terceiro debate

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Revista do 3º EM - maio de 2015

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Alunos do 3º EM de 2015 discutem a redução da maioridade penal neste informativo produzido ao longo de uma manhã.

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Revista do 3º EM - maio de 2015

A discussão sobre a redução da maioridade penal tem sido uma das principais pautas debatidas no Congresso Brasileiro e, se aprovada, afetará diretamente a sociedade e, sobretudo, os jovens. A PEC 171\1993, de autoria do parlamentar Marcos Rogério (PDT-RO), sugere que seja reduzida a idade permitida de aprisionamento de um jovem, de 18 para 16 anos. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou, no último dia 31 de março, o primeiro passo para o andamento da proposta na Casa, em que os deputados avaliaram que o texto não fere a Constituição. O placar da votação foi de 42 deputados favoráveis e 17 contrários.

A proposta, agora, será analisada pela CCJ do Senado e depois votada no Plenário.

A população está dividida. Boa parte acredita que a medida será a solução para o fim da violência no país, enquanto o outro lado alega que sua aprovação trará graves consequências.

Engajados nesse debate, nós, alunos do 3º ano do Ensino Médio da Cooperativa Educacional de Ubatuba, preparamos este especial, trazendo uma coletânea de dados e opiniões para contribuir com a circulação da informação e a construção de um posicionamento perante essa delicada questão.

Equipe de Ediçãomaio de 2015

2 3

Escolhemos o nome Terceiro Debate por sua ambiguidade. Assuntos debatidos na imprensa e em casa encontram, na escola, um espaço privilegiado para a continuação dos debates; portanto, vem daí a sugestão de que na Cooperativa ocorreria um ´Terceiro Debate´. E também tem o fato de ser o Terceiro Ano quem debate.

Arte: Gabriel Sanchez Jade Dangel Luisa Tucat Pedro Mariano Rafael Barbosa

Edição: Caiuá Ortiz Flora Kountouriotis Victoria Travitzki

Pesquisa: Isabella Farah Katharine Prado Laura Costa Luiza Politi Luiza Guizzo Maria Fernanda Pedro André Vitória Bacelar

Editorial:Expediente:

Fonte: G1Ilustração: Luisa Tucat

4

Por que dizer ?sim Por que dizer ?não

Redução da maioridade penal

Já responsabilizamos

adolescentes em ato

infracional

O índice de

reincidência nas

prisões é de 70%

Reduzir a maioridadepenal não reduz a violência

Reduzir a maioridade penal

é tratar o efeito não a

causa

Educar é mais eficientedo que punir

Os jovens "de hoje" têm consciência de que não podem ser presos e punidos como adultos. Por isso continuam a cometer crimes

O Brasil precisa alinhara sua legislação à de países desenvolvidoscomo os Estados Unidos

As pessoas têm que assumir

a responsabilidade pelos

seus atos sejam elas

maiores de idade ou não

5

“Se tem idade para ser “Julgar pela condição econômica ou escolaridade é bandido, tem idade para estar na preconceito, pois nem todos os cadeia” jovens carentes e pobres são criminosos”“Instituições que acolhem

m e n o r e s i n f r a t o r e s n ã o “Não é justo uma pessoa

conseguem ressocializar seus ter direito de tirar a vida de outra e d e t e n t o s , q u e s a e m d a s não ser punida por isso, porque é instituições e vão para as cadeias menor de idade e não sabe o que

está fazendo”quando adultos”

“Proteger o menor da “A impunidade é a mola prisão leva a seu recrutamento ao propulsora da violência. Os jovens crime”de hoje sabem que não podem ser

presos e punidos como adultos”“A legislação que deveria

defender o menor faz exatamente “A redução da maioridade o contrário, coloca-o à mercê da penal iria proteger os jovens do rede do crime para servi-la, aliciamento feito pelo crime assumindo a autoria de crimes organizado, que tem recrutado que não cometeu”menores de 18 anos para

a t i v i d a d e s r e l a c i o n a d a s , sobretudo, ao tráfico de drogas”

Por que sim? Fizemos uma pesquisa virtual em

sites da imprensa e nas redes sociais, a fim de selecionar os principais argumentos usados por quem é a favor da redução da maioridade penal. Eis o que dizem:

A favor da redução

No Brasil menor pode:

No Brasil menor não pode:

- Roubar- Matar- Estuprar- Se prostituir

- Formar Quadrilha- Agredir os pais- Agredir professores- Votar

- Trabalhar- Levar palmadinha

- Responder pelos próprios crimes

Ao todo, 87% dos centro-oeste (93%) e norte (91%) do país.brasileiros são favoráveis à

Na comissão da Câmara redução da maioridade penal que analisa o tema, 14 dos 27

de 18 para 16 anos, segundo depu tados de fendem a

p e s q u i s a d o D a t a f o l h a redução para jovens de 16 e 17 divulgada no mês de abril. anos que cometerem crimes

A i n d a s e g u n d o o hediondos, como homicídio Datafolha, a maior aprovação à qualificado, latrocínio, estupro p r o p o s t a d e r e d u z i r a e sequestro.maioridade está nas regiões

6 7

Dados:

Quadro reproduz uma visão compartilhada em redes sociais

Vale lembrar que o índice marginal não deve ser preso, mas de reincidência no sistema sim educado. Educar é melhor e socioeducativo para jovens se mais eficiente do que punir, porém encontra abaixo dos 20%. o Brasil insiste nessa tradição de

Por fim, podemos notar apenas “curar” a consequência. que reduzir a maioridade penal “Para o Estado, é mais fácil para 16 anos é tratar o efeito, não prender do que educar”.a causa. O jovem delinquente não surge espontaneamente, ele é fruto de uma sociedade desigual, que historicamente exclui boa p a r t e d a p o p u l a ç ã o , marginalizando-a. A criança que nasce e cresce no meio criminoso tem muito mais chances de se tornar uma infratora. Portanto, o problema da violência só será s o l u c i o n a d o q u a n d o a comunidade aprender que o

Por que não?Primeiramente, pode-se

dizer que esse projeto de lei seja inconstitucional, por ferir uma cláusula pétrea da Constituição Federal, que garante o direito à liberdade de toda criança e adolescente. Portanto, não deveria ser motivo de deliberação por parte do Poder Legislativo.

Ao contrário do que vários meios de comunicação têm divulgado, fixar a maioridade penal em 18 anos é uma tendência mundial. Diversos órgãos internacionais, como a ONU, repreenderam o projeto em votação no Brasil.

O ECA (Estatuto da não basta criar novas leis, mas Criança e do Adolescente) já f a z e r a s l e i s e x i s t e n t e s prevê uma série de medidas para funcionarem.jovens infratores. Elas são: O mesmo pode-se dizer a advertência, obrigação de reparar respeito do sistema carcerário o dano, prestação de serviços à brasileiro, que se encontra comunidade, liberdade assistida, superlotado, com mais de 500mil semiliberdade e internação, que p resos (a te rce i ra ma io r devem ser aplicadas de acordo população carcerária do mundo). com a gravidade do delito e a Isso mostra como ele é ineficiente, capacidade do jovem de cumpri- já que não cumpre sua função las. Essas medidas, porém, social de controle, reinserção e muitas vezes não são aplicadas e, reeducação dos cárceres. O se são, acabam por prejudicar o índice de reincidência nessas jovem, já que o sistema das instituições ultrapassa os 70%, instituições de reeducação não funcionando assim como uma funciona corretamente. Portanto, verdadeira “escola do crime”.

R e d u z i r a maioridade penal para 16 anos é tratar o efeito, não a causa

Contra a redução

O jovem delinquente não surge espontaneamente, ele é fruto de uma sociedade desigual, que historicamente exclui boa parte da população

8 9

10

“Não adianta comparar o Brasil com a Inglaterra, onde a maioridade penal é de 10 anos. Não temos o mesmo legado histórico, tampouco as mesmas condições financeiras e políticas.” Caiuá Giffoni, 17

“Por volta de 80% da população brasileira é a favor da emenda, induzida claramente pelos meios hegemônicos de comunicação. Afinal é muito mais simples colocar menores infratores no absurdo sistema carcerário do que reorganizar a educação de base e a reintrodução desses adolescentes na sociedade.” Flora Kountouriotis, 17

“Alguns adolescentes roubam, matam, estupram e sabem que não lhes acontecerá nada, pois a impunidade reina no nosso país... O povo brasileiro reclama quando é vítima, reclama quando vê absurdos criminais e deve se sentir feliz pelo país buscar leis compatíveis.”Gustavo Barros, 17

“Enxergar o jovem como verme da sociedade e castigá-lo, jogando-o numa cela com mais 30 pessoas, é muito fácil, porém isso não é de jeito algum a solução para a criminalidade.” Isabella Farah, 17

“O investimento em educação, saúde e condições básicas para todos deve ser independente de raça, idade ou classe social.” Jade Dangel, 17

“Educais as crianças e não punirás os homens. A frase de Pitágoras resume muito o que o Brasil realmente precisa.” Kim Camps, 17

Entre aspas

11

Sim Não

32 20

Você sabe o que é o projeto sobre a redução da maioridade penal?

11%

81%

8%

Você apoia a proposta de redução da maioridade penal?

Sim

Não

Não souberam responder

Pesquisa realizada na escola com 52 jovens de 14 a 18 anos

Ilustração: Rafael Barbosa

Selecionamos trechos de dissertações avaliativas que nós, alunos do Ensino Médio, escrevemos sobre o tema “redução da maioridade penal”, assim como opiniões de adultos pertencentes a nossa comunidade escolar. As citações sintetizam a posição de jovens perante uma questão delicada, que atingirá toda a sociedade, principalmente a nossa geração.

“A maior parte das internações de jovens é devida a tráfico e roubo. Desta forma, conclui-se que o problema está no ambiente em que eles crescem.” LuisaTucat, 17

“Devemos lembrar que os adolescentes não são os principais responsáveis pelos crimes graves no Brasil.” Maria Fernanda, 17

“O simples fato dessa proposta ter sido feita já demonstra a

incapacidade do poder público em lidar com a criminalidade e com a violência crescentes na nação.” Pedro André, 16

“É necessário fornecer educação para esses jovens e, principalmente, fazer um trabalho para a desglamourização da vida do crime.” Rafael Barbosa, 17

“Medidas socioeducativas devem ser tomadas em uma sociedade que tenta tirar o jovem do mau caminho, em vez de enfatizar sua presença nele.” Victoria Travitzki, 17

“Para nos aproximarmos dos índices de países desenvolvidos, como os EUA, precisamos rever toda a organização política e social do Brasil, e não mudar apenas uma pequena parte da legislação. Diante de uma política envolvida em tantos escândalos, uma sociedade com as riquezas extremamente mal divididas, uma educação completamente defasada e a 4ª maior população carcerária do mundo, não está parecendo que o foco do problema sejam os menores de 18 anos, a maioria de origem simples, sem acesso à educação de qualidade, que tem como exemplo políticos corruptos, capazes de roubar os cofres de seu próprio país e saírem impunes’’. Vitória Bacelar, 16

Entre aspas

13

“As pessoas deixam de fazer coisas erradas quando há punição, mas não é só isso que vai fazer diminuir a criminalidade, mas um conjunto de ações que devem ser adotadas, desde o controle da natalidade à educação das crianças e jovens'’. Flávia Parodi, empresária

"Esporte, música e artes desviam a mente da criminalidade'’. Juliana Marangon, advogada e filósofa

"A redução da maioridade penal fere as cláusulas pétreas". Jandira Marangon, cirurgiã dentista (trabalhou em escolas públicas por 15 anos)

12

De seis pessoas entrevistadas no bairro do Itaguá, três são contra a

medida e três são a favor, porém, independentemente da opinião, todos

os entrevistados criticam o sistema judiciário e a educação pública do

país.

“Na verdade, tudo começa dentro de casa”,

“Eu acho que passa responsabilidade para as pessoas que são realmente culpadas", Janice, 27.

“Acho que não é a solução, a solução é investir na educação. A gente vai ter cadeias mais lotadas e isso não é a solução”, Caroline, 41.

“Você acha que a redução vai diminuir a violência? Talvez não diminua, mas vai fazer repensarem no assunto. Eu acho que se prende pouco e, quando prende, solta rápido”, Carla, 38.

Irania, 29.

A voz das ruas

Fomos às ruas perguntar o que as pessoas acham da redução da maioridade penal. É uma amostragem sem rigor científico, mas eis os resultados:

Ilust

raçã

o: J

ade

Dan

gel

0

2

4

6

8

10

12

14

Sim Não

Você sabe o que é o projeto sobre a redução da maioridade penal?

Você sabe o que é maioridadepenal?

12%

69%

19%

Você apoia a proposta de redução da maioridade penal?

A favor

Contra

Não sabe

Pesquisa realizada na escola com 16 adultos acima de 30 anos

Ilustração: Rafael Barbosa

14 15

Ilust

raçã

o: G

abri

el S

anch

ez

Entrevista:

A redução da maioridade penal na visão da socióloga Cláudia Costa de Souza

Em entrevista à reportagem do Terceiro Debate, a socióloga, professora e estudante de direito Cláudia Costa de Souza posicionou-se contra a redução da maioridade penal, prevendo que serão catastróficas as consequências da medida, caso seja aplicada.

Segundo ela, a condição do sistema penitenciário no país não cumpre a função que deveria, de reabilitação do indivíduo para que seja reintroduzido na sociedade.

A socióloga cita o documentário O Grito das Prisões, filme chocante que expõe as condições dos presídios em cinco estados brasileiros, para demonstrar o quanto o Brasil está longe do ideário.

Ela comenta, ainda, sobre a existência de leis que não são aplicadas, devido ao caos no sistema, como a que garante ao preso 1 dia a menos na pena por 3 dias trabalhados ou 12h estudadas.

16 17

Qual é a sua experiência ser em formação.profissional? O s i s t e m a p r i s i o n a l

brasileiro está falido e não dá Eu acompanhava e avaliava conta de acolher toda a população famílias vulneráveis, em situação carcerária existente, muito menos de risco, de pobreza ou de de reabilitar essas pessoas para segurança, justamente por saírem melhores. Com o jovem conviverem com o crime, seja sendo criminalizado, aumentará dentro de suas próprias famílias, ainda mais a população carcerária seja na vizinhança.nos presídios, onde efetivamente Como profissional, como não há estrutura adequada para você aval ia a redução da acolhê-lo.maioridade penal?

Não concordo com a redução. A cadeia será “pós-graduação” no crime para o jovem. O adolescente vai para o crime cedo porque o processo da educação falhou. É um problema social crônico, que precisa ser resolvido, mas a solução não é prender o jovem, que ainda é um

Entrevista:

A redução da maioridade penal na visão da psicóloga social Daniela Cavalcante Bacelar

O jovem é vitima de uma todos esses problemas. Mas, para sociedade, de um Estado falido e isso, serão necessárias algumas i n c o m p e t e n t e c o m s u a s décadas até se obter um resultado obrigações. Todos os impostos inicial.que pagamos, que são muitos, O desarmamento também deveriam ir para educação e ajuda, mas a base é a educação, saúde, que são direitos básicos do que vai ensiná-lo a não usar cidadão. Sem isso, não se pode armas. Arma não é meio de falar em uma sociedade razoável, solução pra nada! Só cria mais nem em qualidade de vida. A problemas, mais crimes.consequência é a criminalização e marginal ização dos menos favorecidos, de baixa renda e pouca escolaridade.

Que alternativas haveria para não ter de reduzir a maioridade penal?

Ed u c a ç ã o, e d u c a ç ã o, educação. É a única solução para

O art. 5º da Constituição assegura aos presos o

respeito à integridade física e moral.

A Lei de Execução Penal (LEP), no seu art. 88,

estabelece que o cumprimento da pena se dê em cela individual, com área

mínima de seis metros quadrados.

18 19

No Brasil, o Estatuto do As pessoas poderiam Desarmamento é uma lei federal voltar a andar armadas nas ruas. de 22 de dezembro de 2003, que H o j e , o E s t a t u t o d o dispõe sobre registro, posse e Desarmamento autoriza apenas comercialização de armas de fogo policiais e outros profissionais da e munição. segurança e da Just iça a

A t u a l m e n t e , u m a circularem armados.comissão especial d iscute O projeto torna o registro mudança no estatuto, que da arma definitivo. O estatuto tornaria mais fácil a compra de exige renovação a cada três anos.armas. Governo e especialistas A proposta acaba com a são contra a mudança. E afirmam perda automática do porte para que a lei atual evitou milhares de quem for pego armado sob efeito mortes. de álcool ou drogas, e libera a

O projeto é defendido pela publicidade de armas e munição, indústria de armas e propõe que hoje é proibida no país.mudanças que podem levar ao O p r o j e t o t a m b é m fim do Estatuto, como por autoriza a compra de até nove exemplo: armas por pessoa. O autor da

A proposta é reduzir de 25 proposta defende que desarmar a anos para 21 anos a idade mínima população não reduz a violência. para comprar armas, liberar a Segundo ele, não se pode negar compra de armas para quem já ao cidadão o direito de ter uma esteve preso e também para arma para enfrentar criminosos.pessoas investigadas por crimes violentos, o que hoje é proibido.

Estatuto do desarmamento:na mira da indústria da bala

E agora tem mais essa: bancada da bala quer facilitar a compra de armas

Foto: Reprodução Internet

20 21

22

Entrevista:

A redução da maioridade

penal na visão do

especialista em Direito

Penal, Direito

Constitucional e Filosofia,

Roberto da Silva Teixeira

Jr., que também é membro

do Instituto Brasileiro de

Ciências Criminais

(IBCCRIM) e funcionário da

8ª Vara Criminal Federal

de São Paulo,

unificar as informações sobre registros criminais e fomentar as e n t i d a d e s d i r e c i o n a d a s à ressocialização, uma vez que só o caráter punitivo da pena vem sendo utilizado.

Outro aspecto importante seria o cumprimento da lei de execuções penais, em que os p r e s í d i o s r e s p e i t a s s e m a integridade dos presos, uma vez que hoje, como disse o próprio ministro da justiça, José Eduardo Cardozo, só temos masmorras.

Cabe ressaltar que casos como o do menor Champinha (ele matou um casal em Embu-Guaçu, na Grande São Paulo) são exceções. Além disso, quando ocorrerem, podem ser tratados co m o ato s i n f ra c i o n a i s , a d e m a n d a r m e d i d a s socioeducativas pelo ECA.

O caminho mais viável, paralelo à reforma do sistema, seria aumentar a previsão do período de internação para atos infracionais que resultem na morte de alguém ou que envolvam violência sexual; e para tanto bastaria reformar o ECA.

Embora eu não acredite que a questão resida em uma cláusula pétrea, entendo que a redução da maioridade penal não resolveria o problema do crime no Brasil, onde apenas 7% dos homicídios são resolvidos, de modo que a redução apenas agravaria as estatísticas.

O problema, na realidade, é a falta de estrutura e o aparelhamento dos órgãos incumbidos de tratar da matéria. Não basta normatizar, é preciso criar mais varas criminais, incrementar a defensoria pública,

75%

25%

Usuários de drogas

Usuários Não Usuários

57%

43%

Frequentavam a escola antes da

internação

Não

Sim

Perfil do adolescente infrator

Ilustração: Rafael Barbosa Fonte: DFM e DPJ/CNJ

40%

24%

9%

6%

3%

3%

2%2%

2% 1%8%

Divisão por crime cometido por adolescentes no Brasil

Roubo

Tráfico de drogas

Homicídio

Ameaça de morte

Furto

Tentativa de homicídio

Porte de arma de fogo

Latrocínio

Tentativa de roubo

Estupro

Outros

Ilust

raçã

o: R

afae

l Bar

bo

sa

Fo

nte

: Sin

ase

23

Artigo de opiniãoIlu

stra

ção

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San

chez

Presídios brasileiros

A realidade dos presídios brasileiros é que são superlotados, sem a mínima infraestrutura para todos os seus “moradores”, portanto um local desumano e incapaz de possibilitar uma reabilitação. Um lugar onde se cultiva o ódio, alimentado pelo progressivo aumento da criminalidade e falta de segurança encontrados no Brasil.Não existe lugar para todos, os presos se revezam para dormir, existem milhares de casos de espancamento, estupro e fome dentro dos presídios. A maioria dos funcionários tem medo de estar ali e por isso deixa que essas barbaridades aconteçam.

O Brasil é um dos primeiros no ranking de piores presídios, perdendo apenas para países da Ásia e do Leste Europeu, sem falar na população carcerária, que é a terceira maior do mundo, estando atrás dos E.U.A, Rússia e China.Estar preso na teoria significa ficar separado por um tempo do convívio social, para que se possa refletir sobre os erros, aprender sobre o que é certo e, após uma reabilitação, sair uma pessoa melhor, que encontre oportunidades. Porém, não é isso o que acontece na prática, ainda mais porque o povo brasileiro tem preconceito com ex presos, que acabam não conseguindo emprego quando voltam a ter liberdade e acabam retornando ao crime.

Isabella Farah

De acordo com balanço do Ministério da Justiça, em 2014

havia no país uma média de 1,69 preso para cada vaga. A típica

prisão brasileira abriga cerca de 17 detentos num espaço onde

caberiam 10. Uma das consequências são as

rebeliões. Pedrinhas, no Maranhão, recentemente ocupou

as manchetes dos jornais por causa das decapitações e

esquartejamentos de presos no Complexo Penitenciário do

município. Um fator importante que contribui para a superlotação

dos presídios brasileiros é o confinamento de presos não

condenados, que representam cerca de um terço da população

carcerária.

24 25

Entrevista:

A redução da

maioridade

penal na visão da ex-

funcionária da Fundação

Casa, Cristina Dangel

C o m o F u n c i o n a a Qual são os tipos de Fundação? crime mais frequentes?

As unidades recebem Tráfico de drogas, roubo e adolescentes e os separa por furto são os mais comuns, porém centros, de acordo com idade, existem casos de homicídio, infração cometida e compleição latrocínio e estupro.(constituição) física.

Qual a classe social Há casos de violência predominante dos detentos?

dentro da instituição? A classe predominante é a Existem muitos casos de mais pobre. Os adolescentes

violência na Fundação, entre os geralmente vêm das favelas e adolescentes e entre eles e os bairros afastados. Na maioria funcionários. das vezes, deixam a escola bem

cedo, mal sabem ler e escrever, O s j o v e n s s a e m não são qualificados para

reparados? trabalhar e não têm valores Nos casos de reabilitação, consolidados.

p e r c e b e - s e u m a g r a n d e p a r t i c i p a ç ã o d a fa m í l i a , psicólogos e assistentes sociais, a l é m d o i n t e r e s s e d o a d o l e s c e n t e e m s e profissionalizar, estudar e sair daquela realidade social.

A Fundação Centro de assistência a jovens de 12 a 21 Atendimento Socioeducativo ao anos incompletos em todo o Adolescente (CASA) é uma Estado de São Paulo. Para os entidade vinculada à Secretaria de jovens que precisam ficar privados Estado da Justiça e da Defesa da de liberdade, a CASA iniciou um C i d a d a n i a . Te m a m i s s ã o programa que prevê a construção primordial de aplicar medidas de 61 centros socioeducativos no socioeducativas de acordo com as Interior – destes, 59 já estão diretrizes e normas previstas no funcionando. Em 2006, na época Estatuto da Cr iança e do da antiga Fundação Estadual do Adolescente (ECA) e no Sistema Bem Estar do Menor (FEBEM), N a c i o n a l d e At e n d i m e n t o 29% dos jovens em internação Socioeducativo (SINASE). reincidiam. Hoje, a taxa está em

A Fundação CASA presta torno de 13%.

Charge extraída da Internet trabalha com o argumento de que os presídios funcionam, hoje, como escolas do crime

Sobre a

Fundação Casa

26 27

Entrevista:

A redução da maioridade

penal na visão da

Assistente Social Erika

Lunardi Longo,

coordenadora do Projeto

Namaskar, em Ubatuba

Qual a sua experiência bola ou participar de alguma aula de teatro. Sem opção nenhuma, profissional nas comunidades?fica muito limitado. Qualquer coisa que tenha é na cidade, fica Eu trabalhei com dois distante e coloca as crianças em bairros populosos e bem carentes risco por terem de atravessar a aqui em Ubatuba, o Ipiranguinha rodovia para vir do Ipiranguinha e, agora, Sesmaria. O Ipiranguinha para o centro. Muitas mães não é um bairro muito populoso, bem permitem, então deixam as carente, mas o projeto só atendia crianças presas no bairros e sem 80 crianças. Havia, na época, 300 acesso a nada. Aí aumenta o risco crianças na lista de espera, fora as de caírem no mundo do tráfico.que nem entravam na lista, só de

O mesmo problema pode saber que seriam acima de 300. O ser visto no bairro do Sesmaria, que eu percebi é que o Estado é que fica na região centro-oeste de ausente. Ubatuba. Não há nada de lazer e No bairro do Ipiranguinha, esporte naquele pedaço. A única por exemplo, não tinha uma quadra que existe no bairro é uma quadra esportiva e nada em que não tem iluminação, não é relação a esporte e lazer. Muitas adequada. Na verdade, é apenas v e z e s e s s a s c r i a n ç a s um terreno, com barro batido, frequentavam o projeto para jogar

mas em tal país, com 14, 12 anos já é punido como adulto”. Só que em muitos países desses o Estado fornece acesso a tudo o que acabei de falar, então é diferente, o jovem teve oportunidade de aprender, de ter acesso à tecnologia, a vários esportes, à cultura. Nessa fase, o adolescente está em formação, não é uma pessoa formada.

Que alternativas haveria para não ter de reduzir a

onde as crianças fazem alguma maioridade penal?atividade esportiva.

Qualquer coisa relacionada P e n s a n d o n a n o s s a a cultura e arte é dentro do projeto realidade, em que o Estado, como Namaskar, só que a gente eu disse, está ausente, meter na consegue atender somente 150 cadeia, em uma cadeia que não crianças, em um bairro que tem de tem estrutura nenhuma, que mal 2 mil a 3 mil. O E s t a d o e s t á dá conta de atender o que já tem, ausente, não oferece acesso a vai resolver ou só vai lotar ainda lazer, esporte, cultura, o que mais? Não é uma solução viável. É colaboraria para afastar o menor inacreditável que existam pessoas do crime. que ainda acham que esse é o

caminho. Se algum dia o Estado C o n t a n d o c o m s u a fizer a parte dele, as cadeias

experiência profissional, o que tiverem condições de acomodar você tem a dizer sobre o tema os presos e cumprirem realmente “redução da maioridade penal”? a proposta de prepará-los para a

reinserção na sociedade, já será diferente. Mesmo assim, tem que Acho que, primeiro, fica se considerar que são indivíduos muita gente comparando: “Ah, em formação.

“É inacreditável que existam pessoas que ainda acham que esse é o caminho

28 29

O que, então, poderia ser feito para esses adolescentes pagarem pelos crimes cometidos?

Hoje, eles já são punidos, já e x i s t e m a s m e d i d a s socioeducativas, mas não acho que sejam de qualidade, pois falta um acompanhamento psicológico m a i s i n t e n s o , f a l t a acompanhamento familiar, afinal não adianta trabalhar só o adolescente, tem que ter um assistente social que acompanhe a família, entenda porque esse adolescente muitas vezes volta para a Fundação Casa. Tem que ter u m a co m p a n h a m e nto b e m próximo desse adolescente, além de cursos que atraiam e que sejam adequados para aquela realidade local.

P o r e x e m p l o , s e o adolescente, que mora em Ubatuba e vai para a Fundação Casa, de repente é enviado para uma unidade em São Paulo, ele acaba fazendo um curso que não lhe será útil quando voltar para a sua cidade, daí não resolve. Então é preciso conhecer a realidade local, que t ipo de trabalho esse adolescente poderia conseguir em

30 31

sua região, e prepará-lo para isso, junto com um acompanhamento psicológico e social bem intenso, q u e c o n t i n u e q u a n d o o adolescente sair, por um período, afinal ele volta para a sua vida normal, para o espaço onde cometeu o crime. Ele vai andar com os mesmos amigos, no mesmo bairro, então, se não houver um acompanhamento, que ele vá pelo menos durante um ano no psicólogo, fica muito difícil, a chance de ele voltar a cometer o crime é muito grande. Tem que haver, ainda, aquele atendimento de assistente social próximo à família. A família inteira tem que estar compromet ida nessa transformação.

“É preciso conhecer a realidade local, que tipo de trabalho esse adolescente poderia conseguir em sua região, e prepará-lo para isso

A ONU é contra a proposta de redução da maioridade

penal. O argumento é o seguinte: 1% dos

adolescentes no Brasil são responsáveis por

homicídios e 36% são vítimas, principalmente

jovens e negros da periferia

Ilust

raçã

o: G

abri

el S

anch

ez