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0 FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA PARAÍBA FESP FACULDADES CURSO DE DIREITO TÉRCIO JOSÉ MORAIS DO REGO CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA A LUZ DO CÓDIGO CIVIL E DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR JOÃO PESSOA 2009.2

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FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA PARAÍBA

FESP FACULDADES CURSO DE DIREITO

TÉRCIO JOSÉ MORAIS DO REGO CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA A LUZ DO CÓDIGO CIVIL E DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

JOÃO PESSOA 2009.2

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TÉRCIO JOSÉ MORAIS DO REGO

CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA A LUZ DO CÓDIGO CIVIL E DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Monografia apresentada à Banca Examinadora da Faculdade de Ensino Superior da Paraíba- FESP FACULDADES, com exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Odon Bezerra Cavalcanti Sobrinho. Área: Direito do Consumidor

JOÃO PESSOA 2009.2

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TÉRCIO JOSÉ MORAIS DO REGO CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA A LUZ DO CÓDIGO CIVIL E DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

BANCA EXAMINADORA ______________________________________ Prof. Odon Bezerra Cavalcanti Sobrinho

______________________________________Prof. Duina Porto Belo

_____________________________________ Prof. Ana Carolina Gondim de Albuquerque

Oliveira

JOÃO PESSOA 2009.2

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“Dedico este trabalho a Deus por tantas bênçãos que recebi e por dar-me força para suportar as dificuldades da vida”.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente ao Senhor Jesus Cristo, que é o Senhor e Salvador de todos nós, e que me deu capacidade de estar concluindo mais uma etapa importante da minha vida. Aos meus pais, que contribuíram de maneiras diferentes e, acima de tudo, por acreditarem em mim. Ao meu irmão, pela compreensão e pelas vezes que me ajudou para que eu concluísse meu trabalho com tranquilidade. Ao meu orientador, por todo aprendizado, incentivo e confiança que me foi depositada. A todos os meu amigos de sala, que tiveram sua parcela de contribuição para a conclusão do meu curso. À minha professora de monografia, pois, sem suas preciosas orientações seria impossível organizar meu trabalho.

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“Uma grande vitória só é possível se precedida de pequenas vitórias sobre nós mesmos.”

Leonid Maksimovich Leonov

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RESUMO O trabalho monográfico a seguir vai abordar as disciplinas de direito civil e direito do consumidor tendo por objetivo discutir os contratos de adesão, especificamente nos contratos de alienação fiduciária no âmbito das duas disciplinas. A idéia de fazer esta monografia surgiu da necessidade de analisar esta modalidade de contrato, que tem como característica a compra de um bem com recursos fornecidos por financeiras, e revendidos para estas, ficando assim com o domínio até o pagamento total do valor fornecido para a compra. Este tipo de contrato está inserido nos contratos de adesão, que são contratos com cláusulas pré-estabelecidas unilateralmente pela parte mais forte economicamente, ficando o consumidor como aderente ou não deste contrato, impossibilitando qualquer negociação entre as partes sobre as cláusulas contratuais. Com o crescimento do uso deste tipo de contrato aumentado também o número de Ações revisionais, pois o consumidor adere a um contrato cláusulas preestabelecidas e com o decorrer do tempo fica impossibilitado de cumprir o que foi acordado, seja por algum imprevisto que tenha alterado a condição econômica do aderente, seja pela caracterização de cláusulas abusivas inseridas no contrato elaborado pelo fornecedor. Este trabalho tem como objetivo mostrar as dificuldades enfrentadas pelo consumidor ao celebrar um contrato de adesão desta natureza, e esclarecer seus direitos. Palavras-chave: Contrato de adesão. Alienação fiduciária. Relação de consumo. Ação revisional.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..................................................................................... CAPÍTULO I - CONTRATOS............................................................... 1.1 Conceito de Contratos ................................................................ 1.2 Evolução Histórica dos Contratos ............................................ 1.3 Espécies de Contratos ............................................................... CAPÍTULO II - CONTRATOS DE ADESÃO (ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA) A LUZ DO CÓDIGO CIVIL .......................................... 2.1 Disposições Gerais ..................................................................... 2.2 Definições de Contrato de Adesão ........................................... 2.3 Contrato de Adesão no Código Civil (alienação fiduciária) CAPÍTULO III - CONTRATOS DE ADESÃO (ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA) A LUZ DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR 3.1 Cláusulas Abusivas ....................................................................

3.1.1 Previsão dos contratos de adesão no CDC...................... 3.1.2 Definição de cláusulas abusivas ...................................... 3.1.3 O controle das cláusulas abusivas ...................................

3.2 Ação Revisional de Contratos ...................................................

3.2.1 Conceito .............................................................................. 3.2.2 Requisitos legais .................................................................

CAPÍTULO IV TEORIA DA IMPREVISÃO ........................................ 4.1 Considerações sobre Teoria da Imprevisão ........................

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4.1.1 Cláusula do Rebus Sic Stantibus ...................................... 4.1.2 Princípio do Pacta Sunt Servanda .................................... 4.1.3 Teoria da imprevisão na jurisprudência brasileira ...........

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................... REFERÊNCIAS ..................................................................................

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INTRODUÇÃO

Os contratos preveem que, uma vez manifestada a vontade, as partes envolvidas

estão ligadas por este, gerando direitos e deveres que deverão ser cumpridos, e que só

poderão se desvincular em caso de outro acordo de vontade, por força maior ou caso

fortuito.

Diante dessa realidade, surgiram os contratos de adesão. Estes são elaborados

antecipadamente pelo fornecedor, restando ao consumidor, que é a parte mais

vulnerável economicamente, aderir a este ou não. É fato que os contratos de adesão

trouxeram melhorias e deram mais agilidade às negociações comerciais, porém, muitas

vezes, eles vêm recheados de cláusulas que favorecem aos fornecedores, visto que

são estes que elaboram o contrato.

A escolha do tema deve-se às várias discussões na doutrina e também para se

alerte o consumidor ( parte vulnerável na relação comercial ) sobre os abusos presente

neste tipo de contrato, e assim possibilitar a igualdade entre as partes e a perfeita

formação do contrato.

A pesquisa será desenvolvida através da corrente metodológica dedutiva, para

isso, partimos de uma idéia geral sobre os contratos, para em seguida, explanarmos

sobre os contratos de alienação fiduciária, que estão inseridos nos contratos de

adesão.

Em relação à classificação dos procedimentos técnicos, será utilizada a pesquisa

bibliográfica, desenvolvida a partir de material já elaborado, que se constitui,

principalmente de livros, artigos jurídicos e da própria lei, além da internet, fonte muito

importante de acesso à pesquisas jurídicas.

A composição da monografia a seguir está organizada da seguinte maneira: o

primeiro capítulo tratará de forma geral, da conceituação do contrato, sua evolução

histórica e também demonstrar e definir as principais espécies de contratos, com

destaque ao contrato de alienação fiduciária.

O segundo capítulo irá abordar especificamente os contratos de adesão, no

geral, apontará suas diversas definições de alguns doutrinadores, uma vez que os

contratos de alienação fiduciária estão inseridos neste instituto, e demonástrar de que

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forma esta modalidade de contrato estar previsto no nosso Código Civil Brasileiro.

No terceiro capítulo será analisada a ação revisional, seu conceito, seus

requisitos legais para o ingresso no Judiciário, pois que houve um notável crescimento

no número desse tipo de ação.

Por último, será abordada a Teoria da Imprevisão, a relação conflitante entre a

cláusula Rebus Sic Stantibus e o princípio do Pacta Sunt Servanda, e o posicionamento

da jurisprudência em relação a esta teoria, já que, na maioria das vezes a revisão

contratual faz-se necessária se o consumidor não está mais conseguindo arcar com a

obrigação, ou alguma anormalidade que não foi prevista, tenha acontecido na vigência

do contrato, entre outros motivos.

A pretensão desse trabalho é trazer à tona um tema que nunca esteve tão

presente no nosso cotidiano e demonstrar a sua importância no nosso ordenamento

jurídico. A presente pesquisa tem como objeto estudar o contrato de alienação fiduciária

ligados ao direito do consumidor e do direito civil, tema é de grande relevância

atualmente, devido ao grande aumento da utilização dessa modalidade de contrato nas

negociações comerciais na aquisição de bens móveis, e ao aumento do número de

ações que chegam todos os dias aos tribunais, cobrando do Poder Judiciário uma

solução para a abusividade daqueles que elaboram esses contratos.

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CAPÍTULO I

CONTRATOS

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1.1 Conceito de Contratos

Antes de dar início a esta discussão acerca dos contratos de alienação fiduciária,

faz-se necessária a apresentação histórica dos contratos, seus princípios gerais e seus

conceitos.

Os contratos encontram-se no elo dos sistemas social, econômico e jurídico.

Como sabemos, o contrato é um acordo entre duas ou mais pessoas em relação a um

determinado objeto, e reconhecido pelo direito como fato social que se torna relação de

direito mesmo, não sendo submetido à controle de validade jurídica.

A ordem contratual é de certa forma uma ordem privada, pois um contrato pode

permanecer fora da esfera do direito estatal sem que sua natureza jurídica seja

alterada. Apesar do direito objetivo prevê regras para a constituição de um contrato,

nem a administração pública nem os tribunais garantem, a não ser posteriormente, que

haja uma demanda nesse sentido.

Domat ( LOUREIRO, 2005, p. 23) escrevia no século XVII que:

“o uso das convenções é uma continuação natural da ordem da sociedade civil, e de ligações que Deus forma entre os homens. Porque como ele se tornou necessário, para todas as suas necessidades, o uso recíproco de sua indústria e de seu trabalho, e os diferentes comércios das coisas, é principalmente pelas convenções que eles se acomodam.”

O contrato, em sentido estrito, é definido como acordo de vontades que produz

efeitos obrigacionais no âmbito patrimonial. Já em sentido amplo, o contrato denomina

todo negócio jurídico originado do concurso de vontades. Nessa ótica, o contrato é um

tipo de negócio jurídico que se distingue na sua formação, por exigir a presença de pelo

menos duas partes.

Atualmente, o conceito de contrato é tão amplo quanto a idéia do acordo entre

duas ou mais pessoas, tendo como limite a natureza jurídica e patrimonial do objeto, ou

seja, não atingindo acordos sobre objetos não-jurídicos ou que não sejam de cunho

patrimonial.

Para Ruggiero (LOUREIRO, 2005, p. 25-26):

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Não merece aplausos a doutrina que, separando o contrato da convenção, e subordinando aquela a esta, restringe em limites mais acanhados a noção de contrato moderno, porque ou ela separa, para os contrapor, os dois conceitos, o que é falso, ou limita-se a um simples expediente para destacar um contrato obrigatório de todos os outros negócios bilaterais, que também tem o nome e a disciplina de contrato, e todo o seu valor se reduz então a uma simples distinção verbal. O mesmo se pode dizer, aliás, do que sucede aqueles que, suprimindo qualquer distinção, dão a própria palavra contrato uma acepção dupla: entendendo-a em sentido restrito como sinônimo de convenção obrigatória, de modo que incluem só aqueles que geram obrigações ( e, subtendendo-se, obrigações patrimoniais ), como a venda, a locação, a sociedade, o mútuo, a doação; e em sentido lato como sinônimo de convenção, sem mais nada, abraçando qualquer outro encontro de duas declarações de vontade, como pode verificar-se, por exemplo, na tradição, no casamento, na novação, na compensação convencional e no pagamento.

Muitos códigos deram-se o trabalho de definir o contrato, como, por exemplo, o

código francês, através do artigo 1.101, e o argentino (artigo 1.137).

Como se sabe, o contrato pressupõe a relação de duas ou mais pessoas de

acordo sobre determinado objeto, mas existe um caso em que ocorre o autocontrato:

se o contratante intervém por si mesmo, em seu próprio nome, e como representante de outrem; então sim, não repugnará ao sistema de nossa legislação o contrato consigo mesmo. Nesse caso, embora intervenham só indivíduo, manifesta ele sua vontade de dois ângulos diferentes, sob duas roupagens diversas. São duas vontades jurídicas distintas, posto que expressas por uma só pessoa (SELBSTVERTRAG )

O autocontrato ocorre, por exemplo, no contrato de fornecimento, realizado pela

mesma pessoa, como parte e administradora da entidade jurídica fornecedora.

Já para Aristóteles, o contrato era uma lei feita por particulares, tendo em vista

determinado negócio; A escola de Kelsen vê o contrato como a criação de uma norma

jurídica particular. (BARROS, ano, p. 4-5).

1.2 Evolução histórica dos Contratos

O contrato é um instituto de construção recente, apesar de sempre terem existido

operações econômicas. De acordo com Roppo :

se é possível afirmar, em termos de larga aproximação, que a progressiva

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jurisdicionalização dos comportamentos e o desenvolvimento da civilização, já não é possível identificar o momento histórico em que na organização social surge o instituto do contrato.

No direito romano, as operações já estavam sujeitas a um sistema de normas. O

contrato surge como categoria independente do pensamento jurídico.

Nos séculos V e VI a. C., o contrato já era conhecido pelos cidadãos, pois eles

podiam dispor livremente dos seus bens. No direito grego a transferência de

propriedade era efetivada apenas por efeito do contrato, efeito este limitado às partes.

Na Grécia havia um sistema de publicidade semelhante ao nosso sistema de registro de

atos, o que tornava maior a proteção a terceiros e mais segura do que em Roma, onde

não havia esse tipo de sistema.

O processo e a sofisticação das operações econômicas estão diretamente

ligadas à evolução histórica dos contratos. As atribuições assumidas pelos contratos no

âmbito dos sistemas econômicos arcaicos foram comparadas com funções que

exercidas pelo contrato no quadro de uma formação econômico-social, é notório

grandes diferenças quanto à difusão e a dimensão efetiva em relação ao emprego do

contrato. Gradativamente o contrato foi tornando-se um instrumento essencial no

funcionamento de todo o sistema econômico e nas relações sociais.

O contrato e a evolução do modo de produção tem uma ligação muito estreita,

pois as primeiras elaborações da moderna teoria do contrato ocorreram em uma época

e em um lugar onde surgia o capitalismo. Não foi por acaso também que a supremacia

burguesa e o amadurecimento da Revolução Industrial deram origem ao Código de

Napoleão.

No direito romano clássico, o instrumento existente era a stipulatio, instrumento

este que englobava as convenções e os pactos de diversas naturezas. Outro

instrumento da época era a negotia; este adquiriu tamanha importância que era

considerado merecedor de tutela jurídica. Nesse período, o ato de negociar, de fazer

circular riquezas, era bem mais importante do que a formalização jurídica, que ainda

não era autônoma.

Os romanos faziam a distinção entre o contrato, a convenção e o pacto, da

seguinte forma:

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a) Contrato: relação constituída com base no acordo se não o próprio. b) Convenção: elemento subjetivo das vontades. c) Pacto: todos os acordos privados das formas e das solenidades previstas pelo direito, ficando excluso da categoria dos contratos (RUGGIERO p. 25).

No direito inglês também não existia o contato como instrumento autônomo.

Caso não fosse cumprido ou fosse cumprido de maneira parcial a obrigação prometida,

o promissário poderia ingressar com uma ação ex delicto. A quebra do contrato era

considerada um dano. Depois de um longo período é que foi reconhecido, na common

law, o contrato como fonte autônoma.

1.3 Espécies de Contratos

Com a evolução do instituto dos contratos, foram surgindo várias espécies de

contratos, uma vez que as relações econômicas tornaram-se mais complexas,fazendo-

se necessário, pois, determinadas espécies de contratos para cada tipo de negociação.

1.3.1 Do contrato de compra e venda

Este é um contrato bilateral, no qual uma pessoa compromete-se a passar a

propriedade de um bem, seja este corpóreo ou incorpóreo, para outra pessoa que se

comprometeu em pagar certo valor em dinheiro por este bem.

A partir deste conceito, surgem quatro caracteres do contrato de compra e

venda:

a) Contrato Consensual: a compra e venda é resultado de consenso sobre certas

condições, como, por exemplo o bem e o preço.

b) Contrato a Título Oneroso: prevê uma contrapartida que é o pagamento do

valor em dinheiro.

c) Contrato Pessoal: o vendedor compromete-se a passar a propriedade, que

acontece com a tradição, no caso bens móveis, ou com o registro de títulos, no caso de

bens imóveis.

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d) Contrato Bilateral: as partes assumem direitos e obrigações para com o outro,

pois passam a ser credor e devedor respectivamente.

Em geral, o contrato de compra e venda consiste num contrato de execução

instantânea, pois o vendedor entrega a coisa no momento em que recebe o valor.

Existem casos em que a execução é demorada, como, por exemplo nos contratos de

compra e venda a prazo, em que o preço é dividido em várias parcelas ou pago em

certo tempo após a entrega real ou ficta.

Os elementos necessários ao contrato de compra e venda são os seguintes:

a) Coisa: esta deve estar sujeita à alienação, pois, caso contrário, o contrato será

nulo.

b) Preço: deve ser determinado ou determinável, seja por terceiro ou por taxa de

mercado ou outros critérios de fixação, sendo vedado o preço incerto.

1.3.2 Compromisso de compra e venda

Este é um contrato no qual uma das partes compromete-se a vender um bem a

outra mediante pagamento de certo preço dentro do prazo estabelecido. Este tipo de

contrato é celebrado de maneira antecipada, antes da efetivação da negociação.

1.3.3 Permuta

Este tipo de contrato era celebrado nas sociedades mais antigas, na permuta de

bens em excesso, como, por exemplo, os alimentos, essencial para a subsistência

humana. Este tipo de contrato só foi substituído pelo contrato de compra e venda com o

surgimento da moeda.

Nos dias de hoje, ainda podemos ver a permuta presente, como, por exemplo, no

ramo da construção civil, onde o construtor dá ao proprietário do terreno em que

construirá o seu empreendimento, unidades autônomas futuras.

A permuta é um contrato bilateral e oneroso no qual uma das partes

compromete-se a dar um determinado bem a outra. Caso uma das partes não cumpra

sua obrigação, a outra poderá opor exceção de contrato não cumprido.

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1.3.4 Contrato estimatório

O contrato estimatório, mais conhecido como venda em consignação, é aquele

em que o consignante passa a posse do bem para o consignatário e este fica

autorizado a vendê-lo pelo preço combinado dentro do prazo estabelecido; havendo a

possibilidadede, caso não consiga fazer a venda no prazo previsto, devolver o bem ao

consignante.

Este tipo de contrato é um contrato bilateral, porque gera obrigações para ambas

as partes; também oneroso porque prevê retribuição pela prestação de uma das partes

e, por último, é real, pois se aperfeiçoa com a entrega do bem.

O contrato estimatório é muito utilizado nas negociações de veículos, em

mercados de artes e de jóias, visto que este tipo de contrato só pode ter como objeto

bens móveis que possam ser livremente alienados.

1.3.5 Contrato de doação

No contrato de doação ocorre que uma pessoa, por livre e espontânea vontade,

faz uma transferência do seu patrimônio para outra que os aceita sem nenhum tipo de

retribuição. É um contrato a título gratuito, mas entre vivos, visto que na nossa

legislação é vedada a doação causa mortis.

Além de ser um contrato gratuito, é também unilateral, visto que só o doador

assume obrigações. Ele também é de caráter pessoal pois não há imediata

transferência de propriedade.

A doação tem por objeto qualquer bem com valor patrimonial, seja móvel ou

imóvel, que seja alienável e que esteja no mercado. Um bem gravado com cláusula de

inalienabilidade não poderá ser doado, pois de acordo com o entendimento do STF, a

inalienabilidade implica na impenhorabilidade e incomunicabilidade do bem, mas o

contrário não é verdadeiro.

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1.3.6 Contrato de seguro

O conceito deste tipo de contrato esta previsto no artigo 757, do novo Código

Civil, que diz que, este contrato é aquele no qual uma das partes ( segurador ) obriga-

se para com outra ( segurado ), mediante o pagamento de um prêmio, a garantir

interesse legítimo do segurado, relativo à pessoa ou à coisa, contra riscos

predeterminados. Este tipo de contrato tem por objeto passar o risco do segurado para

o segurador, seja de qualquer espécie.

A única forma de comprovação deste tipo de contrato é por documento escrito.

Primeiramente, uma proposta é apresentada ao segurador que irá analisar e depois dar

a sua decisão, tudo isso antes do contrato. Na proposta devem estar contidos todos os

elementos importantes para a caracterização do risco a ser coberto.

O contrato de seguro extingue-se ao término do prazo estipulado, pelo distrato

ou na perda do objeto do contrato pelo pagamento da indenização pela seguradora.

1.3.7 Do mandato

O mandato é o tipo de contrato usado para uma pessoa passar para outra o

poder de representá-la no cumprimento de um negócio jurídico. É por meio deste

instrumento que é permitido ao mandante exercer seus direitos à distância, através do

mandatário.

O mandato é formado por duas partes: o mandante e o mandatário. Em geral, é

permitido ao mandatário substabelecer os poderes a terceiros, considerando

responderá por eventuais prejuízos que o mandante venha a sofrer. Caso haja cláusula

expressa, o substabelecimento de poderes é vedado.

A extinção deste tipo de contrato pode ser voluntária, no caso de revogação ou

renúncia, ou involuntária, pela abertura de um regime de proteção com relação ao

mandante ou ao mandatário ou por morte de uma das partes ou alguma mudança que

retire a autoridade do mandante de passar os poderes ou mandatário para os exercer.

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1.3.8 Contrato de comodato

Este é um contrato gratuito em que é entregue um bem infungível, em que dele

se utilize e o restitua. Os objetos deste tipo de contrato podem ser coisas imóveis ou

móveis, desde que não sejam fungíveis.

O contrato de comodato pode ter um prazo determinado ou não. No caso do

comodato com prazo determinado, o contrato é extinto com o simples advento do

termo. Já no caso de comodato com prazo indeterminado, tendo decorrido o tempo

necessário para o uso da coisa, o comodatário será notificado pelo comodante para que

lhe restitua o bem no prazo que assinar.

1.3.9 Contrato de mútuo

O mútuo é uma modalidade de contrato onde o mutuante transfere a propriedade

de bens fungíveis ao mutuário, que fica com a obrigação de devolver um objeto do

mesmo gênero, quantidade e qualidade. Não precisa ser o mesmo objeto entregue pelo

mutuante.

Este é um contrato unilateral, pois, só impõe obrigações ao mutuário; também é

real porque se aperfeiçoa com a tradição, e temporário, pois tem prazo certo para ser

concluído.

1.3.10 Contrato de alienação fiduciária

Por fim, vamos falar do contrato de alienação fiduciária, que é o foco de estudo

desse trabalho. Este é um contrato formal e acessório que tem como finalidade o

cumprimento de uma obrigação como, por exemplo, a compra de um automóvel,

máquinas, etc.

O civilista Gomes (1987), define esse instituto da seguinte forma:

A alienação fiduciária é uma modalidade de negócio fiduciário, tendo por objeto bens móveis, no qual estes são adquiridos pelo comprador com recursos fornecidos por financeiras, e revendidos fiduciariamente para elas, que ficam com o domínio desses bens, até que se complete o pagamento do numerário

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que forneceram para a aquisição.

O devedor fiduciário fica só com a posse do bem, enquanto que a propriedade é

do credor fiduciário até que seja pago o valor integral da dívida negociada. Isto ocorre

com a finalidade de evitar que o devedor venda o bem alienado ou o repasse como

garantia a terceiros, sem autorização do credor fiduciário.

O contrato de alienação fiduciária contém alguns itens de caráter essencial,

como: a) total da dívida negociada; b) local e data do pagamento; c) taxa de juros, bem

como, o índice da correção monetária; d) descrição do bem com sua devida

identificação, conforme previsto no parágrafo 1º do artigo 66 da Lei no. 4.728/65, com

as alterações do artigo 1º do Decreto-lei no. 911/69.

Art. 1º O art. 66, da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, passa a ter a seguinte redação: "Art. 66. A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta da coisa móvel alienada, independentemente da tradição efetiva do bem, tornando-se o alienante ou devedor em possuidor direto e depositário com todas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de acordo com a lei civil e penal. § 1º A alienação fiduciária somente se prova por escrito e seu instrumento, público ou particular, qualquer que seja o seu valor, será obrigatoriamente arquivado, por cópia ou microfilme, no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do credor, sob pena de não valer contra terceiros, e conterá, além de outros dados, os seguintes: a) o total da divida ou sua estimativa; b) o local e a data do pagamento; c) a taxa de juros, as comissões cuja cobrança for permitida e, eventualmente,

a cláusula penal e a estipulação de correção monetária, com indicação dos índices aplicáveis;

d) a descrição do bem objeto da alienação fiduciária e os elementos indispensáveis à sua identificação. § 2º Se, na data do instrumento de alienação fiduciária, o devedor ainda não for proprietário da coisa objeto do contrato, o domínio fiduciário desta se transferirá ao credor no momento da aquisição da propriedade pelo devedor, independentemente de qualquer formalidade posterior. § 3º Se a coisa alienada em garantia não se identifica por números, marcas e sinais indicados no instrumento de alienação fiduciária, cabe ao proprietário fiduciário o ônus da prova, contra terceiros, da identidade dos bens do seu domínio que se encontram em poder do devedor. § 4º No caso de inadimplemento da obrigação garantida, o proprietário fiduciário pode vender a coisa a terceiros e aplicar preço da venda no pagamento do seu crédito e das despesas decorrentes da cobrança, entregando ao devedor o saldo porventura apurado, se houver. § 5º Se o preço da venda da coisa não bastar para pagar o crédito do proprietário fiduciário e despesas, na forma do parágrafo anterior, o devedor continuará pessoalmente obrigado a pagar o saldo devedor apurado. § 6º É nula a cláusula que autoriza o proprietário fiduciário a ficar com a coisa alienada em garantia, se a dívida não for paga no seu vencimento.

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§ 7º Aplica-se à alienação fiduciária em garantia o disposto nos artigos 758, 762, 763 e 802 do Código Civil, no que couber. § 8º O devedor que alienar, ou der em garantia a terceiros, coisa que já alienara fiduciariamente em garantia, ficará sujeito à pena prevista no art. 171, § 2º, inciso I, do Código Penal. § 9º Não se aplica à alienação fiduciária o disposto no artigo 1279 do Código Civil. § 10. A alienação fiduciária em garantia do veículo automotor, deverá, para fins probatórios, constar do certificado de Registro, a que se refere o artigo 52 do Código Nacional de Trânsito (Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965).

O instituto da alienação fiduciária surgiu no nosso ordenamento jurídico com a legislação acima referida. A constituição desse instituto veio com a finalidade de superar a carência de garantias sobre os bens móveis, além de estruturar uma série de mecanismos de captação e aplicação de recursos. A finalidade principal da alienação é facilitar que o consumidor adquira bens, garantindo de forma eficaz ao financiador, com a propriedade resolúvel da coisa financiada, enquanto o devedor não quitar a totalidade da dívida.

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CAPÍTULO II

CONTRATOS DE ADESÃO (ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA) A LUZ DO CÓDIGO CIVIL

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2.1 Disposições Gerais

Com o avanço sócioeconômico e a modernização da sociedade em geral,

percebe-se um relevante crescimento dos serviços “de massa”, o que induz a uma

falha nas relações comercias, e os contratos de adesão surgiram para preencher

esse espaço e suprir de uma forma mais prática e objetiva as relações de consumo.

Segundo o exímio Venosa (2003, p. 370-371):

No campo dos contratos que por ora nos interessa, foram trazidos para o bojo da lei, além de instrumentos eficazes em favor do consumidor no tocante à responsabilidade objetiva do fornecedor e possibilidade de inversão do ônus da prova carreada para o fornecedor, princípios de direito contratual que a doutrina tradicional já adotava de há muito tempo, na exegese de proteção do contratante mais fraco. Nesse diapasão encontramos na letra expressa dessa lei, entre outros, o princípio geral da boa-fé (art. 51, IV), da obrigatoriedade da proposta (art. 51, VIII), da intangibilidade das convenções (art. X, XI e XIII). Ao coibir a vantagem exagerada do fornecedor, o Código de Defesa do Consumidor reaviventa os princípios tradicionais da lesão nos contratos e da excessiva onerosidade (art. 51, § 1°), também reativados pelo novo Código Civil. Cumpre lembrar que o rol presente no referido artigo apresenta ainda, de forma objetiva, algumas cláusulas abusivas que devem ser examinadas das relações de consumo. Ademais, o elenco das cláusulas é exemplificativo, cabendo, segundo o disposto no art. 56 do Decreto n° 2.181, de 20-03-1997, a Secretaria de Direito Econômico editar, anualmente, lista complementar de cláusulas consideradas abusivas, o que tem sido regularmente. Não se esqueça, porém, que cabe ao juiz, no caso concreto, independentemente de descrição legal específica, definir a abusividade de cláusula.

Marques (p. 53), diz que:

Logo, por uma questão de economia, de racionalização, de praticidade e mesmo de segurança, a empresa predispõe antecipadamente um esquema contratual, oferecido à simples adesão dos consumidores, isto é, pré-redige um complexo uniforme de cláusulas, que serão aplicáveis indistintamente a toda esta série de futuras relações contratuais.

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Deve ser verificado que as disposições dos contratos de adesão são redigidas

antecipadamente e unilateralmente pelo parceiro contratual economicamente de maior

poder; cabe apenas à outra parte acolher, sem debater nem modificar o teor do contrato

escrito, gerando obrigações recíprocas entre as partes contratantes.

2.2 Definições dos Contratos de Adesão

Um contrato nada mais é do que um acordo formal de interesses de duas ou

mais pessoas, firmando-se as obrigações e os direitos dos contraentes e regulando as

partes a obedecerem às cláusulas de uma forma vinculada, determinando os

efeitos jurídicos desejáveis de forma que a mesma valha como lei para ela. Portanto,

podemos afirmar que contratos no direito brasileiro são acordos feitos com base na

vontade das partes e na autorização jurídica, capazes de criar, regular, modificar

ou extinguir relações jurídicas de conteúdo patrimonial.

De acordo com Gonçalvez (2002, p. 32):

O contrato é fonte de obrigação. Fonte é o fato que dá origem a esta,de acordo com as regras de direito. Os fatos humanos que o Código Civil brasileiro considera geradores de obrigação são: os contratos, as declarações unilaterais da vontade e os atos ilícitos, dolosos e culposos.

Enquanto Diniz (2002, p. 23) aduz que:

O contrato constitui uma espécie de negócio jurídico, de natureza bilateral ou plurilateral, dependendo, para sua formação, do encontro da vontade das partes, por ser ato regulamentador de interesses privados.

Levando-se em consideração esta precisa visão sobre os contratos no direito

brasileiro, passaremos a avaliar os contratos de adesão. Primeiro, o contrato de

adesão define-se como um negócio legal bilateral, em que a participação de uma

das partes advém da aceitação de uma série de cláusulas pré-estabelecidas pela

outra parte, que gera direitos e obrigações mútuas em futuras relações concretas.

Marques (p. 58) define que:

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Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas são pré-estabelecidas unilateralmente pelo parceiro contratual economicamente mais forte (fornecedor), ne varietur, isto é, sem que o outro parceiro (consumidor) possa discutir ou modificar substancialmente o conteúdo do contrato escrito.

Conforme Garms o contrato de adesão pode ser definido da seguinte forma:

Trata-se de um negócio jurídico no qual a participação de um dos sujeitos sucede pela aceitação em bloco de uma série de cláusulas formuladas antecipadamente, de modo geral e abstrato, pela outra parte, para constituir o conteúdo normativo e obrigacional de futuras relações concretas.

Já Fiúza e Roberto (2002, p.68) trazem o seguinte conceito:

Contrato de Adesão é aquele que se celebra pela aceitação de uma das partes de cláusulas contratuais gerais propostas pela outra, a fim de constituir a totalidade ou ao menos a porção substancial do conteúdo de sua relação jurídica.

Segundo Miranda (2002, p. 27), o contrato de adesão, é:

Aquela forma de contratar em que, emitida pelo predisponente uma declaração dirigida ao público, contendo uma promessa irrevogável para esse efeito, mediante cláusulas uniformes, formuladas unilateralmente, o Contrato (individual, singular) se forma, com o conteúdo assim prefixado, no momento em que uma pessoa, aceitando essas cláusulas na sua totalidade, ainda que com eventuais aditamentos, adere a tal conteúdo.

Enquanto que o entendimento do abalizado Venosa (2005, p. 412) é:

Contrato de Adesão é o típico Contrato que se apresenta com todas as cláusulas predispostas por uma das partes. A outra parte, o aderente,somente tem a alternativa de aceitar ou repelir o Contrato. (...) não se abre a discussão ou alteração das condições gerais dos Contratos ou das cláusulas predispostas.

Fica assim confirmado o entrave para o consumidor, que muitas vezes assina

o contrato sem ler totalmente as cláusulas sugeridas no documento, adquirindo

assim, função de mero adepto, da pretensão do fornecedor. Na realidade, o contrato

de adesão é oferecido de forma a agilizar a relação comercial, como afirma a

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doutrinária Marques ( p. 549):

É um contrato oferecido ao público em um modelo uniforme, geralmente impresso, faltando apenas preencher os dados referentes à identificação do consumidor-contratante, do objeto e do preço. Assim, aqueles que,como consumidores, desejarem contratar com a empresa para adquirirem produtos e serviços já receberão pronta e regulamentada a relação contratual, não poderão efetivamente discutir, nem negociar singularmente os termos e condições mais importantes do contrato.

Deste modo, percebemos que nesta espécie contratual não existe uma fase de

negociação prévia, portanto, não há uma troca de idéias sobre cláusulas existentes no

contrato, realiza-se apenas uma fase de aceitação do consumidor e a celebração

do contrato. Nesta linha de raciocínio, a advogada Garms aduz que:

A figura jurídica nomeada contrato de adesão apresenta-se sob o duplo aspecto,conforme o ângulo de que seja focalizada. Considerada na perspectiva da formulação de cláusulas por uma das partes, de modo uniforme e abstrato, recebe a denominação de condições gerais dos contratos e é analisada à luz dos princípios que definem a natureza desse terial jurídico. Encarada no plano da efetividade, quando toma corpo no mundo da eficácia jurídica, é chamada contrato de adesão e examinada no prisma do modo por que se formam as relações jurídicas bilaterais.

2.3 Contratos de Adesão no código civil (alienação fiduciária)

Surgido como ferramenta solucionadora para a carência nas relações

comerciais, que se agravou com a evolução sócioeconômica, o contrato de adesão é o

meio mais utilizado nas relações de consumo.

Ele Caracteriza-se como um negócio jurídico no qual uma das partes elabora

antecipadamente as cláusulas contratuais e a outra, prontamente, aceita, gerando

obrigações mútuas entre os contratantes.

No início do século XX, o contrato de adesão foi definido por Saleilles,

como esclarece Orlando Gomes:

“a prática de predeterminar o esquema do Contrato mediante cláusulas uniformes elaboradas por uma das partes, não restando à outra senão a alternativa de aceita-lá in totun, foi registrada em

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breve apreciação crítica por Saleilles ao estudar na parte geral do Código Civil alemão a declaração de vontade. A essa espécie nova deu, à falta de melhor denominação, o nome de Contrato de Adesão, que fez fortuna. “

Assim, o contrato de adesão ganhou essa denominação, devido ao fato, de no

método formulado pela legislação, o conteúdo contratual ser elaborado

antecipadamente por uma das partes, não restando alternativa à outra parte

senão aceitar as condições impostas no todo, por isso chegou-se a essa

denominação de contrato de adesão.

Dentro do instituto dos contratos de adesão, será dado ênfase aos contratos de

alienação fiduciária, os quais visam garantir o cumprimento de uma obrigação

convencionada através de um contrato de adesão. Esta modalidade de negócio jurídico

está prevista no Código Civil, no Título III – Dos direitos reais sobre as coisas alheias,

no Capítulo IX – Da propriedade fiduciária.

Art. 1.361. Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor. § 1o Constitui-se a propriedade fiduciária com o registro do contrato, celebrado por instrumento público ou particular, que lhe serve de título, no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, ou, em se tratando de veículos, na repartição competente para o licenciamento, fazendo-se a anotação no certificado de registro. § 2o Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o devedor possuidor direto da coisa. § 3o A propriedade superveniente, adquirida pelo devedor, torna eficaz, desde o arquivamento, a transferência da propriedade fiduciária. Art. 1.362. O contrato, que serve de título à propriedade fiduciária, conterá: I - o total da dívida, ou sua estimativa; II - o prazo, ou a época do pagamento; III - a taxa de juros, se houver; IV - a descrição da coisa objeto da transferência, com os elementos indispensáveis à sua identificação. Art. 1.363. Antes de vencida a dívida, o devedor, a suas expensas e risco, pode usar a coisa segundo sua destinação, sendo obrigado, como depositário: I - a empregar na guarda da coisa a diligência exigida por sua natureza; II - a entregá-la ao credor, se a dívida não for paga no vencimento. Art. 1.364. Vencida a dívida, e não paga, fica o credor obrigado a vender, judicial ou extrajudicialmente, a coisa a terceiros, a aplicar o preço no pagamento de seu crédito e das despesas de cobrança, e a entregar o saldo, se houver, ao devedor. Art. 1.365. É nula a cláusula que autoriza o proprietário fiduciário a ficar com a coisa alienada em garantia, se a dívida não for paga no vencimento. Parágrafo único. O devedor pode, com a anuência do credor, dar seu direito eventual à coisa em pagamento da dívida, após o vencimento desta. Art. 1.366. Quando, vendida a coisa, o produto não bastar para o pagamento da dívida e das despesas de cobrança, continuará o devedor obrigado pelo

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restante. Art. 1.367. Aplica-se à propriedade fiduciária, no que couber, o disposto nos arts. 1.421, 1.425, 1.426, 1.427 e 1.436. Art. 1.368. O terceiro, interessado ou não, que pagar a dívida, se sub-rogará de pleno direito no crédito e na propriedade fiduciária. Art. 1.368-A. As demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial.

A alienação fiduciária é uma espécie de negócio fiduciário no qual o devedor só

tem a posse do bem; e a propriedade permanece com o credor fiduciário, até ser feito

o pagamento integral do valor da dívida negociada. Esta modalidade de negócio é bem

semelhante ao instituto da reserva de domínio. O diferencial entre os dois institutos é

que na reserva de domínio não existe a possibilidade de haver uma terceira pessoa, só

figurando apenas vendedor e comprador, enquanto que na alienação fiduciária figura

também a instituição financiadora.

Segundo o civilista Gomes (1987):

A alienação fiduciária é uma modalidade de negócio jurídico, tendo por objeto bens móveis , no qual estes são adquiridos pelo comprador com recursos fornecidos por financeiras, e revendidos fiduciariamente para elas, que ficam com o domínio desses bens, até que se complete o pagamento do numerário que forneceram para a aquisição.

Esta espécie de negócio jurídico estaá inserida dentro do instituto dos contratos

de adesão, visto que, quando o consumidor adquire um bem através desta modalidade,

ele adere a um contrato pré-estabelecido pelas instituições financeiras. Muitas vezes,

nestes contratos. Estão contidas cláusulas que são prejudiciais ao aderente, o que

acaba acarretando a solicitação de revisão ou até mesmo a dissolução destes.

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CAPÍTULO III

CONTRATOS DE ADESÃO (ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA) A LUZ DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

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3.1Cláusulas abusivas

3.1.1 Previsão dos contratos de adesão no CDC

Neste sentido, o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 54, prevê

que:

Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. § 1° A inserção de cláusula no formulário não desfigura a natureza de adesão do contrato. § 2° Nos contratos de adesão admitisse cláusula resolutória, desde que alternativa, cabendo a escolha ao consumidor, ressalvando-se o disposto no § 2 do artigo anterior. § 3° Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor. § 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão. § 5° (Vetado).

Dentro dos contratos de adesão existem três vulnerabilidades que o consumidor

está sujeito. Diante desse problema, surge o código consumerista com a finalidade de

resguardar e proteger os direitos da parte mais fragilizada ( consumidor ).

Nery Júnior comenta que:

Na estipulação da possibilidade de resolução alternativa, deverão ser observados os princípios fundamentais do CDC, entre os quais ressaltam o da boa-fé, o do equilíbrio nas relações de consumo e o da proporcionalidade, que indica a proibição de o fornecedor auferir vantagem excessiva em detrimento do consumidor.

Assim sendo, o contrato vai criando corpo conforme suas condições vão

sendo expostas, procurando sempre primar pela clareza em sua redação e

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informações precisas sobre o produto negociado. Segundo Nunes (2008, p. 615): “o

que a norma pretende é evitar o uso de linguagem técnica ou inacessível. Como a

informação é dirigida ao consumidor (leia-se: todo consumidor), que é leigo, não

se pode admitir que contenha ela termos ininteligíveis”.

No Código de Defesa do Consumidor estes entendimentos estão regulados nos

§ 3° e § 4°, acima citados, obrigando o fornecedor a alertar o consumidor sobre as

cláusulas que lhe sejam desfavoráveis e que informe de maneira simplificada o

conteúdo contratual.

Segundo Marques ( p. 60):

os contratos de adesão se caracterizam principalmente por: a sua pré-elaboração unilateral, a sua oferta uniforme e de caráter geral, para um número indefinido de pessoas, seu modo de aceitação através da simples adesão à vontade manifestada pelo contratante economicamente superior [...] Por muito tempo a doutrina discutiu o caráter contratual ou não dos contratos de adesão. Para alguns, por sua estrutura pré-elaborada unilateralmente, por suas características que eliminam a fase de discussão pré-contratual, estes contratos se aproximariam dos atos de direito público, dos atos regulamentares. Para outros não haveria um real acordo de vontades, mas sim um ato unilateral (MARQUES, p. 60).

Com isso, entendemos a limitação da liberdade nos contratos de adesão por

parte do consumidor, pois ele não define conjuntamente com o fornecedor o

conteúdo contratual, ficando somente com a opção de aceitar ou recusar o contrato.

Reforçando mais a proteção ao cidadão, o Código de Defesa do Consumidor

relaciona uma série de nulidades de cláusulas em seu art. 51, pois como nos

contratos de adesão há uma imposição de cláusulas, muitas delas podem ser

consideradas abusivas cabe aqui, como instrução, a transcrição do referido artigo, in

verbis:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis; II - subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos

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casos previstos neste código; III - transfiram responsabilidades a terceiros; IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; V - (VETADO); VI - estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor; VII - determinem a utilização compulsória de arbitragem; VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor; IX - deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor; X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral; XI - autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor; XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor; XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração; XIV - infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais; XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor; XVI - possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias. § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vontade que: I - ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence; II - restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. § 2° A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes. § 3° (VETADO). § 4° É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto neste código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes.

Desta forma, o Código de Defesa do Consumidor inovou, pois proibiu que

sejam pactuadas determinadas cláusulas, impondo normas imperativas, sempre na

busca da proteção do consumidor e visando um reequilíbrio contratual de forma que

atenda as perspectivas criadas pelos mesmos.

3.1.2 Definição de cláusulas abusivas

Para se compreender com mais exatidão o termo “Cláusulas Abusivas”,

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consideramos importante que se conheça o conceito do vocábulo “Cláusula”.

Nunes (2008, p.652) conceitua que:

(...) o sentido estrito de “cláusula contratual” está previsto. Mas deve-se entender o vocábulo “cláusula” da norma na sua acepção mais ampla, de todo e qualquer pacto ou estipulação contratual, escrito ou verbal, de todas as formas possíveis de fazerem nascer relações jurídicas de consumo.

Enquanto que o termo pertinente à abusividade, segundo Vieira (2002, p. 116):

Há três correntes que explicam o conceito de abusividade: para a primeiracorrente, seria abusiva a cláusula que causar um grave prejuízo ao consumidor (substancial), do qual esse não pudesse se desobrigar (inevitável); para a segunda, é aquela cláusula que exigisse do consumidor uma prestação além do razoável, de acordo com os critérios do senso comum; por terceiro, são aquelas que ofendem aos bons costumes (inescrupulosas).

Entendemos assim que cláusulas abusivas estão densamente conectadas

aos contratos de adesão, pois os fornecedores que preparam as cláusulas

contratuais previamente e, freqüentemente, tendem a instituir vantagens a seu

favor, desprezando os consumidores, que é a parte contratante mais fraca

economicamente.

Com isso, observando o CDC, entendemos que no Brasil se passou a acolher

normas jurídicas superiores à vontade dos contratantes como, por exemplo, a

equidade contratual, pois de acordo com o CDC, é admitido ao Poder Judiciário um

certo controle sobre os contratos de consumo.

Neste sentido, Marques ( p. 288), aduz que:

As normas proibitórias de cláusulas abusivas são de normas de ordem pública, normas imperativas, inafastáveis pela vontade das partes. Estas normas do CDC aparecem como instrumentos do direito para restabelecer o equilíbrio, para restabelecer a força da ‘vontade’ das expectativas legítimas do consumidor, compensando, assim, a sua vulnerabilidade fática.

Marques (1992a, p. 27-54) ainda define que: O Código possui um novo método que, para harmonizar e dar maior

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clareza às relações de consumo, possui dois momentos: No primeiro, cria o Código novos direitos para os consumidores e novos deveres para os fornecedores de bens, visando assegurar a sua proteção na fase pré-contratual e no momento da formação do vínculo.[...] No segundo momento, cria o Código normas proibindo expressamente as cláusulas abusivas nesses contratos, assegurando, assim, uma proteção a posteriori do consumidor, através de um efetivo controle judicial do conteúdo do contrato de consumo.

Assim, o CDC busca o reequilíbrio contratual através da nulidade dessa

abusividade por parte dos fornecedores.

3.1.3 O controle das cláusulas abusivas

O Código de Defesa do Consumidor coloca entre seus artigos instrumentos nos

quais o consumidor ou o poder público podem ampara-se, para prevenir ou punir

atos de abuso de poder econômico, adequados às cláusulas abusivas.

Deste modo, o controle das cláusulas abusivas pode ser: preventivo ou

repressivo, geral ou particular, administrativo ou judicial, social ou estatal.

Neste sentido, Silva (2004, p. 122-123) comenta que:

Por controle preventivo entende-se aquele realizado anteriormente à produção dos efeitos de determinada cláusula abusiva, seja mediante propositura de ação individual declaratória de nulidade, seja por meio de ação civil pública movida, por exemplo, pelo Ministério Público. Esse tipo de controle tem fundamento no art. 6°, VI, do CDC, de acordo com o qual é direito básico do consumidor a efetiva prevenção de danos patrimoniais e morais.(...) por controle repressivo entende-se aquele praticado durante ou após à produção dos efeitos da cláusula opressiva, podendo ser realizado da mesma maneira como é feito o controle preventivo. (...) por controle geral das cláusulas abusivas entende-se o realizado pelo Ministério Público por meio do inquérito civil seguido da ação civil pública, buscando à proteção dos direitos difusos e coletivos. (...) por controle particular entende-se aquele exercido pelo consumidor, ou até mesmo pelo Ministério Público (art. 51, § 4°, do CDC), para a proteção dos direitos de que aquele é titular, única e exclusivamente. (...) entende-se por controle social o exercitado pela sociedade civil, podendo ser feito pelos cidadãos individualmente considerados ou por suas associações de classe, como as entidades de defesa do consumidor e os sindicatos. (...) por controle estatal das cláusulas abusivas deve ser entendido o efetuado pelo Estado, diretamente por seus três Poderes ou indiretamente pelos órgãos da administração pública, como os Procons estaduais e municipais, o Ministério Público, o Banco Central, em relação às instituições financeiras, a Anatel, quanto às empresas de telecomunicação, e a ANS, em relação às empresas de planos e segurados de saúde. (...) por controle administrativo entende-se o realizado pelo Ministério Público ou pelos demais órgãos da

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administração pública responsáveis pela defesa do consumidor. (...) já por controle judicial entende-se aquele exercido exclusivamente pelo Poder Judiciário, desde que tenha sido provocado a manifestar-se, tendo em vista o princípio da inércia da jurisdição.

Marques explana sobre o controle judicial das cláusulas abusivas:

Tanto na lista exemplificativa de cláusulas consideradas abusivas constante do art. 51 do CDC, quanto em seu art. 53, referente aos contratos de compra e venda a prazo, a sanção escolhida para coibir abusos foi a nulidade absoluta. Uma vez que a nulidade absoluta deverá ser decretada ex officio pelo Poder Judiciário, cria o CDC, na prática um novo controle incidente do conteúdo e da equidade de todos os contratos de consumo submetidos à apreciação do Judiciário brasileiro.

O Código de Defesa do Consumidor instituiu, assim, um próprio sistema de

proteção contra as cláusulas abusivas, dando-lhe um regime de nulidade eficaz nas

relações jurídicas de consumo. O Artigo 51, Inciso IV do Código de Defesa do

Consumidor prevê que:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras as cláusulas relativas ao fornecimento de produtos ou serviços que: estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.

Portanto, em concordância com o que regula o artigo acima, a cláusula

contratual avaliada como abusiva será considerada nula de pleno direito, podendo

ser avaliada a qualquer tempo ou instância, pois estas cláusulas vão de encontro a

ordem pública de proteção do consumidor. Portanto, o consumidor não estará

forçado a cumprir o que consigna uma cláusula abusiva, independente de

provocação judicial.

Segundo Lobo (1998, p. 178):

O aderente não precisa aguardar a decisão judicial para deixar de cumprir as cláusulas abusivas tipificadas na lei ou compreendidas na cláusula geral. A declaração de nulidade opera ex tunc e a cláusula, por ser absolutamente inválida, nunca se integra ao contrato ou produz efeitos jurídicos.

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Este posicionamento jurídico da legislação que o Código de Defesa do

Consumidor regula, deve-se ao fato de que a proteção do consumidor contra essas

cláusulas abusivas é de ordem pública, devendo-se considerar como uma ofensa

não apenas ao consumidor figurante da relação contratual, mas sim, como toda uma

sociedade passível dessa abusividade.

3.2 Ação Revisional de Contratos

3.2.1 Conceito

Atualmente, tem-se escutado bastante sobre ação revisional de contratos que

consiste naquelas ações que os clientes movem contra os fornecedores, e nestas são

feitos vários questionamentos em relação a validade ou aplicabilidade de cláusulas

contratuais, com a finalidade de invalidar estas, modificando os termos do acordo ou

sua resolução. Os temas questionados variam desde cláusulas referentes a juros,

correção monetária, até pedidos de restituição por eventuais cobranças indevidas, no

caso de ações revisionais contra instituições financeiras.

O termo "revisar" tem como significado "ver novamente", neste caso o que será

revisto é o negócio jurídico. Nesse sentido, compreende-se que na legislação, o termo

tem sido utilizado expressamente para designar a ação revisional locatícia (art. 68, Lei

8.245/91), constando também no CDC, que prevê, como um direito básico do

consumidor, a possibilidade de "revisão" de cláusulas por onerosidade excessiva

superveniente (art. 6º, V). Nos dois casos, nós encontramos diante de ações

tipicamente definidas como constitutivas.

Os pedidos constantes nas demandas revisionais contra instituições financeiras,

esta nem sempre é homogênea, havendo, na maioria das vezes, a cumulação de

diversos pedidos referenciados em causas diversas, de naturezas distintas como, por

exemplo, revisão de cláusula contratual que dificulte a execução do contrato,

impossibilidade do cumprimento da obrigação por elevada onerosidade, entre outros.

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3.2.2 Requisitos legais

Com o grande aumento o número de contratos de alienação fiduciária celebrados

entre os consumidores e as instituições financeiras, consequentemente aumentou

também o número de ações pedindo revisão destes contratos.

O autor quando for ingressar com uma ação revisional, recomenda-se instruir a

inicial com cópia do contrato que deseja revisar, especificar as cláusulas que deseja

impugnar por entender que as mesmas são abusivas e elaborar pedido certo neste

sentido. Se o consumidor não tiver o contrato, o ônus da prova passará a ser do

fornecedor, de acordo com o artigo 6º. , inciso VIII, do código consumerista.

Como exemplo, citaremos a Ação Revisional no. 395/2009, impetrada contra

uma instituição bancária na 2ª. Vara Cível da Comarca de Várzea Grande-MT, na qual

se discute a diferença entre os juros pactuados entre as partes e os que são cobrados

além da ilegalidade da correção monetária pela Tabela Price. O pedido do autor foi

negado pelo Juízo original. Já na Segunda Instância, o pedido do autor foi deferido pelo

Desembargador Sebastião Moraes Filho, pois o mesmo entendeu que:

o banco não apresentou defesa quanto aos encargos contratuais, especificando a suposta legalidade dos juros, forma de correção monetária e inexistência de cumulações indevidas de encargos. Desta feita, pelo fato dos contratos bancários poderem ser interpretados pelo Código de Defesa do Consumidor, destacou o magistrado que a inversão do ônus da prova, prevista no seu art. 6º, VIII, ganhou peso para referendar, nesta fase inicial do procedimento de origem, as pretensões do agravante. O desembargador destacou que a jurisprudência firmada pelo STJ, determina a ação revisional como instrumento para suspender a configuração da mora do devedor, excluir seus dados dos cadastros de proteção ao crédito, obstruindo a busca e apreensão do bem. Ainda em conformidade com o entendimento superior, o devedor deve comprovar que pende ação proposta contestando, integral ou parcialmente, a existência do débito, demonstrar que a negativa do débito em cobrança se funda em bom direito, e deve também depositar o valor correspondente à parte reconhecida do débito ou prestar caução idônea. Destacou o magistrado haver interesse do agravante em depositar mensalmente em Juízo os valores apresentados como devido, sendo que a dívida encontrava-se devidamente amparada por garantia fiduciária. Explicou que a agravada poderá levantar os valores para abatimento no saldo devedor e a terceiro, ainda podendo optar entre o bem ou a execução da própria dívida remanescente, a teor da nova previsão do procedimento (art. 899, § 2º, do CPC). “Frise-se, desta feita, que

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não se está prejudicando, com isso, qualquer direito de petição do banco embargante ou retirando a própria garantia do contrato, apenas se salvaguarda o direito do consumidor e o meio de trabalho utilizado pelo agravante para sustento próprio e de sua família (caminhão)”, informou o relator, que foi acompanhado em seu voto unanimemente pelos desembargadores Carlos Alberto Alves da Rocha, primeiro vogal, e Leônidas Duarte Monteiro, segundo vogal.

Como foi mostrado na decisão acima, o consumidor questionou os juros que estavam sendo cobrados pela agravada, juros estes que estavam acima do acordado, levando ao questionamento do valor a ser pago devidamente. A decisão foi favorável ao consumidor, fazendo com que a financeira fizesse uma revisão, levantando os valores a serem abatidos no saldo restante a ser pago pelo consumidor.

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CAPÍTULO IV

TEORIA DA IMPREVISÃO

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4.1 Considerações sobre a Teoria da Imprevisão

A Teoria da Imprevisão hoje é, reconhecida implícitamente em contratos nos

quais ocorrem situações imprevistas, que podem modificar ou rescindir a relação

contratual, a princípio, todos os contratos são fundamentados na idéia de igualdade,

para aqueles que difundem esta teoria, e são realizados na previsão de qualquer ato

proveitoso, não sendo possível uma contratação para depreciar qualquer das partes, ou

seja, não se contrata para perder ou levar desvantagem.

A imprevisibilidade e a extraordinariedade precisam caminhar lado a lado para

que seja caracterizada a teoria da imprevisão, na visão de alguns doutrinadores. A não

execução dos termos do contrato não deve decorrer da impossibilidade, mas sim de

uma grande dificuldade de cumprir a atividade contratual, pois se fóssemos falar em

impossibilidade econômica, estaríamos nos referindo a um caso de força maior. O

cumprimento da obrigação precisa ser excessivamente oneroso, ou seja, deve haver

um sacrifício econômico. Esta dificuldade excessiva apenas complica em muito o

adimplemento da obrigação, não tornando-o impossível. O vínculo contratual pode ser

resolvido por solicitação da parte prejudicada e o juiz, desta forma, revisa e modifica o

conteúdo do contrato, buscando recuperar o equilíbrio desfeito.

Quanto à intervenção da justiça, quando em situações que desejam rescindir o

contrato ( no caso de contratos comutativo,de execução continuada e periódica ),

varificando se há onerosidade excessiva e se esta tem nexo causal com o fato

imprevisível que a gerou,o juiz pode intervir para reajustar as prestações contratuais. A

sentença deve produzir efeitos retroativos entre as partes.

4.1.2 Cláusula do Rebus Sic Stantibus

O século XIX foi de um liberalismo de grande intensidade, com a não

interferência do Estado. Os contratos uma vez celebrados tornavam-se lei entre as

partes. Várias pessoas foram aniquiladas economicamente falando. Dessa forma e

devido às guerras mundiais, que trouxeram grande instabilidade para os contratos, e

com a alteração da mentalidade de liberal para intervencionista, foi ressuscitada a

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cláusula rebus sic stantibus.

A cláusula rebus sic stantibus consiste é uma presunção de cláusula, que estar

implícita em todos os contratos de execução futura, pela qual as partes estão

coobrigadas a cumpri-la de maneira rigorosa, apesar de não ser uma cláusula de ler

expressamente, no pressuposto de que as situações ambientes conservem-se ilesas no

momento da execução, iguais às que vigoravam no momento da celebração.

Pela teoria da imprevisão as obrigações contraídas a termo ou a longo prazo,

caso não seja possível seu cumprimento por total dificuldade financeira, decorrentes de

causas supervenientes não passíveis de previsão, a parte prejudicada tem direito a

revisão judicial do contrato.

É essencial também que a alteração imprevisível seja de tal magnitude que torne

impossível para o contratante cumprir a obrigação, por se tornar onerosa a prestação.

Geralmente, isso se dá como um ônus excessivo para uma parte e enriquecimento

imotivado de outra parte.

Nos contratos de execução sucessiva ou a termo, o vínculo obrigatório percebe-

se ligado à continuação do mesmo estado de fato vigente no momento da celebração.

Caso a situação não seja a mesma da época da assinatura do contrato, o contrato

poderá ser modificado.

Esta teoria está implícita em todos os contratos, por isso não necessita ser

estipulada expressamente.

A teoria da imprevisão não é cabível para os contratos aleatórios como, por

exemplo, nos contratos de seguro, de saúde, etc., pois estes assumem risco de valor

incerto.

Somente a justiça pode proceder à revisão, cabendo ao interessado interpelá-la.

A revisão produz efeitos ex nunc , ou seja, a partir do momento em que é

realizada.

O Novo Código Civil admite, expressamente, em seus Artigos 478 a 480, in

verbis, a resolução dos contratos nos casos de onerosidade excessiva:

Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a

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decretar retroagirão à data da citação. Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato. Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva.

4.1.3 Princípio do Pacta Sunt Servanda

O Princípio da Força Obrigatória ou Pacta Sunt Servanda, como já vimos, define

que o contrato é lei entre as partes. Ou seja, tudo que está nele escrito não pode ser

modificado; devendo, os pressupostos e requisitos de validade e os preceitos legais

imperativos, serem observados. No entanto, a equidade, a boa-fé, a proibição do abuso

de direito e tantas outras noções gerais podem levar o legislador a alargar exceção a

este tão importante princípio da Força Obrigatória, fazendo com que situações

imprevistas surgidas, façam pertinente a revisão do contrato, principalmente, se a parte

contratante se achar em situação de prejuízo decorrente do contrato.

Indubitavelmente, para que se possa corrigir o contrato, em caso de fatos

imprevistos surgidos, devem ocorrer requisitos ou elementos que caracterizem a Teoria

da Imprevisão, como, por exemplo:

a) "Vigência de um contrato de execução diferida ou sucessiva", ou seja, o

contrato tem que ser de execução continuada, prolongar-se no tempo;

b) "Alteração radical das condições econômicas objetivas no momento da

execução, em confronto com o ambiente objetivo no da celebração", ou seja, alterações

que ao momento da celebração contratual não sejam de modo algum previsíveis e que

ocorram após o contrato celebrado;

c) "Onerosidade excessiva para um dos contratantes e benefício exagerado para

o outro", ou seja, um contratante não pode beneficiar-se em detrimento de prejuízo do

outro, tem que haver uma equivalência (equidade) entre as partes, requisito básico de

qualquer contrato;

d) "Imprevisibilidade daquela modificação", qualquer fato que ocorra depois, e

não podia ser conhecido previamente.

De suma importância para a segurança dos contratantes, é o Princípio da Força

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Obrigatória, que aduz da imperativa necessidade que se mune o contrato, pelo

cumprimento do acordo firmado entre as partes. Esta necessidade imperiosa provém da

importância jurídica da liberdade de convergência de vontades, na qual presume-se

haver a livre e consciente escolha de ambas as partes para a feitura do negócio.

Desse modo, outro princípio surge e consubstancia-se no Princípio da Força

Obrigatória: o chamado Princípio da Intangibilidade do conteúdo dos contratos. Ele traz

em seu direcionamento a decorrente impossibilidade de apreciação pelos pretórios ou

desmotivação, para o adimplemento, por ato unilateral, podendo ser alterado de

qualquer forma, apenas se sobrevier novo acordo de vontades.

Devido a natureza de sua constituição, o Princípio da Intangibilidade ganhou

força, visto que sua alteração unilateral ou por intervenção estatal ferem o Princípio da

Autonomia da Vontade. A palavra dada era requisito impossibilitador da revisão

contratual. Mesmo que o ato de adimplir o acordo gerasse dificuldades de

sobrevivência para a parte, teria ela plena liberdade para desaprovar as obrigações

adquiridas à época do acordo, sendo desnecessário, se a obrigação fosse onerosa

demasiadamente, ou se o direito constituído não lhe retribuísse de forma justa.

Absoluto era esse princípio, a começar pelos romanos, que diziam que o contrato

faz das partes servas ("pacta sunt servanda"), passando por seu apogeu que se deu

com o liberalismo econômico e o extremo individualismo dominante na doutrina jurídica

que vigorava. Porém, com o passar dos tempos surgiram novos acontecimentos, como

guerras, aos quais este princípio não se adequava por revelar-se injusto. O Direito,

como algo dinâmico que é, passou a atenuar-lhe a força, preservando sua substância,

mas dando-lhe certa relatividade. Passou-se a aceitar a intervenção judicial no

conteúdo de certos contratos, desde que fosse em caráter excepcional, nos contratos

de execução duradoura ou diferida, que atribuísse condição insustentável a uma das

partes, impondo-lhe uma onerosidade excessiva.

A Lei Failliot, a primeira norma jurídica a permitir exceções à intangibilidade dos

contratos, constitui marco decisivo na evolução do pensamento jurídico.

Como justificativa às exceções, a intangibilidade do contrato, a doutrina procurou

recuperar a cláusula "rebus sic stantibus", proveniente do Direito Canônico, que era

considerada implícita nos contratos de duração e de execução diferida, estabelecendo

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que estes deveriam conservar o estado de fato existente no momento de sua formação.

No entanto, constatou-se que não era apenas necessária a mudança do estado de fato

existente na formação do vínculo, mas também que este fosse imprevisível para que

pudesse haver intervenção judicial, e sua modificação e resolução.

4.1.4 Teoria da imprevisão na jurisprudência brasileira

Sabemos que para aplicarmos a teoria da imprevisão há a necessidade de

alguns pré-requisitos. São eles: anormalidade do evento, imprevisibilidade do mesmo,

geração de uma onerosidade excessiva e impossibilidade do cumprimento do contrato.

No Brasil, um evento absolutamente anormal, que não poderia ser previsto foi o

chamado Plano Collor, em março de 1990. Suas regras geraram uma onerosidade

excessiva, tornando assim, impossível o cumprimento de alguns contratos.

Foram bloqueados os ativos financeiros acima de NCz$ 50 mil e os valores que

ficaram disponíveis para os contratantes impossibilitavam o adimplemento de cláusulas

de pagamento com vencimentos próximos naquele mês.

Todos que recorreram à justiça obtiveram decerto a resolução contratual.

No Supremo Tribunal de Justiça foi julgado, em nível de recurso especial, o

pedido de um consumidor a respeito de uma cláusula de correção ligada a variação do

dólar americano, pois, em decorrência desta oscilação ficou cada vez mais onerosa a

obrigação do consumidor, dificultando o cumprimento da mesma.

Relatado pelo Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA quarta turma do

STJ, RESP. 2002/0056040-9) e proferido por acórdão, o recurso foi acolhido de

maneira parcial.

DIREITO DO CONSUMIDOR. LEASING. CONTRATO COM CLÁUSULA DE CORREÇÃO ATRELADA À VARIAÇÃO DO DÓLAR AMERICANO. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. REVISÃO DA CLÁUSULA QUE PREVÊ A VARIAÇÃO CAMBIAL. ONEROSIDADE EXCESSIVA. DISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS DA VALORIZAÇÃO CAMBIAL ENTRE ARRENDANTES E ARRENDATÁRIOS. RECURSO PARCIALMENTE ACOLHIDO. [...] III – Consoante o art. 6º-V do Código de Defesa do Consumidor, sobrevindo, na execução do contrato, onerosidade excessiva para uma das partes, é possível a revisão da cláusula que gera o desajuste, a fim de recompor o equilíbrio da equação contratual. [...]

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V - Contendo o contrato opção entre outro indexador e a variação cambial e tendo sido consignado que os recursos a serem utilizados tinham sido captados no exterior, gerando para a arrendante a obrigação de pagamento em dólar, enseja-se a revisão da cláusula de variação cambial com base no art. 6º-V do Código de Defesa do Consumidor, para permitir a distribuição, entre arrendantes e arrendatários, dos ônus da modificação súbita da política cambial com a significativa valorização do dólar americano. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Votaram com o Relator os Ministros Barros Monteiro, Ruy Rosado de Aguiar, Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior. Presidiu a Sessão o Ministro Aldir Passarinho Junior

De acordo com Wald (2000, p. 263):

Não devemos ver nas afirmações feitas em relação a teoria da imprevisão uma deturpação do contrato, nem um sintoma do seu declínio no mundo atual. Ao contrário, a técnica privatista continua a imperar, invadindo até em certas esferas o direito público, que na sua expansão recorre a instintos de direito privado para melhor atender as suas finalidades, como ocorre nos casos das empresas públicas e sociedades de economia mista.

A teoria da imprevisão em nenhum momento elimina a autonomia da vontade.

Ela consiste apenas numa interpretação construtiva do conteúdo desta vontade. Esta

teoria é responsável pela conciliação do interesse individual e da necessidade social,

da justiça e da segurança, que são as finalidades primárias do direito.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi observado no decorrer desse estudo que as diversas transformações que

ocorreram na nossa sociedade, principalmente as que se deram no século XX, fizeram

surgir a necessidade de proteger o cidadão nas relações de consumo com os

fornecedores de serviços e produtos, que muitas vezes tem tirado proveito do poder

que tem de preestabelecer o contrato de adesão, na intenção de se beneficiar na

relação de consumo.

Tem sido grande a incidência de ações revisionais interpostos contra instituições

financeiras que, por muitas vezes usam do poder de elaborar o contrato de adesão para

inserir cláusulas abusivas, com a finalidade de se beneficiar, prejudicando o

consumidor, que fica impossibilitado de cumprir sua obrigação, em decorrência da

inserção dessas cláusulas. O contrato de adesão é um dos instrumentos mais usados

atualmente, visto que o mesmo desenvolveu-se em grande escala, sendo usados em

vários negócios, como por exemplo, na compra de veículos financiados, através do

instituto da alienação fiduciária.

O Código de Defesa do Consumidor foi criado nesse contexto e inseriu no

ordenamento jurídico brasileiro a legislação específica para cuidar dessa matéria

protegendo o consumidor da prática abusiva por parte dos fornecedores. O CDC tem a

finalidade de equalizar as relações entre fornecedor e consumidor, inibindo os abusos e

vícios constantes nos contratos.

Graças ao código acima referido, como também à facilidade de acesso à justiça

do consumidor, é fácil perceber que houve uma mudança positiva na elaboração

desses contratos no sentido de se respeitar mais o direito do consumidor. Os contratos

de adesão passaram a ser analisados como instrumentos de cooperação, pois sendo

elaborados com honestidade e lealdade, poderão realizar suas expectativas e alcançar

seus legítimos objetivos.

Diante de todo o exposto, apesar de o consumidor ser a parte mais vulnerável da

relação contratual, os mesmos têm meios de defesas bastantes consolidados na nossa

legislação, principalmente no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8,078/90), que

preza pelo direitos dos consumidores.

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REFERÊNCIAS

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___________.Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: RT. 2002. ___________.Contratos no código de defesa do consumidor. São Paulo: RT. 2004. MIRANDA, Custódio da Piedade Ubaldino. Contratos de Adesão. 2002. NERY JÚNIOR, Nelson, Código de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 7 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 2001. VIEIRA, Adriana Carvalho Pinto. O Princípio Constitucional da Igualdade e o direito do consumidor. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002. NORONHA, Fernando. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. NUNES, Rizzatto. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva. 2008. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 3 ed. São Paulo: Atlas. 2003.

WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro: obrigações e contratos. Cidade:São Paulo. Revista dos Tribunais, 2000. SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho, Cláusulas abusivas no código de defesa do consumidor. Ed. São Paulo: Saraiva, 2004 TEIXEIRA, Ministro Sálvio de Figueredo Teixeira, Quarta Turma do STJ. RESP no. 2002/0056040-9. Disponível em:http://www.correioforense.com.br/interna/ox/jurisprudencial/id/1220/titulo/Alienação fiduciária Revisão contratual Suspensão do processo. Html< acesso em 06 nov. 2009

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MATO GROSSO, 2ª Vara Cível da Comarca de Várzea Grande. Agravo de Instrumento no. 88471/2009. Quinta Câmara. Relator: Desembargador Sebastião Moraes Filho. 23 set.2009. Disponível no Site:http://www.netlegis.com.br/imprimirPage.jsp?imp=/detalhesNoticia.jsp?cod=56039&imprimir=sim< acesso em 08 de nov. 2009