se par-te dessa estrutura política para assegurarque as pessoas recrutadas permaneçam naempresa. Se tais preocupações são legíti-

mas, persiste o fato de que a maior partedos textos sobre carreira deixam de ladoos aspectos mais macroscópicos e, em par-ticular, as relações que as carreiras man-têm com os aspectos econômicos, sociais,culturais e políticos mais amplos", Todavia,é difícil falar a respeito de carreira sem evo-car as estruturas socioeconômicas, as ca-racterísticas do mercado de trabalho, osvalores dominantes, a cultura na qual aempresa está mergulhada e o contexto his-tórico dentro do qual os encaminhamen-tos profissionais se inscrevem. Este é o as-sunto que o presente artigo pretende abor-dar. Após observamos como a idéia de car-reira é uma noção moderna e aquela degestão de carreira é uma idéia ainda maiscontemporânea, deter-nos-emos no enrai-zamento social das carreiras, através dosprincipais perfis e modelos que encontra-mos desde o fim da Segunda Guerra Mun-dial. Nós nos inclinaremos, então, sobre osparadoxos e os desafios que a gestão decarreira enfrenta atualmente, no momentoda racionalização e precarização do traba-lho",

CARREIRA E SOCIEDADE: UM BREVERELATO HISTÓRICO

Anoção de carreira é uma idéia histori-camente recente, aparecendo no decorrerdo século XIX,assim como suas derivadas:carreirismo e carreirista, surgidas no sécu-lo XX.A própria palavra "carreira", como

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QUAIS CARREIRAS E PARA QUAL SOCIEDADE?

nos indica o dicionário, em sua acepçãomoderna, quer dizer: "um ofício, uma pro-fissão que apresenta etapas, uma progressão".Dito de outro modo, a idéia de carreira,nasce com a sociedade industrial capitalistaliberal.

Ao contrário da sociedade feudal, mar-cada por uma divisão social muito estan-que entre o Clero, a Nobreza e o TerceiroEstado (camponeses, artesãos, mercadoresetc.) e por uma grande desigualdade so-cíal", a sociedade industrial capitalista li-beral está, com efeito, fundada sobre asidéias de igualdade, liberdade de êxito in-dividual e progresso econômico e social".Dentro deste quadro, fazer carreira torna-se possível, em teoria, para todo mundo,porém, na prática, como sabemos, é mui-tas vezes diferente. A ideologia individualde êxito, a despeito de seus limites, está nocentro da ordem social moderna. Esta ideo-logia é, em particular, marcante na Améri-ca do Norte, onde a herança feudal foi ine-xistente, a terra facilmente disponível e asdistâncias sociais mais reduzidas do quena Europa". Tal fato permitiu a Mills escre-ver que "na América, o êxito foi um fato uni-versal, uma imagem atraente, um motivo po-deroso e um verdadeiro modo de vida "8. Com-parativamente ao modelo único de êxitosocial fundado sobre o enobrecimento, ouseja, sobre a passagem de uma condiçãosocial a outra, encontrada no Antigo Regi-me, a sociedade capitalista industriallibe-ral emergente abre a porta a modelos desucesso muito variados e encoraja a pro-moção social. É, neste momento, que a car-reira, no sentido moderno, nasce. Anterior-mente, cada um se dedicava ao exercíciode funções que sua origem social e tradi-ção lhes tinham' destinado. O reconheci-mento e a mobilidade social não eram pos-síveis, a não ser pela boa vontade do mo-narca e sendo que esta deveria preservar orespeito às estruturas aristocráticas. O casode Mozart é inteiramente exemplar. Comolembra N. Elias, o artista, mesmo célebre,é ainda no século XVIII, considerado pelamaioria da nobreza como "um domésticosuperior'". Mozart é o primeiro músico a serebelar contra esta condição. Ele pagará opreço pela rejeição social. No século XIX,isto não ocorrerá mais. O artista poderá

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fazer carreira sozinho. Ele não estará maisautomaticamente submetido a um senhor.

A carreira não estará mais subordinadacompletamente à estrutura da classe aris-tocrática. Estamos a um passo de mudar asociedade. Se a idéia de carreira é uma no-ção moderna no sentido que a entendemoshoje em dia, aquela de gestão de carreira éainda mais. É nos anos 80 que vai aparecera idéia de que a empresa deve preocupar-se em gerir as carreiras de seu pessoal Estapreocupação, relativamente nova dentro desua formulação, decorre da importânciaque a empresa adquire no decorrer dosanos 8010 e da profissionalização da gestãoque ocorre em todos os países industriali-zados, ambos durante o mesmo período".O termo gestão torna-se uma palavra damoda. É dentro deste contexto de reabili-tação da empresa e de hegemonia do dis-curso gerencial que surge a noção de car-reira. Ela é igualmente alimentada pelonovo discurso sobre a gestão dos recursoshumanos. De agora em diante, "o capitalhumano" torna-se essencial nas práticas degestão. A gestão de carreira é encarregadade fazer frutificar melhor os interesses dasempresas e de seu pessoal. Se este discur-so novo, não é, hoje em dia, sem parado-xos, cabe ainda considerar que esta gestãonão pode ser feíta sem que se leve em con-ta o enraizamento social das carreiras.

o ENRAIZAMENTO SOCIAL DAS CARREIRAS

Toda sociedade, independente de seutipo, fornece os quadros no interior dosquais as carreiras nascem, desenvolvem-se e morrem. A sociedade industrial capi-talista liberal, que se define pela mobilida-

5. BLOCK. M. La soeiétéféndale. Paris: Albin Michel,1968; WINOCK, M. 1789L'année sans pareille:ehronique. Paris: O. Orban,1988.

6. ARON, R.Dix-huit leçons surla société industrielle. Paris:Gallimard.1964.

7. TOCQUEVILLE, A. De ladémocratie en AmériQue. Pa-ris: Gallimard, 1951.

B. MILLS, C. W. Les eolsblanes. Paris: Éditions du Seuil,1966.

9. ELIAS, N.Mozart soeiologied'un génie. Paris: Seuil, 1991.

10. ROUSSEAUX, N. (dir). Leculte de I'entreprise. Autrement,100, Sept. 1988; SAINSAULlEU,R. (dir.) L'entreprise uneaffairede société. Paris: Fondationnationale des sciencespolitiques, 1990.

11. MINTZBERG, H. Mintzbergon management: inside ourstrange world of organizations.New York: FreePress, 1989.

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Sistema cultural Estrutura social(valores dominantes)

Estrutura econômica

Modelos e tipos-de ca~TeirÇl.

Sistema pol~tico

12. DUNPHY, D. An historicalreview of the Iiteratu re on theJapanese enterprise and it'smanagement. The enterpriseand management in east Asia.Hong Kong Centre of AsiansStudies, University of HongKong, 1986, p. 334-68.

13. Le Japon rejette ses enfantsqui ont vu du pavs. Courrier In-ternacional, n. 70, p. 15, jeudi5 mars 1992.

14. HOFSTEDE, G. Culture'sconsequences, internationalcitterences in work-relatedvalues. Beverly Hills: Sage,1980.

15. DUNPHY, D. An historicalreview 01 the literature ... Op. cit.

16. MAURICE, M., SELLlER, F.,SYLVESTRE, J. P. PolitiquesIndustrielles en France et enAllemagne. Paris: PUF,1982.

17. JOFFRIN, L. Les diplômesne suffisent plus. Le nouveJobserveteur, n. 1437,21-27mai 1992.

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de, não escapa desta regra. Por que ela éconstitutiva desta sociedade. Desde o iní-cio da revolução industrial, numerosas pro-fissões apareceram e desapareceram. Essasmudanças na estrutura dos empregos fa-zem parte da própria natureza de nossassociedades. Todavia, a cultura e a estrutu-ra social de cada sociedade acabam pormodificar as configurações que os tipos eos modelos de carreira podem ter de umpaís a outro.

Apresentamos numerosas situações portestemunho.

Exemplo 1Se tomarmos o caso da grande empresa

japonesa, podemos fazer certas constata-ções:

• só um pequeno número de mulheres po-dem fazer carreira;

• as grandes organizações fazem distinçãoentre antigüidade e posição hierárquica,permitindo aos indivíduos progrediremem reconhecimento e em salário, mesmoquando as possibilidades de mobilida-de vertical são pequenas e as promoçõesraras;

• todos os executivos são forçados a fazerum rodízio de atividades na empresa,acumulando uma série de experiênciasque vão da oficina a um grande númerode serviços;

• o emprego está garantido até os 55 anos-';• os japoneses que tiveram uma experiên-

cia no exterior não são bem reconheci-dos no seu retorno ao [apão".

Esta série de constatações decorrem di-retamente do fato de que a cultura é orien-tada por valores masculinos", a promoçãopassa por um conhecimento global da em-presa e uma direção voltada para o coleti-vo, sendo que o engajamento deve ser to-tal, uma vez que o indivíduo não é nadasem o grupo, já que a cultura japonesa re-jeita aqueles que não se adaptam ao mo-delo padrão".

Exemplo 2Se tomarmos agora o caso da Alemanha,

observaremos que nas empresas alemãs:

• a diferença salarial entre os operários eos executivos é uma das menores dos paí-ses industrializados;

• os operários beneficiam-se de uma for-mação profissional de qualidade;

• os níveis hierárquicos são menores doque numa empresa francesa 16, como ve-remos posteriormente;

• os executivos são recrutados em funçãode sua experiência profissional e estes so-bem escalões, um a um.

Exemplo 3O exemplo alemão contrasta estranha-

mente com o caso da empresa francesa, naqual verificamos que:

• as diferenças entre os operários e os exe-cutivos são maiores;

• os postos de direção são reservados aosdiplomas das grandes escolas;

• o reconhecimento e a especialização são,antes de tudo, uma questão de prestígiodo diploma obtido;

• a experiência estrangeira é relativamen-te pouco valorizada'".

Esta comparação França-Alemanha, re-vela-nos quando dois países europeus vi-zinhos podem ter diferenças em suas ges-tóes de carreira. Tais diferenças não sãocompreensíveis se não as remetermos àcultura, ao sistema de educação e ao modode reprodução das elites. Como mostrourecentemente d'Iribarne, o gerenciamento

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QUAIS CARREIRAS E PARA QUAL SOCIEDADE?

à francesa distingue-se da gestão à ameri-cana ou à holandesa": As relações sociais,as relações de autoridade e a carreira sãovividas diferentemente de um país a ou-tro. A França moderna - herdeira da or-dem social feudal e de valores aristocráti-cos - realiza uma gestão baseada na dis-tinção social e na honra, enquanto que osPaíses Baixos - nascidos de um reagru-pamento igualitário de províncias e de ci-dades desiguais - desenvolveram umagestão mais igualitária, mais consensual.Os Estados Unidos - fundados por mer-cadores religiosos - desenvolveram umalógica contratual baseada na eqüidade e emuma certa ética puritana. É no cerne destesenquadramentos sociais que os modelos decarreira vão se distinguir de uma empresaa outra. Deste modo, a carreira na Françaestá fundada sobre a nobreza do diploma",a carreira alemã, sobre a experiência pro-fissional, a carreira americana sobre osméritos e performances individuais e a car-reira holandesa sobre a especialização e oespírito igualitário".

Exemplo 4Se colocarmos o caso da Suécia, vamos

estar diante de um outro tipo de experiên-cia. Como todos sabemos, a Suécia é umdos países mais igualitários do mundo:

• a igualdade entre os sexos é, ali, a maisforte;

• as diferenças de renda são as mais redu-zidas;

• as diferenças de comportamento entre asclasses são menores do que nos outrospaíses industrializados.

Estas característiscas são reforçadas porum sistema de proteção social bem elabo-rado e por uma forte fiscalização. É nestecontexto que as carreiras dos executivossuecos se desenvolvem. Segundo certosanalistas do cenário sueco, parece que osexecutivos não são muito inclinados àmobilidade geográfica e nem entusiastascom as promoções que impliquem mudan-ças. Podemos compreender essa situaçãoatravés do fato de que o acréscimo de salá-rio e vantagens sociais e materiais, associa-dos a este gênero de promoção, são relati-

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If':J~"'!1i· Os modelos de carreira

o modelo tradlelonal O modelo moderno

um homem um homem e/ou uma mulher

• pertencente aos grupos • pertencente a grupossocialmente dominantes sociais variados

• estabilidade • instabilidade• progressão linear vertical • progressão descontínua

vertical e horizontal

vamente falíveis em relação àgueles que seobservam, em situações comparáveis, emoutros lugares no Ocidente. Isto se explicatambém pelo fato de que o próprio con-junto de executivos tem uma carreira e acultura igualitária da Suécia não favorecea idéia de promoção, já que os suecos per-manecem ligados a um equilíbrio entre avida profisional e a vida familiar, preser-vando seus momentos de lazer e seu gostopela natureza 21, não vendo no individua-lismo um valor em si 22 .

Todos estes exemplos, extraídos de paí-ses diferentes, ilustram o quanto a gestãode carreira não tem o mesmo valor e oquanto esta idéia está enraizada socialmen-te na cultura, na história e nas estruturassociais próprias de cada país. Porém, alémdas diferenças observadas entre as empre-sas de países distintos, podemos depreen-der certos modelos e perfis comuns.

Modelos e tipos de carreiraNas sociedades industrializadas, as car-

reiras podem ser reagrupadas em doisgrandes modelos e quatro tipos principais.O modelo engloba as características fun-damentais da carreira em nossa socieda-de, enquanto os tipos remetem ao aspectoprofissional desta carreira, ou seja, aos di-ferentes encaminhamentos possíveis ofe-recidos a uma pessoa no ambiente de tra-balho.

Dois modelos de carreiraQuando lançamos um olhar sobre a car-

reira nas nossas sociedades desde a virada

18. D'IRIBARNE, P.f,.a toçiouede t'tionneur. Paris: Editions duSeuil, 1989.

19. BOURDIEU, P. La noblessed'État. Paris: Éditions de minuit,1989.

20. D'IRIBARNE, P.La logique ...Op. cit.

21. LAWRENCE, P., SPYBEY, T.Management and society inSweden. Londres: Routledge &Kegan Paul, 1986.

22. GUILLET de MONTHOUX, P.Le modele suédois, dans D.Schnapper et H. Mendras, Sixtmniêres a'étre européen. Pa-ris: Gallimard, 1990.

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npoad.ca•.•.••ra

Burocrática

Profissional

Elemento central eleascensão .

decarreíra

Umltes npoaele

Sociedade deempregados

o nível de perícia ede reparação

Sociedade deperitos

EnrloremlS artesanais,culturais, comunitárias ede caridade

A capacidadepessoalAs exigênciasexternas

ConhecimentoRelaçõesParentesco(Rede sociaQ

FamiliarComunitáriade Clãs

Sociopolrtica Sociedade de clãsHabilidades sociaisCapital de relilCOes .

O número derelações conhecidase ativas

23. DAVID, H. Femmes etemplois. Le défi de I'égalité.Québec: Presses de l'Uniseritédu Québec, 1986.

24. MILLS, C. W. Les colsblancs ... Op. cit.

25. HAREL-GIASSON, F.,MARCHIS-MOUREN, M. F.Débuts de carriêrre au féminin.Gestion, v. 17, n. 1, p. 50-9,1992.

26. LANGLOIS, S. et coll, Lasociété québécoise entendances 1960-1990.Montréal: Institut québécois derecherches sur la culture, 1990.

27. HAREL-GIASSON, F.,ROBICHAUD, J. (dir.) Toutsavoir sur les cadres fémininsd'jei. Montréal: Les PressesHEC, 1988; Corporate womenhow much progress? BusinessWeek, 8 juin. 1992.

28. LANGLOIS, S. et coll, Lasociété québécoise en... Op.cit.

29. McNEIL,J. Ladiversificationdes ressources humainesquébécoises. Gestion, v. 17, n.2, p. 39-48, mai 1992.

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do século, nós podemos facilmente obser-var dois grandes modelos: o modelo tradi-cional e o moderno. O primeiro correspon-de àquele que tem sido o dominante, hojeem dia; o segundo descreve aquele queemerge a partir dos meados dos anos 70.

Como nos mostra a tabela 1, tradicional-mente a carreira é feita por um homem,pertencente aos grupos socialmente domi-nantes. Ela é marcada por uma certa esta-bilidade e uma progressão linear vertical.Esse modelo tradicional está em perfeitaressonância com uma sociedade em que adivisão sexual do trabalho interditou portodas as práticas a carreira das mulheres",a homogeneidade da população era maior,a instrução estava desigualmente reparti-da e as grandes organizações ofereciamempregos, estabilidade e aberturas". Hojeem dia, esse modelo tradicional está aindalargamente presente mais em certos paísesdo que em outros, sendo o Japão - entreos países industrializados - exemplar, sobeste ponto de vista; e, mais em certas in-dústrias do que em outras, como no casode engenharia e finanças, mesmo em socie-dades mais avançadas no domínio daigualdade sexual". Contudo, a partir dosanos 70, surge um outro modelo, menostradicional, resultante das mudanças so-ciais que vamos conhecer nas sociedades,no decorrer dos últimos trinta anos:

• feminização do mercado de trabalho;• elevação dos graus de instrução;• cosmopolitação do tecido social;• afirmação dos direitos dos indivíduos;• globalização da economia;• flexibilização do trabalho etc26•

Esse novo modelo caracteriza-se pelavariedade ao mesmo tempo sexual e social.Numerosas mulheres iniciam, com efeito,em nossos dias, carreiras com os mesmostítulos que os homens". Se a democratiza-ção da educação ajuda as mulheres nesteprocesso, permite igualmente a muitos in-divíduos de origem modesta o acesso a estemodelo". Mais recentemente, a diversida-de étnica cada vez maior de nossa popula-ção só reforça este fenômeno de diversifi-cação de carreiras". Ao contrário do mo-delo tradicional, esse modelo é marcadopela instabilidade, descontinuidade e ho-rizontalidade. No presente momento, ascarreiras são, com efeito, menos estáveis emenos lineares do que antes. A chegadamaciça das mulheres, as mudanças tecno-lógicas e a reestruturação da economia vãointroduzir uma variedade de comporta-mentos anteriormente desconhecidos. Po-demos parar de trabalhar para estudar, es-tudar trabalhando, educar as crianças evoltar ao mercado de trabalho e aos estu-dos, reorientar a carreira mais freqüente-

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QUAIS CARREIRAS E PARA QUAL SOCIEDADE?

mente, tirar uma licença sabática etc. To-das essas coisas, que eram menos realizá-veis no passado, introduzem rupturas nomodelo de carreira tradicional". Veremos,um pouco mais adiante, que esta instabili-dade e esta descontinuidade não são, ain-da hoje, sinônimos de progresso e de bem-estar para todos aqueles a elas submetidos.As aberturas e os encaminhamentos pro-fissionais no interior desses modelos são,por outro lado, múltiplos. Como mostra atabela 2, nós os reagrupamos em quatrograndes tipos:

• burocrático;• profissional;• empreendedor;• sociopolítico.

Cada um desses tipos não só recuperauma tarefa precisa, mas indica tambémuma lógica no caminho a seguir, a nature-za das aberturas profissionais e o sistemade recompensas a ele associado.

A carreira de tipo burocráticoA carreira de tipo burocrático, como seu

nome indica, remete às estruturas burocrá-ticas da organização. Caracteriza-se por:

• divisão elaborada do trabalho;• rígida hierarquia de papéis e de estatutos;• regulamentação onipresente;• centralização de poder;• impessoalizaçâo das relações.

A organização burocrática oferece umavanço dentro de uma carreira que estáestritamente dentro da pirâmide organiza-cional", A cada nível concede-se uma cer-ta responsabilidade, um certo salário e van-tagens sociais formalmente definidas. Aantigüidade e os concursos são geralmen-te a base da seleção, do recrutamento e dapromoção. O recurso central é a posiçãoque se ocupa, e os números de escalõesexistentes estabelecem os limites deste tipode carreira. São numerosos os indivíduosque trabalham dentro de tal universo. Asgrandes organizações de natureza priva-da, pública, paraestatal, ou cooperativa!têm, efetivamente, diversos graus burocrá-ticoS32.

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Este tipo de carreira predominou du-rante muitos decênios, com o crescimentodas grandes empresas e com a criação da-quilo que Mills chamou de La societéd'employes33, no decorrer da primeira me-tade do século XX, ou com o que algunsqualificaram de "sociedades burocráticas" ,epíteto que designou as experiências so-ciais conduzidas até recentemente pelospaíses do Leste e pela URSS34.Hoje, essetipo de carreira está seriamente ameaçadopela crise do Estado, pela reestruturaçãodas empresas, pelo achatamento das hie-rarquias, pelo apelo à criatividade, inova-

ção e iniciativa individual que surgem nonovo discurso gerencial 35. Historicamenteassociada à grande empresa oligopolista oumonopolista e ao seu desenvolvimento,esse tipo de carreira parece, segundo cer-tas análises, pouco adaptado à nova ordem,à concorrência internacional, às mudançastecnológicas e ao apelo à flexibilidade, queminam pouco a pouco as estruturas buro-cráticas".

A carreira de tipo profissionalA carreira de tipo profissional baseia-se

no monopólio de um certo saber, da espe-cialização, da profissão e da reputaçâo".Ela não é uma carreira de tipo vertical,como é, forçosamente, a carreira burocrá-tica. Seu avanço se faz, sobretudo, no inte-rior da disciplina profissional, à medidaque o conhecimento e a experiência se acu-mulam. Um advogado, um engenheiro, ummédico, um notável, um professor ou umpesquisador podem muito bem, ascendera postos de direção, porém, na maioria doscasos, o avanço em sua carreira estará, so-

30. LANGLOIS, S. et coll. l.J1société québécoise en... Op.cit: HAREL-GIASSON, F.,MARCHIS-MOUREN, M. F. Op.clt.

31. WEBER, M. Économie etsociété. Paris: Plon, 1972.

32. CROZIER, M. Le phéno-mêne bureaucratique. Paris:Éditions du Seuil, 1962; CLEGG,Modem organization. Londres:Sage, 1990.

33. MILLS, C. W. Les co/sblancs ... Op. cít,

34. CASTORIAOIS,C.1.J1socié-té bureaucratique. Paris: UGE,1973.

35. MESSINE, P. Les satur-niens. Paris: La découverte,1987.

36. KANTER,R. M. Careersandthe wealth of.... Op. cit.

37. SÉGUIN, F.,HAMEl, P. leshauts et les bas de la professioncomplable. Gestion, v. 7, n. 1,p. 18-24, 1982.

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bretudo, ligado à sua reputação e ao seusaber. Enquanto a pessoa tem os meios e acapacidade de aprender e de aperfeiçoar-se, ela pode crescer no interior de sua pro-fissão. Ao contrário da carreira burocráti-ca associada, muitas vezes, a uma organi-zação em particular, a carreira de tipo pro-fissional oferece uma mobilidade maior,uma vez que seu recurso central é a espe-cialização reconhecida. Os profissionaistendem a desenvolver uma lealdade maiorem relação à profissão do que em relação àorganização que o emprega. Isto explicaporque eles têm, em geral, maior mobili-

38. MILLS, C. W. Les colsblancs ...Op. cit., SÉGUIN, F.,HAMEL, P. Les hauts et les basde la profession ... Op. cit.

39. MINTZBERG, H. Mintzbergon management ... Op. cit.

40. ALLEN, T. J., KATl. R.Managing engineers andscientists: some newperspectives. I~: EVANS, P.,DOl, V., LAURENT, A. Humanresource management ininternational firus. Londres:MacMillan, 1989, p. 191-99.

41. MINTlBERG, H. Mintzbergon management ... Op. cit.

42. TOULOUSE, J. M.L'entrepreneurship. MOIltréal:Les Presses HEC, 1979.

43. MILLS, C. W. Les colsblancs ... Op. cit.

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dade do que os outros, desde que a orga-nização já não os satisfaça. Todavia, a in-dependência e a autonomia próprias dotrabalho profissional tornam-se, hoje emdia, variadas. Este tipo de carreira de tipoprofissional está cada vez mais inserido nasgrandes estruturas", para as quais Mintz-berg deu o qualificativo de burocráticasprofissionais".

O interesse, neste tipo de carreira, resi-de justamente no fato de que o desenvol-vimento e o avanço pessoal não estão to-talmente ligados à hierarquia e aos níveishierárquicos, como é o caso da carreira detipo burocrático, mas sim à própria natu-reza do trabalho. Pode-se, assim, avançarnesta profissão, em função da especializa-ção, pela participação em projetos interes-santes'", Tal carreira terá, portanto, maiorimportância nas sociedades orientadas emdireção a uma cultura de especialistas.

Contudo, um excesso de profissionaliza-ção, notamente em gestão, comporta umcerto risco, simultaneamente, para as socie-dades, para as organizações e para os in-divíduos, porque pode desembocar nummodo de gestão abstrato, formado por umgrupo de especialistas geralmente distan-tes da realidade bem concreta da vida or-ganizacional".

A carreira de tipo empreendedorA carreira de tipo empreendedor está

ligada às atividades de uma empresa in-dependente, traçadas por uma pessoa. Essetipo de carreira é, em geral, identificadacom o empreendedor econômico. Hoje emdia, há uma concepção mais ampla destetipo de carreira. Os artistas, os fundadoresde empresas culturais, comunitárias oubeneficentes são aqui considerados sob omesmo título que os artesãos, os comer-ciantes e os patrões das pequenas e médiasempresas",

A carreira empreendedora é constituti-va de nossa sociedade capitalista liberal ede sua ideologia de sucesso individual. Nodecorrer do século XIX, ela foi particular-mente valorizada, pois, era a ilustração dasuperioridade liberal sobre a sociedadearistocrática feudal. O sucesso não era maisfruto do nascimento mas sim resultado dotalento, do trabalho e da poupança de umindivíduo honesto". Já no século XX,a car-reira do tipo empreendedor, sem desapa-recer, foi largamente substituída pelos doistipos de carreira precedentes. A complexi-dade dos problemas, a concentração dasempresas, a expansão do Estado relegaramesta carreira ao segundo plano. Há algunsanos, a carreira de empreendedor, após tersido eclipsada pela expansão das grandesorganizações, parece ressurgir de maneirainteressante. Fatores como: as dificuldadesdo setor público, a crise do Estado-Previ-dência, as dispensas maciças em certas in-dústrias, a concorrência internacional pa-recem ter empurrado, por sua vez, os go-vernos, as empresas e as sociedades paravalorizarem novamente este tipo de carrei-ra. Nos países do Leste, da era pós-comu-nista, e na ex-União Soviética, ela transfor-mou-se num objeto de culto. Às vezes, paranão dizer com freqüência, ela se confunde

RAE • v. 35 • n. 6 • Nov./Dez. 1995

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QUAIS CARREIRAS E PARA QUAL SOCIEDADE?

mesmo com aquilo que, certamente entrenós, consideraríamos como simples pira-taria comercial. Mais arriscada do que osdois outros tipos de carreira, a carreira deempreendedor oferece, em caso de suces-so, recompensas materiais mais elevadase, em certos casos, bem consideráveis. Bas-ta pensar em todos estes empreendedoresque partiram do nada e ficaram bilionários.Tal êxito não será jamais alcançado por umburocrata ou por um profissional de altonível, a menos que, bem entendido, elepróprio se transforme em um empreende-dor. Isto não impede que numerosas pes-soas defendam, cada vez mais, o desenvol-vimento do espírito de empreendimento eas características associadas ao empreen-dedor: criatividade, inovação, gosto pelorisco, além de independência nos cargosexecutivos e não-executivos das grandesempresas para melhorar o desempenho:nasce, então, o intrapreneurship": Nossasociedade parece fazer desta, a grande car-reira, por excelência. A precarização cadavez maior do trabalho e uma taxa de de-semprego tenaz, podem levar às pessoas acriarem seu próprio emprego". Apesar dis-to, pode-se questionar a qualidade destenovo tipo de carreira, o de tipo empreen-dedor.

A carreira de tipo sociopolíticoA carreira de tipo sociopolítico baseia-

se nas habilidades sociais e no poder derelações de que dispõe uma pessoa. O ele-mento central aqui não é nem a posiçãonem a especialização ou a inovação cria-dora, mas sim o capital de conhecimentos,de relações e de pertencimento a um nívelsocial e bem estruturado e entendido. Égraças a esse nível de relações que a car-reira se constrói e as promoções são obti-das. Encontra-se, neste tipo de carreira, asempresas de tipo familiar, comunitária ouem clãs. É um tipo particularmente domi-nante em certas partes do mundo, notada-mente na África negra, onde a solidarie-dade étnica tem maior importância, namaior parte do tempo, do que a competên-cia profissional, as regras burocráticas ouo dinamismo empresarial" . Pode tambémser observada dentro de nossas sociedades.Se este tipo de carreira parece legítimo, em

No pr~sente momento, as carreirassãO, com efeito, menos estáveis e

menos lineares do que antes.

certos casos, como nas empresas família-res, por exemplo, ele é denunciado, mui-tas vezes, em outros universos, em espe-cial dentro das estruturas burocratizadas,estando associado ao nepotismo. Não foicolocada a própria burocracia para justa-mente por fim à arbitrariedade e ao favo-ritismo"?

De certa forma, o capital de relaçõesdesempenha um papel sobre os três tiposde carreira já apontados. A carreira não é,jamais, unicamente o fruto da sorte, da cria-tividade dos talentos ou da competência,ela é também o produto de um tecido derelações, como nos indicam certos estudosclássicos sobre a maneira em que as pes-soas se reconduzem ao emprego. O parti-cular no tipo de carreira sociopolítico, é queneste o capital de relações domina larga-mente todo o resto. Em certas empresas,nas quais o caráter do clã é fortementeacentuado, ele substitui com vantagem, odiploma, os concursos, a antigüidade e acompetência profissional.

O modelo tradicional e os tipos de car-reira que descrevemos estão inscritos emuma sociedade baseada, até meados dosanos 70, sobre a estabilidade, o enriqueci-mento, o progresso e uma divisão sexual esocial do trabalho bem delimitada. O mo-delo moderno emergente, ao qual aludi-mos, enraíza-se em um outro tipo de socie-dade. Ao criar abertura para as mulheres epara as minorias, este novo tipo de socie-dade está em vias de instalar uma novadivisão do trabalho, o qual questionará aprópria noção de carreira para a maioriada população. Este importante paradoxo,que se liga às outras constatações, inquie-ta àqueles e àquelas que se preocupam jus-tamente em gerir os encaminhamentos pro-fissionais. O

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Artigo recebido pela Redação da RAE em junho/1994, avaliado e aprovado para publicação em novembro/1994.

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Artigo originalmente publicadona revista Gestion, v. 17, n. 3,p. 100-11, 1992, sob o títuloPeut-on encore 'faire-caniére?Tradução de Maria José Tonelli,revista por Edith Seligmann Sil-va, professoras do departamen-to de Fundamentos Sociais eJurídicos da Administração daEAESP/FGV.

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