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Terapia Cognitivo-Comportamental dos Transtornos Alimentares Psicologia- Ulbra/Guaíba
Profa. Mestre Cláudia Galvão Mazzoni
Fabiana Lima Rosinski
Lisiane Botelho Ferreira
Patrícia dos Santos Silveira
Resumo: O presente artigo tem como objetivo descrever as principais conseqüências
e alterações que os transtornos alimentares caucionam no pensamento e no
comportamento das portadoras dessa síndrome. A partir dos conhecimentos obtidos
dos transtornos alimentares, em relevante, a bulimia e anorexia nervosas. As autoras
mostram, de forma reduzida, as distorções cognitivas relacionadas com o corpo que é
influenciado por muitos fatores sócioculturais mostrando como a terapia cognitivo-
comportamental trata esse tipo específico de transtorno, a modificação dos sistemas
de crenças distorcidas, a avaliação de eficácia e o transtorno da compulsão alimentar
periódica, utilizando conceitos de autores como Ballone, Duchesne e Almeida. A
terapia cognitivo comportamental tem como objetivo intervir diretamente nas crenças
de distorção corporal.
Palavras chave: Transtorno alimentar. Terapia cognitivo comportamental. Tratamento
INTRODUÇÃO
Os Transtornos Alimentares constituem uma verdadeira "epidemia" que
assola sociedades industrializadas e desenvolvidas acometendo, sobretudo,
adolescentes e adultos jovens. Quais serão os sintomas dessa epidemia
emocional? De um modo geral, o pensamento falho e doentio das pessoas
portadoras dessas patologias se caracteriza por uma obsessão pela perfeição
do corpo. Na realidade, trata-se de uma "epidemia de culto ao corpo" que se
multiplica em uma população patologicamente preocupada com a estética
corporal e afetada por alterações psíquicas relacionadas ao esquema corporal.
É assim que os transtornos alimentares vêem aumentando sua incidência
perigosamente.
Conforme Kaplan (1997) os transtornos alimentares são quadros
psiquiátricos caracterizados por uma grave perturbação do comportamento
alimentar, sendo a anorexia e a bulimia nervosas os dois tipos principais.
A anorexia nervosa pode ser definida como uma recusa sistemática em
manter o peso no mínimo normal adequado à idade e altura, acompanhada de
uma perturbação no modo como o indivíduo vivencia seu peso e sua forma
física. Já a bulimia nervosa caracteriza-se por episódios de comer compulsivo,
associados a um sentimento de descontrole sobre o comportamento alimentar.
Os comportamentos alimentares anormais e as práticas inadequadas de
controle de peso estão associados à insatisfação pessoal e à baixa auto-
estima, sendo comumente expressados pela insatisfação com o peso corporal.
Olhar-se como uma obesa sem ser implica uma distorção cognitiva que pode
ser explicada por algum tipo de aprendizado imposto a um grupo por pressão
psicossocial e cultural.
Quando se elencam os fatores predisponentes à anorexia nervosa,
torna-se óbvio que se sabe pouco sobre a vulnerabilidade individual. Ballone
(2007) atribui à predisposição fundamental a um déficit do eu, no que se refere
à autonomia e ao domínio do próprio corpo, o que dá conta de um sentimento
de “ineficácia pessoal”. Descreve-o assim: “Os pacientes anoréxicos se
percebem como tendo perdido o controle de sua conduta, suas necessidades e
seus impulsos, como não sendo os donos de seus próprios corpos, como
carecendo de um centro de gravidade. Pelo contrário sentem-se sob a
influência de forças externas”.
Segundo Kaplan (1997) os pacientes com Bulimia Nervosa apresentam
uma freqüência maior de sintomas depressivos (por ex., baixa auto-estima,
insegurança) ou Transtornos do Humor (particularmente Transtorno Distímico e
Transtorno Depressivo Maior). Em muitas ou na maior parte dessas pessoas, o
distúrbio do humor começa simultaneamente ou segue o desenvolvimento da
Bulimia Nervosa, sendo que com freqüência atribuem sua perturbação do
humor à Bulimia Nervosa. Também pode haver maior freqüência de sintomas
de ansiedade (por ex., medo de situações sociais) ou Transtornos de
Ansiedade.
A compulsão periódica freqüentemente prossegue até que o paciente se
sinta desconfortável, ou mesmo dolorosamente repleto. A compulsão periódica
é tipicamente desencadeada por estados de humor disfóricos, estressores
interpessoais, intensa fome após restrição por dietas, ou sentimentos
relacionados a peso, forma do corpo e alimentos. A compulsão periódica pode
reduzir temporariamente a disforia, mas autocríticas e humor deprimido
freqüentemente ocorrem logo após.
Na bulimia nervosa, as pessoas ingerem grandes quantidades de
alimentos (episódios de comer compulsivo ou episódios bulímicos) e, depois,
utilizam métodos compensatórios, tais como vômitos auto-induzidos, uso de
laxantes e/ou diuréticos e prática de exercícios extenuantes como forma de
evitar o ganho de peso pelo medo exagerado de engordar. Diferentemente da
anorexia nervosa, na bulimia não há perda de peso, e assim médicos e
familiares têm dificuldade de detectar o problema. A doença ocorre mais
freqüentemente em mulheres jovens, embora possa ocorrer mais raramente
em homens e mulheres com mais idade.
FATORES SOCIOCULTURAIS
Ballone (2007) conclui que pelas características da doença, os fatores
socioculturais podem influir no aumento de sua incidência. Antes deste século,
os alimentos eram disponíveis para as classes sociais mais altas, a comida
abundante e a obesidade denotavam um poder econômico e nível social
elevado. No século XX, grande parte da população dispõe de alimentos de alta
densidade calórica, e a obesidade prevalece nos grupos de população de nível
sócio-econômico inferior. Nas classes altas, à medida que se dispõe de
alimentos mais saborosos e atraentes, há um interesse maior em evitar a
obesidade; os quilos a mais já não são um sinal de luxo; o controle de peso e a
busca da esbelteza se associam a um aumento do número de pacientes com
transtornos alimentares.
RELAÇÃO ENTRE BULIMIA E ANOREXIA NERVOSA
Para Ballone (2007) apesar de que, nas primeiras descrições de
pacientes com anorexia nervosa, eram descritos sintomas bulímicos, estes não
ocupavam um lugar destacado. Entretanto, nos últimos 50 anos aumentou
significativamente o número de pacientes com anorexia nervosa que
apresentam sintomas de bulimia, atribui este aumento á crescente pressão
social pela esbelteza, exercida basicamente sobre a população feminina. É
possível que isto seja um dos fatores que expliquem a evolução da
psicopatologia do transtorno, desde um deleite no ascetismo e na supressão
das necessidades do corpo até o mais até o mais moderno “medo da gordura”.
Herscovici e Bay (1987) afirmam que os pacientes se deslocam entre as
síndromes de anorexia nervosa e bulimia nervosa. Apesar de ser muito menos
freqüente que pacientes com bulimia nervosa desenvolvam depois uma
anorexia nervosa, algumas vezes isso ocorre. Também é certo que pacientes
com bulimia nervosa às vezes atravessam períodos em que obtêm um controle
sobre a sua ingestão e, se não estão sob uma supervisão clínica adequada,
podem evoluir para uma anorexia nervosa.
Tanto a anorexia nervosa como a bulimia, independentemente do peso,
são parte de uma gama de transtornos da alimentação. Em ambos os casos,
há um medo mórbido da gordura e a busca da esbelteza, como um recurso
para lidar com dificuldades no desenvolvimento, ou então uma maneira de
enfrentar o mal estar emocional. (HERSCOVICI E BAY APUD ANDERSEN)
DIMINUIÇÃO DA RESTRIÇÃO ALIMENTAR
Atualmente para Duchesne e Almeida (2002) a história de privação
alimentar de um indivíduo pode ser significativa para o desenvolvimento de
alterações persistentes do padrão alimentar, determinando também alterações
de humor e cognição. A normalização da alimentação inicia-se pela discussão
dos fatores que favorecem a manutenção da restrição dietética e por
orientações acerca de alimentação e regulação de peso. O tratamento
concentra-se no estabelecimento de horários regulares para alimentação e na
exposição gradual aos alimentos e situações freqüentemente evitadas
ABORDAGEM COGNITIVO-COMPORTAMENTAL DO DISTÚRBIO DA
IMAGEM CORPORAL.
Duchesne e Almeida (2002) consideram a terapia cognitivo
comportamental a abordagem do distúrbio de imagem corporal central para o
tratamento da Anorexia Nervosa. O conceito de “imagem corporal” envolve três
componentes: 1) a precisão da percepção do tamanho corporal; 2) o grau de
ansiedade associada à aparência e 3) o comportamento de evitação de
exposição corporal. Para diminuir a distorção da percepção corporal pode-se
solicitar à paciente que desenhe como percebe seu corpo, olhando-se em um
espelho. Em seguida, o terapeuta desenha a silhueta real, para que a paciente
possa observar a discrepância entre os desenhos. Essa medida pode reduzir a
ansiedade associada à aparência e facilitar a exposição corporal, que é
organizada de forma gradual, incentivando a paciente a usar roupas justas e
curtas. Para maior redução da ansiedade, a paciente deve também modificar
seu ideal de imagem corporal, aprendendo a lidar melhor com eventuais
“imperfeições”.
MODIFICAÇÃO DO SISTEMA DE CRENÇAS
Para Duchesne e Almeida (2002) a terapia cognitivo comportamental
pressupõe que o sistema de crenças de um indivíduo exerce importante papel
no desenvolvimento de seus sentimentos e comportamentos. Desta forma, as
pacientes com transtornos alimentares apresentam crenças distorcidas e
disfuncionais acerca de peso, formato corporal, alimentação e valor pessoal,
que são significativas para a manutenção dos transtornos alimentares. Uma
das crenças distorcidas centrais para os transtornos alimentares é a que
equaciona valor pessoal ao peso e formato corporal, ignorando ou não
valorizando outros parâmetros. Para pacientes com transtornos alimentares a
magreza estaria associada à competência, superioridade e sucesso, tornando-
se assim intrinsecamente associada à auto-estima.
O sistema distorcido de crenças pode perpetuar-se em decorrência de
várias tendências disfuncionais de raciocínio. Uma das tendências
freqüentemente encontradas é a de atentar seletivamente para as informações
que confirmam suas crenças, ignorando ou distorcendo os dados que poderiam
questioná-las.
Para modificar o sistema de crenças a terapia cognitivo comportamental
utiliza diversas técnicas. Uma delas consiste em ensinar a paciente a identificar
pensamentos que possam conter alguma distorção. Em seguida ela é
incentivada a analisar todas as evidências disponíveis que possam confirmar
ou refutar o pensamento distorcido, tornando-o mais funcional. Uma grande
variedade de estratégias, como as descritas para o tratamento da imagem
corporal, podem ser utilizadas para facilitar a modificação das crenças. Por
exemplo, o desenho da imagem corporal e a exposição gradual do corpo
permitem que a paciente modifique suas crenças de que está gorda e de que
será rejeitada em função disto.
O processo de análise das crenças é realizado de forma colaborativa,
sendo o terapeuta inicialmente mais ativo, ajudando a paciente a treinar as
habilidades necessárias e, progressivamente, incentivando a paciente a
comportar-se como se fosse o próprio terapeuta.
AVALIAÇÃO DE EFICÁCIA
Duchesne e Almeida (2002) afirmam que no tratamento da Bulimia
Nervosa, a terapia cognitivo comportamental tem sido apontada como uma
psicoterapia eficaz na remissão ou diminuição da freqüência de episódios de
compulsão alimentar, dos comportamentos purgativos, da restrição alimentar e
da preocupação com peso e formato corporal. A terapia tem auxiliado também
na redução dos sintomas depressivos associados, na melhora da auto-estima e
do funcionamento social. A utilidade desta forma de intervenção tem sido
enfatizada por superar os resultados alcançados com o uso de medicação
isolada e pelo fato da associação de terapia cognitivo comportamental à
medicação aumentar a eficácia do tratamento farmacológico. Foi observada
também uma boa manutenção dos resultados.
TRANSTORNO DA COMPULSÃO ALIMENTAR PERIÓDICA
Segundo Duchesne e Almeida (2002) o programa de terapia cognitivo
comportamental para o Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica (TCAP)
foi desenvolvido a partir do modelo utilizado para a Bulimia Nervosa, tendo sido
necessárias algumas adaptações às diferenças entre estas duas síndromes.
Os objetivos terapêuticos no Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica
incluem o desenvolvimento de estratégias para controle de episódios de
compulsão alimentar, a modificação de hábitos alimentares, o desenvolvimento
de estratégias para adesão a exercício físico e a redução gradual do peso,
quando há obesidade associada. A teoria cognitivo comportamental sugere,
também para estes casos, a abordagem da auto-estima, a redução da
ansiedade associada à aparência e a modificação do sistema de crenças
disfuncionais, realizada nos moldes já descritos para Anorexia Nervosa e
Bulimia Nervosa.
O tratamento, afirma Duchesne e Almeida (2002), está basicamente centrado em
reeducação alimentar, orientação para prática de atividade física adequada, abordagem
do distúrbio da imagem corporal e da auto-estima, e modificação do sistema de crenças.
Devido às características diagnósticas e as complicações clínicas, o tratamento requer
também uma visão em intervenção em crise. A terapia cognitivo comportamental tem-se
mostrado eficaz para o tratamento e para a prevenção da recaída nos transtornos
alimentares.
CONCLUSÃO
Conclui então Duchesne e Almeida (2002) que estudos comparando
terapia cognitivo comportamental, a outros tipos de terapia evidenciam maior
eficácia da terapia cognitivo comportamental em relação à terapia de apoio, e
resultados similares aos obtidos por terapia interpessoal. A terapia cognitivo
comportamental considera a relação terapêutica fundamental para a obtenção da
melhora dos transtornos alimentares. O terapeuta mantém uma atitude
empática em relação às dificuldades e necessidades da paciente e apresenta a
terapia como um trabalho em equipe, no qual ambos terão uma participação
ativa na detecção de causas das dificuldades e na seleção das estratégias
utilizadas no tratamento.
O tratamento dos transtornos alimentares é realizado em equipe
multidisciplinar, sendo necessária a associação de psicólogos a outros
profissionais, tais como: nutricionistas, médicos clínicos e psiquiatras. O
envolvimento da família no tratamento pode ajudar a criar uma estrutura de
colaboração, facilitando mudanças.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
HERSCOVICI, R.C; BAY, L. Anorexia nervosa e Bulimia: Ameaças á
Autonomia. Porto Alegre. Artes Médicas, 1997.
KAPLAN, H.I; SADOCK, B.J; GREBB, J.A. Compêndio de Psiquiatria:
Ciências do Comportamento e Psiquiatria Clínica. Porto Alegre. Artes
Médicas, 1997.
Ballone, GJ - Transtornos Alimentares, in. Psiqweb, Internet, disponível em
http://www.psiqweb.med.br/, revisto em 2007. Acesso em 11/de setembro de
2009.
Rev Bras Psiquiatr 2002; 24(Supl III): 49-53Terapia Cognitivo-Comportamental
dos transtornos alimentares- Mônica Duchesne e Paola Espósito de Moraes
Almeida.